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    Orlanda Miranda Santos

    TENDNCIAS DE TRADUO DEMEXICANISMOSEMROTEIROS E EPISDIOS DAS SRIES TELEVISIVAS CHAVESE

    CHAPOLIN: ANLISE COM BASE NA LINGUSTICA DE CORPUSE NA TRADUO AUDIOVISUAL

    Tese submetida ao Programa de Ps-Graduaoem Estudos da Traduo da Universidade Federalde Santa Catarina para a obteno do grau deDoutora em Estudos da Traduo.Orientadora: Profa. Dra. Adja Balbino de AmorimBarbieri Duro.

    Florianpolis2013

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    Orlanda Miranda Santos

    TENDNCIAS DE TRADUO DEMEXICANISMOSEMROTEIROS E EPISDIOS DAS SRIES TELEVISIVAS CHAVESE

    CHAPOLIN: ANLISE COM BASE NA LINGUSTICA DE CORPUSE NA TRADUO AUDIOVISUAL

    Tese julgada como requisito final para a obteno do grau deDOUTORA EM ESTUDOS DA TRADUO

    rea de Concentrao: Processos de Retextualizao

    Lexicografia, traduo e ensino de lnguas estrangeirasAprovada em sua forma final pelo programa de Ps-Graduao emEstudos da Traduo da Universidade Federal de Santa Catarina.

    Florianpolis, 03 de dezembro de 2013.

    BANCA EXAMINADORA

    ______________________________________Profa. Dra. Adja Balbino de Amorim Barbieri Duro(UFSC / Orientadora e presidente)

    ______________________________________Prof. Dr. Flix Valentn Bugueo Miranda (UFRGS)

    ______________________________________Profa. Dra. Ieda Maria Alves (USP)

    ______________________________________Profa. Dra. Leandra Cristina de Oliveira (UFSC)

    ______________________________________Prof. Dr. Lincoln Fernandes (UFSC)

    ______________________________________

    Profa. Dra. Andria Guerini (UFSC-Suplente)

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    AGRADECIMENTOS

    A Deus que est sempre comigo, minha luz neste longo caminho.

    Ao meu marido Charles Bruno e ao meu filho Emanuel (de apenas umaninho e nove meses) pelo carinho e por estarem sempre ao meu lado.

    Aos meus pais Sebastio e Brgida e aos meus irmos pelo incentivo epacincia. Em especial, a minha me (quem mais admiro neste mundo) ea minha irm Olga por me socorrerem nos momentos mais difceis.

    Aos amigos verdadeiros que sempre me apoiaram e que ficaram felizes

    com mais esta conquista.

    A minha orientadora, Adja Balbino, por me orientar, incentivar e meajudar a crescer intelectualmente.

    A todos da PGET que me acolheram, especialmente aos entocoordenadores Andria Guerini e Walter Costa. Aos secretriosFernando e Gustavo pela ateno.

    Fundao de Amparo Pesquisa do Estado de Minas Gerais peloincentivo financeiro e apoio pesquisa, Universidade Estadual deMontes Claros, Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha eMucuri e Universidade Federal de Santa Catarina.

    A todos, meus sinceros agradecimentos.

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    Aprender a nica coisa de que a mente

    nunca se cansa, nunca tem medo e nunca searrepende.Leonardo da Vinci

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    RESUMO

    Esta pesquisa, por um lado, teve o objetivo de identificar tendncias de

    traduo de mexicanismos em roteiros das sries Chaves e Chapolin,criadas na dcada de 70, no Mxico, exibidas pela rede Televisa,tradues essas feitas por acadmicos de Letras Espanhol. Teve por fimanalisar episdios retraduzidos pela equipe de dublagem e legendagemda Amazonas Filmes. Para a realizao deste estudo, selecionaram-sedois grupos de acadmicos, que traduziram roteiros do Chaves e doChapolin criados e publicados na Internet por Resto e Cardona (2006) eresponderam a um questionrio. A esses textos aplicou-se a ferramentawordlist do programa WordSmith Tools, que gerou 3.192 palavras(types), caractersticas do texto original (TO) e das duas tradues (TA1e TA2). Compilou-se um corpus de base para ser comparado com astradues no que se refere ao tamanho de vocabulrio. Investigaram-setodas as palavras do TO para identificar cognatos e no cognatos. Ostextos foram alinhados (original com respectiva traduo) e ento, pormeio de um concordanciador paralelo, foram analisados todos os nocognatos em seu contexto. Dessas palavras investigadas, osmexicanismos (palavras da variante mexicana do espanhol) foram as que

    desencadearam maiores dificuldades para os acadmicos. O segundopasso foi buscar os mesmos mexicanismos em episdios do Chaves e doChapolin em DVDs, retraduzidos e distribudos pela Amazonas Filmes.Houve a tentativa de responder s seguintes perguntas: (i) quais so ascaractersticas lexicais dos roteiros e de suas respectivas tradues?; (ii)que palavras apresentaram diferentes solues tradutrias entre osacadmicos?; (iii) como os acadmicos justificam as solues dadas

    para essas tradues?; (iv) que tendncias tradutrias os acadmicosdemonstraram na traduo dos mexicanismos em roteiros; (v) que

    tendncias a equipe de dublagem e legendagem da Amazonas usarampara traduzi-los em episdios? Na primeira fase da pesquisa, constatou-se que: a) h indcios da estabilizao e da simplificao; b) osacadmicos comprovaram ser tradutores inexperientes, conformedescrevem Alves e Tagnin (2010, p. 189-190); c) conhecer os episdiostraduzidos contribuiu para a traduo de mexicanismos mais recorrentes;d) a principal fonte de pesquisa dos acadmicos foi o dicionrio, emboraa maioria tenha traduzido os mexicanismos com base no contexto; e) acarga horria da disciplina Prticas de Traduo no foi suficiente paraorient-los. Na segunda fase, constatou-se que: a) a retraduo dosepisdios da Amazonas teve por justificativa questes ligadas aos

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    direitos de autor e modalidade da traduo; b) a recepo dessesepisdios retraduzidos no foi positiva; c) houve problemas nos cdigosde significao (cdigo lingustico, de colocao do som, de mobilidade,

    de planejamento e tecnolgico) e condies desfavorveis de trabalhopara a equipe; d) a legendagem foi feita pela mesma equipe e com basena dublagem, o que geralmente no costuma ser muito comum.Identificaram-se as tendncias de traduo (domesticao,estrangeirizao, omisso, inadequao, adequao e transgresso)usadas pelos os acadmicos e as tendncias (domesticao, omisso,adequao e transgresso) empregadas pelos membros da equipe daAmazonas. Houve dois mtodos de traduo mais frequentes:domesticao e adequao. Esta pesquisa pretende contribuir para a

    formao de tradutores, pesquisadores do campo dos Estudos daTraduo (especialmente em Traduo Audiovisual - TAV) e deLingustica de Corpus. Esta pesquisa justifica-se, tambm, por seuineditismo e interesse tanto para tradutores em formao comotradutores experientes.

    Palavras-chave: Estudos da Traduo; TAV; Re(traduo); Lingusticade Corpus.

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    ABSTRACT

    The main goal of this research was to identify translation tendencies to

    mexicanismos in scripts of the TV shows El Chavo and El Chapuln.These TV shows were created in Mexico in the 70s and first aired in1971, exhibited by Televisa. The script translations were made byacademic students. The same mexicanismos were translated by

    Amazonas Filmes team (dubbing and subtitling). To carry out thisstudy, we selected two groups of academic students that translated thescripts ofEl Chavo andEl Chapuln, created and published on the web

    by Resto and Cardona (2006). These students answered a questionnairetoo. We put the original text and the translations though the WordSmith

    Program and the Wordlist output 3.192 words (types), original text andtranslations features. We compiled a base corpus to compare it with thetranslations in terms of vocabulary size. We investigated all the words toidentify cognates and non-cognates. The texts were aligned (originalwith its translation) and analysed in context by a parallel concordancer.We verified that the academic students had trouble translatingmexicanismos (Mexican Spanish). The second step was to search thesetypical words in episodes of El Chavo andEl Chapuln in DVD. This

    thesis tried to answered the following questions: i) what are the lexicalfeatures of the scripts and their translations?; ii) wich were the wordsthat presented different translation solutions?; iii) how do the students

    justify the solutions found?; iv) what are the students and Amazonasteams translation tendencies to translate mexicanismos in the scriptsand episodes, respectively? In the first moment of this research, wediscovered: a) possible features (levelling out and simplification); b) theacademic students are inexperienced translators, according to Alves andTagnin (2010: 189-90); c) knowing the translated episodes contributed

    to translate the most recurrent mexicanismos; d) their main referencesource was the dictionary and their main strategy was to translate themexicanismos through the context; e) the hours destinated to study ofthe subject Translation Practices were insufficient to orientate theacademic students. In the second moment, we concluded: a) theAmazonas retranslation of the episodes justified itself by copyright andtranslation modality; b) the reception of the retranslated episodes wasnegative; c) some erros in the signifying codes (linguistic code, thesound arrangement code, mobility codes, planning code and

    technological code) and the teams unfavorable conditions of work; d)the subtitling was made by the same team based on the dubbing. We

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    identified students translation tendencies (domestication,foreignization, omission, inadequacy, adequacy and transgression) andtranslation tendencies of the Amazonas team (domestication, omission,

    adequacy and transgression). We verified two translation methods:domestication and adequacy. This study aspired to contribute totranslatiors education, researchers on Translation Studies (particularlyon Audiovisual Translation - AVT) and Corpus Linguistics. It justifieditself by containing unedited theme that translation students andexperienced translators have a great interest in it.

    Keywords: Translation Studies; AVT; Re(translation); CorpusLinguistics.

