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Economistas reivindicam revisão de sua legislação Em tramitação no Congresso Nacional, o Projeto de Lei 658/2007 trata da modificação da Lei nº 1.411, de 13 de agosto de 1951, que pretende “atualizar a regulamentação do exercício da profissão e dá outras providências” ISSN 1677-0668 ARTIGOS ENTREVISTA ANO VIII Nº 35 julho/setembro de 2008 Revista de Conjuntura Publicação do Conselho Regional de Economia do Distrito Federal Para o economista Mauricio de Paula Pinto o objetivo do crescimento sem aceleração da inflação só pode ser alcançado se o governo coordenar melhor os vários instrumentos da política macroeconômica Desenvolvimentismo Keynesiano: o caminho a ser percorrido João Paulo de Almeida Magalhães O Fundo Soberano do Brasil José Fernando Cosentino Tavares Modernizar a legislação que regula a profissão do economista – um desafio para muitos Wellington Leonardo da Silva Mapa da desigualdade espacial da renda no Brasil Júlio Miragaya Marco César Araujo Pereira Carlos Henrique Rosa Patrícia Guedes da Silva Carta de Brasília

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Mapa da desigualdade espacial da renda no Brasil Em tramitação no Congresso Nacional, o Projeto de Lei 658/2007 trata da modificação da Lei nº 1.411, de 13 de agosto de 1951, que pretende “atualizar a regulamentação do exercício da profissão e dá outras providências” Modernizar a legislação que regula a profissão do economista – um desafio para muitos O Fundo Soberano do Brasil Carta de Brasília ISSN 1677-0668 Wellington Leonardo da Silva João Paulo de Almeida Magalhães

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Economistas reivindicam revisão

de sua legislação

Em tramitação no Congresso Nacional, o Projeto de Lei

658/2007 trata da modificação da Lei nº 1.411, de 13 de

agosto de 1951, que pretende “atualizar a regulamentação

do exercício da profissão e dá outras providências”

ISSN

167

7-06

68

ArtigoS

ENTREVISTA

ANO

VIII

• Nº 3

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de 2

008

Revista deConjunturaPublicação do Conselho Regional de Economia do Distrito Federal

Para o economista Mauricio de Paula Pinto o objetivo do crescimento sem

aceleração da inflação só pode ser alcançado se o governo coordenar melhor os vários instrumentos da

política macroeconômica

Desenvolvimentismo Keynesiano: o caminho

a ser percorridoJoão Paulo de Almeida Magalhães

O Fundo Soberano do Brasil José Fernando Cosentino Tavares

Modernizar a legislação que regula a profissão

do economista – um desafio para muitos

Wellington Leonardo da Silva

Mapa da desigualdade espacial da renda no Brasil

Júlio MiragayaMarco César Araujo Pereira

Carlos Henrique RosaPatrícia Guedes da Silva

Carta de Brasília

(61) 3964.8364

Estudos e pesquisas econômicas e sociais

Planejamento e políticas governamentais

Assessoria e consultoria econômica

Entidades associadas: Corecon/DF – Conselho Regional de Economia do Distrito Federal • Sindecon/DF –Sindicato dos Economistas

do Distrito Federal • ACDF – Associação Comercial do Distrito Federal • Dieese/DF – Departamento Intersindical de Estatísticas e

Estudos Sócio-Econômicos • Fecomércio – Federação das Indústrias do Distrito Federal • CUT/DF – Cental Única dos Trabalhadores

do DF • Sebrae/DF – Serviço de Apoio às Pequenas e Médias Empresas do Distrito Federal • IEL/DF – Instituto Euvaldo Lodi •

Fibra – Federação das Indústrias de Brasília • UnB – Universidade de Brasília • UCB – Universidade Católica de Brasília • UniDF

– Centro Universitário do Distrito Federal • Cesubra – Centro de Ensino Superior de Brasília • Faculdade Euro-Americana

O Instituto Brasiliense de Estudos da Economia Regional (IBRASE) foi criado e está em

funcionamento desde 18 de abril de 2000. Sua constituição foi motivada e norteada pela

necessidade de promover e realizar pesquisas, estatísticas e estudos de relevância sobre

a economia do Distrito Federal e do Centro-Oeste como um todo. Suas atenções estão

voltadas tanto para o setor público como para a iniciativa privada. O IBRASE conta com

quadro diversificado e especializado de economistas cadastrados, todos registrados

e em situação regular perante o Conselho Regional de Economia do Distrito Federal.

Além de estudos e pesquisas, o IBRASE promove seminários, cursos e outros eventos.

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A assinatura da Revista de Conjuntura pode ser efetuada contactando o Corecon/DF. O valor da assinatura é de

R$ 80,00 anual, o que equivale a quatro edições da revista.

7 Desenvolvimentismo

Keynesiano: o caminho a ser percorrido

João Paulo deAlmeida Magalhães

13 O Fundo Soberano do Brasil

José Fernando Cosentino Tavares

21Modernizar a legislação

que regula a profissão do economista – um desafio para muitos

Wellington Leonardo da Silva

30Mapa da desigualdade

espacial da renda no Brasil

Júlio MiragayaMarco César Araujo Pereira

Carlos Henrique RosaPatrícia Guedes da Silva

51Carta de Brasília

ArtigoS

2 editorial3 entrevista

Mauricio Barata de Paula Pinto

26 capaEconomistas reivindicam revisão de sua legislação

ÍndicePublicação do Conselho Regional de

Economia do Distrito Federal

ANO VIII • Nº 35 • julho/setembro de 2008

ConjunturaRevista de

Nesta edição

Editor responsávelMário Sérgio Fernandez Sallorenzo

Conselho editorialAndré NunesHumberto Vendelino RichterJosé Fernando Cosentino TavaresJosé Luiz PagnussatJosé Roberto Novaes de AlmeidaJúlio Flávio Gameiro MiragayaMaurício Barata de Paula PintoMônica Beraldo Fabrício da Silva

Jornalista responsávelDaniela Lima (Reg. DRT/DF: 4926)

RedaçãoDaniela Lima

RevisãoMarluce Moreira Salgado

Editoração eletrônicawww.arsventura.com.br

Tiragem: 4.000Periodicidade: trimestral

As matérias assinadas por colaboradores não refletem, necessariamente, a posição da entidade. É permitida a reprodução total ou parcial dos artigos desta edição, desde que citada a fonte.

CONSELHO REGIONAL DE ECONOMIA DA 11ª REGIÃO - DF

PresidenteMário Sérgio Fernandez Sallorenzo

Vice-presidenteJosé Luiz Pagnussat

Conselheiros efetivosEvilásio da Silva Salvador Homero Gustavo Reginaldo LimaJosé Luiz Pagnussat Júlio Miragaya Mário Sérgio Fernandez Sallorenzo Maurício Barata de Paula Pinto Max Leno de Almeida Mônica Beraldo Fabrício da Silva Roberto Bocaccio Piscitelli

Conselheiros suplentesAndré Nunes Érton Birk Teixeira Guilherme Costa Delgado Junia Rodrigues de Alencar Newton Ferreira da Silva Marques Paulo Luiz Figueiredo de Oliveira Ronalde Silva Lins Victor José Hohl

Conselheiro Federal pelo DFHumberto Vendelino Richter

Equipe do CoreconAngeilton Francisco Lima Faleiro Iraci da Costa Lopes Ismar Marques Teixeira Jamildo Cezário Gomes Maria Aparecida Carneiro Michele Cantuária Soares

EstagiáriosMayara Bruno Ferreira (ensino médio)Rodrigo Nascente de Oliveira (Economia)

End.: SCS Qd. 04, Ed. Embaixador, Sala 202CEP 70300-907 – Brasília/DF Tel: (61) 3225-9242 / 3223-14293964-8366 / 3964-8368Fax: (61) 3964-8364E-mail: [email protected]: www.corecondf.org.brHorário de funcionamento:das 8h às 18h (sem intervalo)

Esta edição da Revista de Conjuntura tem como destaque a discussão sobre a proposta

de revisão da Legislação da profissão de economista. Nos últimos anos houve uma sucessão

de Projetos de Lei propondo a atualização do campo de atuação do economista, a reorgani-

zação do sistema de conselhos e a ampliação do escopo da profissão para profissionais com

formação em nível de pós-graduação strictu sensu e cursos superiores seqüenciais.

O atual Projeto de Lei em tramitação no Congresso Nacional, apesar dos avanços que

apresenta, necessita de ajustes, pois não inclui campos importantes de atuação dos econo-

mistas e não trata da questão dos pós-graduados e tecnólogos, além de incluir temas po-

lêmicos não-consensuados entre os dirigentes das entidades representativas da categoria,

como é o caso da representatividade regional na plenária do Conselho Federal.

A questão do reconhecimento dos mestres e doutores em economia como profissio-

nais da área, em suas especialidades, é hoje o ponto mais urgente de atualização da legis-

lação que regulamenta a profissão do Economista. A Lei nº 1.411, de 13 de agosto de 1951,

reconhece como economistas apenas os bacharéis em Ciências Econômicas; entretanto, a

realidade, hoje, é muito diferente da de 1951. Houve grande expansão dos cursos de pós-gra-

duação strictu sensu em economia nestes 67 anos. Há um vácuo jurídico na regulamentação

do exercício profissional dos pós-graduados.

O crescimento da demanda por cursos de mestrado e doutorado na área de Economia,

nos últimos anos, vem sendo acompanhado pela redução da demanda pelos cursos de gra-

duação em Economia no país e, em especial, em Brasília. O caso de Brasília é ilustrativo: há

apenas três cursos de Ciências Econômicas em nível de graduação com vestibular anual e

nove cursos de mestrado e doutorado em economia.

O princípio básico que se propõe é o reconhecimento dos profissionais com base na sua

formação específica, considerando os conteúdos desenvolvidos em cada curso. Esse, aliás, é

o princípio básico para que os conselhos profissionais cumpram a sua missão de defesa da

sociedade diante dos profissionais que atuam no seu campo de fiscalização. Cabe ao Conse-

lho Regional de Economia indicar os profissionais que têm competência para desenvolver

atividades específicas na área de Economia e punir os profissionais que revelarem defici-

ências técnicas ou que assumirem atividades para as quais não tenham os conhecimentos

exigidos. O Código de Ética do economista é um dos mais avançados entre as diversas pro-

fissões, mas tem sido pouco aplicado e muitas vezes desrespeitado até pelos dirigentes das

entidades representativas dos economistas.

A revista traz três textos abordando o assunto: a reportagem produzida pela jornalista

Daniela Lima; o artigo “Modernizar a legislação que regula a profissão do economista – um

desafio para muitos”, do economista do Corecon/RJ, Wellington Leonardo da Silva; e a “Carta

de Brasília” produzida em evento realizado em setembro, com a participação de dirigentes

de vários Conselhos Regionais de Economia.

A Revista tem ainda os artigos: “Desenvolvimentismo Keynesiano: o caminho a ser per-

corrido”, do professor João Paulo de Almeida Magalhães, presidente do Corecon/RJ; o exce-

lente artigo “O Fundo Soberano do Brasil” do economista José Fernando Cosentino Tavares;

e o estudo “Mapa da desigualdade espacial da renda no Brasil” de autoria conjunta de Júlio

Miragaya, Marco César Araújo Pereira, Carlos Henrique Rosa e Patrícia Guedes da Silva.

Outro destaque da Revista é a entrevista com o professor Maurício Barata de Paula Pinto,

conselheiro do Corecon/DF e professor do Departamento de Economia da UnB, que avalia

os riscos de alta da inflação no Brasil.

Nesta edição da Revista não foram incluídos artigos sobre a crise financeira, pois este

será o tema principal da edição especial de final de ano da Revista. Neste sentido, concla-

mamos os economistas de Brasília para enviarem, ao Corecon, seus artigos relacionados

a essa temática.

EditorialEditorialPublicação do Conselho Regional de Economia do Distrito Federal

ConjunturaRevista de

A volta da

inflação no Brasil

ENTREVISTA

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julho / setembro / 2008

O economista Mauricio Barata de Paula Pinto concentra-se no estudo da economia internacional. Ele

é membro do Corecon/DF desde 1995, participando da Plenária e coordenando a Comissão de Valorização da Profissão. Sua experiência profissional incluiu cargos

de professor titular na Universidade de São Paulo e na Universidade de Vanderbilt, nos Estados Unidos.

Atualmente leciona na Universidade de Brasília (UnB). Em sua entrevista avalia a alta da inflação no país, e

segundo ele, o motivo foi o desejo da administração federal de fazer muitas coisas boas ao mesmo tempo,

sem levar em conta as conseqüências inflacionárias de suas políticas. Para o economista, o objetivo do

crescimento sem aceleração da inflação só pode ser alcançado se o governo coordenar melhor os vários

instrumentos da política macroeconômica.

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a

inflação no Brasil foi o desejo de a administração federal

fazer muitas coisas boas ao mesmo tempo, sem levar em

conta as conseqüências inflacionárias de suas políticas.

Três políticas macroeconômicas expansivas foram ado-

tadas simultaneamente: o governo implementou o PAC,

diminuiu a taxa de juros do Copom e amorteceu a queda

da taxa de câmbio. O governo alcançou seus objetivos que

eram acelerar o crescimento, desonerar os consumidores

do pagamento de juros altos e proteger, contra o declínio

do dólar, os produtores de exportações e importações. Mas

o resultado dessa combinação de medidas expansionistas

foi o aumento simultâneo dos vários componentes da de-

manda agregada, destacando-se o aumento dos gastos

com a aquisição de bens de consumo duráveis. E, ao amor-

tecer o declínio da taxa de câmbio através das volumosas

compras de dólares, o governo inibiu a contribuição que o

ajustamento da balança comercial poderia ter dado para

o equilíbrio de oferta e demanda agregada. A balança co-

mercial continuou produzindo superávits maiores que os

desejáveis e por muito mais tempo que o necessário, pres-

sionando assim a demanda agregada. Não houve preocu-

pação com a coordenação de políticas macroeconômicas.

A expansão da demanda agregada não veio acompanha-

da de política de contenção do crédito que seria necessá-

ria, e o resultado foi o aumento da inflação.

Conjuntura - Ao que o senhor atribui o fato de a infla-

ção ter registrado fortes altas nos primeiros meses do

ano e de repente ter começado a apontar uma queda?

Maurício de Paula Pinto - De fato, a inflação se acele-

rou no primeiro semestre do ano, mas observe que o au-

mento da inflação não é tão recente; ela já estava cres-

cendo antes. A inflação vem se acelerando anualmente

desde agosto de 2005. Avaliando a inflação pela taxa de

crescimento do IGP-DI, e calculando essa taxa para os

períodos de agosto de cada ano até agosto do ano se-

guinte, vemos a inflação crescer de 2,78% em 2006 para

5,19% em 2007 e para 12,80% em 2008. Portanto, a ten-

dência de crescimento da inflação já se observa desde

2005. E nesse período a taxa de inflação se multiplicou

por mais de quatro vezes.

Mas olhando novamente os primeiros meses do ano

atual, como a pergunta sugere, observamos que de fato

a aceleração da inflação foi alta. Esse período inicial de

2008 foi caracterizado pelos seguintes fatos importantes:

Conjuntura - Quais os motivos do crescimento da infla-

ção no Brasil? Quais são suas perspectivas no Brasil?

Maurício de Paula Pinto - Nos primeiros anos da ad-

ministração do presidente Lula, o desejo de acelerar o

crescimento foi colocado em segundo plano. Ficaram

em destaque as preocupações com a estabilidade de

preços e com as políticas redistributivas, inclusive com o

Programa Fome Zero, mas depois as prioridades foram

reorientadas. Foi lançado o Programa de Aceleração do

Crescimento, e a política monetária foi modificada, pro-

curando diminuir as taxas de juros. A mudança de obje-

tivos da administração foi possibilitada pelas boas con-

dições da economia mundial, que permitiram uma taxa

de juros interna mais branda, pois o volume de recursos

de capital orientados para o Brasil era suficientemente

grande, e ao mesmo tempo, o crescimento da deman-

da internacional por nossas exportações permitia uma

posição folgada para a balança comercial. O presidente

Lula afirma que a inflação prejudica os trabalhadores, e,

ao dizer isso, ele certamente se baseia não apenas em

sua sensibilidade política, mas também em sua longa

experiência como líder sindical.

É possível que os novos objetivos do governo tenham

sido ambiciosos demais. O principal motivo da alta da

5

julho / setembro / 2008

no exterior, a crise hipotecária americana dominava as

preocupações e no Brasil, a inflação já se acelerava. Mas

a política de diminuição da taxa de juros continuou em

ação até meados de abril de 2008, quando finalmente

o Copom e o Banco Central sensatamente reverteram a

tendência de queda dos juros. Não é segredo que há um

conflito interno no governo, entre o ministro da Fazen-

da e o presidente do Banco Central, em torno da política

monetária, e certamente esse conflito dificultou a ação

do Banco Central. Possivelmente a lentidão do aumento

da taxa do Copom levou o mercado financeiro a acredi-

tar que a política monetária não seria mais usada para

conter a inflação. Certamente algum tempo foi necessá-

rio para convencer os mercados de que uma política mo-

netária adequada seria usada para enfrentar a inflação e

finalmente, em julho, a taxa de inflação começou a ceder,

para, em agosto, se tornar negativa.

Conjuntura - O senhor acredita que o regime de metas

de inflação, em meio a um cenário de turbulência inter-

nacional, tem se mostrado um componente eficiente e

importante de gerência de política monetária?

Maurício de Paula Pinto - Acredito sim. Se o regime de

metas de inflação for usado corretamente e com em-

penho, ele dará os resultados desejados. A experiência

recente mostra isso. Comparando as taxas de inflação

observadas nos primeiros meses de 2008 com as taxas

do Copom, e expressando ambas as taxas em termos

mensais, vemos que a taxa real de juros foi fortemente

negativa no período de quatro meses entre abril e julho

de 2008. Meu ponto de vista é que a elevação persisten-

te dos juros nominais, a partir de meados de abril, rever-

teu o processo de aceleração da inflação, confirmando

que o regime de metas de inflação é eficiente. Hoje, no

Brasil, a maior dificuldade com o regime de metas de

inflação e com o uso correto da política monetária não

decorre da turbulência do mercado internacional, mas

sim da falta de consenso e coordenação entre os princi-

pais responsáveis pela política econômica.

Conjuntura - A elevação da taxa Selic pelo Copom, para

enfrentar a elevação dos preços que têm componente

externo forte, foi adequada? A elevação foi exagerada?

Maurício de Paula Pinto - Não, a elevação dos juros

não foi exagerada, mas talvez tenha sido implementa-

da um pouco tarde, e isso permitiu as taxas de inflação

tão altas entre abril e julho do presente ano. Qualquer

forma de política monetária, e não apenas o regime de

metas de inflação, fica sujeito a uma restrição importan-

te: não se deve aumentar a taxa de juros subitamente

e acentuadamente, pois isso poderia causar choques e

desequilíbrios insustentáveis no sistema financeiro. Os

juros devem ser aumentados gradualmente. Por isso é

necessário haver consenso dentro do governo sobre o

rumo da política monetária. Quando parte do governo

só se convence da necessidade de aumentar a taxa de

juros reais depois que ela se torna negativa, a política

monetária vai funcionar com atraso.

Conjuntura - Quais as principais fontes de pressão in-

flacionária neste segundo semestre? Câmbio, preços

administrados etc.?

Qualquer forma de política monetária, e não apenas o regime de metas de inflação, fica sujeito

a uma restrição importante: não se deve aumentar a taxa de juros subitamente e acentuadamente,

pois isso poderia causar choques e desequilíbrios insustentáveis no sistema financeiro.

Mauricio Barata de Paula Pinto

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a

Maurício de Paula Pinto - É possível que os preços ad-

ministrados contribuam para pressionar a inflação, mas

é possível também que após a inflação ter cedido em

agosto, os partidários dos juros baixos voltem a pressio-

nar o Banco Central para diminuir a taxa do Copom. Se

isto acontecer, podemos ter um novo ciclo inflacionário.

