UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS
FACULDADE DE ENGENHARIA ELÉTRICA E DE COMPUTAÇÃO
DEPARTAMENTO DE SEMICONDUTORES INSTRUMENTOS E FOTÔNICA
ANDERSON VEDOVETO MARTINS
MEDIDOR DE ENERGIA ELÉTRICA NÃO INTRUSIVO PARA DETECÇÃO
DE FRAUDES
CAMPINAS
2018
ANDERSON VEDOVETO MARTINS
MEDIDOR DE ENERGIA ELÉTRICA NÃO INTRUSIVO PARA DETECÇÃO
DE FRAUDES
Dissertação de mestrado submetida à Faculdade de
Engenharia Elétrica e de Computação da Universidade
Estadual de Campinas como parte dos requisitos
exigidos para a obtenção do título de Mestre em
Engenharia Elétrica na área de Eletrônica,
Microeletrônica e Optoeletrônica.
Orientador: Prof. Dr. Elnatan Chagas Ferreira
CAMPINAS
2018
Esse exemplar corresponde à versão final da
dissertação defendida pelo aluno Anderson
Vedoveto Martins, e orientada pelo Prof. Dr.
Elnatan Chagas Ferreira
COMISSÃO JULGADORA - DISSERTAÇÃO DE MESTRADO
Candidato: Anderson Vedoveto Martins RA: 124048
Data da Defesa: 28 de agosto de 2018
Título da Tese: “Medidor de Energia Elétrica Não Intrusivo Para Detecção de Fraudes”.
Prof. Dr. Elnatan Chagas Ferreira (Presidente, FEEC/UNICAMP)
Prof. Dr. Flávio José de Oliveira Morais (UNESP)
Prof. Dr. José Antônio Siqueira Dias (FEEC/UNICAMP)
A ata de defesa, com as respectivas assinaturas dos membros da Comissão Julgadora, encontra-se no processo de vida acadêmica do aluno.
Dedico este trabalho à minha família, sobretudo a minha companheira, e à memória de meus
avós Salvador Vedoveto e Cecília Vedoveto
Agradecimentos
Ao meus pais pela criação que me deram, amor e suporte sempre.
Ao meu irmão pela amizade e exemplo de sucesso.
À minha família, tios e tias que participaram da minha criação e me deram tantos
momentos de alegrias assim como meus primos e primas.
À minha sortuda companheira Stella Maris pelo suporte, amizade, amor,
compreensão e paciência.
Ao meu orientador Prof. Dr. Elnatan Chagas Ferreira pela oportunidade dada,
pelo suporte e por todo aprendizado que me proporcionou.
À todo pessoal do antigo DEMIC pela amizade e suporte direto ao meu trabalho,
principalmente aos Prof. Drs. Rodrigo Bacurau, Flávio Morais e Siqueira Dias. Ao Adelson,
Marllon, Alex Dante, Reynaldo e Paulo.
Ao pessoal do LEPO pelo empréstimo de equipamentos e claro, pela amizade.
Agradecimento especial ao Prof. Dr. Tarcio Barros.
À nossa secretária de departamento Jaqueline e secretaria da pós-graduação
Noêmia.
À todos meus amigos que tanto prezo.
À Capes pela concessão de bolsa.
Aos proprietários da sorveteria Mundo Ice, Sr. João e Sr. Francisco pelo apoio e
colaboração com minha pesquisa ao permitirem o uso de suas instalações.
Faça. Ou não faça. Não existe a tentativa
(Mestre Yoda)
Resumo
Neste trabalho é apresentado o desenvolvimento de um medidor de energia elétrica, não
intrusivo, para uso na detecção de fraudes ou defeitos em medidores de unidades
consumidoras de baixa tensão. O medidor utiliza um sensor de tensão por acoplamento
capacitivo, desenvolvido para detectar a fase da tensão, porém, não a sua amplitude. Este
sensor foi integrado a um transformador de corrente do tipo garra, para possibilitar a fácil e
rápida instalação no ramal de ligação, sem a necessidade de abertura do circuito ou contato
galvânico com o condutor fase. O método utilizado para o cálculo da potência ativa considera
a forma de onda de corrente em conjunto com a de tensão e a defasagem entre estas,
atribuindo o valor nominal para a amplitude da tensão. Este método resolve uma limitação
típica de sensores de tensão capacitivos ao eliminar a necessidade da medição da amplitude,
e ainda, promove uma melhoria na exatidão em relação aos medidores do tipo ampere-hora,
que são incapazes de medir o fator de potência. Testes realizados em bancada indicaram que
o dispositivo é capaz de medir potência ativa com erro inferior a 1,5 %. Um teste realizado
em campo sob condições reais monitorou um consumidor com ligação bifásica, onde o
consumo total medido em kWh, apresentou um erro de apenas 1 %. Os resultados
demonstram que o sistema possui exatidão suficiente para identificar fraudes ou defeitos em
medidores de energia, com alto índice de acerto. Este medidor poderá ser utilizado por
distribuidoras de energia elétrica na etapa de pré-inspeção, aumentando a efetividade das
visitas técnicas e reduzindo custos.
Palavras-chave: Sistemas embarcados (Computadores), Consumo de energia, Fraude, Furto,
Detecção, Instrumentação.
Abstract
This work presents the development of a non-intrusive energy meter aimed to identify
meter tampering or meter defects in low voltage consumers. The meter features a capacitive
coupled voltage probe designed to detect the voltage phase but not its amplitude. This probe
was integrated to a clamp on current transformer enabling fast and easy installation on
service drop lines requiring no circuit opening neither galvanic contact to the phase
conductor. The method used for active power calculation considers the current waveform
together with the voltage waveform and the phase shift between then, assigning the nominal
value for the voltage amplitude. This method solves a common limitation of capacitive
coupled sensors by eliminating the need of amplitude measurement, while improving the
precision in relation to ampere-hour meters, which are incapable of sensing the power
factor. Bench tests showed the meter is capable of measuring active power with error below
1.5 %. A field test under real conditions monitored a biphasic installation, where the total
consumption measured in kWh had an error of only 1 %. This results proofs the system has
enough accuracy to identify frauds or defects in electricity meters. The presented meter may
be used by electricity distribution companies on the pre-inspection phase, improving the
effectiveness of technical inspections and reducing costs.
Keywords: Embedded Systems (Computers), Energy consumption, Fraud, Tampering,
Detection, Instrumentation.
Lista de Figuras
Figura 1. Dados de perdas das distribuidoras brasileiras [1]......................................................... 17
Figura 2. Ramal de ligação típico [7]........................................................................................... 20
Figura 3. Cabos multiplexados com neutro nu. ............................................................................ 21
Figura 4. a) Ilustração de ancoragem e conexões em cabos multiplexados [12]; b) Foto tirada em
uma instalação típica na cidade de Campinas em conexão com rede da CPFL. ............................ 22
Figura 5. Diagrama de blocos do MENI ...................................................................................... 27
Figura 6. Fotos do MENI. a) Sistema completo com a caixa fechada; b) Caixa de circuitos aberta;
c) Visão inferior da placa principal.............................................................................................. 28
Figura 7. MENI instalado em fio sob teste................................................................................... 29
Figura 8. TC modelo LCTC-0100. Foto do original antes das alterações. .................................... 30
Figura 9. Circuito de condicionamento de sinal do sensor de corrente. ........................................ 31
Figura 10. Simulação do circuito de condicionamento do sensor de corrente mostrando a resposta
em frequência da amplitude e rotação de fase. ............................................................................. 31
Figura 11. Ilustração da garra sensora identificando os sensores de tensão e corrente. ................. 32
Figura 12. Ilustração de uma seção do sensor de tensão por acoplamento capacitivo. .................. 33
Figura 13. Circuito equivalente do circuito de medição de tensão. ............................................... 35
Figura 14. Esquerda, layout da placa de processamento. Direita, layout da placa principal. ......... 39
Figura 15. Placas eletrônicas (sem bateria). a) Placa de processamento sobre a placa principal. b)
Face inferior da placa principal. .................................................................................................. 39
Figura 16. Fluxograma geral do firmware. .................................................................................. 43
Figura 17. Fluxograma da função Mede. ..................................................................................... 45
Figura 18. Interface MENI, aba Program variables. .................................................................... 52
Figura 19. Inteface MENI, aba RTC. ........................................................................................... 52
Figura 20. Interface MENI, aba Parameters. ............................................................................... 53
Figura 21. Interface MENI, aba Measurement Data. ................................................................... 54
Figura 22. Exemplo de arquivo .info. .......................................................................................... 54
Figura 23. Exemplo de arquivo .data. .......................................................................................... 54
Figura 24. Interface MENI, aba Real-time Visualization. ............................................................. 55
Figura 25. Exemplo de arquivo .wvf do MENI. ........................................................................... 56
Figura 26. Layout da placa do medidor trifásico. ......................................................................... 60
Figura 27. Foto do medidor trifásico com conexões................................................................. 61
Figura 28. Aba Parameters da interface do medidor trifásico ...................................................... 62
Figura 29. Aba Real-time Visualization da interface do medidor trifásico. ................................... 62
Figura 30. Setup de ajuste do medidor trifásico. .......................................................................... 66
Figura 31. Setup de ajuste para o MENI. ..................................................................................... 66
Figura 32. Arranjo de teste básico utilizado nos testes de laboratório (setup de teste). ................. 68
Figura 33. Técnica de amplificação de corrente por enrolamento................................................. 70
Figura 34. Enrolamento para amplificação da corrente lida pelo MENI. ...................................... 73
Figura 35. Gráfico do erro de escala da Garra 3 ........................................................................... 74
Figura 36. Comparativo da medida de corrente da Garra 4 com o medidor de referência. ............ 74
Figura 37. Comparativo da medida do FP da Garra 4 com o medidor de referência. .................... 75
Figura 38. Comparativo da medida de potência ativa da Garra 4 com o medidor de referência. ... 75
Figura 39. MENI instalado nos cabos sob teste............................................................................ 77
Figura 40. Gráficos das leituras de FP para cada cabo testado. .................................................... 78
Figura 41. Gráfico dos erros de FP para cada cabo testado. ......................................................... 78
Figura 42. Ilustração do efeito parasita causado por condutor próximo. ....................................... 79
Figura 43. Setup para análise de sensibilidade à condutores vizinhos. .......................................... 79
Figura 44. Esquema de ligação dos medidores na instalação do teste de campo. Fora de escala para
melhor visualização. ................................................................................................................... 81
Figura 45. Gráfico da corrente durante todo período de teste. ...................................................... 83
Figura 46. Zoom na leitura de corrente. ....................................................................................... 83
Figura 47. Tensão medida pelo medidor de referência. ................................................................ 85
Figura 48. Tensão medida pelos MENI's. .................................................................................... 85
Figura 49. Leitura de FP para todo período.................................................................................. 86
Figura 50. Zoom na leitura de FP ................................................................................................ 86
Figura 51. Leitura da potência ativa em todo período .................................................................. 87
Figura 52. Zoom na leitura de potência ativa. .............................................................................. 87
Figura 53. Erro na leitura de potência ativa. ................................................................................ 88
Figura 54. Histograma do erro da potência ativa medido pela Garra 3. ........................................ 88
Figura 55. Histograma do erro da potência ativa medido pela Garra 4. ........................................ 88
Lista de Tabelas
Tabela 1. Faixas de variação para tensões nominais iguais ou inferiores a 1KV [6]. .................... 22
Tabela 2. Resistência de isolamento típica para cabos utilizados em ramal de entrada. ................ 34
Tabela 3. Valores calculados da capacitância entre o sensor e o cabo sob medição. ..................... 35
Tabela 4. Exemplo de log de dados. ............................................................................................ 47
