Post on 01-Dec-2015
UNIVERSIDADE DA REGIÃO DA CAMPANHA – URCAMP
CAMPUS DE SANT’ANA DO LIVRAMENTO
CURSO DE DIREITO
FRANCIELLE RIBEIRO ORNELAS
ALIENAÇÃO PARENTAL: FILHOS COMO INSTRUMENTOS DE VINGANÇA
Sant'Ana do Livramento
2012
FRANCIELLE RIBEIRO ORNELAS
ALIENAÇÃO PARENTAL: FILHOS COMO INSTRUMENTOS DE VINGANÇA
Monografia apresentada ao Curso de Direito
da Universidade da Região da Campanha –
URCAMP, Campus Universitário de Sant’ Ana
do Livramento, na área de Direito da Família,
como requisito parcial para a obtenção do
título de Bacharel em Direito.
Orientadora: Silvia Carolina Ribeiro Gougeón
Sant'Ana do Livramento
2012
FRANCIELLE RIBEIRO ORNELAS
ALIENAÇÃO PARENTAL: FILHOS COMO INSTRUMENTOS DE VINGANÇA
Monografia apresentada ao Curso de Direito da Universidade da Região da Campanha –
URCAMP, Campus Universitário de Sant’ Ana do Livramento, na área de Direito de Família,
como requisito parcial para a obtenção do título de Bacharel em Direito.
BANCA EXAMINADORA:
Prof. (a) ________________________________
De acordo: ______________________________.
Prof. (a) _________________________________
De acordo: ______________________________.
Prof. (a) _________________________________
De acordo: _______________________________.
___________________________________
Prof.ª Silvia Carolina Ribeiro Gougeón
Orientadora
Conceito: ..................................................
Sant’Ana do Livramento, ...... de ................. de 2012.
DEDICATÓRIA
Dedico este trabalho aos meus pais
Nilma e Jaime, com imenso carinho, pelo
exemplo de vida que me deram e pela grande
contribuição na formação do meu caráter.
A minha irmã Giselle, pelo apoio,
incentivo e amizade. Dedico ainda às crianças
e pais vítimas da alienação parental,
guerreiros diante dessa prática tão egoísta.
E de modo especial ao meu esposo,
Fabio Luís, a quem dedico esta conquista com
admiração e respeito, pelo amor e apoio
incondicional aos meus estudos. Família, esse
título não é meu, é nosso. Amo vocês.
AGRADECIMENTOS
AGRADEÇO primeiramente a Deus,
por ter me amparado nos momentos de
angústias e dificuldades e ter me guiado para
mais essa conquista.
Aos meus pais, pelo esforço,
dedicação e por terem me ajudado de todas as
formas que podiam.
À Professora Silvia, minha
orientadora, pela grande contribuição,
ajudando-me na construção deste trabalho.
À Dra. Caren Leticia, Juíza de
Direito, que prontamente se dispôs a
contribuir para este trabalho com sua
experiência como magistrada.
À colega Valquíria pelo auxílio e a
disposição em ajudar.
A todos que fizeram parte da minha
vida durante esta jornada e que, direta ou
indiretamente, colaboraram para realização
deste sonho.
Por fim, faço um agradecimento
especial ao meu esposo Fabio Luís, pela
paciência e apoio, se fazendo presente em
todos os momentos em que precisei.
A todos, meu singelo OBRIGADO.
A decisão de ter um filho é muito séria.
É decidir ter, para sempre, o coração fora do corpo.
E. Stone.
RESUMO
A relação entre pais e filhos deve prevalecer ainda que o relacionamento entre os
pais não esteja mais instituído na configuração de uma família, ou até mesmo que nunca tenha
se constituído. Entretanto, infelizmente, a dissolução da união afetiva entre os pais por vezes
acaba por ocasionar o surgimento de uma relação de ódio e rancor que ultrapassa a relação
entre eles, chegando a influenciar a relação deles para com os filhos menores. Nessa
conjuntura é que se apresenta o objeto de pesquisa deste estudo: a Alienação Parental.
Aborda-se no presente trabalho o conceito, formas de identificação e consequências desta
prática, bem como a Lei nº 12.318/2010, considerada um grande avanço acerca do tema, já
que visou resguardar em primeiro plano a dignidade e melhor interesse do menor. Objetivou-
se com o presente trabalho divulgar comportamentos característicos tanto do menor vítima
quanto do alienador, pois somente com essa identificação será possível tomar providências a
fim de evitar consequências futuras mais graves nos envolvidos. Procurou-se ainda destacar a
importância de um Poder Judiciário mais sensível a ponto de conseguir identificar em
disputas judiciais a alienação parental e ainda o quão relevante é o trabalho conjunto dos
profissionais da saúde mental e operadores do direito para o combate dessa prática. A opção
pelo tema se deve a grande incidência da alienação parental nas famílias brasileiras e da
necessidade de divulgação e esclarecimentos acerca do assunto visto que ainda hoje é pouco
abordado.
Palavras-chave:
Alienação Parental. Gardner. Guarda. Família.
ABSTRACT
Even though the relationship between parents is no longer established as a family
setting, the relation between parents and children should prevail, even if it has never been set.
However, unfortunately, sometimes the dissolution of affective relation between parents may
originate a relationship of hate and anger that goes beyond the relationship among them to a
point where it would influence their relationship with their children. At this juncture, this
study presents its objetive: Parental Alienation. It also discusses the concept, forms of
identification and consequences of this practice, as well the Law Nº 12.318/2010, considered
a major breakthrough on the topic since it has as a purpose to safeguard the dignity and the
best interest of the child in the foreground. The objective of this study is to disclose the
characteristic behaviors of both the victim and the alienating parent because only with this
identification that will be possible to take steps to avoid more serious consequences in the
future for those involved. The word has also attempted to highlight the importance of a
Judiciary more sensitive to be able to identify parental alienation in court disputes as well as
to demonstrate how relevant is collaborative work among health professionals and operators
of law on the fight of this practice. The choice of subject is due to the high incidence of
parental alienation in Brazilian families and the need for disclosure and clarification of this
matter since it is still a topic rarely studied.
Keywords:
Parental Alienation. Custody. Gardner. Family.
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO ...................................................................................................................... 08
1 A EVOLUÇÃO DA FAMÍLIA ............................................................................................ 10
1.1 CONCEITO DE FAMÍLIA ................................................................................................ 10
1.2 PRINCÍPIOS NORTEADORES DO DIREITO DE FAMÍLIA ......................................... 11
1.3 EVOLUÇÃO HISTÓRICA DO DIREITO DE FAMÍLIA ................................................. 13
1.4 A FAMÍLIA NO CÓDIGO CIVIL E NA CONSTITUIÇÃO FEDERAL .......................... 14
1.5 PODER FAMILIAR E SUAS DIFERENÇAS ENTRE O PÁTRIO PODER E
AUTORIDADE PARENTAL ................................................................................................... 15
2 A DISSOLUÇÃO DA UNIÃO EFETIVA E A DISPUTA PELA GUARDA DOS
FILHOS ................................................................................................................................... 20
2.1 GUARDA: CONCEITO E MODALIDADES ................................................................... 21
2.1.1 Guarda Comum ............................................................................................................. 22
2.1.2 Guarda Unilateral ......................................................................................................... 22
2.1.3 Guarda Compartilhada ................................................................................................. 23
2.1.4 Guarda Alternada ou Conjunta ................................................................................... 24
2.2 A PROTEÇÃO DO INTERESSE DO MENOR NAS DISPUTAS POR GUARDA ......... 24
2.3 O DIREITO À CONVIVÊNCIA DO NÃO GUARDIÃO ................................................. 25
3 ALIENAÇÃO PARENTAL ................................................................................................ 28
3.1 CONCEITO ........................................................................................................................ 28
3.2 HISTÓRICO ....................................................................................................................... 30
3.3 DIFERENÇA DE SÍNDROME DE ALIENAÇÃO PARENTAL (SAP) E ALIENAÇÃO
PARENTAL .............................................................................................................................. 32
3.4 IDENTIFICAÇÃO DA ALIENAÇÃO PARENTAL ......................................................... 33
3.5 CONSEQUÊNCIAS DA ALIENAÇÃO PARENTAL ....................................................... 37
3.6 IMPLANTAÇÃO DE FALSAS MEMÓRIAS ................................................................... 40
3.7 FALSA DENÚNCIA DE ABUSO SEXUAL ..................................................................... 42
4 ALIENAÇÃO PARENTAL E O PODER JUDICIÁRIO ................................................. 46
4.1 COMENTÁRIOS À LEI 12.318/2010 ............................................................................... 46
4.2 O PAPEL DA PSICOLOGIA FORENSE NO TRATAMENTO DA SÍNDROME DA
ALIENAÇÃO PARENTAL ...................................................................................................... 49
4.3 JURISPRUDÊNCIAS E RELATOS DE CASOS .............................................................. 50
4.4 MOVIMENTOS NO COMBATE A ALIENAÇÃO PARENTAL ..................................... 54
4.4.1 Pais Para Sempre ........................................................................................................... 54
4.4.2 Associação de Pais e Mães Separados (APASE) ......................................................... 55
4.4.3 Pais por Justiça .............................................................................................................. 56
4.4.4 S.O.S. Papai e Mamãe ................................................................................................... 56
4.4.5 Pai Legal ......................................................................................................................... 56
CONCLUSÃO ......................................................................................................................... 58
OBRAS CONSULTADAS ...................................................................................................... 60
APÊNDICE ............................................................................................................................. 62
8
INTRODUÇÃO
A prática de Alienação Parental sempre esteve presente nos conflitos familiares,
principalmente no que diz respeito ao término da relação entre pais e disputas pela guarda dos
filhos menores; contudo, não haviam sido realizadas pesquisas aprofundadas que
identificassem esse fenômeno e suas graves consequências.
O primeiro estudo acerca do tema foi realizado por Richard Gardner, psiquiatra
norte-americano, em 1985. A partir daí outros estudos surgiram, entre eles o de François
Podevyn que, baseado em Gardner, difundiu a Alienação Parental pela Europa. Contudo,
trata-se ainda de assunto novo para o Direito de Família brasileiro.
A Alienação Parental é uma realidade e é imprescindível que o Direito em sua
condição dinâmica acompanhe as mudanças sociais e os novos fenômenos.
Por tudo isso, aborda-se neste estudo a problemática da Alienação Parental,
esclarecendo seus aspectos.
O primeiro capítulo analisará a evolução do Direito de Família e seus princípios
norteadores, trazendo a perceptível valorização da afetividade nas relações; trará ainda
observações sobre o poder familiar diferenciando-o do que anteriormente denominava-se
“pátrio poder”.
Posteriormente, no segundo capítulo, será abordada a origem da alienação parental: a
dissolução da união afetiva e as disputas pela guarda dos filhos menores, ressaltando o
princípio do melhor interesse do menor e o direito deste em ter por perto ambos os genitores.
Depois de elucidadas questões necessárias ao melhor entendimento do tema, o estudo
passará à análise da Alienação Parental e da síndrome que dela deriva, trazendo seu conceito,
histórico, consequências e considerações a respeito da implantação de falsas memórias e
falsas denúncias de abuso sexual.
Alienação Parental é a desmoralização de um dos genitores perante a criança e, por
suas graves consequências, a prática foi objeto da Lei nº 12.318, de 2010. Sobre a referida lei
discorrerá o último capítulo desta monografia, analisando ainda os reflexos da forma de
enfrentamento das questões pelo Poder Judiciário nas decisões sobre o tema.
A construção do trabalho se deu por meio de pesquisas bibliográficas com auxílio de
artigos e sites especializados no tema.
9
Deixa-se claro que não se pretende com esse estudo o exaurimento do tema, ao
contrário, deseja-se que novas portas se abram para novas pesquisas e que ainda mais pessoas
busquem conhecimento sobre o assunto, dessa forma a utilização de crianças como
instrumentos de vingança será comportamento inaceitável na sociedade e no Poder Judiciário.
10
1 A EVOLUÇÃO DA FAMÍLIA
1.1 CONCEITO DE FAMÍLIA
Possivelmente o conceito de família seja um dos mais complexos e abrangentes do
campo do Direito. Isto se deve às constantes ampliações do termo decorrente das mudanças
sociais.
Já se sabe que a família compõe a base do Estado, o núcleo fundamental da
organização social; além disso, é considerada como instituição sagrada e indispensável. Por
tudo isso merece a mais abrangente proteção do Estado.
No entanto, a nossa legislação pátria não apresenta definição clara, apesar de
estabelecer sua estrutura. Mesmo dentro da própria seara do Direito, este conceito varia
conforme o ramo. Dessa forma, a definição de família não é a mesma para o direito tributário
e penal, por exemplo.
A autora Maria Helena Diniz definiu o vocábulo família explorando três sentidos:
No sentido amplíssimo o termo abrange todos os indivíduos que estiverem ligados
pelo vínculo da consanguinidade ou da afinidade. Na acepção “lata”, além dos
cônjuges ou companheiros, e de seus filhos, abrange os parentes da linha reta ou
colateral, bem como os afins. Na significação restrita é a família o conjunto de
pessoas unidas pelos laços do matrimonio e da filiação, ou seja, unicamente os
cônjuges e a prole.1
Em geral, a legislação se refere à família de forma mais restrita, formada por pessoas
unidas por uma relação conjugal ou de parentesco, mas abarca, ainda, em diferentes aspectos
os três sentidos apontados pela a autora. Assim, importante destacar a família também sobre
um conceito mais abrangente, sendo formada por indivíduos ligados por um liame jurídico de
essência familiar, compreendendo os ascendentes, descendentes e os colaterais do cônjuge, ou
seja, os chamados parentes por afinidade.
É importante ainda trazer o sentido sociológico de família, aludindo ao conjunto de
pessoas que vivem sob um mesmo teto, sujeitos a autoridade de um titular.
Ainda sobre a definição de família, Maria Berenice Dias aborda o termo de forma
atual e preceitua que a definição do vocábulo família está baseada na afetividade entre seus
componentes e não mais apenas nos laços consanguíneos.
1 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro, 5° volume: direito de família, 20. ed. São Paulo,
Saraiva, 2005, p. 9 e 10.
11
O atual conceito de família prioriza o laço de afetividade que une seus membros, o
que ensejou também a reformulação do conceito de filiação que se desprendeu da
verdade biológica e passou a valorar muito mais a realidade afetiva. Apesar da
omissão do legislador o Judiciário vem se mostrando sensível a essas mudanças. O
compromisso de fazer justiça tem levado a uma percepção mais atenta das relações
de família. As uniões de pessoas do mesmo sexo vêm sendo reconhecidas como
uniões estáveis. Passou-se a prestigiar a paternidade afetiva como elemento.2
Não paira dúvidas que a compreensão e abrangência de família se alteraram no curso
de tempo, daí a flutuação de seu conceito. A própria Maria Berenice Dias, afirma neste
sentido que
[...] a constitucionalização das relações familiares – outro vértice da nova ordem
jurídica – também ocasionou mudanças na própria estrutura da sociedade. Mudou
significativamente o conceito de família, afastando injustificáveis diferenciações e
discriminações, que não mais combinavam com uma sociedade que se quer
democrática, moderna e livre. O alargamento conceitual das relações
interpessoais acabou deitando reflexos na própria conformação da família, que
não possui mais um significado singular. A mudança da sociedade e a evolução
dos costumes levaram a uma verdadeira reconfiguração, quer da
conjugalidade, quer da parentalidade. Assim, expressões como “ilegítima”,
“espúria”, “adulterina”, “informal”, “impura” estão banidas do vocabulário jurídico.
Não podem ser utilizadas na esfera da juridicidade, tanto com referência às relações
afetivas, como no tocante aos vínculos de parentesco. Quer o conceito de família,
quer o reconhecimento dos filhos não mais admitem qualquer adjetivação.3 [grifei].
1.2 PRINCÍPIOS NORTEADORES DO DIREITO DE FAMÍLIA
A família é a instituição imperativa para o desenvolvimento da sociedade, por isso
possui ampla proteção do Estado, daí seus principais aspectos serem regulados à luz da
Constituição Federal. A família passou então a ser tratada como matéria constitucional, o que
ocasionou a origem de inúmeros princípios familiares. O art. 226 da nossa Carta Magna assim
preceitua:
Art. 226 - A família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado.4
§ 1º - O casamento é civil e gratuita a celebração.
§ 2º - O casamento religioso tem efeito civil, nos termos da lei.
§ 3º - Para efeito da proteção do Estado, é reconhecida a união estável entre o
homem e a mulher como entidade familiar, devendo a lei facilitar sua conversão em
casamento.
2 DIAS, Maria Berenice. Família normal? Disponível em: <http://www.ibdfam.org.br/?artigos&artigo=371>.
Acesso em: 27 fev. 2012. 3 Idem. Disponível em: <http://www.mariaberenice.com.br/uploads/4_-_novos_tempos_-_novos_termos.pdf>.
Acesso em: 27 fev. 2012. 4 VADE MECUM .Obra coletiva de autoria da Editora Saraiva com a colaboração de Antonio Luiz de Toledo
Pinto, Marcia Cristina Vaz dos Santos Windt e Livia Céspedes – 9. ed. atual. e ampl. – São Paulo: Saraiva,
2010, p. 72.
12
§ 4º - Entende-se, também, como entidade familiar a comunidade formada por
qualquer dos pais e seus descendentes.
§ 5º - Os direitos e deveres referentes à sociedade conjugal são exercidos igualmente
pelo homem e pela mulher.
