UNIOESTE – UNIVERSIDADE ESTADUAL DO OESTE DO PARANÁ
CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS, EDUCAÇÃO E LETRAS
CAMPUS DE MARECHAL CÂNDIDO RONDON
COLEGIADO DO CURSO DE HISTÓRIA
VILMA FIOROTTI
O JOVEM E O MUNDO DO TRABALHO
MARECHAL CÂNDIDO RONDON
2008
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VILMA FIOROTTI
O JOVEM E O MUNDO DO TRABALHO
Proposta Didática Pedagógica apresentado à coordenação do PDE (Programa de Desenvolvimento Educacional) como exigência parcial para a participação no programa, sob a orientação da Mestra Aparecida Darc de Souza Professora da Universidade Estadual do Oeste do Paraná – Campus de Marechal Cândido Rondon.
MARECHAL CÂNDIDO RONDON
2008
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PRODUÇÃO DIDÁTICA PEDAGÓGICAUNIDADE DIDÁTICA
Vilma Fiorotti
Disciplina: História
Colégio: Estadual Mendes Gonçalves – EFMP
Núcleo: Toledo
Série: 1ª Ensino Médio
Conteúdo Estruturante: Relações de Trabalho
Conteúdo Específico: A Exploração do Trabalho Juvenil
Título: O Jovem e Mundo do Trabalho
Relação Interdisciplinar 1: Sociologia
Relação Interdisciplinar 2: Filosofia
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SUMÁRIO
1. O JOVEM E O MUNDO DO TRABALHO..................................... 05
1.1 - A Produção Industrial Capitalista e a Formação da
Sociedade de Consumo................................................. 06
1.2 - Industrialização e Construção da Sociedade de
Consumo no Brasil.......................................................... 12
2. O Mundo do Trabalho Legal e Ilegal, Formal e Informal.......... 19
3. O Jovem Trabalhador e o Chão da Fábrica............................. 26
4. O Jovem Trabalhador: as variadas situações de
exploração do trabalho infanto-juvenil no final do
Século XX e início do Século XXI.......................................... 29
5. Referências Bibliográficas.................................................. 38
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1. O JOVEM E O MUNDO DO TRABALHO
Apresentação
Diante da perspectiva de fazer um estudo sobre a questão que envolve
o jovem e o mundo do trabalho, me proponho nesta produção didática
pedagógica a abordar o assunto já contemplado por outros colegas
historiadores.
O tema em questão pretende levar o jovem a entender como se
consolidou a prática da exploração do trabalho infanto-juvenil no mundo, no
Brasil e especialmente no Paraná. Bem como apontar os prejuízos que o
trabalho precoce trás as crianças e adolescentes em idade escolar.
Busco com esta produção destacar a industrialização e a construção da
sociedade de consumo, as atividades exercidas pelos jovens trabalhadores, o
tempo dedicado ao trabalho, à remuneração obtida e os prejuízos que a
longa jornada de trabalho provoca a vida escolar.
Os textos relacionados ao tema “o Jovem e o Mundo do Trabalho” têm a
pretensão de manter um diálogo contínuo com o educando, despertando no
mesmo o desejo de levantar novas questões e reflexões critica. As questões
para discussão propostas no final de cada texto pretendem estimular o aluno
a comparar informações, analisá-las e formar seu próprio juízo. Por isso, para
muitas das questões a resposta é pessoal.
Para pensar estas questões relacionadas ao trabalho infanto-juvenil além
de autores ligados a sociologia, propõe-se historiadores articulados à Nova
Esquerda Inglesa. Pois, estes fornecerão subsídios teóricos que partem das
possibilidades reais de ensino. Transformando o conteúdo cotidiano da sala
de aula em um processo que resulta na análise, reflexão e construção do
conhecimento histórico.
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1.1 - A Produção industrial capitalista e a formação da sociedade de
consumo.
As transformações tecnológicas provenientes da
revolução industrial contribuem na redução da
população camponesa e no aumento da
população urbana. Aos trabalhadores
despossuídos dos meios de produção só restou à
venda da força de trabalho como única forma de
sobrevivência. Neste momento o capitalismo
como sistema em vias de consolidação precisava transformar a mentalidade
campesina em mentalidade capitalista de consumo (HOBSBAWM, 1995, p.
284-285). Para isso era necessário produzir máquinas cada vez mais
eficientes que acelerassem a produção em massa, e uma maior divisão do
trabalho. Vale ressaltar que a produção em grande escala, tornava possível a
redução do custo por unidade, ao mesmo tempo em que aumentava o
volume da produção e possibilitava o consumo por parte da classe
trabalhadora.
O desenvolvimento e a consolidação do capitalismo como sistema
econômico possibilita o aumento dos lucros por parte da burguesia,
acentuando a exploração da mão-de-obra e a luta por melhores salários. Em
tempos de consolidação do capital esta luta torna-se cotidiana para uma
classe trabalhadora que esperava melhorar suas condições de vida e sentia-
se fortalecida para se contrapor a exploração capitalista imposta pela
industrialização.
Enquanto o capitalismo se consolidava e alterava o modo de vida da
classe trabalhadora esta se mobilizava e prosseguia com suas lutas para
quebrar a disciplina da fábrica, operários sentiram-se identificados por
interesses comuns, e criaram formas de relacionamento pessoal baseados na
solidariedade, (as sociedades de auxílio mútuo) que transformavam o desejo
individual em projeto de muitas pessoas que viviam em condições sociais
semelhantes. Surgiam assim, as primeiras organizações operárias do século
6
Consumo-www.vestemoda.com.brAcesso: Novembro - 2008
XIX, que propiciou aos trabalhadores a conquista de muitos direitos. Desde
esse período a classe operária passou a ser motivo de preocupação para a
burguesia e/ou governantes que passaram a buscar alternativas de como
manter a exploração do trabalho.
Em função disso o final do século XIX e o início do século XX são
marcados por grandes transformações no mundo do trabalho. A exploração
capitalista neste momento conta com dois novos princípios de organização
que norteiam as relações capital-trabalho no seio das grandes indústrias.
São eles:
Cena do filme Tempos Modernos - Falalivre.wordpress.com Acesso: Novembro - 2008
Cena do filme Tempos Modernos - Memexx.wordpress.comAcesso: Novembro de 2008
Texto 1
- Taylorismo, termo derivado do nome de seu inventor, o engenheiro americano Taylor (1865-1915), baseado na estrita separação entre as tarefas de concepção e de execução, acompanhada de uma parcelização das últimas, devendo cada operário, em última análise, executar apenas alguns gestos elementares;- Fordismo, com base nos princípios tayloristas, desenvolve-se a me-canização do processo de trabalho, um verdadeiro sistema de máquinas que garante a unidade (a recomposição) do processo de trabalho parcelado, ditando a cada operário seus gestos e sua cadência (sendo sempre a cadeia de montagem a forma extrema desse princípio). É o que posteriormente será denominado "fordismo” tendo sido Henry Ford o pri-meiro a introduzir, a partir de 1913, uma cadeia de montagem em suas indústrias automobilísticas de Detroit. (BIHR, 1998, p. 39-40)
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Segundo Alain Bihr (1985) estes dois princípios enquanto responsáveis
pela reestruturação da ordem produtiva monopolizam o saber e a habilidade
do operário. Pois, necessita de trabalhadores com capacidade física
adaptados à noção de divisão de tarefas, um sistema que absorve apenas os
operários que são um complemento da máquina, trabalham de forma
acelerada ao ritmo da esteira, operários que atendam a produção em massa.
Operários incorporados ao sistema, submetidos à aceleração das tarefas, um
trabalhador submetido a movimentos ininterruptos e repetitivos, obrigado a
comportar-se de forma mecânica e passiva. Neste contexto o fordismo e o
taylorismo reorganizam a exploração capitalista. As esteiras de montagem
aliadas à redefinição do tempo de trabalho possibilitam grande aumento de
produtividade na indústria em detrimento a uma expropriação ainda maior
da classe trabalhadora. (BIHR, 1998 P. 39 e 40).
A introdução do fordismo-taylorismo como princípio capitalista,
inaugura uma nova fase de exploração da classe trabalhadora à medida que
determina uma disciplina operária e absorve o trabalhador ao tempo da
fábrica, impossibilitando sua organização sindical. Neste contexto para
garantir o emprego e a sobrevivência, o trabalhador se submete às
exigências impostas pelo capital.
