SINOPSE
O trabalho tem por finalidade discorrer acerca do sujeito passivo do mandado
de segurança, tema ainda muito discutido na doutrina e na jurisprudência. Expõe os
elementos constitucionais sobre o mandado de segurança, identificando o ato coator
e a autoridade coatora.
Envolve questões como quem deve figurar no pólo passivo da demanda,
explicando as posições doutrinárias, qual a natureza jurídica das informações, quem
possui legitimidade recursal, entre outras questões relevantes.
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SUMÁRIO
1. INTRODUÇÃO ....................................................................................................... 4
2. A EVOLUÇÃO HISTÓRICA DO MANDADO DE SEGURANÇA ........................... 6
2.1. O MANDADO DE SEGURANÇA NAS CONSTITUIÇÕES ANTERIORES ............................ 62.2. O MANDADO DE SEGURANÇA NA CONSTITUIÇÃO DE 1988 ..................................... 8
2.2.1. A concessão do Mandado de Segurança ............................................... 82.2.2. Do Direito líqüido e certo ........................................................................ 92.2.3. Do Habeas corpus e Habeas data........................................................ 102.2.4. Da Ilegalidade ou Abuso de Poder ....................................................... 122.2.5. Das Pessoas Jurídicas de Direito Público ............................................ 132.2.6. Da Autoridade Pública ou Agente de Pessoa Jurídica no exercício deatribuições do Poder Público ......................................................................... 14
3. A AUTORIDADE COATORA ............................................................................... 17
3.1. O ATO COATOR ............................................................................................... 173.2. DA IDENTIFICAÇÃO DA AUTORIDADE COATORA .................................................... 19
4. O SUJEITO PASSIVO NO MANDADO DE SEGURANÇA.................................. 24
4.1. CONSIDERAÇÕES INTRODUTÓRIAS ..................................................................... 244.2. O SUJEITO PASSIVO ......................................................................................... 264.3. A AUTORIDADE COATORA COMO SUJEITO PASSIVO NO MANDADO DE SEGURANÇA 274.4. DO LITISCONSÓRCIO NECESSÁRIO ..................................................................... 324.5. A AUTORIDADE COATORA EM LITISCONSÓRCIO NECESSÁRIO COM A PESSOA JURÍDICADE DIREITO PÚBLICO COMO RÉUS NO MANDADO DE SEGURANÇA................................. 334.6. A PESSOA JURÍDICA DE DIREITO PÚBLICO COMO SUJEITO PASSIVO...................... 35
5. NATUREZA JURÍDICA DAS INFORMAÇÕES.................................................... 40
7. LEGITIMIDADE RECURSAL ............................................................................... 45
8. CONCLUSÕES .................................................................................................... 49
9. BIBLIOGRAFIA.................................................................................................... 52
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1. INTRODUÇÃO
O mandado de segurança constitui-se em garantia Constitucional, previsto no
artigo 5º, inciso LXIX, da Constituição Federal de 1988.
É o meio posto à disposição de toda pessoa física ou jurídica para a proteção
de direito individual ou coletivo, líqüido e certo, não amparado por habeas corpus ou
habeas data, lesado ou ameaçado de lesão, por ato de autoridade.
É regulamentado pela Lei 1.533/51, que afirma em seu art. 1º que o mandado
de segurança será concedido sempre que, ilegalmente ou com abuso de poder,
alguém sofrer violação ou houver justo receio a sofrer por parte de autoridade. Para
os efeitos dessa Lei, são consideradas autoridades os representantes ou
administradores das entidades autárquicas e das pessoas naturais ou jurídicas com
funções delegadas do Poder Público (art. 1º, § 1º).
A finalidade do estudo é responder à questão, ainda bastante discutida na
doutrina e na jurisprudência, a respeito do papel que possui a autoridade na relação
processual. Se atua como parte passiva direta; ou em litisconsórcio necessário com
a pessoa jurídica de direito público; ou, ainda, se limita apenas a prestar
informações. É necessário esclarecer qual a natureza jurídica dessas informações.
O agente efetivamente contesta a ação, ou, apenas descreve os fatos e
fundamenta o ato praticado? Neste caso, a autoridade tem o dever de informar com
a verdade?
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Outro problema inerente está relacionado à atuação da pessoa jurídica à qual
a autoridade está vinculada. Qual é a sua função? Deve figurar como pólo passivo
direto ou como mero litisconsórcio da autoridade?
O fato de a autoridade ser ou não parte da ação abrange, ainda, o problema
da legitimidade recursal. Quem possui legitimidade para recorrer? A autoridade, a
pessoa jurídica de direito público ou ambas? Do ponto de vista dos efeitos, há
diferença entre ser parte no sentido processual ou material.
Para obter uma adequada compreensão dessas questões, procuramos
primeiramente entender os elementos enunciados no dispositivo constitucional
acerca do mandado de segurança, especificando, ainda, as pessoas jurídicas de
direito público.
Procuramos identificar o ato coator e a autoridade coatora para que
pudéssemos discorrer acerca do tema aqui examinado. Recorremos também ao
conceito de parte, sujeito passivo e legitimidade.
Tentamos ilustrar as três posições doutrinárias a respeito do sujeito passivo
do mandado de segurança, observadas as questões de ilustres mestres que
expuseram suas opiniões sobre o assunto, para que procurássemos responder as
indagações aqui presentes.
Dessa forma, pretendemos ampliar horizontes sobre o estudo da legitimação
passiva do mandado de segurança, que, mesmo após 52 anos de existência da Lei
1.533/51, ainda encontra divergências.
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2. A EVOLUÇÃO HISTÓRICA DO MANDADO DE SEGURANÇA
2.1. O Mandado de Segurança nas Constituições anteriores
Omisso na Constituição Federal de 1891, apenas com a de 1934, no art. 113,
§ 331, é que se instituiu o mandado de segurança em nosso ordenamento jurídico.
Porém, por tal definição, o processo seria o mesmo do habeas corpus.
No Direito brasileiro, o habeas corpus antecedeu ao mandado de segurança.
Apesar de não previsto na Constituição de 1824, a legislação ordinária implantou tal
instituto no nosso sistema ainda durante o Império. Em 1891, passou a ser garantia
constitucional pela Lei Maior desse ano. Mas os demais direitos, que não o de
locomoção, permaneciam não tutelados.
De 1891 a 1926, vê-se um gradativo alargamento da utilização do habeas
corpus. A reforma introduzida em 1926 colocou um ponto final em sua interpretação
ampliativa, deixando claro que a medida só seria concedida para proteção do direito
de locomoção.
Surge, então, a necessidade de um remédio específico, de outras ações
rápidas e seguras para atender as situações urgentes, não atendidas pelo habeas
corpus. Foi então que se instituiu o mandado de segurança na Constituição de 1934.
A Carta ditatorial de 1937 ignorou o instituto, silenciando a respeito,
1Art. 113, § 33, CF/1934: “Dar-se-á mandado de segurança para a defesa de direito, certo eincontestável, ameaçado ou violado por ato manifestadamente inconstitucional ou ilegal de qualquerautoridade. O processo será o mesmo do habeas corpus, devendo sempre ser ouvida a pessoa dedireito público interessada. O mandado não prejudica as ações petitórias competentes”.
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“baixando-o" à categoria de medida ordinária processual. Com a Constituição de
1946, voltou a ter status constitucional, inserido no capítulo relativo aos direitos e
garantais individuais, art. 141, § 24 e definido como meio de proteção de direito
líqüido e certo não amparado por habeas corpus, seja qual for a autoridade
responsável pela ilegalidade ou abuso de poder.2
A Lei Magna de 1967, no art. 150, § 213, reproduziu o conceito corrente do
mandado de segurança, mas lhe acrescentou o termo “individual” ao direito líqüido e
certo.
Com a supressão do vocábulo “individual”, a EC nº 1, de 1969, em seu art.
153, § 214, conservou-se o conceito de mandado de segurança na Constituição de
1967.
O texto de 1988 ampliou o campo de incidência do mandado de segurança.
Ao lado dos balizamentos tradicionais (direito líqüido e certo não amparado por
habeas corpus; ato eivado de ilegalidade ou abuso de poder, por parte de autoridade
pública), a Carta Maior, em seu art. 5º, inciso LXIX, tornou expressa a possibilidade
do remédio quando o ato coator provier de agente da pessoa jurídica, no exercício
delegado de atribuições do Poder Público. E, no inciso LXX do mesmo preceptivo,
abrigou, por fim, a legitimação ativa coletiva, passando a proteger também o direito
coletivo.
2Art. 141, § 24, CF/1946: “Para proteger direito líqüido e certo não amparado por habeas corpus,conceder-se-á mandado de segurança, seja qual for a autoridade responsável pela ilegalidade ouabuso de poder”.3 Art. 150, § 21, CF/1967: “Conceder-se-á mandado de segurança, para proteger direito individuallíqüido e certo não amparado por habeas corpus, seja qual for a autoridade responsável pelailegalidade ou abuso de poder”.4 Art. 153, § 21, CF/1969: “Conceder-se-á mandado de segurança para proteger direito líqüido e certonão amparado por habeas corpus, seja qual for a autoridade responsável pela ilegalidade ou abusode poder”.
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2.2. O Mandado de Segurança na Constituição de 1988
O mandado de segurança está previsto no artigo 5º, inciso LXIX, da
Constituição Federal de 1988, que dispõe: “conceder-se-á mandado de segurança
para proteger direito líqüido e certo, não amparado por habeas corpus e habeas
data, quando o responsável pela ilegalidade ou abuso de poder for autoridade
pública ou agente de pessoa jurídica no exercício de atribuições do Poder Público”.
Primeiramente, é preciso compreender os elementos enunciados no
dispositivo constitucional.
2.2.1. A concessão do Mandado de Segurança
Determina-se que seja concedido ou outorgado o mandado de segurança.
Trata-se de norma dirigida à autoridade judicial, no plano da respectiva competência,
que, em nossa organização, tem poder para tal concessão ou outorga cogente.
A concessão da segurança é impositiva ao julgador quando a ilegalidade ou
abuso de poder descritos na petição inicial forem admitidos como verdadeiros. Para
impetrar o mandado de segurança é suficiente que o impetrante afirme ter sido
vítima de tal ilegalidade. A verificação de sua existência relaciona-se com a
concessão do mandado de segurança.
