[2010] TCC_Digressões homossociais
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MÍLTON RIBEIRO DA SILVA FILHO
DIGRESSÕES HOMOSSOCIAIS a (micro-)política do armário ajudando a construir um ethos LGBT
Belém-PA 2010
MÍLTON RIBEIRO DA SILVA FILHO
DIGRESSÕES HOMOSSOCIAIS a (micro-)política do armário ajudando a construir um ethos LGBT
Trabalho de Conclusão de Curso apresentado para obtenção do grau de Bacharel e Licenciado Pleno em Ciências Sociais, ênfase em Ciência Política, Faculdade de Ciências Sociais do Instituto de Filosofia e Ciências Humanas da Universidade Federal do Pará.
Orientadora: Carmem Izabel Rodrigues
Belém-PA 2010
MÍLTON RIBEIRO DA SILVA FILHO
DIGRESSÕES HOMOSSOCIAIS a (micro-)política do armário ajudando a construir um ethos LGBT
Trabalho de Conclusão de Curso apresentado para obtenção do grau de Bacharel e Licenciado Pleno em Ciências Sociais, ênfase em Ciência Política, Faculdade de Ciências Sociais do Instituto de Filosofia e Ciências Humanas da Universidade Federal do Pará.
Data de aprovação: _____ FEV 2010. Conceito: _____________________ Banca Examinadora: ______________________ Carmem Izabel Rodrigues FCS/UFPA (orientadora) ______________________ Telma Amaral Gonçalves FCS/UFPA (examinadora)
Para Maria, minha mãe
Razão do meu viver.
TROCANDO EM MIÚDOS (Agradecimentos)
À minha orientadora, Carmem Izabel Rodrigues, pela generosidade, paciência, pelas conversas e por acreditar que este trabalho seria possível.
Aos professores coordenadores do Pet/GT/CS, prof. Samuel Sá, profa. Denise
Cardoso e profa. Wilma Leitão, pelos incentivos, pelo apoio incondicional e pelas palavras amigas nos momentos de indecisão.
Aos professores Ernani Chaves, Cristina Cancela, Maurício Costa que gentilmente
me acolheram em suas disciplinas no PPGCS. Às professoras Telma Amaral e Hecilda Veiga pela imensa generosidade. @s amig@s de curso, em especial Sandra, Barbara, Juliana, Dany, Thaize e Dalila,
pela companhia, pelos risos, pelas alegrias durante esses cinco anos, mas sem esquecer d@ Claudiane, Adele, Marta, Luiz Cláudio, Eliana, Luis Guilherme, Jéssica, Luis Carlos, Simone, José Jorge, Watson, Glaúcia, Paulo, Adrienne, Leila e Ruth.
@s amig@s de ComUni, Shirlene, Regina (in memorian), John, Ruth e Patrícia,
pelos momentos de estudo, dedicação e alegria. E, também, à Roberta, Rosilene, Fernanda, Rosania, Lupy, Américo, Patrícia, Maryelma, Drica, Darlene e Wal, pelo apoio e incentivo, mesmo que distantes.
@s petian@s de todas as gerações, Kirla, Marta, Natasha, Andreza, Edinelson,
Thales, Ricardo, Luiz Eduardo, Pedro, Kelly, Gaby, Cassiano, João, Willame, Lucas, Sammy, Guilherme, pelos incentivos.
@s amig@s do Esquadrão de Pessoal da Base Aérea de Belém, especialmente,
Raquel, Emerson, Eduardo Cezar, Rodrigues, Madson, Gilson e Mauro Peralba, além dos FABianos, Rafael Alves, Eduardo Lugarinho, Luiz Farias, Walber Nepomuceno, Pontes, Anayse, S. Oliveira e Rafael Castro pelas muitas “horas rachadas” juntos.
Ao Movimento Universitário em Defesa da Diversidade Sexual – Grupo
OrQuídeas, Elane, Denise, Franci, Priscila, Paula, Samuel, Ramon, Osmar, Zé Luiz, Robson, Wagner, Ton, Vinny, Alan e Diogo obrigado por todos os estímulos, aborrecimentos e alegrias neste quase três anos de luta.
e por último, porém, não menos importante À minha família, em especial, minha mãe Maria, por ser a minha base física e
emocional, meus irm@s Carol e Cleber e minhas sobrinhas Laura e Lorenna, por estarem proporcionando os melhores momentos da minha vida. E @s ti@s Hélio e Rosa e @s prim@s Mayara, Heitor, Helton, Helder e Maynara pela convivência e apoio inestimáveis.
[...] o gay o é para o hétero não como uma cópia para o original e sim o da cópia para uma cópia.
Judith Butler
SUMÁRIO
RESUMO/ABSTRACT 8 IMAGEM E QUADROS 9 INTRODUÇÃO 10 CAPÍTULO 1 – A OPÇÃO PELA ETNOGRAFIA: trabalhando com sexualidade na Amazônia 13 1.1 Em busca de um tema de pesquisa 13 1.2 Vasculhando, pesquisando, constatando 16 1.3 Reflexões iniciais sobre homossexualidade 18 1.4 Efetivando uma decisão 19 CAPÍTULO 2 – AQUENDANDO O BAJUBÁ: gênero, sexualidade, construção de identidade e o bajubá em Belém 24 2.1 Um breve olhar sobre as relações de gênero em Belém 24 2.2 Um breve olhar sobre a homossexualidade em Belém 26 2. 3 Identidade, sociabilidade: conflitos, soluções 28 2. 4 Uso e apropriação do bajubá 31 CAPÍTULO 3 – A (MICRO)POLÍTICA DO ARMÁRIO: o coming out, o estilo camp e a fechação em Belém 36 3.1 Negociando o “armário”: reflexões sobre si 36 3.2 Um pouco de queer, um pouco de camp 39 3.3 Notas sobre a fechação em Belém 41 (IN)CONCLUSÃO 45 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 48
RESUMO
Neste trabalho fiz considerações acerca da construção de identidade LGBT, do uso e apropriação do bajubá, da “política do armário” e da fechação como forma de construção do ethos homossexual. Utilizei a etnografia com o objetivo de construir uma análise centrada na dinâmica dos indivíduos com um aspecto da linguagem, neste caso, com o bajubá. Escolhi realizar entrevistas não estruturadas e observação participante com o objetivo de estabelecer uma conexão entre as referências simbólicas e a realidade prática do indivíduo homossexual, analisando o “armário” a partir da experiência vivenciada em Belém. Verifiquei que a utilização do bajubá compõe parte do coming out e que serve de elemento agregador nos momentos de sociabilidade. Palavras-chave: Homossexualidade, “Política do armário”, Bajubá.
ABSTRACT
In this work I have made considerations about the construction of LGBT identity, use and appropriation of bajubá, the "politics of the closet" and fechação as a way of building the homosexual ethos. I have used ethnography in order to build an analysis focused on the dynamics of individuals with an aspect of language, in this case, with the bajubá. I have chosen to work with non-structured interviews and participant observation in order to establish a connection between symbolic references and the practical reality of the homosexual person, looking at the "closet" from their experience in Belém. I have found the use of bajubá composes part of the coming out and it serves as an aggregator in moments of sociability. Keywords: Homosexuality, "Politics of the closet”, Bajubá.
IMAGEM E QUADROS
IMAGEM 1: Palavra do bajubá 35 QUADRO 1: DISSERTAÇÕES sobre homossexualidade, travestilidade e drag queens 16 QUADRO 2: TCCs sobre homossexualidade 11 QUADRO 3: TCCs dos membros do Grupo Orquídeas 20 QUADRO 4: Sujeitos da pesquisa 22
Introdução
Os estudos sobre sexualidade na Amazônia, nas últimas décadas, têm mostrado
avanços tímidos, pois apesar de existirem pesquisadores interessados na discussão, ainda
são poucos se comparados ao número existente no eixo sul-sudeste. E mesmo dentro das
Ciências Sociais que seria, a priori, campo propício para o fomento deste tipo de debate,
percebe-se que ainda existem obstáculos a serem transpostos para que os temas ligados à
sexualidade sejam encarados como objetos válidos para pesquisa.
A discussão sobre o tema da homossexualidade a partir da realidade amazônica
é desafiante, pois se apresenta, sob vários aspectos, diferenciada das outras regiões do país,
posto que mantém uma ligação constante entre moderno e tradicional, contato esse
recíproco e permanente, mas também desponta como um celeiro vanguardista.
A cidade de Belém serviu de campo, na década de 1970, para que o antropólogo
Peter Fry (1982), embasado na teoria da cultura para explicar a construção do sujeito
homoerótico, pudesse realizar uma análise pioneira das relações estabelecidas entre a
homossexualidade e os cultos afro-brasileiros e, assim, despontasse como um dos primeiros
antropólogos ocupados com as dinâmicas que envolviam as relações homossexuais e com a
influência das convenções sociais de gênero na construção da identidade homossexual.
Depois de um hiato de quinze anos, no final da década de 1980, a etnografia
realizada pela antropóloga Telma Amaral Gonçalves (1989), estudante do curso de Ciências
Sociais à época da pesquisa, desponta como, talvez, a primeira realizada por uma
pesquisadora paraense acerca das representações, do preconceito e discriminação contra
homossexuais da capital paraense, sendo escrita na época em que os indivíduos
homoeróticos sofriam com as chagas sociais da chamada “peste gay”, que estigmatizava
qualquer pessoa que mantivesse relações afetivo-sexuais com pessoas do mesmo sexo.
Em 2010, com base nos levantamentos feitos para este trabalho, constatou-se
que, apesar de muitas produções ainda não se encontrarem disponíveis para pesquisa, e que
talvez seja maior o número de pesquisas sobre homossexualidade na Universidade Federal
do Pará (UFPA), ainda podemos “contar nos dedos” a quantidade de Trabalhos de Conclusão
de Curso (TCC) e dissertações (não encontrei nenhuma tese sobre o tema) que fazem parte
do acervo de poucas faculdades desta Instituição de Ensino Superior (IES), e que poderiam
ajudar no desenvolvimento de políticas sociais específicas para a população de lésbicas,
gays, bissexuais, travestis e transexuais (LGBT) no estado do Pará, a partir da interlocução
entre os movimentos sociais e o governo estadual, assim como de fazer com que esta
universidade acabasse inserida no debate brasileiro sobre sexualidade.
Considerando as discussões atuais sobre homossexualidade, optei por abordar o
tema a partir da construção da identidade, da “política do armário” e da linguagem, neste
caso, através do uso de determinada gíria urbana que, entre os homossexuais, possui o
nome de bajubá. E acabei optando pela etnografia neste trabalho, com o objetivo de centrar
a análise sobre os aspectos considerados acima, tendo em vista o início de uma longa
discussão (que será continuada no mestrado) acabei desenvolvendo-o em três capítulos e
uma breve (in)conclusão.
