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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES
PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”
AVM FACULDADE INTEGRADA
A DECLARAÇÃO DE INIDONEIDADE E SUA ABRANGÊNCIA
Por: Fábio Marcondes Ferraz Petrelli Toledo
Orientador
Prof. Mariana Monteiro
Rio de Janeiro
2015
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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES
PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”
AVM FACULDADE INTEGRADA
A DECLARAÇÃO DE INIDONEIDADE E SUA ABRANGÊNCIA
Apresentação de monografia à AVM Faculdade
Integrada como requisito parcial para obtenção do
grau de especialista em Direito Público e Tributário
Por: . Fábio Marcondes Ferraz Petrelli Toledo
3
AGRADECIMENTOS
....à Deus, à esposa, aos familiares e
aos colegas da AVM
4
DEDICATÓRIA
.....dedica-se a esposa pelo apoio no
desenvolvimento do trabalho.
5
RESUMO
Trata a presente monografia da apresentação do tema afeto à
abrangência da declaração de inidoneidade, sanção administrativa prevista no
art. 87, IV, da Lei 8.666/93, que, por seus estritos termos, impõe impedimento
para licitar e contratar com a Administração Pública. A importância do tema
revela-se pela falta de especificação legal acerca do âmbito de abrangência da
sanção administrativa de inidoneidade.
Desta feita, no Capítulo I pretendeu-se destacar o conceito e os
sentidos da Administração Pública, bem como salientar alguns dos seus
princípios orientadores, especialmente a supremacia do interesse público e o
princípio licitatório.
No Capítulo II buscou-se apresentar um panorama sobre os contratos
administrativos e suas cláusulas exorbitantes, dentre as quais se insere a
declaração de inidoneidade, além de ter sido abordada a questão do Direito
Administrativo Sancionador.
Por fim, no Capítulo III, procurou-se o estudo da declaração de
inidoneidade, bem como a pontuação da controvérsia doutrinária e da
jurisprudência acerca da matéria, de modo a que se pudesse chegar a uma
conclusão sobre a abrangência da declaração de inidoneidade.
6
METODOLOGIA
O estudo do tema fora realizado a partir da abordagem legal, doutrinária
e jurisprudencial sobre a matéria. Ganhou importância, neste método, a
verificação do texto legal, bem como sua inteligência por parte da doutrina e
jurisprudência. Tudo isso a fim de que se realizasse a necessária abordagem
acerca das normas contidas no texto legal e a interação das mesmas com a
estrutura de princípios informadores da atividade administrativa, buscando-se
novas abordagens e concepções teóricas e judiciais que infirmem ou
confirmem a tese ora colocada.
7
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO 08
CAPÍTULO I - Administração Pública e o Princípio da Licitação 09
CAPÍTULO II - Contrato Administrativo e a Atividade Sancionatória 21
CAPÍTULO III – Declaração de Inidoneidade 36
CONCLUSÃO 56
BIBLIOGRAFIA 58
ÍNDICE 59
8
INTRODUÇÃO
O art. 87, IV, da Lei 8.666/93, prevê o impedimento para contratar e
licitar com a Administração Pública, o que suscita dúvida: se se refere ao
Poder Público como um todo ou se se refere unicamente à Administração que
emitiu a declaração sancionatória.
A questão da interpretação legal, de outra feita, não se esgota na mera
acepção do termo “Administração Pública”, eis que o influxo dos princípios
administrativos e constitucionais, notadamente o da moralidade, confere
complexidade ao tema. Certamente, o dever administrativo de zelo pela
probidade e de proteção da coisa pública contra atos inidôneos devem ser
analisados e ponderados com o princípio federativo.
Os efeitos teóricos e práticos da análise do art. 87, IV, da Lei 8.666/93,
portanto, são de fundamental importância, eis que, a depender do enfoque
prevalente, a prática da contratação administrativa pode sofrer fundamental
influência.
Neste diapasão, mostrou-se oportuno o estudo da referida sanção e de
seus efeitos subjetivos, eis que na prática diuturna da administração o Poder
Público pode se ver na contingência de vedar ou autorizar determinado
particular, caso entenda ou não pela extensão da penalidade aplicada por Ente
diverso. Eis o que se pretende descortinar a seguir.
9
CAPÍTULO I
ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA E O PRINCÍPIO DA
LICITAÇÃO
Inicialmente, cabe perquirir os sentidos em que a Administração
Pública pode ser analisada, bem como os princípios constitucionais que lhe
conferem fundamento de atuação, de forma a estabelecer o contexto próprio
de estudo das relações jurídicas público-contratuais e, por conseguinte,
viabilizar a abordagem das prerrogativas administrativas inerentes àquelas
relações, incluindo as sanções contratuais, tal como a declaração de
inidoneidade.
1.1 – A Administração Pública: Conceito e Sentidos
De acordo com Maria Sylvia Zanella Di Pietro, a expressão
Administração Pública pode ser vista sob os prismas subjetivo e objetivo,
diferenciando a abordagem a partir dos sujeitos que exercem a atividade
administrativa e do sentido relativo à própria atividade em si considerada:
“Basicamente, são dois os sentidos em que se utiliza
mais comumente a expressão Administração Pública:
a) em sentido subjetivo, formal ou orgânico, ela designa
os entes que exercem a atividade administrativa;
compreende pessoas jurídicas, órgãos e agentes públicos
incumbidos de exercer uma das funções em que se
triparte a atividade estatal: a função administrativa; b) em
10
sentido objetivo, material ou funcional, ela designa a
natureza da atividade exercida pelos referidos entes;
nesse sentido, a Administração Pública é a própria função
administrativa que incumbe, predominantemente, ao
Poder Executivo.
Há, ainda, outra distinção que alguns autores costumam
fazer, a partir da ideia de que administrar compreende
planejar e executar:
a) em sentido amplo, a Administração Pública,
subjetivamente considerada, compreende tanto os órgãos
governamentais, supremos, constitucionais (Governo),
aos quais incumbe traçar os planos de ação, dirigir,
comandar, como também os órgãos administrativos,
subordinados, dependentes (Administração Pública, em
sentido estrito), aos quais incumbe executar os planos
governamentais; ainda em sentido amplo, porém
objetivamente considerada, a Administração Pública
compreende a função política, que traça as diretrizes
governamentais e a função administrativa, que as
executa; b) em sentido estrito, a Administração Pública
compreende, sob o aspecto subjetivo, apenas os órgãos
administrativos e, sob o aspecto objetivo, apenas a
função administrativa, excluídos, no primeiro caso, os
órgãos governamentais e, no segundo, a função política.”
(2014, p.50).
Também se mostra minucioso o estudo do professor Alexandre Mazza,
que extrema o conceito de Administração Pública da ideia de Poder Executivo,
ao mesmo passo em que discrimina os sentidos da expressão relacionados
aos órgãos exercentes da atividade e a própria atividade:
11
“Administração Pública (com iniciais maiúsculas) é um
conceito que não coincide com Poder Executivo.
Atualmente, o termo Administração Pública designa o
conjunto de órgãos e agentes estatais no exercício da
função administrativa, independentemente se são
pertencentes ao Poder Executivo, ao Legislativo, ao
Judiciário, ou a qualquer outro organismo estatal (como
Ministério Público e Defensorias Públicas). (...)
Administração pública (com iniciais minúsculas) ou poder
executivo (com minúscula) são expressões que designam
a atividade consistente na defesa concreta do interesse
público. (...) A expressão “Administração Pública” pode
ser empregada em diferentes sentidos: 1º - Administração
Pública em sentido subjetivo ou orgânico é o conjunto de
agentes, órgãos e entidades públicas que exercem a
função administrativa; 2º - Administração Pública em
sentido objetivo, material ou funcional, mais
adequadamente denominada “administração pública”
(com iniciais minúsculas), é a atividade estatal
consistente em defender concretamente o interesse
público.” (2014, p.49-50)
No mais, além do mero destaque conferido aos sentidos da
Administração Pública – grosso modo, um sentido voltado para os órgãos
exercentes da atividade e um outro referente à atividade administrativa em si
mesma considerada –, oportuno esclarecer o que se entende por atividade
administrativa. Nas palavras de Fernanda Marinela:
“A atividade administrativa é a gestão de bens e
interesses qualificados da comunidade, de âmbito federal,
estadual e municipal, segundo os preceitos do Direito e
da Moral, visando ao bem comum. Representa toda
12
atividade desenvolvida pela Administração, protegendo os
interesses da coletividade e decorre do fato de o Brasil
ser uma República, em que toda atividade desenvolvida
deve privilegiar a coisa pública.
A natureza da Administração Pública, enquanto atividade
administrativa, é de munus publico, de encargo para
quem a exerce, caracterizando-se como um dever de
defesa, conservação e aprimoramento dos bens, serviços
e interesses da coletividade, não se admitindo a liberdade
para a perseguição de outros interesses.” (2013, p.19)
1.2 – Princípios da Administração Pública
A Constituição da República traz os princípios norteadores da
Administração Pública a partir do art. 37, o qual, em seu caput, faz referência
aos princípios da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e
eficiência. Nos incisos do mesmo dispositivo prossegue o legislador
constituinte com as demais normas e princípios aplicáveis à Administração
Pública, dentre eles o princípio da licitação (art. 37, XXI).
