1. Poluição Atmosférica Associada à Produção de Ferro e Aço
1.1. Importância do aço
Indubitavelmente, o aço é um artigo cada vez mais importante nos tempos
atuais. A presença desta liga é notada desde bens duráveis até a construção de
máquinas e equipamentos que possibilitam a existência da humanidade. Imaginar
o mundo contemporâneo sem a presença de uma ínfima quantidade deste valioso
bem é um plano utópico; além de ser parâmetro auxiliar na avaliação da força
econômica de uma nação, através do consumo per capita de aço (NOLDIN Jr,
2002).
O aço pode apresentar em sua composição outros elementos que em
variações apropriadas, permitem sucesso em aplicações específicas. Níquel e
cromo podem conferir resistência a oxi-redução através de mais de 20 variações
comerciais; alumínio pode ser adicionado com vistas à captura de oxigênio e a
impedir propriedades danosas decorrentes da presença de óxido de ferro; e a
adição de diminutas quantidade de manganês pode garantir maior resistência,
através de formação do sulfeto (HOCKING, 2005).
1.2. Do ferro ao aço
O primeiro contato do homem com o ferro foi através da utilização de
meteoritos. Desta ocasião deriva a origem do vocábulo siderurgia, no latim sider
denota astros ou estrela (NOLDIN Jr, 2002). O ferro artesanal continha traços de
Ni, ao passo que os meteoritos contém em geral de 5 – 26%, permitindo a fácil
diferenciação das matérias-primas (NOLDIN Jr, 2002). Por volta do século V a.C
os chineses começaram a fabricar o ferro carburado, posteriormente denominado
ferro-gusa, matéria-prima para a produção de aço. A denominação aço designa,
atualmente, uma família de materiais com mais de 2000 membros.
1.3. Os alto-fornos
O ferro não é encontrado na natureza em estado de pronta aplicação,
geralmente, ele está associado ao oxigênio formando minérios. Uma série de
processos podem ser empregados para a remoção dos átomos de oxigênio, e
consequente formação do ferro primário. O alto-forno é uma destas alternativas: a
mais antiga e a mais utilizada mundialmente. A evolução dos fornos, a partir da
forja Catalã fez com que o flussofen fosse originado, que é considerado o
precursor do moderno alto-forno. A partir de 1550, o refino do ferro-gusa foi
usado como rota de obtenção do ferro (NOLDIN Jr, 2002).
Após mais de sete séculos de hegemonia, a extrema eficiência destes
dispositivos não foi capaz de atender uma série de novas exigências relevantes
para sua perpetuação, dentre as quais podemos destacar: maior compatibilidade
ambiental e baixo nível de emissões danosas ao ecossistema local (NOLDIN Jr,
2002). Nos EUA, em 30 anos, houve redução de cerca de 87% no número de alto-
fornos em atividade. Dentre as tecnologias de substituição existentes, destaca-se a
tecnologia de auto-redução (NOLDIN Jr, 2002).
Segundo HOCKING (2005) as emissões advindas da produção de ferro e
aço podem ser entendidas como uma sequência de eventos desde a preparação da
matéria prima até o produto final. A coqueria, através do preparo de combustível
para os alto-fornos, carvão, com baixo teor de enxofre, que garante maior dureza
ao aço, pode produzir altas quantidades de compostos policíclicos aromáticos
(HPAs), material particulado, e, por conseguinte, elementos associados à
composição do carvão (ex.: Ni, V, S). Os alto-fornos por sua vez têm como
principal problemática, a emissão de elementos associados a sua escória (ex.: Al,
Ga, Zn, Si), e elementos utilizados como aditivos (ex.: Mg, V).
1.4. Material Particulado
Segundo Schumauss (1920), o termo aerossol designa as suspensões
relativamente estáveis de partículas sólidas ou gotículas dispersas num gás com
dimensões inferiores a 100 μm, mas tamanhos superiores aos das moléculas
individualizadas. Tais suspensões são frequentemente designadas como
aerocolóides, matéria particulada (MP, ou do inglês, Particulate Matter, PM) ou
simplesmente partículas e incluem poeiras, fumos, cinzas, nevoeiros e “sprays”
(ALVES, 2005).
As partículas se distribuem na atmosfera em diferentes tamanhos. Para fins
de avaliação da qualidade do ar, o entendimento das frações nas quais o material
particulado é distribuído é fundamental na determinação do transporte, deposição,
tempo de residência correlato e propriedades químicas (COLBECK e
LAZARIDIS, 2010). As partículas são divididas em: partículas totais em
suspensão (PTS), PM10 e PM2.5.
