ELISA DUARTE DOS SANTOS MESQUITA
PERCEPES E USOS DA FAUNA SILVESTRE PELASCOMUNIDADES HUMANAS DO ENTORNO DA RESERVA
PARTICULAR DO PATRIMNIO NATURAL DO CARAA, CATASALTAS/SANTA BRBARA, MG.
Belo HorizontePontifcia Universidade Catlica de Minas Gerais
2004
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http://www.pdfpdf.com/0.htmELISA DUARTE DOS SANTOS MESQUITA
PERCEPES E USOS DA FAUNA SILVESTRE PELASCOMUNIDADES HUMANAS DO ENTORNO DA RESERVA
PARTICULAR DO PATRIMNIO NATURAL DO CARAA, CATASALTAS/SANTA BRBARA, MG.
Belo HorizontePontifcia Universidade Catlica de Minas Gerais
2004
Dissertao apresentada ao Programa de Ps-graduaoStrictu Sensu em Zoologia de Vertebrados deAmbientes Impactados da Pontifcia UniversidadeCatlica/MG como requisito parcial para a obteno doTtulo de Mestre em Zoologia de Vertebrados.
Orientadora: Dr. Sonia Nicolau dos Santos
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http://www.pdfpdf.com/0.htmELISA DUARTE DOS SANTOS MESQUITA
PERCEPES E USOS DA FAUNA SILVESTRE PELAS COMUNIDADES HUMANASDO ENTORNO DA RESERVA PARTICULAR DO PATRIMNIO NATURAL DOCARAA, CATAS ALTAS/SANTA BRBARA, MG.
Trabalho apresentado ao Programa de Ps-Graduao Strictu Sensu em Zoologia deVertebrados de Ambientes Impactados da Pontifcia Universidade Catlica de Minas Gerais PUC/MG.
APROVADO EM: _______/________/________.
BANCA EXAMINADORA:
_________________________________________________________________PROF. Dr. NIVALDO NORDI UFSCar
_________________________________________________________________PROF. Dra. SNIA MISSAGIA UFES
_________________________________________________________________PROF.Dr SONIA NICOLAU DOS SANTOS (ORIENTADORA PUC/MG)
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http://www.pdfpdf.com/0.htmAGRADECIMENTOS
A todas as pessoas maravilhosas que possibilitaram a realizao deste trabalho:
Meus pais, que sempre e incondicionalmente acreditam nos meus sonhos e me apiam mesmosem entender;
Meu marido, que mesmo tardiamente, compreendeu a minha enorme necessidade de estudar eestudar e estudar...
Meus filhos maravilhosos e to relegados ao segundo plano nestes ltimos dois anos; queconsigam perdoar as minhas ausncias (em todo o sentido da palavra);
Minha orientadora, pessoa extremamente competente que me ensinou a amar a etnobiologia;
A Grazy, pelos palpites certos em momentos nem tanto assim;
Aos Guias da RPPN do Caraa, principalmente Neneco, que gentilmente dividiu a suaetnosabedoria comigo em tantas conversas mato afora...
Ao grupo da etnobiologia, companheiras de etnopapos, etnoexpectativas, etnocaminhadas.
Aos moradores das comunidades de Santana do Morro, Sumidouro e Brumal, pessoas dotadasde enorme pacincia e senso de cooperao, que abriram suas casas e seus coraes para aintrusa que perguntava tanto e tantas vezes...
Aos administradores da RPPN do Caraa, que abrigaram nossas expectativas, esclareceramnossas dvidas e nunca deixaram faltar a pipoca salgada e o ch quentinho em tantas noitesfrias de viglia espera do seu ilustre visitante...
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http://www.pdfpdf.com/0.htmTodo animal existe de dois tipo: um pequeno e um grande
(Sr. Jos Barreiras morador de Brumal)
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http://www.pdfpdf.com/0.htmRESUMO
Esta pesquisa tem como principal objetivo identificar e caracterizar o
conhecimento sobre a fauna local por parte dos moradores do entorno de uma Unidade de
Conservao denominada Reserva Particular do Patrimnio Natural do Caraa, nos
municpios de Catas Altas e Santa Brbara, Estado de Minas Gerais.
As comunidades limtrofes a ela, Santana do Morro, Sumidouro e Brumal, datam
da mesma poca da fundao do Caraa, no sculo XVIII e podem ser consideradas uma
pequena extenso do patrimnio histrico, cultural, arquitetnico e natural que ele representa.
Existem nos trs distritos cerca de 1.500 habitantes.
Para a coleta de dados, foram realizadas entrevistas estruturadas em 141
domiclios. Utilizou-se para tal a abordagem etnozoolgica.
Os moradores identificaram 63 tipos diferentes de animais, em um total de 622
citaes, representando uma mdia de 4,47 citao/pessoa. Os mais citados so os animais
pertencentes Classe Mammalia, com 460 citaes, onde o tatu citado 62 vezes. Quanto aos
animais que desapareceram da regio, obteve-se um total de 160 citaes, onde os mamferos
obtiveram o maior nmero, com 121 citaes.
Dentre os rpteis, os mais citados foram s serpentes. Estas so consideradas
perigosas, traioeiras e ms entre as populaes estudadas, que sentem uma grande averso
elas. As concepes negativas que as serpentes despertam, aliadas falta de um levantamento
cientfico sobre rpteis principalmente sobre as serpentes podem caracterizar um frgil
status de conservao para as mesmas na regio.
Dentre as formas de uso da fauna pelos moradores a alimentao e o uso
medicinal so as mais significativas, com 106 e 45 citaes respectivamente. As citaes
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http://www.pdfpdf.com/0.htmobtidas sobre consumo de animais silvestres indicam que estes podem ser uma importante
fonte nutricional em sua dieta. O animal mais citado foi o tatu, sendo utilizado na
alimentao e como zooterpico. Como zooterpico, so utilizadas apenas partes do corpo dos
animais sendo elas o couro, o rabo, o veneno, o sangue, o chifre, a pata e o leo. O leo o
mais utilizado, com 42 citaes. O sangue, o couro, o rabo, a pata e o chifre obtiveram 1
citao cada um e o veneno retirado exclusivamente das serpentes obteve 3 citaes.
Partes ou produtos dos animais so utilizadas para diferentes doenas ou dores e, do mesmo
animal pode-se obter diversos tipos de remdios, sendo elas relacionadas ao aparelho
respiratrio, ao aparelho locomotor, ao sistema nervoso, ao sistema auditivo, pele e como
antdoto para mordidas de serpentes.
Estes resultados mostram que os moradores da regio de Santana do Morro,
Sumidouro e Brumal conhecem principalmente aqueles animais que apresentam alguma
forma de utilizao ou que so considerados danosos ou perigosos. Este trabalho um
importante instrumento que pode ser utilizado para estabelecer programas de manejo e
educao ambiental que apreendam o ponto de vista cultural dos moradores para relacion-los
abordagem cientfica, enquanto concepo educativa e cientfica.
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http://www.pdfpdf.com/0.htmABSTRACT
The aim of this research was to identify and characterize the dwellers knowledge about
the local fauna of a Conservation Unit denominated as Caraas Natural Park, located in Catas
Altas and Santa Brbara, Minas Gerais.
The boundary communities, Santana do Morro, Sumidouro and Brumal, are from the
same period of Caraas foundation, on 18th century and can be considered a small extension
of historical, cultural and natural patrimony that it represents. In the three communities, there
are around 1500 inhabitants.
To data collect, semi-structured interviews was carried out in 141 residences. Dwellers
identified for the region 63 different animal types, from 622 mentions, representing mean of
4,7 mentions to each person. The most mentioned are animals concerned to Mammalian
Class, with 460 mentions, where armadillo is mentioned 62 times. Concerning to animals that
disappeared of region, a total of 160 mentions were obtained, where mammals obtained the
largest number, with 121 mentions.
Among reptiles, the most mentioned were the snakes. They are considered dangerous,
treacherous and mean among studied populations, which feel great aversion to them. The
misconception that snakes arouse, allied to lack of scientific researches about reptiles
mainly about snakes can characterize a fragile conservation status to them in the area.
Concerning to fauna use from Caraas Natural Park boundary dwellers, nutrition and
medicinal use are the most significative, with 106 and 45 mentions respectively. The mentions
obtained about wild animal consumption by interviewed indicate that it can be an important
nutritional resource in their diet. The most mentioned animal were the armadillo, being used
in nourishment and as remedy. As remedy, only parts of the animals body are used, like
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http://www.pdfpdf.com/0.htmleather, tail, poison, blood, limbs, horn and oil. Oil is the most used, with 42 mentions.
Leather, tail, blood, limbs and horn obtained 1 mention each and poison extracted
exclusively from snakes obtained 3 mentions. Animal parts or products are used to different
diseases or pains and from the same animal can be obtained various kinds of remedies, being
the diseases or pains related to body systems and skin and as antidote to snakes bites.
This results show that Santana do Morro, Sumidouro and Brumal dwellers know
mainly the animals that are used in some way or that are considered damaging or dangerous.
This research is an important instrument that can be used to establish handling and
environmental education programs that apprehend dwellers cultural point of view to relate it
to a scientific board, while educational and scientific conception.
