WALDEMIRO DE XANGÔ-entrevista

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 WALDEMIRO DE XANGÔ OU O BAIANO DE XANGÔ NASCIDO NA CIDADE DE SÃO SALVAD OR, NA BAHIA, NA RUA DA GRAÇA, BAIRR O DE SÃO PEDRO, NO DIA 13 DE DEZEMBRO DE 1928, SUA FAMÍLIA ERA MUITO POBRE E COM SEU NASCIMENTO SUA MÃE, EUGÊNIA ALCÂNTARA PINHEIRO, PRECISOU TRABALHAR COMO AMA DE LEITE, ONDE GANHAVA QUINZE MIL RÉIS POR QUINZENA, PARA PODER SUSTENTAR ESTE H OMEM QUE FICOU CONHECIDO EM TODO BRASIL E NO MUNDO, COMO, OGRANDE REI DO CANDOMBLÉ, DO RIO DE JANEIRO E DO BRASIL. ENTREVIST A DADA AO ORGÃO DE DIVU LGAÇÃ O DA CULTURA AFR O -BRASILEIR A ILUAIÊ EM ABRIL DE 1991  ADILSON MARTINS/JOSÉ ROBERTO DE SOUZA  WALDEMIRO DA COSTA PINTO FIGURA DAS MAIS RESPEITADAS NO CANDOMBLÉ BRASILEIRO, COM SUA FIGURA IMPONENTE, CONFIGURA -SE NUM VERDADEIRO OBÁ, PROT ÓT IPO VIVO DO PRÓPRIO ORIXÁ DE QUEM É FILHO, XANGÔ, O REI DE OIÓ, SENHOR DO TROVÃO E DO FOGO, A QUEM, NA OPORTUNIDADE SAUDAMOS COM REVERÊNCIA:

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WALDEMIRO DE XANGÔ 

OU 

O BAIANO DE

XANGÔ 

NASCIDO NA CIDADE DE SÃO SALVADOR, NA BAHIA, NA RUA DA GRAÇA, BAIRRODE SÃO PEDRO, NO DIA 13 DE DEZEMBRO DE 1928, SUA FAMÍLIA ERA MUITOPOBRE E COM SEU NASCIMENTO SUA MÃE, EUGÊNIA ALCÂNTARA PINHEIRO,PRECISOU TRABALHAR COMO AMA DE LEITE, ONDE GANHAVA QUINZE MIL RÉIS

POR QUINZENA, PARA PODER SUSTENTAR ESTE H OMEM QUE FICOU CONHECIDO EMTODO BRASIL E NO MUNDO, COMO, OGRANDE REI DO CANDOMBLÉ, DO RIO DEJANEIRO E DO BRASIL.

ENTREVISTA DADA AO ORGÃO DE DIVULGAÇÃO DA CULTURA AFRO -BRASILEIRA

ILUAIÊ EM ABRIL DE 1991 ADILSON MARTINS/JOSÉ ROBERTO DE SOUZA 

WALDEMIRO DA COSTA PINTOFIGURA DAS MAIS RESPEITADAS NO CANDOMBLÉ BRASILEIRO, COM SUA FIGURAIMPONENTE, CONFIGURA -SE NUM VERDADEIRO OBÁ, PROTÓT IPO VIVO DO PRÓPRIOORIXÁ DE QUEM É FILHO, XANGÔ, O REI DE OIÓ, SENHOR DO TROVÃO E DOFOGO, A QUEM, NA OPORTUNIDADE SAUDAMOS COM REVERÊNCIA:

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_ OBÁ NISHÉ KAWÔ KABIECÍLE!

IA-Waldemiro descreva para nossos leitores como foi sua vida, desdeseu nascimento at é os dias atuaes.W- Nasci na rua da Graça, bairro de São Pedro, cidade de São Salvador,na Bahia e isto foi no dia 13 de Dezembro de 1928. Minha família eramuito pobre e com meu nascimento, minha mãe Eugênia AlcântaraPinheiro, foi ser ama de leite, ganh ando quinze mil réis por quinzenapara poder me sustentar .Minha infância foi muito sacrificada, não tive tempo para brincar,passear e folgar como toda criança. nunca tive aniversário nembrinquedos, nem infância. posso dizer que já nasci trabalhando poi s,antes de completar sete anos, já carregava trouxas de lavandeiras eaos dez anos vendia cabeça de boi no matadouro do Retiro.

