A correção de erros no jornalismo online: reflexões a partir do monitoramento de notícias e de...

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1 A correção de erros no jornalismo online: reflexões a partir do monitoramento de notícias e de entrevistas em cinco redações brasileiras Lívia de Souza Vieira 1 Resumo: O erro jornalístico é um objeto de reflexão que se localiza na confluência de ética, técnica e qualidade. Pode ser ocasionado por despreparo dos profissionais, por falta de gestão na cadeia informativa, entre outras razões. Apesar disso, as organizações jornalísticas - se comparadas a de outros ramos - pouco fazem para desenvolver mecanismos mais efetivos de identificação de erros e retificação. O cenário se torna mais agudo na internet, com os webjornais que não só oferecem uma grande quantidade de conteúdos, como o fazem de forma apressada, em condições propícias ao erro. Este artigo tem como base a pesquisa de mestrado da autora, que versa sobre a correção de erros no jornalismo online, com ênfase na análise das modalidades de publicação de erratas em cinco webjornais brasileiros: Folha de S. Paulo, O Globo, R7, G1 e Zero Hora. Utilizou-se como metodologia o monitoramento das modificações feitas em 1.500 notícias durante 100 dias, com análise qualitativa; e entrevistas em profundidade com os editores dos cinco webjornais. Os resultados indicam falhas no processo de correção de erros e inobservância pelos veículos jornalísticos brasileiros das especificidades da retificação no meio digital. Palavras-chave: Erro jornalístico. Correção. Errata. Jornalismo online. Ética. 1 INTRODUÇÃO Na era da instantaneidade e do ‘tempo real’, vivemos atualmente o que Ignacio Ramonet (2012) chama de “a explosão do jornalismo”. Segundo o autor, passamos das mídias de massa para a massa de mídias. Ou seja, se antes havia uma certa hegemonia, com poucos veículos agindo como emissores de informação, hoje o cenário mudou: cada vez mais pessoas produzem conteúdos (noticiosos ou não) em diversas mídias. Mais notícias circulando em curtíssimo espaço de tempo na internet, criadas ou não por jornalistas, nos fazem chegar às seguintes questões: o jornalismo online está produzindo informação com menos erros? E de que forma os veículos corrigem seus erros? 1 Doutoranda e mestre em Jornalismo pela Universidade Federal de Santa Catarina (PosJor-UFSC). Tem especialização lato sensu em Comunicação Empresarial pela Universidade Cândido Mendes (UCAM) e graduação em Jornalismo pela Universidade Federal Fluminense (UFF). É docente nos cursos de Jornalismo e Publicidade e Propaganda do Bom Jesus/IELUSC (Joinville – SC). E-mail: [email protected]

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O erro jornalístico é um objeto de reflexão que se localiza na confluência de ética, técnica e qualidade. Pode ser ocasionado por despreparo dos profissionais, por falta de gestão na cadeia informativa, entre outras razões. Apesar disso, as organizações jornalísticas - se comparadas a de outros ramos - pouco fazem para desenvolver mecanismos mais efetivos de identificação de erros e retificação. O cenário se torna mais agudo na internet, com os webjornais que não só oferecem uma grande quantidade de conteúdos, como o fazem de forma apressada, em condições propícias ao erro. Este artigo tem como base a pesquisa de mestrado da autora, que versa sobre a correção de erros no jornalismo online, com ênfase na análise das modalidades de publicação de erratas em cinco webjornais brasileiros: Folha de S. Paulo, O Globo, R7, G1 e Zero Hora. Utilizou-se como metodologia o monitoramento das modificações feitas em 1.500 notícias durante 100 dias, com análise qualitativa; e entrevistas em profundidade com os editores dos cinco webjornais. Os resultados indicam falhas no processo de correção de erros e inobservância pelos veículos jornalísticos brasileiros das especificidades da retificação no meio digital.

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    A correo de erros no jornalismo online: reflexes a partir do monitoramento de notcias e de entrevistas em cinco redaes

    brasileiras

    Lvia de Souza Vieira1

    Resumo: O erro jornalstico um objeto de reflexo que se localiza na confluncia de tica, tcnica e qualidade. Pode ser ocasionado por despreparo dos profissionais, por falta de gesto na cadeia informativa, entre outras razes. Apesar disso, as organizaes jornalsticas - se comparadas a de outros ramos - pouco fazem para desenvolver mecanismos mais efetivos de identificao de erros e retificao. O cenrio se torna mais agudo na internet, com os webjornais que no s oferecem uma grande quantidade de contedos, como o fazem de forma apressada, em condies propcias ao erro. Este artigo tem como base a pesquisa de mestrado da autora, que versa sobre a correo de erros no jornalismo online, com nfase na anlise das modalidades de publicao de erratas em cinco webjornais brasileiros: Folha de S. Paulo, O Globo, R7, G1 e Zero Hora. Utilizou-se como metodologia o monitoramento das modificaes feitas em 1.500 notcias durante 100 dias, com anlise qualitativa; e entrevistas em profundidade com os editores dos cinco webjornais. Os resultados indicam falhas no processo de correo de erros e inobservncia pelos veculos jornalsticos brasileiros das especificidades da retificao no meio digital. Palavras-chave: Erro jornalstico. Correo. Errata. Jornalismo online. tica.

    1 INTRODUO

    Na era da instantaneidade e do tempo real, vivemos atualmente o que Ignacio

    Ramonet (2012) chama de a exploso do jornalismo. Segundo o autor, passamos das

    mdias de massa para a massa de mdias. Ou seja, se antes havia uma certa hegemonia,

    com poucos veculos agindo como emissores de informao, hoje o cenrio mudou: cada

    vez mais pessoas produzem contedos (noticiosos ou no) em diversas mdias. Mais

    notcias circulando em curtssimo espao de tempo na internet, criadas ou no por

    jornalistas, nos fazem chegar s seguintes questes: o jornalismo online est produzindo

    informao com menos erros? E de que forma os veculos corrigem seus erros?

    1 Doutoranda e mestre em Jornalismo pela Universidade Federal de Santa Catarina (PosJor-UFSC). Tem

    especializao lato sensu em Comunicao Empresarial pela Universidade Cndido Mendes (UCAM) e graduao em Jornalismo pela Universidade Federal Fluminense (UFF). docente nos cursos de Jornalismo e Publicidade e Propaganda do Bom Jesus/IELUSC (Joinville SC). E-mail: [email protected]

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    As respostas para essas perguntas partem da compreenso de que a informao

    correta e precisa um valor do jornalismo. Picard (2010, p. 49) afirma que a correo de

    erros um valor instrumental, a exemplo da interao social, do engajamento, da

    participao democrtica e da soluo de conflitos, ligados a valores mais intrnsecos como

    verdade, honestidade e identidade. "Os valores so particularmente importantes na

    produo e consumo de notcias. Eles desempenham papel altamente significativo na

    cultura onde informaes e notcias so criadas e distribudas (PICARD, 2010, p. 52).

