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UNIVERSIDADE FEDERAL DE SÃO CARLOS CENTRO DE EDUCAÇÃO E CIÊNCIAS HUMANAS DEPARTAMENTO DE METODOLOGIA DO ENSINO CURSO DE PEDAGOGIA Potencialidades Pedagógicas para a Educação das Relações Etnicorraciais em imagens integrantes da Coleção Professor Eduardo de Oliveira e Oliveira São Carlos 2010

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UNIVERSIDADE FEDERAL DE SÃO CARLOS

CENTRO DE EDUCAÇÃO E CIÊNCIAS HUMANAS

DEPARTAMENTO DE METODOLOGIA DO ENSINO

CURSO DE PEDAGOGIA

Potencialidades Pedagógicas para a Educação das Relações Etnicorraciais em imagens

integrantes da Coleção Professor Eduardo de Oliveira e Oliveira

São Carlos

2010

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UNIVERSIDADE FEDERAL DE SÃO CARLOS

CENTRO DE EDUCAÇÃO E CIÊNCIAS HUMANAS

DEPARTAMENTO DE METODOLOGIA DO ENSINO

CURSO DE PEDAGOGIA

Potencialidades Pedagógicas para a Educação das Relações Etnicorraciais em imagens

integrantes da Coleção Professor Eduardo de Oliveira e Oliveira

Flavio Santiago

São Carlos

2010

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado à

Universidade Federal de São Carlos, como requisito

para obtenção do título de Licenciatura Plena em Pe-

dagogia, sob orientação da Profª. Dra. Petronilha

Beatriz Gonçalves e Silva do Departamento de Meto-

dologia de Ensino da Universidade Federal de São

Carlos.

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Banca examinadora

Professora Doutora Petronilha Beatriz Gonçalves e Silva (orientadora)

Professora Doutora Claudete de Souza Nogueira

Professor Doutor Douglas Verrangia

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O ponto central da questão é, sem dúvida, o problema escolar. “Se eu fizer questão de mandá-

los à escola moderna”, exclama o chefe dos diallobé, “eles irão em massa. Mas, aprendendo,

também esquecerão. Será que o que vão aprender tem o mesmo valor daquilo que vão

esquecer?”.

E vai mais longe: “A escola, para onde faço questão de mandar meus filhos, matará neles o que

hoje conservamos com zelo e por motivo óbvios. E depois, a que leva a escola européia? A

civilização é uma arquitetura de respostas... A felicidade não é função do conjunto de respostas,

mas da distribuição destas repostas. É preciso um equilíbrio...”.

(Kane, 1984)

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Agradecimentos

À minha família, mesmo que não botassem fé na minha seriedade, foram pacien-

tes quando as minhas escolhas. Também tiveram forças para me aturar e me ouvir e

mais ainda para me contestar e contrariar. Meus pais, que constantemente me alertavam

as dificuldades das minhas escolhas e tentavam de algum modo me levar para um cami-

nho mais tranqüilo, mas não me impediram de voar. Ao meu irmão, por todo apoio, por

dar colo ao meu choro, pelos dias de preguiça, por exatamente ser o melhor irmão do

mundo.

À minha orientadora, professora Petronilha, que aceitou me orientar, proporcio-

nando uma viaje ao encontro de novas descobertas e redescobertas do mundo. Ao Gru-

po de pesquisa Educação e Relações Etnicorraciais, por todo apoio e ajuda no desenvol-

vimento desse trabalho, e a Unidade Especial de Ensino, Pesquisa e Extensão - Infor-

mação e Memória, por fornecer o material de base dessa pesquisa.

A Andreliza, Neila e Luiz Gustavo com quem aprendi ver a vida de um modo

mais queer, me proporcionando momentos inesquecíveis em meio a toda histeria uni-

versitária.

A Juliana, por toda ansiedade compartilhada em relação ao curso e a vida, a mi-

nha prima Solange, por toda paciência e ajuda desempenhada durante a minha formação

enquanto pedagogo.

A Odila, por toda aprendizagem que me proporcionou e pela amizade construída

em nosso ambiente de trabalho.

Pessoas, tempo, saberes, lugares. Este trabalho é fruto de tudo que vivencie em

minha vida, não somente no tempo e espaço da graduação.

Uma parte de mim se materializou nesse trabalho, uma parte inquieta, diabólica,

inconstante.

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RESUMO:

Este trabalho é uma monografia exigida para a conclusão do Curso de Licencia-

tura em Pedagogia da Universidade Federal de São Carlos. Ele consiste em uma pesqui-

sa que teve como objetivo apontar potencialidades pedagógicas em imagens integrantes

da Coleção Professor Eduardo de Oliveira e Oliveira, que possam contribuir positiva-

mente para a construção da educação das relações etnicorraciais. A Coleção Professor

Eduardo de Oliveira e Oliveira pertencente ao acervo de coleções de documentos do

NEAB/UEIM – UFSCar e é fruto da concessão da guarda de materias que pertenceram

ao Professor Eduardo de Oliveira e Oliveira. A identificação das potencialidades peda-

gógicas teve como guia os princípios do Parecer CNE/CP 003/2004, que institui as Di-

retrizes Curriculares para a Educação das Relações Etnicorraciais e para o Ensino de

Historia e Cultura Afrobrasileira e Africana.

PALAVRAS-CHAVE: Potencialidades Pedagógicas; Educação para Relações

Étnico-Raciais; Imagens como instrumentos educativos.

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SUMÁRIO

Introdução ..................................................................................................................................... 8

Capítulo I - A Pesquisa ............................................................................................................... 11

Por que pesquisar na Coleção Eduardo de Oliveira e Oliveira? ............................................13

Capítulo II - Educação das Relações Etnicorraciais: um olhar para além do único. ................... 17

Capítulo III - Potencialidades Pedagógicas para a Educação das Relações Etnicorracial. ......... 26

Imagens: potencialidades pedagógicas para a educação das relações etnicorracial. .............27

Capítulo IV – Passos da Pesquisa: busca por significados .......................................................... 33

Capítulo V- Potencialidade Pedagógicas em imagens da Coleção Prof. Eduardo e Oliveira e

Oliveira ........................................................................................................................................ 38

Capítulo VI - Elucidações do pesquisador .................................................................................. 46

Bibliografia: ................................................................................................................................ 50

Anexos......................................................................................................................................... 54

Anexo I – Quadros de análise das imagens...........................................................................55

Anexo II – Carta explicativa sobre as imagens .....................................................................61

Anexo III – Imagens ..............................................................................................................62

Anexo IV - Lei 10.639/2003 ...................................................................................................66

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Introdução

Este trabalho é uma monografia de conclusão do curso de Licenciatura em

Pedagógica da Universidade Federal de São Carlos, e tem como objetivo apontar

potencialidades pedagógicas em imagens integrantes da Coleção Prof. Eduardo de

Oliveira e Oliveira que possam contribuir com a construção da educação das relações

Etnicorraciais.

Materias com potencialidades pedagógicas para a educação das relações

etnicorraciais, conforme sugere Evaldo Ribeiro Oliveira (2009), seriam aqueles que

gerariam aprendizagens significativas para a vida dos envolvidos nos processos de

ensinos e de aprendizagens em que se objetiva a construção de uma sociedade mais

equânime. É importante destacar que tais materiais devem expressar visões de mundo

de ascendência africana, mostrar a produção e a capacidade das pessoas negras, e

ajudem a resolver problemas.

As Imagens com potencialidades pedagógicas transmitem significados que se

entrecruzam entre o olhar do criador – o fotografo-, em relação ao fato ou objeto

retratado, e a interpretação do observador que contempla a fotografia, tendo em conta as

experiências e conhecimentos que tem acumulado ao longo da vida.

A coleta de dados foi realizada na Coleção Professor Eduardo de Oliveira e

Oliveira, como anunciado no primeiro capítulo desta pesquisa. A Coleção Professor

Eduardo de Oliveira e Oliveira é fruto da concessão da guarda a UEIM/ NEAB –

UFSCar de livros, separatas, imagens que pertenceram ao Prof. Eduardo de Oliveira e

Oliveira, que foi docente desta universidade nos anos 1970.

No interior da Coleção Prof. Eduardo de Oliveira e Oliveira não existe somente

um conjunto livros, imagens e outros objetos, mas também expressões de um intelectual

negro que lutou contra o racismo, e situações constrangedoras que colocavam, e

colocam ainda hoje, a população negra em posições sociais inferiores. Por isso, pareceu

a esta pesquisa que materiais por ele reunidos poderão ser úteis no combate ao racismo

e as discriminações.

A opção pela temática de estudo da educação das relações etnicorraciais, se fez

por acreditar este pesquisador, que a educação deve estar para além do ensino de visão

única de mundo propagada pelo eurocentrismo, e que professores/as devem combater de

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maneira intensa todos os pensamentos racistas, e as ações discriminatórias correntes no

interior das instituições escolares.

Durante o meu processo formativo - enquanto pedagogo - tive a oportunidade de

participar dos encontros de estudo do grupo de pesquisa Educação e Relações

Etnicorraciais do Núcleo de Estudo Afrobrasileiro, que me proporcionaram conhecer

um pouco mais das experiências de desumanização que vive os descendentes dos

antigos escravizados.

As leituras dos textos sobre a temática das relações etnicorraciais, e as

discussões no grupo de estudo me proporcionaram uma reeducação da minha

(inter)subjetividade – enquanto homem branco, de ascendência européia - a respeito

das relações etnicorraciais, contribuindo para que percebesse de maneira mais ampla o

racismo e as práticas discriminatórias presente na sociedade, e com forte influência na

escola.

Em um movimento contrário a estas formas de discriminações que deslegitimam

as pessoas negras, a cultura, e história afrobrasileira e africana se constituiu a idéia da

produção deste trabalho, em que busco potencialidades pedagógicas que possam

construir para educação das relações etnicorraciais de maneira positiva.

A construção desse trabalho também visa responder aos desafios colocados a

educadores, diretores e secretarias de ensino com a promulgação da Lei 10.639/2003, e

o estabelecimento pelo Conselho Nacional de Educação das Diretrizes Curriculares

Nacionais para A Educação das Relações Etnicorraciais e para o Ensino de História e

Cultura Afrobrasileira, que torna obrigatório o Ensino de História e Cultura Afro-

Brasileira nos estabelecimentos de ensino de todos os níveis, bem como a promoção da

educação etnicorracial.

No primeiro capítulo, apresento os objetivos que orientam a pesquisa, a questão

orientadora, e contextualizo a criação da Coleção Prof. Eduardo de Oliveira e Oliveira, e

a importância do material bibliográfico produzido pelo intelectual Eduardo de Oliveira e

Oliveira para as reflexões sobre as relações etnicorraciais no Brasil. No capítulo

seguinte apresento o processo de luta pela educação das relações etnicorraciais, e a

importância desta para o âmbito da formação humana.

No capítulo subseqüente destaco o conceito de potencialidades pedagógicas para

a educação das relações etnicorraciais, descrevendo suas implicações e importâncias

para a construção de um pertencimento etnicorracial positivos entre negros e não-

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negros. Em seguida apresento a utilização das imagens enquanto elementos

potencializados de aprendizagens para a educação das relações etnicorraciais.

No quarto capítulo apresento os procedimentos metodológicos de coleta, análise

e interpretação dos dados, e no último, me proponho a mostrar as potencialidades

pedagógicas presentes em imagens da Coleção Eduardo de Oliveira e Oliveira,

selecionadas para este estudo.

Por fim, é através deste estudo que pretendo identificar elementos que

contribuam para uma educação das relações etnicorraciais positivas, e colaborem para o

processo de construção de uma percepção multi/pluri visionaria do mundo.

