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MITOS CHINESES: A VERDADE É UM MITO

Quanto à mitologia de todo este vasto território do continente asiático, podeconstatar-se que, realmente, talvez seja uma cópia da própria organizaçãohierarquizada da sociedade chinesa, pois assim como havia um governantemáximo à frente de cada dinastia, também devia adorar-se um deus único esupremo, o qual recebia, ao mesmo tempo, obediência e reverência por parte dasoutras deidades.

Alguns dos seus chefes religiosos foram considerados, entre a legendáriapopulação chinesa, como seres imortais ou encarnações da denominada "OrigemPrimeira", deidade que fazia parte de uma trindade de deuses com poderes paravencer o mal e os seus representantes.

No entanto, o panteão chinês conta com uma grande variedade de deuses. E atéos fundadores de grandes movimentos religiosos tiveram em conta o ancestral -rico e variado- de todos os estados feudais assentados em território chinês, paraconfeccionar os seus dogmas e assertos. A povoação agradeceu, na prática, estedetalhe dos seus iluminados, pois elevou à categoria de mito tanto o autor como asua obra. Deste modo, arraigará entre a população o mítico conceito denominado"tan", cujo simbolismo é tão rico que ultrapassa a sua origem primigénia; "tan"significa "caminho", "via". É um princípio guiador de tudo quanto existe e douniverso inteiro. Pelo "tan" há verdade, e sabedoria, e harmonia. ..

Sucede a mesma coisa com a introdução da moral como único aspecto reguladorde qualquer relação social, quer seja pública ou privada, que deveria desembocar,por obrigação, numa ética do altruísmo, do desprendimento, da solidariedade, dorespeito e da tolerância entre os humanos. Tratar-se-ia de erradicar a beligerância,o ódio e as guerras e, ao mesmo tempo, substituí-los pelo amor universal e a paz.

MITO DA ETERNA JUVENTUDE

Há que acrescentar, além do mencionado, outros aspectos que completarão estepanorama, real e mítico ao mesmo tempo. A população deste imenso territóriochinês também adorava os fenômenos da natureza, as suas forças desatadas;comemorava o espírito dos antepassados; acudia a consultar os oráculos eparticipava de um ritualismo rico em sacrifícios e esoterismo mágico.

Muito especialmente, se pretendia uma longevidade perene -o mito da eternajuventude- que, mais tarde, aparecerá em todas as outras culturas e civilizações,especialmente na mitologia greco-latina.

A verdade é que o povo chinês tinha um deus especialmente dedicado a procurarjuventude e viçosidade a todos os que lho rogassem e, por isso, lhe ofereceramcontínuos sacrifícios e preces.

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Esta deidade chamava-se Cheu-Sing e era a encarregada de guardar a vida doshumanos, pois, entre outras coisas, tinha poder para fixar o dia em que tinha demorrer uma determinada pessoa. Mas, segundo a crença popular, se podia mudara vontade deste deus oferecendo-lhe sacrifícios e participando nos diversos rituaisna sua honra. Tudo isto indica que era possível estender os anos de vida, bastavaque Cheu-Sing prolongasse a data que tinha marcado de antemão e, pelo mesmomotivo, ampliasse, assim, o tempo de vida daqueles mortais que mais fidelidadelhe tivessem demonstrado.

O "VENERÁVEL"

No entanto, segundo as narrações mitológicas do povo chinês, há uma deidadesuperior, criadora do mundo e de tudo quanto existe, rei dos mortais e dos outrosdeuses. Recebe o nome genérico de "Venerável Celeste da Origem Primeira" e hájá muito tempo -uma eternidade- que delegou todo o seu poder num dos seusdiscípulos e, ao mesmo tempo, segundo dos três deuses -denominados os "TrêsPuros"- que compõem a trindade chinesa. O nome deste deus, que realiza apesada tarefa que lhe encomendou o seu mestre, é "Senhor do céu". E chegaráum dia em que também ele deixará que o seu sucessor leve a cabo o trabalho deordenar e governar o universo inteiro. Mas, por agora, é o último dos "Três Puros",e é um deus que se evoca pelo nome de "Venerável Celeste da Aurora".

