UNIVERSIDADE FEDERAL DE MINAS GERAIS · RELATÓRIO PARCIAL ... inter e transdisciplinares, ... uma...

36
1 ______________________________________________________________________________ Avenida João Pinheiro, nº 100, Prédio 01, 5º andar, sala 512 Centro Belo Horizonte, MG / CEP: 30.130-180. E-mail: [email protected] UNIVERSIDADE FEDERAL DE MINAS GERAIS PROGRAMA CIDADE E ALTERIDADE: CONVIVÊNCIA MULTICULTURAL E JUSTIÇA URBANA RELATÓRIO PARCIAL PARQUES E OUTROS LADOS DA CONSERVAÇÃO AMBIENTAL: POPULA- ÇÕES LOCAIS, PROJETOS DE ‘DESENVOLVIMENTO’ E O TURISMO ECOLÓGICO PERÍODO (AGOSTO OUTUBRO DE 2014) BELO HORIZONTE, 2014

Transcript of UNIVERSIDADE FEDERAL DE MINAS GERAIS · RELATÓRIO PARCIAL ... inter e transdisciplinares, ... uma...

Page 1: UNIVERSIDADE FEDERAL DE MINAS GERAIS · RELATÓRIO PARCIAL ... inter e transdisciplinares, ... uma parcela da sociedade em conservar aquilo que ainda não fora destruído por seus

1 ______________________________________________________________________________ Avenida João Pinheiro, nº 100, Prédio 01, 5º andar, sala 512 – Centro – Belo Horizonte, MG / CEP: 30.130-180. E-mail: [email protected]

UNIVERSIDADE FEDERAL DE MINAS GERAIS

PROGRAMA CIDADE E ALTERIDADE: CONVIVÊNCIA MULTICULTURAL E

JUSTIÇA URBANA

RELATÓRIO PARCIAL

PARQUES E OUTROS LADOS DA CONSERVAÇÃO AMBIENTAL: POPULA-

ÇÕES LOCAIS, PROJETOS DE ‘DESENVOLVIMENTO’ E O TURISMO

ECOLÓGICO

PERÍODO (AGOSTO – OUTUBRO DE 2014)

BELO HORIZONTE, 2014

Page 2: UNIVERSIDADE FEDERAL DE MINAS GERAIS · RELATÓRIO PARCIAL ... inter e transdisciplinares, ... uma parcela da sociedade em conservar aquilo que ainda não fora destruído por seus

2 ______________________________________________________________________________ Avenida João Pinheiro, nº 100, Prédio 01, 5º andar, sala 512 – Centro – Belo Horizonte, MG / CEP: 30.130-180. E-mail: [email protected]

EQUIPE DO PROGRAMA

Coordenação Geral

Profa. Dra. Miracy Barbosa de Sousa Gustin

Coordenadores em Exercício no Período

Ana Beatriz Vianna Mendes– Coordenadora Metodológica

Sielen Barreto Caldas de Vilhena – Coordenadora Administrativa

Coordenação de gestão e planejamento

Fernanda de Lazari Cardoso Mundim

Juliano dos Santos Calixto

Coordenação de Eixos e de Projetos

Aderval Costa Filho

Adriana Goulart de Sena Orsini

Ana Beatriz Vianna Mendes

Egidia Maria de Almeida Aiexe

Eloy Pereira Lemos

Gregório Assagra de Almeida

Ludmilla Zago Andrade

Márcia Helena Batista Corrêa da Costa

Marcos Cristiano Zucarelli

Maria Tereza Fonseca Dias

Miracy Barbosa de Sousa Gustin

Rennan Lanna Martins Mafra

Sielen Barreto Caldas de Vilhena

Page 3: UNIVERSIDADE FEDERAL DE MINAS GERAIS · RELATÓRIO PARCIAL ... inter e transdisciplinares, ... uma parcela da sociedade em conservar aquilo que ainda não fora destruído por seus

3 ______________________________________________________________________________ Avenida João Pinheiro, nº 100, Prédio 01, 5º andar, sala 512 – Centro – Belo Horizonte, MG / CEP: 30.130-180. E-mail: [email protected]

EQUIPE DO PROJETO

Coordenação do Projeto: Ana Beatriz Vianna Mendes

Orientador de Campo: Leonardo Vasconcelos de Souza

Pesquisadores de Graduação: Amanda Cristina Nunes Pacifico; Giulia Volpini Soares de

Gouvêa; Iara Oliveira Silva e Freitas.

Page 4: UNIVERSIDADE FEDERAL DE MINAS GERAIS · RELATÓRIO PARCIAL ... inter e transdisciplinares, ... uma parcela da sociedade em conservar aquilo que ainda não fora destruído por seus

4 ______________________________________________________________________________ Avenida João Pinheiro, nº 100, Prédio 01, 5º andar, sala 512 – Centro – Belo Horizonte, MG / CEP: 30.130-180. E-mail: [email protected]

Sumário

1. CONTEXTUALIZAÇÃO GERAL: A CRIAÇÃO DE ÁREAS AMBIENTALMENTE

PROTEGIDAS ................................................................................................................................. 6

2. OBJETIVOS DO PROJETO E BREVES NOTAS METODOLÓGICAS ............................. 8

3. A CRIAÇÃO DO PARQUE NACIONAL DA SERRA DO CIPÓ: REGULARIZAÇÃO

FUNDIÁRIA E POPULAÇÕES TRADICIONAIS .................................................................... 10

3. A VIDA NO RETIRO ................................................................................................................ 11

4. A CONSTRUÇÃO DA NOVA PORTARIA NO RETIRO .................................................... 14

5. RELATOS LOCAIS .................................................................................................................. 21

5.1 O caso de Dona Deusdita ......................................................................................................... 21

6. TERMO DE COMPROMISSO ................................................................................................ 26

7. CONCLUSÃO ............................................................................................................................ 29

Referências Bibliográficas ............................................................................................................. 32

Page 5: UNIVERSIDADE FEDERAL DE MINAS GERAIS · RELATÓRIO PARCIAL ... inter e transdisciplinares, ... uma parcela da sociedade em conservar aquilo que ainda não fora destruído por seus

5 ______________________________________________________________________________ Avenida João Pinheiro, nº 100, Prédio 01, 5º andar, sala 512 – Centro – Belo Horizonte, MG / CEP: 30.130-180. E-mail: [email protected]

Lista de Figuras

Figura 1: A estrada na região do Retiro ............................................................................... 12

Figura 2: Muitas árvores foram derrubadas ......................................................................... 13

Figura 3: O mirante ............................................................................................................. 13

Figura 4: O atual cruzeiro do Retiro .................................................................................... 15

Figura 5: Barracão construído por Dona Deusdita .............................................................. 20

Figura 6: Auto de infração recebido por Deusdita. ............................................................. 22

Page 6: UNIVERSIDADE FEDERAL DE MINAS GERAIS · RELATÓRIO PARCIAL ... inter e transdisciplinares, ... uma parcela da sociedade em conservar aquilo que ainda não fora destruído por seus

6 ______________________________________________________________________________ Avenida João Pinheiro, nº 100, Prédio 01, 5º andar, sala 512 – Centro – Belo Horizonte, MG / CEP: 30.130-180. E-mail: [email protected]

1. CONTEXTUALIZAÇÃO GERAL: A CRIAÇÃO DE ÁREAS AMBIENTAL-

MENTE PROTEGIDAS

A criação de Unidades de Conservação (UCs) tem sido vista como uma das princi-

pais estratégias para conservação da natureza. Isso implica reflexões, debates e embates

sobre a gestão do espaço em escalas simultaneamente de âmbito global, regional e local,

com recortes de análise e definição de critérios de relevância consubstanciadas em perspec-

tivas multi, inter e transdisciplinares, além de interculturais, e que envolvem institucionali-

dades, sujeitos e atores com capitais simbólicos muito desiguais em termos de capacidade

de produzir e legitimar discursos de verdade, seja no Brasil ou em outras partes do mundo.

Diversas pesquisas indicam que a criação das primeiras áreas protegidas foi inici-

almente pensada para garantir certos usos humanos, como a caça e a extração de madeira.

Contudo, com a introdução de novas tecnologias surgidas no âmbito da Revolução Indus-

trial, a humanidade modificou suas relações sociais, bem como suas dinâmicas entre ho-

mem/paisagem e entre rural/urbano. Nesse contexto de mudanças sociais e espaciais, sur-

giu um sentimento saudosista em parte da sociedade, que passou a se sensibilizar com o

cenário selvagem, bucólico e espiritual anteriormente fornecido pelo ambiente natural e

agora já visivelmente ameaçado. Houve uma clara mudança de percepção da humanidade

sobre sua relação com a Natureza, o que fez com que a delimitação e cerceamento de áreas

naturais deixasse parte de seu propósito inicial de assegurar os usos humanos diretos, tor-

nando-se também um mecanismo de criação de santuários protegidos contra esses mesmos

usos, que passaram então a ser, uns, sumamente condenados, outros, regulados. Esse mo-

delo de isolamento de territórios contra as transformações humanas reflete a esperança de

uma parcela da sociedade em conservar aquilo que ainda não fora destruído por seus pro-

cessos econômicos. Há ainda a intenção de criação de espaços que possam servir ao turis-

mo ecológico, à educação ambiental e à pesquisa científica.

Essa lógica de proteção de ecossistemas esteve intimamente relacionada à rápida

expansão urbana, e sobretudo industrial, das grandes cidades norte-americanas e europeias

de meados do século XIX, contexto que atualmente é comum a todos os grandes centros

urbanos mundiais. Desde essa época, o número de Parques Nacionais cresceu por todo o

planeta, constituindo-se na mais conhecida e tradicional forma de se proteger espaços natu-

rais.

Page 7: UNIVERSIDADE FEDERAL DE MINAS GERAIS · RELATÓRIO PARCIAL ... inter e transdisciplinares, ... uma parcela da sociedade em conservar aquilo que ainda não fora destruído por seus

7 ______________________________________________________________________________ Avenida João Pinheiro, nº 100, Prédio 01, 5º andar, sala 512 – Centro – Belo Horizonte, MG / CEP: 30.130-180. E-mail: [email protected]

Durante seu processo de expansão pelo mundo, esse modelo de isolamento ambien-

tal chocou-se com a realidade de diversos países, inclusive já no ato da criação do primeiro

parque nacional do mundo, onde havia várias tribos indígenas que habitavam o território

que passou a ser conhecido como Parque Nacional de Yellowstone e que dele foram expul-

sas.

Não existe consenso sobre o papel de comunidades na proteção do ambiente natu-

ral, embora haja convenções e legislações internacionais que reconhecem a importância de

povos/comunidades tradicionais para a conservação da biodiversidade (o caso mais em-

blemático é a Convenção da Diversidade Biológica, assinada em 1992 por diversos países).