Estabelece-se que a autoridade judicial competente deve dar, como prestação
jurisdicional, a sentença mandamental de segurança, defendendo e preservando o
direito líqüido e certo afetado pela ilegalidade ou abuso de poder. É uma sentença
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ordenativa, obrigatória e cumprível de imediato, sem nova ação, como ocorre com as
sentenças condenatórias. Diante do princípio da inércia jurisdicional, aparece a
necessidade da demanda, como ato inicial, instrumentalizada na petição inicial.
2.2.2. Do Direito líqüido e certo
O mandado será emitido para proteger direito líqüido e certo, cuja existência e
delimitação são claras e passíveis de demonstração documental.
É preciso que o direito seja existente, inequivocadamente, e definido em seu
conteúdo. Há de vir expresso em norma legal e trazer em si todos os requisitos e
condições de sua aplicação. Se depender de comprovação posterior, não é líqüido
nem certo, para fins de segurança.
As provas tendentes a demonstrarem a liqüidez e a certeza do direito devem
ser documentais. Exige-se a prova pré-constituída das situações e fatos que
embasam o direito invocado pelo impetrante.
O impetrante deverá demonstrar, já com a petição inicial, em que consiste a
ilegalidade ou abusividade que pretende ver expungida do ordenamento jurídico,
não havendo espaço para que se demonstre sua ocorrência no decorrer do
procedimento. A única exceção é a regulada pelo art 6º, parágrafo único da Lei
1.533/51.
Ou seja: a locução “direito líqüido e certo” diz respeito, na verdade, à certeza
dos fatos que são narrados na inicial. Se os fatos são incontroversos, estão
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perfeitamente comprovados, é possível a utilização do mandado de segurança. A
questão relativa à existência ou não do direito que o impetrante afirma na inicial é
própria do mérito do mandado de segurança.
Contudo, Sérgio Ferraz afirma que o direito tido como certo e incontestável é
concepção equivocada e simplista, pois somente as questões muito simples e de
extrema evidência seriam acessíveis ao mandado de segurança. “Repise-se: a maior
ou menor complexidade do tema litigioso não é e jamais foi condição da ação de
segurança”5.
Dessa lição do ilustre jurista uma conclusão emerge: não pode ser condição
da ação o direito certo e inconteste, pois a simplicidade dos fatos e do direito
alegado não exige total evidência, mas o que deve ser condição da ação de
mandado de segurança é direito líqüido e certo, que não requeira aprofundamento
probatório, isto é, que nos autos existam elementos suficientes de modo a
possibilitar o deslinde da lide.
2.2.3. Do Habeas corpus e Habeas data
Como se viu, algum tempo vacilou-se, no direito brasileiro, entre o emprego
do mandado de segurança e o habeas corpus, para o resguardo de determinados
direitos líqüidos e certos, violados por ato de autoridade.
A reforma de 1926 tentou delimitar seu campo, reduzindo-o tão só à proteção
da liberdade corporal. A partir de 1937, a orientação da jurisprudência firma-se no
5Sérgio Ferraz. Mandado de Segurança individual e coletivo: aspectos polêmicos, p. 19.
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sentido de que o habeas corpus é “remédio específico para a liberdade de
locomoção”, reservando o mandado de segurança para “outros direitos ameaçados
ou violados”.
A Constituição de 1946 aproximou ainda mais do que a de 1934 no
parentesco entre habeas corpus e mandado de segurança. A distinção completa e
nítida entre os dois institutos foi estabelecida pelo Supremo Tribunal Federal em
1947.
Inspirada na Declaração Universal dos Direitos do Homem de 1948, a
Constituição de 1988, no art. 5º, LXI e LXVIII6, regula a prisão de pessoas e
determina a concessão de habeas corpus, no caso de violência ou coação ilegal e
abusiva, constrangedoras da liberdade de locomoção. Continua como pressuposto o
impedimento ilegal ou abusivo do direito de locomoção. Trata-se de garantir o livre
gozo do direito à liberdade física de ir, vir, ficar e permanecer.
Residualmente, do mandado de segurança, nasce o habeas data, novidade
da Constituição de 1988, em seu art. 5º, inciso LXXII7. É concedido para assegurar o
conhecimento de informações relativas à pessoa do impetrante, constantes de
banco de dados de entidades de caráter público, ou de registro, ou para retificação
de dados.
Portanto, não sendo caso de habeas corpus ou habeas data, é cabível a
6Art. 5º, LXVIII, CF/1988: “Conceder-se-á habeas corpus sempre que alguém sofrer ou se acharameaçado de sofrer violência ou coação em sua liberdade de locomoção, por ilegalidade ou abuso depoder”.7Art. 5º, LXXII, CF/1988: “Conceder-se-á habeas data: a) para assegurar o conhecimento informaçõesrelativas à pessoa do impetrante, constantes de registros ou banco de dados de entidades
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utilização do mandado de segurança, desde que presentes os demais pressupostos
constitucionais.
2.2.4. Da Ilegalidade ou Abuso de Poder
A administração pública está sujeita aos princípios da legalidade,
impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência. Enquanto o particular tem a
liberdade de praticar atos que a lei não proíbe (art. 5º, II, da CF/88), a autoridade
pública só pode fazer o que a lei autoriza.
Na administração pública direta, indireta ou fundacional de quaisquer dos
poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios (art.37, CF/88),
deve-se obediência à lei, inclusive no exercício de competências discricionárias.
A ilegalidade configura-se pela contrariedade ao direito, de um modo geral. O
abuso de poder consiste na ultrapassagem das atribuições ou da competência ou o
desvio dos princípios ou da finalidade da função exercida. Constitui ato ilícito, quer
decorra de excesso ou desvio de seu objetivo.
Não só os atos comissivos, mas, também, os omissivos, podem ser ilegais ou
abusivos, lesando direitos líqüidos e certos, ou constituindo séria ameaça de lesão.
governamentais ou de caráter público; b) para retificação de dados, quando não se prefira fazê-lo porprocesso sigiloso, judicial ou administrativo”.
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2.2.5. Das Pessoas Jurídicas de Direito Público
Cumpre-nos compreender, sucintamente, acerca das pessoas jurídicas de
Direito Público.
As pessoas jurídicas, também chamadas pessoas coletivas, podem ser
definidas como associações ou instituições formadas para a realização de um fim.
São reconhecidas pela ordem jurídica como sujeitos de direito.
Classificadas quanto às suas funções e capacidade, as pessoas jurídicas são
de direito público, interno ou externo, e de direito privado (art. 40, do Código Civil).
As pessoas jurídicas de direito público interno estão enumeradas no art. 41,
do Código citado, quais sejam: a União, os Estados, o Distrito Federal e os
Territórios, os Municípios, as autarquias e as demais entidades de caráter público
criadas por lei.
A atividade exercida pelo Estado é dupla: jurídica e social. Jurídica é a
atividade que visa o asseguramento da ordem jurídica interna, com a manutenção
da ordem pública e da justiça. A atividade social tem por objeto a promoção do bem
comum.
Para preencher as suas funções e realizar esses fins, o Estado lança mão de
pessoas físicas, agentes e funcionários públicos, aos quais delega os necessários
poderes. Age, assim, por meio de representantes, cujos atos, em última análise, são
atos da própria administração pública.
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2.2.6. Da Autoridade Pública ou Agente de Pessoa Jurídica no
exercício de atribuições do Poder Público
O art. 5º, inciso LXIX, da CF/88, restringiu-se à autoridade pública de que
trata o direito público constitucional e administrativo. Entende-se por autoridade
pública o poder de que se investem certas pessoas, de o exercer sobre outra, em
virtude de sua posição de ocupante de cargo, emprego ou função pública.
José da Silva Pacheco8 entende que “autoridade pública é o Poder Público de
que se investe uma pessoa, em função de sua situação ou estado dentro da
organização estatal, que compreende a União, os Estados, o Distrito Federal e os
Municípios (art. 18, da CF/88), a administração pública direta, indireta ou fundacional
de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos
Municípios (art. 17, da CF/88)”.
Também particulares, quando exercentes de função pública, o que é possível
pelo instrumento da delegação, podem ser alvo de mandado de segurança naquilo
que diz respeito à delegação. Daí a admissibilidade, pela jurisprudência, de
mandados de segurança contra dirigentes de escolas particulares ou de particulares
prestadores de serviços públicos.
Agente é a pessoa física que atua em nome e por conta da pessoa jurídica de
direito público (União, Estado, Distrito Federal, Município, autarquia) ou privado
(empresa pública, sociedade de economia mista, fundação ou entidade privada).
Embora não o diga, expressamente, como fez no § 6º do art. 37 da CF/88,
8José da Silva Pacheco. O Mandado de Segurança e outras Ações Constitucionais Típicas, p. 171
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refere-se a parte final do inciso LXIX do art. 5º da Constituição, aos serviços
públicos.
Como assevera J. Cretella Jr.9, “agente de pessoa jurídica pode ser agente de
pessoa jurídica pública e, nesse caso, autoridade pública, como pode, também, ser
agente de pessoa jurídica privada, e, nesse caso, no exercício da atribuições do
Poder Público.”
Deve-se lembrar que a autoridade pública e o administrador só podem fazer o
que a lei autoriza e dentro do que a lei lhes define como suas atribuições. Não
podem ultrapassar os limites de suas atribuições ou se desviarem das finalidades de
suas funções.
Dada a previsão constitucional do mandado de segurança, não pode haver
dúvida quanto à circunstância de ele ser mecanismo apto a coibir qualquer atividade
ilícita em suas mais diversas formas de manifestação por qualquer um que exerça
função pública. É meio de defesa do cidadão contra um eventual desvio de poder do
Estado ou de quem produza atos ou fatos jurídicos em nome do Estado.
A exemplo de todos os direitos e garantias definidos na Constituição,
prescinde o mandado de segurança de qualquer disciplina infraconstitucional para
seu funcionamento e aplicação concretos, nos exatos termos do § 1º, do art. 5º, da
CF/88.
Em 31 de dezembro de 1951 foi editada a Lei nº 1.531, que, com algumas
alterações, é o diploma que, até nossos dias, rege esse fundamental instrumento da
cidadania brasileira. Mais do que isso: o alocamento do mandado de segurança
9 J. Cretella Jr.. Comentário à Constituição de 1988, vol. II, p. 697.
16
entre os direitos e garantias não é passível de subtração por emenda à Constituição
(art. 60, § 4º, IV, CF/88).
