Vila Torres Políticas públicas para regularização fundiária: o caso da Vila Torres em Curitiba

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1 Porto Alegre, de 28 a 31 de maio de 2012 Políticas públicas para regularização fundiária: o caso da Vila Torres em Curitiba - PR Rafaela Antunes Fortunato (1) Roberto Caldeira (2) Cristina de Araújo Lima (3) (1) Doutoranda em Meio Ambiente e Desenvolvimento, UFPR, Brasil. E-mail: [email protected] (2) Mestrando em Engenharia de Construção Civil, UFPR, Brasil. E-mail: [email protected] (3) Dep. Arquitetura e Urbanismo, UFPR, Brasil. E-mail: [email protected] Resumo: A Vila Torres é uma das mais antigas ocupações irregulares do município de Curitiba, teve início na década 1960 e foi chamada anteriormente de Vila Pinto. Esse artigo pretende realizar uma análise da forma como o planejamento e a gestão urbana estão sendo aplicadas na Vila Torres, verificando o que prevêem as políticas públicas para regularização fundiária no município de Curitiba e como as mesmas estão sendo aplicadas na prática. O artigo parte da seleção de importantes documentos de planejamento e gestão municipal, como o Plano Municipal de Habitação e Habitação de Interesse Social e o Plano Municipal de Regularização Fundiária em Áreas de Preservação Permanente, análise dos projetos da COHAB-CT para área e visitas a campo. Percebe-se que apesar do início da regularização fundiária na Vila Torres ter iniciado em 1987, a mais de 20 anos atrás, ainda existe muito a ser feito na área que seus moradores tenham dignidade de moradia, trabalho e inclusão social. Todavia, deve-se destacar que houve um imenso avanço na atual gestão. Palavras-chave: políticas públicas; regularização fundiária; planejamento e gestão urbana Abstract: The “Vila Torres” is one of the oldest irregular occupations in Curitiba city, began in the 1960s and was formerly called Vila Pinto. This paper aims analyse how urban planning and management are being applied in Vila Torres, checking the public policies to provide land regularization in Curitiba and how these policies are being applied in practice. The paper begins with the selection of important urban planning and management documents, as the Municipal Plan for Housing and Social Housing, Municipal Land Regularization in Permanent Preservation Areas Plan, analysis of COHAB-CT projects and field visits. The start of regularization in Vila Torres have started in 1987, more than 20 years ago, but there is still much to be done in this area to provide affordable housing, employment and social inclusion for their residents. However, it should be noted that there was a breakthrough in the current administration. Keywords: public policies; land regularization, urban planning and management 1. INTRODUÇÃO A Vila Torres é uma das mais antigas ocupações irregulares do município de Curitiba, chamada anteriormente de Vila Pinto. A ocupação iniciou-se na década de 1960, juntamente com outras ocupações irregulares do antigo bairro Capanema, hoje, Jardim Botânico. Esse aglomerado subnormal, chamado Favela do Capanema, representava entre 1950 e 1970 a maior ocupação subnormal do município de Curitiba, tendo 700 famílias, cerca de 3000 pessoas. Entre 1976 e 1977, uma engenhosa operação de desfavelamento retirou a Favela do Capanema do local, levando as famílias para habitações distribuídas pelos bairros Cajuru, Boqueirão e Uberaba. Todavia, alguns moradores recusaram-se a sair, assim, restou na área somente a Vila Pinto, na época com aproximadamente 40 moradias (ver Figuras 1 e 2).

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Políticas públicas para regularização fundiária: o caso da Vila Torres em Curitiba - PR

Rafaela Antunes Fortunato (1) Roberto Caldeira (2) Cristina de Araújo Lima (3) (1) Doutoranda em Meio Ambiente e Desenvolvimento, UFPR, Brasil. E-mail: [email protected]

(2) Mestrando em Engenharia de Construção Civil, UFPR, Brasil. E-mail: [email protected] (3) Dep. Arquitetura e Urbanismo, UFPR, Brasil. E-mail: [email protected]

