DESENVOLVIMENTO DOCENTE E CAPACITAÇÃO
GERENCIAL EM ESCOLAS MÉDICAS BRASILEIRAS
Fabiana A. Silva1, Nilce Maria da S. C. Costa
2, Jadete B. Lampert
3, Rosana Alves
4
1Curso Medicina - Universidade do Estado do Mato Grosso
Av. Santos Dumont, S/N Depto Medicina – Cidade Universitária – Bairro Aeroporto.
Cáceres – MT. Cep: 78200-000
2Curso de Nutrição - Universidade Federal de Goiás
3Curso Medicina - Universidade Federal de Santa Maria
4Curso Medicina - Universidade Federal do Espirito Santo
[email protected]; [email protected]; [email protected];
Abstract: The objective was to analyze the existence of managerial training for teachers
from the perceptions of institutional actors of medical schools in Brazil. descriptive
qualitative approach. Participated in 41 Brazilian medical schools, represented by
institutional actors: teachers, students and administrative staff. It was used for data
collection the assessment tool of medical schools "Wheel Method" and the technical
analysis "content analysis". For institutional actors most medical schools does not
promote managerial training, but recognizes its importance, indicating the need to
institutionalize faculty development program. We conclude that, given the current
scenario of expansion of medical and curriculum changes schools, it is necessary to
institutionalize faculty development programs to address educational and pedagogical
and management aspects.
Resumo: O objetivo foi analisar a existência de capacitação gerencial para docentes a
partir das percepções dos atores institucionais de escolas médicas no Brasil. Pesquisa
descritiva de abordagem qualitativa. Participaram 41 escolas médicas brasileiras,
representadas pelos atores institucionais: docentes, estudantes e técnicos
administrativos. Utilizou-se para coleta de dados o instrumento de avaliação de escolas
médicas “Método da roda” e para análise a técnica “análise de conteúdo”. Para os
atores institucionais a maioria das escolas médicas não promove a capacitação
gerencial, mas reconhece sua importância, indicando a necessidade de institucionalizar
programa de desenvolvimento docente. Conclui-se que, diante do atual cenário de
expansão das escolas médicas e mudanças curriculares, é necessário institucionalizar
programas de desenvolvimento docente que aborde aspectos didático-pedagógicos e de
gestão.
INTRODUÇÃO
Desde a criação e regulamentação do Sistema Único de Saúde (SUS) [Brasil, 1988;
Brasil, 1990a; Brasil, 1990b], foram intensificadas as discussões sobre mudanças na
formação profissional na área da saúde. Na década de 1990, as pesquisas desenvolvidas
pela Comissão Interinstitucional Nacional de Avaliação do Ensino Médico (CINAEM),
verificou que as condições das escolas quanto aos aspectos políticos, administrativos,
econômicos, recursos humanos, modelo pedagógico, interação com os serviços de saúde
e adequação do egresso às demandas sociais estavam aquém da qualificação desejada
[CINAEM, 1994; CINAEM, 2000]. Os dados da CINAEM desencadearam propostas de
transformação das escolas médicas, a partir de mudanças curriculares, capazes de
viabilizar a formação de um médico adequado às demandas sociais contemporâneas
[Miranda, 2003].
Na década de 2000, as Diretrizes Curriculares Nacionais (DCN) para a
graduação em medicina, estimularam mudanças na organização curricular e na
integração ensino-serviço, com a premissa de repensar o processo educativo e as
práticas em saúde [Jesus and Ribeiro 2012]. As DCN pontuam princípios que tem
possibilitado às instituições organizar e modificar os currículos [Anastasiou 2006].
Diante das transformações que estavam acontecendo no cenário universitário e
nos serviços de saúde, ficou evidente a necessidade de implantar políticas direcionadas
aos recursos humanos no SUS. Assim, em 2003, no Ministério da Saúde (MS), foi
criada a Secretaria de Gestão do Trabalho e da Educação na Saúde (SGTES) e instituído
o Departamento de Gestão da Educação na Saúde (DEGES), desenvolvendo ações em
conjunto com o Ministério da Educação (MEC).