E acrescentamos um ponto importante: o reajustamento

dos preços administrados não implica necessariamente

mais inflação, desde que a política monetária seja usada

corretamente. A elevação dos preços administrados só

acarreta mais inflação quando não é compensada pela

política monetária.

Conjuntura - Qual o impacto do câmbio na inflação?

Maurício de Paula Pinto - O impacto do câmbio na infla-

ção pode ser visto de dois ângulos diferentes. Em primei-

ro lugar, sabemos que a taxa de câmbio tem efeito direto

sobre os preços internos de bens importáveis e exportá-

veis, e como esses bens entram no cálculo dos índices de

preços, há um efeito direto do câmbio sobre aqueles índi-

ces. Esse efeito é maior do que geralmente se pensa, pois

devemos levar em conta não apenas o peso das exporta-

ções e importações sobre o produto nacional, mas sim a

parcela dos gastos com bens exportáveis e importáveis

na despesa nacional, e apesar de ser difícil avaliar esses

últimos pesos, sabemos que eles não estão longe de 50%.

Portanto, o índice geral de preços é muito sensível à taxa

de câmbio. O outro ângulo de onde podemos ver o efeito

do câmbio sobre a inflação considera que o saldo da ba-

lança comercial é parte da demanda agregada, e quando

a taxa de câmbio se movimenta, há um impacto sobre

a demanda agregada. Como sabemos, há muito tempo

o governo compra quantidades substanciais de divisas

para aumentar as reservas do país, que já chegaram a

207 bilhões de dólares. Essa política inibe o processo

de ajustamento da balança comercial. Essa é uma das

razões pelas quais o nível da demanda agregada e seu

efeito sobre o nível geral de preços permanecem altos.

E como a política de juros não neutralizou esse efeito, ao

mesmo tempo em que estimulou fortemente as com-

pras de bens duráveis, a inflação acelerou. Se o Banco

Central não tivesse comprado tantos dólares, o impacto

do câmbio na inflação teria sido menor e não haveria

necessidade de juros mais altos.

Conjuntura - É possível procurar alcançar ao mesmo

tempo a aceleração do crescimento e a estabilidade

de preços? Os dois objetivos são compatíveis? O se-

nhor pode sugerir alternativas para a política macroe-

conômica brasileira?

Maurício de Paula Pinto - Sustentar a taxa de câm-

bio com o aumento das reservas e ao mesmo tempo

estimular a demanda agregada de bens de consumo

duráveis, quando a economia se encontra perto do

produto potencial, não abre espaço para produzir to-

dos os bens exigidos pela aceleração do crescimento.

O resultado é o aumento da inflação. O objetivo do

crescimento sem aceleração da inflação só pode ser

alcançado se o governo coordenar melhor os vários

instrumentos da política macroeconômica.

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julho / setembro / 2008

ArtigoO título do presente trabalho é “Desenvolvimen-

tismo Keynesiano”. Para bem entender seu objetivo faz-

se necessário mostrar o que se acha por trás dele.

No período recente, em função do estrondoso fracas-

so do experimento neoliberal no Brasil, grande número

de textos vêm sendo publicados, como contribuição

pessoal ou coletânea de artigos, oferecendo sugestões

sobre a maneira de fazer o país voltar ao crescimento

acelerado que registrou no passado e constitui hoje a

norma entre as economias emergentes.

É freqüente os autores desses trabalhos se autode-

nominarem keynesianos. Pretendem, com isso, sinalizar

que discordam da visão neoliberal de total respeito

aos mecanismos de mercado sustentando, em sentido

contrário, a tese de que a sistemática intervenção do

governo na economia é fundamental para a eliminação

do atraso econômico. Nesse sentido, o nome de Key-

nes é uma boa escolha porque ele foi o primeiro eco-

nomista de grande projeção a negar a capacidade do

livre funcionamento do mecanismo de preços levar ao

ótimo econômico.

Essa nova corrente do pensamento econômico

brasileiro poderia receber o nome de pós-keynesiana,

neokeynesiana ou novo-keynesiana. Acontece que es-

sas denominações já foram apropriadas pelos seguido-

res de Keynes não podendo, assim, ser utilizadas. Pos-

sivelmente em função disso, Bresser Pereira sugeriu a

denominação “novo-desenvolvimentismo” que a nosso

ver, sem o adjetivo “novo” e completada com referência

expressa a Keynes ilustra bem a proposta dessa nova

corrente de pensamento econômico.

As teses desse autor, que encontraram forte resis-

tência inicial da mainstream economics, acabaram sen-

do a ela incorporadas dado seu nível em nada inferior

ao da melhor ciência econômica da época. A tarefa

aqui proposta para o desenvolvimentismo-keynesiano

é exatamente, tal como Keynes, oferecer alternativa, ao

neoliberalismo e à teoria neoclássica (da qual o neoli-

beralismo é a vertente doutrinária), justificada por pa-

radigma de nível científico não inferior ao dela. O que

até agora não está acontecendo.

As propostas de política econômica do desenvol-

vimentismo-keynesiano são, usualmente, justificadas

como alternativa à fórmula neoclássica de política eco-

nômica que fracassou redondamente, não só no Brasil

como em toda América Latina. Diante disso, os desen-

volvimentistas-keynesianos passaram simplesmente, e

sem qualquer justificação teórica, a defender políticas

econômicas opostas às que vinham sendo adotadas.

Exemplifiquemos:

A passividade do Estado na economia levou o Bra-

sil a vinte e cinco anos de semi-estagnação. A alterna-

tiva óbvia a essa opção, sugerida pelo desenvolvimen-

tismo-keynesiano, é a condução da economia com

base em planos que descrevam os objetivos visados e

apontem os instrumentos requeridos para alcançá-los. A

Desenvolvimentismo Keynesiano: o caminho a ser percorrido1

João Paulo de Almeida Magalhães

1 O presente artigo se baseia nas formulações contidas em pesquisa do Centro de Estudos para o Desenvolvimento – CED do CORECON-RJ a ser proximamente publicado com o título de Desenvolvimentismo Keynesiano um enfoque Teórico-Didático.

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a

sobrevalorização do real vem conduzindo o país à cres-

cente especialização no setor de commodities agrícolas

e industriais. Especialização indesejável por se tratar de

setor de baixo valor adicionado por trabalhador, tec-

nologia elementar e lento crescimento. Torna-se, dessa

forma, desnecessária maior justificação da proposta

desenvolvimentista de desvalorização da taxa de câm-

bio. Algo semelhante acontece com os altíssimos juros

vigentes no país, que desencorajam investimentos, atra-

em capital estrangeiro especulativo e oneram pesada-

mente as finanças públicas. O que torna óbvia e, portan-

to, sem necessidade de maior justificação, a proposta de

sua drástica redução.

Ou seja, as justificações das alternativas propostas se

acham, simplesmente, nos maus resultados da fórmula

neoliberal. Não existe nelas embasamento teórico, mos-

trando que as políticas em curso no país estão erradas

porque, ignorando a especificidade do crescimento re-

tardatário, pretendem conduzi-lo a partir de fórmulas

que se revelaram eficazes nos atuais países desenvolvi-

dos. Diante da falta de justificações teóricas, essenciais

em debate científico, os defensores da visão neoclássica

continuam a poder alegar que suas sugestões se baseiam

no que há de melhor e mais avançado na ciência econô-

mica. Os maus resultados obtidos são justificados como

erros facilmente corrigíveis. Assim, a alegação atualmen-

te em moda é de que o fracasso da proposta neoliberal,

codificada no Consenso de Washington, deveu-se exclu-

sivamente ao fato de as instituições existentes nos países

subdesenvolvidos não serem adequadas ao crescimento

econômico. As propostas do neoliberalismo continua-

riam, portanto, plenamente válidas, bastando apenas

complementá-las com esforço de aperfeiçoamento

institucional. É o Consenso de Washington Ampliado. O

grave defeito do desenvolvimentismo-keynesiano a ser

corrigido é, portanto, a falta de justificação teórica (ou

científica) de suas teses. Vejamos por quê.

Antes de definir o que deve ser feito, para criar para-

digma teórico que se contraponha à visão neoclássica,

é indispensável indagação preliminar. Como se explica

a utilização em países subdesenvolvidos de fórmula de

política econômica incompatível com sua realidade?

Somente em função da resposta a essa pergunta será

possível decidir sobre a melhor forma de se contrapor

ao liberalismo neoclássico.

Duas explicações foram oferecidas para o fato. De

acordo com a primeira, houve somente erro de interpre-

tação das peculiaridades do crescimento retardatário

pelos formuladores de políticas econômicas. De acordo

com a segunda, existiu inegável intenção dos econo-

mistas do Primeiro Mundo de bloquear a expansão das

economias atrasadas. O exame dessas duas interpreta-

ções é importante para se decidir sobre o que deve ser

feito a fim de evitar que os erros do passado se repitam

no futuro.

Para Bacharach (1980), que oferece argumento favo-

rável à primeira interpretação, o que ocorreu foi apenas

um problema de verstehen. Este, extremamente impor-

tante nas ciências sociais, consiste na capacidade de o

analista envolvido em determinada realidade compre-

endê-la de forma direta, sem necessidade de estudos

ou pesquisas sobre ela. Assim, diante da ameaça de uma

guerra, ou séria comoção social, o analista percebe de

forma imediata, isto é, sem necessidade de qualquer

pesquisa, os motivos da corrida aos bancos e da estoca-

gem de bens de consumo pelas famílias.

O verstehen pode ser dividido em doméstico e radi-

cal. O primeiro se refere ao observador agindo no seu

‘‘

‘‘

Não existe embasamento teórico, mostrando que

as políticas em curso no país estão erradas

porque, ignorando a especificidade do

crescimento retardatário, pretendem conduzi-lo

a partir de fórmulas que se revelaram eficazes

nos atuais países desenvolvidos.

julho / setembro / 2008

próprio ambiente. No segundo, o cientista procura se

colocar no ambiente de outras civilizações ou culturas,

caso do antropólogo, do etnólogo e de pesquisadores

de países desenvolvidos analisando economias retarda-

tárias. O verstehen radical é mais difícil e problemático o

que aumenta, no caso da Economia, o risco de indevida

transferência para países subdesenvolvidos de políticas

adotadas, com sucesso, em economias maduras. Políticas

que vão se revelar ineficazes, ou mesmo prejudiciais, para

as economias atrasadas. Isso teria sido o que ocorreu à

América Latina na aplicação do modelo neoclássico.

Schumpeter (1954) apóia essa interpretação ao

afirmar: “É também verdade que sempre que ten-

tamos interpretar atitudes humanas, sobretudo de

pessoas muito distantes de nós em tempo e cultura,

arriscamo-nos a não entendê-las, não apenas se subs-

tituirmos grosseiramente nossas atitudes pelas delas,

mas também quando nos esforçamos para penetrar

no comportamento de suas mentes. Tudo isso se tor-

na muito pior do que seria de outro modo, porque o

observador é produto de um contexto social e de sua

situação especial nesse contexto, o que o condiciona

mais para certas coisas do que para outras e para vê-

las de certa perspectiva. E isso não é tudo: fatores am-

bientais podem inclusive marcar o observador com o

desejo subconsciente de vê-las sob uma certa ”luz” (p.

34). Essa análise abrange tanto a dificuldade colocada

pelo verstehen radical quanto pela defesa inconsciente

de interesses paroquiais pelos pesquisadores.

Ainda no sentido de justificar a existência de cons-

piração contra os países subdesenvolvidos, alegou-se

o sucateamento da Economia do Desenvolvimento

sem que suas teses básicas tivessem sido refutadas.2

Krugman (1995) explica de outra forma o declínio

dessa disciplina. De acordo com ele os grants, que nos

desenvolvidos constituem a base de qualquer pesqui-

sa científica, eram, na Economia do Desenvolvimento,

ligados aos auxílios concedidos a países pobres. O es-

tudo destes permitia, em última análise, orientar me-

lhor o apoio oferecido. Com o declínio desse auxílio,

desapareceram os grants com correspondente impac-

to negativo na Economia do Desenvolvimento. Não

teria havido, portanto, qualquer intenção de prejudicar

os subdesenvolvidos.

A mais decidida defesa da tese da existência de

conspiração contra os subdesenvolvidos foi proposta

por H. C Chang (2002). No seu livro Chutando a Escada,

ele retoma a tese de List, segundo a qual os pioneiros

da Revolução Industrial do século 19 estavam tentando

impedir que os demais países seguissem pelo mesmo

caminho. Isto é, estavam “chutando a escada “ pela qual

subiram a fim de evitar que outros fizessem o mesmo.

Sua crítica se concentra na tese propalada pelos paí-

ses ricos, e pelos organismos internacionais por eles

controlados, de que o subdesenvolvimento resultava,

essencialmente, da falta de instituições adequadas. En-

tendidas estas como as regras do jogo econômico. A

importância da denúncia de Chang está em que, diante

do estrondoso fracasso do neoliberalismo, procurava-se

explicar que isso acontecera em conseqüência da falta

‘‘

‘‘

O observador é produto de um contexto social e de sua situação especial nesse

contexto, o que o condiciona mais para certas coisas do

que para outras e para vê-las de certa perspectiva.

E isso não é tudo: fatores ambientais podem inclusive marcar o observador com o

desejo subconsciente de vê-las sob uma certa ”luz”.

Schumpeter (1954)

2 A Economia do Desenvolvimento era importante para as economias retardatárias porque, contrariamente dos trabalhos usuais sobre o tema, tipicamente de Economia Aplicada, a disciplina tinha como objetivos criar teorias ou paradigmas aplicáveis ao caso específico dessas economias.

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de instituições adequadas ao crescimento econômico.

Ou seja, o receituário neoliberal estaria correto faltando

apenas complementá-lo com a reforma institucional.

Em suas palavras: “Ao pedirem aos países em desen-

volvimento padrões institucionais que eles mesmos

nunca atingiram, os países desenvolvidos estão adotan-

do duplo critério e prejudicando os países subdesenvol-

vidos ao impor-lhes muitas instituições de que eles não

precisam e nem têm capacidade de implantar “ (p. 135).

Não menos importante, segundo ele, é o fato de as

instituições hoje existentes nos países em desenvol-

vimento serem mais avançadas do que as registradas,

pelos atuais desenvolvidos, em fase correspondente de

seu crescimento. Lembra, nesse sentido, que a Inglaterra

registrava, em 1820, nível de desenvolvimento corres-

pondente ao da Índia de hoje. E não contava com insti-

tuições já existentes naquele país, como sufrágio univer-

sal, banco central, imposto de renda, responsabilidade

limitada generalizada, moderna lei de falência bancária,

burocracia profissionalizada e regulamentação signifi-

cativa do sistema acionário. Da mesma forma, a Itália em

1875 tinha o nível de desenvolvimento do Paquistão de

hoje. E, no entanto, não dispunha de sufrágio universal

masculino, burocracia profissional, sistema judiciário

independente, banco central com monopólio de emis-

sões ou lei de concorrência, instituições essas que já

existem no atual Paquistão, algumas delas há décadas.

Por que, então, se exigir das economias retardatárias o

que os atuais países desenvolvidos jamais tiveram na

época áurea do seu crescimento?

Completando sua crítica o autor afirma, taxativa-

mente, que a maioria das instituições recomendadas

aos países em desenvolvimento como boa governança

foram, de fato, resultados e não causa do crescimen-

to das atuais economias maduras, não tendo sentido

apontá-las como pré-requisito ao sucesso das políticas

de desenvolvimento.

Também com respeito ao abandono da Economia

do Desenvolvimento, a interpretação conspiratória ofe-

rece explicação diferente da proposta por Krugman. De

acordo com ela, o otimismo, surgido logo após a Segun-

da Guerra Mundial, sobre a viabilidade da eliminação do

subdesenvolvimento em escala planetária deu lugar, no

fim dos 1960s, a sério pessimismo. Os países desenvol-

vidos tomaram consciência de que políticas destinadas

a alcançar esse objetivo teriam, para eles, graves efeitos

negativos em termos de elevação do preço de recursos

naturais não-renováveis e de grandes investimentos

para reduzir a agressão ao meio ambiente de suas ati-

vidades econômicas. Teria sido por esse, e não por ou-

tro motivo, que desapareceram os grants e às pesquisas

sobre o crescimento retardatário, com o conseqüente

declínio da Economia do Desenvolvimento.

Mais que isso, como os países desenvolvidos não

podem hoje lançar mão dos mesmos instrumentos

utilizados no passado para bloquear o desenvolvimen-

to das nações periféricas, tais como o pacto colonial, a

abertura militarmente imposta à China e ao Japão e as

pressões econômicas de diversos tipos sobre a América

Latina3, o instrumento ideológico passou a ser utilizado.

3 No caso do Brasil, a Inglaterra impôs ao país, durante praticamente toda a metade do século 19, a tarifa aduaneira máxima de 15% sobre as importações oriundas daquele país.

‘‘

‘‘

Os países desenvolvidos não podem hoje lançar

mão dos mesmos instrumentos utilizados

no passado para bloquear o desenvolvimento das nações periféricas, tais como o pacto colonial,

a abertura militarmente imposta à China e Japão

e as pressões econômicas de diversos tipos sobre a

América Latina.

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julho / setembro / 2008

O abandono da Economia do Desenvolvimento foi

complementado com a imposição do que se tornou

conhecido como “pensamento único” que alguns auto-

res preferem chamar de pensamento hegemônico. De

acordo com este, as recomendações da teoria neoclás-

sica, que se revelaram eficazes nas economias maduras,

são plenamente válidas para as economias retardatá-

rias. Ou seja, a abstenção do Estado, a ampla abertura

do país à entrada de capitais e mercadorias estrangei-

ros e o estrito respeito aos mecanismos de mercado,

constituiriam a forma correta de eliminar o atraso eco-

nômico.

Dutt e Ros (2003) definem bem o problema do sur-

gimento do chamado – pensamento único – ao afirma-

rem: “A mainstream economics raramente reconhece (...)

a existência de enfoques alternativos aos seus. O que

agora é a mainstream economics é usualmente chama-

da economia neoclássica” (p.7). E continuam. “Embora

houvesse diversas escolas competitivas inicialmen-

te, pelo meio do século 20 a economia neoclássica se

tornou relativamente estandartizada e estabeleceu

seu domínio na profissão (apesar do crescimento da

economia keynesiana que se tornou crescentemente

“neoclássica”). Essa tendência da teoria neoclássica de

dominar a profissão econômica alcançou um ponto no

qual a maioria dos economistas (principalmente nos

Estados Unidos) definiriam a economia como econo-

mia neoclássica.” (p. 8)

A pergunta é, então, a seguinte: as políticas eco-

nômicas implementadas na América Latina, e que a

condenaram a quase três décadas de semi-estagna-

ção, decorreram de erros determinados pelo verstehen

radical, e pela defesa inconsciente dos economistas do

Primeiro Mundo do interesse de seus países, ou resul-

taram, como sustenta Chang, da tentativa dos desen-

volvidos de monopolizarem os ganhos resultantes da

industrialização?

Tudo indica que a resposta não é relevante. Vejamos

por que: A teoria das vantagens comparativas, proposta

por Ricardo, era perfeitamente correta no século 19, quan-

do países do mesmo nível econômico se propunham a

facilitar sua industrialização, mediante abertura recípro-

ca de mercados. Logo depois, todavia, ela passou a ser

erradamente utilizada para condenar o protecionismo

dos países da segunda onda de industrialização (Estados

Unidos e Alemanha). Foi esse fato que levou List a acusar

os países industrializados de estarem chutando a esca-

da para impedir que os demais seguissem pelo mesmo

caminho. A bem-sucedida reação contra esse tipo de

manobra foi o enfrentamento direto do problema com

base em argumentos, de nível igual ao da melhor ciência

econômica da época, que invalidavam a irrestrita conde-

nação de qualquer fechamento econômico, contida na

teoria das vantagens comparativas. Tarefa levada adian-

te pela teoria protecionista de List.

Nos Estados Unidos, Alexandre Hamilton percebeu

a importância do protecionismo para garantir a indus-

trialização do seu país. Suas teses, contudo, dificilmente

prosperariam diante do aconselhamento em contrário

do que existia de mais avançado na ciência econômica.

