VALENTE 2012 ICMedia Perspectivas Da Fonetica Forense

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Errata: p. 7, segunda coluna, final do 3º parágrafo, onde se lê "de todo o espaço amostral", leia-se "de toda a população".

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  • RESUMO Na percia oficial brasileira ainda h pouca discusso a respeito da chamada mudana de paradigma na Criminalstica, com sua crtica ao dogma da unicidade. Este tutorial apresenta os principais argumentos que emba-sam as propostas recentes de uma nova abordagem para a comparao forense de locutor, alm de tambm discutir a utilizao de razes de verossimilhana (LR, Likelihood Ratios) nesse tipo de exame.

    1. INTRODUO

    Muitas reas da Criminalstica envolvem o que chamaremos aqui de problema da determi-nao da fonte ou origem: dado um vestgio o material questionado , uma pessoa ou objeto suspeitos de o terem produzido (ou terem sido utilizados na sua produo) so apresentados percia, para obteno de material de mesma natureza do material questionado, o qual cons-tituir o material padro. Em alguns casos, o material padro pode ter sido obtido por outras instncias que no a pericial, sendo posterior-mente encaminhado aos peritos.

    O que se pergunta percia : a pessoa ou objeto suspeitos produziram o vestgio?

    So exemplos desse tipo de exame:

    um confronto microbalstico no qual se investiga se um projetil foi disparado por uma determinada arma de fogo;

    um exame grafoscpico (ou grafotcni-co) que avalia se lanamentos manus-critos questionados foram produzidos por uma determinada pessoa;

    um confronto datiloscpico que procura atribuir (ou no) a produo de um fragmento de impresso digital a uma determinada pessoa;

    um exame de DNA forense que investi-ga se um resduo biolgico foi produzi-do por um determinado suspeito;

    um exame de reconhecimento de pa-dro que procura determinar se uma marca de solado provm de determina-do calado;

    um exame de reconhecimento facial em que se compara a imagem da face de uma pessoa em um vdeo de um siste-ma de vigilncia com a fotografia de um suspeito obtida em situao contro-lada;

    um exame de fontica forense em que se avalia se as falas em uma gravao questionada foram emitidas por uma determinada pessoa.

    Os exames relacionados determinao da fonte so tradicionalmente abordados a partir de uma metodologia de comparao de caracte-rsticas que tem os seguintes passos gerais:

    1) anlise prvia do material questionado a fim de verificar se ele contm infor-mao suficiente para possibilitar a comparao;

    2) obteno de material padro apropria-do, ou anlise do material enviado pe-rcia a ttulo de padro para verificar se utilizvel. Em geral, esse estgio leva em conta requisitos referidos nos textos de Criminalstica como adequabilida-de, quantidade, contemporaneida-de, autenticidade e espontaneidade (por exemplo, ver: [1], p. 203-204; [2], p. 300-314; [3], p. 286-287);

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    Perspectivas da fontica forense num cenrio de quebra do dogma da unicidade

    Charles Rodrigues ValenteSEPAEL, Instituto Nacional de Criminalstica

    Braslia, DF, CEP 70.610-902, [email protected]

  • 3) extrao ou levantamento de um deter-minado conjunto de caractersticas jul-gadas discriminadoras do material pa-dro e do material questionado;

    4) comparao das caractersticas levanta-das e concluso a respeito da coinci-dncia ou no da origem do material padro e do material questionados.

    A respeito dessa metodologia geral, h duas questes subjacentes de grande importncia e que esto inter-relacionadas:

    Questo 1: que embasamento cientfico os respectivos ramos da Criminalstica apresentam para concluir sobre a ques-to da determinao da fonte ou origem a partir dessa metodologia geral?

    Questo 2: que tipo de concluso possvel apresentar? Quantitativa, qualitativa, categrica, escala de probabilidade?

    2. IDENTIDADE QUALITATIVA E IDENTIDADE NUMRICA

    Para tentar responder s questes propostas ao final da introduo, necessrio primeira-mente distinguir duas operaes lgico-concei-tuais que, normalmente, na determinao fo-rense da origem de um vestgio, tanto nos lau-dos periciais quanto em muitos livros e peri-dicos da rea, so confundidas.

    2.1. IDENTIFICAO E INDIVIDUALIZAO

    Usando a nomenclatura encontrada em [4], p. 206, essas duas operaes so denominadas identificao (ou identificao qualitativa, como veremos a seguir) e individualizao (ou identificao numrica, como tambm veremos a seguir).

    A identificao seria o agrupamento de um conjunto de seres em uma classe com base no levantamento de caractersticas comuns entre esses seres. J a individualizao seria a opera-o de destaque de um nico ser.

    Deve-se notar que, na lngua portuguesa, no seu uso comum, identificao, bem como cognatos como identidade, so termos amb-guos, que podem ter, conforme o contexto, qualquer um dos dois significados. Quando,

    por exemplo, algum diz eu me identifico com Fulano de Tal, quer dizer que v entre si e Fulano de Tal um conjunto de caractersticas comuns (preferncias, viso de mundo, atitudes etc.) que permitem colocar a si e Fulano de Tal em uma mesma classe, e esse significado de identificao est relacionado ao primeiro conceito definido no pargrafo anterior. J quando, por exemplo, no noticirio dito que o suspeito do crime foi identificado, o signi-ficado de identificao (ou deveria ser) o que se denominou no pargrafo anterior de indivi-dualizao.

    Se a anlise pericial demonstrar que proprie-dades do material questionado e do padro in-dicam que o ente (pessoa ou objeto) que os produziu tem um certo conjunto de caractersti-cas comuns, ter, a rigor, determinado uma classe de seres que poderiam dar origem ao vestgio, e realizado uma identificao, no uma individualizao. Essa identificao est relacionada, conforme [4], p. 206, ao que tam-bm denominado identidade qualitativa dos membros da classe.

    Por outro lado, se a anlise da origem apon-tar uma pessoa ou objeto especfico como aquele que originou o vestgio, o que se reali-zou foi uma individualizao, a qual est rela-cionada ao que se denomina identidade num-rica daquela pessoa ou objeto especfico.

    Pela prpria natureza das duas operaes, v-se que a identidade qualitativa, no caso da investigao de origem, pode ser estabelecida a partir do levantamento de caractersticas co-muns entre dois entes ou, ainda, pelas caracte-rsticas comuns entre traos ou marcas por eles produzidas. J a identidade numrica s pode ser estabelecida, a rigor, pela garantia da conti-nuidade no tempo, no caso, entre o instante em que o ser produziu o vestgio e o instante em que a sua identidade foi atestada.

    Portanto, da identidade qualitativa no se-gue, por deduo, a identidade numrica.

    2.2. ESCOLHA DE CARACTERSTICAS DEFINIDORAS DA CLASSE

    Deve-se notar que o estabelecimento da identidade qualitativa processo que chamare-

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  • mos aqui de identificao qualitativa est umbilical e necessariamente associado esco-lha de um modelo e/ou de um conjunto de ca-ractersticas as quais so usadas para definir a classe de seres.

    Essa escolha pode implicar, dependendo do tipo das caractersticas classificadoras, em ter outro nvel de escolha embutido: a determina-o, qualitativa ou quantitativa, de quando se considera a caracterstica presente ou no, ou a adoo de uma escala de gradao que vai da ausncia ou presena, em grau mximo, da ca-racterstica.

    No caso da percia de determinao da fonte, o que se quer dizer que o resultado da percia diretamente dependente dos parmetros de comparao e da mtrica escolhida para men-surar a distncia entre o material questionado e o material padro.

    Esse processo de escolha no pressuposto lgico necessrio no estabelecimento da identi-dade ou identificao numrica.

    2.3. CONTINUIDADE NO TEMPO

    A continuidade no tempo no uma questo alheia ao contexto jurdico-policial e pericial. Por exemplo, ela a preocupao central quan-do se fala em cadeia de custdia ([4], p. 207), ou seja, quando se implementam mecanismos que busquem garantir que o vestgio colhido na cena de crime ou apresentado como prova per-manea o mesmo ao longo de toda a cadeia de persecuo penal.

    E ainda que muitos manuais tradicionais de Criminalstica no explicitem a diferena lgi-ca entre a identificao qualitativa e a identifi-cao numrica, ela est implcita em relao continuidade no tempo em um dos requisitos desejveis do material padro: a contempora-neidade em relao ao material questionado (ver, por exemplo: [2], p. 300 e 308; [1], p. 203-204; [3], p. 286 e 292).

    Exceto em exames associados a caractersti-cas tidas como perenes ou de alterao apenas em eventos drsticos como o caso do mate-rial gentico e dos desenhos papilares, respecti-vamente o requisito da contemporaneidade

    reconhece que a comparao de caractersticas, que o cerne da metodologia geral apresentada na Introduo, no acompanha no tempo o ob-jeto ou indivduo que produziram o vestgio.

