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UNIVERSIDADE FEDERAL DO MATO GROSSO DO SUL
INSTITUTO DE MATEMTICA
PROGRAMA DE PS-GRADUO EM EDUCAO MATEMTICA
VIVIANE RAMOS GOMES GASPAR
A MENTORIA NA FORMAO DE PROFESSORES QUE ENSINAVAMMATEMTICA: UMA INSTITUIO (?), DIVERSAS EXPERINCIAS NA
CIDADE DE CAMPO GRANDE/MS DE 1980 A 1990.
Campo Grande MS
2015
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VIVIANE RAMOS GOMES GASPAR
A MENTORIA NA FORMAO DE PROFESSORES QUE ENSINAVAM
MATEMTICA: UMA INSTITUIO (?), DIVERSAS EXPERINCIAS NA
CIDADE DE CAMPO GRANDE/MS DE 1980 A 1990.
Dissertao apresentada ao Programa de PsGraduao em Educao Matemtica daUniversidade Federal do Mato Grosso do Sul,
como requisito parcial para a obteno dottulo de Mestre em Educao Matemtica.Orientador (a): Prof. Dra. Luzia Aparecida deSouza
Campo Grande - MS
2015
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VIVIANE RAMOS GOMES GASPAR
A MENTORIA NA FORMAO DE PROFESSORES QUE ENSINAVAM
MATEMTICA: UMA INSTITUIO (?), DIVERSAS EXPERINCIAS NA
CIDADE DE CAMPO GRANDE/MS DE 1980 A 1990.
Dissertao apresentada ao Programa de Ps
Graduao em Educao Matemtica daUniversidade Federal do Mato Grosso do Sul,como requisito parcial para a obteno dottulo de Mestre em Educao Matemtica.
BANCA EXAMINADORA:
_________________________________Prof. Dra. Heloisa da Silva
Universidade Estadual Paulista Julio deMesquita Filho, campus de Rio Claro/SP.
_________________________________Prof. Dr. Thiago Pedro PintoUniversidade Federal de Mato Grosso do Sul.
_________________________________Prof. Dra. Luzia Aparecida de SouzaUniversidade Federal de Mato Grosso do Sul.
Campo Grande, 02 de Maro de 2015.
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AGRADECIMENTOS
Agradeo imensamente a Deus pela vida e por todos.
A minha famlia que sempre est ao meu lado me apoiando em todas as minhas decises. Em
especial, minha me Solange, tambm Educadora, por deixar como herana os meus
estudos.
Ao meu esposo, Rogrio. Ao meu filho amado, Heitor Augusto Gomes Gaspar que me
acompanhou durante esses dois anos de mestrado, nos estudos em casa, nas reunies do
Hemep, nas aulas e seminrios, enfim. Obrigada meu filho pela pacincia e carinho.
A minha amiga Juliana Vicente, por seus conselhos e incentivo.
Aos membros do Grupo HEMEP que me acolheram, tornando-se fundamentais na construo
dessa pesquisa: Prof Luzia, Prof Thiago, Prof Carla, Marcos, Carlos, Nathalia, Natalia,
Tiaki, Carol, Vivian e Endrika.
A Professora Dra. Ednia Martins-Salandim, pelas contribuies no texto de anlise.
Aos meus queridos colegas e professores do Programa de Ps-Graduao em Educao
Matemtica, turma de 2013. Vocs foram maravilhosos, principalmente meus amigos
Juliana de Sousa Pardim, Jlio, Jonas, Miriam e Marcos que sempre estiveram ao meu lado
compartilhando momentos de estudos, alegrias, tristezas e dificuldades.
A banca examinadora, Professor Dr. Thiago Pedro Pinto e Professora Dra. Heloisa da Silva,
pelas valiosas sugestes e orientaes.
A CAPES pelo o apoio financeiro.
Aos interlocutores dessa pesquisa: Madalena, Celina, Miriam, Marisandra, Damaris Lima e
Damaris Viana Sanches. Sem suas preciosas colaboraes no seria possvel a realizao
desse trabalho.
A minha querida orientadora Luzia Aparecida de Souza , por ter depositado em mimconfiana, credibilidade e por ter permitido que eu percorresse caminhos que me fizeram ser
essa pesquisadora. Agradeo por sua orientao, dedicao, amizade, ateno, pacincia,
reflexes, por seus valorosos conhecimentos e, principalmente, por ter acreditado em meu
trabalho.
A Mozart, Chopin, Listz, Bethoven, Schubert e outros grandes nomes da msica clssica que
proporcionaram a mim momentos de concentrao em que s existiam a msica e a
dissertao.
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Eu no pinto as coisas como as vejo, mas sim
como as penso.
(Pablo Picasso)
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RESUMO
Essa pesquisa constitui-se no campo da Histria da Educao Matemtica e se estrutura demodo a compreender o cenrio acerca do exerccio de uma formao, especfica, por prticade mentoria a professores do Ensino Primrio em uma instituio privada de CampoGrande/MS nas dcadas de 1980 a 1990. Buscamos contribuir, por meio desse estudo, com asinvestigaes referentes formao de professores que ensinam e/ou ensinavam Matemticano pas. Para tanto, nos baseamos em estudos sobre como a formao de professores vemsendo abordada, em teorias historiogrficas voltadas para a desconstruo da ideia de verdadee na histria oral como metodologia de pesquisa qualitativa que tem o foco, principal, nacriao intencional de fontes historiogrficas a partir de situaes de entrevista. Este trabalho
partiu de alguns indcios dos relatos de vivncias de professores que, ao chegarem em umainstituio de ensino privada, no Colgio Batista Sul-Mato-Grossense, sendo iniciantes nacarreira docente ou no, passavam por situaes de acompanhamento em sua prtica, sendoorientados pela coordenao/direo ou por professores mais experientes dessa instituio,o que chamamos aqui de prtica de mentoria. Assim, a partir das fontes orais e escritas,buscamos caracterizar a mentoria, principalmente com relao ao ensino de Matemtica, pormeio de dois movimentos analticos distintos que evidenciaram alteraes na postura dessapesquisadora, passando pela busca de um olhar sobre a temtica relaes de poder. Oprimeiro deles discute a mentoria focando uma perspectiva de discurso pautado em um podercentral, que vem de cima para baixo e o segundo busca articular discursos e contradiscursos sobre a prtica de mentoria evidenciando linhas de foras multidirecionais. Comonos mltiplos discursos sobre as mentorias no Colgio Batista, haviam relaes estabelecidasentre professor, aluno, supervisor e diretor. Cada qual exercia seu papel de modo a legitimarou no as aes um do outro.
Palavras-chave: Histria da Educao Matemtica. Histria Oral. Formao de Professoresde Matemtica. Prtica de Mentoria. Colgio Batista.
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ABSTRACT
This research is constituted in the area of History of Mathematics Education and structure inorder to understand the scene for the exercise of a formation, specific for practical mentoringto primary school teachers in a private institution of Campo Grande / MS in decades 1980 and1990. we seek to contribute, through this study, with the investigations into the training ofteachers who teach and / or taught mathematics in the country. For this, we rely on studies onhow the training of teachers is being addressed in historiographical theories aimed todeconstruct the idea of truth and oral history as a qualitative research methodology that hasthe focus, principal in the intentional creation of historiographical sources from interviewsituations. This work is guided in known experiences of teachers, to reach an privateeducational institution, the College Baptist South Mato-Grossense, and beginners in the
teaching profession or not, passed by monitoring situations in their practice, being guided bythe coordination / direction tutor "experienced" this institution, we call here the practice ofmentoring. Thus, from the spoken and written sources, we seek to characterize the mentoring,particularly with respect to teaching mathematics through two distinct analytical movementsthat show changes in posture that researcher fostered by research, trying to show a look on thetheme "power relations ". The first discusses the mentoring focusing one speech perspectiveguided by a central power, which comes from "top to bottom" and the second seeks toarticulate discourses and counter discourses on the practice of mentoring evidencing lines ofmultidirectional forces. As in the multiple discourses on mentorias the Baptist College, hadestablished relationships between teacher, student, supervisor and director. Each exercised itsrole in order to legitimize or not the actions of each other.
Keywords: History of Mathematics Education. Oral History. Mathematics TeacherEducation. Mentoring practice. Baptist College.