No primeiro capítulo procurei demonstrar o percurso da pesquisa desde o
momento de escolha do tema até a escrita deste TCC, mantendo a sexualidade como objeto
de estudo, o contato que mantive (e que ainda mantenho) com a militância organizada,
(dentro e fora da UFPA), passando pelo contato com publicações clássicas e com os atuais
temas de pesquisa nesta área e constatando a dificuldade que foi/é trabalhar com a
homossexualidade na Amazônia.
No segundo capítulo faço algumas considerações sobre as relações de gênero e a
homossexualidade em Belém, mantendo o foco na construção destes marcadores nos
sujeitos pesquisados a partir da apropriação do bajubá (este aparecendo enquanto
constructo identitário), ou seja, explicando de que maneira o uso intensivo de uma
linguagem acaba influenciando no processo de identificação do sujeito individual e sua
relação com a comunidade LGBT.
No terceiro capítulo privilegiei a discussão acerca da política do armário, as
formas que estes sujeitos encontraram para estabelecer formas de publicidade de suas
orientações sexuais, com o objetivo de entender como esses sujeitos desviam-se das
convenções de gênero, estabelecidas pelo senso comum, buscando na linguagem o
diferencial que faltava na busca pelo rompimento do ethos convencional.
E para finalizar, pude concluir que este trabalho apenas inicia uma análise (ainda
que breve) sobre as identidades homossexuais em Belém, as formas como elas acabam
sendo incorporadas pela sociedade, mesmo que encontrem condições adversas durante o
coming out, como a tentativa de enquadramento da homossexualidade nas convenções
sociais, fazendo com que o “armário” seja um elemento determinante na produção de
sujeitos políticos.
Capítulo 1
A opção pela etnografia: trabalhando com sexualidade na Amazônia
Este trabalho é resultado de pesquisa bibliográfica e de campo realizada na
cidade de Belém, entre os anos de 2007 e 2009, com o objetivo de acompanhar alguns
sujeitos falantes de uma gíria estranha à maioria das pessoas, em grande parte indivíduos
com uma orientação sexual considerada como não heterossexual, mas que faz parte de um
processo de sociabilidade e formação de identidades lésbicas, gays, bissexuais, travestis e
transexuais (LGBT), ainda considerados como uma “minoria”, e que fazem de suas
performances na cidade o locus privilegiado para a disseminação do bajubá, gíria urbana,
como forma ritualística de aceitação ao grupo.
1.1 Em busca de um tema de pesquisa
As raízes deste trabalho estão no primeiro semestre de 2007 quando, em função
da minha participação no Projeto Extracurricular Temático/Grupo de Trabalho em Ciências
Sociais1 (Pet/GT/CS), fora sugerido em reunião que haveríamos que trabalhar um tema de
pesquisa proposto e decidido coletivamente, com período de tempo determinado de um
ano, entre o início da pesquisa e a conclusão.
Com o intuito de marcar presença, pois era novato no Pet/GT/CS (havia
começado a participar das reuniões no primeiro semestre de 2006, com a intenção de
ministrar a disciplina de Sociologia no cursinho pré-vestibular “Projeto Universidade Aberta”
(PUA), organizado pelo PET2-Física. Porém, como essa reunião nunca aconteceu, continuei a
1 Projeto da Faculdade de Ciências Sociais coordenado pelos professores Samuel Sá, Wilma Leitão e Denise
Cardoso. 2 O Programa de Educação Tutorial é mantido pelo MEC-SESU e existe em diversas instituições de ensino
superior que objetiva o desenvolvimento do ensino, da pesquisa e da extensão nos cursos de graduação.
enveredar na pesquisa sozinho, e em um momento específico com a ajuda de duas amigas3,
com a intenção de trabalhar o tema em disciplina, parte integrante do currículo do curso.
Na disciplina “Métodos e Técnicas de Pesquisa Aplicadas às Ciências Sociais I”, no
segundo semestre de 2006, havia trabalhado com outro tema, mas em “Métodos II”, no
primeiro semestre de 2007, resolvi que era hora d’eu assumir a temática como objeto de
estudo para o Trabalho de Conclusão de Curso. E partindo desta perspectiva, comecei a
escrever um artigo, a partir de algumas entrevistas informais com alguns amigos, e depois
com entrevistas formais (não estruturadas) com interlocutores escolhidos a partir da minha
rede pessoal e que me permitiu inscrever o trabalho no V Encontro Nacional Universitário de
Diversidade Sexual (ENUDS4), ocorrido no segundo semestre de 2007, em Goiânia-GO.
O alerta, para inscrever o trabalho neste encontro, veio através de uma
professora coordenadora5 do Pet/GT/CS que conhecia uma aluna do curso (Elane Pantoja)
ligada ao Grupo Orquídeas6, que estava coordenando a ida de seus militantes para o
encontro em Goiânia. E depois de dois contatos com o grupo foi-me concedido um lugar no
ônibus que fez a viagem de Belém à Goiânia.
Com o título “Babados, Truque e ‘Bafons’: uma leitura antropológica das gírias
utilizadas pelos homossexuais em Belém-PA” o trabalho foi aprovado pela Comissão
Organizadora do encontro, o Grupo Colcha de Retalhos7 da Universidade Federal de Goiás, e
com o objetivo de apresentar os primeiros resultados da pesquisa desenvolvida para
disciplina, em forma de artigo, no V ENUDS, viajei com o Grupo Orquídeas.
O interesse pela temática da diversidade sexual foi aguçado pelo fato de haver
percebido que as discussões no V ENUDS almejavam e alcançavam uma excelência
acadêmica que eu ainda não tinha percebido na Universidade Federal do Pará (UFPA). No
entanto, em algumas universidades federais, como foi possível constatar nas plenárias
3 Barbara Cardoso e Sandra Palheta.
4 O 1º ENUDS aconteceu em 2003, na cidade de Belo Horizonte-MG, tendo como um dos objetivos o fomento e
articulação para criação de grupos de diversidade sexual nas universidades brasileiras. Nos anos seguintes, as cidades de Recife-PE (2004), Niterói-RJ (2005), Vitória-ES (2006), Goiânia-GO (2007), Belém-PA (2008) e Belo Horizonte-MG (2009) sediaram uma edição do encontro. 5 Profa. Wilma Leitão.
6 Movimento Universitário em Defesa da Diversidade Sexual – Grupo Orquídeas.
7 Assim como o Colcha de Retalhos na UFG e o Orquídeas na UFPA existem outros grupos de diversidade em
universidades espalhadas pelo Brasil: Pontes (UFRRJ), NuDU (UNICAMP), Diversitas (UFF), Klaus (UnB), Plur@l (UFES), Ciranda (UERJ), Kiu! (UFBA), Avessos (UCSAL), MULES (UFMT), Pathernon (UFRJ), GUDDS! (UFMG), Prisma (USP), etc.
(inicial e final), existiam grupos e/ou coletivos estudantis que tinham a diversidade sexual
como tema central das discussões acadêmico-científicas.
E na UFPA existe o Movimento Universitário em Defesa da Diversidade Sexual –
Grupo OrQuídeas criado, oficialmente, em 13 de julho de 2007, na reunião final da 59ª
Reunião Anual da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciências (SBPC) ocorrida na
capital paraense, no auditório da Fundação Cultural do Pará “Tancredo Neves” (ou CENTUR),
com o objetivo de pautar as questões relativas à diversidade sexual, dentro desta IES, de
maneira acadêmico-científica. E, após apresentação de trabalho em Goiânia, resolvi filiar-me
ao grupo, como maneira de estimular a produção na própria UFPA, assim como desenvolver
as minhas intenções de pesquisa com o apoio de um coletivo, que me ajudaria,
principalmente, nas questões teóricas, tão novas para mim.
Neste ínterim (2º semestre de 2007) em que o “pânico” em escolher uma das
ênfases do curso, dentre as três disponíveis (Antropologia, Ciência Política e Sociologia), fez
com que eu escolhesse a tida como a mais “dura” e “difícil” entre as três (como escutava
meus colegas dizerem) e que repensasse na abordagem que daria ao TCC, sem, no entanto,
perder de vista o objeto de pesquisa por mim já delimitado: o estudo do bajubá como
elemento na construção da identidade de LGBTs.
As disciplinas da ênfase em Ciência Política, parte integrante do currículo visível
do curso, não me proporcionaram o estímulo necessário à continuação da pesquisa em
curso, mas eu fazia do currículo invisível o motor estimulante para dar continuidade a um
tema pouco relevante nesta, pois ela estava sempre atenta aos temas da macro-política,
como as eleições, partidos políticos e instituições e pouco próxima de temas da micro-
política, como a sexualidade, as relações de gênero, e neste caso especial, a linguagem do
bajubá.
O que acabei por chamar de currículo visível eram as disciplinas da ênfase em
Ciência Política, parte obrigatória do currículo do curso, que me estimulavam pouco a refletir
acerca das questões referentes à diversidade sexual. O que batizei de currículo invisível
eram/são as maneiras que encontrei, buscando em livros, periódicos e revistas
especializadas – como, por exemplo, os Cadernos PAGU da UNICAMP e a Revista de Estudos
Feministas –, para me apropriar do tema, partindo de uma visão antropológica para
continuar estudando o uso da linguagem como marcador de distinção, pois, de acordo com
Brandão (1986, p. 46), “não haverá sujeito, dimensão ou aspecto de nossa sociedade que
não sejam hoje lugar e assunto de interesse sistemático da Antropologia”.
1.2 Vasculhando, pesquisando, constatando
Havendo delimitado o problema de pesquisa, passei a coletar material
bibliográfico, pesquisando primeiro, no acervo da Biblioteca Central “Clodoaldo Beckman”
da UFPA, especialmente na Coleção Amazônia, pois tinha a intenção de saber se existiam
TCCs, dissertações ou teses produzidas nas Ciências Sociais ou áreas correlatas que me
ajudassem a desenvolver o tema, tendo elegido o direcionamento dado pela Antropologia,
às questões sobre sexualidade, ou seja, objetivava “buscar insistentemente, comparar,
integrar e totalizar” as produções paraenses (BRANDÃO, 1986, p. 46).
Depois, passei a pesquisar no SciELO8 (Scientific Eletronic Library Online), no
Google Acadêmico e nos sites das principais universidades federais (e que se sobressaem
nos estudos sobre sexualidade) e, principalmente, nos programas de pós-graduação em
Antropologia, qualquer material relacionado à homossexualidade que pudesse esclarecer
algumas dúvidas básicas que eu tinha, na época, e que ainda não haviam sido supridas pelas
disciplinas do curso de graduação, nem pela participação em movimento social.
Neste momento inicial da pesquisa, encontrei somente três dissertações de
mestrado arquivadas na Coleção Amazônia, mas, posteriormente, ao refazer a pesquisa (em
2009) constatei a presença de mais uma dissertação defendida e arquivada na coleção (a
última do quadro), totalizando, então, quatro trabalhos que tiveram na diversidade sexual o
objeto de pesquisa, conforme quadro abaixo.
