UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO · 2020. 1. 31. · Resumo da tese de Doutorado submetida ao...
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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO
A COMPETIÇÃO ENTRE [VERBO ADJETIVO ADVERBIAL] E [VERBO XMENTE]
NA REDE CONSTRUCIONAL QUALITATIVA DO PORTUGUÊS BRASILEIRO:
UMA ANÁLISE CENTRADA NO USO
Júlia Langer de Campos
2019
https://www.google.com.br/url?sa=i&rct=j&q=&esrc=s&source=images&cd=&ved=2ahUKEwjq9eLYjIfgAhWQE7kGHfBVBHgQjRx6BAgBEAU&url=https://pt.wikipedia.org/wiki/Ficheiro:Minerva_UFRJ_-_Clara.png&psig=AOvVaw24tZa6MTfiByzVwoXGAI0T&ust=1548442694996386
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A COMPETIÇÃO ENTRE [VERBO ADJETIVO ADVERBIAL] E [VERBO XMENTE]
NA REDE CONSTRUCIONAL QUALITATIVA DO PORTUGUÊS BRASILEIRO:
UMA ANÁLISE CENTRADA NO USO
Júlia Langer de Campos
Tese de Doutorado apresentada ao Programa de
Pós-Graduação em Linguística da Universidade
Federal do Rio de Janeiro como quesito para a
obtenção do Título de Doutor em Linguística.
Orientadora: Profa. Doutora Maria Maura da
Conceição Cezario
Coorientadora: Profa. Doutora Priscilla Mouta
Marques
Rio de Janeiro
Fevereiro de 2019
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A COMPETIÇÃO ENTRE [VERBO ADJETIVO ADVERBIAL] E [VERBO XMENTE]
NA REDE CONSTRUCIONAL QUALITATIVA DO PORTUGUÊS BRASILEIRO:
UMA ANÁLISE CENTRADA NO USO
Júlia Langer de Campos
Orientadora: Professora Doutora Maria Maura da Conceição Cezario
Coorientadora: Professora Doutora Priscilla Mouta Marques
Tese de Doutorado submetida ao Programa de Pós-Graduação em Linguística, Faculdade
de Letras, da Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ, como parte dos requisitos
necessários para a obtenção do título de Doutor em Linguística.
Examinada por:
______________________________________________________________________
Presidente, Profa. Doutora Maria Maura da Conceição Cezario
______________________________________________________________________
Profa. Doutora Priscilla Mouta Marques
______________________________________________________________________
Prof. Doutor Diogo Pinheiro – UFRJ
______________________________________________________________________
Profa. Doutora Deise Cristina Moraes Pinto – UFRJ
______________________________________________________________________
Profa. Doutora Marcia dos Santos Machado Vieira – PPG Vernáculas –UFRJ
______________________________________________________________________
Profa. Doutora Mariangela Rios de Oliveira - UFF
______________________________________________________________________
Profa. Doutora Christina Abreu Gomes– UFRJ, Suplente
______________________________________________________________________
Prof. Doutor Roberto Freitas Junior– Departamento Letras Libras – UFRJ, Suplente
Rio de Janeiro
Fevereiro de 2019
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Campos, Júlia Langer de.
Competição entre [Verbo Adjetivo Adverbial] e [V Xmente] na rede
construcional qualitativa do português brasileiro: uma análise centrada no uso/
Júlia Langer de Campos. – Rio de Janeiro: UFRJ/ Faculdade de Letras, 2019. xix,
148 fl.: il.; 34 cm.
Orientador(a): Maria Maura da Conceição Cezario/
(co) orientador(a): Priscilla Mouta Marques
Tese (doutorado) – UFRJ/ Faculdade de Letras/ Programa de Pós-
Graduação em Linguística, 2019.
Referências Bibliográficas: f. 139-144.
1. Construções adverbiais qualitativas. 2. Rede Construcional. 3.
Linguística Funcional Centrada no Uso. I. Cezario, Maria Maura da Conceição. II
Marques, Priscilla Mouta. III. Universidade Federal do Rio de Janeiro, Faculdade
de Letras, Programa de Pós-graduação em Linguística. IV. Título.
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Aos meus pais, por todo exemplo, amor e
incentivo.
Ao eterno e inesquecível professor Mário
Martelotta (in memoriam), por, de alguma
forma, acompanhar-me até aqui.
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AGRADECIMENTOS
Ao finalizar esta tese de doutorado, encho-me de gratidão, primeiramente, ao
CNPq por ter financiado esta pesquisa, possibilitando realizá-la com toda dedicação e
seriedade que a ciência no Brasil merece. Agradeço também a esta universidade da qual
tanto me orgulho, a UFRJ, que, desde 2006, me recebeu na graduação e até hoje é para
mim como uma “casa”. Casa grande, democrática e que devolve à sociedade a excelência
em ciência e material humano. Minha gratidão também ao Programa de Pós-graduação
em Linguística e a todos os professores componentes deste programa.
Obrigada a todos os membros que compõem a minha banca por terem aceitado o
convite prontamente e desde já contribuírem e colaborarem para o desenvolvimento e
aperfeiçoamento deste trabalho.
Em especial, agradeço a minha família por me ensinarem valores tão caros a estes
tempos e à profissão de professor: a empatia, o amor e o respeito. Obrigada por serem
mais que o sangue nos impõe, por serem também amigos, companheiros para bons e maus
momentos. Só eu sei como foi difícil, ao longo destes quatro anos, não poder estar com
vocês em algumas ocasiões, mas, quando presente, termos os melhores e mais valiosos
momentos.
Destaco ainda pessoas sem as quais jamais ousaria voos mais altos: meus pais,
minhas irmãs e minha sobrinha. Carrego comigo um pouquinho de cada um. Obrigada
por me apoiarem, por me incentivarem, por se orgulharem de mim. Pai, obrigada por
todos os cafezinhos com bolo e as conversas que me faziam ter uma semana mais leve
neste último ano. Foram verdadeiras terapias e de um valor que nem eu nem você
saberíamos mensurar. Mãe, obrigada por secar minhas lágrimas, me acolher no seu abraço
e me fazer ter a certeza de que tudo passa. Minhas irmãs, Luísa e Danielle, agradeço por
me fazerem rir, por acreditarem em mim mais que eu mesma e por sempre cuidarem de
mim. À Rafinha, nem sei especificamente a que agradecer... a TUDO! Obrigada por ser
a melhor “sobrinha-amiga-irmã” e, acrescento, “aluna” por três anos! Vocês são a minha
essência!
Agradeço ao meu noivo, Osvaldo, por estar sempre ao meu lado, me acalmando,
me ajudando em tudo o que pôde para que a finalização deste trabalho fosse possível. Que
bom que você existe, meu amor! Que bom que pude contar com você para dividir as
angústias e com a sua companhia para os momentos de lazer. A vida é muito mais feliz e
completa ao seu lado.
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Ao longo de muitos anos até o presente momento, acredito também ter construído
uma outra família, a acadêmica. Pessoas tão importantes, influentes e essenciais quanto
uma família de verdade é. Vou começar, então, agradecendo a minha querida orientadora,
Maria Maura. Uma vez ouvi uma antiga orientanda sua dizer que se ela fosse 10% da
orientadora que você é para os seus alunos, ela estaria realizada. Esta frase ficou na minha
memória, pois também me identifico com ela. Aprendi a te admirar ainda mais ao longo
desses quatro anos... Como você é incrível! Sua serenidade, experiência, compreensão,
reconhecimento e entusiasmo fazem toda a diferença! São características de um
verdadeiro líder, em quem eu me espelho e desejo ainda mais sucesso. A gratidão que
carrego por você é inexplicável! Só obrigada!! Por tudo!
A minha, hoje, coorientadora, Priscilla Mouta. Explico-me: muito antes de me
alçar ao Doutorado, ela foi a pessoa com quem logo me identifiquei quando ingressei no
grupo Discurso & Gramática, em 2009. Por diversas compatibilidades, nos tornamos
amigas. Priscilla tem uma característica de ouvir, de compreender e de amar que são raras
e talvez por isso ela também o seja! Dividimos turmas, cursos e com ela tive o prazer de
aprender e me apaixonar pelos adjetivos adverbiais. Pessoa que me ensinou sobre
funcionalismo clássico, com quem aprendi (e repito) os exemplos mais prototípicos para
explicar certos conceitos, em quem espelho a postura profissional, o discurso bonito e a
seriedade com que lida com a pesquisa e com a análise de dados. Meu muito obrigada a
você!
Agradeço também aos demais professores do D&G UFRJ, Deise, Karen e
Roberto. Obrigada por contribuírem tanto com a minha formação, seja em relação à teoria
discutida nas reuniões de terça, nos cafezinhos, nos corredores e almoços, mas também
em relação ao exemplo de pessoas e profissionais que são! Cada um de vocês é muito
importante para o resultado desta tese.
Meu “muito obrigada” especial para dois alunos maravilhosos com quem tive o
prazer de trabalhar mais proximamente: Rodrigo Tiradentes e Beatriz Lones! Meus
queridos, faltam-me palavras para agradecer a vocês por tudo o que construímos ao longo
desses últimos anos. Finalizo este trabalho com a mais absoluta certeza de que vocês, de
alguma maneira, são coautores desta tese. Amo muito vocês e contem sempre comigo.