Minha família era católica por tradição emuito devota. Todos os sábados meus avós por parte de mãe reunião afamília e alguns vizinhos para rezar o Terço de Nossa Senhora econfessavam e comungavam todos os domingos. Havia um tio irmão de meupai que tinha um problema de ordem Espiritual que só mais tarde vim aentender.

Sempre que se matava um porco em casa,ele "pegava"um "negócio" quefazia com que ele corresse para o mato e ficasse dias sem falar nemconhecer ninguém.Meu pai morreu por não querer "fazer o santo", minha mãe foi pelo

mesmo caminho.

Eu nunca quis saber da Igreja. Apanhei muito para aprender a fazer o"pelo sinal"e a rezar o "Creio em Deus Padre", o Pai Nosso e AveMaria, nem assim, consegui aprender direito. As outras criançasaprendiam a rezar e eu, como não conseguisse ficava ajoelhado nocaroço de milho. O meu problema era só com a religião, com as outrascoisas eu aprendia rápido.Nesta época eu morava num lugar chamado São Felipe, meu pai tinhamorrido deixando minha mãe grávida, de uma menina e eu ainda muitopequeno. Ficamos morando na casa de meu avô. Pouco depois minha mãemorreu, eu fiquei com meu avô,; meu avô morreu e , logo depois morreuminha avó.

Parece que todos que se encarregavam de cuidar de mim morriam logodepois, porque meus padrinhos me pegaram para criar e, também vieram

a falecer. Com a morte de minha madrinha voltei para S alvador, para acasa de uma tia, onde conheci uma Mãe de Santo, por nome de Angélicade Zazi,que "tocava"um Candomblé. Eu fugia de casa para assistir aoCandombléde Dona Angélica e, quando voltava de manhã era recebido comuma surra.

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 Havia, na vizinhança uma senhora chamada Maria Francisca que,vendo oque eu apanhava morria de pena de mim. Um dia ela me disse: _ "vadú(este era meu apelido), Domingo tem, Candomblé na casa de meu Pai deSanto, você não quer ir comigo?" _" A senhora me levando eu vou e setiver lugar para ficar não volto mais", respondi.Foi então que Dona Francisca me levou para a casa de Cristóvão, queera seu Pai de Santo e lá fiquei morando durante quatro anos, vendendoacaçá para ele, dois por um tostão. Todos os dias eu vendia dequarenta a cinquenta mil réiz e o dinheiro era todinho entregue paraCristóvão, que nunca me dava um tostão pelo meu trabalho. O acaçá erafeito na pedra à moda antiga, tinha a pedra e a mão de pedra.

Um belo dia sumiu a mão de pedra, e nós ficamosprocurando mão de pedra para ralar o milho ninguém achava. Aí eu subia Ladeira do Papagaio, no Rio Vermelho, e dei uma topada numa pedra.

"Que pedra boa para fazer Mão de Pedra"! Baixei, peguei a pedra, boteino tabuleiro que já estava vazio levei.e levei. Chegando na roça eu disse :_ Meu pai Cristóvão, olha apedra que eu trouxe pra fazer mão de pedra para ralar o milho". Quandoeu dei a pedra a ele , ele olhou para mim e disse: _ "Isso é pedra

 

para fazer mão de pedra menino"? Runhó, olha a pedra que Vadú tro uxepra fazer mão de pedra! Mansú, venha ver! Mãe Miquilina, venha ver apedra"! e ficou todo mundo olhando e rindo da minha cara. Ele pegou apedra e diss: _ " Vai servir pra você mesmo"! e depois guardou.Aquilo não me "cheirava nem fedia", menino da Ba hia não era sabidocomo de hoje!...Eu já ajudava, apesar de nunca ter tomado um "banho de folhas"a fazer ebó, acarajé, ekurú e tudo quanto era comida de santo. Um diaele mandou pegar um galo para dar comida a ExúDudú", Lá um espírito