    Outra questo basilar que a correo de erros, quando feita de forma

    transparente, ajuda a construir confiana e credibilidade do veculo com seu pblico. O

    defensor do leitor (ombudsman) do jornal El Pas, Toms Delcls, citou em uma de suas

    colunas um estudo do antigo diretor do Los Angeles Times, John Carroll. Segundo ele,

    Carroll comparou os erros jornalsticos com a poluio industrial. E, admitindo que

    comet-los inevitvel, defendia que um bom jornal limpa a si mesmo reconhecendo-os

    e reparando-os2 (DELCLS, 2013, online). Essa analogia com a poluio parece bastante

    adequada. A correo de erros seria, nesse contexto, a melhor limpeza possvel para o

    veculo jornalstico. Delcls ainda acrescenta que o reconhecimento do erro a maneira

    mais honesta e franca de manter a reputao de um jornal que tem em sua funo central

    explicar de forma verdadeira o que acontece3 (Id. Ibid.).

    A partir dessas breves reflexes, h questionamentos especficos sobre a retificao

    no contexto do jornalismo online. Como funciona o sistema de publicao de erratas nesse

    ambiente? H modificaes nas pginas dos webjornais no informadas aos leitores, ou seja,

    h erros que no se transformam em erratas, mas simplesmente em atualizaes?

    A seguir, apresentamos uma metodologia para deteco de erros e a anlise dos

    resultados obtidos por meio do monitoramento de cinco webjornais, que nos permitem

    traar um panorama do fluxo de erros nas rotinas produtivas das redaes online.

    2 COMO FUNCIONA A CORREO DE ERROS NA INTERNET?

    2 Traduo livre do original: Y, admitiendo que cometerlos es inevitable, defenda que un buen peridico se

    limpia a s mismo reconocindolos y reparndolos (Delcls, 2013, online). 3 Traduo livre do original: El reconocimiento del error es la manera ms honesta y franca de mantener la reputacin de un diario que tiene en su empeo central explicar de forma veraz lo que sucede (Id. Ibid.).

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    Durante 100 dias (entre 16 de fevereiro e 1 de junho de 2013 , no caso de O Globo,

    Folha de S. Paulo, G1 e R7; e entre 18 de julho e 25 de outubro, no caso de Zero Hora), foi

    realizado o monitoramento de 1.500 notcias em cinco webjornais brasileiros de

    referncia: Folha de S. Paulo, Zero Hora, G1, O Globo e R7. Durante o perodo, trs notcias

    de cada webjornal foram inseridas diariamente no site Change Detection4 de forma a

    identificar alteraes nas pginas. Pela manh, foram cadastradas as notcias mais

    recentes dos webjornais, atendendo ao critrio de atualidade; tarde, manchetes (critrio

    de relevncia); e noite, as mais lidas/mais comentadas (popularidade).

    Optamos pelo aprofundamento da anlise qualitativa, melhor forma de

    compreender esse processo. Segundo Seabra (2001, p. 35), como a realidade social

    representa o prprio dinamismo da vida individual e coletiva, com toda a riqueza de

    significados a ela relacionados, o objeto da pesquisa social essencialmente qualitativo.

    A anlise das pginas observadas resultou em dez falhas: falta de transparncia,

    retificao no visvel, interrupo do processo de retificao, reviso deficiente, pressa,

    perpetuao do erro, falta de interao com o leitor, notcia original sem meno ao erro,

    reproduo automtica de material de terceiros e excesso de modificaes.

    A ttulo de exemplo, selecionamos uma notcia do portal R7 (figura 1). No primeiro

    pargrafo, h a informao de que diante da onda de violncia que j deixou 106

    mortos...; e ainda, no subttulo da matria, est dito que neste sbado, 25 pessoas foram

    presas, segundo cinco advogados. Duas palavras erradas foram o bastante para mudar

    completamente a informao. Na verdade, no foram 106 mortos, mas 106 ataques; e a

    informao dos 25 presos no havia sido passada pelos advogados (como sugere a palavra

    segundo). Era: 25 pessoas foram presas, sendo cinco advogados. Os erros

    permaneceram ao longo de quase 24 horas no site do R7. Inclusive a matria foi manchete

    do portal durante todo o dia 16. Depois, foi simplesmente retificada sem qualquer errata

    que, nesse caso, seria extremamente necessria.

    4 De forma automtica, o site mostra as atualizaes de texto feitas nas pginas previamente cadastradas, destacando em amarelo o que foi includo e em tachado, os trechos suprimidos. Disponvel em: www.changedetection.com (acesso em 13 ago 2014).

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    Figura 1: reproduo de modificao identificada em notcia do R7 de 16.2.20135

    Ang e Nadarajan (1999) fizeram um estudo sobre erro em webjornais americanos,

    que teve a retificao como uma das questes centrais. As autoras questionaram quando se

    deve simplesmente corrigir o erro sem um aviso de correo (errata); quando preciso

    deixar o erro visvel e fazer a correo; ou ainda quando necessrio corrigir o erro e dar a

    errata.

    As respostas apontaram os seguintes caminhos: chamar ateno para pequenos erros

    pode ser contra-producente (erros em locais e datas, ortogrficos e de digitao). Esses

    podem ser corrigidos online sem emitir uma errata (ANG e NADARAJAN, 1999, p. 11). Mas

    no caso de erros materiais (erros de ttulo, declarao errada, erros factuais e omisses),

    uma errata necessria. A seguir, um resumo das falhas encontradas:

    5 Disponvel em: http://noticias.r7.com/cidades/policia-de-santa-catarina-cumpre-mandados-de-prisao-em-meio-a-onda-de-violencia-no-estado-17022013. Acesso em 13 de agosto de 2014.

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    Tabela 1: Sistematizao das falhas encontradas nos webjornais analisados Falha Resumo

    1. Falta de transparncia Os webjornais alteram os textos das notcias sem explicitar para o leitor o que foi modificado.

    2. Retificao no visvel Mesmo com modificaes na notcia, a data e o horrio de atualizao no so alterados na pgina.

    3. Interrupo do processo de retificao A simples mudana de uma palavra pode transformar toda a notcia e, por isso, pede uma errata que, no entanto, no ocorre.

    4. Reviso deficiente Erros de ortografia, digitao, concordncia gramatical, entre outros. So casos em que o reprter primeiro publica e depois revisa, comprometendo assim a qualidade da informao.

    5. Pressa Casos em que a pressa faz com que a notcia seja divulgada com erros graves.

    6. Perpetuao do erro Erros no percebidos e, portanto, no corrigidos, que vo se perpetuar na web.

    7. Falta de interao com o leitor Em dois exemplos, a autora tentou se comunicar com o webjornal para alertar sobre erros, mas no houve resposta.

    8. Notcia original sem meno ao erro

    A informao corrigida, mas sem nenhuma meno retificao feita na pgina da notcia.

    9. Reproduo automtica de material de terceiros

    Repetio exata da correo enviada pela agncia ou de releases, que acabam confundindo o leitor.