§ 6º O casamento civil pode ser dissolvido pelo divórcio. (Redação dada Pela
Emenda Constitucional nº 66, de 2010)
§ 7º - Fundado nos princípios da dignidade da pessoa humana e da paternidade
responsável, o planejamento familiar é livre decisão do casal, competindo ao Estado
propiciar recursos educacionais e científicos para o exercício desse direito, vedada
qualquer forma coercitiva por parte de instituições oficiais ou privadas.
§ 8º - O Estado assegurará a assistência à família na pessoa de cada um dos que a
integram, criando mecanismos para coibir a violência no âmbito de suas relações.
Os princípios que norteiam o Direito de Família são inúmeros, ficando a critério de
cada doutrinador trazer os que julgarem mais importantes à ciência do Direito.
Veremos a seguir a visão de Carlos Alberto Gonçalves5 acerca dos princípios de
maior visibilidade:
a) Princípio do respeito à dignidade da pessoa humana: este princípio compõe a
base do Estado e também da comunidade familiar, é ainda garantidor máximo
dos direitos humanos. Sem dúvida é o princípio de maior relevância, ainda que
não se possa falar em hierarquia entre eles. Segundo o autor, trata-se então do
princípio mantenedor do pleno desenvolvimento e realização de todos os
membros da família, em especial da criança e do adolescente.
b) Princípio da igualdade jurídica dos cônjuges e companheiros: está previsto
no § 5º do art. 226 da nossa Carta Magna. Pertinente dizer que a referida
regulamentação põe fim ao poder marital e ao sistema de repressão da mulher,
que antes era restrita as tarefas domésticas e à criação dos filhos. Assim, o dever
do marido de prover o sustento e manutenção da família passa a ser também
dever da mulher, sendo respeitadas as possibilidades de cada um.
c) Princípio da igualdade jurídica de todos os filhos: consubstanciado no art.
227, § 6° da Constituição Federal, o referido dispositivo estabelece de forma
incondicional e irrestrita igualdade entre todos os filhos, não admitindo mais a
ultrapassada diferença entre a filiação legítima e ilegítima tão pouco a situação
dos pais, se casados ou não. Assim, o princípio ora em questão passa a não
admitir diferença entre filhos naturais, adotivos e ilegítimos e proíbe atitudes de
discriminação para com estes.
5 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro, volume VI: Direito de Família. 7. ed. São Paulo:
Saraiva, 2010, p. 21-25.
13
d) Princípio da paternidade responsável e planejamento familiar: firmando-se
no art. 226, § 7°, da CF, este princípio dispõe sobre a liberdade do casal quanto
ao planejamento familiar, fundando-se nos princípios da dignidade humana e da
paternidade responsável.
d) Princípio da comunhão plena de vida: com base no art. 1.511 do Código Civil,
trata-se do aspecto espiritual do casamento e do companheirismo que nele deve
existir. Baseia-se na afeição entre os cônjuges ou conviventes. O dispositivo em
apreço demonstra a intenção do legislador em torná-lo mais humano. Resta
então priorizada a família baseada nos laços de afetividade.
e) Princípio da liberdade de constituir uma comunhão de vida familiar: este
princípio está correlacionado ao princípio da livre decisão do casal no
planejamento familiar, seja no casamento ou união estável o Estado não deve
interferir ou impor qualquer condição à formação familiar, sendo esta livre para
administrar seu patrimônio, optar pelo regime de bens mais apropriado e a livre
conduta. Tal princípio está supramencionado no art. 1.513 do Código Civil e
ainda § 7° do art. 226 da Constituição Federal.
Conforme demonstrado com os princípios acima explanados, é notório que os novos
horizontes do Direito de Família conduzem a prevalência da afetividade sobre os meios
unicamente formais e, com isso, a família socioafetiva conquista cada vez mais o apoio de
doutrinadores e magistrados.
1.3 A EVOLUÇÃO HISTÓRICA DO DIREITO DE FAMÍLIA
A família é considerada a instituição social mais antiga do ser humano. Existem
registros da história que o homem se relacionava a partir de um grupo formado por pessoas
ligadas por um ancestral em comum.
O princípio da autoridade, pater familias6, era o organizador máximo da família no
direito romano. O pai exercia a sua autoridade sob seus descendentes, sob sua esposa e demais
mulheres da família. Desse modo, podia determinar castigos e até mesmo tirar-lhes a vida.
A austeridade foi abrandada com o decurso do tempo à medida que os romanos
tomaram conhecimento do casamento sine manu deixando para trás a prática de casamento
cum manum.
6 Pater familias era o mais elevado estatuto familiar na Roma Antiga, sempre uma posição masculina. O termo
é Latim e significa, literalmente, “pai da família”.
14
Por meio do casamento cum manum, a mulher era transferida da autoridade do pai
para a autoridade do marido. Nessa espécie, a mulher não tinha qualquer direito sobre seus
bens nem mesmo sobre sua vida. Este tipo de casamento passou a não ser mais utilizado antes
mesmo do fim da República. A partir daí deu-se lugar ao casamento sob a forma sine manu,
em que a mulher continuava sujeita à tutela de seu pai e poderia fazer uso de seus bens e
herança.
Como se vê, a família romana foi evoluindo e encurtando a autoridade do pai. Com
isso, houve considerável aumento da autonomia da mulher e dos filhos.
Entendiam os romanos que a afeição era necessária não só no momento da
celebração do casamento; esta deveria perdurar no decorrer da união, para eles o fim da
afeição constituía motivo para o divórcio. Por outro lado, os canonistas eram contra a
dissolução da união, pois para eles o casamento era um sacramento e por tal motivo somente
Deus podia dissolvê-lo.
O direito canônico foi de grande influencia na Idade Média, pois as relações
familiares regiam-se por ele, sendo o casamento religioso o único conhecido.
Para Carlos Alberto Gonçalves, a família brasileira foi consideravelmente
influenciada, vejamos:
Podemos dizer que a família brasileira, como hoje é conceituada, sofreu influência
da família romana, da família canônica e da família germânica. É notório que o
nosso direito de família foi fortemente influenciado pelo direito canônico, como
consequência principalmente da colonização lusa. As Ordenações Filipinas foram a
principal fonte e traziam a forte influencia do aludido direito, que atingiu o direito
pátrio. 7
Tudo quanto foi dito demonstra que a evolução da família teve por base a
consanguinidade de seus membros, apesar de ser um modelo familiar ainda existente, nos dias
atuais a família socioafetiva é uma realidade da qual a doutrina e jurisprudência buscam se
aproximar.
1.4 A FAMÍLIA NO CÓDIGO CIVIL E NA CONSTITUIÇÃO FEDERAL
O Código Civil de 1916 regulava a família constituída exclusivamente pelo
casamento, hierarquizada e de modelo patriarcal. Com a evolução do instituto, identificaram-
se novos elementos que compõem as relações familiares, destacando os vínculos afetivos.
7 Ibidem, p. 32.
15
De acordo com Rodrigo da Cunha e Maria Berenice Dias, citado por Carlos Roberto
Gonçalves, “[...] a Constituição Federal absorveu essa transformação e adotou uma nova
ordem de valores, privilegiando a dignidade da pessoa humana realizando verdadeira
revolução no Direito de Família.” 8
O art. 226 da CF assegura que “a entidade familiar é plural e não mais singular,
podendo ter várias formas de constituição”.
O advento da Constituição de 1988 com as inovações decorrentes das mudanças
sociais levaram à redação e aprovação do Código Civil de 2002. O novo Código ampliou o
conceito de família com a regulamentação da união estável e reafirmou a igualdade entre os
filhos, além de ter introduzido uma nova concepção ao instituto da adoção.
Em suma, as alterações do Direito de Família sucedidas da Constituição Federal de
1988 e do Código Civil de 2002 destacam a função social do instituto familiar, principalmente
a partir da proclamação da igualdade dos cônjuges e dos filhos, da disciplina referente à
guarda, dentre outras muitas alterações.
1.5 PODER FAMILIAR E DIFERENÇAS ENTRE PÁTRIO PODER E AUTORIDADE
PARENTAL
Baseado no progresso do que anteriormente se via no chamado pátrio poder, que
consistia no poder autoritário exercido pela figura masculina sobre a família, surgiu à
necessidade do Estado em regular a relação existente entre pais e filhos. Esta evolução levou
o legislador a adotar o termo poder familiar. Assim, temos que poder familiar é o antigo
pátrio poder, que por atualmente ser exercido por ambos os genitores, passou a se chamar
poder familiar.
Como bem pontua Silvio Rodrigues poder familiar é “o conjunto de direitos e
deveres atribuídos aos pais, em relação à pessoa e aos bens dos filhos não emancipados, tendo
em vista a proteção destes”.9
A respeito da nomenclatura poder familiar, Paulo Luiz Netto Lôbo defende que:
A denominação ainda não é a mais adequada, porque mantém a ênfase no poder.
Todavia, é melhor que a resistente expressão “pátrio poder”, mantida pelo Estatuto
da Criança e adolescente [...] Não faz sentido que seja reconstruído o instituto
8 Ibidem, p. 33
9 RODRIGUES, Silvio. Direito Civil. v. 6, 28 ed. São Paulo: Saraiva, 2004, p. 356.
16
apenas deslocando o poder do pai (pátrio) para o “poder” compartilhado dos pais
(familiar), pois a mudança foi muito mais intensa, na medida em que o interesse dos
pais está condicionado ao interesse do filho, ou melhor, no interesse de sua
realização como pessoa em formação.10
Ainda em relação às denominações, autoridade parental é a terminologia que
conquistou a simpatia do meio doutrinário, pois melhor demonstra a evolução do instituto
familiar.
Nesse contexto observa Paulo Luiz Netto Lôbo:
Com efeito, parece-me que o conceito de autoridade, nas relações privadas, traduz
melhor o exercício de função ou de múnus, em espaço delimitado, fundado na
legitimidade e no interesse do outro. “Parental” destaca melhor a relação de
parentesco por excelência que há entre pais e filhos, o grupo familiar, de onde deve
ser haurida a legitimidade que fundamenta a autoridade. O termo "paternal" sofreria
a mesma inadequação do termo tradicional.11
Atualmente, não há nomenclatura mais adequada que autoridade parental, pois esta
reflete de forma clara a ideia da função que deve ser exercida pelos pais retirando a ideia do
poder.
Embora o debate acerca da terminologia seja importante, já que demonstra o
constante progresso do Direito, nos prenderemos, para a continuidade do tema, ao termo
adotado pelo Código Civil, qual seja poder familiar.
O Código Civil confere o seguinte tratamento no que concerne ao poder familiar.
Art. 1.634. Compete aos pais, quanto à pessoa dos filhos menores:
I - dirigir-lhes a criação e educação;
II - tê-los em sua companhia e guarda;
III - conceder-lhes ou negar-lhes consentimento para casarem;
IV - nomear-lhes tutor por testamento ou documento autêntico, se o outro dos pais
não lhe sobreviver, ou o sobrevivo não puder exercer o poder familiar;
V - representá-los, até aos dezesseis anos, nos atos da vida civil, e assisti-los, após
essa idade, nos atos em que forem partes, suprindo-lhes o consentimento;
VI - reclamá-los de quem ilegalmente os detenha;
VII - exigir que lhes prestem obediência, respeito e os serviços próprios de sua idade
e condição.12
O exercício do poder familiar cabe a ambos os pais, na falta ou impedimento de um
deles, o outro o exercerá de forma exclusiva, como acontece, por exemplo, na família
10
LÔBO, Paulo Luiz Netto. Do Poder Familiar. Disponível em: <http://jus.com.br/revista/texto/8371/do-
poder-familiar>. Acesso em: 03 abr. 2012. 11
Ibidem. 12
VADE MECUM. Obra coletiva de autoria da Editora Saraiva com a colaboração de Antonio Luiz de Toledo
Pinto, Marcia Cristina Vaz dos Santos Windi e Livia Céspedes – 9 ed. atual e ampl. – São Paulo: Saraiva.
2010.
17
monoparental13
ao passo que todos os filhos, enquanto menores, estão sujeitos ao poder
familiar, não havendo distinção entre legítimos e ilegítimos por ordem constitucional.
O poder familiar possui determinadas características. É irrenunciável, não podendo
os pais abdicar por se tratar de um dever/função. É inalienável, pois não pode ser transferido a
outras pessoas. Imprescritível, já que os genitores não o perdem pelo fato de não exercê-lo,
somente podem perdê-lo nos casos previstos em lei. E por fim, guarda ainda a natureza de
relação de autoridade, por haver entre pais e filhos o vínculo de subordinação.
O poder familiar deve ser exercido pautado no principio do melhor interesse do
menor, o Estado pode, quando achar necessário, intervir nesta relação. O Código Civil elenca
as hipóteses em que o titular do poder familiar deve ser retirado de seu exercício, podendo ser
de forma temporária ou permanente. A suspensão ou perda do poder familiar é a medida
tomada com finalidade de proteger o menor do comportamento irregular de um genitor ou de
ambos.
A respeito da suspensão do poder familiar o art. 1.637 do Código Civil, dispõe:
Art. 1.637. Se o pai, ou a mãe, abusar de sua autoridade, faltando aos deveres a eles
inerentes ou arruinando os bens dos filhos, cabe ao juiz, requerendo algum parente,
ou o Ministério Público, adotar a medida que lhe pareça reclamada pela segurança
do menor e seus haveres, até suspendendo o poder familiar, quando convenha.
Parágrafo único. Suspende-se igualmente o exercício do poder familiar ao pai ou à
mãe condenados por sentença irrecorrível, em virtude de crime cuja pena exceda a
dois anos de prisão. 14
Ainda neste sentido pontua Maria Helena Diniz:
[...] Na suspensão, o exercício do poder familiar é privado, por tempo determinado,
de todos os seus atributos ou somente de parte deles, referindo-se a um dos filhos ou
a alguns. Por ex., poderá o juiz privar o pai da administração do patrimônio do filho,
se lhe está ruindo os bens, restaurando-se-os com a expiração do prazo.15
Quando cessada a causa que originou a suspensão do poder familiar, ou quando
terminado o prazo determinado pelo juiz para a suspensão deste, os pais voltarão a exercê-lo
normalmente.
É importante ressaltar que a suspensão do poder familiar é faculdade do juiz,
podendo este aplicar ou não, baseado no caso concreto. É possível ainda que a medida seja
13
Configuração familiar formada por apenas um dos pais e seus descendentes. 14
Ibidem, p. 279 15
Ibidem, p.523.
18
aplicada concomitantemente a ambos os pais ou individualmente, bem como para a proteção
de todos os filhos ou apenas um deles.
Assim, é nítido que se trata de uma sanção que objetiva a preservação dos interesses
do menor, afastando-o de qualquer influência ruim por parte de qualquer dos genitores.
Já em relação à perda do poder familiar, trata-se de uma sanção mais grave,
decorrente da prática de qualquer das condutas tipificadas no art. 1.638 do Código Civil.
Art. 1.638. Perderá por ato judicial o poder familiar o pai ou a mãe que:
I - castigar imoderadamente o filho;
II - deixar o filho em abandono;
III - praticar atos contrários à moral e aos bons costumes;
IV - incidir, reiteradamente, nas faltas previstas no artigo antecedente.16
Na hipótese de perda, resta evidenciada a incapacidade do genitor de exercer os
poderes-deveres decorrentes do exercício do poder familiar. Diferentemente da suspensão, a
perda possui caráter permanente.
Cumpre recordar que o principal objetivo decorrente do exercício do poder familiar é
a proteção à pessoa do menor; portanto, nos casos de perda cabe ao Estado continuar a
promover esta proteção por meio da nomeação de tutores.
E finalmente, quanto à extinção do poder familiar, o art. 1635 defini seus motivos
causadores.
Art. 1.635. Extingue-se o poder familiar:
I - pela morte dos pais ou do filho;
II - pela emancipação, nos termos do art. 5o, parágrafo único;
III - pela maioridade;
IV - pela adoção; V - por decisão judicial, na forma do artigo 1.638.
No entendimento de Silvio Rodrigues, a extinção do poder familiar ocorre por fatos
naturais, de pleno direito, ou por decisão judicial.17
A extinção por fatos naturais diz respeito à ação direta da natureza, ou seja, a morte
dos pais ou filhos ou quando estes alcançarem a maioridade.
Também extinguirá o poder familiar o decurso de tempo já que ao atingir a
maioridade o filho adquire capacidade plena para os atos da vida civil.
O poder familiar também cessará pela emancipação ou adoção. Na primeira situação
os filhos adquirem antecipadamente capacidade plena para o exercício dos atos da vida civil,
16
Ibidem, p. 278. 17
Ibidem, p.368-369.
19
já na segunda situação, o poder familiar não terá de fato fim, e sim, sua titularidade
transferida, por decisão judicial, dos pais biológicos para os novos pais.
20
2 A DISSOLUÇÃO DA UNIÃO AFETIVA E A DISPUTA PELA GUARDA DOS
FILHOS
A relação conjugal, seja ela fundada no casamento ou na união estável, tem suas
bases na afetividade. No entanto, quando chega ao fim, esta é rodeada de conflitos, sendo os
mais preocupantes aqueles relacionados aos filhos.
Por meio do Direito Sucessório e o Direito de Família, o legislador regulou os
reflexos da dissolução da união, este último tratando notoriamente do efeito pessoal,
especialmente quanto à pessoa dos filhos.
O fim da relação, se não assimilado de modo coerente, pode alcançar a base familiar
gerando graves consequências para os envolvidos, em especial aos menores e adolescentes
que estão em importante fase de formação.
