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UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARAN SETOR DE CINCIAS JURDICAS
PROGRAMA DE PS-GRADUAO EM DIREITO CURSO DE DOUTORADO EM DIREITO
FRANCISCO BISSOLI FILHO
LINGUAGEM E CRIMINALIZAO A CONSTITUTIVIDADE DA SENTENA PENAL
CONDENATRIA
VOLUME I
CURITIBA 2009
UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARAN SETOR DE CINCIAS JURDICAS
PROGRAMA DE PS-GRADUAO EM DIREITO CURSO DE DOUTORADO EM DIREITO
FRANCISCO BISSOLI FILHO
LINGUAGEM E CRIMINALIZAO A CONSTITUTIVIDADE DA SENTENA PENAL
CONDENATRIA
Tese apresentada ao Programa de Ps-graduao em Direito, rea de concentrao Direito do Estado, do Setor de Cincias Jurdicas da Universidade Federal do Paran, como requisito parcial obteno do grau de Doutor, sob orientao do Prof. Dr. Joo Gualberto Garcez Ramos.
CURITIBA
2009
DEDICATRIA Aos meus pais, Francisco e Florinda, pela
oportunidade da minha existncia, mas,
sobretudo, por terem despertado em mim o
gosto pelo estudo, sem o qual esse trabalho
no seria realizado. Apesar de terem visto o
incio desta empreitada, no presenciaram,
ao menos neste plano, a sua concluso,
deixando-me, contudo, a fora e a
obstinao para faz-lo.
A linguagem molda a forma em que
pensamos e determina o que podemos
pensar. (Benjamin Lee Whorf)
SUMRIO INTRODUO..................................................................................................... I PARTE I UMA INTRODUO AO ESTUDO DA LINGUAGEM JURDICO-PENAL.................................................................................................................
1
CONSIDERAES INICIAIS............................................................................... 1 CAPTULO I A LINGUAGEM JURDICO-PENAL COMO OBJETO DE ESTUDO..............................................................................................................
2
Apresentao...................................................................................................... 2Seo I Configurao da linguagem jurdico-penal..................................... 2Subseo I - Conceituao da linguagem jurdico-penal..................................... 3Subseo II - Funes da linguagem jurdico-penal............................................ 81. A funo designativa ou descritiva da linguagem jurdico-penal.................. 92. A funo prescritiva da linguagem jurdico-penal......................................... 113. A funo expressiva da linguagem jurdico-penal........................................ 124. A funo performativa da linguagem jurdico-penal...................................... 155. A funo metalingustica da linguagem jurdico-penal.................................. 166. A funo de fabulao da linguagem jurdico-penal..................................... 187. A funo de dominao da linguagem jurdico-penal................................... 218. A funo potica da linguagem jurdico-penal.............................................. 23Subseo III - Tipos de linguagem jurdico-penal................................................ 241. A linguagem jurdico-penal normativa........................................................... 252. A linguagem jurdico-penal cientfica............................................................ 263. A linguagem jurdico-penal potica............................................................... 264. A linguagem jurdico-penal simblica........................................................... 27Subseo IV - Formas de linguagem jurdico-penal............................................ 271. Formas gerais de linguagem........................................................................ 282. Formas de linguagem jurdica....................................................................... 293. Formas de linguagem jurdico-penal............................................................. 30Seo II - O estudo da linguagem jurdico-penal............................................ 31Subseo I Divises e dimenses do estudo da linguagem jurdico-penal...... 321. A sintaxe e a dimenso sgnica da linguagem jurdico-penal....................... 332. A semntica e a dimenso proposicional da linguagem jurdico-penal........ 393. A pragmtica e as dimenses ilocucional e discursiva da linguagem jurdico-penal........................................................................................................
56
Subseo II - A importncia do estudo da linguagem jurdico-penal................... 66CAPTULO II - O PARADIGMA DA LINGUAGEM E SUAS APLICAES......... 70Apresentao...................................................................................................... 70Seo I - Conceitos e distines paradigmticas........................................... 70Subseo I O paradigma do ser........................................................................ 72Subseo II - O paradigma da conscincia ou do sujeito.................................... 75Subseo III - O paradigma da linguagem........................................................... 83Seo II Aplicaes jurdicas dos paradigmas do ser, do sujeito e da linguagem...........................................................................................................
97
Subseo I - Aplicaes jurdicas do paradigma do ser...................................... 98Subseo II Aplicaes jurdicas do paradigma da conscincia ou do sujeito. 100Subseo III - Aplicaes jurdicas do paradigma da linguagem......................... 1021. O realismo jurdico........................................................................................ 103
2. A hermenutica jurdico-filosfica................................................................. 1053. A interpretao normativo-constitutiva.......................................................... 1074. A interpretao constitucional....................................................................... 1094.1 O procedimentalismo..................................................................................... 1124.2 O substancialismo.......................................................................................... 1144.3 O garantismo.................................................................................................. 1165. O uso da linguagem jurdica......................................................................... 1175.1 A leitura moral................................................................................................ 1175.2 O modelo da ponderao............................................................................... 1185.3 A noo de derrotabilidade das normas jurdicas.......................................... 121Seo III - Aplicaes jurdico-penais dos paradigmas do ser, do sujeito e da linguagem......................................................................................................
125
Subseo I - Aplicaes jurdico-penais do paradigma do ser............................ 126Subseo II - Aplicaes jurdico-penais do paradigma da conscincia ou do sujeito...................................................................................................................
127
Subseo III Aplicaes jurdico-penais do paradigma da linguagem.............. 1311. Surgimento e configurao do paradigma da definio................................ 1322. Dimenses subjetiva e objetiva do paradigma da definio......................... 1353. Objetos da investigao cientfica no paradigma da definio..................... 1373.1 O sistema penal............................................................................................. 1383.2 O processo de criminalizao........................................................................ 141CAPTULO III - A METALINGUAGEM JURDICO-PENAL.................................. 145Apresentao...................................................................................................... 145Seo I - Metalinguagem jurdico-penal e linguagem jurdico-penal objeto...................................................................................................................
145
Seo II - Elementos estruturais da metalinguagem jurdico-penal.............. 149Subseo I - O indivduo, a sociedade, o Estado e o direito de punir................. 1501. O indivduo.................................................................................................... 1512. A sociedade.................................................................................................. 1513. O Estado....................................................................................................... 1534. O direito de punir.......................................................................................... 162Subseo II - A norma e a lei penal e processual penal...................................... 1691. A norma penal e processual penal............................................................... 1692. A lei penal e processual penal...................................................................... 174Subseo III - O fato punvel................................................................................ 1761. O crime, a criminalidade e a criminalizao................................................. 1771.1 A conceituao criminolgica......................................................................... 1781.2 A conceituao jurdica.................................................................................. 1822. O conceito analtico...................................................................................... 1832.1 As categorias do fato punvel......................................................................... 1842.1.1 A conduta (ao e omisso)........................................................................ 1842.1.2 O tipo penal e a tipicidade........................................................................... 1902.1.3 O injusto penal e a antijuridicidade............................................................. 1962.1.4 A culpabilidade............................................................................................ 1982.1.5 A punibilidade.............................................................................................. 2012.2 Os diversos conceitos de fato punvel............................................................ 2022.3 Espcies de fatos punveis............................................................................. 206
Subseo IV - A sano penal............................................................................. 2071. A sano....................................................................................................... 2082. A sano jurdica.......................................................................................... 2103. A sano penal............................................................................................. 210Subseo V A vtima e o criminoso................................................................... 214Subseo VI - O processo penal e suas relaes............................................... 2181. O processo penal.......................................................................................... 2181.1 Os conceitos de processo penal.................................................................... 2191.2 A finalidade do processo penal...................................................................... 2231.3 Os sistemas processuais penais.................................................................... 2241.3.1 O sistema acusatrio................................................................................... 2251.3.2 O sistema inquisitrio ou inquisitivo............................................................ 2261.3.3 O sistema misto........................................................................................... 2281.4 O devido e justo processo penal.................................................................... 2291.4.1 A garantia da igualdade processual............................................................ 2311.4.2 A garantia do contraditrio.......................................................................... 2321.4.3 A garantia da publicidade............................................................................ 2341.4.4 A garantia da verificao e da refutao ftica........................................... 2352. As relaes processuais penais................................................................... 2382.1 A ao penal.................................................................................................. 2402.1.1 A persecuo penal.................................................................................... 241A) A instruo ou investigao preliminar............................................................ 242B) A acusao penal............................................................................................ 2452.1.2 A defesa...................................................................................................... 2512.2 A jurisdio penal........................................................................................... 2532.2.1 A jurisdio instrutria................................................................................. 2562.2.2 A jurisdio decisria.................................................................................. 258A) A jurisdio de ordem...................................................................................... 259B) A jurisdio de mrito...................................................................................... 2602.2.3 A jurisdio executiva.................................................................................. 262PARTE II - A CONSTITUTIVIDADE DA LINGUAGEM JURDICO-PENAL....... 263CONSIDERAES INICIAIS......................................................................... 263CAPTULO IV A PR-CONSTITUTIVIDADE DA REALIDADE E A LINGUAGEM DESIGNATIVA...............................................................................
266
Apresentao...................................................................................................... 266Seo I - A pr-constitutividade da realidade e a linguagem no mbito geral.....................................................................................................................
267
Subseo I - O sofismo e o carter arbitrrio da designao.............................. 269Subseo II - O platonismo e a busca da designao correta............................. 272Subseo III - O aristotelismo e a designao apofntica................................... 276Subseo IV - O nominalismo e a designao singular....................................... 283Subseo V - A fenomenologia e a designao como expresso da conscincia...........................................................................................................