    10. Excesso de modificaes Ocorre principalmente nas coberturas em tempo real e no considera o leitor que acessou a notcia em diferentes momentos.

    Fonte: Elaborao da autora.

    3 ENTREVISTAS COM EDITORES DE CINCO WEBJORNAIS BRASILEIROS

    O monitoramento das notcias e sua consequente anlise apontaram falhas

    importantes durante o processo de correo de erros nos webjornais. Apesar de os dados

    terem mostrado claramente que h problemas nesse fluxo, tornou-se imprescindvel

    entender os porqus dessas falhas. Dito de outro modo, alm de somente apontar as

    falhas, era preciso conhecer os procedimentos internos de cada webjornal numa

    perspectiva dialtica.

    Dessa forma, foram realizadas entrevistas presenciais individuais em profundidade

    com o Diretor de Contedo do portal R7, Luiz Pimentel6; com o Secretrio-Assistente de

    Redao da rea Digital da Folha de S.Paulo, Roberto Dias7; com a Diretora de Redao da

    Zero Hora e dos jornais do Grupo RBS no Rio Grande do Sul em todas as plataformas,

    Marta Gleich8; e com o Editor Executivo de Plataformas Digitais de O Globo, Pedro Doria9.

    Em razo da poltica interna do portal G1, a entrevista com o Editor Executivo Renato

    6 Entrevista realizada no dia 4 de outubro de 2013 na sede do portal R7, em So Paulo.

    7 Entrevista realizada no dia 4 de outubro de 2013 na sede do jornal Folha de S. Paulo, em So Paulo. 8 Entrevista realizada no dia 18 de outubro de 2013 na sede do jornal Zero Hora, em Porto Alegre. 9 Entrevista realizada no dia 1 de novembro de 2013 na sede do jornal O Globo, no Rio de Janeiro.

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    Franzini s pde ser realizada por email10 e por intermdio do Globo Universidade, que

    centraliza a interlocuo entre Academia e veculos do grupo. No caso do jornal Zero Hora,

    ainda foi realizada uma entrevista por e-mail com o Diretor de Redao do Dirio

    Catarinense e dos jornais do Grupo RBS em Santa Catarina, Ricardo Stefanelli11, pois ele

    coordenou, em 2007, a criao do Manual de Preveno de Erros do Grupo RBS. Em todas

    as entrevistas utilizou-se o mesmo roteiro semiestruturado de perguntas.

    A entrevista em profundidade uma tcnica qualitativa que visa recolher

    respostas a partir da experincia subjetiva de uma fonte, selecionada por deter

    informaes que se deseja conhecer (DUARTE, 2006, p. 62). Segundo o autor, este

    recurso metodolgico explora um assunto a partir da busca de informaes, percepes e

    experincias, para ento analis-las e apresent-las de forma estruturada.

    Assim, a priorizao pela entrevista presencial objetivou identificar nuances,

    intenes e procedimentos imperceptveis por meio da anlise de dados empricos ou das

    respostas enviadas por e-mail. Nota-se, inclusive, uma diferena importante entre a

    entrevista feita com o editor do G1 e as demais, no s pelo menor volume de contedo,

    mas principalmente pela previsibilidade do discurso corporativo. Como veremos a seguir, a

    imprevisibilidade da entrevista presencial gerou descobertas fundamentais para a

    pesquisa, que talvez no tivessem sido feitas por meio de um questionrio enviado

    digitalmente.

    Depois de gravadas e transcritas, as entrevistas foram sistematizadas em grandes

    temas, como veremos a seguir.

    3.1 A existncia (ou no) de uma poltica de correo de erros

    Os principais manuais de redao do pas abordam a questo do erro jornalstico,

    diferindo no detalhamento de diretrizes para os reprteres quando o erro ocorre. Mas o

    fato deste assunto estar presente nos manuais no quer dizer que haja uma poltica de

    correo de erros estabelecida, como realmente percebemos nas entrevistas.

    10 Entrevista respondida por e-mail no dia 11 de novembro de 2013. 11 Entrevista respondida por e-mail no dia 3 de novembro de 2013.

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    De acordo com Pedro Doria (2013), O Globo tem como poltica corrigir erros e

    segue as instrues previstas no manual de conduta. No h um documento especfico

    sobre os erros jornalsticos.

    A Folha de S. Paulo tambm segue o que est previsto no manual de redao. De

    acordo com Roberto Dias (2013), o manual da Folha muito claro: errou, corrige. A Folha

    no tem nenhum problema em corrigir erros, temos a seo fixa Erramos na pgina 3 do

    jornal. Mesmo assim, Dias reconhece que o veculo no consegue corrigir a maioria dos

    erros que comete.

    Fazemos alguns controles que nos indicam que a gente no consegue corrigir a grande maioria dos erros que cometemos, assim como qualquer jornal do mundo. A gente no consegue corrigir porque no consegue detectar, porque no tem conhecimento (o que no significa que no tenhamos errado). Mas tudo o que chega ao nosso conhecimento ou que a gente consegue detectar, a gente corrige sem nenhum tipo de problema. (DIAS, 2013)

    O portal G1 segue as orientaes dos Princpios Editoriais das Organizaes Globo

    que, como vimos no segundo captulo, o que mais detalha o assunto. Segundo Renato

    Franzini (2013), o G1 tem regras sobre a correo de erros. A mais geral que todos

    devem ser corrigidos. No entanto, tambm no h um documento especfico sobre os

    erros jornalsticos.

    De acordo com Luiz Pimentel (2013), o portal R7 tem um manual de redao, mas

    no colocamos online publicamente porque so nossas polticas internas. Dentro do

    manual existe uma poltica de correo de erros, mas ela no to objetiva quanto voc

    tem que fazer num veculo impresso. Pimentel explica que o manual est no Google

    Docs12. As pessoas aqui tm um email que d acesso ao Google Docs, se elas quiserem

    imprimir, podem imprimir. A gente est inclusive refazendo o manual agora. E a eu tenho

    a ideia de imprimir para cada um dos redatores, pra que eles tenham uma consulta que

    seja fsica (PIMENTEL, 2013).

    O jornal Zero Hora o nico que possui um documento especfico sobre os erros

    jornalsticos. Criado em 2007, o Manual de Preveno de Erros do Grupo RBS foi

    distribudo para todos os jornalistas de Santa Catarina e do Rio Grande do Sul. Ricardo

    12 O Google Docs faz parte de um pacote de aplicativos do Google, que funciona totalmente online e diretamente no browser. Esses arquivos podem ser compartilhados e editados por outras pessoas.

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    Stefanelli (2013) explica que as redaes tm hoje exemplares desse manual, mas como

    os processos vo mudando, precisamos atualizar esse guia. No temos data prevista para

    tal. At l, no h nova distribuio, usamos os atuais. De acordo com Marta Gleich

    (2013), um assunto meio pendular. Ns j tivemos aqui processos mais agudos de

    preveno de erros, nesse momento estamos com menos desses processos. O que a gente

    faz? Corrige o erro quando detectado, at porque considerado crime se o erro no

    corrigido.