Sou grata também por ter alguns amigos ao meu lado neste meio acadêmico que,
por vezes, é tão cruel. Dennis Castanheiras, você é O cara! Sempre sabe de tudo, um
pouco e está disponível a ajudar, a acrescentar. Você só soma na minha vida! Que nossa
amizade seja “ao infinito e além”! Agradeço também à Bruna Soares por todos esses anos,
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de Mestrado e Doutorado, com quem pude compartilhar momentos de conquistas e de
dificuldade. Apesar da distância física de hoje, guardo sua amizade no meu coração. Ao
Matheus Silva e Érika Ilogti por toda identificação e liberdade de desabafarmos sobre os
mais diversos assuntos.
Agradeço à Carol Fummaux, Carol Martins, Monique e Thiago pelas trocas e
auxílio mútuos na pós-graduação. Agradeço também aos demais colegas contemporâneos
da pós que, hoje, também defendem suas teses, por toda troca durante as aulas e a empatia.
Agradeço aos colegas do grupo dos adjetivos adverbiais pelas discussões e toda
contribuição, em especial, à Raíssa pela revisão do abstract.
Em suma, agradeço ao Deus do Universo que, na sua infinita generosidade,
permitiu que eu chegasse até aqui e por ter colocado tantas pessoas maravilhosas no meu
caminho, essenciais nesta trajetória.
Gratidão!
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SINOPSE
Análise acerca dos usos de duas construções
adverbiais qualitativas no PB, [V AAdj] e [V
Xmente], buscando descrever características
formais, semânticas e discursivo-pragmáticas
que expliquem o contexto de uso de cada um
desses padrões construcionais em situações
reais de comunicação no PB.
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RESUMO
A COMPETIÇÃO ENTRE [VERBO ADJETIVO ADVERBIAL] E [VERBO XMENTE]
NA REDE CONSTRUCIONAL QUALITATIVA DO PORTUGUÊS BRASILEIRO:
UMA ANÁLISE CENTRADA NO USO
Júlia Langer de Campos
Orientadora: Professora Doutora Maria Maura da Conceição Cezario
Co-Orientadora: Professora Doutora Priscilla Mouta Marques
Resumo da tese de Doutorado submetida ao Programa de Pós-Graduação em Linguística,
Faculdade de Letras, da Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ, como parte dos
requisitos necessários para a obtenção do título de Doutor em Linguística.
Esta tese tem como objetivo central descrever as propriedades de cunho formal e
funcional que caracterizam uma construção adverbial qualitativa não-prototípica, os
chamados adjetivos adverbiais, em que um adjetivo forma com o verbo um par de forma
e sentido no português (Ex.: Maria falou claro), e compará-la com o padrão de
modificação canônico, cuja base lexical seja a mesma daqueles (Ex: Maria fala
claramente). Pautamo-nos no arcabouço teórico-metodológico da Linguística Funcional
Centrada no Uso, segundo o qual a língua é conceptualizada como uma rede simbólica de
construções, apresentando níveis hierárquicos relacionados aos diferentes graus de
esquematicidade. Assim sendo, a construção [V Adjetivo Adverbial]Qualit é um
pareamento de forma e função instanciado por um esquema maior [V Adverbial]Qualit, o
qual também licencia as construções com advérbios em -mente, representada por [V
Xmente]Qualit..
Para isso, coletamos dados no Corpus do Português web para a análise dos
seguintes fatores: (i) frequência type e token do verbo e do adjetivo; (ii) tipo semântico
do verbo e do adjetivo; (iii) transitividade verbal; (iv) presença e natureza do elemento
interveniente entre o verbo e o item adverbial; (v) estrutura informacional e (vi)
composicionalidade. A hipótese geral é a de que essas duas construções, de configurações
formais distintas, são semanticamente semelhantes, no que tange a semântica de
qualidade (modo), mas são pragmaticamente distintas, sobretudo quanto ao foco
discursivo. Além disso, haveria restrições colocacionais vinculadas aos itens verbo e
adverbial em cada um dos padrões.
PALAVRAS-CHAVE: 1. Construções adverbiais qualitativas 2. Rede construcional 3.
Linguística Funcional Centrada no Uso.
Rio de Janeiro
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ABSTRACT
THE COMPETITION BETWEEN [VERB ADJETIVE ADVERBIAL] AND [VERB
XMENTE] IN THE QUALITATIVE CONSTRUCTION NETWORK OF BRAZILIAN
PORTUGUESE:
AN USAGE-BASED APPROACH
Júlia Langer de Campos
Orientadora: Professora Doutora Maria Maura da Conceição Cezario
Co-Orientadora: Professora Doutora Priscilla Mouta Marques
Abstract da tese de Doutorado submetida ao Programa de Pós-Graduação em Linguística,
Faculdade de Letras, da Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ, como parte dos
requisitos necessários para a obtenção do título de Doutor em Linguística.
This thesis aims to describe the formal and functional properties that characterize
a non-prototypical qualitative adverbial construction, in which an adjective modifies the
scope of the verb, forming an integrated and productive unit in Portuguese (eg, Mary
speaks clear), the so-called adverbial adjectives, and to compare it with the canonical
modification patterns, whose lexical basis is the same as those (eg, Mary speaks clearly).
We focus on the theoretical-methodological framework of Usage-based and
constructional approaches, according to which language is conceptualized as a symbolic
network of constructions, presenting hierarchical levels related to different degrees of
schematicity. Thus, the construction [V Adjective Adverbial]Qualit is a pairing of form and
function instantiated by a higher scheme [V Adverbial]Quali, which licences constructs
with adverbs in -mente, (-ly) represented by [V Xmente]Quali.
In order to do this, we collected data in the Corpus of Portuguese web for the
analysis of the following factors: (i)verb and adjective type and token frequency; (ii) verb
and adjective semantic type; (iii) verbal transitivity; (iv) the presence and nature of the
intervening element; (v) information structure and (vi) compositionality. The general
hypothesis is that both constructions, of distinct formal configurations, are semantically
similar because of the quality semantics, but are pragmatically distinct, especially in
discursive focus. In addition, there would be collocational restrictions linked to the verb
and adverbial items in each of the patterns.
KEYWORDS: Qualitative adverbial constructions; Network; Usage-based Approach.
Rio de Janeiro
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SUMÁRIO
INTRODUÇÃO .............................................................................................................. 17
1. PRESSUPOSTOS TEÓRICOS .................................................................................. 27
1.1 A Linguística Funcional Centrada no Uso ............................................................ 27
1.2 Alguns pressupostos funcionalistas clássicos ....................................................... 31
1.2.1 Princípio da Iconicidade ................................................................................. 31
1.2.2 Informatividade ............................................................................................. 33
1.2.3 Foco Discursivo.............................................................................................. 35
1.3 Construções Gramaticais ...................................................................................... 37
1.4 Rede Construcional (Taxonômica) ....................................................................... 42
2. REVISÃO DA LITERATURA .................................................................................. 46
2.1 A categoria adverbial e a semântica qualitativa .................................................... 46
2.2 Sobre a fluidez categorial entre adjetivos e advérbios .......................................... 48
2.2.1 Hummel (2002, 2003, 2013): A categoria dos atributos dos adjetivos e
advérbios na sincronia e diacronia das línguas românicas ...................................... 49
2.2.2 Barbosa (2006): Gramaticalização de advérbios a partir de adjetivos: um
estudo sobre os adjetivos adverbializados. .............................................................. 53
2.2.3 Virgínio (2016, 2018): Investigando a Semiprodutividadade da Construção
Circunstancial de Adjetivo Adverbializado do PB em comparação com os
Advérbios em -mente. ............................................................................................. 56
2.2.4 Tiradentes (2018): A configuração da construção com adjetivo adverbial no
português brasileiro do século XX .......................................................................... 60
3. METODOLOGIA ....................................................................................................... 63
3.1 O Corpus e a Coleta de Dados .............................................................................. 68
4. ANÁLISE DE DADOS .............................................................................................. 72
4.1 Frequência Type e Token do Verbo ...................................................................... 74
4.2 Frequência Type e Token do Adjetivo Adverbial e de Xmente ............................. 84
4.3 Tipo Semântico do Verbo (Scheibman, 2001) ...................................................... 92
4.4 Tipo Semântico do adjetivo (Castilho, 2010) ..................................................... 101
4.5 Transitividade Verbal ......................................................................................... 107
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4.6 Estrutura informacional ...................................................................................... 111
4.7 Tipo de elemento interveniente ........................................................................... 122
4.8 Grau de Composicionalidade .............................................................................. 128
4.9 Síntese: tendências gerais de usos das duas construções .................................... 133
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS ................................................................................... 135
6. BIBLIOGRAFIA ...................................................................................................... 139
ANEXO 1 ..................................................................................................................... 145
LISTA DE TABELAS
Tabela 1: Distribuição da frequência dos itens adjetivais em função prototípica vs.
