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1 UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE - UFRN CENTRO DE EDUCAÇÃO PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO - PPGED JAMIRA LOPES DE AMORIM RECONFIGURAÇÕES DO CAMPO UNIVERSITÁRIO NO BRASIL E SUAS REPERCUSSÕES EM UMA INSTITUIÇÃO PERIFÉRICA FAFIDAM/UECE NATAL 2019

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE - UFRN

CENTRO DE EDUCAÇÃO

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO - PPGED

JAMIRA LOPES DE AMORIM

RECONFIGURAÇÕES DO CAMPO UNIVERSITÁRIO NO BRASIL E

SUAS REPERCUSSÕES EM UMA INSTITUIÇÃO PERIFÉRICA –

FAFIDAM/UECE

NATAL

2019

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Universidade Federal do Rio Grande do Norte - UFRN

Sistema de Bibliotecas - SISBI

Catalogação de Publicação na Fonte. UFRN - Biblioteca Central Zila Mamede

Amorim, Jamira Lopes de.

Reconfigurações do campo universitário no Brasil e suas

repercussões em uma instituição periférica - FAFIDAM/UECE / Jamira Lopes de Amorim. - 2019.

197 f.: il.

Tese (doutorado) - Universidade Federal do Rio Grande do

Norte, Centro de Educação, Programa de Pós-Graduação em Educação,

Natal, RN, 2019.

Orientador: Prof. Dr. Moisés Domingos Sobrinho.

1. Campo universitário - Tese. 2. Ensino Superior - Tese. 3.

Reconfigurações - Tese. I. Sobrinho, Moisés Domingos. II. Título.

RN/UF/BCZM CDU 378.147

Elaborado por Ana Cristina Cavalcanti Tinôco - CRB-15/262

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JAMIRA LOPES DE AMORIM

RECONFIGURAÇÕES DO CAMPO UNIVERSITÁRIO NO BRASIL E

SUAS REPERCUSSÕES EM UMA INSTITUIÇÃO PERIFÉRICA –

FAFIDAM/UECE

Tese apresentada ao Programa de Pós-Graduação em

Educação do Centro de Educação, da Universidade Federal

do Rio Grande do Norte, como requisito parcial para

obtenção do grau de Doutora em Educação.

Linha de Pesquisa: Educação, Formação e profissionalização

docente.

Orientador: Prof. Dr. Moisés Domingos Sobrinho.

NATAL

2019

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Dedico este trabalho ao meu pai Cândido e à minha mãe Alzenira!

Mãe, obrigada por vir me visitar de vez em quando. Sempre que a senhora chega eu percebo, vejo sua

vestimenta, seus cabelos e seu olhar. A senhora está mais bonita!

Pai, ainda vamos nos encontrar, eu sei que o senhor está só esperando para me conhecer!

À toda a minha linhagem cigana! Ao meu povo Rom!

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AGRADECIMENTOS

“Eu me lembro muito bem, do dia em que eu cheguei, jovem que desce do Norte pra cidade grande

com os pés cansados e feridos de andar légua tirana, e lágrimas nos olhos de ler o Pessoa e de

ver o verde da cana (…)”

Muitas vezes cruzando a passarela da Avenida Salgado Filho em direção à UFRN, me perguntei

onde estava e por que caminhava naquela direção. O estranhamento com a indiferença da

metrópole, o sofrimento de quem vem do interior - alheio, estrangeiro e geralmente cheio de bolsas.

As noites mal dormidas, a ansiedade, a responsabilidade, o medo de falhar. Cada travessia ia me

fazendo ver que de alguma maneira era possível ignorar os pedintes na rua, os vendedores, os

ambulantes, os assaltantes. Foram muitas distâncias percorridas até que eu chegasse aqui e, nessa

caminhada, muitas mãos foram sendo dadas. Quando cheguei, não sabia quem era, não lhe

conhecia o rosto, mas trazia um papel anotado com seu nome e, na cabeça, tantos sonhos que eu

depois descobri que eram ilusões.

A você, meu querido Moisés, toda a minha gratidão e respeito. Sei que não fui a sua melhor

orientanda e, também, sei que você não perde tempo com dramas, por esta razão quero lhe dizer

que ter lhe encontrado foi um dos melhores presentes que a vida poderia me dar. Porque lhe

conhecendo, ouvi você dizer: “vá ler, porque você não tem domínio do conceito!”. E eu fui, embora

não tenha o domínio do conceito, eu ganhei um encontro com Pierre Bourdieu. E esse encontro foi

um grande divisor de águas para mim. Levarei eternamente a gratidão e o amor por sua pessoa.

Moisés, a minha mão está estendida para a nossa amizade. Ter sido sua última orientanda foi uma

grande responsabilidade para mim e em muitos momentos não me senti à altura, vacilei, entrei em

conflito comigo mesma. Agora, depois do trabalho avaliado, me sinto satisfeita por saber que, de

alguma forma, este trabalho vai na direção do que você orienta.

Agradeço ao meu companheiro Oliveiro Marrocos. Obrigada pela generosidade, pelo carinho,

proteção e cumplicidade. Seu apoio foi fundamental para mim em todos os momentos. Nesses

quinze anos, que nos conhecemos, esse foi o momento que você mais me ajudou e me deu apoio

para continuar caminhando. Agradeço à minha mãe por tanto me querer bem e por tanto fazer o

possível para que eu alcance os meus objetivos.

Quero agradecer de maneira muito especial à Profa. Sandra Gadelha pela amizade, consideração,

pelas dicas, pela paciência e sobretudo, obrigada por dividir sua experiência, compartilhar seu

conhecimento. Obrigada pelo aceite de participar desta banca. Agradeço ao Prof. Ernandi Mendes,

meu primeiro orientador. Sensível, atencioso e sempre disponível para ajudar. Também não

poderia esquecer a Profa. Marly que desde o mestrado foi tão gentil e atenciosa comigo.

Agradeço as vibrações positivas de todos os meus irmãos da Casa Espírita Mãos de Luz. Obrigada

a todos pelo acolhimeto! Que cada trabalhador da seara espírita Mãos de Luz se sinta abraçado.

Agradeço aos bons amigos espirituais que estiveram comigo ajudando, alentando. Ao amigo

espiritual Simão, muito obrigada pelos bons conselhos, pela humildade no ouvir, pelas reflexões

oportunas. Estou esperando suas visitas e já diminuí o consumo de café como você me

recomendou, em breve eu retorno às meditações!

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Agradeço imensamente à Carísia Maia, terapêuta amiga, que vem me conduzindo no processo da

busca pelo meu equilíbrio e saúde emocional. É maravilhoso ser sua paciente e sentir que você se

entrega plenamente ao sagrado ofício. À luz da sua condução pude caminhar melhor.

Agradeço aos meus irmãos José e Janice, por compreenderem minhas ausências, por me apoiarem,

prestarem ajuda sempre que necessitei. Esse trabalho também é de vocês. Aos meus três sobrinhos

deixo o meu agradecimento por compreenderem as minhas faltas durante tanto tempo. Iasmin,

Gabriela e Pedro, tia vai poder ver vocês esse final de semana!

Agradeço à vovó Margarida por tanto rezar e pedir a Deus que desse tudo certo. Tudo dará certo,

vó e o seu sonho de estudar não realizado eu estou realizando em sua homenagem. Em homenagem

à todas as mulheres que como a senhora não puderam frequenter a escola. Homenageio também

as lavadeiras de roupa, profissão que a senhora executou com maestria, apesar de gostar mais da

agricultura.

Obrigada ao Prof. Adir, pessoa da minha mais alta admiração, obrigada pela contribuição nesta

pesquisa. Agradeço carinhosamente à Profa. Lia Albuquerque por todas as contribuições dadas a

este trabalho. Sua leitura generosa, seu olhar atento e experiente foram fundamentais para o

fechamento deste trabalho. Prof. Lia, quero que saiba que sua participação na banca de defesa foi

um grande presente para mim. Aos Professores André Lira, Elda Melo e Gilmar Guedes muito

obrigada!

Agradeço aos professores da FAFIDAM que me receberam tão bem no período da pesquisa e que

foram dedicados em oferecer os recursos para que a pesquisa fosse encaminhada. Deixo o meu

agradecimento ao Prof. Rameres e à Profa. Lucenir por todo o apoio durante a pesquisa.

Às amigas Janine Mara, Leide Carla, Jacineide (Neide), Sílvia Moura, Fátima Bezerra e Graciele

Lima obrigada por todas as palavras de apoio, por acreditarem em mim, e serem tão boas

companhias. Nos momentos de maior fragilidade e dificuldade o ombro amigo de vocês me

fortaleceu. Sou feliz e agradecida à vida por colocar em meu caminho pessoas tão sensíveis e

generosas.

Ao querido amigo, Emerson Augusto de Medeiros, deixo o meu agradecimento! Você é um irmão

que a vida me deu, um companheiro de luta, alma querida e dedicada. Como é bom poder

pronunciar a palavra ‘amigo’, sentindo toda a plenitude de seu significado. Durante esses quatro

anos de doutorado, você foi a mão que mais me socorreu, que mais me prestou solidariedade, que

mais me ajudou. Sem suas mãos generosas eu nunca teria me afastado do trabalho para conseguir

escrever essa tese. Você me ensinou o caminho das “burocracias”, fez publicações junto comigo,

me auxiliou nas atividades de extensão, me consolou nos desesperos. Você é brilhante e eu me

sinto agraciada de poder estar perto do seu brilho, de ser iluminada por ele. O seu talento torna

você grande e toca quem convive com você.

Amigo Linconly, você está guardado no meu coração, extamentente no lugar onde se guarda os

irmãos. Meu Pai de Santo querido! Obrigada por me levar para ver o mar, em horas tão tristes.

Obrigada por me fazer sair da rigidez, da contração, da obsessão acadêmica, para sentir a leveza

dos orixás. Com você aprendi que a vida não precisa ser tão séria. Por fim, deixo meu

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agradecimento e meu abraço à querida professora Marta Pernambuco (in memorian). Sua

inteligência e sensibilidade sempre foram inquietantes e me tocaram profundamente durante o

curso de Doutorado. Eu lembro de sua imagem constantemente, quando vejo como a realidade na

universidade está cada dia mais difícil. A senhora faz muita falta aqui neste plano, mas me conforta

saber que está agora realizando novas aprendizagens e colaborando com a ciência aí no plano

invisível onde só é possível enxergar se o coração está aberto para sentir, sem racionalizar. Muito

obrigada, querida Marta!

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RESUMO

A presente pesquisa trata de uma análise sobre o campo universitário brasileiro, com recorte empírico

realizado em uma universidade estadual situada no interior do Ceará. Procura-se, como objetivo central,

analisar as principais reconfigurações ocorridas no campo universitário nas últimas décadas e apreender as

repercussões destas reconfigurações na Faculdade de Filosofia Dom Aureliano Matos (FAFIDAM/UECE)

– instituição estadual de ensino superior, pertencente à Universidade Estadual do Ceará. Parte-se do

pressuposto que diferentes “imposições de legitimidade” vêm sendo operacionalizadas no interior do campo

universitário por meio de processos de regulação da prática científica cada vez mais burocratizada,

exigência de níveis de produtividade em espaços curtos de tempo, pressão por publicações em periódicos

qualificados. Além disto, a fragmentação entre ensino, pesquisa e extensão, permeada por impositivos de

uma política com viés mercadorizante vem produzindo mudanças significativas no interior do campo

universitário nacional. Desta forma, pressupõe-se que, dada a autonomia relativa deste espaço, ocorre

também um amplo processo de retradução/refração dessas imposições, como estratégia dos agentes para

preservar o campo de mudanças alheias aos interesses específicos de sua natureza. Assim, “dizemos que

quanto mais autônomo for um campo, maior será seu poder de refração e mais as imposições externas serão

transfiguradas, a ponto, frequentemente, de se tornarem perfeitamente irreconhecíveis” (BOURDIEU,

2004, p. 22). O presente trabalho ancora-se numa abordagem da sociologia reflexiva, mais especificamente

na abordagem praxiológica desenvolvida pelo sociólogo Pierre Bourdieu. No âmbito das principais

reconfigurações do campo universitário, a partir dos anos de 1990, pode-se dizer que o desmonte do modelo

único - fundamentado no princípio da autonomia universitária, pautado ao final dos anos de 1970, e

assegurado na Constituição Federal de 1988, somado à indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão

– é o núcleo primordial de alterações realizadas no ensino superior a partir da década de 1990. No âmbito

da propositura desta tese, pode-se afirmar que a instituição pesquisada constitui-se como um subcampo do

campo universitário brasileiro. A investigação demonstra que dentre as principais reconfigurações neste

espaço encontra-se a implantação do Mestrado Acadêmico Intercampi (MAIE) – o primeiro Mestrado

Acadêmico do interior do Ceará a partir de 2013. Pode-se afirmar que as dinâmicas da instituição vêm

sendo reconfiguradas em face da presença da pós-graduação, sendo possível identificar um impulso na

produção científica. No bojo da produção científica identificamos a presença estruturada da atividade

extensionista incorporada formalmente ao curso de Pedagogia como eixo de formação discente. A

confluência de interesses entre áreas disciplinares tem favorecido os agentes do campo permanecerem no

jogo acadêmico na disputa pela definição legítima de região e de ciência.

Palavras-chave: Campo universitário. Ensino Superior. Reconfigurações.

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RÉSUMÉ

La présente recherche porte sur une analyse du domaine universitaire brésilien, avec une étude empirique

réalisée dans une université d’État située à l’intérieur du Ceará. L’objectif central est d’analyser les

principales reconfigurations survenues dans le domaine universitaire au cours des dernières décennies et de

comprendre les répercussions de ces reconfigurations au sein de la Faculté de philosophie Dom Aureliano

Matos (FAFIDAM / UECE) - établissement d’enseignement supérieur public appartenant à l’Université

d’État de Ceará. Il est fondé sur l’hypothèse selon laquelle différentes "impositions de légitimité" ont été

mises en oeuvre dans le domaine universitaire par le biais de processus de régulation de pratiques

scientifiques de plus en plus bureaucratisées, d’exigences de niveaux de productivité en peu de temps, de

les journaux. De plus, la fragmentation entre l'enseignement, la recherche et la vulgarisation, imprégnée

des exigences d'une politique axée sur les commerçants, a entraîné des changements importants dans le

champ universitaire national. De cette manière, on suppose que compte tenu de la relative autonomie de cet

espace, il existe également un vaste processus de retranslation / réfraction de ces impositions, en tant que

stratégie des agents pour préserver le champ de changement sans rapport avec les intérêts spécifiques de

leur nature. Ainsi, "on dit que plus un champ est autonome, plus son pouvoir de réfraction sera grand, et

plus les impositions externes seront transfigurées, si souvent qu'elles deviennent parfaitement

méconnaissables" (BOURDIEU, 2004, 22). Le présent travail s'inscrit dans une approche de sociologie

réflexive, plus spécifiquement dans l'approche praxiologique développée par le sociologue Pierre Bourdieu.

Dans le contexte des grandes reconfigurations du domaine universitaire, à partir des années 1990, on peut

dire que le démantèlement du modèle unique - fondé sur le principe de l'autonomie universitaire, fondé sur

la fin des années 1970 et garanti par la Constitution fédérale de 1988, À l'indissociabilité de l'enseignement,

de la recherche et de la vulgarisation, s'ajoute le noyau primordial des changements intervenus dans

l'enseignement supérieur à partir des années 1990. Dans le contexte de la proposition de cette thèse, on peut

affirmer que l'institution étudiée se constitue en tant que sous-domaine du domaine Université brésilienne.

La recherche montre que parmi les principales reconfigurations dans cet espace figure la mise en œuvre du

Master académique Intercampi (MAIE) - le premier Master académique de l'intérieur du Ceará à partir de

2013. On peut affirmer que la dynamique de l'institution a été reconfigurée en face de la présence du

diplômé, et il est possible d'identifier une impulsion dans la production scientifique. Au sein de la

production scientifique, nous avons identifié la présence structurée de l’activité de vulgarisation

formellement incorporée au cours de pédagogie comme l’axe de la formation des étudiants. La convergence

des intérêts entre les domaines disciplinaires a incité les agents de terrain à rester dans le jeu académique

dans le conflit pour la définition légitime de la région et de la science.

Mots-clés: domaine universitaire. Enseignement supérieur Reconfigurations.

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RESUMEN

La presente investigación trata de un análisis sobre el campo universitario brasileño, con recorte empírico

realizado en una universidad estatal situada en el interior de Ceará. Se busca, como objetivo central, analizar

las principales reconfiguraciones ocurridas en el campo universitario en las últimas décadas y aprehender

las repercusiones de estas reconfiguraciones en la Facultad de Filosofía Dom Aureliano Matos (FAFIDAM

/ UECE) - institución estadual de enseñanza superior, perteneciente a la Universidad Estatal de Ceará. Se

parte del supuesto de que diferentes "imposiciones de legitimidad", vienen siendo operacionalizadas en el

interior del campo universitario por medio de procesos de regulación de la práctica científica cada vez más

burocratizada, exigencia de niveles de productividad en espacios cortos de tiempo, presión por

publicaciones en periódicos calificados. Además, la fragmentación entre enseñanza, investigación y

extensión, permeada por impositivos de una política con sesgo mercantil viene produciendo cambios

significativos en el interior del campo universitario nacional. De esta forma, se presupone que, dada la

autonomía relativa de este espacio, ocurre también un amplio proceso de retraducción / refracción de esas

imposiciones, como estrategia de los agentes para preservar el campo de cambios ajenos a los intereses

específicos de su naturaleza. "Así," decimos que cuanto más autónomo es un campo, mayor será su poder

de refracción y más las imposiciones externas serán transfiguradas, a punto, a menudo, de llegar a ser

perfectamente irreconocibles "(BOURDIEU, 2004: 22). El presente trabajo se ancla en un abordaje de la

sociología reflexiva, más específicamente en el enfoque praxiológico desarrollado por el sociólogo Pierre

Bourdieu. En el marco de las principales reconfiguraciones del campo universitario, a partir de los años

1990, se puede decir que el desmonte del modelo único - fundamentado en el principio de la autonomía

universitaria, pautado al final de los años 1970, y asegurado en la Constitución Federal de 1988, que se

suman a la indisociabilidad entre enseñanza, investigación y extensión, es el núcleo primordial de

alteraciones realizadas en la enseñanza superior a partir de la década de 1990. En el ámbito de la proposición

de esta tesis, se puede afirmar que la institución investigada se constituye como un subcampo del campo

universitario brasileño. La investigación demuestra que entre las principales reconfiguraciones en este

espacio se encuentra la implantación del Máster Académico Intercampi (MAIE) - el primer Maestría

Académico del interior de Ceará a partir de 2013. Se puede afirmar que las dinámicas de la institución

vienen siendo reconfiguradas a la cara de la presencia del posgrado, siendo posible identificar un impulso

en la producción científica. En el seno de la producción científica identificamos la presencia estructurada

de la actividad extensionista incorporada formalmente al curso de Pedagogía como eje de formación

discente. La confluencia de intereses entre áreas disciplinarias ha favorecido a los agentes del campo

permanecer en el juego académico en la disputa por la definición legítima de región y de ciencia.

Palabras clave: Campo universitario. Enseñanza superior. Reconfiguraciones.

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LISTA DE SIGLAS

ABE Associação Brasileira de Educação

ABMES Associação Brasileira de Mantenedoras do Ensino Superior

CADE Conselho Administrativo de Defesa Econômica

CNPq Conselho Nacional de Pesquisas

CAPES Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior

CsF Ciências sem Fronteiras

ENEM Exame Nacional do Ensino Médio

FIES Fundo de Financiamento Estudantil

FUNCAP Fundação Cearense de Apoio ao Desenvolvimento Cinetífico e

Tecnológico

GERES Grupo Executivo da Reforma da Educação Superior

IES Instituição de Ensino Superior

LDBEN Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional

PARFOR Programa Nacional de Formação de Professores da Educação Básica

PBEU Programa de Bolsas de Estudo e Permanência Universitária

PEC-G Programa de Estudantes Convênio de Graduação

PDPP Programa de Desenvolvimento Profissional para Professores

PLI Programa de Licenciatura Internacional

PNAES Programa de Assistência ao Estudante de Ensino Superior

PNE Plano Nacional de Educação

PROCAMPO Programa de Apoio à Formação em Licenciatura em Educação do

Campo

PROUNI Programa Universidade para Todos

SISU Sistema de Seleção Unificada

SINAES Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior

SNPG Sistema Nacional de Pós-Graduação

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LISTA DE QUADROS

Quadro 1 - Cursos Isolados

50

Quadro 2 - Universidades/Faculdades passageiras no Brasil

51

Quadro 3 - Universidades criadas entre 1934 – 1946

54

Quadro 4 - Principais marcos regulatórios das reconfigurações do campo

universitário nacional

71

Quadro 5 - Objetivação Participante

79

Quadro 6 - Sujeitos da Pesquisa

85

Quadro 7 - Professores entrevistados

88

Quadro 8 - Questionários

88

Quadro 9 - Variáveis (tipos de escolas, formação inicial dos professores)

88

Quadro 10 - Sujeitos da Pesquisa

89

Quadro 11 - Unidades e ensino no interior e respectivos cursos de graduação –

UECE

92

Quadro 12 - Programas e Bolsas vinculados ao Ensino, Pesquisa e Extensão na

UECE

94

Quadro 13 - Ingresso de novos docentes na FAFIDAM a partir de 2016 106

Quadro 14 - Laboratórios da FAFIDAM/UECE 107

Quadro 15 - Ex-alunos da FAFIDAM Professores efetivos em universidades

brasileiras

132

Quadro 16 - Grupos de Pesquisa relacionados ao Mestrado Acadêmico

Intercampi/FAFIDAM

133

Quadro 17 - Produção científica sobre a Chapada do Apodi com diferentes pares

vinculados ao LECAMPO e MAIE 2013 – 2019

153

Quadro 18 - Produção científica a partir do MAIE envolvendo as categorias:

Educação do Campo, Educação de Jovens e Adultos, Educação

Popular, Escolas Rurais, Práxis, Pedagogia do Oprimido

156

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Quadro 19 - Produção científica derivada de pesquisas do MAIE e do

LECAMPO envolvendo as categorias: Educação do Campo,

Educação de Jovens e Adultos, Educação Popular, Escolas Rurais,

Práxis, Pedagogia do Oprimido

157

Quadro 20 - Circulação Internacional de ideias – Brasil, Lisboa, Inglaterra 162

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LISTA DE FIGURAS

Figura 1 - Número de publicações de pesquisas (papers) em nível mundial

2011-2016

57

Figura 2 - Servidores docentes efetivos na FUNECE, por titulação e regime de

trabalho (PDI 2012-2016)

98

Figura 3 - Servidores docentes efetivos na FUNECE, por classe e regime de

trabalho (PDI 2012-2016)

98

Figura 4 - Servidores docentes efetivos na FUNECE, por titulação e regime de

trabalho (PDI 2017-2021)

99

Figura 5 - Servidores docentes efetivos na FUNECE, por classe e regime de

trabalho (PDI 2017-2021)

99

Figura 6 - Principais Metas UECE 2014-2015 101

Figura 7 - Região do Baixo Jaguaribe 104

Figura 8 - Número de alunos por cidade FAFIDAM/UECE 105

Figura 9 - Professores efetivos e substitutos na FAFIDAM 106

Figura 10 - Distribuição dos grupos de pesquisa, pesquisadores e doutores por

instituição 2016

122

Figura 11 - Universidades brasileiras com maior número de publicações 123

Figura 12 - UFC e UECE no ranking internacional 125

Figura 13 - Projetos de Extensão no PPC Pedagogia/FAFIDAM 127

Figura 14 - Evolução do número de ingressos na Pós-Graduação

FAFIDAM/UECE 1998 a 2019

130

Figura 15 - Alunos egressos da FAFIDAM/UECE efetivos em Universidades

brasileiras

131

Figura 16 - Folder/Convite de comemoração de dez anos do LECAMPO 134

Figura 17 - Produção científica sobre o Baixo Jaguaribe no campo da Geografia

Agrária

148

Figura 18 - Pesquisas sobre a região do Baixo Jaguaribe sob orientação de

Raquel Rigotto

151

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Figura 19 - União de dois campos da educação superior 167

Figura 20 - Interseção de dois campos da educação superior

Figura 21 - Interseção de variados campos sociais 169

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LISTA DE FOTOS

Foto 1 - Parede lateral do Restaurante Universitário da FAFIDAM

108

Foto 2 - Finalização do semestre em 2018/Reunião de Trabalho LECAMPO 112

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20

SUMÁRIO

INTRODUÇÃO

22

CAPÍTULO I – Teoria dos campos e reconfigurações do campo

universitário

34

1.1 Praxiologia e campo social

34

1.2 Formação do campo universitário no Brasil

48

CAPÍTULO II – Caminhos da Pesquisa

74

2.1 A objetivação participante

74

2.2 Os sujeitos da Pesquisa e as entrevistas: considerações e

detalhamentos

83

2.3 Itinerário das entrevistas 90

2.4 Caracterização da Universidade Estadual do Ceará - UECE 91

2.5 A Faculdade de Filosofia Dom Aureliano Matos - FAFIDAM 103

2.6 Apresentação do Laboratório de Estudos da Educação do Campo –

LECAMPO e Mestrado Acadêmico Intercampi

109

CAPÍTULO III – O campo científico nacional: modelos de universidade 113

3.1 Modelos de Universidade no Brasil 113

3.2 Origens e desdobramentos dos modelos: napoleônico, humboldtiano e

americano

114

3.3 Estrutura do campo científico nacional: análise comparada 121

3.4 O campo científico no Ceará 124

3.5 O campo científico e sua materialidade na FAFIDAM 126

CAPÍTULO IV – Achados da Pesquisa 136

4.1 Laboratório de Estudos da Educação do Campo: identidades e

resistências

136

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4.2 A distribuição dos capitais 141

4.3 Pós-Graduação no contexto de confluências na FAFIDAM: produção

científica a partir de campos disciplinares

144

4.4 O crescimento da produção científica por meio da Pós-Graduação na

FAFIDAM

158

4.5 Internacionalização e trocas simbólicas na FAFIDAM/UECE:

diálogos interculturais e científicos entre Brasil e Reino Unido

160

CONSIDERAÇÕES FINAIS 171

REFERÊNCIAS 175

ANEXOS 181

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INTRODUÇÃO

A presente pesquisa trata de uma análise sobre o campo universitário brasileiro, com

recorte empírico realizado em uma universidade estadual situada no interior do Ceará. Procura-se,

como objetivo central, analisar as principais reconfigurações ocorridas no campo universitário nas

últimas décadas e apreender as repercussões destas reconfigurações na Faculdade de Filosofia

Dom Aureliano Matos (FAFIDAM/UECE) – instituição estadual de ensino superior, pertencente

à Universidade Estadual do Ceará.

Parte-se do pressuposto que diferentes “imposições de legitimidade” vêm sendo

operacionalizadas no interior do campo universitário por meio de processos de regulação da prática

científica cada vez mais burocratizada, exigência de níveis de produtividade em espaços curtos de

tempo, pressão por publicações em periódicos qualificados. Além disto, a fragmentação entre

ensino, pesquisa e extensão, permeada por impositivos de uma política com viés mercadorizante

vem produzindo mudanças significativas no interior do campo universitário nacional. Desta forma,

pressupõe-se que, dada a autonomia relativa deste espaço, ocorre também um amplo processo de

retradução/refração de tais imposições, como estratégia dos agentes para preservar o campo de

mudanças alheias aos interesses específicos de sua natureza. Assim, “[...] dizemos que quanto mais

autônomo for um campo, maior será seu poder de refração e mais as imposições externas serão

transfiguradas, a ponto, frequentemente, de se tornarem perfeitamente irreconhecíveis”

(BOURDIEU, 2004, p. 22).

O amplo acervo de pesquisas realizadas no âmbito da educação superior revela que este

nível de ensino vem passando por profundas alterações desde os anos de 1990. O processo de

expansão acelerada, propiciada pela diversificação institucional e fomentada por políticas e

programas específicos vem colocando o campo universitário frente a uma encruzilhada expressa

entre democratização e massificação mercantil (SGUISSARD, 2015). A separação entre

universidade de pesquisa e universidade de ensino tem marcado sérias disputas entre

pesquisadores e especialistas (BALBACHEVSKY, 1995; SCHWARTZMAN, 2006; DURHAM,

2003) e de outro lado, tem levado às resistências quanto a esse modelo (DOURADO, 2008;

CATANI; OLIVEIRA; DOURADO, 2001, SAVIANI, 2010 e outros). Estes processos evidenciam

que a agenda e os temas que constituem o campo universitário também fazem parte do conjunto

de relações de forças entre agentes, configuradas por batalhas classificatórias. Sobre este aspecto,

Hey (2008, p. 22) destaca que:

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[...] o poder na instituição de uma agenda acadêmica em educação superior é representado

pela confluência nas batalhas classificatórias, que foram travadas no espaço de produção

acadêmica, pelo grupo que conseguiu dominá-lo, nesse momento específico. Em tal jogo,

o grupo dominante mobiliza os instrumentos próprios da atividade científica, mas,

sobretudo os recursos extracientíficos, os quais permitem a realização do trabalho de

imposição do conhecimento e reconhecimento do produto dito acadêmico.

O estudo realizado por esta autora demonstra que, no espaço do campo universitário, as

lutas simbólicas em torno dos objetos ditos científicos, são perpassadas por interesses políticos, e

caracterizam-se não apenas na imposição dos dominantes, mas também na resistência dos

dominados. Grosso modo, no Brasil é possível afirmar que essas lutas se configuram na formação

de grupos, tanto do alto clero como do baixo clero. Há lutas permanentes em torno da definição

legítima de sistema de educação superior, de um lado o grupo da USP figurado pelo Núcleo de

Pesquisas sobre o Ensino Superior (NUPES)1 representando o alto clero - e que em grande medida

influenciou as políticas públicas geradas para o ensino superior na última década de 1990 - de

outro os pesquisadores ligados ao campo disciplinar da Educação, representando o baixo clero2.

Vale dizer que, esta separação se institui no plano das políticas que, a partir de 1995

especificamente vêm produzindo a diversificação, diferenciação e processos de flexibilização dos

currículos e dos formatos institucionais no contexto do ensino superior.

O presente trabalho ancora-se numa abordagem da sociologia reflexiva, mais

especificamente na abordagem praxiológica desenvolvida por Pierre Bourdieu. A temática do

ensino superior está na agenda das políticas educacionais, configurada por meio de estudos

encomendados, com um corpo de profissionais especializados e autorizados a falarem sobre este

nível de ensino.

Pode-se afirmar, desta maneira, que o campo de estudos relacionado ao ensino superior

se constitui, sociologicamente, como um problema legítimo no sentido de que ocupa uma agenda

pública, oficial, dotada de uma espécie de universalidade, sobretudo pelo fato de estar interligado

e garantido pelo Estado (BOURDIEU, 2003). Ou seja, é um problema socialmente construído,

perpassado por interesses diversos, dentre os quais se destaca como ‘problema oficial’ na política

educacional brasileira.

1 Atualmente o grupo é denominado como Núcleo de Pesquisa de Políticas Públicas (NUPPs) da USP. 2 Para aprofundamento, ver: “Esboço de uma sociologia do campo acadêmico” de Ana Paula Hey (2008).

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Assim, pode-se também afirmar que, há uma ampla literatura3 onde se destacam Cunha

(1989; 2007); Oliveira (2011); Morosini (2011); Ribeiro (1975); Sampaio (2014); Saviani (2015);

Cavalcante (2000); Dourado, Catani e Oliveira (2004); Oliveira (2000); Ferreira (2015); Mazzilli

(2011); Azevedo (2015); Miranda (2008); Castro e Barbalho (2015); Pacheco, Pereira e Domingos

Sobrinho (2010), somado a isto, há também um conjunto de grupos de pesquisa, observatórios e

laboratórios4 voltados para as temáticas pertinentes a este nível de ensino que aborda o ensino

superior como problema de pesquisa, e diversos autores nacionais e internacionais que procuram

entender este nível de ensino a partir de diversas lentes de análise destacando-se o viés da política

educacional.

É válido observar que há o predomínio de análises direcionadas para o ensino superior,

que se voltam em grande medida para as universidades situadas nos grandes centros, com especial

foco para as regiões sul e sudeste e com destaque para as universidades federais. Esse interesse

não se dá não por acaso, mas porque nestas regiões se encontram também os programas de pós-

graduação melhor posicionados no campo universitário, além de que há maior captação de recursos

3 Destacam-se algumas literaturas que abordam o ensino superior sob o entendimento de que este vem passando por diferentes crises, em obras reconhecidas no meio universitário, tais como “Crise da universidade” De Peter Scott (1984); A universidade em ritmo de barbárie de José Arthur Giannotti (1986); O naufrágio da universidade de Michel Freitag (1995) - esta obra originalmente em francês (Le naufrage de l’université et autres essays d’ épistemologie politique); Universidade em ruínas de Bill Readdings (1996); A universidade em tempo de conciliação autoritária de Franklin Leopoldo e Silva (2004). É possível encontrar apontamentos acerca destas obras no trabalho “Universitas semper reformanda”? A história da Universidade de São Paulo e o discurso da gestão à luz da estrutura social de Maria Caramez Carlotto (2014). Além destas, “A universidade na encruzilhada” de Cristovam Buarque (2003); “Escritos sobre a universidade” de Marilena Chauí (2001). No âmbito das pesquisas voltadas para análise das últimas remodelagens do ensino superior destacam-se Fávero e Sguissard (2012); Dourado (2008); Hey (2008), Oliveira

(2000); dentre outros. A Rede Universitas BR dispõe de farto material sobre o ensino superior, com acervo de

pesquisas atuais e, o Observatório da Educação também desenvolve estudos direcionados diretamente para o ensino

superior. 4 Rede Sulbrasileira de Investigadores em Educação Superior (RIES), que é um Núcleo de Excelência em Ciência,

Tecnologia e Inovação do CNPq/FAPERGS, composto pela PUCRS, UFRGS, UFSM, e UNISINOS; Grupo de

Estudos e Pesquisas em Educação Superior (GEPES) que analisa a expansão da Educação Superior no Brasil nos

governos Lula (2003-2010) e Dilma a partir de 2011; Observatório da Educação Superior da UFPR que atua de

maneira interinstitucional em parceria com Programas de Pós-Graduação; Observatório Universitário da Unicamp que

disponibiliza documentos e análises acerca do Ensino Superior, vinculado também à Revista Ensino Superior

Unicamp, do Centro de Estudos Avançados da Unicamp; Observatório do PNE que apresenta um acompanhamento

dos indicadores e estratégias para alcance da Meta de número 12 do atual Plano Nacional de Educação 2014 – 2024

(PNE); Observatório da Ciência, Tecnologia e das Qualificações vinculado à Direção-Geral de Estatísticas da

Educação e Ciência cujo objetivo é o estudo da capacidade científica e tecnológica nacional no âmbito do Ensino

Superior, tendo este Observatório projeção nacional e internacional; Instituto de Estudos Avançados da Universidade

de São Paulo que realiza estudos sobre instituições e políticas públicas, tendo este Instituto projeção nacional e

internacional. É possível localizar toda a produção desses grupos em plataformas virtuais. Além destes, é possível

também localizar grande quantidade de conteúdos e dados relacionados à Educação Superior na página do Censo da

Educação Superior.

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por parte de grupos de pesquisa consolidados por longo tempo em tais contextos geográficos, além

disso as universidades federais contam com recursos da União, e correspondem a 36,3% da oferta

de educação superior no Brasil.

No âmbito das principais reconfigurações do campo universitário, a partir dos anos de

1990, pode-se dizer que o desmonte do modelo único5 - fundamentado no princípio da autonomia

universitária, pautado ao final dos anos de 1970, e assegurado na Constituição Federal de 1988,

somado à indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão – é o núcleo primordial de alterações

realizadas no ensino superior a partir da década de 1990. Atrelado a este processo a reforma do

Estado, caracterizada pelo avanço da globalização e neoliberalismo, empreendeu uma

reengenharia em toda a estrutura social.

No lastro das modificações instituídas no campo universitário, a partir de 1995, quando

da formulação da Lei de Diretrizes e Bases a inserção de dispositivos definindo que a organização

acadêmica para a educação superior seria classificada em Universidades, Centros Universitários,

Institutos Superiores ou Escolas Superiores, houve a oficialização do processo de diversificação

institucional. A reestruturação da organização acadêmica inclui profundas mudanças na identidade

e no projeto de desenvolvimento institucional das universidades públicas (CATANI &

OLIVEIRA, 2004). A partir disto, Mancebo (2015) aponta dois caminhos decorrentes, primeiro a

quebra do modelo de indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão e, segundo o estímulo a

novas modalidades de formação e de pesquisa.

Os dados do Censo da Educação Superior (2016) informam que a rede pública de ensino

superior é responsável por 24,7% das matrículas, o que corresponde a um total de 1.990.078 alunos

matriculados na rede pública, enquanto na rede privada o valor percentual chega a 75,3% o que

equivale em números absolutos a 6.058.623 de alunos matriculados em instituições de ensino

superior privadas. Pode-se afirmar que, o processo expansionista se configura de maneira

desordenada, do ponto de vista de sua regulação e controle da oferta por parte do Estado, gerando

5 Implementado a partir da Reforma Universitária de 1968, definida pela Lei 5.540/68, que passou a orientar os rumos da universidade. Dentre as principais mudanças que esta Reforma instituiu está a extinção do regime de cátedras, havendo a partir de então a progressão na carreira docente vinculada aos graus acadêmicos de mestre e doutor. A partir desta Reforma passou a ser estruturado o trabalho em tempo integral e dedicação exclusiva que recebeu incentivos para fixar professores e pesquisadores na universidade. A Reforma previu o princípio da autonomia em nível didático-científico e disciplinar, posteriormente, esse princípio foi retomado e assegurado pela Constituição Federal de 1988 (CUNHA, 1989; DOURADO, 2008).

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um sistema de ensino superior heterogêneo e complexo, inersectado por orientações e intrusões

externas.

Assim, nossa análise se dará com vistas a apreender as reconfigurações do campo

universitário, mas enfocando uma instituição periférica e observando as repercussões das

reconfigurações ocorridas no plano macro e que se refletiriam no micro do nosso campo de

observação. Desse modo, sistematizamos e traçamos os objetivos específicos da pesquisa da

seguinte forma:

a) Identificar as principais reconfigurações do campo universitário brasileiro, ocorridas

a partir dos anos de 1990 com vistas a apreender os seus desdobramentos no contexto

de uma universidade estadual situada no interior do estado do Ceará;

b) Mapear as propriedades gerais e específicas que caracterizam o campo (ou subcampo)

na realidade investigada, para compreender a sua dinâmica específica;

c) Descrever os capitais dos agentes inseridos nas disputas do subcampo pesquisado, por

meio de análise morfológica centrada no perfil sociológico desses;

d) Elucidar, especificamente, as estratégias desenvolvidas pelos agentes da instituição

periférica frente às mudanças, bem como para manter-se nas disputas em torno do

jogo acadêmico.

Desta feita, a seguinte pergunta orienta o ponto de partida deste trabalho: Quais as

principais repercussões ocorridas na Faculdade de Filosofia Dom Aureliano Matos

(FAFIDAM) a partir das últimas reconfigurações do campo universitário brasileiro? Todo o

escopo deste trabalho está amparado pela Teoria dos Campos de Pierre Bourdieu. Desta forma, é

importante explicar nosso lugar de fala, ou seja, é oportuno situar nosso lugar epistêmico. Ao tratar

do campo universitário e suas reconfigurações, partimos do entendimento de que o espaço, que

configura o ensino superior se organiza-se como um campo – que denominamos de campo

universitário. Originariamente, a noção de campo desenvolvida por Pierre Bourdieu aparece como

alternativa, frente a diferentes formas de análise do mundo social e dos produtos culturais

predominantes nas Ciências Sociais desde os anos de 1950. O campo científico é um microcosmo,

com autonomia relativa e leis próprias de funcionamento e, assim como os demais campos sociais,

dispõe de autonomia relativa, ao mesmo tempo em que a imposição de pressões externas se tornam

cada vez mais notórias.

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Bourdieu (1997) explica que a noção de campo é uma ideia extremamente simples, e parte

da compreensão de que para compreender uma produção cultural, por exemplo, não basta referir-

se ao conteúdo textual dessa produção ou tampouco estabelecer uma relação direta entre texto e

contexto. Para ilustrar, o autor explica que na França com o florescimento da semiologia e

posteriormente com o que se convencionou chamar de pós-modernismo pelo mundo, o texto

passou a ser o alfa e o ômega para compreensão dos produtos culturais, como se nada mais

houvesse, num movimento de fetichismo do texto autonomizado.

Bourdieu (1997) elenca a tradição, frequentemente representada por aqueles que se filiam

ao marxismo, onde se propõe a relação entre texto e contexto para interpretar as obras colocando-

as em relação com o mundo social ou mundo econômico. Nessa esteira de reflexão, Bourdieu

(1997) explica que essa relação direta entre texto e contexto, em sua percepção, caracteriza-se

como um “erro do curto-circuito”, pois consiste em “[...] relacionar uma obra musical ou um

poema simbolista com as greves de Foumies ou as manifestações de Anzim” (BOURDIEU, 1997,

p. 20). Para o autor, entre esses dois pólos de análise - que ele classifica como sendo um de caráter

internalista e outro de caráter externalista – existe um universo intermediário, que denomina de

campo literário, artístico, jurídico ou científico.

Isto significa, para o autor, que há um universo onde estão “[...] inseridos os agentes e as

instituições que produzem, reproduzem ou difundem a arte, a literatura ou a ciência”

(BOURDIEU, 1997, p. 20). Assim, a noção de campo refere-se a espaços relativamente

autônomos, dotados de leis próprias, ao mesmo tempo submetidos à leis gerais das quais o

macrocosmo também se encontra submetido. Nesses moldes, Bourdieu (1997, p. 21) explica que

“o campo científico é um mundo social e, como tal, faz imposições, solicitações, etc., que são, no

entanto, relativamente independentes das pressões do mundo social global que o envolve.”

Os campos, nesta perspectiva, possuem graus de autonomia relativa que se expressam

pela capacidade de refratarem as imposições, tornando-as, por vezes, irreconhecíveis. O autor

destaca também que, inversamente, a heteronomia dos campos se expressa muito claramente por

meio da entrada direta de problemas políticos no seu interior. E afirma:

Isto significa que a ‘politização’ de uma disciplina não é indício de uma grande

autonomia, e uma das maiores dificuldades encontradas pelas ciências sociais para

chegarem à autonomia é o fato de que pessoas pouco competentes, do ponto de vista de

normas específicas, possam sempre intervir em nome dos princípios heterônomos sem

serem imediatamente desqualificadas (BOURDIEU, 1997, p. 22).

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Nessa direção, ao tratar da autonomia dos campos, da natureza das pressões externas e

sob quais formas se manifestam as resistências, o autor destaca a importância de escapar à

alternativa da “ciência pura” e da “ciência escrava”. Pois a primeira se posiciona como totalmente

livre acerca de qualquer necessidade social, enquanto a outra se coloca como sujeita a todas as

demandas político-econômicas (BOURDIEU, 1997).

O campo universitário a que nos reportamos aqui “[...] diz respeito ao aparato institucional

assegurado pelo Estado brasileiro que garante a produção, circulação (e mesmo o consumo) de

bens simbólicos que lhe são inerentes (...)” (HEY, 2008, p. 11). Ainda de acordo com esta autora,

este aparato envolve o conjunto das instituições de Educação Superior, tanto públicas como

privadas, abrangendo seus variados níveis, formato e natureza. Oliveira e Catani (2012, p. 150)

assinalam que:

Estrictamente hablando, solo podriamos hablar de universidades al referirnos a las

instituciones universitarias, y a las otras, como instituciones no universitarias o de

ensenanza superior... adoptaremos la terminologia campo universitario para referirnos al

conjunto de las instituciones que integran la educacion superior, principalmente las

universidades que se dedican mas a la investigacion y al posgrado (maestria y doctorado).

Isto posto, escolhemos para participar da pesquisa 05 (cinco) professores, sendo 02

(duas) professoras e 03 (professores), todos em exercício profissional – com, pelo menos, dez anos

de trabalho na instituição, atuantes em atividades de ensino, pesquisa e extensão, além de

atividades próprias da burocracia do campo científico. Os docentes escolhidos para participar da

investigação, possuem titulação mínima de Mestre, sendo que 02 (dois) são pós-doutores, 02 (dois)

são doutores e 01 (um) é Mestre. No quadro abaixo constam as informações referentes aos sujeitos

da pesquisa, com titulação, tempo de trabalho e curso onde cada um ministra aulas:

SUJEITOS TITULAÇÃO TEMPO DE

TRABALHO NA

INSTITUIÇÃO

CURSO EM QUE

LECIONA

Professor José Pós-doutor 26 anos Pedagogia/Mestrado

Acadêmico

Intercampi

Professora Maria Pós-doutora 26 anos Pedagogia/Mestrado

Acadêmico

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Professor João Doutor 24 anos História/Mestrado

Acadêmico

Intercampi

Professora Lúcia Doutora 21 anos Geografia

Professor Francisco Mestre 13 anos História

Os critérios de escolha se deram a partir das observações em campo, no andamento da

pesquisa, visto que passamos a perceber que seria possível responder às questões do estudo

elaborando uma análise do tipo morfológica, uma vez que não seria possível consultar todo o

universo de agentes envolvidos na dinâmica da instituição6. Nesse sentido, a instituição, embora

tenha um quadro de 110 (cento e dez) professores, do quadro de profissionais efetivos, há apenas

73, dentre os quais 05 (cinco) fizeram parte da pesquisa. Os agentes escolhidos para a pesquisa se

encontram em posições estratégicas no interior do campo, desenvolvem atividades variadas,

transitam também no espaço político, configurado pela relação com Movimentos Sociais na região

onde a instituição está localizada, estabelecem conexões com outras instituições de ensino

nacionais e internacionais, colaboram com a organização da agenda institucional a partir de seus

objetos de estudo, aglutinam capital e poder simbólico em grupos de pesquisa e estudo, participam

de bancas diversas, atuam em Comissões e Comitês, lideram atividades em laboratórios onde

coordenam e/ou colaboram e protagonizam ativa participação na vida acadêmica da instituição,

não apenas no âmbito da região, na qual a instituição está circunscrita. Destes cinco professores

investigados, três foram alunos da instituição entre as décadas de 1980 e 1990.

Além destes profissionais, realizamos também entrevista com 03 (três) alunos formados

na instituição de ensino ora pesquisada e posteriormente alunos do Mestrado oferecido pela mesma

instituição. No quadro abaixo constam algumas informações referentes aos discentes sujeitos da

pesquisa:

ALUNOS IDADE ANO DE CONCLUSÃO DO

MESTRADO

TRABALHO

Aluno 1 27 anos 2017 Professor do Instituto

Federal do Ceará

(IFCE)

Aluna 2 30 anos 2016 Professora da

Universidade Estadual

do Ceará (UECE)

6 Na descrição da metodologia.

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Aluna 3 25 anos 2019 Professora da Rede

Básica de Educação

A escolha por incluir esses sujeitos na pesquisa se deu, porque observamos que, no lastro

das principais reconfigurações do campo universitário, a pós-graduação aparece no contexto da

instituição pesquisada como uma das repercussões mais visíveis. Os alunos escolhidos para a

pesquisa são ex-alunos da graduação na FAFIDAM, tendo realizado ingresso no Mestrado logo

após a conclusão do curso de graduação. Neste aspecto, em especial, procuramos demonstrar como

a lógica da economia que rege as trocas simbólicas no interior da instituição é garantidora da

produção e reprodução de capitais simbólicos e institucionalizados que vêm conduzindo os

‘excluídos do interior’ ao caminho da pós-graduação. Não se trata aqui de um apelo retórico falar

em ‘excluídos do interior’, pois no mapeamento por nós realizado, constatamos que ocorre o

ingresso de alunos que concluíran a graduação na FAFIDAM na pós-gradução. No espaço-tempo

entre 1998 e 2019 houve regularidade do ingresso, tendo havido a partir de 2014 um crescimento

mais expressivo deste ingresso. A instituição é reconhecida na região pelo protagonismo na

formação de professores. Dentre esses que ingressaram na pós-graduação no período mapeado

(1998 – 2019), aproximadamente 26 (vinte e seis) são professores do Magistério Superior em

diferentes cidades do Brasil. Se considerarmos que a FAFIDAM tem um total de 1.006 alunos

matriculados, veremos que os números que parecem irrisórios, possuem uma dimensão sociológica

valiosa.

