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    OS IMPACTOS SOCIOECONMICOS DO CULTIVO DE EUCALIPTO: O CASO DO MUNICPIO DE ARATIBA-RS

    PERSPECTIVA, Erechim. v.34, n.127, p. 113-122, setembro/2010

    OS IMPACTOS SOCIOECONMICOS DO CULTIVO DE EUCALIPTO: O CASO DO

    MUNICPIO DE ARATIBA-RSThe socio-economic impacts of eucalyptus plantation: the Aratiba city case

    MARQUES DA SILVA, J. O.

    MARIN, M. Z.

    Recebimento: 11/08/2010 - Aceite: 28/09/2010

    RESUMO: O processo de desenvolvimento de monocultivos arbreos, entre eles o eucalipto, acelerou-se no Brasil, mais especificamente a partir da dcada de 1960. Tinha-se o objetivo de suprir a necessidade de madeira para diversos fins. No municpio de Aratiba-RS no foi diferente, pois houve um significativo aumento no cultivo nos ltimos anos, sobretudo devido ao estmulo da Prefeitura Municipal e da Cooperativa Tritcola Erechim Ltda (COTREL). Esta pesquisa teve por finalidade analisar os impactos sociais e econmicos do cultivo de eucalipto em unidades de produo familiar em Aratiba-RS, atravs de reviso da literatura e entrevistas realizadas por meio de pesquisa de campo. A pesquisa buscou avaliar os impactos junto a trs grupos de agricultores familiares: unidades de produo familiar contendo at 25 hectares; entre 25 e 50 hectares; e com mais de 50 hectares. Trinta e quatro por cento (34%) das unidades de produo do municpio cultivam eucalipto, em um total de 1.500 hectares. Considerou-se que o cultivo de eucalipto uma importante alternativa de renda e emprego aos sujeitos envolvidos na cadeia produtiva. Entretanto, percebeu-se a substituio por eucalipto de algumas culturas agrcolas, como o milho. Observaram-se, tambm, alguns conflitos de vizinhana entre agricultores que cultivam e outros que no cultivam o eucalipto. Foi possvel, ainda, constatar que o cultivo de eucalipto j utili-zado como uma alternativa de produo comercial, servindo como fonte de renda e acmulo de capital de empresrios urbanos, sobretudo madeireiros e profissionais autnomos. Entende-se que a diversidade na produo familiar deva ser mantida e no ser resumida a monocultivos arbreos, a exemplo do eucalipto.

    Palavras-chave: Monocultivo arbreo. Eucalipto. Agricultura Familiar. Im-pactos socioeconmicos. Aratiba-RS.

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    ABSTRACT: The development of the arboreal monoculture, among them the eucalyptus, has accelerated in Brazil mainly in the 1960s. There was the need of wood supply according to its demand. In the city of ARATIBA-RS there has been a significant increase in the Eucalyptus plantation in the last years, due to the City Hall and the Cooperativa Tritcola de Erechim Ltda (COTREL) incentive. The aim of this research is to analyse the social and economic impacts of the Eucalyptus plantation on family production units in ARATIBA-RS, through literature review and interview conducted by means of a field research. The research sought to assess the impacts on the three groups of farmers: family production unit made up of 25 hectares, between 25 and 50 hectares and more than 50 hectares. Thirty-four percent (34%) of the produc-tion units of the city cultivate eucalyptus, adding up 1,500 hectares. It was concluded that the cultivation of eucalyptus is an important alternative source of employment and income to the people who are involved in the production chain. However, it is observed the replacement of some crops such as corn by eucalyptus and also some conflicts between farmers who cultivate and those who do not cultivate them. It was also possible to verify that the cultivation of eucalyptus is used as an alternative of commercial production serving as a source of income and capital accumulation for urban entrepreneurs, especially timbers and other professionals. It is understood that the diversity in household production should be maintained and that the cultivation of eucalyptus is an alternative income not the only one.Keywords: Arboreal monoculture. Eucalyptus. Family farming. Socio-economic impact. Aratiba-RS.

    Introduo

    O processo de desenvolvimento de mo-nocultivos arbreos acelerou-se no Brasil, mais especificamente a partir da dcada de 1960, em especial com o plantio de eucalip-to. Esta ao visava a suprir, futuramente, a necessidade de madeira para diversos fins: produo de celulose, lenha, construo civil e produo de carvo vegetal.