Entretanto, antes de mais nada convém asseverar a diferença entre
princípios e regras, pelo que trazemos a doutrina de Pedro Lenza:
“ Barroso, avançando, identifica uma distinção qualitativa
ou estrutural entre regras e princípios. Conforme anota,
“...a Constituição passa a ser encarada como um sistema
aberto de princípios e regras, permeável a valores
jurídicos suprapositivos, no qual as ideias de justiça e de
realização dos direitos fundamentais desempenham um
papel central. A mudança de paradigma nessa matéria
deve especial tributo às concepções de Ronald Dworkin e
aos desenvolvimentos a ela dados por Robert Alexy. A
13
conjugação das ideias desses dois autores dominou a
teoria jurídica e passou a constituir o conhecimento
convencional da matéria. E, em seguida, conclui: regras:
relatos descritivos de condutas a partir dos quais,
mediante subsunção, havendo enquadramento do fato à
previsão abstrata, chega-se à conclusão. Diante do
conflito entre regras, apenas uma prevalece dentro da
ideia do tudo ou nada (all or nothing). A “...regra somente
deixará de incidir sobre a hipótese de fato que contempla
se for inválida, se houver outra mais específica ou se não
estiver em vigor” (ou seja, acrescente-se, critérios
hierárquico, da especialidade ou cronológico); princípios:
a previsão dos relatos se dá de maneira mais abstrata,
sem se determinar a conduta correta, já que cada caso
concreto deverá ser analisado para que o intérprete dê o
exato peso entre os eventuais princípios em choque
(colisão). Assim, a aplicação dos princípios “não será no
esquema tudo ou nada, mas graduada à vista das
circunstâncias representadas por outras normas ou por
situações de fato”. Destaca-se, assim, a técnica da
ponderação e do balanceamento, sendo, portanto, os
princípios valorativos ou finalístico.” (2014, p. 162).
Segundo Mazza, a importância dos princípios torna-se ainda mais
evidente ante a natureza não codificada do Direito Administrativo:
“O Direito Administrativo brasileiro não é codificado. Por
isso, as funções sistematizadora e unificadora de leis, em
outros ramos desempenhadas por códigos, no Direito
Administrativo cabem aos princípios. Princípios são
regras gerais que a doutrina identifica como
condensadoras dos valores fundamentais de um sistema.
14
(...) Assim, os princípios informam e enformam o sistema
normativo. Informam porque armazenam e comunicam o
núcleo valorativo essencial da ordem jurídica. Enformam
porque dão forma, definem a feição de determinado
ramo.” (2014, p.85).
Nesta linha, os princípios constitucionais explícitos do art. 37, caput, e
incisos, da Constituição, conferem unidade e sentido às normas que tratam da
Administração Pública. No particular, ganha destaque o princípio da licitação
(art. 37, XXI, da CRFB), fundamental para o entendimento das contratações
públicas, onde se insere a prerrogativa sancionadora do Estado e a declaração
de inidoneidade.
Para os fins deste trabalho, importante ainda não olvidar o princípio da
supremacia do interesse público, não expresso na Constituição, porém basilar
no entendimento do Estado e de suas prerrogativas em face do particular,
inclusive na seara dos contratos administrativos.
Por certo, o entendimento da declaração de inidoneidade perpassa
pelo conhecimento da supremacia do interesse público e sua vinculação ao
princípio da licitação (mais especificamente o contrato administrativo), pelo que
se tornará possível desenvolver o tema do poder sancionatório do Estado no
bojo do contrato administrativo.
No ponto, não se ignora a plêiade de outros princípios administrativos
expressos, implícitos e os decorrentes de estudos doutrinários. No entanto, o
escopo delimitado do presente trabalho estimula a abordagem tão-somente
das facetas adequadas ao conhecimento do tema.
1.3 – Princípio da Supremacia do Interesse Público
15
Deveras, o princípio da supremacia do interesse público deve ser
sempre verificado na interpretação e aplicação do Direito Administrativo, visto
que princípio de caráter fundamental no contexto do Direto Público.
Neste diapasão, a doutrina de Vicente Paulo e Marcelo Alexandrino
ressalta que:
“O princípio da supremacia do interesse público
fundamenta a existência de prerrogativas ou dos poderes
especiais da Administração Pública, dos quais decorre a
denominada verticalidade das relações Administração-
particular. (...) As prerrogativas que o ordenamento
confere ao Estado, então, que são típicas do direito
público, justificam-se tão-somente na estrita medida em
que são necessárias para que o Estado logre atingir os
fins que lhe são impostos por esse mesmo ordenamento.
(...) Exemplos de manifestações do princípio da
supremacia do interesse público temos no exercício do
poder de polícia, nas chamadas cláusulas exorbitantes
dos contratos administrativos, (...) nas hipóteses de
intervenção na propriedade privada (...). A noção central
desse princípio é: havendo conflito entre o interesse
público e os interesses de particulares, aquele deve
prevalecer (...)” (2008, p.10-11).
O princípio da supremacia do interesse público, como se nota, integra
a base do regime jurídico administrativo, representando a tônica da forma com
que a Administração se relaciona no mundo jurídico com os particulares. Sem
dúvida, a busca da satisfação do interesse público impõe a prevalência da
vontade geral sobre vontade do particular, evidentemente quando se atendo ao
atendimento da finalidade pública.
16
Ademais, pontue-se que as repercussões do princípio são de
fundamental importância para o entendimento das relações contratuais
públicas e da atividade sancionatória do Estado no âmbito da Lei 8.666/93,
como se abordará.
1.4 – Princípio da Licitação
O princípio da licitação está encartado no art. 37, XXI, da CRFB e
impõe a necessidade de um procedimento administrativo público para a
seleção da proposta mais vantajosa para a Administração, quando da
contratação de fornecimento de bens e serviços junto aos particulares.
Com efeito,
“ A licitação é um procedimento obrigatório que antecede
a celebração de contratos pela Administração Pública. A
razão de existir dessa exigência reside no fato de que o
Poder Público não pode escolher livremente um
fornecedor qualquer, como fazem as empresas privadas.
Os imperativos da isonomia, impessoalidade, moralidade
e indisponibilidade do interesse público, que informam a
atuação da Administração, obrigam à realização de um
processo público para seleção imparcial da melhor
proposta, garantindo iguais condições a todos que
queiram concorrer para a celebração do contrato.”
(MAZZA, 2014, p. 381)
Ainda quanto à licitação, dispõe a doutrina:
Licitação é um procedimento administrativo destinado à
seleção da melhor proposta dentre as apresentadas por
aqueles que desejam contratar com a Administração
17
Pública. Esse instrumento estriba-se na ideia de
competição a ser travada, isonomicamente, entre os que
preenchem os atributos e as aptidões, necessários ao
bom cumprimento das obrigações que se propõem
assumir. A licitação tem como finalidade viabilizar a
melhor contratação possível para o Poder Público, além
de permitir que qualquer um que preencha os requisitos
legais tenha a possibilidade de contratar, representando o
exercício do princípio da isonomia e da impessoalidade.
“(...) 3. A licitação é um procedimento que visa à
satisfação do interesse público, pautando-se pelo
princípio da isonomia. Está voltada a um duplo objetivo: o
de proporcionar à Administração a possibilidade de
realizar o negócio mais vantajoso - o melhor negócio - e o
de assegurar aos administrados a oportunidade de
concorrerem, em igualdade de condições, à contratação
pretendida pela Administração. Imposição do interesse
público, seu pressuposto é a competição. Procedimento
que visa à satisfação do interesse público, pautando-se
pelo princípio da isonomia, a função da licitação é a de
viabilizar, através da mais ampla disputa, envolvendo o
maior número possível de agentes econômicos
capacitados, a satisfação do interesse público. A
competição visada pela licitação, a instrumentar a seleção
da proposta mais vantajosa para a Administração, impõe-
se seja desenrolada de modo que reste assegurada a
igualdade (isonomia) de todos quantos pretendam acesso
às contratações da Administração. 4- A lei pode, sem
violação do princípio da igualdade, distinguir situações, a
fim de conferir a uma tratamento diverso do que atribui a
outra. Para que possa fazê-lo, contudo, sem que tal
violação se manifeste, é necessário que a discriminação
18
guarde compatibilidade com o conteúdo do princípio. 5. A
Constituição do Brasil exclui quaisquer exigências de
qualificação técnica e econômica que não sejam
indispensáveis à garantia do cumprimento das
obrigações. A discriminação, no julgamento da
concorrência, que exceda essa limitação é inadmissível.
Hoje esse procedimento conta com um novo objetivo que
foi introduzido pela Lei n212.349, de 15.12.2010,
conversão da Medida Provisória 11a 495/10, que, por sua
vez, acrescentou ao art. 32 da Lei n2 8.666/93, dentre as
finalidades buscadas através da licitação, a promoção do
desenvolvimento nacional.” (FERNANDA MARINELA,
2013, p.353-354).
Por fim, cabe destacar precedente do STF que pode conferir
concretude à abordagem do princípio licitatório:
“A licitação é um procedimento que visa à satisfação do
interesse público, pautando-se pelo princípio da isonomia.
Está voltada a um duplo objetivo: o de proporcionar à
administração a possibilidade de realizar o negócio mais
vantajoso – o melhor negócio – e o de assegurar aos
administrados a oportunidade de concorrerem, em
igualdade de condições, à contratação pretendida pela
administração. (...) Procedimento que visa à satisfação do
interesse público, pautando-se pelo princípio da isonomia,
a função da licitação é a de viabilizar, através da mais
ampla disputa, envolvendo o maior número possível de
agentes econômicos capacitados, a satisfação do
interesse público. A competição visada pela licitação, a
instrumentar a seleção da proposta mais vantajosa para a
administração, impõe-se seja desenrolada de modo que
19
reste assegurada a igualdade (isonomia) de todos
quantos pretendam acesso às contratações da
administração. A conversão automática de permissões
municipais em permissões intermunicipais afronta a
igualdade – art. 5º –, bem assim o preceito veiculado pelo
art. 175 da CB. (...) Afronta ao princípio da isonomia,
igualdade entre todos quantos pretendam acesso às
contratações da administração. A lei pode, sem violação
do princípio da igualdade, distinguir situações, a fim de
conferir a uma tratamento diverso do que atribui a outra.
Para que possa fazê-lo, contudo, sem que tal violação se
manifeste, é necessário que a discriminação guarde
compatibilidade com o conteúdo do princípio. A CB exclui
quaisquer exigências de qualificação técnica e econômica
que não sejam indispensáveis à garantia do cumprimento
das obrigações. A discriminação, no julgamento da
concorrência, que exceda essa limitação é inadmissível.”
(ADI 2.716, Rel. Min. Eros Grau, julgamento em 29-11-
2007, Plenário, DJE de 7-3-2008.) No mesmo sentido:
RE 607.126-AgR, Rel. Min. Cármen Lúcia, julgamento
em 2-12-2010, Primeira Turma, DJE de 1º-2-2011.
