Post on 05-Oct-2021
Ministério da EducaçãoUniversidade Federal de São Paulo
Campus Osasco
UNIVERSIDADE FEDERAL DE SÃO PAULO
ESCOLA PAULISTA DE POLÍTICA, ECONOMIA E NEGÓCIOS
ALEXANDER HOFFMAN NAKASHIMA
REFORMA PREVIDENCIÁRIA DE 2019 E O INCREMENTO
DOS RISCOS SOCIAIS PARA A POPULAÇÃO EM
SITUAÇÃO DE POBREZA
OSASCO
2021
ALEXANDER HOFFMAN NAKASHIMA
REFORMA PREVIDENCIÁRIA DE 2019 E O
INCREMENTO DOS RISCOS SOCIAIS PARA A
POPULAÇÃO EM SITUAÇÃO DE POBREZA
Trabalho de Conclusão de Curso apresentado
à Escola Paulista de Política, Economia e
Negócios da Universidade Federal de São
Paulo como requisito parcial para obtenção do
título de Bacharel em Ciências Atuariais.
Orientador: Prof. Celso Takashi Yokomiso
OSASCO
2021
ALEXANDER HOFFMAN NAKASHIMA
REFORMA PREVIDENCIÁRIA DE 2019 E O INCREMENTO DOS
RISCOS SOCIAIS PARA A POPULAÇÃO EM SITUAÇÃO DE
POBREZA
Trabalho de Conclusão de Curso apresentado
à Escola Paulista de Política, Economia e
Negócios da Universidade Federal de São
Paulo como requisito parcial para obtenção do
título de Bacharel em Ciências Atuariais.
Data da aprovação:
13/08/2021
Banca Examinadora:
Prof. Dr. Celso Takashi Yokomiso
EPPEN – Unifesp
Prof. Dr. João Tristan
EPPEN – Unifesp
RESUMO
Em 2020, o mundo se deparou com um cenário extremamente desafiador,
causado pela pandemia causada pelo vírus COVID-19. É nesse contexto que o
governo brasileiro encabeçado pelo presidente Jair Bolsonaro e o Ministro de
Economia Paulo Guedes vendeu a ideia de que a previdência social seria o principal
impeditivo de novos investimentos do governo.
O objetivo do estudo é analisar como a reforma, consubstanciada na Emenda
Constitucional 103, influenciou nas contribuições e concessões do Regime
Previdenciário no ano de 2020 e quais as possíveis consequências para a parcela
da população mais pobre em nosso país.
Palavras-chave: Reforma Previdenciária, Governo Bolsonaro, Emenda Constitucional, Risco social.
ABSTRACT
In 2020, the world with an extremely challenging scenario, a pandemic caused
by the COVID-19 virus. In this context that the Brazilian government headed by
President Jair Bolsonaro and Economy Minister Paulo Guedes sold the idea that
social security would be the main impediment to new government investments.
The objective of the study is to analyze how the sócia security reform, embodied
by Constitutional Amendment 103, influenced the new contributions and concessions
of the Social Security System and the possible outcomes for the poorest portion of
the population in our country.
Keywords: Social Security Reform, Bolsonaro Government, Constitutional
Amendment, Social Risk.
Sumário
RESUMO.......................................................................................................................3
LISTA DE GRÁFICOS...................................................................................................6
LISTA DE TABELAS.....................................................................................................7
1. HISTÓRIA DA SEGURIDADE SOCIAL BRASILEIRA..............................................8
2. CONTEXTO DA SEGURIDADE BRASILEIRA PRÉ E PÓS EMENDA
CONSTITUCIONAL Nº 103/2019................................................................................15
2.1 PRINCIPAIS ALTERAÇÕES ENTRE A CONSTITUIÇÃO DE 1988 E EMENDA
Nº 103......................................................................................................................15
2.2 EMENDA CONSTITUCIONAL Nº 103: NECESSIDADE OU COAÇÃO?........16
2.2.1 REGRAS DE TRANSIÇÃO........................................................................19
2.2.2 PRINCIPAIS MUDANÇAS DA EC Nº103..................................................21
3. MÉTODOS..............................................................................................................25
4. ANÁLISE DE DADOS..............................................................................................25
4.1 FLUXO DE CAIXA INSS...................................................................................26
4.2 DADOS POPULACIONAIS...............................................................................28
4.2.1 TAXAS DE DESOCUPAÇÃO....................................................................29
4.3 BENEFÍCIOS DA SEGURIDADE SOCIAL BRASILEIRA.................................35
4.3.1 BENEFÍCIOS CONCEDIDOS – REGIME GERAL DE PREVIDÊNCIA
SOCIAL (RGPS).................................................................................................37
CONSIDERAÇÕES FINAIS........................................................................................41
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS............................................................................43
LISTA DE GRÁFICOS
Gráfico 1: Distribuição Populacional com Renda Família Mensal Abaixo da Linha da
Pobreza - 2002 e 2014
Gráfico 2: População brasileira, de acordo com as divisões do mercado de trabalho,
1º trimestre 2021
Gráfico 3: Taxa de Desocupação no Brasil e nas Grandes Regiões, 1º trimestre 2021
Gráfico 4 – População residente, segundo sexo e os grupos de idade (%)
Gráfico 5 – Evolução da Despesa Real do RGPS 1988-2020 – em R$ Bilhões Reais
a Preços de Dezembro de 2020 - INPC
Gráfico 6 - Taxa de Desocupação - Média Anuais (Centro Oeste)
Gráfico 7 – Taxa de Desocupação – Média Anuais (Nordeste)
Gráfico 8 – Taxa de Desocupação – Média Anuais (Norte)
Gráfico 9 – Taxa de Desocupação – Média Anuais (Sudeste)
Gráfico 10 – Taxa de Desocupação – Média Anuais (Sul)
Gráfico 11 – Mapa de densidade para o percentual (cores) e número (pontos) de
residentes rurais – Microrregiões Brasileiras, 1991 e 2010
Gráfico 12 – Quantidade de benefícios concedidos por grandes grupos de espécie –
2020
Gráfico 13 – Valor de benefícios concedidos por grandes grupos de espécie – 2020
Gráfico 14 – Valor de Benefícios RGPS – Região CENTRO OESTE
Gráfico 15 – Valor de Benefícios RGPS – Região NORDESTE
Gráfico 16 – Valor de Benefícios RGPS – Região NORTE
Gráfico 17 – Valor de Benefícios RGPS – Região SUDESTE
Gráfico 18 – Valor de Benefícios RGPS – Região SUL
LISTA DE TABELAS
Tabela 1 – Fluxo de caixa do FRGPS - 2019/2020 - (EM R$ MIL)
Tabela 2 - Evolução Real da Arrecadação, Despesa e Resultado RGPS 1988 a 2020
(em R$ Bilhões de Dezembro de 2020 - INPC)
Tabela 3 - Dados Populacionais – 2019 x 2017
1. HISTÓRIA DA SEGURIDADE SOCIAL BRASILEIRA
Sergio Pinto Martins (2001) coloca a Alemanha, como marco inicial do que
hoje denominamos seguridade social, mais precisamente em 1884, durante o
Governo do Chanceler Otto Von Bismarck, em resposta às greves e pressões dos
trabalhadores. No Brasil, o primeiro modelo prático de previdência ganhou forma em
24 de janeiro de 1923, após a promulgação do Decreto n.º 4.682. Seus primeiros
artigos diziam:
Art. 1º Fica creada em cada uma das emprezas de estradas de ferroexistentes no paiz uma caixa de aposentadoria e pensões para osrespectivos empregados.Art. 2º São considerados empregados, para os fins da presente lei, não sóos que prestarem os seus serviços mediante ordenado mensal, como osoperarios diaristas, de qualquer natureza, que executem serviço de caracterpermanente.Paragrapho unico. Consideram-se empregados ou operarios permanentesos que tenham mais de seis mezes de serviços continuos em uma mesmaempreza (COLEÇÃO DAS LEIS DO BRASIL. 1923. V. 1., P. 126)
A lei federal que recebeu o nome de Lei Eloy Chaves, obrigava cada
companhia ferroviária do país a criar a Caixa de Aposentadorias e Pensões (CAP),
departamento incumbido de recolher as contribuições de patrão e funcionários e
pagar o benefício aos aposentados e pensionistas. No decorrer de 1923, 27
empresas instituíam suas respectivas CAPs.