As partículas totais em suspensão (PTS) representam o grupo que possui
diâmetro aerodinâmico menor do que 100 µm. As partículas de PTS são
majoritariamente geradas a partir de processos mecânicos de fragmentação de
partículas maiores; por exemplo, poeira do solo, fragmentos de folhas, grãos de
pólen e “spray” marinho (ALVES, 2005; SOUZA et al., 2010). Deste modo estas
partículas possuem menor tempo de residência na atmosfera, o que confere
deposição próxima às fontes emissoras.
As partículas de PM10 possuem diâmetro aerodinâmico menor que 10 µm,
podendo ser depositadas desde as vias nasais até os pulmões, e por isto
representam um fator de risco para o desenvolvimento ou agravação de doenças
respiratórias e cardiovasculares (SOUZA et al., 2010). Estas partículas tem como
principais fontes os processos mecânicos, como resuspensão do solo, do sal
marinho, das cinzas de combustão e das emissões biogênicas naturais (FREITAS e
SOLCI, 2009).
As partículas de PM2.5 são aquelas que possuem diâmetro aerodinâmico de
até 2,5 µm. As partículas de PM2.5 são geradas por processos de combustão
industrial, veículos automotivos, usinas termelétricas, metalurgia, fábricas de
cimento e papel, refinarias de óleo e queimadas de florestas (BRAGA et al. 2004;
ALVES, 2005; FREITAS e SOLCI, 2009). Os principais componentes dessas
partículas são aerossóis secundários (ex.: NO3-, SO4
2-), metais (ex.: Zn, Cu, Pb) e
compostos orgânicos com origens notadamente antropogênicas. O tempo de
residência destas partículas na atmosfera é da ordem de dias (COLBECK e
LAZARIDIS, 2010).
Existe um consenso quanto à composição media tanto elementar quanto
iônica do material particulado. Todavia, este parâmetro, bem como a concentração
são determinados pelas propriedades meteorológicas da atmosfera, relevo, fontes
emissoras, e parâmetros da partícula, tais como densidade, forma e
higroscopicidade (GIODA et al., 2004).
1.4.1. Composição química e fontes das espécies no PM
1.4.1.1. Espécies iônicas
Devido à proximidade do mar, a influência desta fonte sobre a composição
química das espécies iônicas (Cl-, SO42-, Mg2+, K+, Ca2+) foi verificada; não é
atribuída origem marinha ao NO3-. Através do cálculo da fração não-marinha (nss,
do inglês non sea salt), esta inferência foi possível, segundo a seguinte fórmula:
[nss-X] = [X] – [Na+] * X/ Na+ (1)
Onde:
[nss-X]: concentração do elemento cuja origem não é marinha
[X]: concentração da espécie investigada (µg m-3)
[Na+]: concentração da sódio determinada nas amostras (µg m-3)
X/ Na+: razão entre a concentração (mg L-1) da espécie investigada e sódio
na água do mar.
A Tabela 1 apresenta as razões entre as espécies e o íon sódio, uma vez que
sua concentração é considerada constante (LIDE, 2005; ZHANG et al., 2007).
Tabela 1: Razões iônicas na água do mar (mg L-1).
Íon Sea ratio (X/Na+)
Cl- 1,80
SO42- 0,25
Mg2+ 0,12
K+ 0,035
Ca2+ 0,038
1.4.1.2.Elementos
Na Tabela 2 podem ser vistos os elementos, e suas as principais fontes, tanto
naturais quanto antropogênicas.
Tabela 2: Fontes principais dos elementos determinados no PM.
Elemento Fonte
natural
Fonte
antropogênica Referência
C
compostos
orgânicos voláteis,
plantas
combustíveis
fósseis,
queimadas,
agricultura
ALVES, 2005
Na mar, solo
siderurgia,
produção de
alumínio,
produção cloro-
soda, indústria
têxtil, produção de
celulose e papel
HOCKING, 2005;
GODOY et
al.,2009
Mg mar, solo siderurgia,
HOCKING, 2005;
LOYOLA et al.,
2005;
Al solo,
siderurgia,
produção de ligas
metálicas,
produção de
alumínio,
HOCKING, 2005;
LOYOLA et al.,
2005; LIDE, 2005
Si mineral,
produção de
vidro, indústria de
componentes
eletrônicos,
indústria de
polímeros,
construção civil,
queimadas
BRAGA et
al.,2004;ALVES,
2005; LIDE,
2005;
Tabela 2: Fontes principais dos elementos determinados no PM (continuação).