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http://www.pdfpdf.com/0.htmLISTA DE FIGURAS
Figura n 1: Mapa de localizao da RPPN do Caraa e comunidades de entorno.................. 16
Figura n 2: Santana do Morro. Destaque: rua da Igrejinha ..................................................... 22
Figura n 3: Casa em Santana do Morro .................................................................................. 22
Figura n 4: Sumidouro: em destaque a Capela de So Jos e a rua asfaltada......................... 24
Figura n 5: Brumal: em destaque a Igreja de Santo Amaro com salo comunitrio ao fundo 24
Figura n 6: Denominao do quati descrita pelos moradores de Santana do Morro,Sumidouro e Brumal, com base no ciclo biolgico do animal................................................. 36
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http://www.pdfpdf.com/0.htmLISTA DE GRFICOS
Grfico n1: Classes de animais silvestres existentes na regio:. 31
Grfico n2: Classes de animais que desapareceram da regio:. 37
Grfico n3: Citao de rpteis pelos moradores das trs comunidades:... 43
Grfico n4: Espcies de cobras existentes na regio, segundo moradores:.. 43
Grfico n5: Animais silvestres que aparecem nos sonhos dos moradores: 45
Grfico n6: Animais silvestres utilizados na alimentao: 53
Grfico n7: Uso do couro/pelo/pele/casco de animais silvestres:. 55
Grfico n8: Animais utilizados como zooterpico, segundo moradores:.. 56
Grfico n9: Partes dos animais utilizadas como zooterpicos: 57
Grfico n10: Doenas tratadas com zooterpicos: 59
Grfico n11: Animais utilizados para criao:.. 60
Grfico n12: Animais com uso artesanal... 62
Grfico n13: Animais utilizados para atividades msticas. 63
Grfico n14: Animais silvestres utilizados para enfeite 65
Grfico n15: Animais utilizados para xerimbabo:. 66
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http://www.pdfpdf.com/0.htmS U M R I O
1. INTRODUO.................................................................................................................... 14
2. OBJETIVOS......................................................................................................................... 202.1. Objetivo Geral: .................................................................................................................. 202.2. Objetivos Especficos: ....................................................................................................... 20
3. REA DE ESTUDO ............................................................................................................ 213.1. Localizao, perfil e caracterizao das comunidades do entorno da RPPN do Caraa... 213.1.1. Santana do Morro ........................................................................................................... 213.1.2. Sumidouro ...................................................................................................................... 233.1.3. Brumal ............................................................................................................................ 23
4. METODOLOGIA................................................................................................................. 264.1. Instrumento de Pesquisa.................................................................................................... 27
5. CAPTULO IPERCEPO E CARACTERIZAO DA FAUNA DE TRS COMUNIDADESHUMANAS.............................................................................................................................. 305.1. Animais que existem atualmente na regio segundo os moradores .................................. 305.2. Denominaes locais para alguns animais ........................................................................ 345.3. Animais que desapareceram da regio, segundo moradores ............................................. 37
6. CAPTULO IIA RELAO SER HUMANO E SERPENTES EM TRS COMUNIDADES HUMANAS 426.1. Rpteis existentes na regio, segundo moradores ............................................................. 426.2. Animais que aparecem nos sonhos dos moradores ........................................................... 45
7. CAPTULO IIIUSOS DA FAUNA EM TRS COMUNIDADES HUMANAS............................................. 527.1. Animais utilizados para alimentao................................................................................. 527.2. Utilizao do couro/plo/pele/casco de animais................................................................ 547.3. Uso medicinal da fauna silvestre ....................................................................................... 557.4. Uso para criao: ............................................................................................................... 607.5. Uso para cruzamento ......................................................................................................... 617.6. Uso para artesanato............................................................................................................ 627.7. Uso para atividades msticas ............................................................................................. 637.8. Animais silvestres utilizados para enfeite ......................................................................... 647.9. Uso para xerimbabo (estimao)....................................................................................... 66
8. CONSIDERAES FINAIS............................................................................................... 68
9. REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS................................................................................. 71
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http://www.pdfpdf.com/0.htmANEXO ILista das espcies de mamferos da RPPN do Caraa, MG.* .................................................. 75
ANEXO IILista das espcies de aves existentes nos arredores da RPPN do Caraa, MG*...................... 77
ANEXO IIILista das espcies de serpentes encontradas na RPPN do Caraa/MG* .................................. 88
ANEXO IVLista das espcies de Anuros encontrados na RPPN do Caraa/MG....................................... 89
ANEXO VModelo do questionrio referente fauna, aplicado aos moradores de Santana do Morro,Sumidouro e Brumal: ............................................................................................................... 91
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http://www.pdfpdf.com/0.htm1. INTRODUO
Segundo a Unio Internacional para a Conservao da Natureza (IUCN), as
Unidades de Conservao (UCs) do Brasil podem ser agrupadas em trs categorias diferentes
de manejo, sendo ento definidas como uso indireto dos recursos onde esto includas as
Reservas Particulares do Patrimnio Natural - uso direto e reservas de destinao1.
As Reservas Particulares do Patrimnio Natural (RPPNs) foram institudas pelo
Decreto Lei n 98.914, de 31 de janeiro de 1990, e correspondem ao imvel de domnio
pblico ou privado no qual, no todo ou em parte, sejam identificadas condies naturais
primitivas, semiprimitivas, recuperadas ou cujas caractersticas justifiquem aes de
recuperao, por seu aspecto paisagstico ou para preservao do ciclo biolgico de espcies
da fauna ou da flora do Brasil (CABRAL & SOUZA, 2002).
A instituio delas parte do princpio democrtico da manifestao expressa de
vontade do proprietrio, onde a "vontade de proteger" o ponto de partida e o incio do
procedimento que culmina na RPPN. O decreto que criou as RPPNs bem claro quando
afirma que sua destinao no pode ser outra seno a de proteo integral dos recursos,
admitindo-se, neste contexto, a prtica do turismo ecolgico, a educao ambiental e a
educao cientfica.
A Reserva Particular do Patrimnio Natural do Caraa (RPPN do Caraa) foi
criada pela Portaria n 32, em 30 de maro de 1994, pelo Decreto n 98.914 (INSTITUTO
BRASILEIRO DE MEIO AMBIENTE E DOS RECURSOS NATURAIS RENOVVEIS -
IBAMA) (Fig. n1). Localiza-se nos municpios de Santa Brbara e Catas Altas, no estado de
1 O uso indireto dos recursos exprime a no ocupao do espao considerado para fins de explorao direta; ouso direto dos recursos exprime a ocupao do espao, considerado em sua plenitude racional, pelo serhumano; e a reserva de destinao implica manter o espao considerado inclume, de maneira a ser definido,no futuro, seu uso racional (BRUCK et al., 1995 apud CABRAL & SOUZA, 2002).
PDF Creator - PDF4Free v2.0 http://www.pdf4free.com
http://www.pdfpdf.com/0.htmMinas Gerais, a 120 km de Belo Horizonte, capital do estado. Est nas coordenadas de
2005S 4328W (VASCONCELOS & MELO JUNIOR, 2001). Possuem cerca de 11.233
hectares, onde 10.187,89 ha so rea de preservao. Os restantes 1.045,11 ha so rea de
manejo (PLANO DE AO DA PBCM PARA O CARAA 2003/2006).
Seu relevo, com altitudes de 800 a 2.050 metros ngremes, abrigam nascentes que
atingem as plancies, atravs de cachoeiras de enorme valor cnico. Sua hidrografia est
vinculada a Bacia do Rio Doce.
Por se encontrar em uma regio de transio entre o bioma do Cerrado e Mata
Atlntica (PAULA, 1997), a RPPN do Caraa resguarda uma cobertura vegetal diversificada
com amostras significativas de campos cerrados, fragmentos de florestas de Mata Atlntica e
campo rupestre. A variedade de ambientes existentes na regio propicia o habitat para uma
enorme riqueza faunstica, com espcies raras e endmicas, algumas ameaadas de extino
(COSTA, et. al., 1998).
A beleza natural, a riqueza cultural e arquitetnica aliadas ao histrico religioso e
intelectual que caracterizam o Caraa, atrai turistas2 de diversas localidades. O turismo
tornou-se, assim, a sua principal fonte de arrecadao financeira (PLANO DE AO DA
PBCM PARA O CARAA 2003/2006).
Possuindo uma privilegiada diversidade faunstica, com algumas espcies
ameaadas de extino, o Caraa adotou uma delas, o Lobo-guar, como sua espcie-
bandeira, tornando-se ele um importante seno o principal atrativo para os turistas que ali
chegam.
2 No ano de 2003, cerca de 50.000 pessoas visitaram a RPPN do Caraa (Plano de Ao da PBCM para o Caraa 2003-2006).
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http://www.pdfpdf.com/0.htmFigura N 1: Mapa de localizao da RPPN do Caraa e comunidades de entorno.
Fonte: Hirscht, 2004
Dessa forma, mantm-se uma rotina que se iniciou h quase 30 anos, quando toda
noite, o Lobo-guar, diante da expectativa e suspense de vrios turistas espera no prtico da
Igreja, sobe as suas escadarias em busca da carne colocada l pelos funcionrios do local ou
pelos prprios padres que ali residem.
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http://www.pdfpdf.com/0.htmSendo uma espcie-bandeira, o Lobo-guar para os administradores do Caraa,
uma fonte atrativa e de aes de educao ambiental junto aos turistas. Busca-se, assim,
despertar nestas pessoas, o senso de respeito ao meio ambiente e a proteo fauna.
No entanto, os grupos que interagem com a RPPN do Caraa so mais complexos
e distintos, no se resumindo apenas aos turistas que por ali passam. As comunidades
humanas, em seu entorno, so elementos importantes que podem e devem ser includos em
seu plano de manejo e preservao natural. Porm, so indivduos com percepes e culturas
diferentes em relao fauna local. Desta forma, os trabalhos de educao ambiental
realizado junto aos turistas, podem no ser adequados quando direcionados para as
populaes das comunidades limtrofes ao Caraa.
A diversidade da fauna da regio, bem como a sua preservao, despertou durante
anos, o interesse no apenas dos amantes da natureza, mas tambm de pesquisadores de
outrora, que viajavam pela regio e, com maior ou menor intensidade, procuraram conhec-la
e catalog-la. Como por exemplo, Spix e Martius, que no sculo XIX visitaram o Caraa,
citando, em seus apontamentos, algumas espcies da fauna e flora que ali encontraram
(STRANG, 1981).
A partir da dcada de 80, alguns levantamentos de aves e mamferos foram
realizados na regio da RPPN do Caraa. Dentre estes, os mais recentes so os de Talamoni
(2001) que registrou a presena de 59 espcies de mamferos includas em nove ordens:
Didelphimorphia, Xenarthra, Chiroptera, Primates, Carnvora, Perissodactyla, Artyodactyla,
Rodentia e Lagomorpha. (Anexo tabela 1) e o de Vasconcelos et. al.,(indito), que
registraram a presena de 281 espcies de aves para a regio da RPPN do Caraa.
Para os anfbios, Canelas (2003), registrou a presena de 48 espcies de anuros,
distribudos em cinco (5) famlias, sendo elas Bufonidae, Centrolenidae, Hylidae,
Leptodactylidae e Microhylidae (Anexo tabela 3).
PDF Creator - PDF4Free v2.0 http://www.pdf4free.com
http://www.pdfpdf.com/0.htmA RPPN do Caraa limita-se com trs comunidades humanas, Santana do Morro,
Sumidouro e Brumal, que, juntas, perfazem o total de 1.500 habitantes (SANTOS, 2003). So
populaes tradicionais3, cuja dependncia econmica, religiosa e cultural da RPPN do
Caraa se faz presente de maneira marcante, e delineiam um ambiente singular no que se
refere preservao ambiental - quando se leva em considerao a sua proximidade espiritual,
material e religiosa com uma Reserva Particular do Patrimnio Natural.
Atualmente, a RPPN do Caraa pode ser considerada uma ilha de vegetao
rodeada por um ambiente degradado por mineraes e carvoarias que, h cerca de 250 anos,
submete o local a grandes devastaes ambientais.