    2.4. HIERARQUIA DE PROPOSIES

    Como visto, a anlise pericial da questo da origem feita com base na metodologia geral apresentada na Introduo no capaz, por uma limitao lgica, de realizar a identifica-o numrica. Porm, a identificao numrica um pressuposto, ao menos terico, no qual se fundamenta a imputao penal. Essa constata-o poderia levar a concluir que a percia tem uma contribuio pequena para a Justia, o que obviamente incorreto.

    Em primeiro lugar, o que se deve ter em mente que a percia, apesar de ser um ele-mento importante na cadeia de persecuo pe-nal, no retira do rgo julgador a responsabili-dade ltima pela deciso de mrito, em particu-lar sobre a fixao penal da autoria do delito.

    Alm disso, deve-se ter em mente que a per-cia no se restringe aplicao da metodologia bsica de investigao da origem.

    Uma maneira de situar o trabalho da percia na cadeia de persecuo penal a proposta de hierarquia de proposies contida em [5], que comentada, por exemplo, em [6], p. 118-120.

    Com base nesse artigo, adaptando a aborda-gem para o enfoque aqui desenvolvido, pode-se dizer que as hipteses ou proposies pass-veis de serem confrontadas pela percia so classificveis em trs nveis:

    nvel I ou nvel da fonte (source): aquele em que as proposies ou hip-teses se referem determinao da fon-te ou origem do material questionado. O exame centrado na anlise do vest-gio e do material padro;

    nvel II ou nvel da atividade (activity): aquele em que as proposies se refe-rem efetiva presena do suspeito no tempo, lugar e situao em que se deu a ao ou omisso objeto de questiona-mento;

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  • nvel III ou nvel do delito (offence): aquele em que a percia trata de hipte-ses referentes prtica da ao ou omisso pelo suspeito.

    Do nvel I para o nvel III cresce a aproxima-o entre as proposies e o estabelecimento da autoria delitiva.

    importante salientar que essa hierarquia no um esquema rgido (ver [5], p. 233), po-dendo haver superposio de nveis. Alm dis-so, o objetivo final dos autores daquele artigo possibilitar uma anlise baseada em razes de verossimilhana (LR, likelihood ratios), que veremos mais frente. Por esse motivo, as hi-pteses ou proposies, em cada nvel, so sempre analisadas em pares antagnicos, sendo tambm importante distinguir entre proposi-es e explicaes (ver [7]).

    Seja, como exemplo, um caso de furto quali-ficado, em que so encontradas marcas de cal-ado no local de crime. A concluso de um exame de reconhecimento de padro que con-trasta essas marcas questionadas com aquelas de um calado do suspeito ser de nvel I.

    O nvel I o campo por excelncia da per-cia. No caso da investigao da origem, esse o nvel em que se situa a metodologia geral descrita na Introduo e mesmo qualquer outra metodologia que tenha o mesmo objetivo, como as baseadas em razes de verossimilhan-a.

    A rigor, no nvel I, no est em questo a continuidade no tempo. Portanto, no nosso exemplo, mesmo que houvesse sido estabeleci-do que as marcas encontradas no local de crime vieram do calado do suspeito (veremos mais a frente qual o grau de certeza possvel de se ter numa afirmao desse tipo), isso no garan-tiria que foi o suspeito quem adentrou o local do furto, pois, por exemplo, outra pessoa pode-ria estar usando aquele calado, emprestado pelo, ou subtrado do, suspeito.

    Dessa forma, a percia no pode afirmar, com base apenas no vestgio em questo e no material padro, que efetivamente o suspeito estava no local, tempo e circunstncia em que ocorreu o furto. Para isso, seria necessria in-

    formao de natureza circunstancial, ou seja, informao que agregasse elementos de conti-nuidade no tempo anlise. Proposies desse tipo j seriam do nvel II na hierarquia proposta em [5].

    Progredindo na hierarquia, no nvel III tem-se que as hipteses a serem confrontadas dizem respeito ao cometimento, pelo suspeito, da ao ou omisso descritas no tipo penal. O tra-balho da percia nesse nvel tangencia o dom-nio que , por excelncia, do julgador. Acima do nvel III esto as questes jurdico-penais propriamente ditas: inteno (dolo e culpa), ex-cludentes de ilicitude etc.

    No sistema processual brasileiro, e na pr-pria cultura da sua percia criminal oficial, o perito no incentivado a incluir na sua anlise elementos que vo alm dos vestgios propria-mente ditos, e, principalmente, informao contextual, e portanto extracientfica, que, ape-sar de no necessariamente incorreta, depende de outros tipos de prova (por exemplo, a teste-munhal) ou mesmo da assuno de elementos circunstanciais.

    O fato de [5] incluir a participao da percia em consideraes de nvel II e, principalmente, nvel III que no seriam da alada pericial na tradio brasileira talvez se explique porque, na tradio processual dos autores daquele arti-go o Reino Unido os peritos sejam costu-meiramente chamados para testemunhar em ju-zo e opinar sobre esse nveis, sendo esse teste-munho parte integrante do trabalho pericial. No Brasil, a percia se manifesta fundamentalmen-te por meio do laudo pericial, podendo ser ou-vida em audincia apenas para esclarecer sobre o exame (art. 159, 5o, inciso I e art. 400, ca-put e 2o, todos do Cdigo de Processo Penal CPP, [8]).

    Alm disso, como fica evidenciado em [7], mesmo no nvel III a percia avalia pares de hi-pteses passveis de possibilitar uma anlise estatstica, sendo isso distinto da mera emisso de uma opinio.

    Em todo caso, talvez seja prudente conside-rar que concluses de nvel II e III, a rigor, s sero da alada pericial quando os elementos

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  • circunstanciais forem colhidos pela prpria pe-rcia, que, munida de sua f pblica, pode agreg-los nas consideraes a serem feitas no laudo pericial.

    No exemplo da marca de calado, a existn-cia de prova testemunhal que relacione o sus-peito ao local e ao horrio provvel de ocorrn-cia do furto um elemento circunstancial rela-cionado ao nvel II, porm no de natureza as-similvel a prova pericial.

    Nada impede, entretanto, que essa informa-o seja indiretamente includa na anlise peri-cial por meio, por exemplo, de um quesito que pede um estudo de plausibilidade de uma de-terminada dinmica de eventos que inclui o suspeito como o agente delituoso.

    Em contraste, um exemplo de proposio efetivamente pericial de nvel II seria a que conclusse, num exame de local em suspeita de crime de telecomunicao, por meio de consta-tao in loco realizada pela equipe de peritos, que uma estao clandestina operada por um determinado indivduo transmitia informao por processo eletromagntico.

    2.5. RESUMO DAS CARACTERSTICAS DOS DOIS TIPOS DE IDENTIFICAO

    A Tabela 1 contrape a identificao qualita-tiva e a identificao numrica tendo em vista o que foi apresentado at aqui.

    Os exames periciais de determinao da fon-te se baseiam, como regra geral, em anlise de material questionado e padro, circunscre-vendo-se ao nvel I (nvel da fonte) da hierar-quia de proposies e constituindo uma ativi-dade de identificao qualitativa.

    Esse o caso de todos os exemplos dados na Introduo quando a anlise se basear em me-todologias de comparao entre vestgio e ma-terial padro, sem preocupao direta com questes de persistncia e transferncia de mar-cas e traos.

    Em particular, o caso da comparao fo-rense de locutor (ltimo exemplo dado na In-troduo).

    TABELA 1IDENTIFICAO QUALITATIVA VERSUS IDENTIFICAO NUMRICA

    Tipo de identifica-o

    Qualitativa Numrica

    Resultado O resultado uma clas-sificao (a fonte do vestgio ou no da mesma classe da fonte do padro).

    O resultado uma individualizao.

    Nmero de seres discriminados

    Varivel conforme o caso, podendo ser qual-quer inteiro maior ou igual a 1.

    1 (um).

    Dependncia em relao escolha de parmetros de classificao/com-parao

    Dependente intrinseca-mente.

    No utiliza parme-tros de classifica-o.

    Relao com a continuidade no tempo

    No pressupes meca-nismo de garantia de continuidade. O resulta-do pode variar se a fonte do material questionado se alterar.

    A continuidade no tempo pressuposto essencial.

    Correlao com a hierarquia de pro-posies

    Relacionada a proposi-es de nvel I (fonte).

    Relacionada a pro-posies de nvel II (atividade) e III (de-lito).

    Deve ficar claro que as questes de persis-tncia e, em particular, transferncia podem ser, e normalmente so de fato, pericialmente importantes na aceitao, como vestgio, do u-dio questionado. Porm, isso no parte do exame de comparao forense de locutor, mas do exame de verificao de edio (ver [9], p. 299; [3], p. 284-285).

    3. O DOGMA DA UNICIDADE

    A diferena entre identificao qualitativa e identificao numrica teria pouca relevncia prtica na percia se fosse possvel demonstrar para os exames de determinao da fonte cir-cunscritos ao nvel I da hierarquia de proposi-es que a metologia de anlise, ainda que em condies especficas, seria capaz de deter-minar classes que contivessem um nico ele-mento.

    Ou, equivalentemente, se fosse possvel de-monstrar o que chamaremos aqui de unicidade: apenas um nico ente (pessoa ou objeto) pode-ria produzir o vestgio com as caractersticas levantadas pela anlise pericial.