"pegou" uma mulher e disse que era minha prima que estava "encarnada"no meu estômago. Me deram remédios, fizeram uns "negócios", mas nãodeu geito, a dor não melhorou. Foi aí que Aurélia, irmã de santo deMadalena de Nanã e filha de santo de "seu " Álvaro do Pé Grande, m elevou pra jogar com "seu" Rufino que me disse: É...é Santo pra fazer,precisamos fazer o seu Santo"! Eu não tinha dinheiro pra fazer osanto, mas um homem de Obáluaiê, por nome Dé, se ofereceu pra ser meuPai Pequeno e me dar tudo pra "feitura", aí tive um desentendimentocom uma filha de santo de Rufino, do primeiro barco, a falecidaKiumbanda de Inhansã, aí eu não quis mais fazer santo lá. Aí a dorvoltou de novo e Aurélio me levou pra casa de Paulo de Brongo, ...era

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santo pra fazer. Fui jogar na casa de "seu" Álvaro, e ele disse : _ Meniono, você tem é xangô pra fazer, seu santo já tá em casa! Eu voulhe dar um Boorí que é pra melhora , mas seu santo já esta em casa.!_ " Meu Santo, tá em casa como?_ "É sim , você já tem santo e ele está em casa "!

aquilo só me entregou, mas não me disse maisnada. Arrumei tudo para o Boorí,com "seu" Álvaro... aí fiquei comaquela dor e quiseram me levar para a casa de Cristóvão e eu, como nãotinha saido de lá brigado, resolvi jogar lá, . Quando cheguei, todoescabrinhado e com medo dele falei: - "bênção me pai Cristóvão", e elerespondeu "Deus lhe dê boa sorte, e o que que lhe traz aqui?"

Eu estava muito doente, magrinho, a dor só melhorava se eu tomasse cháde "Canela de Velho", e a única alimentação que ficava em meu estômagoera papa de pão dormido com leite morno. Quando Cristóvão pegou ojogo, fez" kawô kabiecilê! Eu sabia que você voltava porque o seuSanto está aqui em casa" ! Aquilo me deixou muito intrigado _ e pensei_ "Que Santo está aqui? Nunca fiz na da de Santo aqui!" Foi então queCristóvão foi lá dentro e voltou, em seguida, com a bendita pedra queeu havia levado para fazer o acaçá. _ " Você conhece isto aqui"?Perguntou. "Esta é a pedra que eu trouxe para ralar o milho"! _ É seuSanto que está aqui lhe esperando!"

Foi então que resolvi fazer o Santo e por isso fui trabalhar no

Retiro. Na Bahia se fazia "caixa" que é um rolo de dinheiro que sefaz. Por exemplo, : Tem dez televisões, todos se inscrevem econtribuem com uma mensalidade e cada mê s um tira a sua. O premio dascaixas que eu fazia era sempre em dinheiro.Fiz caixa de cinco, de dez,de vinte, e de até cinquenta mil réis e assim me preparei para fazer oSanto.Eu só queria o meu prêmio no último número. Fiz todo tipo de caixaque havia, por semana , por mês, ... o que eu queria era juntardinheiro para fazer o meu Santo. Quando consegui, fui lá na casa doCristóvão e fiz o Santo. Fiquei lá por um ano e quando desci já tinhafeito a obrigação de um ano. Na minha feitura tinha muita gent e e no"nome do Santo" também . Muita gente já morreu e alguns ainda estãovivos, que eu me lembre, estavam lá: Muçú d'oxun, Gaiacú Nicinha doBogun, Mariinha de Nanã, e muitos outros.

Um dia , eu saí escondido para assistir um candomblé na Casa de Roco.Me ensinaram a dar um nó na camisa para não "pegar" Santo, e eu fuilá e fiquei assistindo o Candomblé. não deu certo a estória do nó equando acordei já era outro dia. Isso provoco u um grande

aborrecimento, minha Mãe Celina, mulher de Cristóvão, ficou muitozangada e quis me bater, a Mãe de Santo tomou as dores, meu Pai vilú,que era meu Pai Pequeno da casa , tomou as dores e eu fui mandadoembora sem ter onde morar. Foi então que r esolvi ficar morando na Casade Roco e ali fiquei por quatro anos. Arrumei emprego em umrestaurante e fiquei morando na casa de Candomblé, ajudando em tudo,

