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UNIVERSIDADE ESTADUAL DO CEARÁ
CENTRO DE CIÊNCIAS E TECNOLOGIA
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM GEOGRAFIADA UECE
MESTRADO ACADÊMICO EM GEOGRAFIA
CHRISTOVAM REIS DOS SANTOS FILHO
O TEMPLO CENTRAL DA IGREJA UNIVERSAL DO REINO DE DEUS EM
FORTALEZA-CE: A COMPREENSÃO DE UM ESPAÇO SAGRADO
FORTALEZA - CEARÀ
2016
CHRISTOVAM REIS DOS SANTOS FILHO
O TEMPLO CENTRAL DA IGREJA UNIVERSAL DO REINO DE DEUS EM
FORTALEZA-CE: A COMPREENSÃO DE UM ESPAÇO SAGRADO
Dissertação apresentada ao Curso de Mestrado
Acadêmico em Geografia do Programa de Pós-
Graduação em Geografia do Centro de
Ciências e Tecnologia da Universidade
Estadual do Ceará, como requisito parcial à
obtenção do título de mestre em Geografia.
Área de Concentração: Geografia.
Orientador: Prof. Dr. Otávio José Lemos Costa
FORTALEZA - CEARÀ
2016
CHRISTOVAM REIS DOS SANTOS FILHO
O TEMPLO CENTRAL DA IGREJA UNIVERSAL DO REINO DE DEUS EM
FORTALEZA-CE: A COMPREENSÃO DO ESPAÇO SAGRADO
Dissertação apresentada ao Curso de Mestrado
Acadêmico em Geografia do Programa de Pós-
Graduação em Geografia do Centro de
Ciências e Tecnologia da Universidade
Estadual do Ceará, como requisito parcial à
obtenção do título de mestre em Geografia.
Área de Concentração: Geografia.
Aprovada em: 16 de dezembro de 2016.
BANCA EXAMINADORA
Prof. Dr. Otávio José Lemos Costa (Orientador)
Universidade Estadual do Ceará - UECE
Prof. Dr. Fabrício Américo Ribeiro
Instituto Federal do Ceará - IFCE
Profa. Dr
a. Zeny Rosendahl
Universidade do Estado do Rio de Janeiro - UERJ
AGRADECIMENTOS
Ao Criador, por despertar o sagrado na vida das pessoas.
À Érica Lima, companheira de vida, de profissão e de lutas e à Ive Sofia, fruto desta união.
À Débora Albuquerque, minha querida mãe e educadora.
Aos meus pais José Neres e Francisca Lima, que, além de gerar minha esposa, me acolheram
em vários momentos da minha vida acadêmica.
Ao Prof. Dr. Otávio José Lemos Costa que sempre confiou na minha capacidade e me
orientou neste trabalho.
À Profa. Dr
a. Claudia Maria Magalhães Grangeiro (in memorian) por todo seu carinho e apoio.
À Profa. Dr
a. Zenilde Baima Amora pelas contribuições ao projeto de pesquisa.
Aos Professores Dr. Christian Dennys Monteiro de Oliveira Dr. Solonildo Almeida da Silva
pelo auxílio em vários momentos da pesquisa e pelas contribuições na qualificação.
Ao Programa de Pós-Graduação em Geografia da Universidade Estadual do Ceará pela
oportunidade de realizar o curso.
Ao Laboratório de Estudos em Geografia Cultural pelo convívio e troca de saberes.
À Terceira Família, que sempre me animou nos momentos de lazer durante o curso.
Aos amigos que torceram pela finalização desta dissertação.
RESUMO
O templo central da Igreja Universal do Reino de Deus em Fortaleza-CE: a compreensão de
um espaço sagrado analisa as práticas religiosas que se dimensiona por meio das formas
simbólicas espaciais. A pesquisa enfatiza uma interpretação de um fenômeno sócioespacial,
representado pela sede estadual da Universal no Ceará. O objetivo principal deste trabalho é
compreender a estrutura socioespacial desta igreja enquanto espaço sagrado para os fiéis. Para
este fim, elencaram-se os seguintes objetivos específicos: distinguir as atividades religiosas,
administrativas e midiáticas existentes na construção do espaço sagrado do templo; identificar
os elementos geossimbólicos transformadores da igreja no espaço sagrado na percepção dos
fiéis; entender as formas simbólicas espaciais na relação entre as práticas do templo e a
formação de uma centralidade simbólica de vivência dos fiéis em busca do sagrado.
Inicialmente, fez-se necessário a construção de um esteio teórico que apontou a aproximação
entre espaço e religião, a partir das formas simbólicas espaciais, portadores de novos
significados mediante a percepção de determinados grupos sociais. Contemplou-se a análise
do real, observação de campo e entrevistas semiestruturadas para captar as essências
percebidas pelos fiéis ao vivenciarem a catedral da Universal de Fortaleza. A análise
direcionou ao entendimento de que a religião como outros aspectos culturais se baseia na
vivência das relações, sendo as formas simbólicas espaciais um meio interativo da captação da
realidade. Neste caso, inferimos que o nosso objeto é um espaço vivido pela experiência
corporal dos fiéis,cuja centralidade religiosa do templo lhes traz um significado representativo
de um centro de eventos, uma espacialidade multifuncional para a prática do sagrado, atuando
ao gosto do fiel. Portanto, o espaço sagrado do templo central da Igreja Universal do Reino de
Deus, em Fortaleza, é para o fiel um centro de conveniência simbólico, sendo o sagrado o
sentimento religioso de resposta aos ritos lá praticados coletiva e/ou individualmente,
compostos por várias funcionalidades simbólicas que remetem a objetividades sociais na vida
dos próprios fiéis. Estas funcionalidades são condições sociais não satisfatoriamente providas
pelo poder público ou econômico, causando uma busca por parte dos indivíduos.
