UNIDADE III - INSTITUIES E MOVIMENTOS SOCIAIS
DO CAMPO
O estudo das instituies e movimentos sociais do campo, aqui
apresentado, tem como propsito discorrer sobre formas de ao coletiva,
caracterizadas por sua organicidade no que diz respeito a propsito de ao
transformadora da realidade, ainda que no possamos falar, ao menos no
perodo que antecedeu a dcada de 40 do sculo passado, na existncia de
um projeto de carter efetivamente nacional, como salienta a bibliografia
especializada.
So inmeras as lutas sociais que tiveram no campo ou na contestao
da estrutura fundiria-agrria brasileira, sua principal pauta reivindicatria,
ainda que os cientistas sociais continuem a estabelecer nveis de importncia
hieraquizados na anlise da lutas sociais, tomando como referencial
paradigmas europeus.
Para tanto cabe destacar dois momentos distintos, que tm como marco
divisor a dcada de 30 do sculo passado com a chegada de Getulio Vargas
ao poder.
1. Reao e resistncia no campo brasileiro at 1930
Como referido na unidade anterior, o pleno desenvolvimento do
capitalismo no campo brasileiro, ocorreu com a otimizao da estrutura
tradicional de produo (grande propriedade, abastecimento do mercado
externo e mo de obra escrava ou livre expropriada) pressupondo a adequao
da terra e do trabalho nova lgica capitalista, que teve na Lei de Terras o seu
principal arranjo institucional, pois a constituio de um mercado de terras
transformava paulatinamente uma frao da aristocracia rural em burguesia
agrria.
Ainda que possamos identificar na historiografia agrria brasileira uma
srie de contestaes estrutura agrria, foi aps a Lei de Terras que esse
quadro se intensifica, especialmente com o advento da Repblica no Brasil em
1889, sendo conveniente recordar que a marca do republicanismo brasileiro foi
o positivismo de tradio comteana, que atribua modernizao o poder de
superar o atraso atribudo sociedade brasileira.
Nesse contexto, a ttulo de reflexo cabe destacar a obra de Euclides da
Cunha Os Sertes - e o tratamento atribudo aos sertanejos e ao serto
identificado pelo autor como tpicos de um Brasil que deveria desaparecer,
dando lugar ao Brasil do litoral e das grandes cidades.
Ademais, a centralidade dos militares com o advento da repblica,
tambm fez com que esse grupo fosse o principal ator na represso as lutas
camponesas no Brasil desde ento, vistas at a dcada de 1930, por um
prisma linear e etapista que concebia que esse grupo social fatalmente
desapareceria, alm de consider-los incapazes de agir politicamente, da
decorrendo a sua identificao, hoje equivocada, de que essas aes
representam um momento pr poltico desses movimentos, marcadamente
orientados por variveis de ordem religiosa.
Feitas essas consideraes passaremos agora a apontar os principais
movimentos do perodo;
1.1 - Canudos
Ocorrido na Bahia nos anos de 1896-97, organizado por Antonio
Conselheiro liderana de uma importante manifestao da religiosidade
popular brasileira, denominada de messianismo.
O contexto brasileiro na poca era bastante tenso, provocando
migraes de agricultores empobrecidos que, seguindo Conselheiro, dirigiam-
se ao Arraial de Canudos, formando ali uma comunidade inspirada na obra
Utopia de Thomas Morus, em um evidente conflito com as elites locais que se
sentiam ameaada pela alternativa representada pelo Arraial de Canudos,
pressionando o poder pblico a tributar a referida comunidade, que diante da
recusa de pagamento passa a ser identificada como monarquista, o que faz
com que o governo federal fosse mobilizado para combater Conselheiro e seus
seguidores, que somente aps duras batalhas, acabam derrotados.