O uso da noção de “excluídos do interior” esta se faz com amparo na teoria de Pierre

Bourdieu obsevando-se que a instituição por nós investigada tem em seu quadro discente a

presença majoritária de estudantes oriundos de escolas públicas7, residentes nas cidades do

7 O Relatório Geral do Censo Discente Universidade Estadual do Ceará (UECE), realizado em 2013, consta que o

público que frequenta a instituição é predominantemente jovem, na faixa etária de 15 a 24 anos, correspondendo a

64,25%. O detalhamento do Censo explicita também que 48,02% dos estudantes da UECE vieram de escola pública,

isto quando não consideradas as especificidades por campi; 85% dos estudantes da UECE moram com os pais; 56,41%

são trabalhadores; 15,91% das famílias vive com renda de apenas um salário mínimo; 60,24 % sobrevive em cenários

de pobreza e extrema pobreza (até 01 a 03 salários mínimos); 37,22 tem rendimentos entre 03 a 10 salários mínimos

e 1,16% acima de 20 salários mínimos. Embora já se tenha passado seis anos após o levantamento realizado pela

instituição, serve de parâmetro, além disto o director da instituição informou que foi realizado um levantamento

recente e disponibilizará para a finalização das analises deste trabalho.

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interior, onde predomina a agricultura, ou atividades de pequenos comércios. Os dados referentes

ao perfil dos estudantes revelam que quase todos são pertencentes à classe D e E.

Quanto aos procedimentos utilizados para realização das análises, fizemos uma incursão

em campo, por meio de observações (observação direta) e diário de campo, pois durante dez meses

acompanhamos diferentes atividades na instituição. A partir disto, definimos que, para responder

às perguntas do estudo seria possível realizar uma análise do tipo morfológica, considerando os

agentes melhor posicionados no interior do campo. Para tal fizemos uso da entrevista, no estilo da

autoanálise provocada, conforme apresenta Bourdieu (2008) em sua obra “A miséria do Mundo”.

Realizamo a aplicação de questionário aberto, e procuramos realizar a objetivação participante no

campo pesquisado, o que favoreceu um conjunto de análises com viés etnográfico. Além destes

procedimentos em campo, procedemos à análise de documentos da instituição, dentre os quais se

destacam o Plano de Desenvolvimento Institucional (PDI, 2012-2016), Plano de Desenvolvimento

Institucional (PDI, 2017-2021), Relatório de Desempenho da Gestão (2015), Censo

Socioeconômico e Cultural dos Alunos da UECE: Versão 2009 e, Relatório Geral do Censo

Discente da UECE – 2013.

Assim, o que consideramos ser uma usina de capitais parece se configurar na relação

exitosa entre alunos e professores, em determinado conjunto de relações na instituição, sobretudo,

institucionalizada pela relação nas atividades dos Laboratórios, que funcionam como verdadeiras

‘usinas’ de capitais e formadores de habitus. Tudo isso, expressa aspectos de como a valorização

aparentemente ‘pouco interessada’ da autoridade científica, do prestígio e da notoriedade

intelectual (BOURDIEU, 2011) reforçam não apenas os capitais, mas também um conjunto de

habitus que demarcam as identidades do grupo. Isto porque o interesse no espaço de produção

simbólica se dá movido por uma lógica diferente da lógica economicista, portanto, chamamos de

illusio, porque não se trata de um interesse utilitarista, ou cínico, mas uma forma de estar, investir

e acreditar que jogar vale a pena. Nesses moldes Aguiar (2017, p, 231) esclarece que:

O que a noção de illusio reflete, como interesse em um campo, é a cumplicidade e o

ajustamento entre as estruturas mentais dos sujeitos (seus habitus ou suas disposições) e

as estruturas objetivas (os próprios campos, suas regularidades, os alvos em jogo, as

disputas), manifestados numa tendência à ação, ao investimento, que nasce desse acordo.

Ante o exposto, organizamos o trabalho da seguinte maneira:

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No Capítulo I - apresentamos um esboço geral da Teoria dos Campos em Pierre Bourdieu,

em seguida fazemos uma breve apresentação acerca do surgimento das instituições de ensino

superior no Brasil, evidenciando o processo de formação do campo universitário no Brasil e

apresentamos as principais reconfigurações ocorridas a partir dos anos de 1990. Neste primeiro

capítulo, buscamos responder à nossa primeira pergunta que abre o estudo. Assim procuramos

demonstrar quais as principais reconfigurações do campo universitário, bem como procuramos

apresentar um esboço da Teoria dos Campos.

No Capítulo II – Apresentamos os caminhos da pesquisa, evidenciando os procedimentos

escolhidos para responder às principais questões do estudo. Em seguida apresentamos uma

caracterização da Universidade Estadual do Ceará (UECE), buscando evidenciar que a instituição

é apenas uma das instituições que compõem o campo universitário cearense. No procedimento das

análises específicas da instituição elaboramos analogias com o campo universitário nacional,

realizando observações acerca do quadro específico da instituição, que por ser de categoria

administrativa estadual apresenta uma dinâmica específica, principalmente por estar situada numa

região interiorana. Ao mesmo tempo, é possível identificar uma relação estreita entre a dinâmica

do campo nacional com o campo estadual.

No Capítulo III – Apresentamos maiores detalhes acerca deste campo, evidenciando

melhor suas características, com ênfase na produção científica que, a nosso ver, demarca,

atualmente, um ponto fundamental de diferença entre as instituições de ensino superior públicas e

as instituições de ensino superior privadas. Fica evidente, por meio da pesquisa, que a universidade

pública brasileira é responsável majoritária pela produção da ciência e assim o foi historicamente

desde sua consolidação. Assim, o campo universitário é compreendido enquanto manifestação do

campo científico, razão pela qual utilizamos as duas denominações ao longo do texto. Como uma

espécie de prolegômenos, buscamos evidenciar que as reconfigurações as quais o campo

universitário vem passando, se encontram atreladas à questão dos ‘modelos de universidade’, que

a partir das décadas de 1980 e 1990 passam por redefinições em face da reforma do Estado. Em

seguida estabelecemos uma análise comparada entre o trabalho de Miranda (2008) e os dados

recentes sobre a produção científica brasileira. A pesquisa realizada por esta autora, apresenta um

quadro geral do campo científico nacional ainda no ano de 2008, além de um recorte específico no

campo da FAFIDAM. Após uma década, esse quadro continua semelhante no que se refere ao

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campo científico nacional e a posição das instituições hegemônicas do campo. No âmbito da

FAFIDAM o quadro esboçado pela autora naquele período, se encontra modificado, tendo havido

reconfigurações. Destacamos a análise do campo nacional até o campo científico no Ceará. Por

último, fazemos um comparativo entre os achados de Miranda (2008) e as reconfigurações atuais

da FAFIDAM. Os substratos da pesquisa realizada pela autora servem de referencial empírico para

um panorama e quadro comparativo, que demonstra importantes reconfigurações e mudanças na

instituição nesta última década.

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CAPÍTULO I

TEORIA DOS CAMPOS E RECONFIGURAÇÕES DO CAMPO UNIVERSITÁRIO

BRASILEIRO

Tratamos aqui de apresentar um esboço geral da teoria dos campos em Pierre Bourdieu.

A guisa de introdução elencamos as contribuições da Praxiologia elaborada pelo autor, entendida

como filosofia disposicional ou filosofia da ação - condensada em um pequeno número de

conceitos fundamentais: campo, capital e habitus. A partir destes elementos, vamos refletir sobre

a formação do campo universitário no Brasil, suas principais reconfigurações e suas possíveis

repercussões destas relacionadas à instituição de ensino superior estadual localizada no interior do

Ceará – a Faculdade de Filosofia Dom Aureliano Matos (FAFIDAM), vinculada à Universidade

Estadual do Ceará (UECE).

1.1 Praxiologia e o conceito de campo social

Pensar o conceito de campo implica obrigatoriamente conceber a sociedade moderna como

complexa e heterogênea, sobretudo, porque se encontra organizada a partir de uma lógica de

diferenciação social das atividades ou funções (LAHIRE, 2017). Este é o primeiro ponto

importante para que se compreenda que a noção de campo diz respeito a uma concepção sobre o

mundo social a partir de seu funcionamento em relação inextrincável com os que o produzem – os

agentes sociais. Assim, o exercício fundamental que a Praxiologia nos impõe é entender o mundo

social como configurado por uma dupla objetividade, o que corrobora para que se possa “[...]

desvendar a multifacetada dialética das estruturas sociais e mentais no processo de dominação.”

(WACQUANT, 2002, p. 98).

Nesse sentido, adotar o conceito de campo é pensar, sobretudo nas sociedades

diferenciadas, e que no século XXI se configuram como altamente diferenciadas. Nesse sentido,

pensar a sociedade atual a partir do complexo processo de diferenciação entre as atividades sociais

requer que façamos uma observação acerca da economia de bens simbólicos, que caracteriza o

imenso mercado de trocas simbólicas. A elaboração do conceito de campo revela, na sua base, a

dimensão simbólica que circunscreve as práticas sociais. Embora o economicismo tenha se

consolidado desde século XVIII e ocupe um lugar legitimado na análise sobre o mundo social, é

importante destacar que a praxiologia de Bourdieu demonstra, tal como afirma Sapiro (2017), que

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alguns universos sociais não têm seu princípio de funcionamento ancorado na economia, mas

funcionam com os princípios da economia pré-capitalista. Bourdieu (1989) demonstra que nos

universos da ciência, da literatura, da arte e da religião prevalece “o interesse pelo desinteresse”.

Assim, a economia de bens simbólicos que governa certos universos baseia-se na recusa do

cálculo, da lógica do valor, posto que é o interesse, o cálculo e o valor que estão na origem do

economicismo (SAPIRO, 2017).

Ao mesmo tempo, é necessário atentar ao fato de que em sua obra síntese acerca da teoria

dos campos, Bourdieu (2004) explica que o mundo da ciência, por exemplo, assim como o mundo

da economia conhece relações de força, fenômenos de concentração do capital e do poder, e

relações de dominação. Seu modo antieconômico de funcionar não significa que não esteja

enraizado neste subuniverso de aspectos da economia, posto que por meio dele se tem acesso ao

poder econômico ou político, além do acesso às estratégias, que visam conquistar ou conservá-los

(BOURDIEU, 2004). Em “As regras da Arte” Bourdieu (1996) sobre a teoria dos campos afirma

que:

A teoria dos campos que assim se elaborou pouco a pouco não deve nada, porém,

contrariamente às aparências, à transferência do modo de pensamento econômico; ainda

que ao repensar em uma perspectiva estruturalista a análise de Weber, que aplicava à

religião um certo número de conceitos tomados à economia (como concorrência,

monopólio, oferta, procura, etc.), eu me tenha visto introduzido de imediato a

propriedades gerais, válidas para os diferentes campos, que a teoria econômica ressaltara

sem lhes possuir o justo fundamento teórico.

Para que não haja nenhum equívoco quanto ao modelo fundador da noção de campo - que

não é oriundo diretamente da economia, Bourdieu (1996) esclarece que o uso de conceitos tomados

do campo econômico (lucro, troca, capital, dentre outros), não se trata de empréstimos

descontextualizados, ou simples metáfora com função puramente emblemática retirada do campo

econômico. Trata-se, portanto, de transferências realizadas por uma espécie de indução,

empiricamente validada - que ao demonstrar sua fecundidade e seus limites de validade de

transferência – obriga a repensar os pressupostos da teoria econômica, frente às aquisições

extraídas da análise dos campos de produção cultural (BOURDIEU, 1996), razão pela qual o autor

constata que a teoria do campo econômico é um caso particular da teoria geral dos campos.

Neste ponto, a praxiologia confirma, que o universo social se caracteriza por diferentes

microcosmos, que se instituem como espaços relativamente autônomos, o campo científico, por

exemplo, é um mundo social que faz imposições e solicitações, que são relativamente

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independentes das pressões do mundo social global que o envolve (BOURDIEU, 2004). A

depender do grau de sua autonomia, o campo se encontra resguardado das intrusões externas.

Bourdieu (1996, p. 246) afirma que:

O grau de autonomia de um campo de produção cultural revela-se no grau em que o

princípio de hierarquização externa aí está subordinado ao princípio de hierarquização

interna: quanto maior é a autonomia, mais a relação de forças simbólicas é favorável aos

produtores mais independentes da demanda [...].

Bourdieu demonstrou que as lógicas, que orientam os espaços sociais, não são

homogêneas, nem uníssonas. O núcleo duro que conforma a noção de campo está intimamente

relacionado com o que Wacquant (2013) denomina de ruptura contra os ‘rochedos do realismo

estrutural’ dotando, assim, a análise sobre a estrutura social de dinamismo e movimento para

apreendê-la em seu conjunto de regularidades e variações.

Compete sublinhar que, umas das questões primordiais da praxiologia não é o debate, nem

a disputa no âmbito do argumento teórico, tal como se pode observar em muitas tradições e/ou

doutrinas. As batalhas entre pensadores diversos e, principalmente, entre os iniciados/discípulos

em uma determinada teoria acerca da pureza e da ‘ortodoxia’ do pensamento original de autores

consagrados, não é em nenhuma hipótese o caminho que fundamenta a praxiologia. Bourdieu

(1996, p. 15) explica que todo o seu empreendimento científico “[...] se inspira na convicção de

que não podemos capturar a lógica mais profunda do mundo social a não ser submergindo na

particularidade de uma realidade empírica, historicamente situada e datada.”

Não se resumindo a uma leitura particularista, nem tampouco empiricista, Bourdieu

apresenta “um modelo de espaço social e de espaço simbólico” (BOURDIEU, 1996, p.13),

apresentando o resultado de sua inserção no campo da ciência por meio de uma linguagem

específica, cuja finalidade é dar às Ciências Sociais um lugar de ciência, pois rompe com a

linguagem do ‘senso comum’, muitas vezes, travestida da aparência de uma universalidade, mas

imprecisa, frouxa e presa a um léxico, que pouco se distingue do uso comum.

Por esta razão, o autor também entende ser necessário o domínio de uma linguagem

própria, específica do ofício a que o sociólogo, ou mesmo professores, filósofos e jornalistas se

subscrevem. Estes profissionais da palavra como descreve Marteleto (2017) fazem da profissão

de falar do mundo social um contraponto à retórica dos discursos do senso comum, por isso é

necessário a vigilância epistemológica para não cair nos simplismos da linguagem, nos exemplos

simplificados para descrever ou ilustrar o objeto.

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Importa esclarecer que, a defesa de Bourdieu em torno de uma linguagem específica não

repousa sobre a tentativa de elaborar uma ciência esotérica, nem tampouco fetichizar os conceitos,

mas demonstrar que, para o uso da palavra, não basta saber o uso correto da gramática. A

linguagem é produtora de variados mercados, além disto, o leitor tende a traduzir o que lê a partir

de um esquema de percepção e da posição que ocupa no campo, razão pela qual quanto mais o

cientista/pesquisador utiliza a retórica científica, tendo sob controle as operações de seu discurso,

mais conseguirá distinguir o discurso científico do discurso de ficção. É oportuno destacar a

relevância de ruptura também com o espontaneísmo científico acerca dos objetos do mundo social,

considerando-se que, entre as estruturas sócio-mentais, há um conjunto de representações, que

estabelecem sentido prático para os agentes.

Antes de adentrar nos caracteres específicos, que constituem propriamente a noção de

campo, é imperioso explicar que a filosofia disposicional desenvolvida por Bourdieu enuncia o

primado das relações entre o espaço social, organizado por meio das posições sociais ocupadas

pelos agentes, das disposições e Das tomadas de posições (BOURDIEU, 1996). Deste modo, a

praxiologia é definida por Bourdieu (1996) como uma filosofia da ação ou, também, uma filosofia

disposicional, que atribui primazia às relações, e está condensada em um pequeno número de

conceitos fundamentais, tais como: habitus, campo e capital. A praxiologia tem como “[...] ponto

central a relação, de mão dupla, entre as estruturas objetivas (dos campos sociais) e as estruturas

incorporadas (do habitus)” (BOURDIEU, 1996, p. 10).

Por esta razão, fala-se em estrutura estruturada e estrutura estruturante, vez que o

conhecimento praxiológico é produto de uma dupla translação teórica, porque,

[...] ele opera, com efeito, uma nova inversão da problemática que a ciência objetiva do

mundo social, como sistema de relações objetivas e independente das consciências e das

vontades individuais, constituiu, ao colocar ela mesma as questões que a experiência

primeira e a análise fenomenológica dessa experiência tendiam a excluir (BOURDIEU,

2002, p. 02).

É comum, entre os desavisados ou mesmo entre pesquisadores iniciantes, procurar

relações entre a teoria de Pierre Bourdieu e a teoria de Karl Marx, por exemplo, buscando-se

encontrar equivalência entre os conceitos. Embora Bourdieu tenha feito combinações entre o

materialismo sensível de Marx, os ensinamentos de Durkheim e as análises de Weber

(WACQUANT, 2013) sua teoria ultrapassa os modelos desses seus antecessores, sobretudo

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porque o primado da teoria bourdieusiana se dá nos liames da dinâmica das relações constituintes

do mundo social, de forma que:

Os grupos sociais, e notadamente as classes sociais, existem de algum modo duas vezes,

e isso antes mesmo de qualquer intervenção do olhar científico: na objetividade de

primeira ordem, aquela registrada pela distribuição das propriedades materiais; e na

objetividade de segunda ordem, aquela das classificações e das representações

contrastantes que são produzidas pelos agentes na base de um conhecimento prático das

distribuições tal como se manifestam nos estilos de vida (WACQUANT, 2013b, p. 111).

As representações que os indivíduos têm do mundo não se dão de maneira autônoma

posto que são produto de um sistema de esquemas de percepção e de apreciação, que, por sua vez,

são produzidos a partir de uma condição, que se caracteriza pela posição, que o indivíduo ocupa

no espaço social. Nessa direção, o desenvolvimento da sociologia genética proposta por Bourdieu

nos faz revisar o uso de categorias analíticas tantas vezes aplicadas como universais, invariáveis,

invariantes (CHARTIER, 2002), tal como parece comum ocorrer com os conceitos de classe social

e luta de classes.

Sobre este aspecto da relação entre o pensamento de Bourdieu e Marx, Wacquant (2013)8

desenvolveu um importante ensaio, no qual apresenta, detalhadamente, em seis pontos9, como

Bourdieu reformulou a questão marxista de classe10 social, efetuando deslocamentos conceituais,

que vão de estrutura de classe a0 espaço social, consciência de classe ao habitus, ideologia à

8 Ensaio publicado originalmente em Journal Classical Sociology, vol. 13, nº2, maio de 2013, também constitui parte de uma coleção dos textos-chave de Pierre Bourdieu sobre classe e política, lançada em norueguês, de acordo com Wacquant (2013a). Para aprofundamentos ver também: “Capital simbólico e classes sociais” (BOURDIEU, 2013). 9 De acordo com Wacquant (2007) Bourdieu ampliou, mesclou e corrigiu visões clássicas num quadro próprio. A reformulação da questão de classes em Bourdieu exemplifica os principais aspectos de sua sociologia in globo, evidencia o conjunto de operações realizadas para desenvolver sua teoria. Wacquant (2007) destaca os seis aspectos centrais nesta reformulação do conceito de classes, da seguinte forma: 1) Concepção relacional da vida social; 2) É a luta e não a reprodução que revela o motor tanto da ruptura quanto da continuidade social; 3) Ênfase na dimensão e nos mecanismos simbólicos da formação e da dominação de grupo; 4) Revogação e ruptura com a oposição perene entre concepções objetivistas e subjetivistas de classe, ruptura com visões realistas e substancialistas; 5) Fusão entre teoria e pesquisa, ferramentas de análise e ferramentas empíricas, princípios teóricos e metodológicos não podem existir separadamente; 6) Remodelagem da noção de classe, não reduzida somente a questão teórica e empírica, mas inovada com o refinamento da técnica estatística da análise da correspondência múltipla e posteriormente análise geométrica de dados. 10 Na obra “O poder simbólico” Bourdieu (1989, p. 152) ao tratar do espaço social e gênese das classes explica que: “As insuficiências da teoria marxista das classes e, sobretudo, a sua incapacidade de explicar o conjunto das diferenças objectivamente provadas, resultam de que, ao reduzir o mundo social unicamente ao campo econômico, ela se vê obrigada a definir a posição social em referência unicamente à posição nas relações de produção econômica, ignorando com isso as posições ocupadas nos diferentes campos e subcampos – sobretudo nas relações de produção cultural”. O mundo, sob o viés da teoria marxista, conforme assinala Bourdieu organiza-se de forma unidimensional, organizado em torno da oposição entre dois blocos. Para Bourdieu (1989) o espaço social é um espaço multidimensional.

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violência simbólica, e de classe dirigente ao campo do poder. Os deslocamentos conceituais

desenvolvidos por Bourdieu foram realizados em face das questões mais problemáticas da teoria

social. O esforço realizado ao elaborar seu modelo teórico foi de não colocar teorias justapostas, e

sobre elas desenvolver a sua perspectiva, mas de criar um modelo que traz inovações conceituais

guiadas por questões de pesquisa de campo.

O autor procurou integrar contribuições tanto de Marx, como de Weber num mesmo

sistema conceptual e incorporou, também contribuições das várias escolas construtivistas,

considerando-se a fenomenologia e etnometodologia. Nesse mesmo sistema, incorporou

contribuições advindas de diferentes campos, de acordo com Miranda e Domingos Sobrinho

(1998) foram também as contribuições de Durkheim, Sartre, Lévi-Strauss e Saussure. Ao fazer

comunicar teorias opostas, que “[...] muitas vezes se constituíram umas contra as outras”

(BOURIDEU, 2003, p. 28), não tratou de elaborar sínteses ecléticas. Seu esforço se deu no sentido

de diminuir o ‘racismo’ entre teorias, uma vez que considerava a condenação do ecletismo, por

parte de certas correntes, um álibi para a incultura e a tranquilização preguiçosa que encerra certas

tradições.

Bourdieu (2003, p.24) afirma que:

É mais cômodo para elaborar lições claras: primeira parte Marx, segunda parte Weber,

terceira parte eu próprio... Ao passo que a lógica da investigação conduz a superar a

oposição, retomando à raíz comum. Marx evacuou de seu modelo a verdade subjetiva do

mundo social contra a qual estabeleceu a verdade objetiva desse mundo como relações de

forças. Ora, se o mundo social se reduzisse à sua verdade de relações de forças, se não

fosse, em certa medida, reconhecido como legítimo, as coisas não funcionariam. A

representação subjectiva do mundo social como legítimo faz parte da verdade completa

desse mundo.

Com base nesse entendimento, Bourdieu vê, na sociologia, a possibilidade de “desvelar

coisas escondidas e por vezes recalcadas” (BOURDIEU, 2003, p.24), porém, mais do que, apenas,

colocar sob exame a ciência e os que a produzem, pois na compreenão bourdieusiana a sociologia

é uma ciência que incomoda, porque diferente das outras ciências, “exige-se dela uma

acessibilidade que não se pede à física ou sequer à semiologia e à filosofia (BOURDIEU, 2003, p.

9)”.

Neste ponto, é valioso considerar que, ao desenvolver noções de campo, capital e habitus

Bourdieu colocou em cena aspectos, que dizem respeito às formas de reprodução da dominação,

tendo demonstrado, que os diferentes cosmos e microcosmos funcionam a partir de lutas e disputas

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concorrenciais em nome daquilo, que os agentes consideram ser a verdade legítima. Nessa linha

de raciocínio, Bourdieu (2004) explica, que, no âmbito da produção das teorias sociais, existem

análises internalistas (endógenas) e análises externalistas (exógenas), ou seja, para algumas

correntes teóricas, grosso modo, basta ler o texto e entendê-lo em sua autonomia – em si mesmo,

como princípio e fim da análise -, para outras, basta ler o texto e entender o contexto, sua relação

com o mundo social e econômico, dessa forma surge uma análise pretensamente científica.

Para realizar uma inserção no campo da praxiologia, é preciso recorrer recorrer às

questões epistemológicas suscitadas por essa filosofia, posto que foi elaborada a partir de muitas

integrações e, sobretudo de rupturas. Nesse sentido, Baranger (2017, p. 173) afirma:

Tudo o que Bourdieu nos diz poderia ser resumido em uma única diferença para com as

ciências naturais, diferença que consiste em uma resistência ativa do objeto. Nas ciências

sociais, afirma ele, impõe-se dar um passo suplementar, do qual as ciências naturais

podem se eximir [...] é necessário historicizar o sujeito da historicização, objetivar o

sujeito da objetivação, ou seja, o transcendental histórico (SSR, 168).

Com efeito, para objetivar esse sujeito ao qual Bourdieu se refere, é necessário saber como

proceder para tal, pois neste ponto, sua teoria acerca do espaço social ou teoria dos campos

apresenta as ferramentas necessárias para o exercício de objetivação e historicização. Pode-se

afirmar que as noções de campo, habitus e capital são ferramentas eficazes para esse trabalho.

Nesse lastro, Catani (2011) explica que a noção de campo começou a ser elaborada por Bourdieu

no início dos anos de 1960, e destaca que esta noção foi resultado de reflexões desenvolvidas em

seminários e na ‘releitura do capítulo sociologia da religião de Max Weber’.

Ao rastrear as primeiras utilizações da noção de campo propriamente realizadas por

Bourdieu, Catani (2011) identifica a publicação do texto “Campo intelectual e projeto criador” na

revista Les Temps (1966) e, posteriormente a republicação na coletânea Problemas do

Estruturalismo (1967) que marcam o início de sua sociologia da cultura, quando se debruçou sobre

o microcosmo intelectual na França11.

Ainda em torno das primeiras publicações com o uso da noção de campo por Bourdieu,

Catani (2011) afirma que em 1970 a noção foi retomada, de modo que Bourdieu definiu o campo

intelectual como constituinte do campo do poder. Catani (2011, p.195) assinala que “os

intelectuais, enquanto possuidores de capital cultural, integram a fração dominada das classes

11 Em “As regras da Arte” Bourdieu explica que “a primeira formulação rigorosa da noção de campo elaborou-se por ocasião da leitura do capítulo de Wirtschaft und Gesellschaft sobre a sociologia religiosa que, obseda pela referência levantada aos problemas levantados pelo estudo do campo literário” (BOURDIEU, 1996, p. 208).

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dominantes, mantendo relações ambivalentes com as frações dominantes das classes dominadas e

com as classes dominadas”. Convém ressaltar que a posteriori Bourdieu procurou demonstrar que

seu modelo teórico era válido para além da França e foi explícito neste ponto em seu livro Razões

Práticas (1996).

Nesses termos, a noção de campo elaborada por Bourdieu tem como premissa as relações

sociais constituídas em relação ao tempo e ao espaço e, não apenas, as relações em si mesmas. O

espaço social, na percepção de Bourdieu (1996) organiza-se de acordo com três dimensões

fundamentais, descritas de seguinte maneira: 1) os agentes se distribuem de acordo com o volume

global de capital possuído; 2) os agentes se organizam de acordo com a estrutura desse capital

(peso relativo de capital econômico e cultural) e, 3) os agentes se distribuem de acordo com a

evolução do volume e a estrutura do capital, ao longo do tempo.

Na base estrutural da noção de campo social, está a compreensão de “espaço dos

possíveis.” Assim a noção de espaço não apenas no sentido físico, mas no sentido sócio-histórico,

ou seja, “[...] o que eu denomino espaço social, lugar de coexistência de posições sociais, de pontos

mutuamente exclusivos [...]” (BOURDIEU, 2001, p. 159). Neste espaço, o “eu” apreende, inclui,

incorpora as estruturas sociais “sob a forma de estruturas de disposições, de chances objetivas, sob

a forma de esperanças e de antecipações” (idem). Nesse processo os agentes adquirem um

conhecimento sobre o mundo e desenvolvem um senso prático, admitindo sua posição e suas

tomadas de posições. O primado das relações, na praxiologia configura o estruturalismo simbólico

que rompe com o estruturalismo sem sujeito estruturante.

O pano de fundo que dá suporte ao empreendimento bourdieusiano acerca da elaboração

da noção de campo se encontra plasmado na oposição a algumas questões básicas de como a

ciência moderna - herdeira direta da tradição escolástica - construiu uma visão científica do ser

humano. Nesse sentido,

[...] a questão do sujeito se acha suscitada pela própria existência de ciências cujo objeto

é o que se costuma chamar de “sujeito”, esse objeto para quem existem objetos; e que por

isso mesmo, mobilizam pressupostos filosóficos diametralmente opostos àqueles

defendidos pelas “filosofias dos sujeitos” (BOURDIEU, 2001, p.157)

Domingos Sobrinho (1998, p.06) observa que Bourdieu não compactuava “nem com o

desprezo...nem com o olhar distanciado...” das “filosofias sem sujeito” acerca do mundo social, no

qual as oposições tradicionais, tais como: subjetivo/objetivo, individualismo/holismo representam

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uma compreensão do corpo como exterioridade. Desse modo, esse ‘sujeito’ que a ciência analisa,

comumente, de maneira separada do mundo social, na percepção bourdieusiana não pode ser

entendido como mero espectro de estímulo-resposta mecânica às diversas experiências às quais

está exposto, ou mesmo como objeto a ser dissecado e separado em partes anatômicas.

O sujeito é um corpo submetido a diferentes experimentações no mundo social, encontra-

se incluído, incorporado, habitado na dimensão espaço-temporal. Compete frisar que a concepção

de ‘corpo situado, habitado’, que Bourdieu centraliza, na elaboração de sua teoria, não se trata do

corpo no sentido noético, ou seja, aquele que só reconhece a si e ao mundo por meio do ato de

consciência. Também não se trata de um sujeito transcendental, mas de um corpo que passa por

processos de socialização, estando exposto à regularidades, ao mesmo tempo em que, ao

estabelecer os princípios práticos de organização, construção e classificação do mundo social

também pode revisar ou rejeitar determinadas experiências. Desse modo, Bourdieu (2011, p. 167)

detalha que se trata de “um corpo socializado, investindo na prática dos princípios de

organizadores socialmente construídos e adquiridos no curso de uma experiência social situada e

datada”.

O corpo ocupa um lugar basilar nos fundamentos do pensamento bourdieusiano, o

conhecimento da ação corporal é traduzido por meio do seu conceito de habitus, que de acordo

com Domingos Sobrinho (1998, p.07) é o conceito “mais antigo e sólido” construído pelo autor.

Para Bourdieu as ações não devem ser entendidas como efeito mecânico às imposições de caráter

socialmente coercitivo, ou mesmo não podem ser resumidas a uma visão utilitarista, onde o sujeito

age apenas com a finalidade de obter lucros e ganhos (BOURDIEU, 2001).

Nesses termos, Bourdieu nomeia de ‘agente’ os atores sociais situados na estrutura social

e o termo agência também serve também para designar instituições. Cumpre assinalar, que embora

o conceito de habitus seja um dos mais antigos e um dos mais acessados na teoria bourdieusiana,

este possui uma relação indissociável com o campo. Wacquant (2007) ao apresentar as raízes

históricas do conceito de habitus afirma que eu nascedouro/gênese se encontra na noção

aristotélica de hexis, quando o filósofo grego elaborou sua doutrina sobre a virtude.

Desse modo, desde sua gênese, o conceito de habitus diz respeito a um estado adquirido

e estabelecido do caráter moral, que de acordo com Amorim (2016) orienta nossos sentimentos e

desejos nas situações, modelando desta forma as nossas condutas. Wacquant (2007, p.65) sublinha

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que foi no século XIII12, com a tradução do termo para o latim que foi acrescentado ao seu sentido

a “[...] capacidade para crescer por meio da atividade, ou disposição durável suspensa a meio

caminho entre potência e ação propositada”. Na mesma linha do autor acima citado, Domingos

Sobrinho (1998, p. 07) apresenta as três dimensões básicas do habitus, que são: eidos, ethos e

hexis13, ao mesmo tempo ressalta que Bourdieu sempre recebeu muitas críticas devido à “forte

acentuação estruturalista” deste conceito.

Numa primeira impressão, é possível considerar que o habitus, ao estar intimamente

relacionado às lógicas do campo, pareça ser um conceito que dá diminuta liberdade para a atuação

dos agentes frente à estrutura social. Pode-se chegar ao mesmo equívoco, que Bourdieu tratou de

recusar: a ideia de que os indivíduos agem de determinada maneira porque não têm outras

possibilidades. Domingos Sobrinho (1998), esclarece que ao desenvolver sua teoria ao longo dos

anos, Bourdieu demonstrou o caráter relacional do conceito tornando-o mais evidenciado em

algumas obras.

Deste modo, em “Questões de sociologia” Bourdieu (2003) explica o porquê de retomar

um conceito tão antigo, explicando que a noção de habitus se assemelha, em grande medida, com

a noção de hábito, mas consegue ultrapassá-la em um aspecto essencial: o fato de se tratar daquilo

que se encarnou de modo duradouro no corpo do indivíduo sob a forma de disposições

permanentes, que se constitui por um “conjunto sistemático de princípios simples e parcialmente

substituíveis [...] princípio de uma autonomia real relativamente às determinações imediatas pela

“situação” [...]” (p. 141).

Também em sua obra “A distinção”, Bourdieu (2011, p. 228) afirma que:

O habitus engendra representações e práticas que, apesar das aparências, são sempre mais

ajustadas às condições objetivas das quais elas são produto. A frase de Marx segundo a

qual “o pequeno burguês é incapaz de superar os limites de seu cérebro” – outros teriam

falado dos limites de seu entendimento – significa que seu pensamento tem os mesmos

limites de sua condição, ou seja, por sua condição, é limitado, de alguma forma,

duplamente: pelos limites materiais que ela impõe à sua prática e pelos limites que ela

12 O termo foi retomado por Tomás de Aquino na sua Summa Theologiae. 13 “...eidos que corresponde à matriz de esquemas lógicos e cognitivos orientadores da apreensão e classificação dos objetos no mundo social e se encontra na base das estratégias desenvolvidas pelos agentes para se inserirem nos diversos espaços sociais; ethos refere-se à uma ética em estado espontâneo e naturalizado, portanto não necessariamente consciente; hexis exteriorização, através do corpo, da internalização da história dos indivíduos (jeito de falar, posicionar-se, gesticular, etc.). (DOMINGOS SOBRINHO, 1998, p 07.).

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impõe ao seu pensamento, portanto à sua prática, levando-o a aceitar – até mesmo amar

– esses limites.

Em “As regras da Arte” Bourdieu afirma que a noção de habitus exprime uma recusa a uma série

de alternativas apresentadas pelas ciências sociais acerca da ação dos indivíduos no mundo. Desta

forma, as disposições que cada indivíduo tem estão ajustadas à sua posição, tendo o habitus a

função de “dar conta da unidade de estilo que vincula as práticas e os bens de um agente singular

ou de uma classe de agentes” (BOURDIEU, 1996, p. 21). Pode-se dizer que a relação entre habitus

e campo é indissociável, vez que o espaço social, traduzido por meio de um sistema de separações

diferenciais se organiza a partir de distribuições, que “num campo, agentes e instituições estão em

luta, com forças diferentes, e segundo as regras constitutivas desse espaço de jogo [...]”

(BOURDIEU, 2003, p. 142).

Nessa esteira, o campo existe como uma espécie de universo intermediário entre dois

pólos, ou seja, “[...] é o universo no qual estão inseridos os agentes e as instituições que produzem,

reproduzem e difundem a arte, a literatura ou a ciência.” (BOURDIEU, 2004, p.20). Convém

salientar que o campo não é um aparelho, “[...] o sistema escolar, o Estado, a Igreja, os partidos,

não são aparelhos, mas campos.” (idem). O autor atenta ao fato de que os aparelhos são um estado

patológico dos campos e destaca que, quando os campos se tornam aparelhos, os dominantes têm

os meios de anular a resistência dos dominados, ou seja,

[...] quando o baixo clero, os militantes, as classes populares, etc. não podem mais que

sofrer com a dominação; quando os movimentos vão de cima para baixo e os efeitos de

dominação são tais que interrompem a luta e a dialética que são constitutivas do campo

(BOURDIEU, 2003, p. 142).

Apreende-se desse modo que, a noção de campo parte da premissa de que há no interior

do macrocosmo diferentes microcosmos, que embora estejam submetidos às leis sociais mais

gerais, possuem autonomia relativa e por esta razão têm suas leis específicas de funcionamento.

Segundo Bourdieu (2004, p.21) quando um campo está submetido às imposições do macrocosmo,

dispõe “de uma autonomia parcial mais ou menos acentuada.”

Desse modo, é necessário entender que, a autonomia dos campos se dá segundo graus

diferentes, portanto, impõe-se analisar a natureza das pressões externas a cada campo para captar

seus mecanismos de resistência, conforme explicita o autor:

Um dos problemas conexos será, evidentemente, o de saber qual é a natureza das pressões

externas, a forma sob a qual elas se exercem, créditos, ordens, instruções, contratos, e sob

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quais formas se manifestam as resistências que caracterizam a autonomia, isto é, quais

são os mecanismos que o microcosmo aciona para se libertar dessas imposições externas

e ter condições de reconhecer apenas suas próprias determinações internas (BOURDIEU,

2004, p.21).

Nesse diapasão, quanto maior o grau de autonomia de um campo maior a sua capacidade

de refratar as pressões externas. O processo de refração que um determinado campo pode operar

sobre demandas que lhe são impostas se configura na retradução, transfiguração das demandas.

Nesta perspectiva, os campos possuem graus de autonomia relativa, que se expressam pela

capacidade de refratarem as imposições, tornando-as irreconhecíveis. O autor destaca também que,

inversamente, a heteronomia dos campos se expressa muito claramente por meio da entrada direta

de problemas políticos no interior do campo, por exemplo.

Assim, Bourdieu (1997, p. 22) afirma:

Isto significa que a ‘politização’ de uma disciplina não é indício de uma grande

autonomia, e uma das maiores dificuldades encontradas pelas ciências sociais para

chegarem à autonomia é o fato de que pessoas pouco competentes, do ponto de vista de

normas específicas, possam sempre intervir em nome dos princípios heterônomos sem

serem imediatamente desqualificadas.

A heteronomia caracteriza-se como processo contrário ao da autonomia uma vez que,

quanto mais o campo sofre influenciações externas, principalmente problemas políticos, menos

autonomia esse campo possui. É oportuno observar que a entrada de questões alheias aos interesses

do campo, a imposição de agendas, “[...] as determinações externas sempre se exercem por

intermédio das forças específicas do campo, ou seja, depois de haver sofrido uma reestruturação

tanto mais importante quanto o campo é mais autônomo” (BOURDIEU, 1996, p.67).

Desta maneira quanto mais autônomo o campo, “[...] mais capaz de impor sua lógica

específica, que não é mais que a objetivação de toda a sua história em instituições e mecanismos”

(BOURDIEU, 1996, p. 262 – grifos do autor). Nessa direção, ao tratar da autonomia dos campos,

da natureza das pressões externas e sob quais formas se manifestam as resistências, o autor destaca

a importância de escapar à alternativa da “ciência pura” e da “ciência escrava”. Isto porque a

primeira se posiciona como totalmente livre acerca de qualquer necessidade social, enquanto a

outra se coloca como sujeita às demandas político-econômicas (BOURDIEU, 1997).

De modo mais detalhado, os campos são definidos por Bourdieu (2003, p.119) como:

[...] espaços estruturados de posições (ou de postos) cujas propriedades dependem da sua

posição nesses espaços e que podem ser analisadas independentemente das características

de seus ocupantes (em partes determinadas por elas).

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No que se refere às propriedades dos campos, há propriedades gerais e específicas. Assim,

as propriedades gerais podem ser analisadas independentemente das características dos agentes

ocupantes de determinado lugar no campo. Isto se dá porque os campos se relacionam com outros,

possuindo autonomia relativa. Desse modo, ao se estruturarem, os campos possuem leis gerais de

funcionamento, ou mesmo “[...] mecanismos universais... que se especificam em função das

variáveis secundárias” (BOURDIEU, 2003, p.120). Quanto mais o campo científico objeto de

nosso interesse, possui autonomia, mais escapa às leis sociais externas (BOURDIEU, 2004).

A estrutura dos campos se constitui com base nas lutas e na distribuição de capitais

específicos, ou seja, para se estruturar um campo é necessário um acúmulo de tempo e experiências

que garantirão a formulação de estratégias para conservar o monopólio de determinada autoridade

específica. Os limites do campo são determinados pela distribuição de capitais específicos. Isto

quer dizer, por exemplo, que, um crítico de arte não possui os capitais específicos para adentrar o

campo jurídico, a não ser que se empenhe na sua aquisição, pois a entrada de um agente no campo

é sempre determinada pela sua bagagem de capitais e pela capacidade de adequar-se às leis de

inserção no campo. Na lógica da teoria de Bourdieu (2003, p.121) é “o capital específico,

fundamento do poder ou da autoridade específica característica de um campo.” A inserção de um

agente em determinado campo demanda a posse de capitais específicos, mas esta posse se dá em

relação a um conjunto de interesses, ou seja, nenhum agente entra em um campo por acaso. As

condições para se inserir em um campo precisam estar mais ou menos estruturadas em lutas

anteriores à inserção propriamente no campo. Incialmente à entrada em um jogo é necessário um

‘habitus originário’ que gradualmente se converte em habitus específico.

Com base no exposto, a partir da Teoria dos Campos, Bourdieu desenvolveu

especificamente o conceito de campo científico, que tal como os demais, também é um campo de

forças e de lutas, que possui uma lógica de funcionamento específica. O espaço científico, define-

se como espaço físico, “[...] comportando relações de força, as relações de dominação.”

(BOURDIEU, 2004, p.23). O espaço social, na percepção bourdieusiana existe, de alguma

maneira, em relação aos agentes e às relações objetivas por eles engendradas. Assim, o autor

destaca que são as estruturas objetivas entre os agentes que formam os princípios do campo, ou

seja, as visões predominates neste espaço, os pontos de vista, as crenças (illusio), os valores

(habitus, nomos, doxa), são resultado destas relações objetivas, encarnadas a partir de distribuições

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no espaço. A estrutura das relações objetivas é constituttiva do campo, conforme assegura

Bourdieu (2004). Desse modo, a posição que o agente ocupa, em relação à estrutura do campo é

que determina/orienta as tomadas de decisões.

É necessário não confundir o conceito de campo científico elaborado por Bourdieu com

a noção de “comunidade científica”, pois o campo científico longe de ser um espaço de meras

concordâncias, onde os agentes agem a partir de um espírito comunitário e coletivista, é um espaço

de disputas que,

[…] no domínio da pesquisa científica, os pesquisadores ou as pesquisas dominantes

definem o que é, num dado momento do tempo, o conjunto de objetos importantes, isto

é, o conjunto das questões que importam para os pesquisadores, sobre as quais eles vão

concentrar seus esforços e, se assim posso dizer, “compensar”, determinando uma

concetração de esforços de pesquisa (BOURDIEU, 1998, 35)14.

A estrutura do campo científico é determinada segundo a distribuição do capital

científico, que funciona como crédito científico a partir da posição ocupada pelo agente.

Oportunamente, Bourdieu em sua obra síntese sobre o campo científico indaga: “[…] o que você

entende por capital?” e responde:

[…] O capital científico é uma espécie particular do capital simbólico (o qual, sabe-se, é

sempre fundado sobre atos de conhecimento e reconhecimento) que consiste no

reconhecimento (ou no crédito) atribuído pelo conjunto de pares-concorrentes no interior

do campo científico […] (BOURDIEU, 2004, p. 26)

Isto inclui todos os atos de reconhecimento, que fazem parte do mundo científico, a partir

de posições que só podem ser assumidas por aqueles que dispõem do mínimo do capital necessário,

que envolve o reconhecimento dos pares, mas requer prioritariamente que exista a ‘competência’.

O capital científico, quando está objetivado no agente, reflete-se no reconhecimento, a partir do

número de citações, obras publicadas, pesquisas reconhecidas, objetos de estudo legítimos e

legitimados, etc.

De posse desses elementos introdutórios à teoria dos campos de Pierre Bourdieu, e para

não nos enredarmos em questões demasiadamente longas, considerando o objeto originário desta

14 Em “Escritos de Educação” Bourdieu apresenta um capítulo específico, intitulado “Método científico e hierarquia social dos objetos” onde apresenta importante reflexão sobre a hierarquia dos objetos legítimos, legitimáveis ou indignos, sendo que, esta definição, a depender das condições de independência do campo pode ser resultado de censura específica, com relação às demandas da classe dominante. Assim, destaca-se que: “A definição dominante das coisas boas de se dizer e dos temas dignos de interesse é um dos mecanismos ideológicos que fazem com que coisas também muito boas de se dizer não sejam ditas e com que temas não menos dignos de interesse não interessem a ninguém, ou só possam ser tratados de modo envergonhado ou vicioso.” (BOURDIEU, 1998, p. 35).

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pesquisa, compete-nos indagar: existe campo universitário no Brasil? É possível lastrear sua

formação? Quais têm sido as principais reconfigurações deste nível de ensino a partir da década

de 1990? A FAFIDAM constitui-se como um subcampo do campo universitário, no contexto

cearense e nacional?

1.2 Formação do campo universitário no Brasil

Para iniciar o caminho de contextualização acerca do campo universitário no Brasil,

recorremos à obra “As Regras da Arte”, na qual Bourdieu (1996, p. 210) destaca que:

Para entrar, em cada caso, na particularidadeda configuração histórica considerada, é

preciso a cada vez dominar a literatura consagrada a um universo artificialmente isolado

[…] A impressão de poder heurístico proporcionada frequentemente pelo emprego de

esquemas teóricos que exprimem o próprio movimento da realidade tem como

contrapartida o sentimento permanente de insatisfação despertado pela imensidão do

trabalho necessário para obter o pleno rendimento da teoria em cada um dos casos

considerados – o que implica os incontáveis recomeços e modificações […]

Esta citação relativa ao movimento da realidade e aos incontáveis recomeços e modificações

acerca da construção do objeto da pesquisa, serve para retratar o longo percurso que realizamos

para chegar a algumas possíveis respostas/reflexões sobre o objeto de estudo desta pesquisa. Por

se tratar de um universo complexo, espaço de disputas que é objeto de análise dos mais variados

tipos, tivemos muita dificuldade em delinear por onde começar, pois as reformas educacionais de

1990 se configuram por meio de inúmeros arranjos na legislação, meandros e nuanças sobre as

quais repousam muitas lutas de cunho politico-ideológico. O campo das análises e dos estudos,

que toma o ensino superior como objeto de estudo se caracteriza por batalhas classificatórias, que,

em grande medida, evidenciam os limites do campo universitário em relação à esfera política.

Desta maneira, Hey (2008, p. 21) argumenta que a “[...] configuração desse espaço em educação

superior permite demonstrar um jogo de lutas entre grupos explicitamente distintos.”

A autora supracitada, a partir de uma análise sociológica de tipo morfológica, por

intermédio da observação acerca do espaço de produção acadêmica em educação superior

identificou a presença e atuação de um grupo dominante na construção de uma agenda acadêmica

para o ensino superior, tendo por horizonte a realização de um projeto político de sociedade15.

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Nesse contexto, a partir de 1980 os delineamentos quanto à estruturação do campo

universitário vão sendo definidos de forma mais concisa e vão se materializando a partir de espaços

próprios, voltados para a produção da ciência no Brasil.