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LISTA DE FIGURAS
Figura 1 Rede de Colaboradores .......................................................................................................... 40
Figura 2 Maria Madalena Messias, entrevista realizada em 10 de Setembro de 2013 ........................ 52
Figura 3 Miriam Ferreira Abreu da Silva, entrevista realizada em 30 de Outubro de 2013 ................ 81
Figura 4 Marisandra de Souza Nepomuceno, entrevista realizada em 02 de Dezembrode 2013 ....... 96
Figura 5 Oliveira Flores, entrevista realizada em 12 de Fevereiro de 2014 ...................................... 102
Figura 6 Damaris Viana Sanches Oliveira, entrevista realizada em 29 de Agosto de 2014 .............. 133
Figura 7 Sobre a Madalena de papel e tinta ....................................................................................... 160
Figura 8 Nuvem de palavras referente textualizao da Professora Maria Madalena Messias. ..... 160
Figura 9 Sobre a Miriam de papel e tinta........................................................................................... 164
Figura 10 Nuvem de palavras referente textualizao da Professora Miriam Ferreira de Abreu ... 164
Figura 11 Sobre a Marisandra de papel e tinta .................................................................................. 167
Figura 12 Nuvem de palavras referente textualizao da Professora Marisandra de Souza
Nepomuceno ....................................................................................................................................... 167
Figura 13 Sobre a Celina de papel e tinta .......................................................................................... 170
Figura 14 Nuvem de palavras da textualizao da Professora Celina Oliveira Flores. ..................... 170
Figura 15 Sobre a Damaris Pereira de papel e tinta ........................................................................... 173
Figura 16 Nuvem de palavras referente textualizao da Professora Damaris Pereira Santana Lima
............................................................................................................................................................. 173
Figura 17 Sobre a Damaris Viana de papel e tinta ............................................................................ 176
Figura 18 -Nuvem de palavras referente textualizao da Professora Damaris Viana Sanches Oliveira
............................................................................................................................................................. 176
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SUMRIO
INTRODUO ................................................................................................................................... 10
1. FORMAO DE PROFESSORES .............................................................................................. 16
1.1 MAPEAMENTOS DE PESQUISAS SOBRE A FORMAO DE PROFESSORES QUE
ENSINAM MATEMTICA................................................................................................................. 16
1.2 FORMAO DE PROFESSORES NOS TRABALHOS COM NARRATIVAS. ........................ 23
2 HISTRIA ORAL: PERSPECTIVA, CONCEPES E ABORDAGEM ............................... 28
2.1 HISTRIA E HISTORIOGRAFIA ................................................................................................ 32
2.2 HISTRIA ORAL: ENTRE PROCEDIMENTOS, CUIDADOS E ALGUMAS
PERMANNCIAS ................................................................................................................................ 36
3 HISTRIAS NARRADAS: VOZES NA PESQUISA ................................................................... 52
3.1 MARIA MADALENA MESSIAS .................................................................................................. 52
3.2 MIRIAM FERREIRA DE ABREU ................................................................................................ 81
3.3 MARISANDRA DE SOUZA NEPOMUCENO ............................................................................. 96
3.4 CELINA OLIVEIRA FLORES .................................................................................................... 102
3.5 DAMARIS PEREIRA SANTANA LIMA.................................................................................... 124
3.6 DAMARIS VIANA SANCHES OLIVEIRA................................................................................ 133
4 A(S) MENTORIA(S) NO COLGIO BATISTA SUL-MATO-GROSSENSE ........................ 139
4.1 REFLEXOS DE UMA ORIGEM: A MENTORIA NO COLGIO BATISTA SUL-MATO-
GROSSENSE ...................................................................................................................................... 140
4.1.1 Um incio, uma histria: a educao nas escolas Batistas .................................................... 141
4.1.2 A mentoria como prtica formativa no Colgio Batista Sul-Mato-Grossense ...................... 148
4.2 CONSTRUINDO MARCAS DE UM SUJEITO DE PAPEL E TINTA ...................................... 156
4.3 MULTIPLAS MENTORIAS: RELAES NO COLGIO BATISTA SUL-MATO-GROSSENSE
............................................................................................................................................................. 178
4.3.1 O Colgio Batista Sul-Mato-Grossense visto por dentro ...................................................... 179
4.3.2 De portas abertas: a espera do olhar na porta ....................................................................... 185
CONSIDERAES FINAIS ........................................................................................................... 193
REFERNCIAS ................................................................................................................................ 198
APNDICES (em CD-Rom)ANEXOS (em CD-Rom)
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INTRODUO
Antes mesmo de efetivar-me1 como aluna regular no curso de Ps-Graduao em
Educao Matemtica da UFMS, tinha uma ideia rudimentar sobre o que , ou do que se trataum curso de mestrado nessa rea. Como tenho fascnio em ensinar, amo a sala de aula, o
ambiente escolar, as relaes com os colegas, lidar com alunos de diversas faixas etrias e,
principalmente, ensinar Matemtica, o ttulo Educao Matemtica chamou-me ateno
desde quando cheguei a Campo Grande-MS e tomei conhecimento sobre o curso. Da
licenciatura em Matemtica onde me formei, Unesp de Presidente Prudente-SP, os indicativos
para cursar uma ps-graduao em nvel de mestrado tendiam s cincias exatas, como Fsica,
a prpria Matemtica e at Engenharia Cartogrfica ou, poderia cursar o mestrado emEducao a saber, em Presidente Prudente, na Unesp, esse curso bastante almejado.
Enfim, aps alguns anos lecionando em turmas da Educao Bsica tanto em Presidente
Prudente como em Campo Grande tive a oportunidade de ingressar no Programa de Ps-
Graduao em Educao Matemtica da UFMS buscando o aperfeioamento do meu trabalho
como professora de Matemtica, alm das possibilidades de melhorar minha carreira
profissional, buscando novas oportunidades.
Em contato com essa rea de conhecimento, pude compreender melhor esse campo e
desconstruir a ideia rudimentar que tinha sobre o curso. Nesse sentido, o que compreende o
campo de conhecimento em Educao Matemtica? Posso pensar em Educao Matemtica
como uma rea que volta-se para o ensino da Matemtica?
Respostas para essas questes podem ser atendidas pelos estudos de alguns
pesquisadores, assim, nesse momento, senti a necessidade de discutir melhor esse campo no
qual me incluo como pesquisadora. Souza (2006) aborda esse tema, dialogando com diversos
autores que discutem os movimentos da Educao Matemtica ao longo do tempo. Nesse
trabalho, em um de seus captulos, a autora destaca tendncias e abordagens no campo da
Educao Matemtica, deste modo a concebe como um campo autnomo de investigao2.
Essa autonomia decorre da capacidade de gerar questes e inquietaes prprias que esto
ligadas no s a Matemtica, ou Educao, mas s ligaes que so estabelecidas ao pensar
1O uso do pronome pessoal em primeira pessoa, neste momento, proposital por posicionar-me como sujeitoem pesquisa que se encontra em movimento, possui crenas e acredita em mudanas e possibilidadesdesenvolvimento.
2
Para melhor compreenso dessa expresso indicamos o trabalho de MIORIM, M. A.; MIGUEL, A. Aconstituio de trs campos afins de investigao: Histria da Matemtica, Educao Matemtica e Histria &Educao Matemtica. Revista do Departamento de Teoria e Prtica da Educao, Maring, n.8, p.35-62, 2001.
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na Matemtica em situao de ensino, ou seja, situaes ligadas Educao. Nesse aspecto,
uma das caractersticas principais no campo da Educao Matemtica, evidenciada pela a
autora, a do dilogo com outras reas de conhecimento, tendo em vista as possibilidades de
ampliao de enfoques e perspectivas que contribuem para a compreenso de questes
prprias a essa regio. (p. 56)
A Educao Matemtica no se reduz a um simples sinnimo de ensinar matemtica,
perspectiva adotada por aqueles que a tomam por uma abordagem mais prtica. Todavia, os
que a desenvolvem como uma abordagem terica fazem pesquisas nessa rea em instituies
acadmicas. Tentar entender o ensino e a aprendizagem de Matemtica, faz com que o
educador/pesquisador transite por diversas reas e cenrios, conhecendo diversos tericos e
experincias. Pesquisas vinculadas a essa rea tem interlocuo com a Psicologia, Educao,Matemtica, Filosofia, Antropologia, Sociologia, a Histria, dentre outras.
Concordamos com Garnica e Souza (2012), quando propem pensar a Educao
Matemtica como um campo de investigao, campo esse, que pode ser entendido como uma
prtica social exercida por uma comunidade que sistematiza, reflete, produz e atua de forma a
compreender a Matemtica em situaes de ensino e aprendizagem. Os referidos autores
destacam diversos temas que envolvem esse campo de investigao:
o estudo de currculos, a formao de professores, a criao e anlise desituaes didticas, as potencialidades metodolgicas da modelagemmatemtica, a Histria da Matemtica como recurso para o ensino decincias, a resoluo de problemas, a informtica e as outras mdias comorecursos para o ensino de Matemtica, a Filosofia da Matemtica e daEducao Matemtica, o estudo das relaes entre matemticos e educadoresmatemticos, da Matemtica do matemtico e da Matemtica do professorde Matemtica, a Psicologia da Educao Matemtica, a Histria daEducao Matemtica, a linguagem matemtica em seus mltiplos vnculoscom outras linguagens, a Etnomatemtica, as concepes de professores,alunos e familiares, o estudo das tendncias de pesquisa em cada uma dessas
temticas, das metodologias de pesquisa criadas/efetivadas na rea, dentreoutros tantos temas. (p. 20-21).
A partir dos temas apresentados pelos autores, no podemos nos limitar em pensar
esse campo como sendo sinnimo do ensino de Matemtica, contudo pensar a Matemtica
no cenrio de ensino e aprendizagem. O que possibilita fazer interlocues com outras reas
de conhecimento, conhecendo diversos tericos, metodologias, outras abordagens e
perspectivas.
No interior desse universo que a Educao Matemtica, nos cabe aqui, discutirmelhor o tema da Histria da Educao Matemtica, o que nos interessa diretamente por
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tratar-se de uma pesquisa que investiga prticas do passado. Antes de esclarecer com mais
apreo os objetivos e direcionamentos desse trabalho, optei, nesse momento, por discutir o
tema supracitado anteriormente. relevante lembrarmos que esta presente pesquisa de
mestrado se intitulava, inicialmente, Formao de professores que ensinavam Matemtica
em Campo Grande/MS: um olhar para prticas informais entre as dcadas de 1980 a 1990.
O estudo da Histria da Educao Matemtica proporciona um dilogo entre Histria,
Educao, Matemtica e outras reas. Olhar para prticas do passado nos ajuda a
compreender, projetar, propor e avaliar as prticas do presente. Nesse sentido, a Histria da
Educao Matemtica nos ajuda a compreender as alteraes e permanncias nas prticas
relativas ao ensino e aprendizagem de Matemtica (GARNICA e SOUZA, 2012, p. 41), e
como as comunidades organizam/organizavam, produzem/produziam ecompartilham/compartilhavam conhecimentos matemticos.
Essa linha de pesquisa agrega estudos de diversos saberes, que, no nosso caso em
especfico, traz contribuies para tentarmos compreender prticas escolares; alteraes e
permanncias no que tange o ensino de Matemtica e como vm se formando os professores
de Matemtica no Estado de Mato Grosso do Sul.
Nessa perspectiva, ao ingressar no mestrado em Educao Matemtica, pude iniciar as
atividades junto ao grupo Histria da Educao Matemtica em Pesquisa (HEMEP)3
.Voltado a pesquisas em Histria da Educao Matemtica, este grupo tem por objetivo
(projeto) contribuir para um mapeamento (histrico) da formao e atuao de professores
que ensinam/ensinavam Matemtica no sul de Mato Grosso Uno e em Mato Grosso do Sul,
bem como buscar melhores compreenses da dinmica escolar no contexto do ensino e da
aprendizagem de matemtica.