Palavras-chaves: Geografia da Religião. Espaço sagrado. Igreja Universal do Reino de Deus.
RÉSUMÉ
Le temple central de l'Église Universelle du Royaume de Dieu à Fortaleza-CE: la
comprehénsion de um espace sacré analyse les praticques religieuses qu’il se proporcionne
par des formes symboliques spatiales. La recherche met l'accent sur une interprétation d'un
phénomène sociospatiale, représenté par la siège de l'église Universelle en Ceará. L'objectif
principal de ce travail est de comprendre la structure sociospatiale de cette église comme
espace sacré. À cette fin, ils sont comptés les objectifs spécifiques suivants: distinguer les
activités religieuses, administratives et mediatiques existantes dans la construction de l'espace
sacré du temple; identifier des éléments geossymboliques transformateurs de l'église dans un
espace sacré dans la perception des fidèles; entendre les formes symboliques spatiales dans la
relation entre les pratiques du temple et la formation d'une centralité symbolique de
l'expérience des fidèles à la recherche du sacré. Dans un premier temps, il est devenu
nécessaire la construction d'une base théorique, qu’il a vise à un rapprochement entre l'espace
et la religion d’après des formes symboliques espatiales, porteurs de nouvelles significations
par la perception de certains groupes sociaux. Il s’est regardé l'analyse du réel, l'observation
sur le terrain et des entretiens semi-structurés pour capturer les essences perçues par les
fidèles quand ils éprouvent la cathédrale de l’Universelle à Fortaleza. L'analyse a conduit à la
compréhension que la religion em tant qu’autres aspects culturels, est basé sur l'expérience
des relations et des formes symboliques spatiales un moyen interactif de l'abstraction de la
réalité. Dans ce cas, il a en déduit que l’objet est un espace vécu par l'expérience corporelle
des fidèles, dont la centralitée religieuse du temple leur apporte une signification
représentative d'un centre d'événements, une spatialité multifonctionnelle à la pratique du
sacré, à volonté des fidèles. Donc, l'espace sacré du temple central de l'Eglise Universel du
Royaume de Dieu à Fortaleza est pour fidèle une grande boutique symbolique, dans lequel Le
sacré est Le sentiment religieux de réponse à les rites qu’ils la bas sont pratiqué
collectivement et/ou individuellement, composé de diverses fonctions symboliques que se
réfère à les objectivités sociales dans la vie des fidèles eux-mêmes. Ces fonctionnalités sont
les conditions sociales insatisfaisant fournis par la puissance publique ou économique,
provoquant une recherche par des individus.
Mots-clés: Géographie du Religion. Espace sacré. Eglise Universelle du Royaume de Dieu.
LISTA DE ILUSTRAÇÕES
Figura 1 – Coreto do Méier, local do primeiro culto da IURD, na cidade do Rio de Janeiro 74
Figura 2 – Primeira reunião na antiga funerária em 09/07/1977, Abolição, Rio de Janeiro. . 76
Figura 3 – Catedral Mundial da Fé, no Rio de Janeiro. .......................................................... 77
Figura 4 – Tenda de atendimento em frente à entrada principal da IURD-TCF. ................... 94
Figura 5 – Estacionamento interno da IURD-TCF. ................................................................ 99
Figura 6 – Prédio anexo da IURD-TCF................................................................................ 100
Figura 7 – Fachada principal da IURD-TCF. ....................................................................... 101
Figura 8 – Janelas laterais da entrada principal da IURD-TCF. ........................................... 103
Figura 9 – Logomarca da IURD. .......................................................................................... 103
Figura 10 – Prédio de acesso às salas dos pastores. ............................................................... 104
Figura 11 – Estacionamento privativo da IURD-TCF............................................................ 105
Figura 12 – Altar da IURD-TCF ............................................................................................ 108
Figura 13 – Vara de Arão, distribuída durante uma reunião na IURD-TCF. ......................... 124
Figura 14 – Remessa do Jornal Folha Universal em frente à IURD-TCF. ............................. 129
Figura 15 – Exibição do programa Nosso Tempo, da IURD-TCF. ........................................ 130
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO ............................................................................................................. 9
2 ESPAÇO E RELIGIÃO: ABORDAGENS CONCEITUAIS ................................. 16
2.1 ESPAÇO GEOGRÁFICO E A ABORDAGEM CULTURAL E
FENOMENOLÓGICA ................................................................................................. 16
2.2 ESPAÇO SAGRADO ................................................................................................... 25
2.3 A DINÂMICA RELIGIOSA E O ESPAÇO GEOGRÁFICO...................................... 33
3 AS DIMENSÕES DO SAGRADO A PARTIR DAS FORMAS SIMBÓLICAS
ESPACIAIS. ................................................................................................................ 40
3.1 ESPAÇO E SIMBOLISMO.......................................................................................... 40
3.2 AS FORMAS SIMBÓLICAS ESPACIAIS E OS GEOSSÍMBOLOS ........................ 46