    No municpio de Aratiba-RS o cultivo de eucalipto teve incio por volta do ano de 1994. Porm, sabe-se que antes dessa data j haviam sido plantadas, em algumas proprie-dades familiares, uma ou outra muda de eu-calipto, mas nada de grande expresso. Nesse perodo, a COTREL (Cooperativa Tritcola

    Erechim Ltda) passou a incentivar o cultivo de eucalipto em Aratiba-RS. Essa iniciativa tinha trs finalidades bsicas: a) aproveitar as reas (dentro das propriedades familiares) de relevo leve ou fortemente ondulado; b) tornar a COTREL autossuficiente em lenha e; c) aumentar e diversificar a renda e a produo das unidades de produo familiar.

    Em 2007 foi aprovado, pela cmara municipal de vereadores, o Programa de Desenvolvimento Sustentvel e de Incentivo ao Reflorestamento. Esse Programa compe o Artigo n 12 da Lei Municipal n 2.589, de 04 de dezembro, que relata sobre o subsdio de mudas de plantas exticas e nativas a se-rem plantadas no municpio, com finalidades diversas. A partir daquela data diminuram, em vrias paisagens geogrficas, e, em alguns casos, desapareceram as lavouras de milho,

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    feijo e outros produtos, e surgiram as la-vouras de eucalipto. Muitos dos produtores rurais do municpio fizeram da cultura uma atividade monocultora, outros ainda mantm a produo agrcola e a pecuria juntamente com o cultivo do eucalipto, como alternativa de renda para a propriedade.

    No municpio de Aratiba o termo reflores-tamento utilizado erroneamente por rgos pblicos e produtores em geral, referindo-se ao plantio de eucalipto. De acordo com o Pro-tocolo de Quioto, o conceito de florestamento e reflorestamento, diz respeito transforma-o apenas de uma rea sem cobertura vegetal em uma rea florestada, considerando tanto plantaes para fins comerciais quanto a re-generao de espcies nativas. Entendem-se como florestamento as plantaes para fins comerciais de, por exemplo, eucalipto, pois se trata de uma espcie no nativa do Brasil. J ao caso de plantaes para fins comerciais ou no, de espcies nativas de uma dada re-gio, denominamos reflorestamento.

    Tendo em vista essa problemtica, este ar-tigo apresenta os resultados de uma pesquisa sobre os impactos socioeconmicos provo-cados pelo cultivo de eucalipto no municpio de Aratiba. Dessa forma, as informaes do presente trabalho provm dos principais personagens de todo o processo que envolve o cultivo de eucalipto: os agricultores.

    O cultivo do eucalipto foi se tornando polmico de maneira gradual, da mesma forma que a planta foi ganhando espao no mercado mundial.

    Segundo Lima, (1996, p. 33) [...] as plantaes florestais, ou seja, as de florestas a partir de regenerao artificial, tm sido estabelecidas desde h muito tempo na Am-rica do Norte e na Europa com o propsito de fornecer madeira para fins industriais.

    Lima (1996, p. 35) destaca ainda que:

    [...] alm da participao decisiva no desenvolvimento do setor de celulose e

    papel na regio, o qual praticamente baseado na madeira fornecida por planta-es florestais, outra utilizao crucial da madeira na maioria dos pases tropicais para a produo de lenha para a gerao direta de energia.

    Ao longo do desenvolvimento das socie-dades o homem desenvolveu prticas que estimularam a derrubada de reas de vegeta-o nativa. A ao de derrubada de rvores e venda de madeira na Amaznia, por exemplo, ou mesmo em qualquer ecossistema do Bra-sil, consiste na primeira atitude capitalista do homem em contato com a mata. Picoli (2006, p. 39) explica que: o setor de trans-formao de madeira na Amaznia brasileira desenvolveu-se com a finalidade de servir ao capitalismo e abastecer com seus produtos o mercado interno e externo.

    Esse comrcio vem seguido pela pecuria extensiva e pelo plantio da soja na regio. Paiva et al. (2001, p. 10) constatou que:

    O consumo, cada vez maior, de produtos derivados da madeira faz com que haja uma crescente presso sobre as florestas nativas. O corte destas florestas tem sido feito sem critrios tcnicos, pondo em risco de extino vrias espcies vegetais de grande valor. Por isso, a implantao de florestas constitui alternativa vivel para a reduo da presso exercida sobre as florestas nativas.