TÍTULO DA DISSERTAÇÃO AUTOR(A) LOCAL ANO DE DEFESA
“Tribos Urbanas em Belém: Drag Queens – rainhas ou dragões?”
Izabela Jatene de Souza Programa de
Pós-Graduação em
1998
8 Página da web especializada em periódicos e revistas especializadas.
Antropologia
“As bonecas da pista no horizonte da cidadania: uma
jornada no cotidiano travesti” Rubens da Silva Ferreira
Núcleo de Altos Estudos
Amazônicos 2003
“A análise da investigação dos determinantes do
comportamento homossexual humano”
Aline Beckman Menezes
Programa de Pós-Graduação
de Teoria e Pesquisa do
Comportamento
2005
“Demandas homoeróticas e adoção em Belém”
Eli do Socorro Pinheiro Teixeira
Programa de Pós-Graduação
em Serviço Social
2007
Quadro 1: DISSERTAÇÕES sobre homossexualidade, travestilidade e drag queens. Fonte: Pesquisa de campo, 2009.
Quanto à produção de TCCs nas Ciências Sociais, pude observar, ao cursar a
disciplina “Estágio Supervisionado em Ciência Política”, no primeiro semestre de 2009, no
Laboratório de Pesquisa e Ensino em Ciências Sociais (criado a partir do desmantelamento
do antigo Laboratório de Metodologia) onde ficam arquivados os Trabalhos de Conclusão de
Curso defendidos, desde que fora institucionalizada a defesa como parte da obtenção do
diploma de graduação em Ciências Sociais, que havia poucos trabalhos ligados à temática da
homosexualidade.
E quando estava fazendo o levantamento sobre os TCCs que haviam trabalhado a
temática, pude constatar a presença de, somente, quatro trabalhos arquivados no novo
Laboratório. Porém, a partir de uma busca pessoal no site do CNPq, acabei me deparando
com um dado novo: um TCC defendido, no final da década de 1980, por uma professora da
Faculdade de Ciências Sociais, Telma Amaral Gonçalves, na época aluna do curso, cujo título
“Homossexualidade – representações, preconceito e discriminação em Belém” me fez
considerar a possibilidade de haver mais produções do que eu havia pensado e que não
estão disponíveis para consulta (como mostra o quadro 2).
TÍTULO DO TCC AUTOR(A) ÊNFASE ANO DE DEFESA
“Homossexualidade – representações, preconceito e
Telma Amaral Gonçalves Antropologia 1989
discriminação em Belém”
“Algumas contribuições educacionais da
homossexualidade sobre o caráter psico-social”
Laodicéia Corrêa Pinto Sociologia 1995
“Homossexualidade: história, vida e luta”
Mª das Graças dos Santos Brito
Antropologia 2000
“Desmistificando os ‘balaios de gatos’: a heterogeneidade
homossexual”
Fabrício Rodrigo Silva de Araújo
Antropologia 2004
“O movimento homossexual em Belém do Pará: uma
aproximação à luz da experiência do Grupo Homossexual do Pará”
Mª Jeane da Silva Cavalcante
Ciência Política 2005
Quadro 2: TCCs sobre homossexualidade. Fonte: Pesquisa de campo, 2009.
Tempos depois, pude obter das mãos dessa professora o original do trabalho, a
partir do qual pude refletir acerca dos procedimentos metodológicos que ela havia tomado,
haja vista estarmos em épocas diferentes, possuirmos leituras e lutas distintas, e, ainda,
porque na década de 1980 ainda eram muito fortes as barreiras erigidas em favor do
preconceito e discriminação contra homossexuais por conta da AIDS. Não que isso tenha
acabado, porém a forma como hoje se manifesta a publicidade da homossexualidade
encontra outros alicerces no qual se fundamentar, porém deixaremos isso para os próximos
capítulos.
Após ser feita essa busca, que continua incessante, ainda, comecei a leitura de
artigos, livros, periódicos (com os quais tive contato) que tratavam de sexualidade, além de
buscar nas referências desses textos os autores que são considerados clássicos nos estudos
sobre homossexualidade, com este procedimento pude entrar em contato com Michel
Foucault (1997; 2001; 2008), Peter Fry (1982; 1983), Luiz Mott (2006), Judith Butler (2003),
dentre outros.
1.3 Reflexões iniciais sobre homossexualidade
O contato inicial com autores clássicos nos estudos sobre sexualidade me fez
repensar sobre o caminho que tinha percorrido até aqui, pois havia escolhido um curso de
graduação que me possibilitaria um leque gigantesco de opções de pesquisas para o TCC,
porém havia escolhido a ênfase em Ciência Política e percebia que meu campo de ação
precisava ser expandido.
No segundo semestre de 2008, duas disciplinas do Programa de Pós-Graduação
em Ciências Sociais (PPGCS) me ajudaram a desenvolver teórico-metodologicamente este
problema de pesquisa: “Práticas Culturais em Espaço Urbano” e “Normais v.s Anormais
segundo Michel Foucault”. Na primeira, ministrada pela profa. Carmem Izabel Rodrigues
(orientadora deste trabalho) foi onde passei a refletir sobre o espaço urbano, a sociabilidade
e a formação de identidades nas cidades – pano de fundo da minha pesquisa, pois havia
percebido, inicialmente, que a cidade possui um significado especial para as práticas
desenvolvidas pelos indivíduos LGBTs – e, na segunda, ministrada pelo prof. Ernani Chaves,
foi onde comecei a ter contato com a obra de um dos autores clássicos nos estudos da
homossexualidade.
Após esse período, no primeiro semestre de 2009, tive contato, novamente, com
a obra de Foucault no PPGCS, quando fui aluno-ouvinte da disciplina “História da
Sexualidade segundo Michel Foucault”. E agora, enquanto escrevo este TCC, acabei de ter
outra experiência com os estudos sobre gênero e sexualidade, além do contato com a
antropologia nas disciplinas “Sexualidade, Corpo e Gênero”, com a profa. Cristina Cancela e
“Antropologia Urbana” com o prof. Maurício Costa.
Essas disciplinas, além do contato com os alunos do PPGCS e a leitura de uma
publicação do próprio Programa, onde se fez levantamento das pesquisas defendidas no
curso de mestrado em antropologia até o ano de 2003, me fizeram perceber que os temas
ligados à sexualidade eram apenas transversais às diversas temáticas, não tendo encontrado
nenhuma pesquisa cujo principal problema esteja ligado às práticas homossexuais na cidade
de Belém.
1.4 Efetivando uma decisão
Nos momentos iniciais desta pesquisa, ainda em 2007, quando passei a fazer
parte do Grupo Orquídeas, quase sempre, fazíamos um balanço de quantos trabalhos de
conclusão seriam desenvolvidos pelos membros do coletivo, porém foi somente a partir de
2008 que, de fato, as monografias começaram a ser defendidas. Elegendo a diversidade
sexual como tema principal estes trabalhos trouxeram outras perspectiva sobre as pesquisas
desenvolvidas em suas faculdades, como demonstra o quadro abaixo.
TÍTULO DO TCC AUTOR(A) LOCAL ANO DE DEFESA
“Criminalização de práticas discriminatórias: respeito aos
direitos fundamentais no combate à homofobia”
Samuel Luiz de Souza Junior Faculdade de
Direito 2008
“Gênero e homossexualidade: compreensão a partir dos
discursos de enfermeiros(as) docentes das instituições
públicas de ensino superior de Belém”
Osmar de Souza Reis Junior Faculdade de Enfermagem
2009
“As experiências das mulheres que perpassam suas práticas
sexuais pela homossexualidade frente à existência ou não de
preconceito por parte de profissionais da área da saúde”
Francielle da Silva Quaresma Faculdade de Enfermagem
2009
“Transexualidade e Direito: rediscutindo gênero pela perspectiva dos Direitos
Humanos”
Diogo Souza Monteiro Faculdade de
Direito 2009
“Autopercepção em travestis da cidade de Belém”
Warlington Luz Lobo Faculdade de
Psicologia 2009
“Conjugalidades homossexuais na mídia televisiva: o discurso
midiático pautando as relações homoconjugais expostas no
seriado Queer as Folk”
Ramon Pereira dos Reis Faculdade de
Ciências Sociais
2010
Quadro 3: TCCs dos membros do Grupo Orquídeas. Fonte: Pesquisa de campo, 2009.
E valendo-me do objetivo do Grupo, procurei desenvolver um trabalho de cunho
etnográfico, na tentativa de direcionar a atenção para os discursos dos sujeitos
interlocutores desta pesquisa, realizada em Belém, em períodos de tempo alternados, e que
objetiva relacionar o uso e apropriação do bajubá com a construção da identidade LGBT,
além de entender como esses sujeitos negociam a “saída do armário”, em diferentes esferas
de vivência, seja no âmbito familiar ou não, haja vista outros fatores influenciarem o coming
out e impedirem a vivência plena de uma homossexualidade.
De certa forma, os acontecimentos descritos até aqui, me levaram a refletir
sobre a escolha dos entrevistados, pois tendo contato com a militância organizada
considerei o fato de que havia entre os indivíduos militantes certo alinhamento de discurso,
onde os acontecimentos se davam em cadeia, por exemplo, com a descoberta da
homossexualidade, o conflito com os pais ou com um deles ou com quem representasse
esse papel, a saída ou não de casa, o contato com as ONGs9 e o “esclarecimento” alcançado
através da compreensão de questões macro-políticas e a formação de um sujeito político
que acabava tornando os discursos uníssonos.
Dessa forma, comecei descartando indivíduos ligados à militância LGBT e
mantive contatos iniciais, nas boates do centro de Belém, com pessoas que quisessem
participar da pesquisa e dispostas a serem entrevistadas, sendo que a escolha destes lugares
deveu-se por conta da possibilidade de uma abordagem com menos constrangimento, para
eles e para mim, pois a princípio estávamos envoltos numa aura festiva, de descontração, e
que, portanto, seria um elemento facilitador na aproximação com o entrevistado. Mas
outros contatos, também, foram feitos através de sites de relacionamento e de conversa
instantânea10, partindo da rede de amigos para isso, mas no final resolvi entrevistar somente
6 pessoas do grupo escolhido inicialmente, devido aos problemas de desencontro ocorridos
de ambos os lados11.