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Capítulo I - A Pesquisa

Em nove de janeiro de dois mil e três, após grande luta do Movimento Negro, é

aprovada a Lei n°10.639, que altera a Lei n° 9.394/96 para incluir no currículo oficial da

Rede de Ensino a Obrigatoriedade da temática “História e Cultura Afrobrasileira”.

A fim de estabelecer o cumprimento da lei 10.639/2003, o Conselho de

Educação se manifesta, estabelecendo as Diretrizes Curriculares Nacionais para a

Educação das Relações Etnicorraciais e para o ensino de História e Cultura Africana e

Afrobrasileira, nos termos do Parecer CNE/CP 003/2004 e sua Resolução 01/2004

(BRASIL, 2004).

Como apresenta Silva (2007) à referida lei dá suporte para que os negros tenham

reconhecido e respeitado sua participação na construção da cultura nacional, bem como

na construção da sociedade brasileira, garantindo também o direito a todos os alunos

negros a aprender e ampliar o seu conhecimento, sem ser obrigado a negar suas raízes

étnico-raciais, e adotar costumes, idéias e comportamentos que lhe sejam adversos.

Isso significa que o jeito de ser, viver, pensar dos negros devem ser respeitados e

incluídos em atividades sistemáticas da educação, se desdobrando, sem dúvida, em uma

política de ação afirmativa que reconhece e valoriza a participação dos negros na

construção da nação brasileira, e propõe reparar danos que o racismo e políticas tácitas

vêm causando ao longo da história a população negras.

No entanto, o processo de construção da educação das relações étnico-raciais

tem desafiado estabelecimentos de ensino, processos educativos, educadores, escritores

e editoras a elaborarem materiais de ensino voltados a uma educação das relações

étnico-raciais (OLIVEIRA, 2009).

Como resposta a esse desafio, o presente trabalho de conclusão de curso tem

como objetivo central a busca de potencialidades pedagógicas para a educação das

relações étnico-raciais em imagens da Coleção Professor Eduardo de Oliveira e

Oliveira, que está sob a guarda da Unidade Especial de Ensino, Pesquisa e Extensão -

Informação e Memória (UEIM) e do Núcleo de Estudos Afro-Brasileiros (NEAB) da

Universidade Federal de São Carlos (UFSCar), a partir da questão de pesquisa: “Quais

potencialidades pedagógicas estão presentes em imagens da Coleção Professor Eduardo

de Oliveira e Oliveira?”.

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Essas imagens contêm informações iconográficas sobre aspectos da vida do

negro no Brasil, apresentando “pistas” de eventos que, acrescidas de elementos de

natureza histórica, geográfica e antropológica, carregam-se de sentido (KOSSOY, 2007,

p. 40), transmitindo informações a respeito do modo de vida, das condições sociais, bem

como do posicionamento do fotógrafo ao registrar o fato ou o objeto apresentado na

imagem.

As imagens integrantes da Coleção Professor Eduardo de Oliveira e Oliveira

seriam elementos que contribuiriam para a construção de aprendizagens significativas

para a vida dos membros envolvidos nos processos de ensino e de aprendizagem,

expressando uma visão de mundo a partir da perspectiva negra.

A compreensão do sentido didático nas imagens da Coleção Professor Eduardo

de Oliveira e Oliveira abre a discussão da necessidade de apresentar a história e a

cultura de maneira pluri/multi visionaria, deixando de lado somente a interpretação do

mundo a partir do que os europeus brancos acreditavam ser verdadeira.

Não estou advogando a favor de uma inversão bipolar da história da

humanidade, mas sim tentando construir uma terceira via, que não se pauta a partir de

um olhar único, desconstruindo o olhar de um sistema hegemônico de verdades.

O quero propor é a construção de processos de ensino e aprendizagens que se

arquitetam ao encontro da diferença, desarticulando as amaras do hegemônico, do

correto, do verdadeiro, do único. Garantindo aos negros que tenham o direito de se

reconhecerem na cultura nacional, expressarem visões de mundo próprias, e

manifestando com autonomia, individual e coletiva, seus pensamentos (BRASIL, 2004,

p. 25).

Estratégias para valorização da diferença estão sendo criadas desde o início do

sistema escravista, por meio de organizações e entidades do Movimento Negro, como as

organizações de quilombos, o custeio de alforrias de escravizados, a construção de

movimentos artísticos e religiosos que se reinventaram no curso da história do Brasil

(OLIVEIRA, 2009, p.54).

Como se vê, diferentes ações foram se construindo aos longos dos anos para

combater a construção de um único olhar para com o mundo. Pesquisar e apresentar a

história dos negros e das negras é uma forma de combater a construção deste olhar,

desarticulando a representação unitária do mundo que vem criando no decorrer da

história formas estereotipadas e preconceituosas do que é ser negro.

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Por essa razão, nesta pesquisa busco compreender que potencialidades

pedagógicas estão presentes nas imagens da Coleção Professor Eduardo de Oliveira e

Oliveira para a educação das relações étnico-raciais. Apresentando a história do Brasil a

partir do ponto de vista de quem sobreviveu e viveu a história, recontando as relações

étnico-raciais de modo diferente do olhar europeu-branco.

Por que pesquisar na Coleção Eduardo de Oliveira e Oliveira?

Eduardo de Oliveira e Oliveira, homem negro e homossexual, nasceu no ano de

1928 e conquistou o mundo com sua inteligência, formado em licenciatura e

bacharelado em Ciências Sociais pela Universidade de São Paulo, com estágio em

Sorbone, não acreditava muito em títulos ou diplomas, mas sim no que se realizava.

Entretanto, “em uma terra de doutores um cartão de visitas se faz necessário”

(OLIVEIRA e OLIVEIRA, texto não publicado).

Maria Antonia (1998), dizia que “havia na tristeza do seu olhar velado uma

flama surda, que parecia erguer contra obstáculos a sua figura nervosa e frágil. Ele

procurava criar o bom escândalo – enfrentando, protestando e desmascarando os

prazeres – quando estava em jogo”.

Eduardo dedicou grande parte da sua vida à luta em benefício da comunidade

negra, sendo um dos pioneiros a apontar propostas para a construção da lei Caó - Lei Nº

7.437, de 20 de dezembro de 1985, que inclui entre as contravenções penais a prática de

atos resultantes de preconceito de raça, de cor, de sexo ou de estado civil - nos termos

que conhecemos atualmente.

Entre os principais trabalhos desenvolvidos por Eduardo de Oliveira e Oliveira,

está o livro O Mulato, Um Obstáculo Epistemológico, que discute o papel do mulato na

sociedade e apresenta a barreira epistemológica que este representa, sendo um dos

principais trabalhos sociológicos que discutem o conceito de raça no Brasil.

Eduardo de Oliveira e Oliveira acreditava que as relações raciais são por

definições relações de coerção, podendo ser ou não relações antagônicas. Contudo,

apresentam sempre oposições polares, “preponderantemente entre negros e brancos,

substituindo uma epidemia social que as regulamenta” (OLIVEIRA e OLIVEIRA, texto

não publicado).

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Para uma melhor compreensão dos problemas raciais no Brasil, Eduardo buscou

em um contexto histórico-social a gêneses dos mesmos. Para tanto, reportou ao regime

escravocrata, onde pensava o negro em dois níveis de consciência1:

1 – a consciência de escravo: “que assim entendemos, por ocasião da

degradação do regime servil, na década de 1880, quando o movimento abolicionista

ganha sua feição revolucionaria. Quando a agitação abolicionista tinha atingido as

câmeras populares e as próprias senzalas, conferindo aos escravos, nos derradeiros anos

de existência do regime, uma ação decisiva no solapamento da ordem vigente.”

(OLIVEIRA e OLIVEIRA, texto não publicado).

2- a consciência de liberto: “quando os negros procuram fugir às marcas que

possa identificá-lo socialmente com o trabalho servil. De um lado essa conjuntura os

proporcionava uma atitude de relação latente à associação entre a cor da pele a situação

social degradante, e de outro sublimava a excelência dos valores da camada racial

dominante, na medida em que as transformava em símbolos de dignidade e de

independência.” (OLIVEIRA e OLIVEIRA, texto não publicado).

No primeiro momento, a consciência de escravo, o negro era entendido para

sociedade da época segundo Oliveira e Oliveira como um objeto, resultado de um

processo de coisificação. No segundo momento, a consciência de liberto, já sujeito, mas

cuja ação é totalmente moldada a partir do exterior, e a insatisfação manifesta-se contra

a ordem social, não encontrando meios de expressão, sendo muitas vezes obrigados a

abandonar sua ancestralidade.

As obras deixadas por Eduardo de Oliveira e Oliveira fornecem subsídios para

entender o processo de degradação da humanidade dos ex-escravizados e de seus

descendentes, sendo peças importantes para entender as relações étnico-raciais no

Brasil.

Durante toda sua vida Eduardo foi profundamente discriminado, como afirma

Thereza Santos (2008, p. 90) “por negros e brancos, por brancos porque ele era negro e

por negros por causa da sua opção sexual”.

Alguns anos após a sua morte é concedida a guarda de materiais que

pertenceram a Eduardo de Oliveira e Oliveira à Unidade Especial de Informação e

Memória da UFSCar, constituindo uma coleção com cerca de 510 livros, de autoria

1 Eduardo de Oliveira e Oliveira – Projeto de Pesquisa tendo em vista a Dissertação de Mestrado

Ideologia Racial – Estudo de relações Raciais.

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própria e de outros autores, bem como figuras e imagens, arquivos audiovisuais, teses e

separatas, constituindo um total de 2200 documentos que representam a vida de um

intelectual, bem como o seu engajamento com o Movimento Negro.

A Coleção Professor Eduardo de Oliveira e Oliveira faz parte dos acervos de

militantes do Movimento Negro, doados ao Núcleo de Estudo Afrobrasileiro/UFSCar e

acervados na Unidade Especial de Informação e Memória.

Criada em 1997 a Unidade Especial de Informação e Memória (UEIM) é

vinculada ao Centro de Educação e Ciências Humanas da UFSCar e origina-se da

reestruturação do Arquivo de História Contemporânea (AHC) desse Centro. Trata-se de

um fundo documental privado constituído de documentos de naturezas diversas,

contendo inestimáveis documentos e informações sobre História, além de retratar

aspectos particulares e públicos de alguns intelectuais brasileiros.

Os documentos da Coleção Prof. Eduardo de Oliveira e Oliveira não registra

somente a história pessoal, mas tudo aquilo que atravessou a vida do pesquisador, sendo

um retrato social. Nesse sentido, convêm ressaltar que os indivíduos se constituem pelas

suas histórias, fluxos, por aquilo que fazem com eles, e aquilo que fazemos com aquilo

que nos fazem, portanto, somos muitas coisas a todo o tempo (ABRAMOWICZ, 2006,

p. 38).

Buscar potencialidades pedagógicas para a educação das relações étnico-raciais

nas imagens da Coleção Professor Eduardo de Oliveira e Oliveira é uma forma de

valorizar a história e cultura da população negra, garantindo o estudo e a divulgação da

participação de africanos e de seus descendentes na construção do Brasil (BRASIL,

2004, p. 22).

Permitindo conhecer a história dos negros a partir do olhar de um militante

negro, que dedicou a sua vida as questões relativas ao processo de degradação da

humanidade dos escravizados e de seus descendentes.

Para Chartier (1991, p.185) apresentar o olhar de um sujeito em relação ao

mundo é um modo de exibir uma maneira própria de ser no mundo, marcando de modo

visível e perpétuo a existência do grupo, da comunidade ou da classe que o sujeito

pertence.

Eduardo de Oliveira e Oliveira deixa um legado documental de denúncia e

combate a discriminação da população negra na sociedade brasileira, apresentando a

16

“situação do negro no Brasil como um problema político que só politicamente poderá

ser resolvido (OLIVEIRA e OLIVEIRA, 1971, p.02)”.

