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FUNDAMENTOS DA EDUCAÇÃO

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FUNDAMENTOS

DA EDUCAÇÃO

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APRESENTAÇÃO

A finalidade do módulo é esboçar aqueles elementos dos Fundamentos de Educação que consideramos relevantes para a compreensão adequada de educação e da tarefa do ensino.

Pretendemos com o embasamento apresentado evitar a frase já tão comum “Se você finge que ensina, eu finjo que aprendo”.

(Hamilton Werneck, 1993)

FUNDAMENTOS DA EDUCAÇÃO

1.INTRODUÇÃO

Numa disciplina como a Didática, não se pode compreender o seu todo sem estudar seus fundamentos sociais, psicológicos, biológicos e filosóficos.

“Todo conceito num dado sistema é determinado por todos os outros conceitos do mesmo sistema, e nada significa por si próprio”.

(Joseph Hrabák, citado por Matoso Câmara, no artigo Estruturalismo, na Revista Tempo Brasileiro, ns. 15/16)

2. FUNDAMENTOS DA EDUCAÇÃO

“Sendo educar a adaptação da criança ao meio social adulto, isto é, transformar a constituição PSICOBIOLÓGICA do indivíduo em função do conjunto de realidades coletivas ás quais a consciência comum atribui algum valor”. (Jean Piaget)

A educação deve levar em conta a natureza própria do indivíduo, encontrando esteios nas leis da constituição psicológica do individuo e seu desenvolvimento. A relação entre os indivíduos a educar e a sociedade torna-se recíproca. Pretende que a criança aproxime do adulto não mais recebendo as regras de boa ação, mas conquistando-as com seu esforço e suas experiências pessoais, em troca a sociedade espera das novas gerações mais do que uma imitação; espera um enriquecimento ( em Psicologia e Pedagogia de Jean Piaget, p. 139).

Sendo convincente para nós as palavras de Piaget, não haverá o que acrescentar para assegurar o valor da contribuição da Sociologia, Psicologia, Filosofia e Biologia para a Educação.

Caso queiramos proceder corretamente no campo técnico da educação, teremos que a elas recorrer para que não sejamos tentados em nossa ação educativa, a impor modelos, para com que eles, os alunos, se identifiquem. Teremos sim que lhes oferecer situações. experiências que resultem em uma modelagem adequada. Modelagem não estereotipada, mas decorrentes das diferenças individuais de cada aluno.

Abordaremos a seguir os fundamentos sociológicos da educação, seqüenciando os Fundamentos Psicológicos, Filosóficos e Biológicos.

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2.1. FUNDAMENTOS SOCIOLÓGICOS

No Brasil, convivem lado a lado, uma Sociologia de Educação cética com relação à

ordem existente, baseada em modelo marxista, uma outra baseada em metodologia de pesquisa empiricista e, ainda outra que, rejeitando ambas as abordagens, adota perspectivas de inspiração interacionista, fenomenológica ou etnometodológica. As diferenças entre os referenciais teóricos, os temas tratados e a orientação política são tão grandes que talvez fosse mais correto falar em Sociólogas da Educação.

Nos últimos vinte anos pertencem a Althusser (1970), Bowles e Gintis (1976), Bourdieu e Passeron (1970) e Michael Yong (1971), os estudos que marcaram e delimitaram o campo da Sociologia Educacional.

Estes estudos postulam que a produção e reprodução das classes reside na capacidade de manipulação e moldagem das consciências, na preparação de tipos diferenciados de subjetividade de acordo com as diferentes classes sociais. A escola participa na consolidação desta ordem social pela transmissão e incubação diferenciada de certas idéias, valores, modos de percepção, estilos de vida, em geral sintetizados na noção de ideologia. Os estudos centram-se nos mecanismos amplos de reprodução social via escola. Num outro eixo, encontramos os ensaios da Nova Sociologia da Educação preocupados em descrever as minúcias do funcionamento do currículo escolar e seu papel na estruturação das desigualdades sociais. A Nova Sociologia da Educação coloca a problematização dos currículos escolares no centro da análise sociológica de Educação.

A Sociologia da Educação, hoje, aborda como tema central de discussão: o papel da educação na produção e reprodução da sociedade de classes.

Segundo Demo, Educação facilmente descobre que um dos lugares eminentes de sua teoria e de sua prática está no interior dos movimentos sociais. Cabe pois a escola o papel de preparar técnica e subjetivamente as diferentes classes sociais para ocuparem seus devidos lugares na divisão social. Bourdien e Passeron percebem como essa divisão é mediada por um processo de reprodução cultural.

Sabemos que as forças culturais que atuam sobre o comportamento precisam ser conhecidas para um melhor planejamento e, conseqüentemente, melhor ensino. De particular interesse para o processo educativo são os fatores familiares, o grupo de adolescentes a que se filia (“a turma”) e a escola.

As condições do ambiente forjam a sua resposta ou reticência, aos estímulos, formando padrões de hábitos que encorajam ou desencorajam as atividades que motivam ou desmotivam a aprendizagem.

O comportamento em classe está estritamente relacionado com o ambiente familiar e a sua posição sócio-econômica. Fatores estes ocasionadores de procedimentos anti-sociais ou de extrema instabilidade e falta de amadurecimento.

A “turma” é de vital importância para o adolescente que, ao “enturmar-se”, prefere os padrões de seu grupo aos dos adultos, algumas vezes diminuindo até o seu rendimento escolar para satisfazer o seu grupo.

O aluno, ser temporal e espacial, vivendo dentro de uma comunidade, pertencendo a um grupo social, participando de instituições várias, possuindo um “status” sócio-econômico, para integrar-se aos padrões de comportamento social necessita de um atendimento dentro da sua realidade individual. A organização de currículos, programas e planejamentos de ensino alienados da realidade social não é de natureza prática e não conduz a motivação. No entanto, como os grandes educadores e pedagogos, deveríamos ir muito além, formando “conceitos humanísticos” que superam dialeticamente o individual e o social para fazer surgir o ser humano integral , dando ao educando condições de adaptação em qualquer tipo de sociedade no tempo e no espaço.

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BIBLIOGRAFIA

BAUMAN, Z. Por uma Sociologia critica: um ensaio sobre senso comum e emancipação. Rio de Janeiro, Zahar, 1977.

BOTTMORE, T. B. A Sociologia como Crítica Social. Rio de Janeiro, Zahar, 1976.

COSTA, M. C. Castilho. Sociedade: Introdução e Ciência de Sociedade. Rio de Janeiro, Ed. Moderna, 1980.

DURKHEIM, E. Educação e Sociedade. São Paulo, Melhoramentos, 1985.

FARACHI, M. e PEREIRA, L. (Org). Educação e Sociedade. São Paulo, Cia Editora Nacional, 1972.

FERRAROTTI, F. Uma Sociologia Alternativa: da sociologia como técnica de conformismo à sociologia critica. Porto, Afrontamento, 1972.

OLIVEIRA, B. A., Duarte N. Socialização do saber Escolar. São Paulo, Cortez, 1986.

PAIC, M. H., 5. A Produção do Processo Escolar. São Paulo. TA Queiroz, 1984.

PEREIRA, L. e FARACCHI, M. A. Educação e Sociedade. São Paulo: Cia Editora Nacional, 1970.

2.2. FUNDAMENTOS PSICOLÓGICOS

INTRODUÇÃO

Iniciemos situando Educação como o âmbito amplo que abarcaria, numa

representação espacial, em círculos concêntricos, a Pedagogia e a Didática, como no esquema que segue.

A Educação competem todos os detalhes, em toda a amplitude das situações que

produzem ou provocam aprendizagem. Consideramos Educação como o campo característico da categoria dos humanos,

porque a definimos como a esfera das aprendizagens. Ela é característica do humano, uma vez que o homem tem como sua marca definidora o fato de ser um ser de cultura, por conseguinte, um ser que aprende.

Aprender pode ser definido como a forma construída pelo bicho-homem de

DIDÁTICA

PEDAGOGIA

EDUCAÇÃO

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enfrentamento da realidade que o circunda e que lhe permite sobreviver ou, mais ainda, que lhe permite transformar o seu entorno com vistas a sua felicidade. Em face da complexidade e da amplitude dos fenômenos que regem os atos de aprender, a sua abordagem é intrinsecamente interdisciplinar. Assim, educação se faz obrigatoriamente a partir dos múltiplos enfoques.

No esquema acima, a passagem do exterior ao interior está associada a um movimento cada vez mais especializado, do informal ao formal. Assim, Educação na região exterior à Pedagogia, compreenderia as responsabilidades e as atuações da sociedade como um todo em suas ações (não propriamente intencionais) provocadoras de aprendizagens. Tratar-se-ia da atmosfera que se gera, pelo tipo de organização social e material dos agrupamentos humanos.

Na Pedagogia, restringe-se a amplitude para reforçar a profundidade da abordagem dos fenômenos do aprender.

Para explicar a Pedagogia, é útil passar-se à definição da Didática, uma vez que aquela abarca esta.

A Didática é a parte da Pedagogia que se ocupa das aprendizagens complexas que requerem sistematização e organização. A Pedagogia pode ser entendida como o contexto que possibilita a Didática. Ela se ocupa do ambiente que possibilita as aprendizagens mais pontuais e especificas dos campos científicos, que configuram as disciplinas escolares. A Didática é a ciência que dá conta de fazer com que alguém, não tendo um certo conhecimento, passe a tê-lo; isto é, ela se ocupa da construção dos conhecimentos, na perspectiva construtivista. Porém o que são conhecimentos ‘? Quais suas características definidoras ? Quais suas relações com o saber ? O que saber e conhecimento têm em comum e em que divergem ? Há entre eles precedência ou complementaridade? Estas e outras perguntas serão abordadas, a seguir, através da conceituação e classificação de quatro produtos da aprendizagem.

PRODUTOS DE APRENDIZAGEM

Dentre os múltiplos ângulos em que a aprendizagem pode ser analisada, merece

importância a caracterização dos tipos de produtos que dela derivam. Propomos o esquema que segue, como síntese de uma abordagem destes produtos.

Não Sistematizada Sistematizada

Não transformadora Chute Conhecimento Transformadora Saber Práxis

Consideramos nestes produtos de aprendizagem dois atributos principais: a sua

sistematização e a sua capacidade de transformação. A combinatória da presença ou da ausência desses dois atributos caracteriza os quatro espaços deste esquema, isto é, o chute, o saber, o conhecimento e a práxis.

Denominamos chute um produto da aprendizagem não sistematizado e não transformador. Chute pode ser tomado como algo aproximado a improviso. Como define o dicionário Aurélio, improviso é um produto intelectual inspirado na própria ocasião e feito de repente, sem preparo. Observemos que estamos nos atendo à definição de improviso, enquanto produto intelectual sem preparo, que é o chute. Não consideramos, neste contexto, a validade da intuição ou da espontaneidade, que também podem estar embutidas no sentido comumente dado à palavra improviso. Chute, portanto, tem aqui a

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conotação de algo aprendido muito superficialmente, localizado, sem nenhuma generalização.

Chamamos de saber o produto de aprendizagem não sistematizado, mas transformador. Um produto de aprendizagem é transformador na medida em que acrescenta ser a quem aprende, modificando-lhe em algo a maneira de viver. Uma aprendizagem não é sistematizada quando ela é apenas descritiva de etapas de soluções de um problema, sem entrar na análise desta solução. O saber implica num valor capaz de mobilizar energias de quem aprende, a ponto de levá-lo a novas formas de vida.