285
Subseo VI - O neopositivismo lgico e a designao como figurao do mundo..................................................................................................................
288
Seo II - A pr-constitutividade da realidade e a linguagem no mbito jurdico................................................................................................................
290
Subseo I - A pr-constitutividade do direito natural.......................................... 2911. A pr-constitutividade do direito natural clssico.......................................... 2922. A pr-constitutividade do direito natural de origem divina............................ 2953. A pr-constitutividade do direito natural racional.......................................... 299Subseo II - A pr-constitutividade do direito positivo....................................... 312Seo III - A pr-constituvidade da realidade e a linguagem no mbito jurdico-penal......................................................................................................
316
Subseo I - A pr-constitutividade do fenmeno criminal na criminologia positivista e na poltica penal...............................................................................
316
Subseo II - A pr-constitutividade do fenmeno criminal na lei e na dogmtica penal...................................................................................................
321
Subseo III - A pr-constitutividade do fenmeno criminal na lei e na dogmtica processual penal.................................................................................
324
CAPTULO V A CRIMINALIZAO PRIMRIA E A CONSTITUTIVIDADE DA LINGUAGEM JURDICO-PENAL...................................................................
328
Apresentao...................................................................................................... 328Seo I - A constitutividade da linguagem no mbito geral.......................... 328Subseo I Antecedentes filosficos da constitutividade da linguagem geral.. 3311. Razes aristotlicas da constitutividade da linguagem geral........................ 3322. Humboldt e a linguagem como condio do pensamento humano.............. 335Subseo II A constitutividade da linguagem geral no pragmatismo................ 3371. O pragmatismo geral e a linguagem como condio da experincia humana................................................................................................................
338
2. O pragmatismo lingustico e os usos da linguagem..................................... 3422.1 Wittgenstein e os usos contextuais da linguagem......................................... 3432.2 Austin e os performativos ou perlocucionais.................................................. 3502.3 Searle e a fala como um comportamento regrado......................................... 3582.4 Habermas e a constituio consensual da validade da significao............ 364Subseo III A constitutividade da linguagem geral na hermenutica filosfica...............................................................................................................
365
1. Heidegger e a linguagem como instncia constituidora do ser.................... 3662. Gadamer e a linguagem como condio da interpretao........................... 368Seo II - A constitutividade da linguagem no mbito jurdico..................... 369Subseo I - A pragmtica jurdica e a constituio do direito............................ 3701. O realismo jurdico e a constituio do direito.............................................. 3732. A interpretao normativa e a constituio do direito................................... 374Subseo II - A hermenutica jurdico-filosfica e a constituio do direito........ 380Seo III - A constitutividade da linguagem no mbito jurdico-penal......... 382Subseo I O pragmatismo jurdico-penal, a hermenutica jurdico-filosfica e a constituio da realidade criminal..................................................................
383
1. O pragmatismo jurdico-penal e a constituio da realidade criminal........... 3841.1 Os usos contextuais da linguagem, os atos de fala e a criminalizao......... 3841.2 A interpretao normativa e a criminalizao................................................ 3882. A hermenutica jurdico-filosfica e a constituio da realidade criminal..... 389Subseo II Aspectos gerais da criminalizao primria.................................. 3921. O princpio da legalidade penal.................................................................... 3952. A criao do tipo penal................................................................................. 399
PARTE III - A CONSTITUTIVIDADE DA SENTENA PENAL CONDENATRIA................................................................................................
406
CONSIDERAES INICIAIS............................................................................... 406CAPTULO VI A CRIMINALIZAO SECUNDRIA E A PREPARAO DA CONSTITUIO DA REALIDADE CRIMINAL.....................................................
407
Apresentao...................................................................................................... 407Seo I Aspectos gerais da criminalizao secundria.............................. 407Subseo I A atividade de imposio das regras penais.................................. 4081. Os processos informais de definio de condutas e pessoas...................... 4082. A imposio formal das regras penais.......................................................... 412Subseo II O raciocnio jurdico na imposio das regras penais................... 4171. O raciocnio jurdico penal subjuntivo........................................................... 4182. O raciocnio jurdico nos casos penais difceis............................................. 419Seo II A preparao da constituio da realidade criminal..................... 424Subseo I - A constituio do caso penal.......................................................... 4261. A constituio dos indcios e do indiciado.................................................... 4322. A constituio da acusao e do acusado.................................................... 4412.1 A justa causa para a acusao...................................................................... 4422.2 Os elementos da acusao............................................................................ 4472.3 A constitutividade da acusao...................................................................... 451Subseo II - A constituio da relao processual penal................................... 453Subseo III A constituio das provas e teses acusativas e defensivas........ 4561. A constituio das provas............................................................................. 4562. A constituio das teses acusativas e defensivas........................................ 462Subseo IV A constituio da tutela penal de urgncia.................................. 465Seo III A preparao da constituio da realidade criminal e o princpio do estado de inocncia.....................................................................
469
Subseo I O princpio do estado de inocncia................................................ 469Subseo II Imposies do princpio do estado de inocncia na preparao da constituio da realidade criminal...................................................................
474
Seo IV - A linguagem jurdico-penal na preparao da constituio da realidade criminal e o poder de definio dos agentes do sistema penal....................................................................................................................
477
Subseo I A linguagem jurdico-penal na preparao da constituio da realidade criminal.................................................................................................
477
1. A linguagem da notcia do crime................................................................... 4782. A linguagem da investigao ou instruo preliminar................................... 4793. A linguagem da acusao e da defesa......................................................... 4834. A linguagem das jurisdies instrutria e de ordem..................................... 488Subseo II O poder de definio dos agentes do sistema penal.................... 4891. O poder de definio dos agentes policiais.................................................. 4912. O poder de definio dos agentes do Ministrio Pblico.............................. 493CAPTULO VII A CRIMINALIZAO SECUNDRIA E A CONSTITUTIVIDADE DA SENTENA PENAL CONDENATRIA.....................
496
Apresentao...................................................................................................... 496Seo I Configurao da sentena penal..................................................... 497Subseo I A conceituao de sentena penal................................................ 497
Subseo II Pressupostos e requisitos da sentena penal............................... 5001. Pressupostos da sentena penal.................................................................. 5002. Requisitos formais da sentena penal.......................................................... 5012.1 O relatrio....................................................................................................... 5012.2 A motivao ou fundamentao..................................................................... 5022.3 A disposio e a autenticao....................................................................... 508Subseo III A importncia da sentena como ponto culminante do processo 508Subseo IV A eficcia da sentena penal e o seu elemento condenatrio.... 5101. Elementos determinantes da eficcia da sentena penal............................. 5112. Classificao das sentenas quanto a sua eficcia...................................... 5113. O elemento condenatrio da sentena penal............................................... 514Seo II - A constitutividade da sentena penal condenatria..................... 516Subseo I Os fundamentos da constitutividade da sentena penal condenatria.........................................................................................................
517
1. Os fundamentos jurdicos da constitutividade da sentena penal condenatria.........................................................................................................
518
1.1 A distino entre normas primrias e secundrias........................................ 5191.2 A distino entre sentenas declarativas e constitutivas............................... 5201.3 A distino entre estado de inocente e estado de culpado............................ 5221.4 A importncia do elemento constitutivo da sentena penal condenatria..... 5272. Os fundamentos filosficos e criminolgicos da constitutividade da sentena penal condenatria...............................................................................
529
2.1 Funes da linguagem na sentena penal condenatria............................... 5302.2 Efeitos da linguagem na sentena penal condenatria................................. 5312.2.1 Efeito de certeza ftica................................................................................ 5332.2.2 Efeito de certeza jurdica............................................................................. 5382.2.3 Efeito de correo axiolgica...................................................................... 5402.2.4 Efeito de imparcialidade judicial.................................................................. 5412.3 A constitutividade da linguagem na sentena penal condenatria................ 545Subseo II - O trnsito em julgado da sentena penal condenatria como marco objetivo da constituio da realidade criminal...........................................
549
Subseo III - O poder de definio dos juzes e a sua responsabilidade na criminalizao de condutas e pessoas.................................................................
553
1. O poder de definio dos juzes................................................................... 5532. A responsabilidade dos juzes na criminalizao......................................... 554Seo III Uma concepo realista de crime e de contraveno penal....... 558CONCLUSO...................................................................................................... 562REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS.................................................................... 575
BISSOLI FILHO, Francisco. Linguagem e criminalizao: a constitutividade da sentena penal condenatria. 2009. Tese (Doutorado em Direito). Universidade Federal do Paran. Curitiba-PR.
