FACULDADE DE EDUCAÇÃO
GRADUAÇÃO EM PEDAGOGIA
PSICOLOGIA DA EDUCAÇÃO
PROFA. DRA. CRISTINA LÚCIA MAIA COELHO
Amanda Lima Rocha Erick Santana
Heloiza Souza Mendes Thais Thurler
Talita Monteiro Lobountchenko
Psicanálise dos Contos de Fadas
NITERÓI / RJ – 2018
PSICANÁLISE DOS CONTOS DE FADAS
Trabalho apresentado à Faculdade
de Educação da Universidade
Federal Fluminense, como requisito
parcial da avaliação da disciplina
Psicologia da Educação.
Prof.ª Dr.ª CRISTINA LÚCIA MAIA COELHO
NITERÓI / RJ– 2018
RESUMO
O presente trabalho apresenta a importância do universo da fantasia para o
desenvolvimento da criança através de uma análise psicanalítica.
Através de algumas estórias, apresentaremos como alguns conflitos presentes na
infância são abordados e interpretados pelas crianças, levando ao autoconhecimento.
Conceitos como “bem” e “mal”, valores morais, diversidade de sentimentos e ações de
acordo com o ambiente são alguns dos tópicos abordados. Apesar dessas questões, os
contos nos mostram como sair vitoriosos no final, através de uma visão lúdica.
SUMÁRIO INTRODUÇÃO ................................................................................................................ 5
CAPÍTULO I – A Psicanálise de Freud e a Psicanálise dos Contos de Fadas ................. 6
A DESCOBERTA DA SEXUALIDADE INFANTIL ................................................. 6
PSICANÁLISE DOS CONTOS DE FADAS .............................................................. 7
CAPÍTULO II - Importância dos contos na infância ....................................................... 8
A IMPORTÂNCIA DOS CONTOS DE FADAS ........................................................ 8
A IMPORTÂNCIA DOS CONTOS COMO FERRAMENTA PEDAGOGICA. ..... 10
CAPÍTULO III – A criança x os contos ......................................................................... 11
CAPÍTULO IV – Análise dos contos ............................................................................. 13
ANÁLISE DO CONTO DA BRANCA DE NEVE ................................................... 13
ANÁLISE DO FILME VIVA - A VIDA É UMA FESTA ........................................ 15
ANÁLISE DO FILME DIVERTIDAMENTE ........................................................... 17
CONSIDERAÇÕES FINAIS ......................................................................................... 19
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ........................................................................... 20
ANEXOS ........................................................................................................................ 20
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INTRODUÇÃO
Podemos dizer que o ser humano atinge a maturidade psicológica no momento
em que adquire uma compreensão segura do significado da própria vida. O que ela é e o
que ela poderia ou deveria ser.
A busca por esse significado da vida começa na infância, e uma das tarefas dos
pais e educadores é a de ajudar nesse processo de autoconhecimento; estimulando-lhes a
imaginação, ajudando a tornar claras suas emoções, desenvolver seu intelecto,
harmonizar suas ansiedades e aspirações, reconhecer dificuldades e ao mesmo tempo
buscar soluções para os problemas. Deve-se relacionar todos os aspectos de sua
personalidade promovendo a confiança nela mesma e no seu futuro.
Os contos de fadas têm o poder de transmitir à criança de forma lúdica, valores
como o bem e o mal, a luta contra as dificuldades - que muitas das vezes são inevitáveis
ao longo da nossa existência - e a lutar contra opressões inesperadas e injustas. O conto
mostra, através de uma compreensão infantil, como se sair vitorioso dessas situações.
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CAPÍTULO I – A Psicanálise de Freud e a Psicanálise dos Contos de Fadas
“Freud ousou colocar os “processos misteriosos” do psiquismo,
suas “regiões obscuras”, isto é, as fantasias, os sonhos, os
esquecimentos, a interioridade do homem, como problemas
científicos. A investigação sistemática desses problemas levou
Freud à criação da psicanalise” (BOCK e FURTADO e
TEIXEIRA, 1999 p.70)
“Inconsciente”, uma palavra que concentra a principal descoberta freudiana.
