Tema do 48 shortmedia v2

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Tema da segunda edição do 48 Shortmedia

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TEMA

“48 SHORT MEDIA”

TEMA O tema escolhido para o evento deste ano, é a obra do escritor Aquilino Ribeiro, nomeadamente os romances “Quando os Lobos Uivam”, “Arcas Encoiradas” e “Terras do Demo”. Estão em anexo dois documentos cedidos pelo Centro de Estudos de Aquilino Ribeiro. A leitura desses documentos permitirá de forma relativamente simples “compreender” a escrita de Aquilino nas obras referidas, a sua visão em relação ao espaço físico, aos personagens e aos vários aspetos do dia-a-dia. A liberdade criativa é total, mas é necessário que existam no guião referências que permitam identificar, de forma indubitável, a inspiração nestas obras de Aquilino. A primeira fase de seleção será feita mediante a apresentação do guião a ser filmado durante o evento e um objeto audiovisual realizado por um dos elementos do grupo. A fase de seleção termina a 7 de Junho às 19h e os selecionados serão avisados até às 13h do dia 9 de Junho. Os guiões apresentados para a seleção poderão vir a ser adaptados, durante a rodagem da curta, no entanto devem manter a estrutura e personagens. Existirá um objeto de utilização obrigatória na curta-metragem, cartaz e presença na web. As normas de criação do cartaz e presença na web serão divulgadas no briefing inicial. Haverá a obrigatoriedade de filmar uma cena num local indicado pela organização mediante sorteio a realizar durante o briefing. Toda a captura de imagens e edição deverá ser feita durante as 48h do evento, o não cumprimento deste critério implica a desclassificação. Toda a edição deverá ser efetuada nas instalações do Solar do Vinho do Dão. O 48 Shortmedia disponibiliza um “elenco” de onde deve ser escolhido pelo menos um ator. Relembramos que o tempo máximo de duração de cada curta é de dez minutos incluindo introdução e créditos.

Não existe material de Vídeo tal como camaras, objetivas, tripés, microfones, gravadores, etc.. Para emprestar aos participantes. Existem como referido no regulamento, iluminadores, um “estúdio de fotografia” com um sistema de flash, um “estúdio de vídeo” com um sistema de fundos com branco, preto, verde e azul e iluminação fixa, e ainda uma sala com isolamento acústico Contactos: 1 – E-mail: 48shortmedia@epms.pt 2 – Facebook: https://www.facebook.com/48shortmedia 3 – Escola Profissional Mariana Seixas – 232 468 078

A entidade organizadora

Escola Profissional Mariana Seixas (EPMS - Viseu)

Anexo – 1

Terras do Demo Arcas Encoiradas

Aquilino Ribeiro Terras do Demo e Arcas encoiradas (Extracto do ensaio de José Manuel Sobral)

[…]