    A partir das entrevistas, observamos que, dos cinco webjornais apenas um possui

    um documento especfico que verse sobre o processo de correo de erros. E mesmo na

    Zero Hora esse documento no mais difundido como na poca do seu lanamento, em

    2007, necessitando, inclusive, de uma reviso. Outra questo que chama ateno o fato

    de o portal R7 disponibilizar seu manual de redao somente de forma interna, utilizando

    o Google Docs. Por se tratar de um veculo nativo digital, seria de grande importncia a

    divulgao desse manual, que deve conter orientaes especficas para o meio online. A

    autora no teve acesso ao manual, desta forma, no h como analisar de que forma a

    questo do erro tratada nele.

    3.2 Como os erros chegam redao

    No portal G1, as comunicaes de erro por parte do leitor podem chegar das

    seguintes formas: pelo Fale Conosco, em comentrios na prpria reportagem ou pelos

    perfis nas redes sociais. De acordo com Renato Franzini (2013),

    o Fale Conosco gerenciado por uma equipe especializada na Central de Atendimento ao Telespectador (CAT) da TV Globo. Essa equipe filtra as mensagens, repassando para a redao, com urgncia, as classificadas como "comunicao de erro". A moderao de comentrios e o gerenciamento dos perfis nas redes sociais so feitos por uma equipe na prpria redao do G1. Em todos os casos, assim que uma comunicao recebida, ela repassada para a rea responsvel. No caso das mensagens que chegam pelo Fale conosco, depois que o erro corrigido, a CAT envia um aviso para o leitor. (FRANZINI, 2013)

    Na Folha de S. Paulo, Roberto Dias explica que os alertas de erros chegam pela

    prpria redao (um reprter v um erro, avisa e h a correo); pela ombudsman (tanto

    os erros que ela v quanto os que ela recebe dos leitores, fontes, etc); ou pelo leitor direto

    para a redao (seja no Painel do Leitor, nos comentrios do site ou nas redes sociais). Ele

    ainda afirma que o jornal recebe muitas comunicaes de erro por parte do leitor: Temos

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    no site aquela rea de comunicao do erro e o leitor pode fazer diretamente por ela. Em

    geral, quando h erro, a informao corrigida, publicada e respondemos o leitor (DIAS,

    2013). Posteriormente, por e-mail, Dias enviou autora as seguintes informaes relativas

    ao ms de setembro de 2013: Publicamos 127 Erramos, sendo 14 exclusivos do online e

    os demais impresso e online; 38% dos erros apontados vieram via redao/fontes, 37% via

    ombudsman e 25% via leitores diretamente (Id. Ibid.).

    Assim como a Folha, o jornal Zero Hora possui um cone para comunicao do erro

    por parte do leitor. Na entrevista, Marta Gleich inicialmente afirmou que a resposta a

    essas comunicaes ficava a cargo da editoria de Relacionamento com o Leitor. Mas ela

    decidiu testar se o sistema realmente funcionava, enviando uma comunicao de erro em

    uma matria selecionada aleatoriamente no site (a matria, de trs pargrafos, realmente

    continha quatro erros de ortografia). Aps o teste, Gleich foi at a editoria responsvel e a

    editora afirmou que as comunicaes de erro caem numa pasta no gerenciador de

    contedo de cada editoria. Ou seja, se o leitor viu um erro em uma matria de Cultura,

    essa comunicao cai numa pasta que deve ser aberta e respondida pelo editor de Cultura,

    no gerenciador de contedo. No entanto e a reside o grande problema esse processo

    no estava claro para os editores e, ao que tudo indica, essas comunicaes no so

    respondidas. Marta Gleich (2013) chegou a dizer voc est vendo tudo ao vivo e a cores,

    dando a entender que a autora havia presenciado a identificao de uma falha no processo

    de correo do jornal. Ela ainda acrescentou que o alerta de correo chega de diversas

    maneiras, por um twitter, pela telefonista, pela prpria fonte, por e-mail ou pelo prprio

    reprter que se d conta do erro.

    No portal R7, Luiz Pimentel (2013) afirma que o alerta de erros chega,

    principalmente, pelas redes sociais. As redes sociais so os observadores da internet. As

    pessoas acham que tm seguidores no Twitter, mas elas tm vigias. O Facebook mais

    social mesmo, no Twitter qualquer erro o pessoal j d um print na tela (porque sabem

    que o erro vai ser corrigido rapidamente), publicam e espalham. Pimentel explica que as

    comunicaes so sempre respondidas, tendo, inclusive, uma pessoa que cuida

    especificamente do Fale Conosco.

    No jornal O Globo, Pedro Doria (2013) enfatiza que as comunicaes de erro

    acontecem diariamente, tanto pelo leitor quanto pela fonte, e no nem via canais

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    tradicionais como o site, via Twitter e Facebook toda hora. Quando perguntado sobre a

    inexistncia de um cone de comunicao de erro no site, que comum nos demais

    veculos, Doria afirma que

    no achamos necessrio e por um motivo muito simples. O que acaba acontecendo, principalmente agora que a gente vai entrar em ano eleitoral, que todo mundo do PT vem dizer que o que a gente publica sobre o PSDB est errado, se for a favor do PSDB; e vice-versa. Vira uma guerra pouco eficiente e ns consideramos que j existem inmeros canais de contato com o leitor. A gente tem o Eu Reprter, que serve para o leitor passar notcia; a gente publica o email de todos os jornalistas, tanto no jornal quanto no site; ns temos os emails dos editores publicados, temos Facebook, Twitter... A gente no sente que existe uma falta de caminhos para o leitor entrar em contato. E temos uma equipe de mdias sociais extremamente ativa, no existe tweet ou comentrio no Facebook que no seja respondido quando h necessidade. (DORIA, 2013)

    Pelas respostas obtidas, nota-se que a comunicao de erro por parte do leitor

    um processo que est dentro das preocupaes dos webjornais, mas que nem sempre

    funciona como deveria. No G1, o fato de estar sob a responsabilidade da Central de

    Atendimento ao Telespectador da Rede Globo bastante positivo mas, como vimos no

    captulo trs, a autora comunicou um erro por meio do comentrio da matria e o mesmo

    no foi respondido. certo que o volume de comentrios no portal muito grande, mas

    como no h um cone de comunicao do erro, o leitor pode no encontrar a melhor

    forma de se comunicar com o veculo.

    No caso da Folha de S. Paulo, ntida a preocupao com a mensurao dos erros,

    o que faz com que o webjornal seja extremamente assertivo. Pelos dados enviados, chama

    ateno os erros relatados pela ombudsman, que superam, inclusive, os enviados pelos

    leitores. J a Zero Hora, alm de no ter um controle dos alertas de erros, mostrou falhas

    no processo de comunicao do erro por parte do leitor. No se sabe desde quando esses

    alertas no so lidos e nem tampouco respondidos -, o que caracteriza um descontrole.

