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Grupo Economia e Sociedade
Pensar a Educação. Portugal 2015
ORGANIZAÇÃO, ADMINISTRAÇÃO E FINANCIAMENTO DA
EDUCAÇÃO*
*Documento de trabalho elaborado por
Belmiro Cabrito, João Pinhal, Jorge Martins, Maria José Rau, Mariana Dias e Natércio Afonso
Março de 2015
[email protected] A Areia dos Dias http://areiadosdias.blogspot.pt
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Sumário
NOTA PRÉVIA
I – INTRODUÇÃO
II - A EDUCAÇÃO NO ENQUADRAMENTO CONSTITUCIONAL E NO REGIME JURÍDICO
DAS AUTARQUIAS LOCAIS
III – NÍVEIS DE ADMINISTRAÇÃO
III.1 – Administração Central
III.1.1 - Caracterização e condicionantes
III.1.2 - Clarificações necessárias e identificação de zonas fraturantes
III.2 – Províncias, Regiões, Áreas Metropolitanas, Associações de Municípios (Pag.12)
III.2.1 - Clarificações necessárias e identificação de zonas fraturantes
III.2.2 - Pistas de trabalho/atuação e áreas de negociação/concertação
III.3 – Município
III.3.1 - Caracterização e condicionantes
III.3.2 - Clarificações necessárias e identificação de zonas fraturantes
III.4 – Da Escola Pública aos Mega-agrupamentos
III.4.1 Traços atuais do funcionamento e gestão
III. 4.2 Como surgiram os “mega-agrupamentos”
III.4.3 Algumas características funcionais dos agrupamentos de escolas
III.4.4 Pistas de trabalho/atuação e áreas de negociação/concertação
IV- REGULAÇÃO E FINANCIAMENTO
IV.1. Formas de regulação do sistema e das organizações educativas
IV.1.1.Globalização, governação e “novas ortodoxias em educação”
IV.1.2. A “hiperburocratização” da administração educacional e o papel das plataformas informáticas
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IV.1.3. Europeização das políticas educativas
IV.2.Financiamento
IV.2.1. Introdução
IV.2.2. Os quase-mercados
IV.2.3. A “liberdade de escolha” e o cheque-ensino
IV.2.4. Privatização e níveis de ensino
IV.2.5. A procura educativa e o financiamento da educação
IV.2.6. Notas para discussão
V – COMO ATUAR NO PRESENTE E PREPARAR O FUTURO
V.1. Afinal o que é a escola pública?
V.2. A atualidade da Lei de Bases do Sistema Educativo
V.3. Pela autonomia das escolas!
V.4. Como descentralizar sem “municipalizar”?
V.5. Uma nova visão para a administração pública
V.6. Qual o papel da sociedade civil?
V.7. Questões à margem que se podem tornar questões centrais
*ANEXOS :
I – Níveis da Administração e Domínios de Decisão
II - Competências das Direções de Serviço Regionais da Direcção Geral dos Estabelecimentos Escolares
III - Composição das 21 Comunidades Intermunicipais e das 2 Áreas Metropolitanas
IV - Quadro resumo de caracterização e condicionantes
V - Características funcionais dos agrupamentos de escolas
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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NOTA PRÉVIA
O texto que seguidamente se apresenta constitui uma versão revista e reduzida do
documento conjunto elaborado pelos membros que integram a área temática
ORGANIZAÇÃO, ADMINISTRAÇÃO E FINANCIAMENTO DA EDUCAÇÃO do Projeto “Pensar
a Educação”.
Objeto de pareceres de dois consultores e apresentado num seminário em Lisboa, que
teve lugar no ISEG no dia 14 de Novembro de 2014, constitui já o resultado do debate
havido e de aspetos essenciais que se pretende continuar a apresentar e a discutir.
Num momento em que alguma evolução já houve - se não real e efetiva pelo menos
aparente e apregoada - no que se tem designado por “municipalização da educação”, o
que se pretende ao por de novo o documento a debate é confirmar se as questões
essenciais estão devidamente identificadas e caracterizadas e se os problemas em
aberto que urge “atacar” e resolver estão claramente explicitados.
Legislação ou propostas surgidas já depois do início do trabalho em Maio de 2014 só
foram consideradas /integradas brevemente dado não só o seu estado elementar, mas,
sobretudo, o não terem ainda sido efetivamente negociadas, aplicadas ou
experimentadas.
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I – INTRODUÇÃO
1. À semelhança dos restantes fenómenos sociais, a “educação” sempre assumiu formas
particulares que, no tempo e no espaço, perseguem finalidades e objetivos que
caracterizam o contexto socioeconómico e político em que ocorre.
Estruturada em torno dos atores – o aprendiz e o mestre; o aluno e o professor; o
formando e o formador – a educação, enquanto produto socialmente construído, sofre
mutações advindas das especificidades próprias do momento e do lugar em que se
realiza, ao mesmo tempo que as suas concretizações podem influir, diretamente,
naquelas mutações. As mudanças por que passa são, assim, consequência das condições
ideológicas, materiais e sociais em que é produzida e do papel que a sociedade lhe
comete na construção do devir. Daí resultam impactos não só na sua “roupagem”
externa, mas também naquilo que a define e lhe dá uma racionalidade própria,
estruturadora e justificadora mesmo da sua existência: a educação enquanto forma de
aquisição, transmissão e desenvolvimento do conhecimento, motora de alterações nas
maneiras de pensar e de agir individuais e coletivas, ao serviço do desenvolvimento
integral dos indivíduos e das sociedades.
2. “Pensar a Educação” é, assim e também, pensar como a educação e o sistema
educativo estão organizados e qual a forma como, para o gerir, se estrutura a
administração da educação e como, correspondendo a essa organização – ou
assentando nessa organização –, está estabelecido o seu financiamento.
Existe uma base ampla de consenso sobre o diagnóstico relativamente às políticas
educativas e à administração da educação, no que respeita à excessiva concentração da
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decisão na esfera do governo central. Há investigação, com décadas em Portugal e
noutros países europeus, mostrando os problemas e as dificuldades resultantes de uma
administração muito centralizada. De há muito que é um lugar-comum dizer que é
necessário reforçar a intervenção municipal na definição de políticas locais de educação
e na administração da provisão do serviço público de educação. Do mesmo modo,
parece não haver grandes dúvidas sobre a necessidade do reforço da autonomia das
escolas e dos poderes dos seus órgãos de direção e gestão. Também parece consensual
que os processos de descentralização territorial e de promoção da autonomia das
escolas envolvam as dimensões clássicas que concretizam a provisão da educação, a
saber: os recursos humanos, o desenvolvimento do currículo, o financiamento e a
própria estrutura orgânica de cada escola, devendo concentrar-se no governo central
apenas as macropolíticas, as leis de enquadramento geral, o planeamento estratégico e
a avaliação. Há contudo uma clarificação necessária e urgente subjacente a este
processo de transferências de competências e que implica, nomeadamente, a
confrontação com o que estabelece o artigo 47º da LBSE, e que podem/devem obrigar
a uma consensualização prévia, talvez não tão fácil e evidente como se parece supor.
3. Estudos que têm incidido sobre a relação entre eficácia e equidade na educação têm
levado a um olhar mais atento sobre como esta relação está intimamente dependente
da forma como estão repartidas as competências, do enquadramento do exercício
dessas competências, nomeadamente no que se refere aos níveis de autonomia quanto
à atribuição e gestão dos recursos, a que correspondem, naturalmente, as exigências de
rigor na avaliação e prestação de contas. Uma ampla reflexão feita, desde meados do
século XX, em alguns países sobre medidas tomadas, em especial para responder ao
insucesso escolar em zonas problemáticas (“ZEP- Zones d’Education Prioritaire” em
França, “Education in Cites” no Reino Unido, “TEIP-Territórios Educativos de Intervenção
Prioritária” em Portugal, projetos vários nos EUA) tem sido determinante para este olhar
sobre a organização e funcionamento dos sistemas educativos na perspetiva já não só
de custo/benefício, mas também da relação entre eficácia e equidade. A investigação
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tem, simultaneamente demonstrado as potencialidades associadas com as políticas de
melhoria das escolas e a diversidade de percursos e processos que as mesmas podem
envolver1.
4. O problema central na definição de uma estratégia política para a educação consiste
em evitar uma abordagem centrada na ação das autoridades governamentais, ou seja,
evitar que as medidas de política se organizem fundamentalmente em torno de
legislação e de normativos produzidos na administração central da educação. Pode
haver vantagem em abordar a política pública numa lógica de ação pública, em que as
decisões são tomadas em rede, em várias instâncias, e em função de múltiplos
interesses e objetivos. A ação governamental seria concebida como criadora de balizas
e oportunidades para a ação dos outros atores (famílias, profissionais, escolas,
municípios, etc.), mais do que na definição de “reformas” ou mudanças estruturais.
Tudo o que for mudança estrutural deve ser objeto de concertação social e política a
estabilizar em leis-quadro ficando, assim, protegida das flutuações conjunturais do
processo político.
5. O “Olhar sobre a Educação”2 publicado pela OCDE tem, na sua edição de 2012 no
capítulo D – Ambiente pedagógico e organização escolar (Environnement pédagogique
et organisation scolaire) – uma secção dedicada ao que identifica como indicador D6
“Quem toma as decisões chave no seio dos sistemas educativos” (na edição de 2013
este indicador não consta). A análise feita nesta secção tem por base uma grelha que
compara a situação em 35 países no que se refere aos níveis de administração e aos
domínios de decisão que, em anexo (Anexo I) sucintamente se traduz/adapta.
1 Fullan, Bolivar , 2011, Avila, 2009, Mortimore , 1998.
2 OECD (2012), Education at a Glance 2012: OECD Indicators, OECD Publishing.
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Desta análise resulta, como seria previsível, que Portugal é dos países onde as decisões
são maioritariamente tomadas a nível da administração central. Resultam igualmente
muitos outros aspetos interessantes e que justificam uma reflexão, nomeadamente que,
nos últimos anos e após uma caminhada no sentido da aumentar as competências dos
níveis inferiores – mais próximos dos alunos – da administração, “paradoxalmente
muitos países aumentarem a influência da administração central”.
No caso português, partindo, há 40 anos, de uma administração altamente centralizada,
o discurso político e algumas decisões têm ido no sentido de fortalecer a transferência
de competências para as autarquias e aumentar a autonomia das escolas, mas sempre
de uma forma que se poderá classificar de pouco clara, hesitante, titubeante mesmo,
com a constante fuga para situações vagas e quase contraditórias que encontram
refúgio frequente em regimes experimentais e processos de contratualização casuística.
6. Talvez que o maior erro do debate sobre a descentralização territorial do sistema
educativo tenha sido a sua limitação ao sistema escolar. Isto não significa que outras
abordagens tenham estado totalmente ausentes, mas sim que a prevalência tem sido
dada à questão de se saber o quê e o como da transferência para os municípios de
competências no sistema escolar, o que tem retirado ao debate as cambiantes mais
políticas e tem-no limitado excessivamente às questões administrativas, de natureza
executiva.
A natureza política da descentralização educacional que se pretende implica ponderar-
se sobre as sedes de conceção do sistema educativo e da produção normativa
correspondente, porque é aí que reside grande parte do problema.
7. Desde 2011 que o Conselho Nacional de Educação (CNE) se em vindo a preocupar e a
produzir, a partir de uma ampla e pormenorizada caracterização da realidade
observada, recomendações relacionadas com estas questões, nomeadamente sobre
quem toma ou deva tomar certas decisões chave no seio dos sistemas educativos.
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7.1. A Recomendação 2/2011 do Conselho Nacional de Educação3 identifica cinco
aspetos prioritários de atuação no que respeita o financiamento das escolas públicas e
que se prendem com a necessidade de identificar claramente os recursos de que uma
escola deve dispor e deve poder gerir de forma autónoma bem como adequar essa
identificação ao enquadramento social/económico e cultural dos alunos, as
características físicas da escola e as características geográficas da sua localização, sem
esquecer que é possível e desejável prever e identificar serviços partilhados a que as
escolas podem recorrer, prestados por entidades externas;
7.2. Já a recomendação 6/2012 do Conselho Nacional de Educação1 reconhece uma
situação que não favorece a efetiva assunção de poderes, quer ao nível autárquico quer
ao nível das escolas, nem a criação das necessárias competências e práticas de
autonomia, desde a existência de um corpo técnico devidamente habilitado para o
efeito, capaz também de procedimentos regulares de planeamento, avaliação e
prestação e contas. Como principais causas desta situação identificam-se aspetos
críticos que urge resolver no processo de assunção de competências pelas autarquias
em matéria de educação e que resultam i) da incoerência e instabilidade legislativa que
levam à existência de orientações distintas e, por vezes, opostas, ii) de um processo de
delegação de competências estabelecido em sede de um instrumento de
contratualização, e não de um efetivo processo de descentralização, e iii) e de medidas
várias que podem conduzir à restrição do caráter universal e gratuito dos serviços e bens
educativos.
7.3. Também na Recomendação 7/20121 sobre autonomia das escolas, num conjunto
vasto de 19 recomendações dirigidas a diferentes destinatários, assumem especial
3 Recomendação 2/2011 – Financiamento das Escolas Públicas
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relevo as 12 recomendações “dirigidas ao Governo e à administração educacional” de
que têm maior impacto as seguintes 3:
- A definição de um novo quadro de responsabilidades entre os vários níveis da
administração educacional, que consagre o caminho já feito por todas as partes, desde
o nível central ao local, e potencie o desenvolvimento da descentralização da educação
e da autonomia das escolas/agrupamentos de escolas;
- O reforço inequívoco da necessidade de cada escola ter o seu projeto educativo
centrado nos alunos e se garanta a diversidade de situações que cada escola representa
contrariando um processo de descentralização e de autonomia regulados por um
“modelo único”;
- O incentivo à celebração dos contratos de autonomia entre as escolas/agrupamentos
de escolas e a tutela, que amplie os níveis de responsabilidade pelos processos e pelos
resultados escolares e contribua para que se dissipe o clima de desconfiança que existe
na administração central face às escolas/agrupamentos de escolas;
8. Justificações possíveis da situação portuguesa podem-se encontrar:
- Por um lado, num certo comprazimento dos decisores e profissionais envolvidos que,
aos vários níveis da administração, encontram nos animadores resultados dessas
autonomias ocasionais, contratualizações casuísticas e situações experimentais;
- Por outro na incapacidade de encarar de frente os evidentes e fortes interesses
opostos e as zonas fraturantes que existem entre os diferentes níveis de administração
e instâncias e grupos profissionais envolvidos na educação. Esta natural e saudável
oposição entre interesses e perspetivas não se resolve, porém, com fáceis e amigáveis
consensos, mas sim através de aturadas negociações e de uma concertação que implica
a assunção de compromissos, com perdas e ganhos pelas diferentes partes. É que não
existem decisões políticas duradouras que possam ter efeitos práticos sem que este
processo prévio de concertação tenha lugar.
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- Por outro lado, ainda, é preciso notar que processos mal conduzidos podem destruir
os difíceis equilíbrios e as exigentes colaborações já alcançadas, nomeadamente entre
autarquias e escolas, e que implicaram tempo e esforço mútuo a desenvolver-se.
São estes vários consensos, discordâncias e interesses que neste documento se
pretendem analisar no que respeita aos níveis de administração para os diferentes
domínios de decisão, procurando, depois de um amplo debate, identificar as questões
que se impõem e apontando vias possíveis a prosseguir ou iniciar.
II - A EDUCAÇÃO NO ENQUADRAMENTO CONSTITUCIONAL E NO
REGIME JURÍDICO DAS AUTARQUIAS LOCAIS
Relembrando o que diz a Constituição da República Portuguesa (CRP) sobre os vários
níveis de administração, no contexto mais geral da Educação, constata-se que o
ordenamento constitucional do território e da administração não contempla a Província
(circunscrição político-administrativa existente em Espanha, por exemplo), nem a
Região (as regiões autónomas e as regiões administrativas têm outro enquadramento
constitucional, não equiparado ao conceito político de região), mas admite as
associações de autarquias locais que, hoje, podem ser Áreas Metropolitanas ou
Comunidades Intermunicipais. Nem umas nem outras, contudo, representam um nível
intermédio de poder próprio (com atribuições e competências constitucionais
originárias) entre a administração central e a administração local. Tal facto tem
reforçado o cariz acentuadamente centralista do Estado português, que legitima e
determina o centralismo da administração educativa.
A CRP, nos Princípios Fundamentais, estabelece que Portugal é um Estado Unitário que
respeita na sua organização e funcionamento o regime autonómico insular (os
arquipélagos dos Açores e da Madeira constituem regiões autónomas, dotadas de
estatutos político-administrativos e de órgãos de governo próprios) e os princípios da
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subsidiariedade, da autonomia das autarquias locais e da descentralização democrática
da Administração Pública (AP).
Em educação, após determinar que é tarefa fundamental do Estado assegurar o ensino
e a valorização permanente da língua portuguesa, a CRP esclarece, no capítulo dos
Direitos e Deveres Fundamentais, que é garantida a liberdade de aprender e ensinar,
que o Estado não pode programar a educação e a cultura segundo quaisquer diretrizes
filosóficas, estéticas, políticas, ideológicas ou religiosas, que o ensino público não é
confessional e que é garantido o direito de criação de escolas particulares e
cooperativas.