A partir da criação da SGTES foi instituída a Política Nacional de Educação
Permanente em Saúde (PNEPS) e diversas ações de formação e reorientação dos
profissionais para o SUS, intensificando, o estreitamento das relações entre instituições
formadoras e o sistema público de saúde [Brasil 2004; Brasil 2007; Cavalheiro and
Guimarães 2011; Dias, Lima and Teixeira 2013; Cyrino et al, 2015].
Dentre as principais ações de reorientação da formação profissional em saúde
para o SUS, por iniciativas interministeriais, destaca-se em 2002 o Programa de
Incentivo a Mudanças Curriculares nos Cursos de Medicina (Promed), em 2005 o
Programa Nacional de Reorientação da Formação Profissional em Saúde (Pró-Saúde)
com sua segunda edição em 2007, e em 2008 o Programa de Educação pelo Trabalho
para a Saúde (Pet-Saúde).
Assim, foram observadas transformações na quantidade de experiências
inovadoras e de reformas curriculares em diversas escolas médicas, vislumbrando-se um
cenário de favorecimento para a construção de novas realidades [Nogueira 2009]. Essas
mudanças ganharam impulso a partir do ano de 2013 com a implantação do Programa
Mais Médicos (PMM), criado para enfrentar o problema histórico da falta de médicos
no Brasil [Brasil 2013a]. Como parte do PMM foi instituída a Política Nacional de
Expansão das Escolas Médicas das Instituições Federais de Educação Superior (IFES)
criando novos cursos de graduação em medicina e ampliando as vagas nos cursos já
existentes [Brasil 2013b]. Além de mobilizar a expansão de escolas médicas, o PMM
desencadeou a reformulação da formação de graduação em medicina no país por meio
da elaboração das novas DCN, as quais foram instituídas em 2014 [Brasil 2014].
No contexto histórico, os cursos de medicina do país vivem um dilema, com a
necessidade de incorporação de um volume crescente de novos conhecimentos e
tecnologias, ao mesmo tempo em que tem aumentado à demanda na formação de
profissionais capacitados para atender às necessidades da sociedade [Bollela and
Machado 2010]. Deste modo, com as constantes transformações na prestação de
cuidados, na prática clínica e na educação médica, é fundamental que os docentes
estejam preparados para lidar com as rápidas mudanças paradigmáticas [Steinert 2012].
Acreditando na importância do protagonismo docente para mobilizar e efetivar
mudanças na educação médica, diversas ações e políticas foram instituídas com vistas a
fomentar o desenvolvimento docente. Como principais exemplos a especialização em
Ativação de Processos de Mudanças na Formação Superior de Profissionais da Saúde, o
Programa Nacional de Desenvolvimento Docente em Saúde (Pró-Ensino), e o Programa
FAIMER Brasil da Foundation for Advancement of International Medical Education
and Research [Lima et al 2015; Brasil 2010; Teixeira 2016]
Nesse processo de implantação de mudanças, ainda são fatores limitantes a falta
de adesão e a resistência por parte dos docentes, justificados pela possível perda de
centralidade e autonomia, insegurança e despreparo para uso de estratégias pedagógicas,
refletindo a deficiência na formação pedagógica [Almeida et al 2007, Costa 2007, Costa
2009, Garcia and Silva 2011, Vieira, Tamousauskas 2013, Alves et al 2013].
Para superar essas limitações, é fundamental que as IES reconheçam os docentes
como principais protagonistas no processo de inovação pedagógica e apoiem as
iniciativas de aprendizagem docente [Morosini et al 2016, Queluz 2003, Perim et al
2009, Cyrino et al 2015]. Nacionalmente, os parâmetros de qualidade do ensino,
instituídos pela Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB) e pelo Sistema
Nacional de Avaliação da Educação Superior (SINAES), são vinculados à identidade e
formação do docente [Giansante 2016]. Seguindo essa lógica, nas DCN de 2014, o papel
do docente na formação do futuro profissional está vinculada à necessidade explícita das
escolas institucionalizarem um Programa Permanente de Formação e Desenvolvimento
da Docência em Saúde [Brasil 2014].