Segundo reportagem de Agência Senado (2019), o Senado e a Câmara dos
Deputados tiveram um papel decisivo na concepção dos rudimentos da Previdência
Social. A lei que o presidente Arthur Bernardes assinou em janeiro de 1923 foi
proposta pelo deputado federal Eloy Chaves (SP) e aprovada pelas duas Casas do
Congresso Nacional.
Mesmo com o Senado e a Câmara dos Deputados apoiando a criação da lei,
os empresários responsáveis não demonstravam o mesmo entusiasmo com a
novidade, e segundo documentos históricos guardados nos Arquivos do Senado e
da Câmara, parlamentares denunciavam vários patrões que tentavam burlar a lei
para não pagar as aposentadorias na forma prevista. Segue a citação do então
senador Irineu Machado (DF, na época RJ), que havia trabalhado na Estrada de
Ferro Central do Brasil antes de entrar na política:
“É natural que os funcionários ferroviários de idade mais avançada, nesseperíodo da vida em que o homem começa a curvar-se para a terra embusca do túmulo, pensem em obter as vantagens da aposentadoria. De fato,os velhos servidores foram os que levantaram a ideia e recorreram aocoração generoso de Eloy Chaves, a quem coube a glória imorredouradessa iniciativa. No entanto, quando entra em vigor a lei, surgem surpresas.Todas as empresas vão buscando interpretações capciosas e contrárias aodireito dos homens do trabalho.”
Machado expôs as irregularidades cometidas pelas ferroviárias, que iam do não
depósito de sua contribuição acordada até a exclusão de representantes dos
empregados no conselho de administração das CAPs.
Com a edição da Lei Eloy Chaves, outras categorias se mobilizaram na busca
pelos mesmos direitos, provocando uma extensão dessa medida protetiva. São
exemplos dessa situação a Lei nº 5.109 (1926), que estendeu a incidência da Lei
Eloy Chaves aos portuários e marítimos, e a Lei nº 5.485 (1928), referente ao
pessoal das empresas de serviços telegráficos e radiotelegráficos.
Após a Segunda Guerra Mundial, observa-se uma tendência universalizadora do
seguro social, inspirados pelo Plano Beveridge. Tal tendência ficou explícita em
1948 com a Declaração Universal Dos Direitos Humanos, prevista na resolução 217,
(III) da Assembléia Geral das Nações Unidas, responsável por promover a elevação
da previdência ao patamar de direito fundamental, perante estabelecido no artigo
XXV. 1:
1. Todo homem tem direito a um padrão de vida capaz de assegurar asi e a sua família saúde e bem-estar, inclusive alimentação, vestuário,habitação, cuidados médicos e os serviços sociais indispensáveis, e direitoà segurança em caso de desemprego, doença, invalidez, viuvez, velhice ououtros casos de perda dos meios de subsistência em circunstâncias fora deseu controle. 2. A maternidade e a infância têm direito a cuidados eassistência especiais. Todas as crianças, nascidas dentro ou fora domatrimônio, gozarão da mesma proteção social. (ASSEMBLÉIA GERALDAS NAÇÕES UNIDAS,1948).
As maiores taxas de natalidade e crescimento econômico geravam a euforia
protetora, com a consequente universalização da clientela, sem maiores distinções
em razão das atividades econômicas. No sistema beveridgiano, as prestações
pagas pelo sistema são desvinculadas da real remuneração do trabalhador, ao
contrário do sistema bismarckiano, no qual a prestação é relacionada à cotização.
Os princípios fundamentais são a unificação institucional e uniformização dos
benefícios. O financiamento distancia-se da técnica de capitalização, com a
repartição simples, trazendo evidente enfraquecimento do aspecto atuarial do
sistema protetivo. (BEVERIDGE; CASTEL apud REGAZI, 2016).
Farias (1997) cita que após o marco inicial da política previdenciária em 1923, o
recém-criado Ministério do Trabalho, Indústria e Comércio se tornou o órgão
responsável por supervisionar as diversas Caixas de Aposentadorias e Pensões —
CAP’s – que foram criadas especificamente nas categorias profissionais mais
organizadas, como marítimos, comerciários, bancários e industriários. Em 1933,
surgiram os Institutos de Aposentadorias e Pensões — IAP’s, autarquias
organizadas em função das categorias profissionais e não mais das empresas como
as CAP’s.
O governo Vargas foi marcado por decretos que introduziram mudanças
extremamente relevantes a legislação trabalhista. Farias (1997) destaca a
regulamentação do trabalho feminino e de menores, a jornada de oito horas, as
férias para comerciários e industriários e a edição de normas regulamentadoras da
questão dos acidentes de trabalho como suas principais contribuições.
No âmbito da política de saúde, o Ministério dos Negócios da Educação e Saúde
Pública, criado em 1930, sofreu grande reformulação entre 1937 e 1941, ficando a
cargo do Departamento Nacional de Saúde as atividades relativas à saúde pública,
assistência médico-hospitalar, amparo à maternidade e à infância, planejamento,
pesquisa e aperfeiçoamento de questões de natureza médica e sanitária.
O sistema de IAP’s vigorou em sua plenitude até 26 de agosto de 1960,
momento em que a Lei Orgânica da Previdência Social (LOPS) foi promulgada
através do Decreto no 3.807. Seu principal objetivo era a uniformização das fontes
de custeio, das contribuições e dos planos de benefícios dos vários institutos.
Segundo Farias (1997) apesar de a LOPS unificar benefícios e sistemas de
financiamento entre os vários institutos, a lei era exclusiva aos trabalhadores
urbanos formais, excluindo os grupos de trabalhadores rurais e domésticos do
sistema, situação que só foi alterada nos anos 1970, com a cobertura estendida aos
trabalhadores domésticos (1972) e aos por conta própria (1973).
A diferenciação entre os direitos do trabalhador rural e urbano resultou em uma
série de instabilidades sociais geradas por movimentos camponeses, fato que
exacerbava a necessidade da abrangência das politicais de proteção social aos
trabalhadores rurais. Tal pressão resultou no Estatuto do Trabalhador Rural, lei nº
4.214, de 2 de março de 1963, que instituiu o Fundo de Assistência ao Trabalhador
Rural (Funrural), financiado pela contribuição incidente sobre o valor de
comercialização de produtos agropecuários.
Em novembro de 1966, a fusão entre os diversos Institutos Previdenciários
originou o Instituto Nacional de Previdência Social (INPS). Segundo Gentil (2015) a
nova estrutura contou com 22 superintendências regionais, 288 agências, 505
ambulatórios, 828 consultórios médicos, 27 hospitais próprios e 82.482 servidores. A
LOPS promoveu um passo significativo na história da seguridade social brasileira,
trazendo a unificação administrativa de seis dos sete institutos então existentes. As
principais atribuições do recém-criado instituto foram a prestação dos serviços de
assistência médica, pagamento de benefícios e arrecadação das contribuições
relativas a todos os trabalhadores segurados dos antigos institutos.
Em 1977, a Lei nº 6.439 instituiu o Sistema Nacional de Previdência e
Assistência Social (SINPAS), que conservou as competências previdenciárias do
INPS, e criou, entre outros órgãos, o Instituto Nacional de Assistência Médica da
Previdência Social (INAMPS). Em 1976, novamente a legislação esparsa, que havia
surgido desde a LOPS de 1960, foi unificada pelo Decreto nº 77.077 na
Consolidação das Leis da Previdência Social (CLPS). A CLPS de 1976 foi
substituída pela CLPS de 1984, aprovada pelo Decreto nº 89.312. Já o INPS passou
a concentrar-se nos processos de concessão e manutenção dos benefícios
previdenciários.