    Referindo-se ainda polmica do euca-lipto, pode-se dizer que tal fato se deve a uma srie de fatores, alguns ainda no bem explicados pelas pesquisas, como o efeito aleloptico da rvore de eucalipto (efeito inibitrio na germinao, crescimento e desenvolvimento de outras plantas) e o alto consumo de gua pela referida planta.

    O plantio de eucalipto, no Brasil, no acompanhado, na maioria dos casos, por um estudo de solos e de clima. Sabe-se que exis-tem mais de seiscentas espcies de eucalipto

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    catalogadas, cada uma com uma propriedade diferente e apropriada a uma determinada condio edafoclimtica. O Manual Brasil Agrcola (1986) explica que: o plantio deve ser feito com espcies que se adaptem bem regio. Para tanto se uma espcie for plan-tada em um determinado stio imprprio, tal planta pode responder com efeitos ambientais demasiadamente nocivos ou pelo menos com efeitos no prprios da espcie quando plantada em solo adequado, sob condies climticas apropriadas.

    O Manual Brasil Agrcola (1986, p. 338) destaca que:

    Quanto ao clima, necessrio que haja um perodo de seca ou de baixa tempe-ratura para que o eucalipto realize o seu perodo de repouso vegetativo, por isso no deve ser plantado em regies de calor constante e altas taxas de umidade do ar.

    patente para todos os estudiosos dessa rea que as florestas de rpido crescimento exigem uma ateno maior no que se refere escolha da espcie a ser cultivada, para que em longo prazo os efeitos ambientais no repercutam de maneira negativa, denegrin-do, assim, a imagem do eucalipto perante os ambientalistas e a sociedade em geral. Pereira et al. (2000, p.11) afirma que: importante conhecer a variabilidade de populaes de eucalipto para que se possa utilizar correta-mente a espcie e melhor-la geneticamente.

    Cultivar eucalipto deve significar produzir madeira para atender s exigncias de merca-do e, em muitos casos, servir de renda alter-nativa para a propriedade rural. Entretanto, entende-se que seja necessrio racionalidade no desenvolvimento da cultura.

    Metodologia

    O municpio de Aratiba possui uma populao estimada de 6.990 habitantes, conforme levantamento do Instituto Brasi-

    leiro de Geografia e Estatstica (IBGE) no ano de 2007, sendo 3.368 urbanos e 3.622 rurais. O municpio possui uma rea de 342 km e localiza-se entre as latitudes de 272339 sul e a uma longitude 521801 oeste (praa central da cidade), estando a uma altitude mdia de 420 metros (Figura 1). Est situado na Regio Norte do Rio Grande do Sul e pertence Mesorregio Noroeste Rio-Grandense e Microrregio Geogrfica de Erechim. O municpio de Aratiba tem seu relevo predominantemente acidentado, com 63% de reas fortemente onduladas, 35% de reas onduladas e 12% de reas planas. Conta com onze empresas madeireiras que comer-cializam diversas espcies de madeiras, entre elas o eucalipto. No total so 450 proprieda-des que cultivam eucalipto, em um total de 1.500 hectares destinados cultura. Nesse montante esto inclusas unidades de produ-o de at 25 hectares, entre 25 e 50 hectares ,e com mais de 50 hectares. As unidades de produo so predominantemente familiares (PREFEITURA MUNICIPAL, 2010). As in-dstrias que mais consomem a matria-prima so as moveleiras, de aberturas. O eucalipto tambm aproveitado na construo civil e para a produo de lenha s indstrias insta-ladas na regio Alto Uruguai. O trabalho se baseou em reviso de literatura e trabalho de campo realizando-se entrevistas, contendo 25 questes, para 30 produtores de eucalipto, 5 empresrios do setor madeireiro, e busca de informaes atravs de dilogos com agricultores que so vizinhos de produtores que possuem plantaes de eucalipto, a Associao Rio-Grandense de Empreendi-mentos de Assistncia Tcnica e Extenso Rural (EMATER), a Secretaria Municipal da Agricultura e a COTREL. Os dados foram tabulados e transformados em informaes para o desenvolvimento do trabalho.

