01. Mazzotti AJ. Ciencia Natural, Os Pressupostos Filosoficos

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Aida Judith Alves-MilzzottiFernando Gewandsznajder

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1. 0 positivismo 16gico

Ciencia Natural: Os PressupostosFiIosoficos

membras do grupo eram judeus ou !iriham ideias liberais ou socialistas incom­pativeis com 0 nazismo.~ positivismo a T.6gica e a Matcm6tica sedam v;ilidas porqlJe estabe­

lcccm'<lS fegTus d~Ji!1~C!SCIl}..~O!l$ti.t.llJnqO-SC Crn,:um·~conhccjm".9tQ a priori. QY

S~Lindepend'!.nte. c!a expc_ri~nci'h_Em .cOl\traste £Q.IIl_~ JAgie~ _~atema.!!£a,

porem, 0 eonheciment() factual ou em irico d__'_'_ ~~o~Ji40__'LJ'~ti!9_aobseryac;ao, P'1£..'e'!'_Ir\~todo_~o_l)))~do c~_ 0. indu,ao. "

A partir da observac;ao de urn gran TO de cisnes "brancos, porcxcmplo, concIuimos, por indu<;ao, que 0 proximo cisne a SCf obscrvado serabranco. Do mcsmo modo, a partir cia obscrv<I~5.o de que alguns metais scdilatam quando aquecidos, concluimos que tadns os mctC1is sc dilatam quandoaquccidos e assim por diantc. A induS50, portanto. ¢ Q processo pelo qyal"podemos obter e confirmar hip6teses e gnuociados gerais a partir cia ObSeTV(l~

,ao.As leis cicntificas, que s50 cnunciados gerais que indicam relac;6es entre

dois ou mais fatores, \ambem poderiam ser obtidas por indu,ao. Estudando-sea variac;ao do volum.t de urn gas em func;ao de sua pressao, por exemplo,conclufmos que 0 volj{me do gas e inversamente praporcional i\ pressao exerei­da sobre ele (lei d~Boyle). Em termos '''stratos, as l~is podem ser expressas naforma "em todos os casOS em que se realizam as condic;oes AI serao realizadasas eondi,6es lJu. A associa,ao das leis com 0 que ehamamos de condi,6esiniciais perntite preyer e expliear os fenomenos: a lei de lJoyle perntite preyerque se dobrarmos a pressao de urn gas com volume de umlitro, em temperaturaconstante (condir;oes iniciais), eSse volume sera reduzido ametade.

Embora 0 lermo leoria tenha varios signifieados (podendo ser utiJizadosimplcsmente como sin6nirno de uma hip6tcse ou conjectura), em sentidoestrito as tcorias sao formadas por urn conjunlo de leis c, freqiientemente,procuram explicar as fenomenos com auxilio de conceitos abstratos e naodiretamente observaveisl como "Momo"1 "eJetron", Iican1po", "selec;ao natural"etc. Esses conceitos abstratos ou le6ricos estao relacionados por regras deeorrespondencia com enunciados diretamente observaveis (0 ponteiro do apa­relho deslocou-se em 1 centimetro, indicando uma corrente de 1 ampere, porexemplo).

As teorias geralmente utiJizam modelos simplifieados de urna situa,aomais complexa. A leoria cinetiea dos gases, por exemplo, sup6e que urn gas sejaformado por particu1as de tamanho desprezivel (atomos ou moleculas), semforc;as de atrnr;ao ou rcpulsao entre elas e em movimento aleatorio. Com auxI1iodesse modele, podemos explicar c deduzir diversas leis - inclusive a lei deDoyle, que re1<J.ciona a pressao com 0 volume do gas (se 0 volume do recipicntcdo gas diminuir, 0 numero de choques das molcculas corn a parcdc do recipien­te aumenta, aumentando a pressao do gas sabre a parede).

E:Mf;WMo+­t'ltl treeN /I..