Elemento Fonte
natural
Fonte
antropogênica Referência
P Solo
Siderurgia, fertilizantes.
HOCKING, 2005;
ARTAXO et al.,2005;
S
Emissões
vulcânicas,
mineral.
Combustíveis fósseis,
indústria de borracha,
fertilizantes, fungicidas,
indústria de celulose e
papel.
ALVES, 2005; LIDE,
2005; GODOY et al.,2009;
K Solo Siderurgia, queimadas,
fertilizantes.
GODOY et al.,2009;
ARTAXO et al.,2005;
BRAGA et
al.,2004;SELLA et
al.,2006
Ca Solo Siderurgia, construção
civil, plantas de cimento.
HOCKING, 2005;
LOYOLA et al., 2005;
MARIANI e de MELLO,
2007; GALINDO et
al.,2011;
Ti Solo Poeira de estrada, tintas. GODOY et al.,2009;
ARTAXO et al.,2005;
V Solo, queima de
combustíveis fósseis. GODOY et al.,2009
Tabela 2: Fontes principais dos elementos determinados no PM (continuação).
Elemento Fonte
natural
Fonte
antropogênica Referência
Cr Solo Siderurgia
HOCKING, 2005;
LOYOLA et al.,
2005;
Mn Solo Siderurgia
HOCKING, 2005;
LOYOLA et al.,
2005; AMARAL,
2010
Fe Solo Siderurgia
HOCKING, 2005;
LOYOLA et al.,
2005;
Ni Solo
Combustíveis
fósseis, produção
de aço inoxidável,
siderurgia, ligas
metálicas,
pigmentos para
vidro.
GODOY et
al.,2009; LIDE,
2005
Cu Solo Fundição GODOY et
al.,2009
Tabela 2: Fontes principais dos elementos determinados no PM (continuação).
Elemento Fonte
natural
Fonte
antropogênica Referência
Zn Solo
Siderurgia,
pesticidas,
cerâmicas,
fabricação de
pneus.
HOCKING, 2005;
LOYOLA et al.,
2005; WU et
al.,2008
Ga Solo
Queima de
combustíveis
fósseis, produção
de alumínio,
siderurgia, ligas
metálicas.
LIDE, 2005
Cd Solo
Queima de
combustíveis
fósseis, fundição,
pigmento.
GODOY et
al.,2009; LIDE,
2005
Sb Solo
Incineração de
esgoto e lixo,
combustíveis
fósseis,produção
de tintas,
borrachas, ligas de
freios, adesivos
papéis.
SMICHOWSKI,
et al., 2008
Pb Solo
Poeira de estrada,
pigmentos,
produção de
vidros, ligas
metálicas,
produção de
baterias.
GODOY et
al.,2009; LIDE,
2005
1.4.2. Solubilidade
Além do tamanho da partícula, a solubilidade é outra característica notável
relacionada ao material particulado, tratando-se da caracterização elementar. A
eficiência de extração depende do tipo de ligação química. Elementos
relacionados a atividades antropogênicas tendem a formar compostos de baixa
força de ligação química, sendo mais eficazmente extraídos em água (Amaral,
2010). Em contrapartida, aqueles que se apresentam no modo grosso (origem
natural) tendem a formar espécies mais refratárias, sendo mais eficazmente
extraídos em ácido. Elementos tóxicos que se apresentam em espécies com maior
solubilidade em água são alvo de maior preocupação em relação à saúde pública,
uma vez que são provavelmente mais biodisponíveis (GIODA et al., 2011; von
SCHNEIDEMESSER et al., 2010)
1.4.1. Rio de Janeiro
A cidade do Rio de Janeiro (22º 54’ 23” de latitude sul e 43º 10’ 21” de
longitude oeste) está localizada na Região Sudeste do Brasil, sendo um dos mais
populosos centros urbanos do país. A cidade é banhada pelo oceano Atlântico ao
sul, pela Baía de Guanabara a leste e pela Baía de Sepetiba a oeste. Suas divisas
marítimas são mais extensas que as terrestres. A área do município do Rio de
Janeiro é de 1.255,3 km², incluindo as águas continentais e ilhas, as quais
correspondem a mais 37 km².