RESUMO
A presente tese trata da linguagem do processo de criminalizao, em especial da constitutividade da sentena penal condenatria como ato processual e de linguagem, uma vez que tem por objetivo demonstrar que essa sentena que constitui o crime ou a contraveno penal e o criminoso ou o contraventor. uma pesquisa bibliogrfica orientada pelo paradigma da linguagem e que segue, como mtodo de abordagem, o dedutivo e, como mtodos de procedimento, o descritivo e o argumentativo. Dividida em trs partes, realiza-se, na primeira, uma introduo ao estudo da linguagem jurdico-penal, na qual se discorre sobre os principais aspectos configuradores dessa linguagem, sobre o paradigma da linguagem e suas aplicaes nos mbitos jurdico e jurdico-penal e sobre a metalinguagem jurdico-penal, isto , sobre a linguagem que se usa para falar da linguagem jurdico-penal objeto, o que inclui os seus principais elementos estruturais. Na segunda parte, seguindo o paradigma da linguagem, apresentam-se as diferenas entre a tradicional ideia de pr-constitutividade da realidade, por um lado, o que remete ao carter designativo da linguagem em face dessa realidade, e, por outro, concepo de constitutividade da linguagem, uma vez que nesta que se constitui a realidade. Na terceira parte, por fim, demonstra-se que os atos de linguagem realizados no processo de criminalizao so constitutivos da realidade criminal e que a sentena penal condenatria, pice desse processo, constitutiva do crime ou da contraveno penal bem como do criminoso ou do contraventor, pois somente ela que pode modificar o estado de inocncia de algum para de culpado, o que representa uma alterao substancial na situao jurdica do condenado, com consequncias, muitas vezes, irreversveis. Constata-se, assim, um poder de definio dos agentes do sistema penal, especialmente dos juzes, dos quais se exige conscincia da sua responsabilidade no processo de criminalizao. Em face dessa constitutividade, sustenta-se uma concepo realista sobre o crime e a contraveno penal, os quais deixam de ser condutas abstratas para ser condutas concretas definidas como tais nas sentenas penais condenatrias.
Palavras-chave: processo penal, linguagem, criminalizao, sentena penal, constitutividade.
BISSOLI FILHO, Francisco. Language and criminalization: the constitutibility of the de penal sentence. 2009. Thesis (PhD of Law). Federal University of Paran. Curitiba-PR (Brazil).
ABSTRACT
The present thesis deals with the language of the criminalization process, especially about the condemnatory penal sentence constitutibility as a processual act and of language, since it aims to demonstrate that it is this sentence that constitutes the crime or the penal contravention and the criminal or the contraventor. It is a bibliographic research oriented by the paradigm of the language and follows, as method of approach, the deductive and, as methods of procedure, the descriptive and argumentative. Divided into three parts, is held in the first, an introduction to the study of the juridic penal language, which discusses the main aspects of the configuration of this language, about the paradigm of the language and its applications in the juridic and juridic penal ambits and about the juridic penal metalanguage, ie, about the language that is used to speak about the juridic penal language object, which includes its main structural elements. In the second part, oriented by the paradigm of the language, it is presented the differences between the traditional idea of preconstitutibility of the reality, by a side, what remits to the designative character of the language in face of this reality, and by another side, the conception of the constitutibility of the language, since the reality is constituded in the language. In the third part, finally, it is demonstrated that the acts of language performed in the process of criminalization constitute the criminal reality and that the condemnatory penal sentence, apex of this process, constitutes the crime or the penal contravention as well the criminal or the contraventor, because it is only it that can modify the innocence state of someone to the guilty, what represents a substantial change in the legal situation of the guilty, with consequences often irreversible. It is perceived thus a power of definition of the agents of the penal justice system, especially of the judges, which from is required awareness of their responsibility in the process of criminalization. In face of this constitutibility, it is sustained a realistic conception about crime and the penal contravention, which are no longer abstract conducts and turn to be concrete conducts defined as such in criminal condemnatory sentences. Keywords: penal process, language, criminalization, criminal sentence, constitutibility.
BISSOLI FILHO, Francisco. Linguaggio e criminalizzazione: la costitutivit della sentenza di condanna penale. 2009. Tesi (Douttorato di Ricerca in Giurisprudenza). Universit Federale del Paran. Curitiba-PR (Brasile).
SOMMARIO
Questa tesi si occupa del linguaggio del processo di criminalizzazione, in special modo della costitutivit della sentenza di condanna penale come atto processuale e di linguaggio, in quanto mira a dimostrare che questa stessa sentenza costituisce il crimine, il delitto o la contravvenzione penale e il criminale, il delinquente o il contravventore. Si tratta di una letteratura di ricerca, guidata dal paradigma del linguaggio, che si avvale del metodo di approccio deduttivo e, come metodo di procedimento, di quello descrittivo e argomentativo. Divisa in tre parti, si realizza per primo una introduzione allo studio del linguaggio giuridico-penale, nella quale si discorre sui principali aspetti configurativi di questo linguaggio, sul paradigma del linguaggio e le sue applicazioni nellambito giuridico e giuridico-penale, nonch sul metalinguaggio giuridico-penale, vale a dire, il linguaggio utilizzato per parlare del linguaggio giuridico-penale oggetto, che comprende i suoi principali elementi strutturali. Nella seconda parte, seguendo il paradigma del linguaggio, vengono presentate le differenze tra il tradizionale concetto di precostitutivit della realt che, da un lato si riporta al carattere designativo del linguaggio di fronte a questa realt, e dallaltro alla concezione costitutiva del linguaggio, poich questa che costituisce la realt. Nella terza parte, infine, si dimostra che gli atti di linguaggio realizzati nel processo di criminalizzazione sono costitutivi di realt criminale e che la sentenza di condanna penale, apice di questo processo, costitutiva del crimine, del delitto o della contravvenzione penale, cos come del criminale, del delinquente o del contravventore, perch solo questo atto che pu modificare lo stato di innocenza a colpevolezza di qualcuno, rappresentando un cambiamento sostanziale della situazione giuridica del condannato, con conseguenze spesso irreversibili. Si constata, quindi, un potere di definizione degli agenti del sistema di giustizia penale, in particolare, dei giudici, dai quali si richiede la consapevolezza della propria responsabilit nel processo di criminalizzazione. Di fronte a questa costitutivit si difende una concezione realistica del crimine, del delitto e della contravvenzione penale, i quali da condotta astratta passano ad essere condotta concreta, definita come tale nella sentenza di condanna penale. Parole chiave: procedura penale, linguaggio, criminalizzazione, sentenza penale, costitutivit.
BISSOLI FILHO, Francisco. Lenguaje y criminalizacin: la constitutividad de la sentencia penal condenatoria. 2009. Tesis (Doctorado en Derecho). Universidade Federal de Paran. Curitiba-PR.
RESUMEN
La presente tesis trata del lenguaje del proceso de criminalizacin, en especial de la constitutividad de la sentencia penal condenatoria como acto procesal y de lenguaje, una vez que tiene por objetivo demostrar que es esa sentencia que constituye el crimen o la contravencin penal y el criminal o el contraventor. Es una investigacin bibliogrfica orientada por el paradigma del lenguaje y que sigue, como mtodo de abordaje, el deductivo y, como mtodos de procedimiento, el descriptivo y el argumentativo. Dividida en tres partes, se realiza, en la primera, una introduccin al estudio del lenguaje jurdico penal, en la cual se discurre sobre los principales aspectos que lo configuran, sobre el paradigma del lenguaje y sus aplicaciones en los mbitos jurdico y jurdico-penal y sobre el metalenguaje jurdico-penal, es decir, sobre el lenguaje que se usa para hablar del lenguaje jurdico-penal objeto, lo que incluye sus principales elementos estructurales. En la segunda parte, siguiendo el paradigma del lenguaje, se presentan las diferencias entre la tradicional idea de preconstitutividad de la realidad, por un lado, lo que remete al carcter designativo del lenguaje a la vista de esa realidad, y, por otro lado, a la concepcin de constitutividad del lenguaje, una vez que es en este que la realidad se constituye. En la tercera parte, por fin, se demuestra que los actos de lenguaje realizados en el proceso de criminalizacin son constitutivos de la realidad criminal y que la sentencia penal condenatoria, pice de ese proceso, es constitutiva del crimen o de la contravencin penal as como del criminal o del contraventor, pues es slo ella que puede modificar el estado de inocencia de alguien para de culpable, lo que representa una alteracin substancial en la situacin jurdica del condenado, con consecuencias, muchas veces, irreversibles. Se constata, as, un poder de definicin de los agentes del sistema penal, especialmente de los jueces, de los cuales se exige consciencia de su responsabilidad en el proceso de criminalizacin. A la vista de esa constitutividad, se sostiene una concepcin realista sobre el crimen y la contravencin penal, cuales dejan de ser conductas abstractas para ser conductas concretas definidas como tales en las sentencias penales condenatorias.
Palabras claves: proceso penal, lenguaje, criminalizacin, sentencia penal, constitutividad.
AGRADECIMENTOS minha esposa Jane Maria e aos meus
filhos Francisco Neto e Jane Alessandra,
pelo auxlio dispensado durante todo Curso
de Doutorado, mas, sobretudo, pela
compreenso nos momentos de ausncia.
Ao Professor Doutor Joo Gualberto Garcez
Ramos, por ter acreditado no projeto de
pesquisa, possibilitando, assim, o meu
ingresso no Programa de Ps-Graduao em
Direito da Universidade Federal do Paran e
pelas orientaes e sugestes durante a
realizao da tese.
Aos Professores Doutores Ivan Gurios Curi
(UFPR), Carlos Roberto Bacila (UFPR), Artur
Csar de Souza (UNOESTE) e Jos
Laurindo de Souza Neto (UNIPAR),
integrantes da banca de exame da presente
tese, os trs primeiros tambm integrantes
da banca de qualificao, pelas
consideraes realizadas.
Aos professores do Programa de Ps-
Graduao em Direito da Universidade
Federal do Paran, especialmente aos
Professores Doutores Carlos Maria Crcova,
Cesar Antonio Serbena, Clmerson Merlin
Clve, Eduardo de Oliveira Leite, Ivan
Gurios Curi, Jacinto Nelson de Miranda
Coutinho, Joo Gualberto Garcez Ramos,
Juarez Cirino dos Santos, Luiz Alberto
Machado e Manoel Eduardo Alves Camargo
Gomes, pelos ensinamentos transmitidos nas
respectivas disciplinas ministradas durante o
Curso.
Professora Anna Fracchiola Cabrera, pelo
apoio dispensado na traduo de textos.