Segundo Farias (1997), o aumento nos níveis de concentração de renda e o
crescimento descontrolado dos grandes centros urbanos, resultou em um processo
de metropolização da miséria nacional em que quase metade da força de trabalho
ativa se concentrava no setor informal do mercado de trabalho, excluída, portanto,
dos mecanismos oficiais de proteção social. Farias (1997) seguiu elencando o
Estado como uma das causas da crise social, à medida que mantinha um conjunto
excludente de serviços sociais de qualidade questionável e não conseguia
equacionar os problemas relativos ao equilíbrio de suas contas, contribuindo para a
instabilidade econômica.
Somente com a Constituição Federal de 1988, sob clara influência dos modelos
de Estado do Bem-Estar Social vigentes em diversos países europeus, que as
políticas de previdência, saúde e assistência social foram reorganizadas e
reestruturadas com novos princípios e diretrizes e passaram a compor o sistema de
seguridade social brasileiro.
O parágrafo único do artigo 194 aponta para os princípios norteadores da
seguridade social:
Art. 194. (...) Parágrafo único. Compete ao Poder Público, nos termosda lei, organizar a seguridade social, com base nos seguintesobjetivos:I - universalidade da cobertura e do atendimento;II - uniformidade e equivalência dos benefícios e serviços àspopulações urbanas e rurais;III - seletividade e distributividade na prestação dos benefícios eserviços;IV - irredutibilidade do valor dos benefícios;V - equidade na forma de participação no custeio;VI - diversidade da base de financiamento;VII - caráter democrático e descentralizado da administração,mediante gestão quadripartite, com participação dos trabalhadores,dos empregadores, dos aposentados e do Governo nos órgãoscolegiados. (BRASIL. Emenda Constitucional no 20, de 1998).
Segundo (BOSCHETTI, 2006), a Constituição foi desenvolvida se apoiando no
modelo bismarckiano para a previdência social, e no modelo beveridgiano para o
atual sistema público de saúde (com exceção do auxílio-doença, tido como seguro-
saúde e regido pelas regras da previdência) e de assistência social, o que fez com
que a seguridade social brasileira se situasse entre o seguro e a assistência social.
Mesmo com atraso em relação ao resto do mundo, o sistema nacional brasileiro
de proteção social conseguiu auxiliar grande parcela da população que vivia em
condições de extrema pobreza ao redor do Brasil.
O gráfico 1, ajuda a comprovar a abrangência das políticas sociais ao
demonstrar a evolução da distribuição de renda no Brasil em suas respectivas
regiões:
Gráfico 1: Distribuição Populacional com Renda Família Mensal Abaixo da Linha da
Pobreza - 2002 e 2014
Segundo Boschetti (2006), apesar da Constituição de 1988 propor um modelo
de seguridade de caráter inovador e planejar um sistema de proteção social com
ampla cobertura, o resultado foi um sistema híbrido, que associou direitos derivados
e dependentes do trabalho (previdência) com direitos de caráter universal (saúde) e
direitos seletivos (assistência).
Boschetti (2004) indica que as diretrizes constitucionais como universalidade na
cobertura, equidade no custeio, diversidade do financiamento, caráter democrático e
descentralizado da administração (Constituição Federal, artigo 194), além da
uniformidade, equivalência, seletividade, distributividade e irredutibilidade do valor
dos benefícios, não foram materializadas e as políticas sociais foram arquitetadas de
forma bastante diferenciada, sem instituir qualquer tipo de padrão de seguridade
social homogêneo, integrado e articulado.
Apesar de apresentar princípios que poderiam ter alterado o patamar das
políticas de saúde, previdência e assistência social, a Constituição não foi efetivada
com a mesma destreza com que foi realizada sua escrita devido uma série de
elementos conjunturais e estruturais. Boschetti (2006) destaca que a onda liberal
presente no país durante a década de 90 foi fator primordial para o desenvolvimento
de uma política econômica voltada para o crescimento das receitas do país em
detrimento dos avanços sociais. A crise econômica que o país enfrentava foi
conduzida por um Estado que não assumiu compromissos redistributivos e o
“conceito retardatário, híbrido, distorcido ou inconcluso da seguridade social
brasileira, conforme apontam importantes pesquisadores do tema, encontrou
dificuldades antigas e novas ainda maiores para se consolidar” (BEHRING e
BOSCHETTI, 2006, p. 158).
BOSCHETTI (2006) conclui que a separação entre a lógica de seguro
(bismarckiana) e a lógica assistencial (beveridgiana) na seguridade brasileira acabou
materializando políticas com características próprias e específicas que mais se
excluem do que se complementam, fazendo com que, na prática, o conceito de
seguridade fique no meio do caminho, entre o seguro e a assistência.
Nas vésperas do Natal de 2016, o governo do Presidente Michel Temer, depois
de vários adiamentos, apresentou ao Congresso seu projeto de reforma da
previdência (PEC 286/2016), que mesmo sendo aprovado em comissão especial da
Câmara, ficou emperrado após a divulgação de gravações com o empresário
Joesley Batista e foi suspenso no início de 2018 devido intervenção federal no Rio
de Janeiro.
Apesar de inicialmente apresentar opinião contrária a reforma apresentada na
PEC 286/2016, o então recém-nomeado Presidente, Jair Bolsonaro escolheu a
previdência social como um dos vilões da administração pública. Cedia, assim, à
pressão de empresários e investidores que viam a reforma da previdência brasileira
como elemento fundamental para qualquer projeto de retomada da economia
nacional e que sem a reforma, o Estado não recuperaria sua capacidade de gestão
e aprimoramento dos serviços públicos, causando o colapso gradual de seus
encargos básicos, como saúde, educação e segurança pública.
No dia 12 de novembro de 2019, foi promulgada a nova Reforma da Previdência
(Emenda Constitucional 103), e a questão a ser indagada é: qual será a
consequência da mudança de condições para o gozo dos benefícios da previdência
social? Afinal, aprendemos que previdência social é um sistema de proteção voltado
a trabalhadores e dependentes frentes aos infortúnios da vida e demais
necessidades sociais. Essa reforma realizada às pressas e sem as devidas
representatividades eliminará todos os problemas das contas públicas ou apenas
irão expor desigualdades ainda maiores no Brasil?
O presente trabalho objetiva indagar quais serão os prejudicados por essa
mudança legislativa; como o processo histórico resultou na presente emenda; se
essas medidas serão efetivas para sanar o deficit brasileiro; e se seus efeitos
acarretarão benefícios ou malefícios na vida do cidadão brasileiro, seja de maneira
direta ou indireta. Assim, serão levados em conta aspectos como a densidade
demográfica, a particularidade de cada unidade federativa e a especialidade de cada
categoria dos trabalhadores brasileiros. Por exemplo, como a taxa de desemprego
varia de Estado para Estado, não seria possível entender que os efeitos da Reforma
sejam iguais em todo o território brasileiro.
2. CONTEXTO DA SEGURIDADE BRASILEIRA PRÉ E PÓS EMENDA
CONSTITUCIONAL Nº 103/2019
Conforme citado anteriormente, a aprovação da Reforma da Previdência Social,
a Emenda nº 103 de 12/11/2019, trouxe consigo modificações no principal sistema
protetivo brasileiro. Neste capítulo, serão apresentadas as alterações jurídicas das
aposentadorias e pensões por morte urbanas do Regime Geral de Previdência
Social (RGPS), caracterizando o contexto histórico da reforma, as circunstâncias
que levaram a mesma e se é possível identificar as justificativas técnicas para a
alteração de cada artigo. Após apresentação do contexto em que a reforma foi
realizada, discorreremos sobre como foi a atuação do governo federal durante do
processo, e analisaremos se as medidas foram discutidas entre as
representatividades adequadas e a efetividade das alterações realizadas pela
Emenda.
2.1 PRINCIPAIS ALTERAÇÕES ENTRE A CONSTITUIÇÃO DE 1988 E EMENDA
Nº 103
Até chegarmos na Emenda 103, o sistema de seguridade brasileiro passou
por algumas transformações de menor impacto após a Constituição de 1988, a
primeira reforma ocorreu em 1993, através da Emenda Constitucional nº 3/93 que
instituiu:
Art. 1º Os dispositivos da Constituição Federal abaixo enumerados passama vigorar com as seguintes alterações:
Art. 40 § 6º As aposentadorias e pensões dos servidores públicos federais serãocusteadas com recursos provenientes da União e das contribuições dosservidores, na forma da lei.