Assim, este estudo adota a concepo terico-metodolgica da etnobiologia, que
se traduz como sendo o estudo do conhecimento, conceituaes e crenas desenvolvidas por
sociedades diversas a respeito da natureza e da adaptao do homem a determinados
ambientes (POSEY, 1987).
Os estudos etnobiolgicos, de modo geral, tm contribudo para unir os
conhecimentos cientficos e os saberes tradicionais de comunidades humanas distintas, no que
se refere ao meio ambiente e suas inter-relaes. Diegues (1988) afirma que, sobretudo em
pases do Terceiro Mundo, a conservao da biodiversidade depender da conservao da
diversidade cultural.
No Brasil, trabalhos sobre etnozoologia tm dado nfase ao conhecimento cultural
de grupos sociais especficos (pescadores, ribeirinhos, camponeses etc.) no que se refere
ictiofauna (TH, 1999; MOURO, 2000), ou enfocando a dieta e os tabus alimentares e o uso
medicinal (MARQUES, 1995; COSTA-NETO, 1999).
3 A populao das trs comunidades pode ser entendida como populao tradicional segundo a conceituaoestabelecida por ARRUDA (1997) onde estas so caracterizadas por manterem um modo de vida diferente daspopulaes urbano-industriais e que, via de regra, mantm com os recursos naturais uma relao de dependnciapautada no respeito aos ciclos naturais. Desta forma, o manejo dos recursos utilizados ocorre atravs de umcomplexo de conhecimentos adquiridos pela tradio herdada dos mais velhos, resultando na adequao de uso emanuteno dos ecossistemas naturais onde esto inseridos.
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http://www.pdfpdf.com/0.htmEm relao aos mamferos, poucos trabalhos sobre o enfoque etnozoolgico foram
realizados. Entre eles, temos o de Fernandes-Pinto e Krger (1999) sobre caa de subsistncia
e o de Cavallinni (2001) que estuda o conhecimento de pequenos agricultores sobre primatas.
Outros trabalhos, como o de Anic (2002), discorrem sobre o contato de populaes
tradicionais com o Lobo-guar.
Neste trabalho, portanto, objetiva-se identificar a forma como os moradores das
comunidades de Santana do Morro, Sumidouro e Brumal reconhecem, relacionam-se e
utilizam a fauna existente no local, bem como traos da percepo destas populaes humanas
em relao mesma.
Conhecidas s formas de interaes existentes entre seres humanos e fauna local,
espera-se contribuir para uma relao mais harmoniosa entre os conhecimentos locais e os
conhecimentos cientficos, visando a conservao da fauna e do ambiente natural da RPPN.
Ou seja, contribuir para uma conservao alicerada na compreenso dos sistemas
ambientais e dos sistemas scio-econmicos e culturais existentes no entorno da RPPN do
Caraa.
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http://www.pdfpdf.com/0.htm2. OBJETIVOS
2.1. Objetivo Geral:
Identificar e caracterizar o conhecimento etnobiolgico sobre a fauna silvestre
regional pelas populaes de Santana do Morro, Sumidouro e Brumal, no entorno da
RPPN do Caraa, Minas Gerais.
2.2. Objetivos Especficos:
Identificar e caracterizar as atitudes e valores que os moradores tm sobre a fauna.
Identificar os usos da fauna quanto a: alimentao; uso do couro; uso medicinal; uso
para xerimbabo; uso para criao; para cruzamentos com animais domsticos; para
artesanato e para atividades msticas.
Contribuir com um conjunto de informaes etnozoolgicas visando estratgias
institucionais de conservao e educao ambiental para a RPPN do Caraa, voltadas
s suas comunidades de entorno.
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http://www.pdfpdf.com/0.htm3. REA DE ESTUDO
3.1. Localizao, perfil e caracterizao das comunidades do entorno da RPPN doCaraa.
A rea de estudo situa-se em um ambiente de transio entre Cerrado e Mata
Atlntica (PAULA, 1997). Constitui uma rea de intensa riqueza natural que abriga diversas
espcies florsticas e faunsticas com a presena de algumas ameaadas de extino
(STRANG, 1981).
A RPPN do Caraa pode ser considerada uma ilha de vegetao rodeada por um
ambiente degradado por mineraes e carvoarias que, h cerca de 250 anos, submete o local a
grandes devastaes ambientais.
Em seus limites, existem trs comunidades, Santana do Morro, Sumidouro e
Brumal, que juntas perfazem um total de 1500 habitantes (SANTOS, 2003).
Das trs, Santana do Morro a menor, com 131 habitantes e 36 moradias;
Sumidouro possui cerca de 336 habitantes e 70 moradias e Brumal a maior possui 713
habitantes e 312 moradias.
3.1.1. Santana do Morro
Em Santana do Morro (Figura n 2), as casas so grandes com no mnimo quatro
cmodos servindo como dormitrios. Algumas so no estilo colonial de adobe, com tcnicas
construtivas da poca colonial, porm se encontram em pssimo estado de conservao (Fig.
n3), 24,1% das pessoas nasceu e sempre viveu ali (SANTOS, 2003).
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http://www.pdfpdf.com/0.htmFig. n2: Santana do Morro. Destaque: rua da IgrejinhaFonte: MARTINS, Lvia 2002.
Fig. n3: Casa em Santana do MorroFonte: MELO, 2003.
A renda familiar em Santana do Morro de at um salrio (48,3%) e at dois
salrios mnimos por ms (24,14%). Ou seja, a grande maioria da populao (72,44%) recebe
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http://www.pdfpdf.com/0.htmat dois salrios mnimos por ms, bem como 55% dos entrevistados trabalham por dia e no
tm carteira assinada. (SANTOS, 2003).
Na comunidade no existe escola e as crianas em idade escolar vo para outras
localidades (principalmente para Sumidouro, Brumal e Santa Brbara).
As comunidades limtrofes a Santana do Morro so Sumidouro e Brumal.
3.1.2. Sumidouro
Sumidouro (Fig. n4), possui 70 moradias e aproximadamente 336 habitantes fixos
(Fig. n4). 21,4% das pessoas residem ali entre 20 e 30 anos (SANTOS, 2003).
Sumidouro possui escola com ensino fundamental (1 a 4 sries), recebendo alm
das crianas que moram ali, tambm aquelas de Santana do Morro que esto nessa idade
escolar.
A renda familiar em Sumidouro distribuda da seguinte maneira: 17% recebem
at um salrio, 28,6% recebem at dois salrios, 18% recebem at trs salrios e 14% recebem
mais de quatro salrios mnimos por ms. Destes, 28% trabalha por dia e no possui carteira
assinada (SANTOS, 2003).
3.1.3. Brumal
Brumal (Fig. n5), a maior comunidade dentre as trs, com 312 casas e 713
habitantes (SANTOS, 2003) (Fig. n5).
Grande parte das pessoas (28,6%) residem ali entre 10 e 20 anos (SANTOS,
2002). a nica que possui escola com o ensino fundamental completo (at a 8a srie). H um
pequeno comrcio. A renda familiar encontrada para o ano de 2003 em Brumal, estava assim
PDF Creator - PDF4Free v2.0 http://www.pdf4free.com
http://www.pdfpdf.com/0.htmdistribuda: 23,8% das famlias recebem at um salrio, 23,8% recebem at dois salrios, 19%
recebem at trs salrios, 11,9% recebem at quatro salrios, 14,3% recebem mais de quatro
salrios mnimos por ms. Das pessoas entrevistadas, 26,19% tm carteira assinada
(SANTOS, 2002).
Fig. n4: Sumidouro: em destaque a Capela de So Jos e a rua asfaltadaFonte: MELO (2003)
Fig. n5: Brumal: em destaque a Igreja de Santo Amaro com salo comunitrio ao fundoFonte: MARTINS, Lvia (2002)
PDF Creator - PDF4Free v2.0 http://www.pdf4free.com
http://www.pdfpdf.com/0.htmAs principais atividades econmicas da regio, como um todo, so: a agricultura
de subsistncia, o trabalho em minerao (inclusive de ouro) e servios gerais prestados ao
Santurio do Caraa e aos eventuais turistas que possuem propriedades nas comunidades.
Estas comunidades, estabelecidas nestes locais, h quase tanto tempo como o
prprio Santurio do Caraa, mantm com este e com a natureza que as envolvem, uma clara
relao de dependncia. Dependncia esta que, no caso do primeiro, fica bem explcita na
relao empregatcia e religiosa e, da segunda, encontra-se sombreada pelas novas legislaes
ambientais, inibidoras de muitos hbitos culturais que aconteciam com freqncia, como a
caa, desmatamentos e queimadas.
PDF Creator - PDF4Free v2.0 http://www.pdf4free.com
http://www.pdfpdf.com/0.htm4. METODOLOGIA
Primeiramente, realizou-se um levantamento bibliogrfico sobre a fauna local e
reconhecimento em campo sobre a histria da ocupao humana na regio da RPPN do
Caraa.
Na fase seguinte, foram realizadas dez visitas de campo s comunidades de
Santana do Morro, Sumidouro e Brumal nos meses de agosto de 2002 at agosto de 2003,
com durao de dois dias em cada visita/ms.
Nesse perodo foram elaboradas e realizadas entrevistas semi-estruturadas, com
questes abertas para propiciar ao entrevistado a liberdade de responder segundo sua prpria
lgica e conceitos. As questes enfocaram o perfil dos moradores, a sua relao com a fauna
silvestre regional, os usos atuais e pretritos desta fauna pelos moradores e, especialmente, a
compreenso dos sentimentos, comportamentos, crenas e conhecimentos a respeito da fauna
terrestre pelos moradores (Anexo V).
Em funo dos resultados obtidos neste primeiro levantamento, foi utilizada
posteriormente, a tcnica de entrevistas em profundidade, com alguns informantes-chave, cujo
foco foram as serpentes. Nestas entrevistas, procurou-se detectar junto a estes informantes,
quais as espcies de serpentes que existem no local, bem como a sua percepo sobre as
mesmas.
Na comunidade de Santana do Morro foram feitas entrevistas em 29 domiclios,
de um total de 31 domiclios contabilizados. Tal diferena devida ao fato de que os
moradores no foram encontrados nas ocasies das entrevistas ou recusaram-se a respond-
las. Na comunidade de Sumidouro, foram feitas entrevistas em 70 domiclios. Assim, em
Santana do Morro e Sumidouro realizou-se um censo por domiclio.