O ritmo de produção sustentada pela disciplina na fábrica, logo provoca
um desequilíbrio entre o excesso de mercadorias produzidas e o escasso
poder aquisitivo da classe trabalhadora. Surge então uma conjuntura
econômica de superprodução capitalista, tendo como um de seus marcos, a
crise de 1929, ano em que os conflitos entre as classes sociais tornaram-se
mais profundas e que os setores explorados da sociedade (operários e
camponeses) reclamavam por melhores condições de vida.
Em função da crise, alguns capitalistas modernistas entre eles Henry
Ford entenderam que a estabilidade do sistema capitalista está vinculada ao
aumento proporcional do poder de compra da classe trabalhadora. A crise
dos anos 1930, associada às lutas da classe trabalhadora foi responsável por
reformas sustentadas pelos seguintes argumentos:
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Texto 2
Garantir a todo operário um salário mínimo, correspondente a uma norma de consumo considerada irredutível; e, sobretudo um crescimento dos salários reais, por meio da indexação do salário nominal aos preços (instituição da "escala móvel de salários") e levando em conta, implícita ou explicitamente, os ganhos de produtividade previstos na empresa, no ramo ou mesmo em toda a economia nacional; o que significava ampliar a norma de consumo do proletariado no ritmo do desenvolvimento da produtividade do trabalho social.Instituir práticas e procedimentos de negociação coletiva por ramos e em nível nacional, chegando à adoção de contratos coletivos com força constrangedora para os agentes econômicos individuais (empregadores e assalariados), de modo a permitir o controle pactuado (entre patronato e sindicatos supervisionados pelo Estado) da massa salarial global.Para garantir a regulação da acumulação intensiva (a continuidade de seu processo de circulação e, portanto, de seu processo de produção), instituir um salário indireto (ou salário social) financiado por recolhimentos obrigatórios (impostos e/ ou cotizações sociais); ou seja, um conjunto de benefícios sociais (em espécie ou in natura), colocando o assalariado e os seus ao abrigo dos acasos naturais ou sociais da existência (doença, invalidez, desemprego, velhice, sobrecargas ligadas à educação das crianças), garantindo-Ihe a possibilidade de reproduzir sua força de trabalho (de acordo com normas sociais determinadas) em todas as circunstâncias (BIHR, 1998 P. 43).
As exigências colocadas em pauta pela classe trabalhadora, resultam
na institucionalização de leis que define o acordo selado com a burguesia e
que proporciona ao proletariado um ganho real possibilitando-o tornar-se
consumidor.
Estas transformações provocam também mudanças nos padrões de
consumo, a produção em série permite a classe trabalhadora usufruir de
bens até então consumidos apenas pelas classes mais abastadas. O
desenvolvimento industrial e o aumento da produção criam mecanismos que
levam a classe trabalhadora, principalmente os jovens a ter novas
necessidades de consumo. Influenciado pela sociedade capitalista movida
pelo lucro o jovem trabalhador é conclamado a consumir. O mundo moderno
lhe apresenta tecnologias que o fascina levando-o a viver e a consumir de tal
forma, que atenda a necessidade do mercado. Visto que, ao fazer parte do
processo produtivo o jovem além de suprir a falta de mão-de-obra, consume
produtos industrializados, contribuindo assim, na consolidação do processo
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produção e consumo.
Segunda metade do século XX, as transformações econômicas e
sociais que estão ocorrendo provocam mudanças básicas nos arranjos
familiares. A crise oriunda destas transformações e das novas relações
construídas por conta da entrada da mulher e do jovem no mercado de
trabalho é responsável pelo surgimento de uma cultura juvenil específica. Os
jovens trabalhadores da sociedade de consumo tornam-se um grupo com
vontade própria, conquistam o direito de escolha, suscitando profundas
mudanças nas relações familiares deste período. (HOBSBAWM, 1995 p. 317).
A consolidação desta jovem sociedade do consumo faz uma revolução
nos modos e costumes, as velhas convenções são abolidas, a juventude
assimila novos valores, o rock e o jeans passam a representar a juventude
moderna, que neste momento torna-se uma massa concentrada de poder de
compra. A hegemonia cultural do EUA aparece nos estilos de vida de jovens
de diversos países. A descoberta deste mercado jovem revolucionou a
indústria e o comércio de eletrônicos, calçados e roupas. A inserção no
processo produtivo como consumidor e mão-de-obra levaram a juventude a
construir símbolos materiais e culturais de identidade. (HOBSBAWM, 1995 p.
320-322).
Nesta moderna sociedade industrial, os laços de solidariedade e o
sistema moral pautado em “direitos e deveres, pecado e virtude, sacrifício,
consciência, prêmios e castigos” (HOBSBAWM, 1995 p. 331), são banidos do
vocabulário cotidiano dos jovens. O modo de ordenar a sociedade não está
pautado em interesses coletivos, a nova realidade econômica e social
sustentada pela produção e consumo não permite mais este valor social. A
estruturação da vida neste momento parte de preferências individuais, cada
um passa a buscar aquilo que atenda aos seus interesses imediatos, sem
preocupações morais e éticas. Neste contexto cada indivíduo busca o que
considera melhor para si, o que impera é a lei de Gerson (levar vantagem
em tudo). A moderna sociedade industrial torna os jovens cada vez mais
individualistas e competitivos.
Em função disso, muito cedo é incutido nos adolescentes necessidades
que só podem ser supridas com a venda de sua força de trabalho. Para
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satisfazer estas “prioridades” são obrigados a entrar precocemente para o
mercado de trabalho. Com a renda obtida consomem as novidades ofertadas
pelo mercado e contribuem no enriquecimento da burguesia que os explora.
Com o avanço de novas tecnologias é necessário aperfeiçoar a mão-
de-obra e o jovem é incentivado a estudar e trabalhar, sua longa jornada de
trabalho e estudo é justificada com conceitos criados pelo próprio sistema
capitalista, que necessita de mãos hábeis que executam tarefas
determinadas pela linha de produção das grandes fábricas. Para poder
consumir grande parte de seu tempo é utilizado com o trabalho remunerado.
Já que este “trabalho” responde a um ordenamento econômico que privilegia
o acúmulo de riqueza e expressa o consumo como padrão ideal de vida,
juntando assim dois fatores convergentes; o jovem que precisa trabalhar e o
mercado de trabalho que necessita de mão-de-obra barata.
ATIVIDADES:
01- Após a leitura caracterizar os elementos básicos presentes no texto que
constituem o funcionamento do sistema capitalista.
02-Com base no texto 1, explique como o fordismo-taylorismo reorganiza a
exploração capitalista e fazem uma nova definição do tempo de trabalho na
indústria.
03- Tendo como referência a leitura do texto 2 enumere as reforma
defendidas pela classe trabalhadora da década de 1930.
04- A condição econômica de grande parte das famílias brasileiras não
permite que o jovem se aproprie dos bens produzidos pela própria economia
capitalista. No entanto esta mesma sociedade incute no jovem que sua
integração social esta vinculada ao consumo. Baseada nesta afirmação
escreva sua opinião sobre a entrada do jovem no mercado de trabalho.
05- Monte um painel na escola com notícias sobre o jovem e o mercado de
trabalho.
06- Faça um levantamento das pretensões de cada colega da classe em
termos profissionais, escreva um pequeno texto sobre as suas conclusões,
baseando-se no seguinte roteiro:
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a) Qual a viabilidade de concretização destes sonhos profissionais?
b) Quais os principais motivos que levam um jovem a abandonar um
sonho?
07- Brincando de imaginar... Faça uma previsão das mudanças que precisam
ocorrer no Brasil para que todos os jovens comecem a trabalhar somente
após a conclusão dos estudos.
1.2 - Industrialização e Construção da Sociedade de Consumo no
Brasil
Brasil início do século XX, o capitalismo industrial dá seus primeiros
passos, o número de empresas aumenta significativamente, transformando a
economia e a sociedade. As transformações econômicas dão margem a
novos interesses e a nascente indústria brasileira vai pleitear proteção ao
governo. Articulado a indústria surge à burguesia e o proletariado,
responsáveis pelo crescimento dos centros urbanos, pelo aumento
populacional das cidades, pelo consumo e desenvolvimento da indústria.