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    Figura 1- Mapa de Localizao Geogrfica do Municpio de Aratiba, RS.Fonte: Laboratrio de Geoprocessamento, URI-Campus Erechim, 2007.

    Resultados e discusso

    A queda na produo de milho expressi-va no municpio de Aratiba. Dados fornecidos pela Secretaria Municipal da Agricultura do Municpio de Aratiba mostram que a safra 2009/2010 resultou em cerca de 27.000 to-neladas de milho, que foram cultivadas em 4.500 hectares de terra. A mdia de produo de milho por hectare no municpio de Aratiba de 6 toneladas por hectare (100 sacas/ha), ocorrendo uma variao por decorrncia de fatores climticos.

    O levantamento da safra 1999/2000 mos-trou cerca de 51.000 toneladas (88% a mais que na safra de 2009/2010) de milho colhidas no municpio de Aratiba. Nesse perodo, o setor agrcola do municpio reservava pro-duo de milho 8.500 hectares (88% a mais que a safra 2009/2010). Ao mesmo tempo em que a produo de milho foi diminuindo, sua expresso e participao na produo agrcola do municpio de Aratiba, o Programa

    de Incentivo ao Reflorestamento foi obtendo sucesso em seu processo de distribuio e subsdio de mudas de eucalipto, que, por sua vez sofreu um aumento gradativo, como possvel acompanhar no Quadro 1:

    ANO MUDAS DE EUCALIPTO DISTRIBUDAS

    2006 200.000

    2007 350.000

    2008 500.000

    2009 600.000

    2010 340.00

    TOTAL 1.950.000

    Quadro 1 - Distribuio de mudas de eucalipto no municpio de AratibaFonte: Secretaria Municipal de Agricultura do Municpio de Aratiba, 2010.

    Os dados expostos no Quadro 1 tornam mais clara a problemtica vivida pelo setor agrcola no municpio de Aratiba, onde os produtores rurais deixam de lado culturas agrcolas tpicas, dando nfase para culturas exticas como o eucalipto.

    A pesquisa revelou que 39,5% das pro-priedades pesquisadas possuem plantaes de eucalipto em reas fortemente onduladas, 51,5% das plantaes de eucalipto se locali-zam em terrenos levemente ondulados e os 9% restantes dos produtores entrevistados relatam que fazem uso de reas totalmente planas para o cultivo de eucalipto.

    Uma caracterstica marcante das planta-es de eucalipto do municpio de Aratiba a jovialidade das plantaes. Uma parcela considervel de produtores de eucalipto ainda no obtiveram lucros por o terem introduzido h pouco tempo nas propriedades; constatou-se que 51,5% dos produtores entrevistados in-troduziram o eucalipto em suas propriedades h um tempo mdio de cinco anos.

    O incentivo ao cultivo de eucalipto no municpio de Aratiba, conforme j exposto neste artigo, faz parte do Programa de De-senvolvimento Sustentvel e, cabe lembrar, conforme o Planejamento Estratgico do Alto Uruguai Gacho (2010, p. 15) que:

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    A sustentabilidade dada no apenas no marco da adequao ambiental das atividades econmicas no que respeita proteo dos recursos naturais e dos espaos construdos atravs da histria, mas tambm na capacidade da comuni-dade em dar respostas aos desafios de seu prprio desenvolvimento.

    Constata-se ainda que, a realizao do potencial econmico se d simultaneamente com a distribuio de riqueza e da renda e com reduo das externalidades socioambientais negativas (PLANEJAMENTO ESTRAT-GICO DO ALTO URUGUAI GACHO, 2010, p.15). Dessa forma pode-se afirmar que, para uma melhor sustentabilidade do Programa de Incentivo ao Reflorestamento (parte do Programa de Desenvolvimento Sustentvel), importante que a renda obtida com o cultivo de eucalipto nas propriedades rurais do municpio de Aratiba seja investida no prprio municpio, servindo de estmulo para outros setores da economia municipal.

    Questionados sobre o destino da renda extrada com o cultivo de eucalipto em suas propriedades, 81,5% dos produtores entrevis-tados, e que j obtiveram retorno financeiro com o cultivo de eucalipto, responderam que fizeram investimentos no prprio municpio de Aratiba, sendo que 18,5% alegaram ter in-vestido pelo menos parte da renda em outros municpios da regio.