Art. 42
§ 10 Aplica-se aos servidores a que se refere este artigo, e a seuspensionistas, o disposto no art. 40, §§ 4º, 5º e 6º. (BRASIL. EMENDACONSTITUCIONAL Nº 3,1993)
A conquista dessa emenda foi relevante devido a inclusão do pagamento da
União e dos servidores na constituição do custeio da previdência dos membros do
Regime Próprio.
Em 1998, a Emenda Constitucional nº20/98 promoveu alterações exclusivas
aos contribuintes do Regime Próprio, estabelecendo aos servidos públicos a idade
mínima de 60 anos para homens e de 55 anos para mulheres, a exigência de 10
anos de serviço público e cinco anos no cargo em que se der a aposentadoria e o
valor máximo do benefício de aposentadoria.
A Lei nº 9.878, de 26 de novembro de 1999, instituiu o fator previdenciário no
cálculo das aposentadorias concedidas devido ao tempo de contribuição. Essa
medida tinha o objetivo de criar estímulos à postergação voluntária do momento da
aposentadoria do segurado em idade precoce (anterior aos 60 anos de idade),
fenômeno que, de acordo com grande parte dos especialistas previdenciários, é
importante fonte do desequilíbrio atuarial e financeiro em diversos sistemas
previdenciários no mundo.
Em 2005, a adoção da Emenda Constitucional nº 47/05 garantiu cobertura
diferenciada para portadores de deficiência e empregados com atividades de risco
ou insalubres. Na mesma emenda foi definida a criação de um sistema
previdenciário para as populações de baixa renda, garantindo através da criação de
alíquotas diferenciadas de contribuição o pagamento de benefício no piso
previdenciário de um salário-mínimo.
No ano de 2015, a Emenda Constitucional nº 88/2015 alterou a idade para a
aposentadoria compulsória do servidor público em geral para os 70 anos de idade,
ou aos 75 anos de idade.
Apesar das diversas medidas citadas promoverem alterações no sistema de
seguridade social brasileiro, nenhuma teve o mesmo grau de relevância política,
econômica e social como a Emenda Constitucional nº103.
2.2 EMENDA CONSTITUCIONAL Nº 103: NECESSIDADE OU COAÇÃO?
O contexto de aprovação da Reforma Previdenciária de 2019 era de um país
que passava por problemas financeiros, com altos níveis de desemprego e diversas
mudanças demográficas. O gráfico abaixo traz um panorama de como a força de
trabalho está distribuída atualmente no país:
Gráfico 2: População brasileira, de acordo com as divisões do mercado de trabalho,
1º trimestre 2021
Fonte: IBGE
O outro ponto relevante a ser considerado, é a falta de homogeneidade na
distribuição de renda ao redor do país. Cada região possui suas características
distintas, o que reflete no patamar socioeconômico de cada unidade federativa, fato
que é suportado pelo gráfico abaixo:
Gráfico 3: Taxa de Desocupação no Brasil e nas Grandes Regiões, 1º trimestre 2021
Fonte: IBGE
Referente ao aspecto demográfico do país, é historicamente conhecido que o
Brasil passa por um acelerado processo de envelhecimento de sua população. Fato
de extrema relevância para a seguridade social do país, visto que o sistema tem a
necessidade de prover assistência a população idosa, fora do mercado de trabalho.
Gráfico 4 – População residente, segundo sexo e os grupos de idade (%)
Fonte: IBGE, Diretoria de pesquisas, Coordenação do trabalho e rendimento,
Pesquisa nacional por amostra de domicílios continua 2012/2019
A pirâmide acima explicita a atual situação do país, em que o envelhecimento da
população brasileira aumentou em 2019, se comparado a 2012. Esta mudança pode
ser observada pela menor porcentagem encontrada em 2019 nos grupos etários
mais jovens (base da pirâmide), ao mesmo tempo em que houve aumento nas
porcentagens dos grupos de idade que ficam no topo da pirâmide.
Combinando-se aos dois fatores, uma maior taxa de desemprego no país e o
envelhecimento da população, o Governo Federal sustenta que os deficits
crescentes da previdência engessam a administração das contas públicas,
restringindo cada vez mais o espaço para investimento pelo Estado, argumento que
vai em linha com o pensamento de empresários e do setor financeiro.
No dia 20 de fevereiro de 2019, o governo apresentou a proposta de emenda à
constituição, chamada “Nova Previdência”, que firmou as regras necessárias para
que o país tenha um crescimento econômico bom, que permitirá uma aposentadoria
garantida a todos (BRASIL, 2019). Além disso, foi utilizado o argumento de que
estas regras foram elaboradas pensando nas próximas gerações que contribuirão
para um Brasil com uma economia segura e que fará com que sejamos um dos
países mais influentes do mundo (BRASIL, 2019).
Conforme descrito nesse trabalho, o Governo Federal deixou de tratar a
seguridade brasileira como um importante instrumento de distribuição de renda e
proteção da camada fora da força de trabalho, conforme descrito na Constituição
Federal de 1988, por um discurso de que o deficit previdenciário é o grande
causador do rombo das contas públicas.
Elencaremos as principais alterações propostas pela reforma, assim como as
regras de transição pelas quais os trabalhadores que se encontram perto de se
aposentar terão que se adaptar. Tentaremos concluir a partir da apresentação dos
dados, se a Emenda aprovada pelo governo Bolsonaro, fará o país “...reequilibrar
suas contas, atrair investimentos, gerar empregos e retomar o crescimento
econômico, garantindo que todos possam se aposentar no futuro”, conforme site
oficial do governo, ou apenas exacerbará os desiquilíbrios de um sistema
desbalanceado.
2.2.1 REGRAS DE TRANSIÇÃO
Até que a EC 103/19 esteja em completa implantação, foram estipuladas seis
regras de transição, das quais quatro se aplicam ao RGPS. A primeira apresenta o
sistema de pontos através do somatório da idade com o tempo de contribuição, em
2019 puderam se aposentar os homens que contribuíram pelo menos 35 anos e
alcançaram 96 pontos e, mulheres com 86 pontos que contribuíram pelo menos 30
anos. A partir de 1 de janeiro de 2020, esse sistema de pontos acrescenta 1 ponto a
cada ano limitado a 105 pontos para o homem e 100 pontos para a mulher (BRASIL,
2019).
A segunda regra trouxe mudanças no sistema de concessão devido à
elegibilidade por idade mínima com a vinculação do requisito tempo de contribuição.
Em 2019 puderam se aposentar homens a partir dos 61 anos com pelo menos 35
anos de contribuição, e mulheres com no mínimo 56 anos de idade e 30 anos de
contribuição. A partir de 2020 este sistema acrescenta por ano 6 meses na idade
mínima, até atingir 65 anos para homens e 62 para as mulheres (BRASIL, 2019).
A terceira regra trouxe o conceito de pedágio para quem estaria próximo de se
aposentar (2 anos ou menos de contribuição restantes) com o tempo mínimo de
contribuição de 30 anos para mulheres e 35 anos para homens. Neste caso, os
pretendentes devem cumprir um pedágio que corresponde a 50% do tempo que
faltaria para atingir os 35 ou 30 anos de contribuição, contado da data que entrou em
vigor a EC 103/19. O fator previdenciário ainda valerá (BRASIL, 2019)
A quarta regra de transição se refere ao sistema de idade mínima e carência
anterior de 15 anos. Foi estabelecido o acréscimo de 6 meses na idade mínima de
aposentadoria da mulher a partir de janeiro de 2020. Ou seja, a regra inicial de 60
anos de idade e 15 de contribuição chegará a 62 anos em 2023. (BRASIL, 2019)
A quinta regra se refere ao pedágio de 100% e engloba tanto os contribuintes do
INSS quanto servidores públicos, que podem aposentar se cumprirem um pedágio
de 100% sobre o tempo de contribuição que falta para se aposentar pelas regras
anteriores à EC 103/19.