função adverbial ............................................................................................................. 69
Tabela 2: Distribuição da construção [V AAdj] qualitativa ............................................. 72
Tabela 3: Distribuição da construção [V Xmente]qualitativa. ....................................... 72
Tabela 4: Frequência de tipo e frequência de ocorrência de verbos: análise do slot V por
subesquema [V AAdj] ..................................................................................................... 76
Tabela 5: Frequência de types verbais e tokens por cada subsesquema [V AAdj] .......... 76
Tabela 6: Frequência tipo e frequência de ocorrência de verbos: análise do slot V por
subesquema [V Xmente] ................................................................................................ 79
Tabela 7: Frequência de itens verbais por cada subsesquema [V Xmente] .................... 79
Tabela 8: Comparação da aceitabilidade de itens verbais por subesquema ................... 83
Tabela 9: Distribuição da frequência token por item AAdj.............................................. 84
Tabela 10: Distribuição da frequência token por subesquema [V Xmente]. .................. 85
Tabela 11: Distribuição da Semântica Verbal por subesquema ..................................... 95
Tabela 12: Distribuição de semântica verbal por [V AAdj]. ............................................ 99
Tabela 13: Distribuição da semântica verbal por [V Xmente] ....................................... 99
Tabela 14: Distribuição da semântica do Adjetivo por [V AAdj] .................................. 103
Tabela 15: Distribuição da transitividade verbal por subesquema. .............................. 107
Tabela 16: Distribuição do foco por subesquema. ....................................................... 112
Tabela 17: Tipo de compartilhamento de foco em [V AAdj]......................................... 114
Tabela 18: Tipo de compartilhamento de foco em [V Xmente] ................................... 114
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Tabela 19: Relação entre cada subesquema [V AAdj] e Foco informacional ................ 119
Tabela 20: Relação entre cada subesquema [V Xmente] e Foco informacional .......... 120
Tabela 21: Distribuição do tipo de elemento interveniente por construção ................. 122
Tabela 22: Relação entre cada subesquema [V AAdj] e presença/ausência de material
interveniente. ................................................................................................................ 125
Tabela 23: Relação entre cada subesquema [V Xmente] e presença/ausência de material
interveniente. ................................................................................................................ 126
Tabela 24: Tendências gerais das construções qualitativas [V AAdj] e [V Xmente] .... 133
LISTA DE FIGURAS
Figura 1: Propriedades da Construção (Croft, 2001) ...................................................... 39
Figura 2: Exemplo de não linguística (Traugott e Trousdale, 2013) .............................. 44
Figura 3: Rede Construcional Adverbial qualitativa ...................................................... 45
Figura 4: Disposição da função "atributo" de adjetivos e advérbios (Hummel, 2003:02).
........................................................................................................................................ 50
Figura 5: A construção [V AAdj]Qualit e as construções lexicalizadas bater forte e falar
alto. ............................................................................................................................... 131
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LISTA DE ABREVIAÇÕES
1- [V AAdj]Qualit: construção [Verbo Adjetivo Adverbial]Qualitativa
2- [V Xmente]Qualit: construção [Verbo Xmente]Qualitativa
3- [V Adverbial]: construção [Verbo Adverbial]
4- AAdj: Adjetivo Adverbial
5- PB: Português do Brasil
6- LFCU: Linguística Funcional Centrada no Uso
7- SPSS: Statistical package for the social sciences
8- SVO: Sujeito- Verbo- Objeto
9- SV: Sujeito- Verbo
10- VS: Verbo- Sujeito
11- SNs: Sintagmas nominais
12- Sprep: Sintagma preposicional
13- D&G: Discurso e Gramática
14- GC: Gramática de Construções
15- N1: Nome 1
16- N2: Nome 2
17- GTs: Gramáticas tradicionais
18- TCC: Trabalho de conclusão de curso
19- CCAA: Construção circunstancial com adjetivo adverbial
20- GCBU: Gramática de Construções baseada no Uso
21- CAA: Construção de adjetivo adverbial
22- CAS: Construção de advérbio sufixal
23- RFE: Restrição de foco exclusivo
24- AS: advérbio sufixal
25- BI: (frequência) baixa do item
26- BS: (frequência) baixa da sequência
27- AI: (frequência) alta do item
28- AS: (frequência) alta da sequência
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INTRODUÇÃO
Ao longo de décadas, muitos estudos linguísticos foram desenvolvidos acerca da
controversa categoria dos advérbios. A heterogeneidade desta classe advém da
multiplicidade de propriedades sintáticas e semânticas que a envolvem fazendo com que
esses elementos, os advérbios, ora apresentem comportamentos ligados ao léxico da
língua (como hoje, ontem, agora, que se referem ao mundo biossocial, nos termos de
Câmara Jr, 1970), ora desempenhem funções ligadas ao nível organizacional e funcional
do discurso (como assim, este, aquele, que podem ter papéis anafóricos ou catafóricos).
Tradicionalmente, o advérbio é uma classe invariável, que funciona no sistema das
línguas como modificador de outras classes, tais como do verbo, do adjetivo, de outro
advérbio, podendo, inclusive, ser um atributo de toda uma cláusula. A presente tese se
restringe à modificação verbal por meio desses elementos, os quais chamamos aqui de
advérbios qualitativos (Ilari et alii, 1990), convencionalmente chamados de advérbios de
modo. Porém, alguns gramáticos, como Castilho (2010, 2014), apontam para o fato de a
modificação verbal não se restringir unicamente à categoria dos advérbios, podendo ser
feita também por adjetivos (ex: Ele fala rápido), por sintagmas preposicionais (ex: Ele
fala com rapidez) e por particípios verbais (ex: Ele fala correndo).
Dessa forma, a tese defendida aqui trata da existência, no domínio da modificação
verbal do português do Brasil (PB), de um esquema maior, distribuído em dois
subesquemas, responsável pela instauração de adverbialização qualitativa. Esses
subesquemas, em uma comparação horizontal entre si, teriam suas instanciações
motivadas por fatores de ordem pragmático-discursivo e também estrutural. Partindo
deste ponto, este trabalho tem como objetivo descrever a construção de modificação
verbal por adjetivos não-prototípicos, uma vez que, em contextos sintático-semânticos
semelhantes ao de predicativos, esses elementos permanecem invariáveis, modificando o
verbo e não um nome, como seria o esperado por esta classe, aproximando-se, assim, dos
advérbios. Por esta razão, assume-se aqui que não se trata de um adjetivo que passa a
figurar como advérbio, como um processo, mas sim de uma categoria híbrida de adjetivos
que podem não só modificar núcleos nominais, como também do núcleo verbal, formando
com esta unidade um todo significativo, o qual chamamos de [Verbo Adjetivo
Adverbial]Qualit (doravante [V AAdj]Qualit). Este trabalho, portanto, busca demonstrar as
propriedades estruturais e semântico-pragmáticas que caracterizam esta construção no
sistema linguístico do português brasileiro.
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Ao analisarmos essas propriedades, procuramos atender o principal objetivo desta
tese que é comparar esta construção com o subesquema de modificação canônico por
meio de advérbios terminados em -mente de valor qualitativo, chamados aqui de Xmente
(Campos, 2013), os quais também formam com o verbo uma construção maior denotada
por [Verbo Xmente]Qualit (doravante [V Xmente]Qualit). Por vezes, certas situações
discursivas fazem parecer que estas duas construções são livremente intercambiáveis no
sistema do PB, uma vez que sintaticamente são modificadores do núcleo verbal e
semanticamente expressam valor de modo, como seria o caso de Ela bateu forte a perna
e Ela bateu fortemente a perna. Porém, segundo o princípio da não sinonímia, não há
estruturas formais distintas que desempenhem a mesma função discursiva. Da mesma
forma, a sociolinguística também atenta para o fato de que cada prática social aponta para
padrões linguísticos distintos (Eckert, 2012).
Sendo assim, o ponto desta tese é defender que [V AAdj]Qualit e [V Xmente]Qualit são
construções distintas no sistema do PB por apresentarem certas peculiaridades formais e
funcionais. Portanto, não atuam no mesmo contexto discursivo e são pragmaticamente
distintas. Por essa razão, destacamos que o termo competição aqui utilizado trata-se da
atuação de ambas construções em diferentes situações de uso e não de um intercâmbio
livre entre uma e outra. O falante busca em sua memória um dos elementos de um
paradigma linguístico para melhor dar conta de seus objetivos comunicativos ou que
melhor se adeque ao contexto discursivo ou situacional. Dessa forma, a competição de
construções estaria vinculada às nossas diversas habilidades cognitivas, tais como leitura
de intenção, categorização, analogia, dentre outras (cf. Bybee, 2010; Tomasello, 2003).
Traugott & Trousdale (2013; 175) preferem o termo “escolha” ao invés de competição,
pois não são as construções que têm vida própria, independentemente da vontade do
falante, mas se trata de uma escolha do falante entre as opções dadas pelo paradigma de
construções similares.
Buscamos, então, através da análise qualitativa e quantitativa de sete
subsesquemas de ambos os padrões construcionais, descrever a construção com adjetivo
adverbial com semântica qualitativa (modo), definir quais itens adjetivais são licenciados
pelos verbos para figurarem no slot AAdj, bem como quais destes itens adjetivais podem
ocupar a base X da construção com advérbio em -mente. Nossa hipótese central é a de
que estas construções são semanticamente semelhantes, visto que são qualitativas (modo),
porém pragmaticamente distintas, pois desempenham funções comunicativas diferentes.
Outra hipótese importante relaciona-se à frequência de uso. Padrões microconstrucionais
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altamente frequentes, sobretudo da construção [V AAdj]Qualit, tendem a perder
composicionalidade apresentando maior integração entre as unidades verbo – adjetivo
adverbial, fato que não ocorreria entre as unidades que compõem a construção canônica
em -mente.
Para atingir os objetivos deste trabalho, pautamo-nos no aporte teórico-
metodológico da Linguística Funcional Centrada no Uso (doravante LFCU), linha que
amalgamou os pressupostos do Funcionalismo norte-americano e alguns advindos da
Linguística Cognitiva. Um dos conceitos caros a essa corrente é o de construções
gramaticais, as quais são unidades básicas da língua, podendo ser definidas como
unidades simbólicas de forma e função organizadas hierarquicamente na cognição
humana, a qual subsidia a experiência linguística em situações reais de comunicação, do
mesmo modo que instâncias de uso também alimentam esta rede, reconfigurando-a de
tempos em tempos. As construções gramaticais se interconectam por links de diferentes
naturezas, isto é, por associações de propriedades da forma ou do conteúdo a diferentes
padrões, formando um todo organizado e holístico. Nessa perspectiva teórica, então,
habilidades cognitivas gerais (Bybee, 2010) cooperam nessa organização dos dados
obtidos na experiência, tais como processos analógicos, categorização, armazenamento
na memória, mecanismos de ativação e acesso, dentre outros.