1.2. Guerra do Contestado
Movimento ocorrido na atual divisa entre o Estado do Paran e Santa
Catarina entre os anos de 1912 e 1916, cuja origem estava relacionada ao
conflito entre coronis da regio que, na sequncia, acaba envolvendo
posseiros que foram expulsos da regio em razo de disputas entre empresas
colonizadoras e exploradoras de madeira que eram responsveis pela
construo de uma ferrovia. A liderana desse movimento tambm foi atribuda
ao um religioso popular de nome Jos Maria que assumiu o papel de um
monge de mesmo nome que teria vivido no sculo XIX na regio, a quem era
atribudo uma srie de milagres, e que acaba denunciado de monarquista. Ao
fugir com seus seguidores para o estado do Paran, so considerados
Gnero: Drama
Ano: 1997
Durao: 169 minutos
Origem: Brasil
Distribuidora: Columbia TriStar Pictures
Direo: Srgio Rezende
Roteiro: Srgio Rezende e Paulo Halm
Msica: Edu Lobo
Fotografia: Antnio Lus Mendes
invasores, organizando-se brigadas contra esses lavradores, que em ltima
instncia reagiram a expropriao de terras ocupadas desde tempos
imemoriais.
Assim como o que ocorrera com Canudos, os camponeses do sul do
Brasil acabam duramente reprimidos, sob a acusao de fanatismo religioso e
ignorncia, pois resistiam ao que havia de mais avanado, na tica das elites
locais, qual seja, a ferrovia.
Indicao de vdeo:
1.3. Lutas do cangao no nordeste brasileiro
As primeiras dcadas do sculo XX no nordeste brasileiro foram
marcadas pelo que a bibliografia especializada denomina de banditismo social,
que teve nas aes de Lampio e seu grupo a maior notoriedade, pois ainda
que parte significativa desses cangaceiros tenham lutado por questes de
ordem pessoal, de honra e de sangue, muitos deles se mostraram sensveis s
lutas camponesas reativas aos desmando dos coronis locais.
A Guerra dos Pelados
Gnero: Drama
Ano: 1970
Durao: 98 min.
Direo: Sylvio Back
Tipo: Longa-metragem / Colorido
Distribuidora(s): CIC Vdeo
Paran Filmes, Servicine
Virgulino Ferreira da Silva, mais conhecido como Lampio, foi o
cangaceiro de maior destaque. Lampio coordenou um bando que atuou no
serto nordestino, enfrentando coronis, policiais e bandos rivais. Perseguido
foi assassinado em 1938, na divisa entre os estados da Bahia e de Sergipe.
Com a sua morte, o cangao entrou em um processo de refluxo, ainda que
tenha passado para o imaginrio popular como um movimento de revolta
contra o descaso dos rgos pblicos em relao ao serto nordestino, sendo
na atualidade identificado com a fora e determinao do sertanejo nordestino.
Indicao de vdeo:
1.4 Revolta dos Muckers
O movimento denominado revolta dos muckers ocorreu no final da
dcada de 1860 at 1874, no interior do Rio Grande do Sul, onde hoje
encontra-se a cidade de Sapiranga, na rea de colonizao alem.
Diretor: Carlos Coimbra
Produo: Oswaldo Massaini
Roteiro: Carlos Coimbra, Talma de Oliveira
Fotografia: Tony Rabatoni
Trilha Sonora: Gabriel Migliori
Durao: 110 min.
Ano: 1962
Pas: Brasil
Gnero: Drama
Cor: Colorido
Distribuidora: No definida
Quando os imigrantes alemes chegaram ao Brasil, receberam terras e
incentivos do governo, o que no foi capaz de impedir a fragmentao das
propriedades em razo das sucessivas partilhas decorrentes de herana, de tal
forma a gerar propriedades muito pequenas. Cabe destacar ainda que o Brasil
e a regio de So Leopoldo era oficial e majoritariamente catlica, de forma
que os imigrantes luteranos acabavam sendo prejudicados, pois todos os
registros de batismo, casamento e bito deveriam estar cadastrados na Igreja,
no reconhecendo, portanto, a herana de quem no fosse catlico.
Naquele contexto, existiam disputas ora explicitas ora veladas entre
imigrantes alemes luteranos e catlicos, moradores do meio rural e do meio
urbano, cabendo destacar que os comerciantes, eram o grupo social mais
importante da rea colonial. Foi naquele contexto que surgiu a figura do casal
Jacobina e Joo Jacob Maurer.