Buscando articular esse projeto do mapeamento da formao de professores no
estado de Mato Grosso do Sul com a minha experincia profissional e meus anseiospessoais emergiu a inteno dessa pesquisa.
O interesse em contribuir com esse projeto surgiu ao ouvir relatos de professores
(colegas de trabalho) que vivenciaram uma prtica de formao pouco convencional das ditas
regulares. Atuando em um colgio de Campo Grande/MS como professora de Matemtica no
Ensino Fundamental II, pude perceber o destaque de algumas professoras da Educao
3 Grupo formado em 2011, devidamente cadastrado no CNPQ e certificado pela UFMS. Compreende asseguintes linhas de pesquisas: Aspectos histricos do ensino e da aprendizagem de matemtica, Histria da
formao de professores que ensinam matemtica, histria oral e narrativa. Tem por objetivo contribuir paraum mapeamento da formao de professores que ensinam matemtica no pas, bem como para uma melhorcompreenso da dinmica escolar no contexto do ensino e da aprendizagem de matemtica.
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Infantil com relao s suas prticas na sala de aula: tais professoras revelaram o que era
reconhecido pelos pares da instituio como um bom desempenho na alfabetizao, tanto para
a leitura e escrita quanto para o ensino de matemtica. Nas reunies do grupo HEMEP esse
tipo de prtica acabou sendo apresentada em algumas narrativas de outras pesquisas.
(SOUZA, 2011; REIS, 2014b)
Nessa pesquisa, estabelecemos como interlocutores professores (com formao, seja
em nvel mdio no Magistrio ou em nvel Superior em Pedagogia) que, por ventura, ao
ingressarem na instituio de ensino recebiam da coordenao e/ou por parte dos colegas mais
experientes uma espcie de ajuda ou, podemos dizer, um acompanhamento mais de
perto para auxili-los em sua prtica, que, por conseguinte estamos associando a outro tipo
de formao, que chamamos aqui de prtica4 de mentoria. Tais prticas, evidenciadas emdcadas passadas, nos trouxeram a possibilidade de olhar para uma formao de professores,
inicialmente, no encontrada na literatura vigente. Dessa forma, temos como objetivo
principal nesta investigao compreender a formao por mentoria na prtica de
professores que ensinavam Matemtica, em uma instituio privada de Campo
Grande/MS, nas dcadas de 1980 a 19905.
Esta pesquisa est inserida no campo da Histria da Educao Matemtica, que vem
possibilitar a compreenso do ensino, aprendizagem, formao e prticas matemticas e seusentornos. Neste sentido, buscamos compor um cenrio de prticas (no institucionais) de
formao na poca mencionada. Essa composio estruturada a partir de um exerccio de
mapeamento. Segundo Garnica,
Esboar um mapeamento termo inspirado nos fazeres cartogrficos elaborar, em configurao aberta, um registro das condies em queocorreram/ocorrem a formao e atuao de professores de Matemtica, dosmodos com que se deram/do a atuao desses professores, do como se
apropriam/apropriavam dos materiais didticos, seguiam/seguem ousubvertiam/ subvertem as legislaes vigentes (GARNICA, 2011, p.241).
Pretendemos alcanar o objetivo da pesquisa aqui proposta percorrendo os seguintes
objetivos especficos:
4A palavra prtica, abordada nesse trabalho, ser melhor caracterizada nos captulos de anlise.5 Os primeiros profissionais contatados por esta pesquisadora indicaram as dcadas de 1980 e 1990 como
profcuas ao tipo de estudo proposto. Alm disso, o estudo dessas dcadas interessa, historicamente, ao grupoHEMEP por serem seguintes ao momento de dissoluo do Mato Grosso (Uno) e consequente criao doestado de Mato Grosso do Sul.
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mapear indcios do acontecimento de uma prtica de formao por mentoria entre
professores do Ensino Primrio em Campo Grande/MS e sua relao com um modelo
de ensino considerado ideal poca;
compreender como os mentores estruturavam a formao dos professores que estavam
em atuao nas dcadas de 1980 a 1990 nessa instituio;
compreender quais prticas de ensino de matemtica eram privilegiadas no processo
de formao por mentoria.
Tendo em vista esses objetivos, estruturamos essa dissertao em quatro captulos que
apresentaremos adiante, direcionando as discusses em torno de uma reviso de literatura, da
abordagem terico-metodolgica utilizada, os depoimentos gerados e os exerccios analticos
nessa pesquisa.
No primeiro captulo buscamos apresentar um apanhado geral sobre o que se tem
pesquisado, nos ltimos tempos, no campo de formao de professores que ensinam
Matemtica no pas. A fim de compor esse cenrio buscamos discutir, segundo nossas
escolhas, sobre: o que pesquisadores, que tem se dedicado a realizar um mapeamento e/ou o
estado da arte, sinalizam; de que forma tem aparecido elementos ou aspectos referentes ao
nosso objeto de investigao nos trabalhos voltados para a formao de professores,
especificamente, produzidos com narrativas. Embora esses trabalhos, utilizando-se ou no denarrativas, voltam-se para perspectivas que algumas vezes se aproximam da nossa
investigao, ainda no encontramos trabalhos que tematizem a proposta que aqui
apresentamos. Nesse contexto buscamos elementos que nos orientem a compreender, de
forma mais adequada, esse campo de formao que investigamos.
O segundo captulo apresenta reflexes tericas e metodolgicas que fundamentam o
desenvolvimento dessa pesquisa. Num primeiro momento, discutimos a pesquisa qualitativa
no campo da Histria da Educao Matemtica em articulao com a metodologia histriaoral. A partir disso, propomos delinear pressupostos historiogrficos, dialogando com
pesquisadores de diversas reas que fundamentam a histria oral como abordagem
metodolgica. Tambm podero ser vislumbrados, nesse captulo, os procedimentos
metodolgicos que orientaram o caminhar dessa investigao e como essa metodologia se
mostrou (olhando para aspectos tcnicos, procedimentais e alguns cuidados necessrios)
significativa na pesquisa aqui relatada. Olhar para o percurso metodolgico em nossa pesquisa
discutir como essa teoria metodolgica se mostrou para ns enquanto pesquisadores, como
ela se tornou outra ao ser significada e utilizada em formao e contexto especficos. Nesse
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sentido, discutimos alguns cuidados e posturas adotadas, conscientes ou no, pela autora
dessa pesquisa diante de um caminhar metodolgico que se mostra significativo no campo da
Educao Matemtica, refletimos sobre algumas potencialidades da metodologia histria oral
e esboamos o movimento analtico a que nos dedicamos.
O terceiro captulo apresenta as entrevistas estruturadas na verso de textualizao,
tendo como pano de fundo os depoimentos orais gerados. So seis narrativas de professores
da instituio de ensino.
O quarto e ltimo captulo esboa dois movimentos analticos que evidenciam
alteraes na postura dessa pesquisadora fomentadas pela pesquisa. Estes movimentos
pretendem explicitar formas de compreenso disparadas/desenvolvidas pela autora dessa
pesquisa ao longo do mestrado. O primeiro deles busca exercitar um olhar da autoraefetivamente presente, ao longo da pesquisa, sobre a temtica relaes de poder como
unidirecional, de cima para baixo. Considerando o desconforto da prpria autora, frente aos
estudos realizados no Grupo de Pesquisa, quando se percebia advogando por essa perspectiva,
optamos por coloc-lo para fora, reforando seus tons, suas marcas de modo que um segundo
movimento, de desconstruo desse primeiro, fosse possvel e desejvel. Desse modo, o
primeiro movimento discute a mentoria focando uma perspectiva de discurso pautado em um
poder central, que vem de cima para baixo e o segundo busca articular discursos e contradiscursos sobre a prtica de mentoria evidenciando linhas de foras multidirecionais. Este
ltimo movimento estrutura-se a partir de dois exerccios: o primeiro de uma anlise por
singularidades de cada narrativa produzida e o segundo que busca, considerando essas
singularidades, compreender as relaes de poder constituintes de uma (mltipla) noo de
mentoria.
A dissertao finalizada com algumas consideraes sobre a pesquisa
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1. FORMAO DE PROFESSORES
Para aqueles que querem ingressar na carreira do magistrio a formao uma
necessidade bsica6
e, desse modo, corrobora com um afastamento da ideia de magistriocomo misso ou vocao. Essa formao (institucionalizada/regulamentada) ocorre em um
momento identificado como formao inicial, que o primeiro contato que o futuro professor
tem com discusses tericas e metodolgicas relacionadas ao ensino e aprendizagem da
disciplina que ir desenvolver na educao bsica. Em momento posterior, so reconhecidas
prticas de formao continuada, que acontecem como uma atualizao ou aprofundamento
das informaes e conceitos recebidos na formao inicial.
Este texto se estrutura a partir de uma busca por compreender qual possvel cenriotem sido delineado para a formao de professores de Matemtica quando consideramos
pesquisas do tipo estado da arte e, de modo mais especfico, pesquisas que trabalham com
experincias particulares de formao a partir de narrativas. O objetivo desse captulo,
portanto, problematizar a pesquisa aqui em desenvolvimento junto a um cenrio
investigativo sobre a formao de professores.