    Juntando-se unicidade o requisito da con-temporaneidade do material padro, que garan-

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  • tiria a continuidade no tempo, chegar-se-ia concluso de que o exame de investigao da fonte realizado conforme a metodologia de comparao delineada na Introduo, que uma identificao qualitativa, faria as vezes, para os fins prticos, de uma individualizao.

    3.1. A FALCIA DA INDIVIDUALIZAO

    No se analisaro aqui as questes relativas ao requisito da contemporaneidade, que depen-dem de consideraes particulares para cada tipo de vestgio.

    No que se refere ao pressuposto da unicida-de, verifica-se que, em geral, na Criminalstica ele no somente assumido como hiptese de trabalho provisria, a ser colocado sob teste empiricamente, mas como verdade bvia e evi-dente (ver [10] e [11]).

    O que se observa em muitos textos devota-dos ao tema da Criminalstica - e no somente no Brasil - bem como na prtica diria de vri-as reas da percia, a assuno da unicidade como um verdadeiro dogma.

    Sua base consiste de um raciocnio indutivo que iguala infrequncia a unicidade, fundamen-tado no acmulo de experincia pessoal no sistematizada, reforado pelas afirmaes de estudiosos vistos como baluartes nas suas res-pectivas reas (argumento de autoridade).

    Alm disso, como afirmado em [4], p. 208, a hiptese da unicidade da fonte no s assumi-da como verdade mas tambm transferida, sem questionamento, para o vestgio produzi-do.

    Configura-se, assim, o que [11] chama de falcia da individualizao.

    Por exemplo, para justificar a capacidade de determinao individualizadora da percia gra-foscpica, um texto da rea afirma:

    A escrita individual. A escrita resultante de est-mulos cerebrais que determinam movimentos e estes criam as formas grficas.Muito embora os crebros de todos sejam anatomica-mente iguais, a sua funo varia de pessoa para pes-soa. O mesmo ocorre com o sistema somtico. Vale dizer, portanto, que ambos tendem variar (sic) ao in-finito. Como a escrita resulta do concurso desses dois

    sistemas, evidentemente ela tambm varia ao infini-to.Se assim no fosse, a percia grafotcnica, que acei-ta universalmente, no teria o menor valor.([1], p. 29; grifos em negrito meus).

    De modo semelhante, mas em relao aos exames comparativos na balstica, outro texto afirma:

    (...) assim como pacfico que duas impresses digi-tais cujos desenhos coincidam exatamente s podem corresponder a um mesmo dedo, assim tambm pode-se ter como indiscutvel que a presena de deforma-es normais convergentes, em dois ou mais projetis, significa que foram todos expelidos por um s e mes-mo cano raiado.([2], p. 316; grifos meus).

    Para exemplos semelhantes na literatura em ingls, ver [11], p. 203-206.

    3.2. PREMISSAS DA FALCIA DA INDIVIDUALIZAO

    Como discutido em [10] e [11], h diversas razes, inclusive de cunho sociolgico, que po-dem explicar a presena razoavelmente disse-minada da falcia da individualizao, ou seja, da afirmao categrica da capacidade in-dividualizadora dos exames baseados em com-parao de caractersticas, na Criminalstica.

    Destacam-se a seguir duas das justificativas levantadas em [11] e que podem ser observadas nas duas citaes diretas feitas acima.3.2.1. O NMERO DE COMBINAES POSSVEIS

    A primeira diz respeito ao nmero de combi-naes possveis de determinadas caractersti-cas. Ainda que esse nmero seja grande, indi-cando que a possibilidade de coincidncias baixa, a matemtica e a estatstica no permi-tem concluir que ela pode ser assumida, mes-mo para os fins prticos, como sendo nula.

    O conhecido paradoxo do dia de anivers-rio (ver, por exemplo, [12], p. 64) mostra que o clculo de probabilidades apresenta muitas vezes resultados que no so intuitivos. Assim que, apesar de haver, desconsiderando-se os bissextos, 365 dias em um ano, basta tomar 23 pessoas ao acaso para que a probabilidade de que pelo menos duas delas faam aniversrio no mesmo dia seja maior do que 50% (na ver-dade, essa probabilidade ser de aproximada-

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  • mente 50,73%). Com 57 pessoas, a probabili-dade de ter pelo menos uma coincidncia ultra-passa 99%.

    Esses nmeros 23 e 57 so, respectiva-mente, duas e uma ordem de grandeza menores do que o universo de possibilidades, 365.

    No caso geral, havendo um universo de k possibilidades equiprovveis de combinaes de um conjunto de caractersticas e n seres que apresentam uma dessas combinaes, a proba-bilidade p de que pelo menos dois desses seres tenham as mesmas caractersticas :

    p=1 p2onde p2 a probabilidade de que no haja ne-nhuma coincidncia, ou seja,

    p2=kkk1

    k

    k(n1)k

    = k !(kn)!k n

    e, portanto,

    p=1 k !(kn)!k n

    (1)

    Pode-se argumentar que, na prtica, dada a enorme quantidade de possibilidades de combi-naes de um determinado conjunto de caracte-rsticas por exemplo, os pontos caractersti-cos em um fragmento de impresso digital , o clculo de probabilidade de coincidncias ao acaso utilizando (1) (ou qualquer expresso se-melhante) resultaria em valores nfimos para p, que permitiriam, mesmo considerando toda a populao de fontes possveis no planeta, fazer uma identificao individualizadora categrica.

    Entretanto, muitas caractersticas envolvidas em problemas de determinao da fonte co-muns na Criminalstica no tm o seu mecanis-mo satisfatoriamente descrito pela cincia.

    Clculos de nmero de combinaes poss-veis via de regra fazem suposies como a de independncia de variveis e distribuio uni-forme de possibilidades. Porm, se o mecanis-mo fsico de determinao dessas caractersti-cas no foi cientificamente levantado de modo satisfatoriamente completo, pode haver, na rea-lidade, variveis ainda no descobertas que fa-zem determinadas combinaes mais provveis do que outras.

    Outros processos como por exemplo, a aquisio de marcas de uso em solados de cal-ados e de marcas de disparo em projetis de ar-mas de fogo de alma raiada muitas vezes ca-recem de modelamentos e levantamentos esta-tsticos que permitam apresentar concluses em exames periciais de modo mais objetivo.

    Isso leva a uma consequncia, que parte da boa prtica cientfica, mas, surpreendentemen-te, tem ainda pouca ressonncia na cultura de muitas reas periciais: a necessidade de realizar levantamentos empricos e validaes estatsti-cas, ao invs de se assumir a unicidade como uma premissa inquestionvel.

    Mesmo quando os fundamentos bsicos do mecanismo sob anlise so bem estabelecidos, como no caso do DNA, a estatstica, vale lem-brar, no leva individualizao. Por sua pr-pria natureza, o que ela permite a quantifica-o objetiva de uma inferncia. O exame peri-cial de investigao da fonte continua sendo uma identificao qualitativa ([13], p. 199; [4], p. 209). A rigor, somente a verificao de todo o espao amostral poderia levar individuali-zao ([11], p. 7).

    Apesar da simplicidade da considerao em-butida na equao (1), importante refor-la. Muitas reas da Criminalstica, ainda hoje, de-senvolvem raciocnios equivocados que preten-dem embasar concluses individualizadoras para seus respectivos exames a partir da mera determinao do nmero possvel de combina-es de um conjunto de caractersticas (para um exemplo desse equvoco, ver [14]).3.2.2. CONHECIMENTO PACFICO E INDISCUTVEL

    Outra justificativa subjacente defesa aprio-rstica da unicidade e da capacidade individua-lizadora dos exames de investigao da ori-gem, mesmo no nvel I da hierarquia de propo-sies, a inocorrncia de coincidncias, ou seja, de seres diferentes produzindo vestgios indistinguveis, observada pelos peritos ao lon-go de sua experincia profissional.

    Como destacado em [11], p. 212-213 e em [10], h vrios problemas nesse raciocnio.

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  • Um deles lgico: a induo pode e usada cientificamente na formulao de hipte-ses, porm o acmulo de observaes no pro-va a hiptese. Na realidade, basta uma observa-o em discordncia com a hiptese para co-loc-la em cheque (conceito da falseabilidade das teorias cientficas, proposto por Karl Pop-per).

    Afirmativas sobre a capacidade de individu-alizao de exames criminalsticos deveriam, ao menos, ser mais modestas, sob o risco de pretenderem colocar a Criminalstica acima das prprias Cincias Naturais.

    Outro problema que, no cenrio de diver-sas reas das chamadas cincias forenses, v-se poucos estudos dedicados verificao, emba-sada no mtodo cientfico, da hiptese da indi-vidualizao. Baixo nvel de pesquisas formais e mesmo de esforo concentrado em busca de falsos positivos, alm da ausncia de levanta-mentos extensos e bancos de dados, parecem ser mais a regra do que a exceo, incluindo na rea de comparao forense de locutor.