Para explicitar alguns percursos de como se deu a estruturação do campo universitário

brasileiro, é necessário recorrer a algumas digressões, sem as quais poderá não ficar explicitada a

necessidade de discutir a noção nesta pesquisa, pois, somente a partir do entendimento de como se

estrutura este espaço social, podemos percebê-lo. O campo universitário brasileiro está perpassado,

atualmente, por diversas lógicas externas, no entanto vem conseguindo refratar e resistir à

transformações radicais e bruscas. Oliveira e Catani (2011, p.16) afirmam que:

[...] o mercado dos bens e trocas universitárias ou acadêmico-científicas é um

universo social de poder, de capital, de relações de força, de lutas para preservar

ou transformar essas relações de força, de estratégias de manutenção ou de

subversão e de interesse que se vincula às estruturas objetivas dos diferentes

campos sociais, bem como às estruturas incorporadas do habitus.

Por se constituir também como um campo cultural, o ensino superior movimenta-se por

meio de uma economia da produção simbólica, tal como destaca Chartier (2002, p.141) “[...] uma

economia que funciona com parâmetros opostos ao funcionamento do campo econômico”, nesses

moldes “há o desinteresse estético ou intelectual contra a busca do benefício, de lucro econômico;

a gratuidade do gesto contra a utilidade da produção...” (CHARTIER, 2002, p.141).

Destacamos que a formação do campo universitário no Brasil é recente. O Ensino

Superior, durante largo tempo na história educacional do país ficou restrito a determinados grupos

e interesses, encontra-se instituído desde a vinda da Coroa real portuguesa para o Brasil em 180816.

O mesmo não ocorrera com as universidades que, apenas há aproximadamente um século foram

estruturadas em nosso contexto. Portanto, embora façamos o uso do termo ‘ensino superior’ para

designar toda e qualquer forma de educação de terceiro grau, há diferenças entre sua forma geral

e o ensino propriamente universitário, no que concerne suas concepções e as funções atribuídas às

universidades17.

16 No âmbito da oferta de ensino superior sem vínculo direto com o Estado, portanto, sem nenhum amparo oficial do ponto de vista da manutenção financeira e do aparato legal, Cunha (1989) explica que o primeiro estabelecimento de ensino superior no Brasil foi fundado pelos jesuítas, na Bahia, em 1550. .

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No panorama amplo da história das universidades pelo mundo, Charle e Veger (1996)

afirmam que as primeiras universidades surgiram no século XIII, na Itália, França e Inglaterra.

Afirmam que “[...] a história das universidades, segmento decisivo da história da cultura ocidental,

possibilita compreender melhor uma parte de nossa herança intelectual e do funcionamento de

nossas sociedades.” (CHARLE; VERGER, 1996, p. 9). Os autores consideram que as

universidades sempre representaram, apenas, uma parte do que se convencionou de modo mais

amplo, denominar de ensino superior. Portanto, ensino superior e universidade se constituem como

dois espaços que são diferentes, complementares em certa medida e concorrentes entre si.

Procedendo a um recuo na história das universidades no Brasil, Saviani (2010) destaca

que os cursos superiores foram instalados no Brasil - com apoio oficial a partir de 1808 - esses

cursos funcionavam de maneira isolada. Organizamos um quadro que ilustra a disposição dos

cursos superiores isolados de 1808 a 1875. Vejamos a seguir:

QUADRO 1: Cursos Isolados (1808 – 1875)

CURSO ANO DE CRIAÇÃO ASPECTOS HISTÓRICOS

Curso de Cirurgia (Bahia); Curso de

Anatomia (Rio de Janeiro); Curso de

Economia (Rio de Janeiro)

1808

Curso de Medicina (Rio de Janeiro)

1809

Curso de Engenharia (Rio de

Janeiro)

1810 Curso agregado à Academia Militar

Curso de Agricultura (Rio de

Janeiro)

1812

Academia de Medicina (Rio de

Janeiro e Bahia)

1813 Junção das cátedras de Anatomia e Cirurgia.

Atualmente fazem parte das universidades

federais dos respectivos estados

Curso de Química (química

industrial, geologia e mineralogia –

Rio de Janeiro)

1817

Curso de Desenho Técnico (Rio de

Janeiro)

1818

Curso de Direito (Olinda/PE)

Curso de Direito (São Paulo)

1827 Em 1854, os dois cursos de Direito

constituíram, respectivamente a Faculdade de

Direito do Largo de São Francisco (SP) e a

Faculdade de Direito de Recife.

Integram atualmente as Universidades de São

Paulo (estadual) e Universidade Federal de

Pernambuco.

Escola Politécnica de Engenharia 1874 Antigo Curso de Engenharia, que foi agregado

da Academia Militar no Rio de Janeiro.

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Atualmente faz parte da Universidade Federal

do Rio de Janeiro.

Escola de Minas (Ouro Preto) 1875 Remonta uma lei de 1832 que criou o Curso de

Estudos Minerológicos. Atualmente a Escola

de Minas (e Metalurgia) integra a

Universidade Federal de Ouro Preto.

Fonte: Saviani (2010, p. 5 - 7); elaboração da autora.

Para Saviani (2010), os cursos criados por D. João e as duas faculdades de Direito (uma

em São Paulo e outra em Recife) resumem todo o ensino superior no Brasil até o final do Império.

O autor ressalta que já, no final do Império, iniciou-se um movimento de ‘desoficialização’ do

ensino18. O autor denomina por ‘desoficialização’ o processo de adesão às instituições de ‘ensino

livre’ o que constituiu uma bandeira do movimento positivista no Brasil. Este tipo de ensino foi

oficializado/reconhecido no Decreto da Reforma Leôncio de Carvalho de 187919. Em tal contexto,

surgiram faculdades e esboços de universidades no âmbito particular/privado. Organizamos, no

quadro abaixo a experiência com as “universidades passageiras20”, onde algumas foram

dissolvidas e outras persistiram, tendo sido federalizadas posteriormente.

QUADRO 2: Universidades/Faculdades passageiras no Brasil (1900 – 1946)

FACULDADES/UNIVERSIDADES ANO DE CRIAÇÃO ASPECTOS HISTÓRICOS

Faculdade de Medicina e Direito do Rio

Grande do Sul

1900

Remonta à Escola de Farmácia e Química

criadas em 1895. Também remonta à

Escola de Engenharia fundada em 1896.

Em 1934 foram acrescidas as Faculdades

de Agronomia e Veterninária, Filosofia,

Ciências e Letras. Constituíram a

Universidade de Porto Alegre, e em 1947

transformou-se em Universidade do Rio

Grande do Sul – federalizada em 1950.

Universidade de Manaus 1909 Dissolvida em 1926 – crise econômica e

esgotamento do ciclo da borracha. Das

faculdades que a integravam restou apenas

a Faculdade de Direito, federalizada em

1949 e posteriormente incorporada à

Universidade do Amazonas.

Universidade de São Paulo 1911 Cessou as atividades por volta de 1917, não

restou nenhuma de suas faculdades.

Universidade do Paraná 1912 Iniciou as atividades em 1913 e foi

desativada em 1920, por indução do

governo federal. Passou a funcionar na

19 Decreto Nº 7.247, de 19 de abril de 1979. 20 Este termo é utilizado originalmente por Luiz Antônio Cunha.

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forma de faculdade isolada, tendo os cursos

de Direito, Engenharia e Medicina. Foi

reconstituída em 1946 e federalizada em

1951, atual Universidade Federal do

Paraná.

Universidade do Rio de Janeiro

1920 Oficializada pelo Decreto n°. 14.343, de 7

de setembro de 1920. Resultou da reunião

da Faculdade de Medicina (originária da

Academia de Medicina e Cirurgia –

fundada em 1808 por D. João VI). Resultou

também da Escola Politécnica (originária

de 1792 com a fundação da Real Academia

de Artilharia, Fortificação e Desenho).

Também resultou da Faculdade de Direito

(criada em 1882 e reestabelecida em 1891,

acrescida da Faculdade Nacional de Belas

Artes e Faculdade Nacional de Filosofia.).

Em 1937 recebeu o nome de Universidade

do Brasil e em 1965 recebeu o nome de

Universidade Federal do Rio de Janeiro.

Universidade de Minas Gerais 1927 De iniciativa privada, contava com recurso

estadual. Foi federalizada em 1949, quando

se tornou Universidade Federal de Minas

Gerais.

Universidade da Bahia 1946 Constituída em 1946, incorporou a Escola

de Cirurgia (1808), Farmácia (1832),

Odontologia (1864), Academia de Belas

Artes (1877), Direito (1891), e Politécnica

(1896) e Faculdade de Filosofia, Ciências e

Letras (1941). Federalizada em 1950,

tornando-se Universidade Federal da

Bahia.

Fonte: Saviani (2010, p. 5), elaboração da autora.

Saviani (2010) destaca o protagonismo do Estado nacional na condução da educação

superior, a partir de 1930 e, também a criação do Ministério da Educação e Saúde Pública21, bem

como a Reforma Francisco Campos22. Nessa direção, Oliveira e Catani (2011) consideram que o

processo de institucionalização das universidades teve como marco, a aprovação do Estatuto das

Universidades Brasileiras, em 1931, contudo, a educação superior, em sua forma ampla, no Brasil

é anterior à institucionalização das universidades. Nessa mesma ótica, Rothen (2008) destaca que

o Estatuto das universidades brasileiras foi um dos primeiros marcos estruturais de regulação

21 Neste período Saviani destaca também a organização do movimento estudantil, com a criação da União Nacional dos Estudantes (UNE) no ano de 1938. 22 A Reforma Francisco Campos, de acordo com Dallabrida (2009), significou a modernização do ensino secundário brasileiro.

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legislativa do ensino no Brasil. Além deste Estatuto, foram aprovados outros decretos23,

interligados, e que versavam sobre o modelo de universidade a ser adotado no país, bem como

também faziam referência à Universidade do Rio de Janeiro – primeira instituição a tentar

implementar um modelo de universidade no país.

Rothen (2008) afirma que, no início do século XX, a concepção de educação superior era

herdeira da Reforma Pombalina, o que implicava uma ideia de ciência aplicada, caracterizada por

instituições isoladas, de maneira que a experiência com a universidade era caracterizada pela

aglutinação de cursos e faculdades. De acordo com Rothen (2008) a ideia propriamente de

universidade como cultivo da ciência universal não era bem aceita, tendo dentre seus opositores

os representantes do positivismo brasileiro. Neste cenário, havia disputas entre liberais e

autoritários e, em 1924, a fundação da Associação Brasileira de Educação (ABE) caracterizou-se

como uma reação dos liberais aos positivistas.

O Estatuto das universidades visava, dentre outras coisas, equilibrar os dois pólos de

disputas em torno da instituição da universidade de modo a não gerar uma ruptura brusca do

modelo institucional até então vigente (idem). Nesse contexto, Rothen (2008) destaca que embora

tenha havido mudanças a partir do Estatuto das universidades, a figura do professor catedrático

não foi extinta – o que por sua vez dificultou a criação de uma carreira acadêmica, além de manter

o ‘autoritarismo’ do professor catedrático. Nesse contexto, a autonomia universitária se dava de

maneira consentida, havendo dubiedade na forma de descrevê-la no próprio texto legal. A Reforma

Francisco Campos pretendeu conciliar a ideia de universidade centrada no desenvolvimento de

23 Decreto n. 19.850, de 11 de abril de 1931, que criou o Conselho Nacional de Educação; Decreto n. 19.851, de 11

de abril de 1931, que dispôs sobre a organização do ensino superior, instituindo o Estatuto das Universidades Brasileiras; Decreto n. 19.852, de 11 de abril de 1931, que dispôs sobre a organização da Universidade do Rio de Janeiro. Decreto n.19.890, de 18 de abril de 1931, que estruturou o ensino secundário; Decreto n. 20.158, de 30 de junho de 1931, que organizou o ensino comercial; Decreto n. 21.241, de 14 de abril de 1932, consolidando as

disposições sobre a estruturação do ensino secundário. Verbete organizado por ANDREOTTI, fonte: ROMANELLI,

O. História da educação no Brasil 1930-73. Petrópolis, Vozes, 1978; ARANHA, M.L.A. História da Educação. São Paulo, Moderna, 2002. RIBEIRO, M. L. História da Educação Brasileira. A Organização Escolar. Campinas, Autores Associados, 2003.

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alto padrão da cultura e formação profissional, portanto, houve mais uma justaposição de

diferentes cursos do que mesmo uma intergração.

Definiu-se, a partir do Estatuto das Universidades, que a universidade para ser

reconhecida como tal deveria ser caracterizada pela conjuminância de pelo menos três cursos.

Nessa ótica, Mendonça (2000) considera que a instituição da universidade, se deu a partir de um

caráter desarticulado, uma vez que as instituições criadas a partir de 1920 consistiam mais num

aglomerado de escolas isoladas do que propriamente universidades. No quadro abaixo, constam

algumas universidades criadas entre 1934 e 1946

Quadro 3: Universidades criadas entre 1934 e 1946

UNIVERSIDADES ANO DE CRIAÇÃO

Universidade de São Paulo 1934

Unversidade do Distrito Federal 1935

Universidade do Brasil 1937

PUC do Rio de Janeiro 1941

PUC de São Paulo 1946

Fonte: Saviani (2010). Elaboração da autora.

Segundo Saviani (2010) ao longo da década de 1940 e 1950 ocorreu o processo de

federalização do ensino superior brasileiro, que se estendeu pelas décadas de 1960 e 1970. No que

concerne às reconfigurações e à formação do campo universitário no Brasil, o outro aspecto

relevante foi a Reforma Universitária de 1968. Por meio da Lei Nº 5.540/68, a Reforma

Universitária foi aprovada, tendo sido reformulado, também, o ensino primário e secundário.

Saviani (2010) explica que estes níveis de ensino passaram a ser denominados de ‘ensino de

primeiro e segundo grau’. Por meio da Reforma de 1968, foi apontado o princípio da

indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão, que posteriormente, foi incorporado à

Constituição Federal de 1988. Nesse contexto da reforma, em especial, foi consagrada a autonomia

universitária, que associada ao tripé (ensino, pesquisa e extensão) se tornou referência para a

organização do sistema de ensino superior no país.

No âmbito da discussão sobre a Reforma Universitária de 1968, entram os modelos

clássicos de universidade (modelo napoleônico, modelo anglo-saxônico e modelo prussiano ou

humboldtiano). Saviani (2010, p. 10) considera que: “a origem desses modelos se assenta nos

elementos básicos contituivos das universidades contemporâneas: o Estado, a sociedade civil e a

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autonomia da comunidade interna à instituição.” Para o autor, no Brasil, desde o final do Império

até a Constituição de 1988, prevaleceu o modelo napoleônico, que é caracterizado pela forte

presença do Estado na organização e regulação do ensino superior (SAVIANI, 2010). Nos anos de

1980, começa a haver um deslocamento e uma alteração do modelo napoleônico, e esse momento

é carcaterizado pela distinção entre universidades de pesquisa e universidades de ensino. Para

Saviani (2010) este deslocamento e alteração ocorreram incialmente em 1986, por meio do Grupo

Executivo para Reformulação do Ensino Superior (GERES), desde então a distinção entre

universidade de pesquisa e universidade de ensino vem sendo inserida nos documentos sobre este

nível de ensino.

Acerca do Grupo Executivo para Reformulação do Ensino Superior (GERES), Cunha

(1997) afirma que a lógica da reforma empreendida em 1995/97 - configurada nas leis e decretos

concernentes ao ensino superior – é resultado da intensa atividade reformadora que caracterizou a

ação do MEC e que se antepôs à aprovação da Lei de Diretrizes e Bases Nº 9.394/96. Desta forma,

o autor destaca que a criação de leis, medidas e decretos, anteposta à aprovação da Lei, gerou

interpretações com predominância para a atribuição do impulso deste processo de reformas estar

alinhado com instituições como o Banco Mundial, por exemplo. A este respeito Cunha (1997, p.

22) assinala que uma das hipóteses para esta interpretação se deu em face de que:

[…] a presença de certas recomendações nos relatórios de agências internacionais

refletem o protagonismo de grupos internos, que visam valorizar suas propostas mediante

o endosso político, importante não apenas devido ao financiamento por elas detido, como,

também, devido ao valor simbólico que tais propostas possam ostentar, depois de

consagradas pelo agente externo.

Mediante o exposto, observa-se que, a instituição universitária é uma das formas que o

ensino superior assume historicamente (MENDONÇA, 2001), e embora tenha ocorrido

tardiamente no Brasil, esta é a forma predominante e elemento central em nosso sistema de ensino.

Assim, mesmo as instituições que não gozam do mesmo estatuto social e jurídico, alinham-se em

torno da instituição universitária. Cunha (2006, p.14) assinala que “[...] em certos países, a

universidade se confunde com o ensino superior, enquanto, em outros ela rivaliza com instituições

de outro tipo na outorga de diplomas e no desenvolvimento do saber legítimo”. O autor prossegue

destacando que há um núcleo comum às instituições universitárias, desde seu nascimento - que é

a luta pela difusão e desenvolvimento do saber. No caso brasileiro, pode-se inferir que a distinção

entre universidade e demais instituições com autorização para outorgar diplomas é significativa,

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tendo em vista os aspectos históricos de sua tardia implantação e a proliferação de instituições não-

universitárias.

Nesses termos, o ensino superior é a forma mais abrangente de classificação para um

conjunto de instituições, que concorrem entre si, ou se complementam com a finalidade de

produzir e transmitir conhecimento científico, como afirma Miranda (2008, p.21) a universidade

“[...] é uma instituição social que tem como finalidade a produção e transmissão do conhecimento

científico, a formação profissional e a educação de gerações [...]”. É possível lastrear a abordagem

acerca do campo universitário em diferentes autores, tais como Oliveira e Catani (2011), Oliveira

(2000; 2012), Miranda (2008), Hey (2008), Cunha (2006).

Nosso foco de interesse é, portanto, a instituição universitária, constituída como um campo

específico, a partir de aspectos históricos e sociológicos. Em face da grande complexificação do

sistema de ensino superior no país, da heterogeneidade das instituições, da diversidade de práticas

e do grande mercado de disputas simbólicas, que circunda esses espaços – optamos por analisar a

instituição universitária, que desde sua origem, tem por princípio a produção e difusão de

conhecimento, com relativa autonomia frente a outras instituições e com legitimidade para falar e

fazer. Além disto, é no campo universitário, que a produção da pesquisa científica se encontra

consolidada pois atualmente, o Brasil ocupa a 13ª posição de maior produtor de publicações de

pesquisa (papers) em nível mundial, tal como se pode identificar na figura abaixo24.

24 Figura retirada do Relatório da Clarivate Analytics disponibilizado à Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) o relatório “Research in Brazil”, com análise sucinta do desempenho da pesquisa brasileira, descrevendo as tendências recentes e identificando destaques. Fonte: http://www.capes.gov.br/sala-de-imprensa/noticias/8726-documento-disponibilizado-a-capes-apresenta-desempenho-e-tendencias-na-pesquisa-brasileira.

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Figura 1: Número de publicações de pesquisas (papers) em nível mundial de 2011 - 2016

Fonte: InCites – Clarivate Analytics Web of Science (2011-2016)

Nas informações contidas no Relatório da Clarivate Analytics ressaltamos que 20% da

produção nacional de pesquisa científica se concentram na Universidade de São Paulo. Além desta

instituição, no Relatório, vinte universidades públicas se destacam na produção científica

brasileira. Embora se possa problematizar aspectos, que se referem à produção histórica de uma

hegemonia em torno de certas instituições no país, os dados corroboram o entendimento de que a

produção científica se encontra consolidada em instituições públicas e universitárias. Vale

destacar que, sobre o aspecto da relevância, qualidade e quantidade de produção científica pairam

algumas questões, posto que o parâmetro referencial para se “mensurar” esses elementos, mesmo

com metodologia bibliométrica25 apresenta-se vantagens, mas também limitações. De acordo com

Souza, Filipo e Casado (2018, p. 8) as limitações se dão no sentido da

[…] inclinação temática, idiomática e a presença pouco representativa de países não

anglófonos […] Há também alguns limites de catalogação de periódicos… Alega-se que

25 “Os estudos bibliométricos constituem um conjunto de procedimentos que analisa o comportamento da informação registrada, por meio de indicadores que utilizam as quantificações, análises estatísticas e recursos tecnológicos, com o objetivo de analisar e avaliar a produção da informação nas diferentes áreas do conhecimento. Dentre os indicadores utilizados, destacam-se os de colaboração científica que tem sido definida como dois ou mais atores trabalhando em parceria, onde compartilham informação e conhecimento entre si”. (ALVES, 2013, p. 7).

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essas bases de dados representam essencialmente a ciência do primeiro mundo, publicada

em idioma inglês e em periódicos de alta reputação […].

Embora tenha se constituído tardiamente em nosso país e, haja um sistema estruturado de

ensino superior privado concorrente há mais de um século26 e a instituição universitária e sua

experiência no contexto brasileiro apresentam características e propriedades, que a nosso ver

configuram-se como próprias de um campo social, considerando-se as disposições historicamente

constituídas, que a colocam em posição de certo monopólio da produção da ciência , ou seja, o

grau de legitimidade adquirido lhe confere autoridade para determinar paradas em jogo – objetos

mais, ou menos, legítimos. Apesar do processo de diferenciação institucional respaldado a partir

da Lei de Diretrizes e Bases Nº 9.394/96, o campo universitário constitui-se como espaço

referencial para a produção científica. Além disto, o campo universitário constitui-se como

referência para todo o sistema de ensino superior do país, razão pela qual diferentes pesquisadores

defensores da diversificação e diferenciação, afeitos à privatização, ao longo das últimas duas

décadas, têm concentrado altos investimentos de seus capitais – cultural, científico, intelectual,

social – para implantar na política educacional o total desmonte do campo universitário nos moldes

como este se encontra, separando as instituições de ensino e as instituições de pesquisa.

A partir de diferentes meios de produção e circulação de seus produtos, o campo

universitário tem, em sua composição, a autonomia e legitimidade para sua produção de

conhecimento, encontra-se também estruturado por meio de diferentes grupos de pesquisa, que

visam a manutenção e conservação de diferentes áreas de estudo, estabelece correlação de forças

com agências financiadoras (CAPES, CNPq), possui associações específicas voltadas para a classe

profissional27, detém autonomia para a criação de mestrados e doutorados com base nos critérios

de classificação acordados entre agências financiadoras e agentes especializados para determinar

regras de funcionamento – com base na produção de seus atores principais (professores e alunos).

Como pano de fundo, esse campo que estamos denominando de campo universitário, ao mesmo

tempo em que goza de autonomia relativa, possui importante relação de dependência com o Estado,

fortalecendo-se assim - embora pareça contraditório - sua força simbólica na produção de valor e

na atribuição de sentido a determinados objetos sociais e culturais.

26 Sampaio (2014) destaca que a relação entre setor privado e o Estado é antiga e se estabeleceu há mais de um século no país, conferindo singularidade ao sistema de ensino superior brasileiro no contexto internacional. 27 A nível nacional os professores do ensino superior possuem uma Associação Nacional dos Docentes do Ensino Superior (ANDES), criada em 1981, transformada em Sindicato Nacional em 1988, passando e ser ANDES-SN.

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Assim, o campo universitário “[...] diz respeito ao aparato institucional assegurado pelo

Estado brasileiro que garante a produção, circulação (e mesmo o consumo) de bens simbólicos que

lhe são inerentes [...]” (HEY, 2009, p. 11). De acordo com a autora, este aparato envolve o conjunto

das instituições de educação superior, públicas E privadas, abrangendo seus variados níveis,

formato e natureza. Nesse sentido, o uso da noção de campo universitário, ou, como denomina

Hey (2009) “campo acadêmico” particulariza um universo específico de práticas, que possui

visibilidade em decorrência de sua consolidação, como lugar legitimado para produção do

conhecimento.

O uso da noção de campo ajuda-nos a perceber os espaços sociais como mercado de bens

simbólicos, “...que mesmo estando interconectado a uma ampla rede de interações e estruturas, um

campo social apresenta uma relativa autonomia.” (MIRANDA, 2008, p. 33).

Desse modo, conforme assinala Miranda (2008), a instituição universitária ocupa um

espaço social de disputas simbólicas pela capacidade de falar e agir, de maneira legítima e em

nome da ciência. Nessa mesma linha, Hey (2008) aponta que esse campo já se encontra

solidificado, uma vez que impõe padrões de produção e circulação de bens simbólicos, dotado de

força social global, que o autoriza a estudar tanto os objetos da ciência, como a si mesmo em suas

lógicas e mecanismos constituintes de funcionamento – caracterizados pelos jogos, que lhe são

inerentes. Assim, o campo universitário se constitui como “espaço de posições ligadas por relações

de força específicas, como campo de forças e campo de lutas para conservar ou transformar este

campo de forças” (BOURDIEU, 1989, p.52). Catani (2009, p.11) descreve o campo universitário

da seguinte forma:

O campo universitário diz respeito ao aparato institucional assegurado pelo

Estado brasileiro que garante a produção, circulação (e mesmo o consumo) de

bens simbólicos que lhes são inerentes, envolvendo o conjunto das instituições

de educação superior públicas e privadas, em seus mais variados níveis, formatos

e natureza

Oliveira (2011, p. 08) assinala que “[...] é a partir da década de 1980 que se pode falar mais

efetivamente de um espaço ou campo da educação superior ou universitário no Brasil, tendo por

base um Sistema amplo, heterogêneo e complexo de educação superior.” Nesses termos, Oliveira

e Catani (2011) com base em Dreze e Debelle (1983), observam que mediante as drásticas

modificações do ensino superior, a partir das últimas reformas, não é mais possível pensar em uma

concepção única de universidade. A partir de 1990, por meio do Decreto Nº 2.306, de 19 de agosto

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de 1997, foi regulamentado o sistema federal de ensino em alinhamento com a nova Lei de

Diretrizes e Bases Nº 9.394/96 (SAVIANI, 2010). Nesse novo alinhamento jurídico a classificação

acadêmica das instituições de ensino superior foi modificada e o modelo único implementado em

1968 começa a ser demonstado28. Para Oliveira (2000, p. 01):

O jogo concorrencial da diferenciação e da distinção institucional, ou melhor, da

ocupação de posições específicas e diferenciadas, contribui para desmontar o sistema

federal, tendo em vista que rompe, paulatinamente, com elementos centrais de

convergência, que asseguravam, pelo menos em tese, certo nível de solidariedade, como:

indissociabilidade ensino-pesquisa-extensão, gestão democrática, padrão unitário de

qualidade, carreira unificada e avaliação institucional.

A partir do desmonte do modelo único, o processo de diferenciação e diversificação

institucional abriu margens para uma espécie de expansão ‘sem controle’, posto que não há

nenhum tipo de planejamento para equalização e equilíbrio quanto ao número de instituições, que

podem pleitear a abertura de novos cursos e a oferta de cursos.

A diferenciação institucional é, portanto, um dos veículos político-jurídicos, que

asseguram a multiplicidade de instituições ofertando a educação superior, sem contudo, se

compromissarem ao desenvolvimento da pesquisa e da extensão, reduzindo-se, apenas, às

atividades de ensino. Nesse lastro, Sguissard (2006, p.1024) destaca que por meio de diferentes

dispositivos legais, a expansão da oferta pública do ensino superior tem sido restrita, enquanto há

uma “desenfreada expansão do setor privado no nível de graduação”29.

Sobre este aspecto, é oportuno explicar, que os termos como “desenfreada expansão” ou

“expansão desordenada” têm sido utilizados para caracterizar o crescimento da oferta de educação

28 A LDB 9.394/96, por meio do seu artigo 52, classifica as Universidades da seguinte maneira: “Art. 52. As universidades são instituições pluridisciplinares de formação dos quadros profissionais de nível superior, de pesquisa, de extensão e de domínio e cultivo do saber humano, que se caracterizam por: I – produção intelectual institucionalizada mediante o estudo sistemático dos temas e problemas mais relevantes, tanto do ponto de vista científico e cultural, quanto regional e nacional; II – um terço do corpo docente, pelo menos, com titulação acadêmica de mestrado ou doutorado; III – um terço do corpo docente em regime de tempo integral.” Quanto à diversificação institucional, consta o seguinte: Art. 8º Quanto à sua organização acadêmica, as instituições de ensino superior do Sistema Federal de Ensino classificam-se em: I – universidades; II – centros universitários; III – faculdades integradas; IV – faculdades; V – institutos superiores ou escolas superiores. Art. 9º As universidades, na forma do disposto no art. 207 da Constituição Federal, caracterizam-se pela indissociabilidade das atividades de ensino, de pesquisa e de extensão, atendendo ainda ao disposto no art. 52 da Lei no 9.394, de 1996. Sobre o regime de trabalho: Art. 10. Para os fins do inciso III do art. 52 da Lei no 9.394, de 1996, entende-se por regime de trabalho em tempo integral aquele com obrigação de prestar quarenta horas semanais de trabalho, na mesma instituição, nele reservado o tempo de pelo menos vinte horas semanais destinado a estudos, pesquisa, trabalhos de extensão, planejamento e avaliação.

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superior privada no país, contudo, os termos não se restringem simplesmente à forma como esta

expansão vem ocorrendo, mas dizem também respeito ao conteúdo regulatório, que do ponto de

vista da política educacional é “permissivo”, não havendo regulamentação acerca do controle deste

crescimento30. Por esta razão, tem-se visto uma concentração desta oferta sob a responsabilidade

de alguns conglomerados, dentre os quais se destacam, por exemplo, a Kroton – integrada a outros

grandes grupos que oferecem serviços educacionais não apenas para o ensino superior, mas

cobrem também uma parte do ensino básico no Brasil31.

No que tange à regulamentação oriunda da legislação educacional específica, as formas de

“controle” sobre a expansão do ensino superior privado têm sido cada vez mais flexibilizadas, não

havendo limite para este crescimento. No transcurso de 1997 até o ano de 2017 surgiram várias

modificações, quanto à regulamentação do sistema de ensino superior. O Decreto Nº 2.306/97 que

regulamentava o sistema federal de ensino, foi revogado pelo Decreto Nº 3.860/2002,

posteriormente revogado pelo Decreto Nº 5. 773/2006 – que dispunha sobre o exercício das

funções de regulação, supervisão e avaliação de instituições de educação superior e cursos

superiores de graduação e sequenciais no sistema federal.

Este Decreto do ano de 2006 foi revogado pelo Decreto Nº 9.235/201732 – estabelece a

coexistência de instituições públicas e privadas na oferta de ensino de pós-graduação. No texto

deste Decreto, há menção ao Decreto n 9.057 de 2017 que regulamenta o Artigo 80 da LDB Nº

9.394/96 e estabelece que a educação básica e educação superior poderão ser ofertadas na

modalidade à distância. Neste mesmo Decreto, o polo de educação à distância deixa de ser a

unidade acadêmica e operacional descentralizada para ser apenas a unidade descentralizada da

instituição de educação superior, cuja oferta poderá ser no país ou em outros países. O conteúdo

destes Decretos altera substancialmente os papéis atribuídos às universidades, “desmontando” o

conjunto de dispositivos exarados na própria LDB Nº 9.394/96.

30 Credenciamento/recredenciamento são os passos necessários para as instituições privadas. O Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior (SINAES), por meio de solicitação da devida instituição avalia e autoriza ou não o recredenciamento da instituição. Ver: Decreto n° 5.773, de 9 de maio de 2006. 31 O Grupo Somos destaca que a Educação Básica é um espaço mais rentável para os negócios e arguenta que a regulação para este nível de ensino é menor do que no ensino superior. 32 Este Decreto revoga os seguintes Decretos: Decreto nº 5.773, de 09 de maio de 2006; Decreto nº 6.303, de 12 de janeiro de 2007; Decreto nº 8.142, de 21 de novembro de 2013; Decreto nº 8.754, de 10 de maio de 2016 e Decreto nº 6.861, de 27 de maio de 2009. Fonte: http://abmes.org.br/legislacoes/detalhe/2289/decreto-n-9.235

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Assim, o crescimento é “desenfreado” e “desordenado” no sentido de sua regulação por

parte do Estado e frente às instituições universitárias, que vêm tendo reduzido o seu financimaneto

e redefinidos os seus papéis. No âmbito da lógica específica de funcionamento do ensino superior

privado, este setor se encontra fortemente organizado, pois conta com agências específicas de

análise de mercado e acessoria, como a Associação Brasileira de Mantenedoras do Ensino Superior

(ABMES), Consultoria Educacional Hoper, dentre outras. A regulamentação quanto ao

crescimento sem limites ocorre por parte do Conselho Administrativo de Defesa Econômica

(CADE) – que, por sua vez, regulamenta e fiscaliza os Atos de Concentração. Tal terminologia se

refere ao conjunto de aspectos econômicos e concorrenciais que envolvem instituições de ensino

privado que, a partir da década de 1990 passaram por expressivo movimento de fusões e

aquisições.

No ano de 2016, o Grupo Kroton Educacional S/A entrou com ação junto ao Conselho

Administrativo de Defesa Econômica (CADE) com a finalidade de aquisição e controle do Grupo

Estácio Participações S/A, contudo, na expedição do voto da relatora33 o pedido foi negado tendo

em vista a sobreposição horizontal e vertical do Grupo sobre os demais, havendo uma concentração

de mercado, sendo considerada uma operação complexa que poderia incidir em abuso de poder.

Os termos do Relatório Final, revelam uma preocupação com o mercado de players de educação

privada e os prejuízos concorrenciais, que a aquisição poderia constituir, também, prejuízos aos

consumidores, sendo indicada a “necessidade de remédios estruturais e de remédios

comportamentais” (SCHMIDT, 2017). Além disto, o Relatório que reprovou a fusão dos dois

grupos afirma que esse tipo de concentração de mercado tem induzido processos de

homogeneização, estabelecendo um cenário de McDonalds ou Blockbusters de conteúdo

educacional.

No âmbito da reflexão sobre o não limite para o crescimento mercadorizado do ensino se

pode fazer referência à uma entrevista com as pesquisadoras Helena Sampaio e Elizabeth

Balbachevsky, no Programa da UNIVESP TV34, veiculado no youtube, onde as pesquisadoras

33 Ato de Concentração 08700.006185/2016-56, Relatoria da Conselheira Cristiane Alkmin Junqueira Schmidt e Voto-vogal do Conselheiro Gilvandro Vasconcelos Coelho de Araújo. Sugerimos leitura do documento: “Concentração do ensino superior privado – Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade), RDA – Revista de Direito Administrativo (2017). 34Entrevista publicada no youtube, pelo site da UNIVESP, em 27 de setembro de 2013. Link: https://www.youtube.com/watch?v=ZxbZWxD_KZs&t=713s. Nesta entrevista as professoras pesquisadoras

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explicam que o crescimento da oferta de ensino privado por meio do financiamento (FIES) é

ilimitado, infinito, posto que não há restrição quanto a esta oferta35. Em outra entrevista concedida

ao Programa da UNIVESP TV36, as pesquisadoras destacam que há uma “fantasia” de que todo o

ensino superior precisa fazer pesquisa e, também há uma “fantasia” de que qualquer curso precisa

de uma quantidade X de mestres e doutores. O tom que se pode captar das entrevistadas, a partir

de como se colocam (textualmente e gestualmente) é de que é necessário separar as instituições,

diferenciá-las, sobretudo, realizando uma distinção entre as instituições de alta pesquisa e as

isntituições de ensino (massificadas e profissionalizantes).

Neste ponto, é oportuno observar que a diversificação institucional repercute sobre a

estrutura do ensino superior no Brasil, forjando uma separação entre universidade de ensino e

universidade de pesquisa. A separação entre universidade de ensino e universidade de pesquisa

não se restringe à mera questão de quem pode ou, deve produzir pesquisa, mas traz implicações

quanto aos contratos de trabalho, pois, nas universidade privadas, o contrato de trabalho por hora-

aula difere do contrato de trabalho de 40 horas com dedicação exclusiva como ocorre nas

universidades públicas, o custo-aluno é menor, além da flexibilização dos contratos de trabalho

dos profissionais da área da educação37. Além disto, nas instituições privadas não é necessário

desenvolver pesquisa e extensão, pois apenas o ensino se constitui como dimensão necessária para

formação discente.

Nessa perspectiva, a pesquisadora Eunice Ribeiro Durham, na ocasião em que recebeu o

título de Professora Emérita da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da

Universidade de São Paulo (USP) destacou o seguinte:

A verdade é que, se é impossível manter instituições nas quais se ministra ensino de boa

qualidade, sem que os alunos se familiarizem com a prática da investigação, é

perfeitamente possível fazê-lo sem os custos de manutenção da pesquisa básica ou

explicam que o sistema público gratuito de ensino superior está se tornando uma “anomalia”, uma espécie de “jabuticaba.” 35 Chizzote (2014) também destaca que nas falas de empresários do ramo de educação superior privada o “céu é o

limite”, posto que este é um setor em franco crescimento e prosperidade mercadológica no Brasil. 36 Entrevista em 16 de janeiro de 2015. Fonte: https://www.youtube.com/watch?v=BZGHosLIGqQ. 37 O estudo realizado por Calderón & Lourenço (2009) destaca que, no contexto do Ensino superior privado, tem sido adotado o modelo de terceirização da mão-de-obra docente. É predominante a figura do professor horista, ou professor contratado por meio de cooperativa, refletindo uma lógica de precarização do trabalho e da carreira docente. Esta política de natureza gerencialista tem por base a redução de custos com encargos trabalhistas, configurando um mercado de trabalho instável e precarizado para os profissionais da educação superior.

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tecnológica de ponta e sem que a maioria dos quadros docentes trabalhe em tempo integral

(DURHAM, 2002, p. 10).

A questão do financiamento encontra-se na base deste posicionamento, atrelada à ideia

de que é necessário tornar mais eficiente a avaliação de desempenho acadêmico, na busca pela

racionalização da aplicação dos recursos públicos. A ideia de fragmentar o ensino, pesquisa e

extensão repercute diretamente no financiamento, mas não apenas, serve como argumento para

flexibilização de contratos de trabalho, visa alterar o papel das universidades e mantém a pesquisa

no patamar de distinção, tornando-se restrita aos grupos “autorizados” e melhor posicionados nas

disputas. Sobre este aspecto, Oliveira e Catani (2011, p.19) consideram que:

As instituições com maior capital acumulado – intelectual, científico, político e

social – tendem a assumir posição dominante, constituindo-se como

universidades de pesquisa/inovação ou centros de excelência, enquanto as

instituições dominadas ou pretendentes adotam estratégias de sobrevivência e de

alteração de sua condição no espaço do campo.

A indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão encontra-se ancorada em dois

conceitos fundamentais, tais como: qualidade socialmente referenciada e autonomia

universitária, que constituem preceitos fundamentais para o desenvolvimento da universidade no

Brasil.

No bojo desta reconfiguração do ensino superior, o processo de expansão deste nível de

ensino vem se dando configurado por meio da massificação38, no caso da presença marcante da

oferta de educação privada, que se encontra orientada por políticas externas em conexão com o

conjunto de políticas educacionais, que a partir de 1990, instituíram sua abertura jurídica.

No que concerne às orientações externas advindas de organismos multilaterais, Dourado

(2002) ressalta a atuação do Banco Mundial, na Agenda Educacional Brasileira, na qual as

orientações se dão no sentido do binômio privatização e mercantilização da educação. Assim, a

inserção das lógicas do campo econômico vem ocorrendo sobre o campo da educação por meio de

vias jurídicas. Outrossim, vale observar que a presença da inciativa privada na oferta de ensino

superior data desde 189139, pois àquela época este tipo de oferta de ensino já era concorrente das

39 Barreyro (2008) afirma que em 1776 foi criada uma faculdade no Seminário dos franciscanos no Rio de Janeiro e em 1798 outra faculdade foi criada no Seminário de Olinda. A autora afirma que em 1890 havia 2.300 alunos em instituições privadas de ensino superior. Para aprofundamento ver: “Mapa do Ensino Superior privado”, Barreyro (2008).

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ordens religiosas, que conduziam o ensino superior no Brasil. No contexto das reformas iniciadas

a partir de 1995, a privatização no âmbito do ensino superior configura-se como um dado concreto.

Corbucci, Kubota e Meira (2016) assinalam que a participação do setor privado na oferta de

educação superior constitui uma tendência global, em face da internacionalização do capital e do

ingresso de grupos empresariais nos sistemas nacionais, mediante a oferta de ações em bolsas de

valores.

A colaboração do Brasil na Fundação da Organização Mundial40 do Comércio (OMC) e

adesão às suas regras constitui um marco no processo de reconfiguração do campo universitário,

porque a partir desta adesão, o processo de fusões e de aquisições de grupos empresariais de

educação privada passa a ocorrer de maneira expressiva. Nos anos 2000 de acordo com Corbucci,

Kubota e Meira (2016) a feição empresarial deste setor passou a ser fortalecida. Nesse sentido, o

ano de 2005 aparece como marco central das fusões de grupos privados de educação, de modo

que,

Nesse ano, parte majoritária das ações da Universidade Anhembi-Morumbi foi

adquirida pelo grupo americano Laureate. Estudo da CM Consultoria (2014),

referente ao período 2007-2014, mostra que, no primeiro ano desse período, houve

a compra por parte da Anhanguera do capital total da Unibero, assim como o

ingresso no mercado brasileiro do fundo de investimento americano Advent, que

adquiriu 50% das ações da rede Kroton. Esta, por sua vez, fundiu-se à rede Iuni

Educacional, considerada, no referido estudo, como empresa líder na área de

educação no Centro-Oeste brasileiro (CORBUCCI; KUBOTA. MEIRA, 2016, p.

15).

Os autores Corbucci, Kubota e Meira (2016) consideram que houve reconfiguração

estrutural do setor privado de educação superior a partir de 2005, em face da reconcentração deste

tipo de oferta, por parte de grandes grupos empresariais. Nessa mesma linha de raciocínio, os

autores consideram que a partir do ano de 2015, houve um redesenho do setor tendo em vista

reformulações quanto ao Fundo de Finaciamento Estudantil (Fies). As reformulações em torno do

Fundo de Financiamento Estudantil (Fies) se deram no sentido de coibir o aumento abusivo das

mensalidades praticados por instituições de ensino, tendo sido estabelecidos contratos por

instituição de ensino e, também, outros critérios foram traçados neste período41. Nos termos a que

a privatização vem ocorrendo no Brasil, a rentabilidade das empresas de ensino privado brasileiras

de acordo com Corbucci, Kubota e Meira (2016) é superior a das congêneres, que atuam nos

40 Ver: Thortensen, Ramos, Nogueira e Gianesella (2013). 41 Ver: Corbucci, Kubota e Meira (2016).

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Estados Unidos, no Japão e Coreia do Sul, o que torna este mercado altamente atrativo para os

investidores estrangeiros.

Nosso esforço por demonstrar a presença expressiva da iniciativa privada na oferta de

ensino superior se dá no sentido de evidenciar que há uma redefinição do papel e da organização

das instituições de ensino superior, portanto, as instituições universitárias se encontram

condicionadas às regulações e orientações emanadas da política educacional, que a partir de 1990

passam por uma reengenharia, que envolve a reforma do Estado. O processo de diversificação e

diferenciação, não se resume à oferta de ensino superior privado, pois está circunscrito à expansão,

caracterizada pelo processo de massificação do ensino superior e os rumos que vêm sendo dados

a este processo no Brasil.

Nesses termos, vale observar que as regulações, que recaem sobre as universidades vêm

se dando enfaticamente em paralelo com a reforma do Estado, operacionalizada a partir de 1995

com a publicação do Plano Diretor da Reforma do Aparelho do Estado - documento que coloca a

educação, cultura, saúde e pesquisa no setor de serviços não-exclusivos do Estado - deixando o

Estado de ser executor e passando a ser regulador e promotor de serviços42. Chizzote (2014, p.

899) afirma que desde, que entrou em vigor o Acordo Geral de Comércio de Serviços (AGCS), no

ano de 1995,

[…] deu suporte jurídico internacional para tornar a educação um serviço similar aos

demais serviços comerciais. Os serviços da educação tornaram-se uma commodity,

sujeitos às leis do mercado, atraindo capitais, novos agentes educacionais e grandes

conglomerados financeiros, e tendem a pôr fim ao modelo tradicional de universidade do

século XX.

Este processo de reconfiguração indica a redefinição de aspectos, que envolvem o

financiamento das instituições, perpassa a questão da autonomia, envolve as concepções e os

modelos de universidade. Nesta pesquisa enfocamos o campo universitário, que se caracteriza

pelas instituições universitárias, reconhecidamente aquelas, que desenvolvem ensino, pesquisa e

extensão, e além disto, são responsáveis pela produção da ciência no país, constituindo atualmente

90% desta produção, sendo estas instituições públicas.

O campo da educação superior constitui-se como o conjunto de instituições de ensino

superior que, não necessariamente, produz ciência, no sentido de sua viculação obrigatória com a

42 Ver: Plano Diretor da Reforma do Aparelho do Estado (1995).

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pesquisa. Com base nisto, vale destacar a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional Nº

9.394/96 que, no seu texto e em seus dispositivos fazem referência às instituições universitárias e

não-universitárias, como é o caso, por exemplo, do Art. 48, tal como se encontra abaixo descrito:

Art. 48. Os diplomas de cursos superiores reconhecidos, quando registrados, terão

validade nacional como prova da formação recebida por seu titular. § 1º Os diplomas

expedidos pelas universidades serão por elas próprias registrados, e aqueles conferidos

por instituições não-universitárias serão registrados em universidades indicadas pelo

Conselho Nacional de Educação. (LDB 9. 9394/96, p. 22 – destaque nosso).

É oportuno observar que, não somente os impositivos externos propiciam o incremento

da expansão nos moldes privatistas, mas, também a adesão por parte de pesquisadores brasileiros

ao pensamento de que a universidade de ensino, pesquisa e extensão não é uma necessidade para

todo o conjunto de instituições do país - mesmo as públicas.

Desta forma, a aproximação das reformas do ensino superior brasileiro com as orientações

dos organismos transnacionais podem ser pensadas, não somente pelo viés da ação do Estado sob

o jugo da economia em abstrato e, sobretudo, percebidas a partir do entendimento do conceito de

‘estratégia internacional’, que de acordo com Dezalay e Garth (2000, p. 164) “[...] se refere à forma

pela qual os indivíduos usam capital internacional – títulos universitários, conhecimento técnico,

contatos, recursos, prestígio e legitimidade obtida no exterior – para construir suas carreiras em

seus países natais”. Por meio de estratégias internacionais, a importação e exportação de ideias,

abordagens e instituições têm configurado o processo de dolarização do conhecimento. Na base

das transformações institucionais, há um paralelismo estrutural entre países exportadores e

importadores, por esta razão sua interação é fundamental.

No bojo deste paralelismo estrutural, por exemplo, é possível identificar um movimento de

regulação transnacional no campo do ensino superior, Ferreira (2011) destaca a reestruturação das

universidades européias, com especial atenção ao Processo de Bolonha, no qual a autora identifica

semelhanças com a reforma universitária no Brasil a partir de 1990. Nos dois casos, a autora

observa que os diagnósticos sobre a ineficiência das instituições tendem a ser semelhantes, o que

justifica as reformas como forma de atribuir novos papeis a este nível de ensino. No caso dos

diagnósticos em torno da “ineficência” das instituições de ensino superior, Cunha (1997) cita o

Relatório do Banco Mundial em 1991 intitulado “Higher Education Reform in Brasil” de 1991,

que foi elaborado no contexto anterior à formulação da Nº LDB 9.394/96, durante o transcurso das

discussões, que culminaram com a aprovação da Lei, ocasião em que a avaliação institucional

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ganhou bastante força, com ênfase na questão da produtividade acadêmica. Em meados dos anos

de 1980 houve um “vazamento” de informações na mídia, de uma lista de nomes dos “professores

improdutivos” na Universidade de São Paulo (USP) – vazamento que gerou polêmicas à época e

que reforçou a argumentação de grupos que defendiam um tipo de avaliação baseado na

produtividade acadêmica.

No caso brasileiro, para se compreender as mudanças pelas quais o ensino superior vem

passando, é necessário ter em vista a estrutura social do país, os modos como este nível de ensino

aqui se firmou, as variantes de sua consolidação, como um campo e, também a participação de

diferentes grupos na construção das identidades disputadas e negociadas sobre o que e a quem este

nível de ensino deve atender. Desta maneira, em face às reformas do Estado, Franco e Morosini

(2016) destacam que, a partir da década de 1990, há novas ‘arquiteturas acadêmicas’ que vão sendo

constituídas como resposta às diferentes questões específicas, que quais o ensino superior

brasileiro é chamado a responder.

