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Neriane Nascimento da Hora
Atividades produtivas e conservação da biodiversidade
um estudo na comunidade Igarapé Grande, ilha de João Pilatos, Ananindeua-PA
Belém 2014
Universidade do Estado do Pará
Pró-Reitoria de Pesquisa e Pós-Graduação
Centro de Ciências Naturais e Tecnologia
Pós-Graduação em Ciências Ambientais – Mestrado
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Neriane Nascimento da Hora
Atividades produtivas e conservação da biodiversidade: um estudo na comunidade Igarapé Grande, Ilha de João Pilatos,
Ananindeua-PA
Dissertação apresentada como requisito parcial para obtenção do título de mestre em Ciências Ambientais no Programa de Pós-Graduação em Ciências Ambientais. Universidade do Estado do Pará. Orientador (a): Prof. Dr. Hélio Raymundo Ferreira Filho. Co-orientador (a): Profª Dra. Ana Cláudia Caldeira Tavares Martins.
Belém 2014
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Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP),
Biblioteca do Centro de Ciências Naturais e Tecnologia, UEPA, Belém - PA.
H811a Hora, Neriane Nascimento da
Atividades produtivas e conservação da biodiversidade: um estudo na comunidade Igarapé Grande, Ilha de João Pilatos, Ananindeua-PA. /
Neriane Nascimento da Hora; Orientador Hélio Raymundo Ferreira Filho,
Co-orientador Ana Cláudia Caldeira Tavares Martins. -- Belém, 2014.
61 f. : il. ; 30 cm.
Dissertação (Mestrado em Ciências Ambientais) – Universidade do
Estado do Pará, Centro de Ciências Naturais e Tecnologia, Belém, 2014.
1. Diversidade biológica - Conservação. 2. Agrobiodiversidade. 3.
Agricultura sustentável. I. Ferreira Filho, Hélio Raymundo. II. Martins, Ana Cláudia Caldeira Tavares.
CDD 630.98115
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Neriane Nascimento da Hora
Atividades produtivas e conservação da biodiversidade: um estudo na comunidade Igarapé Grande, Ilha de João Pilatos,
Ananindeua-PA
Dissertação apresentada como requisito parcial para obtenção do título de mestre em Ciências Ambientais no Programa de Pós-Graduação em Ciências Ambientais. Universidade do Estado do Pará. .
Data da defesa: 24/02/2014
Banca Examinadora
_____________________________________ – Orientador (a)
Prof. Hélio Raymundo Ferreira Filho Doutor em Ciências da Gestão Universidade do Estado do Pará
_____________________________________
Profa. Norma Ely dos Santos Beltrão Doutora em Economia Agrícola Universidade do Estado do Pará
_____________________________________
Profa. Flávia Cristina Araújo Lucas Doutora em Ciências Biológicas Universidade do Estado do Pará
_____________________________________
Profa. Cláudia Magalhães Drouvot Doutora em Ciências da Gestão Universidade da Amazônia
_____________________________________
Prof. Suezilde da Conceição Amaral Ribeiro (SUPLENTE) Doutora em Engenharia de Alimentos Universidade do Estado do Pará
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AGRADECIMENTOS
A Deus, autor da minha vida, por iluminar meus pensamentos, dar-me saúde e me
conceder esperança nos momentos difíceis.
A minha família, pelo suporte e encorajamento em todas as ocasiões. Obrigada mãe,
obrigada pai, obrigada toda família! Sem vocês, eu não conseguiria.
Ao Programa de Pós-Graduação em Ciências Ambientais pela oportunidade de
crescimento acadêmico.
Ao meu orientador pela paciência, liberdade e confiança. Obrigada Prof. Dr. Hélio
Ferreira por tudo!
A minha coorientadora, Profª Dra. Ana Cláudia Martins, que me aceitou de braços
abertos e deu grande contribuição a este trabalho.
Ao pesquisador Francisco Diniz por me apresentar à comunidade Igarapé Grande e
conceder as primeiras orientações de campo.
À Profª Dra. Aline Meiguins pela contribuição na construção do mapa deste trabalho.
Aos moradores de Igarapé Grande pelo acolhimento, em especial, Seu Gilberto, Dona
Graça, Ariana, Seu Atemiz, Dona Rosa, Rose e Gisele. Obrigada pela hospedagem
calorosa e gentil, por me acompanharem nas caminhadas e nas viagens pelos rios e
furos de João Pilatos.
Aos entrevistados pela recepção nas suas casas e transmissão de informações
valiosas.
Aos meus amigos, de perto e de longe, pelo apoio e incentivo constante. Aos colegas
da turma 2012 pelo companheirismo nas disciplinas.
Aos integrantes do Núcleo de Estudos em Educação Científica, Ambiental e Práticas
Sociais – Necaps pela força e incentivo.
Ademais, quero registrar aqui a minha estima por uma pessoa que, não somente,
contribui neste trabalho, mas, principalmente, para minha formação acadêmica e
pessoal. Infelizmente, ela já não está entre nós, mas se estivesse, creio que ficaria
muito feliz com a conclusão de mais uma etapa em minha vida. Profa. Jesus, um
grande exemplo de coragem, luta e determinação. Saudades eternas.
5
E, por fim, meu agradecimento a todos que cooperaram com esta pesquisa, direta e
indiretamente. Obrigada!
Neriane Nascimento da Hora
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RESUMO
O avanço da fronteira agrícola e da pecuária são atividades que têm ocasionado taxas crescentes de perda de diversidade biológica na Amazônia. Encontrar estratégias para frear este processo e formas de uso da terra sustentáveis é um desafio para tomadores de decisão, pesquisadores e a sociedade civil. Neste contexto, estudos envolvendo os saberes de comunidades tradicionais amazônicas podem trazer algumas respostas. Sendo assim, esta pesquisa investigou saberes sobre conservação da biodiversidade presentes na atividade agrícola dos moradores da comunidade Igarapé Grande, Ilha de João Pilatos, Ananindeua-PA. Os dados foram coletados através de entrevistas semi-estruturadas, com nove agricultores, e informais, com 14 indivíduos, e observação participante com os moradores locais, e analisados através de análise de conteúdo. Os agricultores de Igarapé Grande desenvolvem, principalmente, sistemas de cultivo baseado nos roçados e nos quintais agroflorestais, nos quais são cultivados, sobretudo, Manihot esculenta Crantz, Euterpe oleracea Mart. e Theobroma grandiflorum (Wild. Ex Spreng.) Schum. Verificou-se que a produção agrícola em Igarapé Grande não vem produzindo grandes impactos na biodiversidade da ilha, visto que os principais processos que acarretam em perda de diversidade biológica são evitados como desflorestamento de matas primárias, uso de insumos e fertilizantes agrícolas e destruição das matas ciliares. E ainda, utilizam-se de processos que provocam menor impacto sobre a biodiversidade, como, diversificação das espécies agrícolas, multiestratificação e diversificação de espécies nos quintais, adubação orgânica e enriquecimento de capoeiras. . Palavras chaves: Uso da Terra. Amazônia. Sustentabilidade.
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ABSTRACT
Increasing cattle ranching and agriculture are accelerating the rate of biodiversity loss in the Amazon region. To develop strategies to stop this process and seek sustainable land use is a challenge for decision makers, researchers and society. In this context, investigation of the knowledge of natural resources in traditional communities might offer novel approaches. This research investigates knowledge of biodiversity conservation present in the agriculture of the inhabitants of Igarapé Grande on João Pilatos Island in Ananindeua – Pará. Data were collected through semi-structured interviews with nine smallholders and non-structured interviews with fourteen people, and participant observation with area residents, and were evaluated using content analysis. The smallholders from Igarapé Grande develop, mostly, agriculture systems based on ‘roçados’ and homegardens for which the main crop is Manihot esculenta Crantz, Euterpe oleracea Mart. e Theobroma grandiflorum (Wild. Ex Spreng.) Schum. It was found that agriculture in Igarape Grande Island is not promoting impacts on biodiversity of island, because processes that cause biodiversity loss are avoided such as deforestation of primary forests, use of fertilizers and agricultural inputs and destruction of riparian vegetation. Moreover, they use process that cause less impact on biodiversity conservation as crop diversification, multistoreyed configuration and diversification in homegardens, organic fertilization and enrichness of secondary vegetation. Keywords: Land Use. Amazon. Family Farming.
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SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO (GERAL) 09
REFERÊNCIAS DA INTRODUÇÃO (GERAL) 15
2 SABERES TRADICIONAIS E CONSERVAÇÃO DA
BIODIVERSIDADE: USOS, FAZERES E VIVÊNCIA DOS
AGRICULTORES DE UMA COMUNIDADE DE ANANINDEUA-
PA
20
2.1 INTRODUÇÃO 20
2.2 AGRICULTURA E CONSERVAÇÃO DA BIODIVERSIDADE 23
2.4 METODOLOGIA 24
2.4.1 ÁREA DE ESTUDO 25
2.4.2 SELEÇÃO DOS INFORMANTES 26
2.4.3 COLETA DE DADOS 26
2.4.4 ANÁLISE DE DADOS 27
2.5 RESULTADOS E DISCUSSÃO 28
2.5.1 O MODO DE VIDA DOS MORADORES DE IAGARAPÉ GRANDE 28
2.5.2 OS AGRICULTORES DE IGARAPÉ GRANDE 29
2.5.3 A ATIVIDADE AGRÍCOLA EM IGARAPÉ GRANDE E SUA
RELAÇÃO COM A CONSERVAÇÃO DA BIODIVERSIDADE
30
2.6 CONSIDERAÇÕES FINAIS 39
2.7 REFERÊNCIAS 40
3 CONCLUSÕES GERAIS 50
4 APÊNDICES 51
REVISTA DE DESENVOLVIMENTO REGIONAL: NORMAS PARA
PUBLICAÇÃO
51
ROTEIRO DE ENTREVISTA 54
TERMO DE LIVRE CONSENTIMENTO ESCLARECIDO 56
TERMO DE COMPROMISSO I 58
TERMO DE COMPROMISSO II 59
IMAGENS 61
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1. Introdução Geral
A biodiversidade ou diversidade biológica refere-se à variedade de vida,
genes e ecossistemas presentes no planeta Terra, bem como, a interação
entre todos esses componentes (BRASIL, 2000; MEA, 2005). Sabe-se que a
biodiversidade não está distribuída de forma uniforme no espaço e no tempo,
havendo regiões de ampla variedade de espécies e ecossistemas e outras nem
tanto (CARVALHO, 2009).
O Brasil, entre os 17 países megadiversos, é considerado o que
apresenta maior diversidade biológica no mundo por abrigar cerca de 14% da
mesma (LEWINSOHN; PRADO, 2005; METTIMEIER et al., 1997; SARÚKHAN;
DIRZO, 2013). Esta se encontra distribuída nos seus biomas: Amazônia, Mata
Atlântica, Cerrado, Caatinga, Pantanal e Pampas Sulinos (BRANDON et al.,
2005). Além disso, o Brasil apresenta maior número de espécies endêmicas,
maior extensão territorial de floresta tropical (Amazônia) e dois hotspots (Mata
Atlântica e Cerrado) entre os dezenove existentes (MYERS et al., 2000;
RYLANDS et al., 2002).