    Epistemologicamente, todas as Cincias Na-turais tm no raciocnio indutivo um dos seus pilares e, do ponto de vista sociolgico, os ci-entistas, na prtica do dia a dia, tambm podem tender a apropriar como dogma as hipteses e teorias de ampla aceitao na comunidade ci-entfica em dado momento histrico, at por uma questo de eficincia (ver [15] ou [16]).

    Porm, a cultura cientfica, ao mesmo tem-po, tambm destaca a necessidade de testes sis-tematizados e objetivos no processo de estabe-lecimento de hipteses.

    Considerando, alm disso, que em muitas reas, incluindo a comparao de falantes, como veremos mais adiante, ainda no h par-metros objetivos quantitativos para todos os as-pectos levados em conta na anlise, seria dese-jvel implantar uma cultura de incentivo a tes-tes cegos de proficincia dos grupos periciais ([10]; [11], p. 201-202).

    4. RAZO DE VEROSSIMILHANA

    Abandonado o dogma da unicidade, a lgica inferencial de base estatstica se apresenta

    como a ferramenta preferencial para a soluo, em bases cientificamente mais slidas, do pro-blema da determinao da fonte.

    Considerando o nvel I da hierarquia de pro-posies, a metodologia tradicional de compa-rao de caractersticas entre os materiais ques-tionado e padro dever ser complementada pela avaliao estatstica da distribuio dessas mesmas caractersticas no restante da popula-o de entes que, potencialmente, poderiam ter produzido ou ter sido utilizados na produo do vestgio.

    O ideal, portanto, para a abordagem do pro-blema da determinao da origem, no ape-nas estabelecer o grau de compatibilidade entre as marcas ou traos do vestgio e as marcas ou traos do material padro ou seja, o seu grau de similaridade , mas tambm avaliar estatis-ticamente se as caractersticas observadas no vestgio poderiam ter-se originado de outros seres de uma populao de referncia, ou seja, o grau de tipicidade do conjunto de caracters-ticas do vestgio.

    Por exemplo, um alto grau de similaridade entre vestgio e material padro , em princ-pio, favorvel a uma concluso positiva a res-peito da identidade qualitativa entre a fonte do material questionado e do material padro. Po-rm, se o conjunto de caractersticas do vest-gio for muito comum, ou seja, seu grau de tipi-cidade for grande, isso ser desfavorvel concluso positiva a respeito da identidade qualitativa.

    Considera-se atualmente que a metodologia mais adequada para realizar os exames de de-terminao da fonte segundo esses princpios a que utiliza razes de verossimilhana no con-texto da anlise bayesiana de dados.

    4.1. ANLISE BAYESIANA DE DADOS

    A abordagem, teoria ou interpretao bayesiana da probabilidade, bem como sua fa-ceta operacional, a chamada anlise bayesiana de dados, uma das teorias matemticas que tratam do tema da probabilidade. Na realidade, no totalmente correto falar em uma nica interpretao bayesiana da probabilidade,

    8

  • pois pode haver pequenas diferenas de viso sobre aspectos especficos da probabilidade de acordo com o autor consultado.

    Neste tutorial, adota-se em linha geral, cha-mando de abordagem, teoria ou interpretao bayesiana, a encontrada em [17] e [18].

    A teoria bayesiana pretende ser um sistema lgico que permite atribuir um peso ou grau plausibilidade de eventos incertos. A incerteza deriva da ausncia de informao que permita determinar por deduo e seguramente se o evento ocorre ou no. A probabilidade, na vi-so bayesiana, , portanto, um estado de conhe-cimento, no uma entidade do mundo fsico, externa ao observador ([19], p. 10-11).

    Apesar de haver um foco no observador, o que faz com que em geral se classifique a abor-dagem bayesiana como uma teoria subjetiva da probabilidade, ela permite atingir resultados objetivos definidos, ou seja, inferncias de ca-rter conclusivo obtidas por deduo, a partir de inferncias tomadas como hipteses de tra-balho indutivas, as quais so tambm informa-das pelos dados observados. V-se, desde logo, o papel importante que a probabilidade condi-cional desempenha na anlise bayesiana.

    Para uma discusso aprofundada da teoria bayesiana, ver [18].

    A teoria bayesiana se contrape, tanto do ponto de vista filosfico quanto do ponto de vista operacional, a muitos dos aspectos da chamada teoria frequentista da probabilidade, que, historicamente, norteou os estudos da pro-babilidade na maior parte das geraes de ma-temticos nos sculos XIX e XX.

    A abordagem bayesiana centrada no teore-ma de Bayes, que recebe seu nome do matem-tico e reverendo ingls Thomas Bayes, o qual, em um artigo publicado postumamente em 1763, apresenta expresses e raciocnios relaci-onados probabilidade condicional.

    Entretanto, na realidade, a formulao defi-nitiva, e utilizada atualmente, do chamado teo-rema de Bayes deve-se a Laplace (1749-1827), que, em 1812, publicou um estudo no qual de-

    senvolvia vrios aspectos de uma teoria da pro-babilidade propriamente bayesiana.

    Nas dcadas seguintes, entretanto, os princ-pios do trabalho de Laplace foram colocados em xeque, sob o argumento de que careciam de rigor matemtico, por estarem baseados em uma noo intuitiva e subjetivista da probabili-dade.

    Prevaleceu, a partir da, a chamada teoria frequentista, onde a probabilidade de um even-to incerto X, aqui indicada por p(X), (por exemplo, ver [20]):

    p (X )limn

    n (X )n

    (2)

    onde:n o nmero de repeties, reais ou imagina-das hipoteticamente, da situao ou experimen-to em que X pode aparecer;n(X) o nmero de vezes em que se observa X.

    A teoria frequentista tambm conhecida como a teoria tradicional ou ortodoxa da pro-babilidade. Ela fortemente dependente do conceito de aleatoriedade (randomness), en-quanto a teoria bayesiana, por outro lado, centrada no conceito de incerteza.

    Como a noo de inferncia inerente de-finio bayesiana de probabilidade, essa teoria transita naturalmente para o campo da infern-cia estatstica, ao passo que, no contexto da abordagem tradicional da probabilidade, a infe-rncia estatstica considerada uma disciplina distinta, ainda que correlacionada com a proba-bilidade.

    Outra diferena que a abordagem tradicio-nal, por sua definio de probabilidade, leva diretamente regra da probabilidade conjunta de eventos, podendo-se dizer ento que essa re-gra se sobressai nessa teoria. Na abordagem bayesiana, a regra bsica a da probabilidade condicional, que veremos mais adiante. Opera-cionalmente, ela permite obter resultados a par-tir da assuno de um grau de plausibilidade a priori. Ao mesmo tempo, essa regra seria a ex-presso da prpria validade da abordagem bayesiana.

    9

  • A Tabela 2 mostra, de maneira resumida, as principais diferenas entre a interpretao fre-quentista e a bayesiana. Alguns aspectos pre-sentes na tabela sero abordados no prximo item.

    TABELA 2INTERPRETAO FREQUENTISTA VERSUS INTERPRETAO BAYESIANA DA

    PROBABILIDADE

    Interpretao: Frequentista Bayesiana

    Significado de pro-babilidade

    Frequncia relativa Grau de plausibili-dade

    Natureza da pro-babilidade

    Propriedade da situao sob anlise

    Estado de conheci-mento sobre a situa-o sob anlise

    Na relao obser-vador/objeto fo-cada no ...

    objeto ...observador

    Deduo x induo Se pretende uma teoria puramente dedu-tivo-matemtica

    Pode-se dizer que indutivo-dedutiva, se aproximando da fsica-matemtica

    Regra mais ca-racterstica

    Probabilidade conjunta Probabilidade con-dicional

    Conceito impor-tante

    Aleatoriedade Incerteza

    Admisso na teoria matemtica de probabilidades apriorsticas

    No admite, mas as tem de certa forma embuti-das na escolha do mo-delo de inferncia esta-tstica, que disciplina a parte

    Admite

    Inferncia estatsti-ca

    uma disciplina parte conceitualmente parte da teoria

    Papel do teorema de Bayes

    Regra de aplicao no clculo de probabilida-de condicional

    um mtodo geral de anlise

    Dependncia em relao dissemi-nao de ferra-mentas computaci-onais

    J era dominante antes da disseminao dessas ferramentas

    Deve parte de sua atual popularidade disseminao do microcomputador a partir da dcada de 1980

    A teoria bayesiana no a nica abordagem alternativa frequentista. O sistema axiomtico de Kolmogorov, por exemplo, utiliza teoria dos conjuntos para fundamentar o estudo da proba-bilidade (muitos manuais de probabilidade, como [21] e [22], usam essa abordagem). Po-rm, o sistema de Kolmogorov mais afim com a teoria frequentista do que com a teoria bayesiana.

    Para outras teorias da probabilidade, inclusi-ve que se afirmam bayesianas mas diferem do entendimento desse termo aqui delineado, ver [18], apndice A.

    4.2. O TEOREMA DE BAYES

    Um dos marcos na retomada do interesse pela teoria bayesiana foi a publicao do livro da referncia [17], cuja primeira edio de 1939.