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    LISTA DE FIGURAS

    Figura 1: Wordlistdo texto original nmero de tokens e types ............ 87Figura 2: Wordlistdas tradues nmero de tokens e types................. 87Figura 3: Caractersticas do corpus de base ............................................ 90Figura 4: Palavras por ordem de ocorrncia............................................ 92Figura 5: Palavras por ordem alfabtica.................................................. 93Figura 6: Concordncias da palavra voy (que aparece no centro) ........... 94Figura 7: Utilities alinhamento dos corpora ......................................... 94Figura 8: Caixas para alterao ou no de marcadores e seleo doidioma...................................................................................................... 96Figura 9: Texto alinhado ......................................................................... 99

    Figura 10: Pgina inicial do concordanciador paralelo ......................... 100Figura 11: Concordncia da palavra llega (em corpus paralelo)........... 101Figura 12: Interface do windows com o programa Tagger.................... 103Figura 13: Interface do windows com o programa training .................. 103Figura 14: Planilha do MS-Excel com as trs colunas e opes deincluso e excluso................................................................................ 106

    LISTA DE GRFICOS

    Grfico 1: O que traduzir?.................................................................. 129Grfico 2: Estratgias utilizadas pelos acadmicos............................... 131Grfico 3: Conhecimento dos episdios e facilidade para traduzi-los... 132Grfico 4: Suficincia ou no das aulas de Prticas de Traduo........ 133Grfico 5: Conhecimento sobre mexicanismos ..................................... 134Grfico 6: Fontes de consulta dos acadmicos...................................... 135Grfico 7: Tendncias G1, G2, G3........................................................ 155

    LISTA DE QUADROS

    Quadro 1: Principais tipos de padres, segundo Sardinha (2004, p. 40-41) - Exemplos extrados do corpus de estudo (roteiros) ........................ 65

    LISTA DE TABELAS

    Tabela 1: Caractersticas dos corpora utilizados na pesquisa................ 104Tabela 2: Caractersticas dos corpora aps lematizao........................ 106Tabela 3: Tendncias dos acadmicos e da equipe da Amazonas ......... 148

    Tabela 4: Diferena entre os corpora de estudo e corpus de base apslematizao............................................................................................ 150

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    LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

    LC Lingustica de CorpusCCL Computer Corpus LinguisticsLA Lngua-AlvoLF Lngua-FonteLM Lngua MaternaLE Lngua EstrangeiraTF Texto-FonteTA Texto-AlvoTS Translation Studies

    DTSDescriptive Translation StudiesTD Translation DescriptionThTS Theoretical Translation StudiesTTh Translation TheoryDELOS Peridico dedicado histria e esttica da traduoALTAAmerican Literary Translators AssociationET Estudos da TraduoDTSDescriptive Translation StudiesTAV Traduo Audiovisual

    SBT Sistema Brasileiro de TelevisoSCFA Stylistique Compar edu Franais et de lAnglaisUNAM Universidad de MxicoTIM emissora mexicanaBIOTEMAS Frum para discusso de diversos temas ligados educaoNAPNcleo de Atividades para a Promoo da CidadaniaTO Texto original (em espanhol)TA1 Traduo de Acadmicos 1TA2 Traduo de Acadmicos 2TTR Type-Token RatioCEPRIL Centro de Pesquisa, Recursos e Informao em LinguagemEOS Marcador para fim de sentenaEOP Marcador para fim de pargrafoFIMS Fim da SentenaFIMP Fim do PargrafoLAEL Lingustica Aplicada e Estudos da Linguagem

    CORPUSLG Corpus, Lingustica, GelcGELC Grupo de Estudos de Lingustica de CorpusDRAEDiccionario de la Real Academia Espaola

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    DBMDiccionario Breve de MexicanismosRAEReal Academia EspaolaP Participante

    LO Lngua OriginalG1 Grupo 1G2 Grupo 2G3 Grupo 3TP Traduo de ProfissionaisCB Corpus de BaseCH Carga Horriav. volumen. nmero

    Loc. Adv. Locuo adverbialInt. InteriorMx. MxicoHond. HondurasArg. ArgentinaBol. BolviaEl Salv. El SalvadorNic.NicarguaEc. Equador

    Adj. coloq. Adjetivo coloquialTr. TransitivoC. Rica Costa RicaU. t. c. prnl. Usado tambm como pronominalet al. e outrosp.pgina

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    SUMRIO

    INTRODUO..................................................................................... 19CAPTULO 1 Fundamentao Terica .............................................. 231.1 Os Estudos da Traduo.................................................................... 231.1.1 Tipos de traduo ........................................................................... 241.1.1.1 Traduo Audiovisual: conceito.................................................. 251.1.1.1.2 Os cdigos de significao do texto audiovisual...................... 261.1.1.1.3 O percurso da Traduo Audiovisual (TAV) ........................... 301.1.1.1.4 Modalidades de traduo audiovisual....................................... 331.1.1.1.4.1 A dublagem........................................................................... 33

    1.1.1.1.4.2 A legendagem........................................................................ 361.1.1.1.4.3 Outras modalidades ............................................................... 391.1.1.1.5 A prtica da traduo audiovisual ............................................ 401.1.1.1.6 Os estudos descritivos e a TAV................................................ 421.1.2 Os estudos culturais e sua aplicao nos Estudos da Traduo...... 431.1.3 A retraduo................................................................................... 471.1.4 Estratgia, Tcnica / Procedimento, Mtodo, Tendncia e Norma 531.2 A Lingustica de Corpus.................................................................... 591.2.1 Conceito de corpus......................................................................... 61

    1.2.2 Viso padronizada da linguagem ................................................... 621.2.3 O Empirismo e o sistema probabilstico......................................... 661.2.4 Conceito de lexical priming ........................................................... 681.2.5 Corpus paralelo e corpus comparvel............................................. 711.2.6 Os Estudos da Traduo com base em corpus................................ 72CAPTULO 2 Metodologia................................................................... 792.1 Corpus do estudo............................................................................... 802.1.1 O autor dos episdios originais ...................................................... 822.1.2 A seleo dos participantes ............................................................ 842.1.3 Compilao dos roteiros recriados e traduzidos ............................. 862.2 Corpus de base .................................................................................. 882.3 Ferramentas automatizadas utilizadas na pesquisa............................ 912.3.1 WordSmith Tools............................................................................ 912.3.2 Outras ferramentas ......................................................................... 952.3.2.1 Alinhador..................................................................................... 952.3.2.2 Concordanciador Paralelo ........................................................... 992.3.2.3 Etiquetador/lematizador ............................................................ 101

    2.4 Mtodo para anlise dos roteiros recriados e traduzidos................. 1042.4.1 Wordlist........................................................................................ 104

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    2.4.2 Lematizao............................................................................................ 1042.4.3 Alinhamento............................................................................................ 1062.4.4 Seleo dos itens para anlise ................................................................. 107

    2.4.4.1 Estudo piloto ........................................................................................ 108CAPTULO 3 Anlises de Dados.................................................................. 1113.1 Das estratgias s tcnicas, das tcnicas s tendncias .............................. 1113.2 Respostas individuais ao questionrio........................................................ 1283.3 Seleo de palavras do texto audiovisual................................................... 1353.4Mexicanismospresentes nos episdios selecionados e sua traduo ......... 1363.5 Confrontao entre as tendncias dos tradutores em formao e dostradutores profissionais .................................................................................... 1473.6 Comparao entre as tradues dos roteiros e o corpus de base ................ 149

    3.7 Classificao do tradutor............................................................................ 1523.8 Anlise das tendncias dos acadmicos atravs da triangulao dedados ................................................................................................................ 1523.9 Anlise e discusso das tendncias encontradas na traduo feita portradutores em formao e por tradutores profissionais .................................... 154CONSIDERAES FINAIS ........................................................................ 157REFERNCIAS............................................................................................. 159APNDICES .................................................................................................. 171Apndice 1: Resumos dos roteiros selecionados para anlise.......................... 171Apndice 2: Palavras de contedo e no cognatas do corpus de estudo .......... 179Apndice 3: Lxico com divergncia tradutria entre acadmicos.................. 183Apndice 4: Concordncias das palavras no cognatas e de contedo(excetuando-se os mexicanismos com divergncia tradutria) ....................... 203Apndice 5: Questionrio respondido individualmente................................... 245Apndice 6: Entrevista com Eduardo Gouvea (presidente do F-ClubeChespirito Brasil) ............................................................................................. 251

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    INTRODUOA dvida o princpio da sabedoria

    (Aristteles).

    A Internet tornou-se uma das principais fontes de pesquisa dostradutores. Dicionrios on-line atualizados e contextualizados tmcontribudo para a melhoria da qualidade das tradues. Ferramentas de

    processamento lingustico j fazem parte do dia a dia de muitos que sepropem a traduzir e a analisar tradues.

    O espanhol e o portugus so lnguas que tm a mesma origem, araiz latina, e apresentam, de modo geral, mais semelhanas do quediferenas no lxico. Com base nessa viso, esta pesquisa objetivou

    identificar tendncias de traduo de palavras tpicas de um pas. Essetipo de traduo implica na necessidade de reunir conhecimentolingustico e cultural especfico.

    Optou-se por dois procedimentos: 1. descrever a traduo demexicanismos feita por acadmicos do curso de Letras Espanhol,tomados como tradutores inexperientes; 2. comparar essas traduescom a traduo feita por tradutores experientes. Com este propsito emmente e seguindo a opinio de McEnery e Xiao (2007, p. 1)i, para quemcorpora paralelos e comparveis oferecem possibilidades para os estudos

    da traduo e para a anlise contrastiva1, o primeiro passo foi levantar ascaractersticas das tradues dos acadmicos e confront-las com umcorpus de base.

    Alm de fazer a traduo dos roteiros propostos, os acadmicosresponderam a um questionrio que deu suporte pesquisa, como sedetalha na metodologia. Com as tradues dos acadmicos em mos,

    partiu-se em busca de ferramentas que pudessem auxiliar realizao daanlise, fazendo-se um estudo piloto, descrito no captulo 2. Aps leitura

    minuciosa de textos dos campos dos Estudos da Traduo e daLingustica de Corpus (LC), colocou-se o original alinhado com astradues e procedeu-se leitura dos textos resultados dessa montagem.

    A LC tem sido definida, por exemplo, por Sardinha (2004, p. 3),como a rea que se ocupa da coleta e explorao de dados lingusticostextuais, em formato legvel por computador, coletados com o propsitode servirem para a pesquisa de uma lngua ou variedade lingustica.

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    Todas as tradues de citaes diretas ou indiretas nesta tese so de autoriaprpria.

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    Aps a qualificao, perguntas no previstas inicialmente e maisespecficas surgiram, tais como: (i) quais so as caractersticas lexicaisdos roteiros e de suas respectivas tradues?; (ii) que palavras

    apresentaram diferentes solues tradutrias entre os acadmicos?; (iii)como os acadmicos justificam as solues dadas para essas tradues?;(iv) que tendncias tradutrias os acadmicos demonstraram na traduodos mexicanismos em roteiros; (v) que tendncias a equipe de dublageme legendagem da Amazonas usaram para traduzi-los em episdios?

    Para realizao da primeira fase da pesquisa (identificao detendncias de traduo dos acadmicos), os roteiros, tanto em espanholcomo em portugus, foram salvos em arquivos de texto (.txt), de formaque passaram a poder ser executados em programas e ferramentas de

    processamento lingustico. Alinharam-se dois corpora paralelos com ostrs textos (Original e TA1 / Original e TA2) para cotejar trechos dooriginal com seus correspondentes traduzidos. Compilou-se um corpusde base em lngua portuguesa do mesmo gnero e tamanho devocabulrio aproximado ao das tradues. Levantaram-se caractersticaslexicais dos quatro textos, aps fazer buscas das acepes de palavras decontedo, no cognatas e mexicanismos, e analisaram-se as tradues demexicanismos, usando para isso um concordanciador paralelo.

    Em uma anlise qualitativa, discutiram-se as respostas dosacadmicos apresentadas no questionrio, alm de suas tradues,mediante triangulao desses dados com os quantitativos. Aidentificao das tendncias de traduo de mexicanismos tanto dosacadmicos como da equipe de dublagem e legendagem da AmazonasFilmes permitiu que se fizesse um confronto entre ambas.