Os Muckers, denominao atribuda aos agricultores de ascendncia
alem, pelas autoridades locais com a conotao de falso santo, viviam em
uma regio de difcil acesso, onde a presena do poder pblico praticamente
inexistia. Nesse contexto, Jacobina Mentz Maurer e seu marido Joo Maurer,
lideram um conjunto de colonos, que em razo de uma conduta moral bastante
restritiva acabam por entrar em conflito com a comunidade local, resultando na
priso dos lderes do movimento pela polcia local com posterior libertao a
pedido do presidente da Provncia do Rio Grande do Sul.
Os muckers, cada vez mais crentes no carter messinico de Jacobina,
passaram a combater de forma mais enftica os que se opunham ao
movimento, acabando por provocar, acidentalmente a morte da esposa e dos
filhos de um dissidente do grupo, e de um importante comerciante local, alm
executaram um tio de Joo Maurer, que se opunha abertamente ao movimento.
Acirrados pela profecia de que quem acreditasse em Jacobina seria imune
morte, os muckers entram em confronto com foras policiais, saindo vitoriosos.
A 18 de julho de 1874, as foras policiais cercaro a casa onde o grupo
religioso se mantinha, matando dezesseis muckers. Jacobina conseguiu fugir
at, que em 2 de agosto, Carlos Luppa, um dissidente mucker traiu o grupo,
levando as tropas militares at ao morro Ferrabrs onde Jacobina se refugiou,
sendo os revoltosos executados pelas militares.
A revolta dos muckers foi um movimento social religioso milenarista, que
via em Jacobina o seu Messias. Ao mesmo tempo, foi depreciado tanto pelas
autoridades eclesisticas, como por pastores luteranos. Mesmo assim, a
mensagem de Jacobina atingiu uma ampla parcela da sociedade, visto que
tanto pobres quanto pessoas mais abastadas se identificaram com suas ideias.
Durante aproximadamente um sculo o tema dos muckrs, foi tabu na
regio de Sapiranga, sendo que seus intrpretes, ora responsabilizavam a
ignorncia dos colonos; ora o abandono dos mesmos por parte da Igreja
Alem; ora a maonaria e os polticos locais, ferrenhos antireligiosos; ora a
esperteza dos Maurers para compreender acontecido.
Uma diferena do movimento Mucker em relao aos demais
movimentos mencionados que os Muckers foram preponderantemente
protestantes, tendo sido liderados por vulto feminino, Jacobina Mentz Maurer.
Ttulo A Paixo de Jacobina Pas de Origem: Brasil Gnero: Romance Classificao etria: 12 anos Tempo de Durao: 101 minutos Ano de Lanamento: 2002 Estdio/Distrib.: PlayArte Direo: Fbio Barreto
2. Movimentos sociais e organizao sindical ps 1930
Com a chegada de Vargas ao poder, no ano de 1930, o Brasil passava
por profundas transformaes, identificadas principalmente por um processo de
progressiva industrializao e urbanizao percebidas como sinnimo de
modernizao. O momento em anlise foi marcado por um contexto de
crescente movimento migratrio no sentido campo cidade, que funcionava
como um atrativo para as populaes rurais, ainda sob o controle do poder
local, materializado no coronelismo.
No final da dcada de 1930 e incio da dcada de 1940, a
reconfigurao econmica e demogrfica do Brasil foi potencializada por
movimentos sociais urbanos protagonizados pelos trabalhadores, fazendo com
que o governo Vargas editasse uma srie de legislaes protetivas as relaes
de trabalho que, em 1943, foram reunidas em um nico texto legal conhecido
como Consolidao das Leis do Trabalho CLT, cuja caracterstica que nos
interessa nesse momento diz respeito ao fato que esse conjunto de direitos
sociais, trabalhistas e previdencirios incidiam apenas nos trabalhadores
urbanos sindicalizados, o que provocou o descontentamento dos camponeses,
que apoiaram o governo Vargas desde o primeiro momento.
Cabe destacar um elemento apontado pelos estudiosos da matria, no
sentido de identificar uma perspectiva linear e etapista do desenvolvimento
social, na qual os camponeses deveriam desaparecer dando lugar a um
proletariado urbano, coordenado pelo partido de Getulio Vagas, qual seja o
PTB.