Tabela 5. Formato do registro na memória. ................................................................................. 47
Tabela 6. Exemplo de registro. .................................................................................................... 48
Tabela 7. Lista de comandos ....................................................................................................... 49
Tabela 8. Códigos de resposta ..................................................................................................... 50
Tabela 9. Varredura de corrente do medidor trifásico e Kron Mult-K. ......................................... 69
Tabela 10. Resultado da aferição do medidor trifásico desenvolvido. .......................................... 70
Tabela 11. Varredura de tensão do medidor trifásico e Kron Mult-K. .......................................... 71
Tabela 12. Resultados da medição de FP do medidor trifásico. .................................................... 72
Tabela 13. Resultados da medição de potência ativa do medidor trifásico. .................................. 72
Tabela 14. Resultado da medição de fator de potência em bancada com MENI. .......................... 76
Tabela 15. Resultados da análise de sensibilidade à condutores vizinhos. .................................... 80
Tabela 16. Leituras do medidor da concessionária no teste de campo. ......................................... 82
Tabela 17. Sumário dos valores de consumo medidos no teste de campo. .................................... 82
Lista de Abreviações
AD Conversor Analógico/Digital
ADC Conversor Analógico/Digital
CAPES Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior
DEMIC Departamento de Eletrônica e Microeletrônica
FEEC Faculdade de Engenharia Elétrica e de Computação
FP Fator de Potência
IEEE Institute of Electrical and Electronics Engineers
MENI Medidor de Energia Não Intrusivo
PC Personal Computer
PCB Printed Circuit Board
PCI Placa de Circuito Impresso
SPI Serial Peripheral Interface Bus
USB Universal Serial Bus
http://www.capes.gov.br/
Sumário
Capítulo 1 .......................................................................................................................................................................... 16
Introdução ........................................................................................................................................................................ 16
1.1 Contextualização ........................................................................................................................................ 16
1.2 Características da rede elétrica ........................................................................................................... 20
1.3 Trabalhos correlatos ................................................................................................................................ 22
1.4 Objetivos ........................................................................................................................................................ 25
1.5 Organização do texto................................................................................................................................ 26
Capítulo 2 .......................................................................................................................................................................... 27
Medidor de Energia Não Intrusivo (MENI)....................................................................................................... 27
2.1 Visão geral ..................................................................................................................................................... 27
2.2 Sensor de corrente .................................................................................................................................... 30
2.3 Sensor de tensão ........................................................................................................................................ 32
2.4 Realização do hardware ......................................................................................................................... 37
2.5 Cálculo das grandezas elétricas .......................................................................................................... 39
2.6 Firmware ........................................................................................................................................................ 42
2.6.1 Inicialização............................................................................................................................................................ 42
2.6.2 Estado de espera .................................................................................................................................................. 44
2.6.3 Medição .................................................................................................................................................................... 44
2.6.4 Armazenamento de dados .............................................................................................................................. 46
2.6.5 Tratamento de comando ................................................................................................................................. 48
2.6.6 Medição via serial................................................................................................................................................ 50
2.7 Interface em PC ........................................................................................................................................... 50
2.7.1 Variáveis de programa ..................................................................................................................................... 51
2.7.2 Relógio de tempo real (RTC) ......................................................................................................................... 52
2.7.3 Parâmetros ............................................................................................................................................................. 53
2.7.4 Dados de medição ............................................................................................................................................... 53
2.7.5 Visualização em tempo real ........................................................................................................................... 55
2.8 Instruções de uso do MENI .................................................................................................................... 56
Capítulo 3 ......................................................................................................................................................................... 58
Medidor de Energia Trifásico de Referência ................................................................................................... 58
3.1 Visão geral ..................................................................................................................................................... 58
3.2 Interface em PC ........................................................................................................................................... 61
3.3 Instruções de uso do medidor de referência ................................................................................ 63
Capítulo 4 ......................................................................................................................................................................... 65
Resultados Experimentais........................................................................................................................................ 65
4.1 Ajuste dos medidores ............................................................................................................................... 65
4.1.1 Ajuste do medidor trifásico desenvolvido.............................................................................................. 65
4.1.2 Ajuste do MENI ..................................................................................................................................................... 66
4.2 Testes em laboratório .............................................................................................................................. 67
4.2.1 Testes com o medidor trifásico desenvolvido ...................................................................................... 68
4.2.1.1 Ganho de corrente ................................................................................................................... 68
4.2.1.2 Ganho de tensão ....................................................................................................................... 70
4.2.1.3 Fator de potência ..................................................................................................................... 71
4.2.1.4 Potência ativa ............................................................................................................................ 72
4.2.2 Testes com medidores MENI......................................................................................................................... 73
4.2.2.1 Ganho de corrente ................................................................................................................... 73
4.2.2.2 Variação de carga ..................................................................................................................... 74
4.2.2.3 Sensibilidade à bitola do fio ................................................................................................ 76
4.2.2.4 Sensibilidade a fases adjacentes ....................................................................................... 78
4.3 Teste em campo .......................................................................................................................................... 80
4.3.1 Medição de consumo ......................................................................................................................................... 81
4.3.2 Medição de corrente .......................................................................................................................................... 83
4.3.3 Medição de tensão .............................................................................................................................................. 84
4.3.4 Medição de fator de potência ........................................................................................................................ 85
4.3.5 Medição de potência ativa .............................................................................................................................. 86
Capítulo 5 ......................................................................................................................................................................... 90
Conclusões e Trabalhos Futuros ........................................................................................................................... 90
5.1 Conclusões ..................................................................................................................................................... 90
5.2 Trabalhos Futuros ..................................................................................................................................... 91
Referências ..................................................................................................................................................................... 92
Apêndice A – Esquemático da placa de processamento de sinais do MENI ..................................... 95
Apêndice B – Esquemático da placa principal do MENI ............................................................................ 96
16
Capítulo 1
Introdução
este capítulo é apresentada a contextualização do projeto e revisão de
trabalhos correlatos. Também é apresentada uma visão geral das
características da rede de distribuição de baixa tensão no Brasil e de sua
normatização. Em seguida, é apresentada a proposta e objetivos deste trabalho. Por fim,
é apresentado a organização dos demais capítulos dessa dissertação.
1.1 Contextualização
O sistema elétrico brasileiro é divido nos setores de geração, transmissão e
distribuição. Em cada um desses setores ocorrem perdas de energia, que são divididas
em duas categorias: perdas técnicas e perdas não técnicas. Perdas técnicas são causadas
por não idealidades inerentes ao sistema, como aquecimento por efeito Joule e correntes
de fuga. Perdas não técnicas ocorrem principalmente na distribuição, e são subdivididas
em fraude e furto. O furto de energia elétrica é caracterizado por uma conexão não
autorizada à rede de distribuição, popularmente chamado de “gato”. A fraude é
caracterizada por adulterações na instalação ou no medidor de consumo que fazem com
que o valor medido seja inferior ao de fato consumido. A conta não paga por motivo de
fraude é cobrada dos bons consumidores, sendo a redução de perdas de interesse das
distribuidoras e dos clientes, pois garante maior qualidade da energia, maior
rentabilidade para as distribuidoras e menor valor final do preço da energia. Na Figura 1
são apresentados os dados de perdas no sistema de distribuição brasileiro em 2016 [1].