A qualidade do ar é estudada desde 1967, no então Estado da Guanabara,
quando foram instaladas as primeiras estações de monitoramento. Conforme pode
ser visto na Figura 1, o INEA (Instituto Estadual do Ambiente) designou áreas
prioritárias para o monitoramento da qualidade do ar, a saber: Região
Metropolitana, Médio Paraíba e Norte Fluminense (INEA, 2009).
Figura 1: Mapa da Região Metropolitana do Rio de Janeiro (RMRJ).
Fonte: INEA, 2009.
A Região Metropolitana do Rio de Janeiro compreende 17 municípios,
sendo a segunda maior área metropolitana do Brasil, e a terceira maior do
continente Sul-Americano. A segunda maior concentração de população, de
veículos, indústrias e de fontes emissoras do país, também se encontra nesta
região. Somado a estes e demais fatos, deve-se considerar as características
climáticas tropicais, que resultam na geração de poluentes secundários.
Considerando as influências topográficas e meteorológicas, a região foi
subdividida em outras quatro, como observado na Figura 2. A sub-região I possui
área de 730 km2 e compreende os distritos de Itaguaí e Coroa Grande, no
município de Itaguaí; os municípios de Seropédica, Queimados e Japeri e as
regiões administrativas de Santa Cruz e Campo Grande, no município do Rio de
Janeiro.
Figura 2: Subdivisão da RMRJ.
Fonte: INEA, 2009.
As regiões administrativas de Bangu, Barra da Tijuca, Campo Grande,
Guaratiba, Jacarepaguá, Realengo e Santa Cruz formam a chamada zona oeste do
Rio de Janeiro. Nesta região, é possível encontrar tanto áreas de alta densidade
populacional quanto outras que apresentam mais da metade de sua superfície
cobertas por ecossistemas ameaçados, tais como mangues e mata atlântica. Nos
últimos tempos, a região em questão tem passado por intensas mudanças de
natureza econômica e social, que acentuaram ainda mais estes contrastes. Sendo
assim, por um lado existem regiões mais industrializadas e com maior
urbanização, fruto de surtos de industrialização anteriores (iniciados na década de
50), em contrapartida, áreas menos modificadas pela ação humana, cuja economia
é baseada em torno da pesca e atividades relacionadas ao turismo (KATO E
QUINTELA).
1.4.2. Região de Santa Cruz
A área industrial de Santa Cruz está localizada na zona oeste da área
metropolitana do Rio de Janeiro. A região dista cerca de 9 km da costa do
Atlântico (Praia de Sepetiba). Trata-se de uma região que possui áreas
residenciais, industriais e comerciais. A principal fonte de poluição está
relacionada à diversidade da matriz industrial, que é composta por mais de 15
indústrias que ocupam a área de 126,85 km2 (QUITERIO et al., 2004b). Segundo
dados fornecidos pelo Censo Demográfico de 2010, a região tem população de
217 333 habitantes. As atividades industriais abrangem produção de tintas e
solventes, fábricas de couro, instalações de impressão, fabricação de estruturas de
ferro, e principalmente atividades metalúrgicas (QUITERIO et al., 2004b). Esta
região abriga aquela que é, no momento, a maior companhia siderúrgica do país
cujo funcionamento iniciou em 2010, em fase de teste.
1.4.3. Região de Seropédica
A região hoje conhecida como Seropédica tem ocupação datada dos meados
do século XVIII. Ainda como território pertencente ao município de Itaguaí, a
região desfrutou de terras férteis e alta taxa de exportação de produtos como
cereais, farinha, açúcar e aguardente, fato que perdurou até 1880, após a abolição
da escravidão a região experimentou forte crise econômica ocasionada pelo êxodo
rural. O processo de renascimento da região foi devido a obras de saneamento,
empreendidas por Nilo Peçanha, assim como a passagem da antiga rodovia Rio
São Paulo e instalação da industrial têxtil no antigo distrito de Paracambi (IBGE,
2011; PREFEITURA MUNICIPAL DE SEROPÉDICA, 2010).
Em 1938, teve inicio o “embrião” da atual Universidade Federal Rural do
Rio de Janeiro (UFRRJ). Dez anos mais tarde, a UFRRJ transfere seu campus
para a atual BR-465, tendo início o desenvolvimento urbano de Seropédica.
Elevado a categoria de município, através da lei estadual nº 2446, de 12-10-1995
desmembra-se de Itaguaí. O município de Seropédica teve sua população estimada
em 78 186 habitantes em 2010, apresentando densidade demográfica de 275,53
habitantes/km2 e 283,762 km2 de área territorial, e dista 21 km do Oceano
Atlântico. Sua principal atividade socioeconômica costumava ser a agricultura.
