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EDUCAÇÃO NUTRICIONAL E A PROMOÇÃO DA ALIMENTAÇÃO SAUDÁVEL NO CENÁRIO
ESCOLAR: REFLEXÕES A PARTIR DE UMA EXPERIÊNCIA NA PERSPECTIVA DA
EDUCAÇÃO POPULAR
ALIMENTAÇÃO SAUDÁVEL NO ÂMBITO ESCOLAR
HEALTHY EATING IN SCHOOLS
Luciana Maria Pereira de SOUSA1,
Paula Maryana Albuquerque da SILVA¹,
Aline da Silva ALVES¹,
Islany Costa ALENCAR¹,
Pedro José Santos Carneiro CRUZ2.
RESUMO
O Projeto Práticas Integrais da Nutrição na Atenção Básica em Saúde – PINAB -
consiste em uma atividade de extensão universitária vinculada ao Departamento de
Nutrição da Universidade Federal da Paraíba. O projeto atua na Unidade de Saúde da
Família - Vila Saúde e na Escola Municipal de Ensino Fundamental Augusto dos Anjos
(EMEFAA), ambos localizados na cidade de João Pessoa-PB, no bairro do Cristo
Redentor. O projeto é constituído por cinco grupos operativos, entre eles o grupo
Escola II, direcionado ao público adolescente, matriculados do 6º ao 9º ano do ensino
fundamental no turno da tarde, o qual realizou no período de setembro a dezembro de
2010 ações visando a promoção da Alimentação Saudável na escola. É importante
mencionar que o projeto possui a Educação Popular em Saúde como inspiração
teórica e metodológica essencial no delineamento e execução das iniciativas
empreendidas. Para essas atividades com os escolares, foram usadas, também,
metodologias de aprendizagem ativa, participativas e coletivas que contribuíram para
um maior envolvimento dos jovens na mobilização de reflexões, posturas e novas
1 Universidade Federal da Paraíba, Centro de Ciências da Saúde, Departamento de Nutrição. Cidade Universitária, 58059-900, João Pessoa, PB, Brasil.
22 Universidade Federal da Paraíba, Centro de Ciências Médicas, Departamento de Promoção da Saúde. Cidade Universitária, 58059-900, João Pessoa, PB, Brasil. (83) tel do DPS / (83) 8888-7859 pedrojosecruz@yahoo.com.br
1
dinâmicas comunitárias capazes de garantir a alimentação saudável como direito
humano e social.
PALAVRAS-CHAVES: Educação Alimentar e Nutricional; Alimentação no Contexto
Escolar; Promoção da Alimentação Saudável, Educação Popular em Saúde.
A B S T R A C T
The Project Integral Practice of Nutrition in Basic health Care - PINAB consists of a
practice of popular extension in health, tied to the Department of Nutrition of the
Federal University of Paraíba. The project operates in the Vila Saúde Family Health
Unit and in the Augusto dos Anjos school, both located in the neighborhood of Cristo
Redentor, in the city of João Pessoa-PB-Brasil. The project consists of five operating
groups, including the group School II, directed to the public teenagers who were
enrolled from 6 to 9 years of elementary school in the afternoon, at which place during
the period September to December 2010 actions to promotion of healthy eating in
school. Possessing the Popular Health Education key theoretical and methodological
inspiration in the design and implementation of initiatives undertaken. For these
activities were used active learning methodologies, participatory and collective
contributed to a greater involvement of youth in mobilizing ideas, new attitudes and
community dynamics can ensure healthy food as a human right and social.
KEY WORDS: Food and Nutrition Education, Food in the School Context, Promoting
Healthy Eating, Popular Education in Health.
INTRODUÇÃO
No âmbito da Estratégia Saúde da Família, a promoção da alimentação
saudável nas escolas, seja de ensino infantil, fundamental ou médio, constitui um dos
desafios singulares no contexto de ações de Promoção da Saúde e da Segurança
Alimentar e Nutricional (SAN)1.
A Prova disto têm sido a presença desta temática nos diversos programas,
estratégias e políticas públicas direcionadas ao cenário escolar, a partir do campo da
saúde.