PDF Creator - PDF4Free v2.0 http://www.pdf4free.com
http://www.pdfpdf.com/0.htmEm Brumal, devido impossibilidade de realizar entrevistas em 312 moradias,
optou-se pela tcnica de amostragem. Visando preservar a representatividade de domiclios de
todas as ruas existentes no distrito, a amostra foi assim definida: foi confeccionado um mapa
com registro de todos os domiclios do povoado e a extenso em metros de cada rua/ruela
existentes no distrito. A partir da diviso da extenso total das ruas em metros e da quantidade
de domiclios em cada uma delas, obteve-se uma amostra onde, a cada 50 metros, era
escolhido um domiclio a ser pesquisado. Foram recenseados 42 domiclios.
Para a investigao do saber local e da utilizao da fauna pelos moradores, este
estudo de caso, adotou a abordagem da percepo social.
A percepo social, segundo Saarinen (1969):
est relacionada com os efeitos dos fatores social e cultural sobre aestruturao cognitiva do homem no seu ambiente fsico e social,depende do estmulo presente e das capacidades dos rgos dossentidos e varia tambm com a histria passada e da atitude presentedos indivduos, atuando via valores, necessidades, lembranas,humos, circunstancias sociais e expectativas.
4.1. Instrumento de Pesquisa
As questes sobre a fauna da regio, bem como seus objetivos, esto explicitadas
abaixo:
Primeira questo: Que animais existem aqui?
Objetivo: descobrir quais animais existem na regio e como as pessoas os
reconhecem.
Segunda questo: Que animais existiam h dez anos atrs e hoje no existem mais
aqui?
Objetivo: descobrir quais animais existiam em um passado no muito remoto.
Terceira questo: Quais animais da regio as pessoas daqui utilizam para:
PDF Creator - PDF4Free v2.0 http://www.pdf4free.com
http://www.pdfpdf.com/0.htmUso alimentar: envolve a utilizao dos animais ou seus produtos na alimentao
humana.
Uso do couro, plo e pele: envolve a utilizao do plo/pele/couro dos animais na
confeco de utenslios, vestimentas ou ainda para uso ornamental.
Uso medicinal: est relacionado com a preparao de remdios caseiros, onde, partes
do corpo ou o todo do animal podero ser utilizados.
Uso artesanal: relaciona-se a confeco de instrumentos ou objetos para usos
diversos.
Atividades msticas: envolve o uso de partes ou do todo do animal como amuletos
para dar sorte.
Enfeite: refere-se ao uso de partes do animal consideradas bonitas ou mesmo do
animal inteiro, que so utilizadas como objeto decorativo.
Criao: refere-se a criao de animais silvestres em casa, com finalidades mltiplas:
vender, criar para reproduo, etc.
Cruzamento: refere-se ao uso de animais silvestres como matriz para cruzamentos
com animais domsticos.
Xerimbabo: refere-se criao de animais silvestres como animal de estimao.
Objetivo: descobrir quais animais so mais utilizados na regio e identificar o fim
para que so usados.
Quarta questo: Voc sonha com animais? Pode contar o sonho?
Objetivo: Identificar quais animais esto mais presentes nos sonhos das pessoas e o
seu simbolismo.
As informaes foram categorizadas, codificadas e agrupadas em um banco de
dados simples organizados a partir do Excel e Word for Windows - 2000. A anlise e
PDF Creator - PDF4Free v2.0 http://www.pdf4free.com
http://www.pdfpdf.com/0.htminterpretao dos dados foram feitas comparando os modelos percebidos (dos informantes)
com os modelos operacionais (cientficos).
PDF Creator - PDF4Free v2.0 http://www.pdf4free.com
http://www.pdfpdf.com/0.htm5. CAPTULO I
PERCEPO E CARACTERIZAO DA FAUNA DE TRS COMUNIDADESHUMANAS
Neste captulo, busca-se conhecer como os moradores de Santana do Morro,
Sumidouro e Brumal percebem e conhecem a fauna local. Procura-se identificar, a partir das
respostas obtidas dos moradores, a lgica do pensamento por eles utilizada na caracterizao
da fauna. Para isto, duas perguntas direcionaram o trabalho:
Quais os animais existem atualmente na regio da RPPN do Caraa?.
Quais animais desapareceram na regio, ou no so mais vistos com
freqncia?.
Para efeito deste estudo, foram analisados apenas os dados sobre a fauna silvestre.
5.1. Animais que existem atualmente na regio segundo os moradores
Dos entrevistados, 141 no total, 139 pessoas responderam a esta questo e 02 no
responderam.
Das 692 citaes obtidas de animais domsticos e silvestres existentes na regio,
622 se referiam a animais silvestres. Destas, 460 citaes se referiram a mamferos; 99 a aves;
59 a rpteis e quatro (4) a anfbios. (Grfico 1).
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http://www.pdfpdf.com/0.htmCLASSES DE ANIMAIS SILVESTRES EXISTENTES NA REGIO
460
9959
4
622
0
100
200
300
400
500
600
700
Mamferos Aves Rpteis Anfbios Total
Os moradores conseguiram relacionar 63 tipos diferentes de animais silvestres em
um total de 622 citaes, o que representa uma mdia de 4,47 citaes/pessoa.
A relao de espcies citadas pelos moradores est explicitada no quadro n1.
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http://www.pdfpdf.com/0.htmQuadro n 1: Animais que existem nas trs comunidades, segundo moradores*:Nome comum/Nome cientfico N Nome comum/Nome cientfico N
Mamferos Inhambu (Crypturellus sp.) 01Tatu 62 Papa-arroz (Sporophila caerulescens) 01Lobo guar (Chrysocyon brachyurus) 57 Joo-de-barro (Furnarius rufus) 01Capivara (Hydrochaeris hydrochaeris) 44 Beija-flor (vrias espcies) 01Ona 42 Bicudo (Oryzoborus maximiliani) 01Paca (Agouti paca) 41 Azulo (Passerina brissoni) 01Veado (Mazama sp.) 38 Curi (Oryzoborus angolensis) 01Macaco 37Esquilo (Sciurus aestuans) 19 RpteisRaposa (Lycalopex vetulus) 15 Cobra (vrias espcies) 44Porco-do-mato (Pecari tajacu) 12 Lagarto 10Oncinha (Leopardus pardalis) 12 Lagarto vermelho 01Coelho (Sylvilagus brasiliensis) 11 Lagarto verde 01Tamandu 10 Lagarto branco 01Anta (Tapirus terrestris) 09 Cobra caninana 01Quati (Nasua nasua) 09 Lagartixa 01Gamb (Didelphis albiventris) 09Furo (Galictis cuja) 08 AnfibiosMico estrela (Callithrix penicillata) 06 Sapo (Bufo sp.) 02Ourio (Coendou prehensilis) 04 Perereca (vrias espcies) 02Cutia (Dasyprocta leporina) 03Morcego (vrias espcies) 02Lontra (Lontra longicaudis) 02Cachorro-do-mato (Cerdocyon thous) 02Mico leo (Leontopthecus sp.) 01Macaco sau (Callicebus personatus) 01Mico (Callithrix sp.) 01Tatu-mirim 01Tatu-testa-de-ferro (Euphractus sexcinctus) 01Tatu-de-rabo-mole (Cabassous unicinctus) 01
AvesPassarinhos (vrias espcies) 24Jacu (Penelope superciliaris) 17Saracura (Rallus sp.) 11Maritaca (vrias espcies) 07Seriema (Cariama cristata) 07Gara (Casmerodius albus) 04Tucano (Ramphastos dicolorus) 04Pica-pau (vrias espcies) 03Pombo (vrias espcies) 03Papagaio (vrias espcies) 02Bentevi (vrias espcies) 02Periquito (vrias espcies) 02Coruja (vrias espcies) 01Sabi (vrias espcies) 01Canrio chapinha (Sicalis flaveola) 01Canrio (vrias espcies) 01Tico-tico (vrias espcies) 01Arara (vrias espcies) 01
Total: 622*Manteve-se o nome vernacular e o registro de todos os animais citados alm do nmero de citaes,para facilitar a consulta de pesquisadores e dos administradores institucionais.
PDF Creator - PDF4Free v2.0 http://www.pdf4free.com
http://www.pdfpdf.com/0.htmOs quatro mamferos mais citados pelos moradores foram o tatu (62); o lobo guar
(57); a capivara (44); a ona (42). Comparando as indicaes dos moradores com os
levantamentos cientficos, verificou-se que o mico-leo no apontado no trabalho de
Talamoni (2001).
Para as aves, as mais citadas foram passarinhos (24), o jacu (17), a saracura (11), a
maritaca (7) e a seriema (7). Os jacus so considerados pragas pelos moradores, que dizem
que eles reproduzem muito e esto comeando a invadir o ambiente urbano, causando
prejuzos e transtornos aos moradores da localidade, como confirmam alguns depoimentos
colhidos: Eles (jacus) comem a roa toda(moradora de Sumidouro); Jacu tem tanto que
entra at dentro de casa (morador de Brumal).
O bicudo (Oryzoborus maximiliani) e o curi (Oryzoborus angolensis), aves
citadas pelos moradores, no foram registrados no levantamento cientfico de Vasconcelos e
Melo-Junior (op. cit.) e Vasconcelos et al (op. cit.).
Por sua vez, entre os moradores, os rpteis mais citados so as "cobras" (44). A
designao de tipos especficos de cobras muito pouco observada. Obteve-se uma
designao de serpente, sendo ela a cobra caninana.
No que se refere aos rpteis, no existe um levantamento cientfico para a regio.
Para os membros da Subordem Ophidia, o que existe um registro, feito pela Fundao
Ezequiel Dias (FUNED) em Belo Horizonte, M.G, que recebe estes animais oriundos da
RPPN do Caraa. At novembro/2003, haviam sido registrados 73 indivduos, em cinco (5)
espcies diferentes, sendo elas a jararaca (Bothrops jararaca) (25), a jararaca-de-rabo-branco
(B. neuwiedi) (26), a cascavel (Crotallus durisus) (3), a boipeva (Waglerophis merreni) (1) e a
falsa coral (2) (Oxyrhopus sp). As 16 espcies restantes so categorizadas pela FUNED como
desconhecidas4. Quanto aos anfbios, o mais citado foi o sapo (3).
4 Estes animais so categorizados pela Fundao Ezequiel Dias como serpentes no-venenosas.
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http://www.pdfpdf.com/0.htm5.2. Denominaes locais para alguns animais
Alguns animais foram descritos utilizando-se uma forma genrica de
denominao. As pessoas geralmente classificam os animais dentro de um limitado nmero de
categorias e muitas vezes pequenos organismos so agrupados de forma errnea quando so
analisadas sob o enfoque cientfico - de acordo com seu tamanho e semelhana fsica
(GUERRA, s.d.).