Conhecido como o pai da psicanálise, Sigmund Freud foi o responsável pela revolução
no estudo da mente humana. Freud tornou-se especialista em doenças nervosas e criou
uma nova teoria, a qual estabelecia que pessoas que ficavam com a mente doente eram
aquelas que não colocavam seus sentimentos para fora. Segundo Freud, esse tipo de
pessoa tinha a capacidade de fechar de tal maneira os sentimentos dentro de sua mente,
que, após algum tempo, esquecia-se da própria existência.
Ao longo dos anos de estudo, desenvolveu o que é uma das bases da técnica
psicanalítica na atualidade: a livre associação, em que o paciente é convidado a falar o
que lhe vem à mente para revelar memórias reprimidas causadoras de neuroses. Para
estudar melhor seus pacientes, iniciou um processo de autoanálise e trabalhou com a
interpretação de seus próprios sonhos. Em 1896, utilizou pela primeira vez o termo
psicanálise. Ao afirmar a influência do inconsciente sobre as ações humanas e a ligação
dos impulsos sexuais com as neuroses.
A DESCOBERTA DA SEXUALIDADE INFANTIL
Ao longo de suas investigações clinicas, Freud descobriu que a causa da maioria
das neuroses advém de pensamento reprimidos, na grande maioria de origem sexual. A
descoberta revelou também que a origem desses conflitos tinha início durante a
infância, deixando marcas na profundas na estrutura da pessoa.
Para Freud, o corpo da criança é erotizado, e há um desenvolvimento progressivo
do desenvolvimento sexual: fase oral (a zona de erotização é a boca), fase anal (a zona
de erotização é o ânus), fase fálica (a zona de erotização é o órgão sexual), seguida por
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um período de latência, que se prolonga até a puberdade, período caracterizado por uma
diminuição das atividades sexuais. Ao atingir a puberdade, é dado início à fase genital,
quando o objeto de erotização não se encontra mais no próprio corpo, mas sim em um
objeto externo – no outro.
Durante estas etapas do desenvolvimento, podemos destacar o complexo de
Édipo (3-5 anos) como um dos acontecimentos mais determinantes na estruturação da
personalidade do indivíduo. No complexo de Édipo, o objeto de desejo do menino é a
mãe, sendo o pai o rival que impede que tenha acesso ao objeto de desejo. Já no caso
das meninas é o oposto, sendo o pai este objeto desejado. A passagem por esse período
é determinante para a formação da estrutura, já que é através dele que a menina se
“define” como mulher e o menino como homem.
O que se espera é que no final da época do conflito edipiano, a investigação
sexual caia sob domínio da repressão. A partir da internalização das proibições, dos
limites e da autoridade, é formado o superego. O id constitui o reservatório da energia
psíquica, é onde se “localizam” as pulsões: a de vida e a de morte; é regido pelo
princípio do prazer. O ego é o sistema que estabelece o equilíbrio entre as exigências do
id, as exigências da realidade e as “ordens” do superego. Procura “dar conta” dos
interesses da pessoa, agindo como regulador, na medida em que altera o princípio do
prazer para buscar a satisfação considerando as condições objetivas da realidade.
PSICANÁLISE DOS CONTOS DE FADAS
Em praticamente todos os contos de fadas o bem e o mal recebem corpo na
forma de algumas figuras e de suas ações, apresentando que essa dualidade que coloca o
problema moral e requisita a luta para resolvê-lo faz parte da vida de todo ser humano.
Mostra que a luta contra dificuldades graves na vida é inevitável, mas se a pessoa não se
intimida e defronta de modo firme essas questões, dominará os obstáculos e, ao fim,
sairá vitoriosa. “A psicanalise foi criada para capacitar o homem a aceitar a natureza
problemática da vida sem ser derrotado por ela, ou levado ao escapismo. A prescrição
de Freud é de que só lutando corajosamente contra o que parecem probabilidades
sobrepujantes o homem pode ter sucesso em extrair um sentido da sua existência.”
Bettelheim (1980, p.17)
A partir da figura do herói, a criança, ao se projetar no personagem decide ser
uma pessoa boa também. Geralmente nas estórias, o herói mantém-se por algum tempo
em isolamento, assim como a criança moderna, que com frequência se sente isolada.
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Sempre ajudado por árvores, animais, dentre outros objetos inanimados, a maioria das
crianças se sente mais em contato com estes objetos do que a maioria dos adultos.
Enfrentar a vida com uma crença na possibilidade de dominar as dificuldades ou com a
expectativa da derrota constitui também um problema existencial.