    No portal R7, apesar de Pimentel afirmar que os alertas de erros so respondidos,

    verificamos, tambm no captulo trs, que isso, na prtica, no ocorre sempre.

    Em O Globo, perceptvel a ateno que o veculo d aos erros vindos das redes

    sociais, pois a repercusso tende a ser maior. No entanto, Pedro Doria no v necessidade

    de um canal especfico para a comunicao do erro, alegando questes polticas e a

    existncia de outros caminhos para tal. Enfatizamos que nenhuma polaridade poltica

    deveria ser argumento para a inexistncia de canais de comunicao com o leitor. Alm

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    disso, a comunicao do erro no se torna pblica quando feita a partir do cone

    presente nos webjornais, diferentemente das redes sociais. Dessa forma, se h tanta

    preocupao com o que circula nas redes, O Globo poderia cogitar um alerta de erros que,

    a princpio, exporia menos o veculo e centralizaria as comunicaes voluntrias de seus

    leitores.

    3.3 O processo de reviso das notcias

    Conhecer como ocorre a reviso das notcias nos webjornais entender um pouco

    sobre a preveno de erros jornalsticos. Apesar de o cargo de revisor estar em extino na

    grande maioria dos veculos, no portal R7 h trs profissionais dedicados exclusivamente a

    essa funo: dois com formao em Jornalismo e um em Letras. Luiz Pimentel (2013)

    explica que os revisores no conseguem ler todas as matrias do dia, que somam mais de

    mil. Prioriza-se as que vo para a home e depois a gente vai descendo a escala. S a home

    tem 150 unidades informativas (destaques), sem contar os servios. Alm disso, Pimentel

    afirma que, na maioria das vezes, a matria revisada depois de publicada. Ento a

    responsabilidade maior do redator e do editor (Id. Ibid).

    Na Folha de S. Paulo, o reprter nunca publica direto no site, de acordo com

    Roberto Dias (2013). Existe uma edio, ou o redator ou o editor assistente fazem isso. O

    processo jornalstico no muda, mesmo que atrase um pouco. A gente acha que jornalismo

    continua sendo jornalismo, o sistema de contrapesos tem que funcionar, o que no

    impede de errar um monte, mas a gente toma esses cuidados.

    Na Zero Hora, no existe um revisor para o webjornal. Marta Gleich (2013) explica

    que no jornal impresso, as matrias so lidas por pelo menos duas pessoas antes de ir para

    o industrial, o que no ocorre no online. No online o reprter publica diretamente. No

    passa pelo editor, ele poder ler ou no. Mas o papel do editor no ficar revisando

    portugus. O tempo inteiro a gente est encontrando erro no online.

    No jornal O Globo, Pedro Doria (2013) afirma que no h revisores, ningum tem

    mais dinheiro. A gente tem redatores que cuidam da primeira pgina do jornal impresso.

    Segundo Doria, o processo funciona da seguinte forma: Quanto mais delicada a

    informao com a qual voc est lidando, maior o nmero de pessoas que vo passar os

    olhos naquele texto e, portanto, maior o nmero de pessoas atentas repercusso

    daquele texto. Quando uma coisa curta, o reprter publica direto (Id. Ibid.).

  • 12

    E no portal G1, Renato Franzini (2013) defende que a internet uma plataforma

    de informao que exige velocidade e competncia. Portanto, todos os jornalistas tm de

    estar capacitados a publicar diretamente, com autonomia, de onde estiver. Segundo ele,

    em casos de publicao urgente, os jornalistas esto orientados a publicar um texto curto,

    apenas com as informaes principais. Depois, eles revisam esse trecho e adicionam com

    mais calma as demais informaes. Em casos de reportagens feitas com mais tempo,

    reprteres e editores trabalham juntos no texto.

    A existncia de trs revisores no portal R7 nos surpreendeu durante as entrevistas.

    Isso sinaliza que, mesmo em um veculo totalmente digital possvel incluir a reviso no

    imediatismo das rotinas produtivas. O ponto negativo o momento em que essa reviso

    acontece: aps a publicao da notcia. A Folha de S. Paulo tambm mostra ateno a esse

    assunto ao no permitir que o reprter publique direto, sem passar pelo editor assistente.

    Na nossa avaliao, o processo ideal seria uma mistura desses dois: defendemos a

    existncia do revisor nas redaes, visando a melhora na qualidade e a diminuio dos

    erros nas notcias dos webjornais. Esses revisores leriam as matrias antes da publicao e

    as liberariam por ordem de prioridade. No prprio gerenciador de contedo poderia haver

    um ranqueamento das notcias por ordem de importncia. Esse processo evitaria a falha

    que encontramos no captulo trs, de erros que se perpetuam nas pginas dos webjornais

    por no terem sido revisados.

    3.4 O fluxo da correo de erros

    No portal G1, cada correo merece um tratamento especfico. De acordo com

    Renato Franzini (2013), aps a verificao do erro, avalia-se internamente o formato mais

    claro de correo, que pode se dar de diversas formas.

    Em linhas gerais, o erro de informao pode ser corrigido na reportagem ou, alm disso, pode ser publicado um texto adicional, parte, detalhando a correo. A deciso sobre o formato de correo tomada em funo da clareza e da transparncia. Se o link de uma reportagem corrigida tiver sido muito compartilhado, por exemplo, preciso que a correo esteja chamada e bem visvel dentro dela. Nos dois casos, deixamos um aviso dentro da matria de que aquele texto foi corrigido. A correo fica chamada por, pelo menos, o tempo que o erro ficou em exposio. Com o tempo, passamos a adotar um modelo bsico de texto a ser inserido dentro da reportagem13. A publicidade dada ao erro

    13 Veja um exemplo em: http://g1.globo.com/bienal-do-livro/rio/2011/noticia/2011/09/incerteza-e-agua-em-que-nadamos-diz-lisa-sanders-real-dra-house.html. Acesso em 13 ago 2014.

  • 13

    depende de onde ele foi chamado. Pode at ser a manchete do G114. Podemos entender tambm que o texto original estava errado em sua essncia e que necessrio publicar um novo, explicando o caso

    15. (FRANZINI, 2013)

    Quando o erro ocorre no portal R7, o reprter passa para o editor e este tem

    autonomia para tomar atitude. Existem os editores executivos, os chefes de reportagem,

    os editores de cada canal e os redatores. O redator errou, ele passa para o superior direto,

    que o editor, e ele tem autonomia para fazer a correo. Ele me comunica ou pede

    minha orientao se for algo mais grave (PIMENTEL, 2013). Durante a entrevista,

    explicamos a observao feita no processo de correo do R7, de que a retificao feita

    por meio da publicao de uma nova matria, mas a antiga permanece com o erro.

    Pimentel (2013) disse que realmente no deveria ser assim e completou: Bom saber,

    porque voc acaba no olhando pra trs, n? Temos que corrigir na prpria notcia

    original, deixar naquela URL e fazer a correo. Bem observado, obrigado (Id. Ibid.).