O problema foi contornado pela teoria protecionista de

List, que deu cobertura científica às reivindicações de

Hamilton.

Esses fatos oferecem lição a ser aproveitada pela

América Latina. A escolha entre as duas interpretações

‘‘

‘‘

O abandono da Economia do Desenvolvimento foi

complementado com a imposição do que se

tornou conhecido como “pensamento único” que alguns autores preferem chamar de pensamento hegemônico. De acordo

com este, as recomendações da teoria neoclássica, que se revelaram eficazes nas economias maduras, são

plenamente válidas para as economias retardatárias.

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acima (a conspiratória e a de interpretação errada das

condições de subdesenvolvimento) é irrelevante. Isso

porque, se estivermos diante de erro técnico ou de uma

conspiração, a solução é sempre a mesma. Ou seja, a

montagem de paradigma ajustado à realidade dos sub-

desenvolvidos que, da mesma forma que a teoria prote-

cionista de List, no caso da industrialização dos Estados

Unidos e Alemanha, justifique tecnicamente políticas

econômicas capazes de proporcionar a países subde-

senvolvidos a eliminação do seu atraso econômico.

A tarefa básica do desenvolvimentismo-keynesiano

é, portanto, fazer para os subdesenvolvidos o mesmo

que List fez para os países da segunda onda de indus-

trialização e Keynes para a correção das recessões eco-

nômicas. A saber, criarem paradigma teórico, de nível

não inferior ao neoclássico, que justifique políticas eco-

nômicas capazes de eliminar seu atraso econômico. E a

tarefa não será fácil por dois motivos.

Em primeiro lugar, porque o que se exige do eco-

nomista brasileiro é fazer ciência econômica e não

simplesmente utilizar, em suas análises e propostas de

política econômica, as fórmulas recebidas do Primeiro

Mundo. Estamos diante de exigência incomum nos pa-

íses subdesenvolvidos. Estes são, em todos os ramos do

conhecimento, simples aplicadores de teorias e inter-

pretações dos países desenvolvidos.

Em segundo lugar, ela será difícil porque em ciência

econômica as condições parecem particularmente des-

favoráveis. Pesquisa de 2002, dirigida por Bielschowsky

e Mussi envolvendo mais de quarenta economistas do

mais elevado nível disponível no país, indagou dos en-

trevistados o que se deveria fazer para recolocar o Brasil

na trilha do desenvolvimento. A conclusão dos organi-

zadores foi a que segue: “Desde as primeiras entrevis-

tas ficou claro que o – crescimento – não tem ocupado

parte central das preocupações e reflexões da maioria

dos economistas brasileiros. De fato, o campo temático

mostrou-se pouco propício a grandes aprofundamen-

tos por parte dos entrevistados e tornou-se evidente,

durante a pesquisa, que se tratava de um regresso ao

tema”. E continuam “Há que se mencionar uma extre-

ma preocupação com o curto prazo. Em especial com

as políticas de estabilização, a qual vem afogando e

desfocando a visão de longo prazo “ (p. 34)

Ou seja, há um longo e difícil caminho a percorrer.

Referências

Bacharach M . The Role of Verstehen in Economic Theo-

ry em Richerche Economiche jan/jun, (1989)

Bielschowsky, R e Mussi (orgs) Políticas para a Retomada

do Crescimento, IPEA, Brasília, (2002)

Bresser – Pereira,L C. Macroeconomia da Estagnação.

São Paulo Editora 34, (2007)

Chang H.J. Kicking Away the Ladder, Anthem Press, Lon-

dres, (2002)

Dutt A e Ros J . Development Economics and Structutalist

Macroeconomics Edward Elgar Nothampton, (2003)

Schumpeter, J A. History of Economic Analysis, Oxford

University Press New York, (1954)

João Paulo de Almeida MagalhãesPresidente do Corecon-RJ

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julho / setembro / 2008

I – Apanhado geral e principais conclusões

Os fundos soberanos de riqueza2 pertencem aos go-

vernos nacionais (daí, “soberanos”). Consistem de ativos

em moedas estrangeiras fortes, separados das reservas

internacionais do país, muitas vezes administrados pelos

respectivos bancos centrais, aplicados a mais longo prazo

no exterior e em condições de maior risco que as ditas

reservas (em participações societárias, por exemplo). Es-

ses fundos buscam melhor retorno que o normalmente

obtido com as reservas oficiais, em função de estratégias

que combinam distribuir riqueza de seus recursos natu-

rais não-renováveis entre gerações, fazer política fiscal

anticíclica e atender a passivos contingentes.

Os fundos soberanos de riqueza são heterogêneos

e, segundo suas finalidades, podem ser classificados da

seguinte forma:3,4 (a) de estabilização, para proteger o

orçamento e a economia de flutuações de preços de

commodities, principalmente o petróleo, em países

que dependem desses produtos; (b) de poupança,

que a viabilizam e propiciam transferir para gerações

futuras, por meio de carteira de títulos diversificada, as

receitas derivadas da exploração de recursos naturais

não-renováveis ou da privatização de ativos públicos;

(c) de aplicação alternativa de reservas internacionais,

para diversificar a carteira dos governos, visando me-

lhor rentabilidade que os bancos centrais conseguem

com as reservas oficiais;5 (d) de desenvolvimento, para

financiar projetos ou políticas industriais; e (e) de apo-

sentadoria e pensão, para aplicar contribuições do go-

verno no mercado internacional de capitais e atender a

passivos previdenciários.

O Fundo Soberano do Brasil1

José Fernando Cosentino Tavares

Artigo

1 O autor concluiu a versão final deste artigo em 12 de outubro de 2008 e agradece à economista e Consultora de Orçamento Márcia Rodrigues Moura e ao Consultor de Orçamento Flávio Leitão Tavares da Câmara dos Deputados pelos valiosos comentários, assim como dos economistas que participaram da reunião de conjuntura do Corecon-DF, de 17 de julho de 2008, coordenada pelo professor José Luiz Pagnussat no Espaço do Economista. Nem os erros que porventura existam neste artigo, nem as conclusões devem ser atribuídos a esses economistas ou comentarista.

2 Para o leitor interessado neste assunto e com pouco tempo a perder, sugerimos a leitura de documento em http://www.imf.org/external/pubs/ft/survey/so/2008/POL03408A.htm e da pesquisa da JP Morgan Sovereign Wealth Funds: A Bottom-up Primer, JP Morgan, 22 de maio de 2008.

3 Esta classificação é baseada em trabalhos do Fundo Monetário Internacional. Ver, por exemplo, Sovereign Wealth Funds - A Work Agenda em http://www.imf.org/external/np/pp/eng/2008/022908.pdf, que serviu de base para parte da presente pesquisa. Outra leitura valiosa foi de Why Does Brazil Want a Sovereign Wealth Fund? em http://www.rgemonitor.com/latam-monitor/author_name/rziemba/.

4 Os objetivos podem ser múltiplos, sobrepostos ou mudar com o tempo. Por exemplo, quando as reservas acumuladas excedem o necessário para promover estabilização, tornam-se fundos de poupança. Segundo a literatura, muda a estratégia do fundo, pois se a finalidade for estabilização, a ênfase é na liquidez e no menor risco; se a finalidade for poupança, procura-se a rentabilidade em prazo mais longo.

5 A necessidade da manutenção de reservas tem diminuído rapidamente, com a adoção crescente, a partir da última década do século passado, dos regimes de metas de inflação e de câmbio flutuante em países emergentes. O acúmulo de reservas oficiais acima do adequado tem levado países a instituir ou a pensar em instituir fundos soberanos. O nível ideal de reservas é difícil de avaliar, e os bancos centrais não divulgam suas conclusões a esse respeito. Por diversas razões os países vieram acumulando moeda estrangeira e o excesso não precisa ser aplicado em títulos de curto prazo, com grande liquidez, admitindo, para essa parcela, aplicações menos líquidas, de mais longo prazo e de maior rentabilidade.

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Alguns desses fundos, do Oriente Médio e da Ásia, são

relativamente antigos (os do Kuwait, Abu-Dhabi, e Cinga-

pura); outros novos, porém fortes (China, iniciado em 2007

com US$ 200 bilhões, contra US$ 1,7 trilhão de reservas).

Eles se multiplicaram nos últimos vinte anos em de-

corrência de fatores relativamente novos na cena mun-

dial: a globalização e diversificação dos mercados, que

deu inédita mobilidade aos capitais financeiros; a que-

da da cotação do dólar; a valorização das commodities

no mercado internacional; a redução dos passivos dos

países emergentes em moeda estrangeira; e os cres-

centes superávits em transações correntes do balanço

de pagamento, superávits comerciais ou investimentos

estrangeiros elevados em países emergentes, que ge-

raram enorme acumulação de reservas internacionais.

As estimativas variam, mas são de que os fundos sobe-

ranos tenham hoje patrimônio entre US$ 2,5 trilhões e

US$ 3,7 trilhões, e que poderiam alcançar entre US$ 12

trilhões e US$ 15 trilhões em 2015, projetando-se seu

ritmo recente de crescimento.

Tais fatos esclarecem em grande parte as razões pelas

quais nosso governo busca ter o seu fundo soberano. Ou-

tra razão é que são considerados instrumentos das econo-

mias emergentes para firmar sua importância no sistema

financeiro global, principalmente depois de os primeiros

bancos americanos vitimados pela bolha imobiliária te-

rem sido resgatados por esses fundos soberanos, ainda

que eles cautelosamente já tenham suspendido esse tipo

de negócio com o recrudescimento da crise.

Foram instituídos 20 novos fundos desde 2000.

Os fundos chilenos datam de 2006, criados na lei de

responsabilidade fiscal, com os propósitos de estabi-

lização econômica e social e reserva previdenciária.

Substituíram o fundo de compensação das receitas

do cobre e passaram a repartir o superávit fiscal em

parcelas variáveis conforme o ciclo econômico. A Rús-

sia, que há quatro anos instituiu um fundo de estabi-

lização para administrar o resultado da exploração do

petróleo, em fevereiro de 2008 apartou US$ 32 bilhões

para seu fundo nacional soberano e deixou outros

US$ 130 bilhões em um fundo de reserva mais bem

comportado. A soma é inferior ao volume das reser-

vas brasileiras. Outro BRIC, a Índia, cogita de criar seu

fundo soberano com a perspectiva de garantir fontes

de energia e aumentar a rentabilidade da aplicação

de suas reservas internacionais. A Índia mais que do-

brou suas reservas em 2 anos, para US$ 290 bilhões

no final de setembro. O fundo compraria parte delas

do banco central e emprestaria a empresas indianas,

incluindo as que exploram minas de carvão e blocos

de petróleo e gás no exterior. Analistas internacionais

consideram parecidos os casos de Brasil e Índia, ainda

que a dependência de fontes externas de energia não

seja nosso problema. Ambos acumularam reservas ra-

pidamente e ostentavam volumosas entradas de ca-

pitais, embora tenham déficit fiscal e em transações

correntes no balanço de pagamentos.

Na atual conjuntura, descarta-se a urgência na

criação do Fundo Soberano do Brasil, diferentemente

de 8 meses atrás ou mesmo quando o projeto de lei

nº 3.674/086 foi apresentado ao Congresso. O Fundo

Analistas internacionais consideram parecidos

os casos de Brasil e Índia, ainda que a dependência

de fontes externas de energia não seja nosso

problema. Ambos acumularam reservas

rapidamente e ostentavam volumosas entradas de capitais, embora

tenham déficit fiscal e em transações correntes

no balanço de pagamentos.

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‘‘

6 Ver em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Projetos/PL/2008/msg466-080703.htm.

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julho / setembro / 2008

Soberano do Brasil poderia estar vindo tarde demais

em relação à bonança de receitas federais, estaria vin-

do também tarde demais em relação à abundância de

dólares ingressando no Brasil, e cedo demais em rela-

ção ao Pré-sal, principalmente se investimentos forem

adiados devido à queda da cotação do petróleo e falta

de fontes de financiamento do investimento. Outras

razões para se ter calma são que estão aumentando

a incerteza das aplicações em ativos financeiros ex-

ternos, o juro doméstico básico e a cotação do dólar,

enquanto caem as das commodities.

À época do encaminhamento do projeto de cria-

ção, o fundo soberano não seria necessário para que o

Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e So-

cial (BNDES), supostamente junto ao qual será consti-

tuído um segundo fundo que instrumentalizará a por-

ção desenvolvimentista do FSB, captasse recursos no

exterior; pois, com grau de investimento, os analistas

acreditam que, passada a volatilidade, existe mercado

para emissões do governo brasileiro.

O FSB não seria necessário para prover empresas

nacionais com recursos subsidiados, pois isso já se

faz por meio dos fundos orçamentários existentes

(fundos constitucionais e outros, especializados) e de

operações do próprio BNDES, todos podendo ser am-

pliados independentemente da criação do Fundo Fis-

cal de Investimentos e Estabilização. Não estava cla-

ra a necessidade de maior aporte de recursos para o

BNDES, quando havia dúvidas até quanto à existência

de demanda qualificada para os créditos oferecidos.

Os grandes conglomerados já conseguiam obter re-

cursos no exterior a custo bastante atraente. Até o ob-

jetivo de permitir a aplicação do excedente pruden-

cial das reservas internacionais em ativos de maior

rentabilidade, visando reduzir o custo de sua manu-

tenção, poderia ser atendido diretamente pelo Ban-

co Central com a mesma competência da instituição

financeira federal que o FSB venha a contratar como

agente operador (outros bancos centrais do mundo já

diversificam aplicação de suas reservas, com as mes-

mas finalidades). Além disso, como já se disse, não é

aconselhável neste momento a procura de aplicações

de maior risco.

A criação do FSB poderia ser substituída pelo au-

mento do superávit primário, para atender aos objetivos

imediatos de reduzir a demanda agregada e reduzir a

dívida pública. Caso venha a ser definido como objetivo

estimular a economia, bastaria, ao contrário, diminuir a

meta fiscal.

Com o aprofundamento da crise, cujo primeiro

efeito na economia brasileira foi a escassez de crédito

privado de fontes externas ou internas para as empre-

sas brasileiras, pareceria surgir um argumento decisivo

que justificasse a criação imediata do FSB. O elevado

superávit primário federal a ser obtido em 2008 será

esterilizado na ausência do fundo, quando, alternati-

vamente, poderia suprir o BNDES ou outra instituição

oficial junto à qual o fundo fosse constituído, permi-

tindo-lhe ampliar sua carteira de empréstimos. Ainda

assim, haveria como alternativa a concessão de em-

préstimo pelo Tesouro ao BNDES, nos mesmos moldes

de operações recentes com a Caixa Econômica Fede-

ral e com o próprio banco de desenvolvimento.

‘‘

‘‘

A criação do Fundo Soberano do Brasil

poderia ser substituída pelo aumento do

superávit primário, para atender os

objetivos imediatos de reduzir a demanda agregada e reduzir a dívida pública. Caso venha a ser definido

como objetivo estimular a economia, bastaria, ao contrário, diminuir a meta fiscal.

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II – Mais sobre fundos soberanos

Os fundos soberanos de riqueza servem para ate-

nuar os efeitos da doença holandesa7. No plano inter-

nacional esses fundos realocam excedentes e injetam

liquidez nos mercados financeiros.8

Países ricos e analistas do mercado preocupam-

se com esses fundos sob diversos aspectos: (a) como

contemplá-los nas formulações nacionais de política

econômica; (b) em que medida seus investimentos

afetarão os países hospedeiros, principalmente se seus

mercados de capitais forem (ainda) incipientes ou (mo-

mentaneamente) frágeis; (c) sua falta de transparência

(por exemplo, quanto a tamanho e estratégias de inves-

timento, considerando ainda eventuais objetivos políti-

cos que possam ter vis-à-vis questões de segurança na-

cional); e (d) o avanço estatal indesejável nos mercados

internacionais. Do lado oposto, a maior parte dos países

emergentes que administram tais fundos queixa-se de

restrições ao livre fluxo de capitais e do protecionismo.

É provável que novas regras afetem em breve o fun-

cionamento desses fundos. Desde outubro de 2007, está

na pauta do Fundo Monetário Internacional estabelecer as

melhores práticas para essas entidades, em conjunto com

a OCDE e o Banco Mundial, e acompanhar suas operações

para aprimorar, em especial, a troca de informações.9 Resul-

tados dos estudos eram esperados para outubro de 2008.

III – O projeto brasileiro

O projeto de lei não foi novidade. Durante algum

tempo a idéia da criação deste novo instrumento foi

debatida e combatida dentro do governo. Observava-

se, de um lado, que o Brasil tem economia suficiente-

mente diversificada e não depende, como outros paí-

ses, de receitas de exportação de poucos ou um único

recurso natural não-renovável. O modelo que o Brasil

persegue neste momento é o de países cujos fundos

foram criados mais recentemente com o excesso de

reservas, embora o projeto de lei seja suficientemente

amplo para acomodar outras configurações. O argu-

mento mais convincente a favor do fundo é de que fu-

turamente seremos importante produtor de petróleo.

Há algum tempo o Ministério da Fazenda anunciava

que o capital inicial do FSB seria o excesso de superávit pri-

7 Economistas identificaram relação entre a exploração e a exportação de recursos naturais (ou, mais genericamente, qualquer fator que pro-duza um aumento do influxo de capitais externos) e a desindustrialização do país, devida à combinação da valorização desses recursos com a desvalorização cambial. A valorização da moeda nacional (real, por exemplo) torna a indústria nacional menos competitiva com as importações, ocorrendo o que aconteceu na Holanda. Na Holanda, no início dos anos 80, subiram os preços do gás e as receitas de exportação, valorizando-se, à época, o florim, e o excesso de exportações de gás derrubou as exportações dos demais produtos por falta de competividade.

8 Tiveram destaque e papel estabilizador recentemente, quando aplicaram US$ 55 bilhões desde o último trimestre de 2007 até março de 2008 em instituições norte-americanas e européias, e mais de US$ 35 bilhões somente no capital das instituições financeiras norte-americanas Citi-group, Morgan Stanley e Merrill Lynch, que beiravam o colapso no período que se seguiu à crise do mercado imobiliário.

9 Discordando desse entendimento, o Ministro Guido Mantega, em audiência na Comissão de Finanças e Tributação, em 2/7/2008, afirmou que “apesar dos esforços do FMI e OCDE para desenvolver boas práticas dos FSR, observa-se que grande parte deles já está “em linha” com as best practices, o contrário do que a retórica sugere”. Ver em http://www.fazenda.gov.br/portugues/documentos/2008/julho/p020708.pdf dispositivo 48 da apresentação na CFT.

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O modelo que o Brasil persegue neste momento

é o de países cujos fundos foram criados

mais recentemente com o excesso de reservas,

embora o projeto de lei seja suficientemente amplo

para acomodar outras configurações. O argumento mais convincente a favor do fundo é de que futuramente

seremos importante produtor de petróleo.

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17

julho / setembro / 2008

mário de 2008, de ½ por cento do PIB, ou R$ 14,5 bilhões a

mais (US$ 8 bilhões à época, hoje US$ 1 bilhão a menos),

com os quais compraria títulos do BNDES para financiar

investimentos no exterior de empresas brasileiras.

A Exposição de Motivos que encaminhou o proje-

to refere-se ao processo acelerado de acumulação de

reservas internacionais por países emergentes, graças

a que o Brasil reduziu sua vulnerabilidade e aumen-

tou a proteção contra choques externos. Menciona em

seguida novos desafios de política macroeconômica,

principalmente quanto ao efeito desse acúmulo sobre

taxas de câmbio e competitividade internacional dos

produtos nacionais, indicando papel destacado do FSB

para influenciar o mercado cambial.

O FSB teria essas quatro funções: (a) absorver dólares

e conter a valorização do real; (b) obter remuneração su-

perior à proporcionada atualmente pelas reservas oficiais

de mais de US$ 200 bilhões, fruto dos superávits na ba-

lança comercial e do ingresso volumoso de capitais nos

últimos 4 anos; (c) subsidiar investimentos externos de

empresas brasileiras, cobrando juros inferiores aos que

contratariam no exterior; e (d) adquirir debêntures (ou

títulos) do BNDES. As funções (c) e (d) são inovadoras. As

funções (a) e (b) são de todos os fundos soberanos.