Dentre os biomas brasileiros, a Amazônia é constituída por uma vasta
biodiversidade que inclui um complexo de ecossistemas e vegetações
(PRANCE, 2013), a saber: floresta de terra firme, floresta de várzea, campos
de terra firme, campina, vegetação serrana e vegetação de restinga (BRAGA,
1979). Em termos de espécies, na região existem mais de 40.000 espécies de
plantas (30.000 endêmicas), 1.300 de aves (263 endêmicas), 427 de anfíbios
(366 endêmicos), 425 mamíferos (172 endêmicos) e 371 de répteis (260
endêmicos) (MIITERMEIER et al., 2003).
A biodiversidade é considerada um fator preponderante para a
manutenção da vida na Terra, pois dela dependem processos ecológicos
diversos1. Particularmente na Amazônia, esta é responsável pela provisão de
bens e serviços, além de participar da cultura dos povos da região (BARROS,
2009; FEARNSIDE, 2008).
1 Interações entre seres vivos e entre ecossistemas, serviços ambientais / ecossistêmicos
(ciclagem de nutrientes, regulação climática, frutificação, fotossíntese, floração, manutenção do solo, polinização, recreação, produção científica, regulação hídrica, etc.), produção de bens alimentares e materiais, dentre outros (PRIMACK; RODRIGUES, 2001).
10
Frente a esta importância e utilização, nos últimos anos a diversidade
biológica tem passado por um acelerado processo de erosão. Na Amazônia
Brasileira, a degradação e exploração desordenada dos recursos naturais,
como exploração madeireira (ASNER et al., 2005), e, sobretudo, a
fragmentação de habitat e o desmatamento têm provocado perda da
biodiversidade (FEARNSIDE, 2005, 2006; VIEIRA et. al., 2008).
A agropecuária e a expansão da fronteira agrícola, principalmente, da
indústria da soja, são os principais fatores de desmatamento e fragmentação
de habitat na Amazônia (BETTS; MALHI; ROBERTS, 2008; DOMINGUES;
BERMANN, 2012; GAZONI; MOTA, 2010), os quais estão também intimamente
relacionados com abertura de novas estradas oficiais e não oficiais (AHMED et
al., 2013; PTAFF et al., 2007). Conter esse processo de degradação ambiental
é primordial para que a floresta amazônica permaneça em pé, assim como
para a manutenção dos serviços ambientais2 e a conservação da diversidade
biológica.
Diversas estratégias têm sido discutidas para solução desses
problemas, os quais incluem: criação de áreas protegidas (MARTINI et al.,
2012; SILVA, 2005; SOARES-FILHO et al., 2010), pagamento por serviços
ambientais (HALL, 2008; MACIEL et al., 2010) e ordenamento territorial aliado
a formas de uso da terra sustentáveis (GALFORD; SOARES-FILHO; CERRI,
2013; GARDNER et al., 2013; SOARES-FILHO et al., 2006). Como exemplo,
Homma (2011) destaca que dentre os principais desafios para a conservação
da biodiversidade amazônica está o desenvolvimento de atividades produtivas
‘mais adequadas’3 e restritas às áreas desmatadas, além é claro, da
preservação das áreas de floresta primária e da recuperação das áreas de
reserva legal (ARL) e áreas de proteção permanente (APP).
Estudos sobre a incorporação das comunidades locais para cogestão de
áreas protegidas e terras indígenas (NEPSTAD et al., 2006; POTTER-
2 Em escala global, os principais bens/serviços providos pela biodiversidade amazônica são
fonte de água doce (20%), ciclagem de água e estoque de carbono, além do potencial genético e o conhecimento associado dos povos da região para o desenvolvimento de remédios (USAID, 2005). 3 Atividades ‘mais adequadas’, de acordo com Homma (2011), são aquelas adaptadas ao ambiente, isto é, não promovem degradação ambiental. Para tal, deve-se levar em conta o conceito de primeira e segunda natureza desenvolvido pelo autor. Pecuária e agricultura, por exemplo, quando desenvolvidas em áreas antropizadas (segunda natureza), promovem menor prejuízo ambiental, sendo assim, sua realização é mais adequada nestas áreas.
11
BOLLAND et al., 2012; SCHWARTZMAN; ZIMMERMAN, 2005), bem como a
inclusão dos seus saberes e práticas (CHARNLEY et al., 2007; MOLLER et al.,
2004; PEI et al., 2009) defendem que estas podem auxiliar na manutenção da
cobertura vegetal e conservação da biodiversidade através de usos
sustentáveis. Além disso, pode-se garantir a reprodução física e social dessas
comunidades e dos seus direitos sobre o território (ALMEIDA, 2004;
NAUGHTON-TREVES et al., 2005).
Vale ressaltar que a Convenção sobre Diversidade Biológica (CDB),
assinada por 175 países, dentre eles o Brasil, prevê princípios e diretrizes para
conservação, valorização e uso sustentável da diversidade biológica. Dentre
estes, se reconhece a dependência das populações dos recursos naturais e a
existência de práticas interessantes para a conservação e uso sustentável da
biodiversidade, além de promulgar no Art. 8 o respeito, a preservação e a
manutenção dos conhecimentos e práticas de comunidades locais de estilo de
vidas tradicionais relevantes para a conservação e uso sustentável da
diversidade biológica (BRASIL, 2000).
A Política Nacional da Biodiversidade, promulgada pelo Decreto
4.339/2002, descreve de forma mais precisa as estratégias e diretrizes que
devem ser tomadas pelo Brasil no que diz respeito ao compromisso assumido
mundialmente relacionado à proteção e conservação da biodiversidade
brasileira. Entre as estratégias adotadas, a realização de estudos e pesquisas
em comunidades indígenas, quilombolas e outras comunidades tradicionais
estão previstas. O objetivo é a valorização e identificação de saberes
referentes à conservação e utilização sustentável da biodiversidade,
reconhecendo-os, também, como importantes para a conservação e não
apenas o conhecimento científico (BRASIL, 2002).
A socialização de saberes das comunidades tradicionais é crescente no
mundo dado o número de estudos científicos, publicação de obras, criação de
núcleos de pesquisa etc. (TOLEDO; BARRERA-BASSOLS, 2009). Em relação
à Amazônia é preciso considerar que esta apresenta uma ampla diversidade
sociocultural representada, em sua maioria, pelos povos indígenas (HECK;
LOEBENS; CARVALHO, 2005). Neste caso, faz-se necessário intensificar
pesquisas que busquem entender as práticas relacionadas às atividades
produtivas dessas comunidades, entre elas, pesca, agricultura, manejo
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florestal, extrativismo dentre outras na tentativa dimensionar práticas produtivas
adaptadas e ajustadas aos ecossistemas da região que proporcionem
conservação e uso sustentável.
Na Amazônia paraense, são diversas as áreas que precisam ser
estudadas, como exemplo podem-se citar a insular da região metropolitana de
Belém (RMB), composta por mais de 40 ilhas (CARDOSO et al., 2006), nas
quais se encontram comunidades locais que, mesmo mais próximas ao meio
urbano, possuem suas identidades socioculturais (ALMEIDA; JARDIM, 2012;
TEIXEIRA; ALVES, 2008).
Dados de Cardoso et al., (2006), mostram que no período de 1990 a
2000 a região metropolitana de Belém constituiu uma das áreas de maior
formação urbana do estado do Pará. Neste período, registrou uma perda de
69% da sua cobertura vegetal florestal (LEÃO; ALENCAR; VERISSÍMO, 2007),
que não atingiu apenas os remanescentes florestais encontrados,
principalmente, na sua região insular e alguns na área continental, como o
Parque Ambiental de Belém com 1.2 mil hectares (AMARAL et al., 2009;
COSTA; PIETROBOM, 2007).
Estas áreas de remanescentes florestais correspondem a 369
quilômetros quadrados (LEÃO; ALENCAR; VERISSÍMO, 2007) e podem ser
considerados como ilhas da biodiversidade, pois são os únicos que
resguardam informações sobre a diversidade biológica da RMB, e, portanto,
podem permitir a formulação de modelos para a restauração e conservação
ecossistêmica (FERREIRA et al., 2012).
Entre os municípios integrantes da região metropolitana de Belém, que
apresenta extensa área insular apresenta-se o de Ananindeua. Este se localiza
no nordeste paraense e é composto de nove ilhas, além da parte continental
(ANANINDEUA, 2013). As ilhas do município são João Pilatos, Viçosa,
Sassunema, Mutá, Guajarina, São José da Sororoca, Sororoca, Arauari e
Santa Rosa (DINIZ, 2010). Entretanto, esta pesquisa se detém a Ilha de João
Pilatos por integrar a comunidade na qual foi realizado este estudo.
João Pilatos é a maior ilha da região insular do município de
Ananindeua, cuja área mede 3.854, 7138 ha (três mil oitocentos e cinquenta e
quatro hectares, setenta e um ares, trinta e oito centiares) (INCRA, 2011)
composta pelas comunidades de Nova Esperança, Igarapé Grande e João
13
Pilatos. A comunidade Nova Esperança possui formação recente4, povoada por
migrantes do bairro Curuçambá, na área onde antigamente funcionava uma
fábrica de extração de argila (DINIZ, 2010). As comunidades de João Pilatos e
Igarapé Grande têm formação mais antiga, entre 100 e 150 anos5, cujas
famílias ribeirinhas vivem, principalmente, do extrativismo vegetal com
destaque para o açaí, atividades agrícolas, pesca e produção de carvão (DINIZ
et al., 2012).
No ano de 2005, a ilha João Pilatos foi reconhecida como Patrimônio da
União a pedido dos moradores, uma vez que os mesmos temiam perder suas
terras por ocasião da invasão às terras da antiga fábrica que atualmente
consiste na comunidade da Nova Esperança. Nesse sentido, a Secretaria de
Patrimônio da União e o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária
(INCRA) viabilizaram a criação do Projeto de Assentamento Extrativista (PAE)
João Pilatos na categoria de assentamento agroextrativista federal através do
processo INCRA/SR-01/Nº 54100.001818/2005-63 que regularizou 200
unidades agrícolas familiares (INCRA, 2011).
O PAE é uma modalidade de assentamento que visa garantir o uso
adequado dos recursos naturais nas áreas em que são implantados de modo a
promover sua conservação e garantir a sobrevivência e subsistência das
populações residentes (INCRA, 1996). Em João Pilatos, a implantação do PAE
ocorreu por meio do “Plano de Uso do Projeto de Assentamento Agro-
extrativista João Pilatos”. Sobre esse assunto, Diniz e colaboradores (2012), ao
analisarem as formas de sustentabilidade da comunidade Igarapé Grande da
ilha de João Pilatos, argumentam que o projeto do INCRA não está em
consonância com a realidade dos moradores, uma vez que desconsiderou os
saberes e práticas da população local, bem como, o modo de vida e a
reprodução social das mesmas.
Sendo assim, há necessidade de maior dialogicidade na implantação de
PAEs, haja visto que esta tipologia de assentamento é crescente na região
amazônica (TORNEAU, 2009). Dessa forma, esta pesquisa tem como objetivo
geral identificar saberes sobre conservação da biodiversidade envolvidos nas
4 O início da ocupação da comunidade Nova Esperança ocorreu a partir do ano 2002 (DINIZ,
2010). 5 Segundo dados da Associação dos Moradores e Pequenos Produtores Rurais da Ilha de
Igarapé Grande (AMPIG).
14
atividades produtivas de moradores da comunidade Igarapé Grande, ilha de
João Pilatos, Ananindeua-PA. E como forma de norteá-lo apresenta-se como
objetivo específico analisar a contribuição dos saberes locais para à
conservação da biodiversidade da comunidade Igarapé Grande.
Portanto, o estudo propôs-se investigar quais são os saberes sobre
conservação da biodiversidade que se fazem presentes nas atividades
produtivas de moradores da comunidade Igarapé Grande, Ilha de João Pilatos,
Ananindeua-PA?