Por vezes, a ruptura da união afetiva motiva sentimento de rejeição, acalorando uma
disposição vingativa. A dificuldade de elaborar de forma sensata esta situação poderá levar a
um processo de desmoralização e destruição da imagem do ex-cônjuge ou companheiro
perante aos filhos.
Nesse aspecto cabe destacar que a falta de dialogo e as discussões constantes entre os
genitores é mais prejudicial que a própria separação, pois pode gerar uma desestabilização
emocional dos menores, vez que estes passam a ter como parâmetro a família que acabara de
se dissolver e podem levar por longos anos os reflexos dessa fase sofrida.
A forma como se dá a ruptura da união dos pais poderá ser acontecimento traumático
para os menores. No entanto, isto pouco será evidenciado caso haja consonância e bom senso
dos genitores, principalmente se houver por parte de ambos a consciência de que o bem estar
do menor deve permanecer em primeiro plano.
Dentre as questões que norteiam a separação do casal, a guarda dos filhos
possivelmente seja a mais delicada, uma vez que antes da dissolução da união, esta pertence
de maneira implícita a ambos os genitores.
Neste sentido, defende Fabio Vieira Figueiredo e Georgios Alexandridis:
[...] devemos analisar a questão da guarda do menor e do direito convivencial
estabelecido em razão da ruptura da família. É necessário que a guarda seja
estabelecida de maneira a resguardar tanto quanto se possa as vertentes do
desenvolvimento da personalidade dos filhos, de modo que sejam salvaguardados
seus direitos fundamentais, humanos e de personalidade.18
18
FIGUEIREDO, Fábio Vieira; ALEXANDRIDIS, Georgios. Alienação Parental. São Paulo: Saraiva, 2011, p.
38.
21
Não há dúvidas de que, em relação à guarda dos filhos menores, o ideal seria que os
próprios pais acordassem sobre tal assunto, definindo de forma consensual com quem o
menor ficará após a dissolução da união, afinal os pais são os guardiões maiores do bem estar
dos menores e por esse motivo presume-se sabedores do que é de fato melhor para eles.
Entretanto, atualmente o Judiciário encontra-se abarrotado de ações desta natureza,
isto porque em grande maioria dos casos, os pais sensibilizados pela separação e motivados
pelo sentimento de mágoa e algumas vezes até mesmo vingança, não conseguem transpor
suas dificuldades e, dessa forma, submetem os menores à linha de frente das questões que
pertencem somente ao casal.
2.1 GUARDA: CONCEITO E MODALIDADES
O instituto da guarda decorre diretamente do poder familiar e seu exercício deve
respeitar, antes de tudo, o princípio do melhor interesse do menor.
Há que se ressaltar que sob a ótica do Estatuto da Criança e Adolescente (ECA)
guarda significa também a colocação do menor em família substituta, a tutela de menores e
ainda diz respeito aos maiores incapazes que permanecem sob a responsabilidade de curador
ou tutor.
O inciso II do art. 1.634 do Código Civil dispõe sobre o instituto da guarda,
disciplinando que é competência dos pais terem os filhos em sua companhia bem como
educá-los, criá-los, assisti-los moralmente e financeiramente, formando-os para o futuro.
Sobre o conceito de guarda, esclarece Douglas Philips Freitas e Graciela Pellizaro:
“Guarda é a condição de direito de uma ou mais pessoas, por determinação legal ou judicial,
em manter um menor de 18 anos sob sua dependência sociojurídica, podendo ser unilateral ou
compartilhada.” 19
Analisando este conceito, pode-se concluir que guarda é a atribuição de ambos os
pais ou apenas um só, nos casos de separações, de zelar, cuidar e ter o menor sob sua
custódia. Do latim guardare e no germânico warden, seu principal significado consiste em
proteger, conservar, vigiar.
19
FREITAS, Douglas Philips, PELLIZZARO, Graciela. Alienação parental: Comentários à Lei 12.318/2010.
Forense: Rio de Janeiro, 2010, p. 83.
22
Na hipótese de não haver consenso quanto à guarda, esta poderá ser requerida por um
dos pais nas ações de divórcio ou dissolução de união estável ou ainda em ação autônoma.
Neste caso observará o juiz as necessidades do menor, buscando sempre seu melhor interesse.
É permitida ainda ao julgador, em qualquer caso, para o bem dos filhos regular a guarda de
modo diferente.
Elucidado o que é guarda, tendo explorado seu conceito e suas premissas, passemos a
entender as modalidades de exercício da guarda, estas dizem respeito à forma como a guarda
será exercida.
2.1.1 Guarda Comum
Este tipo de guarda é exercido por ambos os pais na constância do relacionamento
conjugal ou união estável. Os pais exercem de forma comum os direitos e deveres em relação
aos filhos, pois neste caso a família reside conjuntamente.
Cabe dizer que esta modalidade de guarda não se confunde com a guarda
compartilhada, possuindo esta última características específicas.
2.1.2 Guarda Unilateral
Entende por guarda unilateral aquela conferida a somente um dos genitores. Assim
dispõe o § 1º do art. 1.583 do Código Civil, com redação dada pela Lei n° 11.698, de 13 de
Junho de 2008. “Compreende- se por guarda unilateral a atribuída a um só dos genitores ou a
alguém que o substitua”.
Esta modalidade de exercício de guarda ainda é predominante, já que segundo dados do
IBGE do ano de 2009, 87,6% dos filhos vivem, de forma unilateral, sob a guarda materna.20
A respeito da guarda unilateral, a legislação apresenta critérios claros para sua
definição, em geral possuirá a guarda do menor o genitor que tiver melhores condições para
seu exercício.
Vejamos o que preceitua o §2° do art. 1.583 do Código Civil:
Art. 1.583 [...] § 2 A guarda unilateral será atribuída ao genitor que revele melhores
condições para exercê-la e, objetivamente, mais aptidão para propiciar aos filhos os
seguintes fatores:
20
Disponível em: <http://www.istoe.com.br/reportagens/177923_UNIDOS+NA+SEPARACAO> Acesso em:
15 mar. 2012.
23
I – afeto nas relações com o genitor e com o grupo familiar;
II – saúde e segurança;
III – educação.21
A partir daí derruba-se o mito de que teria melhores condições o genitor com mais
recursos financeiros.
2.1.3 Guarda Compartilhada
A Lei n° 11.698/2008 institui a guarda compartilhada, conceituando-a como a
responsabilização conjunta e o exercício simultâneo de direitos e deveres dos pais que não
vivam mais sob o mesmo teto, no tocante aos filhos comuns. Esta modalidade de guarda tem
como objetivo principal a redução dos danos emocionais causados aos filhos quando ocorre a
separação dos pais.
Douglas Phillips e Graciela Pellizzaro bem definiram este instituto:
A guarda compartilhada é um sistema em que os filhos de pais separados
permanecem sob a autoridade equivalente de ambos os genitores, que vêm a tomar
em conjunto decisões importantes quanto ao seu bem-estar, educação e criação. Esse
é um dos meios de exercício da autoridade familiar, que busca harmonizar as
relações pai/filho e mãe/filho, que espontaneamente tendem a modificar-se depois da
dissolução da convivência.22
Muito se questiona se seria esta modalidade de guarda a solução para a Alienação
Parental, entretanto, convém dizer que não se trata, naturalmente, de um modelo de guarda
que deva ser imposto como solução para todos os casos, sendo até mesmo contraindicado para
alguns. Porém, quando for conveniente para os filhos e existir interesse dos pais, a guarda
compartilhada deve ser incentivada, pois implica em uma relação ativa e participante de
ambos os pais, o que é, fora de dúvida, benéfico para a criança. Pode-se dizer então que esta
modalidade de guarda não pode ser considerada isoladamente como solução para o fim da
Alienação, contudo, em um ambiente favorável, onde haja harmonia e consciência de ambos
os pais, pode sim diminuir as chances da prática da Alienação, já que estimula a relação do
menor com ambos os pais de forma mais igualitária.
Depreende-se do art. 1.584 do Código Civil que a guarda compartilhada poder ser
definida de forma consensual ou por meio de decisão judicial.
21
BRASIL. Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Institui o Código Civil. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/L10406.htm>. Acesso em: 17 mar. 2012. 22
Ibidem, p. 86.
24
Em suma, esta modalidade de guarda deixa de priorizar a guarda unilateral e defende
maior participação de ambos os pais na educação dos filhos, mesmo após a dissolução da
união.
2.1.4 Guarda Alternada ou Conjunta
Neste caso, os genitores se alternam na titularidade guarda. Ocorre, portanto, um
revezamento do exercício do referido instituto, podendo ser quinzenal, semanal, mensal,
conforme for definido pelos genitores.
Atualmente existe uma considerável aversão de doutrinadores e magistrados por este
tipo de guarda, de acordo com eles a guarda alternada é o reflexo do egoísmo dos genitores,
que, pensam serem os filhos objetos.
Nesse sentido decidiu o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul.
GUARDA CONJUNTA: Só é recomendada a adoção de guarda conjunta quando os
pais convivem em perfeita harmonia e é livre a movimentação dos filhos entre as
duas residências. O estado de beligerância entre os genitores não permite a
imposição judicial de que seja a guarda compartilhada. (Apelação Cível Nº
70001021534, Sétima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Maria
Berenice Dias, Julgado em 21/06/2000)23
2.2 A PROTEÇÃO DO INTERESSE DO MENOR NAS DISPUTAS PELA GUARDA
Muitas vezes, nas disputas pela guarda, as crianças são equiparadas a um mero objeto
que será disputado entre o casal em litígio. No entanto, no que diz respeito à guarda, o foco
principal deve ser o menor, e o seu bem estar é o que deve ser levado em conta.
O princípio que deve orientar toda e qualquer decisão é o da preservação do melhor
interesse da criança, consiste em uma forma de proteção aos filhos, respeitando seu
desenvolvimento, idade e principalmente resguardando-os de futuros conflitos entre os pais.
Nos inúmeros casos levados as Varas de Família não é raro que se confundam os
interesses dos pais com os dos filhos. Os pais buscam, em grande parte dos casos, seus
próprios interesses, abandonando o questionamento do que de fato seria melhor para o menor.
Por este motivo, a aplicação do principio melhor interesse do menor, em especial no tocante a
guarda, pode seguir alguns critérios norteadores, tais como disponibilidade e tempo do
23
(Apelação Cível Nº 70001021534, Sétima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Maria
Berenice Dias, Julgado em 21/06/2000). Disponível em: <http://www1.tjrs.jus.br>. Acesso em: 18 mar.
2012.
25
possível guardião, preferência da criança, a não separação dos irmãos, capacidade educativa e
econômica dos pais, o genitor que mais favorece o convívio do menor com o outro genitor,
entre outros fatores.24
Ao magistrado compete fazer valer a aplicação deste principio, adotando medidas
que protejam o menor levando em conta o caso concreto e suas peculiaridades.
2.3 O DIREITO DE CONVIVÊNCIA DO NÃO GUARDIÃO
Naturalmente, ao genitor que não possui a guarda caberá o direito convivencial, ou
seja, o de conviver com o filho participando ativamente de sua educação. A afirmação de
vínculos afetivos é essencial à condição humana e compõe requisito efetivo ao
desenvolvimento pessoal de cada um.
No tocante ao direito de convivência, relata Munir Cury: “Não basta sobrevive, a
criança possui o direito de participar de uma rede afetiva onde possa crescer e se desenvolver
de forma plena, tendo, ao seu entorno, todos os meios e instrumentos necessários a um
crescimento natural”.25
Ao genitor não guardião caberá o dever de fiscalização do exercício de guarda. Sobre
os direitos do não guardião, Maria Helena Diniz descreve:
Assegurar ao genitor (CC. Art. 1.589) que não tem a guarda e companhia da prole o
direito, desde que não se tenha esquadrado numa das hipóteses de perda do poder
familiar: a) fiscalizar sua manutenção e educação, podendo reclamar aos juiz se as
entender contrárias aos interesses dos filhos; b) de visita-la (RJTJSP, 75:43, 67:247;
RT, 782:358, 306:243, 456:205, 452:208, 458:69, 554:114, 547:54, 562:75,
517:125, 574:68), por pior que tenha sido seu procedimento em relação ao ex-
cônjuge, sendo que na separação consensual, os próprios cônjuges deliberam as
condições em que se poderá exercer tal direito e, na separação litigiosa, o juiz as
determina, atendendo ao superior interesse dos filhos, tendo em vista a comodidade
e possibilidade do interessado, os dias, inclusive os festivos e os de férias escolares,
o local e ad duração da visita, sem que haja prejuízo à atividade escolar.26
Aos pais compete a educação dos filhos, mostrando-lhes os limites da liberdade,
ensinando-lhes responsabilidades. Todo esse processo educativo ocorre por meio da
convivência, que de fato é onde se constrói os vínculos necessários à formação do cidadão.
24
CHAVES, Mariana. Melhor Interesse da Criança: Critério para atribuição da guarda unilateral. Disponível
em: <http://jus.com.br>. Acesso em: 19 mar. 2012. 25
CURY, Munir; SILVA, Antônio Fernando do Amaral; GARCÍA, Emilio Mendez. Estatuto da Criança e do
Adolescente comentado: comentários jurídicos e sociais. 3. ed.. São Paulo: Malheiros, 2001, p. 85. 26
Ibidem, p. 312.
26
O Estatuto da Criança e do Adolescente dispõe sobre o direito à convivência no art.
19, que assim descreve:
Art. 19. Toda criança ou adolescente tem direito a ser criado e educado no seio da
sua família e, excepcionalmente, em família substituta, assegurada a convivência
familiar e comunitária, em ambiente livre da presença de pessoas dependentes de
substâncias entorpecentes.27
A alternativa jurídica para abrandar os efeitos da ruptura dos vínculos entre os pais é
o direito de visitas, que consiste em estipular períodos, judicialmente ou por consenso entre os
pais, de contato entre o genitor que não detém a guarda e o filho. O referido direito é tanto um
direito do genitor de ter convívio ativo com o seu filho, quanto um direito do filho de manter
ter por perto seu genitor.
Sobre esse aspecto, destaca Madaleno: “[...] a visita é um direito conferido a todas as
pessoas unidas por laços de afeto, de manterem a convivência e o intercambio espiritual
quando estas vias de intervenção tiverem sido rompidas pela separação física dos
personagens”.28
De natureza puramente afetiva, o direito de visitas não possui caráter definitivo,
devendo ser alterado sempre que houver necessidade, também não é um direito absoluto,
podendo haver circunstâncias em que esse direito possa ser prejudicial, sendo adequado que
todos os problemas sejam resolvidos sob o prisma do melhor interesse do menor, aliás,
convém dizer que este deve ser soberano ao se falar em direito de visitas.
É de suma importância dizer que o direito de visitas não compreende visitas em seu
aspecto puramente social, ou seja, apenas o contato físico, e sim a continuação, do não
guardião, na participação efetiva na educação do filho. Cumpre ressaltar que esse direito
também compreende as pessoas ligadas fortemente ao menor, por exemplo, avós, irmãos, tios
etc.
Nesse sentido, posiciona-se Madaleno:
[...] É direito que pode ser outorgado aos protagonistas mais importantes da vida de
uma criança e cujas pessoas lhe são muito próximas por vínculos consanguíneos ou
de afeto, como seus pais, irmãos, avós, padrastos ou madrastas, servindo a visitação
para que não terminem soterrados os contatos, as relações de comunicação e de
carinho das pessoas que o Direito separa, sobretudo porque são vinculações
27
BRASIL. Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990. Dispõe sobre o Estatuto da Criança e do Adolescente e dá
outras providências. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L8069.htm>. Acesso em: 02
abr. 2012. 28
MADALENO, Rolf Hanssen. Repensando o Direito de Família. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2007,
p. 119.
27
fecundas e fundamentais para o menor que ainda está moldando a sua identidade
pessoal.29
Entende-se como função primeira do direito de visitas a manutenção de outros tantos
direitos, principalmente quanto à assistência moral e afetiva.
A própria Carta Magna assegura esses direitos em seu art. 227.
Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao
adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à
alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao
respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a
salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade
e opressão [grifei].30
Ainda, a respeito do direito de visitas, Maria Berenice Dias manifestou-se
brilhantemente da seguinte forma:
A visitação não é somente um direito assegurado ao pai ou à mãe – é um direito do
próprio filho de com eles conviver, o que reforça os vínculos paterno e materno-
filial. [...] O direito à visitas é um direito de personalidade, na categoria do direito à
liberdade, pelo qual o indivíduo, no seu exercício, recebe as pessoas com quem quer
conviver. Funda-se em elementares princípios de direito natural, na necessidade de
cultivar o afeto, de firmar os vínculos familiares à subsistência real, efetiva e eficaz.
É direito da criança de manter contato com o genitor com o qual não convive
cotidianamente, havendo o dever do pai concretizar esse direito. É totalmente
irrelevante a causa da ruptura conjugal para a fixação das visitas. O interesse a ser
resguardado, prioritariamente, é o do filho, e objetiva atenuar a perda da convivência
diuturna da relação parental.31
Contudo, infelizmente, após a separação, existem pais que não conseguem resguardar
os filhos de sua própria dor, feridos com o fim da união transpassam para os filhos toda a
mágoa sentida e muitas vezes usando-os como instrumento de vingança.
Para esses pais, a primeira medida é dificultar as visitas, ignorando até mesmo, caso
haja, decisão judicial.
