Delegado e o princpio da insignificncia frente ao furto
famlico"O DELEGADO DE POLCIA E O PRINCPIO DA INSIGNIFICNCIA: FRENTE
AO FURTO FAMLICO O QUE FAZER?"POR ANTONIO AILTON BENONE SABBRESUMO:
O Delegado de Polcia o primeiro Juiz da causa, os fatos lhe so
apresentados, muitas vezes na calada da noite, sem ningum para
trocar ideias e geralmente existe presso de policiais militares,
vtimas impacientes e da Corregedoria sempre muito exigente, ainda
assim a deciso tem de ser rpida, certa e precisa.PALAVRAS-CHAVE:
Introduo; 1) Princpio da Insignificncia; 2) Princpio da
insignificncia na viso do STF (Furto famlico); 3) O Delegado de
Polcia - Discricionariedade e a Priso em Flagrante; 4) Consideraes
finais; 5) Bibliografia.1. INTRODUOEsta semana estava trabalhando
normalmente na Seccional Urbana da Pedreira quando me foi
apresentado pela policia militar um cidado que teria furtado
algumas mercadorias para o alimento de sua famlia, formalmente eu
teria que lavrar o flagrante, pois me foi apresentado a vtima, o
suspeito, condutor, testemunha e a res furtiva. Eu na qualidade de
paladino da justia ainda relutei em fazer o procedimento, pois,
sabia que ali estava um pobre pai de famlia de trs filhos sendo que
um deles especial. Ao entrar em contato com a assessoria do Juzo da
Vara de Inquritos policiais ouvi a determinao segura e
imperativa:DOUTOR NO CABE A AUTORIDADE POLICIAL SE NEGAR A
LAVRATURA DO FLAGRANTE, SE A VTIMA INSISTIR E FOR AT A CORREGEDORIA
O SENHOR PROVAVELMENTE SER PROCESSADO ADMINISTRATIVAMENTE, A
SENHORA ASSESSORA DO JUIZ DISSE AINDA PARA MIM: DOUTOR POR QUE O
SENHOR NO FAZ CONCURSO PARA DEFENSOR PBLICO, O SENHOR EST NA REA
ERRADA.Ao analisar os dados contido no sistema de informao
LIBRA/TJ/PA vi que o suspeito j respondia a procedimento criminal
na 9 vara penal de Belm, pela pratica de outro furto, e por este
crime j havia recebido o beneficio da fiana pela justia, por isso
resolvi lavrar o procedimento flagrancial.Superado tais fatos do
caso concreto algumas dvidas ainda persistem:1 - E SE O SUSPEITO NO
TIVESSE QUALQUER PROBLEMA COM A JUSTIA, PODERIA A AUTORIDADE
POLICIAL APLICAR O PRINCIPIO DA INSIGNIFICNCIA SEM INCORRER EM
ILCITO PENAL OU ADMINISTRATIVO?2 - PODERIA DEIXAR DE FAZER O
PROCEDIMENTO POR ENTENDER NO HAVER CRIME POR SER FURTO FAMLICO, SEM
SER PENALIZADO NA CORREGEDORIA?Vejamos:2) O PRINCPIO DA
INSIGNIFICNCIAO princpio da insignificncia foi formulado pelo
clebre CLAUS ROXIN, em 1964 qual props a interpretao restritiva aos
tipos penais, com a excluso da conduta do tipo a partir da
insignificante importncia das leses ou danos aos interesses
sociais, a partir do adgio latino MINIMA NOM CURAT PRAETOR, visando
orientar a interpretao dos tipos penais.Outros princpios devem ser
considerados como o princpio da adequao social e o princpio da
fragmentariedade, onde a conduta formalmente inserida na descrio do
tipo seria materialmente atpica, caso se situasse entre os
comportamentos socialmente permitidos. A ao adequada socialmente
estaria, desde o seu incio, excluda do tipo, uma vez que se
realizaria dentro do campo da normalidade social.Ante o princpio da
insignificncia, mnimas ofensas aos bens jurdicos no justificam a
incidncia do Direito penal, ou seja, tem o condo de excluir a
atipicidade material, depois de constatada a presena das
atipicidades formal e conglobante do fato praticado pelo agente,
tendo tal posio se firmado cada vez mais nos tribunais superiores,