~~Ti lfiJ.t'lor 'w6tlLo

CAPITULO 2

~ termo positivis1Ilo vern de Comtc, que considerava a ciencia como 0

paradlgma de todo 0 conhecimento. No entanto, mais importante do queComte para a lmha anglo-americana foi a eombina,ao de ide;as empiristas(Mill, Hume, Mach & Russell) com 0 usa da l6gica modema (a partir dostrabalhos em matema.tiea e l6gica de Hi!."ert, Peano, Frege, Russell e das idejasdo TTlU:talus Logl~O-PhllosophlCUS, de Wittgenstein). Oai 0 movimento ser chama­?O~d~U'0sitivismo 16gico ou empirismo 16gicOJO movimento foiuu:u":'Clado am~a pelas novas descobertas em flsiea, principalmente a teoria9uantica e a teona da relativldade. (Para uma exposi,ao mais detalhada das,M,as e do desenvolvimento do positivismo l6gico ver Ayer, 1959, 1982; Gillies,1993; Hanfllng, 1981; Oldroyd, 1986; Radnitzky, 1973; Suppe, 1977; Urmson,1956; Wedberg, 1984.)

Embora tenha surgido nos anos 20, na Austria (a partir do movimentoconheado como "Circulo de Viena", fundado pelo fil6sofo Moritz Schlick\Alema~a e Pol6nia, muitos d~ seus princip<lis filosafos, como Rudolf Carnil~:Hans ReIchenbach, Herbert Felgl e Otto Neurath, entigraram pora os EstodosUrudos ou Inglaterra com 0 surgimcnto do naziSI!l0, uma vez que alguns dos

Neste c~pf~~ovamos discutir as principais concep~5esacerca da naturezado metodo clentIfJeo. Veremos entao que, embora os fil6sofos diseordem aeereade ~AriOS pontos, e possivel extrair algumas eonclusOeS importantes, que saoaeeltas por todos os que defendem {busca da objetividaOelcomo urn ideal doconhecimento cientifico. J

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"N~Jll'llid~de,OS positivist~s nao est~vam interessados ex~lamente emcomo 0 cientist~ pens~v~, em su~ motiv~~oesou mesmo em comoele agia napratica: isto seri~ uma tarefa para a psicologia e a sOOologia. 0 que interessav~

cram ~s rel~~6es I6gicas entre enunci~dos cientificos. A 16gi<;a da ciencia fome­ceri~ um criterio ideal de como 0 cientista-e>t-il-GOffiunidade~lffica dl:Deria agir

// ~ ~dd" 0au pensar, tendo, portanto, urn ~er nonn_~_!.iy~em v e escntivo.ol~I~Yo central R~a, partanto, 0 de expn-ea:r como a'd~cia funciona, mas

::: (1u~ti~car ou legiti?,ar oQonhecimento cientffico, estabelecendo seus fundamen-~,c..~16lg1CQ$Ii: E!if+nI~ ~ _~~c:.,~{", .z 6kUSo.CcO C~S~

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)sitivistas exigiam que cada conceito presente em uma teoria tivesse-rcnda algo observavcl. fsto explica a oposi~,io :1 tcoria atomica no

iw'cio do.;kulo: embora esta teoria conseguisse ex-plicar as leis da qufmica, aspropriedales_dos gases e a natureza do calor, Mach e seguidores nao a aceita­varn, umavez·que as Momos nao podiam ser observados com qualquer tecrucaimagina'e1da epoca.

:A<aIlila~aode uma lei ou teoria seria decidida exclu,i\'amente pela obser­VaC;aCGU experimento. Vma lei ou teoria poderia ser testadil dircta au indireta­ment! com auxI1io de senten~as observacionais que descrc\·eriam 0 que umapessaa estaria experimentando em determinado momenta (:::criam sentenc;as dotipo "'urn cubo verrnelhc esta sobre a mesa"). Estes enunciJdos forneceriamuma base empirica s6lida, a parnr da qual poderia ser construido 0 conheci- 1 .1 Crf,ticas ao positivismomenlo cientifico, garantindo, aindn a objetividade da cii:·nC; ...I. {~ GO--Cft 0.