Foi nesse cenrio de descontentamento que os trabalhadores rurais
passaram a se organizar em associaes, pois era vetada a sindicalizao dos
mesmos, prerrogativa essa exclusiva dos trabalhadores urbanos. Estas
associaes, cuja origem encontramos principalmente o nordeste, recebiam o
nome de Ligas de Lavradores, que impunham seu reconhecimento a
sociedade, fazendo do tema da reforma agrria um importante eixo de
discusso poltica no Brasil de ento, liderado pelo Partido Comunista
Brasileiro, o que acabou por provocar o descontentamento dos grandes
proprietrios, organizados a partir da Unio Democrtica Nacional UDN,
agremiao poltica que reunia a elite proprietria brasileira da poca.
A aproximao dos lavradores com o Partido Comunista Brasileiro
PCB, acabou atribuindo as reivindicaes camponesas a percepo de tratar-
se de ao de agentes externos que incitavam a revolta perturbando a paz no
campo brasileiro, segundo argumento articulado pela UDN.
Essa leitura da ao dos camponeses fragilizava a luta dos lavradores,
escondendo a real dimenso dos embates e conflitos que marcavam o campo
brasileiro, alm de identificar as demandas sociais desses segmentos no
como direitos mas sim como um pedido, que poderia ou no ser acolhido pela
ddiva do patro ou do Estado, como bem assevera Jos de Souza Martins.
A centralidade do perodo ps dcada de 1940 para os debates sobre a
questo agrria brasileira decorre, principalmente, do fato que os movimentos
sociais tenderam a se generalizar, perdendo seu carter local, articulando
formas mais abrangentes de organizao progressivamente distanciados das
orientaes messinicas que orientavam os organizaes dos camponeses no
perodo anterior.
Naquele contexto surgiam propostas polticas diversas vinculando a
temtica agrria com o projeto de desenvolvimento implementado para o pas,
forjando-se questes que at hoje so centrais nas lutas camponesas: direitos
trabalhistas e previdencirios e necessidade de uma efetiva reforma agrria.
Utilizando um balizamento cronolgico possvel perceber dois
momentos distintos:a) aquele que se inicia em 1945 perdurando at 1964 e, b)
um segundo momento que inicia em 1964 com a chegada dos militares ao
poder e vai at os dias atuais, com algumas nuances.
O primeiro momento assinalado, qual seja, 1945-1964, pode ser
identificado como um momento de grande efervescncia democrtica que
permitiu vir luz diversos conflitos e demandas do campo, capitaneado por
uma matriz sindicalista vinculada ao Estado, de tal sorte a potencializar a
extenso dos direitos dos trabalhadores urbanos para os trabalhadores rurais,
com a promulgao do Estatuto dos Trabalhadores Rurais no ano de 1963.
Entre os anos de 1949 e 1954 possvel identificar no pas um total de 55
greves em fazendas de caf, cana e cafezais, demandando, via de regra,
aumento salarial e/ou pagamento de salrios atrasados, o que demonstra a
mobilizao dos trabalhadores rurais no perodo.
Outra frente importante de mobilizao de camponeses no perodo
referido encontramos na organizao de posseiros atingidos pela expanso da
fronteira agrcola e pela ao de grileiros no sentido de lhe expropriar a terra.
Essas lutas foram frequentes e se notabilizaram especialmente no sudoeste do
Paran, no que ficou conhecido como revolta dos posseiros ou Guerrilha do
Porecatu, na qual os posseiros resitiam armados ao seu despejo da terra.
Esse processo acaba se esgotando com a chegada dos militares ao
poder, o que inaugura um momento de intensa represso e perseguio das
lideranas camponesas, de tal sorte que as lutas do campo acabam por
atomizar-se, ainda que no tenham desaparecido, ganhando inclusive uma
maior intensidade, pelo processo de modernizao agrcola implementado pelo
governo brasileiro com a edio do Estatuto da Terra, sendo importante a
constituio de um sindicalismo rural centralizado pela Confederao Nacional
dos Trabalhadores na Agricultura CONTAG.