A docência universitária envolve uma atividade complexa e singular, abarcando
uma multiplicidade de saberes, competências e atitudes; prevê o domínio de um
conteúdo especializado para a formação de uma profissão; engloba a interação do
ensino, pesquisa, extensão e gestão [Morosini et al 2016, Pachane 2009]. Diante dessas
atribuições, é particularmente interessante notar que a capacidade gerencial torna-se
cada vez mais uma prioridade para que o docente possa ser competente, hábil e
socialmente comprometido com a formação do futuro profissional nas áreas de atenção,
gestão e educação em saúde, bem como, e com as mudanças organizacionais do curso.
A capacidade gerencial é mais do que treinamento, implica mudanças de
referências teórico-metodológicas e de pressupostos arraigados sobre o ensino, o papel
do docente e a prática médica [Lampert et al 2009]. Dessa maneira, acredita-se que os
programas de formação docente devem ser institucionalizados visando mais que
treinamento ou capacitação, mas ancorados no desenvolvimento do docente. A
capacitação e treinamento, assim como formação são considerados sinônimos, indicam
atividades que promovem a aprendizagem de competências para o cargo, tem caráter
operacional, prático e de curto prazo [Marras 2011, Maximiano 2014]. Já o
desenvolvimento abrange atividades que promovem a aprendizagem de competências
relacionadas tanto com a instituição universitária, quanto com a pessoa [Marras 2011,
Maximiano 2014].
Neste cenário, o objetivo deste estudo foi analisar a existência de capacitação
gerencial para docentes a partir das percepções dos atores institucionais de escolas
médicas no Brasil.
PERCURSO METODOLÓGICO
Caracterização da pesquisa
Trata-se de um estudo descritivo e de abordagem qualitativa. Apresenta o recorte de
uma pesquisa nacional que avaliou 41 cursos de graduação em medicina no Brasil no
ano de 2013, desenvolvido pela Comissão de Avaliação das Escolas da Área da Saúde
(CAES) da Associação Brasileira de Educação Médica (ABEM). Os sujeitos da
pesquisa, que representaram as escolas médicas, foram os docentes, estudantes e
técnicos administrativos, denominados de atores institucionais.
Coleta de dados: o instrumento “Método da Roda” e sua aplicação
O instrumento para coleta de dados, “Método da Roda” [Lampert 2009] possui cinco
eixos de avaliação: Mundo do Trabalho, Projeto Pedagógico, Abordagem Pedagógica,
Cenários de Prática e Desenvolvimento Docente. Cada eixo possui desdobramentos
temáticos denominados vetores, resultando em dezessete vetores, cada vetor possui três
alternativas relacionadas à tipologia das escolas: 1) tradicional, predominância do
modelo flexineriano; 2) inovadora em situação de mudanças; ou 3) avançada, atende às
DCN.
A coleta de dados foi realizada nas 41 escolas e foi conduzida por docentes da
própria escola que anteriormente receberam treinamento em oficina. Com o Projeto
Pedagógico de Curso (PPC) em mãos, os atores realizaram a leitura do instrumento em
voz alta, discutiram todos os vetores e o grupo escolheu a alternativa que
predominantemente identificava a escola. Descreveram uma justificativa indicando o
porquê da opção escolhida e listaram evidências, que comprovem a alternativa
escolhida, as quais foram debatidas exaustivamente até se obter o consenso entre os
participantes. O instrumento respondido foi encaminhado a CAES, os resultados foram
analisados e devolvidos à escola.
Organização e análise dos dados
Os dados qualitativos são oriundos do texto descrito nas justificativas e evidências para
o eixo Desenvolvimento Docente e seu vetor Capacidade Gerencial. As descrições
foram transcritas num único texto e identificadas por escola médica, sendo utilizada a
sigla CAES seguida de uma numeração definida pela secretaria da ABEM e de uma letra
“T” (tradicional), “I” (inovadora) ou “A” (avançada) como, por exemplo, “CAES1886 –
A”. Realizou-se a análise de conteúdo conforme Bardin (2011), seguindo as fases de
pré-análise, exploração do material, categorização e tratamento dos resultados:
inferência e interpretação.
Aspectos éticos
O projeto foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa sob número de protocolo
CEP/UFSM /CONEP/MS nº 0150.0.243.000-07. Os gestores das escolas médicas
assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) e cada escola recebeu
um código de identificação para preservar a identidade institucional e de seus
representantes.