Um dos grandes desafios para Eduardo era a inserção de negros em instâncias de

decisão da sociedade, e construções de políticas públicas a partir daquilo que os negros

concebiam como sendo importante para a sua comunidade.

Eduardo fazia parte de um Movimento Negro que possui forte identificação

como lideranças negras internacionais, tais como Malcon X, Martin Luther King, em

seus trabalhos vemos fortemente a presença de conceitos desenvolvidos por estas

lideranças.

É neste quadro de luta que Eduardo constrói sua trajetória enquanto intelectual

na sociedade brasileira, denunciando quando necessário, e construindo conceitos que

nos ajuda atualmente a entendemos à posição de um negro na sociedade brasileira,

fornecendo subsídios para o fortalecimento do pertencimento étnico-racial e para

edificação de lutas políticas.

17

Capítulo II - Educação das Relações Etnicorraciais: um olhar para além

do único.

Historicamente as instituições escolares e algumas pesquisas relativas a estas

instituições vêm se ausentando de reflexões sobre a educação e as relações étnico-

raciais (CAVALLEIRO, 2005).

O silenciamento da escola em relação a preconceitos contra determinados grupos

étnico-raciais é um dos elementos que contribui para a construção de um olhar único,

muitas vezes voltado a um aspecto sociocultural europeu branco2, pregando no sentido

etnicorracial uma educação formal de embranquecimento.

O sistema educacional [brasileiro] é usado como aparelhamento

ideológico de controle nas estruturas de discriminação cultural.

[...] Onde e quando a história da África, o desenvolvimento de

sua cultura e civilização, as características, do seu povo, foram

ou são ensinadas nas escolas? Quando há alguma referencia ao

africano ou negro, é no sentido do afastamento e da alienação da

identidade negra. (NASCIMENTO apud SANTOS 2005, p. 23).

Os sistemas educacionais se pautam em uma ideologia racial que faz da brancura

o “sujeito universal e essencial”, associando a uma situação de privilégios que

desacredita na presença da austeridade de sua posição e por isso mesmo é incapaz que

compreender a experiência do outro (ROSSATO & GESSER, 2001, p. 11). Tornando o

padrão branco sinônimo de pureza artística, nobreza estética, majestade moral,

sabedoria cientifica.

A partir desse aparelho ideológico, muitas ações pedagógicas acionam

mecanismos de poder que fixam um modelo de sociedade e punem todos aqueles que

dele desviam, mutilando a particularidade cultural de diversos segmentos da população

negra (ABRAMOWICZ & OLIVEIRA, 2006, p. 47).

Neste contexto milhares de crianças diariamente vivenciam práticas racistas e

discriminatórias nas diversas instituições escolares, as quais contribuem para que

2 Essa forma de educar se organiza tomando como referencial privilegiado as culturas européias,

atribuindo-lhe sempre o protagonismo na história geral da humanidade, em detrimento das

civilizações não européias, esse pensamento pode ser denominado de Eurocentrismo (Silva,

2005, p. 121)

18

diferenças fenotípicas sejam entendidas como pressupostos naturais das desigualdades

sociais.

Para Cavalleiro (2005), o racismo cotidiano não só impede o florescimento do

potencial intelectual de milhares de mentes brilhantes nas escolas brasileiras, como

também nos embrutece ao longo de nossas vidas, impedindo de sermos seres realmente

livres.

O racismo e as práticas discriminatórias no interior das instituições escolares

tornam elementos de coerção e neutralização de diferentes vozes, entre ela as negras,

tendo como objetivo central construir uma única perspectiva de mundo, embebida em

uma visão eurocêntrica branca, desvalorizando e ignorando as outras: a indígena, a

africana e asiática.

Entretanto, esta forma de educar-se pautada na desvalorização do outra e na

negação da diferença não é concebida por todos os homens e mulheres do mundo,

existindo paralelamente uma luta constante para que se desconstruam esses processos de

ensino e aprendizagem e (re)construam novas formas de ensinar e aprender no cotidiano

escolar.

A luta ao longo do século XX do Movimento Negro pela construção da

educação das relações etnicorracias, e por mudanças na educação escolar pode ser

tomada como um exemplo de reivindicações para a transformação dessa forma de

educar-se.

O Movimento Negro através das suas reinvidicações apresenta novas propostas

para se ensinar e aprender, desarticulando a visão unitária (eurocêntrica) estabelecida

dentro dos currículos, e também possibilite a construção do respeito e valorização de

todas as raízes culturais que constituem a nação brasileira.

Essa luta não se trata de uma discussão partidária ou de modismo educacional,

antes, é uma postura ética daqueles que se dispões a trabalhar ao encontro das

diferenças existentes no interior das escolas (GOMES, 2006). Não tratando somente de

oferecer aprendizagem a negros indígenas ou marginalizados, mas sim a todos aqueles

que estiverem dispostos a trocar conhecimento e quebrar desconfianças (BRASIL,

2004).

As ações e reivindicações do Movimento Negro têm o propósito de promover

oportunidades de educação que permita a criação de condições do exercício pleno da

cidadania (GONÇALVES & SILVA, 2000). Cidadania que requer o conhecimento, o

19

respeito e a valorização de todas as raízes culturais que constituem a nação (MORAIS;

OLIVEIRA; SILVA, 2008, p. 33).

Segundo Rodrigues (2006), a luta do Movimento Negro por mudanças nas

formas de ensinar e aprender dentro das escolas acontece a partir da compreensão da

educação como base sobre a qual se estrutura a forma de pensar e agir de um povo. Esta

compreensão foi se construindo a partir dos anos 1930 quando a educação escolar

passou a ser compreendida como sinônimo de instrução, que proporcionaria fornecer

instrumentos para a promoção das demandas da população negra e contribuir para o

combate às desigualdades sociais e raciais (CAVALHEIRO, 2006, p. 17).

Ao reivindicar o reconhecimento da cultura, da política e da história da

população negra para os sistemas de ensino, o Movimento Negro faz críticas ao

currículo escolar – entendido como uma atividade política que pode ser visto em dois

sentidos: em uma ação e em um efeito, não se restringindo somente a idéias e

abstrações, mas a experiências e práticas concretas construídas por sujeitos (GOMES,

2006, p. 31).

Como resultado dessa luta é aprovado a Lei 10639/2003, que alterou a Lei de

Diretrizes e Bases da Educação Brasileira (LDB) - 9394/1996 nos artigos 26-A e 79-B,

tornando obrigatório o ensino de História e Cultura Afro-brasileira e Africana no

currículo oficial da educação básica e incluindo no calendário escolar o dia 20 de

novembro como “Dia Nacional da Consciência Negra”.

O objetivo central dessa lei é corrigir desigualdades educacionais e garantir o

reconhecimento do valor da história e da cultura dos diferentes povos que constituem a

nação brasileira (MORAIS; OLIVEIRA; SILVA, 2008, p. 33). Abandonado o

ocultamento da diversidade no Brasil, que tem cultivado entre indígenas, negros e

empobrecidos o sentido de não pertencimento à sociedade, ocasionando uma distorção

das relações étnico-raciais, pregando uma democracia racial em uma sociedade em que

não se vê as diferenças (SILVA, 2007).

A fim de estabelecer o cumprimento da Lei 10.639/2003, o Conselho de

Educação se manifesta, estabelecendo as Diretrizes Curriculares Nacionais para a

Educação das Relações Etnicorracias e para o Ensino de História e Cultura Africana e

Afro-Brasileira, através da aprovação do parecer CNE 003/2004 e sua Resolução

01/2004.

20

Como destaca o parecer CNE 003/2004 as Diretrizes Curriculares Nacionais

para a Educação das Relações Etnicorracias e para o Ensino de História e Cultura

Africana e Afro-Brasileira, trata-se de uma “política curricular fundada em dimensões

históricas, culturais, sociais e antropológicas oriundas da realidade brasileira, e busca

combater o racismo e as discriminações que atingem particularmente os negros”

(BRASIL, 2004, p. 10).

Educar-se nas relações etnicorraciais é promover a reeducação das relações entre

negros e não negros, emergindo as dores e medos que têm sido geradas pelos processos

de opressão existentes na sociedade (BRASIL, 2004, p.14), proporcionando uma

formação de cidadãos e cidadãs empenhados em promover mudanças sociais e que

lutem por igualdade no exercício dos direitos próprios a diferentes pertencimentos

étnico-raciais (SILVA, 2007, p. 490).

Compreendendo o conceito raça no termo educação das relações etnicorraciais

com:

uma construção social forjada nas tensas relações entre brancos e

negros, muitas vezes simuladas como harmoniosas, nada tendo a ver

com o conceito biológico de raça cunhado no século XVIII e hoje

sobejamente superado. Cabe esclarecer que o termo raça é utilizado

com freqüência nas relações sociais brasileiras, para informar como

determinadas características físicas, como cor de pele, tipo de cabelo,

entre outras, influenciam, interferem e até mesmo determinam o

destino e o lugar social dos sujeitos no interior da sociedade brasileira

(BRASIL, 2004, p. 14).

E o conceito etnia:

serve para marcar que essas relações tensas devidas a diferenças na

cor da pele e traços fisionômicos o são também devido à raiz cultural

plantada na ancestralidade africana, que difere em visão de mundo,

valores e princípios das de origem indígena, européia e asiática

(BRASIL, 2004, p. 14).

A educação das relações étnico-raciais se fundamenta como uma política de

reconhecimento que “requer adoções de políticas educacionais que valorizem a

diversidade, a fim de superar as desigualdades etnicorracias presentes na sociedade”

(BRASIL, 2004, p. 11), bem como de reparação para a educação dos negros, “buscando

a valorização do patrimônio histórico-cultural afro-brasileiro, de aquisição das

competências e dos conhecimentos tidos como indispensáveis para continuidade nos

estudos” (BRASIL, 2004, p. 11).

21

O conjunto de ações voltadas para o reconhecimento e reparação pode ser

entendido como uma política de ações afirmativas que visa corrigir desigualdades

raciais e sociais, “orientada para oferecer tratamento diferenciado com vista a corrigir

desvantagens e marginalizações criadas e mantidas por estruturas sociais excludentes e

discriminatórias” (BRASIL, 2004, p. 12).

Como se vê, é complexa, mas não pode ser tomada como impossível a tarefa de

educar para/na educação das relações etnicorraciais, construírem-na é proporcionar a

“edificação” de um olhar para além do único, é possibilitar a abertura para diferentes

encontros ao movimento do pensamento. A escola a partir dessa perspectiva deixa de

sancionar o correto o hegemônico o transcendental para possibilitar linhas de fungas

para diferentes percepções de mundo e construções dos conhecimentos (PELBART,

2005).

Isto possibilita emergir o pensamento africano não a partir de estereótipos

construídos socialmente, mas sim de “maneira própria dos negros se porem no mundo

ao receber o mundo em si” (SILVA, 2005, p. 06).

Trata-se de trazer procedimentos e pensamentos que orientem a produção de

conhecimento, oriundos de valores e princípios próprios da matriz africana,

apresentando não somente uma mentalidade “europeu-branco” para entender os

fenômenos, rompendo com a compreensão de homogeneidade do conhecimento

(SILVA, 2005, p. 33).

Neste sentido parte da história do Brasil forçada ao esquecimento nas senzalas,

em quilombos, terreiros e memórias individuais de negros ganham força e se

estabelecem como parte do currículo oficial das redes de ensino, produzindo percepções

múltiplas de fatos antes concebidos a partir de uma perspectiva homogênea.