N
17
Figura 1. Dados de perdas das distribuidoras brasileiras [1].
Furtos de eletricidade são comuns em regiões pobres e também em grandes
consumidores, sendo que a sua identificação e resolução são relativamente fáceis do
ponto de vista técnico, uma vez que as conexões clandestinas são visivelmente
identificadas. A grande dificuldade nesses casos envolve questões sociopolíticas e de
segurança pública, sendo difícil assegurar a integridade física das equipes técnicas nos
18
locais de inspeção. O presente trabalho não lida com a problemática do furto, focando
somente na identificação de fraudes.
Fraudes de medidores de consumo de energia elétrica são comuns em
consumidores residenciais, comerciais e industriais. A identificação de fraudes pode ser
uma tarefa complicada, visto que há inúmeras maneiras de se adulterar o medidor ou
ainda a fiação elétrica. Um procedimento comum adotado pelas empresas distribuidoras
no Brasil é a identificação de possíveis fraudadores através do uso de algoritmos que
monitoram o padrão de consumo do cliente e identificam anormalidades ou alterações
súbitas nesse padrão. Em uma segunda etapa uma equipe técnica é deslocada até a
localidade do cliente para efetuar vistoria técnica e tomar as devidas providências em
caso de confirmação da fraude. O custo de manutenção e deslocamento destas equipes é
alto, e ao mesmo tempo, o índice de acerto dos algoritmos é relativamente baixo [2].
Embora a recuperação de receita conseguida justifique o custo da operação, há ainda
margem para aumento da efetividade e também da abrangência das inspeções.
Trabalhos anteriores desenvolvidos no DSIF (Departamento de Componentes
Semicondutores Instrumentos e Fotônica) da Faculdade de Engenharia Elétrica e da
Computação (FEEC) da Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP) propuseram
uma nova abordagem para melhorar a eficiência do processo de identificação de
fraudadores [3,4,5]. Nessa proposta, o processo de inspeção dos potenciais fraudadores
é dividido em duas etapas: pré-inspeção e inspeção. Na primeira etapa, a energia ativa
consumida pelos potenciais fraudadores é estimada através de medidores de corrente
não intrusivos instalados nos ramais de entrada das unidades consumidoras. Esses
medidores de corrente são compostos por transformadores de corrente de núcleo
bipartido, de baixo custo e fácil instalação. Após um período de 7 a 10 dias, o consumo
de energia estimado pelo medidor não intrusivo é comparado ao registrado pelo
medidor de energia da unidade consumidora. Se for identificada uma discrepância de
consumo entre os dois medidores superior a 15% considera-se que está havendo fraude,
e então, uma equipe técnica é convocada para realizar uma inspeção física na unidade.
Esta abordagem aumenta a eficácia global da operação, aumentando a assertividade e
reduzindo custos em relação à abordagem tradicional.
Embora o processo de pré-inspeção com medidores de corrente seja eficaz
em muitas situações, essa abordagem não é adequada para todos os tipos de clientes. O
19
fator de potência utilizado no cálculo da potência consumida é estimado a partir de um
estudo feito na região de aplicação. Portanto, em um unidades consumidora com fator de
potência muito distante do valor médio, será apresentado falso positivo ou falso
negativo. A estimativa da potência ativa somente através da corrente elétrica não é
adequada para consumidores residenciais bifásicos e trifásicos, comerciais e industriais.
Nesses consumidores, o fator de potência varia muito entre as unidades consumidoras, e
entre as fases medidas, tornando a estimativa de potência ativa imprecisa.
Uma solução que consiga medir com razoável exatidão o fator de potência
aumentaria a exatidão nos resultados e ainda estenderia a capacidade de medição para
os setores comerciais e de pequenas indústrias. No entanto, para tal, é necessário obter a
curva de tensão da rede, o que exige, na forma mais simples o contato elétrico do sensor
com os condutores, dificultando a instalação do sistema de identificação de fraudes.
Como veremos a seguir, na maior parte das instalações, os cabos de fase são isolados, o
que impossibilita a medição de tensão através do contato galvânico com esses
condutores.
Com o objetivo de suprimir as limitações do medidor para identificação de
fraudes baseado somente em medida de corrente apresentado acima, foi proposto neste
trabalho um medidor de energia ativa que não requer contato com os condutores de
fase. Este sistema é baseado em medição não intrusiva de corrente elétrica através de
transformadores de corrente tipo alicate e medição da forma de onda de tensão, também
de forma não intrusiva, através de acoplamento capacitivo. No sistema proposto, o
sensor de tensão por acoplamento capacitivo é usado apenas para identificar a forma de
onda de tensão e a defasagem entre a tensão e corrente. A amplitude do sinal de tensão
medido não é considerada no cálculo da energia ativa, ao invés disso, utiliza-se o valor
nominal de tensão da rede elétrica. Como as flutuações na amplitude da tensão nas
linhas CA são limitadas ente -8% e +5% pela regulamentação [6], o erro na medição da
potência ativa usando essa técnica é relativamente baixo. Essa abordagem elimina a
grande desvantagem da medição de tensão CA por acoplamento capacitivo: baixa
exatidão na medição da amplitude do sinal.
20
1.2 Características da rede elétrica
O medidor de energia ativa proposto foi projetado considerando-se as
características da rede elétrica de distribuição em baixa tensão presente em boa parte
do território nacional. O setor de distribuição é o responsável direto pela entrega de
energia aos clientes de baixa tensão, e, portanto, o responsável pelo monitoramento de
fraudes no sistema de tarifação. Cada concessionária de energia elétrica tem a liberdade
de criar e aplicar normas técnicas próprias para procedimentos, projeto e instalações de
suas redes, incluindo os padrões de entrada de seus clientes. No restante dessa subseção
serão apresentados os pontos mais pertinentes das normas técnicas adotadas por
algumas das maiores distribuidoras de energia elétrica do Brasil.
A entrega de energia elétrica é feita através da derivação da rede secundária
de distribuição através de um ramal de ligação, conforme ilustrado na Figura 2. O ramal
de ligação se conecta ao ramal de entrada no ponto de entrega. O medidor para tarifação
é instalado entre o ramal de entrada e o circuito alimentador, sendo este compreendido
pelos condutores instalados entre a caixa de medição e o quadro de distribuição da
unidade consumidora. O padrão de entrada compreende o ramal de entrada, poste
particular, caixas, proteção, aterramento e ferragens. Ele é de responsabilidade do
cliente, e deve ser preparado de forma a permitir a ligação de uma unidade consumidora
à rede da concessionária [7].
Figura 2. Ramal de ligação típico [7].
21
Embora haja variações das normas técnicas para o ramal de ligação, a
maioria das concessionárias pesquisadas (CPFL, Copel, Eletropaulo, Celesc, Cemig e
Energisa) seguem padrões parecidos, que estabelecem o uso de cabos multiplexados
com neutro nu, conforme mostrado na Figura 3 [7,8,9,10,11,12]. Por exemplo, a norma
NDU-001 da ENERGISA estabelece: “Os condutores para os ramais de ligação aéreos
serão multiplexados, com isolamento em XLPE, fases em alumínio CA e neutro nu em
alumínio CA...” [11].
Figura 3. Cabos multiplexados com neutro nu.
Na Figura 4 são apresentados detalhes da ligação no ponto de derivação e no
ponto de entrega, que são similares. Como será discutido a seguir, essa característica é
importante para o sensor desenvolvido, pois, permite que seja feito contato elétrico
direto com o neutro de maneira não intrusiva. Como será visto mais adiante, na
descrição do circuito da garra de tensão, o contato com o neutro estabelece um
referencial para medida de tensão e ainda permite a blindagem elétrica que reduz a
influência das fases vizinhas na medição.
A tensão fornecida pela concessionária deve ser mantida em valores
adequados estabelecidos por norma. A ANEEL estabelece no Módulo 8 do PRODIST os
valores mostrados na Tabela 1. Cabe a concessionária tomar as devidas providências
para que a norma seja atendida. No projeto do sensor proposto nesse trabalho, não será
medido a amplitude da tensão, somente será extraído informação de sua fase em relação
a corrente e sua forma de onda. Portanto, o erro máximo devido à variação da tensão é o
próprio valor admitido para variação da tensão que é de -8% a +5% para uma tensão de
atendimento adequada.
Duplex Triplex Quadriplex
22
Figura 4. a) Ilustração de ancoragem e conexões em cabos multiplexados [12]; b) Foto tirada em uma instalação típica na cidade de Campinas em conexão com rede da CPFL.
Tabela 1. Faixas de variação para tensões nominais iguais ou inferiores a 1KV [6].
1.3 Trabalhos correlatos
O grande diferencial do sistema desenvolvido é a capacidade de medir
energia de maneira totalmente não intrusiva em cabos multiplexados isolados, obtendo
para isso a leitura de corrente através do transformador de corrente e o sinal de tensão
através do sensor de acoplamento capacitivo. Os próximos parágrafos apresentam uma
breve revisão dos artigos e patentes correlatos ao tema dessa dissertação.