O genitor guardião, privilegiado por passar maior parte do tempo com o menor e
possuindo maior influência sobre este, inicia um processo de destruição da imagem do não
detentor da guarda, o que desencadeia uma aversão do menor para com o genitor; seu
comportamento sofre modificações passando de saudade e carinho para o desejo de
afastamento. A partir daí está instalada a Alienação Parental.
29
Ibidem, p. 119. 30 BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constitui%C3%A7ao.htm>. Acesso em: 24 de abr. 2012. 31
Ibidem, p. 398.
28
3 ALIENAÇÃO PARENTAL
3.1 CONCEITO
A relação entre pais e filhos deve prevalecer mesmo que o relacionamento entre pais
não esteja mais instituído na configuração de uma família constituída, ou até mesmo que
nunca tenha se constituído.
No entanto, a dissolução da união afetiva entre os pais por vezes acaba por ocasionar
o surgimento, entre os genitores ou apenas em um deles, de uma relação de ódio e rancor que
ultrapassa a relação entre eles chegando a influenciar a relação deles para com os filhos
menores.
Na conjectura de imaturidade e abalo emocional, usa-se o filho como instrumento de
agressividade direcionada ao outro, principalmente quando os sentimentos de rejeição e
abandono rondam o fim da relação.
Em relação ao nascedouro da Alienação Parental, Képes preleciona: “Ela costuma
ser desencadeada nos movimentos de separações ou divórcios dos casais, mas sua descrição
ainda constitui uma novidade, sendo pouco conhecida por grande parte dos operadores do
direito”.32
Por conseguinte Maria Berenice Dias bem definiu esta situação dizendo que:
[...] Muitas vezes, quando da ruptura da vida conjugal, um dos cônjuges não
consegue elaborar adequadamente o luto da separação e o sentimento de rejeição, de
traição, o que faz surgir um desejo de vingança: desencadeia um processo de
destruição, de desmoralização, de descrédito do ex-parceiro. O filho é utilizado
como instrumento da agressividade – é induzido a odiar o outro genitor. Trata-se de
verdadeira campanha de desmoralização. A criança é induzida a afastar-se de quem
ama e de quem também ama. Isso gera contradição de sentimentos e destruição do
vinculo entre ambos.33
Pesquisas mencionadas por Marco Antônio Garcia de Pinho34
apontam dados
alarmantes em relação a Alienação Parental no Brasil: 90% dos filhos de pais divorciados já
sofreram algum tipo de alienação parental e mais de 25 milhões de crianças sofrem este tipo
de violência. No Brasil, o número de ‘Órfãos de Pais Vivos’ é proporcionalmente o maior do
32
ZAMAN, Rada Maria Metzger Képes. A Síndrome da Alienação Parental: um estudo exploratório. Porto
Alegre: Revista do Ministério Público do Rio Grande do Sul, 2006, p. 51. 33
DIAS, Maria Berenice. Alienação Parental: Um abuso Invisível. Disponível em:
<http://www.mariaberenice.com.br>. Acesso em: 22 mar. 2012. 34
PINHO, Marco Antônio Garcia de. Alienação parental. Jus Navigandi. Disponível em:
<http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=13252>. Acesso em: 22 mar. 2012.
29
mundo, fruto de mães (e pais), que, pouco a pouco, apagam a figura do pai (ou mãe) da vida e
imaginário da criança.
O conceito legal da Síndrome da Alienação Parental está elencado no art. 2° da Lei
12.318, de 2010, no qual é descrito:
Considera-se ato de alienação parental a interferência na formação psicológica da
criança ou do adolescente promovida ou induzida por um dos genitores, pelos avós
ou pelos que tenham a criança ou adolescente sob sua autoridade, guarda ou
vigilância para que repudie genitor ou que cause prejuízo ao estabelecimento ou à
manutenção de vínculos com este.35
Trata-se então de um processo que consiste em influenciar uma criança para que
odeie, sem motivos, um de seus genitores, resultando daí que a própria criança contribua na
trajetória de desmoralização. O genitor, denominado alienador, modifica a consciência de seu
filho com objetivo de impedir, criar obstáculos e destruir sua relação com o outro genitor, este
denominado alienado.
Esse processo tem início quando o genitor alienador usa como instrumento de
represália o filho, procurando monitorar não só seu tempo, mas também os sentimentos do
menor em relação ao outro genitor.
Vingativo, o genitor alienador busca calar toda e qualquer expressão de carinho da
criança para com o genitor alienado, chegando, algumas vezes, ao extremo de acusar
falsamente o outro de ter cometido maus tratos. Cumpre dizer ainda que a alienação pode se
apresentar também de forma sutil, quando o alienador retira toda a autoridade do outro em
relação ao filho, induzindo a criança a respeitar e ouvir somente a ele, com isso a criança
passa a ter como referência apenas o genitor guardião perdendo todo o afeto, respeito,
consideração pelo o não guardião.
É visível que a criança é desconsiderada totalmente como sujeito sendo encarada
pelo genitor alienador apenas como objeto de suas manipulações; nesse ponto o menor
desenvolve uma situação patológica, aceitando como verdade e correto tudo o que o genitor
guardião afirma.
Diversas podem ser as razões que levam ao surgimento da Alienação Parental. Sobre
o assunto, Priscila Fonseca, manifestou-se nos seguintes termos:
35
BRASIL. Lei 12.318 de 26 de agosto de 2010. Dispõe sobre a alienação parental e altera o art. 236 da Lei nº
8.069, de 13 de julho de 1990. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato20072010/2010/
Lei/L12318.htm>. Acesso em: 24 mar. 2012.
30
Muitas vezes o afastamento da criança vem ditado pelo inconformismo do
cônjuge com a separação; em outras situações funda-se na insatisfação do
genitor alienante, ora com as condições econômicas advindas do fim do vínculo
conjugal, ora com as razões que conduziram ao desfazimento do matrimônio,
principalmente quando este se dá em decorrência de adultério e, mais
frequentemente, quando o ex-cônjuge prossegue a relação com o parceiro da relação
extra-matrimonial. Nesse último caso, o alijamento dos filhos de um dos pais resulta
de um sentimento de retaliação por parte do ex-cônjuge abandonado que entrevê, na
criança, o instrumento perfeito da mais acabada vindita [grifei]. 36
Priscila afirma ainda que, em determinadas situações, a alienação representa a
consequência do desejo de o alienante ter, apenas para si, o amor do filho e em grande maioria
das vezes, é resultado do ódio que o genitor alienante nutre pelo alienado.37
Todas as razões, oriundas de atitudes egoístas e imaturas, podem dar origem a
Alienação Parental. A criança torna-se vítima da situação à medida que o genitor alienante
alcança o objetivo de prejudicar o genitor alienado.
Importa dizer que, ainda que a ruptura da convivência não seja absoluta causará, sem
dúvidas, as mais graves consequências à criança.
3.2 HISTÓRICO
Ainda que registros apontem para a existência das situações de Alienação Parental na
década de 40, somente no ano de 1985, Richard Gardner, psiquiatra norte-americano, difundiu
a chamada Síndrome de Alienação Parental (SAP).
Em seu trabalho apresentou a seguinte reflexão:
Os profissionais de saúde mental, os advogados do direito de família e os juízes
geralmente concordam em que temos visto, nos últimos anos, um transtorno no qual
um genitor aliena a criança contra o outro genitor. Esse problema é especialmente
comum no contexto de disputas de custódia de crianças, onde tal programação
permite ao genitor alienante ganhar força no tribunal para alavancar seu pleito. Há
uma controvérsia significativa, entretanto, a respeito do termo a ser utilizado para
esse fenômeno. Em 1985 introduzi o termo Síndrome de Alienação Parental para
descrever esse fenômeno.38
Com objetivo de possibilitar que os profissionais do direito e da saúde, e ainda
pessoas em geral, tivessem conhecimento da Síndrome da Alienação Parental e que a partir
36
FONSECA, Priscila M. P. Correa. Síndrome da Alienação Parental. Disponível em:
<http://www.priscilafonseca.com.br/?id=59&artigo=6>. Acesso em: 06 abr. 2012. 37
Ibidem. 38
GARDNER, Richard. Parental alienation syndrome. Traduzido por Rita Rafaeli. Disponível em:
<http://www.scribd.com/doc/6155591/Sindrome-da-Alienacao-Parental-Richard-Gardner>. Acesso em 22
mar. 2012.
31
dessas informações pudessem identificá-la, evitando o desgaste de muitas famílias, François
Podevyn39
, baseado nos estudos de Gardner, iniciou um trabalho que difundiu por toda
Europa os estudos sobre a Alienação Parental. Fato interessante é que Podevyn desenvolveu
seus estudos motivado por seus próprios sentimentos, sofreu a situação de Alienação Parental
na pele. Em seu trabalho relata que viu seus filhos se afastarem cada vez mais após sua
separação, apesar de todos os seus esforços para os manterem por perto. Relata ainda que ao
pesquisar sobre o assunto se espantou ao encontrar abundantes fontes sobre o tema na
internet, e partir daí resolveu também ser um lutador por esta causa.
No entendimento de Podevyn, a mulher, na condição de mãe, é vista como mais apta
que o homem para deter a guarda dos filhos, portanto, em geral, a síndrome se manifesta no
ambiente da mãe dos menores, entretanto, pode se apresentar em ambientes de pais e até
mesmo de quem possui influencia direta sobre a criança.
A esse respeito, preceitua Barbara Heliodora:
Normalmente é a genitora quem exercer tal manipulação, mas é claro que não se
trata de uma regra, pois há casos inclusive de avos maternos como alienadores. No
entanto o objetivo desta conduta detestável é exclusivamente destruir a relação pai e
filho, através da manipulação da criança em odiar o genitor (a).40
Realmente, no decurso do tempo, incumbiu-se o homem de sustentar e prover a
família enquanto a mulher cabia à criação dos filhos; porém, a partir da revolução feminista,
nos anos 60, esses papéis foram, gradativamente, se transformando. As mulheres adquiriram
uma preocupação com o trabalho e profissão, adquiriram conhecimento formal passando a
competir com os homens, que por sua vez iniciaram um envolvimento com as tarefas
familiares.
É importante destacar que a situação de alienação sempre existiu, no entanto, não
havia sido abordada de forma aprofundada, até mesmo porque havia o conformismo de que
após a separação a mãe era quem deveria deter a guarda da criança, cabendo ao pai apenas o
direito de visitas, que na maioria dos casos eram simplesmente protocolares e não incentivava
o real direito de convivência de pais e filhos.
Com o passar do tempo e o estreitamento das relações familiares, o conformismo deu
lugar a questionamentos, passou-se a dar maior enfoque nas questões psicológicas e
39
PODEVYN, F. Síndrome da Alienação Parental. Disponível em: <http://www.apase.org.br/94001-
sindrome.htm>. Acesso em: 26 mar. 2012. 40
BRITO, Barbara Heliodora Avellar Peralta. Alienação Parental: Um abuso que não pode ser tolerado pela
sociedade. Disponível em: <http://www.avellarperalta.com/site/artigos.html>. Acesso em: 24 mar. 2012.
32
emocionais, surgindo grandes estudos acerca do tema, com o mais importante objetivo de
encontrar soluções para as manifestações da Alienação Parental.
No Brasil a ONG APASE (Associação de pais e mães separados) foi responsável por
trazer dos Estados Unidos e da França os estudos sobre a Alienação Parental e a iniciar a
divulgação incansável sobre o tema. A referida ONG foi responsável também pela a
publicação do primeiro livro dedicado ao tema no país.
3.3 DIFERENÇA DE SÍNDROME DE ALIENAÇÃO PARENTAL (SAP) E ALIENAÇÃO
PARENTAL
É importante saber que, apesar de relacionadas, o conceito da SAP e de Alienação
Parental se distinguem.
Primeiramente, cumpre esclarecer o conceito de síndrome41
que consiste em um
agregado de sinais e sintomas associados a uma mesma patologia e que em seu conjunto
definem o diagnóstico e o quadro clínico de uma condição médica. Em geral são sintomas de
causa desconhecida ou em estudo, que são classificados geralmente com o nome do cientista
que o descreveu ou o nome que o cientista lhes atribuir. Uma síndrome não caracteriza
necessariamente uma só doença, mas um grupo de doenças.
De acordo com Gardner42
o que configura uma síndrome é o conjunto de sintomas
que se manifestam simultaneamente em decorrência de uma causa única. Gardner diz que o
termo Alienação Parental é vago, englobando uma grande variedade de fenômenos clínicos
que não deveriam ser unidos.
Alienação Parental é a desmoralização de um dos genitores perante a criança, é uma
campanha manipulada com a finalidade de denegrir e marginalizar esse genitor. Já a
Síndrome da Alienação Parental corresponde às consequências e efeitos causados na criança-
vítima dessa situação. Em suma, são as decorrências deixadas pela Alienação Parental.
Na visão de Marcos Antônio de Pinho, a Síndrome não se confunde com a Alienação
Parental, pois aquela geralmente decorre desta, em síntese, enquanto a Alienação corresponde
ao afastamento do filho do pai por meio de manipulações do guardião. A Síndrome diz
respeito às questões emocionais, aos danos e sequelas que a criança e o adolescente vêm a
sofrer.43
41
Stedman Dicionário Médico. 23 ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 1987, p. 23. 42
Ibidem. 43
Ibidem.
33
Também nesse sentido, Goudart relata:
A alienação parental é um termo genérico que reúne várias situações distintas. Ela
corresponde à relação particular de um ou vários filhos com somente um dos dois
genitores. Sobrepõe-se também a casos de sequestro parental ou de alcoolismo,
abuso sexual, maus-tratos ou negligência por parte do genitor de quem as crianças
estão cortadas. Em certos casos, esta alienação se justifica totalmente e se constitui
até no único modo de preservação mental da criança.44
Em síntese, a síndrome é o conjunto de sintomas causados pelo afastamento da
criança da figura paterna. Importa dizer que é possível, com auxílio de terapeutas e do Poder
Judiciário, reverter a Alienação Parental e reaver o convívio com o genitor alienado,
entretanto, instalada a Síndrome esta reversão se torna mais difícil.
3.4 IDENTIFICAÇÃO DA ALIENAÇÃO PARENTAL
Tendo em vista a gravidade das situações que diz respeito à Síndrome da Alienação
Parental surge a necessidade de identificá-la para posteriormente tratá-la na condição de um
problema psicológico e dependente de uma atenção peculiar.
O ponto de partida para essa identificação é atentar-se ao comportamento do genitor
alienador.
Sobre a identificação da Síndrome, Podevyn diz:
Para identificar uma criança alienada, é mostrada como o genitor alienador
confidencia a seu filho seus sentimentos negativos e às más experiências vividas
com o genitor ausente. Dessa forma, o filho vai absorvendo toda a negatividade que
o alienador coloca no alienado, levando-o a sentir-se no dever de proteger, não o
alienado, mas, curiosamente, o alienador, criando uma ligação psicopatológica
similar a uma “folie à deux”45
. Forma-se a dupla contra o alienado, uma aliança
baseada não em aspectos saudáveis da personalidade, mas na necessidade de dar
corpo ao vazio.46
É de extrema importância a descoberta precoce da síndrome, já que dessa forma a
intervenção psicológica e jurídica ocorrerá antes de consequências mais graves.
Jorge Trindade, psicólogo, nesse sentido posicionou-se:
44
GOUDART, Bènèdicte. A Síndrome de Alienação Parental. Versão Traduzida disponível em:
<http://www.sos-papai.org>. Acesso em: 08 abr. 2012. 45
Expressão em francês que significa: “loucura a dois”. 46
PODEVYN, F. Síndrome da Alienação Parental. Disponível em: <http://www.apase.org.br/94001-
sindrome.htm>. Acesso em: 06 abr. 2012.
34
A Síndrome da Alienação Parental pode demandar um atendimento de dupla
abordagem, pois exige um tratamento de cunho psicológico, mas pode também
reclamar uma intervenção jurídica, quando as circunstâncias externas precisam ser
modificadas. Por isso, recomenda-se que a intervenção psicoterapêutica deva ser
sempre amparada em um procedimento legal e deva contar com o apoio judicial.47
É importante destacar que a alienação pode ocorrer por condutas do pai, da mãe, de
forma mais comum, e ainda por terceiros.
A alienação parental insulta questões morais e abala a família, pilar da sociedade,
além de pregar o amor doentio capaz de distorcer valores e manipular. Desta forma, é
essencial a identificação a fim de que possibilite um tratamento eficaz.
Com enorme contribuição para o tema Podevyn identificou os comportamentos
clássicos de um genitor alienador, conforme descrito abaixo48
:
a) recusar ou dificultar passar as chamadas telefônicas aos filhos;
b) organizar várias atividades com os filhos durante o período que o outro genitor
deve, normalmente, exercer o direito de visitas;
c) apresentar o novo cônjuge aos filhos como sua “nova mãe” ou “novo pai”;
d) desvalorizar e insultar o outro genitor na presença dos filhos;
e) recusar informações ao outro genitor sobre as atividades em que os filhos estão
envolvidos (esportes, atividades escolares, grupos teatrais, escotismo etc.);
f) falar de maneira descortês do novo cônjuge do outro genitor;
g) impedir o outro genitor de exercer seu direito de visitas;
h) “esquecer” de avisar o outro genitor e compromissos importantes (dentista,
médicos, psicológicos);
i) envolver pessoas próximas (sua mãe, seu novo cônjuge etc.) na lavagem cerebral
de seus filhos;
j) tomar decisões importantes a respeito dos filhos sem consultar o outro genitor
(escolha de religião, escolha da escola etc.);
l) trocar (ou tentar trocar) seus nomes e sobrenomes;
m) impedir o outro genitor de ter acesso às informações escolares e/ou médicas dos
filhos;
n) sair de férias sem os filhos e deixá-los com outras pessoas que não o outro
genitor, ainda que este esteja disponível e queira ocupar-se dos filhos;
47
TRINDADE, Jorge. Manual de Psicologia Jurídica para operadores do Direito. 2011, 5 ed. Porto Alegre:
Livraria do Advogado, 2008, p. 201. 48
Ibidem.
