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25 A EDUCAÇÃO AMBIENTAL NA FORMAÇÃO DO PROFESSOR: A PRÁTICA DA PESQUISA COMO EIXO NORTEADOR Este trabalho tem como objetivo evidenciar a importância da pesquisa no processo de formação e atuação do professor. A investigação em torno do tema procede ante a demanda para a melhoria da qualificação e formação de professores nas últimas décadas. Observa-se que a globalização do conhecimento coloca para a humanidade de modo acelerado, o desafio de acompanhar com competência os avanços da tecnolgia e das novas descobertas científicas. Por outro lado, observa-se também que, enquanto uma determinada pesquisa ou descoberta não chegou ainda aos resultados e conclusões, outras já estão em andamento ou superando os resultados. Situação que tem demandado uma visão da complexidade dos conhecimentos. Partimos do pressuposto que a interpretação da história tem um papel fundamental para a busca das origens dos problemas ambientais que a sociedade vivencia atualmente. Desse entendimento retomamos alguns momentos da história de vida, associando o processo de formação com a atuação profissional em diferentes níveis de atuação. Intentamos a compreensão de como o professor busca a inserção das questões ambientais em suas práticas de sala de aula, a percepção e a sinalização das possibilidades dessa inserção em seu planejamento. Sinalizamos que a metodologia da pesquisa qualitativa dá suporte para reflexões e análises em torno da teoria e da prática; possibilita a associação de dados recolhidos de vivências e memórias significativas da trajetória do professor contextualizando os problemas ambientais no cotidiano escolar. Nas conclusões enfatizamos a importância da pesquisa e dos diagnósticos das questões ambientais, com vistas a transversalização destes na organização curricular, especialmente nos programas de formação de professores. Ressaltamos o papel da pesquisa como contribuição para a melhoria da qualificação e desempenho destes profissionais frente às exigências para a produção de novos conhecimentos incorporando a visão da complexidade ambiental. Palavras-chave: Formação de professores, ambiente, memórias, pesquisa. Nos últimos anos, ampliou-se o consenso sobre a centralidade que a educação ocupa nas estratégias de desenvolvimento na estrutura da sociedade. As instituições de educação têm enfrentado a cada dia o desafio de atender às demandas dos diferentes contextos que se entrelaçam caracterizando a globalização vigente. Registra-se, alto percentual da população marginalizada do processo de acumulação das riquezas, representando a degradação mais visível do planeta terra, gerada pelo “desenvolvimento” com divergências nas características culturais de cada comunidade. XVI ENDIPE - Encontro Nacional de Didática e Práticas de Ensino - UNICAMP - Campinas - 2012 Junqueira&Marin Editores Livro 3 - p.006694 Maria Sacramento Aquino

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artigo endipe educação ambiental e formação de professores.

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    A EDUCAO AMBIENTAL NA FORMAO DO PROFESSOR: A PRTICA DA

    PESQUISA COMO EIXO NORTEADOR

    Este trabalho tem como objetivo evidenciar a importncia da pesquisa no processo de formao e atuao do professor. A investigao em torno do tema procede ante a demanda para a melhoria da qualificao e formao de professores nas ltimas dcadas. Observa-se que a globalizao do conhecimento coloca para a humanidade de modo acelerado, o desafio de acompanhar com competncia os avanos da tecnolgia e das novas descobertas cientficas. Por outro lado, observa-se tambm que, enquanto uma determinada pesquisa ou descoberta no chegou ainda aos resultados e concluses, outras j esto em andamento ou superando os resultados. Situao que tem demandado uma viso da complexidade dos conhecimentos. Partimos do pressuposto que a interpretao da histria tem um papel fundamental para a busca das origens dos problemas ambientais que a sociedade vivencia atualmente. Desse entendimento retomamos alguns momentos da histria de vida, associando o processo de formao com a atuao profissional em diferentes nveis de atuao. Intentamos a compreenso de como o professor busca a insero das questes ambientais em suas prticas de sala de aula, a percepo e a sinalizao das possibilidades dessa insero em seu planejamento. Sinalizamos que a metodologia da pesquisa qualitativa d suporte para reflexes e anlises em torno da teoria e da prtica; possibilita a associao de dados recolhidos de vivncias e memrias significativas da trajetria do professor contextualizando os problemas ambientais no cotidiano escolar. Nas concluses enfatizamos a importncia da pesquisa e dos diagnsticos das questes ambientais, com vistas a transversalizao destes na organizao curricular, especialmente nos programas de formao de professores. Ressaltamos o papel da pesquisa como contribuio para a melhoria da qualificao e desempenho destes profissionais frente s exigncias para a produo de novos conhecimentos incorporando a viso da complexidade ambiental.