Resumo: A Vila Torres é uma das mais antigas ocupações irregulares do município de Curitiba, teve início na década 1960 e foi chamada anteriormente de Vila Pinto. Esse artigo pretende realizar uma análise da forma como o planejamento e a gestão urbana estão sendo aplicadas na Vila Torres, verificando o que prevêem as políticas públicas para regularização fundiária no município de Curitiba e como as mesmas estão sendo aplicadas na prática. O artigo parte da seleção de importantes documentos de planejamento e gestão municipal, como o Plano Municipal de Habitação e Habitação de Interesse Social e o Plano Municipal de Regularização Fundiária em Áreas de Preservação Permanente, análise dos projetos da COHAB-CT para área e visitas a campo. Percebe-se que apesar do início da regularização fundiária na Vila Torres ter iniciado em 1987, a mais de 20 anos atrás, ainda existe muito a ser feito na área que seus moradores tenham dignidade de moradia, trabalho e inclusão social. Todavia, deve-se destacar que houve um imenso avanço na atual gestão. Palavras-chave: políticas públicas; regularização fundiária; planejamento e gestão urbana Abstract: The “Vila Torres” is one of the oldest irregular occupations in Curitiba city, began in the 1960s and was formerly called Vila Pinto. This paper aims analyse how urban planning and management are being applied in Vila Torres, checking the public policies to provide land regularization in Curitiba and how these policies are being applied in practice. The paper begins with the selection of important urban planning and management documents, as the Municipal Plan for Housing and Social Housing, Municipal Land Regularization in Permanent Preservation Areas Plan, analysis of COHAB-CT projects and field visits. The start of regularization in Vila Torres have started in 1987, more than 20 years ago, but there is still much to be done in this area to provide affordable housing, employment and social inclusion for their residents. However, it should be noted that there was a breakthrough in the current administration. Keywords: public policies; land regularization, urban planning and management 1. INTRODUÇÃO

A Vila Torres é uma das mais antigas ocupações irregulares do município de Curitiba, chamada anteriormente de Vila Pinto. A ocupação iniciou-se na década de 1960, juntamente com outras ocupações irregulares do antigo bairro Capanema, hoje, Jardim Botânico. Esse aglomerado subnormal, chamado Favela do Capanema, representava entre 1950 e 1970 a maior ocupação subnormal do município de Curitiba, tendo 700 famílias, cerca de 3000 pessoas. Entre 1976 e 1977, uma engenhosa operação de desfavelamento retirou a Favela do Capanema do local, levando as famílias para habitações distribuídas pelos bairros Cajuru, Boqueirão e Uberaba. Todavia, alguns moradores recusaram-se a sair, assim, restou na área somente a Vila Pinto, na época com aproximadamente 40 moradias (ver Figuras 1 e 2).

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FIGURA 1 – ANTIGA FAVELA DO CAPANEMA

FONTE: ARQUIVO IPPUC (apud GAZETA DO POVO, 2011)

FIGURA 2 – ATUAL OCUPAÇÃO DA VILA TORRES

FONTE: ARQUIVO IPPUC (apud GAZETA DO POVO, 2011)

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Em 1987, iniciou-se na Vila Pinto um processo de regularização fundiária e urbanização de favelas. As mudanças refletiram até na identidade do local, que 12 anos mais tarde deixou de chamar-se Vila Pinto para ser denominada Vila Torres, buscando acabar com o estigma criado pela antiga favela.

Contudo, as condições de urbanização, moradia e urbanidade dos habitantes da Vila Torres em 2011 ainda são extremamente precárias, como se constatou na visita técnica ao local - realizada no início de outubro de 2011. Grandes são os riscos e vulnerabilidades dos habitantes do local. Diversos moradores se encontram em áreas de risco de inundações urbanas (ver Figura 3). Outros tantos convivem diariamente com o lixo, em suas casas, nas ruas, nos poucos locais de lazer onde brincam as crianças (ver Figura 4). Além disso, conforme relatos de moradores, a área ainda é reduto de traficantes de drogas.

FIGURA 3 – RISCOS E VULNERABILIDADES SOCIOAMBIENTAIS: ÁREAS SUJEITAS A INUNDAÇÕES

NA VILA TORRES FONTE: Elaboradas pelas autoras (2011)

FIGURA 4 – RISCOS E VULNERABILIDADES SOCIOAMBIENTAIS: O PROBLEMA DO LIXO NA VILA TORRES

FONTE: Elaboradas pelas autoras (2011)

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A visita ao local também demonstrou que mesmo as áreas consideradas urbanizadas apresentam uma série de problemas, evidenciados pela total disparidade com o entorno, comprovando a exclusão/segregação socioespacial1 de seus habitantes, ressaltada pelos empreendimentos de grande valorização do entorno, como a PUC e a FIEP. Esses problemas estão relacionados à falta de calçamento de demais espaços para pedestres, pavimentação precária de ruas, iluminação pública deficitária, inexistência de espaços de lazer no interior da Vila Torres, ambiente de paisagem urbana extremamente degradada, com famílias e crianças convivendo com o lixo em suas moradias, enfim, um misto de abandono e degradação socioambiental (ver Figura 5).