Isto posto, o grupo pesquisado é composto por 6 homens, com idade entre 16 e
26 anos, moradores da área metropolitana de Belém, em bairros da periferia, todos tendo se
9 Em Belém existem o GHP (Grupo Homossexual do Pará), Apolo (Grupo pela Livre Orientação Sexual), COR
(Cidadania, Orgulho e Respeito), etc. 10
Orkut e MSN. 11
Cabe ressaltar que, no início, havia pensado na possibilidade de entrevistar pessoas de ambos os sexos, de diferentes identidades e performances de gênero, mas abandonei, por hora, esse intento porque os contatos que havia estabelecido com duas meninas na boate não lograram êxito, uma vez que elas não se consideravam “lésbicas” ou “entendidas” e, também, porque não responderam às chamadas para as entrevistas.
auto-atribuído a cor branca, somente um com o ensino superior completo, um outro
cursando o ensino superior, três com o ensino médio completo e um ainda cursando. Sendo
duas as formas como descreveram sua orientação sexual: “homossexual” e “gay”, mas que
em outros momentos, também, acabavam se considerando “bichas” e todos considerando a
“juventude” como o estágio pelo qual estão passando (a partir do exame de algumas
respostas contidas nas entrevistas), de acordo com o quadro 4.
nome12 idade orientação sexual (auto-atribuída) escolaridade cor/raça
(auto-atribuída)
bairro de Belém onde
mora
XY1 16 anos gay ens. médio incompleto branco Maguary
XY2 21 anos gay ens. médio completo branco Guamá
XY3 22 anos homossexual ens. médio completo branco Marco
XY4 22 anos gay ens. médio completo branco Marambaia
XY5 24 anos gay ensino superior incompleto branco Pedreira
XY6 26 anos homossexual ensino superior completo branco Pedreira Quadro 4: Sujeitos da pesquisa. Fonte: Pesquisa de campo, 2009.
Durante a pesquisa, consegui manter contato com alguns deles e apesar desse
não ser meu objeto de estudo, questões relativas aos relacionamentos, passados ou
presentes, entravam sempre em discussão, levando em consideração que, para alguns deles,
a homossexualidade, principalmente a masculina, estaria ligada a certo tipo de conduta que
entendi como “livre de amarras monogâmicas”, onde a prática do relacionamento aberto
encontra um solo propício, pois “a juventude é o que se tem agora”, como afirmou um
deles, para evidenciar que poderia viver relacionamentos extra-oficiais.
Portanto, a partir da decisão por uma etnografia sobre homossexualidade em
Belém pude constatar inicialmente que os indivíduos não-militantes mantinham discursos
diferentes dos que eu havia notado até então, como parte da militância organizada. E pude,
então, constatar que o discurso difundido no movimento é apenas um dos vários que se
12
Os nomes dos entrevistados foram substituídos pelas letras “XY” acompanhadas de um número na alusão ao entendimento que Ludovic faz, no filme Ma vie em rose, sobre a definição dos sexos biológicos, quando ele conclui que Deus foi “esperto” em deixar cair um de seus “X” no lixo e tê-lo feito menino, mas quando for resolvida a confusão (e a ele ser devolvido o “X” que falta) então ele poderá se casar com Jérôme (cf. MARQUES FILHO e CAMARGO, 2008).
pode ouvir. Assim sendo procurei na observação participante e nas entrevistas realizadas ao
longo de 2009 a metodologia mais apropriada para construção deste trabalho. E nos
capítulos seguintes procurarei desvendar como estes sujeitos encaram a experiência de ser
homossexual em Belém, com todas as dificuldades que esta identidade possa trazer.
Capítulo 2
Aquendando o bajubá13: gênero, sexualidade, formação de identidade e o bajubá em Belém
Neste capítulo pretendo fazer algumas considerações sobre o campo e algumas
reflexões teórico-metodológicas adotadas neste trabalho, através da análise das entrevistas
realizadas durante o primeiro e segundo semestre de 2009, acerca da construção da
identidade homossexual em Belém-PA, os seus desdobramentos sobre a sociabilidade
urbana e a apropriação e uso do bajubá, como elemento de distinção e facilitador na
dinâmica da comunidade LGBT.
2.1 Um breve olhar sobre as relações de gênero em Belém
Entre os dias 05 e 08 de junho de 2008 foi realizado, em Brasília-DF, a I
Conferência Nacional GLBT, um marco na história do movimento organizado no Brasil, sendo
a primeira e, talvez, a única no mundo, preocupou-se em debater questões sobre
discriminação e preconceito, além dos impactos das políticas públicas na vida cotidiana dos
indivíduos LGBT, tendo o Governo Federal como promotor, através da Secretaria Especial de
Direitos Humanos (SEDH) e com o apoio de 18 ministérios, além de agir no combate à
homofobia e iniciar a “elaboração do Plano Nacional de Promoção da Cidadania e Direitos
Humanos LGBT (BRASIL DIREITOS HUMANOS, 2008, p. 103).
Na plenária final, dentre outras deliberações, fora decidido que a ordem da sigla
que designa o movimento organizado no Brasil deveria mudar: de GLBT para LGBT. Sendo,
neste caso, um avanço importante no reconhecimento de um duplo preconceito envolvendo
as mulheres lésbicas: primeiro por serem mulheres e segundo por serem lésbicas. E por,
talvez, a plenária ter entendido que este marcador (o gênero) foi tão importante
13
Nome dado à gíria urbana de ampla divulgação entre os LGBTs.
historicamente, na existência do movimento organizado brasileiro, quanto os que
determinaram a retirada do homossexualismo14 do Catálogo Internacional de Doenças (CID-
10) da Organização Mundial de Saúde (OMS), em 1992, e a escolha pelo termo orientação15,
em vez de opção, para se referir a pessoas que vivenciam situações de homocorporalidades
(Heilborn, 2004), relações homossociais (Guimarães, 2004), homoeróticas, etc.
Neste caso, Bourdieu (2007) já aponta para o fato das mulheres, ao longo da
história, terem padecido pela dominação masculina. E o esquema sinóptico bourdiesiano,
como possibilidade de análise das relações de gênero, com base no feminino como “gênero
diminuto”, de compreensão do modelo universal de dominação masculina, onde o ethos
político-cultural está assentado no ideal falocêntrico, ajuda a elucidar o fato de que a
construção da invisibilidade por que passaram as mulheres, não só no convívio sócio-
cultural, mas também no campo científico foi/é uma construção, também.
Um dos meus entrevistados aponta para o modelo de educação familiar no qual
foi socializado e nos ajuda a refletir sobre o modelo hegemônico de masculinidade,
enquanto padrão universal na nossa sociedade, que acaba construindo modalidades de
experiências para serem vividas distintamente entre meninos e meninas e que apareceria
como uma das causas da dominação masculina (BOURDIEU, 2007) e que nossa prática
cultural acaba ditando como norma.
As considerações a seguir apontam para um tipo de tratamento diferenciado que
é colocado para as crianças, onde os meninos devem externar uma virilidade e as meninas
são direcionadas ao comedimento, à docilidade.
Quando a gente ia brincar pra rua lá em casa tinha esse lance de homem não chora, briga na rua, bate, nunca apanha e se apanha na rua, apanha em casa também. E quando a brincadeira era dentro de casa, no quintal, somente as meninas podiam brincar de boneca, de casinha, dessas coisas de mulher. Então quando tinha que brincar com meus primos, vizinhos, amigos e mesmo quando os meninos iam brincar ele tinha que ser o pai, o filho, nunca a mãe, pois não podia, né? (XY1, 16 anos, 18/09/2009)
14
Este fato demarcou o uso da expressão homossexualidade para se referir às práticas homocorpóreas, homoeróticas, homossociais, homoafins, etc. 15
Segundo Facchini (2003, p. 101) foi na “segunda onda” do movimento organizado brasileiro que ficou acertado que o termo mais apropriado para definir pessoas homoafins seria orientação sexual, em detrimento do termo opção sexual, levando em consideração que a escolha de parceiro(a) afetivo-sexual não ocorre de forma deliberada, ou seja, com base em uma escolha racional, afastando o essencialismo do antigo termo.
Como notamos, há uma diferença no tratamento dado às crianças, que são
divididas em meninos e meninas, e que faz com que se inicie um processo de hierarquização
nas relações de gênero e comece o processo de assimilação da performatividade e da
performance atribuídas a cada gênero, enquanto estrutura binária, porém, é importante
ressaltar que essas inteligibilidades, que pressupõem uma heterossexualidade, encontram
assento na construção cultural do indivíduo em sociedade (BUTLER, 2003).
Meu intento, neste momento, não é fazer uma longa explanação sobre os
conceitos acerca das relações de gênero, mas demonstrar que as práticas discriminatórias
sobre a homossexualidade estão assentadas tanto em uma clara distinção entre os gêneros
(e a perpetuação da mesma através das práticas e ligações com certa natureza distintiva
entre eles), onde o masculino ocupa uma posição superior nesta hierarquia, quanto na
impossibilidade de se pensar uma relação de amizade entre pessoas do mesmo sexo
(FOUCAULT, 1981)
2.2 Um breve olhar sobre a homossexualidade em Belém
No ano de 1974 o antropólogo Peter Fry veio a Belém e conviveu nos meios
homossexuais da cidade e, após as quatro semanas e meia de convívio, escreveu um breve
artigo, considerado hoje como um dos trabalhos pioneiros sobre a homossexualidade no
país, fazendo uma relação entre a homossexualidade e os cultos afro-brasileiros. A partir
deste momento foram estabelecidas, em nível analítico, bases que, ainda, perduram na
compreensão do comportamento homossexual masculino (FRY, 1982; FRY 1983).
Os tipos dicotômicos descritos por Fry (1982) como bicha e bofe assentam, em si
mesmos, reflexos marcados pelas relações hierárquicas de gênero, presentes na sociedade
brasileira, onde o primeiro acaba por ser ligado ao feminino, sendo passivo na relação,
manifestando trejeitos afeminados e, até mesmo, querendo ser mulher, enquanto que o
segundo continua a se comportar como “homem de verdade”, mantém seu papel ativo e
rejeita ser classificado como homossexual.
Alguns reflexos das considerações feitas acima, ainda, podem ser sentidos, pois
quando questionado sobre sua orientação sexual (auto-atribuição) um de meus
informantes16 deu a seguinte declaração:
Pode até tá na cara que eu sou gay, mas as pessoas geralmente gostam de dizer homossexual, entendido, elas querem te agradar e acaba que é sempre aquela coisa de que homossexual é o seu filho e gay é o filho do vizinho, pois a bichinha nunca é aceita, sempre são discriminadas. E isso deve ser pelo fato de que muitas querem ser mulher, querem virar mulher (risos) (XY6, 26 anos, 26/09/2009)
O indivíduo homossexual aparece, neste caso, hierarquizado dependendo do
indivíduo que “acusa”, uma vez que no discurso deste entrevistado surgiram quatro
categorias de definição da identidade gay, e que estão colocadas como pares distintos: o
“homossexual” ou “entendido” como a identidade aceita e o “gay” ou “bichinha” como a
identidade deteriorada, portanto, não-aceita, pois para este entrevistado o querer ser
mulher, querer virar mulher é algo que estaria fora da condição homossexual, ilustrando que
sua posição na hierarquia das relações de gênero e da sexualidade estaria um pouco abaixo,
ou fora, das características que as localizariam como “homossexual”.
