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DESAFIOS NA TERCEIRIZAÇÃO DE SERVIÇOS DE
T.I. EM UMA EMPRESA PÚBLICA: ANÁLISE
DOCUMENTAL
ALINE VIEIRA MALANOVICZ - malanovicz@gmail.com
UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO SUL - UFRGS
Área: 7 - GESTÃO ESTRATÉGICA E ORGANIZACIONAL
Sub-Área: 7.2 - ESTRATÉGIAS DE PRODUÇÃO
Resumo: A TERCEIRIZAÇÃO DE SERVIÇOS DE TECNOLOGIA DE INFORMAÇÃO
(T.I.) É UMA OPÇÃO DE GESTÃO UTILIZADA POR EMPRESAS PRIVADAS E
PÚBLICAS. ENTRETANTO, EMBORA A TERCEIRIZAÇÃO DA T.I. TRAGA
BENEFÍCIOS, TAMBÉM TRAZ DESAFIOS. O OBJETIVO DESTE TRABALHO É
DESCREVER DIFICULDADES ENCONTRADAS EM UM CASO DE TERCEIRIZAÇÃO
EM UMA EMPRESA PÚBLICA. PARA ISSO, FOI REALIZADA UMA PESQUISA
UTILIZANDO CONSULTA DOCUMENTAL EM UMA EMPRESA PÚBLICA DO SETOR
FINANCEIRO. OS RESULTADOS CONFIRMARAM DESAFIOS, DIFICULDADES, E
FATORES DE RISCO IDENTIFICADOS EM OUTRAS PESQUISAS. OS PRINCIPAIS
DESAFIOS IDENTIFICADOS SÃO RELACIONADOS A FORNECEDORES,
CONTRATOS E AO PRÓPRIO CLIENTE. E AS AÇÕES QUE A EMPRESA VEM
FAZENDO PARA ENFRENTAR OS DESAFIOS IDENTIFICADOS INCLUEM:
DESENVOLVIMENTO INTERNO DE CONTROLES, BENCHMARKING COM OUTRAS
PARCEIRAS DA TERCEIRIZADA, DIÁLOGO COM A TERCEIRIZADA PARA SOLUÇÃO
DAS DIFICULDADES, E REVISÃO PERIÓDICA DAS CONDIÇÕES DO PRODUTO, DO
PROCESSO E DO CONTRATO, PARA MELHOR CONTROLE E GESTÃO.
Palavras-chaves: TERCEIRIZAÇÃO; SERVIÇOS DE TI; GESTÃO PÚBLICA;
PROCESSAMENTO DE OPERAÇÕES FINANCEIRAS.
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CHALLENGES IN OUTSOURCING I.T. SERVICES
IN A PUBLIC COMPANY: A REVIEW OF
DOCUMENTS
Abstract: OUTSOURCING OF INFORMATION TECHNOLOGY SERVICES (T.I.) IS A
MANAGEMENT OPTION USED BY PRIVATE AND PUBLIC COMPANIES. HOWEVER,
WHILE OUTSOURCING T.I. BRING BENEFITS ALSO BRINGS CHALLENGES. THE
AIM OF THIS STUDY IS TO DESCRIBE DIFFICULTIES IN AA CASE OF
OUTSOURCING IN A PUBLIC COMPANY. FOR THIS, A SEARCH WAS PERFORMED
USING DOCUMENT RESEARCH IN A PUBLIC COMPANY IN THE FINANCIAL
SECTOR. THE RESULTS CONFIRMED CHALLENGES, DIFFICULTIES, AND RISK
FACTORS IDENTIFIED IN OTHER STUDIES. THE KEY CHALLENGES IDENTIFIED
ARE RELATED TO SUPPLIERS, CONTRACTS AND CUSTOMER. AND AMONG THE
ACTIONS THAT THE COMPANY IS TAKING TO ADDRESS THE CHALLENGES
IDENTIFIED ARE: INTERNAL CONTROLS DEVELOPMENT, BENCHMARKING WITH
OTHER PARTNERS OF OUTSOURCED, DIALOGUE WITH OUTSOURCED TO SOLVE
DIFFICULTIES, AND PERIODIC REVIEW OF CONDITIONS OF THE PRODUCT, THE
PROCESS AND THE CONTRACT, FOR BETTER CONTROL AND MANAGEMENT.