    Palavras-chave: Formao de professores, ambiente, memrias, pesquisa.

    Nos ltimos anos, ampliou-se o consenso sobre a centralidade que a educao ocupa nas

    estratgias de desenvolvimento na estrutura da sociedade. As instituies de educao

    tm enfrentado a cada dia o desafio de atender s demandas dos diferentes contextos

    que se entrelaam caracterizando a globalizao vigente. Registra-se, alto percentual da

    populao marginalizada do processo de acumulao das riquezas, representando a

    degradao mais visvel do planeta terra, gerada pelo desenvolvimento com

    divergncias nas caractersticas culturais de cada comunidade.

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    Na atual sociedade brasileira, dentre as exigncias demandadas escola e ao trabalho

    dos professores esto: a habilidade para a compreenso da necessidade de afeto dos

    alunos, lidar com a questo das drogas, o controle da violncia nos espaos da escola, ao

    lado da tarefa fundamental que possibilitar o desenvolvimento de habilidade e

    competncia para o desafio do mercado de trabalho, cada vez mais seletivo e exigente

    de qualificao em todas as instncias da produo.

    Nesse contexto, ressalta-se a centralidade colocada no papel do professor, na

    caracterizao de um novo perfil de professor, na demanda por profissionais da

    Educao em condies de analisar, compreender e interpretar os contextos histricos,

    sociais, culturais e poltico que fazem parte das relaes ambientais em seu campo de

    atuao. Assim, a perspectiva de aes multidimensionais e integradas para os

    problemas sociais e individuais da humanidade est no centro das concepes, das

    idias, da urgncia de formao pessoal e profissional de qualidade para as relaes

    ambientais no mercado de trabalho. De modo que, os segmentos economia, poltica,

    cultura e educao no so reas isoladas, mas interligadas, transversalizadas e

    integradas como pauta do pensamento crtico e globalizado.

    Neste sentido, durante a realizao da Rio-92, movimentos sociais de todo o mundo

    reunidos no Frum Global das ONGs formularam o Tratado de Educao Ambiental

    para Sociedades Sustentveis e Responsabilidades Globais (BRASIL, 1992), aprovado

    em plenria de 06/06/1992, o qual enfatiza que as aes devem ter como princpio:

    incentivar a produo de conhecimento, polticas, metodologias e prticas de Educao

    Ambiental em todos os espaos de educao formal e no formal, para todas as faixas

    etrias. Tratado de repercusso internacional, diante da sua natureza e significncia.

    Vale ressaltar, que no Brasil, a emergncia da sustentabilidade ambiental confronta a

    estrutura organizacional poltica cultural do pas com a necessidade de acelerar o

    processo de democratizao do acesso escola pblica com oferta de educao de

    qualidade em todos os nveis. A organizao do Projeto Poltico Pedaggico da Escola,

    exigncia das Diretrizes e Bases da Educao, na prtica, no tem se efetivado com

    qualidade a contento. A pesquisa uma estratgia que possibilita diagnosticar os

    entraves cotidianos da organizao e da concepo curricular da escola, questionando,

    por exemplo: as verbas do municpio para a educao; quanto destinado da verba para

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    a formao do professor; dentre outras alocaes previstas para as verbas de cada

    escola.

    Desta forma, a abordagem dos problemas ambientais a partir de diagnsticos possibilita

    novas assimilaes, postura crtica e clareza quanto significncia da organizao

    curricular do projeto poltico-pedaggico da escola. Possibilita a percepo das

    contradies que so evidenciadas entre a teoria e a prtica, dos saberes que so

    desenvolvidos no processo ensino aprendizagem no cotidiano da instituio escolar.

    Testemunhos e vivncias ambientais como estratgia de pesquisa

    A formao de professor nunca foi prioridade nas polticas pblicas brasileiras. A

    Educao formal tem origem e influncia na Educao implantada pelos Jesutas. Para

    Romanelli (1985), do ponto de vista das atividades de produo, o currculo jesutico

    era sem utilidade prtica visvel em uma economia fundada na agricultura rudimentar e

    no trabalho escravo. A histria registra que, s em 1827, foi criada a primeira legislao

    para a alfabetizao das crianas brasileiras.

