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Coletânea de contos
Vários autores
O soldado de Sua Majestade
©2015 Vários autores Contato: http://osoldadodesuamajestade.blogspot.com http://facebook.com/gloriosoimperiobrasil Edição, Diagramação e Arte: Eber Josué Impressão e acabamento:
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)
Tavares, Laerte Sílvio et al.
T231s O soldado de Sua Majestade / Laerte Síl-
vio Tavares [et al.] – Três Corações: Eber
Josué Dias de Oliveira, 2015.
190 p.
ISBN 978-85-464-0088-1
1.Literatura brasileira. 2.Ficção.
3.Contos brasileiros. 4.História do Brasil.
5.Brasil Imperial. 6.Dom Pedro II. 7.Duque
de Caxias. 8.Luis Alves de Lima e Silva.
9.Exercito Brasileiro. 10.Patronos. I. Eber
Josué, org. II. Série Glorioso Império do
Brasil. III. Título.
CDD: B869.3
CDU: 82-3 / 82-92/94
Índices para catálogos sistemáticos
1.Literatura brasileira: 869.3
2.Ficção : Contos brasileiros: 869.308
Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução deste livro com fins comerciais sem
prévia autorização dos respectivos autores.
Coletânea de contos
Vários autores
O soldado de Sua Majestade
1ª Edição
Três Corações-MG
Outubro de 2015
PREFÁCIO
No meu juízo, um nobre convite para prefaciar um li-
vro tão esplêndido como este, sem dúvida alguma se so-
bressai a pessoas com altos níveis de intelectualidade e
proficiência linguística, como poetas e gramáticos, atribu-
tos nos quais não me ajusto. Logo, isso modestamente me
orgulha, pois consigo compreender que se não tenho esses
honoráveis apanágios e sou respeitosamente tratado como
se os tivesse; de fato tenho o dever de cumprir com grande
esmero esta digna “missão”.
A literatura é indiscutivelmente uma ferramenta es-
sencial para a reflexão dos pensamentos e imaginações.
Entretanto, torna-se condizente enaltecer os autores desta
obra prima “O Soldado de Sua Majestade” onde é possível
evidenciar a erudição e conhecimento técnico-literário pelos
autores e autoras através dos contos fictícios deste livro.
No decurso deste trabalho as páginas são vencidas em sua
plenitude, uma vez que a diversidade de histórias imaginá-
rias envolvidas em um tema relacionado à memória do
“Pacificador” Luís Alves de Lima e Silva, como se refere no
conto “O Duque e a imensidão de paz”, cooperam para tor-
nar a leitura inestimável, suave e agradável; haja vista o
legado incomparável deixado por este bravo homem tam-
bém conhecido por suas vitórias em detrimento da paz nos
rincões brasileiros.
Cada autor, individualmente, enseja algo novo em
suas narrativas, incitando a curiosidade do leitor no decor-
rer da coletânea, todavia em virtude da enorme riqueza
literária contida neste célebre livro. Além disso, vale sali-
entar que cada conto nos remete ao exercício da capacidade
de imaginar e adentrar afinco na vida de cada personagem
das narrativas. Contudo, indiretamente nos impulsionando
ao encontro dos devaneios do período imperial no Brasil.
Dessa forma, indubitavelmente infere-se a importân-
cia da arte literária propagada nas linhas deste livro “O
Soldado de Sua Majestade”. Com efeito, imortalizando a
cultura e tradições da sociedade brasileira. Logo, vale res-
saltar ao leitor a imprescindibilidade da leitura deste livro
a fim de aprimorar o senso crítico de imaginação e conhe-
cimento. Afinal, como dizia Platão, “A coisa mais indispen-
sável a um homem é reconhecer o uso que deve fazer do seu
próprio conhecimento”.