    O presente estudo apresenta modelos de tendncias de traduode elementos interculturais que dependem de conhecimentos quedesafiam o tradutor pela falta de equivalentes em sua lngua materna

    e/ou pela necessidade de oferecer uma opo mais adequada para oreceptor, que filtrar o elemento traduzido conforme sua percepo demundo, como esclarece Katan (2009, p. 91)ii:

    No ato da traduo, um novo texto ser criado, oqual ser lido de acordo com um mapa diferenteou modelo do mundo por meio de uma srie decondies diferentes de filtros de percepo.Portanto, a necessidade de mediao. O tradutor

    deveria ser capaz de modelar os vrios mundos[...]

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    Esta pesquisa aspira por contribuir para a formao de tradutores,de pesquisadores em Estudos da Traduo e para pesquisadores queutilizam a Lingustica de Corpus, oferecendo, por um lado, um suporte

    terico no campo disciplinar dos Estudos da Traduo com interface nosaportes metodolgicos da LC; por outro lado, pretende proporcionaruma aplicao da Lingustica de Corpus, de seus procedimentos eferramentas.

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    CAPTULO 1 Fundamentao Terica

    Este captulo destina-se apresentao das reas que forneceram

    subsdios tericos e metodolgicos, da rea de Estudos da Traduo(com nfase na traduo audiovisual) e da Lingustica de Corpus.

    1.1 Os Estudos da Traduo

    Consoante com Baker (2000, p. 277)iii, o interesse em traduo2 to antigo como a civilizao humana. Entretanto, como disciplinaacadmica, os Estudos da Traduo so relativamente recentes. Nocontexto do The Map (WILLIAMS e CHESTERMAN, 2002, p. 1)iv, os

    Translation Studies so definidos como um campo de estudo dedicado adescrever, analisar e teorizar o processo, contextos e produtos do ato detraduzir assim como os papis dos agentes envolvidos. Williams eChesterman (2002, p. 2)v explicam que o objetivo da pesquisa nosEstudos da Traduo contribuir para: a) fornecer novos dados; b)sugerir respostas para perguntas especficas; c) testar ou refinarhipteses, teorias ou metodologias existentes e; d) propor novas ideias,hipteses, teorias ou metodologias. Esta pesquisa tenta atingir, dealguma forma, esses objetivos.

    Segundo Williams e Chesterman (2002, p. 85-86)vi, h variveiscontextuais no mbito dos Estudos da Traduo, que podem seragrupadas da seguinte forma: variveis do texto-fonte (como a lngua-fonte, estilo, formato, aspectosestruturais e semnticos, tipo de texto); variveis do texto-alvo (restries retricas e estruturais especficas decada lngua, comparveis com textos no traduzidos na lngua-alvo); variveis do trabalho (fatores de produo, tais como o propsito e o

    tipo de traduo, prazo, material de referncia disponvel, programascomputacionais, etc); variveis do tradutor (por exemplo, seu nvel de experincia

    profissional, suas atitudes emocionais em relao ao trabalho, etc.);

    2 A traduo frente verso se diferencia tomando como base a lngua maternado tradutor e a lngua estrangeira. Se for brasileiro, uma traduo converter

    um texto em espanhol para o portugus. A verso exatamente o contrrio. Ainterpretao a traduo oral.

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    variveis socioculturais (normas, valores culturais, ideologias, estadoda lngua de interesse); variveis de recepo (reaes do cliente, revises, respostas do leitor,

    avaliao de qualidade, etc.).Todos esses elementos afetam a forma final da traduo.Hoje, h uma grande expanso no mbito dos Estudos da

    Traduo nacional e internacionalmente. No Brasil, em torno de 22universidades oferecem cursos de graduao em Traduo3. Tambmaumentam o nmero de universidades que oferecem ps-graduao emEstudos da Traduo como rea de especializao. Por outro lado, hcursos de Letras com habilitao em lngua estrangeira, entre outroslugares, no Norte de Minas Gerais, com disciplinas que abordam

    prticas de traduo. Pensa-se que altamente relevante odesenvolvimento de pesquisas nessa rea que possam melhorar aformao de tradutores.

    1.1.1 Tipos de traduo

    difcil elaborar uma definio geral de traduo, visto que aprpria palavra polissmica, podendo significar tanto o ofcio(atividade do tradutor) como o produto (texto traduzido) e, ainda, o

    processo do ato tradutrio e a disciplina.Jakobson (1959, p. 114)vii divide as teorias da traduo em trs

    tipos: 1. traduo intralingual ou reformulao: interpretao de signosverbais atravs de outros signos dentro da mesma lngua (traduo deuma obra espanhola do sculo XII para a Lngua Espanhola moderna);2. traduo interlingual: interpretao de signos verbais atravs de outralngua (traduo de um texto em espanhol para o portugus do Brasil);3. traduo intersemitica ou transmutao: interpretao de signos

    verbais mediante signos de sistemas de signos no verbais (um poematraduzido em uma pintura ou dana, um romance traduzido em um filmeou pera). Nesta tese se trabalharo dois tipos de traduo: a traduointerlingual (roteiros) e a traduo intersemitica (programa de humor).

    3 Por exemplo: Universidade de Braslia, Universidade Federal de Ouro Preto,Universidade Federal de Uberlndia, Universidade Federal da Paraba,Universidade Federal do Paran, Universidade Federal do Rio Grande do Sul,Pontifcia Universidade Catlica do Rio de Janeiro, Universidade EstadualPaulista Jlio de Mesquita Filho e a Universidade Sagrado Corao.

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    H, ainda, diferentes tipos, subtipos e modalidades de traduo.Os subtipos de traduo so, segundo Shuttleworth e Cowie (1997, p.181)viii: a traduo literria, a traduo tcnica, a legendagem e a

    traduo de mquina. Como se ver mais adiante, para alguns autores, alegendagem assim como a dublagem inserem-se no subtipo denominadotraduo literria. Para outros, e nesta pesquisa, consideram-se essasduas modalidades como traduo audiovisualpor ser esta um subtipo detraduo com caractersticas claramente especficas.

    Dos tipos e subtipos de traduo, focar-se-, respectivamente, natraduo interlingustica e na traduo intersemitica (conformemencionado anteriormente), na traduo de roteiros (escritos) e deepisdios (DVDs) do espanhol para o portugus, e no subtipo traduo

    audiovisual. importante salientar que a interpretao simultnea temum papel importante na histria do cinema, consequentemente nahistria da traduo audiovisual (TAV), sobre a qual se fala a seguir.Dedicar-se- um subitem para a descrio da traduo audiovisual, poissua compreenso de grande importncia para a anlise do segundoobjeto desta pesquisa: os episdios de Chaves e de Chapolin.

    1.1.1.1 Traduo Audiovisual: conceito

    A TAV a traduo de filmes, seriados, videogames e desenhosanimados, entre outros. Consoante com Chiaro (2009, p. 141)ix, a TAVinclui a traduo de mdia, a traduo multimdia, a traduo multimodale a traduo de tela. A legendagem e a dublagem so as modalidadesmais usadas de TAV para traduzir produtos de tela. A referida autoraexplica, ainda, que a dublagem um processo que usa o canal acstico

    para propsitos tradutrios, enquanto que a legendagem envolve umatraduo escrita que superposta tela (CHIARO, 2009, p. 141-142)x.

    Na TAV, trabalha-se com uma linguagem pr-fabricada, ou seja,o roteiro elaborado/planejado de forma escrita para simular a falaespontnea. Concorda-se com Chaume (2004, p. 168)xi e MartnezSierra (2008, p. 35)xii, que afirmam que essa linguagem encontra-se emum caminho intermedirio entre o discurso oral espontneo e o escrito(elaborado).

    Concorda-se com a definio de Chaume (2004, p. 15)xiii, queexpe que texto audiovisual:

    um texto transmitido atravs de dois canais decomunicao, do canal acstico e do canal visual,e cujo significado elaborado e construdo a partir

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    da confluncia e interao de diversos cdigos designificao, no somente do cdigo lingustico.Os meios de transmisso so tambm diversos eincluem a grande tela do cinema, a televiso, ocomputador pessoal, o reprodutor de vdeo e deDVD, etc.

    1.1.1.1.2 Os cdigos de significao do texto audiovisual

    A traduo audiovisual rene informao verbal (escrita e oral) eno verbal, codificada atravs de sistemas (cdigos de significao). Deacordo com Chaume (2004, p. 17)xiv, os cdigos de significao sosistemas adotados convencionalmente por uma comunidade culturalcom suas prprias regras e que transmitem certos significados acordadosentre a comunidade (como semforos, lngua de sinais, cdigos

    paralingusticos, etc). Esse conceito fundamental para relacionar oscdigos de significao da linguagem flmica com certas operaesconvencionais de traduo, tanto para a dublagem como para alegendagem, modalidades com as quais se trabalharo na anlise datraduo de mexicanismos em TAV.

    Pode-se entender, segundo Carmona (1996, p. 86)xv, a existncia

    de quatro macrocdigos nos textos audiovisuais, os quais so:- cdigos visuais: iconogrficos, fotogrficos, de planejamento, demobilidade e grficos;- cdigos sintticos (ou de montagem);- cdigos tecnolgicos: cdigos de suporte (formato, tipo de cmera, deobjetivo, etc.), de dispositivo de reproduo, de espao onde sematerializa a projeo (tipo e amplitude de tela, tipo de instalaosonora, etc.);- cdigos sonoros: cdigos lingustico, paralingustico, musical, de

    efeitos especiais, assim como o cdigo de colocao do som.Todos esses elementos so de interesse para o tradutor.Alm de o tradutor fazer uma anlise semitica do texto

    audiovisual, preciso que conhea o funcionamento de cada cdigo designificao e sua possvel incidncia na traduo. Apresentar-se- uma

    breve explanao de cada um desses cdigos com base em Chaume(2004, p. 19-27), exceto quando for preciso fazer referncia a outrasfontes:

    a.cdigos iconogrficos

    : segundo Chaume (2004, p. 22)

    xvi

    , o cdigoiconogrfico o primeiro dos cdigos de significao transmitido pelocanal visual, apresentando o problema da representao de cones,

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    ndices e smbolos na dublagem e na legendagem. Geralmente, essescdigos no so traduzidos (representados linguisticamente), a no serque sejam acompanhados de alguma explicao verbal, caso sua

    desconstruo seja essencial para a compreenso ou para o desenlace dahistria. O sinal de ok, por exemplo, representado de formas diferentesem vrias culturas. Se aparecer somente o smbolo sem a voz dos

    personagens, de alguma forma, ele precisa ser explicado.b. cdigos fotogrficos: na traduo, esses cdigos representam asmudanas de iluminao, de perspectiva e de uso de cores. O usointencionado de preto e branco no lugar do colorido pode significar amudana do mundo real para o mundo imaginrio ou, ainda, do presente

    para um passado distante, entre outras possibilidades. Chaume (2004, p.