RESULTADOS
Para o vetor analisado, capacitação gerencial, das 41 escolas avaliadas, oito escolas
(19,51%) foram consideradas tradicionais, não promovem capacitação gerencial dos
docentes; vinte e sete escolas (65,86%) foram identificadas como inovadoras, não
promovem, mas reconhecem a importância da capacitação gerencial, tendo docentes que
assumem cargos administrativos institucionais com algum conhecimento em gestão; e
seis escolas (14,63%) foram classificadas como avançadas, pois promovem capacitação
gerencial e possuem docentes que assumem cargos administrativos institucionais com
bom conhecimento em gestão.
Das respostas descritas pelos atores institucionais, emergiram três categorias de
análise: Categoria 1- Não Reconhece, nem promove capacitação, Categoria 2 -
Reconhece a capacitação, mas não promove e Categoria 3 - Promove a capacitação.
Não Reconhece, nem promove capacitação
As falas dos atores institucionais indicaram a inexistência de capacitação na área de
gestão para os docentes, sugerindo que esta formação não é priorizada pela instituição.
“Não existe programa institucional para capacitação gerencial de docentes
em cargos administrativos”. (CAES 28289-T)
“Não há preparo na área gerencial e administrativa para os professores
assumirem cargos administrativos”. (CAES 12702-I)
“A universidade e o curso não realizam capacitações tendo a gestão como
tema”. (CAES GG 8206-A)
A partir das falas sugere-se que os docentes assumem cargos administrativos na
instituição mesmo sem ter tido algum tipo de formação na área, sugerindo que a
universidade não tenha identificado a oferta de capacitação na área gerencial como uma
necessidade, levando os gestores a assumirem cargos baseados em conhecimentos
empíricos.
Reconhece a capacitação mas não promove
Na percepção dos participantes, as instituições reconhecem a importância da capacitação
gerencial, porém não ofertam de modo sistemático algum tipo de formação na área,
assim os docentes acabam assumindo cargos sem formação específica.
“Reconhece a importância da capacitação gerencial, mas ainda não
promove capacitação sistematicamente aos docentes que assumem cargos
administrativos gerenciais”. (CAES 1667-A)
“Embora não promova a capacitação gerencial, há reconhecimento da
importância da formação nesta área”. (CAES 17626-I)
Foi possível observar nas falas que mesmo não ofertando capacitação na área da
gestão, a instituição reconhece sua importância ao utilizar essa formação como critério
de indicação de docentes a cargos de gestão.
“Reconhecimento da formação e experiência gerencial para a indicação a
determinados cargos, como exemplo, cargos de coordenação de cursos e
direção”. (CAES 17626-I).
O reconhecimento da necessidade da capacitação é o primeiro passo para o
planejamento das ações de desenvolvimento docente, preparando-o para assumir cargos
de gestão.
Promove a capacitação
Nesta categoria são evidenciadas ações institucionais que priorizam a oferta da
capacitação em gestão. As capacitações são ofertadas em algumas instituições
esporadicamente, de modo pontual, geralmente vinculada a demanda de um profissional
com esse conhecimento.
“Há iniciativa pontual da pró-reitora de recursos humanos oferecendo,
esporadicamente, cursos de gestão de forma generalizada”. (CAES 16841-
T)
“Para assumir os cargos administrativos do curso de medicina foi oferecido
treinamento em gestão”. (CAES 8385-A)
“[...] A Pró-reitora de Graduação e Extensão, implantou um programa de
capacitação permanente docente, com periodicidade semestral, visando à
capacitação de docentes em cursos de capacitação gerencial e outras
formas de capacitação docente”. (CAES 12451-A)
As falas revelam a preocupação da instituição acerca da capacitação gerencial
para docentes, promovendo e estimulando o docente a participar dessas capacitações. A
participação do docente em cursos de capacitação não é um critério de exigência que
possa futuramente influenciar ou impedir que ele assuma cargos de gestão.
“A Universidade estimula e promove capacitação para gestão, porém não é
pré-requisito e não há cobrança formal ter uma formação de gestão para
assumir função administrativa. Existe a preocupação institucional com esse
importante aspecto. (CAES 21211-I)
“Vários docentes ocupam cargos administrativos, porém não há um plano
de capacitação gerencial” (CAES 6000-I)
Também emergiram informações relacionadas ao público-alvo para quem às
capacitações gerenciais são ofertadas. Algumas capacitações são restritas aos docentes
que assumem cargos de gestão, como coordenadores de curso.