Um momento histórico foi determinante para criação da “espécie” homossexual,
e foi por volta 1870, como diz Foucault (1997), que os mecanismos de saber-poder criaram
um tipo específico, que seria construído, para poder ser estudado, e que, portanto, suas
ações seriam causas da sexualidade aflorada:
A homossexualidade apareceu como uma das formas de sexualidade quando foi transposta da prática de sodomia para um tipo de androginia interior, um hermafroditismo da alma. O sodomita tinha sido uma aberração temporária; o homossexual era agora uma espécie (p. 43-44).
16 Por parte dos informantes, nos momentos das entrevistas, havia certa preocupação com as respostas dadas,
apesar de anteriormente ter-lhes mostrado o projeto de TCC e dizer que os relatos seriam destinados apenas para fins acadêmicos e que suas identidades não seriam reveladas, quase sempre tinham receio de como seriam utilizados os dados colhidos por mim, talvez seja por isso que parte das considerações sobre sua sexualidade às vezes pareça opaco, mas essas são as considerações que fiz a respeito destas questões, sendo passíveis de interpretações outras. E, ao longo do período de convivência, não cansei de expor-lhes quais eram os objetivos da pesquisa e a que fins se destinavam.
Em Belém, as considerações sobre ser ou não ser homossexual evidenciam que
os discursos estão impregnados do conteúdo biomédico e, porque não dizer, do conteúdo
das ciências psi, também. Entretanto, outras formas de considerar-se como um indivíduo
com práticas homoafetivas, sem, no entanto, recorrer a tal identidade fixa (que parece
querer enquadrar todos numa única caixa) será explorada na próxima seção.
2.3 Identidade, sociabilidade: conflitos, soluções
Durante as entrevistas notei certa fluidez identitária entre os participantes, pois
na medida em que algumas considerações acerca de suas orientações sexuais eram
escamoteadas ou negligenciadas, nos acontecimentos importantes narrados, e quando era
por mim percebida, tentava fazer com que eles me dissessem o motivo do “deslize” (de
encobrir, por exemplo, que era gay) e a partir desses pontos percebi que as considerações
de Woodward (2007) sobre identidades se mostram pertinentes, pois
A complexidade da vida moderna exige que assumamos diferentes identidades, mas essas diferentes identidades podem estar em conflito. Podemos viver, em nossas vidas pessoais, tensões entre nossas diferentes identidades quando aquilo que é exigido por uma identidade interfere com as exigências de uma outra (p. 31)
Neste complexo jogo de identidades, em que aparece para alguns sujeitos, como
os dessa pesquisa, a difícil tarefa de ocultamento de uma identidade estigmatizada pela
sociedade, como a belenense, por exemplo, e que a isso acarretem uma série de tensões
pessoais, familiares, profissionais, etc. que advém do propósito de sombreamento da
homossexualidade, percebe-se, claramente, na autora acima, a proposta de afirmação de
que a “cultura molda a identidade” (WOODWARD, 2007, p. 18).
Ainda que, nesta seção, pretenda discutir a formação de uma identidade
homossexual em Belém, reitero que meu propósito, também, é verificar a “política do
armário” enquanto elemento na constituição desta identidade, porém o farei mais
detalhado no capítulo seguinte. Porém, parte de uma das entrevistas, transcrita abaixo,
ajuda a desenvolver, em parte, meu raciocínio:
[...] sempre soube que gostava de meninos, mas eu acabei negando pra todo mundo até que me apaixonei pela primeira vez, quando eu tinha uns 17 anos, por um menino que conheci na boate [...] fui lá com amigos e lá descobri que eu era gay [...] tinha muita gente, todo mundo se pegando, beijando pra todo mundo ver [...] e depois só namorei com homens (XY5, 24 anos, 09/10/2009)
Neste trecho, percebemos que não existe diferença conceitual entre as
categorias “gay”, “homossexual”, “HSH17” ou outra qualquer para este informante, tendo ele
o entendimento de que manter um relacionamento afetivo-sexual com outro homem é,
portanto, o que o caracterizaria como gay. Mas, também, o que visualizo nesta parte é a
percepção que ele faz da sua própria sexualidade a partir do contato com uma rede de
amigos, que acabam por levá-lo à boate, e a experiência um tanto essencialista da
percepção de sua orientação sexual: a de que “sempre soube que gostava de meninos”;
como se aquilo fosse parte de uma natureza latente; onde a “descoberta” só se deu
mediante a apresentação a um público gay.
Apesar de não querer pautar, nesta discussão, o caráter essencialista da
homossexualidade e, em via disso, de uma identidade homossexual pura, visto que ela não
existe, pois as “identidades sexuais também estão mudando, tornando-se mais questionadas
e ambíguas, sugerindo mudanças e fragmentação que podem ser descritas em termos de
uma crise de identidade” (WOODWARD, 2007, p. 31), tenho que fazer referência às
proposições de Hall (2006) sobre o declínio das velhas identidades e que faz surgir novas
identidades, fragmentando o indivíduo moderno, pois essa “crise de identidade” é um
processo amplo de mudanças, que acaba deslocando as estruturas e processos centrais da
sociedade moderna.
Contudo, a homossexualidade transcende o âmbito das relações afetivo-sexuais
posto que, de certa forma, acabou se transformando em elemento crucial no processo de
17
Essa sigla que dizer “Homem que faz Sexo com Homem” e que, portanto, não se remete à identidade homossexual, sendo utilizada nas políticas de promoção à saúde do homem.
subjetivação, na sociabilidade e constituição de um mercado de bens simbólicos
(FOUCAULT, 1997; BOURDIEU, 2001). E isso acaba fazendo com que a sexualidade seja
considerada como parte do processo de subjetivação, por isso, talvez, ganhe importância
acentuada na sociedade moderna e seja referência na identificação dos sujeitos, de acordo
com Foucault (1997).
E, dentro dos aspectos de sociabilidade, a homossexualidade demarca um ethos
distinto do modelo vivenciado pela sociedade heterossexual, que até mesmo podem ser
objetos de uma classe média urbana e que, por sofrerem influências de ciências ligadas à
área do conhecimento psi, tendem a revelar em sua fala noções sobre a homossexualidade
como transtorno, doença ou distúrbio, parecidas como a idéia do homossexual egodistônico
que, mesmo sabendo de sua condição, almeja a mudança, pelo menos no campo psicológico
(MOTT, 2002; FRY, 1983).
E mesmo que a vida na metrópole possibilite um afastamento d@s
indivíduos/pessoas, como acentua Simmel (1979), com a atitude blasé, especificando que
não podemos interagir emocionalmente com todas as pessoas, mas indo além desta
caracterização, podemos afirmar que a cidade proporciona uma espécie de solidariedade,
muito próxima do tipo proposto por Durkheim, como orgânica, em que: propicia uma
interdependência entre corporalidades, vivências, atitudes, linguagens, etc. onde uma
pessoa acaba por influenciar outras.
A idéia de Simmel (1983) é que a sociabilidade é uma forma de sociação, cujo fim
é a própria relação, ou seja, os laços estabelecidos entre os indivíduos têm uma razão em si
mesmos. Na pureza de suas manifestações, a sociabilidade não tem propósitos objetivos,
conteúdo ou resultados exteriores. Seu alvo é o sucesso do momento sociável, onde “cada
indivíduo deve oferecer o máximo de valores sociais (de alegria, de realce, de vivacidade,
etc.) compatível com o máximo de valores que o próprio indivíduo recebe” (p. 172).
Hodiernamente, acaba por ocorrer uma modificação nas formas de sociabilidade,
que passaram a ser fluidas, divergindo das formas tradicionais, que tendiam a ser mais
estáveis, sendo aquelas consideradas mais “abertas e movediças”, pois na modernidade, os
sujeitos acabam desempenhando uma grande diversidade de experiências, podendo
pertencer a uma ou mais coletividades, simultaneamente ou não, isto é, acabam por
vivenciar várias identidades.
O pertencimento e/ou a construção da identidade homossexual não estaria no
conteúdo da relação, na satisfação de interesses, mas na própria relação, ou seja, no campo
da sociabilidade, do estar junto, estabelecendo laços, pois tem em si mesmo a sua razão de
ser, o fortalecimento de uma rede homossocial (Guimarães, 2004):
[...] os momentos em que estou com meus amigos é pra me divertir. Sempre que encontro com eles conversamos sobre ocó, roupa, festa, música, essas conversas de bichas [...] [mas] nas boates quase não dá pra conversar porque é muita cassação, muitas linhas e porque o som atrapalha um pouco, é muito alto (XY2, 21 anos, 26/08/2009)
Portanto, se não existe outro tipo de interesse, além da própria relação, para que
ela continue existindo é preciso que se estreitem os laços. E Simmel (1983) acredita que a
realidade social só existe porque existe conflito, pois se as tensões estão presentes em todas
as esferas (individual, grupal e social), bem como entre as esferas, então, a investigação do
processo de construção da intersubjetividade no mundo da vida cotidiana, seja na busca das
formas da interação na sociedade, a matéria da sociação deve ser buscada nas relações
entre os sujeitos.
Então, podemos afirmar que tanto a construção identitária quanto a
fundamentação de uma sociabilidade de tipo específico, como a homossexual, nascem de
um conflito e que aparecem ancoradas por uma situação de oposição, onde: no caso do
primeiro, o outro heterossexual é a norma e, no caso do segundo, cria-se uma sustentação
dos laços de afinidade.
2.4 Uso e apropriação do bajubá
Quando Fry (1984) fez sua incursão por terras paraenses, tentado buscar uma
relação causal entre a homossexualidade masculina e os cultos afro-brasileiros, talvez, tenha
passado despercebido ou possa ser que, até aquele momento, o objeto em questão não
fosse tão difundido entre a comunidade gay, tanto que os escritos desta época não fazem
referência a linguagem/gíria, que aqui defino, como um dos elementos-chave na construção
da identidade LGBT e facilitador na dinâmica social da comunidade.
O bajubá é parte do processo criativo, tão somente incorpore uma série de
palavras de línguas alienígenas, como as provenientes do Iorubá-Nagô (PELÚCIO, 2007;
SILVA FILHO e PALHETA; 2008), do francês, do inglês, quão esteja atrelado ao uso
performático que a linguagem acaba acarretando, ou seja, faz parte de um constructo da
identidade homossexual, como pude perceber durante a pesquisa, pois ele também aparece
como instrumento da sociabilidade, conectando pólos distintos, ou seja, relacionando duas
categorias que não se excluem, mas que por vezes aparecem como, essencialmente,
dicotômicas: a casa e a rua.