Para levar a cabo a ingente tarefa encomendada pelo primeiro dos deuses, o seudiscípulo contava com a ajuda doutras deidades afins. Por exemplo, narra o relatomítico que o segundo dos deuses, isto é, o "Senhor do céu", delegavadeterminadas funções no "Segundo Senhor", um deus muito célebre e popularporque travava, a quem o invocava, os maus espíritos. Enviava contra estes o"Cão Celeste", que os perseguia com raiva e não permitia que assustassem oshumanos. Também havia deusas de segunda ordem que tinham como missãopredizer a possibilidade de casamentos estáveis. A elas acudiam muitos jovenspara consultá-las acerca das qualidades do seu futuro marido e também sobre aconveniência ou não de casar-se.

DISTRIBUIR FELICIDADE

O anterior não faz senão avaliar a teoria defendida por quase todos osinvestigadores da mitologia. Estes, com respeito às lendas chinesas, afirmam queo imanente e o transcendente são uma mesma coisa, dado que, realmente, aorganização entre os deuses é similar à estrutura da sociedade dos humanos.Aqueles se servem de outros mais inferiores para levar a cabo as suas tarefasmais custosas; sucede a mesma coisa entre os mortais, pois os governantes seservem de subordinados -ministros, funcionários, etc.- para levar a cabo as suasrealizações em pró do bem geral do seu povo. Tanto os deuses como osgovernantes devem procurar o bem material e moral dos humanos, pois, casocontrário, o universo e o mundo albergariam unicamente ruindade e desgraça.Portanto, segundo explicam as narrações dos mitos chineses, a atenção e a

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própria existência dos deuses e dos governantes são absolutamente necessárias.Mas os governantes têm que demonstrar sabedoria em todos os seus atos. E osdeuses devem cumprir com diligência a missão que lhes foi encomendada pelosseus mestres ou pelos deuses superiores. E, assim, existiam deidades que seencarregavam de apontar as boas e más ações dos humanos e, ao mesmotempo, deviam procurar levar ao mundo dos mortais a maior felicidade possível. Aencomenda de distribuir paz, felicidade e alegria entre os humanos era uma tarefainvejável que nenhuma deidade eludia.

AGENTE DA TERRA

Outros muitos deuses menores ajudavam a deidade superior "Deus do céu"; era oseu dever e a sua única função. Deste modo, o paralelismo com a estrutura dasociedade humana era uma realidade tangível, pois estes deuses inferiorescumpriam os mandatos da deidade que estava por cima deles e esta, por sua vez,devia obediência à seguinte de grau superior. Assim até chegar ao mais poderosode todos, por cima do qual ainda existia outro deus que tinha delegado nele assuas funções -a pesada carga de governar- mas que, não obstante, continuavasendo o mais poderoso de todos os deuses do panteão chinês.O mundo mitológico, portanto, tinha sido construído de acordo com os mesmoscritérios usados nas próprias sociedades humanas. Aqui, o soberano -que tinhapor cima dele os deuses- organizava o seu território e publicava as suas leis coma ajuda -com certeza, obrigatória- dos seus súditos, que se encontravamperfeitamente organizados por categorias e deviam cumprir fielmente os mandatosdos seus superiores. Portanto, humanos e deuses se organizavam sob umaestrutura similar; daqui que, segundo a mitologia chinesa, até as mais fúteisfunções se encontravam encomendadas a uma deidade. Por exemplo, quando oscidadãos tinham cometido faltas graves contra os seus congêneres, ou contra osdeuses da sua tribo, deviam elevar súplicas à deidade que perdoava os pecados eque conferia, de novo, a paz de espírito aos que já tinham sido purificados. Apopulação da ancestral China chamava Ti-kuan ao deus que perdoava os pecadose, segundo a crença popular, era o "Agente da Terra" que formava tríade comoutros dois deuses; o "Agente do céu" e o "Agente da água".