Aos Servidores do Programa de Ps-
Graduao em Direito da Universidade
Federal do Paran, especialmente s
Servidoras Laura da Silva (Secretria),
Sandra Mara Pinheiro Maciel, Ftima Cristina
Becker Pain, Maria Cristina Cirino Schultz,
Eunice Maria Cirino Linhares de Camargo,
Rosana Soldi Briski da Silva, Ana Maria
Castelo Noronha e Maria Ceclia Barbosa
Lopes, e ao Servidor Marcelo Alves Britzkow,
pelo incansvel apoio dispensado durante o
Curso.
Aos Colegas de curso, pelo conhecimento e
estmulo transmitido durante a caminhada.
Administrao Superior do Ministrio
Pblico de Santa Catarina, especialmente ao
Promotor de Justia Carlos Eduardo Abreu
S Fortes, Assessor do Procurador-Geral de
justia, que soube compreender a
necessidade do meu afastamento para a
realizao da presente pesquisa.
Associao Catarinense do Ministrio
Pblico, pelo apoio material dispensado.
Aos Membros, Servidores, Estagirios e
Bolsistas do Ministrio Pblico de Santa
Catarina, especialmente os que atuam na 20a
Promotoria de Justia da Comarca da Capital
(SC), da qual sou titular, pelo suprimento das
minhas ausncias.
I
INTRODUO
A presente tese tem como tema a linguagem do processo de criminalizao
e, mais especificamente, a constitutividade da sentena penal condenatria, por
ser esse o ato processual e de linguagem que constitui o crime ou a contraveno
penal e o criminoso ou o contraventor.
Deve-se a escolha do tema importncia atribuda, atualmente,
linguagem como objeto da investigao filosfica e cientfica, mas, sobretudo,
existncia de lacuna no conhecimento no que diz respeito ao papel da linguagem
no processo de criminalizao, lacuna esta que caracteriza a originalidade desta
tese.
Essa importncia da linguagem pode ser percebida, principalmente, a partir
do surgimento do paradigma da linguagem, quando esta deixa de exercer um
papel secundrio ou instrumental de expresso ou designao da realidade, at
ento, considerada preexistente ou pr-constituda em relao linguagem, e
passa a ter importncia primordial e a ser a instncia na qual a realidade
constituda. No mbito jurdico, isso significa dizer que o direito no est pr-
constitudo na natureza (direito natural) ou nos textos legislativos (direito positivo),
mas, sim, que constitudo na argumentao e na interpretao que se realiza
desses textos na linguagem jurdica. No mbito jurdico-penal, diferentemente do
paradigma etiolgico, que concebe a realidade criminal como preexistente ou pr-
constituda em relao reao social, isso implica reconhecer que tal realidade
construda no processo de criminalizao, que um processo que se realiza na
linguagem jurdico-penal.
Inexistia, no entanto, at ento, estudos mais aprofundados sobre a
linguagem jurdico-penal, mais especificamente sobre a linguagem do processo de
criminalizao, que formado por um conjunto de atos de linguagem que tm
origem nas instncias informais do senso comum e, como ponto culminante, a
sentena penal, nas instncias formais do sistema de justia criminal. Deve-se ter
em mente que as pessoas, no seu cotidiano, definem ou qualificam as condutas
das outras pessoas e os seus autores em face dessas condutas, sendo essas
II
definies ou qualificaes muito importantes nas relaes intersubjetivas. Tais
definies ou qualificaes so realizadas por pessoas comuns, em processos
informais, e por agentes do sistema penal, em processos formais.
A presente investigao tem a pretenso de preencher essa lacuna,
descrevendo como ocorrem os atos de linguagem e, sobretudo, os seus efeitos
em relao realidade criminal, para demonstrar que a sentena penal
condenatria constitutiva do crime ou da contraveno penal e do criminoso ou
do contraventor.
Devido a essa lacuna no conhecimento humano, formula-se o seguinte
problema, composto por trs indagaes: a) a sentena penal condenatria ,
tambm, constitutiva, ou seja, constitui uma determinada conduta como crime ou
contraveno penal e o seu autor como criminoso ou contraventor, modificando o
seu estado de inocente para de culpado? b) os agentes do sistema penal, em
especial os juzes, tm poder de definio de condutas e pessoas e, por isso, so
responsveis pela criminalizao? c) por fim, o crime e a contraveno penal
podem ser concebidos como realidades concretas definidas como tais nas
sentenas penais condenatrias?
A hiptese que se apresenta a esse problema pode assim ser resumida: a)
a sentena penal condenatria, desde que transitada em julgado, constitui a
realidade criminal em sentido estrito, sendo, pois, tambm, constitutiva, uma vez
que, alm de qualificar uma conduta como crime ou contraveno penal, modifica
o estado jurdico do autor dessa conduta, passando-o de inocente a culpado; b) os
agentes do sistema penal, especialmente os juzes, tm parcela importante de
responsabilidade na definio dessas realidades, pois so estes que, nas suas
sentenas condenatrias, definem, concretamente, determinadas condutas como
crimes ou contravenes penais e seus autores como criminosos ou
contraventores, passando estes, aps o trnsito em julgado dessas sentenas, a
ser considerados culpados; c) o crime e a contraveno penal passam a ser
concebidos como realidades concretas definidas como tais nas sentenas penais
condenatrias transitadas em julgado.
III
O objetivo geral da presente pesquisa , portanto, demonstrar, a partir da
constitutividade da linguagem jurdico-penal, a constitutividade da sentena penal
condenatria, isto , que o crime ou a contraveno penal e o criminoso ou o
contraventor so realidades constitudas, pelos juzes, nessas sentenas, uma vez
que somente elas podem imprimir modificao no status pessoal do acusado,
passando este de inocente a culpado.
Mais especificamente, a pesquisa tem por objetivo: 1) discorrer: a) sobre a
linguagem jurdico-penal como objeto de estudo; b) sobre os paradigmas
relacionados linguagem e suas aplicaes aos mbitos jurdico e jurdico-penal;
c) sobre as distines entre a linguagem jurdico-penal objeto e a metalinguagem
jurdico-penal e sobre as estruturas bsicas que compem essa metalinguagem;
d) sobre as relaes entre a linguagem e a realidade, confrontando as idias de
pr-constitutividade da realidade e de constitutividade da linguagem jurdico-penal;
e e) sobre a configurao da sentena penal; e 2) demonstrar: a) a distino entre
a preparao da constituio da realidade criminal e a constitutividade da
sentena penal condenatria; b) o poder de definio dos agentes do sistema
penal, especialmente dos juzes, bem como a sua responsabilidade na
criminalizao de condutas e pessoas; e c) a modificao nas concepes de
crime e de contraveno penal, que passam a ser compreendidos como
realidades definidas como tais nas sentenas penais condenatrias, concepes
estas inseridas no mbito do pragmatismo ou, mais especificamente, do realismo
jurdico.
Essa a contribuio original que a presente tese pretende dar ao mundo
do conhecimento, de modo a corresponder ao dito por Eco, quando afirma que, no
campo humanista, quando se fala em descoberta, est se falando em
descobertas mais modestas, considerando-se resultado cientfico at mesmo
uma maneira nova de ler e entender um texto clssico, a identificao de um
manuscrito que lana nova luz sobre a biografia de um autor, uma reorganizao e
releitura de estudos precedentes que conduzem maturao e sistematizao
das idias que se encontravam dispersas em outros textos.1
1 ECO, Humberto. Como se faz uma tese, p. 2.
IV
A presente pesquisa, que tem carter multidisciplinar e se orienta pelo
paradigma da linguagem, adota, como mtodo de abordagem, o dedutivo, pois,
partindo de bases filosficas, criminolgicas e jurdicas gerais sobre a linguagem e
sobre o processo de criminalizao, procura demonstrar, especificamente, a
constitutividade da sentena penal condenatria. Enquanto os mtodos de
procedimento so o descritivo e o argumentativo, a tcnica de pesquisa a
bibliogrfica, construindo-se as descries e os argumentos a partir das mais de
430 fontes pesquisadas, de autores tanto nacionais quanto estrangeiros.
A pesquisa importante para o mundo cientfico, pois, ao discorrer sobre a
linguagem do processo de criminalizao e ao demonstrar a constitutividade da
sentena penal condenatria, possibilita uma compreenso mais precisa acerca
dos pr-julgamentos e juzos paralelos que ocorrem nos processos informais e
formais de definio ou qualificao de condutas e pessoas; possibilita, tambm,
visualizar o momento exato em que surgem, como realidades criminais estritas, o
crime ou a contraveno penal e o criminoso ou o contraventor; permite constatar,
ainda, a responsabilidade das pessoas em geral, dos meios de comunicao de
massa e, sobretudo, dos agentes do sistema penal, especialmente dos juzes, na
atribuio das qualificaes de crimes ou contravenes penais s condutas
concretas, e de criminosos ou contraventores aos seus autores; finalmente,
oferece uma contribuio importante para uma concepo pragmtica e realista de
crime e de contraveno penal, que podem ser tidos como realidades concretas
definidas como tais nas sentenas penais condenatrias transitadas em julgado.