    De modo que a iniciao da leitura e da escrita era oferecida pela prpria famlia, e em

    alguns casos, reforada nos colgios, geralmente para os filhos dos nobres. Os jesutas

    no se dedicaram educao das camadas populares, caracterizando seu sistema de

    ensino como aristocrtico. A concepo dos jesutas se confirma com o argumento de

    Incio de Loyola: ensinar os ignorantes a ler e escrever seria uma obra de caridade se a

    Companhia de Jesus tivesse suficientes membros para prover a tudo. As evidncias

    apontam que o analfabetismo tem forte herana da escola da colonizao.

    No incio da minha escola primria (dcadas de 1950-1960) as lies de matemtica

    eram temidas, a sabatina, com uso da palmatria (uma pea circular de madeira) ou

    palmadas aplicadas em quem errava o questionamento da professora, era precedida de

    ansiedade, medo e vergonha de errar! Quem errava era alvo de brincadeiras

    depreciativas entre os colegas. A luz da cincia, Piaget (1967) contraria estas prticas,

    com a demonstrao das operaes mentais e concretas no processo ensino-

    aprendizagem estabelecendo bases para uma concepo didtica. A aquisio do

    conhecimento para GMEZ (1998), no nunca uma mera cpia figurativa do real,

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    uma elaborao subjetiva que desemboca na aquisio de representaes organizadas do

    real e na formao de instrumentos formais de conhecimentos (p. 34).

    De modo que, recorremos narrativas, relatos as orais e escritos como testemunhos e

    experincias educacionais vividas, e, que utilizadas como estratgias de pesquisa

    representam objetos de reflexo crtica e resgate de outras perspectivas sobre a funo

    social da escola. A expectativa da provocao se estende a transversalizao de

    contedos scio ambientais na organizao curricular dos cursos de formao de

    professores e da educao bsica atravs do Projeto Poltico-Pedaggico para a Escola.

    Para tanto, contamos com o respaldo das Cincias Sociais que considera a

    contextualizao de experincias de vida, como um recurso de investigao no espao

    histrico-geogrfico, social e poltico, em que transcorrem interaes e aes atravs de

    diferentes meios de comunicao e linguagens. A pesquisa possibilita ao profissional da

    educao tornar-se um pesquisador de suas prprias prticas, exercitando os meios para

    a validao de seus conhecimentos atravs do cotidiano, espao em que as grandes

    certezas so confirmadas ou negadas, e o que complica ainda mais que s vezes a

    mesma certeza num momento confirmada, no momento seguinte, negada

    (GARCIA, 2003a, p. 195).

    Associar a construo scio-histrica ao processo de formao oportuniza um novo

    olhar para a escrita narrativa. Um mergulho na interioridade, do conhecimento de si, ao

    configurar-se como atividade formadora porque remete o sujeito para uma posio de

    aprendente e questiona suas identidades a partir de diferentes modalidades de registro

    que realiza sobre suas aprendizagens experienciais SOUZA (2006, p. 136). De modo

    que, dialogamos com a histria da educao mais ampla, com recortes entre formao e

    desempenho profissional, recorrendo s memrias que desvelada e contextualizada

    produz contribuies para o presente e o futuro.

    Nesse sentido, revisando os arquivos da memria, do inicio da formao (dcada de

    1960) refletimos sobre a situao de descaso e preconceito com relao s mulheres,

    destinadas a permanecer em casa. Na concepo de algumas famlias, a filha no devia

    ir escola corria o risco de aprender a fazer carta para o namorado. No necessitava

    da leitura e da escrita para os afazeres domsticos.

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    Hoje, o problema reside em desafios inconcebveis para a base familiar. Os dados sobre

    a prostituio apresentam casos de crianas com at oito anos de idade; situaes em

    que a prpria famlia encaminha as filhas prostituio como meio de sobrevivncia. O

    Congresso Nacional tem apresentado dados das CPIs que so realizadas com

    investigaes em todo pas, principalmente na regio Nordeste com o maior foco de

    prostituio, em todas as idades.

    A populao clama por Poltica pblica onde a pessoa no seja desconsiderada, o outro

    no seja visto como nada. O outro o outro gnero; representa a cor diferente; pode ser

    outra sexualidade, ou raa diferente; pode ser de outra nacionalidade, o outro apresenta

    um tipo fsico ou um corpo diferente (SILVA, 2000). Cresce assim, a significncia para

    a transversalidade de contedos que tratam das drogas, da prostituio, da fome, do

    desemprego, da degradao ambiental e humana, no cotidiano da escola.