Estas garantias são retomadas no capítulo dos Direitos e Deveres Culturais, onde
encontram a explicitação dos seus objetos e objetivos.
Assim, no Art.º 73º, a CRP esclarece que todos têm direito à educação e à cultura e que
o Estado promove a democratização da educação e as demais condições para que a
educação, realizada através da escola e de outros meios formativos, contribua para a
igualdade de oportunidades, a superação das desigualdades económicas, sociais e
culturais, o desenvolvimento da personalidade e do espírito de tolerância, de
compreensão mútua, de solidariedade e de responsabilidade, para o progresso social e
para a participação democrática na vida coletiva.
Mas é nos artigos seguintes que a CRP estabelece as obrigações do Estado na promoção
do objetivo de que “todos têm direito ao ensino com garantia do direito à igualdade de
oportunidades de acesso e êxito escolar” (CRP, Art.º 74º, 1 e 2) e que vão desde o dever
de assegurar o ensino básico universal, obrigatório e gratuito e criar um sistema público
educação pré-escolar, até estabelecer progressivamente a gratuitidade de todos os
graus de ensino e inserir as escolas nas comunidades que servem, estabelecendo a
interligação do ensino e das atividades económicas, sociais e culturais.
Assim, o Estado fica obrigado a criar uma rede de estabelecimentos públicos de ensino
que cubra as necessidades de toda a população, mas reconhece e fiscaliza o ensino
particular e cooperativo e estipula a democraticidade no acesso ao ensino superior e o
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estatuto de autonomia das universidades. Ao mesmo tempo, determina a participação
democrática no ensino esclarecendo que os professores e alunos têm o direito de
participar na gestão democrática das escolas, nos termos da lei; a lei regula as formas
de participação das associações de professores, de alunos, de pais, das comunidades e
das instituições de carácter científico na definição da política de ensino (Art.º 77º, 1 e 2).
Quanto ao regime autonómico insular, que é estabelecido no Título VII da CRP sob a
designação genérica de Regiões Autónomas, importa referir que, em matéria de
educação e ensino, com uma única exceção respeitante à legislação sobre “Bases do
Sistema de Ensino”, que é da reserva absoluta de competência da Assembleia da
República (CRP, Art.º 164º , i)), os poderes das regiões autónomas abrangem todas as
matérias (e domínios) enunciadas no respetivo estatuto político-administrativo e que
não estejam reservadas aos órgãos de soberania (Idem, Art.º 227º).
Finalmente, sobre o Poder Local, de que trata o título VII, a CRP esclarece que este diz
respeito às autarquias locais que, fazendo parte da organização democrática do Estado,
são definidas como pessoas coletivas territoriais dotadas de órgãos representativos, que
visam a prossecução de interesses próprios das populações respetivas (CRP, Art.º 235º,
1 e 2).
O texto constitucional estabelece diferentes categorias de autarquias locais e remete
para legislação própria a divisão administrativa do território. No continente, as
autarquias locais são as freguesias, os municípios e as regiões administrativas. Nas
grandes áreas urbanas e nas ilhas, a lei poderá estabelecer, de acordo com as suas
condições específicas, outras formas de organização autárquica.
As atribuições e a organização das autarquias locais, bem como a competência dos seus
órgãos, são reguladas por lei4, de harmonia com o princípio da descentralização
administrativa. Embora tenham património e finanças próprios, o seu regime de
finanças é estabelecido por lei e visará a justa repartição dos recursos públicos pelo
Estado e pelas autarquias e a necessária correção de desigualdades entre autarquias do
4 Lei n.º 75/2013 de 12 de Setembro
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mesmo grau (Idem, 238º), mas estão sujeitas à tutela administrativa que consiste na
verificação do cumprimento da lei por parte dos órgãos autárquicos. Os municípios
podem constituir associações e federações para a administração de interesses comuns,
às quais a lei pode conferir atribuições e competências próprias e participam, por direito
próprio nas receitas provenientes dos impostos diretos, embora também disponham de
receitas tributárias específicas.
Quanto às regiões administrativas, para existirem têm que ser criadas por lei e
simultaneamente5, o que ainda não aconteceu. Esta lei definirá os respetivos poderes, a
composição, a competência e o funcionamento dos seus órgãos, podendo estabelecer
diferenciações quanto ao regime aplicável a cada uma.
Ainda sobre a descentralização administrativa, a lei constitucional refere que a
Administração Pública será estruturada de modo a evitar a burocratização, a aproximar
os serviços das populações e a assegurar a participação dos interessados na sua gestão
efetiva, designadamente por intermédio de associações públicas, organizações de
moradores e outras formas de representação democrática. Para estes efeitos, a lei
ordinária deverá estabelecer adequadas formas de descentralização e desconcentração
administrativas, sem prejuízo da necessária eficácia e unidade de ação da Administração
e dos poderes de direção, superintendência e tutela dos órgãos competentes. No
entanto, a lei ordinária pode criar entidades administrativas independentes (Idem,
267º).
Importa agora referir brevemente as atribuições das autarquias locais, matéria inscrita
na Lei n.º 75/2013 de 12 de Setembro, que hoje estabelece o regime jurídico das
autarquias locais, aprova o estatuto das entidades intermunicipais, estabelece o regime
jurídico da transferência de competências do Estado para as autarquias locais e para as
5 Decisão dependente do voto favorável expresso pela maioria dos cidadãos eleitores que se tenham pronunciado em consulta direta (referendo) de alcance nacional e relativa a cada área regional (CPR, Art.º 256, 1) que ainda não
ocorreu.
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entidades intermunicipais e aprova o regime jurídico do associativismo autárquico, e
que revoga grande parte da legislação anterior sobre aqueles assuntos6.
Presididas pelo princípio da promoção e salvaguarda dos interesses próprios das
respetivas populações, em articulação com as freguesias, as atribuições dos municípios
manifestam-se, entre outros, nos domínios do equipamento rural e urbano, da energia,
dos transportes e comunicações, da educação, do património, cultura e ciência, dos
tempos livres e desporto, da saúde, da ação social, da habitação, do desenvolvimento e
do ordenamento do território e urbanismo (Lei 75/2013, Art.º 23º).
As competências, associadas àquelas atribuições podem ser de consulta, de
planeamento, de investimento, de gestão, de licenciamento e controlo prévio e de
fiscalização, sendo que a prossecução das atribuições e o exercício das competência
pelas autarquias locais e pelas entidades intermunicipais devem respeitar os princípios
gerais da descentralização administrativa, da subsidiariedade, da complementaridade,
da prossecução do interesse público e da proteção dos direitos e interesses dos cidadãos
e a intangibilidade das atribuições do Estado.
À Assembleia Municipal cabe deliberar sobre a criação do conselho municipal de
educação, mas cabe-lhe também discutir e aprovar o plano de atividades e o orçamento
municipais, bem como o relatório de atividades e as contas, o que corresponde a uma
possibilidade politicamente relevante de influenciar a atividade municipal.
À Câmara Municipal cabe especificamente organizar e gerir os transportes escolares e
deliberar no domínio da ação social escolar, designadamente no que respeita a
alimentação, alojamento e atribuição de auxílios económicos a estudantes (Art.º 33º,
gg) e hh)).
Têm, contudo, importantes competências no domínio da conceção e planeamento do
sistema educativo local, no domínio da construção e gestão de equipamentos e serviços
6 A Lei n.º 75/2013 de 12 de Setembro revoga vários artigos e cláusulas do Código Administrativo, do Decreto-Lei n.º
78/84, da Lei n.º 159/99 e das posteriores alterações, da Lei n.º 169/99 e posteriores alterações e do Decreto-Lei n.º
310/2002, de 18 de dezembro, e posteriores alterações.
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(como a construção e equipamento de jardins de infância e escolas do ensino básico, a
contratação e gestão de pessoal não docente e a gestão de refeitórios) e no domínio do
apoio aos alunos e às escolas, entre as quais avulta a organização e apoio de atividades
complementares de ação educativa, como as atividades de enriquecimento curricular
no 1º ciclo e a componente de apoio à família nos jardins de infância. Refira-se que nem
todas estas competências são universais, já que dependem da contratualização de
competências entre o Estado e cada município, o que levanta inúmeros problemas
Quanto à atividade das freguesias as suas competências próprias na área da educação
são escassas mas podem assumir bastante importância no caso das competências que
muitos municípios lhes delegam.
Podendo ser instituídas associações públicas de autarquias locais para a prossecução
conjunta das respetivas atribuições (previstas na CRP, Art.º 247º, 253º e 267º), o
normativo que se tem vindo a referir (Lei 75/2013) estabelece como associações de
autarquias locais as Áreas Metropolitanas (AM)7, as Comunidades Intermunicipais (CIM),
bem como as associações de freguesias e de municípios de fins específicos, sendo que
só a área metropolitana e a comunidade intermunicipal são entidades municipais e que
as associações de autarquias locais estão sujeitas ao regime de tutela administrativa
(Idem Art.º 63º e 64º).
As CIM existentes são pessoas coletivas de direito público, constituídas por municípios
localizados numa ou mais unidades territoriais definidas com base nas Nomenclaturas
das Unidades Territoriais Estatísticas de nível III (NUTS III). Estas unidades territoriais
constam do Decreto-Lei n.º 68/2008, de 14 de abril, que as definiu para efeitos de
organização territorial das associações de municípios e respetiva participação em
estruturas administrativas do Estado e nas estruturas de governação do Quadro de
Referência Estratégico Nacional 2007-2013 (QREN)” (DGAL,2011).
De acordo com a Lei 75/2013, as atribuições das AM e das CIM são várias e vão desde
participar na elaboração dos planos e programas de investimento público com
7 A Lei n.º 44/91, de 2 de agosto, criou as Áreas Metropolitanas de Lisboa e do Porto, que integraram os municípios
da respetiva área ou região de influência.
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incidência na sua área territorial promovendo o planeamento e a gestão da estratégia
de desenvolvimento económico, social e ambiental do território abrangido até articular
os investimentos municipais de caráter territorial e participar na definição de redes de
serviços e equipamentos de âmbito de âmbito intermunicipal.
Cabe-lhes igualmente assegurar a articulação das atuações entre os municípios e os
serviços da administração central em várias áreas, nomeadamente na rede de
equipamentos de saúde, na rede educativa e de formação profissional, na mobilidade e
transportes, na promoção do desenvolvimento económico e social e na rede de
equipamentos culturais, desportivos e de lazer.
Através do conselho metropolitano e do conselho intermunicipal, compete-lhes aprovar
os planos, os programas e os projetos de investimento e desenvolvimento em várias
áreas, nomeadamente no ordenamento do território, na saúde, na educação e na
cultura e desporto.
Sobre a descentralização administrativa, a lei nº 75/2013 determina que ela se
concretiza através da transferência por via legislativa de competências de órgãos do
Estado para órgãos das autarquias locais e das entidades intermunicipais, tendo como
objetivos a aproximação das decisões aos cidadãos, a promoção da coesão territorial, o
reforço da solidariedade inter-regional, a melhoria da qualidade dos serviços prestados
às populações e a racionalização dos recursos disponíveis, sendo que “no respeito pela
intangibilidade das atribuições autárquicas e intermunicipais, o Estado concretiza a
descentralização administrativa promovendo a transferência progressiva, contínua e
sustentada de competências em todos os domínios dos interesses próprios das
populações das autarquias locais e das entidades intermunicipais, em especial no âmbito
das funções económicas e sociais”(Idem, Art.º 111.º; 112.º e 113.º).
Assim, aquela lei estabelece que o Estado deve promover os estudos necessários de
modo a que a concretização da transferência de competências assegure, entre outros,
os seguintes requisitos: o não aumento da despesa pública global; o aumento da
eficiência da gestão dos recursos pelas autarquias locais ou pelas entidades
intermunicipais; os ganhos de eficácia do exercício das competências pelos órgãos das
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autarquias locais ou das entidades intermunicipais e a articulação entre os diversos
níveis da administração.
Salvaguardando que o Estado, as autarquias locais e as entidades intermunicipais devem
articular entre si a prossecução das respetivas atribuições, a mesma lei permite que,
para o efeito, aquelas possam recorrer à delegação de competências: os órgãos do
Estado podem delegar competências nos órgãos das autarquias locais e das entidades
intermunicipais e os órgãos dos municípios podem delegar competências nos órgãos das
freguesias e das entidades intermunicipais. A delegação de competências concretiza-se
através da celebração de contratos inter-administrativos, sob pena de nulidade (Idem,
Art.º 120º).
No quadro resumo que se anexa (Anexo IV) procura resumir-se a composição, o âmbito
geográfico e os domínios de competências aos vários níveis da administração pública
portuguesa.
III – NÍVEIS DE ADMINISTRAÇÃO
III.1 – Administração Central
III.1.1 - Caracterização e condicionantes
Como se refere na introdução, segundo o relatório da OCDE de 2012 Portugal é dos
países onde as decisões são maioritariamente tomadas a nível da administração central.
À frequente afirmação política que à administração central devem caber quase
exclusivamente as leis gerais de enquadramento da atividade educativa escolar, não só
o caracter dessa legislação (decretos-lei e portarias) contradiz essa afirmação
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ultrapassando largamente o mero enquadramento, como também os normativos que
se sucedem às ditas leis de enquadramento (circulares, notas de aclaramento ou
orientação, etc.) reduzem e fragilizam as condições de gestão autónoma dos processos
educativos tanto pelas autarquias, como pelas escolas e pelos professores.
Acresce que a instabilidade e frequência na emissão de normas e orientações constitui
uma dificuldade acrescida para a capacidade de assumir, de forma sólida e continuada,
a gestão das condições e dos processos educativos das escolas, imprescindíveis à
construção e fortalecimento de rotinas, de práticas e de competências.
III.1.2 - Clarificações necessárias e identificação de zonas fraturantes
Pode dizer-se que os pontos de difícil consenso resultam de uma falta de esclarecimento
do que se deve entender por leis-quadro e o que, a partir delas, deve competir a cada
nível de administração, bem como aos profissionais (professores/psicólogos/assistentes
sociais, etc..) e como e onde se situa o imprescindível financiamento dessas
competências.
Recorrendo aos domínios de decisão explicitados no Anexo I, as principais questões que
se põem são:
- Quanto à organização do ensino : Não deverá competir exclusivamente às escolas, a
partir do enquadramento geral (lei-quadro) sobre programas e organização do ensino,
a admissão, o percurso escolar, os tempos letivos, a escolha dos manuais escolares, a
escolha dos materiais de ensino, a organização das turmas, os apoios suplementares aos
alunos, os métodos pedagógicos e a avaliação contínua dos alunos?
E a que pormenor se deve ir numa lei-quadro, quer no que se refere aos conteúdos
programáticos quer no que respeita os critérios de acesso e ingresso numa escola, em
consonância com o que devem ser as competências das equipas educativas e dos órgãos
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de coordenação e de direção das escolas e do que se deve entender por ordenamento
da rede educativa.
- Quanto à gestão do pessoal: A partir de um contrato coletivo de trabalho que defina o
recrutamento e licenciamento dos professores e dos restantes trabalhadores que
exercem a sua atividade profissional nas escolas, funções e condições de trabalho, níveis
salariais e evolução nas carreiras profissionais, qual deve ser o papel das autarquias e
das escolas? Tem sentido a atual diferenciação entre o que está estabelecido para os
professores e o que está para os outros profissionais essenciais à vida das escolas? Será
oportuno e haverá interesse e coragem em debater seriamente as vantagens e
desvantagens educativas de alguma descentralização da colocação e gestão dos
professores?
Tem também sentido, nos agrupamentos, a dependência hierárquica do pessoal não
docente ser diferenciada? Compare-se, no que se refere à efetiva capacidade dos órgãos
de gestão das escolas, com o que é o enquadramento no ensino superior ou no setor da
saúde, nomeadamente no que se refere à gestão do pessoal dos hospitais.
No que respeita ao recrutamento e licenciamento dos diretores, e a manter-se o sistema
atual, a quem deve competir a supervisão, confirmação e aceitação dos resultados
eleitorais?
A quem deve caber o desenvolvimento profissional daqueles dirigentes e dos
professores e do restante pessoal necessário à vida das escolas?
- Quanto à planificação e estruturas: Qual o papel que as escolas e as autarquias devem
desempenhar na criação ou supressão de estabelecimentos ou de ofertas educativa
(níveis de ensino e cursos), na seleção dos programas oferecidos pela escola, na
definição dos conteúdos de ensino, conceção dos exames (escolha do conteúdo, das
provas e sua administração e correção)? Parecendo que existe algum consenso para que
a administração central tenha aqui um papel relevante mas não tendo havido a esperada
revisão da rede dos municípios será que, enquanto se aguardam as Regiões
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Administrativas, não poderá caber, um papel mais interventivo às áreas metropolitanas
e às comunidades intermunicipais?
- Finalmente quanto à gestão dos recursos : Não deverá haver uma relação direta entre
quem gere os recursos físicos e humanos e a quem devem ser atribuídos os
correspondentes recursos financeiros necessários para essa gestão? Será que a
especificidade e a exigência técnica de algumas tarefas e competências atribuídas às
escolas não podem justificar a existência de serviços partilhados por vários
agrupamentos/escolas a localizar em sedes distintas em função da dimensão (geográfica
e demográfica) de escolas e municípios?