35
o) falar aos filhos que os presentes do outro genitor são inadequados ou feios e
proibi-los de usá-los;
p) ameaçar punir os filhos se eles telefonarem, escreverem ou se comunicarem com
o outro genitor de qualquer maneira;
q) culpar o outro genitor pelo mau comportamento dos filhos;
r) interceptar as cartas e os pacotes mandados aos filhos;
s) transformar a criança em espiã da vida do ex-cônjuge;
A lei da Alienação Parental também exemplifica alguns sintomas da síndrome,
justamente com intuito de auxiliar quem esteja passando por esta situação a identificar as
características do alienador, vejamos:
Art. 2° [...] Parágrafo único. São formas exemplificativas de alienação parental,
além dos atos assim declarados pelo juiz ou constatados por perícia, praticados
diretamente ou com auxílio de terceiros:
I - realizar campanha de desqualificação da conduta do genitor no exercício da
paternidade ou maternidade;
II - dificultar o exercício da autoridade parental;
III - dificultar contato de criança ou adolescente com genitor;
IV - dificultar o exercício do direito regulamentado de convivência familiar;
V - omitir deliberadamente a genitor informações pessoais relevantes sobre a criança
ou adolescente, inclusive escolares, médicas e alterações de endereço;
VI - apresentar falsa denúncia contra genitor, contra familiares deste ou contra avós,
para obstar ou dificultar a convivência deles com a criança ou adolescente;
VII - mudar o domicílio para local distante, sem justificativa, visando a dificultar a
convivência da criança ou adolescente com o outro genitor, com familiares deste ou
com avós.49
A descrição dessas condutas é essencial para que de forma eficaz e rápida a síndrome
seja identificada, entretanto, o alienador pode ser inventivo sendo complicada a criação de um
rol taxado de suas possíveis condutas, podendo estas variar.
Outro fato importante a ser observado é que o alienador não costuma obedecer a
regras e sim apenas aos seus próprios sentimentos, por isso é comum que este genitor
desrespeite até mesmo ordens judiciais.
Assim como o genitor alienador apresenta condutas típicas da alienação, a criança
também demonstra, por meio de seu comportamento, indícios da existência da Síndrome.
A psicóloga Denise Maria Perissini, levando em consideração os estudos de Gardner,
descreve algumas das condutas da criança envolvida pela Síndrome:
49
BRASIL. Lei 12.318 de 26 de agosto de 2010. Dispõe sobre a alienação parental e altera o art. 236 da Lei nº
8.069, de 13 de julho de 1990. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato20072010/2010/
Lei/L12318.htm>. Acesso em: 24 mar. 2012.
36
a) a criança denigre o pai alienado com linguajar impróprio e severo
comportamento opositor, muitas vezes utilizando-se de argumentos do (a)
genitor (a) alienador (a) e não dela própria; para isso, dá motivos fracos,
absurdos ou frívolos para sua raiva.
b) declara que ela mesma teve a ideia de denegrir o pai alienado. O fenômeno do
“pensador independente” acontece quando a criança garante que ninguém disse
aquilo a ela.
c) o filho apoia e sente a necessidade de proteger o pai alienante. Com isso,
estabelece um pacto de lealdade com o genitor alienador em função da
dependência emocional e material, demonstrando medo em desagradar ou opor-
se a ele.
d) menciona locais onde nunca esteve na data em que é relatado um acontecimento
de suposta agressão física/sexual ou descreve situações vividamente que nunca
poderia ter experimentado – implantação de “falsas memórias”.
e) a animosidade é espalhada para também incluir amigos e/ou outros membros da
família do pai alienado (voltar-se contra avós paternos, primos, tios,
companheira). Neste ponto “vovó querida” transforma-se na “velha chata”, novo
cônjuge do alienador torna-se intruso e as atitudes severas para o genitor
alienado se estende também ao seu companheiro (a). 50
O que ocorre é que o alienador relata aos filhos seus sentimentos negativos em
relação ao genitor ausente. Dessa forma, a criança vai aos poucos absorvendo a negatividade e
acaba por aprender a conviver com a mentira e a mostrar falsas emoções em relação ao
genitor alienado.
De acordo com Trindade, dentre os comportamentos do genitor alienador, é comum
os sentimentos destrutivos de ódio, ou seja, a pessoa sente-se invadida por sentimentos de
raiva capazes de destruir a relação dele com o outro e do filho com o outro, o que acaba por
destruir a própria capacidade restauradora dos vínculos. Sentimentos de ciúmes também são
frequentes, o genitor alienador não suporta que o alienado inicie qualquer outro tipo de
relação amorosa, em geral utilizando os filhos como forma de castigar o outro cônjuge por
aquilo que, equivocadamente, encara como traição.
Outro sentimento característico é o de ódio exacerbado por fatores econômicos, a
diminuição da capacidade financeira, associada à dissolução da união, potencializa o
50
Perissini da Silva, Denise Maria. Por uma Ética na Psicologia Jurídica aplica ao Direito de Família.
Disponível em: <http://psicologiajuridica.org/archives/187>. Acesso em: 05 abr. 2012.
37
sentimento de ódio, aumentando a privação dos filhos sobre o alienado, pois este passa a ser
considerado pelo alienador responsável por mais essa situação.
O alienador ainda possui como sentimento a vontade de mudanças súbitas e radicais,
podendo realizar mudanças abruptas e severas em seus hábitos, podendo até mesmo mudar de
cidade ou país. No entanto, essas mudanças nada mais significam do que ataques ao alienado,
com a finalidade de dificultar o direito de visita aos filhos.
Constitui também sentimento do alienador a superproteção em relação aos filhos,
pois passa a conceber o mundo e as relações em geral como ameaçadoras, podendo transferir
esse sentimento para o genitor alienado, que a passa a ser visto como um perigo em potencial
para os filhos.
Não há dúvidas de que a identificação precoce da existência desta prática
possibilitará o restabelecimento do vinculo entre o alienado e a criança com sucesso, já que
quanto antes se constate a existência da alienação maiores serão as chances de um intervenção
psicológica e jurídica a fim de romper com a campanha desmoralizadora do alienador.
3.5 CONSEQUÊNCIAS DA ALIENAÇÃO PARENTAL
Não há duvidas de que instalada a Síndrome da Alienação Parental as consequências
serão as piores possíveis. De acordo com Trindade51
, estas consequências podem variar de
acordo com a idade da criança, com sua personalidade, além de inúmeros outros fatores.
Segundo os estudos de Gardner52
, usados por Podevyn em sua obra, existem três
estágios de enfermidade dos filhos, estes estágios foram organizados da seguinte maneira:
a) Estágio I – Leve: neste estágio, normalmente, as visitas apresentam-se calmas,
com um pouco de dificuldades na hora da troca de genitor. Enquanto o filho está
com o genitor alienado, as manifestações da campanha de desmoralização
desaparecem ou são discretas e raras. A motivação principal do filho é conservar
um laço sólido com o genitor alienador;
b) Estágio II – Médio: o genitor alienador utiliza uma grande variedade de táticas
para excluir o outro genitor. No momento de troca de genitor, os filhos, que
sabem o que genitor alienador quer escutar, intensificam sua campanha de
desmoralização. Os argumentos utilizados são os mais numerosos, os mais
frívolos e os mais absurdos. O genitor alienado é completamente mau, e o outro
51
Ibidem, p. 203. 52
Ibidem.
38
completamente bom. Apesar disso, aceitam ir com o genitor alienado, e, uma vez
afastado do outro genitor, tornam a ser mais cooperativos;
c) Estágio III – Grave: os filhos em geral, estão perturbados e frequentemente
fanáticos. Compartilham os mesmos fantasmas paranoicos que o genitor
alienador tem em relação ao outro genitor. Podem ficar em pânico apenas com a
ideia de ter que visitar o outro genitor. Seus gritos, seu estado de pânico e suas
explosões de violência podem ser tais que ir visitar o outro genitor torna-se
impossível. Se, apesar disso, foram com o genitor alienado, podem fugir,
paralisar-se por um medo mórbido ou manter-se continuamente tão provocadores
e destruidores, que devem necessariamente retornar ao outro genitor.
Como observado, no estágio grave, ocorrem fortes campanhas de desmoralização do
genitor não guardião, com isso esse vínculo fica seriamente prejudicado. Segundo Marco
Antônio de Pinho, ao destruir a relação do filho com o pai, a mãe entende que assume o
controle total e atinge sua meta: que o pai passe a ser considerado um intruso, um inimigo a
ser evitado, e que o filho agora é “propriedade” somente dela.53
Para Priscila Fonseca54
uma vez instalada a Síndrome no menor enseja que este,
quando adulto, padeça de um grave complexo de culpa por ter sido cúmplice de uma grande
injustiça contra o genitor alienado.
Ainda de acordo com Fonseca, sobre os efeitos da síndrome:
[...] podem se manifestar às perdas importantes – morte de pais, familiares
próximos, amigos, etc. Como decorrência, a criança (ou o adulto) passa a revelar
sintomas diversos: ora apresenta-se como portadora de doenças psicossomáticas, ora
mostra-se ansiosa, deprimida, nervosa e, principalmente agressiva. Os relatos acerca
das consequências da síndrome de alienação parental abrangem ainda depressão
crônica, transtornos de identidade, comportamento hostil, desorganização mental e
às vezes, suicídio.
Insta dizer que, ao contrário do genitor alienado, a criança permanece indefesa e
sem capacidade para ajudar a si mesma. Nesse aspecto, Douglas Darnall manifestou-se:
Os efeitos da Síndrome de Alienação Parental sobre as crianças e sobre o genitor
afastado ou alienado podem ser catalogados como uma forma de dano ou abuso
psicológico e emocional. [...] Não é somente questão de que a criança poderia não
chegar a estabelecer jamais uma relação positiva com o genitor afastado, mas que
53
PINHO, Marco Antônio Garcia de. Alienação parental e suas consequências. Disponível em:
<www.paisporjustica.com.br>. Acesso em: 10 abr. 2012. 54
Ibidem.
39
seus próprios processos de pensamentos foram interrompidos e coagidos em direção
a padrões patológicos.55
Ainda sobre as sequelas da Síndrome, Jorge Trindade, ressaltou:
Esses conflitos podem aparecer na criança sob forma de ansiedade, medo e
insegurança, isolamento, tristeza e depressão, comportamento hostil, falta de
organização, dificuldades escolares, baixa tolerância a frustração, irritabilidade,
enurese, transtorno de identidade ou de imagem, sentimento de desespero, culpa,
dupla personalidade, inclinação ao álcool e as drogas e, em mais extremos, ideias ou
comportamentos suicidas.56
Isolamento, baixo rendimento escolar, depressão, melancolia, rebeldia, conduta
antissocial, essas são apenas algumas das consequências notadas na criança vitima da SAP,
baseadas em estáticas do Instituto Brasileiro de Direito de Família (IBDAFAM) e relatadas
por Marco Antonio Garcia Pinho57
em seu artigo sobre o assunto.
Aos poucos a criança absorve tudo o que lhe é dito pelo alienador e a cada dia se
afasta mais do alienado, rejeitando-o. É a configuração do abuso e da utilização da criança
como verdadeiro instrumento de vingança e as sequelas são tão graves a ponto de prejudicar
toda uma vida.
O Estatuto da Criança e Adolescente, em seu art. 5º, dispõe: “Nenhuma criança ou
adolescente será objeto de qualquer forma de negligência, discriminação, exploração,
violência, crueldade e opressão, punido na forma da lei qualquer atentado, por ação ou
omissão, aos seus direitos fundamentais”.58
A criança vitima da alienação tem sua infância perdida e seu estado psicológico
abalado. Uma vida prejudicada pela imaturidade de adultos que não souberam elaborar de
forma madura a dissolução da união, transportando para os filhos problemas que são somente
seus. Nas palavras de Trindade59
, a Síndrome de Alienação Parental constitui uma forma
grave de abuso contra a criança, contra a pessoa do alienado e contra a família.
Cumpre dizer que a Alienação Parental assola também o genitor abandonado pelos
filhos, este também sofre importantes traumas.
Sobre esse aspecto concluiu Gardner que a perda de uma criança nesta situação pode
55
DARNALL, Douglas. Consequências da Síndrome de Alienação Parental sobre as crianças e sobre o
genitor alienado. Disponível em: <http://www.apase.org.br/94006-douglas.htm>. Acesso em: 06 abr. 2012. 56
TRINDADE, Jorge. Síndrome de alienação parental. In. DIAS, Maria Berenice (Coordenação). Incesto e
alienação parental: realidades que a justiça insiste em não ver. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007, p.
104. 57
Ibidem. 58
Ibidem. 59
Ibidem, p. 211
40
ser mais dolorosa para o pai-vítima do que a própria morte da criança, pois a morte é um fim,
sem esperança ou possibilidade para reconciliação, mas os “´Filhos da Alienação Parental”
estão vivos. Gardner afirma ainda que a aceitação e renuncia à perda de um filho vivo é
infinitamente mais dolorosa e difícil, e, para alguns pais, afirma o psiquiatra, “a dor contínua
no coração é semelhante à morte viva”.60
Por tudo isso, o alienador deve ser responsabilizado perante a justiça civil com a
reparação do dano causado à personalidade do filho, e perante o juízo criminal por ofensa aos
direitos fundamentais da criança, tendo como base o princípio da dignidade da pessoa
humana, incluindo-se a reparação ao cônjuge alienado.
3.6 IMPLANTAÇÃO DE FALSAS MEMÓRIAS
Existem memórias que eu só conheço de nome. Posso imaginar que as tenho, mas na
verdade nunca as vivi (Jack Abott, citado por Jorge Trindade em sua obra).
Em uma simples definição, memória é a lembrança de fatos ocorridos na vida de um
indivíduo, entretanto, o conceito de falsas memórias consiste em lembranças de fatos que
nunca ocorreram. São memórias baseadas em informações enganosas.
De acordo com Alexandra Ullmam61
, as influências externas, como informações
repetidas por terceiros, são capazes de introduzir ou modificar elementos em experiências
pelas quais efetivamente passamos. Uma lembrança mal lembrada pode nos remeter a
sentimentos não sentidos ou momentos não vividos, situação clara de dicotomização e
fragmentação da personalidade.
A respeito da definição do fenômeno de falsas memórias, Trindade manifestou-se:
A Síndrome das Falsas Memórias traz em si a conotação das memórias fabricadas
ou forjadas, no todo ou em parte, na qual ocorrem relatos de fatos inverídicos,
supostamente esquecidos por muito tempo e posteriormente relembrados. São erros
que se devem à memória, e não à intenção de mentir. Podem ser implantadas por
sugestão e consideradas verdadeiras e, dessa forma, influenciar o comportamento.62
Esse fenômeno das Falsas Memórias é mais um dos frutos da mente doentia do
genitor alienador, este, com intuito de atingir o alienado, implanta falsas memórias na criança
vitima da Alienação Parental, fomentando uma realidade inexistente.
60
Ibidem. 61
ULLMANN, Alexandra. A Introdução de Falsas Memórias. Disponível em:
<http://paisporjustica.blogspot.com.br/2009/08/artigo-introducao-de-falsas-memorias.html>. Acesso em: 11
abr. 2012. 62
Ibidem, p. 212.
41
Para Felipe Niemezewski da Rosa63
as crianças são submetidas a uma mentira, sendo
emocionalmente manipuladas e abusadas, e por esse motivo deverão enfrentar diversos
procedimentos como análise, tanto psiquiátrica como judicial.
Como já dito, a Alienação Parental nada mais é que a campanha de desmoralização
do genitor não guardião para a criança. A partir dessa conduta, tudo relacionado ao genitor
alienado passa a ser direcionado a destruição da sua imagem perante o filho. Situações
corriqueiras, na mente do alienador, passam a ter conotação diferente, sempre no intuito de
difamar o outro genitor.
Exemplificando, Raquel Pacheco ilustra em sua obra como uma situação típica e
cotidiana se transforma em arma para o alienador: a criança narra ao guardião que o pai,
durante uma visita, não deixou o filho tomar sorvete depois do parque. Em vez de a guardiã
tentar explicar ao filho que já devia estar tarde e era quase hora do jantar, ou, ainda, que era
um dia frio, ou enfim qualquer coisa que explicasse a conduta paterna, ela aproveita o ensejo
e reforça para a criança que “o papai é “mau” e que o menor tem de ter “cuidado” com ele,
pois não é um “bom pai”.64
Dessa forma, falsas memórias vão sendo construídas e com o passar do tempo se
enraízam as verdadeiras memórias da criança, fazendo com que ela mesma narre de forma
distorcida algo que nunca aconteceu.