DESENHOS EMBLEMÁTICOS

Todos os desejos, e necessidades, dos humanos ficavam satisfeitos assim queestes invocavam o deus apropriado. Por tudo isso, o número de deuses familiaresera considerável. Mas não só cada casa, mas também os bairros, circunscrições,povoações, cidades e territórios contavam com os seus deuses protetores. Aspróprias deidades se ocupavam de que tudo funcionasse perfeitamente; e assimos deuses do lugar guardavam a terra, a rua, a casa e todos os seus moradores.Em todos os lares havia uma imagem do "Deus do lar" que, geralmente, apareciasob a figura de um ancião com barba branca. No desenho -impreciso e carregadode colorido aberrante- aparecia também uma mulher, que se venerava comoesposa do "Deus do lar", rodeada de animais domésticos, tais como porcos,

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galinhas, cães, cavalos, etc., que cuidava e dava de comer. Nestes desenhos, queos chineses colocavam no interior das suas casas para adorar o verdadeiroespírito das figuras que lá apareciam, o artista tinha respeitado também aessência hierárquica da mitologia destes povos do longínquo oriente, pois averdade é que, em qualquer caso, o "Deus do lar" permanecia sempre sentado erelaxado sobre um colorido trono. Em compensação, a mulher estava em pé,preocupando-se dos labores domésticos, neste caso do cuidado dos animais quehavia em casa. Isto indica que o "Deus do lar" tinha subalternos, por assim dizer,nos quais delegava a sua própria função de cuidar pessoas e fazendas.

DEUS CÃO CERBERO

A mitologia chinesa conta com um lugar de perdição, similar ao que entre osgreco-latinos se denominará Tártaro, Hades ou Inferno. Segundo a tradiçãopopular chinesa, a alma dos mortais é conduzida a esse lugar de perdição paraser julgada e, como no mito clássico aparece o feroz cão Cerbero custodiando asgigantescas portas do Tártaro, também aqui há um encarregado de controlar apassagem para o interior de tão tétrico lugar: o "Deus da Porta".

Se tudo estivesse em regra, a alma podia passar e toparia imediatamente com odeus de "Muros e Fossas", que era o encarregado de submetê-la ao primeiro, emais benigno, dos julgamentos. No entanto, os interrogatórios duravam perto decinqüenta dias -exatamente quarenta e nove, que era um número pleno deconotações simbólicas entre muitos povos do extremo oriente: "Este é o prazo deque necessita a alma de um morto para alcançar definitivamente a sua novamorada. É a terminação da viagem", durante os quais a alma permanecia retidanos domínios do deus de "Muros e Fossas". Este pode condená-la ou deixá-la emmãos do seguinte juiz. Se acontece o primeiro, a alma pode ser açoitada ou atadapelas suas extremidades superiores a uma tábua que a aprisiona o pescoço. Dequalquer maneira, a alma terá que passar, agora, à presença do "Rei Yama", quese encarregará de decidir, após um novo interrogatório, se aquela é uma almajusta ou um alma pecadora. Se for o primeiro, a alma será enviada para um dosparaísos chineses -o que se encontra na "Grande montanha" ou o denominado, demaneira pomposa, a "Terra da Extrema Felicidade de Ocidente", onde gozará deliberdade e felicidade eterna-, dado que aqui tudo se encontra embebido dapresença do Buda.

BEBERAGEM PARA ESQUECER

Se, pelo contrário, o "Rei Yama" sentenciou que se trata de uma alma pecadoraentão esta será arrojada para o abismo dos infernos para que lá purgue as suasculpas. Depois de sofrer dores e castigos sem fim, a alma chegará, por fim, aodécimo lugar de perdição. Uma vez aqui será obrigada a reencarnar-se e poderáescolher entre um animal ou um humano. Se se reencarnar num animal, nem porisso perderá o seu antigo sentir humano e, pelo mesmo motivo, sofrerá quando amaltratem ou quando a matem. Por exemplo, pôde escolher renascer como porco

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e, portanto, não durará muito sem ser sacrificado, em cujo caso a dor do animal éa mesma que sentiria o humano ao qual pertencia a alma antes de reencarnar-se.No entanto, ninguém reparará nisso pois o porco não poderá exprimir a sua dor eo seu sofrimento, de forma humana, dado que a alma reencarnada, antes de sairdo décimo Inferno e dirigir-se para o lugar onde se encontra a "Roda dasMigrações", deve beber o "Caldo do Esquecimento" para, assim, guardar segredoobrigatório -pois nada do passado poderá já então recordar- de tudo quanto lheaconteceu na sua digressão infernal. Esta beberragem, segundo a lenda dospovos do longínquo oriente, era preparada pela deusa que habitava na misteriosacasa edificada à saída do Inferno. Todas as almas que abandonassem aquelelugar de perdição tinham que beber o "Caldo do Esquecimento" pois só então lhesseria permitido continuar para a frente e chegar à "Roda das Migrações", paraassim consolidar a sua reencarnação.

