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GBECAM REVISTA Gramado Destaques do congresso Câncer de Mama Gramado 2010 Artigos Seleção e análise de artigos nacionais e internacionais Entrevista O oncologista Ricardo Caponero faz um raio X do câncer de mama no Brasil Ano I • número 1 2º semestre 2010

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GBECAMREV

ISTA

GramadoDestaques do congresso Câncer de Mama Gramado 2010

ArtigosSeleção e análise de artigos nacionais e internacionais

EntrevistaO oncologistaRicardo Caponero faz um raio X docâncer de mamano Brasil

Ano I • número 12º semestre 2010

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Proporcionando o futurodo tratamento do cincer de mama

paraas pacientes de hoje.

GBECAMAvenjda Ibimpuem, 2.901- Conj 216

lndiandpolis -CEP 04029-200 - Sio Paulo - SlTel: 01) 2679 6093 Fa\: (11) 5094 1938

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OGrupo Brasileiro de Estudos do Câncer de

Mama (GBECAM) completou em março

deste ano cinco anos de pioneirismo no Brasil.

Começamos tímidos, mas cercados do apoio

de profissionais competentes e comprometi-

dos, e munidos de vontade de contribuir com a

pesquisa e a divulgação de informações sobre o

câncer de mama no país.

Os esforços deram resultado. Crescemos

de forma gradual e sólida e aprimoramos o que

julgamos ser nossa missão principal: imple-

mentar e facilitar a realização de estudos clíni-

cos multi-institucionais de qualidade científica e

ética em câncer de mama no Brasil, além de

implementar e auxiliar programas educativos

de esclarecimento e prevenção da doença.

Com o tempo, percebemos a necessidade

de aumentar nosso escopo de ação na pro-

dução e na divulgação de informações científi-

cas sobre o câncer de mama. Uma das formas

encontradas para tanto foi a Conferência

Brasileira de Câncer de Mama – Enfoque San

Antonio, um fórum em que profissionais de

diversas especialidades se reúnem anualmente

para discutir os avanços e as novidades na área.

O encontro, que em 2011 chega a sua 5ª

edição, vem se consolidando como um dos

principais eventos do gênero no Brasil.

Desse mesmo raciocínio surgiu a ideia da

Revista GBECAM. Mais do que uma ferramenta

para divulgação do grupo e fortalecimento de

imagem, queremos com ela cumprir um dos

nossos objetivos de estatuto: disseminar para a

classe médica e para o público em geral, por

meio de publicações, seminários e outros

canais, novas modalidades de tratamento e

prevenção do câncer feminino.

A Revista GBECAM, de periodicidade

semestral, será distribuída gratuitamente aos

membros do grupo e a instituições públicas e

privadas de ensino e pesquisa, além de órgãos

governamentais que atuem nessa área. Em suas

páginas você encontrará novas formas de trata-

mento e prevenção do câncer feminino e os

estudos que estão sendo conduzidos pelo GBE-

CAM. De suas páginas esperamos que você leve

informação e atualização para o melhor

desempenho da arte médica.

Porque nós, do GBECAM, acreditamos que,

com conhecimento científico de qualidade e

credibilidade, já teremos andado boa parte do

caminho na luta contra o câncer de mama.

Sergio D. SimonEditor clínico

Mais uma ferramenta

Revista GBECAM 3

>> SUMÁRIO

4 Panorama Confira os desta -ques da 5a edição do congressoCâncer de Mama Gramado

9 Ponto de vista Uma seleçãoe análise dos principais estudos decâncer de mama no mundo

14 Mais GBECAM Conheça ahis tó ria e os projetos desse grupopioneiro no Brasil

16 Diálogo SUS, acesso a medi -camentos, atendimento multidiscipli-nar em câncer de mama: uma aná lisepelo oncologista Ricardo Caponero

20 Pesquisa clínica Artigosde autores brasileiros em institui -ções nacionais na literatura do cân -cer de mama

23 Encontro Comunidade cien-tífica e indústria farmacêutica: juntaspor um objetivo comum

25 Giro De tudo um pouco: inicia-tivas, terceiro setor, dicas de leitura

Sergio D. SimonEditor clínico

José BinesDiretor científico

Carlos BarriosDiretor de relações internacionais

Cláudia VasconcelosCoordenadora executiva

GBECAM - Grupo Brasileiro de Estudos do Câncer de MamaTel.: (11) 2679-6093E-mail: [email protected]: www.gbecam.org.br

A Revista GBECAM é uma publicaçãosemestral do Grupo Brasileiro de Estudos do Câncer de Mama e é distribuída gratuitamente a seus membros, além de profissionais e instituições envolvidos na área de câncer de mama. A reprodução parcial ou total de seus artigos é proibida.

Tiragem: 2 mil exemplaresImpressão: Ipsis Gráfica e Editora

Edição e produção:

Rua João Álvares Soares, 1223Campo Belo – 04609-002 São Paulo – SPTel.: (11) 2478-6985E-mail: [email protected]

Jornalista responsávelLilian Liang – Mtb 26.817E-mail: [email protected]

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Ocongresso Câncer de Mama Gramado

chegou à sua quinta edição com dis-

cussões acaloradas, interatividade e novas ini-

ciativas. Sob coordenação cuidadosa do onco -

logista Carlos H. Barrios, diretor do Centro de

Pesquisa em Oncologia do Hospital São Lucas

da PUC de Porto Alegre (RS) e diretor do Ins -

tituto do Câncer do Hospital Mãe de Deus, e do

mastologista Antonio Frasson, coordenador do

Centro de Mama do Hospital da PUC-RS, o

evento reuniu cerca de 360 participantes entre

26 e 28 de agosto.

“Nosso objetivo principal é criar um cenário

em que especialistas tenham a oportunidade de

discutir os principais avanços no tratamento de

pacientes com câncer de mama e se manter

atualizados”, explicou Barrios.

Para ele, proporcionar um fórum em que

especialistas possam debater e trocar experiências

é salutar para identificar pontos críticos e melho-

rar as disparidades na prevenção, no diagnóstico e

no tratamento no Brasil, que só em 2010 terá 50

mil novos casos de câncer de mama.

“O tratamento do câncer, principalmente

do câncer de mama, tem evoluído de forma

fantástica, com redução de mortalidade, em

países desenvolvidos. Lamentavelmente não é

o que acontece no Brasil, onde a mortalidade

continua aumentando. Isso significa que os

benefícios dos avanços tecnológicos e científi-

cos recebidos pelas pacientes de câncer de

mama fora do Brasil não estão sendo aplicados

em toda a nossa população”, disse.

Segundo Barrios, tal problemática é

comum em outros países da América Latina.

Por isso, ele vê com bons olhos e muito otimis-

mo a crescente internacionalização do encon-

tro, que neste ano contou com representantes

de pelo menos dez outros países, entre con-

gressistas e palestrantes. “Essa abrangência,

essa internacionalização são importantes pela

troca de experiências e pela riqueza de partici-

pações”, comemorou.

Outro ponto ressaltado pelo especialista, e

que ele considera “uma batalha constante”, é

conferir às sessões um caráter mais participati-

vo. Para Barrios, a aproximação entre pales -

trante e plateia é um fator essencial para dis-

cussões mais ricas e o melhor aproveitamento

das sessões. Por isso, um de seus objetivos

cons tantes é encontrar formas eficazes e ino-

vadoras de promover essa interatividade.

Barrios enfatizou que se o participante

tivesse de levar apenas uma lição de todo o

evento, que fosse a personalização do trata-

mento. “Não dá para tratar todas as pacientes

de câncer de mama do mesmo jeito. Médico e

paciente devem entender que se trata de uma

condição única, que precisa de uma abor-

dagem diferenciada. Esse é o recado que deve

ser passado para a frente”, afirmou.

NCCNJá tradicional ponto de encontro de grupos de

pesquisa clínica em câncer de mama, como o

Grupo Brasileiro de Estudos do Câncer de Ma -

ma (GBECAM) e o Grupo Latino-Americano de

Investigação Clínica em Oncologia (GLICO),

este ano Gramado também foi palco de uma

iniciativa pioneira: a elaboração de diretrizes

em câncer de mama e câncer de pulmão para

a América Latina, através de uma parceria entre

o GLICO e o National Comprehensive Cancer

Network (NCCN).

O NCCN é uma organização sem fins lucra-

tivos formada por 21 dos principais centros de

câncer do mundo, cujo objetivo é melhorar a

qualidade e a eficácia do tratamento de

pacientes de câncer de todo tipo. Suas dire-

trizes são reconhecidas como o padrão ouro

para política clínica em oncologia e abordam

detecção, prevenção e redução de risco, diag-

nóstico, tratamento e cuidados paliativos.

Segundo Mohammad Jahanzeb, diretor

médico da Miller School of Medicine, da

Universidade de Miami, e conselheiro médico

para iniciativas globais do NCCN, as dificuldades

num projeto continental como esse é “trazer

todos os países para um território comum e

mantê-los em território comum”. “Como o

câncer, essa região é muito diversa. Em cada país

pode haver diferenças regionais e dentro de cada

região pode haver diferenças filosóficas”, explicou

Jahanzeb, que esteve envolvido numa iniciativa

similar para o Oriente Médio e o norte da África.

As diretrizes latino-americanas serão

baseadas nas norte-americanas, mas adaptadas

para o contexto local. “Existem muitas similari-

dades, mas há diferenças como acesso e custo

de tratamento na América Latina, que são

extremamente diversos”, explicou John Ward,

membro do painel de câncer de mama do

NCCN e professor de medicina da divisão de

oncologia da Universidade de Utah. “Um dos

principais desafios é conseguir adaptar as dire-

trizes a realidades econômicas e políticas dife -

rentes.” Entretanto, é importante ressaltar que,

neste momento, as diretrizes GLICO-NCCN

para a América Latina levarão em consideração

a evidência médica disponível na literatura e não

aspectos de custo da tecnologia necessária.

Ao regionalizar as diretrizes, a América

Latina segue o exemplo de países como China,

Japão e Coreia do Sul, que já contam com suas

guias adaptadas. Na América Latina, os

primeiros esforços nesse sentido começaram

no final de 2009. Onze países – México, El

Salvador, Panamá, Venezuela, Colômbia, Equa -

dor, Peru, Chile, Argentina, Uruguai e Brasil –

abraçaram a iniciativa. Ao longo de 2010 foram

organizados dois painéis de especialistas latino-

americanos em câncer de mama e pulmão,

abrangendo oncologistas clínicos, ci rurgiões,

radioterapeutas e patologistas para discutir as

guias de tratamento.

O trabalho para se chegar a um mapa que

possa guiar o médico em decisões relacionadas

ao câncer é longo e cheio de nuances. Ward, da

Universidade de Utah, ressaltou que um dos

principais desafios do NCCN é avaliar os “mo -

dismos” na área. Segundo o especialista, muitas

drogas ou procedimentos podem ser usados

por médicos ou solicitados por pacientes

porque parecem revolucionários.

“O painel evita seguir tendências e espera

Câncer de Mama Gramado 2010Destaques do congresso

>> panorama

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que haja dados claros antes de apoiar deter-

minada abordagem. Só porque algo parece

bom não significa que seja bom. Se novos

dados mostram que uma recomendação

anterior não é mais útil, ela é removida das

diretrizes. Todos os anos, as diretrizes têm

uma página mostrando as mudanças em

relação às guias anteriores, para que todos

tenham ciência das alterações”, disse.

Outra dificuldade destacada por Ward na

elaboração de diretrizes é determinar medidas

de eficácia comparativa. Em outras palavras:

avaliar se algo que é estatisticamente significa-

tivo se traduz em benefício real ao paciente.

“Um exemplo de algo que é estatistica-

mente significativo, mas talvez com benefício

limitado ao paciente, é o uso do bevacizu -

mabe em conjunção com quimioterapia no

câncer de mama metastático. Estudos mos -

tram uma pequena melhora na sobrevida livre

de doença, mas nenhuma melhora em sobre-

vida global. É caro e, embora raras, há toxici-

dades sérias. Atualmente o NCCN está traba -

lhando em melhores formas para se incorpo-

rar ‘eficácia comparativa’. É um trabalho em

andamento”, explicou.

O lançamento das diretrizes GLICO-NCCN

para câncer de mama e câncer de pulmão está

previsto para dezembro. “Essas diretrizes têm

implicações muito importantes graças à credi-

bilidade que o NCCN carrega. Com isso, espe -

ra mos poder ter um impacto local em termos

de como o tratamento deve ser feito, de como

se manejam as pacientes, o que pode aumen-

tar a qualidade de tratamento em toda a

América Latina”, concluiu Barrios.

Revista GBECAM

Um dos temas que geraram mais discussão na quinta edição do

congresso Câncer de Mama Gramado foi a detecção precoce da

doença metastática e até que ponto o rápido início do tratamento

pode melhorar os resultados e favorecer nossas pacientes.

O câncer de mama é uma doença impactante, que responde por

aproximadamente 11 mil mortes entre as mulheres brasileiras a cada

ano. Nos EUA, trata-se da segunda maior causa de morte por câncer,

com mais de 39 mil óbitos/ano.1 Na maioria absoluta dos casos, o óbito

deve-se ao desenvolvimento de metástase à distância.

Sabemos que 5% a 10% das pacientes se apresentam com doença

disseminada no diagnóstico. Na doença localizada, estima-se que cerca

de 30% das pacientes com linfonodos negativos e 50% daquelas com lin-

fonodos positivos irão desenvolver metástase à distância. A despeito dos

grandes avanços obtidos nos últimos anos no tratamento sistêmico do

câncer de mama metastático (CMM) e do relato de melhora progressiva

dos resultados,2,3 a sobrevida mediana ainda é de apenas 24 a 36 meses.

Os principais objetivos do tratamento do CMM são oferecer

tratamento paliativo adequado, melhorar a qualidade de vida e pro-

longar o tempo de vida. Embora seja tentada, a cura é improvável.

Apenas de 5% a 10% da população está viva em cinco anos e de 2%

a 4% acima de dez anos. Entre os fatores que influenciam na sobre-

vida no CMM temos características clínicas como performance sta-

tus, idade, intervalo livre de doença, número de sítios metastáticos e

presença de doença visce ral, características relacionadas à biologia

tumoral como grau de dife renciação, receptores hormonais e perfil

molecular, tratamento adjuvante prévio e o tratamento da doença

metastática propriamente dita. Modelos como o desenvolvido por

Yamamoto e cols, que consideram a história de quimioterapia adju-

vante prévia, presença de metástase linfonodal ou hepática, DHL

elevada e intervalo livre de recorrência alocando a população com

CMM em grupos de baixo, médio e alto risco, podem ajudar na esti-

mativa do prognóstico de sobrevida.4

A recorrência de um câncer de mama é sempre um momento

difícil para nossas pacientes. Em mais de 70% dos casos o diagnóstico

se dá no intervalo entre as visitas de rotina, estando elas sintomáticas

na maioria das vezes.16

Mário Alberto Costa Oncologista clínico do Instituto Nacional de Câncer e da Oncoclínica, Rio de Janeiro, membro daSociedade Brasileira de Oncologia Clínica, da American Society of Clinical Oncology e da Sociedade Brasileira de Mastologia,membro do Grupo Brasileiro de Estudos do Câncer de Mama (GBECAM).

