Covid-19: quais os próximos passos para as empresas de energia elétrica?
O setor é resiliente, mas essa crise acelera a demanda por novos produtos e serviços, incluindo eficiência energética e novas tecnologias, e reforça a necessidade de efetiva segurança regulatória.”
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Onde estamos hoje?
O setor de energia já passou por muitas crises e hoje tem uma estrutura institucional e empresas robustas, que asseguram a prestação do serviço essencial. A conta-covid1 deve mitigar o risco de liquidez, e um contexto geral de razoável estoque de água nos principais reservatórios auxilia na manutenção da bandeira tarifária verde.
Mas a pandemia traz um choque profundo na demanda, que impactará toda a cadeia.
Passado o momento inicial, apresentamos neste material a nossa visão sobre onde estamos, o que aprendemos até aqui e nossas principais recomendações para as empresas de agora em diante.
1. Decreto n° 10.350/20, que cria a conta para enfrentamento de efeitos da pandemia do novo coronavírus nosetor elétrico, em regulamentação ao previsto na Medida Provisória nº 950, de 8 de abril de 2020.
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Fontes: CCEE; Análise Strategy&
QUADRO 1
Consumo de energia por região Média do período de isolamento em base anual, MWm
13%Queda na média do consumo de energia nos estados, desde o início do isolamento social.
32,9
38,3
9,4
10,5
9,8
11,42019 4,9
4,82020
65,1
56,8SE/CO
Norte
Sul
NE
A queda na renda das empresas e das famílias se traduz em redução de consumo e aumento da inadimplência, que pode alimentar o ciclo de revisão tarifária para lidar com os custos e investimentos da cadeia.”
A demanda tem sido afetada de modo particularmente forte nas empresas. Segundo a CCEE (Câmara de Comercialização de Energia Elétrica), quando se compara a média das três primeiras semanas de março, antes do início das medidas restritivas, com a média do período após o começo do distanciamento social, a demanda por eletricidade recuou 14% no mercado regulado e 19% no mercado livre. A indústria automotiva teve queda de 60% no consumo de energia, em maio, em comparação com o mesmo mês de 2019, enquanto o setor de serviços registrou média 33% menor em relação a abril de 2019.
As distribuidoras atenderam com qualidade ao reequilíbrio do consumo comercial para residencial, fato que dará mais credibilidade para aumentar a lealdade de clientes e até mesmo contribuir para evitar que o consumidor mude de concessionária, quando isso for possível.
Em todo o país, o consumo médio caiu 13% (ver Quadro 1). O Rio de Janeiro liderou a queda, com 21%, seguido por São Paulo (16%), Espírito Santo, Rio Grande do Sul e Amazonas, todos com 15%.
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Fontes: IBGE; EPE; Análise Strategy&
QUADRO 2
Variação do consumo de energia no país
O PIB brasileiro deve levar 4-5 anos para retornar ao nível de 2019, impactando diretamente o consumo de energia.”
Por várias décadas, o consumo de energia do país tem acompanhado a variação do PIB, em especial no setor empresarial (ver Quadro 2).
Consumoresidencial
Consumoindustrial/comercial
Variaçãodo PIB
-15%
-10%
-5%
0%
5%
10%
15%
‘95 ‘97 ‘99 ‘01 ‘03 ‘05 ‘07 ‘09 ‘11 ‘13 ‘15 ‘17 ‘19
Embora sejam grandes as incertezas, há algumas consequências da pandemia das quais dificilmente escaparemos: (i) desemprego, (ii) endividamento, (iii) diminuição do comércio global, e (iv) preços de combustíveis mais baixos.
Com isso vislumbramos cenários em que o PIB não deve retornar aos níveis de 2019 antes de, no mínimo, 4-5 anos. Em consequência, deverá haver uma queda no mercado de energia como um todo (ver Quadro 3).
Fontes: Economist Intelligence Unit (cenário base); Análise Strategy&
QUADRO 3
Cenários para a retomada da economia brasileira pós-Covid-19
Cenário base(anterior à Covid-19)
2020 20222021
2,3 2,52,1
Real
2019
1,3
Cenário V (moderado)
2020 20222021
-5,5 2,51,2
Cenário U (severo)
2020 20222021
-8,5 2,51,8
Cenário L (drástico)
2020 20222021
-11,0 2,51,1Crescimentodo PIB (%)
Lockdown
Curva de infecção
Crise e recuperação
Produção e logística
• Necessidade de priorizar investimentos e processos de manutenção.
• Atenção à cadeia de suprimentos e revisão dos estoques de segurança.
• Aceleração da migração para o mercado livre e autoprodução.
Força de trabalho
• Aplicação de novos requisitos de higiene e segurança para manter as operações.
• Utilização ampla de teletrabalho para equipes administrativas.
• Redução de equipes devido à desaceleração econômica geral.