A identificação de usos da biodiversidade associada às práticas de
manejo dessas populações além de possibilitar sua compreensão fornece
elementos necessários à sua afirmação como estratégia sustentável e/ou seu
redirecionamento quando comprometer a conservação ambiental.
Para tanto, considera-se que a relevância da pesquisa consiste na
identificação e valorização de saberes sobre a conservação da biodiversidade
dos moradores de Igarapé Grande, bem como, as práticas que podem
influenciar na degradação ambiental, e partir disso, indicar ações para políticas
públicas que atendam às necessidades da população local e resguardem a
diversidade biológica, e dessa forma, venham a contribuir de maneira geral,
para a conservação ambiental das ilhas do município de Ananindeua.
Os resultados dessa dissertação estão organizados em um artigo
produzido e intitulado como: “Saberes tradicionais e conservação da
biodiversidade: usos, fazeres e vivência dos agricultores de uma comunidade
de Ananindeua-PA”. O mesmo está submetido à Revista de Desenvolvimento
Regional – REDES. O capítulo está formatado de acordo com as normas da
revista. Entretanto, numerações e margens das páginas, estão padronizados
segundo as Normas de elaboração de dissertação do Programa de Pós-
Graduação em Ciências Ambientais da Universidade do Estado do Pará.
15
REFERÊNCIAS
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20
SABERES DE AGRICULTORES E CONSERVAÇÃO DA
BIODIVERSIDADE EM UMA COMUNIDADE DE
ANANINDEUA, PA
KNOWLEDGE OF SMALLHOLDERS AND BIODIVERSITY
CONSERVATION FROM A COMMUNITY IN ANANINDEUA, PA
Resumo: Na atual crise ambiental, busca-se encontrar uma nova forma de relação sociedade-natureza que integre o uso dos recursos naturais à conservação da biodiversidade. Neste contexto, incluem-se as atividades produtivas de pesca, agricultura, extrativismo, caça, dentre outras. Deste modo, este estudo investiga saberes sobre conservação da biodiversidade presentes na atividade de produção agrícola de moradores da comunidade Igarapé Grande, ilha de João Pilatos, Ananindeua-Pará. Os dados foram coletados através de entrevistas semi-estruturadas, com nove agricultores, e informais, com 14 indivíduos, e observação participante com os moradores locais, e analisados através de análise de conteúdo. Os agricultores de Igarapé Grande desenvolvem, principalmente, sistemas de cultivo baseado nos roçados e nos quintais agroflorestais, nos quais são cultivados, sobretudo, Manihot esculenta Crantz, Euterpe oleracea Mart. e Theobroma grandiflorum (Wild. Ex Spreng.) Schum. Estes também sobrevivem de outras atividades como a pesca, extrativismo vegetal, criação de aves, artesanato, e em menor escala, caça e pecuária. A atividade agrícola em Igarapé Grande fundamenta-se em saberes ambientais relacionados à escolha da área para o plantio, época do plantio/safra, procedimentos e técnicas e áreas sem cultivo. Os agricultores reconhecem a importância da conservação da biodiversidade na ilha de Igarapé Grande, e, portanto, desenvolvem técnicas que promovem o enriquecimento das capoeiras, preservam áreas de floresta primária e de mata ciliar e conservam a agrobiodiversidade. Palavras chaves: Roçados Amazônicos. Quintais Agroflorestais. Agrobiodiversidade. Abstract: In the current environmental crisis people seek a new form of relationship between society and nature that can integrate the use of natural resources and biodiversity conservation. In this sense are included productive activities such as fishing, agriculture, harvesting and hunting, among others. In this context, this study investigates knowledge of biodiversity conservation present in the agriculture of the inhabitants of Igarapé Grande on João Pilatos Island in Ananindeua – Pará. Data were collected through semi-structured interviews with nine smallholders and a dozen more non-structured interviews with area residents along with participant observation, and were evaluated using content analysis. The smallholders from Igarapé Grande develop, mostly, agriculture systems based on ‘roçados’ and homegardens for which the main crop is Manihot esculenta Crantz, Euterpe oleracea Mart. e Theobroma grandiflorum (Wild. Ex Spreng.) Schum. It was found that agriculture in Igarape Grande Island is not promoting impacts on biodiversity of island, because processes that cause biodiversity loss are avoided such as deforestation of primary forests, use of fertilizers and agricultural inputs and destruction of riparian vegetation. Moreover, they use process that cause less impact on biodiversity conservation as crop diversification, multistoreyed configuration and diversification in homegardens, organic fertilization and enrichness of secondary vegetation. Keywords: Amazon ‘roçados’. Homegardens. Agrobiodiversity.
21
INTRODUÇÃO
Comunidades tradicionais, povos tradicionais, populações tradicionais6 são
termos comumente utilizados para designar os grupos sociais culturalmente
diferenciados das sociedades urbanos – industriais (HANAZAKI et al, 2010). Nessa
categoria são listados: indígenas7, quilombolas, quebradeiras de coco, caiçaras,
coletores da mangaba, seringueiros, ribeirinhos, extrativistas, pescadores, dentre
outros (CUNHA; ALMEIDA, 2000). Entre algumas de suas características, Pereira e
Diegues (2010) destacam o uso e manejo dos recursos naturais, e,
consequentemente, o desenvolvimento de atividades produtivas (pesca, caça,
cultivo agrícola, domesticação de animais etc.), no qual se estabelece também uma
forte ligação com o território.
A dependência direta das comunidades tradicionais com o ambiente
configura uma modalidade de relação sociedade-natureza diferenciada das
sociedades ocidentais (DIEGUES; ARRUDA, 2001; TOLEDO; BARRERA-BASSOLS,
2009). É uma relação considerada de baixo impacto ambiental (CUNHA;
ALMDEIDA, 2000) e, portanto, que pode propiciar a conservação da diversidade
biológica (SHEN et al., 2012; SILVA; FRAXE, 2013). Nesse sentido, frente à crise
ambiental o modo de vida e os saberes dessas populações têm sido arrolados como
importantes instrumentos para a conservação ambiental (PEREIRA; DIEGUES,
2010).
Os saberes tradicionais ou saberes ecológicos tradicionais são um conjunto
de conhecimentos sobre a vida, o meio ambiente, os seres vivos, o homem etc.,
bem como, a interação entre todos esses elementos expressos por meio de
crenças, usos e práticas de um grupo social (TOLEDO; BARRERA-BASSOLS, 2008;
REYES-GARCÍA, 2009). Lévi-Strauss (1989) situa os saberes tradicionais como
conhecimento baseado no concreto, daí a denominação “ciência do concreto”,
uma vez que esta também é construída através de experimentações e observações
ao longo de anos, bem como, de refutações e validações.
A transmissão dos saberes tradicionais se dá ao longo das gerações a partir
da oralidade na vivência dos mais velhos com os mais novos (DIEGUES, 2008). São
produzidos, na maioria das vezes, por pessoas iletradas e sem instrução escolar,
todavia isso não o invalida como forma de conhecimento, porquanto resultam de
observações e experiências de pessoas tão perspicazes quanto àqueles que estão
na academia (ELISABETSKY, 2003).
6 A definição do termo “população tradicional” e suas variantes não é consensual entre os pesquisadores (CUNHA; ALMEIDA, 2000; DIEGUES, 2008). Há uma definição legal dada pelo decreto nº 6040 de 07 de fevereiro de 2007 (BRASIL, 2007). 7 Cunha e Almeida (2000) consideram que os povos indígenas, no caso brasileiro, compõe uma categoria diferenciada em relação aos demais povos e comunidades tradicionais, visto que estes possuem direito a terra, enquanto que os demais povos, exceto quilombolas, ainda lutam por esse direito, e também por conta da língua dos povos indígenas, em geral, ser diferente do idioma oficial do país.
22
Dentre alguns estudos pioneiros sobre a relação dos saberes tradicionais
com a conservação ambiental têm-se Gadgil; Berkes; Folke (1993) e Balée (1994).
Atualmente este número tem crescido e contemplado vários continentes, como
Gómez-Baggetun et al. (2010) na Europa, Shen et al. (2012), Camacho et al.
(2012) na Ásia e Ramstad et al. (2007) na Oceania. Tais estudos apontam e
reiteram a importância dos saberes dessas comunidades no que se refere à
conservação e utilização sustentável da biodiversidade.
A discussão atual sobre o papel das comunidades na conservação ambiental
pauta-se na integração dos conhecimentos tradicionais aos conhecimentos
científicos (HANAZAKI et al., 2010; BOHENSKY; MARU, 2011) e na inclusão dos
habitantes na gestão dos recursos naturais para conservação e utilização
sustentável (CHARNLEY et al., 2007; POTTER-BOLLAND et al., 2012).
Esse é o caso da parte insular da Região Metropolitana de Belém (RMB)8
que é uma área remanescente da floresta original da mesma (AMARAL et al.,
2009; FERREIRA et al., 2012), na qual residem comunidades que sobrevivem da
pesca, extrativismo vegetal, atividades agrícolas etc. (ALMEIDA; JARDIM, 2012;
DINIZ et al., 2012). Este estudo reporta-se à comunidade Igarapé Grande da ilha
João Pilatos, pertencente ao município de Ananindeua, inserido na RMB.
João Pilatos é a maior ilha do município de Ananindeua e possui uma
cobertura vegetal representativa. Entretanto, esta começa a apresentar indícios de
antropização, principalmente, devido a área de uma fábrica desativada ter sido
invadida por moradores de bairros periféricos de Ananindeua no ano de 2005.
Estes desconhecem os sistemas de uso tradicionais da terra, bem como, não
apresentam os conhecimentos necessários relacionados ao modo de vida
dependente de forma direta dos recursos naturais, como relatado no estudo de
Diniz (2010).
Frente à importância das ilhas como remanescentes florestais e do processo
de continuidade da perda da cobertura florestal da RMB nos últimos anos (LEÃO
et al., 2008), faz-se necessário conhecer a relação entre as famílias da comunidade
Igarapé Grande com o uso da diversidade biológica9, entre os quais, relacionados à
terra. Portanto, este estudo objetivou analisar a contribuição dos saberes presentes
nas atividades agrícolas para a conservação da biodiversidade na comunidade de
Igarapé Grande, ilha de João Pilatos, Ananindeua-PA.
Dessa forma, a questão norteadora deste trabalho é: Quais os saberes sobre
conservação da biodiversidade se fazem presentes nas na atividade de produção
agrícola de moradores da comunidade Igarapé Grande, ilha de João Pilatos,
8 Concentra os municípios de Belém, Ananindeua, Marituba, Santa Bárbara e Benevides (ANANINDEUA, 2013). 9 Entendida nos seus três níveis de compreensão: variedade de espécies, genes e ecossistemas
(PRIMACK; RODRIGUES, 2001).
23
Ananindeua-PA? Dessa forma, poder-se-á indicar caminhos para tornar essa
comunidade cogestora dos recursos naturais visando a sua conservação.
AGRICULTURA E CONSERVAÇÃO DA BIODIVERSIDADE
Em substituição ao extrativismo, o cultivo agrícola trouxe inúmeros
benefícios à humanidade, entre os quais, ampliação e melhoramento da
produtividade e fixação do homem a terra garantindo, assim, sua sobrevivência e
crescimento populacional (PATERNIANI, 2001). Esta prática, no entanto, envolve
custos agrícolas e ambientais, uma vez que simplifica o ambiente natural através
da perda da diversidade biológica, erosão do solo e perturbação de processos
ecológicos (MERCADANTE, 2008).