O conto de fadas é orientado para o futuro e guia a criança a abandonar seus
desejos de dependência infantil e buscar uma independência satisfatória.
CAPÍTULO II - Importância dos contos na infância
A IMPORTÂNCIA DOS CONTOS DE FADAS
“Só partindo para o mundo é que o herói dos contos de fada (a
criança) pode se encontrar; e fazendo-o, encontrará também o
outro com quem será capaz de viver feliz para sempre; isto é, sem
nunca mais ter de experimentar a ansiedade de separação. O conto
de fadas é orientado para o futuro e guia a criança – em termos
que ela pode entender tanto na sua mente inconsciente quanto
consciente – a ao abandonar seus desejos de dependência infantil
e conseguir uma existência mais satisfatoriamente independente”.
Bettelheim (1980, p.16)
Irreal. Fantasioso. Mágico. Tais palavras resumem o imaginário do senso comum
sobre os contos de fadas. É comum que educadoras e educadores, assim como
responsáveis, manifestem preocupação em relação ao fato de os contos apresentarem
uma linguagem que se distancia da realidade da criança, indagando-se sobre a
relevância -ou não - deste para o período infantil.
No entanto, saindo do imaginário popular e adentrando às perspectivas
psicanalíticas, é possível compreender que os contos de fadas, mesmo se apropriando do
irreal, fantasioso e mágico para discorrerem suas histórias, dialogam com as realidades e
os conflitos internos da criança, penetrando às questões emotivas, como: amor, ódio,
solidão, abandono, rejeição, raiva. Por conseguinte, tornando-se importante para o
melhor desenvolvimento cognitivo, afetivo e social desse público.
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Segundo Bettelheim, em A Psicanálise dos contos de Fadas, para dominar
problemas psicológicos do crescimento, como os citados acima, que perpassam às
decepções narcisistas, os dilemas edipianos, às rivalidades fraternas, etc., a criança
precisa entender o que está se passando dentro de seu “eu” consciente para que também
possa enfrentar o que se passa em seu “eu” inconsciente. Isso, no entanto, não é
alcançado através de uma compreensão racional, mas sim através de devaneios, de
fantasias. A criança pode obter um consolo muito maior de um conto de fadas do que de
um esforço para consolá-la baseado em raciocínio e pontos de vista adultos, já que os
contos são baseados em pontos de vista e raciocínio semelhantes aos seus.
Outrossim, torna-se válido ratificar que o “mundo fantasioso”, proposto pelos
contos de fadas, facilita a compreensão das crianças, porque é o que mais se aproxima
do modo como estas veem e interpretam o mundo real. Afinal, como relatado por
Piaget, a crianças, até o período da puberdade, assume uma postura animista, que é a
percepção de objetos inanimados como se tivessem vida, sentimentos e intenções. É um
fenômeno, aliás, comum tanto às crianças como aos adultos, e depende, em sua origem,
da sensibilidade de cada pessoa para as "propriedades fisionômicas" dos objetos e
acontecimentos. Por isso, é comum, por exemplo, observarmos que crianças fornecem
vida ao sol, à lua, acreditam em monstros, duendes e, também, fazem da vassoura um
cavalo ou de um parto o volante de um carro.
Em síntese, pode-se compreender que, por aproximar-se da realidade das
crianças, os contos de fadas são de suma importância para o desenvolvimento infantil,
pois contribuem para formação da personalidade e ajudam a estas a compreenderem o
mundo que as cerca. Talvez, por esse motivo, seja necessário que responsáveis,
educadoras e educadores possibilitem a leitura dos contos de fadas para alunas, alunos,
filhas e filhos, a fim de contribuir, portanto, como o progresso de suas habilidades
afetivas, sociais e cognitivas.
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A IMPORTÂNCIA DOS CONTOS COMO FERRAMENTA PEDAGOGICA.
Há prazer de folhear um livro, colorido ou branco e preto [...]
livros feitos para crianças pequenas, mas que podem encantar aos
de qualquer idade, são, sobretudo, experiências de olhar, de um
olhar múltiplo, pois se vê com o olhar do autor e do
olhador/leitor, ambos enxergando o mundo e os personagens de
modo diferente, conforme percebem o mundo. Saborear e detectar
tanta coisa que nos cerca usando este instrumento nosso tão
primeiro, tão denotador de tudo, a visão.