Entendendo, portanto, que a gramática das línguas é vista como uma rede de
construções, postulamos que as construções adverbiais qualitativas com adjetivos
adverbiais e com advérbios canônicos estariam conectadas a um esquema mais alto nesta
rede, que reúne propriedades mais gerais, instanciando não só os subesquemas por nós
analisados, mas também outros subesquemas de qualificação do verbo (sintagmas
preposicionais, particípios, etc.). Propomos a notação [V Adverbial]Qualit como o esquema
geral, mais abstrato, que instancia a [V AAdj]Qualit e a [V Xmente]Qualit. Esses subesquemas,
por sua vez, licenciam outras construções ainda mais específicas, em que um dos slots
esteja preenchido – neste caso, assumimos a postura metodológica de ter como ponto de
partida o elemento adverbial. Assim, o subesquema [V AAdj] licencia construções como
[V forte], [V claro], etc., ao passo que as construções de qualificação canônica, a
construção Xmente, instancia construções de mesma base lexical dos adjetivos adverbiais,
como [V fortemente] e [V claramente], por exemplo. São esses níveis mais específicos,
porém, também abstratos, por se tratar de unidades simbólicas, que licenciam instâncias
de uso em situações reais de comunicação, também chamados de constructos (ou tokens).
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Para a observação do fenômeno, coletamos dados em uma base de dados online,
o Corpus do Português. Esta plataforma reúne textos das variedades do PB e do PE desde
o século XIII até o século XX, envolvendo registro formal e informal, modalidade oral e
escrita, em diferentes gêneros e domínios discursivos. Em sua versão mais atualizada, o
corpus também reúne textos do domínio discursivo da internet, sobretudo, sites e blogs
vigentes nas variedades do português do Brasil, Portugal, Angola e Moçambique nos
séculos XX e XXI. É desta aba mais recente, aba web, que foram retirados apenas dados
do PB1 para constituirmos nosso banco. Segue um exemplo ilustrativo da construção com
adjetivo adverbial
(1) Em uma família, por exemplo, onde todos falam baixo, o insuportável é aquele
primo que fala alto como um italiano. Já em um família de italianos, o
insuportável pode ser aquele que não participa da bagunça (...)
(http://apenas1.wordpress.com)
No exemplo (1) verifica-se um constructo da microconstrução de [V AAdj]Qualit.
Neste exemplo, o item alto, que também figura em construções de adjetivos prototípicos
(Ele é alto), atribui uma qualidade ao verbo, denotando o modo (em tom alto) como a
ação de falar é feita. Além disso, percebe-se o alto grau de integração entre essas duas
unidades, passando toda a construção fala alto como uma característica do primo
insuportável. Nesse sentido, percebemos que a construção com adjetivos adverbiais
perfila um escopo além do verbal, envolvendo, neste caso, parte do atributo do sujeito do
verbo falar.
Feita a coleta da construção [V AAdj]Qualit, partimos para a observação de trechos
em que o item Xmente de mesma base lexical daqueles elementos que figuraram na
construção [V AAdj] esteja figurando no padrão de modificação verbal de semântica
qualitativa. Vejamos um exemplo da construção [V Xmente]
(2) A primeira coisa que você precisa colocar na cabeça é que, não existe nada que
faça seu cabelo crescer naturalmente em pouco tempo. (007blog.net)
1 O próprio corpus faz a separação entre as variedades do português.
http://apenas1.wordpress.com/http://007blog.net/coisas-que-nao-se-deve-fazer-no-comeco-do-namoro/
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Em (2), verifica-se o verbo crescer recebendo o atributo qualitativo canônico
naturalmente. Neste caso, percebe-se que este item perfila apenas o escopo verbal,
demonstrando o modo como a ação de crescer acontece (de modo natural), não
estabelecendo, pois, nenhuma relação semântica com o sujeito da oração (cabelo).
Após a coleta e análise dos fatores, submetemos os resultados ao programa
estatístico SPSS (versão 17), afim de obter resultados quantitativos mais precisos acerca
dos resultados em geral e de seus cruzamentos. Para tanto, analisamos os seguintes
fatores: (i) frequência type e token dos itens verbais; (ii) frequência type e token dos itens
adverbiais; (iii) o tipo semântico do verbo; (iv) o tipo semântico do elemento adverbial;
(v) a transitividade dos verbos que figuram na construção; (vi) a presença e a natureza de
elementos intervenientes; (vii) a estrutura informacional e, qualitativamente, também
analisamos (viii) o grau de composicionalidade.
Sendo assim, postulamos alguns objetivos específicos e algumas hipóteses
vinculadas a cada um deles às quais procuramos comprovar neste trabalho.
Objetivos e Hipóteses específicos
A fim de comprovar o objetivo central desta tese, de que as construções [V AAdj]
e [V Xmente] de semântica qualitativa apresentam características formais distintas,
semânticas semelhantes, distinguindo-se, sobretudo, pragmaticamente, postulamos
alguns objetivos específicos vinculados aos fatores de análise que buscam atender este
grande objetivo. A cada um deles, relacionam-se algumas hipóteses.
a) Verificar como a frequência de uso impacta a representação de cada um dos
padrões adverbiais na memória rica do falante. Para tanto, medimos a frequência type
(frequência de tipo) dos elementos que ocupam os dois slots das construções, isto é, a
frequência type do item verbal e a frequência type dos elementos adverbiais, o adjetivo
adverbial e de Xmente. Controlamos também a frequência token (frequência de
ocorrência) de cada microconstrução. Com isso, pretendemos responder três perguntas:
(1) que itens verbais aparecem em cada construção com maior frequência; (2) que itens
adverbiais aparecem em cada construção com maior frequência; (3) Quais combinações
entre verbo e item adverbial são muito frequentes e quais não são. Com isso procuramos
dar conta da produtividade das construções.
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Segundo Bybee (2010; 2015), a frequência de uso exerce um papel fundamental
na estruturação do sistema linguístico. Assim, nossa hipótese baseia-se nos trabalhos de
Bybee ao postular que o membro mais frequente é o elemento central de uma categoria2
e, então, novos elementos que compartilhem de alguma semelhança quanto a face formal
ou funcional são recrutados para figurarem naquela categoria por analogia às
características do membro mais frequente. Dentro do que é possível observar em dados
da sincronia atual em construções já formadas no sistema do português, essa hipótese nos
leva a outra de que quanto maior o número de itens verbais aceitos neste slot, maior é a
produtividade do subesquesma em questão. O mesmo também se aplica à frequência type
do elemento adverbial, pois, quanto mais frequente é um adjetivo na construção [V AAdj]
ou um advérbio em -mente na construção [V Xmente], mais produtivo este item será para
expressar qualidade à ação verbal3.
Quanto à frequência token, ela colabora com a análise da frequência type, pois é a
partir de instâncias de uso reais que partimos para generalizações mais abstratas acerca
da estruturação das construções na rede linguística. Quanto a esse fator, também
aventamos a hipótese de que, quanto maior são ocorrências de algumas microconstruções
em cada um dos subesquemas, mais produtivas elas serão e apresentarão fortes tendências
à perda de composicionalidade e à formação de chunks. Falar alto, por exemplo, é uma
microconstrução muito frequente do subesquema [V alto]Qualit. Essa microconstrução
qualitativa teria dado origem ao chunk com sentido de prevalecer, sobrepor-se (Ex.:
Nessas horas, minha consciência fala alto), mas que mantêm com a construção qualitativa
um link de herança.
b) Controlar o tipo semântico do verbo (com base na proposta de Scheibman,
2001, modificada por Martelotta, 2004), afim de depreendermos propriedades semânticas
mais específicas deste elemento componente das construções adverbiais qualitativas.
2 A autora explica que o elemento central de uma categoria também pode ser aquele mais representativo,
isto é, o mais prototípico de uma categoria (linguística ou não linguística) e não necessariamente este seja
o mais frequente. 3 Ressaltamos o fato de este estudo se debruçar sobre a análise de sete subesquemas específicos, dos quais
o slot AAdj foi preenchido por adjetivos mais frequentes em todo o corpus, ou seja, em sua maioria,
adjetivos modificadores de núcleos nominais e não verbais. Do mesmo modo, a busca pelos advérbios em
-mente foi guiada pela ocorrência de um determinado item adjetival em função adverbial, assim, este item
lexical serviu como base dos advérbios canônicos. Devido a isso, a análise da produtividade de tais
construções limita-se apenas à observação da variedade de elementos licenciados para o preenchimento do
slot V.
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Espera-se que ocorra, em geral, maior incidência de verbos do tipo material, com
base na hipótese de Martelotta (2004), segundo o qual advérbios qualitativos tendem a se
relacionar a verbos materiais, pois estes dão conta do mundo sócio-cognitivo dos falantes.
Porém, dependendo do item que esteja preenchendo o slot adverbial, são esperados outros
tipos semânticos também. O item claro, por exemplo, relaciona-se frequentemente com
verbos de percepção (ver, perceber); o item grande com verbos de cognição (pensar,
sonhar); o item alto a verbos de atividade verbal (falar, gritar, chamar). Assim,
estabelece-se uma relação semântica intrínseca entre o verbo e o elemento adverbial.
c) Depreender a semântica expressa pelo item adjetival no contexto discursivo de
cada ocorrência pautados na proposta de Castilho (2010) para a classificação semântica
dos adjetivos4, a fim de descrever mais detalhadamente o papel semântico desse elemento
construcional.
