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Critrio cientfico para distinguir a prescrio da decadncia e para
identificar as aes imprescritveis
Agnelo Amorim Filho
(Professor da Faculdade de Direito da Universidade da Paraba)
I O PROBLEMA EM FACE DA DOUTRINA E DA LEI
II CRITRIOS QUE TM SIDO APRESENTADOS PARA DISTINGUIR A
PRESCRIO DA DECADNCIA
III A MODERNA CLASSIFICAO DOS DIREITOS E DOS DIREITOS
POTESTATIVOS
IV CRTICAS FEITAS EXISTNCIA DOS DIREITOS POTESTATIVOS
V FORMAS DE EXERCCIO DOS DIREITOS POTESTATIVOS
VI MODERNA CLASSIFICAO DAS AES
VII AES CONSTITUTIVAS
VIII FUNDAMENTOS E EFEITOS DA PRESCRIO
IX FUNDAMENTOS E EFEITOS DA DECADNCIAX CASOS ESPECIAIS DE AES CONSTITUTIVAS
XI AES DECLARATRIAS
XII AES APARENTEMENTE DECLARATRIAS
XIII O PROBLEMA DA IMPRESCRITIBILIDADE DAS AES
XIV CONCLUSES
I O PROBLEMA EM FACE DA DOUTRINA E DA LEI
A questo referente distino entre prescrio e decadncia to
velha quanto os dois velhos institutos de profundas razes romanas
continua a desafiar a argcia dos juristas. As dvidas a respeito do
assunto so tantas e vm se acumulando de tal forma ao longo dos
sculos que, ao lado de autores que acentuam a complexidade da
matria, outros, mais pessimistas, chegam at a negar certo que com
indiscutvel exagero a existncia de qualquer diferena entre as duas
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II CRITRIOS QUE TM SIDO APRESENTADOS PARA DISTINGUIR A
PRESCRIO DA DECADNCIA
O critrio mais divulgado para se fazer a distino entre os dois
institutos aquele segundo o qual a prescrio extingue a ao, e a
decadncia extingue o direito. Entretanto, tal critrio, alm de carecer de
base cientfica, absolutamente falho e inadequado, uma vez que
pretende fazer a distino pelos efeitos ou conseqncias. O critrio
apontado apresenta-se, assim, com uma manifesta petio de princpio,
pois o que se deseja saber, precisamente, quando o prazo atinge a ao
ou o direito. O que se procura a causa e no o efeito. Processo
indiscutivelmente mais vantajoso do que aquele o sugerido por CMARA
LEAL, assim resumido pelo seu autor:
de decadncia o prazo estabelecido pela lei, ou pela vontade unilateral
ou bilateral, quando prefixado ao exerccio do direito pelo seu titular. E
de prescrio, quando fixado, no para o exerccio do direito, mas para oexerccio da ao que o protege. Quando, porm, o direito deve ser
exercido por meio da ao, originando-se ambos do mesmo fato, de modo
que o exerccio da ao representa o prprio exerccio do direito, o prazo
estabelecido para a ao deve ser tido como prefixado ao exerccio do
direito, sendo, portanto, de decadncia, embora aparentemente se afigure
de prescrio (CMARA LEAL, Da Prescrio e da Decadncia, 1 ed.,
pgs. 133 e 134). Todavia, o critrio proposto por CMARA LEAL,embora muito til na prtica, se ressente de dupla falha: em primeiro
lugar, um critrio emprico, carecedor de base cientfica, e isso
reconhecido pelo prprio CMARA LEAL, pois ele fala em discriminao
prtica dos prazos de decadncia das aes (obra citada, pg. 434).
Com efeito, adotando-se o referido critrio, fcil verificar, praticamente
na maioria os casos, se determinado prazo prescricional ou decadencial,
mas o autor no fixou, em bases cientficas, uma norma para identificar
aquelas situaes em que o direito nasce, ou no, concomitantemente
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com a ao, pois esse o seu ponto de partida para a distino entre os
dois institutos. Em segundo lugar, o critrio em exame no fornece
elementos para se identificar, direta ou mesmo indiretamente (isto , por
excluso), as denominadas aes imprescritveis. Faz-se necessrio,
assim, intensificar a procura por um outro critrio, e temos a impresso
que, tomando-se como ponto de partida a moderna classificao dos
direitos desenvolvida por CHIOVENDA e, particularmente, a categoria dos
direitos potestativos, chegar-se-, indubitavelmente, quele critrio ideal,
isto , a um critrio dotado de bases cientficas e que permite, simultnea
e seguramente, distinguir, de incio, a prescrio da decadncia, e
identificar as denominadas aes imprescritveis. o que nos propomos
a demonstrar com o presente trabalho.
III A MODERNA CLASSIFICAO DOS DIREITOS E OS DIREITOS
POTESTATIVOS
Segundo CHIOVENDA (Instituies, 1/35 e segs.), os direitossubjetivos se dividem em duas grandes categorias: a primeira
compreende aqueles direitos que tm por finalidade um bem da vida a
conseguir-se mediante uma prestao, positiva ou negativa, de outrem,
isto , do sujeito passivo. Recebem eles, de CHIOVENDA, a denominao
de direitos a uma prestao, e como exemplos poderamos citar todos
aqueles que compem as duas numerosas classes dos direitos reais e
pessoais. Nessas duas classes h sempre um sujeito passivo obrigado aumaprestao, seja positiva (dar ou fazer), como nos direitos de crdito,
seja negativa (abster-se), como nos direitos de propriedade. A segunda
grande categoria a dos denominados direitos potestativos, e
compreende aqueles poderes que a lei confere a determinadas pessoas de
influrem, com uma declarao de vontade, sobre as situaes jurdicas de
outras, sem o concurso da vontade dessas. Desenvolvendo a
conceituao dos direitos potestativos, diz CHIOVENDA:
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Esses poderes (que no se devem confundir com as simples
manifestaes de capacidade jurdica, como a faculdade de
testar, de contratar e semelhantes, a que no corresponde
nenhuma sujeio alheia), se exercitam e atuam mediantesimples declarao de vontade, mas, em alguns casos, com
a necessria interveno do Juiz. Tm todas de comum
tender produo de um efeito jurdico a favor de um
sujeito e a cargo de outro, o qual nada deve fazer, mas nem
por isso pode esquivar-se quele efeito, permanecendo
sujeito sua produo. A sujeio um estado jurdico que
dispensa o concurso da vontade do sujeito, ou qualqueratitude dele. So poderes puramente ideais, criados e
concebidos pela lei..., e, pois, que se apresentam como um
bem, no h como exclu-los de entre os direitos, como
realmente no os exclui o senso comum e o uso jurdico.
mera petio de princpio afirmar que no se pode imaginar
um direito a que no corresponda uma obrigao.
(Instituies, trad. port., 1/41, 42).
VON TUHR, por sua vez, conceitua os direitos potestativos nos seguintes
termos:
Em princpio, quando se trata de modificar os limites entre
duas esferas jurdicas, necessrio o acordo dos sujeitos
interessados. A possibilidade que tm A e B de modificar
suas relaes jurdicas recprocas, no pode, evidentemente,
conceber-se como um direito, pois no pressupe mais que
a capacidade geral de produzir efeitos jurdicos. Semembargo, distinta a situao quando A ou B tm a
faculdade de realizar a modificao em virtude de sua s
vontade. Tais faculdades so inumerveis e ilimitadamente
diversas, porm sempre se fundamentam em certos
pressupostos exatamente determinados. Neste caso cabe
falar de direitos; so os potestativos. (Derecho Civil, vol. 1,
tomo 1, pg. 203 da trad. cast.).
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Como exemplos de direitos potestativos podem ser citados os
seguintes: o poder que tm o mandante e o doador de revogarem o
mandato e a doao; o poder que tem o cnjuge de promover a
separao; o poder que tem o condmino de desfazer a comunho; o
poder que tem o herdeiro de aceitar ou renunciar a herana; o poder que
tm os interessados de promover a invalidao dos atos jurdicos
anulveis (contratos, testamentos, casamentos, etc.); o poder que tem o
scio de promover a dissoluo da sociedade civil; o poder que tem o
contratante de promover a resoluo do contrato por inadimplemento
(art. 475, do Cdigo Civil), ou por vcios redibitrios (art. 441); o poder de
escolha nas obrigaes alternativas (art. 252); o poder de interpelar,
notificar, ou protestar, para constituir em mora; o poder de alegar
compensao; o poder de resgatar imvel vendido com clusula de
retrovenda; o poder de dar vida a um contrato mediante aceitao da
oferta; o poder de requerer a interdio de determinadas pessoas; o
poder de promover a resciso das sentenas; o poder assegurado ao filho
de desobrigar os imveis de sua propriedade alienados ou gravados pelopai fora dos casos permitidos em lei; o poder assegurado ao cnjuge ou
seus herdeiros necessrios para anular a doao feita pelo cnjuge
adltero ao seu cmplice. Muitos outros exemplos ainda poderiam ser
citados. Da exposio feita acima se verifica que a principal caracterstica
dos direitos potestativos o estado de sujeio que o seu exerccio cria
para outra ou outras pessoas, independentemente da vontade dessas
ltimas, ou mesmo contra sua vontade. Assim, por exemplo, omandatrio, o donatrio, e os outros condminos, sofrem os efeitos da
extino do mandato, da doao e da comunho, sem que possam se
opor realizao do ato que produziu aqueles efeitos. No mximo, a
pessoa que sofre a sujeio pode, em algumas hipteses, se opor a que o
ato seja realizado de determinada forma, mas nesse caso o titular do
direito tem a faculdade de exerc-lo por outra forma. Ex.: diviso judicial,
quando os demais condminos no concordam com a diviso amigvel.