apesar da recalcitrncia do Ministrio Pblico que em regra insiste na
denuncia.Entendo ser desproporcional castigar fatos de importncia
manifestamente risvel como o furto de um quilo de charque de uma
rede de supermercado de Belm, e colocar um jovem pai de famlia numa
cela com 14 assaltantes da mais alta periculosidade.Entendo que
princpio da insignificncia, deve-se utiliz-lo com cautela,
considerando insignificante apenas aquilo que realmente o , sendo
que h a necessidade de serem observadas as circunstncias objetivas
e subjetivas que envolvem o caso concreto, impedindo-se que seu
contedo possa vir a ser uma porta aberta impunidade.A interveno
penal s ser legtima, pois, se houver lesividade, apesar dos bens
furtados serem insignificantes, in casu o indiciado j respondia um
procedimento criminal por furto, assim me vi obrigado a fazer um
procedimento flagrancial contra o jovem infrator da lei, mesmo
entendendo no haver lesividade para o estado ou a
vtima.Infelizmente o Ministrio Pblico no Par e a Corregedoria Geral
da Polcia Civil no comungam do meu pensamento, per entender que
somente pela via judicial, possvel realizar a proposio
poltico-criminal da imperatividade de descriminalizao de condutas
que, no obstante formalmente tpicas, no atingem de forma relevante
os bens jurdicos protegidos pelo Direito Penal.3) O PRINCIPIO DA
INSIGNIFICNCIA NA VISO DO STF.Em suas decises o Supremo Tribunal
Federal reconhece a descaracterizao da tipicidade penal em seu
aspecto material, tendo em conta a reunio dos seguintes
requisitos:a) mnima ofensividade da conduta do agente;b) nenhuma
periculosidade social da ao;c) reduzido grau de reprovabilidade do
comportamento;d) inexpressividade da leso jurdica provocada.Com
efeito, os requisitos a que o STF se refere tipicidade
material-normativa da teoria constitucionalista do delito, ou seja,
ao resultado jurdico desvalioso.Luiz Flvio Gomes (8 fev. 2006), ao
abordar o tema em testilha, pondera:Resultado jurdico desvalioso,
que implica uma ofensa:a) objetivamente imputvel conduta (leia-se:
criao ou incremento de um risco proibido penalmente relevante e
objetivamente imputvel conduta);b) concreta ou real (leso ou perigo
concreto ao bem jurdico);c) transcendental (afetao de terceiros);d)
grave (significativa);e) intolervel ef) objetivamente imputvel ao
risco criado pelo agente (imputao objetiva do resultado jurdico,
que significa duas coisas: 1) conexo direta do resultado jurdico
com o risco proibido criado ou incrementado; 2) que esse resultado
esteja no mbito de proteo da norma); (o grifo nosso)Todavia,
inobstante o guardio da Carta Magna mencionar nos julgados, os
requisitos da tipicidade apenas em seu prisma axiolgico-normativo,
mister ressaltar que esta, na roupagem da teoria constitucionalista
do delito, possui trs dimenses, quais sejam: tipicidade
formal-objetiva, tipicidade material-normativa e tipicidade
subjetiva (nos crimes dolosos).4) O DELEGADO DE POLCIA
DISCRICIONARIDADE - PRISO EM FLAGRANTEA Administrao Pblica, pelo
princpio da legalidade estrita, somente pode agir por determinao ou
atribuio legal, ao contrrio do particular que pode fazer tudo que
no seja vedado por Lei, ao agente pblico o discernimento necessrio
para agir, de acordo com a supremacia do interesse pblico, dentro
dos limites e critrios legais. a chamada discricionariedade, que se
traduz na convenincia e oportunidade do agente pblico quando em ao.