Tsang argumenta que a medição de tensão AC sem contato, feita com um
único capacitor, é pouco precisa e pode ser facilmente afetada por fatores ambientais
[13]. Para contornar esse problema, é apresentado um sensor que possui dois
capacitores. Um algoritmo extrai a relação entre as tensões medidas por cada capacitor e
a) b)
23
faz uma compensação para aumentar a exatidão. Os resultados apresentados apontam
para um erro na estimativa da tensão da ordem de 5%.
O artigo de Brunelli et al [14] mostra dois métodos de medição de tensão não
invasivos através de acoplamento capacitivo. No primeiro método, a medição da tensão
é feita entre um cabo fase encapado e um ponto comum onde há contato ôhmico. No
segundo método, a medição é feita entre um fio fase e um fio neutro, sendo ambos
encapados. É apresentado resultados somente para o segundo método, onde o erro
máximo reportado foi de 1% [14]. O mesmo grupo publicou uma continuidade do
trabalho, onde o sistema é expandido para medir também corrente e calcular o consumo
de energia para instalações trifásicas. Nesse sistema o erro máximo foi de 3% na
medição de energia ativa [15]. O sensor utilizado nesses trabalhos foi feito enrolando-se
um filme metálico ao redor dos cabos sob medição. Observa-se que esse tipo de
montagem não é adequada para instalação rápida em redes aéreas externas, sendo
viável somente para testes em bancada.
No trabalho apresentado por Furukawa et al [16], é apresentado um sensor
de tensão e corrente integrados em um molde de resina para medição de fator de
potência e harmônicas de tensão, em redes de distribuição de 6,6 kV. As características
do sensor em si são muito parecidas com o proposto neste trabalho e foram igualmente
pensadas para montagem rápida em ambiente externo.
Lorek et al [17] desenvolveram um sensor de baixo custo que engloba a
medição de corrente por sensor de efeito Hall e medição de tensão por acoplamento
capacitivo. Foi desenvolvida uma PCI de tamanho reduzido com microcontrolador,
circuito de condicionamento de sinal e os sensores. O capacitor do sensor de tensão foi
produzido na própria PCI. O sinal de tensão obtido é bastante distorcido, porém, foi
implementado um PLL em Python que sintetiza uma forma de onda senoidal ideal em
fase com a tensão. A potência instantânea é obtida multiplicando-se a forma de onda de
tensão sintetizada pela forma de onda de corrente. Esse sensor pode ser instalado em
quadros de distribuição para monitorar a potência conduzida através de um dado
disjuntor, simplesmente colando-se o sistema sobre este. O sistema apresenta baixo
custo, porém, requer uma rotina de calibração através da conexão de cargas conhecidas
na instalação sob teste [17]. As características mecânicas e de montagem desse sistema
são adequados somente para o cenário residencial indoor.
24
Donnal apresentou em [18] um sistema com características parecidas com o
de Lorek et al, aplicável na medição de energia tanto em quadros de distribuição quando
em cabos isolados com uma ou múltiplas fases. Foram apresentadas duas soluções para
medição de corrente, a primeira com sensor de efeito Hall e a segunda com um sensor de
tunelamento magneto resistivo (TMR). O sensor de tensão proposto é baseado em
acoplamento capacitivo, com um esquema de medição diferencial entre duas placas. Os
sensores de tensão e corrente são suscetíveis a influência dos condutores vizinhos. Para
tornar o sistema robusto à essas influências, foi apresentado um robusto sistema de
calibração baseado em matrizes. Para extração dos parâmetros de calibração, é
necessário conectar uma carga conhecida, controlada por PWM, em cada condutor
próximo [18]. Embora muito engenhosa, a necessidade da etapa de calibração inviabiliza
a utilização dessa técnica na medição em ramal de entrada.
Lawrence apresentou em [19] um sensor de tensão por acoplamento
capacitivo sem contato. Este sensor foi otimizado para monitorar linhas de baixa e
média tensão. O sensor faz aquisição da razão da variação do sinal de tensão que é então,
digitalmente integrado para recuperar o sinal original. O sensor é construído em PCI
com três camadas dedicadas. Uma delas é o plano de terra, que requer conexão com um
ponto de aterramento do circuito de tensão AC sob medição, embora o autor nomeie o
sensor como sendo “sem contato”. O artigo introduz um filtro FIR digital otimizado para
medir o conteúdo harmônico da tensão. É reportado um erro de linearidade de ±5%
para tensões até 300V. O autor conclui que a medida precisa da amplitude de tensão
exige calibração específica com uma referência conhecida, porém, outras medidas de
qualidade de energia como a taxa de distorção harmônica, não são afetadas pelo ganho
de escala.
Shenil, analisou em [20] a viabilidade de um esquema de medição de tensão
sem contato através de acoplamento capacitivo, com uma geometria de tubos
concêntricos. Foi apresentado um esquema de circuito e processamento que permite a
leitura correta da tensão independente da variação da capacitância entre o sensor e o
condutor. Foi analisado inicialmente um circuito ideal e depois feita uma análise da
influência de parasitas do sistema. Um esquema de calibração foi proposto para
compensar os parasitas. Testes práticos foram realizados com variação de tensão entre
25
40 V e 240 V, variação de frequência entre 100 Hz e 1000 Hz e variação da posição do
condutor em relação ao sensor. Para todos esses testes o erro se manteve abaixo de 1%.
Em um segundo trabalho, Shenil propõe um outro esquema de medição
baseado em um digitalizador [21]. Este último, permite a leitura direta de um sinal
proporcional à tensão independentemente de variações da capacitância e sem a
necessidade de cálculo da transformada de Fourrier do sinal medido. As características
físicas do sensor proposto em [20,21] são similares as do proposto nessa dissertação,
embora o esquema do circuito medidor seja diferente. A implementação de um esquema
de leitura que permita também a leitura de amplitude da tensão e seja robusto à
variação de capacitância, deverá ser explorada em trabalhos futuros.
Foram levantadas algumas patentes que possuem similaridades com o
trabalho desenvolvido. A discussão do conteúdo de cada patente não será feita nesta
dissertação. Porém, com o objetivo de auxiliar o leitor caso haja interesse pela busca de
propriedades intelectuais correlatas, é deixada aqui, uma lista das patentes encontradas.
Os títulos foram traduzidos livremente para o português.
Ponteira capacitiva [22];
Ponteira de tensão por acoplamento capacitivo tipo braçadeira [23];
Aparelho de prova de tensão sem contato [24];
Monitor de potência elétrica sem contato autoalimentado [25];
Método, e dispositivo, e ponteira de detecção para medição de tensão
sem contato [26];
Monitor de potência não intrusivo [27].
1.4 Objetivos
O objetivo geral deste trabalho é o desenvolvimento de um dispositivo que
auxilie na identificação de fraudes e anomalias em medidores de energia elétrica com
capacidade para ser aplicável em instalações residências, comerciais e pequenas
indústrias. O princípio de funcionamento básico deste dispositivo é medir a energia
consumida, através do ramal de ligação, e comparar a medição deste, com a do medidor
da empresa distribuidora.
26
Para que o objetivo seja alcançado, o dispositivo deve ser um medidor de
energia não intrusivo, de fácil aplicação e remoção. Suas características devem permitir
a sua aplicação no ramal de ligação próximo ao ponto de derivação da rede secundária
ou próximo ao ponto de entrega, em redes aéreas multiplexadas com neutro nu. As etapa
de desenvolvimento do dispositivo foram divididas em projeto, construção de
protótipos, calibração, testes em bancada e teste em campo.
Para a realização do teste em campo se fez necessário, o uso de um medidor
de energia de referência, para verificação das medidas realizadas pelo dispositivo não
intrusivo. O desenvolvimento deste medidor de referência, é um objetivo secundário
deste trabalho. As características desse medidor deve permitir a fácil aplicação em
caixas de medição ou quadros de distribuição, sem a necessidade de alterações na
instalação elétrica ou desligamento de cargas. As etapas de desenvolvimento deste
medidor são divididas em projeto, construção, ajuste e testes.
1.5 Organização do texto
As próximas seções desta dissertação estão organizadas da seguinte forma:
no Capítulo 2 é apresentado o Medidor de Energia Não Intrusivo (MENI) proposto.
Sendo apresentada inicialmente uma visão geral do sistema e depois detalhados o
hardware, software e interface.
No Capítulo 3 é apresentado o medidor de referência desenvolvido para
permitir a avaliação do MENI em campo.
No Capítulo 4 são apresentados e discutidos os resultados experimentais
obtidos tanto em bancada quanto em teste de campo.
As conclusões e sugestões para trabalhos futuros são apresentadas no
Capítulo 5.
27
Capítulo 2
Medidor de Energia Não Intrusivo
(MENI)
este capítulo é apresentado o projeto do medidor de energia não intrusivo
(MENI). Primeiramente é apresentada uma visão geral do sistema e depois
são detalhados o sensor de corrente, sensor de tensão, firmware e interface
LabVIEW em PC.
2.1 Visão geral
O MENI é composto basicamente por um sensor de corrente e um sensor de
tensão cujos sinais são lidos por um microcontrolador que efetua o cálculo de grandezas
elétricas e armazenamento de dados. A Figura 5 apresenta um diagrama de blocos com
os principais componentes do sistema. Cada sensor possui um circuito de
condicionamento próprio que adequa o sinal para leitura pelos conversores AD
integrados ao microcontrolador. Uma interface serial permite que a configuração de
parâmetros e o acesso aos dados armazenados, sejam realizados por um computador
(PC). A alimentação do circuito é realizada através de uma única bateria que possui nível
adequado de tensão (3,6V) e não requer o uso de reguladores.