    Logo, urge a formao continuada, como a oportunidade do professor penetrar na

    engrenagem da sociedade com olhar crtico; a possibilidade de adquirir novas idias

    para enfrentar os desafios. Nesse contexto urge uma reflexo em torno do papel do

    professor. Ao longo da Historia cada gerao educa a subseqente a partir do seu

    entendimento do que o ser humano. A pedagogia se constitui dessa dialtica que

    fundamental para a construo da formao, no sentido de que cada gerao implementa

    uma pedagogia contextual.

    Portanto, faz-se necessrio levantarmos reflexes em torno das condies para a

    reconstruo de uma cultura, com tomada de decises de conscincia individual ou

    coletiva. Ou se permanecemos impregnados de uma concepo filosfica que considera

    mais importante os 50 minutos da aula, independente do que acontece l fora [...].

    Espervamos atuao mais coerente de alguns professores que so egressos dos Cursos

    de Licenciatura ou Pedagogia, cursos que foram reformulados, a partir da LDB de 1996,

    no sentido de adequar os contedos curriculares para formao de professores, ante as

    demandas das novas linguagens na sociedade.

    Considerando a situao das implicaes profissionais provocamos uma discusso para

    a percepo das dificuldades que os professores apresentam para a insero da educao

    ambiental ao projeto de trabalho da escola. E, assim registramos posicionamentos de

    gestores da educao na comunidade em que as aes da escola se efetivam:

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    Registro 01:. Elegemos um tema transversal a cada ano. Meio ambiente este ano fica para

    o trabalho do segundo semestre.

    Registro 02: Todo ano a gente faz qualquer coisa sobre meio ambiente. O planejamento

    mais com professores do mesmo turno, no temos condio de reunir todos ao mesmo tempo,

    a maioria trabalha em 02, 03 escolas, durante o ano.

    Registro 03: Este ano estamos contando com a colaborao de uma professora que vai nos

    ajudar no nosso planejamento. Quanto ao trabalho com o meio ambiente, difcil: o carro do

    lixo passa e logo depois a populao coloca todo lixo na rua outra vez, tem de ter uma

    conscientizao.

    Registro 04: difcil planejar sem verba o que recebemos no cobre as despesa mnimas.

    Este o nosso projeto: Lixo: natureza e conscientizao.

    Registro 05: [...] no temos arborizao s promessa da vice-prefeita que tem um projeto que

    vai melhorar as condies do conjunto. As crianas tm convvio com os urubus na rea.

    Analisando os relatos, em um primeiro momento no se percebe a possibilidade de

    contemplao dos temas Transversais sugeridos pelos PCNs para a organizao do

    currculo e a gesto do conhecimento na instituio escolar. Efetivamente a

    transversalidade da questo ambiental requer a considerao da complexidade dos

    contedos, da integrao e interao entre estes, em todo planejamento das atividades

    prticas no cotidiano escolar e no somente em aes isoladas e pontuais como tem

    evidenciado algumas organizaes curriculares.

    Em parte, atribui-se s dificuldades para a insero das questes ambientais na

    organizao curricular, ao fato de a histria do pensamento ocidental ter sido norteada

    pelo paradigma da cincia compartimentada. Separou-se o esprito da matria; a

    filosofia da cincia; separou-se o conhecimento particular que vem da literatura e da

    msica, do conhecimento que vem da pesquisa cientfica. Separaram-se as disciplinas,

    as cincias, as tcnicas. Separou-se o sujeito do conhecimento do objeto do

    conhecimento. (MORIN, 2006, p. 17).

    Por outro lado, se buscarmos significados nas falas dos professores podemos

    desenvolver atividades com diferentes contedos, e transversalizados com o foco nas

    relaes ambientais. Vejamos a situao ambiental do registro n 05 quando diz: as

    crianas aqui tm convvio com os urubus que ficam na rea. Com um olhar reflexivo

    se desenvolve um projeto de pesquisa, envolvendo todos os profissionais da escola.