Keyword: OUTSOURCING; I.T. SERVICES; PUBLIC MANAGEMENT; FINANCIAL
OPERATIONS PROCESSING.
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1. Introdução
Para aprimorar a gestão de operações em serviços, assim como seus impactos sociais,
a Gestão da Tecnologia é um dos temas de pesquisa destacados em eventos da Engenharia de
Produção (UNESP, 2016). A terceirização de serviços de Tecnologia de Informação (T.I.) é
uma opção de gestão utilizada pelas empresas, tanto privadas como públicas.
Nas empresas públicas, esta escolha se justifica pelo objetivo estratégico de permitir à
empresa manter o foco na prestação de serviços para a sociedade e em suas competências
primordiais (core competences). Por isso, tais empresas buscam terceirizar atividades de apoio
a seus processos internos, utilizando a tecnologia de informação (GUARDA, 2011).
Atividades de tecnologia de informação, tais como o desenvolvimento de sistemas e o
processamento de dados de produtos e serviços vêm sendo, cada vez mais, alvo de
terceirização. O setor de T.I. foi um dos pioneiros no processo de terceirização das atividades
(por exemplo, no final do século XX, a IBM terceirizou a fabricação de processadores com a
Intel e o desenvolvimento de software com a Microsoft) (FERREIRA; LAURINDO, 2009).
Na literatura acadêmica, diversos temas referentes à terceirização de T.I. são foco de
pesquisas: determinantes da sua realização, insights para sua prática, resultados em
organizações brasileiras, conhecimento e sua transferência, produtividade da firma com a
terceirização de T.I., gestão da terceirização de T.I., mitigação de riscos, análises empíricas, e
comunicação (PAULA et al., 2015). Mas se debate pouco a necessidade de se adaptar o
processo de terceirização de serviços de tecnologia de informação às condições da esfera
pública brasileira (GUARDA, 2011).
O objetivo deste trabalho é descrever dificuldades encontradas em um caso de
terceirização em uma empresa pública. Para tanto, foi selecionado como cenário de estudo
uma empresa pública do setor financeiro, e optou-se por realizar uma investigação com uso da
técnica de consulta documental.
As seções deste artigo apresentam, além desta seção 1 de introdução, uma revisão
bibliográfica sobre riscos, problemas e desafios da terceirização na seção 2, seguida de uma
seção que descreve o método de pesquisa (seção 3). A seção 4 descreve os resultados da
análise de dados do caso estudado. A seção 5 encerra este artigo, resumindo o trabalho e
mostrando as conclusões a que as análises conduziram.
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2. Riscos, Problemas e Desafios na Terceirização de Tecnologia de Informação
Esta seção apresenta uma síntese da revisão de literatura realizada sobre o processo de
terceirização de serviços de T.I. Foram pesquisados trabalhos acadêmicos voltados ao tema
para identificar os principais problemas e dificuldades relatados na literatura em relação ao
processo de terceirização de serviços de T.I.
A terceirização de T.I. é “o ato de delegar ou transferir os direitos a decisões
relacionadas com atividades de prestação de serviços de T.I. a contratados, que passam a
desenvolvê-las e administrá-las em conformidade com cláusulas contratuais previamente
estabelecidas” (GONÇALVES, 2015).
Entretanto, uma controvérsia sobre o tema envolve o argumento de que a T.I. não deve
ser terceirizada. Isso porque não poderia ser vista como serviço de suporte, por ser crítica para
a competitividade das empresas (FERREIRA; LAURINDO, 2009).
De fato, diversas empresas enfrentam dificuldades na gestão de serviços terceirizados
(CRISTOFOLI et al., 2012), e, embora a terceirização da T.I. traga benefícios, também traz
riscos que precisam ser mitigados pelos seus gestores (PAULA et al., 2015). Há riscos
oriundos de contratos mal elaborados, de perda de conhecimento, de baixa motivação da
equipe (FERREIRA; LAURINDO, 2009), problemas de entrega no prazo, altos custos, baixa
qualidade de serviço e baixo desempenho (SANTOS; CAMPOS, 2011).