Espera-se encontrar maior ocorrência de adjetivos denominados qualificadores
devido ao caráter atributivo deste elemento dentro das construções aqui estudadas. Alguns
adjetivos adverbiais apresentam um caráter polissêmico, atribuindo não só qualidade à
ação verbal, mas também intensidade a ela. O item alto, por exemplo, na construção [V
AAdj]Qualit expressa, ao mesmo tempo, o modo e a intensidade da ação verbal, fato que não
ocorre com o item altamente da construção Xmente, o qual se restringe à semântica de
intensidade no sistema do português e não funciona como atributo do verbo, mas sim de
um adjetivo (Ele é altamente capacitado).
d) Analisar a transitividade dos verbos que ocorrem em cada token das
microconstruções em questão, objetivando verificar se são verbos intransitivos ou se há
complementos internos selecionados pelo verbo. Para tanto, assumimos a postura teórica
de que a transitividade é uma propriedade discursiva, ou seja, a depender do contexto
enunciativo, um mesmo verbo pode apresentar estruturas argumentais distintas.
A hipótese vinculada a este fator é a de que a intransitividade seja uma propriedade
formal da construção [V AAdj]Qualit e, desta forma, os verbos que figurem nela assumiriam
coercitivamente o padrão intransitivo. Fato este que não ocorreria com o subesquema [V
4 Ressaltamos que este objetivo se restringe apenas à construção [V AAdj]Qualit, visto que é o nosso ponto
de partida para a coleta e análise dos advérbios. A construção com o advérbio canônico apresenta sempre a
mesma base adjetiva, portanto.
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Xmente]Qualit, em que se espera que haja um equilíbrio maior entre verbos transitivos e
intransitivos.
e) Avaliar a estrutura informacional das construções em questão com o objetivo
de captarmos a informação focalizada por cada um dos padrões adverbiais. Em outras
palavras, observamos se cada uma das construções evidencia exclusivamente a novidade
da informação ou se compartilha o foco informacional com algum outro elemento, seja
ele algum argumento verbal ou termos adjuntos, como advérbios simples, locuções
adverbiais ou orações.
A este objetivo atrela-se a hipótese consoante a outros trabalhos (Virgínio, 2016,
2018; Tiradentes, 2018) de que a construção [V AAdj] carregue exclusivamente o foco
informacional ao passo que a construção [V Xmente] tende a compartilhar o foco com
outros elementos. Além disso, hipotetizamos que este fator seja uma estratégia
pragmático-discursiva fundamental que diferencia os dois subesquemas adverbiais aqui
analisados. Nesse sentido, quando o falante pretende dar foco na sequência verbo +
adverbial, recorreria à construção com adjetivo e não com o advérbio canônico, como em
(3), em que os constructos pense simples e faça simples apresentam exclusivamente a
novidade de toda a sentença, uma vez que os locutores são conhecidos, o assunto é
conhecido (os posts) e a novidade vem sendo apresentada exatamente pelas
microconstruções pense simples e faça simples. Já em (4), o constructo ver simplesmente
compartilha o foco informacional com o complemento interno oracional do verbo ver, o
que elas enceram. Parece ser esta uma tendência do padrão com advérbios em -mente
qualitativos.
(3) “teve um dos seus posts, não me lebro qual, em que voce disse "« pense
simples, faça simples "» nunca vou me esquecer disso” (http://tableless.com.br/offtopic-
pra-que-simplificar-se-pode-complicar)
(4) “O entendimento de as parábolas, espiritualmente falando, significa mais do
que ver simplesmente o que elas enceram (http://24.229.2.221/parabolas/parb11.html)
f) Verificar a natureza de possíveis elementos intervenientes entre as unidades-
chave da construção, isto é, entre o verbo e o item adverbial, em ambos os subesquemas.
Este objetivo justifica-se pelo fato de estarmos lidando com estruturas que admitem a
http://tableless.com.br/offtopic-pra-que-simplificar-se-pode-complicarhttp://tableless.com.br/offtopic-pra-que-simplificar-se-pode-complicarhttp://24.229.2.221/parabolas/parb11.html
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presença de outros elementos gramaticais como, por exemplo, os próprios argumentos do
verbo, internos e externos; intensificadores como muito, pouco, super etc.; partícula “se”
vinculada ao verbo ou outros. Em suma, elementos previstos pelos próprios itens que
integram as construções adverbiais qualitativas [V AAdj] e [V Xmente].
Por hipótese, esperamos que as duas construções admitam poucos elementos
intervenientes uma vez que a semântica qualitativa prevê uma integração mais forte entre
as unidades verbo e adjetivo, a qual é verificada na decodificação linguística (cf. Givón
1990, 1995).
g) Comparar a composicionalidade de microconstruções altamente frequentes do
esquema [V AAdj]Qualit com microconstruções menos frequentes deste mesmo padrão, bem
como microconstruções de alta frequência do esquema [V Xmente]Qualit com outras de
baixa frequência Observamos a composicionalidade semântica em cada constructo
buscando depreender maior ou menor grau de previsibilidade entre os elementos que
integram a construção, ou seja, em que medida a soma do significado das partes
componentes resultam na atribuição do modo como a ação verbal é praticada.
A composicionalidade é tratada aqui com base em alguns autores, como Traugott
e Trousdale (2013), que dizem que um constructo será avaliado como mais composicional
quando houver compatibilidade semântica e sintática entre os itens que compõem a
construção e será, portanto, um constructo menos composicional quando ocorrer um
desacordo (mismatcht) entre a forma original e o significado final. Lambrecht (1994)
também apresenta uma hipótese que se vincula ao nosso objetivo, quando diz que quanto
menos substituições a construção permitir em suas posições estruturais, mais serão
percebidas como idiomáticas. Em outras palavras, quando apresentarem restrições
colocacionais.
Falando de forma mais específica acerca das construções [V AAdj] e [V Xmente],
postulamos a hipótese de que um item adjetival muito frequente nas construções [V AAdj]
vai perdendo a função semântica qualitativa, perdendo analisabilidade entre as unidades
verbo e adjetivo adverbial, perdendo também a liberdade sintática entre essas unidades
de modo a formarem uma unidade ainda mais integrada. Desta forma, verbo e adjetivo
adverbial formam um bloco cognitivo único (chunk) e posteriormente, formam um novo
pareamento de forma e função na rede linguística. Por hipótese, esse fenômeno de
mudança não ocorreria com as construções adverbiais qualitativas canônicas, mesmo
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dentre as mais frequentes5. Em suma, o subesquema [V AAdj] de valor semântico
qualitativo teria fortes tendências à perda de composicionalidade, dando origem a novas
construções (mais lexicalizadas) na rede linguística do falante, enquanto o mesmo não
ocorreria com o padrão [V Xmente]Qualit, tende a manter canonicamente sua função
adverbial qualitativa.
Tendo em vista os principais pontos que envolvem o objeto de estudo desta tese e
seus principais objetivos e hipóteses, no capítulo 1 apresentamos o arcabouço teórico no
qual se insere esta pesquisa, desde características gerais da Linguística Funcional
Centrada no Uso, pressupostos funcionalistas clássicos, à noção de construções e de rede
construcional. O capítulo 2 traz uma revisão dos principais trabalhos em que nos
pautamos para o desenvolvimento de nossa pesquisa. Nele tratamos da classe dos
advérbios, da semântica qualitativa bem como da fluidez categorial entre adjetivos e
advérbios. Em seguida, o capítulo 3 aborda a metodologia utilizada para a coleta e
observação dos dados. Já no capítulo 4, desenvolvemos toda a análise qualitativa e
quantitativa dos fatores postulados como relevantes para atingir nossos objetivos. Por fim,
o capítulo 5 diz respeito às conclusões as quais chegamos após toda a análise e, em 6,
apresentamos a bibliografia utilizada.
Em suma, esta tese objetiva-se a descrever as construções qualitativas com
adjetivos adverbiais e compará-las à rede dos advérbios qualitativos em -mente no PB
atual, com o intuito de contribuir com os estudos sincrônicos da linguagem, sob a ótica
construcionista, no que diz respeito a padrões de modificação verbal. Nossa intenção é
incorporar o que vem sendo defendido acerca dessas construções e aprofundar análises
qualitativas e quantitativas com base em dados do PB contemporâneo.
5 Porém, ainda assim, apresentam um grau de idiomaticidade maior que aquelas construções menos
frequentes.
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1. PRESSUPOSTOS TEÓRICOS
A Linguística (Funcional) Centrada no Uso6 (doravante LFCU) é uma tradução
do termo Usage-based Model, utilizado por Langacker, em 1987, para designar modelos
de análise linguística que partem de instâncias de uso reais para se chegar a generalizações
teóricas, diferenciando-se, em sua própria natureza, de abordagens de cunho formalista,
segundo as quais a mente humana possui uma organização interna e inata para a
gramática, refletida nos usos da língua. Para abordagens baseadas no uso, o pensamento
linguístico é organizado por diversas habilidades cognitivas gerais, muitas delas não
sendo restritas à nossa espécie (Bybee, 2010), tais como o pensamento analógico,
capacidade de categorizar, compreensão de metáforas e metonímias, associação de
formas a funções, armazenamento de informações na memória, acesso etc.