Os trabalhadores do INSS tem a opção de se aposentar com pedágio, tanto no
setor privado quanto no setor público, escolha interessante para os segurados que
estavam mais próximos da aposentadoria. Todos terão de se enquadrar nas
seguintes regras: idade mínima de 57 anos para mulheres e 60 anos para homens,
tempo de contribuição de 30 anos para mulheres e 35 para homens, e pedágio de
100%, ou seja, o dobro do tempo que faltava para cumprir o tempo mínimo de
contribuição na data de publicação da emenda constitucional no Diário Oficial da
União.
Para os policiais federais, a idade mínima é de 52 anos para mulheres e 53 anos
para homens e tempo de contribuição de 25 anos para mulheres, com pelo menos
15 anos no exercício do cargo, e de 30 anos de contribuição para homens, com pelo
menos 20 anos no exercício do cargo, além do pedágio de 100%.
Para professores, a idade mínima exigida é 52 anos para mulheres e 55 anos
para homens somado ao pedágio de 100%.
Já para os servidores da União, é preciso cumprir 20 anos de serviço público,
com 5 anos no cargo em que o servidor pretende se aposentar. (BRASIL, 2019)
A última regra se aplica apenas para servidores públicos no que se refere ao
sistema de pontuação. Nela, soma-se o tempo de contribuição e a idade mínima,
que começa em 86 pontos para mulheres e 96 pontos para homens. A partir de 2020
este sistema acrescenta um ponto até que a pontuação alcance 100 pontos para
mulheres e 105 pontos para homens. (BRASIL,2019)
2.2.2 PRINCIPAIS MUDANÇAS DA EC Nº103
A principal alteração da EC nº103 é o estabelecimento de idade mínima para
aposentadoria tanto para os homens, quanto para as mulheres que são beneficiários
urbanos do RGPS, que modificou o § 7º do art. 201 da Carta Magna de 1988:
“§ 7º É assegurada aposentadoria no regime geral de previdência social,nos termos da lei, obedecidas as seguintes condições: (Redação dada pelaEmenda Constitucional nº 20, de 1998) I – 65 (sessenta e cinco) anos deidade, se homem, e 62 (sessenta e dois) anos de idade, se mulher,observado tempo mínimo de contribuição; (Redação dada pela EmendaConstitucional nº 103, de 2019).”
Na modalidade de concessão em razão da elegibilidade por idade mínima e
alteração no tempo mínimo de contribuição, a EC 103/19 mantém o tempo de
contribuição de 15 anos para mulheres, porém aumenta de 60 para 62 a idade
mínima para aposentadoria feminina; já para os homens mantém a idade mínima de
65 anos mas acrescenta 5 anos ao tempo de contribuição, de 15 para 20.
Essa medida é extremamente relevante, devido ao fato de extinguir a
possibilidade de aposentadoria apenas pela regra do tempo de contribuição
(mulheres que tinham 30 anos de contribuição e homens com 35 anos de
contribuição), mesmo que, nesses casos, fosse aplicado o fator previdenciário,
conforme já citado anteriormente.
A Emenda também alterou a condição referente a classe de professores
vinculados ao RGPS. O § 8º do art. 201 da CF/1988, introduziu considerável
modificação na regra de redução dos 05 (cinco) anos para aposentadoria, que
incide sobre a idade e não mais sobre o tempo de contribuição:
“§ 8º O requisito de idade a que se refere o inciso I do § 7º será reduzido em5 (cinco) anos, para o professor que comprove tempo de efetivo exercíciodas funções de magistério na educação infantil e no ensino fundamental emédio fixado em lei complementar. (Redação dada pela EmendaConstitucional nº 103, de 2019).”
Referente ao benefício de pensão por morte, a Emenda 103 apresentou uma
relevante alteração em sua fórmula de cálculo que, após aprovação, foi relacionado
ao número de dependentes do segurado. Abaixo, transcreve-se as principais
mudanças ocorridas no âmbito da pensão por morte:
Art. 23. A pensão por morte concedida a dependente de segurado doRegime Geral de Previdência Social ou de servidor público federal seráequivalente a uma cota familiar de 50% (cinquenta por cento) do valor daaposentadoria recebida pelo segurado ou servidor ou daquela a que teriadireito se fosse aposentado por incapacidade permanente na data do óbito,acrescida de cotas de 10 (dez) pontos percentuais por dependente, até omáximo de 100% (cem por cento). § 1º As cotas por dependente cessarão com a perda dessa qualidade e nãoserão reversíveis aos demais dependentes, preservado o valor de 100%(cem por cento) da pensão por morte quando o número de dependentesremanescente for igual ou superior a 5 (cinco). § 2º Na hipótese de existirdependente inválido ou com deficiência intelectual, mental ou grave, o valorda pensão por morte de que trata o caput será equivalente a: I – 100% (cem por cento) da aposentadoria recebida pelo segurado ouservidor ou daquela a que teria direito se fosse aposentado porincapacidade permanente na data do óbito, até o limite máximo debenefícios do Regime Geral de Previdência Social; e II – uma cota familiar de 50% (cinquenta por cento) acrescida de cotas de10 (dez) pontos percentuais por dependente, até o máximo de 100% (cempor cento), para o valor que supere o limite máximo de benefícios doRegime Geral de Previdência Social. § 3º Quando não houver mais dependente inválido ou com deficiênciaintelectual, mental ou grave, o valor da pensão será recalculado na forma dodisposto no caput e no § 1º. (…) (Redação dada pela EmendaConstitucional nº 103, de 2019).”
Em sua redação original no art. 75 da Lei de Benefícios, a pensão por morte
consistia em um valor de cota familiar de 80% da aposentadoria que o falecido
recebia ou a que teria direito, se estivesse aposentado na data de seu falecimento,
com acréscimo de 10% por dependente, até o limite de 02 (duas) cotas, ou seja,
100%. Em caso de falecimento por acidente de trabalho, a pensão era de 100% do
salário de benefício ou do salário de contribuição na data do acidente, dependendo
do que fosse mais vantajoso.
Mais adiante, com a edição da Lei nº 9.032/1995, o art. 75 da Lei de Benefícios
teve nova redação e “no ritmo do avanço social, foi elevado e unificado o coeficiente
de cálculo da pensão ao patamar máximo de 100% (cem por cento) do salário de
benefício, inclusive a decorrente de acidente de trabalho” (ALENCAR, 2020, p. 230
apud MOURA, 2021). Ora, como se vê, a pensão por morte, com o passar do tempo
e da evolução social, foi garantindo maior proteção aos dependentes, especialmente
em sua fórmula de cálculo, mas a Emenda 103 seguiu o sentido do retrocesso
social, restaurando o valor de benefício que havia sido estabelecido há cerca de 60
anos.
Outro aspecto relevante que foi inserido na Emenda 103, foi a alteração na
fórmula do cálculo trazida pela disposição transitória constante do art. 26, a qual
baliza a maioria das espécies e modalidades de aposentadorias (inclusive a Regra
de Transição do art. 15, § 4º da EC nº 103/2019), merecendo destaque o que segue
abaixo:
Art. 26. Até que lei discipline o cálculo dos benefícios do regime próprio deprevidência social da União e do Regime Geral de Previdência Social, seráutilizada a média aritmética simples dos salários de contribuição e dasremunerações adotados como base para contribuições a regime próprio deprevidência social e ao Regime Geral de Previdência Social, ou como basepara contribuições decorrentes das atividades militares de que tratam osarts. 42 e 142 da Constituição Federal, atualizados monetariamente,correspondentes a 100% (cem por cento) do período contributivo desde acompetência julho de 1994 ou desde o início da contribuição, se posterioràquela competência. (…) § 2º O valor do benefício de aposentadoria corresponderá a 60% (sessentapor cento) da média aritmética definida na forma prevista no caput e no § 1º,com acréscimo de 2 (dois) pontos percentuais para cada ano decontribuição que exceder o tempo de 20 (vinte) anos de contribuição noscasos: I – do inciso II do § 6º do art. 4º, do § 4º do art. 15, do § 3º do art. 16e do § 2º do art. 18; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 103, de2019).”