(ABRAMOVICH, 2006, p. 33).
A prática educativa deve possibilitar às alunas e aos alunos, além das questões
elementares e tradicionais, como ler, escrever e fazer contas, a compreensão completa
do mundo que a cerca, desenvolvendo seus aspectos cognitivos, emotivos e, também,
sociais. A ludicidade, imaginação e criatividade devem fazer parte da prática
pedagógica. Um dos caminhos para fazê-la, é integrando os contos de fadas, portanto a
leitura, às aulas, principalmente da Educação Infantil.
Segundo o RCNEI (Referencial Curricular Nacional para Educação Infantil), de
1988, é possível compreender que:
Ter acesso à boa literatura é dispor de uma informação cultural
que alimenta a imaginação e desperta o prazer pela leitura. A
intenção de fazer com que as crianças, desde cedo, apreciem o
momento de sentar para ouvir histórias exige que o professor,
como leitor, preocupe-se em lê-la com interesse, criando um
ambiente agradável e convidativo à escuta atenta, mobilizando a
expectativa das crianças, permitindo que elas olhem o texto e as
ilustrações enquanto a história é lida.
(BRASIL, 1998, p. 143)
Logo, pode-se entender que a leitura é de suma importância para o
desenvolvimento infantil e as educadoras e os educadores devem ser grandes
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incentivadores deste recurso para atingir os objetivos pedagógicos. Afinal, é por meio
da leitura, a destacar-se os contos de fadas, que a criança irá progredir nos seus
processos de concentração, à medida que ouve a leitura; e de interpretação, à medida
que relaciona o conto com a sua vida.
Ademais, vale mencionar que, nos contos, a figura do personagem enriquece a
identidade da criança, pois ela consegue verificar, ao mesmo tempo, outras formas de
ser, de pensar e de se comunicar. Isso, aliás, possibilita à criança uma melhor concepção
do ambiente em que esta está inserida. É como acontece na brincadeira de faz de conta.
Os contos de fadas, portanto, são importantes e devem estar integrados às
práticas educativas, pois, como dito anteriormente, envolvem a imaginação, criatividade
e ludicidade no ensino, assim como desenvolve suas habilidades sociais, afetivas e
cognitivas. Por isso e para isso, faz-se necessário que as educadoras e os educadores não
hesitem ao utilizar-se deste recurso como ferramenta pedagógica.
CAPÍTULO III – A criança x os contos
Os contos de fadas são extremamente importantes para o desenvolvimento da
criança, ele auxilia na concretização dos sentimentos e emoções, fazendo com que ela
aprenda a lidar com os mesmos. A estrutura dos contos corresponde às necessidades
infantis, ou seja, eles partem de um viés que a criança consiga fazer uma assimilação
com a sua realidade interna.
Segundo a teoria do brincar de Vygotsky a criança num primeiro momento
desenvolve o seu imaginário pelo jogo, pelo gesto, pelo corpo e só depois que ela vai
utilizar o desenho, a pintura, e por fim, a narração. O brincar de faz de conta, não é uma
atividade banal ou vazia, é no faz de conta que grande parte do desenvolvimento
cognitivo da criança se dá. As crianças tendem a ouvir repetidamente as mesmas
histórias, porque isso as ajuda a integrar a informação ao seu ritmo, ao mesmo tempo,
em que lhes transmite familiaridade e segurança. Apesar de ver de forma repetida, cada
vez é única e diferente das anteriores e, quando sentem que tiraram todo o ensinamento,
mudam para outra história; como se passassem para uma “nova” fase. Os contos têm o
papel de auxiliar a criança na superação de dilemas edipianos, rivalidades fraternas e
decepções narcisistas; tornando-as capazes de abandonar dependências infantis,
adquirindo um sentimento de individualidade e de autoestima, e assim, um sentido de
obrigação moral.
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Através dos contos, é possível proporcionar as crianças algumas formas de
aprendizagem que estejam de acordo com o desabrochar do seu ego, ou seja, os contos
de fadas proporcionam um refúgio e um meio de solução para os seus conflitos internos.
Os contos de fadas não são moralistas, não ensinam diretamente o que é certo e errado,
mas ajuda a criança a abstrair e moldar de forma saudável o seu superego; de forma
indireta a criança constrói o seu senso moral e aprende lidar com seus problemas.