Outras caractersticas dos direitos potestativos: so insuscetveis de
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violao e a eles no corresponde uma prestao. Tais caractersticas
so encontradas em todos os exemplos enumerados acima. A categoria
dos direitos potestativos conceituada por vrios autores em termos mais
ou menos equivalentes aos de CHIOVENDA e VON TUHR: ENNECERUS-
KIPP E WOLF, Tratado de Derecho Civil, vol. 1, tomo 1, trad. cast., pg.
294; LEHMANN, Tratado de Derecho Civil, vol. 1, pgs. 128 e 129;
GUILHERME ESTELITA, Direito de Ao Direito de Demandar, pgs. 88 e
89; PONTES DE MIRANDA, Tratado de Direito Privado, vol. V, pg. 242; J.
FREDERICO MARQUES, Ensaio sobre a Jurisdio Voluntria, pg. 241;
ORLANDO GOMES, Introduo ao Direito Civil, pg. 119; e LUIS LORETO,
Revista Forense, 98/9.
IV CRTICAS FEITAS EXISTNCIA DOS DIREITOS POTESTATIVOS
A categoria dos direitos potestativos, embora admitida por vrios
autores, principalmente na Alemanha e na Itlia, tambm tem sido muito
combatida. Entretanto, CHIOVENDA, ao redigir as suas Instituies deDireito Processual Civil, afirmou que ...as vivas controvrsias dos ltimos
anos em torno dos direitos potestativos agora se aplacaram e a categoria
pode se considerar em definitivo, tambm na Itlia, reconhecida pela
doutrina e pela jurisprudncia, que lhe consagrou a utilidade prtica em
importantes aplicaes (vol. 1, pg. 43 da trad. port.). As principais
objees feitas existncia dos direitos potestativos so as seguintes:
alega-se que eles nada mais so do que faculdades jurdicas, ou, ento,manifestaes da capacidade jurdica, e que no se pode admitir a
existncia de um direito ao qual no corresponda um dever. Todavia, na
exposio que faz da sua doutrina, CHIOVENDA d resposta cabal e
antecipada a todas aquelas objees. Assim, acentua ele, em primeiro
lugar, que o exerccio de um direito potestativo cria um estado de sujeio
para outras pessoas, fato que no ocorre com o exerccio das meras
faculdades. Por sujeio, como j vimos, se deve entender a situao
daquele que, independentemente da sua vontade, ou mesmo contra sua
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vontade, sofre uma alterao na sua situao jurdica, por fora do
exerccio de um daqueles poderes atribudos a outra pessoa e que
recebem a denominao de direitos potestativos. precisamente o que
ocorre com o poder, assegurado aos contratantes, de promoverem a
decretao de invalidade dos contratos anulveis, exemplo tpico de
direito potestativo. Se um dos contratantes pretende exercit-lo, pode
faz-lo sem o concurso da vontade do outro, e esse, embora no possa se
opor, fica sujeito aos efeitos do ato: sua esfera jurdica afetada por uma
manifestao da vontade alheia, independentemente da prpria vontade.
J o mesmo no ocorre com o exerccio das denominadas faculdades
jurdicas: tal exerccio s afeta a esfera jurdica de terceiro com a
aquiescncia deste. Ex.: o proprietrio tem o poder de vender a coisa,
mas s a compra quem quer ningum obrigado a faz-lo. O exerccio
desse poder no cria um estado de sujeio para terceiros sem a vontade
desses. Tal poder , por conseguinte, uma mera faculdade, e no um
direito potestativo. Por a se verifica que no assiste qualquer parcela de
razo a CUNHA GONALVES quando identifica os direitos potestativos comas faculdades jurdicas e cita, como exemplos, os atos de andar, comer,
beber, dormir, danar, ler, escrever (Princpios de Direito Civil Luso-
brasileiro, vol. 1, pg. 62; e Tratado de Direito Civil, vol. 1, tomo 1, da
1 ed. bras.). Tais atos, entretanto, so faculdades que nem sequer
podem ser classificadas de jurdicas e muito menos podem ser
classificados de direitos potestativos, pois no criam estados de sujeio
para terceiros. Com referncia s outras objees feitas existncia dosdireitos potestativos, convm atentar para as consideraes que
CHIOVENDA faz a respeito do contedo jurdico da expresso bem, a
qual abrange, entre outras coisas, ...a modificao do estado jurdico
existente, quando se tenha interesse de interromper uma relao jurdica
ou de constituir uma nova. E arremata: ...pois que (tais poderes) se
apresentam como um bem, no h como exclu-los de entre os direitos,
como realmente no os exclui o senso comum e o uso jurdico
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(Instituies, vol. 1, pg. 42). Como reforo de argumentao, poder-
se-ia invocar, ainda, a opinio de PONTES DE MIRANDA:
Toda permisso de entrar na esfera jurdica de outrem direito;
...........................................................................................
A todo direito corresponde um sujeito passivo ou total, nos direitos
absolutos, ou determinado, nos direitos relativos. Os direitos formativos,
quer geradores, quer modificativos, quer extintivos, no so sem sujeitos
passivos: h sempre esfera jurdica alheia em que se opera a eficcia do
exerccio de tais direitos. (Tratado de Direito Privado, vol. V, pg. 245).
certo que, em virtude da grande semelhana entre os dois
institutos, torna-se muito sutil, em alguns casos, a distino entre os
direitos potestativos e as meras faculdades, mas a questo fica
grandemente facilitada caso se leve em conta, como fator distintivo, a
sujeio, pois essa apenas existe nos direitos potestativos. Deste modo,
aqueles que no querem, de forma alguma, ver nos direitos potestativos
uma categoria autnoma de direitos subjetivos, tm que admitir,
necessariamente, que eles constituem, pelo menos, uma classe especialde faculdades isto , aquelas faculdades cujo exerccio cria um estado
de sujeio para terceiros. O problema se reduzira, ento, a uma simples
questo de natureza terminolgica. De qualquer forma, no sero
afetadas as concluses que temos em vista no presente estudo.
V FORMAS DE EXERCCIO DOS DIREITOS POTESTATIVOS
Os direitos potestativos se exercitam e atuam, em princpio,
mediante simples declarao de vontade de seu titular,
independentemente de apelo s vias judiciais, e em qualquer hiptese
sem o concurso da vontade daquele que sofre a sujeio. Exemplos: os
direitos de revogao do mandato, de aceitao da herana, de dar vida a
um contrato mediante aceitao da oferta, de escolha nas obrigaes
alternativas. Em outros casos, que compem uma segunda categoria, os
direitos potestativos tambm podem ser exercitados mediante simples
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declarao da vontade do seu titular, sem apelo via judicial, mas
somente se aquele que sofre a sujeio concordar com tal forma de
exerccio. Se no houver concordncia, o titular do direito potestativo
pode recorrer via judicial para exercit-lo. Tal via funciona, a, apenas
subsidiariamente. Exemplos: o direito que tem o condmino de dividir a
coisa comum; o direito que tem o doador de revogar a doao; o direito
que tem o filho de desobrigar os imveis de sua propriedade alienados ou
gravados pelo pai fora dos casos expressos em lei; o direito que tem o
cnjuge, ou seus herdeiros necessrios, para anular a doao feita pelo
cnjuge adltero ao seu cmplice; o direito que tem o vendedor de
resgatar o imvel vendido com clusula de retrovenda. Finalmente, h
uma terceira categoria de direitos potestativos que s podem ser
exercidos por meio de ao. A ao, aqui, j no tem carter
simplesmente subsidirio, ou facultativo mas obrigatrio como forma
de exerccio do direito. Conseqentemente, nessa terceira categoria no
se dispensa a propositura da ao nem mesmo quando todos os
interessados, inclusive aqueles que sofrem a sujeio, esto de acordo emque o direito seja exercitado por outra forma. por esse motivo que
CALAMANDREI d, a tais procedimentos judiciais, a denominao de aes
necessrias, e a elas faz referncia em vrias passagens dos seus Estudios
sobre el Proceso Civil (pgs. 37, 152, 233, 238, 239 e 240 da trad. cast.).
O que tem em vista a lei, ao eleger a via judicial como forma especial e
exclusiva de exerccio dos direitos potestativos dessa terceira categoria,
conceder mais segurana para determinadas situaes jurdicas, cujaateno tem reflexos acentuados na ordem pblica. Nessa categoria
EDUARDO COUTURE inclui, de modo geral, aqueles direitos potestativos
que dizem respeito ao estado civil das pessoas (Fundamentos del Derecho
Procesal Civil, pg. 221). Exemplos: o direito de invalidar o casamento
nulo ou anulvel; o direito que tem o pai de contestar a paternidade dos
filhos de sua mulher; o direito que tem o filho de pleitear o
reconhecimento de sua paternidade, quando o pai no reconheceu
voluntariamente; o direito que tm determinadas pessoas de requererem
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a interdio de outras, dentre outros. Corolrio da natureza especial
dessas aes constitutivas necessrias a impossibilidade de ser aplicado
a elas o princpio da confisso ficta, consubstanciado no art. 319 do
Cdigo de Processo Civil. Ao propor uma daquelas aes por meio das
quais so exercidos os direitos potestativos da segunda e da terceira
categorias, o respectivo autor no pleiteia do ru qualquer prestao, seja
prestao de dar, de fazer, de no-fazer, de abster-se, ou de outra
espcie. O que ele visa com a propositura da ao , apenas, a criar,
extinguir, ou modificar determinada situao jurdica, e isso feito
independentemente da vontade, ou mesmo contra a vontade da pessoa
ou pessoas que ficam sujeitas aos efeitos do ato. Assim, o ru da ao,
embora no fique obrigado a uma prestao, sofre uma sujeio. o que
ocorre, por exemplo, com a ao proposta pelo cnjuge coacto para
anular o casamento: julgada procedente, o efeito da sentena no a
condenao do outro cnjuge a uma prestao, e sim a anulao do
casamento. A tal efeito o outro cnjuge fica sujeito, mesmo contra sua
vontade. Como se verifica fcil e prontamente, h uma ntida diferenade contedo entre tais aes e aquelas outras que caracterizam a
atividade jurisdicional e que so propostas exatamente com o objetivo de
compelir o ru a uma prestao.