Uma dificuldade relevante para os contratos de terceirização de serviços é a
dependência excessiva da organização-cliente com relação ao fornecedor. Ela ocorre quando
o conhecimento necessário para o sucesso da contratação não é transferido do cliente para o
fornecedor e vice-versa, reduzindo o poder do cliente, engessando a flexibilidade estratégica
do cliente, aumentando custos e reduzindo a qualidade do serviço (BRITO et al., 2015).
Outra dificuldade é a gestão dos contratos e dos fornecedores. Alguns fatores
peculiares a TI tornam ainda mais complexa a elaboração de contratos e sua gestão junto aos
fornecedores. Um exemplo seria a verificação, administração e o controle do serviço depois
de implementado (FERREIRA; LAURINDO, 2009).
Nesse sentido, vale lembrar que os melhores resultados obtidos pelas organizações
estão associados à adoção de contratos formais detalhados com uso de Acordos de Nível de
Serviços (ANS) (Service Level Agreement, SLA). Isso ocorre porque permite que a empresa
contratante aumente seu foco na sua própria área de atuação, em função da terceirização de
serviços de T.I. (CRISTOFOLI et al., 2012).
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Apesar disso, pesquisas sobre a realidade de empresas públicas brasileiras demonstram
que o processo de gestão dos contratos e dos ANS na terceirização de T.I. ainda não flui
suavemente. Os acordos precisam ser mais claros e formalizados para evitar o surgimento de
custos de oportunidade (LARANJEIRA; SILVA, 2012). Os órgãos ainda estão em processo
de alinhamento com as regras, em especial no que se refere a cumprir itens fundamentais da
contratação como, por exemplo, os elementos para a gestão do contrato, e os funcionários
ainda precisam de treinamento, e mais conhecimento sobre essa gestão (GUARDA, 2011).
Também em empresas públicas, uma mesa-redonda entre gestores de T.I. sobre o tema
da terceirização de serviços da área (PLANO EDITORIAL, 2010) mostrou depoimentos
realistas dos debatedores, sobre problemas, riscos e desafios do processo, destacando-se estes:
Na terceirização, vivemos de altos e baixos: há dias em que acordamos felizes com
nossos fornecedores; há outros em que já não podemos vê-los pela frente...
Nós observamos a degradação da qualidade na medida em que optamos pelo menor
preço.
O nosso SLA está em fase de amadurecimento, a começar pela padronização dos
processos, dependendo do serviço.
Acho que a gestão de SLAs é o mal comum a todos nós.
Nós ainda estamos aprendendo. E uma coisa que precisamos aprender é a negociar o
SLA não apenas com o fornecedor, mas com o usuário, cujas necessidades vão ditar
o teor do contrato.
Quanto mais bem desenhado o serviço, internamente, maior a chance de sucesso na
terceirização.
(PLANO EDITORIAL, 2010).
Diversos outros tipos de desafios, dificuldades e riscos foram identificados na pesquisa
conceitual bibliográfica. Esses resultados encontram-se sintetizados no Quadro 1.
Item Desafio Potencial Item Desafio Potencial
Fo
rnec
edo
r
Superestimar suas capacidades
Co
ntr
ato
Contratos longos sem negociação
Dependência técnica excessiva Contratação inflexível (falta de
autonomia para mudar contratos) Falta de integração entre fornecedores
Oportunismo do fornecedor Contratação truncada
Critérios de avaliação de potenciais fornecedores Negligência em contratos longos
Demora na assistência
So
ftw
are
Tempo de resposta lento
Assistência de má qualidade Interdependência das atividades
Cli
ente
Expectativas irrealistas dos clientes Banco de dados
Uso indevido do software Falha de segurança
Falta de maturidade do cliente no acompanhamento
de ANS e experiência com terceirização de T.I.
Pla
nej
am
ento
Aproveitamento inadequado do
produto contratado
Vício operacional Falta de estratégias de T.I.
Falhas na metodologia de gerenciamento de serviços Falta de definição dos serviços
Negligência nas inter-relações para gestão do risco Falha de transição dos serviços
Adquirir o software apenas por
motivos de obrigatoriedade fiscal
Falta ou falha de avaliação
estratégica da terceirização
QUADRO 1 – Desafios da terceirização de TI. Fonte: adaptado de Paula et al.(2015) e Laranjeiras e Silva(2012).