O início da industrialização brasileira é sustentado por capitais
originários da agricultura. Capital este responsável pelo surgimento de uma
burguesia industrial com raízes oligárquicas como relata Sonia Mendonça:
Devido à íntima relação entre as atividades cafeeira e industrial, a formação da burguesia industrial foi marcada, por um lado, pela duplicidade dos papéis e funções econômicas representados por um mesmo agente social como no caso, por exemplo, do cafeicultor que se transformava, ele próprio, em industrial. Por outro lado, a constituição da burguesia industrial brasileira também se caracterizou por um grande entrosamento entre famílias de cafeicultores e de empresários-imigrantes, sobretudo por meio de casamentos. Através de ambos os processos, criava-se uma razoável afinidade entre os interesses agrários e os interesses industriais, afinidade essa que, mesmo em conjunturas econômicas específicas que, simultaneamente,
desfavoreciam a uns e beneficiavam a outros - como no caso da desvalorização da moeda, favorável ao cafeicultor, mas não ao industrial - impediu a emergência de conflitos abertos entre ambos principalmente quando se tratava de discutir o protecionismo à indústria ou a questão da taxa cambial. (MENDONÇA, 1995 p. 20)
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Assim, a região sudeste se tornou o centro industrial do Brasil. Pois,
além do capital oriundo da cafeicultura, contou com a entrada de imigrantes
de diversas nacionalidades e trabalhadores do campo desestimulados com a
situação de exploração que sofriam nas grandes fazendas de café. Dessa
forma, a desilusão com o trabalho no campo contribui para o aumento da
mão-de-obra urbana e a consolidação do setor industrial brasileiro.
O desenvolvimento da indústria foi transformando a sociedade e a
economia brasileira. Novos produtos são ofertados aos consumidores, no
entanto o acesso aos bens de consumo é restrito a um grupo social
privilegiado, detentor das riquezas do país. Segundo Sonia Mendonça,
durante a crise econômica provocada pela Segunda Guerra Mundial à classe
trabalhadora perdeu ainda mais o poder aquisitivo de compra, consumindo
apenas o necessário a sobrevivência. Dessa forma se encerra a primeira
etapa da industrialização brasileira. (MENDONÇA, 1995 p. 27).
A segunda etapa do processo industrial para Mendonça, é marcada por
mudanças estruturais provocada pela crise de 1929, que dificulta a
importação de bens manufaturados abrindo espaço à expansão da indústria
nacional subsidiada pelo Estado. O investimento em novos setores
produtivos é responsável por mudanças estruturais na indústria brasileira.
Produtos até então importados passam a ser produzidos no Brasil,
possibilitando a classe média e operária das estatais consumirem bens
produzidos pela indústria nacional. Assim o capitalismo brasileiro encerra a
era Vargas e chega à década de 1950, com uma sociedade de consumo
estabelecida que sustenta os privilégios dos empresários brasileiros.
O crescimento industrial atrai cada vez mais, trabalhadores urbanos.
“Ainda que a média dos salários fosse baixa, o poder total de consumo da
população havia crescido” (MENDOÇA, 1995 p. 54) e isso incentivava a saída
do campo e a busca de um trabalho urbano assalariado. Foi neste contexto
que Juscelino Kubistchek assumiu o governo do Brasil em 1956. Ao tomar
posse, incentivou a produção dos chamados bens de consumo duráveis, tais
como os automóveis e os eletro-eletrônicos. Para ampliar o parque industrial
e atrair empresas estrangeiras ao Brasil, Juscelino adotou incentivos à
importação de máquinas e equipamentos, disponibilizou financiamentos
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subsidiados, isenção de impostos às empresas, que aqui se instalaram,
facilitou remessas de lucros destas empresas para o exterior, dentre outras
medidas. No entanto as mesmas condições não foram oferecidas às
indústrias nacionais, criando situações de concorrência desleal e protestos
dos industriais brasileiros acostumados ao protecionismo getulista.
(MENDONÇA, 1995 p. 60-62).
Este desenvolvimento industrial mesmo que com capital estrangeiro,
foi responsável pelo surgimento de um novo público consumidor, criado
especificamente a partir do final da década de 1950, Pois, ao optar pela
abertura do Brasil ao capital internacional e por uma política externa de
incentivo às importações JK possibilitou a classe média o consumo de alguns
produtos que apenas europeus e americanos até então tinham acesso.
Segundo Mendonça (1995) o modelo econômico implantado por
Juscelino Kubstchek produziu grande concentração de renda e as
conseqüências desta concentração apareceram posteriormente no governo
de João Goulart que assume a presidência do Brasil em 1961 e que já no
início de seu governo enfrenta uma grave crise econômica gerada pelo
desenvolvimentismo de JK, que gerou inflação, desemprego, baixos salários
e uma indústria que proporcionava muitos lucros as empresas internacionais.
Ao perceber que estes lucros não eram utilizados para aumentar salários, ou
baratear produtos a classe trabalhadora se mobiliza e organiza sucessivas
greves.
Em 1962, o presidente João Goulart para amenizar as tensões sociais e
estimular a economia, instituiu o décimo terceiro salário, uma medida para
acelerar o consumo no final do ano comercial e amenizar os problemas
econômicos causados pela política econômica de JK. Assim a chamada
“sociedade de consumo” foi se constituindo e tornando-se uma expressão
atual do capitalismo.
A partir da década de 1960, a televisão e os demais meios de
comunicação de massa brasileiros através do discurso publicitário direto e
indireto, passaram a exercer grande pressão principalmente nos jovens de
classe média, para que estes se tornassem assíduos consumidores. A
televisão foi se impondo como um meio de comunicação e hoje faz parte do
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cotidiano das classes pobres possibilitando uma uniformização dos padrões
referenciais de consumo, fazendo com que as mesmas mercadorias sejam
desejadas pelas pessoas com maior poder aquisitivo de compra, como
também pela população de baixa renda.
No início da industrialização brasileira apenas os ricos e a classe média
podiam consumir determinadas mercadorias, hoje os produtos “importados”
possibilitam o consumo de eletro-eletrônicos, proporcionando principalmente
o jovem a sentir-se incluído nesta sociedade que valoriza o ter. Ao sair para
uma balada o jovem trabalhador sente-se igual, ao consumir produtos
idênticos aos consumidos pelas classes mais abastadas. Segundo Maldonado
(2003, p. 6) “A importância aparente do consumo seria relacionada aos
aspectos ideológicos desta nova fase do capitalismo que valoriza o ter”. Ao
falar da cultura do consumo que se consolidou na sociedade atual
Maldonado faz referência a Jacob Gorender que escreve:
A sociedade capitalista se apresenta como sociedade do espetáculo, tal qual definiu Debord. Importa mais do que tudo a imagem, a aparência, a exibição. A ostentação do consumo vale mais que o próprio consumo. O reino do capital fictício atinge o máximo de amplitude ao exigir que a vida se torne ficção de vida. A alienação do ser toma o lugar do próprio ser. A aparência se impõe por cima da existência. Parecer é mais importante do que ser (GORENDER, 1999 p.125).
Os valores capitalistas que se consolidaram na sociedade brasileira,
influenciam principalmente os jovens a agir de acordo com os interesses
imediatos. Prioriza-se apenas o que oferece determinadas “vantagens”. Se
um grupo social ou um objeto lhe dá condições de inserção social busca-se a
participação neste grupo ou a conquista deste objeto. O importante é o
status que isso pode representar como identificação perante a sociedade
que este jovem pertence, a aparência se sobrepõe à existência como afirma
Gorender.
Para a manutenção deste próprio sistema é difundida a idéia que todos
são capazes de consumir. E o trabalhador utiliza parte de seu salário
adquirindo produtos que a mídia apresenta como necessidade. Assim possuir
um determinado produto torna-se sinônimo de status. E o jovem para ser
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aceito no grupo utiliza o dinheiro que recebe comprando coisas que lhe
abrem portas para esta sociedade que valoriza a aparência. À medida que
seu ganho não é suficiente para suprir seu consumo, a necessidade de
ostentar uma aparente realidade o faz recorrer ao comércio informal
(camelôs), no centro das cidades brasileiras, pois, mesmo adquirindo um
produto de qualidade inferior perante seu grupo de convívio sente-se
socialmente incluído.