Embora Silva Filho e Palheta (2008), tenham atentado para o fato de que é no
espaço da rua em que o bajubá é falado, trago à discussão o conceito de “pedaço”, descrito
por Magnani18 (1998), e que em Pelúcio19 (2007) e Rodrigues20 (2008) aparece como suporte
às suas etnografias realizadas em espaço urbano, como o espaço de interseção entre o
público e o privado, uma vez que esta linguagem (e sua performatividade), também, pode
remeter a um continuum público-privado (ou porque não dizer um continuum folk-urbano21)
quando notei a disseminação do bajubá, através repercussão das Paradas do Orgulho em
todo país, nas entrevistas de (tele)jornais, na mídia eletrônica, na presença de personagens
gays em novelas, séries de TV, programas humorísticos, etc., ou seja, algumas palavras do
bajubá fazendo parte do cotidiano do “mundo heterossexual”.
Enquanto suporte de identidades LGBT, o bajubá, acaba encontrando
possibilidade na difusão que acontece no meio gay ou no uso do “pedaço” gay: onde o
código, que deveria ser restrito somente àqueles que vivenciam a homossexualidade ou
18
Magnani (1998, p. 116) define o pedaço como “espaço intermediário entre o privado (a casa) e o público, onde se desenvolve uma sociabilidade básica, mais ampla que a fundada nos laços familiares, porém mais densa, significativa e estável que as relações formais e indivudualistas impostas pela sociedade”. 19
Pelúcio (2007) esclarece da seguinte forma a apropriação do termo: “Em A casa e a rua, DaMatta estabelece uma triangulação espacial, simbólica e moral entre casa/rua/outro mundo, propondo que estas categorias espaciais estão moralmente opostas. Ainda que não sejam estanques só se definem em oposição umas às outras, ocorrendo o englobamento de um pela outra, mas não o patente trânsito que proponho. Magnani procurou quebrar essa visão dicotomizada de “casa” e “rua” através da idéia de “pedaço” (Nota de rodapé 92, p. 77). 20
Rodrigues (2008, p. 235) diz que são “espaços conhecidos e nominados em um território claramente demarcado e apropriado pelos usuários, lugares de passagem e de encontro entre vizinhos, conhecidos ou chegados”. 21
Quando nos referimos à categoria de Redfield (1949) para referendar que o bajubá nasce de palavras de línguas e/ou dialetos tradicionais, como o Yorubá-Nagô, o francês, o inglês, e que são (justa)postas em outro contexto, tendo como novo nascedouro o meio urbano.
àquele que está inserido no “gueto” gay, como as mulheres heterossexuais, por exemplo, é
o grande responsável pela sociabilidade, pelos encontros com amigos, pela pegação (que
neste caso acontecerá, por vezes, preferencialmente, com quem não fala o bajubá22).
E fazer parte de uma comunidade LGBT, do “pedaço” homossexual, por exemplo,
traz conseqüências, seja na luta por manter o código em sigilo, o mais que puder, seja
“comprar”, “usar” e “difundir” (entre os iguais) as muitas palavras e performances, ou seja,
expandir o bajubá, porém, com ressalvas:
[...] Quando minha mãe me viu conversando com um amigo lá em casa, depois, numa outra conversa, disse que não tinha entendido nada do que eu tinha falado [...] ela tinha escutado a gente falar bafon
23, ocó
24, neca
25, num sei direito... mas eu
disse assim: “não era pra entender, porque se fosse *eu+ não usava o bajubá [...] e depois, mais tarde, eu tive que dizer o que era o bajubá (risos) [...] mas não disse tudo, algumas coisas eu ensinei errado (risos) (XY6, 26 anos, 26/09/2009)
Mas, antes de retomar as considerações acima, permito-me pensar um pouco
sobre uma possível genealogia do bajubá, pois, de acordo com a etnolinguísta Pessoa de
Castro
o iorubá é uma língua única, constituída por um grupo de falares regionais concentrados no sudoeste da Nigéria (ijexá, oió, ifé, ondô, etc.) e no antigo Reino de Queto (Ketu), hoje, no Benim, onde é chamada de nagô, denominação pela qual os iorubás ficaram tradicionalmente conhecidos no Brasil (2009, p. 3)
Então, o iorubá como língua, e que não esteve presente na etnografia sobre a
relação entre homossexualidade e os cultos afro-religiosos encontrados por Fry (1982) em
Belém, ajuda a demonstrar que o
22
Isso acontece devido o entendimento, por parte da comunidade, de que quem fala o bajubá é bicha, não homem de verdade. 23
No bajubá significa “Lugar do babado; Caso amoroso e/ou sexual; Briga; escândalo; faniquito; piti” e também “Acontecimento; Algo muito importante”. 24
No bajubá significa “homem que faz o papel de ativo”; aquele que é “masculino”. 25
No bajubá significa “pênis”.
repertório linguístico, genericamente chamado de língua-de-santo na Bahia, compreende uma terminologia religiosa operacional, de caráter mágico-semântico e de aparente forma portuguesa, mas que repousa sobre sistemas lexicais de diferentes Iínguas africanas que provavelmente foram faladas no Brasil durante a escravidão, vindo a constituir uma língua ritual, mítica, que se acredita pertencer a nação do vodum, do orixá ou do inquice e não a determinada nação africana política atual. (PESSOA DE CASTRO, 1983, p. 84)
E o que antes se encontrava cercado por uma aura privada e de culto começou a
ser utilizado no espaço das ruas, entre as travestis (PELÚCIO, 2007; FOLHA ON-LINE, 2006),
as drag-queens (SOUZA, 1998), portanto, afastando-se da configuração religiosa “original”;
assim sendo, a presença constante de homossexuais nos terreiros de umbanda em Belém
(FRY, 1982), levou a uma transposição do caráter litúrgico e ritualístico para uma
configuração mais “profana”: o uso da língua-de-santo no seio da comunidade gay.
Os reflexos desse entrecruzamento de línguas, de espaços, de domínios, como o
público e o privado, e até mesmo de palavras de outras variantes africanas, como é o
exemplo da palavra nena26 (do banto kunena, pois o prefixo ku- indica o verbo no infinitivo)
e que significa “defecar”, mas que na “linguagem de comunicação usual do povo-de-santo”
aparece como “fazer nena” (PESSOA DE CASTRO, 1983, p. 88). E no bajubá aparece na
expressão “deserdar a nena”, que corresponde ao mesmo processo (SILVA FILHO e PALHETA,
2008).
Mas a glossolalia27 que é o bajubá, no qual a entrevista acima deixa claro,
quando aparecem palavras que antes faziam parte de outro repertório, como é o caso da
palavra “bafon” (do francês bas-fond), com significação diferente da percebida no bajubá:
no primeiro caso, significa “baixo”, “baixio” e que, também, está relacionado as classes
baixas, na França; e no segundo caso, significa “1. Lugar do babado; 2. Caso amoroso e/ou
sexual; 3. Briga; escândalo; faniquito; piti” (cf. AURÉLIA, 2006?), “acontecimento, algo muito
importante” (cf. SILVA FILHO e PALHETA, 2008).
No afã de compilar todos os verbetes, 1.300 no total, que compreendem o rico
vocabulário do bajubá, foi editado em 2006, por Angelo Vip (o jornalista e cineasta Victor
26
Cf. Pessoa de Castro (1983, p. 91): “itens que se referem aos órgãos sexuais, a diversas funções fisiológicas, a gravidez, ao homossexualismo; entre os casos assinalados por eufemismo, a maioria foi de étimos bantos, como nena, fezes, ou fazer nena, defecar”. 27
Encarada aqui um pouco diferente do sentido etimológico.
Angelo) e Fred Libi (definido no Aurélia como Joaquim Nozes do Rego Vanderley, mas que
em entrevista, à época do lançamento do dicionário, não fora identificado) “Aurélia, a
dicionária da língua afiada”, reunindo palavras/expressões do bajubá presentes nas grandes
cidades brasileiras, inclusive Belém. Porém, seu lançamento gerou um “desconforto” na
família de um famoso dicionarista, por conta da homenagem, que chegou até a reclamar a
Lei de Direitos Autorais, para “proteger” a marca (FOLHA ON-LINE, 2006).
Não entrarei no mérito da questão, se a família encarou com preconceito a
“homenagem” da dupla, mas a contribuição que a Aurélia (2006) trouxe para o
entendimento de várias palavras/expressões do bajubá, quando do início desta pesquisa. E
mesmo utilizando esse recurso, algumas expressões só se tornam claras, de fato, no
contexto em que estão inseridas.
A imagem abaixo, retirada da internet28, no qual ilustra uma das palavras mais
escutadas, durante o campo, e até mesmo fora dele, que ganha, no entanto, outras
variações, como “truqueira”, “equezeira”, “truquenta”, etc. e é relativo “à bicha mentirosa”,
“enganador”, “mentiroso” (AURÉLIA, 2006):
Imagem 1: Palavra do bajubá. Fonte: http://www.itaucultural.org.br/impressao.cfm?materia=964, acesso em 09 jan. 2010
28
Responsável pela imensa disseminação dos babados do mundo gay. Quando fiz uma busca pelo Google, digitando bajubá, encontrei 364 citações, de arquivos fotográficos, imagens, textos acadêmicos, jornalístico, etc. e digitando no Google Acadêmico encontrei apenas 22 citações.
Capítulo 3
A (micro)política do armário: o coming out, o estilo camp e a fechação em
Belém
Este capítulo refletirá, brevemente, sobre a maneira encontrada, por cada
entrevistado deste trabalho, acerca de sua “saída do armário”, suas relações com familiares
e amigos, suas formas de negociar uma identidade ligada à orientação sexual, as
performances homossexuais, ligada a um estilo camp e a um modo particular de
manifestação e publicidade da identidade LGBT.
3.1 Negociando o “armário”: reflexões sobre si
Quando iniciei a série de entrevistas que comporiam este trabalho já tinha, mais
ou menos, uma idéia do que estaria por vir quando abordasse o coming out, pois o tema do
“armário” é constante nas conversas entre pessoas LGBTs, uma vez que em várias situações
há alguém apontando para uma “evidente” homossexualidade do outro. Então, o “sair do
armário” serviu-me como reflexão acerca da normalidade da conduta heterossexual e de
acordo com Spargo
[...] Declarar-se fora do armário da sexualidade escondida pode ser uma liberação pessoal, mas implica reconhecer a centralidade da heterossexualidade, assim como reforçar a marginalidade daqueles que ainda estão dentro do armário. Em suma, é impossível mover-se inteiramente por fora da heterossexualidade (2006, p. 43).
