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 92 Cadernos Cedes, ano XXI, nº 55, novembro/2001 DESAFIO À ESCOLA PÚBLICA: TOMAR EM SUAS MÃOS SEU PRÓPRIO DESTINO  V ERA  LÚCIA  S  ABONGI DE R OSSI* RESUMO :  Este texto tem por objetivo refletir sobre algumas das novas estratégias reguladoras – de demandas externas de trabalho de grupo e de participação de pais, alunos e professores no sistema educativo – que vêm sendo apressadamente generalizadas enquanto argumentos demo- cráticos, contribuindo para a despolitização das práticas de gestão esc olar nas escolas públicas. Estratégias do neoliberalismo de reestruturação da capacidade de decisão dos agentes do sistema educativo, facilitadoras da retirada do protagonismo do Estado das P olíticas Sociais que garantem os serviços essenciais de educação. Palavras-chave : Trabalho de grupo participativo; Práticas de (co)gestão  Político-Pedagógica. O som dessas palavras ainda pode ser ouvido... Mudar a cara da escola pública implica também ouvir meninos e meninas, sociedades de bairro, pais, mães. Diretoras, delega dos de ensino, professoras, supervisoras, comunidade científica, zeladores, merendeiras (...). É claro que não é fácil! Há obstáculos de toda ordem retardando a ação transformadora. O amontoado de papéis tomando o nosso tempo, os mecanismos administrativos emperrando a marcha dos projetos, os prazos para isto, para aquilo, um deus- nos-acuda (. ..). (Paulo Freire, 1991, p. 35 e 75) Nas últimas décadas, outros grupos de interesses, aproveitaram- se desse argumento democrático de longa duração entre grupos progres- sistas, transformando-o em um dos pilares mais conservadores da  racionalidade técnica e instrumental. Afim de orientar-se e dividir respon- sabilidades políticas, reclamam um novo tratamento as relações entre poderes atribuídos aos que participam da educação no tempo flexível ditado pelo mercado. Quais os outros grupos interessados em fazer com * Professora Doutora do Departamento de Administração e Supervisão Escolar (Dase)da Faculdade de Educação da Unicamp. E-mail : [email protected]

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  • 92 Cadernos Cedes, ano XXI, n 55, novembro/2001

    DESAFIO ESCOLA PBLICA:TOMAR EM SUAS MOS SEU PRPRIO DESTINO

    VERA LCIA SABONGI DE ROSSI*

    RESUMO: Este texto tem por objetivo refletir sobre algumas das novasestratgias reguladoras de demandas externas de trabalho de grupo ede participao de pais, alunos e professores no sistema educativo quevm sendo apressadamente generalizadas enquanto argumentos demo-crticos, contribuindo para a despolitizao das prticas de gesto escolarnas escolas pblicas. Estratgias do neoliberalismo de reestruturao dacapacidade de deciso dos agentes do sistema educativo, facilitadorasda retirada do protagonismo do Estado das Polticas Sociais que garantemos servios essenciais de educao.

    Palavras-chave: Trabalho de grupo participativo; Prticas de (co)gesto Poltico-Pedaggica.

    O som dessas palavras ainda pode ser ouvido...

    Mudar a cara da escola pblica implica tambm ouvir meninos e meninas,sociedades de bairro, pais, mes. Diretoras, delegados de ensino, professoras,supervisoras, comunidade cientfica, zeladores, merendeiras (...). claro queno fcil! H obstculos de toda ordem retardando a ao transformadora. Oamontoado de papis tomando o nosso tempo, os mecanismos administrativosemperrando a marcha dos projetos, os prazos para isto, para aquilo, um deus-nos-acuda (...). (Paulo Freire, 1991, p. 35 e 75)

    Nas ltimas dcadas, outros grupos de interesses, aproveitaram-se desse argumento democrtico de longa durao entre grupos progres-sistas, transformando-o em um dos pilares mais conservadores daracionalidade tcnica e instrumental. Afim de orientar-se e dividir respon-sabilidades polticas, reclamam um novo tratamento as relaes entrepoderes atribudos aos que participam da educao no tempo flexvelditado pelo mercado. Quais os outros grupos interessados em fazer com

    * Professora Doutora do Departamento de Administrao e Superviso Escolar (Dase)da Faculdadede Educao da Unicamp. E-mail: [email protected]

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    que na democracia escolar os agentes sociais tomem em suas prprias mosseu prprio destino?