1.5 – SÍNTESE
A Administração Pública, entendida como o conjunto de órgãos e
entidades que exercem a gestão qualificada do interesse público (atividade
administrativa), sujeita-se a uma série de princípios que, em última análise,
radicam-se na Constituição da República. Dentre esses princípios, destaca-se
o princípio da supremacia do interesse público, que pende em favor da
vontade geral a consecução de objetivos porventura em choque com o
interesse particular.
20
Outro princípio de extrema relevância é o princípio licitatório, que
impõe o dever da Administração de selecionar, previamente a uma contratação
e em procedimento público formal, a proposta mais vantajosa apresentada em
caráter isonômico pelos fornecedores de bens e serviços interessados.
A licitação culmina na contratação de bens e serviços, sendo certo que
este pacto administrativo segue uma série de características que o extremam
do contrato privado, contexto este em que se sobressai a supremacia do
interesse público e o poder-dever de sancionar o particular, como se verá.
Neste aspecto, a declaração de inidoneidade ganha relevo, e, da mesma
forma, a discussão quanto à sua abrangência.
Isto posto, cabe a análise do contrato administrativo para, finalmente,
tratar-se da referida penalidade objeto deste trabalho.
21
CAPÍTULO II
CONTRATO ADMINISTRATIVO E A ATIVIDADE
SANCIONATÓRIA
Uma vez estabelecido o contexto inicial da Administração Pública
e sua relação com o princípio licitatório, mister que haja a devida abordagem
do contrato administrativo, onde ganha destaque a supremacia do interesse
público e, nesse aspecto, a atividade sancionatória do Estado. A partir daí,
será possível adentrar na análise das sanções administrativas, especialmente
a declaração de inidoneidade, objeto deste trabalho.
2.1 – Contrato Administrativo – Conceito e Características
Segundo Rafael Carvalho Rezende Oliveira, contratos administrativos
podem ser definidos como:
“(...) os ajustes celebrados entre a Administração Pública
e o particular, regidos predominantemente pelo direito
público, para execução de atividades de interesse
público. É natural, aqui, a presença das cláusulas
exorbitantes (art. 58 da Lei 8.666/1993) que conferem
superioridade à Administração em detrimento do
particular. Independentemente de previsão contratual, as
cláusulas exorbitantes serão observadas nos contratos
administrativos, pois sua aplicação decorre diretamente
da Lei. As características, básicas do contrato
22
administrativo são: (i) desequilíbrio contratual em favor da
Administração, tendo em vista a presença das cláusulas
exorbitantes (“verticalidade”); e (ii) regime
predominantemente de direito público, aplicando-se,
supletivamente, as normas de direito privado. Ex.:
contratos de concessão de serviço público, de obras
públicas, de concessão de uso de bem público, etc.”
(2013, p.205-206).
Por sua vez, Fernanda Marinela assim leciona acerca da definição do
contrato administrativo:
“Inicialmente, convém fazer um alerta para a divergência
doutrinária quanto à definição dos contratos
administrativos. Para a maioria dos doutrinadores, nem
todo contrato celebrado pelo Poder Público tem natureza
de contrato administrativo, preferindo-se como
terminologia geral “contratos da administração”. Essa
expressão, em sentido amplo, visa alcançar todos os
ajustes bilaterais firmados pela Administração,
correspondendo a um gênero. Entretanto, quando esses
contratos são regidos pelo direito privado, denominam-se
“contratos privados da Administração” e, quando regidos
pelo direito público, recebem o nome de “contratos
administrativos”. Pode-se conceituar “contrato
administrativo” como a convenção estabelecida entre
duas ou mais pessoas para constituir, regular ou extinguir,
entre elas, uma relação jurídica patrimonial, tendo sempre
a participação do Poder Público, visando à persecução de
um interesse coletivo, sendo regido pelo direito público. É
o ajuste que a Administração Pública firma com o
particular ou outro ente público, para a consecução de
23
interesse coletivo. O instrumento é regulado pelas suas
cláusulas e pelos preceitos de direito público, aplicando-
se a eles, supletivamente, os princípios da teoria geral
dos contratos e as disposições de direito privado. Sendo
assim, a Administração celebra contratos regidos pelo
direito privado, como uma compra e venda, a locação de
um imóvel para a instalação de uma repartição pública,
bem como contratos regidos pelo Direito Administrativo,
tais como: a concessão de serviços públicos, o contrato
de gestão e outros.” (2014, p.49-50)
Portanto, possível verificar que o contrato administrativo configura o
acordo de vontades entre a Administração e o particular, visando ao
atendimento do interesse público. Neste caso, submete-se ao regime público,
de onde se extrai as prerrogativas da Administração e o desequilíbrio da
relação jurídica em favor da mesma. A supremacia do interesse público, por
esse ângulo, ganha importante relevo, o que culminará no estudo das sanções
administrativas, dentre elas a declaração de inidoneidade.
Sem dúvida, dentre as características do contrato administrativo,
arroladas pela doutrina ante o arcabouço legal aplicável (Lei 8.666/93) e o
regime público, estão os elementos denominados desequilíbrio e a
instabilidade. Quanto ao desequilíbrio, Rafael Carvalho Rezende Oliveira prevê
que:
“É tradicional a afirmação de que, ao contrário do que
ocorre nos contratos privados, as partes contratantes nos
contratos administrativos estão em posição de
desigualdade, tendo em vista a presença das cláusulas
exorbitantes que consagram prerrogativas à
Administração e sujeições ao contratado. O art. 58 da Lei
8.666/1993 prevê as cláusulas exorbitantes (alteração
24
unilateral, rescisão unilateral, fiscalização, aplicação de
sanções e ocupação provisória).” (2013, p.213)
Já quanto à instabilidade, o mesmo autor assim se manifesta:
“A Administração possui a prerrogativa de alterar
unilateralmente as cláusulas regulamentares ou, até
mesmo, rescindir os contratos administrativos, tendo em
vista a necessidade de atender o interesse público, em
razão da alteração da realidade social, política e
econômica, acarreta a maleabilidade (instabilidade) nos
contratos administrativos. Enquanto nos contratos
privados sempre vigorou a ideia, hoje muito mitigada
pelas teorias revisionistas, do pacta sunt servanda, nos
contratos administrativos a instabilidade é uma nota
essencial” (2013, p.213)
Na mesma esteira, a doutrina de Alexandre Mazza, que pontua as
características da desigualdade entre as partes, mutabilidade e a existência de
cláusulas exorbitantes:
“(...) c) desigualdade entre as partes: no contrato
administrativo, as partes envolvidas não estão em
posição de igualdade. Isso porque o interesse público
defendido pela Administração é juridicamente mais
relevante do que o interesse provado do contratado. Por
isso, ao contrário da horizontalidade vigente nos contratos
privados, os contratos administrativos caracterizam-se
pela verticalidade, pois a Administração Pública ocupa
uma posição de superioridade diante do particular,
revelada pela presença de cláusulas exorbitantes que
conferem poderes especiais à Administração contratante;
25
d) mutabilidade: diferentemente do que ocorre no direito
privado, em que vigora o princípio segundo o qual os
contratos devem ser cumpridos tal como escritos (pacta
sunt servanda), no Direito Administrativo a legislação
autoriza que a Administração Pública promova a
modificação unilateral das cláusulas do contrato,
instabilizando a relação contratual diante de causas
supervenientes de interesse público. Porém, os
dispositivos contratuais que tratam da remuneração do
particular nunca podem sofrer alteração unilateral, à
medida que eventuais modificações em tais cláusulas
pressupõem a anuência do contratado; e) existência de
cláusulas exorbitantes: as cláusulas exorbitantes são
disposições contratuais que definem poderes especiais
pra a Administração dentro do contrato, projetando-a para
uma posição de superioridade m relação ao contratado. s
A atividade administrativa é a gestão de bens e interesses
qualificados da comunidade, de âmbito federal, estadual
e municipal, segundo os preceitos do Direito e da Moral,
visando ao bem comum. Representa toda atividade
desenvolvida pela Administração, protegendo os
interesses da coletividade e decorre do fato de o Brasil
ser uma República, em que toda atividade desenvolvida
deve privilegiar a coisa pública. A natureza da
Administração Pública, enquanto atividade administrativa,
é de munus publico, de encargo para quem a exerce,
caracterizando-se como um dever de defesa,
conservação e aprimoramento dos bens, serviços e
interesses da coletividade, não se admitindo a liberdade
para a perseguição de outros interesses.” (2013, p.19)
26
À luz das lições acima expostas, impende observar que a posição de
superioridade da Administração, escorada na supremacia do interesse público,
serve à necessidade de satisfação da vontade geral, que prevalece sobre a
vontade do particular. Deveras, a instabilidade e o desequilíbrio, características
da contratação pelo regime público, dão a tônica da relação do Estado com o
contrato, na esteira do que surge as cláusulas exorbitantes, que abrangem a
atividade sancionatória e a declaração de inidoneidade.
2.2 – Cláusulas Exorbitantes
A supremacia do interesse público, na seara contratual, fundamenta a
existência de instrumentos aptos a conferir flexibilidade à Administração, para
fins de adequação dos rumos do contrato à satisfação da finalidade que
justificou a relação jurídica. As chamadas cláusulas exorbitantes se inserem
exatamente nesse contexto.
A doutrina assim aborda as cláusulas exorbitantes:
“Uma das características fundamentais dos contratos
administrativos é a presença das chamadas cláusulas
exorbitantes. São regras que conferem poderes
contratuais especiais, projetando a Administração Pública
para uma posição de superioridade diante do particular
contratado. São prerrogativas decorrentes da supremacia
do interesse público sobre o privado e, por isso, são
aplicáveis ainda que não escritas no instrumento
contratual. Importante esclarecer que o qualificativo
“exorbitantes” não tem qualquer sentido pejorativo, ou que
denote abusividade. Ao contrário, as cláusulas recebem
tal denominação porque são dispositivos incomuns,
atípicos, anormais para a lógica igualitária dos contratos
de Direito Privado. Por isso, se previstas nos contratos
27
privados celebrados pela Administração, serão nulas. (...)