Portanto, os contos de fadas são considerados como a literatura infantil que mais
enriquece e satisfaz a criança, mas não desde a sociedade moderna e concreta, já que
esses relatos foram criados muito antes do surgimento da agitada sociedade na qual
vivemos. No entanto, dessas histórias pode se aprender sobre os problemas internos dos
seres humanos e sobre as soluções para essas dificuldades, em um nível no qual a
criança possa compreender.
Uma exemplificação de como o conto pode ajudar na percepção da criança seria,
O conto dos Três Porquinhos, ele ajuda a criança a desenvolver o princípio da realidade,
ou seja, ela consegue compreender que se entregarem ao prazer retratado pelos dois
porquinhos mais novos não será satisfatório e é preferível adiar a satisfação e "construir
uma casinha de tijolos" porque só ai conseguirá desfrutar da vida; aprende a adiar a
satisfação imediata e a "se proteger do lobo". Assim, tirando suas conclusões sobre o
que fazer, ela entende que a preguiça e a comodidade não levam a nada.
“A imagem é subjetividade”; Sartre, A Imaginação.
Para Sartre (1993), a imaginação é um ato mágico. É uma
encantação determinada a fazer aparecer o objeto pensado,
desejado. Imaginar é reconstruir e transformar a realidade por
meio dos significados dados aos acontecimentos ou repercussões
interiores que eles têm em nós.
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CAPÍTULO IV – Análise dos contos
ANÁLISE DO CONTO DA BRANCA DE NEVE
Esse é um dos contos mais conhecidos. Existem várias versões do mesmo,
porém, o mais popular é o dos Irmãos Grimm e a versão da Disney. Contendo suas
semelhanças e diferenças, as narrativas contam a história de uma menina de
extraordinária beleza, a qual tinha uma madrasta que desejava ser a mais bela do reino.
No ponto de vista da psicanálise, a rivalidade entre Branca de Neve e a rainha se
origina dos ciúmes da madrasta, não apenas por causa da beleza possuída por Branca,
mas também pelo amor do pai dedicado a filha. O Édipo é identificado nesse momento,
em que, a posição da criança se torna conflituosa no ambiente familiar.
Neste drama infantil, é possível perceber nitidamente as fases principais da
infância e também as representações da psicanálise, como no sangue derramado na neve
branca que representa a quebra da inocência e o início da vida sexual (menstruação e
rompimento do hímen) da menina.
“Era uma vez, no meio do inverno, quando a neve caía como
plumas no céu, uma rainha que estava sentada perto de uma janela
cuja moldura era de ébano negro. Enquanto costurava olhando
para a neve, picou o dedo com a agulha e três gotas de sangue
caíram na neve. O vermelho ficou tão lindo sobre a neve branca
que ela pensou: - ‘Quisera uma filha branca como a neve, rosada
como o sangue, e de cabelos negros como a madeira’ – Pouco
depois teve uma filha que era branca como a neve, rosada como
sangue, e de cabelos negros como o ébano, e que por isso passou
a chamar-se Branca de Neve.” (p.241)
Podemos verificar a representação dos pais nos personagens da madrasta/rainha
má e no caçador. O narcisismo da rainha/mãe é representado pela voz do espelho
mágico que sempre confirma sua beleza até o momento em que Branca de Neve cresce,
e ao amadurecer, passa a ser uma ameaça se tornando a mais bela. A madrasta só passa
a ser má com Branca no momento em que o sentimento de ameaça e ciúmes ao vê-la
crescer, desperta. O desejo da rainha de incorporar os encantos de Branca de Neve
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vemos representado pelo ato de comer os órgãos da jovem. O amor e proteção do pai é
representado pelo caçador, que ao desobedecer a uma ordem da rainha, nega-se a matar
Branca de Neve.