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3. Método
Esta pesquisa pode ser classificada como qualitativa, descritiva e exploratória (YIN,
2005; VERGARA, 2006; WAZLAWCKI, 2009). O cenário de estudo é uma empresa pública
que operacionaliza um de seus produtos financeiros com uso de terceirização de serviços de
tecnologia e processamento de dados (MALANOVICZ, 2014; MALANOVICZ, 2015). A
unidade de análise do estudo é o processo terceirizado destes serviços para o produto Cartão.
A técnica de coleta de dados utilizada é a Consulta Documental a materiais escritos
da organização: atas, normativos, publicações oficiais, manuais e relatórios (PRIOR, 2004),
principalmente e-mails trocados (FREITAS, 2010). Esta opção de pesquisa justifica-se porque
a maneira como os documentos são utilizados no dia-a-dia das práticas de trabalho pode
evidenciar como é o processo de trabalho nas organizações (PRIOR, 2004; CUNHA et al.,
2010). Além disso, atualmente a correspondência eletrônica (e-mail) tem sido uma ferramenta
habitual de comunicação, coordenação e colaboração (CORRÊA, 2002; FREITAS, 2010).
A coleta de dados foi realizada em junho/2016 e abrangeu documentos emitidos entre
maio/2013 e maio/2016. Foram coletados 267 documentos, incluindo 227 e-mails. O
protocolo de coleta de dados incluiu os campos descritos no Quadro 2 (Tipo; Identificação;
Data/hora; Origem e Destino; Assunto; Evidência literal) (BAUER; GASKELL, 2002). Para
preservar dados sigilosos da empresa, alguns termos foram substituídos por equivalentes.
Tipo e Quantidade
de Documentos
Identificação
e data+hora
Origem e
Destino Processo/Serviço/Tema/Assunto
Evidências
de Desafios
Ata (14),
E-mail (227),
Manual (4),
Memorando (2),
Norma (6),
Ofício (2),
Relatório (12)
(número
sequencial,
data e hora
do documento)
Remetente e
Destinatário –
Equipe da
empresa
contratante ou
da terceira
contratada
Pedido, Emissão, Cadastro, Troca
de Arquivos (cada arquivo),
Transação, Cálculo, Parcerias,
Cobrança, Comissão, Retorno,
Contabilização, Pagamento,
BACEN, Inadimplência,
Faturamento, Manualização
(citação
literal do
trecho de
texto do
documento)
QUADRO 2 – Protocolo de Pesquisa Documental. Fonte: desenho de pesquisa.
Como na maioria das pesquisas deste tipo, a análise de dados utilizou as técnicas de
Análise de Conteúdo (KRIPPENDORFF, 2004). Esta análise foi dirigida pelo cruzamento
entre os itens do protocolo de coleta de dados e as categorias a priori dadas pelos conceitos da
pesquisa bibliográfica precedente (Quadro 1). Isso permitindo identificar evidências
documentais que exemplificam o desafio correspondente. Uma pequena inovação na forma da
apresentação dos resultados foi o uso adicional da técnica de visualização de palavras em
nuvem, recurso gráfico que destaca os termos que aparecem mais frequentemente nas
evidências coletadas (FEINBERG, 2013).
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4. Resultados
O diagrama de contexto (Figura 1) da instituição financeira estudada descreve o
ambiente de atuação da empresa e mostra, de forma gráfica, os relacionamentos mais
relevantes da empresa com o mundo exterior, incluindo terceirizados (parceiros de negócio).
Os Produtos da empresa são produtos financeiros, incluindo o produto Cartão aqui estudado.
FIGURA 1 – Diagrama de contexto da empresa pública do setor financeiro estudada. Fonte: coleta de dados.
Para a empresa, a comercialização deste produto foi uma escolha estratégica e, embora
existam outros bancos que o operam, a empresa foi a pioneira em sua área de atuação. O
produto Cartão é baseado no conceito de cartão de crédito para financiar os investimentos de
micro, pequenas e médias empresas e dos microempreendedores individuais (BNDES, 2016;
BAGDADI, 2013). A emissão do Cartão se dá por meio de bandeiras de cartão de crédito
parceiras. A operação financeira é caracterizada pelo estabelecimento de um limite de crédito,
mediante análise de crédito feita pela empresa emissora. A efetivação de uma transação de
compra com Cartão envolve o relacionamento entre os atores Cliente/Beneficiário, Emissor (a
empresa estudada), Fornecedor, Portal, Bandeira, Adquirente e Processador (a terceirizada). O
fluxo do funcionamento do produto é realizado nas seguintes etapas:
Cliente realiza compra com Fornecedor. Fornecedor registra compra no Portal.