PONTES DO AVERNO

Algumas versões explicam, não obstante, que as almas dos mortos, antes dechegarem à presença do deus de "Muros e Fossas", recebiam a ajuda de Abida,deidade que tinha encomendada a tarefa de aliviar a todos os humanos à hora damorte, pois acolhia as almas puras e purificava as impuras.

Também se diz que o Tártaro era um lugar de perdição, sim, mas constituído porcidades cheias de funcionários e também de vários edifícios que eram comosedes dos diferentes tribunais perante os quais tinham que comparecer as almasdos mortos para serem julgadas. O próprio palácio do Rei Yama encontrava-senuma das cidades principais do mundo infernal e, ao lado deste soberbo -e, aomesmo tempo, tétrico edifício- se levantavam as diversas edificações quealbergavam no seu interior as terríveis câmaras de tortura e suplício.

Esta mítica cidade chamava-se Fong-tu e tinha uma entrada principal,denominada "Porta do Mal"; no extremo oposto, ficava protegida e resguardadapor um pustulento rio -posteriormente, também entre os mitos greco-latinosaparecerá o rio Aqueronte, cujas turvas, lodosas e fedorentas águas, rodearão olugar de perdição chamado Tártaro-, que contava com três pontes, as quaisconstituíam outros tantos acessos a Fong-tu, embora pelo lado contrário dessepara a zona principal.

A primeira ponte estava construída em ouro maciço e só os deuses podiamatravessá-la. A segunda ponte era de prata e estava reservado às almas quetinham sido justas. A terceira ponte era muito mais comprida e estreita do que asanteriores e atravessá-la resultava perigoso, pois carecia de corrimões para seagarrar. As almas que tinham sido perversas e viciosas estavam obrigadas aatravessá-la e, se caíssem no fedorento rio, seriam imediatamente trituradas pormonstros que tomavam a aparência de serpentes de bronze e de raivosos cães deferro.

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A "ÁRVORE DA IMORTALIDADE"

A mitologia dos povos do longínquo oriente contava, também, com lugares defelicidade e de dita, isto é, com paraísos. Como já se indicou, o da "GrandeMontanha" era um deles. O outro era a "Terra da Extrema Felicidade deOcidente", e, geralmente, era o lugar escolhido por "Rei Yama" para enviaraquelas almas dos mortais que tinha encontrado inocentes e que, pelo mesmomotivo, considerava justas.

O primeiro dos paraísos estava habitado pela "Dama Rainha" (a quem a tradiçãomítica fazia esposa do poderoso "Senhor do céu" que, no cimo da montanha maisalta, tinha construído o seu grandioso palácio; este era um edifício fabuloso(contava com mais de nove andares), rodeado de jardins com plantas e floresaromáticas e permanentemente verde. Aqui crescia, oculto num lugar recôndito, amítica "Árvore da Imortalidade"; dos seus frutos se alimentavam os bem-aventurados, isto é, aqueles que tinham levado uma vida reta e justa e que,portanto, não tinham enganado nem maltratado nenhum dos seus semelhantes.Por tudo isso lhes era permitido conviver com as deidades denominadas"Imortais".

VENERADO SOL, VENERADA LUA

Era muito comum, entre as altas esferas da sociedade chinesa, tais como os seusmonarcas e classes poderosas, dar culto nos inícios da primavera e da estaçãooutonal- ao Céu, à Terra, ao Deus da Guerra e ao grande mestre Confúcio.

Também as duas luminárias eram objeto de adoração entre a população doancestral território do extremo oriente. Tanto o Sol como a Lua eram astrosconsiderados como personificações de certas deidades. E não só os imperadorese a classe poderosa mas também o povo apoiava o culto às citadas luminárias;pelo qual a veneração à Lua e ao Sol ficava convertida, ao mesmo tempo, emculto oficial e popular.

