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Midiatização e jornalismo – Interfaces para a construção de
uma crítica social da mídia Diônatas Álisson Coelho
Universidade do Vale do Rio dos Sinos
Palavras-chave: Jornalismo, Crítica de Mídia, Circulação
RESUMO EXPANDIDO
Noções compartilhadas
O jornalismo é uma atividade que historicamente foi se transformando ao longo
do tempo, em especial, no último século. Em um contexto de acelerada midiatização da
sociedade, a atividade de produzir e difundir notícias segue em um momento de
readequação de suas práticas e estruturas.
Entre as mudanças das últimas duas décadas, uma é analisada aqui: as relações
entre mídia e sociedade. A ideia em análise é que o processo de midiatização potencializa
a crítica social da mídia. Em outras palavras: a sociedade imersa em lógicas e processos
que são tipicamente oriundos dos meios de comunicação de massa passa a, em parte, se
comportar sob essa lógica.
Como demonstrado por Coelho (2015), parte desses comentários volta aos meios
interferindo, de uma forma ou de outra, na produção de notícias. É o que Braga (2006)
chama de Sistema Social de Resposta. O objetivo aqui é observar o que estamos
chamando de construção social da crítica das práticas jornalísticas dentro de um
contexto midiatizado.
As discussões teóricas que buscam pensar os processos de crítica de mídia através
de múltiplos dispositivos, são potencializadas por uma análise contextual do processo de
midiatização da sociedade. Esses aportes subsidiam uma exploração empírica de base
netnográfica (Amaral, Natal e Viana, 2009) que gerou um estudo de caso singular (Braga,
2008).
A articulação dessas duas metodologias dá base a uma análise da repercussões de
reportagem publicada pelo jornal Folha de S. Paulo na edição de 17 de julho de 2016, e
que que trazia números de uma pesquisa do Instituto Datafolha sobre a situação política
brasileira. Para complementar o levantamento, foi realizada uma entrevista com Vanessa
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Henriques, a assistente da Ombudsman da Folha, Paula Cesarino Costa, presencialmente
no dia no dia 8 de setembro de 2016.
Contextos teóricos
Esse artigo parte de uma visão da Comunicação como objeto complexo e em
transformações. Ainda em 1997, Eliseo Verón já pensava a comunicação para além de
relações lineares de causa e efeito. Para o autor argentino, o fluxo da comunicação pode
ser pensado como uma formação de circuitos de retornos. O discurso é então visto como
um amplo processo de interfaces, em que os atores têm seus papéis modificados em
diferentes momentos dessa dinâmica.
Essa perspectiva dá base à ideia de uma comunicação circular formada por
sucessivos feedbacks, mudando a dinâmica das relações em diferentes níveis. É nesse
caldo circular que se insere o que aqui vamos chamar de comentário social sobre a mídia.
Nesse contexto, o status dos sujeitos (produtores e receptores), as lógicas de contatos
entre eles e os modos de envio e reenvio de discursos entre eles, diluindo fronteiras
outrora cristalizadas. (Fausto Neto, 2005).
A partir do momento em que se pensa a produção discursiva a partir de fluxos e
circuitos, é preciso reposicionar os processos do jornalismo, repensando a cadeia que se
articula na construção do discurso. Braga (2012) observa, em uma perspectiva que ajuda
a entender esses circuitos e dá base a esse artigo, que se pensarmos a circulação da
comunicação na sociedade em uma visada abrangente percebemos que o produto da mídia
de massas não é o ponto de partida desses fluxos.
Essa circulação complexificada é o ambiente onde hoje majoritariamente circula
com mais força o comentário crítico sobre a mídia. Assim, se se antes o jornalismo se
outorgava como enunciador dos acontecimentos, a partir das perspectivas de uma
circulação mais abrangente, e com a proliferação das redes, hoje a notícia pode circular
primeiro pela internet. Essa descentralização por si só levou o jornalismo a um momento
de questionamento de suas práticas.
Para Braga (2006), esse comentário posto em circulação pode ser pensado como
um sistema para além da ideia de produção e recepção, o Sistema de Resposta Social. Ele
entra em operação no momento em que os sentidos midiaticamente produzidos chegam à
sociedade, e passam a circular nela. Uma das características desse comentário, dessas
respostas, é o seu caráter diferido e difuso na sociedade.
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Aqui, então, tratamos de observar essa difusão com o objetivo de buscar
regularidades, formas de comportamento, que deem base a uma análise da construção
desses comentários que contêm em sim um conteúdo de crítica aos meios. O caso objeto
de análise nesse artigo é apresentado resumidamente a seguir.
Povo versus Folha
Em julho de 2016 o Brasil vivia um momento raro. Tinha então uma presidente
da república eleita, Dilma Rousef, porém afastada. Enquanto isso, o país era governado
por um presidente interino, Michel Temer, cuja legitimidade era contestada.
A primeira pesquisa sobre o momento político brasileiro, após a posse de Temer,
viria a público no dia 18 de julho. O Instituto de Pesquisas Datafolha realizou
levantamento nos dias 14 e 15 de julho de 2016. Nesse momento, Michel Temer
governava interinamente desde 17 de abril. A pesquisa foi a base da manchete da Folha
de S. Paulo na edição de 17 de julho com o título “Cresce o otimismo com a economia,
diz Datafolha”.
Além da matéria que virou manchete, publicada na página A4, a pesquisa do
Datafolha gerou outra, que abriu a página A5: “Para 50% Temer deve ficar; 32% são pró-
Dilma”. Analisado o título da reportagem, ela trazia algo realmente novo. Em 9 de abril,
pouco antes do afastamento de Dilma Rousseff, o mesmo instituto Datafolha havia
divulgado pesquisa que mostrava 79% dos brasileiros queriam a saída de ambos, Dilma
e Temer, e a consequente realização de novas eleições.
Três meses depois, essa nova pesquisa mostrava que apenas 4% dos entrevistados
pediam a saída tanto da presidente eleita quanto do presidente interino, e apenas outros
3% pediam novas eleições. Uma queda de mais de 70 pontos percentuais no desejo dos
eleitores por uma nova ida às urnas, ideia de que havia sido encampada por Dilma
Rousseff na fase final do processo de impeachment. A Folha não publicou quais as
perguntas que foram feitas pelo Datafolha para chegar a esses resultados.
Os dados geraram perplexidade nos leitores da Folha de S. Paulo. A postagem
recebeu 740 comentários na fanpage no jornal no Facebook. Desde as primeiras
manifestações, fica claro o estranhamento que esses dados geraram. Analisando os 740
comentários que a reportagem recebeu no Facebook é possível observar que em 112 deles
os leitores faziam críticas diretas ao Instituto Datafolha ou aos institutos de pesquisa de
maneira geral.
Em pouco tempo, sites e blogs passaram a criticar tanto a Folha de S. Paulo quanto
o Datafolha pela pesquisa. Isso porque, na pergunta que foi formulada aos entrevistados,
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e que não havia sido publicada naquele dia pela Folha e nem pelo Datafolha, não havia
sido dada a opção “nova eleição”.
A Folha de S. Paulo em sua matéria não esclarece esse ponto. Apenas cita que 4%
citaram “nenhum dos dois” e que 3% disseram “novas eleições”. No dia seguinte à
publicação dos dados, uma nova informação veio a público. Folha e Datafolha haviam
decidido não publicar que a pesquisa havia perguntado se os eleitores desejavam uma
nova eleição.