17
3. A AUTORIDADE COATORA
3.1. O Ato Coator
O objeto do mandado de segurança será sempre a correção de ato ou
omissão de autoridade pública ou agente de pessoa jurídica no exercício de
atribuições do Poder Público. Um ato é considerado coator se ilegal ou abusivo de
poder, que ameace ou viole direito líqüido e certo do impetrante.
A identificação da autoridade coatora depende, sempre, da causa de pedir da
ação, e, portanto, da identificação do ato coator que se pretende impugnar.
De imediato, ao se falar em ato coator, tem-se em mente o ato administrativo.
Importante ter presente a individualização do ato que se pretende questionar pelo
mandado de segurança dentro da esfera administrativa, até para que a identificação
da autoridade coatora seja a mais correta possível.
É no evoluir dos conceitos que se pacificou que o ato administrativo coator
pode provir de agente de quaisquer dos Poderes Estatais, bem como de agentes a
quem se delegue a execução de atribuições do Poder Público.
Assim é que, “para atos sujeitos a controle (que são perfeitos, mas dependem
de um ato homologatório ou aprobatório posterior para adquirir eficácia), atos
complexos (dependentes do concurso de vontade de duas autoridades, somente se
aperfeiçoando com a junção de duas vontades) e atos colegiados (praticado por
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uma pluralidade de pessoas, e que só existem quando completada a deliberação
respectiva, inexistindo até esse instante final), deve ser observado o instante em que
se impugna o ato judicialmente”.10
Apela Celso Agrícola Barbi11 para a distinção entre os atos que a
Administração pratica como Poder Público, com prerrogativas e meios especiais,
como, por exemplo, lança impostos, desapropria bens, etc., e os atos que a
Administração pratica como pessoa privada, o que se dá quando contrata a
aquisição de bens, a locação de imóveis, etc..
E acrescenta ser pacífico na doutrina brasileira: “Que o mandado de
segurança só será remédio adequado se o ato lesivo ou ameaçador tiver sido
praticado pelo Estado como Poder Público, excluídos, assim, os atos em que ele
tenha agido como pessoa privada, pois, nesses casos estará sujeito apenas aos
remédios comuns das leis processuais”.
É necessário salientar que só não se admite mandado de segurança contra
atos meramente normativos, leis em tese, (Súmula 266, do STF) e contra a coisa
julgada. As Leis e os decretos gerais, enquanto normas abstratas, não são
suscetíveis de lesar direitos, salvo quando proibitivos. Somente a lei e decretos de
efeitos concretos tornam-se passíveis de mandado de segurança. A coisa julgada só
é invalidável por ação rescisória (art. 485, do Código de Processo Civil e Súmula
268, do STF).
10Cassio Scarpinella Bueno. Mandado de Segurança – Comentários às Leis nº 1.533/51, 4.348/64 e5.021/66 e outros estudos sobre Mandado de Segurança, p. 23.11Celso Agrícola Barbi. Do Mandado de Segurança, p. 92.
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3.2. Da identificação da Autoridade Coatora
Deflui do texto constitucional a possibilidade de ser impetrado mandado de
segurança contra quem quer que seja autoridade.
De seu turno, o art 1º, da Lei 1.533/51, lei específica que dispõe sobre tal
instituto, afirma, in verbis:
Art. 1º. Conceder-se-á mandado de segurança para proteger direito líqüido e
certo não amparado por habeas corpus, sempre que, ilegalmente ou com abuso de
poder, alguém sofrer violação ou justo receio de sofrê-la por parte de autoridade,
seja de que categoria for ou sejam quais forem as funções que exerça.
§ 1º. Consideram–se autoridades para efeitos desta Lei, os representantes ou
administradores das entidades autárquicas e das pessoas naturais ou jurídicas com
funções delegadas do Poder Público, somente no que entender com essas funções.
O art. 1º, § 2º, III, da Lei nº 9.784/99, que “regula o processo administrativo no
âmbito da Administração Pública Federal”, define autoridade como “o servidor ou
agente público dotado de poder de decisão”. Embora as regras dessa lei tenham
aplicabilidade restrita à Administração Federal, o conceito é válido para todas a
demais esferas federadas.
Autoridade impetrada, pois, deve ser a pessoa física que, em nome da
pessoa jurídica à qual está vinculada, tenha poder de decisão, isto é, de
desfazimento do ato guerreado no mandado de segurança.
É aquela que detém poder e competência para decidir. É a única que, além
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de poder praticar atos executórios, pratica atos decisórios. É aquela autoridade da
qual emana o ato ilegal ou abusivo de poder e a legitima para dispor de condições
para restaurar o status quo ante. De outro tanto, o agente público é o executor do
ato, que pode ou não se confundir na pessoa da autoridade coatora.
Enquanto a autoridade coatora tem poder de decisão, e, portanto, de alterar a
irregularidade combatida, o agente público encontra-se despido de competência
para a prática de atos decisórios.12
No pensamento de Lucia Valle Figueiredo, a autoridade coatora “é o agente
administrativo que pratica ato passível de constrição”. Em outras palavras, “é aquela
que efetivamente pratica o ato, ou que tem poder legal de praticá-lo nos casos de
omissão, é aquela designada pelo ordenamento jurídico, aquela a quem a regra de
competência obriga à prática do ato.”13
Desse modo, pode-se compreender a autoridade coatora como aquela que,
além de mera executora material do ato abusivo ou ilegal, é aquela que decide,
sendo capaz de corrigir a ofensa ao direito líqüido e certo do impetrante. Assim,
afasta-se a possibilidade de ser apontado como coator aquele que recomenda a
abstenção ou atuação, ou aquele que estabelece normas abstratas para a execução
do ato (ou para a omissão descabida).
Para Hely Lopes Meirelles, autoridade não é quem elabora normas gerais,
nem quem cumpre materialmente o ato, mas quem tem competência para desfazer
12Compreensão também consagrada na jurisprudência: “Autoridade coatora é aquela que ordena ouomite a prática do ato impugnado, e não o superior que recomenda ou baixa normas para suaexecução.” (STJ – 1ª T. Resp – 62.147-7 – Rel. Min. Demócrito Reinaldo – j. 07.06.1995 – DJU14.08.1995, p. 23.989)13Lucia Valle Figueiredo. Mandado de Segurança, p. 18-19.
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seus efeitos.14
Um problema concernente à autoridade coatora, que normalmente ocorre,
sobretudo nas questões tributárias, é a inexistência aparente de quem esteja a
constranger. Muitas vezes não é fácil descobrir a autoridade coatora, principalmente
para o administrado.
A exata determinação de quem seja a autoridade coatora nos casos
concretos é da maior importância, porque disso depende a fixação do órgão
competente para o julgamento, uma vez que, segundo o nosso direito positivo, a
competência para conhecer dos mandados de segurança não deriva da natureza da
questão ajuizada, e sim da hierarquia da autoridade que praticou o ato impugnado
por aquela via processual.
Todavia, mesmo nessa apertada síntese, o problema da caracterização do
coator não se apresenta pacífico. Para o resolver, Sérgio Ferraz15 propõe o
estabelecimento de uma dicotomia: atos praticados por deliberação do próprio
agente; atos praticados em execução de ordem superior.
Na primeira fase, não se põe dúvida: coator é aquele que desempenhou a
atividade impugnável. Para o autor, “a materialização do ato é que define a
autoridade que se pode apontar como coatora”16
Na segunda fase, a controvérsia pode desenvolver-se com amplitude. Pontes
de Miranda17, por exemplo, diz que coator é o executor da ordem. Mas adiciona que
14Hely Lopes Meirelles. Mandado de Segurança, Ação Popular, Ação Civil Pública, Mandado deInjunção, “Habeas data”, p. 25.15Sérgio Ferraz. Mandado de Segurança individual e coletivo: aspectos polêmicos, p. 48.16 Op. cit., p. 48.17Pontes de Miranda. Comentários ao Código de Processo Civil, p. 158-159.
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o agente não é o coator se praticou ato em “obediência a ordem direta” da
autoridade superior, que seria, então, o alvo do writ.
Porém, tal solução parece-nos incompleta. Não só em razão da regra contida
no art. 3º da Lei de Introdução ao Código Civil, mas, também, por força do vetor da
Administração Pública, o princípio da legalidade. Ao mero executor também se
impõe o princípio em tela18. Portanto, no caso de pluralidade de autoridades
constritoras, o mandado deverá ser endereçado contra todas elas.
Pela mesma razão, idêntica solução se impõe, quando em face do ato coator
submetido a controle de autoridade superior. Assim prevalece no STJ: “Se o ato
administrativo de outorga das permissões tinha sua validade condicionada à
aprovação da autoridade que lhe emprestou eficácia no mundo jurídico, quem
praticou esse ato é parte legítima para responder ao mandado de segurança” (RMS
612, Rel. Min. Hélio Mosimann, DJU 17.12.92, p. 24.232).
Ainda pela mesma razão, a solução exposta também prevalecerá no caso de
atos complexos. Observe-se que há uma soma de vontades, e comuns são os
interesses, sendo um ato uno, embora resultante da fusão de mais de uma vontade,
devendo, consoante entendimento de Hely Lopes Meirelles, ser feita apenas a
notificação da autoridade que nele inervem para seu aperfeiçoamento, inexistindo a
notificação de todos que participaram do ato.
Referentemente a atos coatores praticados mediante delegação, já há algum
tempo não há controvérsia, reinando a tese da Súmula 510, do STF, segundo a qual
coator é o agente delegado.
18Claro que, se o superior comparece à lide e defende a legalidade do ato, assume integralmente opapel de coator. Assim decidiu o STJ, no MS 774-0, Rel. Min. Milton Pereira, DJU 1.3.93, p. 2.474.
23
Todavia, a grande controvérsia encontrada até hoje na Doutrina é a questão
do papel da autoridade coatora no mandado de segurança. Se atua como parte
passiva, se há litisconsórcio necessário com a pessoa jurídica de direito público, ou,
ainda, se é chamada apenas para prestar informações.