A detecção precoce da doença metastática é importante e pode alterar o prognóstico?

Carlos Barrios e Antonio Frasson, John Ward e Mohammad Jahanzeb: congresso de Gramado deste ano contou com participação especial da equipe do NCCN

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>> panorama

Dois grandes estudos conduzidos há aproximadamente 20 anos

procuraram avaliar se a detecção precoce da doença metastática interfere

no prognóstico e faz com que o tratamento seja mais eficiente com

aumento da sobrevida ou da chance de cura. No estudo de Del Turco e

cols, 1.243 pacientes foram randomizadas entre seguimento clínico com

consultas, exame físico e mamografia ou seguimento intensivo aos quais se

adicionavam radiografia de tórax e mamografia a cada seis meses. Foi

possí vel antecipar a recorrência no grupo com seguimento intensivo, mas

essa antecipação não levou a qualquer melhora nas taxas de sobrevida em

dez anos.5,6 O estudo do grupo italiano GIVIO também avaliou o seguimen-

to intensivo em 1.320 pacientes. Não houve benefício na qualidade de vida

ou sobrevida.7 Mais recentemente, uma revisão de Cochrane avaliou os

dados de todos os quatro estudos randomizados que testaram a eficácia

das dife rentes políticas de seguimento após o tratamento primário de

câncer de mama estádios I, II e III em 3.055 mulheres. Mais uma vez, não

houve dife rença em relação à sobrevida global ou à sobrevida livre de

doença, mesmo na análise de subgrupos considerando idade, tamanho de

tumor e linfonodos, reforçando a ideia de que seguimento baseado em

exame físico periódico e mamografia anual é tão efetivo quanto controle

mais intensivo baseado em testes laboratoriais e de imagem.8

Marcadores tumorais como CA 15.3 ou CEA podem antecipar a recor-

rência em cinco a seis meses, mas não há estudos prospectivos mostran-

do impacto favorável em relação a sobrevida, qualidade de vida, redução

de toxicidade ou custo-efetividade.10,14 Além disso, os níveis de CEA e CA

15.3 flutuam significativamente e sua sensibilidade e especificidade para

detecção de recorrência são baixas. Exames de imagem como tomografia

computadorizada realizada de rotina também não se mostraram úteis.13

Um pequeno percentual de pacientes com doença metastática limita-

da pode ser tratado com terapia multimodal envolvendo metastatectomia

e intenção “curativa”. Não se sabe se essas pacientes são mais bem identi-

ficadas através de um seguimento rigoroso. Em relação à metástase pul-

monar, em 416 pacientes em controle com exame do tórax, um estudo

diagnosticou apenas nove metástases pulmonares isoladas em 148 casos

de recidiva. Havia seis metástases solitárias e em cinco delas ocorreu nova

progressão da doença dentro de cinco meses.12 Metástase hepática geral-

mente significa doença disseminada, e menos de 10% das pacientes

evoluem com comprometimento hepático isolado. É pouco provável que

seguimento com tomografia computadorizada faça diferença.

Quando analisamos o potencial de um teste para diagnóstico de

recorrência, é preciso tomar cuidado, pois comparações não ajustadas

em relação ao momento do diagnóstico da recidiva (lead-time bias) ou

à velocidade de progressão da doença (length bias) podem dar a falsa

impressão de que a antecipação do diagnóstico (diagnóstico “precoce”)

traz benefício. Na realidade, apenas aumentamos o tempo de obser-

vação e/ou de tratamento ou tratamos aparentemente melhor patolo-

gias mais indolentes e de melhor prognóstico, mas o tempo de sobre -

vida permanece inalterado.9

Não se sabe se novos exames como PET-TC podem ajudar. PET-TC

é mais sensível que outros exames de imagem e marcadores tumorais

para detectar recorrência. Uma metanálise reviu os estudos com FDG-

PET na avaliação de recorrência e metástase em pacientes com câncer

de mama. A sensibilidade mediana foi de 92,7%, a especificidade me diana

de 81,6%, e a taxa de falso-positivo de 11%.11 Entretanto, o benefício em

relação à sobrevida ou à qualidade de vida não foi testado.

Provavelmente, mesmo em casos de recidiva diagnosticada precoce-

mente pelo PET, já estamos ante uma situação de doença relativamente

avançada em termos biológicos e a terapia atualmente disponível não é

tão eficaz a ponto de permitir que essa antecipação faça diferença. Além

disso, há muitas dúvidas em relação ao PET e a outros testes. Por exem-

plo, qual a população a ser avaliada com PET? Qual a periodicidade? Qual

o risco de segunda neoplasia induzida pela alta carga de irradiação repeti-

da com frequência? E em pacientes com risco de recidiva no sistema

nervoso central, como aquelas com tumor triplo-negativo ou HER-2 pos-

itivo, deve-se recomendar ressonância magnética do crânio? Se ela for

normal, quando deve ser repetida? Certamente, há muitas perguntas não

respondidas e espaço para testar prospectivamente o impacto de novos

exames como presença de células tumorais circulantes, novos mar-

cadores mais sensíveis e específicos e novos métodos de imagem.

Para o momento, seguem valendo diretrizes estabelecidas como as

da ASCO, que recomenda avaliação periódica com história clínica,

exame físico, autoexame da mama, mamografia, exame ginecológico,

imediata avaliação de novos sinais e sintomas e aconselhamento

genético para subgrupos com maior risco de câncer hereditário. As

pacientes devem ser orientadas quanto a sintomas que podem estar

relacionados à recorrência, como dor, dispneia, presença de nódulos e

cefaleia. Não se recomendam de rotina avaliação com exames de

sangue, marcadores tumorais, exames de imagem como cintilografia

óssea, ultrassonografia, tomografia computadorizada, ressonância mag-

nética ou PET.17 Claro que é mais fácil seguir tais recomendações quan-

do estamos atuando dentro de grandes instituições como o INCA ou o

MD Anderson, onde são estabelecidos protocolos de seguimento e con-

duta para pacientes oncológicos. Algumas vezes no consultório, frente a

frente com uma paciente de risco para recorrência, o médico deve ter

sensibilidade e flexibilidade e a conduta precisa ser individualizada.

Embora nossas pacientes se sintam mais seguras quando são acom-

panhadas de forma mais intensiva,15 tais exames não substituem atenção

médica e psicológica adequadas. A realização de exames, por vezes

desnecessários, pode gerar mais ansiedade ainda. Devemos lembrar tam-

bém que há muitos falso-positivos e negativos, que em muitas das vezes

o tratamento precoce só aumenta o tempo em que a paciente fica

exposta a esse tratamento e a sua toxicidade e que exames mais moder-

nos e sofisticados implicam maior custo, que nem sempre é efetivo.

Referências1. Jemal A et al. CA Cancer J Clin 60: 277-300, 2010.2. Giordano S H et al. Cancer 100: 44-52, 2004.3. Chia S K et al. Cancer 110: 973-979, 2007.4. Yamamoto N et al. J Clin Oncol 16: 2401, 1998.5. Del Turco M R et al. JAMA 271: 1593-1597, 1994. 6. Palli D et al. JAMA 281: 1586, 1999.7. The GIVIO Investigators. JAMA 271: 1587-1592, 1994. 8. Rojas et al. Cochrane Database Syst Rev 1: CD001768, 2005.9. Black W C and Welch H G. N Engl J Med 328: 1237-1243, 1993.10. Keshaviah et al. Ann Oncol 18(4): 701-708, 2007.11. Isasi et al. Breast Cancer Res Treat 90:105-112, 2005. 12. Rutgers E J et al. Br J Surg 76(2): 187-90, 1989.13. Drotman M B et al. Am J Roentgenol 176(6): 1433-1436, 2001.14. Molina R et al. Breast Cancer Res Treat 36(1): 41-48, 1995.15. Morris S et al. Postgrad Med J 68: 904-907,1992.16. Hiramanek H. Postgrad Med J 80: 172-176, 2004.17. ASCO Expert Panel. J Clinl Oncol 24: 5091-5097, 2006.

6 Revista GBECAM

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Revista GBECAM

Durante o evento Gramado 2010, os temas abordados do ponto de

vista cirúrgico incluíram: avaliação radiológica pré-operatória

antes de cirurgia conservadora; opções de tratamento cirúrgico para

tumores iniciais; uso da quimioterapia pré-operatória com finalidade de

tratamento conservador; papel da cirurgia em pacientes com doença

metastática; importância da ressecção de metástases em pacientes

com carcinoma metastático; e abordagem cirúrgica com mastectomia

(e o tipo de mastectomia), quando necessária.

Avaliação pré-operatória

O diagnóstico é baseado nos exames clínico, radiológico e patológico.

O exame radiológico consiste de mamografia bilateral exclusiva em

pacientes com mamas lipossubstituídas. Em pacientes mais jovens, ou

com mamas densas, ou com exame mamográfico falso-negativo, a

ultrassonografia mamária é o exame complementar de escolha. A

ressonância magnética mamária com contraste não é um procedi-

mento de rotina, mas deve ser realizada sempre que as informações

obtidas com mamografia e ultrassom forem consideradas insuficientes

para a escolha de um tratamento conservador seguro.

O exame patológico deve ser obtido preferencialmente através da

punção biópsia com agulha grossa (PAG), também denominada de tru-

cut ou core-biopsy. Em situações em que não for possível realizar uma

PAG, deve ser realizada uma punção aspirativa com agulha fina (PAAF).

Este método, porém, apresenta um maior número de falso-negativos,

além de não diferenciar entre lesão infiltrante e intraductal, nem permi-

tir avaliação imuno-histoquímica.

A avaliação pré-operatória das pacientes deve incluir: hemograma

completo, contagem de plaquetas, exames de coagulação (TP e KTTP),

testes funcionais hepáticos (TGO, TGP) e renais (creatinina) e fosfatase

alcalina. Os exames de rastreamento sistêmicos não são indicados em

pacientes assintomáticas (exceção nos casos de T3N1). Caso ocorra

alguma alteração nos exames sanguíneos ou a paciente apresente

algum sinal ou sintoma, indica-se uma investigação sistêmica.

A avaliação da patologia deve incluir tipo e grau histológico, deter-

minação de receptores hormonais, status do HER2 e avaliação de Ki67.

Tratamento cirúrgico

A cirurgia conservadora é preconizada nas pacientes que não apresen-

tem contraindicação (ver tabela ao lado).

A biópsia do linfonodo sentinela, realizada por equipe experiente na

técnica, é a cirurgia de escolha em pacientes com axila negativa.

Naquelas com axila clinicamente positiva podemos realizar PAAF ou

PAG, guiadas por ultrassonografia mamária, para avaliação do linfono-

do. Em casos de negatividade, realizamos linfonodo sentinela; em

casos de positividade, procede-se ao esvaziamento axilar diretamente.

Nos casos de mastectomia, devemos oferecer a oportunidade de

reconstrução mamária. Podemos realizar técnicas de oncoplástica ou

terapia neoadjuvante em pacientes com tumores unifocais de maiores

dimensões e que não apresentem outra contraindicação para o trata-

mento conservador, se a lesão tumoral diminuir de tamanho.

Quanto ao tipo de mastectomia, se clássica, com preservação de

pele ou com conservação de pele, aréola e mamilo, não há nenhum

estudo que tenha comparado as técnicas, e a opção por uma ou

outra é absolutamente empírica. No entanto, há uma grande

tendência mundial para a conservação da pele, aréola e mamilo,

sempre que o tumor se localizar longe do complexo areolomamilar

(distância supe rior a 3 cm), sendo o risco de recorrência cutânea e

subcutânea muito mais relacionado com as características biológi-

cas do tumor, com o tamanho do tumor e com sua distância em

relação à pele do que propriamente com a conservação do com-

plexo areolomamilar.

Quimioterapia neoadjuvante ou quimioterapia primária

Para pacientes com tumores unifocais que, em função do tamanho do

tumor, não sejam candidatas a cirurgia conservadora, a quimioterapia

pré-operatória pode ser uma alternativa viável tanto para aumentar as

chances de tratamento conservador quanto para testar a eficácia do

esquema quimioterápico escolhido. Em relação à biópsia do linfonodo

sentinela nessas circunstâncias, em pacientes com axila clinicamente

Antonio Frasson Professor adjunto doutor da Faculdade de Medicina da PUC-RS, coordenador do Centro de Mama daPUC-RS, Felipe Zerwes Professor assistente doutor da Faculdade de Medicina da PUC-RS e Betina Vollbrecht Médicaassistente mestre do Centro de Mama da PUC-RS

Avanços no manejo cirúrgico do câncer de mama

Contraindicaçõesabsolutas

Contraindicaçõesrelativas

- microcalcificaçõesextensas e difusas

- impossibilidade demargens livres

- lesões muito grandesem relação ao volumeda mama

- radioterapia torácicaprévia

- desejo da paciente

- gestação

- tumores multicêntricos

- tumores > 5,0 cm

- doenças vasculares docolágeno em atividade(lúpus ou esclerodermia,exceto artrite reumatoide)

- pacientes jovens commutação de BRCA

Contraindicações de cirurgia conservadora mamária

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Revista GBECAM

>> panorama

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negativa, ela pode ser realizada tanto antes quanto depois da

quimioterapia, sem vantagens conclusivas de uma alternativa sobre a

outra. Naquelas pacientes com linfonodos clinicamente suspeitos, é

aconselhável avaliá-los antes de começar o tratamento sistêmico. Isso

pode ser realizado utilizando punção aspirativa ou core-biopsy guiada

por ultrassonografia. Nos casos de linfonodos positivos pré-quimiote -

rapia, a recomendação é o esvaziamento axilar radical no momento da

cirurgia, seja ela conservadora, seja mastectomia.

Radioterapia

A radioterapia pós-operatória faz parte do tratamento conservador do

câncer de mama e a sua realização é fortemente recomendada.

O guideline de 2010 do NCCN (National Comprehensive Cancer

Network) americano, baseado em estudo randomizado (categoria 1 de

indicação), faz uma exceção para pacientes com 70 anos ou mais,

com pT1N0 e receptores hormonais positivos submetidas a cirurgia

conservadora (com margens livres). Nesses casos, a radioterapia pode

ser evitada quando utilizado tamoxifeno.

Quando a quimioterapia adjuvante for indicada, normalmente realiza-

se a radioterapia após a finalização da quimioterapia.

Tratamento sistêmico

O principal objetivo do tratamento sistêmico adjuvante é controlar

qualquer depósito remanescente de doença, reduzindo a taxa de

recidiva e melhorando a sobrevida a longo prazo.

Em outro artigo no Lancet em 2005, o EBCTCG analisou os efeitos

da quimioterapia e da hormonioterapia na recidiva local e na sobrevi-

da em 15 anos em pacientes com carcinoma de mama inicial.