Na regra de cálculo anterior, a RMI (Renda Mensal Inicial) consistia na média
aritmética simples dos 80% maiores salários de contribuição de todo o período
contributivo, desde a competência de julho do ano de 1994 (07/1994). Ou seja, os
20% piores salários de contribuição (SC) eram descartados do cálculo, com
posterior multiplicação pelo fator previdenciário ou não, conforme o caso.
Na regra atual, além de considerar a média aritmética simples de 100% dos
salários de contribuição de todo o período de contribuição desde a competência de
07/1994 ou, se posterior à competência citada desde a primeira contribuição, haverá
a aplicação de outro percentual sobre o valor da média apurada. Esse percentual é a
alíquota de 60% da média obtida na primeira parte, com acréscimo de 2% a cada
ano que ultrapassar 20 anos de TC (homens) e 2% a cada ano que ultrapassar 15
anos de TC (mulheres).
Moura (2021) explicita que na ânsia de ajustar as contas públicas e manter o
setor financeiro controlado, os direitos sociais e os valores do trabalho do
contribuinte, foram deixados em segundo plano, optando por adiantar matéria
reservada à Lei na Emenda Constitucional 103.
Por fim, outra mudança de extrema relevância está disposta no art. 28, medida
que majorou as alíquotas de contribuições dos segurados empregados, domésticos
e trabalhadores avulsos. Os trabalhadores que recebem acima de um salário-
mínimo tiveram aumento em suas alíquotas previdenciárias e os que recebem até o
mínimo constitucional foram minoradas em 0,5% (meio por cento). Assim, destaca-
se a redação do dispositivo supracitado da Emenda 103:
Art. 28. Até que lei altere as alíquotas da contribuição de que trata a Leinº 8.212, de 24 de julho de 1991, devidas pelo segurado empregado,inclusive o doméstico, e pelo trabalhador avulso, estas serão de: I – até 1 (um) salário-mínimo, 7,5% (sete inteiros e cinco décimos porcento); II – acima de 1 (um) salário-mínimo até R$ 2.000,00 (dois mil reais), 9%(nove por cento); III – de R$ 2.000,01 (dois mil reais e um centavo) até R$ 3.000,00 (três milreais), 12% (doze por cento); e IV – de R$ 3.000,01 (três mil reais e um centavo) até o limite do salário decontribuição, 14% (quatorze por cento). § 1º As alíquotas previstas no caputserão aplicadas de forma progressiva sobre o salário de contribuição dosegurado, incidindo cada alíquota sobre a faixa de valores compreendidanos respectivos limites. § 2º Os valores previstos no caput serãoreajustados, a partir da data de entrada em vigor desta EmendaConstitucional, na mesma data e com o mesmo índice em que se der oreajuste dos benefícios do Regime Geral de Previdência Social, ressalvadosaqueles vinculados ao salário-mínimo, aos quais se aplica a legislaçãoespecífica.(Redação dada pela Emenda Constitucional nº 103, de 2019).”
Anterior a Reforma, existia três preceituais de contribuição para o INSS de
acordo com a renda do empregado da iniciativa privada: 8%, 9% e 11% (BRASIL,
1998). Com a reforma da previdência os percentuais vão se alterar, havendo uma
alíquota diferente (alíquota progressiva) para cada parcela do salário, sendo de
7,5%, 9%, 11% e 14%, desta forma será necessário calcular salário a salário, uma
vez que a incidência da contribuição se dá por faixa de renda (BRASIL, 2019).
3. MÉTODOS
O presente trabalho tem como método a pesquisa bibliográfica, de caráter
exploratório. Para Gil (1999) todo trabalho é de natureza exploratória quando este
possuir a finalidade primordial de desenvolver, esclarecer e transformar conceitos
para a formulação de abordagens posteriores. Assim, esta pesquisa pretende
fornecer maior conhecimento acerca do assunto, a fim de que seja possível a
formulação de problemas mais precisos ou criadas hipóteses a serem pesquisadas
por estudos posteriores.
Para tanto, utilizou-se dados da previdência, disponibilizados em documentos
oficiais e em sites do próprio governo, para apresentar o panorama atual do sistema
de seguridade brasileiro.
4. ANÁLISE DE DADOS
O ano de 2020 foi marcado por graves e sérias consequências sanitárias,
econômicas e sociais decorrentes da pandemia de COVID pelo mundo e com uma
intensidade muito forte no caso brasileiro. Após a eclosão da pandemia do novo
coronavírus, durante o primeiro semestre do ano de 2020, os governantes
começaram a se preocupar com os efeitos nefastos que a doença poderia causar no
sistema de saúde público. Isso obrigou a imposição de um isolamento social com
graves consequências econômicas.
O principal setor afetado foi o de serviços, devido ao fato de as pessoas estarem
impedidas de sair de casa. Dessa forma, o governo anunciou uma série de medidas
para transferir alguma renda para os cidadãos que ficaram sem poder trabalhar, indo
ao contrário à ideologia apresentada no decorrer das negociações da reforma da
previdência. Do ponto de vista econômico, vale o destaque para o auxílio
emergencial, medida que serviu para reduzir o impacto negativo na economia.
Dentro das análises dos dados, apresentaremos uma seção com informações
do país como um todo, seguido de considerações por regiões, devido à grande
heterogeneidade que pode ser encontrada no território brasileiro e da condição
econômica/social de cada unidade federativa.
4.1 FLUXO DE CAIXA INSS
Tabela 1 - Fluxo de caixa do FRGPS - 2019/2020 - (EM R$ MIL)
No ano de 2020, o RGPS apresentou, em valores nominais, uma arrecadação
da ordem de R$ 404,8 bilhões e uma despesa da ordem de R$ 663,9 bilhões,
gerando um deficit da ordem de R$ 259,1 bilhões (Tabela 1). Se descontarmos a
inflação (INPC), a arrecadação teve uma queda real de 5,7% como reflexo dos
efeitos negativos da pandemia sobre a atividade econômica. Como a despesa teve
incremento real de 2,5%, o deficit, em termos reais, teve incremento de 18,4%. Em
valores nominais, a despesa aumentou de R$ R$ 626,5 para R$ 663,9 bilhões entre
2019 e 2020 (+6% ou + 37,4 bilhões). Portanto, a piora do deficit do RGPS de R$
45,9 bilhões, entre 2019 e 2020 (de R$ 213,2 para R$ 259,1 bilhões), pode ser
decomposta em uma queda da arrecadação de R$ 8,5 bilhões e um aumento da
despesa de R$ 37,4 bilhões.
Tabela 2 - Evolução Real da Arrecadação, Despesa e Resultado RGPS 1988 a 2020
(em R$ Bilhões de Dezembro de 2020 - INPC)
Ao estender a análise para um período maior, conseguimos identificar as
mudanças estruturais da sociedade brasileira que apresentamos nos capítulos
anteriores, resultando em um aumento das despesas com benefícios, devido ao
envelhecimento da população; e por conta da população econômica ativa não
crescer na mesma proporção que envelhece, levando o deficit a aumentar a cada
ano.
Gráfico 5 – Evolução da Despesa Real do RGPS 1988-2020 – em R$ Bilhões Reais
a Preços de Dezembro de 2020 - INPC
Fonte: Ministério da Economia
Em relação a evolução da despesa do RGPS, conseguimos identificar que nas
últimas três décadas tivemos uma mudança significante no volume de benefícios e
que, mesmo com as reformas de 1998, 2003, 2012, 2014 e, atualmente, a de 2019,
não conseguimos identificar a efetividade das mudanças que cada reforma
promoveu no sistema. Dessa forma, dificilmente conseguiremos distinguir o projeto
de longo prazo do governo brasileiro e onde queremos chegar como país em relação
ao cuidado social de sua população.
4.2 DADOS POPULACIONAIS
A seguir, apresentaremos os dados da população brasileira e como está a
distribuição daqueles que realizam as contribuições para a manutenção do RGPS,
assim como as proporções entre os trabalhadores que pertencem ao espaço rural ou
urbano.