Sem desrespeitarmos as opiniões de ilustres autores que sustentam ser a
autoridade coatora parte efetiva no processo, seja como sujeito passivo direto ou
como litisconsórcio, pretendemos demonstrar neste trabalho que a autoridade atua
apenas como representante da pessoa jurídica de direito público, sendo esta a única
ré do mandado de segurança.
24
4. O SUJEITO PASSIVO NO MANDADO DE SEGURANÇA
Ingressaremos no palpitante problema da legitimação passiva, em mandado
de segurança.
4.1. Considerações introdutórias
O direito de ação é atribuído ao titular de um interesse em conflito com o
interesse de outrem. Por meio da ação, aquele pretende a subordinação do
interesse deste ao próprio, ao que este resiste. Assim, na ação há dois sujeitos, um
sujeito ativo, o autor, e outro sujeito passivo, o réu, aos quais são abrangidos pela
denominação jurídica de partes.
Fixemo-nos na clássica lição de Chiovenda19, à qual “’parte é aquele que
demanda em seu nome (ou em cujo nome é demandada) a atuação de uma vontade
da lei, e aquele em face de quem essa atuação é demandada’”.
As partes iniciais no mandado de segurança são o impetrante e o impetrado.
Sem essa integração ativa e passiva, não se completa a relação processual
formadora da lide.
Não se chega a um conceito de parte sem, antes, extremar a idéia de parte
da relação material daquela que ocupa a parte na relação processual.
19in Instituições, vol. II, p. 320, apud Celso Agrícola Barbi. Do Mandado de Segurança. Rio de Janeiro:Forense, 2001, p. 117.
25
Alguém que seja titular de uma situação subjetiva de vantagem, devidamente
tutelada pela ordem jurídica, será parte em uma relação jurídica material, de forma
que essa sua posição a coloque em condições de pretender uma prestação a ser
realizada em seu favor, prestação que cabe a outra pessoa, precisamente a parte
contrária, na mesma relação de direito material.
Ocorre que a situação de vantagem que a lei eventualmente estabeleça em
favor de alguém, pode não ser satisfeita espontaneamente pelo seu devedor, de
molde a tornar necessário o manejo de instrumento judicial capaz de obrigar o titular
do dever a prestar aquilo que o obriga a lei. Nesse acionar o Judiciário é que se
forma uma outra relação jurídica, já agora triangular: alguém pede ao Estado que
torne efetiva a situação de vantagem em seu favor estabelecida, com isso obrigando
a uma prestação o devedor da relação material (Estado – autor – réu), formando-se,
assim, a relação jurídica processual.
É conveniente deixar assente que o estabelecimento da relação processual
faz-se pelo simples afirmar a uma lesão a situação de vantagem. Isto fica dito para
que não se conclua, equivocadamente, que o autor da relação processual coincide
sempre com o autor da relação material.
A percepção do conceito de legitimidade é um pouco mais complexa do que a
de parte, porque a primeira dessas noções compreende a segunda,
complementando-a. Viu-se que as relações materiais têm uma estrutura de tipo
credor-devedor e que a relação processual é estabelecida, perante o juiz, sempre à
base da afirmação da existência de uma relação material, cujo objeto (a prestação)
não tenha sido, por hipótese, espontaneamente satisfeito pelo respectivo sujeito
passivo (o devedor). Ora, a coincidência, via de regra, entre o pólo da relação
26
material (ativo ou passivo) afirmada como existente pelo autor e o pólo da relação
processual formalmente estabelecida, determina a afirmação da legitimidade. A
legitimidade, assim, é um ente relacional, basicamente uma espécie de identidade,
para usar-se da linguagem de Francesco Carnelutti, em sua obra Teoria geral do
direito.20
4.2. O Sujeito Passivo
Além das dificuldades teóricas e práticas para identificar a autoridade coatora,
o profissional do Direito depara-se com mais uma questão: quem é o sujeito
passivo? A autoridade coatora? A pessoa jurídica de direito público? Os dois?
Celso Agrícola Barbi, tratando do sujeito passivo no mandado de segurança,
relembra que a Lei 191/36, obediente ao texto constitucional de 1934, mandava citar
tanto a autoridade coatora como a pessoa jurídica de direito público, esta através de
seu representante legal. O Código de Processo Civil de 1939, preservando em linhas
gerais a sumariedade do procedimento, previu no art. 322, I e II, que a autoridade
coatora seria apenas notificada para prestar informações, enquanto citada seria a
pessoa jurídica de direito público. A Lei 1.533/51 previu no seu art. 7º apenas a
notificação da autoridade coatora para prestar informações, silenciando sobre a
citação da pessoa jurídica. Daí surgiram divergências.
20 Lejus, 1999, p. 47: “As relações, numa situação, correspondem ao recíproco modo de ser de doisentes, ou, de um modo geral, de dois objetos, mais exatamente, a reação que em nós determina nãojá a sua existência, mas a sua coexistência”. Uma das formas de relação, talvez a mais importante, éexatamente a igualdade, na doutrina de Carnelutti uma relação estática, porque estabelecida entreentes da mesma situação, apud Leonardo Castanho Mendes. “A legitimidade passiva da autoridadecoatora no mandado de segurança”. In: Aspectos Polêmicos e Atuais do Mandado de Segurança – 51anos depois. São Paulo: RT, 2002, p. 460-487.
27
De regra, há três posições acerca da legitimidade jurídica do mandado de
segurança: a parte passiva é a autoridade coatora; as partes passivas em
litisconsórcio necessário são a autoridade coatora e a pessoa jurídica; a parte
passiva é a pessoa jurídica de direito público.
O que significa, pois, para nós, sujeito passivo? Inquestionavelmente, se por
tal entendermos aquele contra quem é dirigida a notificação para prestar
esclarecimentos e responder aos termos do mandado, os conceitos de autoridade
coatora e sujeito passivo confundem-se, ou melhor, o sujeito passivo acaba por ser a
própria autoridade coatora.
Contudo, ser sujeito passivo é mais do que ser um mero destinatário da
notificação ou citação. É, na verdade, o ente que vai suportar os efeitos da
pretensão deduzida em juízo pelo autor, daí porque não nos afigurar correta a
posição daqueles que sustentam ser a autoridade coatora o sujeito passivo.
4.3. A Autoridade Coatora como Sujeito Passivo no Mandado de
Segurança
Porém, para muitos autores, a autoridade coatora é tida com ré no mandado
de segurança. É a opinião, por exemplo, de Hely Lopes Meirelles21: “o impetrado é a
autoridade coatora, e não a pessoa jurídica ou o órgão a que pertence e ao qual seu
ato é imputado em razão do ofício”.
Manifestava essa opinião apesar de reconhecer que, “(...) quanto aos efeitos
28
patrimoniais da decisão final, serão suportados pela Fazenda Pública atingida pelo
ato coator, esteja ou não representada mo processo”.22
E entre os mais modernos defensores dessa tese, não podemos deixar de
mencionar a posição esposada por Cândido Rangel Dinamarco, que situava a
questão dentro do tema da substituição processual: “De regra e mais comumente,
quando se impetra o mandado de segurança, o titular da eventual relação jurídica
com o impetrante é uma pessoa jurídica. Normalmente, é o Estado de São Paulo ou
a Municipalidade de São Paulo, ou a União, ou alguma autarquia, o titular da relação
jurídica controvertida posta no processo pelo impetrante. No entanto, a lei confere
legitimidade passiva ao próprio autor do ato impugnado. É o caso típico, conforme
muito bem ressaltado pelo Min. Moacyr Amaral Santos, em artigo publicado sobre “A
natureza jurídica do mandado de segurança”, nos Arquivos do Ministério da Justiça,
v. 114, é caso típico, repito, de substituição processual ou de legitimação
extraordinária. Alguém, sem ser o titular de uma relação jurídica controvertida, tem,
no entanto, a titularidade de uma posição no processo. A autoridade coatora é,
portanto, o substituto processual da pessoa jurídica de direito público, nela
encarnada naquele momento”.
Cremos, todavia, com base em lições posteriores do mesmo autor, que essa
tese não é mais acolhida por ele.
Cumpre ressaltar, ainda, que a idéia de autoridade coatora como substituto
processual, como observou Cândido Rangel Dinamarco, já havia sido defendida por
21Op. cit., p.4422Op. cit., p.45
29
Moacyr Amaral Santos:23 “(...) no papel que a autoridade coatora desempenha na
ralação processual, em que é sujeito sem dúvida, mas não funciona em defesa de
direito próprio, defende direito alheio, ou seja, da pessoa de direito público da qual é
órgão ou à qual se acha subordinada. Por outras palavras, a autoridade coatora
como sujeito passivo na relação processual, funciona como substituto processual da
pessoa jurídica de direito público, por isso que a lei a tanto lhe confere atribuição”.24
Podemos ainda citar Othon Sidou como defensor dessa opinião e que, após
analisar as opiniões num e noutro sentido, chega à conclusão de que ”(...) parte da
ação de mandado de segurança é a autoridade coatora (...)”.25
Embora neste trabalho se busque evidenciar que a parte passiva no mandado
23Moacyr Amaral Santos. “Natureza Jurídica do mandado de segurança”, Arquivos do Ministério daJustiça, 114-40, jun, 1970.24O Min. Antônio Pádua Ribeiro (“Mandado de segurança; alguns aspectos atuais”, In Mandados deSegurança e Injunção, p. 154, apud Carlos Augusto de Assis. Sujeito Passivo no Mandado deSegurança. São Paulo: Malheiros, 1997, p. 23) também adota este posicionamento, como se percebedo seguinte excerto:
“O impetrado é a autoridade coatora, que figura no processo como ”substituto processual” dapessoa jurídica de direito público, e, portanto, como parte em sentido formal. Parte em sentidomaterial é a pessoa jurídica da qual a autoridade coatora é órgão. Tal colocação da autoridadecoatora como substituto processual não é referida, em geral, pelos doutrinadores. Quem a propôs, deforma magistral, foi o insigne Amaral Santos”.