Foram analisados 194 estudos randomizados iniciados em 1995,

com mais de 144 mil mulheres e 46 mil óbitos. Mulheres com recep-

tores hormonais positivos que receberam tamoxifeno por pelo menos

alguns anos tiveram uma melhora substancial na sobrevida a longo

prazo, independentemente de fatores como idade, status linfonodal e

quimioterapia concomitante. O maior benefício foi demonstrado em

pacientes que receberam cinco anos de tamoxifeno, com uma

redução média nos óbitos por câncer de mama em 15 anos de apro -

ximadamente 9%.

A proporção de mulheres que sobreviveram por pelo menos 15

anos após o tratamento quando elas tinham menos de 50 anos foi 10%

maior quando elas foram submetidas a alguns ciclos de poliquimiote -

rapia (mais de um agente) após a cirurgia. Entre mulheres de 50 a 69

anos, a melhora na sobrevida foi de 3%. Havia um número pouco

expressivo de pacientes acima de 70 anos nos estudos avaliados para

uma conclusão definitiva.

Os benefícios foram maiores para regimes que continham antraci-

clinas se comparados aos com CMF (ciclofosfamida, metotrexate e

5-fluorouracil). Mulheres pré-menopáusicas submetidas a ablação

ovariana, quando na ausência de quimioterapia, tiveram uma melhor

sobrevida a longo prazo.

A combinação de quimioterapia com antraciclina e tamoxifeno

pode reduzir o risco de óbito por câncer de mama em mais da metade

em mulheres com menos de 50 anos e um pouco menos em mulhe -

res de 50 a 69 anos.

Por incluir somente estudos que estavam finalizados em 2000,

este artigo não inclui estudos com inibidores da aromatase, taxanos e

trastuzumabe.

O guideline da NCCN de 2010 coloca os taxanos na lista de

regimes de adjuvância preferenciais, geralmente em esquemas con-

tendo também antracíclicos.

O mesmo guideline e as recomendações da Sociedade Europeia

de Oncologia Clínica (ESMO) indicam trastuzumabe para todas as

pacientes com HER2 + com tumores acima de 1 cm ou com axila po -

sitiva com qualquer dimensão tumoral, acompanhado de quimiote -

rapia adjuvante. As indicações de inibidores da aromatase podem ser

mais bem estudadas no capítulo específico de hormonioterapia.

Cirurgia mamária em paciente com doença metastática, ou cirur-

gia da metástase em pacientes com câncer de mama

Apesar de não existirem estudos randomizados que demonstrem os

benefícios da ressecção de tumores mamários em pacientes que apre-

sentem doença sistêmica, estudos pareados têm demonstrado os

benefícios da remoção de doença grosseira, tanto mamária quanto

extramamária, em pacientes com doença sistêmica. A maior sobrevi-

da observada, que pode ser decorrente apenas de uma seleção de

pacientes que vão a cirurgia e que têm melhor prognóstico, acaba

sendo um fator motivador importante para o controle global de

pacientes com doença grosseira. Por esse motivo, e de um modo

geral, após uma avaliação sistêmica cuidadosa, pacientes com doença

localizada não letal de imediato tendem a ser manejadas cirurgica-

mente sempre que a cirurgia for possível, no sentido de extirpar

doença grosseira e contribuir para o controle local e sistêmico de

pacientes no estádio IV.

Conclusão

A abordagem da paciente com tumor inicial deve ser multidisciplinar

com planejamento terapêutico inicial, que deve prever tipo de cirurgia

(setorectomia, mastectomia, adenomastectomia), tipo de reconstrução

(retalhos locais, mamoplastias, reconstrução com prótese ou expansor,

lembo miocutâneo), uso de radioterapia (parcial ou total) e necessidade

de tratamento sistêmico. Essa reflexão inicial é importante para evitar

que uma atitude cirúrgica intempestiva inviabilize algumas das opções

terapêuticas ou sequência em que elas deveriam ser realizadas.

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Ponto de vista

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Ofato de o estrógeno isolado causar

grande aumento do câncer de endo -

métrio já era bem conhecido nos anos 90.

Uma metanálise de Grady em 1996, abran -

gendo 30 estudos randomizados, mostrava

que o uso na menopausa de estrógenos iso-

lados (”unopposed estrogen therapy”) au -

men tava significativamente (em até quatro

vezes) o risco de câncer de endométrio, e

que esse risco persistia bastante elevado

mesmo muitos anos após a parada do uso de

estrógenos. Por esse motivo, a reposição

hormonal passou a ser feita, em mulheres

não histerectomizadas, com a combinação

de estrógeno e progestágenos (e+p). O

estró geno seria o componente útil no trata-

mento dos sintomas da menopausa,

enquanto a progesterona teria o efeito prote-

tor sobre o endométrio.

Entretanto, o aumento do risco de

câncer de mama com o uso de TRH com a

combinação estrógeno + progestágeno ficou

de monstrado no estudo conhecido como

WHI (Women’s Health Initiative), publicado

em 2002. Nesse estudo, 16.608 mulheres

foram randomizadas para receber a combi-

nação de E+P (estrógenos equinos conjuga-

dos 0,625 mg/dia + acetato de medroxipro -

gesterona 2,5 mg/dia) ou placebo. Uma breve

nota no JAMA-Express em julho daquele ano

informava que o comitê de segurança do

estudo recomendara sua suspensão, uma

vez que, após 5,2 anos de seguimento, havia

aumento de risco não só de câncer de

mama, mas também de doença cardiovas-

cular, tromboembolismo pulmonar e aci-

dente vascular cerebral. Para câncer de

mama, o hazard ratio atingira naquele

momento 1,26 (IC95%=1,00-1,59). Numa

análise do mesmo estudo, mais específica

para a relação entre câncer de mama e TRH,

Chlebowski1 publicou em janeiro de 2003,

também no JAMA, que a combinação E+P

aumentara o número absoluto de casos de

câncer de mama de 185 para 245, com um

hazard ratio de 1,24, com valor estatístico

altamente significante. O grau e o tipo his-

tológico não variaram, mas o tamanho dos

tumores era maior e o estádio inicial era mais

avançado no grupo que recebeu a combi-

nação E+P do que no grupo placebo.

Ainda em 2003, Beral2 relatou o estudo

britânico Million Women Study, no Lancet.

Nele, dados similares foram observados: um

aumento significativo de câncer de mama

nas mulheres que faziam uso da combi-

nação de E+P, de tibolona e mesmo de

estrógenos isolados. O risco da combinação,

entretanto, foi bem maior para a combi-

nação E+P, com um hazard ratio de 2,00

(IC95%=1,88-2,12), p<0,0001 (HR = 1,45 para

tibolona; HR = 1,30 para estradiol isolado).

Numa atualização do WHI apresentada

recentemente na ASCO de 2010, Chle -

bowski, agora apresentando dados de 41.449

mulheres observadas ao longo do período

total de 11 anos, mostrou que não só houve

mais câncer de mama no grupo que rece-

beu TRH (385 vs. 295 casos) como também

esses tumores tinham mais risco de com-

prometer a axila (p=0,02). A mortalidade di -

retamente atribuída ao câncer de mama

tam bém foi maior, bem como a morte por

qualquer causa após o diagnóstico do

câncer de mama.

Com a publicação inicial do estudo

WHI, seguida pela publicação do estudo

britânico, o número das usuárias de TRH

nos EUA começou a cair já em 2002 e caiu

abruptamente, em mais de 40%, em 2003.

Prova velmente como consequência disso,

a partir desse mesmo ano foi observada,

pela primeira vez na história, uma queda

no número absoluto de casos de câncer de

mama no país. Ravdin apresentou na

ASCO de 2007 uma avaliação da incidên-

cia de câncer de mama nos EUA no perío-

do de 2002 a 2004, mostrando queda de

cerca de 7% no número de casos de

câncer de mama. Essa queda foi observada

em todos os estados do país, e restringiu-

se aos casos de câncer de mama com

receptores hormonais positivos.

Em agosto de 2010, T. Saxena et al. pu -

blicaram um novo estudo3 observacional de

professoras da Califórnia no qual demons -

tram que mulheres que usaram estrógeno

por mais de 15 anos tiveram um risco 19%

maior do que as mulheres que nunca haviam

usado estrógeno. As mulheres que haviam

usado a combinação E+P, entretanto, apre-

sentaram um risco 83% maior do que as que

Relação entre o emprego de terapia de reposiçãohormonal (TRH) e câncer de mama: novos dados

Atualizações em câncer de mama

Por Sergio D. Simon

Uma seleção e análise dos principais artigos

internacionais nos últimos meses

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Ponto de vista

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nunca haviam feito TRH. Foram estudadas

56.867 mulheres peri e pós-menopausadas,

das quais 2.857 (5%) apresentaram carcinoma

invasivo de mama, num seguimento media -

no de 9,8 anos. Um dado interessante do

estudo é que o risco foi proporcionalmente

maior quanto maior o tempo de exposição,

mas somente para as mulheres com índice

de massa corporal (IMC) < do que 29,9 kg/m2,

mas não para as obesas (IMC>30). Outro dado

significativo foi que esse risco se restringia

não só aos tumores que tinham receptores

de estrógeno e de progesterona positivos,

como também aos tumores HER2+, fato

ainda não conhecido.

Esse estudo recente de Saxena traz

alguns dados provocativos. Primeiramente,

chama a atenção o fato de haver aumento do

risco para tumores HER2+. Esse fato

aparentemente surpreendeu os próprios

autores, uma vez que se acredita que

reposição hormonal afete somente células

hormônio-dependentes, aumentando o nú -

mero de tumores hormônio-dependentes,

que seriam estimulados pela TRH. Como

existe uma relação inversa entre presença de

receptores hormonais e presença de amplifi-

cação do gene HER2, será necessária maior

investigação nessa área. É possível que se

trate de artefato estatístico, mas, por outro

lado, não se pode ignorar um achado que

atinge significância num estudo desse porte.

Segundo, o risco de câncer de mama aumen-

ta significativamente nas mulheres com

sobrepeso, mas parece não se modificar nas

mulheres obesas. É possível que o aumento

de estradiol sérico causado pela TRH seja

mais importante para as mulheres não obe-

sas, uma vez que as obesas, por serem porta-

doras de grande massa de tecido adiposo e,

consequentemente, de grande quantidade de

aromatase, já apresentam um nível circulante

de estrógenos mais elevado. Nesse caso, o

estrógeno adicional da TRH faria pouca dife -

rença no aumento de risco.

Esses conhecimentos recentes têm le -

va do a uma mudança profunda no câncer

de mama. Primeiramente, a própria epi-

demiologia da doença parece haver muda-

do. Numa recente revisão epidemiológica da

doença, Verkooijen e colaboradores4 mos -

tram que entre os períodos de 2001-2002 e

2005-2006 houve uma queda muito signifi-

cante, de cerca de 22%, na incidência de

câncer de mama observada nos EUA e em

vários países europeus. Temporalmente,

essa queda está certamente relacionada à

diminuição no uso da TRH. Essa diminuição

de incidência de mama tem sido bem mais

acentuada nas mulheres na faixa de 50-60

anos, e tem sido maior entre os tumores

RH+. Em segundo lugar, houve uma

mudança importante de atitude por parte

das mulheres nesses países: há muita

resistência por parte delas ao uso da TRH, e

esta tem sido de duração muito mais curta.

Mesmo assim, estima-se que, ainda hoje,

cerca de 30 milhões de mulheres ameri-

canas ainda façam uso de TRH.

A dimensão do problema ainda não é

bem conhecida em nosso meio, mas a

grande quantidade de dados apresentados

na última década deve levar a mudanças

significativas no uso da TRH também no

Brasil. Recomenda-se uma discussão ampla

dos riscos e benefícios com cada paciente

que tenha real indicação de TRH.

Referências:

1. Chlebowski RT, Hendrix SL et al.: Influence

of estrogen plus progestin on breast cancer

and mammography in healthy post-

menopausal women: The Women’s Health

Initiative trial. JAMA. 2003 Jun

25;289(24):3243-53.

2. Beral V: Breast Cancer and hormone-

replacement therapy in the Million Women

Study. Lancet 2003 Aug 9;362(9382):419-27.

3. Saxena T, Lee E et al.: Menopausal hor-

mone therapy and subsequent risk of speci -

fic invasive breast cancer subtypes in the

California Tea chers Study. Cancer Epidemiol

Biomarkers Prev. 2010 Sep;19(9):2366-78.

Epub 2010 Aug 10.

4. Verkooijen HM, Bouchardy C et al.: The

incidence of breast cancer and changes in

the use of hormone replacement therapy: a

review of the evidence. Maturitas. 2009 Oct

20;64(2):80-5. Epub 2009 Aug 25.

Dois estudos recentes mostram que o

estudo cuidadoso da imuno-histo-

química do câncer de mama de uma

paciente pode auxiliar na escolha dos me -

lhores agentes quimioterápicos para o

tratamento adjuvante.

No primeiro deles, Hugh e colabo-

radores1, em nome dos pesquisadores do

BCIRG, investigaram o papel prognóstico e

preditivo da tipagem em subgrupos mole-

culares de câncer de mama nas pacientes

do estudo BCIRG0012 (também conhecido

como “TAC vs. FAC”). Esse estudo, de 1.491

mulheres, mostrara vantagem de sobrevida

livre de progressão e sobrevida global para

as pacientes que haviam recebido a com-

binação de docetaxel na adjuvância. Num

seguimento mediano de 55 meses, a taxa

de sobrevida livre de doença (o endpoint

primário do estudo) era de 75% para as

pacientes do grupo TAC, vs. 68% para as

pacientes do grupo FAC, representando

uma redução de 28% no risco de recidiva.

A sobrevida global estimada aos cinco

anos era de 87% para o grupo TAC vs. 81%

para o grupo FAC, resultando numa

diminuição de 30% do risco de morte.

Baseado nesse estudo, o TAC passou a ser

um dos protocolos de tratamento adju-

vante mais utilizados em vários países do

Imuno-histoquímica pode auxiliar na escolha da quimioterapia adjuvante

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mundo, inclusive no Brasil.

Nesse estudo, 1.350 casos (91% dos

casos do estudo original) tiveram sua

imuno-histoquímica revista e, como resulta-

do, as pacientes foram classificadas em qua-

tro subtipos tumorais: 1) “Triplo-negativas”

(RE-, RP-, HER2-); 2) “HER2 positivas” (RE-,

RP-, HER2+); 3) Luminal B (RE+, RP+ e ou

HER2+ ou KI67 elevado); e 4) Luminal A

(RE+, RP+, HER2 negativo e Ki67 baixo).

É importante lembrar que os estudos de

imuno-histoquímica e FISH foram todos

realizados em laboratório central e lidos

exclusivamente por uma única patologista (a

própria dra. Judith Hugh). Ao final da análise,

14,5% das pacientes foram subclassificadas

como “triplo-negativas”, 8,5% como “HER2

positivas”, 61,1% como “Luminal B” e 15,9%

como “Luminal A”.

Analisada como um todo, a população

tratada com docetaxel teve um hazard ratio

de 0,73 (IC95%= 0,58-0,91, p=0,051). As

pacientes do grupo Luminal B mostraram

uma melhora estatisticamente significativa de

SLD, favorecendo o docetaxel, com SLD aos

três anos de 85,2% vs. 70% (HR = 0,66, IC95%

= 0,46-0,95, p=0,025). Houve diferença mar-

ginal favorecendo o esquema TAC nos sub-

grupos triplo-negativo e HER2 positivas, com

SLD aos três anos de 73,5% vs. 60% e 76,4% vs.