    Tambm, da totalidade de entrevistados, 48,5% disseram ter obtido melhorias na qualidade de vida com a renda extrada da comercializao do eucalipto; o restante, 51,5%, compem a fatia de entrevistados que ainda no obtiveram lucros no devido seguimento.

    Simultaneamente s entrevistas realizadas com os produtores de eucalipto, foram rea-lizadas entrevistas com as cinco principais empresas madeireiras do municpio de Ara-tiba, objetivando verificar, da melhor maneira

    possvel, os impactos causados pelo cultivo de eucalipto no municpio.

    Para a madeira de eucalipto produzida no municpio de Aratiba e comercializada pelas madeireiras entrevistadas so dados diversos fins, como se confere no Quadro 2.

    FINALIDADE DAMADEIRA PERCENTUALDE MADEIRADESTINADA

    Lenha 42%

    Indstria moveleira 8%

    Construo civil 36%

    Maravalha e paletes 14%

    Quadro 2 - Finalidade da madeira de eucalipto produzida no municpio de Aratiba.

    Tambm notvel, nesse quadro, que a parte predominante da madeira de eucalipto extrada no municpio de Aratiba empre-gada na produo de lenha. A utilizao da madeira como fonte de energia se deve a dois fatores, principalmente:

    - A necessidade de uma alternativa de renda por parte das unidades familiares de produo, uma vez que grande parte destes produtores de eucalipto no dispe muitas fontes de renda;

    - Um mercado consumidor favorvel, em virtude do grande nmero de indstrias da regio do Alto Uruguai que utilizam a lenha como fonte de energia, tais como: indstrias ervateiras, frigorficos, indstrias de roupas, entre outras.

    Em geral, entre todas as madeireiras en-trevistadas, a madeira de eucalipto representa em mdia 47% do montante de madeiras co-mercializadas. Esse levantamento estatstico mostra que o eucalipto tem uma contribuio bastante significativa na movimentao financeira das empresas madeireiras do mu-nicpio de Aratiba.

    No municpio de Aratiba, sob uma anlise econmica e considerando que a estrutura fundiria vem sofrendo alteraes nos lti-mos anos, devido ao aumento da rea mdia das propriedades rurais, e que algumas delas vm perdendo o carter familiar de produo,

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    pode-se caracterizar o cultivo de eucalipto da seguinte forma:

    a) O eucalipto pode ser empregado como uma alternativa para a diversificao da produo e para contribuir em mdio prazo com o aumento da renda da propriedade. Considera-se mdio prazo para as proprieda-des com menos de 25 hectares por iniciarem o corte de eucalipto com maior antecedncia do que as propriedades com rea acima de 25 hectares, utilizando sua madeira para abastecer o mercado lenheiro da regio. As propriedades que cultivam eucalipto com menos de 25 hectares e com 25 a 50 hectares tm como finalidade principal a produo de lenha, de menor rentabilidade, enquanto que nas propriedades com mais de 50 hectares a prioridade a produo para a obteno de madeira beneficiada, que, nesse caso, tem maior rentabilidade.

    b) Em grande parte das propriedades com rea superior a 50 hectares, o eucalipto empregado como uma alternativa de re-produo de capital em longo prazo, uma vez que muitas destas propriedades no se caracterizam como propriedades familiares e que no necessitam obter renda do eucalipto para a sobrevivncia dos proprietrios e para a manuteno da propriedade. Nesse caso, o eucalipto chamado de poupana verde, tratando-se de um investimento agroeco-nmico de grande rentabilidade e mercado consumidor crescente.

    A realizao deste trabalho nos mostrou trs vieses para uma anlise sobre os impac-tos sociais de repercusso municipal:

    a) A criao de novos postos de trabalho, sejam eles permanentes ou temporrio, nas propriedades com rea territorial igual ou superior a 50 hectares, e que somam 12,5% das propriedades entrevistadas.