A transformação dos pensamentos negros em conteúdos programáticos do

currículo promove remoção de um passado construído sobre práticas de dominação e de

exclusão, e cria-se força de emancipação, entendida como um instrumento para a

construção de uma identidade e de um pertencimento étnico-racial positivo (BARBOSA

& SILVA, 1997).

A escola se torna assim um espaço privilegiado para o encontro com as

diferenças, produzindo não um padrão único de aluno, de currículo e de práticas

pedagógicas, tornando as diferenças um triunfo a ser explorado por sua riqueza e

possibilidade de troca de conhecimento (GOMES, 2003, p 117).

22

Impelindo ações positivas e democráticas entre diferentes grupos étnico-raciais,

não se tratando de reafirmar o mito da democracia racial, mas sim construir espaços

para que possibilite a construção de um olhar para a diferença, em que o

reconhecimento da inestimável contribuição dos negros à nação brasileira seja tangível,

desarticulando e desconstruindo o racismo que vem causando ao longo de cinco séculos

prejuízos inestimáveis (SILVA, 2008).

Enegrecer a educação com pensamento de base teórica africana é possibilitar

garantir o respeito e valorização de um povo cuja ancestralidade foi negada e conduzida

a um status de (sub)cultura por um sistema de poder ligadas a exploração e exclusão

(SHUJJA & SILVA, 2005).

Não se trata de reduzir somente o ensino a questões estruturais da sociedade ou

manifestações culturais pontuais, tais como: canção, comida típicas, indumentárias, mas

sim de incorporar no ensino o conjunto de valores culturais do mundo africano, tal

como se exprime na vida, nas instituições e nas obras dos negros.

Neste sentido, como apresenta Silva (2007, p.501.), é esperado que o jeito de ser,

viver, pensar de diferentes grupos etnicorraciais sejam respeitados e incluídos nas

atividades de ensino, não significando que se descuide ou fragilize a aprendizagem de

conhecimentos específicos das ciências, objeto central em todos os níveis de ensino. Ao

contrário, a meta é completar tais aprendizagens, promovendo juntamente com o estudo

das contribuições européia para a humanidade, as africanas, indígenas, entre outras.

Como apresentado no Parecer CNE/CP 003/2004(p. 20-1), a educação das

relações étnico-racial deve promover oportunidades em que ponham em comunicação

diferentes sistemas simbólicos e estruturas conceituais, buscando formas de convivência

respeitosa, construindo um projeto de sociedade em que todos sejam encorajados a

expor, defender sua especificidade étnico-racial e a buscar garantias para que ninguém

deixe de fazê-lo.

Para construção deste ensino o Parecer CNE/CP 003/2004, propõe princípios

que as instituições de ensino e os professores devem usar como referência ao planejar e

conduzir ações para a educação das relações étnico-raciais:

O primeiro princípio refere a “consciência política e histórica da diversidade”,

entendida como condutores para uma

23

igualdade básica de pessoa humana como sujeito de direitos; à

compreensão de que a sociedade é formada por pessoas que

pertencem grupos etnicorraciais distintos, que possuem cultura e

história próprias, igualmente valorizadas e que em conjunto

constroem, na nação brasileira, sua história; ao conhecimento e à

valorização da história dos povos africanos e da cultura afro-

brasileira na construção histórica e cultural brasileira; à

superação da indiferença, injustiça e desqualificação com que os

negros, os povos indígenas e também as classes populares às

quais os negros, no geral pertencem, são comumente tratados

[...] (BRASIL, 2004, p. 18-19).

O segundo princípio constitui o “fortalecimento de identidades e de direitos”,

nos orienta para

o desencadeamento de processo de afirmação de identidades, de

historicidade negada ou distorcida; o rompimento com imagens

negativas forjadas por diferentes meios de comunicação, contra

os negros e os povos indígenas; os esclarecimentos a respeito de

equívocos quanto a uma identidade humana universal; o

combate à privação e violação de direitos; a ampliação do

acesso a informações sobre a diversidade da nação brasileira e

sobre a recriação das identidades, provocada por relações

etnicorraciais; as excelentes condições de formação e de

instrução que precisam ser oferecidas, nos diferentes níveis e

modalidades de ensino, em todos os estabelecimentos, inclusive

os localizados nas chamadas periferias urbanas e nas zonas

rurais (BRASIL, 2004, p. 19).

O terceiro princípio é “ação educativa de combate ao racismo e a discriminação”

compreendido como

a conexão dos objetivos, estratégias de ensino e atividades com

a experiência de vida dos alunos e professores, valorizando

aprendizagens vinculadas às suas relações com pessoas negras,

brancas, mestiças, assim como as vinculadas às relações entre

negros, indígenas e brancas no conjunto da sociedade; a crítica

pelos coordenadores pedagógicos, orientadores educacionais,

professores, das representações dos negros e de outras minorias

nos textos, materiais didáticos, bem como providências para

corrigi-las; condições para professores e alunos pensarem,

decidirem, agirem, assumindo responsabilidade por relações

etnicorraciais positivas, enfrentando e superando discordâncias,

conflitos, contestações, valorizando os contrastes das diferenças;

valorização da oralidade, da corporeidade e da arte, por

exemplo, como a dança, marcas da cultura de raiz africana, ao

lado da escrita e da leitura; educação patrimonial, aprendizado a

24

partir do patrimônio cultural afro-brasileiro, o cuidado para que

se dê um sentido construtivo à participação dos diferentes

grupos sociais, étnico-raciais na construção da nação brasileira,

aos elos culturais e históricos entre diferentes grupos étnico-

raciais, às alianças sociais; participação de grupos do

Movimento Negro, e de grupos culturais negros, bem como da

comunidade em que se insere a escola, sob a coordenação dos

professores, na elaboração de projetos político-pedagógicos que

contemplem a diversidade étnico-racial (BRASIL, 2004, p. 19-

20).

A finalidade destes princípios é que os descendentes de africanos, assim como

todos os cidadãos brasileiros, tenham valorizado a sua identidade étnico-racial, e

construam através da educação para/das relações etnicorracias um olhar pautado na

diferença.

A construção do olhar para diferença não deve ser estabelecida dentro da lógica

da tolerância neoliberal, mas sim ser produzido através da recusa da homogeneização,

que ocorrer nos dispositivo que montamos quando nos subordinamos a um modelo

único, ou a uma dimensão predominante (PELBART, 1993, p. 23).

Como destaca Gusmão (1999, p. 50) a escola como um espaço de transformação

ao encontro das diferenças étnico-raciais deve questionar a validade e a legitimidade do

modelo que é tomado como único no interior da cultura da qual somos herdeiro.

É importante destacar, como ressalta Silva (2009, p. 45) que não se tratar de

leviana rejeição a pensamentos alheios ao mundo africano, tampouco de mera mudança

de pontos de vista ou de referências teóricas usualmente empregadas, mas de premência

por nova mentalidade, imprescindível para que se compreendam ou expliquem

processos educativos vivenciados pelos negros. O propósito é romper com significados

produzidos em perspectivas eurocêntricas e que têm sido adversos a africanos e

afrodescendentes, por instigá-los a se submeter a interesses e pensamentos que se

pretendem universais.

Desta forma, para se obtiver êxito, a escola e seus professores não podem

improvisar, temos que desfazer de mentalidades racistas, superando o etnocentrismo

europeu, reestruturando relações étnico-raciais e sociais (BRASIL, 2004, p.15).

A educação para/das relações étnico-raciais rompe com a idéia de sistema de

ensino pautado no único, contudo, “não pode ficar reduzida a palavras e a raciocínios

desvinculados da experiência de ser inferiorizados vividos pelos negros, tampouco das

25

baixas classificações que lhe são atribuídas nas escalas de desigualdade social,

econômicas educativas e política (BRASIL, 2004, p.15)”.

Educar-se nas/para as relações étnico-raciais é propiciar a criação de espaço de

fortalecimento do pertencimento étnico-racial de negros e também dos não-negros,

dando subsídios para lutar contra desigualdades e opressões, promovendo o

reconhecimento da história e cultura de todos os povos.

26

Capítulo III - Potencialidades Pedagógicas para a Educação das

Relações Etnicorracial.

Construir materiais de ensino que possibilite a percepção da heterogeneidade

étnico-racial e edifiquem uma educação positiva em relação às relações étnico-raciais é

um desafio para educadores, estabelecimentos de ensino e editoras.

Na contemporaneidade ainda vemos nos livros didáticos uma organização de

conteúdos que não permitem ao negro ter visibilidade enquanto sujeito do processo

histórico nacional, mantendo a população negra confinada a determinadas temáticas que

reafirmam o lugar social a qual ela está limitada (OLIVEIRA, 2000, p. 127).

A não representação dos negros no livro didático, ou a representação deste em

situação social inferior a dos brancos são elementos simbólicos que contribuem para a

manutenção da visão unitária do mundo embebidas no padrão europeu branco

(NEGRÃO, 1988, p. 53).

Um dos primeiros passos para a construção de materiais de ensino que forneçam

subsídios para a edificação positiva da educação das relações étnico-raciais é o

rompimento com as amaras do padrão etnocêntrico. Proporcionado uma expansão da

nossa capacidade de pensar para além do que nos é ensinado como único, incorporando

processos de resistências negras, produções culturais negras, modos de ser e viver dos

negros /as, e de outros grupos étnico-raciais inferiorizados.

Há inúmeros meios para se construir esses materiais de ensino para a educação

das relações étnico-raciais, para OLIVEIRA (2009, p. 48) estes meios passam pelas

mudanças nas práticas pedagógicas, nas políticas públicas municipais, estaduais,

federais, nos projetos políticos pedagógicos das instituições de ensino.

Quando pensamos o processo de construção de materias de ensino que

possibilite a educação das relações etnicorraciais devemos buscar potencialidades

pedagógicas que contribuiria para o combate ao racismo e a discriminação racial, bem

como favorecesse a construção de um pertencimento étnico-racial positivos de negros e

não negros.

As potencialidades pedagógicas podem ser entendidas como capazes de gerar

aprendizagens que permitiriam a conexão da experiência vivida no dia a dia com aquela

que o material explicita, desencadeando ações para aprender-ensinar-aprender.

Materias com potencialidades pedagógicas seriam aqueles que gerariam:

27

[...] aprendizagens significativas para a vida dos membros envolvidos

nos processo de ensino e de aprendizagem, expressando visões de

mundo, que incentivem a produção de conhecimento, mostrem

capacidade de realização, despertem reflexões, organizem

pensamentos, resolvam problemas, ajudem a fortalecer o sentimento

de perecimento étnico-racial (OLIVEIRA, 2009).

As potencialidades pedagógicas para a educação das relações étnico-raciais,

presentes nos matérias, serviriam como elementos aos professores (as) e educadores

(as), para a construção, discussão e (re) significação dos seus processos de ensino

(MARCON, 2005, p.12).

As utilizações de materias com potencialidade pedagógica para a educação das

relações étnico-raciais possibilitaria a construção de um olhar para com a diferença

étnico-racial, permitindo a tomada de consciência do mundo, das coisas, das pessoas,

das relações que entre elas se estabelecem, e assim tomar consciência de si próprio.

Estas potencialidades pedagógicas podem ser encontradas em diversos

materiais, não existindo um material exclusivo que as tenham, da mesma forma que não

existe uma maneira única de utilizá-las didaticamente. Entanto, nesse trabalho de

conclusão de curso será explorado o potencial pedagógico em imagens.

Contudo, as identificações destas potencialidades pedagógicas sempre terão

como guia os princípios da educação das relações étnico-raciais, conforme estabelecido

no Parecer CNE/CP 03/2004: “consciência política e histórica da diversidade;

fortalecimento de identidades e de direitos; ações educativas de combate ao racismo e a

discriminações” (BRASIL, 2004, p. 18-19).

Imagens: potencialidades pedagógicas para a educação das relações

etnicorracial.