As cláusulas exorbitantes mais importantes previstas na
Lei n. 8666/93 são as seguintes: (...) 6) fiscalização; 7)
aplicação de penalidades (...)” (ALEXANDRE MAZZA,
2014, p. 494-495).
Quanto ao tema, temos ainda a doutrina de Celso Antônio Bandeira de
Melo, que pontua os fundamentos subjacentes às cláusulas exorbitantes:
“Em decorrência dos poderes que lhe assistem, a
Administração fica autorizada – respeitado o objeto do
contrato – a determinar modificações nas prestações
devidas pelo contratante em função das necessidades
públicas, a acompanhar e fiscalizar continuamente a
execução dele, a impor as sanções estipuladas quando
faltas do obrigado as ensejarem e a rescindir o contrato
sponte própria se o interesse público o demandar” (2009,
p. 616)
Nas palavras de Maria Sylvia Zanela Di Pietro:
“São cláusulas exorbitantes aquelas que não seriam
comuns ou que seriam ilícitas em contrato celebrado
entre particulares, por conferirem prerrogativas a uma das
partes (a Administração) em relação à outra; elas
colocam a Administração em posição de supremacia
sobre o contratado.” (2014, p. 280)
Neste diapasão, o que se pode verificar é que os poderes da
Administração no bojo do contrato administrativo representam consectário
lógico e legal da posição de supremacia que lhe é conferida pela envergadura
da finalidade pública envolvida. Nesse âmbito, mister que a atividade
28
sancionatória seja abordada, na medida em que a fiscalização da execução
contratual e as decorrentes sanções administrativas estão inseridas nesse
contexto.
Com certeza, o tema ora trabalhado está contextualizado no bojo das
cláusulas exorbitantes, visto que a imposição de sanções administrativas ao
contratado, dentre elas a declaração de inidoneidade, se radicam na
supremacia estatal frente ao interesse particular. Deste modo, imperioso, neste
momento, o estudo da atividade sancionatória estatal.
2.3 – Direito Administrativo Sancionador
Anteriormente já se assentou que a declaração de inidoneidade é uma
espécie de sanção administrativa, a qual ora se verifica ser cláusula
exorbitante escorada na supremacia do interesse público. Tratando-se de
sanção, oportuno que seja brevemente tratada a questão do poder punitivo
estatal.
Realmente, Flávio Amaral Garcia e Diogo de Figueiredo Moreira Neto,
em artigo intitulado A Principiologia no Direito Administrativo Sancionador,
lecionam que a atividade sancionatória do Estado deve obedecer uma série de
princípios, aproximando-se esta atividade da seara Penal.
No caso, assim se manifestam:
“O Direito Punitivo estatal, tanto no Direito Penal como no
Direito Administrativo, se funda sobre um conjunto de
princípios e regras garantidoras de direitos dos
administrados e dos cidadãos que, apesar das diferentes
formas de aplicação, a depender de se tratar de infração
penal ou administrativa, informa o ius puniendi estatal.
Sem a observância de tais normas a atividade punitiva
29
estatal se torna ilegítima e arbitrária. Isso se deve, como
é sabido, ao hausto renovador trazido pela cópia de
relevantes mudanças pós-modernas no pensamento
filosófico, político e jurídico desenvolvidas nas últimas
décadas do século XX, que, em boa hora, recuperaram
para o Direito certos valores substantivos das condutas
humanas por muito tempo relegados, quando não
absorvidos na legalidade estrita, recolocando os
princípios jurídicos em novo patamar na hermenêutica
contemporânea. Com efeito, é no conceito de Estado
Democrático de Direito e no de legitimidade da ação
estatal que o Direito Administrativo Sancionador encontra
o seu núcleo fundamental, com a necessária e
indispensável preocupação de contenção do poder
aplicado pelo Estado.” (2011-2012, p.1).
Realmente, a atividade sancionatória estatal não é livre, devendo
seguir os ditames constitucionais pertinentes às garantias dos administrados
contra o abuso de poder do Estado, contenção esta conquistada
historicamente pela sociedade. Novamente a doutrina de Flávio Amaral Garcia
e Diogo de Figueiredo Moreira Neto assim destaca:
“O Estado Democrático de Direito se assenta como
princípio fundamental da Constituição Federal de 1988 e
exprime a inextricável submissão que se quer do Estado:
à vontade do povo e à vontade da ordem jurídica. Como
se sabe, com o advento do Estado de Direito, as normas
de Direito Público explicitaram sua dupla função: a de
limitar e controlar o poder do Estado, de modo a coibir os
excessos e desvios praticados no exercício do poder
político em desfavor dos administrados. Completava-se,
no plano teórico, a tarefa histórica da superação do
30
arbítrio do poder pelo poder do direito, com a substituição
da vontade do soberano pela vontade da lei, do que
resultou a sujeição do próprio Estado aos limites e
controles impostos pela legítima expressão jurídica da
vontade do povo. Como resultado da feliz confluência de
sucessivas etapas históricas do aperfeiçoamento
convergente da noção original de Estado de Direito,
avançou-se contemporaneamente para o conceito de
Estado Democrático de Direito, que, ao agregar o
esquecido elemento da legitimidade, subordinou a ação
estatal ao atendimento do interesse público, bem como a
inexorável observância de valores, que passaram a ser
expressos como direitos fundamentais dos cidadãos.
Ora, essas premissas – de contenção de arbítrio do poder
– que revelam a essência combinada do moderno Estado
de Direito e do pós moderno Estado Democrático de
Direito, são especialmente importantes quando se deva
examinar a essência e os limites do poder punitivo
estatal, seja decorrente da aplicação de sanções pela
própria Administração (sanções administrativas), seja
decorrente da aplicação direta pelo Poder Judiciário
(sanções penais).” (2011-2012, p.2).
Concluem esses doutrinadores por aproximar a atividade sancionatória
administrativa da atividade sancionatória penal, sob a ótica de uma atividade
sancionatória única do Estado, que deve ser permeada por princípios
garantistas comuns:
“(...) tem-se difundido o esclarecido entendimento de que
as sanções administrativas, tradicionalmente entendidas
como circunscritas ao campo de atividade administrativa
de polícia, são, em verdade, uma manifestação específica
31
de um ius puniendi genérico do Estado, destinado à tutela
de quaisquer valores relevantes da sociedade,
transcendendo o âmbito da função de polícia para se
estender às demais funções administrativas, incluindo as
regulatórias, próprias do ordenamento econômico e do
ordenamento social. Deste modo, tornou-se necessário
dispensar um tratamento integrado à matéria, inclusive
reconhecendo a aplicabilidade limitada de certos
princípios da penologia criminal, no exercício de todas
demais funções punitivas do Estado, tal como
pioneiramente foi proposto pelo jurista espanhol
ALEJANDRO NIETO GARCÍA, em sua obra Derecho
Administrativo Sancionador, originalmente publicada em
1993. 2 Posto em outros termos, não se propugna uma
identidade absoluta entre o Direito Penal e o Direito
Administrativo Sancionador, mas se reconhece a
existência de um núcleo principiológico orientador do
poder estatal que toca ao exercício do seu poder punitivo.
3 E foi diante desse cenário e da imperiosa necessidade
de proteção dos direitos dos cidadãos, que a Constituição
Federal de 1988 assegurou às pessoas um conjunto de
princípios garantísticos de contenção do poder punitivo
estatal, independentemente de a sanção ser aplicada
pelo Estado Administração ou pelo Estado Juiz. ” (2011-
2012, p.3).
Destarte, ganham relevo os seguintes princípios minudenciados pelos
autores já citados, que passam a ser vistos como sistematizadores da
atividade sancionatória estatal, com repercussão direta nas cláusulas
exorbitantes do contrato administrativo. Em síntese:
Princípio do Contraditório
32
“Por intuitivo, o Direito Administrativo Sancionador se
sustenta na cláusula geral do due process of law,
expressa no art. 5º, LIV, da Constituição de 1988, e
define a garantia de que “ninguém será privado da
liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal”.
O Poder Punitivo do Estado deve, portanto, encontrar
limites materiais e formais à sua extensão teórica e
aplicação prática, uma vez que sua concretização enseja
a imposição de sanções em razão de condutas tidas
como ilícitas (ou ilegais) e o objetivo aflitivo desse mal
consistirá, sempre, na privação de um bem ou de um
direito ou na imposição de pagamento de multa. A assim
denominada cláusula do due process of law ostenta duas
vertentes conceituais: a do devido processo legal adjetivo
e a do devido processo legal substantivo. O devido
processo legal adjetivo é a garantia formal de observância
de um procedimento legal, que assegura às partes, em
processos administrativos ou judiciais, o direito à ampla
defesa e ao contraditório, dentre outras garantias. O
devido processo legal substantivo, por sua vez, está
relacionado a um processo justo e razoável logo no
momento da criação normativo legislativa.” (2011-2012,
p.4-5).
Princípio da Segurança Jurídica
“A segurança jurídica, mais que um princípio, é por
muitos justamente considerada um axioma do Direito.
Sua tônica centra-se no encarecimento de um inarredável
imperativo de justiça em todas as relações assimétricas
de poder, estatais, pluriestatais, extraestatais ou
33
transestatais. Entendida como princípio de Direito,
apresenta duas vertentes: a objetiva, que tem a função de
garantir a estabilidade das relações jurídicas,
notadamente pela proteção do direito adquirido, do ato
jurídico perfeito e da coisa julgada; e a subjetiva, que se
relaciona com a confiança na atuação do Estado, nos
mais diferentes aspectos de sua atuação. (...)Em outros
termos: é direito fundamental dos administrados que as
normas que fixem infrações e respectivas sanções
administrativas permitam uma aferição objetiva de
previsibilidade de modo que possa orientar as suas
condutas e comportamentos. Fora desta compreensão,
portanto, estarão quaisquer normas que apenem ações e
omissões de terceiros que não apresentem um grau
mínimo de previsibilidade.” (2011-2012, p.11-12).