1.1 MAPEAMENTOS DE PESQUISAS SOBRE A FORMAO DE PROFESSORES QUE
ENSINAM MATEMTICA
Nos ltimos anos a quantidade de pesquisas que tratam sobre a formao de
professores que ensinam Matemtica tem aumentado consideravelmente e alguns
6 A lei n. 5.692, de 1971, que rege o perodo aqui estudado j exigia como formao mnima para o magistrio:formao de nvel de 2 grau (habilitao especfica de 2 grau), destinado a formar professores do ensino do
1 grau, da 1 a 4 srie; formao de grau superior no nvel de graduao ou licenciatura curta, destinado aformar professores para lecionar em todo o 1 grau e formao em nvel superior em licenciatura plena,destinado a preparar professor de disciplina em todo o ensino de 1 e 2 graus (BRASIL, 1971). A nova LDBde 1996, Lei 9394, incorpora alguns itens da lei anterior, redesenhando o quadro da formao de professoresexigindo a formao em nvel superior para professores da Educao Infantil e das sries iniciais do EnsinoFundamental. importante ressaltar que nas duas leis h brechas para a atuao do professor Leigo(profissional sem habilitao mnima). Como, por exemplo, no caso da Lei de 1971. [...] Art. 77. Quando aoferta de professores, legalmente habilitados, no bastar para atender s necessidades do ensino, permitir-se-que lecionem, em carter suplementar e a ttulo precrio: a) no ensino de 1 grau, at a 8 srie, os diplomadoscom habilitao para o magistrio ao nvel da 4 srie e 2 grau; b) no ensino de 1 grau, at a 6 srie, osdiplomados com habilitao para o magistrio ao nvel da 3 srie de 2 grau; c) no ensino de 2 grau, at asrie final, os portadores de diploma relativo licenciatura de 1 grau. Pargrafo nico. Onde e quando persistira falta real de professores, aps a aplicao dos critrios estabelecidos neste artigo, podero ainda lecionar: a)
no ensino de 1 grau, at a 6 srie, candidatos que hajam concludo a 8 srie e venham a ser preparados emcursos intensivos; b) no ensino de 1 grau, at a 5 srie, candidatos habilitados em exames de capacitaoregulados, nos vrios sistemas, pelos respectivos Conselhos de Educao; [...] (BRASIL, 1971).
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pesquisadores tm se dedicado a mapear o que vem sendo realizado, em termos de pesquisa,
sobre essa temtica em diferentes momentos da histria.
Considerando nosso interesse em compreender um pouco melhor esse cenrio, para,
ento, termos elementos que nos direcionem a discusses sobre o tipo de formao que
queremos caracterizar nessa presente pesquisa e considerando os diversos autores que atuam
nesse mbito, daremos destaque a alguns trabalhos que foram realizados no campo da
Educao Matemtica e que constroem mapeamentos indicando direes e opes na pesquisa
sobre formao docente.
Ferreira (2003), em seu estudo e nos de seu grupo de pesquisa7, apresenta um
panorama das pesquisas que versam sobre o tema formao de professores que ensinam
Matemtica, mais especificamente, nas dcadas de 1970, 1980 e 1990. O foco nesse texto discutir a trajetria de pesquisas que versam sobre formao de professores tanto no mbito
internacional (mais especificamente dos Estados Unidos), como das produes brasileiras
(teses e dissertaes), at 2000, que remetem a questes polticas, sociais, tericas e
epistemolgicas.
No que se refere s pesquisas internacionais, segundo a autora, a dcada de 1960
marcada pela ausncia de pesquisas sobre o tema. Nesse sentido, era difcil compreender
como se dava a formao de professores naquela poca. Um dos fatores atribudos a issodeve-se pouca relevncia, dada pelos governantes, sobre o foco em formao de professores
e pela falta de investimentos em polticas pblicas. J no final da dcada de 1970, a principal
caracterstica das pesquisas educacionais que estas possuam cunho quantitativo e
investigavam a eficincia de diversos mtodos para treinar professores em tarefas especficas.
Ferreira (2003) menciona que a apreenso central era modelar o comportamento do professor
e examinar os efeitos de determinadas estratgias de ensino (p. 21). Ainda enfatiza que a
7 As ideias apresentadas em seu artigo partem da tese de doutorado da autora, dos estudos advindos daparticipao no Grupo de Estudos e Pesquisas sobre Formao de Professores de Matemtica (GEPFPM) e danecessidade em compreender/conhecer melhor o que se tem pesquisado no campo de formao de professores edo desenvolvimento profissional de professores de Matemtica.Nos estudos do grupo GEPFPM, criado por ps-graduandos da rea de Educao Matemtica da FE/Unicamp durante o segundo semestre de 1999, sorealizadas leituras e discusses que englobam o tema formao de professores, como tambm discussesenvolvendo aportes terico-metodolgicos acerca da investigao sobre formao e desenvolvimentoprofissional de professores de Matemtica. Dentre as contribuies do grupo GEPFPM, Ferreira (2003) ressalta aparticipao no I SIPEM (Seminrio Internacional de Pesquisa em Educao Matemtica, ano de 2000), em quefoi apresentado um trabalho que versa sobre um levantamento do estado da arte da pesquisa sobre formao deprofessores que lecionam Matemtica. Este trabalho trouxe contribuies significativas para os pesquisadores
atuantes neste campo, recuperando boa parte da produo brasileira sobre o tema. Esse grupo coordenado,atualmente, pelo professor Dr. Dario Fiorentini. Fonte: . Acesso em: 05 de Mai2014.
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perspectiva da pesquisa dessa poca, centrava-se na questo: o que um ensino eficiente?,
orientando os estudos de programas de formao inicial e continuada.
As questes e temas que orientavam os estudos no campo de formao de professores
foram ampliados em 1980, emergindo, a partir de ento, uma grande variedade de
metodologias e o interesse de outras reas como, Antropologia, Sociologia e Filosofia por
esse campo. Nesse contexto, aspectos importantes emergiram, como as influncias do curso
de formao de professores sobre o desenvolvimento cognitivo e moral do professor. Em
meados dessa dcada, ocorreram mudanas no campo da formao de professores em diversos
pases potencializando diferentes ideias. Uma delas concebia a formao como treinamento a
ser encaminhado por um profissional experiente, acreditava-se que o desenvolvimento das
habilidades s seria possvel por meio da prtica (FERREIRA, 2003, p. 22). Outra ideia erade que a formao era sinnimo de educao, no sentido de ensinar uma profisso, sendo que
nessa concepo a formao seria desenvolvida no contexto da universidade. Para a referida
autora, embora tenha ocorrido, em seus termos, um avano nos estudos sobre a formao de
professores, h muito se tornou evidente que no conseguiam abranger toda a complexidade
da cultura da sala de aula e que suas propostas no alcanavam os resultados esperados. (p.
23).
No Brasil, as pesquisas sobre formao de professores tiveram um incio tardio comrelao a outros pases. Ferreira (2003) aponta que, at meados de 1980, pouco havia sido
escrito sobre a formao de professores de Matemtica no pas. A partir dessa poca, esse
tema torna-se um dos mais ativos. Ferreira fortalece essa afirmao descrevendo a tese de
Fiorentini (defendida em 1994) que amplia esse quadro fornecendo elementos importantes
referentes s pesquisas sobre formao de professores de Matemtica no Brasil. Dario
Fiorentini realizou um inventrio da produo acadmica na rea de Educao Matemtica no
pas, analisando 204 teses e dissertaes produzidas nos cursos de ps-graduao no perodode 1960 a 1990. Nesse estudo, o autor focaliza as tendncias temticas, terico-metodolgicas
e questes dos pesquisadores. Desse trabalho, Ferreira (2003) destaca que, entre as diversas
reas da Educao Matemtica, o tema de formao de professores aparece em 34 dos 204
trabalhos analisados por Fiorentini, sendo classificados em trs categorias: formao inicial,
formao continuada em servio e competncias tcnicas do professor.
Esse levantamento, que foi iniciado por Dario Fiorentini, indica que os primeiros
trabalhos acadmicos sobre formao de professores de Matemtica comeam a surgir em
meados de 1970, a partir de dissertaes desenvolvidas em programas de ps-graduao em
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Educao. Desses trabalhos, emergiram temas que foram relacionados em trs categorias,
conforme Ferreira (2003):
estudos diagnsticos dos cursos de licenciatura;estudos comparativos acerca das influncias de determinadas caractersticas
dos professor sobre o desempenho dos alunos;estudos avaliativos acerca da eficincia de propostas de treinamento de
professores. (p.27, grifo nosso)
Interessante observar que esses temas abordados assemelham-se, em boa parte, aos
que eram estudados, na poca, em diversos pases e, segundo a autora, a principal
preocupao das pesquisas centrava-se no desenvolvimento de estratgias eficientes de
treinamento8como, tambm, em estudos que diagnosticavam e comparavam influncias do
professor com relao ao desempenho do aluno. No que diz respeito a crenas dos
professores, suas concepes e valores, no foram encontradas pesquisas sobre esses temas.
Com o surgimento de novos cursos de ps-graduao9, ocorrem mudanas significativas nesse
quadro a partir de 1980 e comeam a emergir outras temticas:
avaliao de cursos de licenciatura;atitudes de professores de matemtica diante das novas tecnologias;concepes/percepes dos professores de matemtica;
estudo sobre a prtica pedaggica dos professores de matemtica (p. 28).
Com a tentativa de superar o modelo vigente, a partir de 1980, comeou-se a
desenvolver pesquisas, nos Estados Unidos, sobre o pensamento do professor, todavia eram
pesquisas que investigavam o professor como sendo um obstculo implantao de mudanas
e no como um profissional com uma histria de vida, crenas, experincias, valores e
saberes prprios (FERREIRA, 2003, p. 23). A mudana na viso de formao e de ensino e
aprendizagem ocorreu com a percepo do professor enquanto um agente cognoscente10.
Nesse contexto, as principais questes dos pesquisadores eram:
[...] o que os professores conhecem? [...] que conhecimento essencial para oensino? [...] Desde ento, o pensamento do professor tem sido descrito dediversas formas (perspectiva,conhecimento prtico, imagem, conhecimentopessoal etc.) (FERREIRA, 2003. p.23-24).
8 As dcadas de 1950 e 1960, segundo o estudo de Pires (2008), foram fortemente influenciadas peloMovimento da Matemtica Moderna (MMM), priorizando modelos pedaggicos Teoricista e Tecnicista, emque a relao professor-aluno era centrada no professor.
9 Conforme Fernandes (2004), a dcada de 1980 foi decisiva para a Educao Matemtica no Brasil com o
surgimento de cursos, programas e pesquisas voltadas para o Ensino da Matemtica e seus entornos.10Conforme perspectivas de correntes construtivistas disseminadas por Jean Piaget, so sujeitos cognitivos, quetomam conhecimento, que aprendem.