No final dos anos de 1970 o regime militar comea a dar sinais de
esgotamento, agudizando s contradies pela ineficcia do milagre
econmico, surgindo tambm uma crtica crescente a estrutura sindical vigente
no perodo. Naquele cenrio as lutas no campo se diversificaram, incorporando
a luta social a questo da reforma agrria, greves de assalariados, lutas de
pequenos produtores por melhores preos, entre outras.
2.1 As Primeiras Organizaes: ligas, associaes e unies
Foram duas as principais formas de organizao dos camponeses no
perodo de 1945-1964: sindicatos e organizaes civis (associao, ligas,
unio, irmandades, etc.)
Os sindicatos eram organizaes de trabalhadores considerados
assalariados, que viam na sindicalizao o mecanismo mais adequado para
acessar direitos trabalhistas e previdencirios.
As associaes civis, destinavam-se a aglutinar lavradores que tinham
acesso a terra de forma precria, no sendo proprietrios, tais como posseiros,
arrendatrios, meeiros, etc., cuja principal demanda dizia respeito a
modificao da estrutura agrria brasileira, profundamente excludente.
Nesse contexto foram inmeros os encontros de trabalhadores, o que
indica uma efetiva articulao entre as diferentes organizaes que
congregavam as demandas camponesas.
2.1.1 ULTAB Unio dos Lavradores e Trabalhadores Agrcolas do
Brasil
Em 1953 foi realizado em Viana a Conferncia Internacional dos
Trabalhadores Agrcolas, o que fez com que o PCB organizasse um encontro
nacional para indicar representantes e organizar a pauta a ser encaminhada ao
encontro internacional, tendo sido elaborado um documento intitulado Carta
dos Direitos e das Reivindicaes dos Lavradores e Trabalhadores Agrcolas,
apontando de forma incisiva a temtica da reforma agrria como uma medida
de justia social, a denncia de formas semifeudais de explorao do trabalho,
alm da demanda de apoio produo.
Naquele contexto o latifndio foi identificado como a causa da explorao
do campons, de tal forma a denominao campons adquirir um significado
social e sentido poltico, criando-se uma entidade capaz de unificar as
demandas mais diversificadas do campo brasileiro, com atuao no mbito
nacional Ultab, que representou um esforo do PCB em aglutinar as lutas em
diferentes locais do pas.
2.1.2 A luta dos posseiros
Nas regies de fronteira agrcola foram inmeros os conflitos, opondo
principalmente posseiros e grileiros, especialmente em decorrncia da
expressiva valorizao e especulao imobiliria em reas de fronteira.
Naquele contexto destacamos Trombas e Formoso em Gois; os posseiros do
sudoeste do Paran e na Baixada de Guanabara.
Acerca de Trombas e Formoso cabe destacar a intensa valorizao
fundiria da regio em razo da criao da Colnia Agrcola de Gois, o que
fez com que a rea, ocupada por populaes tradicionais, resistissem a intensa
grilagem, auxiliados por quadros do PCB e liderados pelo posseiro Joo
Porfrio, em um dos mais violentos conflitos agrrios do pas. A importncia da
Organizao de Posseiros de Trombas e Formoso foi tamanha, que os
mesmos conseguiram um acordo com o governo de Gois no sentido de
afastar o controle policial e disponibilizar a titulao das posses, havendo um
controle absoluto dos posseiros sobre a regio, que foi capaz de eleger Joo
Porfrio deputado estadual em 1962.
No sudeste do Paran, local de intensas correntes migratrias e local de
instalao de uma Colnia Agrcola Federal, uma transao imobiliria ilegal
atribui a propriedade da regio a CITLA Empreendimentos imobilirios, que
passou a expulsar os colonos da rea ocupada desde tempos imemoriais ou
for-los a assinar contratos de arrendamento.
A resistncia dos posseiros ganhou intensidade em agosto de 1957 com
confrontos abertos com as companhias, o que fez com que os posseiros
acabassem por ocupar as cidades de Pato Branco e Francisco Beltro,
obrigando o governo a negociar. A partir de 1960 comeam a ser emitidos os
ttulos de propriedade aos colonos.