Princípio da Legalidade
“Este princípio, como pressuposto estruturante do Estado
de Direito, garante, no âmbito privado, que “ninguém será
obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão
em virtude de lei” (art. 5º, II, CF/88) e, no ambiente
público, a submissão do agir do Estado à lei, como
produto formal dos órgãos legiferantes do Estado. Ainda
em sede constitucional, o princípio da legalidade também
decorre da aplicação (pela extensão desejada pelo § 2º
do art. 5º) à esfera administrativa do princípio segundo o
qual “não há crime sem lei anterior que o defina, nem
pena sem prévia cominação legal” (art. 5º, XXXIX, CF/88).
Diretamente ligado ao princípio da legalidade está o
conexo princípio da legitimidade, entendido como a
vontade, expressa pelas vias democráticas, do interesse
34
da sociedade, situando-se, portanto, em um campo mais
vasto do que o da legalidade estrita. Legalidade e
legitimidade são, ambos, princípios que se integram para
a garantia dos cidadãos administrados e para a sua
proteção contra o arbítrio estatal. No campo do Direito
Administrativo Sancionador, não se pode compreender a
atividade punitiva do Estado sem que prevista em lei em
sentido formal, posto que a imposição de penalidades
administrativas aparticulares significa atingi-los em suas
atividades, seus bens e seu patrimônio, restringindo,
portanto, direitos individuais.” (2011-2012, p.14).
Princípio da Tipicidade
“É a tipicidade, um corolário da legalidade, que impõe
esse detalhamento específico das condutas e
comportamentos dos administrados e das penas
aplicáveis, que, afinal, é o que lhes permitirá ter maior
previsibilidade acerca de suas ações e condutas. Assim,
o objetivo maior da tipicidade é permitir que os
administrados possam orientar as suas condutas com
previsibilidade, o que somente se torna viável com uma
detalhada especificação dos núcleos de comportamento
considerados ilícitos e a sua correlação com as
respectivas infrações administrativas. (...) Essa tipicidade
administrativa admite, contudo, certa flexibilização se
comparada com a tipicidade penal, já que nesta, por ter
como possível consequência uma restrição da liberdade
de ir e vir, exige um maior grau de determinação do que
naquela.” (2011-2012, p.14).
35
Assim, resta evidente a necessidade de se zelar pelo atendimento das
garantias constitucionais do cidadão, as quais formam uma principiologia
única, genérica, da atividade sancionadora estatal. A partir daí, a aplicação de
sanções administrativas no âmbito do contrato administrativo se tornará
legítima, estando a sanção de declaração de inidoneidade igualmente
abrangida pelos princípios referidos.
2.4 – Sanções Administrativas
As sanções administrativas estão previstas no art. 87 da Lei 8.666/93,
sendo suas espécies: advertência (infrações leves), multa (infrações médias),
suspensão temporária do direito de licitar e contratar (infrações graves) e
declaração de inidoneidade (infração gravíssima).
No caso, a declaração de inidoneidade é sanção aplicada a faltas
gravíssimas, sendo certo que seu limite de abrangência é o objeto deste
trabalho, o que se passará a abordar doravante.
36
CAPÍTULO III
DECLARAÇÃO DE INIDONEIDADE
Como se verificou, o art. 87 da Lei 8.666/93 prevê as sanções
administrativas a que se sujeitam os particulares pela inexecução do contrato
administrativo. Nas lições de Rafael Carvalho Rezende Oliveira:
“As sanções administrativas encontram-se enumeradas
no art. 87 da Lei 8.666/97, a saber: (i) advertência
(infrações leves); (ii) multa, na forma prevista no
instrumento convocatório ou no contrato (infrações
médias); (iii) suspensão temporária de participação em
licitação e impedimento de contratar com a Administração
por até dois anos (infrações graves); (iv) declaração de
perdurarem os motivos determinantes da punição ou até
que seja promovida a reabilitação perante a própria
autoridade que aplicou a penalidade, que será concedida
sempre que o contratado ressarcir a Administração pelos
prejuízos resultantes e após decorrido o prazo da sanção
aplicada com base no inciso anterior (infração
gravíssima). Na aplicação das referidas sanções, a
Administração deve exercer o juízo de proporcionalidade,
aplicando a sanção adequada à gravidade da infração.”
(2013, p. 213)
37
Neste aspecto, mister que se aborde a declaração de inidoneidade, a
mais grave das sanções administrativas, aplicada nas hipóteses de infrações
gravíssimas, respeitada a proporcionalidade que legitima o exercício da
discricionariedade administrativa.
3.1 – Previsão Legal da Declaração de Inidoneidade
A declaração de inidoneidade encontra-se inserta no art. 87, III, da Lei
8.666/93, cujos termos são a seguir reproduzidos:
“Art. 87. Pela inexecução total ou parcial do contrato a
Administração poderá, garantida a prévia defesa, aplicar
ao contratado as seguintes sanções:
I - advertência;
II - multa, na forma prevista no instrumento convocatório
ou no contrato;
III - suspensão temporária de participação em licitação e
impedimento de contratar com a Administração, por prazo
não superior a 2 (dois) anos;
IV - declaração de inidoneidade para licitar ou contratar
com a Administração Pública enquanto perdurarem os
motivos determinantes da punição ou até que seja
promovida a reabilitação perante a própria autoridade que
aplicou a penalidade, que será concedida sempre que o
contratado ressarcir a Administração pelos prejuízos
resultantes e após decorrido o prazo da sanção aplicada
com base no inciso anterior.
§ 1o Se a multa aplicada for superior ao valor da garantia
prestada, além da perda desta, responderá o contratado
pela sua diferença, que será descontada dos pagamentos
38
eventualmente devidos pela Administração ou cobrada
judicialmente.
§ 2o As sanções previstas nos incisos I, III e IV deste
artigo poderão ser aplicadas juntamente com a do inciso
II, facultada a defesa prévia do interessado, no respectivo
processo, no prazo de 5 (cinco) dias úteis.
§ 3o A sanção estabelecida no inciso IV deste artigo é de
competência exclusiva do Ministro de Estado, do
Secretário Estadual ou Municipal, conforme o caso,
facultada a defesa do interessado no respectivo processo,
no prazo de 10 (dez) dias da abertura de vista, podendo a
reabilitação ser requerida após 2 (dois) anos de sua
aplicação.
Art. 88. As sanções previstas nos incisos III e IV do artigo
anterior poderão também ser aplicadas às empresas ou
aos profissionais que, em razão dos contratos regidos por
esta Lei:
I - tenham sofrido condenação definitiva por praticarem,
por meios dolosos, fraude fiscal no recolhimento de
quaisquer tributos;
II - tenham praticado atos ilícitos visando a frustrar os
objetivos da licitação;
III - demonstrem não possuir idoneidade para contratar
com a Administração em virtude de atos ilícitos
praticados.”
Pela mera interpretação gramatical é possível verificar que a
declaração de inidoneidade afeta as relações jurídicas do sancionado com a
39
Administração Pública. Segundo José dos Santos Carvalho Filho, pode-se
verificar como hipóteses de aplicação da declaração de inidoneidade:
“A suspensão temporária e a declaração de inidoneidade
podem ser aplicadas também a empresas ou profissionais
que: 1) tenham praticado atos ilícitos, intentando
comprometer os objetivos da licitação; 2) demonstrarem
não ter idoneidade para contratar com a Administração,
em razão de outros atos ilícito (ilícitos graves,
entendemos nós, além de relacionados, de alguma forma,
com os postulados das licitações e contratos); e 3) que
tenham sofrido condenação definitiva em virtude de
fraude fiscal dolosa no recolhimento de quaisquer
tributos.” (2005, p. 182)
No particular, oportuno trazer à baila o princípio constitucional da
moralidade administrativa, insculpido no art. 37, caput, da CRFB, por se tratar
de norte interpretativo basilar da Administração Pública, o que diz diretamente
com a tutela de valores caros à mesma, os quais são protegidos por diversas
normas cogentes, tais como a Lei de Improbidade (lei 8429/92) e, no particular,
a sanção de inidoneidade.
A questão a ser debatida, porém, se situa na própria previsão legal.
Deveras, o art. 87, §3º, da Lei 8.666/93 estabelece que o Ministro de Estado
ou os Secretários de Estado são as autoridades competentes para a aplicação
da declaração de inidoneidade. A par disso, o caput do art. 87 do mesmo
Diploma comina a inidoneidade para licitar ou contratar com a Administração
Pública. A partir desse panorama, surge controvérsia acerca da abrangência
da aludida sanção, uma vez que é preciso saber que Administração Pública
será afetada.
3.2 – Controvérsia sobre a Abrangência da Sanção
40
Quanto ao ponto, Rafael Carvalho Rezende Oliveira identifica três
correntes acerca da abrangência da declaração de inidoneidade, as quais
sumarizam de forma lapidar o âmbito da controvérsia:
“Primeira posição: as sanções possuem efeitos restritivos,
limitando-se ao Ente estatal em que foram aplicadas,
tendo em vista a autonomia federativa e o princípio da
competitividade aplicável às licitações (os sancionados
seriam afastados dos certames). Ex.: as sanções
aplicadas pelo Município não poderiam ser utilizadas pelo
Estado para inabilitar determinado licitante. Nesse
sentido: Marcos Juruena Villela Souto.” (2013, p. 243)
Nesta primeira linha de entendimento, a doutrina prestigia a autonomia
federativa e a competitividade. Nos ensinamentos da doutrina
constitucionalista
“a partir do momento que os Estados ingressam na
Federação perdem soberania, passando a ser
autônomos. Os entes federativos são, portanto,
autônomos entre si, de acordo com as regras
constitucionalmente previstas, nos limites de sua
competência; a soberania, por seu turno, é característica
do todo, do “país”, do Estado federal, no caso do Brasil,
tanto é que aparece como fundamento da República
Federativa do Brasil (art. 1º, I, da CF/88). (...)” (2014,
LENZA, p. 473)
A autonomia federativa, portanto, para essa corrente, configura limite à
sanção de inidoneidade, eis que não seria possível impor decisões tomadas
por um ente da Federação no âmbito de sua competência à outro Ente da
41
Federação, por si mesmo autônomo. Do contrário, restaria vulnerada a
competência do ente que não proferiu a decisão, tornando lera morta sua
autonomia ante a turbação de suas atividades por um processo decisório
ultimado alhures. Em última análise, tal situação representaria um desrespeito
à própria Federação que por sua vez é uma cláusula pétrea (art. 60, §4º, I, da
CRFB).