60,3%, respectivamente (p=0,051 e 0,068,

respectivamente). Já no grupo Luminal A não

houve nenhuma diferença quanto ao tipo de

quimioterapia utilizada: 92,2% e 89,3% de SLD

com TAC e FAC, respectivamente (p=0,472).

O segundo estudo nessa área é de

Penault-Llorca e colaboradores3, que uti-

lizam o valor do Ki67 para avaliar o efeito da

introdução do docetaxel na adjuvância. O

antígeno Ki67 (também conhecido como

KI67 ou MKI67) é uma proteína de localiza-

ção nuclear codificada pelo gene MKI 67.

Aparentemente, essa proteína é importante

na proliferação celular e está associada à

transcrição de RNA no ribossomo, uma vez

que a inativação do Ki67 leva à inibição da

síntese ribossomal de RNA. Na interfase, sua

localização é puramente nuclear, mas

durante a mitose o antígeno migra para a

superfície dos cromossomas. Ele pode ser

localizado em todas as fases proliferativas da

célula (G1, S, G2 e mitose), mas não na fase

de repouso (G0), sendo, portanto, um exce-

lente marcador de proliferação.

Os autores analisaram a relação entre o

Ki67 e o efeito do docetaxel nas pacientes

receptor de estrógeno-positivas que haviam

participado do estudo francês PACS01. No

estudo original4, 1.999 pacientes com câncer

de mama linfonodo positivo haviam sido ran-

domizadas para receber seis ciclos de FEC100

ou três ciclos de FEC100, seguidos de três ci -

clos de docetaxel 100 mg/m2, demonstrando

uma redução de 17% no risco de recidiva

(HR=0,83, IC95%=0,69-0,99). Das 1.999

pacien tes do estudo original, 1.190 espécimes

foram coletados (55% dos casos), dos quais

798 foram classificados como RE-positivos e

incluídos nesse estudo. O ponto de corte do

escore de Ki67 foi de 20% (positivo = escore >

20%). Os grupos Ki67-negativos e Ki67-posi-

tivos foram bem balanceados quanto à idade,

tamanho do tumor e número de linfonodos

acometidos. Em termos de grau tumoral, as

pacientes Ki67-negativas tinham tumores

graus 1 e 2 em 91% dos casos, enquanto as

Ki67-positivas tinham tumores graus 1 e 2 em

apenas 48% dos casos, certamente devido à

diferente biologia desses dois grupos de

tumores. 79% dos tumores foram tidos como

Ki67-negativos (escore de Ki67 <20%) e 21%

foram classificados como Ki67-positivos

(escore > 20%).

Quando analisadas em relação à eficácia

da droga, viu-se que o hazard ratio de TAC

vs. FAC foi de 0,51 (0,26-1,01) para as

pacientes com Ki67 elevado. Já para as

pacientes Ki67-negativas, o HR foi de 1,03

(0,69-1,55). A sobrevida livre de doença aos

cinco anos foi de 81% vs. 84% nas pacientes

Ki67 negativas e positivas tratadas com

FEC/Taxotere, enquanto a SLD foi de 81% vs.

62% nas pacientes Ki67 negativas e positivas

tratadas com FEC somente. Ou seja, para as

pacientes com Ki67 alto, a introdução do

docetaxel aumentou a SLD de 62% para 81%,

enquanto nas pacientes com Ki67 baixo

praticamente não houve modificação da SLD

com a introdução do taxano.

Assim, ambos os estudos demonstram

que os tumores classificados como Luminal

A (estudo de Hugh) ou os tumores com RE-

positivos com baixo índice proliferativo

(estudo de Penault-Llorca) não se benefi -

ciam, na prática, de taxanos na adjuvância.

Isso vai de acordo com dados pré-clínicos,

que mostram que células muito ricas em

receptores hormonais são geralmente de

crescimento lento e, portanto, são relativa-

mente insensíveis a agentes quimioterápicos

que agem preferencialmente na fase de

divisão celular. Tendo-se em conta que os

tumores do tipo Luminal A são, em muitas

séries, os mais frequentemente diagnostica-

dos, especialmente na população pós-

menopausa, esses achados de imuno-histo-

química têm implicações práticas impor-

tantes na escolha da quimioterapia adju-

vante mais apropriada para essas pacientes.

Além disso, fica ressaltada a importância do

docetaxel para as pacientes de subgrupos

mais agressivos, ou de Ki67 mais elevado.

Referências:

1. Hugh J, Hanson J et al.: Breast cancer sub-

types and response to docetaxel in node-

positive breast cancer: use of an immuno-

histochemical definition in the BCIRG 001

trial. J Clin Oncol 2009 27:1168-1176.

2. Martin M, Pienkowski T et al.: Adjuvant

docetaxel for node-positive breast cancer. N

Engl J Med 2005; 352:2302-2313.

3. Penault-Llorca F, André F et al. Ki67

expression and docetaxel efficacy in patients

with estrogen-receptor positive breast can-

cer. J Clin Oncol 2009 27:2809-2815.

4. Roché H, Fumoleau P et al.: Sequential

adjuvant epirubicin based and docetaxel

chemotherapy for node-positive breast can-

cer patients : The FNCLCC PACS01 Trial. J

Clin Oncol 2006 24: 5664-5671.

Imuno-histoquímica pode auxiliar na escolha da quimioterapia adjuvante(continuação)

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Ponto de vista

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Sem dúvida, um dos avanços mais impor-

tantes da oncologia moderna nas últimas

duas décadas foi o desenvolvimento do con-

ceito do tratamento individualizado. Embora

do ponto de vista intuitivo todos reconhe -

çamos que existe uma heterogeneidade

importante na evolução de casos teorica-

mente semelhantes da perspectiva clínica,

somente nos últimos anos é que desenvolve-

mos a capacidade de separar pacientes segun-

do critérios bem definidos, com vantagens

prognósticas e preditivas. A consequência

prática desse conceito é identificarmos esses

subgrupos de forma diferente, a ponto de não

somente tratarmos esses pacientes de maneira

distinta, mas também de desenvolvermos

pesquisa em cada grupo, separadamente.

Permanece sem explicação como, por

tanto tempo, não fizemos uma diferencia -

ção clara entre as populações de pacientes

com ou sem expressão de receptores hor-

monais. Inúmeros estudos foram desenha -

dos e conduzidos sem uma preocupação

com o conceito de que a expressão hor-

monal poderia identificar doenças de com-

portamento biológico diferente.

Essa dificuldade parece finalmente estar

sendo superada. A identificação da anormali-

dade de HER2, receptor de membrana que é

parte de uma família de receptores de fatores

de crescimento, tem sido instrumental nesse

processo coletivo destes últimos 20 anos. De

uma expressão normal de apenas 1.000-

2.000 moléculas de HER2 por célula, esse

subgrupo de tumores passa a apresentar

2.000.000 de moléculas na sua membrana,

com consequências biológicas importantes.

Outro elemento crítico para a nossa evolução

nesse sentido tem sido a capacidade, pratica-

mente universal, de identificar esses tumores/

pacientes com a técnica de imuno-histo-

química, que democratizou nossa habi lidade

de subclassificar o câncer de mama.

O desenvolvimento do anticorpo trastu -

zu mabe, dirigido especificamente a bloquear

a sinalização alterada de HER2 nesse grupo

de tumores, levou sem dúvida a uma mudan -

ça na história natural da doença nessas

pacientes. Primeiro foram as evidências de

aumento na sobrevida de pacientes com

doença metastática. Depois, dados de vários

estudos demonstraram melhor prognóstico

para as pacientes que recebiam esse anticor-

po de forma adjuvante e neoadjuvante.

Mesmo assim, a caracterização de subgrupos

de câncer de mama com história natural e

prognóstico diferentes ainda carecia de uma

comparação prognóstica com outros grupos.

Num artigo publicado no Journal of

Clinical Oncology, Dawood e colaboradores

revisam de forma retrospectiva as evoluções

de pacientes com câncer de mama avançado

tratadas no MD Anderson Cancer Center. As

pacientes são separadas em três grupos,

segundo expressão de receptores por imuno-

histoquímica: pacientes com expres são de

receptor HER2 que não receberam trastu -

zumabe; pacientes com expressão de HER2

que receberam trastuzumabe; e, finalmente,

pacientes sem expressão de HER2 tratadas

com quimioterapia. A evolução desses gru-

pos foi posteriormente comparada. Embora

os autores reconheçam as limitações desse

tipo de trabalho, a análise demonstrou, de

forma clara, que o prognóstico das pacientes

HER2 positivas se modificou com a intro-

dução do tratamento específico.

O prognóstico da doença HER2+ é pior

do que o das pacientes que não apresentam

essa alteração. O tratamento com trastuzu -

mabe, no entanto, melhora tal prognóstico,

tornando-o equivalente àquele das pacientes

HER2-. Mesmo retrospectiva, a análise repre-

senta a confirmação de um impacto clinica-

mente evidente na nossa prática clínica.

Um único reparo que poderia ser acres-

centado às limitações da análise é a diferen -

ciação do grupo HER2- entre as triplo-nega-

tivas (receptores hormonais e HER2 negati-

vas) e aquelas ER ou PR positivas e HER2-.

Isso provavelmente resultaria em duas cur-

vas de sobrevida muito diferentes, melhoran-

do a sobrevida daquelas que expressam

receptores hormonais – onde encontramos

as Luminais A e B – ao serem retiradas do

grupo as pacientes de pior prognóstico sem

expressão desses receptores. Seria interes-

sante saber se o resultado final seria o

mesmo. Os autores reconhecem parcial-

mente tal situação numa res posta ao ques-

tionamento de um grupo italiano, que

comentou um estudo fase II prospectiva-

mente realizado, no qual as diferenças entre

os dois grupos de pacientes (HER2+ e

HER2-) foram inicialmente observadas.

Referências:

1. Sorlie T, Perou CM, Tibshirani R, et al.:

Gene expression patterns of breast carcino-

mas distinguish tumor subclasses with clini-

cal implications. Proc Natl Acad Sci U S A

98:10869-10874, 2001.

2. Slamon DJ, Clark GM, Wong SG, et al.:

Human breast cancer: Correlation of relapse

and survival with amplification of the HER-

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7. Ferretti G, Fabi A, Felici A, et al.: Improved

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HER2-positive breast cancer compared with

those with HER2- negative disease. J Clin

Oncol 28:e337, 2010.

Considerações sobre o impacto da introdução de terapias biológicasdirigidas (trastuzumabe) no tratamento do câncer de mama

12

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Revista GBECAM

Adoença receptor hormonal positiva é bio-

logicamente heterogênea: nem todas as

pacientes que expressam receptores respon-

dem da mesma forma às manipulações

endócrinas. Mesmo reconhecendo a pre-

sença de receptores hormonais como um

aspecto importante para caracterizar o câncer

de mama, nossa capacidade para diferenciar

diferentes populações dentro desse grupo

ainda deve ser considerada muito limitada.

Um dos aspectos de maior limitação nesse

sentido é não conhecermos de forma adequa-

da os mecanismos por meio dos quais a

doença originalmente endócrino-sensível se

torna resistente. Aparentemente, a célula

tumoral no início depende da sinalização

através dos receptores de estrógeno e proges-

terona para sobrevivência e crescimento.

Quando tal sinalização é bloqueada com algu-

ma estratégia endócrina, essa célula desenvolve

estímulos através de vias alternativas para subs -

tituir e manter seus processos fundamentais.

A sinalização alternativa através de recep-

tores de fatores de crescimento representa um

mecanismo de desenvolvimento de resistên-

cia endócrina que vem sendo reconhecido

como uma das formas que a célula tumoral

utiliza para burlar o bloqueio hormonal. Tal

conceito é importante porque levanta a possi-

bilidade de estabelecermos um bloqueio con-

comitante, tanto da sinalização da via hor-

monal quanto da via de fatores de crescimen-

to, como uma estratégia de tratamento que

possa ser mais eficaz e retardar ou evitar o

desenvolvimento de resistência hormonal.

Dados pré-clínicos em modelos animais

sugerem que a combinação de diferentes

agentes alvo-dirigidos apresenta maior eficá-

cia contra linhagens celulares com expressão

tanto de receptores hormonais como de

HER2. Do ponto de vista clínico, essa situação

identifica um subgrupo particular de pacien -

tes com câncer de mama que poderia ser

chamado de “triplo-positivo”. Pouco conhe -

cemos da biologia específica desses tumores,

que, provavelmente, são classificados por sua

expressão genética entre os tumores Lu -

minais B. A percepção é que, neles, existe

uma resistência parcial ao tratamento hor-

monal ou pelo menos menor sensibilidade à

manipulação endócrina.

Entre os mecanismos de resistência

primária ao tratamento hormonal reconhece-

mos a hiperexpressão de EGFR ou de HER2,

por isso o bloqueio concomitante das duas

vias tem sido considerado uma alternativa te -

rapêutica. Dois estudos randomizados de fa -

se III têm explorado estratégia. O primeiro,

TAnDEM, tratou pacientes com câncer de

ma ma metastático com HER2 e receptor hor-

monal positivo. As pacientes foram rando -

mizadas a receber anastrozol como agente

único ou a combinação de anastrozol com

trastuzumabe. Várias informações foram ge -

radas com esse estudo. A primeira é que a

resposta ao tratamento hormonal isolado

nesse grupo de pacientes é muito pobre, de

apenas 6%. O tempo para progressão também

é muito curto, 2,4 meses. Esses números ates-

tam para a relativa resistência desses tumores

a manipulações hormonais. A combinação

com o bloqueio concomitante da via HER2

com o anticorpo monoclonal resultou numa

melhor resposta e num prolongamento signi-

ficativo no tempo para progressão, 4,8 meses

(p=0,0016), confirmando que o bloqueio das

duas vias oferece melhores resultados.

O segundo estudo, de Johnston e colabo-

radores, analisou pacientes com câncer de

mama metastático com receptores hormonais

positivos. Mais de 1.200 pacientes foram incluí-

das, independentemente da expressão de

receptores hormonais, na projeção de que

cerca de 120 delas também fossem HER2+. As

pacientes foram randomizadas a receber letro-

zol como agente único ou a combinação do

inibidor de aromatase (IA) com lapatinibe.

Tanto a resposta objetiva (15% vs. 28%) quanto

o tempo para progressão (3,0 vs. 8,2 meses)

foram superiores para o grupo tratado com o

bloqueio duplo.

Na população HER2 negativa não houve

diferenças significativas, embora uma análise

retrospectiva tenha demonstrado que o sub-

grupo que apresentava progressão de

doença em menos de seis meses de descon-

tinuação do tamoxifeno (“mais resistente”)

parecia apresentar maior benefício com o

uso da combinação quando comparado ao

IA isolado. Essa análise foi retrospectiva e não

atingiu significância estatística, devendo por-

tanto ser considerada exploratória.