Não haverá que, previamente, clarificar o que é a escola pública e em que posição se
encontra face aos diferentes poderes decisores?
O estudo e a deliberação sobre questões como as relações hierárquicas e de supervisão,
ou de tutela e superintendência não devem, obrigatoriamente, acompanhar o debate
sobre a atribuição de competências?
É que, quer se queira quer não, é ou não é de um edifício político-administrativo que se
está a tratar e não simplesmente do “tricotado” relacional entre os intervenientes?
III.2 – Províncias, Regiões, Áreas Metropolitanas, Associações de Municípios
III.2.1 Clarificações necessárias e identificação de zonas fraturantes
A partir do enquadramento legal que consta no Capítulo II e que, de alguma forma,
constitui a caracterização e as condicionantes deste nível de administração, a primeira
questão controversa que se coloca é a das eventuais vantagens na mudança do atual
paradigma centralista da educação pública para um modelo que privilegie outros níveis
de decisão e administração, nomeadamente através do reforço do poder local (e das
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suas associações) e/ou através do reforço da autonomia das próprias unidades escolares
(agrupamentos de escolas).
Tendo em conta o quadro constitucional atual e tendo em conta que o processo de
regionalização política e administrativa está bloqueado desde o referendo negativo de
1998, a primeira opção restringe-se ao reforço do papel das freguesias e municípios e
suas associações (CIM e AM).
Ora, o reforço da intervenção educacional dos municípios é polémico, não só junto dos
executivos camarários, com uma vasta experiência de administração sectorial sem
contudo terem beneficiado dos meios financeiros necessários, mas também junto das
associações profissionais e sindicais e da população em geral, que encaram com alguma
desconfiança a possibilidade de a administração central se afastar do seu papel de
garante e regulador, assim dando livre curso a um “municipalismo educativo” micro
regulado, mas bastante limitado na resposta aos princípios constitucionais e europeus8.
Nos últimos três ou quatro anos, no contexto da crise austeritária em curso, têm
emergido como novos protagonistas as CIM e as AM. Não constituindo uma instância de
poder intermédio entre administração central e local, acabam por assumir-se como um
nível de articulação, coordenação e planificação entre (e de) vários poderes, por isso
capazes de gerar economias de escala.
No quadro da diminuição dos encargos do Estado, a organização político-administrativa
complexificou-se de tal modo que os objetivos da sua reforma9 são agora reformatar as
competências dos diferentes níveis das divisões administrativas através de novas
atuações dos Municípios, das CIM e AM, procurando a eficiência da gestão pública com
o intuito de gerar economias de escala no seu funcionamento (o que pressupõe que não
deveriam sobrepor-se nem repetir-se nas suas funções, o que não está assegurado).
8 Princípios explícitos na Carta da Governação a Vários Níveis na Europa.
9 Documento Verde da Reforma da Administração Local, Gabinete do Ministro Adjunto e dos Assuntos
Parlamentares, versão 2.40 Setembro/2011.
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Nota: Na figura, as setas representam transferência e delegação de competências originárias
A figura mostra os níveis de administração educativa e os fluxos recentes de
transferência de competências: as CIM e AM deveriam receber competências (e meios
financeiros, técnico-jurídicos e humanos) do Estado (da administração central,
desconcentrada ou não) e dos municípios, de modo a terem um campo de ação bem
claro e delimitado, que evitasse as sobreposições de competências.
Por isso, a questão mais difícil é a redistribuição de atribuições, competências e meios
financeiros, no âmbito das diversas administrações, que permita, por um lado, a
esperada articulação promovida pela CIM/AM entre os municípios e os serviços da
administração central e, por outro lado, soluções para uma mais eficiente gestão dos
recursos públicos nas áreas identificadas, tendo como critério prioritário a manutenção
ou melhoria da prestação dos serviços às populações. Ora, o que as políticas públicas
sectoriais vão demostrando, nos últimos anos, é uma menor e menos qualificada
intervenção nesses domínios, quer por parte da administração central (sobretudo ao
nível das entidades que deviam promover a desconcentração), quer por parte da
administração local e das suas associações.
ESTADO
(Administração central e desconcentrada)
CIM e AM
(Administração Local s/ competências originárias)
MUNICÍPIOS
(Administração Local c/ competências originárias)
AGRUPAMENTOS
(Administração desconcentrada)
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III.2.2 Áreas de trabalho e de negociação / concertação
Uma possibilidade de trabalho de superação das dificuldades apontadas passa pela
identificação dos domínios e dos modos de relacionamento, tanto institucionais como
informais, entre municípios, CIM e AM, governo, administração central, agrupamentos
escolares e estruturas associativas locais, ligadas ao desenvolvimento económico e
social (incluindo a educação e a cultura), ao ordenamento e planeamento do território,
ao emprego, à mobilidade e aos transportes. A este diagnóstico integrado, intersectorial
e multinível, deveriam corresponder políticas de negociação e concertação bem como
ações públicas também intencionalmente integradas.
De qualquer modo, mesmo estando longe essa visão integrada, mas tendo em conta a
experiência já desenvolvida pelas CIM e os resultados de vários estudos já elaborados,
é possível identificar um conjunto de áreas e competências da administração central
que poderiam ser exercidas prioritariamente pelas CIM, para além do que já fazem nas
questões relacionadas com a gestão de Programas de Apoio ao Desenvolvimento
Regional10.
No domínio da Educação, e reconhecendo o papel determinante desempenhado pelos
municípios em muitas das suas áreas, seria possível alargar o atual âmbito de atuação
destas autarquias e das suas associações em matéria de competências a descentralizar,
desde que se garantissem os meios financeiros e técnicos necessários, nomeadamente
em sede de lei de financiamento autárquico. Simultaneamente deveria iniciar-se um
processo de negociação relativo a outras áreas nas quais é possível iniciar novos
processos de descentralização de competências, complementando as atuais.
Nesta negociação seria de considerar a escala intermunicipal como a desejável no
exercício das competências a descentralizar, uma vez que oferece, pelo menos do ponto
de vista teórico, maiores ganhos de escala e de eficiência, não pondo em causa o nível
municipal, que representa hoje o único nível de descentralização já testado. Assim, às
10 Nomeadamente na participação no processo de contratualização da gestão de fundos estruturais.
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CIM e AM caberia jurisdição sobre as seguintes áreas educacionais (o texto que se segue
tem por base as propostas inscritas no Estudo - Piloto Comunidades Intermunicipais11):
Transporte escolar: hoje os municípios já asseguram o exercício desta competência, no
entanto com o alargamento da escolaridade obrigatória para o 12º ano o transporte
escolar ganha importância e dimensão pelo que se deverá ponderar o seu exercício à
escala intermunicipal numa lógica de economia de escala e redução de custos. O
transporte escolar reforça a importância de uma eventual gestão do transporte público
ao nível intermunicipal sendo que neste aspeto existe necessidade de descentralizar nas
comunidades intermunicipais a gestão dos transportes públicos.
Gestão de refeitórios escolares e ação social escolar: atualmente os municípios fazem a
gestão integrada dos refeitórios e da ação social escolar apenas no 1º ciclo, pelo que se
entende como desejável estender aquela gestão à nova escolaridade obrigatória,
potenciando desta forma a capacidade de gestão intermunicipal nesta matéria, com o
intuito de um melhor aproveitamento racional dos técnicos e estabilidade dos recursos
humanos afetos.
Gestão de equipamentos e de pessoal não docente: é desejável no âmbito dos novos
contratos, descentralizar nos municípios e para todos os ciclos de ensino tanto a gestão
do edificado escolar como a gestão do pessoal não docente. No entanto, esta gestão
integrada poderá ganhar escala e eficiência se for realizada ao nível intermunicipal. Tal
transferência implicaria, a montante, a transferência de poderes de planeamento e
gestão das redes de oferta de educação e formação secundária para as CIM e as AM.
Na perspetiva anterior, assume especial significado a possibilidade das cartas educativas
poderem ser elaboradas no âmbito intermunicipal, com o intuito de promover a
planificação da rede de oferta de educação e formação, pública, cooperativa e privada,
numa base territorial de NUT III. A importância advém sobretudo da reorganização da
11 DGAL (2011). Estudo-Piloto Comunidades Intermunicipais. Relatório final. Documento Verde da Reforma
da Administração Local, Gabinete do Ministro Adjunto e dos Assuntos Parlamentares, versão 2.40
Setembro/2011DELOS DE COMPETÊNCIAS, DE FINANCIAMENTO, DE
GOVERNAÇÃO, DE GESTÃO E DE TRANSFERÊNCIA DE RECURSOS
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26
rede escolar que a administração central está a levar a cabo tendo em vista a
racionalização do parque escolar e dos futuros investimentos ao nível de novos
equipamentos. A reorganização da rede escolar com base em Cartas Educativas
Intermunicipais permitiria potenciar economias significativas em especial na
recuperação do edificado escolar e na redução de custos com transporte escolar.
A existência de ganhos de escala com a transferência de competências para as CIM faz
sentido se houver uma redução nas despesas inerentes ao exercício dessas
competências nos municípios e na administração central, e se com o aumento da
eficiência da gestão, não houver perda de qualidade. Tal aferição só é possível apurando
antes o custo de cada uma das competências nos municípios.
A determinação de custos da educação em cada município é difícil dadas as disparidades
existentes para ofertas de serviços idênticos, devido às diferentes prioridades políticas
que cada município legitimamente define. Por exemplo, existem municípios que
apresentam um valor residual na gestão de transportes escolares enquanto outros,
pertencentes à mesma CIM, apresentam valores substancialmente maiores, mas que
têm forte justificação local.
Esta dificuldade demonstra uma das consequências da transferência de competências
para as CIM, na medida em que passará a existir uma igual prioridade na satisfação das
necessidades no conjunto dos municípios que a integram. Daí a importância da
negociação entre Estado, Municípios e CIM, sobre a natureza das novas competências
das associações, que devem ser de coordenação intermunicipal e não de direção e,
sendo originariamente municipais, só devem ser transferidas através da delegação
formal (contratualizada) de competências.
Estas dificuldades não devem impedir que, ao nível intermunicipal, se desenvolva o
planeamento integrado da rede de provisão de serviços públicos de proximidade, que
assegure níveis de acesso e qualidade adequados à evolução de cada território
intermunicipal num determinado horizonte temporal, apostando desta forma na
reorientação de cartas intermunicipais enquanto instrumentos de integração de
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políticas públicas de âmbito social, educativo, desportivo e de equipamentos de
desenvolvimento económico.
III.3 – Município
III.3.1 - Caracterização e condicionantes
Cada vez mais responsabilizados pelo desenvolvimento das suas comunidades, os
municípios devem assumir-se como produtores e mentores de políticas e projetos em
todas as áreas que não sejam legalmente excluídas da sua intervenção, prosseguindo
assim os interesses próprios das suas populações. Ora a educação não pode ficar fora
deste processo, pela sua óbvia influência no desenvolvimento social e humano.
Neste sentido, os municípios não podem ser considerados como simples pessoas
coletivas públicas, ou seja, como entidades meramente administrativas. Eles são o pilar
e a charneira da construção do poder local democrático e, portanto, o seu carácter
político deve ser reconhecido e estimulado.
Não é, contudo, isso que se tem passado. O paradigma dominante declarado (mas mal
realizado) da política educativa tem sido o da centralidade da escola na produção de
políticas. É nesse paradigma que entroncam, por exemplo, o reforço da autonomia da
escola e a discutível ideia de se tomar a escola como se fosse uma cidade ou autarquia,
dotada de um parlamento e um governo. Em contrapartida, as ideias de projeto
educativo local ou de política educativa de território nunca tiveram qualquer
concretização legislativa, apenas aparecendo vagamente mencionadas nos preâmbulos
e discursos.
Cada município poderá ter condições para adotar políticas educativas próprias, com
opções e prioridades adequadas às aspirações, necessidades e interesses locais, embora
evidentemente dentro do respeito pelas orientações nacionais. Ou seja, essas políticas
devem concretizar um projeto educativo que aja sobre a população jovem e adulta, com
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uma visão transformadora do seu quadro de vida, das suas capacidades e mesmo das
suas referências.
E que políticas devem ser essas? Sem particularizar demasiado, pode dizer-se que elas
deverão abarcar as seguintes áreas: a) definição e planeamento de ofertas educativas
de conceção local; b) construção e gestão de equipamentos e serviços educativos locais;
c) apoio às escolas da comunidade e aos estudantes; d) valorização das organizações
educativas e das associações locais; e) incentivo à participação democrática (ela mesma
geradora de importantes aprendizagens).
Para desenvolverem programas nestas áreas, os municípios não precisam do
beneplácito, nem dos regulamentos do Ministério, exceto quando se trate do sistema
escolar formal.
Nos termos da Constituição da República, cabem ao Estado, designadamente, as
incumbências de assegurar o ensino básico universal, obrigatório e gratuito (art.º 74º,
nº 2, alínea a) e de criar uma rede de estabelecimentos públicos de ensino que cubra as
necessidades de toda a população (art.º 75º, nº 1). Deste modo, o sistema escolar é da
responsabilidade do Estado, pelo que neste domínio não se admite outra solução que
exceda o quadro da descentralização administrativa, ou seja, uma solução de execução
local do sistema escolar concebido a nível nacional.
Os municípios poderão ser encarregados, por lei, de uma parte importante dessa
execução, mas é normal que tenham de sujeitar-se a um quadro regulamentar vindo de
cima. Neste sistema, o que se pode discutir é a eventual excessiva especificidade desse
quadro regulamentar, que transforme os municípios em oficiais às ordens do Estado ou
mesmo em meros amanuenses. Outro aspeto que se pode também discutir é a
tendência que o poder central tem para não respeitar as leis que dele próprio emanam
(veja-se o caso do reordenamento da rede educativa e do processo de agregação de
agrupamentos de escolas), lançando a confusão no sistema e tolhendo o seu
desenvolvimento.
Ora, a pergunta que se impõe é se se pretende alterar este quadro constitucional, dando
aos municípios poder normativo sobre o sistema escolar e mesmo o poder de gerir o
sistema escolar local? Se sim, é necessário fazer previamente uma revisão constitucional
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29
porque os municípios, embora sejam entes públicos (que prosseguem fins públicos), não
fazem parte do Estado. Ou, pelo contrário, pretende-se acentuar uma descentralização
de base institucional, apostando no reforço da autonomia de cada escola, sem
obediência a uma política de território (talvez até para permitir certas políticas de
competição e concorrência entre escolas e a famosa política de escolha da escola pelos
pais)?
Mesmo que não se pretenda nem uma coisa nem outra, é certo que uma clarificação se
impõe sobre a arquitetura dos poderes locais da educação. A atual Lei de Bases do
Sistema Educativo é demasiado antiga e não prevê mais que generalidades insuficientes
sobre os intervenientes do sistema educativo local e as suas relações. Houve muitas
ideias que o tempo veio impor e que ainda não foram harmonizadas de modo a criar um
sistema coerente, inteligível.
III.3.2 - Clarificações necessárias e identificação de zonas fraturantes
Para analisar a relação escola-município, num quadro de descentralização da educação,
importa equacionar a questão da autonomia da escola num quadro de reforço dos
poderes dos municípios sobre o sistema escolar. Esta questão constitui a maior
preocupação dos professores e dos dirigentes escolares, e é uma questão que não está
clarificada e analisada, constituindo-se como constrangimento para o desenvolvimento
de dinâmicas locais mais efetivas.
Além das dúvidas e inquietações que este assunto encerra, há outro constrangimento
antigo: a falta de relacionamento entre escolas vizinhas. O maior constrangimento ao
desenvolvimento do sistema educativo local é a falta de hábitos de colaboração das
escolas umas com as outras. Poderia pensar-se que a criação dos agrupamentos (e das
suas agregações) viria melhorar essa situação, mas isso está por demonstrar. A melhor
maneira de vencer esse bloqueio é trabalhar para a construção de uma lógica
comunitária na definição de políticas educativas locais e da administração local da
educação, de que as escolas sejam coautoras e corealizadoras, o que, naturalmente,
implica negociação e concertação, mas é disso que se faz a democracia.
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30
Se se deve “evitar uma abordagem centrada na ação das autoridades governamentais”,
pode haver vantagem em assumir uma lógica de ação pública, “em que as decisões são
tomadas em rede, em várias instâncias, e em função de múltiplos interesses e
objetivos”. Esta fórmula pode ser muito interessante e aparentemente compatível com
a criação das desejadas dinâmicas locais, mas impõe a clarificação prévia do papel do
Estado no sistema escolar e das suas relações com as organizações educativas. É que o
Estado tem responsabilidades constitucionais, que o obrigam como principal
responsável pelo sistema.
Mas em que se traduz essa responsabilidade principal? Deve a provisão da educação ser
remetida para as redes sociais circunstanciais, que em cada momento e em cada local
se manifestem, ficando o Estado a desempenhar esse papel de chapéu do sistema, que
simplesmente o define e o avalia?
III.4 – Da Escola Pública aos Mega agrupamentos
III.4.1 Traços atuais do funcionamento e gestão
Ao contrário dos anos 9012, os sucessivos governos portugueses, desde 2002 até ao
presente, implementaram, por razões diversas que se prendem com o papel do Estado,
processos de recentralização política e administrativa da educação.