    Entretanto, do ponto de vista dos fundamen-tos da teoria, [23] tem relevncia proeminente por tentar deduzir matematicamente, a partir de princpios elementares, as regras bsicas da in-ferncia lgica. Em outras teorias, como a fre-quentista e a de Kolmogorov, essa dificuldade no existe. Na teoria frequentista, essas regras bsicas decorrem facilmente da definio de probabilidade. Na teoria de Kolmogorov, elas so admitidas como axiomas ou so postas como definies (ver [22], p. 20-21 e 27-28).

    Em [23], as regras deduzidas so:

    probabilidade condicional:p (X ,YI )= p(XY , I )p(YI ) (3)

    probabilidade do complementar (ou re-gra da soma):p (XI )+ p (XI )=1 (4)

    onde:- a vrgula indica a operao E lgica;- a barra vertical | significa dado ou su-pondo, ou seja, p(A|B) deve ser lido como probabilidade de A dado B, ou, equivalente-mente, p(A) supondo que p(B)=1;- X significa X falso ou X no ocorre;- I a informao ou evento de referncia (background information), que destaca o fato de que toda probabilidade depende de pressu-postos ([19], p. 5).

    Nas expresses acima, como I pressuposto para todos os eventos ou informaes, ele pode, por economia na notao, ser omitido, desde que nunca seja esquecido que condio prvia para todo o restante.

    No caso pericial, podem-se citar como exemplos de pressupostos I em um exame de determinao da fonte no nvel I (um) da hie-rarquia de proposies: a integridade da cadeia de custdia da prova, de modo que o vestgio apresentado a exame aquele coletado na cena do crime; a validade da teoria cientfica que

    10

  • subjaz ao exame, por exemplo, os princpios da gentica em um exame de DNA.

    Dados dois eventos X e Y, a partir da regra da probabilidade condicional temos que:

    {p(X ,YI )= p (XY , I )p (YI )p (Y , XI )= p(YX , I )p(X I )mas:

    p (X ,YI )= p(Y , XI )pois falar no evento X e Y o mesmo que fa-lar no evento Y e X. Das expresses acima obtm-se, ento:p (XY , I )p (YI )=p (YX , I )p (XI )

    p (XY , I )=p (YX , I )p (XI )

    p (YI ) (5)

    A expresso (5) conhecida como teorema de Bayes, e pode, como fica evidente acima, ser obtida e utilizada no contexto da teoria fre-quentista e de outras teorias da probabilidade, j que, basicamente, um corolrio de (3) (ver, por exemplo, [20], p. 36, e [22], p. 30-31).

    O que distingue seu papel na probabilidade bayesiana que, nela, o teorema de Bayes a ferramenta de anlise principal. Para apreciar sua importncia, consideremos, na expresso (5), que X uma hiptese H cuja probabilidade se deseja calcular e Y a informao ou evi-dncia E obtida dos dados empricos. Dessa forma:

    p (HE , I )= p (EH , I )p (HI )p(EI ) (6)

    A expresso (6) mostra que o teorema de Ba-yes uma maneira de calcular a probabilidade da hiptese luz dos dados empricos a cha-mada probabilidade a posteriori, p(H|E,I) , partindo de duas informaes: uma estimativa inicial do valor dessa probabilidade a proba-bilidade a priori, p(H|I) e o clculo da proba-bilidade de que os dados empricos seriam real-mente aqueles observados caso a hiptese fosse verdadeira a chamada funo de verossimi-lhana, p(E|H,I).

    O termo p(E|I) uma espcie de constante de proporcionalidade que, em muitos proble-

    mas prticos, incluindo no uso forense das ra-zes de verossimilhana, no relevante.

    Ao contrrio do que a nomenclatura dos ter-mos pode talvez sugerir, no apenas a funo de verossimilhana que pode ser uma funo. Qualquer dos termos do teorema de Bayes pode ser uma funo densidade de pro-babilidade discreta ou contnua, ou um valor de probabilidade de um evento especfico.

    No h em princpio restries para o valor ou funo admitida para a probabilidade a pri-ori, mas o valor de convergncia da probabili-dade a posteriori, se houver um, poder ser al-canado com maior ou menor quantidade de dados dependendo da funo a priori utilizada.

    Esse comentrio introduz outra caracterstica da anlise bayesiana de dados, que o fato de demandar mais esforo computacional para de-terminados problemas do que se utilizada uma abordagem de natureza frequentista. No co-incidncia, portanto, que a popularizao do microcomputador a partir da dcada de 1980 tenha coincidido com o aumento significativo de interesse pela anlise bayesiana de dados.

    4.3. APLICAO FORENSE DO TEOREMA DE BAYES: LR

    Para equacionar o problema pericial da de-terminao da fonte, seja Hso a hiptese de que vestgio e material padro tenham vindo da mesma fonte (so: same origin), no caso a pes-soa ou objeto suspeitos.

    De (6), tem-se:

    p (H soE , I )=p (EH so , I )p (H soI )

    p(EI )(7)

    De igual forma, seja Hdo a hiptese de que a fonte no seja o suspeito (do: different origin). De (6):

    p (H doE , I )=p(EH do , I )p(H doI )

    p (EI )(8)

    Pode-se dizer que (7) uma medida da simi-laridade entre vestgio e material padro, en-quanto (8) uma medida da tipicidade do ves-tgio, pois quanto maior p(Hdo|E,I), mais tpico o vestgio, pois maior a probabilidade de

    11

  • que tenha se originado de outra fonte que no a suspeita.

    A razo entre as expresses (7) e (8), portan-to, permitir avaliar conjuntamente esses dois aspectos:

    p (H soE , I )p(H doE , I )

    =p(EH so , I)p (EH do , I )

    p (H soI )p(H doI )

    (9)

    Como mostrado acima, cada um dos termos da expresso (9) possui, a exemplo do que se tem no teorema de Bayes, um nome especfico.

    A razo esquerda da igualdade chamada razo de probabilidade a posteriori.

    direita da igualdade, o primeiro termo a razo de verossimilhana ou LR (Likelihood Ratio). O segundo a razo de probabilidade a priori.

    O termo p(E|I) acaba se cancelando quando passamos de (7) e (8) para (9).

    Tendo em vista que a percia realiza a anlise cientfica do vestgio e no deve, nem preten-de, substituir o julgador, a expresso (9) forne-ce uma base metodolgica bastante adequada para os exames de determinao da fonte.

    O objetivo dos exames passa a ser o forneci-mento da razo de verossimilhana, LR, obtida a partir da anlise do vestgio e do material pa-dro, bem como da amostra de uma populao de referncia. Dessa forma, a percia se atm evidncia material.

    Um LR maior do que um indica que maior a probabilidade da evidncia considerando que o suspeito a fonte; um LR menor do que um significa que maior a probabilidade da evi-dncia supondo que sua fonte seja diversa do suspeito; um valor igual a 1 significa que am-bas as probabilidade so iguais.

    muito importante, entretanto, notar que, na abordagem via LR, o exame pericial no for-nece valores ou razes de probabilidade a pos-teriori. Mas em geral a razo de probabilida-

    de a posteriori o que interessa diretamente ao julgador.

    Para chegar razo de probabilidade a pos-teriori, necessrio, como mostra a expresso (9), ter um valor de razo de probabilidade a priori, a qual representar o aporte, por parte do julgador, de outras consideraes pertinen-tes ao caso.

    5. LR NA COMPARAO FORENSE DE LOCUTOR

    A gentica forense foi a primeira rea da Cri-minalstica a adotar de forma generalizada uma metodologia baseada em razes de verossimi-lhana (ver, por exemplo, [10]). Seu papel pio-neiro demonstra que a sistemtica passvel de implementao.

    Na fontica forense, os chamados sistemas de reconhecimento automtico de locutor (RAL) ou sistemas ASR (Automatic Speaker Recognition) que incorporam a abordagem por LR e no meramente apresentam, como o caso, em geral, das aplicaes de controle de acesso, um resultado do tipo positivo ou ne-gativo so uma ferramenta que tambm de-monstra a aplicabilidade da metodologia na comparao forense de locutor.

    Entretanto, importante ter em mente que a abordagem por LR no uma panaceia, nem pode ser aplicada sem ter em vista suas princi-pais caractersticas.

    5.1. CARACTERSTICAS E LIMITES DA ABORDAGEM POR LR

    5.1.1. A EVIDNCIA NO O VESTGIO

    O emprego da anlise por LR no altera a natureza do exame de determinao da fonte: ele continua sendo uma identificao qualitati-va, no uma individualizao.

    Valem, portanto, as observaes feitas no item 2.2: o resultado do exame diretamente dependente das caractersticas e da mtrica uti-lizados na comparao.

    Na expresso da razo de verossimilhana,

    LR=p(EH so , I )p(EH do , I )

    (10)

    12

    Razo de probabilidade a posteriori

    Razo de verossimilhana

    Razo de probabilidade a priori

  • a evidncia E no o vestgio, mas o resultado da anlise comparativa entre o vestgio e o ma-terial padro, ou seja, a evidncia construda durante a anlise, estando nela embutida a es-colha de parmetros a serem extrados.