Chamamos de conhecimento um produto de aprendizagem sistematizado, mas não transformador. Uma aprendizagem não é transformadora, quando ela somente instrumentaliza teoricamente de forma desvinculada da prática. Um produto de, aprendizagem não é transformador quando apenas ilustra, sem mover o aprendiz a incorporar nova postura existencial ou nova capacitação prática. Um produto de aprendizagem é sistematizado, quando ele chega à explicação das causas dos problemas enfrentados; e isto de forma organizada. Esta organização pode ser explicitada em livros ou similares, por escrito.

O saber transforma, mas não é sistematizado. O conhecimento é sistematizado, mas não é transformador. O saber é pessoal; e o conhecimento é social ou socializável, na medida em que pode ser ou é sistematizado. O saber é mais ligado à ação, enquanto o conhecimento é mais ligado à reflexão e à linguagem. O saber tem mais a ver com percepções e movimentos, enquanto o conhecimento tem mais a ver com as palavras.

A interpenetração entre saber e conhecimento é o produto da aprendizagem que realmente interessa ao ser humano, ou seja, um produto de aprendizagem que é sistematizado e transformador, ao qual damos o nome de práxis.

A práxis pode ser definida como a continua conversão do conhecimento em ação transformadora e da ação transformadora em conhecimento.

A Psicologia tem como objeto o comportamento humano. Para estudá-lo, ela faz recortes, que constituem suas sub-áreas: ao individuo que aprende corresponde a Psicologia de Aprendizagem, ao indivíduo que se desenvolve corresponde a Psicologia do Desenvolvimento, ao individuo que se relaciona no grupo, a Psicologia Social, ao indivíduo que se Constitui como individualidade, a Psicologia da Personalidade, e assim por diante. Em cada sub-área surgem, evidentemente, várias teorias.

Dentre as sub-áreas de Psicologia, as que têm tido um papel destacado na Educação são: a Psicometria, a Psicologia da Aprendizagem e a Psicologia do Desenvolvimento.

Voltando-se a afirmativa de que a Didática tem por função primordial, levar o educando a aprender, não podemos desvincular de sua estrutura o auxilio da ciência psicológica, pois na medida em que aplica as formulações cientificas fornecidas por esta ciência, responde a pergunta como:

• Quem Aprende? • Como Aprende? Por meio dos conhecimentos psicológicos, que diferem e caracterizam o sujeito que

aprende e os processos ou formas de aprendizagem é que a didática pode formular princípios, indicar normas convenientes de ensino, sugerir meios adequados para uma orientação realmente eficiente da aprendizagem.

Do ponto de vista psicológico, os determinantes mais significativos no campo educacional, estão relacionados as diferenças de personalidade, quer no aspecto de diferenças de inteligência, quer nas diferenças estruturais de própria personalidade.

Caso o professor deseje ser um educador e não apenas um instrutor, sua tarefa se centralizará no aluno e para tal, é indispensável o seu conhecimento.

De maneira geral, as contribuições da escola no desenvolvimento da personalidade

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podem ser sintetizadas da seguinte maneira: - atividades de grupo dão aos alunos a oportunidade de contribuir e de se sentirem

aprovados; - o sociograma pode auxiliar o professor a colocar um aluno junto aquele de quem

gosta, dando-lhe apoio emocional; - o professor pode diminuir a competição; - unidades de programas voltadas para problemas de relações sociais ajudam os

alunos inibidos e inexperientes a saber como prosseguir; - como lidar com as diferenças individuais; - permitir que o aluno discuta suas hipóteses e orientá-lo para a escolha de soluções

que levem ao desenvolvimento harmonioso de sua personalidade. É preciso lembrar, no entanto, que a aprendizagem é um processo que ocorre no

aluno, é um processo pessoal, logo, se não conhecemos este aluno e a maneira como este processo se desenvolve, não pode haver ensino eficiente, com economia de tempo e esforço e elevação na produtividade.

Daí o fato de se enfatizar o “como se aprende” o “onde se passa esta aprendizagem”. Os produtos da aprendizagem serão conseqüência e não causa do ensino. Há necessidade do professor conhecer o seu aluno como um todo, para que a aprendizagem valorize o aluno como centro de ensino.

As situações de classe são extremamente complexas e é tarefa do psicólogo analisá-las e tratar de compreender não só os princípios de aprendizagem, mas as motivações que as determinam. Seria interessante que o professor levasse o aluno a perceber que ele próprio é um estimulo. .„

Sara Pain afirma que só aprendo quando alguém primeiro me olha, reconhece-me como sujeito desejante e depois se volta para o conhecimento. Quando o professor dirigir o seu olhar para o conhecimento, o olhar de quem vai aprender também se volta para lá. O primeiro passo para que alguém aprenda é que ele seja reconhecido por um outro, do ponto de vista da identidade pessoal e da possibilidade de interação cognitiva. Esses dois, quem aprende e quem ensina, visam a explicar a realidade, explicar para transformá-la. Mas a realidade não é atingida diretamente pelo aluno com o professor. Entre eles, há sistemas de valores, uma cultura, uma rede de significados. O professor e o aluno só vão abordar da realidade aquilo que é considerado como valor; esse sistema de valores é que determina a ciência. Além disso, o trânsito entre o sujeito epistêmico desejante e a realidade se faz através da linguagem. A linguagem éo veículo da aprendizagem. A linguagem, tanto das palavras, quanto a linguagem de percepção e a linguagem dos movimentos.

As relações entre a Psicologia e a Educação, não são relações de uma ciência normativa e de uma ciência ou de uma arte aplicadas. Isto é, não cabe à Psicologia normatizar a ação pedagógica e nem é a ação pedagógica uma aplicação da Psicologia.

A Psicologia deve, antes, compreender as condições e motivos que constituem a conduta do indivíduo na instituição escolar em sua especificidade.

Para conhecer a criança, diz-nos Wallon (1975, p. 20), é “indispensável observá-la nos seus diferentes campos e nos diferentes exercícios de sua atividade quotidiana ... e na escola em particular”.

Continua Wallon (1975, p. 48), muitas das inaptidões dos alunos se devem a uma ruptura na cadeia dos significados, cabendo ao professor identificar quais as categorias de pensamento que faltam à criança e encaminhar sua ação no sentido de criá-las.

O estudo da Psicologia Educacional não se destina a proporcionar fórmulas de comportamento ou receitas especificas para males pedagógicos. É mais realístico esperar que ele permita melhores perspectivas sobre os processos psicológicos implicados na

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educação. A psicologia educacional proporciona ao professor um esquema de referências que lhe permitem exercer suas funções mais adequadamente.

BIBLIOGRAFIA

AUSUBEL, D. P. et alli. Psicologia Educacional. Rio de Janeiro, Ed. Interamericana, 1980

BEE, H. A criança em desenvolvimento. São Paulo, Harba, 1978

BEIGE, M. L. Teorias da aprendizagem para professores. Rio de Janeiro, Ao Livro Técnico e Científico, 1986.

BIAGGIO, A. M. B. Psicologia do Desenvolvimento. Petrópolis, Ed. Vozes, 1986

CAMPOS, D M S. Psicologia de Aprendizagem. Petrópolis, Ed. Vozes, 1986

______________. Psicologia de adolescência. Petrópolis, Ed. Vozes, 1986

CHARLES, C. M. Piaget ao alcance dos professores. Rio de Janeiro, Ao Livro Técnico e Científico, 1986.

MOREIRA, M. A. Ensino e aprendizagem. São Paulo, Ed. Moraes, 1985.

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PIAGET, J. Seis estudos de psicologia. Rio de Janeiro, Forense, 1970.

PATTO, M. H. Introdução a psicologia escolar. São Paulo, T. A. Queirós, 1986.

RAPPAPORT, C. et alli. Psicologia do desenvolvimento. São Paulo, EPU, 1980 (4 volumes).

2.3 FUNDAMENTOS FILOSÓFICOS Para educarmos os homens de um modo sensato e esclarecido, convém saber no

que queremos que eles se tornem quando os educamos. E para sabê-lo é necessário indagar para que vivem os homens - ou seja, investigar qual pode ser a finalidade da vida e o que ela deve ser. Portanto, devemos inquirir sobre a natureza do mundo e os limites que este fixa para o que o homem pode saber e fazer. A natureza humana, a boa vida e o lugar do homem no esquema das coisas estão entre os tópicos perenes de Filosofia.

Refletindo sobre o significado da educação para a vida humana, teremos de, mais cedo ou mais tarde, considerar filosoficamente a educação.

O que é, pois, a Filosofia e qual a sua contribuição para a educação? A Filosofia é a tentativa para pensar do modo mais genérico e sistemático em tudo o

que existe no universo * no “todo da realidade”. Aí, temos a Filosofia como especulação - seu aspecto contemplativo e conjetural. Outros dois aspectos são prescritivo e o crítico. O primeiro quando recomenda (prescreve) valores e idéias. Examina o que entendemos por bom e mau, certo e errado, belo e feio. Analisa se essas qualidades são inerentes às próprias coisas ou se são, simplesmente, projeções das nossas próprias mentes. O outro aspecto concerne a crítica e à analise. O filosofo aí, analisa conceitos tais como mente, eu e causa - e, na educação, motivação, adaptação e interesse a fim de descobrir seu significado em diferentes contextos.

APLICAÇÕES DA FILOSOFIA À EDUCAÇÃO

Como a Filosofia Formal se relaciona com a educação e a Filosofia Educacional?

Como as diversas categorias da Filosofia Formal podem ser úteis ao pensamento que se dedica a questões educacionais?

Para isto, teremos que considerar o significado de Educação.

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A educação pode ser considerada em dois sentidos: um lato, o outro técnico. Em sua acepção lata, a educação diz respeito a qualquer ato ou experiência que tenha um efeito formativo sobre a mente, o caráter ou a capacidade física de um indivíduo. Neste sentido, a educação nunca termina; verdadeiramente, “aprendemos pela experiência” ao longo de nossa vida. Todas as espécies de experiência podem ser educativas - desde a leitura de um livro até uma viagem ao estrangeiro, desde as opiniões das pessoas nossas conhecidas até a possibilidade de surpreendermos um comentário, no burburinho de um bar. Na sua acepção técnica, a educação é o processo pelo qual a sociedade, por intermédio de escolas, ginásios, colégios, universidades e outras instituições, deliberadamente transmite sua herança cultural - seus conhecimentos, valores e dotes acumulados - de uma geração para outra.

Devemos igualmente distinguir entre educação como um produto e como um processo. Como um produto, a educação é o que recebemos através da instrução ou aprendizagem - os conhecimentos, ideais e técnicas que nos ensinam. Como processo, a educação é o ato de educar alguém ou de nos educarmos.

Examinemos agora as definições de educação por três especialistas, as quais diferem mutuamente e também da que por nós foi proposta. Herman Horne, um idealista, escreve: “A educação ... é o processo externo de adaptação superior do ser humano, física e mentalmente desenvolvido, livre e consciente, a Deus, tal como se manifestou no meio intelectual, emocional e volitivo do homem”. John Dewey, um pragmático, declara: “A educação pode ser definida como um processo de contínua reconstrução da experiência, com o propósito de ampliar e aprofundar o seu conteúdo social, enquanto, ao mesmo tempo, o individuo ganha o controle dos métodos envolvidos”. De acordo com o Papa Pio Xl : “A educação consiste, essencialmente, em preparar o homem para o que deve ser e para o que deve fazer aqui na Terra, a fim de atingir o fim sublime para que foi criado ... O assunto da educação é o homem global e inteiro, alma unida ao corpo em unidade da natureza, com todas as suas faculdades naturais e sobrenaturais, tal como a razão justa e a revelação lhe mostraram que fosse

Assim, diferentes Filosofias fornecem diferentes definições da educação. Qual é a natureza da Filosofia educacional que toma possíveis semelhantes diferenças?