    23)xvii cita, por exemplo, os contextos em que diferentes coresrepresentam luto em culturas distintas ou um jogo de palavras no qualuma cor pode ser visualizada na tela, que somente o conhecimentocultural da representao da cor por parte do tradutor pode levar oespectador a entend-los.c. cdigos de planejamento: esto relacionados sincronia labial (oufontica). O tradutor tem que manter a impresso de verossimilhana,encaixando as vogais abertas e as consoantes bilabiais nos precisosmomentos em que o personagem que est no primeiro ou primeirssimo

    plano (em maior evidncia) abra ou feche visivelmente a boca, por issoa necessidade de conseguir uma boa sincronia labial guia as opes detraduo em alguns momentos (CHAUME, 2004, p. 23)xviii. Chaume(2004, p. 23)xix acrescenta que, na legendagem, os planos tambm

    podem afetar diretamente a traduo, como no caso de um cartaz emprimeiro plano e em uma lngua desconhecida pelo espectador, que aono ser traduzido, faa perder o fio da narrao temporariamente.Porm, se esse cartaz dividir espao com outros signos na cena,

    devendo-se observar a pertinncia da informao, pois a traduo podeno ser funcionalmente necessria.d. cdigos de mobilidade: consoante com Chaume (2004, p. 24)xx,desses cdigos, so de interesse especial para o tradutor os signos

    proxmicos, cinticos e os movimentos de articulao bucal dospersonagens da tela. Os cdigos proxmicos relacionam-se tanto distncia dos personagens entre si como distncia dos personagens emrelao cmera. Nesse pormenor, Chaume (2004, p. 24)xxi chama aateno para o fato de que:

    Quando vrios personagens falamsimultaneamente, mas o tradutor s pode

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    representar um dos enunciados na legenda, ocritrio de seleo pode ser escolher aqueleenunciado do personagem que se encontra maisperto da cmera (e do espectador), j que,provavelmente, seu grau de proximidade sejamotivado e tenha a ver com a pertinncia do quenarra.

    Em relao aos signos cinticos, o tradutor de dublagem deveobservar os movimentos dos personagens. Por exemplo, se o

    personagem fizer um movimento com a cabea que represente umanegao, a traduo deve conter uma frase negativa. A representao daarticulao bucal e a durao da traduo de cada enunciado devemcoincidir com o tempo que o ator demora para pronunci-lo no original,desde o momento em que se observa a primeira articulao bucal at omomento em que a boca se fecha. De acordo com Chaume (2004, p. 24-25)xxii, isso o que se conhece porisocronia ou durao equivalente dosenunciados do texto-fonte e os enunciados do texto-alvo. Essa isocroniatenta criar um efeito de realidade, deixando o produto traduzido maisverossmil4.e. cdigos grficos: Chaume (2004, p. 25)xxiii apresenta normas e

    convenes para representar a linguagem escrita que aparece na tela,pois se percebe a linguagem escrita (ttulos, didasclias5, textos esubttulos) tambm pelo canal visual. Existem convenes de formatode cdigos grficos tanto para a dublagem como para a legendagem.f. cdigos sintticos ou de montagem: so as associaes icnicas que

    podem ajudar o tradutor a entender melhor o texto audiovisual, a relaodas cenas entre si, o planejamento e desenvolvimento da trama, e ofuncionamento narrativo do filme.g. cdigo lingustico: fundamental para a traduo, mas no exclusivo

    do texto audiovisual, o cdigo lingustico est presente em todos ostextos suscetveis de serem traduzidos. Embora o cdigo lingustico sejaconsiderado o elemento mais importante na traduo, no textoaudiovisual, ele compartilha espao com outros cdigos de significao,

    4Na legendagem, esse procedimento conhecido como sincronizao: tenta-seque a presena de uma legenda na tela coincida mais ou menos com o texto-fonte, mesmo que sua consecuo no seja to restrita como na dublagem.

    5 As didasclias so os interttulos, mostras textuais que servem para integrartudo que as imagens apresentam (CHAUME, 2004, p. 282).

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    que interagem entre si e condicionam a traduo como em nenhumaoutra variedade tradutria, obrigando o tradutor a buscar tcnicas eestratgias de traduo especficas diante de tal complexidade

    semntica.No caso da TAV, h um discurso elaborado de forma escrita paraser oralizado, porm h diferenas entre o discurso oral pr-fabricado eo discurso oral espontneo, inclusive porque um dos objetivos do textoaudiovisual transmitir a informao de forma a no provocarambiguidades ou dvidas entre o que falado e o que se ouve. Porexemplo, no discurso oral, fala-se pa no lugar de para. Na falaespont nea h maior vacilao, mas no caso da dublagem, a articulaofontica deve ser tensa e a pronncia clara, sendo necessrio que haja

    equilbrio entre as caractersticas prprias do discurso oral que devemser mantidas para que parea espontneo e as que devem ser evitadaspara que o espectador compreenda todo o contexto (cacofonias,ambiguidades, supresso de consoantes intervoclicas, etc.)6.

    Segundo Chaume (2004, p. 171)xxiv, na dublagem, no nvelprosdico, o encarregado de reescrever os dilogos o ajustador, assimcomo o diretor de dublagem e os atores, mas interessante que otradutor conhea todos os filtros pelos quais seu produto vai passar antesde entrar na sala de gravao. O desafio do tradutor reescrever oroteiro com essa peculiaridade.

    Chaume (2004, p. 170-185)xxv d vrias recomendaeslingusticas (nveis prosdico, morfolgico, sinttico e lxico-semntico) para tradutores de dublagem e adverte que devem tercuidado para no cair na tentao de reproduzir um registro oralespontneo tal e como poderamos defini-lo de maneira prototpica,devendo encontrar um equilbrio entre a oralidade e as convenesnormativas (lingusticas e estilsticas) que esperam os clientes. Essas

    convenes costumam responder a critrios histricos, polticos,culturais e de recepo.h. cdigos paralingusticos: h uma srie de smbolos que precisam serincludos na traduo, cujo uso convencional entre os adaptadores. Namodalidade da dublagem, Chaume (2004, p. 20-21)xxvi d o exemplo dos

    6Na legendagem, o registro escrito possui um amplo repertrio de recursos parareproduzir as tendncias da linguagem oral (uso de aspas, cursivas, maisculas,

    elipses, anacolutos, pausas, etc.) no nvel fontico-prosdico, pretendendosimular o registro oral.

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    risos (que poderiam ser gritos, suspiros), que costumam serrepresentados com um R entre parnteses, os gestos com um G, ossilncios ou pausas com uma barra inclinada /7.

    i. cdigo musical e cdigo de efeitos especiais: h filmes em que asmsicas no so traduzidas. Caso sejam, Chaume (2004, p. 21)xxvii alertapara a adequao da traduo aos ritmos da msica (quantidade,intensidade, tom e timbre). Esses quatro elementos, de acordo comTorrego (2007, p. 378)xxviii, so conhecidos na fontica como qualidadesfsicas do som: o tom ou altura musical, a intensidade ou energiaarticulatria, a quantidade ou durao no tempo e o timbre (que dependedo volume e da caixa de ressonncia, ou seja, da cavidade bucal).

    Tanto na dublagem como na legendagem, a msica costuma ser

    acompanhada por um corte de take (ou mudana de subttulo). Nadublagem, os efeitos especiais que no esto registrados na trilha sonorado filme tambm costumam ser representados pelo tradutor mediante aexplicitao do efeito entre parnteses. A traduo sempre deve sercoerente com o efeito especial em questo.

    j. cdigo de colocao do som: tambm transmitido pelo canal acstico,esse cdigo tem incidncia direta nas operaes de traduo. O tradutorde dublagem que tambm realiza a adaptao marca o som que seencontra no campo (visvel simultaneamente com a percepo do som cdigos lingustico e paralingustico) com o smbolo ON; com OFF,aquele que se encontra fora de campo, podendo ser marcado tambmcom a cursiva na legendagem.

    Finalizam-se, aqui, os esclarecimentos sobre o que representacada cdigo de significao. Em adiante, ser mais fcil entender comoa interao entre esses cdigos co-controla as operaes de traduo ecomo podem influenciar na traduo dos mexicanismos.

    1.1.1.1.3 O percurso da Traduo Audiovisual (TAV)Nesta pesquisa, alm das contribuies da Lingustica de Corpus

    (LC), que serviu para delimitao do objeto de estudo, e dos Estudos deTraduo, que juntamente com a LC forneceram suporte terico, importante salientar que, para a anlise de textos audiovisuais com

    7

    Na legendagem, cita certos usos ortotipogrficos7

    , como os pontossuspensivos, os cortes de subttulo, o uso da cursiva, etc.

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    finalidade tradutolgica, so tambm importantes para a compreensocompleta desse tipo especfico de texto transmitido pelo meioaudiovisual as contribuies tericas dos Estudos Cinematogrficos.

    Segundo Chaume (2004, p. 40-41

    xxix

    ), a histria da traduoaudiovisual ocorre de modo paralelo histria do cinema, emboraesclarea que h pouca bibliografia sobre a histria da TAV. Em 22 demaro de 1895 nasceu o cinematgrafo, em Paris. O interesse pelaanlise tradutria iniciou-se quando o cinema comeou a incorporar alinguagem escrita representao icnica. J nas primeiras pocas docinema mudo, colocavam-se interttulos escritos na lngua do filme queajudavam a desenvolver a trama e a comunicar melhor a informao dotexto audiovisual. Segundo Gottlieb (1997, p. 50)xxx, os primeiros

    interttulos apareceram no filme Uncle Toms Cabin, de Edward S.Porter, em 1903.

    Um interttulo consiste em uma ou mais palavrasescritas (normalmente com caracteres brancos)sobre um fundo determinado (normalmente preto)que aparecia entre duas cenas de um filme(CHAUME, 2004, p. 42)xxxi.

    Chaume (2004, p. 43)xxxii

    explica que, desde o incio, a crticacinematogrfica via com maus olhos o uso de interttulos. Alm dosinterttulos, havia os explicadores. Segundo vila (1997, p. 43)xxxiii, amisso dessa figura era narrar o filme para um pblico majoritariamenteanalfabeto, prender sua ateno e diverti-lo. Para isso, recorriam aartifcios sonoros, que mais tarde ficaram conhecidos como trilhasonora.

    Conforme Chaume (2004, p. 44-46)xxxiv, o primeiro filme sonoroparece serEl cantor de Jazz (ou The Jazz Singer), que estreou em 6 deoutubro de 1927, em Nova York, com alguns interttulos e dilogosfalados. Em 1928, a Warner estreou o primeiro filme falado em suatotalidade: The lights of New York. Ainda segundo esse autor, que citaDanan (1996, p. 114), esse filme estreou com legendas em francs, em26 de janeiro de 1929, mas foi s um entusiasmo inicial, pois hoje, naFrana, prefere-se a dublagem.