Tabela 3 - Dados Populacionais – 2019 x 2017
Ao analisar o relatório de distribuição de ocupação do país, conseguimos
identificar que aproximadamente 50% (104,9 x 209,5 MM) da população compõe o
grupo da população economicamente ativa em 2019, ou seja, estão aptos a
empregabilidade, e desse grupo, 12% (12,9 x 104,9 MM) não possui emprego, o que
traz o percentual de desemprego no país.
4.2.1 TAXAS DE DESOCUPAÇÃO
Abaixo apresentaremos a evolução da taxa média de desocupação, respeitando a
diversificação de cada Unidade Federativa e as Regiões do Brasil, que agrupam
características físicas, culturais, sociais e econômicas próprias. Essa distinção entre
regiões é extremamente relevante em qualquer discussão estrutural de nosso país,
devido à alta heterogeneidade de sua população. Qualquer mudança na
Constituição Federal deveria ter como compromisso a diminuição entre as
desigualdades encontradas nas condições de vida entre UF’s. Todos os dados
apresentados a seguir foram divulgados pelo IBGE obtidos pela metodologia da
PNAD Contínua.
Gráfico 6 - Taxa de Desocupação – Médias Anuais (Centro-Oeste)
Gráfico 7 – Taxa de Desocupação – Médias Anuais (Nordeste)
2012 2013 2014 2015 2016 2017 2018 2019 20200
2
4
6
8
10
12
14
16
Centro Oeste
Brasil
Distrito Federal
Goiás
Mato Grosso
Mato Grosso do Sul
Ano
%
2012 2013 2014 2015 2016 2017 2018 2019 20202
4
6
8
10
12
14
16
18
20
22
Nordeste
Brasil
Alagoas
Bahia
Ceará
Maranhão
Paraíba
Pernambuco
Piauí
Rio Grande do Norte
Sergipe
Ano
%
Gráfico 8 – Taxa de Desocupação – Médias Anuais (Norte)
Gráfico 9 – Taxa de Desocupação – Médias Anuais (Sudeste)
2012 2013 2014 2015 2016 2017 2018 2019 20202
4
6
8
10
12
14
16
18
20
22
Norte
Brasil
Acre
Amapá
Amazonas
Pará
Rondônia
Roraima
Tocantins
Ano
%
2012 2013 2014 2015 2016 2017 2018 2019 20202
4
6
8
10
12
14
16
18
20
22
Sudeste
Brasil
Espírito Santo
Minas Gerais
Rio de Janeiro
São Paulo
Ano
%
Gráfico 10 – Taxa de Desocupação – Médias Anuais (Sul)
Fonte: PNAD Contínua
Com a apresentação da evolução histórica da taxa de desocupação dos 26
estados e do distrito federal conseguimos confirmar nossa hipótese de que qualquer
mudança de modelo que venha contemplar toda a população brasileira, como por
exemplo a EC 103, pode vir a camuflar desigualdades e distorções entre as UF’s,
devido ao alto grau de heterogeneidade dos aspectos já citados anteriormente.
Em sua análise da taxa média de desocupação em 2020, o IBGE afirma que 20
estados do país apresentaram recorde em seu índice de desocupação,
acompanhando a média nacional, que aumentou de 11,9% em 2019 para 13,5% no
ano passado, a maior da série histórica da PNAD Contínua, iniciada em 2012. As
maiores taxas foram registradas em estados do Nordeste e as menores, no Sul do
país. Mesmo que o efeito pandêmico tenha tido alta influência nas taxas de 2020,
esse delta apenas confirma como o Brasil não tem um sistema trabalhista
estruturado e como isso afeta diretamente o deficit do RPGS.
2012 2013 2014 2015 2016 2017 2018 2019 20202
4
6
8
10
12
14
16
Sul
Brasil
Paraná
Rio Grande do Sul
Santa Catarina
Ano
%
4.2.2 ESPAÇO RURAL X URBANO
Apesar das inerentes dificuldades e controvérsias na delimitação do espaço
rural, estudos apontam para um acelerado processo de redução da população rural
brasileira, sobretudo a partir dos anos 60. Entre 1970 e 2010, a participação da
população rural caiu de 44% para 15,6%, o que qualifica a velocidade do processo
de urbanização no Brasil.
Gráfico 11 – Mapa de densidade para o percentual (cores) e número (pontos)
de residentes rurais – Microrregiões Brasileiras, 1991 e 2010
Fonte: Microdados dos Censos Demográficos 1991 e 2010
Referente aos motivos desse processo de redução da população rural do país,
Maia e Buainain (2018) citam tanto fatores endógenos, como a queda da
fecundidade e a fragmentação das famílias; quanto exógenos, como a modernização
da agricultura e as extremas desigualdades territoriais. Os autores concluem que
nos centros urbanos, a falta de um planejamento adequado gerou grandes
aglomerados populacionais, caóticos em provisão de infraestrutura e qualidade de
vida.
Neste fenômeno, refletido no mercado de trabalho e, por consequência, nas
áreas urbanas, as desigualdades sociais tendem a se acentuar. Isto, por sua vez,
tem acarretado em uma crescente oferta de mão de obra de baixa qualificação em
ocupações de serviços de baixa remuneração, como por exemplo, a construção civil.
4.3 BENEFÍCIOS DA SEGURIDADE SOCIAL BRASILEIRA
Após apresentarmos algumas das diversas características da população do
país, conseguimos identificar a dificuldade de classificação de um perfil do brasileiro,
resultando em medidas arbitrárias que giram em torno da narrativa construída pelo
governo, se aproveitando da ignorância em torno do assunto, para atender os
interesses e alianças construídas pré, durante e pós processo eleitoral.
A seguir, discutiremos sobre os dados das concessões dos benefícios
previdenciários no ano de 2020, para enfim concluirmos se as medidas já efetivadas
pela EC 103 irão expor a sua população mais vulnerável ao risco social, ou como o
governo Bolsonaro definiu em seu site oficial durante a campanha de marketing: “o
texto estabelece uma lógica bem simples: acabar com privilégios. Pelas regras
propostas, quem ganha mais deve contribuir mais com o sistema de aposentadorias;
já aqueles com salários menores devem contribuir menos.”
Gráfico 12 – Quantidade de benefícios concedidos por grandes grupos de espécie –
2020
Jane
iro
Fever
eiro
Mar
çoAbr
ilM
aio
Junh
oJu
lho
Agost
o
Setem
bro
Outub
ro
Novem
bro
Dezem
bro
0
50.000
100.000
150.000
200.000
250.000
300.000
350.000
400.000
450.000
500.000
RGPS
Assistencial
Mês
Qu
an
tida
de
Gráfico 13 – Valor de benefícios concedidos por grandes grupos de espécie – 2020
Fonte: INSS, Suibe e Síntese-web
Ao observar a quantidade e valor total de benefícios concedidos em 2020, é
possível identificar uma predominância na concessão dos benefícios que são
administrados pelo RGPS.
Entretanto fica evidente a importância dos benefícios assistenciais em nosso
país, principalmente pelo contexto pandêmico do ano de 2020. O benefício
assistencial, que é garantia constitucional do cidadão, presente no art. 203, inciso V
da Constituição Federal, sendo regulamentado pela Lei 8.742/93 (Lei Orgânica da
Assistência Social – LOAS), podem ser caracterizados como a forma do estado
minimamente amparar pessoas que não possuam meios de prover a própria
subsistência ou de tê-la provida por sua família.
O Benefício de Prestação Continuada (BPC) consiste no programa
socioassistencial mais dispendioso para o governo federal. Através dele, no entanto,
concede-se o valor de um salário-mínimo aos idosos com idade acima de 65 anos
em situação de pobreza e às pessoas com deficiência que estão impossibilitadas de
participar e se inserir em paridade de condições com o restante da sociedade. Desta
forma, o BPC garante dignidade a grupos historicamente excluídos.