Os superávits comerciais com o exterior e o ingres-

so de investimento estrangeiro vinham acelerando a

desvalorização do dólar e piorando a competitividade

dos produtos nacionais no exterior, não obstante a in-

tervenção do Banco Central no mercado de câmbio.

A manutenção de reservas implica elevados custos

fiscais, decorrentes do diferencial entre as taxas bási-

cas de juros interna (captação) e externa (aplicação).

O Fundo Soberano do Brasil (FSB) teria o mérito de in-

fluenciar a cotação e aplicar a moeda estrangeira em

ativos externos mais rentáveis. Dentro de alguns anos

o FSB poderia assumir as características típicas de um

fundo de commodities, acumulando os ingressos da

exportação de petróleo ou derivados, com a entrada

em operação de novos poços do Pré-sal. Mesmo hoje,

os recursos orçamentários para criação do fundo po-

deriam advir das receitas federais de petróleo já ar-

recadadas segundo a legislação vigente (dividendos

da Petrobras, concessões de exploração de petróleo,

royalties por sua exploração e a participação especial

na produção, podendo as porcentagens ser revistas).

O projeto de lei de criação do FSB, tramitando até

agora em regime de urgência constitucional (prazo

de 45 dias em cada Casa para aprovação ou rejeição),

cobre em poucos artigos um vasto espectro de finali-

dades, fontes de recursos e aplicações internas e no ex-

terior, podendo abarcar, naturalmente, o fundo petro-

lífero. Sua fraqueza reside no fato de não lhe estarem

vinculadas fontes específicas de recursos, obrigando-se

a disputar exercício a exercício, de 2009 em diante, do-

tações no orçamento da União.

O PL diz que o fundo deverá promover investimen-

tos em ativos, tanto no Brasil como no exterior; formar

poupança pública; mitigar os efeitos dos ciclos econô-

micos; e fomentar projetos de interesse estratégico do

País localizados no exterior – em apresentação na Co-

missão de Finanças e Tributação10 da Câmara dos De-

putados, em 2 de julho, o Ministro da Fazenda referiu-se

também a apoiar o comércio exterior. A finalidade do

FFIE é praticamente a mesma do FSB.

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O projeto de lei de criação do FSB, tramitando até agora

em regime de urgência constitucional (prazo de

45 dias em cada Casa para aprovação ou rejeição), cobre em poucos artigos um vasto

espectro de finalidades, fontes de recursos e aplicações

internas e no exterior, podendo abarcar, naturalmente, o

fundo petrolífero.

10 http://www.fazenda.gov.br/portugues/documentos/2008/julho/p020708.pdf.

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a

O FSB pode adquirir ativos financeiros externos por

qualquer meio e qualquer fonte de recursos à disposi-

ção do Tesouro, e o FFIE (constituído, presumivelmente,

no Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e

Social), do qual o primeiro será o único cotista, pode ain-

da mais: adquirir quaisquer ativos externos e internos.

O FSB pode, segundo o projeto, mediante emissão de

títulos da dívida pública, no mercado interno ou inter-

nacional, comprar: (a) internamente moeda estrangeira,

para aplicar em ativos financeiros externos, ou qualquer

outro ativo financeiro externo; (b) moeda estrangeira

no exterior, com a mesma finalidade; (c) outros ativos

financeiros externos mediante aplicação em depósitos

especiais remunerados em instituição financeira fede-

ral, supondo-se agência no exterior da dita instituição;

e (d) outros ativos no exterior e internamente, tendo

como intermediário o FFIE (como debêntures em mo-

eda estrangeira ou ações de empresas brasileiras, se

forem estratégicas). Recursos de emissão de títulos só

não podem ser usados para integralização de cotas do

FFIE. O FSB poderá manter seus recursos depositados na

conta única do Tesouro no Banco Central.

A rentabilidade mínima das aplicações em ativos fi-

nanceiros externos será equivalente à Libor de seis me-

ses (era de pouco mais de 3% a.a. antes da crise recente,

estava em cerca de 4,4% a.a. em 10 de outubro). A TJLP

cobrada pelo BNDES é de 6,25%, à qual acrescenta spre-

ad. O PL não esclarece qual a rentabilidade das cotas

do FFIE, a ser definido em estatuto pelo Ministério da

Fazenda.

O FSB seria regulamentado por decreto, ao qual

cabe fixar normas de funcionamento do fundo, em es-

pecial a política de aplicação dos recursos, incluindo

rentabilidade e de risco; e regras de supervisão pruden-

cial, “respeitadas as melhores práticas internacionais”. O

Conselho Deliberativo do FSB, indicado pelo Executivo,

poderá decidir que a União contrate instituição finan-

ceira federal para atuar como agente operador.

Segundo o projeto de lei, a prestação de contas

será feita nos moldes que dispuser o regulamento, suas

demonstrações contábeis e resultados das aplicações

serão elaborados e apurados semestralmente, e o Mi-

nistério da Fazenda encaminhará ao Congresso, com a

mesma freqüência, relatório de desempenho.

O FSB deverá integrar o orçamento fiscal e será cons-

tituído em parte com dotações orçamentárias. Além des-

sas dotações (incluindo recursos da emissão de títulos

do Tesouro) e os resultados das aplicações financeiras

do próprio fundo, completarão os recursos do FSB ações

de sociedade de economia mista federal excedentes ao

necessário para manutenção de seu controle pela União

ou outros direitos com valor patrimonial.

Há promessa na Exposição de Motivos11 que não

encontra respaldo nos dispositivos do PL: a estabiliza-

ção de receitas fiscais no longo prazo, pois não há pre-

visão do resgate das cotas do fundo para retorno como

receita ao orçamento federal e o aumento de despesas

em períodos de desaquecimento, nem seu uso para a

amortização futura da dívida pública.

IV – Mais sobre o modelo brasileiro

Algumas diferenças do modelo brasileiro em relação

a outros fundos soberanos vêm sendo destacadas pe-

los analistas: (a) os outros investem em títulos públicos e

‘‘

‘‘

O FSB pode adquirir ativos financeiros externos por

qualquer meio e qualquer fonte de recursos à disposição

do Tesouro, e o FFIE (constituído, presumivelmente,

no Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social), do qual o primeiro

será o único cotista, pode ainda mais: adquirir quaisquer

ativos externos e internos.

11 Ver em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Projetos/EXPMOTIV/MF/2008/83.htm.

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1�

julho / setembro / 2008

privados ou em ações de empresas estrangeiras e diver-

sificam os riscos. A diversificação do risco não parece ser

a intenção dominante até agora expressa pelo governo,

pois parte do portfólio do FSB será de empréstimos a

empresas brasileiras e aplicação em debêntures emiti-

das pelo BNDES. Se o fundo concentrar seus investimen-

tos em fomento a empresas nacionais, seu risco será o

risco Brasil; (b) o FSB, de início, dependerá de superávit

primário, ou de receitas públicas federais, e não de supe-

rávit nominal. Também, o Brasil não registra mais saldo

positivo em transações correntes. O Brasil é estrutural-

mente deficitário, como mostrou a rápida deterioração

recente do saldo da balança comercial – déficit corrente

de 1,45% do PIB nos 12 meses encerrados em agosto de

2008, depois de cinco anos consecutivos de superávit.

Reservas elevadas não significam “riqueza soberana”.

O aumento das reservas brasileiras deveu-se também à

entrada de capitais que cedo ou tarde fariam e farão o ca-

minho de volta. A EM, na defesa das condições favoráveis

à criação do FSB, substitui a condição de saldo positivo

em transações correntes pela posição do País, de credor

líquido internacional e de grau de investimento.

V – A questão fiscal

Não fosse pela questão fiscal, a recomendação

seria a de o governo investir mais e melhor em infra-

estrutura em vez de aumentar a meta de superávit

primário. A formação bruta de capital fixo no Brasil re-

presenta pouco mais de 17% do PIB, comparados com

pouco mais de 20% da Rússia, mais de 30% da Índia e

mais de 40% da China. De outro lado, a poupança pú-

blica permite que o investimento privado se amplie e

contribua para o aumento dessa taxa.

Para alguns, a persistência em alimentar o fundo

com o superávit primário pode somar mais um fator

para a resistência à queda da carga tributária.

Se a decisão fosse a de aumentar o superávit primá-

rio como instrumento auxiliar no controle da demanda

agregada, a recomendação é de que seja usado para re-

duzir a dívida pública ou para evitar que ela cresça em

razão da colocação de títulos para financiar a compra

de dólares no mercado.

Ao fazer investimentos subsidiados, o fundo deixa de

almejar a rentabilidade mais elevada possível. Existem

nos empréstimos públicos ao setor privado subsídios

implícitos que se escondem “abaixo da linha”, no sen-

tido de que são apurados pelo Banco Central nas es-

tatísticas de finanças públicas mas não transitam pelo

orçamento público. Destacou-se freqüentemente nos

debates sobre o fundo seu custo fiscal elevado. Como o

governo não tem superávits nominais e como os dóla-

res que ingressam na economia não resultam da venda

de uma commodity cuja receita lhe pertença, o Tesouro

terá de aumentar seu endividamento bruto à taxa bási-

ca de juros de 13,75% ao ano para adquirir no mercado

ativos externos e fatalmente terá prejuízo, comparan-

do-se o retorno desses ativos. A rentabilidade dos ati-

vos externos, segundo o projeto, terá como benchmark

a taxa Libor.

Contra-argumentando, por que não se fixa défi-

cit fiscal zero como meta? A resposta é que há outras

prioridades cujos custos de oportunidade são mais al-

tos que a própria taxa básica de juros, incluindo a pró-

pria acumulação e manutenção das reservas (menores

vulnerabilidades a crises externas, risco país e custo de

captação de empresas privadas e fortalecimento do

dólar, como ganhos). Uma alternativa que pode vir a

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Não fosse pela questão fiscal, a recomendação seria a de o governo investir mais e melhor em infra-estrutura em vez de aumentar a meta

de superávit primário. A formação bruta de capital

fixo no Brasil representa pouco mais de 17% do PIB,

comparados com pouco mais de 20% da Rússia, mais

de 30% da Índia e mais de 40% da China.

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a

ser cogitada no novo cenário pós-crise é o de esterilizar

todo o excesso de superávit primário de 2008 e definir

metas iguais ou maiores para 2009 em adiante, e ape-

nas deslanchar as atividades do FSB após o Brasil osten-

tar, por um certo período, saldo fiscal positivo.

V – A questão cambial

O FSB terá ativos financeiros externos. A EM vê nisso

como vantagem a maior transparência na gestão das

reservas internacionais. Essa transparência poderia ser

exigida do Banco Central.

Teria sido descartada a idéia de se vender parte das

reservas oficiais para o fundo, que ficaria restrito a com-

pras no mercado financeiro. As reservas oficiais manter-

se-iam em pelo menos os US$ 200 bilhões de hoje, e

variações posteriores. Eventualmente, esse volume de

reservas pode continuar sendo excessivo para a mera

estabilização da moeda. A informação oficial é de que

a criação do Fundo não interferirá na política de forma-

ção de reservas pelo Banco Central.

O Banco Central não é o único a atuar no mercado

cambial. O Banco Central compra moeda estrangeira

diretamente no mercado mediante leilão, e também o

Tesouro, para atender a algumas das suas obrigações.

Ambos convivem com compradores privados.

Caso persistisse o cenário anterior, o Tesouro passaria

a ser comprador mais ativo para conter a valorização do

real. Ainda assim, as compras pelo FSB teriam início gra-

dualmente, de forma a não causar instabilidade na taxa

de câmbio nem conflitar com a atuação do Banco Central

na administração do regime de câmbio flutuante. No atu-

al cenário, o FSB, se vier a ser criado, terá que se restringir

aos depósitos na conta única e à integralização de co-

tas do FFIE, pois neste momento o dólar, cotado acima

de R$ 2,00, está mais valorizado do que convém para o

atingimento da meta de inflação. Não caberia ao FSB

comprar moeda estrangeira, quando a postura do Ban-

co Central é de venda para baixar sua cotação.

Em quaisquer circunstâncias, a compra de moeda

estrangeira pelo FSB pode simplesmente substituir a

demanda por dólares de empresas brasileiras dispos-

tas a investir e aptas a captar no exterior, que venham a

preferir ir ao BNDES em busca desses recursos mais ba-

ratos. Nesse caso, o efeito da intervenção do Fundo na

taxa de câmbio seria nulo; entretanto, com custo fiscal

para o governo.

VI – Política industrial e papel desenvolvimentista

O Fundo pretende combinar rentabilidade para as

reservas brasileiras acima da remuneração comporta-

da, garantida e líquida de títulos do Tesouro norte-ame-

ricano, com política industrial12, usando o BNDES como

instrumento. Aparentemente, fundo soberano não

existe para dar incentivos porque conflita com o obje-

tivo de obter maior rentabilidade para as reservas. No

entanto, a vocação desenvolvimentista do instrumento

sugere que o retorno do FSB convirja para o mínimo

previsto no projeto de lei e que aumentem os riscos

de recuperação das aplicações, pouco valendo que o

Congresso acompanhe semestralmente a posteriori seu

desempenho. Para que os empréstimos oferecidos pelo

BNDES sejam atraentes, haverá subsídio.

Sabe-se que, em um ambiente normal, as empresas

brasileiras bem administradas não têm dificuldade de

obter o financiamento privado para exportações ou

para investimento no exterior, seja no mercado brasilei-

ro de capitais, seja no BNDES, seja no próprio mercado

internacional. Por outro lado, as empresas brasileiras,

mesmo capitalizadas, vêem hoje incentivo em tomar

empréstimos no BNDES à TJLP de 6,25% a.a. e aplicar a

13,75% a.a. no mercado financeiro interno.

José Fernando Cosentino Tavares Economista e consultor de Orçamento da Câmara dos Deputados

12 Sobre o cabimento de uma “política industrial”, sempre houve críticas quanto à cientificidade dos critérios, se é que há, que levam à escolha dos setores beneficiados, e ao risco de viés político nessa escolha. O Brasil cometeu erros no passado no uso de incentivos fiscais e financeiros, desperdiçando recursos públicos e disseminando privilégios. No caso mais geral da Política de Desenvolvimento Produtivo, ver em http://www.desenvolvimento.gov.br/pdp/public/arquivos/Apresentacao_PDP.pdf o grau de complexidade da iniciativa .

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julho / setembro / 2008

Modernizar a legislação que regula a profissão do economista –

um desafio para muitos

Wellington Leonardo da Silva

Artigo

Talvez muitos economistas não saibam, mas tra-

mita na CAS – Comissão de Assuntos Sociais do Sena-

do Federal, desde 13 de novembro de 2007, o Projeto

de Lei nº 658/07, subscrito pelo Senador Inácio Ar-

ruda. A iniciativa pretendia reformular e modernizar

a legislação reguladora do exercício da profissão de

economista, atualmente definida na Lei nº 1.411/51

e no Decreto nº 31.794/52. Ambos estão bastante de-

fasados em função da crescente complexidade das

relações produtivas no mundo contemporâneo; do

surgimento de novas tecnologias e dos emblemáti-

cos desafios a serem superados pela ciência econô-

mica, a partir das restrições impostas ao desenvolvi-

mento pelo meio ambiente.

O projeto contou, desde a fase de formulação inicial,

com o patrocínio e empenho do Conselho Federal de

Economia e hoje representa verdadeiro desastre para

os economistas. A bem da verdade, ele é cópia imper-

feita de iniciativa anterior patrocinada pela ex-depu-

tada Ieda Crusius, que tramitou sob o nº 7.166/03 na

Câmara dos Deputados e foi arquivado quando o de-

putado-relator, à época, apontou a existência de dois

artigos inconstitucionais.

Ao analisar a versão inicial do PLS 658/07, já se per-

cebe a necessidade de aprimorar a redação de vários

de seus artigos, de forma a explicitar as significativas di-

ferenças entre as atividades exercidas pelos economis-

tas e as que constituem prerrogativas de outras profis-

sões, em especial, a dos contadores e administradores.

Evidente também é a fragilidade da justificativa apre-

sentada pelo autor, na defesa de sua proposição. Em

nenhum momento, o projeto diferencia, por exemplo, a

perícia contábil da perícia econômico-financeira; o pla-

nejamento do desenvolvimento econômico do plane-

jamento de gestão; o arbitramento em questões eco-

nômico-financeiras dos arbitramentos em questões de

caráter civil, trabalhista ou contábil; e a administração

econômico-financeira da administração financeira.

Verificam-se também ausências graves, sendo as

principais: a inexistência de dispositivo capaz de per-

mitir o registro, nos conselhos regionais de economia,

dos doutores em ciências econômicas graduados em

outras ciências, tornando-os aptos a exercer a profis-

são nas áreas em que se tornaram especialistas; a in-

clusão, como atividades privativas dos economistas,

dos estudos e análises técnicas referentes à avaliação

de custos de obras e serviços em processos de licita-

ções e contratos na administração pública federal, es-

tadual e municipal; o estudo, a análise econômica e a

elaboração, na administração pública federal, estadual

e municipal, dos instrumentos de planejamento deter-

minados na Constituição Federal e na Lei de Respon-

sabilidade Fiscal - LRF necessários à elaboração de pla-

nos plurianuais, leis de diretrizes orçamentárias e leis

dos orçamentos anuais; e os estudos, a elaboração de

laudos e pareceres periciais necessários à determina-

ção de valor patrimonial de sociedades anônimas e de

sociedades empresariais.

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a

O Senador Expedito Júnior

Porém, embora imperfeito, o projeto de lei poderia

servir de base para a atualização da legislação atual,

desde que efetuados alguns ajustes. Entretanto, a si-

tuação alterou-se radicalmente quando o Senador

Expedito Júnior, a quem coube a responsabilidade de

relatar o projeto na Comissão de Assuntos Sociais do

Senado, apresentou seu relatório. O documento, além

de demonstrar abissal desconhecimento do que seja

a Ciência Econômica, desfigura o projeto original e re-

vela, explicitamente, interferências constantes, e pou-

co transparentes, de outras categorias profissionais.

Evidências disso são: a substituição da expressão “eco-

nômico-financeira” pela palavra “econômica”, aplicada

a totalidade dos artigos do projeto original, na descri-

ção de várias atividades definidas pela legislação atual

como privativas da profissão de economista; a supres-

são de atividades atualmente privativas dos economis-

tas e a substituição da expressão “atividades inerentes

à profissão do economista” por “atividades facultadas

à profissão de Economista, sem prejuízo de seu exer-

cício por outras profissões regulamentadas”. Passariam

a ser classificadas dessa forma, dentre outras ativida-

des: a formulação, implementação, acompanhamento

e avaliação de planos, programas e projetos de natu-

reza socioeconômica para os setores público, privado,

misto e para o terceiro setor; a elaboração de planos

de desenvolvimento econômico para o setor público;

e os estudos, a elaboração, a análise e a avaliação de

orçamentos públicos e privados.

Representam também grave atentado contra a

profissão, a exclusão de atividades inerentes ao cam-

po profissional do economista, tais como: a realização

de estudos e análises de relações econômicas e finan-

ças internacionais, aduanas e comércio exterior; a for-

mulação, a análise e a implementação de estratégias

empresariais e de concorrência; os estudos e análises

de custos, formação de preços e de demonstrações

financeiras de empresas públicas e privadas, mistas e

do terceiro setor; e o planejamento, formulação, imple-

mentação, acompanhamento e análise nos campos da

política tributária e das finanças públicas.

O que denominamos de interferências constantes e

pouco transparentes de outras categorias no processo

de elaboração do texto do relator acha-se registrado,

explicitamente, nas justificativas das emendas por ele

apresentadas. Ali são recorrentemente mencionados

contadores e administradores como seus inspiradores

originais. Outro aspecto importante a corroborar essa

dedução foi a realização de apenas uma audiência pú-

blica para a discussão da proposta, com a participação

de representantes das categorias profissionais nele in-

teressadas.