“Em ‘Branca de Neve’, como em ‘Chapeuzinho Vermelho’,
sempre aparece um homem que pode ser encarado como uma
representação inconsciente do pai – o caçador que recebe ordens
de matar Branca de Neve, mas em vez disso salva-a. Quem senão
o pai substituto poderia aparentemente aquiescer ao domínio da
madrasta e, no entanto, pelo bem da criança, ousar contrariar a
vontade da rainha? É o que a menina edípica ou adolescente
deseja acreditar sobre o pai: que, mesmo que ele fizesse o que a
mãe lhe ordena, tomaria o partido da filha se fosse livre, como o
fez.” (p.244)
O período em que Branca de Neve passa com os anões, representa o desejo de
fuga em busca de um lar ideal. Mostra seu processo de amadurecimento quando ao se
deparar com obrigações e afazeres do dia a dia, passa aos poucos a cumprir e a assumir
responsabilidades.
“Os sete anões sugerem os sete dias da semana- dias cheios de
trabalho. Se quiser crescer bem, Branca de Neve deve transformar
o seu mundo em um mundo de trabalho [...]” (p.248)
“Os anões simbolizam uma forma de existência imatura que
Branca de Neve deve transcender [...]” (p.249)
O conto apresenta o domínio já obtido dos anseios orais e o amadurecimento do
ego, representados nas cenas em que Branca se contém ao comer pequenos pedaços da
refeição dos anões e ao ter cuidado na escolha da cama ideal para dormir. A aparição
dos desejos sexuais, antes reprimidos, são representados nas tentativas da madrasta de
matar a jovem, sempre oferecendo algum objeto. A facilidade da adolescente em ceder
às tentações internas é representada nas três tentativas em que Branca de Neve se deixa
levar pela rainha disfarçada. A atração de Branca pelos artefatos apresentados pela
rainha, representam seu desenvolvimento e inconsciente interesse em se manter
sexualmente atraente.
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“Os altos e baixos dos conflitos do adolescente são simbolizados
pelas duas tentações por que passa Branca de Neve, com risco e
sendo salva por uma volta a existência prévia, a da latência. A
terceira experiência de tentação finalmente acaba com os esforços
de Branca de Neve voltar à imaturidade quando encontra
dificuldades adolescentes”. (pp.250-251)
Muitos heróis de contos de fadas, em determinados momentos das estórias, caem
num sono profundo ou renascem. O renascimento ou despertar simboliza a conquista de
maturidade e de uma nova compreensão dos aspectos da vida. Para que a mudança
aconteça precisamos abandonar velhos hábitos, e que as mudanças muitas vezes são
dolorosas, mas compensadoras no final. A estória de Branca de Neve ensina que para
chegar a fase adulta, é necessário passar e superar as contradições internas,
prosseguindo como uma pessoa madura e equilibrada, e apresenta também que pais com
ciúmes edípicos podem destruir os relacionamentos com seus filhos.
ANÁLISE DO FILME VIVA - A VIDA É UMA FESTA
A animação Viva – a vida é uma festa surge contrapondo os filmes tradicionais
da Disney e tratando de forma direta um tema pouco explorado anteriormente para
crianças. A morte é trabalhada de forma atípica e bem-vinda. O filme explora não só a
morte natural, mas as por acidente, o assassinato e o esquecimento, como morte
simbólica.
O pequeno Miguel é o ponto central da história. Apaixonado por música, o
garotinho vive em uma estrutura matriarcal na qual ela está banida, devido a um trauma
do passado. Porém, isso não o impede de nutrir em segredo o sonho de se tornar artista,
um músico de sucesso. Mas seria possível equilibrar o amor pelos familiares e o amor
pela arte? O desejo de aventura e ascensão artística e a vida doméstica?
Miguel, impulsionado pelo seu ego, decide se aventurar e desobedecer a regra
familiar de não reproduzir música. Descoberto, tem seu desejo colocado em xeque, em
pauta. A família, por sua vez, da como encerrada a questão. Impondo a ele o
afastamento da música. O que o leva a morte, como limite dos seus desejos. Podemos
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então identificar que segundo Freud, o protagonista estaria entrando em um estágio de
melancolia. A melancolia está de alguma forma relacionada a uma perda objetal retirada
da consciência, uma perda relativa ao seu ego.
A narrativa revela um menino decidido a confrontar seus antepassados e suas
origens para realizar seu sonho. Renunciando a família, notamos outras características
do indivíduo melancólico, aquele moralmente desprezível, esperando e sabendo que
merece ser expulso ou punido. Vemos que nele uma parte do ego se sobrepõe a outra,
julgando-a criticamente. Perde o interesse na família e parece temporariamente incapaz
de amar. O menino, com a esperança de ter seu sonho aprovado, segue em busca do seu
falecido tataravô, o músico que trocou a vida ao lado da família por reconhecimento
artístico e sua realização musical.