No estado do Rio de Janeiro, na regio denominada de Baixada da
Guanabara foi criada no ano de 1948, com a articulao do PCB, a Associao
dos Lavradores Fluminenses, como uma forma de resistir aos ataques dos
grileiros e aos despejos arbitrrios que atingiam os posseiros, demandando no
poder judicirios, inmeras aes de usucapio, que na grande maioria foram
improcedentes, tal era a fora da elite agrria regional.
2.1.3- Ligas Camponesas
A partir da dcada de 1950 verificamos no nordeste significativas
transformaes nas relaes de trabalho, merecendo destaque o ocorrido no
Engenho da Galilia no interior de Pernambuco quando, em razo da
excessiva cobrana de tributos para a utilizao do Engenho, os trabalhadores
se organizam e contratam o advogado Francisco Julio, deputado estadual
recm eleito para a defesa dos interesses do lavradores que realizaram
inmeras mobilizaes, marchas, comcios, congressos, dando visibilidade a
questo. Ganhando uma dimenso que extrapolou o nordeste brasileiro, e
servindo de referncia para a organizao dos lavradores, as Ligas
Camponesas, entram em rota de coliso com a ULTAB, uma vez que at
aquele momento o PCB monopolizava a luta camponesa no Brasil.
A principal causa de divergncia entre os dois grupos decorria da
concepo de reforma agrria. Enquanto o PCB via a reforma agrria como um
momento para a constituio de revoluo democrtica burguesa, as Ligas
viam no campons o protagonista da revoluo socialista inspirada na
experincia cubana.
Sugesto de Filme.
Diretor: Eduardo Coutinho Produo: Zelito Viana Roteiro: Eduardo Coutinho Fotografia: Edgar Moura Trilha Sonora: Rogrio Rossini Durao: 119 min. Ano: 1984 Pas: Brasil Gnero: Documentrio Distribuidora: H2O Filmes
2.1.4 MASTER
No Rio Grande do Sul, o ento governador Leonel de Moura Brizola,
alm de dar apoio aos acampamentos de trabalhadores rurais sem terra, que
surgiram no estado nos final dos anos de 1950 e se organizaram no Movimento
dos Agricultores Sem Terra MASTER, especialmente nos municpios de
Camaqu, Santa Maria, Caapava, Alegrete, So Francisco de Assis, entre
outros. Brizola declarou essa organizao de utilidade pblica, criando o
Instituto Gacho de Reforma Agrria IGRA, com a finalidade de agilizar o
processo de assentamento desses agricultores, sob forte influncia do PTB.
2.2 A Organizao Sindical
Durante a dcada de 1950 foi possvel perceber uma acentuada atuao
dos partidos polticos, especialmente PCB, PSB e PTB na organizao dos
camponeses, o que provocou no interior da Igreja Catlica uma significativa
reorientao, sendo expressivos os documentos eclesiais que tm como pauta
a situao dos trabalhadores rurais, sendo que, por volta de 1960, a Igreja
volta-se para o trabalho organizativo investindo na sindicalizao, alm de
mobilizar e orientar lderes sindicais, seguindo a orientao da Comisso dos
Bispos do Brasil CNBB, no sentido de fomentar o sindicalismo cristo.
No mesmo sentido foi expressiva a constituio da Ao Catlica como
organizao de leigos mobilizados pela transformao social, bem como a
fora da Igreja Catlica nos quadros da CONTAG, criada em 1962.
3. Ps 1964 at hoje
Com o golpe militar de 31 de maro de 1964, as lutas do campo e da
cidade entram, em um processo de refluxo diante da represso que passam a
enfrentar, sendo que a ao dos militares, no que tange a temtica agrria,
estava assentada em dois pressupostos: a) represso aos movimentos e
organizaes populares que existiam no Brasil e b) a aprovao do Estatuto
da Terra, propondo a denominada modernizao conservadora, no campo
brasileiro.
Com exceo aos sindicatos, todas as outras organizaes foram postas
na clandestinidade, ainda que vrios sindicatos tenham sido fechados e
lideranas sindicais presas, num intenso processo de interveno nesses
espaos. Cabe destacar que em 1971 foi institudo o Funrural - Previdncia
Social dos Trabalhadores Rurais.