Autores como Traugott e Trousdale (2013), Bybee (2010, 2015), Tomasello
(2003), Barlow e Kemmer (2000), dentre outros utilizam este termo para designar análises
que, de um modo geral, reúnem pressupostos da corrente funcionalista norte-americana e
pressupostos da linha cognitivista. Dentro desta nova roupagem da linha funcionalista, a
gramática é entendida como uma rede de construções, isto é, nós que são pareamentos de
forma e função e estão organizados em rede através de links, constituindo um todo
interconectado. A gramática, como uma rede de construções, está susceptível a mudanças
e a reorganizações mediante às necessidades advindas do contexto pragmático-discursivo.
Neste sentido, a LFCU estabelece uma relação íntima entre forma e função, isto é, o
pesquisador busca explicações no contexto de uso real da língua, bem como em fatores
de ordem estrutural, semântica, pragmática e cognitiva para dar conta das construções
linguísticas e das mudanças que ocorrem na rede construcional.
Este capítulo destina-se aos pressupostos teóricos da LFCU, os quais estão em
consonância aos objetivos desta tese.
1.1 A Linguística Funcional Centrada no Uso
Em linhas gerais, a Linguística Funcional Centrada no Uso (LFCU) postula que,
para compreender o funcionamento da linguagem humana, devem-se considerar, além de
aspectos estruturais e comunicativos, aspectos de cunho cognitivo. A gramática de uma
6 Como dito anteriormente, o termo funcional fora inserido a fim de preservar a origem desta vertente
linguística.
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língua é dependente do seu uso concreto, pois é no momento da interação que o falante
faz adaptações entre estrutura e contexto a fim de atingir seus propósitos comunicativos.
De acordo com Martelotta, a gramática seria “o resultado de um conjunto de princípios
dinâmicos que se associam a rotinas cognitivas e interativas moldadas, mantidas e
modificadas pelo uso” (2009: 63).
Desta forma, Hopper (1998) utiliza o termo gramática emergente para dar conta
de explicar o fato de que a estrutura linguística se reestrutura constantemente, ou seja, ela
é passível de mudanças; os falantes (re)criam padrões gramaticais a todo o momento
devido à força informativa do discurso. Tal fato permite-nos entender que há uma
simbiose entre discurso e gramática, em que um se favorece do outro, renovando-se nas
diferentes situações discursivas. Essa retroalimentação entre discurso e gramática é de
suma importância para continuidade do sistema linguístico, já que desempenha um papel
duplo: construções linguísticas são resultantes da atuação do sistema linguístico e ao
mesmo tempo, moldam-no, num movimento de interdependência, como um ciclo.
Lidamos não só com a estabilidade de padrões gramaticais, como também com a
instabilidade advinda do uso, do ato comunicativo, pautados em processos cognitivos que
categorizam e organizam o pensamento. Portanto, o uso e a cognição estão na base da
capacidade humana para a linguagem.
Barlow e Kemmer (2000) assinalam as principais propriedades que permeiam esta
teoria da linguagem:
(a) Há uma relação íntima entre estrutura linguística e instâncias de uso
Instâncias de uso são a base da formação do sistema linguístico. Ao passar por
experiências concretas, determinadas, é que o sistema em si mesmo se abstratiza. Esta
premissa nos evidencia que a gramática de uma língua se forma e se enrijece por meio de
instâncias de uso lexicalmente específicas; é a partir delas que o geral (construções mais
abstratas) emerge. Desta forma, como já dito anteriormente, instâncias de uso específicas
e concretas alimentam padrões gerais e mais abstratos da mesma forma que estes
licenciam tais realizações, isto é, instâncias são bottom-up, mas depois também se tornam
instanciadoras (top-down).
(b) A importância da frequência
Os autores chamam a atenção para a atuação da frequência na estruturação,
manutenção e funcionamento do sistema linguístico. Os trabalhos de Bybee (2003, 2010
e 2015) também salientam bastante este fator. Segundo eles, como o nosso sistema é
amplamente guiado pela experiência (concreta), a frequência com que passamos por
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diversas experiências e as instâncias de uso utilizadas para nos referirmos a elas são de
suma importância para moldarmos tanto estruturas linguísticas mais gerais, quanto outras
mais específicas. A rotinização de padrões linguísticos permite que, cognitivamente,
determinada estrutura se torne mais acessível na mente do falante, fazendo o sistema mais
susceptível à criação de novas estruturas, bem como à obsolescência de outras7.
(c) Compreensão e produção integradas ao sistema linguístico
Nessa perspectiva, a forma como o falante utiliza o sistema linguístico é também
parte que integra o conhecimento dele sobre a sua própria língua. As diversas realizações
são marcadas pragmaticamente e não ocorrem de forma aleatória ou acidental, o que
demonstra sistematicidade e conhecimento intrínseco, corroborando o fato de que o
sistema é orientado pela experiência.
(d) O foco no papel da aprendizagem e da experiência na aquisição da linguagem
Sobre essa propriedade, os autores defendem que é a partir da produção e
compreensão da linguagem advinda da interação entre os participantes de uma cena
comunicativa, e tudo o que ela envolve, que o sistema do ouvinte vai se estruturando.
(e) As representações linguísticas são tomadas como emergentes e não como
entidades fixas armazenadas
Este ponto evidencia o fato de que a língua está susceptível à mudança, não se
tratando de estruturas fixas e categorias fechadas. A fala humana é baseada em padrões
que podem (ou não) se repetir em um discurso. Nesse sentido, um determinado padrão
vai percorrendo caminhos neurológicos que podem ser cada vez mais reforçados à medida
que os falantes os utilizam. Estas construções permanecerão ativas na mente do falante,
da mesma forma que o oposto também se fará verdadeiro, caso a frequência seja cada vez
mais baixa, assim, renovando e reorganizando o sistema linguístico. Um referente,
quando utilizado pela primeira vez em um discurso, requer do ouvinte maior esforço
cognitivo, por exemplo, do que um referente já conhecido.
(f) Importância de dados reais na descrição e construção da teoria
A LFCU baseia-se na análise de contextos reais de produção linguística por partir
do princípio de que a linguagem se constrói na interação, de forma que há uma simbiose
entre discurso e gramática. Portanto, devido a esta relação intrínseca, a análise e a
descrição de dados são feitas com a coleta e a observação de ocorrências reais, não por
meio de dados criados a partir da intuição do próprio falante, sujeita a falhas.
7 Defende-se a hipótese de que nenhuma construção deixa de existir na rede linguística do falante, mas sim
que, devido à baixa (ou nenhuma) ocorrência de algumas estruturas, elas estariam desativadas.
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(g) Relação íntima entre uso, variação sincrônica e mudança diacrônica
A mudança e a variação são vistas nesse modelo como reflexos do uso dinâmico
da linguagem. Entende-se o uso da língua como o locus da mudança, sendo o ouvinte o
principal agente deste processo, pois, ao interpretar um discurso, ocorrem adaptações
mínimas que afetam tanto o sistema interno do próprio ouvinte, quanto o de seus próximos
interlocutores, o que motiva o surgimento de variantes em competição. E, com a
frequência incidindo, pode surgir, de fato, uma nova construção na língua (mudança). A
ativação das variantes em competição pelo uso é motivada tanto por fatores internos,
quanto por fatores contextuais e estas são entendidas como alternativas licenciadas pela
rede em que as construções linguísticas estão organizadas. Fenômenos linguísticos são
mais bem analisados quando observados dentro do sistema e na sua evolução histórica.
Por isso, a temática da variação e mudança linguística é o principal interesse dos
estudiosos dessa área. Esses fenômenos são reflexos do caráter dinâmico das línguas.
(h) A interconectividade entre o sistema linguístico e os sistemas cognitivos não
linguísticos
Nesse modelo entende-se que padrões cognitivos e culturais estão integrados em
prol da compreensão da habilidade verbal humana. Assim, as diferentes áreas da cognição
humana interagem para que se chegue a um resultado final que envolva a compreensão e
produção de enunciados. Para isso, as diversas habilidades cognitivas humanas, como
memória, atenção, capacidade de reconhecer padrões, experiência, organização, acesso,
conexão e outras se unem para a produção e compreensão de enunciados linguísticos.
Essas habilidades formam um sistema cognitivo coerente, com conhecimentos de
diferentes níveis de complexidade, envolvendo desde esquemas mais simples, como
esquemas imagéticos, por exemplo, até os mais complexos. Entendemos a linguagem em
termos de gestalt, isto é, a mente humana é holística.
(i) O papel crucial do contexto no funcionamento do sistema linguístico
Toda construção gramatical é dependente do contexto de uso. Assim, os autores
defendem que o sentido não é circunscrito pela forma; esta sugere, fornece pistas a
respeito do significado dentro de um contexto específico, mas não o determina. O sentido,
portanto, não está diretamente ligado à forma, ele está em potencial, permitindo que
inferências sejam feitas e que o falante faça uso da sua criatividade no ato comunicativo.
Em suma, esta abordagem lida com a riqueza do significado8.
8 Vincula-se ao princípio da escassez de significante.
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Diante do exposto, verificaram-se as características gerais e principais que
norteiam o modelo da LFCU. Porém, conforme exposto no início do capítulo, esse
modelo é a versão mais recente da vertente funcionalista norte-americana e muitos dos
seus pressupostos clássicos, desde seu advento em 1970, continuam presentes em estudos
e análises linguísticas sob esta ótica. Vejamos, então, a seguir alguns desses pressupostos
clássicos que se fazem importantes para a observação e interpretação dos dados desta tese,
que são eles: o princípio da iconicidade e noções de estrutura da informação.
