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Direito Internacional Público 28_04_2015 Direito internacional penal Crimes internacionais - Genocídio (raça/etnia + matar): Etimologicamente, significa a destruição de certos grupos humanos. Este é considerado o crime mais grave que alguém pode cometer. Tem um lado sinistro uma vez que há uma despersonalização da vítima , ou seja, não se mata a pessoa A, B ou C por serem determinadas pessoas mas sim por esta pertencer ao grupo que foi selecionado como alvo. A convenção de 1948 tem uma definição de genocídio completa. Diz também que este pode ser cometido tanto em tempo de guerra como em tempo de paz. Em terceiro lugar diz que o genocídio para além de envolver a responsabilidade criminal dos indivíduos que em concreto praticaram as infrações constitutivas do crime, envolvem também a responsabilidade internacional do estado cujo autoridades politicas ou militares tenham estado por de trás da prática deste crime. Conclui-se que o genocídio é um crime que é insuscetível de ser praticado como ato esporádico ou isolado. Ele implica sempre a participação da hierarquia politica e militar de um estado. É um crime que está fora do alcance de um individuo. Ele envolve meios que os indivíduos por si sós não dispõem. Esta convenção de 1948 tinha duas debilidades: não contemplava no seu âmbito de proteção os grupos políticos nem tao pouco o genocídio cultural. Apenas previa genocídio físico; por outro lado não previa mecanismos sancionatórios eficazes para a punição deste crime. Segundo o artigo 6º do Estatuto de Roma, quanto ao elemento objetivo estão em causa neste crime grupos nacionais, étnicos,

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Aula Dr. Ferreira de Almeida

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Direito Internacional Público28_04_2015

Direito internacional penal

Crimes internacionais

- Genocídio (raça/etnia + matar): Etimologicamente, significa a

destruição de certos grupos humanos. Este é considerado o crime mais

grave que alguém pode cometer. Tem um lado sinistro uma vez que há uma

despersonalização da vítima, ou seja, não se mata a pessoa A, B ou C por

serem determinadas pessoas mas sim por esta pertencer ao grupo que foi

selecionado como alvo. A convenção de 1948 tem uma definição de

genocídio completa. Diz também que este pode ser cometido tanto em

tempo de guerra como em tempo de paz. Em terceiro lugar diz que o

genocídio para além de envolver a responsabilidade criminal dos indivíduos

que em concreto praticaram as infrações constitutivas do crime, envolvem

também a responsabilidade internacional do estado cujo autoridades

politicas ou militares tenham estado por de trás da prática deste crime.

Conclui-se que o genocídio é um crime que é insuscetível de ser praticado

como ato esporádico ou isolado. Ele implica sempre a participação da

hierarquia politica e militar de um estado. É um crime que está fora do

alcance de um individuo. Ele envolve meios que os indivíduos por si sós não

dispõem.

Esta convenção de 1948 tinha duas debilidades: não contemplava no seu

âmbito de proteção os grupos políticos nem tao pouco o genocídio cultural.

Apenas previa genocídio físico; por outro lado não previa mecanismos

sancionatórios eficazes para a punição deste crime.

Segundo o artigo 6º do Estatuto de Roma, quanto ao elemento objetivo

estão em causa neste crime grupos nacionais, étnicos, rácicos ou religiosos.

Isto porque adere-se a estes grupos desde nascença. Argumenta-se aqui

que as pessoas podem mudar de grupo.

- Infrações que podem constituir o crime de genocídio:

1. Homicídio de membros de um grupo

2. Ofensas graves à integridade física ou mental de membros do grupo

3. Sujeição intencional do grupo a condições de vida pensadas para

provocar a sua destruição física total ou parcial. (ex.: disseminação

de vírus)

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4. Imposição de medidas destinadas a impedir nascimentos no seio do

grupo (Ex: medidas de esterilização forçada).

5. Transferência à força de crianças do grupo para outro grupo. (ex.: na

Jugoslávia matava-se todos os homens de um determinado grupo).

- Elemento subjetivo do crime (o que é preciso acontecer para ser

acusado)

Deve praticar com dolo (intenção) uma das infrações que podem constituir

o crime de genocídio. Além disso tem de haver uma necessária presença de

um dolo específico, uma intenção criminal agravada, ou seja, é preciso que

o agente tenha atuado com o propósito de destruir o grupo em todo ou em

parte. É isto que torna o genocídio o um crime bastante difícil de provar

uma vez que é preciso provar o seu “propósito de destruir o grupo em todo

ou em parte”. Este dolo específico pode ser demonstrado segundo o

contexto em que o crime foi cometido.