Em geral as imagens são elaboradas para funcionar como jogo de espelhos,

como se fosse um reflexo imediato da realidade, suscitando a ilusão da própria

realidade. As imagens como apresenta Diniz (2001, p.115) não são dados, meras

evidências indiciárias, mas construções imaginativas, simbolizações construídas

historicamente e socialmente.

28

Dentro da tradição livresca as imagens sempre se viram relegadas à condição de

ilustrações dos textos e “apêndices” das histórias, servindo somente como signo que

possibilitava visualizar aquilo que estava descrito nas linhas dos livros ou nas páginas

de um jornal (BITTENCOURT, 1997, p.69).

Para Pierre Francasatel (1973) o papel de ilustração que a imagem desenvolve

dentro da tradição livresca não faz sentido, pois o documento iconográfico é tão

importante quanto à literatura. Como apresenta durante sua obra “A realidade

figurativa” tanto a imagem como a literatura são transmissores de crenças, sentidos e

percepções do mundo, existindo um pensamento plástico como existe um pensamento

matemático ou um pensamento lingüístico; o que se tem dificuldade é de se entender

esta forma de pensar.

Ao pensar as imagens através dos conceitos relativos à linguagem verbal,

acabamos por descrevê-las, falar da imagem, mas jamais revelar a sua matéria visual.

Para Souza (1998) “uma imagem não vale mil palavras, ou outro número qualquer”, as

palavras não podem ser a moeda de troca das imagens, pois é a sua visualidade que

permite a sua existência.

As imagens são expressões do imaginário, uma linguagem e um discurso, se

expandindo não como mero instrumento supletivo da linguagem falada ou escrita, mas

como discurso visual dotado de vida e legitimidade própria, devendo ser pensada por

meio dos seus próprios instrumentos (MARTINS, 2009, p.30).

Através dos estudos desenvolvidos por Kossoy (2007), Munguel (1996), Diniz

(2001) conseguimos começar a desvendar o modo de pensar plasticamente e a perceber

a importância dos documentos iconográficos, impelindo nestes a percepção de suas

potencialidades enquanto instrumento para se perceber fatos da história, manifestações

culturais ou características socialmente construídas.

A iconografia através dessa percepção se torna um instrumento que possibilita

revelar fragmentos de fatos, sentidos, conhecimentos, interpretações da vida, alegrias e

sofrimentos, transmitindo um conhecimento aparente, pois como apresenta Kossoy

(2007, p.31) as imagens guardam em si apenas indícios, a face externa de uma realidade

que é necessária desvendar.

A imagem é, portanto, indiciaria, na medida em que possibilita a descoberta de

“pistas de eventos não diretamente experimentáveis pelo observados”, mas que

acrescida de informações geográficas, históricas, antropológicas e sociais carregasse de

29

sentido apresentando um conjunto de informações ao observador (KOSSOY, 2007,

p.41).

a imagem significa, ao mesmo tempo, o olhar do criador e o olho do

espectador, e a interpretação é o resultante desta interdependência, ou

desta ambigüidade de olhares, associada ou não a um terceiro olhar

que busca compreender os mecanismos sociais que desconstroem e

reconstroem as informações transmitidas pelo intercruzamento dos

diversos olhares (DINIZ apud KOURY, 2001, p. 114).

As imagens dentro deste contexto possuem potencialidades pedagógicas,

transmitindo sentidos, sendo um importante documento cujo conteúdo é “ao mesmo

tempo revelador de informação e detonador de emoções” (KOSSOY, 2001, p. 28).

Falar das imagens como um meio que potencializam aprendizagens não e tarefa

fácil, pois como salientado anteriormente e como afirma Jovino, Silveira, Simião apud

Lima (2010, p. 16) “a escrita sempre foi colocada como a mais cientifica, mas

filosófica, mais verdadeiras” e conseqüentemente as imagens sempre foram

identificadas como mais ilusórias ou imediatas.

Isso se deve como salienta Kossoy (2001, p. 30) a ordem cultural, pois temos um

aprisionamento multissecular à tradição escrita como forma de transmissão do saber,

nossa herança livresca predomina com meio de comunicação e transmissão de

conhecimento cientifico, ligando às imagens a condição de ilustrações.

Contudo, a idéia de imagem ligada somente a “ilustração” não é o foco deste

trabalho, pois, tomo “as imagens enquanto elementos de linguagem que possibilitam

revelar a quem vê: fatos, sentidos, conhecimentos, interpretações da vida

(CONCEIÇÃO & SILVA, 2004)”.

As imagens para o campo da educação das relações étnico-raciais são grandes

elementos “potencializadores” de aprendizagens, pois permitiriam a conexão da

experiência vivida no dia a dia com aquela que o material explicita, desencadeando

ações para aprender-ensinar-aprender.

Ao olhar uma imagem são despertados sentimentos profundos de afetos, ódio ou

nostalgia; elas nos dizem respeito e nos mostra como éramos, como somos, nos levando

30

a uma viagem ao encontro de lugares, épocas e personagens distintos (KOSSOY, 2001,

p.106).

As imagens desencadear lembranças, possibilitando a criação do que Conceição

& Silva apud Jeudy (2004, p. 07) designa como “memória coletiva, partilhável e

necessária à pluralidade e à convergência de experiências de vida daqueles alijados, até

então, da história oficial”.

A iconografia se constitui como um testemunho da memória, permitindo retornar

traços originais de significações vividas, constituindo-se como um lugar de memória, o

que Conceição & Silva apud Nora (2004, p. 10) define como registros que restaram do

passado, revelando um mundo não mais habitado pelos que rememoram, mas cuja

lembrança reconstruída faz a passagem de um registro silencioso para um registro

crítico, fazendo ligações do já passado e vivido com o que está atualmente sendo vivido.

As expressões sociais das imagens se configuram enquanto autos no processo

histórico, demonstrando sua significação política latente, apresentando facetas externas

da história que não se mostram, mas que podemos aprender a desvendar (BENJAMIN,

1994; KOSSOY, 2007).

Como apresentado por Kossoy (2007), as imagens reúnem uma série de

elementos que fornecem informações, sendo de natureza formal e cultural. Os de

natureza formal dizem respeito ao aspecto da técnica de construção da imagem, ao

passo que os de natureza cultural se referem ao tema representado, sendo seus

elementos, ícones: o espaço e o tempo no interior de um tempo histórico.

A natureza cultural das imagens explicita a necessidade de acrescentar

elementos externos para sua análise, pois as imagens só adquirem sentido na medida em

que se tenham somatórios de outras informações de naturezas distintas.

A partir dessa perspectiva, para selecionarmos potencialidades pedagógicas

presentes em imagens para a educação das relações étnico-raciais temos que estar alerta

aos princípios do Parecer CNE/CP 003/2004. Tendo “claramente” a percepção de que as

imagens devem proporcionar uma educação para uma ação que vise: “consciência

política e histórica da diversidade”, um “fortalecimento da identidade e de direitos” e

uma ação educativa de combate ao racismo e à discriminação.

As imagens que representam os negros devem ser positivas, por exemplo, exibir

relações familiares atenciosas, pais e filhos, mostrar adultos em atitudes e gestos de

amizade e de carinho, indumentárias que demonstrem serem trabalhadores alegres.

31

Contextualizando sempre as imagens das pessoas num contexto: cidade, trabalho, casa,

terreiro, igreja, baile, festa (SOUZA, 2006, p.24).

Na busca por potencialidades pedagógicas, não devemos tentar explicar o que

cada imagem representa, mas sim compreender os significados que se escondes por trás

do que ela apresenta.

Trata-se de uma busca pelo quem, que, como, quando e onde, de forma a

individualizar cada elemento, demonstrando os seus significados intrínsecos, que

comportam valores simbólicos.

É fundamental, contudo, no processo de análise não esquecermos que o homem,

ser das relações e criador das imagens, “não apenas está no mundo, mas com o mundo”.

Estar com o mundo resultar de sua abertura à realidade, que o faz ser o ente de relações

que é (FREIRE, 1981, p. 30).

Isso implica a não reduzir o papel do homem e da mulher a mera dimensão de

quem participa, possibilitando abandonar a idéia ingênua de simples espectador, a quem

não fosse permitida interferir sobre a realidade para modificá-la (FREIRE, 1981, p. 30)..

A utilização das imagens com fins didáticos deve ser acompanhada de uma

reflexão sobre o mundo, sobre sua posição no mundo, sobre seu trabalho, sobre seu

poder de transformação no mundo. Pois, toda representação visual é uma projeção

imaginativa do sujeito sobre um objeto, mesmo aquela que se pretende fundamentada

no registro do dado. Como apresenta Diniz (2001, p.115) nada escapa ao processo de

elaboração simbólica e de atribuição de significados, mesmo as imagens que perseguem

a “verdade”, ou a reprodução “fiel” da realidade, como a fotografia.

As imagens constroem enredos e cristalizam as percepções sobre o mundo

registrado, informando através dos seus arranjos simbólicos, valores crenças que

orientam as percepções de mundo (LIMA, 2004).

As figuras representadas nas imagens, sejam elas pinturas em sala de estar ou em

cavernas da história antiga, nos dizem algo sobre história, sobre a mentalidade da época

que representa, constituindo-se como uma percepção do artista para com o mundo

(CERTEAU, 1985).

Os testemunhos oferecidos pelas as imagens são de valor real, suplementando,

bem como apoiando os documentos escritos, apresentando aspectos que outras fontes

não alcançam, oferecendo-nos visões contemporâneas do mundo que retrata

(CERTEAU, 1985).

32

Isso não faz delas personagens secundárias, mas antes pelo contrário, são

elementos centrais, aglutinadoras de sentidos, concentrado em si uma potência do

pensamento, por sua vez enigmática, ambíguas, mas também podem ser metáforas

luminosas da razão (CANTINHO, 1996, p. 01).

A utilização de imagens no campo da educação das relações étnico-raciais torna-

se um elemento fecundo para a produção de novas compreensões do mundo,

confrontando os aspectos unitários da história com a realidade subjetiva daquele que

produziu a imagem.

A utilização de distintas imagens, construída por sujeitos de diferentes

pertencimentos étnico-raciais, abre a possibilidade de perceber a história e as relações

sociais de modo pluri/multi visionária, rompendo totalmente com a idéia de uma

história única.

33

Capítulo IV – Passos da Pesquisa: busca por significados

Neste capítulo apresentarei os procedimentos metodológicos de coleta, análise e

interpretação dos dados. Antes de começar a anunciação dos procedimentos, se faz

necessário ressaltar que os processos metodológicos se desenvolveram a partir da minha

percepção enquanto homem branco e estudante do curso de Licenciatura em Pedagogia

da UFSCar.

Durante o processo análise as possíveis potencialidades pedagógicas foram

pensadas em relação ao Ensino Fundamental, compreendido entre o 1° ao 9° ano, mas

isto não quer dizer que outros educadores não possam perceber outras potencialidades

pedagógicas para outros níveis de ensino.

Para Kassoy (2007) as “leituras” das imagens permitem diferentes interpretações

em função do próprio repertório de informações e de conhecimentos do observador, de

seus preconceitos, de suas convicções morais, éticas, religiosas, de sua situação

socioeconômica, possibilitando o surgir de diferentes leituras para diferentes receptores

que as apreciem.

Como foi apresentado no primeiro capítulo, a Coleção Professor Eduardo de

Oliveira e Oliveira possui um total de 2200 documentos, destes 200 são imagens que

registram a vida dos negros na sociedade brasileira, tendo diferentes enredos

representados plasticamente nas imagens.