Jane
iro
Fever
eiro
Mar
çoAbr
ilM
aio
Junh
oJu
lho
Agost
o
Setem
bro
Outub
ro
Novem
bro
Dezem
bro
0
100.000.000
200.000.000
300.000.000
400.000.000
500.000.000
600.000.000
700.000.000
RGPS
Assistencial
Mês
Va
lor
(R$
)
No dia 2 de abril de 2020, o Governo Federal aprovou a antecipação do
pagamento do Benefício de Prestação Continuada (BPC), prevista na Lei nº 13.982,
aos requerentes do benefício, para tentar diminuir a exposição social de muitas
famílias durante o período da pandemia do novo Coronavírus (Covid-19). O que
reflete diretamente na quantidade de concessões de benefícios assistenciais,
principalmente no mês de Abril, mês em que a medida foi aprovada.
4.3.1 BENEFÍCIOS CONCEDIDOS – REGIME GERAL DE PREVIDÊNCIA SOCIAL
(RGPS)
A seguir, finalizaremos nossa análise destrinchando os valores dos benefícios
concedidos pelo RGPS, parcela mais significante do volume de recursos transitados
pelo sistema de seguridade social. Manteremos a linha de apresentação dos dados
de desocupação, respeitando a diversidade de cada Unidade Federativa. Todos os
dados foram obtidos do Boletins Estatísticos da Previdência Social, com os gráficos
sendo montados pelo autor.
Gráfico 14 – Valor de Benefícios RGPS – Região CENTRO OESTE
Jane
iro
Fever
eiro
mar
ço abril
maio
junho
julho
agos
to
sete
mbr
o
outu
bro
nove
mbr
o
deze
mbr
o0
20.000.000
40.000.000
60.000.000
80.000.000
100.000.000
120.000.000
CENTRO-OESTE
Mato Grosso do Sul
Mato Grosso
Goiás
Distrito Federal
Mês
R$
Gráfico 15 – Valor de Benefícios RGPS – Região NORDESTE
Gráfico 16 – Valor de Benefícios RGPS – Região NORTE
Jane
iro
Fever
eiro
mar
ço abril
maio
junho
julho
agos
to
sete
mbr
o
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NORTE
Rondônia
Acre
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Roraima
Pará
Amapá
Tocantins
Mês
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Gráfico 17 – Valor de Benefícios RGPS – Região SUDESTE
Gráfico 18 – Valor de Benefícios RGPS – Região SUL
Ao analisarmos as taxas de desocupação, anteriormente apresentadas no
trabalho, e as concessões de benefícios do RGPS por Unidade Federativa, fica
evidente a singularidade que cada UF apresenta dentro do território nacional,
principalmente em relação as oportunidades no mercado de trabalho. Podemos
afirmar que a previdência social é um seguro que repõe a renda do contribuinte
quando ele perde a capacidade para o trabalho, sendo um importantíssimo
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SUDESTE
Minas Gerais
Espírito Santo
Rio de Janeiro
São Paulo
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SUL
Paraná
Santa Catarina
Rio Grande do Sul
Mês
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mecanismo de distribuição de renda a parcela da população que já passou de sua
fase economicamente ativa e contribuiu ao sistema durante toda sua vida.
No entanto, o que os gráficos mostram é que mesmos estados de uma mesma
Região podem apresentar números de taxas de desocupação e concessão de
benefícios que não se correlacionam com os demais da mesma região (Exemplo:
São Paulo).
Segundo o Ministério da Economia (2021), no Brasil, a estimativa é de que cerca
de 38% da população economicamente ativa com até 29 anos de idade estejam na
informalidade. Estimativa que reforça a hipótese de que o principal problema do
sistema de seguridade social é a falta de um sistema trabalhista nacional
consolidado e oportunidades profissionais formais ao redor do país. Mudar
especificidades nas regras de concessões atuais, em que o principal resultado seria
no processo orçamentário, não levará ao provimento da seguridade social à
população.
Assim, o acesso do cidadão ao direito de se aposentar fica extremamente
prejudicado, principalmente em um contexto em que o desemprego e informalidade
é uma situação cotidiana em nosso país. Sendo o acesso à previdência social de
caráter contributivo, a obrigatoriedade do recolhimento implica na restrição do
acesso ao direito, uma vez que aqueles que não possuem capacidade contributiva
não são amparados pela previdência social.
O parecer do professor José Ricardo Costa, em 2009, ainda pode ser analisado
no contexto atual pós EC 103:
[...] alteram de forma substantiva a estrutura do sistema previdenciário, ouseja, não asseguram nenhuma gestão democrática nas políticas públicasprevidenciárias; não alteram o sistema de arrecadação e de fiscalização dasreceitas da seguridade em geral e da previdência em particular; não criammecanismos para conter a sonegação, a evasão de recursos, o desvio denumerário (sendo o Governo o ator principal neste caso, quando se trata daprevidência pública dos servidores), muito menos a quantidade de fraudesque assolam, diariamente, a Previdência Social em todos os cantos do país.(2009, p. 67).
Pode-se afirmar que a Emenda Constitucional 103, proposta no início do novo
Governo Federal, tornou-se seu principal projeto político. Foi apresentada no
Congresso Nacional, consubstanciada na PEC 6/2019. Desde então, os
representantes do governo faziam questão de tratar a seguridade social e o sistema
de previdência social como o vilão das contas públicas. O falso consenso vendido
pelo governo Bolsonaro, somado com a ignorância da população em vista de um
tema tão cheio de “falsas verdades”, fez a reforma ser aprovada e comemorada pelo
então presidente.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Neste trabalho, tentamos abordar desde os conceitos primários e o contexto
histórico do sistema de seguridade social brasileiro até a situação das concessões
de benefícios no ano de 2020, para então responder se a Emenda Constitucional
103, incrementara os riscos sociais para a população em situação de pobreza.
Conforme fomos analisando os dados coletados, conseguimos identificar um
Brasil com perspectivas de forte envelhecimento de sua população, o que significa
uma maior quantidade de benefícios que o INSS terá que administrar. Considerando
a manutenção dos elevados níveis de informalidade e desocupação no mercado de
trabalho brasileiro, o cenário fica mais pessimista em relação aos trabalhadores que
custearão o já caro e seletivo sistema de aposentadoria do RGPS.
As medidas de maior impacto, trazidas pela Emenda Constitucional 103, são a
da extinção da possibilidade de aposentadoria exclusivamente por tempo de
contribuição e a alteração das alíquotas de contribuição do INSS. Essas alterações
podem impactar, principalmente, a parcela da população que estava na iminência de
aposentadoria, agora precisando se adaptar as confusas regras transitórias.
Porém, a situação que conseguimos identificar no presente trabalho, são os
diversos problemas estruturais do país, que apenas dificultam a construção de um
sistema de seguridade estável que, ao mesmo tempo, consiga distribuir
aposentadorias aos trabalhadores que foram privilegiados em possuir um emprego
formal durante a vida, mas também que possa garantir à população mais pobre e
vulnerável condições de vida adequadas para que tenham acesso ao mercado de
trabalho, e não apenas dependam da informalidade e de benefícios assistenciais
que garantem o mínimo para uma vida justa.
Não há como afirmar que as alterações trazidas pela Emenda Constitucional
103 promoverão proteção social. O favorecimento político e econômico de grupos
específicos reflete um governo sem o mínimo de sensibilidade para tratar de uma
questão tão relevante para o país e que afetará milhões de brasileiros diretamente.
Vendeu-se uma narrativa de que os problemas das contas públicas estarão
resolvidos a partir da aprovação da reforma, sem pesar os deveres do próprio
Estado em promover inclusão, equidade e justiça social.
A reforma apenas alterará as condições das pessoas que hoje já estão
presentes no sistema de RPGS, e não tocará em um dos principais problemas do
sistema de seguridade social, que consiste na dificuldade das gerações mais jovens,
principalmente as que não estão próximas de centros econômicos do país, de
adentrar o mercado de trabalho formal, o que só aumenta os altíssimos índices de
informalidade do país.
Dessa forma, mesmo que não diretamente, a reforma previdenciária comandada
pelo governo Bolsonaro muda as condições de contribuição e concessões dos
benefícios. Porém, em nenhum momento, foi identificado no discurso do governo a
preocupação com o principal índice que justifica o deficit da previdência social, o
desemprego que assola seu território.
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