Todavia houve declínio nesta atividade em consequência da expansão industrial
dos municípios vizinhos. Em virtude das características geomorfológicas da
região, o extrativismo mineral, principalmente voltado para a construção civil, foi
atraído para a região. Sendo assim, a mineração tornou-se a base da economia da
região, com ênfase na mineração de areia. No entanto, a região vem sofrendo
mudanças em suas características primárias, e vem ganhando caráter industrial e
urbano com a presença de algumas indústrias, tais como as cervejarias, Kaiser Rio
LTDA, Cia Brahma, Panco Produtos Alimentícios, além da termelétrica Eletrobolt
(AMARAL, 2010; PREFEITURA MUNICIPAL DE SEROPÉDICA, 2010).
1.5. Revisão dos trabalhos publicados no Estado do Rio de Janeiro
Os primeiros trabalhos relacionados à concentração de partículas totais em
suspensão (PTS) foram realizados no início da década de 80. No estudo
desenvolvido por Trindade, et al. (1981) duas regiões foram investigadas:
Copacabana (uma região costeira da zona sul do Rio de Janeiro) e São Cristovão
(uma área industrial). Neste último ponto de amostragem, foram observadas altas
concentrações de V, Ni, Fe, Mn, Cr, e Zn. O período de estudo foi de agosto de
1975 a abril de 1978. Os limites estabelecidos pelo CONAMA já estavam em
vigor, e a concentração média de PTS (ao redor de 100 µg m-3) mostrou-se maior
do que o padrão primário. A composição dos locais foi sensível às diferentes
atividades socioeconômicas. Duas importantes atividades no que diz respeito às
fontes de metais ocorriam naquele período, a incineração de lixo doméstico,
proibida somente a partir de abril de 1977, e o uso de gasolina contendo chumbo
tetraetila, cuja proibição ocorreu na década de 90. Esta última atividade justificava
os elevados níveis de Pb na atmosfera, enquanto as primeiras respondiam por
níveis de Cd e Cr.
Em outro estudo realizado na área conhecida como Cinelândia, localizada
no centro da cidade do Rio de Janeiro, amostras de PTS foram coletadas no
período de setembro de 2001 à agosto de 2002, a fim de determinar o nível da
qualidade do ar desta região (QUITERIO, et al., 2004a). A região é notadamente
afetada por veículos leves e pesados. A média geométrica anual de PTS foi de 133
± 48 µg m-3 (54 amostras), que é 1,66 vezes maior do que o padrão primário
nacional e 2,2 vezes maior do que o padrão secundário. Segundo os autores, estes
valores foram maiores que os encontrados em outros países desenvolvidos, e
também subdesenvolvidos; no entanto, existe similaridade com os resultados
encontrados em São Paulo, Guayaquil (Equador) e Lima (Peru), ou seja, outras
cidades latino-americanas. A caracterização química teve por objetivo a
determinação dos níveis de Ca, Mg, K, Na, Mn, Fe, Zn, Cr, Cu, Co, Ni, Al, Cd e
Pb. Entres estes, Ca, Mn e Fe tiveram como provável fonte os incrementos
naturais e Pb e Cu tiveram como fontes presuntivas as emissões antropogênicas.
Diferentemente do que os primeiros estudos da qualidade do ar da cidade do Rio
de Janeiro indicaram, os resultados de Pb não puderam ser relacionados a
emissões por veículos automotivos devido a redução dos níveis observadas a
partir de 1995.
O mesmo grupo, QUITERIO et al.,2004(b), realizou outro estudo pioneiro
no distrito industrial de Santa Cruz utilizando amostras de PTS com vistas à
caracterização química elementar, determinando todos os elementos do estudo
realizado na Cinelândia, além de molibdênio. A média geométrica (87 ± 40 µg m-
3) do período amostrado (março de 2001 à fevereiro de 2002) ultrapassou os dois
padrões estabelecidos pelo CONAMA (secundário – 60 µg m-3 e primário – 80 µg
m-3).