Além das críticas direcionadas ao Datafolha, volume considerável de comentários
dos leitores era dirigido à Folha de S. Paulo especificamente e à mídia/imprensa de
maneira geral. Foram 119 posts criticando a reportagem da Folha e a imprensa brasileira.
No domingo seguinte, a ombudsman da Folha, Paula Cesarino Costa afirma já no título
da sua coluna1: “A Folha errou, e persistiu no erro”.
Considerações
A polêmica envolvendo a Folha de S. Paulo e o Instituto Datafolha reserva
algumas lições ao jornalismo, e do ponto de vista desta pesquisa, sobre os diferentes
dispositivos críticos midiáticos. Do que podemos observar até aqui, existe o que podemos
chamar de uma construção social da crítica das práticas jornalísticas.
Fica evidente que o leitor é parte da construção de uma crítica que é coletiva, e
que justamente por ser coletiva, repercute nas redações. Parte dessa construção passa por
outros dispositivos críticos, como a própria ombudsman, e a relação dos leitores com
outros meios de comunicação, no quais algum tipo de crítica profissional é difundida.
A análise dos comentários, e das repercussões do caso, mostra ainda que muitos
dos leitores carregam um descontentamento que não foi gerado por essa situação de
maneira específica, mas é baseado em experiências anteriores na relação com o
jornalismo no país. Nessas situações, a construção da crítica passa menos por outros
dispositivos críticos – sites, blogs ou a própria ombudsman – e dizem da descrença do
público com a mídia.
Referências
AMARAL, A.; NATAL, G.; VIANA, L. Netnografia como aporte metodológico da
pesquisa em comunicação digital. Revista Sessões do Imaginário, Porto Alegre,
1 http://www1.folha.uol.com.br/colunas/paula-cesarino-costa-ombudsman/2016/07/1794799-a-folha-errou-e-persistiu-no-erro.shtml
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ed. 20, p.34-40, dez. 2008.
BRAGA, José Luis. A sociedade enfrenta a sua mídia: dispositivos sociais de crítica
midiática. São Paulo: Paulus, 2006.
__________. Circuitos versus campos sociais. In: MATOS, Maria Ângela; JANOTTI JR,
Jeder; JACKS, Nilda. Mediação e Midiatização: Livro Compós 2012. Salvador/Brasília:
UFBA/COMPÓS, 2012.
COELHO, D. Á. Jornalismo, Sociedade e Crítica – Potencialidades e Transformações.
Dissertação (Mestrado) Universidade do Vale do Rio dos Sinos. São Leopoldo, 2015.
COSTA, Paula Cesarino. A Folha errou e persistiu no erro. Folha de S. Paulo, 2016.
FAUSTO NETO, Antônio. A circulação além das bordas. In: Mediatización, Sociedad y
Sentido. Diálogos Brasil y Argentina. Rosário: UNR, 2010.
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Atorização do acontecimento: os complexos processos
comunicacionais na sociedade em midiatização
Élida Lima
Universidade do Vale do Rio dos Sinos
Palavras-chave: atorização, circulação, midiatização, celebridade, acontecimento.
RESUMO EXPANDIDO
Este trabalho focaliza os processos comunicacionais engendrados na construção de um
acontecimento midiático em torno do adoecimento de uma celebridade, contemplando
parte das reflexões desenvolvidas em pesquisa de doutorado. Nossas elaborações se
baseiam nos pressupostos teóricos desenvolvidos em pesquisas de comunicação social,
que, em interlocução com conceitos situados nos estudos de áreas afins, foram
mobilizados para a observação de práticas, operações e processos de uma sociedade em
midiatização. O objetivo geral de nossa pesquisa é analisar as estratégias discursivas na
construção do acontecimento, observando indícios de operações de atorização.
As práticas sociais que marcam a sociedade em midiatização fazem emergir novas
transações do processo de construção do acontecimento, conforme ocorre o deslocamento
dos atores sociais da instância de mediação para a instância de atorização. As celebridades
do tempo contemporâneo, enquanto indivíduos que produzem, conforme a apropriação
das lógicas discursivas midiáticas e o acesso a tecnologias transformadas em meios,
ocupam posição protagônica na construção do acontecimento.
Com vistas a demonstrar os resultados obtidos com nossa investigação, contemplamos
neste trabalho a análise de materiais publicados na conta da celebridade no Instagram. As
especificidades do personagem central de nosso objeto de pesquisa requisitaram a
organização dos observáveis sob dois critérios. O primeiro deles atenta para a sua
biografia midiática , sinalizando para a filiação deste à condição de celebridade. O
segundo versa sobre o adoecimento desse personagem midiático e os desdobramentos do
Caso sob a tessitura de discursos midiáticos. As categorias analíticas verificam aspectos
da constituição discursiva desses materiais, considerando as dimensões enunciativas
verbo-visuais.
Entre as percepções sobre o objeto deste estudo, destacamos as operações de circulação
e de atorização que se projetam na diversidade de lugares por onde o acontecimento se
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mostra e na atividade dos atores sociais. Atentamos, também, para pistas das estratégias
discursivas acionadas na construção do acontecimento e na manutenção deste no espaço
público, conforme novos e imprecisos desdobramentos narrativos são realizados sobre a
vida privada da celebridade. Nesse sentido, compreendemos a complexificação do
acontecimento conforme os atores sociais, internos ou não ao universo das instituições
midiáticas, protagonizam operações típicas de uma sociedade em midiatização.
Vale destacar, no entanto, que o enfraquecimento do protagonismo das mídias no trabalho
de mediação da sociedade não representa uma posição marginal dos meios na construção
dos acontecimentos, mas na conjugação de processos de anunciabilidade cada vez mais
heterogêneos e sob a tessitura de uma pluralidade de sujeitos. Ou seja, os processos
técnico-simbólicos das mídias na orquestração dos acontecimentos são afetados por
práticas de atorização dos atores sociais conforme estes têm acesso a tecnologias que
possibilitam ofertar e atribuir sentidos aos discursos no espaço público. Assim, a clássica
concepção de sujeito, como receptor, também é revisitada, segundo elaborações de um
indivíduo ativo e responsivo. Para além da ideia de ‘receptores’ que atribuem sentidos
aos discursos, como abordado em estudos sobre a linguagem, a noção de ator social na
sociedade em midiatização abrange também a viabilidade técnico-simbólica destes em
ocupar a posição de produtores no processo de comunicação.
A compreensão de processos e práticas de uma sociedade em midiatização representa o
acionamento de inúmeros conceitos e noções, que fazem parte de uma extensa malha
teórica, tecida de tal forma que dificilmente pode ser fragmentada. Desse modo, nosso
estudo articula as noções de uma sociedade em midiatização com os conceitos de
acontecimento, celebridade e narrativas, aportando elaborações filiadas às ciências
humanas e sociais. Esse diálogo somente é possível justamente pela dimensão processual
do objeto da comunicação e, portanto, pela heterogeneidade da sua constituição. Com
base em tais pressupostos teóricos, definimos a proposta desta pesquisa com vistas a
observar a construção de acontecimento pela abordagem da midiatização e dos processos
sociais de referência da contemporaneidade. Tal empreitada, no entanto, não desconsidera
a natureza e a constituição da ‘sociedade dos meios’, pois é nessa ambiência que se
encontram aspectos contextuais da emergência da midiatização da sociedade. Além disso,
as transformações vivenciadas, nas últimas décadas, não ocorrem de modo estanque, mas
em processos que comportam práticas e operações tanto da sociedade dos meios quanto
da sociedade em midiatização.