A partir de relatório tão desfavorável, os Conse-

lhos Regionais do Distrito Federal, Rio de Janeiro, São

Paulo, Rio Grande do Sul, Minas Gerais e Bahia estabe-

leceram interlocução com vários senadores, obtendo

como resultado concreto a determinação de que o

projeto de lei fosse submetido à análise complemen-

tar nas Comissões de Educação e de Assuntos Econô-

micos do Senado, por iniciativa do Senador Cristovam

Buarque, atual presidente da primeira delas. Isso re-

presentou, naquele momento crucial, a possibilidade

de interação com maior número de parlamentares, a

reabertura e ampliação das discussões sobre a matéria

e, fundamentalmente, a obtenção de tempo para apre-

sentação de emendas destinadas a aprimorar o PLS.

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‘‘

Representam também grave atentado contra a profissão, a exclusão de

atividades inerentes ao campo profissional do economista,

tais como: a realização de estudos e análises de relações econômicas e finanças internacionais,

aduanas e comércio exterior; a formulação, a análise e a

implementação de estratégias empresariais etc.

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julho / setembro / 2008

O novo cenário, apesar de melhor, quando conside-

ramos o risco da aprovação das alterações promovidas

pelo relator, era o possível naquele momento, mas não

garante solução satisfatória para o problema, mesmo

considerando a hipótese de acatamento de nossas con-

tribuições por parte dos novos relatores do projeto, na

medida em que o rito legislativo prevê o retorno do PLS

à Comissão de Assuntos Sociais, onde se iniciou sua tra-

mitação. Quando isso ocorrer, os novos relatórios serão

confrontados com o do Senador Expedito Júnior, apoia-

do pelas representações institucionais das categorias

profissionais que pretendem ampliar seus espaços de

atuação no mercado de trabalho, a custa de prejuízos aos

economistas. Nesse sentido, foi sintomática a comemora-

ção precoce dos contadores, em seus meios de comuni-

cação, dando conta da vitória parcial obtida sobre nossa

categoria a partir do texto apresentado pelo relator.

Onde erramos?

A essa altura dos acontecimentos cabe indagar onde

erramos na condução do processo. Em minha opinião,

houve várias falhas, sendo a mais importante a imper-

feita leitura, por parte do Conselho Federal, do cenário

político atual relacionado com o mundo do trabalho

no Brasil. Essa análise revela ser predominante, tanto no

setor público quanto no privado, o desejo de promover

a redução e a fragilização, drásticas, da regulamentação

de atividades profissionais. No setor público isso é facil-

mente verificável, se considerarmos o número de ações

judiciais impetradas pelos conselhos de fiscalização pro-

fissional cujos réus são empresas estatais e órgãos de go-

verno, por conta de tentativas de burlar a desatualizada

legislação em vigor, quando da promoção de concursos

públicos. Aliás, o próprio Presidente da República vatici-

nou recentemente o fim da era dos economistas – que

planejariam demais em sua opinião – e a prevalência,

sobre esses, dos engenheiros, profissionais cuja disputa

por espaço no campo da ciência econômica também

vem crescendo nos últimos anos. Agregue-se a isso o ab-

soluto menosprezo da capacidade de mobilização e ar-

ticulação dos profissionais que disputam conosco, legi-

timamente ou não, postos de trabalho. Esse aspecto, em

particular, é revelado pela ausência de planejamento es-

tratégico adequado, desde a fase de formulação do PLS,

no qual estivessem definidas ações capazes de mobilizar,

integrar e organizar os economistas e as entidades que

os representam na defesa de seus interesses e, sobretu-

do, para o exercício de legítima pressão política durante

a tramitação do projeto no ambiente legislativo.

Merece destaque a ausência de participação, que

deveria ter sido emulada pelo Conselho Federal, da

Ange – Associação Nacional dos Cursos de Graduação

em Economia e da Anpec – Associação Nacional dos

Centros de Pós-graduação em Economia, principais

responsáveis pela reformulação das diretrizes curri-

culares junto ao Ministério da Educação e Cultura – e

que trabalharam em conjunto com o Conselho Federal

e os conselhos regionais de economia naquela opor-

tunidade – nas fases de formulação e, principalmente,

justificação do projeto. A principal razão pela qual o

economista se diferencia dos profissionais que buscam

usurpar-lhe espaço é a qualidade de sua formação aca-

dêmica, cujo conteúdo é de amplo domínio dessas en-

tidades e poderia ser utilizado na justificativa do PLS.

Além disso, a participação direta de profissionais

vinculados a nichos de atuação específicos, como a

‘‘

‘‘

Houve várias falhas, sendo a mais importante a imperfeita leitura, por

parte do Conselho Federal, do cenário político atual relacionado ao mundo do trabalho no Brasil. Essa análise revela ser

predominante, tanto no setor público quanto no privado,

o desejo de promover a redução e a fragilização,

drásticas, da regulamentação de atividades profissionais.

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a

de perito judicial e árbitro em questões econômico-fi-

nanceiras, teria sido de grande valia na construção da

argumentação de sustentação da inclusão dessas ativi-

dades no projeto. Importante registrar, para descartar o

argumento de que se buscou promover a participação

dos conselhos regionais, a impossibilidade de lograr-se

êxito na execução dessas complexas articulações, quan-

do as iniciativas a eles delegadas foram subordinadas a

prazos que chegavam, às vezes, a incríveis 48 horas.

Representação em plenário

Por último, merece destaque outro grave equívoco

cometido pelas duas últimas direções do Conselho Fe-

deral quando assumiram postura egocentrista e açoda-

da ao desencadear movimentos destinados a acelerar

a tramitação do projeto. Essa atitude, provavelmente,

deu-se em função da urgência, de alguns de seus mem-

bros, em ver consignados em lei aspectos vinculados

à representação dos economistas no plenário daquela

instância. A esse respeito cumpre observar que os ar-

tigos referentes ao tema, incluídos no projeto de lei,

representam grave afronta à intenção do último legis-

lador que tratou do tema, qual seja, a de garantir re-

presentação proporcional ao número de economistas

registrados em situação regular perante cada conselho

regional. Por oportuno, esse aspecto nos remete a pro-

blema de outra natureza, pois, como é de domínio pú-

blico, existem pareceres, em mais de uma instância dos

poderes executivo e legislativo, nos quais se aponta a

inconstitucionalidade desses dispositivos, se origina-

dos no Congresso Nacional, por serem prerrogativas da

Presidência da República quaisquer definições ou alte-

rações referentes à estrutura das autarquias especiais.

São assim classificadas: a duração de mandatos de pre-

sidente, vice-presidentes e dos conselheiros federais; as

formas de eleição; e a composição do plenário.

Estratégias possíveis

Em que pese todo esse quadro adverso, ainda existe

uma proposta tramitando, em relação à qual é imperio-

so agir, sob pena de passarmos a ter instrumento regu-

lador da profissão de pior qualidade do que a legisla-

ção hoje em vigor. Nesse sentido, passamos a propor

e analisar, ainda que preliminarmente, três estratégias

alternativas a adotar. A formulação de cada uma delas

parte de três premissas, a saber: a) viabilidade política

da aprovação de projeto de lei, condizente com a ne-

cessidade de atualização de nossa legislação, princi-

palmente, em função da atual visão do governo fede-

ral e, portanto, de sua base parlamentar no Congresso

Nacional, sobre a regulamentação de profissões; b)

nossa capacidade de mobilizar os economistas e suas

entidades representativas na elaboração de emendas

e/ou proposta alternativa à que se encontra em curso

e de mantê-los engajados em sua defesa durante sua

tramitação; c) análise da correlação de forças existente

entre nossa categoria e as dos demais interessados no

assunto, em que se destacam administradores, conta-

dores, engenheiros e advogados.

A primeira delas, a mais adequada em nossa opi-

nião, seria solicitar ao Senador Inácio Arruda a retira-

da do projeto por ele patrocinado, por conta de sua

absoluta descaracterização a partir do texto do rela-

tor. Sua principal vantagem consiste em permitir a re-

avaliação da oportunidade política de submetermos

‘‘

‘‘

A participação direta de profissionais vinculados a nichos de

atuação específicos, como a de perito judicial

e árbitro em questões econômico-financeiras,

teria sido de grande valia na construção

da argumentação de sustentação da inclusão

dessas atividades no projeto.

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25

julho / setembro / 2008

à apreciação do legislativo demanda voltada à atu-

alização de nossa legislação, consideradas as atuais

concepções dos poderes executivo e legislativo so-

bre regulamentação profissional. Caso concluíssemos

pela existência de alto risco de redução de nosso

campo de atuação profissional, abandonaríamos a

iniciativa e passaríamos a emitir resoluções, com base

na legislação em vigor, detalhando as prerrogativas

dos economistas. Importante sublinhar a farta gama

de possibilidades para o sucesso dessa iniciativa, se

considerarmos a amplitude da redação do artigo que

trata do exercício da profissão do economista, consig-

nada no Decreto nº 31.794/52, em que consta:

A atividade profissional privativa do economista

exercita-se, liberalmente ou não, por estudos, pesquisas,

análises, relatórios, pareceres, perícias, arbitragens, lau-

dos, esquemas ou certificados sobre os assuntos com-

preendidos no seu campo profissional, inclusive por

meio de planejamento, implantação, orientação, super-

visão ou assistência dos trabalhos relativos às ativida-

des econômicas ou financeiras, em empreendimentos

públicos, privados ou mistos, ou por quaisquer outros

meios que objetivem, técnica ou cientificamente, o au-

mento ou a conservação do rendimento econômico.

No caso de recusa, por parte do autor, de retirar

seu projeto, a segunda opção estratégica seria solici-

tar ao Senador Expedito Júnior que abdicasse de seu

relatório, devolvendo ao projeto sua condição inicial,

a partir da qual operaríamos para incluir alterações

capazes de aprimorá-lo. Se porventura também essa

alternativa viesse a inviabilizar-se, iniciaríamos a ela-

boração de um substitutivo ao PLS capaz de atender

a nossas necessidades.

No cenário em que só nos restassem a elaboração

de emendas ou de um substitutivo, tais iniciativas

seriam precedidas de amplo debate com os econo-

mistas e suas entidades representativas – sem o aço-

damento vigente, mesmo após o desastre em que se

transformou o PLS – e, sobretudo, de sua mobilização

para a defesa de nossas propostas no âmbito legisla-

tivo, em contraponto às pressões das demais catego-

rias profissionais. Elas não cessarão; ao contrário, ten-

dem a se intensificar. A execução dessas estratégias,

se não forem capazes de nos assegurar êxito pleno,

ao menos nos garante a incorporação de muitos na

execução da tarefa, com alguma chance de reduzir a

dimensão da derrota que se avizinha.

Wellington Leonardo da Silva

Diretor do Sindicato dos Economistas do Estado do Rio de Janeiro e Secretário Executivo do Conselho

Regional de Economia do Estado do Rio de Janeiro

‘‘‘‘

A atividade profissional privativa do economista exercita-se, liberalmente ou não, por

estudos, pesquisas, análises, relatórios, pareceres, perícias,

arbitragens, laudos, esquemas ou certificados sobre os

assuntos compreendidos no seu campo profissional, inclusive por meio de planejamento,

implantação, orientação, supervisão ou assistência dos

trabalhos relativos às atividades econômicas ou financeiras,

em empreendimentos públicos, privados ou mistos,

ou por quaisquer outros meios que objetivem, técnica ou

cientificamente, o aumento ou a conservação do

rendimento econômico.

(Decreto nº 31.794/52)

Economistas reivindicam revisão de sua legislação

A Lei nº 1411, de 1951 – um histórico

Criada há 57 anos, a lei federal nº 1.411/51 criou e

regulamentou a profissão do economista. A lei também

regulamentou o Conselho Federal de Economistas Profis-

sionais (CFEP) e Conselhos Regionais de Economistas Pro-

fissionais (CREP) que, constituídos autarquia vinculada ao

Ministério do Trabalho, iria fiscalizar, orientar e disciplinar

o exercício da profissão. As atribuições destes Conselhos

Regionais e do Conselho Federal, a constituição de suas

rendas, a expedição da carteira profissional e penalidades

às infrações também foram objeto de apreciação da lei,

sancionada por Getúlio Vargas.

Naquela época, em 1951, regulamentar a profissão

significou o reconhecimento da cidadania, pois a lei, ba-

seada no Decreto-lei nº 5.452 de 1º de maio de 1943, de

Consolidação das Leis do Trabalho, foi ao encontro da po-

lítica econômico-social do pós-30, solidamente institucio-

nalizada e que vigeu até o movimento de 1964. A política

implementada logo no início do Estado Novo reconheceu

o direito dos cidadãos através do reconhecimento do

direito das profissões. E as profissões existiam via regula-

mentação estatal.

No ano seguinte, em 17 de novembro de 1952, o de-

creto nº 31.794 dispõe sobre a regulamentação da profis-

são do economista. Em essência, este decreto, assinado

por Getúlio e seu ministro de Estado dos Negócios de

Trabalho, Indústria e Comércio, Segadas Viana, detalha e

aprofunda as determinações contidas na Lei nº 1.411/51.

Em 12 de setembro de 1968 é aprovado pela resolu-

ção nº 283 o Código de Ética Profissional do Economista.

O seu artigo primeiro esclarece que: “O Código de Ética

Profissional do Economista tem por objetivo indicar nor-

mas de conduta que devem inspirar as atividades profis-

sionais, regulando suas relações com a classe, os poderes

públicos e a sociedade”. Assim o Código prevê os deveres

fundamentais dos economistas bem como as atitudes

que contrariam a ética profissional, além de reger sobre os

honorários do trabalho do economista, as relações entre

os colegas, os procedimentos no setor público e privado.

por Daniela Lima

Em tramitação no Congresso Nacional, o Projeto de Lei nº 658/2007, de autoria do senador Inácio Arruda, trata da modificação da lei nº 1.411, de 13 de agosto de 1951, que pretende “atualizar a regulamentação do exercí-cio da profissão e dá outras providencias”.

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26

Economistas reivindicam revisão de sua legislação

Outras leis e resoluções irão alterar alguns dispositi-

vos da Lei nº 1.411, de 13/8/51, mas sempre a utilizando

como parâmetro, mantendo a sua essência. A exemplo:

a Lei nº 6.021/74, altera dispositivo da Lei nº 1.411; a Lei

nº6.206/75 atribui valor de identidade às carteiras emiti-

das pelos conselhos de fiscalização profissional; a Lei nº

6.537/78 altera dispositivo da Lei nº1.411.

Em 2002, a economista e atual governadora do Rio

Grande do Sul Yeda Crucius (PSDB/RS) foi a autora do Pro-

jeto de Lei 7.166, que atualiza a Lei n° 1.411, com as altera-

ções introduzidas pelas Leis nos 6.021/74 e 6.537/78, que

dispõem sobre a profissão de Economista.

As modificações servem para adequar a 1.411 às dife-

rentes conjunturas. A lei segue, assim, as constantes mu-

danças que marcam a segunda metade do século.

Projeto de Lei em tramitação no Congresso desagrada

economistas

Em tramitação no Congresso Nacional, o Projeto de Lei

nº 658/2007, de autoria do Senador Inácio Arruda, trata

da modificação da Lei nº 1.411, de 13 de agosto de 1951,

que pretende “atualizar a regulamentação do exercício da

profissão e dá outras providências”. Entretanto, segundo

a categoria dos economistas, o PL contém falhas e neces-

sita de uma profunda discussão entre os economistas e

o Conselho Federal de Economia (Cofecon). Situação que

se agravou após a apresentação do relatório do Senador

Expedito Júnior (PR/RO), a quem coube a relatoria do pro-

jeto na Comissão de Assuntos Sociais do Senado Federal.

Os economistas preocupados com o andamento

deste projeto reuniram-se em Brasília nos dias 15 e 16 de

setembro para debater sobre a situação deste PL. O presi-

dente do Corecon/SP, Waldir Pereira Gomes, ressaltou que

a revisão da legislação é uma ambição antiga da categoria,

mas critica este PL 658. “O relator descaracterizou o nosso

projeto, razão pela qual nos posicionamos contra. É uma

ambição do economista colocar de forma clara na lei que

os doutores em economia pudessem ter seu registro e

que ficasse bem explicado na legislação quais são nossas

competências, qual nosso campo de atuação, sem entrar

em confronto com outras categorias” disse.

De acordo com o economista do Corecon/RJ, João

Manuel Gonçalves Barbosa, o projeto, nas mãos do rela-

tor foi substancialmente modificado. “O Projeto na forma

em que se encontra exclui de nosso campo de trabalho

atribuições que, inclusive, já se encontravam assegura-

das na lei em vigor, atribuindo atividades próprias dos

Economistas aos Contadores. As áreas compartilhadas

devem ser tratadas com respeito e especificidade. A

profissão do economista tem uma formação muito es-

pecífica, é rica em conteúdo social e científico do que

as categorias aplicativas como contabilidade – aplica-

tivos de saber. Respeitando isso, é nos dado à questão

27

julho / setembro / 2008

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de análise e projeções com mais conteúdo científico.

Os contadores e administradores trabalham mais com

especificidade – aplicativos de normas e técnicas –, os

economistas trabalham mais com formulação de técni-

cas. Dá para conviverem juntos, desde que se respeite à

especificidade de cada um, disse”.

O economista fala ainda sobre os artigos que tratam

da estrutura administrativa do Cofecon. “O Projeto procu-

ra legitimar uma composição discriminatória de Plenário,

uma vez que a forma como a questão está prevista no

projeto leva à inaceitável situação, em que conselhos cujo

número de economistas, efetivamente inscritos, alcan-

çam apenas duas e até meia centena de profissionais, que

estejam representados naquela instância com o mesmo

peso daqueles nos quais, de um a três mil economistas

se acham inscritos, contrariando a intenção do legislador

que tratou do tema, ou seja, garantir a representação pro-

porcional”.

Osmar Sepúlvida, economista do Corecon/BA e con-

selheiro do Cofecon, também mostrou insatisfação com

o Projeto, e explicou: “o que esperávamos de novidade

no projeto de lei era separar atividades que são privati-

vas dos economistas daquelas que ele compartilha com

outras profissões, que convive no mercado com outros

profissionais. Essa distinção do que é privativo e do que é

compartilhado com outros profissionais não existe na lei

original; a lei original cria a profissão de economista, diz

o que é a profissão, mas não dá uma idéia exata de quais

são as atividades que o economista exerce. Para o econo-

mista, o relator transformou um projeto do Cofecon, pois

segundo ele os economistas não participaram do debate

em um projeto dos conselhos regionais de contabilidade,

“o que está hoje em discussão e que está para ser votado

no Senado é um projeto que nasceu como dos economis-

tas e que hoje é um projeto dos contadores, pois tira as

atividades do economista e coloca como se fosse dos con-

tadores, de forma absurda, pois um contador não pode ter

capacidade maior de fazer planejamento governamental

do que um economista, que foi treinado para isso, pois ele

entrou na universidade e aprendeu a doutrina econômica,

a teoria da economia, o funcionamento histórico da eco-

nomia para fazer o planejamento”, declara o economista.

Falhas no Projeto de Lei

O secretário-executivo do Corecon/RJ, Wellington

Leonardo, analisa dois pontos do PL: o projeto traz para

a legislação superior o que hoje consta apenas nas re-

soluções do sistema, ou seja, o que seriam as atividades

privativas e o que seriam as atividades inerentes; e que o

sistema poderia detalhar cada uma dessas atividades por

meio de resoluções. As falhas são graves. “Em primeiro lu-

gar o Projeto pega das resoluções do Conselho Federal as

atividades que anteriormente eram privativas e as torna

inerentes, quando a torna inerente é no sentido de que

outras profissões podem fazê-las, então o planejamento

estratégico nas áreas de desenvolvimento econômico pú-

blico foi alvo deste tipo de remanejamento. Isso é muito

ruim. Você acaba deixando atividades que centralmente

seriam dos economistas ao sabor da vontade do admi-

nistrador, ou quem for o mandatário de plantão, tanto na

área pública como na privada”.