Durante esta última década, ainda sem as pressões austeritárias produzidas pela crise
da dívida que iria manifestar-se entre nós em 201113, aquele processo caracterizou-se
pela combinação, aparentemente paradoxal (Lima, 2007), de estratégias de
reconcentração levadas a cabo pela formação generalizada de agrupamentos de escolas
12 Nos primeiros 20 anos da Democracia em Portugal, a principal tarefa do Estado em matéria de educação consistiu em fazer chegar a todos a escolarização, alargando-a nos segmentos a montante e a jusante da curta escola obrigatória herdada do fascismo. Até ao final da década de 90 coexistiram políticas que claramente favoreciam a autonomia, a descentralização e a territorialização educativa (TEIP, rede pública de educação pré-escolar) com outras que mantinham a centralização férrea do sistema (concursos nacionais de recrutamento de professores e educadores).
13 Crise financeira, conhecida como “Crise do Subprime”, que atingiu o ponto alto nos Estados Unidos em 2008.
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horizontais (abrangendo apenas o 1º ciclo do ensino básico e as ofertas de educação
pré-escolar) e verticais (integrando os três ciclos do ensino básico), mas de pequena e
média dimensão humana e geográfica, com estratégias de desconcentração previstas
num novo reordenamento da rede de ofertas educativas que pressupunha novos graus
de autonomia às escolas agrupadas e nova delegação de competências para os
municípios.
Em 2003, na esteira da estratégia de territorialização educativa do final dos anos 9014,
os argumentos então aduzidos pelo governo15 para a rápida implementação deste
reordenamento privilegiavam o favorecimento de um percurso sequencial e articulado
dos alunos abrangidos pela escolaridade obrigatória (9ª ano ou 15 anos de idade) numa
dada área geográfica, a superação de situações de isolamento de estabelecimentos e a
prevenção da exclusão social, o reforço da capacidade pedagógica dos estabelecimentos
que integravam o agrupamento e o aproveitamento racional dos recursos, bem como
“a garantia da aplicação de um regime de autonomia, administração e gestão e a
valorização e o enquadramento de experiências” (Despacho nº 13.313/2003).
Tudo isto representava um investimento público na educação nunca anteriormente
conseguido (médias de 5,2% do PIB entre 2002 e 2005 e 4,3% entre 2005 e 2008) a que
se seguiram, entre 2008 e 2010, valores novamente ascendentes (entre os 4,5% e os 5%
do PIB, respetivamente)16. A avaliação positiva deste investimento manifesta-se no
relatório do CNE, 2012, onde são destacados resultados interessantes em matéria de
qualidade e equidade da educação: a democratização do acesso a todos os níveis de
ensino é uma realidade; há um crescente reconhecimento internacional da qualidade
dos nossos diplomados; os resultados dos testes internacionais realizados pelos alunos
Portugueses são acentuadamente melhores, quer em termos de equidade (PISA 2009),
14 Barroso, 2003.
15 XV Governo Constitucional, 2002/2004, presidido por Durão Barroso sendo Ministro da Educação David Justino.
16 Nabarrete, 2013.
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quer em termos de qualidade, designadamente em matemática, leitura e ciências no 1º
ciclo do ensino básico.”17
Contudo, a partir de 2011, tal como noutros países europeus sujeitos a medidas de
redução do défice e da dívida, assistimos a uma das estratégias mais fortes do processo
austeritário de “ajustamento financeiro, económico e social”, que consiste na
reconfiguração do Estado feita através da redução das finalidades sociais (educação,
saúde e segurança social) e da capacidade de resposta qualificada dos seus diversos
serviços.
Com este objetivo, o atual XIX Governo, em matéria de administração educativa,
desenvolve um programa de desinvestimento e de transferência do serviço público para
o sector privado em nome dos “ganhos de eficiência”18.
Se o desinvestimento é patente no relatório que acompanha o Orçamento de Estado
para 2013, onde se verifica que a despesa em educação desce para os 3,8 % do PIB, um
valor idêntico ao de 1989, a crescente desresponsabilização estatal e a simultânea
preparação da transferência do serviço público de educação para os designados
“stakeholders” manifesta-se através da diminuição da oferta pública em todos os níveis,
dos despedimentos massivos de pessoal docente e não docente e dos novos aumentos
do número de alunos por turma, fatores que contribuem para o declínio generalizado
da qualidade educativa e dos resultados escolares.
Neste programa de reforma e limitação da ação do Estado, ação essa considerada uma
das principais razões da crise socioeconómica atual, a teoria da “escolha pública” e as
suas consequentes conceções elitistas de democracia jogam um papel determinante na
emergência do mercado da educação e formação e na reconfiguração do Estado como
Estado-avaliador, supervisor ou estratega 19. Segundo Licínio Lima, “[é] exatamente
17 Relatório do Conselho Nacional de Educação, “Estado da Educação em 2012. Autonomia e Descentralização”.
18 Ao contrário da eficácia de um processo, característica que relaciona os objetivos com os resultados, a eficiência mede a relação dos meios postos ao dispor desse processo com os resultados obtidos.
19 Lima, 2013.
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neste contexto que a provisão de educação por parte do Estado cede o seu lugar à defesa
do princípio da “livre escolha”, pretensamente capaz de libertar os indivíduos das
sobredeterminações estatais e de regenerar as aprendizagens individuais, finalmente
consideradas úteis e responsáveis, competitivas e competentes, legitimando diferentes
estatutos, destinos e papéis sociais a partir da “ideologia da competência”, tal como a
produção de novas desigualdades sociais.”
Com a mesma justificação da melhoria dos “ratios de eficiência”, o governo reforça o
controlo centralizado das despesas de funcionamento das escolas e da administração
educativa em geral, através do designado “aprofundamento do processo de
reorganização da rede escolar”20 que consiste em criar novas “unidades orgânicas de
administração escolar” (idem), de maior dimensão, por agregação dos anteriores
agrupamentos, todos entretanto já verticalizados no âmbito da educação pré-escolar e
dos três ciclos do ensino básico, com as escolas de ensino secundário que coexistiam
com aqueles agrupamentos em situação de não agregação.
Surgem assim os designados “Mega agrupamentos” (unidades com mais de 2.500
alunos) cuja escala administrativa, financeira e de relevância sociopolítica, permitem,
por um lado, a dispensa das anteriores estruturas desconcentradas da administração
educativa (as direções regionais de educação), e por outro lado, permitem e aconselham
o controlo remoto, frio e anónimo, realizado através da intensificação do uso de meios
eletrónicos de gestão das principais variáveis educativas sistémicas (desde as matrículas
e o número de alunos por turma, até ao recrutamento de professores e pessoal não
docente, passando pelo planeamento da oferta da rede escolar e pelo fornecimento de
bens e serviços).
Importa referir, no entanto, que este passo em direção ao abismo burocrático do
sistema público aproveitou as políticas de contraciclo desenvolvidas entre 2009 e 2011
pelo XVIII Governo que, em matéria de educação, conduziram a despesa novamente ao
20 Despacho nº 5634-F/2012, de 26 de Abril de 2012
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patamar médio dos 5% do PIB21 e que, em termos de reconfiguração da rede, já se
propunham “adaptá-la progressivamente ao objetivo de uma escolaridade obrigatória
de 12 anos para todos os alunos”, adequando as condições das escolas “à promoção do
sucesso e ao combate ao abandono escolar” através de “percursos sequenciais e
articulados para os alunos abrangidos numa dada área geográfica”, configurando-se
assim os primeiros grandes agrupamentos inter-ciclos e inter-níveis de educação e
formação.
Os Mega agrupamentos constituem exemplos fortes daquela recentralização. As
anteriores escolas de ensino básico e secundário deixam de existir enquanto
estabelecimentos de ensino com registo administrativo e órgãos próprios e passam a
ser partes periféricas do nóvel agrupamento, publicamente representado pela respetiva
sede e diretor.
III. 4. 2 Como surgiram os Mega agrupamentos
O processo histórico que conduziu ao aparecimento e generalização recentes dos
agrupamentos - e da sua versão mega - passou por várias fases com justificações
político-administrativas diversas.
Os TEIP22, associações de escolas criadas em 1996 para fins específicos e com identidade
jurídico-administrativa, sucederam às associações que tinham em vista a criação de
centros de formação contínua de educadores e professores (DL nº 249/92, de 9 de
Novembro) e quase coincidiram com a criação dos primeiros agrupamentos de escolas.
Três lógicas de associação para fins específicos foram, portanto, contemporâneas, o que
pode ser revelador de que o poder central não tinha – tal como hoje - uma noção de
como organizar a administração local da educação.
21 Sobretudo pelo efeito conjugado das diversas medidas de renovação de instalações (edifícios), de equipamentos, de mobiliário e de material didático levadas a cabo pela em presa pública Parque Escolar.
22 O Projeto dos Territórios Educativos de Intervenção Prioritária foi criado pelo XIII Governo Constitucional
(presidido por António Guterres, sendo Ministro da Educação, Marçal Grilo) através do Despacho nº 147-B/ME/96.
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35
As suas características associativas e integradoras, com algum grau de autonomia nas
decisões do conselho pedagógico, inspiraram a conceção e a generalização dos
agrupamentos de “geometria variável” (podiam ser horizontais, só com escolas do 1º
ciclo e jardins de infância, ou verticais, com os três ciclos e pré-escolar) consagrados dois
anos depois, através do Regime de Autonomia, Administração e Gestão das escolas
públicas (RAAG)23.
No entanto, apesar dos resultados razoáveis conseguidos na compatibilização da
reorganização da rede de oferta com as características de proximidade da procura de
educação e formação, a partir de 2003, como já referimos no ponto anterior, este
processo sofreu profundas alterações com a determinação legal24 da obrigatoriedade
da reorganização da rede se fazer apenas por via de agrupamentos verticais, ou seja,
associando a educação pré-escolar e os três ciclos do ensino básico. Ficava por agregar
uma parte substancial das escolas que ofereciam o ensino secundário.
Se, nos modelos de desconcentração anteriores, já estava presente a preocupação
política da administração central não perder o controlo administrativo e pedagógico
sobre um sistema público que se tinha complexificado em quantidade e na diversidade
das suas ofertas e resultados escolares, com esta determinação de verticalização, a
dupla centralização torna-se muito forte.
Em pouco tempo, 12.663 estabelecimentos de educação foram reduzidos a 765
agrupamentos, dos quais 85,5% de tipo vertical. Deste modo, cada escola agrupada
passou à categoria de “subunidade de gestão”, vendo os seus órgãos de representação
e gestão deslocalizados para a escola-sede do agrupamento, sem se perceber qualquer
ganho em termos da sua autonomia. Ao invés, o que terá saído reforçado terá sido o
carácter periférico da escola, já não apenas face aos órgãos do poder central, mas
também face à própria sede do agrupamento, a qual se constitui como a verdadeira
“unidade de gestão”. Licínio Lima (2007)
23 Decreto-Lei nº 115-A/98, de 4 de Maio, 24 O Despacho n.º 13 313/2003, de 13 de Junho (2.ª série), entre outras alterações, estabelecia que “só serão admitidos agrupamentos horizontais em casos excecionais, devidamente fundamentados pelo diretor regional de educação
respetivo.”
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36
Ficavam assim criadas as condições para, após dez anos de vigência conturbada do
primeiro regulamento, surgir em 2008 um segundo RAAG25 de que resultou, por um
lado, uma conceção de autonomia consideravelmente mais circunscrita a dimensões
técnicas e operacionais, com um ordenamento interno mais diretivo e centrado na
figura do diretor e, por outro lado, uma nova reorganização da rede através da
integração das escolas secundárias nos agrupamentos verticais anteriores.
Num primeiro momento, durante os XVII e XVIII Governos, aquela intenção é justificada
sobretudo com a criação de condições que permitissem o cumprimento geral da nova
escolarização obrigatória até aos 18 anos, através da diversificação das ofertas
educativas e formativas e da sequencialidade curricular entre ensino básico e ensino
secundário nas suas várias vias. Num segundo momento, já após o estourar da crise da
dívida soberana e em plena execução da austeridade imposta pelas entidades que
emprestaram verbas ao estado português, a justificação para a concretização forçada
dos Mega agrupamentos, embora mantendo a retórica anterior, acrescenta-lhe o
argumento da necessária austeridade assumida num quadro ideológico neoliberal,
através dos critérios da eficácia, da eficiência, da competitividade entre escolas, do
direito de escolha individual e familiar, enfim da abertura deste domínio às leis do
mercado.
De acordo com informações públicas governamentais, o processo de criação dos Mega
agrupamentos foi o seguinte:
1ª Fase 2010 /2011 87
2ª Fase 2011/2012 150
3ª fase 2012/2013 67
4ª Fase 2013/2014 18
Total 322
Nesse processo, muitas escolas foram agrupadas contra a sua vontade, contra a vontade
dos pais e até contra a vontade dos municípios onde se inseriam (como é o caso, entre
outros, dos municípios de Braga, Guimarães, Barreiro, Faro, Leiria)26.
25 Decreto-Lei nº 75/2008.
26 Fonte http://www.jornaldenegocios.pt/economia/educacao/detalhe/mega_agrupamentos
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37
Por outro lado, embora o MEC, em comunicado, tenha dito que os novos agrupamentos
“têm uma dimensão equilibrada e racional”, passaram a existir muitas unidades com
mais de 3000 alunos. Pondo em crise aquela justificação, os três agrupamentos com
maior número de alunos situam-se nos municípios de Alcobaça (4156), Sintra (4.104) e
Lisboa (3.953)27 .
Aliás, em 2010, a constituição de 87 Mega agrupamentos com a justificação de
“racionalizar a gestão dos recursos humanos” levou a uma redução de 5000 docentes.
Só nesse ano, através da chamada a racionalização da rede escolar, o Governo esperava
poupar 54 milhões de euros.28
III.4.3 Algumas características funcionais dos agrupamentos de escolas
É nas características de funcionamento das novas unidades de administração escolar, e
sobretudo nos Mega agrupamentos, que se encontram os principais traços da
recentralização política e administrativa da educação. É também nesses traços que se
sustenta a crescente dualização da oferta educativa pública e a criação de um
correspondente mercado educativo segmentado.
No funcionamento interno de todos os agrupamentos há três grandes temas:
1) O processo e os resultados da constituição da nova unidade;
2) O modo como as orientações superiores foram e são implementadas;
3) Os problemas decorrentes quer das atuais medidas de política educativa, quer das
orientações para a administração e gestão escolar.
Em cada um destes temas há categorias, subcategorias e indicadores que se procuram
caracterizar e identificar no quadro resumo que se anexa (Anexo V).
Não cabendo nos objetivos e na economia deste texto uma análise aprofundada de cada
uma das categorias, subcategorias e indicadores, apenas iremos referir resumidamente
um indicador significativo, relacionado com os problemas atuais de administração
27 Fonte http://www.publico.pt/sociedade
28 idem
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38
escolar, que é a concorrência entre agrupamentos enquanto sinal emergente do novo
mercado educativo.
Já no ponto anterior se indicou que os atuais Mega agrupamentos resultaram da fusão
administrativa obrigatória de anteriores unidades orgânicas, elas próprias já
constituindo agrupamentos verticais do ensino básico estabilizados há vários anos, com
escolas secundárias ainda mais estáveis do ponto de vista pedagógico administrativo e
financeiro. Umas e outras já tinham construído uma cultura escolar e um clima de
trabalho interno adequados aos respetivos projetos educativos de escola e
supostamente validados pela avaliação externa dessas unidades. Umas e outras
também já tinham adquirido um lugar próprio no contexto local da oferta e da procura
de educação.
A fusão obrigatória daquelas unidades destruiu os respetivos projetos educativos de
escola e planos de atividade, ambos com uma perspetiva temporal alargada e
estratégica, alterou as suas rotinas, impôs a necessidade de elaboração e
implementação de novos regulamentos internos, de novas culturas organizacionais e de
novas lideranças de topo e intermédias e promoveu uma nova distribuição das
chamadas áreas de influência, necessárias à regulação da oferta e da procura da
educação.
Entre outras razões de natureza estratégica da administração central29, a redução
acentuada de cargos dirigentes, de órgãos estatutários de representação e participação
dos vários atores, de coordenações intermédias e de créditos horários para múltiplos
fins resultantes da fusão, justificou a diminuição das verbas de funcionamento corrente
por comparação com aquilo que eram os orçamentos das unidades escolares anteriores.
Esta diminuição de investimento educativo estatal, embora superiormente designada
de racionalização da despesa e justificada também pelo período de austeridade vigente,
conduziu as novas grandes unidades escolares a uma gestão centrada na obtenção de
mais-valias (financeiras e/ou sociais) que superassem a perda de receita.
29 Nomeadamente o aumento do número de alunos por turma e as alterações às regras da composição de turmas que
integram alunos com necessidades educativas especiais e com dificuldades de aprendizagem.
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39
Assim, por um lado, todas as anteriores unidades escolares passaram a estar na situação
de dependência exclusiva da nova repartição de verbas decidida na escola-sede do Mega
agrupamento, perdendo assim a autonomia relativa que anteriormente detinham, e por
outro lado a escola-sede passou a estar ela própria muito dependente da estratégia de
autofinanciamento junto das famílias que a procuram, da atratibilidade da sua oferta
educativa, dos resultados escolares obtidos, do tipo de população escolar abrangida, das
parcerias com outras entidades (empresas, autarquias locais, instituições particulares
de solidariedade social, etc.) e sobretudo, do êxito de candidaturas a programas e
projetos de financiamento em domínios diversos, de âmbito nacional e europeu.