VI MODERNA CLASSIFICAO DAS AES
A concepo dos direitos potestativos induziu a substituio datradicional classificao das aes, oriunda do direito romano, e que
levava em conta a natureza do direito cuja defesa se pretendia com o
exerccio da ao (aes reais, pessoais, mistas e prejudiciais), por uma
outra classificao que tivesse em vista a natureza do pronunciamento
judicial pleiteado. Classificao segundo a carga de eficcia, conforme
a conceituou PONTES DE MIRANDA (Tratado de Direito Privado, 5/483).
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De acordo com essa orientao, CHIOVENDA classificou as aes em
trs grupos principais: condenatrias, constitutivas e declaratrias
(Instituies, 1/67).
Lana-se mo da ao condenatria quando se pretende obter do
ru uma determinada prestao (positiva ou negativa), pois, "correlativo
ao conceito de condenao o conceito de prestao".
Deste modo, um dos pressupostos da ao de condenao "a
existncia de uma variedade de lei que garanta um bem a algum,
impondo ao ru a obrigao de uma prestao. Por conseqncia, no
podem jamais dar lugar a sentena de condenao os direitos
potestativos" (CHIOVENDA, op. Cit., 1/267).
J a ao constitutiva (positiva ou negativa) cabe quando se procura
obter, no uma prestao do ru, mas a criao de um estado jurdico, ou
a modificao, ou a extino de um estado jurdico anterior.
Por a se verifica, de pronto, que as duas mencionadas espcies de
ao correspondem exatamente, com rigorosa preciso, queles dois
grandes grupos nos quais CHIOVENDA divide os direitos: as aescondenatrias so meios de proteo daqueles direitos suscetveis de
violao (direitos a uma prestao); e as aes constitutivas so meios
de exerccio daqueles direitos insuscetveis de violao (direitos
potestativos).
Quanto s aes declaratrias, tm elas por objetivo conseguir uma
certeza jurdica. Ou, segundo a conceituao de CHIOVENDA:
verificar qual seja a vontade concreta da lei, quer dizer,certificar a existncia do direito (j direito a uma prestao,
j direito potestativo), sem o fim de preparar a consecuo
de qualquer bem, a no ser a certeza jurdica.
.............................................................................
O autor que requer uma sentena declaratria, no pretende
conseguir atualmente um bem da vida que lhe seja
garantido por vontade da lei, seja que o bem consista numa
prestao do obrigado, seja que consista na modificao do
estado jurdico atual; quer to-somente, saber que seu
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direito existe ou quer excluir que exista o direito do
adversrio; pleiteia, no processo, a certeza jurdica e nada
mais (Instituies, 1 vol., pgs. 265 e 303).
Por enquanto, deve ficar bem fixada esta noo, que tem
importncia capital no desenvolvimento de alguns aspectos do presente
estudo: o objetivo da ao declaratria a obteno de uma certeza
jurdica e nada mais. Nas declaratrias, conseqentemente, o autor
no colima a realizao do direito (CHIOVENDA, op. Cit., 1/302).
Convm acentuar, porm, que as sentenas condenatrias e as
constitutivas tambm tm certo contedo declaratrio, ao lado do
contedo condenatrio ou constitutivo, pois toda sentena deve conter,
necessariamente, a declarao da existncia da relao jurdica sobre a
qual versa. O que as distingue das declaratrias propriamente ditas
que, nestas, tal contedo total, ao passo que nas outras duas espcies
parcial. Em outras palavras: as sentenas declaratrias so puramente
declaratrias, ao passo que as condenatrias so, simultaneamente,
declaratrias e condenatrias.
O mesmo se pode dizer com referncia s constitutivas: so,
simultaneamente, declaratrias e constitutivas (CALAMANDREI, Estudios
sobre el Proceso Civil, pg. 282; Lus MACHADO GUIMARES, in Rev. For.,
101/8; LOPES DA COSTA, Direito Processual Civil Brasileiro, 1 ed., 1/84;
ALFREDO BUZAID, Ao Declaratria, 95; e TORQUATO CASTRO, Ao
Declaratria, pg. 19).
Ainda a respeito da classificao das aes, faz-se necessrioregistrar que alguns autores admitem categorias alm daquelas trs j
referidas, como, por exemplo, as aes executrias, as aes
determinativas, as aes mandamentais, dentre outras. Todavia,
EDUARDO COUTURE acentua, com muita propriedade, que a classificao
tricotmica abarca todas essas aes, as quais, de resto, nem sequer
chegam a formar categorias particulares (citao feita por NELSON
CARNEIRO na Rev. For., 136/51).
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VII AES CONSTITUTIVAS
A natureza do presente estudo exige que, a esta altura, nos
detenhamos um pouco na anlise das aes constitutivas. Tm elas por
objetivo o exerccio de duas categorias de direitos potestativos: a) aqueles
que, por medida de segurana dos negcios jurdicos, a lei no permite
que sejam exercidos mediante simples declarao de vontade, nem
mesmo quando esto de acordo todos os interessados, inclusive aquele
que sofre a sujeio (aes constitutivas necessrias, segundo a
terminologia adotada por CALAMANDREI). Exemplos: as aes anulatrias
de casamento; e b) aqueles direitos potestativos que so exercidos por
meio de ao apenas subsidiariamente, isto , quando os outros
interessados no concordam em que eles sejam exercidos mediante
simples declarao de vontade. Exemplo: a ao de diviso.
Pelo que foi dito acima, j se pode concluir que as aes
constitutivas tm as seguintes caractersticas: a) no pressupem a
existncia de leso a um direito, como ocorre nas aes condenatrias; b)por meio delas no se exige uma prestao do ru, mas apenas se pleiteia
a formao, modificao, ou extino de um estado jurdico; c) no so
meio para se restaurar um direito lesado, mas meio pelo qual se
exercitam duas classes de direitos potestativos; d) no tm por objetivo a
satisfao de uma pretenso, caso se entenda como tal o poder de exigir
de outrem uma prestao, pois os direitos potestativos so, por
definio, direitos sem pretenso; (quando muito, h, nas aesconstitutivas, uma pretenso de natureza muito especial, isto , uma
pretenso dirigida contra o Estado, ou uma pretenso tutela jurdica, ou
pretenso prestao jurisdicional, como quer PONTES DE MIRANDA,
mas ele mesmo acentua que no se deve confundir pretenso de direito
material com pretenso tutela jurdica Comentrios ao Cdigo de
Processo Civil, 1 ed., 1 vol., pg. 19); finalmente: c) as sentenas
proferidas nas aes constitutivas (positivas ou negativas) no so
suscetveis, e nem carecem, de execuo, pois o contedo de tais aes
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se esgota com o provimento judicial que determina a criao, modificao,
ou extino do estado jurdico. (somente quando a ao constitutiva se
encontra cumulada com uma ao condenatria que se pode cogitar de
execuo, mas a a execuo diz respeito a essa ltima. Exemplo: a ao
para rescindir o contrato de compra e venda de coisa recebida com vcio
redibitrio, e reaver o preo pago, mais perdas e danos art. 443).
Convm acentuar, finalmente, que, embora as sentenas proferidas
nas aes constitutivas produzam, normalmente, efeitos no retroativos,
no contrria sua natureza, e at mesmo freqente, a produo de
efeitos retroativos, conforme ensinam CHIOVENDA (Instituies, 1/286),
PONTES DE MIRANDA (Comentrios ao Cdigo de Processo Civil, vol. 2,
pg. 468 da 1 ed.), GOLDSCHMIDT (Derecho Procesal, pg. 112) e
PRIETO CASTRO (Derecho Procesal Civil, tomo I, pg. 65).
VIII FUNDAMENTOS E EFEITOS DA PRESCRIO
Acentua SAVIGNY que, durante muito tempo, a prescrio foi uminstituto completamente estranho ao direito romano, mas, ao surgir o
direito pretoriano, passou a constituir uma exceo antiga regra da
durao perptua das aes.
Por ltimo, a exceo se converteu em regra geral (Sistema del
Derecho Romano, tomo IV, pgs. 181 e 185 da trad. cast.). Tendo ainda
em vista o direito romano, diz o mesmo autor que o principal fundamento
da prescrio a necessidade de serem fixadas as relaes jurdicasincertas, suscetveis de dvidas e controvrsias, encerrando-se a dita
incerteza em um lapso determinado de tempo (op. e vol. cits. pg. 178).
Por sua vez, ensina PONTES DE MIRANDA que o instituto da
prescrio serve segurana e paz pblicas, e este, precisamente, o
ponto de vista que, de modo geral, prevalece, a respeito do assunto, na
doutrina e na jurisprudncia, embora ainda haja quem procure
apresentar, como fundamento do mesmo instituto, o castigo
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negligncia, a aplicao do princpio de que o direito no protege a quem
dorme (dormentibus non sucurrit ius).
Mas, h um ponto que deve ficar bem ressaltado, porque interessa
fundamentalmente s concluses do presente estudo: os vrios autores
que se dedicaram anlise do termo inicial da prescrio fixam esse
termo, sem discrepncia, no nascimento da ao (actio nata),
determinando, tal nascimento, pela violao de um direito.
SAVIGNY, por exemplo, no captulo da sua monumental obra,
dedicado ao estudo das condies da prescrio, inclui, em primeiro lugar,
a actio nata, e acentua que esta se caracteriza por dois elementos: a)
existncia de um direito atual, suscetvel de ser reclamado em juzo; e b)
violao desse direito (op. cit., tomo IV, pg. 186).