O nmero de espcies de primatas brasileiros, por exemplo, muito grande, mas,
muitas vezes, em uma classificao folk, eles so designados em apenas duas categorias, de
acordo com o tamanho: "mico/sagui" (primatas de pequeno porte) e "macaco" (termo genrico
ou referncia aos primatas de mdio porte) (GUERRA, Op. cit.).
No que se refere aos mamferos, nas trs comunidades trabalhadas, obteve-se
algumas denominaes genricas de animais, que na taxonomia cientfica receberiam
denominaes distintas, como ilustra o Quadro n2.
Quadro n2: Algumas denominaes tradicionais (genricas) e cientficas (especficas)atribudas aos mamferos existentes na regio
Denominao Tradicional Denominao Cientfica*MacacoMico; macaquinho; miquinho
Callicebus personatusCebus apelaCallithrix penicillata
Tatu Cabassous unicinctusDasypus novemcinctusDasypus septemcinctusEuphractus sexcinctus
Veado Mazama americanaMazama gouazoupira
Tamandu Myrmecophaga tridactylaTamandua tetradactyla
*Fonte: Modificado de TALAMONI (2001).
Esses dados apresentados, referentes s espcies cientficas, foram obtidos atravs
do levantamento mastofaunstico realizado por Talamoni, (2001), na RPPN do Caraa, onde
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http://www.pdfpdf.com/0.htmregistrou-se a ocorrncia de trs espcies de primatas, quatro espcies de tatu, duas espcies
de veado e duas espcies de tamandu.
Para as aves, os moradores locais usam, geralmente, uma denominao comum
para categoriz-las, referindo-se aos membros da Classe genericamente como passarinho.
So designadas, de forma diferente, apenas as aves de porte maior. Conclui-se, portanto que,
provavelmente, a referncia a passarinho, para as aves de pequeno porte. Existem poucas
excees a esta denominao geral, registradas principalmente na comunidade de Sumidouro,
onde obteve-se o maior nmero de designaes de tipos diferentes de aves pequenas (16).
Utilizam tambm o termo genrico cobra para designar as serpentes sendo a
designao especfica para estes animais pouco observada. Neste sentido, obteve-se apenas a
citao de cobra caninana (1).
O mesmo acontece com os anfbios citados, que so reconhecidos por duas
denominaes: sapos ou pererecas.
Ao denominarem estes animais utilizando uma forma genrica, os moradores
podem estar se referindo tanto a uma espcie distinta de animal como tambm vrias
espcies diferentes de animais, suja semelhana morfolgica, de hbito e de habitats, pode
leva-los a serem denominados com um nico nome, que representaria vrias espcies
relacionadas.
Assim, por exemplo, a denominao de tatu, pode ser uma referncia a diversas
espcies deste animal que foram ou no, detectadas nos levantamentos cientficos realizados
na regio, como pode ser referncia a apenas uma espcie de tatu.
Outros animais, como o quati, so denominados de forma diferente, de acordo
com o seu ciclo reprodutivo.
Tal forma de denominao do quati, relacionada ao seu ciclo biolgico, foi
observada nas comunidades trabalhadas, sendo assim explicada por um morador:
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http://www.pdfpdf.com/0.htmO quati chamado de dois nome, dependendo da poca da vidadele e do jeito dele. O quati-mundu o macho que j cumpriu assuas obrigao de homem casado e no tem mais que preocupar comfilhote nem companheira. Ele fica sozinho, fica mais gordo e maior.J o quati-de-vara o quati que anda de bando, onde tem tambm osfilhote dele. Ele mais magro e menor do que o outro.(morador deSantana do Morro).
Assim, o quati recebe o nome de quati-de-vara, quando encontrado em bandos,
sendo esta caracterstica relacionada com a fase reprodutiva do animal. Nessa fase ele
descrito como sendo menor e mais magro. Posteriormente, denominado de quati-mundu,
quando o indivduo solitrio, sendo descrito como aparentando ser maior e mais gordo.
(Fig. n6). Esse perodo corresponde fase no-reprodutiva do animal, quando ele no se
acasala mais.
Quati
Quati-mundu Quati-de-vara
Fig. n6: Denominao do quati descrita pelos moradores de Santana do Morro, Sumidouroe Brumal, com base no ciclo biolgico do animal.
Este tipo de classificao um importante exemplo de como a morfologia externa
do animal e seu comportamento influenciam na maneira como as pessoas o percebem e
conseguem determinar o seu ciclo biolgico, reconhecendo o seu perodo reprodutivo e
modificando desta forma, a sua relao com ele.
Embora seja cientificamente uma nica espcie, as diferentes fases de sua vida
reprodutiva, torna-o passvel de receber denominaes diferentes, relacionadas
especificamente, a essas fases. A percepo das pessoas acerca destes indivduos tambm se
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http://www.pdfpdf.com/0.htmmodifica, alterando, paralelamente, a sua relao com ele. O quati-de-vara considerado um
animal que causa mais danos do que o quati-mundu, porque o primeiro anda em bandos, o
que o torna mais danoso.
O status de preservao da espcie, portanto, pode apresentar-se mais frgil
quando ela reconhecida como sendo um tipo de quati (quati-de-vara) e no o outro tipo
(quati-mundu).
5.3. Animais que desapareceram da regio, segundo moradores
Neste estudo, de um total de 141 pessoas entrevistadas, 88 responderam a questo,
18 no responderam e 35 no sabem quais animais no existem mais na regio. Foram citados
um total de 169 animais silvestres e domsticos que no existem mais na regio, segundo os
moradores. Destas, 160 citaes se referiam a animais silvestres, o que equivale a 1,82
citao/pessoa. Das citaes obtidas, 121 correspondem Classe Mammalia, 33 Classe
Aves, quatro Classe Reptilia e dois Classe Amphibia. (Grfico n2).
CLASSES DE ANIMAIS QUE DESAPARECERAM DA REGIO:
121
33
4 2
160
0
20
40
60
80
100
120
140
160
180
Mamferos Aves Rpteis Anfbios Total
freq
unc
ia(n
)
PD
F C
reat
or -
PD
F4Fr
ee v
2.0
ht
tp://
ww
w.p
df4f
ree.
com
http://www.pdfpdf.com/0.htmForam relacionados 44 tipos diferentes de animais, em 160 citaes obtidas.
(Quadro n3).
Quadro n3: Animais que desapareceram da regio, segundo moradoresNome comum/Nome
cientficoN Nome comum/Nome
cientficoN
MamferosTatu 26 Jacu (Penelope superciliaris) 03Ona 21 Tucano (Rampasthus dicolorus) 02Lobo guar (Chrysocyon brachyurus) 19 Pintassilgo (Carduelis magellanicus) 01Paca (Agouti paca) 15 Bicudo (Oryzoborus maximiliani) 01Veado (Mazama sp) 10 Sabi (Enbernagra sp) 01Porco-do-mato (Pecari tajacu) 05 Seriema (Cariama cristata) 01Coelho (Sylvilagus brasiliensis) 04 Sabi-una (Platycichla flavipes) 01Tamandu 04 Maritaca (vrias espcies) 01Furo (Galictis cuja) 02 Saracura (Rallus sp.) 01Oncinha (Leopardus pardalis) 02 Beija-flor (vrias espcies) 01Ona pintada (Panthera ona) 02 Gara (Casmerodius albus) 01Raposa (Lycalopex vetulus) 02 Papagaio (vrias espcies) 01Capivara (Hydrochaeris hydrochaeris) 01 Arara (vrias espcies) 01Anta (Tapirus terrestris) 01 Canrio-chapinha (Sicalis flaveola) 01Mico leo (Leontopithecus sp) 01 Melro (Gnorimopsar chopi) 01Ona preta 01 Canrio (Sicalis sp.) 01Ona vermelha 01 --Quati (Nasua nasua) 01 --Lontra (Lontra longicaudis) 01 Rpteis --Esquilo (Sciurus aestuans) 01 Lagarto 03Mo-pelada (Procyon cancrivorus) 01 Cobra (vrias espcies) 01
-- --Aves -- Anfbios --
Curi (Orizoborus Angolensis) 04 Sapo (Bufo sp) 02Azulo (Passerina brissoni) 04 --Canarinho (vrias espcies) 03 --Pssaros (vrias espcies) 03 --
Total: 160
Dentre os mamferos, o mais citado foi o tatu, com 26 citaes; seguido da ona,
(21) e do lobo guar, (19). As aves obtiveram 33 citaes, sendo as mais citadas o azulo e o
curi, com quatro citaes cada um. O rptil mais citado foi o lagarto, com trs citaes, o
sapo foi o anfbio mais citado, com duas.
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http://www.pdfpdf.com/0.htmQuando os dados para as duas perguntas: animais que existem e animais que no
existem mais na regio de Santana do Morro, Sumidouro e Brumal, foram analisados, obteve-
se o resultado apresentado no quadro n4.
Quadro n4: Animais que existem e animais que no existem mais na regio deSantana do Morro, Sumidouro e Brumal, segundo moradores.
Animais que existem n Animais que no existem mais nTatu 65 Tatu 26Lobo guar 57 Lobo-guar 19Ona 42 Ona 25Paca 44 Paca 15Veado 38 Veado 10Capivara 41 Capivara 01Cobra 45 Cobra 01
Incluindo as citaes de nomes especficos.Incluindo as citaes de nomes especficos.Incluindo as citaes de nomes especficos.
De acordo com o apresentado acima, a ona, o lobo-guar, o veado, a paca e o tatu
so animais que, provavelmente, existiam em maior quantidade e, atualmente, esto
desaparecendo, diminuindo assim, a sua freqncia de observao pelos entrevistados.
Os desmatamentos que ocorreram na regio que abrange a RPPN do Caraa, at a
dcada de 1970, principalmente para a fabricao de carvo e plantio de culturas de cereais,
modificaram as caractersticas vegetacionais das comunidades trabalhadas, o que levou
tambm a mudanas nos componentes da fauna presente nas mesmas. Segundo os moradores,
alguns animais nativos, como o coelho (tapeti), esto desaparecendo da regio devido
ausncia de hbitat propcio a eles, bem como outros animais, como o porco-do-mato, vo
surgindo e se adaptando a ela. Isso leva a uma modificao da fauna que percebida pelas
pessoas do local e, ao descreverem os animais que existiam na regio, tentam explicar o
porqu da sua ausncia atual.
Aqui era mato brabo. Eu desmatei pra poder comer. Aqui era umpedao de terra que no tinha valor, era s mato. A gente acaba coma vida de um pra dar vida a outro.(morador de Santana do Morro).Os coelhos sumiram por causa dos desmatamentos. Eles devem tervirado a montanha, buscando outro lugar para viver.(moradora deSumidouro).