2
Dentre elas, o Programa Saúde na Escola se destaca como iniciativa do
Governo Federal para buscar estratégias com finalidade de contribuir para a formação
integral dos estudantes da rede pública de educação básica por meio de ações de
prevenção, promoção e atenção à saúde. Suas ações são desenvolvidas em
conformidade com os princípios e diretrizes do Sistema Único de Saúde (SUS),
podendo compreender ações de promoção da alimentação saudável, entre outras,
como promoção da atividade física, ações de Promoção da Saúde e Prevenção de
doenças e agravos sobressaindo-se ainda a instituição de Políticas Nacionais,
Portarias e Regulamentações neste sentido, dentre as quais destacando-se a Portaria
nº 1010 de 30 de junho de 2005 dos Ministérios da Saúde e Educação que dispõe
sobre as diretrizes para a Promoção da Alimentação Saudável nas Escolas de
educação infantil, fundamental e nível médio das redes públicas e privadas, em
âmbito nacional 2.
Nessa direção, nos últimos anos a interação entre alimentação, saúde e escola
vem se configurando cada vez mais como objeto de debates e estudos no meio
acadêmico3, além de estratégias e propostas no âmbito das políticas públicas e de
iniciativas de movimentos sociais, especialmente nas áreas de educação, saúde e
segurança alimentar e nutricional3.
A escola é um ambiente propício para a aplicação de propostas de educação
em saúde, pois esta se insere em todas as dimensões escolares: ensino, relações lar
– escola – comunidade, bem como ambiente físico e emocional4.
Ora, o ambiente de ensino, ao articular de forma dinâmica estudantes,
familiares, professores e funcionários, podem proporcionar condições para
desenvolver atividades que reforcem a capacidade da escola de se transformar em um
local favorável à convivência saudável, ao desenvolvimento psico-afetivo, ao
aprendizado e ao trabalho de todos os envolvidos nesse processo podendo, como
conseqüência, constituir-se em um núcleo de promoção de saúde local5.
A partir do trabalho de educação em saúde no cotidiano escolar, desde o
ensino infantil, pode-se estimular o desenvolvimento de hábitos saudáveis, trazendo
melhor qualidade de vida, capacitando crianças e jovens para fazer escolhas corretas
sobre comportamentos que promovam a saúde do indivíduo, família e comunidade6.
Ademais, na perspectiva da Educação em Saúde, podem-se criar
oportunidades de trabalhar pedagogicamente a percepção cidadã de saúde e os
determinantes de uma saúde integral, na medida em que se apresenta e estimula os
estudantes a compreender saúde a partir de uma perspectiva ampliada, crítica e
problematizadora7.
3
O conceito de alimentação saudável é amplo. Conforme fundamentado por
Danelon et al.8 e estabelecido pela Política Nacional de Alimentação e Nutrição
(PNAN) do Ministério da Saúde (MS)9 e pela Portaria Interministerial do MS/Ministério
da Educação nº 1.0102, a alimentação saudável, abrange desde o aporte adequado
de nutrientes para promover o crescimento e desenvolvimento ideal, até os cuidados
de prevenção de alguns problemas mórbidos que aparecem na idade adulta cuja
etiologia e prognóstico podem estar relacionados, pelo menos em parte, à
alimentação e hábitos alimentares dos primeiros anos de vida da criança.
Esta alimentação adequada deve respeitar os padrões sociais, econômicos e
culturais da família e mesmo da região, além da competência digestiva, absortiva e
metabólica do indivíduo, levando em consideração as necessidades nutricionais de
cada idade9.
Para tanto, recomenda-se que a educação alimentar deve ser iniciada ainda
na infância, principalmente no espaço escolar, período no qual o hábito alimentar é
formado10. Visto que a escola desempenha importante função na formação do hábito
alimentar e que nesse ambiente as crianças e adolescentes permanecem por um
expressivo período de tempo, tal cenário pode ser considerado espaço privilegiado
para a intervenção na busca de um estilo de vida que tenha por objetivo uma boa
qualidade de vida presente e futura.
A perspectiva da Segurança Alimentar e Nutricional consiste na realização do
direito de todos ao acesso regular e permanente a alimentos de qualidade, em
quantidade suficiente, sem comprometer o acesso a outras necessidades essenciais,
tendo como base práticas alimentares promotoras de saúde, que respeitem a
diversidade cultural e que sejam ambiental, cultural, econômica e socialmente
sustentáveis11.
Este conceito se articula de forma intensa com o princípio do Direito Humano a
Alimentação Adequada e Saudável (DHAAS), o qual recomenda que a alimentação
adequada seja direito fundamental do ser humano, inerente à dignidade da pessoa
humana e indispensável à realização dos direitos consagrados na Constituição
Federal11.