De todo o modo, vários estudos demonstram que o ato de se excluir populações

humanas de territórios ocupados há várias gerações, pode não surtir o efeito de conserva-

ção ambiental desejado. Uma vez que a humanidade também faz parte dos ecossistemas

em que se insere, seria eticamente recomendável e ecologicamente prudente avaliar a atua-

ção dessas populações diferenciadas nos determinados ecossistemas a fim de compreender

se e como elas têm contribuído para a manutenção ou depredação da biodiversidade e, a

partir daí, fortalecer os benefícios e contornar os malefícios que suas práticas resultam aos

ecossistemas. O ser humano é Natureza e o que compromete a proteção dos bens naturais

não é a presença ou ausência de pessoas no lugar, mas o modo como se dá a exploração

dos bens naturais e como se convive com a biodiversidade.

A criação de Parques no Brasil vem acontecendo desde o século XIX, mas foi no

período militar (1964-1985) que esse tipo de área protegida ganhou força no cenário naci-

onal. Naquela época, os Parques eram criados num contexto marcado por um discurso de-

senvolvimentista, de integração e de segurança do território nacional, mas também por

influências internacionais, como do Banco Mundial e do Banco Internacional de Desen-

volvimento.

Atualmente, após a criação do Sistema Nacional de Unidades de Conservação

(SNUC) – Lei 9.985/2000 – lei que unificou todas as categorias de áreas ambientalmente

protegidas no Brasil, nota-se a existência de dois paradigmas diferentes e complementares

de áreas protegidas: aquelas de proteção integral, que só permitem o uso indireto; e aquelas

de uso sustentável, que permitem alguns usos diretos. De todo modo, do ponto de vista da

história institucional de áreas protegidas no Brasil, é evidente a força e o peso que os par-

ques carregam como emblema de conservação da natureza. Ainda que haja forte reconhe-

Page 8: UNIVERSIDADE FEDERAL DE MINAS GERAIS · RELATÓRIO PARCIAL ... inter e transdisciplinares, ... uma parcela da sociedade em conservar aquilo que ainda não fora destruído por seus

8 ______________________________________________________________________________ Avenida João Pinheiro, nº 100, Prédio 01, 5º andar, sala 512 – Centro – Belo Horizonte, MG / CEP: 30.130-180. E-mail: [email protected]

cimento histórico e jurídico dos Parques no país, percebe-se que há mais vontade política

para estabelecê-los do que para manejá-los e implementá-los efetivamente.

A legislação brasileira sempre exigiu que houvesse a desapropriação de proprieda-

des privadas presentes nos territórios em que se almejasse criar um Parque. Neste caso, o

Estado deve indenizar os posseiros ou proprietários de áreas que passam a ser reconhecidos

pelo Estado como parques, e esta indenização deve ser paga previamente e de forma justa.

Entretanto, há diversos relatos de expulsão de populações locais de seus territórios

ao longo de parques no Brasil inteiro. Mesmo quando a comunidade não está de fato dentro

dos limites do Parque, as limitações de uso do território impostas pelo Estado nas áreas de

entorno dos parques, podem por si só comprometer sua permanência no local e acabar re-

pelindo as famílias.

2. OBJETIVOS DO PROJETO E BREVES NOTAS METODOLÓGICAS

O projeto tem como objetivo investigar as versões da história de criação e implan-

tação do PNSCi, em especial as histórias das comunidades tradicionais locais, buscando:

(i) descrever mudanças na relação com a natureza, sociabilidade e dinâmicas identitárias

que ocorreram na vida dessas pessoas; (ii) situar a análise dessas mudanças em seus con-

textos históricos, políticos e sociais, sob diferentes escalas temporais, espaciais e planos

institucionais; (iii) fomentar a organização sociopolítica da comunidade; (iv) resgatar e

valorizar conhecimentos e modos tradicionais de relacionamento com o ambiente; e (v)

propiciar interlocução entre a gestão do PNSCi, comunidades tradicionais, Ministério Pú-

blico Federal (MPF) e Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN), de

modo a refletir de forma compartilhada sobre a gestão da sociodiversidade e da biodiversi-

dade local.

A pesquisa é baseada em formas qualitativas de investigação e análise. A análise

preliminar de trabalhos acadêmicos conduzidos na região e de documentos produzidos pelo

Estado (Legislações, Processos Administrativos, Plano de Manejo, Atas de Reuniões) de-

monstra que a narrativa sobre o lugar gira quase que exclusivamente em torno de informa-

ções referentes a seus meios físicos e bióticos, excluindo-se as comunidades locais. A par-

tir da realização de oficinas e entrevistas, com base na técnica da história-oral, realizadas

Page 9: UNIVERSIDADE FEDERAL DE MINAS GERAIS · RELATÓRIO PARCIAL ... inter e transdisciplinares, ... uma parcela da sociedade em conservar aquilo que ainda não fora destruído por seus

9 ______________________________________________________________________________ Avenida João Pinheiro, nº 100, Prédio 01, 5º andar, sala 512 – Centro – Belo Horizonte, MG / CEP: 30.130-180. E-mail: [email protected]

junto à comunidade e aos gestores públicos envolvidos, buscou-se compreender quais as

vocações do território a partir de perspectivas diversas e, em especial, daqueles que nele

moravam/moram. Foram realizadas seis visitas a campo e três oficinas com comunitários,

ocasiões em que foi possível captar histórias das famílias que viviam/vivem na região.

Conseguiu-se reunir representantes da comunidade com outros dois grupos de pesquisa,

movimentos sociais e com o MPF, resultando em uma ação de extensão que fortaleceu sua

luta e mobilização.

No caso das observações in lócus, ou das pesquisas de campo1, a estratégia consis-

tiu basicamente em observação da atuação dos atores, com anotações em cadernos de cam-

po de suas falas e comportamentos, etnografando as situações do cotidiano e descrevendo

as lembranças que trazem à tona. Foram feitas fotografias dos contextos observados e a

maior parte das entrevistas foi gravada em áudio.

As histórias contadas por essas famílias, e refletidas – mormente pela ausência - em

documentos relativos ao histórico de criação e à gestão da unidade, atestam a invisibiliza-

ção desses grupos em várias etapas do processo de implantação do Parque. Neste relatório

parcial são relatados alguns resultados obtidos até o momento, após cerca de um ano de

investigação sobre o caso do Parque Nacional da Serra do Cipó.

De um ponto de vista mais amplo, o presente relatório visa trabalhar simultanea-

mente em duas direções: descrever a especificidade do caso concreto e, ao mesmo tempo,

refletir sobre o caráter universalista de sua manifestação, o que leva a antropologia de um

modo geral, e esta pesquisa em particular, a um processo de refinamento de problemas e

conceitos e não a um acúmulo de situações e/ou informações descontextualizadas. Neste

caso, a investigação de situações de ação na Serra do Cipó (VELSEN, 1987) tem como

objetivo maior desvelar as histórias marginalizadas de moradores e ex-moradores que fo-

ram afetados pela criação do Parque, entendendo como imprescindível ouvir, não apenas

esses sujeitos principais da pesquisa, mas também depoimentos de gestores e ex-gestrores,

bem como realizar leituras críticas e análise de documentos que tratam da história de cria-

ção e implantação desta Unidade de Conservação.

1 Talvez não seja demasiado ressaltar que “a experiência de campo depende, entre outras coisas, da biografia

do pesquisador, das opções teóricas dentro da disciplina, do contexto sócio-histórico mais amplo e, não me-

nos, das imprevisíveis situações que se configuram, no dia-a-dia, no próprio local de pesquisa, entre pesqui-

sadores e pesquisados” (PEIRANO, 1995: 22).

Page 10: UNIVERSIDADE FEDERAL DE MINAS GERAIS · RELATÓRIO PARCIAL ... inter e transdisciplinares, ... uma parcela da sociedade em conservar aquilo que ainda não fora destruído por seus

10 ______________________________________________________________________________ Avenida João Pinheiro, nº 100, Prédio 01, 5º andar, sala 512 – Centro – Belo Horizonte, MG / CEP: 30.130-180. E-mail: [email protected]

3. A CRIAÇÃO DO PARQUE NACIONAL DA SERRA DO CIPÓ: REGULARIZA-

ÇÃO FUNDIÁRIA E POPULAÇÕES TRADICIONAIS

No caso do Parque Nacional da Serra do Cipó (PARNA Cipó), criado em 19842, a

população atingida por ele alega que somente os grandes fazendeiros foram indenizados

corretamente, pois, além de melhor instruídos sobre os procedimentos legais vigentes, eles

possuíam poder aquisitivo que os permitiu pagar bons advogados.

“A minha família até então não tinha noção do que que era procurar um

advogado (isso deve ter decorrido há mais ou menos uns 20 anos) pra

poder entrar na Justiça. Antes não tinha noção de direito, de Lei. Eles

achavam que o Parque mandava mesmo e tinha direito de pegar aquela

terra. Então eles nunca pensavam em lutar por aquilo.” (Descendente de

família atingida pelo PARNA Cipó. Depoimento colhido em 17/01/2014

por Ana Beatriz Vianna Mendes).

Os servidores lotados no PARNA Cipó alegam não compreender totalmente a atual

situação fundiária do Parque, uma vez que muitos documentos sequer estão sob seu domí-

nio, e que o melhor caminho para a resolução do problema seria que o processo fosse anu-

lado, conforme parecer do Ministério Público Federal (MPF) de 04/10/2013, e recomeçado

“para que então a gente tenha oportunidade de trazer essas famílias pra que sejam citadas

da forma correta e para que recebam aquilo a que tem direito” (Servidor do PARNA Cipó.

Depoimento colhido em 28/10/2014 pela equipe do Projeto Cipó). O MPF alega que houve

irregularidades na citação de proprietários de terras no processo de regularização fundiária

e desapropriação do PARNA Cipó, sendo que alguns deles só tomaram conhecimento da

ação quando foram notificados pelo IBAMA para retirarem-se do terreno, fato que, con-

forme recomendação do MPF, deveria tornar nula a imissão de posse ganha pelo órgão

ambiental. Segue trecho da recomendação feita pelo Ministério Público Federal à gestão do

PNSCi3:

“Diante do exposto, requer o Ministério Público Federal:

a) seja declarada a nulidade absoluta do processo em relação ao Espólio

de [nome de morador] e aos proprietários de benfeitorias localizadas na

área objeto de desapropriação;

2 O parque havia sido criado em 1975 em âmbito estadual, em área parecida com a que atualmente é a do

Parque Nacional. Mas, conforme relatos de servidores e moradores e ex-moradores, foi apenas quando a área

foi transferida para âmbito federal, em 1984, é que o parque começou a ser efetivamente implementado e

seus efeitos começaram a se fazer presentes na região, à época gerido pelo IBDF (Instituto Brasileiro de

Desenvolvimento Florestal). 3 Cumprimento da Sentença em Ação de Desapropriação – Processo n° 2000.38.00.08183-3. Belo Horizonte:

Ministério Público Federal, 4 out. 2013.