    Para atuao direta no micro-sistema, preciso reordenar os papis dos agentessociais que esto em jogo convocao de pais e comunidades para participarnos assuntos escolares , para tanto, ser dado apoio a participao na gesto dasescolas atravs da nfase crescente no marco regulador da educao, essa formafacilita a inovao (...), os consumidores (pais e alunos) elegem os provedores(escolas e instituies) tomando um papel mais ativo e exigente (...). (BancoMundial, 1986, 1996, apud Sacristn, 1999, p. 290)

    Para tanto, foi preciso construir condies polticas legais e insti-tucionais de participao:

    Os sistemas de ensino definiro as normas da gesto democrtica do ensinopblico na educao bsica, de acordo com suas peculiaridades e conforme osseguintes princpios: 1. participao dos profissionais da educao na elaboraodo projeto pedaggico da escola; 2. participao das comunidades escolar elocal em conselhos escolares ou equivalente. (...) os sistemas de ensino asseguraros unidades escolares progressivos graus de autonomia pedaggica eadministrativa e de gesto financeira (...). (artigos 14 e 15, da Nova Lei deDiretrizes e Bases da Educao Nacional LDB n 9394, 1996)

    Esta forte tendncia vem sendo tambm espalhada nas escolas,por duas vias complementares: pelas imagens televisivas e pela literaturaeducacional. No momento em que o Estado aparenta ser tambm uminstrumento da solidariedade organizada, pede aos cidados paraassumirem voluntariamente as organizaes de auto-ajuda. Observe-se aconvocao televisiva de participao das comunidades feita pela redeGlobo, para que se integrem ao grupo dos Amigos da Escola, comoum exemplo atual oportuno. Pela literatura educacional (livros, jornais esubsdios oficiais), percebe-se a tendncia de encarar a categoria da gestocoletiva junto das comunidades como se o interesse coletivo, naturali-zado, j fosse um bem comum, constitudo com valores neutros e consen-suais. Como se cada aluno, cada professor pudesse agir coletiva e esponta-neamente, como se j fosse, de partida, motivado para obteno dointeresse comum.

    A teoria que da decorre esbarra no processo social, o conhecimento considerado constitucional e individual. No entanto, as crticas quedo nfase ao carter social do conhecimento estipulam que as pessoaspodem, atravs da cooperao, aumentar seu entendimento sobre asconseqncias sociais de seus atos, ainda que nunca venha a saber plena-mente suas conseqncias. bem provvel que, reforando a maneira

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    socialmente constituda do conhecimento e das prticas de gesto dotrabalho coletivo (cooperativo e/ou colegiado), tal como apontam freirea-nos, por exemplo, proporcione-se a base para questionar os valores e me-canismos despolitizadores que regulam a ordem social (McLaren, 2000).

    Este texto1 tem por objetivo refletir sobre algumas das estratgiasreguladoras de demandas externas de trabalho de grupo e de parti-cipao (dos pais, alunos, professores) no sistema educativo que vmsendo apressadamente generalizadas enquanto argumentos democrticosentre os agentes da educao, contribuindo para a despolitizao dasprticas de gesto escolar nas escolas pblicas. Estratgias do neoliberalismode reestruturao da capacidade de deciso dos agentes do sistema edu-cativo, facilitadoras da retirada do protagonismo do Estado das PolticasSociais que garantem os servios essenciais de educao.

    Embora a maioria dos estudiosos da gesto escolar no veja identida-de absoluta entre a Escola e a Empresa (Paro, 1998), embora os educa-dores sempre tenham lutado pelos processos de democratizao e departicipao nas decises polticas, tais problemas tornam-se, hoje, maiscomplexos. Deixam de ser apresentados como relevantes, poltica esocialmente, passando a ser definidos como obstculos a uma gestomoderna, racional, mais eficaz e eficiente. Essa despolitizao das prticasde gesto (e/ou de administrao) da organizao escolar vem ocorrendocom maior ou menor intensidade em quase todos os pases e sistemasescolares: ora (re)centralizando certos poderes de deciso, ora descen-tralizando outros compatveis com estratgias de desregulao e de priva-tizao do setor pblico da educao (Lima, 2000, p. 17).

    H uma tenso de longa durao entre a educao poltica e apoltica educativa, entre educadores e Estado. A natureza da prtica dagesto contraditria e ambivalente ora mais desafiadora, ora maislegitimadora de grupos de interesses, ora, as duas coisas. preciso escla-recer que as prticas de gesto poltico-pedaggica no se esgotam nombito da instituio escolar, nem se reduzem ao dos gestores nosprocessos administrativos e pedaggicos. Mas entendo que devem terem conta uma organizao do trabalho escolar colegiada, envolvendo (sepossvel) todos os personagens que atuam na escola, pois uma prticaque d respostas a alguns problemas existentes uma construo maiscoletiva (ns-eu) na qual devem comprometer-se diferentes aes maisindividuais.2 Este seu carter educativo pode gerar um movimentodialtico entre interesses externos, reguladores das suas funes, e internos,prprios da vida escolar, remetendo os educadores a outros mbitos maisamplos de pensamento e de ao poltica (Sacristn, 1992, 1999).

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    Tais prticas contribuem tambm para organizar algo que hojetem encontrado pouco espao: as bases do procedimento poltico e aessncia da poltica, entendida como a organizao da esfera pblica naqual as pessoas ampliam sua comunicao, articulam suas opinies e seunem para alcanar objetivos coletivos e interesses comuns (Hobsbawm,2000). No seria isso, em outras palavras, tudo o que entendemos porpoltica nas sociedades democrticas?