As autoras supramencionadas explicam, que, no contexto europeu, o termo “arquitetura”

diz respeito às finalidades e princípios produzidos com ênfase no desenvolvimento cultural,

científico e técnico (FRANCO; MOROSINI, 2016). À guisa de maior esclarecimento sobre o uso

do termo, mencionam a Declaração de Sorbone (1998) e a Declaração de Bolonha (1999) como

representativas da busca pela harmonização do sistema europeu da Educação Superior. Portanto,

o uso do termo arquitetura, no contexto brasileiro se dá em torno na organização acadêmica, que,

na visão das autoras, vem ocorrendo por meio de atos normativos e regulatórios.

Rothen e Silva (2014) entendem as demandas atribuídas à educação superior como

mediadas por um complexo categorial relacionado intimamente ao mundo produtivo, ao mesmo

tempo “um sistema simbólico que cria distinções e estabelece, num só golpe, hierarquias e

legitimações” (p.08). Os autores enxergam uma homologia entre o campo político e econômico

em relação ao campo acadêmico, Sguissard (2006) considera que a reforma universitária no Brasil,

sofre influência direta da Comunidade Econômica Européia (CEE), a partir da Declaração de

Bolonha (1999).

Nesse sentido, os autores citam diferentes eixos para a análise do campo científico e

consideram a pós-graduação como “eixo radiador das reconfigurações das práticas universitárias”.

Na mesma perspectiva, Franco e Morosini (idem) visualizam a expansão da educação superior nas

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últimas décadas como sendo marcada por regulações importadas da economia. As mudanças

encetadas na estrutura do ensino superior vêm sendo realizadas em diferentes países,

impulsionadas por políticas internacionais de acompanhamento e monitoramento43 voltadas para

este nível de ensino. Sobre este aspecto Oliveira e Catani (2011, p.20) sublinham que:

O condicionamento e a subordinação do campo universitário implicam certamente em

maior comprometimento com a sociedade de mercado, com o campo econômico e, por

isso, tende cada vez mais à reprodução do próprio espaço social, deixando em segundo

plano a ruptura e a transformação social. Assim, o campo universitário parece tornar-se

mais ajustado e conservador, uma vez que instaura, também, certa cultura e práticas

organizacionais, que naturaliza, eterniza, consagra e legitima a ordem vigente (...).

O ensino superior parece estar no coração das sociedades modernas, constituindo-se como

ponte estratégica para o desenvolvimento social. Nesse sentido, o Brasil vem instituindo algumas

tendências pronunciadas de reestruturação do ensino superior, que tiveram início no governo de

Fernando Henrique Cardoso (1995-2002) e significativa implementação a partir dos últimos

governos de Luíz Inácio Lula da Silva (2003 - 2010) e Dilma Rousseff (2011 – 2015).

É possível afirmar, portanto, que há linhas de forças principais, atuantes no campo

universitário a partir da reforma do Estado44, que foram impulsionadas a partir de 1990 em nível

macrossocial. Essas linhas de força expressam um conjunto de homologias entre o campo

econômico e político em sua relação de violência simbólica sobre o campo universitário. Desta

forma, com base em Bourdieu, Wacquant (2012, p. 512) observa que: “

[...] o Estado contemporâneo é atravessado por duas batalhas internas e homólogas aos

conflitos que perturbam obliquamente o conjunto do espaço social: a batalha vertical

(entre dominantes e dominados), que opõe a “alta nobreza do Estado” dos formuladores

de política entusiastas das noções neoliberais, que querem fomentar a “mercatização”, à

“baixa nobreza estatal” dos executores, que defendem as missões protetoras da burocracia

pública e a batalha horizontal (entre as duas modalidades de capital, a econômica e a

cultural, competindo pela supremacia interna), que envolve a “mão direita” do Estado, a

ala econômica, que pretende impor restrições fiscais e a disciplina de mercado, e a “mão

43 A reforma do Estado vem se caracterizando por meio de diferentes frentes, no caso do ensino superior, especificamente nos países em desenvolvimento, têm sido produzidos um conjunto de materiais, cartilhas e orientações oriundas de Conferências nacionais e internacionais, onde agentes legitimados pelas instâncias do Estado são autorizados a participarem. Dentre esses materiais e eventos destaca-se: Higher education: the lessons of experience (1994), documento organizado pelo Banco Mundial. Conferência Mundial sobre o Ensino Superior, Paris (1998); Conferência Mundial de Educação Superior Paris +5 (2003); Seminário Internacional Universidade XX, Brasília (2003); Seminário “Por que e como reformar a Universidade?” (2003).

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esquerda” do Estado, a ala social, que protege e apoia as categorias destituídas de capital

conômico e cultural.”

Wacquant (2012) defende a tese de que o neoliberalismo implica uma propensão para a

direita do campo burocrático engendrando um Estado-centauro. O Estado centauro apresenta duas

faces,

[...] é edificante e ‘libertador’ no topo, onde atua para alavancar os recursos e expandir as

opções de vida dos detentores de capital econômico e cultural; mas é penalizador e

restritivo na base, quando se trata de administrar as populações desestabilizadas pelo

aprofundamento da desigualdade e pela difusão da insegurança do trabalho e da

inquietação étnica. O neoliberalismo realmente existente exalta o “laissez faire et laisez

passer” para os dominantes, mas se mostra paternalista e intruso para com os subalternos,

especialmente para com o precariado urbano, cujos parâmetros de vida ele restringe

através da malha combinada de workfare fiscalizador e da supervisão judicial”

(WACQUANT, 2012, p.512)

A ideia de Estado, no contexto das metamorfoses por quais o ensino superior vem

passando, não pode ser atrelada ao Estado em sentido abstrato, embora seja comum atribuir-se ao

Estado verbos de ação como se houvesse uma entidade metafísica que age animada por vontades

próprias. Sobre este aspecto Wacquant (2012, p. 511-512) afirma que:

“[...] o Estado” não é um monólito, um ator coerente (opere ele autonomamente ou como

um servo diligente dos dominantes), nem uma alavanca única, sujeita a ser capturada por

interesses específicos ou movimentos emergentes da sociedade civil. Pelo contrário, ele

é um espaço de forças e de lutas sobre o contorno, as prerrogativas e as prioridades da

autoridade pública, e, em particular, sobre os “problemas sociais” que merecem sua

atenção e como devem ser tratados.

Dezalay e Garth (2000) utilizam o conceito de “guerras palacianas” para explicar que as

lutas em torno do Estado neoliberal não se dão apenas pela disputa em torno do controle do Estado,

mas se dão também em relação aos valores dos indivíduos e dos conhecimentos que dão forma ao

Estado. Ao analisar a história da transformação do Estado na América Latina e nos Estados Unidos,

a partir de 1960 até os anos 2000, os autores consideram que:

A pesquisa descobriu que, de 1960 até hoje, as guerras palacianas do Sul são cada vez

mais desenvolvidas em termos de estratégias internacionais. Uma conclusão provisória

da investigação é que, na verdade, os Estados estão crescentemente inseridos em um

Mercado internacional de conhecimento técnico centrado no circuito internacional

universitário dos Estados Unidos e instituições correlatas (DEZALAY & GARTH, 2000,

p. 164).

Desta forma, com base na teoria dos campos, observa-se que as reconfigurações do

campo universitário se dão em relação a um paralelismo estrutural entre países exportadores e

importadores de conhecimento técnico profissional em nível transnacional. Por meio desse fluxo

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de trocas internacionais, as reformas institucionais são garantidas, posto que “exportações

simbólicas tendem a ser mais bem-sucedidas quando há homologias estruturais entre o Sul e o

Norte” (DEZALAY & GARTH, 2000, p. 165). No contexto da reengenharia do Estado e da

consequente reconfiguração do campo universitário brasileiro a expansão e a privatização são

norteadoras deste processo. Desta forma, apresentamos a seguir um quadro no qual elencamos

principais marcos regulatórios que estão na base da reconfiguração do campo:

Quadro 4: Principais marcos regulatórios das reconfigurações do campo universitário nacional PRINCIPAIS MARCOS REGULATÓRIOS DAS RECONFIGURAÇÕES DO CAMPO UNIVERSITÁRIO

NACIONAL a partir de 1990

Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional - LDB 9.394/96, promulgada sob a égide da

Constituição Federal de 1988 que trazia nos dispositivos sobre a educação elementos como a gratuidade

do ensino público em todos os níveis, indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão, gestão

democrática, autonomia das universidades.

Na LDB 9.394/96 foram incorporados vários dispositivos referentes à educação superior, havendo uma

reforma “por dentro” da educação superior.

Decreto nº 2.306/97 - regulamentado o sistema federal de ensino em alinhamento com a nova Lei de

Diretrizes e Bases 9.394/96. Este Decreto foi revogado pelo Decreto Nº 3.860/2002, que também foi

revogado pelo Decreto Nº 5.773/2006, revogado pelo Decreto Nº 9.235/2017 e, revogado pelo Decreto

Nº 9.057/2017.

Plano Nacional de Educação (PNE, 2001). O Plano Nacional de Educação é uma prerrogativa legal

desde a Constituição de 1934, contudo só foi implementado a partir de 2001. Tem vigência de dez anos

e é composto por 20 Metas, foi atualizado pela Lei nº 13.005/14.

Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior (SINAES) – Lei Nº 10.861, de 14 de abril de

2004. O sistema nacional de avaliação foi precedido por diferentes estratégias de avaliação que ficaram

notabilizadas a partir de 1990. Em 1994, surgiu o PAIUB que foi um Programa construído pelas IES

visando desenvolver a avaliação institucional. Em 1996, foi iniciado o Provão associado a outros

mecanismos de avaliação, contudo, não atendia aos objetivos efetivos da avaliação.

Internacionalização e ações afirmativas a partir de 2000 e reforçado a partir de 2006 – incentivo

para mobilidade entre alunos brasileiros e estrangeiros em países que têm acordo nos Programas, tais

como: Programa de Estudantes Convênio de Graduação (PEC-G), Programa de Licenciatura

Internacional (PLI).

Programa de Apoio a Planos de Reestruturação e Expansão das Universidades Federais – REUNI instituído a partir do Decreto nº 6.096, de 24 de abril de 2007, também vinculado ao Plano de

Desenvolvimento da Educação (PDE, 2007).

Programa de Assistência ao Estudante de Ensino Superior (PNAES) – Decreto 7243/10, prevê

assistência estudantil (moradia, alimentação, inclusão digital, saúde, esporte, creche e apoio pedagógico).

Programa Universidade para Todos – PROUNI regulamentado pela Lei nº 11.096/2005, política de

concessão de bolsas (integrais/parciais) para alunos de baixa renda para estudos em instituições de ensino

superior privadas. As instituições que aderem recebem isenção do pagamento de tributos.

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Fundo de Financiamento Estudantil - FIES criado pela MP nº 1.827, de 27/05/99 e regulamentado

pelas Portarias MEC nº 860, de 27/05/99 e 1.386/99, de 15/19/99 e a Resolução CMN 2647, de 22/09/99.

O banco Caixa Econômica Federal é administrador e agente operador deste Fundo.

Sistema de Seleção Unificada (SISU) – instituído por meio da Portaria Normativa MEC nº 021/2012.

Seleção de estudantes para vagas disponibilizadas por instituições que aderiram ao Sistema. O ingresso

se dá com base nos resultados obtidos no ENEM.

Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM) foi criado em 1998. Regulamentado a partir de dispositivos

contidos na LDB 9.394/96.

Por meio dos resultados obtidos neste exame os candidatos podem concorrer a vagas, tanto nas

instituições públicas, como podem concorrer a bolsas de estudo em instituições de ensino superior

privadas.

Programas especiais voltados para a expansão do ensino de graduação – PROCAMPO,

PROLIND, PARFOR.

Sistema Nacional de Pós-Graduação (SNPG) – regula as atividades da Pós-Graduação, sob

coordenação da CAPES.

Plano Nacional de Pós-Graduação (2011 – 2020); Programa de Apoio à Pós-Graduação (PROAP);

Programa de Excelência Acadêmica (PROEX).

Universidade Aberta do Brasil (UAB) – criada em 2005, a UAB é um sistema integrado por

universidades públicas que oferece cursos por meio de metodologia à distância. Foi ampliado

especialmente a partir de 2009.

Reforma da Educação Profissional – iniciada em 1997, regulamentada pelo Decreto nº 2.208/97,

Medida Povisória nº 1.549/97 e Portaria nº 646/97.

Em 2005 foi anunciado o Plano de Reestruturação Profissional e Tecnológica.

Criação dos Institutos Federais de Educação Ciência e Tecnologia por meio da Lei nº 11.892 de 29 de

dezembro de 2008. Fonte: Dourado (2002); Azevedo (2016); Pacheco, Pereira e Domingos Sobrinho (2010); Polidori; Marinho-Araújo,

Barreyro (2006). Elaboração da autora.

Mediante o quadro regulatório, que reconfigura os papeis das instituições de ensino

superior, destacamos alguns dados relevantes do atual cenário do campo universitário, com base

no Censo da Educação Superior do ano de 2017:

No Brasil, há 296 instituições de educação superior públicas. Destas,

41,9% são Estaduais, o que equivale em números absolutos a 124 instituições;

36,8% são Federais, o que equivale em números absolutos a 109 instituições;

21,3% são Municipais, o que equilave em números absolutos a 63 instituições;

92% dos cursos de graduação nas universidades são presenciais.

No âmbito privado, há 2.152 instituições. Destas,

87,3% são faculdades,

87,9% das instituições de educação superior no país são privadas.

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Ao todo, são 2.448 instituições de Educação Superior no Brasil.

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CAPÍTULO II

CAMINHOS DA PESQUISA

Neste capítulo, apresentamos os caminhos da pesquisa evidenciando os procedimentos por nós

realizados ao longo da investigação. Em seguida, apresentamos uma caracterização da

Universidade Estadual do Ceará (UECE), situando-a como um campo, e estabelecemos algumas

analogias entre a estrutura interna da instituição e as reconfigurações campo universitário. Em

sequência, apresentamos um breve panorama sobre a Faculdade de Filosofia Dom Aureliano

Matos – FAFIDAM, explicitando sua estrutura, aspectos do seu funcionamento, e adentramos em

uma descrição sobre os espaços, que servirão de ponto de partida para as análises.

2.1 A OBJETIVAÇÃO PARTICIPANTE

Antes de adentrarmos às especificidades de como realizamos as entrevistas e as ações da

pesquisa, na coleta específica dos dados junto aos sujeitos, é oportuno destacar alguns dos

princípios que nortearam a caminhada. Neste sentido, é necessário considerar que pensar o mundo

social é sempre um desafio, pois a força do pré-construído está inscrita tanto nas coisas e nos

cérebros (BOURDIEU, 1989). Romper com a aparência das evidências, ou seja, realizar a

conversão do olhar consiste em grande desafio para o pesquisador. Bourdieu (1989) considera esta

ruptura como o primeiro passo importante, capaz de “dar novos olhos”, produzindo, se não um

homem novo, mas pelo menos um “novo olhar”, que é o olhar sociológico sobre o mundo social.

O autor menciona uma ‘revolução mental’, que é a mudança de toda a visão do mundo

social que o indivíduo que deseja se tornar pesquisador necessita se submeter. Colocar em

suspenso as pré-construções “[...] implica uma ruptura com os modos de pensamento, conceitos,

métodos que têm a seu favor todas as aparências do senso comum” (BOURDIEU, 1989, p. 49), ou

seja, também aquilo que a atitude positivista honra e reconhece. Nesse sentido, a conversão do

pensamento a que o autor se refere diz respeito, principalmente, à ruptura com o que é evidente no

mundo social e no universo douto, caracterizado pelo exercício de um magistério profético. A

tentação da ciência profética é sempre muito contumaz, principalmente para pesquisadores

principiantes. Bourdieu (1989, p. 50) afirma que “muitas vezes é, só ao cabo de um verdadeiro

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trabalho de socioanálise que se pode realizar o casamento ideal de um investigador e do seu

‘objeto’, por meio de uma série de fases de sobreinvestimento e de desinvestimento.”

Nesta linha de raciocínio, a objetivação participante não deve ser confundida com a

observação participante, posto que esta segunda, na percepção de Bourdieu (1989) desenvolve a

análise de uma falsa participação em um grupo estranho. Desta feita, o trabalho de objetivação

consiste em lançar o olhar sobre um objeto muito particular. No caso da presente pesquisa, de um

lado, estão os interesses da pesquisadora quanto ao pertencimento no campo universitário, ao

mesmo tempo em que ocupa de uma posição particular nesse campo (BOURDIEU, 1989). Por

conseguinte, os sujeitos da pesquisa ocupam um lugar no campo universitário e, também a pessoa

que realiza esta pesquisa. Por esta razão, adotar a postura de observador imparcial, distanciado

significa dissimular um lugar de neutralidade, que não existe.

Discorrer longas análises sobre o espaço onde atuamos e sobre colegas, que são também,

em alguma medida, pares-concorrentes, não pode ser um exercício omnipresente e quase divino,

dissimulado por detrás da impessoalidade dos procedimentos. É necessário ter consciência também

de que a objetivação possui seus limites. Bourdieu (1989, p. 53) considera que, no mundo

universitário, há uma série de instituições, que “produzem o efeito de tornar aceitável a distância

entre a verdade objectiva e a verdade vivida daquilo que se faz e daquilo que se é”. Por isto há uma

dupla verdade, “objetiva e subjetiva, que constitui a verdade do mundo social” (idem, idem).

Nesses termos, a pesquisa constitui uma relação social, por mais específico que este

trabalho pareça. No trabalho de objetivação participante é necessário entender como o espaço de

interação funciona, quais características conjunturais podem ser destacadas. Além disso, é preciso

compreender o que pode ser dito e, principalmente o que não pode ser dito, é também indispensável

saber quem é excluído e quem se exclui (BOURDIEU, 1989). Desta forma, Bourdieu (1989, p.

57) interroga “mas por que razão a análise é, neste caso, particularmente difícil? E responde

afirmando que “o sociólogo, segundo os objetos que estuda, ele mesmo, mais ou menos afastado

dos actores e das coisas em jogo por ele observadas, mais ou menos diretamente envolvido em

rivalidade com eles [...]”.

Nessa ótica, Bourdieu (2017, p. 74) afirma que:

Eu significo a objetivação dos participantes e não a observação, como se diz

habitualmente. A observação do participante, como eu a entendo, designa a conduta de

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um etnólogo que a imerge, - ou imerge a ele mesmo, - em um universo social estranho

para observar uma atividade, um ritual ou uma cerimônia, enquanto, idealmente, participa

dela.

Desta maneira, o autor argumenta que a observação participante pressupõe uma espécie

de duplicação da consciência considerada difícil de sustentar, uma vez que “[...] como alguém

pode ser sujeito e objeto, aquele que age e aquele que, por assim dizer, se vê atuando?”

(BOURDIEU, 2017, p. 74). Ao tratar da objetivação participante procura “[...] expor a objetivação

do objeto de objetivação, do sujeito analisador, - em suma, do próprio pesquisador” (idem).

Portanto, não se trata de trazer à baila a prática, no sentido do que o pesquisador realizou durante

a pesquisa, estabelecendo um retorno descritivo ao campo pesquisado e, o relacionamento, que

estabeleceu com seus informantes e também a narrativa dessas experiências. A isto Bourdieu

denomina de um exercício de obervar-se observando. Nesses termos afirma que:

Torna-se, assim, rapidamente claro, que tenho pouca simpatia com o que Clifford Geertz

(1988: 89) chama, depois de Roland Barthes, a doença do diário, isto é, uma explosão de

narcisismo que, às vezes, chega ao exibicionismo, e que surgiu na sequência e em reação

aos longos anos de repressão positivista (BOURDIEU, 2017, p. 74).

Nesses moldes, explica que a reflexividade proposta por sua sociologia não se trata de

uma reflexividade textual “[...] com todas as considerações falsamente sofisticadas sobre o

processo hermenêutico de interpretação cultural e a construção da realidade através da gravação

etnográfica” (BOURDIEU, 2017, p. 75). Para o autor a ciência não pode se resumir à gravação e

análise das pré-construções. A objetivação participante, nos termos a que Bourdieu a apresenta,

não é um entretenimento narcisista, nem mesmo o efeito de um ponto de horna epistemológico

gratuito.

A objetivação participante requer um esforço autoanalítico do pesquisador, sem o qual

poderá ver, no espaço pesquisado, elementos que não reconhece em si mesmo. Deste modo,

Bourdieu (2017, p. 79) afirma que:

O antropólogo que não conhece a si mesmo, que não tem um conhecimento adequado de

sua própria experiência primária do mundo, coloca o primitivo à distância porque não

reconhece o pensamento primitivo e pré-lógico dentro de si mesmo. Fecha-se, assim, em

uma visão escolástica e, portanto, intelectualista, de sua própria prática, e não pode

reconhecer a lógica universal da prática nos modos de pensamento e ação (tal como

mágicos) que ele descreve como pré-lógico ou primitivo.

O pesquisador deve seguir em direção à sua experiência, aceitando que, na sua pesquisa,

há tudo de si, sem que isto implique uma conduta culpada, porque em todos os indivíduos, que são

objeto da investigação, a ação também ocorre sem que estes se interroguem o tempo inteiro por

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que agem de determinada maneira e não de outra. Bourdieu (2017, p. 80) observa que aqueles que

estão sendo observados e pesquisados,

[…] não têm em suas cabeças a verdade científica de sua prática que eu estou tentando

extrair da observação de sua prática. Além disso, elas normalmente nunca se fazem as

perguntas que eu me perguntei ao atuar junto a elas como um antropólogo: por que tal

cerimônia? Por que as velas? Por que o bolo? Por que os presentes? Por que esses convites

e esses convidados, e não outros? E assim por diante.

Efetivamente a questão que circunda a objetivação participante é a ruptura com a

aplicação do “pensamento acadêmico encarnado pelo mito do homo economicus e da teoria da

ação racional nos comportamentos dos agentes comuns” (idem, grifos do autor), exercício que

contribui para defender o pesquisador de interpretações formatadas espontameamente por si

mesmo e das informações modeladas pelos agentes informantes da pesquisa. Desta maneira, o uso

do conhecimento nativo é parte importante nas operações da pesquisa, que passa pela fase reflexiva

de objetivação que envolve a observação, e a fase ativa – constituindo-se duplo movimento.

A objetivação participante é o cume da arte sociológica, difícil de ser realmente realizada,

mas por pouco realizável que seja, optamos por nos firmar a partir dela, como meio de inserção no

campo pesquisado, principalmente porque nossa relação com este espaço se dá de maneira muito

estreita, desde a graduação. Assim, envidamos o largo esforço de nos firmar numa objetivação,

que nos desse a condição de nossa participação no espaço, colocando em suspenso nosso interesse

mais particular e suas representações. O cuidado nesta participação se deu no sentido de reduzir

ao máximo e, de fato, procurar controlar as distorções e a violência simbólica que se pode ser

exercida através da pesquisa.

Assim, de modo prático, podemos afirmar que a objetivação participante se deu a partir

de uma inserção, no período de agosto de 2017 a agosto de 2018 em atividades realizadas na

instituição, especificamente no Laboratório de Estudos da Educação do Campo (LECAMPO). Este

Laboratório vinculado ao Curso de Pedagogia e se tornou ponto de partida para as nossas análises.

A nossa relação com o espaço pesquisado vem de longo tempo, quando realizamos nosso curso de

graduação em Pedagogia (2006 – 2011). Neste período, atuamos de maneira ativa no Movimento

Estudantil, nas instâncias formais como representante discente do Conselho Universitário –

instância deliberativa na qual tramitam todas as decisões da instituição. Além destas experiências,

estivemos na condição de bolsista do Programa Nacional de Educação na Reforma Agrária

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(PRONERA), no período de 2008 a 2010. Portanto, nossa inserção neste espaço, durante o período

da graduação, foi marcada por uma intensa participação na vida acadêmico-institucional.

Nos anos de 2014 e 2015 – durante a finalização do Curso de Mestrado - estivemos

trabalhando na FAFIDAM, na condição de professora substituta. Neste período desenvolvemos

atividades junto ao LECAMPO, colaborando com as atividades de extensão, pois coordenamos

um Projeto vinculado ao Programa de Extensão denominado “Educação do campo, escola e

organização da cultura: vivências e conhecimentos para a emancipação humana”. O Programa

de Extensão foi desenvolvido na Chapada do Apodi, no Acampamento José Maria do Tomé –

espaço de ocupação territorial por agricultores e agricultoras vinculados ao Movimento dos

Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST).

Neste Acampamento, em especial, são desenvolvidas as atividades de extensão do

LECAMPO, é também o espaço de pesquisa e extensão de muitos trabalhos, que vêm sendo

desenvolvidos desde o ano de 2013/2014. Além disto, pesquisas acerca da região do Baixo

Jaguaribe e das problemáticas em torno desta região vêm ocorrendo desde o final dos anos de

1990. Com a inserção dos projetos de extensão, neste espaço, desde o ano de 2014 têm sido

produzidos trabalhos acadêmicos diversos, resultando em uma produção científica que circula em

diferentes canais de divulgação.

No processo de realização do trabalho, adotamos o uso de um diário de campo, posto

que nossa inserção no campo, durante cerca de um ano, se deu para construção da análise com

observação direta e anotações. O primeiro momento da pesquisa em campo foi construído

basicamente pelas anotações no diário, registros fotográficos, inserção ativa no campo pesquisado

e, sobretudo, pela observação direta. Para evitar pressões e/ou influênciações sobre aqueles, que

estavam sob nossa observação, optamos por não lhes revelar, que no momento nossa presença no

campo se dava em virtude da realização da pesquisa. Esta foi a primeira decisão que tomamos,

com a intenção de reduzir ao máximo a violência simbólica, evitando, também, os efeitos de uma

‘intrusão’ e todas as distorções que isso pode provocar. Além disto, conforme fomos nos revelando

como pesquisadora no campo, havia uma certa indefinição do que seria de fato a pesquisa, todos

sabiam que era sobre a FAFIDAM, o que gerou menos preocupação nos sujeitos. Compete

informar que nossa interação, no transcorrer da pesquisa, ocorreu com muitos estudantes,

professors em reuniões e atividades acadêmicas. A seguir apresentamos o roteiro da objetivação

participante.

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Quadro 5: Objetivação participante

OBJETIVAÇÃO PARTICIPANTE Evento: Comemoração dos 50 anos da FAFIDAM.

Tema da Mesa de abertura: FAFIDAM 50 anos construindo conhecimento no Vale do

Jaguaribe.

06/08/18

07/08/18

08/08/18

09/08/18

Reunião de Mestrandos sobre a Avaliação da CAPES. 09/08/18

Reunião Preparatória para comemoração dos dez anos do Laboratório. 12/09/18

Evento de Comemoração dos dez anos do LECAMPO. 16/10/18

17/10/18

18/10/18

Defesa dos Memoriais do PROCAMPO. 13/11/18

Aula do Mestrado. 26/09/18

Ato Público: Manifesto sobre a morte de Marielle Franco e Anderson Gomes. 14/03/18

Atividade preparatória para o Ato #elenão na Chapada do Apodi. 30/09/18

Comemoração do dia das crianças na Chapada do Apodi. 15/10/18

Atividade de apoio aos acampados contra a reintegração de posse na Chapada do Apodi. 21/11/18

Defesa de Trabalho de Conclusão de Curso – especialização em Gestão Educacional –

discente de Morada Nova/CE.

24/10/18

Defesa de Dissertação – discente Janine Mara Freitas de Lima 17/07/2017

Qualificação de Mestrado – discente Mila Nayanne 29/08/18

Diário Etnográfico – conversa informal com a professora Maria 25/07/18

Visita para registros fotográficos e coleta de dados. 28/03/18

Aula de campo: alunos da UFERSA conhecendo o LECAMPO e a Chapada do Apodi. 27/02/18

Visita para registros e observação. Conversa com os professores João e Lúcia. 21/03/18

A escolha por realizar a pesquisa na Faculdade de Filosofia Dom Aureliano Matos

(FAFIDAM), não foi aleatória, pois está intimamente, relacionada com a nossa trajetória de vida.

Conforme já citamos, nossa formação inicial se deu na FAFIDAM, quando nos graduamos em

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Pedagogia, tendo concluído o curso no ano de 2011. Também nesta instituição, iniciamos nossa

trajetória profissional, antes mesmo de concluir o Mestrado, ainda no ano de 2013 – momento em

que ingressamos na profissão docente no Curso de Pedagogia. No exercício da atividade

profissional, na condição de “professora substituta” realizamos o ingresso também no doutorado

já no ano de 2015 – neste mesmo ano ingressamos, por meio de concurso público, como professora

efetiva em uma universidade federal de ensino.

A rápida trajetória acadêmica colocou-nos diante de grandes desafios, sendo necessário

em curto espaço de tempo realizar uma transição do habitus estudantil para o habitus docente,

processo complexo e difícil que nos conduziu a muitas reflexões sobre a formação inicial, uma vez

que ingressamos como professora do magistério superior em um curso de Licenciatura em

Educação do Campo. A experiência como docente neste curso nos fez perceber o quanto a

universidade se constitui como um espaço da mais alta valia para aqueles, que, historicamente,

estiveram fora dela. As cotas de sacrifício, as lutas enfrentadas para permanecer neste espaço, as

desigualdades de acesso, entre outros, tornaram-se pontos de reflexão e fundamentaram nossas

primeiros questionamentos.

Observamos haver, de modo recorrente, a ideia de que ingressar na universidade/ensino

superior é romper com uma cultura elitista de acesso exclusivo daqueles, que ocupam posição de

privilégio social, sendo também uma forma de transformar o mundo, no sentido político e no

sentido próprio do universo acadêmico que é a apropriação do conhecimento. Este pensamento

permeia uma série de representações do meio acadêmico como espaço de superação do atraso.

Percebemos tais representações naqueles que, sendo do interior, se concebem superando muitas

limitações, pois estão inseridos no mundo universitário. Predomina a ideia de que o “despertar” da

consciência, por meio do conhecimento gera uma mudança de comportamentos rumo a uma

mudança social. Portanto, nossa experiência como aluna e professora nos leva a esta percepção,

concebendo-a não como uma verdade absoluta, mas como uma construção que permeia as imagens

e representações de universidade. Esse fato é resultado do modo como ocorre a relação dos agentes

com o conhecimento, pois essa relação é sempre perpassada por uma efetiva ampliação das

percepções sobre o mundo social em maior ou menor medida.

Nesses termos, em nossa trajetória particular, o acesso à universidade serviu como forma

de superação daquilo que renunciamos, desprezamos e, até mesmo, reprimimos por considerar

provinciano, atrasado e arcaico. O ingresso no meio acadêmico nos fez caminhar em uma pulsão

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ansiosa e excessivamente apressada rumo ao centro cultural no sentido de alcançar as “altas

teorias” e verdades sobre o mundo social. Ainda que possa soar como um tipo de pensamento

colonizado, de exaltação do mundo “douto” como mundo à parte, é comum que se pense desta

maneira em espaços, onde a arrogância se confunde com a autoridade científica, e o pouco

exercício de autoanálise coletiva se constitui como uma ausência regular das práticas.

Assim, quando passamos a ouvir, no exercício profissional, cotidianamente frases como

“vamos ocupar o latifúndio do saber”, ou mesmo “vai ter filho de agricultor na universidade

sim!”, de imediato sentimos a necessidade de olhar em retrospectiva para nossa própria formação,

ou seja, para nosso lugar de origem, pois em todas estas frases e nas condutas ligadas a elas, havia

de nossa parte um reconhecimento, naqueles que as proferiam - as cotas de sofrimento social, as

lutas internas e externas para assegurar um lugar neste universo chamado universidade. De nossa

parte havia facilidades do ponto de vista da interação e integração a este mundo, porém foram

muitos os desafios quanto à manutenção dos materiais, além de vivenciar as sutilezas da violência

simbólica que não cabe aqui declinar.

Nós nos encontramos em posição, aparentemente ‘privilegiada’ como docente, no

entanto, caminho para chegar a esta posição foi de muitos desafios. Este processo é particular, sob

um certo ponto de vista, mas tem sua relação com o macrocontexto, uma vez que houve uma

expansão acentuada das vagas nos cursos de graduação, e na pós-graduação, além de uma política

de mais efetiva de concursos públicos em diferentes cursos, áreas de conhecimento e instituições

– principalmente, federais.

Nesse sentido, no lastro da compreensão sobre o campo universitário como campo de

forças e campo de lutas para conservar ou transformar, podemos dizer que o acesso ao ensino

superior transformou substancialmente todo o nosso roteiro biográfico, em virtude de sermos

oriundos de uma origem familiar bastante modesta, cuja formação escolar dos parentes mais

próximos e dos pais não chegou sequer ao Ensino Fundamental completo.

Com os parcos recursos familiares tivemos a trajetória escolar toda realizada em

instituições públicas, com muitas dificuldades e limitações e, no contexto familiar, os incentivos

para o ingresso neste nível de ensino foram próximos ou igual a zero. Este pouco incentivo se

constituiu, em grande medida, pelas ausências, que se fizeram logo cedo. No início da

adolescência, perdemos nossa mãe e ficamos aos cuidados de outros parentes, tendo morado em

várias casas diferentes, o que com certeza, propiciou uma “desatenção” maior com o

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acompanhamento e incentivos para o estudo. Antes disto, levamos uma vida no “estilo cigano”,

tendo viajado para diferentes estados, o que também ocasionou algumas perdas escolares.

Pode-se considerar que “a família nunca é este organismo coerente, homogêneo e

harmonioso como nas visões encantadas ou tão simplesmente em sobrevoo, como muitas visões

macrossociológicas do “meio familiar [...]” (LAHIRE, 2011, p. 13), no entanto, é cabível

considerar que é a instância primeira de socialização, que possui o “monopólio da formação

precoce das disposições mentais e comportamentais”, tal como afirma Lahire (2011, p. 15). Em

nosso caso, somos a primeira geração a cursar o ensino superior, rompendo um padrão familiar de

naturalização do “pouco estudo” como fato sem nenhuma importância.

Nesse sentido, a Faculdade de Filosofia Dom Aureliano Matos (FAFIDAM), caracteriza-

se como um espaço, cujo público advém de realidades semelhantes à nossa, em termos de primeira

geração, que obtém diploma de curso superior e, também, com também indivíduos oriundos da

escola pública e, sobretudo, residentes em cidades pequenas do interior. Por conseguinte a

instituição pesquisada ocupa o lugar de “centro cultural”, espaço de encontro dessas diversas

realidades interioranas que interagem.

Segundo Lahire (2011, p. 16) “[...] um lugar é a maneira de ser no mundo e de estar no

mundo, uma série de coisas pensáveis, possíveis ou autorizadas (e ao mesmo tempo, um quadro

que fixa os limites do pensável, do possível e do que é permitido).” Nessa perspectiva,

consideramos que o nosso lugar de fala é parte de uma árdua construção e o resultado de um longo

processo de interiorização, por meio de milhares de interações, de repetições, treino e

disciplinamento, que nos levaram a interiorizar o gestual, a linguagem e certos modos de

raciocínio. Podemos afirmar, sem nenhuma falsa moral, que hoje nos encontramos razoavelmente

“longe do mato” mas sabendo e admitindo que ele permance nas nuanças do que somos.

Por isto, o gérmen primário de nosso estudo, e a epigênese de nosso interesse acerca do

ensino superior, suas reconfigurações e as repercussões destas numa instituição periférica estão

revestidos de profundo valor emocional, em decorrência de nossa posição e trajetória, neste

espaço, que denominamos como campo universitário. Portanto, no nosso encontro com a

praxiologia bourdieusiana e no processo de construção deste trabalho – na objetivação objetivante

- um primeiro exercício se impôs: a ruptura com os julgamentos sociológicos que são amparados

pela lógica do uso ordinário dos conceitos. Além disto, procuramos fazer uma ruptura com os

julgamentos do senso ideológico, evitando ler e transmitir o discurso científico de maneira a julgar

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“isto é bom”, “isto é ruim”, “isto é correto politicamente”. Sair de uma lógica de mundo organizada

a partir da ideia de que a realidade deve ser deste ou daquele jeito, foi um longo caminho, até

entendermos que o mundo social se organiza sob várias lógicas de funcionamento e, não

unicamente, sob a lógica das classes sociais, organizadas como dois ou três blocos de concreto,

sem interconexão entre si e separadas mecanicamente pela economia.

Superar o pensamento materialista incorporado aos nossos esquemas de percepção exigiu

um esforço de reelaboração de uma longa caminhada formativa. Assimilar a alquimia

sociossimbólica das práticas sociais ainda é um processo de estranhamento e acomodação do novo.

Desta feita, tomando de empréstimo o pensamento bourdieusiano, podemos dizer que “[...] nesse

esforço para explicar-me e compreender-me, poderei doravante apoiar-me nos cacos de

objetivação de mim mesmo que fui deixando pelo caminho” (BOURDIEU, 2005, p.39).

2.2 OS SUJEITOS DA PESQUISA E AS ENTREVISTAS: considerações e detalhamentos

Para esta pesquisa selecionamos 05 (cinco) professores, seguindo o critério de: a) pelo

menos dez anos de atuação na instituição pesquisada; b) titulação mínima de Mestre; c) trajetória

em atividades acadêmicas de ensino, pesquisa extensão e, atividades administrativas. Em geral, os

professores desenvolvem atividades acadêmicas, no entanto, adotamos este critério para identificar

a relação dos professores com a atividade de ensino e, sobretudo, com a pesquisa e extensão.

Consideramos que, as reconfigurações do ensino superior vêm alterando significativamente os

modelos e concepções de universidade e entendemos que o princípio da indissociabilidade entre

ensino, pesquisa e extensão vem sendo também reconfigurado.

Assim, entendemos a partir da praxiologia bourdieusiana que estes princípios presentes

nas práticas institucionais colaboram para a formação dos diferentes tipos de capitais

desenvolvidos pelos sujeitos escolhidos para a pesquisa, entendemos, também, que tais princípios

fortalecem a autonomia da universidade. Tomamos como ponto de partida a observação acerca da

posição ocupada por cada professor escolhido para a pesquisa, pois consideramos que a estrutura

do campo é definida a partir da distribuição do capital científico. Tal como afirma Bourdieu (2004,

p. 24) “[...] em outras palavras, os agentes (indivíduos ou instituições) caracterizados pelo volume

de seu capital determinam a estrutura do campo em proporção ao seu peso, que depende do peso

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de outros agentes, isto é, de todo o espaço”. Assim Bourdieu (2004, p. 23) considera que “[...] a

estrutura das relações objetivas entre os agentes que determina o que eles podem ou não fazer”.

Isto significa que a posição ocupada por cada agente orienta e/ou determina suas tomadas

de posição (idem). Bourdieu (2004, p.26) define o capital científico como uma espécie particular

do capital simbólico, explica que: “[...] é sempre fundado sobre atos de conhecimento e

reconhecimento que consiste no reconhecimento (ou crédito) atribuído pelo conjunto de pares-

concorrentes no interior do campo científico.” Nesse sentido, quando analisamos o contexto do

campo universitário no tempo presente, é possível identificar que a posse de capital científico é

uma condição necessária para qualquer agente adentrar o campo. Além disto, o capital científico

é uma propriedade geral do campo.

O capital científico assemelha-se às competências desenvolvidas pelo agente, que

garantem sua permanência no campo. Ao mesmo tempo, por meio de tais competências, é possível

considerar, que cada posição ocupada no interior do campo científico leva em consideração os

sinais de reconhecimento e consagração (BOURDIEU, 2004).

Convém atentar ao fato de que, na praxiologia bourdieusiana, não se pode levar as leituras

sobre as práticas pelo viés da ilusão maquiavélica e, até cínica, acerca das distribuições no campo

social, isto porque “[...] nada é mais difícil e até mesmo impossível de “manipular” do que um

campo” (idem, p.25). Ao mesmo tempo, não se pode achar que um campo se orienta ao acaso, por

esta razão “[...] os campos são lugares de relações de forças que implicam tendências imanentes e

probabilidades objetivas” (idem, idem).

Os agentes não são partículas passivas conduzidas pelas forças do campo, é oportuno

observar isto. O habitus, nesse contexto, como disposições adquiridas, “[...] pode, em particular,

levá-los a resistir, a opor-se às forças do campo” (BOURDIEU, 2004, p. 28). O habitus funciona

como “[...] sistema de disposições duráveis e transponíveis estruturas estruturadas predispostas a

funcionar como estruturas estruturantes” (BOURDIEU, 2011, p. 87). Neste ponto, consideramos

valioso o estudo aprofundado das relações que se instituem na FAFIDAM, uma vez que a análise

sobre uma fração determinada do campo pode revelar suas lógicas específicas de funcionamento,

fugindo à regra das grandes análises sobre grandes objetos. Sobre este aspecto Bourdieu (1989)

afirma que em uma pesquisa o que há de mais valioso é construção do objeto de modo, que o

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pesquisador possa reconstruir objetos “grandes” ou “pequenos” no sentido de apreendê-los sob um

ângulo imprevisto.

Os professores escolhidos para esta pesquisa, são “jogadores profissionais”, tal como

observa Bourdieu (BOURDIEU, 2004, p.28):

[..] esse senso do jogo é, de início, um senso da história do jogo, no sentido do futuro do

jogo. Como um bom jogador de rugby sabe para onde vai a bola e se põe lá onde a bola

vai cair, o bom cientista é aquele que, sem ter a necessidade de calcular, de ser cínico, faz

as escolhas que compensam. Aqueles que nasceram no jogo têm o privilégio do

“inatismo”. Eles não têm necessidade de serem cínicos para fazer o que é preciso quando

é preciso ganhar a aposta.

Assim, “[...] os agentes bem ajustados ao jogo são possuídos por ele e tanto mais, sem

dúvida, quanto melhor o compreendem” (BOURDIEU, 1996, p.142). O que isto significa? dito de

outra forma, “entre os agentes e o mundo social há uma relação de cumplicidade infraconsciente,

infralinguística...” (idem, p.143), ou seja, ao incorporar o sentido do jogo, os agentes apropriam-

se de um conjunto de “esquemas práticos de percepção e apreciação” realizando escolhas, que não

ocorrem, apenas, no plano das ações conscientes, pura e simplesmente. Ante o exposto, seguindo

os critérios traçados, apresentamos o quadro com algumas informações sobre os sujeitos

selecionados para a pesquisa

Quadro 6: Sujeitos da pesquisa (Professores) SUJEITOS TITULAÇÃO TEMPO DE

TRABALHO

SEXO/

IDADE/

ESTADO

CIVIL

ESCOLARIDADE

DOS PAIS

PROFISSÃO DOS PAIS

Professor

José

Pós-Doutor 26 anos Maculino

59 anos

Casado

Mãe: analfabeta

Pai: semianalfabeto

Pai: Pedreiro, mestre de

obras, posteriormente

pequeno empresário da

indústria de cerâmica

Mãe: Doméstica

Professora

Maria

Pós-Doutora 26 anos Feminino

59 anos

Casada

Pai:

Mãe:

Pai: comerciante

Mãe:

Professor

João

Doutor 24 anos Masculino

51 anos

Casado

Pai: Ensino

fundamental

incompleto

Mãe: Ensino

Fundamental

incompleto

Pai: agricultor, sendo

pequeno proprietário rural

Mãe: agricultora nas

atividades domésticas

Professora

Lúcia

Doutora 21 anos Feminino

48 anos

Casada

Pai:*

Mãe:*

Pai: agricultor

Mãe: doméstica

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Professor

Francisco

Mestre 13 anos Masculino

45 anos

Casado

Pai: semi-

analfabeto

Mãe: analfabeta

Pai: agricultor

Mãe: agricultora

*não respondeu. Fonte: informações coletadas a partir das entrevistas.

Os critérios de escolha se deram a partir das observações em campo, no andamento da

pesquisa, pois percebemos que seria possível responder às questões do estudo, elaborando uma

análise do tipo morfológica, uma vez que não seria possível consultar todo o universo de agentes

envolvidos na dinâmica da instituição. No quadro acima, em especial, colocamos a escolaridade

dos pais conforme o pesquisado respondeu.

Para preservar as identidades, atribuímos pseudônimos aos pesquisados. Os sujeitos da

pesquisa não se opuseram à publicação de seus nomes, contudo, por ocuparem posições

estratégicas na estruturação da instituição pesquisada, consideramos mais adequado atribuir

pseudônimos. A escolha dos nomes se deu por semelhança aos nomes reais dos professores, sendo

que todos os nomes atribuídos são parte do nome real dos entrevistados. Os nomes José, João,

Maria e Francisco são parte do nome verdadeiro – que sem o sobrenome não é possível saber quem

são. Apenas a professora Lúcia recebeu, de fato um pseudônimo, por não haver em seu nome

nenhum que pudesse ser utilizado sozinho, sem o sobrenome.

Para a coleta desses dados, procedemos de duas maneiras. Realizamos entrevista com três

professores (José, Maria e Francisco) e aplicamos questionário aberto a dois professores (João e

Lúcia). A aplicação dos instrumentos da pesquisa ocorreu em duas etapas. A primeira, a partir da

aplicação dos questionários abertos à Professora Lúcia e ao Professor João. Em face de suas

ocupações com as atividades administrativas as quais os dois professores são vinculados

consideramos mais oportuno fazer a aplicação do questionário aberto, dando-lhes a condição de

responder e, posteriormente, entregar as respostas. Os questionários foram entregues na versão

impressa e, por solicitação dos professores foram, também, enviados para o e-mail. As perguntas

dos questionários foram organizadas a partir de três tópicos principais, a saber: 1) Trajetória; 2)

Capitais; 3) Gestão universitária/acadêmica. Além dos questionários aplicados, ocorreram

diferentes momentos de conversa com esses professores.

A segunda etapa da pesquisa, constituiu-se da realização das entrevistas. Este momento

exigiu um maior esforço, para conseguir adequar datas e horários nas agendas dos professores. O

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ambiente da FAFIDAM e do Laboratório não parecia favorável à realização de uma entrevista, em

decorrência do fluxo constante alunos entrando e saindo, além da agenda dos professores sempre

muito cheia de compromissos. Compreendemos que não alcançaríamos os objetivos da

metodologia realizando uma entrevista com “quebras”, com a preocupação do tempo para começar

e terminar, além das interrupções. A primeira entrevista ocorreu no LECAMPO, no período de

recesso das atividades do Laboratório45.

A possibilidade de realizer entrevista com esse professor no LECAMPO foi maior em

virtude do mesmo residir na cidade de Limoeiro do Norte. Então fomos até à residência dos

professores, momento que pudemos aproveitar ao máximo na realização da entrevista. Ao todo,

foram entrevistados 03 (três) professores.

No segundo momento da pesquisa, além da entrevista com os professores, realizamos

entrevista com 03 (três) ex-alunos da instituição. Portanto, no universo da presente pesquisa há

duas amostras de sujeitos diferentes. Apenas no último capítulo, sistematizamos as entrevistas

realizadas com os ex-alunos. Estabelecemos relações entre as trajetórias dos ex-alunos da

instituição, recém formados na graduação e pós-graduação, com faixa etária entre 25 e 30 anos e

as trajetórias de três (03) dos professores pesquisados - que também são ex-alunos da instituição

(João, Francisco e Lúcia), contudo, já em exercício profissional de mais de uma década na

FAFIDAM. O objetivo de ter realizado estas três entrevistas foi relacionar a trajetória de vida e

trajetória escolar com a obtenção de “sucesso” acadêmico. Assim, as entrevistas dão suporte para

nossa reflexão sobre o perfil dos alunos, que ingressam na FAFIDAM, sendo majoritariamente um

público de classe popular, oriundo de trajetórias diversas de exclusão. Para fechar o trabalho

apresentamos o mapeamento da entrada de ex-alunos da FAFIDAM em cursos de pós-graduação

no período de 1998 a 2019.

45 Aproveitei o período do recesso para realizar a primeira entrevista. Marquei o encontro com o professor Francisco

em uma data X, contudo, neste dia o mesmo precisou desmarcar o encontro por motivos de saúde. Por este fato remarcamos para outra data. A possibilidade de realizer entrevista com esse professor no LECAMPO foi maior em virtude do mesmo residir na cidade de Limoeiro do Norte.