O INEA (Instituto Estadual do Ambiente) reportou concentrações de PTS,
na Baixada Fluminense, região estuda por Lorena Quiterio et al. (2005), para PTS,
no período de 1980 a 2002, com valores compreendidos entre 150-300 µg m-3,
muito aquém do padrão primário (80 µg m-3) e secundário (60 µg m-3)
regulamentados pelo CONAMA. Em consequência da ausência de estudos na
região e do interesse das autoridades, o estudo foi desenvolvido a fim de
determinar a concentração de metais (Ca, Mg, K, Na, Mo, Mn, Fe, Zn, Cu, Cr, Co,
Ni, Al, Cd e Pb) no material particulado. Estes elementos foram os mesmos
observados em estudo realizado na vizinhanças da Cinelândia: haviam suspeitas
de que os níveis encontrados na Baixada fossem maiores do que os do centro da
cidade.
Em 2005, Lorena Quiterio et al. avaliaram a concentração e a composição
química do PTS de 7 municípios da Baixada Fluminense (São João de Meriti,
Mesquita, Queimados, Japeri, Magé, Belford Roxo e Nova Iguaçu), parte
integrante da Região Metropolitana do Rio de Janeiro (RMRJ). Além das
contribuições naturais e veiculares comuns ao outro estudo realizado pelo mesmo
autor em 2004, esta região conta com fontes industriais. Nesta região, alumínio
exibiu elevadas concentrações que estão relacionadas a ressuspensão do solo
devido a existências de muitas vias não pavimentadas, e o extrativismo mineral.
As concentrações ficaram entre 55,6 ± 15,9 e 241,5 ± 40,0 µg m-3, ambos valores
ficaram acima dos padrões primário e secundário estabelecidos pelo CONAMA.
Em trabalho desenvolvido por Gioda et al. (2004) a qualidade do ar foi
avaliada em Volta Redonda; à época a CSN era considerada a maior indústria
metalúrgica do país. Duas avaliações foram efetuadas, na primeira (Dez-95 a Mai-
96), três locais mediram os níveis de PTS, PM10 e metais associados. Os níveis
diários de PTS ficaram abaixo do estabelecido pelo CONAMA (240 µg m-3), em
apenas uma estação o nível foi ultrapassado. Dentre os metais associados, a
concentração de zinco compreendeu o intervalo de 2,5 a 7,0 µg m-3, na
determinação de ferro as concentrações variaram de 2,1 a 5,2 µg m-3. Cromo e
Vanádio não foram detectados, e os limites estabelecidos para Pb pela EEA (EEA
– Agência Europeia de Meio Ambiente) e USEPA (US EPA – Agência Norte-
Americana de Proteção Ambiental) não foram violados.
Loyola et al. (2006), realizou estudo no distrito industrial de Volta Redonda
(RJ), que consistiu na determinação da concentração de PTS e 12 metais, em 4
locais de coleta distribuídos neste distrito, a fim de avaliar a influência veicular
industrial na região. Os metais Ca, Zn, Al, Fe, e Mg apresentaram as maiores
concentrações; os níveis dos três primeiros metais foram maiores do que os
encontrados em outras áreas industriais. Estes três metais são empregados no
fabricação do aço, a principal atividade socioeconômica da região. Através de
análises estatísticas foi possível notar boa correlação entre os metais presentes na
matéria prima para a produção de aço e/ou nas escórias do forno ou do processo
siderúrgico. O distrito industrial do Médio Paraíba (Volta Redonda) possui área
equivalente a 21% do estado do Rio de Janeiro, com população próxima aos
740 000 habitantes (no ano do estudo). A malha industrial era bastante
diversificada, constituindo em grande desafio a atribuição das fontes de metais
encontrados no material particulado da região. As indústrias ultrapassavam o
número de 10, tanto pequenas quanto grandes, respondendo pela produção
metalúrgica, aço, plástico, couro, têxtil, química, alimentícia e insumos para a
impressão. Além da CSN, que já foi uma estatal, presente na região desde 1946,
outras 6 indústrias de produção de aço aumentavam a contribuição deste tipo de
emissão na qualidade do ar local.