Tal situação representa uma nova dificuldade na avaliação multidimensional, reflexiva
qualitativa e formativa que devia presidir ao funcionamento de qualquer escola. Há uma
nova hegemonia das preocupações gestionárias de cariz acentuadamente concorrencial
ao nível externo (entre agrupamentos), e prioritariamente hierarquizado, competitivo e
sancionador ao nível interno.
Um dos traços mais impressivos desta nova forma de administração pública é a aberta
concorrência entre agrupamentos na procura de mais, melhores e mais favorecidos
(económica e culturalmente) alunos, o que dificulta, a nível sistémico, a garantia dos
direitos de todos os alunos à conclusão da nova escolaridade obrigatória (ensino
secundário ou até aos 18 anos), à integração em turmas regular e socialmente diversas,
à não segregação e marginalização precoce e forçada para experiências pedagógicas não
democráticas, ou para vias e percursos educativos socialmente menosprezados.
Já com alguma nitidez, emerge assim um novo contexto educativo global marcado pela
segmentação da oferta e da procura em torno de dois grandes polos: por um lado, os
agrupamentos competitivos, que desde muito cedo e através da forte seleção de alunos
logo nos primeiros anos de escolaridade, garante elevados rendimentos escolares e o
prosseguimento de estudos para níveis superiores através de currículos
academicamente muito valorizados, e os agrupamentos periféricos que, embora com
uma população discente heterogénea, acolhem sobretudo aqueles que o processo de
seleção dos anteriores vai rejeitando através da diversificação precoce das suas ofertas
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40
curriculares e, sobretudo, da valorização social da sua relação com as comunidades que
lhes são mais próximas.
Ficam, assim, criadas as condições para a dualização do sistema e, por essa via, para o
surgimento de largas concessões ao mercado educativo, quer através da gestão privada
de alguns agrupamentos escolares públicos (os primeiros), com a consequente
passagem de alguns (os segundos) para a gestão direta municipal, quer através do
incentivo à privatização de outros por “natural” agregação a estabelecimentos de ensino
privado já existentes ou a criar. Em qualquer caso, poderá estar em risco, neste
processo, a finalidade constitucional do sistema educativo português.
III.4.4 – Pistas de trabalho/atuação e áreas de negociação/concertação
As políticas educativas concretas são concebidas e geridas pelas autoridades
governamentais como se as escolas fossem apenas espaços de aplicação de normas
legais, quando na verdade são instâncias de ação pública onde as políticas se declinam
em múltiplas variantes, de acordo com as ordens locais que se instituem em função do
jogo político local e organizacional.
A descentralização implica simultaneamente o reforço da intervenção municipal na
definição de políticas locais de educação e na administração da provisão do serviço
público de educação, mas também o reforço da autonomia das escolas e dos poderes
dos seus órgãos de direção e gestão.
Os processos de promoção da autonomia das escolas têm de envolver as dimensões
clássicas que concretizam a provisão da educação e que constituem fontes de fratura:
os recursos humanos (recrutamento nacional ou local), o desenvolvimento do currículo
(o currículo nacional mínimo), o financiamento (orçamentos globais e plurianuais,
negociados, fontes de financiamento) e a própria estrutura orgânica de cada escola
(maleabilidade da organização interna).
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41
O problema central na definição de uma estratégia política para a educação consiste em
evitar uma abordagem centrada na ação das autoridades governamentais, ou seja,
evitar que as medidas de política se organizem fundamentalmente em torno de
legislação e de normativos produzidos na administração central da educação.
Há toda a vantagem em abordar a política pública numa lógica de ação pública, em que
as decisões são tomadas em rede, em várias instâncias, e em função de múltiplos
interesses e objetivos e em que as escolas são um parceiro importante e fundamental.
Tudo parece aconselhar que se deve evitar uma ação política centralista de carácter
pombalino centrada na uniformidade das soluções de confunde homogeneidade com
igualdade. Deve favorecer-se a negociação local e organizacional, soluções diversas em
função de dinâmicas locais específicas, a contratualização da administração da provisão
do serviço em função de projetos educativos locais inovadores e fomentadores da
participação social.
Não há que ter medo da diferenciação da oferta resultante da multiplicação de políticas
locais, com grande potencial de prestação de contas, reforçando-se os instrumentos de
avaliação externa e de controlo social.
A concertação social em educação deve ser considerada um ponto central da condução
das políticas públicas, entendendo-se que tal concertação deve assumir uma natureza
muito ampla não se circunscrevendo às tradicionais formais de negociação politico-
sindical.
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42
IV- REGULAÇÃO E FINANCIAMENTO
IV.1. Formas de regulação do sistema e das organizações educativas
Na era da globalização os estados nacionais necessitam encontrar o seu próprio lugar e
capacidade de ação num universo crescentemente marcado pela competição
internacional e pela complexificação dos níveis e processos de influência, decisão e
coordenação. No caso português, esse imperativo tem-se traduzido em dois
movimentos fundamentais: a adoção de novas formas de governação da educação e a
crescente europeização das políticas educativas. No entanto, nenhum desses
movimentos tem sido linear nem progressivo, fundindo-se com especificidades da
estrutura, cultura, tradição política e situação económica e política nacional. Apesar
disso, esses movimentos alteraram, profundamente, as visões do mundo e da educação
em Portugal e a relação entre os atores que, tradicionalmente, desempenhavam o papel
de protagonistas na definição e implementação das políticas de educação e de
formação.
IV.1.1.Globalização, governação e “novas ortodoxias em educação”
Nas últimas décadas do séc. XX o desenvolvimento das políticas públicas começou a ser
influenciado por uma agenda neoliberal, assente num núcleo restrito de premissas que
alguns autores designam por “novas ortodoxias em educação”30, envolvendo uma
ligação estreita entre economia e educação, o controle estatal sobre os áreas
curriculares e de aprendizagem dos alunos consideradas mais relevantes para a
30 Carter & O’Neill, 1995; Ball, 1998,
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43
economia do conhecimento e a promoção de diversas formas de redução dos custos
em educação (privatização de serviços , subcontratação , escolha parental alargada).
Essa intencionalidade começou por ser expressa de forma bastante explícita nalguns
países, enquanto noutros dominavam os apelos à “modernização da educação” e à
“autonomia da escola31”. Em Portugal, a presença da nova “ortodoxia da educação”, que
começou por se manifestar de forma muito mitigada nos anos 80, constitui atualmente
o eixo central do discurso e da definição das políticas públicas, que apresentam o
contexto de crise económica e financeira como fator de legitimação acrescida. Verifica-
se, simultaneamente, uma crescente marginalização dos princípios fundamentais que
devem presidir à escola pública e à responsabilidade do Estado nesse domínio
(equidade, cidadania, justiça social). Aliás, a racionalidade instrumental e económica
que preside à agenda política atual tende a apresentar o funcionamento democrático
das organizações educativas, não como uma dimensão fundamental do
desenvolvimento pessoal e social ou como um requisito de “sociedades avançadas”,
mas como um obstáculo potencial à eficácia e qualidade das mesmas. É nesse contexto
que deve ser entendida a apologia das “liderança fortes” e a defesa dos princípios e as
virtudes da gestão privada, paradoxalmente tão “iluminada” (visão) quanto pragmática
(rapidez, eficiência, eficácia). A participação dos atores, por sua vez, é objeto de uma
significativa redefinição. Assim, por um lado, é equiparada às dimensões de
autorregulação e de “empreendorismo”, num quadro de valores dos atores sempre
convergente com os objetivos organizacionais e com os imperativos do mercado. Por
outro lado, é apresentada como sinónimo da livre escolha dos clientes, num número
sempre crescente de áreas: escolha da escola, diversificação da oferta educativa,
financiamento da procura. Em qualquer das circunstâncias , tende a ser limitada a por
processos de prestação de contas (“accountability”) de cariz gerencialista:
“performatividade” de alunos, escolas e professores; empregabilidade de cursos e vias
31 Ball, S. & Van Zanten, 1998, Dias, 2008,
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44
de ensino; maximização dos resultados e da eficiência organizacional; cumprimento de
metas e objetivos contratualizados.
IV.1.2. A hiperburocratização da administração educacional e o papel das plataformas
informáticas
A rápida expansão de formas de controlo “gerencialista” que acabamos de descrever
está longe de significar, em Portugal como noutros contextos 32, o fim do controle
burocrático em nome do qual as mudanças são conduzidas. Com efeito, a apropriação
“gerencialista” de algumas aspirações democráticas - autonomia das escolas,
desconcentração e descentralização da ação educativa - legitima e permite a
recentralização administrativa do sistema, realizada através dos poderosos meios
informáticos hoje usados pelo “new public management” educativo. De fato, como
alguns autores referem33, a desconcentração e contratualização da autonomia é
acompanhada por novos instrumentos de gestão da informação que nos últimos anos
configuram uma situação de “taylorismo informático que cava um ainda maior fosso
entre a conceção e a execução, reduzindo frequentemente os órgãos de gestão escolar
a simples dispositivos ao serviço da burocracia central para quem mais e melhor
informação possibilitam maior controlo.”
Em que consiste aquele taylorismo informático? Na simples divisão, sequencialização e
controlo de um conjunto nuclear de funções de administração e gestão escolares, que
tem por base plataformas informáticas (concebidas por empresas especializadas, que
geralmente detêm os direitos – e os segredos tecnológicos – sobre a conceção, a
manutenção e a formação dessas plataformas e programas) que ligam em rede nacional
todas as sedes de agrupamento.
32 Grimaldi e Serpieri, 2013
33 Lima, 2014
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45
É a escala e o preço dessas plataformas que ajuda a legitimar também a criação de Mega
agrupamentos: quanto menor for o número de nós principais da rede de utilizadores (os
nós principais são apenas as escolas-sede dos agrupamentos), maior é a eficácia e a
eficiência desse aparelho de controlo. Ao mesmo tempo, menor é o número de
funcionários que no terreno – nas escolas-sede – as utiliza e que, por isso, é mais
facilmente responsabilizado por qualquer “ação-desviante” dos seus objetivos e
métodos. Por outro lado, também são menores os encargos com a manutenção do
sistema e com a formação específica para os poucos que têm acesso a cada um dos
programas.
Se inicialmente o controlo informático se concentrava na monotorização das metas
estabelecidas e dos objetivos contratualizados, atualmente são cada vez mais reduzidas
as áreas da administração e gestão escolares que escapam à normatividade, à
formatação e ao controlo burocrático das poderosas plataformas.
De facto, desde o apuramento de vagas de professores, respetivos concursos e gestão
do serviço docente (que inclui as juntas médicas, o tempo de serviço ou a informação
sobre regras e procedimentos), até aos resultados escolares dos alunos (e todo o
procedimento relativo às avaliações sumativas internas e externas), passando pelo
recrutamento de pessoal não docente, pelas refeições escolares, pela preparação e
informação relativa a exames e outras provas nacionais, até à informação e gestão de
instalações e equipamentos escolares, entre tantos outros elementos (nomeadamente
as circulares, os documentos de apoio à gestão e a recolha de dados de periodicidade
regular e sistemática) são agora processados digitalmente e estandardizados, em regra
sujeitos a prazos e horários de consulta e resposta que devem ser cumpridos sob a nova
ameaça de o “sistema bloquear” ou “ficar automaticamente indisponível” caso o minuto
ou o número de caracteres seja ultrapassado.
Não surpreende, por isso, que alguns atores considerem que estamos perante um
fenómeno de hiperburocratização da administração educacional34 que não se limita ao
34 Lima, 2012,
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46
desenvolvimento da mesma, mas é marcada por uma significativa transformação do
próprio processo burocrático:
“…A uma burocracia clássica, mecânica e formalista, sucederia….uma burocracia
parcialmente desmaterializada, admitindo, simultaneamente, elementos de
descentralização de certo tipo e novas formas de centralização e de telecontrolo, ou
controle a distância. Seria uma burocracia mais acelerada, capaz não apenas de uma
presença ubíqua, mas também de operar uma compressão do tempo e de aumentar
exponencialmente as suas capacidades de cálculo, de mensuração e de matematização
da realidade social e, ainda, de registo e “gravação” do real, individual e coletivo”.35
IV.1.3.Europeização das políticas educativas
A afirmação de novas “ortodoxias” e formas de governação da educação não
constituem, contudo, as únicas mudanças nos processos de regulação que se tem
verificado em Portugal nas últimas décadas. Diversos autores têm sublinhado e
caracterizado a crescente europeização das políticas educativas que se tornou mais
visível a partir da cimeira de Lisboa (2000) e que se faz sentir em praticamente todos as
áreas e setores educativos 36.Assim, a primeira década do seculo XX foi marcada em
Portugal por uma importante reconfiguração do ensino superior (Processo de Bolonha)
e, no que respeita aos ensinos básico e secundário, pelas prioridades definidas na
Estratégia de Educação e Formação 2010: melhoria das competências nas
aprendizagens básicas, redução do abandono escolar precoce, universalização
tendencial do ensino secundário entre os mais jovens e criação de incentivos para o
desenvolvimento da aprendizagem ao longo da vida.
Estas mudanças ilustram o papel vital que passou a ser concedido à educação nas
políticas e prioridades da União, crescentemente centradas na preocupação da
35 Lima, 2012: 136.
36 Antunes, 2005, Nóvoa, 2005 Alves, 2010.
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47
promoção da competitividade da economia europeia37, com percussões importantes
nos planos discursivos e como guião para a interpretação da realidade, para a orientação
das políticas, e para a reconfiguração das instituições, processos e conteúdos educativos
e de formação38. Numa análise das implicações do novo quadro de decisão política não
pode deixar de ser reconhecido que, apesar disso, as metas fixadas constituíram um
estimulo importante à expansão dos sistemas educativos e de formação dos estados
membros, designadamente dos países como Portugal em que a consolidação da escola
de massas constituiu um processo muito tardio como se verifica no quadro que se segue.
Quadro - Comparação Portugal UE Anos
Dimensões 2000 2004 2006 2009 2010
Abandono escolar precoce
PT 43,1 39,4 39,2 31,2 28.7
Média EU 19,7 15,9 15,3 14,4 9.1
Baixos níveis de literacia
PT 26,3 22 24,9 17,6 17,6
Média EU 19,4 19,8 24,1 19,6 20.0
Aprendizagem ao longo da vida
PT 2,9 4,8 3,8 6,1 5.8
Média EU 8 9,4 9,6 9,2 9.1
Apesar da importância destes desafios para a sociedade portuguesa importa ter
presente que o “método aberto de coordenação“, apesar do caráter sugestivo da
designação, apresenta características que permitem que o processo de decisão em
educação seja subtraído aos espaços democráticos de decisão e remetidos para
plataformas intergovernamentais (definição de matrizes de politicas ) ,
37 Antunes, 1996; 2005, Dias, 2008,
38 Alves,2010, Antunes, 2005.
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48
“peritos”(definição de objetivos e metas de referencia ) e comissões de avaliação com
reduzidíssimo controlo dos eleitores.
“ Esta conceção e realização tecnocrática da política - que dispensa os atores e ignora os
processos e os contextos concretos de ação - constitui o quadro instituído para as
políticas educativas e de formação a desenvolver nos próximos anos pelos estados em
causa e apresenta-se também como um elemento novo neste terreno da vida social; qual
o seu impacto e quais os seus efeitos são questões cujas respostas os próximos tempos
hão de testemunhar”. 39
A nova “arquitetura “do processo de elaboração das políticas tende a produzir um duplo
efeito, que coloca em questão o próprio amago do funcionamento democrático das
escolas públicas. De fato, por um lado, verifica-se uma quase-irrelevância dos atores
nacionais e locais na definição de objetivos fundamentais da escola pública,
contribuindo para que estes lhes atribuíam que assumem, por isso, um caracter
aparentemente arbitrário e fragmentado. Por outro lado, esses atores, formalmente
“autónomos “ e investidos do poder formal de decisão, são colocados perante a
obrigatoriedade de implementar medidas e procedimentos que não escolheram e sobre
os quais deverão prestar contas, que terão um impacto profundo nas suas carreiras
profissionais e condições de trabalho (financiamento da instituição, natureza do público
escolar, progressão na carreira, etc…).
Neste contexto torna-se vital um grande debate público em torno dos desafios que a
União Europeia (UE) elegeu para a corrente década e dos processos utilizados na criação
e desenvolvimento do espaço europeu de educação e formação. Importa, ainda, ter em
consideração que a evolução positiva registada em Portugal, no que respeita aos
padrões de referencia estabelecidos pela UE que o processo verificado no princípio do
Séc. XXI em Portugal está longe de garantir uma convergência crescente e linear entre
39 Antunes, 2005, p131
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49
os padrões nacionais europeus. De fato, a própria OCDE tem realçado as consequências
negativas, no plano da educação e do emprego, associadas com a crise económica e
financeira dos últimos anos:
“Em 2009, Portugal gastou 5, 9% do PIB em educação, valor bastante superior aos 4,
9% de 1995. Mas com a crise económica, o governo já indicou que desceria para 4, 7%
em 2011 e , provavelmente , para 3, 8% em 2012(…)Os professores em Portugal têm
salários mais elevados que outros diplomados com o ensino superior .Mas isto
provavelmente mudará em 2012, com as medidas de austeridade que incluirão cortes
nos salários (.. ) Com 10% da população diplomada com o ensino secundário
desempregada , Portugal ocupa a oitava posição no ranking dos 33 países da OCDE com
estatísticas neste domínio (uma década atrás ocupava a posição 23 , entre os 28 países
da OCDE abrangidos pela mesma análise).A situação é similar para os diplomados com
o ensino superior, tendo o desemprego subido de 2, 7% em 2000 para 6, 3% para 2010,
enquanto, no mesmo período, a taxa média de desemprego destes diplomados no
conjunto dos países da OCDE subiu de 3, 7% para 4, 7%” (tradução/adaptação MD) 40.