Para 0 positivismo, as senten~as que nao pudcrcm sor \·crific.:das cmpiri- I (!f' \~ Popper e outros fil6sofos questionaram 0 papel atribuido it observac;ao nocamente estariam fora da fronteira do conhecimento: seri;;m sentenc;as scm ~\) positivismo 16gico. A ideia eque toda a observac;ao _ cientffica ou nao _ estasentido. A tarefa da fiJosofia seria apenas a de ap' 'isar loglco mente os conceitos, ~ imersa em teorias (au expectativas, pontos de vista, etc.). Assirn, quando urncienlifieos, A verificabilidade seria, portanto, 0 criterio de ~gnifu;~o~ I cientista mede a corrente eletrica ou a resistencia de um circuito ou quando.-Wunciad~:para todo enunciado com sentido deveria ser possivel decidir se ele observa uma celula com 0 microsc6pio eletr6nico, ele se vale de instrumenlose falso ou verdadeiro, conslruidos com auxHio de complicadas teorii'~ fisicas. A fidedignidade de urn"

,,"""{lid As leis e teorias poderiam ser ~'ormuladase verificadas pelo metodo indu- simples medida da temperatura.com auxilio~de urn term6metro, por exemplo,tivo, urn processo pdo qual, a partir de urn certo nt.'imero de observa<;6es depende da lei da dilatac;ao do mercurio, assim como a observa~ao atraves derecolhidas de urn conjunto de objetos, fatos ou acontecimentos (a observa<;ao de urn simples microsc6pio 6ptico depende das leis da refra~ao.alguns cisnes brancos), concluimos algo aplicavel a um coojunto mais ampIo r~'hoje amplamente aceita em fQ~~ofiada ciencia, de que toda,obser-

(todos os cisnes sao brancos) ou a casos dos quais nilo tivcmos expericncia (0 va~ao, ~ "imP,,regna,, .d.,,,::.c;lgteOria (1IzeOry-.lade,") fc>L 9.,eLe.,"ffi_.~ci"j;,a no)rua,~.9Qpr6ximo cisne sera branco). S6culo peIo fil6sofo.. Picrrc Dybcm Djzia de q!1c._:um cxperlmentQ em fJS1:-3

Mesmo que nao garantisse certcza, 0 metoda ind\.ltivo podcria confcrir n~~.~i?'pl<:sro~n~en~..Qq§~ry~sao9£ l!~ [e~pm!?.n?i.¢JaIJlk,em a_!?terpreta<;aoprobabiJidade cada vez maior ao conhecimento cientifico, que se aproximaria· 954 1 )cada vez mais da verdade. Haveria um progresso cumulativo em cioncia: novas I te6rie~ _d~~!,_!el)6me."Q" (Duhem, 1 , ,p. 44 . _.. . f!'

Em resumo, do momenta em que as observa<;oes Incorporam teonas a 1-leis e teorias seriam capazes de cxplicar e preyer urn numcro cada vez maior de vcis, clas nao podem ser consideradas como fontes seguras para se conc;truir 0fenomenos.

conhecimento e nao podem servir como uma base s6lida para 0 conhecimentoMuitos fil6sofos positivistas admitiam que algumas hip6teses, leis e cientifico, como pretendia 0 positivismo, (Mais detalhes sobre a rela~ao entre

teorias NO podern ser obtidas por indu<;ao, mas sim a partir da imaginar;ao observar;ao e conhecimento estao em: Gregory, 1972; Hanson, 1958; Musgrave,e criatividade do cientista. A hip6tese de que a molecula de benzeno teria aforma de urn ane! hexagonal, pur exemplo, surgiu na mente do quimico 1993; Popper, 1975b; Shapere, 1984; Watkins, 1984.)Frederick Kekule - quando ele imaginou uma cobra mordendo a pr6pria Outro problema para 0 positivismo foi a critica aindu~ao.

d H d 1 f h I Ja no seculo dezoito, 0 fil6sofo David Hume questionava a validade d,ocau a. a aqui uma i cia importante, anteeipada pelo Ii 650 a John Herse e ed(1830) e depois reafirmada por Popper (1975a) e Reichenbach (1961): .t,'H'i~ raciOOnio indutivo, argumentando que a indu~ao nao e urn argurnento d ull-entre 0 "contexto da deseoberta" e 0 "contexto da justificaci,o", Isla guer dizer vo e, portanto, nao e Jogicamente valida (Hume, 1972), Alem disso, ela tambemque 9 prorediments:' para f0!"ffiular au descobrir uma tc'?!0__c}rrele~ante nao pode ser justificada peJa observaC;ao: 0 fato de que todos os Cl~nes obser·para sua aceitasao. No entanto,·Cfg.29ra nac haia rCg.@~ pa~a_il: ~~Y~,iio ou vados ate agora sejam brancos, nao garante que 0 proximo cisne seJa branco-descoberta de novas hip6tese§~.~1_J!1?v~.z formuLadas!.-e~~steriam de scr tcst'l~.~? nem que todos os cisncs sejam brancos. A indu<;ao nao podc; portanto, ser~xperimentalmente. justificada - nem pela 16gica, nem pela experiencia. I