Investimento e fluxo de caixa
• Gestão do aumento da inadimplência.
• Gestão dos desembolsos para a conta-covid.
• Dificuldade de pagamento de contas em locais físicos.
Vendas e distribuição
• Aumento da utilização de canais digitais de atendimento.
• Aumento do risco de ataques cibernéticos.
Econômicos e sociais
• Queda da renda deve elevar subsídios e roubo de energia, pressionando os ciclos de revisão tarifária.
+120 milempregados no setorDados de empregados diretos e formais nos setores de distribuição, transmissão e geração de energia, a partir do cadastro da Rais (Relação Anual de Informações Sociais).
Baixoíndice de risco de empregoClassificação reflete análise conduzida pelo ILO (International Labour Organisation) sobre quais setores têm maior propensão a demissão devido à Covid-19.
33%dos funcionários têm contato físico com +20 colegasContato próximo definido como distância menor do que 2 metros.
Fonte: PwC Research QuantiBus, abril 2020.
O setor de energia terá que lidar com impactos severos, gerenciando uma força de trabalho de grande escala e dispersa, enquanto revê os custos gerenciáveis e planos de investimentos.”
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O que estamosaprendendo?O estágio inicial da Covid-19 e as ações para mitigar sua disseminação trouxeram mudanças imediatas na forma de trabalhar, no comportamento do consumidor e na demanda por tecnologia em todos os setores.
Novas formas de trabalho podem ser um desafio de curto prazo
Os funcionários de serviços essenciais precisam estar no campo para dar continuidade à operação. O desafio é servir os times operacionais no campo e o cliente com a equipe de suporte em teletrabalho. A solução? Rápida adoção de tecnologia e upskilling das equipes, assim como novos canais e serviços para engajar o consumidor. Por exemplo, a autoleitura do medidor pode se tornar o padrão no mercado.
O setor rapidamente se reinventou
O segmento de distribuição de energia rapidamente pivotou o atendimento a milhões de clientes. Desde o início do isolamento, as concessionárias adotaram o teletrabalho para a equipe de atendimento ao cliente e reforçaram o uso de canais digitais, inclusive aplicativos de mensagens e mídias sociais. Em poucas semanas, foram anos de avanços na digitalização do atendimento. Isso traz profundas e duradouras mudanças no comportamento do consumidor.
A crise deu oportunidade para que as empresas acelerem suas capacitações de data analytics. Direcionar esforços aqui pode gerar ganhos significativos na redução de custos, melhoria dos índices de qualidade e otimização da cadeia de suprimentos.
No longo prazo, empresas de energia bem-sucedidas serão aquelas que mais rápida e incisivamente abraçarem as mudanças impostas pela realidade da pandemia.”
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Consumidores valorizarão ainda mais as relações digitais, especialmente serviços integrados e tecnologias de IoT e smart home, e isso traz ainda mais valor para a última milha.”
Oportunidades para novos serviços digitais
A cultura do teletrabalho vai acelerar a adoção de aparelhos de smart home, residência conectada e meios de pagamento digitais. Concessionárias podem utilizar sua capilaridade e confiança com o consumidor para expandir a oferta de produtos e serviços.
Introdução dos carros elétricos pode atrasar alguns anos
A eletrificação dos carros continua sendo um movimento inexorável, mas pode ser postergada, uma vez que as pessoas tenderão a viajar menos e o preço da gasolina se manterá baixo, estimulando o uso dos combustíveis fósseis e do etanol por mais tempo. Fabricantes de tecnologia e montadoras com menor disponibilidade de caixa também devem alongar o plano de investimentos. Vale ressaltar que os modelos de negócio de locação e compartilhamento de carros elétricos pode ser ainda mais relevante na expansão da frota com essas novas tecnologias.
Empoderamento do consumidor torna a autogeração mais relevante
O aumento do tempo das pessoas em suas residências cria oportunidades na cadeia de valor. O uso de tecnologia solar, em especial a geração distribuída (GD), pode aumentar apesar da desvalorização cambial, que é compensada pela disponibilidade de financiamento. Haverá demanda por novos serviços de instalação e manutenção, e pode crescer a oferta de produtos como tarifas variáveis e armazenamento de energia, em paralelo ao aumento dos serviços de eficiência energética.
Smart grid se provou, mas pode ser postergado
A redução no consumo e as pressões tarifárias aumentam a importância da eficiência operacional. Por facilitarem a gestão e a otimização remota da rede, as iniciativas de smart grid devem ser estimuladas. Porém, a limitação de investimento exigirá a repriorização dos planos.
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Como podemos responder?No curto prazo, as empresas de energia precisam dar continuidade à prestação do serviço, mantendo a qualidade tanto do ponto de vista operacional quanto financeiro. À medida que o isolamento e as ações de saúde pública se tornarem mais brandas, acreditamos que surgirão alguns temas para o “novo futuro” das empresas.