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levando ebó, quinando folhas e tal e tal...A Mãe de Santo era sozinhae só contava com a ajuda da Mãe pequena, eu fiquei ajudando eaprendendo e só depois de quatro anos é que vim para o Rio de Janeiro.Quando vim devia ter mais ou menos uns vinte anos. Eu já conhecia "SeuJoãozinho de Gomeia que gostava muito de mim e já me chamara para virmorar no Rio de Janeiro. Juntei dinheiro e dei a meu Pai Critóvão paraguardar e ele gastou todinho. Depois fiz as pazes com Cristóvão e pedipara vir com ele pois eu não conhecia nada e tinha medo de virsozinho. Juntei o dinheiro das passagens e dei a ele que des savez comprou as passagens direitinho. Lá viemos nós , chegamos no Rionuma sesta- feira às três horas da tarde e às seis horas ele me botoupra fora da casa dele, por motivos que não valem a pena relatar. Aíeu fui até uma barraca que ficava perto da casa dele, que era de umasenhora chamada Dona Dilú, e perguntei a ela se conhecia Seu João daGomédia, ela me disse que me levaria lá quando fechasse a barraca.Quando chegamos na casa de Seu João fomos recebidos por Mãe Chica quejá me conhecia da Bahi a e conversamos por um bom tempo até que seuJoão se levantou e veio conversar comigo. Não tive coragem de contaro acontecido e por volta de uma hora da manhã voltei com Dona Dilú queme pediu que a acompanhasse até sua casa que ficava em um lugar muitodeserto. Quando chegamos lá , ela disse : "Já é tão tarde, 'como' vocênão dorme aqui"? Ora, eu não tinha onde dormir, e de pronto, eu

aceitei o convite. Menino a mulher me deu uma caminha tão boa, com umradinho de cabeceira e eu que nunca tinha tido um rádio!

De manhã fui comprar comida para a criação de DonaDilú, ela me deu café , cuidei da criação e depois descemos para abrira barraca, pouco depois ela começou a destrinchar um fato de boi, eme pediu ajuda _ "para que é isso "? Perguntei curioso. " É para fazerangu a baiana". _ angu a baiana ? _ o que é"? - É cmida mineira que

 

dizem ser da Bahia. Logo eu estava picando bofe e coração de boi etudo mais e fiquei ali com ela preparando o tal " angu a baiana". Euna Bahia já tinha trabalhado de coz inheiro e não tinha nenhumadificuldade de aprender a fazer um novo prato . Trabalhamos o diainteiro atendendo a freguesia da barraca e servido angu as pessoas queali passavam, homens e mulheres. Já era muito tarde quando depois defechar a barraca, fui lavá-la em casa , onde tornei a pernoitar. Nasegunda-feira expliquei a Dona Dilú o por que da minha permanência emsua casa e pedi a Dona Dilú que me ensinasse a chegar a casa de um

amigo, que morava na rua Júlio do Carmo , 218. Dona Dilú me ensinoucomo chegar lá e eu fui. Quando eu entrei no trem de um"toró", queparecia que ia acabar o mundo. Desci na Estação da Leopoldina e comoestava tudo alagado , o bonde não passava, arregacei as calças e fuide pé. Quando cheguei no hospital São Francisco de Assis , lá vinhameu amigo Gilberto atravessando a rua. _ Menino que é que esta fazendoaqui no meio de tanta água? _ " Vim com meu Pai Cristóvão mas, ele mebotou pra fora e não tenho onde ficar."

Naquela mesma semana arrumei um trabalho de cozinheiro no BalneárioHotel Londres de Copacabana, que era na rua Domingos Ferreira, 123, e

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ali trabalhei por dois anos. Aluguei uma casa na rua São Pedro em SãoJoão de Meriti e trouxe Bobó da Bahia para morar comigo. Dali arrumeioutro emprego para ganhar melhor na rua da Lapa, num restaurante ondetravei conhecimento com as mulheres que transitavam por ali.Quando elas souberam que eu ganhava quinhentos cruzeiros por mês e

descontava a comida, me ofereceram mil cruzeiros por mês com direito acasa e comida, para tr abalhar em uma pensão. Como a proposta era boafui acertar o emprego e só depois fiquei sabendo que era uma casa detolerância. Trabalhei ali por dois anos e só saí porque o secretáriose segurança, da época, não sei se Zilton Jorge ou Frota Aguiar,mandou fechar aquilo tudo e só deu tempo para fugir._ Depois fui trabalhar na casa de um jornalista, Cláudio Medeiros

Lima, um dos fundadores da "Última Hora". Dali só saí para abrir umapensão de comida na zona do baixo meretrício, na rua Visconde Duprat,n28. Ali arrumei minha vida, trabalhando, fazendo e vendendo comida.Foi então que aluguei uma casa no Morro do Pinto, na rua Furnesi, 70.Minha participação no Candomblé era ajudar na casa de Seu João daGoméia, Eu estava afastado da casa de Cristóvão que, na época, aindaera na Vila SãoLuiz só se transferindo mais tarde para o Pantanal deCaxias.