Nesse contexto a ideologia do consumo atinge a todos, crianças, jovens
e adultos. O jovem com mais intensidade, independente se pertence à classe
média ou a classe trabalhadora sofre o mesmo tipo de pressão para
consumir. E se as condições materiais da família, não atende seus anseios de
consumo, adentram precocemente ao mercado de trabalho, muitas vezes
prejudicando os estudos para atender uma necessidade imposta pelo
capitalismo. Isso quando não se envolvem em atividades consideradas
“ilegais” para atender os anseios de consumo que lhe foram incutidos no
decorrer da vida pelos meios de comunicação de massa.
O grande desafio hoje é desconstruir o conceito de consumo,
consolidado na sociedade brasileira, que associa o exercício da cidadania a
capacidade de apropriação de bens de consumo. As gerações constroem
suas identidades tendo como requisito básico aquilo que possuem ou
almejam possuir, os produtos padronizam um grupo social, os vínculos
sociais, étnicos e até nacionais aos poucos são superados, o jovem brasileiro
de uma pequena cidade que possui uma renda considerável, tem acesso aos
mesmos produtos consumidos por um adolescente de uma grande cidade
americana ou européia (CATAPAN&THOMÉ, 1999 p. 90).
A relação que o jovem constrói com as compras e encara o processo de
consumo está intimamente ligado ao mito de felicidade, o bem estar
atrelado a um determinado produto. O bombardeio de propagandas
incentivando o consumo acaba camuflando os interesses da classe industrial
que necessita ditar regras de consumo para atender os anseios capitalistas
que utiliza o lucro e o acúmulo de riquezas como estratégia de manutenção
do próprio sistema. Carlos Drumond de Andrade retrata muito bem essa
sociedade do consumo no poema:
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EU ETIQUETA
Em minha calça está grudado um nome Que não é meu de batismo ou de cartório Um nome... estranho. Meu blusão traz lembrete de bebida Que jamais pus na boca, nessa vida, Em minha camiseta, a marca de cigarro Que não fumo, até hoje não fumei. Minhas meias falam de produtos Que nunca experimentei Mas são comunicados a meus pés. Meu tênis é proclama colorido De alguma coisa não provada Por este provador de longa idade. Meu lenço, meu relógio, meu chaveiro, Minha gravata e cinto e escova e pente, Meu copo, minha xícara, Minha toalha de banho e sabonete, Meu isso, meu aquilo. Desde a cabeça ao bico dos sapatos, São mensagens, Letras falantes, Gritos visuais, (...) E fazem de mim homem-anúncio itinerante, Escravo da matéria anunciada. Estou, estou na moda.É doce estar na moda, ainda que esta modaSeja negar minha identidade.Trocá-la por mil, açambarcandoTodas as marcas registradas,Todos os logotipos do mercado.Com que inocência demito-me de serEu que antes era e me sabia. (...) Eu que antes era e me sabia Tão diverso de outros, tão mim mesmo, Ser pensante sentinte e solitário Com outros seres diversos e conscientes
De sua humana, invencível condição. Agora sou anúncio Ora vulgar ora bizarro. (...) Peço que meu nome retifiquem. Já não me convém o título de homem. Meu nome novo é Coisa. Eu sou a Coisa, coisamente.
Fragmentos do poema “Eu Etiqueta” do livro Poesia e Prosas de Carlos Drumond de Andrade. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 1988.
Montelato, Cabrine e Catelli. HistóriaTemática. Scipcione, 2000 p. 14
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O poema de Drumond retrata um jovem que é obrigado a se adequar a
um padrão de vida imposto pela sociedade de consumo, onde os livros são
trocados por produtos que o deixam igual ao modelo estipulado pela
mídia.Vale ressaltar que, mesmo no espaço escolar se dá enfase a aparência,
o jovem se afirma perante os colegas pelo seu estilo de vida. Quem não se
enquandra ao padrão de consumo imposto pelos meios de comunicação de
massa se sente culpado por não consumir. Nesse contexto os problemas
sociais são deixados de lado, o salário baixo, o desemprego, a atuação no
mercado de trabalho informal, o exercício de atividades remuneradas
consideradas “ilegais” ficam em segundo plano, a prioridade é desfilar um
estilo de vida construído pela sociedade capitalista da qual faz parte.
O jovem se submete a um padrão de vida que lhe é apresentado e
acaba reafirmando sua possibilidade de existência no mundo pela sua
capacidade de compra, a relação com os iguais é sustentada pela lógica do
consumo, ao comprar um produto se compra um sonho de inclusão. Percebe-
se que grande parte dos jovens trabalhadores, não tem acesso a maioria dos
produtos apresentados. No entanto a mídia vende um sonho de vida
responsabilizando o sujeito pela sua própria miséria, isso leva o jovem a
desenvolver uma necessidade de pertencimento a um determinado grupo,
dessa forma o capitalismo vai encontrando mecanismos para impor a
ideologia do consumo que serve mais ao interesse do capital que ao
interesse do consumidor.
ATIVIDADES:
1- Segundo o poema de Carlos Drumond de Andrade qual o comportamento
de um jovem que é educado nos valores da sociedade de consumo?
2- Explique com suas palavras o que o poeta quis dizer com o verso: “É doce estar na moda, ainda que esta moda, seja negar minha identidade. Trocá-la por mil, açambarcando, todas as marcas registradas, todos os logotipos do mercado. Com que inocência demito-me de ser, eu que antes era e me sabia”.
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3- Leia as afirmativas abaixo:
− O dinheiro do jovem trabalhador raramente se converte em bens pessoais, na maioria das vezes se torna complemento da renda familiar, diferente dos jovens das classes média e alta, que são consumidores, e contribuem de forma significativa para sustentação do capitalismo como sistema hegemônico que explora o trabalho de crianças e adolescentes.
− Segundo os meios de comunicação de massa, tanto os trabalhadores de renda mínima, como os de classe média e/ou classe média alta que atuam em grandes empresas familiares, estão inseridos na lógica capitalista, isso é são assíduos consumidores. Na sua opinião todos os jovens que estão inseridos no processo produtivo, trabalham para consumir?
2. O Mundo do Trabalho Legal e Ilegal, Formal e Informal.
Fragmentos da música:
Dança do desempregado
Autor da letra e música:
Gabriel o Pensador
Essa é a dança do desempregado Quem ainda não dançou tá na hora de aprender A nova dança do desempregado Amanhã o dançarino pode ser você
E vai descendo vai descendo vai E vai descendo até o Paraguai E vai voltando vai voltando vai "Muamba de primeira olha aí quem vai?" E vai vendendo vai vendendo vai Sobrevivendo feito camelô E vai correndo vai correndo vai O rapa tá chegando olha aí sujô!...
No final do século XIX e Início do século XX as transformações no
sistema de trabalho no Brasil continuam favorecendo a exploração do
19
Vendedor de Rua –
trabalho humano e, por conseqüência, o trabalho de crianças e
adolescentes. Neste período o capitalismo Brasileiro faz emergir novas
formas de pensamento que se constituíram em bases importantes de sua
consolidação. Na medida em que o sistema se consolida, vai se construindo
a mentalidade burguesa e a exploração do trabalho é justificada, seja ele do
adulto ou do jovem. Visto que, este capitalismo mesmo ligado à idéia de
progresso, desde o início é responsável por um sistema de exploração do
trabalho que gera exclusão e pobreza.
Nesse período, transição do trabalho compulsório para o trabalho livre,
muda-se também a concepção de legalidade e ilegalidade. A burguesia rural
e urbana preocupada com a negação ao trabalho disciplinado, conta com a
ajuda do Estado para desenvolver mecanismos de coerção que solidificam a
idéia de propriedade. Os versos populares escritos no final do século XVIII
que retratam o furto ao viveiro de D. Tomás, governador de Pernambuco,
denominam a colheita em propriedade particular, uma atividade ilegal,
utilizada como mecanismo para combater a “vadiagem”.
A Tainha
Aviltante duplamente
É tua pena Simplício
Horrível, porco flagicio
Dum nababo inelente!
Até quando essa Tainha
Que ao pescoço tens pendida
Restará de apodrecida
Esturricada na espinha?
Pique-te, esta na mente
Toma sentido rapaz!