Viva, dissocia da noção óbvia de céu e inferno, preferindo a transferência
harmônica e igualitária para outro plano de existência, tratando com muita delicadeza e
irreverência o “outro lado”, trazendo imagens coloridas e cenas divertidas no pós vida.
Os mortos são esqueletos maquiados e vestidos, o corpo é visto como mero acessórios.
A espiritualidade e cultura mexicana não são empregadas como única verdade ou
religião, dispensando a utilização de igrejas ou padres para o tema. Preso neste lado,
Miguel apesar de necessitar e depender da família, está longe de demonstrar atitude
humilde ou submissa. Ao contrário, dando a impressão de que se sente desconsiderado e
que foi tratado com grande injustiça. Comportamento típico de indivíduos melancólicos.
Ao contar com o auxílio do morto Hector, surgem questionamentos naturais a respeito
de suas escolhas. Percebe aos poucos que o esquecimento daqueles que o amam é mais
grave do que abrir mão de suas paixões, com consequências mais marcantes e
definitivas. Ele então renúncia do seu objetivo, em prol de um equilíbrio e valorização
do seu contexto familiar. Saindo assim do período de melancolia, buscando sua
vivacidade normal. Em outro ponto, temos também a perspectiva da família, que
desafiada por Miguel se vê obrigada a abrir mão de determinadas práticas e regras, que
eram verdadeiras punições pela dor que a música indiretamente lhe causou. Saindo
assim do luto.
A canção tema “Lembre de mim” reforça que o amor se encontra na lembrança
daqueles que estiveram próximos e de que o amor não é obrigatoriamente um
sentimento físico, possibilitando assim a manutenção e o afeto com aqueles que já
foram. Encurtando e ressignificando para o público os períodos de melancolia e luto.
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ANÁLISE DO FILME DIVERTIDAMENTE
A animação narra a história de Riley, uma garota de 11 anos que enfrenta
diversas mudanças na sua vida. A trama se desenrola dentro da cabeça da menina, onde
cinco emoções (Alegria, Tristeza, Medo, Raiva e Nojo) são as encarregadas por
organizar as informações e recolher as memórias. Esta traz uma concepção sobre a
passagem da infância para a adolescência, seu comportamento e principalmente o
desenvolvimento emocional da criança.
As emoções acima convivem equilibradamente tentando buscar o melhor
resultado de controle e existência para a protagonista. Portanto, são as construtoras das
características comportamentais e também do caráter de Riley. Segundo a teoria de
Freud a personagem principal está no estágio da latência, pois, a mesma se encontra em
direção a adolescência, entretanto apresenta o desenvolvimento do superego em seu
processo de ensino, o qual é possível comprovar pelo fato de no filme só aparecer ela
com suas amigas e não com namorados, é nessa fase que acontece o desenvolvimento
de habilidades sociais e intelectuais e a apropriação de valores e papeis culturais aceitos.
As emoções residem no pré-consciente e exercem o papel de filtro, o qual decide
o que vai ou não vai do inconsciente para o consciente e assim vice e versa. As ilhas de
personalidades estão localizadas entre o id e o ego os quais constituem boa parte da
personalidade que se compreende como um conjunto: objetividade, caráter,
temperamento e subjetividade.
Após ocorrer uma oscilação na mente de Riley, por conta da mudança de cidade,
escola e amigos; suas emoções mais primitivas passam a atuar e o filtro do Pré-
consciente torna-se incapaz de filtrá-las. Entram em ação diversos mecanismos de
defesa na tentativa de deturpar a compreensão da realidade dela. Como a purificação da
saudade de Minnesota, tentando encontrar novos elos afetivos na nova cidade: São
Francisco.
A teoria de Freud diz que a personalidade se desenvolve através de frustrações
(chorar no meio da sala de aula), conflitos (brigar com o pai), crescimento fisiológico
(puberdade em desenvolvimento) e perigos (tentar fugir de casa).
As relações da protagonista com o ambiente podem se enquadrar no fator de
formação da personalidade, segundo a teoria comportamental de Skinner. A partir de
um novo viés a teoria de Adler identifica que a protagonista apresenta um complexo de
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inferioridade, no qual, por não se encaixar, externaliza sua tristeza chorando no primeiro
dia de aula, por conta da recordação dos antigos hábitos, mas até o final do filme, ocorre
o processo de adaptação contínua ao meio ambiente.