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Segundo esta autora, pesquisas centradas no processo de aprender a ensinar dos
professores, em suas crenas, concepes e valores, comearam a ser desenvolvidas a partir
de meados de 1990, passando a analisar os processos de mudanas e inovaes com base emdimenses organizacionais, curriculares, didticas e profissionais. (p. 24)
Com a mudana no paradigma da formao de professores, as pesquisas sobre esse
campo, cresceram tanto quantitativamente como qualitativamente, tal que o professor passa, a
partir da, a ser considerado um elemento importante do processo de ensino-aprendizagem.
Seguindo esse mesmo mote, o levantamento realizado por Passos (2009), assinala que a
formao continuada passa a ser foco de discusso somente aps uma dcada do foco da
licenciatura ter se consolidado. Segundo o corpus de sua investigao as propostas deformao so planejadas por diversas abordagens. Iniciam-se como uma receita de como
ensinar determinados contedos, passam pelo levantamento de concepes de professores e
alunos sobre alguns contedos e movem-se, atualmente, nas direes de levar o professor a
pesquisar a prpria prtica (PASSOS, 2009, p. 299). Nesse sentido, constatou-se a transio
de um contexto de treinamento do professor para um convite reflexo.
Ferreira (2003) destaca que, a partir da, ocorrem transformaes no que tange ao tema
treinamento/formao de professores, no sentido de que algumas pesquisas comeam a
perceber o professor de Matemtica, identificando e discutindo suas percepes, concepes,
crenas e valores a ponto dele ser visto como um agente importante no processo de ensino-
aprendizagem. Essa tendncia ganhou fora no incio da dcada de 1990. Segundo a autora, o
paradigma do pensamento do professor ganha espao num movimento em que os
pesquisadores passam a se interessar pelo que os professores pensam sobre sua prpria
formao, como avaliam essa formao partindo da prtica. Esses estudos apresentaram
abordagens metodolgicas e tericas diversas.
Aps trs dcadas de pesquisas, analisadas, sobre formao de professores que
ensinam Matemtica foram desenvolvidas inmeras investigaes cujo principal objetivo era
conhecer a licenciatura, identificar seus problemas e propor alternativas (FERREIRA, 2003,
p. 30). A autora tambm discute que o processo de formao acadmica tem sido um dos
principais temas das pesquisas que versam sobre formao de professores de Matemtica no
pas.
No levantamento realizado por Andr (2009) indica que nos anos de 1990, a maior
parte das pesquisas (72%) relacionadas ao tema formao de professores, investigavam cursos
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de formao inicial e, dentre os mais investigados esto os cursos de formao de nvel mdio
(Escola Normal).
A tendncia de investigar cursos (com incio nos anos 1980) de licenciaturas retorna
com vigor nos ltimos anos da dcada de 1990, preocupando-se com disciplinas especficas,
estgios supervisionados, dentre outros. Embora haja uma permanncia em termos do foco na
formao inicial quando observadas as dcadas de 1980 e 1990, h uma mudana, como j
apontado anteriormente, em relao perspectiva com que esses estudos se efetivavam:
passa-se a compreender essas questes a partir da viso do profissional, de suas concepes.
A formao continuada aparece nas pesquisas alterando-se de forma significativa ao
longo das dcadas de 1970, 1980 e 1990. Conforme Ferreira (2003), a princpio, as pesquisas
envolviam estudos referentes a projetos de treinamento, reciclagem, atualizao ou mesmoadestramento, posteriormente passa a projetos de parceria entre formadores de professores e
professores (p. 32). Ainda dentro desse foco, a autora destaca dois tipos de estudos: os que
so voltados para o uso de tecnologias e os estudos voltados para o desenvolvimento de
propostas curriculares.
Outro trabalho, em destaque, refere-se ao artigo publicado em 2002 por Dario
Fiorentini em parceria com outros pesquisadores do Grupo de Estudos e Pesquisas sobre
Formao de Professores de Matemtica (GEPFPM). Fiorentini et al (2002) apresentam umbalano de 25 anos de pesquisas brasileiras que foram produzidas no perodo de 1978 a 2002,
fazendo um levantamento de 112 teses e dissertaes. Esse levantamento tem o foco na
formao de professores que ensinam Matemtica11e no desenvolvimento profissional.
Ao realizar este levantamento, em suas anlises, estes autores destacam dois focos
temticos que emergiram a partir do balano das pesquisas sobre formao de professores, so
eles: a Formao Inicial e a Formao Continuada.
As pesquisas sobre formao Inicial, com 59 estudos, abrangem quatro modalidades:antigo Magistrio 2 Grau; Pedagogia; Licenciatura Curta em Cincias e Licenciatura Plena
em Matemtica (Fiorentini et al, 2002, p. 141) e as sobre formao continuada contemplam
51 estudos de propostas, projetos, cursos, trajetrias e experincias individuais ou coletivas
que tm como preocupao bsica a atualizao ou desenvolvimento profissional dos
professores (ibidem, p. 148).
11
Termo usado para contemplar, alm dos Professores de Matemtica, professores que lecionam na EducaoInfantil e sries iniciais do Ensino Fundamental. Embora no tenham formao especfica, em Licenciatura emMatemtica, ensinam Matemtica e isso requer uma formao.
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possveis aproximaes, ou no, com o tema da nossa pesquisa18. Tais pesquisas
(desenvolvidas na dcada de 1980) apontaram que a formao para professores em servio,
era concebida como treinamento por meio de um profissional mais experiente; buscavam
estratgias eficientes no treinamento de professores e investigavam projetos de
treinamento/reciclagem/adestramento para professores de Matemtica. Contudo, a nossa
pesquisa se difere dessas listadas, por tratar-se de um modo de formao que no havia uma
regulamentao, certificao, horrios marcados, um padro especfico de formar o professor.
A busca por aproximao trazia, ento, efetivo distanciamento, mas indicava como
possibilidade o redirecionamento do olhar para a questo da experincia, da prtica docente e,
com esse, para trabalhos desenvolvidos a partir de narrativas de professores.
1.2 FORMAO DE PROFESSORES NOS TRABALHOS COM NARRATIVAS.
As narrativas enquanto estruturao da experincia como relato podem trazer
prticas de subverso ou elementos no institucionais que, por vezes, no so encontrados em
outros tipos de documentos. De acordo com Bolvar (2002), para podermos entender algumas
caractersticas humanas preciso narr-las por intermdio de uma histria.
Para tentar compreender essa dimenso nos voltamos para a coletnea de Vicentini etal (2008), Professor-Formador: histrias contadas e cotidianos vividos e Garnica (2014),
Cartografias contemporneas: mapeando a formao de professores de matemtica no
Brasil. Esses pesquisadores discutem perspectivas de formao por meio de narrativas de:
professores do ensino bsico, das redes municipais ou estaduais de ensino; do Ensino
Superior; coordenadores pedaggicos; orientadores pedaggicos; assessores educacionais
entre outros.
Na obra de Vicentini et al (2008), a inteno dos autores foi organizar uma coletneamobilizando experincias de formao vinculadas figura do professor-formador, sendo que
este est envolvido, principalmente, com formaes continuadas em instituies pblicas.
Esse profissional (o professor-formador denominado, por vezes, de Assistente Tcnico
Pedaggico) designado para trabalhar com a formao continuada, lindando com
professores de diversos nveis, escutando suas queixas, promovendo cursos, palestras,
combinando saberes, socializando suas experincias, sendo graduados, mestres ou doutores
18
A partir da anlise dos trabalhos de mapeamento, essa inteno surgiu como forma de buscar umacompreenso sobre essa perspectiva de formao que apareceu nas dcadas de 1970 e 1980, tendo comoprincipal caracterstica a noo de formao como treinamento.
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que atuaram como professores antes de serem formadores. A sua ao situa-se entre formao
e interveno no estabelecimento de ensino, no projeto disciplinar, interdisciplinar e
transdisciplinar.
Um trabalho nessa coletnea, de Soligo e Prado, intitulado Quem forma quem,
afinal?, tem seu principal foco voltado para depoimentos de diferentes19profissionais que
narram suas experincias.Destacamos a narrativa da professora iniciante, Tamara Abro Pina
Lopretti, que relata a relevncia de suas experincias com os estudos e pesquisas durante o
processo de desenvolvimento pessoal e profissional.
[...]. Assim, na busca pelo dilogo das experincias de formao com osacontecimentos da profisso, com leituras e referenciais tericos que me
ajudem a compreender o que estou vivenciando, na partilha e troca comoutras colegas de profisso, na observao de professoras mais experientes(mas que comungam dos mesmos princpios educativos), e principalmente,na observao atenta, no questionamento e registro permanente dosacontecimentos e vivncias da minha prpria sala de aula tomando-a comolugar privilegiado para ensinar, aprender e pesquisar que tenho alcanadoresultados significativos como professora []. (VICENTINI et al, 2008, p.21)
A busca por exemplos no exerccio da profisso e a valorizao dos conhecimentos de
profissionais mais experientes do indcios para outros olhares sobre a formao docente,
mais prximos daquilo que buscamos investigar.
Esse texto, tambm, discute algumas modalidades formativas vinculadas a aes do
processo pedaggico escolar, no que tange orientao e ao acompanhamento pedaggico da
equipe de professores. Em um dos relatos, emerge a ideia da importncia do trabalho de
orientao pedaggica junto ao corpo docente, como podemos observar no depoimento de
Mrcia Alexandra Leardine
Estar em sala de aula muitas vezes causa a sensao de isolamento, pareceque estamos ilhados, vem a impresso que as exigncias so tantas e osprogramas so to pesados que no d tempo de se dedicar a outra coisa.[] Por isso, o papel da coordenadora pedaggica da escola onde trabalhotem sido fundamental para a nossa equipe, auxiliando-nos na superao deresistncias ao trabalho coletivo, explorando nossas singularidades,incentivando a cooperao profissional, as parcerias, o dilogo, o debate, areflexo, o estudo. Alm disso, h o apoio ao registro do trabalho e avalorizao dos saberes provenientes de nossa prtica, o que tem sidoessencial para todos ns. (VICENTINI et al, 2008, p. 41)
19Professor alfabetizador iniciante, professor experiente e orientador pedaggico.