Figura 5. Diagrama de blocos do MENI.
N
28
Para o sensor de corrente foi utilizado um transformador de corrente (TC) do
tipo garra ou clamp-on, disponível comercialmente. O sensor de tensão é do tipo
capacitivo, tendo sido desenvolvido e construído in-house com materiais amplamente
disponíveis (PVC, chapas de cobre e resinas). Este sensor possui placas metálicas que
formam um acoplamento capacitivo com o condutor sob medição, permitindo que o
sinal de tensão seja medido sem contato. O projeto do sensor de tensão foi concebido
para que este se integrasse ao sensor de corrente do tipo garra, formando um sensor
unificado de tensão e corrente. Essa montagem permite que a mecânica da garra
continue funcional, permitindo uma instalação rápida, sem contato galvânico e sem
necessidade de abertura do circuito. A Figura 6 apresenta fotos do MENI identificando
suas partes. O conjunto sensor de corrente e sensor de tensão será referido no restante
desse texto como “garra sensora”. A garra sensora é ligada por cabos à placa eletrônica
que fica acondicionada em uma caixa plástica (caixa de circuitos). O comum do circuito
(GND), está disponível através de um fio terminado em um conector do tipo jacaré.
Figura 6. Fotos do MENI. a) Sistema completo com a caixa fechada; b) Caixa de circuitos
aberta; c) Visão inferior da placa principal.
Para a instalação do MENI, a garra sensora é colocada de maneira a abraçar o
fio da fase sob medição, conforme mostrado na Figura 7. O conector jacaré é ligado ao
neutro nu, estabelecendo assim, a referência do circuito em relação ao neutro da rede.
Para instalação em clientes bifásicos ou trifásicos basta utilizar um MENI para cada fase,
sendo os valores de consumo somados através de simples adição ao final do período de
medição.
29
Figura 7. MENI instalado em fio sob teste.
A alimentação do MENI é feita exclusivamente por uma única bateria, o que
exigiu escolhas durante o projeto para que o consumo de energia fosse mantido baixo
para permitir maior autonomia ao sistema. Foram adotadas algumas das estratégias
desenvolvidas em [4], como por exemplo a aquisição de amostras por um curto período
ao invés de aquisição contínua, como é tipicamente implementada por medidores de
energia. Quando no modo de medição, o microcontrolador fica a maior parte do tempo
em estado de dormência (sleep mode), onde o consumo é muito baixo, e acorda uma vez
por segundo para fazer aquisições durante uma janela de tempo de 134 ms. Além disso,
caso a corrente medida seja inferior ao limiar de 50 mA, o medidor passa para o modo
de espera, passando a acordar somente a cada 10 s para verificar se a corrente se
encontra acima do limiar, voltando para o modo de medição caso necessário. Essa
estratégia reduz drasticamente o consumo de energia, visto que o bloco com maior
consumo é o conversor AD.
No modo de medição, a cada segundo as amostras aquisitadas são
processadas para o cálculo da corrente RMS (𝐼𝑟𝑚𝑠), tensão RMS (𝑉𝑟𝑚𝑠), componente
fundamental da tensão RMS (𝑉1), potência ativa normalizada (𝑃𝑛) e acumulação do
consumo da energia ativa normalizada (𝐸𝑛). Os valores médios dessas grandezas são
computados a cada 1 minuto, utilizando portanto 60 amostras por média. Os valores
médios são armazenados na memória interna do microcontrolador e podem ser
acessadas posteriormente via porta serial com o uso da interface gráfica desenvolvida
em LabVIEW para PC. O MENI possui um LED indicador de status de funcionamento, que
pisca a cada 1 s quando no modo de medição ou a cada 10 s quando no modo de espera.
A taxa de aquisição utilizada é de 3840 S/s (amostras por segundo) que corresponde a
64 amostras por ciclo de rede em 60 Hz, este valor foi escolhido por ser múltiplo de dois,
30
o que facilita os cálculos de divisão por rotação de bits. O ganho de corrente e a
compensação do ângulo de defasagem introduzido pelos elementos do sensor são
configuráveis para permitir a calibração do sistema. Há ainda um relógio de tempo real
(RTC) interno que é utilizado para gravar a data e horário de início e fim para cada
período de medição realizada.
2.2 Sensor de corrente
Para a medição da corrente é utilizado um transformador de corrente com
núcleo aberto do tipo garra, também chamado de clamp-on ou alicate de corrente,
mostrado na Figura 8. O modelo utilizado é o mesmo dos trabalhos [3] [4], tendo sido
escolhido devido aos bons resultados apresentados e disponibilidade no mercado.
Fabricado pela YUANXING o modelo LCTC-0100 apresenta as especificações abaixo [28]:
Corrente nominal: 100 A
Corrente máxima: 120 A
Diâmetro interno livre: 25 mm
Classe de exatidão: 1.0
Faixa de linearidade: 5% a 120% (da corrente nominal)
Resistor de burden: ≤ 10 Ω
Núcleo de ferro nanocristalino
Figura 8. TC modelo LCTC-0100. Foto do original antes das alterações.
31
O circuito de condicionamento do sinal da garra de corrente é mostrado na
Figura 9. Os terminais I_IN+ e I_IN- são conectados à garra de corrente. Os sinais I1+ e
I1- são conectados às entradas diferenciais do conversor sigma-delta do
microcontrolador. Esse circuito é um filtro passa baixa com frequência de corte em 5,28
KHz. A resposta em frequência e a rotação de fase do filtro são mostrados no gráfico da
Figura 10. A defasagem causada pelo filtro em 60Hz é de -0,64°de acordo com a
simulação, ou seja, a fase da corrente medida é atrasada de 0,64° em relação a corrente
real. A mudança de fase máxima causada pelo TC é de +3,4° (adiantado) de acordo com
o fabricante. Essa defasagem de valor positivo, pode ser contra intuitivo uma vez que se
trata de um componente indutivo, porém, a mudança de fase é de fato tipicamente
adiantada, devido à corrente de magnetização [29]. A defasagem total da leitura de
corrente é a soma da defasagem causada pelo circuito de condicionamento com a
defasagem do próprio TC.
Figura 9. Circuito de condicionamento de sinal do sensor de corrente.
Figura 10. Simulação do circuito de condicionamento do sensor de corrente mostrando a
resposta em frequência da amplitude e rotação de fase.
32
2.3 Sensor de tensão
Um componente fundamental do sistema desenvolvido, e ao mesmo tempo
seu grande diferencial, é o sensor de tensão por acoplamento capacitivo. Esse sensor
permite a aquisição da forma de onda da tensão sem a necessidade de contato galvânico,
permitindo então, a medição em cabos com isolamento. Enquanto que o transformador
de corrente é capaz de medir a variação no campo magnético causada pela corrente que
flui no condutor, o sensor de tensão é capaz de medir a variação no campo elétrico
causada pela variação da tensão (cargas) no condutor.
Como será mostrado mais adiante, é difícil medir com exatidão a amplitude
da tensão, devido principalmente, a sensibilidade à variação da capacitância de
acoplamento. Porém, a forma de onda e sua defasagem apresentam baixa sensibilidade a
esta variação, permitindo então, que a determinação do fator de potência seja feita com
razoável exatidão, mesmo para baixos fatores de potência.
O sensor de tensão proposto é constituído basicamente de uma placa
metálica que envolve o condutor a ser medido, formando um capacitor em relação ao
mesmo. Para permitir a rápida instalação é necessário que o sensor seja bipartido, tal
como o TC utilizado. Para evitar o acoplamento capacitivo com fases adjacentes e ruído
de outros condutores próximos, é necessário uma blindagem eletrostática do sensor.
Esta blindagem é realizada com uma segunda placa metálica cobrindo (blindando) a
placa interna e conectada ao comum do circuito, que por sua vez se conecta ao neutro da
rede. Para garantir o isolamento elétrico entre as placas metálicas e contra intempéries,
foram utilizados materiais isolantes.
Figura 11. Ilustração da garra sensora identificando os sensores de tensão e corrente.
33
As dimensões do sensor de tensão fabricado foram calculadas para permitir o
encaixe e colagem dentro da estrutura da garra de corrente, formando assim um sensor
integrado de corrente e tensão, conforme visualizado na Figura 11. As dimensões
aproximadas são: diâmetro interno 16 mm, diâmetro externo 24 mm, comprimento 55
mm e comprimento das placas metálicas 40 mm. Os materiais utilizados foram: PVC
para o isolamento interno e externo, filme Kapton para o isolamento estre as placas,
cobre para as placas metálicas, Araldite e resina Epoxi para colagem das camadas e
isolamento lateral, fita isolante líquida e esmalte para isolamento de pontos metálicos
expostos. Uma ilustração identificando as camadas do sensor é apresentada na Figura
12.
Figura 12. Ilustração de uma seção do sensor de tensão por acoplamento capacitivo.