O poder público deve adotar as políticas e ações que se façam necessárias
para promover e garantir a Segurança Alimentar e Nutricional da população. A adoção
dessas políticas e ações deverá levar em conta as dimensões ambientais, culturais,
econômicas, regionais e sociais. É dever do poder público respeitar, proteger,
promover, prover, informar, monitorar, fiscalizar e avaliar a realização do direito
humano à alimentação adequada, bem como garantir os mecanismos para sua
exigibilidade12.
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Diante destas perspectivas políticas e teóricas, as atuais políticas públicas para
a promoção da alimentação saudável no cenário escolar fundamentam-se, em sua
maioria, nas diretrizes da PNAN, na qual se afirma a garantia da qualidade dos
alimentos colocados para consumo no País, a promoção de práticas alimentares
saudáveis e a prevenção e o controle dos distúrbios nutricionais, bem como o
estímulo às ações intersetoriais que propiciem o acesso universal aos alimentos13.
Sua implementação tem ocorrido através de ações destinadas à prevenção de
doenças e promoção da saúde no cotidiano escolar. Essas atividades são
monitoradas pela Coordenação Geral de Alimentação e Nutrição (CGAN) do
Ministério da Saúde desde 2006, quando foram publicadas e instituídas as diretrizes
para a promoção da alimentação saudável em escolas públicas e privadas em âmbito
nacional, através da Portaria Interministerial do MS/Ministério da Educação nº 1.0102.
Dentre as diversas possibilidades para desenvolver iniciativas de promoção da
alimentação saudável no âmbito escolar, as experiências empreendidas a partir do
referencial da Educação Popular em Saúde vêm merecendo destaque por insistir em
dinâmicas pedagógicas com vertente crítica e aberta às experiências dos escolares,
além de serem caracterizadas pelo trabalho a partir de uma concepção ampliada de
saúde e alimentação9.
Desde 2007 atuando no campo da Estratégia Saúde da Família, o Projeto de
Extensão Popular “Práticas Integrais de Promoção da Saúde e Nutrição na Atenção
Básica em Saúde” (PINAB), vinculado ao Departamento de Nutrição da Universidade
Federal da Paraíba (UFPB), e atualmente ao Departamento de Promoção da Saúde
(UFPB), vem procurando desenvolver iniciativas de Educação Popular com ênfase na
Promoção da Saúde e da Segurança Alimentar e Nutricional em parceria a
comunidade da Escola Municipal de Ensino Fundamental Augusto dos Anjos
(EMEFAA), na cidade de João Pessoa-PB, envolvendo estudantes, professores,
merendeiras, diretores e demais funcionários. Neste período, o PINAB passou a
articular os sujeitos da Escola no desafio de incorporar o tema da alimentação
saudável de modo perene e estrutural no contexto escolar, com ações inspiradas no
arcabouço teórico-metodológico da Educação Popular em Saúde14.
Para tanto, o PINAB vem buscando mobilizar de forma participativa, criativa e
crítica os protagonistas da escola através de atividades educativas em salas de aula,
campanhas nas turmas, gincanas estudantis, além de formação permanente com os
professores e as merendeiras15.
Tais ações visam desenvolver bases para a promoção de práticas alimentares
saudáveis protagonizadas pelos próprios sujeitos da escola, através de propostas que
possibilitem o envolvimento dos setores de saúde, educação, família e comunidade15.
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Para tanto, o PINAB apresenta um grupo operativo, formado por estudantes de
nutrição sob orientação de docentes do Departamento de Nutrição e Departamento de
Promoção da Saúde, para interagir cotidianamente com a comunidade escolar na
construção coletiva destas ações.
No período entre agosto a dezembro de 2010, correspondente ao semestre
letivo 2010.2 da UFPB, cinco estudantes extensionistas envolveram-se no Grupo
Operativo da Escola no turno da tarde, com estudantes e professores do Ensino
Fundamental, com o objetivo de promover a participação de extensionistas,
professores e estudantes da Escola num espaço de construção com estímulo a
criatividade, onde ambos protagonizam a construção de conhecimentos para
promoção da saúde e da alimentação saudável. Nesse contexto, foi realizada uma
campanha de promoção a alimentação saudável, com ênfase participativa, visando
promover a formação em SAN e DHAAS de acordo com a realidade e o cotidiano
escolar.