Portal valida e registra compra. Processador verifica limite de crédito disponível.
Processador envia a Emissor arquivo de dados de compra. Emissor registra compra.
Processador calcula valores de parcelas a pagar e envia-os em arquivo ao Emissor.
Emissor registra valores atualizados de parcelas calculados pelo Processador.
Emissor recebe pagamentos do Cliente, envia arquivo de retornos ao Processador.
Processador calcula valor pago, atualiza saldo e limite, envia arquivo ao Emissor.
Emissor realiza pagamentos ao Portal, envia arquivo ao Processador.
Processador apura valor pago pelo Emissor, atualiza saldo, envia arquivo a Emissor.
Emissor registra valores atualizados (parcelas, saldos) calculados pelo Processador.
Processador calcula saldos, limites, lançamentos contábeis, envia arquivo a Emissor.
Emissor registra valores atualizados de saldos e limites calculados pelo Processador.
(MALANOVICZ, 2015, p.3694)
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A Consulta Documental mostrou que documentos do tipo Manual, Norma e Ofício
revelaram o modo de funcionamento do produto e de sua operacionalização entre contratante,
contratada, cliente, fornecedor e banco repassador de recursos. Documentos do tipo
Memorando solicitaram e relataram resultados de investigação do setor de Auditoria Interna
da contratante sobre os controles operacionais do produto. E documentos do tipo Relatório
descreveram a situação bimestral do projeto de desenvolvimento do produto (2013-2014) e a
situação operacional do produto (2015-2016). Documentos do tipo E-mail revelaram
solicitações de solução de ocorrências, demora na solução de pendências, tentativas de
solução de entendimentos sobre as demandas de ajustes. Documentos como Atas de reuniões
revelaram queixas dos funcionários da empresa quanto à baixa qualidade do atendimento
prestado pela contratada e propostas de solução para atendimento das demandas.
A Figura 2 apresenta na forma de uma nuvem de palavras os desafios, problemas e
dificuldades mais recorrentemente mencionados nos documentos consultados. É possível
perceber o destaque de itens como (além de projeto, implantação, produto), por exemplo:
qualidade, insuficiência, monitoramento, ausência, gestão, avaliação, maturidade.
FIGURA 2 – Nuvem de palavras dos desafios da terceirização de T.I. no caso estudado. Fonte: coleta de dados.
Os principais resultados preliminares da análise documental encontram-se resumidos
no Quadro 3. São apresentadas algumas evidências documentais, a categorização preliminar
adotada para cada evidência, e o tipo de fator de risco elencado na pesquisa bibliográfica.
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Desafios
Identificados
Categorização
Preliminar
Evidências
Documentais
Dependência técnica
e operacional
da contratada
Risco de descontinuidade
do produto em caso de
rescisão da contratada.
Ausência de apuração de valores financeiros pelo
Emissor de modo independente dificultou o processo de
validação dos dados financeiros de cada operação.
Expectativas
irrealistas
e
Superestimativa
das capacidades
da contratada
Dificuldades para
expansão da carteira e
riscos à comercialização
massiva
Não ampliação da operação através de convênios
operacionais, por não existência de sistemas de suporte e
relatórios gerenciais com informações suficientes para a
gestão da carteira da conveniada. (i) demora para implementar pagamento de faturas por
parte das parcerias através de fluxo de arquivos entre
parceira, empresa e contratada (pagamento por boleto);
(ii) indefinição da automação da rotina de pagamento de
comissões para as parceiras (valores a pagar calculados
pela contratada incorretos).
Fragilidade de acompanhamento de operações e
necessidade de revalidações dos dados financeiros
informados pela contratada, e consequente insegurança
nas áreas comerciais quanto ao aumento do risco de
crédito das operações.