Seu João já estava estabelecido com seu Candomblé no mesmo lugar em

que se encontrava quando morreu .

Muita gente pensa que o Candomblé de Seu João da Gomé ia foi o primeiroa se estabelecer no Rio de Janeiro, mas isso não é verdade. Antes delejá existia o Candomblé de João da Lesenge, de Mesquita, de Banculê, deSeu Abedé, e de Seu João da Barca, sendo que os dois últimos já haviammorrido. Quem na verdade puxou a vinda dos baianos e abriudefinitivamente o Candomblé no Rio de Janeiro foi o sucesso obitidopor João da Goméia. Nessa época eu eraPai Pequeno de muitos filhos deSanto de seu João. Na verdade o primeiro Logun Edé tirado na Goméia,foi "feito " por mim. O rapaz chamava -se vivaldo Pires de Carvalho, eesta vivo, até hoje, para confirmar o que estou dizendo. Vivaldo é o

mais velho Logum feito no Rio de Janeiro. Apesar de tudo Eu não queriaassumir responsabilidades de Pai de Santo. Eu morava na rua F arnesi eum conterrâneo cismou que eu tinha que fazer o seu Santo, e eu comonão queria ser Pai de Santo de ninguém,dizia, _ Menino eu não querome envolver nisso, eu não quero e pronto. _ O menino sabia que eutinha raspado o Vivaldo que por sua vez dava a maior força para queeu fizesse aquele Orixá. O menino insistia, Vivaldo forçava. Olufandeída casa de Bancolê, dizia, faça!, faça!, faça ! e aí eu botei o yaôjunto com seu Bobó, finada Santa, Dona Teodora de yemanjá, Chagüi dacasa de Ciriáco, e fiz o Santo do yaô. Depois Vivaldo disse pra mim "Baiano, já que botou esse yaô, vamos alugar uma casa em caxias que

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tenha quintal e vamos fazer um " Barracão". Aí apareceu Francisco deYemanjá, apareceu Dinis da Oxun, a Lurdes de Ogum, que morreu agora, eapareceu a Ilza de Oxalá, que era prima do meu primeiro filho deOxoguian. Este foi meu segundo "Barco", as roupas dos Santos foramtodas emprestadas por seu João da Goméia. O primeiro barco foi o darua Farnesi, quando raspei o Oxoguian de Valobado. O se gungo "Barco eutirei na casa da rua Primeiro de Janeiro , em Caxias. Eram,Francisco,Dinis, Lourdes e Ilza. Dali eu me animei e parti paracomprar o Parque Fluminense , onde permanece até hoje o meu Candomblé.Esta é a minha história.

IA _ Você tomou obrigação de sete anos com Cristóvão do Pantanal?W _ Não, minha obrigação de sete foi na Bahia com minha Mãe Matilde.

Só depois é que voltei para botar yaô. Naquela época eu já estavabrigado com Cristóvão.IA _ Por que razão você rompeu definitivame nte com o Fon de Cristóvão

 

do Pantanal aderindo ao Keto de Menininha do Gantois?W _ Eu falei que quando era criança eu vendia cabeça de boi e faziaisso para uma mulher que era irmã de Santo de minha Mãe Menininha.Dona Creuza nesta época era muito novi nha e eu tinha total acesso aoGantoi. Eu trabalhava para Dona Amorzinho, conhecia Dona Creuza e DonaMenininha desde aquela época. Dentro do Matador do Retiro só tinhagente "feita" de Santo e a maioria era do Gantoi. Eu sempre tive ganade aprender Candomblé, depois que aprendi tudo de Fon, senti quefaltava alguma coisa, que faltava muita coisa mesmo e que poderiasuprir esta falta com minha Mãe Menininha do Gantois.