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lcses, leis c tcorias que: nao podcm ser comprovadas? (Mais sobre as ideias de~.Popper em: Andersson, 1994; Gewandsznajder, 1989; Magee, 1989; Miller, 1994i?-'Newton-Smith, 1981; O'Heer, 1980; Popper, 1972, 1975a, 1975b, 1979, 1982; .'Schilpp, 1974; Watkins, 1984.) _,.~

\/E!?() 1<'!::::t::S ~!~\, i..s, ;((J J\ .s: ~~TI-'\ ~~ __

2.1 0 Metoda das ~onjecturas e refuta90es Co ~PI'ICf'1ACfcu

Popper aceita a conclusao de HUI!'$ ~ que a partir de observac;6es e da16gica nao podemos verificar aev"rd.de (ou aumentar a probabilidade) deenunciados gerais, como as leis e fcorias -ete .. No entanto, diz Popper, aobservar;ao e a 16gica podem ser usadas pa refutar sses enunciaqos gerais: aobscrvac;iio de urn unicn cisne negro (se ele de ato or negro) pode, logicamen­te, refutar a generaUza<;ao de que todas os cisnessao brancos. Ha, portanto, umaassimetria e~tre a_.~efldJ~C:.~(?.s_~~.gifi.~o.

~artirdai, Popper constr6i sua visao do metoda cientifico - 0 radonalis­ma crftico - e tambem do conhecimento em geral: :lmbos progridem atraves doque ele chama de conjecturas e relutacOes. Islo significa !Jue ab~c~~, inic!!"com a lor.!!,ulacao de hip6teses que procuram resolver proble­mas e continua com tentativas de refutar;ao dessas hip6teses, atraves de testesque envolvem observa,oes ou experimentos. Se a hip6tese nao resistir~testes, formulam-se novas hip6teses que, por sua _v.:.z, ~mbem serao testad~s.

Quando uma hip6tese passar pe~os testes, eia sera acelta como~\.l.1l)? solucaoprovis6ria para (, problema. onsi ra-se, entao, ue a hi 6tese foi corroboou adquiriu algurn grail de roborac;ao:Este rau e fun ao da severidade dtgstes a que fOl-5uom~'t-'~~_~_I!l~ -.-- eou. tCO!~~,.~ce~o~.£QIO,..qye..a

hip6teseju teo!;.p~u PO!,~stci,~6 termo corrobora¢o.e pr:!erivel 11confirma,no para)'?:o dar a ideia ae que as hlp6teses, leIS ou teonas sao verda­deiras ou se .toinam cada vez mais provaveis amedida q~e passaro peles testes.A corrob9raC;ao e uma medida que avalia apenas 0 suc~so passado de umateori• .eh50 diz nada acerca de seu desempenho futuro. A qualquer momento,no,vos testes poderao refutar uma hip6tese ou uma teoria que foi bem-sucedidano passado, isto C, que passou com sucesso pelos testes (como aconteceu com a

/hip6tese de que todos os cisnes sao brancos depois da descoberta de cisnes.,,'

~ negros na Australia).As hip6teses, leis e teorias que resistiram aos testes ate 0 momento sao

importantcs porque passem a fazer parte de nosso conhecimento de base:podcm ser usadas como "vcrdades proviSOFias", como urn conhecimento naoproblematica, que, no momento, nao esta sendo contcstado. :Mas a dedsao deaccitar qtMlqucr hip6tesc como parte do conhecimento de base etcmporaria epode sempre ser revista c revogada a partir de novas evidencias.

r;-; -, ?, .. ' ~p-~, T-6':P..vS£' --P {l-.A"""<.}"t:':, t--.l./~"-'S\'!~ ,:~{" :',,\-~