Assistência
de baixa
qualidade
e
Demora na
assistência
Dificuldades operacionais
devidas à falta de
coordenação entre áreas
da empresa, a contratada
e as parceiras
para adaptação às rotinas
operacionais do produto.
(i) falta de produção e envio, pela contratada, de
relatórios gerenciais semanais para apoio à operação;
(ii) indefinições de rotinas internas de alteração de limite
de crédito do cartão e de bloqueio e cancelamento no
caso de inadimplência;
(iii) dificuldade de compra por parte das beneficiárias
devido ao limite diário de compras de R$ 50 mil;
(iv) problemas de postagem e entrega dos plásticos
devido a cadastro de endereço incorreto ou ausência de
recebedor;
(v) reemissão de cartão por erro no nome do titular.
Defeitos nos dados,
falhas em sistemas,
processos inadequados
e erros, como falta de
arquivos, datas
incorretas, valores
incorretos de
limite de crédito e de
saldos de operações,
aquisições acima do
limite do cartão.
Reincidência de casos de inconsistências de dados,
atrasos no envio de arquivo, diferenças da
operacionalização esperada e a realizada, entre outros
erros da contratada, mais a fragilidade na validação de
informações financeiras fornecidas gerou o risco de
inconsistências que comprometam a integridade das
informações financeiras e contábeis referentes às
operações. (...) Retrabalho para validação de relatórios
periódicos para órgãos fiscalizadores, para elaboração de
controles paralelos de validação e eventual correção dos
dados informados.
Dificuldades jurídicas e
institucionais, como
bloqueio indevido de
contas e cobrança
indevida de tributação.
(ii) beneficiárias, após o pagamento da fatura mensal,
recebiam SMS informando que o pagamento não havia
sido realizado e que seu cartão estava bloqueado;
(iii) contratada não estava adaptada para a cobrança do
IOF nos termos do decreto, (alíquota reduzida ou alíquota
zero) e utilizava método de cálculo distinto do previsto.
Falta de maturidade
organizacional no
monitoramento de
contratos (ANS)
Tardia elaboração de
métodos de
monitoramento
da qualidade das entregas
da contratada
Falta de instrumentos para penalizar: (i) excessivo tempo
de resposta dos fornecedores às solicitações realizadas,
(ii) erros inusitados nos testes evidenciando riscos
potenciais, (iii) cumprimento parcial das entregas pela
contratada.
QUADRO 3 – Desafios da terceirização dos serviços de T.I. no caso estudado. Fonte: coleta e análise de dados.
Neste caso estudado, foi possível concluir que se confirmaram os principais
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indicativos de desafios, riscos e dificuldades em processos de terceirização de serviços de T.I.
Destacaram-se os fatores relacionados a Fornecedores (dependência do fornecedor,
superestimativa das capacidades, assistência de má qualidade, demora na assistência),
Contratos (contratação truncada) e Cliente (expectativas irrealistas, falta de maturidade e
experiência com terceirização de TI, acompanhamento de ANS e gestão de serviços).
Embora “os melhores resultados obtidos pelas empresas estão associados à adoção de
contratos formais detalhados com uso de ANS” (CRISTOFOLI et al., 2012), os resultados
mostram que a empresa pode ecoar a frase “Nós ainda estamos aprendendo a negociar o ANS
com o fornecedor e com o usuário, cujas necessidades vão ditar o teor do contrato” (PLANO
EDITORIAL, 2010). Esta empresa parece estar, como outras empresas públicas, ainda em
processo de alinhamento com regras de gestão de contratos (GUARDA, 2011). Nesse sentido,
importa refletir sobre o conhecimento dos funcionários sobre o processo de licitações, para
elaboração de edital, ANS, monitoramento e penalizações conforme o contrato (GUARDA,
2011). Para o processo que é a unidade de análise desta pesquisa, a empresa parece precisar
de formação, para formalização dos acordos e definição de garantias que possam assegurar
um melhor nível de qualidade nas entregas de serviço (LARANJEIRA; SILVA, 2012).
Diante desses resultados, também foram investigadas ações de contorno. A consulta
documental indicou que têm sido promovidas ações para enfrentar tais desafios (Quadro 4).
Desafios Identificados Ações para minimizar os riscos
Dependência técnica e
operacional da contratada
Desenvolvimento interno de controles e relatórios gerenciais do produto.