Page 11: UNIVERSIDADE FEDERAL DE MINAS GERAIS · RELATÓRIO PARCIAL ... inter e transdisciplinares, ... uma parcela da sociedade em conservar aquilo que ainda não fora destruído por seus

11 ______________________________________________________________________________ Avenida João Pinheiro, nº 100, Prédio 01, 5º andar, sala 512 – Centro – Belo Horizonte, MG / CEP: 30.130-180. E-mail: [email protected]

b) seja o ICMBio notificado a se abster de realizar qualquer ato voltado

à remoção dos moradores que ainda residem na área inserida nos limites

do Parque Nacional da Serra do Cipó.” (MPF, 2013: 9).

O MPF alega ser preciso investigar de forma detalhada a situação, pois alguns ex-

moradores podem ter sido indenizados, porém, o fato dos valores terem sido pagos por

precatória pode gerar o sentimento entre as famílias de que elas não receberam os valores

devidos. Ainda segundo o MPF, é preciso confirmar se os representantes legais desses pro-

prietários/posseiros repassaram os valores indenizados a seus clientes e, no caso das pro-

priedades em espólio, se esses valores foram devidamente distribuídos entre os herdeiros.

Dentro desse contexto de incertezas sobre o processo fundiário do PARNA Cipó,

casos de expulsão de pessoas foram e ainda são percebidos, como, por exemplo, em 2004,

a expulsão de três irmãos, retirados de sua propriedade de dentro do Parque, ocasião em

que, segundo relatos de moradores e servidores do PARNA Cipó, houve uso abusivo de

força e descaso por parte do Estado, uma vez que os membros dessa família foram deixa-

dos em um posto policial abandonado às margens da MG-010, sem ter outro local para ir.

“Eles vieram, eles estavam todos armados. Se fosse pra atirar, eles esta-

vam todos armados. [...] O Cuta até que me ajudou, coitado, e até “pa-

daná”. Porque vem gente estranha de todo lado, né? Aí o Cuta ajudou

a olhar, né, porque ali é perigoso, beira de estrada, né?” (Depoimento

colhido em 19/01/2014 por Ana Beatriz Vianna Mendes).

Essa ação de deslocamento compulsório de moradores de parques, presente em di-

versas situações no Brasil, causa uma série de problemas éticos, sociais, econômicos, polí-

ticos e culturais, sendo considerada pelo MPF como um “total descompasso com a letra e o

espírito da Constituição Federal de 1988 [...] destoando, ademais, das diretrizes estabeleci-

das em conferências internacionais sobre a proteção do meio ambiente” (MPF, 2003: 5 –

Anexo).

3. A VIDA NO RETIRO

Atualmente, ao todo, apenas quatro famílias mantém o uso permanente de residên-

cias dentro dos limites do PARNA Cipó, em uma região conhecida como Retiro, onde foi

delimitada uma área definida pelo Plano de Manejo da unidade, publicado em 2009, como

Zona de Ocupação Temporária (ZOT). O uso do território por parte dessas famílias é limi-

Page 12: UNIVERSIDADE FEDERAL DE MINAS GERAIS · RELATÓRIO PARCIAL ... inter e transdisciplinares, ... uma parcela da sociedade em conservar aquilo que ainda não fora destruído por seus

12 ______________________________________________________________________________ Avenida João Pinheiro, nº 100, Prédio 01, 5º andar, sala 512 – Centro – Belo Horizonte, MG / CEP: 30.130-180. E-mail: [email protected]

tado conforme as especificações próprias da ZOT, o que não as agrada por inviabilizar

algumas de suas práticas de reprodução sociais e culturais. Todas essas pessoas alegam não

terem recebido qualquer indenização pelo título da terra e, ainda assim, terem que viver

conforme as regras estabelecidas unilateralmente pelo órgão ambiental.

Entre as restrições a que estão submetidas, a proibição da prática do cultivo em sis-

tema de rodízio é uma das que mais dificulta a vida dessas famílias, afetando não somente

sua alimentação e economia, como também o modo como essas pessoas se relacionam com

o território e interagem como comunidade.

“A área da gente plantar foi só diminuindo, foi só ficando lá pra perto da

porta, na beira, aqueles pezinhos de manga... O lugar que gente plantava

um arroz, um feijão foi fechando...” (Morador do Retiro. Depoimento co-

lhido em 20/01/2014 por Ana Beatriz Vianna Mendes).

“Aí depois que entrou esse IBAMA, esse parque ai, ai foi só não podia

plantar, não podia criar um bicho, a gente tinha que ficar ali como se ti-

vesse presa, não podia fazer nada”. (Ex-morador do Retiro. Depoimento

colhido em 19/01/2014 por Ana Beatriz Vianna Mendes).

O próprio Plano de Manejo do PARNA Cipó atesta que a agricultura, quando im-

plementada de modo tradicional, “é um tipo de atividade com maior possibilidade de con-

viver em harmonia com os objetivos de unidades de conservação” (ICMBio, 2009b: 43).

No entanto, a prática ainda não foi conciliada com esses objetivos da unidade, havendo

ainda uma proibição de abrir novas roças, o que fez com que o cultivo de alimentos fosse

substituído pelas idas e vindas aos supermercados do Distrito para a compra de mantimen-

tos.

“Veio a proibição de não fazer a cultura mais na terra. Não podia nem

plantar nem criar o gado. E vivia disso! Vivia do que plantava, comia o

que plantava, o gado... Comia tudo só o que eles produziam ali na terra.

[...]

Minha avó, ficou ainda, minha vó e meu tio. Eles ainda ficaram em João

Fernandes, teimando na verdade, porque eles também não podia mexer

em nada. Então eles vinham embaixo [no Distrito], compravam as coisas

de alimentação, já que não mexia na terra, e levavam pra alimentar lá.”

(Descendente de família atingida pelo PARNA Cipó. Depoimento colhido

em 17/01/2014 por Ana Beatriz Vianna Mendes).

Além de prática de subsistência, o cultivo era parte importante do processo de gera-

ção de renda das famílias atingidas e também um modo de interação solidária desses indi-

víduos em comunidade, uma vez que “quando cê não tinha as coisa aí, cê emprestava com

o outro” (Morador do Retiro. Depoimento colhido em 28/07/2014 por Giulia Gouvêa e

Page 13: UNIVERSIDADE FEDERAL DE MINAS GERAIS · RELATÓRIO PARCIAL ... inter e transdisciplinares, ... uma parcela da sociedade em conservar aquilo que ainda não fora destruído por seus

13 ______________________________________________________________________________ Avenida João Pinheiro, nº 100, Prédio 01, 5º andar, sala 512 – Centro – Belo Horizonte, MG / CEP: 30.130-180. E-mail: [email protected]

Leonardo de Souza). Não que esses moradores não estivessem envolvidos com o mercado

no passado, mas sua dependência dos produtos industrializados e agrícolas comercializa-

dos nunca foi tão alta.

“Hoje, tudo nós temos que comprar” (Morador do Retiro. Depoimento

colhido em 28/07/2014 por Giulia Gouvêa e Leonardo de Souza).

Parte desses moradores parou de realizar essa e outras práticas culturais tradicionais

por não compreenderem mais a terra em que moram como sua. Segundo Jorge, práticas

como o cultivo foram proibidas pelo IBDF logo quando o PARNA Cipó foi criado.

“Jorge: Acabou porque desde que o IBDF veio aqui é área do Parque,

né? Na época, o IBDF, IBDF: Instituto Brasileiro de Desenvolvimento

Florestal, veio e: “Óh, cê não pode plantar mais nada. Nada! Mais na-

da.” Cortou até as plantinhas que tavam aqui, ó. Cortou tudo, falou que

não podia plantar mais nada. Tem mais de vinte e tantos anos. (Morador

do Retiro. Depoimento colhido em 28/07/2014 por Giulia Gouvêa e Leo-

nardo de Souza).

“A vida inteira nós planta. Nós plantava todos os mantimentos, plantava

arroz, plantava milho, plantava cana, plantava feijão o terreiro era todo

limpinho todo cheio de planta, quando era esse tempo assim que não era

tempo das águas, nós fazia aquelas vasilhas de barro, essas panelas, es-

sas vasilhas de barro, nós fazia aquilo tudo, nós fazia telha” (Ex-

morador do Retiro. Depoimento colhido em 19/01/2014 por Ana Beatriz

Vianna Mendes).

.

A sensação de estar entrando em terras alheias, pelo que apreendemos a partir dos

depoimentos dos moradores, variou conforme a disposição da gestão. Deusdita, ex-

moradora, relata que nos anos 2000, muitos anos depois de já ter deixado de viver no Reti-

ro, mas ainda frequentando a região, conta que certa vez, quiseram usufruir do rio e um

funcionário do parque os impediu de entrar, alegando que se o cachorro que os acompa-

nhava com coleira entrasse junto, sujaria o rio. Mesmo que Dona Deusdita tivesse se com-

prometido a não entrar com o cachorro no rio, o funcionário chamou o seu superior, que

por sua vez, chamou policias para impedirem a entrada de Dona Deusdita e família, ale-

gando que o cachorro poderia sujar o rio. Conforme relato de Dona Deusdita:

“Nós vai no rio, nós não vamos fazer coisa errada, nós vamos ir no rio”.

Aí [o funcionário disse]: “ah, mais então eu vou chamar a polícia”. Eu

falei: “pode chamar, pode chamar a polícia (...) porque no rio nós vai”.

Aí, menina, e nisso eu estourei com ele também, nossa senhora, eu estou-

rei com ele de um jeito e fui falando e fui falando e fui falando, xingando

e falando. E ele: “eu vou chamar a polícia” e eu falando: “pode chamar

a polícia, pode ir lá e chamar, pode ligar pra elas vim aqui. Porque no

rio nós vai, o terreno é nosso, nós num recebeu, vocês nunca pagou nós

Page 14: UNIVERSIDADE FEDERAL DE MINAS GERAIS · RELATÓRIO PARCIAL ... inter e transdisciplinares, ... uma parcela da sociedade em conservar aquilo que ainda não fora destruído por seus

14 ______________________________________________________________________________ Avenida João Pinheiro, nº 100, Prédio 01, 5º andar, sala 512 – Centro – Belo Horizonte, MG / CEP: 30.130-180. E-mail: [email protected]

nada. Aí, liga pros policias, chegou duas policinha lá, quando a polícia

chegou, eu falei: “olha”. “Ah, porque o que aconteceu?”, aí eu falei:

“porque nós vai ali no rio e ele falou que não podia, o terreno é nosso,

eles não pagou nada, não indenizou nós e eu falei pois é.” Aí ele falou, o

César [ex-chefe do parque]: “ah, mas isso tá errado, porque no rio com

cachorro tá errado”. Eu falei: “errado César? Errado tá é desde o co-

meço, errado tá desde que você apareceu aqui nessa Serra do Cipó, por-

que você acha isso certo que você tá fazendo, com o trailer aqui, rece-

bendo dinheiro e embolsando ele, no terreno de nós, cê acha isso certo?

Isso é coisa mais errada, isso tá errado desde a raiz. (...) Quando ele viu

que eu comecei a soltar trem demais, o que que ele falou: “ah vamo mo-

ço, vamo embora.” (Depoimento colhido em 19/01/2014 por Ana Beatriz

Vianna Mendes).

Casos de denúncia como estes, pelo que apuramos, nunca foram levados à justiça.