2. As ideias de Popper

A partir das criticas aindw;ao, POppC'f tenta construir uma tcori<1 <1ccrca dometodocientifico (e tambcm acerca do conhecimento em gt1ral) que n~b envolvcla indw;ao - que nao seja, portanto, vulner!lvel aos argumcntos de HUiTIc. Aquestao c: como epassivel 'lue nosso conhecimento 3umentc a pMt:r dL' hip6·

Se passannos de generaliza¢es superficiais, como ados cisnes, para as leise teorias cientfficas, 0 problema se complica mais ainda. A partir da observac;aode urn certo nUmero de fatos, podemos cxtrair diversas leis e teorias cientiiicascompativeis com os dados recolhidos. Isto quer dizer que a induc;ao, por si s6,nao e suficiente para descobrirmos qual das generalizac;OeS e a que melhorexplica os dados.

AJem disso, meSffiO que procedimentos indutivos perm.itClnl reunir urnconjunto de dados e formar generalizac;Ccs superficiais (do tipo "todos osmetais se dilatam"), eles sao insuficientes para originar teorias profundas, queapelam para conceitos impossfveis de serem percebidos por obser.:a<;ao direta,como eletron, quarck, selec;50 natural, etc.

lI!Js fil6sofos positivistas afirmam, no entanto, que 0 mctodo indutivo podeser usado para aumentar 0 grau de confirma<;ao de hip6teses e teorias. Comauxilio da teoria da probabilidade, procuram desenvolvcr lima logiGl indutivapara medir a probabilidade de urna hip6tese em func;ao das evidencias a seufavor (calculando, por exemplo, a probabilidade que um paciente tem de terdeterminada doenc;a em func;ao dos sintomas que apresenta).

A construc;ao de uma 16gica indutiva contou com a colabora<;ao de variespositivistas 16gicos, como Camap (1950) e Reichenbach (1961) e ainda terndefensores ate hoje, que procuram, por exemplo, implementar sistemas induh­vos em computadores para gorar e avaliar hip6teses (Holland el aI., 1986).

Outra Iinha de pesquisa, 0 bayesianisrno, utiliza 0 teorema de Bayes (emhomenagem ao matematico ingles do scculo XVIII, Thomas Bayes) para atuali­zar 0 grau de cenfirmar;ao de hip6teses c teorias a cada nova cvidencia, a partirde uma probabilidade inicial e das evidencias a lavor da teoria. (Para exposi<;aoe defesa do bayesianismo, ver Howson & Urb"ch, 1989; Jeffrey, 1983; Horwich,1982.)

Os sistemas de 16gica indutiva c as tcntativas de atribuir probabiJidade ahip6t.eses e tcorias tern sido bastante criticados c aprcscntam muitos problemasnao resolvidos. Mesmo que sc possa atribuir probabilidadc a cnunciados gerais,parece multo diflcil - senao impossivel - aplicar probabilidades as teoriascientfficas profundas, que tratam de conceitos nao observaveis. (Para criticas a16gica indutiva, ao bayesianismo e 11 busca de princlpios que justifiquem ainduc;ao, ver: Earman, 1992; Gillies, 1993; Glymour, 1980; Lakatos, 1968; Miller,1994; Pollock, 1986; Popper, 1972, 1974, 1975" 1975b; Watkins, 1984).

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o conjunto de falseadores potencjais nos da uma medida do conle11doempirico da teona: quanto mais a teoria "profbe", rnais ela nos diz acerca domundo. Para compreender melhor essa coloca~ao, observe-se 0 caso oposto: 0

de enundados do tipo "vai chover ou nao vai chover amanh~". Enunciadosdeste tipo nao possuem falseadores potenciais e, portanto, nao t~ conle11doempfrico ou informativo, nao sao testaveis ou refuUveis e nada t\zem acercado mundo nem contribucm para 0 progresso do conhecimento.

Por Dutro lade, quanta mais geral for urn enunciado ou lei, maior seuconteudo empirico ou informativo (a generalizc\(;ao "topos os metais se dilatamquando aquecidos" nos diz mais do que "0 chum])o se dilata qua"do aqueci­do") e maior sua refutabilidade (a' primeira afirma~ao pode ser refutada casoaIgum metal - inclusive 0 chumbo - nao se dilate.. enquanto a segunda 56 erefutada casa 0 chumbo nao se dilate).