    A participao e o dilogo democrticos no esto prefigurados,mas representam um exerccio democrtico de participao decisria que lento, processual e conflituoso, por lidar simultaneamente com o conflitode interesses (de classes, partidos, grupos) e de valores culturais taiscomo crenas, regras (in)visveis da regulao, pontos de vista diferentes,(res)sentimentos (raivas, hostilidades, solidariedade). Boa parte da profis-so de professor (com alunos) e de gestor (com todos os agentes que par-ticipam do trabalho escolar) consiste em mediar e entender o sentidocultural dos conflitos no processo decisrio, manter o princpio da dife-rena, sem deter, em ltima instncia, o poder de deciso. Defensoresda democracia sempre tiveram por objetivo ameniz-los (seno re-equilibr-los) com a tolerncia, com cooperao para poder reconheceras pessoas e seus direitos. J os ideolgos liberais, desde o sculo XVIII,para confirmar os efeitos reguladores/desmobilizadores da democracia,permanecem ocultando o conflito, utilizando estratgias participativas,com novas prescries impostas pelo novo tempo do mercado. Importantedestacar alguns efeitos reguladores mais atuais.

    preciso manter os ouvidos afinados com os trs diferentes frag-mentos iniciais que contm argumentos democrticos, descentralizadores,demandas de (auto)gesto colegiada das comunidades locais e de paisno sistema educativo, aparentemente semelhantes. Ser que os apelos doBanco Mundial e da nova LDB esto indicando novas vias de emancipaoe de legitimao da escola pblica, tal como fez Paulo Freire?

    Por comportar, em princpio, a ampliao do processo decisrio, adescentralizao do sistema educativo, que se apresenta como bandeirade democratizao (pelo BM e pela LDB), aproxima-se, primeira vista,da reivindicao histrica de setores progressistas (tal como o de PauloFreire), na defesa de relaes menos desiguais e injustas entre grupos esetores sociais de diferentes regies do pas, em sua articulao com apoltica central. No entanto, descentralizao implica necessariamentealteraes efetivas no funcionamento das vrias esferas do poder pblico,envolvendo transferncia do poder decisrio, de atribuies e de recursoentre elas. Mas, geralmente, tais iniciativas, quando concedidas pelo

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    Estado, terminam desagastadas pelos princpios privatistas de autofinan-ciamento do investimento social, de excluso da participao social epoltica da populao nos processos decisrios (Hfling, 2000). O merca-do, apresentado como antdoto contra os excessos da regulao estatal,aproveita os insucessos do capitalismo e do socialismo real para se transfor-mar numa nova ideologia, que os ventos da globalizao ajudam espalharrapidamente (Afonso, 2000, p. 129).

    Embora a Constituio Federal brasileira tenha incorporado, pelaprimeira vez, em seu texto A gesto democrtica do ensino pblico, naforma da lei (art. 206, inciso VI) devido s exigncias dos educadoresno processo constituinte de 1987, a nova LDB, que no foge da inspiraoneoliberal, est envolta no pacto conciliatrio com os agentes sociais.Todas as iniciativas de poltica educacional, apesar de sua aparente autono-mia, tm um ponto em comum: o empenho em reduzir custos, encar-gos e investimentos pblicos, buscando seno transferi-los e/ou dividi-los, com a iniciativa privada e organizaes no governamentais. Emlugar do dever do Estado (como est inscrito em nossa Constituio), asoluo das questes educacionais foi deixada ao encargo boa vontadeda populao, ao invs da responsabilidade pblica (Saviani, 1997, p.200).

    Estratgias ministeriais sem fronteiras. Face aos insucessos dosistema educativo, o Ministrio da Educao de Portugal tem tambmencorajado a autonomia e a participao em equipes para consolidar umacomunidade educativa abrangente para dentro do sistema. Por meio deparcerias, papis e percias diferentes, criam a iluso de que sero respei-tados na difcil tarefa de articulao de saberes diferentes. Trata-se deresponsabilizar os que foram tradicionalmente excludos, perante a escolae a educao em geral, para que no possam mandar bocas sobre umsistema que em nada lhes diz respeito. Assim, em sua funo de regulao,o Estado saber com quem pode contar. Trata-se tambm de dar umadimenso nacional a uma tentativa que aparentemente parece recuperarcentenas de anos de oportunidades perdidas (Magalhes & Stoer, 1998).

    A entrada das famlias na atividade escolar uma das medidaspreconizadas pelas Reformas Educativas dos anos 90, que se denomi-naram reestruturadoras e estiveram apoiadas na eqidade, qualidade,diversidade e eficincia. Sua caracterstica essencial consiste em alterar asregras bsicas do sistema educativo e escolar. Reestruturar, nesse contexto,significa recolocar a capacidade de deciso sobre as prticas de gesto emuma nova distribuio da legitimidade de interveno para prover dedireo o sistema escolar. O discurso democrtico presente nas estratgias

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    do Banco Mundial para conduzir polticas educacionais envolve no s adescentralizao das instituies escolares, mas primordialmente o autofi-nanciamento das escolas, ou seja, a privatizao gradual do ensino mdioe superior (Sacristn, 1999, p. 255). Todos os elementos necessrios esta reestruturao poltica e econmica fundem-se e confundem-se comas crenas religiosas presentes na organizao do tempo de trabalho nasinstituies escolares.