3.3 A RELAÇÃO CORPO X SAGRADO ......................................................................... 55
4 CONTEXTO HISTÓRICO DA IGREJA UNIVERSAL DO REINO DE DEUS
EM FORTALEZA ...................................................................................................... 63
4.1 O PENTECOSTALISMO COMO PLANO DE FUNDO DA IGREJA UNIVERSAL
DO REINO DE DEUS. ................................................................................................. 64
4.2 O NEOPENTECOSTALISMO: SUA CLASSIFICAÇÃO E PRINCIPAIS
CARACTERÍSTICAS .................................................................................................. 68
4.3 CONTEXTUALIZANDO A IGREJA UNIVERSAL DO REINO DE DEUS. ........... 73
4.4 A IGREJA UNIVERSAL DO REINO DE DEUS NO CEARÁ .................................. 86
5 O TEMPLO CENTRAL DA IGREJA UNIVERSAL DO REINO DE DEUS EM
FORTALEZA: DIMENSIONANDO UM ESPAÇO SAGRADO .......................... 88
5.1 UMA APRESENTAÇÃO DESCRITIVA DA IGREJA UNIVERSAL DO REINO DE
DEUS – TEMPLO CENTRAL DE FORTALEZA ...................................................... 88
5.2 COMPREENDENDO A ARQUITETURA DO TEMPLO ENQUANTO FORMA
SIMBÓLICA ESPACIAL ............................................................................................ 99
5.3 ATRAVÉS DAS ENTREVISTAS: PERCEPÇÃO DE UM LUGAR SAGRADO ... 111
5.4 A INTERPRETAÇÃO DA PERCEPÇÃO DOS FIÉIS ACERCA DA IURD-TCF .. 124
6 CONSIDERAÇÕES FINAIS ................................................................................... 134
REFERÊNCIAS ........................................................................................................ 141
APÊNDICES ............................................................................................................. 148
APÊNDICE A – Entrevista realizada com os fiéis da IURD-TCF............................. 149
9
1 INTRODUÇÃO
Esta dissertação é fruto de quase dois anos de pesquisa, que se iniciou com a
entrada ao curso de Mestrado Acadêmico em Geografia, do Programa de Pós Graduação em
Geografia – PROPGEO, da Universidade Estadual do Ceará (UECE), em fevereiro de 2015,
para obtenção do título de Mestre. Os estudos realizados atentaram em dar uma interpretação
científica à temática da religião, inclusive em sua paisagem por meio de templos religiosos de
diferentes pensamentos do cristianismo.
O tema desta pesquisa se insere nos estudos da Geografia da Religião, subcampo
da Geografia que compreende os aspectos religiosos enquanto fenômenos da espacialidade.
Trata-se de uma análise sobre a dimensão espacial da religião, a partir da perspectiva de uma
valorização do significado nas vivências do cotidiano, que se comunicam e constroem novos
significados para os objetos, criando um espaço vivido. A religião, assim como a Geografia,
são duas práticas sociais (ROSENDAHL, 1996). Por isso, a relação entre religião e Geografia
é de proximidade, pois estas se encontram numa dimensão espacial, daí notamos o sagrado
como componente de distinção e particularização de lugares, portando-os à esfera do
simbólico (ROSENDAHL, op. cit).
Em perspectiva de uma relação socioespacial, percebemos elementos que são
identificados através de rituais, formas simbólicas espaciais e outras manifestações do
sagrado, indicando, portanto, amostras simbólicas que marcam fortemente a paisagem
cultural. Estas marcas na paisagem fazem sentido quando há percepção do que as provocam,
ou seja, as motivações ligadas entre o lugar e as pessoas que as materializam por meio das
suas convicções e discursos. Isto se compreende mediante pesquisas e aprofundamento
teórico, principalmente nos conceitos, como espaço sagrado.
Deste modo, buscamos a associação entre Geografia e religião por intermédio de
uma objetivação captada da paisagem, representado pelo recorte que propomos compreender
neste trabalho, sob o título: O Templo Central da Igreja Universal do Reino de Deus em
Fortaleza-CE: uma interpretação do espaço sagrado, no qual analisamos o espaço sagrado
organizado pela Igreja Universal do Reino de Deus-Templo Central de Fortaleza (IURD-
TCF)1, localizada na Avenida Tristão Gonçalves, 613, no centro de Fortaleza. A Igreja
Universal do Reino de Deus é uma confissão da religião cristã, classificada como
neopentecostal, seguindo a classificação adotada por Mariano (2012). Este autor utiliza uma
classificação para o pentecostalismo brasileiro, parametrizado por características teológicas e
1 Sigla a ser usada daqui por diante.
10
histórico-institucionais. Desta maneira, as igrejas pentecostais são agrupadas em: pentecostais
clássicas, deuteropentecostais e neopentecostais. Estas últimas são as que mais se expandem
na cidade, no caso de nosso objeto, a Igreja Universal do Reino de Deus, em Fortaleza, conta,
segundo o último Censo do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE, 2010), com
44.384 fiéis declarados.
A IURD-TCF é sede estadual da instituição no Ceará, compondo-se de nave com
capacidade para 3000 pessoas sentadas2, um prédio/alojamento, onde estão instalados os
pastores missionários, locais para reuniões eclesiásticas, um prédio anexo onde os pastores se
concentram e organiza a logística dos cultos, estacionamento subterrâneo e em nível,
localizado em um terreno em frente à entrada principal do templo, além de instalações para
recepção, fraldário, banheiros e locais para atendimento ao público na entrada secundária que
tem saída para a rua paralela ao endereço oficial do templo.