Tambm CMARA LEAL afirma, peremptoriamente:
sem exigibilidade do direito, quando ameaado ou violado,ou no satisfeita sua obrigao correlata, no h ao a serexercitada; e sem o nascimento desta, pela necessidade degarantia e proteo ao direito, no pode haver prescrio,porque esta tem por condio primria a existncia da ao.
....................................................................................
Duas condies exige a ao, para se considerar nascida(nata) segundo a expresso romana: a) um direito atualatribudo ao seu titular; b) uma violao desse direito, qualtem ela por fim remover.
....................................................................................
O momento de incio do curso da prescrio, ou seja, o
momento inicial do prazo, determinado pelo nascimento daao (actioni nondum natae non praescribitur).
Desde que o direito est normalmente exercido, ou nosofre qualquer obstculo, por parte de outrem, no h aoexercitvel.
Mas, se o direito desrespeitado, violado, ou ameaado, aotitular incumbe proteg-lo e, para isso, dispe da ao...(CMARA LEAL, Da Prescrio e da Decadncia, pgs. 19, 32e 256).
Opinando no mesmo sentido, podero ser indicados vrios outrosautores, todos mencionando aquelas duas circunstncias que devem ficar
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bem acentuadas (o nascimento da ao como termo inicial da prescrio,
e a leso ou violao de um direito como fato gerador da ao).
Convm acentuar que quando se diz que o termo inicial do prazo
prescricional o nascimento da ao, utiliza-se a a palavra ao no
sentido de pretenso, isso , no mesmo sentido em que ela usada nas
expresses ao real e ao pessoal, pois, a rigor, a prescrio no
comea com a ao e sim com a pretenso; est diretamente ligada a
essa, e s indiretamente quela.
A pretenso, como se sabe, um conceito relativamente antigo,
concebido no sculo passado como decorrncia necessria do princpio da
autonomia do direito de ao, mas ainda pouco utilizado pela maioria dos
autores nacionais.
Com ele se designa um dos sentidos da actio romana: o poder de
exigir de outrem, extrajudicialmente, uma prestao; a exigibilidade ou
a prpria exigncia de uma prestao, positiva ou negativa (HLIO
TORNAGHI, Processo Penal, 2 vol., pg. 140, da 1 ed.); a ao no
sentido material, contraposta ao no sentido judicial (ORLANDOGOMES, Introduo ao Direito Civil, pg. 397). Ou, conforme acentuou
WINDSCHEID, que foi o fixador dos contornos da pretenso: a actio do
direito romano e do direito comum desprovida de todo o aparato
processual (apud LIEBMANN, Tratado de Derecho Civil, vol. 1, pg.
138).
Note-se, ainda, para melhor ressaltar a diferena, que a pretenso
um poder dirigido contra o sujeito passivo da relao de direitosubstancial, ao passo que a ao processual poder dirigido contra o
Estado, para que esse satisfaa a prestao jurisdicional a que est
obrigado.
A rigor, s quando a pretenso no satisfeita pelo sujeito passivo,
ou seja, s quando o sujeito passivo no atende a exigncia do titular do
direito, que surge, como conseqncia, a ao, isto , o poder de
provocar a atividade jurisdicional do Estado.
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As digresses feitas acima impem a concluso de que, sob o ponto
de vista doutrinrio, no rigorosamente correto afirmar que o prazo
prescricional comea a fluir a partir do nascimento da ao processual
oriunda da leso do direito (ou para usar a terminologia da doutrina
mais atualizada a partir da reunio das condies para o exerccio da
ao), pois alm de no se originar a ao, diretamente, da violao do
direito, ainda h casos em que aquele prazo necessariamente deve
comear a fluir antes da leso do direito e, conseqentemente, antes que
o titular possa, a rigor, propor a ao (processual).
Serve para ilustrar a assertiva o exemplo anteriormente citado, da
dvida qurable (art. 327 do Cdigo Civil) sujeita a prazo, em que o
credor, na data do vencimento, no foi receber o pagamento no domiclio
do devedor, nem esse manifestou recusa em efetuar o pagamento, no
tendo havido, assim, violao do direito do primeiro, nem,
conseqentemente, nascimento da ao.
Caso se entenda que, no caso, o prazo prescricional deve comear a
fluir com o nascimento da ao decorrente da violao do direito, chegar-se-ia concluso evidentemente absurda de que tal prazo jamais ter
inicio, ou, ento, que seu inicio ficar dependendo exclusivamente da
vontade do credor; somente quando ele procurar o devedor, para receber
o pagamento, e houver recusa da parte desse (caracterizando-se, assim,
a violao do direito), que comear a fluir o dito prazo.
Foi, talvez, para atender a tais situaes, que o Cdigo Civil alemo
introduziu em seu texto, exatamente na seo que trata da prescrio, oconceito de pretenso (Anspruch), que extremamente til na prtica: o
poder de exigir de outrem uma prestao ( 194). E acrescentou, no
198: a prescrio comea com o nascimento da pretenso.
Acentue-se que, quando o mencionado Cdigo, em seu 194, fala
em poder de exigir, est subentendido que o poder de exigir
extrajudicialmente (tendo em vista a possibilidade de realizao
espontnea do direito por parte do sujeito passivo), e no o poder de
exigir por via judicial. Esse ltimo constitui a ao propriamente dita (ou
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ao judicial), e corresponde ao outro sentido que os romanos davam
actio.
Desde que o inicio do prazo prescricional determinado pelo
nascimento da pretenso, segue-se, da, como concluso lgica e
inevitvel, que a primeira coisa atingida pela prescrio a pretenso, e
no a ao. Pode at haver casos em que se verifica a prescrio da
pretenso, sem que a ao haja sequer nascido. O exemplo citado acima,
com apoio no art. 327 do Cdigo Civil, tambm de utilidade aqui: assim,
decorrido o prazo prescricional (iniciado com o vencimento da obrigao),
sem que haja comparecido ao domiclio do devedor, e sem que esse haja
manifestado recusa em efetuar o pagamento, prescrever a pretenso
(desde que o interessado tenha oferecido a exceo de prescrio),
embora, a rigor, no tivesse nascido a ao.
Em resumo: a ao, que posterius lgico em relao pretenso,
atingida apenas indiretamente pela prescrio; desde que uma
pretenso fica encoberta pela prescrio, tambm fica encoberta a ao
porventura originada daquela pretenso (ou que tinha na mesmapretenso uma das condies para o seu exerccio).
Por outro lado, caso se entenda que a prescrio atinge de modo
direto a ao (processual), ter-se- que concluir, necessariamente, que a
pretenso (como prius lgico que , em relao ao), ficar inclume;
persistir o poder do credor de exigir a prestao (embora apenas
extrajudicialmente); e frustrar-se-, desse modo, a principal finalidade da
prescrio.Chegar-se- tambm, por um caminho mais curto, concluso de
que a prescrio atinge diretamente a pretenso, caso se leve em conta
que a prescrio uma exceo de natureza substancial, e que tais
excees so utilizadas, precisamente, contra as pretenses, e no contra
os direitos nem contra as aes.
Compreende-se facilmente o motivo da escolha da pretenso como
termo inicial do prazo de prescrio. que o estado de intranqilidade
social que o instituto procura limitar no tempo, no resulta somente da
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possibilidade de propositura da ao, mas tambm de um fato que sempre
lhe anterior, e que pode at ocorrer sem que haja nascido a ao: a
possibilidade de exerccio da pretenso. Pouco, ou nada, adiantaria
paralisar a ao, com o objetivo de alcanar aquela paz social, se a
pretenso permanecesse com toda sua eficcia.
Deste modo, fixada a noo de que o nascimento da pretenso e o
inicio do prazo prescricional so fatos correlatos, que se correspondem
como causa e efeito, e articulando-se tal noo com aquela classificao
dos direitos formulada por CHIOVENDA, concluir-se-, fcil e
irretorquvelmente, que apenas os direitos da primeira categoria, (isto ,
os direitos a uma prestao), conduzem prescrio, pois somente eles
so suscetveis de leso ou de violao, e somente eles do origem a
pretenses, conforme ficou amplamente demonstrado.
Por outro lado, os da segunda categoria, isto , os direitos
potestativos (que so, por definio, direitos sem pretenso, ou
direitos sem prestao, e que se caracterizam, exatamente, pelo fato de
serem insuscetveis de leso ou violao) no podem jamais, por issomesmo, dar origem a um prazo prescricional.
Por via de conseqncia chegar-se-, ento, a uma segunda
concluso importante: apenas as aes condenatrias podem sofrer os
efeitos da prescrio, pois so elas as nicas aes por meio das quais se
protegem judicialmente os direitos que irradiam pretenses, isto os da
primeira categoria da classificao de CHIOVENDA.
Com efeito, as condenatrias so as nicas aes que servem demeio para se obter judicialmente, com a interveno do Estado, satisfao
das pretenses no atendidas extrajudicialmente pelos sujeitos passivos
das relaes jurdicas substanciais.
Igual satisfao no possvel obter, jamais, por via de aes
constitutivas ou declaratrias, pois essas tm finalidades diversas.
Assim, desde que a prescrio atinge diretamente as pretenses,
somente as aes condenatrias podem sofrer seus efeitos. Se, a ttulo de
verificao do acerto daquelas concluses, as aplicarmos aos vrios prazos
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para propositura de aes enumerados no artigo 206 do Cdigo Civil,
verificaremos o seguinte: 1) todos os prazos do mencionado dispositivo
que so classificados, pela doutrina e pela jurisprudncia, como prazos de
prescrio, em sentido estrito, se referem a aes condenatrias; 2) os
demais prazos (que so classificados pela doutrina e pela jurisprudncia
como prazos de decadncia) no se referem a aes condenatrias.