O genocídio só pode ser cometido com dolo direto ou com dolo necessário.

Porém, não é possível cometer genocídio com dolo eventual ou por

negligência.

Para haver genocídio tem de existir um “número” significativo de vítimas.

Claro que uma pessoa pode ser condenada apenas por uma infração desde

que tenha feito com o dolo específico e com um elevado número de vítimas.

Pode haver ainda a seleção de elementos mais destacados de um grupo.

Por exemplo, se visar os dirigentes políticos, não se exige que tenha de

haver um número elevado de vítimas uma vez que estes já são reduzidos.

É também admissível que o genocídio ocorra numa área delimitada. Desde

que os autores do crime tenham encarado o segmento como um segmento

autónomo.

- Crimes contra a humanidade

Podemos defini-los como atrocidades que são aplicadas contra

determinados segmentos da população civil de forma sistemática ou em

larga escala/generalizada. Tal como o genocídio aplicasse a tempos de paz

ou de guerra.

Qualquer que seja a posição do acusado na cadeia de comando. Ou seja,

pode ser uma pessoa do topo da cadeia militar ou em lugares mais baixos.

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Aplica-se independentemente da nacionalidade. As vítimas podem ser da

mesma nacionalidade do autor ou de diferente.

Não necessita de ser praticado com intenção discriminatória. Com exceção

da perseguição e do Apartheid.

Tal como o genocídio, os crimes contra a humanidade não podem ser casos

individuais. Pressupõe então o envolvimento de uma grande organização

criminosa ou por altos dirigentes. São então praticados sob o comando ou

pelo menos com tolerância e complacência das autoridades de um estado

ou de uma grande organização criminosa. Isto porque se pressupõe a

utilização de aparatos que os indivíduos por eles próprios não tem acesso.

São então praticados no quadro/contexto de uma ação ou política estadual.

*Ataque em larga escala significa um ataque que pressupõe como

consequência um número elevado de vítimas. Pode advir de uma ou várias

ações em simultâneo independentemente do lugar. Podem ainda ser

atrocidades de forma sistemática (obedecem a um padrão – de forma

metódica e planeada). Ainda assim, uma ação de larga escala

necessariamente há de estar por de trás de um grande planeamento. Assim

não há grande diferença entre um ataque de larga escala e de uma taque

sistemático. Ainda assim, distingue-se que o ataque sistemático tem de ser

planeado/patrocinado pelas autoridades do estado na respetiva

consumação. Já no ataque em larga escala poderá bastar-se com a mera

omissão/inação por parte do estado (ex.: caso de Timor Leste).

Certo é que alguém só pode ser condenado por crime contra a humanidade

se realmente tiver atuado num determinado contexto.

- Ações eventualmente constitutivas de crimes contra a humanidade

1. Homicídio

2. Extermínio

3. Escravidão

4. Deportação/transferência à força

5. Prisão, tortura, desaparecimento forçado…

6. Apartheid

7. Outros atos de natureza semelhante;

- Elemento subjetivo dos crimes contra a humanidade

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É necessário que o autor pratique com dolo. É preciso ainda que o agente

quando pratica uma dessas infrações esteja ciente de que elas se inscrevem

num contexto mais vasto, o contexto de um ataque generalizado ou

sistemático contra a população civil. Ou seja, ele tem de ter a consciência

de que a ação que estava em curso fazia parte de um ataque em larga

escala.

Por isso, o crime contra a humanidade tem de específico o elemento

político ou contextual. É necessário que o agente tenha consciência disso

quando pratica o crime.

Os crimes contra a humanidade, implica que exista uma ação

discriminatória. Pois para se “escolher” determinado grupo tem de haver

uma intenção discriminatória. Porém, daqui não sucede que desta medida

seja implicada uma demonstração da ação discriminatória do autor para a

acusação. A não ser que o ataque tenha sido em perseguição ou em crimes

de Apartheid pois estes implicam à “nascença” uma intenção

discriminatória.

Duas ou três decisões jurisprudenciais vieram considerar desnecessário o

elemento político ou contextual. Ao mesmo tempo havia quem dissesse que

estes elementos não era dispensáveis.

- Crimes de Guerra – enviar para o pedro

Crimes praticados durante um conflito armado. Ao contrário dos crimes

contra a humanidade, os crimes de guerra só podem ser praticados durante

um conflito armado. Inicialmente intendia-se que os crimes de guerra só

poderiam ser praticados durante conflitos internacionais. Atualmente

aceita-se que também pode acontecer durante conflitos não internacionais

(dentro das fronteiras de um estado).