A IURD-TCF é um espaço religioso com momentos congregacionais diários,
durante os turnos manhã, tarde e noite. Os horários de reuniões litúrgicas são: 6h30m, 8h,
10h, 12h, 15h e 19h30 durante os dias de semana a aos sábados. Há uma exceção nas
segundas-feiras que é acrescentada uma reunião às 21h e aos domingos, cujos horários são
alterados pela manhã devido ao tempo de execução das reuniões dominicais, mais estendidas,
ficando com inícios de 6h30, 9h30, 12h. No período vespertino e noturno, os horários se
mantêm.
Com este trabalho, procuramos interpretar a estrutura socioespacial do templo
Central da Igreja Universal do Reino de Deus, em Fortaleza, enquanto um espaço sagrado na
visão dos fiéis. Desta forma, o trabalho se enquadra em entender como um templo, com suas
formas, funções e significados, faz parte da vida dos seus seguidores e, até que ponto a igreja,
enquanto parte visível, material e simbólica desperta no grupo o interesse em vivenciar as
atividades religiosas ensinadas e praticadas no templo.
Partindo deste contexto, apontamos algumas hipóteses que levaram a presente
pesquisa. Como ponto de partida, questionamos: Como as atividades religiosas,
administrativas e midiáticas praticadas na Igreja Universal do Reino de Deus criam formas
simbólicas espaciais percebidas no Templo Central de Fortaleza? Como auxílio à questão
principal, indagamos: quais as atividades religiosas, administrativas e midiáticas praticadas na
construção do espaço sagrado do Templo Central da Igreja Universal do Reino de Deus em
2 Segundo informações da construtora responsável. Fonte: FUJITA Engenharia. Disponível em:
<http://novo.fujita.com.br/projetos/obras-institucionais/>. Acesso em: 15/02/2016. Já na porta do templo há um
cartaz informando ser a capacidade para 3500 pessoas.
11
Fortaleza? Quais elementos geossimbólicos percebidos pelos fiéis tornam essa igreja um
espaço sagrado? Como as formas simbólicas espaciais se relacionam com as atividades
praticadas no templo e formam uma centralidade simbólica vivida pelos fiéis que a buscam?
Consequentemente, nossa pesquisa almeja, principalmente, interpretar a estrutura
socioespacial da Igreja Universal do Reino de Deus, Templo Central de Fortaleza, enquanto
espaço sagrado. Para este fim, elencamos os seguintes objetivos específicos: distinguir as
atividades religiosas, administrativas e midiáticas existentes na construção do espaço sagrado
do Templo Central da Igreja Universal do Reino de Deus em Fortaleza; identificar os
elementos geossimbólicos transformadores da igreja em um espaço sagrado na percepção dos
fiéis; entender as formas simbólicas espaciais na relação entre as práticas do templo e a
formação de uma centralidade simbólica de vivência dos fiéis em busca do sagrado.
Trazemos uma interpretação referente ao tema na Geografia, uma vez que o
templo se destaca na paisagem urbana de Fortaleza. Além disto, a Igreja Universal do Reino
de Deus (IURD) possui certo destaque não somente no país, mas também se manifesta
espacialmente em vários lugares do mundo com núcleos formados na África, América Central
e do Norte, Ásia e Europa, ou seja, já tem repercussão internacional.
O estudo deste tema visou contribuir para a compreensão da relação simbólica
envolvente entre Geografia e religião, uma vez que esta é uma manifestação cultural que
realizada espacialmente por meio de experiências religiosas ritualizadas em espaços sagrados.
Nosso anseio foi mostrar que a Igreja Universal do Reino de Deus, enquanto
igreja é um elemento geossimbólico na composição da paisagem, porém é na atuação
consonante com as formas simbólicas espaciais, através de atividades religiosas,
administrativas e midiáticas que se consolidou como um espaço sagrado. Entendemos de
igual modo que os fiéis percebem a IURD-TCF como um ponto de difusão do sagrado. Tendo
o corpo como um elemento mediador entre o objeto e o ser, o fiel corporifica o templo como
ponto de contato com o divino e como fonte de poder para a vivência do cotidiano profano.
Consideramos nosso estudo como uma parte da pesquisa que vem se
substanciando no Brasil, no que concerne aos estudos culturais na Geografia. No país a
Geografia Cultural vem assumindo destaque nos estudos culturais, com núcleo, no Brasil, em
maior difusão e profundidade pelo Núcleo de Estudos e Pesquisas sobre Espaço Cultura
(NEPEC, 1996 até 2016) e Núcleo de Estudos em Espaço e Representações (NEER, 2006 até
2016) agregando novos conhecimentos sobre a vertente cultural na Geografia. Por
conseguinte, nosso trabalho é mais um detalhamento que soma, ou pelo menos discute, a
12
temática da Religião nos estudos geográficos através de uma igreja popularmente conhecida
no Brasil e uma das que mais arrebanham fiéis entre as que se encaixam nas práticas
neopentecostais.