    No caso do DNA, a tcnica atual obtm um perfil gentico que distinto do sequenciamen-to completo do genoma, baseando-se, na reali-dade, no tamanho (massa) de segmentos espe-cficos do DNA (para detalhes, ver [24], p. 249-264).

    No caso da fala, por outro lado, a distncia entre vestgio e evidncia ainda maior do que na gentica forense, onde h um acentuado iso-morfismo entre ambos. Na comparao forense de locutor, a evidncia no a gravao questi-onada, mas o resultado da anlise comparativa entre essa gravao e a gravao padro, que depender das metodologias manuais e/ou automticas; acsticas e/ou articulatrias em-pregadas no exame.

    Enquanto o vestgio gentico do tipo dis-creto, sem intravariabilidade excetuando-se os casos rarssimos de quimerismo e mosaicis-mo , sem possibilidade de ser disfarado e praticamente imutvel no tempo, o vestgio na comparao forense de locutor tem caractersti-cas muito mais variveis (ver [6], p. 7-9; [9], p. 303; [25], p. 148-151), pois:

    h intravariabilidade intrnseca na fala, em todos os seus nveis;

    os parmetros (tanto acsticos quanto articulatrios) so contnuos;

    pode ocorrer tentativa de disfarce;

    a gravao do udio depende das ca-ractersticas do canal e do ambiente, como rudo de fundo e reverberao.

    Pode-se dizer, ento, que os resultados de uma anlise por LR na comparao forense de locutor ser intrinsecamente mais dependente da sistemtica de obteno da evidncia a par-tir do vestgio do que no caso do exame de DNA.5.1.2. SISTEMAS DE RECONHECIMENTO AUTOMTICO DE

    LOCUTOR

    Os sistemas ASR forenses (ou FSAR, Fo-rensic ASR), por exemplo, fazem anlise pre-dominantemente de parmetros acsticos fre-quenciais e, na prtica, costumam usar os coe-ficientes cepstrais, filtrados e transpostos se-gundo a escala Mel ([26], p. 262-265; [27], p. 432-433), recebendo a denominao de coefi-cientes mel-cepstrais (MFCC, Mel Frequency Cepstral Coeficients).

    Outras tecnologias especficas so tambm empregadas nesses sistemas, sendo muito co-mum o modelamento estatstico por mistura de gaussianas (GMM, Gaussian Mixture Model) com modelo de locutor de referncia nico (UBM, Universal Background Model).

    Obviamente, isso no significa que essas es-colhas de implementao foram arbitrrias. Testes objetivos e controlados e, portanto, ci-entificamente consistentes foram realizados mostrando, por exemplo, que a abordagem por GMM era mais eficiente do que HMM (Hid-den Markov Model) para fins forenses (ver, por exemplo,[28]).

    Porm, tendo em vista a diferena entre ves-tgio e evidncia, e as condies de contorno do vestgio forense de voz, pode-se afirmar que, embora os atuais sistemas FASR sejam uma ferramenta importante de anlise, eles no so definitivos ([29], seo 3.3.2). Por exem-plo, ainda h um grande campo de pesquisa aberto a outras abordagens acsticas, automti-cas ou semiautomticas, como a anlise de rit-mo ([29], seo 3.4.3 e p. 59).

    A discusso sobre o chamado UK position statement ([30]; [25]; [9], p. 305-306; e [31]) mostra que a rea de comparao forense de lo-cutor est distante da fase de sedimentao de metodologias. Levantamento recente (ver [32]) sugere que ainda no h uniformidade, em n-vel mundial, nos mtodos de execuo desse exame e na forma de expressar seu resultado.

    Deve-se ter em mente que a comparao fo-rense de locutor envolve situaes especficas (como a possibilidade de disfarce da voz; am-biente com rudos especficos e reverberao), no levadas em conta em outras aplicaes, como o controle de acesso, e que tendem a di-

    13

  • minuir drasticamente o ndice de validade e confiabilidade dos sistemas ASR.

    De particular relevncia, tanto no alerta que faz, vlido para todas as metodologias de reali-zao do exame de comparao forense de lo-cutor, quanto pela experincia dos seus autores, alguns deles com contribuio cientfica decisi-va para o prprio avano dos sistemas ASR, o artigo da referncia [33].5.1.3. POPULAO DE REFERNCIA

    A abordagem por LR, sendo um mtodo es-tatstico, depende da amostragem de uma po-pulao de referncia.

    Tem-se dois conjuntos de questes envolvi-dos, os quais, imbricados com a escolha das ca-ractersticas de comparao (item 5.1.1), tam-bm iro influenciar diretamente no resultado da anlise: primeiramente, as questes perti-nentes definio da populao de referncia; e, em segundo lugar, as relacionadas defini-o da amostra.

    Essas questes so relevantes e ainda no es-to totalmente resolvidas no somente nas re-as onde a abordagem estatstica relativamente nova, como na fontica forense, mas tambm em reas tradicionais como a gentica foren-se.

    As questes passveis de serem levantadas e suas solues podem variar de caso a caso e re-fletir-se no somente no clculo da LR, mas tambm na informao de referncia I e nas probabilidades a priori. Para um panorama desses problemas, ver [34].

    Do ponto de vista prtico, para o desenvolvi-mento da comparao forense de locutor na pe-rcia oficial brasileira, importante que esse tema seja amplamente e continuamente debati-do, gerando procedimentos de construo e uti-lizao de bancos de amostras para o portugus brasileiro, preferencialmente comuns e com-partilhados por todos os rgos de percia ofi-cial. importante lembrar que essa discusso no se aplica somente aos bancos de amostras necessrios para os sistemas FASR do tipo MFCC/GMM/UBM, mas para toda a gama de possveis parmetros, acsticos e articulatrios,

    que venham a ser abordados por meio de ra-zes de verossimilhana.5.1.4. QUANTITATIVO VERSUS QUALITATIVO

    A expresso (9) e mesmo toda a anlise bayesiana no necessariamente dependem de dados explicitamente colhidos, em base quanti-tativa, de um levantamento estatstico explci-to. As inferncias podem ter por base estimati-vas do observador, no caso o perito.

    A referncia [9], por exemplo, admite a pos-sibilidade de atribuio de valores para as pro-babilidades envolvidas no clculo da LR na comparao forense de locutor a partir da ex-perincia do perito. Porm, como destaca na p. 306, apenas se essa experincia foi submetida a testes cientificamente controlados de confiabi-lidade.

    Esse requisito de estimativa do desempenho de peritos ou de grupos de percia, em reas onde o mtodo basicamente o convencimento do examinador ([10], p. 894), entretanto, est longe de ser alcanado na prtica.

    Como discute [10], e j foi comentado no item 3.2.2, programas continuados de aferio da proficincia de peritos e grupos de percia em condies de teste cego, com dados realsti-cos, so praticamente inexistentes na maioria dos ramos da Criminalstica. A fontica forense brasileira no exceo.5.1.5. LR E OS NVEIS DA HIERARQUIA DE PROPOSIES

    Embora, como ilustram os exemplos dados na Introduo, quando se fala em exames de determinao da fonte basicamente se est re-ferenciando exames no nvel I da hierarquia de proposies discutida no item 2.4, o uso de ra-zes de verossimilhana no se restringe a esse nvel.

    Pelo contrrio, como j apontado naquele item, os proponentes dessa hierarquia a defini-ram com base na possibilidade de realizar a anlise pericial em termos de LR em qualquer nvel.

    As proposies, portanto, no so explica-es ou hipteses quaisquer, mas apenas aque-las passveis de algum tipo de anlise estatsti-

    14

  • ca por LR, onde o perito possa, com seu conhe-cimento cientfico, auxiliar a Justia.

    Para ilustrar essa diferena, [7] oferece al-guns exemplos. Um deles (p. 4) diz respeito a uma mancha de sangue, encontrada em local de crime, cujo perfil gentico concordante com o do suspeito. Um conjunto de hipteses apa-rentemente possvel em nvel I seria:

    hiptese da acusao (H1): a mancha de sangue do suspeito;

    hiptese da defesa (H2): a mancha de sangue de outra pessoa que, por aca-so, tem o mesmo perfil gentico do sus-peito.

    Apesar de serem explicaes possveis, o par de proposies H1 e H2 no passvel de anli-se pericial. Dadas as caractersticas da evidn-cia gentica j discutidas em 5.1.2, p(E|H1, I) 1, como em geral nos exames de DNA, onde o numerador da LR ou 0, ou 1.

    Porm, p(E|H2, I), pelo modo como H2 foi formulada, tambm 1, o que daria

    LR=p(EH 1 , I )p (EH 2 , I )

    =1 .

    Para esse exemplo, um par de proposies passvel de anlise pela percia seria, na verda-de:

    hiptese da acusao (Hso): a mancha de sangue do suspeito;

    hiptese da defesa (Hdo): a mancha de sangue foi deixada por uma outra pes-soa que no o suspeito.

    A medida que se avana para os nveis II e III da hierarquia, com o aporte de informao contextual, fica mais crtica no somente a ob-teno e anlise de dados estatsticos, mas tam-bm a percepo pelo perito dos pares de pro-posies adequados para a anlise por LR.