(i) necessidade de melhor aproveitamento das informações existentes nos
arquivos da contratada, através do processamento e organização das
informações;
(ii) desenvolvimento de rotina de alteração de limite de crédito de cartões
emitidos via arquivo.
Expectativas irrealistas e
Superestimativa das
capacidades da contratada
Benchmarking com outras empresas atendidas pela contratada.
Reuniões entre níveis hierárquicos superiores da empresa e da contratada,
para reafirmar a parceria, esclarecer as expectativas e cobrar maior
comprometimento.
Assistência de baixa qualidade e
Demora na assistência
Reuniões e call conferences com funcionários-chave da contratada,
expondo os problemas com a assistência, contrapondo o que havia sido
prometido com a realidade do serviço que está sendo prestado.
Cobrança das chefias da empresa, em conferência com chefias da
contratada, por uma assistência mais rápida.
Utilização de uma ferramenta de controle de chamados (SipagDirect).
Falta de maturidade
organizacional no monitoramento
de contratos (ANS)
Elaboração de relatórios semestrais do produto, analisando seu
desempenho e as dificuldades operacionais com a contratada.
Identificação de itens a monitorar em um Acordo de Nível de Serviços.
Revisão anual dos contratos, com a opção de aditivos para estabelecer
claramente as formas de trabalho da contratada e quais as penalidades se
não cumprir as cláusulas contratuais.
QUADRO 4 – Ações de minimização de riscos para cada desafio identificado. Fonte: coleta e análise de dados.
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5. Conclusão
Este trabalho alcançou seu objetivo de descrever dificuldades encontradas em um caso
de terceirização numa empresa pública. Para tanto, foi realizada uma análise documental
sobre um processo de terceirização de serviços de TI para um produto financeiro da empresa.
Os resultados confirmaram diversos desafios e dificuldades, bem como fatores de
risco, identificados em outras pesquisas da literatura da área. Resumidamente, os principais
desafios são relacionados a fornecedores, contratos e ao próprio cliente. A dependência do
fornecedor, a superestimativa das suas capacidades, a assistência de má qualidade e a demora
na assistência (percebidas em diversas pendências de serviços) foram os principais desafios
relacionados a fornecedores, no caso a empresa terceirizada. A existência de contratação
truncada foi uma dificuldade relacionada aos contratos. E as expectativas irrealistas, a falta de
maturidade e experiência com ações de gerenciamento de terceirização, seja de T.I., seja de
acompanhamento de acordos de nível de serviços (ANS) e a própria gestão de serviços, foram
os desafios relacionados ao próprio cliente, no caso, a empresa pesquisada. Percebe-se assim,
também neste caso de estudo, que o processo de terceirização não é livre de problemas.
Os resultados também mostraram ações que vêm sendo tomadas pela empresa para
mitigar os riscos e enfrentar os desafios identificados. Entre elas, estão: o desenvolvimento
interno de controles e relatórios gerenciais do produto, benchmarking com outras empresas
que atuam com a mesma terceirizada neste processo, diálogo direto com a terceirizada para
solução das dificuldades, e a revisão periódica das condições do produto, do processo de
terceirização dos serviços, e do contrato com a terceirizada, para melhor controle e gestão.
Pela necessidade que empresas públicas percebem de terceirizar seus serviços de
tecnologia de informação e desenvolvimento de sistemas de apoio a seus produtos e serviços,
é importante identificar os desafios desta opção gerencial, para melhor se preparar a mitigação
de suas causas. Uma contribuição deste trabalho para a Engenharia de Produção, assim como
para ajudar a adaptar o processo de terceirização de serviços de T.I. às condições da esfera
pública brasileira, foi identificar elementos a contemplar em ANS que prevejam restrições e
punições para erros, atrasos e outros itens de baixa qualidade de serviço.
A técnica de coleta de dados via consulta documental foi adequada para esta pesquisa,
mas não é simples compreender, somente por documentos, todo o contexto do tema de estudo
(CUNHA et al., 2010). Assim, o prosseguimento da pesquisa, com uso de técnicas adicionais
de coleta de dados, como entrevistas e observação, é uma indicação para trabalhos futuros.
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Referências
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