Para fim deste estudo selecionei as imagens do artista plástico Luiz Paulo3,

brasileiro de ascendência africana, que retratam impressões pessoais do artista em

relação à população negra, as imagens foram feitas no dia 13 de Maio de 1978 e entre

elas existem algumas que retratam manifestações referentes à data. Como destaca

Oliveira e Oliveira (1978) 4 o artista nos dá uma leitura bastante significativa do povo

negro após noventa anos de abolição jurídica no Brasil.

No mesmo ano em que Luiz Paulo produz as fotografias é fundado o Movimento

Negro Unificado contra a Discriminação Racial (MNU), que tem como objetivo o

combate e a denúncia das práticas discriminatórias e racistas. Como apresenta Silvério

(2010, p. 140) a atuação do MNU alterou a agenda política, resultando na formação de

3 Em anexo.

4 Em anexo carta escrita por Eduardo de Oliveira e Oliveira que explica a temática das imagens.

34

políticas públicas denominadas políticas de promoção da igualdade racial ou políticas

de ações afirmativas.

As fotografias de Luiz Paulo estão arquivadas coladas em folhas de papel, e

abaixo de algumas fotos se encontra citações transcritas por Eduardo de Oliveira e

Oliveira.

Durante o processo de análise será considerada as imagens em dois momentos:

um primeiro sem a legenda, apresentando os significados e potencialidades pedagógicas

presentes na expressão plástica da imagem, posteriormente se apresentará os

significados e potencialidades pedagógicas da imagem com a legenda escrita por

Eduardo de Oliveira e Oliveira, todo esse processo se desenvolverá do ponto de vista de

um pesquisador branco que luta contra as desigualdades e discriminações em relação à

população negra.

A seleção das imagens se estabeleceu segundo alguns critérios, que foram

pautados nos princípios para a educação das relações étnico-raciais presentes no Parecer

CNE/CP 003/2004; compreendendo que as imagens devem proporcionar uma educação

para uma ação que vise:

“consciência política e histórica da diversidade”, se desdobrando para:

Igualdade básica de pessoa humana como sujeito de direitos; à

compreensão de que a sociedade é formada por pessoas que

pertencem grupos étnico-raciais distintos, que possuem cultura e

história próprias, igualmente valorizadas e que em conjunto

constroem, na nação brasileira, sua história; ao conhecimento e à

valorização da história dos povos africanos e da cultura afro-

brasileira na construção histórica e cultural brasileira; à

superação da indiferença, injustiça e desqualificação com que os

negros, os povos indígenas e também as classes populares às

quais os negros, no geral pertencem, são comumente tratados

[...] (BRASIL, 2004, p. 18-19).

“fortalecimento da identidade e de direitos”, orientando para:

... o desencadeamento de processo de afirmação de identidades,

de historicidade negada ou distorcida; o rompimento com

imagens negativas forjadas por diferentes meios de

comunicação, contra os negros e os povos indígenas; os

esclarecimentos a respeito de equívocos quanto a uma

identidade humana universal; o combate à privação e violação

35

de direitos; a ampliação do acesso a informações sobre a

diversidade da nação brasileira e sobre a recriação das

identidades, provocada por relações étnico-raciais; as excelentes

condições de formação e de instrução que precisam ser

oferecidas, nos diferentes níveis e modalidades de ensino, em

todos os estabelecimentos, inclusive os localizados nas

chamadas periferias urbanas e nas zonas rurais (BRASIL, 2004,

p. 19).

“ação educativa de combate ao racismo e à discriminação”, encaminhando

para:

a conexão dos objetivos, estratégias de ensino e atividades com

a experiência de vida dos alunos e professores, valorizando

aprendizagens vinculadas às suas relações com pessoas negras,

brancas, mestiças, assim como as vinculadas às relações entre

negros, indígenas e brancas no conjunto da sociedade; a crítica

pelos coordenadores pedagógicos, orientadores educacionais,

professores, das representações dos negros e de outras minorias

nos textos, materiais didáticos, bem como providências para

corrigi-las; [...] educação patrimonial, aprendizado a partir do

patrimônio cultural afro-brasileiro, o cuidado para que se dê um

sentido construtivo à participação dos diferentes grupos sociais,

étnico-raciais na construção da nação brasileira, aos elos

culturais e históricos entre diferentes grupos étnico-raciais, às

alianças sociais; participação de grupos do Movimento Negro, e

de grupos culturais negros, bem como da comunidade em que se

insere a escola, sob a coordenação dos professores, na

elaboração de projetos político-pedagógicos que contemplem a

diversidade étnico-racial (BRASIL, 2004, p. 19-20).

Como apresentado por Evaldo Ribeiro Oliveira (2009, p.53) e pelo Parecer

CNE/CP 003/2004, esses princípios conduzem, orientam, encaminham entendimento,

ações e proposições para sistemas de ensino, para professores e estabelecimentos de

ensino, com o objetivo de proporcionar a professores alunos, e toda a comunidade

escolar a educação das relações étnico-raciais.

As imagens selecionadas também devem representar os negros de maneira

positiva, por exemplo, exibir relações familiares atenciosas, acolhedoras entre pais,

filhos, avós, visitantes, indumentárias e instrumentos que demonstrem a sua atividade

de trabalho, nos diferentes setores da economia e em diferentes posições hierárquica.

Esta decisão se fundamentou com base nos critérios desenvolvidos para a seleção de

materiais com potencialidades para educação das relações étnico-raciais do projeto

36

Textos e Contextos do Movimento Negro Contribuições para a Introdução de História e

Cultura Africana e Afrobrasileira nas escolas, encerrado em abril de 2007.

É necessário destacar que durante o processo de seleção das imagens houve

também uma preocupação para que todas as fotos selecionadas representassem pessoas

negras em um contexto, por exemplo: em uma cidade, no trabalho, em casa, no terreiro,

na igreja, no baile, na festa. A preocupação se coloca, pois, as imagens

descontextualizadas, poderiam reforçar a idéia que muitos têm de que os negros não têm

raízes, não tem referencia.

Para analisar as imagens tomou-se princípio por princípio do Parecer CNE/CP

003/2004, buscando as expressões plásticas que contribuiriam para a formação na

perspectiva do princípio. Para a organização das análises das imagens selecionadas

foram confeccionados quadros (Figura I), em que busquei identificar a relação entre os

princípios do Parecer CNE/CP 003/2004 e expressão plástica contida em cada imagem.

O quadro contém uma primeira coluna com o princípio apontado no Parecer

CNE/CP 003/2004 e seus respectivos desdobramentos, numa segunda coluna a imagem

da Coleção Professo Eduardo de Oliveira e Oliveira que apresentam significações

relativas ao princípio em tela. E em uma terceira coluna foram registrados os

significados que se depreendem na compreensão do pesquisador em relação à imagem

selecionada e, na última, as possíveis potencialidades pedagógicas.

Quadro de Análise – Imagem por Imagem

Princípio do Parecer

CNE/CP 003/2004

Imagem selecionada

da Coleção Professor

Eduardo de Oliveira e

Oliveira

Significado

Potencialidades

Pedagógicas

Figura I – quadro de análise

37

Apresentado o mapa metodológico da análise das imagens passo a exposição e

interpretações dos dados, que têm por eixo de organização a análise individual de cada

imagem.

38

Capítulo V- Potencialidades Pedagógicas em imagens da Coleção Prof.

Eduardo e Oliveira e Oliveira

Após apresentar o campo estudado, conceitos referentes à literatura e as forma

de análise, exponho neste capítulo a análise e interpretação dos dados.

A análise dos dados terá como eixo de organização a apresentação individual de

cada imagem, apresentando suas potencialidades pedagógicas para o âmbito da

educação das relações étnico-raciais.

Imagem 1:

A primeira imagem (figura 2) analisada é a de um homem negro trabalhando

aparentemente no mercado municipal de São Paulo, este traz consigo alguns elementos

do seu trabalho - caixa de madeira, formas - e aparenta estar caminhando, nos

transmitindo uma idéia de movimento, de fluidez.

Figura 2 – foto de Luiz Paulo - material pertencente à UEIM.

39

Dentro de uma escola pública, a imagem sem a citação transcrita por Eduardo de

Oliveira e Oliveira, poderia ser utilizada de forma a representar membros da

comunidade que exercem trabalhos da mesma natureza ao representado na imagem.

A utilização dessa imagem colada em murais, dentro ou foras das salas de aulas,

contribuiria para que as crianças percebessem a importância que a escola dá em relação

a todos dos tipos de trabalhos, sejam estes trabalhos temporários como “bicos”,

“biscates”, ou trabalhos considerados mais nobres como os relacionados ao âmbito da

administração.

As crianças que tenham pais, vizinhos, amigos, trabalhando nessas condições

podem construir um sentimento positivo em relação ao ambiente escolar, pois poderia

ver membros da sua família, comunidade, representados dentro da escola.

Tendo em vista os princípios do Parecer CNE/CP 003/2004 a imagem sem a

citação escrita por Eduardo contribuiria para a construção de ações educativas que

colaborariam para o “fortalecimento de identidades e de direitos”, proporcionando que

os membros envolvidos no processo e ensino construam percepções positivas em

relação ao modo que a escola vê as diferentes formas de trabalho.

Dentro de uma escola particular, e em algumas escolas públicas, para a

utilização desta imagem deve ser feito um trabalho anterior de positivação das

atividades remuneradas não considerados nobres, desenvolvidas em sua maioria por

pessoas de classe populares às quais, no geral, os negros pertencem.

Com a citação transcrita por Eduardo de Oliveira e Oliveira: “Somos escravos

libertos, mas se não há tronco nem peias, se abertas foram às cadeias, vivemos em outra

prisão...” as potencialidades pedagógicas da imagem vão ao sentido de conduzir ações

educativas que possibilitem a construção de uma “consciência política e histórica da

diversidade”.

A partir da apresentação da imagem com a legenda os professores/as poderiam

construir diálogos com os alunos em relação aos papeis desempenhados pelos negros no

mercado de trabalho, trazendo experiências dos alunos negros e não negros para a

compreensão da situação sócio-histórica do negro no Brasil.

Nesses diálogos com os alunos/as o professor/a deve tomar cuidado para que não

se reforce preconceitos e estereótipos presentes na sociedade, conduzindo sua ação

educativa para o esclarecimento de mitos, que induzem à crença de que no Brasil as

desigualdades sociais não possuem componentes raciais, pregando a igualdades de

40

Figura 3 – Foto de Luiz Paulo - material pertencente à UEIM.

oportunidades entre os diferentes pertencimentos étnico-raciais para ascensão

econômica e social.

A imagem possibilitaria que alunos/as vejam seus pais, amigos, vizinhos,

colegas representados no cotidiano escolar, e que professores/as promovam ações de

reconhecimento dos trabalhos considerados menos nobres, bem como promovam

diálogos a respeito das estruturas sociais que levam muitos negros a exercer trabalhos

considerados menos nobres.

Imagem 2:

41

Figura 3 – Foto de Luiz Paulo - material pertencente à UEIM.

A segunda imagem (Figura 3) representa uma manifestação cultural negra,

apresentando aspectos da espiritualidade africana e da história das mulheres negras no

Brasil. Na fotografia de Luiz Paulo algumas mulheres negras referenciam o monumento

da Mãe Preta do Largo do Paissandu em São Paulo.

A Mãe Preta é atualmente um dos símbolos maiores para o Movimento Negro da

respeitabilidade da mulher e da família negra, sendo uma representante das ancestrais

africanas que educaram e criaram os filhos dos “senhores”, e muitas vezes não puderam

fazer com seus próprios filhos.

A imagem com a citação transcrita por Eduardo de Oliveira e Oliveira: “estes

negros robustos e fortes/ bonitos e portentosos que tu criaste/ te parabenizam mãe

preta/porque no mundo só tu/ tiveres o cordão divino/ de ser mãe de duas raças (4°

exaltação de Bélsiva)”, possibilita perceber a importância da população negra para a

construção da nação brasileira.