Com essas evidências, podemos concluir

que essa população triplo-positiva tem, em

geral, uma sobrevida livre de progressão muito

curta com hormonioterapia, é relativamente

resistente ao tratamento endócrino isolado e

que esses resultados parecem melhorar com a

combinação de hormonioterapia e bloqueio da

via do HER2. Uma pergunta que permanece

sem resposta é a relativa vantagem de tratar

esse grupo de pacientes com quimioterapia.

Nenhum estudo até agora abordou esse ques-

tionamento de forma definitiva.

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Crosstalk between the estrogen receptor and

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Implicações do bloqueio de múltiplas vias: o “crosstalk”entre os receptores hormonais e HER2

13

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Apesquisa clínica é o único método eficaz

para a incorporação de novas terapias à

prática médica. Somente através da chamada

medicina baseada em evidências podemos dar

passos concretos na direção dos avanços no

entendimento e do tratamento do câncer.

É esse o caso do câncer de mama: uma

patologia complexa, que exige sempre um

grande número de estudos clínicos, com dife -

rentes perguntas científicas a ser respondidas. A

realização de tais estudos clínicos, porém, com

o cuidado ético e a precisão científica

necessários, só seria possível se houvesse um

grande esforço conjunto de investigadores e

centros de pesquisa.

A partir dessa premissa, um grupo de

oncologistas brasileiros interessados e compro-

metidos com o estudo e o tratamento do

câncer de mama fundou, em 11 de março de

2005, o Grupo Brasileiro de Estudos do Câncer

de Mama (GBECAM), organização indepen-

dente e sem fins lucrativos, cujo principal obje-

tivo é desenvolver, implementar e facilitar a

realização de estudos clínicos multi-institu-

cionais de qualidade científica e ética em cân -

cer de mama no Brasil, bem como implemen-

tar e auxiliar programas educativos de esclare -

cimento e prevenção da doença.

Sediado em São Paulo, o GBECAM conta

hoje com membros em 32 grandes centros de

câncer no Rio Grande do Sul, Santa Catarina,

São Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais, Goiás,

Rio Grande do Norte e Bahia. Espera-se uma

abrangência nacional nos próximos três anos.

O GBECAM participa atualmente de vários

protocolos clínicos internacionais. Também

estão em andamento alguns protocolos

nacionais, originados pelo próprio grupo.

Os estudos clínicos conduzidos pelo GBE-

CAM são inicialmente selecionados para

atender às necessidades das pacientes de

câncer de mama – somente então eles são

distribuídos entre instituições e investi-

gadores afiliados pelo país. Os estudos são

preparados e desenvolvidos em parceria com

as áreas de desenvolvimento e pesquisa de

indústrias farmacêuticas e grupos coopera-

tivos internacionais, como o Grupo Inter -

nacional de Mama (BIG), a Coalizão Ibero-

Americana de Pesquisa em Oncologia Ma -

mária (CIBOMA) e o Grupo Español de Inves -

tigación del Cáncer de Mama (GEICAM). Há

ainda estudos de iniciativa do próprio GBE-

CAM, através de seus membros e de sua

comissão científica.

Promover uma reunião brasileira sobre o

câncer de mama é uma das metas iniciais já

alcançadas pelo GBECAM. A Conferência

Brasileira de Câncer de Mama, rumo à sua quin-

ta edição, é realizada anualmente e foca nos

principais trabalhos apresentados na reunião

anual de San Antonio, no Texas, EUA. Ela reúne

em São Paulo cerca de 500 profissionais de

todo o Brasil, entre oncologistas clínicos, mas-

tologistas, radiologistas e patologistas envolvi-

dos no tratamento do câncer de mama.

Estudos em andamentoCIBOMA 2004/01

O estudo CIBOMA 2004/01 é um estudo mul-

ticêntrico, fase IV/III, aberto, randomizado, que

avalia a eficácia de capecitabina (Xeloda) após

quimioterapia neoadjuvante e/ou adjuvante

padrão em pacientes com câncer de mama

ressecável, triplo-negativo. O objetivo primá -

rio desse estudo é comparar a sobrevida livre

de doença cinco após a terapia de manu -

tenção, com oito ciclos de capecitabina, à

observação, em pacientes com câncer de

mama operável, triplo-negativo, que recebe -

ram tratamento quimioterápico neoadjuvante

e/ou adjuvante padrão.

Esse estudo internacional randomizará 876

mulheres portadoras de câncer de mama tri -

plo-negativo na Espanha, Brasil, México, Chile,

Colômbia e Venezuela. A primeira paciente foi

recrutada em outubro de 2006 e o recrutamen-

to será concluído em dezembro de 2010. As

pacientes do braço A receberão capecitabina

1.000 mg/m2, duas vezes ao dia durante

14 dias, seguidos de um período de descanso

de sete dias, durante oito ciclos. As pacientes

do braço B serão apenas observadas. Todas as

pacientes serão acompanhadas por cinco anos.

O estudo CIBOMA é uma iniciativa da

Coalizão Ibero-Americana de Pesquisa em

Oncologia Mamária (CIBOMA), com apoio do

laboratório farmacêutico Roche.

Participam desse estudo nove centros

nacionais, e até 1º de setembro de 2010

Um grupo pioneiro

14 Revista GBECAM

>> mais GBECAM

Criado há cinco anos por um grupo de oncologistas, o GBECAM

hoje se firma como referência na elaboração e desenvolvimento

de estudos clínicos na área de câncer de mama

Por Cláudia Vasconcelos

Divu

lgaç

ão

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15Revista GBECAM

foram recrutadas 207 pacientes brasileiras.

Destas, 128 foram randomizadas para o estu-

do. O Brasil é o segundo país com maior

recrutamento, atrás somente da Espanha, país

idealizador do protocolo.

ALTTO

O estudo ALTTO é um estudo internacional,

randomizado, multicêntrico, fase III de lapa-

tinibe, trastuzumabe, sequenciamento ou com-

binação dessas drogas no tratamento adjuvante

de pacientes portadores de câncer de mama

HER2 positivo (Study no. BIG 2-06/N06D/

EGF106708). O objetivo primário desse estudo é

comparar a sobrevida livre de doença entre os

braços contendo lapatinibe e o braço monoter-

apia trastuzumabe.

O estudo ALTTO está sendo conduzido em

1,3 mil centros de 50 países. A primeira paciente

foi recrutada em junho de 2007. Os pacientes

serão tratados por 52 semanas e acompa -

nhados por dez anos.

O estudo ALTTO é uma iniciativa de dois

grupos acadêmicos – Breast International Group

(BIG) e North Central Cancer Treatment Group

(NCCTG) – e é patrocinado pela GlaxoSmithKline.

Participam desse estudo dez centros

brasileiros. Até 1º de setembro de 2010 foram

recrutadas 124 pacientes brasileiras e, destas, 98

foram randomizadas para o estudo.

NeoALTTO

O estudo NeoALTTO (Neo-adjuvant lapatinib

and/or Trastuzumab Treatment Optimisation

Study) é um estudo internacional randomiza-

do, multicêntrico, fase III de neoadjuvância

com lapatinibe, trastuzumabe ou sua combi-

nação com paclitaxel em câncer de mama

HER2 positivo.

Esse estudo recrutou 450 mulheres porta-

doras de câncer de mama HER2 positivo em 30

países. A primeira paciente foi recrutada em

setembro de 2007 e o recrutamento foi encer-

rado em dezembro de 2009. As pacientes rece-

berão tratamento por 52 semanas (18 semanas

pré-cirurgia e 34 semanas pós-cirurgia).

O estudo NeoALTTO é uma iniciativa dos

grupos acadêmicos Breast International Group

(BIG) e SOLid Tumour Intensification (SOLTI),

baseado na Espanha, e patrocinado pela

GlaxoSmithKline.

Foram recrutadas 11 pacientes para esse

estudo e oito foram randomizadas em três cen-

tros brasileiros.

CAP Neo

Trata-se de um estudo de fase II, de tratamen-

to neoadjuvante de pacientes com câncer de

mama localmente avançado, triplo-negativo,

com o esquema CAP – ciclofosfamida, adria -

micina e cisplatina. Esse é um estudo de inicia-

tiva do GBECAM, sem patrocínio, conduzido

como colaboração acadêmica entre as institui -

ções participantes.

O objetivo primário desse estudo é avaliar a

taxa de resposta patológica completa após

tratamento neoadjuvante com seis ciclos de

CAP em pacientes do sexo feminino com

câncer de mama localmente avançado (está-

gios IIB, IIIA e IIIB), triplo-negativo. A definição

de resposta patológica completa baseia-se na

ausência de neoplasia invasiva residual em

material cirúrgico de axila e mama e será descri-

ta de acordo com critérios TNM.

O estudo CAP Neo está sendo conduzido

em três centros brasileiros, que recrutaram 34

pacientes até 1º de setembro de 2010. Esse

estudo foi iniciado em dezembro de 2007 no

Instituto Nacional de Câncer (INCA). O recruta-

mento será encerrado em dezembro de 2010.

Projeto Étnico

O GBECAM conduzirá a partir de 2011 o Projeto

Étnico, que pretende estudar prospectivamente

as subpopulações étnicas brasileiras: índias/

mestiças; negras/mulatas; brancas. Serão estu-

dadas 81 mu lheres em cada subgrupo, nas se -

guintes regiões: região amazônica; região da

Bahia/Rio de Janeiro; região de São Paulo/Porto

Alegre. As pacientes recentemente diagnosti-

cadas com câncer de mama terão amostras

coletadas para a realização de IHQ (ER, PR,

HER2, EGFR, citoqueratinas 5/6, 14 e 17, p63, ki67

e p53), hibridização genômica comparativa

(aCGH), análise molecular detalhada por TMA,

aberrações cromossômicas e mutações, além

de mapeamento genético com alelos específi-

cos das populações.

Esse é o primeiro estudo clínico nacional

que avalia fenótipos brasileiros. O grupo acredi-

ta que a melhor compreensão do perfil de sub-

tipos moleculares de câncer de mama pode

contribuir na decisão quanto à melhor opção

terapêutica e, consequentemente, na utilização

dos recursos terapêuticos de forma adequada.

Projeto AMAZONA

Observando a carência de informações refi-

nadas sobre características do câncer de mama

no Brasil, excluindo indicadores de incidência,

prevalência e mortalidade, o GBECAM imple-

mentou o projeto AMAZONA, que visa também

observar a diversidade de tratamento entre as

regiões do país.

O nome do projeto foi originado da lenda

das amazonas, mulheres guerreiras que não

hesitavam em queimar ou comprimir um seio

para facilitar o uso do arco e flecha e, assim,

lutar melhor contra o inimigo. É uma home-

nagem às mulheres brasileiras que enfrentam o

câncer de mama.

O presente projeto é um amplo levanta-

mento retrospectivo de casuística de pacien -

tes de câncer de mama em 28 institui ções de

saúde, entre clínicas e hospitais (públicos e

privados), considerando aspectos epidemio -

lógicos, de diagnóstico e de tratamento do

câncer de mama.

O estudo analisou todos os casos de câncer

de mama registrados nas instituições partici-

pantes entre 2001 e 2006. A coleta teve por

finalidade a mensuração da casuística de câncer

de mama (em ambos os sexos) registrada, o

atendimento oferecido e a descrição da sobre -

vida observada nessa população.

O manuseio do câncer de mama é com-

plexo e tem se desenvolvido muito rapidamente

nos últimos anos, com novos agentes terapêu-

ticos disponíveis. A paisagem terapêutica se

desenvolverá ainda mais através desse registro

nacional e pioneiro.

Em 2011, o GBECAM implementará a con-

tinuação desse projeto para analisar e atualizar a

coorte de pacientes de 2006.

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Ocâncer de mama é a maior causa de morte

por câncer entre as mulheres no Brasil.

Dados do Instituto Nacional de Câncer (INCA)

estimam que cerca de 50 mil novos casos são

diagnosticados anualmente. Dessas mulheres, a

vasta maioria recebe tratamento através do

Sistema Único de Saúde (SUS), que nesta entre-

vista é analisado pelo oncologista clínico

paulista Ricardo Caponero, atual presidente da

Associação Brasileira de Cuidados Paliativos.

Com vasta experiência nos setores público

e privado da medicina, Caponero fala, sem

papas na língua, sobre diagnóstico precoce e

atendimento pelo SUS, acesso a medicamentos

de alto custo e o que pode ser feito para ofere-

cer um atendimento mais multidisciplinar e

adequado às pacientes de câncer de mama. A

seguir, os principais trechos da conversa.

Revista GBECAM – Um recente trabalho conduzi-do pelo GBECAM, o AMAZONA, indica que aspacientes tratadas no SUS apresentam piorsobrevida que pacientes do mercado privado. Oestudo indica que acesso a tratamento e diag-nóstico tardio seriam as duas principais causas

dessa diferença de sobrevida. Em sua opinião,quais seriam os principais fatores que poderiamexplicar essa diferença?

Ricardo Caponero – Com relação ao diagnósti-co, o primeiro empecilho é a dificuldade de

marcação e acesso, além da demora para rece-

ber o resultado.

As pacientes mais pobres têm mais dificul-

dade para procurar o serviço médico. Muitas

são mães solteiras, arrimo de família. Um proje-

to da dra. Maria Caleffi (presidente da Femama),

em Porto Alegre, constatou que as mulheres

adiavam ou não faziam a mamografia para não

faltar ao trabalho, pois o período seria descon-

tado. Hoje a mulher tem de se ausentar duas

vezes: uma para marcar, outra para fazer o

exame. Por isso, uma das propostas da Femama

é para que os empresários liberem as mulheres

na idade de fazer mamografia por um período,

sem que a ausência seja descontada, como no

caso dos doadores de sangue, que têm o dia

abonado. Não precisa nem ser uma lei, que seja

um acordo de cavalheiros.

Existe também um problema cultural. As

pessoas não entendem que é um exame de

fato importante, que pode fazer diferença para

ela. Quanto menor o nível cultural, mais difícil

entender isso. Algumas mulheres nem sabem o

que é mamografia. Outras dizem que “quem

procura acha”, então não têm de procurar pelo

em ovo. Então a mulher não sente nada, mas

tem de faltar ao trabalho e ter o dia descontado

para fazer um exame que não é agradável e que

vai achar algo ruim nela. Tudo isso dificulta a

procura pelo serviço.

Quando ela finalmente procura o serviço,

há o problema de acesso. Apesar de haver um

número suficiente de mamógrafos no país, eles

16 Revista GBECAM

“Determinação política e dinheiro resolvem o problema”

>> diálogo

Sistema Único de Saúde, acesso a medicamentos de alto custo, necessidade de equipes multidisciplinares

e mais bem preparadas – nada escapa da minuciosa análise do oncologista clínico Ricardo Caponero

Lilian Lian

g

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não estão adequadamente distribuídos. Em São

Paulo deve haver cerca de 200, mas há municí-

pios do interior que não têm nenhum. Em

muitos casos o mamógrafo existe, mas instalá-

lo, fazer a manutenção, manter um técnico e

um médico radiologista é outra história.