O ÂMBITO DA FILOSOFIA EDUCACIONAL

Assim como a Filosofia geral procura entender a realidade como um todo,

explicando-a da maneira mais genérica e sistemática, assim a Filosofia educacional procura também compreender a educação, na sua integridade, interpretando-a por meio de conceitos gerais suscetíveis de orientarem a escolha de objetivos e diretrizes educativas. Do mesmo modo que a Filosofia geral coordena as descobertas e conclusões das diversas ciências, a Filosofia educacional interpreta-as na medida em que se relacionem com a educação. As teorias científicas não comportam em si mesmas inequívocas implicações educacionais; não podem ser aplicadas diretamente. Um motivo para isso é que os cientistas nem sempre concordam entre si sobre o que constitui um conhecimento definitivo. Não existe, por exemplo, uma teoria de aprendizagem geralmente aceita. Outro motivo é que, ao selecionar objetivos e diretrizes educativas, temos de formular juízos de valor, de decidir, entre uma quantidade de fins e meios possíveis, quais os que deveremos adotar. Como já vimos, a ciência não pode tomar por nós tais decisões, se bem que possa fornecer muitos dos fatos em que as nossas decisões se baseiam. Esses juízos têm de ser elaborados dentro do quadro de uma Filosofia que pessoalmente aceitamos.

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A Filosofia educacional depende da Filosofia formal porque quase todos os grandes problemas da educação são, no fundo, problemas filosóficos. Não podemos criticar os ideais e as diretrizes educacionais existentes, nem sugerir novos, sem atendermos a problemas filosóficos de ordem geral, tais como a natureza do próprio homem, que é um dos alvos da educação; a natureza cio próprio homem, porque é o homem que estamos educando; a natureza da sociedade, porque a educação é um processo social; e a natureza da realidade suprema, que todo o conhecimento procura penetrar. A Filosofia educacional, portanto, envolve a aplicação da Filosofia formal ao campo da educação. Tal como a Filosofia geral, ela é especulativa, prescritiva e crítica ou analítica.,

A Filosofia educacional é especulativa quando procura estabelecer teorias da natureza do homem, sociedade e mundo, por meio das quais ordene e interprete os dados conflitantes da pesquisa educacional e das ciências humanas. O filósofo educacional pode estabelecer tais teorias deduzindo-as da Filosofia formal e aplicando-as à educação, ou, então, passando dos problemas particulares da educação para um esquema filosófico capaz de resolvê-los. Seja qual for o método que siga, permanece o fato de que a educação suscita uma série de problemas que nem ela nem a ciência podem resolver sozinhas, pois são meros exemplos das questões que perenemente se repetem na própria Filosofia.

Uma Filosofia da educação é prescrita quando especifica os fins a que a educação deve obedecer e os meios gerais que deve usar para atingi-los. Define e explica os fins e os meios existentes do nosso sistema educativo e sugere novos meios e fins para devida consideração. Para um tal propósito, os “fatos”, mesmo quando definitivos, não podem ser suficientes. Os fatos apenas indicam, com maior ou menor rigor, as conseqüências de adotarmos certas diretrizes. Não nos dizem se tais orientações são desejáveis ou, sendo desejáveis, se justificam o abandono de outras diretrizes. Tanto as finalidades da educação como quaisquer de seus meios, excetuando os mais particulares, não podem ser estabelecidos mediante critérios considerados válidos unicamente para a educação, visto que, como disciplina, a educação não pode ficar sozinha. Com efeito, sem recorremos à Filosofia Política, como poderemos inteligentemente discutir a questão de saber se a escola deve ou não praticar a democracia na administração e no governo dos estudantes ? Ou, sem referência à Filosofia Social, como poderemos discutir o problema da instrução individual? Quando o educador escolhe os seus fins, deve fazê-lo não como educador, mas como filósofo.

Uma Filosofia da educação também é analítica e critica. Nesta acepção, analisa suas próprias teorias especulativas e prescritivas, bem como as teorias que encontra em outras disciplinas. Examina a racionalidade dos nossos ideais educativos, sua coerência com outros ideais e a parte neles desempenhada pelo pensamento improvisado ou ilusório. Comprova a lógica dos nossos conceitos e sua adequação aos fatos que procuram explicar. Demonstra as inconsistências existentes em nossas teorias e indica o preciso alcance das teorias que restam, quando as incoerências são removidas. Examina a vasta proliferação de conceitos educacionais especializados. Sobretudo, luta por esclarecer os múltiplos significados diferentes ligados a expressões tão desgastadas como “liberdade”, “adaptação”, „crescimento”, “experiência”, “interesse” e “maturidade”.

EPISTEMOLOGIA E EDUCAÇÃO

Um dos interesses primordiais da educação é descobrir e transmitir conhecimento.

Mas nem tudo o que circula sob o nome de educação pode corretamente ser rotulado de „conhecimento”. Como é importante para o professor, pois, ser capaz de avaliar as bases em que se formulam as exigências de conhecimento!

O professor pode ajudar os estudantes a compreenderem e distinguirem entre opinião e fato, entre crença e conhecimento. Da convicção de que uma crença é

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verdadeira não se segue, necessariamente, que a crença é verdadeira de fato, a menos que satisfaça os padrões do conhecimento idôneo. Por exemplo, o princípio da separação da Igreja e do Estado não é a razão suprema para a exclusão da religião das escolas públicas. Um motivo pertinente para o problema em questão é que o estado de conhecimento das crenças religiosas não está esclarecido; muitos consideram as crenças religiosas algo predominantemente mítico. Outros, que não negam a benéfica influência moral da religião sobre o comportamento dos estudantes, duvidam que a religião possa fornecer conhecimentos de um modo apropriado. Claro, os teólogos e outros estão convencidos de que a religião fornece conhecimento de fato: o conhecimento revelado. Talvez a única solução para os professores seja admitirem uma preferência por certos tipos de conhecimento ou dizerem que os padrões para julgar o que é conhecimento e o que não constituem, eles próprios, matéria para debate.

O professor também pode discutir os métodos pelos quais o conhecimento é adquirido - através da revelação, autoridade, intuição, razão, os sentidos e a experimentação. O conhecimento derivado da experimentação científica é o mais aceito, hoje em dia. Isto não quer dizer que os outros métodos sejam errados ou inúteis. Pelo contrário, o professor pode demonstrar que os diferentes métodos, na realidade, complementam-se entre si. Só a percepção sensorial fornecerá fatos e dados objetivos e distintos. Mas precisamos da razão para sintetizar as descobertas empíricas, para incorporá-las numa teoria ou numa lei. Se abandonado a si próprio, contudo, o raciocínio estaria vazio de conteúdo. O filósofo alemão, lmmanuel Kant, resumiu a interdependência do raciocínio e da percepção sensorial no ato de conhecimento: “Os conceitos sem percepções são vazios; as percepções sem conceitos são cegas”. O conhecimento intuitivo, revelado e autoritário, cada um deles poderá ser o que melhor atua em diferentes situações da vida. A vida é, com efeito, demasiado variada e imprevisível para que qualquer um formule arrogantes afirmações a seu respeito. A questão importante para o professor é a seguinte: “Quanto tempo e esforço deve ser dedicado a cada um desses métodos ?“ A resposta dependerá, em grande parte, da matéria que ele estiver ensinando.

Em última análise, porém, deve depender sobretudo da sua Filosofia de Educação. Como sabemos, diferentes Filosofias sublinham diferentes tipos de conhecimento e, por conseguinte, diferentes metodologias de ensino.

AXIOLOGIA, ÉTICA E EDUCAÇÃO

Seja qual for a importância das teorias do conhecimento para a instrução concreta

na sala de aula, a necessidade de uma sólida teoria social e ética é facilmente aceita como fundamental para a prática educativa. De fato, muitos consideram a educação do caráter mais importante para a juventude do que o ensino de matérias cognitivas. Estão mais preocupados com a maneira como as escolas podem eficazmente transmitir os valores morais e espirituais que façam do mundo um melhor lugar para se viver do que com as questões de conteúdo da matéria dos programas. Os inúmeros escritos sobre a relação entre Filosofia e a educação revelam que a maioria dos que consideram a metafísica e outras categorias filosóficas sem importância especial para a prática educativa está impressionada com a necessidade de um estudo dos valores em educação. A pergunta parece ser sempre: “Quais os valores e tipos de valor que são, justamente, os mais pertinentes ?“ A razão para tal é que a educação está sempre formulando avaliações. Não hesita em articular juízos, em suas estimativas da prática escolar. Os professores avaliam os estudantes e são por estes avaliados. A sociedade avalia os cursos estudados, os programas escolares, a competência do ensino; a própria sociedade está sendo constantemente avaliada pelos educadores. Um estudo de axiologia é, portanto, uma necessidade para o professor do divertimento.”

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O valor especifico que um professor atribui aos problemas escolares derivará do seu próprio sistema de valores. Uma posição professoral, por exemplo, considerada principalmente como um degrau para fins e intuitos pessoais, poderá refletir perfeitamente valores subjetivos. A posição não terá um valor próprio. O professor que considera a sua classe um meio para alcançar um fim, em vez de um fim em si mesma, poderá refletir uma preferência por valores instrumentais. Ensinará de um modo tal que os estudantes apreciarão o processo de ensino, em vez de dominarem o conhecimento que o professor propicia.

A Filosofia da educação guia a teoria e a prática de três maneiras: 1) ordena as descobertas e conclusões das disciplinas relevantes para a educação, incluindo as descobertas da própria educação, dentro de uma concepção compreensiva do homem e da educação que se lhe ajuste; 2) examina e recomenda os fins e os meios gerais do processo educacional; e 3) esclarece e coordena os conceitos educativos básicos.

Quando a reflexão filosófica se volta deliberada, metódica e sistematicamente para a questão educacional, explicitando os seus fundamentos e elaborando as suas diversas dimensões num todo articulado, a concepção de mundo se manifesta, aí, na forma de uma concepção filosófica de educação. Considerando que as diversas concepções de filosofia da educação constituem diferentes maneiras de articular os pressupostos filosóficos com a teoria da educação e a prática pedagógica, o estudo crítico dessas concepções constitui um componente essencial da formação do educador.

Com efeito, através desse estudo o educador irá compreender com maior clareza a razão da existência de teorias da educação contrastantes e de práticas pedagógicas que se contrapõem. E contrariamente, à opinião corrente que tende a autonomizar a prática da teoria e vice-versa, entenderá que a prática pedagógica é sempre tributária de determinada teoria que, por sua vez, pressupõe determinada concepção filosófica ainda que em grande parte dos casos essa relação não esteja explicitada.

Ora, quando os pressupostos teóricos e os fundamentos filosóficos da prática ficam implícitos, isto significa que o educador, via de regra, está se guiando por uma concepção que se situa ao nível do senso comum. Entende-se por senso comum uma concepção não elaborada, constituída por aspectos heterogêneos de diferentes concepções filosóficas e por elementos sedimentados pela tradição e acolhidos sem critica. Em conseqüência, a prática orientada pelo senso comum tende a se caracterizar pela inconsistência e incoerência.