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http://www.pdfpdf.com/0.htmOs bicho to vindo para a cidade. Deve ser porque no tem maismato para eles(morador de Brumal).O porco-do-mato apareceu tem pouco tempo; deve ser por causa dodesmatamento em outros lugares. (moradora de Brumal).
A caa, que existe atualmente, mas de maneira dissimulada, tambm modificou a
caracterstica faunstica da regio, levando ao desaparecimento de alguns animais, ou a sua
diminuio.
Hoje no tem mais bicho como antigamente(moradora deSumidouro)Aparecia ona (mais de 30 anos) antes do asfalto, oninha pequenacinzenta (gato-do-mato), teiu (j comeu e tem gosto de peixe), porco-do-mato (acha que ainda tem hoje) tatu. (moradora de Sumidouro).O mico-leo e tucano sumiu, o lobo, que agora s temdois.(morador de Sumidouro).A paca, tatu, veado diminuiu muito por causa da caa. A polciaprende quem caa, mas come a carne apreendida.(morador deSumidouro).Antigamente tinha mono carvoeiro aqui. Tinha muita anta. Nsmatamos muito anta (em 1960). Tinha ona preta, vermelha epintada. J matamos.(morador de Santana do Morro, ex-caador).
Torna-se importante destacar os resultados obtidos sobre o tatu. Nas duas questes
ele foi o animal mais citado, com 65 e 26 citaes respectivamente. Estas informaes podem
ser explicadas pelo fato de ser o tatu um dos animais mais utilizados na regio, seja na
alimentao ou como zooterpico. Esta caracterstica, exclusivamente utilitria, o torna um
animal mais presente na memria das pessoas, cujo aparente desaparecimento pode causar
algum transtorno na vida delas.
Alguns animais obtiveram grande nmero de citaes apenas na primeira questo.
A cobra e a capivara, por exemplo, foram muito citadas pelos moradores que afirmam que
na regio elas existem em grande quantidade.
Um bicho que de uns dez anos para c est aparecendo muito, cobra. (Guia da RPPN do Caraa).Capivara j virou praga. Ela destri tudo que plantao(Morador de Santana do Morro)
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http://www.pdfpdf.com/0.htmJ o curi (Oryzoborus angolensis), citado nas duas questes, no apresenta
registro para a regio, segundo o levantamento de Vasconcelos e Melo-Junior (op. cit.). Os
prprios moradores dizem que: H uns quinze anos atrs tinha muito curi. A geada matou
tudo e eles sumiram desde esta poca. (moradora de Sumidouro)
As mudanas nos elementos faunsticos observadas pelos moradores, podem ser
um indicativo da sua relao com os mesmos e reforam a necessidade de se verificar de que
forma ela se manifesta, para que se possa, futuramente, estipular planos de manejo na regio
trabalhada.
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http://www.pdfpdf.com/0.htm6. CAPTULO II
A RELAO SER HUMANO E SERPENTES EM TRS COMUNIDADESHUMANAS
No decorrer do trabalho, foi observado um elevado nmero de citaes referentes
s cobras, que segundo os moradores, so animais que tm aparecido muito no local.
Observou-se tambm que existe um forte antagonismo entre estes moradores e as cobras,
que so fontes de lendas e simbolismos, freqentemente gerando medo entre estas pessoas.
A partir dessas observaes, optou-se por aprofundar o estudo no que se refere a
estes animais e o simbolismo associado a eles. Para tal, uma pergunta direcionou este estudo,
sendo ela:
Voc sonha com animais? Pode contar o sonho?.
Montou-se ento uma nova tcnica, onde foram escolhidos nove informantes-
chave nas comunidades trabalhadas, e, atravs de entrevistas em profundidade, observou-se
que eles conhecem um nmero maior de cobras do que o descrito no captulo I, bem como
mantm com estas, uma relao pautada na raiva e no medo.
6.1. Rpteis existentes na regio, segundo moradores
Quando indagados sobre quais animais existem atualmente na regio, como
observado no captulo I, aqueles pertencentes Classe Reptilia obtiveram 59 citaes,
distribudas em trs categorias diferentes, sendo elas as cobras, os lagartos e as lagartixas
(Grfico n3).
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http://www.pdfpdf.com/0.htmCITAO DE RPTEIS PELOS MORADORES DAS TRS COMUNIDADES:
59
1
13
45
0
10
20
30
40
50
60
70
Cobras lagarto lagartixa Total
Freq
unc
ia(n
)
Dentre as 59 citaes, as cobras foram os animais mais citados (45), seguidas
dos lagartos (13) e das lagartixas (1).
Segundo os moradores entrevistados:De uns dez anos pra c, tem aparecido
muita cobra aqui.
Posteriormente, ao serem solicitados a citar quais espcies de serpentes existem na
regio, alguns moradores descreveram quatorze (14) espcies, que so cobras (Grfico n4).
ESPCIES DE COBRAS EXISTENTES NA REGIO, SEGUNDO MORADORES:
9 73 6 1 3 3 1 3 1 1 1 1
46
6
0
10
20
30
40
50
Freq
unc
ia(n
)
Urutu Cascavel CaninanaJararaca Jaracuu Cobra verdeCobra cip Coral JararaquinhaCobra de duas cabeas Cobra-de-crista Cobra-correiaCobra-de-p Cobra-de-vidro Total
PDF Creator - PDF4Free v2.0 http://www.pdf4free.com
http://www.pdfpdf.com/0.htmDentre os quatorze (14) animais relacionados, a cascavel foi o mais citado, com
nove, seguido da caninana, com sete, da urutu e da jaracuu, cada uma com seis. Quatro
citaes consideram como cobras dois animais que no pertencem Subordem Ophidia,
sendo eles a cobra-de-vidro (1) e a cobra-de-duas-cabeas (3).
As serpentes mais citadas cascavel, caninana e jaracuu - so animais tpicos de
cerrados, campos e campos rupestres, bem como de reas abertas e pastagens, sendo,
geralmente animais terrestres, pouco observados no alto das rvores (FREITAS, 2003).
Desta forma, compreensvel a afirmativa dos moradores entrevistados, que
dizem que cobra gosta de ficar em lugar limpo, ou seja, em ambientes pouco florestados.
Algumas das espcies de cobras citadas pelos moradores, como a cobra-correia, a
cobra-de-p e a cobra-de-crista foram consideradas ser apenas fruto do folclore e das
inmeras lendas sobre estes animais, como verifica-se nos depoimentos abaixo:
As cobra corre atrs da gente. Atrs do morro, mais l longe, existea cobra de crista. Todo mundo fala que ela grande e tem os olhosvermelhos. Se ela te ver, ela corre atrs at que a gente joga paraela alguma coisa da gente: chinelo, blusa...(Entrevistada deSantana do Morro).Agora a cobra-correia engana a gente. Ela comprida e fininha,parecendo uma correia ou cinto e fica achatadinha no cho praningum ver ela no meio da puera. A quando a pessoa passa perto,ela d o bote.(Moradora de Sumidouro).Cobra de p: parecido com uma lagartixa, s que fina e cheia delistas que mudam de cor de acordo com a luz. Ela fica em cima detoco seco e tem cinco ps. O ltimo p fica pendurado atrs. O courodela liso e brilhante.(Moradora de Santana do Morro).
As serpentes so animais freqentemente mortos pelos moradores, o que pode,
aliado falta de conhecimento das espcies existentes no local, ter conseqncias desastrosas,
no que se refere manuteno da fauna herpetolgica local.
Se tem um bicho que eu mato sem medo de polcia nem de nada, cobra. Esse bicho mau, ruim, tem que matar. (Entrevistado emSumidouro).
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http://www.pdfpdf.com/0.htmEu, se eu ver cobra, eu mato mesmo.(Entrevistado na Fazenda doEngenho, RRPN do Caraa).O nico bicho que eu mato agora cobra.(Morador de Santana doMorro).
6.2. Animais que aparecem nos sonhos dos moradores
Ao serem indagados se sonham com animais, em um total de 141 entrevistados,
92 disseram que sonham com animais, sejam eles domsticos ou silvestres, 44 disseram que
no sonham, dois no sabem e trs no responderam a questo.
Obteve-se um total de 17 tipos diferentes de animais, em 107 citaes. Dessas, 42
se referiam a animais silvestres, distribudos em oito tipos diferentes, como pode ser
verificado no grfico n5, onde esto relacionados os animais silvestres mais freqentemente
presentes nos sonhos dos moradores.
ANIMAIS SILVESTRES QUE APARECEM NOS SONHOS DOS MORADORES:
42
111144
6
24
05
1015202530354045
Cobra Tat
uCoe
lho paca
Total
Freq
unc
ia(n
)
Dentre as citaes obtidas de animais que aparecem nos sonhos dos moradores, as
cobras obtiveram mais da metade das mesmas, com 24, a seguir vem a ona (6), os pssaros
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http://www.pdfpdf.com/0.htme o lobo guar (4). Os outros animais citados (gara, coelho, tatu, paca) obtiveram um total de
uma citao cada.
Assim, aliada importante informao de que as serpentes so mais constantes
nos sonhos das pessoas, est tambm a importante informao da forma como ela aparece
nestes sonhos.
Ou seja, as serpentes sempre aparecem nos sonhos dos entrevistados, perseguindo
algum, atacando os animais domsticos ou espreitando uma presa para atacar.
Desta forma, em grande parte das citaes, as serpentes representam ou traduzem
o sentimento de pavor, perseguio e ataque.
Sonhei que estava minha me e minha namorada e elas gritavamcom medo de cobra. (Morador de Sumidouro).Sonhei que uma cobra estava me perseguindo.(Morador deSumidouro).Sonhei que estava deitado na rede e uma cobra mepicou.(Morador de Brumal).Sonhei que estava dentro da Igreja rezando e uma cobra apareceuquerendo me atacar.(Moradora de Sumidouro).
A interpretao dos sonhos pelos prprios moradores, que tentam explicar
situaes ou acontecimentos relacionados com o objeto sonhado, traduz o comportamento
exclusivamente humano de criatura m e traioeira que atribudo, por eles, s serpentes.
Sonhar com cobra sinal de coisa traioeira; se sonhar com cachorro sinal de coisa
boa...(Moradora de Sumidouro).
Verificou-se, ao solicitar maiores detalhes aos entrevistados, que este medo
apresentado em relao s serpentes nem sempre devido a alguma experincia vivida pela
pessoa, mas, quase sempre, a histrias de ataque a outrem ou a lendas, que reforam, nas
serpentes, sentimentos exclusivamente humanos, como vingana, perversidade e traio. Os
depoimentos abaixo exemplificam estes tipos de simbologia:
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http://www.pdfpdf.com/0.htmQuando tem pessoa andando nas trilhas comigo e de escorpio certo que as cobras vo aparecer.(Morador em Brumal e guia deturismo na RPPN do Caraa)Cobra bicho to ruim que uma pessoa assim chamada decobra.(Moradora de Santana do Morro)
Estas experincias vividas ou ouvidas so traduzidas como concepes que regem
as atitudes das pessoas, tornando-se um parmetro interessante para avaliar o grau e o tipo de
interao entre estas populaes e as serpentes.