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As reflexes tomadas por essa professora, acerca do trabalho que realizado em
conjunto com a coordenao pedaggica, abarcam aspectos formativos imersos nessas
relaes. Como podemos observar no depoimento de Renata Barrichelo Cunha que narra
situaes quando se posiciona como professora e, em um outro momento, quando passou a ser
coordenadora na mesma instituio.
Minhas primeiras experincias como professora na Educao Infantil foramcomo auxiliar e as colegas com as quais convivi constituram-se comopresenas significativas no meu processo de formao. [] Depois de umano e meio como auxiliar, assumi minha primeira classe de Maternal. [] 'Oque que eu fao agora?' foi sempre a pergunta instigadora diante doenfrentamento do novo e que me mobilizava a buscar e construir jeitos defazer e pensar sobre o meu trabalho. As dvidas maiores sempre eram as
relacionadas aos contedos, isto , ao como ensinar. Pude sempre contarcom as parcerias mais experientes da escola e com as reunies pedaggicas,mas o que mais me ajudou na construo de significados das dificuldades eaprendizagem de coisas que eu no sabia foram os encontros de orientaoindividual com as coordenadoras. As relaes com as duas coordenadorasque tive nessa poca, alm de respeitosas e afetuosas, foram pontuadas pelaescuta e pela confiana antecipada. [] Esse modelo de coordenao euincorporei, inclusive, na minha prpria prtica como coordenadora:rascunhar os conceitos e atividades com as professoras (estudar junto);registrar num caderno especfico as dvidas, combinados, coisas aprovidenciar [] Aprendi com as minhas coordenadoras e com essesassessores 'fazendo junto': perguntando, registrando, estudando, criando
roteiros, desenvolvendo problemas, produzindo material didtico [].(ibidem, p. 42)
A professora Renata narra suas experincias profissionais relacionado outros
educadores que foram significativos no seu processo de se constituir professora. Percebe-se,
nesse relato, uma relevncia ao trabalho que feito em parceria com outros profissionais mais
experientes, no caso com coordenadoras que acompanharam a professora nos momentos
individuais, influenciando, assim, sua prtica como coordenadora a partir das aes
observadas quando ainda era professora.Nesse contexto, Soligo e Prado discutem que as relaes colaborativas estabelecidas
por profissionais num ambiente escolar so um processo de formao que envolve dedicao,
persistncia, disposio para ouvir e vontade de produzir transformaes necessrias para a
aprendizagem desse profissional.
Fazendo meno ao professor-formador (profissional que podemos identificar a
partir dos estudos reunidos na obra de Vicentini et al (2008) como sendo aquele que
proporciona uma formao em espaos e contextos vinculados a Secretarias de Educao
exercendo formaes continuadas), podemos inferir que nas pesquisas produzidas com
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narrativas, especificamente as discutidas nessa obra, experincias so narradas no interior do
ambiente escolar apontando a simples observao de um profissional mais experiente, seja ele
um colega de trabalho (professor), um coordenador pedaggico, ou mesmo, a observao de
uma aula modelo por meio de um DVD, como processos de formao que ocorrem de
forma individualizada, a partir de necessidades que partem do prprio sujeito. Vale ressaltar
que esses processos esto direta ou indiretamente vinculados a programas regulares
promovidos por um rgo pblico. Essas categorias aproximam-se de aspectos em nossos
depoimentos, no momento em que o professor ao ser orientado por um profissional
experiente, incorpora as aes observadas/orientadas em sua prpria prtica, entretanto se
distancia nos aspectos institucionais, de modo a no se vincular a programas de formao seja
em redes municipais ou estaduais.Como vimos, o trabalho com narrativas permite deslocar o foco apontando para
prticas formativas diversas e contnuas e, por essa razo, consideramos oportuno dialogar,
tambm, com Garnica (2014). Como proposta de mapeamento essa obra aborda estudos sobre
a formao de professores de Matemtica no Brasil, porm de natureza historiogrfica20. As
pesquisas desenvolvidas no projeto de Mapeamento se propem a investigar a formao e
atuao de professores de Matemtica no Brasil, ao longo do tempo, utilizando,
principalmente, testemunhos orais e fontes de diversas naturezas (documentos institucionais,legislaes, fotografias, atas publicaes escolares, livros didticos etc.). Esse projeto busca
elaborar registros das condies em que ocorreu/ocorrem a formao e atuao de professores
de Matemtica e, sua relevncia, nesse contexto, se d no modo em que o projeto investiga as
formas como se vem dando a atuao desses professores, como eles se vm apropriando dos
materiais didticos, como vm seguindo ou subvertendo as orientaes legais em vigor
(GARNICA, 2014, p. 16).
As narrativas elaboradas nos trabalhos do Mapeamento so textos produzidos pormeio da oralidade, que assumem formas e estilos diversificados construdos a partir da leitura
de cada pesquisador. So narrativas histricas que emergem das memrias de colaboradores,
memrias essas que so transformadas pelas aes prprias da investigao, materializadas
em documentos resultantes de entrevistas, juntamente com fontes diversas.
20Para composio desse trabalho, foram elaborados textos objetivando construir um cenrio do Projeto do
Mapeamento da Formao e Atuao de Professores de Matemtica no Brasil estruturado pelos membros doGHOEM Grupo Histria Oral e Educao Matemtica.
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Um ponto interessante relatado pelos autores, no tocante temtica do projeto, diz
respeito diversidade de contextos em que a formao e atuao de professores de
Matemtica so abordadas na pesquisa. Alguns focalizam cursos que formam docentes em
instituies de ensino superior, outros dedicam-se a abordar esse tema em regies especficas
ou em escolas especficas, outras tomam como foco principal o prprio professor,
independente da instituio em que se formou, ou regio e escola que atua, tambm, h
pesquisas que contemplam a formao de professores do Ensino primrio, no nosso caso alm
de contemplar um estudo com professores do Ensino Primrio, a pesquisa se restringe a uma
nica instituio do ensino privado.
O principal aspecto desse projeto, em proximidade com o exerccio aqui relatado,
corresponde s possibilidades em perceber atores que, ao relatar suas experincias, revelampontos de vistas que em outros tipos de documentos no seriam contemplados.
Nas pesquisas brasileiras, as fontes sobre as vidas dos atores emmapeamentos similares ao que propomos tm sido, majoritria e usualmente,os estticos registros escolares (dirios de classe, boletins de supervisores deensino, registros de exames, atas e livros de presena) que, embora tambmsejam materiais importantssimos em nossos estudos, pouco ou nada falamsobre as expectativas singulares desses atores sobre a profisso, seusencantamentos e desencantamentos, suas ansiedades, seus motivos e
justificativas para terem desenvolvido suas experincias como asdesenvolveram. No falam, via de regra, das imposies a que foramsubmetidos, das formas de subverso que implementavam (ou no), daspossibilidades de formao a que recorrem, das limitaes polticas,geogrficas etc. Ou antes, falam desses enfrentamentos mas sempreuniversalizando o ser professor e explicando sua trajetria a partir de umemaranhado de causas e consequncias de uma conjuntura maior, como aeconmica e poltica. Tanto quanto auscultar os espaos tutelados, para aconfigurao de um cenrio assim preciso ouvir tambm os espaosintersticiais (GARNICA, 2014, p. 50-51)
Desse modo, as histrias construdas a partir desse projeto abrangem uma colocaodo foco sobre cenrios muito diversificados, dos pontos de vista humano, poltico, econmico,
sociocultural, escolar, permitindo, assim perceber conexes que no se evidenciam quando a
formao e a atuao de professores de Matemtica no Brasil so abordadas na perspectiva
genrica e universalizante.
A pesquisa, aqui, apresentada coloca-se em consonncia aos trabalhos desenvolvidos
no GHOEM, por corroborar com o projeto de mapeamento da formao e atuao de
professores que ensinavam/ensinam Matemtica no Mato Grosso do Sul. Desse modo,
procuramos olhar uma perspectiva de formao que, embora reconhecendo em algumas
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narrativas especficas a existncia de aspectos similares, esses no vem sendo tematizados na
maior parte das pesquisas de que temos nos aproximado. Trata-se da perspectiva de mentoria.
Nessa direo, a partir do momento que consideramos diversas pesquisas sobre formao de
professores, a ideia da mentoria (aparentemente discutida como uma prtica de formao),
no explorada.
Diante disto propomos investigar uma possibilidade de olhar para uma formao por
mentoria junto a professores que ensinavam Matemtica e que nos proporcionam a
compreenso das prticas de apoio e subverso a modelos clssicos e institucionais de
formao inicial e continuada, focos das pesquisas realizadas na linha de Formao de
Professores e delineadas brevemente acima.
2 HISTRIA ORAL: PERSPECTIVA, CONCEPES E ABORDAGEM
Consideramos que uma metodologia de pesquisa, pela natureza que lhe atribumos e
esboaremos mais adiante, no tem paternidade, no sentido de pertena a uma rea qual se
tem que prestar contas sempre que ocorre um processo de mobilizao. Desse modo, a
metodologia aqui apresentada prpria deste trabalho, dessa pesquisadora e, portanto,
respeita seus processos de amadurecimento, suas necessidades de dilogo e as necessidades
que seu percurso investigativo impe.
Nesse sentido, houve uma primeira necessidade em diferenciar posturas, encontrar
marcas prprias daquela que reconheceramos como uma postura qualitativa de pesquisa, ou
como em geral referenciada, de Pesquisa Qualitativa.
Dialogando com Goldenberg (2003), o debate entre a sociologia positivista e a
sociologia compreensiva pareceu um bom caminho para identificar as marcas pelas quais
buscvamos.