O constructo teórico desta pesquisa envolveu um caminho percorrido para a
interpretação da IURD-TCF enquanto um espaço sagrado. Um passo deste caminho voltou-se
ao caráter conceitual, explicitando os conceitos adotados para compreensão do objeto, bem
como nosso embasamento teórico e método de análise. Outras referências se embasaram no
contexto histórico do objeto, com suas características e expansão até a cidade do recorte
empírico. Além das referências teóricas de caráter metodológico. Estas leituras foram
costuradas no sentido de oferecer solidez ao pensamento adotado para se chegar aos objetivos
que a pesquisa requereu. Destacamos, porém, que não são estanques, pois a análise enquadrou
um conjunto de estudos que os aproximaram ao objeto de estudo no decorrer da pesquisa.
A construção teórica do trabalho foi fundamental nesta etapa, pois direcionou a
interpretação do objeto sem perder de vista os conceitos-chave da Geografia. A descrição do
lugar observado foi pautada nas leituras iniciais de modo a respaldar a metodologia aqui
utilizada.
Os apontamentos deste trabalho foram embasados nos pressupostos da
fenomenologia. Este método inicialmente proposto por Husserl (op.cit.) busca “ir ao encontro
às coisas mesmas”, ir além da aparência objetiva positivista, mas buscar as essências. As
essências precisam ser analisadas de maneira que os sujeitos sejam participantes do
fenômeno. Assim, uma forma de exercer a fenomenologia na Geografia é através da maneira
que as pessoas experieciam o lugar e das impressões e relações nos quais elas vivem.
No entanto, a fenomenologia tem particularidades de pensamento, nas quais
alguns autores divergem quanto ao tipo de abordagem. Destarte, partimos da fenomenologia
colocada por Merleau-Ponty (op. cit.) para chegar à essência do objeto proposto nesta
pesquisa – a IURD-TCF. Interpretamos os conceitos geográficos à luz do entendimento
merleaupontiano de que o corpo é o agente conectivo entre o ser e o espaço. Logo, a
percepção dos fiéis/usuários do templo nos interessa para uma interpretação do espaço
sagrado.
Na presente pesquisa deparamos com “a espera do ser descoberto”. Talvez um
parâmetro positivista que sustenta o princípio de que a verdade é exterior ao sujeito. Portanto,
os fatos existentes e independentes de quaisquer procedimentos teórico-metodológicos nos
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leva a buscar o real, aqui representado pela IURD-TCF, como objeto real e que existe fora de
nossa percepção.
Acrescenta-se às leituras as visitas in loco para observar as ações identificadas
pela manifestação de um espaço, aqui representado pela IURD, momento este que podemos
realizara observação de uma forma simbólica espacial. Para o campo, utilizamos o método
exploratório, que “são estudos exploratórios que têm por objetivo descrever completamente
determinado fenômeno, como, por exemplo, o estudo de um caso para o qual são realizadas
análises empíricas e teóricas.” (LAKATOS, 2003, p.188). O registro de campo contemplou
imagens fotográficas e visitas ao templo, com o intuito de documentar a vivência e o
comportamento dos fiéis naquele templo sagrado.
As visitas foram estruturadas em duas etapas. A primeira se relacionou ao objeto
de estudo, com visitas regulares semanais ou até em mais dias dependendo da época do ano,
pois há eventos religiosos que, no Brasil, são comemorados por todas as religiões cristãs,
como a Páscoa. Também intensificamos as visitas em dias especiais para a igreja, como
eventos planejados por seus idealizadores como batismos em massa, unções de pastores,
campanhas de arrecadação e outros.
Por meio desta observação, extraímos informações que documentos oficiais não
nos permitiram analisar. As fotos e textos informativos são aparentes e geralmente os dados
são estatísticos, porém a visita em campo, com momentos de interação com os fiéis,
permitiram analisar as reações e emoções sentidas naquele lugar. Esses sentimentos e
sensações foram descritas e anotadas após um período de visitas e convivência com o grupo.
A segunda etapa, em paralelo à primeira, constituiu na realização das entrevistas.
Para as entrevistas, selecionamos algumas pessoas que frequentam o templo central da IURD
de Fortaleza. Essa seleção se baseou na perspectiva do fiel/usuário. Dentre os selecionáveis,
estiveram pessoas que se disponibilizaram conversar, mesmo que de maneira informal, pois
entendemos que a formalidade da entrevista pode inibir os entrevistados ou reduzir as
respostas a meras afirmações ou negações.
As entrevistas foram semiestruturadas, pois “combinam perguntas abertas e
fechadas, onde o informante tem a possibilidade de discorrer sobre o tema proposto.” (BONI
e QUARESMA, 2005). Elas tiveram como finalidade a análise e interpretação geográfica das
impressões que os fiéis têm daquele espaço. Usamos também entrevistas não-diretivas, ou
seja, sem perguntas pré definidas e sem uma orientação estabelecida. Isto refletiu em
conversas em que fiéis se sentem incomodados com perguntas prontas. Nesse caso, as pessoas
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foram falando o que sentiam e logo após as conversas foram transcritas. Apesar da fragilidade
do método quanto à fidelidade da transcrição, uma vez que quando se já se utiliza de uma
interpretação por parte do entrevistador, assim, tivemos a vantagem de uma maior abertura
por parte do entrevistado, pois não se sentiram inibidos em relatar suas experiências, o que
colaborou para o cerne da pesquisa. O público aferido foi o amostral, pois se trata de uma
pesquisa qualitativa, no qual o importante são os detalhes expressos pelos entrevistados.