Por outro lado, essas famílias alegam ser herdeiras legítimas, e deveriam ter direito de do-

mínio sobre a terra enquanto não receberem as indenizações devidas. A proibição ao culti-

vo, portanto, além de não ser justa, compromete seu direito de produção de alimentos e

impede que elas coloquem em prática o trabalho no qual se ocupavam há anos, e através do

qual construíam suas identidades com o território e suas histórias de vida.

“A pessoa tem criação mas nem tem o terreno. O terreno não é da gente,

a gente tá errado. Dos outros é dos outros uai. [...] Nem no terreno da

gente a gente pode porque a gente tá errado.

[...]

A vontade que a gente tem, eu não sei não. É de poder ficar no lugar da

gente. [...] A gente sai do lugar, a gente não tem costume do lugar, não

tem lugar pra fazer nada”.

(Morador do Retiro. Depoimento colhido em 28/07/2014 por Iara Freitas

e Amanda Pacífico).

4. A CONSTRUÇÃO DA NOVA PORTARIA NO RETIRO

Além de se tornar um território onde práticas culturais tradicionais são apenas tole-

radas há dezenas de anos, o Retiro desde fevereiro de 2014 vem sendo palco para uma re-

cente obra (segundo relato dos moradores, iniciada no dia 17/02/2014) para a construção

de uma nova portaria de acesso a turistas, obra que inclui alargamento da via de acesso, a

construção de um estacionamento e de um mirante (Figuras 1, 2 e 3). A obra vem sendo

realizada pelo Departamento de Estradas de Rodagem como medida de compensação e,

segundo relatos dos próprios servidores do Parque, o planejamento da unidade é fazer com

que essa nova portaria seja o principal acesso dos turistas às cachoeiras e demais atrativos

Page 15: UNIVERSIDADE FEDERAL DE MINAS GERAIS · RELATÓRIO PARCIAL ... inter e transdisciplinares, ... uma parcela da sociedade em conservar aquilo que ainda não fora destruído por seus

15 ______________________________________________________________________________ Avenida João Pinheiro, nº 100, Prédio 01, 5º andar, sala 512 – Centro – Belo Horizonte, MG / CEP: 30.130-180. E-mail: [email protected]

locais. Ou seja, os interesses de desfruto paisagístico dos turistas (tidos pela legislação na-

cional apenas como uso indireto – que não envolve dano/destruição ao ambiente) estão

ganhando novas possibilidades de acesso e permanência, e, no caso, em detrimento aos

usos dos proprietários dos terrenos onde estão sendo construídas essas novas “facilidades”.

Conjugam-se no mesmo espaço, de forma mais radical a partir do início dessa obra, usos

distintos associados a um mesmo lugar, a partir de atores com capitais simbólicos muito

diversos para poderem garantir seu direito de voz e de justiça.

Moradores que saíram há mais de vinte anos, e as atuais quatro famílias que ainda

residem no Retiro, assistem, com um misto de decepção e indignação, à destruição que a

ampliação da estrada tem trazido.

Figura 1: A estrada na região do Retiro foi alargada, ganhando uma largura que destoa da paisagem ao redor

e assustou alguns moradores locais. (Foto: Leonardo Vasconcelos de Souza, 2014)

Page 16: UNIVERSIDADE FEDERAL DE MINAS GERAIS · RELATÓRIO PARCIAL ... inter e transdisciplinares, ... uma parcela da sociedade em conservar aquilo que ainda não fora destruído por seus

16 ______________________________________________________________________________ Avenida João Pinheiro, nº 100, Prédio 01, 5º andar, sala 512 – Centro – Belo Horizonte, MG / CEP: 30.130-180. E-mail: [email protected]

Figura 2: Muitas árvores foram derrubadas para dar lugar a um estacionamento, entre elas pés de macaúba

centenários. (Foto: Leonardo Vasconcelos de Souza, 2014)

Figura 3: O mirante construído no lugar do antigo cruzeiro. Imposição de novas lógicas e usos sobre o territó-

rio tradicional. (Foto: Leonardo Vasconcelos de Souza, 2014)

Page 17: UNIVERSIDADE FEDERAL DE MINAS GERAIS · RELATÓRIO PARCIAL ... inter e transdisciplinares, ... uma parcela da sociedade em conservar aquilo que ainda não fora destruído por seus

17 ______________________________________________________________________________ Avenida João Pinheiro, nº 100, Prédio 01, 5º andar, sala 512 – Centro – Belo Horizonte, MG / CEP: 30.130-180. E-mail: [email protected]

O Grupo de Estudos em Questões Agrária (GEQA/UFMG), a Comissão Pastoral da

Terra (CPT/MG), a Comissão de Direitos Humanos da OAB-MG e o Núcleo Interdiscipli-

nar em Investigações Socioambientais (NIISA/UNIMONTES) enviaram um documento ao

MPF no dia 28/04/2014, em que contestam as obras realizadas no Retiro, alegando que elas

infringem os artigos 215 e 216 da Constituição Federal, bem como o Decreto Nº

5.051/2004, que ratificou a Convenção 169 sobre Povos Indígenas e Tribais, da Organiza-

ção Internacional do Trabalho (OIT). O não cumprimento desses determinantes legais

ocorre pois a obra vem comprometendo a valorização e proteção dos direitos, valores e

patrimônios culturais que envolvem os bens materiais e imateriais das famílias residentes

do Retiro, bem como seus modos de vida próprios. Além disso, conforme o Art. 6º da

Convenção 169/OIT, é preciso haver consulta prévia sobre quaisquer medidas que possam

afetar direta ou indiretamente os modos de vida tradicionais dessas populações diferencia-

das, o que, segundo relatos de moradores locais, não ocorreu.

Entre os modos de vida ameaçados, os moradores relatam algumas práticas antigas

relacionadas a um cruzeiro existente ali no Retiro (Figura 3). Era nesse cruzeiro que os

moradores se reuniam para realizar rezas, ocasião em que toda a comunidade se reunia, e

para enterrar bebês que faleciam prematuramente. A solidariedade do grupo social também

era fortalecida quando se reuniam para fazer leilões de comidas preparadas por eles mes-

mos; e o dinheiro arrecadado era utilizado para comprar artefatos utilizados para enfeitar o

cruzeiro nos dias de rezas. Os moradores alegam que, para “fazer chover”, bastava jogar

água nas pedras da base do cruzeiro. Em suma, o cruzeiro era concebido como um local

sagrado e poderoso, em torno do qual se congregava um universo de saberes, sociabilida-

des e práticas locais.

Page 18: UNIVERSIDADE FEDERAL DE MINAS GERAIS · RELATÓRIO PARCIAL ... inter e transdisciplinares, ... uma parcela da sociedade em conservar aquilo que ainda não fora destruído por seus

18 ______________________________________________________________________________ Avenida João Pinheiro, nº 100, Prédio 01, 5º andar, sala 512 – Centro – Belo Horizonte, MG / CEP: 30.130-180. E-mail: [email protected]

Figura 4: O atual cruzeiro do Retiro nem sequer lembra as práticas religiosas e solidárias que presenciava

outrora; suas heranças culturais estão fadadas à memória dos antigos e ao esquecimento. (Foto: Iara Oliveira

Silva e Freitas, 2014)

Atualmente, esse símbolo cultural do Retiro foi deslocado de sua posição tradicio-

nal para dar lugar ao mirante (Figura 4), que, segundo a gestão do PARNA Cipó, será utili-

zado como ponto de vigilância de focos de incêndio. Ao mesmo tempo, ideias sobre me-

lhorar o acesso para turistas, desde a estrada até o novo mirante, têm sido discutidas no

âmbito do Conselho Consultivo do Parque, instância consultiva que deveria contar com

representação desses povos tradicionais expulsos do parque, mas cujo estatuto permite par-

ticipação apenas de pessoas jurídicas. Esses moradores e ex-moradores ainda não se orga-

nizaram para criar uma associação e pleitear espaço de participação nesse conselho.

Ao ampliar os conflitos gerados pela implantação do PARNA Cipó, a obra no Reti-

ro também contraria o conteúdo da Política Nacional de Desenvolvimento Sustentável dos

Povos e Comunidades Tradicionais (PNPCT) – Decreto N° 6.040/2007 –, da Política Esta-

dual para o Desenvolvimento Sustentável dos Povos e Comunidades Tradicionais de Minas

Gerais (PEPCT) – Lei N° 21.147/2014 e do Art. 42 do SNUC – Lei 9.985/2000 –, que pre-

Page 19: UNIVERSIDADE FEDERAL DE MINAS GERAIS · RELATÓRIO PARCIAL ... inter e transdisciplinares, ... uma parcela da sociedade em conservar aquilo que ainda não fora destruído por seus

19 ______________________________________________________________________________ Avenida João Pinheiro, nº 100, Prédio 01, 5º andar, sala 512 – Centro – Belo Horizonte, MG / CEP: 30.130-180. E-mail: [email protected]

vê que em casos de comunidades com modos de vida tradicionais vivendo em Parques (en-

quanto esperam suas indenizações ou reassentamentos) deva haver a compatibilização de

sua presença com os objetivos da UC “sem prejuízo dos modos de vida, das fontes de sub-

sistência e dos locais de moradia destas populações”, o que não foi respeitado nem antes,

nem durante as obras.

Percebe-se que esses novos usos destinados autoritariamente ao território ignoram

as relações humanas que ocorreram e ainda ocorrem ali, bem como o processo de territo-

rialização construído no lugar, incluindo os pés de macaúba, o rio e demais elementos que

caracterizam os modos de vida das famílias ali presentes e das que dali foram expulsas.

Além disso, o mesmo documento enviado ao MPF no dia 28/04/2014 contestou o

fato de não ter sido realizado um estudo sobre os impactos ambientais que seriam gerados

em decorrência da obra no Retiro. Em resposta aos questionamentos feitos pelo MPF sobre

as obras, o ICMBio divulgou uma nota técnica afirmando não haver dano algum ao ambi-

ente. Contudo, não foram apresentados quaisquer dados sobre hidrografia, vegetação, fau-

na, geologia, aspectos sociais ou mesmo documento do órgão licenciador (no caso de UCs,

o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis – IBAMA)

que provasse a inexigibilidade de licença ambiental, em descumprimento das Instruções

Normativas Nºs 04/2009 e 05/2009 do ICMBio. Em contrapartida, os relatos de moradores

locais nos dizem que houve carreamento de sedimentos para dentro de suas proprieda-

des/posses; os materiais utilizados para a realização da obra, bem como a terra remexida

foram empilhados na beira da estrada dificultando o acesso da população do Retiro (em

grande parte idosa) a suas casas; e houve derrubada de um grande número árvores, ao que

uma das moradoras afirmou sentir dor, dor profunda, ao ver os diversos pés de macaúba

serem derrubados em frente à casa de seus parentes, sem poder fazer nada (Depoimento

colhido em 22/02/2014 por Ana Beatriz Vianna Mendes).

