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UNIVERSIDADE FEDERAL SANTA CATARINA DEPARTAMENTO DE CIÊNCIAS ECONÔMICAS GUSTAVO HENRIQUE MARTINS PRESTES EVOLUÇÃO DA DÍVIDA PÚBLICA BRASILEIRA, A RELAÇÃO COM O CAPITAL FICTÍCIO E SEUS IMPACTOS DISTRIBUTIVOS FLORIANÓPOLIS 2010

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UNIVERSIDADE FEDERAL SANTA CATARINA DEPARTAMENTO DE CINCIAS ECONMICAS

GUSTAVO HENRIQUE MARTINS PRESTES

EVOLUO DA DVIDA PBLICA BRASILEIRA, A RELAO COM O CAPITAL FICTCIO E SEUS IMPACTOS DISTRIBUTIVOS

FLORIANPOLIS

2010

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Gustavo Henrique Martins Prestes

A EVOLUO DA DVIDA PBLICA BRASILEIRA, A RELAO COM O CAPITAL FICTCIO E SEUS IMPACTOS DISTRIBUTIVOS

Monografia apresentada ao Curso de Cincias Econmicas da

Universidade Federal de Santa Catarina como requisito parcial

obteno do grau de Bacharel em Cincias Econmicas

Orientador: Professor Dr. Wagner Leal Arienti

Co-Orientador: Professor Wolney Roberto de Carvalho

FLORIANPOLIS 2010

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UNIVERSIDADE FEDERAL SANTA CATARINA DEPARTAMENTO DE CINCIAS ECONMICAS

A banca examinadora resolveu atribuir nota 7,0 ao acadmico Gustavo Henrique

Martins Prestes na disciplina CNM 5420 Monografia, como requisito obrigatrio para

a obteno do grau de Bacharelado.

Banca Examinadora:

______________________________

Prof. Dr. Vagner Leal Arienti

Orientador

______________________________

Prof. Msc. Wolney Roberto Carvalho

Co Orientador

______________________________

Prof. Dr. Marcos Alves Valente

AGRADECIMENTOS

Gostaria de agradecer: primeiramente a minha famlia, que alm do

companheirismo de sempre tambm serviram de suporte emocional, financeiro e

psicolgico para a concluso dessa jornada de estudos, e dividem comigo o mrito

deste trabalho; aos trabalhadores da UFSC que tornaram esse curso realidade; aos

tcnico-administrativos e professores dedicados, que facilitaram muito esses cinco

anos de convivncia; aos amigos de movimento estudantil e meio acadmico, onde

nossas conversas e indagaes serviram como questionamentos da realidade ao

meu redor, criando a experincia da crtica em meu cotidiano, e tecendo a

verdadeira vida acadmica; lembro com carinho da importncia da Fer e da Belinha

em grande parte desse percurso; ao Leo e sua famlia (Dona Ins, Seu Bernardo,

Gui, Rodrigo e Fernanda; que foram sem dvida a minha famlia em Florianpolis);

a Cibelle pelo companheirismo nas madrugadas estudando e escrevendo essa tese

aos fins de semana, e aos amigos e amigas de bares, de futebol, de repblicas, de

sentimentos, que vivenciamos momentos maravilhosos juntos.

A todos, muito obrigado...

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RESUMO

PRESTES, Gustavo H. Martins. Evoluo da dvida pblica brasileira, a relao

com o capital fictcio e seus impactos distributivos. Curso de Cincias

Econmicas, Universidade Federal de Santa Catarina, Florianpolis, 2010.

O sistema capitalista mundial foi constitudo historicamente a partir do

desenvolvimento do seu modo de produo, as estruturas e caractersticas desse

processo embrionrio foram expandidas, formando as economias nacionais. Os

meios de expanso e acumulao de capital tambm sofreram modificaes,

sempre buscando novas formas de aumentar sua valorizao. O avano do sistema

capitalista, que tem como um dos alicerces a predominncia dos aspectos

financeiros como determinantes das relaes econmicas traz consigo uma srie

de impactos no que concernem as finanas nacionais. A emisso, estruturao e

consolidao dos ttulos e do mercado da dvida pblica brasileira vem

respeitando as diretrizes do capitalismo mundial. Ao mesmo tempo em que financia

o estado, a emisso de ttulos comprados pelo capital portador de juros serve como

mantenedor de altos ndices de expropriao de excedente econmico, respeitando

uma diviso social e internacional do trabalho, dos rendimentos e da hierarquia de

poder que so encontradas no sistema-mundo da economia capitalista. Este ser o

foco do trabalho, articulao do desenvolvimento do capitalismo como sistema

mundial de reproduo, e como ele direciona o desenvolvimento dos estados

nacionais e cria mecanismos de perpetuao de sua acumulao atravs de ttulos

de dvida pblica inseridos no mercado financeiro mundial.

Palavras-chave: ttulos da dvida pblica; sistema financeiro; capital fictcio;

desenvolvimento nacional; impactos distributivos.

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ABSTRACT:

The global capitalist system was established historically through the

development of its mode of production, structures and characteristics of the

embryonic process were expanded, forming national economies. The means for

expansion and capital accumulation also suffered changes, always seeking new

ways to increase recovery. The advancement of the capitalist system that has as

one of the foundations, the predominance of financial aspects as determinants of

economic relations entails a series of impacts that concern the national finances.

The issuance, restructuring and consolidation of the securities market and the

Brazilian public debt seen respecting the guidelines of global capitalism. At the

same time that the state finances, the issue of securities purchased by interest-

bearing capital serves as maintaining high levels of expropriation of economic

surplus, respecting a social and international division of labor, income and the

hierarchy of power that are found world system of capitalist economy. This will be

the focus of work, joint development of capitalism as a world system of reproduction,

and how he directs the development of national states and creates mechanisms for

the perpetuation of its accumulation through debt securities included in the global

financial market.

Key-words: headings of the public debt; financial system; fictitious capital; national

development; distributive impacts.

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Sumrio 1.1 INTRODUO.................................................................................................................................................

7

1. 2. Tema e problema................................................................................. .......................................................

10

1.3 Objetivos ............................................................................................................................. ........................

10

1.3.1 Geral ............................................................................................................................. ............................

10

1.3.2 Especficos............................................................................................................................. ...................

10

1.4 Justificativas ............................................................................................................................. ...................

11

1.5 Metodologia.................................................................................................................................................

11

2 O PAPEL DO ESTADO DENTRO DO DESENVOLVIMENTO CAPITALISTA .........................................

13

2.1 Aspectos pr-capitalistas e formao das Economias Nacionais ................................................................. 14

2.2 Os estados capitalistas contemporneos e a economia mundial .................................................................. 20

2.3 Capital Financeiro e Imperialismo................................................................................................................30

2.4 Origens histricas e contextualizao da dvida pblica ............................................................................. 33

2.5 Carter de classe do Estado Capitalista.................................................................................. .......................36

3 - O SISTEMA DE CRDITO E O CICLO DE ACUMULAO FINANCEIRA: ........................................... 41

3.1 - O capital produtor de juros e os ttulos da dvida pblica ......................................................................... 42

3.2 A circulao financeira dentro do sistema de crdito................................................................................... 47

3.3 - O papel do capital fictcio ......................................................................................................................... 52

4- O SISTEMA DE DVIDA PBLICA BRASILEIRO....................................................................................... 58

4.1 Caractersticas do sistema de dvida pblica ............................................................................................... 58

4-2 Anlise da evoluo histrica da dvida pblica brasileira: ......................................................................... 62

4.2.1 Dvida pblica do perodo Imperial .......................................................................................................... 63

4.2.2 Dvida Pblica no perodo republicano ................................................................................................ .

64

4.3 Interpretaes de dados macroeconmicos brasileiros ................................................................................ 74

4.4 Contribuies polticas acerca da problemtica da dvida pblica .............................................................. 83

CONSIDERAES FINAIS ................................................................................................................................

90

REFERNCIAS: ................................................................................................................................................... 94

/%201.1.1%20INTRODUO|outline/%201.1.1%20INTRODUO|outline/%202.1.1.%202.%20Tema%20e%20problema.|outline/%202.1.1.%202.%20Tema%20e%20problema.|outline/%202.2.1.3%20Objetivos|outline/%202.2.1.3%20Objetivos|outline/%202.3.1.3.1%20Geral|outline/%202.3.1.3.1%20Geral|outline/%202.4.1.3.2%20Especficos|outline/%202.4.1.3.2%20Especficos|outline/%202.5.1.4%20Justificativas|outline/%202.5.1.4%20Justificativas|outline/%202.6.1.5%20Metodologia|outline/%202.6.1.5%20Metodologia|outline/%20_toc266/%20_toc266/%203.1.2.1%20Aspectos%20pr-capitalistas%20e%20formao%20das%20Economias%20Nacionais|outline/%203.2.2.2%20Os%20estados%20capitalistas%20contemporneos%20e%20a%20economia%20mundial|outline/%20_toc532/%205.1.4.1%20Caractersticas%20do%20sistema%20de%20dvida%20pblica|outline/%20_toc581/%205.4.4.2.2%20/%205.4.4.2.2%20/%205.5.4.3%20Interpretaes%20de%20dados%20macroeconmicos%20brasileiros|outline/%205.6.4.4%20Contribuies%20polticas%20acerca%20da%20problemtica%20da%20dvida%20pblica|outline/%20_toc953/%20_toc953/%20_toc988

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1.1 INTRODUO

Com a insero da economia brasileira na economia mundial, fato que se

iniciou de maneira mais clara a partir da nossa independncia, e a formao de

nosso estado nao, o pas passou tambm a experimentar outras complicaes

estruturais, tais como a aquisio de dvida perante o mercado mundial.

A histria da economia e do desenvolvimento da sociedade brasileira,

principalmente aps o incio do sculo passado, passou a ter uma grande influncia

dos resultados da balana comercial, financeira e de servios com o mercado

externo.