A quantidade foi amostral, pensando-se, a princípio, em 30 entrevistas no total,
mas este número não foi definitivo, cabendo redução ou ampliação. Tivemos como medida de
cooperação envolver os participantes a descreverem o que eles sentem, percebem e entendem
do templo central, mas sem constrangê-los a respostas prontas, pois a espontaneidade é crucial
para uma descrição da pesquisa.
Em seguida, estabelecemos a interpretação e a relação dos dados com as
perguntas iniciais da pesquisa, buscando respondê-las por meio dos resultados obtidos com as
entrevistas. Pretendemos dar substância e responder aos objetivos propostos em nossa
pesquisa. Para isto, atentamos às descrições e às entrevistas, buscando a impressão que os
fiéis têm aos frequentarem o templo e a espacialidade envolvida nas suas práticas litúrgicas ao
participarem das reuniões. Deste modo, empreendemos uma interpretação pelo qual se
considerou uma invariabilidade, para o qual refletimos sobre as respostas do nosso
questionamento inicial.
Além desta introdução, capítulo primeiro, estruturamos mais cinco capítulos. O
capítulo 2 - Geografia e Religião: abordagens conceituais – tratou da relação existente da
ciência geográfica com o fenômeno religioso. Utilizamos autores os quais fundamentam
nosso entendimento de espaço sagrado, como Rosendahl (1996, 2006, 2008, 2014) que faz
uma interpretação relativa ao espaço geográfico, sagrado e religião pautada no pensamento de
Eliade (1979). Na medida em que esclarecemos estes conceitos, o conceito de espaço sagrado
se evidenciou. Por isso, nosso ponto de partida foi o espaço vivido.
No capítulo 3 – As dimensões do sagrado a partir das formas simbólicas
espaciais - a partir da interpretação de Corrêa (2007), elaboramos um constructo teórico
sobre as formas simbólicas espaciais, pois temos no templo central da IURD de Fortaleza uma
forma inserida no espaço, com significados que ultrapassam a dimensão da aparência, mas
que revelam diferentes compreensões, ou seja, possui uma polivocalidade. Desta maneira,
para se chegar à essência da paisagem representada pelo templo, precisamos alcançar os
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sentidos que este templo tem para os fiéis. Logo, o conceito de forma simbólica espacial nos
auxilia, pois é definido enquanto símbolo na relação entre a forma e o conceito.
As formas espaciais simbólicas são constituídas de Geossímbolos para
exprimirem as identidades existentes (BONNEMAISON, 2002). Esses geossímbolos são
lugares que exprimem, por circunstâncias diversas (no nosso caso, religiosas), uma dimensão
simbólica, potencializando a identidade do indivíduo ou grupo, conforme o pensamento de
Bonnemaison (2002). Usamos esse conceito para propor que a IURD-TCF é uma forma
simbólica espacial expressa concretamente por meio de geossímbolos ali existentes.
Em seguida, no capítulo 4 - Contexto histórico da Igreja Universal do Reino de
Deus em Fortaleza - temosum enquadramento histórico e acadêmico dos investigadores que
trataram da formação da IURD, contextualizando nosso objeto de estudo. Para isso,
apresentamos o pentecostalismo como componente protestante do cristianismo e sua
segmentação histórica até chegar ao neopentecostalismo, no qual a IURD-TCF se insere.
Nossa análise alcança, sobretudo, a presença desse segmento no Brasil e, particularmente,
no Ceará.
No capítulo 5 - O Templo Central da Igreja Universal do Reino de Deus em
Fortaleza: dimensionando um espaço sagrado – realizamos a interpretação das
informações obtidas da observação em campo e por meio das entrevistas. Neste capítulo,
fizemos uma descrição detalhada do objeto e buscamos a partir desses dados, relacionar as
informações dos frequentadores para responder aos questionamentos iniciais. Buscamos
entender como o fiel percebe a IURD-TCF, pela aplicação dos conceitos estudados ao
exposto pelos fiéis nas entrevistas.
Por fim, no último capítulo, tecemos as considerações finais que obtivemos na
pesquisa. Nosso intento foi responder ao problema inicial da pesquisa, contudo sem perder
de vista que nosso trabalho poderá futuramente ser contemplado por outros estudos que
englobam a relação espaço e religião, sobretudo no neopentecostalismo, no qual nosso
empírico contemplou.
16
2 ESPAÇO E RELIGIÃO: ABORDAGENS CONCEITUAIS
A proposta deste capítulo remete à discussão e ao entendimento entre a relação
espaço e religião. Essa relação aporta à dimensão espacial em sua forma objetivada pela
IURD-TCF. Inicialmente, esta igreja é considerada como um espaço no qual ocorre a
manifestação do sagrado para os fiéis. Como aquela exerce uma função religiosa, pretende-se,
neste capítulo, fazer a ligação dos conceitos geográficos de espaço e espaço sagrado,
direcionados para o uso religioso do espaço geográfico.
Por se tratar de um espaço religioso, adotamos o conceito de religião e
religiosidade. O intuito é perceber como a religião condiciona e é condicionada
espacialmente, fato que envolve uma relação intrínseca entre sujeitos e objeto, ou seja, fiéis e
igreja.
Comecemos então com a abordagem do conceito de espaço. Após,
conceituaremos o espaço sagrado e, por fim, o conceito de religião e seus aspectos
fundamentais.