Alis, se analisarmos o Cdigo Civil alemo, faremos algumas
observaes interessantes, que vm conformar, plenamente, aquelas
concluses a que chegamos com referncia ao artigo 206 do Cdigo Civil
brasileiro: o dispositivo do Cdigo alemo ( 196), que fixa os prazos
especiais de prescrio, enumera exclusivamente pretenses ligadas a
direitos pertencentes primeira categoria da classificao de CHIOVENDA,
isto , direitos a uma prestao, que so os nicos suscetveis de
violao, so os nicos dos quais se irradiam pretenses e so os nicos
protegidos por meio de aes condenatrias.
As consideraes feitas acima conduzem, pois, inevitavelmente,
fixao desta primeira regra, indispensvel distino entre prescrio edecadncia: todas as aes condenatrias (e somente elas) esto sujeitas
prescrio.
Passemos, agora, ao instituto da decadncia.
IX FUNDAMENTOS E EFEITOS DA DECADNCIA
Por que razo h prazos de prescrio e prazos de decadncia? Porque h aes que conduzem prescrio e aes que conduzem
decadncia, quando seria muito mais simples unificar os conceitos e dar
uma s denominao aos principais efeitos da incidncia do tempo sobre
as relaes jurdicas? exatamente porque os dois institutos, embora
tendo fundamentos comuns, divergem quanto ao objeto e quanto aos
efeitos.
Realmente, ao conceituarem a decadncia, doutrina e
jurisprudncia, na sua maioria, embora no forneam critrio seguro para
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distingui-la da prescrio, acentuam um fato de importncia capital: o
efeito imediato da decadncia a extino do direito, ao passo que o da
prescrio a cessao da eficcia da ao (entenda-se: da pretenso).
Isto, porm, no basta para distinguir os dois institutos, e o
problema permanece de p. Examinemos a questo sob outro aspecto.
Quando enumera os princpios concernentes ao exerccio dos
direitos, o professor ORLANDO GOMES inclui dois que interessam de perto
matria em discusso: o da disponibilidade, segundo o qual o exerccio
dos direitos facultativo (ningum obrigado a exerc-los); e o da
inesgotabilidade, de acordo com o qual os direitos no se esgotam pelo
no-uso (Introduo ao Direito Civil, pg. 122).
Pode-se dizer, assim, que a exemplo do que ocorria com as aes
no direito romano antes de surgir o instituto da prescrio, tambm os
direitos, em princpio, tm durao perptua.
Todavia, conforme j vimos anteriormente, h certos direitos cujo
exerccio afeta, em maior ou menor grau, a esfera jurdica de terceiros,
criando para esses um estado de sujeio, sem qualquer contribuio dasua vontade, ou mesmo contra sua vontade. So os direitos potestativos.
natural, pois, que a possibilidade de exerccio desses direitos
origine, em algumas hipteses, para os terceiros que vo sofrer a
sujeio, uma situao de intranqilidade cuja intensidade varia de caso
para caso.
Muitas vezes aqueles reflexos se projetam muito alm da esfera
jurdica dos terceiros que sofrem a sujeio e chegam a atingir interessesda coletividade, ou de parte dela, criando uma situao de intranqilidade
de mbito mais geral.
Assim, a exemplo do que ocorreu com referncia ao exerccio das
pretenses, surgiu a necessidade de se estabelecer tambm um prazo
para o exerccio de alguns (apenas alguns) dos mencionados direitos
potestativos, isto , aqueles direitos potestativos cuja falta de exerccio
concorre de forma mais acentuada para perturbar a paz social.
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Da fixar a lei (alm de outros), prazos para o exerccio dos
seguintes direitos potestativos: direito de preempo ou preferncia;
direito de propor ao rescisria; direito que tm os cnjuges de
promover a anulao do casamento; direito que tm os contratantes de
rescindir ou anular os contratos; dentre outros.
Convm acentuar, a esta altura, que nem todos aqueles prazos
esto ligados propositura de uma ao, pois, como j vimos, h direitos
potestativos que se exercem por outro meio que no o do procedimento
judicial, mas, mesmo assim, podem estar subordinados a um prazo. Por
exemplo: o exerccio do direito de preempo ou preferncia no se faz
por meio de ao, porm est subordinado a um prazo (art. 516 do
Cdigo Civil).
Assim, pode-se dizer, com relao aos direitos potestativos
subordinados a prazo, que o prazo no fixado, propriamente, para a
propositura da ao, mas para o exerccio do direito. E se quase sempre
no se atenta para essa circunstncia porque, na maioria dos casos, tais
direitos, quando subordinados a prazo, se exercitam por meio de ao.Tambm se verifica a situao inversa: h direitos potestativos que
se exercitam (facultativa ou mesmo obrigatoriamente) por meio de ao,
mas, apesar disso, no esto subordinados a prazo. Exemplos: os direitos
potestativos exercitados por meio das aes de diviso e investigatria de
paternidade. Essa observao deve ficar bem acentuada, porque o ponto
de partida para a construo da teoria da imprescritibilidade, que
pretendemos expor mais adiante.Com referncia queles direitos potestativos para cujo exerccio o
legislador no achou necessrio fixar um prazo especial, fica
prevalecendo, ento, o princpio geral da inesgotabilidade ou da
perpetuidade (os direitos no se extinguem pelo no-uso), pois no h
dispositivo estabelecendo um prazo geral para que os direitos potestativos
sejam exercitados sob pena de extino.
Relativamente a tais direitos s h prazos especiais. J o mesmo
no acontece com os direitos da outra categoria (os direitos a uma
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prestao da classificao de CHIOVENDA): as aes por meio das quais
esses direitos so protegidos, ou esto subordinados a prazos especiais no
art. 207 do Cdigo, ou esto subordinadas aos prazos gerais do art. 206,
pois esse ltimo artigo s se aplica s aes condenatrias, que so as
nicas ligadas s pretenses reais e pessoais.
As consideraes feitas acima levam, inevitavelmente, concluso
de que, quando o legislador, visando paz social, entende de fixar prazos
para o exerccio de alguns direitos potestativos (seja exerccio por meio de
simples declarao de vontade, como o direito de preempo ou
preferncia; seja exerccio por meio de ao, como o direito de promover
a anulao do casamento), o decurso do prazo sem o exerccio do direito
implica na extino deste, pois, a no ser assim, no haveria razo para a
fixao do prazo.
Tal conseqncia (a extino do direito) tem uma explicao
perfeitamente lgica: que (ao contrrio do que ocorre com os direitos
suscetveis de leso) nos direitos potestativos subordinados a prazo o que
causa intranqilidade social no , propriamente, a existncia dapretenso (pois deles no se irradiam pretenses) nem a existncia da
ao, mas a existncia do direito, tanto que h direitos desta classe
ligados a prazo, embora no sejam exercitveis por meio de ao. O que
intranqiliza no a possibilidade de ser exercitada a pretenso ou
proposta a ao, mas a possibilidade de ser exercido o direito.
Assim, tolher a eficcia da ao, e deixar o direito sobreviver (como
ocorre na prescrio), de nada adiantaria, pois a situao deintranqilidade continuaria de p. Infere-se, da, que quando o legislador
fixa prazo para o exerccio de um direito potestativo, o que ele tem em
vista, em primeiro lugar, a extino desse direito, e no a extino da
ao. Essa tambm se extingue, mas por via indireta, como conseqncia
da extino do direito.
O mesmo fato no observado com referncia outra categoria de
direitos (os direitos a uma prestao): o legislador no fixa e nem tem
motivos para fixar prazo para o exerccio de nenhum deles. Com relao
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a esses direitos, os prazos que existem, fixados em lei, so to-somente
para o exerccio das pretenses que deles se irradiam. Assim, o decurso
do prazo sem exerccio da pretenso, implica no encobrimento da eficcia
dessa (desde que o interessado oferea a exceo de prescrio) e no na
extino do direito que ela protege, pois repita-se em face dos
denominados direitos a uma prestao, a pretenso e a ao funcionam
como meios de proteo e no como meios de exerccio.
Por conseguinte, tambm se impe, necessariamente, a concluso
de que s na classe dos potestativos possvel cogitar-se de um direito
em virtude do seu no-exerccio. Da se infere que os potestativos so os
nicos direitos que podem estar subordinados a prazos de decadncia,
uma vez que o objetivo e efeito dessa , precisamente, a extino dos
direitos no exercitados dentro dos prazos fixados. A concluso imediata
, igualmente, inevitvel: as nicas aes cuja no propositura implica na
decadncia do direito que lhes corresponde so as aes constitutivas que
tm prazo especial de exerccio fixado em lei; e apenas essas, pois
insista-se a lei no fixa prazos gerais para o exerccio de tais aes, aexemplo do que ocorre com as condenatrias (art. 205).
Finalmente, se, para testar o acerto daquelas concluses,
analisarmos os vrios prazos especiais enumerados no art. 206 do Cdigo
Civil, verificaremos que todos aqueles classificados pela doutrina e pela
jurisprudncia como sendo prazos de decadncia, correspondem,
exatamente, a direitos potestativos e a aes constitutivas.
Deste modo chegamos, por deduo, a esta segunda regra: osnicos direitos para os quais podem ser fixados prazos de decadncia so
os direitos potestativos e, assim, as nicas aes ligadas ao instituto da
decadncia so as aes constitutivas que tm prazo especial de exerccio
fixado em lei.
Com a aplicao das duas regras deduzidas acima, torna-se
extremamente fcil distinguir a prescrio da decadncia: caso se trate de
ao condenatria, o prazo de prescrio da pretenso que lhe
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corresponde; e caso se trate de ao constitutiva, o prazo de decadncia
do direito exercitado por meio dela.
Entretanto, convm atentar para alguns fatos que so corolrios da
exposio feita acima: 1) tanto na decadncia quanto na prescrio a
ao (judicial) no atingida de modo direto, e sim, indiretamente. De
modo direto so atingidos o direito (na decadncia) e a pretenso (na
prescrio); 2) a decadncia opera ipso jure: produz efeito extintivo
imediato a partir da consumao do prazo, e como diz respeito extino
do direito, dela o juiz pode, e deve, conhecer de ofcio,
independentemente da provocao do interessado, pois no se conceberia
que ele fosse basear sua deciso em um direito que deixou de existir.