FIGURA 5 – PAISAGEM URBANA DEGRADADA: EVIDÊNCIA DA SEGREGAÇÃO SOCIOESPACIAL NA

VILA TORRES FONTE: Elaboradas pelas autoras (2011)

2. OBJETIVO

Todas essas situações levaram os autores a escrever esse artigo, questionando a realidade e buscando compreender essa lacuna existente entre as políticas públicas da cidade modelo e as imensas vulnerabilidades e segregação socioespacial encontradas.

Será que a atual gestão contempla melhorias e avanços socioambientais, incluindo mitigação dos riscos e vulnerabilidades socioambientais dos moradores da Vila Torres? O que prevê o planejamento urbano para essa porção urbana? Se existem programas previstos, quando serão implementados? Como se encontra o processo de participação social no planejamento e gestão urbana na Vila Torres? Os moradores estão cientes desses programas, participaram das discussões?

3. JUSTIFICATIVA

De acordo com Maricato (2003a) o processo de urbanização no Brasil ocorreu praticamente no século XX, no entanto, não foram superadas nas cidades algumas características dos períodos colonial e imperial, épocas marcadas pela concentração de terra, renda e poder, pelo exercício do coronelismo ou

1 Para Davis (2006, p. 106) “a segregação urbana não é um status quo inalterável, mas sim uma guerra social incessante na qual o Estado intervém regularmente em nome do progresso, do embelezamento e até da justiça social para os pobres, para redesenhar as fronteiras espaciais em prol dos proprietários de terrenos, investidores estrangeiros, a elite com suas casas próprias e trabalhadores de classe media”.

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política do favor e pela aplicação arbitrária da lei. Todos esses fatores contribuíram para a desigualdade na distribuição do solo urbano e, consequentemente, para o processo de formação de favelas2 e ocupações irregulares.

Acentuando-se esse processo, cabe destacar que desde a década de 1950, o Brasil vem passando por um processo de urbanização e metropolização bastante intenso. Neste período, residiam nas cidades somente 36% da população brasileira, contudo, em 2007 este percentual alcançou um total de 73,6%. O mais alarmante é que somente nas nove regiões metropolitanas nacionais – São Paulo, Rio de Janeiro, Salvador, Recife, Belo Horizonte, Fortaleza, Curitiba, Porto Alegre e Belém – residem aproximadamente 30% da população brasileira (MARICATO, 2008). Ainda segunda a autora, durante as décadas de 1980 e 1990, sob novas relações internacionais, a globalização, a desigualdade se aprofunda devido ao recuo das políticas sociais e crescimento do desemprego. Assim, conforme dados do IBGE no Censo de 2000 ocorre um aumento exponencial no número de favelas (MARICATO, 2003b).

Um dado alarmante sobre as favelas é trazido por Davis (2006) - em seu livro Planeta Favela que realiza análise do Relatório publicado pelo Programa de Assentamentos Humanos das Nações Unidas (UN-Habitat) em 2003, “The challenge of the slums [O desafio das favelas]” - no qual o autor ressalta que em 2035 conterá a maioria dos pobres do mundo, sendo que pelo menos metade da próxima explosão populacional urbana do Terceiro Mundo será creditada às comunidades informais.

No caso do Brasil, conforme SANTOS (2009), com diferença de grau e de intensidade todas as cidades exibem problemáticas parecidas. Apesar do tamanho, tipo de atividade, região em que se inserem serem elementos de diferenciação, em todas as cidades brasileiras existem problemas quanto ao emprego, habitação, educação, saúde, rede de transportes, lazer, acesso à água, falta de saneamento, entre outros problemas urbanos que revelam enormes carências. Essa falta de infra-estrutura será muito pior nas periferias urbanas e demais espaços ocupados pela população de baixa renda, como as favelas e ocupações irregulares, integrantes da “cidade ilegal”. Além disso, para o autor “quanto maior a idade, mais visíveis se tornam essas mazelas” (SANTOS, 2009, p. 95).