Não se bole impunemente
Nas coisas de D. Tomás
(BARREIRO, 2005 p. 11)
Homem negro do século XIX www.asminasgerais.com.br Acesso: Novembro - 2008
20
Se apropriar de um bem para matar a fome era uma atividade legal
até a abolição, visto que, o Senhor segundo as leis do período escravista
tinha a obrigação em prover o sustento de seus escravos. Com a abolição, e
a necessidade de legitimação da propriedade privada, as leis são
modificadas, Simplício ao furtar a tainha é preso e condenado a trabalhos
forçados. Percebe-se que uma prática cotidiana, utilizada como recurso de
sobrevivência da população excluída e expulsa do mundo do trabalho neste
momento torna-se crime.
A forma como foram legitimadas as relações de trabalho neste período,
contribuiu para empurrar grande parte da população brasileira à
marginalização, criando um contingente de “desocupados” que o poder
instituído da época denominava de grupo social adepto da “vadiagem e
prostituição” (BARREIRO, 2005 p. 10-11).
Neste momento, era primordial para o processo de consolidação do
Estado nacional, legitimar também a idéia de propriedade para assim
estabelecer “as bases da hegemonia Cultural burguesa”(BARREIRO, 2005 p.
12). Em função disso, a burguesia nacional se utiliza do poder do Estado para
impor mecanismos de coerção e combater a negação ao trabalho
disciplinado, quando legitima como crime a retirada da tainha do viveiro do
governador ou a colheita indevida de frutas e cereais feita por pessoas que
não possuem uma ocupação regularizada pelo mercado de trabalho.
Segundo Barreiro (2005) na consolidação do Estado Nacional brasileiro o
próprio Estado, de acordo com os interesses da burguesia nascente
determina e define o que é crime e o que é considerada uma atividade legal.
Vale ressaltar que até o final do século XIX e início do século XX a
economia brasileira sustentava-se pela agro-exportação, com um
insignificante desenvolvimento industrial, já que a indústria brasileira se
defrontava abertamente com a concorrência dos produtos ingleses. Nesse
período ao mesmo tempo em que o Estado definia como crime uma
atividade exercida pela população pobre, expedia documentos que protegia
grandes monopólios e assegurava exorbitantes lucros a fazendeiros e
comerciantes. Considerando atividade legal, ou ilegal aquela que o Estado,
os grandes proprietários de terra e a burguesia mercantil definiam.
21
(BARREIRO, 2005 p. 16).
No início do século XX, industriais montam fábricas em vários Estados
do país, sem que isso signifique uma industrialização generalizada. As novas
relações de produção que surgiam com a industrialização, além de
dependerem de novos mecanismos de coerção, precisavam incutir valores
que levassem o trabalhador a considerar a venda da força de trabalho, uma
coisa legítima e natural, uma virtude da liberdade, uma fonte de riquezas,
conceitos capitalistas que predominavam há muito tempo no mundo europeu
e que eram novidade no Brasil. A situação de exploração e a própria
necessidade levava a população pobre a romper com o conceito de
honestidade socialmente estabelecido. As classes pobres neste momento
vão desenvolver laços de solidariedade para tentar romper com as
imposições sociais estipuladas pela classe dominante. (BARREIRO, 2005 p.
18-19).
Frente a essa realidade, José Carlos Barreiro enfatiza que a
malandragem e a esperteza foram se constituindo tanto entre as classes
subalternas como entre as classes abastadas. Junto à identidade nacional
brasileira foi-se construindo vínculos baseados na ideologia do valor. Como
muitos da classe dominante constroem sua fortuna utilizando-se de
atividades ilícitas, a população pobre e explorada acreditava que retirar da
burguesia rural e urbana, o que ela acumulou de forma ilegal era aceitável.
Ao perceber a formação deste ideário nacional esta mesma elite brasileira
sente necessidade de construir um conceito de moralidade entre os pobres e
este valor moral deve ser repassado junto aos conteúdos curriculares das
escolas e nos sermões das igrejas. Assim o Brasil vai se constituindo como
nação (BARREIRO, 2005 p. 22-23).
Concomitante à consolidação do Estado Nacional Brasileiro vai se
formando a classe operária. Nas primeiras décadas do século XX, por falta de
uma legislação trabalhista a mão-de-obra assalariada, torna-se uma
mercadoria livremente negociada, as relações de trabalho são determinadas
pelos empregadores que pagam o salário “justo”, segundo as normas sociais
definidas pelos próprios empresários. (NORONHA, 2003 p. 112)
Nesse período, as condições de vida e trabalho eram as que os patrões
22
impunham. A jornada de trabalho era muito longa, chegando há dezoito
horas por dia. Trabalho noturno para mulheres, crianças e jovens era comum.
Relatos da época falam de inúmeras crianças e adolescentes trabalhando
nas indústrias de São Paulo e Rio de Janeiro. Elas habitavam junto aos
familiares lugares insalubres sem as mínimas condições de higiene. Nesse
período não havia uma legislação trabalhista. Salário, horas de trabalho
férias, tudo dependia da vontade do patrão. A burguesia da época não
admitia o direito de organização sindical.
No entanto os operários formavam suas associações e lutavam
legalmente ou clandestinamente contra o capital. A exploração do trabalho
agita o período e a arma usada contra a exploração do trabalho foi à greve,
que nasce junto à classe operária e contribui para abalar o Estado
oligárquico dos anos 1920.
Na década de 1930, com Getúlio Vargas no poder, a burguesia muda
de posição. Se até aquele período se opunha violentamente a qualquer
legislação que regulamentasse as relações de trabalho agora exige que o
Estado desenvolva uma legislação trabalhista.
Neste contexto o Estado varguista institui a CLT (Consolidação das Leis
do Trabalho) e com ela a regulamentação das relações de trabalho, que
especifica as atividades remuneradas consideradas como formais informais,
legais e ilegais. Gradativamente a legislação trabalhista foi definindo as
regras mínimas conhecidas como direitos sociais para que, uma atividade
remunerada fosse considerada um trabalho justo e formal. Entre estes
direitos aparece o registro em carteira, salário mínimo, jornada de oito horas
diárias, e férias anuais. (NORONHA, 2003 p. 113)
A adoção da carteira de trabalho, ao mesmo tempo em que insere o
trabalhador no “mercado formal”, também funciona como mecanismo de
controle, já que nela se registra as empresas e o comportamento do
trabalhador no período em que este, presta serviço a um determinado grupo
econômico. Assim quem tem carteira assinada e consegue provar um vínculo
empregatício perante as leis trabalhistas brasileiras é considerado um
trabalhador do “mercado formal”, e quem exerce uma atividade remunerada
sem registro em carteira faz parte do “mercado de trabalho informal”, vende
23
sua força de trabalho, recebe salário, mas os “direitos sociais” não são
assegurados perante a lei (NORONHA, 2003 p. 114).
O governo centralizador de Vargas, difundiu uma mentalidade de
cunho teórico onde a população foi induzida a acreditar que seus atos, eram
exclusivamente para beneficiar o povo sofrido. No entanto, seu discurso não
trouxe mudanças reais, a teoria getulista sempre esteve desvinculada da
realidade cotidiana do povo brasileiro. Isso tudo veio á tona no final da 2ª
Guerra Mundial, quando o grupo que dava sustentação ao seu governo
passou a questionar o regime autoritário do Estado Novo. As elites contrárias
a Vargas começaram a manifestar-se. Getúlio percebeu que havia inimigos
no poder, tentou se articular junto às classes populares, concedendo
aumento de salários e ampliando leis sociais. Setores da burguesia e
militares percebendo a inquietação popular se anteciparam e garantiram o
poder, destituindo Vargas em novembro de 1945.
Com o fim da era Vargas e a “redemocratização do Brasil”, o Estado
continuou a financiar grande parte das indústrias de base, através de novas
emissões de moedas ou de empréstimos externos, pois, pretendia um
processo de integração com outros setores da vida nacional. Já o setor de
bens de consumo desenvolveu-se a partir da internacionalização da
economia e para isso utilizou-se de superfúgiosdo legais para garantir a
importação de máquinas e equipamentos no exterior, sem impostos, desde
que os empresários estrangeiros tivessem um sócio nacional. Assim uma
atividade econômica, moralmente ilegal, era legitimada pelo Estado, que
continuava subsidiar as empresas multinacionais aqui instaladas que enviava
remessas de lucros ao exterior. Com esta política econômica, a inflação
voltou a crescer e a classe trabalhadora foi cada vez mais perdendo o poder
aquisitivo de compra. A política para o setor agrário caracterizou-se pela
manutenção do modelo tradicional. Os trabalhadores rurais foram expulsos
da terra e as cidades não estavam preparadas para recebe-los. Mesmo com
o aumento dos problemas sociais, a concentração fundiária manteve-se e foi
menos questionada, uma vez que toda a discussão econômica passou a
basear-se no desenvolvimento industrial. Desta maneira, os financiamentos
tradicionais garantiram a manutenção do latifúndio, ao mesmo tempo em
24
que a não existência de uma nova política para o campo garantia o afluxo
constante de mão de obra barata para as cidades.