Eram ofereciam sacrifícios aos citados astros coincidindo com ano par ou ímpar.

Os anos ímpares estavam consagrados ao Sol e os anos pares à Lua. Ambas asluminárias apareciam também relacionadas com os dois princípios essenciais. OSol era princípio ativo e, portanto, era associado com o "Yang"; ao passo que aLua era princípio passivo, pelo qual aparecia sempre relacionada com o "Yin".Para a população chinesa, estes dois princípios tinham uma importância capital.Se concebia a eternidade como um círculo que carecia de um princípio e que nãotinha fim. O "Yang" e o "Yin" estavam dentro dela, como duas forças que senecessitam mutuamente e, pelo mesmo motivo, em vez de opor-se, secomplementam. Na mitologia dos povos do extremo oriente, portanto, tudo seencontra estruturado com antecedência, não há lugar para improvisações e serejeita qualquer tipo de intuição, e classificado em itens que se sobrepõem, a

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maneira de arquivo, para dar lugar a emoções, paixões, tendências enecessidades.

TORMENTO DO CALOR E DO FRIO

Outros mitos dos povos orientais especialmente entre a população que seguia osensinos de Buda, o "Iluminado" explicavam que o Tártaro se encontrava num lugarescuro e subterrâneo e, segundo a crença popular, tinha umas característicasbastante contraditórias. Havia oito infernos de fogo e outros oito de gelo. E ambosproduziam nos condenados torturas pelo calor ou torturas pelo frio.

No entanto, também existiam distribuídos em cada um dos quatro pontoscorrespondentes aos infernos principais, tanto de fogo como de gelo outroslugares de perdição inferiores que, em ocasiões, supriam os dezesseis principais.Contudo, não se sabia com certeza o sítio exato onde estes lugares de perdiçãoiam surgir. Apareciam tanto (o que sempre sucedia de forma repentina) naprofundidade de um vasto e verde vale como no pico de uma montanha; até umaárvore milenária podia converter-se subitamente em sede de um destes infernosinferiores. Às vezes surgiam no próprio espaço e o ar abrasava ou gelava oscondenados. Por outro lado, todas as condutas estavam controladas pelosajudantes e funcionários do "Juiz do Averno", que se sentava num trono duroencaixado entre duas estantes de pedra. Na da sua esquerda encontra-se o"Julgador que vê tudo"; é uma figura feminina que penetra com a sua vista nomais recôndito do pensamento daqueles que comparecem para serem julgados. Àdireita situa-se o "Julgador que cheira tudo"; trata-se de uma figura masculina quetem como função descobrir, com o seu fino olfato, qualquer ação injusta ou imoralque tenha cometido o mortal que comparece para ser julga- do. Portanto, como sepode comprovar, não há escapatória possível para os condenados, dado quetodas as suas ações foram "vistas e cheiradas". Embora, para reduzir a pena,estivesse permitido que os vivos intercedessem em favor dos condenados, o querequeria sempre uma atuação inteligente e um mestre budista como mediador.

FENÔMENOS NATURAIS

Toda a natureza, segundo a tradição popular devia ser cuidada e mimada eresguardada,e preservada de qualquer mal, dado que através dela semanifestavam as diferentes deidades. Fenômenos naturais como o raio, o trovão,a chuva torrencial, o vento forte. .., deviam a sua aparição a uma deidade menor.E, assim, Yunt Ong tinha a função de reunir as nuvens, depois de tê-las formado,e era invocado com certa freqüência como o "jovem deus que reúne as nuvens".

Também contavam os povos do extremo oriente com a "Dama do céu Sereno",que tinha a missão de limpar todo o espaço, uma vez que a chuva parava. Sedizia que afastava as nuvens com o seu hálito purificador.

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Outra deidade, considerada como um agente celeste, era Tien-kuan, que seencarregava de levar ao mundo dos humanos a maior felicidade possível. Emocasiões era associada com a "Mãe dos Relâmpagos" e, então, recebia o nomede Tien'mu. A lenda dos povos do extremo oriente explica que Tien'mu produzia oraio servindo-se de dois espelhos.

Também o ruído ensurdecedor do trovão era produzido por uma deidade menor;recebia o nome de "Senhor do trovão" e, por isso, estava considerado como oamo e dono do ruído.