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Todos esses fechos asseguram nossa tese de que há reconfigurações no campo

univeristário e, no caso da FAFIDAM a reconfiguração principal se dá no âmbito da pós-

graduação, razão pela qual apresentamos em pormenor os aspectos destas reconfigurações.

A seguir demonstramos o roteiro das entrevistas com os professores.

Quadro 7: Professores entrevistados (Francisco, José e Maria)

Professor

entrevistado

Data Hora Duração da entrevista Local da entrevista

1º Prof. Francisco 14/12/18 14:30 - 1 hora e 53 minutos Laboratório de Estudos

da Educaçãp do Campo

LECAMPO/FAFIDAM

2º Prof. José 24/01/19 13:30 1 hora e 40 Residência do

professor –

Fortaleza/CE. 3ª Profa. Maria 24/01/19 15:30 2 horas e 10 Residência do

professor –

Fortaleza/CE.

Quadro 8: Questionários (professores João e Lúcia)

Questionário aberto Data de entrega Data de recebimento

Profa. Lúcia 27/12/18 18/01/19

Prof. João 27/12/18 21/01/19

Considerando relevante lastrear as variáveis sobre origem familiar e trajetória escolar,

solicitamos aos pesquisados informações referentes a tais aspectos. No quadro a seguir,

apresentamos os tipos de escolas frequentadas pelos pesquisados e a formação inicial de cada

pesquisado:

Quadro 9: Variáveis (tipos de escolas, formação inicial dos professores)

SUJEITOS TIPOS DE ESCOLA QUE

ESTUDARAM

FORMAÇÃO NA

GRADUAÇÃO

Professor José Ens. Fund: Escola pública (dois anos

em escola privada com bolsa – 7º e 8º

ano).

Ens. Médio: Escola pública.

Pedagogia

Professora Maria Ens. Fund: Escola particular.

Ens. Médio: Escola particular.

Serviço Social

Professor João Ens. Fund: Escola pública.

Ens. Médio: Escola pública.

História

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Professora Lúcia Ens. Fund: Escola pública.

Ens. Médio: Escola pública.

Geografia

Professor Francisco Ens. Fund: Escola particular

Ens. Médio: Escola particular

História

Esses dados são necessários, na medida em que os utilizamos para compreender as

práticas dos sujeitos, principalmente para entender a estruturação do habitus e dos capitais, na

perspectiva de Pierre Bourdieu. Como já mencionamos, entrevistamos 03 (três) ex-alunos da

instituição, recém formados na graduação e pós-graduação ofertada pela FAFIDAM. Os ex-alunos

escolhidos continuam circulando nos espaços da universidade, vinculados às atividades, que são

realizadas no Laboratório de Estudos da Educação do Campo (LECAMPO). Neste espaço, em

especial, há grande circulação de alunos e ex-alunos. O Laboratório tem uma dinâmica de

encontros e reuniões semanais para estudos, preparação de atividades ou reuniões de planejamento

e avaliação. A seguir apresentamos dados coletados

Quadro 10: Sujeitos da pesquisa (ex-alunos)

ALUNOS IDADE ANO DE

CONCLUSÃO

DO MESTRADO

PROFISSÃO DOS

PESQUISADOS

PROFISSÃO

DOS PAIS

ESCOLARIDADE

DOS PAIS

Aluno 1 27 anos 2017 Professor do Instituto

Federal do Ceará (IFCE)

Pai: autônomo

Mãe:

agricultora

Pai:

Mãe:

Aluna 2

30 anos 2016 Professora da

Universidade Estadual do

Ceará

(UECE/FAFIDAM)*

Pai: agricultor

Mãe:

agricultora

Mãe: analfabeta

Pai: sabe ler e

escrever muito

pouco

Aluna 3 25 anos 2019 Professora da Rede

Básica de Educação em

Flores/CE

Pai: agricultor

Mãe:

agricultora

Mãe: 1º ano

primário

Pai: 4ª série

*Professora substituta

Destacamos a idade, o ano de conclusão do Mestrado, a profissão que exercem, bem como

a profissão e escolaridade dos pais, porque, na última parte da pesquisa, realizamos algumas

reflexões acerca dos condicionantes sociais do sucesso acadêmico. Os ex-alunos por nós

selecionados para entrevista, oriundos de trajetórias bastante adversas, obtiveram razoável sucesso

acadêmico, no contexto da instituição e dos cursos de graduação aos quais foram alunos. Incluir

esta amostra de sujeitos na pesquisa se fez em acordo com os argumentos, que levantamos ao longo

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da pesquisa, que apontam a FAFIDAM como um subcampo do campo universitário, no estado do

Ceará e, no contexto nacional, a partir do Mestrado Acadêmico.

2.3 Itinerário das entrevistas

Na obra “A miséria do mundo” Pierre Bourdieu (2008) chama atenção ao fato de que na

pesquisa científica não se pode confiar na boa vontade do pesquisador e do sujeito pesquisado,

posto que “[..] todo tipo de distorções estão inscritas na própria estrutura da relação de pesquisa”

(BOUDIEU, 2008, p.694). Por esta razão a “reflexividade reflexa, baseada num “trabalho”, num

“olho” sociológico, permite perceber e controlar no campo, na própria condução da entrevista, os

efeitos da estrutura social na qual ela se realiza” (idem). Nessa mesma linha de raciocínio, o autor

também observa que as perguntas realizadas no momento da entrevista produzem efeitos

inevitáveis que devem ser controlados pelo pequisador. Deste modo afirma que:

O sonho positivista de uma perfeita inocência epistemológica oculta na verdade que a

diferença não é entre a ciência que realiza uma construção e aquela que nçao o faz, mas

entre aquela que o faz sem saber e aquela que, sabendo, se esforça para conhecer e

dominar o mais completamente possível os seus atos, inevitáveis, de construção e os

efeitos que eles produzem também inevitavelmente (BOURDIEU, 2008, p.694).

O autor ressalta de que há duas propriedades inerentes à relação de entrevista: a primeira

diz respeito a uma espécie de intrusão sempre um pouco arbitrária, que está no princípio da troca

realizada no ato da entrevista e, em segundo lugar, a dissimetria entre o pesquisador e o pesquisado

na hierarquia das diferentes espécies de capital, mesmo quando há homologias de posição entre

pesquisador e pesquisado. Por esta razão, devemos buscar reduzir ao máximo a violência

simbólica, portanto podemos buscar instaurar uma relação de escuta ativa e metódica. Dessa

forma, as entrevistas realizadas com os dois grupos de sujeitos seguiram o modelo de entrevista

denominado por Bourdieu (2008) como auto-análise provocada e acompanhada. Assim,

iniciamos todas as entrevistas seguindo o mesmo padrão, apresentando um pequeno comentário

sobre a pesquisa, destacando quais os pontos de interesse que nos levaram até o pesquisado. No

caso dos professores, os pontos de interesse iam no sentido de perceber sua relação com as

atividades desenvolvidas nos espaços do Laboratório de Estudos da Educação do Campo, no

Mestrado Acadêmico Intercampi, e nas experiências com as atividades e projetos realizados ao

longo dos últimos anos. Antes de adentrar nestes aspectos de ordem ‘profissional” solicitamos aos

entrevistados que discorressem sobre sua trajetória, considerando suas experiências escolares até

à chegada na FAFIDAM.

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Tivemos o intuito de deixar o pesquisado livre para discorrer sobre suas experiências,

porém, durante a escuta ativa, metódica e com uma atenção silenciosa e acolhedora, inserimos

perguntas, a partir das falas dos pesquisados, semelhante ao que faz o terapêuta com seu paciente.

As intervenções se deram em alguns momentos como forma de maiêutica, ou seja, procurando não

extorquir as declarações dos entrevistados, mas colaborar e estimular que cada resposta fosse a

melhor possível. Conduzimos os momentos das entrevistas, colaborando com as pessoas

interrogadas, a familiaridade e proximidade com todos os pesquisados favoreceu uma condição de

comunicação “não-violenta”, embora nessa relação também haja limites. Bourdieu (2008, p. 696)

observa que “[…] o interrogador não pode nunca esquecer que objetivando o interrogado, ele

objetiva a si mesmo.” De modo mais claro se pode dizer que, as seis (06) entrevistas seguiram o

mesmo padrão, organizado em duas questões centrais.

A primeira questão era conduzir o entrevistado a falar de sua trajetória, fazendo a relação

com sua origem social. A segunda questão era fazer o entrevistado falar de sua trajetória no espaço

pesquisado, fazendo a relação com os espaços e as práticas que dissemos a cada um deles que

havíamos observado. A partir desta estruturação, seria possível identificar as origens sociais do

grupo, remetendo à identidade de cada participante. Nesse contexto, os três professores ouvidos

apresentam trajetórias diferentes, no sentido de que cada um é oriundo de experiências familiares

e escolares nada semelhantes, mas o entrecruzamento de suas práticas profissionais, de afinidades

políticas e teóricas fazem o grupo parecer homogêneo. No caso das entrevistas com os ex-alunos,

foi possível identificar uma maior similaridade entre as trajetórias e as experiências escolares.

2.4 CARACTERIZAÇÃO DA UNIVERSIDADE ESTADUAL DO CEARÁ – UECE

A Universidade Estadual do Ceará (UECE) teve suas atividades iniciadas nos anos de

1970, por meio da Lei Nº 9.753/73, quando foi dada autorização pelo Poder Executivo para instituir

a Fundação Educacional do Estado do Ceará – a FUNEDUCE. Em 1975, por meio do Decreto Nº

11.233 foi criada a Universidade Estadual do Ceará (UECE).

À essa nova instituição foram incorporadas as Unidades de Ensino Superior existentes na

época, tai como: Escola de Administração do Ceará, Faculdade de Veterinária do Ceará, Escola de

Serviço Social de Fortaleza, Escola de Enfermagem São Vicente de Paula, Faculdade de Filosofia

Dom Aureliano Matos (de Limoeiro do Norte) e Televisão Educativa Canal 5. Em 1979, a

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FUNEDUCE foi transformada em Fundação Universidade Estadual do Ceará (FUNECE) – criada

para atender às demandas de desenvolvimento Científico e Tecnológico do Estado do Ceará –

momento em que passou a atuar em rede multicampi. Faculdades do Crato, Juazeiro, Quixadá,

Iguatu, Crateús, Ipu, Ubajara, Redenção e Cedro foram integradas à instituição.

Desde sua criação, a Universidade Estadual do Ceará privilegia cursos de formação de

professores e, atualmente, a instituição conta com seis campi localizados no interior do estado,

dispostos da seguinte maneira:

Quadro 11: Unidades de ensino no interior e respectivos cursos de graduação - UECE

UNIDADES DE ENSINO NO INTERIOR CURSOS

Faculdade de Filosofia Dom Aureliano Matos –

FAFIDAM (Limoeiro do Norte)

Ciências Biológicas

Física

Geografia

História

Letras (Língua Inglesa/Língua Portuguesa)

Matemática

Pedagogia

Química

Licenciatura em Educação do Campo*

Mestrado Acadêmico Intercampi em Educação e Ensino

(MAIE)

Faculdade de Educação, Ciências e Letras do

Sertão Central – FECLESC (Quixadá)

Ciências Biológicas

Física

História

Letras (Língua Inglesa/Língua Portuguesa)

Matemática

Química

A Faculdade de Educação, Ciências e Letras de

Iguatu - FECLI (Iguatu)

Ciências Biológicas

Física

Geografia

História

Letras (Língua Inglesa/Língua Portuguesa)

Matemática

Química

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Faculdade de Educação de Crateús - FAEC

(Crateús)

Ciências Biológicas

Pedagogia

Química

Faculdade de Educação de Itapipoca - FACEDI

(Itapipoca)

Ciências Biológicas

Ciências Sociais

Pedagogia

Química

Centro de Educação, Ciências e Tecnologia da

região dos Inhamuns – CECITEC (Tauá)

Ciências Biológicas

Pedagogia

Química

Fonte: Plano de Desenvolvimento Institucional (PDI, 2012; 2017), elaboração da autora.

Além das seis Unidades multicampi, a UECE tem uma Fazenda de Experimentação

Agropecuária, na cidade de Guaiúba, vinculada à Faculdade de Veterinária (FAVET) e, também,

o campus Experimental de Educação Ambiental e Ecologia de Pacoti/CE. Na disposição dos campi

no quadro acima, a UECE é uma instituição que se caracteriza pela oferta de cursos de licenciatura,

sendo o que consiste como sua principal linha de atuação no contexto do estado do Ceará.

Ressaltamos que a UECE, desde a sua criação, por meio da atuação multicampi desenvolve um

trabalho relevante quanto à oferta de cursos superiores no interior do estado.

A relação da UECE com a pós-graduação teve início no ano de 1981, com a pós-

graduação lato sensu, encampada pelo Centro de Estudos Sociais Aplicados (CESA). A pós-

graduação strictu sensu foi iniciada na década de 1990, com o Mestrado em Produção e

Reprodução de Pequenos Ruminantes, o Mestrado em Letras e o Mestrado em Administração. A

parceria entre a UECE e a Capes iniciou-se também na década de 1990 quando foram

desenvolvidos cursos com a finalidade de qualificar professores para o ensino superior, em âmbito

regional. No âmbito da formação strictu sensu, foram criados Programas de Mestrado em Saúde

Pública e em Geografia neste período. No decênio de 1990 aos anos 2000, houve um crescimento

da instituição, com a implantação de novos cursos, crescimento da pós-graduação, parcerias com

o governo federal, dentre outros.

No lastro desse crescimento, houve uma expansão, que se acentuou de maneira mais

expressiva a partir dos anos 2000. A instituição vem conduzindo Programas e Bolsas vinculadas

ao ensino (graduação), à pesquisa e à extensão, além de bolsas de assistência estudantil. Como

pudemos observar a partir do Plano de Desenvolvimento Institucional (PDI, 2012-2016 e 2017-

2021) a relação (ensino, pesquisa e extensão) está bem delineada na macroorganização da

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instituição, constituindo-se como um dos valores institucionais da UECE46. Há bolsas específicas

voltadas para o apoio à graduação (ensino), à pesquisa e à extensão. Sistematizamos um esboço

geral da organização dessas Bolsas e Programas, da seguinte maneira:

Quadro 12: Programas e Bolsas vinculados ao ensino, pesquisa e extensão na UECE

Programas e Bolsas vinculados à Graduação

(ENSINO)

- Programa de Monitoria Acadêmica (PROMAC);

- Programa de Educação Tutorial (PET) – atende 07

Cursos;

- Projeto de Reorientação na Formação Acadêmica

dos Cursos de Graduação da Área da Saúde (PRO-

SAÚDE/ PET-SAÚDE);

- Programa de Institucional de Iniciação à Docência

(PIBID) – atende 09 Licenciaturas;

- Programa de Mobilidade e Intercâmbio

Internacional – ocorre por meio de Convênio

Bilateral (convênios específicos);

- Programa de Bolsas Ibero-americanas do Banco

Santander – alunos de graduação podem cursar até

06 meses em universidade ibero-americana. A

UECE tem enviado especialmente para a

Universidad Nacional de La Plata;

- Programa de Mobilidade Nacional ABRUEM –

mobilidade e intercâmbio entre universidades

estaduais e municipais;

- Programa Estudante-Convênio de Graduação

PEC-G – oferece oportunidade de formação

superior a cidadãos de países em desenvolvimento,

com os quais o Brasil tem convênio. Seleciona

estrangeiros entre 18 e 25 anos.

PROCAMPO

PARFOR

46 Os Princípios e Valores da instituição encontram-se dispostos no Plano de Desenvolvimento Institucional na seguinte ordem: Autonomia universitária; Universalismo; Excelência Acadêmica; Indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão; Abertura à avaliação externa; Democratização, eficácia e transparência; Respeito à diversidade e Inserção nacional e internacional (PDI, 2017-2021).

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Programas e Bolsas vinculados à PESQUISA - Programa Institucional de Bolsas de Iniciação

Científica – PIBIC/CNPq;

- Programa Institucional de Bolsas de Iniciação

Científica nas Ações Afirmativas – PIBIC-

Af/CNPq – voltada para alunos que ingressaram por

meio de Ação Afirmativa;

- Programa Institucional de Bolsas de Iniciação em

Desenvolvimento Tecnológico e Inovação –

PIBIT/CNPq;

- Programa de Iniciação Científica e Tecnológica –

ICT/CNPq;

- Programa de Iniciação Científica – IC/UECE;

- Programa de Bolsas de Preparação para

Competições Acadêmicas – PCA/UECE;

- Programa Voluntário de Iniciação Científica –

PROVIC/UECE

Programas e Bolsas vinculados à EXTENSÃO - Programa de Bolsas de Extensão;

- Programa de Bolsas de Iniciação Artística;

- Programa de Bolsa da Orquestra Sinfônica da

UECE;

- Programa de Bolsa da Banda Sinfônica da UECE.

Fonte: PDI (2017-2021), elaboração da autora.

A partir do Quadro acima, afirmamos que um estudo realizado por Alves, Macário e Vale

(2013) demonstra, que, no ano de 2008, a UECE contava com 497 bolsas de Iniciação Científica,

e em 2011 esse número subiu para 803 bolsas, representando 161,5% de aumento do número de

bolsas. Contudo, os autores observam que esse crescimento não responde às necessidades da

instituição, uma vez que, no universo de mais de 18 mil alunos de graduação, apenas 4,87%

obtiveram acesso às bolsas de Iniciação Científica no período analisado. Na perspectiva de estudo

realizado pelos autores, ora mencionados, ao analisarmos o Relatório de Gestão da UECE

identificamos que, foram distribuídas 632 bolsas de iniciação científica, 354 bolsas de monitoria,

84 bolsas PET/MEC, 16 bolsas PET Saúde/MS, 922 bolsas PIBID/CAPES, 01 bolsa Santader

Universidade e 900 bolsas do Programa de Bolsas de Estudo e Permanência Universitária (PBEU).

O número absoluto de bolsas distribuídas chega a 2.909. Também existem bolsas de pós-graduação

nos Mestrado Acadêmicos e Profissionais, e nos cursos de Doutorado.

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No âmbito dos Programas Especiais voltados para graduação, a UECE com o Programa

Ciências sem Fronteiras (CsF), Programa Licenciaturas Internacionais (PLI), Programa de

Desenvolvimento Profissional para Professores (PDPP), Programa Laboratório Interdisciplinar de

Formação do Educador (LIFE). Dentre os Programas Especiais de Apoio à Graduação, na

instituição, com apoio federal constam: Programa Nacional de Formação de Professores da

Educação Básica (PARFOR), Programa de Apoio à Licenciatura Superior e Licenciaturas

Indígenas (PROLIND), Programa de Apoio à Formação Superior em Licenciatura em Educação

do Campo (PROCAMPO), Serviço Social da Terra e Universidade Aberta do Brasil (UAB). Vale

observar que a instituição conta também com a presença do Programa Institucional de Bolsa de

Iniciação à Docência (PIBID)47.

Procedendo à análise do Plano de Desenvolvimento da Instituição, observando

características organizacionais e históricas, para identificar como se encontra estruturada a UECE,

dois aspectos relativos aos Programas e Bolsas se mostraram relevantes para nosso trabalho. É

possível identificar a presença de Programas diretamente relacionados com a reestruturação do

ensino superior no Brasil, a partir de 1990. Em especial, identificamos a existência de Programas

de mobilidade para estudantes de graduação em nível nacional e internacional48. O Programa

Licenciaturas Internacionais (PLI), por exemplo, foi criado em 2009 a partir da proposta do Grupo

Coimbra de Universidades Brasileiras (GCUB). A proposta deste Programa, de acordo com

Nascimento (2017) é incentivar a mobilidade de estudantes entre universidades brasileiras,

portuguesas e francesas em sete áreas de formação (Matemática, Português, Física, Química,

Biologia, Estudos Artísticos e Educação Física). Além deste, o Programa de Apoio à Licenciatura

47 Respaldado pelo Decreto nº 7.219/10, criado no ano de 2010, tem também respaldo na Portaria Capes nº 096 de julho de 2013. De acordo com Tavares (2015) a Lei de Diretrizes e Bases nº 9.394/96 teve seu texto alterado para inclusão do PIBID no Art. 62. A autora explica também que a Lei nº 12.796 de 04 de abril de 2013, altera o texto da Lei de Diretrizes e Bases (LDB 9.394/96) para incluir outras questões no Art. 62, §4º E §5º. 48 Os dados do Censo da educação superior (2017) informam que maior parte dos estudantes estrangeiros que circulam no Brasil é oriunda do continente americano (46,6%), do continente africano o percentual de alunos matriculados no Brasil é de 27,6%.

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Superior e Licenciaturas Indígenas (PROLIND)49, o PARFOR50 e o PROCAMPO51. A

distribuição de Programas e Bolsas alinhados pelo tripé da indissociabilidade ensino, pesquisa e

extensão corrobora nosso entendimento de que a instituição pesquisada, no âmbito de sua

identidade institucional, está atrelada aos valores do modelo único instituído a partir da Reforma

Universitária de 1968.

O modelo de universidade centrado no ensino, pesquisa e extensão tornou-se a referência

para o Sistema de ensino superior no Brasil, desde a reforma de 1968, cujo formato é reconhecido

como autenticamente universitário52, mas existem tensões e desafios quanto à manutenção deste

modelo, por parte das políticas educacionais desde as reformas iniciadas nos anos de 1990. As

reformas implementadas no ensino superior, com ênfase a partir de 1990 foram e são instituídas

por meio de um processo de metamorfose do Estado e voltam-se cada vez mais à separação e à

distinção entre instituições de ensino superior.

Acerca da oferta diversificada de ensino superior, por exemplo, onde há sepração entre

ensino, pesquisa e extensão, Balbachevsky e Holzhacker (2005) afirmam que a diversificação

institucional foi reconhecida pela primeira vez vez na legislação brasileira a partir da Lei de

49 Este Programa se encontra estruturado a partir de um conjunto de dispositivos legais, onde se destaca o Decreto Presidencial 5.051 de 19 de abril de 2004. Este Decreto promulga a Convenção de nº 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT) que trata sobre povos indígenas e tribais. A Convenção 169 da OIT foi adotada em Genebra em 1989 e a partir do Decreto Presidencial 5.0501, no Brasil, passaram a ser aplicadas as suas disposições e executadas por meio de políticas específicas. De acordo com o texto do Decreto “será executada e cumprida tão inteiramente como nela se contém” fazendo referência ao conteúdo e as diretrizes imprimidas na Convenção da OIT. Fonte: http://portal.mec.gov.br/prolind. Além do Decreto mencionado há também o Parecer 14/99, a Resolução 03/99 e o Parecer 10/2002 todos oriundos do Conselho Nacional de Educação. 50 Este Programa é direcionado à formação inicial e continuada dos professores da rede básica de educação brasileira, congrega 71 municípios de Estados da Federação, tendo 76 instituições de educação superior envolvidas (48 universidades federais, 28 universidades estaduais e 14 universidades comunitárias), ver melhores aprofundamentos em Amorim e Medeiros (2016). No âmbito dos Programas especiais voltados para a formação inicial, o Censo da educação superior (2017) demonstra que em 2017 foram oferecidas quase 10 mil vagas para esta modalidade, dentre os quais o PARFOR e o Programa Nacional de Educação na Reforma Agrária (PRONERA). 51 Também ensejado no âmbito das políticas e ações supletivas que objetivam a correção progressiva das disparidades de acesso à formação, tanto inicial como continuada, em nível superior, voltada para professores da rede básica. Por meio da Resolução/CD/FNDE de 17 de março de 2009 há a autorização para assistência financeira direcionada a instituições públicas de ensino superior que desenvolvem projetos educacionais que promovem a ampliação do acesso e permanência de estudantes (de baixa renda e grupos étnicos diversificados) na universidade. Os projetos educacionais a que a Resolução diz respeito são aqueles particularmente voltados para formação de professores indígenas, do campo e afrodescendentes. Fonte: http://portal.mec.gov.br/tv-mec. 52 Durham (1998) destaca que a questão da indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão já estava contida no movimento de criação das universidades nos anos de 1920, para aprofundamento deste tema a autora sugere o trabalho de Schwartzman e Bomeny (1984).

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Dretrizes e Bases da Educação Nacional Nº 9.394/96. As autoras ressaltam que: “ainda que

mantenha a idéia de que a vocação do ensino superior seja a pesquisa, o ensino e a extensão, a

nova lei reconhece explicitamente a existência de um formato institucional prioritariamente

voltado para o ensino” (BALBACHEVSKY; HOLZHACKER, 2005, p. 01). Ao tratar da

identidade das instituições de ensino superior53, Oliveira (2000) considera que os processos de

ajuste prevalecem sobre os processos de resistência no campo universitário, por esta razão o

desmonte do modelo único vem ocorrendo de maneira deliberada. Um elemento que nos pareceu

relevante, embora não se trate de nosso objeto específico, mas configura-se como questão de fundo

no trabalho, no PDI (2012-2016) o quadro de docentes efetivos por titulação aparece demonstrando

o seguinte:

Figura 2: Servidores docentes efetivos na FUNECE, por titulação e regime de trabalho

Fonte: PDI (2012-2016).

Figura 3: Servidores docentes efetivos na FUNECE, por classe e regime de trabalho

Fonte: PDI (2012-2016).

53 É importante explicar que a análise do autor é direcionada especialmente para as instituições federais de ensino, o que não invalida o uso análogo para as instituições estaduais de ensino superior. Sobre os modelos de universidade trataremos de maneira mais detalhada no terceiro capítulo.

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O total de docentes efetivos, incluindo todos os níveis de titulação, classe e regime de

trabalho era de 812, entre os anos de 2012 e 2016. No PDI (2017-2021), observamos, no quadro

com o mesmo conjunto de informações o seguinte:

Figura 4: Servidores docentes efetivos na FUNECE, por titulação e regime de trabalho

Fonte: PDI (2017-2021).

Figura 5: Servidores docentes efetivos na FUNECE, por classe e regime de trabalho

Fonte: PDI (2017-2021).

Houve diminuição no número de professores no PDI (2017-2021). Não é possível decifrar

quais as razões da diminuição do número de docentes efetivos, uma vez que não é possível

identificar as variáveis específicas acerca deste quantitativo, tais como: aposentadorias,

afastamentos para qualificação, licenças por motivo de saúde, exoneração e/ou outras variáveis.

Constatamos que, em números absolutos, houve uma redução do quantitativo de docentes efetivos.

Houve uma redução de 31 (trinta e um) docentes no quadro de efetivos, o que corresponde

percentualmente a 3,81% menos servidores docentes efetivos na instituição54. Quando

54 Com base na análise das informações contidas no PDI (2012-2016), em 2013 houve processo de nomeação e posse de novos professores, decorrente de Concurso Público de Provas e Títulos realizado no segundo semestre de 2012. À época havia 76 vagas de docentes falecidos e exonerados durante o período de janeiro de 2007 a julho de 2012. No período de 2007 a 2012 havia o total de 163 vagas de docentes efetivos a serem preenchidas decorrentes de aposentadorias. De acordo com o PDI (2013-2017) a meta da UECE era até 2015 completar o total de 1.133 cargos definidos por Lei, atendendo às determinações do Ministério da Educação (MEC) e do Conselho Estadual de Educação do Ceará (CEE). Embora na análise dos quadros seja possível identificar decréscimo na variação do número

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confrontamos o PDI (2012-2016 com o PDI (2017-2021) percebemos que, em 2015, houve

Concurso Público de Provas e Títulos, contudo, não consta a informação de quantos docentes

foram aprovados e/ou contratados55.

Além da redução no número de docentes efetivos, também constatamos, por meio do

Relatório de Gestão da UECE (2015), que houve corte de recursos federais na instituição, o que

provocou uma retração no número de matrículas56. No Relatório consta que, devido aos cortes

orçamentários, realizados no âmbito do PARFOR e da Universidade Aberta do Brasil (UAB) não

foi possível aumentar o número de matrículas, nem criar novos cursos. Além disto, os professores

aprovados no concurso não foram contratados. O quadro a seguir demonstra a situação da

instituição, em termos de número de matrículas de 2012 a 2015 e o número de professores

contratados.

absoluto de docentes efetivos na instituição, no PDI (2017-2021) o texto, no tópico “Dimensão 5 – Perfil do Corpo Docente” (p.67) descreve que a instituição tem cerca de 1.116 docentes, sendo 69,9% efetivos e 30,1% substitutos e visitantes. O Relatório de Gestão da UECE (2017) apresenta a informação de que 340 processos foram realizados no ano de 2017, dentre os quais constam pedidos de afastamento para aposentadoria, averbação de tempo de serviço, declaração de tempo de serviço, cumprimento de diligênciass dos processos de aposentadoria e implantação de aposentadorias. Para maiores detalhes ver: Relatório de Gestão da UECE (2017). 55 No ano de 2014 houve greve de professores, a reivindicação era de que fosse realizado concurso público para docentes efetivos. Em 2013, 60 (sessenta) novos professores tomaram posse e em 2016, mais 15 (quinze) professores efetivos foram contratados. Fonte: http://g1.globo.com/ceara/noticia/2014/09/professores-em-greve-da-uece-protestam-nas-ruas-de-fortaleza.html; http://g1.globo.com/ceara/noticia/2013/07/60professorestomam-posse-nesta-segunda-feira-na-uece.html; https://www.sct.ce.gov.br/2016/03/16/quinze-novos-professores-efetivos-da-uece-tomam-posse/. 56 Não será possível nos determos na análise detalhada e específica acerca da expansão no âmbito da UECE, contudo, o panorama esboçado a partir do PDI (2012-2016 e 2017-2021) e dos Relatórios de Gestão (2015; 2017) evidencia que houve crescimento da pós-graduação, apesar da retração no número de matrículas na graduação.

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Figura 6: Principais Metas UECE 2014-2015

Fonte: Relatório de Gestão da UECE (2015).

De acordo com a figura anterior, apesar da expansão a nível nacional, a instituição sofreu

uma redução no número de matrículas nos cursos de graduação. Em 2014, havia o total de 18.499

alunos matriculados na instituição e, em 2015, esse número caiu para 16.995, o equivalente a um

percentual de 8,13% a menos no número de matrículas, correspondente a menos 1.504 alunos na

instituição57.

Apesar da redução de incentivo financeiro por parte da instância federal, os Programas e

Bolsas distribuídas entre atividades de ensino, pesquisa e extensão – como citado, no Quadro 12,

houve um maior apoio da esfera federal direcionada ao fortalecimento da formação inicial, ou seja,

para o ensino de graduação. Estão funcionando cerca de 07 (sete) Programas com essa finalidade

(PDPP, PARFOR, PROCAMPO, PEC-G, PLI, PROLIND, PIBID).

57 A Câmara de Coordenadores da instituição vem buscando meios para solucionar o problema de alunos com tempo excedente na instituição. Assim, criando meios de conduzir esses alunos à finalização dos cursos, haverá possibilidade de se criar novas vagas na instituição.

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Além disto, é possível observar um viés da internacionalização58, figurado nas Bolsas

específicas para mobilidade de estudante entre países ou no Brasil. Sobre este aspecto, o Relatório

de Gestão (2015) destaca que a UECE tem convênio com 21 (vinte e um) países, dentre os quais

se destacam os seguintes: França, Portugal, Chile, Canadá, Alemanha, Suécia, Argentina, Cabo

Verde e Espanha. No ano de 2013, foram assinados três convênios internacionais pela UECE e,

em 2014, mais três convênios, que envolvem a Universidade de La Plata (Argentina), o Instituto

Universitário de Educação de Cabo Verde e a Universidade La Frontera do Chile.

As informações relativas aos Programas de formação inicial, às Bolsas de estudo e aos

Convênios de intercâmbio (internacionalização) fortalecem e revelam a estruturação da UECE.

Por conseguinte, tais informações estão de acordo como o nosso interesse de pesquisa. No âmbito

da observação sobre a repercussão das reconfigurações do campo universitário, os professores

pesquisados são as figuras essenciais, que movimentam o mercado de trocas simbólicas, conforme

as condições estruturais da instituição e, também, de acordo com as suas condições (posições e

disposições) de seus habitus e seus capitais no interior do campo. A referencialidade ao tripé –

ensino, pesquisa e extensão – aparece de maneira estruturada nas falas, nas atividades

desenvolvidas e no conjunto de documentos, que permeiam a estrutura institucional da UECE e da

FAFIDAM.

Convém observar, que nossa análise e caracterização recaem sobre uma instituição de

ensino superior com categoria administrativa estadual59. As implicações acerca deste aspecto são

variadas, uma vez que:

As universidades estaduais constituem um segmento específico do setor público de ensino

superior brasileiro. Diferentemente das federais e das particulares, as universidades

estaduais estão fora do âmbito de atuação do Ministério da Educação e do Desporto, sendo

mantidas e fiscalizadas por seus respectivos Estados. Isso significa, que a interface desse segmento com os órgãos federais se dá esporadicamente, mediante pleitos de apoio

financeiro adicional (SAMPAIO, BALBACHESKY; PEÑALOZA, 1998, p. 4).

58 É importante estar atento ao fato de que o conceito de internacionalização converge para uma variedade de entendimentos, é um conceito complexo que pode, a depender das condições que se aplica, estar ligado à cooperação ou a dominação (FRANCO et al, 2010). 59Tratamos da relação da UECE com o campo científico nacional, fazendo um recorte das principais instituições que

compõem este no terceiro capítulo.

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Houve crescimento nas atividades de pós-graduação, a partir dos dados do Relatório de

Gestão (2015). No Quadro anterior, observamos que no ano de 2014 foi programado pela

instituição atingir o número de 1.419 matrículas na pós-graduação, e, este número sido superado.

Na análise do planejado das matrículas com base somente no ano de 2014, é perceptível o

crescimento de 9,7% do número total, superando o estipulado pela instituição. Quando comparado

o número absoluto de matrículas na pós-graduação, entre 2014 e 2015 é perceptível um

crescimento de 7,5%. Embora não tenha atingido o número programado para 2015, que era de

2.064 matrículas, é possível afirmar, que houve crescimento, quando comparamos com o ano

anterior.

2.5 A FACULDADE DE FILOSOFIA DOM AURELIANO MATOS – FAFIDAM

A Faculdade de Filosofia Dom Aureliano Matos (FAFIDAM) foi estruturada como

autarquia estadual, em janeiro de 1967, pela Lei Nº 8.716, quando passou a gozar de autonomia

financeira, administrativa, disciplinar e pedagógica. Até o ano de 1973, a instituição teve

personalidade jurídica e independência orçamentária, tendo sido incorporada pela Fundação

Educacional do Estado do Ceará, no final do ano de 1973. As atividades na instituição foram

iniciadas no ano de 1968, quando houve a aula inaugural. Os primeiros cinco cursos da instituição

foram: Peadagogia, História, Geografia, Letras e Matemática. Atualmente, a instituição oferece

nove (09) cursos de Licenciatura, tais como: Biologia, Física, Geografia, História, Letras

(Inglês/Português), Matemática, Pedagogia, Química e a Licenciatura em Educação do Campo –

implantada na instituição a partir de 2010 por meio do PROCAMPO que é uma Programa especial

para formação de professores do campo.

Situada na região do Baixo Jaguaribe, a FAFIDAM recebe alunos de dezenove (19)

cidades, tem mil e seis (1006) alunos regularmente matriculados e um corpo docente formado por

cento e dez professores (110). O mapa a seguir mostra as principais regiões de onde os alunos da

instituição são originários:

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Figura 07: Região do Baixo Jaguaribe

Fonte: Atualização do Plano de Desenvolvimento Regional do Vale do Jaguaribe/2016

*Destaques nossos

Como é possível observar a cidade de Limoeiro do Norte é a “sede cultural” que concentra

a oferta de ensino de graduação pública e gratuita. Desde sua criação, no final dos anos de 1960 a

FAFIDAM oferece somente cursos de Licenciatura, tendo se constituído ao longo de seus

cinquenta anos como referência neste tipo de ensino. A distribuição do número de alunos por

cidade se apresenta da seguinte maneira:

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Figura 8: Número de alunos por cidade FAFIDAM/UECE

Fonte: Controle Acadêmico da FAFIDAM, ano 2018. Elaboração da autora.

O quadro atual de professores da instituição é de cento e dez (110) profissionais, conforme

já citamos. Dentre efetivos e substitutos. O gráfico abaixo mostra o número de efetivos e

substitutos por curso. A lógica do gráfico é: o número maior corresponde sempre ao número de

docentes efetivos.

3222

506

187225

1241

3046

94174

232

55

Aracati

Ereré

Itaiçaba

Jaguaruana

Morada Nova

Palhano

Potiretama

Russas

Solonópolis

0 50 100 150 200 250

Nº de alunos por cidade FAFIDAM/UECE

Nº de alunos por cidadeFAFIDAM/UECE

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Figura 9: Professores efetivos e substitutos na FAFIDAM

Fonte: Controle Acadêmico da FAFIDAM, ano 2018. Elaboração da autora.

No conjunto das observações realizadas, considerando as reconfigurações do campo

universitário, identificamos, a partir da consulta aos documentos da instituição, que houve ingresso

de novos docentes a partir de 2016, conforme demonstra o quadro abaixo:

Quadro 13: Ingresso de novos docentes na FAFIDAM a partir de 2016 CURSO DOCENTE EFETIVO

(a partir de 2016)

DOCENTE

SUBSTITUTO

(a partir de 2016)

TOTAL

Ciências

Biológicas

02 05 07

Física 02 03 05

Geografia 01 03 04

História 01 04 05

Letras 02 07 09

Matemática 01 02 03

Pedagogia 03 06 09

Química 01 05 06

TOTAL 13 novos efetivos 35 novos substitutos 48 (efetivos e

substitutos

Fonte: Controle Acadêmico da FAFIDAM. Elaboração da autora.

A FAFIDAM conta com seis (06) Laboratórios cadastrados no sistema da UECE.

Desenvolvemos nossas análises a partir da inserção no LECAMPO. Além dos cursos de graduação

já mencionados e dos Laboratórios descritos a FAFIDAM oferece um Mestrado Acadêmico de

natureza Intercampi.

Ciências Biológicas; 8 Ciências Biológicas;

5Física; 7

Física; 3

Geografia; 9

Geografia; 3

História; 11

História; 4Letras; 13

Letras; 7

Matemática; 9

Matemática; 2

Pedagogia; 11

Pedagogia; 7

Química; 6

Química; 5

Professores efetivos e substitutos na FAFIDAM

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Quadro 14: Laboratórios da FAFIDAM/UECE

Laboratórios da FAFIDAM*

01 Lab. de Biologia

02 Lab. de Física Luíz Cláudio

03 Lab. de Geografia - LAGEO

04 Lab. de Matemática para Formação do Educador

05 Lab. de Química

06 Lab. Interdisciplinar de Formação do Educador - LECAMPO

07 Programa de Educação Tutorial – PET/História**

*Informações coletadas do PDI (2017-2021). Elaboração da autora.

**Acrescentamos o PET nessa relação dos Laboratórios porque este funnciona como laboratório do curso de

História

A FAFIDAM é uma instituição de pequeno porte, durante muito tempo a instituição

precisou utilizar a estrutura do Colégio Diocesano e da escola Liceu de Artes de Ofícios para

ofertar as disciplinas. Após reformas, ocorridas nos últimos anos, a instituição já possui o número

de salas sufucientes para sua demanda. No ano de 2019 foi inaugurado o Restaurante Universitário,

que, desde sempre, foi um serviço necessário, mas não ofertado. Os estudantes da FAFIDAM, em

sua maioria, não reside na cidade, precisando realizer deslocamentos diários, pois a instituição não

dispõe de residência universitária. O Restaurante Universitário foi construído no local de uma

antiga cantina, que servia como espaço de convivência de alunos e professores. Com a demolição

da cantina para construção do Restaurante, o espaço de convivência ficou mais restrito para

atividades coletivas. O prédio do restaurante foi construído tendo passado um longo tempo sem

funcionar. Em decorrência da demora na finalização da obra do Restaurante Universitário, os

alunos fizeram uma pichação na parede lateral, com a inscrição: “bora funcionar?”. A foto a seguir

é da referida parede.

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Foto 1: Parede lateral do Restaurante Universitário (2018). Fonte: arquivo pessoal.

Há uma Biblioteca na instituição, que conta com o serviço de empréstimo de livros e

dispõe de um laboratório com computadores para acesso dos alunos para a realização de pesquisas

e de trabalhos acadêmicos. A instituição dispõe de um auditório com duzentos lugares, sala

específica de almoxarifado, Controle Acadêmico, Sala de Direção, uma sala para professores, sala

de Movimento estudantil, Secretaria, salas de aulas e os laboratórios de estudos ou mistos

(pesquisa/extensão). Na ocasião da comemoração dos cinquenta anos da FAFIDAM, na Mesa de

Solenidade, estavam presentes o prefeito da cidade e outras figuras importantes. Na ocasião, o

mesmo doou um prédio que fica localizado na esquina da FAFIDAM. Em decorrência do

funcionamento do Mestrado, a instituição conseguiu recursos para construção de uma Unidade de

Pesquisa, que servirá como espaço de pesquisa científica disponível para a comunidade acadêmica.

A Faculdade de Filosofia Dom Aureliano Matos está situada na região do Baixo

Jaguaribe, especificamente, na cidade de Limoeiro do Norte. Os dados do Censo do IBGE

informam que no ano de 2010 a população de Limoeiro do Norte era de 56.264 pessoas e no ano

de 2018, o número estimado é de 59.278 pessoas. Os dados do IBGE explicitam também que

43,8% da população têm o rendimento nominal mensal percapta de até ½ salário mínimo. A media

mensal dos trabalhadores formais é de 1,8 salários mínimos. Os dados de 2010 mostram que a taxa

de escolarização de 06 a 14 anos era de 98%. Neste mesmo ano, Limoeiro contava com 342

docentes de ensino fundamental, 97 docentes do Ensino Médio. A cidade dispõe de 26 escolas de

ensino fundamental e 05 escolas de Ensino Médio.

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Além da FAFIDAM, em Limoeiro do Norte há mais outras seis (06) instituições de

ensino superior, que ofertam ensino de graduação e pós-graduação, dentre as quais somente duas

são públicas: Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia (IFCE) e a Universidade Aberta

do Brasil (UAB). As outras instituições são privadas: Faculdade Vidal de Limoeiro (FAVILI),

Faculdade Integrada do Vale (FIVALE), Universidade Potiguar (UNP) e Polo de Apoio Presencial

Anhanguera. Destas, apenas a FAVILI dispõe em sua página na internet informações referente à

sua estrutura e organização. Em anexo, no final deste trabalho, encontram-se disponíveis as

informações sobre a oferta de extensão, iniciação científica e monitoria por parte desta instituição.

As instituições de esnino superior privado no Brasil não têm obrigatoriedade legal de ofertar

pesquisa e extensão, pois o ensino é a sua única função.

2.6 Apresentação do Laboratório de Estudos da Educação do Campo e Mestrado Acadêmico

Intercampi

Conforme já citamos, nossa análise privilegia um olhar sobre o Laboratório de Estudos

da Educação do Campo (LECAMPO) vinculado ao curso Pedagogia, e, também, sobre o Mestrado

Acadêmico Intercampi. O Laboratório de Estudos da Educação do Campo foi implementado na

instituição a partir do Edital Nº 003/2006, como um resultado de um projeto submetido à Fundação

de Apoio à Pesquisa (FUNCAP)60. O Laboratório de Estudos da Educação do Campo, doravante

referido por nós de LECAMPO ou Laboratório completou dez anos de atividades relacionadas

direta e indiretamente com a Educação do Campo, Educação de Jovens e Adultos e Educação

Popular, em 2018. A entrada dessas temáticas, no espaço do campo universitário, ao qual a

FAFIDAM encontra-se localizada, se deu a partir dos objetos61 de estudo e pesquisas dos

professores que coordenam o Laboratório desde sua institucionalização, no ano de 2008.

60 É importante frisar que, no ano de 2006, a FAFIDAM também desenvolvia atividades vinculadas ao Programa Nacional de Educação na Reforma Agrária (PRONERA), tendo este Programa perdurado de 2006 a 2010. Se faz importante destacar esta informação para que se evidencie que a relação do curso de Pedagogia com as disciplinas e temáticas voltadas para Educação do Campo, Educação de Jovens e Adultos, Educação Popular vem se estabelecendo na instituição há longo tempo.

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110

Primordialmente a decisão de analisar estes dois espaços e suas relações de um

levantamento que realizamos, mapeando o ingresso de alunos da instituição em Programas de Pós-

Graduação, no período de 1998 a 2019. Fizemos este mapeamento a partir da percepção de uma

possível regularidade quanto ao ingresso de ex-alunos da FAFIDAM na pós-graduação. Esta

percepção desencadeou todo o processo de análise desta pesquisa, no sentido das operações

práticas, das tomadas de decisão em relação aos procedimentos e análises posteriores. O referido

mapeamento foi o primeiro passo no sentido de buscar identificar por qual razão os estudantes da

FAFIDAM logravam êxito nas seleções de mestrado e, posteriormente, doutorado.

Após o levantamento desses dados, observamos que eles corroboravam uma linha

importante da nossa pesquisa, pois evidenciava os cursos que mais projetavam alunos na pós-

graduação. Isto indicou alguns caminhos acerca da elaboração dos critérios para escolha dos

sujeitos que seriam entrevistados, pois seria impossível realizar investigação com todos os

professores e alunos da instituição. Aos poucos, a pesquisa foi sendo construída e, escolhemos

os procedimentos que melhor responderiam às questões iniciais da investigação.

Identificamos que, não era tão alta a taxa de projeção dos alunos nos cursos de pós-

graduação como “imaginávamos” incialmente, mas não era irrelevante. Assim, passamos a

observar a rotina da instituição, procurando “descobrir” o que movimentava o interesse de certos

estudantes, que com frequência estavam próximos a determinados professores. As divisões entre

preferências de alunos por este ou aquele professor, o burburinho dos corredores sempre cheios de

alunos, trazendo para a universidade as questões que saltavam e saltam nas mídias e redes sociais.

As paredes com cartazes de denúncias de “professores assediadores”, misturados à mensagens

religiosas, outras mensagens de apoio à autoestima fixadas nas paredes dos banheiros femininos.

Com uma intuição persistente consideramos que fazia considerar que a FAFIDAM

propiciava cenários de mudança e superação de muitas trajetórias, daqueles que por ela circulavam

e circulam e, por ser uma instituição localizada no interior, recebe alunos de várias outras cidades

de interior – muitas menores que Limoeiro do Norte em termos populacionais. Nesse sentido,

observamos que o perfil da instituição é majoritariamente popular, conforme demonstra o

Relatório do Censo Discente de 2013. A população estudantil da UECE sobrevive em cenários de

pobreza, poia 44,33% sobrevive com renda de 01 a 03 salários mínimos; e 15,91 vive em cenários

de extrema pobreza, com renda de até um salário mínimo.

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111

Desta forma, utilizando nosso conhecimento nativo acerca deste espaço fomos

palmilhando o campo da pesquisa, até identificar, que, na instituição havia inúmeras, tais como:

entre professores, entre áreas, posições políticas e, também entre objetos comuns de disputas. Este

fato se estende às divisões entre funcionários: aqueles do primeiro escalão, os “marginalizados”,

os mais antigos e os novatos. Neste cenário, passamos a observar que a instituição tem espaços

nos quais os grupos afins se encontram, compartilham dos mesmos pensamentos, “brigam” pelas

mesmas questões. A estrutura físca da FAFIDAM é pequena e não dispõe de sala de professores.

Há, somente, uma sala grande, na qual os professores podem tomar café, deixar seus materiais,

mas não oferece as condições de “isolamento” e nem mesmo de trabalho individual. Muitos

professores entram e saem na instituição, ministram suas aulas, realizam o trabalho burocrático e

vão embora, o que impede uma melhor convivência entre os docentes.

Na direção oposta a essa, há os professores que estão vinculados à atividades semanais,

que ocorrem em âmbito de laboratório, razão pela qual há um fluxo contínuo de alunos reunidos

semanalmente nestes espaços. A partir desta percepção e por outras, que se apresentarão ao longo

do texto, observamos que alguns professores ocupavam posições estratégicas, que lhes permitiam

implementar uma economia de bens simbólicos significativa, capaz de estabelecer uma

movimentação com problemáticas próprias do campo universitário e com temas da região, na qual

a instituição se encontra localizada. Em geral, tais grupos “pautam” a agenda institucional e

ocupam o espaço da FAFIDAM com seus objetos de estudo.