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Crise d’água em São Paulo: mediações protagonizadas pela
sociedade civil não organizada no Facebook Jane Marcia Mazzarino
Marina Antunes Martini
Rodrigo Marques Muller Centro Universitário Univates
Palavras-chave: mediações. Sociedade civil não organizada. Comunicaãço virtual. Crise
da água. Estudo quanti-qualitativo.
RESUMO EXPANDIDO
A crise hídrica paulista foi tema recorrente nas mídias tradicionais e nas redes
sociais entre 2013 e 2015. A comunidade “A Crise da Água em São Paulo” surge no
Facebook, tendo como característica a crítica ao tratamento dado a este acontecimento
por diferentes atores sociais. Trata-se de um espaço livre das restrições para publicação
impostas pelas mídias tradicionais (seleção de fontes e de pautas e os constrangimentos
decorrentes da edição das mensagens, por exemplo). Neste sentido, busca-se
compreender quais usos sociais a sociedade civil não organizada institucionalmente faz
deste espaço aberto, quando se pronuncia e protagoniza um processo de mediações em
relação ao problema ambiental hídrico vivido em São Paulo.
A ciberespaço aparece como um território onde se dão as mediações pesquisadas.
Trata-se de um espaço global e amplo, um lugar flexível, interativo, com fontes plurais e
acessível a trocas permeadas por processos simbólicos e de construção de sentido.
Portanto, pensar e pesquisar a comunicação em uma sociedade midiatizada e em rede é
algo complexo e envolve múltiplas interações (CASTELLS, 2010; CARDOSO, 2007;
MUSSO, 2004; MORAES, 2006).
Por meio da pesquisas bibliográfica e documental, com abordagem quanti-
qualitativa, analisaram-se as publicações da comunidade A Crise da Água em São Paulo,
no Facebook, realizadas ao longo de todo ano de 2014, contemplando-se três categorias:
perfil da comunidade (perfil dos membros, frequência e autores das postagens, membros
mais ativos), agendamento (temas e fontes das postagens) e engajamento (curtidas,
comentários, críticas, conflitos). Estas categorias compõem a macrocategoria
mediações,decorrente das interações deste grupo social.
Entende-se que internautas emitindo opiniões e produzindo informações medeiam
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discursos sociais provenientes de suas interações com outros e com as mídias que
acessam. Desse modo, são ativos nos processos de comunicação e participação social.
Esses processos possibilitam o fortalecimento do corpo social (MASSIMO; TORRES,
YANAZE, 2012).
Segundo Martin-Barbero (2006), a comunicação hoje se coloca como lugar de
duas oportunidades: a de digitalização, que traz consigo uma linguagem comum de dados,
sons, textos e imagens; e de ser um novo espaço público de cidadania e participação. Os
novos dispositivos criam novas formas de relacionamento, de comunicar e de participar,
um novo território com seus próprios processos simbólicos e de interação.
Mudam e aparecem desenhos de sociabilidades híbridos, empoderamentos e
relacionamentos. As mídias na sociedade em rede criam novos territórios fluidos de
debate e discussão, um lugar móvel, influenciado socialmente, mas não controlando
absolutamente. No caso das redes sociais, observa-se que oportunizam conhecimento,
informação e participação para internautas e instituições (CASTELLS, 2010;
CARDOSO, 2007).
Os modos de apropriação das mídias organizam grande parte das relações na
sociedade em rede, os papéis sociais, trocas de informação, formas de entretenimento, de
ação e de organização, designando interdependências e interinfluências diversas
(CARDOSO, 2007). Portanto, não se pode pensar isoladamente uma mídia, já que elas
interagem e formando redes.
Além disso, há múltiplas mediações nos processos de comunicação: tecnológicas,
situacionais, decorrentes da experiência, da formação, do contexto sócio-histórico, etc..
Nesse complexo jogo, a cultura se constrói assim como as mediações são também
engendradas por meio de processos culturais. As mediações caracterizam-se pela sua
multiplicidade e seus cruzamentos, afetando modos de ser individuais e coletivos. São
filtros pelos quais os sentidos passam em um processo de construção/reconstrução
contínua de sentidos, criando um pano de fundo em que se dão as trocas culturais
cotidianas. A cultura cotidiana se concretiza por meio das mediações, que requerem
negociação de sentidos entre emissores/receptores e receptores/emissores do processo
comunicacional. Assim, aspectos relativos à comunicação, à política e à cultura,
retroalimentam-se e transformam-se através das mediações (BASTOS, 2008;
WOTTRICH, SILVA, RONSINI, 2009; MARTÍN-BARBERO, 1997; ESTEVES, 2003).
Deste modo, as mediações colocam-se como processos simbólicos estruturantes,
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e não apenas como extensão dos meios. Elas provêm de diversas fontes e incidem nas
trocas comunicacionais, afetando os diferentes atores sociais (MARTIN-BARBERO,
2006). Busca-se analisá-las em suas especificidades, quando o ambiente em que
acontecem é uma comunidade do Facebook que tem adesão crescente. Em agosto de 2016
já tinha cerca de três mil membros, inseridos nas áreas ambiental e da educação, filósofos,
psicólogos, e outros, os quais evidenciam uma formação técnica e ou acadêmica.
As análises evidenciam que a crise da água em São Paulo não foi o único tema
elencado pela comunidade em suas postagens. Conflitos relacionados a partidos políticos,
disputas partidárias, críticas voltadas para a mídia, população e governo, sugestões e
propostas para superação da crise e posts com cunho mais espiritual, motivacional ou
pessoais, não vinculados diretamente à crise hídrica, também foram temas em circulação
na comunidade. Em pequena escala, apareceram postagens relacionadas a manifestações
e organização de eventos/mobilizações/protestos.
O grupo criticou fortemente as grandes mídias, porém o maior volume das
postagens tinha links e não raras vezes dessas mesmas mídias. Observou-se uma
diversidade de fontes, entre elas verificou-se que os próprios membros produzem
informação, mas também repassam de portais e sites relacionados à sociedade civil
organizada e não organizada. O número de postagens que possuíam links chegou a 75%,
demonstrando interação com diferentes mídias e agentes comunicativos, que constituem
a rede de agendamento da comunidade.
Percebeu-se que a participação na rede não ocorre de maneira horizontal, depende
do dia, e horário e da própria significação que determinado usuário da rede social dá à
postagem. O número de postagens que gerou debates foi de 8%. Portanto, não há muitos
conflitos, o que sugere que haja uma concordância de opiniões na maior parte das
postagens, ou então a não visualização ou, ainda, a não midiatização da ressignificação.
A análise da comunidade assinala que mesmo com a oportunidade de ser o próprio
usuário produtor de notícia, ainda é predominantemente agendada pelas mídias
tradicionais. Os debates voltam-se muito mais para críticas do que para propostas de
soluções. A organização de mobilizações não ocorre facilmente e grande parte das
postagens refere-se ao acompanhamento da crise.
Referências
BASTOS, Marco Toledo de Assis. Do sentido da mediação: às margens do
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pensamento de Jesús Martín-Barbero. Revista FAMECOS, n°35. Porto Alegre, 2008.