Os planos polticos dos governos brasileiros contaram em parte com

recursos estrangeiros, em especial com o capital excedente dos pases centrais.

Investimentos estatais, dficit da balana pblica, criao de empresas nacionais,

pagamentos de dvidas anteriores, entre outras despesas dos governos brasileiros,

foram resultados dos emprstimos que o pas contraa com instituies ou pases

externos.

O papel que a dvida pblica brasileira exerce sobre a economia real atual,

quais seus impactos para o desenvolvimento do pas at aqui, quais as limitaes

que essa dvida nos impe no atual processo de desenvolvimento econmico do

pas, so aspectos determinantes que sero estudados para uma melhor

compreenso do desenvolvimento da estrutura e da sociedade capitalista brasileira.

Como procedimento de investigao foi adotado uma abordagem terica do

ciclo de acumulao financeira, feita logo aps um grande levantamento e

conhecimento histrico das formaes do sistema capitalista, para a suposio de

crticas realidade, e superao da nossa evoluo econmica e social.

Para o entendimento completo da evoluo da dvida pblica brasileira, e

seus impactos distributivos, necessria uma minuciosa anlise sobre formao do

sistema capitalista mundial, sendo este fato determinante para a estruturao das

economias capitalistas. A criao de estados nacionais tambm merece uma

ateno especial, visto que os Estados so o espao de interao econmica,

poltica e social entre os diferentes agentes econmicos do nosso cotidiano.

Aps essa primeira parte de desenvolvimento da dissertao, precisamos

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investigar teoricamente o funcionamento do sistema de crdito dentro da estrutura

do capitalismo contemporneo, extraindo a essncia da ordem de acumulao do

capital financeiro dentro do sistema bancrio internacional.

Dentro do sistema de crdito existem ativos de diversos tipos, nessa

dissertao o foco de estudo ser os ttulos de dvida pblica, que foram um dos

primeiros bens financeiros comercializveis na histria do capitalismo.

Na formao do Estado capitalista brasileiro, sofremos desde o incio com a

interao e relao com o sistema capitalista como um todo, portanto, deveremos

realizar uma anlise totalizante perante as condies impostas para nossa

formao.

Tambm temos que considerar a teoria poltica do desenvolvimento desigual

entre os pases centrais e os perifricos, e como o mecanismo da dvida contribui

para esse panorama.

Na poca que o desenvolvimento do capitalismo mundial era voltado

especialmente para o comrcio intra-martimo, e as principais formas de auferir

lucro era atravs das trocas comerciais internacionais, o Brasil fez parte desse

cenrio servindo como base para a exportao de matria-prima e minerais em

geral, que foram os mecanismos que garantiam ao mercantilismo europeu sua

forma de acumulao.

Aps esse perodo, o modo de produo capitalista passou a expandir sua

base material, e o modo de produo industrial passou a ser o agente dominante

nas diretrizes econmicas de desenvolvimento, com isso, o Brasil serviu como base

de indstrias internacionais, por oferecer mo-de-obra barata e possuir um

mercado consumidor em expanso.

Posteriormente, as relaes econmicas foram dominadas pela lgica

acumulante do capital financeiro, e o sistema de crdito, bancrio e as bolsas de

valores passaram a exercer uma papel ainda mais central nesse sistema, e com

isso o Estado brasileiro teve que novamente seguir a lgica central do capitalismo,

desenvolvendo seus ttulos pblicos e o mercado acionrio, de forma a garantir os

excedentes econmicos para o capital financeiro.

O capitalismo mundial atua hoje sobre diferentes materializaes, e com

nveis diferentes de atividades, e o capital financeiro global possui influncia e

existe em todos os pases, s vezes tendo papel fundamental para propiciar ou

afetar o desenvolvimento de certos estados, especialmente se tratando de pases

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subdesenvolvidos.

O sistema de crdito do sistema capitalista exerce mltiplas funes, alm

de intermediar as trocas comerciais, proporciona o ambiente ideal para a expanso

do capital portador de juros, e conseqentemente expande as possibilidades do

ciclo de acumulao e explorao.

O capital fictcio, como subproduto do ciclo de acumulao e expanso do

capital financeiro global, no conceito de ser uma figura lgica da representao do

capital financeiro futuro sobre um direito do capital produtor de juros do presente, foi

determinante para promover as ondas de investimento externo e emprstimos

nacionais durante o sculo passado, e o entendimento do papel desse capital sobre

o fluxo financeiro mundial, e tambm o peso relativo dele sobre a dvida pblica

essencial para a melhor compreenso da evoluo dessa dvida.

Um estudo do funcionamento da dvida pblica dentro do mercado financeiro

global, a estruturao da dvida e sua respectiva ao sobre o sistema de contas

nacionais deve ser realizado.

Alm dessa introduo, o trabalho ser formado pelo desenvolvimento e

concluso como elementos textuais; o desenvolvimento ser composto por um

captulo sobre a histria e formao dos estados capitalistas dentro de uma tica de

sistema mundial, com duas subsees, dividindo o perodo de caractersticas pr-

capitalistas e a evoluo do capitalismo mundial posteriormente; no segundo

captulo, uma anlise terica sobre a estrutura de crdito do sistema capitalista, e o

papel da dvida pblica ser desenvolvida, com trs subsees, na primeira seo

ser abordado o funcionamento do capital portador de juros dentro do sistema de

crdito financeiro, na segunda, a circulao do capital investigada, e por ltimo o

papel do capital fictcio no ciclo de acumulao analisado; no terceiro captulo

uma reviso acerca do funcionamento do mercado de ttulos brasileiro, e a sua

organicidade dentro da dinmica do sistema capitalista sero demonstradas na

primeira seo; alm de um levantamento histrico da formao da dvida no

perodo da Repblica at os dias de hoje ser exposto na segunda seo; no ltimo

captulo feito um debate acerca de alguns dados sobre o servio da dvida para o

estado brasileiro, e as eventuais constataes sero analisados; na concluso

sero expostas as principais contribuies deste estudo, assim como as limitaes

da anlise e as eventuais sugestes para futuros trabalhos.

necessria uma reviso da literatura crtica da teoria econmica e da

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economia poltica (se que possvel separar as duas), para identificarmos quais

os principais pontos relevantes no servio que a dvida exerce sobre o capital

financeiro e sobre o desenvolvimento dos pases subdesenvolvidos, dentro da

teoria de classes do estado na economia marxista.

1. 2. Tema e problema. Tema: relacionar o capital fictcio com a evoluo da dvida pblica brasileiro

e demonstrar o seu papel no desenvolvimento nacional.

Problema: quais os setores da sociedade brasileira e internacional que so

afetados de maneira positiva e de maneira negativa com a funo da dvida

pblica?

1.3 Objetivos

1.3.1 Geral

Demonstrar a relao poltica, econmica e social do capital fictcio,

subproduto do ciclo de acumulao do capital financeiro, com a dvida pblica

brasileira no desenvolvimento da economia nacional, e identificar os setores da

economia nacional e internacional que sofrem seus impactos distributivos.

1.3.2 Especficos

- Analisar a evoluo histrica do sistema capitalista mundial, e suas

transformaes

- Estudar os mecanismos de circulao, expanso e explorao do capital

financeiro dentro do sistema de crdito

- Investigar a evoluo histrica da dvida pblica brasileira, suas limitaes e

estruturao legal.

- Analisar a funo do capital fictcio no ciclo de endividamento pblico dos pases

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perifricos, a partir do ciclo financeiro.

- Identificar os mtodos de ferramentas polticas que os pases centrais utilizam

para garantir o interesse dos capitais emprestados.

Qualificar o peso do servio da dvida com o Produto Bruto Interno, e oramento

do governo.

1.4 Justificativas

- A questo da dvida pblica brasileira sempre foi um assunto muito polmico ao

interpretarmos o desenvolvimento de nossa economia

- O dficit da balana comercial brasileira, ou o financiamento do investimento

estatal, variveis totalmente impactantes na realidade da economia brasileira,

muitas vezes foram impulsionados pelos emprstimos externos.

- necessrio entender o papel controlador, determinante, que os pases centrais

do capitalismo exercem sobre os pases perifricos atravs do mecanismo do

financiamento externo.

- Pouco se fala de como seria nossa sociedade em hiptese de um no pagamento

da dvida, e quais esses impactos para o desenvolvimento da economia capitalista

brasileira aps a renncia da dvida.

- Esse projeto deve contribuir para a investigao do ciclo de reproduo do capital

financeiro (de acordo com o conceito de Lnin, que ser exposto posteriormente)

em escala global, e quais so os impactos para a economia brasileira, como pas

perifrico, dentro deste ciclo.

1.5 Metodologia A histria do desenvolvimento das estruturas e instituies do capitalismo

mundial deve ser apontada, para uma posterior compreenso dos fenmenos que

impactam no desenvolvimento do capitalismo brasileiro.

As particularidades que as transformaes do modo predominante de

acumulao realizam ao longo dos sculos tambm so condicionantes no contexto

de insero da economia brasileira no sistema capitalista mundial, e devem ser

abordadas como pano de fundo da insero global da economia brasileira.

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Como mtodo instrumental da anlise da evoluo da dvida pblica

brasileira, nacional e internacional, necessrio estabelecer quais so as principais

caractersticas do desenvolvimento do capitalismo em um pas perifrico, alm de

identificar quais as principais atribuies e funes do estado nacional.

Utilizando as categorias marxistas para determinar a diviso de classes da

sociedade capitalista moderna, conceitos leninistas acerca da formao do capital

financeiro nos pases centrais do sistema imperialista, formulao terica sobre o

funcionamento do sistema financeiro mundial, focando no movimento do capital

portador de juros e suas atribuies estruturais, ser possvel criar uma nova

concepo acerca da problemtica da dvida brasileira.

necessrio verificar as origens histricas da formao da dvida pblica e

sua contextualizao com o atual perodo, identificando os aspectos condicionantes

desse endividamento estatal.