.C~uimos entao que para acelerar 0 progresso do conhecimento deve­mas busc'iu leis cada vez mais gerais, uma vez que 0 risco de refuta<;ao 'e 0

conteudo informativo aumentam com a amplitude da,lei, aumentando assim achance de aprendermos algo novo.

Um raciodnio semelhante pode ser feito com a busca de leis mais precisas.Essas leis tern conteudo maior e arriscam-se mais a refuta~ao; exemplo: "adilata~aodos metais c diretamente proporcionaI ao aumento da temperatura"tem maior reiutabilidade do que "os metais se dilatamquando aquecidos", urnavez que este ultimo enunciado somente sera refutado se 0 metal nao se dilatarl

enquanto 0 primeiro enunciado sera refutado caso 0 metal nao se dilate' auquando a dilata<;ao se desviar significativamente dos valores previstos.

A refutabilidade tambem se aplica abusca de leis mais simples. Se medir­mos a simplicidade de uma lei em fun,ao do numero de parametros (0 criteriode Popper), veremos que leis mais simples sao tambcm mais refutaveis (ahip6tese de que os planetas tern 6rbitas circulares e mais simples do que ahip6tese de que os planetas tern 6rbitas eJipticas - ja que 0 circulo e um tipo deelipse).

Portant6, de acordo com Popper, a elencia deve buscar leis e teorias cadavez mais amplas, precisas e simples, ja que, desse modo, maior sera' a refutabi­lidade e, conseqiientemente, maior a chance de aprendermos com nassos erros.

No entanto, nao se deve confundir refutabilidade com refuta<;ao: a lei rnaisprecisa, simples ou geral pode nao ser bem-sucedida no teste e terminar substi­tuida por urna lei menos geral (ou menos simples ou precisa). A avalia,ao dasteorias s6 estara cornpleta ap6s os resultados dos testes. Na realidade, 0 quedefinira 0 destino de uma teoria sera 0 seu grau de corrobora~aO.

Eimportante cornpreender, porem, que ha uma liga~ao entre a refutabili­dade 12' a corroboraqao: quanta maior a ~futabilidade de uma teoria, maior 0

numero de acontecimentos que ela "profbe" e maior a variedade e severidadedos testes a que ela pode ser submetida. Conseqiientemente, maior 0 grau decorroboraqao adquirido se a teoria passar pelas testes.

. !¥_v&ias vezes, POpper protestou por ter sido confundido por seuscrilicos (Kuhn e Lakato~, por exemplo) com urn "talsificacionista ingenuo"(Popper, 1982). Para ele, 15to acontece porque esses crlticos confundem refuta-

~ CaD em n{~el16gico com refutacao em nEve! experimental. Em nivel experi~ou empfrico nunca podemos provar conelusivamente que uma teoria e fals,,:isto decorre do carater conjectural do conhecimento. Mas a tentativa de refut,,­~ao conta com 0 apoio da 16gica dedutiva, que esta ausente na tentativa deconfirma~ao. .

Ad~o de aceilar que urna hip6tese foi refutada e sempre conjectural:p~e ter havldo urn erro na observa~aoou no experimento que passou desper­cebido. No entanto, se a observa\,ao ou 0 experimento forem bern realizados en,a~ houver ~uvi.dasquanta a sua corrcqao, podemos considerar que, em prin­OpIO, e provisonamente, a hip6tese foi refutada. Quem duvidar do resultadopode "reabrir a questao", mas para isso deve apresentar evidencias de quehouve um erro no experimento ou na observa~ao. No caso do cisne, istoequivale a mostrar que 0 animal nao era urn cisne ou que se trataVi1 de urn cisnebranco pintado de preto, por exemplo.

, A refu.ta~ao ~onta com 0 apoio 16gico presente em argumentos do tipo:'"rodos os Clsnes sao brancos; este Clsne e negro; logo, e falso que todos os cisnes

sejam brancos". Neste casa, estamos diante de urn argumento dcdutivamentevalido. Este tipo apoio, porem, nao esta presente na comprova,ao indutiva.