Os professores/as poderiam a partir da imagem com a citação, apresentar os

papeis que as mulheres negras desempenharam no período da escravidão no Brasil,

enquanto mães, amas de leite, filhas, domesticas nas casas grandes, e alfabetizadoras

dos filhos dos senhores, demonstrando o papel fundamental da mulher negra para a

sociedade da época.

Durante a apresentação da imagem com a citação, o professor/a também poderia

apontar o papel que os homens negros desempenharam, e vem desempenhando na

construção da nação brasileira, por mais que a imagem não represente um homem negro

o educador poderia propor esta reflexão também.

Tendo em vista os princípios do Parecer CNE/CP 003/2004 a imagem com a

citação possibilitaria a construção de ações pedagógicas que contribuiriam com o

“fortalecimento de identidades e de direito”, possibilitando que crianças negras e não

negras conheçam a historicidade e importância das mulheres negra para a construção da

sociedade brasileira.

A partir da apresentação da impotência histórica da mulher negra para a

sociedade brasileira, o professor/a poderia também fazer um paralelo entre o papel que a

mulher negra desenvolveu na historia colonial do Brasil e o papel que vem

desempenhando na sociedade contemporânea, como trabalhadora, pesquisadora, mãe,

filha, etc., tomando sempre cuidado para que não se construa mais estereótipos

negativos em relação à população negra.

42

A imagem do fotografo Luiz Paulo também poderia ser utilizada sem a citação

transcrita pelo Prof. Eduardo de Oliveira e Oliveira, possibilitando que os alunos

conhecessem um pouco mais sobre a cultura africana, em que os ancestrais não somente

fundaram comunidades, mas também garantem há permanência nos tempos e nos

espaços.

O professor/a poderia apresentar a imagem, e explicar que ao reverenciarem o

monumento da Mãe Preta, as mulheres estão cultuando seus ancestrais, cultivando uma

espiritualidade que as ligam com aspectos sociais, culturais e históricos da África.

A imagem contribuiria para a construção de processos educativos em que o

respeito e o reconhecimento aos antepassados são colocados em primeiro plano,

demonstrando a importância que estes têm para construção das futuras gerações.

O respeito aos ancestrais poderia ser um dos conceitos trabalhados durante a

apresentação dessa imagem, construindo um diálogo de como os alunos vêm seus

antepassados, e a importância que dão a sua ancestralidade, procurando estreitar os

laços afetivos- históricos- sociais que ligam os alunos aos seus antepassados.

As potencialidades pedagógicas da imagem vão ao sentido da construção de

uma educação patrimonial, em que os patrimônios culturais individuais e afrobrasileiros

sejam preservados e reconhecidos como base da história nacional.

A educação patrimonial teria por uma das suas finalidades a preservação de bens

culturais imateriais, bem como de bens materiais, que contribuiriam para a preservação

da história de grupos, e da nação que pertence.

Imagens 3 e 4:

A terceira e quarta imagem (figura 5 - 6), serão analisadas em conjunto, pois

ambas retratam o mesmo momento histórico. Nessas imagens Luiz Paulo registra a

visita de integrantes do Movimento Negro ao túmulo do abolicionista José Bonifacio (O

Moço).

Figura 5 – foto de Luiz Paulo - material pertencente à UEIM.

43

Os professores/as poderiam a partir das fotografias construírem um diálogo a

respeito do processo de resistência negra no período colonial, apresentando os

abolicionistas como heróis, por terem lutado contra todo um sistema que

desqualificavam e discriminavam os negros.

A utilização dessas imagens exposta na sala de aula, ou em murais do espaço

escolar, e acrescidas de informações sobre quem foi José Bonifacio contribuiria para

que as crianças começassem a perceber que no Brasil não existe somente os heróis

proclamados pela república, mas sim muitos outros que lutaram e vem lutando em prol

da população negra.

Em todas as séries do ensino fundamental, os professores/as poderiam expor as

fotos e construir um diálogo a respeito de quem são os heróis brasileiros, o que

realmente fizeram para todos os seguimentos da população, e por quem eles lutavam?

As fotos analisadas anteriormente também poderiam ser utilizadas nessa

discussão, apresentando os homens e as mulheres negras como heróis para a nação

brasileira, ressaltando a importância do trabalho que desenvolveram no curso da

história, e que vem desenvolvendo ainda atualmente.

Este diálogo poderia contribuir para que algumas crianças comecem a perceber

que a história oficial exclui alguns seguimentos da sociedade em suas narrativas, o

professor/a a partir dessa “problematização” poderia começar a apresentar outros

seguimentos da história, seus heróis, suas narrativas, de modo a fazer um contrapondo

entre o que a história oficial profere, e o que os outros seguimentos da população dizem.

Figura 6 – foto de Luiz Paulo - material pertencente à UEIM.

44

As potencialidades pedagógicas nas fotografias de Luiz Paulo são um incentivo

a construção de processos educativos que fortalecem a história não oficial, negada e

distorcida por muitos seguimentos da sociedade.

Imagem 4:

A sexta imagem (Foto 5) que será analisada é de uma mulher negra caminhando

em uma Praça de São Paulo acompanhada de duas crianças, tomo estas crianças como

possíveis filhos da mulher, representando um núcleo familiar negro.

Esta imagem exposta nas salas de aula, ou em murais fora da sala de aula,

poderia proporcionar que crianças negras se visem representadas no ambiente escolar,

criando um sentimento de identificação entre as crianças negras e as crianças retratadas

na imagem.

Foto 5 – foto de Luiz Paulo - material pertencente à UEIM.

45

A imagem também proporcionaria que as crianças negras e não negras percebam

a mulher negra como uma representante da sua comunidade, da sua família, criando um

sentimento positivo em relação ao ambiente escolar, pois a escola proporcionaria as

crianças perceberem seus pares representados na escola, deixando de ser a escola um

ambiente tão distante da realidade dos alunos.

Nesse sentido a imagem contribuiria com o fortalecimento das identidades,

possibilitando que crianças de diferentes pertencimentos étnico-raciais se vejam

representados no ambiente escolar.

A imagem do artista plástico Luiz Paulo também poderia ser utilizada com a

citação transcrita pelo Prof. Eduardo de Oliveira e Oliveira: “Eu venho vindo, ainda não

cheguei”... mas vive aqui meu velho pensamento, que se adiantou, enquanto demorei...

“Canção Amarga, de Oswaldo Camargo.” para promover discussões sobre a situação

social da população negra no Brasil.

O professor/a poderia utilizar a imagem acompanhada da citação com os alunos

um pouco maiores (4°ao 9° ano) promovendo uma discussão de onde os negros ainda

não conseguiram chegar? Que reinvidicações os negros vem fazendo a respeito das

desigualdades sociais? Quais dessas reivindicações foram alcançadas?

E através dessa discussão proporcionar que os alunos negros expressem o que

vivenciam no seu cotidiano, e quais dificuldades que eles encontram, mas sempre

tomando cuidado para conduzir a discussão para um lado positivo, nunca permitindo

que se reforcem preconceitos, e estereótipos contra a população negra.

Tendo em vista os princípios do parecer CNE/CP 003/2004 a imagem com a

legenda contribui para a formação de uma “consciência política e histórica da

diversidade”, possibilitando “ações educativas de combate ao racismo e a

descriminação”, as quais teriam como objetivo a “problematização” da situação sócio-

histórica da população negra, e o fortalecimento das identidades dos diferentes

pertencimentos étnico-raciais.

46

Capítulo VI - Elucidações do pesquisador

Este trabalho teve como principal objetivo a busca de potencialidades

pedagógicas em imagens integrantes da Coleção Professor Eduardo de Oliveira e

Oliveira. O foco de análise centrou-se nas possibilidades de tais materiais, cuja

utilização possa vir a contribuir positivamente para a construção da educação das

relações etnicorraciais, na prática pedagógica em espaços escolares.

Nesta pesquisa, o conceito de materiais com potencialidades pedagógicas é

retirado da dissertação de Evaldo Ribeiro de Oliveira (2009), e seriam aqueles que

gerariam aprendizagens significativas para a vida dos envolvidos nos processos de

ensino e de aprendizagens em que se objetiva a construção de uma sociedade mais

equânime. É importante destacar que tais materiais devem expressar particularmente na

especificidade das relações étnico-raciais, visões de mundo de ascendência africana,

mostrarem a produção e a capacidade das pessoas negras, e ajudem a resolver

problemas.

As potencialidades pedagógicas para a educação das relações etnicorraciais,

presentes nos materiais, poderiam sirvam como elementos para professores(as) e

educadores, na construção da sua prática pedagógica, contribuindo para o

fortalecimento do pertencimento étnico de afrodescendentes e indígenas, e também

para a construção de uma educação antirracista. .

A identificação das potencialidades pedagógicas teve como guia os princípios

para a promoção da educação das relações étnico-raciais, conforme estabelecido pelo

Parecer CNE/CP3/2004: “consciência política e histórica da diversidade; fortalecimento

de identidades e de direitos; ações educativas de combate ao racismo e a

discriminações” (BRASIL, 2004, p. 18-19).

Ao final da análise dos dados podemos perceber que as imagens nos permitem

compreendermos percepções múltiplas e plurais, aqui entendidas por visões de mundo

ou cosmo visões, maneira como a pessoa identifica sua maneira etnicorracial e conduz

sua existência. Esta ação ao se construir de forma positiva permite que todas as

crianças, adolescentes e jovens se vejam representadas no ambiente escolar, e assim seja

incentivado a construir uma autoimagem positiva, valorizado o seu pertencimento

étnico-racial. Dessa forma podemos perceber que as imagens contribuiriam para que as

47

crianças negras tenham uma autoimagem valorizada e que as crianças não negras

consigam perceber a heterogeneidade étnico-racial que forma a nação brasileira.

A utilização de imagens como a selecionadas neste trabalho possibilitaria o

rompimento com as amarras do padrão etnocêntrico (europeu-branco), que

historicamente fundamenta a matriz da educação brasileira, permitindo assim, que

estudantes ao conhecerem a perspectiva de um homem negro a respeito do processo

sócio-histórico que foi submetida à população negra, possam construir outras relações

étnico-raciais, mais positivas que valorizem a contribuição histórica que esse povo deu

ao Brasil.

Múltiplas são os significados que podem ser explorados, e novos podem ser

percebidos pelos alunos negros e não-negros, entre possíveis significados estão: a

valorização do papel das mulheres negras, homens negros, e das crianças negras para a

construção da nação brasileira também pode ser um elemento, fundamental a ser

trabalhado a partir das imagens, construindo diálogos que afirmem a importância dessas

pessoas para o desenvolvimento do processo histórico da formação da nação brasileira.

A utilização destas imagens pode ser desenvolvida de inúmeras formas, não

existindo uma maneira única para seu uso, contudo deve se tomar sempre cuidado para

não reproduzir estereótipos em relação à população negra, conduzindo sempre os

procedimentos educativos, adequados no sentido da construção da educação das

relações étnico-raciais de modo positivo.

É necessário também, que os professores/as tenham um comprometimento

político a favor da afirmação das diferenças, desconstruindo em sua prática cotidiana

concepções homogeneizadas como, por exemplo, o padrão considerado ideal de

homem: com determinadas características associadas a uma estética eurocêntrica

supervalorizada em detrimento de quaisquer estéticas que não se assemelham a esta. É

importante destacar que não se trata de acrescentar conteúdos em datas específicas

criando “momentos da diversidade”, mas de trabalhar os processos educativos a partir

da perspectiva da diferença, mostrando que existem diferentes visões de mundo, e

distintas realidades sócio-culturais e históricas.