Apoiar empregados, clientes e a economia como um todo
Enquanto os negócios e as famílias continuarem sentindo os efeitos de longo prazo da pandemia de Covid-19, as empresas de energia deverão equilibrar sua saúde financeira com o apoio a empregados e à sociedade. Algumas ações nesse sentido são: acompanhar o cumprimento das recomendações de saúde dos seus funcionários, proteger empregos realocando e treinando pessoal, estimular o trabalho remoto, apoiar os subsídios transitórios para clientes necessitados, buscar otimizações de despesas que reduzirão a pressão sobre os ciclos de reajuste tarifário.
Acelerar a transformação digital e o ganho de eficiência operacional
As empresas devem alavancar as novas tecnologias na interação com o cliente, nos processos internos de gestão e na operação da rede, priorizando os investimentos de maior impacto no curto prazo. Por exemplo, a adoção ampla de leitura e pagamento das contas por via digital pode ganhar enorme tração, inclusive via novas plataformas de pagamento instantâneos.
Reforçar o relacionamento com o cliente
Até agora, empresas de energia cuidaram dos consumidores, suportando postergações de recebimento, evitando corte no fornecimento e mantendo os índices de qualidade. As manutenções preventivas e investimentos críticos foram mantidos. Se por um lado essas medidas afetam o caixa do setor, a sociedade reconhece o papel crítico das empresas públicas e privadas neste momento. À medida que saímos da crise, as empresas de energia devem aproveitar essa percepção positiva e o aumento da confiança para desenvolver novos serviços e produtos, ou atualizar os já existentes, de forma a reforçar o relacionamento com os clientes.
Readequar planos de investimento à nova realidade de carga do sistema
A menor demanda justifica que os agentes do mercado revisem o plano de expansão da rede, para evitar repasses excessivos à tarifa. Enquanto isso, no curto prazo, a compra de energia spot deve se tornar mais barata, gerando oportunidades e desafios para diferentes players.
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Nota: amostra de 15 companhias de capital aberto do setor elétrico. Cada ponto representa uma companhia.Fonte: Análise Strategy&
Dívida líquida/EBITDA(mar/20 ou dado mais atual)
Var
iaçã
o no
val
or d
as a
ções
(31/
mar
/20
x 31
/dez
/19)
6x3x
0%
0x 1x 2x
-50%
4x
-20%
5x-70%
-60%
-40%
-30%
-10%
QUADRO 4
Valor de mercado versus endividamento
À medida que o setor ressurge da crise, as melhorias de eficiência operacional, lideradas pela tecnologia, vão impulsionar o desempenho financeiro e regulatório.”
Encurtar a jornada de descarbonização e descentralização
A sociedade está alterando sua visão e seus comportamentos, quebrando barreiras e restrições. Isso passa, por exemplo, por ter protagonismo na agenda de eficiência energética, estimular as fontes renováveis e reduzir encargos setoriais.
Novas oportunidades de M&A
O valor relativo das companhias do setor mudou significativamente. O mercado premia empresas de maior porte, que operam em regiões menos voláteis, são mais capitalizadas e têm modelos de negócio mais robustos e processos/tecnologias mais modernos. O câmbio desvalorizado eleva o poder de investimento dos grupos internacionais (ver Quadro 4).
Essa reconfiguração momentânea pode gerar movimentos rápidos de fusões e aquisições, tanto para consolidação quanto para diversificação. Esses movimentos devem ser rápidos, pois as oportunidades podem não durar muito.
O setor tem a responsabilidade de acelerar o uso de tecnologias e estimular as fontes renováveis para consolidar sua força na sociedade do futuro.”
Contatos
Ricardo PierozziSócio da Strategy&+55 (11) 99785 [email protected]
Ronaldo ValiñoSócio e líder de Energia da PwC+ 55 (21) 98129 [email protected]
José Luis MenghiniSócio de Deals CP&I da PwC+ 55 (11) 98781 [email protected]
O sistema energético do futuro
O isolamento social nos deu uma amostra do que será o sistema energético do futuro: menor demanda, maior uso das fontes renováveis e intermitentes, clientes demandando soluções digitais. Isso acelera o desenho e a implementação de soluções novas, serviços mais flexíveis e novas oportunidades para as companhias ao longo da cadeia de valor.
Em um prazo pequeno, o setor provou sua resiliência e a importância de companhias dinâmicas, ganhando em imagem e em posicionamento perante a sociedade. Isso abre novas oportunidades estratégicas para o futuro, por meio da revisão de planos de investimento, aceleração da digitalização, avaliação de oportunidades de M&A em capacitações adjacentes e liderança na discussão da agenda regulatória.
O front-office das empresas se torna cada vez mais crítico para o negócio, e precisa garantir agilidade e segurança cibernética e de dados, em especial à luz dos requisitos da LGPD.
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