Em trabalho realizado por Sella, et al. (2006) em Cabo Frio, região costeira
do Estado, amostras de PTS foram coletadas de Fevereiro (2004) a Janeiro (2005)
a fim de determinar as concentrações de Ca, Cu, Mo, Mn, Ti, V, Zn e K na
atmosfera. As visíveis diferenças nos níveis de PTS (mínimo - máximo) nos
pontos 1 (23- 659 µg m-3) e ponto 2 (24 - 56 µg m-3) apontam para a influência de
partículas de origem marinha no primeiro, já que as mesmas são de maior
diâmetro. Em contrapartida, o ponto 2 é influenciado por uma grande via de
acesso localizada no município de Rio Bonito. Dentre os elementos analisados, o
vanádio apresentou valores significantemente diferente entre os pontos. A análise
dos componentes principais (PCA) identificou fatores capazes de auxiliar a
atribuição das fontes de material particulado. No ponto de amostragem 1, quatro
fatores que combinavam fonte continental e marinha explicam 86,5% da
variabilidade dos dados. Em contrapartida, no segundo ponto de amostragem estes
fatores explicam 89,2% da variabilidade, e indicam que o particulado proveniente
do escapamento de veículos é a principal fonte de metais na atmosfera. O
fenômeno ocorrido no primeiro local de amostragem é interessante e incomum, já
que as emissões antropogênicas certamente são as causas principais de metais
tóxicos na atmosfera.
Em 2007, Soluri et al. estudou a composição de amostras de material
particulado coletado em dez locais diferentes da cidade do Rio de Janeiro, entre
setembro de 2003 e setembro de 2004, em base semanal e tempo de amostragem
de 24 h. Foi determinada a concentração total de elementos e íons associados ao
PM2.5. Cerca de 60% do PM2.5 foi composto de carbono elementar e aerossóis
secundários. Ao longo dos anos, muitas medidas tem sido tomadas a fim de
diminuir as emissões, por exemplo: a eliminação de lixo doméstico, combustíveis
limpos em estabelecimentos e indústrias, desativação de pedreiras, o emprego de
programas de redução das emissões veicular e industrial, a restrição à circulação
de veículos pesados em alguns túneis da cidade, entre outros. Estes fatores tem
contribuído para significativas mudanças, as quais resultaram, por exemplo, desde
1997, na redução da concentração total de material particulado, aproximando-se
da estabilização (SOLURI et al., 2007).
Mariani e de Mello (2007), determinaram a concentração de PM2.5 e PM2.5-10
e dos íons solúveis em água (n=50) durante o período de Outubro de 1998 à
Setembro de 1999 em Niterói (zona costeira situada na RMRJ). Segundo os
autores, a concentração na estação seca foi cerca de duas vezes maior do que a
observada no período chuvoso. A concentração da fração fina foi igual a 17 ± 13
µg m-3. SO42- e NH4
+ foram as espécies mais abundantes de acordo com a razão
(neq m-3) entre elas, provavelmente na forma de sulfato de amônio.
A subdivisão da Região Metropolitana do Rio de Janeiro (RMRJ)
denominada Base III é considerada a mais poluída da cidade, não só por sua
proximidade com uma das principais vias de acesso do estado, mas também pela
presença de regiões industrializadas, tais como a Baixada Fluminse (TOLEDO et
al., 2008). Este estudo foi o primeiro relatório sobre PM10 e metais associados no
Rio de Janeiro. Um fato interessante a ser notado é que os valores encontrados
para Al são similares aos determinados em PTS na Baixada Fluminense. Deste
modo, rearfirmam-se as características geomorfológicas da RMRJ, que é rica em
óxido de alumínio.
Fatores geográficos e os socio-econômicos influenciam a atmosfera urbana
da cidade do Rio de Janeiro. Através de estratégias de controle, desde os idos de
1997 tem se observado um decréscimo na concentração total de partículas
(GODOY et al., 2009). Como foi observado pelo autor, somado aos relatórios do
INEA muito pouco foi feito, e tem sido feito em relação a pesquisa da qualidade
do ar. Através da análise de amostras coletadas em 10 locais da RMRJ (Gávea,
Maracanã, Ilha do Fundão, Recreio dos Bandeirantes, Jacarepaguá, Honório
Gurgel, Guaratiba, Campo Grande, Realengo e Santa Cruz), foi possível notar que
a poeira do solo é um componente importante, tanto para fração inalável grossa
(PM2.5-10) quanto para a fina (PM2.5), representando respectivamente, 22-72% e
25-48%. No entanto, as fontes notadamente antropogênicas foram altamente
representativas para o modo fino, chegando a representar no mínimo a metade, e
no máximo quase 80% da composição de algumas amostras. Os elementos traço
foram analisados através da Espectrometria de Massa com Plasma Indutivamente
Acoplado. No Recreio dos Bandeirantes, região em rápida expansão, apresentou
níveis elevados de Cd, Sb e Pb no PM2.5. Estes valores foram atribuídos às
atividades da construção civil e o aumento do fluxo veicular na região. Já o ponto
de amostragem localizado no distrito industrial de Santa Cruz apresentou os
maiores níveis de elementos marcadores de solo. Na Ilha do Fundão, região
influenciada por intenso tráfego veicular, foram observados os mais elevados
níveis de elementos relacionados à combustão de óleo (tais como Ni e V), em
amostras de mesma moda que as de Santa Cruz. No campus da Fiocruz (Fundação
Oswaldo Cruz) localizado em Manguinhos, norte da cidade, que possui distância
de 4 km da costa e 52 km da área industrial de Santa Cruz, devidoa predominância
de ventos é Sul-Sudeste, existe a possibilidade de transporte de material
particulado.