RITUAL DO INCENSO

Também se venerava, especialmente entre as classes poderosas, o deus dariqueza. Em quase todas as casas dos ricos havia não só um desenho com onome do deus gravado em caracteres ideográficos, mas também uma efígierepresentativa da deidade. Deste modo,sempre o consideravam próximo deles epodiam dirigir-lhe as suas preces com assiduidade, na crença de que, assim,nunca se veriam reduzidas a sua fortuna e o seu patrimônio. O deus das riquezasera conhecido pelo nome de T'saichem; o seu poder era superior ao das outrasmuitas deidades similares e até tinha designados numerosos deuses para oservirem e levarem a cabo as tarefas que aquele considerasse mais duras edifíceis.

Outro aspecto muito importante, que também estava regulado e protegido por umadeidade, era o estamento familiar com todas as suas implicações. A intimidade dafamília, e as relações pessoais entre todos os seus membros, ficavam a salvo decríticas adversas, proferidas por pessoas não integrantes do grupo familiar. Detudo isto se encarregava o deus T'sao-Wang e, em troca, recebia todos os dias oreconhecimento dos seus protegidos. Era freqüente, entre as famílias dapopulação do extremo oriente, honrar o deus que se erigia em seu protetor, pormeio de um ritual que consistia em queimar varetas de incenso, ao mesmo tempoque se invocava o nome do deus T'sao-Wang, duas vezes; uma quandocomeçava o dia e outra ao anoitecer.

PERSONIFICAÇÃO DA LITERATURA

Cada profissão, ofício e trabalho, tinham a sua deidade protetora. Entre todosestes deuses, a tradição popular destacava o deus das letras e da literatura, aoqual se atribuía uma obra de conteúdo simbólico e emblemático. Era conhecidopelo nome de Wen-t'chang e, segundo a lenda, antes de chegar a obter adistinção de protetor das letras e da literatura já tinha passado por dezesseteexistências; o dezessete estava concebido, entre os orientais, como um númerorepleto de significação mágica e esotérica.

O livro que tinha escrito o próprio deus era, por assim dizer, uma espécie debiografia e nele se indicava o dado das dezessete reencarnações, ou novos

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nascimentos. Também se davam pautas a seguir para agir com moralidade eretidão e, geralmente, se louvava o saber e a inteligência sobre quaisquer outrosaspectos. Segundo a mitologia dos povos do extremo Oriente, a interpretação doscaracteres ideográficos do livro escrito pelo deus Wen't-chang leva a considerar àsabedoria por cima de quaisquer outros aspectos. Mediante o saber e ainteligência se pode superar qualquer obstáculo e, ao mesmo tempo, equilibrarqualquer sofrimento. A sabedoria, segundo explica na sua obra o deus das letras eda literatura, é como uma espécie de "Candeeiro da câmara escura", o quesignifica que até nos momentos mais difíceis da vida, quando vemos tudo negro,quando nos achamos encerrados na "Câmara escura" deste mundo dos mortais,sempre existirá a luz do "Candeeiro" que proporciona o saber e a inteligência para,assim, tornar possível uma nova procura, uma solução inédita.

LENDA DO ELEFANTE BRANCO

Outro dos deuses principais que a população oriental venerava recebia o nome deFo. Este era um deus superior aos anteriores, pois ocupava o primeiro lugar entreas outras deidades que compunham a tríade da Felicidade.

A sua importância, dentro da mitologia chinesa, era acrescentada porquerepresentava, ao mesmo tempo, a Hierarquia, a Fortuna e a Honra. A ele acudiaquem sentia o peso de um destino e um azar adversos; também os governantessolicitavam de Fo que os guiasse no momento de legislar, para que nenhumanorma injusta saísse da sua cabeça nem fosse permitida no seu reino. Erasolicitado, além disso, por todos aqueles que tinham sido objeto de escárnio edesonra, mediante engano. Ao parecer -e segundo a crença popular-, Fo devolvia-lhes a sua honra perdida, pois por algo era um deus principal. O mito relativo aeste deus poderoso nos fala do seu nascimento portentoso, da forma em quesurgiu da costela direita da sua mãe que, segundo conta a lenda, tinha sonhadoantes que um belo elefante branco a possuía.