Assim sendo, pergunta-se: por que os moradores foram cerceados em suas ativida-

des ao longo de todos esses anos, não podendo, em muitos casos, nem ao menos residir de

forma digna, e muito menos manter seu modo tradicional de vida, se tudo o que eles fazem

é muito menos impactante do que as obras em andamento?

Pois, se movimentações de terra por maquinário pesado, supressão de vários indiví-

duos da flora de uma só vez e outras atividades que estão ocorrendo, não têm impacto am-

Page 20: UNIVERSIDADE FEDERAL DE MINAS GERAIS · RELATÓRIO PARCIAL ... inter e transdisciplinares, ... uma parcela da sociedade em conservar aquilo que ainda não fora destruído por seus

20 ______________________________________________________________________________ Avenida João Pinheiro, nº 100, Prédio 01, 5º andar, sala 512 – Centro – Belo Horizonte, MG / CEP: 30.130-180. E-mail: [email protected]

biental significativo; então, pergunta-se: qual o impacto ambiental de uma família vivendo

da agricultura familiar? Quais são os critérios definidores desses impactos?

Percebe-se, assim, que as comunidades tradicionais que vivem na região do Retiro,

têm sido reiteradamente vítima de violação de direitos, desde há muito tempo sendo proi-

bidas de manter seus modos de vida e suas fontes de subsistência.

Outra prática cultural que ainda se faz presente na Serra do Cipó é o aluguel de ca-

valos e a contratação de guias locais para passeios turísticos. Dentro do PARNA Cipó,

existem aqueles servidores que consideram a atividade como comprometedora dos objeti-

vos de conservação da unidade, uma vez que os cavalos poderiam ser responsáveis pela

dispersão de sementes de espécies invasoras. A proibição da prática do turismo equestre no

Parque foi suspensa em 2008, mas recentemente ela tem sido colocada em pauta nas reuni-

ões do Conselho Consultivo da unidade para serem discutidas alterações que melhor aten-

dam os interesses dos cavaleiros, dos turistas e que também não comprometam tanto o am-

biente natural.

Apesar de entender que a atividade não deva ser proibida por consistir uma prática

de subsistência para algumas famílias locais, um servidor do PARNA Cipó, chegou a clas-

sificar o turismo equestre como uma atividade em extinção, que será substituída com o

tempo. Nesse sentido, o servidor indica que prefere tolerar a presença dos cavaleiros ao

invés de gerar maiores discordâncias com a população local, aguardando que o problema

seja resolvido com o tempo.

Recentemente, entretanto, houve um novo entendimento sobre a atividade por parte

da atual gestão e tem sido criada uma associação para regular o trabalho dos cavaleiros no

Parque Nacional da Serra do Cipó. Conforme apresentou o Boletim Informativo Nº15/2014

do Parque, o Conselho Consultivo, em reunião do dia 10/09/2014, recomendou por unani-

midade a reorganização da atividade, que passará a ser exercida em uma trilha própria. A

associação recém criada testou, durante 90 dias, o novo formato pensado para os passeios

equestres, mas o Boletim Informativo nem sequer menciona o descontentamento dos cava-

leiros com as novas regras de segurança e exigências veterinárias de vacinas e cuidados

com os animais impostas, e que tornaram inviável a realização da atividade, conforme in-

dicam relatos de moradores e ex-moradores que trabalham ou trabalhavam com a ativida-

de.

Page 21: UNIVERSIDADE FEDERAL DE MINAS GERAIS · RELATÓRIO PARCIAL ... inter e transdisciplinares, ... uma parcela da sociedade em conservar aquilo que ainda não fora destruído por seus

21 ______________________________________________________________________________ Avenida João Pinheiro, nº 100, Prédio 01, 5º andar, sala 512 – Centro – Belo Horizonte, MG / CEP: 30.130-180. E-mail: [email protected]

5. RELATOS LOCAIS

5.1 O caso de Dona Deusdita

Relata-se, a seguir, um caso recente de multa aplicada a uma ex-moradora que de-

cidiu construir um barraco em cima da fundação de sua casa antiga, que foi abandonada em

razão das proibições de uso da terra com a chegada do parque.

Cabe fazer uma descrição pormenorizada do caso de dona Deusdita, pois o conside-

ramos emblemático sobre a forma como o Parque Nacional da Serra do Cipó, em particu-

lar, e muitos parques no Brasil, em geral, têm sido implantados, especialmente no que diz

respeito à relação que passa a ser estabelecida entre o órgão ambiental e povos e comuni-

dades tradicionais que tinham referido local como lugar ou território, no sentido antropoló-

gico.

Dona Deusdita, que atualmente tem em torno de 50 anos, relata que seu avô foi

nascido e criado no Retiro e suas terras ficaram de herança para vários herdeiros:

“Nós viveu sofrendo demais da conta mesmo e viveu naquele lugar [Reti-

ro] a vida inteira: nasceu, criou, foi até morrer, num acomodou, sempre

dentro do terreno e a gente cultivando o terreno, plantando, tudo as coi-

sas que a gente tirava era do terreno, plantava as coisas tudo, colhia de

lá de dentro do terreno e assim nós foi vivendo. (...) A vida inteira nós

planta. Nós plantava todos os mantimentos, plantava arroz, plantava mi-

lho, plantava cana, plantava feijão o terreiro era todo limpinho todo

cheio de planta, quando era esse tempo assim que não era tempo das

águas, nós fazia aquelas vasilhas de barro, essas panelas, essas vasilhas

de barro, nós fazia aquilo tudo, nós fazia telha. Aí depois que entrou esse

IBAMA, esse parque aí, aí foi só não podia plantar, não podia criar um

bicho, a gente tinha que ficar ali como se tivesse presa, não podia fazer

nada. (...) Aí nisso meu pai morreu, ficou minha mãe e meus irmãos, aí

eles foram saindo também, um saiu, o outro saiu e eu tinha, eu morava lá

nessa época eu morava lá perto, em torno, do Jorge [irmão], eu era vizi-

nha dele lá, morava ali pertinho, e com cinco meninos pequenos, construí

uma casinha no sofrimento, só Deus é que sabe o sofrimento que foi pra

mim construir uma casinha lá com esses meninos pequenos, de menor.

Aí, aí bom, um dia chegou lá era o Albino [chefe do parque à época]

ainda, o Albino e um moço chegou lá e disse, olha quarenta dias pra de-

socupar a área do parque, quarenta dias, e eu fiquei doida, pra onde eu

ia com esse tanto de menino, não tinha pra onde eu ir com a meninada

toda pequena. Aí falei Meu Deus do céu, o que eu vou arrumar? (...) A

gente sem saber o que fazia com essa meninada pequena e falou [com o

Prefeito] se conseguir um lote pra mim já é uma boa. Aí ficou esperando,

esperando quando foi na ocasião de, ai eles [funcionários do parque] só

apertando pra sair, quando foi na ocasião de repartir o lote, aí eu voltei

lá, aí o prefeito já tinha passado pro vice prefeito, que ele já tinha saído

e disse: que assim a lista tem os nomes das pessoas que tá desapropriada

Page 22: UNIVERSIDADE FEDERAL DE MINAS GERAIS · RELATÓRIO PARCIAL ... inter e transdisciplinares, ... uma parcela da sociedade em conservar aquilo que ainda não fora destruído por seus

22 ______________________________________________________________________________ Avenida João Pinheiro, nº 100, Prédio 01, 5º andar, sala 512 – Centro – Belo Horizonte, MG / CEP: 30.130-180. E-mail: [email protected]

da área do parque, que é pra dar o lotinho pra eles, o lote pra eles. Aí o

moço começou, aí eu fui lá: “ah não, eu não vou dar o lote, porque o lote

é só pro povo que mora de aluguel”, eu falei “uai, mas eu tô lá dentro

sem lugar de ir, eu tenho o terreno porque o terreno é da gente é, o ter-

reno é da gente. Ele falou: “ah não, eu vou ver”. Aí vou ver, vou ver, tira

pra um, tira pra outro, tira pra um, tira pra outro e o meu ele não me

deu. Aí ficou lá naquele sofrimento não tinha jeito de trabalhar lá mais

eu com os meninos pequenos: deixava eles lá e descia e trabalhava lá

perto do Açude [região relativamente distante]. A pé, deixava os meninos

pequenos em casa e trabalhava lá porque tinha arrumado um serviço de

faxina lá e fazia faxina, pegava meu dinheiro pra comprar as coisas pros

meninos e por aí eu fui. Por aí fui.” (Depoimento colhido em 19/01/2014

por Ana Beatriz Vianna Mendes).

No entanto, depois de alguns anos vivendo dessa forma, Dona Deusdita desistiu de

tentar viver em sua própria terra, e foi viver no distrito, pois ela relata que quando chegou

“o parque”:

“(...) Nas terras da gente, que já era da gente plantar, você não podia

limpar pra plantar uma coisa que eles chegavam e diziam que não podia

e a gente deixava. Ia pegar um pau de lenha seco, que a gente nem co-

nhecia fogão de gás, nós tinha fogão de lenha, nós tava de um jeito que

não podia pegar nem um pau de lenha pra acender o fogão que eles não

deixavam, eles não estavam deixando, você tinha que pegar escondido

lenha seca no mato, podre assim, cê tinha que catar escondido deles, eles

não deixavam. Aí foi assim, foi assim, aí falei: eu não tô aguentando mais

esse trem não, vivendo desse jeito, aí eu falei com o João [marido] que é

esse que tava quando você chegou: falei vê se a gente arruma um lugar-

zinho e compra, vê o que a gente faz. Arruma um pedacinho em um lugar

lá embaixo e sai daqui, porque aqui não tá tendo jeito de ficar mais não,

porque não pode mexer com nada. Sai dessa distância pra trabalhar e

vinha comprar as coisas os mantimentos, tinha que ser aqui embaixo,

buscar na cabeça. Aí que ele conversou com o patrão dele, aí o patrão

dele falou: não, tem um pedaço de terra ali, cê vai lá e faz uma casa lá,

constrói uma casinha lá pro cês ir morando até vê no que vai dá. Aí onde

nós veio parar aqui; e o Retiro nem o dinheiro, nem a terra, e eu tinha, tá

até marcado, quer ver, minha casinha aqui de adobe. Tá até no papel que

eles mandou, eles mandou esse papel pra cá, quer ver? Tá aqui, pode ler

que você vai ver que eu tinha uma casinha separada de adobe e não sei o

que mais, até uma eguinha preta eu tinha, aí eu desfiz dela porque eu não

tinha lugar pra pôr ela, o prazo tava só vencendo, só chegando e eu fa-

lei: uai tem que caçar jeito de sair daqui e assim a gente tá até hoje, não

recebeu nem a terra nem dinheiro e nem nada.” (Depoimento colhido em

19/01/2014 por Ana Beatriz Vianna Mendes).