Nesse contexto insere-se a Vila Torres, que se encontra em processo de reurbanização e regularização fundiária, dentro de uma malha urbana central, valorizada economicamente e, sobretudo, inserida em pontos chaves de Curitiba, uma cidade considerada modelo3 sob os pontos de vista social e ambiental. 4. MÉTODO EMPREGADO

A presente pesquisa utilizou o método do estudo de caso, com avaliações de dados secundários em diferentes publicações institucionais e visitas a campo, realizadas por todos os pesquisadores envolvidos. Segundo Yin (2001), os estudos de caso são preferidos quando o pesquisador tem como problemas de pesquisa questões do tipo como e porque. Além disso, os estudos de caso são eficazes quando não há uma clara separação entre o fenômeno e seu contexto. Nessa mesma ótica, Robson (1993) caracteriza o estudo de caso como uma estratégia que permite o desenvolvimento dos detalhes, do conhecimento intensivo sobre um caso.

2 Conforme Maricato (2003b, p. 79): “o que define a favela é a completa ilegalidade da relação do morador com a terra. Trata-se de áreas invadidas. O que a difere dos loteamentos ilegais é o contrato de compra e venda que garante algum direito ao morador do loteamento, também chamado popularmente de loteamento clandestino. Muitas são as variantes que o loteamento ilegal pode assumir. Em geral a ilegalidade pode estar na burla às normas urbanísticas: diretrizes de ocupação do solo, dimensão dos lotes, arruamento, áreas públicas e institucionais, que devem ser doadas para o poder público, estão entre as mais comuns. Há casos, entretanto, em que a ilegalidade está na documentação de propriedade, na ausência da aprovação do projeto pela prefeitura ou no descompasso entre o projeto aprovado e sua implantação”. 3 A capital paranaense apesar da imagem de cidade modelo, que por meio do city marketing imprimiu-lhe identidade, símbolos e valores positivos criados pelos gestores locais, amplamente veiculados pela mídia local, nacional e exportados na década de 1990 para o mundo, como referência de planejamento urbano no Brasil, apresenta inúmeros problemas socioambientais (GARCÍA, 1997).

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5. RESULTADOS OBTIDOS

Conforme o Plano Diretor de Curitiba (CURITIBA, 2004), na seção única de habitação de interesse social, Art. 27, são diretrizes da política municipal de habitação de interesse social: diversificar as modalidades de acesso à moradia, tanto nos produtos quanto nas formas de comercialização, adequando o atendimento às características socioeconômicas das famílias beneficiadas; estabelecer normas especiais de urbanização, de uso e ocupação do solo e de edificações para assentamentos de interesse social, regularização fundiária e urbanização de áreas ocupadas por população de menor renda, respeitadas a situação sócio-econômica da população e as normas ambientais; instituir de zonas especiais de interesse social; estabelecer critérios para a regularização de ocupações consolidadas e promover a titulação de propriedade aos seus ocupantes; promover a relocação de moradores residentes em locais impróprios ao uso habitacional e em situação de risco, recuperando o meio ambiente degradado; produzir e incentivar a produção de moradias e lotes urbanizados destinados ao atendimento de famílias de menor renda; permitir o parcelamento e ocupação do solo de interesse social com parâmetros diferenciados, como forma de incentivo à participação da iniciativa privada na produção de habitação para as famílias de menor renda; promover a regularização fundiária e a urbanização de áreas de assentamentos subnormais, adequando-as aos parâmetros urbanísticos e ambientais estabelecidos e incluindo-os no contexto da cidade formal; promover melhores condições de habitabilidade às moradias já existentes, tais como salubridade, segurança, infra-estrutura e acesso aos serviços e equipamentos urbanos; promover assistência técnica e jurídica para a comunidade de baixa renda de ocupações irregulares, visando à regularização da ocupação; promover a melhoria da capacidade de gestão dos planos, programas e projetos habitacionais de interesse social; buscar a auto-suficiência interna dos programas habitacionais, propiciando o retorno dos recursos aplicados, respeitadas as condições sócio-econômicas das famílias beneficiadas.

Assim, pode-se considerar que as diretrizes da política municipal de habitação de interesse social permitem trabalhar com a mitigação dos problemas encontrados na Vila Torres, reurbanizando as áreas de ocupação subnormal e realizando a relocação de famílias que se encontram em áreas de risco de inundações.