Leonardo explica a importância para a sociedade da

execução de determinadas atividades por economistas.

“Queremos assegurar que a execução de determinada

atividades, na promoção de estudos, análise e avalia-

ções seja feita por economista. Essa questão interessa

a sociedade, pois quando o mau economista, ou o não-

economista que não tem o ferramental necessário para

estabelecer um plano de desenvolvimento regional, por

exemplo, se for realizá-lo, pode fazê-lo de maneira incor-

reta, ineficaz, ineficiente, insuficiente e quem vai acabar

penalizado é a sociedade. Investimentos são feitos a partir

O que esperávamos de novidade no projeto de lei era

separar atividades que são privativas dos economistas

daquelas que ele compartilha com outras profissões.

Osmar SepúlvidaCorecon/BA

‘‘ ‘‘2�

2�

julho / setembro / 2008

dessas definições. E se o plano não está bem elaborado,

se não é consistente, estes investimentos se perderão, e

a sociedade terá que investir novamente em outro mo-

mento”, conclui.

A preocupação de conselheiros e representantes de

vários Corecon’s sobre a necessidade de alterações no PL

658/2007 é evidente. Desta maneira foi elaborada durante

o Seminário sobre a revisão da legislação que ocorreu em

“No decorrer da história brasileira, os econo-

mistas tiveram um papel muito importante no de-

senvolvimento da economia brasileira e da própria

sociedade brasileira. Nessa luta que tivemos como

profissionais para contribuir para o governo e com

a própria sociedade para modificar o Brasil, tirar o

Brasil de um modelo de sociedade agrária expor-

tadora para um modelo de sociedade moderna e

industrial, convocamos outros profissionais e ensi-

namos a eles a nossa profissão, foi o caso dos ad-

vogados, médicos, engenheiros, etc. Precisávamos

contar com eles, pois o País não tinha o número

de economistas suficientes para tocar esse grande

projeto do desenvolvimento brasileiro. Quando

treinamos esses profissionais, mostramos a eles um

mercado que não era o nosso mercado cativo, pois

a lei não o define como cativo nosso; então cria-

mos nosso próprio problema quando convocamos

outros profissionais e passamos a eles o nosso co-

nhecimento sobre desenvolvimento, planejamento

econômico, análise de mercado. Fizemos tudo isso

para o bem do País. O novo projeto de lei era para

nos defender ou defender o nosso mercado do

que outros profissionais fizeram. No início compar-

tilhamos com eles o mercado, agora eles querem

impedir que utilizemos certas áreas de mercado,

alegando que é particular deles, como é o caso dos

contadores, administradores, e em alguns mo-

mentos dos próprios advogados. Não podemos

impedir que outros profissionais exerçam ativi-

dades que os ensinamos, mas eles querem nos

impedir de exercer atividades que são da nossa

própria profissão. Esse é o principal problema

que estamos vivendo no mercado hoje. As prin-

cipais áreas que podem ser compartilhadas são:

perícia, recuperação de empresas, análise de ba-

lanços e de situações patrimoniais das empre-

sas. O orçamento público, de certa forma, não

podemos fazer sozinhos, fazemos a política or-

çamentária, a política fiscal, da qual resulta o or-

çamento, mas a parte contábil do orçamento, da

execução orçamentária são de responsabilidade

dos contadores. Tem áreas que compartilhamos

com outros profissionais, mas existem áreas que

são nossas, e eles não podem impedir que sejam

nossas.” Osmar Sepúlvida – Corecon/BA

Atividades compartilhadas

setembro, em Brasília, uma “Carta de Brasília” (veja p. 51)

com o registro das principais questões discutidas duran-

te o evento. O Cofecon também realizou uma reunião em

São Paulo sobre o andamento do Projeto de Lei de Atua-

lização da Profissão do Economista. Ficou pautada nesta

reunião a organização de debates nas regiões que se dis-

puserem a investir neste processo.

Fonte: Corecon/DF; Corecon/MG; Corecon/RJ

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Artigo

Introdução

O Brasil se constituiu, desde a segunda metade do

século 20, numa das principais economias da periferia

do sistema capitalista mundial. Devido às suas grandes

dimensões territorial e populacional, à complexidade

de sua sociedade e às condições históricas e peculiares

do desenvolvimento de “seu” capitalismo, o país cons-

truiu ao longo dessas últimas décadas uma das maio-

res desigualdades espaciais do planeta.

A questão regional começou a ser efetivamente discu-

tida no Brasil na década de 1950, suscitada principalmente

por Celso Furtado e Josué de Castro ao defenderem uma

estratégia específica voltada para a superação do subde-

senvolvimento daquela considerada a “região problema”

do país, a Região Nordeste. Data desta época a criação das

superintendências de Desenvolvimento Regional (Sude-

ne, Sudam, Sudesul e Sudeco) e das instituições regionais

de fomento (BNB, Banco da Amazônia e BRDE). Também

foram criadas companhias regionais de desenvolvimento,

a exemplo da Companhia do Desenvolvimento do Vale

do São Francisco (Codevasf), assim como programas re-

gionais, como o Polocentro e Polonoroeste.

Durante muito tempo, entretanto, fez-se no Brasil

apenas a leitura macrorregional da desigualdade es-

pacial, sendo as disparidades intramacrorregionais ab-

solutamente desconsideradas pela administração pú-

blica, assim como, de certa forma, pela academia. Mais

recentemente, as fragmentadas políticas regionais do

Governo FHC, expressas nos programas “Brasil em Ação”

e “Avança Brasil”, limitaram-se a uma proposta de articu-

lação de alguns poucos eixos dinâmicos do território na-

cional aos centros de comando da economia mundial.

No vácuo da ausência de políticas/ações de desen-

volvimento regional, prosperou o que ficou conheci-

do como “Guerra Fiscal”, onde os estados/municípios

disputavam os investimentos privados oferecendo

uma ampla gama de subsídios e isenções fiscais (efe-

tivamente, renúncia fiscal), e que causaram um enorme

prejuízo às suas finanças.

Nos últimos anos, tem prosperado uma discussão

mais abrangente da questão regional, abordando não

apenas os espaços macrorregionais, mas, de forma es-

pecial, os espaços subestaduais. De outro lado, tem sido

ressaltada a importância desempenhada pelos gran-

des centros urbanos regionais para o sucesso da imple-

mentação de ações de desenvolvimento regional.

O precursor de todos os estudiosos da questão

regional, Christaller, já na terceira década do século

passado, com a sua conhecida Teoria das Localidades

Centrais, afirmava que determinados centros urbanos,

ao assumirem funções centrais na produção e na dis-

tribuição de bens e serviços a uma determinada região

de influência (seu hinterland), induziam à organização

de um sistema hierarquizado de cidades, destacando o

papel de centralidade dos núcleos urbanos.

Mapa da desigualdade espacial da renda no Brasil

Júlio Miragaya (coordenador)Marco César Araujo Pereira

Carlos Henrique RosaPatrícia Guedes da Silva

30

31

julho / setembro / 2008

Posteriormente, Perroux (1966) desenvolveu o con-

ceito de região polarizada, partindo do conceito eco-

nômico de espaço, em que ele é expressão da inter-

dependência existente entre as diversas áreas, a partir

da irradiação da influência comercial. Na mesma linha,

Kayser (1996) destacava que cada região se organiza

em torno de um centro, que pode ser chamado de pólo

(ou de nó). Centro que não somente polariza a região

em torno de si, como também domina e orienta a vida

econômica da sua área de influência, ou seja, a cidade

comanda, por mecanismos bem conhecidos, o espaço

que a cerca, articulando as relações econômicas, admi-

nistrativas, sociais, demográficas e políticas.

Benko (1996) aprofunda essa análise ao afirmar que

na nova divisão espacial e internacional do trabalho –

introduzida pela empresa multinacional – as atividades

de alta tecnicidade e as funções direcionais são reser-

vadas às regiões centrais, ao passo que as repetitivas,

pouco qualificadas e que requerem considerável mão-

de-obra se vêem relegadas à periferia.

Em suma, a atual dinâmica de alocação espacial das

atividades produtivas está cada vez mais associada aos

interesses das grandes corporações, com forte tendên-

cia de acentuarem a concentração espacial da renda e

da riqueza. Espaços econômicos são constituídos e des-

constituídos em ritmos cada vez mais acelerados, de-

mandando ações cada vez mais efetivas por parte do

Estado para atenuarem seus efeitos nocivos.

Atento a esta situação, logo que assumiu em 2003,

o governo federal atribuiu à Secretaria de Políticas de

Desenvolvimento Regional (SDR), do Ministério da In-

tegração Nacional, a tarefa de elaborar uma Política

Nacional de Desenvolvimento Regional (PNDR), que

minimamente enfrentasse esse desafio.

Deve-se reconhecer o esforço despendido pelo go-

verno federal em 2003/2004, liderado pelo Ministério

da Integração Nacional, no sentido de aprovar o Fundo

Nacional de Desenvolvimento Regional (FNDR), que te-

ria um considerável volume financeiro para ser investi-

do nas regiões mais pobres e estagnadas, com base nos

critérios formulados pela PNDR. Lamentavelmente, en-

tretanto, o FNDR até hoje não foi aprovado, muito em-

bora tenha reaparecido as chances de sua aprovação.

Ocorre que, não obstante a implementação de polí-

ticas e ações voltadas para a redução das disparidades

regionais ao longo dos últimos cinqüenta anos, muito

pouco se avançou na resolução da desigualdade espa-

cial no Brasil.

O “Mapa da Desigualdade Espacial da Renda no Brasil”

apresenta este quadro de profunda desigualdade na dis-

tribuição espacial da renda nacional.

Os dados são apresentados na escala subestadual,

considerando as chamadas Regiões Estaduais de Pla-

nejamento (REP).

Foram adotados dois indicadores principais: o ta-

manho da renda per capita e o ritmo de crescimento da

renda na região.

Para identificar o nível de renda, adotou-se o PIB per

capita trienal (a preços de 2007 deflacionados pelo de-

flator implícito nacional) e para identificar o grau de di-

namismo, adotou-se a taxa de crescimento geométrico

do PIB per capita entre os triênios 1999/2001 (conside-

rando ser 1999 o primeiro ano com informações sobre

os PIB municipais) e 2003/2005 (considerando ser 2005 o

último ano com informações sobre os PIB municipais).

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‘‘

A dinâmica de alocação espacial das atividades

produtivas está cada vez mais associada aos interesses

das grandes corporações, com forte tendência de

acentuarem a concentração espacial da renda e da riqueza.

Espaços econômicos são constituídos e desconstituídos

em ritmos cada vez mais acelerados, demandando

ações mais efetivas por parte do Estado para atenuarem

seus efeitos nocivos.

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CLASSIFICAÇÃO DAS PRIORIDADES PARA IMPLEMENTAÇÃO DE AÇÕES DE DESENVOLVIMENTO REGIONAL:

A PRIORIDADE MÁXIMA renda baixa com tendência de estagnação/regressão

B.1 PRIORIDADE ALTA 1 renda baixa, com tendência de baixo crescimento B.2 PRIORIDADE ALTA 2 renda média, com tendência de estagnação/regressão

C.1 PRIORIDADE MÉDIA 1 renda baixa, com tendência de forte crescimento C.2 PRIORIDADE MÉDIA 2 dinamismo médio mantém renda média C.3 PRIORIDADE MÉDIA 3 baixo dinamismo pode reduzir a renda

D.1 PRIORIDADE BAIXA 1 renda média, com tendência de forte crescimento D.2 PRIORIDADE BAIXA 2 renda alta, com tendência de baixo crescimento

E SEM PRIORIDADE dinamismo alto tende a elevar a renda

A adoção do PIB como variável básica para aferição

do nível da renda regional implica vantagens e desvan-

tagens. A principal vantagem é que o IBGE disponibi-

liza anualmente, desde 1999, o PIB para a totalidade

dos municípios brasileiros, o que permite a atualização

anual do “Mapa”. A desvantagem é que a base de dados

disponível (1999 a 2005) permite gerar uma série his-

tórica ainda muito curta, impedindo uma análise mais

apurada do ritmo de crescimento das regiões.

A opção por médias móveis trienais é justificada

pelo fato de atenuar as fortes oscilações de ano para

ano, comuns na apuração dos PIB municipais.

Já o critério adotado para a classificação das regiões

quanto ao nível de renda e de dinamismo foi o posicio-

namento em relação à média nacional. No caso de nível

de renda, foram classificadas como de alta renda aque-

las regiões com PIB per capita acima da média nacional;

como de média renda aquelas entre a média nacional

e 50% de seu valor e como de baixa renda, as regiões

com PIB per capita abaixo de 50% da média nacional.

Em relação ao grau de dinamismo, foram classifi-

cadas como dinâmicas as regiões com taxa de cresci-

mento do PIB per capita acima de 150% da taxa média

nacional, como de médio dinamismo aquelas com

RENDA (PIB PER CAPITA)

BAIXA< 50% da média nacional

MÉDIAEntre 50% e 100% da média nacional

ALTA> 100% da média nacional

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Alta Renda e Médio Dinamismo

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Baixa Renda e Alto Dinamismo

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Média Renda e Alto Dinamismo

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Alta Renda e Alto Dinamismo

(E)

Quadro 1: Quadro-resumo da Tipologia

32

33

julho / setembro / 2008

taxas de crescimento entre 150% e 50% da taxa média

nacional, e, estagnadas, as regiões com taxa de cresci-

mento inferior a 50% da taxa média nacional.

Deve-se ressaltar que o período considerado

(1999/2001 a 2003/2005) é ainda bastante curto para

que se possam tirar conclusões definitivas sobre o grau

de dinamismo das diferentes regiões.

O Quadro 1 apresenta de forma resumida a tipolo-

gia adotada e que será abordada em detalhes no Capí-

tulo 3 do Estudo.

Análise do “Mapa da Desigualdade Espacial”

As Figuras apresentadas neste capítulo explicitam a

profunda desigualdade espacial em nosso país. Observa-

se, em quase todos os mapas apresentados, uma visível

divisão do Brasil em duas grandes regiões, o Centro-Sul,

englobando as Regiões Sudeste, Sul e Centro-Oeste, e o

Norte-Nordeste, abarcando as Regiões Norte e Nordeste.

A Figura 1 apresenta o PIB per capita médio do tri-

ênio 2003/2005 considerando os três valores de corte

adotados na tipologia.

Pode-se observar que as regiões de alta renda têm

uma fortíssima concentração no chamado Centro-Sul

do país. A partir da região metropolitana de São Paulo,

centro dinâmico da economia nacional, identificam-

se três vertentes de alta renda: a) em direção ao norte

paulista, envolvendo o Triângulo Mineiro e o sul goiano

e o Distrito Federal e alcançando as ricas regiões graní-

feras do Mato Grosso; b) na direção sul, envolvendo o

leste e sul paranaense, o nordeste e oeste catarinense,

alcançando o centro-norte do Rio Grande do sul; c) em

direção ao Vale do Paraíba paulista e fluminense, abar-

cando todo o litoral do Rio de Janeiro e o litoral sul capi-

xaba. Na porção Norte-Nordeste, as áreas de alta renda

limitam-se às regiões de Manaus, Salvador e Aracaju.

Todo o restante do Centro-Sul situa-se na condição

de média renda, com exceção de duas regiões do norte

de Minas Gerais, de duas pequenas regiões capixabas e

do Entorno do Distrito Federal. Já no Norte-Nordeste do

país, são poucas as regiões de média renda, prevalecendo

amplamente aquelas classificadas como de baixa renda.

A Figura 2 apresenta o mesmo dado ampliando os

valores de corte para seis. As regiões com PIB per capita

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acima de 150% da média nacional são em número re-

duzido, envolvendo os principais centros industriais do

país e os principais centros do agronegócio.

Pode-se observar, contudo, que as regiões com ren-

da abaixo de 25% da média nacional ainda são nume-

rosas, com forte concentração no Norte-Nordeste.

A Figura 3 apresenta a taxa de crescimento médio

geométrico do PIB per capita entre os triênios 1999/2001

e 2003/2005 considerando os três valores de corte ado-

tados na tipologia. Observa-se que o dinamismo maior

é verificado nas regiões de expansão da fronteira agro-

pecuária, envolvendo praticamente a totalidade dos es-

tados do Mato Grosso, Goiás e Tocantins, além das regi-

ões de cerrado do Maranhão, Piauí, Bahia e Minas Gerais,

onde se deu no período em questão uma forte expan-

são da produção de grãos, particularmente da soja.

Já as regiões menos dinâmicas, com crescimento

inferior à metade do crescimento médio nacional no

período, concentram-se principalmente nos estados

de São Paulo e Minas Gerais. Compõem também este

grupo a maior parte do leste paraense e uma ampla

região do Semi-Árido, englobando parcelas dos territó-

rios do Ceará, Paraíba e Pernambuco.

Já a Figura 4 apresenta o mesmo dado ampliando

os valores de corte para seis, sendo que a situação das

áreas mais dinâmicas praticamente não se altera. No ex-

tremo oposto são destacadas as regiões que apresen-

taram crescimento médio negativo no período. Nesta

condição aparecem algumas regiões no oeste paulista,

no norte e sul de Minas Gerais, assim como no sudeste

e nordeste paraense e em boa parte do Semi-Árido an-

teriormente descrito.

As Figuras 5 a 7 apresentam as regiões de baixa,

média e alta renda confrontadas com seus respectivos

graus de dinamismo.

A Figura 8, enfim, consolida o cruzamento entre ta-

manho da renda e grau de dinamismo, gerando as dis-

tintas situações de prioridade para seleção de regiões a

serem contempladas por políticas de desenvolvimento

regional (ver Figura 1).

3�

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Pode-se observar que os casos mais graves em

termos de desenvolvimento regional, que são os que

combinam as condições de baixa renda com estagna-

ção, envolvem parte do Semi-Árido (regiões do Ceará,

Paraíba e Pernambuco), parte do leste paraense e o

extremo norte de Minas Gerais, além de outras poucas

regiões dispersas pelo território nacional.

As regiões que hipoteticamente prescindem de ações

de desenvolvimento regional são as que combinam a con-

dição de alta renda combinada com alto dinamismo, e, em

menor dimensão, as que combinam alta renda com médio

dinamismo e média renda com alto dinamismo.

No primeiro caso, há uma forte concentração ao

longo do eixo que vai do Triângulo Mineiro ao centro-

Gráfico 1: Taxa de crescimento anual do PIB per capita X PIB per capita

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norte mato-grossense, e que compreende as mais prós-

peras regiões do agronegócio brasileiro. Nesta condi-

ção, aparecem também algumas regiões industriais e

produtoras de petróleo do Centro-Sul.

O Gráfico 1 apresenta a dispersão das Regiões Es-

taduais de Planejamento ao longo dos eixos de tama-

nho da renda e de seu ritmo de crescimento. Nota-se

a grande concentração das regiões no intervalo de

renda até a média nacional (R$ 12.396) e no intervalo

de crescimento médio de até 5% ao ano.

2.2 – As regiões destacadas

As Figuras 9 a 12 apresentam as regiões em situa-

ções de destaque.

A Figura 9 apresenta apenas as regiões destacadamen-

te mais ricas do país, ou seja, aquelas com PIB per capita

acima de 150% da média nacional em 2003/2005. Já a Ta-

bela 1 apresenta as dez Regiões Estaduais de Planejamen-

to do país de maior PIB per capita no triênio 2003/2005.

Pode-se observar que das dez regiões mais ri-

cas, três (Norte Fluminense, Baixadas Litorâneas/RJ e

Salineira/RN) têm suas riquezas vinculadas à extração

do petróleo; outras três aos seus prósperos parques in-

dustriais (Médio Paraíba/RJ, Serra/RS e Jaraguá do Sul/

SC); também três vinculadas à riqueza do agronegócio

(Centro/MT, Joaçaba/SC e Capinzal/SC) e, completando

a lista, o Distrito Federal, cuja riqueza está fortemente

associada à renda gerada no setor público.