RENAN ESTÉFANO LEMES MERLIM Cabo do Exército Brasileiro (Escola de Sargentos das Armas)
Graduado em Gestão de Recursos Humanos
ÍNDICE PREMIADOS
Adilson Roberto Gonçalves (Campinas-SP) 9
Aflição
Alana Evelyn Alcântara (Pilar-PB) 16
Marcha para o império
Anna Julia Dannala Franco de Souza (Valinhos-SP) 31
O Duque e a imensidão de paz
Joan Saulo do Monte (Pilar-PB) 36
O título ofertado
Laerte Sílvio Tavares (Florianópolis-SC) 43
O cabo Lima
Letícia Ferreira (Arraial do Cabo-RJ) 52
O Pecado do Soldado
Marcelo de Abreu Almeida (Porto Alegre-RS) 61
O Bom Soldado
Marcelo de Araujo (Rio de Janeiro-RJ) 78
24 de maio em Florença
Nicoly Almeida (Pilar-PB) 86
De xícara a Duque
Péricles Luiz Pimentel Calafange (Coruripe-AL) 95
Ideais e sonhos jamais são derrotados, eles vivem póstumos
MENÇÃO HONROSA ESPECIAL
Marcos Brito (Manaus-AM) 111
O Duque
MENÇÕES HONROSAS
Cleison Fernandes de Souza (Manaus-AM) 137
O mestre das armas
Edweine Loureiro (Saitama – Japão) 146
O velho soldado
Evandro Valentim de Melo (Brasilia-DF) 152
O general e a assombração
Flavia de Araújo Padula (Poços de Caldas-MG) 165
O sequestro do presidente
Jonatas dos Reis Pereira (Brasília-DF) 176
Sonho majestoso de verão
Sílvio Eduardo Paro. (Santa Fé do Sul-SP) 182
Um acontecimento real
O soldado de Sua Majestade
9
Adilson Roberto Gonçalves (Campinas-SP) Nascido na cidade de Pedreira-SP, é membro fundador e Vice-Presidente da Academia de Letras de Lorena e membro do Clube dos Escritores Piracicaba. Possui cerca de uma centena de textos curtos e poemas publi-cados em antologias. Selecionado três vezes para o Poeta de Gaveta da USP, Prêmio Canon de poesia em 2012, Lilá Ripoll 2014 e SFX 2014. Manteve por 4 anos uma coluna do Jornal Guaypacaré de Lorena-SP, escrevendo sobre ciência, tecnologia, meio-ambiente e educa-ção.Atividade profissional como pesquisador científico e professor uni-versitário.
Aflição
Aflição. Essa era a melhor – senão a única – palavra que
definia o que corria por dentro das entranhas dela. Corria tam-
bém a gestação de um herdeiro, mas isso ela ainda não sabia. A
partida para mais uma batalha para aqueles combatentes fiéis e
ordeiros, poderia ser mais uma linha em seus diários, o afivelar
da farda, o afiar da espada. Para ela, era mais uma etapa da ago-
nia, da aflição enfim. Ana Luíza Carneiro Viana, seu nome, esposa
do Major Luiz Alves de Lima e Silva sua condição e escolha acer-
tada; aflita, sua característica íntima, constante, nunca revelada.
Bem, naquele final de 1835 eclodia mais uma revolta,
uma guerra que foi chamada dos Farrapos. A guerra que lhe rou-
ba o marido Luiz por meses. Mais uma guerra, mais uma ausência
do Major em ascensão na prodigiosa carreira militar e na impor-
tância na política, conturbada, na Nação naqueles tempos.