    Chaume (2004, p. 46)xxxv afirma que a primeira tentativa detraduo audiovisual consistiu em verses legendadas de filmes

    americanos para o francs, para o alemo e para o espanhol.Chaume (2004, p. 113-114)xxxvi explica que, como mbito deestudo, a traduo audiovisual conta somente com duas dcadas de

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    tradio. Ele explica que os principais fatores que contriburam para aausncia de publicaes sobre esse assunto so: o fato de os Estudos da Traduo serem uma disciplina recente;

    os estudos sobre comunicao e meios de comunicao tambmserem relativamente recentes (especialmente os referentes ao cinema e televiso); a TAV tem contado com pouco crdito no mbito acadmico, nocontexto de trabalho de tradutor e, inclusive, como disciplina especficada rea dos Estudos da Traduo, diferentemente da traduo literria,que j conta com uma bibliografia grande se consideradas outrasmodalidades; a TAV tem recebido pouca ateno dentro de seu prprio setor.

    Os seguintes fatores tm feito da TAV um processo de produo emmassa, mais do que uma atividade artstica ou profissional baseada emcritrios sistemticos: a ausncia de reflexo acadmica; a rapidez comque o trabalho realizado e a necessidade de obter benefcioseconmicos em curto prazo aceleram o processo; a quantidade de

    pessoas que tm acesso ao texto traduzido, modificando-o, sem que hajaalgum que se responsabilize pela qualidade do texto.

    Autores como Bassnett (2002, p. 18)xxxvii consideram a TAVcomo traduo literria. Autores como Whitman-Linsen (1992, p.103)xxxviii, Hurtado Albir (1994, p. 20)xxxix e Chaume (2004, p. 139)xlconsideram a traduo audiovisual como diferenciada, dada a suaespecificidade. Concorda-se com estes autores, pois a TAV apresentacaractersticas particulares, tais como: o modo de transmisso, astcnicas utilizadas, as convenes especficas, etc.

    Chaume (2004, p. 16)xli esclarece que o conceito de traduoaudiovisual encontra-se em oposio paradigmtica com os conceitos detraduo escrita e traduo oral ou interpretao, e no com os de

    traduo cientfica, tcnica ou jurdica, pois pode versar sobre qualquertema e incluir os mais diversos graus de formalidade e informalidade.Mayoral (2001b, p. 34-36)xlii apresenta as quatro peculiaridades

    da TAV que a torna uma atividade tradutria assim como um mbito deestudo independente:a) a comunicao desenvolvida nos canais auditivo e visual comsignos de diferentes tipos (imagem em movimento, imagem fixa, texto,dilogo, narrao, msica e rudo), o que obriga a realizar um trabalhode sincronizao e ajuste;

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    b) a traduo no feita unicamente pelo tradutor, mas alterada pelodiretor de dublagem ou legendagem, pelos ajustadores e, ainda, pelosatores no processo de dublagem, etc.;

    c) em determinados casos, o espectador recebe o produto audiovisual emduas ou mais lnguas distintas de forma simultnea (pelo mesmo canalou por canais diferentes);d) a traduo audiovisual conta com uma srie de convenes prpriasentre o produto traduzido e o espectador.

    Agost (1999, p. 15)xliii explica que, por possuir caractersticasprprias, a traduo audiovisual exige conhecimentos especiais doprofissional (pelo contedo, limitaes e tcnicas particularesutilizadas), pois possui um cdigo oral (as vozes que ouvimos), um

    cdigo escrito (os roteiros) e um cdigo visual (as imagens). Agost(1999, p. 80-93)xliv divide a TAV em quatro gneros: dramtico (filmese sries de televiso), informativo (documentrios, reportagens,entrevistas), publicitrio (anncios, propagandas, campanhas) e deentretenimento (programas de humor). Um dos objetos deste estudo(episdios) constitui um tipo de texto audiovisual e do gnero deentretenimento.

    Esta pesquisa centra-se na traduo audiovisual como produto,ainda que se deixe patente a considerao do processo que supe uma

    parte da anlise, situando este campo nos estudos descritivos de basepolissistmica e sobre normas da traduo audiovisual. O objetivo geral,aqui, identificar tendncias de traduo a partir de uma anlisediscursiva de base cultural sobre a traduo de mexicanismos.

    1.1.1.1.4 Modalidades de traduo audiovisual

    1.1.1.1.4.1 A dublagem

    Conforme Chaume (2004, p. 31)xlv, as modalidades de traduoaudiovisual so os mtodos tcnicos que so utilizados para realizar a

    passagem lingustica de um texto audiovisual de uma lngua para outra.Chaume (2004, p. 32)xlvi explica que dublar um filme parece

    significar, na mente de muitos, convert-lo em um produto nacional,adaptando-o.

    Chaves (2000, p. 92-93)xlvii esclarece que no fcil estabeleceruma diferena entre traduo e adaptao quando se fala em traduo

    cinematogrfica, referindo-se especificamente dublagem, pois muitosautores a relacionam com a adaptao cinematogrfica. Com base nessa

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    autora, chama-se de adaptao a uma das tcnicas tradutrias ou fase deajuste e adaptao cinematogrfica para fazer referncia a uma formade traduo intersemitica (do tipo romance transformado em teatro ou

    cinema, por exemplo).A dublagem um processo que envolve a substituio da falaoriginal por outra voz que tenta acompanhar, na medida do possvel, otempo, a frase e os movimentos labiais do dilogo original (LUYKEN etal., 1991, p. 31)xlviii. Seu principal objetivo fazer com que as pessoasouam os dilogos em sua lngua nativa como se estivessem ouvindo osatores no original.

    De acordo com Chiaro (2009, p. 144-145)xlix, h tradicionalmentequatro passos envolvidos no processo de dublagem de um filme: 1. o

    roteiro traduzido; 2. O roteiro adaptado ao som, ambos na lngua-fonte, e adequado aos movimentos labiais dos atores na tela; 3. o novoroteiro traduzido gravado pelos atores; 4. a gravao resultado dessetrabalho misturada gravao original. Segundo Chiaro (2009, p.145)l, algumas empresas contratam tradutores para fazer a traduoliteral do roteiro e, depois, o adaptador ou tradutor dubl faz os ajustesque considera necessrios para faz-la parecer semelhante lngua-alvo.Ela acrescenta que o tradutor dubl no precisa ser proficiente na lngua-fonte, mas ser talentoso e criativo o suficiente na lngua-alvo para criarum dilogo que seja convincente.

    O dubl pode fazer os ajustes que considerar necessrio, mas odiretor de dublagem tambm intervm na traduo quando entende queisso necessrio; portanto, nem o tradutor de roteiro, nem o tradutordubl so totalmente responsveis pelo resultado final dessa traduo:

    Graas aos formatos eletrnicos, cada ator dublpode gravar apenas sua parte sem a presena dosoutros atores [...] a nova tecnologia pode tambmmodificar a sincronizao dos lbios e a qualidadeda voz. Um software que j est disponvel podeautomaticamente modificar a cena de tal formaque as palavras que so proferidas pela boca doator no so na verdade as que foram faladas nooriginal; em outras palavras, a sequencia originalpode ser modificada para sincronizar osmovimentos labiais dos atores para a nova trilhasonora (CHIARO, 2009, p. 146)li.

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    Os formatos eletrnicos disponveis hoje conseguem combinar aprimeira gravao com a segunda, garantindo padres de entonao ecaractersticas de qualidade da lngua-fonte.

    Chiaro (2009, p. 147)

    lii

    apresenta duas vantagens e umadesvantagem em relao dublagem. As vantagens so: a) a dublagemno reduz a fala dos personagens nem preciso que o espectador seconcentre em legendas que, muitas vezes, no consegue ler eacompanhar, pois na legendagem as palavras tendem a ser reduzidas de40 a 75%, segundo Antonini (2005, p. 213)liii, de modo que osespectadores possam l-las e, ao mesmo tempo, ver o filme. Adesvantagem que no se ouve a voz dos atores originais.

    Com vantagens e desvantagens, o certo que a dublagem tem o

    poder de influenciar o espectador no que diz respeito ao contato com acultura da lngua-fonte (LF). Segundo Whitman-Linsen (1992, p. 11)liv,a indstria da dublagem pode ser parcialmente responsvel pelo modocomo determinado pas v outro. A imagem contm elementos queidentificam a cultura de origem do filme ou seriado (como roupas,msicas na LF, gestos, expresses faciais, lugares tursticos, etc.).Conhece-se muito da lngua e da cultura de um pas atravs de filmes,seriados, novelas, etc. O poder de influncia desses elementos pode serto grande que muitas palavras e expresses so incorporadas ao idiomada lngua receptora. Se isso j ocorre com filmes famosos, a dublagem ainda mais poderosa. No caso das sries Chaves e Chapolin, h mais de25 anos emitidas pela TV brasileira, tornaram-se conhecidas frasescomo: foi sem querer querendo; isso, isso, isso!; no contavam comminha astcia.

    Martnez Sierra (2008, p. 50)lv, ao falar dessa influncia exercidapela dublagem, destaca um componente que ele chama de credibilidade.As sries televisivas que so objeto de estudo desta pesquisa contam

    com certa credibilidade, j que vm h tempos sendo reprisadas peloSBT. Nesta anlise, verificar-se- se essa credibilidade permanece nosDVDs distribudos pela Amazonas Filmes, que no contaram com a

    participao de alguns dubladores j consagrados. Chaves (2000, p.142)lvi comenta que o espectador espera que as vozes dos atoresoriginais e os de dublagem sejam sempre as mesmas e explica que hum conjunto de fatores que afetam essa credibilidade. Esses fatores

    podem ser lingusticos (frases sem sentido ou ambguas, traduo muitoliteral, presena ou ausncia de sotaques, elementos culturais traduzidos

    de forma errnea este ltimo totalmente relevante para esta anlise) eno lingusticos, como, por exemplo, erros de sincronia, escolha de

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    vozes no condizente com o personagem, m qualidade da equipetcnica de projeo, etc.

    Sobre a sincronia na dublagem, Agost (1999, p. 58-59)lvii

    distingue trs tipos correspondentes a cada uma das fases da dublagem:a) sincronismo de contedo ou de coerncia (de responsabilidade dotradutor): a verso traduzida deve coincidir com o do roteiro original;

    b) sincronismo visual (de responsabilidade do ajustador): consiste emconseguir que os movimentos prprios da articulao da fala coincidame que sejam visveis, que estejam em harmonia com os sons que chegamaos nossos ouvidos8;c) sincronismo de caracterizao ou acstico (de responsabilidade dodiretor de dublagem): trata-se de que a voz do dublador e a aparncia e

    gesticulao do ator ou atriz da tela estejam em harmonia. Nesse tipo desincronismo, Whitman-Linsen (1992, p. 39-53)lviii acrescenta que sedeve levar em considerao a compatibilidade entre a voz que se escutae a imagem visual do ator ou atriz na tela, assim como outrascaractersticas (como personalidade ou conduta), o que depende de cadacultura, j que cada uma possui seu inventrio de vozes estereotipadas,elementos paralingusticos e prosdicos, e variaes culturais (sotaquese dialetos).