IV.2 Financiamento
IV.2.1 Introdução
Na atual “sociedade globalitária”41, caracterizada pela massificação da produção e do
usufruto massificado dos resultados da atividade produtiva, a função da “escola”
alterou-se. Hoje espera-se que a escola não só contribua para o desenvolvimento da
cidadania mas, muito particularmente, que “produza” cidadãos socialmente úteis, isto
é, cidadãos capazes de ingressar no mercado de trabalho e de responder às solicitações
que este lhe impõe, revelando-se o indivíduo em constante estado de empregabilidade.
40 OECD, 2012, pp.1-2,
41 Ramonet, 1997
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50
Existe uma nova intencionalidade para a educação que a coloca ao serviço da economia
num contexto de exigências do mercado global marcado por expressões que fazem
parte da gramática ultraliberal como individualismo, capital humano, competição,
competitividade, flexibilidade, investimento e empregabilidade.
Este processo coexiste com uma intenção bem real mas que não se pretende evidente
de destruição/privatização da escola pública, em Portugal, seguindo de perto outras
mudanças recentes acerca da forma como encarar a educação, nomeadamente no
Reino Unido/Inglaterra, as quais dão corpo à formulação e desenvolvimento a dois
“conceitos”/práticas que devem ser perspetivados como dois dos principais ataques à
“escola pública”: os “quase-mercados” e a ”liberdade de escolha”.
IV.2.2. Os quase-mercados
Suportado por teóricos, como Bartlett, Le Grand e Barr42, os quase-mercados pretendem
ser uma forma de organizar a produção e a provisão dos serviços públicos,
nomeadamente educativos, segundo uma fórmula de “todos ganham” e assente no
pressuposto da ineficiência da produção de serviços públicos pelo Estado/entidades
públicas. Para eles, e tantos outros, os serviços públicos e os funcionários públicos são,
por natureza, ineficientes por múltiplas razões, nomeadamente o desinteresse por parte
dos trabalhadores públicos pela “coisa pública” dado que ganharão o mesmo
independentemente do seu desempenho e o desincentivo à eficiência e eficácia
produtivas em virtude do monopólio estatal na produção e provisão daqueles serviços.
Nestas circunstâncias, o que esta linha de pensamento propõe é a produção privada dos
serviços públicos, permitindo a concorrência entre produtores que justifica a existência
de um “mercado”, e a sua provisão/financiamento públicos através do estabelecimento
de um preço convencionado no quadro desta “pareceria público-privada” e que
explicaria o “quase”.
42 Bartlett (1991, 1992, 1993), Bartllet et. al (1994), Le Grand (1982, 1990, 1991, 1996), Le Grand et al. (1993),
Barr (1989, 1991, 1993), Barr et al. (1996, 1998
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51
Nesta ordem de ideias, e no caso específico da educação, nomeadamente da
escolaridade obrigatória que, exatamente por ser compulsiva, é gratuita, o que se
passaria seria a privatização (no todo ou em parte) da instituição escolar que seria, no
entanto, financiada pelos poderes públicos, de molde a que o serviço educativo
continuasse a ser provido gratuitamente. Nesta forma de produção/provisão de
educação o ganho estaria no facto de a instituição, porque privada e com um preço de
venda “controlado”, para ter lucro teria que ser mais eficiente. O ganho do produtor
residiria, exatamente nessa eficiência: quanto mais barato produzir, maior será o seu
lucro uma vez que o montante das receitas é o resultado do concurso no mercado e não
da elevação do preço de venda no consumidor, já que esse será, sempre, nulo. Ao
mesmo tempo o Estado gastaria menos na provisão do mesmo serviço, pois que seria
ele a selecionar no mercado um, de entre os diversos concorrentes e respetivos
cadernos de encargos. Finalmente, o consumidor em nada seria prejudicado, uma vez
que continuaria a ser-lhe disponibilizado o mesmo serviço gratuitamente.
Simultaneamente, as famílias poderiam, desta forma, procurar a escola que mais lhes
conviesse para os seus filhos, podendo, assim, exercer o seu direito de escolha.
Esta linha de pensamento, aplicada também na saúde, na prestação de cuidados a
cidadãos idosos, etc., assenta em diversos pressupostos que ou são manifestamente
errados e preconceituosos ou não têm tido os resultados pretendidos.
Partir do princípio de que os trabalhadores públicos são maus trabalhadores é partir de
premissas não provadas e de senso comum inaceitáveis em qualquer situação que se
pretenda científica. Por outro lado, é, também, garantir que os serviços privados são
eficientes. Ora, e para não ir mais longe, a atual crise financeira aí estar a provar que as
empresas privadas não são, necessariamente, eficientes.
De qualquer forma, e pegando, ainda, no caso da escola pública/escola “quase-privada”
é necessário refletir sobre os problemas sociais gravíssimos de discriminação que tais
soluções podem provocar como, aliás, a situação inglesa comprova.
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52
No Reino Unido, perante a possibilidade de “privatização” das escolas do ensino básico,
algumas dessas escolas aceitaram entrar nesse figurino (situação já tentada, pelo menos
no discurso, pelo atual governo em Portugal) enquanto outras continuaram
dependentes das LEAs (Local Education Authorities). É significativo o que este processo
tem tido de discriminatório: algumas escolas “recusam” a entrada dos jovens que não
desejam, mantendo sempre uma máscara de não-discriminação, pois a recusa de
entrada pode resultar do facto de as escolas já estarem lotadas (ainda que não estejam),
ou das despesas que os pais serão obrigados a realizar na aquisição de determinado
material (ainda que a escolaridade se mantenha gratuita), ou do facto de a escola, no
quadro do seu projeto educativo disponibilizar/oferecer atividades variadas que tornam
a frequência bastante cara (ainda que o tempo da escolaridade obrigatória continue
gratuito), realizar “testes de conhecimentos”, etc. Na verdade, que escola destas quer
aceitar, por exemplo, crianças com problemas de aprendizagem/necessidades
educativas especiais que vão, necessariamente, encarecer os serviços e, portanto,
diminuir a margem monetária entre o que estas escolas recebem do Estado e os custos
que realizam, já que o preço de venda (da escolaridade obrigatória, não esqueçamos),
se mantém nulo?
Obviamente, as crianças com problemas de aprendizagem, ou oriundos de estratos
sociais menos interessantes, ou …, continuam a ter direito à educação e, por isso, é-lhes
prestado o serviço. O problema é que a sua liberdade de escolha depara com tantos
obstáculos, económicos, sociais, burocráticos, administrativos, etc., que a sua única
escolha é a escola pública. De facto, não deixa de ser curioso que estas crianças vejam
assegurado o serviço educativo através da prestação pelas escolas públicas, aquelas que
não se “quase-privatizaram” e que em virtude de inúmeros fatores discriminatórios,
nomeadamente o de terem públicos altamente discriminados, apresentarem os piores
resultados vindo, ironicamente, dar razão àqueles que dizem mal da escola pública por
ser pouco eficiente, voltada ao insucesso, etc.
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53
IV.2.3. A “liberdade de escolha” e o cheque-ensino
Sermos livres para decidir acerca das nossas opções, é um direito que a todos deverá
assistir. No âmbito do discurso liberal do freedom of choice de autores como Le Grand,
este direito encontra-se virtualmente “assegurado” a dois níveis. Num caso, como o
exposto atrás, as famílias são livres de escolherem colocar os seus filhos numa escola
pública ou numa escola quase privada que disponibiliza educação gratuita.
O outro nível é o que decorre do discurso do “cheque-ensino”. O “cheque ensino” surge
para a nova ideologia do individualismo, competição, empreendedorismo,
empregabilidade, etc., que caracteriza este novo discurso liberal, como o instrumento
que garante a possibilidade real dos jovens frequentarem a escola que efetivamente
desejam, ou que as suas famílias selecionam, seja uma escola pública ou privada,
gratuita ou paga, do centro da cidade ou da periferia, etc.
O cheque-ensino representa um montante (um voucher) que os governos entregam às
famílias e com o qual estas poderão escolher uma escola para os seus descendentes. À
partida, tudo muito transparente: todos terão aquele valor que lhes permite procurar a
educação que desejarem.
Claro que os defensores desta solução “esquecem-se” de informar que cada família
poderá procurar a escola para a qual o cheque-ensino é suficiente. Se a exigência
financeira de alguma escola, obviamente privada, for superior àquele valor, então as
famílias só têm que arranjar o valor extra e isso será da sua inteira responsabilidade. Ou
seja, se as famílias efetivamente querem escolher, que paguem. E desta forma se conclui
acerca da fortíssima discriminação negativa que o cheque-ensino acarreta: por um lado
reproduz situações de extrema desigualdade social, criando e lançando para guetos
aqueles que de lá querem sair; por outro, criando ofertas radicalmente diferentes para
os “mesmos” cidadãos e, finalmente, porque coloca a sociedade inteira a financiar
diretamente as escolas privadas e, não menos importante, a subsidiar aquelas famílias
que, à partida, dispõem de rendimentos suficientes para continuarem a fazer o que
sempre fizeram: colocar os filhos em escolas privadas teoricamente de elevado
potencial.
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54
Claro que falar, nestas condições, em democratização do ensino, em igualdade de
condições, em liberdade de escolha, em equidade, em cidadania, etc., é estarmos a
troçar dos próprios princípios de democracia e de justiça social. Mas a verdade é que
esta forma de ver a coisa pública tem os seus seguidores, também em Portugal, e que
exigem um cuidado acrescido da parte daqueles que pretendem um país mais justo,
equitativo, democrático.
IV.2.4. Privatização e níveis de ensino
Naturalmente que os problemas que a privatização da escola pública pode trazer
estendem-se a todos os níveis de ensino, ainda que com manifestações particulares em
função do nível educativo. Se o que acima se expôs se aplica, particularmente, ao ensino
obrigatório e que testemunha apenas duas situações perigosas para a democracia e a
democratização do ensino, o caso do ensino superior regista, também ele, situações
altamente lesivas dos direitos dos jovens e da democracia.
Sabemos que em 1986 o governo de então reorganizou o já existente e desorganizado
ensino superior privado, através da publicação do estatuto do ensino superior particular
e cooperativo. Também sabemos que o apoio do governo a este segmento educativo
não foi através do financiamento. Todavia, sabemos que esse apoio foi feito de forma
indireta, nomeadamente no âmbito da definição quer do número de vagas (lado da
oferta – fixação anual de um numerus clausus), quer das condições pedagógico-
científicas e de avaliação no ensino secundário, desenhando, assim, pelo lado da procura
(número de candidatos ao ensino superior) as condições de aparecimento e de
permanência de instituições privadas de ensino superior que assim « puderam
responder » a uma procura explosiva de ensino superior, de tal modo que o ensino
superior privado chegou a ter matriculados cerca de um terço do total de alunos deste
nível de ensino.
Se atualmente os alunos do ensino privado rondam os 20% do total de alunos do ensino
superior, registando uma quebra à volta dos 23% nos últimos anos não é devido, de
forma alguma, a quaisquer medidas de política educativa no sentido de reorganizar e de
democratizar este nível de ensino. Aliás, um dos grandes problemas que o nosso ensino
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55
superior vive hoje é o da sua elitização43. Cada vez mais o ensino superior é um ensino
de elites contrariando, em absoluto, o que qualquer Estado deve aspirar: a
universalização da educação em todos os níveis de ensino a que não será estranho a
crise económica e financeira do país, a crise do (des)emprego e a extensão da rede
pública e a tão falada questão demográfica.
Naturalmente, no centro de todo o problema da educação, e que o pensamento do
“quase-mercado” bem corporiza, encontra-se a questão do financiamento. Educar é,
por definição, uma atividade consumidora de muitos recursos “caros” e só tem retorno
após alguns anos da sua produção44. Nestas circunstâncias, e face à pressão que os
diversos serviços de natureza pública fazem sobre os orçamentos de Estado cada vez
mais magros, explica-se, pelo menos parcialmente, toda uma ideologia liberal que
assenta na lógica do utilizador-pagador, independentemente da natureza pública do
serviço, nomeadamente o educativo45 e que em Portugal, e no caso específico do ensino
superior, se concretiza, entre outras coisas, no estabelecimento de propinas no ensino
superior público, desde 1992, que assumem um valor “condicionado” no 1º ciclo e que
ascendem a um valor de mercado nos 2º e 3ºciclos.
43 (Cabrito, 2002; Cerdeira, 2009; Cerdeira et al., 2014).
44 Baumol et al., 1989
45 (Ray et al., 1988; Farchy et al., 1994)
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56
IV.2.5. A procura educativa e o financiamento da educação
Se há algo de que nos devemos orgulhar relativamente às últimas décadas é,
definitivamente, o progresso que alcançámos em termos educativos. Do início da
década de 1970 aos nossos dias, a educação foi um dos vetores a que os portugueses
mais atenção deram, sentindo que ela está por detrás de todo o processo de ascensão
social e de desenvolvimento pessoal.
À semelhança do que ocorreu na generalidade dos países desenvolvidos desde meados
do século passado, a educação é eleita pelas famílias portuguesas como o grande
instrumento de ascensão social e inserção qualificada no mercado de trabalho que se
traduziria em maior reconhecimento social46, e em maior produtividade e maiores
ganhos salariais47, factos que dão corpo à designada teoria do capital humano48.
Nas últimas décadas registou-se, de facto, uma procura explosiva de educação, em
todos os níveis de ensino. Observe-se o quadro abaixo :
46 Baudelot & Establet, 1971, 1977; Bourdieu, 1994; Bourdieu & Passeron, 1964, 1970; Grácio, 1986)
47 Becker, 1964, 1981, 1992; Kiker & Santos, 1991; Meulemeester & Rocha, 1995; Mincer, 1974, 1980; São Pedro e Baptista, 1992; Schultz, 1961, 1963, 1981; Woodhall, 1991, 1992, 1995
48 Becker, 1964; Schultz, 1961.
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57
Evolução do número de estudantes em todos os níveis de ensino
Ano
s
Total Educaçã
o Pré-
escolar
Ensino Básico Ensino
Secundári
o
Ensino
Superio
r Total 1º
Ciclo
2º
Ciclo
3º
Ciclo
196
1
X 6528 106647
1
88723
5
78064 10117
2
13116 24149*
197
0
X 15153 131627
9
93545
3
19391
2
18691
4
27028 49461*
198
0
187355
9
80373 153838
9
92785
2
30565
9
30487
8
169516 80919
199
0
216018
0
161629 153111
4
71588
1
37060
7
44462
6
309568 157869
200
0
226074
5
228459 124083
6
53994
3
27652
9
42436
4
417705 373745
200
5
217285
3
259788 115305
7
50441
2
26774
2
38090
3
376896 380937
201
0
240609
8
274387 125646
2
47951
9
27324
8
50369
5
483982 383627
201
1
223940
1
276125 120671
6
46462
0
27826
3
46383
3
440895 398268
201
2
224175
6
272547 115781
1
45400
3
26609
5
43771
3
411238 390273
201
3
X 266666 109352
3
44037
8
25266
7
40047
8
398447 371000
Fonte : DGEEC/MEC, PORDATA; *Barreto et al, A Situação Social em Portugal, 1960-1995
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58
A procura social de educação acima referida explica a evolução fortemente positiva da
taxa real de escolarização em todos os níveis do ensino básico (pré-escolar, básico e
secundário) nas últimas décadas, como pode observar-se no quadro abaixo.
Taxa real de escolarização (%)
Anos Educação Pré-
Escolar
Ensino Básico Ensino
Secundário 1º Ciclo 2º Ciclo 3º Ciclo
1961 0,9 80,4 7,5 6,1 1,3
1970 2,4 84,3 22,2 14,4 3,8
1980 14,2 98,4 35,4 25,8 11,7
1990 41,7 100,0 69,2 54,0 28,2
2000 71,6 100,0 87,4 83,9 58,8
2005 77,4 100,0 86,4 82,5 59,8
2010 83,9 100,0 93,8 89,5 71,4
2011 85,7 99,1 95,4 92,1 72,5
Fonte: PORDATA
Obviamente, esta evolução positiva do número de jovens no sistema educativo teria,
forçosamente, de se repercutir no nível dos recursos afetados à educação. Disso nos dá
conta o quadro abaixo.