Ao analisarmos os impactos distributivos que o financiamento internacional

via emisso de ttulos pblicos acarretou ao Brasil, temos que considerar os

mecanismos macro-econmicos, que so os principais responsveis pelas

determinaes empricas desse processo de endividamento dentro do cenrio

econmico nacional.

Aps a anlise terica, poltica e tcnica, ser possvel formular algumas

alternativas para a economia brasileira acerca da questo da dvida pblica, e

visualizar quais as principais dificuldades do pas para superar esse entrave.

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2 O PAPEL DO ESTADO DENTRO DO DESENVOLVIMENTO CAPITALISTA

Antes de aprofundarmos a anlise terica acerca da relevncia da dvida

pblica no estado capitalista brasileiro nos tempos atuais, precisamos decifrar

algumas estruturas bsicas que formaram os estados capitalistas embrionrios, e

serviram de base para o desenvolvimento do sistema capitalista na Europa, e

posteriormente na Amrica Latina e no Brasil.

Alm dos aspectos econmicos, a interao entre diferentes regies, que

esto em distintos estados de desenvolvimento econmico e social so elementos

que devem ser considerados. A vivncia entre essas distintas estruturas promove um

desenvolvimento desigual e combinado, onde at mesmo Marx j identificou esse

ponto:

Em todas as formas de sociedade, uma produo especfica que determina todas as outras, so as relaes engendradas por ela que atribuem a todas as outras o seu lugar e a sua importncia. uma luz universal onde so mergulhadas todas as outras cores e que as modifica no seio de sua particularidade. um ter particular que determina o peso especfico de toda a existncia que a se

manifesta Marx(1977, pg. 172).

Alguns fatos essenciais em certos aspectos do sistema no ocorrem na

mesma relevncia em outra parte do sistema econmico de determinada regio, ou

ainda, certos elementos de uma regio influenciam outros em diferentes espaos

cronolgicos e geogrficos. Este arcabouo de mecanismos faz do capitalismo um

sistema mundial, tal como explicito a seguir: Ligando todos os pases entre si pelo seu modo

de produo e seu comrcio, o capitalismo fez do mundo inteiro um s organismo econmico e

poltico. Trotsky (1905, pg. 456)

de extrema importncia descrever de forma terico-metodolgica os

caminhos do desenvolvimento do capitalismo europeu, sua forma de atuao

perante os estados nacionais ocidentais e quais impactos este desenvolvimento

guarda para a interao da economia capitalista mundial, somente assim uma

anlise dos dias de hoje seria completa dentro do curso do sistema-mundo 1

capitalista.

Uma ordenao dos dados histricos ser realizada de modo a demonstrar o

ambiente geogrfico, cultural e material que foram pano de fundo para as

transformaes sociais que criaram o estado capitalista contemporneo. Aps esse

1

De acordo com a Teoria de Wallerstein (1979), que ser posteriormente analisada

14

primeiro passo sero incorporados conceitos tericos acerca do aperfeioamento

do capitalismo e sua economia no sistema-mundo, com contribuies das obras de

Braudel (1958) e Wallerstein (1979).

Alm da evoluo histrica, um enfoque nas mudanas nos modos de

produo e acumulao da atividade humana no cotidiano econmico tambm ser

realizado. Na seo 2.1 sero levantados apontamentos acerca dos aspectos pr-

capitalistas e do perodo de formao das economias nacionais; na seo 2.2 o

foco de estudo a formao dos estados nacionais e a consolidao do sistema

capitalista mundial; na seo 2.3 ser analisada a contextualizao histrica da

dvida pblica dentro do sistema capitalista.

2.1 Aspectos pr-capitalistas e f ormao das Economias Nacionais

Uma das principais divergncias entre os historiadores e os cientistas sociais

que tratam desse tema, est na questo da existncia do Estado e de quando ele

passou a assumir a forma atual.

As principais dificuldades de certos pesquisadores encontram-se no fato de

relacionar o Estado com a comunidade primitiva, atribuindo a ele algumas funes

de carter organizacional do ambiente analisado.

No estado comunal, onde as pessoas viviam em tribos e possuam uma

produo social do trabalho total dividida de forma igualitria entre os seus

membros, onde todos deveriam trabalhar para que um excedente produtivo fosse

alcanado para o conjunto da populao, temos que algumas atividades essenciais

para as sociedades de hoje, que j estavam presentes na vida social desde aquele

perodo, eram feitas de forma igualmente comum.

As tarefas de proteo da tribo e de julgamento diversos eram realizadas

pela coletividade dos indivduos. Todos os homens livres possuam direito a posse

de armas, para defesa pessoal, familiar ou coletiva, assim como assemblias

abertas e democrticas eram realizadas para as discusses e decises sobre

eventuais problemas no interior da vida social, criando um senso de justia moral

socialmente discutido e decidido.

Essa situao fica bem clara como descrita abaixo:

A idia de que pudesse haver certos homens destacados da coletividade, a quem fosse reservado o direito de

dispensar justia, parecia aos cidados de uma sociedade baseada no coletivismo do cl ou da tribo, to fora

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de sentido como o reverso parece maioria dos nossos contemporneos. Mandel (1977, pg. 18).

Com o aperfeioamento da diviso social do trabalho, o desenvolvimento da

produtividade das atividades criou maiores excedentes econmicos e a instaurao

de uma sociedade mercantil minimamente desenvolvida pode ser criada, por

conseguinte, as formas de organizao social tambm foram modificadas, criando-

se novas estruturas econmicas.

Os cls tribais tiveram sua formao estrutural modificada com o

crescimento da populao e da atividade produtiva, a criao da propriedade

privada acabava com a produo social, a ascenso de um responsvel para gerir

as atividades antes tidas como coletivas criou tambm uma diviso de classe

dentro dessa sociedade.

Os Imprios foram criados, determinando as regras polticas e econmicas

da populao em seu entorno, as atividades de tributao e de poder coercitivo

foram instauradas.

Com a evoluo histrica desses Imprios, foi criada uma casta de nobres e

proprietrios de terra que estavam alinhadas com a instituio Imperial, e

desfrutavam grande prestgio social e econmico.

O tempo do Imprio Romano sofreu grandes mudanas quando invases

brbaras ocorreram, desestabilizando esse controle central, e criando fragmentos

de propriedades rurais minimamente independentes. Quando o Imprio de fato ruiu,

formaram-se de um lado estruturas produtivas rurais de grande extenso, e de

outro uma populao de colonos que necessitavam de emprego.

A formao dos feudos agrrios era constituda de uma grande parcela de

terras que eram trabalhadas para a rentabilidade do Senhor Feudal, e outra parcela

que tinha a sua produtividade direcionada para a economia de subsistncia dos

colonos.

A ascenso do feudalismo traz uma nova realidade metodolgica ao

cotidiano humano, as tarefas de controle econmico, justia social e defesa de

propriedade passam a ser exercidas pelo senhor das terras, o senhor feudal.

A atuao deste novo comandante do espao geogrfico e social do

feudalismo fica bem evidente a seguir:

Este senhor feudal dono absoluto do seu reino. o nico com direito ao porte de armas em qualquer momento; o nico polcia, o nico agente de autoridade; o nico com direito a cunhar moeda; o nico ministro das finanas. Exerce em todo o seu domnio todas as clssicas funes

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desempenhadas pelo Estado, tal como hoje o conhecemos. Mandel (1977, pg. 13).

Conforme a economia feudal passou a ser o modo principal de reproduo

social, os feudos acompanharam essa estabilidade e cresceram de tamanho e

importncia, fato que aumentou os trabalhos necessrios para o controle humano

desenvolvidos pelo Senhor feudal; com isso, foi necessria a diviso das tarefas

coercitivas e controladoras, criando assim uma casta dentro da classe dominante,

trabalhadores que antes s atuavam na produo de bens de subsistncia e de

excedente pagos ao Senhor das terras, passaram a trabalhar cumprindo suas

tarefas de vigilncia econmica, social e das atividades de justia. Assim foram

criadas as primeiras funes de autoridades para uma parte da populao que era

alinhada aos interesses do proprietrio da terra e do feudo. Esta caracterstica de

fragmentao da fora de trabalho, de modo a criar uma estrutura onde alguns

trabalhadores fiscalizem e monitorem a atividade produtiva em defesa dos interesses

dos proprietrios um fato marcante na histria do capitalismo mundial.

Tambm importante adicionar, que juntamente com o poder coercitivo e

judicirio, as autoridades recm criadas atuam de forma muito mais inerente no

desenvolvimento de uma sociedade, j que normalmente ela traz consigo questes

como ideologia, filosofia, valores sociais e morais, que esto presente na formao

humana da sociedade.

Alm de possuir como principal pilar de sustentao de qualquer sistema

produtivo o aspecto material de reproduo da sociedade, temos que considerar

que as estruturas morais, os valores humanos tambm so meio intrnsecos de

dominao e explorao ao longo do tempo histrico da civilizao humana.

A forma de acumulao capitalista tambm embrionria nesse estgio de

desenvolvimento econmico, conforme descrito:

A expropriao do produtor rural, do campons, que fica assim privado de suas terras, constitui a base de todo o processo. A histria dessas expropriaes assume matizes diversas nos diferentes

pases, percorre vrias fases em seqncia diversa e em pocas diferentes Marx (1981 vol. 1, pg. 828)

As economias da Idade Mdia eram baseadas nas trocas de excedentes

econmicos entre seus povoados, e as primeiras cidades nasceram onde o

comrcio encontrou condies de estabelecer-se da melhor forma possvel.