Por outro lado, se a produção agrícola fosse extinta, a humanidade também
seria, visto que a obtenção de alimentos a partir da coleta e caça seria insuficiente
para alimentar a população mundial (MAZOYER; ROUDART, 2010). Esta assertiva
gera o seguinte impasse: como harmonizar a conservação da diversidade biológica
com o desenvolvimento de atividades produtivas? Questão expressiva no caso
brasileiro, detentor de uma megadiversidade e, ao mesmo tempo, com grande
potencial para produção de alimentos (MARTINELLI; FILOSO, 2009).
Nesse contexto, a região amazônica é o centro das discussões, haja vista
que esta possui a maior floresta tropical contínua do mundo, prover inúmeros
serviços ambientais e detém uma diversidade biológica inestimável (FEARNSIDE,
2008; MITTERMEIER et al., 2003; RYLANDS et al., 2002). Contudo, o cenário de
desenvolvimento aplicado para região permanece na ampliação das fronteiras
agrícolas apoiada na agricultura intensiva acarretando sérios problemas à
manutenção da biodiversidade da mesma (VIEIRA et al., 2008; GAZONI; MOTA,
2010). Soma-se a isso o avanço das pastagens, que têm sido o principal fator do
desmatamento na região, provocando perda de imensas áreas de floresta
(FEARNSIDE, 2005; RIVERO et al., 2009).
A implantação de sistemas de uso da terra/sistemas de produção
sustentáveis, sobretudo, adaptados à agricultura familiar é uma alternativa para
concretização do desenvolvimento sustentável da região, o que inclui a
conservação da biodiversidade (HURTIENNE, 2005).
A mão de obra familiar é a base da agricultura tradicional amazônica
(NODA et al., 2012). Esta se fundamenta na agricultura itinerante10, inicialmente
praticada pelos indígenas, e que, posteriormente, foi incorporada e
redimensionada pelos povos imigrantes - colonizadores europeus e nordestinos
10 Também é conhecida como agricultura de corte e queima e agricultura migratória. Em Inglês, podem ser encontradas as palavras slash-and-burn, shifting cultivation ou swidden.
24
(KITAMURA, 1982; FEARNSIDE, 1989). Este tipo de agricultura foi por muito
tempo o principal modelo de uso e ocupação do solo amazônico (MORAN, 1990),
notadamente, através do sistema de roças, tendo como componente principal a
mandioca (MARTINS, 2005).
A agricultura itinerante caracteriza-se pela derrubada, queima, plantio e
pousio de uma área de vegetação primária, ou então, de uma área em sucessão
secundária (capoeira) em diferentes estágios (COOMES et al., 2000; PEREIRA et
al., 2006; RICHERS, 2010). Em estudo entre os índios kayapó, Posey (1986)
assinala a importância das capoeiras para a manutenção da diversidade biológica
amazônica, pois diversas espécies, incluindo florestais, são plantadas nesses
“campos abandonados”. Assim sendo, atuais florestas consideradas prístinas na
Amazônia podem ter sido florestas secundárias no passado, oriundas de antigas
capoeiras manejadas pelos indígenas (HECKENBERG et al., 2003; HECKENBERG et
al., 2007).
Por outro lado, estudos que reportam mudanças no uso do solo
relacionadas à agricultura tradicional, em virtude do crescimento demográfico e
pressões econômicas, têm ampliado o debate sobre a real contribuição desta na
conservação da biodiversidade (PEDROSO JUNIOR et al., 2008). Frente a isso,
defende-se a transformação da agricultura tradicional por meio de técnicas e
tecnologias modernas desenvolvidas pela ciência (LEAL et al., 2006; RODRIGUES
et al., 2007; LUIZÃO et al., 2009).
Nesse cenário, técnicos e/ou assistentes rurais na tentativa de
transformação da agricultura desenvolvida por populações etnicamente
diferenciadas buscam promover a difusão de conhecimentos científicos
relacionados à atividade agrícola. No entanto, na maioria das vezes, ocorre certo
estranhamento entre os técnicos e às comunidades resultando na rejeição do saber
científico, porquanto nessa aproximação, a lógica dos saberes locais e a realidade
dos moradores é desconsiderada (SILVA JUNIOR; BIASE, 2012). Assim sendo,
buscar compreender o modo de vida, as formas de manejo e usos da terra dos
agricultores de Igarapé Grande entende-se como meio mais eficaz ao diálogo
sobre uma gestão compartilhada dos recursos naturais visando à conservação da
biodiversidade, bem como a reprodução física e social dos mesmos.
METODOLOGIA
Esta pesquisa caracteriza-se como um estudo de caso (CHIZZOTTI, 2011),
de caráter exploratório e, predominantemente, de natureza qualitativa, pois não se
detém a interpretação quantificada, mas está voltada para a compreensão do
contexto que os dados estão inseridos (AMOROZO; VIERTLER, 2010). Sendo
25
assim, optou-se por aplicação de uma amostragem não probabilística
(ALBUQUERQUE et al., 2010b).
Área de Estudo
A pesquisa de campo foi realizada na comunidade Igarapé Grande situada
na ilha de João Pilatos, Ananindeua-PA (010 16’ 22.3” S e 480 22’ 50.4” W).
Optou-se por esta área devido à representatividade territorial (3.854,7138 ha11) da
mesma, sendo assim, a conservação da diversidade biológica da ilha é significativa
para a RMB.
A cobertura vegetal da ilha caracteriza-se por floresta de várzea
representada, principalmente, pelas espécies: açaí (Euterpe oleracea Mart.), buriti
(Mauritia flexuosa L. f.), ucuuba (Virola surinamensis Warb.), andiroba (Carapa
guianensis Aubl.), samauma (Ceiba pentandra L. Gaertn.), louro (Nectandra 11 Fonte: Incra (2011).
Figura 1- Mapa de Localização da ilha João Pilatos, Ananindeua, Pará. Fonte: Base Vetorial CPRM (2008) e IBGE (2010). Elaboração: Laboratório de Modelagem e Estudos Hidroambientais (LEMHA/UFPA).
26
amazonum Nees), assacú (Hura crepitans L.) etc. Apresenta o clima típico da
região amazônica, quente e úmido, com chuvas abundantes, média de 2.6927
mm, e temperatura média anual em torno de 27º C (ANANINDEUA, 2013).
A comunidade Igarapé Grande é composta por quatro localidades,
denominação estabelecida pelos moradores locais: Cabeceira, Bela Vista, Paraíso e
Maritubinha. Nas localidades da Cabeceira e Bela Vista vivem 10 famílias cada, no
Paraíso residem 36 famílias e em Maritubinha 15, totalizando 71 famílias12. O
acesso à ilha de João Pilatos se dá pelo Porto do Surdo, localizado no bairro do
Curuçambá – Ananindeua ou Porto do Fidélis em Outeiro (ANANINDEUA, 2013).
A comunidade Igarapé Grande foi escolhida por abrigar famílias que
realizam atividades agrícolas e por apresentar um histórico de ocupação entre 100
e 150 anos13.
Seleção dos Informantes
Selecionou-se um informante principal (ALBUQUERQUE et al., 2010b) para
orientação nas caminhadas pela comunidade e indicação das famílias que
desenvolviam atividades agroextrativistas. Sobre isso, ressalta-se que na maioria
dos casos, entrevistou-se somente um dos membros da família que era apontado
pelos próprios pares. Também foi aplicada a técnica bola de neve (BAILEY, 1994),
na qual os informantes, ao término da entrevista, indicavam outros sujeitos para
pesquisa.
Coleta de Dados
Ocorreu através de entrevistas (informais e semi-estruturadas) e observação
participante com anotações em caderno de campo e registro audiovisuais,
mediante autorização, formalizada por meio da assinatura de “Termo de Livre
Consentimento e Esclarecido”.
As entrevistas informais eram realizadas de forma espontânea em
momentos de viagens no barco escolar, rabetas14 e caminhadas. Estas não foram
gravadas, mas assim que possível tomava-se notas em caderno de campo.
Informalmente, entrevistou-se 14 sujeitos, sendo que alguns eram moradores de
outras comunidades (03 da comunidade de João Pilatos) e, até mesmo, outras ilhas
12 Fonte: dados da Associação dos Moradores e Pequenos Produtores Rurais da Ilha de Igarapé Grande (AMPIG). 13 Fonte: relato de entrevistas. 14 Canoa de madeira acoplada a um motor de baixa potência.
27
(02 da ilha de Santa Rosa). Estes últimos foram ouvidos devido terem residido na
comunidade Igarapé Grande.
As entrevistas semi-estruturadas seguiram um roteiro elaborado
previamente no qual constava de perguntas relacionadas à identificação dos
sujeitos entrevistados (idade, sexo, escolaridade, dentre outros), e sobre atividade
agrícola (espécies cultivadas, sistema de cultivo, distribuição das espécies, tempo
de pousio, tipo de mão de obra etc.) (ALBUQUERQUE et al., 2010a). Neste caso,
o total de sujeitos entrevistados foram nove, sendo três da localidade de
Maritubinha, cinco da Cabeceira e um do Paraíso.
Na observação participante foram registradas análises prévias, impressões
observações de comportamento, registros de falas em conversas informais,
desenhos esquemáticos, atividades diárias, seguindo uma lógica temporal com
base na descrição de Albuquerque et al. (2010a).
Análise de Dados
Utilizou-se a técnica de análise de conteúdo, a qual “visa decompor as
unidades léxicas ou temáticas de um texto, codificadas sobre algumas categorias,
compostas por indicadores que permitam uma enumeração das unidades e, a partir
disso, estabelecer inferências generalizadoras” (CHIZZOTTI, 2011, p. 113). Dessa
forma, foram levantadas todas as informações coletadas em caderno de campo e
as falas dos sujeitos nas entrevistas e com base no referencial teórico adotado
estabeleceram-se unidades de contexto e unidades de análise (MORAES, 1999).
As unidades de contexto estabelecidas são: saberes ambientais15 e saberes
sobre conservação da biodiversidade. Os saberes ambientais estão relacionados
aos conhecimentos acerca do ambiente para a produção agrícola. Os saberes sobre
conversação da biodiversidade dizem respeito aos conhecimentos sobre práticas
agrícolas que podem propiciar ou não a conservação da diversidade biológica.
As unidades de análise (Quadro 1) foram identificadas nas entrevistas
transcritas e anotações em caderno através de um código de cores e numeração,
isto é, cada unidade de análise corresponde a determinada cor e número. Este
processo de codificação visa auxiliar o pesquisador identificar as informações no
material analisado de forma mais célere.
Quadro 1- Unidades de análise estabelecidas em relação aos saberes ambientais e saberes sobre conservação da biodiversidade.
Unidades de análise Sistema de cultivo Área escolhida para plantio
Obtenção de mudas/sementes Tempo de pousio
15 Esta unidade de contexto foi estabelecida tomando com base o trabalho de Diniz et al. (2012).
28
Período do plantio Áreas sem cultivo
Procedimentos/técnicas Fonte: Elaborado pelo autor a partir do relato das entrevistas, anotações do caderno de campo e
referencial teórico adotado.