Além disto, observamos que, essas práticas se dão atreladas ao princípio da

indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão. Por se tratar de uma instituição de pequeno

porte, a FAFIDAM possui uma dinâmica de funcionamento em que é possível identificar certas

linhas principais de atividades das quais há envolvimento regular de alunos e professores. Então,

privilegiamos a análise centrada a partir do Laboratório de Estudos do Campo, pois suas atividades

ocorrem de maneira regular, havendo reiteradamente o reforço à ideia de que este Laboratório se

constitui como uma família, marcado por intensas atividades seja de pesquisa ou de extensão, os

alunos e professores utilizam o espaço de maneira ampla, promovendo momentos de café da tarde,

troca de presentes, bazar para aquisição de recursos para viagens acadêmicas – enfim, há uma

logística de funcionamento própria do Laboratório. As análises sobre estes aspectos serão tecidas

ao longo do texto.

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Foto 2: Finalização do semestre em 2018/Reunião de trabalho LECAMPO

*Captura em 19/12/18

Além do Laboratório, o Mestrado Acadêmico Intercampi em Educação e Ensino (MAIE)

criado na FAFIDAM, no ano de 2011 e iniciadas as atividades em 2013, foi o primeiro Mestrado

Acadêmico do interior do Ceará. O aludido Mestrado tem caráter interdisciplinar,

interdepartamental, interinstitucional e intercampi, por isso realiza suas atividades em parceria

com a Faculdade de Educação, Ciências e Letras do Sertão Central (FECLESC) da cidade de

Quixadá/CE. O Mestrado foi criado pela Resolução Nº 3385/2011-CEPE, de 16 de maio de 2011,

Resolução Nº 808– CONSU/UECE, de 27 de junho de 2011, Resolução Nº 879/2012- CONSU,

de 25 de junho de 2012 e aprovado pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível

Superior (CAPES), em 22 de outubro de 2012. Tem como área de concentração Educação, Escola

e Movimentos Sociais, constituído por duas linhas de pesquisa: 1. Educação, Escola, Ensino e

Formação Docente e 2.Trabalho, Educação e Movimentos Sociais.

Por esta razão, entendemos que somente por meio de análise das práticas seria possível

identificar a economia de bens simbólicos que, muito provavelmente, era o motor responsável por

tal aquisição na instituição, pois as condições materiais da instituição e a sua categoria

administrativa de universidade estadual a posicionam em situação de relativa desvantagem frente

à instituições hegemônicas que compõem, por exemplo, o conjunto de instituições de ensino

superior no Estado do Ceará. Pelas lentes da praxiologia bourdieusiana, entendemos que, a

instituição pesquisada desenvolve uma performance buscando, por meio de variados

investimentos, equiparar-se e legitimar-se como produtora e difusora de conhecimento científico.

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CAPÍTULO III - O CAMPO CIENTÍFICO NACIONAL: modelos de universidade em discussão

No primeiro capítulo deste trabalho, apresentamos um esboço geral de como se constitui,

a partir da praxiologia bourdieusiana, o campo universitário no Brasil. Neste capítulo,

apresentamos maiores detalhes acerca deste campo, evidenciando melhor suas características, com

ênfase na produção científica que, demarca, atualmente, um ponto fundamental de diferença entre

as instituições de ensino superior públicas e as instituições de ensino superior privadas. Com base

nos dados da pesquisa podemos afirmar, que a universidade pública brasileira é responsável

majoritária pela produção da ciência. Assim, o campo universitário é compreendido como

manifestação do campo científico, razão pela qual utilizamos as duas denominações ao longo do

texto. Como uma espécie de prolegômenos, buscamos evidenciar que as reconfigurações as quais

o campo universitário vem passando se encontram atreladas à questão dos ‘modelos de

universidade’, que a partir das décadas de 1980 e 1990 passam por redefinições em face da reforma

do Estado.

Em seguida, estabelecemos uma análise comparada entre o trabalho de Miranda (2008) e

os dados recentes relativos à produção científica brasileira. Fazemos uma análise do campo

nacional até o campo científico no Ceará. Por último, fazemos um comparativo entre os achados

de Miranda (2008) e as reconfigurações atuais da FAIDAM. Os substratos da pesquisa realizada

pela autora servem de referencial empírico para um panorama e um quadro comparativo, que

demonstram importantes reconfigurações e mudanças na instituição nesta última década.

3.1 MODELOS DE UNIVERSIDADE NO BRASIL

Mediante a discussão até o momento empreendida, é oportuno ressaltar, que, no núcleo

das reconfigurações do campo universitário, se encontra a problemática referente aos modelos de

universidade. Nesses termos, Sguissard (2004) observa que apesar de nunca se ter firmado

formalmente/oficialmente um modelo típico de universidade no Brasil, a cada época, surge um

modelo ideal ou, idealizado desta instituição a partir de características determinadas com ênfase

nos modelos predominantes nos países centrais. Desta forma, Sguissard (2004) considera, que, no

atual contexto, é possível falar de uma superposição de modelos universitários, ao mesmo tempo

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o trânsito de uma universidade “pública” para uma universidade privada de caráter neoprofissional,

heterônoma e competitiva.

Se na atualidade, é possível discutir os modelos de universidade, é relevante retomar

alguns aspectos históricos sobre sua estruturação desde a Idade Média, evidenciando que nem

sempre a universidade e o ensino superior estiveram organizados da forma como atualmente

conhecemos. Por conseguinte, é necessário falar das características de tais modelos, pois estas são

referenciais para a estruturação do complexo sistema de ensino superior na atualidade. É a partir

desses modelos que as instituições de ensino superior se estruturam no sentido de sua relação, ou

não, com ensino, pesquisa e extensão.

3.2 Origens e desdobramentos dos modelos: napoleônico, humboldtiano e americano

As primeiras universidades, de acordo com Charle e Verger (1996), surgiram na Europa

ocidental no início do século XIII e foram herdeiras de uma longa história, que remete à

Antiguidade cristianizada. As universidades de Bolonha, Paris, Oxford e a universidade de

Medicina de Montpellier foram as primeiras experiências universitárias no Ocidente. Essas

primeiras instituições apresentaram algumas características importantes, tais como: dependência

em relação ao movimento associativo bastante forte no início do século XIII, período em que se

estabeleceram os estatutos próprios; eleição dos representantes entre o movimento associativo;

auxílio mútuo na garantia da proteção ao exercício autônomo da atividade de ensinar.

Como segunda característica destaca-se: ruptura com o estreito quadro diocesano, que

constituía as escolas anteriores. Charle e Verger (1996) sublinham que foi reivindicada uma

autoridade intelectual em escala ocidental. Fatores como o progresso urbano, as novas

necessidades das cidades favoreceram o surgimento dessas novas instituições. Os autores afirmam,

ainda, que as disfunções surgidas nas escolas anteriores aguçaram as necessidades “profissionais”

do ensino, de modo que a solução universitária foi o caminho para tal.

Inicialmente as formas de funcionamento dessas instituições ocorriam de maneira um

tanto “desorganizada”, visto que cada um ensinava à sua maneira, percorrendo superficialmente

as autoridades e misturando disciplinas. Para controlar tal situação, os mestres estabelecidos se

associaram com a finalidade de limitar a proliferação das escolas e impor um regime de estudos

bem definidos. O apoio para esta organização veio do papado (papas, teólogos e canonistas do séc.

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XIII) e, também dos reis da Inglaterra e França. Tais apoios garantiram a autonomia universitária,

ao mesmo tempo as interferências nos negócios da universidade ocorriam por parte do papado, o

que levou à admissão de ordens mendicantes no interior da universidade (Dominicanos e

Franciscanos). Vale ressaltar que essa ‘autonomia universitária’ se deu nos moldes da época,

portanto, não se deve confundir com o que hoje denominamos de autonomia universitária. É

necessário considerar que os contextos históricos são diferentes evitando-se o ‘presentismo’.

Segundo Charle e Verger (1996) naquele contexto, as universidades eram bastante

móveis, pois não havia barreira alguma à validade universal dos diplomas. Essa mobilidade

favorecia Paris e Bolonha, na percepção dos autores já mencionados. Além disto, afirmam que os

alunos, que frequentavam as universidades eram de “classe média”. O percentual de nobres era

muito baixo nessas instituições, pois esse tipo de ensino não “acrescentava” muito a este grupo

social, porque não conduzia ao tipo de cultura e nem ao tipo de carreira ao qual se dedicavam

preferencialmente.

Apesar dos conflitos e crises, conforme Charle e Verger (1996, p. 30) durante a Idade

Média, as instituições universitárias ofereceram uma “[...] cultura de base muito sólida, um modo

rigoroso de raciocinar, uma arte de analisar minuciosamente os textos e, igualmente, noções gerais,

os elementos de uma visão coerente do mundo”. A cultura de base assumiu grande relevância na

Idade Média e, portanto, houve o reconhecimento da competência adquirida a partir dos estudos,

mesmo que o indivíduo não concluísse sua formação e não obtivesse um diploma. A partir das

escolas e das universidades medievais surgiu no Ocidente, a figura social do “intelectual”.

Perdurou durante a Idade Média, de acordo com Charle e Verger (1996) a percepção da

“Ciência Sagrada”, havendo dificuldades quanto à autonomia em relação aos ensinamentos, posto

que a Exegese Bíblica era praticada desde a Alta Idade Média, tendo se juntado à Teologia. Desta

maneira, havia a ideia de que todo o saber existente era derivado de um número de textos

produzidos por “autoridades” veneráveis, que desde a Antiguidade, eram a fonte de todo o saber.

O progresso do conhecimento, apenas, podia derivar dessas fontes, devendo se constituir em uma

exegese aprofundada desses textos.

Para Charle e Verger (1996) as primeiras universidades não obedeceram a um modelo

único, uma vez que havia dois sistemas. Na região norte da Europa, as universidades eram

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originariamente associações de mestres, tal como federações de escolas, tendo como disciplinas

principais Artes Liberais e Teologia, com a marca eclesiástica bastante presente. Nas regiões

mediterrâneas as universidades eram originariamente associações de estudantes, e a disciplina

predominante era o Direito, e em segundo plano Medicina. Esse cenário perdurou do século XII

até, pelo menos, o século XV. Os autores relatam que as primeiras escolas de Direito surgiram

também neste período.

Embora as universidades no século XIII tenham alcançado autonomia e se iniciado a

separação entre “sentenças” de cunho dogmático e “questões” debatidas a partir da dialética, havia

submissão à autoridade da Igreja. O método escolástico foi uma das bases do ensino medieval.

Contudo, os limites da escolástica se fizeram presentes, havendo marginalização de disciplinas

vistas pelos escolásticos como de menor importância ou, mesmo sem “valor” erudito. Por exemplo,

eram ignoradas as expressões em língua vulgar, o Direito consuetudinário, as “Ciências Exatas”,

as Artes Mecânicas, claramente uma recusa à quantificação e a ausência de qualquer recurso de

experimentação. Charle e Verger (1996, p. 39) observam que:

O peso da Teologia Escolástica, baseada no recurso universal à dialética, não só

comprometeu, como vimos, a emancipação da Filosofia, mas, na própria Teologia,

impediu a renovação de uma exegese bíblica mais aberta à História e à Filologia ou a

consideração de uma abordagem mais afetiva, até mesmo mística, de Deus, que teria

muitas vezes melhor respondido à expectativa dos fiéis.

A “arrogância dos mestres, o rigor inumano dos canonistas, a aridez e o palavratório

estéril dos teólogos” (CHARLE; VERGER, 1996, p. 39) caracterizou o modus escolástico, pelo

qual a universidade se organizou, em termos de disciplinas e em termos de sua autonomia, em

relação aos poderes eclesiásticos. A partir do século XVI, começam a ocorrer algumas mutações

institucionais, tendo havido uma multiplicação das universidades, pela emergência dos Estados

Nacionais e, também, pelas rupturas causadas pela Reforma – o que levou não apenas protestantes

a dotarem-se de uma rede própria de estabelecimentos como também a Igreja Católica multiplicou

universidades novas, principalmente em áreas de fronteiras, como Áustria, Baviera, Renânia

(CHARLE; VERGER, 1996).

A partir da formação dos Estados Nacionais surgiu um crescente controle exercido pelos

poderes políticos sobre as universidades, sobretudo, pelo fato de que os Estados passaram a tomar,

cada vez mais para si, a responsabilidade dos salários dos regentes, além da construção de prédios.

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Charle e Verger (1996) consideram que a renovação do saber a partir da Idade Média e sua forte

adesão não são explicadas apenas, pelo desenvolvimento geral do Ocidente, no sentido do

crescimento urbano em si mesmo e da aceleração das trocas, mas pelo fato da Igreja (em menor

escala), os poderes leigos e as classes dirigentes terem sentido a crescente necessidade de apelar

aos letrados para gerir seus negócios públicos e privados.

Nesse sentido, podemos afirmar que o nascimento das primeiras universidades se deu,

não exatamente por um “esgotamento” do modelo anterior das escolas - como algumas correntes

de pensamento costumam conceituar – mas por um processo de reclassificação. Portanto, a partir

dos séculos XVI ao XVIII iniciou-se nova fase, passando a existir novas fundações universitárias.

O ato de fundação passou a ser de iniciativa de autoridades políticas (príncipe), ou mesmo pela

vontade dos cidadãos com chancela do papado.

De acordo com Charle e Verger (1996) nem todos os países foram beneficiados com essas

novas fundações62, os autores afirmam que:

Na América Latina, as mais antigas fundações foram as de São Domingos (1538), a de

Lima (1551) e a do México (1551); instituídas por decreto real com estatutos inspirados

nos de Salamanca e de Alcalá, quase sempre controladas por ordens religiosas

(Dominicanos, Jesuítas) (CHARLE & VERGER, 1996, p. 42).

Houve importante crescimento dessas instituições em diversos países, de modo que a

significação social dos estudos e dos graus começou a ser questionada, razão pela qual se iniciou

uma série de reformas universitárias. Os modelos de universidade alemão/humboldtiano,

francês/napoleônico e o modelo americano foram gestados no transcurso do desenvolvimento das

instituições de ensino superior, predominantemente, nos países centrais.

Vale destacar, que, no bojo da discussão em torno dos modelos, pairam algumas questões,

que, no contexto brasileiro, têm uma dimensão muito significativa, desde o surgimento das

primeiras experiências com a universidade, tendo havido desde então muitas lutas em torno

daquilo que se denomina como a(s) função/funções das universidades. Além das funções, os

62 Houve monopólio de Coimbra e Cracóvia, mas também houve proliferação para países como a Espanha, Itália, França. As fundações surgiram também no norte da Europa e Alemanha e as mais promissoras foram Konigsber (1554), Leyde (1575), Graz (1585), Dublin (Trinity College, 1592), Abo (1640) Halle (1693) Gottingen (1733), Moscou (1755) (CHARLE & VERGER, 1996).

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modelos de universidade funcionam como base para as concepções, que fundamentam essa

instituição e estabelecem diretrizes para sua organização estrutural.

Sobre os modelos de universidade, Cunha (2007) afirma que de 1812 a 1816, os maiores

filósofos do idealismo escreveram sobre a ideia de universidade e sua realização. Cunha (2007)

destaca cinco autores, que produziram, em poucos anos, talvez uma das mais densas reflexões

sobre a instituição universitária desde sua criação no século XIII. Desta maneira, Hegel, Schelling,

Fichte, Schleiermacher e Humboldt trouxeram contribuições, que, até os dias atuais, reverberam

nas concepções sobre os modelos de universidade. De acordo com Cunha (2007, p. 17):

Os cinco filósofos pensadores da universidade em gestação tinham em comum a

concepção de que se tratava de realizar, na prática, a Universidade, isto é, a ideia de

Universidade. Para uns, essa ideia implicava a manifestação diversa do saber uno; para

outros, a totalização sistemática do saber diverso. Conforme abraçassem uma ou outra

variante da concepção ideal de universidade, as propostas para a universidade real

brotavam com marcas liberais ou autoritárias.

Assim, Schleimacher propunha uma relação tênue entre a universidade e o Estado, quase

totalmente reduzida à sua manutenção econômica. Nessa ótica, não deveria haver a imposição de

programas e métodos aos professores e, os alunos poderiam escolher aqueles professores de sua

preferência, em livre concorrência (CUNHA, 2007). Fichte por sua vez, defendia que cada

professor deveria ter o monopólio de uma matéria e, assim como os estudantes, deveriam estar

sujeitos a um rígido esquema hierárquico e disciplinar. Este esquema disciplinar deveria ser

controlado por instâncias de supervisão (idem).

Especificamente, no Brasil, de acordo com Mazzilli (2011, p. 207):

[...] foram incorporados os modelos que englobam as funções clássicas da universidade,

de conservação e transmissão da cultura, de ensino das profissões e de ampliação e

renovação do conhecimento. Esses modelos, adotados pela França e pela Alemanha,

respectivamente resultaram de movimentos ocorridos na Europa do século XVIII, que

redefiniram o papel social e as funções das universidades, adequando-as às demandas

emergentes naquelas sociedades [...]

De acordo com autora supramencionada, a partir do século XIX, no contexto alemão, com

a Universidade de Berlim foi introduzida a pesquisa científica como uma função da universidade.

A universidade que foi criada, em 1810, por Humboldt, por esta razão, este modelo de universidade

de pesquisa ficou conhecido como modelo humboldtiano. Cunha (2007, p. 18) considera que “[...]

o ensino brasileiro incorporou tanto os produtos da política educacional napoleônica quanto os da

reação alemã à invasão francesa”. Saviani (2010) considera que de 1960 até à promulgação da

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Constituição Federal de 1988, o modelo de expansão e organização do ensino superior é

napoleônico. De 1990 aos dias atuais, o autor considera que vem prevalecendo o modelo anglo-

saxônico na versão norte-americana.

Convém esclarecer que, na França “[...] o papel da universidade foi redefinido com

características diversas das que marcaram o modelo alemão e inglês”. (MAZZILLI, 2011, p. 207).

A universidade francesa teve o Estado como responsável pela legitimação do pensamento nacional,

razão pela qual “a universidade tinha como meta a preparação profissional de servidores do

Estado” (idem). Mazzilli (2011) observa que, embora recebesse o nome de universidade, o modelo

francês se caracterizou como um aglomerado de faculdades profissionais. O aludido modelo foi

incorporado pelo sistema de universidades da América Latina, só tendo sido alterado a partir do

Movimento de Córdoba em 1918, no contexto argentino, que se estendeu às demais instituições

universitárias da América Latina.

Na percepção de Mazzilli (2011), este Movimento foi o embrião de um novo paradigma

de universidade na América Latina, a partir do qual houve redefinição da identidade das

universidades. A partir do Manifesto de Córdoba, surgiu a proposta de incorporação da extensão

universitária, havendo uma redefinição do para que e para quem a instituição universitária deveria

estar a serviço. A autora afirma que, uma das consequências desse movimento foi a adesão desta

nova concepção consagrada na legislação de quase todos os países do mundo.

No que concerne ao modelo de universidade experimentado nas primeiras instituições de

ensino superior no Brasil, Mazzilli destaca o modelo francês (napoleônico). Baseado na proposta

para a formação a partir das instituições isoladas de ensino, o que repercutiu também na primeira

universidade brasileira, criada em 1920. A contestação a esse modelo só veio ocorrer a partir de

1930, sob a liderança de Anísio Teixeira e Fernando de Azevedo, que propunham o modelo

humboldtiano, segundo o qual a incorporação da pesquisa e extensão deveria ocorrer nas

instituições de ensino superior. De acordo com Mazzilli (2011) o Manifesto dos Pioneiros da

Educação trouxe a proposta da tríplice função da universidade.

Conforme Sguissard (2011) os denominados modelos clássicos de universidade se

constituíram ao longo dos séculos XVII e XIX. Os chamados modelo napoleônico e humboldtiano,

são conceitos que dificilmente se poderia aplicar na realidade. Todavia, servem de parâmetro e de

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referência há, aproximadamente, dois séculos. Sguissard considera que o modelo francês foi

revolucionário no contexto da França em Revolução, “[…] livrando-se ao máximo de heranças do

antigo regime” (p.276) fato que contribuiu para formar quadros necessários ao Estado.

O modelo humboldtiano, que preconizou a liberdade de pesquisar, aprender, ensinar,

“[…] constituiu-se com produção do saber e a formação livre, reconciliados nos mesmos espaços

e tempo” (SGUISSARD, 2011, p. 276). Nesse sentido, Sguissard (2011, p. 276) afirma que:

[...] pode-se afirmar que o que se tem feito nestas Terras do Novo Mundo são verdadeiros

transplantes ou adaptações autóctones de estruturas universitárias europeias,

principalmente do viés confessional até a Revolução Francesa, e vazadas nos conhecidos

modelos clássicos – no caso do Brasil, primeiro, o francês/napoleônico; depois, alemão

ou humboldtiano (...)

No limiar do século XX surgiu o modelo denominado de massas ou americano, que na

percepção de Sguissard, se subdivide em vários outros, portanto, não há como afirmar, que há um

modelo francês ou alemão, mas muitos modelos americanos, dentre os quais o autor menciona as

Research Universities. Há um fato inquestionável: o atraso de dois ou três séculos do surgimento

da universidade no Brasil. Nesta linha de raciocínio, afirma:

A desigual experiência universitária em países de colonização inglesa, espanhola e

portuguesa alerta para o fato de que esta instituição não possui, para sua implantação e

desenvolvimento, uma relação bastante direta ou estreita apenas com o desenvolvimento

econômico, mas sofre influência de diversos outros fatores, como os políticos, religiosos

e culturais em geral, que caracterizam a seu modo tanto os impérios inglês e espanhol,

quanto o português (SGUISSARD, 2011, p. 277).

A tentativa de adoção do modelo humboldtiano se deu de maneira lenta, tendo se iniciado

mais claramente a partir dos anos de 1930. Assim, para ilustrar, o autor cita a criação de algumas

instâncias ligadas à produção do conhecimento científico, tais como: Sociedade Brasileira para o

Progresso da Ciência (SBPC) criada em 1948, Conselho Nacional de Pesquisas (CNPq) criado em

1951, Coordenação de Aperfeiçoamento do Pessoal de Nível Superior (CAPES) criada em 1951,

Fundação de Amparo à Pesquisa (FAPESP) criada em 1962. Estes espaços cumpriram e cumprem

importante tarefa no direcionamento do fazer universitário, no sentido de implementar um modelo

que associa o ensino e a pesquisa.

Desta maneira, sob a ótica dos modelos Sguissard (2011) considera que a Reforma

Universitária de 1968 foi importante, por associar pesquisa e ensino, constituindo uma formulação

genérica, a qual o autor chama de neo-humboldtiana. Nessa perspectiva, o autor considera que a

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não obrigatoriedade das instituições de associar ensino e pesquisa, e a falta de controle e supervisão

sobre as instituições fariam que, somente, as universidades com sistemas de pós-graduação

seguissem o modelo proposto pela Reforma. O autor cita ainda, que houve muitas reações à

implementação deste modelo na Reforma Universitária, por exemplo, o famigerado Grupo

Executivo de Reformulação do Ensino Superior (GERES) resistiu e reagiu à Reforma, tendo

colaborado para aplicar interpretações liberalizantes sobre o preceito Constitucional do Art. 207

da Constituição Federal de 1988 e em outros documentos e dispositivos voltados para a educação

superior. Na base das reconfigurações do campo universitário no Brasil se encontram as disputas

em torno dos modelos de universidade.

3.3 Estrutura do campo científico nacional: análise comparada

Na propositura deste trabalho de tese, escolhemos analisar as reconfigurações do campo

universitário no Brasil e como estas tocam a realidade da FAFIDAM. Inicialmente, apresentamos

um esboço da teoria dos campos de Pierre Bourdieu, esboçando como se definem os campos e suas

lógicas de funcionamento a partir da praxiologia. Neste tópico em especial demonstramos como

se estrutura o campo universitário, quais instituições se colocam hegemonicamente no topo das

hierarquias. Desta maneira atentamos ao fato de que “[…] é a estrutura das relações objetivas entre

os agentes que determina o que eles podem ou não fazer” (BOURDIEU, 2004, p. 10). Nesse

sentido, a distribuição dos capitais no espaço vai determinar as posições, além de que as relações

objetivas entre agentes formam os princípios do campo.

Desta maneira, a pesquisadora Marly Miranda, no ano de 2008, realizou um estudo na

FAFIDAM e com amparo na teoria dos campos envidou largo esforço em demonstrar a estrutura

e funcionamento do campo científico a nível nacional, no nordeste e no estado do Ceará. Desta

maneira, no âmbito da estrutura do campo científico nacional, Miranda (2008) identificou as seis

mais importantes universidades do país na época, sendo estas: Universidade de São Paulo (USP),

Universidade do Estado de São Paulo (UNESP), Universidade de Campinas (UNICAMP),

Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ)

e a Universidade do Rio Grande do Sul (UFRGS).

Os critérios organizados pela pesquisadora foram vários, tais como número de cursos de

graduação oferecidos, infra-estrutura para acesso à informação expresso em número de bibliotecas,

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títulos e volumes de livros, número percentual do corpo docente por titulação máxima, conceito

atribuído pela CAPES aos programas de Pós-Graduação Stricto Sensu das IES na avaliação trienal

2001 – 2003. Além disto, Miranda (2008, p.) também considerou a produção de artigos, tendo

observado que:

Uma forte característica da produção científica nacional é que ela ainda é muito

concentrada nas regiões Sudeste e Sul. Por esta razão, atualmente, apenas seis

universidades e as Instituições Federais de Ensino respondem por 60% dos artigos

publicados em periódicos internacionais.

Se considerarmos, apenas, a dimensão da pesquisa científica para realizar uma

comparação entre os achados de Miranda (2008) e um quadro mais atual, veremos que os dados

na plataforma CNPq, na qual consta a súmula estatística da distribuição de grupos de pesquisa por

região, no ano de 2016, revela que as seis instituições com posição dominante no ano de 2008

continuam dominantes em 2016.

Figura 10: Distribuição dos grupos de pesquisa, pesquisadores e doutores por instituição 2016

Fonte: Súmula Estatística CNPq 2016

Um Relatório encomendado pela CAPES no ano de 2018, intitulado “Research in Brazil”

apresenta o desempenho da pesquisa brasileira, por meio dos recursos bibliométricos. Tal relatório

organizado pela Clarivate Analytics63 destaca a posição das vinte universidades brasileiras com

maior produção científica no período de 2011 a 2016. As mesmas instituições identificadas por

Miranda no ano de 2008, como localizadas no centro dinâmico do campo acadêmico continuam

ocupando posição central, tal como demonstra a figura abaixo:

63 De acordo com a Incits a “Clarivate Analytics – antiga Thomson Reuters) é uma ferramenta online de avaliação de pesquisa personalizada e baseada em citações, que permite realizar análises de produtividade científica e comparação de resultados com parceiros no mundo inteiro. Tomando por base o conjunto de registros da Web of Science, o InCites congrega ferramentas de análise e métricas que ensejam quantificar e qualificar os resultados de

pesquisa”.(s.d). Fonte: http://www.sibi.usp.br/apoio-pesquisador/indicadores-pesquisa/incites/.

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Figura 11: Universidades brasileiras com maior número de publicações

Destacamos, em amarelo, as três universidades do Nordeste, que aparecem entre as vinte

universidades com maior produção científica no Brasil no perído de 2011 a 2016. Essas três

instituições aparecem no ano de 2008, na pesquisa realizada por Miranda, que afirma: “os dados

demonstram a posição periférica das universidades do Nordeste e, particularmente as do Ceará, na

hierarquia do campo acadêmico nacional” (MIRANDA, 2008, p.59). Assim, podemos inferir que,

a Universidade Federal do Ceará (UFC) obteve melhoria uma vez que aparece entre as vinte

maiores produtoras de ciência e, no quadro comparativo elaborado por Miranda (2008) a

instituição ocupava quarto lugar no quadro das instituições nordestinas, estando atrás da

Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), a Universidade Federal da Bahia (UFBA),

Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN).

Noutro passo, quando comparada somente com as instituições do Ceará, a Universidade

Federal do Ceará (UFC) apareceu no topo da hierarquia, na pesquisa de Miranda (2008).

Propositalmente realizamos um pequeno desvio em relação às variáveis que foram consideradas

por Miranda (2008) para a análise das instituições - tais como número de cursos de graduação e

alunos matriculados, infra-estrutura para acesso à informação, expresso no número de bibliotecas,

títulos e volumes de livros, número de percentual de docentes por titulação máxima, conceito

atribuído pela CAPES aos programas de Pós-Graduação Stricto Sensu -trazendo para comparar as

posições entre as instituições a partir da produção científica, ou seja, comparamos as instituições

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124

a partir de variáveis diferentes e desiguais. Nosso “desvio” se deu no sentido de evidenciar que a

produção científica tem sido desenvolvida pelas instituições universitárias, posto que são elas que

realizam pesquisa. Nesse sentido, outro Relatório organizado pela Science-Metrix64 registra o

Brasil como 13º maior país a publicar artigos científicos entre países, que também publicam.

Desta forma, fica evidenciada que o que denominamos campo universitário no Brasil é

uma manifestação do campo científico. Destarte, tal como afirmam Oliveira e Catani (2012, p.

150):

Estrictamente hablando, solo podriamos hablar de universidades al referirnos a las

instituciones universitarias, y a las otras, como instituciones no universitarias o de

ensenanza superior. [...] adoptaremos la terminologia campo universitario para referirnos

al conjunto de las instituciones que integran la educacion superior, principalmente las

universidades que se dedican mas a la investigacion y al posgrado (maestria y doctorado).

A produção da ciência no campo em tela está diretamente relacionada à prática da

pesquisa, além disto o sistema de pós-graduação Stricto sensu construído no Brasil constitui-se

atualmente como o maior e melhor da América Latina (SOUZA, FILIPPO, CASADO, 2018,

p.126).

3.4 O campo científico no Ceará

No caso do campo científico no Ceará, Miranda (2008) identificou cinco universidades

que se encontravam no centro dinâmico do campo, sendo uma pública federal - no caso a

Universidade Federal do Ceará (UFC), três públicas estaduais, sendo: Universidade Estadual do

Ceará (UECE), Universidade Estadual do Vale do Acaraú (UVA), Universidade Regional do

Cariri (URCA) e Universidade de Fortaleza (UNIFOR). As variáveis utilizadas pela pesquisadora

foram as mesmas utilizadas na primeira situação com as instituições nacionais. Neste caso, as duas

instituições melhor posicionadas foram a Universidade Federal do Ceará (UFC) e a Universidade

Estadual do Ceará (UECE).

Miranda (2008, p. 63) sublinha que:

[...] fica explícito que as instituições e agentes situados nas posições periféricas do campo

acadêmico no Nordeste detêm menos volume de capitais que o necessário para atuar no

âmbito nacional. Por essa razão, são obrigados a submeter-se à imposição das regras e

significados legítimos estabelecidos pelas instituições e agentes posicionados no topo da

hierarquia do campo e pelas agências reguladoras oficiais.

64 Disponível em: http://www.science-metrix.com/sites/default/files/science-metrix/publications/science-metrix_open_access_availability_scientific_publications_report.pdf

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125

Apesar disto, a Revista Inglesa Times Higher Education (THE), em 2018, selecionou a

Universidade Federal do Ceará (UFC) e a Universidade Estadual do Ceará (UECE) no ranking das

melhores universidades da América Latina. Foram Classificadas 129 instituições de dez países

latinoamericanos, de modo que a UFC ficou posicionada na 56ª colocação e a UECE 107ª.

De acordo com informações da Universidade Estadual do Ceará (UECE)65, a instituição

foi identificada pelo periódico, em razão de nos últimos cinco anos ter realizado, pelo menos 200

publicações indexadas pelo Scopus 66– que é o maior banco de dados de resumos e citações da

literatura com revisão por pares, dentre os quais se incluem revistas científicas, livros e publicações

em Congressos. Ainda de acordo com informações prestadas pela aludida instituição, esse

desempenho também é resultado da qualidade dos cursos de pós-graduação e de seus

pesquisadores.

Figura 12: UFC e UECE no ranking internacional

De fato, houve um crescimento da pós-graduação em âmbito de Universidade Estadual

do Ceará (UECE), conforme demonstramos em sua carcaterização. Além do crescimento do

número de matrículas, houve aumento no número de publicações e no número de grupos de

pesquisa cadastrados na Plataforma do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e

Tecnológico (CNPq). Por exemplo, no ano de 2015, havia 163 grupos de pesquisa cadastrados na

Plataforma e, em 2017, este número era de 167. No âmbito de tais reconfigurações, é possível

também identificar um investimento da UECE em torno da internacionalização, havendo políticas

internas com a finalidade de obter melhor desempenho nesta área. Os Programas de mobilidade de

65 Disponível no site da instituição. 66 Maior banco de dados de resumos e citações da literatura científica com revisão por pares. A partir deste banco de dados é possível ter um panorama da produção de pesquisas em âmbito mundial nas áreas da ciência, tecnologia, medicina, ciências sociais, artes e humanidades.

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126

estudantes e os convênios podem ser considerados como estratégias dos agentes da instituição, que

buscam desenvolver e/ou fortalecer seu senso do jogo.

3.5 O campo científico e sua materialidade na FAFIDAM

A FAFIDAM está numa posição periférica do campo acadêmico, tanto em nível

nacional, quanto regional e estadual. Se considerarmos os indicadores apontados ao

longo do capítulo que serviram para dar visibilidade à estruturação do campo científico

nacional, poderemos facilmente constatar essa condição. A inexistência de bases e

grupos sólidos de pesquisa, o baixo índice de publicações acadêmicas, a debilidade do

acervo da única biblioteca existente, a inexistência de pós-graduação, mesmo em cursos

isolados, dentre outros elementos, põem em evidência essa condição, a qual vai

influenciar fortemente os sentidos e as práticas relativas á Ciência. Caracteriza-se essa

instituição exclusivamente voltada para o ensino e transmissora de conhecimento

(MIRANDA, 2008, p. 64 grifos nossos)

O fragmento de texto acima transcrito evidencia a estrutura da FAFIDAM, no ano de

2008. Neste ano, iniciou-se um processo de formalização de atividades de extensão, tendo sido

criado um laboratório para atividades desta natureza. A criação deste espaço propiciou a

institucionalização progressiva das disciplinas ligadas à educação do campo, educação popular,

educação de jovens e adultos, fomentando um espaço de práticas comuns entre agentes da

FAFIDAM, no âmbito da extensão e, posteriormente ligadas à produção da pesquisa.

Vale dizer que, no ano de 2008, iniciou-se uma experiência significativa com um projeto

denominado “Mais um passo na Educação do campo” ligado ao Programa Nacional de Educação

na Reforma Agrária (PRONERA), cuja execução demandou um estreitamento da relação entre os

professores da universidade e agentes do Movimento dos Trabalhadores Sem Terra. O Projeto foi

aprovado pela Câmara de Extensão da UECE e, visava beneficiar 400 educandos jovens e adultos

residentes em área de reforma agrária, organizados em 20 salas de aula situadas em 16 municípios

cearenses (em anexo o Projeto).

A relação de alguns agentes da FAFIDAM com o MST estava sedimentada, desde 2006,

quando o Programa Nacional de Educação na Reforma Agrária iniciou suas atividades na UECE,

contudo, não havia um espaço comum destinado a tais práticas no interior da FAFIDAM, voltadas

para a extensão, nem havia uma relação clara das disciplinas com as práticas extensionistas. No

decorrer destes dez anos, foi se estruturando um campo, que podemos chamar, também, de um

campo disciplinar.

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127

Desta maneira, com a reformulação do Projeto Pedagógico de Curso, no âmbito do Curso

de Pedagogia, iniciada no ano de 2009 e com as discussões acerca das reformulações curriculares,

foram introduzidos os projetos de extensão com a finalidade de instituir a prática extensionista

como parte da formação no curso de Pedagogia. No referido Projeto Pedagógico de Curso estão

descritos os projetos, que subsidiaram a atividade extensionista no Curso de Pedagogia em parceria

com Movimentos Sociais. A seguir, o trecho do PPC, no qual consta a descrição:

Figura 13: Projetos de Extensão no PPPC Pedagogia/FAFIDAM

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128

Fonte: Projeto Político Pedagógico do Curso de Pedagogia, fluxo 2011.

Isto posto, Silva (2007, p.56) com arrimo em Bourdieu (2004) afirma que:

A institucionalização progressiva das disciplinas no âmbito da universidade, destaca o

autor, é produto das lutas independentes visando impor a existência de novas entidades e

suas fronteiras destinadas a demarcar os seus limites e proteger-lhes.

Desta maneira, na formação de um campo científico, a autora menciona com fundamento

em Gingras (1991) que, em primeiro lugar ocorre a emergência de uma prática de pesquisa, de

maneira que sejam criadas as condições favoráveis à produção do saber e à reprodução do grupo.

De acordo com a perspectiva a qual se filia, afirma que, na formação de um campo deve haver

“[…] a constituição de um grupo reconhecido como socialmente distinto e portador de uma

identidade social seja disciplinar, por meio de associações científicas, seja profissional, por meio

de uma corporação” (SILVA, 2007, p. 54).

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129

Na época da pesquisa realizada por Miranda (2008), nenhum destes elementos estava

posto claramente, mas houve um processo de constituição de um espaço de extensão e de pesquisa

que foi se consolidando. Nesse sentido, vale observar que a distribuição dos capitais é fundamental

para a estruturação de um campo e foi necessário o transcorrer de um determinado o qual, a

institucionalização das práticas foi se constituindo a partir de um jogo de disputas no interior do

espaço pesquisado. Na época da pesquisa realizada por Miranda (2008), a FAFIDAM ainda não

tinha sequer o auditório reformado, era o antigo auditório que funcionava desde a fundação da

instituição. Na descrição que a pesquisadora faz do espaço, ainda, existia a antiga cantina, que foi

demolida para construção do Restaurante Universitário. Podemos dizer, que, no período da

pesquisa realizada por Miranda, a FAFIDAM já pretendia ser um campo, contudo, as condições

estruturais eram bastante limitadas.

Nesse sendito, outro elemento contribuiu para a estruturação da FAFIDAM como uma

instituição do campo universitário do Estado do Ceará: foi a participação de dois professores em

estágio de pós-doutorado, na École des Hautes Études en Sciences Sociales- EHESS/Paris, com a

supervisão do Prof. Michel Löwy (2012/2013). Estes dois professores estiveram, diretamente,

envolvidos com a instituição da extensão no espaço da FAFIDAM, não limitada ao Curso de

Pedagogia e, com o uso de seus capitais conseguiram congregar um conjunto de agentes, em torno

da ideia de implantar a pós-graduação na FAFIDAM. Portanto, a emergência de um espaço próprio

para a pesquisa se deu a partir de uma vinculação institucional das práticas de ensino e extensão e,

foram sendo garantidas a partir de recursos científicos acumulados no campo. O capital científico

bem estruturado, de maneira que “[…] a estrutura da distribuição do capital científico está na base

das transformações do campo científico e se manifesta por intermédio das estratégias de

conservação ou subversão da estrura...” (BOURDIEU, 1976, p.13).

Nesses termos, compete destacar em acordo com Bourdieu (2004, p. 24) que, a “[…]

estrutura...determinada pela distribuição do capital científico num dado momento” desta maneira

“os agentes (indivíduos ou instituições) caracterizados pelo volume de seu capital determinam a

estrutura do campo em proporção ao seu peso, que depende do peso de todos os outros agentes”

(BOURDIEU, 2004, p.24). Isto significa que “[…] aquilo que define a estrutura de um campo num

dado momento é a estrutura da distribuição do capital científico entre os diferentes agentes

engajados” (idem).

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130

Uma década após a pesquisa realizada por Miranda (2008), é possível afirmar que houve

uma mudança significativa na instituição, constituindo-se uma reconfiguração deste espaço. A

consolidação da pós-graduação na FAFIDAM, instituída a partir de 2011, por um grupo de

professores, que se organizou para pleitear o Mestrado, tendo as aulas iniciadas em 2014,

constituiu a principal reconfiguração deste espaço. Com a pós-graduação, houve um impulso na

pesquisa científica na instituição. No início desta pesquisa, nós realizamos um levantamento

buscando mapear o ingresso de ex-alunos da FAFIDAM em cursos de pós-graduação. Fizemos

um recorte temporal de 1998 a 2019 e, por meio deste mapeamento, identificamos que houve uma

significativa repercussão do ingresso de ex-alunos na FAFIDAM, a partir de 2014, tal como se

pode observar no gráfico abaixo:

Figura 14: Evolução do número de ingressos na Pós-Graduação FAFIDAM/UECE 1998 a 2019

Elaborado pela autora.

É possível observar uma discreta regularidade de ingresso de ex-alunos a partir do ano de

2004, tendo oscilado, maiormente entre 4 e 5 ingressos até 2012. O mapeamento exposto no gráfico

acima foi realizado a partir da busca por nomes dos ex-alunos da FAFIDAM e da localização de

seus Currículos Lattes, bem como de seus trabalhos de dissertação ou tese publicados. É possível

que este levantamento não seja perfeito, porque o fizemos com base no recurso da memória e da

01

0 0

21

5

0

2

4 4

1

4 43

0

910

9 9

7

13

Evolução do Número de ingressos na Pós-Graduação

1998 - 2019

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131

colaboração de uma ex-aluna do curso de Geografia67, que, também, por meio de sua memória

indicou alguns nomes para que fosse feita a busca. O levantamento revela a repercussão da pós-

graduação na FAFIDAM, de maneira que o número de ingressos aumentou a partir de 2014,

sobretudo, pela presença da pós-graduação em nível local. Na oportunidade deste mesmo

levantamento, identificamos que, dos ex-alunos ingressantes na pós-graduação, um número

significativo tornou-se professor efetivo em diferentes universidades, principalmente no Nordeste.

Abaixo o gráfico com o quantitativo de ex-alunos da FAFIDAM que se tornou professor efetivo

em universidades:

Figura 15: Alunos egressos da FAFIDAM/UECE efetivos em universidades brasileiras

Elaborado pela autora.

A seguir apresentamos um Quadro onde constam os nomes, as instituições onde os

egressos atuam, suas respectivas titulações e os cursos aos quais se graduaram na Faculdade de

Filosofia Dom Aureliano Matos – FAFIDAM/UECE. O levantamento foi realizado por meio de

busca (por nome) na Plataforma Lattes.

67 A ex-aluna Bernadete Freitas fez uma lista com os nomes de colegas de sua época que ingressaram na pós-graduação (Mestrado e/ou Doutorado) e, nos repassou.

UECE28%

IFCE16%

UFPI8%

UFCA4%

UERN8%

UFERSA4%

IFRN4%

UESPI4%

IFAL4%

IFPA4%

UFC8%

URCA4%

UNILAB4%

Professores efetivos em Universidades

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132

Quadro 15: Ex-alunos da FAFIDAM Professores Efetivos em Universidades brasileiras

Número Nome Instituição Titulação FORMADO

EM

01 João Rameres

Regis

Universidade Estadual

do Ceará –

UECE/FAFIDAM

Doutor História

02 Sergiano Araújo Instituto Federal do

Ceará - IFCE

Doutor Geografia

03 Maurilene do

Carmo

Universidade Federal

do Ceará - UFC

Doutora Pedagogia

04 Jovelina da Silva

Santos

Universidade do estado

do Rio Grande do

Norte - UERN

Mestre/Doutoranda História

05 Lenúcia Moura Universidade Estadual

do Ceará - UECE

Doutora História

06 Ana Carmita B.

Sousa

Universidade Federal

do Cariri – UFCA

Doutora Pedagogia

07 Fernanda

Cardoso Nunes

Universidade Estadual

do Ceará –

UECE/FAFIDAM

Mestre/Doutoranda Letras/Inglês

08 Kelson Chaves Instituto Federal de

Educação, Ciência e

Tecnologia do Rio

Grande do Norte -

IFRN

Pós-Doutor História

09 Bernadete Freitas Universidade Federal

do Piauí - UFPI

Doutora Geografia

10 Leonardo Cabó Universidade Federal

do Piauí - UFPI

Mestre/Doutorando Pedagogia

11 Jamira Lopes Universidade Federal

Rural do Semi-Árido -

UFERSA

Mestre/Doutoranda Pedagogia

12 Emanuela Chaves Universidade do Estado

do Rio Grande do

Norte - UERN

Mestre/Doutoranda Pedagogia

13 Claudemir

Martins Cosme

Instituto Federal de

Alagoas - IFAL

Mestre/Doutorando Geografia

14 Rubson P. Maia Universidade Federal

do Ceará - UFC

Doutor Geografia

15 Maria da

Conceição da

Silva Rodrigues

Instituto Federal do

Pará - IFPA

Mestre História

16 Leiliana

Rebouças Freire

Universidade Estadual

do Piauí - UESPI

Mestre Pedagogia

17 João Paulo

Guerreiro

Almeida

Instituto Federal de

Educação, Ciência e

Tecnologia do Piauí -

IFCE

Mestre Pedagogia

18 Daniela Glícea de

Oliveira da Silva

Instituto Federal de

Educação, Ciência e

Mestre Pedagogia

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133

Tecnologia do Piauí -

IFPE

19 Raquel Lima de

Freitas

Universidade Estadual

do Ceará –

UECE/FAFIDAM

Mestre Pedagogia

20 Maria Ozirene

Maia Vidal

Instituto Federal de

Educação, Ciência e

Tecnologia do Piauí -

IFPE

Mestre Pedagogia

21 Maria Auricélia

Gadelha Reges

Universidade Estadual

do Ceará –

UECE/FAFIDAM

Mestre/Doutoranda Pedagogia

22 Cleuton Almeida

da Costa

Instituto Federal de

Educação, Ciência e

Tecnologia do Piauí -

IFPI

Mestre Geografia

23 Maria Danielly

Freire Guerra

Universidade Regional

do Cariri - URCA

Mestre/Doutoranda Geografia

24 Francisco

Antônio da Silva

Universidade Estadual

do Ceará –

UECE/FAFIDAM

Mestre/Doutorando História

25 Luma Nogueira

de Andrade

Universidade da

Integração Luso-

Brasileira - UNILAB

Doutora Geografia

26 Maria Elioneide Instituto Federal de

Educação, Ciência e

Tecnologia - IFCE

Mestre Pedagogia

Elaborado pela autora.

Retomando o estudo de Miranda (2008), que a mesma afirmava inexistir na FAFIDAM

“bases e grupos sólidos de pesquisa” e destacava “o baixo índice de publicações acadêmicas...a

inexistência de pós-graduação”, o que caracterizava a instituição como “uma instituição

exclusivamente voltada para o ensino e transmissora de conhecimento”. O quadro atual está

modificado em relação a este cenário apresentado por Miranda em 2008. O Mestrado Acadêmico

Intercampi conta hoje com seis (06) Grupos de Pesquisa ligados aos partir dos professores:

Quadro 16: Grupos de Pesquisa relacionados ao Mestrado Acadêmico Intercampi/FAFIDAM

01 Pragmática Cultural, Linguagem e Interdisciplinaridade – UECE

Líder: Claudiana Nogueira Alencar

02 Trabalho, Educação, Estética e Sociedade – UECE

Líderes: José Deribaldo Gomes dos Santos

03 Ontologia Marxiana e Educação – UFC

Líderes: Josefa Jackeline Rabelo/ Maria das Dores Mendes Segundo

04 Natureza, Ciência e Sociedade

Líderes: Makarius de Oliveira Tahim eLiliam Mara Trevisam Tavares

05 Grupo de Edição de Textos do Estado do Ceará - UECE

Líder: Expedito Eloísio Ximenes

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134

06 História, Memória, Sociedade e Ensino - UECE

Líderes: Isaíde Bandeira da Silva e Fátima Mª Leitão Araújo

Em 2018, o Laboratório de Estudos da Educação do Campo – LECAMPO completou 10

anos de atividades, tendo realizado um Seminário para comemorar esta década de experiências

com a extensão e com a pesquisa. A atividade comemorativa foi intitulada de “LECAMPO (2008

– 2018): Pintando a Universidade de Povo”. A seguir, a figura do folder elaborado para a ocasião:

Figura 16: Folder/Convite comemoração de dez anos do LECAMPO

A partir do conjunto das disciplinas, publicações e práticas instituídas a partir do

LECAMPO, é possível identificar a presença de um habitus coletivo, um enjeux. Na atividade de

comemoração de dez anos do LECAMPO foi organizada uma viagem à cidade de Angicos no Rio

Grande do Norte para os alunos bolsistas conhecerem o Memorial Paulo Freire. Na ocasião, houve

uma roda de conversa com os ex-alunos do Projeto de Alfabetização coordenado por Paulo Freire.