Para imprimir maior coerência e consistência à sua ação, é mister que o educador se eleve do senso comum ao nível da consciência filosófica da sua própria prática, o que implica detectar e elaborar o bom senso que é o núcleo válido de sua atividade. E tal elaboração passa pelo confronto entre as experiências pedagógicas significativas vividas pelo educador e as concepções sistematizadas da filosofia da educação. Com isso será possível explicitar os fundamentos de sua prática e superar suas inconsistências, de modo a torná-la coerente e eficaz.

CLAREZA CONCEITUAL E TERMINOLÓGICA

Atingindo uma compreensão mais profunda, mais rigorosa e mais ampla de seu

objeto, o educador irá depurando seu pensamento e sua linguagem de eventuais ambigüidades e imprecisões.

Essa função da filosofia tem sido especialmente enfatizada pela concepção analítica, a qual entende que o papel próprio da filosofia é a análise lógica da linguagem. Em conseqüência, o papel da filosofia da educação passa a se efetuar a análise lógica da linguagem educacional de modo a libertá-la de suas imprecisões e incongruências.

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Entretanto, independentemente da concepção que o inspira ou na qual desemboca, o aprofundamento filosófico implica necessariamente o rigor lógico-conceitual, o qual só pode se manifestar através de uma linguagem precisa, clara e inteligível.

Essa é uma outra contribuição da filosofia para a educação. Possibilitando uma maior clareza conceitual e de linguagem, melhora-se a comunicação entre os educadores e destes com os que cultivam as demais áreas do conhecimento, situando a pedagogia no rumo da maturidade epistemológica que lhe garanta condições de igualdade em face dos demais ramos do saber científico.

TEXTO PARA REFLEXÃO: Filosofia, exercício do filosofar e a prática educativa (Cipriano Carlos Luckesi) I - Importância da Filosofia

Sobre as considerações que a sociedade e as pessoas têm para com a filosofia, é

possível detectar pelo menos cinco atitudes, sendo que as quatro primeiras são negativas e a última positiva.

Em primeiro lugar, temos aqueles indivíduos e aqueles grupos humanos que consideram a filosofia como alguma coisa inútil e que é produto de mentes diletantes e, deste modo, sem nenhum comprometimento com a existência diária das pessoas.

Uma segunda atitude em relação à filosofia constitui-se na polidez com a qual, muitas vezes, ela é admitida no seio da sociedade, sem, contudo ser levada a sério como deveria sê-lo.

Vejamos Uma primeira forma pela qual essa polidez universal para com a filosofia faz-se presente em situações particulares pode ser detectadas numa situação de convívio social. Em uma roda de final de semana, alguém chega e se apresenta como sendo um profissional da área de filosofia; então o comentário polido é mais ou menos o seguinte: Puxa, para trabalhar com filosofia é preciso ter uma inteligência excepcional, pois essa é uma área de conhecimento muito difícil”. Há nessa expressão um elogio para o profissional de filosofia, mas uma forma de dizer que não vale a pena tentar se dedicar à filosofia, por ser uma área de estudo tão difícil, que somente uns poucos privilegiados podem dedicar-lhe atenção. A filosofia, assim sendo, não é para todos, mas para poucos. Parece, então, que o comum dos mortais não deve, de forma alguma, cuidar da filosofia, pois que não vai conseguir chegar ao seu objetivo. Elogia-se a filosofia, através do elogio ao filósofo, porém retira-se a possibilidade de que a filosofia venha a ser alguma coisa interessante e importante para todos.

Esse julgamento do significado da filosofia é manifesto de diversas maneiras. Existem aqueles que dizem que a filosofia constrói castelos de idéias e conceitos que servem somente para preencher o tempo dos que a ela se dedicam. Chegam mesmo a considerar como “malucos”, “lunáticos”, “os fora-da-realidade” aqueles que se dedicam ao filosofar.

É dentro desta perspectiva que se pode entender a frase popular, corriqueiramente dita no cotidiano das conversas: “aquele sujeito ali é um filósofo...” Com isso usualmente se quer indicar alguém que se apresenta (seja nas condutas, seja no vestir, ou em outros acontecimentos do dia-a-dia) de uma forma que diverge do comum das pessoas. Esse julgamento será ainda mais exacerbado se o sujeito denominado “filósofo”, importar-se pouco com as questões econômicas da sobrevivência. Pareceria que aqueles que se dedicam à filosofia não necessitam de meios para sobreviver.

Tanto uma como outra forma de “polidez” para com a filosofia revela a atitude de quem não penetra no efetivo significado da mesma. São julgamentos que se referem a

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„aspectos absolutamente exteriores à filosofia e não ao ato de filosofar propriamente dito. Uma terceira forma de conduta em relação à importância da filosofia é a “blangue”.

Há uma frase secular e folclórica com a qual se define o que seria a filosofia: “A filosofia é a ciência com a qual ou sem a qual o mundo continua tal e qual”. Ë uma blague‟ Todavia é uma forma de dizer, brincando, que o exercício de filosofar é uma coisa inútil. Ou seja, essa blague é uma forma de expressar a compreensão de que a filosofia é um modo de conhecer que não se sabe de onde veio nem para onde vai. Ao mesmo tempo que expressa uma brincadeira essa definição manifesta uma postura negativa da sociedade em relação á filosofia. Brincando, ela é definida como inútil.

Uma quarta atitude, paradoxal, em relação à filosofia, é a que assumem, aqui e acolá, os poderes constituídos. Entendem que a filosofia é uma forma de saber que é perigosa nas mãos dos cidadãos e, por isso, deve ser abolida, mas que é importante nas mãos dos poderes constituídos. Isso foi o que ocorreu no Brasil pós-64, por exemplo. O governo militar brasileiro suprimiu o ensino de filosofia nas escolas de ensino médio e dificultou-o nas universidades. Contudo, investiu em especialistas da área do estudo filosófico e político, encarregando-os do estabelecimento do pensamento filosófico-político norteador das ações governamentais.

Todas as atitudes, em relação à filosofia, até agora descritas, diminuem ou suprimem o seu valor. Todas elas apresentam um aspecto contraditório entre o “valorizar e o desvalorizar”, como fazem as atitudes cotidianas, ou entre o “desvalorizar e o valorizar”, como faz a oficialidade.

Evidentemente que a atitude mais correta em relação ao saber filosófico - a quinta atitude - é considerá-lo naquilo que ele tem de propriamente seu. Isto é, assumir a filosofia no seu aspecto essencial de ser uma forma de entendimento necessário à práxis humana, rejeitando, assim, todos os subterfúgios, sejam eles de “polidez”, de “blague”, de “oficialidade”, ou outros.

Leôncio Basbaum expressa bastante bem o sentido da importância da filosofia na vida humana. Ele diz:

“Devemos repelir qualquer idéia de que a filosofia seja um quadro exposto à contemplação passiva do homem, ou, mesmo um entorpecente para mergulhá-lo em doces sonhos etéreos enquanto esquece a realidade da vida e o muito que há a fazer dentro dela. A filosofia é, antes de mais nada, em primeiro lugar e acima de tudo, “uma arma”, uma ferramenta, um instrumento de ação, com a ajuda da qual o homem conhece a natureza e busca o conforto físico e espiritual para a vida. Se o homem realmente se destaca dos outros animais pela amplidão e profundidade do seu pensamento, se tudo o que ele realizou, desde que, saindo da selvageria, começou a construir o que chamamos de civilização, foi a concretização desse pensamento que, evoluindo, se transformou através do tempo e do espaço; não há dúvida de que esse pensamento, mobilizando os dedos de suas mão, é sua principal arma na conquista da natureza e, portanto, de sua liberdade”.

Assim, ao nosso ver, a verdadeira compreensão do que vem a ser a filosofia implica assumi-Ia como uma forma de entendimento da realidade que coloque nas mãos do ser humano uma orientação, um direcionamento para a sua ação. Ela é de fundamental importância para a vida de todos os indivíduos, enquanto seres humanos que desejam encontrar um sentido e um significado para o seu agir.

No que se segue, vamos tentar definir a filosofia a partir desse último ponto de vista. II- O que é a Filosofia

Desde que recusamos as formas implícitas ou explícitas de diminuir ou alijar a

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importância da filosofia e afirmamos o seu efetivo significado para a vida humana, importa, agora, conseguirmos esclarecer o que ela é, como ela pode ser compreendida.

Jaspers, em seu livro Introdução ao Pensamento Filosófico, compreende a filosofia da seguinte maneira:

“Seja a filosofia o que for, está presente em nosso mundo e a ele necessariamente se refere.

Certo é que ela rompe os quadros do mundo para lançar-se no infinito. Mas retorna ao finito, para aí, encontrar o seu fundamento histórico sempre original.

Certo é que tende aos horizontes mais remotos, horizontes situados para além do mundo, a fim de ali conseguir, no eterno, a experiência do presente. Contudo, nem mesmo a mais profunda meditação terá sentido se não se relacionar à existência do homem, aqui e agora.

A filosofia entrevê os critérios últimos, a abóboda celeste das possibilidades e procura, à luz do aparentemente impossível, a vida pela qual o homem poderá enobrecer-se em sua existência empírica”.

Esse pensador nos mostra que a filosofia é uma forma de compreender o dia-a-dia da história, a cotidianidade do mundo, os seres humanos com suas aspirações, desejos, grandezas e misérias; essencialmente, ela é a “via pela qual o homem poderá enobrecer-se em sua existência empírica”.

Ainda que a filosofia construa entendimentos da realidade que possam parecer abstratos, eles são efetivamente concretos. Eles nascem da realidade e, para abarcá-la na sua universalidade, necessitam ultrapassá-la, formulando compressões que se universalizem, Isto é, a filosofia reflete sobre os dados concretos do dia-a-dia, porém, para cumprir o seu papel, necessita de descolar-se dessa realidade empírica, para, no nível do pensado, deslindá-la e, assim, possibilitar ao ser humano uma orientação segura para a sua prática. Deste modo, e tão-somente deste modo, é que a filosofia pode ser significativa para o ser humano, individual ou coletivo. Pensando o concreto, ela constitui um entendimento coerente e critico que possibilita o direcionamento da ação prática cotidiana. Assim sendo ela “dá forma” à ação.

No dizer de Leôncio Basbaum, “A filosofia traduz o sentir, o pensar e o agir do homem. Evidentemente, ele não se

alimenta de filosofia, mas sem dúvida nenhuma, com a ajuda da filosofia”. O que pode ser dito, com propriedade, é que todos vivem a partir de significações de

uma forma mais consciente ou menos consciente; mas a filosofia, propriamente, é uma forma consciente e crítica de pensar e de agir.

A filosofia, propriamente dita, como forma consciente e crítica de compreender o mundo e a realidade não se confunde, de maneira alguma, com o fato de se estar “investido” inconscientemente de conceitos e valores adquiridos a partir do “senso comum‟. Contudo, cada ser humano pode e deve aprender a pensar criticamente o mundo, elevando o seu nível de entendimento e de compreensão da vida e de sua forma de conduzi-la.

A filosofia tem por seu objetivo de reflexão os sentidos, os significados e os valores que dimensionam e norteiam a vida e a prática histórica humana. Assim sendo, nenhum individuo, nenhum povo, nenhum momento histórico vive e sobrevive sem um conjunto de conceitos que significa a sua forma de existência e sua ação. Não há como viver sem se perguntar pelo seu sentido; assim como não há como praticar qualquer ação, sem que se tenha que perguntar pelo seu significado, pela sua finalidade. É claro que alguém poderá viver pelo senso comum entranhado em seu inconsciente, sem se perguntar conscientemente pelo seu efetivo significado. Já falamos nisso, porém essa não é uma conduta filosófica, como já temos reiterado anteriormente. A filosofia e o seu exercício no filosofar implicam a pergunta explícita e consciente pelo sentido das coisas, da vida e da prática humana.