Dessa maneira, estruturaram-se os resultados da seguinte forma: modo de
vida da comunidade em geral; caracterização dos agricultores, como exemplo,
faixa etária, sexo, tempo de residência na comunidade Igarapé Grande dentre
outras e; identificação de atividades de produção agrícola relacionadas aos saberes
sobre conservação da biodiversidade.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
O modo de vida dos moradores da comunidade Igarapé Grande
Os moradores da comunidade Igarapé Grande vivem das atividades da
pesca, agricultura e extrativismo vegetal, com destaque para a extração do açaí, e
em menor escala do artesanato (utilitário e decorativo), avicultura (criação de
galinhas e perus), pecuária16 e caça17. Entretanto, há moradores que possuem
outras fontes de renda como aposentadoria, pensão e funcionalismo público.
A maioria dos ribeirinhos tem um histórico de ocupação antiga na ilha,
entre 100 e 150 anos18, e são descendentes de Domiciano Farias de Ramos,
fundador da comunidade Igarapé Grande. Apesar de ocuparem a área há bastante
tempo, no ano de 2005, os habitantes não somente os da comunidade Igarapé
Grande, mas de toda área da ilha de João Pilatos foram incorporados aos projetos
de assentamento agroextrativistas (PAEs) do Instituto Nacional de Colonização e
Reforma Agrária (Incra). A iniciativa partiu dos próprios ribeirinhos, visto que os
mesmos não possuíam títulos de suas terras e temiam perdê-las.
Após a demarcação das terras e a “Concessão de Uso”, o financiamento
oriundo do Incra, permitiu aos moradores, construir e reformar as casas, receber
ferramentas de trabalho, sistema de eletrificação e abastecimento de água. O
projeto ainda prevê, na segunda fase de implantação, provimento de recursos do
Programa Nacional de Agricultura Familiar (Pronaf) para fortalecimento das
atividades produtivas locais.
Mesmo com as melhorias na comunidade, os ribeirinhos ainda carecem de
assistência a alguns serviços básicos, como, assistência à saúde, pois não há um
16 Somente um morador possui uma pequena criação de gado bovino (entre 3 a 5 cabeças). 17 Identificaram-se somente dois moradores que caçavam, sobretudo, tatu e paca. 18 Dado da Associação dos Moradores e Pequenos Produtores Rurais da Ilha de Igarapé Grande (AMPIG).
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posto médico na ilha; segurança, visto que constantemente são relatados roubos e
furtos de piratas; e transporte público, não há qualquer embarcação coletiva19 que
garanta o deslocamento dos moradores, dificultando o acesso a outras ilhas e a
parte continental de Ananindeua.
Em relação à educação, existe uma escola situada na localidade do Paraíso
que atendia alunos do ensino fundamental e médio das quatro localidades da
comunidade Igarapé Grande, bem como das demais comunidades da Ilha de João
Pilatos, de ilhas próximas e do bairro Curuçambá (área continental). No entanto,
durante o percurso desta pesquisa, o ensino médio foi extinto da escola, assim,
muitos estudantes não o concluíram e outros se deslocaram para a o município de
Benevides na tentativa de finalizar o curso.
Os agricultores da comunidade Igarapé Grande
Os agricultores entrevistados, cinco são do sexo masculino e quatro do sexo
feminino, indicando uma distribuição igualitária da atividade entre os gêneros.
Estes dados corroboram com os estudos de Simonian (2006), Machado (2007) e
Sousa e Silva (2012), que apontam para ampliação do papel da mulher no meio
rural, passando de meramente reprodutora para produtora em diversas atividades.
Com relação à faixa etária, a maioria dos entrevistados (cinco) tem mais de
60 anos, quase todos aposentados (quatro) que continuam realizando seus cultivos
agrícolas. O estudo realizado por Beltrão et al. (2005) também identificou essa
tendência entre os idosos do meio rural, a partir dos dados da Pesquisa Nacional
de Amostras por Domicílio (PNAD) de 2002. Os demais entrevistados (quatro)
possuem entre 32 a 59 anos.
O nível de escolaridade dos agricultores restringe-se ao ensino fundamental
incompleto (seis) e três são analfabetos. A pouca escolaridade ou analfabetismo é
um fator bastante encontrado no meio rural, visto que, historicamente, estas
populações não são assistidas educacionalmente (FERRARO, 2012).
Do total dos entrevistados, sete são nativos da ilha de João Pilatos, os
demais são oriundos de localidades próximas à região das ilhas em Ananindeua:
São Paulo das Pedrinhas - Santa Bárbara (um) e Murinim - Benfica (um), e residem
por Ca. 50 e 20 anos, respectivamente.
No que diz respeito aos núcleos familiares, a maioria das unidades de
concessão20 é composta por mais de uma residência, na qual a residência principal
é a dos pais que em média contém 3,3 integrantes, sendo estes os pais, filhos,
19
Existe um barco escolar que transporta alunos e professores, que na maioria das vezes, também é utilizados pelos moradores que não possuem embarcações próprias. 20 Lotes de terra demarcados pela Incra.
30
netos e agregados (compadres). As residências adjacentes são pertencentes aos
filhos/filhas e/ou sobrinhos que ganharam o espaço após constituírem família.
É comum, em alguns períodos do ano, os núcleos familiares adjacentes se
reunirem em mutirão para executarem mais rapidamente uma determinada tarefa,
como exemplo, na abertura de uma roça e na colheita e produção da farinha.
Nestes casos, estabelecem-se acordos entre pais, filhos e compadres sobre a
repartição da produção e troca de dias de trabalho. A prática de ajuda mutua e
solidariedade no meio rural são relatadas também em outros estudos (OLIVEIRA,
2008; SEOANE et al., 2013)
Os indivíduos entrevistados não são exclusivamente agricultores, pois
exercem múltiplas funções, isto é, são pescadores, extrativistas de produtos não
madeireiros e madeireiros, criadores de animais (principalmente, aves) e artesãos.
Essa multiplicidade de tarefas está relacionada aos aspectos ambientais de clima
(períodos chuvoso e seco) que impõe uma sazonalidade determinante em períodos
de safra e entressafra. Quando há escassez de um recurso, amplia-se a força de
trabalho exercida em outra(s) atividade(s) e vice-versa.
Pereira (2011) também identificou um exercício múltiplo de atividades entre
os ribeirinhos das comunidades existentes nas Reservas de Desenvolvimento
Sustentável (RDS) de Amanã e Mamirauá e acrescenta que esta associação de
atividades, para as comunidades ribeirinhas da Amazônia, está relacionada, além
disso, a valores culturais e sociais.
A atividade artesanal abrange a produção de artefatos para pesca (matapi,
viveiros e redes de pesca), produção da farinha (tipiti) e extração do açaí
(paneiros), afora o artesanato decorativo e doméstico. Esta é uma prática
desenvolvida por diversas comunidades na Amazônia, sendo que em alguns locais
representa importante fonte de geração de renda e comércio (SANTOS; COELHO-
FERREIRA, 2011). No caso do artesanato em Igarapé Grande, a produção
desenvolvida tanto por homens, quanto mulheres é uma alternativa de
complementação de renda e de suporte às demais atividade tendo em vista a
produção de ferramentas. Vale ressaltar que a produção artesanal possui aspectos
culturais importantes, visto que diversos artefatos são herança dos primeiros povos
e habitantes da região amazônica, como argumenta Sousa (2009).
Atividade agrícola dos moradores de Igarapé Grande e sua relação com a
conservação da biodiversidade
O principal sistema de cultivo dos agricultores de Igarapé Grande é a roça,
na qual se cultiva, sobretudo, variedades da espécie Manihot esculenta Crantz,
popularmente conhecidas como mandioca e macaxeira (Tabela 1). A
31
predominância desta espécie também é relatada em outros estudos situados na
região amazônica (PEREIRA et al., 2006; LIMA et al., 2012; LIMA et al., 2013).
Tabela 1- Espécies vegetais cultivadas pelos agricultores de Igarapé Grande (Ut: utilidade; Nº de cit: número de citações; A: Alimentação; M: Medicinal) / *Espécies que se cultivam mais de uma variedade. Nome Vulgar Nome Científico Ut. Nº de Cit.
Mandioca* Manihot esculenta Crantz A 9
Cupuaçu Theobroma grandiflorum (Wild. Ex Spreng.)Schum A 6
Açaí Euterpe oleracea Mart. A 6 Banana* Musa ssp. L. A 6
Milho* Zea mays L. A 6
Maxixe Cucumis anguria L. A 6
Jerimum Cucurbita L. A 4
Limão comum* Citrus X limon (L.) Burm. A 3 Arroz Oryza sativa L. A 3
Caruru Amaranthus viridis L. A/M 3
Abacate Persea americana Mill. A 2
Uchi Endopleura uchi (Huber) Cuatr. A 2 Ananã Ananas comosus (L.) Merril A 2 Melancia Citrullus lanatus (Thunb.) Matsum. & Nakai A 2
Côco Cocos nucifera L. A 2
Urucum Bixa orellana L. A/M 2
Tomate Solanum lycopersicum L. A 2 Erva-cidreira Lippia alba (Mill.) N.E.Br. ex Britton M 2
Sucurijú Mikania lindleyana DC. M 2
Feijão Phaseolus vulgaris L. A 2
Quiabo Abelmoschus esculentus (L.) Moench A 3
Pupunha Bactris gasipaes Kunth A 1 Bacuri Platonia insignis Mart. A 1
Bacabi Oenocarpus bacaba Mart. A 1
Manga Magifera indica L. A 1
Mamão Carica papaya. L. A 1
Laranja Citrus X sinensis (L.) Osbeck A 1
Batata Solanum tuberosum L. A 1
Couve Brassica oleracea L. A 1
Pimentinha Capsicum ssp. L. A 1
Puçari Não Identificada A 1
Cheiro-verde Petroselinum crispum (Mill.) Nym. A 1
Gergelim Sesamum indicum D.C. M 1
Eparex Não identificada M 1
Gengibre Zingiber officinale Roscoe M 1
Unha de Gato Uncaria spp. Schreb M 1
Pé de Galinha Eleusine indica L. Gaertn M 1
Coramina Pedilanthus tithymaloides Poit. M 1
Canarana Panicum L. M 1
Corrente Pfaffia glomerata (Spreng.) Pedersen M 1
Sacaca Croton cajucara Benth. M 1
Camomila Matricaria recutita L. M 1
Boldo Plectranthus barbatus Andrews M 1
Capim-marinho Cymbopogon Spreng. M 1
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Nome Vulgar Nome Científico Ut. Nº de Cit.
Juru Não Identificada M 1
Arruda Ruta graveolens L. M 1
Fonte: Relato das entrevistas.
Os quintais são áreas ao redor das casas, nas quais são cultivadas espécies
florestais e arbustivas associadas a espécies agrícolas anuais e perenes (Tabela 1),
por isso são classificados como sistemas agroflorestais (SAFs) (FERNANDES; NAIR,
1986). No caso de Igarapé Grande, predominam o plantio de açaí (Euterpe
oleracea Mart.) e cupuaçu (Theobroma grandiflorum (Wild. Ex Spreng.) Schum).
Além disso, como já citado, abrigam criações de animais, principalmente de aves
(galinhas e perus), que crescem livres ou em pequenos cercados, assegurando uma
alternativa de segurança alimentar através da comercialização do excedente ou do
próprio consumo, como também identificado por Tosetto et al. (2013).
A utilização de sistemas agroflorestais, sobretudo, os quintais são
frequentes modelos de uso da terra adotado por agricultores familiares amazônicos
(CASTRO et al., 2009; MARTINS et al., 2012; VIEIRA et al., 2012). A
diversificação e a multiestratificação de espécies dos quintais podem operar efeitos
benéficos no ambiente (FERNANDES; NAIR, 1986; NAIR, 1993), como maior
proteção e fertilidade do solo, ampliação de interações ecológicas (ABDO et al.,
2008), provisão de habitat secundários para espécies tolerantes a certos níveis de
distúrbios, redução da pressão sob áreas de floresta primária, conexão de
remanescentes florestais (MCNEELY, SCHROTH, 2006) e conservação da
diversidade genética através de bancos de sementes (GALUZZI et al. 2010).