Todo o folclore que envolve as serpentes, tornando-as seres misteriosos aos olhos
dos humanos, leva as pessoas a designarem como fazendo parte da fauna herpetolgica local,
animais que existem apenas nas lendas e causos populares.
Geralmente, so animais que as pessoas no viram realmente, mas sempre
conhecem algum que viu, o que mantm viva na imaginao delas, o temor de serem vtimas
deste animal.
Algumas serpentes ao sentirem-se ameaadas, colocam-se em posio agressiva
emitindo um forte e prolongado chiado que produzem devido expulso do ar acumulado nos
pulmes atravs da contrao da musculatura corporal. Por haver um estreitamento traqueal, o
ar expelido reproduz um som caracterstico e alto (VIZOTTO, 2003) que serve para afugentar
o potencial inimigo.
Esta caracterstica, presente em mais de uma espcie de serpente, levou as pessoas
a definirem etnoespcies que possuem exclusivamente esta faculdade, sendo o som produzido,
geralmente alto, transformado em canto, que utilizado pela cobra para enganar as pessoas
que ela deseja atacar.
O exemplo abaixo ilustra este tipo de derivao:
Aqui nas redondeza, existe tris ou quatro qualidade de cobra quecanta. Ela canta um canto fino e comprido e alto e para enganar agente, por que se ela canta perto porque est longe e se ela cantalonge porque est perto.(Moradora de Sumidouro)
PDF Creator - PDF4Free v2.0 http://www.pdf4free.com
http://www.pdfpdf.com/0.htmAs classificaes cientficas de espcies de serpentes utilizam diversos caracteres,
como folidose, biometria e cromatismo. Estes caracteres morfolgicos externos constituem
elementos bsicos e fundamentais para a sistemtica desses animais (SCHIMIDT &
SCHIMIDT, 1923; DIXON, 1983; LEMA, 1989; DI-BERNARDO & LEMA, 1990 apud
MESQUITA, 1997). A sua anlise fornece tambm subsdios para o estudo evolutivo destes
organismos.
Os moradores das comunidades pesquisadas demonstraram utilizar poucos
caracteres para classificar em espcies diferentes, os organismos com os quais interagem, de
forma direta ou no.
Na classificao das serpentes, a caracterstica mais utilizada pelos moradores a
morfolgica e, dentro desta, analisa-se somente o padro e a disposio das cores nas escamas
epidrmicas.
Usa as pinta que ela tem no lombo (Moradora de Santana doMorro). Para diferenciar uma da outra.
A gente conhece as cobras pela cor e o jeito das malhas no courodela(Morador de Santana do Morro)Diferencia as cobra pela estampa que ela tem no couro(Morador de Sumidouro)
Etnoclassificaes so baseadas quase que exclusivamente em caractersticas
morfolgicas, (primeiramente) e/ou caractersticas ecolgicas (secundariamente), facilmente
observveis. Embora, nessas classificaes, possam ocorrer uma interao das duas
caractersticas (morfolgicas + ecolgicas).
As espcies cientficas de serpentes so colocadas dentro de famlias, conforme
apresentem caractersticas semelhantes, utilizadas na sua classificao. Pode ocorrer tambm
de famlias diferentes serem agrupadas, de acordo com alguns critrios como o padro de
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http://www.pdfpdf.com/0.htmdentio. Este critrio pode ser utilizado para classificar as serpentes como peonhentas ou
no-peonhentas.
Podemos encontrar algumas similaridades nos critrios folk e cientfico utilizados
na classificao das serpentes, como por exemplo, a morfologia. Porm, enquanto na
classificao cientfica, a morfologia um dos vrios critrios usados na definio de espcies
diferentes, para os moradores das comunidades trabalhadas, ela o nico critrio de
classificao utilizado.
Quanto a reconhecer se uma cobra venenosa ou no, a metodologia utilizada
pelos moradores das comunidades trabalhadas, caracterizada pelo seu empirismo, fruto da
experincia observacional de geraes passadas: Cobra braba v a gente e fica paradinha,
cobra mansa v a gente e sai correndo.(Moradora de Santana do Morro).
No entanto, este critrio no acontece de forma padronizada entre os
entrevistados, pois muitos deles afirmaram que todas as cobras so venenosas, por isso
mesmo, todas so perigosas e, portanto, passveis de serem mortas.
Reconhecem tambm que o veneno das cobras diferente de uma para outra,
sendo que algumas so mais venenosas, e outras no possuem veneno, como disse uma
moradora de Santana do Morro:A cainana, a cobra-cip no so bravas, no tem veneno,
no mordem. (Moradora de Santana do Morro).
As espcies de cobras citadas pelos entrevistados exibem formas diferentes de
inocular sua peonha na presa pretendida. Isto pode ser feito tanto com uma mordida, os
dentes servindo ento como condutores do veneno, como com o rabo, que em algumas cobras
exibe um ferro utilizado para tal.
...todas as cobras corais so perigosas. Elas atacam com o rabo,onde existe um ferro, igual ao de escorpio, onde est o veneno. Mass o macho que tem, a fmea no. Ento a fmea no pica ningum.Por isso no existe soro para o veneno de cobra coral, porque notem jeito de tirar para fazer soro. A cobra coral joga uma baba em
PDF Creator - PDF4Free v2.0 http://www.pdf4free.com
http://www.pdfpdf.com/0.htmquem mexe com ela que se cair na pessoa, apodrece acarne(Morador de Santana do Morro 45 anos ex-caador)
Existem outras espcies de cobras que tambm no utilizam os dentes para atacar
sua presa, e sim, uma espcie de baba, que elas cospem e o local no corpo onde
atingido, apodrece. A cainana (caninana) joga uma baba ou espuma, que tonteia a pessoa
e escurece as vista. Onde cai na pessoa, apodrece a carne. (Morador de Santana do Morro
45 anos ex-caador)
Da mesma forma que existem diversas maneiras utilizadas pelas cobras para
atacar as pessoas, existem tambm diversas formas de curar do seu veneno. Alguns
remdios manipulados por estas pessoas, podem ser empregados, bem como diversos mitos
relacionados aos cuidados que uma pessoa ofendida de cobra deve ter para no morrer. Os
exemplos abaixo, explicam este tipo de situao:
Para tirar o veneno da cobra do corpo da pessoa, s picar jil ecolocar no local, que o veneno sai todo. O jil fica pretinho porcausa do veneno(Moradora de Santana do Morro)Se amassar alho e colocar no local da mordida da cobra, o venenotambm sai.(Moradora de Santana do Morro ).O chifre de veado bom para retirar veneno de cobra. Ferve ochifre e coloca alguns preparados com ele e pe no local que a cobrapicou. O chifrepuxa o veneno. Enquanto ele no puxa tudo, eleno sai do lugar.S as pessoas preparadas que sabem fazer esteremdio.(Morador de Santana do Morro)....se a cobra morder e a pessoa saltar um crrego, a pessoa morre.Se uma pessoa mordida de cobra for vista por uma mulher grvida,a pessoa mordida morre.(Moradora de Santana do Morro).
As diversas formas de tratar algum mordido por cobra retrata o importante papel
que as mesmas representam no imaginrio das pessoas.
Apesar disso, poucos so os relatos de pessoas que foram mordidas por cobras na
regio da RPPN do Caraa. Os moradores entrevistados acreditam que este fato devido a
uma promessa feita por Nossa Senhora aos padres do Santurio do Caraa, de que as pessoas
daquela regio estavam protegidas contra as mordidas de cobra.
PDF Creator - PDF4Free v2.0 http://www.pdf4free.com
http://www.pdfpdf.com/0.htmPorm, mesmo sob a proteo divina, as pessoas daquelas comunidades no
deixam de temer as cobras, sendo que estas continuam a ser um smbolo do mal, que, de
acordo com elas, devem ser destrudas sempre que forem vistas.
PDF Creator - PDF4Free v2.0 http://www.pdf4free.com
http://www.pdfpdf.com/0.htm7. CAPTULO III
USOS DA FAUNA EM TRS COMUNIDADES HUMANAS
Para a aquisio dos dados referentes a utilizao da fauna nestas trs
comunidades, foi realizada junto aos moradores, uma entrevista estruturada, onde procurou-se
detectar como as pessoas daquelas comunidades usam a fauna da regio.
Para obter uma anlise detalhada dos usos, subdividiu-se a questo sobre o uso da
fauna em nove categorias diferentes, da seguinte forma: uso alimentar; do couro; medicinal;
criao; cruzamento; artesanato; atividades msticas; atividades enfeite; estimao. Para efeito
desse trabalho, foram analisados apenas os dados referentes aos animais silvestres.
7.1. Animais utilizados para alimentao
Nesta questo, em um total de 141 entrevistados, 110 responderam que utilizam
alguma fonte de protena animal na alimentao e 12 pessoas responderam que no utilizam.
Dez pessoas no responderam a questo e nove disseram que no sabem qual tipo de animal
utilizam na alimentao. Quanto ao nmero de citaes, a alimentao foi o item que obteve o
maior nmero, com 256, distribudas entre animais silvestres e domsticos.
Obteve-se um total de 106 citaes de animais silvestres utilizados na alimentao (Grfico
n6).
PDF Creator - PDF4Free v2.0 http://www.pdf4free.com
http://www.pdfpdf.com/0.htmANIMAIS SILVESTRES UTILIZADOS PARA ALIMENTAO:
106
112345571012
2630
0
20
40
60
80
100
120
Tatu
PacaCap
ivaraVea
doCoe
lhoLag
arto
Porco
doma
to JacuPom
bo Cutia
Cobra
Total
Freq
unc
ia(n
)
Dentre os animais silvestres, o tatu foi o mais citado (30) seguido da paca (26); da
capivara (12); do veado (10); do coelho (7); do lagarto e do gamb, cada um com cinco; do
porco do mato, com quatro; do jacu com trs; do pombo com duas; e da cutia e da cobra, com
uma citao cada. As espcies mais relacionadas como de maior preferncia alimentar ficam
restritas a trs tipos, sendo eles o tatu, a paca e a capivara.
As pessoas reconhecem esta forma de utilizao da fauna como algo que
acontecia com mais freqncia no passado, quando as condies scio-econmicas eram a
determinante para que este fato ocorresse. Em casa era tanta dificuldade que a gente usava
banha de tatu pra fazer comida.(Moradora de Sumidouro).