Outro aspecto tpico dessas economias era a prtica da usura como mtodo

17

de renda, onde descrito a seguir:

consideremos o capital usurrio na forma em que efetivamente se apodera de todo o trabalho

excedente dos produtores imediatos, sem modificar o modo de produo; em que tem por

pressuposto essencial a propriedade ou a posse das condies de trabalho pelos produtores

Marx (1981 livro 3, vol. 5, pg. 790)

Em outra passagem destacado o papel desse tipo de acumulao na

poca:

A usura na antiguidade e na era feudal, solapa e destri a riqueza e a propriedade. Alm disso, corri e arruna a pequena produo camponesa e pequeno-burguesa, em suma, todas as formas

em que o produtor aparece como proprietrio dos meios de produo Marx (1981 livro 3, vol. 5, pg. 790)

Com isso, os aspectos particulares do modo de acumulao da poca j se

encarregaram de separar o campons e o pequeno produtor do meio individual de

reproduo de sua existncia, estabelecendo assim uma nova classe social dentro

da economia capitalista que estava sendo formada; o mercado de trabalho com

indivduos que nada mais dispunham para sobreviver alm da venda da sua fora

de trabalho.

Nesse sentido o desenvolvimento das trocas entre estas cidades-estados

dispersas; alinhado s novas transformaes sociais no modo de reproduo de

subsistncia dos indivduos passou a ser criado um ambiente nico ao redor de

cada uma delas, onde as limitaes impostas pelas diferenas tnicas e de

costumes foram superadas aos poucos pelo aperfeioamento da linguagem e de

uma moeda nica entre territrios de certa proximidade geogrfica.

Esse cenrio foi o plano de fundo para a criao das economias nacionais,

onde o comrcio foi o elemento catalisador deste processo, visto que era um

elemento que trazia uma nova integrao entre as regies e cidades mais

dispersas.

No entanto, a partir do comrcio exterior de longa distancia ou do comrcio

internacional que a instituio do mercado vai progressivamente invadindo a vida

econmica das economias nacionais. Os mercados externos, que inicialmente eram

desconectados das estruturas econmicas internas, acumularam grande volume de

riqueza, que foram instrumentalizadas pelos Estados nacionais em seu proveito.

Com isso, a dinamizao das trocas comerciais entre estas cidades-estados,

que posteriormente transformaram-se em economias nacionais, foi o plano de

18

fundo para o desenvolvimento de um estado nacional.

Assim, nascida das relaes comerciais internacionais, a economia

mercantil penetra no campo e nas cidades, quebrando monoplios e desmanchando

obstculos circulao interna de mercadorias, processo este fortemente apoiado

pelos Estados nacionais recm criados. No decorrer do sculo XVII as primeiras

cidades-estados nascem, especificamente no norte da Itlia, com Gnova e Veneza.

Estas cidades foram base fundamental para a organizao do comrcio mundial

foram estabelecendo uma estrutura ao seu redor, e respaldadas por uma classe

mercantil enriquecida durante sculos de comrcio externo criaram-se os primeiros

Estados. A unio entre Estados e mercadores refora e atende os seus interesses

recprocos, portanto, criando um estado embrionrio que desde o incio respeitasse

e defendesse os interesses da classe que o originou, estabelecendo um cenrio que

fosse possvel perpetuao da dominao econmica agora em uma estrutura

nacional.

Os novos Estados se unificam a partir das guerras com terras vizinhas, as

estruturas administrativas nacionais so criadas, seu Tesouro administrado por

hbeis comerciantes e so financiados por ricos banqueiros. Assim, comerciantes e

banqueiros se infiltram em todos os lugares chaves da administrao estatal, onde

interesses pblicos e privados se misturam. o contexto de crise interna e externa

que fora governos e comerciantes em favor do desenvolvimento dos mercados

internos.

Analisando a evoluo produtiva desse cenrio histrico, temos que as

economias de carter de subsistncia, minimamente conectadas entre as poucas

relaes dos feudos dispersos, do lugar a uma economia comercial, baseada nas

trocas de excedentes produtivos, passando para ncleos de cidades-estados, e

posteriormente economias nacionais, desenvolvendo uma interao social ampla e

criando estruturas para a criao do capitalismo mundial.

importante analisar esse cenrio perante a tica tripartida de Braudel

(1985), onde ele estabelece divises estruturais para diferentes estgios de

economias. No primeiro estgio encontram-se economias de atividades prximas a

nveis de subsistncia, denominada de vida material, onde as aspiraes seriam

guiadas pelos valores de uso das mercadorias. No nvel seguinte, chamado de

economia de mercado, a atividade mercantil vive o seu auge, as trocas ocorrem

com freqncia e determinam o ambiente cotidiano social. Por fim existe o terceiro

19

estgio de desenvolvimento econmico, histrico e social de uma economia, que

Braudel define como o estgio capitalista, onde as trocas e os meios de

acumulao de excedente ocorrem atravs de estruturas elaboradas respeitando

uma hierarquia de comando dentro do sistema capitalista mundial.

A partir desse cenrio descrito acima, temos que o desenvolvimento histrico

do capitalismo, respeitando a idia de longa durao de Braudel (1985), ocorre

atravs da interao do espao mundial entre diferentes economias nacionais, cada

qual em seu respectivo estgio de evoluo, estruturando assim um moderno

sistema-mundo da economia capitalista contempornea.

Braudel (2002) afirma que, entre 1400 e 1800, a economia de trocas ainda

muito imperfeita, pois o mercado ainda no consegue unir toda produo a todo

consumo, dado que uma enorme parte da produo se destina ainda ao

autoconsumo e no entra no circuito do mercado. Alm de distinguir claramente os

dois conceitos, a economia de mercado e o capitalismo, Braudel afirma que tanto

uma como o outro, at o sculo XVIII, so realidades minoritrias, pois a massa das

aes dos homens permanece contida no imenso domnio da vida material. Embora

seja um elemento muito ativo, que tente invadir tudo, antes do sculo XIX, a

economia de mercado se reduz, muitas vezes, a uma fina camada entre o oceano da

vida cotidiana e o processo capitalista, que comea a manobrar a ambos a partir de

cima. Mas a economia de mercado no cessa de se expandir entre os sculos XV e

XVIII.

Da mesma forma que a economia de mercado, tambm o capitalismo se

forma progressivamente, sem rupturas ao longo de vrios sculos. Para muitos

autores, embora houvesse capital, ainda no existe capitalismo, como sistema

econmico propriamente dito, antes da Revoluo Industrial do sculo XVIII. Ou

seja, somente quando uma parte da populao que domina os rumos do comrcio e

da atividade econmica produtiva possui o poder de identificar o seu interesse de

classe como o interesse geral do Estado, que o capitalismo comea a desenvolver-

se da forma mais direta. Quando o Estado Ingls define como prioritrio uma poltica

de desenvolvimento industrial particular, que os Estados Nacionais aumentam a

sua influncia sobre o cotidiano social. Segundo Braudel (2002: 68), O capitalismo

no triunfa seno quando ele se identifica com o Estado, quando ele o Estado. O

que ele est dizendo que o capitalismo se impe, quando os homens do dinheiro

chegam ao poder. Foi assim nas cidades Estado italianas, em Amsterd do sculo

20

XVII, na Inglaterra com a Revoluo de 1688, na Frana, com a revoluo de julho

de 1830, quando a burguesia dos negcios se instala confortavelmente no poder.

O desenvolvimento das economias nacionais capitalistas e seu sucesso dependem

de determinadas condies sociais. O capitalismo exige uma certa tranqilidade da

ordem social, bem como uma certa neutralidade, ou fraqueza, ou complacncia do

Estado..

O Estado moderno, em gestao no sculo XIV e XV, estimula a

padronizao das economias locais, visando os impostos e, com ele, as funes

administrativas nacionais so formadas. O desenvolvimento do comrcio entre as

economias nacionais foi um meio para que as instituies fiscais e tributrias fossem

formadas, garantindo o arcabouo legal para a criao das economias nacionais.

Os Estados capitalistas nacionais nascem atrelados ao capital, mesmo porque

ele necessita de emprstimos desde a sua consolidao, visto que apesar das

tributaes ocorrerem, os gastos cotidianos necessitam muitas vezes ser

adiantados, assim como investimentos pblicos precisam de financiamentos muitas

vezes mais rpidos do que a capacidade do oramento estatal comporta.

Para promover obras pblicas, e efetuar a estruturao da mquina do

Estado, necessria a criao de uma dvida pblica, que formada pela expanso

do crdito, concedido pelos grandes comerciantes, e tambm do mercado financeiro.

Do mesmo modo que o surgimento das economias nacionais, suas estruturas

e limites foram desenvolvidos de acordo com as necessidades que o sistema

capitalista mundial possua para dar base material e humana para seu

aprimoramento, em contrapartida, esse mesmo estado nacional pode ceder lugar

para uma nova configurao do sistema econmico mundial, caso seja essa a

vontade da fora motriz do modo de produo capitalista, a acumulao.

2.2 Os estados capitalistas contemporneos e a economia mundial

Com a formao das economias nacionais, tal como foi exposto

anteriormente, todo o arcabouo legal, sua estrutura administrativa, coercitiva e

executiva precisou ser formulada. Instituies polticas e econmicas passaram a

21

determinar a ordem social, e todo esse processo exige tempo, e principalmente,

dinheiro.

Vimos que conforme o senso de autoridade foi extrado da esfera de deciso

social, assim como as formas de reproduo de subsistncia tambm foram

extradas dos trabalhadores autnomos, a organizao das economias nacionais foi

o modo que o capitalismo encontrou para organizao que servisse para seus

interesses de acumulao.

Ainda sobre a configurao da economia nacional, temos que:

Uma economia nacional um espao poltico transformado pelo Estado; em virtude das

necessidades e inovaes da vida material, num espao econmico coerente, unificado, cujas atividades podem encaminhar-se em conjunto numa mesma direo. Braudel (1987, pg. 64)

Reformas polticas tambm ocorreram, com o avano da ideologia da

revoluo francesa, as monarquias foram aos poucos sendo substitudas pelo

parlamentarismo. As idias de participao de todos foram incorporadas no

cotidiano poltico, assim como o sistema econmico passou a incorporar a atividade

produtiva de todos os trabalhadores.