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Sobre isso, o padre Vaz nos diz: “A filosofia é a resposta que uma sociedade traz à dupla exigência de refletir

criticamente e de se explicar teoricamente quanto aos valores e representações que tornam inteligíveis, ou pelo menos aceitáveis, para os indivíduos que nela vivem um modo de ser, isto é, um modo de viver e de morrer, de imaginar e de conhecer, de amar e de trabalhar, de mandar e de obedecer, etc., que constitui o legado da tradição, e que os indivíduos devem assumir e, de fato, já assumiram antes mesmo de poder responder por ele, ou justificá-lo diante da própria razão”.

Ou seja, a filosofia trata dos fundamentos últimos que dão sentido ao existir humano na história. Não se faz ciência nem educação, não se faz economia nem religião, não se faz política nem se vive familiarmente, não se ama nem se odeia, não se é honesto nem desonesto, assim como não se pratica todas as outras atividades e condutas humanas, sem buscar o seu sentido e significado.

Para aprofundar esse entendimento da filosofia, vamos nos valer da citação do pensamento de alguns autores:

“Os filósofos exprimem sempre, em cada instante, o pensamento de um grupo social, classe ou povo a que pertencem. Eles são os teoristas, os que explicam e interpretam os seus desejos, as tendências e as reivindicações desses grupos, classes ou povos”, nos alerta Leôncio Basbaum.

“As idéias ou os princípios dos homens provêm da experiência quer se trate de princípios especulativos, quer dos princípios práticos ou princípios de moral. Os princípios morais variam segundo os tempos e os lugares. Quando os homens condenam uma determinada ação é porque ela os prejudica, quando a enaltecem é porque ela lhes é útil. O interesse (não o interesse pessoal, mas o interesse social) determina, assim os julgamentos do homem no domínio da vida social”, nos diz G. Plekanov, pensador russo.

Sendo a filosofia a interpretação da experiência humana no aqui e agora da existência histórica dos indivíduos e dos povos, ela é também orientação para o futuro da vida em sociedade. É isso que nos diz Basbaum, no texto que se segue:

“A filosofia é a concretização de um espírito ou de uma idéia que surge como conseqüência das necessidades de uma época ou de uma classe, em geral de ambas as coisas. Ela se encarrega de justificar este espírito, pela experimentação ou pela razão, no sentido de demonstrar a verdade desse conceito. E seu papel, ainda difundi-Ia e propagá-la. Sofrendo a influencia da história, ela encarrega-se de, por sua vez, influenciar e orientar o curso da história de acordo com o interesse dos inventores ou criadores e propagadores dessas idéias”.

Desta maneira, a filosofia não é tão-somente a interpretação do “já vivido” ou “daquilo que está vivendo”, mas é também, e principalmente, interpretação das aspirações e anseios dos povos, na medida em que ela se destina a estabelecer fundamentos e direcionamentos para a práxis.

Aqui, a filosofia manifesta-se como impulsionadora da ação, tendo em vista a concretização de determinadas aspirações dos seres humanos, de um povo ou de um grupamento humano. Neste sentido, ela é uma força mobilizadora da ação, é o sustentáculo de um modo de agir. Aliás, esta é a idéia que vimos apresentando como compreensão do que seja a filosofia.

A filosofia, como já dissemos, - confirma Basbaum - “não é apenas um instrumento para a compreensão do mundo e interpretação dos seus fenômenos. E também um instrumento de ação e uma arma política e, como tal, tem sido utilizada, em todos os tempos, consciente ou inconscientemente”.

Em síntese, podemos afirmar que a filosofia é uma forma critica e coerente de pensar o mundo, produzindo um entendimento de seu significado e do seu sentido, formulando, deste modo, uma concepção geral do mundo, uma cosmovisão da qual decorre uma forma de agir. A filosofia, através da compreensão que produz, constrói uma

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fonte permanente e crítica de significação e direcionamento da práxis. O exercício do filosofar implicará que cada um de nós que deseje refletir

filosoficamente, tome em suas mãos as significações corriqueiras da existência humana e lhes dê uma significação critica e consciente. Esse será o assunto do tem subseqüente do nosso texto.

III - A Questão do Método no Filosofar

O exercício do filosofar faz-se em três passos fundamentais, que são distinguíveis

somente de forma didática, já que na prática eles podem se dar simultaneamente. Como vimos, anteriormente, a filosofia é um processo de pensar a realidade e o

mundo de tal forma que ela desvenda criticamente os conceitos e valores que compreendem e direcionam a vida humana assim como, criticamente, ela propõe conceitos e valores que possam e devam orientar a vida humana individual e social. Desse entendimento decorre o caminho metodológico do exercício do filosofar; isto é, a prática do filosofar vai de um inventário dos conceitos e valores que no momento “explicam” a vida humana, passando por sua crítica e chegando a uma proposição de novos conceitos e valores, que incorporam os anteriores, por superação.

Esses três passos podem se dar, e certamente se dão, de uma forma dinâmica, de tal modo que na medida em que começamos a inventariar os conceitos e valores que gerem a compreensão e o direcionamento que damos à realidade, ao mesmo tempo já estamos procedendo a crítica desses elementos e vislumbrando a proposição nova que estamos desejando sistematizar e apresentar. Então, didaticamente, podemos entender e seguir sequentemente esses três elementos; como passos, porém, no processo do filosofar propriamente dito, eles não se dão de modo separado e distinto como indicamos acima. O resultado final do nosso exercício do filosofar, que será o nosso pensamento filosófico constituído, usualmente se apresenta como um discurso que, a partir de uma crítica do existente, encaminha novos entendimentos e novos caminhos para a ação.

Assim sendo, a primeira coisa a fazer, no exercício do filosofar, é dar-se conta dos conceitos e valores que estão “aplicando” e dirigindo nossa prática. É o momento de inventariar conceitos e valores que se tornaram comuns em nossa prática e que estão dando forma às nossas condutas afetivas, intelectuais, morais, políticas, familiares,... Não há como estabelecer uma critica dos nossos conceitos e valores se nós não os conhecemos, se nós não temos ciência de que são eles que estão informando o nosso modo de ser e agir.

Tendo ciência dos conceitos e valores que “explicam” e gerem nossas vidas, importa fazê-los passar pelo crivo de nossa crítica, perguntando se eles, de fato, são significativos para nossas vidas no mundo; se ainda aceitamos esses conceitos e valores como aqueles que são importantes para dar significado ao nosso modo de ser e de conduzir. É uma situação de dúvida e de crise.

Todavia, como vivemos sem conceitos e valores que direcionem nossas práticas, assim como não vivemos sem o ar que respiramos, necessitamos restabelecer conceitos e valores para que dêem forma e direcionem nossas práticas. É o momento da reelaboração dos conceitos e valores no processo do filosofar. É o momento do estabelecimento de entendimentos novos, de caminhos críticos e conscientes.

Deste modo, todos nós podemos e devemos filosofar, na medida que todos nós necessitamos de conceitos e valores para viver e dirigir nossa práticas.

Esse inventário que critica a reelaboração de conceitos e valores não será simples, certamente. Esse processo exigirá cuidado e atenção de cada um de nós, assim como não poderemos dispensar a ajuda que os pensadores clássicos da filosofia podem nos

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oferecer para compreender o processo que estamos querendo trilhar. Não diríamos que, sem o conhecimento dos clássicos, não são se pode filosofar. Contudo importa ter claro que eles são auxiliares fundamentais desse processo, na medida em que já trilharam esse caminho e deixaram “luzes” que podem ser utilizadas, desde que tomadas, também de forma crítica. Não é porque foram os clássicos que disseram alguma coisa que devemos tomá-la como dogma. Os dogmas não existem; o que existe é o mundo e a realidade a ser interpretada. Esse é o limite, porque é o próprio objeto de investigação O mais, são meios auxiliares.

IV - Conseqüências do Filosofar para a Prática Educativa

Historicamente, podemos dizer que a filosofia e o exercício do filosofar sempre

tiveram conseqüências para a prática educativa, na medida em que os diversos sistemas e pensamentos filosóficos produziram encaminhamentos para a educação, assim como pedagogos praticaram o filosofar sobre o seu objeto específico de trabalho - a prática educativa - produzindo crítica e direcionamentos novos para as diversas atividades comprometidas com processos educativos.

Não nos interessa, aqui, trabalhar, com as conseqüências dos pensamentos e dos sistemas filosóficos para a prática educativa. Estamos mais interessados em convencer cada educador e dedicar-se à investigação filosófica em torno do seu próprio objeto de trabalho na medida mesma em que opera com esse objeto; ou seja; importa que cada educador tome em suas mãos o seu cotidiano e medite sobre ele, verificando e criticando os conceitos e valores que o informam e o direcionam, assumindo criticamente o seu modo de ser e agir como educador.

Cabe a um educador questionar permanentemente sobre o objetivo do seu trabalho, sobre os sujeitos de sua prática, sobre o sentido dos procedimentos que utiliza, sobre o que é conhecimento, sobre efetividade, sobre métodos, sobre os conteúdos que veicula, e tantos outros objetos que estão comprometidos com sua prática.

Os objetos de meditação filosófica para o educador não estão distantes de suas condutas; não são objetos abstratos. Ao contrário, são os fenômenos, acontecimentos e fatos que estão imediatamente juntos de si, diretamente articulados com a materialidade de sua ação.

Todos nós, educadores, podemos e devemos exercitar essa prática do filosofar. Se necessitarmos - e certamente que necessitaremos -„ não há porque não nos utilizarem dos autores clássicos ou autores consagrados, para que nos auxiliarem na compreensão e aprofundamento de nossa meditação. Como já dissemos, eles trouxeram “luzes” sobre alguns dos objetos de reflexão a respeito dos quais nos debatemos. Então podem nos auxiliar.

Assim sendo, a filosofia e o exercício do filosofar têm conseqüências diretas e imediatas para nossa prática educativa, na medida em que atuam buscando e produzindo fundamentos que dêem direção ao nosso agir. Aliás, como em tudo o mais na vida humana, também na prática educativa não se age sem filosofia.

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2.4 - FUNDAMENTOS BIOLÓGICOS

O estudo de algumas noções básicas de Biologia humana é indispensável para

melhor compreender a utilidade da Biologia para a educação e os aspectos biológicos mais diretamente envolvidos no trabalho escolar.

A citologia ou estudo de célula e de suas funções, a fisiologia e a anatomia do organismo humano; os órgãos e processos envolvidos na formação de novos seres humanos; e a genética ou a origem de nossas características hereditárias constituem elementos fundamentais, tanto para o conhecimento do aluno quanto para o desenvolvimento do processo educativo.

A Biologia estuda as transformações que ocorrem nos seres vivos, suas relações entre eles e o meio ambiente ao longo dos tempos.

Sabe-se que a partir da segunda metade do século XX, professores de Psicologia e de Pedagogia salientavam a necessidade de uma melhor base biológica para seus alunos. Houve então, a criação da Cátedra de Biologia Educacional a fim de dar ao educador uma ampla visão dos fenômenos da vida e da evolução, ao mesmo tempo que se lhe fornecia, por intermédio desta disciplina, base científica para a compreensão de certos capítulos da Psicologia, da Sociologia e da Pedagogia.