Nesse sentido, Maria Berenice Dia, disse:
Nem sempre a criança consegue discernir que está sendo manipulada e acaba
acreditando naquilo que lhes foi dito de forma insistente e repetida. Com o tempo,
nem a mãe consegue distinguir a diferença entre verdade e mentira. A sua verdade
passa a ser verdade para o filho, que vive com falsas personagens de uma falsa
existência, implantando-se, assim, falsas memórias.65
Desta forma, conclui-se que a implantação de falsas memórias é um dos meios da
Alienação Parental e constitui um grave abuso, perturbando o estado emocional e psicológico
da criança, é sem duvida uma forma de violência com consequências futuras, inclusive, no
que concerne ao caráter da vitima.
63
XAXÁ, Igor Nazarovicz. A síndrome da alienação parental e o Poder Judiciário. Disponível em:
<http://www.alienacaoparental.com.br/bibliotecao>. Acesso em 11 abr. 2012. 64
SILVA, Evandro Luiz, et al., Síndrome da Alienação Parental e a Tirania do Guardião: Aspectos
Psicológicos, Sociais e Jurídicos. Porto Alegre: Equilíbrio, 2007, p. 25. 65
DIAS, Maria Berenice. Síndrome da Alienação Parental, o que é isso? Disponível em:
<http://www.apase.org.br>. Acesso em 11 abr. 2012.
42
3.7 FALSAS DENÚNCIAS DE ABUSO SEXUAL
A falsa denúncia de abuso sexual está, sobretudo, interligada ao fenômeno de
implantação de falsas memórias. De acordo com Alexandra Ullmann, uma criança que afirma
com firmeza que o pai abusou dela quando tinha 1 ano, e repete a mesma história por anos a
fio, se questionada, não consegue alocar o fato no tempo nem no espaço, não consegue se
lembrar de cores, odores, sensações e sentimentos que o pretenso abuso teria gerado. 66
Percebe-se então a íntima ligação dos fenômenos, sobretudo porque, um acontece por meio do
outro.
Ainda sobre esse aspecto, Alexandra destaca o seguinte:
[...] A cruel submissão de uma criança à informação enganosa de que teria sido
abusada sexualmente por um de seus genitores é reforçada pela comoção com que o
assunto é tratado, tanto por familiares que cercam o menor e muitas vezes acreditam
na informação daquele adulto que criou a história inverídica, quanto também pelos
profissionais de saúde e da lei que atuam na legítima intenção de “proteger” a vítima
de seu “abusador”. A fala e o comportamento dos adultos que cercam o menor
fazem que se reforce em seu íntimo a “recordação do fato inexistente”. 67
A falsa denúncia de abuso sexual é uma das armas utilizadas pelo alienador para
afastar o filho do genitor acusado. Uma simples assertiva de ter sido o filho vítima de abuso
sexual, já é motivo para o juiz determinar o afastamento do genitor acusado da criança vítima
de abuso sexual. A criança, então, é convencida de que esse fato realmente aconteceu e levado
a repetir o que lhe é afirmado como tendo realmente acontecido.68
Não há duvidas de que a falsa denúncia de abuso sexual é a mais grave demonstração
da Síndrome de Alienação Parental. Para a mente manipuladora do alienador qualquer simples
fato relacionado ao período de visitas da criança e o outro genitor molda-se uma situação de
abuso sexual. Por repetir constantemente sobre o fato que não ocorreu como sendo verídico, o
alienador acaba por convencer a criança, que não consegue distinguir a manipulação,
passando a aceitar tudo como algo que verdadeiramente aconteceu.
Maria Helena Diniz, sobre o assunto, manifestou-se:
Neste jogo de manipulações, todas as armas são utilizadas, inclusive a assertiva de
ter sido o filho vítima de abuso sexual. A narrativa de um episódio durante o período
66
Ibidem. 67
Ibidem. 68
ASSUMPÇÃO, Vanessa Cristho de. Alienação Parental e as disputas familiares através de falsas
acusações de abuso sexual. Disponível em: <http://www3.pucrs.br/pucrs/files/uni/poa/direito/
graduacao/tcc/tcc2 /trabalhos2011_1/vanessa_ assumpcao.pdf. Acesso em: 12 abr. 2012.
43
de visitas que possa configurar indícios de tentativa de aproximação incestuosa é o
que basta. Extrai-se deste fato, verdadeiro ou não, denúncia de incesto. O filho é
convencido da existência de um fato e levado a repetir o que lhe é afirmado como
tendo realmente acontecido. Nem sempre a criança consegue discernir que está
sendo manipulada e acaba acreditando naquilo que lhes foi dito de forma insistente e
repetida. Com o tempo, nem a mãe consegue distinguir a diferença entre verdade e
mentira. A sua verdade passa a ser verdade para o filho, que vive com falsas
personagens de uma falsa existência, implantando-se, assim, falsas memórias.69
Comunicada a denúncia de abuso a um pediatra ou advogado, desencadeia a pior
situação com que pode um profissional deparar-se. De um lado, há o dever de tomar
imediatamente uma atitude e, de outro, o receio de que, se a denúncia não for verdadeira,
traumática será a situação em que a criança estará envolvida, pois ficará privada do convívio
com o genitor que eventualmente não lhe causou qualquer mal e com quem mantém excelente
convívio.70
Quando uma situação como esta é levada ao conhecimento do Poder Judiciário, a
primeira providência é a suspensão dos períodos de visitas, até que se proceda com os estudos
sociais e psicológicos acerca da veracidade do fato e enquanto estes estudos não são
concluídos, interrompe-se a convivência do pai com o filho.
Para Maria Helena Diniz, o mais doloroso é que o resultado da série de avaliações,
testes e entrevistas que se sucedem durante anos acaba não sendo conclusivo. Mais uma vez
depara-se o juiz diante de um dilema: manter ou não as visitas, autorizar somente visitas
acompanhadas ou extinguir o poder familiar, enfim, manter o vínculo de filiação ou condenar
o filho à condição de órfão de pai vivo, cujo único crime eventualmente pode ter sido amar
demais o filho e querer tê-lo em sua companhia.71
Diante da dificuldade de identificação da existência ou não dos episódios
denunciados, é necessário que o juiz tome cautelas redobradas, essa cautela, geralmente,
traduz-se no afastamento da criança de seu suposto abusador e as sequelas desse afastamento
são as piores possíveis.
Para Andrea Calçada, um caso de falsa acusação de abuso sexual, pode se configurar
para a criança em um abuso sexual real, em função do imaginário infantil. Andrea descreve
algumas das implicações dessa situação para a criança envolvida:
Alterações na área afetiva depressão infantil, angústia, sentimento de culpa,
rigidez e inflexibilidade diante das situações cotidianas, insegurança, medos e
fobias, choro compulsivo sem motivo aparente.
69
Ibidem. 70
Ibidem 71
Ibidem.
44
Alterações na área interpessoal: dificuldade em confiar no outro, dificuldade em
fazer amizades, dificuldade em estabelecer relações, principalmente com pessoas
mais velhas, apego excessivo a figura "acusadora". Alterações na área da
sexualidade: não querer mostrar seu corpo, recusar tomar banho com colegas, recusa
anormal a exames médicos e ginecológicos, vergonha em trocar de roupa na frente
de outras pessoas. Esses dados foram observados e colhidos na fase de avaliação em
crianças. Não temos por enquanto, dados que digam respeito a alterações a médio e
a longo prazo. Vemos então que assim como no abuso sexual real, a base estrutural
de autoestima, autoconfiança e confiança no outro ficam bastante abaladas, sendo
portanto, terreno fértil para que patologias graves possam se instalar [grifei].72
Há que se falar também do genitor alienado, a falsa denúncia provoca sentimentos
de raiva e impotência no acusado, este passa a ser visto pela sociedade como “monstro”. Para
ele as consequências também são as mais graves, de acordo com Andrea Calçada, ocorre a
perda da estrutura básica de confiança social, ou seja, “comedor de criancinhas", indigno de
confiança, perda de amizades, situações de constrangimento em ambientes de trabalho e lazer,
perda de privacidade, exposição a insultos, levando-o ao retraimento social, por vezes,
tornando-se necessária a mudança de cidade.
Também sobre essas sequelas, Patricia Pimentel se posiciona:
A acusação de abuso sexual, notadamente quando o acusado é pai, traz uma mancha
indelével para a sua imagem. Dentro de uma sociedade sadia, a violência sexual
praticada contra crianças é considerada algo ignóbil, que merece repúdio e
mecanismos sérios de proteção da vítima.73
Leila Maria Torraca de Brito74
em entrevista ao site G1 sobre o tema relatou que as
acusações recaem, na maioria das vezes, sobre o pai. “Isso decorre de um viés cultural, que
apontava a mulher como a única pessoa capaz de cuidar de uma criança. Se, depois de passar
o fim de semana com o pai, a criança voltava com alguma mudança de comportamento, ou
uma assadura, levantava-se logo a suspeita de que houve algum abuso. E, muitas vezes, esses
indícios não eram comprovados”.75
Também em entrevista ao site, Alexandra Ullmann, advogada especialista em ações
de família, relatou caso com o qual se deparou no exercício da profissão. Um suposto desenho
erótico feito por uma criança de quatro anos. “No fim, a mãe confessou na audiência que fez
72
CALÇADA, Andrea. Falsas acusações de abuso sexual: o outro lado da história. Porto Alegre: Equilíbrio,
2009, p. 20. 73
RAMOS, Patricia Pimentel de Oliveira Chambers. Abuso Sexual ou Alienação Parental: o difícil
diagnóstico. Disponível em: <http://www.ibdfam.org.br/?artigos&artigo=695>. Acesso em: 12 abr. 2012. 74
Psicóloga coordenadora da do Programa de Pós-Graduação em Psicologia Jurídica da UERJ e organizadora
do livro Famílias e Separações: perspectivas da psicologia jurídica. 75
BRITO, Leila Maria Torraca de. Entrevista sobre Falsas Denuncias de Abuso Sexual ao site G1.
Disponível em:
<http://g1.globo.com/Noticias/Rio/0,,MUL8868145606,00CRESCEM+FALSAS+DENUNCIAS+DE+ABUS
O+SEXUAL+DE+MENORES+DIZ+ESPECIALISTA.html>. Acesso em: 13 abr. 2012.
45
umas linhas pontilhadas e obrigou a criança a passar o lápis por cima. Isso é uma atitude
criminosa. Tem que ser passível de pena”. 76
Trata-se a falsa denúncia de abuso sexual de uma estratégia cruel da Alienação,
ferramenta de tormento psicológico para acatar o desejo de vingança de um guardião em
relação ao outro.
É imprescindível, então, com a finalidade de reconhecer a verdadeira situação por
trás da denúncia de abuso, a participação de psicólogos e assistentes sociais com estudos
acerca do que supostamente ocorreu. Além disso, é necessário que os operadores do Direito se
sensibilizem a ponto de distinguir o sentimento vingativo que leva o detentor da guarda a
manipular a criança apenas com fito de afastá-la de seu pai.
O Poder Judiciário não pode compactuar com a falsa denúncia que, de forma muitas
vezes, precipitada ou sem atentar ao que realmente possa ter acontecido, vem rompendo
vínculo de convivência imprescindível ao desenvolvimento saudável de crianças em
desenvolvimento.77
76
ULLMANN, Alexandra. Em entrevista ao site G1. Disponível em:
<http://g1.globo.com/Noticias/Rio/0,,MUL8868145606,00CRESCEM+FALSAS+DENUNCIAS+DE+ABUS
O+SEXUAL+DE+MENORES+DIZ+ESPECIALISTA.html>. Acesso em: 13 abr. 2012. 77
Ibidem.
46
4 A ALIENAÇÃO PARENTAL E O PODER JUDICIÁRIO
O fato é antigo: usar filhos como instrumento de vingança pelo término do sonho do
“felizes para sempre”.
A Alienação Parental é uma via de mão dupla. Ao mesmo tempo em que fere as
vítimas, genitores e crianças, fere os operadores do Direito e aplicadores da Justiça, que
passam para si próprios atestado de desatualizados, ingênuos e/ou incompetentes.
O mais comum é a existência de certo preconceito contra a figura masculina em
significativo número das varas de família de todo o país, tanto que o número de “Crianças
Órfãs de Pais Vivos” no Brasil é proporcionalmente o maior do mundo.78
Na intenção de desmoralizar e destruir a imagem do outro genitor, todas as armas são
utilizadas, inclusive a absurda e irresponsável alegação de prática de abuso sexual. Ao se
deparar com esta noticia o juiz não tem como identificar a veracidade dos episódios
denunciados para reconhecer se está diante da síndrome da alienação parental e que a
denúncia do abuso foi levada a juízo pelo banal desejo de vingança. Com intenção de proteger
a criança, muitas vezes toma-se como medida a reversão da guarda ou a suspensão das visitas,
enquanto são realizados estudos sociais e psicológicos.
Diante da necessidade de regulamentação do tema foi sancionada a Lei nº
12.318/2010, que trata da alienação parental, importante ferramenta para que seja reconhecida
a situação de extrema gravidade e prejuízo à pessoa do menor e daquele que está sujeito a ser
vitimado.
Para Jorge Trindade, a Lei da Alienação Parental mostrou-se um instrumento e o
jurídico dotado de eficácia para combater esse fenômeno. Além do mais o legislador optou
por uma técnica descritiva e exemplificativa quanto as hipóteses de conduta do alienador, o
que permite uma identificação mais célere por parte dos operadores do direito e das partes
envolvidas no conflito.79
4.1 COMENTÁRIOS À LEI 12.318/2010
Serão abordados, a partir da agora, os artigos da de Lei da Alienação Parental e
breves comentários:
78
Ibidem. 79
Ibidem, p. 211.
47
Art. 2º Considera-se ato de alienação parental a interferência na formação
psicológica da criança ou do adolescente promovida ou induzida por um dos
genitores, pelos avós ou pelos que tenham a criança ou adolescente sob a sua
autoridade, guarda ou vigilância para que repudie genitor ou que cause prejuízo ao
estabelecimento ou à manutenção de vínculos com este. Parágrafo único. São formas exemplificativas de alienação parental, além dos atos
assim declarados pelo juiz ou constatados por perícia, praticados diretamente ou
com auxílio de terceiros:
I - realizar campanha de desqualificação da conduta do genitor no exercício da
paternidade ou maternidade;
II - dificultar o exercício da autoridade parental;
III - dificultar contato de criança ou adolescente com genitor;
IV - dificultar o exercício do direito regulamentado de convivência familiar;
V - omitir deliberadamente a genitor informações pessoais relevantes sobre a criança
ou adolescente, inclusive escolares, médicas e alterações de endereço;
VI - apresentar falsa denúncia contra genitor, contra familiares deste ou contra avós,
para obstar ou dificultar a convivência deles com a criança ou adolescente;
VII - mudar o domicílio para local distante, sem justificativa, visando a dificultar a
convivência da criança ou adolescente com o outro genitor, com familiares deste ou
com avós.
Percebe-se que alienação parental funda-se na atuação de um sujeito, denominado
alienador, na prática de atos que envolvam de uma forma depreciativa um dos genitores.
Na visão de Douglas Philips, o rol do art. 2° da Lei da Alienação Parental e seu
parágrafo único é exemplificativo, tanto o conceito quanto as hipóteses e ainda os sujeitos que
podem incorrer na prática da alienação. Importante ressaltar que tal prática não se restringe
apenas aos genitores, podendo ocorrer com todos os que possam se valer de autoridade
parental ou afetiva com intuito de prejudicar um dos genitores.80
Art. 3º A prática de ato de alienação parental fere direito fundamental da criança ou
do adolescente de convivência familiar saudável, prejudica a realização de afeto nas
relações com genitor e com o grupo familiar, constitui abuso moral contra a criança
ou o adolescente e descumprimento dos deveres inerentes à autoridade parental ou
decorrentes de tutela ou guarda.
O art. 3° caracteriza a conduta ilícita e abusiva por parte do alienante, o que justifica
a propositura de ação de danos morais contra ele. Quando configurada a alienação parental
constitui grave abuso moral contra a criança ou adolescente, além do mais constitui
descumprimento dos deveres inerentes à autoridade parental.
Art. 4º Declarado indício de ato de alienação parental, a requerimento ou de ofício,
em qualquer momento processual, em ação autônoma ou incidentalmente, o
processo terá tramitação prioritária, e o juiz determinará, com urgência, ouvido o
Ministério Público, as medidas provisórias necessárias para preservação da
integridade psicológica da criança ou do adolescente, inclusive para assegurar sua
80
Ibidem, p. 30.
48
convivência com genitor ou viabilizar a efetiva reaproximação entre ambos, se for o
caso.
Parágrafo único. Assegurar-se-á à criança ou adolescente e ao genitor garantia
mínima de visitação assistida, ressalvados os casos em que há iminente risco de
prejuízo à integridade física ou psicológica da criança ou do adolescente, atestado
por profissional eventualmente designado pelo juiz para acompanhamento das
visitas.
No art. 4° o legislador previu ao identificarem a prática de Alienação Parental,
partes, magistrado e membro do Ministério Público, devem impor tramitação prioritária ao
processo bem como promover medidas que resguardem os direitos do menor em defesa do
genitor alienador.
Ressalta-se que separação total entre o alienador e o menor deve ser a última medida,
buscando sempre soluções que mantenham, ainda que diminuída, a convivência entre ambos.
Art. 5º Havendo indício da prática de ato de alienação parental, em ação autônoma
ou incidental, o juiz, se necessário, determinará perícia psicológica ou
biopsicossocial.
A Lei prevê a possibilidade de uma ação autônoma para a identificação de indícios
da Alienação Parental. Permite ainda que no tramite das ações de divorcio, regulamentação de
visitas, possa se requerer a averiguação de prática de alienação.