IA - Como era a sua relação com Dona Menininha?W _ Era ótima, eu adorava aquela criatura, tinha por ela carinho,

respeito, admiração e muito amor . Era uma relação de mãe e filho,quando eu chegava no Gantois era recebido com uma verdadeira festa.Nunca soube como não sei , o que é porta fechada no Gantois, semprefui tratado como um filho, mesmo antes de tomar obrigação naquelacasa.

IA - Você não desconhece que essa mudança de Nação provocou um certodescontentamento por parte de algumas pessoas que, a partir de então,tentaram descaracterizar Waldemiro de Xangô, quer como memb ro da NaçãoFon, quer como membro da Nação Ketu. De que forma você tem solucionadoe convivido com esse fato?

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W _ Eu não quero ser mais que ninguém, mas sei, também que não soumenos. Existe um pequeno número de "Pai de Santino" que não seconformam com meu sucesso e com minha Ascenção. Esta reportagem vaiservir para que muita gente saiba que tudo que consegui foi as custasde muito trabalho e de muito esforço, muita dedicação e deprincipalmente de muito respeito aos Orixás. Se mudei de Nação foiporque sabia que faltava alguma coisa muito importante para prosseguirem minha missão.

Hoje sou o homem mais velho feito de Santodentro do Brasil; Não sou Ogan que virou Pai de Santo, nem fuipreparado, fui raspado e pintado. Esse ano comple4to quarenta e oitoanos de Santo e fui e posso dizer que recebi de quem tinha e podiadar. Tenho sessenta e dois anos de idade e minha religião é oCandomblé.Acho que não posso ser mais claro em minhas declarações, até para nãomagoar pessoas que não merecem ser magoadas, mas quem for de entenderque entenda.

IA _ Existe um boato bastante divulgado d e que Mãe Menininha era Ekeji. Isto é verdade ou mais um boato mentiroso?

W _ De geito nenhum mi9nha Mãe Menininha nãoera ekeji e na família dela não dava Ekeji! Pai de Santo e Mães deSanto antigos e com saber, não confirmavam os filhos , raspavam epintavam. Tanto ela não era Ekeji que os dois netos homens que elatinha, raspou e pintou! A qualidade do Santo de minha Mãe Menininhanão "chegava" e se chegasse ela morria.

IA_Quer dizer que , independente de não virar no Santo, a pessoa

pode ser adoshu, não tendo necessariamente que ser confirmado comoOgan ou Ekeji?

W _ Eu mesmo tenho dois filhos raspados e pintados lá no Gantois,cujos Santos não "rodam", lá no Gantois existem vários homens queapesar de pintados e raspados não "dão" Sant o, como é o caso do meufilho que é feito lá.

IA _ É verdade que Waldomiro Baiano carrega dois xangôs?W _ Sim é verdade, eu fiz Agodô com Critóvão, porque no Fon tem Barú

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e este é um dos motivos porque não fiquei na casa . Eu nasci para Barúe ele não fez Barú para não dar carneiro por causa da filha dele queera minha Mãe Pequena, . Eu sou feito de dois Xangôs. Fiz Agodô comCristóvão e Barú com minha Mãe Menininha . Tenho dois Orunkó com muitahonra!

IA _ Qual o seu maior sonho para o futuro?

W _ São três grandes sonhos que pretendo realizar no futuro. Oprimeiro é terminar o que falta no Parque Fluminense. O segundo éreabrir a roça da Bahia. e o terceiro é fazer o Axexê de Dona Matildecom tudo que tem direito.

IA _ A que roça da Bahia Você se refere?

W _ a Casa de Roko, sede do sede do Ashé de Fon. O terreiro já mepertence de direito e de fato. O IPTU já saiu em meu nome e agoraquero ir a Bahia fazer uma reunião com as mulheres da casa para saberque atitude vou tomar. Critóvão deixou aqu ilo abandonado e a mulherque morava lá ia abrir uma Igreja de Crentes. Eu interferi pagueitodos os impostos atrazados e reclamei o direito sobre o imóvel quehoje me pertence legalmente. Se as pessoas de lá me aceitarem pretendo

dar continuidade ao Can dmblé, caso contrário vou doar o terreno aparaa Igreja de São Bento.

IA _ O pessoal de Pantanal de caxias, do Rio de Janeiro, está deacordo com essa sua disposição?