    Enquanto instituio externa fbrica, a escola foi vital para inculcara dolorosa noo de economia de tempo e formar hbitos de trabalhopara obter a submisso passiva que o trabalho industrial exige do operrio.Desde o sculo XVII, principalmente na Inglaterra, os evanglicos deparceria com os metodistas, atrelados pregao religiosa, tambmtomaram conta do tema. Wesley publicou, em 1786, seu sermo Odever e as vantagens de levantar cedo, arrebatando todo momento fugazdas mos de Sat, do pecado e da preguia: Ficando de molho (...)tanto tempo entre os lenis quentes, a carne como que escaldada,torna-se macia e flcida. Os nervos, nesse meio tempo ficam bem debi-litados.

    Hannah More, em Acordar Cedo, contribuiu com versos imortais:

    Assassino calado, oh preguia,Pare de aprisionar minha mente;E que eu no perca outra horaContigo, oh sono perverso

    Para transportar a imagem do lembra-te que tempo dinheiro(de Benjamin Franklin) para o mercado de trabalho, para internalizar adisciplina que preparou para o estudo sobre tempo e movimento deTaylor, quando a Revoluo industrial avana, a retrica moral da ocio-sidade encontrada em todos os sermes e brochuras destinadas ao consu-mo da classe trabalhadora assume um tom mais forte. Exalta no tanto amorte, mas a brevidade da vida mortal e as recompensas palpveis peloconsumo produtivo do tempo com novas atitudes profticas, capazes deamenizar o dia do terrvel ajuste de contas no Juzo Final. No poracaso que essa proviso de orientaes ideolgicas tivesse sido bem aco-lhida na Fundao Ford (Thompson, 1998, p. 296-298).

    Apesar da contestao intensa dos trabalhadores, a mudana dosenso do tempo sempre afetou a disciplina de trabalho e a vida emocional.Desde os fins do sculo XIX, administrao do tempo nas classes escolaresfoi utilizado como soluo preventiva mais barata que os crceres, tantopara conter resistncias coletivas, quanto para reconhecer a liderana do

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    mundo empresarial. Suas vias de acesso foram: subdiviso e supervisodo trabalho, multas, relgios, incentivos em dinheiro, pregaes religi-osas, esportes e escolas. Nestas no faltaram cronmetros, relgios, sinos,campainhas, assinaturas em livros de ponto, cadernetas de classe (sempreconferidas pelos supervisores de ensino), sem falar da sonoridade doscantos e do movimento das bandeirolas das crianas nas festas cvicas.

    Hoje, com os computadores, as formas de programao flexvel dotrabalho e do tempo podem alterar o controle cara a cara pela submissoeletrnica (e-mails, celulares), considerada mais aberta reinvenodecisiva da gesto e do trabalho pedaggico, que por sinal nunca dispen-sou as tarefas de casa para professores e alunos. Assim, as tarefas podemser controladas de forma mais eficiente no espao ntimo das pessoas,podem ser alteradas com mais rapidez, evitando a lentido burocrticade consulta aos chefes do topo da pirmide.3

    Por mais enfadonhas e infrutferas que sejam as mudanas acele-radas, a vivncia do tempo sem passado, como instantneo, constitutivoda lgica poltica e industrial futurolgica, desintegradora do lao social,limitadora do longo prazo necessrio ao amadurecimento da confianainformal, do compromisso mtuo, da solidariedade. Apesar do mal-estargerado pela auto-proteo fictcia de demanda externa do uso do nsgrupal, que pode fortalecer o terrvel anseio de (sub)grupos defensivos(do outro, do estrangeiro, de minorias), os educadores precisam acreditarter mais tempo e liberdade de moldar suas vidas com menos riscos e me-nos ansiedades!

    A demanda externa desta moderna tica do trabalho de grupo,que aparentemente aumenta o entendimento das pessoas sobre as conse-qncias sociais dos seus atos, concentra-se na experincia superficial,pois no sistema fragmentado que est a possibilidade de intervir. Umexemplo atual do modelo de grupo auto-organizado est no perfil daformao profissional do trabalhador para as empresas alems. Seusobjetivos? Reagir com maior flexibilidade, rapidez e competncia s dife-rentes demandas dos clientes, e maior rentabilidade do processo de pro-duo. O porta-voz da equipe responsvel, principalmente, pela coope-rao das diferentes reas e conciliao dos conflitos surgidos no grupo.A necessidade de alta flexibilizao da disposio de cada um, decooperao e de comunicao dos trabalhadores, dentro do processo detrabalho, representaram o maior obstculo encontrado pelos operrios(e, sem dvida, pelos professores). Por isso, a empresa comeou pelotreinamento das capacidades em grupos participativos, para que defi-nissem o local de trabalho como local de aprendizagem (Market, 1998).