    Entretanto, possvel, em teoria, como mos-trado em [7], essa anlise, de maneira que a pe-rcia possa trazer informao estatstica de base cientfica a fim de auxiliar o julgador, seja na constituio da autoria, seja na constituio da materialidade delitiva.

    Na anlise forense de udio e vdeo, os exa-mes de verificao de edio so uma das reas que podem se beneficiar do aprofundamento dos estudos da aplicao de LR em nveis aci-ma do nvel I da hierarquia de proposies.

    5.2. A METODOLOGIA E A CONCLUSO DO LAUDO DE COMPARAO FORENSE DE LOCUTOR

    Embora desejvel do ponto de vista cientfi-co, a introduo da anlise por LR em todos os aspectos hoje utilizados nos exames de compa-rao forense de locutor bastante problemti-ca, como alerta [31].

    O cenrio atual, aparentemente (ver [32]), ainda de predomnio, em nvel mundial, da anlise do tipo impressionstica baseada na comparao de caractersticas acsticas e arti-culatrias.

    Como discutido nos itens 5.1.2 e 5.1.3, en-tretanto, um cenrio na verdade muito pior, em termos da qualidade dos resultados fornecidos pela percia de comparao forense de locutor, seria aquele em que sistemas FASR do tipo MFCC/GMM/UBM fossem usados com exclu-sividade sem a compreenso das suas limita-es e dos cuidados de implementao.

    Admitindo, portanto, que a melhor soluo no momento no seja abandonar as metodolo-gias tradicionais, mas buscar agregar a elas, paulatinamente, cada vez mais elementos base-ados na abordagem por LR, so apresentadas a seguir algumas consideraes sobre as con-cluses dos exames.5.2.1. CONCLUSES CATEGRICAS ATRIBUTIVAS DE IDENTIDADE

    Independente do uso ou no da abordagem bayesiana com razes de verossimilhana, a anlise lgica apresentada no item 2 e as consi-derao feita no item 3 mostram que, mesmo quando peritos emitem um laudo com conclu-so categrica atribuindo a identidade entre a fonte do vestgio (material questionado) e a fonte do material padro, com base exclusiva-mente na anlise desses materiais, essa conclu-so deve ser interpretada como uma afirmao do grau (mximo) de convico dos peritos, no como uma identificao numrica (indivi-dualizao).

    15

  • O mais adequado, portanto, seria no utilizar concluses categricas de atribuio de identi-dade, a fim de no dar ao exame a aparncia de um peso cientfico que ele no possui.5.2.2. CONCLUSES CATEGRICAS DE EXCLUSO DE IDENTIDADE

    Outra questo diz respeito possibilidade ou no de concluses categricas de excluso (ne-gativas de identidade), quando a anlise aponta flagrantes incompatibilidades entre o vestgio e o material padro.

    De acordo com [25], item 3.3.1, que se atm ao nvel I da hierarquia de proposies, esse tipo de concluso possvel no caso de anlise de caractersticas discretas, como o caso do DNA.

    De fato, se admitidos como condio de con-torno I na expresso (9) os princpios da gen-tica, a no ocorrncia de erros no procedimento de exame (por exemplo, contaminao) e a no ocorrncia de quimerismo ou mosaicismo, en-to, se no houve correspondncia entre o per-fil gentico do vestgio e do suspeito,

    p(E|Hso, I) = 0 e LR = 0.Independente da razo de probabilidade a

    priori, a razo de probabilidade a posteriori tambm ser nula, e possvel uma afirmao categrica, em nvel I da hierarquia de proposi-es.

    Entretanto, a natureza distinta da fala huma-na, conforme comentado em 5.1.2, no permiti-ria esse tipo de raciocnio na comparao de lo-cutor, o que impediria o uso de concluses ca-tegricas de excluso.

    [31], por outro lado, reafirma a defesa da possibilidade desse tipo de concluso categri-ca, lembrando, alm de outras consideraes, que h um limitante lgico, inescapvel, na anlise de gravaes de voz no contexto dos exames de comparao forense de locutor, in-clusive se todo o exame for realizado por meio de razes de verossimilhana, de modo manu-al, semiautomtico ou automtico (mesmo se empregados sistemas de diarizao; ver, por exemplo, [35]).

    Esse limitante so as decises atributivas/no atributivas de identidade por meio de avaliao localizada, seja de trechos menores ou maiores da gravao, as quais fun-damentam a prpria delimitao do que consti-tui a fala questionada.

    A necessidade dessa seleo fica evidente quando a gravao questionada claramente por uma avaliao lgico-indutiva, no exclusi-vamente lgico-dedutiva contm falas de mais de um locutor, mas essa atividade de sele-o existe mesmo quando h, claramente, apenas falas de um locutor.

    Pode-se dizer que a admisso de que essa se-leo correta faz parte da hiptese I da ex-presso (9).

    Esse tema pertinente, tambm, s questes da continuidade no tempo e da hierarquia de proposies, j que o limite entre o que acei-tvel de intravariabilidade de um locutor, bem como o limite de distino, via intervariabilida-de, entre locutores distintos, quando se analisa um determinado conjunto de gravaes questi-onadas, mesmo que a seleo seja feita por sis-temas automticos ou semiautomticas de dia-rizao, calibrados a partir de experimentos onde a origem das falas garantida por meio da garantia de continuidade no tempo, sempre ser, no final das contas, um limite estatstico.

    Esse limite , sob outro ponto de vista, o li-mite inerente lgica indutiva que fundamenta o mtodo cientfico.

    Para [31], o peso lgico-indutivo de uma afirmao que exclui a identidade o mesmo das avaliaes localizadas que embasam todo o exame de comparao forense de locutor. Por esse motivo, esse artigo admite concluses ca-tegricas de excluso.

    Na verdade, essa admisso, implicitamente, considera suficiente o julgamento impressio-nstico do perito.

    A anlise da questo em [25], entretanto, no levantou esse ponto especificamente, embora seja foroso admitir que, para atingir higidez lgica na sua defesa do uso incondicional da abordagem por LR, o referido artigo [25] deve-

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  • ria defender tambm que a capacidade de reali-zao dessas atribuies/no atribuies locali-zadas se subsumisse sistemtica de testes de calibrao/proficincia segundo o mtodo cien-tfico, preferivelmente sendo realizada por m-todos automticos de diarizao.

    De qualquer forma, na prtica, pelo menos no estado atual das metodologias, talvez seja mais prudente seguir, por exemplo, o que apre-senta [29], seo 3.8.1, e tambm no utilizar concluses categricas de excluso.5.2.3. CONCLUSES EM SITUAES DE CONJUNTO FECHADO

    Outra questo que diz respeito ao uso ou no de concluses categricas refere-se aos casos em que, ao invs de um conjunto aberto de possveis fontes para o vestgio, tem-se um conjunto fechado de suspeitos.

    [30], item 5, fala, por exemplo, de situaes em que se tem, por gravaes de vdeo, a ima-gem dos falantes presentes.

    Essa questo extrapola o nvel I da hierar-quia de proposies, pois inclui questes relati-vas continuidade no tempo.

    Pode-se dizer que, se as filmagens incluem o udio ambiente e as imagens mostram clara-mente os movimentos de articulao da fala em cada locutor mostrado, o exame de comparao de locutor se torna desnecessrio, podendo o problema ser abordado do ponto de vista da ve-rificao de edio e do reconhecimento facial.

    Se, de qualquer modo, nessa ou em outras si-tuaes, um exame de comparao de locutor em situao de conjunto fechado solicitado, a metodologia bsica a ser seguida no deveria diferir daquela empregada nos exames de con-junto aberto (ver [25], item 3.3.2), talvez ape-nas se considerando um menor nmero de pas-sos de anlise ou espao amostral, para se che-gar a uma concluso, a qual seria, ainda, no categrica.5.2.4. O FORNECIMENTO DE VALORES DE LR NA CONCLUSO DO

    LAUDO E AS ESCALAS DE PROBABILIDADE

    Em princpio, se fosse ou for algum dia possvel, nos exames de comparao forense de locutor, fornecer um valor de LR engloban-do todas as caractersticas relevantes para a

    anlise, conforme lista no exaustiva levantada em [31], nada impediria que esse nmero cons-titusse, por si s, a concluso do laudo.

    De fato, essa a sistemtica adotada nos exames de DNA.

    Porm, na prtica, essa questo no to simples. A prpria experincia na rea de gen-tica forense mostra que a percepo do real sig-nificado de uma LR no contexto da anlise bayesiana de dados em si um desafio.

    Uma das maiores dificuldades separar o que a razo de probabilidade a posteriori dos demais termos direita da igualdade na expres-so (9). Esses conceitos razes de probabili-dade a priori e a posteriori e razo de verossi-milhana , embora sejam matematicamente simples, no so intuitivos.

    A situao se complica ainda mais porque h uma dificuldade em compreender os prprios limites lgico-cientficos da atuao da percia. Como se viu na discusso do item 3, essa ob-servao se aplica at mesmo aos prprios pe-ritos.