E foi assim que, passados mais de vinte anos, sem ter qualquer indenização seja pe-

la terra, pelas benfeitorias, pelas criações ou mesmo por danos morais, vendo a realização

do empreendimento de construção do estacionamento para a nova portaria no Retiro, cons-

truída em parte, em suas próprias terras, que Dona Deusdita decidiu construir um barraco

Page 23: UNIVERSIDADE FEDERAL DE MINAS GERAIS · RELATÓRIO PARCIAL ... inter e transdisciplinares, ... uma parcela da sociedade em conservar aquilo que ainda não fora destruído por seus

23 ______________________________________________________________________________ Avenida João Pinheiro, nº 100, Prédio 01, 5º andar, sala 512 – Centro – Belo Horizonte, MG / CEP: 30.130-180. E-mail: [email protected]

de 29,14 metros quadrados para guardar ferramentas para cultivo das poucas roças que

conseguiu manter precariamente no local ao longo de todos esses anos.

Figura 5: Barracão construído por Dona Deusdita. (Foto: Giulia Volpini Soares de Gouvêa, 2014)

Deusdita visitava com frequência o Retiro, onde ainda residiam alguns parentes e

amigos, faziam pequenas roças e iam passear. O barracão de alvenaria foi construído exa-

tamente em cima da fundação de sua casa antiga (a casa construída com muito sofrimento,

quando os filhos eram pequenos, e que foi abandonada entre as décadas de 80 e 90). Sobre

essa casa, Deusdita relata “Minha casa ficou lá, não sei o que eles fizeram com ela, se

desmanchou ela e jogou ela no chão... Que as casas que a gente saía, eles iam e desman-

chavam ela, carregavam o telhado pra eles” (Depoimento colhido em 19/01/2014 por Ana

Beatriz Vianna Mendes).

O barraco foi construído durante sete dias e seu perímetro era bem menor do que a

casa antiga cujo fundamento ainda estava preservado: “Essa daqui [antiga] era cinco cô-

modo. Agora [construiu uma de] um cômodo só, só pra gente guardar as ferramenta que a

gente mexe aqui... e se a gente tiver mexendo aqui e vier uma chuva, a gente vai ficar aqui

tomando ela toda? Tem o cantinho da gente se esconder” (Depoimento colhido em

31/05/2014 pela equipe do Projeto Cipó).

Page 24: UNIVERSIDADE FEDERAL DE MINAS GERAIS · RELATÓRIO PARCIAL ... inter e transdisciplinares, ... uma parcela da sociedade em conservar aquilo que ainda não fora destruído por seus

24 ______________________________________________________________________________ Avenida João Pinheiro, nº 100, Prédio 01, 5º andar, sala 512 – Centro – Belo Horizonte, MG / CEP: 30.130-180. E-mail: [email protected]

Por realizarem esta pequena construção, em local onde outrora havia sua casa de

morada, construída com muito sacrifício e da qual alega nunca ter recebido qualquer inde-

nização, receberam um auto de infração que determinava que a obra fosse embargada, fos-

se demolida (segundo relata, ela mesma teve que demolir, caso contrário teria que arcar

com os custos da demolição e limpeza do local, conforme instrução repassada por servidor

do ICMBio), e, além disso, recebeu uma multa no valor de mil e duzentos reais.

Page 25: UNIVERSIDADE FEDERAL DE MINAS GERAIS · RELATÓRIO PARCIAL ... inter e transdisciplinares, ... uma parcela da sociedade em conservar aquilo que ainda não fora destruído por seus

25 ______________________________________________________________________________ Avenida João Pinheiro, nº 100, Prédio 01, 5º andar, sala 512 – Centro – Belo Horizonte, MG / CEP: 30.130-180. E-mail: [email protected]

Figura 6: Auto de infração recebido por Deusdita.

Page 26: UNIVERSIDADE FEDERAL DE MINAS GERAIS · RELATÓRIO PARCIAL ... inter e transdisciplinares, ... uma parcela da sociedade em conservar aquilo que ainda não fora destruído por seus

26 ______________________________________________________________________________ Avenida João Pinheiro, nº 100, Prédio 01, 5º andar, sala 512 – Centro – Belo Horizonte, MG / CEP: 30.130-180. E-mail: [email protected]

Além de tudo isso, Dona Deusdita foi intimada a comparecer, no dia 11/11/2014,

no Ministério Público Federal, em Belo Horizonte, “para prestar esclarecimentos pessoais

e se manifestar sobre a proposta de realização de um Termo de Ajustamento de Conduta”;

e à Polícia Federal, também em Belo Horizonte, no dia 19/11/2014, “a fim de prestar escla-

recimento no interesse da Justiça” e responder ao crime causado por danos ao meio ambi-

ente.

6. TERMO DE COMPROMISSO

Visando o consenso entre conservação da biodiversidade e garantia de práticas tra-

dicionais, o SNUC (em seu Art. 39) estabelece que em caso de áreas de proteção integral

seja criado um Termo de Compromisso (TC), a partir de negociação entre o órgão gestor e

as populações tradicionais atingidas, o que nunca aconteceu, colocando o PARNA Cipó em

mais uma situação de ilegalidade.

O TC é definido como um instrumento de caráter transitório (uma vez que possui

validade) para a mediação de conflitos em UCs e também consiste em um mecanismo legal

de promoção do diálogo entre população e Estado, tendo potencial para diminuir restrições

da população local e garantir uma melhor consolidação dos objetivos de conservação pre-

vistos para a UC. O Termo é, portanto, um mecanismo baseado em princípio de respeito à

diversidade cultural e ao diálogo, que, se bem feito, terá implicações positivas tanto para a

conservação ambiental, quanto para a manutenção do patrimônio cultural representado por

essas famílias e seus modos diferenciados de vida. Ele pode ser celebrado entre moradores

e usuários da UC que sejam povos e comunidades tradicionais e que não tenham sido inde-

nizadas ou reassentadas pelo poder público.

Para os servidores do PARNA Cipó entrevistados, o TC pode solucionar o conflito

existente já que traria maior segurança para os processos de gestão da unidade, formalizan-

do a condição de moradia e de usuários, definindo as atividades que podem, ou não, ser

realizadas por essas famílias. Apesar da Justiça já ter dado a imissão de posse do território

ao órgão ambiental, o MPF contesta o processo e solicita sua anulação. Dentro desse con-

texto, um TC poderia impedir que novas ordens (administrativas ou judiciais) para a desa-

propriação dos moradores tivessem que ser cumpridas antes que se chegasse a uma conclu-

são entre a legalidade ou não do processo fundiário.

Page 27: UNIVERSIDADE FEDERAL DE MINAS GERAIS · RELATÓRIO PARCIAL ... inter e transdisciplinares, ... uma parcela da sociedade em conservar aquilo que ainda não fora destruído por seus

27 ______________________________________________________________________________ Avenida João Pinheiro, nº 100, Prédio 01, 5º andar, sala 512 – Centro – Belo Horizonte, MG / CEP: 30.130-180. E-mail: [email protected]

Um ex-chefe do PARNA Cipó alega que tentou criar um Termo de Compromisso

com os moradores do Retiro (Depoimento colhido em 08/09/2014 pela equipe do Projeto

Cipó), mas a proposta foi barrada pelo escritório central do ICMBio, pois, à época, não

havia uma diretriz do órgão que definia os critérios para se redigir tal Termo. De forma um

tanto contraditória, esse ex-chefe assume que chegou a morar em uma casa dentro do Par-

que (Depoimento colhido em 08/09/2014 pela equipe do Projeto Cipó). Relatos de funcio-

nários da unidade confirmam a prática e apontam que o fato não era bem visto pela equipe.

Tem-se aqui um paradoxo envolvendo o PARNA Cipó, pois, enquanto famílias eram criti-

cadas e viviam sob ameaça constante de serem despejadas, o responsável por garantir a

ausência desses moradores no Parque ia contra as regras da própria unidade.

A Instrução Normativa ICMBIO/Nº 26/2012 trouxe as diretrizes para a criação de

um TC, contudo, os servidores do PARNA Cipó afirmam que criar a Instrução Normativa

não basta, sendo necessário capacitar a equipe para redigir e aplicar esses TCs. Além disso,

pelo fato do “Termo de Compromisso [ser] uma coisa nova no próprio Instituto Chico

Mendes em nível nacional”, é preciso dar tempo para que esse novo instrumento possa “se

instituir de forma concreta” (Servidor do PARNA Cipó. Depoimento colhido em

20/01/2014 por Ana Beatriz Vianna Mendes). Atualmente já foram celebrados 8 Termos

de Compromisso em Unidades de Conservação de proteção integral brasileiras, sobrepos-

tas a territórios tradicionais.

A aplicabilidade desses TCs também é dificultada pela negação das comunidades

em participar de sua elaboração, conforme previsto na IN Nº 26. Os servidores alegam que

isso ocorre devido à população desconfiar dos agentes ambientais. “Desconfia com razão?

Sim, desconfia com razão. Nós temos um histórico de relação de conflito com essas popu-

lações” (Servidor do PARNA Cipó. Depoimento colhido em 28/07/2014 pela equipe do

Projeto Cipó). Enquanto os moradores não passarem a confiar no Instituto, redigir um

Termo desses será impossível, já que o ideal e determinação legal é que as comundiades

participem do processo de construção do texto do TC.

A princípio, o fato da população atribuir a culpa das injustiças que sofrem aos ser-

vidores do órgão ambiental pode ser considerado como uma confusão que precisa ser sa-

nada. Para alguns servidores do PARNA Cipó não há confusão nisso, pois, uma vez que

eles, como servidores públicos, representam o órgão ambiental, eles também passam a re-

presentar todas as ações praticadas e ainda em prática pelo Estado e seus órgãos ambien-

Page 28: UNIVERSIDADE FEDERAL DE MINAS GERAIS · RELATÓRIO PARCIAL ... inter e transdisciplinares, ... uma parcela da sociedade em conservar aquilo que ainda não fora destruído por seus

28 ______________________________________________________________________________ Avenida João Pinheiro, nº 100, Prédio 01, 5º andar, sala 512 – Centro – Belo Horizonte, MG / CEP: 30.130-180. E-mail: [email protected]

tais, sejam consideradas positivas ou negativas do ponto de vista da população local. A

falta de diálogo com alguns moradores, como no caso de Dona Clemência é “por nossa

própria culpa. Por nossa própria culpa, forma de se fazer a gestão da unidade, de como

fazia... A gente tem um passivo. A gente entende isso.” (Servidor do PARNA Cipó. De-

poimento colhido em 20/01/2014 por Ana Beatriz Vianna Mendes). Um morador do Reti-

ro, por sua vez, deixa claro que seu problema é com o Estado, “o Parque não, o Estado. O

Parque não tem nada a ver. É o Estado.” (Depoimento colhido em 28/07/2014 por Giulia

Gouvêa e Leonardo de Souza).