CAMINHOS METODOLÓGICOS
O PINAB atua, sendo composto por estudantes do Curso de Graduação em
Nutrição do Centro de Ciências da Saúde da Universidade Federal da Paraíba, além
de dois docentes, os quais desenvolvem ações educativas com as comunidades de
Boa Esperança, Jardim Itabaiana, Pedra Branca, na Unidade de Saúde da Família
(USF) Vila Saúde e na Escola Municipal de Ensino Fundamental Augusto dos Anjos
(EMEFAA), localizados no bairro do Cristo Redentor, em João Pessoa – PB. O projeto
possui três frentes de atuação: 1) ações educativas com grupos operativos de:
gestantes, escolares (sendo um grupo no Ensino Infantil e outro no Ensino
Fundamental), beneficiários do Programa Bolsa Família, e integrantes de
organizações populares locais; 2) visitas domiciliares; 3) gestão compartilhada do
Projeto. Tais ações têm possibilitado um olhar crítico sobre a nutrição no cotidiano da
comunidade. Ademais, têm estimulado que os extensionistas construam caminhos
para uma atuação comprometida com a promoção da saúde.
Além das atividades coletivas, empreendidas por cada Grupo Operativo com
um publico especifico, os extensionistas realizam vivências nas comunidades através
de visitas domiciliares, onde os extensionistas divididos em duplas ou trios entram em
contato com famílias da comunidade, ocorrendo um compartilhar de saberes e
estratégias de construção do cuidado em saúde, bem como das formas de resistência
e luta popular. Dessa forma, há uma construção de vínculo com as famílias e os
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integrantes do projeto permitindo que se possa conhecer a realidade da comunidade,
respeitando-se seus saberes, iniciativas e formas de saber/pensas/agir.
Sob orientação do referencial teórico-metodológico da Educação Popular, as
atividades do PINAB são realizadas com ênfase na Promoção a Saúde e alimentação
saudável no eixo da Segurança Alimentar e Nutricional (SAN), do Direito Humano a
Alimentação Adequada e Saudável (DHAAS)11 e pela Portaria interministerial nº 10102,
que institui diretrizes para incorporar o tema da alimentação e nutrição no contexto
escolar.
A Educação Popular tem se desenvolvido no campo da saúde como uma
estratégia de superação do grande fosso cultural existente entre os serviços de saúde
e o saber dito científico, de um lado, e a dinâmica de adoecimento e cura do mundo
popular, de outro16. Trata-se de um princípio ético e metodológico que busca entender,
sistematizar e difundir a lógica, o conhecimento e os princípios que regem a
subjetividade dos vários atores envolvidos.
Conforme ressalta Vasconcelos17, tendo por base o diálogo, a Educação
Popular tem significado não como uma atividade a mais que se realiza nos cenários de
produção de saúde, educação, cultura ou assistência social, mas implica uma ação
que reorienta a globalidade das práticas ali executadas, contribuindo na superação do
autoritarismo e do desprezo pelas iniciativas dos grupos populares, bem como da
imposição de soluções técnicas restritas para problemas sociais de cunho complexo e
global. É um instrumento de construção da ação de saúde mais integral e mais
adequada à vida da população.
Baseado nisso, o traço fundamental da Educação Popular em Saúde está no
método: o fato de tomar, como ponto de partida do processo pedagógico, o saber
anterior das classes populares. Na saúde, isso significa considerar as experiências
das pessoas e dos movimentos sociais e organizações populares (em sua luta pela
saúde) nas comunidades de moradia, de trabalho, de gênero, de raça e etnia. Ponto
de partida que significa reconhecimento - palavra que tem o sentido de admitir outro
saber, tão válido, no âmbito do diálogo, quanto o saber técnico-científico17.
Para tanto, torna-se necessário o desenvolvimento de ações de educação em
saúde numa perspectiva dialógica, emancipatória, participativa, criativa e que
contribua para a autonomia do usuário (comunidade), no que diz respeito à sua
condição de sujeito de direitos e autor de sua trajetória de saúde e doença; e
autonomia dos profissionais diante da possibilidade de reinventar modos de cuidado
mais humanizados, compartilhados e integrais.
Durante o período de Agosto a Dezembro de 2010, as ações do PINAB no
Grupo Operativo da Escola - Ensino Fundamental foram empreendidas no turno da
7
tarde, de maneira quinzenal, às sextas-feiras, alternando as atividades do Grupo com
as visitas domiciliares. O trabalho deste Grupo envolveu 12 turmas do 6º ao 9º Ano do
Ensino Fundamental, perfazendo um total aproximado de 250 escolares.