    1.1.1.1.4.2 A legendagem

    A legendagem, como o prprio nome indica, consiste emincorporar um texto escrito na lngua-alvo (legendas) na tela onde umfilme exibido na verso original, de forma que essas legendascoincidam aproximadamente com as intervenes dos atores da tela.

    Consoante com Chaume (2004, p. 34)lix, a legendagem amodalidade de traduo audiovisual escolhida em pases como Holanda,

    Blgica, Portugal, Grcia, Noruega, Sucia, Finlndia e a maior partedos pases hispano-americanos, com exceo do Brasil. Na Frana, naEspanha e no Brasil, a prtica de legendar filmes torna-se cada vez mais

    popular. A legendagem um processo um pouco menos complexo que adublagem: uma empresa faz a solicitao ao estdio de legendagem, esteenvia a traduo para um tradutor especialista nessa modalidade, que a

    8

    Esses movimentos so apresentados por Chaume (2004, p. 23)8

    comosincronia fontica ou labial.

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    devolve ao mesmo estdio, encarregado da edio, isto , de incorporara traduo dos dilogos em legendas no filme original.

    Chaume (2004, p. 80)lx destaca que no h tantas figuras

    envolvidas no processo de legendagem como no de dublagem e que h ocostume de se respeitar mais o texto do tradutor. Segundo Chaume(2004, p. 80)lxi, o interessado (a empresa de televiso, cinema, festivaisde cinema, etc.) encarrega a traduo a um estdio de legendagem e este

    procura um tradutor para a traduo, adaptao (sntese da informao)e insero das legendas. Chaume (2004, p. 82)lxii acrescenta ainda que,s vezes, o estdio possui o profissional responsvel pela sincronizao(insero das legendas de acordo com a imagem do texto original), masesse tcnico no conhece a lngua-fonte, por isso pode realizar um

    trabalho totalmente intuitivo, de modo a perder qualidade e coerncianarrativas. Segundo Chaume (2004, p. 80-82)lxiii, nem sempre o tradutorrecebe o roteiro do filme, o tempo geralmente escasso e deve seguir as

    pautas estipuladas pela empresa e pelo cliente em relao longevidadedas legendas (quanto menos caracteres, melhor a leitura para oespectador, mas mais complexo para o tradutor sintetizar o texto) e emrelao aos critrios ortotipogrficos.

    Segundo Chiaro (2009, p. 150-151)lxiv, existem vantagens edesvantagem da legendagem, assim como as da dublagem. Ela apresentatrs vantagens e uma desvantagem. As vantagens da legendagem so: alegendagem uma ferramenta que pode ser usada na sala de aula para oensino/aprendizagem da lngua estrangeira, a acstica do filme e a vozoriginal dos atores so conservadas. A grande desvantagem ter que lere prestar ateno no filme ao mesmo tempo.

    Enquanto alguns argumentam que a legendagem a nicamaneira de respeitar e conservar intactos os seus dilogos e somoriginal; outros, partidrios da dublagem, poderiam argumentar que a

    traduo no respeita os dilogos fielmente, pois segue normas parainsero das legendas e que a presena de lngua escrita e oral ao mesmotempo no necessariamente um respeito ao som da verso original.Muitos que assistem a um filme legendado no conhecem a lngua deorigem. Nesse caso, a fala original representa apenas um rudo para esseespectador.

    Os defensores da dublagem tm que reconhecer que essamodalidade tambm possui alguns pontos negativos: alm de ser maiscara que a legendagem, como j se afirmou anteriormente, os dilogos

    no so to precisos como deveriam ser, pois a traduo passa pormuitos filtros, no sendo suficientemente fiel ao original.

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    Embora alguns autores tentem argumentar que existem vantagense desvantagens na dublagem e na legendagem, h aqueles que defendemque esse debate intil, como Chaume (2004), por exemplo, que expe

    razes adversas para que um pas prefira uma ou outra modalidade.Entre essas razes esto as econmicas, as educacionais e as culturais:

    Mas o grande problema que a indstria do cinemaenfrentou aconteceu na dcada de 1930 em quemilhes de espectadores ainda no sabiam ler. AHolanda, em 1930, e a Sucia, pouco tempodepois, aceitaram rapidamente o sistema delegendagem (que dura at hoje), dado o nvelcultural de que j dispunham esses pases e,especialmente, por ser uma modalidade barata(CHAUME, 2004, p. 47)lxv.

    O que leva um pas a adotar uma modalidade de traduoaudiovisual tem a ver com questes culturais, econmicas, histricas,sociais, educacionais e polticas, como a poltica de preservao dalngua em todos os nveis.

    No mundo acadmico, na rea de humanidades,com certeza como fruto da maior formaocultural, costuma-se preferir a legendagem paraapreciar a lngua estrangeira, a interpretao dosatores originais, o produto original. As classesmais populares preferem a dublagem, o sentidoentendido de forma imediata, a facilidade dacompreenso, o desfrutar sem esforo,argumentos to respeitveis como os anteriores(CHAUME, 2004, p. 54)lxvi.

    A defesa por uma ou outra modalidade parece ser produto dahistria e cultura de cada povo e, ainda que a dublagem ou alegendagem tenha se consolidado em alguns pases, ambas podemdividir espao com outros tipos de modalidade audiovisual, no sendoexclusiva. Dentro de um mesmo pas, principalmente um pas como oBrasil, que teve e tem influncia de povos de diferentes origens, comgrande extenso territorial, pessoas de diferentes classes e nveissocioculturais, a maioria das pessoas opta pela dublagem, mas os DVDs,geralmente, oferecem dois tipos de opo e alguns documentriosoferecem, ainda, a modalidade de vozes superpostas. Tanto a dublagem

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    quanto a legendagem, assim como outras modalidades de traduoaudiovisual, possuem vantagens e desvantagens em relao ao contextoem que esto inseridas.

    Os roteiros do Chaves e do Chapolin, especialmente os doChaves, chegaram no Brasil atravs da dublagem e, em menor medida,da legendagem. Isto pode sugerir que a dublagem teve um papelfundamental na recepo dessas sries no Brasil, desde a escolha dosnomes dos personagens at a omisso ou a alterao de falas,

    promovendo uma interao positiva entre o seriado e o telespectador.H uma interao entre a mensagem flmica (recebida em nossa

    lngua atravs da dublagem) e o espectador. Essa interao provoca umaexperincia individual que leva o indivduo a refletir sobre sua

    nacionalidade, raa, gnero e classe social, buscando sua identidadedentro do episdio que est assistindo, reconstri o dilogo e d umnovo significado mensagem ou tenta inseri-la no seu universo.

    Segundo Gorovitz (2006, p. 16), pensar em recepo implicarefletir sobre os efeitos que a obra desperta, definindo critrios deavaliao que no sejam aferidos apenas pelo gosto, mas tambm pelograu de intimidade que ela proporciona e pela proximidade com umadada base cultural.

    No o foco da tese analisar a recepo das sries televisivasChaves e Chapolin no Brasil, embora isso seja mencionado em algunsmomentos da anlise. Tambm no se adentrar em especificaesmuito tcnicas sobre as modalidades, no se falar especificamentesobre a formao de tradutores nem sobre detalhes de convenes dedublagem e legendagem por no serem esses elementos os objetivos do

    presente estudo. Sobre didtica de traduo audiovisual, recomenda-se aleitura de Bartrina e Espasa (2003, p. 89-97) e, sobre especificaestcnicas e convenes, Chaume (2004, p. 61-110).

    1.1.1.1.4.3 Outras modalidades

    As vozes superpostas ou voice-over, segundo Whitman-Linsen(1992, p. 94)lxvii, uma tcnica em que um falante da lngua-alvo l atraduo da lngua-fonte (falada simultaneamente) com o original aindavagamente audvel no backgroundacstico. Ou seja, nessa modalidadeh a emisso simultnea da fala do ator do texto original (em volumemais baixo) e da dublagem (em volume mais alto). Ainda segundo

    Whitman-Linsen (1992, p. 94)lxviii, essa tcnica usada em entrevistastelevisivas com celebridades internacionais, em comdias estrangeiras

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    em que a voz original deve ser ouvida, em documentrios sobrepersonagens histricos em que a metragem do filme original e o som somantidos, etc.

    A interpretao simultnea consiste na interpretao do filme porparte de um tradutor/intrprete que se encontra fisicamente na mesmasala na qual o filme exibido e dispe de um microfone conectado aosalto-falantes por meio do qual realiza a traduo, superpondo sua voz svozes dos atores de tela. mais comum em festivais de cinema(CHAUME, 2004, p. 36)lxix, sendo a modalidade de TAV menosutilizada.

    1.1.1.1.5 A prtica da traduo audiovisual

    Para ser um tradutor na rea de TAV necessrio conhecer, almdos cdigos apresentados, o meio profissional que dita normas econvenes de sua prtica. Segundo Mayoral (2001b, p. 335)lxx, parahaver eficcia no ensino da traduo, deve-se conhecer a prtica

    profissional antes dos princpios tericos ou estudar a teoria da prticaprofissional para que a traduo no seja vista como algo alheio sociedade.

    Segundo Chaume (2004, p. 63)lxxi, uma das grandes carncias daindstria da dublagem, que distorce significativamente o produto final, o fato de tradutor e ajustador ou adaptador serem pessoas diferentes.Segundo ele, essencial que o tradutor realize a adaptao do roteiro, oumelhor, que confeccione simultaneamente um s produto final, ou seja,uma traduo j ajustada durao prosdica dos enunciados dos atoresoriginais e com sincronizao labial. E ainda:

    O ajustador trabalha sozinho em um escritrio,

    vendo uma e outra vez as diferentes cenas dotexto audiovisual, tentando encaixar os dilogosnas bocas dos personagens da tela e, para isso, elemesmo pronuncia os diferentes segmentos fnicose muda ou mantm os do tradutor, dividindo otexto em unidades de traduo audiovisual(conhecidas como tomadas, tomas ou takes) emudando aqueles enunciados que, em sua opinio,no se ajustam ao estilo do filme. Em poucaspalavras, reescreve o texto traduzido sem

    conhecer a LF na maioria dos casos (CHAUME,2004, p. 72)lxxii.

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    Alm das vantagens apresentadas acima, de o tradutor ser oadaptador, h casos em que o adaptador no conhece o idioma deorigem do filme ou seriado. Nesse caso, Martn (1994, p. 325) lxxiii

    explica que se se deixa o peso da criao artstica do novo texto parauma pessoa que no conhecedora do idioma original, com todacerteza, facilitam-se possveis equvocos de inteno e sentido do novoroteiro.