Tal posicionamento da autoridade coatora é convincente, pois, na verdade, não funciona emdefesa de direito próprio, mas alheio. Ademais, permite resolver importantes questões processuais.Primeiramente é de ver-se que a sentença contra o substituto processual atinge o substituído. Deoutra parte, nada impede que a pessoa jurídica ingresse no processo como litisconsórcio daautoridade coatora. Aliás, há caso em que a autoridade coatora pode confundir-se com o própriorepresentante do ente público; é o caso dos prefeitos. Isso não se dá quanto aos chefes dosExecutivos, federal e estaduais, pois estes representam em juízo as entidades que governam; quemas representa são os seus procuradores (CPC, art. 12, I)”.25Othon Sidou. “Habeas data”, Mandado de Injunção, “Habeas corpus”, Mandado de Segurança eAção Popular; as Garantias Ativas dos Direitos Coletivos segundo a Nova Constituição, p. 209:
“Se partirmos de que a competência jurisdicional é mero pressuposto processual e não seconfunde com a legitimidade da parte, condição da ação, concluiremos que a parte da ação demandado de segurança é a autoridade coatora, pessoa natural, do mesmo modo como parte passivano habeas corpus e na ação popular é o agente da coação e o autor do atentado ao patrimôniopúblico. O mandado é concedido contra o executante do ato ilegal, para que ele próprio cumpra oobjeto da segurança e o corrija desfazendo-o ou executando-o, o que reforça a convicção de queparte passiva não é o órgão da Administração.
Argumentar que os ônus do processo de mandado de segurança são suportados não pelaautoridade coatora e sim pela pessoa jurídica de direito público não afiança, por si, que é a pessoajurídica a parte passiva na demanda, porque se é verdade que essa é a levada a absorver asconseqüências da sentença, não menos verdade é que a Administração reserva-se agir
30
de segurança é a pessoa de direito público, é oportuno fazer algumas observações
sobre as palavras de Sérgio Ferraz, para quem a autoridade coatora não pode ser
parte, pois também não é ré, vez que não é dela o direito em causa.26
Também não há que se falar em substituição processual, como sustentam
Cândido Rangel Dinamarco, Moacyr Amaral Santos e Antônio Pádua Ribeiro, pois,
neste instituto, falta-lhe, portanto, capacidade processual.
Para melhor compreendermos, “dá-se a figura da substituição processual
quando alguém está legitimado para litigar em juízo, em nome próprio, como autor
ou réu, na defesa de direito alheio. Quem litiga, como autor ou réu, é o substituto
processual; fá-lo em nome próprio, na defesa de direito de outrem, que é o
substituído”27.
Distintamente, melhor entendimento é de que não há substituição processual
porque na substituição a nova parte passa a litigar em nome da outra, o que não
ocorre no mandado de segurança. Note-se que substituto processual não se
confunde com representante, precisamente pelo fato de que este último atua em
nome alheio.
Tampouco é conveniente sustentar o instituto da assistência processual.
Como afirma Moacyr Amaral Santos, “consiste a assistência simples na intervenção
de terceiro no processo entre as partes visando sustentar as razões de uma delas
contra a outra”.28 Através da assistência, o terceiro ingressa no processo com a
finalidade de auxiliar uma das partes em cuja vitória tenha interesse, uma vez que a
regressivamente contra o seu agente, responsável pelos danos causados a terceiros, como previne oart. 37, § 6º, da Constituição”.26Sérgio Ferraz. Op. cit, p. 52.27Moacyr Amaral Santos. Primeiras Linhas de Direito Processual Civil, p. 345.
31
sentença contrária à parte coadjuvada prejudicaria um direito seu, ligado de alguma
forma ao direito assistido.
Portanto, não há que falar em assistência entre a autoridade coatora e a
pessoa jurídica de direito público, pois ambas possuem o mesmo interesse, não
objetivam auxiliar ninguém, sendo apenas dela o real interesse, vez que foi ela quem
praticou o ato considerado abusivo ou ilegal.
Assim, não nos parece sustentável a posição autores que admitem ser a
autoridade coatora o sujeito passivo do mandado de segurança. A autoridade
coatora titulariza um órgão público e, enquanto tal, atua a vontade da pessoa a que
pertence. As conseqüências do ato que pratica são diretamente imputadas à referida
pessoa que arca com o seu ônus em face do impetrante.
A particularidade que existe quanto à forma de citação da pessoa jurídica de
direito publico, citada através do agente que praticou o ato, e não na pessoa do seu
representante legal, apenas demonstra a preocupação do legislador com a rapidez
processual e com a imediatidade entre o magistrado e a suposta autoridade coatora.
O que é certo é que embora notificada na pessoa da autoridade coatora, a pessoa
jurídica a que pertence é a que efetivamente suportará as conseqüências da
concessão da medida, sendo, portanto, apenas representada pela autoridade.
Em suma, a participação da autoridade coatora no processo restringe-se a
prestar informações e completar a citação, comunicando ao réu a existência da
demanda contra ele proposta. Após, sai do processo.
28Moacyr Amaral Santos. Op. cit. Vol. II, p. 51.
32
4.4. Do Litisconsórcio Necessário
Normalmente, há nos processos um autor litigando contra um réu, disputando
sobre uma lide. No fenômeno do litisconsórcio, há a cumulação de vários sujeitos, no
mesmo processo, como autores ou réus. Pode haver mais de um autor
(litisconsórcio ativo), um autor contra vários réus (litisconsórcio passivo), ou, ainda,
haver vários autores contra réus (litisconsórcio misto).
A possibilidade de formação de litisconsórcio não é livre. É preciso que os
sujeitos da relação de direito material guardem entre si um vínculo que os prenda.
Em outras palavras, se estabelece o litisconsórcio nos casos em que a lei autoriza.
O art. 46, do Código de Processo Civil prevê os pressupostos para a formação de
litisconsórcio.
Quanto à obrigatoriedade ou não de sua formação, classifica-se em
facultativo e necessário. No facultativo, pode-se trazer um só réu a juízo, sem formar
o litisconsórcio, ou mais de um, formando-se o litisconsórcio. Dependerá da vontade
das partes, mas deve ser admitido nos casos especificados no art. 46, do Código
citado.
Haverá litisconsórcio necessário ou por disposição de lei ou pela natureza da
relação jurídica, de acordo com o art. 47, do Código de Processo Civil. A ação
somente poderá ser intentada pró ou contra duas ou mais pessoas. Todos os
litisconsórcios hão de ser citados, conforme o disposto na segunda parte do artigo
referido, uma vez que a lide deverá ser decidida de modo uniforme para todas as
partes. Dessa forma, considerando o juiz que o litisconsórcio é necessário e que não
se constituiu, deverá determiná-lo ex officio (art. 47, parágrafo único, do Código de
33
Processo Civil).
No mandado de segurança, alguns autores sustentam a necessidade de
litisconsórcio passivo entre a autoridade coatora e a pessoa jurídica de direito
publico. Todavia, como antes já expusemos, inadmissível falar-se em litisconsórcio
quando um de seus possíveis sujeitos (a autoridade coatora) não é parte, é apenas
representante da pessoa jurídica de direito público.
4.5. A Autoridade Coatora em litisconsórcio necessário com a
Pessoa Jurídica de Direito Público como réus no Mandado de
Segurança
Na segunda corrente, que vislumbra serem a autoridade coatora e a pessoa
jurídica de direito público partes passivas em litisconsórcio, estão nomes como
Sebastião de Souza, Othon Sidou, Jorge Americano e Aguiar Duas.
Sebastião de Souza29 ressalta: “O sujeito passivo da ação é a autoridade
coatora, mas essa autoridade é agente de uma pessoa jurídica de direito público ou
de uma autarquia, naturalmente interessada na relação jurídica em lide. Daí, essa
pessoa jurídica deve ser considerada com litisconsórcio necessário”.
Esta também parece ser a opinião que Luís Eulálio de Bueno Vidigal,30 que
expressava em seus escritos: “’A autoridade coatora, que seria, no caso,
29Dos Processos Especiais, p. 48-49, apud Sérgio Ferraz, Mandado de Segurança individual ecoletivo, p.43.30Luís Eulálio de Bueno Vidigal. Do Mandado de Segurança, p. 102-103. Observe-se, contudo, que oautor só defende essa opinião nos casos em que o “(...) Estado for sujeito passivo da lide (...)” (p.
34
litisconsórcio necessária do Estado, melhor se denominaria como substituto
processual do Estado, porque desenvolve, em seu próprio interesse, a atividade
necessária para defesa de interesse alheio. Se, nesses casos, não for citado o
Estado, será ineficaz a decisão que conceder o mandado’”.
Othon Sidou sustentava que a autoridade constituía apenas um braço da
pessoa jurídica de direito público, devendo, portanto, ambas responderem em
litisconsórcio necessário quando houvesse a impetração do mandado de segurança:
“(...) pouco interesse haveria em conhecer a personalidade do agente, em face das
autarquias do servidor público, eis que elas formam uma prolongação do Estado, e
seus atos, induvidosamente, são de caráter público, inclusive mercê de regra
constitucional”.31
Lucia Valle Figueiredo também se revelou, anteriormente, adepta dessa
corrente de pensamento: “O sujeito passivo do mandado de segurança é a pessoa
jurídica; deverá estar em litisconsórcio necessário com a autoridade coatora”.32 A
autora mudou sua opinião, passando a se enquadrar entre aqueles que identificam a
pessoa jurídica de direito público como a única ré no mandado de segurança.33
Sustenta Sérgio Ferraz que não pode ser a autoridade coatora parte passiva
no mandado de segurança por não estar ela em juízo litigando direito seu; não
podendo haver substituição processual, não há também que se falar em atuar como
litisconsórcio da pessoa jurídica de direito público.
102). Nas demais hipóteses, segundo ele, réu seria apenas a autoridade coatora, apud CarlosAugusto de Assis. Sujeito Passivo no Mandado de Segurança. São Paulo: Malheiros, 1997, p. 30.31J. M. Othon Sidou. Do mandado de segurança, p. 265.32Lucia Valle Figueiredo. A Autoridade Coatora e o Sujeito Passivo do Mandado de Segurança, p. 75.33Essa impressão veio a ser confirmada por obra posterior, intitulada Mandado de Segurança, no qualvem afirmado à p. 50: “De há muito modificamos posição anterior, para adotar a daqueles queenfatizam ser parte a pessoa de direito público e não, apenas, litisconsórcio necessário. A autoridadecoatora teria apenas o dever de informar”.