Quanto o princípio da competitividade, fundamental na licitação, pode
ser entendido a partir das lições de José dos Santos Carvalho Filho:
“Significa que a Administração não pode adotar medidas
ou criar regras que comprometam, restrinjam ou frustrem
o caráter competitivo da licitação. Em outras palavras,
deve o procedimento possibilitar a disputa e o confronto
entre os licitantes, para que a seleção se faça da melhor
forma possível. Fácil verificar que, sem a competição,
estaria comprometido o princípio da igualdade, já que
alguns se beneficiariam à custa do prejuízo de outros.
Encontramos o princípio no art. 3º, §1º, I, do Estatuto.”
(2005, p. 204)
De fato, a imposição de sanção impeditiva da participação em processo
licitatório por um ente, com repercussão perante a administração de ente
diverso, geraria, no âmbito daquele certame, desequilíbrio na competição,
porquanto afetaria a busca pela proposta mais vantajosa por pessoa jurídica
sem qualquer relação com a primeira sanção.
Prosseguindo na análise da controvérsia, uma segunda corrente acerca
da abrangência da sanção assim se destaca:
“Segunda posição: enquanto a suspensão de participação
em licitação e impedimento de contratar com a
42
Administração incide apenas em relação ao Ente que
aplicou sanção (efeitos restritivos), a declaração de
inidoneidade produz efeitos em todo o território nacional
(efeitos extensivos). Essa distinção advém dos conceitos
de “Administração Pública” e “Administração”,
consagrados, respectivamente, nos incisos XI e XII do art.
6º, da Lei 8.666/1993. De acordo com a Lei, a
“Administração Pública” abrange a administração direta e
indireta da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos
Municípios (XI) e “Administração” é o “órgão, entidade ou
unidade administrativa pela qual a Administração Pública
opera e atua concretamente” (XI). Enquanto a noção de
“Administração Pública” abrange todos os Entes
federados, o conceito de “Administração” é restrito a
determinado Ente. Portanto, ao utilizar a expressão
“Administração Pública” para declaração de inidoneidade
e “Administração” para suspensão para contratar com o
Poder Público, o art. 87 da Lei de Licitações acabou por
estabelecer a diferença de amplitude dos efeitos dessas
sanções. Ex.: a sanção de suspensão para contratar,
aplicada pelo Município, não poderia ser invocada pelo
Estado; por outro lado, a sanção de declaração de
inidoneidade poderia ser utilizada por todo e qualquer
Ente federado. Nesse sentido: Jessé Torres Pereira
Júnior.” (OLIVEIRA, 2013, p. 244)
Por esse ângulo, a declaração de inidoneidade ganha contornos amplo,
possuindo efeitos extensivos por todo o território nacional, abstraindo-se a
questão da competitividade e da autonomia federativa. No caso, a
fundamentação baseia-se na interpretação da Lei de Licitações e no alcance
das expressões “Administração” e “Administração Pública” constantes daquele
Diploma.
43
Destarte, a interpretação literal da Lei 8.666/93 e da expressão
“Administração Pública” levou essa corrente a entender a declaração de
inidoneidade como incidente sobre todos os órgãos e Entes federados,
fundamentando-se, de forma objetiva, na mera consideração do sistema
infraconstitucional específico.
Por fim, uma terceira posição se destaca, tendo sido sintetizada pela
mesma doutrina:
“as sanções possuem efeitos extensivos e podem ser
invocados por todos os Entes federados, pois, se uma
empresa foi punida em razão do cometimento de faltas
graves, a as contratação pelos demais Entes colocaria
em risco o interesse público. Ex.: as sanções aplicadas
pelo Município poderiam ser utilizadas pelos demais
Entes. Nesse sentido: José dos Santos Carvalho Filho.”
(OLIVEIRA, 2013, p. 244).
Neste posicionamento, a declaração de inidoneidade também possui
caráter extensivo, mas não está escorado em interpretação gramatical de
norma infraconstitucional, mas sim na tutela do interesse público. Em verdade,
para este entendimento, não se poderia admitir que a inidoneidade de um
contratado estivesse circunscrita a um Ente federado. Ou o particular é
inidôneo (qualidade subjetiva negativa) ou não o é, podendo contratar.
Segundo Rafael Carvalho Rezende Oliveira, a terceira posição deve ser
prestigiada, sendo ainda a posição do Superior Tribunal de Justiça:
“Preferimos o terceiro entendimento acolhido no STJ. A
investigação sobre a eventual existência das referidas
sanções pode ser feita por meio de consulta ao Cadastro
44
Nacional de Empresas Inidôneas e Suspensas (CEIS).”
(OLIVEIRA, 2013, p. 244-245).
Na sequência, o autor referenciado veicula críticas aos
posicionamentos anteriores, assim se expressando:
“Em primeiro lugar, é importante destacar a completa
imprecisão da distinção entre os vocábulos “Administração
Pública” e “Administração”, uma vez que a doutrina
considera as expressões como sinônimas, e apropria Lei
8.666/93 não se utiliza dessas expressões de forma clara
(ex: o art. 87, IV, da Lei, ao tratar da declaração de
inidoneidade, adota, em verdade, as duas expressões). Em
segundo lugar, não há violação ao princípio federativo na
utilização dessas sanções por outros Entes com o objetivo
de impedir a contratação de empresa que apresenta risco
ao interesse público, não sendo razoável considerar que
uma empresa penalizada coloque em risco apenas o Ente
sancionador, e não os demais.” (OLIVEIRA, 2013, p. 245)
Neste ponto, a doutrina ora destacada salienta que o conhecimento da
abrangência da declaração de inidoneidade tão-somente com base na
interpretação gramatical dos termos “Administração” e “Administração Pública”
é equívoco. Isto porque a Lei de Licitações não conserva unidade de
tratamento a essas expressões. O próprio dispositivo que versa sobre a
declaração de inidoneidade traz as duas expressões, o que fragiliza a distinção
estabelecida no art. 6º, XI e XII, da Lei 8666/93.
Adiante, arremata o autor:
Por fim os princípios da moralidade e da eficiência,
insculpidos no art. 37 da CRFB, devem pautar todas as
45
Administrações Públicas, não importa o nível federativo,
sendo certo que a contratação de risco vulneraria os
citados princípios. Não se pode olvidar, contudo, que a
falta de um cadastro nacional unificador dessas
informações (listagem das empresas sancionadas) coloca
em risco a efetivação esperada desse entendimento, mas
isso não tem o condão de afastar a sua correção.”
(OLIVEIRA, 2013, p. 245).
Sem dúvida, para essa visão, não se mostra possível aplicar
parcialmente o princípio constitucional da moralidade administrativa. Isto
porque a defesa da moralidade não pode sofrer variações conforme o Ente
Público envolvido, estando todos jungidos à proteção daquele bem jurídico.
A moralidade administrativa, a seu turno, pode ser entendida, nos
dizeres de Diogo de Figueiredo Moreira Neto:
“A moralidade administrativa, entendida como espécie
diferenciada da moral comum, atua, também, como uma
peculiar derivação dos conceitos de legitimidade política e
de finalidade pública (...) Com efeito, é a partir da
finalidade, sempre contida na lei, que se estabelece em
abstrato, e da legitimidade, que deve sempre resultar de
sua aplicação, que se a define em concreto. A autonomia
deste princípio, que, como se alertou, não deve ser
confundido com a moralidade tout court, nem, tampouco,
com o conceito de moralidade média, decorre de seu
sentido rigorosamente técnico, como reflexo do conceito
de boa e de má administração. Com efeito, a moral
comum é orientada por uma distinção puramente ética,
entre o bem e o mal, enquanto a moral administrativa é
orientada por uma diferença prática entre boa e má
46
administração. Para o administrador praticar uma
imoralidade administrativa, basta que use de seus
poderes com vistas a resultados divorciados do estrito
interesse público a que deveria atender. Por isso, além da
hipótese de desvio de finalidade, pode ocorrer
imoralidade administrativa nas hipóteses de ausência de
finalidade e de ineficiência grosseira da ação de
administrador público, tendo em vista, também, a
finalidade, a que se propunha atender. Portanto, para que
o administrador público vulnere esse princípio, basta que
administre mal os interesses públicos, o que poderá
ocorrer de três modos: 1º - através de atos com desvio de
finalidade pública, para perseguir interesses que não são
aqueles para os quais deve agir; 2º - através de atos sem
finalidade pública; 3º - através de atos com deficiente
finalidade pública, reveladores de uma ineficiência
grosseira no trato dos interesses que lhe foram afetos.”
(2013, FORENSE, p. 93-94).
Como se nota, admitir a continuidade de contratações e de
participação em procedimentos licitatórios por declarados inidôneos implicaria
em má gestão, ante a ineficiência manifesta em se resguardar a coisa pública
de atos e comportamentos prejudiciais à Administração. Assim, não é
justificável a restrição da sanção, uma vez que a moralidade administrativa é
princípio orientador da Administração em qualquer se de seus níveis
federativos, não sendo o caso de olvido da sanção imposta por ato gravíssimo,
seja lá onde se tenha dado.
Pontuada essa divergência doutrinária, em que três correntes ganham
contornos bem definidos, mister que a jurisprudência seja invocada para
suporte ao deslinde da controvérsia.