Outra observao interessante acerca das instituies do moderno estado

capitalista pode ser direcionada sobre o sistema judicirio. Onde anteriormente

eram comuns decises tomadas em assemblias livres, com a participao de

todos, agora os juzes so representantes da classe dominante, que assim como

ela, promovem o controle dessas instituies, visto que em grande parte

desembargadores e procuradores so indicados por mrito familiar e econmico,

alm do pessoal.

Sobre a evoluo histrica do sistema judicirio, alinhado ao

desenvolvimento do capitalismo, verificamos que:

" parte contendas decididas por famlias ou pelos prprios indivduos, s assemblias colectivas tinham o poder de pronunciar juzos. Na primitiva sociedade germnica, o presidente do tribunal do povo no julgava: a sua funo consistia em verificar que eram observadas certas regras e certas formalidades. A idia de que pudesse haver certos homens destacados da coletividade, a quem fosse reservado o direito de dispensar justia, parecia aos cidados de uma sociedade baseada no coletivismo do cl ou da tribo, to fora de sentido como o reverso parece maioria dos nossos contemporneos. Em resumo: at certa altura do desenvolvimento da sociedade, antes de ser dividida em classes sociais, certas funes, tais como a das armas ou a administrao da justia, eram exercidas coletivamente - por todos os membros adultos da comunidade. S quando esta sociedade se desenvolve mais, no momento em que aparecem classes sociais, que estas funes so retiradas

coletividade e reservadas a uma minoria que passa a exerc-las de modo especial. " Mandell (1977, pg. 2)

22

O desenvolvimento de todo o aparato estatal requer uma estruturao

administrativa e coercitiva, que exige grande quantidade de pessoas e esforos.

Alm das esferas materiais, temos que as esferas ideolgicas, religiosas e morais

tambm esto sendo modificadas para preservar esse carter do estado, mais

bem descrito a seguir:

"Voltando atrs sociedade feudal, notar-se- que as funes de Estado exercidas pela classe dominante no se limitam apenas aos aspectos mais imediatos do Poder, tais como o exrcito, a justia, as finanas. Tambm sob o dedo do senhor existem ideologia, lei, filosofia, cincia, arte, etc." ... e complementa: "Nestas condies, pelo menos enquanto a dependncia total, o desenvolvimento da ideologia inteiramente controlado pela classe dominante: esta a nica que

ordena a "produo ideolgica" e s ela capaz de subsidiar os "idelogos". " Mandel (1977, pg. 3)

As instituies de poder poltico desenvolveram-se, e a ascenso de uma

nova classe representou mudanas na forma decisria, o parlamento foi instaurado,

l era o local onde os representantes da classe dominante encontravam-se para

definir os rumos da economia nacional.

Ao contrrio do que se acredita hoje pelo senso comum, essa democracia

disfarada de representatividade burguesa foi criada para que os interesses dos

burgueses, pagadores de impostos, fossem ouvidos e respeitados pela deciso do

corpo poltico do estado nas questes de gastos pblicos.

O motivo principal, portanto, nunca foi instaurar um meio de representao

poltica que garantisse a participao de todos, visto que no eram todos que

pagavam os impostos, portanto somente estes teriam direito de opinar.

Mandel esclarece brilhantemente essa passagem:

"E o dinheiro dos capitalistas, comerciantes, banqueiros, negociantes, que, em larga parte, enche os cofres do Estado. Sempre, desde esse tempo, uma vez que os capitalistas pagam para manter o Estado, exigiro que este se coloque inteiramente ao servio deles. Tornam isto perfeitamente claro e sentido pela prpria natureza das leis que promulgam e pelas instituies por eles criadas. Vrias instituies que hoje parecem de natureza democrtica, por exemplo, a instituio parlamentar revela

claramente a natureza de classe do Estado burgus." Mandell (1977, pg. 4)

Ao longo do desenvolvimento dos estados nacionais, e a sua conseqente

abrangncia perante todos os indivduos do meio social, inclusive os trabalhadores

que eram recentemente incorporados no modo de produo capitalista, o

oramento do estado passou a necessitar de novos impostos, que ao serem

expandidos de forma universal, tambm forou os parlamentares burgueses a

adotarem ferramentas polticas de incluso social, de modo a balancear a luta

poltica de classes nas sociedades capitalistas.

Com o acirramento da luta de classes, justamente pela demonstrao clara

23

do carter de classe das instituies do moderno estado capitalista, foi necessria

uma reformulao aparente para que esse Estado continuasse seu exerccio de

poder.

Se por um lado o aspecto democrtico passa por reformas que aumentem

seu senso de participao perante a populao, temos que lembrar que outras

instituies do estado permanecem imutveis, ou aumentam sua influncia. Na

esfera repreensiva, os exrcitos, agncias de informao privilegiada, as polcias

em geral, continuam presentes e controlando com mos de ferro os interesses do

estado, e no existe democracia que atue para mudar seu carter de classe. Outras

instituies econmicas, como o fisco, o tesouro, o Banco Central, tambm

continuam presentes defendendo os interesses dos estados, e no da populao

em geral.

Este processo mostra que a escolha democrtica poltica, que acontece de

anos em anos nos dias atuais, nada mais do que uma forma de garantir um senso

de participao ampla para a maior parte da populao, mas as instituies que

controlam o poder de fato do estado capitalista, no passam por tais decises.

Podemos verificar isso na passagem abaixo:

"O poder de Estado permanente e exercido por um certo nmero de instituies isoladas e independentes dessa to mutvel e instvel influncia como a do sufrgio universal. So estas instituies que devemos analisar se quisermos saber onde reside o verdadeiro poder: "Governos aparecem e governos desaparecem, mas a polcia e os administradores permanecem". O Estado , acima de tudo, um conjunto de instituies permanentes: o exrcito (efetivo e de reserva), a polcia geral, a polcia especial, a polcia secreta, os altos administradores nos departamentos governamentais (os serventurios-chave dos servios, os corpos de segurana

nacional, os juzes, etc.) todos quantos esto livres da influncia do sufrgio universal. " Mandell (1977, pg. 5)

Voltando discusso econmica nacional dos estados recm criados, temos

que analisar mais precisamente as estruturas que delimitam a interao entre uma

economia e outras naes.

As relaes podem ser divididas seguindo alguns ramos especficos, tais

como o aspecto comercial entre as naes, o aspecto produtivo entre firmas e

industriais multinacionais e o plano financeiro, de caractersticas globais e

totalizantes.

No aspecto de caracterizao produtiva das sociedades capitalistas, temos

que o resultado conseqente do desenvolvimento da revoluo industrial, da

especializao da produo, de forma a tornar cada vez mais eficiente e lucrativa a

24

atividade da indstria, traz consigo inmeras modificaes para a economia como

um todo.

Iremos utilizar nesse sentido o estudo de Lnin intitulado de "Imperialismo -

Fase Superior do Capitalismo" (primeira edio em 1907), onde investigado com

enorme preciso o cenrio industrial europeu do incio do sculo passado. Claro

que houve mudanas significativas sobre esses dados desde ento, mas a

compreenso precisa dos mecanismos da sociedade capitalistas vlida at hoje.

No final do sculo XIX houve uma grave crise na Europa, algumas grandes

empresas faliram, outras foram foradas a se estruturar para manter a

competitividade dos seus produtos. Na ltima dcada desse perodo foram

verificadas algumas situaes de mudanas. Dentre as principais modificaes est

o incio das atuaes conjuntas de diferentes empresas, criando alianas para

resultados mais satisfatrios. Como podemos verificar:

"Durante o breve perodo de ascenso de 1889 e 1890 foram utilizados em grande escala os cartis para aproveitar a conjuntura. Uma poltica irrefletida elevava os preos ainda com maior rapidez e em maiores propores do que teria acontecido sem os cartis, e quase todos esses cartis

pereceram ingloriamente, enterrados na fossa do craque Lnin (1985, pg. 16).

Aps os primeiros ganhos dessa prtica, que recolocaram algumas

empresas nos caminhos para o lucro produtivo, o perodo seguinte tambm foi

marcado por ajustes, e as margens de lucro eram relativamente baixas, se

comparadas com o perodo glorioso de dcadas anteriores.

Como, segundo a teoria Marxista, a taxa de lucro entre diferentes setores da

indstria tende a ocorrer na mesma intensidade, visto que os investimentos podem

migrar de um setor para o outro, caso aparea uma oportunidade de lucros

exorbitantes, este novo cenrio de combinaes entre diferentes indstrias se

alastrou em espao e intensidade.

"E o movimento dos cartis entrou na sua segunda poca. Em vez de serem um fenmeno passageiro, os cartis tornaram-se uma das bases de toda a vida econmica; conquistaram, uma

aps outra, as esferas industriais." Lnin (1985, pg. 17).

Mais do que ocorrer agrupamentos de empresas para determinado perodo

de crises, com objetivos pontuais, essas alianas ampliaram sua atuao por vrios

setores, e passou a ser o mtodo utilizado para toda a forma produtiva da poca.

Como destacado abaixo:

"Os cartis estabelecem entre si acordos sobre as condies de venda, os prazos de pagamento, etc. Repartem os mercados de venda. Fixam quantidade de produtos fabricar. Estabelecem os preos.

Distribuem os lucros entre as diferentes empresas, etc. Lnin (1985, pg. 17).

25

A caracterstica principal do capitalismo embrionrio de concorrncia perfeita

desfeita, dando lugar para novas formas de concorrncia, onde os interesses do

mercado e da eficincia produtiva e alocativa no eram mais resguardados, sendo

superados pela eficincia lucrativa e exploratria das empresas associadas, como

escrito por Lnin: "a concorrncia transforma-se em monoplio. Da resulta um gigantesco

processo de socializao da produo. Socializa-se tambm, em particular, o processo dos inventos

e aperfeioamento tcnicos. (1985, pg. 19).