Nesta conjuntura, foi se estruturando a informalidade no trabalho
vinculada à própria condição econômica e social do país. Segundo Noronha
para burguesia à medida que o processo de industrialização fosse acelerado,
se ampliaria os postos de trabalhos formais e a legalidade nas relações de
trabalho garantiria os direitos sociais dos sujeitos trabalhadores. No entanto
no final do século XX, a onda da globalização econômica leva a terceirização
das atividades remuneradas, rompendo com o movimento de formalização
do trabalho. Desde então o mercado de trabalho informal no Brasil cresceu e
os meios de comunicação de massa patrocinados pela burguesia industrial
passaram a dar grande ênfase ao capitalismo moderno que reza na cartilha
do empreendedorismo, corrente econômica que incute no sujeito a idéia do
trabalho autônomo, o trabalhador dono do seu próprio tempo, sem levar em
consideração que este trabalhador na verdade é um prestador de serviço
explorado pelo capital, preso a um conjunto de formas de ocupação
marcadas por relações de trabalho na maioria das vezes precárias,
denominado de trabalho informal (NORONHA, 2003 p. 116-120).
ATIVIDADES
01- Organize um debate sobre o trabalho legal e ilegal no Brasil
02- Realize uma pesquisa com seus colegas de sala e descubra quantos
estão inseridos no mercado de trabalho formal e quantos atuam no mercado
informal.
03- No fragmento da música de Gabriel o Pensador ele aborda a questão
camelo. Com relação ao título do texto mundo do trabalho ilegal, legal,
informal e formal em qual destes conceitos você encaixaria o camelô?
25
ANALISANDO DOCUMENTO
Conhecendo a carteira de trabalho: Vamos analisar o texto contido na
primeira página da carteira de trabalho: Esta é a sua Carteira de Trabalho e
Previdência Social - CTPS, documento obrigatório para o exercício de
qualquer emprego ou atividade profissional. Nela deverão ser registrados
todos os dados do Contrato de Trabalho, elementos básicos para o
reconhecimento dos seus direitos perante a Justiça do Trabalho, bem como
para a obtenção da aposentadoria e demais benefícios previdenciários,
garantindo, ainda, sua habili¬tação ao seguro desemprego e ao Fundo de
Garantia do tempo de serviço - FGTS.
O conjunto de anotações contido neste documento e o seu estado de
conservação, espelham a conduta, a qualificação e as atividades
profissionais de seu portador. Pela sua importância, é seu dever protegê-la e
cuidá-la, pois além de conter o registro de sua vida profissional é a garantia
da preservação e validade de seus direitos como trabalhador e cidadão,
contribui para assegurar o seu futuro e o de seus dependentes, tendo
validade, também, como documento de identificação. Em que parte do
texto estão explícitos os mecanismos de controle social praticados pelo
Estado Brasileiro.
3. O Jovem Trabalhador e o Chão da Fábrica
No período denominado República Velha 1889 a 1930, ocorrem
algumas evoluções no setor industrial e junto com a fábrica nasce à
exploração do trabalho, jovens são empregados nas indústrias têxteis do Rio
de Janeiro e São Paulo. Os baixos salários e as condições de trabalho de
adultos e crianças, levam em 1907 os anarquistas a organizarem os
primeiros sindicatos de trabalhadores. O então Presidente do Brasil Afonso
26
Pena assina um decreto-lei e os deputados aprovam a Lei Adolfo Gordo, que
regulariza a expulsão de estrangeiros que “colocam em perigo a ordem
pública”. De 1907 a 1921, são expulsos do Brasil, 550 imigrantes entre eles
jovens idealistas que haviam trazido da Europa experiências de lutas
sindicais. (GIANOTTI, 1998 p. 21)
Em 1914, com a Primeira Guerra Mundial, cresce a indústria de bens de
consumo. O Brasil, sem poder comprar mercadorias no exterior, já que as
indústrias dos países em conflito estavam empenhadas no esforço de guerra,
volta-se para a produção interna. Grupos norte-americanos e ingleses
instalam-se no país, aproveitando a mão-de-obra barata. Surgem neste
período novos estabelecimentos industriais e muitas crianças e jovens
passam a compor o quadro de funcionários das fábricas. O desenvolvimento
da indústria e a exploração da mão-de-obra aguçam a luta operária por
melhores condições de vida e trabalho principalmente em 1917, em que
uma intensa atuação do movimento operário através de organizações
sindicais “paralisou completamente a capital paulista e colocou frente a
frente, o movimento operário e classe dominante-através de um forte
aparato repressivo do Estado” (GIANOTTI, 1988 p. 22).
As greves no Brasil urbano, sobretudo em cidades como São Paulo e
Rio de Janeiro tinham-se tornado freqüentes. Elas resultavam das
desigualdades sociais e das contradições do próprio capitalismo que se
consolidava. “O embate entre ambos evidenciava a luta legítima da classe
trabalhadora versus burguesia que não reconhecia a greve como ferramenta
de luta dos operários fabris daquele período”(GIANOTTI, 1988 p. 22)
Frente à exploração desprendida pelo capital, o trabalhador brasileiro
vai encontrando alternativas para sobreviver, entra elas a utilização da mão-
de-obra infanto-juvenil. No entanto a participação nas ligas e sindicatos de
resistência, logo os fez perceber que as causas reais de sua situação
encontravam-se na própria estrutura social e econômica do nascente
capitalismo brasileiro e não na quantidade de braços trabalhadores que uma
família possuía.
O nascimento da organização sindical leva à classe industrial a
mobilização. Entre os anos 1920 a 1940 do século XX, período de construção
27
da Legislação Trabalhista brasileira, parlamentares discutem a aprovação do
Código de Menores e o empresariado nacional já questionava a
regulamentação de leis que proibia o trabalho infanto-juvenil em algumas
circunstâncias. Para o empresariado a redução de horas de trabalho, o limite
de idade e proibição do trabalho noturno provocaria um enorme prejuízo às
indústrias brasileiras. “Pois, nessa época 60% de todo o operariado engajado
na fiação e tecelagem de algodão, no Rio de Janeiro e São Paulo era
constituído de crianças e adolescentes” (Carvalho, 1985 p. 92).
Segundo Carvalho no Brasil, o trabalho infanto-juvenil nasce junto à
industrialização e a formação da classe operária. Boris Fausto ao pesquisar o
trabalho urbano no final do século XIX e início do século XX encontra relatos
da imprensa anarquista que denúncia às condições subumanas do trabalho
de crianças e jovens em fábricas de tecido do Rio de Janeiro e São Paulo.
Com relação ao trabalho do menor, as acusações contra os espancamentos, à denúncia de mutilações de crianças pelas máquinas quando adormecem em serviço, demonstram a repulsa a seu emprego. Lembre-se, contudo, que o trabalhador menor é com freqüência proveniente da família operária, estabelecendo-se uma espécie de triste pacto desigual entre adultos, na sua exploração. A imprensa anarquista recolhe alguns destes casos; um relato das condições de trabalho da fábrica de tecido Cruzeiro, no Andaraí refere-se ‘a atividade das crianças ao lado dos pais que parecem conformados com a brutalidade reinante; caso extremo, na fábrica carioca, uma menina é espancada pelo pai após ser esbofeteada e despedida pelo mestre, por ter perdido um gancho para tirar algodão (FAUSTO, 1986 p. 116).
Analisando o fragmento de texto de Boris Fausto, percebe-se que
desde a formação da classe operária no Brasil o trabalho da criança e do
jovem tem um peso significativo na composição da renda familiar.