Na época, não tinha conteúdo certo, ela se subordinaria a oferecer bases à Psicoloia, à Sociologia e a Educação.

E certo que a Biologia Educacional daria fundamento à solução de inúmeros problemas de outras disciplinas, de vários cursos, mas não menos exato é que ela deve possuir - e de fato possui - uma finalidade privativa, que a chama para a direta e imediata intervenção na obra educacional.

Para nos fazermos entender, recorramos por um momento à noção estabelecida pela ciência, das diferenças individuais. Não existem dois indivíduos iguais. Diferem um dos outros pelos caracteres somáticos: peso, estatura, conformação externa e interna,

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diferem nas manifestações fisiológicas: força muscular, ritmo circulatório, propriedades sanguíneas, acuidade sensorial, diferem finalmente nas funções psíquicas: memória, inteligência, emotividade, etc...

Por que é que não há dois homens realmente iguais? Por que é que, no grupo de 35 crianças que o professor recebe ao iniciar-se o ano letivo, não encontra ele, duas que tenham os mesmos atributos morfológicos ou funcionais ? De que dependem as diferenças que apresentam, e cujo conhecimento é de tanto, interesse para o educador ? Além disso, por que é que mudam as crianças, de um ano para outro, de um dia para outro, sofrendo muitas vezes alterações radicais e imprevistas nos seus caracteres somáticos, na saúde física, no vigor intelectual?

Diferenças e mudanças resultam de um complexo de fatores em que sobrelevam os de natureza biológica: hereditariedade, alimentação, doenças, ação da atmosfera, atividade funcional dos músculos ou sistema nervoso, etc. - fatores que a biologia educacional mostra e analisa, procurando ao mesmo tempo determinar, quanto possível, o coeficiente de contribuição de cada um.

Mas, não basta ao educador saber quais os fatores das diferenças individuais, cabe a ele procurar influir sobre tais fatores a fim de que, graças a essa providência, certos caracteres individuais desapareçam e outros se desenvolvam.

Daí dizermos que a Biologia Educacional é o estudo dos fatores biológicos que determinam as diferenças e variações individuais na espécie humana, e dos meios com que o educador poderá atuar sobre eles.

Embora as diferenças individuais envolvam atributos do caráter e da personalidade, não se derivam diretamente de fatores orgânicos, eles têm raízes biológicas. A criança começa a vida como um ser orgânico. Torna-se depois um ser social.

A altura, o peso, a conformação do corpo e a aparência geral contribuem para a personalidade de duas maneiras: 10) elas impedem ou contribuem para o desenvolvimento de habilidades socialmente aprovadas; 20) porque estes atributos físicos, em conformidade com os valores sociais de uma cultura ou divergindo deles tem importantes efeitos sobre o comportamento. O físico de um indivíduo influencia as relações das outras pessoas em relação a ele, isto, por sua vez determina os conceitos que o individuo faz de si mesmo, o que tem efeitos decisivos no seu próprio comportamento. Os estudos têm demonstrado sistematicamente que os indivíduos que têm tipos físicos socialmente aprovados, têm mais atividades socialmente aprovadas, menos problemas pessoais e melhor ajustamento social do que aqueles que estão mais distantes da forma física ideal (Dimock, 1937).

Jamais se poderia superestimar a necessidade de compreender como e porque os estudantes sentem e se comportam deste ou daquele modo. Para poder realmente ajudar o aluno, o professor tem que compreender os problemas com que se defronta a criança em desenvolvimento na escola e na comunidade.

O papel do professor como higienista mental é muito importante dentro da unidade escolar.

TEXTO PARA REFLEXÃO: Psicologia Educacional (Sawrey, James M. & Telford, Charles W) O professor deve conhecer bastante sobre ajustamento humano para avaliar os

problemas da classe como grupo e auxiliar os indivíduos no grupo a fazer um ajustamento social, pessoal e adequado. Compreender os alunos e seus problemas resulta do conhecimento dos seguintes fatores: o potencial hereditário e seu desenvolvimento nas

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primeiras idades, motivação em geral, motivação relativa das necessidades especiais dos indivíduos na classe, como ocorre a aprendizagem e quais são as condições para uma melhor aprendizagem; inteligência, personalidade; emoções; interesses, aptidões; e forças sociais. Além da percepção dessas áreas de conhecimento, o professor deve saber algo sobre problemas de ajustamento.

Frustração e conflito solicitam reações de ajustamento por parte do indivíduo. A frustração ocorre quando os meios de satisfação das necessidades de alguém são impedidos. A pessoa aprende a responder à frustração através de suas experiências com a frustração. Situações de conflito são aquelas em que o individuo é motivado por dois motivos incompatíveis simultaneamente. As situações básicas de conflito são: aproximação-aproximação, repulsão-repulsão e atração-repulsão. A resposta emocional generalizada para o conflito é ansiedade.

A ansiedade relativa à segurança, prestigio e autoconceito é típica. O comportamento resultante pode parecer irracional e contrário aos melhores interesses do individuo.

Todos nós aprendemos a nos ajustar às situações da vida de um modo ou de outro. Certos hábitos de ajustamento correm bastante freqüentemente entre as pessoas, para que seja dada uma atenção especial. Estes são chamados mecanismos. Não são adquiridos deliberadamente e com o conhecimento de quem os exibe. São aprendidos através de um processo típico de ensaio e erro, sem que o individuo tenha consciência da condição motivadora, que está sendo satisfeita pelo comportamento aprendido.

A agressão é uma reação típica à frustração. As crianças exibem agressão direta e gradualmente aprendem a expressar agressão indiretamente, através de meios mais ou menos socialmente aceitáveis. Se o comportamento agressivo não é compensador o individuo pode fugir”. A fuga é uma resposta relativamente fácil e é imediatamente compensadora. Deixando de ser envolvido em situações sociais, o individuo está melhor protegido contra o fracasso social. O devaneio freqüentemente acompanha a fuga. Aqui o individuo se ocupa de satisfações imaginárias de seus motivos. As escolas freqüentemente encorajam o devaneio restringindo a atividade e a comunicação das crianças. Crianças excepcionalmente precoces ou excepcionalmente atrasadas ficam muitas vezes desinteressadas da escola e recorrem a satisfações imaginárias.

A regressão é uma resposta à frustração caracterizada pelo comportamento inapropriado ao nível de maturidade do individuo. A regressão na classe não é absolutamente incomum. A racionalização não é alguém dar desculpas socialmente aceitáveis para o seu comportamento, é uma técnica de ajustamento freqüentemente usada. Culpar a causa incidentalmente, atitude de uvas-verdes e limão doce, são três variedades de racionalização. A racionalização tende a iludir o individuo acerca dos motivos verdadeiros de seu comportamento.

A repressão, ou esquecimento seletivo de experiências desagradáveis, serve ao objetivo de proteger o indivíduo contra a lembrança de experiências geradoras de ansiedade. É outra resposta aprendida para experiências que despertam medo e ansiedade. A repressão é básica na formação de alguns dos mais sérios padrões de comportamento anormal.

Quando alguém aumenta seus sentimentos de valor pessoal, pela sua identificação com pessoas ou instituições de destaque, está usando o mecanismo de identificação. A identificação com a escola e seus objetivos é uma forma de identificação culturalmente desejável. Um meio de incrementar tal identificação é através da satisfação dos motivos individuais pela escola e seu programa.

A projeção tem lugar quando alguém percebe em outros, motivos ou traços que são característicos de si próprio. A projeção da culpa ou responsabilidade pela falha do aproveitamento na escola é um modo de evitar a ansiedade pelo fracasso pessoal e perda de prestígio.

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A compensação é a ênfase exagerada num certo tipo de comportamento. Quando a satisfação de um motivo numa certa direção é frustrada, o indivíduo pode substitui-lo por aquisições em outras áreas.

A compreensão pode atuar em proveito do estudo acadêmico e ao mesmo tempo em detrimento do desenvolvimento de uma personalidade saudável. Tanto as deficiências reais como as imaginárias dão origem à compensação. Quando as tensões psicológicas se convertem em sintomas fisiológicos estes são chamados reações de conversão. Reações de conversão são reações aprendidas e a escola deve evitar recompensar tais respostas, tanto quanto possível.

Os professores podem aprender a reconhecer os sintomas de sentimentos de incapacidade que freqüentemente levam ao uso exagerado de certos mecanismos de comportamento.

Sentimentos de incapacidade são caracterizados por: sensibilidade à critica, idéias de referência, isolamento, resposta exagerada à lisonja, reação inadequada à competição e tendência a depreciar os outros. A escola, através da satisfação das necessidades básicas do indivíduo e estando alerta ao desenvolvimento dos sintomas de desajustamento pode ser muito útil na assistência aos alunos, para que formem hábitos de ajustamento que resultarão em personalidades bem integradas.

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O ADOLESCENTE E A LIBERDADE

ARMINDA ABERASTURY

Entrar no mundo dos adultos - desejado e temido - significa para o adolescente a

perda definitiva de sua condição de criança. É o momento crucial na vida do homem e constitui a etapa decisiva de um processo de desprendimento que começou com o nascimento.

As mudanças psicológicas que se produzem neste período, e que são a correlação de mudanças corporais, levam a uma nova relação com os pais e com o mundo. Isto só é possível quando se elabora, lenta e dolorosamente, o luto pelo corpo de criança, pela identidade infantil e pela relação com os pais da infância.

Quando o adolescente se inclui no mundo com este corpo já maduro, a imagem que tem do seu corpo mudou também sua identidade, e precisa então adquirir uma ideologia

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que lhe permita sua adaptação ao mundo e/ou sua ação sobre ele para mudá-lo. Neste período flutua entre uma dependência e uma independência extremas, e só a

maturidade lhe permitirá, mais tarde, aceitar ser independente dentro de um limite de necessária dependência. Mas, no começo, mover-se-á entre o impulso ao desprendimento e a defesa que impõe o temor à perda do conhecido. E um período de contradições, confuso, ambivalente, doloroso, caracterizado por fricções com o meio familiar e social. Este quadro é freqüentemente confundido com crises e estados patológicos.

Tanto as modificações corporais incontroláveis como os imperativos do mundo externo, que exigem do adolescente novas pautas de convivência, são vividos no começo como uma invasão. Isto o leva a reter, como defesa, muitas de suas conquistas infantis, ainda que também coexista o prazer e a ânsia de alcançar um novo status. Também o conduz a um refúgio em seu mundo interno para poder relacionar-se com seu passado e, a partir dai, enfrentar o futuro. Estas mudanças, nas quais perde a sua identidade de criança, implicam a busca de uma nova identidade, que vai se construindo num plano consciente e inconsciente. O adolescente não quer ser como determinados adultos, mas em troca, escolhe outros como ideais; vai se modificando lentamente e nenhuma precipitação interna ou externa favorece este trabalho.

A perda que o adolescente deve aceitar ao fazer o luto pelo corpo é dupla: a de seu corpo de criança, quando caracteres sexuais secundários colocam-se ante a evidência de seu novo status e o aparecimento de menstruação na menina e do sêmen no menino, que lhes impõem o testemunho da determinação sexual e do papel que terão que assumir, não só na união com o parceiro, mas também na procriação.

Só quando o adolescente é capaz de aceitar, simultaneamente, seus aspectos de criança e de adulto pode começar a aceitar em forma de flutuante as mudanças do seu corpo e começa a surgir a sua nova identidade. Esse longo processo de busca de identidade ocupa grande parte da sua energia e é a conseqüência da perda de identidade infantil que se produz quando começam as mudanças corporais.