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    A situao apresenta um problema concreto da comunidade com contedos

    significativos para elaborao de um diagnstico com contedos que podem fazer parte

    do currculo da escola permeado em diferentes disciplinas. Por exemplo: qual o

    significado da presena do urubu na vizinhana da escola? Uma tempestade de

    questionamentos em torno da situao provavelmente justificar uma atividade de

    investigativa. Entretanto, nos resta questionar se os professores tm habilidade e o

    devido embasamento para a elaborao de um projeto de pesquisa.

    No registro n 04: no podemos trabalhar sem verbas. Para esta diretora a falta de

    verbas significa a impossibilidade da atuao da escola junto aos problemas ambientais

    da comunidade. Percebe-se nesta situao um srio problema ambiental, com

    possibilidades de provocao aos alunos, sobre direitos, deveres e exerccio de

    cidadania. Para tanto, formular um projeto de pesquisa sobre o destino dos impostos, o

    papel das polticas pblicas, a manipulao e a gesto dos recursos oriundos dos

    impostos que so destinados educao.

    Nesse entendimento enfatizamos que a prtica da pesquisa um forte instrumento para

    a transversalidade dos contedos no currculo da escola, a partir de uma situao

    concreta da comunidade. Por exemplo: organizar uma pesquisa com os alunos para

    verificar junto aos rgos competentes e responsveis, quanto cada aluno recebe do

    Fundo Nacional para o Desenvolvimento da Educao Bsica - FUNDEB, verba que

    destinada aos municpios por quantidade de aluno matriculado. Como os recursos

    destinados ao municpio so distribudos entre as escolas? Como a escola pode utilizar

    estes recursos? E assim uma srie de outras questes para uma pesquisa significante.

    Entendemos que o chamamento explcito que a LDB faz aos professores para a

    participao na elaborao do projeto pedaggico do estabelecimento do ensino,

    significa participar de um amplo processo de planejamento participativo, em que a

    preocupao maior est centrada no processo e no no produto final. As motivaes

    para esta abordagem so oriundas das dificuldades quanto prtica do planejamento nas

    escolas. Enquanto professora e formadora, tenho vivenciado e observado que a nossa

    situao no tem mudado em termos de pesquisa que favorea a escolha de contedos

    significativos para a organizao do currculo.

    A Gesto da Educao Ambiental como tema transversal no currculo escolar, postula-

    se como concepo interdisciplinar, transdisciplinar, multidisciplinar do conhecimento a

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    partir da apreenso dos contedos vinculados ao cotidiano da coletividade. As questes

    relacionadas ao meio ambiente permeiam necessariamente toda a prtica educativa que

    abarca as relaes entre os alunos, entre alunos professores, entre estes e os demais

    membros da comunidade escolar e da comunidade de um modo geral.

    Nesse sentido, um dos focos dessa abordagem, o projeto Projeto Poltico Pedaggico da

    Escola, tem sido perceber como o professor enfoca a insero das questes ambientais

    em sua prtica, se existe a sinalizao das possibilidades dessa insero em seu

    planejamento de trabalho. Se o professor exerce o papel de detetive do conhecimento,

    como uma estratgia de autonomia da escola. Segundo Wittmann (2000), o fundante

    decisivo desta situao a mudana das regras das relaes que vm se engendrando na

    sociedade e no ato pedaggico. As relaes pedaggicas so da mesma tessitura das

    relaes sociais (p. 88). A recriao de postura passa pela competncia profissional,

    pautada na prxis, na condio de cidado.

    Ressaltamos que a educao ambiental multirreferencial na sua essncia, terica e

    prtica, abrindo possibilidades para a compreenso da heterogeneidade dos contextos

    que no podem ser mutilados com anlises de um ponto de vista, de uma referncia ou

    de uma verdade. De modo que, a complexidade ambiental est associada a todas as

    dimenses humanas e os conceitos esto entrelaados, interligados, articulados,

    permitindo possveis trnsitos de mltiplos saberes, sem se reduzir a nenhum

    (RUSCHEINSKY, 2002, p. 173).

    Nesse entendimento, ns temos clareza do que significa a sustentabilidade ambiental?

    De que a passagem de um modelo de desenvolvimento predatrio a um modelo

    sustentvel em uma estrutura de sociedade, pautada em excluses e desigualdades tem

    muitas implicaes? Que o ambiente no pode conviver com misria, com

    analfabetismo, com desemprego, com intolerncia religiosa, com a fome e todo tipo de

    desigualdade que a sociedade registra.