Inicialmente, foram realizadas atividades educativas em sala de aula, em
diferentes formados, como por exemplo: jogo de perguntas e respostas, dinâmicas de
grupo com ênfase na interação dos educandos e construção da pirâmide alimentar
saudável. Tais ações tiveram como intuito formar um elo maior entre extensionistas e
estudante, para facilitar o desenrolar das atividades seguintes, além de tornar o
aprendizado mais dinâmico e interessante àquele grupo de jovens.
Nestes momentos, foram abordados temas de promoção a saúde e
alimentação saudável, os quais iriam ser trabalhados de modo mais profundo numa
atividade posterior, a Gincana de Promoção da Alimentação Saudável.
Na preparação desta Gincana, para qual escolhemos o tema da Semana
Mundial da Alimentação Saudável – Unidos Contra a Fome – para que pudéssemos
trabalhar com assuntos que oportunizam a interface com a Segurança Alimentar e
Nutricional e o Direito Humano a Alimentação Adequada e Saudável.
A gincana contou com a participação de todas as turmas (6º ao 9º ano) do
turno da tarde da EMEFAA, além da participação efetiva dos professores,
coordenação e direção da escola. Foram realizados desafios pelos estudantes,
referentes à criação de paródias, dramatização, quiz (jogo de perguntas e respostas),
envolvendo sempre temas relacionados a uma alimentação saudável e a questões
acerca do cuidado a saúde, bem como preparação de receita com aproveitamento
integral dos alimentos e organização de mesas de frutas diversificadas, de modo a
valorizar a cultura alimentar comunitária.
Como forma representativa para avaliar a participação dos grupos no
andamento das atividades da gincana, foi composta uma Comissão Avaliadora, com
representantes da USF Vila Saúde, da EMEFAA e do PINAB. A equipe vencedora, por
ter cumprido satisfatoriamente todos os desafios, recebeu um troféu com a logomarca
e o slogan da Gincana, os quais foram escolhidos através de um concurso com todos
os estudantes da escola no primeiro semestre de 2010, em atividade empreendida
pela Escola em parceria com o PINAB.
DISCUSSÃO
A cada contato que tivemos com a escola percebemos que o laço que unia os
extensionistas à gestão escolar, os estudantes e os professores da EMEFAA ficava
mais forte, através da atenção, do respeito e do diálogo existente com a direção e os
8
professores. Acreditamos que isto tenha sido possível por deixarmos a comunidade
escolar sempre ciente dos objetivos e planejamentos das atividades a serem
realizadas, valorizando a escuta e o acolhimento das suas sugestões, a partir da
construção mútua. Dessa forma, eles participavam efetivamente das atividades,
inclusive em sala de aula.
Escutar primeiro, antes de se preocupar em desenvolver ações de modo
unilateral e autoritário, constitui um princípio elementar da Extensão Popular, o qual
avaliamos desenvolver de maneira satisfatória nesta experiência17.
Em primeiro lugar, cumpre ressaltar que todas as iniciativas das extensionistas
não partiram de idéias solitárias de seus aparatos teóricos, mas a partir da vivência
cotidiana das mesmas nas visitas domiciliares e, principalmente, da participação do
PINAB, desde 2007, em ações com crianças e adolescentes em sala de aula. Tudo
isto corroborou para o estabelecimento de um vínculo com a comunidade escolar, no
qual o levantamento dos problemas a serem enfrentados naquela realidade é coletivo
e parte, sobretudo da percepção do conjunto dos atores diante dos problemas e
inquietações emergentes. Depois, as construções das ações originárias daquele
levantamento participativo decorrem também de maneira coletiva, através de
consultas aos sujeitos da escola, pactuação de agendas e indicação de tarefas a
cumprir e desafios a superar14.
Quanto aos estudantes, o nível de participação nas atividades era bem
diversificado. Em algumas turmas encontramos barreiras como a timidez, algo que era
muitas vezes solucionado através de conversas descontraídas, de um toque, uma
palavra, uma escuta, buscando sempre valorizar os seus saberes. Em outras turmas,
nos deparamos com a inquietação dos estudantes que muitas vezes dificultavam a
realização do que havíamos planejado com as conversas paralelas em algumas
situações, e desqualificação de nossas propostas em outras.