Constantemente nos deparamos com situações em que adolescentes se
vêem obrigados a trabalhar, regularmente ou durante jornadas contínuas,
para ganhar seu sustento ou o de suas famílias, com conseqüentes prejuízos
para o seu desenvolvimento físico e mental. Gente muito jovem é privada de
oportunidade de educação e formação profissional porque são obrigados a
28
levar prematuramente uma vida adulta condenada a um presente incerto e
um futuro sem perspectivas.
ATIVIDADE:
1- Discuta com seus colegas a situação atual do jovem trabalhador
brasileiro, comparando-o com a situação e a organização dos trabalhadores
do início do século XX.
2- Pesquise na Internet o sitio www. ipardes .gov.br o Mapa do trabalho
Infanto-Juvenil-2007 no Paraná e descubra o número de crianças e
adolescentes entre 10 e 17 anos que estão trabalhando e o tipo de
atividade que exercem.
4. O Jovem Trabalhador: as variadas situações de exploração do
trabalho infanto-juvenil no final do Século XX e início do Século XXI.
Nas últimas décadas do século XX, o Brasil continuava a desenvolver
uma produção voltada a exportação de produtos primários. E paralelo a esta
economia agroexportadora, estruturava-se a indústria para a produção de
bens de consumo duráveis. Esta dinâmica interna de acumulação do capital
em todo o período esteve pautada na superexploração da força de trabalho,
que gradativamente foi expropriando a família brasileira de suas condições
mínimas de sobrevivência.
A situação de exploração a qual foi submetida o trabalhador “chefe de
família”, foi responsável pela inserção de grande parte dos adolescentes no
mercado de trabalho. Quando as necessidades financeiras começam a se
fazer sentir, torna-se visível a ocorrência de situações nas quais membros
mais novos das famílias são convocados a ajudar no orçamento familiar. A
intensidade com a qual jovens em idade escolar entram para o mercado de
29
trabalho apresenta os efeitos perversos, no interior da família, da
desigualdade social e econômica que assolou o Brasil nos últimos anos.
Essa situação de exclusão social imposta pelo capital, inclui
adolescentes que se tornam trabalhadores sem possibilidade de escolha. A
maioria dos trabalhos realizados por estes adolescentes, não os qualifica
profissionalmente, muito menos contribui em sua promoção social, serve
apenas para realimentar o círculo da pobreza familiar e individual em que
foram submetidos.
Com o aumento do empobrecimento da população e das famílias, um
contingente considerável de jovens são inseridos no mercado de trabalho
formal e informal. Nos setores urbanos, os meninos mais que as meninas,
devido a atividade remunerada, que envolve o trabalho de rua
ideologicamente considerado como trabalho masculino. Essa realidade foi
criada pela conjuntura socioeconômica do Brasil nas últimas décadas e
passou a determinar a entrada ou saída do jovem no mercado de trabalho
(CERVINE e BURGER, 1996 p. 22- 23).
Além da pobreza a forma como está estruturado o mercado de
trabalho brasileiro, contribui na utilização da mão-de-obra infanto-juvenil. Já
que este mercado de trabalho responde a um ordenamento econômico que
privilegia o acúmulo de riqueza e expressa o consumo como padrão ideal de
vida. Juntando assim dois fatores convergentes; o jovem que precisa
trabalhar e o mercado de trabalho que necessita de mão-de-obra barata. No
entanto, mesmo, o jovem precocemente participando deste processo
produtivo, esta estrutura posta pelo capital beneficia uma minoria e exclui a
grande maioria dos benefícios produzidos pelo próprio sistema.
Segundo dados do IBGE de 1990 a 2001 um número significativo de
jovens matricularam-se no Ensino Fundamental, Médio e superior com
esperança de conseguir uma atividade remunerada. O gráfico a seguir
mostra este contingente considerável de jovens na escola neste período, no
entanto uma grande maioria apresenta defasagem escolar série e idade.
Supõe-se que o retorno aos bancos escolares esteja ligado a perspectiva de
uma inserção mais rápida ao mercado de trabalho.
30
A suposição inicial é que o jovem desta época associa os estudos à
possibilidade de emprego, no senso de 2001 foram detectados nove milhões
de jovens cursando o Ensino Médio. Porém a mesma pesquisa encontrou dois
milhões de jovens entre 15 e 17 anos que não estavam estudando. E o
principal motivo é a necessidade de trabalhar e contribuir com a renda
familiar. A situação econômica familiar não permite aos pais perceberem os
riscos e prejuízos que o trabalho precoce impõe aos seus filhos. E o Estado, e
a sociedade, que poderiam criar condições de reverter esta condição social
se omitem deste compromisso. No gráfico apresentado aparece esta
realidade.
31
Com relação ao tipo de trabalho, nota-se que a grande maioria exerce
uma atividade remunerada, são trabalhadores assalariados informais, que
recebem o mínimo para atender as necessidades básicas de consumo. Vale
ressaltar que a estrutura sócio econômica do Brasil tem contribuído para que
as situações de informalidade no trabalho se tornem definitivas. Pois, à
medida que se fecha postos de trabalho formais o contingente de
desempregados é obrigado a inserir-se no mercado informal, principalmente
o jovem que busca o primeiro emprego em um contexto econômico voltado a
destruição do emprego formal. Segundo Dedecca e Baltar a população
oriunda do campo não acostumada ao trabalho assalariado também
contribui para a disseminação do trabalho informal. Visto que ao chegar aos
centros urbanos sem qualificação profissional precisava aceitar qualquer
trabalho que gerasse renda, abrindo espaços a informalidade (DEDECCA e
BALTAR, 1997 p.p. 79-81).
Além do capitalismo brasileiro do final do século XX e início do século
XXI não dar conta de absorver a mão-de-obra juvenil no setor formal, foi
32
responsável pela inserção de jovens em atividades informais e muitas vezes
ilegais, como camelôs que tem essa atividade remunerada como única fonte
de subsistência.
No Paraná, dos adolescentes que trabalham 73.910 não estudam o que
representa o afastamento de um terço dos jovens paranaenses do sistema
de ensino. No Brasil a realidade é semelhante, a necessidade de contribuir
com a economia familiar e ou subsidiar os gastos pessoais obrigam grande
parte dos jovens a abandonar os estudos, ou ser um estudante trabalhador,
do setor formal ou informal, como mostra o gráfico.
Frente a essa realidade apresentada pelo gráfico, muitos jovens
convivem com situações desanimadoras, pouca aprendizagem na escola e
falta de perspectivas de melhores condições de vida, fatores que contribuem
para a reprodução das condições sociais vigentes.
Assim as relações de produção capitalista, vão ampliando cada vez
33
mais a exploração do trabalho, fazendo com que um jovem que deveria estar
preocupado com seus estudos, ocupe seu tempo lutando por condições
materiais de existência. Ao definir que a oportunidade de trabalho está
vinculada a estrutura econômica do Brasil, Cervine e Burger, enfatizam que o
conceito de pobreza não deva ser confundido com a idéia de privação
absoluta de consumo, visto que, nas últimas décadas ocorreram profundas
alterações nos padrões de vida da sociedade brasileira. Assim a exploração
do trabalho juvenil está articulada a própria organização da sociedade
capitalista que impõe aos jovens valores engendrados na própria estrutura
social e nos mecanismos que sustentam o sistema socioeconômico
gerenciado pelo capital obrigando o jovem a estudar e trabalhar. (CERVINE e
BURGER, 1996 p. 22-23).
O Paraná não foge a esta realidade nacional, por mais que órgãos
governamentais e não governamentais desenvolvam programas de combate
à erradicação do trabalho infanto-juvenil, Segundo o IPARDES, (Instituto
Paranaense de Desenvolvimento Econômico e Social, 2007, p. 16-22) o
mercado de trabalho paranaense absorve, como mão-de-obra um total de
36.458 crianças das faixas etárias de 10 a 13 anos e 216.798 adolescentes
de 14 a 17 anos de idade. Segundo o IPARDES é possível que o número de
crianças que trabalham no Paraná seja bem mais elevado que esse
levantado pelo senso demográfico. Visto que nos dados levantados se
desconsidera muitas ocupações como trabalho doméstico, ou
agrossilvopastoril realizados para a própria família. Esse trabalho familiar na
maioria das vezes não atenua a situação de exploração e de risco a que se
pode estar submetendo estas crianças e jovens. O quadro a seguir apresenta
atividades desenvolvidas por jovens paranaenses em variadas situações de
exploração.