O adolescente se apresenta como vários personagens e, ás vezes, frente aos próprios pais, porém com mais freqüência frente a diferentes pessoas do mundo externo, que nos poderiam dar dele versões totalmente contraditórias sobre sua maturidade, sua bondade, sua capacidade, sua afetividade, seu comportamento e, inclusive, num mesmo dia, sobre seu aspecto físico.

As flutuações de identidade se experimentam também nas mudanças bruscas, nas notáveis variações produzidas em poucas horas pelo uso de diferentes vestimentas, mais chamativas na menina adolescente, mas igualmente notáveis no menino, especialmente no mundo atual.

Não só o adolescente padece este longo processo, mas também os pais tem dificuldades para aceitar o crescimento como conseqüência do sentimento de rejeição que experimentam frente à genitalidade e à livre manifestação da personalidade que surge dela. Este incompreensão e rejeição se encontram, muitas vezes, mascaradas debaixo da concessão de uma excessiva liberdade que o adolescente vive como abandono, e que o é na realidade.

Diante desta atitude, o adolescente sente a ameaça iminente de perder a dependência infantil - se assume precocemente seu papel genital e a independência total - em momentos em que essa dependência é ainda necessária. Quando o comportamento dos pais implica um incompreensão das flutuações extremadamente polares entre dependência e independência, refúgio na fantasia-ânsia de crescimento, conquistas adultos-refúgio em conquistas infantis, dificulta-se o trabalho de luto, no qual são necessários permanentes ensaios e provas de perda e recuperação de ambas as idades: a infantil e a adulta.

Só quando a sua maturidade biológica esta acompanhada por uma maturidade

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afetiva e intelectual, que lhe possibilite a entrada no mundo do adulto, estará munido de um sistema de valores, de uma ideologia que confronta com a de seu meio e onde a rejeição a determinadas situações cumpre-se numa critica construtiva. Confronta suas teorias políticas e sociais e se posiciona, defendendo um ideal. Sua idéia de reforma do mundo se traduz em ação. Tem uma resposta às dificuldades e desordens da vida. Adquire teorias estéticas e éticas confronta e soluciona suas idéias sobre a existência ou inexistência de Deus e a sua posição não é acompanhada pela exigência de um submeter-se, nem pela necessidade de submeter.

Mas antes de chegar a esta etapa, encontrar-nos-emos com uma multiplicidade de identificações contemporâneas e contraditórias; por isso o adolescente se apresenta como vários personagens: é uma combinação instável de vários corpos e identidades. Não pode, ainda, renunciar a aspectos de si mesmo e não pode utilizar e sintetizar os que vai adquirindo, e nessa dificuldade de adquirir uma identidade coerente reside o principal obstáculo para resolver sua identidade sexual.

No primeiro momento, essa identidade de adulto é um sentir-se dolorosamente separado do meio familiar, e as mudanças em seu corpo obrigam-no também ao desprendimento de seu corpo infantil. Só alguns conseguem a descoberta de encontrar o lugar de si mesmo no seu corpo e no mundo, ser habitantes de seu corpo no seu mundo atual, real, e também adquirir a capacidade de utilizar seu corpo e seu lugar no mundo.

Este processo da vida, cujo destino é o desprendimento definitivo da infância, tem sobre os pais uma influencia não muito valorizada até hoje. O adolescente provoca uma verdadeira revolução no seu meio familiar e social e isto cria um problema de gerações nem sempre bem resolvido.

Ocorre que também os pais vivem os lutos pelos filhos, precisam fazer o luto pelo corpo do filho pequeno, pela sua identidade de criança e pela sua relação de dependência infantil. Agora são julgados por seus filhos, e a rebeldia e o enfrentamento são mais dolorosos se o adulto não tem conscientes os seus problemas frente ao adolescente. O problema da adolescência tem uma dupla vertente, que, nos casos felizes, pode resolver-se numa fusão de necessidades e soluções. Também os país têm que se desprender do filho criança e evoluir para uma relação com o filho adulto o que impõe muitas renuncias de sua parte.

Ao perder para sempre o corpo do seu filho criança, vê-se enfrentando com a aceitação do provir, do envelhecimento e da morte. Deve abandonar a imagem idealizada de si mesmo, que seu filho criou e na qual ele se acomodou. Agora já não poderá funcionar como líder ou ídolo e deverá, em troca, aceitar uma relação cheia de ambivalências e de críticas. Ao mesmo tempo, a capacidade e as conquistas crescentes do filho obrigam-no a enfrentar-se com suas próprias capacidades e a avaliar suas conquistas e fracassos. Neste balanço, nesta prestação de contas, o filho é a testemunha mais implacável do realizado e do frustado. Só quando pode identificar-se com a força criativa do filho, poderá compreendê-lo e recuperar dentro de si a sua própria adolescência. E neste momento do desenvolvimento onde o modo pelo qual se conceda a liberdade é definitivo para a conquista da independência e da maturidade do filho.

Até hoje, o estudo da adolescência centralizou-se somente no adolescente. Este enfoque será incompleto quando não se levar em conta o outro lado do problema: a ambivalência e a resistência dos pais em aceitar o processo de crescimento.

Que motivos tem a sociedade para não modificar as suas rígidas estruturas, para empenhar-se em mantê-las tal qual, mesmo quando o indivíduo muda ? Que conflitos conscientes e inconscientes levam os pais a ignorar ou a não compreender a evolução do filho ? O problema mostra assim o outro lado, escondido até hoje debaixo do disfarce da adolescência difícil: é o de uma sociedade difícil, incompreensiva, hostil e inexorável, às vezes, frente à onda de crescimento, lúcida e ativa, que lhe impõe a evidencia de alguém que quer atuar sobre o mundo e modificá-lo sob a ação de suas próprias transformações.

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O desprezo que o adolescente mostra frente ao adulto é, em parte, uma defesa para eludir a depressão que lhe impõe o desprendimento de suas partes infantis, mas é também um juízo de valor que deve ser respeitado. Além disso, a desidealização das figuras parentais o afunda no mais profundo desamparo.

Entretanto, esta dor é pouco percebida pelos pais, que costumam fechar-se numa atitude de ressentimento e reforço da autoridade, atitude que torna ainda mais difícil este processo.

Na adolescência, uma vontade biológica vai impondo uma mudança e a criança e seus pais devem aceitar a prova de realidade de que o corpo infantil está se perdendo para sempre. Nem a criança nem seus pais poderão recuperar esse corpo, mesmo que pretendam negá-lo psicologicamente ou mediante atuações, nas quais a vida familiar e a sociedade pretendam comportar-se como se nada tivesse mudado.

A problemática do adolescente começa com as mudanças corporais, com a definição do seu papel na procriação e segue-se com mudanças psicológicas. Tem que renunciar a sua condição de criança; deve renunciar também ser tratado como criança, já que a partir desse momento se é chamado dessa maneira será como um modo depreciativo, zombador ou de desvalorização.

Além disso, devemos aceitar que a perda do vinculo do pai com o filho infantil, da identidade do adulto frente à identidade da criança defrontam-no com uma luta similar às lutas criadas pelas diferenças de classe; como nelas, os fatores econômicos têm um papel importante; os pais costumam usar a dependência econômica como poder sobre o filho, o que cria um abismo e um ressentimento social entre as duas gerações.

O adulto se agarra a seu mundo de valores que, com triste freqüência, é o produto de um fracasso interno e de um refugio em conquistas típicas de nossa sociedade alienada. O adolescente defende os seus valores e despreza os que o

adulto quer lhe impor; ainda mais, sente-os como uma armadilha da qual precisa escapar.

O sofrimento, a contradição, a confusão, os transtornos são deste modo inevitáveis, podem ser transitórios, podem ser elaboráveis, mas devemos perguntar-nos se grande parte da sua dor não poderia ser suavizada mudando estruturas familiares e sociais.

Geralmente, é o adulto que tem escrito sobre adolescência e enfatizado o problema do filho e fala muito pouco da dificuldade do pai e do adulto em geral para aceitar o crescimento, estabelecendo uma nova relação com ele, de adulto para adulto.

O adolescente sente que deve planejar a sua vida, controlar as mudanças; precisa adaptar o mundo externo às suas necessidades imperiosas, o que explica seus desejos e necessidades de reformas sociais.

A dor que lhe causa abandonar o seu mundo e a consciência de que vão se produzindo mais modificações incontroláveis dentro de si, levam-no a realizar reformas exteriores que lhe garantam a satisfação de suas necessidades na nova situação em que se encontra agora frente ao mundo, que, ao mesmo tempo, servem-lhe de defesa contra as mudanças incontroláveis internas e do seu corpo. Neste momento se produz um aumento da intelectualização para superar a incapacidade de ação (que é correspondente ao período de onipotência da pensamento na criança pequena). O adolescente procura a solução teórica de todos os problemas transcendentes e daqueles com os quais se enfrentará a curto prazo: o amor, a liberdade, o matrimônio, a paternidade, a educação, a filosofia, a religião. Mas aqui também podemos e devemos traçar-nos a interrogação: é assim só por uma necessidade do adolescente ou também é resultante de um mundo que lhe proíbe a ação e obriga-o a refugiar-se na fantasia e na intelectualização?

A inserção no mundo social do adulto - com suas modificações internas e seu plano de reformas - é o que vai definindo sua personalidade e sua ideologia.

Seu novo plano de vida exige-lhe traçar-se o problema dos valores éticos, intelectuais e afetivos; implica o nascimento de novos ideais e a aquisição da capacidade

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de luta para consegui-los. Mas, ao mesmo tempo, lhe impõe um desprendimento: abandonar a solução do

como se do jogo e da aprendizagem, para enfrentar o sim e o não da realidade ativa que tem nas mãos.

Isto lhe impõe um afastamento do presente e, com isso, a fantasia de projetar-se no futuro e ser, independizando-se do ser com e como os pais.

Portanto, deve formar-se um sistema de teorias, de idéias, um programa ao qual se agarra e também a necessidade de algo em que possa descarregar a soma de ansiedades os conflitos que surgem de sua ambivalência entre o impulso ao desprendimento e a tendência a continuar ligado.

Soluciona esta crise intensa transitoriamente, fugindo do mundo exterior, procurando refúgio na fantasia, no mundo interno, com um aumento paralelo da onipotência narcisista e da sensação de prescindir do externo. Deste modo cria para si uma nova plataforma de lançamento desde a qual poderá iniciar conexões com novos objetos do mundo externo e preparar a ação.

Sua hostilidade frente aos pais e ao mundo em geral se manifesta na sua desconfiança, na idéia de não ser compreendido, na sua rejeição da realidade, situações que podem ser ratificadas ou não pela própria realidade.

Todo este processo exige um lento desenvolvimento no qual são negados e afirmados seus princípios, lutando entre a sua necessidade de independência e a sua nostalgia de reafirmação e dependência.

Sofre crises de susceptibilidade e de ciúmes, exige e precisa vigilância e dependência, mas sem transição surge nele uma rejeição ao contato com os pais e a necessidade de independência e de fugir deles.