    Para Whitman-Linsen (1992, p. 118)lxxiv, deve-se evitar aartificialidade nos dilogos, pois o espectador saber que no sooriginais. Segundo Chaume (2004, p. 71)lxxv, principalmente quando osadaptadores no so tradutores, eles devem evitar dilogos superficiais eajust-los em suas trs variedades (sincronia fontica, cintica e

    isocronia), conhecer bem a LF e dominar a LA e seus recursos retricos,ser sensvel aos efeitos dramticos e cinemticos, criar um registro oralverossmil, criar ritmo de atuao, etc.

    Para explicar as mudanas que o ajustador ou adaptador realizano roteiro, Whitman-Linsen (1992, p. 64)lxxvi destaca duas questes: a) a

    primeira est relacionada domesticao do roteiro para torn-lonatural, fluente; b) a segunda, sincronizao do texto com osmovimentos labiais na tela. Isso significa moldar o texto por razes desincronia ou estilo.

    Com tantos filtros, torna-se difcil falar em fidelidade eequivalncia tradutria em tradues audiovisuais. Alm de todo o

    processo e equipe de traduo, ainda pode haver outro filtro, o cliente,que ao deter os direitos autorais da obra, pode, a qualquer momento,retirar, acrescentar ou substituir o que desejar. No caso da dublagem,segundo Chaume (2004, p. 76)lxxvii, muitos que no conhecem os

    processos de dublagem e legendagem culpam os tradutores pelos errosque observam, principalmente lingusticos e de sincronizao, e isso

    normalmente injusto. O diretor de dublagem quem assume aresponsabilidade sobre o produto final perante a empresa que contrata osservios, no havendo um responsvel legal pela traduo em si. Almdisso, o tradutor quem menos recebe pelo trabalho, como apontaChaume (2004, p. 66-67)lxxviii, que afirma que a remunerao do tradutor inferior a recebida pelos atores e atrizes de dublagem, pelo diretor e,inclusive, pelo adaptador ou ajustador, mesmo sendo ele quem realiza atransferncia de uma lngua a outra e quem prepara o produto para oexerccio artstico de seus companheiros.

    O diretor de dublagem, segundo Chaume (2004, p. 76)lxxix,geralmente no conhece a lngua-fonte do filme, assim como o

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    adaptador. Ele v o filme em sua verso original para escolher os atorese, somente depois, quando est em posse da traduo da lngua queentende o texto audiovisual. ele quem guia as interpretaes dos atores

    de dublagem e responsvel por contar-lhes a histria, pois os atorescostumam desconhecer o filme em sua globalidade, j que gravamsomente seus papis e nem veem em conjunto todas as intervenes dos

    personagens que interpretam.Nessa fase de preparao do produto, em que que essencial

    traduzir o roteiro e visualizar as imagens ao mesmo tempo, Whitman-Linsen (1992, p. 125-126)lxxx esclarece que a imagem visual inviolvel. Ela acrescenta que no possvel criar os elementos

    paralingusticos para o novo pblico. Tambm no se pode menosprezar

    os signos paralingusticos que no esto presentes no roteiro escrito.Dessa forma, elementos como movimentos corporais, expressesfaciais, idade dos personagens, sotaque, por exemplo, devem ser beminterpretados e, para isso, a visualizao da imagem por parte dotradutor imprescindvel.

    1.1.1.1.6 Os estudos descritivos e a TAV

    Como o objetivo desta pesquisa identificar tendnciastradutrias (e no estabelec-las) implcitas na traduo dos exemplos a

    partir dos corpora, considera-se pertinente falar de normas. Os estudosdescritivos e, em particular, a noo de norma (tendncia, neste caso)guiar a metodologia e sistematizao dos resultados obtidos. Analisar-se- que tipo de escolhas os acadmicos fizeram para traduzir osmexicanismos em roteiros e a equipe de dublagem e legendagem paratraduzi-los nos DVDs.

    Classifica-se este estudo como descritivo, assim como considera

    Martnez Sierra (2008, p. 64-65)lxxxi

    em sua investigao sobre atraduo do humor, a qual se insere na teoria do polissistema ou escolade manipulao, por entender que:a) os produtos audiovisuais traduzidos (nesse caso uma comdia) soum sistema complexo dentro de um sistema cultural, cujos elementosrelacionam-se e so interdependentes;

    b) os postulados funcionalistas tm importncia na concepo detraduo que subjaz a presente anlise;c) h o desejo de observar e de descrever (no de criticar ou prescrever)

    a forma pela qual os mexicanismos foram traduzidos, cruzando afronteira do idioma e da cultura;

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    d) necessrio recorrer ao original (texto e sistema cultural) paraentender o uso dos mexicanismos em seu contexto de origem e observaras mudanas semnticas e culturais que podem ter sofrido para depois

    constatar as tendncias buscadas;e) h uma dimenso histrica e scio-histrica (originais exibidos nadcada dos 70 e traduzidos em 2006);f) importante o conceito de tendncia (entendida como possvel futuranorma) na anlise e, principalmente, na sistematizao dos resultados.

    Por no ter a inteno de estabelecer normas em relao a como otradutor deve proceder para traduzir mexicanismos (ou regionalismos),descrever-se-o as tendncias encontradas. Assim como Martnez Sierra(2008, p. 67)lxxxii, entende-se a descrio como uma metodologia e

    essa metodologia que se utilizar nesta anlise.Embora Holmes (1988, p. 71-72)lxxxiii tenha dividido os Estudosda Traduo em dois ramos, puro (terico e prtico) e aplicado, esubdividido a subdisciplina descritiva em trs classes (estudosorientados pelo produto, pela funo ou pelo processo), compreende-seque tanto o processo quanto o produto so importantes para a anlise

    porque envolvem os fatores que influenciaram na tomada de deciso daequipe de dublagem e legendagem, neste caso, das sries Chaves eChapolin. No se v como dois extremos excludentes, concordando comMartnez Sierra (2008, p. 68)lxxxiv. Da mesma forma, esta linha de

    pesquisa insere-se nos Estudos da Traduo de carter puro e aplicado.Segundo Chesterman (1993, p. 11)lxxxv, os Estudos da Traduo

    so uma rea do saber normativa. Norma, no geral, um termo quedescreve um leque de fenmenos sociais que seguem determinado

    padro, no servindo apenas para estudar os fenmenos lingusticos e detraduo, mas tambm outros dentro das cincias humanas e sociais.

    1.1.2 Os estudos culturais e sua aplicao nos Estudos da TraduoSegundo House (2009, p. 3)lxxxvi, as tradues servem como

    mediadoras entre lnguas, sociedades e literaturas. atravs dastradues que muitas barreiras lingusticas e culturais so superadas.Conforme House (2009, p. 11)lxxxvii, traduzir no apenas um atolingustico, tambm um ato cultural, que envolve sempre ambas aslnguas e culturas. No se pode traduzir um idioma, desconsiderando suacultura. Lngua e cultura constituem um conjunto cujos elementos se

    conectam mutuamente sem que seja possvel falar de um sem fazerreferncia ao outro. Para que a comunicao seja eficaz, o tradutor deve

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    ter conhecimento da cultura e das normas de comportamento social dacomunidade da lngua-alvo. Traduzir uma forma de comunicaointercultural [...] A cultura refere-se a valores e convenes

    compartilhados por um grupo, que atuam como diretrizes mentais paraorientar os pensamentos e comportamento das pessoas (HOUSE, 2009,p. 12)lxxxviii.

    Esta pesquisa baseia-se na concepo intercultural do quesignifica traduzir, portanto, comear-se- pela discusso do que vem aser cultura na tentativa de estabelecer uma definio que sirva para osobjetivos do presente estudo e que possa ajudar a falar sobremexicanismos e de sua traduo a partir de um ponto de vistainter(cultural). Da mesma forma que Martnez Sierra (2008, p. 90),

    buscou-se uma definio de cultura que seja funcional e apropriada paraos propsitos deste trabalho e que se entende como equivalente oucomplementar a outras definies que a literatura oferece. Tambm seutilizar a definio de Samovar e Porter (1997, p. 12)lxxxix, que definemcultura como:

    Para nosso propsito, ns definimos cultura comoum depsito de conhecimento, experincia,crenas, valores, atitudes, significados,

    hierarquias, religio, noes de tempo, funes,relaes espaciais, conceitos do universo e objetosmateriais e propriedades adquiridos por um grupode pessoas ao longo das geraes atravs da lutaindividual e em grupo.

    Seria difcil pensar em traduo de mexicanismos sem levar emconsiderao os fatores culturais relacionados ao Mxico. A anlisedesta pesquisa supe uma situao de comunicao intercultural

    segundo a qual o emissor o criador das sries Chaves e Chapolin e osreceptores, espectadores brasileiros. Nessa comunicao, podem ocorrermal entendidos quando os receptores no conhecem a cultura doemissor.

    No caso da traduo de mexicanismos, lida-se com um objeto deanlise que o prprio elemento cultural que, dependendo do mtodo daequipe de traduo pode ser domesticado ou no. Se o elemento estrangeirizado, a equipe corre o risco de o espectador (receptor) no serconhecedor da cultura mexicana e, portanto, no entender o contexto,

    principalmente porque uma srie humorstica. No caso dadomesticao, que parece mais praticvel na dublagem do Chaves e do

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    Chapolin, esse recurso faz com que o espectador perca a conscincia deque est assistindo a um programa estrangeiro e o aceite como brasileiro

    pelos poucos elementos culturais distintos que contm e por fazer parte

    do seu dia a dia.De acordo com Venuti (2000, p. 468)xc, a traduo nuncacomunica algo de maneira despreocupada, porque o tradutor negocia asdiferenas lingusticas e culturais do texto estrangeiro, reduzindo-as efornecendo outro conjunto de elementos, basicamente domsticos,criado a partir da lngua e cultura receptora para possibilitar que oestrangeiro possa ser recebido. Venuti (2000, p. 470)xci acrescenta que amensagem do texto-fonte (TF) sempre interpretada e reinventada,especialmente nas formas culturais abertas interpretao, tais como

    textos literrios, tratados filosficos, legendagem de filmes, textos depropaganda, textos de conferncia e testemunhos legais. Qualquercomunicao realizada atravs da traduo, ento, segundo Venuti(2000, p. 471)xcii, envolve a liberao de caractersticas domsticas(domestic remainder), especialmente no caso da literatura. Consoantecom o autor, o texto estrangeiro reescrito em dialetos e discursosdomsticos, registros e estilos, e esse resultado na produo de efeitostextuais tem significado apenas na histria da lngua e culturadomsticas. Afirma que o tradutor pode produzir esses efeitos paracomunicar o texto estrangeiro, tentando inventar anlogos domsticos

    para formas e temas estrangeiros; porm, o resultado sempre ir alm deuma comunicao qualquer para lanar possibilidades de significadoorientadas pela lngua-alvo.