Intitulada Linguagem e criminalizao: a constitutividade da sentena penal
condenatria, a tese est dividida em trs partes, a primeira com trs captulos, a
segunda, com dois e a terceira, tambm, com dois, totalizando sete captulos, com
numerao sequencial nica. Em termos gerais, a primeira parte, como o seu
ttulo indica, busca realizar uma introduo ao estudo da linguagem jurdico-penal,
discorrendo sobre essa linguagem como objeto de estudo, sobre o paradigma da
linguagem e as suas aplicaes nos mbitos jurdico e jurdico-penal e sobre a
metalinguagem jurdico-penal. Na segunda parte, confrontam-se as ideias de pr-
constitutividade da realidade em face da linguagem e de constitutividade da
V
linguagem jurdico-penal em face da realidade. Na terceira parte, procura-se
demonstrar a constitutividade da sentena penal condenatria, ponto culminante
da presente tese, da qual decorre o poder de definio dos juzes e uma
concepo realista de crime e de contraveno penal.
Mais detalhadamente, o primeiro captulo procura apresentar a linguagem
jurdico-penal como objeto de estudo, discorrendo sobre a configurao da
linguagem jurdico-penal e sobre os aspectos relacionados ao seu estudo. O
segundo captulo busca conceituar e distinguir os paradigmas do ser, da
conscincia ou do sujeito e da linguagem e discorrer sobre as suas aplicaes,
respectivamente, nos mbitos jurdico e jurdico-penal. O terceiro captulo
estabelece uma distino entre a linguagem jurdico-penal objeto e a
metalinguagem jurdico-penal e descreve as principais categorias desse nvel
metalingustico. J no mbito da segunda parte, o quarto captulo trata da pr-
constitutividade da realidade e da linguagem designativa nos mbitos geral,
jurdico e jurdico-penal. O quinto captulo, por sua vez, destina-se a discorrer,
especificamente, sobre a criminalizao primria e a constitutividade da
linguagem, tambm nos mbitos geral, jurdico e jurdico-penal. Pertencente
terceira parte, o sexto captulo trata dos aspectos gerais da criminalizao
secundria, da preparao da constituio da realidade criminal e da relao entre
essa preparao, o princpio do estado de inocncia e o poder de definio dos
agentes do sistema penal na preparao da constituio dessa realidade. Por fim,
o stimo captulo, ponto culminante da presente tese, trata da configurao da
sentena penal e da demonstrao da constitutividade da sentena penal
condenatria, da qual decorre o poder de definio dos juzes, a responsabilidade
destes na criminalizao de condutas e pessoas e, por fim, o surgimento de uma
concepo pragmtica e realista de crime ou contraveno penal.
1
PARTE I UMA INTRODUO AO ESTUDO DA LINGUAGEM JURDICO-PENAL
CONSIDERAES INICIAIS
Embora o tema especfico desta tese seja a constitutividade da sentena
penal condenatria, por ser esta, tambm, um ato de linguagem, est esse tema
inserido num campo mais amplo que a linguagem jurdico-penal ou da
linguagem do processo de criminalizao, razo pela qual se impe, num primeiro
momento, uma introduo ao seu estudo, ou seja, a sua apresentao como
objeto da investigao.
Por isso, esta parte est dividida em trs captulos, apresentando-se, no
primeiro, uma configurao da linguagem jurdico-penal, ou seja, a sua
conceituao, as suas funes, os seus tipos e as suas formas, assim como os
aspectos relacionados s divises, dimenses e importncia do seu estudo.
O segundo captulo, por sua vez, discorre sobre o paradigma da linguagem,
confrontando-o com os paradigmas do ser e da conscincia ou do sujeito, e suas
aplicaes no mbito jurdico e, especificamente, no campo jurdico-penal, o que
constitui o marco terico da presente tese, porquanto o seu objeto pode ser
abordado por diferentes modelos do pensamento.
O terceiro captulo, por fim, aborda, especificamente, a metalinguagem
jurdico-penal, isto , a linguagem que se usa para falar da linguagem jurdico-
penal objeto, fazendo-se, num primeiro momento, uma distino entre esses dois
nveis da linguagem, para, no momento seguinte, tratar dos elementos estruturais
da metalinguagem jurdico-penal, especialmente do indivduo, da sociedade, do
Estado e do direito de punir; da norma e da lei penal e processual penal; do fato
punvel; da sano penal; da vtima e do criminoso; e, por fim, do processo penal e
das relaes processuais penais.
2
Captulo I A LINGUAGEM JURDICO-PENAL COMO OBJETO DE ESTUDO
Apresentao
Este captulo tem o propsito de, to-somente, apresentar a linguagem
jurdico-penal como objeto de estudo, realizando uma descrio dos seus
principais traos, a fim de que se possa ter uma ideia do objeto pesquisado, que,
por ser demais amplo e preocupao de vrias cincias e disciplinas, exige que
seja configurado, possibilitando uma melhor compreenso do tema. Para que esse
objetivo seja alcanado, o presente captulo est dividido em duas sees,
estando a primeira voltada configurao da linguagem jurdico-penal e a
segunda, aos aspectos que se relacionam, especificamente, ao estudo dessa
mesma linguagem.
Seo I Configurao da linguagem jurdico-penal
necessria uma configurao da linguagem jurdico-penal, uma vez que
esta o objeto mais amplo da presente tese, no qual se inserem os seus objetos
mais especficos, ou seja, a sentena penal condenatria e a sua constitutividade,
que sero objetos de estudos da terceira parte, mas que no podem ser
compreendidos sem um conhecimento prvio dos principais aspectos
caracterizadores da linguagem jurdico-penal. Dividida esta seo em quatro
subsees, destina-se a primeira conceituao da linguagem jurdico-penal,
enquanto as demais tratam, respectivamente, das funes, dos tipos e das formas
dessa mesma linguagem.
3
Subseo I
Conceituao de linguagem jurdico-penal
A obteno de um conceito especfico sobre a linguagem jurdico-penal
depende de que se parta da noo de linguagem geral, na qual todas as
linguagens se inserem, e se passe ao campo mais especfico da linguagem
jurdica, ao qual tambm pertence a linguagem jurdico-penal.
As concepes acerca da linguagem humana, no curso da histria, podem
ser sintetizadas, segundo Koch, em trs princpios, ou seja, como representao
ou espelho do mundo e do pensamento; como instrumento ou ferramenta da
comunicao; e, por fim, como forma ou lugar de ao ou interao.2 Isso no
impede que a linguagem, em seu sentido geral,3 seja compreendida, entre outros,
como sendo um fenmeno fsico, fisiolgico, mecnico, psicolgico ou nervoso,
uma vez que o seu estudo envolve vrias e diferentes reas. Carnap, um dos
principais expoentes do neopositivismo lgico,4 segundo Warat, afirma que a
linguagem um sistema de sons e hbitos produzidos por meio dos rgos
correspondentes ou por qualquer outro meio, independentemente do material
2 KOCH, Ingedore Villaa. A inter-ao pela linguagem, p. 7. 3 A designao da linguagem como geral est relacionada amplitude da comunicao que, no caso, abrange todos os seres. 4 O neopositivismo (ou simplesmente positivismo) lgico, empirismo, empirismo lgico, empirismo cientfico ou empirismo contemporneo ou, ainda, filosofia analtica uma corrente do pensamento lgico que nasceu no Crculo de Viena por volta dos anos vinte do sculo XX, influenciado pelo liberalismo, pelas ideias iluministas, pelo o empirismo, pelo o utilitarismo, pelo esprito antimetafsico e pelo movimento do livre-comrcio oriundo da Inglaterra, constituindo-se num movimento de reao filosofia idealista e especulativa que estava presente e dominava as universidades alems. O neopositivismo foi constitudo por um grupo de intelectuais que se propunham a estudar diversos assuntos, sobretudo as questes relacionadas lgica, linguagem e s cincias em geral, podendo-se citar, como seus integrantes, Otho Neurath, Philiph Frank, Moritz Schilick, Rudolf Carnap, Karl Popper, Hans Hahn e outros. Os posicionamentos do Crculo de Viena tiveram como pressupostos, dentre outros, os escritos de Charlos Sanders Peirce, Gottlob Frege e Ludwig Wittgenstein, considerando-se, quanto a este, o seu primeiro perodo, identificado como o do Tratado Lgico-filosfico. Segundo Pasquinelli, os vienenses buscavam circunscrever mediante a crtica lingustica da teologia e da metafsica o campo do conhecimento ao domnio do conhecimento emprico, o que constitui, por um lado, uma renovada forma de positivismo ou empirismo, enquanto, por outro, atinge uma profunda originalidade relativamente tradio psicologizante da prpria gnoseologia emprico-positivista, uma vez que reivindica como instrumento sistemtico de clarificao filosfica o mtodo da anlise lgica da linguagem, por Russel e Wittgenstein apenas esboado (PASQUINELLI, Alberto. Carnap e o positivismo lgico, p.12).
4
utilizado, que tem o propsito de servir de comunicao entre as pessoas,
influindo em seus atos, decises e pensamentos.5
Ao mesmo tempo em que reconhece a complexidade do sistema de
linguagem, Kristeva um pouco mais explcita, dizendo ser a linguagem uma
cadeia de sons articulados, mas tambm uma rede de marcas escritas (uma
escrita), ou um jogo de gestos (uma gestualidade), e, mais que isso, um
processo de comunicao de uma mensagem entre dois sujeitos falantes pelo
menos, sendo um o destinador ou o emissor, e o outro, o destinatrio ou o
receptor.6
A expressividade algo que, no dizer de Berger e Luckman, est ao dispor
de todos os homens, que produz, em meio a tantas atividades, sinais que se
agrupam em um certo nmero de sistemas, havendo, entre outros, sinais
gesticulatrios, vrios artefatos materiais e sinais vocais. A linguagem
considerada o mais importante sistema de sinais vocais da sociedade humana,
cujo fundamento est na capacidade intrnseca do organismo humano de
expressividade vocal. Contudo, somente se pode falar em linguagem quando as
expresses vocais tornarem-se capazes de se destacar dos estados subjetivos
imediatos para integrarem as objetivaes comuns da vida cotidiana. Isso
somente possvel na linguagem, j que por meio desta que o homem se
relaciona com os semelhantes, sendo, por isso, essencial a compreenso da
linguagem para a compreenso da realidade da vida cotidiana.7
Delineia-se, assim, um conceito de linguagem geral como um sistema de
sinais sonoros, grficos e gestuais que tem o propsito de possibilitar a
comunicao entre as pessoas, influindo em seus pensamentos e aes.