Estas concentraes ocorrem em larga escala, e passam a ser um fator

determinante para o desenvolvimento do sistema capitalista mundial aps essa

nova caracterizao. O cenrio descrito abaixo foi verificado na Alemanha do incio

do sculo passado, que era um dos principais parques industriais da Europa, que

foi palco para as principais transformaes do sistema mundial:

"Quase metade da produo global de todas as empresas dos pais nas mos de uma centsima parte do total das empresas. E essas 3000 empresas gigantescas abarcam 258 ramos da indstria. Daqui se infere largamente que, ao chegar a um determinado grau do seu desenvolvimento, a concentrao por si mesma, por assim dizer, conduz diretamente ao monoplio, visto que, para umas quantas dezenas de empresas gigantescas, muito facil chegarem a acordo entre si e, por outro lado, as dificuldades da concorrncia e a tendncia para o monoplio nascem precisamente das grandes propores das empresas. Essa transformao da concorrncia em monoplio constitui um dos fenmenos mais importantes - para no dizer o mais importante - da economia do capitalismo dos

ltimos tempos." Lnin (1985, pg. 14).

Essas novas caractersticas de concentrao acarretam tambm em novas

formulaes empresariais, onde as firmas que antes eram constitudas de uma

especializao em determinada rea, passa a realizar combinaes verticais,

ampliando suas atuaes em outros ramos e setores.

"A chamada combinao, ou seja, a reunio numa s empresa de diferentes ramos da indstria (...) A combinao - diz Hilferding - nivela as diferenas de conjuntura e garante, portanto, a empresa combinada uma taxa de lucro mais estvel. Em segundo lugar conduz a eliminao do comrcio. Em terceiro lugar, permite o aperfeioamento tcnico, e, por conseguinte, a obteno de lucros suplementares em comparao com as empresas simples. Em quarto lugar fortalece a posio da empresa combinada em relao simples, refora-a na luta da concorrncia durante as fortes

depresses." Lnin (1985, pg. 14).

Essas novas combinaes empresariais criam imprios produtivos, que so

conglomerados de indstrias que aumentam sua participao e fortalecem suas

posies perante esses novos arranjos.

O comrcio passa a ser uma atividade secundria dentro dos grandes

conglomerados, j que no ocorrem mais transaes correntes entre as empresas

do mesmo grupo. A alta concentrao de recursos possibilita uma oportunidade de

26

maiores investimentos em tecnologia, inovao e desenvolvimento desses

monoplios, beneficiando cada vez mais as grandes empresas, e prejudicando as

pequenas, atravs de uma concorrncia desleal.

Esses imprios atingem um alto grau de socializao da produo, visto que

passam a dirigir os rumos de toda a esfera produtiva, trazendo para sua rbita de

atuao a sociedade como um todo. Como identificado a seguir:

"O capitalismo, na sua fase imperialista, conduz a socializao integral da produo nos seus mais variados aspectos; arrasta, por assim dizer, os capitalistas, contra sua vontade e sem que isso tenha conscincia, para um novo regime social, de transio entre a absoluta liberdade de concorrncia e a socializao completa. (...) A produo passa a ser social, mas a apropriao continua a ser privada. Os meios sociais de produo continuam a ser propriedades privada de um reduzido nmero de indivduos. Mantm-se o quadro geral da livre concorrncia formalmente reconhecida, e o jugo de uns quantos monopolistas sobre o resto da populao torna-se cem vezes mais duro, mais

sensvel, mais insuportvel." Lnin (1985, pg. 20).

Deste modo, a alta concentrao industrial possibilita uma socializao da

produo, ao mesmo tempo em que condiciona cada vez maior poder de deciso

para os grandes conglomerados produtivos, que arrastam para todo o conjunto da

sociedade o peso de seus interesses.

As principais caractersticas produtivas do incio do sculo passado foram

demonstradas anteriormente, e foram esses traos que deram base para o

desenvolvimento do capitalismo do sculo passado como sistema mundial, e vem

condicionando nosso sistema histrico at o momento.

Vamos voltar o foco nesse momento para a questo da regulao e

caractersticas do comrcio entre as diferentes naes.

Muitos tericos partiram do conceito de Estado nao para formularem

diferentes estudos sobre a economia mundial. Smith foi um dos pioneiros a

delimitar a diviso social do trabalho e sua produtividade no espao geogrfico

global. Ricardo elabora no mesmo sentido o seu modelo de vantagens

comparativas. Da mesma forma tambm fizeram os tericos marxistas, como Rosa

Luxemburgo e Lnin, que destacam grande importncia para as trocas comerciais

internacionais para alavancar o padro de acumulao capitalista.

A exportao de mercadorias era regulada pela lgica comercial e pelo

princpio da especializao internacional, que repousa sobre as diferenas de

produtividade setorial entre as economias nacionais. Nesta configurao, a figura do

comerciante, que seria o ator principal, fica ofuscada pela ao do Estado nacional,

atravs da poltica comercial e de controle sobre o territrio, que abriga o estoque

27

dos fatores produtivos, responsveis pela produtividade das economias nacionais.

Aps esse perodo de pice das trocas mercantis entre os estados nacionais,

o capitalismo evolui novamente sua forma de atuar, e outras estruturas para o

comrcio foram criadas, especialmente aps a incluso de cada vez mais economias

nacionais dispersas dentro de um sistema internacional de interaes econmicas e

sociais.

Era necessrio um modo de facilitar essas trocas comerciais, algo que

tornasse cada vez mais dinmicas as relaes e reprodues do sistema capitalista,

visto que o aumento do ciclo produtivo, e do aferimento do lucro tornava-se uma

necessidade cada vez mais rpida de ser efetuada. A partir deste cenrio os bancos

passaram a ter um papel cada vez mais decisivo no cotidiano econmico, sendo

responsveis pela transferncia de renda entre os diferentes agentes da sociedade,

assim como atuando de forma central na estocagem de capital-dinheiro.

O desenvolvimento da sociedade capitalista trouxe a necessidade cada vez

maior da atuao dos bancos, assim como a necessidade de recorrer a eles de toda

a parcela da economia que estivesse minimamente inserida no seu processo

reprodutivo.

Sobre este novo cenrio podemos destacar a passagem abaixo:

" medida que vo aumentando as operaes bancrias e se concentram num nmero reduzido de estabelecimentos, os bancos convertem-se, de modestos intermedirios que eram antes, em monopolistas onipotentes, que dispem de quase todo o capital-dinheiro do conjunto dos capitalistas e pequenos patres, bem como da maior parte dos meios de produo e das fontes de matrias- primas de um ou de muitos pases. Esta transformao dos numerosos modestos intermedirios num punhado de monopolistas constitui um dos processos fundamentais da transformao do capitalismo em imperialismo capitalista, e por isso devemos deter-nos, em primeiro lugar, na concentrao

bancria." Lnin (1985, pg. 23).

Do mesmo modo que foi descrito anteriormente no setor industrial, a

concentrao e o monoplio tambm atuam sobre o sistema bancrio, criando

alguns poucos bancos capazes de controlar uma enorme quantidade de recursos da

sociedade capitalista. Esse fato justifica a importncia do tema identificado por

Lnin.

As relaes entre esses bancos cada vez mais poderosos, e os grandes

conglomerados produtivos, que inicialmente era limitadas nas transaes correntes

que um setor provia para o outro, passa por mudanas significativas no perodo

seguinte.

Os grupos industriais so formados muitas vezes por empresas de capital

28

aberto, onde a venda de aes ocorreram inicialmente para a alavancagem de seus

investimentos e sua estruturao. Com o cenrio de monoplio, que foi descrito

previamente, poucos cidados so responsveis por grande parte do controle

acionrio dessas aes. Ocorre que, em muitos casos, existe uma grande relao

entre estes monopolistas do sistema produtivo e os controladores dos bancos.

de extrema importncia para o sistema bancrio os rumos que os negcios

dos conglomerados industriais e produtivos tomarem, visto que esses so seus

principais parceiros comerciais. Do mesmo modo, vital para o desenvolvimento do

sistema capitalista o sistema financeiro. Assim como foi descrito a experincia da

formao de cartis nos perodos de crises para busca de maiores lucros, a classe

de capitalistas, detentores dos meios de produo da sociedade passou a atuar em

conjunto, tornando essa prtica monopolista de ocasio uma estratgia permanente.

Um claro exemplo desse cenrio descrito a seguir: "Simultaneamente, desenvolve-se, por assim dizer, a unio pessoal dos bancos com as

maiores empresas industriais e comerciais, a fuso de uns com as outras, mediante a posse de aes, mediante a participao dos diretores dos bancos nos conselhos de superviso (ou de

administrao) das empresas industriais e comerciais, e vice-versa." Lnin (1985, pg. 32).

Portanto, os capitalistas industriais esto cada vez mais interligados com os

capitalistas bancrios, onde um setor atua com relao direta com outro, trazendo a

sociedade ao jugo desse conjunto de monopolistas.

Como extramos das obras de Mandel no item anterior deste estudo, o

capitalismo atua em dependncia com o Estado, precisa dele para sobreviver, e

condiciona o desenvolvimento da nao perante sua vontade. Em uma sociedade

capitalista burguesa, aqueles que controlam o Estado, tambm esto interligados

com o controle dos modos de produo e circulao. Completando esse ciclo temos

que:

"A unio pessoal dos bancos com a indstria completa-se com a unio pessoal de umas e outras sociedades com o governo. Lugares nos conselhos de administrao so confiados voluntariamente a pessoas conhecidas de renome, bem como a antigos funcionrios do Estado, os quais podem facilitar

em grau considervel as relaes com as autoridades." Lnin (1985, pg. 32).

Temos que ocorre, cada vez mais, uma concentrao de poder, em um

cenrio que os detentores dos meios de produo, juntamente dos possuidores dos

meios de transaes monetrias, e os controladores do Estado esto intimamente

conectados.

Essa nova configurao organizativa da sociedade, onde os bancos atuam de

29

forma associativa com os monoplios industriais, alinhados juntamente dos Estados,

traz consigo mudanas tambm na forma do capital excedente da produo social

ser alocado.