Assim, em experiências como estas, percebe-se em evidência o quanto as
significativas mudanças no desenvolvimento físico, emocional e psicológico dos
adolescentes repercutem fortemente em seu comportamento e trazem expectativas
novas relacionadas à necessidade de liberdade. Sendo assim, pudemos constatar
que, ao trabalhar com adolescentes no cenário escolar, deve-se manter postura e
análise cuidadosa para se considerar os saberes e fazeres desses jovens, permitindo
que eles confiem na própria capacidade de aprender e de atuar, valorizando os
saberes dos outros, o saber social e o conhecimento acumulado historicamente,
valorizando a própria identidade cultural e as diferentes culturas. Nesse sentido,
Educação popular é o saber que orienta nos difíceis caminhos, cheios de armadilhas,
da ação pedagógica voltada para a apuração do sentir/pensar/agir dos setores
9
subalternos para a construção de uma sociedade fundada na solidariedade, justiça e
participação de todos18.
Desse modo, tornou-se fundamental aprofundar a cada ação os conhecimentos
sobre modos de vida, saberes e fazeres dos adolescentes, em tempos e espaços
diversos e compartilhando seus conhecimentos em diferentes contextos. Esse
apanhado de objetivos pôde ser colocado em prática quando utilizamos as diferentes
linguagens – artística, corporal, verbal e escrita – como forma de interação com
diferentes tempos, lugares, pessoas e objetos das culturas, além disso, no incentivo à
sistematização e comunicação de suas próprias aprendizagens através de exposições,
mostras, esquetes e o que é percebido de interesse dos estudantes apresentarem.
Outra dificuldade encontrada foi o tímido envolvimento das famílias nas
atividades, devido às barreiras constituídas no cenário escolar tradicional, onde pais e
mães pouco se fazem presentes no cotidiano escolar19. Nossas tentativas enfrentaram
a pouca disponibilidade em horário diurno dos pais, para participarem de ações com
os estudantes na escola.
Considerando a valorização da família e a comunidade como espaços de
identidade e pertencimento, compreende-se a importância que a presença da família
no cotidiano escolar tem como pilar para a formação do individuo. Faz-se necessário
uma conscientização da escola e dos pais para que todos se sintam envolvidos neste
processo constante de educar e que construa conhecimentos sobre as necessidades
especiais de seus filhos, bem como desenvolva competências de gerenciamento do
conjunto dessas necessidades e potencialidades. Envolver os familiares na elaboração
da proposta pedagógica pode ser uma meta na qual a extensão universitária se
preocupa em desenvolver. Entretanto, observa-se que, até o momento, essas
discussões vêm sendo realizadas apenas timidamente dentro do âmbito da escola, por
mais que seu corpo técnico e diretivo insista em criar oportunidades para se aproximar
das famílias e da comunidade. Contudo, um obstáculo persistente é a falta de tempo
na escola para o delineamento de ações que extrapolem a sala de aula, e outro
desafio está na não procura dos pais em relação à vida escolar dos seus filhos, seu
direito a educação e as condições para que esta se dê em plenitude. Diante deste
contexto, os extensionistas devem ser cautelosos na busca dessa aproximação
buscando ouvir e interagir com a posição da escola, de forma que as ideias devem ser
propostas e discutidas com os atores da educação escolar na medida em que
caminhem juntos em busca da concretização mútua desse ideal.
Como potencialidades do trabalho desenvolvido, identificamos a mobilização
dos professores na participação das atividades e o envolvimento destes, na realização
das ações do projeto. A participação docente revela uma importância essencial, haja
10
vista a centralidade de seu papel enquanto ator que está vinculado de modo contínuo
no cotidiano escolar, o qual cria vínculos com os educandos e desenvolve saberes
singulares quanto aos anseios, particularidades e expectativas de cada um. Sendo
assim, avaliamos ser de difícil sustentação qualquer trabalho extensionista em escolas
que coloque no papel protagônico apenas os atores universitários. É fundamental que
os sujeitos da própria comunidade escolar tenham pela ação extensionista,
potencializada sua força criativa e pró-ativa diante dos problemas identificados na
realidade local. Neste sentido, envolver os professores em todas as etapas da
construção da proposta mostrou-se configurar estratégia importante para se atingir
repercussões mais estruturais a esta iniciativa20.