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    Certamente, os mtodos de formao profissional de empresas inovadoras(no de escolas) tornaram-se modelos para as reformas pedaggicas, gestesescolares, revises de currculo, tpicas das ilhas de aprendizagem.

    Para unir a educao aos requisitos dessa nova ordem do trabalho,para encurtar o caminho que leva do aprendizado ao mercado, as aulasesto sendo projetadas nas escolas atuais como aprendizagem coope-rativa, desenvolvida por comunidades de estudantes para criar ciber-cidados em uma teledemocracia de imagens rpidas, representaes eformas de vida. Para aumentar a eficcia do mtodo de ensino do pro-fessor, h, na atualidade, exemplos extremos da permanncia do princpiode imitar, servir e reconhecer a liderana empresarial, que superaram ainveno do alfabeto de economia, de 1915: B de Banco, D de Dlar, Jde Juro... Os temas atuais Jogo das Bolsas e Crianas aprendem como capitalismo fazem parte do dia-a-dia de muitas grades curriculares ecursos nas escolas primrias, no s norte-americanas. Seguindo o modelodas Firmas Escolares inglesas e holandesas, a Fundao Alem para aCriana e a Juventude lanou na cidade de Berlim, em 1997, uma campa-nha intitulada Esprito empresarial Um Ensino. Aos alunos cabia fundarautnticas microempresas e aprender a pensar em funo dos lucros.Afinal, nas escolas pblicas estatais ensina-se chamada gerao @,desde a infncia, como devem prover seu sustento, como salvao,destino e oportunidade. Introjetados os critrios empresariais, desenvolve-se um tipo de pobreza intelectual e emocional com a mscara do sucessoestampada no rosto, com o objetivo de tornar a criana e o futuro adultoinfantilizado empreendedores prprios, transformando as relaes sociaisem relaes de oferta e de demanda, tal como um contato entre clientes(McLaren, 2000; Kurz, 2001). Exacerbando a individualizao dascompetncias, alunos e professores devem responsabilizar-se, pessoal-mente, pelo processo formativo e pelo desemprego.

    H ainda mais alguns traos de comportamento desejveis. Emboraainda perdure nas escolas o comportamento rgido acionado pelosdispositivos dramatrgicos, que tinham valor legitimador na estruturaburocrtica talento dramtico, culto da aparncia e dos gestos rspidosdo diretor severo, do professor exigente, do supervisor rgido (Tragtenberg,1978) , hoje, parte dos educadores tendem a trabalhar juntos numaoutra imagem. Com salrios cada vez mais baixos, passam a ser apreciadoscomo criaturas flexveis, ou seja, aquelas que agentam ano aps ano,trabalham duro, sempre mantendo sua capacidade de mudar, de adaptar-se em fluxo s circunstncias. No ato de sua comunicao desejvel odomnio da superficialidade dos questionamentos que vo se esgotando

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    em si mesmos no jogo aparente da conversa aberta e flexvel. Alm debons ouvintes cooperativos, devem ser capazes de despreendimento dopassado, da pesquisa, correndo riscos (No limite?), deslocando-se paravrias escolas devido aos contratos de trabalho flexveis (de curto prazo,extinguindo a carreira docente). Tudo sem queixas, sem traies, semmau-humor. Alimentam-se da fico de que j no competem entre si,de que no existe mais antagonismo, confiam na fragmentao dos grupose, acima de tudo, que o gestor administra o poder horizontalmente emgrupo , como um lder que est ao seu lado. Tal como devem ser enten-didos os seus governantes?

    Importante recordar, s mais uma vez, a aparente semelhana entretrs apelos citados no incio do texto, que envolvem tambm a prtica deauto-gesto democrtica. A lgica da auto-gesto, enquanto utopia doseducadores progressistas, tal como Freire, outra. Sua matriz ideolgicaadvm da tendncia libertria do socialismo e implica uma modificao,mais ou menos ampla, de toda ordem econmica e poltica, como condiode sua realizao. Ela tem seu momento de sntese ao nvel das comu-nidades locais, onde a autoridade socializada. Todas as decises sotomadas pela coletividade que concernida pelo objeto dessas decises,nos limites exclusivos que lhes traar sua coexistncia com outras orga-nizaes coletivas e com suas representaes (Bobbio et al., 1986, p. 76-77). As demandas participativas do Banco Mundial e da nova LDB estomais atreladas concepo tecnocrata, que define autonomia como auto-gesto na produo e como modelo de gesto descentralizada para vencera crise da centralizao burocrtica, com o planejamento democrticoda participao dos executantes (Chau, 1989). Trata-se da prtica deco-gesto com controle remoto, com autonomia administrativa/peda-ggica outorgadas e controladas, com descentralizao de decises circuns-critas ao nvel tcnico-operacional. Trata-se de uma alternativa modernade despolitizar o sistema, inserindo a participao de professores, pais,alunos e comunidades locais no processo que se diz neutro. No entanto, uma prtica decorrente da nova estrutura de poder comandada pelosmaiores grupos econmicos, operando em bases supranacionais para rein-ventar instituies, privatiz-las e ampliar o consu-mo em escala mundial.