W _ Minha gente, é preciso entender que o Pantanal de Caxias não temnada a ver com a travessa do Roko da Bahia. O ashé da travessa do Rokotem duas herdeiras que são Crispina d'Ogun e Noela d'Oxun. Cristóvãonão queria que sua filha carnal fosse herdeira da travessa do Rokopois, se quisesse, ele faria o /Santo de Lindinha naquela casa. Ashédo Pantanal e Ashé do roko _ são coisas diferentes e não tem haver umacom a outra. Maria José de xangô, neta de Cristóvão fez Santo noPantanal de caxias, só comhece o povo de Caxias porque a peguei e a

levei pela mão e apresentei a todo mundo. Os filhos de Santo deCritóvão acham que a Casa de Roko seria dele porque ele se dizia Paide santo de lá. A amizade de Cristóvão era com Siá Maria Bernarda daPaixão, mas, a Mãe de santo de lá se chamava Matilde Muniz doNascimento. A mulher de Critóvão que se chamava Omi Toki, se estivesseviva é que poderia ser herdeirta daquele Ashé, porque ela sim, foifeita, pintada e raspada na Casa de Roko.

Cristóvão pertenceu a casa no tempo, de Siá Maria da Paixão, brigoucom a mãe de Santo e abriu sua própria roç a. Eles eram inimigos ehavia muita rivalidade entr eles. Critóvão foi Ogan de lá e não podiaser Pai de Santo e esta foi uma das razões que me levaram a procurar oGantois para acertar as "minhas coisas".

Nota da redação:Tentamos reproduzir o mais fielmente possívela encantadora e peculiar maneira de falar deWaldemiro da costa Pinto, que por si só representauma verdadeira jóia de nosso folclore e de nossa cultura.

Nota do Blogue:

Aqueles que o conheceram com eu que participei de sua vida d urante

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longos anos, só posso dizer que em termos de amor aos Orixás e a tudoque dissece respeito ao Candomblé, nunca vi ninguém que fosse tãodedicado e tão severo em relação a se cumprir as leis do Santo. Tinhao poder de administrar a distância tudo den tro de sua casa de santo ea corrigir a todos e a tudo o que visse e achasse que poderia sermelhorado. Não media esforços para fazer o que fosse necessário pararealizar uma obrigação em um filho de santo e ou a um cliente quenecessitasse de algo. Tirava do seu para completar o que faltace emuma "obrigação". dizia: Este Santo precisa disto desse modo, casocontrário ele irá se zangar e pode prejudica a este filho. E punha doseu!

Ajudava a quem fosse , com dinheiro para fazer enterro, para comprarcomida, para levar a médico, conseguia carro e tudo que alguémprecisace, sem se interessar se este teria um dia dinheiro para lhepagar.Era firme, sério e rude em seu modo de ser, mas era amigo e honesto noque fazia e dizia.

ESTA é a nossa homenagem a este grande

homem que deixou a sua terra natal aBahia, veio para o Rio de Janeiro embusca de uma vida nova e com sua fôrça,determinação e garra, conseguiuencontrar forças em sua Fé e nosOrixás. Venceu as dificuldades e osobstáculos e fez nascer um mundo novopara aqueles que não conheciam o

Candomblé e descobriram a beleza destareligião e de seus mistérios eseus Lindos Orixás com suas lendas(itans). 

Baiano de Xangô, não foi somente umGrande BABALORIXÁ, foi um granderepresentante do Culto aos Orixás deáfrica.

Que se fez respeitar por seu saber epor sua coerência no que dizia E faziadentro do "Santo". Com filhoS de Santono Brasil, de Norte a Sul, de Leste aOeste, na América Latina , na Europa eEstados Unidos da América e em muitos

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outros Paizes pelo mundo à fora... 

Caso estivesse vivo Hoje diríamos :_ 

BABÁ MIM MUTUMBÁ!

E

OBÁ NISHÉ KAWÔ KABIECÍLE!!!!!!!!!!!!  

Caso você tenha algum fatoque possa nos enviar para acrescentar-mos a este, por favor nos envie para [email protected]  

Nossos agradecimentos a nosso irmãomais velho, Valdir D'Òsùmaré que nosforneceu este boletim , sem este seriaquase impossível escrever sobre nossoBabálorixá Waldemiro de Xangô