Visando consolidar as políticas urbanas apresentadas no item anterior, em acordo com o Plano Diretor, foi elaborado em 2008, o Plano Municipal de Habitação e Habitação de Interesse Social. Esse Plano foi estruturado a partir de um diagnóstico que contém: caracterização geral da RMC e Curitiba, breve histórico da habitação no Brasil, Paraná e Curitiba, condicionantes habitacionais, condicionantes legais e normativos, condicionantes institucionais e administrativos, produção habitacional no município, déficit habitacional, as necessidade habitacionais para atendimento à demanda detectada e disponibilidade de terras no município para a produção habitacional, os custos para o atendimento ao déficit habitacional e regularização fundiária, além de conclusões e recomendações (CURITIBA, 2008a).

O Plano Municipal de Habitação e Habitação de Interesse Social (Curitiba, 2008), prevê como linhas programáticas de ação da Companhia de Habitação Popular de Curitiba - COHAB-CT, para urbanização e regularização fundiária: lotes urbanizados e financiamento para material de construção; participação no Programa de Arrendamento Residencial – PAR e no Programa de Parceria com a Iniciativa Privada; além de Alvará Simplificado para Moradia Popular; Fundo Municipal de Habitação – FMH; prevenção e contenção de novas ocupações irregulares; realocações emergenciais e Programa de Subsídio à Habitação de Interesse Social – PSH (CURITIBA, 2008a).

Outro documento a ser analisado é o Plano Municipal de Regularização Fundiária em Áreas de Preservação Permanente (CURITIBA, 2008b). Conforme esse documento, a Vila Torres, antiga Vila Pinto, encontra-se no bairro Prado Velho, com início da ocupação na década de 1960, apresentando domicílios em Área de Preservação Permanente - APP, os quais estão sujeitos à inundação (ver Figura 6).

A área total da Vila Torres é de 13.555,31m2, parte da área foi regularizada a partir de 1987 e, apesar de mais de duas décadas terem se passado (grifo das autoras), o restante ainda continua em processo de regularização. Os moradores da Vila Torres apresentam renda de 0 a 3 salários mínimos e têm como principal atividade o recolhimento, separação e venda de lixo reciclado. O número estimado de habitantes na Vila Torres é de 8000, sendo que aproximadamente 150 famílias estão localizadas em áreas de APP, sujeitas a inundações. Seguindo o índice médio de 3,5 hab/ha, observado pelo Censo IBGE 2000

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para domicílios em aglomerados subnormais, estima-se que mais de 550 pessoas habitem essas áreas de risco (CURITIBA, 2008b).

FIGURA 6 – ÁREAS DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE NA SUB-BACIA DO RIO BELÉM

DESTAQUE PARA A VILA TORRES FONTE: Adaptado de IPPUC-COHAB-PMC, 2008b, p. 110.

O Plano Municipal de Regularização Fundiária em Áreas de Preservação Permanente prevê como ações executivas: recuperação do meio ambiente, entendendo a ocupação irregular como passivo ambiental e promovendo ações que articulem a sua recuperação e a melhoria das condições de moradia; priorização para a regularização dos assentamentos promovidos pelo programa PROLOCAR, os localizados em APAs, APPs e áreas de risco; viabilização dos reassentamentos das ocupações irregulares em APPs, sempre que possível no interior da própria ocupação ou no seu entorno; e criação de um banco de terras, de maneira a ter áreas disponíveis para os reassentamentos, das moradias em APPs e as em situação de risco (CURITIBA, 2008b).

O caso da Vila Torres insere-se em todas essas premissas. No item a seguir serão apresentados os projetos que se encontram em andamento na Vila Torres, verificando na data atual, 2011, de que forma a gestão cumpriu com os objetivos do Plano elaborado em 2008.

Atualmente, novembro de 2011, existem dois programas para melhoria das condições habitacionais em andamento, ambos implantados pela Companhia de Habitação Popular de Curitiba – COHAB-CT:

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A) Projeto Vila Prado – faz parte do programa da PMC para reassentamento de 373 famílias que moram em áreas de risco de inundações, nas Áreas de Preservação Permanente (APPs) das margens do rio Belém, com investimento de R$ 15,6 milhões, incluindo recursos da prefeitura e do governo federal (PAC). Segundo informações da COHAB-CT (2011), o processo encontra-se em licitação (ver Figura 7);

FIGURA 7 – PROJETO VILA PRADO DA COHAB-CT - REASSENTAMENTO DE FAMÍLIAS QUE MORAM EM ÁREAS DE RISCO DE INUNDAÇÕES (NAS APPS)

FONTE: COHAB-CT (2011)

B) Projeto Comunidade em Cores, parceria público-privada, entre a prefeitura e a empresa Akzo Nobel (fabricante das Tintas Coral), prevendo obras de reparos e melhorias nas fachadas de 436 casas, tornando mais bonito o visual da Vila Torres. Já foram atendidas, até meados de agosto de 2011, 136 famílias, outras 300 obras estão em andamento (CURITIBA, 2011), ver Figura 8.