34
Quadro do trabalho infanto-juvenil no Paraná
Ocupação Locais Atividades desenvolvidas
Condições de Trabalho
Riscos a Segurança e a Saúde
Serviços emolarias
Imbituva, Jacarezinho, Jataizinho, Marques dos Reis, Palotina, São Carlos do Ivaí, Siqueira Campos.
Carregar e descarregar argilados caminhões, transportar telhas e tijolos para secagem, “boca de forno” e serviços gerais, colocar o barro com pá e recolher as aparas, enformar e desenformar tijolos.
Galpões semi-abertos e úmidos, luminosidade deficiente, instalações elétricas e sanitárias precárias, falta de água potável; máquinas sem proteção alguma; baixos salários; jornada de até 12 horas; sem registro em Carteira de Trabalho.
Contaminação pela água doenças no aparelho auditivo e respiratório postura inadequadaexposição a intempéries,eletrocussão, ruído, queimaduras e poeira.
Serviços em madeireiras
Cantagalo, Castro, Francisco Beltrão, Irati, Ortigueira, Palmas, Pato Branco, Ponta Grossa, Sengés, Telêmaco Borba, Ventania, União da Vitória.
Executar serviços gerais e de limpeza, manuseio de máquinas perigosas, principalmente na “destopa” com serra pendular.
Trabalho insalubre e perigoso; jornada excessiva; sem registro, em Carteira de Trabalho.
Dermatoses, exposição a ruídos fortes e poeira; cortes e mutilações devido ao manuseio de máquinas perigosas, intoxicações devido à manipulação de pentaclorofenal, usado para a imunização da madeira.
Serviços na indústria moveleira
Arapongas, Prudentópolis Telêmaco Borba.
Lixar, separar, fresar, tornear, pintar, dar acabamento às peças.
Jornada excessiva; baixa remuneração; sem registro em Carteira de Trabalho.
Lesões por esforço físico excessivo, exposição a ruído excessivo e poeira, exposição a máquinas perigosas, inalação e/ou absorção de produtos químicos como solventes, diluentes, tintas, verniz e cola.
Colheita do algodão
Amaporã, Assis Chateaubriand,Campo Mourão, Castelo, Goioerê, Janiópolis, Japurá, Querência do Norte, SantaCruz do Monte, Tamboara
Carregar fardos excessivamente pesados.
Trabalho penoso; transporte em condições desumanas; falta de equipamento de proteção individual; jornada excessiva; sem registro em Carteira de Trabalho.
Picadas de animais peçonhentos, verminoses, má postura, lesões por esforço repetitivo, levantamento de peso excessivo para a idade escoriações (por espinhos e similares, característicos da vegetação fechada) exposição às intempéries (insolação), manuseio de agrotóxicos (intoxicação).
35
Ocupação Locais Atividades desenvolvidas
Condições de Trabalho
Riscos a Segurança e a Saúde
Cultivo e preparo das folhas de fumo
PrudentópolisRebouçasCapanemaSão Mateus do SulPlanalto, MissalSerranópolis e Quedas do Iguaçu,
Manuseio de inseticidas e acaricidas altamente tóxicos.Carregar pesados rolos de fumo
Trabalho insalubre e perigoso, contato de folhas de fumo e inseticida com a pele, jornada excessiva; sem registro, em Carteira de Trabalho.
Durante a colheita, a folha verde entra em contato com o corpo que absorve grandes quantidades de nicotina. A nicotina provoca nas crianças vômitos, fraqueza e perda de apetite.
Comércio eTransporte de mercadorias
GuaíraFoz do Iguaçu
Desempenho de atividades ilegais envolvimento com contrabandistas de cigarro, eletro-eletrônicos e armas.
Jornada de trabalho noturno, trabalho perigoso sem proteção da lei, sem registro em Carteira de Trabalho.
Exposições a situações de perigo, levantamento de pesos excessivos para a idade, exposição às intempéries climáticas (chuva e frio).
Fonte: IPARDES, 2007. Mapa do Trabalho Infanto-Juvenil no Paraná
As atividades exercidas por crianças e jovens em algumas cidades
paranaenses segundo os dados do IPARDES não leva em consideração os
limites estabalecidos pelas leis trabalhistas, pois, expõe estes trabalhadores
a condições insalubres e desumanas. Neste casos específicos o trabalho é
um fator impeditivo de uma situação de vida social e legal de estudo e lazer.
Mesmo na condição de aprendiz ou estagiário onde as associações
comerciais intermediam a contratação, estas são legitimadas por relações
desiguais expressadas em remuneraçõs desfavoráveis que são impostas aos
jovens e justificadas por concepções construídas pelo prório sistema
capitalista que coloca o trabalho do jovem como complementar ao do adulto.
No caso do cultivo do fumo os pais dos pequenos trabalhadores por não dar
conta do compromisso assumido com as empresas são obrigados a usar o
trabalho infantil para cumprir contratos com a indústria. As demais
ocupações que envolve inúmeras atividades estão relacionadas a condição
social da família em que o trabalho do adolescente está vinculado ao
complemento da renda familiar, visto que, segundo dados do IPARDES
(2007) cerca da metade das crianças que trabalham no Paraná, pertence a
famílias que vivem com renda média mensal de meio salário mínimo. O
artigo 7º do Estutudo da Criança e do Adolescente define que “A criança e o
adolescente tem direito a vida e a saúde, mediante a efetivação de políticas
sociais públicas que permitam o nascimento e o desenvolvmento sadio e
36
harmonioso, em condiçoes dígnas de existência” (ECA, 1990) No entanto no
quadro acima podemos identificar muitas violações destes direitos, crianças
e jovens exercendo atividades insalubres e perigosas que colocam a vida em
risco. Mesmo com a aprovação do ECA, os interesses econômicos levam
segmentos da sociedade a consider normal algumas destas ocupações no
cotidiano de crianças e adolescentes tanto em área rurais, como urbanas.
Estes grupos que defendem a entrada de crianças e jovens ao mercado de
trabalho, não levam em consideração que o trabalho precosse atrapalha o
desenvolvimento físico, prejudica os estudos, alimenta o ciclo de pobreza e
expropria o adolescente trabalhador das condições necessárias a mudança
de vida. O não combate a exploração deste trabalho infanto-juvenil só
contribui para gerar mais exclusão e alimentar as desigualdades sociais
presentes em nossa sociedade. O mapa do trabalho infantil no Paraná
aponta trezentas mil crianças entre 10 a 17 anos envolvidas em atividades
não permitidas em lei. O Ministério Público do Paraná tem 1.238
investigações em andamento envolvendo trabalho infanto-juvenil. (IPARDES,
Mapa do trabalho Infanto-juvenil, 2007).
Ao entrevistar um jovem que abandonou a escola devido a carga
horária excessiva de trabalho ele relatou: “a gente que trabalha não
consegue chegar no horário, porque as empresas não colaboram, a lei diz
que nóis tem direito de estudar, mas não tem ninguém aqui que fiscaliza
isso, faz cumprir a lei” (Juninho, 2008). Nesta afirmação percebe-se que o
capital e o trabalho se relacionam. Para sobreviver é necessário trabalhar, no
entanto as condições impostas inviabilizam a formação escolar, fazendo com
que este jovem explorado pelo capital continue no subemprego, recebendo
baixos salários para atender os interes da economia capitalista. Dessa forma
a probabilidade de um jovem trabalhador com uma carga horária excessiva
concluir os estudos é remota, visto que, sua permanência na escola está
condicionada a sua situação econômica. Se a atividade remunerada que
exerce serve apenas para suprir suas necessidades de consumo, pode
abandonar o trabalho e se dedicar aos estudos, mas se a sobrevivência da
família está condicionada ao seu salário acaba priorizando o trabalho e
abandonando a escola.
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ATIVIDADES:
01- Pesquise no Estatuto da Criança e do Adolescente e verifique quais
direitos e medidas de proteção não estão sendo respeitados nas situações
descritas no quadro do trabalho infanto-juvenil no Paraná.
02- Depois de ler o quadro do trabalho infanto-juvenil no Paraná, releia a
coluna sobre os riscos a saúde e a segurança dos jovens trabalhadores.
Escolha cinco entre os riscos listados e, em seguida, procure verificar se
estão relacionados ao tipo de atividades desenvolvidas por você ou por
algum colega.
5. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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