    A represso direta praticada pelos regimes ditatoriais brasileiros(de 1937/45 e de 1964/85) foi substituda por essa nova estrutura depoder, que alm de reduzir custos, reduz os atritos sociais. Quando, em70/80, as lutas sociais tornaram-se mais autnomas e mais numerosas(inclusive a dos professores das redes pblicas), quando o eixo de decisoficou concentrado nas assemblias e comits de greves, houve um duplo

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    alerta aos capitalistas: que os conflitos poderiam inaugurar uma novaordem social, quando conduzidos pelos prprios trabalhadores auto-organizados, e que existem na fora de trabalho mais componentes aserem explorados: sua inteligncia e capacidade de auto-organizao paratrabalhar cooperativa e coletivamente (Bruno, 1999). Por que no assi-milar tal aprendizado para diluir conflitos e oposies?

    Desde o sculo XIX, vem-se dando a destruio metdica dasestruturas coletivas de trabalho, tal como medida preventiva/reguladorados movimentos das coletividades para a defesa de trabalhadores (sindica-tos, associaes, cooperativas), capazes de levantar obstculos mobili-dade do capital. Nas ltimas dcadas, com a individualizao das profis-ses e dos salrios (com o contrato de trabalho flexvel), o programa polticode ao do neoliberalismo, paradoxalmente, estimula grupos partici-pativos escola-comunidade e, efetivamente, nega direitos aos grupos so-ciais que vm construindo, a duras penas, a democracia participativacombinada com representao poltica plena. Seus efeitos mais perversosesto presentes na reduo do convvio e afrouxamento dos laos de soli-dariedade entre professores (trabalhadores); na produo de inseguran-a de desemprego (mal estar social); exrcito de reserva permanente; etraz de volta a tarefa confusa da conciliao capital-trabalho, combinadacom a retrica democrtica distante da realidade histrica.4

    Contudo, as prticas sociais tendem a aparecer como independentes,cada qual buscando seus princpios e sua legitimidade. Assim, a sociedadesepara-se da poltica, esta separa-se do jurdico que, por seu turno, separa-se do saber que, finalmente, separa-se em conhecimentos independentes.A nova formao social aparece como fragmentao de seu espao e deseu tempo, sustentada por um processo real de generalizao e deunificao, qual seja, o mercado ou o movimento posto pelo capital(Chau, 1989, p. 274). As Reformas Educativas contemporneas produ-zem regras de razo. No entanto, apelos ilusrios e emocionais mantmsuas antigas ofertas poltico-religiosas, contando histrias de salvao daalma5 e procurando garantir a eficcia ao processo de despolitizao eevitar que a gesto (micro)poltico e pedaggica da escola possa cobrarrelevncia sobre a macropoltica.

    Contudo, o Estado pode ir se retirando do protagonismo dasPolticas Sociais, do sistema pblico de ensino, para ser rbitro de umjogo onde parece no tomar partido: garante a competncia dos atores,reduzindo as distncias entre consumidores (pais, alunos e comunidadeslocais) e produtores de servios da educao (escolas e professores). Essaretirada no produz liberdade, mas desigualdade e descontrole em um

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    mercado desregulado a educao, onde seus referentes de poder passama ter um exerccio mais oculto e as mudanas escondem-se atrs de umamaior democratizao. Trata-se de uma mudana na poltica educativae, de certa forma, do desaparecimento da poltica como projeto detransformao global. O modelo clssico das polticas educativas pensadaspara um todo, em linha vertical descendente, e desenvolvidas por umaparato escolar regido por regras idnticas, no mais coerente com omodelo flexvel assinalado. Torna-se necessrio um modelo menos linear,mais descentrado e flexvel, capaz de adaptar-se a particularidades, ondeos agentes sociais (no os burocratas) reordenem seus papis e tomem emsuas mos seu prprio destino. Certamente, no com a inteno de repartircotas de representao poltica nos rgos formais para dar contedo democracia escolar (Sacristn, 1999).