Não obstante, entendemos ter sido ainda frágil este envolvimento, na medida
em que a disponibilidade de tempo para planejamento em conjunto, por parte dos
professores era muito tímida. A realidade de trabalho dos professores de ensino
infantil, fundamental e médio ainda é dura no que diz respeito à estabilidade e
possibilidade de tempo suficiente para planejamento contínuo. Dentre tantas aulas a
“dar” e tantos vínculos empregatícios necessários a sua sustentação econômica,
pudemos notar ser difícil conseguir sua concentração e envolvimento profundo no
planejamento de dinâmicas e novas ações que resignifiquem o espaço de sala de aula
e enxerguem na escola um cenário para a promoção da saúde.
Outro ponto que merece destaque é a motivação dos escolares no decorrer
das ações empreendidas. Eles revelaram seus potenciais de olhar crítico e criativo
sobre a realidade vivenciada e protagonizaram a construção de conhecimentos para
promoção da saúde, diante do acesso que tiveram às informações sobre saúde e
alimentação saudável que foram compartilhadas em diálogos abertos.
Percebe-se que os educandos contêm histórias, ideais, pensamentos, críticas,
propostas e criatividades suficientes para se construir ações de educação em saúde
com base em suas realidades e cuja temática tenha uma interface direta com seu
cotidiano, atribuindo então um sentido singular para as ações, uma vez que remeterão
necessariamente ao estudante, sua família, sua comunidade e suas condições de
vida. A utilização da Educação Popular em Saúde ganhou sentido não apenas por ser
uma opção metodológica dos extensionistas, mas, sobretudo por consistir num
caminho significativo através do qual avaliamos conseguir não apenas dar a voz, mas
oportunizar o protagonismo e a criação de sentido por parte dos estudantes para as
ações de Promoção da Saúde empreendidas. Com a Educação Popular, alimentação
e saúde ganham contornos críticos, questionadores e complexos. Agregam sabores,
saberes, cores, cheiros e muitos outros elementos reveladores da riqueza presente no
mundo popular, os quais constituem dimensões bastante potenciais para a revelação
11
de um conceito de saúde ampliado, suficiente para a formação de cidadãos
conscientes da alimentação e da saúde como direito, com dignidade, respeito,
humanização e eqüidade.
A participação da USF-Vila Saúde na gincana consistiu de outro ponto em
destaque, o que se deu através de uma ACS e uma dentista, como juradas,
demonstrando a construção do elo entre a EMEFAA, os profissionais da USF Vila
Saúde e o PINAB. O envolvimento dos trabalhadores da USF nesta experiência
constituiu uma provocação do PINAB e ganha sentindo enquanto estímulo ao
estreitamento de laços, diálogos e parcerias entre o serviço de saúde e a escola. Nos
últimos anos, o Programa Saúde na Escola estimulou este debate, e vem sendo
tocado com compromisso pelos profissionais da USF junto à escola, mas se nota que
suas principais motivações são as metas a serem cumpridas pela gestão de saúde,
não o estabelecimento continuado de diálogo perenes com a escola. Através de ações
como a gincana e outras, o PINAB vem buscando fomentar o estabelecimento de
parcerias mais consistentes do serviço com a escola, o que tem significado um desafio
na medida em que as agendas de ambos os serviços são sempre assoberbadas e a
integração se demonstrar pouco viável pelo escasso tempo disponível para construção
pactuada de ações em conjunto.
Com as atividades, percebemos que as ações realizadas na escola facilitaram
a participação dos estudantes e professores e o diálogo com a gestão escolar em
espaços de construção, com estímulo a criatividade, onde ambos protagonizaram a
construção de conhecimentos para promoção da saúde. Os extensionistas também se
sentem enriquecidos com essas experiências nas quais o conhecimento científico
dialoga com o conhecimento popular promovendo um olhar mais amplo e
transformador.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O trabalho efetuado pelo Grupo Operativo Escola materializou a tarefa de
fomentar a campanha da alimentação saudável junto à comunidade, e dessa forma
consolidar a educação popular envolvendo professores e alunos. O grupo também
assumiu o compromisso de orientar e educar jovens dentro da perspectiva da
Educação Popular em Saúde, permitindo assim a criação de um diálogo junto à
comunidade com o intuito de promover o conhecimento e o despertar da consciência
sobre a promoção da saúde.
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Dispor-se nestas vivências é uma forma de permitir a expressão do potencial de
cada um de modo que seja priorizada a participação e a comunicação de forma
espontânea na construção de saberes.
REFERÊNCIAS
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