.. Popj!1l!r.usa entio a l?gica dedutiva nao para provar teorias, mas paracnti~a-Ias.Hip6teses e teonas funcionam Como premissas de um argumento. Apartir dessas preIIllSsas deduzimos previs6es que serao testadas experimental­m~te. Se uma previsao for talsa, pelo menos uma das hip6teses ou teoriasutilizadas deve ser falsa. Desse modo, a logica dedutiva passa a ser urn instru-menlo de critica. r

i.Al~ !(p. ')ET>yn.,:.. 'J:) ia

2.2 A importiincia da refutabilidcJde \~00 \>\-Ct\TO ~c£n c,r~

.Para que ?~ento progrida atraves de refuta~6es,e necessario queas leIS e ~s teonas ';'teJam abertas arefuta,ao, ou seja, que sejam potencialmenterefutilvels. 56 assun, elas podem ser testadas: a lei da reflexao da luz, porexemplo, .que diz que 0 angulo do raio incidente deve ser igual ao angulo doralC refletido em urn espelho, seria refutada se observarmos Imgulos de reflexaod~f:rentes d.os ~ngulos de incidencia. Ns leis e teorias devem, portanto, "proi lblr a ocorrenCIa de determinados eventos.•

Os enunciados que relatam eventos que contradizem uma lei ou leoria(que relat~macontecimentos "proibidos") sao charnados de falseadores poten­oals da leI ou teoria.

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i", .' ;~, 1.0 . JUDITH ALV~MAZZOTIl <lo: fEKNMiDQ GEWANDSZNAJDER

"'.e~c.:...:..;;o,,:~._"9r~~~.~~;:-?a:s_~~~,-~.;~:~·:~~~_·, ':_:.~~:~-_,_, _. - , -:~"=:"~~'~~'Wi\()re'que:~'inaisrefutiveis POssuem' maior potencial de

-'?eOnoborasao-- enlbora Wrtateorl8."s6aIcance de fato tim alto grau clecorrobo.., ~ose,aII&i'dealtamenleretUtavet,eJa tambempassarcomsuceSSoportestes

!!!OO"P"- ., .'---- ...----.--... -_.. - -. A rehtlIbilidade nos da; entao, urn criterio a priori para a avalia,ao de

teorias: se quisermos 0 progresso do cunhecimento, devemos buscar teoriascada vez lmisrefutaveis (gerais, precisas e simples). A seguir, devemos subme­te-Ias aos testes mais rigorosos possiveis. Ternos' assim urn criterio de pro­gresso: tesias mais refutaveis representam urn avan,o sobre teorias menosrefutaveis-desde que as primeiras sejam corroboradas e nao refutadas.

·;ji!,ppperesta, na'realidade, propondo urn objetivo para a ciencia: a busca deteorias demaior refutabilidade e, conseqiientemenle;de maior conteudo empi­rico, mais wormativas e mais testaveis. Estas sao, tambem, as teorias maisgerais, smpes, precisas, com maior poder explicativo e preditivo e, ainda, commaior polalcial de corrobora.,ao. Eatraves dessa busca que iremos aurnentar achance de aprendermos COm nossos erros.

Finalmente,o conceito de refutabilidade pode ser usado lambem parar~.lver,0J!0blema.d~ ~emar~a,~o;-istO.~,0 p~~lem~~de como podemo!;dlStingwrmp6teSes oentilicas ~E!lUp6Iesesnao cJenti£i.s:a~. - -

I'ar" 0 positivismo, iima hip6tese seria cientifica se ela pudesse ser verjfi­cada experlmentalmente. No entanto, as criticas aindu,ao mostram que essaco.mprov~eproblernatica. Popper sugere entao que urna hip6tese au teoriasc)a consJderada cientifica quando puder ser refutada. Teorias que podemexplicar e preyer eventos observaveis sao refutaveis: se 0 evento nao ocorrer, at:0ria e falsa. Ja teorias irrefutaveis (do tipo "vai chover ou nao amanha") naotern qualquer carater cientifico, uma vcz que nao fazem previs6es, nao ternpader explanat6rio, nem podem ser testedas experimentalmente.