    Na Zero Hora, Marta Gleich (2013) explica que cada grupo tem seu editor de rea.

    Normalmente o alerta de erro canalizado pelo editor e a ordem no varra para baixo

    do tapete porque isso crime. Ento, imediatamente a correo deve ser dada.

    Argumentamos que, por meio da busca pela palavra Correes foram encontradas

    poucas retificaes feitas no site. Ao que Gleich afirmou: Tu ests me dando um alerta de

    que, se faz tempo que ns no publicamos nada, devemos estar displicentes com relao

    correo (Id. Ibid.). Enfatizamos ainda, durante a entrevista, a integrao da errata com o

    gerenciador de contedo da Zero Hora, um avano em relao aos demais webjornais.

    Segundo Gleich,

    esse campo dentro da ferramenta foi criado em 2007, quando lanamos a Zero Hora. Ns quebramos a cabea pra fazer isso na poca, discutimos como vamos fazer pra corrigir a notcia na origem? Tem que estar tudo junto. Criamos um padro de correo, assim como temos no impresso. Acreditamos que a credibilidade do jornal aumenta quando corrigimos. O leitor no pode ter a sensao de que a gente varre o erro para baixo do tapete, que tentamos esconder. Se ele v que erramos e ns, humildimente, escancaramos que erramos, isso faz com que a nossa credibilidade aumente, ele pode confiar naquela informao ou naquele veculo. E corrigimos de uma maneira visvel. (GLEICH, 2013)

    14 Veja aqui comentrio sobre a errata na homepage do G1: http://webmanario.com/2010/09/16/a-coragem-

    de-corrigir-nossos-erros-a-altura/. Acesso em 13 ago 2014. 15 Veja um exemplo em: http://g1.globo.com/rio-de-janeiro/noticia/2013/10/paes-aciona-secretaria-de- seguranca-para-apurar-vazamento-de-dados.html. Acesso em 13 ago 2014.

  • 14

    Em O Globo, Pedro Doria (2013) explica que o processo de correo difere de

    acordo com o tipo de erro.

    Talvez a gente possa dividir em trs grupos: nos casos de erros de portugus, de concordncia, vrgula - alguns mais feios, outros menos feios -, a gente simplesmente entra na matria e corrige. No necessrio uma errata para isso. A temos duas classes de erros de informao: como a gente est num momento de muita polarizao poltica, tem informao que a gente publica e muita gente acha errada, mas ns no consideramos errada. Ento, a gente sequer entra na polmica. Em geral, ns s nos manifestamos quando reconhecemos que h um erro. E a h esse terceiro caso em que algum questiona uma informao que ns publicamos e invariavelmente isso exige algum trabalho de apurao, e vai variar de acordo com a gravidade: ns podemos alterar a matria e colocar no p, em itlico, uma verso anterior dessa reportagem... Se uma histria de grande repercusso, que est circulando muito nas redes sociais e tem um erro de informao, a a nossa tendncia corrigir na matria e botar uma nota no p. Em casos excepcionais, quando for um erro grave, ns chamamos na home a errata. Mas a mais do que corrigir o erro na matria original: a gente publica uma matria explicando porque o erro aconteceu. (DORIA, 2013)

    Na Folha de S. Paulo, Roberto Dias (2013) explica que o Painel do Leitor centraliza e

    publica o Erramos papel e site. Em geral, o secretrio de Redao, no fechamento, olha

    os erros antes de sarem. O reprter, ento, sabe que tem que mandar o erro para o seu

    editor e ele manda para o Painel do Leitor. Sobre a falta de conexo observada entre o

    Erramos e a notcia original (que simplesmente corrigida, sem meno ao erro), Dias

    afirmou: Ento isso um erro. No que o hiperlink resolva o problema, porque eu acho

    que ele no suficientemente claro. Mas voc tem razo, obrigado.

    A anlise dos processos de correo de erros desses cinco webjornais nos permite

    aferir que, em maior ou menor grau, todos possuem um fluxo de retificaes. No G1, esse

    fluxo parece estar bem mapeado, assim como na Folha de S. Paulo, que centraliza na

    editoria de Painel do Leitor. No R7, em O Globo e na Zero Hora, esse fluxo varia de forma

    perigosamente subjetiva. A definio de um processo de correo de erros por meio do

    estabelecimento de uma poltica , a nosso ver, mais do que simplesmente escalar pessoas

    na hierarquia da redao quando o erro acontece. Alm disso, a experincia em redao

    no deve ser o principal meio de preveno de erros. H que se estabelecer dinmicas que

    estejam claras para todos, visando evitar a mxima do a gente sabe quem mais erra.

    3.5 As sees de correo de erros e o ombudsman

  • 15

    A seo Correes do G1 foi criada em novembro de 2011. J fazamos e

    chamvamos as correes de modo transparente, mas achvamos que era necessrio ter

    um lugar para que elas pudessem ser consultadas a qualquer momento (FRANZINI, 2013).

    O jornal Zero Hora no possui uma seo especfica para as correes, mas Marta

    Gleich aprova a ideia:

    A gente se pergunta muito isso no online e no offline. Eu acho que tem vantagens e desvantagens, e que pode ser diferente nos dois. No online, como tu tens espao, o ideal talvez fosse ter os dois modelos (a correo em si e a seo de correes). Por exemplo, toda matria que tivesse correo poderia ser juntada numa pgina pela tag matrias com correo. A voc teria todas, isso a gente poderia fazer hoje. E tem um efeito pedaggico tambm. Eu acho que uma boa ideia. No offline a gente sempre tenta dar a correo junto editoria, porque pode ter algum que s l Esporte, por exemplo, e bom que a correo esteja ali. No online, ter uma seo de Correes de Zero Hora d uma sensao positiva para o leitor. (GLEICH, 2013)

    Na Folha de S. Paulo, Roberto Dias considera que a seo Erramos mostra para os

    leitores que se trata de um jornal srio, que tem credibilidade. E o erro faz parte do

    processo de produo jornalstico. Dias tambm explica a funo da ombudsman Suzana

    Singer: A ombudsman tem uma crtica diria, que circula internamente; e a semanal, que

    publicada no jornal. Alm de discutir a nfase e o enfoque das matrias, h o

    apontamento de erros. Como diz o manual, a ombudsman tem um carter deliberativo, ela

    no pode exigir que a gente d o Erramos (Id. Ibid.).

    A existncia de uma pgina especfica no s centraliza as correes, mas tambm

    permite aos leitores visualizar os erros recentes e as retificaes. Segundo Craig Silverman

    (2011), dessa forma, os leitores tm a oportunidade de descobrir se uma notcia lida ou

    reportada por outros foi corrigida. Isso tambm fornece um elemento bsico de

    transparncia. Uma pgina dedicada faz correes de forma mais visvel e acessvel, e

    aumenta a probabilidade de que as pessoas recebam a informao corrigida. No entanto,

    as pginas de correes so a exceo, no a regra16 (SILVERMAN, 2011, online).