2.1 ESPAÇO GEOGRÁFICO E A ABORDAGEM CULTURAL E FENOMENOLÓGICA
O conceito de espaço é um dos elementos de debate no contexto da ciência
geográfica, pois o seu entendimento se relaciona com o objeto de estudo desta ciência. Há
muito tempo se pratica a ciência geográfica (SILVA, 2001), mas este conceito não é
trabalhado na mesma proporção, ganhando maior relevância teórica somente em meados do
século XIX (CORRÊA, 2000). O conceito ainda hoje é trabalhado e sofre variações de
entendimento entre autores. Desse modo, é mister fazer um direcionamento teórico para
procedermos ao uso deste conceito relacionado à nossa pesquisa.
A divergência de ideias se inicia no número de aplicações que a palavra espaço
comporta. Esse apanhado de definições já foi comentado por Correa3, quando ele aponta que
o uso da palavra espaço é utilizado por diversas ciências. Ao olharmos o verbete nos
dicionários, percebemos que a definição ocupa muitas linhas do livro, devido a essa gama de
aplicações conforme o ramo do conhecimento. A título de exemplificação, podemos citar o
dicionário Michaelis (2009) cuja primeira definição aparece: “Extensão tridimensional
ilimitada ou infinitamente grande, que contém todos os seres e coisas e é campo de todos os
3 Ibid. p. 17.
17
eventos.”. Fica claro que a definição é ligada ao aspecto puramente físico. Principalmente,
quando a definição apresenta as palavras “extensão” e “campo”. Isto é, extensão está ligada a
área e campo ligado a um receptáculo, onde os fenômenos ocorrem.
Essa definição segue a lógica de alguns filósofos, como Aristóteles, que entendia
o espaço como um “lugar como posição de um corpo entre outros corpos” (ARISTOTELES,
Apud ABBAGNANO, 2007). A área é um reservatório que recebe os corpos, isto é, de forma
passiva, o espaço seria um palco onde a vida é o que moldaria as substâncias ali contidas.
O conceito base adotado neste trabalho, porém, segue as definições de alguns
geógrafos da chamada Geografia Crítica e, principalmente, aqueles que estudam a abordagem
cultural na Geografia. Milton Santos (1980, 1988, 2006, 2014) trabalha o conceito de espaço,
baseando-se, principalmente, nas ideias de Karl Marx e Henri Lefebvre. Ou seja, sua análise é
uma crítica ao entendimento de espaço que havia no pensamento positivista, evidenciando o
espaço como conceito fundamental na Geografia.
Para ele, o espaço não é somente uma área ou um ponto do globo e nem
receptáculo, apenas, dos atos humanos na natureza. O espaço
deve ser considerado como um conjunto de ações realizadas através de funções e de
formas que se apresentam como testemunho de uma história escrita por processos do
passado e do presente. (SANTOS, 1980, p. 122)
Mediante isso, ele vê o espaço como marca, mas também como fruto de relações
que se concretizam por determinadas funções. As marcas são os objetos visíveis, concretos,
em que chama de formas. Estas são aparentemente identificáveis e registram no espaço a ação
humana no tempo.
Em sua obra Espaço e método (2014), Milton Santos categoriza o espaço
geográfico em quatro aspectos: forma, função, estrutura e processo. Ele os define da seguinte
forma:
Forma é o aspecto visível de uma coisa. Refere-se, ademais, ao arranjo de objetos, a
um padrão. Tomada isoladamente, temos uma mera descrição de fenômenos ou de
um de seus aspectos num dado instante do tempo. Função, de acordo com o
Dicionário Webster, sugere uma tarefa ou atividade esperada de uma forma, pessoa,
instituição ou coisa. Estrutura implica a inter-relação de todas as partes de um todo;
o modo de organização ou construção. Processo pode ser definido como uma ação
contínua desenvolvendo-se em direção a um resultado qualquer, implicando
conceitos de tempo (continuidade) e mudança. (SANTOS, 2014, p. 69, grifos do
autor)
18
Deste modo, essas categorias nos ajudam a compreender como se concretiza o
espaço geográfico e como dele fazemos as análises dos objetos de estudo na Geografia. Nesse
sentido, utilizando nosso empírico, as formas seriam um resultado visível, ou seja, a estrutura
do templo com suas salas, equipamentos e a nave, mas que somente se concretiza mediante
sua função, isto é, a função religiosa que a IURD-TCF assume. Por sua vez, está dentro de um
processo, no qual as estruturas de momento apontam as funções presentes em sua conjuntura.
A relação da IURD-TCF entre forma e função é nitidamente observada porque as formas dos
objetos são arranjadas para a função ali existente.
Essas categorias são indissociáveis e cada componente é particularmente
importante para o entendimento do conceito de espaço geográfico proposto por Santos e
outros autores. Santos (2006) ao definir o espaço geográfico, deixa bem claro que as ações
humanas materializam o passado, deixando-nos a história. Assim, podemos compreender
nosso passado através dos objetos materializados e também entender que essas formas
possuem uma função e uma objetividade para aqueles que as criam, produzem ou
reproduzem.
Seguindo esta linha de pensamento, Santos (1982 p. 5) diz em outro momento que
as determinações específicas da sociedade “tornam-se realidade pelo espaço e no tempo
[grifos do autor].”. Ou seja, se algo é realizado, está concretizado no tempo pelo espaço, então
essas determinações são vontades humanas e expressões sociais que se manifestaram.