Atualmente, os animais silvestres podem ser considerados ainda um incremento
na dieta das pessoas entrevistadas, porm, para muitos, o progresso ocorrido na regio e as
Leis Ambientais aliadas a uma percepo das modificaes ambientais ocorridas no local,
esto mudando esta realidade.
PDF Creator - PDF4Free v2.0 http://www.pdf4free.com
http://www.pdfpdf.com/0.htmComia-se porque no tinha aougue. Hoje no pode mais caar,porque os animais esto acabando.(Moradora de Sumidouro).Na verdade, mesmo sendo de subsistncia, as pessoas que caavamgostavam do que faziam, e continuavam a caar, mesmo quando noexistia a necessidade de complementao na alimentao.(Moradorde Santana do Morro ex-caador).
No entanto, algumas espcies de animais como algumas espcies de tatu - no
so consumidas ou apresentam restries em seu consumo, devido ao hbito que, acredita-se,
que elas tm de comer carne de defunto, como atestam alguns depoimentos abaixo:
O tatu carnia no pode comer no. Ele come defunto nocemitrio(Moradora de Santana do Morro)O tatu galinha gostoso mais tem gente que no come, porquefalam que ele vai no cemitrio cavuc as cova para comer defunto.(Morador de Santana do Morro)
O nmero de citaes de tipos de animais utilizados na alimentao contradiz as
respostas negativas referentes caa e so um indicativo de que ela acontece sim, porm de
forma menos evidente que em alguns anos atrs, antes da criao da RPPN do Caraa.
7.2. Utilizao do couro/plo/pele/casco de animais
Nesta questo, 52 pessoas responderam que utilizam o couro/pelo/pele/casco de
animais, sejam domsticos ou silvestres e 49 disseram que no utilizam. 20 pessoas no
responderam a questo, 20 no sabem se existe este tipo de utilizao dos animais em suas
comunidades.
O uso do couro/plo/pele/casco dos animais envolve a sua utilizao para a
confeco de utenslios domsticos ou de uso pessoal (cinto, gola de roupa).
Para tal finalidade foram relacionados seis tipos de animais em 18 citaes obtidas
(Grfico n7).
PDF Creator - PDF4Free v2.0 http://www.pdf4free.com
http://www.pdfpdf.com/0.htmUSO DO COURO/PELO/PELE/CASCO DE ANIMAIS SILVESTRES:
18
1123
65
02468
101214161820
Veado
Coeho Tat
uLag
arto
Capivar
a
Jaguat
irica total
Freq
unc
ia(n
)
O coelho foi o animal mais citado (6); seguido do veado (5); do tatu (3); do
lagarto (2) da capivara e da jaguatirica, com uma citao cada.
As formas de uso so variadas, como destacadas abaixo:
Tem gente que tira a pele da oncinha (jaguatirica) pra colocar emgola de blusa. Fica muito bonito.(Moradora de Sumidouro).O couro do veado o povo usa pra fazer bolsa de carregar ascoisa..(Morador de Sumidouro).O couro da oncinha usado pra fazer cinto.(Morador deSumidouro).
As informaes obtidas sobre o uso do couro de alguns animais, so quase sempre
referentes a sua utilizao no passado, sendo esta prtica pouco presente nos dias atuais.
Principalmente porque a sua utilizao seria a comprovao de que ocorre caa, o que leva a
diminuio de sua prtica.
7.3. Uso medicinal da fauna silvestre
Nesta questo, de um total de 141 moradores entrevistados, 41 disseram que
utilizam animais silvestres ou domsticos como zooterpicos e 50 disseram que no utilizam,
PDF Creator - PDF4Free v2.0 http://www.pdf4free.com
http://www.pdfpdf.com/0.htm28 no sabem se existe este tipo de utilizao de animais em suas comunidades e 22 no
responderam a questo (Grfico n8).
ANIMAIS UTILIZADOS COMO ZOOTERPICO, SEGUNDO MORADORES:
2016
3 3 3
45
05
101520253035404550
Tatu Capivara Lagarto Cobra Veado Total
Freq
unc
ia(n
)
Nas entrevistas realizadas, obteve-se um total de cinco tipos de animais. Foram 45
citaes onde o animal mais citado foi o tatu (20), seguido da capivara (16). O lagarto, veado
e a cobra obtiveram trs citaes cada.
A utilizao de partes destes animais, geralmente, descrita como algo que
acontecia no passado, quando a fiscalizao sobre os produtos, oriundos da fauna, no era to
rigorosa. No entanto, a sua utilizao ainda pode ser notada, embora no de maneira to
freqente.
Muitos afirmam que usam alguma parte do animal, apenas quando acham ele
morto.
Quando acha morto, usa o couro do lagarto.(Morador deSumidouro).Um dia desses, uma pessoa procurou banha de tatu pra todo ladopra curar bronquite e no encontrou.(Moradora de Sumidouro).O leo do tatu o mais caro que acha pra compr. Porque ningumanda matando tatu todo dia....(Moradora de Sumidouro).
PDF Creator - PDF4Free v2.0 http://www.pdf4free.com
http://www.pdfpdf.com/0.htmSo utilizadas apenas partes do corpo e/ou produtos oriundos dos animais sendo
elas o couro, o rabo, o veneno, o sangue, o chifre, a pata e o leo. (Grfico n 9).
PARTES DOS ANIMAIS UTILIZADAS COMO ZOOTERPICOS:
42
1 1 1 3 1 105
101520
253035
4045
leo Sangue Couro Rabo Veneno Chifre Canela
Freq
uen
cia
(n)
O leo, denominado tambm de banha, gordura ou sebo o mais utilizado
como zooterpico, aparecendo em 42 citaes, sendo obtido de mais de um tipo de animal. O
sangue, o couro, o rabo, a canela e o chifre foram citados uma vez cada, o veneno retirado
exclusivamente das cobras foi citado trs vezes.
Determinadas partes ou produtos dos animais so utilizados para diferentes tipos
de doenas3 ou dores, bem como do mesmo animal pode-se obter diversos remdios
diferentes, para doenas tambm diferentes. (Quadro n5).
3 Neste trabalho, a palavra doena ser utilizada referindo-se tanto s enfermidades de origem personalstica(provocadas por um agente humano ou sobrenatural) quanto quelas de origem naturalstica (provocadas pelainterveno de causas ou foras naturais). (FOSTER, 1983: In COSTA-NETO, 1999).
PDF Creator - PDF4Free v2.0 http://www.pdf4free.com
http://www.pdfpdf.com/0.htmQuadro n5: Partes dos animais e formas de utilizao nas diferentes doenasencontradas
Parteutilizada
Animal Finalidade Modo de usar
Bo pra dor de ouvido; pra surdez Esquenta ela e pinga umas gotinhaou dentro do ouvido ou no algodo epe no ouvido
Pra quem tem bronquite, problemanos pulmo; tuberculose
Faz um ch bem forte e coloca umasgotinha dentro e toma.
Dor nas perna; dor nas costa Faz um ch bem forte e coloca umasgotinha dentro e toma
leo Tatu; lagarto,capivara
Quebranto Faz um ch bem forte e coloca umasgotinha dentro e toma
Sangue Tatu Pra ficar com a pele bonita; pronenm no ter tiria; evita erizipela,catapora e sarampo
Coloca umas gotinha na gua dobanho do nenm e d banho nele.Depois enxgua.Joga em cima da cabea do nenmantes dele tomar banho e depois d obanho
Couro Tatu Dor de cabea Ferve um pedao do casco junto como ch e toma
Dor de ouvido Ferve o rabo e depois pinga aquelagua que deu no ouvido
Rabo Tatu
Dor de estomago Ferve junto com o leite pra virarcoalhada e toma
Veneno Cobra Contra-veneno para picada de cobra Quando pega tem que levar para opadre. Ele diz que para fazer soro,mas no aqui no.O veneno da cobra usado pra fazerremdio
Canela Veado Ajuda a criana que demora a andar,a andar logo.
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Chifre Veado Contra-veneno para picada de cobra Ferve o chifre e coloca algunspreparados com ele e pe no local quea cobra picou. O chifre puxa oveneno. Enquanto ele no puxa tudo,ele no sai do lugar.
As descries de remdios utilizados para combater o veneno das cobras de uma
pessoa mordida foram tambm catalogadas, sendo descritas como contra o veneno de cobra
O rabo do tatu utilizado como ch para dor de ouvido e para fazer coalhada. A coalhada
pode ser utilizada pura, sendo considerada boa para o estomago, bem como ser utilizada
para fazer queijo-de-minas, o que mais comum. Para a anlise dos dados referentes ao uso
do rabo do tatu, foram utilizadas apenas aquelas indicadas como zooterpico, sendo outras
utilizaes desconsideradas neste grfico. (Grfico n10).
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http://www.pdfpdf.com/0.htmDOENAS TRATADAS COM ZOOTERPICOS:
Dentre as enfermidades tratadas, destacam-se aquelas referentes a doenas do
Aparelho Respiratrio, com 28 citaes; do Aparelho Auditivo, com nove citaes; do
Aparelho Locomotor, com trs citaes; Contra-veneno para picada de cobra, com duas
citaes; do Sistema nervoso com uma; do Sistema Digestivo; e das Doenas de Pele tambm
com uma citao.
A denominao usada pelos moradores de doenas da pele foi mantida na
anlise destes dados, embora algumas das doenas citadas no sejam problemas
dermatolgicos.
O uso de alguns produtos de animais no est relacionado com a fabricao de
remdios e, sim, a simpatias, como por exemplo, o uso do sangue de tatu para ficar com a pele
bonita ou o uso do chifre do veado para retirar o veneno de cobra. No entanto, a sua definio
como remdio pelos moradores, levou a sua categorizao junto aos mesmos.
importante que se destaque que a importncia dessas informaes no se d pela
comprovao da sua efetividade e, sim, pela forma como as pessoas deste local se relacionam
com os animais, e os conhecimentos advindos deste relacionamento de vrias geraes.
9
28
31 1 2
0
5
10
15
20
25
30
freq
unc
ia(n
)
aparelho auditivo aparelho respiratrioaparelho locomotor sistema nervosodoenas de pele contra veneno
PDF Creator - PDF4Free v2.0 http://www.pdf4free.com
http://www.pdfpdf.com/0.htmEstudos semelhantes realizados por Costa-Neto (1998); Begossi e Braga (1992);
Marques (1995) confirmam que o uso de zooterpicos acontece de forma efetiva em
diferentes culturas humanas, sendo um fenmeno muito antigo e difundido.
Estudos farmacolgicos sobre matrias-primas animais mostram que o percentual
de fontes de animai
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