E, então, encontro em uma de minhas entrevistas a seguinte declaração:
[...] continuar a agir como homem é muito difícil para o gay, pois existe muita cobrança, se ele não for assumido [...] tem que namorar uma menina, ter filho, mesmo que seja novo [...] procurar lugares [bares e boates] em que não vá ninguém conhecido, para poder continuar viçando... (XY4, 22 anos, 10/08/2009)
Neste ponto, vemos certa incerteza na distinção entre as categorias de gênero e
sexualidade, pois Spargo (2006) refere-se a uma saída do armário no que tange à orientação
sexual e XY4, acima, faz uma ligeira “confusão” entre performance de gênero, que ligaria a
um tipo específico de agir masculino, e a orientação homossexual, que teria conseqüências
negativas caso esta pessoa não fosse assumida, como exemplo a perda da credibilidade
familiar ou a “ameaça de perder certos privilégios que a posição que ocupam na hierarquia
das sexualidades lhes proporciona” (Saggese, 2006, p. 35).
O que nos faz lembrar das considerações de Fry (1982) e Perlongher (1987) sobre
os tipos descritos como bofe e michê29, que mesmo mantendo relações homoafetivas
mantêm “coerência” com o sexo biológico. Além de outra categoria aparecer como
demarcadora na assunção da sexualidade, pois o ato de “viçar30” determinaria o sujeito
homossexual, haja vista sua orientação estar voltada para pessoas do mesmo sexo e precisar
ser ocultada. É como se, nos dizeres de Foucault (1997), existisse um tipo homossexual, uma
espécie, que necessitasse ser revelada e acusada (e até mesmo estudada) e que tivesse que
sobreviver e ser vivenciada no anonimato, se não fosse respeitado o coming out.
Em outra entrevista encontro uma motivação para uma “saída ostensiva do
armário”, pois, de acordo com XY3 (19/09/2009), “os amigos são os que mais te influenciam
a frescar, dar close” e que, portanto, seriam parte de uma rede de apoio em caso de
“alguma coisa dar errada”, mas que também ajudam a aprender o bajubá, protegem de
confusões e disseminam as fofocas.
Em outro momento, ao perguntar para os entrevistados sobre como se dera a
“saída do armário”, especialmente no âmbito familiar, a maioria fora categórica em afirmar
que houve conflitos e muitas brigas, pois os pais não aceitavam “a vida que eu estava
levando”. Recriminações e xingamentos fizeram (e fazem) parte do cotidiano dos
entrevistados por certo período (para um deles o “sofrimento” ainda perdura), e outro
29
Os autores, Fry (1982) e Perlongher (1987) ilustram as performances de gênero presentes nestas duas categorias, indicando que a presença dos traços de masculinidades estão presentes para que se faça existir esses sujeitos. 30
Palavra do bajubá que designa as relações sexuais ou não ocorridas entre pessoas do mesmo sexo.
chegou a dizer que até hoje sofre com a indiferença paterna, porque o pai ainda não
“aceitou sua condição de gay”.
Quando fiz referência ao comportamento dos familiares, com relação ao
comportamento “diferente” que eles eventualmente poderiam manifestar em casa, como a
presença de amigos, a ida às boates, à parada, que de certa forma os ligariam ao mundo gay,
a totalidade respondeu que alguém da família tinha conhecimento de seu “gosto por
homens”. Seja uma prima, irmão ou mãe, de alguma forma as características que os
identificariam como gays estavam presentes desde a infância e que em determinado
momento necessitava ser revelada, pois
[...] para chegar em “casa”, é claro, era necessário primeiro “sair”. Para lésbicas e gays, estar “fora” ou “dentro” do armário tornou-se uma marca crucial de sua política sexual. “Sair do armário” sugeria emergir do confinamento e da ocultação, realizar um movimento do sigilo para a afirmação pública (Spargo, 2006, p. 28)
As reflexões de Spargo (2006) sobre a política do armário trazem contribuições
interessantes sobre a maneira como as pessoas identificam-se e escolhem construir-se como
sujeito político, uma vez que
[...+ A diferença mais óbvia entre “gay” e “lésbica” e as antigas categorias existentes era que, ao invés de aceitarem uma posição passiva como um objeto de conhecimento, os sujeitos identificados como gays e lésbicas estavam ostensivamente escolhendo ou reivindicando uma posição. Ser gay ou lésbica era uma questão de orgulho, não de patologia; de resistência, não de auto-ocultação (p. 25-26)
Ainda que Sedgwick (2007) tenha afirmado ser o problema do armário ou
“regime do segredo aberto” um problema associado não somente à homossexualidade,
expondo que outros marcadores sociais, também, podem criar “armários”, este está ligado
às estruturas de poder-saber vigentes em nossa sociedade, que de certa forma estariam
atadas a um determinado valor, principalmente moral e religioso, presente na sociedade
ocidental moderna.
De certa forma, resgatando uma historicidade na conquista por publicidade do
desejo homoerótico, Saggese (2006) aponta para
[...] a legitimidade destas práticas [homossexuais] [que] foi[ram] ganhando uma conotação mais explicitamente política, e o episódio de Stonewall, em Nova York, seja talvez o exemplo historicamente registrado mais marcante deste processo [de “sair do armário”+ *...+ Construiu-se desse modo a noção de que práticas homossexuais deveriam ser reconhecidas como apenas um pequeno fragmento de um ethos extremamente complexo, mas diferenciado e diametralmente oposto ao do “universo” heterossexual dominante (p. 31)
3.2 Um pouco de queer, um pouco de camp
Nas entrevistas que realizei, não havia perguntado sobre o camp de forma
explícita, porém sempre tentava interpretar as manifestações, sejam linguísticas, corporais e
performáticas, à luz das considerações sobre a teoria queer e a estética camp, pois quando
perguntava sobre a orientação sexual dos entrevistados, quase sempre depois das respostas
ouvia um tipo de referência que não enquadraria por completo as suas práticas sexuais,
descartando, assim, a restrição de relacionamentos afetivo-sexuais somente com pessoas do
mesmo sexo.
Um dos entrevistados disse-me:
[...] já namorei meninas, mulher, enfim... Naquela época foi mais por conta da pressão da minha família, dos meus pais, que me pressionavam pra ter uma namorada, porque o meu irmão já tinha tido umas quatro ou cinco e eu [com 19 anos] não havia aparecido com nenhuma em casa [...] Talvez seja por isso que eu, hoje em dia, também me relacione com meninas, mas só em festas, nada de muito sério. É só beijo mesmo! (XY5, 24 anos, 09/10/2009)
A ênfase mostrada por ele de que, também, se relaciona com “meninas” mostra
que os relacionamentos são situacionais, pois ocorrem em momentos de festas, de
“curtição”, não sendo levados adiante por estarem estabelecendo outro tipo referência, que
não o referencial homossexual ao qual eles estariam ligados, possivelmente. E é esse caráter
transgressor da teoria queer, aliado ao estilo e/ou estética camp, que me parece ser
interessante de abordar, pois
[...] O termo descreve um leque diverso de práticas e prioridades críticas: leituras de representação do desejo pelo mesmo sexo em textos literários, filmes, música e imagens; análise das relações de poder sociais e políticas da sexualidade; críticas do sistema sexo-gênero; estudos de identificação transexual e transgênero, de sadomasoquismo e desejos transgressivos (Spargo, 2006, p. 9)
O uso da palavra “também”, na entrevista acima, estaria próximo das
considerações queer sobre identidade, processo de subjetivação, construção identitária,
performance, etc. de que estas são fluídas, mutantes, processuais, não estanques, não
estando inseridas num processo taxonomista e/ou esquadrinhador conformado por normas,
principalmente as determinadas pela heterossexualidade compulsória, como que as que
“delimitam os padrões a serem seguidos e, ao mesmo tempo, [o queer] paradoxalmente,
fornece a pauta para as transgressões” (LOURO, 2004, p. 17).
Segundo Louro (2004) o conceito queer obedece às seguintes caracterizações:
[...] é estranho, raro, esquisito. Queer é também, o sujeito da sexualidade desviante – homossexuais, bissexuais, transexuais, travestis, drags. É o excêntrico que não deseja ser “integrado” e muito menos “tolerado”. Queer é um jeito de pensar e de ser que não aspira o centro e nem o quer como referência; um jeito de pensar e de ser que desafia as normas regulatórias da sociedade, que assume o desconforto da ambigüidade, do “entre lugares”, do indecidível. Queer é um corpo estranho, que incomoda, perturba, provoca e fascina (p. 7-8)
Ainda, de acordo com Silva (1999, p. 107), é necessária uma atitude queer para
que se radicalize o “livre trânsito entre as fronteiras da identidade, *entre+ a possibilidade de
cruzamento de fronteiras”. Pois, para ele, observando a construção identitária a partir da
“hipótese da construção social, a identidade acaba, afinal, sendo fixada, estabilizada, pela
significação, pela linguagem, pelo discurso”, pois “não existe identidade sem significação. *E+
Não existe [portanto+ significação sem poder” (p. 106).
Olhando os dois conceitos – queer e camp – como rompimento com a norma
vigente em relação à sexualidade e à identidade de gênero, por exemplo, mesmo que o
camp apareça para alguns autores como uma “forma de exagero descompromissado,
ingênuo, não intencional, fantástico, apaixonado” (MARQUES FILHO e CAMARGO, 2008, p.
85), acabo por evidenciar seu caráter de “duplo sentido” livre de considerações não-
políticas, não intencionais, visto que adotar a estilo camp como parte do cotidiano é uma
escolha, também, política, portanto, estaria dentro da atmosfera transgressiva, da “fuga
consciente” proposta pelos sujeitos queer.
3. 3 Notas sobre a fechação em Belém
As observações de Durkheim e Mauss (1979) sobre como a classificação dos
seres, objetos, pessoas acontecem a partir das relações sociais, da sociedade, ou seja, o real
criando o abstrato, indicam, com relação à questão aqui analisada, que na sociedade
brasileira a homossexualidade aparece classificada como desvio, divergência do normal. E
que apesar de ainda sobreviver sob a égide da violência, causa da intolerância com relação
ao diferente, encontra nos espaços de sociabilidade, na guetização a resistência à
classificação hegemônica. Em vista disso, algo que estaria no plano do preconceito velado
como, por exemplo, na falta de uma discriminação oficializada e que mesmo assim acabaria
deslocando a homossexualidade para um espaço restrito e específico, encontraria espaço
fértil para a transgressão através da performance.
E é nos espaços de sociabilidade (bares, boates, saunas GLS, etc.), no famigerado
“gueto gay”, que a fechação pode ser vivenciada plenamente, pois, de certa forma, a rede
de amigos, que frequentam estes espaços com um objetivo comum, permite a
extravagância, o close, o “aparecer”, a exposição e publicidade da homossexualidade. Mais,
até, que outros espaços onde a identidade homossexual encontra-se como parte da
“sujeira” (DOUGLAS, 1991), do não-lugar (AUGÉ, 2001), do “outsider” e aquém do “processo
civilizador” (ELIAS e SCOTSON, 2000; ELIAS, 1990), mas, é claro, que estas categorias acabam
não existindo como “tipos puros”, apenas sendo conclamadas (ou reclamadas) quando se
pretende marcar uma distinção entre a “normalidade” e a “anormalidade” (FOUCAULT,
2001). Sendo, também, parte das relações produtivas de poder-saber (FOUCAULT, 2008), da
ordem/organização da sociedade (DURKHEIM e MAUSS, 1979).