A discricionariedade pressupe a inexistncia absoluta de qualquer
desvio de finalidade, ou seja, pressupe aes desprovidas de paixes
individuais, em prol da coletividade. (o grifo pessoal)O Delegado
de Polcia sendo o primeiro Juiz da causa em concreto obrigado a dar
respostas e tomar as decises em momentos difceis, todavia deve agir
com cautela e prudncia para no ferir o direito fundamental da
liberdade da pessoa humana, ilegalmente.A atividade policial, por
sua natureza, pode tolher o direito liberdade do indivduo, quando
autorizado em lei. Todavia vejo que os legisladores em relao o
regramento da atividade de policia judiciaria no levado a srio, h
vrios anos a lei orgnica das policias civis e da policia federal
esto tramitando no congresso nacional sem previso para ser votada,
cerceando a discricionariedade da funo, e acabando por sob pena de
cometerem-se os maiores abusos possveis, quais sejam, aqueles
baseados na letra fria da Lei, ausentes de qualquer interpretao
mais acurada, separadas da lgica e do bom senso.O ato discricionrio
da Autoridade Policial dever sempre ser fundamentado e observado o
princpio elementar da proporcionalidade, agindo a autoridade com
bom senso, luz do princpio do livre convencimento motivado.O
encarceramento da pessoa humana medida extremada e, dentro de um
sistema jurdico obviamente pautado pela lgica e pelo bom senso, com
regras legais postas ao julgador, a fim de serem interpretadas em
harmonia umas com as outras, com princpios para a soluo de
eventuais antinomias e, at mesmo, anomias, no se pode aceitar como
crvel que se leve a efeito pela Polcia, e sejam referendados pelo
Judicirio, atos desvirtuados de uma mnima lgica.Em algumas hipteses
a ofensa ao bem jurdico tutelado no justifica dito condenatrio e
muito menos, ento, encarceramento prvio ao incio da persecuo
criminal, entretanto ainda que o Poder judicirio resolva conceder
liberdade provisria ao ergastulado, pelo menos algumas horas este
ficar encarcerado.Em furtos famlicos, ou de itens de pequeno valor
em, no se justifica a priso do sujeito, a menos que reiteradas de
maneira intolervel ou pela contumcia.Tem que ser dosada a
proporcionalidade entre a gravidade da falta e a intensidade da
sano, pois o encarceramento do indivduo no um fim em si mesmo, mas
uma consequncia, donde h de ser observado um nexo, um liame entre a
ao considerada antijurdica e a natureza ou Assim, sustentvel, luz
do sistema jurdico ptrio, que um conjunto de leis e de princpios
que se entrelaam sob a gide dos ditames maiores lanados pela nossa
Constituio Federal, que a Autoridade Policial possa, por meio da
sua discricionariedade nsita, no lavrar flagrantes acerca de
infraes que so, em tese, materialmente atpicas, podendo o tomar sua
deciso sem medo de ser punido pela Corregedoria ou perseguido pelo
RMP.O decisum de valorao a ser levado a efeito pela Autoridade
Policial bastar que contenha fundamentao razovel, fulcro no
princpio da persuaso racional, como, de resto, a atribuio de todos
aqueles que levam a efeito atos administrativos em geral.A
competncia a ser emprestada Autoridade Policial necessitaria emanar
de instrumentos legais, quer fosse por meio de uma clusula geral
acerca do princpio da insignificncia a ser inserida em nosso Codex
substantivo penal, quer fosse, ao menos, por meio de simples pactos
administrativos a serem avenados em cada Estado Federativo, tudo
dependendo da realidade vivida por cada ente federado e luz da
comunho de esforos e da conjugao de vontades existentes entre os
membros do Ministrio Pblico e Delegados de Polcia seus.Assim, em
ilcitos de menor gravidade como o exemplificado neste item, razovel