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59
Despesas do Estado em educação: execução orçamental (em milhões de euros)
Anos Montante Anos Montante
1972 22,3 2006 7263,4
1980 258,5 2007 7232,1
1990 2091,0 2008 7348,6
2000 6202,6 2009 8507,4
2001 6729,8 2010 8559,2
2002 7267,7 2011 7878,5
2003 7005,0 2012 6622,4
2004 7132,1 2013 7108,4
2005 7316,1
Fontes/Entidades: DGO/MF, PORDATA Última atualização: 2014-07-02
Obviamente, este esforço realizado na educação nas últimas décadas é também
percebido através da percentagem do PIB aplicado à educação. Após um crescimento
acentuado daquela percentagem, deparamo-nos com uma evolução praticamente nula
na década de 1990 e uma tendência evidente para uma evolução negativa nos últimos
anos.
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Despesas do Estado em educação: execução orçamental em % do PIB
Anos Montante Anos Montante
1972 1,4 2006 4,5
1980 3,2 2007 4,3
1990 3,8 2008 4,3
2000 4,9 2009 5,0
2001 5,0 2010 5,0
2002 5,2 2011 4,6
2003 4,9 2012 4,0
2004 4,8 2013 4,3
2005 4,7
Fontes/Entidades: DGO/MF, INE, PORDATA Última atualização: 2014-07-02
Este desinvestimento financeiro na educação é também visível quando se analisa o
quanto o Estado gasta com cada aluno. Observe-se o Quadro seguinte :
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61
Despesas do Estado em educação: execução orçamental per capita (em euros)
Anos Montante Anos Montante
1972 2,6 2006 690,3
1980 26,5 2007 686,0
1990 209,4 2008 696,0
2000 602,8 2009 805,0
2001 649,4 2010 809,5
2002 698,4 2011 746,2
2003 669,8 2012 629,8
2004 680,3 2013 679,8
2005 696,6
Fontes/Entidades: DGO/MF, INE, PORDATA Última atualização: 2014-07-02
IV.2.6. Notas para discussão
É indesmentível o desinvestimento do Estado em educação. Esta situação arrasta-se
desde há alguns anos, tendo-se agravado de forma particular e brutal nos últimos anos.
Perante esta situação, coloca-se a necessidade de perguntar como se poderá ela
resolver, sendo certo que não há receitas nem respostas únicas para problemas sociais,
há, contudo, perguntas a que se tem de conceder particular atenção. Muito
rapidamente, apenas algumas:
- Qual o papel a desempenhar pelo ensino privado em Portugal? Coexistindo com a
escola pública? Substituindo-a/ “complementando-a”, face a inexistência de oferta
pública? Concorrendo com a escola pública?
- Qual o papel do Estado no financiamento da escola pública? Ser uma das fontes,
complementando a participação das famílias? Ser a fonte maioritária? Para todos os
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62
níveis educativos? Com que critérios? Número de alunos; sucesso educativo; gestão
« mais eficiente »; ofertas da escola; … ?
- Como entregar mais receitas às autarquias locais? Que competências para as
autarquias? Como descentralizar sem municipalizar?
- Que ajudas aos estudantes e famílias? Em material didático, em bolsas e subsídios, em
gratuitidade, … ?
- Qual o papel do Estado no « financiamento » direto/indireto das escolas privadas?
Através de subsídios ao estudante, nomeadamente o cheque-ensino? Através da
atribuição de bolsas e concessão de subsídios aos estudantes mais carenciados que
utilizam a escola privada? Quais os critérios?
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63
V – COMO ATUAR NO PRESENTE E PREPARAR O FUTURO
Algumas respostas à questão que o título deste capítulo pressupõe já se encontram
enunciadas nos capítulos anteriores, em especial nas interrogações e pistas que
constam das secções III.2.2, III.3.2., III.4.4. e IV.2.6..
Procura-se aqui reuni-las em 7 pontos e de forma mais organizada para centrar o debate
amplo e a concertação possível que elas merecem e um interesse e esforço conjunto
podem conseguir.
V.1 – AFINAL O QUE É A ESCOLA PÚBLICA?
Este debate parece essencial para a tomada de decisões de política educativa ou seja,
há que discutir a natureza da escola pública para se poder responder a muitas das
questões que resultam dos capítulos anteriores e que implicam saber se a escola é um
serviço do Estado, um serviço local, as duas coisas ao mesmo tempo, se tem
personalidade jurídica ou não, se tem autonomia e para quê, a que tipo de relações está
sujeita com o Estado e com as autarquias, etc.
Também têm que ver com este debate questões/dúvidas que parecem surgir à margem
mas que são tão importantes como:
- Será que as dinâmicas internas dos agrupamentos não conduzem à subalternização
dos níveis educativos mais “ baixos” na gestão das escolas e nas lógicas de organização
curricular e pedagógica?
- Será que as condições especiais de funcionamento e o apoio financeiro e educativo
acrescidos ao universo TEIP premeiam as equipas diretivas e os alunos das escolas mais
dinâmicas, em prejuízo dos muitos alunos de outros agrupamentos com características
sociológicas, culturais e educativas similares? Os pressupostos da diferenciação e
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64
adequação que justifica uma medida de intervenção prioritária não devem estar
subjacentes à administração de todas as escolas?
- Não será também que a seleção social introduzida pela diversificação precoce das vias
de ensino e a diversificação da organização curricular e pedagógica das escolas deve,
obrigatoriamente, ser sempre analisada à luz de critérios de equidade e de valor
acrescentado?
- Como num sistema em que coexistem escolas públicas e escolas privadas se devem e
têm de equacionar questões fulcrais como diferenciação, rigor e exigência, eficácia e
eficiência e igualdade de oportunidades de acesso e sucesso?
- Como garantir que o "mercado" educativo não seja regido por interesses vários,
nomeadamente de natureza política e mercantil? Como garantir que a escola pública
não será preterida em benefício da oferta privada? Qual o papel que em tudo isto têm
as comparações (“rankings”!) nacionais e internacionais que, reconhecidamente, têm
conduzido à redução se não mesmo à “pobreza” do papel educativo da escola e do
esbatimento de áreas tão importantes como a educação para a cidadania ou a educação
artística?
V.2. A ATUALIDADE DA LEI DE BASES DO SISTEMA EDUCATIVO
Será ou não uma prioridade refletir sobre a atualidade da Lei de Bases do Sistema
Educativo (LBSE) e a eventual necessidade de a alterar em função das profundas
mudanças ocorridas na sociedade portuguesa?
Não será importante que ocorram mudanças, em particular na organização do sistema
educativo e das suas finalidades (generalização da educação pré-escolar, alteração
profunda da escolaridade obrigatória, das ofertas curriculares, dos sistemas de avaliação
interna e externa, das unidades organizacionais, etc.), bem como na configuração do
Estado e na administração pública (central e local), sobretudo no sentido da melhor
redistribuição de competências e meios entre os diversos níveis do poder (político e
financeiro) e da administração?
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65
V.3 PELA AUTONOMIA DAS ESCOLAS
“A efetiva democratização do acesso, da permanência e do sucesso educativo de alunos
cada vez mais diversos do ponto de vista da sua proveniência social, económica, cultural,
étnica, religiosa, etc., só pode ser conseguida através de soluções contextualmente
diferenciadas e de decisões que só poderão ser legitimamente e adequadamente
tomadas nos contextos local e escolar. Cada escola não pode deixar de se assumir como
um locus de decisões educativas e pedagógicas e cada educador/professor ou se assume,
nesse contexto, como um decisor, ou ficará paralisado, alienado e incapaz de contribuir
para a autonomia e o sucesso educativo dos seus alunos. A manutenção de um sistema
escolar centralizado, concentrado ou desconcentrado, eletronicamente uniformizado e
controlado à distância, se revelará cada vez mais incapaz de responder às exigências de
uma educação democrática e de qualidade social para todos.” 49
Constitui um desafio importante “que o olhar vá mais além do que a lógica que conduziu
ao decreto-lei 115-A/98 e que há quase 20 anos desconfia da capacidade das escolas
para serem verdadeiramente autónomas – embora reguladas e avaliadas externamente
– e serem elas mesmas os atores da mudança, em vez de um simples elo de transmissão
de decisões que estão sempre fora delas, restando-lhes a capacidade para gerir a
atribuição de um ou dois tempos letivos.”50
Afinal gerir, necessariamente enquadrados por regulamentação geral, não se pode
cingir a administrar pormenores, sem que se possam relacionar os resultados/produtos
pretendidos com os recursos a disponibilizar, as características e condicionantes dos
alunos a educar e a ensinar com as formas de organização e as metodologias
consideradas necessárias podendo dispor, para o efeito, dos adequados recursos
financeiros e humanos. A monitorização e avaliação interna e externa lá estarão para
49 Escreveu Licínio Lima no parecer sobre o 2º documento
50 Escreveu Paulo Guinote no parecer sobre o 2º Documento
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66
evitar desvios e as análises do valor acrescentado para assegurar a equidade e a justiça
social.
A capacidade de constituição das equipas dentro das escolas, que considerem, para
além dos professores, todos os técnicos e outros colaboradores educativos e
administrativos de que uma escola não pode prescindir, é um aspeto essencial da
autonomia quase sempre esquecido ou menosprezado
Neste âmbito não será de "avaliar" a pertinência de acabar com todos os Mega
agrupamentos criados nos últimos anos (obviamente após um rápido mas profundo
processo de avaliação multidimensional dessas "unidades organizativas" do sistema), o
que naturalmente implicaria reequacionar o atual regime de administração e gestão das
escolas, nomeadamente no sentido de prever "travões" a sucessivos reagrupamentos
por razões exclusivamente economicistas e de recolocar no centro da questão a
democraticidade do seu funcionamento no que respeita à participação dos professores
e dos pais tendo como principal objetivo o sucesso educativo dos alunos e da escola?
V.4. COMO DESCENTRALIZAR SEM MUNICIPALIZAR
Alguma desconfiança em relação à transferência de competências para as autarquias
em matéria de Educação “nasce de considerar que uma coisa é a gestão do saneamento
básico de um território ou do seu ordenamento urbanístico (e muito teríamos a apontar
de pouco positivo a muitos municípios nesse aspeto), outra gerir uma rede local ou
intermunicipal de Educação no contexto de um país como o nosso que está longe de ter
uma dimensão geográfica que justifique a sua fragmentação e a possibilidade de
agravar ainda mais os desequilíbrios existentes e a quebra da coesão nacional num
aspeto fundamental para o futuro como a Educação.”51
Seria interessante e oportuno interrogar o "Programa Aproximar Educação" (PAE),
criado pelo atual governo, à luz do enquadramento constitucional e do regime jurídico
51 Escreveu Paulo Guinote no parecer sobre o 2º Documento
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das autarquias locais, nomeadamente ao nível dos instrumentos políticos daquele
programa (Contrato de Educação e Formação Municipal, Matriz de Responsabilidades e
Modelo de Financiamento) e da discutível razoabilidade do modelo de descentralização
educativa que lhe está implícito (vulgarmente conhecido como "municipalização da
educação").
Como descentralizar (e o quê) sem municipalizar? Como impedir que a descentralização
não se torne numa reprodução de um sem número de cadeias hiperburocratizadas de
poder onde, por um lado, a escola perde a sua identidade e autonomia e, por outro, a
educação em Portugal deixe de ter uma natureza nacional (independentemente das
especificidades naturais de escola/região)? Haverá instrumentos que permitam garantir
que uma escola não dependa da vontade discricional de novos poderes?
V.5. UMA NOVA VISÃO PARA A ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA
Como articular a descentralização com a necessidade de decisões que, pelo menos ao
nível do enquadramento legal e genérico – não necessariamente da execução - devem
ser de natureza nacional nomeadamente o estabelecimento de um currículo escolar, o
modelo de colocação de professores, de apoio social, e de financiamento dos
estabelecimentos de ensino, sob pena de escolas, alunos e professores poderem ser
penalizados pelo facto de estarem/pertencerem a contextos geográfico, social,
económico e político diferenciados?
Na ausência das Regiões administrativas previstas na CRP impõe-se uma reflexão sobre
as vantagens/inconvenientes da extinção das atuais cinco delegações regionais da
Direcção Geral dos Estabelecimentos Educativos, à luz quer da "racionalização da
administração pública" prometida pelo atual governo através do "Programa Aproximar"
e em curso de experimentação em quatro Comunidades Intermunicipais (CIM Alto
Tâmega, CIM Oeste, CIM Leiria, CIM Viseu, Dão, Lafões), quer da redefinição necessária
do papel político (de planeamento e financiamento) das Comissões de Coordenação e
Desenvolvimento Regional (CCDR) e das próprias Comunidades Intermunicipais (CIM).
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68
Será que não continua a fazer mais sentido, em matéria de níveis intermédios da
administração educativa, a "região administrativa" (NUT II) do que a "comunidade
intermunicipal" (NUTIII), desde que a primeira tenha legitimidade eleitora direta?
V.6. QUAL O PAPEL DA SOCIEDADE CIVIL
Quando tanto se fala da sociedade civil e em participação será importante analisar qual
o papel que têm tido os sindicatos/associações de professores, as associações de
encarregados de educação nos órgãos de gestão e, sobretudo, no debate e decisão
sobre políticas educativas.
Se o papel dos sindicatos dos professores, natural e especialmente centrados nos
interesses dos seus associados, tem sido determinante em muitas das políticas
educativas desde 1974, já as associações de pais, as associações científicas e educativas
de professores e as associações mais recentes de dirigentes escolares têm tido uma
influência esbatida senão subalternizada nas principais decisões de política educativa a
não ser em áreas muito restritas e especializadas.
V.7. QUESTÕES À MARGEM QUE SE PODEM TORNAR CENTRAIS
Um documento sobre ORGANIZAÇÃO, ADMINISTRAÇÃO E FINANCIAMENTO DA
EDUCAÇÃO” tem de deixar de fora muitas questões que, ainda que consideradas de
alguma forma “à margem” do tema central, não deixam de se acercarem dele e
poderem constituir outros novos alertas para a forma como se pensa a educação e esta
se organiza, administra e financia.
De entre as muitas questões por vezes apenas citadas e referidas de passagem e outras
nem sequer abordados, não se pode, como se pode, como ponto final, deixar de referir:
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- A ”formatação “da formação de professores para a matemática /língua e didáticas não
constituem um bom exemplo da “nova ortodoxia da educação” referida no capítulo
IV.1..
- Como se deve considerar a participação e a autonomia dos alunos (baixíssima,
independentemente do tipo de escolas e do lugar no ranking, embora com variações
importantes segundo os dados disponíveis), alunos sujeitos a uma crescente vigilância
eletrónica (cartões controlam o que comem, o que compram na secretaria, as horas a
que chegam…; plataformas moodle que dizem se fazem trabalhos de casa, etc…).
- A alienação total em relação à inexistência de políticas de educação de adultos
e de jovens que abandonaram o sistema de ensino e à integração “local” destas políticas.
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71
ANEXO I
NÍVEIS DA ADMINISTRAÇÃO E DOMÍNIOS DE DECISÃO
Tradução/adaptação do texto das páginas 528-529 de “Regards sur l’Éducation 2012”
- Por Administração Central entendem-se todas as instâncias máximas de um país que tomam
decisões ou intervêm em alguns aspetos do processo de decisão;
- Município é a unidade administrativa mais pequena do país que seja dotada de um executivo,
assim por Autoridades Locais entendem-se os serviços responsáveis pela educação ao nível
municipal;
- Província ou Região considera-se a unidade territorial que vem imediatamente a seguir ao
Executivo Central no caso dos países não federais. Em Portugal apenas existem a este nível a
Região Autónoma dos Açores e a da Madeira;
- Por estabelecimento de ensino entende-se um estabelecimento autónomo, os membros da
sua direção, os seus professores ou um conselho responsável desse estabelecimento. As
redes/agrupamentos de ensino ou de escolas são, par este efeito, considerados como
estabelecimentos.
DOMÍNIOS DE DECISÃO
- Organização do ensino : a admissão, o percurso escolar, os tempos letivos, a escolha dos
manuais escolares, a escolha dos materiais de ensino, a organização das turmas, os apoios
suplementares aos alunos, os métodos pedagógicos e a avaliação contínua dos alunos;
- Gestão do pessoal: recrutamento e licenciamento dos chefes dos estabelecimentos, dos professores e dos restantes trabalhadores que exercem a sua atividade profissional nas escolas, funções e condições de trabalho, níveis salariais e evolução nas carreiras profissionais;
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72
. Planificação e estruturas: criação ou supressão de estabelecimentos ou de ofertas educativa
(níveis de ensino e cursos), elaboração dos programas dos cursos, seleção dos programas
oferecidos pela escola, definição dos conteúdos de ensino, conceção dos exames que conduzem
à obtenção de um diploma e da estrutura que concede o diploma (escolha do conteúdo, das
provas e sua administração e correção);
. Gestão dos recursos : a afetação dos recursos e a sua utilização pelo pessoal docente e não
docente, as despesas de funcionamento e as despesas de capital e o desenvolvimento
profissional dos dirigentes das escolas e dos professores.