Além desta atividade, foram organizadas mesas temáticas de discussão com a presença de

professores e alunos parceiros do LECAMPO.

A finalização da atividade contou com um café coletivo e comemorativo, é oportuno

destacar que as atividades realizadas pelo Laboratório contam sempre com momentos coletivos,

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135

como cafés ou almoços. Na ocasião da finalização das atividades dos dez anos do Laboratório, foi

aberto o momento para as falas dos presentes, tendo sido amplamente ressaltado o caráter coletivo

que o Laboratório imprime em suas atividades. Uma ex-aluna que comparou o Laboratório a um

“quilombo de resistência”. Essa “comunhão de reciprocidades” existente no grupo do Laboratório,

além de constituir-se como ponto de identidades afins, lugar do ‘consensus’, em certa medida,

também, é reforçada pela presença do habitus do interiorano inscrito na ordem de todos os

relacionamentos constituídos no espaço da FAFIDAM, os alunos que vivem e circulam neste lugar

são oriundos, tal como detalha Miranda (2008, p. 74) “[...] nascidos e socializados num espaço no

qual predominam relações sociais primárias (parentesco, vizinhança, amizade), portanto, bem

diferenciadas das relações do anonimato e formalidades dos grandes centros”, razão pela qual a

autora deduz haver um grau menor de individualismo e competição.

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136

CAPÍTULO IV

ACHADOS DA PESQUISA

Neste capítulo, realizamos uma inserção nos achados da pesquisa, buscando apresentar

como se estruturam os capitais, para tanto destacamos o trechos de uma das entrevistas realizadas.

4.1 Laboratório de Estudos da Educação do Campo – LECAMPO: identidades e resistências

Desde, 2008, o LECAMPO, dedica-se às atividades de ensino, pesquisa e extensão no

contexto da educação do campo, educação de jovens e adultos e educação popular em nível local

e nacional. O Laboratório é vinculado ao curso de Pedagogia, bem como à Licenciatura em

Educação do Campo (PROCAMPO), que foi incorporada à dinâmica da FAFIDAM no ano de

2010, a partir de projeto específico enviado ao Ministério da Educação e aprovado desde então.

O Laboratório foi criado a partir do Edital Nº003/2006 da Fundação de Apoio à Pesquisa

(FUNCAP) e, sua origem e criação remonta à presença do Programa Nacional de Educação na

Reforma Agrária (PRONERA), instituído nacionalmente a partir de 1998, vinculado ao Encontro

Nacional de Educadores na Reforma Agrária (ENERA) e implementado na FAFIDAM a partir de

2006. Desse modo, observamos e buscamos lastrear as estratégias desenvolvidas pelos agentes

deste espaço para a aquisição dos capitais necessários à existência e à consolidação do Laboratório,

bem como observamos um largo investimento na manutenção de diferentes capitais e na ‘partilha’

de um habitus que parece comum a todos, que adentram às práticas do Laboratório.

Nosso interesse em explorar a existência e atuação do Laboratório se deu a partir das

observações e da constatação de que, por meio deste espaço, há um conjunto de práticas

organizadas de maneira coletiva. Como uma espécie de illusio, pois cada jogador se encontra preso

ao jogo, porque para cada um e de maneira conjunta vale a pena jogar. Observamos que a pronta

adesão às demandas produzidas a partir do Laboratório potencializa um processo de resistência e

assegura a autonomia do campo universitário, no contexto de sua posição no jogo e nas lutas

próprias deste espaço. Bourdieu (2001, p.123-124) afirma que:

A illusio como pronta adesão à necessidade de um campo tem chances tanto

maiores de aflorar à consciência quando ela é posta de algum modo a salvo da

discussão: a título de crença fundamental no valor dos móveis da discussão e nos

pressupostos inscritos no próprio fato de discutir, ela constitui a condição

indiscutida da discussão.

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137

Identificamos a existência de uma “rede durável de relações mais ou menos

institucionalizadas” tornou e torna possível a efetivação de laços objetivos e, também, simbólicos

em torno de um projeto comum, que une diferentes agentes no interior do campo. que estamos

analisando. Desta forma, o capital social configura-se como o conjunto de recursos potenciais

adquiridos pelos agentes e partilhados pelo grupo, tornando-o orgânico e sólido, contribuindo para

a realização de objetivos comuns. Na esteira desta reflexão ressaltamos que os professores sujeitos

desta pesquisa, como já afirmamos no tópico da metodologia, são bons jogadores, no sentido de

possuírem o senso do jogo, tal como afirma Bourdieu (2004, p.28)

[..] esse senso do jogo é, de início, um senso da história do jogo, no sentido do futuro do

jogo. Como um bom jogador de rugby sabe para onde vai a bola e se põe lá onde a bola

vai cair, o bom cientista é aquele que, sem ter a necessidade de calcular, de ser cínico, faz

as escolhas que compensam. Aqueles que nasceram no jogo têm o privilégio do

“inatismo”. Eles não têm necessidade de serem cínicos para fazer o que é preciso quando

é preciso ganhar a aposta.

Nesse sentido, os agentes envolvidos com a criação do Laboratório, os envolvidos,

também, com o PRONERA no contexto da FAFIDAM e, posteriormente, com a implementação

do PROCAMPO e do Mestrado Acadêmico Intercampi em Educação e Ensino (MAIE) são

oriundos de uma trajetória de vida marcada pela relação com os Movimentos Sociais, pelo

contínuo exercício com a extensão universitária como uma prática internalizada e experienciada

ao longo da profissão, como docentes da Universidade Estadual do Ceará (UECE).

Além disto, é possível identificar, ao longo da trajetória profissional dos agentes, que

estão à frente desses espaços de produção científica, a constituição deste capital social atrelada ao

capital acadêmico e político, vez que participam de Comissões, ocupam posição ativa nos espaços

de deliberação coletiva, por exemplo, CONSU, também do ANDES, FORPRED. Além da

circulação destes em espaços acadêmicos e políticos, transitam nos espaços da universidade e dos

Movimentos Sociais, figurados, principalmente, no acampamento José Maria do Tomé, na

Chapada do Apodi/CE.

Desta forma, esses agentes demonstram domínio acerca do sentido do jogo, de maneira a

travarem disputas e lograrem lucros por meio de um conjunto de capitais bem definidos e

construção de um habitus, que funciona como marcador identitário do grupo. Nesse sentido, é

possível afirmar que, por meio do Laboratório, há uma verdadeira “comunhão de reciprocidades

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138

inscritas na aparência do natural...ao agregar sujeitos cuja identidade está fundada na coincidência

dos esquemas de visão e divisão do mundo social” (HEY; KLUGER, 2017, p.180).

Os agentes posicionados nas atividades tanto do Laboratório, do Mestrado Acadêmico

Intercampi em Educação e Ensino (MAIE) e, também, do PROCAMPO gozam de significativo

capital social, razão pela qual é possível perceber uma rede de relações duráveis. De acordo com

Bourdieu (1998, p.67):

O capital social é o conjunto de recursos atuais ou potenciais que estão ligados à

posse de uma rede durável de relações mais ou menos institucionalizadas de

interconhecimento e de inter-reconhecimento ou, em outros termos, à vinculação

a um grupo, como conjunto de agentes que não são dotados de propriedades

comuns (passíveis de serem percebidas pelo observador, pelos outros ou por eles

mesmos), mas também são unidos por ligações permanentes e úteis.

Essas relações se estabelecem duradouramente no espaço e no tempo, dessa forma, ainda

que expresse de maneira muito evidente um conjunto de afinidades e semelhanças entre os agentes,

que compõem a rede de relações e os lucros dos quais todos partilham, porém não podemos atribuir

um cálculo racional e consciente na busca destes. Na percepção de Bourdieu (1998), a existência

de uma rede durável de relações não é um dado natural, nem tampouco um ‘dado social’ “mas o

produto do trabalho de instauração e de manutenção que é necessário para produzir e reproduzir

relações duráveis e úteis, aptas a proporcionar lucros materiais ou simbólicos.” (p.68).

Os lucros simbólicos se dão a partir do conjunto de trocas realizada pelo grupo, porque

“a troca transforma as coisas trocadas em signos de reconhecimento e, mediante o reconhecimento

mútuo e o reconhecimento de inclusão no grupo que ela implica, produz o grupo e determina ao

mesmo tempo os seus limites...” (BOURDIEU, 1998, p.68). Segundo o autor, a reprodução do

capital é tributária de todas as instituições, que visam favorecer trocas legítimas e excluir trocas

ilegítimas, além disto, é também tributária do trabalho de sociabilidade “série contínua de trocas

onde se afirma e se reafirma incessantemente o reconhecimento e que supõe, além de uma

competência específica...uma disposição adquirida para obter e manter essa competência.”

(BOURDIEU, 1998, p.68). Podemos dizer que, “[…] esse é um capital coletivamente possuído,

um poder sem relação com sua contribuição pessoal, cada agente deve participar do capital

coletivo...na medida em que suas ações, suas palavras e sua pessoa honrarem o grupo...”

(BOURDIEU, 1998, p.69). A seguir, fotografias da parte interna do LECAMPO.

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Marcadores identitários do grupo do Laboratório

Estandarte 25 anos MST Carranca

Trabalhador do campo – madeira talhada/envernizada.

Paulo Freire sobre a mesa de reuniões do LECAMPO Materiais em palha (chapéu, cestas) e panela.

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As fotografias são da parte interna do Laboratório de Estudos da Educação do Campo

(LECAMPO), pois no périplo de nossas observações, percebemos que o espaço utilizado pelos

professores e alunos é permeado por imagens e símbolos, que remetem aos objetos de estudo, que

circundam cada trajetória individual, e parecem constituir um arsenal de materiais identitários, nos

quais capitais (individuais e coletivos) se condensam de maneira objetivada, tal como um conjunto

de propriedades encarnadas no mundo objetivo, que cerca os agentes do Laboratório. Tal como

afirma Bourdieu (1989, p.10):

Os símbolos são instrumento por excelência da “integração social”: enquanto

instrumentos de conhecimento e de comunicação...eles tornam possível o

consensus acerca do sentido do mundo social que contribui fundamentalmente

para a reprodução da ordem social: a integração “lógica” é a condição da

integração “moral”.

Estes símbolos estão presentes na trajetória dos agentes, que fazem parte do Laboratório,

por conseguinte, tornaram-se uma marca distintiva de suas identidades. Além disso, há uma

relação entre os símbolos, os materiais e mensagens espalhadas pelas paredes do Laboratório e as

disciplinas que são objeto de maior investimento dos professores que circulam por este espaço.

4.2 A distribuição dos capitais

É momento de dar voz aos sujeitos desta pesquisa, já descritos em vários momentos sob

o anonimato das generalizações. Neste tópico, destacamos um trecho da entrevista cedida por uma

das professoras que colaboraram com a pesquisa. Nesse trecho, em especial a docente relata que a

aquisição do Laboratório (já menicnado) foi resultado de um Edital. Na sequência narra parte do

processo de:

AQUISIÇÃO DO LABORATÓRIO

(...)

Quando eu cheguei do doutorado abriu um edital para implantação de laboratórios e o

Hidelbrando68 né, que era o diretor da FAFIDAM eu era a vice né, eu tinha terminado o

doutorado ele veio na nossa casa e disse: “olhe eu quero que vocês apresentem um

projeto pra esse edital” eu disse Hidelbrando nós não temos a menor chance, uma

faculdade do interior, eu recém doutora, sem um grande currículo, vou concorrer com

esses grandes que já tão aí há muito tempo! Aí ele disse: mas a gente vai concorrer! Pelo

68 Ex-diretor da FAFIDAM, atualmente ocupa função de Vice-Reitor da UECE.

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menos pra gente dizer que concorreu, façam aí o projeto! Ele acreditou, estimulou, aí o

Ernandi e eu fomos trabalhar e eu trazia algumas questões que tinham ficado né como

uma prospectiva de pesquisa do doutorado e eram algumas questões que vinham também

do PRONERA, o PRONERA já estava na FAFIDAM (...)

O PÓS-DOUTORADO

Depois de todas essas experiências, chegou a época do pós-doutorado, isso coincidiu

também com as próprias políticas do ensino superior, é o próprio governo federal

estimulando a internacionalização não só para a pós mas também para a graduação foi

criado o Programa Ciência sem fronteiras né, foi criado, foi assim, foi instituído, maior

equidade na distribuição de bolsas entre sudeste e sul, nordeste, porque as bolsas eram

muito concentradas naquelas universidades que estavam no sudeste....

Então houve também essas políticas de forma que nós achávamos que não tínhamos a

menor chance de fazer um pós-doutorado fora, porque a gente não era de um programa

né, de pós-graduação efetiva, eu já tinha dado duas disciplinas num programa de pós-

graduação mestrado e doutorado da federal, já tinha participado de algumas bancas da

sociologia, da educação, mas eu não era efetivamente de um programa. Então num

encontro em Brasília, nos fomos até à CAPES e fomos procurar assim, conversar com

alguém desse setor, chegamos lá sem conhecer ninguém, a CAPES não sei se você

conhece é um prédio super moderno todo envidraçado embaixo não tem viva alma, só

tem um balcão, então você chega imediatamente você sobe no elevador e quando a gente

chegou no balcão que a recepcionista foi receber e disse “com quem você deseja falar?”

eu não sabia dizer porque a gente queria ir no setor (risos) nós somos muito assim,

atrevidos, porque ir sem conhecer ninguém nem nada, mas a gente falou o que era que a

gente queria informação e ela nos dirigiu e nós tivemos sorte que um funcionário

maravilhoso nos atendeu tanto que ficou pra além do expediente dele e nos encorajou

muito. Então o quê que ele disse “se vocês estão construindo projeto de mestrado

coloquem que o pós-doutorado vai ajudar na qualificação para esse projeto de mestrado,

que vocês já estão elaborando, já estão pensando em fazer e isso não é exigência pra

bolsa ter é estar no programa de pós, mas você pode mostrar a importância de estar, e

aí foi o que nós fizemos...nós fizemos os projetos, a gente fez acho que uma boa

justificativa já falando do nosso projeto de mestrado que seria importante a gente voltar,

o fato também da gente ser recebido na França por um grande professor né, porque

Michel Lovy tem mais de 26 obras, tem muitas línguas, traduzidos em muitas línguas,

então ele é muito respeitado na CAPES no CNPq e se ele disse que vai receber o nosso

projeto e manda uma carta dizendo isso, isso também confere uma...é assim...um aval.

Mas eu senti muito que o projeto de pós-doutorado também é um coroamento duma

carreira porque a gente tem que, tinha o lattes né, quando você escreve sua carta de

intenção, então todos esses projetos que a gente citou o PRONERA, o PROCAMPO, o

Mestrado, relacionado com a região, de como eles foram importantes pra formar

professores pra região, de que agora havia uma demanda que agora a gente tava

propondo um projeto, o primeiro mestrado em educação do interior do estado do Ceará,

então isso tem uma repercussão porque as suas pesquisas que tão no seu lattes, a sua

vida, os projetos que você coordenou não só fortaleceram a instituição mas também a

região onde ela está inserida e isso se deu ao longo de muitos anos, então é também

coroamento né? De um percurso, de uma carreira, de forma que eu senti muito isso

quando eu tava fazendo meu projeto de pós-doc porque a CAPES exigia tudo isso, a

carta, o lattes, uma declaração da universidade de interesse no projeto, e a gente tinha,

quando a gente foi fazer o projeto de pesquisa na minha justificativa tinha todas essas

experiências, então eu não tava construindo aquele projeto, aquele objeto de pesquisa à

toa né? Então isso foi muito importante e assim, os nossos projetos foram aprovados né,

a gente concorreu nacionalmente aos editais, não foi bolsa de um programa de pós, nós

concorremos nacionalmente e eu assim, foi aprovado na CAPES, no CNPq, eu fiquei com

CNPq o Ernandi já tinha sido aprovado o da CAPES, porque o dele tinha sido aprovado

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no edital da CAPES, o meu foi no edital seguinte e entre o primeiro e o segundo foi

aprovado com CNPq, então eu fiquei com CNPq né, e foi assim muito bom o pós-doc

porque a gente cumpriu nosso plano de trabalho, nós publicamos dois artigos

internacionais e...mas sobretudo a gente construiu parcerias, então no pós-doc a gente

já tinha recebido aqui né, uma colega da Inglaterra, nós conhecemos a professora Joyce

Canaan que é da cidade de Birghman num congresso de sociologia, onde ela tava

apresentando um trabalho sobre o Chiapas né, sobre os zapatistas e nós sobre o MST,

então ela se interessou muito pelo nosso trabalho, me convidou pra um seminário que ela

organizou lá na Inglaterra, eu não pude ir, porque eles garantiam a estadia e a

hospedagem mas a universidade não garantiu as passagens e nós não pudemos ir, mas

veio uma amiga dela pesquisar aqui a inserção das mulheres na política e ela já tinha

feito um doutorado sobre o chile tava pesquisando o Brasil e queria entrevistar a Luiziane

Lins e ela recomendou que a professora Sara...então a professora Sara leu a minha tese,

gostou de mais e me convidou né dessa vez com uma bolsa, com passagem, hospedagem

e alimentação paga para um seminário internacional que ela organizou na Universidade

de .... quando é..quando eu fui fazer o projeto de pós-doc o nosso orientador que nos

recebeu foi o Michel Lovy mas a gente colocou como uma supervisora colaboradora a

professora Sara da Inglaterra, então nós fomos também na Inglaterra, nós tivemos

encontro com ela lá, e nós organizamos um seminário com a presença dela e do Michel

Lovy na França né, com os orientadores que estavam também sendo orientados por ele,

então a partir daí nós já saímos com um plano de trabalho que a gente queria que

continuasse, quando nós chegamos com a aprovação do mestrado, nós tínhamos então a

professora Sara interessada em vir, a professora Joyce né? E é, nós fizemos um projeto,

não imediatamente, mas em 2014 depois que a gente voltou, nós voltamos em 2013, o

Mestrado já estava aberto, porque pra nossa surpresa (risos) quando nós chegamos lá

na França foi aprovado o projeto de Mestrado

Pesquisadora: Vocês tentaram as duas coisas ao mesmo tempo?

Pesquisada: Paralelo, a gente mandou o projeto de mestrado, a gente tava lá aguardando

a resposta, a gente achava que não ia sair imediatamente, fomos para o pós-doc, porque

nós estávamos no plano da universidade de ir pro pós-doc e aí quando a gente chegou

na França tivemos a notícia logo no primeiro semestre que tinha sido aprovado o

mestrado então com o mestrado abria mais possibilidade dos nossos vínculos se

fortalecerem. Quando nós voltamos em 2014 nós fizemos um projeto para a FUNCAP,

um projeto de apoio de fortalecimento da pós-graduação, nesse projeto a gente colocou

como um dos objetivos fortalecer os laços internacionais do Mestrado né, aí nós teríamos

verba pra isso né, e aí nós colocamos as passagens pra trazer professores internacionais,

também pra mandar uma missão nossa, pra Europa, bom, então lá ainda no pós-doc nós

fomos à Lille a e Lyon porque nós tínhamos uma amiga da nossa universidade que tinha

sido professora da FAFIDAM, que tinha trabalhado com a gente né, que é a professora

Kadma que estava também no pós-doc dela na França, na cidade de Lille, então nós nos

encontramos lá, nós fizemos um planejamento de trabalho pra cidade de Lyon pensando

também em fazer o convênio com a França. Então quando a gente chegou a gente ficou

trabalhando no convênio da Inglaterra e a professora Kadma no convênio de Lyon e com

esse dinheiro nós também trouxemos professores da França, no caso Daniel Thin para

esse convênio com a universidade francesa, aí a gente com esse dinheiro...ah bom, nós

fizemos esse projeto em 2014, fevereiro, no carnaval mas leva um tempo até você ter a

resposta, até o dinheiro chegar em conta de forma que dentro do projeto que nós já

tínhamos feito lá, nós fizemos um trabalho para um congresso... (...) Um colóquio Norte-

Sul (...)

Na sequência, a professora explica como ocorreu a proposta do Colóquio Norte-Sul, os

professores envolvidos, destacando-se o Prof. Boaventura de Sousa Santos. O trecho citado abre

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margem para que possamos observar a estruturação de vários capitais atuantes nas práticas

relatadas pela professora. O capital social configurado pela rede durável de relações começa a se

estabelecer desde a visita do diretor da FAFIDAM à sua residência até o conjunto de relações, que

vão se instituindo e culminam com vários projetos realizados ao longo do tempo. Com base em

uma escuta ativa e metódica, identificamos que a palavra ‘projeto’ estruturou parte da entrevista

cedida pela professora. Desta maneira, utilizando o recurso de localização de palavras no

computador – a partir desta, que chamou nossa atenção – identificamos, que tal palavra foi

utilizada 23 vezes, ao longo do trecho analisado.

O uso reiterado da palavra poderá revelar a estruturação do capital científico possuído

pela entrevistada, que poderá ser um dos capitais de maior peso. Obviamente, não apenas, pelo

simples uso reiterado da palavra, mas pelo que vai se estruturando ao longo da fala. Tratando-se

do capital científico da instituição, que é diferente do capital científico “puro”. Bourdieu (2004, p.

36) afirma que:

[...]o capital científico da instituição se adquire, essencialmente, por estratégias políticas

(específicas) que têm em comum o fato de todas exigirem tempo – participação em

comissões, bancas (de teses, de concursos), colóquios mais ou menos convencionais...

Em relação ao capital científico ́ puro´e o capital científico da instituição Bourdieu (2004,

p. 38) observa ainda que:

[...] as duas formas de poder podem coexistir no seio do mesmo laboratório e para o

melhor, em alguns dos casos, do empreendimento coletivo – tendo, de um lado, o diretor

do laboratório que muito informado do estado da pesquisa, em especial, pela frequência

aos comitês e ás comissões, encarna de alguma forma a “ciência normal” e produz

trabalhos voltados para a generalização, e de outro, tendo também o pesquisador

prestigiado que se dedica á construção de “modelos integrativos” e traz para outros

pesquisadores, seniores e juniores, uma espécie de suplemento de imaginação científica

[...].

Para Bourdieu (2004) a reprodução do capital social é tributária do trabalho de

sociabilidade “série contínua de trocas”, pois este um tipo de capital coletivamente, possuído.

Assim, os grupos instituídos delegam seu capital social a todos os seus membros, mas em

graus muito desiguais (do simples leigo ou papa ou do militante de base ao secretário geral),

podendo todo o capital coletivo ser individualizado num agente singular que o concentra [...]

(BOURDIEU, 1998, p. 69).

É possível também identificar outros capitais a partir da fala da pesquisada. Desta maneira

vale lembrar que os capitais são indicadores do habitus.

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4.3 Pós-Graduação no contexto de confluências na FAFIDAM: produção da científica a

partir dos campos disciplinares

A presença do Mestrado Acadêmico Intercampi impactou, significativamente, a produção

e circulação de trabalhos científicos a partir do ano de 2014, no que se refere a uma nova dinâmica

institucional e projeção da FAFIDAM nas disputas em torno do jogo, que envolve as lutas próprias

da pós-graduação. Esta produção é oriunda de experiências, que vêm sendo amadurecidas e

vivenciadas pelos agentes, objetivando-se em capitais – científico, social e cultural. Portanto, a

formalização do Mestrado abriu a possibilidade de confluências de interesses, investimentos e

objetos de estudos comuns a vários agentes de campos disciplinares diferentes, destacando-se os

campos disciplinares da Educação e Geografia Agrária. No bojo desse “encontro” é possível

identificar a estruturação de práticas subsidiadas pelo tripé ensino, pesquisa e extensão.

Necessário se faz compreender sob o prisma da praxiologia bourdieusiana que:

A existência de uma rede de relações não é um dado natural, nem mesmo um “dado

social”, constituído de uma vez por todas e para sempre por um ato de instituição...mas o

produto do trabalho de instauração e de manutenção que é necessário para produzir e

reproduzir relações duráveis e úteis, aptas a proporcionar lucros materiais ou simbólicos

(BOURDIEU, 1998, p. 68).

Assim, não podemos considerar sua produção e o seu significativo crescimento como um

reflexo mecânico, provocado pela presença do Mestrado na FAFIDAM. Tampouco devemos se

pode considerar a existência da pós-graduação, em nível local, como mero reflexo do processo de

expansão da macroestrutura do campo universitário. Contudo, é indispensável observar que:

[...] o mundo da ciência, como o mundo econômico, conhece relações de força,

fenômenos de concentração do capital e do poder ou mesmo o monopólio, relações sociais

de dominação que implicam uma apropriação dos meios de produção e reprodução”

(BOURDIEU, 2004, p.34)

A correlação de forças estabelecida entre os agentes da instituição em prol da

consolidação da pós-graduação em uma região interiorana com a agência de fomento para esse

nível de ensino se fez mediada por um complexo de capitais bem estruturados. Por esta razão, a

pós-graduação em nível local, nas cidades de Limoeiro e Quixadá, tem acentuada repercussão nas

reconfigurações do campo universitário, que podemos verificar na realidade da FAFIDAM.

Por meio dos capitais possuídos por um conjunto de agentes, as mediações entre

imperativos externos e os anseios internos ocorrem, materializando-se na existência do primeiro

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curso de Mestrado Acadêmico do interior do Ceará. Contudo, devemos observar que “todo campo

é um campo de forças” (BOURDIEU, 2004, p. 22), razão pela qual as lutas se dão no sentido de

conservar ou transformar esse campo de forças.

Nesse sentido, no âmbito das lutas próprias do campo científico não é possível

separar/isolar a dimensão puramente ‘política’ e a dimensão puramente ‘intelectual’ ou

‘científica’, posto que os conflitos pela dominação do campo científico se dão a partir de uma

incessante disputa em torno da definição legítima de ciência e sua imposição, pois o campo

científico possui uma dupla natureza: política e científica. O campo científico é o lugar por

excelência da luta política pela dominação científica. Desta feita, entendemos que:

[...] campo científico enquanto espaço objetivo de um jogo onde compromissos

científicos estão engajados resulta que é inútil distinguir entre as determinações

propriamente científicas e as determinações propriamente sociais das práticas

essencialmente sobredeterminadas (BOURDIEU, 1976, p. 3).

O conjunto de disposições adquiridas pelos agentes, somado ao conjunto de lutas

concorrenciais e estratégias de investimento social (consciente ou inconscientemente)

configuraram as vias de acesso à materialização do Mestrado na instituição. Nesse contexto, é

possível afirmar que há uma regularidade da produção científica – que vem sendo produzida com

mais intensidade a partir de 2013.

Especificamente, constatamos que esta regularidade se dá em torno da problemática, que

envolve a questão do agronegócio e a resistência a este modelo na região onde se situa a

FAFIDAM. Tudo isso colabora com o processo fortalecimento da comunidade específica da região

da Chapada/Limoeiro e, também dos pares e agentes com significativo capital científico e social

do campo da Educação e da Geografia Agrária, vinculados à FAFIDAM. Cumpre assinalar que,

É a estrutura das relações objetivas entre os agentes que determina o que eles podem ou

não fazer. Ou, mais precisamente, é a posição que eles ocupam nessa estrutura que

determina ou orienta, pelo menos negativamente, suas tomadas de posição (BOURDIEU,

2004, p. 23 – destaque do autor).

Assim, a escolha dos objetos de estudo no interior do campo científico é orientada a partir

da posição ocupada pelos agentes e que, pois de acordo com sua posição o agente detém o sentido

do jogo, de maneira mais, ou menos ajustada. No caso específico da FAFIDAM, a ‘luta por terra

e água’ constitui um dos sistemas de posições políticas e científicas da instituição, que vêm

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146

funcionando como demarcadores da identidade e representação, que envolve tanto a FAFIDAM,

como se estende a uma luta pela definição legítima de região.

O processo de pesquisa, que ora se desenha no Mestrado Acadêmico Intercampi e que se

configura na materialidade de sua produção e circulação nos meios científicos, tem como canal de

confluência as práticas extensionistas desenvolvidas a partir do LECAMPO. Identificamos

também uma economia de bens e trocas simbólicas produzidas a partir dos trabalhos de pesquisa

em campo que são realizados no âmbito da Geografia Agrária, que compõe uma linha de estudos

sobre a região do Baixo Jaguaribe na FAFIDAM. Os estudos sobre agricultura camponesa e, em

especial, sobre o campo geográfico regional de acordo com Freitas (2018, p. 61):

Diversos estudos aportam suas análises acerca da realidade do campo do Baixo Jaguaribe,

não somente na geografia, mas em várias áreas do conhecimento. No âmbito da geografia,

algumas pesquisas ou artigos relacionados ao tema deste trabalho (não necessariamente

com o mesmo viés teórico-metodológico) podem ser destacadas, tais como: Segundo

(1998); Soares (1999; 2000; 2012); Elias (2000; 2002; 2006; 2010) e de seus orientandos;

Cosme (2007; 2015), Araújo (2016), Bezerra (2009), meu estudo de dissertação

(FREITAS, 2010), dentre outros.

Os autores referenciados na citação acima são vinculados à UECE/FAFIDAM, como

alunos e/ou professores, cujos objetos de estudo confluem ou confluíram em uma parte de suas

formações acadêmicas para a região do Baixo Jaguaribe. Na sequência do texto de Freitas (2018),

a autora faz referências a pesquisadores, que foram pioneiros na abordagem sobre a região e

constituem uma síntese para quem deseja estudar a questão agrária do Baixo Jaguaribe. Nesse

contexto é possível afirmar que:

[...] a região é o que está em jogo como objecto de lutas entre os cientistas, não só os

geógrafos é claro, que por terem que ver com o espaço, aspiram ao monopólio da

definição legítima, mas também historiadores, etnólogos e, sobretudo desde que existe

uma política de “regionalização” e movimentos “regionalistas”, economistas e sociólogos

(BOURDIEU, 1989, p. 108).

Assim, a distribuição do capital científico entre os diferentes agentes engajados no interior

do campo científico, que constitui a FAFIDAM e a UECE vem definindo a estrutura desse campo,

de modo a situá-lo numa posição, que lhe confere graus de reconhecimento. No seu trabalho de

tese, Freitas (2018) recorre a nomes ‘importantes’ no sentido da produção científica em torno da

região do Baixo Jaguaribe, cita, por exemplo, a produção de Hidelbrando dos Santos Soares. Para

a autora, os trabalhos posteriores foram influenciados por esta primeira produção, cuja data da

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publicação, em 1999, é considerada “seminal.” Além de citar os trabalhos produzidos por este

professor, Freitas (2018) destaca sua atuação como professor na FAFIDAM.

Freitas (2018) cita, também, os trabalhos de Denise Elias –professora da UECE –

chamando a atenção para a produção sobre a região do Baixo Jaguaribe, que ganhou mais

visibilidade em face de Denise Elias ser um nome nacionalmente reconhecido nos estudos da

Geografia. É possível identificar a presença do capital científico, neste conjunto de relações

estabelecidas entre diferentes agentes e, segundo Bourdieu (1976), o capital científico pode ser

acumulado, transmitido e até mesmo, em algumas condições, ser reconvertido. Bourdieu afirma

que este processo, envolve o capital científico continua com o acesso aos cargos administrativos

ou comissões governamentais, etc.

No caso do citado Prof. Hidelbrando dos Santos Soares, por exemplo, o mesmo ocupa

atualmente a função de vice-reitor da UECE, estando já no segundo mandato. Antes de chegar a

este posto, o referido professor ocupou a função de diretor da FAFIDAM, também por duas gestões

seguidas. Assim, em conformidade ao que afirma Bourdieu (1976) o pesquisador depende de sua

reputação junto aos colegas, além disto, “[…] o reconhecimento, marcado e garantido socialmente

por todo um conjunto de sinais específicos de consagração que os pares-concorrentes concedem”

(BOURDIEU, 1976, p. 10).

Assim, Bourdieu (1976) considera que o capital da autoridade proporcionado pela

descoberta de determinado objeto original e valioso cientificamente – pode diminuir na medida

em que outros pesquisadores venham se ligar a esta primeira descoberta. No caso da FAFIDAM,

as assinaturas múltiplas em torno do mesmo objeto funcionam como espécie de capital científico

compartilhado, que embora diminua o valor distintivo de cada um dos assinantes, permite a

visibilidade do conjunto de agentes empenhados em adquirir “[…] os lucros mais ou menos

universalmente prometidos às ações que não têm outra determinação aparente senão a do respeito

puro e desinteressado da regra” (BOURDIEU, 1976, p. 12). A ordem em que os nomes dos autores

aparece nos artigos científicos minimiza a perda do valor distintivo imposta pela necessidade de

divisão do trabalho científico. No âmbito das estratégias que permeiam o interior do campo

científico, Bourdieu afirma que:

[...] a visibilidade de um nome numa série é função, em primeiro lugar, de sua visibilidade

relativa, definida pelo grau que ele ocupa na série e, em segundo lugar, de sua visibilidade

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intrínseca, que resulta do fato de que, já conhecido, ele é mais facilmente reconhecido e

retido (um dos mecanismos que fazem com que, também aqui, o capital leve ao capital)

(idem).

No âmbito dos agentes vinculados à FAFIDAM, a produção científica contribui para

caracterizar esta instituição como um campo/subcampo. Desta maneira, Bourdieu (1976, p. 15)

afirma:

A forma que reveste a luta inseparavelmente científica e política pela legitimidade

depende da estrutura do campo, isto é, da estrutura da distribuição do capital específico

de reconhecimento científico entre os participantes na luta.

O mapeamento organizado por Freitas (2018), evidencia a Geografia Agrária com ênfase

na produção científica em torno da região do Baixo Jaguaribe, sob a orientação da professora

Denise Elias:

Figura 17: Produção científica sobre o Baixo Jaguaribe no campo da Geografia Agrária

Fonte: Freitas (2018). *Grifos nossos: Ex-alunos do curso de Geografia da FAFIDAM.

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Além desta produção, Freitas também identifica um conjunto de pesquisas realizadas pelo

Núcleo TRAMAS69, voltados para a Geografia Agrária no Baixo Jaguaribe e, em especial, para a

questão do uso indiscriminado de agrotóxicos pelas empresas multinacionais na produção de frutas

na Chapada do Apodi/CE. Resultado deste encontro tem sido a produção científica com pares de

diferentes campos disciplinares.

Segundo Bourdieu (1976, p.12) o “o mercado de bens científicos tem suas leis, que nada

têm a ver com a moral.” Portanto, as estratégias no universo do campo universitário se orientam

segundo a lógica do interesse no desinteresse. Desta forma,

[...] acumular capital é fazer um “nome”, um nome próprio, um nome conhecido e

reconhecido, marca que distingue imediatamente seu portador, arrancando-o como forma

visível do fundo indiferenciado, despercebido, obscuro, no qual se perde o homem

comum (BOURDIEU, 1976, p. 11)

O autor francês menciona a dificuldade, por exemplo, em realizar pesquisas com

intelectuais, cientistas ou artistas, seja nas entrevistas ou, na publicação dos resultados. Considera

que propor anonimato à pessoas que estão ocupadas em fazer um nome, produz um efeito de

supressão do interesse destas em participar. Como já mencionado, as assinaturas múltiplas

reduzem o valor distintivo atribuído aos signatários, contudo, observamos que a relação

estabelecida entre agentes do campo da FAFIDAM com portadores de nomes de maior distinção

tem colaborado para dar visibilidade aos pares com menor visibilidade. Bourdieu (1976, p. 12)

observa que:

[...] a visibilidade de um nome numa série é função, em primeiro lugar, de sua visibilidade

relativa, definida pelo grau que ele ocupa na série e, em segundo lugar, de sua visibilidade

intrínseca, que resulta do fato de que, já conhecido, ele é mais facilmente reconhecido e

retido (um dos mecanismos que fazem com que, também aqui, o capital leve ao capital).

Desta maneira, “a estrutura do campo científico se define, a cada momento, pelo estado

das relações de força entre os protagonistas em luta, agentes ou instituições, isto é, pela estrutura

do capital específico, resultado das lutas anteriores” (BOURDIEU, 1976, p. 12-13). Depreende-se

69 Fazem parte do Núcleo professores e estudantes de graduação, mestrado, doutorado e pós-doutorado em diferentes áreas, como a saúde, o direito, a comunicação, educação, geografia e, nos grupos de pesquisa, temos contado com a enriquecedora participação de lideranças de movimentos sociais ligados ao processo em estudo. Acolhemos prioritariamente demandas de produção de conhecimento advindas de comunidades em conflito ambiental, que disputam seu território com empreendimentos produtivos ou obras de infra-estrutura, para contribuir na defesa da equidade ambiental. (TRAMAS, s.d).

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150

que “a estrutura da distribuição do capital científico está na base das transformações do campo

científico e se manifesta por intermédio das estratégias de conservação ou de subversão da

estrutura” (idem).

Ainda, ainda no âmbito do trabalho de tese de Freitas (2018, p. 65) quanto à produção da

ciência sobre o Baixo Jaguaribe, a autora destaca que:

Em outras áreas do conhecimento, destacam-se as pesquisas realizadas e em andamento,

orientadas e coordenadas pela médica Profa Dra Raquel Rigotto (coordenadora do Núcleo

TRAMAS/UFC), tornando-se, mais recentemente, uma das principais referências sobre o

Baixo Jaguaribe, no contexto do pensamento crítico. Embora sua formação na área de

medicina, a mesma possui mestrado em educação e doutorado em sociologia. Seu pós-

doutorado trata, dentre outros, da construção da abordagem da pedagogia do território,

pretendendo subsidiar as pesquisas do núcleo TRAMAS.

Mediante os mapeamentos realizados pela autora supracitada, afirmamos que há uma

convergência de interesses de diferentes pesquisadores sobre um mesmo objeto, que, no caso em

tela, está voltada para a “região do Baixo Jaguaribe”. Nesses termos, considerando-se o campo

científico como um espaço objetivo de um jogo “onde compromissos científicos estão engajados”

Bourdieu (1976, p. 3,4) observa que:

[…] a tendência dos pesquisadores a se concentrar nos problemas considerados como os

mais importantes se explica pelo fato de que uma contribuição ou descoberta concernente

a essas questões traz um lucro simbólico mais importante.

Com base em nossas observações, ressaltamos que as posições ocupadas pelos agentes,

mencionados no trabalho de Freitas (2018), levam aos problemas de pesquisa, que,

indissociavelmente, são políticos e científicos. A escolha de seus objetos é também parte de

estratégias políticas de investimento para a maximização do lucro, propriamente, científico. Isto

ocorre porque num campo como é o campo científico,

[...] um produtor particular só pode esperar o reconhecimento do valor de seus produtos

(“reputação”, “prestígio”, “autoridade”, “competência etc) dos outros produtores que,

sendo também seus concorrentes, são menos inclinados a reconhecê-lo sem discussão ou

exame (BOURDIEU, 1976, p.6).

No Quadro a seguir, apresentamos a produção científica sob a orientação de Raquel

Rigotto, envolvendo a região do Baixo Jaguaribe. Diferentemente, do Quadro anterior, no qual as

temáticas envolviam a questão da região jaguaribana no âmbito da Geografia, os trabalhos

orientados por Raquel Rigotto voltam-se para questões que envolvem problemáticas relacionadas

à saúde, perpassadas pelo viés da educação tal como Freitas (2018) menciona acima. Nesta

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151

produção identificamos uma acentuada quantidade de trabalhos, que abordam a Chapada do

Apodi, razão pela qual realizamos todo esforço de demonstrar a produção em detalhes, haja vista

que identificamos a partir desta a confluência de interesses sobre os mesmos objetos, ou objetos

similares situados no espaço geográfico, que envolve a atuação da FAFIDAM e dos agentes por

nós pesquisados.

Figura 18: Pesquisas sobre a região do Baixo Jaguaribe sob orientação de Raquel Rigotto

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152

Fonte: Freitas (2018)

O leitor poderá se interrogar por qual razão o interesse dos pesquisadores converge para

a região do Baixo Jaguaribe e por que a Chapada do Apodi aparece como espaço, no qual muitos

trabalhos têm sido desenvolvidos. Reunindo os fios, que caracterizam esta produção, é possível

identificarmos um contexto social, que favoreceu a reunião de múltiplos interesses. Um elemento

também se destaca na construção desse campo: a constituição “[...] de um grupo socialmente

reconhecido e portador de uma identidade social” (SILVA, 2007, p. 49).

Nesses termos, é importante também destacar em acordo com Bezerra (2014) que o

“encontro da pesquisa com a violência” no Baixo Jaguaribe70 teve seu ponto de maior relevância

a partir de 2010, quando ocorreu o assassinato de um trabalhador da região. O assassinato

encomendado por um empresário do agronegócio e que pôs fim à vida do trabalhador José Maria

– conhecido como Zé Maria do Tomé - ganhou repercussão nacional e internacional, envolvendo

diferentes frentes populares e o apoio da universidade no tocante à denúncia e enfrentamento da

questão ambiental na região. Em decorrência deste fato, Bezerra (2014) assinala que,

70 Região do Baixo Jaguaribe, de acordo com Bezerra (2014) é o recorte territorial formado pelos municípios pertencentes à sua microrregião geográfica, quais sejam: Alto Santo, Ibicuitinga, Jaguaruana, Limoeiro do Norte, Morada Nova, Palhano, Quixeré, Russas, São João do Jaguaribe e Tabuleiro do Norte.

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153

[...] vários pesquisadores se debruçaram na análise sobre a conformação do Baixo

Jaguaribe na economia globalizada e na nova divisão territorial do trabalho, ressaltando

inúmeros aspectos sociais, econômicos, políticos e culturais (ELIAS, 2002, 2006a, 2006b;

MUNIZ, 2004; SANTOS, 2004; CHAVES, 2004; GOMES, 2007; BEZERRA, 2008;

FREITAS, 2010; RIGOTTO, 2011).

A formalização do Mestrado instituiu-se, neste contexto local, onde a força e o peso social

da pesquisa científica somaram-se com a força das ações realizadas no âmbito da extensão

universitária e das atividades de campo, que culminaram em trabalhos e diferentes investigações

sobre a região, por diferentes agentes e de campos disciplinares diversos. Contudo, no âmbito da

FAFIDAM destacam-se o campo da Educação e o campo da Geografia.

Neste ponto, é necessário esclarecer ao leitor que a ação extensionista, desenvolvida pelo

Laboratório de Estudos da Educação do Campo, desde 2008 – conforme já ilustramos ao longo do

texto -, dedica-se à temáticas da educação, com o viés da educação do campo e afins. É possível

verificar inúmeras lutas anteriores, que resultaram na “emergência de uma prática de pesquisa que

favorece a produção do saber e a reprodução do grupo” (SILVA, 2007, p. 49).

Desta forma, desde 2013, o Laboratório de Estudos da Educação do Campo vem se

dedicando às questões específicas, que envolvem os conflitos na Chapada do Apodi, havendo uma

confluência entre a dinâmica do Laboratório e a dinâmica do Mestrado Acadêmico Intercampi.

Isto posto, realizamos um mapeamento, no espaço-temporal de 2013 a 2019, de maneira a

demonstrar, que houve uma repercussão significativa, nos últimos anos, em relação à produção de

trabalhos científicos no contexto da FAFIDAM. Consideramos para critério do mapeamento, as

produções realizadas em torno da temática da Chapada do Apodi, posto que esta tem constituído

uma problemática central na dinâmica do Laboratório, se estendendo, também, ao Mestrado, a

partir de objetos afins.

Quadro 17: Produção científica realizada sobre a Chapada do Apodi com diferentes pares vinculados ao LECAMPO e

MAIE 2013 - 2019

Nº Autores Título Tipo de

Trabalho

Ano Meio de

circulação

01 Sandra Gadelha de

Carvalho

Movimento 21:

Aprendizados em

novas formas de

resistência à lógica do

mercado

Artigo

completo

2013 Colóquio

Internacional de

Ciências Sociais

da Educação –

Universidade do

Minho

02 José Ernandi Mendes Educação e sujeitos

sociais: denúncias e

Artigo

completo

2013 Colóquio

Internacional de

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154

anúncios no contexto

do agronegócio

Ciências Sociais

da Educação –

Universidade do

Minho

03 Sandra Gadelha de

Carvalho; José Ernandi

Mendes; Célia Brito

Experiência do

programa Nacional de

Educação na Reforma

Agrária na

Universidade Estadual

do Ceará: novas formas

de aprendizagem

Artigo

completo

2013 Colóquio

Internacional de

Ciências Sociais

da Educação –

Universidade do

Minho

04 Sandra Gadelha; José

Ernandi Mendes

Práxis educativa do

Movimento 21 na

resistência ao

agronegócio

Artigo

completo

2014 Revista

Interface: a

jornal for and

about social

movements

05 Sandra Maria Gadelha

de Carvalho

Os desafios e

aprendizados no

processo de construção

da agroecologia no

Acampamento Zé

Maria do

Tomé/Chapada do

Apodi

Artigo

completo

2015 4ª Mostra

Nacional de

Experiências e

Reflexões em

Extensão

Popular - UFPB

06 Maria da Conceição da

Silva Rodrigues;

Jamira Lopes de

Amorim

Mulheres em luta: a

constituição da

condição feminina em

processos de ocupação

territorial

Artigo

completo

2015 Encontro de

Geógrafos da

América Latina

– CUBA

(EGAL)

07 Maria José Alves de

Freitas Oliveira; Sandra

Maria Gadelha de

Carvalho

A globalização,

agricultura familiar

camponesa e as

práticas educativas no

campo

Artigo

completo

2015 Seminário

UFSCAR -

GEPEC

08 Jamira Lopes de

Amorim; Maria da

Conceição Silva

Rodrigues

Representações sociais

de gênero em espaços

de ocupação territorial

Resumo

expandido

2015 Jornada

Internacional de

Representações

Sociais (JIRS)

09 Jamira Lopes de

Amorim; Linconly

Jesus Alencar Pereira;

Katson Fernandes

Diário de campo: uma

aula para entender a

luta campesina e o

projeto d agronegócio

na Chapada do

Apodi/CE

Artigo

completo

2016 Congresso

Nacional de

Educação –

Natal

(CONEDU)

10 Claudiana Nogueira

Alencar; Sandra Maria

Gadelha de Carvalho;

José Ernandi Mendes

Práxis educativa e

discursiva do

movimento 21:

transgressões de

fronteiras e hibridismo

emancipatório

Artigo

completo

2016 Revista

Cadernos de

Linguagem e

Sociedade, v.16,

n.2

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155

11 José Ernandi Mendes;

Sandra Maria Gadelha

de Carvalho

O agronegócio na

Chapada do Apodi e a

atuação de resistência

do Movimento 21

Artigo

completo

2016 Livro digital

“Vozes do

Campo:

ressignificando

saberes e

fazeres”

12 Sandra Maria Gadelha

de Carvalho; José

Ernandi Mendes; Maria

das Dores Mendes

Segundo

Os Movimentos

Sociais e processos

educativos no contexto

da crise estrutural do

capital

Artigo

completo

2016 E-book:

Produção de

Conhecimentos

na Pós-

Graduação em

Educação do

Nordeste do

Brasil: realidade

e possibilidades

- UFPI,

Trabalho

encomendado

13 Mila Nayane da Silva;

Sandra Maria Gadelha

de Carvalho

Mulheres,

aprendizados e lutas no

Acampamento José

Maria do Tomé

Artigo

completo

2017 Simpósio

Internacional de

Geografia

Agrária -

Curitiba

(SINGA)

14 Nayara Barreto da

Silva; Lucenir

Jerônimo Chaves;

Cláudio Antônio Vieira

da Silva

Mapeamento dos

territórios e áreas de

conflito por terra e

água no acampamento

José Maria do Tomé na

Chapada do Apodi –

Limoeiro do Norte

(CE)

Artigo

completo

2017 Simpósio

Nacional de

Geografia

Agrária

(SINGA)

15 Sandra Gadelha de

Carvalho; Mila Nayane

da Silva; Jamira Lopes

de Amorim

Mulheres camponeas:

lutas e aprendizados no

Acampamento José

Maria do Tomé –

CE/Brasil

Resumo

expandido

2018 Congresso de la

Associación

Latinoamericana

de Sociologia

Rural

(ALASRU) –

Montevideo,

Uruguay

16 Sandra Gadelha de

Carvalho; Jamira Lopes

de Amorim; Linconly

Jesus A. Pereira;

Emerson Augusto de

Medeiros; José Ernandi

Mendes

Resistência e Práticas

educativas frente ao

avanço do agronegócio

na região do semiárido

brasileiro

Resumo

expandido

2018 Congresso de la

Associación

Latinoamericana

de Sociologia

Rural

(ALASRU) –

Montevideo,

Uruguay

17 Claudiana Nogueira

Alencar; Sandra Maria

Language and Pain in

the Landless worker’s

Artigo

completo

2019

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156

Gadelha de Carvalho;

José Ernandi Mendes

Movement (MST) in

Brazil Fonte: elaboração da autora.