Há dois fatores que limitam a instalação do MENI, a máxima corrente de
medição limitada pelo sensor de corrente em 100 A e a maior bitola de fio comportada
pelas dimensões internas do sensor de tensão. O diâmetro interno do sensor é de 16
mm, porém, a bitola do fio deva ser ainda menor considerando que este se encontra
tipicamente abaulado o que requer mais espaço para a curva do fio. Como referência
para as bitolas de fio encontradas nas instalações, usou-se a norma técnica da CPFL que
estabelece que os condutores do ramal de entrada devem ser cabos unipolares de cobre,
possuir isolação mínima para 750 V, devendo ser do tipo PVC/70°C, conforme NBR NM
280 [7]. A mesma norma estabelece a bitola dos cabos a serem utilizados no ramal de
entrada e no ramal de ligação para as diversas categorias padronizadas de atendimento,
sendo a menor categoria dimensionada para uma corrente de 32 A. Como limite
34
superior de corrente do sensor desenvolvido, fixou-se o valor de 80 A. As bitolas
compreendidas no intervalo entre a menor categoria de atendimento (32 A) e o limite
superior do sensor (80 A) são: 6 mm2, 10 mm2, 16 mm2 e 25 mm2. Essas bitolas são
portanto, as bitolas de interesse para testes e cálculos desse trabalho.
A resistência de isolamento mínima para os cabos normatizados é de 5x108
Ωm a 70 °C e 5x1011 Ωm a 20 °C [30]. A Tabela 2 mostra um resumo das propriedades
dos cabos supramencionados. O método de medição da resistência de isolamento segue
a norma NBR NM-247-2, que estabelece: “Deve ser aplicada uma tensão c.c. entre 80 V e
500 V entre o condutor e a água. A resistência de isolamento deve ser medida 1 min após
a aplicação da tensão...” [31]. Portanto, esse valor de resistência não corresponde ao
valor observado em tensão alternada a 60 Hz, porém, este valor serve como referência
de valores mínimos esperados.
Tabela 2. Resistência de isolamento típica para cabos utilizados em ramal de entrada.
Seção nominal 6 mm2 10 mm2 16 mm2 25 mm2
Diâmetro do condutor 3 mm 4 mm 5,1 mm 6,7 mm
Espessura de isolação 0,8 mm 1 mm 1 mm 1,2 mm
Diâmetro externo 4,6 mm 6 mm 7 mm 9 mm
Resistência de isolamento mínima a 70°C em MΩ.km 0,0353 0,034 0,0284 0,027
Resistência de isolamento mínima a 20°C em MΩ.km 35,3 34 28,4 27
Resistência de isolamento mínima a 70°C em MΩ/4cm 882,5 850 710 675
Resistência de isolamento mínima a 20°C em MΩ/4cm 882500 850000 710000 675000
Foi calculado o valor da capacitância formada entre as placas do sensor e um
condutor em seu interior, considerando-se as bitolas de interesse. Para tal, foi
considerada a geometria do sensor e a constante dielétrica equivalente do material
presente entre as placas. Na Equação (1), é apresentado o cálculo para um capacitor
cilíndrico. O dielétrico presente entre as placas é formado por, no mínimo, três camadas
distintas, sendo elas: o isolamento do cabo (tipicamente PVC), o ar e o isolamento
interno do sensor (PVC). Os valores da constante dielétrica k para PVC rígido varia de
3,3 a 3,6 em 50 Hz e para PVC flexível de 4,5 a 8,5 a 50 Hz [32]. Para efeito de cálculo,
foram consideradas três situações: 1) apenas ar com k=1; 2) apenas PVC rígido com
k=3,3; 3) apenas PVC flexível com k=8,5. Na prática sempre haverá alguma camada de
ar, mas essas situações extremas foram consideradas para determinar os limites
máximo e mínimo para a faixa de capacitância possível. Os valores calculados das
35
capacitâncias para as três condições e para cada bitola de fio são apresentados na Tabela
3.
𝐶 =2𝜋𝑘𝜀0𝐿
𝑙𝑛[𝑏 𝑎⁄ ] (1)
Tabela 3. Valores calculados da capacitância entre o sensor e o cabo sob medição.
a [mm] b [mm] L [mm] k1 k2 k3 C1 [pF] C2 [pF] C3 [pF]
1,50 10 40 1 3,3 8,5 1,2 3,9 10,0
2,00 10 40 1 3,3 8,5 1,4 4,6 11,8
2,55 10 40 1 3,3 8,5 1,6 5,4 13,8
3,35 10 40 1 3,3 8,5 2,0 6,7 17,3
O circuito equivalente do circuito medidor de tensão é mostrado na Figura
13. O capacitor Cin e o resistor Rin formam um filtro na entrada do conversor AD sigma-
delta (terminais Vin+ e Vin−). O resistor Rad representa a resistência de entrada
equivalente do conversor AD, o capacitor Ca a capacitância de acoplamento entre o
sensor de tensão e o condutor fase sob medição e o resistor Ra a resistência de
isolamento entre o sensor de tensão e o condutor fase. O capacitor Cy mostrado na
Figura 12, representa a capacitância entre a placa interna do sensor e a placa externa de
blindagem, porém, este elemento pode ser negligenciado por se encontrar em paralelo
com o capacitor de valor muito maior Cin.
Figura 13. Circuito equivalente do circuito de medição de tensão.
36
Não foi possível calcular ou medir valores precisos para a resistência de
isolamento Ra. Por ser um material isolante, a caracterização do valor é fortemente
dependente da temperatura, tensão, frequência, umidade e tempo de teste. Além disso, o
elemento concentrado Ra é o equivalente da associação da resistência de isolamento da
parte interna do sensor, do isolamento do fio sob medição e do ar entre as partes. É
inviável a previsão do estado de conservação do isolante do fio a ser medido, e também,
das condições atmosféricas durante o teste. Por esse motivo, não se coloca aqui um valor
para Ra, mas admite-se que este componente pode ser negligenciado, desde que possua
valor superior a 100 G. Dessa forma, a isolação adequada deve ser garantida pelo
isolamento da garra sensora.
A defasagem imposta pelo circuito medidor de tensão deve ser considerada.
Os elementos C𝑖𝑛 , R𝑖𝑛 e Rad são estáveis e bem conhecidos, já os elementos equivalentes
Ca e Ra podem variar significativamente com o tipo da instalação e com fatores
ambientais. Assumindo que Ra possui um valor alto suficiente para não influenciar o
sistema, o único elemento que varia é o Ca. Ca varia com a temperatura, humidade do ar,
presença ou não de água da chuva, diâmetro do fio e posição do fio em relação ao sensor.
A função de transferência do circuito medidor de tensão é definida pela
Equação (2).
em que, 𝑉𝑓 é a tensão do condutor fase, 𝑉𝑟𝑒𝑎𝑑 é a tensão lida pelo conversor
AD, 𝑍𝑖𝑛 a impedância de entrada do circuito medidor formada pela associação em
paralelo dos elementos Ci, Rin e Rad e 𝑍𝑠 a impedância equivalente do sensor 𝑍𝑠 = 𝑍𝐶𝑎 .
A impedância 𝑍𝑠 é muito maior do que a impedância 𝑍𝑖𝑛, o que permite
aproximar a Equação (2) pela Equação (3).
A mesma equação pode ser reescrita em formato polar conforme a Equação
(4).
𝑉𝑟𝑒𝑎𝑑 =𝑉𝑓𝑍𝑖𝑛
𝑍𝑖𝑛 + 𝑍𝑠 (2)
𝑉𝑟𝑒𝑎𝑑 =𝑉𝑓𝑍𝑖𝑛
𝑍𝑠 (3)
37
A impedância de entrada 𝑍𝑖𝑛 é calculada conforme a Equação (5).
𝑍𝑖𝑛 = 𝑍𝐶𝑖𝑛 // 𝑍𝑅𝑖𝑛 // 𝑍𝑅𝑎𝑑 = 1
𝑗𝜔∗300𝑛𝐹 // 430k // 97k
𝑍𝑖𝑛 = 976,57 – j8736,84 = 8791,2 ∠ − 83,62°
(5)
A impedância 𝑍𝑠 possui uma característica fortemente capacitiva, ou seja,
𝑍𝑠 ≅ 𝑍𝐶𝑎 , e portanto, 𝜃𝑠 ≅ −90°. Substituindo os valores na Equação (4) tem-se:
A equação (6) mostra que 𝑉𝑟𝑒𝑎𝑑 possui uma defasagem fixa de 6,38°. Esta
defasagem fixa e de sinal positivo significa que a leitura de tensão está adiantada da
tensão real, mas pode ser compensada pelo sistema de processamento de sinais. Fica
evidente que a variação da capacitância Ca, influencia somente a amplitude de 𝑉𝑟𝑒𝑎𝑑 , mas
não altera sua defasagem θread . Portanto, a informação da fase é preservada e pode ser
medida independentemente do valor Ca. Por outro lado, a amplitude da tensão medida é
diretamente afetada por Ca. Em suma, é possível fazer a medição precisa do fator de
potência, apesar do mesmo não ser possível para a amplitude da tensão.
2.4 Realização do hardware
As placas de circuito impresso foram projetadas com auxílio do programa
Altium Designer e a fabricação das mesmas foi realizada nas próprias instalações do
DSIF. Foi utilizado o método de transferência térmica com papel transfer e corrosão com
percloreto de ferro. A maior parte dos componentes eletrônicos presentes na placa são
do tipo surface mount device (SMD), escolhidos de forma a manter as dimensões do
circuito pequenas e com baixo custo.