Enquanto isso, a prescrio s atua ope exceptionis, e por isso pode-se
mesmo dizer que o efeito imediato da consumao do prazo prescricional
um efeito criador: faz nascer, em favor do prescribente, uma exceo
substancial cuja atuao depende exclusivamente da sua vontade se o
prescribente no oferecer a exceo de prescrio, dela o juiz no pode
conhecer ex-officio, ainda tendo cincia da consumao do prazoprescricional. Alis, a prescrio no tem efeito extintivo nem mesmo
quando oferecida a exceo e transitada em julgado a deciso que a
acolheu; o prescribente pode renunciar prescrio, e nesse caso h,
como conseqncia, a restaurao da pretenso primitiva, e no o
nascimento de uma nova pretenso. Tal no ocorreria se houvesse, por
fora do uso da exceo de prescrio, extino da pretenso primitiva. A
seguir trataremos de alguns casos especiais que podem suscitar dvidas.
X CASOS ESPECIAIS DE AES CONSTITUTIVAS
O primeiro caso que pode oferecer alguma dificuldade na aplicao
das duas regras fixadas acima aquele a que se refere o artigo 475 do
Cdigo Civil: o adquirente decai do direito de obter a redibio ou
abatimento no preo no prazo de 30 dias se a coisa for mvel, e de um
ano se for imvel, contado da entrega efetiva; se j estava na posse, o
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primeira vista, parece tratar-se de ao condenatria, pois afigura-se
que, ao propor a ao, o autor pretende do ru uma prestao, isto , a
entrega da parte acrescida ao seu imvel pela avulso. Ocorre, porm,
que a avulso no resulta de ato do proprietrio do imvel beneficiado,
contrrio ao direito do outro proprietrio, e sim de fato da natureza que
tem como efeito jurdico a constituio de um direito de propriedade em
favor do proprietrio do imvel beneficiado, se no houver reclamao do
outro proprietrio dentro do prazo de um ano. Deste modo, a ao em
anlise no tem efeito condenatrio, e sim efeito constitutivo negativo:
visa a evitar que se crie um novo direito de propriedade sobre a poro de
terra objeto da avulso, ou que se crie esse novo direito
independentemente de indenizao. Trata-se, pois, de ao constitutiva, e
conseqentemente o prazo de decadncia. Esse entendimento coincide
com o de PONTES DE MIRANDA (Tratado de Direito Privado, vol. VI, pgs.
358 e 359); CARLOS MAXIMILIANO (Hermenutica e Aplicao do Direito,
pg. 351 da 5 ed.); e CMARA LEAL (Da Prescrio e da Decadncia,
pg. 146 da 1 ed.).
XI AES DECLARATRIAS
Quando expusemos a classificao das aes adotada por
CHIOVENDA, verificamos que, ao lado das aes condenatrias (ligadas ao
instituto da prescrio), e das aes constitutivas (ligadas ao instituto da
decadncia), existe uma terceira categoria, a das aes declaratrias.Qual a posio dessas ltimas em face dos dois institutos? Esto ligadas a
eles, ou a algum deles?
Conceituando as aes declaratrias e, simultneamente, distinguindo-as
das condenatrias e das constitutivas, diz CHIOVENDA:
O autor que requer uma sentena declaratria no pretende
conseguir atualmente um bem da vida que lhe seja
garantido por vontade da lei, seja que o bem consista numaprestao do obrigado, seja que consista na modificao do
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estado jurdico atual; quer, to-somente, saber que seu
direito existe ou quer excluir que exista o direito do
adversrio; pleiteia no processo a certeza jurdica e nada
mais (Instituies, 1/302 e 303).A obteno dessa certeza jurdica , no dizer do mesmo
autor, a mais autnoma e a mais elevada funo do
processo (obra e pg. citadas).
A certeza jurdica surge, assim, como efeito, no apenas imediato, mas
tambm nico, das aes e sentenas declaratrias, e precisamente o
que acentua CHIOVENDA quando afirma que a sentena declaratria
...no ensarta (sic) outro efeito que o de fazer cessar a incerteza dodireito... (obra citada, 1 vol. pg. 286).
Realmente, a noo de obteno da certeza jurdica est sempre ligada
ao conceito de ao declaratria: CHIOVENDA (Instituies, 1 vol., pgs.
286, 321 e 324); Ensayos de Derecho Procesal Civil, 1 vol. pg. 32 da
trad. cast.); e TORQUATO CASTRO (Ao Declaratria, pgs. 27 e 88).
Por conseguinte, pode-se dizer que as sentenas declaratrias no do,
no tiram, no probem, no permitem, no extinguem e nem modificam
nada. Em resumo: no impem prestaes, nem sujeies, nem alteram,
por qualquer forma, o mundo jurdico. Por fora de uma sentena
declaratria, no mundo jurdico nada entra, nada se altera, e dele nada
sai. As sentenas desta natureza, pura e simplesmente, proclamam a
certeza a respeito do que j existe, ou no existe, no mundo jurdico.
exatamente o princpio consagrado no nosso Cdigo de Processo Civil
quando trata de tais aes: o interesse do autor poder limitar-se
declarao da existncia, ou inexistncia de relao jurdica ou
declarao da autenticidade ou falsidade de documento (art. 3).
Fixado o conceito, pergunta-se: as aes declaratrias esto ligadas
prescrio ou decadncia? Parece-nos que nem a uma coisa e nem a
outra, conforme se passa a demonstrar.
J vimos, anteriormente, que todo prazo prescricional est ligado,
necessria e indissoluvelmente, a uma pretenso, de modo que, se no h
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prestao a reclamar, no h como cogitar de prescrio da ao. J
vimos, igualmente, que fato semelhante ocorre com o instituto da
decadncia: todo prazo decadencial est ligado, tambm necessria e
indissoluvelmente, ao exerccio de um direito, de modo que s sofrem os
efeitos (indiretos) da decadncia aquelas aes que so meios de
exerccio de alguns direitos pertencentes a uma categoria especial.
Ora, as aes declaratrias nem so meios de reclamar uma prestao,
nem so, tampouco, meios de exerccio de quaisquer direitos (criao,
modificao ou extino de um estado jurdico). Quando se prope uma
ao declaratria, o que se tem em vista, exclusivamente, a obteno
da certeza jurdica, isto , a proclamao judicial da existncia ou
inexistncia de determinada relao jurdica, ou da falsidade ou
autenticidade de um documento. Da fcil concluir que o conceito de
ao declaratria visceralmente inconcilivel com os institutos da
prescrio e da decadncia: as aes desta espcie no esto, e nem
podem estar, ligadas a prazos prescricionais ou decadenciais. Realmente,
como j vimos, o objetivo da prescrio liberar o sujeito passivo de umaprestao, e o da decadncia, o de liber-lo da possibilidade de sofrer
uma sujeio. Ora, se as aes declaratrias no tm o efeito de realizar
uma prestao, nem tampouco o de criar um estado de sujeio, como
ligar essas aes a qualquer dos dois institutos em anlise? Se o nico
efeito de tais aes a declarao da existncia ou inexistncia de uma
relao jurdica, ou da autenticidade ou falsidade de um documento, qual
a finalidade da fixao de um prazo para o seu exerccio? E quais seriamas conseqncias do decurso do prazo sem propositura da ao? A relao
passaria a existir? E a existente deixaria de existir? O documento falso
passaria a autntico? E o autntico passaria a falso? Mesmo admitindo-se,
para argumentar, a possibilidade de conseqncias to absurdas, a ao
no seria, nestes casos, declaratria, e sim constitutiva.
Para ficar ainda mais acentuada a incompatibilidade entre as aes
declaratrias e os institutos da prescrio e da decadncia, basta atentar
para o seguinte: diz CHIOVENDA que as sentenas declaratrias podem
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ter por objeto qualquer direito, inclusive de natureza potestativa
(Instituies, 1/331; e Ensayos de Derecho Procesal Civil, pg. 127). Da
pode-se concluir que os direitos, objeto das aes declaratrias, so,
tambm, objeto de uma das outras duas categorias de aes
(condenatrias ou constitutivas), e tal concluso d origem a mais um
argumento favorvel ao ponto de vista que sustentamos. Realmente,
desde que as situaes jurdicas que se colocam no campo de atuao das
aes declaratrias j so tuteladas por um dos outros dois tipos de aes
cuja finalidade precpua a realizao do direito (condenatrias ou
constitutivas) e se estas, por sua vez, j se encontram ligadas a uma
prazo (prescricional ou decadencial), seria absurdo admitir outro prazo de
igual natureza para a ao declaratria que tivesse por objetivo a mesma
situao jurdica. Caso se entenda de outra forma, qual dos dois prazos
deve prevalecer? O da ao declaratria ou o outro? Levando em
considerao o ponto assinalado, acentuam CHIOVENDA (Ensayos de
Derecho Procesal Civil, 1/129 da trad. cast.) e FERRARA (A Simulao dos
Negcios Jurdicos, pg. 458 da trad. port.), que quando a aocondenatria est prescrita, no razo para se considerar tambm
prescrita a correspondente ao declaratria, e sim para se considerar que
falta o interesse de ao para a declarao da certeza.
E caso se leve em conta que a prescrio e a decadncia tm uma
finalidade comum, que a paz social, ainda ficar mais evidenciada a
desnecessidade de se fixar prazo para as aes declaratrias, pois, no
produzindo elas (e as respectivas sentenas), como de fato noproduzem, qualquer modificao no mundo jurdico (mas apenas a
proclamao da certeza jurdica), seu exerccio, ou falta de exerccio, no
afetam, direta ou indiretamente, a paz social. Alm do mais, caso se
quisesse fixar um prazo extintivo para as aes declaratrias, de que
natureza seria este prazo? Prescricional ou decadencial? O legislador que
pretendesse fazer uma escolha se depararia com um obstculo
intransponvel: como as aes declaratrias no tm por finalidade a
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restaurao, nem tampouco o exerccio de direitos, elas no podem ser
atreladas nem ao instituto da prescrio nem ao da decadncia.