Outro problema de acesso é o agendamen-

to dos exames. Nos municípios que não têm

mamógrafo a situação é ainda pior, pois a

paciente tem de se deslocar até o município

vizinho, ou mesmo para uma cidade maior.

Algumas instituições encontram formas criati-

vas para driblar o problema, como o Hospital de

Câncer de Barretos, que tem um caminhão que

leva o aparelho para cidades mais distantes. A

vantagem do caminhão é que ele vai até a

porta da fábrica, por exemplo, e a mulher não

precisa faltar ao trabalho.

O segundo empecilho é que, uma vez que

o exame volte alterado, a indicação é comple-

mentar com um ultrassom ou fazer biópsia da

mama. Há uma grande demora para conseguir

marcar a biópsia e, se ela for positiva, para mar-

car a cirurgia. A Faculdade de Medicina de

Jundiaí fez uma pesquisa que mostrou que o

tempo médio entre uma mamografia suspeita e

a cirurgia da mama era de 170 dias: três meses

da suspeita para a biópsia, três meses da biópia

para a cirurgia. Só que em 170 dias o que era

precoce já não é mais precoce.

Esse é o chamado “tempo da roda”, em que

a paciente fica esperando a engrenagem fun-

cionar para que as coisas andem. Alguns hospi-

tais conseguiram resolver esse problema de

forma satisfatória. O hospital Pérola Byington

resolveu isso com uma mudança política:

tiraram o serviço de cuidados paliativos, mini-

mizaram quimioterapia, mas maximizaram re -

solutividade cirúrgica. Portanto, a paciente

chega com uma suspeita, é examinada, faz a

mamografia, se necessário faz o ultrassom, já

co lhe material para biópsia e na próxima sema -

na já tem o resultado. Eles conseguiram

resolver bem pelo menos essa primeira fase.

Barretos também conseguiu dar mais acesso a

tratamento e agilizou o atendimento – hoje

suas estatísticas são comparáveis aos hospitais

particulares. Isso mostra que determinação

política, dinheiro, vontade e disposição para

fazer resolvem o problema.

RG – Recentemente houve uma revisão nos va -lores das APACs para tratamento de câncer peloSUS. No entanto algumas drogas, mesmo combenefícios clínicos comprovados, não estãodisponíveis universalmente na rede pública.Como o governo poderia incorporar essas dro-gas para tratamento pela rede pública?

Caponero – Essa é uma decisão política. O

dinheiro é finito, mas é uma questão de prio -

ridade. A Organização Mundial de Saúde

(OMS) diz que o ideal para países em desen-

volvimento é investir 10% do PIB em saúde. O

Brasil investe entre 2,5% e 3%. Temos prioriza-

do o pré-sal, a transposição do Rio São

Francisco, que são obras importantes, mas

que colocam de lado saúde e educação. Na

Suíça, o governo paga trastuzumabe para

qualquer tumor, independentemente do

tamanho. Se tem HER2, tem direito a tras -

tuzumabe. Os americanos também dão aces-

so, mesmo gastando hoje 17% do PIB em

saúde. É preciso fazer uma priorização.

Essa falta de investimento faz diferença, e

não dá para admitir – é até antiético – que

uma paciente que tem indicação para usar

Herceptin não tenha acesso regular a ele pelo

SUS. Já é um remédio mais do que consagra-

do, aprovado no mundo todo, com vários tra-

balhos científicos. Hoje todos os convênios

pagam, todas as pacientes usam, por que não

vale para o SUS? Porque para o SUS não conta

só a validade científica, mas o impacto finan-

ceiro. E qual é o problema? Estima-se que

hoje 20% das pacientes com câncer de mama

tenham HER2+. Temos 49 mil casos novos.

Vinte por cento de 49 mil é um número muito

grande de mulheres. Portanto raciocina-se

assim: quanto isso vai custar por um ano ou

mais em doença metastática? Não temos

esse dinheiro. Então não pagamos, porque

não temos essa verba para saúde. E isso é

legítimo. Numa cidade em que apenas 10% da

população tem acesso a esgoto e água

encanada, por exemplo, talvez a prioridade

não seja dar Herceptin. Mas isso é inadmissí -

vel quando se veem corrupção, desvio de ver-

bas e os absurdos que se gastam com proje-

tos que não acrescentam nada.

Temos um modelo de aids que é modelo

no mundo inteiro e o tratamento de câncer

está uma lástima. Por quê? Porque os pacientes

de aids são mais ricos, fazem mais barulho,

brigam mais. É desproporcional. Câncer é a

prioridade número um? Talvez não seja. Nós

temos, em Belém, uma das maiores incidências

de câncer de colo do útero do mundo, mas o

governo brasileiro diz que a vacina para HPV é

muito cara e que não será dada pelo SUS. O

governo está certo ou errado? Claro que custa

caro. Claro que é um problema de alguns mi -

lhões de reais. Mas então deixe claro que não se

trata de uma prioridade.

Outro ponto importante: quando o presi-

dente Obama discutiu a reforma de saúde nos

EUA, foi uma discussão pública, não uma cane-

tada de gabinete. Aqui não existe essa trans -

parência política. Apesar de vivermos num go -

verno democrático, a transparência das deci sões

políticas não existe. Elas são todas feitas a portas

fechadas, com base nos lobbies que se estabele-

cem. Enquanto isso, falta dinheiro na saúde.

RG – A Secretaria Estadual de Saúde de SãoPaulo criou, recentemente, uma lista de medica-mentos de alto custo que estão sendo disponibi-lizados no estado. Em sua opinião, quais são osprós e contras desse modelo? Ele poderia servirde referência para outros estados?

Caponero – O pró desse modelo é que ele faci -litou o acesso. A história por trás dele é que os

pacientes processavam o Estado para conse -

guir o medicamento, e o Estado geralmente

perdia. Em vista disso, a própria Procuradoria

Geral do Estado sugeriu que se fizesse um pro-

grama em que o governo estabelecesse que

remédios daria, facilitando o acesso a eles. Foi

um acordo de cavalheiros entre a Defensoria

17Revista GBECAM

"Existe um problema cultural. As pessoas não

entendem que a mamografia é um exame

de fato importante. Algumas nem sabem o que é mamografia."

Page 18: GBECAM · Ricardo Caponero faz um raio X do câncer de mama no Brasil Ano I • número 1 2º semestre 2010. Title: GBECAM Created Date: 11/16/2010 3:32:35 PM ...

Pública e a Secretaria Estadual de Saúde. Não

virou portaria, não virou decreto, não virou lei –

é uma decisão política.

O lado ruim disso é que, exatamente por

ser uma decisão política, há muita instabili-

dade. Isso deveria ser um modelo para outros

estados? Não. Deveria ser uma medida estabe -

lecida por lei, definindo os medicamentos a

que o paciente tem e não tem direito. Dessa

forma, o governo estabelece que esse é o pro-

grama de saúde, que funciona dessa forma e

não adianta processar.

Mas suponhamos que você processe a

prefeitura e ela seja obrigada a dar o remédio.

Em São Paulo isso não é problema, porque a

verba é grande, mas numa cidade de 10 mil

habitantes a prefeitura pode ir à falência se tiver

de comprar remédios de alto custo. Para evitar

isso, existe uma lei que determina que você só

pode comprometer uma parte de seu orça-

mento. Se o comprometimento for maior, o

governo municipal pode se negar a pagar. O

problema disso é que a saúde virou uma gestão

tripartite, em que são corresponsáveis o

município, o Estado e a Federação. Então não

existe mais um único responsável. O município

é responsável parcialmente. Ele pode não ter

dinheiro, mas o Estado tem. Se o Estado não

tiver, a Federação tem. Portanto, na prática até

essa lei pode ser questionada.

Outra razão por que a APAC paulista, que

foi o nome que se deu a essa medida, não é

generalizável é o fato de a legislação brasileira

ser federal, ao contrário dos EUA, que têm legis -

lações estaduais. Se isso virar uma portaria, ela

não pode ser estadual, porque o SUS é federal.

O Estado gerencia, na gestão tripartite, uma

parte do dinheiro do SUS. Portanto, não posso

dizer, dentro do SUS, que quem nasceu em São

Paulo tem direito a determinada droga e quem

nasceu no Rio de Janeiro não tem. É discrimi-

nação, qualquer advogado ganha em primeira

instância citando a violação do primeiro artigo

da Constituição. Por isso se trata de um acordo

de cavalheiros, porque no papel seria muito

mais difícil fazer valer.

O governo não precisa, nem tem como, dar

tudo a todos. Mas acredito ser necessário rever

a noção de que “saúde é um direito do cidadão

e um dever do Estado, que todo cidadão deve

ter acesso à saúde amplo e irrestrito”. No último

encontro da SBOC (Sociedade Brasileira de

Oncologia Clínica) houve quem achasse que o

artigo 146 da Constituição deveria ser retirado.

Lógico que se trata de um exagero, mas não há

dúvida de que são necessários limites. Em

muitos países, como nos EUA, não há acesso

universal à saúde. No Brasil, vende-se a noção

de que isso é realidade, quando na verdade não

é. O erro desse processo está na sua hipocrisia,

em o governo dizer que dá tudo, que o pa -

ciente tem acesso a tudo, porque isso não

acontece no dia a dia. É a hipocrisia da Cons -

tituição e do sistema público de saúde.

RG – Além do acesso a tratamento, outroprovável motivo indicado pelo trabalho do GBE-CAM para explicar a pior sobrevida de pacientesno SUS é o diagnóstico tardio. Em 2009 foiaprovada a Lei 11.664, que garante acesso amamografia anual pelo SUS para todas as mu -lheres acima de 40 anos. Pensando no diagnós-tico das mulheres com câncer de mama, alémdo acesso à mamografia garantido por lei, quaisseriam outras ações do Estado para asseguraro diagnóstico precoce, otimizando a infraestru-tura do SUS? Programas de screening seriamuma alternativa viável?

Caponero – Screening é um bom começo, masnão é suficiente. Quando você começa a ras-

trear entre os 40 e 50 anos, a efetividade é

muito baixa. Achar um caso a cada 2 mil

mamografias ainda não é um exame adequado

– gasta-se muito dinheiro para achar poucos

casos. Precisamos refinar nosso rastreamento. E

a forma de refinar é a que os americanos estão

fazendo: estratificar o risco. Para as pacientes

com risco ao longo da vida maior que 20%,

pede-se ressonância magnética. Se elas têm

mais risco, rastreia-se mais de perto. Em outros

países, pede-se mamografia a cada dois anos. A

cada dois anos teremos muito câncer de inter-

valo? Se o grupo de risco for estratificado, não.

Talvez tenhamos um grupo de baixo risco, em

que se peça mamografia a cada dois anos. E

talvez haja um grupo de alto risco, que talvez

precise fazer ressonância.

Outro aspecto é a questão genética: hoje as

pacientes não têm acesso a teste genético.

Sabemos que 30% dos casos de câncer de

mama têm histórico familiar e 10% têm

antecedentes de genética (BRCA-1 e BRCA-2), e

essas pacientes ficam na fila de mamografia

como as outras. É preciso estratificar o risco e

rastrear essas pacientes de forma diferente.

Portanto, não é só questão de dar acesso,

mas aprimorar a avaliação do risco. Essa lei foi

um grande progresso, porque agora a paciente

tem o direito de fazer a mamografia. Falta agora

melhorar. O ideal seria que, durante a consulta,

o médico fizesse uma avaliação do risco da

paciente para, com base nisso, estabelecer o

programa de rastreamento mais adequado.

Com isso reduz-se o custo, melhora-se a efe-

tividade, estratifica-se o risco e faz-se o exame

em quem de fato precisa.

Mas não adianta fazer o diagnóstico se não

puder tratar. As coisas têm de ir juntas. É preciso

dar condições de diagnóstico e tratamento jun-

tos. E esse tratamento tem de ser rápido e efe-

tivo. Não adianta fazer um belo diagnóstico e

depois tratar de forma inadequada.

RG – Na sua opinião, o SUS carece de infraestru-tura (hospitais, leitos, aparelhos etc.) para otratamento do câncer de mama ou há uma faltade otimização dos recursos existentes? Há comoreorganizar o atendimento nos Centros de AltaComplexidade integrando com as UnidadesBásicas de Saúde para otimização da capacidadede atendimento do SUS?

Caponero – Os recursos existem, mas estãomal utilizados, porque a ineficiência é muito

grande e porque esses recursos não estão

adequadamente dimensionados. Existe, por

exemplo, uma demanda de pedidos de exame

maior do que se consegue realizar. Muitos

pacientes que têm doenças banais, que ti -

nham de ser tratados na rede básica de saúde,

vão para os hospitais grandes. Já houve inclu-

sive uma proposta do governo para resolver

isso: fazer uma hierarquização da saúde em

que houvesse postos de saúde para atenção

primária. Quando houvesse uma coisa mais

séria, seria mandada para uma rede secun -

dária. E só os casos mais complexos chega -

riam à rede terciária. Mas hoje a paciente tem

18 Revista GBECAM

>> diálogo

"Não adianta fazer o diagnóstico se não pudertratar. As coisas têm de irjuntas e esse tratamento

tem de ser rápido e efetivo."

Page 19: GBECAM · Ricardo Caponero faz um raio X do câncer de mama no Brasil Ano I • número 1 2º semestre 2010. Title: GBECAM Created Date: 11/16/2010 3:32:35 PM ...

corrimento e vai ao posto de saúde, daí ou o

posto não tem médico, ou o médico não

podia atender, ou não podia fazer o exame. A

paciente acaba indo ao hospital. Essa falta de

hierarquização acaba sobrecarregando quem

tem resolutividade.

Também falta capacitação profissional.

Muitas vezes, o médico do posto de saúde não

tem condições para fazer o exame adequado,

porque tem 30 mulheres esperando para serem

atendidas. Outras vezes ele não sabe da

importância do exame adequado, porque não

tem formação para isso. Apalpar a mama não é

uma coisa fácil. Então não adianta pedir um

programa de rastreamento para o pronto-

socorro ou posto de saúde se o profissional não

souber apalpar a mama.

Essa capacitação profissional deficiente

gera atendimentos redundantes e não resolu-

tivos. A paciente que foi mal examinada ou não

teve os exames bem interpretados vai voltar

para a roda, porque o problema dela não foi

resolvido da primeira vez, e os recursos acabam

sendo usados de forma inadequada. Precisa-se,

então, de uma organização de recursos finan-

ceiros e humanos.

A saúde também precisa ser estruturada

em todos os níveis. Se existe uma porta de

entrada na rede de saúde, essa porta tem de

ser eficiente para os problemas que apare-

cem. Se sabemos que vamos precisar de dez

radiografias por dia, devemos ter a capaci-

dade para fazer dez radiografias por dia. Hoje,

muitas vezes o paciente fica internado para

fazer um exame, porque a marcação é muito

demorada e com internação o processo é

mais rápido. Só que, assim, se desperdiçam

recursos. Não posso internar pacientes para

esperar por um exame. Isso se resolve com

planejamento. Essa deficiência é que sobre-

carrega o sistema.