    Os produtores de eucalipto foram ques-tionados quanto mo de obra empregada no cultivo de eucalipto nas propriedades e a

    partir das entrevistas realizadas foi possvel constatar que 48,5% dos produtores entrevis-tados fazem uso de mo de obra contratada no processo de cultivo de eucalipto; 51,5% dis-seram no necessitar de servios de terceiros, utilizando somente a mo de obra familiar. No grupo de 48,5% de produtores que contra-tam mo de obra, 56% assim o fazem de ma-neira informal, contratando trabalhadores que aceitam ser remunerados por dia de trabalho e no possuem vnculos empregatcios com o contratante; 44% contratam trabalhadores de maneira legal, respeitando as leis trabalhistas brasileiras. Nesse caso, os trabalhadores so contratados com carteira de trabalho assinada e so assalariados, possuindo vnculo com a propriedade em que trabalham.

    Esta pesquisa ainda revelou que, do total de mo de obra utilizada no plantio de euca-lipto no municpio de Aratiba, conforme as propriedades pesquisadas, 20% composta por mo de obra contratada.

    b) O surgimento de conflitos entre vizi-nhos no meio rural, por consequncia das interferncias ocasionadas pelas plantaes de eucalipto.

    Conforme Bertrand (1973, p.97):

    Provavelmente, o primeiro aspecto da vida rural que atrai a ateno do obser-vador, o relacionamento espacial; os padres de organizao da vizinhana e da comunidade nas relaes agrcolas diferem-se quase radicalmente daqueles encontrados em localidades urbanas.

    Neste aspecto foram identificados, no municpio de Aratiba, alguns conflitos so-ciais entre vizinhos de propriedades rurais, por decorrncia do plantio de eucalipto. As alegaes dos vizinhos de propriedades que cultivam eucalipto se dividem entre dois motivos: devido sombra causada pelas rvores, interferindo diretamente em outra cultura agrcola localizada nas proximidades; e pela diminuio do fluxo de gua de alguns

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    recursos hdricos localizados nas proximida-des de plantaes de eucalipto.

    c) O eucalipto como fator principal e es-timulante no processo de desvinculao do produtor rural da sua propriedade e, muitas vezes, do xodo rural.

    bastante notvel no municpio de Ara-ti ba, devido ao crescente xodo rural, a compra de pequenas propriedades rurais por empresrios do meio urbano. Com isso, em todas as reas cultivveis das propriedades so introduzidos sistemas de florestas co-merciais, em sua maioria de eucalipto. Ao mesmo tempo em que tal processo gera a diminuio no nmero de propriedades rurais e, consequentemente, de famlias a residirem e trabalharem no campo, fomenta o emprego assalariado para trabalhadores que passam a atuar na manuteno de grandes plantaes florestais.

    Lima (1996 p.19) afirma que:

    A questo dos efeitos das plantaes de eucalipto parece, hoje, to indefinida quanto a prpria origem dessas espe-culaes. Muito debatido h algumas dcadas, o assunto parecia, presentemen-te, ser considerado apenas produto de especulaes do passado, talvez indigno de ser discutido nos meios acadmicos. Todavia, as dvidas ainda persistem em diversos pases, e a controvrsia do eu-calipto est longe de ser resolvida.

    De acordo com o artigo n 3 da resoluo do Conselho Nacional de Meio Ambiente, de 20 de maro de 2002, constitui rea de Preservao Permanente (APP)1 a rea situ-ada [...] ao redor de nascente ou olho dgua, ainda que intermitente, com raio mnimo de cinquenta metros, de tal forma que proteja, em cada caso, a bacia hidrogrfica contri-buinte. As APPs devem ter sua vegetao composta por espcies nativas.

    Do total de produtores de eucalipto en-trevistados, 91% tem um ou mais recursos

    hdricos em sua propriedade; 9% das proprie-dades no possui cursos dgua. Outras duas questes foram feitas ao grupo de 91% que possuem recursos hdricos. Com os resulta-dos foi possvel formar o Quadro 3:

    PERGUNTAS SIM NO Alguns dos recursos dgua da propriedade se localizam prximos a plantao de eucalipto?

    30% 70%

    Ocorreu diminuio do nvel de gua nestes recursos?

    3,5% 96,5%

    Quadro 3 - Propriedades que possuem recursos dgua.