Art. 6º Caracterizados atos típicos de alienação parental ou qualquer conduta que
dificulte a convivência de criança ou adolescente com genitor, em ação autônoma ou
incidental, o juiz poderá, cumulativamente ou não, sem prejuízo da decorrente
responsabilidade civil ou criminal e da ampla utilização de instrumentos processuais
aptos a inibir ou atenuar seus efeitos, segundo a gravidade do caso:
I - declarar a ocorrência de alienação parental e advertir o alienador;
II - ampliar o regime de convivência familiar em favor do genitor alienado;
III - estipular multa ao alienador;
IV - determinar acompanhamento psicológico e/ou biopsicossocial;
V - determinar a alteração da guarda para guarda compartilhada ou sua inversão;
VI - determinar a fixação cautelar do domicílio da criança ou adolescente;
VII - declarar a suspensão da autoridade parental.
Parágrafo único. Caracterizado mudança abusiva de endereço, inviabilização ou
obstrução à convivência familiar, o juiz também poderá inverter a obrigação de levar
para ou retirar a criança ou adolescente da residência do genitor, por ocasião das
alternâncias dos períodos de convivência familiar.
O art. 6° traz as possíveis soluções para alienação parental. De acordo com Fábio
Vieira, se perante as provas produzidas nos autos restar comprovada a alienação parental, o
magistrado deverá tomar medidas no sentido de anular ou amenizar os efeitos já ocorridos.
Frisa-se que as medidas judiciais elencadas nos incisos do artigo em questão devem
adotadas conforme o grau de estágio em que estará a Alienação Parental.
49
Fábio Vieira ainda esclarece que o rol de medidas inseridas no art. 6° é apenas
exemplificativo, podendo existir outras medidas aplicadas na prática que possam eliminar os
efeitos da Alienação Parental. 81
Art. 7º A atribuição ou alteração da guarda dar-se-á por preferência ao genitor que
viabiliza a efetiva convivência da criança ou adolescente com o outro genitor nas
hipóteses em que seja inviável a guarda compartilhada.
A Lei da Alienação Parental afirma que a guarda compartilhada deve ser aplicada
sempre que possível e afirma que esta deve ser a regra sendo exceção à guarda em sua
modalidade unilateral.
Para Douglas Phillips este artigo deve ser interpretado em acordo com o art. 1.584 do
Código Civil, que diz que “as necessidades especificas do filho” ou “ a distribuição de tempo
necessário ao convívio” devem ser levados em conta na fixação da guarda e do período de
convivência.
Art. 8º A alteração de domicílio da criança ou adolescente é irrelevante para a
determinação da competência relacionada às ações fundadas em direito de
convivência familiar, salvo se decorrente de consenso entre os genitores ou de
decisão judicial.
Trata-se da competência para julgas as ações de Alienação Parental. Fabio Vieira diz
que a competência é de natureza absoluta, fixada quanto à matéria, dessa forma não é possível
que as partes a modifiquem.82
4.2 O PAPEL DA PSICOLOGIA FORENSE NO TRATAMENTO DA SÍNDROME DA
ALIENAÇÃO PARENTAL
Outro ponto importante a ser observado quanto à Alienação Parental no Poder
Judiciário é a perícia multidisciplinar, prevista no art. 5° da Lei 12.318.
Douglas Philips definiu a perícia multidisciplinar como sendo:
A designação genérica das perícias que poderão ser realizadas em conjunto ou
separadamente na ação judicial. É composta por perícias sociais, psicológicas,
médicas, entre outra que se fizerem necessárias para o subsidio e certeza da decisão
judicial. 83
81
Ibidem, p. 70. 82
Ibidem, p. 79. 83
Ibidem , p. 45.
50
Os psiquiatras e psicólogos são os chamados especialistas da área de psiquiatria
forense.
Uma vez detectada a presença de Alienação Parental nos litígios e necessitando o
juiz concluir quem tem mais condições para adquirir ou manter a guarda, surge a necessidade
de chamar um profissional da psicologia para auxiliar nessas situações, tendo em vista que o
objeto da perícia são assuntos que fogem da objetividade e requerem uma análise profissional
específica.
Neste caso, a perícia psicológica poderá determinar, por exemplo, qual dos genitores
detém melhores condições de atender as necessidades do menor.
Para a psicóloga Denise Maria, um bom profissional da psicologia deve deter um
conhecimento teórico e também prático sobre a psicologia infantil.84
O grande valor do psicólogo para os casos de família e em especial a Alienação
Parental se deve a capacidade e técnica de escutar o que não foi dito. Assim, percebe questões
subjetivas que fogem da competência de outros profissionais. Seu laudo, provavelmente,
auxiliará a fundamentação da decisão judicial.
Em síntese, não pode o magistrado deixar de adquirir importantes informações
técnicas por intermédio de profissionais da psicologia, pois por meio de seus laudos e estudos,
promoverá uma apreciação cuidadosa do caso quando perceber indícios de Alienação
Parental.
4.3 JURISPRUDÊNCIAS E RELATOS DE CASOS
A Internet tem se mostrado importante ferramenta para a divulgação e expansão dos
casos de Alienação Parental. Vítimas e personagens deste triste enredo utilizam esta
ferramenta para divulgação de suas histórias com intuito de buscarem por auxílio e
esclarecimentos sobre o tema, e até mesmo compartilhar suas experiências com outras
pessoas.
Com essa forma de propagação todos se beneficiam, a sociedade como um todo e em
especial vítimas e operadores do Direito, que adquirem nova ótica acerca dos conflitos
familiares e disputas judiciais, conseguindo identificar de forma clara situações em que
ocorrem a Alienação Parental.
84
SILVA, Denise Maria Perissini da. Psicologia Jurídica no Processo Civil Brasileiro: a interface da
psicologia com direitos nas questões de família e infância. São Paulo: Casa do Psicólogo, 2003, p. 62.
51
Em abril de 2009, um advogado, doutor e professor da USP/Largo São Francisco,
cotado para vaga de ministro do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), famoso pela calma e
moderação, matou o próprio filho, de 5 anos, cometendo, após, suicídio. Deixou como
explicação do episódio a seguinte carta:85
Aos meus amigos,
Em primeiro lugar, saibam que estou muito bem e que a decisão foi fruto de
cuidadosa reflexão e ponderação.
Na vida, temos prioridades e a minha sempre foi meu filho, acima de qualquer outra
coisa, título ou cargo.
Diante das condições impostas pela mãe e pela família dela e de todo o ocorrido, ele
não era e nem seria feliz. Dividido, longe do pai (por vontade da mãe), não se sentia
bem na casa da mãe, onde era reprimido inclusive pelo irmão da mãe bêbado e
agressivo, fica constrangido toda vez que falam mal do pai, a mãe tentando sempre
afastar o filho do pai etc.
A mãe teve coragem até de não autorizar a viagem do filho para a Disney com o
próprio pai, privando o filho do presente de aniversário com o qual ele já tanto
sonhava, para conhecer de perto o fantástico lugar sobre o qual os colegas de escola
falavam.
No futuro, todas as datas comemorativas seriam de tristeza para ele, por não poder
comemorar em razão da intransigência materna.
Não coloquei meu filho no mundo para ser afastado e ficar longe dele e para que ele
sofresse.
Se errei, é hora de corrigir o erro, abreviando-lhe o sofrimento. Infelizmente, de
todas as alternativas foi a que me restou e pode ser resumida na maior demonstração
de amor de um pai pelo filho.
Agora teremos liberdade, paz, e poderei cuidar bem do filho.
Fiquem com Deus!
A carta demonstra uma situação extrema e grave da SAP, coloca em evidencia a
fragilidade de um pai diante da “morte em vida” do filho, preferiu ele a verdadeira morte a
continuar vivenciando aquela condição.
Em seu trabalho de conclusão de curso, que atualmente é referencia sobre o tema,
Felipe Niemezewski, embasado por uma matéria publicada no Jornal Correio Brasiliense,
reproduziu outro caso verídico acerca do tema:
Ao telefone, o pequeno Iago, de 3 anos, xinga. Do outro lado da linha, o pai,
estupefato, tenta entender o que leva um garotinho tão novo a agir assim. Na
verdade, o menino é vítima de um problema que somente há poucos anos foi
identificado: a Síndrome de Alienação Parental, ou SAP. O termo é pouco
conhecido. Mas seus efeitos devastadores fazem parte da rotina de milhões de pais
que, com o fim do casamento, são afastados emocionalmente de seus filhos pelo
detentor da guarda das crianças, a mãe em 94% dos casos. O caso da mãe de Iago é
típico. O menino só poderia visitar o pedagogo H.L., de 27 anos, caso a noiva do pai
não estivesse presente. Não bastassem as exigências, a mãe dizia ao filho
repetidamente: ''A tia Lu (noiva de H.L.) é má, ela é muito ruim para você''. A
primeira sensação dos pais que sofrem com a SAP é de desespero e total impotência.
Isso acontece, em primeiro lugar, por desconhecimento da síndrome. Apenas quando
85
Ibidem.
52
soube da existência da SAP, H.L. conseguiu recuperar parte da tranquilidade e
perceber que ele não poderia mais se submeter à situação forçada pela mãe de Iago.
Entrou na Justiça para regulamentar às visitas ao filho. Há um mês, sente-se aliviado
por ao menos conseguir ver o menino com alguma frequência. O pedagogo tenta aos
poucos reverter a campanha negativa contra a ex-namorada a seu favor e reforçar os
laços afetivos com a criança. Mas o noivado do rapaz não resistiu à pressão: ''Luto
agora para reatar com a pessoa que amo'', conta.86
O relato acima corrobora com afirmação de que não somente a criança vitima da
Alienação sofre graves consequências, mas também o genitor alienado e todos que o cercam e
participam direta ou indiretamente desta situação.
A revista ISTOÉ de novembro de 2008 dedicou matéria esclarecedora sobre a
Alienação Parental, relatando casos verídicos de situações típicas, um deles relata a situação
de afastamento do pai que perdurou por anos.
Fazia seis anos que Karla, de oito, não via o pai. Nem mesmo por foto. Sua irmã
mais nova, Daniela, nem sequer o conhecia. Quando seus pais se separaram, ela
ainda estava na barriga de sua mãe. Aquela noite de 1978, portanto, era muito
especial para as duas irmãs. Sócrates havia deixado o Rio de Janeiro, onde morava, e
desembarcado em São Luís do Maranhão, onde elas viviam com a mãe, para tentar
uma reaproximação. “Minha mãe disse que nosso pai iria nos pegar para jantar”,
conta Karla Mendes, hoje com 38 anos. As garotas, animadas e ansiosas, tomaram
banho, se perfumaram e vestiram suas melhores roupas. “Acontece que meu pai
nunca chegou, ficamos lá, horas e horas, até meia-noite”, diz. Enquanto as meninas
tentavam superar a decepção, a mãe repetia sem parar: “Tá vendo? O pai de vocês
não presta! Ele não dá à mínima!”. Naquele dia, Karla viveu sua primeira grande
frustração. Mas o maior baque aconteceu 11 anos depois, quando recebeu uma
ligação inesperada do pai, que até então estava sumido. Karla começou a entender
que sua mãe havia armado contra todos naquela noite – e em outras incontáveis
vezes. Ela descobriu que o pai esteve mesmo em São Luís. Para ele, minha mãe
prometeu que iríamos à praia em sua companhia, mas sumiu com a gente quando ele
passou para nos pegar. Para nós, inventou o jantar”, conta Karla. De tão
desorientada com a descoberta, trancou a faculdade por um ano para digerir a
história. “O mais difícil foi descobrir que meu pai não era um monstro”, diz Karla,
que há 20 anos tem uma relação próxima com o pai, mas não fala com a mãe desde
que descobriu que ela manipula da mesma forma seus dois outros filhos de outro
casamento. 87
Sabe-se que o enfrentamento das questões de Alienação Parental pelos tribunais é
imprescindível para a preservação dos vínculos familiares. As jurisprudências tem
demonstrado que cada vez mais a Alienação Parental é observada em casos de conflitos
familiares, principalmente naqueles de disputa por guarda, regulamentação de visitas e
divórcio.
86
ROSA, Felipe Niemezewski. A Síndrome de Alienação Parental nos casos de separações judiciais no
Direito Civil Brasileiro. Disponível em: <http://www.alienacaoparental.com.br/biblioteca>. Acesso em: 07
maio 2012. 87
Famílias Dilaceradas. Matéria vinculada pela revista ISTOÉ Independente. Disponível em: <http:/
/www.terra.com.br/istoe/edicoes/2038/imprime117195.htm>. Acesso em: 07 maio 2012.
53
As decisões a seguir mostram como tem entendido os tribunais a respeito da
Alienação Parental.
GUARDA. SUPERIOR INTERESSE DA CRIANÇA. SÍNDROME DA
ALIENAÇÃO PARENTAL. Havendo na postura da genitora indícios da presença
da síndrome da alienação parental, o que pode comprometer a integridade
psicológica da filha, atendo melhor ao interesse da infante mantê-la sob a guarda
provisória da avó paterna. Negado provimento ao agravo.88
APELAÇÃO CÍVEL. MÃE FALECIDA. GUARDA DISPUTADA PELO PAI
E AVÓS MATERNOS. SÍNDROME DA ALIENAÇÃO PARENTAL
DESENCADEADA PELOS AVÓS. DEFERIMENTO DA GUARDA AO PAI.
Não merece reparos a sentença que, após o falecimentos da mãe, deferiu a guarda da
criança ao pai, que demonstra reunir todas as condições necessárias para
proporcionar a filha um ambiente familiar com amor e limites, necessários ao seu
saudável crescimento. A tentativa de invalidar a figura paterna, geradora da
síndrome de alienação parental, só milita em desfavor da criança e pode ensejar,
caso persista, suspensão das visitas aos avós, a ser postulada em processo próprio,
Negaram provimento. Unânime.89
Nota-se que o entendimento jurisprudencial do Tribunal de Justiça do Rio Grande do
Sul é no sentido de preservar o melhor interesse da criança, como se depreende dos julgados
acima.
EMENTA: AÇÃO DE REGULAMENTAÇÃO DE VISITAS - PRINCÍPIO DO
MELHOR INTERESSE DA CRIANÇA - AVERSÃO DO MENOR À FIGURA
DO PAI - INDÍCIOS DE ALIENAÇÃO PARENTAL - NECESSIDADE DE
CONVIVÊNCIA COM A FIGURA PATERNA - ASSEGURADO O DIREITO
DE VISITAS, INICIALMENTE ACOMPANHADAS POR PSICÓLOGOS -
REFORMA PARCIAL DA SENTENÇA. O direito de vistas decorre do poder
familiar, sendo a sua determinação essencial para assegurar o desenvolvimento
psicológico, físico e emocional do filho Nos casos de ALIENAÇÃO PARENTAL,
não há como se impor ao menor o afeto e amor pelo pai, mas é necessário o
estabelecimento da convivência, mesmo que de forma esporádica, para que a
distância entre ambos diminua e atenue a aversão à figura paterna de forma
gradativa. - Não é ideal que as visitas feitas pelo pai sejam monitoradas por uma
psicóloga, contudo, nos casos de ALIENAÇÃO PARENTAL que o filho demonstra
um medo incontrolável do pai, torna-se prudente, pelo menos no começo, esse
acompanhamento. - Assim que se verificar que o menor consegue ficar sozinho com
o pai, impõem-se a suspensão do acompanhamento do psicólogo, para que a
visitação passe a ser um ato natural e prazeroso.90
88
RIO GRANDE DO SUL. Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul. Apelação Cível n°
70017390972. Sétima Câmara Cível. Rel. Des. Luis Felipe Brasil Santos. Disponível em:
<http://tj.rs.gov.br>. Acesso em:07 maio 2012. 89
RIO GRANDE DO SUL. Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul. Apelação Cível n°
70014814479. Rel. Des. Maria Berenice Dias. Disponível em: <http://tj.rs.gov.br>. Acesso em:07 maio 2012. 90
MINAS GERAIS. Tribunal de Justiça de Minas Gerais. Apelação Cível n° 1705243-51.2006.8.13.0701. 6°
Câmara Cível. Rel. Des. Sandra Fonseca. Disponível em: <http://www.tjmg.jus.br>. Acesso em: 07 maio
2012.
54
Percebe-se nas decisões acima que o restabelecimento da convivência entre o genitor
alienado e a criança vitima é essencial para amenizar as consequências da alienação parental.
Ação de Modificação de Guarda - Decisão que deferiu a visitação assistida da
genitora em local próprio nas dependências do Fórum, quinzenalmente. Esforços empreendidos no sentido de conscientizar os litigantes da importância para
os filhos e genitores da convivência harmoniosa de casais separados. Constatação,
por este Relator, de sentimentos indesejáveis como posse, domínio, intransigência,
entre muitos outros, inviabilizando e comprometendo o sucesso da guarda
compartilhada. Existência de ordenamento jurídico que existe e merece ser
prestigiado - Lei nº 12.318/2010, que dispõe sobre a Alienação Parental. Análise
minuciosa da prova documental e dos Pareceres Sociais - Documentos recentes
anexados pela agravante que não corroboram as alegações do agravado no sentido
de que o convívio da menor com a genitora ofereça risco de transtornos psicológicos
a mesma, mas, muito pelo contrário, recomendam o direito da filha em desfrutar de
um período maior em companhia de sua mãe. Ausência de convencimento no
sentido da necessidade da visitação assistida - Modificação da decisão - Provimento
parcial do recurso.91
Como já elucidado, a maioria dos casos de alienação parental tem como figura
alienadora a mãe, já que após a dissolução da união em grande parte está detém a guarda dos
filhos. Entretanto, existem casos distintos, em que a mãe é a figura alienada, é o que
demonstra o caso acima.