De um lado, o modelo de pesquisa positivista divulgado por Augusto Comte (1789
1857) que foi significativamente refutado pelos pesquisadores qualitativos. Nesse
movimento as reas do conhecimento passam pelo critrio da verdade: s considerado
verdade o que pode ser submetido experimentao. Nessa concepo a teoria neutra e
isenta de subjetividade. Para os positivistas a cincia nica e verdadeira e, portanto, pode ser
comprovada por um pesquisador que se mantm objetivo e imparcial, evitando, assim,
contaminaes da pesquisa por suas crenas, percepes, preconceitos e julgamentos. Sendo
assim, o sujeito e o objeto do conhecimento, nessa abordagem, estavam sempre separados.
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Essa noo, ou sua atribuio ao positivismo, certamente no uma discusso inovadora, mas
necessria quando, no final desse processo, reconhecemos ser esta a postura com que a
autora dessa dissertao se identificava no incio do mestrado: uma cincia pura, objetiva.
Desse modo, distanciada temporalmente daquele momento, possvel pensar em um processo
fundamental formao do pesquisador: o de desconstruo.
Por outro lado, a sociologia compreensiva, conforme afirma Goldenberg (2003) busca
por procedimentos metodolgicos que se diferenciem daqueles usados nas cincias fsicas e
matemticas. Isso porque, havia o reconhecimento de que o objeto de estudos das cincias
sociais lida, principalmente, com valores, emoes e subjetividades. Dentro dessa perspectiva
podemos associar o paradigma positivista a pesquisas de carter quantitativo, que abrangem a
ideia de racionalidade, que tambm entendida como quantificao. A pesquisa quantitativa,de modo recorrente, vem sendo articulada a noes de objetividade, mensurao, definio de
conceitos e principalmente com o rigor cientfico.
A preocupao com esse processo traz outra identificao com outro discurso que no
o do positivismo, mas que vem da sociologia compreensiva, que est associado ideia de
pesquisa qualitativa. Assim, muda-se a concepo em dizer que no o resultado, mas sim o
processo que importa, desse modo surge, com essa percepo, outra possibilidade de
investigao.Quando algumas dessas noes comeam a ser confrontadas para o surgimento de uma
abordagem dita qualitativa, os argumentos de resistncia apontam como potencialidades,
daquele modelo que colocava a superar, a existncia de regras, a segurana e objetividade por
essas garantida, a confiabilidade absoluta, a produo de uma verdade cientfica e, portanto,
nica e o discurso de que a medida era algo bomse altera para algo como s bom se pode
ser medido(Cf. GARNICA, 2011). Nesse contexto, como podemos caracterizar uma
pesquisa qualitativa? Para Goldenberg os investigadores, nessa perspectiva, so sujeito eobjeto de sua prpria pesquisa, ou seja, existe, na abordagem qualitativa um posicionamento
de reconhecer a subjetividade inerente prtica do pesquisador que faz, no limite, que este
analise, investigue seu prprio olhar sobre o mundo. A diferena entre as duas abordagens
aqui brevemente discutidas no est na existncia ou no de uma subjetividade, mas no seu
reconhecimento. Considerando a abordagem qualitativa, esse reconhecimento traz uma
nova necessidade de expor e justificar escolhas, de explicitar valores que permitam ao leitor
identificar quem e de onde se fala.
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Podemos compreender melhor essa esfera, segundo a concepo de Garnica (2006)
afirmando que
[] o adjetivo qualitativa estar adequado s pesquisas que reconhecem:(a) a transitoriedade de seus resultados; (b) a impossibilidade de umahiptese apriori, cujo objetivo da pesquisa ser comprovar ou refutar; (c) ano neutralidade do pesquisador que, no processo interpretativo, vale-se desuas perspectivas e filtros vivenciais prvios dos quais no consegue sedesvencilhar; (d) que a constituio de suas compreenses d-se no comoresultado, mas numa trajetria em que essas mesmas compreenses etambm os meios de obt-la podem ser (re)configuradas; e (e) aimpossibilidade de estabelecer regulamentaes, em procedimentossistemticos, prvios, estticos e generalistas. (p. 88)
Nessa mesma direo, Goldenberg (2003) explicita como constante esse movimentode reconfiguraes.
A simples escolha de um objeto j significa um julgamento de valor namedida em que ele privilegiado como mais significativo entre tantos outrossujeitos pesquisa. O contexto da pesquisa, a orientao terica, o momentoscio-histrico, a personalidade do pesquisador, o ethos do pesquisado,influenciam o resultado da pesquisa. (p. 45)
O pesquisador envolvido nessa perspectiva, por estar ciente das interferncias de seus
valores durante o processo da pesquisa e no momento de seleo e encaminhamento doproblema estudado, privilegia um movimento de registro de suas opes e impresses. Esse
movimento no visa generalizaes, mas um aprofundamento na questo cujo estudo foi
proposto. Esse aprofundamento local e requer um cuidado para no haver um deslocamento
do objeto em estudo em relao ao cenrio que o produziu e que este produz, explorando
ramificaes que reforam seu carter sociocultural.
Segundo as concepes apresentadas por esses autores, a histria oral pode ser tomada
como uma metodologia de pesquisa qualitativa21, cuja abordagem se compromete na
construo intencional de fontes histricas a partir de situaes de entrevista.
Embora seja um ponto comum essa aproximao com a historiografia por conta da
produo de fontes histricas, existem trabalhos que se utilizam da histria oral sem
preocupao em produzir um estudo histrico sobre as fontes produzidas.
Considerando o cenrio de discursos e contradiscursos no qual se coloca a pesquisa
qualitativa e considerando os diversos usos da histria oral (metodologia, tcnica e
21A histria oral tambm tem sido abordada como tcnica (fazendo referncia criao de arquivos orais para ocomplemento de outros tipos de fontes) ou como disciplina.
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disciplina), buscamos, inicialmente, compreender como esta se constitui como metodologia e
discorrer a respeito de sua abordagem e constituio enquanto metodologia qualitativa nas
pesquisas de cincias humanas e sociais. Um outro olhar para esse processo fez ressaltar nesse
movimento um rano de busca pela origem na histria da histria oral, o que nos fez optar por
um novo direcionamento: aquele que se preocupa em dispor consideraes acerca de como a
histria oral se constituiu nessa pesquisa.
Trabalhamos com a histria oral enquanto metodologia qualitativa de pesquisa que
tem como principal funo a criao intencional de fontes, sendo que essas fontes so
disparadas pela oralidade e comeam a se constituir em situaes de entrevistas. Por conta de
nosso interesse nessa investigao, optou-se pelo trabalho com a histria oral temtica que,
segundo Garnica (2003), se centra num conjunto restrito de temas pretendendo comporaspectos da vida/memria dos entrevistados.
A operao historiogrfica um conjunto de aes que transforma fontes em
narrativas histricas, tal que, essas, sempre se apoiam em uma determinada metodologia.
Cabe ao pesquisador no estudo da Historiografia e seus agentes, questionar-se sobre o que
escrever Histria, o que so e como so elaboradas narrativas histricas, como tambm
sustentar uma concepo de Histria e os modos de praticar Historiografia. (GARNICA et al.,
2011, p. 237.)As fontes nunca so objetivas, pois elas so atravessadas por uma subjetividade tanto
daquele que narra, quanto daquele que entrevista, quanto daquele que l a narrativa e a
compe junto ao narrador e entrevistador. Os documentos orais so resultantes de um trabalho
conjunto do entrevistador e do entrevistado. o pesquisador que escolhe com quem ir falar,
porm o interlocutor que decide se ir realizar a entrevista. o pesquisador quem seleciona
as questes do roteiro, mas o interlocutor quem decide se, o quanto ou o que vai narrar. O
resultado final da entrevista o produto de ambos, narrador e pesquisador (PORTELLI,1997b, p. 36).
O pesquisador, ao analisar as fontes historiogrficas produzidas por meio da oralidade,
cria outras fontes, estabelece novos olhares de passado ao estabelecer verses acerca do
contexto abordado pelas fontes. Esse trabalho analtico requer, por parte do pesquisador, uma
mobilizao de uma variedade de recursos/fontes. Cada um desses recursos possibilita
conhecer perspectivas e promover um dilogo entre elas. Nesse sentido, acreditamos a historia
oral ser uma abordagem qualitativa que nos proporciona novos olhares, novos encontros,
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novas perspectivas e significados que possibilitam compreender um cenrio investigativo
dentro de uma perspectiva historiogrfica.
A histria oral, enquanto metodologia qualitativa de pesquisa se coloca como uma
articulao ressonante entre procedimentos investigativos e fundamentao terica. Desse
modo, para compreendermos melhor a rea de conhecimento em que estamos envolvidos e a
metodologia que orienta o desenvolver do nosso trabalho, um breve delineamento sobre os
movimentos na rea da Histria faz-se necessrio a partir desse momento. A perspectiva
histrica, advinda desse movimento e suas abordagens fundamentam, contextualizam e
sustentam o trabalho com a histria oral pautando-se numa viso mais contempornea de
Histria e Historiografia. Trata-se da fundamentao terica que orienta a estrutura desse
trabalho. Nos tpicos que se seguem, sero delineados os encaminhamentos procedimentaisdessa pesquisa e como essas questes (olhando para aspectos tcnicos, procedimentais e
alguns cuidados necessrios) aparecem ressonantes em nosso trabalho.
2.1 HISTRIA E HISTORIOGRAFIA
Estar em estado de palavra [...] estar em estado de prontido para o nascimento
de algo, para o parto de novos temas, problemas, abordagens e conceitos. []
Estar em estado de palavra sentir prazer de criar, de inventar, de enredar, detramar, de dizer de maneira nova, de fazer ver de outro ngulo, aquele assunto jto desgastado. (ALBUQUERQUE JUNIOR, 2011, p. 259-260)
Os historiadores, escreveu Durval Muniz de Albuquerque Junior (2011), finalmente se
descobriram em estado de palavra e perderam a inocncia diante delas.
Por muito tempo as palavras, para os historiadores, era um instrumento ligado aos
fatos, aos acontecimentos. Serviam para dizer o que se passava l no passado. Para o autor, o
prprio historiador um sujeito que s existe e precisa estar em estado de palavra, para
esboar a si mesmo como sujeito de uma narrativa como, tambm, do objeto e sujeito que vaitratar.