    Possibilidades de transversalizao da questo ambiental no currculo escolar

    A perspectiva de sustentabilidade das relaes scio-ambientais requer das instituies

    que trabalham com educao, atravs de seu corpo docente, a reviso de conceitos e

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    categorias para a anlise das relaes sociais, da produo e principalmente das relaes

    de poder na sociedade que permeia o cotidiano das atividades escolares. As atividades

    de pesquisa, com foco na questo ambiental encontram forte inspirao em estratgias

    que tm relao com trabalho denominada estudo do cotidiano escolar com

    caractersticas de estudos etnogrficos.

    A etnografia possibilita a compreenso do papel socializador da escola na gesto do

    conhecimento, na transmisso dos contedos acadmicos, seja na veiculao das

    crenas e valores que aparecem nas aes, interaes, nas rotinas e nas relaes sociais

    que caracterizam o cotidiano da experincia escolar (ANDR, 2002, pg. 39).

    Experincia que poder ser transportada para o projeto poltico pedaggico da escola

    atravs do professor. De modo que, a integrao da Educao Ambiental na organizao

    do currculo permeia o Projeto Poltico Pedaggico da Escola em consonncia com o

    cotidiano da prtica de cada professor.

    Aos professores enquanto pesquisadores, conforme Haguette (2000) no que se refere s

    estratgias de pesquisa interessam mesmo so os seguintes parmetros: a) como a

    sociedade tem se estruturado e se transformado, os mecanismos que interagem entre o

    macro e as microestruturas; b) a historicidade da ao humana; c) os fatores que

    constroem a dinmica da histria; d) responder s questes. Os procedimentos

    metodolgicos da pesquisa devero ser norteados por fatos reais da comunidade.

    Fazenda (2002) afirma, a interdisciplinaridade no contexto da internacionalizao do

    conhecimento caracteriza-se por intensa troca entre os homens, uma nova atitude diante

    da questo do conhecimento e da troca de saberes, novas formas de aproximao da

    realidade social e leituras das dimenses socioculturais.

    Sacristn (1998) defende a perspectiva da reflexo e da crtica nas relaes do currculo

    com as questes da sociedade, e os processos intelectuais na aprendizagem. No se

    exerce a reflexo no vazio, mas com foco em objetos significativos. Enquanto LEFF

    (2001) afirma que os pontos cegos e impensveis da razo modernizante, do ambiente:

    excludo, oprimido, degradado, desintegrado, no se preenchem ecologizando a

    economia, mas transformando seus paradigmas de conhecimento para construir uma

    nova realidade social. Sob esta perspectiva, o ambiente transforma as cincias e gera um

    processo de ambientalizao interdisciplinar do saber (p.145).

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    Para Assmann (2000), s se conhece aquilo que tem nexo com o mundo do desejvel.

    Com variaes circunstanciais, a poro maior de nossos mundos desejveis bordada

    por linguagens que borbulham desde o imaginrio (p. 282). Assim, na figura a seguir

    uma sugesto para buscarmos significados em coisas consideradas bobas no cotidiano

    da comunidade local e a sociedade de um modo geral;

    O quadro sugerindo possibilidade de transversalizar contedos horizontalmente e

    verticalmente na prtica pedaggica enfatiza a preocupao com o cotidiano das

    prticas no sentido de valorizao da produo cultural da comunidade, com a

    aproximao do mundo do desejvel do aluno e valorizando suas experincias, seu

    modo de vida. Uma das estratgias, se no a mais coerente, juntamente com os alunos,

    nos transformarmos em detetives do conhecimento na comunidade, de sermos agentes

    de investigao.

    E assim, buscarmos outros significados para as tradicionais tarefas da escola que na

    maioria das vezes o aluno passa horas copiando contedos que, em muitas situaes

    estas atividades no so corrigidas e devolvidas para o aluno confrontar acertos e erros.

    Contedo proveniente de investigao criteriosa, tica, pode ser lido e enriquecido com

    a participao de todos os alunos, com a motivao da turma para a elaborao de

    alternativas para os problemas.

    Neste sentido, o desenvolvimento de uma pesquisa, desde os primeiros contatos, deve

    considerar a hierarquia da instituio. Os instrumentos de abordagem, em algumas

    situaes, j representam parte dos dados para as anlises de uma realidade, de um

    perfil, da caracterizao do ambiente ao qual se destina a investigao.

    Quanto a metodologia da pesquisa nos espaos da educao, no cotidiano da escola, no

    se aprende antecipadamente, cria-se no processo, considerando as surpresas que

    geralmente se apresentam com forte significado nas estratgias para recolhimento de

    dados nas atividades desenvolvidas em toda a comunidade na qual est inserido o nosso

    campo de atuao.