Na busca de um conceito de linguagem, no se pode fugir distino
existente entre a linguagem, a lngua e a fala. Para Saussure, enquanto a
linguagem (language) prpria da humanidade, uma vez que todos os homens
possuem capacidade de linguagem, que lhes dada pela natureza, a lngua
(langue) prpria de uma sociedade que a pratica como algo adquirido e
5 WARAT, Luis Alberto. O direito e sua linguagem, p. 38. 6 KRISTEVA, Julia. Histria da linguagem, p. 19-21. 7 BERGER, Peter L.; LUCKMANN, Thomas. A construo social da realidade, p. 53-57.
5
convencional; a fala (parole), por fim, h de ser concebida de indivduo para
indivduo e com caracteres fsico-psquicos.8
Essa distino, no entanto, no pacfica, pois, na teoria dos atos de fala,9
possvel perceber que esta e a lngua so inseparveis, isto , a lngua tem a
fala dentro de si, pois pragmtica, sendo necessrio concluir, portanto, que o
estudo da lngua no pode esgotar o estudo da linguagem, o que deixa
evidenciado que esta uma realidade complexa e que a lingustica apenas uma
das disciplinas que dela se ocupam.
necessrio ressaltar, ainda, que, segundo Orlandi, o espao da
linguagem estabelecido a partir da ideia de silncio, de modo que, para entender
a linguagem preciso entender o silncio,10 embora este no seja diretamente
observvel, diversamente daquela, que pressupe a transformao de
significantes em significados apreensveis e verbalizveis.11
Para a obteno de um conceito de linguagem jurdica,12 bastaria
acrescentar que essa comunicao tem uma relao especfica com o fenmeno
jurdico, o que abrange as normas, as proposies, os atos de linguagem e os
discursos jurdicos, sobre os quais os juristas, os intrpretes, os profissionais do
direito, enfim, as pessoas de modo geral iro se debruar para, em relao a esse
fenmeno, transmitir algo s demais pessoas. Ao realizar essas atividades, as
pessoas utilizam a linguagem, que seria, nessa concepo, um meio ou
instrumento a servio da veiculao de sentido dessas normas e proposies.
Nessa relao da linguagem com o direito, explica Carri, aquela tem
basicamente as mesmas caractersticas que as linguagens naturais, sendo a
8 SAUSSURE, Ferdinand de. Curso de lingustica geral, p. 17, 18, 19, 22 e 27. Tambm compreendendo a linguagem como uma caracterstica da espcie humana, Gusdorf afirma que, enquanto a lngua corresponde a um sistema de expresso falada, particular a uma comunidade ou outra, a fala uma afirmao da pessoa.(GUSDORF, Georges. A fala, p. 6). 9 Ver 3 da Subseo I da Seo II deste Captulo; Subseo III da Seo I do Captulo II; e 2 da Subseo II da Seo I do Captulo V. 10 Segundo Orlandi, o silncio significa de mltiplas maneiras e o objeto de reflexo de teorias distintas: de filsofos, de psicanalistas, de semilogos, de etnlogos, e at mesmo os lingistas se interessam pelo silncio sob a etiqueta da elipse e do implcito. Alm disso, h silncios mltiplos: o silncio das emoes, o mstico, o da contemplao, o da introspeco, o da revolta, o da resistncia, o da disciplina, o do exerccio do poder, o da derrota da vontade etc. (ORLANDI, Eni Puccineli. As formas do silncio, p. 42). 11 ORLANDI, E. P. Op. Cit. p. 29, 29, 32 e 33. 12 A designao da linguagem como jurdica est relacionada amplitude limitada da sua comunicao que, no caso, abrange somente o direito, sendo, portanto, uma espcie da linguagem geral.
6
linguagem normativa definida como a linguagem que usada, entre outros, para
realizar atos, tais como proibir, autorizar, exercer crticas de certos tipos, escusar,
justificar, atribuir ou reconhecer direitos, afirmar ou negar a competncia, o dever,
o direito ou a responsabilidade de algum, ou, ainda, para impor deveres ou
obrigaes e afirmar acerca da transgresso ou do mrito de algum.13 por isso
que, para Capella, a linguagem um elemento necessrio (ainda que no nico
nem suficiente em si mesmo) para a existncia de normas, ou seja, no h
normas, do tipo que seja, sem alguma espcie de comunicao lingustica.14
Num caminhar em direo especificidade, possvel deduzir, a partir do
que foi dito sobre as linguagens geral e jurdica, que a linguagem jurdico-penal
a que se relaciona com o fenmeno criminal, mesmo que esse fenmeno possa
ser compreendido de diversas formas e pontos de vista.
necessrio ponderar que o fenmeno criminal uma realidade da qual
no se pode fugir, pois as notcias sobre a ocorrncia de comportamentos que so
ou podem ser considerados crimes ou contravenes penais so transmitidas,
diariamente, dos diversos pontos da aldeia global, de modo que, em tempo real,
possvel fazer com que, quem no esteja envolvido ou prximo do local de tais
fatos, possa sentir os efeitos psicolgicos de tais prticas. Por outro lado, h
diversos segmentos de pessoas que exercem atividades prticas ou tericas
relacionadas com esse fenmeno, ou que se interessam, direta ou indiretamente,
por ele, pensando, conversando, sofrendo, procurando contra ele reagir ou mesmo
dele extrair alguma vantagem.
Tanto em relao ao fenmeno criminal abstrato, do qual se ocupa,
sobretudo, a linguagem jurdico-penal extraprocessual, quanto em relao ao
fenmeno criminal concreto, objeto da linguagem jurdico-penal processual, h
uma configurao prpria da linguagem jurdico-penal, compreendendo palavras
que so usadas, quase exclusivamente, em contextos e com sentidos prprios,
tais como nas discusses acadmicas, nas investigaes criminais, nos debates
13 CARRI, Genaro R. Notas sobre derecho y lenguaje, p. 55 e 238. 14 CAPELLA, Juan Ramn. Elementos de anlisis jurdico, p. 52: para Capella, el lenguaje es un elemento necesario (aunque no nico ni suficiente en si mismo) para la existencia de normas, ou seja, no hay normas, del tipo que sea, sin alguna especie de comunicacin lingustica.
7
das lides processuais penais ou nas discusses ocorridas no processo legislativo,
exigindo, para a sua adequada compreenso, uma formao intelectual
especfica.15
15 necessrio ressaltar o carter problemtico da conceituao da linguagem jurdico-penal, tendo-se em mente que, nem sempre, os conceitos so bem vistos porque implicam uma limitao ou restrio de caractersticas relativas ao objeto que se est a conceituar. So produtos da limitada percepo sensorial e intelectual de algum que procura exteriorizar a sua compreenso sobre algo, distinguindo-o dos demais seres. De qualquer forma, no se pode desprezar a importncia dos conceitos, embora, tambm, no se possa esquecer das suas limitaes. Conceituar seria, pois, apresentar um maior nmero possvel de elementos cognitivos relativos a algo, a fim de distingui-los das demais categorias. A importncia dos conceitos, contudo, no afasta o seu carter problemtico, o que perceptvel, tambm, em relao linguagem, pois, conforme ressalta Kristeva, cada poca ou cada civilizao, em conformidade com o conjunto do seu saber, das suas crenas, da sua ideologia, responde de modo diferente e v a linguagem em funo dos moldes que a constituem a si prpria (KRISTEVA, Julia. Histria da linguagem, p. 17-18), razo pela qual, a pergunta sobre O que a linguagem jurdico-penal? remete outra pergunta, ou seja, Como que a linguagem jurdico-penal pode ser pensada?. Desnuda-se, assim, um dos problemas da conceituao de linguagem, isto , a sua historicidade, uma vez que esse conceito tem uma determinao espao-temporal. Essa relatividade histrica est relacionada a um outro problema que, segundo Apel, o fato desta ter-se tornado uma preocupao comum a quase todas as escolas e disciplinas (e possivelmente a nica preocupao que elas todas tm em comum), formando-se um emaranhado babilnico de linguagem entre as diversas tendncias e disciplinas da filosofia contempornea. (APEL, Karl-Otto. Transformao da filosofia II, p. 375). Entre essas diversas tendncias e disciplinas encontram-se a lingustica, a semiologia e a filosofia. A lingustica, segundo Searle, um mtodo que tenta resolver problemas filosficos particulares examinando o emprego corrente de certas palavras ou de certos elementos no interior de uma dada lngua e procurando descrever as estruturas reais fonolgica, sinttica e semntica das lnguas naturais. (SEARLE, John R. Os actos de fala, p. 10 e 11). Rocha complementa, ressaltando que o objeto da lingustica se restringe s significaes denotativas dos termos e s suas condies semnticas e sintticas, o que significa dizer que ignora os efeitos polticos da prpria significao, isto , o poder do discurso. A semiologia, por sua vez, est preocupada com os lugares no teorizados pela lingustica, voltando-se, pois, ao estudo dos processos de produo e mutao das significaes conotativas (ideolgicas) da comunicao social, ou seja, procura fornecer regras metodolgicas para considerar a natureza do discurso, para obter alguns critrios firmes para a interpretao dos discursos e efetuar em torno deles