Apesar de insistente nas recomendações ao marido em
sua partida, não sabia ela que esperava por Maria, a segunda filha
que faria companhia à Luiza, mais velha. Da coincidência de no-
mes o seu e o do Major Luiz, se revelava também a cumplicidade
Vários autores série ‘Glorioso Império do Brasil’
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daquela relação não apenas de amor, mas também de respeito. A
época não poderia exigir ou fornecer mais que isso. A saciedade
do corpo era superada pelo corpo da sociedade. Movimentos de
instabilidade da Nação eram combatidos na espada, mas também
na astúcia. E o então Major já mostrava ao que veio bem como a
capacidade de liderança a seus comandados. Filha de família
nobre, inesquecíveis eram as indisposições antigas em relação ao
marido. Fato superado pela história dos acontecimentos, pela
harmonia do lar, mas não totalmente nos brios de alguns familia-
res e agregados. Contribuía para aumentar a aflição de Ana Luíza,
a angústia do que poderia transcorrer de forma não controlada,
repentina, causando dissabores e dissoluções. Referência à Pátria
e ao seu próprio lar. Ela conseguia administrar tudo com prima-
zia e esmero. Nada faltaria quanto à organização das tarefas de
um lar digno de um servidor do País, ausente na presença física,
constante nas cartas e trocas de experiências, clamores, desejos e
projetos.
Insistentemente as aflições continuavam. Se a revolta fos-
se longa, se enfim a instabilidade do momento regente vencesse,
o que seria de seu amado, entregue à causa imperial sem outro
igual ou com o mesmo empenho e convicção?
* * * * *
‘Xô, chispa daqui’. A ama dizia aos moleques que rodea-
vam a cozinha, especialmente quando a fome se fazia presente.
Ambiente infantil contribuía para o bem estar. A pequena Luíza
ainda não participava das estripulias, uma vez que já treinada
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para uma dama se fazia. Mas continuava criança, admirando
Dona Inácia gesticulando com algum utensílio à mão em tom
ameaçador, mas em divertimento também.
Olvidando os enjoos iniciais, no ventre de Ana Luíza, Ma-
ria se formava, ignorada por todos, não por muito tempo. Entre
uma carta e outra recebida do Major Luiz, Ana Luíza começou a
sentir os enjoos matinais. A associação com a falta das regras foi
imediata, apesar de ainda achar que as mudanças repentinas dos
ares de revolta da nação eram motivos para tal disparate. As pre-
senças do Major sabia-se serem pouco frequentes; eram comple-
tas, entretanto.
Assim, no mesmo dia da certeza de mulher e de mãe de
Ana Luíza, o Major Luiz contrai uma gripe, uma constipação forte
que o deixa amuado. Com certeza não o impedia de comandar e
arregimentar a tropa, mas foi notável sua indisposição. O inimigo
estava longe, o dia era para treinar posições. Nada mais sério ou
grave deveria ocorrer. Luiz escreveu uma carta mais longa que a
habitual para Ana Luiza. A carta principiava como sempre pelos
sussurros de saudade e do enaltecimento do amor dividido, com-
partilhado e multiplicado por eles, pelos dois. As batalhas havidas
ou por haver, os preparativos estavam ali também narrados, sem
detalhes da caserna, mas apenas para sensibilizar suas mulheres
da necessidade da ausência. Se soubesse que naquele mesmo
momento Ana Luíza se dividia entre vômitos e sorrisos, correr-
lhe-ia ao menos uma lágrima de emoção pelo rosto.
Vários autores série ‘Glorioso Império do Brasil’
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Mesmo distante, em carta ficou Luiz sabendo da nova
condição de Ana Luíza e somente no mês seguinte conseguiu em-
prenhar uma viagem de volta para ver o estado da esposa e avali-
ar o crescimento daquela barriga. Uma vontade de que um varão
saísse daquelas entranhas o invadiu, substituída de imediato pela
resignação de que não estava mais em suas mãos decidir isso.
Mais fácil o combate em campo aberto, a decisão por qual flanco
atacar, do que entender o que se passa no mistério da vida. Tinha
lá suas crenças, mas isso não é assunto ou importante para nosso
relato.
Os momentos da dureza da capa e da espada não o impe-
diam de ter a mente voltada à prole que se formava. Sentia as
dores da perda do varão, mas era a dor que conseguia usar como
força para continuar a batalha. Batalha nem sempre contra o
inimigo soldado: travava muitas vezes a batalha contra a inimiga
solidão.