A Figura 10 apresenta as regiões muito pobres do

país, ou seja, aquelas com PIB per capita abaixo de 25%

da média nacional em 2003/2005. Observa-se um nú-

mero considerável de regiões nesta situação, quase

que exclusivamente no Norte-Nordeste do país.

Já a Tabela 2 apresenta as dez Regiões Estaduais de

Planejamento do país de menor PIB per capita no triê-

nio 2003/2005.

Observa-se que as regiões mais pobres estão forte-

mente concentradas na porção oeste do Amazonas, no

centro-norte maranhense, na porção central do Ceará,

no nordeste e centro-oeste da Bahia e na quase totali-

dade do Piauí.

Nada menos que nove entre as dez mais pobres en-

contram-se no Estado do Maranhão, e uma no Estado

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3�

julho / setembro / 2008

Tabela 1: Dez Regiões Estaduais de Planejamento do país de maior PIB per capita médio no triênio 2003-2005,

PIB per capita dos municípios de maior PIB e dos municípios de maior PIB per capita nas respectivas regiões.

Rank UF REGIÃO ESTADUALPIB pc

2003-2005 (R$ de 2007)

MUNICÍPIOPIB pc

2003-2005 (R$ de 2007)

MUNICÍPIOPIB pc

2003-2005 (R$ de 2007)

01 RJ Região Norte Fluminense 63.374Campos dos Goytacazes

53.723 Quissamã 224.430

02 MT Centro 33.146 Sorriso 29.229Santa Rita do

Trivelato105.013

03 RJRegião das Baixadas

Litorâneas31.454 Rio das Ostras 167.607 Rio das Ostras 167.607

04 DF Brasília 28.576 Brasília 28.576 Brasília 28.576

05 RJ Região do Médio Paraíba 27.106 Volta Redonda 31.483 Porto Real 205.644

06 SC Jaraguá do Sul 26.576 Jaraguá do Sul 31.780 Jaraguá do Sul 31.780

07 RS Serra 24.166 Caxias do Sul 24.184 Nova Bassano 45.131

08 SC Joaçaba 23.994 Capinzal 29.466 Vargem Bonita 46.006

09 SC Concórdia 23.958 Concórdia 24.041 Seara 38.991

10 RN 8.3 Subzona Salineira 23.345 Macau 22.339 Guamaré 54.902

Fonte: IBGE

“O BRASIL MAIS RICO”

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Tabela 2: Dez Regiões Estaduais de Planejamento do país de menor PIB per capita médio no triênio 2003-

2005, PIB per capita dos municípios de maior PIB e dos municípios de menor PIB nas respectivas regiões.

Rank UF REGIÃO ESTADUALPIB pc

2003-2005 (R$ de 2007)

MUNICÍPIOSPIB pc

2003-2005 (R$ de 2007)

MUNICÍPIOSPIB pc

2003-2005 (R$ de 2007)

315 MA Pinheiro 1.740 Pinheiro 2.244 Apicum-Açu 1.148

314 MA Viana 1.809 Viana 1.804 São Vicente Ferrer 1.373

313 MA Rosário 1.835 Bacabeira 7.247 Icatu 1.319

312 MA Chapadinha 2.041 Chapadinha 2.396Santa Quitéria do

Maranhão1.306

311 MA Codó 2.073 Codó 2.513 Timbiras 1.456

310 PIMeio-NorteT.D

de Cocais2.154 Piripiri 2.491 São João do Arraial 1.653

309 MA Itapecuru Mirim 2.174 Itapecuru Mirim 2.285 São Benedito do Rio Preto 1.673

308 MA Zé Doca 2.245 Zé Doca 1.994 Governador Nunes Freire 1.410

307 MA São João dos Patos 2.251 Colinas 2.007 Passagem Franca 1.837

306 MA Timon 2.278 Timon 2.643 Matões 1.663

Fonte: IBGE

“O BRASIL MAIS POBRE”

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julho / setembro / 2008

Rank UF REGIÃO ESTADUALPIB 1999/01 a 2003/05 (%)

MUNICÍPIOPIB 1999/01 a 2003/05 (%)

MUNICÍPIOPIB 1999/01 a 2003/05 (%)

01 TO Região VII: Goiatins 29,39 Campos Lindos 47,73 Campos Lindos 47,73

02 MA Balsas 26,84 Balsas 32,41 Sambaíba 46,09

03 MT Centro 23,16 Sorriso 18,71 Santa Rita do Trivelato 82,54

04 SE Sertão 18,79Canindé de São

Francisco28,32

Canindé de São Francisco

28,32

05 MA Açailândia 17,04 Açailândia 20,63 Açailândia 20,63

06 MT Sudeste 16,47 Rondonópolis 10,21 Santo Antônio do Leste 62,50

07 MT Centro-Oeste 15,74 Diamantino 20,66 Nova Maringá 21,50

08 TO Região X: Pedro Afonso 15,71 Pedro Afonso 20,09 Pedro Afonso 20,09

09 GORegião Sudeste Goiano

(Estrada de Ferro)15,62 Catalão 20,18 Gameleira de Goiás 43,43

10 TO Região XII: Novo Acordo 15,10 Ponte Alta do Tocantins 16,88 Ponte Alta do Tocantins 16,88

Fonte: IBGE

Tabela 3: Dez Regiões Estaduais de Planejamento do país de maior taxa de crescimento anual do PIB médio

entre os triênios 1999/2001 e 2003/2005, taxa de crescimento anual dos municípios de maior PIB e dos

municípios de maior crescimento nas respectivas regiões.

“O BRASIL COM TAXAS CHINESAS DE CRESCIMENTO”

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a

Tabela 4 - Dez Regiões Estaduais de Planejamento do país de menor taxa de crescimento anual do PIB per

capita médio entre os triênios 1999/2001 e 2003/2005, taxas de crescimento anual dos municípios de maior

PIB e dos municípios de menor PIB per capita nas respectivas regiões.

Rank UF REGIÃO ESTADUALPIB pc

1999/01 a 2003/05 (%)

MUNICÍPIOSPIB pc

1999/01 a 2003/05 (%)

MUNICÍPIOSPIB pc

1999/01 a 2003/05 (%)

315 RJRegião Noroeste

Fluminense-14,09 Itaperuna -5,82 Laje do Muriaé -25,06

314 RJ Região Serrana -7,67 Petrópolis -3,52 São Sebastião do Alto -24,97

313 RSParanhana Encosta da

Serra-6,40 Parobé -10,32 Parobé -10,32

312 ES 12- Caparaó -5,26 Alegre -3,84 Muniz Freire -9,72

311 ES 4- Sudoeste Serrana -3,44 Domingos Martins -4,25 Laranja da Terra -4,46

310 SPRA de São José

dos Campos-3,39 São José dos Campos -2,79 Redenção da Serra -11,47

309 PA Marajó -3,31 Breves 2,51 Soure -7,36

308 RJRegião Centro-Sul

Fluminense-3,24 Três Rios -2,88 Mendes -4,53

307 PB 10ª Região -2,92 Sousa -3,40 Lastro -6,27

306 AL Norte -2,86 União dos Palmares 0,50 Ibateguara -11,24

Fonte: IBGE

“O BRASIL ESTAGNADO”

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julho / setembro / 2008

do Piauí. As mais pobres têm um PIB per capita médio

inferior a 15% da média nacional, sendo que alguns dos

municípios mais pobres apresentam valores em torno

de 10% da média nacional.

A Figura 11 apresenta as regiões com dinamismo

“chinês”, ou seja, aquelas com crescimento médio geomé-

trico do PIB total acima de 10% ao ano entre 1999/2001

e 2003/2005. E a Tabela 3 apresenta as dez Regiões Esta-

duais de Planejamento no país de maior crescimento do

PIB total entre os triênios 1999/2001 e 2003/2005.

Todas as regiões de maior dinamismo, com exceção da

região do Sertão/SE, cujo forte crescimento do PIB está vin-

culado à renda proporcionada pela Usina Hidrelétrica de

Xingó, encontram-se nas novas fronteiras do agronegócio,

apresentando taxas de crescimento verdadeiramente es-

petaculares. Nessas regiões, em geral receptoras de fortes

fluxos migratórios, ocorre forte incorporação de novas ter-

ras ao processo produtivo associada ao desenvolvimento

das melhores tecnologias de produção agrícola.

Deve-se destacar, ainda, que encontram-se em

implantação nessas regiões importantes projetos de

infra-estrutura, principalmente de transportes, como

a Ferrovia Norte-Sul (TO e MA), a Ferronorte (MT), e a

rodovia BR-163 (MT).

A Figura 12 apresenta as regiões mais estagnadas do

país, ou seja, aquelas com crescimento médio geométrico

do PIB per capita negativo entre 1999/2001 e 2003/2005.

E a Tabela 4 apresenta as dez Regiões Estaduais de Pla-

nejamento no país de menor crescimento do PIB per ca-

pita entre os triênios 1999/2001 e 2003/2005.

O mapa mostra uma menor concentração das re-

giões com crescimento negativo, distribuindo-se de

forma equânime por todas as macrorregiões. Duas

concentrações são notadas na porção central do Semi-

Árido e na região da fronteira de Minas Gerais com o

Espírito Santo e o Rio de Janeiro.

A Tabela revela que o crescimento do PIB per capita

encontra seus piores resultados em regiões interioranas

dos Estados do Rio de Janeiro e do Espírito Santo, fron-

teiriças com Minas Gerais, em duas regiões nordestinas,

uma gaúcha, a notoriamente decadente região do Ma-

rajó/PA, e, surpreendentemente, a rica região paulista

de São José dos Campos, cuja taxa negativa de cresci-

mento do PIB per capita deve estar associada à perda

de dinamismo de seu diversificado parque industrial.

Conclusões

Como principais conclusões do estudo, podem ser

elencadas pelo menos três:

A primeira é de que, numa abordagem macrorre-

gional, a Região Centro-Oeste efetivamente ascendeu,

em termos de PIB per capita, ao mesmo patamar das re-

giões Sudeste e Sul, com a maior parte de suas Regiões

apresentando PIB per capita acima da média nacional.

Já as Regiões Norte e Nordeste permanecem com a

quase totalidade de suas regiões num nível muito infe-

rior ao PIB per capita médio do país.

A segunda constatação é o crescente destaque de

regiões cuja principal fonte de riqueza é a atividade

agropecuária tecnologicamente avançada. Estas regiões,

distribuídas desde as antigas áreas agrícolas da fronteira

oeste dos estados sulinos até as novas fronteiras agrícolas

do Cerrado, equipararam-se em termos de PIB per capita

ao padrão existente nos grandes centros industriais dis-

persos ao longo da faixa litorânea meridional do país.

A terceira conclusão do estudo é que o maior dina-

mismo econômico deslocou-se definitivamente do litoral

para o interior do país. O mapa “o Brasil com taxas chine-

sas de crescimento” revela que, das 41 regiões com taxa

de crescimento médio do PIB total entre 1999/2001 e

2003/2005 acima de 10,0% ao ano, com exceção de duas

regiões petrolíferas no Rio de Janeiro, duas em Sergipe e

uma em Santa Catarina, todas as demais 36 situam-se prin-

cipalmente em regiões do Cerrado, nas áreas de expansão

da fronteira agrícola, com destaque para o Mato Grosso e

Tocantins com nove regiões cada, ou da Amazônia.

Metodologia do Estudo

A apresentação detalhada da metodologia do es-

tudo se fará dialogando e fazendo a análise crítica da

metodologia adotada na Política Nacional de Desen-

volvimento Regional. O objetivo da metodologia apre-

sentada neste estudo não é o de propor a substituição

da metodologia utilizada na PNDR, mas abrir a discus-

são sobre algumas das fragilidades por ela apresenta-

da. Anteriormente, contudo, deve-se fazer um breve ba-

lanço desta Política e do contexto em que foi adotada.

Lançada pelo governo federal por meio do Decreto

nº 6.047 de 22/2/2007, nele consta que “a Política Na-

Rev

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ntur

a

cional de Desenvolvimento Regional tem como objeti-

vo a redução das desigualdades de nível de vida entre

as regiões brasileiras e a promoção da eqüidade no

acesso a oportunidades de desenvolvimento, e deve

orientar os programas e ações federais no Território

Nacional”. No texto de sua apresentação, lê-se que “cabe

à PNDR oferecer parâmetros para que o Ministério da

Integração Nacional e demais instituições de coorde-

nação do governo federal possam definir prioridades e

organizar iniciativas para a redução das desigualdades

intra e inter-regionais”.

Um dos méritos da PNDR é de ter implicitamente

reconhecido suas limitações. Assim como qualquer po-

lítica de desenvolvimento regional, ela não tem o poder

de incidir sobre o modelo econômico, e, ainda menos,

sobre o sistema, pois tais faculdades cabem unicamen-

te às políticas macroeconômicas. Da mesma forma ela

não manifesta a equivocada pretensão de objetivar a

redução das desigualdades sociais na distribuição da

renda e da riqueza do País, reconhecendo esta compe-

tência às políticas específicas da área social (e também

às macroeconômicas), muito embora possa ter sobre

elas uma influência indireta. E também, corretamente,

não confere ao Ministério da Integração Nacional a

atribuição de promover a redução das desigualdades

regionais, entendendo que esta é uma tarefa que cabe

ao conjunto dos órgãos governamentais, e que o MI

contribui, sobretudo, com a formulação de estratégias

e a disponibilização de instrumentos.

Passados, contudo, um ano e meio de seu lança-

mento, a PNDR ainda é bastante desconhecida das

instituições e das esferas políticas que deveriam consi-

derá-la um importante instrumento na implementação

de suas políticas específicas.

A que se deve este fato? Uma das principais razões,

seguramente, é porque historicamente a questão re-

gional foi relegada a um segundo plano no Brasil, e, no

atual governo não tem sido muito diferente. Após seu

primeiro ano (2003), quando parecia que a questão re-

gional assumiria maior relevância na esfera federal, eis

que ela logo cai no esquecimento. Nesse novo contex-

to, que perdura até os dias atuais, o panorama é o das

Secretarias de Políticas de Desenvolvimento Regional

e de Programas Regionais (ambas do Ministério da In-

tegração Nacional) absolutamente destituídas de força

política, muito aquém de uma capacidade de ação mais

eficaz, seja por falta de um corpo técnico maior e mais

qualificado, seja por falta de um quadro dirigente de

maior expressão. Este mesmo quadro precário também

é observado nas recém-recriadas Sudam e Sudene, tal-

vez numa escala ainda maior.

De outro lado, os espaços prioritários de atuação

da PNDR (as Mesorregiões Diferenciadas, as Regiões

Integradas de Desenvolvimento – RIDEs, o Semi-Árido,

a Faixa de Fronteira), além de destituídos, em geral, de

planos de atuação apropriados, não dispõem de ins-

trumentos efetivos que possam alterar significativa-

mente o quadro de atraso econômico e social em que

se encontram.

No caso do Semi-Árido, por exemplo, as regras do

Fundo Constitucional do Nordeste – FNE prevêem que

pelo menos 50% dos recursos do Fundo sejam aplica-

dos nesta sub-região, mas na média dos três últimos

anos (2005/2007), apenas 34,3% foram ali aplicados,

sendo 33,0% em 2007. Mesmo outros espaços sub-re-

gionais, que de início contaram com forte apoio polí-

tico governamental, como o da área de influência da

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‘‘

A questão regional foirelegada a um segundo

plano no Brasil, e, noatual governo não tem

sido muito diferente.Após seu primeiro

ano (2003), quandoparecia que a questão

regional assumiria maiorrelevância na esfera

federal, eis que ela logocai no esquecimento.

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julho / setembro / 2008

rodovia BR-163 (Cuiabá – Santarém), dotado de um

bem elaborado plano de desenvolvimento, acham-se

hoje no esquecimento.

Expressão dessa pouca importância da questão regio-

nal no país é revelada por dois importantes programas

federais. O “Programa Territórios da Cidadania” é apresen-

tado como um programa de desenvolvimento regional,

quando se trata, na verdade, de um agrupamento, sob

uma mesma sigla, de vários programas governamentais,

notadamente da área social, sem nenhuma condição de

alterar substancialmente a estrutura produtiva e social

das regiões em que são aplicados, como seria de se espe-

rar de uma ação de desenvolvimento regional.

Já o “Programa de Aceleração do Crescimento - PAC”

propõe-se, muito acertadamente, a realizar um vasto plano

de investimentos na ampliação e melhoria da infra-estrutu-

ra econômica e social do país. O problema é o completo di-

vórcio desses investimentos com um objetivo de redução

das desigualdades regionais. Na verdade, não há nenhuma

garantia de que o PAC não venha acentuar as disparidades

na distribuição da renda em termos espaciais.

Em suma, a organização espacial do País, em termos

econômicos, e o processo de uso e de ocupação de seu

território permanece, como sempre esteve, nas mãos das

empresas, principalmente das grandes corporações.

Outro problema é que nesse contexto já adverso, a

metodologia adotada no processo de elaboração da Polí-

tica dificultou ainda mais sua aceitação e legitimação.

Por tratar-se de uma política multissetorial, deveria

ter sido articulada em seu processo de elaboração a

mais ampla participação das várias esferas do governo

federal, cujas políticas, programas e ações específicas

incidem sobre o desenvolvimento regional, e isso con-

cretamente não aconteceu.

De outro lado, por tratar-se de uma política nacional

(e não somente federal), deveriam ter sido efetivamen-

te envolvidos os diversos governos estaduais, e tam-

bém não foram.

Também por tratar-se de uma política elaborada por

um governo que reivindica a valorização da participa-

ção social, deveriam ter sido convocadas para discuti-la

as representações das principais organizações sociais, o

que também não ocorreu.

E, finalmente, por tratar-se de uma política que aten-

de a uma antiga expectativa daqueles que se dedicaram

a estudar a questão regional brasileira, deveria ter sido

conclamada a participação das instituições acadêmicas

e de pesquisa.

Do mesmo modo, conferiria maior legitimidade à

PNDR a sua aprovação na forma de Projeto de Lei do

Executivo e não como Decreto, como foi feito. Tais ini-

ciativas propiciariam uma maior aceitação e efetivida-

de à Política. Trata-se de questões, todavia, que se resol-

verão apenas na esfera política.

Quanto à tipologia propriamente dita, assim consta

do Anexo II do Decreto nº 6.047: A tipologia da Políti-

ca Nacional de Desenvolvimento Regional - PNDR tem

o propósito de estabelecer um quadro referencial das

desigualdades regionais e utilizará a escala Microrre-

gional, de acordo com a divisão do Instituto Brasileiro

de Geografia e Estatística - IBGE.

A metodologia está baseada em duas variáveis:

a) Rendimento Médio Mensal por Habitante, englo-

bando todas as fontes declaradas (salários, benefícios,

pensões, etc); e

b) Taxa Geométrica de Variação dos Produtos Inter-

nos Brutos Municipais por habitante.

‘‘

‘‘

Por tratar-se de umapolítica multissetorial,

deveria ter sido articuladaem seu processo de

elaboração a mais amplaparticipação das várias

esferas do governofederal, cujas políticas,

programas e açõesespecíficas incidem sobre odesenvolvimento regional,

e isso concretamentenão aconteceu.

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Deve-se reconhecer que um dos principais acertos

da PNDR é o fato de ter resistido à tentação da esco-

lha de uma miríade de variáveis para a construção de

sua tipologia, tão comum na elaboração de políticas

públicas, tendo limitado a apenas duas, que são as de-

terminantes e suficientes para retratar a desigualdade

espacial no País e a sua evolução (ou involução), quais

sejam, o rendimento médio per capita e o dinamismo

econômico.

Em relação ao dinamismo econômico, na PNDR ele é

medido por meio da taxa geométrica de variação do PIB

per capita, e a esta escolha não cabe qualquer reparo.

Mas quanto ao rendimento médio, segundo a

PNDR, ele é medido pelo rendimento domiciliar mé-

dio per capita, ponderados pelo custo relativo da cesta

básica da capital estadual ou da capital mais próxima.