FIGURA 8 – PROJETO COMUNIDADE EM CORES- VILA TORRES

FONTE: CURITIBA, 2011

Além disso, no que tange à vulnerabilidade social, para solucionar o problema do lixo na Vila Torres, considerando que a maioria de seus habitantes têm como renda familiar atividades relacionadas ao

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recolhimento, triagem e venda do lixo reciclável, foi criado um projeto específico para melhoria das condições de vida dos habitantes da Vila Torres, construindo um local próprio para triagem dos resíduos coletados pelos mesmos.

Percebeu-se na visita ao local, que a comunidade está envolvida nos programas e apóia o seu desenvolvimento. Além disso, as intervenções já realizadas foram apropriadas de forma positiva pela população local, criando espaços de convivência, dando uma maior urbanidade à Vila (ver Figura 9 abaixo).

FIGURA 9 – ESPAÇOS PÚBLICOS: A APROPRIAÇÃO DA COMUNIDADE FONTE: Elaboradas pelas autoras (2011)

Conforme o Plano Municipal de Regularização Fundiária em Áreas de Preservação Permanente (CURITIBA, 2008b), para todo o município de Curitiba, 1.091 pessoas participaram, com 257 intervenções - perguntas, sugestões, contribuições e propostas - das quais 196 diziam respeito a questões de caráter pontual e específica de cada ocupação e 61 diziam respeito ao Plano propriamente dito. Não foi possível obter os dados de como esse processo se deu na Vila Torres.

De todo modo, todos os projetos descritos - reassentamento de famílias que moram em áreas de risco de inundações (nas APPs), comunidade em Cores; Ecocidadão – continuam em andamento e com grande aceitação popular, segundo líderes comunitários da Vila Torres.

6. CONSIDERAÇÕES FINAIS

O artigo buscou compreender o Espaço Urbano da Vila Torres sob o ponto de vista das relações entre o planejamento e a gestão urbana desse espaço e a realidade encontrada no local. Percebe-se que apesar do início da regularização fundiária na Vila Torres ter iniciado em 1987, a mais de 20 anos atrás, ainda existe muito a ser feito na área que seus moradores tenham dignidade de moradia, trabalho e inclusão social.

Todavia, deve-se destacar que houve um imenso avanço na atual gestão. Desde 2008, quando os planos municipais voltados à habitação foram elaborados – destacando-se o Plano Municipal de Habitação e Habitação de Interesse Social e o Plano Municipal de Regularização Fundiária em Áreas de Preservação Permanente – a gestão urbana na Vila Torres progrediu de maneira intensa.

Alguns frutos já estão sendo colhidos, como as melhorias na rua principal e em diversas casa da Vila Torres, com o Projeto Comunidade em Cores, mas as principais contribuições sociais estão por vir, com o reassentamento das populações que habitam áreas de risco de inundações urbanas em áreas do entorno – Projeto Vila Prado - e a criação de um espaço que possibilite as famílias trabalhar com o lixo reciclável de forma digna, longe dos ambientes familiares – Projeto Ecocidadão.

Assim, a análise demonstrou que a atual gestão urbana para a Vila Torres encontra-se no caminho certo, cumprindo as diretrizes estabelecidas nas políticas públicas e os objetivos preconizados no planejamento urbano. Caberá uma nova avaliação no local quando esses projetos estiverem concluídos, para realmente comprovar o modo com que todas as intervenções foram realizadas, a apropriação da população desses novos espaços, bem como avaliar futuras melhorias, sobretudo, nas áreas já regularizadas que não

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apresentam ainda infra-estruturas suficientemente adequadas. Intervenções na área de segurança pública também são necessárias e urgentes, pois não se pode viver dignamente em uma região que ainda território do tráfico de drogas.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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