35
Essa posição que podemos chamar de “intermediária”, apresenta uma grande
dificuldade em explicar por que a autoridade coatora apareceria no processo. Sim,
porque, se a autoridade coatora é considerada mera representante da pessoa
jurídica interessada, não há dificuldade para entender-se sua posição no processo:
não é parte ré, não se podendo falar em litisconsórcio.34
Isso sem contar o fato de que a lei do mandado de segurança, ora em vigor,
não determina a citação da pessoa jurídica de direito público, que seria
imprescindível caso ela fosse litisconsórcio necessária.
4.6. A Pessoa Jurídica de Direito Público como Sujeito Passivo
Na terceira concepção, que entende ser a pessoa jurídica de direito público a
parte passiva no mandado de segurança, revelam-se nomes como Celso Agrícola
Barbi, Celso Bastos, Lucia Valle Figueiredo, Carlos Alberto Menezes Dias, Adhemar
Ferreira Maciel, Ari Pargendler e, sobretudo, Sérgio Ferraz.
Lucia Valle Figueiredo assume já ter mudado de posicionamento. Passou a
sustentar a idéia de que, necessariamente, a pessoa jurídica deve estar presente, e
não simplesmente na condição de litisconsórcio, mas, sobretudo, na condição de
parte: “A parte, portanto, seria apenas a pessoa de direito público, ou, então, de
34Nesse sentido: “Constitucional e Tributário - Contribuição Provisória sobre movimentação outransmissão de valores e de créditos e direitos de qualquer natureza (Cpmf) - Ec Nº 21 (19 Mar 99):Constitucionalidade Reconhecida pelo STF (Adinmc Nº 2031-5/Df) - Inexistência de litisconsórcioentre a Autoridade Federal e a União - Apelação e remessa oficial providas. 1. Em sede de Mandadode Segurança, não há falar em "litisconsórcio passivo" entre a autoridade federal (AdministraçãoDireta) e a União, porque ela já é, efetivamente, a "parte" (pessoa jurídica) no processo, não aautoridade, cuja obrigação se limita a prestar as informações (rito do "mandamus"); 2.(...); 3.Apelação e remessa oficial providas; 4. (...)”. (TRF – 1ª Região – AMS 01000227518, Rel. JuizLuciano Tolentino Amaral, DJ 15.03.2002, p. 87).
36
direito privado (...)”.35
Para o Min. Adhemar Ferreira Maciel36, “...é importante lembrar que a ré na
ação de mandado de segurança não é como alguns acham, a autoridade coatora. A
ré é a pessoa jurídica da qual a autoridade coatora é órgão. Ré é quem sofre as
conseqüências da condenação, é quem paga ou reembolsa as custas, etc..”
É também o que dizia Castro Nunes:37 “O Min. Costa Manso observou com
razão que a pessoa jurídica de direito público interessada é verdadeiramente parte
passiva no mandado de segurança (...)”.
Sérgio Ferraz entende que, “em suma, sujeito passivo no mandado de
segurança é a pessoa jurídica de direito público que vai suportar os efeitos
defluentes da ação38. Ela sequer é litisconsórcio necessária da autoridade coatora,
eis que esta não é parte”. E ainda mais incisivo continua o autor: “...o que tem havido
é uma cumplicidade doutrinariamente nefanda: dos juízes, que não aplicam a lei do
mandado de segurança, na moldura da garantia constitucional do direito de defesa –
com o que teriam de exigir a citação do réu verdadeiro, não obstante o silêncio da
35Lucia Valle Figueiredo. Mandado de Segurança, p. 51.36Adhemar Ferreira Maciel. O mandado de segurança na Constituição de 1988. Coletânea Jurídica1/12 – TRF 1ª Região, Brasília, out. 1993, apud Antonio César Bochenek. “A autoridade coatora e oato coator no Mandado de Segurança Individual”. In: Aspectos Polêmicos e atuais do Mandado deSegurança – 51 anos depois. São Paulo: RT, 2002, p. 58-59.37Do Mandado de Segurança, p. 244, apud Carlos Augusto de Assis. Sujeito Passivo no Mandado deSegurança. São Paulo: Malheiros, 1997, p. 24-25.38“Processual Civil. Mandado de Segurança. Ilegitimidade da autoridade indigitada coatora.Intervenção, no processo da pessoa jurídica de direito público. Extinção do processo. Impossibilidade:No processo de mandado de segurança, só pode figurar como coatora a autoridade que ordena ouomite a prática do ato impugnado, carecendo de legitimidade para figurar no pólo passivo daimpetração, aquela (autoridade) que não dispõe de competência para corrigir a ilegalidade do atorespectivo. A pessoa jurídica de direito público a suportar os ônus da sentença proferida na ação desegurança é parte legítima, em face de seu interesse direto na causa, para integrar a lide emqualquer fase em que se encontre. A autoridade coatora, não sendo sujeito passivo na lide e nemtitular do direito em conflito, presta informações (sobre o ato) em nome do Estado e como substitutadeste. É, pois, despida de razão jurídica relevante, a decisão que extingue o processo do mandadode segurança, por considerar ilegítima a autoridade coatora, em que a própria parte passiva o Estadointegrou a lide, encampou o ato malsinado e realizou a mais ampla defesa. Recurso a que se nega
37
Lei 1.533; dos impetrantes, que se querem beneficiar da ausência de um litigante
poderoso; do poder público, omisso em exigir seu chamamento como a parte
passiva real; do Ministério Público, que, fiscal da lei, não poderia deixar prosperar
um processo capenga”.39
Entre os processualistas atuais, destaca-se Celso Agrícola Barbi como um
dos mais ardorosos seguidores dessa corrente. Barbi apresenta duas ponderações
para afastar a configuração do coator como parte e que também são inafastáveis,
para não se admitir perfeita a citação da parte através do funcionário notificado: “a) o
ato que a autoridade pratica, no exercício de suas funções, vincula a pessoa jurídica
de direito público, a cujos quadros ela pertence; é ato do ente público, e não do
funcionário; b) o julgado irá regular a situação do impetrante em relação à pessoa
jurídica de direito público, e não em referência à autoridade coatora”.40
Tal corrente já havia sido defendida por Themístocles Brandão Cavalcanti41,
“que entendia que a autoridade coatora se apresenta no processo como
representante da pessoa jurídica de direito público – esta, sim, verdadeiramente
parte no processo”.
A nosso ver, a parte passiva no mandado de segurança é a pessoa jurídica
provimento. Decisão unânime”. (STJ – RESP 187266, Rel. Demócrito Reinaldo, DJ 08.03.1999, p.133).39Sérgio Ferraz. op. cit., p. 4240Celso Agrícola Barbi. op. cit., p. 123.41Do Mandado de Segurança, p. 247, apud Carlos Augusto de Assis. Sujeito Passivo no Mandado deSegurança. São Paulo: Malheiros, 1997, p. 25-26:
“O mandado de segurança só pode ser requerido contra uma pessoa jurídica de direitopúblico, ou a ela equiparada pela lei”.
“É assim que as que exercem serviços públicos descentralizados ou as que executam pordelegação serviços públicos também podem ser chamadas a juízo, através do mandado desegurança”.
“A medida deve ser requerida contra a pessoa jurídica ou aquela que praticou o ato, comosua representante”.
“Se é chamado a juízo o autor do ato, não significa isso a exclusão da pessoa jurídica, senãoque a pessoa chamada tenha agido na qualidade de seu representante ou funcionário”.
38
de direito público, representada, todavia, pela autoridade coatora, ou que praticou o
ato impugnado, que deverá ser individuada, na inicial, a fim de ser notificada, na
forma estabelecida no art. 7º, I, da Lei nº 1.533. O ato do funcionário é o ato da
entidade pública a que ele se subordina. Seus efeitos operam-se em relação à
pessoa jurídica de direito público.
A Lei nº 1.533 apenas manda notificar a autoridade coatora, para prestar
informações. Nenhuma referência faz à pessoa jurídica de direito público. A
circunstância de a lei, em vez de falar na citação da pessoa jurídica, haver se
referido a “pedido de informações à autoridade coatora”, significa apenas mudança
técnica, em favor da brevidade do processo: o coator é citado em juízo como
“representante” daquela pessoa, e não como parte.
Não nos parece sustentável posição diversa. Nosso ordenamento processual
atribui capacidade de ser parte apenas às pessoas naturais e jurídicas, à herança, à
massa falida, à massa do devedor civil insolvente, à sociedade de fato e ao
condomínio de imóvel dividido em salas e apartamentos.
Não vemos obstáculo à aceitação da idéia de que a Lei de Mandado de
Segurança criou uma representação especial, anômala, da pessoa jurídica de direito
público, não necessariamente coincidente com a representação ordinária. Isto
porque não existe ninguém mais adequado para justificar o ato em juízo do que a
própria pessoa que o praticou.
E, ainda, ao examinarmos o disposto no art. 5º, inciso LXIX, em confronto
com o art. 37, § 6º (“as pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado
prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa
39
qualidade, causarem a terceiros, assegurando o direito de regresso contra o
responsável no casos de dolo ou culpa”), ambos da CF/88, constata-se que a
pessoa jurídica estatal responde, objetiva e diretamente, pelas conseqüências dos
atos ou omissões de suas autoridades ou agentes. Deve fazê-lo também quando
forem estes responsáveis por ilegalidade ou abuso de poder. Daí porque se falar na
legitimidade passiva da pessoa jurídica de direito público no mandado de segurança.
Notamos, conclusivamente, que para que o processo de mandado de
segurança alcançasse o escopo jurídico e político para o qual foi criado, seria
preciso que sua concessão, em cada caso, não ficasse sujeita a incontáveis
detalhes na determinação da autoridade coatora, decorrente da complexidade dos
órgãos administrativos. É o que ocorreria se considerássemos a autoridade coatora
como parte, pois qualquer deslize, qualquer erro na sua indicação, iria acarretar a
carência de ação por ilegitimidade de parte.
Por outro lado, de acordo com Carlos Augusto de Assis, “o fato de a lei
determinar a notificação na pessoa da autoridade coatora é plenamente explicável
pela influência dos writs do Direito anglo-saxão, onde tradicionalmente se dá
proeminência à figura do agente, não se falando no Poder Público como pessoa”.42
Ademais, a própria ligação histórica do mandado de segurança com o habeas
corpus, onde também se destaca a figura do coator, faz-nos intuir o porquê da
peculiaridade que ora nos dedicamos a examinar.