O não atendimento dos limites legais estabelecidos pelo CONAMA para o
PTS é um problema constante verificado nos estudos realizados no Estado,
verificado principalmente na subdivisão da RMRJ estabelecida pelo INEA ,Base
III, que além da Baixada Fluminense inclui a região norte da cidade (PAULINO et
al., 2010). Em estudo efetuado por Paulino et al. (2010), os níveis de PTS foram
determinados em Belford Roxo, Maracanã e São Cristovão, avaliando assim a
evolução da qualidade do ar na Base III (Subdivisão da Região Metropolitana do
Rio de Janeiro). Embora o período tenha sido de 7 meses, e a coleta não tenha
sido realizada a cada 6 dias, inviabilizando uma comparação direta com os
padrões nacionais, muitos valores excederam esses limites. Dentre os locais
estudados, Belford Roxo foi o que apresentou os mais alarmantes sinais de
deterioração da qualidade do ar. Belford Roxo é uma região de grande e
diversificada importância industrial com indústrias que vão de aditivos à
lubrificantes, e abriga uma das mais importantes indústrias farmacêuticas do país.
Cerca de 30% da produção brasileira de lubrificantes está relacionado a uma
indústria da região. Deve-se somar a grave situação de Belford Roxo, além de
contribuições industriais, a falta de infraestrutura básica, um problema comum à
Baixada Fluminense (PAULINO et al., 2010).
A identificação do material particulado, bem como de suas respectivas
fontes tem se tornado um consenso mundial devido aos seus efeitos adversos à
saúde pública. Fundamentados nesta importância, do Nascimento et al. (2011)
avaliaram a influência da sazonalidade sobre a concentração de metais traços
associados ao PTS na Ilha Grande, localizada na região conhecida como Costa
Verde. O estudo realizado apresenta um dos grandes desafios da pesquisa, nos
últimos tempos, em estudos de impacto ambiental, no caso particular a qualidade
do ar, que é a distinção das contribuições antropogênicas e naturais. A Ilha Grande
é uma área de proteção ambiental. No entanto, os estudos mostraram o início de
impactos causados por áreas industriais em São Paulo (250 km de distância) e Rio
de Janeiro (100 km de distância), e até mesmo pela progressiva ocupação e
atividade turística. Dentre os elementos determinados estava o enxofre. No que
tange as fontes, o enxofre é um elemento comum a muitos minerais, e no caso de
fontes antropogênicas pode ser associado ao refino do petróleo, vapores de
fundições, extração de cobre e ferro, além de processos metalúrgicos.
O Estado do Rio de Janeiro possui diversas zonas industriais (Distritos
Industriais) e municípios altamente industrializados, além de contar com intensa
frota veicular; portanto, o reduzido número de estudos não contrabalanceiam a
elevada antropogenicidade da composição química da atmosfera da região.
A perspectiva de vida cresce, e no mesmo sentido a preocupação com
problemas respiratórios, principalmente em idosos, que junto com as crianças
representam grupo de risco; o estado conta ainda com regiões de rica flora e
fauna, como é o caso da Restinga da Marambaia, Baía de Ilha Grande e Baía de
Sepetiba.
A região de Santa Cruz, além de altamente industrial, possui alta densidade
populacional, e tem por vizinhanças importantes ecossistemas como a Baía de
Sepetiba, que representa atualmente o maior pólo pesqueiro do Estado. Portanto,
estudos nesta região fornecem ferramentas iniciais para a avaliação de possíveis
danos a saúde (notadamente idosos e crianças), prejuízos ao meio ambiente
(Restinga da Marambaia), e a economia da região (redução do pescado na Baía de
Sepetiba). Além de servir como referência para outros autores, e permitir as
autoridades competentes (MPRJ e INEA) tomarem as medidas cabíveis nos casos
confirmados.
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