Maxixe (Cucumis anguria L.) e milho (Zea mays L.) também são espécies
representativas cultivadas nos roçados de Igarapé Grande, afora outras espécies
em menor escala (Tabela 1). Os cultivos destas ocorrem misturados às espécies de
mandioca/macaxeira, isto é, não seguem um padrão de alinhamento e/ou
espaçamento agronômico, o que na literatura denomina-se de plantio tradicional
em miscelânea (NODA et al., 2007).
O plantio de Cucumis anguria L. é considerado não convencional pelo
Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento – MAPA (BRASIL, 2010),
contudo na região amazônica é bastante comum, pois esta espécie, embora
exótica, adaptou-se bem ao clima da região (PIMENTEL, 1985). O milho (Zea
mays L.), por outro lado, é utilizado, especialmente, como recurso alimentar para
as aves criadas, principalmente galinhas e perus, nos quintais dos agricultores.
No total, registrou-se 46 espécies cultivadas tanto nos roçados, quanto nos
quintais agroflorestais, sendo a média de espécies por agricultor correspondente a
11,3 espécies. Vale frisar que em algumas espécies é explorado o cultivo de mais
de uma variedade, como é o caso da Manihot esculenta Crantz.
33
Esta diversificação, inter e intraespecífica, é característica da agricultura
tradicional, a exemplo do trabalho de Costa e Mitja (2010) que registraram 97
espécies cultivadas nos pomares e 18 espécies nas capoeiras de ribeirinhos no
Amazonas; Vieira et al. (2007) listaram 38 espécies cultivadas em SAFs de
agricultores no Pará. E quanto à diversidade intraespecífica, Emperaire e Eloy
(2008) catalogaram 150 e 10 variedades de mandioca e macaxeira,
respectivamente; e Lima et al. (2013) 52 variedades de mandioca.
O policultivo proporciona benefícios ao agricultor, uma vez que espécies
consorciadas promovem maior prevenção às pragas, através da cooperação entre
os seus mecanismos de defesa. Por conseguinte, resultam em maiores
produtividade e segurança alimentar (ALTIERI, 2004). Somam-se ainda vantagens
ambientais, como aumento das relações ecológicas, da ciclagem e retenção de
nutrientes e da taxa de resiliência do sistema, regulação climática e hídrica e
depuração da água (JACKSON et al., 2007; PASCUAL; PERRINGS, 2007).
A variabilidade intraespecífica, sobretudo da espécie Manihot esculenta
Crantz, é produto de práticas culturais de permutação de mudas entre roçados
antigos e novos, intra e intercomunitários (ROBERT et al., 2012), bem como
através da seleção artificial realizada pelas comunidades amazônicas (MARTINS,
2005), aspectos que também prevalecem entre os agricultores de Igarapé (Quadro
2).
A prática de obtenção de mudas/semente a partir dos círculos sociais é
importante para a conservação da agrobiodiversidade, pois possibilita a
manutenção e ampliação do pool genético das espécies (LEITE et al., 2012).
Diferentemente da homogeneização de cultivos agrícolas através de sementes
comerciais, que impacta não somente a biodiversidade –silvestre e domesticada-
(MEA, 2005), mas também acarreta erosão dos saberes associados à mesma
(ROBERT et al., 2012).
Quadro 2- Unidades de análise e sua relação com as unidades de contexto.
Saberes relacionados ao ambiente Saberes (práticas) que propiciam a conservação da biodiversidade
Sistema de Cultivo - Quintais agroflorestais. - Roças diversificadas. - Enriquecimento da capoeira.
Obtenção de mudas/sementes
- Mudas do plantio anterior. - Mudas de roçados vizinhos.
Período do plantio/safra
- Preferência por algumas fases lunares, pois aumentam a produção. - Evitam o plantio em quarto minguante, pois prejudica o crescimento dos cultivos agrícolas. - Para se evitar pragas, deve-se plantar na lua nova. - Devem-se fazer a derrubada e queima antes da chegada das
34
chuvas. - O plantio da mandioca no período seco intenso pode levar à perda da produção. Neste caso, deve-se plantá-la um pouco antes da chegada das chuvas. - O plantio do açaí e cupuaçu deve ser feito no período das chuvas. - O milho é bom plantar um pouco antes das chuvas, porque ele não suporta altas temperaturas.
Procedimentos/técnicas
- Devem-se capinar duas a três vezes para evitar que ervas daninha cresçam e compitam com os cultivos agrícolas. - Capinar todo o terreno diminui a fertilidade da terra. - Devem-se retirar os “tocos” (raízes de grande porte das árvores derrubadas) para não impedir a mandioca crescer. - Quanto ao cupuaçu, devem-se podar os galhos para ele possa produzir por muitos anos. - Para produção anual do açaizeiro e cupuaçuzeiro deve-se fazer adubação constante. - O espaçamento no plantio do açaí deve ser entre 8m e 10m. Caso contrário, não ocorrerá uma boa produção. - Podem-se aproveitar os resíduos da capina jogando-os em um buraco para decompor. Com alguns anos, pode-se plantar alguma espécie no local que crescerá. - Onde o solo é bastante compacto, deve se revirá-lo para raiz poder se espalhar. Caso contrário, os cultivos agrícolas, principalmente, a mandioca, não crescerão.
- Aproveitamento da madeira grossa para confecção de carvão. - Limpeza ao redor da área da queima para não ultrapassagem do fogo. - Adubação orgânica (biomassa proveniente da capina).
Escolha da área para plantar
- Onde a terra fica inundada não é propicio para plantar, porque a mandioca morre. - Na terra amarela, solo com menor grau de umidade, é próprio para plantar. - Os antigos buracos de forno (para queimar lenha) podem ser aproveitados para plantar bananeira. - Não é bom plantar em solo arenoso, pois este se aquece bastante, o que pode prejudicar o plantio. - Na terra geral, a produção das frutíferas é constante. Na terra firme, somente de ano em ano.
- Deve-se plantar em áreas com madeiras baixas, onde já ocorreu plantio de roças, as chamadas capoeiras. - Áreas com madeira alta não são derrubadas. - Roças em áreas de capoeira fina (fase inicial da sucessão secundária) produzem muitas ervas daninha, por isso não é bom plantar nestas áreas. - Não se deve plantar em áreas passíveis de inundação porque a mandioca, principalmente, não desenvolverá. - Preferem plantar em áreas de
35
capoeira grossa (fase avançada da vegetação secundária) demanda menos esforço de trabalho (capina).
Tempo de pousio - Quanto maior tempo de pousio, mais fértil fica o solo.
- Descanso da terra é importante para o processo de sucessão ecológica (regeneração ambiental). - Quando o tempo de pousio é longo produzem as capoeiras grossas (áreas de maior acúmulo de biomassa e liteira).
Áreas sem cultivo - São importantes, pois o desmatamento provoca escassez de chuva, morte de peixes e aumento da temperatura.
- Derrubada somente para o plantio. - Deve-se evitar desmatar para a preservação dos rios. - São importantes, pois o desmatamento provoca escassez de chuva, morte de peixes e aumento da temperatura.
Fonte: relatos das entrevistas e anotações do caderno de campo.
Os roçados de Igarapé Grande caracterizam-se por apenas um ciclo de
cultivo, sendo que “abandona-se” a área (pousio), na qual passa a desenvolver-se
uma vegetação secundária (capoeira). Contudo, utiliza-se uma técnica de
enriquecimento das capoeiras (Quadro 2), que consiste no plantio de espécies
frutíferas, sobretudo, cupuaçu (Theobroma grandiflorum) e açaí (Euterpe
oleracea), para aproveitamento da área, como se observa nesta fala:
Eu semeio, faço semear os caroços assim de cupuaçu, de urucum. Eu espalho, assim tudinho no local, no chão mesmo assim [...]. Aí quando for botar um aqui, o outro ali, aí nesse vão aqui que vou pegar mandioca, já enterrei o cupuaçu. Quando eu arrancar a roça, o cupuaçu, já tá tudo aqui. Daqui mais um ano, daqui com cinco anos já tão no ponto deu aparar eles (entrevistada 03).
O plantio de açaí foi uma prática introduzida por técnicos da Empresa de
Assistência Técnica e Extensão Rural- EMATER. Evidencia-se, neste caso, que os
saberes e práticas tradicionais não são estáticos, mas que podem sofrer inserções
de outros conhecimentos (ALMEIDA, 2006). Os agricultores ampliaram a prática
de cultivo nas capoeiras utilizando também a espécie Euterpe oleraceae. Apesar
disso, uma grande parte da produção ainda é proveniente da várzea que é
utilizada de forma coletiva.
O enriquecimento de capoeiras também foi diagnosticado entre caboclos -
ribeirinhos da comunidade Lago de Araras no Amazonas, sendo avaliada como
uma alternativa sustentável frente baixo período de pousio (três a cinco anos)
empregado nas capoeiras (CASTRO et al., 2006), pois promove maior taxa de
regeneração da vegetação secundária (BRIENZA JÚNIOR, 2012).
36
Partindo desse pressuposto, o enriquecimento das capoeiras em Igarapé
Grande também pode ser considerado uma alternativa que reestabelece, em
menor tempo, a vegetação secundária, uma vez que se registraram períodos de
pousio entre três e dez anos. Neste caso, os agricultores avaliam que o impacto do
uso da terra é baixo, ao passo que colaboram para recuperação das capoeiras.
Resta saber, qual seria real contribuição deste enriquecimento, visto que
dependendo das espécies escolhidas, o tempo da regeneração da floresta
secundária pode ser diferente (BRIENZA JÚNIOR, 2012; WILLERDING; OLIVEIRA,
2005).
Mesmo que a vegetação secundária não seja enriquecida, as capoeiras
possuem valor ecológico, pois funcionam como ambientes de regeneração da
vegetação natural, sendo assim, não podem ser consideradas como áreas
totalmente degradadas (ALMEIDA et al., 2010; PEREIRA; VIEIRA, 2001). Isto
contrapõe a ideia de destinação de áreas desmatadas, o que inclui as capoeiras,
para expansão da agricultura mecanizada e agropecuária (HOMMA, 2005).
Outro fator que contribui para considerar que a vegetação secundária pode
estar se reestabelecendo em menor tempo é devido à preferência dos agricultores
pela escolha de áreas com capoeira grossa (áreas de vegetação secundária
avançada) para o plantio. Caso contrário, seria uma contradição os agricultores
afirmarem que estão utilizando um menor tempo de pousio, e ao mesmo tempo,
plantando em áreas de capoeira grossa.
A tendência de escolha das áreas de capoeira grossa é reforçada por meio
dos saberes ambientais dos agricultores, pois reconhecem que tais áreas favorecem
maior produtividade e são menos propensa a proliferação de ervas daninha
(Quadro 2), fator ambiental já caracterizado na literatura (LUIZÃO et al., 2009).
Soma-se a isso que a preferência por áreas de capoeira em detrimento das áreas
de mata (denominada pelos agricultores como áreas de madeira alta) indica certa
estabilidade da regeneração das áreas de capoeira em tempo hábil para novos
ciclos de produção, assim como verificado pelo estudo de Richers (2010).