Fizemos o mapeamento desta produção a partir de análise dos currículos dos agentes, pela

Plataforma Lattes, além da pesquisa por meio de motores de busca com os nomes dos agentes.

Quadro 18: Produção científica a partir do Mestrado Acadêmico Intercampi envolvendo as categorias: Educação do

campo, Educação de Jovens e Adultos, Educação popular, Escolas Rurais, Práxis, Pedagogia do Oprimido.

Nº Autores Título Orientador/a

Co-

orientador/a

Tipo de

Trabalho

Ano

01 Maria Elioneide de

Sousa Costa

Projovem urbano:

limites e

possibilidades de um

programa da EJA

Sandra

Gadelha

Dissertação 2018

02 Alan Robson da Silva O Fechamento de

Escolas Rurais e a

Expansão das

Relações Capitalistas

de Produção no

município de

Jaguaruana-Ce (2005-

2015).

Sandra

Gadelha

Dissertação 2018

03 Diana Nara Da Silva

Oliveira

A Educação do

Campo Em Escola de

Assentamento de

Reforma Agrária em

Jaguaruana/Ceará

Luís Tavora

Furtado

Ribeiro

Sandra

Gadelha

(co-

orientadora)

Dissertação 2017

04 Elenice Rabelo Costa Pedagogia do Oprimido: Interrelações entre Educação, Formação e Consciência Emancipatória

José

Ernandi

Mendes

Sandra

Gadelha

(co-

orientadora)

Dissertação 2017

05 João Paulo Guerreiro

de Almeida

Movimento Brasileiro

De Alfabetização -

Mobral: Memórias e

Práticas Pedagógicas

No Município De São

João Do Jaguaribe/Ce

(1971-1979)

Sandra

Gadelha

Dissertação 2017

06 Mádja Diógenes

Maia

Educação Do Campo:

Avanços e Desafios

na Construção da

Proposta Pedagógica

Sandra

Gadelha

Dissertação 2017

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157

da Escola Padre José

Augusto Regis Alves

07 Maria José Alves de

Freitas Oliveira

Educação, Trabalho e

Resistência da

Agricultura Familiar

Camponesa na

Chapada do Apodí –

Ceará.

Sandra

Gadelha

Dissertação 2016

08 Antônio Oziêlton de

Brito Sousa

Identidades

(des)coloniais nas

práticas de letramento

do Projovem Campo

– Saberes da terra

Claudiana

Alencar

Dissertação 2015

09 Paulo Martins Pio A práxis

em pedagogia do

oprimido: lições

pedagógicas e

políticas

Sandra

Gadelha

Dissertação 2015

Fonte: elaboração da autora.

Quadro 19: Produção científica derivada das pesquisas do Mestrado e do LECAMPO envolvendo as

categorias: Educação do campo, Educação de Jovens e Adultos, Educação popular, Escolas Rurais, Práxis,

Pedagogia do Oprimido.

Nº Autores Título Ano Meio de circulação

01 Sandra Maria

Gadelha de Carvalho;

Paulo Martins Pio

A categoria da Práxis

em Pedagogia do

Oprimido: sentidos e

implicações para a

educação libertadora

2017

Rev. Bras. Estud.

Pedagog. – Brasília,

v. 98, n.249, p.428-

445, maio./ago.

02 Tânia Maria Lima [et

al]

Escola e currículo:

uma análise sobre a

ausência das

vivências e

aprendizagens dos

alunos da classe

popular na Educação

Básica

2018 Revista Instituto de

Políticas Públicas de

Marília – v.4, n.2

03 Nara Lúcia Gomes

Lima

A Educação de

Jovens e Adultos do

campo e a

permanência escolar:

o caso do

Assentamento 25 de

maio, Madalena,

Ceará

2014 Banco de Teses e

Dissertações UFC

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158

Dois aspectos que caracterizam a produção deste conhecimento, até sua confluência, a

partir de 2013. No âmbito da Geografia, as produções vêm se desenhando por meio da pesquisa

de campo com diferentes pares, ou seja, os agentes do campo disciplinar da Geografia circulam

em variados espaços. Tem sido profícua a relação com o Núcleo Tramas e com o grupo, que atua

na FAFIDAM através do Laboratório e do MAIE. Tal produção vem ocorrendo de maneira mais

“dispersa”, no sentido de que os pesquisadores têm realizado sua produção de maneira mais

individual. Mas, alguns esforços são realizados, no sentido de agregar os pesquisadores, em um

grupo cadastrado na CAPES, denominado NATERRA. Esse grupo tem caráter interdisciplinar e

reúne professores e alunos do curso de Geografia do CCT/UECE, em Fortaleza; professos dos e

alunos dos cursos de Geografia, História e Pedagogia da FAFIDAM/UECE.

No âmbito da Educação a produção vem se delineando a partir de ações extensionistas -,

que, também, envolvem atividades de campo – contudo, essas ações estão vinculadas a

compromissos específicos do grupo que mantém o Laboratório e a pós-graduação na FAFIDAM.

Esses compromissos estão voltados para a produção do saber e da reprodução do próprio grupo.

No caso da extensão, a divisão do trabalho científico é maior e as publicações podem ser com

maior número de pares. Nesse sentido é importante observar, a pesquisa ocupa um lugar de mais

prestígio do que a extensão, no ambiente acadêmico, se encontrando em posição de maior

reconhecimento. São princípios de visão e divisão diferentes, que norteiam tais práticas, porém,

no mercado das trocas simbólicas na FAFIDAM, a realção pesquisa e extensão tem garantido

relativo sucesso e visibilidade ao grupo, pois os agentes, que lideram essas atividades, gozam de

capitais bem estruturados de longo prazo. Neste caso, identificamos um acumulado de lutas

anteriores objetivadas na instituição e nas disposições dos agentes.

4.4 O crescimento da produção científica por meio da pós-graduação na FAFIDAM

Queremos explicitar sob que prisma estamos denominando, nos tópicos anteriores, a

produção de artigos, dissertações e teses como produção científica. No âmbito das agências

reguladoras, como a Capes e o CNPq, existe estruturada uma política de avaliação desta produção,

que se materializa a partir da classificação qualis. Para o reconhecimento das produções no campo

científico, Frigeri (2012, p. 15) afirma que:

A ideia de que um conhecimento científico só adquire valor a partir do momento em que

é difundido na comunidade e de que é necessário publicar as descobertas das pesquisas a

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159

fim de se obter reconhecimento e registro de autoria, tem resultado no crescimento

elevado da quantidade de publicações científicas.

A autora observa que a avaliação das publicações científicas é parte integrante do

processo de construção do conhecimento científico. O processo Qualis/CAPES tem como uma de

suas finalidades indicar os veículos de maior relevância para cada área do conhecimento, o que

envolve pesquisadores, agências financiadoras e órgãos científicos. Frigeri (2012) chama a atenção

ao fato de que não há um consenso de que o qualis seja uma maneira eficaz de medir a qualidade

da produção científica. De acordo com Souza, Filipo e Casado (2018, p. 130):

O tardio aparecimento da universidade no Brasil só ocorreu mais de quatrocentos anos

após a chegada dos colonizadores portugueses, e muito depois das universidades da

América Espanhola. As atividades de pesquisa científica, até o início do século XX, eram

incipientes e representavam o esforço individual do pesquisador ou de pequenos grupos

ligados ao segmento acadêmico.

O Brasil Brasil avançou significativamente no que concerne a produção de trabalhos

científicos. Contudo, é necessário estabelecer algumas reflexões, relativas às metodologias

utilizadas para pontuação e rankeamento das instituições e do desempenho dos pesquisadores. O

campo das publicações acadêmicas segue cada vez mais a lógica das editoras comerciais, havendo

uma ampla indústria da publicação científica, que movimenta elevadas margens de lucros.

Taga (2016) destaca que os periódicos são importantes para o campo da pesquisa pois,

por meio de sua circulação, os agentes envolvidos na produção do conhecimento podem

acompanhar os avanços da ciência, amparando-se na literatura produzida em escala nacional e

internacional. Em outra direção, Souza, Filippo e Casado (2018) observam com base em Bordons,

que algumas bases de dados são reconhecidas como muito boas, porém, várias limitações são

percebidas como inclinação temática, idiomática e a presença pouco representativa de países não

anglófonos.

No contexto das reconfigurações do campo universitário, é possível identificar

repercussões acerca do trabalho acadêmico de uma forma geral, que implicam diversificadas

formas de controle e regulação do trabalho acadêmico-científico. Nesses termos, Bauer (2016)

considera que as reestruturações no campo se vinculam à avaliação e, nesse contexto, a pós-

graduação sofre maiores pressões no âmbito da lógica produtivista. A lógica de produtividade

imposta pelas agências competentes vem se mostrando atrelada à imposições de ordem operacional

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160

e gerencialista. A produção em âmbito local, no contexto da FAFIDAM também é tocada por uma

pressão, realizada pelas agências de avaliação.

A produção realizada pelos pares do Laboratório e Mestrado encontra-se em processo de

estruturação, já tendo importante desempenho, haja vista que tem investido em publicações em

revistas, também por meio das parcerias internacionais. É importante não perder de vista que, no

campo científico, os imperialismos cutlturais são instituídos também no campo da produção

científica, Dezalay e Garth71 (2005, s.d) destacam que:

O mercado da avaliação internacional é elitista e protegido. Para acessá-lo, é necessário

dispor de competências culturais e lingüísticas. Antes de serem reforçadas e legitimadas

por cursos escolares internacionais muito dispendiosos, as tendências ao internacional são

privilégio dos herdeiros de linhagens familiares cosmopolitas. Incluindo no meio certas

críticas da globalização, que se inscrevem em redes internacionais muitas vezes marcadas

pela influência norte-americana.

Construir uma agenda científica, que resista aos impositivos externos ao campo

universitário, tem sido um dos grandes e atuais desafios para quem deseja sobreviver no meio

acadêmico, porque tal como sustenta Bourdieu (1976, p. 16) “[…] os dominantes consagram-se às

estratégias de conservação, visando assegurar a perpetuação da ordem científica estabelecida com

a qual compactuam”.

4.5 Internacionalização e trocas simbólicas na FAFIDAM/UECE: diálogos interculturais e

científicos entre Brasil e Reino Unido

Nas observações diretas, percebemos um fluxo razoavelmente regular de trocas realizadas

entre o grupo de agentes, que compõem o Laboratório - tanto com figuras de outras instituições de

ensino brasileiras como é o caso da relação com a Universidade Federal do Ceará – por meio do

grupo que estuda a questão do agronegócio na região do Vale do Jaguaribe. Também observamos

uma relação de trocas simbólicas com um grupo de professores pesquisadores de outros países.

Cumpre também destacar que, as relações internacionais vêm sendo formalizadas

institucionalmente pelo Mestrado Acadêmico Intercampi em Educação e Ensino72(MAIE). Há um

Convênio de Cooperação Internacional promovido pelo MAIE/UECE com a University of East

Anglia (UEA) e Birmingham City University (BCU), ambas do Reino Unido. O Convênio foi

71 Disponível em: http://diplo.org.br/imprima1127. Acesso em 22 de dezembro de 2018. 72 O Mestrado Acadêmico Intercampi em Educação e Ensino (MAIE) foi aprovado pela Capes em 2013.

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161

assinado em 2015 e se estende até 2019, tendo como finalidade o intercâmbio de docentes, alunos

da graduação e pós-graduação na realização de pesquisas colaborativas, organização de eventos,

cursos, publicações, dentre outras atividades de cunho acadêmico-científico. O Convênio com as

Universidades Inglesas se deu a partir do Projeto Interações efetivado pelo Edital nº 01/2014 da

FUNCAP/CAPES.

O acordo entre as duas instituições foi assinado em outubro de 2015 e, por ocasião da

parceria firmada - duas professoras, vinculadas ao MAIE, estiveram na Inglaterra para assinatura

do acordo, tendo também proferido palestras na University of East Anglia (UEA) no Seminário

“Dialogical Seminar on “Education, culture and politics in Latin America and Europe”. As

palestras proferidas foram: “World Bank, the movement ‘Education for all’ and critical

Marxism73” e “Universities, Social Movements and Social Transformation74”. De acordo com

informações disponibilizadas no site da UECE75:

Participou também dos Seminários o Prof. Dr. Paolo Vittoria, da Universidade Federal

do Rio de Janeiro (UFRJ), com a exposição “The role of popular education based social

movements in Brazil today”, abordando o contexto político brasileiro, a educação popular

e as consequências sócio-políticas do golpe contra o governo da Presidenta Dilma

Roussef. Ainda na UEA, participaram do seminário a Profa. Hazel Marsh (PPLUEA),

com a palestra “Whose Heritage? Cultural Policy and Social Change in Venezuela in the

Chávez Period”, discorrendo sobre as políticas culturais no Governo Chavéz, na

Venezuela, e o Prof. Dr. Tristán Mac Cowell (UCL, IoE), com a palestra “The

'developmental' university: origins, experiences and threats”, abordando as perspectivas

que se colocam para as universidades africanas e latino-americanas na atualidade.

Desta forma, além do Acordo de Intercâmbio firmado entre as instituições, conforme

descrição da atividade no site da UECE objetivou-se um diálogo Norte/Sul, com um olhar crítico

quanto às conjunturas políticas, culturais e educacionais76

Objetivou-se assim um diálogo Norte/Sul, com um olhar crítico acerca das conjunturas

políticas, culturais e educacionais. Os seminários foram organizados pelas Profas. Phd

Joyce Canaan e Amanda French da BCU e pelo Prof. Dr. Spyros Themelis na UEA,

ocorrido de 11 e 13 de maio de 2016, nas duas universidades supracitadas,

respectivamente, nas cidades de Birmingham e Norwich, no Reino Unido (...)

73 Ministrada pela professora Maria das Dores Mendes Segundo. 74 Ministrada pela professora Sandra Maria Gadelha de Carvalho. 75Informações disponíveis em: http://www.uece.br/fafidam/index.php?option=com_content&view=article&id=91132:2016-06-20-19-36-53&catid=3:lista-de-noticias&Itemid=1207. 76 Informações disponíveis em: http://www.uece.br/fafidam/index.php?option=com_content&view=article&id=91132:2016-06-20-19-36-53&catid=3:lista-de-noticias&Itemid=1207

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No âmbito ainda dos diálogos transfronteiriços, em 2014, houve também a participação

de dois professores do MAIE no Colóquio Epistemologias do Sul, coordenado pelo Prof.

Boaventura de Sousa Santos, na cidade de Lisboa. Os professores estiveram participando do Painel

“Democratizando a democracia”. A presença dos professores se deu em virtude de seus objetos de

pesquisa, vinculados ao Grupo de Pesquisa “Ecologia de Saberes para a promoção da equidade

ambiental e em saúde no trabalho no contexto da expansão do agrohidronegócio nos territórios do

Vale do Jaguaribe – CE”, coordenado por Raquel Rigotto77.

A relação com a Universidade Federal do Ceará (UFC) foi estabelecida, por meio da

parceria do Laboratório e do MAIE com o grupo Trabalho, Meio Ambiente e Saúde (TRAMAS)

que atua na região do Vale do Jaguaribe, especificamente na Chapada do Apodi, estudando a

questão do agrohidronegócio. Nesta relação interinstitucional, tem havido significativa dinâmica

de atividades por parte dos professores e bolsistas, ocorrendo, também o fluxo, disseminação e

circulação internacional de ideias.

Esboçamos a seguir um quadro com as principais atividades (que conseguimos catalogar

até o presente) do trânsito de professores em atividades no país e fora do país, no espaço-temporal

de 2013 a 2018, considerando-se que o intercâmbio foi formalizado em 2015, contudo já havia

uma rede de relações, que se estabeleceu anteriormente.

Quadro 20: Circulação Internacional de ideias - Brasil, Lisboa, Inglaterra.

ANO ATIVIDADE PAÍS

2014 Colóquio Epistemologias do Sul – Painel “Democratizando a

democracia”

Participação dos professores:

José Ernandi Mendes (UECE);

Sandra Gadelha de Carvalho (UECE);

Claudiana Nogueira (UECE);

Raquel Rigotto (UFC);

Joyce Canaan (Birmingham City University, Reino Unido);

Sara Motta (New Castle University, Australia);

Lisboa

77 Pesquisadora da Universidade Federal do Ceará (UFC).

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163

Grant Banfield ( Flinders University, Australia );

Spirus Alpesh Maisuria (Univeristy of East Anglia, Reino Unido)

2015 Dialogical Seminar on “Education, culture and politics in Latin

America and Europa

Palestras: 1) “Work Bank, the movement ‘Education for all’ and

critical Marxism” (Professora MD3);

2) “Universities, Social Movements and Social transformation”

(Professora SM2).

Inglaterra

A rede durável de relacionamentos estabelecida entre os professores do Laboratório e do

MAIE com o grupo de professores estrangeiros vem se dando com base na troca de experiências,

que se caracteriza na publicação de materiais, artigos científicos, atividades acadêmicas e projetos

desenvolvidos em parceria. Os vínculos estabelecidos entre os agentes vêm se mostrando eficazes

estratégias mediante as diretrizes, que estão sendo pautadas para o ensino superior, havendo nesta

relação o ensaio para a possibilidade de duradoura circulação internacional de ideias. Neste ponto,

consideramos oportuno frisar a importância do senso prático, caracterizado por meio das

estratégias desenvolvidas pelos agentes, no espaço no qual se encontram posicionados os

professores do MAIE/UECE, ou seja, a aproximação entre os agentes, neste caso ocorre não por

um cálculo racional, frio e consciente, mas se dá em face do habitus, tal como destaca Seidl (2017,

p.189) “...princípio que organiza a relação dos agentes com o mundo social, fornecendo-lhes um

sentido prático.”. Seidl (2017, p.189) ainda assinala que:

Assim, embora as estratégias reflitam objetivamente interesses socialmente

orientados – manutenção do patrimônio econômico, reprodução do grupo familiar

-, não são necessariamente objeto de reflexão como cálculo ou intenção

estratégica pelos agentes que as levam a cabo, situando-se, na maioria das vezes,

no nível pré-reflexivo ou infraconsciente.

Nesta rede durável de relacionamentos, estabelecida entre diferentes agentes

posicionados no campo universitário, é possível inferir que, por meio do habitus estruturado dos

que vivem e circulam neste espaço,

A cada classe de posições corresponde uma classe de habitus (ou de gostos)

produzidos pelos condicionamentos sociais associados à condição

correspondente e, pela intermediação desses habitus e de suas capacidades

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geradoras, um conjunto sistemático de bens e de propriedades, vinculadas entre

si por uma afinidade de estilo. (BOURDIEU, 1996, p. 21)

O conjunto sistemático de bens e de propriedades, conforme Bourdieu (1989), são

vinculados por uma afinidade de estilo, ou seja, a cada parceria e a cada encontro as relações se

estabelecem por uma causalidade provável, garantida pelo conjunto de capitais organizados como

propriedades. Desta forma,

Ao agregar sujeitos cuja identidade está fundada na coincidência dos esquemas

de visão e divisão do mundo social, o “espírito de corpo” pode dar origem a

corpos (profissionais, sociedades, clubes), grupos que são capazes de conferir

identidade, estabelecer vínculos de solidariedade e promover o reforço mútuo de

espécies de capital, sobretudo o social, dos participantes. (HEY; Kluger, 2017,

p.178).

Nesse sentido, conforme citam Pereira e Catani (2002) há uma homologia entre espaço

social e espaço simbólico, porque há uma conjunção entre conjunto de posições mutuamente

exteriores e o conjunto de práticas e preferências construidoras dos “signos distintivos” por meio

dos quais os agentes se reconhecem. No caso da cooperação internacional que, aos poucos vai

sendo instituída na FAFIDAM, observamos o surgimento de um terreno de lutas, uma vez que o

próprio conceito de internacionalização e as regras do campo são permanentemente disputadas.

Segundo Azevedo (2014, p.101) “[…] diferente de um esporte, em que as regras são explícitas e

claramente definidas a priori, o campo social para além das regras aparentes e enunciadas

formalmente, possui normas implícitas, tácitas, fluidas e provisórias”.

Há um amplo movimento de transnacionalização e mundialização da educação superior,

encampado por agências internacionais que concorrem diretamente com o campo universitário. A

transnacionalização nesses moldes é orientada por princípios de homogeneização e

universalização das visões dominantes, portanto, as questões específicas de determinado contexto

passam a circular como problemas universais. Bourdieu (2002) a respeito do imperialismo cultural

destaca o necessário cuidado que se deve ter com as artimanhas da razão imperialista, configuradas

por meio da universalização de particularismos associados a uma tradição histórica singular. O

autor adverte sobre esses lugares-comuns que passam a ocupar a agenda universitária, tendo seus

pressupostos indiscutidos. Bourdieu (2002, p. 15) afirma:

[...] assim também, hoje em dia, numerosos tópicos oriundos diretamente de

confrontos intelectuais associados à particularidade social da sociedade e das

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165

universidades americanas impuseram-se, sob formas aparentemente

desistoricizadas, ao planeta inteiro.

Arriscamos afirmar que o processo da transnacionalização do ensino superior vem

ocorrendo acompanhado desses elementos apresentados por Bourdieu, uma vez que a circulação

internacional das ideias, muitas vezes, se dá a partir de uma recepção dos textos de maneira

‘desistoricizada’ como se houvesse uma gênese pura dos conceitos e das teorias, Bourdieu (2002,

p.16) frisa que:

Assim, planetarizados, mundializados, no sentido estritamente geográfico, pelo

desenraizamento, ao mesmo tempo em que desparticularizados pelo efeito de

falso corte que produz a conceitualização, esses lugares-comuns da grande

vulgata planetária transformados, aos poucos, pela insistência midiática em senso

comum universal chegam a fazer esquecer que têm sua origem nas realidades

complexas e controvertidas de uma sociedade histórica particular, constituída

tacitamente como modelo e medida de todas as coisas.

A título de exemplo, menciona o debate impreciso e inconsistente em torno do ‘multiculturalismo’,

um “termo que, na Europa, foi utilizado para designar o pluralismo cultural na esfera cívica,

enquanto, nos Estados Unidos, ele remete às sequelas perenes da exclusão social dos negros e à

crise da mitologia nacional do “sonho americano”...” (BOURDIEU, 2002, p. 16). Contextualiza

ainda a crise encoberta por este vocabulário, denominado ‘multicultural’, vez que:

[…] confinando-a artificial e exclusivamente ao microcosmo universitário e

expressando-a em um registro ostensivamente “étnico” quando, afinal, ela tem

como principal questão, não o reconhecimento das culturas marginalizadas pelos

cânones acadêmicos, mas o acesso aos instrumentos de (re)produção das classes

média e superior – na primeira fila das quais figura a universidade – em um

contexto de descompromisso maciço e multiforme do Estado.

Assim, é possível afirmar que as relações instituídas entre os agentes da FAFIDAM e das

instituições estrangeiras vem se dando no sentido de uma cooperação.

Nesse sentido, Azevedo (2015) explica que há uma diferença entre a internacionalização

do tipo “união” e a do tipo “interseção”. Com base na teoria dos conjuntos, o autor afirma que o

modelo de “união” se baseia no respeito às especificidades, considerando-se os aspectos

interculturais. O autor atribui à internacionalização no modelo de união um caráter mais próximo

dos valores relacionados à solidariedade e Interculturalidade. No caso da internacionalização no

modelo de “interseção” dos campos, Azevedo identifica a transnacionalização vinculada aos

processos de mercadorização da educação superior.

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No processo da internacionalização e das trocas simbólicas, que procuramos destacar

neste tópico, recorremos a Bourdieu (2002) que, no contexto da circulação internacional de ideias,

chama a atenção para o imperialismo cultural, sobretudo porque há uma falsa impressão de que a

vida intelectual é naturalmente internacional, tal como o autor destaca:

Acredita-se, frequentemente que a vida intelectual é espontaneamente

internacional. Nada mais falso. A vida intelectual é lugar, como todos os outros

espaços sociais, de nacionalismos e imperialismos, e os intelectuais veiculam,

quase quanto os outros, preconceitos, estereótipos, idéias prontas...

(BOURDIEU, 2002, p.16)

Além disto,

[...] as trocas internacionais estão sujeitas a um certo número de fatores estruturais

que são geradores de mal entendidos. Primeiro fator: o fato de os textos

circularem sem seu contexto...eles não trazem com eles o seu campo de

produção...do qual eles são o produto e que os receptores, estando eles mesmos

inseridos em um campo de produção diferente, os reinterpretam em função da

estrutura do campo de recepção... (BOURDIEU, 2002, p. 3).

Por esta razão, ressaltamos, de acordo com Azevedo, Catani e Hey (2017) que não se

deve confundir internacionalização da educação superior com transnacionalização da educação

superior. A transnacionalização, segundo Azevedo (2015) envolve a oferta transfonteiriça de

ensino superior presencial e a distância, mediada por organizações transnacionais de serviços

educacionais com a finalidade de obtenção de lucros. Deste modo, o campo universitário, ou

campo científico como denomina Azevedo (2015) por se tratar de um campo social mais ou menos

autônomo, que possui objetos em disputa e regras de funcionamento tácitas e consentidas, a

internacionalização é inerente ao habitus dos agentes, dotados da illusio em busca do

reconhecimento de seus pares situados em ambientes culturais e científicos diversos.

Na mesma linha de raciocínio, Azevedo (2015, p. 58-59) considera que:

...o campo da educação superior tem estabelecido uma relação com o campo

burocrático de “independência na dependência” ou, alternadamente de

“dependência na independência”, pois as instituições de educação superior

públicas e autônomas necessitam de financiamento de Estado para a manutenção

e desenvolvimento de atividades acadêmicas de maneira “desinteressada” (não

imediatista).

Assim, o autor utiliza a noção de União e Interseção para falar da internacionalização e

transnacionalização da educação superior, posto que há campos sociais que intersectam o campo

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universitário. Com base no do diagrama de Ven78 que ilustra a “Teoria dos Conjuntos”, Azevedo

(2015) explica que a internacionalização no formato de União, é a própria integração dos campos

de educação superior, pois visa fins comuns, com atenção à Interculturalidade, respeito à

diversidade cultural e promoção de solidariedade entre os povos.

Segundo Azevedo (2015) o conceito de Interculturalidade faz questão de explicar que

este diz respeito à existência de relações baseadas na compreensão mútua e interação entre atores

sociais de grupos culturais diversos, portanto, a Interculturalidade não diz respeito a um simples

apelo à tolerância entre grupos, de modo que Interculturalidade não é a mesma coisa que

multiculturalidade. No caso do formato de internacionalização pela União dos campos e

Interculturalidade, o autor ilustra graficamente da seguinte forma:

Figura 19: União de dois campos da educação superior pela Interculturalidade

Fonte: Azevedo (2015)

Toda a área dos dois campos encontra-se hachurada, havendo complementariedade entre

uma e outra. No tocante à internacionalização no formato de Interseção, Azevedo (2015, p.63)

explica que se trata de “[...] espaços multinacionais ocupados (ou em vias de ocupação) por pares

homólogos, heteronomamente, submetidos a testes de performance, benchmarkings e tábuas de

78 O autor utiliza os diagramas criados pelo matemático John Ven para facilitar a percepção das relações de união, intersecção, diferença e complemento na teoria dos campos que utiliza para falar do campo universitário.

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rankings e indicadores”. Com base na Teoria dos conjuntos, o autor ilustra a interseção por meio

da figura abaixo:

Figura 20: Interseção de dois campos da educação superior

Fonte: Azevedo (2015).

Como se pode observar, a área hachurada é apenas a área central de interseção entre os

dois campos. Conforme o autor, esse espaço ocupado (hachurado), além de representar a atuação

e presença de agentes e atores, que já se encontram situados no campo, legitimados de alguma

forma, seja por pares homólogos ou heterônomos, indica também que a presença e atuação desses

agentes se dá por meio de pressões de performance. As pressões de performance, conforme e

Azevedo (2015) são pressões ditadas pelas agências de avaliação, não somente e, também, por

organizações internacionais, tais como: OCDE, Banco Mundial, Comissão Europeia e outras. No

interior do campo, ocorre a naturalização dos esquemas do pensamento neoliberal e, de acordo

com Bourdieu (2002), esta naturalização se dá por meio do trabalho duradouro, ao longo das

últimas décadas, dos think thanks. A interseção, portanto, conforme assinala o autor pode ser

compreendida como uma restrita forma de internacionalização da educação superior. Isto porque

os espaços contemplados com a internacionalização são ocupados por aqueles atores que já estão

em comunicação e posição estabelecida. De acordo com Azevedo (2015) esse tipo de

internacionalização é social, econômica e geograficamente situada. Desta forma,

[...] pode-se dizer que o modo restrito de internacionalização (na interseção dos

campos) reúne atores sociais, entre eles os acadêmicos, vinculados

majoritariamente a universidade e laboratórios nacionais, que aceitam as regras

do jogo, algumas delas (heterônomas) provenientes de outros campos sociais, por

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intermédio de atores individuais ou coletivos, tais como os Estados, organizações

internacionais (BM, OCDE), agências de avaliação, think thanks, autoridades

regionais (Comissão Europeia, Mercosul...), empresas, organizações e

instituições sociais (AZEVEDO, .2015, p.63).

A representação gráfica, utilizada por Azevedo, que se encontra logo abaixo, indica as

várias interseções atuantes no campo universitário, como se pode observar:

Figura 21: Interseção de variados campos sociais

Fonte: Azevedo (2015)

O tipo de internacionalização caracterizado pela interseção, conforme a figura acima, na

percepção de Azevedo (2015) pode prescindir da Interculturalidade e contribuir com a redução da

autonomia dos campos acadêmicos. O autor afirma que a redução da autonomia dos campos

acadêmicos pode influenciar na produção de um “capitalismo acadêmico” uma vez que diferentes

campos passam a impor suas lógicas sobre o campo da educação superior. Assim, este “capitalismo

acadêmico” refere-se a uma espécie de transferência de políticas e de uma agenda globalmente

estruturada para a educação. O reflexo mais notório deste processo é a mudança na natureza do

trabalho acadêmico.

Tal mudança na natureza do trabalho acadêmico vem se dando na forma de incentivos

para determinados aspectos da carreira e a desvalorização de outros aspectos. De forma mais clara,

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essas mudanças operacionalizadas sobre o trabalho acadêmico vêm se refletindo de maneira a

privilegiar uma lógica de mercado. No contexto da educação superior, Azevedo (2015), com

amparo em outros autores, observa que a imposição desta lógica vem sendo implementada

maiormente por países anglófonos, tais como Estados Unidos da América, Reino Unido e Canadá

– nesses países a oferta de educação superior não é majoritariamente privada, correspondendo,

apenas, a 20%.

No caso do Brasil, a oferta de educação superior vem se dando, majoritariamente de forma

privada, correspondendo a ¾ de oferta, o que favorece um ambiente extremamente propício à

interseção de diferentes agentes sobre o campo universitário. Desta forma, a troca de experiências

e colaboração, que vêm se consolidando entre os professores do Laboratório e professores dos

países da França e Inglaterra, se constitui em um tipo de troca simbólica, marcada pela colaboração

e união, caracterizando um tipo de internacionalização, ainda em fase de maturação.

As trocas simbólicas, com amparo na teoria dos campos, buscando evidenciar que tais

trocas se dão orientadas por princípios opostos aos princípios do economicismo que reduz as trocas

ao cálculo interessado (SAPIRO, 2017). A autora afirma que a partir da economia dos bens

simbólicos de Bourdieu, embora o economicismo tenha se consolidado a partir do século XVIII

como paradigma dominante com o capitalismo triunfante, é apenas uma forma particular da

economia das práticas e das trocas, pois os campos de produção cultural ou, científica se

movimentam e funcionam a partir de princípios da economia pré-capitalista. Em outras palavras,

as lógicas de funcionamento do campo universitário – se dão a partir de trocas simbólicas -, sem

ser possível objetivar a realidade destas trocas, uma vez que funcionam como a negação, censura,

denegação e recalque do interesse econômico, havendo de acordo com Sapiro (2017)

transfiguração dos atos econômicos em atos simbólicos.

Vale explicar, com arrimo na autora, que essa transfiguração não se dá por meio de uma

estratégia cínica de dissimulação por parte dos agentes, mas por um conjunto de disposições e

investimentos. Dessa forma, afirmamos que o grupo de agentes, que movimenta as atividades do

Laboratório e do MAIE, partilha de amplo patrimônio de esquemas de percepção e apreciação,

que são configurados como capital simbólico, com base no habitus.

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Em relação à internacionalização, afirmamos que, o grupo de professores articula uma

internacionalização no modelo de União. No decorrer desta pesquisa constatamos que é possível

afirmar que a FAFIDAM se constitui como um subcampo do campo universitário em fase de

transformação.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A partir dos dados e da problemática apresentada por esta pesquisa é possível afirmar que,

há no Brasil um campo universitário/científico que se estruturou muito recentemente. Este campo,

denominado por nós de universitário/científico, caracteriza-se como um espaço de lutas

concorrenciais. Portanto, é um campo de lutas que tal como destaca Bourdieu (1976) produz e

supõe em seu funcionamento uma forma específica de interesse. Sem fazer um transplante

mecânico da teoria de Bourdieu para a realidade brasileira, o estudo demonstra que a produção

científica brasileira é desenvolvida pelas universidades e que estas estruturam-se como “[...]

espaço objetivo de um jogo onde compromissos científicos estão engajados...79”.

O estudo permite afirmar que há um campo do ensino superior – que representa todas as

instituições deste nível de ensino. No entanto, o olhar da pesquisa priorizou o campo universitário,

concebendo este como lócus de lutas concorrenciais e classificatórias, com autonomia relativa,

espaço legítimo e legitimado no que concerne as definições de ciência e verdade, com lógicas

específicas de funcionamento, caracterizado pela distribuição de capitais, com capacidade de

refratar as pressões externas – quanto mais autônomo, mais esse campo social escapa às leis sociais

externas. No caso do campo científico nacional é oportuno frisar que o processo de

reconfigurações/reestrurações iniciadas a partir de 1990 vem evidenciando uma significativa perda

de autonomia, aspecto que se revela por meio da imposição de temas e problemáticas da agenda

política.

As pressões externas se exercem por intermédio das forças específicas do próprio campo.

Nesse sentido, Hey (2008) demonstra que há uma agenda acadêmica em educação superior

estabelecida desde os anos de 1990, imposta por um grupo dominante dentro do campo acadêmico

- representada incialmente pelo Núcleo de Pesquisa de Ensino Superior (NUPES) criado ainda

79 Bourdieu (1976, p.3). BOURDIEU, P. Le champ scientifique. Actes de Ia Recherche en Sciences Sociales, n. 2/3, jun. 1976, p. 88-104. Tradução de Paula Montero.

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nos anos 80 do século XX e tendo existido ativamente até o ano de 2005. Posteriormente esse

grupo foi transformado em Núcleo de Pesquisa de Políticas Públicas (NUPPs) – da Universidade

de São Paulo (USP). Uma vez que o espaço acadêmico se constitui como lócus de disputas que se

exercem tanto para conservar como para transformar, pode-se afirmar que a política de educação

superior desde os anos de 1990 se encontra permeada e orientada por tendências estruturais, dentre

as quais a elaboração de um aparato acadêmico - por parte de agentes do grupo dominante já

mencionado – favoreceu a constituição de uma leitura única sobre o campo científico nacional.

Além destes aspectos, é possível identificar um movimento de regulação transnacional no

campo do ensino superior, Ferreira (2011) destaca a reestruturação das universidades europeias,

com especial atenção ao Processo de Bolonha, no qual a autora identifica semelhanças com a

reforma universitária no Brasil a partir de 1990. Nos dois casos, a autora observa que os

diagnósticos sobre a ineficiência das instituições tendem a ser semelhantes, o que justifica as

reformas como forma de atribuir novos papeis a este nível de ensino. No contexto da reengenharia

do Estado e da consequente reconfiguração do campo universitário brasileiro a expansão e a

privatização são norteadoras deste processo de reestruturação deste nível de ensino.

Nesse lastro, o estudo aponta, por meio da literatura pertinente, que a redefinição do papel

do Estado vem interferindo diretamente nas estruturação do ensino superior brasileiro. Verifica-se

a implementação de um modelo de massificação, que na percepção de autores como Sguissard

(2015) representa um tipo de massificação mercantil, porque se caracteriza como de elite e alta

qualificação para poucos e de baixa qualidade e massificada para muitos. Neste sentido, foram

instituídas políticas focais de curto alcance como o Programa Universidade para Todos (Prouni) e

Fundo de Financiamento Estudantil (Fies) – tais políticas se caracterizam pela expansão

significativa do setor privado e crescimento moderado do setor público, considerando-se as últimas

duas décadas – apesar das metas traçadas no Plano Nacional de Educação (2014 – 2024). Há que

se destacar que, no Brasil, a rentabilidade das empresas de ensino privado é uma das maiores

quando comparada às congêneres que atuam em países como Estados Unidos, Japão e Coreia do

Sul (KUBOTA & MEIRA, 2016).

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173

Com base na teoria dos campos, observa-se que as reconfigurações do campo

universitário se dão em relação a um paralelismo estrutural entre países exportadores e

importadores de conhecimento técnico profissional em nível transnacional. Por meio desse fluxo

de trocas internacionais, as reformas institucionais são garantidas, posto que “exportações

simbólicas tendem a ser mais bem-sucedidas quando há homologias estruturais entre o Sul e o

Norte” (DEZALAY & GARTH, 2000, p. 165).

Na base das reconfigurações do campo universitário no Brasil se encontram as disputas

em torno dos modelos de universidade. Este é o núcleo central do processo das reconfigurações

ocorridas nas últimas décadas. De modo mais detalhado, é necessário frisar que a Reforma

Universitária de 1968 foi fundamental para a estruturação do campo universitário nacional, pois

implantou o modelo de universidade que desenvolve ensino, pesquisa e extensão como referência

para o sistema de educação superior. O modelo humboldtiano de universidade carcaterizado pela

associação entre ensino e pesquisa, iniciado a partir dos anos de 1930, fortalecido a partir de 1968

com a Reforma Universitária e assegurado pela criação de instâncias ligadas à produção do

conhecimento (CAPES, CNPq, SBPC, entre outras) favoreceu a consolidação do campo

universitário/científico nacional. Contudo, o desmonte deste modelo teve início no final dos anos

de 1980 e e ganhou força em 1990 – quando foi instituída a reengenharia do Estado.

Nesses termos, foi inserido na legislação específica da educação (LDB 9.394/96) a

abertura para a criação de instituições de educação superior sem a obrigatoriedade de desenvolver

pesquisa e extensão. Esta abertura favoreceu um processo de diferenciação e diversificação

institucional. Houve um deslocamento e uma alteração do modelo instituído na Reforma de 1968,

caracterizando-se um processo de separação entre universidades de pesquisa e faculdades de

ensino. Nessa direção, pode-se afirmar que há uma superposição de modelos, onde o modelo

americano se sobressai. O modelo americano na percepção de Sguissard (2015) se subdivide em

vários outros, no caso brasileiro não há como afirmar que há um modelo francês ou alemão, mas

muitos modelos americanos no atual contexto.

No que se refere à parte específica da pesquisa, pode-se afirmar que a tese por nós

sustentada revelou que há, de fato, um campo universitário e, a instituição por nós investigada

encontra-se situada como um subcampo – fato que foi possibilitado pelas reconfigurações recentes

do campo em questão. Dentre as principais reconfigurações observadas na instituição pesquisada

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destaca-se a implementação da pós-graduação na FAFIDAM, sendo o Mestrado Acadêmico

Intercampi o primeiro Mestrado acadêmico da região. A pós-graduação no contexto de uma

universidade do interior, foi possível devido às ações desenvolvidas ao longo das últimas décadas

– onde a ação extensionista foi decisiva para o amadurecimento de um campo de pesquisa e

disciplinar na área de educação e Movimentos Sociais. Além disto, a pesquisa explicita que a

distribuição dos capitais na estrutura da instituição pesquisada foi e é determinando no jogo e nas

lutas que posicionam a FAFIDAM no campo universitário cearense e nacional. Pode-se afirmar

que, os professores que estão melhor posicionados na estutura do campo são bons jogadores e, por

meio de capitais específicos, possuem

Além da implementação da pós-graduação no contexto pesquisado, foi possóvel também

identificar aspectos da internacionalização. Em linhas gerais, pode-se afirmar que, apesar de um

contexto bastante marcado pela heteronomia – onde as pautas externas ao campo universitário e

as imposições oriundas da agenda política estão cada vez mais perceptíveis – o campo universitário

cearense fortaleceu sua posição no cenário nacional. Isto ficou verificado quando utilizamos a

pesquisa de Miranda (2008). Os aspectos evidenciados pela pesquisa, no que concerne às

alterações na estruturação do campo universitário no país, merecem destaque. Embora história da

universidade no Brasil seja recente, a pesquisa também evidenciou que são as instituições

universitárias as responsáveis pela produção da ciência no contexto brasileiro. O Relatório da

Clarivate Analytics informa que a produção da ciência no Brasil (2011 e 2016) é oriunda de

instituições públicas.

Vale destacar, por fim, que 87,9% das instituições de ensino superior no Brasil são

privadas. Ao todo soma-se 2.152 instituições privadas neste nível de ensino. Frente a este número

o Censo da Educação Superior (2017) informa que no Brasil há 296 instituições de ensino superior

públicas, distribuídas em 124 instituições Estaduais, 109 instituições Federais e 63 instituições

Municipais. Ademais, construir uma agenda científica, que resista aos impositivos externos ao

campo universitário, tem sido um dos grandes e atuais desafios para quem deseja sobreviver no

meio acadêmico, porque tal como sustenta Bourdieu (1976, p. 16) “[…] os dominantes consagram-

se às estratégias de conservação, visando assegurar a perpetuação da ordem científica estabelecida

com a qual compactuam”.

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ANEXOS

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EXTENSÃO NA FACULDADE VIDAL DE LIMOEIRO DO NORTE/CE

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*Grifos nossos

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INICIAÇÃO CIENTÍFICA NA FACULDADE VIDAL DE LIMOEIRO DO NORTE/CE

*Grifos nossos

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MONITORIA NA FACULDADE VIDAL DE LIMOEIRO DO NORTE/CE

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Programas e Projetos de extensão FAFIDAM

PROGRAMAS E PROJETOS DE EXTENSÃO FAFIDAM/UECE

Fonte: http://www.uece.br/proex/index.php/programas-projetos-de-extensao/faculdades/fafidam

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EX-ALUNOS INGRESSANTES NA PÓS-GRADUAÇÃO

EX-ALUNOS INGRESSANTES NA PÓS-GRADUAÇÃO

ANO CURSO ALUNO/A

1998 1999 -História (01) -Edwilson S. Freire (Mestrado)

2000

2001 2002

-História (01)

-João Rameres Régis (Mestrado)

2003

2004 -Geografia (01)

-Pedagogia (01)

-Maria Lucenir J. Chaves (Mestrado) -Sergiano de L. Araújo (Mestrado)

-Francisca Maurilene do Carmo (Mestrado)

2005 2006 Pedagogia (01) -Maria Lenúciade Moura (Mestrado)

2007 -Pedagogia (01)

-Letras (01)

-História (01)

-Ana Carmita B. de Souza (Mestrado)

-Fernanda C. Nunes (Mestrado) Cleidiane Lima (História)-

2008 -História (01) -João Rameres Régis (Doutorado)

2009 -Geografia (01)

-Química (01)

-Flávia Freitas (irmã de Bernadete) -Priscila Faheina

2010 -História (01)

-Geografia (02)

-Química (01)

-KelsonGérison O. Chaves

(Mestrado)

-Bernadete Maria C. Freitas

(Mestrado) -Marcos de B. Bezerra (Mestrado)

-Thiago F. Chaves (Mestrado)

2011 -Pedagogia (01)

-História (02)

-Ana Carmita B. de Souza

(Doutorado)

-Luzia Leila Velez de Miranda

(Mestrado) -Maria da Conceição da S.

Rodrigues (Mestrado)

2012 -Pedagogia (01)

Geografia (02)

-Leonardo José F. Cabó (Mestrado)

-Rayanne Sara (Mestrado)

-Sergiano de L. Araújo (Doutorado)

2013

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2014 -Pedagogia (03)

-História (02)

-Química (01)

Nara Lúcia Gomes (Mestrado)

-Jamira L. de Amorim (Mestrado)

-Emanuela Rútila M. Chaves

(Mestrado)

-Cíntya Chaves (Mestrado)

-Carlos Rochester F. de Lima

(Mestrado)

Thiago F. Chaves (Doutorado)

2015 -Pedagogia (04)

-História (04) -Geografia (01)

-Gabrielle N. Lopes (Mestrado)

-Leiliana R. Freitas (Mestrado) -Maria Ozirene M. Vidal (Mestrado)

-Raquel L. de Freitas (Mestrado)| -Maria Edleuza Maia (Mestrado)

-KélsonGérison O. Chaves

(Doutorado) -Rafaela M. de Lima (Mestrado)

-Jucélio R. Costa (Mestrado)

Claudemir M. Cosme (Mestrado)

2016 -Pedagogia (02)

-História (03)

-Geografia (02)

- Aline N. Paiva (Mestrado)

-Maria Lenúcia de Moura

(Doutorado)

-Francisco Edinou B. Maia

(Mestrado)

-José Wellington de O. Machado

(Mestrado)

-Edwilson S. Freire (Doutorado)

-KélbiaGeísa O. Chaves (Mestrado)

-Maria Lucenir J. Chaves

(Doutorado)\

2017 -Pedagogia (04)

-História (01)

-Letras (01)

-Geografia (01)

-Diana Nara Oliveira (Mestrado)

-Elenice R. Costa (Mestrado)

-Janine F. de Lima (Mestrado)

-Mádja D. Maia (Mestrado)

-João Paulo G. de Almeida

(Mestrado)

-Nádja D. Maia (Mestrado)

-Rose A. de Moura (Mestrado)

-Bernadete Maria C. Freitas

(Doutorado)

2018 -História (03) -Pedagogia (03)

-Letras (01)

-Alan Robson da Silva (Mestrado) -Olívia Bruna de L. Nunes

(Mestrado)

-Maria Elioneide de S. Costa (Mestrado)

-Daniela Glícia O. da Silva

(Mestrado) - Luciana Gomes Reges (Doutorado)

Ruan Carlos Mendes (Mestrado)

2019 -Pedagogia (06) -Geografia (01)

-História (03)

-Leonardo José F. Cabó (Doutorado) -Jamira Lopes de Amorim

(Doutorado)

-Emanuela Rútila M. Chaves (Doutorado)

-Aline N. Paiva (Doutorado)

-Claudemir M. Cosme (Doutorado)

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197

-Carlos Rochester F. de Lima

(Doutorado)| -Maria Edleuza Silva (Mestrado)

-Maiara Marinho (Mestrado)

-João Joel Neto (Mestrado) -Thaís Brito (Mestrado)

-

Fonte: Elaboração própria. Dados coletados na Plataforma Lattes.