42Carlos Augusto de Assis. Sujeito Passivo no Mandado de Segurança, p. 89.
40
5. NATUREZA JURÍDICA DAS INFORMAÇÕES
No sistema das legislações anteriores, em que, além do pedido de
informações à autoridade coatora, havia a citação da pessoa jurídica de direito
público, a defesa desta deveria ser apresentada no prazo de dez dias e sob a forma
de contestação. Como o coator devia prestar informações em igual tempo, tínhamos,
na prática, uma inútil duplicação da defesa.
A Lei nº 1.533/51, conforme dito anteriormente, com o intuito de acelerar o
processo do mandado de segurança, suprimiu a referência à citação do
representante legal ou judicial da pessoa jurídica de direito público, limitando-se, no
art. 7º, item I, a mandar notificar o coator do conteúdo da petição, entregando-lhe a
segunda via da inicial, com cópia dos documentos, para prestar informações no
prazo de cinco dias, prazo esse fixado agora em dez dias pela Lei nº 4.348/64. A
notificação será por ofício, como se infere no art. 9º.
Pensamos que a lei, ao alterar a forma tradicional de citação, suprimindo o
mandado e substituindo-o por ofício, apenas elaborou um meio mais moderno e de
fácil confecção, objetivando a celeridade do processo.
Assim, o coator é citado pela forma de notificação e como representante da
pessoa jurídica de direito público interessada, que é a parte passiva na ação de
mandado de segurança. Nesse sentido orientou-se a jurisprudência do STJ.43
43Embargos de Decl. no Rec. Em Mandado de Segurança nº 888/DF, Rel. Min. Humberto Gomes deBarros: “Processual. Mandado de Segurança. Intimação do Estado. Desnecessidade. AJurisprudência do STJ assentou-se no sentido de que, no processo de Mandado de Segurança, édesnecessária a intimação da pessoa jurídica, pois ela já integra a relação processual, através daautoridade coatora” (DJU, de 15.09.1997).
41
A Lei nº 4.348/64 confirma esse entendimento quando, em seu art. 3º,
determina que a autoridade administrativa, dentro de quarenta e oito horas do
recebimento da notificação da liminar, deva remeter ao Ministério ou órgão a que
esteja subordinada, e ao representante judicial da União, do Estado ou do Município,
elementos para eventual pedido de suspensão da liminar “e defesa do ato apontado
como ilegal ou abusivo de poder”.
Alguns comentadores da nova lei, todavia, insistem em exigir a prática de atos
por ela suprimidos, entre eles o da contestação pelo representante judicial comum
da pessoa jurídica de direito público.
Celso Agrícola Barbi, ao discorrer acerca das informações, entende que
possuem natureza jurídica de contestação: “(...), a defesa da pessoa jurídica de
direito público é feita nas informações prestadas pela autoridade coatora, no prazo
de dez dias, e que têm, assim, natureza de contestação”.44
As razões de ordem constitucional e de sistemática legal para a configuração
da efetiva parte passiva na mandado de segurança, nos impedem de ver nas
informações a defesa da Administração Pública. Assim, “se defesa fosse, teriam de
ser apresentadas por advogado (art. 133, CF/88); se defesa fossem, teriam de ser
deduzidas pelo advogado da União ou pelos procuradores dos Estados e Municípios
(art. 131 e 132, CF/88); se defesa fossem, não estariam jungidas ao dever de
imparcialidade, pois parte não é, por definição, imparcial”.45
As informações da autoridade coatora, uma vez emanadas de agente da
administração pública, submetido ao dever da verdade, gozam, quanto à matéria de
44Celso Agrícola Barbi. op. cit., p. 162.45Sérgio Ferraz. op. cit., p 58.
42
fato, de presunção relativa de veracidade, de legitimidade dos atos administrativos,
do que nelas se contém.46 É exatamente a submissão do coator ao dever da verdade
que tira das informações o caráter de defesa ou contestação.
E, ainda, pelo caráter personalíssimo do ato de constrição, tem-se que a
prestação de informações é uma responsabilidade pessoal e intransferível do
coator.47 Além disso, a intimação da autoridade coatora importa para ela o dever
processual de prestar informações, como todos são obrigados a colaborar com a
justiça, com a peculiaridade de esta obrigação ter sido particularizada pelo
legislador. A apresentação da defesa jamais poderia ser vista como um dever, senão
ônus, pois ninguém é obrigado a defender-se.
Como se não bastassem estas circunstâncias, há de se ressaltar que o
conteúdo das informações deve se limitar a simples informações. Eventuais
alegações de preliminares processuais, opiniões jurídicas, defesas de mérito, etc.
não devem ser feitas pela autoridade coatora, mas pela procuradoria da pessoa
jurídica a quem ela está vinculada, como prevê expressamente o art. 3º, da Lei nº
4.348/64.
Todavia, na prática, especialmente nos mandados de segurança preventivos
e nos que versam sobre matéria de constitucionalidade, as autoridades vêm
realizando freqüentemente a defesa do ato, e não apenas informando acerca dos
fatos. Mesmo não sendo esta a razão de ser das informações, é comum que se
aleguem preliminares processuais e realizem a defesa de mérito do ato.
46Nesse sentido: STJ, MS 1.012, Rel. Min. Peçanha Martins. DJU 3.2.92, p. 423; TRF 5ª Região, MS3.558, Rel.Juiz Francisco Falcão, DJU 10.4.92, Parte II, p. 8.953.47Assim, igualmente, proclama o TRF da 4ª Região: “As informações, no mandado de segurança,devem ser prestadas pessoalmente, não podendo ser delegada a incumbência de prestá-las” (AMS89.04.09813-0, DJU 7.8.91, Parte II, p. 18.081).
43
Fredie Didier Jr.48 entende que, “seja qual for a concepção que se tenha a
respeito do conceito de prova, as informações da autoridade coatora se encaixam, à
perfeição, ao conceito de prova judiciária”. Afirma, ainda, que o legislador criou uma
forma original e típica, embora diferente, de colheita de material probatório, em que o
magistrado contenta-se com as informações por escrito.
Entendemos que as informações são meios de prova apenas no sentido de
que, sendo originariamente um ato administrativo que é, também, um ato
processual, são dotadas de fé pública, e, portanto, constituem em material no qual o
magistrado buscará elementos para formar o seu juízo de convencimento sobre a
causa.
A falta de informações não acarreta presunção de veracidade dos fatos
narrados na inicial, mas a afirmação de um fato pela autoridade, em suas
informações, contém em si a presunção de veracidade, que é própria de qualquer
ato administrativo. Assim, o juiz está autorizado a reconhecer como verdadeiro um
fato afirmado pela autoridade, ainda que essa afirmação não venha acompanhada
de qualquer forma documental. A situação é completamente diferente se a afirmação
está contida na petição inicial.
Sobre a ausência de informações, Celso Barbi afirma que a não apresentação
da defesa no prazo legal, não deve ser considerada com confissão ficta: “(...) é
necessária ao juiz a convicção quanto aos fatos, fundada em prova direta, e não em
presunções decorrentes da falta de contestação tempestiva”.49 Essa é também a
48 “Natureza Jurídica das informações”, p. 372. In: Eduardo Arruda Alvim (coord), Aspectos Polêmicose atuais do Mandado de Segurança - 51 anos depois.49Op. Cit., p. 164.
44
posição de Sérgio Ferraz.50
O art. 319, do Código de Processo Civil, não se aplica à não apresentação
das informações simplesmente porque estas não constituem contestação. A
ausência de informações pode gerar sanções administrativas e até criminais para a
autoridade negligente, mas, em termos processuais, não implica maiores
conseqüências, a não ser a não integração do procedimento probatório previsto para
o procedimento do mandado de segurança.
50Sérgio Ferraz. op. cit., p. 59: “A inação quanto à prestação de informações, não tem relevânciaprocessual. Em outras palavras, daí não decorre revelia ou confissão de fato. E isso porque: I – nãosão elas, por tudo que já se expôs, contestação; assim sua falta não pode gerar efeitos idênticos aosda ausência de defesa; II – o interesse público é de regra indisponível, o que impediria a configuraçãoda confissão ficta, ainda que de contestação de tratasse (TRF, 4ª Região, MAS 90.04.08639-0, rel.Juiz Albino Zavascki, DJU 10.03.93, Parte II, p. 7.272); III – a concessão da segurança temcondicionamentos constitucionais expressos – direito líqüido e certo, ferido ou ameaçado por ato ouomissão de autoridade (ou delegatário), inquinado de ilegalidade ou abuso de poder”.
45
7. LEGITIMIDADE RECURSAL
Entendemos que os recursos do Código de Processo Civil são perfeitamente
cabíveis em mandado de segurança, já que suas normas são aplicáveis
subsidiariamente.
Julgado procedente o pedido, transmite-se à autoridade coatora a sentença.
Da decisão, negando ou concedendo o mandado, cabe apelação, de acordo com o
art. 12 da Lei nº 1.533/51. A sentença concessiva fica sujeita ao duplo grau de
jurisdição (art. 12, parágrafo único).
A Lei nº 1.533/51, entretanto, só regula o mandado de segurança impetrado
em primeiro grau de jurisdição, não obstante reconheça a possibilidade de a ação
ser proposta diretamente no segundo grau de jurisdição (art. 14). Daí o art. 12,
caput, referir-se apenas à sentença e a recurso de apelação. Em se tratando de
mandado de segurança impetrado diretamente nos tribunais, o recurso de apelação
fica sistematicamente afastado. Contra as decisões finais dos órgãos colegiados
(acórdãos – art. 163, do Código de Processo Civil), cabe recurso ordinário nos casos
previstos no art. 102, II, a, e 105, II, b, da Constituição Federal, ou, se for o caso,
recurso extraordinário (art. 102, III, CF/88) ou recurso especial (art. 105, III, CF).
É preciso ressalvar que não se pode confundir a suspensão dos efeitos da
sentença concessiva da segurança, determinada de acordo com o pedido feito pelo
Poder Público, com base no art. 4º da Lei nº 4.348/64, com o efeito suspensivo que
pode ser concedido na apelação do mandado de segurança, com base no art. 558,
do Código de Processo Civil. O pedido de suspensão não é recurso, mas pedido
46
formulado pelo Poder Público visando tão somente a suspensão provisória dos
efeitos da liminar. O órgão destinatário não pode examinar o mérito da sentença
nem modificar a liminar.