A restringir a formação gerencial somente aos docentes que já estão em cargos
de gestão, como coordenadores de curso, a instituição demonstra apresentar um foco
gerencial limitado a cargos, visto que competências gerenciais são necessárias desde o
executar todas as atividades acadêmicas, como planejamento de aula e estratégias
pedagógicas utilizadas no processo ensino aprendizagem.
“A gestão atual tem priorizado a formação gerencial dos coordenadores
dos cursos” (CAES 25345-I)
“A abordagem gerencial ocorre apenas para aqueles docentes que assumem
cargos institucionais de gestão acadêmica” (CAES 8234-I)
Quando as capacitações são ofertadas, foi revelado o desinteresse do docente em
assumir cargos de gestão em diversos segmentos institucionais.
“Dificuldade de renovação do quadro de gestores”. (CAES GG 8206-A)
“Pouca adesão aos fóruns que discutem o processo de gestão” (CAES
12702-I)
“Pouca adesão do corpo docente na gestão, pela inexistência de atrativos
para que o docente assuma cargos. Ausência de incentivo financeiro e
reconhecimento/ valorização para mérito acadêmico”. (CAES 25496-I)
Foi observado o desinteresse docente tanto pela formação, quanto pelo próprio
cargo de gestão, com isso os mesmos docentes tendem a permanecer como gestores, o
que possivelmente reflete na baixa rotatividade dos gestores.
DISCUSSÃO
Em relação à tipologia das escolas médicas pesquisadas, a maioria não oferta
capacitação gerencial para os docentes. Em 2006, segundo uma pesquisa desenvolvida
pela CAES em escolas médicas, a capacitação gerencial foi refletida pela falta de
valorização institucional das atividades de gestão; ausência de programas de capacitação
gerencial; docentes sem formação em ciências administrativas assumem cargos
gerenciais; excessiva carga de trabalho para quem assume as funções de gerenciamento
no curso [Perim et al 2009]. Na presente pesquisa é possível notar avanços em relação
ao reconhecimento das instituições para a necessidade de ofertar capacitação docente em
gestão.
De acordo com as percepções dos atores institucionais, a formação docente em
gestão não faz parte da política da maioria das instituições, propiciando que docentes a
assumam cargos baseados em conhecimentos empíricos ou por aptidão pela gestão.
Contudo, o desenvolvimento de competências para a gestão, está em fluxo contínuo,
nascendo das aptidões, ou seja, do interesse intrínseco do indivíduo por determinada
área, passando pelas habilidades e tornando-se competente [Maximiniano, 2014].
Assim, notamos a importância dos processos de desenvolvimento docente contínuo,
pois mesmo aqueles docentes que apresentam aptidão para a área da gestão necessitam
seguir esse fluxo contínuo para se tornarem competentes em sua função.
Quando essa formação é ofertada, parece permear um contexto técnico, baseado
em treinamento ou capacitação para atender uma demanda pontual da instituição, além
de serem direcionadas aos docentes que já ocupam cargos de gestão. A docência
universitária está entremeada a complexa situação em que alguns defendem a adaptação
da Universidade às premissas do modelo hegemônico e outros que insistem numa
formação crítica, emancipatória e ética. Como consequência destes posicionamentos, é
comum encontrarmos duas vertentes que explicam os atributos necessários para atuar no
ensino superior. Um deles diz que é suficiente o domínio técnico da área do
conhecimento, enquanto outros buscam ampliar as dimensões éticas e epistemológicas
na formação dos futuros profissionais [Ferri 2009].
Assim, os programas de desenvolvimento docente, são constituídos diante dessas
contradições e a premissa para sua institucionalização é planejar e alinhar a vertente que
será o pilar desse processo formativo para o docente. Entre as iniciativas de capacitação
pedagógica do profissional universitário, estão os programas de formação continuada
para docentes do ensino superior, já em desenvolvimento em algumas universidades
brasileiras. Como constituintes de uma política institucional e organizacional, tais
programas oportunizam espaços aos professores interessados para repensar sua prática à
luz de pressupostos teóricos, estratégicas didáticas e experiências planejadas [Paiva and
Sponchiado 2011].