RG – O diagnóstico e o tratamento do câncer demama são multidisciplinares, envolvendo umasérie de especialidades como ginecologia, mas-tologia, patologia e oncologia. Há algo que pode-ria ser feito com os médicos de cada uma dessasespecialidades para um diagnóstico mais pre-ciso, reduzindo o tempo entre o diagnóstico e otratamento das pacientes com câncer de mama?

Caponero – Com certeza. É preciso dar a for-mação adequada para todas as especialidades.

Todos têm de ser peritos no que fazem. E

temos de facilitar a comunicação. Que labo-

ratórios de especialidade são eficazes, isso

qualquer faculdade de medicina sabe. O

Hospital das Clínicas em São Paulo tem a Liga

da Dor, a Liga da Sífilis, a Liga da Febre

Reumática... São profissionais de várias espe-

cialidades que em determinado momento se

juntam num único lugar e fazem o atendimen-

to de pacientes com aquela patologia. São

mutirões de esforço concentrado para atender

uma especialidade. Para algumas situações,

com ligas bem estabelecidas, com programas

bem estabelecidos, fazer ambulatórios de

especialidade facilita muito o processo.

Do ponto de vista particular isso é muito

difícil, porque é preciso volume para fun-

cionar. Mas volume o governo tem. Uma

solução seria concentrar o atendimento de

determinadas condições em um determinado

dia, por exemplo. É mais eficaz, com mais re -

solutividade. E isso é factível.

Alguns convênios já fazem isso. Os con-

vênios têm problemas mas também tem

soluções boas. A Amil fez um centro chamado

Total Care, um ambulatório de múltiplas espe-

cialidades. O doente sai de lá com o problema

resolvido. Numa especialidade em que se pre-

cisa de um radioterapeuta, de um cirurgião e do

oncologista, se todos estiverem trabalhando

juntos no mesmo lugar em períodos concen-

trados, é possível otimizar recursos. Talvez não

seja possível para todas as especialidades, mas

para as mais prevalentes.

No hospital Pérola Byington, por exemplo, a

paciente é examinada pelo mastologista. Se fo -

rem necessários uma mamografia ou um ul -

tras som, o radiologista já está lá para fazer.

Tam bém já está lá o profissional que vai olhar

os exames e, se for preciso fazer biópsia, o

cirurgião também está disponível. Isso é a prova

de que é possí vel funcionar de forma integrada.

Essa é a forma adequada de se trabalhar.

RG – Pensando nisso, como você vê o futuro parao tratamento de câncer de mama pelo SUS?

Caponero – Vejo um sistema nebuloso, porquetrabalhamos com o sistema de APAC que foi

criado em 1999: os mesmos valores, os mesmos

procedimentos, como se em 12 anos a medicina

não tivesse mudado nada. Agora saíram algumas

APACs novas, que dão acesso a MabThera para

alguns linfomas, mas foi a mudança da per-

fumaria. A essência do tratamento continua não

tendo direito a Herceptin, continua não tendo

direito a outros tipos de tratamento, alguns

portes diminuíram de valor, ou seja, não resolveu

nada. Os pacientes com linfoma que precisariam

receber MabThera foram beneficiados, mas o

resto continuou na mesma. Não houve uma

mudança geral do sistema.

Isso tem um grande impacto político,

porque pela primeira vez é incluída alguma

droga desde o Glivec. E ela foi incluída exata-

mente porque o impacto financeiro dela não é

tão grande. Apesar de o custo ser alto, o número

de beneficiados é pequeno. Já o trastuzumabe,

que tem um benefício muito mais consistente e

comprovado, não é incluído porque o impacto

financeiro é muito maior. O mesmo acontece

com a vacina para HPV. Então a decisão não é

só pelo valor científico da descoberta, mas pelo

impacto econômico que isso está tendo. Não dá

para dizer que não foi um progresso, mas se não

se reformar o sistema de financiamento, se não

forem estabelecidas regras claras, vejo um

futuro pouco animador.

A falta de financiamento da saúde tam-

bém passa pela má remuneração dos médi-

cos. Hoje, nos hospitais do SUS, o médico re -

cebe salário do Estado. Mas para colocar um

credenciado conveniado com o SUS, o valor

de uma consulta para especialista hoje é

R$ 10 e para o clínico R$ 7, e já foi um grande

aumento. E aí está nosso problema, porque o

profissional tem de atender 30 mulheres por

hora para poder fazer volume. Ele não vai

conseguir fazer um exame adequado de ma -

mas assim. A gente precisa de um financia-

mento adequado para a saúde e de uma

saúde de nível. Diante do nível de remune -

ração que se tem de SUS e convênio, você

não consegue fazer uma boa medicina.

19Revista GBECAM

"No Brasil, vende-se a noção de que o acesso universal à saúde é realidade, quando na verdade não é. O erro desse processo está na sua hipocrisia."

Page 20: GBECAM · Ricardo Caponero faz um raio X do câncer de mama no Brasil Ano I • número 1 2º semestre 2010. Title: GBECAM Created Date: 11/16/2010 3:32:35 PM ...

Nesta sessão reproduzimos algumas con-

tribuições de autores brasileiros em insti-

tuições nacionais, dentro da literatura de câncer

de mama. Buscamos em revistas indexadas,

onde encontramos uma lista extensa (e, espe -

ramos, crescente).

Fizemos uma seleção baseada na relevân-

cia do artigo, destacando temas variados dentro

do universo de câncer de mama. O abstract é

apresentado, seguido de um breve comentário.

Esperamos aperfeiçoar esse módulo nos

próximos exemplares e, para isso, agradecemos

a colaboração dos leitores, através da sugestão

de artigos que tenham chamado sua atenção

ao longo do ano. Esta também é uma grande

oportunidade para conhecermos as diversas

linhas de pesquisa em curso no país e um estí-

mulo para futuras colaborações.

No evidence for an association ofhuman papillomavirus and breastcarcinoma. Breast Cancer Res Treat.

2010 Aug 24.

Silva RG Jr, da Silva BB.

Department of Pathology, Federal University of

Piauí, Teresina, Brazil.

Abstract

Breast cancer represents a serious public health

problem worldwide, for its high incidence, mor-

bidity, mortality, and its high cost treatment. It is

known that breast cancer is a multifactorial dis-

ease, possessing various risk factors, among

which include hormonal factors, genetic and

environmental. The role of viruses in breast car-

cinogenesis is controversial. This study aims to

evaluate the expression of HPV 6, 11, 16, and 18

by polymerase chain reaction (PCR) in invasive

ductal breast carcinoma. We analyzed 90

women diagnosed with invasive ductal breast

carcinoma, of which the extracted DNA was

amplified, quantified and tested for DNA sub-

types 6, 11, 16, and 18 by PCR. The research car-

ried out in 79 samples of HPV DNA, proved neg-

ative. Our study demonstrates no association

between the most prevalent types of HPV and

breast cancer.

Comentário:

A associação causal do papilomavírus com o

câncer de mama é controversa. Apesar de o

estudo brasileiro não ter mostrado correlação, o

debate continua. Metanálise publicada na mes -

ma revista contradiz os resultados acima. (Li N,

et al. Breast Cancer Res Treat 2010 Aug 26)

Immediate breast reconstructionwith transverse latissimus dorsiflap does not affect the short-term

recovery of shoulder range of motion aftermastectomy. Breast Cancer Res Treat. 2010May;121(1):121-31.

Ann Plast Surg. 2010 Apr;64(4):402-8.

de Oliveira RR, Pinto e Silva MP, Gurgel MS,

Pastori-Filho L, Sarian LO.

Department of Obstetrics and Gynecology,

University of Campinas, Campinas, São Paulo,

Brazil.

Abstract

Immediate breast reconstruction, depending on

the surgical strategy, can result in anatomic

modifications that may affect the shoulder

apparatus. This study compares the recovery of

shoulder range of motion (ROM), after mastec-

tomy, in women with and without immediate

breast reconstruction with latissimus dorsi flap

(LDF). This was a prospective study with 87

women who underwent mastectomy (41 with

LDF). Shoulder ROM was assessed with

goniometry, with a universal full-circle manual

goniometer, prior to surgery, and on a weekly

basis during the first 4 weeks postoperatively.

Reconstruction with LDF was not associated

with a decrease in shoulder ROM (P = 0.84). By

the end of the 4-week assessment program,

women in both groups still had an average

reduction of 30 degrees in their shoulder ROM

compared with baseline. Factors significantly

associated with a reduction in shoulder ROM

during the recovery period were complete dis-

section of the axilla, current smoking behavior,

and presence of painful axillary cords. It is likely

that breast reconstruction with LDF has little or

no effect on shoulder ROM in the immediate

postoperative period. It is also possible that LDF

effects (if any) are overridden by the major

reduction (over 30% in the immediate postop-

erative period, subsiding partially during the first

weeks postoperatively) in shoulder ROM caused

by mastectomy.

Comentário:

A observação prospectiva de mulheres sub-

metidas a mastectomia após câncer de mama e

reconstrução com o grande dorsal não sugere

comprometimento da mobilidade do ombro.

Recomendações habituais quanto a exercícios

e utilização de pesos vêm sendo revisitadas em

câncer de mama. A utilização de exercícios pre-

coces após a cirurgia tem se mostrado estraté-

gia importante. Porém, essa recomendação

deve ser contrabalançada com a possibilidade

de maior acúmulo de seroma.

Adherence to a Breast CancerScreening Program and its Pre -dictors in Underserved Women in

Southern Brazil. Cancer Epidemiol BiomarkersPrev. 2010 Aug 17.

Caleffi M, Ribeiro RA, Bedin Júnior AJ, Viegas-

Butzke JM, Baldisserotto FD, Skonieski G,

Giacomazzi J, Camey SA, Ashton-Prolla P.

1Serviço de Mastologia, Hospital Moinhos de

Vento/Nucleo Mama Porto Alegre.

20 Revista GBECAM

Artigos brasileiros sobrecâncer de mama em 2010

>> pesquisa clínica

¬

¬

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Por José Bines

Page 21: GBECAM · Ricardo Caponero faz um raio X do câncer de mama no Brasil Ano I • número 1 2º semestre 2010. Title: GBECAM Created Date: 11/16/2010 3:32:35 PM ...

Abstract

BACKGROUND: Adherence to breast cancer

(BC) screening is a key element to ensure effec-

tiveness of programs aiming at downstaging of

BC. In this study, we evaluated adherence to a

screening program and its predictors in under-

served women in southern Brazil.

METHODS: Attendance to the program,

which is based on yearly mammogram and clin-

ical examination, was evaluated prospectively.

Mean time frames between visits were calculat-

ed. Possible predictors of adherence (defined as

mean intervals </= 18 months), such as socio-

economic indicators and health/lifestyle behav-

iors, were investigated.

RESULTS: 3,749 women (age 51 +/- 8 years,

illiteracy rate 6.8%, 57.4% with parity >/=3) were

analyzed. Median time between screening

rounds was 16.5 months (IQR = 13.1-25.7),

median number of rounds attended was 3 (IQR

= 2 - 4); 57.6% had mean intervals </= 18 and

71% </= 24 months. The most important inde-

pendent predictors of adherence were high

genetic risk (RR=1.25, 95% CI 1.11-1.40), illiteracy

(RR=0.77, 95% CI = 0.67-0.90), parity >/= 5

(RR=0.89, 95% CI 0.83-0.96) and smoking

(RR=0.82, 95% CI = 0.77-0.88).

CONCLUSIONS: Although the proposed

screening interval was one year, compliance to

biannual screening (accepted in several interna-

tionals programs) was high, especially when

considering the low socio-economic level of

the sample. Impact: This project aims to test a

breast cancer screening model for underserved

populations in limited resource countries,

where adherence is an issue. The identification

of worst adherence predictors can point to

interventions in order to improve outcomes of

similar public health screening strategies.

Comentário:

A detecção precoce através da mamografia é

uma das principais estratégias para a

diminuição da mortalidade por câncer de

mama. Como a utilização dos programas de

rastreamento pelas mulheres constitui etapa

essencial para o seu sucesso, é relevante a

busca de fatores que possam diminuir a

aderência. Dadas as dimensões continentais do

país, com suas diferenças socioeconômicas, as

razões de não aderência e, por conseguinte, as

estratégias para vencê-las provavelmente são

distintas para cada região.

Overall survival and post-progres-sion survival in advanced breastcancer: a review of recent random-

ized clinical trials. J Clin Oncol. 2010 Apr10;28(11):1958-62.

Saad ED, Katz A, Buyse M.

Dendrix Research, Rua Joaquim Floriano, 72/24

Sao Paulo, Brazil 04534-000. everardo@den-

drix.com.br

Abstract

With the availability of several lines of therapy,

overall survival (OS) has been progressively sub-

stituted by progression-free survival (PFS) and

other tumor-based assessments as the primary

efficacy end point in advanced breast cancer tri-

als. We investigated the frequency and determi-

nants of OS gain in the recent literature and the

duration of post-progression survival (PPS)

according to treatment type and line. We used

PubMed to search for phase III trials on systemic

antineoplastic therapies published between

January 1998 and December 2007 in 11 leading

journals. The primary end point was the one

stated explicitly, used for N calculation, or listed

first. Significant gain was considered as reported

P < .05 for superiority trials or proven non-infe-

riority or equivalence otherwise. We retrieved 76

trials, and gain in OS was reported in 15 cases

(19.7%). The median gain in OS was 4.7 months,

and such gain was more frequent when there

was significant gain in PFS and in second-line

and third-line trials. The average median OS was

20.7 months in trials assessing first-line

chemotherapy and 31.1 months with first-line

hormone therapy. The median proportion of OS

accounted for by PPS was significantly longer in

hormone therapy trials than in chemotherapy

trials, but varied little across treatment lines. A

statistically significant gain in OS has been

reported in about one in five recent phase III tri-

als in advanced breast cancer, despite the fact

that OS has seldom been used as the primary

end point. PPS represents nearly two thirds of

patient survival after on-trial disease progression.

Comentário:

Há uma grande discussão a respeito dos me -

lhores objetivos em estudos clínicos de câncer

de mama avançado. Embora a maioria dos

estudos recentes raramente utilize sobrevida

global como objetivo principal, sobrevida livre

de progressão não constitui substituto nesse

cenário. Uma vez que os subtipos de câncer de

mama apresentam diferentes características

moleculares, clínicas, resposta a terapia e pro-

gressão a linhas sucessivas, devemos ter obje-

tivos distintos para cada subgrupo?

Phase III randomized trial of suni-tinib versus capecitabine in pa -tients with previously treated

HER2-negative advanced breast cancer.

Barrios CH, Liu MC, Lee SC, Vanlemmens L,

Ferrero JM, Tabei T, Pivot X, Iwata H, Aogi K,

Lugo-Quintana R, Harbeck N, Brickman MJ,

Zhang K, Kern KA, Martin M.