É preciso reforçar que esses Termos de Compromisso só são previstos para o caso

de residentes enquadrados como populações tradicionais. A legislação que garante o direito

dessas populações define que é, em primeiro lugar, o autoreconhecimento desses povos

como tradicionais o que fundamenta o seu reconhecimento como tais. Entretanto, por esta

legislação ser relativamente nova no âmbito do Estado brasileiro, não há ainda institucio-

nalidades e procedimentos administrativos muito claros sobre como operar esse reconhe-

cimento por parte da administração. Recentemente houve a publicação de um Manual de

Atuação do Ministério Público Federal intitulado “Territórios de Povos e Comunidades

Tradicionais e as Unidades de Conservação de Proteção Integral: alternativas para o asse-

guramento dos direitos socioambientais” (Grabner, Simões & Stucchi, 2014) que merece

ser levado em consideração não apenas por membros do Ministério Público Federal, mas

também por gestores de Unidades de Conservação de Proteção Integral, para que tenham

diretrizes de como atuar nesses casos de sobreposição.

As falas dos servidores do Parque revelam que eles mesmos não entendem total-

mente os procedimentos para que essas famílias sejam enquadradas como populações tra-

dicionais e tenham direito a participarem do TC, ou mesmo de um processo de reassenta-

mento.

Dentro dos fatos e relatos apresentados acerca dos diversos pontos que envolvem a

questão do conflito no caso do PARNA Cipó, percebe-se que o processo autoritário e into-

lerante de criação, implantação e gestão de UCs, que também ocorre no contexto do PAR-

NA Cipó, se dá devido ao engessamento da unidade regulatória em contraposição à diver-

sidade de situações. Parte dos processos de desapropriação que envolvem o PARNA Cipó

permanecem ainda em aberto, fazendo com que moradores e ex-moradores do território

tido atualmente como Parque estejam ainda hoje reivindicando por seus direitos. Entre

Page 29: UNIVERSIDADE FEDERAL DE MINAS GERAIS · RELATÓRIO PARCIAL ... inter e transdisciplinares, ... uma parcela da sociedade em conservar aquilo que ainda não fora destruído por seus

29 ______________________________________________________________________________ Avenida João Pinheiro, nº 100, Prédio 01, 5º andar, sala 512 – Centro – Belo Horizonte, MG / CEP: 30.130-180. E-mail: [email protected]

estes encontram-se, principalmente, as indenizações justas por suas terras e, enquanto tais

indenizações não são realizadas, a garantia de que possam utilizar suas terras de modo a

assegurar seus modos de vida.

7. CONCLUSÃO

Como conclusão deste relatório limitamo-nos a transcrever a Carta Aberta à Popu-

lação Cipoense e ao ICMBio, elaborada por pesquisadores, colaboradores e famílias tradi-

cionais que viviam na área que virou parque e aquelas que nele ainda vivem, publicada no

dia 19 de outubro de 2013. Um ano se passou e nada foi feito. Ou melhor, as obras do esta-

cionamento no Retiro estão sendo concluídas.

CARTA ABERTA À POPULAÇÃO CIPOENSE E AO ICMBIO

"A memória vem e salva, a memória vem e guarda, guarda o cheiro da minha terra, a música do meu povo, a certeza de hoje e sempre que ninguém vai nos tirar."

(Milton Nascimento)

A Serra do Cipó, no coração de Minas Gerais, é uma região marcada pela alta diversidade

biológica e cultural. Situada na porção média da Cadeia do Espinhaço, a Serra é divisor de águas

das bacias do Rio São Francisco e Rio Doce. A leste predomina a Mata Atlântica, a oeste o Cerra-

do, e, nas áreas de maior altitude, os campos rupestres. Foram nestes ambientes que as comuni-

dades da Serra do Cipó construíram sua história, sua cultura e sua memória. O uso múltiplo de

uma paisagem tão heterogênea é uma característica marcante dessas comunidades, com os plan-

tios de arroz e feijão nas baixadas, o extrativismo vegetal no cerrado, a criação de gado no alto da

Serra e, há cerca de quatro décadas, também era freqüente a extração de sempre-vivas nos cam-

pos rupestres. Em séculos de convivência com os ecossistemas locais, as comunidades construí-

ram complexos saberes ecológicos sobre o manejo das espécies e paisagens que garantiram por

gerações a perpetuação de seus modos de vida e ambientes.

Todavia, a implantação do Parque Nacional da Serra do Cipó (PNSCi) nos anos de 1970,

no auge da ditadura militar, iniciou uma nova etapa na vida das comunidades. Dezenas de famí-

lias tiveram que, de forma abrupta, deixar suas casas, sua história e suas terras e mudar para

outros municípios ou para o distrito de Cardeal Mota. Os diversos relatos feitos durante esse reen-

contro apontaram a violência física e simbólica que marcou o processo de criação do Parque,

Page 30: UNIVERSIDADE FEDERAL DE MINAS GERAIS · RELATÓRIO PARCIAL ... inter e transdisciplinares, ... uma parcela da sociedade em conservar aquilo que ainda não fora destruído por seus

30 ______________________________________________________________________________ Avenida João Pinheiro, nº 100, Prédio 01, 5º andar, sala 512 – Centro – Belo Horizonte, MG / CEP: 30.130-180. E-mail: [email protected]

sendo que grande parte dos ex-moradores nunca recebeu nenhum tipo de indenização. O que deu

início a um processo de dramas sociais vivenciados por estas comunidades que tiveram seus mo-

dos de vida profundamente modificados com a criação do PNSCi e a violação de seus direitos.

A hostilidade no trato, o silenciamento de suas memórias e as violências sofridas por essas comu-

nidades, levaram pesquisadores(as) e entidades abaixo assinadas, participantes do Reencontro

dos povos e comunidades do Cipó, realizado nos dia 18 e 19 de outubro de 2013, denunciar as

diversas violações dos direitos humanos ocorridas historicamente durante a criação e implantação

do PNSCi. Queremos também reafirmar nossa solidariedade à luta dessas comunidades pelo seu

direito à memória exigindo a justa indenização por suas perdas materiais, culturais e sociais, bem

como reparação pelos danos morais que tenham sido causados no processo de implementação

do PNSCi. Neste sentido, exigimos do ICMBio:

1. Pedido de desculpas feito publicamente às comunidades tradicionais expropriadas de suas ter-

ras tradicionalmente ocupadas para implementação do PARNA Serra do Cipó, pelos sérios danos

causados a elas;

2. Transparência e facilidade de acesso aos processos de indenização junto aos grupos familiares

expropriados, assim como o imediato pagamento dos mesmos;

3. Listar e prestar conta dos bens materiais (utensílios domésticos, móveis, entre outros) perten-

centes a estes grupos e que foram levados para Museu em Paraopeba e/ ou extraviados para

outros lugares;

4. Transparência e discussão junto às comunidades a serem atingidas e à população cipoense

sobre o processo de ampliação do Parque Nacional da Serra do Cipó que está em tramitação sem

conhecimento dos mesmos. Exige-se a realização de estudos ecológicos, sociais e culturais que

verifiquem a viabilidade dessa ampliação, incluindo consultas públicas e outras formas de oitiva da

população local e a ser atingida. Ressalta-se fortemente que a criação de parques ou ampliação

de seus limites deve respeitar a legislação nacional – em especial o SNUC e as Convenções 169

da OIT e da Diversidade Biológica;

5. Exige-se o direito à permanência das famílias tradicionais ainda resistentes na região do Retiro,

respeitando suas formas tradicionais de apropriação e uso do ambiente, garantindo sua reprodu-

ção social e segurança alimentar, ameaçadas pelas restrições impostas pelo Parque. Neste senti-

do, exige-se tão somente o cumprimento da legislação ambiental e territorial que protege a integri-

dade destes povos e sua permanência no território (Constituição Federal, arts. 215 e 216; Con-

venção 169 da OIT; Convenção sobre a Diversidade Biológica; SNUC; Plano Nacional de Áreas

Protegidas; Política Nacional de Desenvolvimento Sustentável de Povos e Comunidades Tradicio-

nais, dentre outros, que asseguram a proteção dos direitos e modos de vida de povos tradicio-

nais);

Page 31: UNIVERSIDADE FEDERAL DE MINAS GERAIS · RELATÓRIO PARCIAL ... inter e transdisciplinares, ... uma parcela da sociedade em conservar aquilo que ainda não fora destruído por seus

31 ______________________________________________________________________________ Avenida João Pinheiro, nº 100, Prédio 01, 5º andar, sala 512 – Centro – Belo Horizonte, MG / CEP: 30.130-180. E-mail: [email protected]

6. A paralisação imediata das obras para criação de estacionamento e de nova portaria do Parque,

pois estão sobrepostas às terras tradicionalmente ocupadas pelas famílias tradicionais do Retiro,

que não foram indenizadas e que não querem deixar seu território e modo de vida construído no

lugar. Além disso, ressalta-se que esta medida implica no desmatamento de áreas de campo ru-

pestre protegidas por lei ambiental.

7. Exige-se que haja respeito e valorização não apenas da biodiversidade do Parna Serra do Cipó,

mas da sociodiversidade ali presente, incluindo o respeito e fomento à manutenção de seus mo-

dos de vida, que foram responsáveis pela proteção dessa paisagem e desse ecossistema durante

gerações e que correm o risco de serem sumariamente extintos por uma visão equivocada e ultra-

passada de conservação ambiental.

Assinam esta carta os participantes do Reencontro dos povos e comunidades do Cipó:

- Moradores do Retiro; expropriados pelo Parque Nacional da Serra do Cipó; Quilombo do Açude;

Representantes das (os) Apanhadores de Flores e Quilombo do Inhaí (atingidos pelo PARNA

Sempre Viva-Diamantina); Profa. Dra. Felisa Anaya (NIISA- UNIMONTES); Prof. Dr. Rômulo Bar-

bosa (NIISA- UNIMONTES); Profa. Dra. Ana Beatriz Vianna Mendes (GESTA e Cidade e Alterida-

de - UFMG), Prof. Dr Claudenir Fávero – UFVJM; Fernanda Monteiro – CAA- Norte de Minas; Prof.

Dr. Emmanuel Duarte Almada - Laboratório de Estudos Bioculturais (Fundação Helena Antipoff); e

Profa. Dra. Márcia Spyer (UFMG).

Santana do Riacho, 19 de outubro de 2013

Page 32: UNIVERSIDADE FEDERAL DE MINAS GERAIS · RELATÓRIO PARCIAL ... inter e transdisciplinares, ... uma parcela da sociedade em conservar aquilo que ainda não fora destruído por seus

32 ______________________________________________________________________________ Avenida João Pinheiro, nº 100, Prédio 01, 5º andar, sala 512 – Centro – Belo Horizonte, MG / CEP: 30.130-180. E-mail: [email protected]

Referências Bibliográficas

ACSELRAD, H. Conflitos ambientais no Brasil. Rio de Janeiro: Relumé Dumará,

2004.

ALMADA, Emmanuel Duarte. Entre as Serras: etnoecologia de duas comunidades

quilombolas do sudeste brasileiro. Tese de Doutorado em Ambiente e Sociedade. Univer-

sidade Estadual de Campinas, 2012.

BARRETTO FILHO, H. Da nação ao planeta através da natureza: Uma abordagem

antropológica das unidades de conservação de proteção integral na Amazônia Brasileira.

Dissertação (doutorado) – Universidade de São Paulo, 2001.

BECK, Ulrich. Sociedade de risco: rumo a uma outra modernidade. São Paulo:

Editora 34, 2010.