Atravs do cenrio descrito acima temos a formao do "capital financeiro",

que passa a ser a nova forma de atuao do capital, germe embrionrio de uma

transformao por completa no sistema capitalista mundial. Para definio deste

conceito, utilizaremos como base a concluso de Lnin, que foi extrada de

Hilferding (1985):

"Uma parte cada vez maior do capital industrial no pertence aos industriais que o utilizam. Podem dispor do capital unicamente por intermdio do banco, que representa, para eles, os proprietrios desse capital. Por outro lado, o banco tambm se v obrigado a fixar na indstria uma parte cada vez maior do seu capital. Graas a isto, converte-se, em propores crescentes, em capitalista industrial. Este capital bancrio, que por esse processo se transforma de fato em capital industrial, aquilo a que chamo de capital financeiro. Capital financeiro o capital que se encontra a disposio dos

bancos e que os industriais utilizam." Lnin (1985, pg. 36).

Portanto, chamaremos no decorrer do texto de "capital financeiro", toda a

massa de capital mobilizado na posse do sistema bancrio, que utilizado pelos

industriais.

Os novos arranjos produtivos e comerciais esto voltados para o

desenvolvimento dos fatores produtivos globais, e uma nova realocao desses

fatores no espao global ajustada.

Neste processo de multinacionalizao produtiva, se expande a exportao

de capital, de sistemas produtivos e de relaes de produo capitalistas,

especialmente na forma de investimentos diretos externos, efetuados pelas

empresas multinacionais. O fato mais importante desse processo a constituio de

um espao multinacional sobreposto s economias nacionais, um verdadeiro

mercado interno estrutura destas empresas. Na verdade, trata-se mais de uma

circulao de capitais intra-firmas, do que de uma circulao entre economias

nacionais, como era a circulao de mercadorias na configurao internacional.

Em um cenrio econmico de escala mundial, onde a mais recente forma de

materializao do capital, nos seu aspecto de capital financeiro, encontra uma

margem enorme de atuao e de desenvolvimento, essa caracterstica de

concentrao e busca incessante de novos negcios a serem explorados passa a

ser cada vez mais presente no cotidiano. Deste modo, temos que:

"Os grandes estabelecimentos, particularmente os bancos, no s absorvem diretamente os pequenos, como os incorpora, subordinam inclue-nos no seu grupo, no seu consrcio, por meio da

30

participao no seu capital, da compra ou da troca de aes, do sistema de crdito, etc." Lnin (1985, pg. 24).

Chamaremos por definio prpria de "sistema financeiro" o ambiente onde o

capital financeiro atua, seja ele na esfera de transaes bancrias, na esfera

produtiva atravs da atuao nos grupos industriais, na relao com o Estado, ou

em qualquer outra situao poltica ou econmica que ele possa atuar diretamente.

A nova etapa do capitalismo mundial, marcada pela concentrao e o

monoplio, assim como o surgimento do capital financeiro, e sua rpida expanso e

aliana com o Estado, traz uma nova era para o sistema histrico. Deste modo:

"O capital financeiro criou a poca dos monoplios. E os monoplios trazem consigo os princpios monopolistas: a utilizao das relaes para as transaes proveitosas substitui a concorrncia no

Mercado aberto." Lnin (1985, pg. 50).

Continuando:

"O monoplio, uma vez que foi constitudo e controla milhares de milhes, penetra de maneira absolutamente inevitvel em todos os aspectos da vida social, independente do regime poltico e de

qualquer outra particularidade." Lnin (1985, pg. 44).

Uma das principais caractersticas do modo de produo capitalista so a sua

facilidade de adaptao, inovao e revoluo, onde ele consegue transformar-se

cotidianamente para aperfeioar os mecanismos e as estruturas de acumulao e

explorao.

Os estados nacionais, que nasceram da necessidade do capitalismo de

possuir um corpo administrativo sobre a populao em geral, e que esteve alinhado

ao desenvolvimento dos pilares do capitalismo industrial particular, tem suas

estruturas modificadas diariamente, sofrendo com as transformaes desse mesmo

capitalismo. Aprimora-se, portanto, a forma de atuao do Estado em relao

explorao capitalista:

"O capital financeiro, concentrado em muito poucas mos e gozando do monoplio efetivo, obtm um lucro enorme, que aumenta sem cessar com a constituio de sociedades, emisso de valores, emprstimos do Estado, etc., consolidando a dominao da oligarquia financeira e impondo a toda a

sociedade um tributo em provento dos monopolistas." Lnin (1985, pg. 41).

2.3 Capital financeiro e Imperialismo:

Enquanto as formas de extrao de mais-valia eram predominantemente

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encontradas atravs da remunerao do capital mercantil, derivado da circulao de

mercadorias em um comrcio amplo, as novas configuraes dos estados

capitalistas criaram as condies necessrias para a expanso do comrcio mundial,

explorando de forma intramarina e continental os pases globais. Assim: "O que

caracteriza o velho capitalismo, no qual dominava lentamente a livre concorrncia, era a exportao

de mercadorias. O que caracteriza o capitalismo moderno, no qual impera o monoplio, a

exportao de capital." Lnin (1985, pg. 47).

Ainda sobre o monoplio, trao caracterstico dessa nova fase do sistema

capitalista mundial, devemos considerar alguns fatores marcantes:

"As quatro variedades essncias do monoplio so: Primeiro: o monoplio um produto da concentrao da produo num grau elevado de seu desenvolvimento. Formam as associaes monopolistas dos capitalistas, os cartis, os sindicatos e os trustes.

Segundo: os monoplios vieram agudizar luta pela conquista das mais importantes fontes de matrias-primas, particularmente para a indstria fundamental Terceiro: o monoplio surgiu dos bancos, os quais, de modestas empresas intermedirias que eram antes, se transformaram em monopolistas do capital financeiro. A oligarquia financeira, que tece uma densa rede de relaes de dependncia entre todas as instituies econmicas e polticas da sociedade burguesa contempornea sem exceo: tal a manifestao mais evidente deste monoplio. Quarto: o monoplio nasceu da poltica colonial. Aos numerosos velhos motivos da poltica colonial, o capital financeiro acrescentou a luta pelas fontes de matrias-prima, pela exportao de capitais, pelas esferas de influncia, isto , as esferas de transaes lucrativas, de concesses, de lucros

monopolistas, etc., e, finalmente, pelo territrio econmico em geral." Lnin (1985, pg. 93).

Portanto, o monoplio efetivo, que concentra as indstrias e os bancos,

tambm atua na partilha global, no quesito de controle das fontes de matrias-

primas, atravs de uma influncia direta da antiga poltica colonial, que era baseada

na partilha de atuao econmica e exploratria dos territrios mundiais.

As dinmicas que transformam o espao produtivo, e comandam o gene da

sociedade capitalista passam constantemente por um processo lento de

centralizao sobre uma regio especfica, e posteriormente mudam de centro

catalisador com o decorrer da histria.

Sobre essas transformaes, temos alguns traos marcantes desse trajeto:

"No caso da Europa e das zonas que ela anexa, operou-se uma centragem na dcada de 1380, em benefcio de Veneza. Por volta de 1500, houve um salto brusco e gigantesco de Veneza para Anturpia, depois, em 1550-1560, um retorno ao Mediterrneo, mas desta vez em favor de Gnova; enfim, por volta de 1590-1610, uma transferncia para Amsterdam, onde o centro econmico da zona europia se estabilizar por quase dois sculos. Entre 1790 e 1815 deslocar-se- para Londres. Em

1929, atravessa o Atlntico e situa- se em Nova Iorque. " Braudel (1987, pg. 56).

Quando a diviso social e internacional do trabalho foi criada, tambm foi

necessria a criao de economias nacionais que garantissem a expanso do

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capital produtivo industrial, e a consolidao da explorao atravs da mais-valia.

Dado a exausto da forma de acumulao da esfera produtiva, o sistema-

mundo passou a deliberar novas formas de articulao entre os estados nacionais, e

a esfera financeira passou a ser a prioridade da atuao econmica. Por

conseguinte:

"o desenvolvimento do capitalismo chegou a um ponto tal que, ainda que a produo mercantil continue reinando como antes, e seja considerada a base de toda a economia, na realidade encontra-

se j minada e os lucros principais vo parar aos gnios das maquinaes financeiras." Lnin (1985, pg. 21).

Nesta fase, afirma-se o primado da circulao do capital financeiro e a

dominncia da lgica da rentabilidade financeira sobre todas as atividades

econmicas. Neste espao mundial, a interdependncia entre as dimenses da

mundializao assume a forma de uma grande autonomia da dimenso financeira,

na medida em que a circulao e a lgica da rentabilidade financeira fixam a norma

de circulao e rentabilidade s demais atividades produtivas e comerciais.

A configurao deste espao mundial se caracteriza pela interao de trs

fatores: o acmulo de um volume crescente de riqueza monetria e financeira, na

forma de ativos com diferentes graus de liquidez e denominados em diferentes

moedas; a mobilidade crescente desses ativos, propiciada pelo desenvolvimento

extraordinrio da informtica e das telecomunicaes, de tal forma que seu

movimento foge aos controles dos bancos centrais; e finalmente, pelo regime de

taxas de cmbio flutuantes, que engendram oportunidades extraordinrias de

ganhos especulativos. Neste contexto, o prprio ciclo econmico real assume forma

errtica e passa a ser comandado pelo ciclo de valorizao e desvalorizao dos

ativos financeiros. Como descrito abaixo:

"O imperialismo, ou domnio do capital financeiro, o capitalismo no seu grau superior, em que essa separao adquire propores imensas. O predomnio do capital financeiro sobre todas as demais formas do capital implica o predomnio do rentista e da oligarquia financeira, a situao destacada de

uns quatro estados de poder financeiro em relao a todos os restantes." Lnin (1985, pg. 45).

Nessa nova fase do capitalismo mundial, onde a esfera das finanas

comanda as relaes sociais e econmicas da populao, as configuraes dos

Estados Nacionais so novamente modificadas, para mais uma vez garantirem a

remunerao do capital e a sua lgica totalitria de explorao.