Para mim, enquanto pedagogo em formação inicial, a escolha política pela

afirmação das diferenças não é somente uma questão de modismo ou simples

convicções partidárias, mas sim o engajamento em uma luta que se estabelece contra

48

todas as formas de discriminação e pensamentos ideológicos que desqualificam as

pessoas, as comunidades, e as culturas.

Como afirma Evaldo Ribeiro de Oliveira (2009, p. 92), ao final da sua

dissertação,

A busca por potencialidades pedagógicas para a educação das

relações etnicorraciais é a busca por transformações significativas na

sociedade brasileira, principalmente no que tange a população negra,

os desfavorecidos economicamente e todos aqueles que são

desqualificados e discriminados socialmente.

A construção deste trabalho me proporcionou conhecer um pouco mais sobre a

educação das relações etnicorraciais, e o processo de discriminação vivenciado pelos

descendentes dos ex-escravizados.

O exame de diferentes documentos da Coleção Professor Eduardo de Oliveira e

Oliveira, me revelou a importância da conservação de acervos que pertenceram a

militantes negros e negras, pois, estes representam fontes históricas que nos ajudam a

compreender a construção da identidade negra no Brasil, bem como o processo de luta e

resistência da população negra em relação aos processos de discriminação e a ideologia

racial.

No processo de desenvolvimento desse trabalho também pude perceber

preconceitos que eu - homem branco de ascendência européia - possuía em relação a

alguns aspectos da cultura negra, bem como estereótipos que tinha em relação ao que é

ser negra ou negro no Brasil.

A construção desse trabalho se materializou de um processo de autoeducação

das relações etnicorraciais, sendo alguns conceitos referentes à temática novos para

mim, o que ocasionou certa dificuldade, mas nada que me impedisse de progredir na

discussão e continuar a construção desse trabalho.

Pensar a construção da educação das relações etnicorraciais, me possibilitou

começar a perceber o mundo para além da visão eurocêntrica, desconstruindo as

amarras do meu pensamento, que durante muito tempo foi ensinado que se fazer

ciência, é uma arquitetura de respostas, que devem ser buscadas na cultura e tradição

européia branca.

49

Em movimento contrário a estas formas de dominação, que deslegitima e

desumaniza os negros, devemos nós futuros profissionais da educação criar estratégias

de ensino, buscar potencialidades pedagógicas que (des)arquitetem esta forma de

pensar, possibilitando que todos os sujeitos envolvidos no processo de ensino e

aprendizagem tenham sua história, cultura, percepção do mundo reconhecida.

Educar deve se tornar um ato político (Freire, 1978), em que descriminações,

pensamentos racistas, e quaisquer formas de desumanização dos sujeitos envolvidos não

sejam percebidas como algo natural, corriqueiro, passageiro.

O ensino teria por finalidade a ampliação das percepções de mundo, de sujeito e

de realidades sócio-culturais, construindo um ambiente em que o outro não seria mais

um elemento, mas sim peça fundamental para construção da ação educativa.

Termino estas considerações com a certeza de que estas não representam o fim

desse trabalho, mas sim o início de um processo reflexivo sobre minha futura prática

docente, e o meu papel no mundo enquanto homem branco que luta contra os processos

de discriminação e desqualificação dos negros.

50

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Ano XXX, n°3, p. 489-506, set/dez. 2007.

______. Aprendizagem e Ensino das Africanidade Brasileiras. In: MUNANGA, K.

(org) Superando o Racismo na Escola. Brasília: 2005, p. 155-174.

______. Diversidade étnico-racial e currículos escolares – dilemas e possibilidades. In:

Cadernos CEDES, Campinas, n. 32, p. 25-34, 1993.

SOUZA, T. C. Discurso e Imagem:perspectivas de analise do não verba. Revista

Ciberlegenda, n°1, 1998.

______.Pesquisa e Luta por reconhecimento e cidadania.In: ABRAMOWICZ, A., SIL-

VEIRO, V. R. (org.) Afirmando Diferenças: Montando o quebra-cabeça da diversidade

na escola. Campinas: Papirus, 2005, p.27-55.

SILVERIO, V. R. Relações Etnicorraciais. IN:MISKOLCI, R. Marcas da Diferença no

Ensino Escolar, São Carlos: Edufscar, 2010, p. 115-170).

SOUZA, E. S. Contextualizando o Movimento Negro a partir da década de 1990. São

Carlos-SP: Núcleo de Estudos Afro-Brasileiros da Universidade Federal de São Carlos,

2006. (Relatório de Iniciação Científica/ período: agosto de 2005 a julho de 2006).

YOUNG, M. Para que servem as escolas? In: Educação & Sociedade. 28 n.101

Campinas set./dez. 2007 (p.1287-1302).

54

Anexos

Anexo I – Quadros de análise das imagens

Quadro I:

Princípios do Parecer CNE/CP 003/2004 Imagem selecionada da Coleção

Professor Eduardo de Oliveira e

Oliveira

Significados Potencialidades Pedagógicas

Consciência política e histórica da diversidade

Desdobramento:

- à superação da indiferença, injustiça e

desqualificação com que os negros, os povos

indígenas e também as classes populares às quais

os negros, no geral, pertencem, são comumente

tratados

Fortalecimento de identidades e de direitos.

Desdobramento:

-o rompimento com as imagens negativas forjadas

por diferentes meios de comunicação, contra os

negros e os povos indígenas

- Compreensão da realidade social

da população negra, como fruto de

um processo histórico pautado no

racismo.

- Desconstrução do mito da

democracia racial.

- valorização dos trabalhos

considerados inferiores, por

historicamente ser exercidos por

indivíduos da classe popular, em

sua maioria negra.

Possibilita o questionamento das

estruturas sociais as quais os negros

estão submetidos na sociedade

brasileira.

- possibilita a positivação dos

trabalhos considerados inferior,

através da construção da sua

importância para a sociedade.

56

Quadro II:

Princípio do Parecer CNE/CP 003/2004 Imagem selecionada da Coleção Professor

Eduardo de Oliveira e Oliveira

Significados Potencialidades Pedagógicas

Fortalecimento de identidades e de

direitos

Desdobramentos:

- o desencadeamento de processos de

afirmação de identidade, de historicidade

negada ou distorcida;

- o rompimento com imagens negativas

forjadas por diferentes meios de

comunicação contra os negros e os povos

indígenas;

Consciência política e histórica da

diversidade:

Desdobramento:

-à compreensão de que a sociedade é

formada por pessoas que pertencem a

- possibilita ver uma

manifestação espiritual negra,

apresentando aspectos da cultura

negra, contribuindo para o

fortalecimento do pertencimento

etnicorracial.

- possibilita perceber a

impotência das mães pretas para

com a criação das novas

gerações.

- apresenta uma manifestação

espiritual negra, contribuindo para

o processo de afirmação da

identidade, bem como fornecendo

subsídios positivos para a

construção do pertencimento

etnicorracial.

- valoriza o papel desempenhado

pelas mulheres negras para com o

cuidado com as crianças.

57

grupos etnicorraciais distintos, que

possuem cultura e história próprias,

igualmente valiosas e que em conjunto

constroem, na nação brasileira, sua

história.

Ações educativas de combate ao racismo

e a discriminação

Desdobramento:

- educação patrimonial, aprendizado a

partir do patrimônio cultural

afrobrasileiro, visando a preservá-lo e a

difundi-lo.

58

Quadro III

Princípios do Parecer CNE/CP

003/2004

Imagens selecionadas da Coleção Professor

Eduardo de Oliveira e Oliveira

Significados Potencialidades Pedagógicas

Fortalecimento de identidades e de

direitos.

Desdobramento:

- o desencadeamento de processo de

afirmação de identidades, de

historicidade negada ou distorcida.

Ações educativas de combate ao

racismo e a discriminações.

Desdobramentos:

- o cuidado para que se dê um sentido

construtivo à participação dos diferentes

grupos sociais, etnicorraciais na

construção da nação brasileira, aos elos

culturais e históricos entre diferentes

grupos etnicorraciais, às alianças

sociais.

Consciência Política e histórica da

- Fortalecimento da identidade

por meio da afirmação de uma

historicidade negada e relegada

a margem da história oficial.

- homenagem aos ancestrais;

- A percepção do movimento

abolicionista enquanto um

movimento revolucionário que

fez ouvir o protesto negro dos

escravizados (Oliveira e

Oliveira, não publicado).

- promove a possibilidade de

apresentação da história do Brasil

a partir do ponto de vista dos

negros, apresentando seus “heróis

e inimigos”.

- Possibilita a apresentação do

movimento abolicionista como

uma forma de combate ao

racismo e a ideologia racial,

desarticulando o processo de

“coisificação” dos indivíduos

escravizados.

59

diversidade:

Desdobramento:

-ao conhecimento e à valorização da

história dos povos africanos e da cultura

brasileira.

60

Quadro IV

Princípio do Parecer CNE/CP 003/2004 Imagem selecionada da Coleção

Professor Eduardo de Oliveira e

Oliveira

Significados Potencialidades Pedagógicas

Fortalecimento de identidades e de direitos

Desdobramento:

- o desencadeamento de processos de

afirmação de identidades, de historicidade

negada ou distorcida.

Consciência política e histórica da

diversidade

Desdobramento:

-á igualdade básica de pessoa humana como

sujeito de direitos.

- ao conhecimento e à valorização da história

dos povos africanos e da cultura afrobrasileira

na construção histórica e cultural brasileira.

- apresenta uma família negra,

aparentemente uma mulher com seus

dois filhos, possibilitando fortalecer

a percepção de núcleos familiares

negros.

- a dificuldade em conseguir

determinadas igualdades básicas em

relação a outros grupos

etnicorraciais.

- colabora com a luta pela conquista e

fortalecimento de direitos.

- contribui para o fortalecimento de

núcleos familiares negros,

desarticulando a percepção de família

negra como sendo desarticulada.

Anexo II – Carta explicativa sobre as imagens

62

Anexo III – Imagens

63

64

65

66

Anexo IV - Lei 10.639/2003

LEI No 10.639, DE 9 DE JANEIRO DE 2003.

Mensagem de veto

Altera a Lei no 9.394, de 20 de dezembro de

1996, que estabelece as diretrizes e bases da

educação nacional, para incluir no currículo

oficial da Rede de Ensino a obrigatoriedade da

temática "História e Cultura Afro-Brasileira", e

dá outras providências.

O PRESIDENTE DA REPÚBLICA Faço saber que o Congresso Nacional decreta e eu sanciono a seguinte Lei:

Art. 1o A Lei n

o 9.394, de 20 de dezembro de 1996, passa a vigorar acrescida dos seguin-

tes arts. 26-A, 79-A e 79-B:

"Art. 26-A. Nos estabelecimentos de ensino fundamental e médio, oficiais e particulares, torna-se obrigatório o ensino sobre História e Cultura Afro-Brasileira.

§ 1o O conteúdo programático a que se refere o caput deste artigo incluirá o estudo da História

da África e dos Africanos, a luta dos negros no Brasil, a cultura negra brasileira e o negro na formação da sociedade nacional, resgatando a contribuição do povo negro nas áreas social, econômica e política pertinentes à História do Brasil.

§ 2o Os conteúdos referentes à História e Cultura Afro-Brasileira serão ministrados no âmbito

de todo o currículo escolar, em especial nas áreas de Educação Artística e de Literatura e His-tória Brasileiras.

§ 3o (VETADO)"

"Art. 79-A. (VETADO)"

"Art. 79-B. O calendário escolar incluirá o dia 20 de novembro como ‘Dia Nacional da Consci-ência Negra’."

Art. 2o Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.

Brasília, 9 de janeiro de 2003; 182o da Independência e 115

o da República.

LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA Cristovam Ricardo Cavalcanti Buarque

Este texto não substitui o publicado no D.O.U. de 10.1.2003