Disponível em
<http://revistaseletronicas.pucrs.br/ojs/index.php/revistafamecos/article/view/4096/3097
>. Acesso em: 23 mar. De 2015.
CARDOSO, Gustavo. A mídia na sociedade em rede: filtros, vitrines, notícias. 1. ed.
Rio de Janeiro: Editora FGV, 2007.
CASTELLS, M. Comunicacion y poder. Madrid: Alianza Editorial, 2010.
DI FELICE, Massimo; TORRES, Julliana C.; YANAZE, Leandro K. H. Redes digitais e
sustentabilidade: as interações com o meio ambiente na era da informação. São Paulo:
Annablume, 2012
ESTEVES, J. P. . Espaço público e democracia: comunicação, processo de sentido e
identidade social. São Leopoldo: Unisinos, 2003.
MARTIN-BARBERO, Jesús. Dos Meios às Mediações: comunicação, cultura e
hegemonia. Rio de Janeiro: UFRJ, 1997.
MARTIN-BARBERO, Jesús. Sociedade Midiatizada. In MORAES, Dênis de (Org.).
Tecnicidades, identidades, alteridades: mudanças e opacidades da comunicação no
novo século. 1. ed. Rio de Janeiro: Mauad, 2006.
MORAES, Dênis de. Sociedade Midiatizada. In MORAES, Dênis de (Org.). A tirania
do fugaz: mercantilização cultural e saturação midiática. 1. ed. Rio de Janeiro: Mauad,
2006.
MUSSO, Pierre. Sociedade Midiatizada. In MORAES, Dênis de (Org.). Ciberespaço,
figura reticular da utopia tecnológica. 1. ed. Rio de Janeiro: Mauad, 2006.
WOTTRICH,Laura Hastenpflug. SILVA, Renata Córdova da. RONSINI, 3 Veneza V.
Mayora. A Perspectiva das Mediações de Jesús Martín-Barbero no Estudo de
Recepção da Telenovela. Intercom – Sociedade Brasileira de Estudos
12
Interdisciplinares da Comunicação. XXXII Congresso Brasileiro de Ciências da
Comunicação –Curitiba, PR – 4 a 7 de setembro de 2009. Disponível em
<http://www.intercom.org.br/papers/nacionais/2009/resumos/R4-1712-1.pdf>. Acesso
no dia 12 de março de 2015.
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Separação de #fatimabernardes e #bonner: as circulações em
rede das hashtags e um conteúdo ressignificado Letícia Franciele Rossa
Melina da Silveira Universidade do Vale do Rio dos Sinos
Palavras-chave: Circulação. Twitter. Hashtag. Fátima Bernardes. William Bonner.
RESUMO EXPANDIDO
Na segunda-feira, dia 29 de agosto de 2016, os jornalistas Fátima Bernardes e
William Bonner, vinculados à Rede Globo, anunciaram sua separação matrimonial por
meio da rede social twitter. Eles estavam casados há 26 anos. Ambos publicaram o mesmo
texto, dividido em três posts, cada um em sua conta pessoal, ao mesmo tempo. O primeiro
post (às 17h33) e o segundo e terceiro às (17h34) diziam:
[1] “Em respeito aos amigos e fãs que conquistamos nos últimos 26 anos,
decidimos comunicar que estamos nos separando”.
[2] “Continuamos amigos, admiradores do trabalho um do outro e pais orgulhosos
de três jovens incríveis”.
[3] “É tudo o que temos a declarar sobre o assunto. Agradecemos a compreensão,
o carinho e o respeito de sempre. Fátima e William”.
O anúncio, feito pela rede social twitter, foi suficiente para, na internet e fora dela,
se espalhar pela sociedade. No caso da internet, foi a principal pauta nos sites de notícias,
revistas, jornais e, principalmente de fofoca, mas, também, foi assunto recorrente nas
redes sociais. De acordo com o site da Revista Glamour, o twitter divulgou ao portal que
o divórcio dos jornalistas recebeu 709.433 menções (sem especificar datas exatas) –
enquanto o impeachment da ex-presidente Dilma, ocorrido no mesmo dia, registrou
287.945. Ou seja: a separação rendeu 421.488 menções a mais daquele que seria o grande
acontecimento da data.
As hashtags utilizadas pelos usuários do twitter variam, mas concentram-se nos
nomes dos jornalistas escritos de modo distinto: #fatima, #bonner, #fatimaebonner
#fatimabernardes, #williambonner, por exemplo. Neste trabalho, objetivamos selecionar
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duas: #fatimabernardes e #bonner, analisadas com o auxílio da ferramenta keyhole2 a fim
de obter métricas. Foram observadas as postagens com fotos ou vídeos curtos, que se
configuram como memes. Para cada hashtag foram colhidas, respectivamente, as cinco
postagens com maior número de retweets e curtidas. O período de análise compreendeu
os dias entre 29 de agosto e 6 de setembro de 2016.
A proposta que trazemos, a partir desta coleta inicial, é analisar os sentidos que
emergem destas hashtags no processo de circulação – uma circulação que vai ao encontro
da propagação sugerida por Jenkins (2009), quando este trata das táticas desta propagação
e dos circuitos que percorrem dado conteúdo em rede. Ele pontua que a circulação está
ativamente relacionada à participação ativa dos consumidores. Ou seja: a demanda de
interesses de quem absorve determinada informação (neste caso, o casamento de Fátima
e Bonner) interfere na dimensão desta circulação em rede (ou, ainda: o que circula mais,
importa mais).
Este processo coletivo de consumo proposto por Jenkins (2009) indica, ainda, que
a circulação se expande além das fronteiras da rede: a partir do que se vê na televisão, por
exemplo, se constroem tweets que, por sua vez, são motivo de discussão e conversa em
caráter pessoal, no “boca a boca”. Esta circulação de hashtags, no sentido de propagação,
se dá, também, a partir de uma inteligência coletiva, que “[...] pode ser vista como uma
fonte alternativa de poder midiático. Estamos aprendendo a usar esse poder em nossas
interações diárias dentro da cultura da convergência” (JENKINS, 2009, p. 30).
A análise deste estudo consiste, portanto, em rastrear o conteúdo propagado no
Twitter com as hasgtags #fatimabernardes e #bonner (seja textual ou imagético/de
memes), como estes surgiram na rede e o modo pelo qual foram se modificando durante
a semana de análise. Será considerada, neste contexto de circulação midiática, a
ressignificação destas informações e suas diversas apropriações por seus consumidores.
Esta configuração do que se forma a partir de um “algo” (neste caso, o “algo” é a
circulação do conteúdo de Fátima e Bonner) é considerada por Braga (2012) como o fluxo
adiante. Este conceito será considerado com o propósito de compreender uma sociedade
em vias de midiatização que transforma em um meme, uma hashtag ou um novo conteúdo
uma informação que, a priori, é igual para todos: Fátima e Bonner se separaram.
2 Keyhole.com é uma ferramenta que apresenta métricas do twitter. É possível obter resultados através de
palavras-chave, hashtags ou URLs, como dados demográficos e localização dos usuários. A versão utilizada
para a pesquisa foi a oferecida gratuitamente.