    Segundo Venuti (2000, p. 485)xciii, a traduo sempre ideolgicae o domestic remainderrefere-se a uma inscrio de valores, crenas erepresentaes ligados aos momentos histricos e posies sociais nacultura domstica. O autor indaga sobre a possibilidade de a

    comunicao intercultural ocorrer no mesmo plano de entendimentotanto para falantes nativos e leitores no nativos de um idioma:

    Uma traduo pode sempre comunicar aos seusleitores o entendimento do texto estrangeiro queos leitores estrangeiros tm? Sim, eu queroargumentar, mas essa comunicao ser sempreparcial, ambas incompletas e inevitavelmenteinclinadas cena domstica. Ela ocorre somentequando o domestic remainder lanado pelatraduo inclui uma inscrio do contexto

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    estrangeiro em que o texto surgiu primeiro(VENUTI, 2000, p. 473)xciv.

    As lnguas no so equivalentes no sentido de que essa perceposeja igual. Cada comunidade lingustica possui sua cultura prpria queidentifica e distingue diante das demais. A equivalncia existe nosentido de que a comunicao entre lnguas, ainda que muito diferentesem todos os nveis (semntico, fontico, pragmtico, etc.), seja possvel.Segundo House (2009, p. 7)xcv, dois textos (o original e sua traduo)so equivalentes quando, dado o seu respectivo contexto, eles socomparveis no sentido semntico e pragmtico. House (2009, p. 29)xcvi

    acrescenta que, quando se diz que duas coisas so equivalentes no se

    quer dizer que elas so idnticas, mas que elas tm algumascaractersticas em comum, que funcionam de formas similares. SegundoNida (1964, p. 120)xcvii, deve-se analisar a equivalncia da traduomediante sua dimenso dinmica, pois a lngua um cdigo usado comdiferentes objetivos:

    A lngua no consiste somente no significado desmbolos e combinao destes; ela essencialmente um cdigo em operao ou, em

    outras palavras, um cdigo funcionando compropsito(s) especfico(s). Assim, ns devemosanalisar a transmisso da mensagem em termos dedimenso dinmica. Essa dimenso especialmente importante para a traduo, j que aproduo de mensagens equivalentes umprocesso, no meramente uma combinao departes de um discurso, mas tambm da reproduodo carter dinmico total da comunicao. Semambos os elementos, os resultados praticamenteno podem ser considerados, em qualquer sentidorealista, como equivalente.

    Toury (2000, p. 204)xcviii tenta explicar que o conceito deequivalncia s pode ser concretizado ao buscar sua fundamentao nasnormas:

    A aparente contradio entre qualquer conceitotradicional de equivalncia e o modelo limitadoque a traduo tem reivindicado para ser moldadapode apenas ser resolvida postulando que so asnormas que determinam a (tipo e extenso de)

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    equivalncia manifestada pelas tradues atuais.O estudo das normas, ento, constitui um passovital para o estabelecimento de como o postuladofuncionalista e relacional da equivalncia tem sido

    realizado se em um texto traduzido, no trabalhode um nico tradutor ou escola de tradutores,em um dado perodo histrico, ou em qualqueroutra seleo justificvel.

    Toury (1995, p. 56)xcix entende a traduo como uma atividadeque, inevitavelmente, implica a presena de pelo menos duas lnguas eduas tradies culturais (ou seja, pelo menos dois sistemas de normas).Dessa forma, o tradutor deve ser um expertou mediador cultural que,

    segundo Toury (1995, p. 53)c, a figura do tradutor no pode ser reduzidaa de um mero gerador de enunciados como acontece com o significadode traduo para as distintas disciplinas como a Lingustica, aLingustica Textual, a Textologia Contrastiva ou a Pragmtica. Asatividades tradutolgicas tm que considerar o componente cultural.Como afirma Martnez Sierra (2008, p. 103)ci, um pblico exposto auma srie cuja traduo possui deficincias de ndole cultural podeconverter-se em um pblico propenso a acabar ignorando tal srie.

    Segundo Whitman-Linsen (1992, p. 125)

    cii

    , todo filme oespelho de uma cultura, que serve como veculo para transmitir amentalidade, atitudes e intenes do autor e diretor. Essa umaafirmao aplicvel a outros gneros, como, por exemplo, o de sriestelevisivas ou em DVDs, como Chaves e Chapolin. A autora afirma,tambm, que o tradutor, s vezes, tem que traduzir um contedo culturalto especfico que sua traduo parecer impossvel, mas , por outrolado, no caso da TAV, o tradutor pode receber sugestes ou ordens (emum contrato de traduo) provenientes do distribuidor, do estdio de

    dublagem, do cliente ou dos poderes polticos ou fticos para alterarcertos elementos culturais estrangeiros para que o produto seja maisatraente (ou mais vendido) aos olhos do pblico-alvo.

    1.1.3 A retraduo

    Segundo Zaro Vera (2007, p. 21)ciii, o conceito de retraduo temsido pouco explorado nos Estudos da Traduo e quase no tem sidoobjeto de pesquisas especficas, diferentemente de outros conceitostradutolgicos. Conforme esse autor, a maioria das referncias sobre

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    esse tema procede, praticamente em sua totalidade, da tradutologiafrancesa.

    Sobre a definio para o termo retraduo, Zaro Vera (2007, p.

    21)

    civ

    parte provisoriamente da ideia de que a retraduo poderia ser atraduo total ou parcial de um texto traduzido previamente, masexplica que esse conceito impreciso. Ele o coloca alm do mbito datraduo literria traduo audiovisual, tanto nas modalidades dedublagem e legendagem como em textos flmicos que se apoiam emoutros anteriores.

    Shuttleworth e Cowie (1997, p. 76-77)cv denominam aretraduo de vrias formas: traduo indireta, traduo intermediada,traduo mediada ou traduo de segunda-mo. Conforme esses

    autores, a retraduo um termo usado para denotar o processomediante o qual um texto no traduzido diretamente do original.Munday (2009, p. 198-240) no menciona nenhuma das nomenclaturasanteriores. Zaro Vera (2007, p. 21)cvi questiona se uma retraduo realmente uma traduo indireta. Ele entende traduo indireta como,

    por exemplo, uma traduo de um romance chins feita a partir de suacorrespondente traduo francesa ou inglesa. Chaume (2007, p. 51)cvii

    fala tambm da traduo indireta com o mesmo sentido e destaca que confundida constantemente com retraduo.

    Para esclarecer o conceito de retraduo no mbito da TAV,busca-se apoio na definio de Chaume (2007, p. 49)cviii, que percebe aretraduo em oposio binria com a traduo. Como conceito quaseexclusivo no campo da traduo literria, o autor entende a retraduocomo as segundas, terceiras, quartas ou n-tradues consecutivas de ummesmo texto, sendo a primeira, considerada a traduo.

    Sobre a retraduo no mbito da TAV, Chaume (2007, p. 50)cix

    afirma que no uma prtica habitual e a v como traduo interlingual

    e no como adaptao cinematogrfica de um texto anterior (literrio ouno).No caso dos desenhos animados, Chaume (2007, p. 52)cx informa

    que a prtica da traduo indireta muito habitual, principalmente nosdesenhos japoneses conhecidos como anime: o roteiro em japons traduzido para o ingls e do ingls para as demais lnguas, como oscasos deDoraemon eDragon Ball. Chaume (2007, p. 53)cxi explica porque a TAV permite a existncia e uso, s vezes extenso, da traduoindireta:

    O mercado, as condies trabalhistas, a exignciados meios audiovisuais em relao ao tempo emque a traduo solicitada, a distncia entre as

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    culturas envolvidas, as intenes em relao emisso do produto, os destinatrios, ascaractersticas e status da traduo audiovisual(em comparao com a literria, por exemplo),

    etc.

    A retraduo parece surgir da necessidade de aperfeioar o que seacredita ainda no estar perfeito, respondendo a uma preciso demelhoramento, pois dificilmente o tradutor no conhece ou no buscaconhecer a traduo anterior. Segundo essa forma de pensar, OrtizGozalo (2007, p. 35)cxii afirma que retraduzir , em suma, umanecessidade gerada pelo fato de a traduo perfeita ser inacessvel,

    tornando-se uma utopia atrs da qual o mundo da cultura no deixa deprogredir e de buscar novos caminhos de expresso.Mesmo que haja necessidade de aperfeioamento, h outros

    motivos que levam o tradutor a retraduzir uma obra. Venuti (2004, p.25-30)cxiii enumera vrios motivos pelos quais um texto retraduzido.Entre eles esto:a) quando uma obra alcana o estatus de cnone na lngua-alvo e precisaser interpretada segundo a viso de mundo do leitor;

    b) quando se quer criar uma identidade particular com efeitos

    institucionais particulares;c) quando se quer deixar o texto mais adequado lngua-alvo;d) quando a nova considerao artstica de um texto passa de marginal acannico na cultura da lngua-alvo;e) quando se quer contribuir para os estudos da traduo (a prtica e a

    pesquisa) com anlise lingustica, levando em considerao os fatoresculturais e polticos;f) quando mais barato retraduzir do que adquirir os direitos de umatraduo j existente.

    Chaume (2007, p. 56-61)cxiv apresenta as razes pelas quais umtexto audiovisual (destacando o gnerofilme) retraduzido e para que se

    possa entender por que a retraduo de textos audiovisuais encontra-se,frequentemente, ligada noo de traduo indireta:a) o meio de exibio: cada mudana de meio de exibio implica umaretraduo do texto audiovisual. O texto audiovisual pode ser emitido dediferentes formas: atravs da televiso, do vdeo, do CD Rom, do DVDe da Internet;

    b) a modalidade de traduo: a mudana na modalidade tambmimplica nova traduo: por causa dos direitos autorais, porque a empresaque contratou a traduo diferente, pelo desconhecimento de uma

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    traduo anterior ou simplesmente pela rapidez e comodidade. Alegendagem de um filme, que em geral posterior dublagem, feita

    por um tradutor diferente que, em muitas ocasies, pode fazer uso da

    verso dublada;c) o envelhecimento da traduo: ocorrem, com o tempo, falhas desom irrecuperveis ou a dramatizao de vozes pode estar em desacordocom o estilo da dublagem atual;d) as variedades dialetais: o autor d o exemplo da variedadelingustica hispano-americana que soava mal nos ouvidos dosespectadores espanhis, que exigiam que os atores falassem o espanhol

    peninsular;e) a poltica lingustica: o mesmo filme, os mesmos desenhos

    animados, os mesmos documentrios e as mesmas sries de televisoso traduzidos, dublados ou legendados de maneira diferente naCatalunha (catalo oriental) e na Comunidade Valenciana (cataloocidental ou valenciano), comunidades acostumadas a escutar ambas asvariedades. No caso da comunidade valenciana, os partidos do podertm baseado seu programa eleitoral em remarcar as diferenas entre o

    povo valenciano e catalo, e conscientiz-los de suas diferenas emrelao aos demais;f) as razes econmicas: mais fcil e barato pagar pela traduo domesmo original ou comprar uma traduo anterior;g) os direitos de autor: h razes jurdicas que levam retraduo. Atraduo para a dublagem, e no para a legendagem, gera direitos deautor, de forma que, mais simples, juridicamente, providenciar umatraduo do que seguir todo o processo de busca do texto traduzi