1. O NACIONAL E O LOCAL

O mundo rural da obra de Aquilino Ribeiro é, quase sem excepção, o que o viu nascer: a Serra da Nave, espaço planáltico sito na Beira Alta, na parte Norte do distrito de Viseu, também conhecido por Serra de Leomil. É terra de clima continental, prolongamento da meseta ibérica, de acesso por muito tempo difícil. Terras altas, de pão de centeio, de castanheiros, com algum milho e batata, pouco vinho e azeite, produtos que necessitam clima mais ameno. A serra foi terra de matos e pasto de gados – ovelhas, cabras, mesmo porcos – antes de aos povos ter sido tirado o controlo do uso comum dos baldios do planalto, florestados com pinheiro na década de cinquenta do século XX1. Território pobre, pelo seu carácter “bárbaro e agreste” crismou-o como Terras do Demo. Espaço físico, em que o meio molda o homem: “(...) o serrano, confinado em suas barrocas e corujeiras (...) entregue aos individualismos que derivam inevitavelmente da sua inexpansão, é mais bárbaro, bronco e indócil do que o irmão da planície” (Arcas Encoiradas, p. 115)2. Este espaço, onde as características físicas se ligam às sociais, é representado por Aquilino de modo ambivalente. Ele é, por um lado, um mundo fascinante, de contacto íntimo com a natureza e os animais, que lhe inspira a criação dos personagens principais da sua obra; o beirão é representado com as qualidades de “feitio positivo, constância e tenacidade”, e o serrano propriamente dito, conquanto “bárbaro, bronco”, como ser altivo e homem livre (Arcas Encoiradas, pp. 113-115). Por outro, o universo social da aldeia é, para o intelectual urbano e cosmopolita em que se transformou, “um conglomerado lôbrego, rotineiro e depauperado fisicamente” (Aldeia, p.94), que era necessário desenvolver, civilizar. Há múltiplas passagens da sua obra em que se exaltam as infraestruturas materiais que consubstanciam o dito progresso, como as estradas que irão retalhar a Nave um dia, pondo fim ao seu isolamento “tibetano”. Vê chegar o petróleo, o automóvel, a escola e a electricidade, estas últimas decorrentes da iniciativa política do Estado Novo, que ele, um adversário político, não se coíbe de elogiar. A Etnografia de Aquilino Ribeiro Todavia, Aquilino revela-se também um céptico desiludido com a evolução histórica das sociedades, em particular no século XX – o século da bomba atómica, dos campos de concentração, da Cortina de Ferro (Arcas Encoiradas). Pensa que em matéria de moral não se progrediu, ou porventura até sucedeu o contrário, desde os tempos pré-históricos: “O nosso antepassado tinha necessariamente que ser prestável ao seu semelhante; generoso com o fraco e altruísta; benigno, senão indiferente às tramóias do sexo, porquanto a moral respectiva veio com a fórmula de propriedade e com o fervor religioso; desprendido de bens, pois que tudo era seu e nada era seu; caritativo e bom, uma vez que estas virtudes dimanam mais do instinto de raça que da educação. O homem pré-histórico valia, portanto mais, incomparavelmente mais, sob o aspecto humano, que nós os civilizados...” (Arcas... 77-78)3. 1 Os baldios da serra, abrangendo seis concelhos, vão ser submetidos ao regime florestal em Dezembro de 1954; cf. João Antunes Estêvão, “A florestação dos baldios”, in Análise Social, vol. XIX (7-78-79), 1983-3º, 4º, 5º, pp. 1243-44. 2 Os tópicos referentes ao modo como o “meio” – território, clima – determina a vida sociocultural são muito antigos, surgindo já no pensamento grego. Cf. Marvin Harris, The Rise of Anthropological Theory, New York, HarperCollins, pp.41-41. 3 No texto de Aquilino coexiste a presença de uma crença optimista no progresso, aqui associada ao desenvolvimento das comunicações e da instrução pública, com o cepticismo face aos resultados morais do progresso material. Porventura, a maior ou menor importância dessas atitudes poderá correlacionar-se com momentos históricos específicos e com a própria história da vida do escritor, podendo entretanto o cepticismo nutrir-se de alguma das suas leituras, como a de Nietzsche. A visão optimista do progresso predominaria, segundo Nisbet, entre meados do século XVIII e o fim da Segunda Guerra Mundial, momento de forte cepticismo e crítica; este último momento é o da crítica aqui mencionada de Aquilino. Cf. Robert Nisbet, History of the Idea of Progress, Londres, Heinemann, 1980, pp. 171-178 e

Atentemos em alguns tópicos desta passagem de Aquilino. Encontramos aqui a ideia de um comunismo primitivo igualitário, sem propriedade de homens e de bens, uma perspectiva de matriz rousseauniana da desigualdade como fonte de iniquidade. Mas, sobretudo, ela revela uma imagem dasociedade multifacetada, em que a aceitação da existência de uma cadeia evolutiva que conduzia da barbárie à civilização, tinha como contraponto a ideia de uma decadência moral4. As fontes em que assenta a imagem do social de Aquilino são as de um leitor que recolhia certas propostas genéricas correntes nos meios informados pela cultura de divulgação científica da época.