As iniciativas de desenvolvimento docente devem abordar sistematicamente uma
gama de tópicos, incluindo dimensões pessoais, profissionais e sociais, estilos de
liderança e gestão, resolução de conflitos e negociação e formação de equipes
colaborativas [Veiga 2010, Steinert 2012]. Dentre as inúmeras exigências normativas e
pedagógicas está a necessidade institucional, social e pedagógica de uma formação para
melhor elaboração do profissionalismo dos docentes do ensino superior [Lacerda 2015,
Costa, Lima and Leite 2015].
Diante das mudanças curriculares e expansão das escolas médicas, as escolas
precisam ir além do reconhecimento da necessidade da formação em gestão para
docentes, e iniciar um percurso de institucionalização de programas de desenvolvimento
docente, com vista à consolidação das propostas de mudanças, principalmente
curriculares, previstas nas DCN. Conforme os docentes que trabalham num curso de
medicina estruturado em Aprendizagem Baseada em Problemas (ABP) e
Problematização, a proposta pedagógica do curso só será sustentável e efetiva quando as
fragilidades na gestão do PPC forem superadas. Os docentes dessa escola enfatizam o
despreparo dos gestores, a necessidade do próprio preparo para assumir as funções de
gestão previstas nos métodos ativos de ensino e ressaltam que, garantir a
sustentabilidade do curso, implica em planejamento e apoio na implantação e execução
[Almeida, Maia and Batista 2013].
A temática gestão precisa ser abordada de modo amplo, valorizando e
estimulando as habilidades gerenciais do docente, desde o gerir a aula, disciplinas e
demais atividades acadêmicas, até a necessidade de uma formação para assumir cargos
administrativos em qualquer instância da instituição. A gestão em escolas médicas
implica em desenvolver lideranças capazes de planejar e gerenciar o currículo, garantir
que as atividades docentes e discentes sejam cumpridas com motivação e os resultados
esperados sejam alcançados [Almeida, Maia and Batista 2013].
Nessa perspectiva, o saber docente pode ser entendido como o conjunto de
competências que envolverá conhecimentos, habilidades, atitudes que engloba o saber,
saber-fazer e saber-ser [Tardif 2008]. A formação em gestão baseada nos atributos da
competência, proposta neste artigo, como princípio aos programas de desenvolvimento
docente, está embasada na perspectiva da autonomia docente apresentada por Contreras
(2012). Para o autor, a realização do ensino como qualquer outro trabalho, necessita de
certo domínio de habilidades e técnicas no uso de recursos para a ação didática, mas
também no modo como se criam e sustentam vínculos com as pessoas. O conjunto de
competências profissionais é o que capacita o professor para assumir responsabilidades
sociais e políticas.
Dessa maneira entende-se ser primordial a institucionalização de programas de
desenvolvimento docente permanente, fundamentados nos atributos da competência:
conhecimentos, habilidades e atitudes. A partir desse fundamento, sugere-se abordar
temáticas vinculadas à historicidade do docente, aos aspectos didático-pedagógicos e à
gestão. Para estruturação e sustentabilidade de um programa de desenvolvimento
docente, é importante seguir as etapas de diagnóstico situacional da escola, mobilização
dos atores, planejamento colaborativo, oferta das ações e avaliação das ações para
permanente reelaboração.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
De acordo com a percepção dos atores institucionais acerca da existência de capacitação
gerencial para docentes, identificou-se que a maioria das escolas médicas não promove a
capacitação gerencial, mas reconhece sua importância, o que demonstra a abertura para
o planejamento e oferta dessa abordagem em programas de desenvolvimento docente.
O movimento de mudanças na reorganização da educação médica e a expansão
de escolas no país maximizaram a inserção dos estudantes nos serviços de saúde desde o
início da graduação, diversificando os cenários de prática, promovendo metodologias
ativas de ensino e a reflexão acerca da responsabilidade social das escolas médicas,
exigindo gestores mais capacitados. Assim, além da formação técnica e pedagógica, o
docente deverá ter formação em gestão, assistência, ensino, pesquisa e educação em
saúde que juntos formarão o perfil do Gestor Acadêmico.
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