Assim como na Literatura, a Histria s existe em estado de palavra. Entretanto, na
dcada de 1960 do sculo passado alguns autores defendiam a separao entre a Histria e a
Literatura nos textos dos historiadores, tal que caberia ao historiador abordar somente os
fatos, e aos escritores era permitida a fico, entendida como inveno dos eventos que narra.
A histria teria como compromisso a procura da verdade, a Literatura poderia ser fruto da
pura imaginao. (ALBUQUERQUE JR, 2007, p.44). As relaes entre histria e literatura eo lugar (ou lugares) que as mesmas ocupam, so muito bem discutidas pelo autor em seu livro
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Histria: a arte de inventar o passado. Durval pauta-se na discusso sobre a articulao da
Histria com a Literatura e no em uma separao entre elas.
Mesmo tendo, no sculo XIX, se separado da literatura, da fico, em nome da
cientificidade, quase dois sculos depois a historiografia descobre que no conseguiu se
afastar da dimenso literria, ficcional e artstica. A histria no conseguiu se ver livre da
literatura [...] ambas s existem em estado de palavra (ALBUQUERQUE JR, 2011, p.252).
Apesar de suas regras de produo serem distintas, ambas so consideradas formas de
construir narrativamente o tempo, os eventos, os espaos, os sujeitos, os personagens.
Tambm, como produto de tramas, enredos e fabulaes. Essas cincias existem porque os
homens necessitam de significados, de conceitos e so capazes de formular smbolos e
metforas. A histria foi uma das formas criadas pelos homens para usar a palavra e com eladar sentido a sua existncia no tempo e espao. (idem, p.257)
Os poetas conhecem as armadilhas das palavras. Os literatos sabem das artimanhas
de estar em estado de palavra, enquanto que, os historiadores acreditavam na boa inteno das
palavras, crendo que estas entrelaavam-se com as coisas, os fatos, com a realidade, estavam
destinados a falar a verdade, somente os que as desvirtuavam, a usavam de m f. Para os
historiadores as palavras podiam oferecer uma verso realista das coisas, na qual os fatos, os
eventos eram narrados, por meio das palavras, e redigidos exatamente da forma em queforam executados. Assim, mesmo penetrados pelo esprito das palavras, acreditavam que,
eram puros, imaculados, podendo voltar vida.
A partir dos sculos XVI e XVII, com a apario da imprensa, os recursos
historiogrficos (documentos impressos, fontes, objetos histricos) aumentaram
consideravelmente. Conforme Silva e Rolkouski (2006) diversos profissionais produziam
documentos que valorizavam os costumes, leis, a cultura, comrcio, finanas e a populao.
Com tais publicaes o campo da histria tambm aumentou, vrios textos histricospassaram a ser produzidos como, o estudo da cultura popular, o romance histrico, a biografia
e a autobiografia.
O incio da carreira acadmica de historiador se deu na Alemanha no sculo XIX. Os
formadores eram um grupo de classe mdia e viviam isolados em provncias longe da
realidade da vida poltica e social.
O desenvolvimento, no sculo XIX, de uma profisso acadmica do
historiador trouxe consigo uma posio social mais definida e consciente.Isso exigiu tambm que os historiadores, do mesmo modo que os outros
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profissionais, tivessem algum tipo de formao diferenciada. (THOMPSON,2002, p. 78)
No sculo XIX, quando a histria se constituiu como disciplina, o trabalho do
historiador, como j mencionado, era visto como oposto ao do literato. Acreditava-se que ohistoriador era neutro, imparcial e exercia seu trabalho de voltar ao passado desvinculado do
presente, tinha uma postura positivista, cientificista voltada para uma histria dos heris, dos
grandes nomes e acontecimentos. Contudo, as fontes orais, fotogrficas ou pictricas no
eram vistas de forma a compor um trabalho historiogrfico. J na primeira metade do sculo
XX, foi fundada a Escola de Annales, contemplando um conjunto de pesquisadores, como
Marc Bloch, Lucien Febvre, Henri Pirenne dentre outros que encorajava[m] vrias inovaes
terico-metodolgicas no mbito da Histria (como cincia) e da historiografia (como fazercientifico) (CURY, 2011, p. 17). Defendendo um novo paradigma para os estudos histricos,
aquela nova gerao de historiadores passaram [sic] a questionar a hegemonia da Histria
Poltica ibidem. Buscava-se uma nova histria, preocupada com o cotidiano, com fatos e
acontecimentos compreendidos entre as minorias. Todavia, a Nova Histria ou Histria
Nova veio com o surgimento da terceira gerao da escola de Annales, tendo como base
filosfica a ideia de que a realidade social ou culturalmente constituda (CURY, 2011, p.
20), ou seja, aproximando historiadores dos antroplogos. A histria deveria serproblematizada, partindo de questionamentos e indagaes vindas dos historiadores,
organizando e criando suas fontes. Portanto, sem problema no h histria.
Enfim, a histria se aproxima das outras cincias sociais, como a Antropologia, a
Sociologia, a Psicologia e, inevitavelmente, como afirma Albuquerque Jr., Literatura e
Histria se reencontram buscando as semelhanas que as unem e as diferenas que as
separam. A literatura vem se oferecer como signo, escritura ou inscritura do passado, no
como os historiadores pensavam sendoum resto, um fragmento ou evidncias. Anteriormente,
os historiadores acreditavam que seus objetos eram exatamente do mesmo jeito dos
acontecimentos que haviam ocorrido no passado. Com a mudana de paradigma, finalmente
tomam conscincia que s em estado de palavra podem transformar documentos em
monumentos, construir objetos, sentidos e significados aos relatos narrados de outros tempos
(ALBUQUERQUE JR, 2011, p. 253). Concordamos com Albuquerque Jr, que a
historiografia , hoje, o uso metdico, regrado e policiado pelos pares, das palavras, para com
elas estabelecermos verses do passado as quais venham incidir criticamente no presente. (p.
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257). O passado uma leitura do presente que se presentifica a partir de vrios olhares, ele
criado, inventado no presente.
Podemos afirmar, a partir de Marc Bloch, que a Histria a cincia dos homens no
tempo, que estuda/cria o passado dialogando com o presente, vivendo em comunidade, assim
aprendemos que o presente que interroga o passado e conecta com a nossa vida, com as
suas problemticas. O passado, como a Histria, uma inveno do presente, embora
ancorada nos signos deixados pelo passado (ALBUQUERQUE JR, 2007, p.33). Os homens
inventam a Histria atravs de suas aes e de suas representaes, tal que
O momento de inveno de qualquer objeto histrico seria o prprio passadoe caberia ao saber histrico tentar dar conta dos agentes desta inveno,
definindo que prticas, relaes sociais, atividades sociais produziram umdado evento. Os documentos histricos so tomados como pistas atravs dasquais se tenta rastrear o momento desta inveno. (ALBUQUERQUEJUNIOR, 2007, p. 24)
O termo inveno remete a uma dada ruptura, um corte ou a um momento inaugural de
alguma prtica, de algum costume, de alguma concepo. Na abordagem do evento histrico,
este termo enfatiza a descontinuidade, a ruptura, a diferena, a singularidade, alm de afirmar
o carter subjetivo da produo histrica e a necessidade de ampliao de fontes.
As fontes no falam por si s, elas respondem s questes feitas no presente. SegundoGarnica e Souza (2012), fontes so os resduos que um pesquisador que deseja compreender
um campo a partir de uma investigao historiogrfica dispe ou criam. Das fontes sejam
elas registros escritos, pictricos ou qualquer outra forma material que possibilite resduos de
um passado que chega at ns abordadas nas investigaes historiogrficas, existem
tambm as fontes orais, que podem ser criadas por meio de entrevistas tornando-se
documentos orais no momento em que esse registro gravado, transcrito e, portanto, gerem
documentos escritos. Uma fonte sempre criada, pois a leitura (e o leitor) que a faz dizer
alguma coisa, o leitor, no ato da leitura, que atribui significado fonte. (GARNICA;
SOUZA, 2012, p. 31)
necessrio assumir, em meio a essa discusso, que o passado sepresentifica de vrios modos, a partir de vrios olhares; de apostar naperspectiva de que o passado uma leitura (e uma leitura do presente, umacriao/inveno do presente), mas uma leitura e uma criao tornadaspossveis a partir de mltiplas perspectivas que devem vir cena como quepara esboar um jogo entre perspectivas que tm durao, o que leva tempo.(GARNICA et. al., 2011, p. 225)
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Os indcios do passado as fontes so interrogados a partir do presente, so,
inclusive, reconhecidas enquanto tais a partir de perspectivas do presente. Dependendo o que
cada pesquisador deseja estudar, coisas diferentes podem ser ditas a partir de um mesmo
documento. Um documento abre perspectivas de anlise, mas dificilmente d conta, sozinho
de montar todo um cenrio. (GARNICA; SOUZA, 2012, p.33).
Por meio desta metodologia de pesquisa, pretende-se construir verses histricas a
partir de fontes orais e outras possveis fontes, pelas quais se espera compreender e compor
um cenrio da formao por mentoria que era exercida ao olharmos por um tipo de formao
de professores.
2.2 HISTRIA ORAL: ENTRE PROCEDIMENTOS, CUIDADOS E ALGUMASPERMANNCIAS
A voz segue com cautela o deslindar do passado e pouco a pouco descreve experincias vividas. As palavras
cartografam vivncias a partir de um tempo ausente que se tornou presente pela linguagem. Esse um tempo
que nos arrasta em seus passos midos e, no dizer de Lya Luft, devora tudo pelas beiradinhas, roendo,
corroendo, recortando e consumindo. Na esteira do tempo (Cronos), esse devorador age e tudo consome; suairm, a memria (Mnemsine), guarda os momentos mediante a razo narrativa, presente nos sujeitos atravs
da linguagem. Esta expressa, na razo narrativa, um instrumento de poder, ausncia e seduo.
A ausncia est subordinada ao que j se passou na vivacidade do momento vivido. Torna-se presente pela
memria, objetivando-se atravs da linguagem falada no ritual da narrativa. Dessa forma, tem-se a ausnciacomo sinalizadora
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