1.2 Alguns pressupostos funcionalistas clássicos
1.2.1 Princípio da Iconicidade
Em linhas gerais, iconicidade pode ser definida como a correlação natural entre
forma e função, isto é, na visão funcionalista, há uma motivação entre o código linguístico
e seu designatum. À essa noção vincula-se a ideia de que a estrutura linguística reflete,
de alguma forma, a experiência humana: “a suposição geral é a de que a estrutura
linguística revele o funcionamento da mente, bem como as propriedades de
conceptualização humana do mundo” (Martelotta, 2009, p. 167). Sendo assim, os
funcionalistas advogam que há laços de motivação entre padrões linguísticos e o que eles
designam no mundo biossocial dos falantes. Porém, há casos em que essa motivação não
é nítida, sendo aparentemente arbitrária. Isso ocorre devido à força corrosiva do tempo,
fazendo com que um falante, em um estado sincrônico da língua, não recupere a
correlação entre o plano da expressão e do conteúdo.
A relação motivada entre o que é estruturalmente expresso e aquilo que está
cognitivamente armazenado pode ser destrinchada em três subprincípios icônicos: (i) da
quantidade; (ii) da ordenação linear e (iii) da integração (Givón, 1994).
O subprincípo da quantidade prevê que, quanto maior a quantidade de
informação a ser passada ao interlocutor, maior será a quantidade de forma usada para
tal. Isso significa que a complexidade do pensamento se reflete na complexidade
estrutural. Sendo assim, informações que são conhecidas e esperadas pelo interlocutor
tendem a ser expressas por porções menores de texto e são também menos complexas
sintática e morfologicamente; enquanto informações novas e não esperadas requerem
maior quantidade de forma para serem expressas. Croft (1990) corrobora tal assertiva ao
dizer que “conceitos que são sempre, ou frequentemente, expressos por estruturas
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gramaticais simples são cognitivamente primitivas e aqueles expressos por estruturas
complexas são cognitivamente complexos” (1990, p. 173).
Este subprincípio também atua na expressão do aspecto iterativo da linguagem,
como mostra o exemplo:
I. Vou ali rápido.
II. Vou ali rapidinho.
No exemplo I, o adjetivo rápido qualifica o verbo ir, atribuindo a ele a noção de
modo. Porém, em II, verifica-se o mesmo adjetivo em uma forma derivada, na qual foi
acrescido à base o sufixo de diminutivo -inho conferindo ênfase ao aspecto iterativo do
adjetivo rápido. Em II, então, foi necessária uma quantidade maior de forma para
expressar a função de ênfase, ou seja, intensificar o quão “rápido” o evento ocorrerá.
Pensamos, inclusive, que este subprincípio pode contribuir de alguma maneira na
interpretação de instâncias de uso dos padrões [V AAdj] e [V Xmente] em casos como:
vou rápido e vou rapidamente, por exemplo, em que a forma em -mente, por se tratar de
um processo de sufixação, em que se acrescenta à base lexical o sufixo -mente, poderia
ser mais custosa, uma vez que o falante despenderia de mais quantidade de forma no
momento da produção se comparado ao adjetivo adverbial rápido. Assim, em contextos
como esses, o falante recorreria à estrutura menor e menos custosa.
O subprincípio da ordenação linear aponta que a estrutura sintática revela a
ordem como os fatos estão armazenados e organizados na mente do falante. Isto se
relaciona a dois aspectos importantes: (a) a ordem das orações no discurso tende a seguir
a sequência temporal em que os eventos foram conceptualizados e que (b) a informação
mais tópica tende a vir na primeira posição da oração, seguida da informação mais focal,
fato que se observa na ordem canônica SVO no português, por exemplo. Em outras
palavras, o tipo de informação vinculada pelo interlocutor está diretamente associado à
posição que ela ocupa na cadeia sintática.
Desta forma, o grau de importância das informações é refletido na ordenação dos
elementos no enunciado. Este subprincípio tem um papel importante no que se refere à
noção de contraste, uma vez que há uma tendência de colocar no início da cláusula o
elemento que se deseja evidenciar, fugindo muitas vezes do padrão de ordenação mais
frequente e menos marcado, como se vê em:
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III. Meu coração bateu forte.
IV. Bateu forte o meu coração.
Pode-se perceber que, nos exemplos III e IV, o foco contrastivo é diferente. Em
III, evidencia-se como informação mais relevante o predicado bateu forte. Já em IV,
toda oração recebe foco informacional provocado pela mudança na posição do sujeito,
que saiu da posição mais frequente e menos marcada, pré-verbal, para uma posição pós-
verbal, menos esperada e menos frequente.
Por fim, o subprincípio da proximidade (ou integração) postula que o que está
cognitivamente próximo estará sintaticamente próximo. Em outras palavras, conteúdos
armazenados juntos estarão mais integrados também no nível da decodificação. Este
subprincípio contribui para verificarmos o impacto da frequência sobre as construções
linguísticas, em que construções muito frequentes tendem a se aproximar no nível da
cognição e, consequentemente, tal proximidade será refletida no nível da forma.
Este subprincípio, em especial, contribui na interpretação dos dados desta tese,
mais especificamente quanto ao fator composicionalidade, em que instâncias mais
específicas da construção com adjetivo adverbial se tornam mais integradas devido à alta
frequência de uso de tais padrões, levando à perda de composicionalidade e à formação
de novas construções na língua. Também podemos ilustrar este subprincípio com a
análise do fator elemento interveniente, em que os elementos adverbiais de ambas as
construções qualitativas sob análise estabelecem com o verbo unidades mais integradas,
admitindo raras vezes a presença de elementos intervenientes entre Verbo e Adverbial,
sobretudo SNs plenos com função de argumentos verbais.
1.2.2 Informatividade
Informatividade diz respeito ao conjunto de informações compartilhadas entre
locutor e interlocutor no ato comunicativo. “O modo como o falante organiza seu texto é
determinado, em parte, pelos seus objetivos comunicativos e, em parte, pela sua
percepção das necessidades do seu interlocutor” (Martelotta, 2003, p.39). Nesse sentido,
o falante tende a embalar sua fala de acordo com a pressuposição que faz a respeito do
conhecimento do seu interlocutor, isto é, aquilo que o locutor supõe que seu ouvinte saiba/
conheça e aquilo que será apresentado como novidade.
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A informatividade pode ser observada na forma de organização das informações
na cláusula através da oposição de tema e rema. Desde o Círculo Linguístico de Praga,
em que os linguistas trabalhavam com a noção de “Perspectiva Funcional da Sentença”,
essas informações são relevantes para estudos funcionalistas, os quais relacionaram a
posição dos termos componentes da cláusula ao tipo de informação por eles veiculados.
Classificou-se dicotomicamente, então, informações conhecidas (velhas), como tema, o
qual tende a ocupar as primeiras posições da cláusula (estando mais frequentemente
atrelado ao sujeito), enquanto o papel de rema destinava-se às informações novas que
tendem a ocupar posições mais ao final da cláusula (frequentemente vinculadas ao
predicado).
Prince (1981, 1992) apresenta uma proposta mais abrangente do conceito de
informatividade a partir da análise do status informacional de referentes nominais. A
autora organiza as informações em três categorias: novas, subdivididas em nova-em-folha
e nova disponível; evocadas, subdivididas em evocadas textualmente ou situacionalmente
e, por fim, inferíveis. Abaixo está reproduzido um trecho retirado do corpus D&G/ Rio
de Janeiro para ilustrar tais categorias:
“foi uma situação difícil... né? eu não sei... eu não sei onde que engloba
isso......mas eu fui a Petrópolis com uma amiga que nunca tinha subido a
serra... ϕ estava dirigindo há pouco tempo (...) quando a gente está
voltando... começa a chover assim... torrencialmente...” (corpus D&G/ Rio
de Janeiro)
Um referente textualmente velho é aquele que já foi mencionado no discurso
anteriormente e, por isso, pode ser recuperado com pouco material linguístico - ou
nenhum, no caso de uma anáfora zero - como ocorreu no trecho acima para recuperar o
pronome sujeito “eu”, altamente pressuposto. Um referente evocado situacionalmente é
aquele disponível na situação de fala, como as pessoas do discurso, por exemplo. No
trecho, o pronome “eu” representa essa categoria. São classificados como novo-em-folha
referentes que são introduzidos pela primeira vez no discurso, como foi o caso de “uma
amiga”. São novos disponíveis quando se tratam de referentes únicos, como, por exemplo,
“Petrópolis”, que foi mencionado pela primeira vez, porém está disponível no
conhecimento de mundo do falante. Por último, um referente inferível é identificado pelo
processo de inferência, isto é, a partir de outras informações fornecidas no discurso, o
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interlocutor consegue inferir sobre ele. Exemplo: “O ônibus parou e o motorista desceu”9.
Neste exemplo, infere-se o termo, uma vez que todo ônibus possui um motorista.
1.2.3 Foco Discursivo
Antes de discutirmos a noção de foco discursivo propriamente dita, faz-se
necessário comentar a respeito do conceito de estrutura informacional, a qual trata da
decodificação da informação por meio da estrutura linguística. Conforme visto neste
capítulo, há uma motivação entre aquilo que o falante deseja enunciar, em termos de suas
intenções e necessidades, e a estrutura por ele utilizada para decodificar tais informações
para o seu interlocutor, considerado seu estado mental. Nesse sentido, ao julgar, por
exemplo, que uma dada informação é nova para o seu interlocutor, o locutor utilizará
estratégias estruturais a fim de evidenciá-la, como, por exemplo, utilizar-se de mais
quantidade de forma (subprincípio icônico da quantidade) ou organizar tal informação
na sentença a fim de conferir-lhe algum destaque (subprincípio da ordenação linear). Em
outras palavras, o discurso, sob a responsabilidade de um locutor, evidencia indícios de
quais informações são assumidas por ele como sendo evocadas/ conhecidas pelo seu
ouvinte, bem como quais evidenciam graus de novidade.