leituras ideolgicas e para tratar o problema da significao como fenmeno discursivo. (ROCHA, Leonel Severo. A problemtica jurdica, p. 35). A filosofia da linguagem, por fim, definida, por Searle, como a tentativa de fornecer uma descrio filosoficamente esclarecedora para certos traos gerais da linguagem, tais como a referncia, a verdade, a significao e a necessidade, da porque seus dados vm, em regra, das lnguas naturais, voltando-se ocasionalmente a sua ateno para as particularidades de uma dada lngua. (SEARLE, John R. Os actos de fala, p. 10). Esses mltiplos interesses no estudo da linguagem revelam um dos principais problemas da conceituao da linguagem, ou seja, que enfoques to distintos somente poderiam resultar em conceitos tambm diferentes de linguagem, cada um voltado a atender aos seus objetivos especficos. No campo especfico do direito, o estudo da linguagem jurdica tambm tem ocupado espao, sobretudo no que diz respeito s teorias da argumentao e da interpretao jurdica, o que confirma a multiplicidade de interesses tambm nesse campo, confirmando a relatividade da conceituao de linguagem em face desses diversos interesses. Alm disso, a linguagem jurdica tem mltiplas faces, como, por exemplo, as linguagens legislativa e cientfica, relacionadas a situaes imaginrias ou no concretas. A propsito, importante conferir as pesquisas realizadas sobre argumentao em geral e sobre a argumentao jurdica em especial, bem como sobre a interpretao jurdica, entre as quais esto os seguintes estudos: PERELMAN, Cham; OLBRECHTS-TYTECA, Lucie. Tratado da Argumentao: a nova retrica; ALEXY, Robert. Teoria da argumentao jurdica; ATIENZA, Manuel. As razes do direito: teoria da argumentao jurdica: Perelman, Loulmin, MacCormick, Alexy e outros; BUSTAMANTE, Thomas da Rosa. Argumentao contra legem: a teoria do discurso e a justificao jurdica dos casos mais difceis; GNTHER, Klaus. Teoria da argumentao no direito e na moral: justificao e aplicao; MACCORMICK, Neil. Argumentao jurdica e teoria do direito; MONTEIRO, Cludia Servilha. Teoria da argumentao jurdica e nova retrica e Filosofia do
8
Subseo II
Funes da linguagem jurdico-penal
A linguagem exerce vrias funes, entre as quais a designativa, a
prescritiva, a expressiva, a ftica, a metalingustica, a de fabulao, a de
dominao e a potica. A especificao dessas distintas funes leva em
considerao, sobretudo, que o processo lingustico, segundo Jakobson, est
relacionado com o envio, pelo remetente, de uma mensagem ao destinatrio,
em um certo contexto, que nada mais do que o referente, com base em
cdigo, que , parcial ou totalmente, comum ao remetente e ao destinatrio, e
direito: deciso judicial e teoria da argumentao jurdica; ARISTTELES. Da interpretao; BETTI, Emilio. Interpretao da lei e dos atos jurdicos: teoria geral e dogmtica; GRAU, Eros. Ensaio e discurso sobre a interpretao/aplicao do direito; NEVES, A. Castanheira. O actual problema metodolgico da interpretao jurdica I; STRECK, Lnio Luiz. Hermenutica jurdica e(m) crise: uma explorao hermenutica da construo do direito; e MAXIMILIANO, Carlos. Hermenutica e aplicao do direito. No mbito jurdico-penal, essas mltiplas faces podem ser percebidas no campo cientfico, por exemplo, na dificuldade, muitas vezes encontradas, no dilogo entre a antropologia criminal, a sociologia criminal e a psicologia criminal que, nem sempre, levam em considerao os conceitos jurdicos relativos ao fenmeno criminal e vice-versa, resultando, assim, na elaborao de conceitos diversificados sobre esse fenmeno. Tambm a linguagem processual ou a linguagem relacionada aos casos concretos multifacetada, apresentando-se de forma mais diversificada ainda, em face da pluralidade de pessoas envolvidas, direta ou indiretamente, nos diversos casos, como as vtimas e testemunhas e os jornalistas, assim como os agentes do sistema penal, como policiais, membros do Ministrio Pblico, advogados, juzes, peritos e serventurios da justia. A linguagem desses profissionais tem contedo e funes prprias, havendo, pois, linguagens que se situam no mbito da linguagem comum ou popular, linguagens jornalsticas, linguagens oficiais, linguagens processuais, linguagens extraprocessuais, linguagens cientficas, linguagens jurdicas e linguagens no jurdicas, o que evidencia as muitas facetas da linguagem jurdico-penal. Essas mltiplas faces da linguagem jurdico-penal ampliam a diversidade de sentidos dos seus termos, os quais, muitas vezes, so usados num sentido e compreendidos em outro, de modo que, conversar sobre o fenmeno criminal exige um esforo a mais, sendo clara a sensao de se estar vivendo na Torre de Babel, uma vez que, no raro, ao falar-se de crime, este compreendido em sentidos diferentes. A propsito, no terceiro captulo, tratar-se- dos conceitos formal, material e analtico de fato punvel, assim como das concepes metafsicas e criminolgicas envolvendo o fenmeno criminal. A possibilidade de conceituar o fato punvel ou o fenmeno criminal em perspectivas diferentes propicia essa incompreenso, pois o locutor no antecipa, em relao a sua fala, em que perspectiva est empregando esta ou aquela palavra ou expresso. somente no desenrolar da conversa ou no contexto da afirmao que essas incompreenses podem ser esclarecidas, embora isso nem sempre ocorra, resultando, muitas vezes, na ausncia de concatenao entre o locutor e o ouvinte. A diversidade de conceitos sobre um mesmo termo, a infinidade de requisitos ou elementos constitutivos de uma categoria criminal e os inmeros paradigmas que orientam o pensamento criminal, tanto no mbito criminolgico quanto no jurdico, causam conflitos de linguagem. Segundo Carri, a existncia de discrepncias e disputas no desprezveis entre os juristas decorre da falta de claridade acerca de como devem tomar-se certos enunciados que tipicamente aparecem na teoria jurdica.(CARRI, Genaro R. Notas sobre derecho y lenguaje, p. 25). possvel concluir, assim, que essa diversidade terminolgica e de contedos no mbito da linguagem jurdico-penal dificulta muito a busca de uma conceituao mais precisa acerca dessa mesma linguagem.
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por meio de um contato, que um canal fsico e uma conexo psicolgica entre
esse remetente e o destinatrio. Com exceo das funes de fabulao e de
dominao, tais funes so depreendidas da nfase que se atribui a cada um
desses aspectos no processo lingustico.16
1. A funo designativa ou descritiva da linguagem jurdico-penal
em face da sua funo designativa, tambm denominada funo
descritiva, referencial, denotativa, cognitiva, informativa, significativa ou
denominativa, que, segundo Warat, a linguagem veicula um sentido articulvel
com os objetos do mundo,17 procurando, no dizer de Bobbio, fazer conhecer,
dando informaes, comunicando aos outros certas notcias e transmitindo o
saber.18 Essa busca pelo significar, pelo descrever e pelo designar ou denominar
realidades, segundo Dip,19 traz consigo uma preocupao apofntica, pois o seu
resultado suscetvel de verificao ou de falsificao.
Essa funo, por estar centrada no referencial, explica Chalhub, tenta uma
relao e uma aproximao mais diretas entre o termo e o objeto,20 sendo
possvel de ser percebida, por exemplo, ao ler-se as notcias de um jornal,
organizadas de maneira objetiva e com verbos na terceira pessoa, com a
finalidade de informar, resultando evidente que, na organizao da mensagem, o
referente exerce uma funo principal.21
A funo descritiva muito usada na linguagem dos estudiosos do direito,
que procuram descrever o contedo do direito positivo, explicando-o e
possibilitando o seu conhecimento, tanto que, como diz Simon, uma das funes
16 JAKOBSON, Roman. Lingustica e comunicao, p. 122-129. No que diz respeito, especificamente, linguagem jurdica, Capella ressalta as funes prescritiva e descritiva, pois uma linguagem que pode ser usada tanto para ditar a norma ou para prescrev-la quanto para enunciar ou informar acerca da norma j dada. (CAPELLA, Juan Ramn. Elementos de anlisis jurdico, p. 61). De qualquer modo, a referncia somente a essas duas funes no afasta que a linguagem jurdica, assim como a linguagem jurdico-penal, exera, tambm, as demais funes antes mencionadas. 17 WARAT, Luis Alberto. O direito e sua linguagem, p. 66. 18 BOBBIO, Norberto. Teoria da norma jurdica, p. 78. 19 DIP, Ricardo. Direito penal: linguagem e crise, p. 19. 20 CHALHUB, Samira. Funes da linguagem, p. 9. 21 CHALHUB, Samira. A metalinguagem, p. 14.
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da cincia do direito o uso de uma linguagem clarificadora,22 de modo a
aproximar-se do objeto, isto , dos textos normativos, que, estabelecendo o
dever-ser ou o devido, para os estudiosos, so o ser do direito ou o referente.