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Esse “fluxo adiante” acontece em variadíssimas formas – desde a reposição do
próprio produto para outros usuários (modificado ou não); à elaboração de
comentários – que podem resultar em textos publicados ou em simples
“conversa de bar” sobre um filme recém visto; a uma retomada de ideias para
gerar outros produtos (em sintonia ou contraposição); a uma estimulação de
debates, análises, polêmicas – em processo agonístico; a esforços de
sistematização analítica ou estudos sobre o tipo de questão inicialmente
exposta; passando ainda por outras e outras possibilidades, incluindo aí,
naturalmente a circulação que se manifesta nas redes sociais (BRAGA, 2012,
p. 39-40).
Esta circulação mencionada por Braga (2012) foge da natureza até então
tradicional da informação, em uma lógica vertical em que veículos de massa inserem dado
conteúdo em seu público receptor e passivo. A partir destas circunstâncias novas, de
acordo com o autor, recepção e produção saem de um sistema independente e separado
de existência para coexistir: ou seja, a linha cronológica em que determinado conteúdo
inicia com o produtor e segue até o receptor se rompe neste macro-ambiente de interação
social: aqui, todos produzem (a seu modo) e todos recebem (a seu modo).
[…] a rigor, não é “o produto” que circula – mas encontra um sistema de
circulação no qual se viabiliza e ao qual alimenta. O produto, entretanto, é um
momento particularmente auspicioso da circulação – justamente porque,
consolidado em sua forma que permanece (e que se multiplica, na sociedade
em midiatização), pode continuar circulando e repercutindo em outros espaços
(BRAGA, 2012, p. 41).
Neste cenário de circulação em um processo midiático crescente, estas novas
dinâmicas e percepções sobre o produto e as apropriações de consumidores que se
inserem, também, na posição de produtores, conferem uma espécie de protagonismo à
ideia de circulação em rede.
A circulação deixa de ser um elemento “invisível” ou “insondável” e, graças a
um trabalho complexo de linguagem e técnica, segundo operações de
dispositivos, explicita sua “atividade construcionista”, gerando pistas, intuindo
novos objetos e, ao mesmo tempo, procedimentos analíticos que ensejem a
inteligibilidade do seu funcionamento e dos seus efeitos (FAUSTO NETO,
2010, p. 3).
Este movimento do conteúdo em rede, que gera novos significados ao “algo” já
dado, faz emergir sentidos próprios a cada sujeito que se apropria da informação. Estes
sentidos (que também serão considerados nesta análise) são percebidos por meio do
discurso deste conteúdo, a partir do que aponta Anselmiro (2010, p. 37, tradução nossa):
“Essa forma de conceber o sentido que ocorre e circula - e que é socialmente
16
compartilhado - ganhou um lugar em um cenário apenas possível de ser pensado a partir
de mudanças na forma de entendimento da relação linguagem-realidade [...]”3.
A análise a ser desenvolvida neste trabalho considera, assim, as noções teóricas
acima mencionadas em um viés de midiatização que toma a circulação como a
consequência deste novo “fazer informativo”, que ressignifica conteúdos a partir de um
“algo” em uma lógica onde receptores e produtores atuam paralelamente, alternando
constantemente suas posições.
Referências
ANSELMIRO, Natalia Raimondo. Discurso y mediatización: para un análisis no-
intencional de las estrategias discursivas. In: FAUSTO NETO, Antonio;
VALDETTARO, Sandra (Org.). Mediatización, sociedad y sentido: diálogos entre
Brasil y Argentina. Rosario: Universidad Nacional de Rosario, 2010, p. 36-55.
Disponível em: <http://www.fcpolit.unr.edu.ar/wp-
content/uploads/Mediatizaci%C3%B3n-sociedad-y-sentido.pdf>. Acesso em: 26 set.
2016.
BRAGA, José Luiz. Circuitos versus campos sociais. In: MATTOS, Maria Ângela;
JANOTTI JUNIOR, Jeder; JACKS, Nilda (Org.). Mediação & midiatização. Salvador:
Edufba, 2012, p. 29-52. Disponível em: <http://books.scielo.org>. Acesso em: 27 set.
2016.
FAUSTO NETO, Antonio. A circulação além das bordas. In: FAUSTO NETO,
Antonio; VALDETTARO, Sandra (Org.). Mediatización, sociedad y sentido: diálogos
entre Brasil y Argentina. Rosario: Universidad Nacional de Rosario, 2010, p. 2-17.
Disponível em: <http://www.fcpolit.unr.edu.ar/wp-
content/uploads/Mediatizaci%C3%B3n-sociedad-y-sentido.pdf>. Acesso em: 26 set.
2016.
JENKINS, Henry. Cultura da Convergência. São Paulo: Aleph, 2009.
17
Quando julgar é diagramar
Marcos Reche Ávila
Palavras-chave: midiatização; Lava-Jato; Lula; Power Point.
RESUMO EXPANDIDO
Este trabalho consiste em analisar fragmentos de um caso de operação de
midiatização que envolve a intervenção de campos sociais, como o midiático, o jurídico
e o policial, além de atores sociais. Diz respeito à apresentação de denúncia por parte do
Ministério Público contra o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
No dia 14 de setembro deste ano, 2016, o coordenador da força-tarefa da Lava-
Jato, Deltan Dallagnol, apresentou a denúncia, perante um grupo de outros procuradores
e jornalistas, em hotel de Curitiba, apoiando-se em uma longa exposição auxiliado por
um gráfico feito com o software Power Point, da Microsoft. Duas questões surgiram deste
fato: a) o teor e qualidade das informações reunidas em um diagrama; e b) o modelo de
apresentação conhecido pelo nome do seu formato de arquivo: ppt.
A midiatização da denúncia, através desta apresentação gerou imediatos
desdobramentos: o diagrama sobre o qual se apoia o relato da denúncia foi apropriado
por atores sociais em redes sociais, que geraram muitos memes. Como se sabe, o formato
‘ppt’ é muito reconhecido e utilizado, principalmente, para apresentações escolares de
nível fundamental, médio e superior.
Até então as operações de midiatização das ações das forças-tarefa investigativas
da operação Lava Jato vinham sendo feitas através de entrevistas por parte dos
procuradores ou pela cobertura da mídia sobre condução e detenção de pessoas suspeitas.
Pela primeira, o relato das denúncias contra o ex-presidente foi feito através de uma
operação didático-midiática, convocada pelas autoridades judiciárias. O centro do relato
consistiu na apresentação das denúncias por parte de um procurador, que, a seu turno,
valeu-se de um ‘power point’ no qual foram listadas e organizadas. Além de relatadas, as
denúncias recebiam do expositor os comentários adicionais. O foco da apresentação se
centrou no diagrama e a este se apoiava a autoridade denunciante para argumentar. O alto
nível de abstração sem concretude e as informações vagas, sem enfoque de prova,
contidas no ppt geraram apenas suposições ou convicções. Então, pessoas ressignificaram
18
a operação midiática do procurador Dallagnol em sua iniciativa e geraram outras
operações midiáticas, os memes, cujos tons foram cômicos.
O diagrama original (Fig.1) está organizado de acordo com a seguinte
estruturação: o nome do Lula é o epicentro, sendo o espaço restante estruturado em torno
de fluxos de enunciados direcionados através de setas para o epicentro. Os enunciados,
construídos na forma de 14 círculos, em cor azul, partiam das extremidades do espaço
do diagrama para o epicentro, constituindo-se em tópicos sobre vários assuntos
contemplados pela investigação feita contra o ex-presidente. Os enunciados eram:
Reação de Lula; Depoimentos; Petrolão mais Propinocracria; Governabilidade
corrompida; Poder de Decisão; Perpetuação criminosa no poder; Pessoas próximas na
Lava-Jato; Mensalão; Pessoas próximas no Mensalão; José Dirceu; Vértice Comum;
Enriquecimento ilícito; Maior beneficiado; Expressividade.