Ao longo das décadas de estudos linguísticos, muitos foram os que se debruçaram
acerca da estrutura da informação, dentre eles, Lambrecht (1994), que apresenta suas
propostas acerca das noções de tópico e foco discursivo. Nessa perspectiva, considera-se,
então, ser possível dividir o enunciado em dois grandes blocos informacionais em que,
em linhas gerais, o tópico evidenciaria a porção mais conhecida, esperada ou pressuposta,
enquanto o foco veicularia a parte mais informativa do enunciado, com um grau mais alto
de novidade.
Com base, então, em Lambrecht (1994), tem-se por estrutura informacional: “O
componente da sentença gramatical no qual proposições, como representações de estados
de sentimentos, são pareados com estruturas léxico-gramaticais em acordo com estados
mentais de interlocutores, os quais usam e interpretam essas estruturas como unidades
informacionais em contextos discursivos dados” (1994, p. 5)10. O autor entende que essas
9 Martelotta (2003, p. 47). 10 Tradução livre de: “That componente of sentence gramar in wich propositions as conceptual
representations of states of affairs are paired with lexicogrammatical structures in accordance with the
mental states of interlocutors who use and interpret these structures as units of information in given discouse
contexts” (p. 5)
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duas categorias estão muito mais ligadas ao status informacional dos referentes no
discurso que à estrutura temática, sendo proposicional, portanto, a natureza da
informação. Isso significa dizer que um constituinte estrutural (formal) não expressa
informação em si mesmo, uma vez que ele é parte integrante de toda uma proposição, o
que configura tópico e foco como sendo categorias pragmáticas. Para corroborar tal
afirmação, o autor apresenta o exemplo (2.7; 5.1) replicado a seguir (Lambrecht 1994, p.
209):
Q: Where did you go last night?
A: I went to the movies.
De acordo com o autor, a informação veiculada pela resposta à pergunta seria a
proposição abstrata The place I went to last night was the movies e não to the movies nem
the movies. O SN the movies é considerado por ele como foco da informação, não por
veicular a novidade em si mesmo, mas sim pelo fato de esse sintagma apresentar uma
relação pragmaticamente construída com a proposição, de maneira que o seu acréscimo
transforma parte do enunciado em informação nova.
Considerando que, para Lambrecht (1994), a natureza da informação é
proposicional, cabe definirmos dois tipos de proposições pragmaticamente distintos: a
pressuposição e a asserção. A primeira trata-se de uma proposição léxico-
gramaticalmente evocada por uma sentença, em que o locutor assume que o ouvinte
conheça no momento da enunciação. A segunda refere-se a uma proposição que passa a
ser conhecida pelo ouvinte após a enunciação. Parafraseando o autor, asserção é
proposição que se espera que o ouvinte conheça em decorrência de ter ouvido a sentença
anunciada (1994, p. 52). Dessa forma, os conceitos vinculados às porções da proposição
só podem ser compreendidos se considerarmos que o conhecimento e o significado são
construídos pragmaticamente, isto é, na interação entre falante e ouvinte, em situações
reais de comunicação.
Dito isso, Lambrecht (1994, p. 213) define foco discursivo como “o componente
semântico de uma proposição pragmaticamente estruturada, na qual a asserção se difere
da pressuposição”11. Em suma, o autor explica que o foco constitui o elemento central da
asserção, enquanto a porção tradicionalmente chamada de tópico é o elemento central da
11 Segundo Lambrecht (1994), uma proposição pode ser constituída por pressuposição e por asserção.
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pressuposição. Será esta, então, a definição de foco adotada para a observação e análise
dos dados desta tese, uma vez que entendemos esta categoria por um viés pragmático e
discursivo e não como uma categoria formal e/ou dicotômica, no sentindo de que foco
veicularia a informação nova e o tópico a informação velha ou pressuposta. Desta forma,
o foco discursivo também é interpretado de maneira escalar, a depender do contexto
discursivo.
As subseções apresentadas acima foram, então, dedicadas a alguns pressupostos
da abordagem funcionalista clássica pertinentes para a interpretação e diferenciação das
duas construções adverbiais qualitativas estudadas neste trabalho. Porém, as
características a respeito de como a gramática das línguas é delineada na mente humana
e como ela se realiza em contextos reais de comunicação não se restringem ao que foi
dito até aqui. Falaremos a seguir de conceitos basilares à configuração gramatical e aos
objetivos aos quais este trabalho se propõe atingir, que são as noções de construções
gramaticais e de rede construcional.
1.3 Construções Gramaticais
Aproveitando a noção de que o sentido não está encapsulado às formas, a LFCU
lida com a fluidez e o continuum entre as categorias linguísticas, permitindo, por exemplo,
que um adjetivo figure em uma construção de modificação verbal. A correlação entre as
formas e os significados linguísticos é simbólica, construída socialmente e
convencionalizada entre os falantes de uma língua. A essa associação simbólica entre
forma e função (semântica e/ou pragmática) dá-se o nome construção gramatical. Na
LFCU, as construções são tidas como as unidades básicas de uma língua.
Goldberg (1995) apresenta um modelo de gramática baseado em construções12, as
quais a autora define como:
C é uma construção se e somente se C é um pareamento de forma e significado tal
que nenhum aspecto de Fi ou de Si não é estritamente predizível das partes componentes de C ou de
outras construções previamente estabelecidas.” (Goldberg 1995:04)13
12Fillmore (1985; 1987; 1988; 1990), Fillmore e Kay (1993), Filip (1993), Jurafsky (1992), Koenig (1993),
Michaelis (1993), Goldberg (1995) dentre outros autores são conhecidos por serem os proponentes da
chamada Gramática de Construções (GC). 13Tradução livre de: “C is a construction iffdef C is a form-meaning pair such that some aspect of Fi or some aspect of Si is not predictable from C’s component parts or from other previously established
constructions.”
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A partir dessa definição dada pela autora em 1995, evidencia-se o caráter
idiossincrático das construções, pois o significado resultante delas não se trata da soma
das unidades lexicais que as compõem. A ligação entre forma e conteúdo é convencional
e socialmente construída em termos semântico-pragmáticos pelos membros de uma
língua e essa associação passa a ser interna à construção, por isso são consideradas
unidades simbólicas. É sob esta perspectiva de construção que a presente tese segue.
Em um modelo construcionista de gramática, não há uma separação rígida entre
léxico e gramática; o que, de fato, existe são pares de forma-função de valor referencial
e outros pares que desempenham valor procedural, operando em todos os níveis da
gramática. É um modelo que abarca o que era considerado como apêndice por modelos
formalistas de “dicionário-gramática”, ou seja, um conjunto de idiossincrasias, como as
expressões Maria vai com as outras, chutar o balde, enfiar o pé na jaca, etc., que
deveriam ser armazenadas no léxico como itens. Conceber a língua como uma rede de
construções significa dar conta de construções que são mais lexicais e idiossincráticas e
de construções que são mais gerais e mais funcionais, numa perspectiva escalar e gradual.
Devido ao fato de as construções serem unidades basilares das línguas, elas devem ser
reconhecidas como entidades teóricas, não podendo mais ser marginalizadas. Como já
dito anteriormente, o sentido da construção é rico em termos pragmáticos, discursivos,
funcionais e sociais. Sendo assim, falar uma língua é saber usá-la nos diferentes contextos
de uso, de modo a atingir os propósitos comunicativos. O conceito de construção, em si,
também reflete a capacidade humana de associação transmodal por congregar forma e
função, e a de memória rica, por armazenar uma gama de informações vinculadas às
construções e a seus contextos de uso.
Em linhas gerais, o conceito de construção, em diversos modelos construcionistas
da gramática, compartilha das seguintes características: (i) o nível da forma e da função
são igualmente relevantes, não havendo um nível superior ou mais central que outro; (ii)
a mente humana é holística, isto é, habilidades cognitivas gerais atuam no processamento
de dados linguísticos, refutando a hipótese da modularidade da mente14; (iii) construções
são unidades independentes, porém, relacionam-se entre si em um sistema hierárquico;
(iv) este sistema apresenta níveis de abstração que vão desde construções idiossincráticas,
como pé de moleque, cabeça dura, até esquemas mais gerais, como SVO, N1 de N2, , por
exemplo, altamente abstratos.
14Chomsky, N. The Modularity of Mind. Cambridge (Mass): The MIT Press, 1983b.
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O modelo construcionista de Croft (2001) propõe um esquema no qual são
pontuadas as propriedades formais das construções e quais propriedades são próprias da
face da função. Segue abaixo a figura (1), que ilustra o quadro apresentado pelo autor
(2001:18):
Figura 1: Propriedades da Construção (Croft, 2001)
A figura 1 evidencia de maneira organizada e sistemática as propriedades que
envolvem o spectrum formal das construções, são elas: propriedades fonológicas,
morfológicas e sintáticas; ao passo que são propriedades atribuídas ao spectrum do
significado: propriedades semânticas, pragmáticas e discursivo-funcionais. Tal
detalhamento contribui para um maior rigor metodológico às análises construcionistas.
Este quadro também elucida o fato de as duas faces estarem unidas por um link, um elo
de ligação, fazendo com que entendamos essas propriedades como uma unidade
significativa, a qual chamamos de construção.
Outras p