A cultura ocidental doutrina a sociedade a anular as emoções e ser mais
racionais. Filósofos como Descartes e Platão viam os sentimentos como uma série de
impulsos descuidados e potencialmente destrutivos, defendendo o uso da razão para
nossa tomada de decisões. Porém, o filme mostra justamente o contrário, indo de
encontro às teorias psicológicas que defendem que as pessoas devem saber lidar com
seus sentimentos, incorporando-os, e não os reprimindo. Somos moradores de uma
sociedade que valoriza a felicidade acima de tudo e a pressão é tão grande que
acabamos reprimindo qualquer outra emoção.
As condições sociais e fisiológicas contribuem para a formação e
desenvolvimento comportamental da criança. É também nessa construção das relações
sociais que o modo em que se expressa às emoções repercute nas respostas do outro e
influência no tipo e na qualidade dessa interação, auxilia na acomodação do indivíduo e
contribui na evolução de sua pessoalidade.
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CONSIDERAÇÕES FINAIS
A magia e o encantamento que os Contos de Fadas são capazes de provocar em
crianças e também em adultos, fazem com que essas histórias sejam lidas e relidas
várias vezes. A proposta desse estudo foi mostrar como os Contos de Fadas podem
auxiliar na identificação dos estágios de desenvolvimento da criança em relação ao seu
desenvolvimento afetivo, cognitivo e psicológico, e como eles são analisados pela visão
psicanalítica.
Por tratarem de sentimentos e situações conflitantes, como as vividas em seu
cotidiano, os contos buscam, através de uma linguagem lúdica, se tornar um
instrumento facilitador para que a criança se reconheça nos personagens do enredo e
que, junto a eles, encontrem a solução para os problemas e situações que as afligem.
Pelo seu poder de ensinar e de promover o crescimento, no que se refere à
compreensão de si mesmo e do mundo, os Contos de Fadas representam um método de
grande valia para auxiliar nessa busca de significado e autoconhecimento. Buscou-se
mostrar nos contos apresentados, a questão do complexo de Édipo, do luto, do conflito
de sentimentos com a chegada da puberdade, e as relações familiares entre outras.
Enquanto diverte a criança, o conto esclarece sobre si mesma, e
favorece o desenvolvimento de sua personalidade. Oferece
significado em tantos níveis diferentes, e enriquece a existência
da criança de tantos modos que nenhum livro pode fazer justiça à
multidão e diversidade de contribuições que esses contos dão à
vida da criança. Bettelheim (1980, p.20)
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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BETTELHEIM, Bruno (1980). A Psicanálise dos Contos de Fadas. Rio de Janeiro: Paz
e Terra.
COSTA, Teresinha (2010). Psicanálise com Crianças. Rio de Janeiro: Zahar.
COSTA, Teresinha (2010). Édipo. Rio de Janeiro: Zahar.
FREUD, Sigmund (1914-1916). A História do movimento Psicanalítico: Artigos sobre
metapsicologia e outros trabalhos. Trad. Jayme Salomão, Rio de Janeiro: Imago.
HERCULANO-HOUZEL, Suzana. O Cérebro Adolescente: A neurociência da
transformação da criança em adulto. eBook Kindle: Amazon.
PSICOLOGIA POR TRÁS DA LITERATURA INFANTIL, Disponível em
http://lounge.obviousmag.org/marcelo_vinicius/2013/06/psicologia-por-tras-da-
literatura-infantil.html.
SARTRE, Jean Paul, (1936). A Imaginação. Trad. Manuel João Gomes, Lisboa: Difel.
VYGOTSKY, L.S. (1984). A formação social da mente. Trad. José Cipolla Neto et alii
São Paulo: Livraria Martins Fontes.
VYGOTSKY, L.S. (1979). Pensamento e linguagem. Trad. M. Resende, Lisboa:
Antídoto.
ANEXOS Vídeos YouTube: https://youtu.be/GyFQj64amhY https://youtu.be/nbnW0vou57M https://youtu.be/ytzaINVpbZI https://youtu.be/9bB7pUgRo6w https://youtu.be/3ceYpCuGCOk
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