O microcontrolador selecionado para o projeto foi o MSP430F67791 da
Texas Instruments. Esse microcontrolador possui todos os recursos necessários para um
|𝑉𝑟𝑒𝑎𝑑|∠𝜃𝑟𝑒𝑎𝑑 =|𝑉𝑓||𝑍𝑖𝑛|∠(𝜃𝑖𝑛− 𝜃𝑠)
|𝑍𝑠|
(4)
|𝑉𝑟𝑒𝑎𝑑|∠𝜃𝑟𝑒𝑎𝑑 =|𝑉𝑓||8791,2|∠(−83,62 ° − (−90°))
|𝑍𝐶𝑎|
|𝑉𝑟𝑒𝑎𝑑|∠𝜃𝑟𝑒𝑎𝑑 =|𝑉𝑓|
|𝑍𝐶𝑎| |8791,2|∠6,38°
(6)
38
medidor de energia elétrica. As características que tornam esse microcontrolador
adequado para o projeto são listadas abaixo:
Ultra baixo consumo;
Compensação de temperatura;
Relógio de tempo real (RTC);
Múltiplas interfaces de comunicação para medidores inteligentes
Faixa de alimentação de 1,8V a 3,6V;
512KB de memória flash. 32KB de memória RAM;
7 ADCs de 24 bits com PGA independentes do tipo sigma-delta.
O microcontrolador possui oscilador interno, porém, foi utilizado um cristal
de clock externo para garantir maior estabilidade na base de tempo. O componente
escolhido possui frequência de 32.768 KHz ±20ppm, fabricado pela Micro Crystal,
modelo MS3V-T1R [33]. A alimentação de todo o circuito é feita por uma bateria de lítio
com as seguintes características: capacidade de 1200 mAh, tensão nominal 3,6V, não
recarregável, tamanho ½ AA, baixa corrente de fuga, máxima corrente contínua 40 mA e
máxima corrente pulsada 100 mA.
Para facilitar o projeto, optou-se pela divisão dos circuitos em duas placas
eletrônicas distintas interconectadas, a placa principal e placa de processamento de
sinais. A placa principal contém os circuitos para condicionamento de sinal, circuito de
alimentação com bateria, terminais para gravação, terminais para comunicação serial e
conectores para acoplar a placa de processamento de sinais. A placa de processamento
de sinais, que é conectada sobre a placa principal, contém basicamente o
microcontrolador, cristal de relógio e conectores. Dessa maneira, caso haja a
necessidade de mudanças no circuito de condicionamento de sinal, é possível
reaproveitar o microcontrolador, um componente relativamente caro. Além disso, essa
organização do circuito permite a troca do microcontrolador por outro modelo mais
barato, caso seja necessário em desenvolvimentos futuros. Os sensores de corrente e
tensão conectam-se na placa principal. Os esquemáticos da placa de processamento de
sinais e da placa principal são apresentados respectivamente no Apêndice A e Apêndice
B. O layout de ambas as placas são apresentados na Figura 14. Fotos com a visão
39
superior e inferior do sistema com as duas placas acopladas são apresentadas na Figura
15.
Figura 14. Esquerda, layout da placa de processamento. Direita, layout da placa
principal.
Figura 15. Placas eletrônicas (sem bateria). a) Placa de processamento sobre a placa
principal. b) Face inferior da placa principal.
2.5 Cálculo das grandezas elétricas
Os cálculos das grandezas elétricas são efetuados pelo firmware com base no
conteúdo de buffers contendo as formas de onda amostradas de corrente e tensão. Nos
próximos parágrafos são apresentas as equações utilizadas nos cálculos. Na
implementação das equações em código, foram utilizados artifícios matemáticos para
realizar a maior parte das operações com números inteiros e fazer uso do multiplicador
de hardware de maneira eficiente.
O cálculo da tensão eficaz é realizado com base na equação:
𝑉𝑟𝑚𝑠 = 𝐺𝑣√1
𝑁∑ 𝑣[𝑛]2𝑁𝑛=1 , (7)
em que, 𝑉𝑟𝑚𝑠 é a tensão eficaz, 𝐺𝑣 é o ganho de tensão, 𝑛 é o índice da amostra, 𝑣[𝑛] é a n-
ésima amostra do sinal de tensão e N o número total de amostras (256). Essa tensão é
mostrada em unidade arbitrária e não em Volts, devido à incerteza da amplitude do sinal
causada pela variação da capacitância do sensor. Para excluir o efeito da amplitude da
tensão no restante dos cálculos, a forma de onda normalizada vn[n] é obtida conforme a
a) b)
40
equação (8). Desta maneira, vn[n] possui sempre amplitude de 1 V𝑅𝑀𝑆, permitindo que o
valor da tensão nominal seja adicionada aos cálculos em etapa posterior ao período de
medição.
𝑣𝑛[𝑛] = 𝑣[𝑛]
𝑉𝑟𝑚𝑠, (8)
O cálculo da corrente eficaz é realizado através da implementação da
seguinte equação:
𝐼𝑟𝑚𝑠 = 𝐺𝑖√1
𝑁∑ 𝑖[𝑛]2𝑁𝑛=1 , (9)
em que, 𝐼rms é a corrente eficaz, 𝐺𝑖 é o ganho de corrente, 𝑛 é o índice da amostra, 𝑖[𝑛] é
a n-ésima amostra do sinal de corrente e 𝑁 o número total de amostras (256).
O cálculo da potência ativa normalizada para o período é realizado através da
seguinte equação:
𝑃𝑛 = 𝐺𝑖
𝑁∑ 𝑣𝑛[𝑛]. 𝑖[𝑛]
𝑁𝑛=1 , (10)
em que, 𝑃𝑛 é a potência ativa normalizada para o período amostrado e as outras
variáveis seguem a definição dos parágrafos anteriores. Em etapa posterior, na interface
em PC que acessa os dados do medidor, a potência ativa 𝑃, é obtida através da Equação
(11):
𝑃 = 𝑃𝑛 . 𝑉𝑟𝑚𝑠,𝑛𝑜𝑚𝑖𝑛𝑎𝑙 , (11)
onde, 𝑉rms,𝑛𝑜𝑚𝑖𝑛𝑎𝑙 é a tensão nominal da rede em que foi feita a medição da potência.
Dessa forma, a técnica de medição de potência ativa proposta nessa dissertação não
requer a medida da amplitude da tensão da rede elétrica.
A energia é obtida integrando a potência através da Equação (12)
𝐸𝑛 = 1
𝑁∑ 𝑃𝑛[𝑛] ∙ 𝑡
𝑁𝑛=1 , (12)
onde, 𝐸𝑛é a energia normalizada. De maneira semelhante ao cálculo da potência, a
energia real E é obtida através da Equação (13)
𝐸 = 𝑉𝑟𝑚𝑠,𝑛𝑜𝑚𝑖𝑛𝑎𝑙 ∙ 𝐸𝑛 . (13)
Durante testes, foi identificado que sob chuva, quando um grande volume de
água atinge o sensor, pode ocorrer variação significativa do sinal de tensão, inclusive
41
com distorções em seu formato de onda. A modelagem desta influência e a replicação
das condições em laboratório se mostraram trabalhosas e pouco precisas. Acredita-se
que a influência de capacitâncias e resistências parasitas sejam a causa da distorção.
Porém, devido a magnitude das grandezas envolvidas, não foi possível com os
equipamentos disponíveis no laboratório realizar caracterização dessas variáveis. A
saída encontrada foi então, identificar quando essa situação de distorção ocorre, e em
etapa de pós processamento atribuir um fator de potência baseado na corrente medida
no período em que houve distorção. É importante ressaltar que somente a tensão sofre
distorção, a corrente permanece inalterada.
Para identificação de anomalias na medição da tensão, foi usada a taxa de
distorção harmônica (THD) conforme a equação (14)
𝑇𝐻𝐷 = √𝑉𝑟𝑚𝑠2
𝑉12 − 1. (14)
O valor eficaz da componente harmônica fundamental do sinal de tensão é
calculado utilizando uma fórmula baseada na equação clássica da transformada discreta
de Fourier, apresentada nas equações (15), (16) e (17):
𝑅𝑒{𝑉[1]} = ∑ 𝑉[𝑖]𝑐𝑜𝑠 (2𝜋𝑖
𝑁)𝑁−1𝑖=0 , (15)
𝐼𝑚{𝑉[1]} = − ∑ 𝑉[𝑖]𝑠𝑒𝑛 (2𝜋𝑖
𝑁)
𝑁−1
𝑖=0
, (16)
|𝑉1| = √2 ∗ (𝑅𝑒{𝑉[1]}2 + 𝐼𝑚{𝑉[1]}2)
𝑁, (17)
nas quais, Re{V[1]} é a parte real, Im{V[1]} a parte imaginária e 𝑉1 a componente
fundamental da tensão. Não é necessário o cálculo do ângulo, uma vez que há interesse
somente na amplitude. As cosenoides e senoides utilizadas no cálculo da transformada
discreta de Fourrier foram armazenadas na memória flash do microcontrolador para
economizar recursos ao evitar os cálculos para a geração dos mesmos.
42
2.6 Firmware
O firmware foi desenvolvido em linguagem C no ambiente de
desenvolvimento Code Composer Studio – CCS da Texas Instruments. O programa é
transferido para memória do microcontrolador através da interface Spy-Bi-Wire, que
permite gravação e debug do microcontrolador no circuito final (in-circuit). Para isso,
foi utilizado um gravador e debugger MSP-FET que conecta os terminais de
programação e debug da placa principal do MENI ao PC.