Referentemente à legitimação recursal ativa, perdura a questão se tem o
coator legitimação pessoal para recorrer se concedido o mandamus.
Inquestionavelmente, da decisão concessiva do writ poderá recorrer a pessoa
jurídica, eis que ela é titular do direito a que contraposta a ação. O grande problema
encontra-se na possibilidade da autoridade coatora recorrer.
Mesmo aqueles que sustentam ser a autoridade coatora parte não hesitam
em dizer que, denegada a segurança, sujeito passivo recursal é a pessoa jurídica
interessada na salvaguarda do ato coator.
Entende Lúcia Valle Figueiredo que a autoridade coatora tem igualmente à
pessoa jurídica de direito público a legitimidade para recorrer. Sustenta que o Estado
deve acionar regressivamente o funcionário em caso de culpa ou dolo deste, e que
só por isso já se verifica que a autoridade teria legitimidade recursal.51
Sérgio Ferraz admite a possibilidade recursal do coator com terceiro
interessado: “Para aqueles, contudo, como nós, que vêem o coator como figura não
parte da ação, ainda assim parece admissível o recurso do constritor, já então como
terceiro prejudicado”.52
Alertou o Min. Adhemar Ferreira Maciel: “’...no tocante ao recurso, embora
silente a Lei do Mandado de Segurança, deve ser ele, em princípio, interposto pela
parte, através de seu representante legal (art. 12, CPC)’”, embora destaque,
51Mandado de Segurança, p. 52.
47
“‘...todavia, nada impede à autoridade coatora, se se sentir prejudicada ou em vias
de o ser, também recorrer’”.53
Embora a autoridade coatora tenha a capacidade de corrigir diretamente a
eventual ilegalidade que venha a ser confirmada com a concessão da segurança,
deve-se destacar que a pessoa jurídica de direito público é quem tem legitimidade
para recorrer da decisão, visto que a reparação de danos será suportada material e
economicamente por ela, ainda que o ato tenha sido corrigido pela autoridade.54
Sendo apenas representante da pessoa jurídica e, portanto, tendo em seus
atos a manifestação da vontade do Estado, a autoridade não tem legitimidade para
recorrer. O recurso deve ser interposto pela parte do processo, no caso, a pessoa
jurídica de direito público.55
Também não podemos alegar que a autoridade recorreria como terceiro
interessado, uma vez que a sentença do mandado de segurança, em si, não tem
capacidade de alcançar o patrimônio da autoridade.
Deve-se lembrar, ainda, que a eventual imposição de sanção administrativa
em razão de uma infração disciplinar depende da instauração de um processo (ou
procedimento) administrativo autônomo, sem que os efeitos da sentença do
52Op. cit., p.147.53Adhemar Ferreira Maciel. Observações sobre autoridade coatora no mandado de segurança. RT618/25-26, ano 76, São Paulo, abr. 1987, apud Antonio César Bochenek, Aspectos Polêmicos eAtuais do Mandado de Segurança – 51 anos depois, p. 64.54Nesse sentido: “Mandado de Segurança. Autoridade coatora. Ilegitimidade para interpor recursoextraordinário. A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal é no sentido de que a pessoa jurídicade direito público a que pertence a autoridade ou o órgão tido como coator, é o sujeito passivo domandado de segurança, razão por que é ele o único legitimado para recorrer da decisão que defere aordem. Agravo regimental improvido”. (STF, RE 233319, Rel. Min. Ellen Gracie, DJ 17.06.2003).55Nesse sentido: “Processual civil e tributário. Mandado de segurança. Legitimidade recursal. UniãoFederal. Fazenda Nacional. 1. Inobstante ser a autoridade coatora parte no processo, o interessepara recorrer é da pessoa jurídica de direito público interessada, que suportará o ônus da sentença.2. Legitimidade da União Fazenda Nacional para integrar a relação processual. 3. Recurso Especialimprovido”. (STJ, RESP 553959, Rel. Min. Castro Meira. DJ 01/12/2003. p. 342).
48
mandado de segurança acarretem, necessariamente, qualquer penalidade.
A responsabilidade civil do agente também depende de propositura, pelo
Estado, de nova ação, que depende da comprovação de dolo ou culpa do agente,
elementos normalmente ignorados no julgamento do mandado de segurança.
Sequer se admite, no mandado de segurança, denunciação da lide ao agente, como
reconhece boa parte da jurisprudência.
49
8. CONCLUSÕES
1. O Mandado de Segurança surgiu na Constituição de 1934, sendo o habeas
corpus seu antecessor.
2. A garantia vem prevista no artigo 5º, inciso LXIX, da Constituição Federal
de 1988, que dispõe: “conceder-se-á mandado de segurança para proteger direito
líqüido e certo, não amparado por habeas corpus e habeas data, quando o
responsável pela ilegalidade ou abuso de poder for autoridade pública ou agente de
pessoa jurídica no exercício de atribuições do Poder Público”.
3. A autoridade coatora, no mandado de segurança, é a pessoa física que, em
nome da pessoa jurídica a qual esta vinculada, tenha poder de decisão, de
desfazimento do ato guerreado no mandado de segurança. Para que se identifique a
autoridade coatora, é preciso primeiramente identificar o ato coator praticado.
3. A autoridade pública não pratica o ato em nome próprio, mas como
representante da pessoa jurídica e, por isso, não ostenta titularidade para funcionar
no pólo passivo da ação, como sustentam alguns autores. A autoridade coatora
apenas presta informações, completa a citação e comunica ao réu a existência da
demanda contra ele proposta.
4. Uma segunda concepção entende que são réus a autoridade coatora e a
pessoa jurídica de direito público em litisconsórcio necessário. Sendo a autoridade
coatora mera representante da pessoa jurídica de direito público e não podendo
haver substituição processual, não há que se falar em litisconsórcio. Além disso, a
50
Lei nº 1.533/51 não determina a citação da pessoa jurídica de direito público.
5. A concepção que adotamos é que a pessoa jurídica de direito público é
a verdadeira ré do mandado de segurança, representada, todavia, pela autoridade
que praticou o ato impugnado.
6. O ato que a autoridade pratica no exercício de suas funções, vincula a
pessoa jurídica de direito público a cujos quadros ela pertence. É a pessoa jurídica
que vai suportar os efeitos decorrentes da ação. O julgado irá regular a situação do
impetrante em relação á pessoa jurídica de direito público, e não em referência à
autoridade coatora.
7. A Lei 1.533/51 apenas mandar notificar a autoridade coatora, sem fazer
referência à pessoa jurídica de direito público, apenas para objetivar a celeridade do
processo.
8. A pessoa jurídica estatal responde, objetiva e diretamente, pelas
conseqüências dos atos ou omissões de suas autoridade ou agentes.
9. O coator é citado pela forma de notificação e presta informações como
representante da pessoa jurídica de direito público. As informações não são
defesa e não têm natureza de contestação.
10. As informações da autoridade coatora, uma vez emanadas de agente da
administração pública, gozam de presunção de veracidade e submete o coator ao
dever de dizer a verdade. São meios de prova apenas no sentido de que, sendo
originariamente um ato administrativo que é, também, um ato processual, são
dotadas de fé pública e constituem em material no qual o magistrado buscará
elementos para formar o seu juízo de convencimento sobre a causa.
51
11. Os recursos do Código de Processo Civil são cabíveis no mandado de
segurança. Da sentença cabe apelação. A sentença concessiva fica sujeita ao duplo
grau de jurisdição (art. 12, da Lei nº 1.533/51).
12. A pessoa jurídica de direito público é quem tem legitimidade para
recorrer. A autoridade coatora não pode recorrer como terceiro interessado pois a
sentença do mandado de segurança, em si, não tem capacidade de alcançar o
patrimônio da autoridade.
13. A imposição de sanção administrativa em razão de uma infração
disciplinar depende da instauração de um processo administrativo autônomo, sem
que os efeitos da sentença do mandado de segurança acarretem, necessariamente,
qualquer penalidade.
52
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________. Primeiras Linhas de Direito Processual Civil. v. 2, 13ª ed. atual., São
Paulo: Saraiva, 1989-1990.
55
CAMILA BARTH PIRES
A LEGITIMAÇÃO PASSIVA
DO MANDADO DE SEGURANÇA
BACHARELADO EM DIREITO
FACULDADES METROPOLITANAS UNIDAS
SÃO PAULO – 2004
56
UniFMU
CURSO DE DIREITO
A LEGITIMAÇÃO PASSIVA
DO MANDADO DE SEGURANÇA
BACHARELADO EM DIREITO
Orientador: Prof. Dr. Rodrigo da CunhaFreire.
CAMILA BARTH PIRES
R.A.: 440.489/3
319B
TEL: (11) 3666-1140
e-mail: [email protected]
57
58
À memória de meu pai, o eminente e
saudoso Professor e Magistrado Fleury
Antonio Pires.
59
UniFMU
CURSO DE DIREITO
A LEGITIMAÇÃO PASSIVA
DO MANDADO DE SEGURANÇA
BACHARELADO EM DIREITO
Monografia apresentada à BancaExaminadora das FaculdadesMetropolitanas Unidas de São Paulo,como exigência parcial para obtenção dograu de bacharel em direito, sob aorientação do Prof. Dr. Rodrigo da CunhaFreire.
CAMILA BARTH PIRES
R.A.: 440.489/3
SÃO PAULO
60
MARÇO - 2004
Banca Examinadora
_________________________________
_________________________________
_________________________________
61
Agradecimentos
Agradeço, em primeiro lugar, ao ilustre Professor Doutor Rodrigo da Cunha
Freire, meu orientador, pela dedicação, estímulo e brilhantismo no ensino do Direito
Processual Civil.
Agradeço, também, ao eminente professor Renato Barth Pires, pela infinita
paciência, carinho e dedicação com que me auxiliou durante toda a minha formação
acadêmica e, mais precisamente, na elaboração desta monografia.
Agradeço, inclusive, ao querido Danilo Barth Pires, por todos os
ensinamentos no decorrer da minha graduação.
Agradeço à querida Professora Maria Eugenia Terra Barth Pires, sem a qual
este trabalho não teria sido realizado.
Agradeço, ainda, ao Flavio Monaco, por todo o auxílio, sempre presente nos
momentos difíceis.
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