que, alm de rechaar-se a possibilidade de aplicao de priso em
flagrante, tambm se possa eliminar o trmite de todo um inqurito
policial, ocasio em que apenas registrar-se-ia o fato,
aprender-se-ia o instrumento e, qualificadas as partes,
remeter-se-iam os autos apreciao do Ministrio Pblico, titular da ao
penal.Observado isso, a par do fato de que a aplicao do princpio da
insignificncia no tocante ao labor dirio da Polcia Judiciria o
mnimo que se pode exigir, tambm plausvel sustentar-se a extenso da
sistemtica aqui proposta queles ilcitos que, embora materialmente
tpicos, veem-se de menor importncia no cenrio criminoso vivido por
determinadas sociedades.4. CONSIDERAES FINAISO princpio da
insignificncia um tema sempre atual e de grande importncia no mundo
jurdico, ms o debate tem que ser encarado, mormente na esfera
penal, nas mais diversas entrncias, incluindo-se a administrativa,
porque, em primeiro lugar, afeta a liberdade da pessoa humana; em
segundo, porque a sociedade sempre clama por uma justia mais clere,
mais gil e, consequentemente, mais justa.Em momento algum este
debate pode ser encarado como poder da Autoridade Policial para
arquivar autos de inqurito. Muito pelo contrrio o que se prope a
possibilidade real de que, em prol da apurao de ilcitos mais
graves, aqueles procedimentos referentes a fatos aparentemente
atpicos no seu aspecto material acabassem por abarcar sistemtica
processual extremamente mais simples e clere do que a costumeira, o
que por demais plausvel diante da nossa conjuntura hodierna.Essa
sistemtica processual sinttica concretizar-se-ia por meio de uma
verdadeira faculdade a ser concedida legalmente Autoridade
Policial, quer pela norma federal, como se disse acima, quer, ao
menos, em decorrncia de acordos a nvel estadual, onde esta no
necessitaria instaurar inquritos policiais acerca de delitos
materialmente atpicos, remetendo-se, de qualquer forma, os seus
registros respectivos de ocorrncias policiais apreciao dos
Promotores de Justia competentes. Na hiptese de estes discordarem
de um ou de outro critrio seletivo adotado pelo Delegado de Polcia,
restituiriam, ento, os autos Delegacia de Polcia, a fim de ver-se
instaurado o procedimento policial a respeito.Nada mais lgico, nada
mais coerente. Absolutamente nada haveria de prejudicial sociedade,
e poder-se-ia vislumbrar uma sensvel maior celeridade no trmite
daquelas causas penais realmente relevantes, sempre a cargo da
Polcia Judiciria e muitas delas fadadas ao perigo da prescrio em
abstrato.5. BIBLIOGRAFIADINAMARCO, Cndido Rangel. Teoria Geral do
Processo, 4 edio, Editora Revista dos Tribunais, 1984.CAPEZ,
Fernando. Curso de Processo Penal, ed. Saraiva, 4 ed., 1999;GOMES,
Luiz Flvio. Delito de Bagatela: princpios da insignificncia e da
irrelevncia penal do fato. Salvador, revista Dilogo Jurdico, vol.
1, n. 1.LOPES, Maurcio Antonio Ribeiro. Princpio da Insignificncia
no Direito Penal. Volume 2, 1997, 1 edio, Editora Revista dos
Tribunais, So Paulo.MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo
Brasileiro, 14 ed., Revista dos Tribunais.NORONHA, E. Magalhes.
Curso de Direito Processual Penal, ed. Saraiva, 17 ed.,
1986.PEREIRA, Caio Mrio da Silva. Instituies de Direito Civil. 4
ed. Rio de Janeiro: Forense, 1979. v. IIIROMANO, Santi. Princpios
de Direito Constitucional Geral, traduo de Maria Helena Diniz, Ed.
Revista dos Tribunais, So Paulo, 1970, pg. 145/146.ROXIN, Claus.
Poltica Criminal e Sistema Jurdico-Penal. Trad. Lus Greco. Rio de
Janeiro: Renovar, 2000.Sobre o autor ANTONIO AILTON BENONE
SABB
Delegado de Polcia Civil
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