    Por esse motivo, a experincia com o DNA mostra que contar com um razovel grau de en-tendimento dos termos da expresso (9) por parte dos demais atores da cadeia de persecu-o penal pode levar a profundas frustraes (ver, por exemplo, [36]).

    Alm disso, um valor numrico de LR pode ser de pouco esclarecimento e utilidade para o julgador, como apontado por [29], p. 61-62.

    E, no raro, o valor de LR assumido, para os fins prticos, por alguns ou mesmo todos os demais atores da cadeia de persecuo penal, como um valor de razo de probabilidade a posteriori, absolutizando o resultado do exame de determinao da fonte, ainda que ele seja, como vimos, uma identificao qualitativa de nvel I.

    Quando a LR muito maior do que 1, a acu-sao pode lanar mo do seu valor e, median-te a chamada falcia da acusao, tom-la como razo de probabilidade a posteriori e afirmar que a probabilidade do suspeito ser

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  • culpado igualmente enorme (ou seja, para os fins prticos, o suspeito culpado).

    Da mesma forma, a defesa, lanando mo de um raciocnio conhecido como falcia da de-fesa, pode chegar a um valor de razo de pro-babilidade a posteriori muito baixo admitindo uma razo de probabilidade a priori no reals-tica por exemplo, igual ao inverso de toda a populao de um pas. A partir da razo de pro-babilidade a posteriori obtida, a defesa argu-menta que, na verdade, muito maior a proba-bilidade do suspeito ser inocente do que culpa-do, e portanto, havendo dvida de tal monta, ele deve ser absolvido.

    Em ambas as falcias, a falha no se levar em conta as outras provas e circunstncias per-tinentes ao caso.

    No caso da comparao forense de locutor, onde no h, no horizonte de mdio prazo e talvez no de longo prazo , perspectiva de che-gar sequer a uma situao de uso integral da abordagem por LR, talvez seja mais interessan-te, no atual momento, englobar os diversos ti-pos de anlises (impressionstica/semiautom-tica/automtica) em um esquema de concluso por escalas verbais de probabilidade.

    A referncia [29], p. 60, traz um exemplo de escala, a qual, frise-se, no faz, mesmo nos graus mximo (atribuio) e mnimo (exclu-so), concluses categricas.

    Deve-se estar ciente que qualquer tentativa de uso de uma escala qualitativa ainda que a partir da correspondncia objetiva entre, por exemplo, faixas de valores numricos de LR e expresses verbais qualitativas sempre estar sujeita a crticas, como a ocorrncia do efeito do valor de limiar (cliff-edge effect). Para deta-lhes, ver [25], p. 151-155 e [6], p. 133-136.5.2.5. O EMPREGO DO TERMO COMPATVEL E OUTROS

    SEMELHANTES

    Uma questo relacionada ao tema da conclu-so do laudo, no somente na comparao fo-rense de locutor, mas em outros tipos de exame de determinao da fonte, o uso da palavra compatvel e semelhantes.

    Dependendo do tipo de vestgio (ver 5.2.1), a Criminalstica pode fornecer concluses cate-gricas de excluso. A questo se complica, en-tretanto, quando no h possibilidade de afir-mar a excluso ([6], p. 95).

    No caso do exame de determinao da fonte, quando h algum grau de convergncia entre o vestgio e o material padro, no incomum o emprego da expresso h compatibilidade en-tre (em ingls, comum o uso do termo is consistent with; ver [11], p. 216) para expres-sar essa convergncia.

    Infelizmente, esse termo, por sua amplitude, no fornece nenhuma pista a respeito do grau de compatibilidade ([6], p. 96), nem tampou-co fornece subsdios para uma concluso sobre probabilidades a posteriori, como alerta [25], seo 3.4.3.

    A luz dessas ponderaes, no seria indicado o uso de concluses que gravitam em torno do termo compatvel e semelhantes, a menos que seja dado tambm o grau dessa compatibi-lidade.

    O mesmo tipo de observao feito por [6], p. 96, a respeito de expresses como a evidn-cia no exclui determinada hiptese.

    6. NOMENCLATURA DO EXAME

    Neste tutorial, adotamos para o exame foren-se de determinao da fonte em que a fala o vestgio de interesse a denominao compara-o forense de locutor, ou simplesmente comparao de locutor.

    Na percia criminal oficial brasileira, a deno-minao atualmente mais encontrada para o exame verificao de locutor. Esse nome o utilizado na primeira publicao de flego a respeito desse exame no Brasil ([37], de 1999; a segunda edio, [38], de 2003, mantm a mesma nomenclatura) e foi adotado, por exem-plo, no Departamento de Polcia Federal e, por meio de programas de capacitao, difundiu-se para outros rgos de percia criminal oficial.

    Deve-se observar que, apesar da operao lgica de verificao 1-para-1 presente no exa-me de verificao de locutor encontrado na

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  • rea de controle de acesso ser a mesma do exa-me forense, como nota [39], p. 9, as nomencla-turas predominantes em ingls, internacional-mente, empregaram termos como recogniti-on e identification, e no verification, por entender que na rea forense havia condies de contorno distintas, como falta de controle da qualidade do material questionado e possibili-dade de no cooperao por parte dos fornece-dores das amostras de fala.

    Para detalhes, ver, alm de [39], p. 5-10, a discusso mais aprofundada encontrada em [26], captulo 5. Em linhas gerais, a mesma classificao taxonmica dos exames da rea de processamento da fala, mas com vis acsti-co, focada em ferramentas computacionais au-tomatizadas, pode ser encontrada em [40].

    O fato da fala ser efetivamente uma biome-tria ou seja, ela tem valor discriminador no necessariamente significa que ela seja indi-vidualizadora. Como se afirma na referncia [4], p. 208, apenas a verificao emprica pode dar maior ou menor grau de verossimilitude a afirmaes de que determinada biometria atende o critrio de unidade.

    Naquela referncia, por exemplo, se admite que a afirmao da unicidade da decadactilar, colhida em condies ideais, atinge um grau de verossimilitude suficiente para que seja admiti-da na prtica.

    Outra questo, diferente, a da ocorrncia ou no de erros na coleta da decadactilar, o que passvel de acontecer, j que estamos falando de uma atividade humana, ou mesmo do de-sempenho de determinado algoritmo do tipo AFIS (Automatic Fingerprint Identification System) no que concerne ao armazenamento ou recuperao das informaes baseadas nas imagens da decadactilar.

    Outra questo, ainda, a da transferncia de informao de uma digital para um fragmento de digital em um local de crime. Um caso fa-moso de erro cometido pelo FBI, que havia afirmado ter uma identificao com 100% de probabilidade em caso de grande repercusso (ver [41] para uma anlise oficial sobre o

    caso), um dos exemplos que se relacionam aos problemas discutidos no item 3.

    J para a fala, a prpria referncia [4] enten-de no haver, atualmente (no caso, o ano de 2006, mas essa afirmao continua vlida), su-porte cientfico que d a afirmaes de unicida-de grau de verossimilitude suficiente.

    Esse fato j era comentado, por exemplo, em [39], ao tratar da multidimensionalidade da fala e dos limites de intravariabilidade e intervaria-bilidade.

    Essas ponderaes, em face tambm do que foi discutido nos itens 3 e 4, tm levado vrios pesquisadores da rea de fontica forense a preferir nomenclaturas que se afastem da ideia de individualizao.

    Ao invs de reconhecimento, identifica-o, verificao ou discriminao, o ter-mo julgado mais adequado tem sido o de comparao ([9], p. 300-301; [25], item 3.2; [30]; [29]).

    O presente tutorial emprega, alm do termo comparao, a expresso comparao de lo-cutor, o invs, por exemplo, de comparao de voz (como preferem, por exemplo, [9] e [25]) ou comparao de fala (como usado em [29]).

    Essa escolha foi motivada pela experincia de trabalho do autor e pelas argumentaes apresentadas em [29], que distingue voz de fala. Essencialmente, o mesmo argumento de [29] aparece em [31], p. 146, mas, ao lembrar que tambm caractersticas extralingusticas so relevantes no exame, o termo locutor pa-rece mais adequado do que fala.

    Deve-se notar que as denominaes usadas tradicionalmente j esto amplamente difundi-das, no sendo possvel afirmar, no atual mo-mento, se, na literatura tcnica da rea, elas iro perdurar ou se sero substitudas.

    7. CONCLUSO

    O dogma da unicidade, subjacente s meto-dologias tradicionalmente empregadas nos exa-mes de diversas reas da Criminalstica dedica-das ao problema da determinao da fonte, foi

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  • alvo de crticas contundentes principalmente a partir do final da ltima dcada do sculo pas-sado.

    Essas crticas motivaram uma mudana de entendimento sobre o papel e o alcance das pe-rcias que envolvem a identificao de uma pessoa ou objeto.

    Neste tutorial foi feito um apanhado dos principais conceitos envolvidos nessa mudan-a, com foco nos impactos sobre a rea de comparao forense de locutor, mostrando tambm as dificuldades para que se tenha a im-plementao integral de uma abordagem basea-da em razes de verossimilhana nessa rea.

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