    Grande parte dos produtores que no pos-suem em suas propriedades recursos hdricos prximos s plantaes de eucalipto disseram ter recebido instrues tcnicas da secretaria municipal de agricultura, para que fosse mantida uma distncia entre as plantaes e os recursos hdricos. Os produtores que efetuaram o plantio de eucalipto prximo aos recursos aquferos de suas respectivas pro-priedades, em sua maioria alegam no crer na possibilidade de alto consumo de gua pelas espcies de eucalipto; uma minoria, por sua vez, justifica o plantio de eucalipto prximo a recursos hdricos devido s pequenas reas de plantio de suas propriedades, alegando ter poucas reas destinadas ao plantio.

    No decorrer da pesquisa foi identificado um caso isolado de plantao de eucalipto margeando um riacho. Neste caso, por se tratar de plantao com fins comerciais, o eucalipto no se adqua aos critrios de vegetao propcia a ser utilizada nessa finalidade. Esse fator soma-se ao artigo n3 da Resoluo CONAMA, de 20 de maro de 2002, que rege a seguinte lei: constitui rea de Preservao Permanente a rea situada [...] a trinta metros, para o recurso dgua com menos de dez metros de largura, neste caso a rea de Preservao Permanente tambm deve ser composta por vegetao nativa.

    O conflito de vizinhanas tambm deve ser considerado um impacto ambiental, pois

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    refere-se aos efeitos causados s plantaes vizinhas devido sombra produzida pelos ps de eucalipto, que acaba interferindo nas plantaes de outros gneros (produtos) agrcolas de propriedades vizinhas.

    Consideraes finais

    Este trabalho demonstrou a influncia do poder pblico municipal de Aratiba sobre o cultivo de eucalipto. O subsdio de mudas de eucalipto para as unidades de produo familiar foi o ponto inicial (estimulando a gerao de alternativas de renda no meio rural do municpio de Aratiba), viabilizando a diversificao da produtividade rural do municpio de Aratiba.

    Economicamente, o cultivo de eucalipto vem se demonstrando rentvel para as pro-priedades pesquisadas, sendo que todas as propriedades que j obtiveram lucros com o mesmo declararam ter obtido melhorias na qualidade de vida. Tambm foram realiza-dos investimentos em novos plantios ou em outros setores da unidade produtiva.

    possvel afirmar, tambm, que o cultivo de eucalipto utilizado como uma alternativa de produo comercial em larga escala, e

    que estimula relaes capitalistas de produ-o no meio rural do municpio de Aratiba, diminuindo o trabalho familiar no campo e servindo como fonte de renda e acmulo de capital de empresrios urbanos.

    Os impactos sociais mais notveis pro-duzidos pelo cultivo de eucalipto se refletem tambm no meio urbano, para onde migram as famlias que, ao invs de continuar no campo ou vender a propriedade, preferem mudar-se para a cidade e investir unicamen-te no cultivo de eucalipto em suas terras. Isso justifica a hiptese de que o cultivo de eucalipto est ligado ao aumento do xodo rural em Aratiba. Foram percebidos, tambm, conflitos sociais, como o caso do impacto de vizinhana.

    Constata-se que, apesar da relativa renda gerada pelo cultivo de eucalipto, sobretudo pelos agricultores familiares, h ausncia de sustentabilidade em todo o processo de pro-duo de eucalipto no municpio de Aratiba-RS. Quando se introduz um novo cultivo agrcola com tamanha expresso, como o caso do eucalipto, necessrio realizar estudos de supostos impactos que possam interferir na sustentabilidade do processo como um todo. Nota-se a ausncia de estudos realizados nesse sentido na rea abordada.

    NOTAS

    1 rea protegida, coberta ou no por vegetao nativa, com a funo social e ambiental de preservar os recursos hdricos, a paisagem, a estabilidade geolgica, a biodiversidade, o fluxo gnico de fauna e flora, proteger o solo e assegurar o bem-estar das populaes humanas.

    AUTORES

    Jos Otvio Marques da Silva Graduado em Geografia/URI - Campus de Erechim-RS. E-mail: [email protected]

    Mario Zasso Marin Doutor/PPGG/UFSC. Professor da Unio Dinmica de Faculdades Cataratas UDC, Foz do Iguau, PR. E-mail: [email protected]

  • 122 PERSPECTIVA, Erechim. v.34, n.127, p. 113-122, setembro/2010

    Jos Otvio Marques da Silva - Mario Zasso Marin

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