2.3 Verdade e corrobora9ao

~ideia ~e verdade tern, para Popper, um papel importante em sua meto­dologta, funoonando como urn nuclPIO reguIador que gUJa a pesqwsiCienti­flca,) que a pr6pria i eia e erro (oo. Imp ca a J ,a e uma veraaCle objelivaque podemos deixar de alcancar" (popper, 1972, p. 252). . .. --------

A defini ao de verdade usada or Po er e a de corres ondencia com asfatas. Est~ sena 0 sentido e verdade p~ra 0 sense ccmwn, para a ciencia aupara urn lulgamento em urn tribuna!: quanoouma testemunr.a jura-que "fala averdade ao ter vista 0 reu comeler a enme. por exemplO,espera-se que- ~!;team. de fato, vista 0 feU cometer 0 crime. ". _. - .-

. ~Ao se deve confundir, porem, a idela au a dcfini,ao de verdade com umcrJ!eno de verdade. Temos ideia do qu significa "dizer que no verdade que a

2,tN!';~ 'de C.(Yi2-e.'k::(•.D::-'N~~U~ A-DS

o METODO NA5 a£NCIAS NA'\UKAl:;' t SOCIAlS ~5' 19

sacarina provoca cancer", embora oS testes para determinar se isto de fatoacontece (os criterios de verdade) nao sejam conclusivos.

Em certos casos e ate passive! compreender a ideia de verdade sem quescja possivel realizar testes que fundonem como o:iterios de v,,"?ade. Pode-secompreender 0 enunciaclo liE \-erdade que exatamente aito ~l anos atnischovia sobre 0 local ondc era a ddadc do Rio de Janeiro", em&ra nao sejapassivel imaginar urn teste OU observac;ao para descobrir se' es~ enW1ciado everdadeiro.

Isso quer dizer que nao dispomos de urn criteria para reconh~a verda­de quando a encontramos, embora algumas de nossas teorias passam serverdadeiras - no sentido de correspondencia com os fatas. Portanto, emborauma teoria cientifica possa ter p3ssado por testes severos com' sucesso, naopodemos descobrir se ela everdadeira e, mesmo que ela 0 seja, nao temos comosaber isso com certeza.

No entanto, segundo Popper (1972), na hist6ria da ciencia ha vanas situa­~5es em que uma teona parece se aproximar rnais da verclacle de que outra. Istoacontece quando uma teoria faz afirma~6es mais precisas (que sao corrobora­das); quando explica mais fatos; quando explica fatos com mals detalhes;quando resiste a testes que refutaram a outra ,teoria: quando sugere testesnovas, nao sugeridos pela outra teoria (e passa cOm sucesso par estes testes) equando permite relacionar problemas que antes estavam isolados_ Assim',mes­rno que considercmos a dinamica de Newton rcfutada, cia permanece superioras teorias de Kepler e de Galileu, uma vez que a teorin de Newton explica maisfatos que as de Galileu e Kepler, a1em de ter maior precisao e de unir problemas(mecanica celeste e terrestre) que antes cram tratados isoladamente.

o mesmo acontece quando comparanias a teoria da relati\;dade de Eins­tein cam a dinamica de Newton; ou a teoria da combustao de Layoisier e a doflogistoi ou quando comparamos as diversas teorias at6micas que se sucederamao longo da hist6ria cia ciencia au, ainda, quando comparamos a sequencia deteorias propostas para explicar a e\'olw;ao dos seres vivos.

Em todos esses casos, 0 grau de corrobora~aoaumenta quando caminha­mas das teorias mais antiga, para as mals recentes. Sendo assim, diz Popper, agrau de corrobora,ao poderia indicar que urna teoria se aproxima mais daverdade que outra - mesmo que ambas as teorias sejam falsas. Isto acontecequando °conteudo-verdade de uma teoria (a classe das conseqiiencias 16gicase verdadeiras da teoria) for maior que 0 cia outra sem que °mesmo ocarra como conteudo falso (adasse de cOrGequencias lalsas de uma teoria).lstoe possive!,porque a partir de uma teoria falsa podemos deduzir tanto enunciados falsoscomo verdadeiros: 0 enunciado "todos "os cisnes sao brancos" e falso, mas aconseqi.il~ncia 16gica "fodos os cisnes do zooJ6gico do Rio de Janeiro sao bran­cos" pode ser verdadeira. Logo, uma teoria falsa pode conter maior mimero de

1> afirma~6es verdadeiras do que cotra. ~ r

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