No mbito da linguagem jurdico-penal, essa funo est presente, entre
outras, na lei penal, mais precisamente no tipo penal incriminador, compreendido,
conforme Tavares, como a descrio objetiva e neutra do desenrolar de uma
conduta, prevista na lei penal,23 que tem por objetivo dar a conhecer aos
destinatrios da norma penal as condutas (aes e omisses) abstratas e
imaginrias que no devem ser praticadas. Essa funo descritiva tambm
exercida pela doutrina, que compreende tanto os tratados jurdico-penais quanto
as demais obras que buscam atribuir sentido aos textos legislativos, os quais so
convertidos em objetos de descrio da dogmtica penal. Por fim, essa mesma
funo claramente percebida no processo penal, desde o seu incio at o seu
final, quando se procuram elementos descritivos de um caso concreto, entre
outros, por meio de interrogatrios, declaraes das vtimas, depoimentos
testemunhais, levantamentos de local e exames periciais.24 Esses elementos
descritivos passam a integrar as descries dos relatrios policiais,25 das
denncias ou das queixas,26 que so peas, preponderantemente, descritivas, as
alegaes das partes tcnicas,27 que tm, tambm, funo descritiva, assim como
a sentena penal, que tem, entre os seus requisitos, a exposio sucinta da
acusao e da defesa e a indicao dos motivos de fato e de direito em que se
fundar a deciso.28
22 SIMON, Henrique Smidt. Direito, hermenutica e filosofia da linguagem, p. 93. 23 TAVARES, Juarez. Teoria do injusto penal, p. 134. 24 Ver FIKER, Jos. Linguagem do laudo pericial. 25 O Cdigo de Processo Penal brasileiro, em seu artigo 10, 1o e 2o, estabelece que a autoridade far minucioso relatrio do que tiver sido apurado e enviar os autos ao juiz competente, podendo indicar testemunhas que no tiverem sido inquiridas, mencionando o lugar onde possam ser encontradas. 26 O Cdigo de Processo Penal brasileiro, em seu art. 41, estabelece que a denncia ou a queixa conter a exposio do fato criminoso, com todas as suas circunstncias, a qualificao do acusado ou esclarecimento pelos quais se possa identific-lo, a classificao do crime e, quando necessrio o rol de testemunhas. 27 A Lei Orgnica Nacional do Ministrio Pblico Lei no 8.625, de 12 de fevereiro de 1993 -, em seu art. 43, III, estabelece como dever do membro do Ministrio Pblico, entre outros, indicar os fundamentos jurdicos de seus pronunciamentos processuais, elaborando relatrio em sua manifestao final ou recursal. Nesses relatrios devem ser inseridos tanto os elementos descritivos do caso objeto do processo quanto os elementos descritivos do processo. 28 Cdigo de Processo Penal brasileiro, art. 381, II e III.
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2. A funo prescritiva da linguagem jurdico-penal
A funo prescritiva, tambm denominada conativa, apelativa ou diretiva a
que, segundo Warat, visa provocar conexes de sentido, destinadas a atuar
sobre o comportamento futuro do receptor,29 consistindo, no dizer de Bobbio, em
fazer fazer, por meio, entre outros, de comandos, conselhos, recomendaes e
advertncias.30 Essa funo est centrada no destinatrio, pois, segundo Chalhub,
pela linguagem ou, mais precisamente, por meio de uma ordem, de uma
exortao, de um chamamento ou invocao ou de uma saudao ou splica, o
emissor tenta fazer-se notar pelo destinatrio,31 como ocorre, por exemplo, na
linguagem da propaganda, que visa induzir o receptor a consumir o objeto.32
A funo prescritiva est mais evidente nos textos normativos, mas
percebida, tambm, nos pareceres jurdicos e nas decises judiciais, ou seja, nos
enunciados das proposies prescritivas, que estabelecem o dever-ser, sendo
percebida, no mbito da linguagem jurdico-penal, portanto, tanto na lei penal
quanto na doutrina, na jurisprudncia e nos atos processuais penais.
No mbito da linguagem jurdico-penal, segundo Santos, esta funo est
encerrada no tipo penal, cuja descrio busca direcionar a conduta das pessoas
em geral para fora da proibio ou para dentro da permisso. Alm disso, o tipo
penal influencia positivamente os agentes do sistema penal, fazendo com que
estes realizem a criminalizao secundria,33 atribuindo as condutas aos supostos
autores, e negativamente, impedindo-os, em face da sua funo de garantia, de
realizar a represso penal fora dos limites legais.34
A linguagem jurdico-penal tambm exerce uma funo diretiva da atividade
cientfica, especialmente dos cientistas do direito penal, em face, sobretudo, da
29 WARAT, Luis Alberto. O direito e sua linguagem, p. 66. 30 BOBBIO, Norberto. Teoria da norma jurdica, p. 78. Na direo de condutas, explica Dip, distinguem-se as funes imperativa propriamente dita, em que est ausente a possibilidade de aferio acerca da verdade ou falsidade da proposio; estimativa, que possibilita um juzo de valor; e normativa, em cujo mbito se encontram as prescries. (DIP, Ricardo. Direito penal: linguagem e crise, p. 19). 31 CHALHUB, Samira. Funes da linguagem, p. 22. 32 CHALHUB, Samira. A metalinguagem, p. 14. 33 Essa categoria aprofundada na Subseo III da Seo III do Captulo II.
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funo de fundamentao do tipo penal, uma vez que este, no dizer de Santos,
apresenta a estruturao dos seus elementos objetivos e subjetivos, descritivos e
normativos.35 Essa funo prescritiva exercida pelos textos legislativos est
presente, tambm, na linguagem dos tratados de direito penal e processual penal
e nas opinies dos doutrinadores, cujas obras acabam conferindo sentido aos
textos normativos e sendo observados com tanta fidelidade quanto as disposies
constitucionais e legais.
A funo prescritiva se faz presente, ainda, nas decises reiteradas dos
tribunais, isto , na jurisprudncia, cuja linguagem est mais prxima da normativa
do que da cientfica ou descritiva, em face do carter vinculante de parte dessas
decises36, o que, de fato, verifica-se, tambm, em relao aos precedentes das
correntes majoritrias.
A linguagem jurdico-penal usada nos atos praticados no mbito do
processo penal tambm caracterizada por essa inteno de dirigir ou influenciar
algum, como possvel perceber, entre outros, nos boletins de ocorrncia, nos
requerimentos, nas representaes, nas requisies de investigao, nas
denncias, nas queixas, nas peties de modo geral, nas ordens de intimao,
nos depoimentos, nos laudos periciais, nas certides cartoriais, nas alegaes das
partes tcnicas e nas sentenas. Assim, por exemplo, enquanto as requisies de
inqurito policial buscam fazer com que o destinatrio realize a investigao
criminal, a deduo da acusao tem por objetivo fazer com que o juiz a receba,
instaurando-se a relao processual.
3. A funo expressiva da linguagem jurdico-penal
A funo expressiva ou emotiva da linguagem, segundo Warat, indica as
conexes valorativas e as emoes que os termos podem transmitir,37
consistindo, no dizer de Bobbio, em fazer participar aos outros uma certa situao
34 SANTOS, Juarez Cirino dos. Direito penal, 1985, p. 34. 35 SANTOS, J. C. Op. Cit. , p. 34. 36 A Constituio da Repblica Federativa do Brasil, no seu art. 103-A, dispe sobre as smulas vinculantes, que tm funo nitidamente prescritiva. 37 WARAT, Luis Alberto. O direito e sua linguagem, p. 66.
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sentimental, ou seja, em evidenciar certos sentimentos e em tentar evoc-los.38
Em suma, essa funo da linguagem possibilita expressar sentimentos, paixes e
emoes.
Centrada no emissor ou, segundo Jakobson, na atitude de quem fala em
relao quilo de que est falando,39 essa funo da linguagem, conforme
Chalhub, deixa transparecer as intenes do seu dizer, caracterizando-se pela
subjetividade, pelo modo de falar, pela conjugao de verbos na primeira pessoa
do singular e pelo uso de interjeies, de adjetivos e de sinais de exclamao e
reticncias, que revelam o ponto de vista do emissor, como ocorre, por exemplo,
nas canes populares, nas novelas e na pintura expressionista,40 ou mesmo nas
mensagens lidas na primeira pessoa do singular ou que exprimem valores
biogrficos.41
A funo emotiva ou expressiva tambm se faz presente nas linguagens
jurdica e jurdico-penal, tanto no mbito processual quanto no extraprocessual.
Extraprocessualmente, as intenes pessoais ou subjetivas dos emissores em
relao aos seus contedos podem ser constatadas na linguagem utilizada dos
empresrios morais42 e dos legisladores nas discusses ocorridas no processo
de produo da lei em geral e da lei penal em especial, bem como na defesa de
teses e opinies doutrinrias, especialmente nos meios de comunicao de
massa. A linguagem legislativa, muitas vezes, est repleta de subjetividades, o
que pode ser percebido pela utilizao de verbos em primeira pessoa do singular
e pela presena de recursos retricos que revelam mais a relao do locutor com
a sua prpria fala do que com o referente do seu discurso.43 Processualmente, a
38 BOBBIO, Norberto. Teoria da norma jurdica, p. 78. 39 JAKOBSON, Roman. Lingustica e comunicao, p. 122-123. 40 CHALHUB, Samira. Funes da linguagem, p. 17-18. 41 CHALHUB, Samira. A metalinguagem, p. 14. 42 O empresrio moral, que pode ou no ser um legislador, segundo Becker, o prottipo do criador de regra, pois pessoa que se interessa pelo contedo das regras, uma vez que as regras existentes no o satisfazem porque h algum mal que o perturba profundamente, de modo que ele sente que nada pode estar certo no mundo at que as regras sejam feitas para corrigi-lo (BECKER, Howard. Empresrios morais, p. 108). 43 A ttulo exemplificativo, possvel extrair do pronunciamento realizado, no dia 10 de julho de 1990, pelo deputado federal Roberto Jefferson, relator do substitutivo que resultou na Lei dos Crimes Hedi