A qualidade do processo de amadurecimento e crescimento dos primeiros anos, a estabilidade nos afetos, a soma de gratificações e frustrações e a adaptação gradativa às exigências ambientais vão marcar a intensidade e a gravidade destes conflitos. Por exemplo: obter uma satisfação suficiente (adequada no tempo) às necessidades fundamentais da sexualidade infantil, incluindo nesta satisfação tanto a ação como o esclarecimento oportuno dos problemas, determinará no adolescente uma atitude mais livre frente ao sexo, do mesmo modo que relações cordiais mantidas com a mãe determinarão no menino uma facilidade maior no seu relacionamento com a mulher; o mesmo acontecerá no que se refere à menina com o pai. Entretanto, a realidade oferece poucas vezes à criança e ao adolescente estas satisfações adequadas.

Com todo este conflito interno que descrevemos, o adolescente se enfrenta na realidade com o mundo do adulto, que ao sentir-se atacado, julgado, incomodado e ameaçado por esta onda de crescimento costuma reagir com total incompreensão, com rejeição e com reforço de sua autoridade.

Nesta circunstância, a atitude do mundo externo será outra vez decisiva para facilitar ou obstaculizar o crescimento.

Neste momento, vivemos no mundo inteiro o problema de uma juventude inconformada, que se enfrenta com a violência, e o resultado é só a destruição e o entorpecimento do processo.

A violência dos estudantes não é mais do que a resposta à violência institucionalizada das forças da ordem familiar e social.

Os estudantes se revoltam contra todo o nosso modo de vida, rejeitando as vantagens tanto como seus males, em busca de uma sociedade que ponha a agressão a serviço dos ideais de vida e eduque as novas gerações visando à vida e não à morte.

A sociedade em que vivemos, com seu quadro de violência e destruição, não oferece garantias suficientes de sobrevivência e cria uma nova dificuldade para o desprendimento. O adolescente, cujo destino é a busca de ideais e de figuras ideais para identificar-se, depara-se com a violência e o poder e também os usa.

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Tal posição ideológica no adolescente é confusa e não pode ser de outra maneira, porque ele está procurando uma identidade e uma ideologia, mas não as tem. Sabe o que não quer muito mais do que o que quer ser e fazer de si mesmo; por isso os movimentos estudantis carecem, às vezes, de bases ideológicas sólidas. Freqüentemente, o adolescente se submete a um líder que o guia e, no fundo, substitui as figuras paternas das quais está procurando separar-se, ou não tem mais remédio, a não ser procurar uma ideologia própria que lhe permita agir de uma maneira coerente no mundo em que vive. Mas sendo assim, e não tendo tempo para alcança-la, se sente oprimido e responde com violência.

Erikson tem afirmado que a sociedade oferece à criança uma moratória social. Da minha parte, considero que esta moratória social não é mais do que o conteúdo manifesto de uma situação muito mais profunda. Acontece que a própria criança precisa de tempo para fazer as pazes com seu corpo, para terminar de conformar-se a ele, para sentir-se conforme com ele. Mas só chega a esta conformidade mediante um

longo processo de luto, através do qual não só renuncia a seu corpo de criança, mas abandona a fantasia do onipotente de bissexualidade, base de sua atividade masturbatória. Então sim pode aceitar que para conceber um filho precisa a união com o outro sexo, e conseqüentemente o homem deve renunciar às fantasias de procriação dentro do seu próprio corpo e a mulher à onipotência maternal. Numa palavra, a única maneira de aceitar o corpo do outro é aceitar o próprio corpo.

Mas isso - aparentemente simples - se consegue com dificuldade e no transcurso da vida e se traduz em confusões, transtornos e sofrimentos para assumir a paternidade ou a maternidade. Todo este processo leva-o a abandonar a sua identidade infantil, e tratar de adquirir uma identidade adulta que, quando consegue, personifica-se numa ideologia com a qual se enfrentará com o mundo circundante.

A dificuldade do adulto para aceitar o amadurecimento intelectual e sexual da criança é a base dessa pseudo moratória social. E destacável, também, que só tenham evidenciado até agora os aspectos ingratos do crescimento, deixando de lado a felicidade e a criatividade plenas que caracterizam também o adolescente. O artista adolescente é uma figura que a história da cultura oferece seguidamente, e tanto em artistas como em homens de ciência encontram-se vestígios de que toda a sua obra de maturidade não é mais do que a concretização de intuições e preocupações surgidas nessa idade.

O específico do conflito neste período é algo totalmente inédito no ser: sua definição na procriação e a eclosão de uma grande capacidade criativa. Procuram conquistas e encontram satisfação nelas. Se estas conquistas são desvalorizadas pelos pais e pela sociedade, surgem no adolescente sofrimento e rejeição. Mas o diálogo do adulto com o jovem não pode iniciar-se neste período, pois deve ser algo que venha acontecendo desde o nascimento; se não é assim, o adolescente não se aproxima dos adultos.

Um exemplo evidente desta incompreensão: ao adolescente se exige que defina a sua vocação e, ao mesmo tempo, lhe reprimem as primeiras tentativas desta vocação. Essas têm o mesmo significo das primeiras tentativas na vida genital, que, geralmente, não são valorizadas.

Diremos que na situação grupai familiar encontrar-nos-emos com o que Marcuse assinala para o social: “Se são violentos é porque estão desesperados.

À maior pressão familiar, à maior incompreensão frente à mudança, o adolescente reage com mais violência por desespero e, desgraçadamente, é neste momento decisivo da crise adolescente que os pais recorrem geralmente a dois meios de coação: o dinheiro e a liberdade.

São três as exigências básicas da liberdade que apresenta o adolescente de ambos os sexos a seus pais: a liberdade nas saídas e horários, a liberdade de defender uma ideologia e a liberdade de viver um amor e um trabalho.

Entre estas três exigências os pais parecem ocupar-se especialmente da primeira: a

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liberdade nas saídas e horários, porém mais profundamente este controle sobre as saídas e horários significa o controle sobre as outras liberdades: a ideologia, o amor e o trabalho. Quando os pais respondem ante a demanda de liberdade, restringindo as saídas ou utilizando a dependência econômica, cortando a mesada, é que houve algo mal conduzido na educação anterior e os pais se declaram vencidos. O adolescente precoce, a criança em torno dos dez anos, sente uma grande necessidade de ser respeitada na sua busca desesperada de identidade, de ideologia, de vocação e de objetos de amor. Se esse diálogo não se estabeleceu, é muito difícil que no momento da adolescência haja uma compreensão entre os pais e os filhos. Os adolescentes de hoje são muito mais sérios, estão mais informados. Valorizam mais o amor e o sexo e, para eles, este permite realmente um ato de amor e não uma mera descarga ou um passatempo ou uma afirmação de potência.

Do mesmo modo, a liberdade para eles é muito mais que o fato de receber de seus pais a chave de casa ou, inclusive, um apartamento para viverem sós. Sabem que há outra liberdade que envolve a cada um deles e a toda uma comunidade de jovens.

Muitos pais da geração de 30 sentem-se modernos quando dão aos filhos a oportunidade de aventuras ou quando, frente à filha, defendem uma ideologia que consideram quase que revolucionária; entretanto, a posição deles frente ao amor não é a mesma da geração atual. Existe na passada uma tendência, que foi muito estudada por Freud, em considerar um amor desvalorizado e um amor idealizado. A geração atual é muito mais sã e tende a integrar num só objeto estes dois aspectos.

O amor, além disso, é só um aspecto da problemática da adolescência: há muitos outros problemas que são profundamente importantes para eles. Quase todos já sabem que a liberdade sexual não é promiscuidade, porém sentem e expressam a necessidade de fazer experiências que nem sempre são totais, mas que precisam viver. Para que possam fazê-las, têm que encontrar certa aprovação nos seus pais, para não sentirem culpa. Porém, esta aprovação não deve ter como preço a exigência de que informem sobre seus atos. Precisam viver suas experiências para eles. Exigir informação é tão patológico como proibir e é muito diferente de escutar. Falamos já da importância da palavra, da necessidade do adolescente de falar de suas conquistas. E frequente que os pais se queixem de que já não é possível falar entre eles, de que os filhos adolescentes “tomam a palavra‟ e dominam a situação. Esses pais não se deram conta de que escutar é o caminho para entender o que está acontecendo com seus filhos. O adolescente de hoje, como o de todos os tempos, está farto de conselhos, precisa fazer suas experiências e comunicá-las, mas não quer, não gosta nem aceita que suas experiências sejam criticadas, qualificadas, classificadas nem confrontadas com as dos pais. O adolescente percebe muito bem que quando os pais começam a controlar o tempo e os horários estão controlando algo mais: seu mundo interno, seu crescimento e seu desprendimento. O jovem sadio de hoje está ciente de muitas das problemáticas do adulto; dir-se-ia que é mais possível que o adulto aprenda do adolescente e não que o adulto possa dar-lhe sua experiência.

Os pais precisariam saber que na adolescência precoce moças e rapazes passam por um período de profunda dependência, onde precisam deles tanto ou mais do que quando eram bebês, que essa necessidade de dependência pode ser seguida imediatamente de uma necessidade de independência, que a posição útil nos pais é a de espectadores ativos, não passivos, e ao aceder à dependência ou à independência não se baseiam em seus estados de ânimo, mas nas necessidades do filho. Para isto será necessário que eles mesmos possam ir vivendo o desprendimento do filho, concedendo-lhe a liberdade e a manutenção da dependência madura.

Para fazer estas tentativas é preciso dar liberdade, e para isso existem dois caminhos: dar uma liberdade sem limites, que é o mesmo que abandonar um filho; ou dar uma liberdade com limites, que impõe cuidados, cautela, observação, contato afetivo

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permanente, diálogo, para ir seguindo passo a passo a evolução das necessidade das modificações no filho.

O muno moderno reserva aos jovens um lugar de novas dimensões quando se leva em consideração tanto a força numérica da juventude como o papel que são capazes de desempenhar nas transformações que exige o processo de desenvolvimento econômico, ideológico e social. Um dado aparecido na revista da UNESCO encerra dentro da sua verdade matemática um prognóstico que espantará mais de um adulto. Falando da juventude, assinala que o aumento da população do mundo representa a irrupção em cena de uma enorme promoção de jovens. Calcula-se que no ano 2000, o número de habitantes entre quinze e vinte e quatro anos terá aumentado de 519 milhões a um bilhão e 128 milhões.

Pergunto-me agora se as tensões e comoções que hoje resultam da irrupção do jovem na sociedade em que vivemos e sua vontade de intervir nela de uma maneira cada vez mais ativa não surgem tanto da percepção da força que vai adquirindo como do medo do adulto.

O normal é que participem dentro das inquietações que são a própria essência da atmosfera social em que vivem, e se pedem a emancipação não o fazem na procura de chegar rapidamente ao estado de adultos - muito longe disto - senão porque precisam adquirir direitos e liberdades semelhantes aos que os adultos têm, sem deixar por isso sua condição de jovens.

Toda a adolescência têm, além da característica individual, as características do meio cultural, social e histórico desde o qual se manifesta, e o mundo em que vivemos nos exige mais do que nunca a busca do exercido da liberdade sem recorrer à violência para restringi-la.

A prevenção de uma adolescência difícil deve ser procurada com a ajuda de trabalhadores de todos os campos do estudo do homem que investiguem para a nossa sociedade atual as necessidades e os limites úteis que permitam a um adolescente desenvolver-se até um nível adulto. Isto exige um clima de espera e compreensão, para que o processo não se demore nem se acelere. Ë um momento crucial na vida do homem e precisa de uma liberdade adequada, com a segurança de normais que lhe possam ir ajudando a adaptar-se às suas necessidades ou a modificá-las, sem entrar em conflitos graves consigo mesmo, com seu ambiente e com a sociedade.

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