O "imperialismo" a nova face capitalista descrita acima, onde o papel

decisivo econmico e social encontra-se no controle daqueles que comandam o

capital financeiro, em geral tambm so os mesmos que controlam os monoplios

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produtivos, bancrios e o Estado. Neste sentido, adotaremos o conceito descrito

abaixo como "imperialismo":

"Se fosse necessrio dar uma definio o mais breve possvel do imperialismo, dever-se-ia dizer que o imperialismo a fase monopolista do capitalismo. Essa definio compreenderia o principal, pois, por um lado, o capital financeiro o capital bancrio de alguns grandes bancos monopolistas fundido com o capital das associaes monopolistas de industriais, e, por outro lado, a partilha do mundo a transio da poltica colonial que se estende sem obstculos as regies ainda no apropriadas por nenhuma potncia capitalista para a poltica colonial de posse monopolista dos territrios do globo j

inteiramente repartido." Lnin (1985, pg. 67).

2.4 Origens histricas e contextualizao da dvida pblica

Para uma anlise mais adequada sobre as origens histricas da dvida

pblica dentro do capitalismo, necessria uma viso histrica investigativa desse

sistema no decorrer do desenvolvimento do capitalismo mundial.

Caso a dvida pblica seja uma ferramenta utilizada por todos os estados

nacionais contemporneos inseridos no circuito mundial da acumulao capitalista,

como o , o fato importante da anlise ser verificarmos as implicaes sistmicas

desse mtodo de financiamento estatal e ao longo dos sculos dentro do prprio

sistema global do capitalismo.

Utilizaremos como referencial terico a obra de Wallerstein (1979), onde ele

investiga as principais estruturas que fazem o capitalismo possuir uma diviso em

sistemas-mundo.

Um sistema-mundo o modo de estruturao de uma matriz de

desenvolvimento econmico central, ocorrendo em certo tempo histrico e espao

geogrfico, que interage com as reas ao seu redor, principalmente atravs da

diviso social do trabalho e das relaes econmicas, financeiras, sociais e

culturais, criando uma grande influncia perante essas reas virtualmente

anexadas.

Neste sistema-mundo, com predomnio do capital financeiro como

determinantes das demais relaes, temos um cenrio interessante entre as

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relaes de diferentes pases, como verificamos abaixo:

"O capital financeiro uma fora to considervel, pode dizer-se to decisiva, em todas as relaes econmicas e internacionais que capaz de subordinar, e subordina realmente, mesmo os Estados que gozam da independncia poltica mais completa, como veremos seguidamente. Mas compreende-se, a subordinao mais lucrativa e cmoda para o capital financeiro a subordinao

tal que traz consigo a perda da independncia poltica dos pases e dos povos submetidos." Lnin (1985, pg. 62).

A principal contribuio deste mtodo de anlise est em identificar que o

desenvolvimento do capitalismo mundial o principal fenmeno da economia a ser

estudado ao longo dos tempos, visto que os outros fenmenos inerentes a este

sistema fazem parte de um complexo encadeamento histrico da estrutura social

mundial.

Uma viso prtica deste fato pode ser observada atravs do que foi exposto

nas sees anteriores deste trabalho, onde o capitalismo embrionrio, cheio de

suas particularidades e limitaes, ainda concentrado em algumas cidades-estados

da Europa na Idade Mdia, criaram estruturas administrativas, polticas, coercitivas;

posteriormente desenvolveu seus meios de explorao atravs do comrcio, da

produo e das finanas; alm de ocorrer hoje em um espao cada vez mais amplo

do nosso planeta. Portanto, foi a expanso desse modo de produo e organizao

social que o fator central do desenvolvimento histrico global, e as implicaes

que ele assume e causa devem ser estudadas.

O Estado estava em constante unio com a ferramenta de poder, que na

maioria das naes europias do incio do sistema capitalista eram formadas pelo

Parlamentarismo. Sobre essa aliana de interesses, e a formao da dvida pblica,

temos que:

"O Parlamento e, mais ainda, o governo de um Estado capitalista, por mais democrtico que parea ser, est atado burguesia por cadeias doiradas que tomam o nome de dvida pblica. Nenhum governo poderia durar mais de um ms sem bater porta dos bancos para pagar as suas despesas correntes. Se os bancos se recusassem, o governo abriria falncia. So duplas as origens deste fenmeno. Os impostos no entram diariamente nos cofres; as receitas concentram-se em certos perodos do ano, mas as despesas so contnuas. deste modo que surge a dvida pblica em curto prazo. Este problema no de soluo difcil, mas surge ainda outro problema, muitssimo mais grave. Todos os modernos Estados capitalistas gastam mais do que recebem. Eis a origem da dvida pblica em longo prazo para a qual os bancos e estabelecimentos financeiros adiantam dinheiro a juros elevados. Aqui est uma conexo direta e imediata, um lao dirio, entre o Estado e a Alta

Finana." Mandell (1977, pg. 7)

Alm da diviso social do trabalho, ocasionada pela expanso da base

material da economia mundial, o sistema-mundo, e suas relaes com as reas e

estados nacionais ao seu redor, tambm realizam uma diviso internacional do

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excedente econmico, seja ele mercantil, produtivo ou financeiro. Com isso, as

estruturas dos estados nacionais so criadas para prestigiar essa lgica de sistema

totalizante, sendo doutrinada pelas necessidades das economias centrais do

sistema.

Esta diviso do trabalho social dentro do sistema-mundo guiada pelos

pases que esto em estgio mais avanados de organizao e estruturao

econmica dentro do sistema histrico; com isso, a prpria estruturao e

desenvolvimento das economias perifricas respeitam desde o seu nascimento as

relaes econmicas que garantam uma vantagem mercantil, econmica ou

financeira para os pases centrais do sistema. Assim:

"As propores gigantescas do capital financeiro, concentrado em poucas mos, que deu origem a uma rede extraordinariamente vasta e densa de relaes e vnculos, e que subordinou ao seu poder no s a massa dos capitalistas e pequenos e mdios empresrios, mas tambm os mais insignificantes, por um lado, e a exacerbao, por outro lado, da luta contra outros grupos nacionais- estatais de financeiros pela partilha do mundo e pelo domnio sobre outros pases, tudo isto origina a

passagem em bloco de todas as classes possuidoras para o lado do imperialismo." Lnin (1985, pg. 82).

As categorias de centro-periferia servem para analisar o efeito sistmico que

as interaes mercantis ditam sobre a economia mundial, onde os Estados

Nacionais com maiores condies econmicas, poltica ou militar tomam vantagem

dos Estados perifricos durante o curso da histria. Para garantir a perpetuao da

dominao econmica sobre as reas perifricas, os pases centrais tentam manter

seu domnio por meios que garantam o lucro excepcional, tais como o monoplio,

patentes, ganhos de produtividade tecnolgica, entre outros. O mercado utilizado

para promover os ganhos na esfera mercantil e produtiva, mas necessria uma

aliana mais profunda para garantir seus domnios e privilgios perpetuamente,

nesse quesito a aliana com os estados nacionais volta a ser importante.

Ocorrem entre os estados nacionais relaes moldadas pelo sistema

mundial e a diviso internacional do trabalho, sendo assim, alguns estados utilizam

de arcabouos e ferramentas polticas, militares, econmicas ou sociais para

obterem vantagem nas relaes com os outros estados perifricos. As polticas

estatais servem para garantir as vantagens e privilgios dos pases centrais no jogo

de poder com os pases perifricos. Existe, portanto, um sistema interestatal que

organiza, dinamiza e hierarquiza as relaes entre as economias nacionais dentro

do sistema-mundo capitalista. Este fato foi brilhantemente identificado abaixo:

"Os monoplios, a oligarquia, a tendncia para a dominao em vez da tendncia para a liberdade, a

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explorao de um nmero cada vez maior de naes pequenas ou fracas por um punhado de naes riqussimas ou muito fortes: tudo isto originou os traos distintivos do imperialismo, que obrigam a qualific-lo de capitalismo parasitrio, ou em estado de decomposio. Cada vez se manifesta com maior relevo, como uma das tendncias do imperialismo, a formao de Estados-rentistas, de Estados usurrios, cuja burguesia vive cada vez mais a custa da exportao de capitais e do corte de

contingente." Lnin (1985, pg. 94).

Sobre o debate da dvida pblica, ela para Marx (1986) um elemento

intrnseco das finanas estatais contemporneas do sistema-mundial capitalista,

conforme descrito abaixo:

A dvida pblica torna-se uma das mais enrgicas alavancas da acumulao primitiva. Tal como o toque de uma varinha mgica, ela dota o dinheiro improdutivo de fora criadora e o transforma, desse modo, em capital, sem que tenha necessidade para tanto de se expor ao esforo e perigo inseparveis da aplicao industrial e mesmo usurria. Os credores do Estado, na realidade, no do nada, pois a soma emprestada convertida em ttulos da dvida, facilmente transferveis, que continuam a funcionar em suas mos como se fosse a mesma quantidade de dinheiro sonante. Porm, abstraindo a classe de rentistas ociosos assim criada e a riqueza improvisada dos financistas que atuam como intermedirios entre o governo e a nao [...] a dvida do Estado fez prosperar as sociedades por aes, o comrcio com ttulos negociveis de toda espcie, a agiotagem, em uma

palavra: o jogo da Bolsa e a moderna bancocracia. MARX, Karl (1986, Livro III, Vol. 2, pg. 11)

Os ambientes necessrios para essa valorizao do capital precisam ser

garantidos, surgem assim s primeiras bolsas de valores modernas, que so criadas

justamente para a negociao desses ttulos. Se por um lado do debate econmico

esses emprstimos ao Estado daria condies de financiamentos necessrios para

as economias nacionais, por outro lado foi o meio encontrado de garantir o

desenvolvimento e aprimoramento da forma de acumulao do capital