    Assegurar poder de deciso sobre o destino tem tambm um forteefeito retrico popular-religioso que faz uma mistura competente deconcepes de representao teolgico-poltica medieval e liberal, muitopresentes no imaginrio cristo ocidental atual: todos sabemos que, emdecorrncia do pecado original, homem algum tem direito ao poder,quanto mais sobre seu destino (seu futuro), pois a queda separou o homemde Deus, o tornou perverso e despojado de direitos. Todo poder vem doalto (afirmaram So Paulo e So Pedro), no de baixo, e, se algum homemtiver poder, o ter porque nele foi investido por Deus por uma graa eum favor.6 No entanto, quando este poder de deciso, recentemente, foitransferido aos agentes sociais das escolas pblicas, certamente no significaque a questo da construo democrtica participativa foi esgotada. Massignifica que foi produzido mais um forte efeito moderador/regulador(j utilizado em outro tempos e espaos), calcado em novas e eficientesatitudes profticas e recompensas palpveis: atribuir direitos e poderes atento proibidos, capazes de juntar o presente ao futuro (to temidoquanto desejado) com o objetivo de amenizar (qui substituir) neces-sidades e direitos sociais negados. Significa que foram mais uma vez for-talecidas e entrelaadas as preciosas minas polticas, religiosas e econ-micas, responsveis pelo transporte de crenas e pelas novas configuraesdas prticas originrias de todo poder.

    um deus-nos-acuda! alertou-nos Paulo Freire. No entanto, devidoao carter educativo da gesto poltico-pedaggica, h um campo abertode interveno aos educadores que consigo espiar, apenas por algumasfrestas:

    1. Abrir espaos e tempos para seus movimentos de (re)inter-pretao de experincias, fortalecendo as instituies educacionais

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    com a produo e com a crtica do conhecimento, sendo decisivofazer uso do seu poder de reapreenso de conceitos prprios degrupos de autoridades (cujas prticas se pretendem invisveis),que lutam pela universalizao de uma determinada viso de mundoditada pelo tempo do mercado.

    2. O mercado depende, cada vez mais, da produo de potencia-lidades subjetivas, ou seja, do bom desempenho relacional da mer-cadoria-servio (do professor) nas equipes (palavra preferida paraestimular jogos e acirrar a competio), para que sejam capazes dese comunicar e decidir em meio s rpidas mudanas. Tais poten-cialidades podem gerar um movimento dialtico entre interessesexternos e internos, construindo as bases do procedimento polticoe pedaggico (j apontados anteriormente), oportuno, paraprofessores avaliarem o peso da desmobilizao subjetiva causadopela participao operacional, consolidando a participao decis-ria. Em oposio ao tempo do curto prazo das instituies moder-nas, que se concretiza na demanda externa do trabalho de grupos/equipes (que muda de pessoas e de tarefas no caminho), possvelreatualizar o passado, a memria-histria, impedindo que partesinteiras das tradies e dos saberes docentes acumulados nas escolascaiam no esquecimento, perdendo aspectos essenciais de seu apren-dizado poltico pedaggico advindos de sua tradio profissionalcoletiva docente.

    3. Torna-se vital aos mediadores de conflitos professores e gestores articularem interesses comuns e aceitarem o conflito de valoresnas escolas, no como patolgico, nem como antidemocrtico,mas como pressuposto e como fundamento de nossa cultura. Seupoder pode ser construdo, no como servidores dos pais no Estadodas famlias, reduzindo a democracia a ajustes para obteno doconsenso, mas por uma racionalidade que algumas vezes serilustradora para os que no sabem, s vezes ser de colaborao,outras ser de crtica e outras tantas de oposio (Sacristn, 1999).A sociabilidade, a solidariedade so sentimentos que (re)constremlaos sociais, potencializam o alvio das tenses nos grupos parti-cipativos e favorecem o entendimento recproco das diferenasindividuais. Seno, como fazer frente apatia e destrutividadeemocional reinantes?4. Outras dicotomias tradicionais perdem seu carter explicativo,nomeadamente as que se assentam na oposio entre o campo do

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    Estado e o campo do mercado, quando no conseguem proporuma articulao original que d conta do carter hbrido dessasnovas relaes que, atualmente, so estruturadas por esses ele-mentos. No entanto, ainda h um longo e complexo caminho apercorrer para que maiores exigncias beneficiem todos os profes-sores e alunos de forma articulada com a politizao e demo-cratizao do espao escolar pblico, que s faz sentido como partee dever do Estado (primordialmente) e da comunidade. Esta escolatem que ser credvel, o que passa tambm pela sua capacidade derealizar e consolidar projetos com qualidade democrtica ecientfico-pedaggica (Afonso, 2000).5. Apesar das experincias ditatoriais prolongadas; do jogo polticopermanente dos reformadores e legisladores do ensino (ora usur-pando, ora assimilando, ora extinguindo interesses educacionaisde projetos conflitantes); apesar do fundamentalismo conservadorpresente nas mudanas de direo e de controle da educao (dandoautonomia financeira aos agentes para que possam dispor derecursos correntes e captar outros), no h um sistema que notenha regras polticas e morais conflitantes, que no tenha bandasfrgeis. Na realidade social fugidia das escolas pblicas, pulsa umaprendizado perceptvel, audvel (nem sempre registrado), de(re)interpretao e de (re)criao de propostas curriculares, de pro-jetos pedaggicos, de planejamentos e oramentos participativosarticulados em processo pelas prticas de gesto descentralizadorase democrticas.