47
3.3 – Jurisprudência do TCU
O Tribunal de Contas da União tem posicionamento no sentido de que
a declaração de inidoneidade se aplica a toda Administração Pública, isto é,
que os efeitos dessa sanção não ficam restritas ao ente prolator. Deveras, em
relatório de auditoria, acórdão do TCU assim se manifesta, em aproximação
com a segunda corrente doutrinária:
“GRUPO I - CLASSE V - Plenário
TC-012.538/2009-1 (com 5 anexos)
Natureza: Relatório de Levantamento de Auditoria
(Fiscalis nº: 376/2009)
Órgão: Secretaria de Logística e Tecnologia da
Informação (SLTI) do Ministério do Planejamento,
Orçamento e Gestão (MP)
Responsável: Rogério Santana dos Santos
Interessado: Tribunal de Contas da União, Secretaria de
Fiscalização em Tecnologia da Informação (Sefti)
Advogado constituído nos autos: não há
Sumário: LEVANTAMENTO DE AUDITORIA
REALIZADO NA SECRETARIA DE LOGÍSTICA E
TECNOLOGIA DA INFORMAÇÃO (SLTI) DO
MINISTÉRIO DO PLANEJAMENTO, ORÇAMENTO E
GESTÃO. OBJETIVO DE CONHECER O CONJUNTO DE
SISTEMAS INFORMATIZADOS QUE COMPÕEM OU
SUBSIDIAM O PORTAL WWW.COMPRASNET.GOV.BR.
DETERMINAÇÕES E RECOMENDAÇÕES. CIÊNCIA À
COMISSÃO MISTA DE PLANOS, ORÇAMENTOS
PÚBLICOS E FISCALIZAÇÃO DO CONGRESSO
NACIONAL; À CASA CIVIL DA PRESIDÊNCIA DA
REPÚBLICA; À SLTI, À CONTROLADORIA-GERAL DA
48
UNIÃO E AO MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL.
ARQUIVAMENTO.
(...) 4.10.2. As ocorrências que impedem um licitante de
ser contratado são chamadas, pelo Sicaf, de suspensão,
seja classificada como código ‘002 - Suspensão’ ou ‘021 -
Suspensão órgãos não integrantes do Sisg’. Ou seja, ao
analisar a descrição, difeririam apenas na origem da
penalidade. Integrantes do Sisg utilizam o código ‘002’, os
demais ‘021’.
4.10.3. A Lei nº 8.666/93, ao tratar das sanções
administrativas, menciona duas penalidades que, quando
aplicadas, impedem, ou no jargão do Sicaf, suspendem o
licitante:
‘Art. 87. Pela inexecução total ou parcial do contrato a
Administração poderá, garantida a prévia defesa, aplicar
ao contratado as seguintes sanções:
III - suspensão temporária de participação em licitação e
impedimento de contratar com a Administração, por prazo
não superior a 2 (dois) anos;
IV - declaração de inidoneidade para licitar ou contratar
com a Administração Pública enquanto perdurarem os
motivos determinantes da punição ou até que seja
promovida a reabilitação perante a própria autoridade que
aplicou a penalidade, que será concedida sempre que o
contratado ressarcir a Administração pelos prejuízos
resultantes e após decorrido o prazo da sanção aplicada
com base no inciso anterior.’ (sublinhamos)
4.10.4. Ambas impedem o licitante de participar de
futuras licitações e de serem contratados. Entretanto,
diferem em relação ao âmbito da penalidade. A
jurisprudência do TCU adota o posicionamento de que o
inciso III do art. 87, quando menciona ‘Administração’, se
49
refere somente ao órgão/entidade aplicador da
penalidade, conforme posicionamento constante no voto
condutor da Decisão nº 352/1998-Plenário.
4.10.5. Já a penalidade do inciso IV do art. 87, segundo
jurisprudência do TCU, impede o fornecedor de participar
de licitações e de ser contratado por toda a Administração
Pública, englobando, nos termos do inciso XI do art. 6º da
mesma lei, a ‘administração direta e indireta da União,
dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios,
abrangendo inclusive as entidades com personalidade
jurídica de direito privado sob controle do poder público e
das fundações por ele instituídas ou mantidas’.” (Acórdão
1647/2010, ata 25, Plenário, Relator: VALMIR CAMPELO.
ARQUIVAMENTO 14/07/2010)
Por isso, percebe-se que em que pese a divergência de entendimento
levantada pela doutrina, que identifica três correntes acerca da abrangência da
declaração de inidoneidade, fato é que, na prática, o TCU aplica de forma
abrangente o art. 83, III, da Lei 8.666/93. Tal posicionamento é de curial
importância, na medida em que os órgãos da Administração Pública se
baseiam concretamente nos paradigmas fixados pelos Tribunais de Contas e,
o TCU, define jurisprudência adotada em todo o território nacional, por sua
envergadura institucional e destaque pelo controle de contas que realiza no
âmbito federal.
De todo modo, convém ainda abordar como o guardião da
interpretação da lei federal, o Superior Tribunal de Justiça, avalia a questão, a
fim de que a base teórica construída pela doutrina e o direcionamento concreto
dado pelo TCU sejam ou não validados pelo Poder Judiciário.
3.4 – Jurisprudência do STJ
50
O Superior Tribunal de Justiça, por sua vez, prestigia o entendimento
doutrinário da abrangência irrestrita da sanção de inidoneidade, pelo que se
aproxima e valida a posição do TCU. Neste sentido, verifica-se que a
declaração de inidoneidade não vem sendo entendida como sanção restrita ao
Ente prolator da declaração, sendo de extrema importância que as diversas
Administrações considerem a gravíssima sanção que impõe inidoneidade, sem
criação de óbices.
Quanto ao tema:
REsp 520553 / RJ RECURSO ESPECIAL 2003/0027264-
6 Relator(a) Ministro HERMAN BENJAMIN (1132) Órgão
Julgador T2 - SEGUNDA TURMA Data do Julgamento
03/11/2009 Data da Publicação/Fonte DJe 10/02/2011
Ementa ADMINISTRATIVO. LICITAÇÃO. MANDADO DE
SEGURANÇA PREVENTIVO. DECLARAÇÃO DE
INIDONEIDADE EXARADA PELO ESTADO DO RIO DE
JANEIRO. IMPOSSIBILIDADE DE CONTRATAÇÃO COM
A ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. APLICAÇÃO A TODOS
OS ENTES FEDERADOS. 1. A questão jurídica posta a
julgamento cinge-se à repercussão, nas diferentes
esferas de governo, da emissão da declaração de
inidoneidade para contratar com a Administração Pública,
prevista na Lei de Licitações como sanção pelo
descumprimento de contrato administrativo. 2. Insta
observar que não se trata de sanção por ato de
improbidade de agente público prevista no art. 12 da Lei
8.429/1992, tema em que o Superior Tribunal de Justiça
possui jurisprudência limitando a proibição de contratar
com a Administração na esfera municipal, de acordo com
a extensão do dano provocado. Nesse sentido: EDcl no
51
REsp 1021851/SP, 2ª Turma, Relatora Ministra Eliana
Calmon, julgado em 23.6.2009, DJe 6.8.2009. 3. "Pela
inexecução total ou parcial do contrato a Administração
poderá, garantida a prévia defesa, aplicar ao contratado
as seguintes sanções: (...) IV - declaração de
inidoneidade para licitar ou contratar com a Administração
Pública" (art. 87 da Lei 8.666/1993). 4. A definição do
termo Administração Pública pode ser encontrada no
próprio texto da citada Lei, que dispõe, em seu art. 6º, X,
que ela corresponde à "Administração Direta e Indireta da
União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios,
abrangendo inclusive as entidades com personalidade
jurídica de direito privado sob controle do poder público e
das fundações por ele instituídas ou mantidas". 5. Infere-
se da leitura dos dispositivos que o legislador conferiu
maior abrangência à declaração de inidoneidade ao
utilizar a expressão Administração Pública, definida no
art. 6º da Lei 8.666/1993. Dessa maneira, conseqüência
lógica da amplitude do termo utilizado é que o contratado
é inidôneo perante qualquer órgão público do País. Com
efeito, uma empresa que forneça remédios adulterados a
um município carecerá de idoneidade para fornecer
medicamentos à União. 6. A norma geral da Lei
8.666/1993, ao se referir à inidoneidade para licitar ou
contratar com a Administração Pública, aponta para o
caráter genérico da referida sanção, cujos efeitos irradiam
por todas as esferas de governo. 7. A sanção de
declaração de inidoneidade é aplicada em razão de fatos
graves demonstradores da falta de idoneidade da
empresa para licitar ou contratar com o Poder Público em
geral, em razão dos princípios da moralidade e da
razoabilidade. 8. O Superior Tribunal de Justiça tem
52
entendimento de que o termo utilizado pelo legislador -
Administração Pública -, no dispositivo concernente à
aplicação de sanções pelo ente contratante, deve se
estender a todas as esferas da Administração, e não ficar
restrito àquela que efetuou a punição. 9. Recurso
Especial provido. Acórdão Vistos, relatados e discutidos
os autos em que são partes as acima indicadas, acordam
os Ministros da Segunda Turma do Superior Tribunal de
Justiça: "A Turma, por unanimidade, deu provimento ao
recurso, nos termos do voto do(a) Sr(a). Ministro(a)-
Relator(a)." Os Srs. Ministros Mauro Campbell Marques,
Eliana Calmon, Castro Meira e Humberto Martins votaram
com o Sr. Ministro Relator.
No referido acórdão, traz o STJ diversas razões para a extensão ampla
da declaração de inidoneidade. Primeiramente, invoca a competência da União
para legislar sobre normas gerais de licitação, pelo que o art. 22, XXVII c/c art.
37, XXI, da CRFB, já imporia a aludida extensão a todos os Entes públicos.
Demais disso, prestigia entendimento já antevisto pela doutrina e sufragado
pelo TCU, ao destacar que a definição de Administração Pública, estabelecida
no art. 6º, XI da Lei 8.666/93, faz conhecer a extensão da sanção com base na
amplitude daquele termo. Por fim, o STJ cita doutrina e destaca, ainda, os
princípios da moralidade e da razoabilidade; certamente, não seria razoável
supor a aplicação sanção parcialmente, de modo que determinado contratado
fosse inidôneo para algum Ente e ilibado para os demais. Além do que, tal
cenário violaria frontalmente o princípio constitucional da moralidade,
porquanto exsurgiria evidente má gestão e desatendimento do interesse
público.