Fonte: O Globo; reprodução.
Vários diagramas similares trataram de marcar a reação de atores sociais e de
instituições. A reação de pessoas que geraram memes foi bastante voltada ao humor, na
medida em que criaram outros diagramas, cujos conteúdos variavam tematicamente de
futebol a defesas ao Lula. Várias enunciações tratavam de desqualificar o trabalho dos
procuradores, especificamente quanto as informações existentes no diagrama original
19
(Fig.1), em consonância com os temas apontados como fatores responsáveis pela
denúncia contra Lula. Um destes (Fig.2) memes, por exemplo, também coloca o Lula
como epicentro, mas, no entorno, há outros enunciados, apresentando uma fragmentação
de temas que transcendiam o universo da denúncia propriamente dita: Aquecimento
global, Crise dos mísseis em Cuba; 11 de setembro; 7x1; Lula; Separação Fátima/Bonner;
Bel Pesce; Grávida de Taubaté; Kim Kataguiri; Trump; Tragédia de Mariana; Guerra na
Síria; Hiroshima/Nagasaki; Cerco de Sarajevo.
Fonte: Desconhecido.
A criatividade na disputa por sentidos e ressignificações em relação ao diagrama
original (Fig. 1) saiu do campo de políticas republicanas e entrou na esfera da indústria
cultural (Fig. 3). No caso, a empresa Netflix torna-se o epicentro e no seu entorno aparece
um outro rol de conteúdos, que recobrem outra quantidade de temas. Estes, associados
com as condições de exposição e consumo na utilização dos serviços da Netflix, porém,
com um tom de brincadeira e não-depreciativo. Os enunciados eram: Roubou minha vida
social; Dormi muito tarde; Cancelei a balada; Deu spoiler na sinopse; Cade Sense 8; Me
sugeriu galinha pintadinha; Deixou o (a) namorado (a) ver episódios sem mim; Perdi o
sono; Vício; “Tem alguém assistindo”; Stranger Things na semana de provas; Me deixou
tenso (a); Desmarquei compromisso; Me fez chorar.
20
Fonte: Facebook; fanpage Netflix.
Os exemplos acima são fragmentos de um universo maior de produção de memes
baseados no gráfico original, ou seja, disputas de sentido e ressignificações em
midiatizações de um processo de apresentação do que foi considerado como provas para
tornar réu um investigado pela operação conhecida como Lava-Jato. Embora
ressignificados, os memes cumprem o protocolo e mantêm a estética do diagrama original
ao mesmo tempo que são novos produtos e pertencem a ambientes diferentes.
Nossa análise vai examinar os efeitos de sentidos de operações de ingresso na
processualidade da midiatização, realizadas pelos campos político e judiciário,
abandonando regras e competências discursivas que caracterizavam dimensões
enunciativas dos referidos campos. Ao renunciar a observância de lógicas e regras destes
campos, a estratégia de anúncio da denúncia não conseguiu tirar proveito do ritual
espetacularizante sobre a qual se fez o relato da denúncia: apenas parte da mensagem foi
transformada em objeto imediato, dando ao suporte diagramático outros destinos em
ermos de produção de sentidos, indo além dos autos dos procuradores. É extraído dos
contextos enunciativos jurídico e policial, que dele se emprestara, para ser transformado
em novos significantes.
O diagrama é levado adiante mediante regime de produção de sentidos operado
pelas dinâmicas de extensa plataforma circulatória de discursos de diferentes motivações.
Funciona como ‘condição de produção’ para geração de novos diagramas que resultam
de diferentes processos de apropriação: desde aqueles de instituições políticas que dão
21
amplitude ao tom dos conteúdos de denúncias contra o ex-presidente, aos embates
travados no âmbito das redes sociais onde, de fato, realiza-se um ‘sui generis’ júri de
julgamento do ex-presidente.
Nele, conforme analisaremos, outros diagramas emergem e dão sequência ao
trabalho de sentidos que foge das enunciações do mundo judicial e policial, ingressando
na fabulação do ‘homem ordinário’ e/ou de outros coletivos constituídos pelos atores
sociais. Veremos, pela análise, que um dos efeitos da transformação dos diagramas, é o
fato de que eles são apropriados pelas mais diferentes motivações e, talvez o efeito de
sentido mais singular desta extensa operação comunicativa é, justamente, a emergência
de um protocolo emanado pelo mundo jurídico: quando julgar é diagramar.
22
O acontecimento midiatizado em circulação: apontamentos
metodológicos Marlon Santa Maria Dias
Universidade Federal de Santa Maria
Palavras-chave: midiatização; acontecimento; circulação; metodologia.
RESUMO EXPANDIDO
A gênese de qualquer investigação está na inquietação, que pode surgir em um
momento qualquer, enquanto folheamos um jornal no café da manhã, assistimos a um
programa televisivo, andamos de ônibus, conversamos com alguém na fila da padaria ou
deslizamos o cursor do mouse na tela do computador. Ao observarmos a realidade
empírica, formulamos perguntas e fazemos inferências num processo reflexivo de
abdução que, seguindo as proposições peirceanas, é o único caminho para produção de
descobertas.
A escrita de uma proposta de pesquisa atrela-se a esses processos de indagação,
pois é escrevendo que planejamos o caminho, organizamos as ideias, elencamos as
perguntas, descrevemos os observáveis e realizamos um laborioso exercício de
argumentação. Este é o início de um percurso complexo que compreende diferentes etapas
e um trabalho reflexivo de constante vigilância. Um percurso singular, pois cada pesquisa
desenha um mundo a partir da especificidade do problema de pesquisa, dos observáveis
e das inferências.
Este texto nasce tendo como horizonte de retrospecção uma pesquisa finalizada
recentemente, na qual investigamos os modos como estratégias discursivas enunciadas
por atores, campos e mídias – em uma complexa atividade de circulação que envolve
dimensões midiáticas e não-midiáticas – constroem um acontecimento no contexto de
uma sociedade em processo de midiatização. Tínhamos como objeto empírico a produção
discursiva acerca da mobilização Eu não mereço ser estuprada, que emergiu no Brasil
em 2014 a partir de um protesto anti-estupro articulado, sobretudo, por atores nas redes
sociais digitais.
Neste artigo, propomo-nos a realizar um exercício reflexivo sobre questões,
orientações e desafios metodológicos que constituíram a pesquisa supracitada. Assim
como Brennen (2013), acreditamos que o processo reflexivo acerca das práticas
metodológicas nos auxilia tanto na compreensão das interpretações advindas dos
processos de observação dos dados, como também nos alerta para os fatores que
23
influenciam a pesquisa – contextos sociais, culturais, históricos, língua, experiências dos
sujeitos da investigação. Mais do que descrever o percurso metodológico, objetivamos
refletir sobre as especificidades que desafiam as pesquisas no campo da Comunicação
que tem a problemática da midiatização como orientação epistêmico-teórica (BONIN,
2016) e, mais detidamente, investigações sobre a construção de acontecimentos nas
paisagens ainda pouco exploradas da circulação.