Diante de tudo isso, a concluso que se impe a seguinte: as aes
declaratrias devem ser classificadas como aes imprescritveis. E esta,
realmente, a classificao dada pela maioria dos doutrinadores. Entre
muitos eles: CHIOVENDA (Instituies, 1/62; Ensayos, 1/32); PONTES DE
MIRANDA (Tratado de Direito Privado, vol. 6, pgs. 129, 130 e 285) e
FERRARA (Da Simulao dos Negcios Jurdicos, pg. 458).
XII AES APARENTEMENTE DECLARATRIAS
Problema intimamente ligado ao das aes declaratrias, e que
merece exame detido, o daquelas aes que poderiam receber a
denominao de aparentemente declaratrias, em virtude de serem
geralmente classificadas como declaratrias, embora sejam, na realidade,
constitutivas. So as denominadas aes de estado. Pelo menos elas
no podem ser consideradas declaratrias dentro da concepo modernadesses tipos de aes, isto , aquelas aes por meio das quais se
procura, exclusivamente, obter uma certeza jurdica. o que
procuraremos demonstrar.
Da conceituao da ao declaratria se infere, naturalmente, que uma
das suas principais caractersticas a facultatividade ou voluntariedade:
ela utilizada quando algum quer, apenas, estabelecer a certeza jurdica
a respeito da existncia ou inexistncia de determinada relao jurdica,mas ningum obrigado a prop-la para que dessa relao decorram
efeitos jurdicos. A relao jurdica existe (ou inexiste), e seus efeitos se
produzem (ou no se produzem), independentemente de sua declarao
judicial. Em resumo: pode-se dizer que no h aes declaratrias
obrigatrias ou necessrias, como as h na classe das constitutivas.
Assim, por exemplo, se no h dvidas a respeito da existncia de
determinada relao jurdica, isto , se coincidem as vontades de todos os
possveis interessados, no sentido de reconhecerem a existncia da
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relao; ou, em outras palavras, se no h incerteza a respeito da
existncia da mesma relao, a ao declaratria se torna desnecessria.
E mesmo havendo incerteza, ou incoincidncia das vontades dos
interessados, no indispensvel a propositura da ao declaratria para
que a relao jurdica exista e produza seus efeitos, pois, como vimos, a
finalidade nica das aes declaratrias a obteno da certeza jurdica, e
no a produo de quaisquer outros efeitos. O interessado na declarao
pode at achar prefervel aguardar-se para tutelar seu direito por um meio
mais enrgico, que no seja apenas o declaratrio. O que certo, porm e
deve ficar bem ressaltado, que, com ou sem ao declaratria, os
efeitos jurdicos da relao se produzem da mesma forma. Tais inferncias
encontram pleno apoio nestes ensinamentos de GOLDSCHMIDT a respeito
do interesse declaratrio e da incerteza jurdica, ligados s aes
declaratrias:
Desaparece o interesse na declarao se o demandado
declara no pretender discutir no futuro o direito do autor,
ou renunciar ao direito do que se jactou.
...............................................................................
Falta esta insegurana quando a demanda deva procurar,
no o esclarecimento de relaes jurdicas controvertidas,
concretas e determinadas, e sim, a declarao de relaes
ainda incontrovertidas (Derecho Procesal Civil, pg. 107 da
trad. cast.).
Ora, nada do que foi assinalado acima (e que caracterstico das aes
declaratrias), ocorre com as denominadas aes de estado. Assim,
caso se pretenda obter o reconhecimento de determinado estado pessoal
e a produo dos efeitos decorrentes, necessrio e indispensvel a
propositura da competente ao de estado, mesmo havendo absoluta e
inabalvel certeza a respeito da existncia desse estado, e mesmo
havendo coincidncia das vontades e acordo expresso de todos os
interessados possveis e imaginveis, prximos ou remotos. Por
conseguinte, nica e exclusivamente por meio de ao possvel o marido
contestar a paternidade dos filhos de sua esposa (art. 1.601); o filho
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impugnar o reconhecimento (art. 1.614); o filho demandar o
reconhecimento da filiao, quando os pais no o tenham feito
voluntariamente; o cnjuge promover a decretao da invalidade do
casamento nulo ou anulvel.
H, ainda, algumas outras circunstncias observadas nas aes de estado,
em geral, e que as incompatibilizam, inteiramente, com o carter
declaratrio que se lhes pretende atribuir. Assim, em primeiro lugar:
somente determinadas pessoas (e no todos os interessados) podem
propor a ao de estado. Ora, noo elementar e fundamental, que as
sentenas declaratrias no produzem qualquer alterao no mundo
jurdico, pois elas no tm como efeito a aquisio, modificao ou
extino de direitos, e sim a proclamao da certeza jurdica. Deste
modo, se as aes de estado fossem aes declaratrias, no havia razo
para se permitir sua utilizao apenas a determinadas pessoas, e no a
todos os interessados. Se sua utilizao limitada, porque as aes de
estado tm outros efeitos que no a simples proclamao da certeza
jurdica. Em segundo lugar: o Cdigo Civil estabelece prazos extintivospara o exerccio de vrias aes de estado. Qual a conseqncia da
extino do prazo para exerccio de uma ao de estado? A
impossibilidade de ser proclamada, da por diante, a certeza jurdica?
Isto no teria sentido, nem finalidade. O legislador no iria estabelecer,
como conseqncia da extino daquele prazo, apenas a impossibilidade
de se proclamar a certeza jurdica, deixando subsistirem os efeitos
inerentes ao estado objeto da ao, efeitos esses que independem daproclamao daquela certeza; a declarao da certeza jurdica, ou a
permanncia da situao de incerteza, no atingem, e nem podem
atingir, os efeitos das relaes jurdicas. Estas existem, e produzem
efeitos, independentemente da proclamao da certeza jurdica, como j
vimos. Em concluso: se h prazo para o exerccio de algumas aes de
estado, porque a lei tem em vista alcanar, com a extino do prazo,
no a impossibilidade de se proclamar a certeza jurdica, mas a
impossibilidade de serem obtidos os efeitos decorrentes do estado objeto
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da ao. Conseqentemente, a finalidade das aes de estado no a
proclamao da certeza jurdica, mas a obteno daqueles efeitos, e
assim elas devem ser classificadas como constitutivas (positivas ou
negativas), e no como declaratrias.
A brevidade do presente estudo no permite uma anlise mais detalhada
de todas as aes de estado, mas no resistimos tentao de assinalar
algumas particularidades observadas com relao a um dos tipos mais
caractersticos da classe a ao investigatria de filiao. Tais
particularidades tambm acentuam a incompatibilidade que existe entre
as aes de estado e as aes declaratrias. Assim (e devendo-se levar
em conta que a sentena proferida na ao investigatria tem os mesmos
efeitos do reconhecimento voluntrio art. 1.616): o filho maior no pode
ser reconhecido sem o seu consentimento (art. 1.614); mesmo que exista
escrito daquele a quem se atribui a paternidade, reconhecendo-a
expressamente, e mesmo que todos os interessados (inclusive os
herdeiros do suposto pai), estejam de acordo com o contedo de tal
escrito (o que, obviamente, dispensa a ao declaratria para se obter a certeza jurdica), ainda assim no se dispensa a propositura da ao
investigatria; algumas legislaes estrangeiras fixam prazo (de
decadncia) para ser proposta a ao investigatria de paternidade
(PLANIOL, Tratado Practico de Derecho Civil, vol. 2, pg. 729 da trad.
cast., e DE RUGGIERO, Instituies, vol. 1, pg. 335), o que equivale a
dizer que, decorrido o prazo, j no mais possvel obter o
reconhecimento judicial do estado, nem os efeitos dele decorrentes; hlegislaes que, embora reconhecendo efeitos jurdicos ao estado de filho
natural, e permitindo o reconhecimento voluntrio, no admitem a ao
investigatria. Era o caso da Frana, antes da Lei de 1912 (COLIN et
CAPITANT, Curso Elemental de Derecho Civil, tomo 1, pgs. 620 e
segs.).
Parece-nos, face ao exposto, que se impe a concluso de que as aes
de estado no so declaratrias, e sim constitutivas (positivas ou
negativas), e realmente elas se apresentam com as duas principais
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estado), podemos dizer que elas, como constitutivas que so, seguem a
sorte dessas ltimas com referncia aos dois institutos objeto do presente
estudo: esto ligadas decadncia. Finalmente, deve ficar acentuado que
o fato de produzirem, quase sempre, efeitos retroativos, no impede que
as aes de estado, e respectivas sentenas, sejam classificadas como
constitutivas pois, de acordo com os ensinamentos de CHIOVENDA,
GOLDSCHMIDT, PONTES DE MIRANDA e PRIETO CASTRO, tais efeitos no
so privativos das aes e sentenas declaratrias. Eles so at muito
freqentes nas aes e sentenas constitutivas.
XIII O PROBLEMA DA IMPRESCRITIBILIDADE DAS AES
So constantes, na jurisprudncia e na doutrina, referncias a aes
imprescritveis, e entre elas, embora variando as opinies, so colocadas
as seguintes: as aes declaratrias, algumas aes de estado (inclusive a
de separao e a investigatria de paternidade), a ao de diviso e a de
demarcao, e as aes de nulidade. Entretanto, observa-se, com relao imprescritibilidade, a mesma situao j registrada ao tratarmos da
distino entre os institutos da decadncia e da prescrio: a
inexistncia de um critrio seguro, com base cientfica, que permita
identificar, a princpio, as aes imprescritveis. A respeito do assunto,
CMARA LEAL acentua:
Todo o estudo relativo imprescritibilidade se ressente de
um certo empirismo. No se encontra nos autores a fixaode uma doutrina, com princpios juridicamente
estabelecidos. Tudo se reduz casustica (Da Prescrio e da
Decadncia, pg. 51 da 1 ed.).