Nas palavras do STJ, lavradas no mesmo acórdão já citado:
53
“A declaração de inidoneidade para contratar e licitar
alcança a União, os Estados e os Municípios, por força do
art. 22, XXVII, c/c o art. 37, XXI, da Constituição de 1988.
Com efeito, compete privativamente à União legislar
sobre normas gerais de licitação e contratação, em todas
as modalidades, para as administrações públicas direta,
autárquicas e fundacionais da União, Estados, Distrito
Federal e Municípios, e para as empresas públicas e
sociedades de economia mista. A definição do termo
Administração Pública pode ser encontrada no próprio
texto da Lei, que dispõe, em seu art. 6º, XI, que ela
corresponde à "Administração Direta e Indireta da União,
dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios,
abrangendo inclusive as entidades com personalidade
jurídica de direito privado sob controle do poder público e
das fundações por ele instituídas ou mantidas". Infere-se
da leitura dos dispositivos que o legislador conferiu uma
abrangência maior à declaração de inidoneidade ao
utilizar a expressão Administração Pública, definida no
art. 6º da Lei 8.666/1993. Dessa maneira, conseqüência
lógica da amplitude do termo utilizado é a inidoneidade do
contratado perante qualquer órgão público do País. Com
efeito, uma empresa que forneça remédios adulterados a
um município não terá idoneidade para fornecer
medicamentos à União. Ratifica esse entendimento José
Cretella Júnior, ao afirmar que a declaração de
inidoneidade é para licitar e contratar com o Estado,
entendido o governo nas três esferas (Cretella Júnior,
José. Das Licitações Públicas, ed. Forense, 2ª edição, p.
341, 2003). Compartilha desse entendimento Maria Sylvia
Zanella Di Pietro, para a qual a norma geral da Lei
8.666/93, ao se referir à inidoneidade para licitar ou
54
contratar com a Administração Pública, aponta para o
caráter genérico da referida sanção, cujos efeitos irradiam
por todas as esferas de governo (Di Pietro, Maria Sylvia
Zanella. Direito Administrativo , ed. Atlas, 2006, p. 226). A
sanção de declaração de inidoneidade é aplicada em
razão de fatos graves demonstradores da falta de
idoneidade da empresa para licitar ou contratar com o
Poder Público em geral, em razão dos princípios da
moralidade e da razoabilidade, para os quais consigna
que uma dada empresa seja idônea na esfera federal e
inidônea na esfera estadual. Confira-se, nessa linha de
entendimento, a posição de Marçal Justen Filho (Justen
Filho, Marçal. Comentários à Lei de Licitações e
Contratos Administrativos , ed. Aide: 2003, 4ª edição, p.
476), nesse sentido: Documento: 5592903 - RELATÓRIO
E VOTO - Site certificado Página 5 de 8 Superior
Tribunal de Justiça Seria possível estabelecer uma
distinção de amplitude entre as duas figuras. Aquela do
inc. III produziria efeitos no âmbito da entidade
administrativa que a aplicasse; aquela do inc. IV abarcaria
todos os órgãos da Administração Pública. Essa
interpretação deriva da redação legislativa, pois o inc. III
utiliza apenas o vocábulo Administração, enquanto o inc.
IV contém Administração Pública. No entanto, essa
interpretação não apresenta maior consistência, ao
menos enquanto não houver regramento mais detalhado.
Aliás, não haveria sentido em circunscrever os efeitos da
suspensão de participação de licitação a apenas um
órgão específico. Se um determinado sujeito apresenta
desvios de conduta que o inabilitam para contratar com a
Administração Pública, os efeitos dessa ilicitude se
estendem a qualquer órgão. Nenhum órgão da
55
Administração Pública pode contratar com aquele que
teve seu direito de licitar suspenso. A menos que lei
posterior atribua contornos distintos à figura do inc. III,
essa é a conclusão que se extrai da atual disciplina
legislativa. A análise do teor dos incisos III e IV do art. 87
da Lei 8.666/93 revela outro argumento em favor do
entendimento de que a declaração de inidoneidade
abrange a União, os Estados, o Distrito Federal e os
Municípios. Se o âmbito de uma e outra sanção fosse o
mesmo, ou seja, restrito ao órgão ou entidade ao qual se
vincula a autoridade administrativa que aplica a punição,
as sanções se tornariam idênticas, o que contraria a regra
de hermenêutica segundo a qual devem ser afastadas as
interpretações desarrazoadas. A Lei 8.666/1993, ao
estabelecer um discrímen em relação ao agente
competente para aplicar a sanção de declaração de
inidoneidade, ocasiona que tal sanção repercuta de forma
mais ampla que a de suspensão temporária. Diante de
todos os argumentos aqui expendidos, entende-se que a
Declaração de Inidoneidade, na forma do inc. IV do art.
87 da Lei 8.666/93, impede o declarado de contratar e
licitar com todos os órgãos da Administração Pública em
qualquer de suas esferas, União, Estados, Distrito
Federal e Municípios, por tratar-se de norma geral
obrigatória por força de determinação constitucional.
Justamente por ser de competência exclusiva da União
legislar sobre matéria de licitação, esse entendimento não
afronta o princípio federativo.”
56
CONCLUSÃO
A Administração Pública tem como princípio fundamental a chamada
supremacia do interesse público, que pende em favor da vontade geral a
consecução de objetivos porventura em choque com o interesse particular.
Além deste, apresenta-se o princípio licitatório como de extrema importância,
que impõe o dever da Administração de selecionar, previamente a uma
contratação e em procedimento público formal, respeitada ampla
competitividade e isonomia, a proposta mais vantajosa.
Desta conjugação de princípios, sobressai a possibilidade de
desequilíbrio na relação contratual administrativa, podendo a Administração
impor sanções pela inexecução total ou parcial da avença. Dentre essas
sanções, a declaração de inidoneidade, que respeita princípios do chamado
Direito Administrativo Sancionador e se constitui uma das cláusulas
exorbitantes (fulcrada na supremacia do interesse público).
Quanto ao ponto, a aplicação da sanção de inidoneidade, incidente
nas relações jurídicas administrativo-contratuais, suscita controvérsias,
havendo três correntes de entendimento na doutrina: (i) aplicação restrita ao
Ente prolator da decisão, com base na autonomia federativa; (ii) aplicação
extensiva a todos os Entes, em face da definição legal do termo
“Administração Pública”, mencionada expressamente pelo legislador no art. 87,
IV, da Lei de Licitações; e (iii) aplicação extensiva a todos os Entes, em razão
moralidade administrativa e da razoabilidade, bem como a necessidade de
atendimento do interesse público.
Verifica-se, contudo, que a jurisprudência do TCU e do STJ conferem
direcionamento aos entendimentos, fixando a forma de entendimento da
declaração de inidoneidade. Na prática, a referida sanção deve ser aplicada de
forma extensiva a todos os Entes, tanto pelo viés gramatical da Lei de
57
Licitações, como pelo cotejo da natureza da sanção coma necessidade de
satisfazer os ditames da moralidade e da razoabilidade.
Isto posto, o que se observa do estudo, é que a prática administrativa
chancelada pelo TCU e pelo STJ, de certa feita, pacificam a questão tratada
pela doutrina, enveredando o operador do Direito a considerar os efeitos da
declaração de inidoneidade como oponíveis a todos os Entes da Federação,
independentemente de quem prolatou a decisão sancionatória. Decerto,
observados os direitos e garantias que fundamentam o Direito Administrativo
Sancionatório, a declaração de inidoneidade imposta deve ser tomada
conforme jurisprudência, a partir de uma perspectiva ampla.
58
BIBLIOGRAFIA
ALEXANDRINO, Marcelo; PAULO, Vicente. Direito Administrativo
Descomplicado. São Paulo: Método, 2008.
DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. São Paulo: Atlas,
2014.
FILHO, José dos Santos Carvalho. Manual de Direito Administrativo. Rio de
Janeiro: Lumen Juris, 2005.
MARINELA, Fernanda. Direito Administrativo. Niterói: Impetus, 2013.
MAZZA, Alexandre. Manual de Direito Administrativo. São Paulo: Saraiva,
2014.
MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. São
Paulo: Malheiros, 2009.
NETO, Diogo de Figueiredo Moreira. GARCIA, Flavio Amaral. Revista
Eletrônica de Direito Administrativo Econômico (REDAE), Salvador, Instituto
Brasileiro de Direito Público, nº. 28, novembro/dezembro/janeiro, 2011/2012.
Disponível na Internet: < http://www.direitodoestado.com/revista/REDAE-28-
NOVEMBRO-2011DIOGO-FIGUEIREDO-FLAVIO-GARCIA.pdf>. Acesso em:
27 de março de 2015
OLIVEIRA, Rafael Carvalho Resende Oliveira. Licitações e Contratos
Administrativos Teoria e Prática. São Paulo: Método, 2013.
59
ÍNDICE
FOLHA DE ROSTO 2
AGRADECIMENTO 3
DEDICATÓRIA 4
RESUMO 5
METODOLOGIA 6
SUMÁRIO 7
INTRODUÇÃO 8
CAPÍTULO I
Administração e o Princípio Licitatório 9
1.1 – A Administração Pública: Conceito e Sentidos 9
1.2 – Princípios da Administração Pública 12
1.3 – Princípio da Supremacia do Interesse Público 14
1.4 – Princípio da Licitação 16
1.5 – Síntese 19
CAPÍTULO II
Contrato Administrativo e a Atividade Sancionatória 21
2.1 – Contrato Administrativo – Conceito e Características 21
2.2. – Cláusulas Exorbitantes 26
2.3 – Direito Administrativo Sancionador 28
2.4 – Sanções Administrativas 35
CAPÍTULO III
Declaração de Inidoneidade 36
3.1 – Previsão Legal da Declaração de Inidoneidade 37
3.2 – Controvérsia Sobre a Abrangência da Sanção 39
3.3 – Jurisprudência do TCU 47
3.4 – Jurisprudência do STJ 49
60
CONCLUSÃO 56
BIBLIOGRAFIA 58
ÍNDICE 59