    H inmeros educadores capazes de germinar idias com astciaem meio da regulao invisvel e silenciosa dos poderes. Suas conquistastm sido mais efetivas quando: articuladas s comunidades cientficas,s representaes partidrias, movimentos sindicais e sociais mais amplos,e quando prolongam conquistas eleitorais de partidos de esquerda; e,acima de tudo, quando as Polticas Pblicas, com ao competente dospoderes, se opem hegemonia neoliberal, dirigem suas aes pblicas maioria da populao, demonstrando que traduzem as Polticas Sociais.Alguns exemplos de gestes progressistas desenvolvidos por SecretariasMunicipais de Educao: Projeto Inaj I e II cidade de Santa Terezi-nha no Mato Grosso; Escola Cidad, cidade de Porto Alegre no RioGrande do Sul; Cidade de Diadema, Regio do Grande ABC/So Paulo(Camargo, 1997; Azevedo, 1999; Arelaro, 1999).

    Portanto, a prtica de gesto poltico-pedaggica, devido ao seucarter educativo e socialmente mobilizador, pode abrir espaos para

  • ARTIGOS

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    reestruturar o poder de deciso junto das comunidades educacionaisenvolvidas (nos Conselhos de Escola, nas Associaes de Pais e Mestres,nas Comunidades de bairro), potencializando e refinando procedimentosdecisrios democrticos constituintes das prticas sociais capazes deinfluenciar na definio de polticas de interesses pblicos e de realizaohumana.

    Notas

    1. Parte dessa argumentao fruto da fuso de dois textos apresentados em dois Congressos:Gesto do Currculo no tempo flexvel, publicado nas Actas Caminhos da flexibilizao e flexibilizao:Polticas Curriculares, Universidade do Minho, Porto Editora, 2000; e Prticas docentes coletivasenvoltas nas novas artimanhas do poder, VI CLAB, Porto, Portugal, Setembro de 2000.

    2. Elias, em A sociedade dos indivduos, explica este trao bsico da estrutura de personalidade socialdas pessoas da era moderna: no existe identidade-eu sem identidade-ns, tudo o que varia aponderao dos termos na balana eu-ns, o padro da relao eu-ns. Obviamente a experinciasubjacente idia do eu desprovido de ns o conflito entre a necessidade humana natural deafirmao afetiva da pessoa por parte dos outros e dos outros por parte dela, e de outro lado, o medode satisfao dessa necessidade e uma resistncia ela. Nos estgios mais primitivos, a balana ns-eu se inclinava para o ns e, mais recentemente, tem pendido intensamente para o eu (1994, p. 152/165).

    3. A palavra desburocratizao enganadora. O sistema de poder das modernas formas deflexibilidade consiste em trs elementos: reinveno contnua de instituies; especializao flexvelde produo e concentrao de poder sem centralizao. Modernas organizaes que praticamconcentrao sem centralizao (opostas ao fordismo) tm estrutura mais complexa sem a clareza deuma pirmide. A operao de comando permanece forte e fica em aberto apenas o como fazer(Sennett, R. A corroso do carter, 1999, p. 54).

    4. O texto de Evaldo Vieira (Brasil: do golpe de 1964 redemocratizao) possibilita compreenderque as conciliaes, ou as transaes, como se queira, tm composto a base do continusmo e dainrcia de cada momento da vida poltica e social do Brasil, encobertos pela voragem das reformasnecessrias das modernizaes obrigatrias, que custa de enorme sacrifcio da maioria da populaomudam substancialmente muito pouco ou quase nada, conforme se pode verificar no perodocompreendido entre 1964 e a redemocratizao brasileira de 1987 (2000, p. 215).

    5. A maior parte da literatura educativa aceita as histrias inerentes de salvao sem question-lascomo prticas de governo que produzem sistemas de excluso, ao abrir espaos sociais. Ver Popkewitz,Reforma, conhecimento pedaggico e administrao da individualidade: A educao escolar como efeitode poder, 2000.

    6. A representao, para liberais como Burke, resume-se na capacidade de uma elite captar sentimentospopulares como indcios de interesses objetivos determinveis, com atendimento dos encarregadosda administrao, a partir da obteno do consenso dos representantes nos parlamentos. A teoria darepresentao foi oferecida como paliativo e remdio contra o perigo dos conflitos e discrdias quetm por objetivo impedir a democracia poltica. Ver Chau, Representao ou participao, 1989, p.289/294.

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    A CHALLENGE TO PUBLIC SCHOOL: TAKE ITS OWN FATE IN HAND

    ABSTRACT: This text aims at reflecting upon some of the new regulatingstrategies of external demands for group work and participation in theeducational system from parents, students and teachers , hurriedly gene-ralized as democratic arguments, that contribute to despoliticalize the schooladministration practices in public schools. The neoliberal strategies of restruc-turing the decision capacity of the educational system agents help the Statelose its protagonist role in the Social Policies supposed to guarantee theessential services of education.Key words: Participative Group Work; Political-Pedagogical (co)Admi- nistration Practices.

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