Mas como agir, dado que existem instâncias prontas para estabelecer o controle,
com relação a gestos e atitudes? A resposta não parece ser simples de responder, mas
ensaio breves considerações, a partir desta parte transcrita:
[entrevistador] É fácil ser gay em Belém? [XY3] Claro que não, né, mana!? Tem muita mamação, tem muito buu [...] bicha em Belém dá close, mas pena [...] porque a sociedade ainda é muito preconceituosa [...] Lembra do caso dos travestis do Reduto
31? Pois é, algumas foram espancadas,
levaram porrada mesmo [...] mas se não sofrer, não é viado! (26/09/2009)
A mamação e o buu, integrantes da performance e do fenômeno de “acusação”,
são o reflexo da intolerância pela qual passam os indivíduos homoeróticos: vindo de todos
os lados, os insultos, as galhofas, os atos discriminatórios se tornam presentes na maior
parte da vida, seja em casa ou na rua:
[...] O preconceito, no âmbito restrito da família, de acordo com os depoimentos, pode manifestar pela intolerância declarada e até culminar na expulsão de casa. Todavia, é mais comum ignorar-se a situação e “fingir que não se sabe de nada”, ou diante das evidências, aceitá-la. Esta aceitação, entretanto, exigirá em contrapartida, que o indivíduo se realize, seja no campo financeiro ou profissional, como se atestando sua competência e/ou conformidade aos padrões vigentes em outra área, ele abafasse o seu lado “negativo” e “desviante”. Ademais, foi colocado que, mesmo quando há “aceitação” ou “tolerância” por parte dos familiares, sempre há uma esperança de que por algum motivo a situação se reverta e o indivíduos “entre nos eixos”. Diante da situação de preconceito e pressão, ficou constatado nas entrevistas, que os homossexuais se utilizam de estratégias de encobrimento, seja através do escudo da heterossexualidade, saindo com parceiros do sexo oposto ou, no caso feminino, aceitando “cantadas de homens” e, destarte, justificando socialmente sua condição (GONÇALVES, 1989, p. 20-21)
31
Uma espécie de “limpeza” ocorrida no bairro do Reduto em Belém, em 2009, tendo apoio do aparato policial, os moradores das proximidades dos “pontos” de prostituição disseram que as travestis atentavam contra os “bons costumes da sociedade”.
A citação acima saiu da etnografia realizada em Belém, no final da década de
1980, por uma estudante, à época, do curso de Ciências Sociais da Universidade Federal do
Pará, na qual ela procurava desvendar as representações de pessoas homoeróticas, o
preconceito e a discriminação. E como se pode ver, quase nada mudou, com relação aos três
itens pesquisados por ela, mesmo tendo passado duas décadas entre a etnografia da Profa.
Telma Amaral Gonçalves e esta.
Quais as alternativas ao comportamento moralista? E que respostas podem ser
produzidas pelos sujeitos que vivenciam essas situações que vão da “intolerância declarada”
à tolerância vigiada, ao controle mais direto ou mais sutil de suas escolhas e preferências,
enfim, ao risco cotidiano do “segredo aberto” (Sedgwick, 2007) nos diversos contextos de
interação familiar e social?
Entre as alternativas possíveis aos indivíduos LGBT, assumir-se pode implicar em
assumir a fechação como experiência a ser vivenciada nos mais diferentes espaços, no
sentido de produzir uma re-significação do ato de “levar buu”, da “mamação”; pode
implicar, ao mesmo tempo, em um processo político de reconhecimento da diferença como
produtiva (PIERUCCI, 1999); pode implicar ainda em pensar (e viver) a homossexualidade
como uma experiência transgressora e não normatizadora, como pretendeu Foucault (1981,
p. 1), ao dizer que o esforço em “tornar-se” é mais interessante, e por isso mais
“perturbador”, que o reconhecimento de que somos, pois, para alguns
[...] a afirmação passa pela afirmação da radical diferença dos homossexuais e por marcar nitidamente as fronteiras que os separam dos heterossexuais [...] Eles devem assumir de uma forma agressiva a sua própria condição, devem “fechar” para afirmar o seu direito à livre expressão de seu desejo, não devendo aceitar as regras colocadas pela sociedade heterossexual (ALBUQUERQUE JR e CEBALLOS, 2002, p. 322)
Fry (1983, p. 101) assim define a fechação: “um tipo de desmunhecação
proposital e escandalosa” que os homossexuais utilizam como “forma de humor, expressão
de uma identidade grupal e meio de agredir os que têm preconceito anti-homossexuais”.
Acompanhando um pouco deste raciocínio, Pelúcio (2007, p. 162), insiste em que “a
estratégia de resistência é justamente a de se agir ao contrário das expectativas sociais”;
onde o “grito/escândalo” como estratégia de defesa (como micro-política) passa a “estender
o espaço de sua própria abjeção àqueles que comumente as recusam, humilham e
oprimem” (Idem, p. 175)
Então a fechação estaria no âmago do rompimento com as normas, com valores
“heterocentrados”, ou seja, com o que está posto. Evidenciando o desligamento do
indivíduo com o que denomino como “manipulações heteronormativas” e que se assentam
nas formas explícitas e implícitas de enquadramento de indivíduos LGBT na norma
heterossexualmente compulsória, dando ênfase ao comportamento masculinizado para os
homens gays e feminilizado para as mulheres lésbicas, partindo de um entendimento
asséptico com relação às ditas “minorias” sexuais e de gênero, neste caso, qualquer
indivíduo que fuja do padrão heteronormativo (BUTLER, 2003).
(IN)Conclusão
Durante a graduação, quase sempre comentava com @s amig@s a dificuldade
que seria escrever um trabalho de conclusão de curso, onde os temas acabam tomando
dimensões inimagináveis e terminar um trabalho (o primeiro para muitos) requer uma
disposição considerável, pois as noites sem dormir (ou dormir tarde, já de manhã) acabam
alterando as nossas rotinas que, para voltarmos ao ritmo de antes, ficaremos outras noites
em claro.
E isso parece tomar proporções um pouco maiores para aqueles que, assim
como eu, resolveram caminhar pelas “pedreiras” que é a sexualidade. Vista pelo senso
comum até parece ser fácil de explicar, mas quando se pretende abandonar quaisquer
referências superficiais sobre o tema e ajudar a (des)(re)construir, com base na(s) ciência(s),
outros paradigmas sociais e científicos, nos vemos diante de um conflito. Nesse sentido,
Vance (1995) afirma que
[...] A maioria dos orientadores tenta ativamente dissuadir seus alunos de realizarem trabalhos de campo ou dissertações sobre sexualidade por receio que o assunto venha a colocar suas carreiras em risco. Na melhor das hipóteses, os estudantes são aconselhados a completar o doutorado, a construírem reputações e credenciais e até a conseguirem estabilidade em seu cargo acadêmico, para então se envolverem com o estudo da sexualidade (p. 8)
Como podemos notar, estudos sobre sexualidade são tão perigosos a ponto de
“arruinar” carreiras, que seria um motivo inicial para desistência. Mas então porque
começar a vida acadêmica com uma temática tão ameaçadora? E porque escolher o bajubá
e o “armário” como objetos possíveis de análise?
A resposta para o primeiro questionamento está na minha participação em um
grupo de diversidade sexual, onde a premissa básica é o estudo da sexualidade a partir dos
aspectos múltiplos; desse contato com a militância organizada que fez nascer a vontade de
escrever um texto onde as reflexões teóricas pudessem ser aglutinadas à observação da
realidade empírica, por isso a aproximação com a Antropologia de forma tão sistemática.
Essas considerações são o motor de arranque para que eu possa responder à
segunda questão, uma vez que desde o momento inicial percebi na linguagem, neste caso no
uso do bajubá, um elemento na construção do sujeito homossexual. Linguagem essa cada
vez mais difundida, através da TV e da internet, principalmente, pois tod@s querem
“aquendar o bajubá”, principamente os heterossexuais.
E mesmo que não saibam o que é o bajubá, que desconheçam do que se trata,
que não gostem de falar, cotidianamente acabam ouvindo os “babados32”, vendo os “bofes
escândalos33” ou acabam se deparando com um “equê34”. Neste momento o “segredo”, que
fazia parte da sobrevivência bajubá nos guetos, acaba sendo revelado e até mesmo quem
está falando acaba de ser tornar um suspeito. E pode, também, até abrir o “armário” da
sexualidade, em determinados contextos.
Trevisan (2000) diz que a sigla GLS trouxe uma diluição, uma ruptura com o
gueto, quando deu ênfase ao “S” (de simpatizantes), estendendo a esse sujeito a menor
simpatia e uma maior suspeita, ou seja, o indivíduo falante do bajubá será encarado, mesmo
que não seja, pertencente à sopa de letrinhas (FACCHINI, 2005). Em outro momento, Velho e
Machado (1977) já haviam alertado para a questão do anonimato relativo na grande
metrópole, pois um indivíduo mesmo que em “relativa segurança” está na mira de ser
“descoberto” ou “desmascarado”, pois os guetos (linguísticos ou comerciais) podem
denunciar essa condição “desabonadora”, caso seja alvo da curiosidade hétero.
Assim sendo, o bajubá (e todo o jogo performático que nele está inserido)
acabará sob o signo da acusação quando servir para “identificar” o sujeito, mediante o
poder que outro possui em nomear àquele. E sob o signo da identificação quando o
indivíduo utilizá-lo para “sair do armário”, para publicizar uma homossexualidade que antes
era escondida.
Este último momento poderá ser alinhavado ao processo de fechação, que aqui
considerei como um elemento de transgressão do comum, de re-significação do
estabelecido. E Weeks (2000) diz que
32
No bajubá significa “acontecimento importante”. 33
No bajubá significa “homem bonito”. 34
No bajubá significa “mentira”.
Tudo que aprendemos sobre a história da sexualidade nos diz que a organização social da sexualidade nunca é fixa ou estável ela é modelada sob circunstâncias históricas complexas. Na medida em que entramos no período conhecido como “pós-modernidade”, é provável que vejamos uma nova e radical mudança nos modos como nos relacionamos com nossos corpos com suas necessidades sexuais. O desafio será compreender, de uma forma mais efetiva do que no período da modernidade, os processos que estão em ação nesse campo (p. 80).
Então, neste jogo do armário, o processo criativo ficaria por conta do
estabelecimento de novas linguagens e de novas performances e, por que não dizer, de um
outro ethos, este ligado a uma performance desafiadora, que cada vez mais ajudará a
desconstruir convenções, rompendo os contornos da norma, da estigmatização, e criando
sujeitos políticos, de fato.
REFERÊNCIAS
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