Alis, faz-se necessrio acentuar, antes de mais nada, que a admisso de
aes imprescritveis no direito brasileiro aparentemente se choca com o
disposto nos arts. 205 e 206 do Cdigo Civil. Com efeito, dizendo o
referido art. 205, como diz, que a prescrio ocorre em dez anos, quandoa lei no lhe haja fixado prazo menor, a concluso que se impe,
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primeira vista, a da inexistncia de aes imprescritveis em face do
nosso direito. Entretanto, para demonstrar, de incio, e
independentemente de qualquer outra considerao, que existem aes
imprescritveis no direito brasileiro, basta atentar para as concluses
absurdas a que conduziria a adoo de ponto de vista diferente. Assim,
por exemplo, um contrato firmado por um menor de oito anos, ou por um
louco judicialmente declarado como tal, ou a compra e venda de um
imvel de alto valor feita por instrumento particular, apesar de serem atos
nulos, passariam a produzir todos os seus efeitos, como se vlidos
fossem, e no poderiam mais ter sua nulidade decretada, aps o decurso
do prazo geral de prescrio, e depois de atravessados, com referncia
aos incapazes, os obstculos legais que se opem fluncia dos prazos
prescricionais. Outro exemplo: o casamento que um pai contrasse com
sua prpria filha, apesar de ser ato nulo, passaria a produzir efeitos, como
se vlido fosse, e tambm no poderia mais ter sua nulidade decretada,
depois que se consumasse o prazo prescricional geral. Ora, ningum pode
admitir concluses to estapafrdias, nem mesmo invocando o texto legal.Assim, foroso concluir, desde j, no sentido da existncia de, pelo
menos, algumas aes imprescritveis: aquelas aes de nulidade
mencionadas nos exemplos citados. E caso se admita que h algumas
aes imprescritveis, j fica aberta uma brecha no sistema que,
aparentemente, resulta da letra dos mencionados dispositivos. Por a,
ento, podero ser admitidas outras aes igualmente imprescritveis,
pois outras existem. E quais so elas? Como identific-las a princpio?Qual o critrio a adotar? So as perguntas que nos propomos a responder
a seguir. Antes, porm, torna-se mister examinar um assunto de natureza
terminolgica, que deve ser analisado antes de qualquer outro, para que o
problema que temos em vista fique bem equacionado. o que diz respeito
manifesta impropriedade da expresso aes imprescritveis, pois tal
expresso no corresponde, com exatido, ao sentido em que ela
utilizada comumente. Costuma-se usar tal expresso com o objetivo de
designar aquelas aes que no esto sujeitas, direta ou indiretamente, a
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qualquer prazo (prescricional ou decadencial). Esse objetivo no
corresponde, todavia, compreenso lgica e gramatical da expresso.
Imprescritvel significa que no prescreve ou no sujeito a
prescrio. Deste modo, lgica e gramaticalmente, a expresso abrange,
no s: a) as aes no sujeitas nem a prescrio nem a decadncia,
como tambm b) as aes sujeitas a decadncia (indiretamente, por fora
da extino do direito a elas correspondente), pois estas ltimas tambm
so aes que no prescrevem. A expresso em foco tem, por
conseguinte, uma compreenso mais ampla do que o sentido em que
utilizada, pois abrange uma categoria de aes (aquelas sujeitas a
decadncia) que no se tem em mente abranger quando se faz uso dela.
Talvez a anomalia decorra da confuso que muitos fazem entre os
institutos da prescrio e da decadncia, ou da dificuldade que h em
distingui-los. Mas, como a preciso dos conceitos fundamental nos
domnios do direito, h necessidade de ser substituda a expresso aes
imprescritveis por uma outra que corresponda com exatido idia que
se pretende exprimir e concilie a realidade com a lgica. Para esse fim novemos outra melhor do que a expresso aes perptuas, que
submetemos, neste momento, apreciao dos doutos. Alis, no direito
romano, essa expresso designava, inicialmente, aquelas aes que no
estavam sujeitas a qualquer prazo extintivo, e, depois, quando todas as
aes ficaram subordinadas a prazos, passou a designar aquelas aes
sujeitas ao prazo mais longo (SAVIGNY, Sistema..., tomo IV, pg. 185).
O problema da identificao das denominadas aes imprescritveis temsua soluo grandemente facilitada com a fixao daquelas duas regras,
j deduzidas acima, destinadas a identificar as aes ligadas prescrio
ou decadncia. Sendo a imprescritibilidade um conceito negativo, pode
ser definido por excluso, estabelecendo-se como regra que: so
perptuas (imprescritveis) todas aquelas aes que no esto sujeitas
nem prescrio nem decadncia. Por a se verifica, facilmente, que so
perptuas (imprescritveis): a) todas as aes meramente declaratrias; e
b) algumas aes constitutivas (aquelas que no tm prazo especial de
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exerccio fixado em lei). Quanto s aes condenatrias, no h, entre
elas, aes perptuas (imprescritveis) pois todas so atingidas, ou por
um dos prazos especiais do art. 206 ou pelo prazo geral do art. 205.
Com efeito, j vimos anteriormente que no h qualquer razo para o
legislador subordinar as aes declaratrias a prazos, pois o seu uso, ou
no-uso, no afeta, direta ou indiretamente, a paz social, uma vez que
elas nada criam e nada modificam, apenas declaram a certeza jurdica.
J vimos, tambm, que h at mesmo uma impossibilidade lgica em filiar
as aes declaratrias aos institutos da prescrio ou da decadncia, uma
vez que elas no so meio de se exercerem pretenses, nem meio de
exerccio de direitos potestativos.
Quanto s aes constitutivas, a lei s fixou prazo para propositura de
algumas delas. Ademais, aes constitutivas, no estando, como no
esto, sujeitas a qualquer prazo, devem ser classificadas como
imprescritveis (ou perptuas, segundo a denominao que propusemos).
Com relao aos direitos exercidos por meio destas aes constitutivas,
fica prevalecendo o princpio geral da perpetuidade dos direitos.Convm acentuar que no existe, com referncia s aes declaratrias e
s constitutivas, qualquer dispositivo fixando prazo geral para aquelas no
atingidas por prazos especiais, de vez que os arts. 205 e 206 apenas se
aplicam s aes condenatrias.
J temos, assim, elementos para fixar a terceira e ltima regra: so
perptuas (ou imprescritveis) todas as aes declaratrias, e tambm
aquelas aes constitutivas para as quais a lei no fixa prazo especial deexerccio.
Os resultados da aplicao da regra deduzida acima coincidem com a
opinio generalizada a respeito da imprescritibilidade das aes
declaratrias, da ao de diviso, de vrias aes de estado, inclusive a
investigatria de paternidade; da ao de demarcao, e de quase todas
as aes de nulidade. Com a mesma regra ficam, pois, eliminadas aquelas
discusses irredutveis a respeito da prescritibilidade da ao
investigatria de paternidade: ela imprescritvel porque constitutiva e
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no tem prazo especial fixado em lei para o seu exerccio. O mesmo
raciocnio exposto no presente captulo conduz soluo de um outro
problema igualmente tormentoso, e que exige desenvolvimento maior do
que o permitido pela natureza do presente trabalho: o da
imprescritibilidade das excees. Realmente, sendo as excees, como
so, direitos potestativos, e se no tm prazo de exerccio fixado em lei,
prevalece, com relao a elas, o princpio da perpetuidade dos direitos.
Ou, para usar a terminologia ainda em vigor, as excees so, em
princpio, imprescritveis.
XIV CONCLUSES
Reunindo-se as trs regras deduzidas acima, tem-se um critrio
dotado de bases cientficas, extremamente simples e de fcil aplicao,
que permitem, com absoluta segurana, identificar, a princpio, as aes
sujeitas prescrio ou decadncia, e as aes perptuas
(imprescritveis). Assim: 1) esto sujeitas prescrio (indiretamente,isto , em virtude da prescrio da pretenso a que correspondem) todas
as aes condenatrias, e somente elas;
2) esto sujeitas decadncia (indiretamente, isto , em virtude da
decadncia do direito potestativo a que correspondem) as aes
constitutivas que tm prazo especial de exerccio fixado em lei;
3) so perptuas (imprescritveis): a) as aes constitutivas que no tm
prazo especial de exerccio fixado em lei; e b) todas as aesdeclaratrias.
Vrias inferncias imediatas podem ser extradas daquelas trs
proposies. Assim: a) no h aes condenatrias perptuas
(imprescritveis), nem sujeitas decadncia; b) no h aes
constitutivas sujeitas prescrio; e c) no h aes declaratrias sujeitas
prescrio ou decadncia.
Uma grande vantagem do critrio aqui sugerido que, tendo como um
dos pontos de partida, para sua deduo, a categoria dos direitos
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potestativos, pode, contudo, ser acolhido e utilizado at mesmo por
aqueles que no reconhecem essa categoria, desde que admitam a
existncia de aes constitutivas, pois as duas situaes so
perfeitamente conciliveis, conforme acentua CARNELUTTI (Sistema de
Derecho Procesal Civil, 1/172).
A fica, pois, exposto o critrio que, como contribuio das mais modestas
para a soluo do tormentoso problema, apresentamos ao exame e
critica dos doutos.
AMORIM FILHO, Agnelo. Critrio cientfico para distinguir a prescrio da
decadncia e para identificar as aes imprescritveis. Revista dos
Tribunais, vol. 300. So Paulo: RT, out. 1961.
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