O título deste trabalho sinaliza os conceitos que norteiam a investigação:
acontecimento, midiatização e circulação. Acontecimento é um conceito caro – e, por
vezes, problemático – para diferentes disciplinas, que tomam para si definições peculiares
(FRANÇA, 2012). É possível identificar no mínimo dois tipos de acontecimento: o
experienciado no cotidiano e o jornalístico. Enquanto o primeiro “corresponde à
emergência e às afetações do acontecimento na realidade tangível e em suas
reverberações cognitivas” (BERGER; TAVARES, 2010, p. 122), o segundo pode ser
entendido como a construção do acontecimento pelas linguagens jornalísticas. Essa
separação funciona mais em nível didático, afinal, é impossível – e até equivocado, como
atentam Berger e Tavares (2010) – fazer essa separação de modo rigoroso, afinal, o
acontecimento experienciado fornece elementos para a construção do acontecimento
jornalístico, assim como este modifica a percepção daquele.
Comparando as diferentes vertentes do acontecimento (ZAMIN; MAROCCO,
2010) e as possíveis tipologias do acontecimento jornalístico (BERGER; TAVARES,
2010), encontramos um ponto de coesão entre essas perspectivas: o caráter singular do
acontecimento, capaz de romper com uma suposta “normalidade”, instaurando rupturas.
Acrescenta-se a isso o que Quéré (2005) considera o mais importante: o poder de afetação
do acontecimento. Para o autor, só há acontecimento porque ele afeta alguém. A partir
dessa noção de acontecimento, questionamos de que modo podemos pensar a constituição
de acontecimentos que eclodem em uma sociedade em midiatização. Se, como afirma
Nora (1974), os acontecimentos possuem a marca da mídia que lhes é contemporânea,
que características teria o acontecimento em uma sociedade marcada por manifestações
de midiatização?
Entendemos midiatização como fenômeno social, mas também enquanto os
próprios mecanismos que a fazem funcionar, engendrando complexidades resultantes da
instalação de novos modos de interação social (SODRÉ, 2002) e da transformação cada
vez mais frequente de tecnologias em meios (FAUSTO NETO, 2008). Essas
complexidades que envolvem processos midiáticos e sociais se desenvolvem em uma
24
nova ambiência (midiatizada), que estrutura e organiza os sentidos e que se reconfigura a
partir de operações midiáticas e de novas práticas de interação dos atores.
É importante destacar o modo transversal como pensamos esses dois conceitos,
ou seja, a incidência de um sobre o outro. Exatamente por isso é que propomos o termo
acontecimento midiatizado. Refletir sobre o acontecimento midiatizado é pensar sobre o
modo como o processo de midiatização afeta e modifica a constituição de um
acontecimento e possibilita novos espaços para sua eclosão e, consequentemente, outros
olhares, interpretações, usos e construções que remetem a um modo singular de
constituição do próprio acontecimento. Além disso, o processo de circulação de sentidos
sobre o acontecimento nos aponta caminhos para pensar a ambiência da midiatização –
esse bios midiático, na expressão de Sodré (2002).
Nesse cenário, desponta a problemática da circulação, não mais compreendida
como um lugar de passagem, em que os discursos transcorriam numa lógica linear, mas
em locus de outro tipo de trabalho enunciativo dos atores. Essa nova atividade de
circulação acentua a descontinuidade entre as lógicas de produção e recepção, num
processo de acoplamentos que, longe de apontar para uma convergência de sentidos, se
realiza segundo postulados de divergência (FAUSTO NETO, 2012, 2015). A circulação
passa a ser o “espaço do reconhecimento e dos desvios produzidos pela apropriação”
(BRAGA, 2012, p. 38).
Essa nova arquitetura comunicacional (FAUSTO NETO, 2012) desafia a pesquisa
empírica a compreender como opera a midiatização. As realidades complexas e dinâmicas
pelas quais se movimentam nossos objetos de pesquisa impõem repensar os processos e
métodos de investigação. Por isso, consideramos válido refletir sobre os percursos
metodológicos. No artigo completo, apresentamos de modo mais aprofundado os passos
da pesquisa, sintetizados nas seguintes etapas: aproximação do caso, pesquisa
exploratória, mapeamentos, delimitação de observáveis, formulação da problemática,
observação sistemática, interpretação e análise semiológica e construção de circuitos
(diagramas).
Durante o processo, guiamo-nos pelo pensamento de Braga (2010) acerca das
questões comunicacionais comportadas pela situação em estudo. Segundo o autor, há uma
necessidade de interrogar os objetos investigados a partir de um enfoque comunicacional,
ou seja, elaborar perguntas propriamente comunicacionais sobre os fenômenos, a fim de
superar a noção de interdisciplinaridade que ainda caracteriza a Comunicação para
25
avançar na delimitação e constituição desta enquanto uma disciplina com aportes teórico-
metodológicos próprios.
As pesquisas sobre as transformações decorrentes do processo de midiatização
apontam para dificuldades no nível metodológico, porquanto o objeto de pesquisa em
questão é o próprio processo. O estudo de um fenômeno em sua processualidade fez com
que buscássemos percorrer um caminho que não se limitasse a apenas uma técnica de
investigação, fazendo-nos construir um percurso metodológico que nos possibilitasse
compreender a complexidade que caracteriza uma sociedade em que instituições, atores
e práticas se relacionam e se afetam sob a articulação de uma cultura midiática (MATA,
1999; FAUSTO NETO, 2008). Desse modo, a observação sistemática da realidade
empírica do objeto nos ajudou a tomar as decisões de percurso que regem os recortes, as
categorizações e os acionamentos teóricos que fundamentam a pesquisa.
A pesquisa exploratória constituiu um importante processo na construção da
problemática de pesquisa e dos procedimentos de investigação, norteando alguns recortes
necessários para tornar viável a pesquisa sobre os observáveis. A exploração do caso em
estudo iniciou por um mapeamento exaustivo dos espaços por onde circulou o
acontecimento. Esse mapeamento foi uma valiosa estratégia para a construção de
diagramas que tornassem visíveis os circuitos identificados.
O estudo de caso apresentou-se como um caminho eficaz para a realização da
pesquisa, visto que este método tem como objetivo a intensa exploração do caso em
estudo e o aprofundamento de um fenômeno específico (Eu não mereço ser estuprada).
Sinalizamos, todavia, que é preciso considerar o caráter comunicacional-midiático do
fenômeno em análise, afim de criar esquemas interpretativos que deem conta de sua
processualidade e especificidade. Assim, atentamos para o caráter indiciário do estudo
(BRAGA, 2008), entendendo o fenômeno em análise enquanto um caso midiático
(FORD, 1999), cujo estudo de sua narrativização não pode ser deslocado do complexo
ambiente de circulação no qual está inserido.
Referências
BERGER, C.; TAVARES, F. M. B. Tipologias do acontecimento jornalístico. In:
BENETTI, M.; FONSECA, V. (Org.). Jornalismo e acontecimento: mapeamentos
críticos. Florianópolis: Insular, 2010, v. 1, p. 121-142.
26
BONIN, J. Questões metodológicas na construção de pesquisas sobre apropriações
midiáticas. In: MOURA, C. P.; LOPES, M. I. V. Pesquisa em comunicação:
metodológicas e práticas acadêmicas. Porto Alegre: EDIPUCRS, 2016.