O aproveitamento da madeira grossa das roças derrubadas para fabricação
de carvão também diminui a pressão sobre a floresta primária. A extração
madeireira abre clareiras no interior da floresta provocando perturbações na
dinâmica do ecossistema por meio do efeito de borda. Consequentemente, há
aumento da taxa de luminosidade e vento para seu interior, afetando na
distribuição e riqueza das espécies e ainda pode ocasionar focos de incêndio
(LUIZÃO et al., 2009).
A utilização da queima na abertura das roças é um fator de risco, como
relatado em alguns trabalhos (NEPSTAD et al., 2008). Entretanto, verifica-se entre
os agricultores de Igarapé Grande, o cuidado de limpeza da área em volta do local
onde será ateado o fogo com o objetivo de impedir a expansão do mesmo para as
37
áreas adjacentes. A queima, apesar de ser uma prática bastante antiga, que serve
para incorporação de nutrientes da biomassa carbonizada ao solo (FEARNSIDE,
1989), tem sido debatida em termos de sua sustentabilidade. Seu uso frequente
provoca perda da fertilidade do solo ao longo dos anos, sendo necessários
períodos de pousio cada vez mais longos para regeneração ambiental. Além disso,
discute-se o impacto desta sobre o banco de sementes do solo (LEAL et al., 2006).
Portanto, defendem-se propostas de substituição da queima pela técnica de
corte e trituração. Esta consiste no corte raso da vegetação e, posteriormente,
trituração da mesma; após isso, deposita-se a biomassa triturada sobre o solo que
com o passar dos dias sofre decomposição e libera nutrientes para o mesmo
(VEIGA et al., 2012). Apesar de essa prática ser vantajosa em termos ambientais,
existem limitações financeiras para sua implementação por parte dos agricultores,
visto que estes não possuem condições de adquirir máquinas para corte raso e
trituração. Há possibilidade de fazer o corte e a trituração manualmente,
entretanto, exige-se maior força de trabalho, o que se torna uma dificuldade para
os mesmos, pois a única mão de obra empregada é familiar.
Embora os agricultores não utilizem técnica de adubação de corte e
trituração, estes utilizam uma prática mais tradicional e de menor custo, que
consiste na utilização dos resíduos vegetais proveniente da capina. Hole et al.
(2005) asseguram que a adubação orgânica em substituição ao uso de insumos e
fertilizantes inorgânicos aliada a outras práticas pode contribuir para maior
diversidade de espécies nas paisagens agrícolas.
A prática da capina está relacionada a saberes ambientais ligados ao
desenvolvimento do plantio, e segundo os agricultores, sua execução necessita de
habilidades:
Quem capina mais é eu porque a maniva tá miúda e é um buraco lá, outro aqui, bem espaçoso, a gente não pode meter enxada logo, tem que ir devagar, perto da maniva a gente tem que parar tirar todos capins se não mata a maniva, aí bota aqueles capins tudo no pézinho dela aí ela cresce rapidinho (entrevistado 05).
Os saberes ambientais perpassam, ainda, toda a relação dos agricultores
com o uso da terra (Quadro 2). Estes possibilitam, por exemplo, a construção de
um calendário próprio de atividades (período do plantio de cada espécie, período
da safra/colheita de cada espécie) não somente atrelado aos aspectos climáticos,
mas também referentes à posição lunar. Tal relação é relatada por Altieri (2004, p.
34) que afirma que muitos agricultores “podem semear de acordo com a fase da
lua, acreditando que há fases lunares de precipitação”.
A área média de roça em Igarapé Grande corresponde a 0,67 ha. Este valor
aproxima-se do valor ideal para agricultura de corte e queima de baixo impacto –
38
0,5 há (EMPERAIRE; ELOY, 2008). Ademais, 0,67 ha aproxima-se dos valores
encontrados no estudo de Richers (2010) para áreas de várzea, na qual a pressão
para uso da terra é menor do que em áreas de terra firme.
O tipo de uso da terra implica na diversidade das florestas secundárias
posteriores. Estudos revelam que florestas sucessionais sobre solos onde
anteriormente havia pastagem ou praticava-se a agricultura intensiva, a
diversidade florística é menor do que sobre solos da agricultura de corte e queima
(MORAN et al., 2000; PEREIRA; VEIRA, 2001).
As áreas sem cultivo são cruciais para a conservação da biodiversidade
sendo uma prerrogativa do Código Florestal (CFl) brasileiro, denominada de
Reserva Legal (AVANCI, 2009). Além disso, as matas ciliares acabam também
sendo preservadas, tendo em vista o saber ambiental de que plantios próximos a
áreas inundáveis acarretam em prejuízos agrícolas (Quadro 02), aspecto também
retratado no CFl (STEFANELO, 2009). Verifica-se que os agricultores de Igarapé
Grande compreendem essas relações, como demonstra esta fala:
olha uma mata dessa aí, o cara não poder destruir tudo. Se não vai dar a seca, né. Como já deu aí, morre muita coisa aí, peixe é, peixe morre, não tem mais árvore, é só quentura (entrevistado 04).
Dessa forma, os ribeirinhos reconhecem que a conservação do ambiente
está diretamente ligada a manutenção das suas atividades, e consequentemente,
procuram manejar a área de forma harmônica.
Por fim, deve-se destacar que a principal vocação produtiva dos moradores
de Igarapé Grande não é representada pela agricultura, tanto que dentre 76
famílias, foram apontadas somente nove pelo informante principal para a
realização de entrevistas. Tal fato pode ser explicado pela localização da
comunidade Igarapé Grande em um ambiente de várzea, onde a influência da
pesca e extração do açaí é muito maior, fato também encontrado no estudo de
Richers (2010).
A produção proveniente do cultivo agrícola destina-se, principalmente, ao
autoconsumo diferentemente do extrativismo do açaí, que parte desta é voltada
para comercialização. A subsistência é um aspecto comum entre pequenos
produtores tradicionais, na qual a lógica do mercado ainda não exerce influencia
significativa, o que gera maior sustentabilidade social e ambiental (LIMA;
POZZOBON, 2005).
A produção agrícola em Igarapé Grande não vem produzindo grandes
impactos na conservação da biodiversidade na ilha, visto que os principais
processos de perda de biodiversidade são evitados como desflorestamento de
matas primárias, uso de insumos e fertilizantes agrícolas e destruição das matas
39
ciliares. E ainda, utilizam-se de processos que provocam menor impacto sobre a
biodiversidade, como, diversificação das espécies agrícolas, multiestratificação e
diversificação de espécies nos quintais, adubação orgânica, enriquecimento de
capoeiras dentre outros.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Os saberes ambientais expressam-se de forma mais ampla nos relatos dos
agricultores. Este fato era de certa forma esperado, visto que o conhecimento
sobre o ambiente e sua dinâmica é importantíssimo para a sobrevivência e
reprodução do modo de vida dos entrevistados.
Os saberes ambientais estão fortemente ligados a alguns princípios da
conservação da biodiversidade como os saberes sobre tempo de pousio,
crescimento da vegetação secundária e seus impactos no desenvolvimento do
plantio. Além disso, percebeu-se saberes ligados diretamente à conservação, uma
vez que os entrevistados reconhecem o impacto do desmatamento no equilíbrio
ecológico, consequentemente, na manutenção da biodiversidade.
De forma geral, os moradores de Igarapé Grande percebem a sua
dependência dos recursos naturais e tem o entendimento das consequências da
exploração desordenada, por isso procuram utilizar a biodiversidade para tão
somente suprir suas necessidades de sobrevivência. Portanto, consideram a
agricultura como uma atividade de subsistência que não afeta a dinâmica na ilha.
Contudo, é preciso considerar que os agricultores percebem uma forte
pressão do mercado para ampliação das fronteiras agrícolas na ilha de João Pilatos.
E frente à valorização econômica de alguns produtos agrícolas (como a farinha),
estes vislumbram uma forma de emancipação e desenvolvimento. No entanto, são
limitados pela baixa capacidade de investimento na atividade e pela reduzida mão
de obra.
Faz-se necessário a formulação de políticas públicas que não somente
atuem de forma restritiva proibindo o uso dos recursos naturais, ou então,
regulamentando suas atividades. É preciso compreender as demandas dessas
populações ribeirinhas, seu modo de vida e os meios que eles utilizam para sua
reprodução física, cultural e social.
A realização deste estudo, juntamente com outros que enfoquem as demais
atividades realizadas pela comunidade, aliados à estudos econômicos poderiam
indicar soluções mais favoráveis ao desenvolvimento social, econômico e cultural
da comunidade Igarapé Grande.
Pesquisas que tratem do uso das espécies florestais (madeireiras e não
madeireiras) e da aquicultura também poderão apontar eventuais práticas locais
40
relacionadas à conservação da biodiversidade. Somente com informações acerca
de todas as atividades realizadas pelos grupos humanos da Ilha de João Pilatos é
que será possível caracterizar um panorama conservacionista nesta ilha.
As comunidades das ilhas da RMB como dependentes diretas do meio
ambiente e sua biodiversidade são as primeiras a desejarem a conservação, não
somente porque significa um ambiente de provisão de recursos naturais, mas
também pelo seu valor cultural, religioso e ancestral.
REFERÊNCIAS
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CONCLUSÕES GERAIS
A atividade agrícola é um aspecto importante para segurança alimentar
e saúde dos ribeirinhos de Igarapé Grande, que combinada às outras
estratégias produtivas garantem a sobrevivência destes, ainda que de forma
precária. O cultivo de espécies vegetais é possível graças aos saberes,
repassados entre as gerações, que abrangem a dinâmica do meio ambiente
para maior e melhor produtividade, bem como promovem menor taxa de perda
de biodiversidade em comparação à agricultura intensiva.
Por outro lado, estes reconhecem os impactos que a agricultura gera ao
meio ambiente, e, portanto, procuram realizá-la de forma harmoniosa,
mantendo áreas de floresta primária e matas ciliares. Neste caso, segundo os
entrevistados, a atividade de produção agrícola em Igarapé Grande não
provoca perda de biodiversidade.
Entretanto, frente ao crescimento populacional na ilha é preciso que o
poder público garanta a sustentação do modo de vida dos residentes através
da inclusão de outras estratégias de produção e geração de renda. Caso
contrário, a tendência será o aumento da área plantada e/ou uso de
tecnologias mais agressivas ao meio ambiente.
A geração de renda por outros meios, como turismo ecológico e
aquicultura são atividades que poderiam ser inseridas na ilha, possibilitando
menor impacto ambiental e maior conservação da biodiversidade. Além disso,
programas de educação ambiental, ainda inexistentes na ilha, tanto como parte
do currículo escolar, como através de ações extraescolares podem contribuir
para a valorização, conservação e uso sustentável da biodiversidade da região
insular de Ananindeua.
A incorporação de forma mais efetiva dos residentes da comunidade
Igarapé Grande na gestão dos recursos naturais do ambiente em que vivem é
essencial para que os princípios de conservação ambiental sejam alcançados.
Por fim, o atendimento às necessidades básicas dos ribeirinhos permite
a permanência dos mesmos no ambiente rural, reduzindo a emigração para
meios urbanos, consequentemente, problemáticas sociais.
51
APÊNDICES
Apêndice I- Revista de Desenvolvimento Regional
Normas para Publicação
1. Os artigos devem ter um máximo de 30 laudas, com 30 linhas no mínimo
cada, e em torno de 80 toques por linha cheia.
1.1 Resenhas devem ter um máximo de 4 laudas.
2. FONTE, de preferência, Humanst531 BT, 12; senão, Arial 12; Título em
negrito, tamanho 16.