    Sobre a ombudsman da Folha de S. Paulo, muito positivo o fato de haver uma

    crtica diria, que circula internamente na redao. Mesmo que ela no possa exigir a

    16 Traduo livre do original: It also provides a basic element of transparency. A dedicated page makes corrections more visible and accessible, and it increases the likelihood that people will receive the corrected information. Yet corrections pages are the exception, not the rule. (Silverman, 2011, online)

  • 16

    publicao de uma errata, seu papel fundamental no processo de preveno e de

    reflexo sobre o erro jornalstico.

    3.6 A mensurao dos erros

    Alm de corrigir os erros, mensur-los pode ser fundamental como medida

    profiltica contra novos deslizes. Mas esse assunto gerou controvrsias com os

    entrevistados. No portal R7, Luiz Pimentel afirmou que no h mensurao dos erros

    cometidos.

    Eu trabalhei na Folha de S. Paulo nos anos 90 como reprter e l tinha uma coisa que eu acho meio agressiva, que era o placar de erros no meio da redao. Eles colocavam quantos erros havia na edio anterior, por cada editoria, e chegavam a fazer concursos de quem errava menos. E a o reprter e a editoria ganhavam prmios em dinheiro. Mas era uma poca em que era s o jornalismo de papel, ento, voc errou, gravou em pedra o seu erro. Ento voc conseguia mensurar e tinha uma validade para contabilizar se estava indo bem ou mal. Agora tudo to instantneo que a possibilidade de erro aumenta e ao mesmo tempo voc tem que chegar a um ponto em que tem que diminuir ao mximo as chances de isso ocorrer. A gente tem os revisores que ficam lendo as matrias medida em que so produzidas e eles so orientados a lerem as matrias mais delicadas mais rapidamente. (PIMENTEL, 2013)

    Na Zero Hora, Marta Gleich (2013) explica que j houve uma mensurao e controle

    de erros, mas era voltado somente para o impresso. No online, no h mensurao.

    Ricardo Stefanelli (2013), que participou desse processo na Zero Hora, lembra que

    chegamos a reduzir num ano, se no me engano, algo na ordem de 500%. Tnhamos

    mapeado onde ocorriam mais erros, por editoria, por tipo de matria, por horrio e por

    pessoa, sempre no intuito de colocar aparas para proteger aquelas que por caracterstica

    no so to obstinadas pela preciso - mas tm outros mritos e atributos.

    Da mesma forma, em O Globo tambm no existe mensurao de erros. De acordo

    com Pedro Doria (2013),

    isso me soa uma coisa to Folha de S. Paulo... Quando voc toma a deciso de medir alguma coisa, voc tem que ter muita cincia dos resultados que aquilo vai te trazer. Se a gente decide implementar um ndice de erros, por um lado, a teremos uma medida quase cientfica do quanto erramos, o que nos til, a gente vai ter uma percepo mais ntida de que editorias tendem a acertar e a errar mais, o que nos permitiria fazer ataques mais especficos e rankings dos reprteres que mais erram. O problema que no momento em que voc tiver isso voc comea a criar tambm um incentivo para esconder o erro, pra disfarar, pra manipular os dados, natural do ser humano. Erro de portugus uma vergonha, mas s isso. No estou fazendo pouco dele, mas isso. O que eu sei que acontece na Folha que tem gente que disfara erro, enquanto que num ambiente em que voc no tenha a presso de medir o erro o tempo todo,

  • 17

    as pessoas reconhecem os prprios erros com mais facilidade. A gente compreende o erro no como um pecado mortal, algo inerente prtica da profisso. Ento, erraremos. O importante no se erraremos ou no, mas a nossa agilidade de corrigir. (DORIA, 2013)

    Segundo Renato Franzini (2013), no portal G1 existe uma mensurao dos erros por

    amostragem. No entanto, ele no explicou como funciona esse processo. A Folha de S.

    Paulo o nico webjornal que mede os erros cometidos e de que forma eles chegaram ao

    Painel do Leitor, como exemplificamos no item 4.2.2. De acordo com Roberto Dias (2013),

    temos uma tabulao pronta de Erramos por plataforma/origem. Alm disso, temos nossos sistemas de controle onde est includo o fluxo de Erramos - funcionando normalmente para qualquer plataforma. De quando em quando, a ombudsman faz a autpsia da edio, que a checagem de todas as informaes de uma edio impressa. Isso era feito antes de maneira mais sistemtica pelo Controle de Qualidade, e agora mais espordico. (DIAS, 2013)

    Foi bastante interessante observar que a Folha de S. Paulo, nico que possui uma

    mensurao de erros, mencionada pelos editores do portal R7 e de O Globo de forma

    negativa. Talvez realmente possa ter havido exageros nesse controle, mas inegvel a

    contribuio que as mtricas trazem para a qualidade do produto jornalstico. Isso nos leva

    a pensar que, ao invs de focar nos erros cometidos, a mensurao deva se concentrar no

    ndice de correo deles. Uma simples mudana de enfoque, que pode modificar a viso

    negativa que se tem de um processo to importante.

    3.7 A atribuio do erro ao reprter

    A falta de critrios estabelecidos sobre o processo de correo de erros nos leva a

    pensar na responsabilidade do reprter, pois ele pode ser penalizado quando erra. Na

    Folha de S. Paulo, de acordo com Roberto Dias (2013), existe um sistema de contrapesos

    que engloba o reprter, o editor, a ombudsman, os leitores... at porque dificilmente

    algum vai errar sozinho. Ele explica que a questo do erro um dos itens de avaliao

    dos funcionrios. Quando o reprter d furo, reconhecido pelo furo; e quando d erro,

    h uma srie de itens que so avaliados, como o volume, a gravidade do erro. Agora, existe

    essa discusso de at que ponto voc deve expor o reprter ou no. A ombudsman, por

    exemplo, escreveu e discordou dessa poltica (DIAS, 2013). Segundo Dias, j houve casos

    de demisso de reprteres por erro, mas claro que a empresa no tomou essa deciso

    s pelo erro, h todo um contexto (Id. Ibid.).

  • 18

    Essa poltica tambm seguida pelo portal R7. De acordo com Luiz Pimentel (2013),

    erro de informao gravssimo perde a carteira, mas at erros de digitao, erros

    ortogrficos, estando na home, so coisas que reverberam muito aqui dentro. Se um chefe

    de alguma rea percebe um erro e comunica ao R7, aquilo tem um peso muito grande.

    Ele explica que j houve mudanas internas por causa de erros cometidos.

    Ano passado, a gente diminuiu o nmero de folgas no planto das pessoas porque num final de semana especfico teve muito erro na homepage do portal. Considerou-se, pela diretoria geral, que a melhor poltica era aumentar o nmero de pessoas no planto para minimizar a quantidade de erros. E a a gente passou a fazer 2 finais de semana por 1 folgava 2 e trabalhava 1. E agora eu consegui que voltasse a ser 3 por 1, mas com o compromisso das pessoas de que elas vo estar 100% atentas. Porque, eventualmente, se voltar a acontecer um nmero grande de erros, vai voltar a ser 2 pra 1. Ento, existe uma preocupao muito grande aqui na redao quanto aos erros. (PIMENTEL, 2013)

    No jornal Zero Hora, Marta Gleich frisa a existncia de uma cultura na redao

    quanto ao erro, relembrando controles que existiam anos atrs.