Tais dados são fornecidos pelos Censos Demográficos,

e estão disponíveis a cada dez anos. Parece-nos que a

melhor apuração do rendimento médio regional deve

ser diretamente pelo PIB per capita, e sem aplicar-se a

ponderação. As vantagens são a sua simplificação e a

possibilidade de permanente atualização dos dados,

visto que os PIB municipais têm sido, desde 1999, di-

vulgados anualmente pelo IBGE, e com uma defasa-

gem inferior a dois anos.

Deve-se lembrar, ademais, que a renda das famílias

representa a porção maior do PIB (em torno de 60%), per-

centual médio que vale para a ampla maioria das regiões.

Teste feito entre a correlação do PIB com a renda

domiciliar nas 558 microrregiões geográficas (MRGs)

do país mostra um elevado coeficiente de correlação

linear fornecendo um R² = 97,9% (Gráfico 2), o que

torna a utilização dos PIB municipais absolutamente

pertinentes para aferição das rendas regionais. Teste

similar feito para as 315 regiões estaduais de planeja-

mento (REPs) apresenta um R² = 98,2%.

Quanto à adoção de médias móveis trienais, como

forma de se atenuar as inevitáveis oscilações típicas

dessa variável, parece-nos absolutamente correta.

Em relação à escala espacial, a PNDR definiu como

seu espaço de análise as Microrregiões Geográficas

(MRG) do IBGE, sendo que em alguns estados da Ama-

zônia, cujos municípios têm extensões territoriais mé-

dias elevadas (Amazonas, Pará, Roraima, Amapá e Acre),

adotou-se a escala municipal.

A opção do presente estudo foi a de se adotar as

regiões de planejamento dos estados, pelo simples fato

de essas regiões terem dimensões semelhantes as MRG

do IBGE, com a vantagem de conferirem uma maior

aceitabilidade por parte dos estados, que se vêem mais

retratados nos recortes territoriais por eles realizados.

De qualquer forma, esta questão tende a ser supera-

da a partir de 2009 com o início do processo de revisão

da regionalização do IBGE (de 1989), e que terá ampla

participação dos estados, podendo resultar, inclusive,

numa única regionalização de referência, adotada por

todas as unidades da Federação.

Outro questionamento à metodologia da PNDR

refere-se à classificação das diversas regiões, segundo

níveis de renda e ritmos de crescimento.

Consta da PNDR que “As variáveis são estatisti-

camente discretizadas e agrupadas em classes (alta,

média e baixa) de forma a possibilitar o cruzamento

demonstrado no quadro seguinte, contemplando as

quatro situações típicas especificadas:

Com base na classificação do quadro abaixo, defi-

nem-se como prioritárias para a Política Nacional de

Desenvolvimento Regional - PNDR as Microrregiões

dos Grupos 2, 3 e 4, que devem ser territórios preferen-

ciais para as políticas setoriais, observadas as disposi-

ções contidas neste Decreto.”

Em suma, a PNDR, a partir do cruzamento das duas

variáveis selecionadas, define quatro situações “idealtí-

picas” para efeito de sua aplicação:

a) Microrregiões de Alta Renda, que são as que

combinam alto rendimento, independentes do dina-

mismo observado;

b) Microrregiões Dinâmicas (de Menor Renda), que

são as que combinam rendimentos médios e baixos,

com alto dinamismo;

c) Microrregiões Estagnadas, que são as que combi-

nam rendimento médio com médio e baixo dinamismo;

d) Microrregiões de Baixa Renda, que são as que com-

binam rendimento baixo com médio e baixo dinamismo.

Aqui reside talvez a principal fragilidade da sua ti-

pologia, pois tais cruzamentos são absolutamente

insuficientes para retratarem a complexidade da de-

sigualdade regional no Brasil. Este também é o enten-

dimento expresso em estudo do BNDES no âmbito do

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julho / setembro / 2008

Gráfico 2: Correlação entre PIB e Renda Domiciliar em 2000, segundo as MRGs.

Gráfico 3: Correlação entre PIB e Renda Domiciliar em 2000, segundo as REPs.

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a

Programa de Dinamização Regional (PDR). O Programa

do BNDES, tomando como base a tipologia da PNDR,

amplia o número de “situações” para sete, diferencian-

do regiões de baixa renda dinâmicas das estagnadas

e subdividindo as regiões de média renda em média

renda superior e média renda inferior, e ambas, em di-

nâmicas e estagnadas.

O que ocorre é que a tipologia da PNDR ao classificar,

no primeiro caso, as regiões de alta renda, independen-

temente do dinamismo observado, propõe um mesmo

tratamento a regiões em situações absolutamente dis-

tintas, como, por exemplo, Cuiabá (MT), centro da mais

dinâmica região do agronegócio brasileiro, e as de Pe-

lotas-Rio Grande (RS) ou de Lages (SC), que lutam para

saírem do estado de estagnação a que foram conde-

nadas pela decadência das atividades econômicas que

lhe conferiram prosperidade no passado (indústria fri-

gorífica e madeireira, respectivamente). Pela tipologia

da PNDR, não se pode saber se a região de Cuiabá é

dinâmica ou se as regiões de Pelotas-Rio Grande e de

Lages acham-se estagnadas.

No segundo caso, ao definir como dinâmicas tanto

as regiões de média como de baixa renda, misturam-

se casos como os das relativamente prósperas regiões

de Alta Floresta (MT) e de Unaí (MG), onde pontificam

a pecuária bovina e a soja, com o ainda muito pobre

sudoeste piauiense, cujo dinamismo recente propor-

cionado pela rápida expansão da cultura da soja ainda

não permitiu dissociá-la do trágico quadro social típico

do Semi-Árido nordestino.

No terceiro caso, a tipologia mistura, na condição de

estagnadas, regiões efetivamente de baixo dinamismo,

como a de Ilhéus-Itabuna, outrora a mais próspera re-

gião do interior baiano devido à riqueza proporcionada

pelo cacau e retratada nos romances de Jorge Amado,

mas cuja estagnação é nacionalmente notória, com re-

giões de médio dinamismo, como o noroeste parana-

ense, em pleno processo de substituição da pecuária

bovina pela economia canavieira, em situação absolu-

tamente distinta da região baiana.

No quarto caso, incorre-se no mesmo equívoco, ao

agrupar numa mesma condição de baixa renda, regi-

ões absolutamente estagnadas, como o nordeste ma-

ranhense com outras de médio dinamismo, como o sul

do Amazonas.

Por fim, para a definição dos parâmetros de alto, mé-

dio e baixo rendimento, assim como de alto, médio e bai-

xo dinamismo, a PNDR adota a distribuição em quartis.

Dessa forma, destaca como de alta renda os 25% das mi-

crorregiões brasileiras com os rendimentos domiciliares

Quadro PNDR

TipologiaSub-Regional

Rendimento/hab

Alto Médio Baixo

Var

iaçã

o d

o P

IB/h

ab

Alta

Sub-regiões de

ALTA RENDA

Sub-Regiões DINÂMICAS

Média

Sub-Regiões ESTAGNADAS

Sub-Regiões de BAIXA RENDA

Baixa

��

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julho / setembro / 2008

médios mais elevados; como de baixa renda os 25% com

os rendimentos domiciliares médios mais reduzidos e

como de média renda os 50% intermediários. O mesmo

procedimento foi adotado na classificação das mais e

menos dinâmicas. Tal método implica em classificar como

de alta renda, necessariamente, 140 das 558 MRG do País,

independentemente do valor de corte, assim como clas-

sifica como de baixa renda outras 140 MRG.

Tal método também nos parece uma opção equi-

vocada. Pelo critério da PNDR, nada menos que 75%

das MRG do país (418) são de alta ou de média renda.

Política Nacional de Desenvolvimento Regional – PNDRMAPA DA TIPOLOGIA

Ao classificar as MRG pelo PIB per capita médio do

triênio 2003/05, se enquadrariam nesta situação MRG

notoriamente “pobres” como o Seridó (Ocidental e

Oriental) Potiguar, Uruburetama (CE), Brejo Paraibano,

Tomé-Açu (PA), Jalapão e Dianópolis (TO) e Senhor do

Bonfim (BA), todas microrregiões cujo PIB per capita

médio encontram-se na faixa de 30% a 35% da média

nacional.

Por este mesmo critério, determinadas MRG reco-

nhecidamente pouco desenvolvidas como Gurupi (TO)

ou Canoinhas (SC) são classificadas como de alta renda.

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Seria mais apropriado classificar como de alta renda

as MRG que estivessem num determinado patamar em

relação à média nacional. Da mesma forma, não consi-

deraríamos como de baixa renda apenas 25% das MRG

de menor rendimento médio (necessariamente 140

MRG), mas as que estivessem num determinado pata-

mar abaixo da média nacional.

Dessa forma, o presente estudo optou pelos pata-

mares que constam do Quadro 1, todos referenciados

na média nacional.

Por fim, deve-se ter claro que a tipologia da Política

Nacional de Desenvolvimento Regional, assim como

qualquer política pública, deveria permitir uma per-

manente avaliação dos resultados da própria Política.

O mapa da PNDR, contudo, apresenta-se praticamente

estático, impossibilitando a aferição da involução (ou

evolução) da desigualdade da distribuição espacial da

renda nacional.

A Figura 13 apresenta o Mapa da Tipologia da

PNDR.

Referências

BENKO, G. Economia, espaço, globalização na aurora do

século 20I. São Paulo: HUCITEC, 1996.

BNDES. Programa de Dinamização Regional – Disponí-

vel em:

http://www.bndes.gov.br/programas/regionais/pdr.asp

CHRISTALLER, W. Central places in central Germany. En-

glewood Cliffs:Prentice-Hall, 1933.

KAYSER, B. Tipologia dos espaços geográficos no mun-

do subdesenvolvido. Conferência na UFPE, 1996.

IBGE. Contas Regionais. Rio de Janeiro, 2008.

IBGE. Censos Demográficos (Censo demográfico) de

2000. Rio de Janeiro: Instituto Brasileiro de Geografia e

Estatística, 2000.

IBGE. Produção Agrícola Municipal – Disponível em:

<http://www.sidra.ibge.gov.br/cgi-bin/prtabi. Acesso

em: 30 jul. 2002.

IBGE. Sistema IBGE de Recuperação Automática - SIDRA.

Disponível em: http://www.sidra.gov.br/bda/tabela/lis-

tabl.asp. Acesso em: 17 dez. 2002.

IPEA / IBGE / UNICAMP. Caracterização e tendências da

rede urbana do Brasil. Campinas: Instituto de Economia

da Unicamp, volumes 1 e 2, 1999.

BRASIL. MINISTÉRIO DA INTEGRAÇÃO NACIONAL. Po-

lítica Nacional de Desenvolvimento Regional. Brasília:

SDR/MI, 2007.

Júlio Miragaya (coordenador)* Economista, Conselheiro do Conselho Federal de Economia, Doutorando em Desenvolvimento Sustentável no CDS/UnB

Marco César Araújo PereiraMatemático, Mestre em Estatística pela UnB

Carlos Henrique RosaEconomista pela UFMG

Patrícia Guedes da Silva Geógrafa e Doutoranda em Desenvolvimento

Sustentável no NAEA/UFPA

* Colaboraram em sua elaboração Suzana Lena Lins de Góis, Engenheira Agrônoma e Doutoranda em Desenvolvimento Sus-tentável no CDS/UnB; Samuel Menezes de Castro, Geógrafo pela

Faculdade Newton Paiva (MG); Giuliana de Abreu Correa, Cientista Política pela UnB; Gerson Bevenuto Bezerra do Nascimento, Ba-

charel em Direito e Especialista em Direito Público pela UCB e os estudantes de geografia Geílson Salles (UnB), Ana de Araujo Carrari

(UnB), Nina Puglia Oliveira (UnB) e Argélica Saiaka Luiz (UEG).

O Estudo completo, com os Anexos 01 e 02, pode ser acessado nas páginas do Conselho Federal de Economia

(www.cofecon.org.br) e do Conselho Regional de Economia do DF (www.corecondf.org.br).

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julho / setembro / 2008

CARTAEconomistas brasileiros reuniram-se em Brasília em

15 e 16 de setembro para participar do Seminário “A Pro-

fissão do Economista – Revisão da Legislação”, e analisa-

ram os acontecimentos recentes que dizem respeito à

profissão do economista, ao projeto de lei que pretende

atualizar a regulamentação da profissão de economista

e à composição atual do plenário do Conselho Federal

de Economia – Cofecon e seus resultados observados.

Concluídos os debates, e

• considerando que tramita no Senado Federal o Pro-

jeto de Lei do Senado n° 658/2007, de autoria do Senador

Inácio Arruda, com a proposta de atualizar a legislação re-

gulamentadora de atividades profissionais dos economis-

tas constantes da Lei n° 1.411, de 13 de agosto de 1951;

• considerando que o PLS nº 658/2007 deve ser obje-

to de aperfeiçoamento para melhor delimitar as ativida-

des as atividades do economista, vis-à-vis as profissões

afins (principalmente administradores e contadores);

• considerando que as emendas de autoria do Se-

nador Expedito Júnior, relator do projeto na Comissão

de Assuntos Sociais do Senado, se aprovadas, desfigu-

rariam substancialmente o PLS nº 658/2007;

• considerando que o Senador Expedito Júnior afir-

ma que as alterações que promoveu contaram com a

aprovação do Cofecon;

• considerando que a Vigésima Segunda Edição do

Simpósio dos Conselhos de Economia – SINCE, que de-

veria acontecer no mês de setembro, em Brasília, após

ter sido aprovada sua realização pelo Conselho Federal

de Economia, foi cancelada, por deliberação da plenária

do Cofecon, o que impossibilitou a deliberação sobre

questões que afetam a eficiência e a eficácia do Siste-

ma Cofecon/Corecons;

• considerando que a atual composição do plená-

rio do Cofecon desconsidera, quase completamente, a

distribuição espacial dos economistas brasileiros, evi-

denciando notória sub-representação dos economistas

registrados nos Corecons de São Paulo, Rio de Janeiro,

Minas Gerais, Rio Grande do Sul, Distrito Federal, Para-

ná, Bahia, Santa Catarina e Pará, e que essa composição

discriminatória foi aprovada num momento de extre-

ma crise do Sistema (Since de Vitória),

ASSIM SE MANIFESTAM OS SIGNATÁRIOS DO PRE-

SENTE DOCUMENTO, AO CONSELHO FEDERAL DE ECO-

NOMIA, AOS CONSELHOS REGIONAIS E AOS ECONO-

MISTAS DE TODO O PAÍS:

1. não hesitarão os signatários em acompanhar de

perto a tramitação do PLS nº 658/2007 nas Comissões

de Educação e de Assuntos Econômicos do Senado, que

também apreciarão a matéria, por requerimento do Se-

nador Cristovam Buarque, a pedido dos signatários;

2. preocupados em aprimorar o texto do PLS nº

658/2007, e procurando evitar a reprodução dos pro-

blemas constatados na tramitação do Projeto na Co-

missão de Assuntos Sociais do Senado, os signatários

estudarão substitutivo a ser apresentado aos Senado-

res Cristovam Buarque e Aloísio Mercadante, preferen-

cialmente em colaboração com o Cofecon;

3. há ampla margem de negociação com os conse-

lhos representativos de outras profissões regulamen-

tadas, mas de nenhum modo, e sob qualquer pretexto,

podem ser aceitas subtrações de atividades relevantes

do campo profissional dos economistas que venham a

significar perda em relação às autorizações já constantes

da atual regulamentação da profissão de economista;

4. mantidos os contatos com os Conselhos de outras

profissões que desempenham atividades afins com as do

economista, se disto resultar a ameaça de supressão de

Carta de Brasília

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a

atividades relevantes para os economistas, os signatários

não hesitarão em solicitar ao Cofecon que encaminhe

mensagem ao Senador Inácio Arruda, autor do projeto, no

sentido da retirada do PLS nº 658/2007, como já o fizeram

parte dos signatários e os Presidentes dos Corecons do Sul

do País, reunidos por ocasião do recente Enesul, em Foz do

Iguaçu, em vista do estado a que foi reduzido o PLS pelas

emendas do Senador Expedito Júnior, na CAS-Senado;

5. no entendimento da Casa Civil da Presidência

da República, o PLS 658/2007 contém dispositivos que

tratam do funcionamento das autarquias que são o Co-

fecon e os Corecons e, por isso, traz em si elementos

de inconstitucionalidade por vício de origem – tais ma-

térias são de competência exclusiva do Presidente da

República. Assim sendo, o melhor caminho parece ser

o da exclusão de tais dispositivos no substitutivo a ser

encaminhado às Comissões de Educação e de Assuntos

Econômicos do Senado e o início, o mais breve possí-

vel, de entendimentos junto à Presidência da República

para o encaminhamento, pelo Executivo, de projeto de

lei que trate de assuntos como a forma de eleição dos

presidentes do Cofecon e dos Corecons, a duração dos

respectivos mandatos e a composição do plenário do

Cofecon – se este puder ser entendido como elemento

a ser fixado e “congelado” por disposição de lei;

6. as tratativas na Casa Civil para a superação das

inconstitucionalidades não prosperarão, segundo infor-

mação obtida junto a assessor daquela Casa, se houver

mais uma proposta encaminhada pelos economistas,

ainda que uma delas o seja por conjunto de Corecons

que represente mais de oitenta por cento dos econo-

mistas em condição de voto. Assim, é vital que os atuais

conselheiros do Cofecon, por sua maioria, optem pelo

início das discussões a respeito de solução que possa ser

aceita pelo conjunto dos economistas do País;

7. não é mais possível ignorar a situação de crise em

que se encontra o Conselho Federal de Economia, ca-

racterizada pela dificuldade de entendimento entre os

representantes de Conselhos Regionais amplamente

majoritários quanto ao número de economistas regis-

trados e amplamente minoritários quanto aos votos em

plenário, situação anômala criada no Since de Vitória, e

que só poderá ser superada em um outro Since;

8. vêm os signatários, pelas razões apontadas, demons-

trar o mais amplo repúdio ao cancelamento do Since que

realizar-se-ia em Brasília nas datas em que ocorreu o Semi-

nário “A Profissão do Economista – Revisão da Legislação”

e, novamente, solicitar ao Cofecon o restabelecimento das

discussões para o aprimoramento do sistema de represen-

tação dos interesses dos profissionais economistas, aos

quais devemos total respeito.

Brasília, 16 de setembro de 2008.

Antonio Luiz Queiroz Silva Vice-presidente do Corecon-SP

Antonio Melki Júnior Conselheiro federal pelo Rio de Janeiro

Ário Zimmermann Presidente do Corecon-RS

Carlos Magno Andrioli Bittencourt Presidente do Corecon-PR

Carlos Roberto de Castro Assessor do Corecon-SP

Fabíola Andréia Leite de Paula Presidente do Corecon-RN

Heron Carlos Esvael do Carmo Conselheiro federal por São Paulo

Humberto Richter Conselheiro federal pelo Distrito Federal

Iliana Alves Canoff Presidenta do Sindicato dos Economistas do Distrito Federal

João Manoel Gonçalves Barbosa Conselheiro federal pelo Rio de Janeiro

João Paulo de Almeida Magalhães Presidente do Corecon-RJ

José Luiz Pagnussat Vice-presidente do Corecon-DF

Julio Miragaya Conselheiro federal suplente pelo Distrito Federal

Mario Sérgio Fernandez Sallorenzo Presidente do Corecon-DF

Máximo Porto Seleme Presidente do Corecon-SC

Osmar Gonçalves Sepúlveda Conselheiro federal pela Bahia

Paulo Dantas da Costa Presidente do Corecon-BA

Pedro Moreira Filho Conselheiro federal suplente por Santa Catarina

Waldir Pereira GomesPresidente do Corecon-SP

Wilson Benício Siqueira Presidente do Corecon-MG

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Não quebre a corrente!

Conselho Regional de Economia da 11ª Região-DFSCS Qd. 04, Ed. Embaixador, Sala 202

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O Corecon/DF defende os interesses da categoria e trabalha pela valorização dos economistas.

Mas, para que esta luta seja bem-sucedida, é importante a participação de todos. Visite o seu Conselho. Critique. Dê sugestões.

Participe! A conquista é de todos.

Não quebre a corrente!