2.1 CONFIGURAÇÃO DA PÁGINA: margens superior 2,5; inferior 2,5;
esquerda 3,0; direita 3,0.
2.2 PARÁGRAFO: Entrelinhas, de preferência, "pelo menos" 15 pt,
espaçamento 4pt.
3. A primeira página, além do início do texto, deverá conter o título do trabalho
em português e em inglês, o(s) nome(s) do(s) autor(es), titulação, local de
trabalho e função que exerce e endereço eletrônico (e-mail) para contato.
4. Além disso, ainda na primeira página, deverá ser apresentado um RESUMO
(em português) e um ABSTRACT (em inglês), ambos em um único parágrafo.
Artigos escritos em língua estrangeira deverão inverter a ordem de
apresentação: em primeiro lugar o Abstract (em inglês) e em seguida o
Resumo (obrigatoriamente em português).
No final do Resumo e do Abstract deverão constar Palavras-chave e Keywords
respectivamente, indicativas dos principais assuntos tratados no artigo.
5. Os artigos, resenhas, documentos, comentários e comunicações científicas,
notas de pesquisa devem estar vinculados preferencialmente com o contexto
do desenvolvimento regional e serem escritos também, preferencialmente, em
língua portuguesa, espanhola ou inglesa.
6. As indicações bibliográficas deverão estar em ordem alfabética, dentro das
normas usuais. Exemplos:
Um autor
COBRA, Marcos. Marketing essencial: conceitos, estratégias, controle. São
Paulo: Atlas, 1988. 502 p.
Dois autores
52
CERVO, A. L.; BERVIAN, P. A. Metodologia científica; para uso dos estudantes
universitários. 2. Ed. São Paulo: McGraw-Hill do Brasil, 1978. 144 p.
Três autores
BOBBIO, N.; MATTEUCCI, N.; PASQUINO, G. Dicionário de política. 4. Ed.
Brasília: EDUnB, 1992. 530 p.
Quatro ou mais autores
FRANÇA, J. L. et al. Manual para normalização de publicações técnico-
científicas. 3. Ed. Belo Horizonte: Editora UFMG, 1996. 191 p.Organizador,
coordenador etc.
BECKER, Dinizar Fermiano (Org.) Desenvolvimento sustentável: necessidade
e/ou possibilidade? Santa Cruz do Sul: EDUNISC, 1997. 238 p.
Textos integrantes de uma coletânea
STOREY, Christine. Gênero e educação ambiental na Amazônia. In: NOAL, F.
O.; REIGOTA, M.; BARCELOS, V. H. de (Org) Tendências da educação
ambiental brasileira. Santa Cruz do Sul: EDUNISC, 1998, p. 11-25.
Trabalhos apresentados em eventos
MOREIRA, A. F. B. Multiculturalismo, currículo e formação de professores. In:
SEMINÁRIO ESTADUAL DE EDUCAÇÃO BÁSCIA, 2., 1998, Santa Cruz do
Sul. Anais... Santa Cruz do Sul: EDUNISC, 1998, p. 15-30.
Artigos de publicações periódicas
* Com o autor identificado
STRECK, Lênio Luiz. Direito penal, criminologia e paradigma dogmático: um
debate necessário. Revista do Direito - Departamento de Direito da UNISC,
Santa Cruz do Sul, n. 4, p. 71-89, dez. 1995.
* Sem autor identificado
COMPUTADOR facilita dia a dia dos designers. Design gráfico, São Paulo, v.
4, n. 25, p. 28-31, 1999.
Artigos de Jornal
AZEVEDO, Dermi. Sarney convida igrejas cristãs para diálogo sobre o pacto.
Folha de São Paulo, São Paulo, 22 out. 1985. Caderno de Economia, p. 13.
Entidades coletivas
53
UNIVERSIDADE DE SANTA CRUZ DO SUL. Plano de desenvolvimento
institucional. Santa Cruz do Sul: UNISC, 1993.
Especificação de volume
* Periódicos
SIGNO. Santa Cruz do Sul: Editora da UNISC, 1975-. Semestral. ISSN 0101-
1812.
FOLHA ON-LINE. São Paulo. Diário. Disponível em: . Acesso em 27 ago. 2001.
REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. Brasília: Brasília Jurídica,
1997- Mensal. CD-ROM. Ementário da Jurisprudência do STJ.
Dissertações, teses etc.
RATHKE, Fabiana Silveira. Avaliação da qualidade da água em propriedades
de produtores de tabaco nos municípios de Gramado Xavier, Sinimbu e Santa
Cruz do Sul, RS, Brasil, utilizando bioensaios. 2001. 256 f. Dissertação
(Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento Regional - Mestrado e
Doutorado) - Universidade de Santa Cruz do Sul, Santa Cruz do Sul. 2001.
Congressos, conferências, encontros e outros eventos científicos
CONGRESSO LATINO-AMERICANO DE BIBLIOTECONOMIA E
DOCUMENTAÇÃO, 1, 1980, Salvador. Anais... Salvador: FEBAB, 1980. 350 p.
7. Para citações bibliográficas no corpo do texto, sugere-se o sistema autor-
data e, se for o caso, autor-data-página. Nas citações com indicação de fonte
entre parênteses, as chamadas pelo sobrenome do autor ou pela instituição
responsável devem ser em letras maiúsculas; se aparecerem no texto, devem
estar em minúsculas.
Exemplos:
"Pode-se concluir que as organizações [...] estão se aperfeiçoando." (SILVA,
2001, p. 4).
Silva (2001, p. 4) diz que "pode-se concluir que as organizações [...] estão se
aperfeiçoando".
8. As ilustrações e tabelas [indicar fonte (dados bibliográficos)] devem ser
numeradas em arábico, consecutivamente, sempre que possível na ordem em
que aparecem no texto.
54
Apêndice II - Roteiro de Entrevista
I - IDENTIFICAÇÃO PESSOAL
1.1 Sexo ( ) M ( ) F
1.2 Idade:
1.3 Estado Civil
Casado ( ) Solteiro ( ) Outro ( ) Qual? ____________________________
1.4 Escolaridade
1.5 Você é nativo da ilha? Se não, onde nasceu?
1.6 Seus pais são/eram nativos? Se não, qual o lugar de origem deles?
1.7 Em que seus pais trabalhavam?
1.8 Se você não é nativo, há quanto tempo é morador da ilha? Por que você
decidiu morar aqui?
1.9 Quantas pessoas moram na sua casa incluindo você?
1.10Qual o grau de parentesco entre você e estas pessoas?
1.11 Você possui filhos? Quantos? Ainda moram com você?
1.12 Quantos frequentam ou frequentaram a escola?
1.13 Quantos trabalham?
1.14 Qual o tamanho do seu terreno?
1.15 Seu terreno já foi dividido com os filhos? Se, quantas vezes?
1.16 Qual o tamanho que você cedeu para cada um dos seus filhos?
1.17 Qual (is) é (são) o(s) seu(s) principal (is) meio(s) de sobrevivência?
II- CARACTERIZAÇÃO DAS ATIVIDADES PRODUTIVAS: AGRICULTURA
2.1.1 Quais são as espécies vegetais que você cultiva?
2.1.2 Há quanto tempo você desenvolve esta atividade?
2.1.3 Qual a mão de obra que você utiliza para o desenvolvimento desta
atividade? Por quê?
2.1.4 Quanto à mão de obra familiar, quantos estão envolvidos nesta
atividade?
2.1.5 Em relação à faixa etária da mão de obra familiar, quem são os
envolvidos na atividade?
2.1.6 Onde esta atividade é desenvolvida?
2.1.7 Qual o tamanho da terra que você utiliza para o plantio? Por quê?
2.1.8 Como você escolhe uma área para o cultivo das espécies vegetais?
Justifique.
2.1.9 Que ferramentas e/ou produtos você utiliza no desenvolvimento desta
atividade? Justifique.
2.1.10 Onde e como você adquire essas ferramentas e/ou produtos?
2.1.11 Quais são os procedimentos/técnicas que você desenvolve antes do
plantio e no plantio das suas espécies vegetais? Por quê?
55
2.1.12 Quais são os procedimentos/técnicas que você desenvolve no período
de crescimento das suas espécies vegetais? Por quê?
2.1.13 Quais são os procedimentos/técnicas que você desenvolve para colheita
de suas espécies vegetais? Por quê?
2.1.14 Com quem, onde e como aprendeu?
2.1.15 Em relação às culturas anuais, qual o período que ocorre o cultivo
(plantio e colheita) das suas espécies vegetais?
2.1.16 Em relação às culturas perenes, com que frequência você costuma
plantar novas mudas e em que período do ano? Por quê?
2.1.17 Como você distribuiu o plantio das culturas no seu terreno Por quê?
2.1.18 Por quanto tempo você utiliza uma mesma área para cultivo das suas
espécies vegetais? Por quê?
2.1.19 Qual a sua produção média por mês?
2.1.20 A produção ao longo dos anos tem aumentado ou diminuído?Justifique
2.1.21 Qual o destino da sua produção?
Somente consumo ( ) Consumo e venda ( ) Somente venda ( )
2.1.22 Se você vende seus produtos, como eles são comercializados? E/para
onde? Por quê?
2.1.22 Você repassa seus conhecimentos sobre esta atividade aos mais
jovens? Como? Por quê?
2.1.23 Eles demonstram interesse em aprender sobre esta atividade? Por quê?
2.1.24 Você já recebeu algum recurso público (PRONAF ou outro) para o
desenvolvimento desta atividade? Explique.
2.1.25 Você já recebeu alguma orientação técnica de empresas privadas ou
órgãos públicos para o desenvolvimento desta atividade? Explique.
2.1.26 Se sim, que informações são repassadas?
2.1.27 Você utiliza as orientações dos técnicos na sua prática diária? Por quê?
2.1.28 Que diferenças você encontra entre os saberes veiculados pelos órgãos
e os aprendidos com seus pais/colegas que atuam na Agricultura?
2.1.29 Você conhece o plano de uso do Projeto Agroextrativista Ilha João
Pilatos?
2.1.30 Se sim, você procura atender às diretrizes e princípios estabelecidos no
mesmo? Por quê?
2.1.31 Você acha que daqui alguns anos você conseguirá extrair/produzir a
mesma quantidade deste recurso/produto? Justifique.
2.1.32 Para você, o que significa conservar a biodiversidade?
2.1.33 Você considera que alguns dos procedimentos desta atividade auxiliam
ou prejudicam na conservação da biodiversidade em Igarapé Grande?
Justifique.
2.1.34 Quais são as principais dificuldades que você encontra para o
desenvolvimento desta atividade?
2.1.35 Quais são as principais facilidades que você encontra para o
desenvolvimento desta atividade?
56
Apêndice III – Termo de Consentimento Livre e Esclarecido
57
58
Apêndice IV – Termo de Compromisso I
59
Apêndice V – Termo de Compromisso II
60
61
Apêndice VI – Imagens
Imagem 5 – Criação de aves em Igarapé Grande.
Imagem 1 – Rio Magauriaçu, Ananindeua-PA. Imagem 2 – Porto do Surdo, Curuçambá.
Imagem 3 – Roça de mandioca/macaxeira em Igarapé Grande.
Imagem 4 – Casa de farinha em Igarapé Grande.
62
Universidade do Estado do Pará Centro de Ciências Naturais e Tecnologia
Programa de Pós-Graduação em Ciências Ambientais – Mestrado Tv. Enéas Pinheiro, 2626, Marco, Belém-PA, CEP: 66095-100
www.uepa.br/paginas/pcambientais
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