JOSÉ MANUEL SOBRAL, A ETNOGRAFIA DE AQUILINO RIBEIRO, Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa. Revista Antropológica, nº 6, 2002 (pp11 e 12) http://revistas.rcaap.pt/antropologicas/article/download/882/688 Sobre aspectos mais genéricos - e geograficamente situados (por exº, Viseu) - da obra de Aquilino Ribeiro deve consultar-se: Viajar com…Aquilino Ribeiro, de Alberto Correia, Direcção Regional da Cultura do Norte|Edições Caixotim, 2013

319. Por sua vez, Carlton Hayes – Historia Política y Cultural de la Europa Moderna, Barcelona, Editorial Juventud, 1953 – assinala a coexistência de filosofias optimistas e pessimistas entre 1870 e 1910. 4 Aquilino era claramente contrário à ideia de Spencer que afirmava que o sentido moral aumentava com o avanço da evolução. Ver sobre o desenvolvimento do evolucionismo: Marvin Harris, op. cit., pp. 108-216; Nisbet – op. cit., p. 174 – que assinala que no século XIX, “progresso” e “evolução” eram usados de modo equivalente; Hayes, op. cit., pp. 228-266. Um etnógrafo profissional como Jorge Dias, autor da primeira monografia em etnografia com observação directa sobre uma aldeia, praticamente contemporâneo dos textos com maior dimensão etnográfica de Aquilino, inscreve ainda o seu trabalho nos postulados evolucionistas. Cf. Jorge Dias, Vilarinho

Anexo – 2

Quando os Lobos Uivam

Quando os Lobos Uivam

Autor: Aquilino Ribeiro Nº de Páginas: 248 1ª edição - 1958 Editora: Bertrand Editora

«Manuel Louvadeus dum galão subiu os degraus. Em cima, no patamar, topou a porta fechada e deteve-se,

quando ia para bater, como quem toma fôlego. Com a breca, achava tudo tal e qual! Os dez anos de ausência apagaram-se como um sopro perante a obsessiva eternidade que se lhe oferecia ao lance de olhos. Tudo na mesma, a velha aldraba, puída de tanto se lhe pegar(…) Que distância, anos e anos que correram na levada do tempo, e as coisas conservarem-se ali iguaizinhas, estáticas, teimosas no seu ar de encantamento! Talvez mais velhas… Sim, mais velhas, ferradas mais fundo pelos dentes da morte e a despenhar-se na voragem como as telhas do beiral. E haviam, porventura, de resistir aos vaivéns mais que o coirão dum homem, entretanto que se fartava de dar tombo por esses mundos de Cristo?!» pp. 13 e 14 (1ª ed., 1958)

Sobre a obra: Serra dos Milhafres, finais dos anos 40, o Estado Novo resolve impor aos beirões uma nova lei: Os terrenos baldios que sempre tinham sido utilizados para bem comunitário e onde essa comunidade retirava parte vital do seu sustento, seriam agora “expropriados” e utilizados para plantar pinheiros. Emerge um clima de medo nas pessoas e é esse clima que Manuel Louvadeus, que havia emigrado para o Brasil anos antes, vem encontrar quando regressa à aldeia. Agora um Homem vivido e culto, Manuel tem uma visão e um sentido de justiça que rapidamente o fazem cair nas boas graças do povo. Toma então parte da sua gente, homens honestos e humildes que trabalham de sol a sol mas que não deixam de viver em condições miseráveis. A revolta acaba por suceder e tudo acaba numa caçada aos homens por parte da polícia que leva muitos deles à prisão acusados de serem instigadores e cérebros da revolta. O Estado mostra então todo o seu esplendoroso poder. Aqui representada está a saga dos beirões na defesa dos terrenos baldios perante a ditadura do Estado Novo.

Sobre autor: Aquilino Ribeiro nasceu na Beira Alta no ano de 1885 e morreu em Lisboa em 1963.

Deixou uma vasta obra em que cultivou todos os géneros literários partilhando com Fernando Pessoa, no dizer de Óscar Lopes, o primado das letras portuguesas do século XX. Foi sócio de número da Academia das Ciências e, após o 25 de Abril, reintegrado, a título póstumo, na Biblioteca Nacional, condecorado com a Ordem da Liberdade e homenageado, quando do seu centenário, pelo Ministério da Cultura. Em Setembro de 2007, por votação unânime da Assembleia da República, o seu corpo foi depositado no Panteão Nacional.

Fac simile do despacho da censura, de 6 de Fev de 1959, proibindo a reedição da obra bem como o seu anúncio.

Organiz. de J. Costa|CEAR, 2014