ANEXO II
Competências das Direções de Serviço Regionais da Direcção Geral dos
Estabelecimentos Escolares
Portaria 29/2013 – Fixa a estrutura nuclear da Direção-Geral dos Estabelecimentos Escolares
1. Acompanhar, coordenar e apoiar a organização e o funcionamento dos estabelecimentos de educação situados na respetiva circunscrição regional; 2. Promover e monitorizar processos de avaliação da organização escolar; 3. Acompanhar, coordenar e apoiar a organização e o funcionamento dos estabelecimentos de educação situados na respetiva circunscrição regional; 4. Promover e monitorizar processos de avaliação da organização escolar; 5. Colaborar na recolha de informação relevante respeitante à educação especial para efeitos de regulação e de monitorização das respostas educativas e de apoio educativo, em articulação com a Direção-Geral da Educação; 6. Acompanhar a promoção de medidas e orientações para a inclusão e o sucesso educativo dos alunos com necessidades educativas especiais na educação pré-escolar e escolar na modalidade de educação especial nos ensinos público, particular, cooperativo e solidário, designadamente atividades de complemento e acompanhamento pedagógico, em articulação com a Direção-Geral da Educação; 7. Assegurar a implementação a nível regional dos diversos programas, projetos e atividades do desporto escolar, em articulação com a Direção-Geral da Educação; 8. Participar no planeamento da rede escolar da circunscrição regional, promovendo, sem prejuízo das competências dos restantes serviços do MEC, ações de planeamento e execução do ordenamento das redes da educação pré-escolar, dos ensinos básico e secundário, incluindo as suas modalidades especiais, bem como as de educação e formação de jovens e adultos; 9. Apoiar os estabelecimentos de educação e as autarquias locais na manutenção dos contratos de execução celebrados nos termos do Decreto-Lei n.º 144/2008, de 28 de julho;
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73
10. Assegurar a divulgação local das orientações dos serviços do MEC e da informação técnica às escolas; 11. Prestar apoio técnico à manutenção do parque escolar; 12. Apoiar o funcionamento das juntas médicas regionais; 13. Analisar e elaborar pareceres dos Planos Diretores Municipais (PDM), do Plano de Pormenor (PP), Avaliação Ambiental Estratégica (AAE), Carta Educativa (CE), bem como as candidaturas elaboradas pelas autarquias; 14. Acompanhar a requalificação, modernização e conservação da rede de escolas; 15. Identificar as intervenções nos edifícios escolares; 16. Vistoriar as instalações para a concessão de autorização de funcionamento dos estabelecimentos escolares do ensino particular e cooperativo e dos equipamentos das escolas públicas com oferta de ensino profissional, em articulação com a Direção-Geral da Administração Escolar e com a Direção-Geral da Educação; 17. Promover o acompanhamento das escolas profissionais privadas e da execução dos contratos de apoio financeiro celebrados; 18. Promover em articulação com os estabelecimentos escolares, os necessários procedimentos em caso de acidente em serviço de docentes e não docentes; 19. Propor a certificação do tempo de serviço do pessoal docente nos termos da lei, prestado fora do MEC. Assegurar o apoio jurídico e contencioso, em articulação com a Secretaria Geral; Cooperar com outros serviços, organismos e entidades, tendo em vista a realização de ações conjuntas em matéria de educação
ANEXO III
Composição das 21 Comunidades Intermunicipais e das 2 Áreas Metropolitanas
Designação Municípios (nº) População
- Comunidade Intermunicipal do Alto Minho
Arcos de Valdevez, Caminha, Melgaço, Monção, Paredes de Coura,
Ponte da Barca, Ponte de Lima, Valença, Viana do Castelo, Vila Nova
de Cerveira, (10)
2 446
- Comunidade Intermunicipal do Cávado
Amares, Barcelos, Braga, Esposende, Terras de Bouro, Vila Verde (6) 4 109
- Comunidade Intermunicipal do Ave
Fafe, Guimarães, Póvoa de Lanhoso, Vieira do Minho, Vila Nova de
Famalicão, Vizela, Cabeceiras de Basto, Mondim de Basto (8)
4 251
- Área Metropolitana do Porto
Santo Tirso, Trofa, Arouca, Oliveira de Azeméis, Santa Maria da Feira,
São João da Madeira, Vale de Cambra, Espinho, Gondomar, Maia,
Matosinhos, Porto, Póvoa de Varzim, Valongo, Vila do Conde, Vila
Nova de Gaia, Paredes (17)
1 759 524
- Comunidade Intermunicipal do Alto Tâmega
Boticas, Chaves, Montalegre, Valpaços, Vila Pouca de Aguiar
Ribeira de Pena (6)
9 443
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74
- Comunidade Intermunicipal do Tâmega e Sousa
Amarante, Baião, Castelo de Paiva, Celorico de Basto, Cinfães
Felgueiras, Lousada, Marco de Canaveses, Paços de Ferreira
Penafiel, Resende (11)
4 325
- Comunidade Intermunicipal do Douro
Murça, Alijó, Armamar, Carrazeda de Ansiães, Freixo de Espada à
Cinta, Lamego, Mesão Frio, Moimenta da Beira, Penedono, Peso da
Régua, Sabrosa, Santa Marta de Penaguião, São João da Pesqueira,
Sernancelhe, Tabuaço, Tarouca, Torre de Moncorvo, Vila Nova de
Foz Côa , Vila Real (19)
2 057
- Comunidade Intermunicipal das Terras de Trás os Montes.
Alfândega da Fé, Bragança, Macedo de Cavaleiros, Miranda do
Douro, Mirandela, Mogadouro, Vimioso, Vinhais, Vila Flor (9)
1 177
- Comunidade Intermunicipal da Região de Aveiro
Águeda, Albergaria-a-Velha, Anadia, Aveiro, Estarreja, Ílhavo,
Murtosa, Oliveira do Bairro, Ovar, Sever do Vouga, Vagos (11)
3 704
- Comunidade Intermunicipal da Região de Coimbra
Cantanhede, Coimbra, Condeixa-a-Nova, Figueira da Foz, Mira,
Montemor-o-Velho, Penacova, Soure, Mealhada, Mortágua, Arganil
Góis, Lousã, Miranda do Corvo, Oliveira do Hospital, Pampilhosa da
Serra, Penela, Tábua, Vila Nova de Poiares (19)
4 609
- Comunidade Intermunicipal da Região de Leiria
Alvaiázere, Ansião, Castanheira de Pera, Figueiró dos Vinhos,
Pedrógão Grande, Batalha, Leiria, Marinha Grande, Pombal Porto de
Mós (19)
2 942
- Comunidade Intermunicipal Viseu Dão Lafões
Aguiar da Beira, Carregal do Sal, Castro Daire, Mangualde, Nelas,
Oliveira de Frades, Penalva do Castelo, Santa Comba Dão, São Pedro
do Sul, Sátão, Tondela, Vila Nova de Paiva, Viseu, Vouzela (10)
2 942
- Comunidade Intermunicipal das Beiras e Serra da Estrela
Almeida, Celorico da Beira, Figueira de Castelo Rodrigo, Guarda,
Manteigas, Meda, Pinhel, Sabugal, Trancoso, Belmonte, Covilhã,
Fundão, Fornos de Algodres, Gouveia, Seia (15)
2 363
- Comunidade Intermunicipal da Beira Baixa
Castelo Branco, Idanha-a-Nova, Penamacor, Vila Velha de
Ródão, Oleiros, Proença-a-Nova (6)
8 963
- Comunidade Intermunicipal do Oeste
Alcobaça, Alenquer, Arruda dos Vinhos, Bombarral, Cadaval,
Caldas da Rainha, Lourinhã, Nazaré, Óbidos, Peniche, Sobral
de Monte Agraço, Torres Vedras (12)
3 620
- Comunidade Intermunicipal do Médio Tejo
Abrantes, Alcanena, Constância, Entroncamento, Ferreira do
Zêzere, Ourém, Sardoal, Tomar, Torres Novas, Vila Nova da
Barquinha, Mação, Sertã, Vila de Rei (13)
2 471
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75
- Comunidade Intermunicipal da Lezíria do Tejo
Almeirim, Alpiarça, Azambuja, Benavente, Cartaxo,
Chamusca, Coruche, Golegã, Rio Maior, Salvaterra de Magos,
Santarém (11)
2 473
- Área Metropolitana de Lisboa
Amadora, Cascais, Lisboa, Loures, Mafra, Odivelas, Oeiras,
Sintra, Vila Franca de Xira, Alcochete, Almada, Barreiro,
Moita, Montijo, Palmela, Seixal , Sesimbra, Setúbal (18)
2 821 876
- Comunidade Intermunicipal do Alentejo Litoral
Alcácer do Sal, Grândola, Odemira, Santiago do Cacém, Sines (5)
9 725
- Comunidade Intermunicipal do Alto Alentejo.
Sousel, Alter do Chão, Arronches, Avis, Campo Maior, Castelo de
Vide, Crato, Elvas, Fronteira, Gavião, Marvão, Monforte, Nisa, Ponte
de Sor, Portalegre (15)
1 186
- Comunidade Intermunicipal do Alentejo Central
Alandroal, Arraiolos, Borba, Estremoz, Évora, Montemor-o-Novo,
Mourão, Portel, Redondo, Reguengos de Monsaraz, Vendas Novas,
Viana do Alentejo, Vila Viçosa, Mora (14)
1 666
- Comunidade Intermunicipal do Baixo Alentejo
Aljustrel, Almodôvar, Alvito, Barrancos, Beja, Castro Verde, Cuba,
Ferreira do Alentejo, Mértola, Moura, Ourique, Serpa, Vidigueira
(13)
1 262
- Comunidade Intermunicipal do Algarve
Albufeira, Alcoutim, Aljezur, Castro Marim, Faro, Lagoa, Lagos,
Loulé, Monchique, Olhão, Portimão, São Brás de, Alportel, Silves,
Tavira, Vila do Bispo, Vila Real de Santo António (16)
451 006
ANEXO IV
Quadro resumo de caracterização e condicionantes
Níveis de
Administração
Pública
Composição Âmbito
Geográfico
Domínios e
Competências em Educação
Administração
central
desconcentrada
Direcção Geral dos
Estabelecimentos
Escolares(DGEstE)
5 Direções de
serviço
“regionais”52
Ver no Anexo II as competências das
Direções de Serviço Regionais (em
articulação com os serviços centrais)
(Portaria 29/2013)
52 Ver ANEXO II com o elenco das respetivas competências.
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76
Regiões
Autónomas
RA Açores
Secretarias Regionais
O sistema educativo regional,
incluindo as respetivas organização,
funcionamento, recursos humanos,
equipamentos, administração e
gestão dos estabelecimentos de
educação e de ensino.
A avaliação no sistema educativo
regional e planos curriculares;
A atividade privada de educação e
sua articulação com o sistema
educativo regional. A ação social
escolar no sistema educativo
regional;
Os incentivos ao estudo e meios de
combate ao insucesso e abandono
escolares.
RA Madeira
Secretarias Regionais
Educação pré-escolar, ensino básico,
secundário, superior e especial
Administração
Local
Freguesias Ponto II.2 (?) do documento
Municípios Ponto II.2 do documento
Regiões Administrativas Estão previstas mas não existem
Associações de
Municípios
(entidades
intermunicipais)
Áreas
Metropolitanas
(Lisboa e Porto)
Participar na gestão de programas
de apoio ao desenvolvimento
regional, designadamente no
âmbito do Quadro de Referência
Estratégico Nacional (QREN).
Assegurar a articulação das
atuações entre os municípios e os
serviços da administração central na
área da Rede educativa e de
formação profissional. Estabelecer o
Plano metropolitano de gestão de
redes de equipamentos de saúde,
educação, cultura e desporto.
Participar na gestão de programas
de apoio ao desenvolvimento
regional, designadamente no
âmbito do Quadro de Referência
Estratégico Nacional (QREN).
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77
Comunidades
Intermunicipais
(CIM) (NUT III)
Assegurar a articulação das
atuações entre os municípios e os
serviços da administração central na
área da Rede educativa e de
formação profissional. Estabelecer o
Plano intermunicipal de gestão de
redes de equipamentos de saúde,
educação, cultura e desporto
Províncias Não existem
Regiões53 Não existem (embora tenham servido de referência para a
desconcentração da Educação enquanto existiram as Direções Regionais
e, agora, as DS da DGEstE)
ANEXO V
Características funcionais dos agrupamentos de escolas
Categorias Subcategorias Indicadores
1.1 Processo de
constituição
1.1.1 Problemas Natureza do processo.
Justificações para os problemas:
Alteração de práticas e rotinas
Presença de culturas organizacionais diferentes
Desconfiança e resistência às mudanças.
1.1.2 Situações
pendentes
Características da fase transitória.
Coexistência de órgãos (CP, CD)
Inexistência de Projeto Educativo de Agrupamento
1.2 Configuração
atual
1.2.1 Vantagens Redefinição de áreas de influência.
Maiores recursos.
53 Circunscrição territorial que corresponde à estrutura territorial definida nos termos do Regulamento (CE) n.º
1059/2003 do Parlamento Europeu e do Conselho de 26 de Maio de 2003, correspondente à Nomenclatura Comum
das Unidades Territoriais Estatísticas (NUTS), de nível II excluindo as regiões autónomas da Madeira e dos Açores. A
área geográfica de intervenção dos serviços regionais pode ser temporariamente ajustada, através da reafectação de
concelhos ou freguesias, por despacho do membro do Governo responsável pela área da educação.
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78
Gestão integrada.
1.2.2 Inconvenientes Dispersão de equipamentos.
Mobilidade docente intra-agrupamento.
Escala dos problemas
Distanciamento nas relações interpessoais e de gestão
1.2.3. Novos
problemas e novas
soluções
Heterogeneidade na procura e na população discente.
Articulação e coordenação curricular horizontal e vertical.
Controlo social.
Controlo das tutelas.
2.1 Organização
interna geral
2.1.1 Funcionamento
dos órgãos
Liderança de topo (direcção).
Conselho Geral.
Conselho Pedagógico.
Coordenações e lideranças intermédias.
2.1.2 Problemas
decorrentes da
macroestrutura
Sinais do tipo de gestão.
Articulação entre unidades.
Comunicação e informação internas.
Avaliação do funcionamento.
2.1.3Exercício da
autonomia relativa
Medidas de autonomia relativa.
Posição face ao contrato de autonomia.
Macroprojectos (Teip, etc.).
2.2 Organização e
funcionamento
pedagógico
2.2.1 Prioridades
educativas e
pedagógicas
Articulação curricular vertical.
Reorganização da oferta curricular conjunta e de cada
unidade.
Projecto Educativo comum.
Nova cultura de agrupamento
2.2.2 Cumprimento da
escolaridade
obrigatória
Coordenação inter-unidades.
Diversificação da oferta
Combate ao insucesso (estratégias de aula diferentes).
Posição face às metas, programas, exames, transições).
Autoridade e disciplina
Influência na procura.
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79
2.2.3. Projectos
próprios
Prosseguimento de estudos.
Empregabilidade.
Educação para a cidadania.
Integração das NEE’s.
2.3 Resultados
escolares e
educativos
2.3.1Avaliação interna
e auto-avaliação
Taxas de sucesso/insucesso.
Abandono e saídas precoces.
Grau de satisfação de alunos, pais e professores.
2.3.2Avaliação externa
e rankings
Exames externos.
Prestação de contas.
Efeitos dos rankings
3.1 Problemas
atuais da
administração nos
Mega
agrupamentos
3.1.1
Mudanças na gestão
financeira
.Alteração no financiamento (transferências do OE,
financiamento externos).
.Equivalente financeiro.
.Financiamento por objetivos.
.Privatização (outsourcing) de serviços internos.
.Parcerias de financiamento parcial de atividades.
3.1.2
Tomada de decisões
internas
.Validação de critérios (interna e externa).
.Critérios para a concessão de créditos horários.
.Racionalização de recursos humanos (contratação de
pessoal docente e não docente).
.Concorrência entre agrupamentos (mercado).
3.1.3
Controlo externo
.Meios e os métodos de controlo externo.
.As plataformas informáticas externas e obrigatórias.
.Controlo informático interno, equipamento, gestão e
manutenção.
.As atuais relações com as administrações central e local.
3.2 Posição sobre
as perspetivas de
evolução da
administração
escolar
3.2.1
Profissionalização e
privatização da gestão
escolar
.Profissionalização da gestão escolar.
.Privatização da gestão escolar.
.Mercado educativo.
.Vouchers e escolha da oferta.
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80
*REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
Capítulo III.4
-Barroso, João (org.) (2003), A escola pública. Regulação, desregulação, privatização, Porto, Asa; -Lima, Licínio C. (2007), “Administração da educação e autonomia das escolas”, in Sociedade Portuguesa de Ciências da Educação (org.), A educação em Portugal (1986-2006): alguns contributos de investigação, Lisboa, Conselho Nacional de Educação, 15-77; -Lima, Licínio C. (2009), “A democratização do governo das escolas públicas em Portugal “, in Sociologia: revista da Faculdade de Letras, 19 (2009) 227-253; -Lima, Licínio C, “À ponta da baioneta, as escolas são transformadas em repartições”, em http://www.fenprof.pt/Default.aspx?aba=27 acedido em 03.02.2014; -Lima, Licínio C, “Licínio Lima escreve sobre o processo de recentralização política e administrativa da Educação”, em
http://www.fenprof.pt/Default.aspx?aba=27, acedido em 03.
Capítulo IV.1
- Alves, M (ed) (2010) Aprendizagem ao Longo da Vida e Políticas Educativas Europeias: Tensões e Ambiguidades nos Discursos e
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[email protected] A Areia dos Dias http://areiadosdias.blogspot.pt
81
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