4.4 MOVIMENTOS NO COMBATE À ALIENAÇÃO PARENTAL
A Alienação Parental é situação vivenciada por inúmeras famílias. Isto tem
movimentado vítimas e possíveis vítimas a buscarem e também divulgarem toda e qualquer
informação sobre o tema.
No Brasil a Alienação Parental ganhou voz com entidades e ONGs voltadas à
proteção da família. Destacando-se, entre elas, as descritas a seguir.
4.4.1 Pais Para Sempre
Com sede em Lisboa, Portugal, e atuação nacional, a associação Pais para Sempre
trabalha no sentido de assegurar às crianças e aos pais a continuidade dos laços familiares
após a dissolução da relação entre genitores.
91
RIO DE JANEIRO. Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro. Processo nº. 0014558-26.2010.8.19.0000. 1ª
Câmara Cível. Des. Relator Camilo Ribeiro Ruliere. Disponível em: <http://www.tjrj.jus.br
/scripts/weblink.mgw>. Acesso em: 12 maio 2012.
55
O art. 3° do seu estatuto descreve o mais importante objetivo da associação: “A
Associação tem por objectivo a defesa dos Direitos Humanos e da Criança, especificamente,
no que concerne ao Direito que todas as Crianças têm em manter contacto directo e
permanente com os dois Pais, e estes com os seus Filhos”.92
Em defesa do denominado superior e melhor interesse da criança, a associação
trabalha para promover a educação parental e programas de apoio para crianças em risco de
serem privadas do contato com um de seus genitores e deste com os seus filhos.
4.4.2 Associação de Pais e Mães Separados (APASE)
A ONG APASE é uma das entidades mais importantes na luta contra a Alienação
Parental. Presidida por Analdino Rodrigues Paulino, vitima juntamente com sua filha da
prática da Alienação, defende a ideia de que filhos de pais separados têm direito de serem
criados por qualquer um de seus genitores sem discriminação de sexo, e promove a
participação efetiva de ambos os genitores no desenvolvimento dos filhos.
Fundada na cidade Florianópolis no ano de 1997 atualmente possui sedes em
diversas capitais. A APASE tem grande importância na divulgação acerca do tema da
Alienação Parental, vejamos:
O fundador com sua ativa atuação, vinculada ao site da APASE, conseguiu chamar a
atenção da mídia, dos operadores do direito e da sociedade brasileira para a
problemática dos filhos de casais separados. O levantamento e discussão do
problema trouxe como uma das primeiras conquistas a percepção pela ala mais bem
informada e mais preparada do judiciário brasileiro e dos Operadores do Direito o
interesse pelo assunto, que os levaram a estudar melhor o problema e a tomar
atitudes e decisões mais de acordo com a nossa legislação já existente, que de certa
forma era ignorada. 93
Entre os principais objetivos da APASE está o de defender os direitos de igualdade
filial entre pais e mães estabelecido na Constituição da República Federativa do Brasil e em
outros dispositivos legais, quando houver preconceito ou discriminação praticados por
pessoas ou Instituições, cujas consequências representem qualquer tipo de prejuízo às
crianças, filhos de pais separados.
92
Estatuto da Associação para a Defesa dos Filhos de Pais Separados “PAIS PARA SEMPRE”. Disponível em:
<http://www.paisparasempre.eu/arquivo/estatutos-apps.pdf>. Acesso em: 04 maio 2012. 93
História da ONG APASE. Disponível em: <http://www.apase.org.br/>. Acesso em: 04 maio 2012.
56
4.4.3 Pais Por Justiça
O movimento Pais por Justiça luta para quebrar o conceito de que após a separação
do casal apenas a mãe tem condições de deter a guarda dos filhos.
Somos um grupo de homens e mulheres que busca alertar a sociedade sobre uma das
mais sórdidas formas de agressão e encontrar mecanismos para combatê-la: o abuso
emocional causado pela alienação parental. Esta é nossa luta contra os absurdos
cometidos contra nossos filhos, contra nossos direitos e os direitos deles!94
O movimento foi criado em 2007 em razão do descontentamento de um grupo de
pais, que por interferência da mãe, não conseguiam conviver com seus filhos. Tem como
objetivo o combate à Alienação Parental preocupando-se com os danos psicológicos causados
a criança vítima da Alienação.
4.4.4 SOS Papai e Mamãe
A ONG surgiu a partir de um grupo de pessoas, em sua maioria, pais e mães
separados e conscientes da importância de uma convivência harmoniosa e equilibrada entre
pais e mães em benefício dos filhos. Assim como os outros movimentos, tem como foco
principal as crianças.
Com efetivo contato, colaboração e participação de profissionais e instituições do
Brasil e do exterior, pretende promover a conscientização de nossa sociedade para a
importância destes assuntos, propor e desenvolver ações práticas para que as
crianças possam ter uma convivência equilibrada com seus dois pais e, através deste
site, ser uma fonte de consultas para profissionais e público em geral.95
Defende que pais e mães deixem suas divergências e dificuldades de lado a fim de
preservar a educação dos filhos.
4.4.5 Pai Legal
Trata-se de um grupo virtual privado de trabalho para a promoção do debate do
estudo da guarda compartilhada e de um modelo diferente de paternidade. Dedica-se também
à divulgação e ao combate da Alienação Parental.
94
Movimento Pais por Justiça. Disponível em: <http://paisporjustica.com.br/>. Acesso em: 04 maio 2012. 95
SOS Papai e Mamãe. Disponível em: <http://www.sos-papai.org/br_index.html>. Acesso em: 04 maio 2012.
57
Uma equipe de pais que lutam pelo direito de viver com seus filhos e poder oferecer
uma paternidade de excelência. Contamos com auxílio de mães e filhos. Somos pais
que resolveram arregaçar as mangas e construir um site para atender as nossas
necessidades de pai na criação de nossos filhos, seja lutando pelo nosso direito à
convivência com eles após a separação do casal como também pela qualidade de
nossa paternidade. 96
O grupo concentra suas atenções no pai, público-alvo do Pai Legal e luta pelo direito
de viver com seus filhos e poder oferecer uma paternidade de excelência.
Pai Legal tem uma característica de não envolver a participação de mães na luta a
condutas reprováveis de afastamento do não guardião do filho. Possui como objetivo o
resguardo do papel paterno na vida do menor e o fortalecimento dos laços entre o pai e o
filho.
96
Quem somos PAILEGAL, PAI LEGAL OU PAI LEGAU? Disponível em: <http://www.pailegal.net /quem -
somos>. Acesso em: 04 maio 2012.
58
CONCLUSÃO
Diante das considerações expostas no presente trabalho evidenciou-se o quanto a
prática da Alienação Parental afronta a dignidade da pessoa humana, o direito a convivência
familiar e o melhor interesse do menor. Trata-se do desejo egoísta de um dos genitores, ou até
mesmo de quem possua autoridade em relação ao menor, de calar toda e qualquer expressão
de carinho da criança para com o outro genitor. Nesse contexto, o genitor guardião, movido
pelo sentimento de rejeição e privilegiado por passar maior parte do tempo com o menor
inicia um processo de destruição da imagem do não detentor da guarda, o que desencadeia
uma aversão do menor ao não guardião.
No primeiro capítulo do presente trabalho tratou-se de aspectos gerais da família e
constatou-se uma nova configuração familiar, que prioriza os laços de afetividade que une
seus membros, em especial no tocante a filiação que se desvencilhou do fator apenas
biológico valorizando ainda mais o fator afetivo, assim a família socioafetiva se tornou uma
realidade da qual a doutrina e jurisprudência buscam se aproximar.
O segundo capítulo versou sobre o que se conhece como nascedouro da alienação
parental, a dissolução da união afetiva e disputas pela guarda dos filhos. Esclareceu-se as
peculiaridades do instituto da guarda dando ênfase ao princípio do melhor interesse do menor,
que deve ser orientador de toda e qualquer decisão que envolva menores.
Após o embasamento dos primeiros capítulos adentrou-se no assunto da Alienação
Parental destacando a importância de sua identificação, já que dessa forma a intervenção
psicológica e jurídica ocorrerá antes de consequências mais graves. O ponto de partida para
essa identificação é atentar-se ao comportamento do genitor alienador, para isso o presente
trabalho encarregou-se de trazer os comportamentos clássicos do genitor alienador e também
do menor envolvido. Trouxe ainda as possíveis consequências na criança vitima e no genitor
que tem o filho afastado. Neste capítulo destacou-se ainda as falsas denuncias de abusos
sexuais e síndrome de falsas memórias, artifícios cruéis e vingativos usados pelo alienador.
Em seguida, o quarto capitulo cuidou de posicionar a alienação parental no poder
judiciário, apresentando comentários acerca da Lei 12.318/2010, que além de trazer sanções
estabeleceu todo o procedimento destinado ao enfrentamento desta prática. Relatou-se casos e
59
jurisprudências para se entender de que forma o judiciário vem se comportando diante da
questão.
Para enriquecimento dos conhecimentos trazidos neste trabalho e procurando aliar a
teoria com a realidade das varas de família, entrevistou-se a Dra. Caren Leticia97
sobre o
tema.
A Magistrada relatou que já presenciou diversos casos de alienação parental.
“Atualmente, por jurisdicionar em uma vara especializada em família, quase que
semanalmente me deparo com situações de alienação parental, em maior ou menor grau”.
Assim o trabalho em questão tratou de uma discussão moderna sobre um assunto
antigo e comum em muitas famílias. A verdade é que essa prática, muitas vezes silenciosa,
assola milhares de pais e crianças, traz consequências graves à vida adulta do vitimado, além
fazer com que um pai (ou mãe) tenha que lhe dar com uma dor permanente, “semelhante à
morte viva” 98
além da renuncia a convivência com o próprio filho.
97 Dra. Caren Leticia Castro Pereira é Juíza de Direito do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul e atua na 3°
Vara Cível da Comarca de Alegrete, especializado em família, sucessões, infância e juventude. 98
Ibidem.
60
OBRAS CONSULTADAS
ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NBR 6027: informação e
documentação: sumário: apresentação. Rio de janeiro, 2002.
______. NBR 6028: informação e documentação: resumo: apresentação. Rio de janeiro, 2003.
______. NBR 10520: informação e documentação: citações em documentos: apresentação.
Rio de janeiro, 2002.
BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil: Texto constitucional
promulgado em 05 de outubro de 1988, com as alterações adotadas pelas Emendas
Constitucionais n° 1/92 a 56/2007. – Brasília: Senado Federal, Subsecretaria de Edições
Técnicas, 2008.
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art. 236 da Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990. Disponível em:
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61
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TRINDADE, Jorge. Manual de Psicologia Jurídica para operadores do Direito. 5 ed.
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62
APÊNDICE
Entrevista realizada no dia 28/05/2012 com a Dra. Caren Leticia Castro Pereira, Juíza
de Direito do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, jurisdicionando na 3° Vara
Cível de Alegrete, especializada em família, sucessões, infância e juventude.
1) Dra. Caren, fale um pouco de sua trajetória como magistrada. Há quanto tempo está
na profissão? Tomei posse no ano de 2001, como Juíza de Direito do Tribunal de Justiça do
Estado do Rio Grande do Sul. Este ano completo 11 anos de Magistratura. Jurisdicionei a 3ª
Vara Cível de Uruguaiana, por um ano. Depois me classifiquei na Vara Judicial Única de
Quarai, onde fiquei até janeiro de 2009, oportunidade em que me removi para a 1ª Vara
Judicial de Encantado e após, em 2011 me promovi para a 3ª Vara Cível de Alegrete,
especializada em família, sucessões, infância e juventude, onde atuo.
2) Nestes anos de profissão já esteve a frente de algum caso que demonstrasse indícios da
alienação parental? Se sim, poderia relatar? Já tive diversos casos em que havia indícios
de alienação parental umas de forma mais evidente e grave, outras de uma maneira mais
dissimulada e leve. As mais graves ocorrem quando há efetivamente uma tentativa de
rompimento de relacionamento do filho como outro genitor, inclusive sugestionando maus
tratos, exposição a algum risco e até mesmo abuso sexual. Outras, as mais “leves”, com
criação de empecilhos e dificuldades ao exercício do direito de visitas a ser exercido pelo
genitor que não está com a guarda. Atualmente, por jurisdicionar uma vara especializada em
família, quase que semanalmente me deparo com situações de alienação parental, em maior
ou menor grau. Recentemente ingressou na vara uma ação autônoma visando à declaração de
ocorrência de alienação parental, com aplicação das medidas legais pertinentes, tendo a parte
autora postulado a inversão da guarda, relando inúmeros fatos que entendia configuradores da
alienação, dentre os quais: troca de escola, da particular para uma pública, sem prévia
comunicação ou consentimento; negativa de informações acerca de tratamento médico que o
filho estava se submetendo; omissão acerca das consultas médicas e rotinas do filho;
desmoralização do outro genitor, denegrindo sua conduta como pai e como profissional,
fazendo comparações com o atual companheiro; valorização de situações pretéritas de cunho
negativo que “minavam” o relacionamento entre pai e filho; “entrevista inquisitorial” ao
retorno de cada visita ao filho etc. Neste caso, designei uma audiência conciliatória, e após
quase três horas de audiência, demonstrando para o genitor alienador os equívocos de seu
agir, o que estava causando sofrimento e prejuízos ao filho, foi feito um acordo e posto fim ao
63
litígio. Na audiência a parte ré e suposto genitor alienador teve a oportunidade de externar
toda a sua aflição e contrariedade com os fatos que originaram a separação do casal, o que
evidenciou a causa de seu agir e que o filho estava sendo utilizado como instrumento de
vingança.
3) Como definiria alienação parental? Acredito que o texto legal define adequadamente o
que seja (Lei 12.318/2010), mas em síntese seria quando um dos genitores ou alguém que
exerça a guarda ou vigilância sobre a criança/adolescente deflagra uma conduta tendente a
excluir o vínculo entre o filho e o outro genitor, utilizando-se para tanto das mais diversas
estratégias que se caracterizam sempre pela desqualificação do outro, fazendo uma “lavagem
cerebral” no filho, obrigando-o a tomar partido entre um ou outro, o que traz sério prejuízo ao
desenvolvimento psíquico da criança.
4) A senhora julgava necessária a criação da Lei 12.318/2010, a Lei da Alienação
Parental? Sim, a lei se fazia necessária, pois trouxe uma ferramenta jurídica que autoriza a
adoção de procedimentos e medidas adequadas ao caso, propiciando um tratamento mais
isonômico às situações de alienação parental, o que antes não se tinham e ficava a critério do
entendimento e sensibilidade de cada julgador.
5) Na prática é difícil identificar a alienação parental? A prática da alienação parental, no
meu entendimento, é muito fácil de se identificar, bastando uma avaliação através de uma
equipe multidisciplinar, por exemplo, estudo social, avaliação psicológica e também em
alguns casos a simples oitiva das partes pelo juiz autoriza a conclusão. O que é mais difícil de
precisar é o quanto a conduta do alienador influenciou ou influencia o filho, pois crianças são
muito sugestionáveis e adolescentes são mais questionadores, até mesmo por serem mais
desenvolvidos psicologicamente.
6) A senhora acredita que o poder judiciário apresenta resistência em reconhecer a
alienação parental e em atuar contra essa prática? Não vejo nenhuma resistência no
Judiciário em reconhecer a prática, pelo contrário, já se vinha, antes mesmo da lei, sanando
estas distorções.
7) O acompanhamento psicológico tem importância efetiva na solução desses conflitos?
O Estado consegue ofertar este serviço? Dependendo do grau da alienação, o
64
acompanhamento psicológico é efetivo. Nestes casos, se encaminha a família para a rede
municipal, a qual, aqui em Alegrete, através dos CREAS, centros de referência especializados
no atendimento, presta o serviço a contendo. Claro que o sucesso do tratamento fica
condicionado a que as famílias atendam aos encaminhamentos, parecendo às consultas.
8) A senhora acredita que o fator econômico influencie na Alienação Parental? Em que
aspecto se daria essa influência? O fator econômico não influencia, pois ocorre em todas as
classes sociais, o que efetivamente é determinante é a forma como o casal lida com a
separação, se deixa as mágoas e o ódio perseverarem, com espírito vingativo, ou se
efetivamente “viram a página”.
9) Nos conflitos familiares levados ao judiciário quais atitudes do alienador são mais
comuns? A alienação parental não exige uma forma específica para se caracterizar, sendo que
as estratégias são múltiplas e variadas, contudo talvez a mais perceptível seja a colocação de
empecilhos ou até mesmo o impedimento do exercício da visitação ao filho pelo outro genitor
e para isso lança-se mão dos mais diversos argumentos: ex.: não quer contato do filho com a
atual companheira ou companheiro do ex; não quer que o filho vá a determinados lugares; a
criança tem que estudar; a pensão não está em dia; está muito frio ou diz que o filho não quer
ir, sendo que contribuiu para tal atitude etc. Acrescento que o mais comum é o genitor
guardião praticar a alienação, mas não raras as vezes o outro genitor, o não guardião, “cria”
situações e passa a condição de alienador com o fito de buscar um alteração de guarda
Alegrete, 28 de maio de 2012.
Dra. Caren Leticia Castro Pereira
Juíza de Direito