PUCRS School of Medicine, Centro de Pesquisa

em Oncologia, Jardim Botanico, Porto Alegre,

RS, 90610-000, Brazil. [email protected]

Abstract

This multicenter, randomized, open-label phase

III trial (planned enrollment: 700 patients) was

conducted to test the hypothesis that single-

agent sunitinib improves progression-free survival

(PFS) compared with capecitabine as treatment

for advanced breast cancer (ABC). Patients with

HER2-negative ABC that recurred after anthracy-

cline and taxane therapy were randomized (1:1)

to sunitinib 37.5 mg/day or capecitabine 1,250

mg/m(2) (1,000 mg/m(2) in patients >65 years)

BID on days 1-14 q3w. The independent data-

monitoring committee (DMC) determined during

the first interim analysis (238 patients randomized

to sunitinib, 244 to capecitabine) that the trial be

terminated due to futility in reaching the primary

endpoint. No statistical evidence supported the

hypothesis that sunitinib improved PFS compared

with capecitabine (one-sided P = 0.999). The data

indicated that PFS was shorter with sunitinib than

capecitabine (median 2.8 vs. 4.2 months, respec-

tively; HR, 1.47; 95% CI, 1.16-1.87; two-sided P =

0.002). Median overall survival (15.3 vs. 24.6

months; HR, 1.17; two-sided P = 0.350) and objec-

tive response rates (11 vs. 16%; odds ratio, 0.65; P

= 0.109) were numerically inferior with sunitinib

versus capecitabine. While no new or unexpected

safety findings were reported, sunitinib treatment

was associated with higher frequencies and

21Revista GBECAM

¬

¬

Page 22: GBECAM · Ricardo Caponero faz um raio X do câncer de mama no Brasil Ano I • número 1 2º semestre 2010. Title: GBECAM Created Date: 11/16/2010 3:32:35 PM ...

greater severities of many common adverse

events (AEs) compared with capecitabine, result-

ing in more temporary discontinuations due to

AEs with sunitinib (66 vs. 51%). The relative dose

intensity was lower with sunitinib than

capecitabine (73 vs. 95%). Based on these efficacy

and safety results, sunitinib should not be used as

monotherapy for patients with ABC.

Comentário:

Capecitabina é uma opção consagrada de

tratamento em câncer de mama após a pro-

gressão a antraciclinas e taxanes. Alguns estu-

dos sugerem benefício da combinação de

capecitabina com outros agentes, embora

associados com aumento da toxicidade. A

comparação de sunitinib isolado com

capecitabina mostrou-se inferior, levando à

interrupção do estudo.

Estrogen receptor-positive breastcarcinomas in younger women aredifferent from those of older

women: a pathological and immunohisto-chemical study. Breast. 2010 Apr;19(2):137-41.

Bacchi LM, Corpa M, Santos PP, Bacchi CE,

Carvalho FM.

Department of Pathology, Faculdade de

Medicina da Universidade de Sao Paulo, Sao

Paulo, SP, Brazil.

Abstract

The higher frequency of triple-negative and

HER-2-positive tumors detected in younger

patients has been suggested as an explana-

tion for the more aggressive tumor types

observed in this age group. However, estro-

gen receptor (ER)-positive tumors are the

most frequent subtype of breast carcinomas

identified, even in younger patients. In this

retrospective study, the morphological and

immunohistochemical profiles of ER-positive

breast carcinomas from women 35 yrs and

younger that were diagnosed between 1997

and 2007 were evaluated. From these cases,

213 were selected based on the availability of

pathology reports and paraffin blocks. For

comparison, 117 consecutive cases of breast

carcinomas diagnosed in patients >60 yrs

from 2006 were included. Paraffin-embedded

tumors were stained for expression of ER,

progesterone receptor (PR), human epidermal

growth factor receptor 2 (HER-2), Ki-67 anti-

gen, epidermal growth factor receptor (EGFR),

cytokeratin 5/6, p53, vimentin, CD117, and p63

using tissue microarrays. ER-positive carcino-

mas were diagnosed in 120 (56.1%) samples of

the younger patient group and in 92 (78.6%)

samples of the older patient group. Of these

ER-positive carcinomas, 48 (40%) from the

younger patient group presented the subtype

luminal A, compared with 53 (57.6%) from the

older patient group (p=0.01). Tumors from the

younger patient group were also associated

with increased vascular involvement, co-

expression of HER-2, and decreased expres-

sion of CD117. These results highlight differ-

ences in expression markers and the patholo-

gy of ER-positive tumors detected in younger

women, with a notable characteristic being

co-expression of HER-2.

Comentário:

Pacientes com menos de 35 anos apresen-

tam câncer de mama com características de

maior agressividade. Mesmo considerando-

se apenas câncer receptor hormonal positivo,

elas apresentam menor porcentagem de

tumores com perfil luminal A, maior invasão

vascular, assim como coexpressão de HER-2.

Essas características devem ser levadas em

consideração na determinação do tratamen-

to sistêmico.

>> pesquisa clínica

¬

Ooncologista clínico carioca José Bines,

diretor científico do Grupo Brasileiro de

Estudos do Câncer de Mama (GBECAM),

médico sênior do Instituto Nacional de

Câncer (INCA) e membro de comitê da

American Society of Clinical Oncology

(ASCO), foi recentemente eleito para o

Conselho Consultivo do Breast International

Group (BIG, na sigla em inglês), uma organi-

zação sem fins lucrativos para grupos

acadêmicos de pesquisa em câncer de mama no mundo todo, sedi-

ado em Bruxelas, na Bélgica.

O novo Conselho Consultivo foi eleito na última Assembleia Geral

da organização, em Chicago. Apresentado pela nova estrutura de go -

verno criada no início do ano, o Conselho Consultivo auxiliará o Con -

selho Executivo e a sede do BIG a cumprir seus deveres e responsabi -

lidades. O grupo é formado por 15 pessoas, entre profissionais em

começo de carreira e pesquisadores mais experientes, para trazer uma

variedade de habilidades e conhecimentos para o BIG.

O Conselho Consultivo para o período de 2010-2014 é formado

pelos seguintes nomes: Fabrice André, Philippe Bedard, Gouri Shankar

Bhattacharyya, José Bines, Fran Boyle, Boon Chua, Giuseppe Curigliano,

Carsten Denkert, Peter Dubsky, John Forbes, Karen Gelmon, Sibylle

Loibl, Kathy Pricthard, Alastair Thompson e Giuseppe Viale.

O BIG facilita a pesquisa sobre câncer de mama em nível inter-

nacional ao estimular a cooperação entre seus membros – entre

eles, o GBECAM – e outras redes acadêmicas, e colabora com a

indústria farmacêutica, mas sempre trabalhando independente dela.

Segundo descrição do grupo em seu website: “A cooperação em

larga escala é crucial para fazer avanços significativos na pesquisa

sobre o câncer de mama, reduzir o desperdício de esforços duplica-

dos e servir melhor aqueles afetados pela doença”.

Diretor científico do GBECAM é eleito para Conselho Consultivo do BIG

22 Revista GBECAM

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23Revista GBECAM

A 5ª edição do congresso Câncer de Mama Gramado 2010 reuniu cerca de 360 participantes entre 26 e 28

de agosto em Gramado, no Rio Grande do Sul. Durante três dias, oncologistas, mastologistas e pato logistas

brasileiros e estrangeiros debateram os últimos avanços na área. Também estiveram presentes represen-

tantes de la boratórios que investem maciçamente em pesquisa e em novos medicamentos para a condição,

que só em 2010 atingirá cerca de 50 mil mulheres. Confira as imagens desse encontro.

AstraZeneca Mário Sérgio Marques, Selma Kochen, Alexandre Soares,Vivian Low e Paulo Amado

Roche Luciano Del Mestre, Silvio Villani, Renata Maezono,Beatriz Alves e Lissandro Teixeira

Câncer de mama – Gramado 2010

>> encontro

Palestra

Fotos: Lilia

n Liang

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24 Revista GBECAM

J&J Marco Antunes, Janaína Mazoni, Dilmar Baldicera, AnahyDiniz, Flavia Manzoni e Alberto Ribeiro

Novartis Paula Marins, Alfeu Silva, Eduardo Rydz, Marcelo Pegorinie Luciana Foss

Pfizer Ana Raquel Gomes, Mariana Fonseca, Paulo Garrido, Luís Brustolin e Simone Marques

Sanofi Aventis Eder Backes

Carlos Barrios e Antonio Frasson

Ao lado, Ana Paula Granado e Cláudia Vasconcelos;acima, Sergio Simon, Antonio Frasson e José Bines

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25Revista GBECAM

Desde 2009 o laboratório AstraZeneca

vem investindo na autoestima de

mulheres que passam pelo tratamento

contra o câncer de mama.

A Campanha de Autoestima, como foi

chamada, promove reuniões bimensais

em clínicas e hospitais em todo o Brasil,

em que a paciente participa de palestras e

atividades que abordem a questão, consi -

derada crucial para uma atitude positiva da

paciente diante do tratamento.

A campanha já atingiu cerca de 420

pessoas, entre mulheres e familiares, e passou por Campinas, Caxias do Sul, Fortaleza,

Goiânia, Recife, Rio de Janeiro, São Paulo, São José dos Campos, Natal, Porto Alegre, Belo

Horizonte, Salvador e Curitiba.

Um dos pontos altos dos encontros, que colocam a teoria em prática, são as sessões

de fotos, nas quais as pacientes são convidadas a se enfeitar com adereços e posar para

um fotógrafo. A melhor foto é impressa e entregue às pacientes. Uma seleção das me -

lhores fotos do ano passado se transformou no calendário da AstraZeneca de 2010.

“Nosso foco é trabalhar a humanização, o resgate e a manutenção da autoestima,

que muitas vezes é difícil de ser restabelecida. Acreditamos que, com isso, as mulheres

ganhem mais confiança para superar as dificuldades”, diz Selma Kochen, diretora de

marca da AstraZeneca.

AFemama –

Federação

Brasi le i ra

de Instituições

Filantrópicas de

Apoio à Saúde da

Mama – promove pelo terceiro ano con-

secutivo a campanha Outubro Rosa. O

lançamento da edição de 2010, cujo mote

é “Sem investimento, o câncer de mama

não tem tratamento”, aconteceu no dia 5

de outubro, com a iluminação de rosa do

Cristo Redentor, no Rio de Janeiro.

A ideia é chamar a atenção para a

necessidade de se investir na saúde das

mulheres brasileiras, em especial na saúde

da mama. Estima-se que cerca de 50 mil

novos casos de câncer de mama sejam

diagnosticados no Brasil anualmente.

Na terceira edição da campanha, a

Femama pretende dar continuidade ao

sucesso obtido no ano passado com o

tema “Mamografia: Agora é Lei!”, cujo ob -

jetivo foi tornar realidade nos vários esta-

dos brasileiros o que promete a Lei

11.664/2008, de 29 de abril de 2009, que

garante o acesso à mamografia para mu -

lheres acima de 40 anos.

Campanha de autoestima incentivapacientes de câncer de mama

>> giro

OPrograma Mais Mulher, uma iniciati-va da Pfizer, é um programa com-

pleto de apoio a pacientes com câncerde mama usuárias de Aromasin(exemestano), com o objetivo de mantê-las bem informadas sobre a doença eseu tratamento.

A iniciativa é divulgada pelo própriomédico ou por materiais do laboratóriona clínica oncológica. Ao se cadastrar noprograma pelo número 0800 12 66 44,a paciente recebe materiais informa-tivos, bem como dicas de saúde e bem-estar. Outro benefício oferecido é aentrega do medicamento prescrito,adquirido pela Pfizer mediante apresen-tação de prescrição, diretamente nolocal informado pela paciente ao efetuaro cadastro.

Mais informações: www.pfizeroncologia.com.br

Pfizer ofereceprograma deinformação ausuárias deAromasin

Femama lança Outubro Rosa 2010com foco em investimento na saúde

Divulgação

Simon

e Simon

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26 Revista GBECAM

>> dica de leitura

Olivro aborda um tema que provo-

ca grandes reflexões em pesquisa

clínica: a ética na condução de

estudos clínicos.

O estudo Tuskegee foi conduzido pelo

Serviço Público dos Estados Unidos no

Alabama no período de 1932 a 1972. Seu

objetivo era acompanhar a evolução natural

da sífilis, sem que os pacientes fossem trata-

dos. Foram recrutados 600 homens negros,

sendo 399 portadores de sífilis e 201 sem a

doença. Os pacientes não deram consenti-

mento informado, nem foram informados

de que eram portadores da doença. As infor-

mações eram de que tinham “sangue ruim”

e de que receberiam tratamento médico

gratuito, refeições nos dias dos exames e

auxílio funeral.

A inadequação ética dos primeiros anos

de condução desse estudo, quando não

havia terapêutica disponível, foi a omissão

do diagnóstico e do esclarecimento do

prognóstico, além da ausência do termo de

consentimento. Mesmo no início da década

de 50, quando já estava disponível a penicili-

na, tratamento padrão para a doença, os

pacientes permaneceram sendo observados

sem nenhuma terapia.

O estudo somente foi encerrado em 26

de julho de 1972, 40 anos depois, após a

denúncia da repórter Jean Heller no jornal

The New York Times. Por ocasião do encer-

ramento do estudo, apenas 74 pacientes

participantes permaneciam vivos, 25 haviam

morrido em decorrência da doença e 100 de

complicações relacionadas à doença. Além

disso, 40 esposas dos pacientes haviam sido

infectadas e 19 recém-nascidos eram porta-

dores de sífilis congênita.

Foram publicados vários artigos cientí-

ficos relatando os dados do estudo, cujos

títulos não deixavam dúvida de que o obje-

tivo era somente a observação, e não o

tratamento – sem nenhuma repercussão

na comunidade científica. O artigo que

relata os dados de 30 anos de acompa -

nhamento do estudo foi publicado após o

advento da penicilina.1

Em 1969, James H. Jones, historiador e

professor de história do Arkansas, especia -

lista em assuntos bioéticos, teve acesso

aos documentos do estudo, mas deduziu

que ele já tivesse sido descontinuado.

Poste rior mente, liderou uma comissão de

bioé tica que exigiu desculpas formais do

go verno americano aos oito sobreviventes

do estudo e às famílias de todos os parti -

cipantes. Em uma solenidade na Casa

Branca, em 16 de maio de 1997, 65 anos

depois do início do estudo, o então presi-

dente Bill Clinton pediu desculpas formais

aos sobreviventes e suas famílias.2

Como consequência dessa tragédia, o

Departamento de Saúde, Educação e

Bem-Estar (HEW, na sigla em inglês) esta-

beleceu legislação que constituiria os

Comitês Institucionais de Revisão (IRB, na

sigla em inglês), com requerimento de

avaliação ética prévia de estudos envol-

vendo seres humanos.

O legado do estudo Tuskegee força a

comunidade científica a reavaliar conti -

nua mente a ética na condução da pesqui -

sa clínica, principalmente no que diz res -

peito à população vulnerável.

1. Donald H. Rockwell, Anne Roff Yobs e M.

Brittain Moore Jr. The Tuskegee Study of

Untreated Syphilis - The 30th Year of Obser -

vation. Arch Intern Med. 1964;114(6):792-798.

2. AN APOLOGY 65 YEARS LATE. Online News

Hour. Disponível em: www.pbs.org/newshour/

bb/health/may97/ tuskegee_5-16.html.

Bad Blood: The TuskegeeSyphilis Experiment

James H. Jones

Reprod

ução

Por Cláudia Vasconcelos

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