    Houve treinamento, uma poltica muito clara, manuais, houve um controle. Havia a catalogao e ns descobrimos, por exemplo, que uma das coisas que mais errvamos era a grafia do nome ou o cargo da pessoa. Em funo da estatstica, que era mensal e por editoria, identificvamos e treinvamos aquele reprter. Identificamos pessoas que erravam, editorias, tipos de erros e houve, no vou dizer uma caa s bruxas, mas uma poltica muito rgida de que no corrigir crime, que implementou essa cultura que est impregnada nas paredes e se estendeu para o online automaticamente. (GLEICH, 2013)

    No entanto, quando perguntada por que no existe mais esse controle, Marta

    Gleich reconhece: Tu ests me chamando ateno para uma coisa que talvez a gente

    tenha que rever. Talvez essa minha anlise de que a cultura est to bem impregnada nas

    paredes esteja fazendo com que a gente descuide com relao s correes no online. E o

    teu trabalho um bom alerta pra gente, te agradeo por isso (Id. Ibid.).

    No portal G1, Renato Franzini (2013) afirma que os Princpios Editoriais so

    leitura obrigatria por todos os jornalistas do grupo. Em O Globo, Pedro Doria (2013)

    afirma que a compreenso do erro e de suas consequncias faz parte da rotina da redao.

    A gente corrige erro toda hora, mas no tenta tambm sacralizar o erro. A gente sabe

    qual reprter mais apressado, qual mais meticuloso. Eu acredito no processo, ele no

    impede erros, mas evita 90% dos erros que ns possamos cometer.

    Dessa forma, fica muito perceptvel o peso do erro na figura do reprter, o que,

    como foi discutido no captulo dois, no parece ser a melhor poltica. Mesmo nos

  • 19

    webjornais em que no h um controle especfico, como no caso de O Globo, existe o

    discurso de que a chefia sabe quem erra. Na Zero Hora, a falta de ateno para o processo

    de correo de erros atualmente acendeu um alerta. Na Folha de S. Paulo, falou-se em

    demisses e no R7, em mudana na carga horria de trabalho devido aos erros cometidos.

    Entende-se, portanto, que a existncia de uma poltica especfica deixaria as regras e,

    consequentemente, as cobranas, mais claras para todos. Um processo mais justo.

    A seguir, apresentamos um resumo das principais questes abordadas nas

    entrevistas, bem como a anlise das respostas dos editores:

    Tabela 6: Sistematizao das questes abordadas nas entrevistas.

    Tema Resumo da anlise

    A existncia (ou no) de uma poltica de correo de erros

    Dos cinco webjornais apenas um possui um documento especfico sobre o processo de correo de erros. E mesmo na Zero Hora esse documento no mais difundido como na poca do seu lanamento, em 2007, necessitando, inclusive, de uma reviso. Outra questo que chama ateno o fato de o portal R7 disponibilizar seu manual de redao somente de forma interna.

    Como os erros chegam redao

    A comunicao de erro por parte do leitor um processo que est dentro das preocupaes dos webjornais, mas que nem sempre funciona como deveria.

    O processo de reviso das notcias

    O R7 possui trs profissionais especficos para reviso, mas eles atuam aps a publicao das notcias. A Folha de S. Paulo no permite que o reprter publique direto, sem passar antes pelo editor assistente. Nos demais webjornais, no h revisores e os reprteres publicam direto.

    O fluxo da correo de erros

    De forma mais ou menos estruturada, todos os webjornais possuem um fluxo de retificaes. No G1, esse fluxo parece estar bem mapeado, assim como na Folha de S. Paulo, que centraliza na editoria de Painel do Leitor. No R7, em O Globo e na Zero Hora, esse fluxo varia de forma perigosamente subjetiva.

    As sees de correo de erros e o ombudsman

    Somente o portal G1 e a Folha de S. Paulo tm uma seo especfica para correo de erros. Sobre a ombudsman da Folha de S. Paulo, muito positivo o fato de haver uma crtica diria, que circula internamente na redao.

    A mensurao dos erros

    A Folha de S. Paulo o nico webjornal que possui uma mensurao de erros. Curiosamente, a Folha mencionada pelos editores do portal R7 e de O Globo de forma negativa. Na Zero Hora, j houve esse controle no jornal impresso, mas atualmente no h.

    A atribuio do erro ao reprter

    Pelas respostas, ficou bastante perceptvel o peso do erro na figura do reprter, o que no parece ser a melhor poltica.

    Fonte: Elaborao da autora.

    Por meio do monitoramento das notcias e das entrevistas com os editores, ficou

    ntido que h especificidades neste meio que devem ser observadas de forma mais

    criteriosa e tica pelos veculos jornalsticos brasileiros. Quando comparamos com a

    publicao de erratas no jornalismo impresso, uma das particularidades a possibilidade

    de retificao constante das notcias no jornalismo online, sem o atrelamento a uma

  • 20

    periodicidade (a edio do dia seguinte, por exemplo). A oportunidade instantnea que os

    webjornais tm de reparo do erro por vezes desperdiada.

    Dessa forma, este artigo objetivou no somente apontar falhas nos sistemas de

    correo de erros, mas contribuir para o aprimoramento de polticas de qualidade editorial

    das empresas jornalsticas. A nosso ver, aps 20 anos de jornalismo online, podemos

    afirmar que ele no pede pressa, mas qualidade.

    4 REFERNCIAS

    ANG, Peng Hwa; NADARAJAN, Berlinda. Correction Policies of Online Publications. INET Conference Proceedings, 1999, pages 1-15.

    DELCLS, Toms. Fe de errores. In El Pas, 10 nov 2013. Disponvel em: http://elpais.com/elpais/2013/11/08/opinion/1383940231_744533.html (Acesso em 21 jul 2014)

    DUARTE, Jorge; BARROS, Antonio (Orgs.). Mtodos e tcnicas de pesquisa em comunicao. So Paulo: Atlas, 2006. PICARD, Robert G. Value creation and the future os news organizations. Why and how journalism must change to remain relevant in the twenty-firts century. Lisboa: Editora Media XXI, 2010.

    RAMONET, Ignacio. A exploso do jornalismo: das mdias de massa massa de mdias. So Paulo: Publisher Brasil, 2012.

    SEABRA, Gil. Pesquisa cientfica: o mtodo em questo. Braslia: UnB, 2001.

    SILVERMAN, Craig. The Case for the Corrections Page. In Columbia Journalism Review, 2011. Disponvel em: http://www.cjr.org/behind_the_news/the_case_for_the_corrections_page.php?page=all&print=true (acesso em 13 ago 2014).