    Concluses e Consideraes

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    Nesta breve abordagem evidenciamos o papel da pesquisa na formao do professor

    com o foco nas questes ambientais com possibilidades de identificao de problemas

    crnicos e complexos do espao de atuao da escola. Evidenciamos que o trabalho de

    investigao e produo de conhecimento em educao no pode ser considerado

    conclusivo, acabado, mas, sempre parciais, passveis de mudanas, de alteraes, em

    andamento, se desdobrando em novos e diferentes fenmenos e temas.

    As evidncias apontam que a maioria dos professores, embora confirmem trabalhar a questo

    ambiental, desconhecem os PCNs. Evidenciam assim, a contradio e o descompasso entre a

    teoria e a prtica do planejamento. Logo, a formao do professor fundamentada em contedos

    contextualizados nas relaes ambientais, na leitura da realidade histrica e cultural favorecer a

    efetivao do projeto poltico e pedaggico de educao em qualquer instncia da Educao

    Nacional, superando asssim, as prticas desconectadas, sem continuidade de propsitos, sem

    filosofia explcita, geralmente de forma oportunista e demaggica.

    A articulao bem intencionada com os princpios da educao de qualidade dar prioridade aos

    programas de formao de professores que exercite a pesquisa em suas atividades cotidianas,

    respeitando as particularidades de cada comunidade sem perder de vista, o por qu, para que,

    como, com quem, para quem se efetiva a alocao das verbas, a obrigatoriedade da educao de

    qualidade para todos conforme prev a Constituio.

    As evidncias sinalizam tambm que, a prtica da pesquisa na formao do professor

    possibilitar a desconstruo da cultura escolar que fomenta a negao das identidades

    culturais brasileiras. O propsito da pesquisa como recurso de formao pressupe uma

    interao construtiva no sentido do crescimento e da valorizao do outro, que nos leva

    a mais reflexes no que toca a interao com os alunos, com a comunidade onde

    atuamos profissionalmente.

    forte a evidncia de que a humanidade demanda a igualdade, a justia, uma sociedade

    aberta e tolerante que respeite as diferentes culturas que se entrelaam e ultrapassam as

    fronteiras. Questes permeiam todo processo educativo. Entretanto, nos questionamos

    se estamos preparados para o dilogo intercultural com tica, com humildade, senso

    crtico, sem o dogmatismo to enraizado em nossos posicionamentos cotidianos.

    Urge uma reviso da postura de meros repassadores de mensagens e informaes para

    uma postura que busque estratgias de desenvolvimento da criatividade de, do senso

    crtico de professores e alunos, simultaneamente. Este contexto clama pela

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    instrumentalizao para o exerccio e o papel de detetives do conhecimento na

    comunidade.

    A provocao destas reflexes tem a expectativa de que a pesquisa represente sempre o

    carro chefe para o diagnstico dos problemas ambientais nas comunidades. Que todos

    estes aspectos juntos, justifiquem a pesquisa como ferramenta indispensvel para o

    ensino-aprendizagem em todos os nveis de ensino, principalmente na base da educao

    formal.

    Esperamos que estas reflexes sobre o papel da pesquisa contribuam para novas

    formulaes curriculares, considerando a complexidade dos contedos na perspectiva

    do equilbrio e da sustentabilidade ambiental para a qualidade de vida. Que resultados

    de pesquisa sejam sempre pautadas pela tica, pela competncia, sem dogmatismos ou

    fanatismos de quaisquer ordens, enfim, pela justia, E ainda considerando que o ser

    humano significa o ser mais importante do nosso ambiente, no planeta Terra.

    Concluindo, a pesquisa no processo de formao e atuao do professor possibilita a

    desconstruo da fundamentao e do embasamento, o qual tem induzido os educadores

    a separarem a teoria da prtica na produo do conhecimento, aquele que pensa

    daquele que faz. A condio tal, que leva reproduo desigual do modo de produo

    capitalista. Ns educadores carecemos de embasamento terico que ative a percepo de

    que o crescimento capitalista sem reflexo crtica fortalece as relaes de poder na

    sociedade facilita a manipulao desordenada dos recursos naturais e materiais.

    REFERNCIAS

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    Figura: Transversalidade Vertical

    Fonte: Acervo da autora

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