No perodo em pauta havia dois balizadores para a discusso da
temtica agrria no Brasil: o Estatuto do Trabalhador Rural disciplinando as
relaes entre trabalho e capital e o Estatuto da Terra regulamentando as
formas de acesso a terra.
Ainda diante do refluxo dos movimentos sociais do campo, no perodo
dos governos militares, as tenses no campo brasileiro ganhavam significativa
visibilidade, sendo apropriado referir que ao final do perodo - inicio da dcada
de 1980 - tivemos importantes articulaes entre diferentes segmentos
identificados com a luta pela terra.
Em 1984, apoiados pela Comisso Pastoral da Terra, representantes
dos movimentos sociais, sindicatos de trabalhadores rurais e outras
organizaes, reuniram-se em Cascavel no estado do Paran, no 1 Encontro
Nacional dos Trabalhadores Rurais Sem Terra, para fundar o MST, que se
identifica como herdeiro ideolgico de todos os movimentos de base social
camponesa. O Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) teve
como primeira ao efetiva a com a ocupao da Fazenda Anoni, no Rio
Grande do Sul, em outubro de 1985, na qual 1500 famlias montaram um
acampamento, sendo oportuno destacar que o processo de desapropriao da
rea durou 14 anos.
O MST um movimento social brasileiro com inspirao marxista e do
cristianismo progressista (teologia da libertao), cujo objetivo a realizao
da reforma agrria no Brasil, conforme denota-se pela leitura se sua pagina
oficial.
Bernardo Manano Fernandes em seu livro A formao do MST no
Brasil (2000), informa que o MST nasceu da ocupao da terra e tem nesta
ao seu instrumento de luta contra a concentrao fundiria e o prprio
Estado.
Na atualidade os objetivos do MST, vo para alm da reforma agrria,
trazendo discusses sobre as transformaes sociais importantes ao Brasil,
principalmente quelas no tocante incluso social em uma clara articulao
com os movimentos sociais do campo.
O MST compe juntamente com o Movimento de Mulheres Camponesas
(MMC), o Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB) e o Movimento dos
Pequenos Agricultores (MPA), a Via Campesina. Alm desses possvel
identificar outras trs organizaes brasileiros articulados Via Campesina
Internacional: a Comisso Pastoral da Terra (CPT), a Federao dos
Estudantes de Agronomia do Brasil (FEAB) e a Pastoral da Juventude Rural
(PJR).
A Via Campesina uma organizao internacional que coordena
entidades camponesas de pequenos e mdios agricultores, trabalhadores
agrcolas, mulheres rurais e comunidades indgenas e negras da sia, frica,
Amrica e Europa, tendo como principal bandeira a temtica relacionada
defesa da soberania alimentar.
Para maiores aprofundamentos sobre a transnacionalizao dos
movimentos sociais no urbanos sugerimos a leitura dos textos constantes nos
endereos que seguem:
http://www.maxwell.lambda.ele.puc-rio.br/9463/9463_5.PDF
http://www.lagea.ig.ufu.br/xx1enga/anais_enga_2012/gts/1448_1.pdf
Sobre a temtica agrria na perspectiva dos movimentos sociais do
campo, sugiro assistir vdeos constantes no site da Videoteca Virtual Gregrio
Bezerra do MST no endereo que abaixo segue:
http://www.armazemmemoria.com.br/cdroms/videotecas/MST/00ArmazemMemor
ia/Tema/01_catalogos/terra.html
REFERENCIAS
IOKOI, Zilda Maria Gricolli. Lutas Sociais na Amrica Latina. Porto Alegre:
Mercado Aberto, 1989.
FERNANDES, Bernardo Manano. A Formao do MST no Brasil. So
Paulo, Editora Vozes, 2000.
MARTINS, Jos de Souza. Os Camponeses e a Poltica no Brasil: As Lutas
Sociais e seu Lugar no Processo Poltico. Petrpolis: Vozes, 1986.
MEDEIROS, Leonilde Servolo de. Histria dos Movimentos Sociais no
Campo. Rio de Janeiro: FASE, 1989.