O firmware do medidor desenvolvido foi projetado com o objetivo de
otimizar o consumo de energia e o uso dos recursos computacionais. Foram utilizados os
recursos dos periféricos para redução do uso da CPU, como por exemplo o uso do RTC e
do multiplicador em hardware. Um protocolo de comunicação baseada em comandos
permite flexibilidade e facilidade na configuração do dispositivo via comunicação serial
através de um aplicativo em PC. O fluxograma simplificado do firmware é apresentado
na Figura 16, onde se destaca as cinco rotinas principais: inicialização, estado de espera,
tratamento de comando, medição e medição via serial. Cada uma dessas rotinas são
detalhadas nas seções a seguir.
2.6.1 Inicialização
Quando o circuito é alimentado (ligado) é feita a sequência de inicialização.
Nesta etapa são configurados o oscilador a cristal externo, porta serial, ADCs e portas de
entrada e saída. Algumas variáveis são inicializadas com valores conhecidos. Ao fim da
inicialização o programa entra no estado de espera, onde aguarda até que haja conexão
com o PC para receber outras configurações. Todas as configurações são gravadas na
memória flash interna do microcontrolador, e, portanto, os valores são mantidos mesmo
quando não há alimentação.
É necessário inicializar o RTC sincronizando-o com o relógio do PC que deve
estar, por sua vez, sincronizado com algum servidor de hora confiável. Após ser
sincronizado, o RTC passa a gerar uma interrupção a cada 1s, sendo este o evento
utilizado para sincronizar as demais rotinas do programa.
43
Figura 16. Fluxograma geral do firmware.
44
2.6.2 Estado de espera
O sistema permanece em estado de espera até que algum evento aconteça.
Este evento pode ser a interrupção gerada pelo RTC a cada 1 s ou a interrupção causada
pela chegada de um byte pela porta serial. No caso da chegada de um byte, o programa é
direcionado para o estado de tratamento de comando. No caso de interrupção pelo RTC,
um contador de tempo de dormência, que inicia-se com o valor 10, é decrementado a
cada ocorrência. Quando o contador chega a zero, o sistema efetua um ciclo de medição
e verifica se o valor da corrente medida é superior a 50 mA. Caso a leitura indicar uma
corrente acima do limiar, o programa passa para o estado de “Medição”. Caso o valor
medido esteja abaixo desse limiar, é assumido que não há carga para ser medida e o
sistema se mantém no estado de espera, o contador é reiniciado e o sistema aguarda o
próximo evento. Esse procedimento evita o gasto desnecessário de energia para se
medir uma corrente insignificante. Além disso, o limiar de 50 mA corresponde a
corrente de partida da maior parte dos medidores comerciais.
2.6.3 Medição
O estado de medição é ativado quando o MENI se encontra configurado,
instalado e medindo uma corrente superior a 50 mA. A cada 1 s é efetuado um ciclo de
leitura, acumulação e armazenamento. A taxa de aquisição utilizada é de 3840 S/s
(amostras por segundo), portanto, um ciclo de rede de 60 Hz é representado por 64
amostras. Para economizar bateria, optou-se por adotar uma técnica já utilizada em
trabalhos anteriores, onde apenas alguns ciclos de rede são amostrados por segundo,
permitindo que o sistema adormeça no restante do tempo, economizando bateria [4].
Em outras palavras, a leitura é realizada em um janela de tempo e não continuamente.
Esta estratégia não modifica significativamente as medidas, pois, dificilmente uma carga
elétrica permanece em funcionamento por um período inferior à 1 segundo.
O ciclo de leitura é efetuado a cada segundo, sincronizado pelo RTC e segue o
fluxograma da Figura 16. A função “Mede”, faz a aquisição de amostras de tensão e
corrente, efetua os cálculos para compensação do offset dos conversores AD e calcula as
grandezas elétricas 𝐼𝑟𝑚𝑠 , 𝑉𝑟𝑚𝑠 , 𝑉1 e 𝑃𝑛 . O fluxograma desta função é mostrado na Figura
17.
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Figura 17. Fluxograma da função Mede.
Após a execução da função “Mede” é realizada a acumulação do valor lido 𝑃𝑛
para compor a energia 𝐸𝑛 consumida desde o início do período de aquisição.
A função “Armazena dados” acumula os valores das grandezas elétricas a
cada 60 pontos (60 segundos), calcula o valor médio para este período e armazena o
resultado na memória interna. Mais detalhes desta função são apresentados na Seção
2.6.4.
Ao final de cada ciclo de leitura o valor da corrente medida é novamente
comparado com o limiar de 50 mA. Caso esteja acima do limiar, o estado de “Medição” é
mantido, caso contrário, a leitura é finalizada, o timestamp de fim é gravado e o
programa passa para o “Estado de espera”.
Quando os ADs são ativados observa-se um offset acima do especificado pelo
fabricante, causado possivelmente por uma corrente de fuga vinda do circuito que
seleciona a função AD para a porta do microcontrolador que causa um carregamento do
capacitor presente no circuito de condicionamento de sinal, ver Figura 13. Observou-se
experimentalmente que após 256 amostras, que equivalem ao período de acomodação
de aproximadamente 66 ms, este offset cai para um nível aceitável, que pode ser
facilmente compensado pelo firmware. Devido à essa característica do conversor AD
46
utilizado, para a obtenção de 256 amostras úteis (equivalente a 4 ciclos de rede), é
necessário adquirir o total de 512 amostras, descartando as 256 primeiras.
A sequência de aquisição é realizada da seguinte forma: os ADs são ligados,
64 amostras são descartadas, 64 amostras são utilizadas para ajuste do ganho de escala
(função autorange), 128 amostras são descartadas, 256 amostras são armazenadas em
buffer na memória RAM e por fim os ADs são desligados. Esta sequência é realizada
simultaneamente para os canais de tensão e corrente. O cálculo do offset de cada canal é
feito encontrando-se a média aritmética das amostras do buffer. Posteriormente cada
buffer (de tensão e de corrente), têm seus valores corrigidos através da subtração de
cada elemento pelo valor de offset correspondente. O buffer resultante possui o sinal
com offset compensado para ser utilizado no restante dos cálculos.
O segundo conjunto de 64 amostras (segundo ciclo de rede) é aproveitado
para detecção do valor máximo absoluto. Este valor é utilizado para calcular o ganho de
escala adequado (autorange) para as demais leituras. O ganho é ajustado configurando o
PGA (Programmable Gain Amplifier) dos ADs de maneira a garantir o melhor ganho de
escala sem causar sobressinal.
2.6.4 Armazenamento de dados
Conforme já apresentado, o MENI apresenta o consumo para um período de
medição que é comparado ao medidor da distribuidora para verificação de fraude.
Porém, para fins de análise de desempenho do sistema desenvolvido, foi adicionada uma
função que armazena dados de leitura a cada 1 minuto (data log). Além disso, essa
função permite o levantamento da curva de carga da instalação sob teste. Esta função
armazena os valores 𝐼𝑟𝑚𝑠,𝑚é𝑑𝑖𝑜 , 𝑉𝑟𝑚𝑠,𝑚é𝑑𝑖𝑜 , 𝑉1𝑟𝑚,𝑚é𝑑𝑖𝑜 e 𝑃𝑛,𝑚é𝑑𝑖𝑜 , obtidos pela média
aritmética de 60 pontos, ou seja, 60 s de medida totalizando 1 minuto. Caso necessário o
número de pontos por média pode ser reconfigurado através de um comando via serial.
As grandezas medidas e calculadas são salvas na memória flash interna do
microcontrolador. Há 4 blocos de memória disponíveis com 128 kB, sendo eles
nomeados: BLOCK0, BLOCK1, BLOCK2 e BLOCK3. A gravação do firmware ocupa parte
do BLOCK0, deixando uma parte disponível que é então utilizada para gravação de um
registro que contém informação do início e fim de cada arquivo de medição. Os outros
três blocos, de 1 a 3, ficaram inteiramente livres para armazenamento de dados,
47
totalizando 384 kB, o suficiente para guardar 24.000 pontos de medida. Para o período
de integração de 1 min é possível guardar dados de um período de até 400 hrs (16,6
dias). A Tabela 4 mostra um exemplo de log de dados com apenas 4 pontos de medição.
Tabela 4. Exemplo de log de dados.
# 𝑰𝑹𝑴𝑺,𝒎é𝒅𝒊𝒐 𝑷𝒏,𝒎é𝒅𝒊𝒐 𝑽𝑹𝑴𝑺,𝒎é𝒅𝒊𝒐 𝑽𝟏,𝑹𝑴𝑺,𝒎é𝒅𝒊𝒐
1 12,15 581,78 284 283
2 12,15 536,19 295 294
3 12,12 538,48 295 294
4 12,12 539,11 296 295
Conforme explicado nas seções anteriores deste capítulo, a medição da
potência é iniciada quando se identifica uma corrente superior a 50 mA e finalizada
quando a corrente média é inferior a 50 mA. O medidor suporta a gravação de múltiplos
períodos de medição (com início e fim). Para cada período há um arquivo
correspondente na memória. Para otimizar o uso dos recursos do microcontrolador não
foi impleme
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