BRENNEN, B. S. Qualitative research: Methods for Media Studies. New York/London:
Routledge, 2013.
BRAGA, J. L. Comunicação, disciplina indiciária. Matrizes, v. 1, n, 2, p. 73-88, abr.
2008.
______. Pesquisando perguntas (um programa de ação no desentranhamento do
comunicacional). In: FAUSTO NETO, A. et al. (Org.). Midiatização e Processos
Sociais: aspectos metodológicos. Santa Cruz do Sul: EDUNISC, 2010, p. 79-93.
______. Circuitos versus Campos Sociais. In: MATTOS, M. Â.; JANOTTI JUNIOR, J.;
JACKS, N. (org.). Mediação e midiatização. Salvador: EDUFBA, 2012, p. 31-52.
FAUSTO NETO, A. Fragmentos de uma “analítica” da midiatização. Matrizes. São
Paulo: ECA/USP, ano 1, nº 1, 2008, p. 89-105.
______. Narratividades jornalísticas no ambiente da circulação. In: PICCININ, F.;
SOSTER, D. de A. (Org.). Narrativas comunicacionais complexificadas. Santa Cruz
do Sul: EDUNISC, 2012.
______. Recepção, 'corpo-significante' em circulação. In: BRIGNOL, L. D.; BORELLI,
V. Pesquisa em recepção: relatos da Segunda Jornada Gaúcha. Santa Maria: FACOS-
UFSM, 2015, p. 17-24.
FORD, A. La marca de la bestia: identificación, desigualdades e infoentretenimiento
en la sociedad contemporánea. Buenos Aires: Grupo Editorial Norma, 1999.
FRANÇA, V. O acontecimento e a mídia. Galaxia, n. 24, p. 10-21, dez. 2012.
MATA, M. C. De la cultura masiva a la cultura mediática. Diálogos de la
Comunicación, n.56, Lima: Felafacs, 1999.
NORA, P. Le retour de l’événement. In: LeGOFF, J.; NORA, P. Faire de l’histoire:
nouveaux problèmes. Paris: Gallimard, 1974.
QUÉRÉ, L. Entre facto e sentido: a dualidade do acontecimento. Trajectos. Revista de
Comunicação, Cultura e Educação. Lisboa, n. 6, p. 59-75, 2005.
SODRÉ, M. Antropológica do espelho. Petrópolis: Vozes, 2002.
ZAMIN, A; MAROCCO, B. A. Vertentes dos estudos de acontecimento. In: BENETTI,
M.; FONSECA, V. (Org.). Jornalismo e acontecimento: mapeamentos críticos.
Florianópolis: Insular, 2010, v. 1, p. 121-142.
27
Fragmento de midiatização de um fim anunciado Victor Dias Thiesen
Universidade do Vale do Rio dos Sinos
Palavras-chave: Zona de Contato; Midiatização; Talk Show;
RESUMO EXPANDIDO
O presente trabalho descreve a articulação produção / recepção a partir das
notícias e dos comentários que envolvem o anúncio do encerramento do Programa do Jô
depois de 28 anos no ar em duas emissoras, SBT (1988-1999) e Rede Globo (2000-2016),
no formato de talk show. Esse acontecimento se desenvolve ao longo do tempo segundo
processos nos quais, antes mesmo do anúncio formal do encerramento, haviam
especulações sobre o fim do programa alimentadas, sobretudo, a partir de uma entrevista
realizada por Jô Soares com a ex-presidente Dilma Rousseff em junho de 2015 na
biblioteca do Palácio da Alvorada, fora do setting midiático (Imagem 1). Outros sintomas
já vinham se apresentando, como a diminuição dos quadros do programa (de dois à três)
e a redução da banda que acompanhava Jô (de sexteto à quarteto). O anúncio se
materializa somente em março de 2016 pela imprensa, momento em que é revelado o
acordo contratual firmado em 2014 entre Jô e Globo para o encerramento e são dadas
justificativas para o encerramento: evitar o desgaste do formato do programa que já vinha
apresentando queda de audiência. Nesse momento a imprensa analisa a nova fase dos talk
shows, programas são colocados na grade de programação como testes para averiguar a
boa receptividade de programas que privilegiam o entretenimento, “mais show do que
talk”. Exemplo disso é o programa “ADNight”, da Rede Globo, espécie de substituto para
o espaço deixado por Jô. Nota-se também uma segunda estratégia que é quando Jô dedica
um programa inteiro ao seu substituto, Marcelo Adnet, apresentador do ADNight, falar
sobre a dinâmica do novo programa (Imagem 2). O terceiro momento desse processo está
previsto para o final do ano de modo que só se pode falar sobre através dos registros da
dinâmica do ADNight (Imagem 3) e do formato de outros programas talk show de outras
emissoras, como o “Programa do Porchat”, transmitido pela Rede Record. Nossa análise
sobre este acontecimento em processo, se dá naquilo que estamos chamando de “zona de
contato”, ou seja, o espaço de interação entre produtores e receptores onde há embate e
negociação de sentido. Focamos no nível de contato dentro dos sites do sistema produtor,
em que estes condicionam o acesso dos receptores, apesar de haverem outros.
28
Anunciamos em nossa análise que a interação é regulada pelo sistema de produção, uma
vez que é deste âmbito que vem os convites à participação dos receptores na forma de
comentários e é também o lugar de fala da “palavra final” sobre a construção enunciativa
do programa. Examina-se essa manifestação em dois níveis: 1) o anúncio do
encerramento no programa quando disponibilizado pela globoplay e os comentários dos
espectadores do dia 28 de março de 2016, primeiro programa da última temporada, no
qual o próprio apresentador anuncia enfim o encerramento; 2) O anúncio do encerramento
do programa em matérias do G1, O Globo e FSP na íntegra pelos seus sites com
respectivos comentários dos leitores (22/02/2016, 23/03/2016 e 23/02/2016,
respectivamente). Ou seja, trabalha-se com a recepção ora como espectador do programa,
ora como leitor de jornal. Com isso, estuda-se, a partir de marcas das notícias e falas da
recepção, níveis de compreensão que o segundo âmbito se apropria das notícias e como
reelabora o anúncio das notícias. em relação às rotinas que caracterizam o programa.
Segundo nossa hipótese, o encerramento do programa aponta para as manifestações de
efeitos da sociedade em vias de midiatização, especialmente sobre os gêneros
jornalísticos como o talk show. As afetações sobre o campo jornalístico não são
longínquas nem abstratas: são materiais e se passam na própria rotina do mundo
televisivo. O Programa do Jô é uma modalidade que valoriza o infoentretenimento através
da interiorização da recepção no âmbito das mídias. E entendemos que seu fim enseja a
emergência de processos interacionais que se estabelecem pela valorização específica do
entretenimento. Ou seja, uma das marcas que apontam o funcionamento das novas
narratividades do contexto da midiatização.Este tipo de análise ajuda a refinar olhares
sobre a rotina da TV, especialmente o trabalho dos analistas diante de fenômenos que são
mais complexos do que as crônicas apontam.
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Imagem 1: Jô entrevista Dilma Rousseff na biblioteca do Palácio da Alvorada
(12/06/2015)
Imagem 2: Jô dedica um programa inteiro ao seu substituto falar sobre a dinâmica do
novo programa (22/07/2016)