BOURDIEU, Pierre. O poder simbólico. Rio de Janeiro: Editora Difel, 1989.

CANCLINI, Néstor García. Diferentes, Desiguais e Desconectados: mapas da in-

terculturalidade. Tradução de Luiz Sérgio Henriques. 2ª.ed. Rio de Janeiro: Editora

UFRJ, 2007.

CARDOSO, Cristiane Vilela. As interfaces socioambientais de um lugar em re-

construção: distrito Serra do Cipó/MG. Dissertação de Geografia. Universidade Federal de

Minas Gerais, 2008.

CARDOSO DE OLIVEIRA, Roberto. O Trabalho do Antropólogo. Brasília: Pa-

ralelo 15; São Paulo: Editora UNESP, 2000.

CHAUI, Marilena. Cultura e democracia: o discurso competente e outras falas.

São Paulo: Cortez Editora, 2006.

CLAVAL, P. A Geografia Cultural. Florianópolis: Editora UFSC, 1999.

Da MATTA, Roberto. “Os discursos da violência no Brasil”. In: Roberto Da Matta,

Conta de mentiroso: sete ensaios de antropologia brasileira. P. 175-197. Rio de Janeiro:

Rocco. 1993.

DAVIS, Shelton (org.). Antropologia do direito. Jorge Zahar editora: Rio de Ja-

neiro, 1973.

DIEGUES, A. C. S. O Mito Moderno da Natureza Intocada. São Paulo: HUCI-

TEC / NUPAUB-USP, 3.ed, 2001.

FOUCAULT, Michel. Microfísica do Poder. Rio de Janeiro: Edições Graal, 1979.

Page 33: UNIVERSIDADE FEDERAL DE MINAS GERAIS · RELATÓRIO PARCIAL ... inter e transdisciplinares, ... uma parcela da sociedade em conservar aquilo que ainda não fora destruído por seus

33 ______________________________________________________________________________ Avenida João Pinheiro, nº 100, Prédio 01, 5º andar, sala 512 – Centro – Belo Horizonte, MG / CEP: 30.130-180. E-mail: [email protected]

GADAMER, Hans-Georg. O problema da consciência histórica. Org. Pierre Fru-

chon. Rio de Janeiro: Editora Fundação Getúlio Vargas, 1998.

________. Verdade e Método: traços fundamentais de uma hermenêutica filosófi-

ca. Petrópolis: Vozes, 1998b.

GERHARDT, Cleyton H. A invisibilização do outro nos discursos científicos sobre

áreas naturais protegidas. Recife: XIII Congresso Brasileiro de Sociologia, 2007.

GIDDENS, Anthony. As consequências da modernidade. São Paulo: Editora

Unesp, 1991.

GRABNER, M. L.; SIMÕES, E.; STUCCHI, D. Territórios de povos e comuni-

dades tradicionais e as unidades de conservação de proteção integral: alternativas para

o asseguramento de direitos socioambientais / 6. Câmara de Coordenação e Revisão. Brasí-

lia: MPF, 2014.

IPHAN. Levantamento preliminar do Inventário Nacional de Referências Culturais

da Serra do Cipó/Minas Gerais. Serra do Cipó, Jun. 2011.

LATOUR, B. Políticas da natureza: como fazer ciência na democracia. Bauru, SP:

EDUSC, 2004.

____________. Ciência em ação: como seguir cientistas e engenheiros sociedade

afora. São Paulo: Editora Unesp, 2011.

LOBÃO, Ronaldo. Reservas Extrativistas: de política pública à política do ressen-

timento? In: 25ª Reunião Brasileira de Antropologia, 2006, Goiânia. Saberes e Práticas

Antropológicas: desafios para o século XXI. Goiânia: ABA, 2006.

MENDES, Ana Beatriz V. Conservação ambiental e direitos multiculturais: refle-

xões sobre Justiça. Tese de doutorado apresentada ao Programa Ambiente & Sociedade

NEPAM: Unicamp. Campinas, 2009.

__________. Protegendo diversidades: Entre ambientes e culturas no Estado brasi-

leiro. Teoria & Sociedade, n. 19.2, Belo Horizonte, jul./dez. 2011.

PEIRANO, Mariza. A favor da etnografia. Rio de Janeiro: Relume-Dumará, 1995.

PIRES, João Ricardo Ferreira. Notas de um Diário de Viagem a Minas Gerais: polí-

tica e ciência na escrita viajante do Imperador D. Pedro II (1881). Dissertação de Mestrado

em História. Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, 2007.

RAPPORT, Nigel & Joanna OVERING. Social and Cultural Anthropology: the

key concepts. London: Routledge, 2000.

Page 34: UNIVERSIDADE FEDERAL DE MINAS GERAIS · RELATÓRIO PARCIAL ... inter e transdisciplinares, ... uma parcela da sociedade em conservar aquilo que ainda não fora destruído por seus

34 ______________________________________________________________________________ Avenida João Pinheiro, nº 100, Prédio 01, 5º andar, sala 512 – Centro – Belo Horizonte, MG / CEP: 30.130-180. E-mail: [email protected]

RIBEIRO, B. G. & DRUMOND, M. A. O Termo de Compromisso como ferramen-

ta para a gestão de conflitos em Unidades de conservação. In: GONTIJO, B. et al. (Orgs.)

Anais do VI Seminário Brasileiro sobre Áreas Protegidas e Inclusão Social: Áreas protegi-

das e inclusão social – Tendências e perspectivas, v.6, n.1, Belo Horizonte, 15-20 set.

2013.

SAHLINS, Marshall. O “pessimismo sentimental e a experiência etnográfica: Por

que a cultura não é um “objeto” em via de extinção (parte I). Mana, v.3, n.1, Rio de Janei-

ro, abr. 1997.

SANTOS, Boaventura de Souza. “Por uma concepção multicultural de direitos hu-

manos”. In: Identidades estudos de cultura e poder. FELDMAN-BIANCO, Bela e CA-

PINHA Graça (Orgs.). São Paulo: Hucitec, 2000.

_________. A crítica da razão indolente: contra o desperdício da experiência. Vo-

lume1. Para um novo senso comum: a ciência, o direito e a política na transição paradig-

mática. São Paulo: Cortez, 2007.

SERRES, Michel. O contrato natural. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1991.

SOUZA FILHO, Carlos Frederico Marés de. Bens culturais e proteção jurídica.

Porto Alegre: Unidade Editorial. 1997.

VELSEN, J. Van. A análise situacional e o método de estudo de caso detalhado. In:

FELDMAN-BIANCO (org.) Antropologia das sociedades contemporâneas: métodos. São

Paulo: Global, 1987. (345-374 pp.)

ZUCARELLI, Marcos Cristiano. “A Dupla Face da Política Ambiental: Um Estudo

da Legislação das Unidades de Conservação e sua Aplicabilidade na Serra do Cipó/MG”.

Monografia apresentada para obtenção de título de bacharel em Ciências Sociais, Univer-

sidade Federal de Minas Gerais, 2002.

Legislações

BRASIL. Decreto Nº 90.223, de 25 de Setembro de 1984. Cria, no Estado de Minas

Gerais, o Parque Nacional da Serra do Cipó e dá outras providências. Brasília, 25 set.

1984.

BRASIL. Decreto Nº 94.984, de 30 de Setembro de 1987. Declara de utilidade pú-

blica, para fins de desapropriação, áreas de terras e benfeitorias, integrantes do perímetro

Page 35: UNIVERSIDADE FEDERAL DE MINAS GERAIS · RELATÓRIO PARCIAL ... inter e transdisciplinares, ... uma parcela da sociedade em conservar aquilo que ainda não fora destruído por seus

35 ______________________________________________________________________________ Avenida João Pinheiro, nº 100, Prédio 01, 5º andar, sala 512 – Centro – Belo Horizonte, MG / CEP: 30.130-180. E-mail: [email protected]

abrangido pelo Decreto nº 90.223, de 25 de setembro de 1984, que criou o Parque Nacional

da Serra do Cipó, no Estado de Minas Gerais. Brasília, 30 set. 1987.

BRASIL. Lei Nº 9.985, de 18 de julho de 2000. Institui o Sistema Nacional de Uni-

dades de Conservação e dá outras providências. Brasília, 18 jul. 2000a.

BRASIL. Decreto Nº 4.340, de 22 de agosto de 2002. Regulamenta o SNUC e dá

outras providências. Brasília, 22 ago. 2002.

MINAS GERAIS. Lei Nº 6.605, de 14 de julho de 1975. Autoriza o Poder Executi-

vo a criar o Parque Estadual da Serra do Cipó. Belo Horizonte, 14 jul. 1975.

Documentos

ICMBio. Portaria n.55: Plano de Manejo do Parque Nacional da Serra do Cipó e

Área de Proteção Ambiental Morro da Pedreira – Encarte 1. Diário Oficial da União,

n.127. Brasília, 6 jun. 2009a.

ICMBio. Portaria n.55: Plano de Manejo do Parque Nacional da Serra do Cipó e

Área de Proteção Ambiental Morro da Pedreira – Encarte 2. Diário Oficial da União,

n.127. Brasília, 6 jun. 2009b.

ICMBio. Portaria n.55: Plano de Manejo do Parque Nacional da Serra do Cipó e

Área de Proteção Ambiental Morro da Pedreira – Encarte 3. Diário Oficial da União,

n.127. Brasília, 6 jun. 2009c.

ICMBio. Portaria n.55: Plano de Manejo do Parque Nacional da Serra do Cipó e

Área de Proteção Ambiental Morro da Pedreira – Encarte 4. Diário Oficial da União,

n.127. Brasília, 6 jun. 2009d.

ICMBio. Instrução Normativa Nº 26, de 4 de julho de 2012. Estabelece diretrizes e

regulamenta os procedimentos para a elaboração, implementação e monitoramento de ter-

mos de compromisso entre o Instituto Chico Mendes e populações tradicionais residentes

em unidades de conservação onde sua presença não seja admitida ou esteja em desacordo

com os instrumentos de gestão. Diário Oficial da União, n.130. Brasília, 6 jul. 2012a.

ICMBio. Nota Técnica nº 059/2012 – PARNA SERRA DO CIPÓ/MG. Serra do

Cipó/MG, 10 dez. 2012.

ICMBio. Nota Técnica nº 007/2014 – APA Morro da Pedreira/MG. Serra do Ci-

pó/MG, 14 mar. 2014.

Page 36: UNIVERSIDADE FEDERAL DE MINAS GERAIS · RELATÓRIO PARCIAL ... inter e transdisciplinares, ... uma parcela da sociedade em conservar aquilo que ainda não fora destruído por seus

36 ______________________________________________________________________________ Avenida João Pinheiro, nº 100, Prédio 01, 5º andar, sala 512 – Centro – Belo Horizonte, MG / CEP: 30.130-180. E-mail: [email protected]

MPF. Cumprimento da Sentença em Ação de Desapropriação – Processo n°

2000.38.00.08183-3. Belo Horizonte: Ministério Público Federal, 4 out. 2013.