Os crimes de guerra constituem violações graves de direito internacional

humanitário. Designa-se hoje o direito internacional humanitário o

tradicional “direito dos conflitos armados internacionais”. Este tinha dois

ramos, direito da Aia e o direito de Genebra. O direito da Aia (isto porque

tem a ver com as convecções celebradas lá) codifica os meios e métodos de

fazer a guerra. Há limitações impostas quanto aos alvos que são atingidos,

quanto ao armamento utilizado, e às pessoas que são atacadas. Portanto, o

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direito da Aia procura limitar a amplitude da guerra. Procura introduzir

“temperamenta”.

O outro ramo, o Direito de Genebra – antigo Direito internacional

Humanitário, procura limitar a violência nas pessoas, nas vítimas dos

conflitos armados. Este esta codificado nas quatro convenções de Genebra

de 1949 e respetivos protocolos adicionais. Este direito procura humanizar

a guerra, limitar os seus efeitos nas vítimas dos conflitos armados

internacionais. Nas mulheres, crianças, doentes, náufragos, feridos,

prisioneiros de guerra, etc. Estes dois direitos fundiram-se num só, o

Direito Internacional Humanitário. Por esta razão os crimes de guerra

constituem violações graves ao direito internacional humanitário. Estes são

praticados por alguém ligado a um dos lados do conflito contra um neutral.

- Infrações que constituem crimes de guerra

Há uma lista muito extensa de infrações que podem constituir crimes de

guerra. É exemplo:

1. Homicídio doloso

2. Tortura

3. Ato de causar sofrimento

4. Apropriação de bens em larga escala não justificadas

5. Privação intencional de um prisioneiro de guerra ou outra pessoa de

ter um julgamento justo

6. Atacar intencionalmente a população civil que não participem nas

hostilidades

7. Atacar bens civis

Portanto, qualquer uma destas ações praticadas com dolo, à exceção da

perseguição e do Apartheid, será um crime de guerra. A razão por que o

artigo 8º tem uma extensão tao grande é porque alguns destes crimes de

guerra estão previstos em convenções internacionais e outros resultam de

direito internacional costumeiro. No estatuto de Roma, estão ambas

previstas. Daí a lista tão extensa de infrações que constituem crimes de

guerra.

- Há porem que distinguir genocídio e crimes internacionais de crimes de

guerra

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Desde logo os dois primeiros podem ser praticados em tempos de guerra

ou de paz e os crimes de guerra apenas durante os conflitos armados.

Inicialmente dizia-se que nos dois primeiros a nacionalidade dos autores e

vítimas podiam ter a mesma nacionalidade ou diferente nacionalidade.

Uma vez que nestes dois casos podem ser causados pelo estado aos

nacionais. Porém, os crimes de guerra tinham como característica a

nacionalidade das vítimas e do autor serem sempre diferentes. Só que, os

crimes de guerra hoje também podem ser praticados em conflitos armados

não internacionais, logo, a nacionalidade do autor e da vítima pode ser a

mesma. *quando praticados em conflitos internos. Assim esta diferença

deixa de ser válida.

- Genocídio vs. Crimes contra a humanidade

No genocídio, são cinco as infracções. Os crimes contra a humanidade podem materializar-se em onze infracções. 

A diferença reside no elemento subjectivo. No genocídio, exige-se que o agente actue com dolo e que tenha intenção criminal agravada. Nos crimes contra a humanidade não se exige isso. 

Por outro lado, nos crimes contra a humanidade é preciso que o agente tenha tido conhecimento que a sua infracção se insere num ataque em larga escala contra a população civil. Para o genocídio não se exige esse conhecimento. 

No genocídio, exige-se a intenção criminal agravada e nos crimes contra a humanidade exige-se somente para duas das onze infracções (perseguição e apartheid). Desta forma, estes não seriam crimes contra a humanidade.

A intenção genocida é impossível de provar quando baseada na confissão; só se pode deduzir através do contexto em que actua o agente. 

- Crimes de guerra vs. Crimes contra a humanidade e Genocídio

Os últimos podem ser praticados em contextos de guerra ou paz, enquanto os de guerra só podem surgir em tempos de guerra. 

Os crimes de guerra podem ser cometidos a título de infracções isoladas, esporádicas, fortuitas, já os últimos não o podem ser (inserem-se num contexto mais amplo).