Naquelas semanas, houve mudança notável na verve mis-
sivista do Major que passou a tecer olas aos infantes, falar sobre
folguedos de sua escassa infância e da importância de tais para o
crescimento do humano e do homem dentro de cada um. Dizia
que a organização, o senso dos limites, o aprendizado da socieda-
de começa ali, naquelas brincadeiras e danças. Espera que viesse
um varão e que convivesse bem com a primogênita e ainda pe-
quena Luiza. Mas se fosse outra a fazer companhia a ela, que as-
sim fosse, aprenderiam juntas a dura arte da convivência. Não
deixava de lado a natureza militar de suas ponderações com a
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organização e estratégias de sobrevivências, quer fossem as do
campo de batalha, quer fossem as de um lar.
Ana Luíza procurava se esmerar nessa arte também, op-
tando pela simplicidade das palavras, alguma picardia na cobran-
ça pelas cada vez mais constantes ausências do marido, mas rela-
tando de tudo um pouco para aliviar sua tensão e aflições e, qui-
çá, também as do Major.
Relatava mais a curiosidade da primogênita sobre aquela
barriga em formação e de algumas dificuldades da mãe na loco-
moção, especialmente quando os dias mais frios se aproximaram
junto com o final daquela prenhez.
Que infelicitava o Major saber ou imaginar o quanto per-
dia do cotidiano da vida familiar, todos sabiam. Ele tinha de con-
ciliar a nostalgia não vivida com a primazia da consciência do
estabelecimento da ordem e da Pátria. Ao menos, naqueles dias,
contribuía para isso, como auxiliar, não com o protagonismo que
viria a ter alguns anos à frente.
Uma pequena cabeça de retalhos de pano grudada em
corpo de uma lata de azeite com gravetos fazendo o papel rudi-
mentar de braços e pernas. Essa fora encontrada por um soldado
raso, o Joaquim, que sempre estava por perto para atender ao
Major, sem maiores pretensões além de servir àquele que de-
monstrava humildade na mesma proporção de sua serenidade
para lidar com as movimentações necessárias da tropa.
Vários autores série ‘Glorioso Império do Brasil’
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‘Insisto que leve para sua filha, mesmo que não goste, te-
rá uma lembrança de uma terra, de uma época em que guerras
deixavam também frutos.’
A afirmação de Joaquim sensibiliza nosso Major Luiz,
que agradeceu e voltou às suas preocupações, já criando uma
frase a mais para ilustrar a carta que estava por terminar.
* * * * *
Sabiam todos que um varão poderia não ser um alívio nas
contas dos humores do casal, pois filho não se substitui. A vinda
da pequena Maria glorificou aquele lar que ainda viveria agruras
de mais guerras, mas também o estabelecimento de uma Nação.
Luiz não viu Maria vir ao mundo, saudável e com alegria
para as parteiras e amas que acompanhavam aquele trabalho de
algumas horas. O anúncio logo se fez pela casa, pelos arredores. A
notícia galopou por mensageiro até o campo de batalha – ainda
em preparação, mas logo assim seria. O bilhete encontrou um
Luiz sereno, ciente do aumento de suas responsabilidades, não
apenas com o Exército Nacional, mas agora, mais uma vez, como
pai. Resolveu procurar mais uma boneca de pano para comprar
como regalo para a caçula. Juntaria com a outra já embalada para
levar à primogênita Luíza.
Estava feliz.
A aflição de Ana Luíza foi aos poucos sendo trocada pela
alegria da filha de aspecto saudável. Da emoção ao dar-lhe de
mamar, trocar os cueiros, de esperar para quando abrisse os o-
O soldado de Sua Majestade
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lhos e começasse a identificar o mundo que a rodeia. Um mundo
ainda incerto, mas de uma família forte para acolhê-la.