Como veremos adiante, os espaços sagrados seguem uma função específica e sua
materialização se dá em meio a uma estrutura existente no decorrer do processo de formação
do espaço geográfico. Daí a importância de considerar o espaço como uma relação entre
sociedade e natureza. Com isso, a percepção sobre as formas de função religiosa adquire um
significado social elementar, pois também resulta de esforços humanos concretizados na
paisagem, como podemos visualizar pela arquitetura da IURD-TCF, com formas bem
particulares e suntuosas.
Consoante ao pensamento de Milton Santos, também temos a contribuição de Ruy
Moreira que aponta o espaço como práxis. Essa práxis é a relação entre as formas e os
conteúdos. Segundo ele,
O espaço é então a totalidade estruturada de relações, dialeticamente complexa e
historicamente determinada, na forma do qual reside o amálgama do
entrecruzamento entre primeira e segunda natureza, porque é por seu meio que
homem e natureza em sua relação recíproca se separam e se reaglutinam, a cada
momento do movimento da reprodução cíclica da sociedade. (MOREIRA, 2012. p.
25-26).
19
Destarte, não podemos pensar no todo sem atentar que o espaço é um de seus
elementos, que influencia o modo em que as relações ocorrem. As formas são postas pelas
ações da sociedade e moldadas conforme o ajuste que o espaço, nesse caso, natural, as
posiciona e a as molda. Com isso, queremos dizer que cada porção do espaço é
diferentemente particular na sua relação com a sociedade ali ativa. Apesar das ações humanas
serem semelhantes, o espaço concretizado é diferenciado pelo elemento espacial, que refrata a
práxis social.
Isso resulta no que Milton Santos chama de sistemas de objetos e sistemas de
ações. Pois para ele
O espaço é formado por um conjunto indissociável, solidário e também
contraditório, de sistemas de objetos e sistemas de ações, não considerados
isoladamente, mas como quadro único em que a história se dá. [...] De um lado, os
sistemas de objetos condicionam a forma como se dão as ações e, de outro lado, o
sistema de ações leva à criação de objetos novos ou se realiza sobre objetos
preexistentes. (SANTOS, 2006, p. 39)
Os objetos são as concretizações realizadas pelas ações, que, por sua vez, são
resultantes da combinação e do arranjo dos objetos. É uma troca permanente e dialógica, em
que um depende do outro e é resultante do outro. Por menos valor que o objeto aparenta ter,
ali há uma combinação entre os sistemas de objetos e sistema de ações. Isso vale também para
as formas religiosas que estão no espaço, concretizadas pela paisagem, como no caso da
IURD-TCF, que tem em sua fachada colunas em frente à entrada principal. Essas colunas não
fariam sentido se as ações humanas ali intencionadas não fizessem parte de um entendimento
simbólico que projeta na paisagem que ali é um lugar diferenciado.
Desse modo, cabe salientar que essas formas são arranjadas por intencionalidades
dos atores sociais que dirigem esse espaço. As formas fogem ao acaso porque são arranjadas
de tal modo que transmite algo, aquilo que os dirigentes querem transmitir aos que visitam
aquela forma. A IURD-TCF é representativa dessa intencionalidade ao transmitir, por meio
das formas, sua grandiosidade e poder. Isso é visto pelo tamanho e pela disposição do altar,
das colunas, dos assentos da nave, dos objetos usados nas reuniões, todos transmitindo uma
imponência que se adéqua às intencionalidades funcionais, pois ali é um espaço de poder e,
assim, deve ser representada por uma paisagem de poder. Este termo significa que as
paisagens além de afirmações de sua presença, também reivindicam sua permanência,
20
promovendo uma perpetuação de seu significado (COSGROVE, 1998), portanto as formas
remontam a uma paisagem intencional, com valores referentes à sua função.
Cabe destacar que, para Milton Santos, “A paisagem é o conjunto de formas que,
num dado momento, exprimem heranças que representam as sucessivas relações localizadas
entre homem e natureza” (SANTOS, 2006, p. 66). Então, há uma distinção entre paisagem e
espaço, pois a paisagem é expressa pelas formas que resultam das relações entre objetos e
ações. Já o espaço é mais além, pois “resulta do casamento da sociedade com a paisagem”
(SANTOS, 1988, p. 25).
Portanto, o conceito de espaço nos direciona a uma noção de totalidade, entendida
como maior que a soma de suas partes. Daí ser relevante considerar que a vivência é um
ponto essencial na dinâmica espacial, pois qualifica as relações sociais, dando sentido e
significado. Desse modo, as contribuições da Geografia Cultural no estudo espacial são de
grande auxílio à compreensão do espaço geográfico e, por conseguinte, a nossa maneira de
interpretar as formas espaciais.
Com os estudos da abordagem cultural na Geografia, esta passa a abranger o
sujeito como importante agente de interpretação e ação das formas espaciais. Claval diz que
Para entender os objetivos da ação humana, tem-se que supor ser possível a
comunicação com outros mundos. Os geógrafos têm de estudar o papel desses
outros mundos na diferenciação do sagrado e do profano, e na construção das
categorias do bem e do mal. (CLAVAL, 2002, p. 26).
A Geografia Cultural tem, portanto, uma abordagem mais humanista ao conceito
espacial, inclusive a valorização do vivido por meio das experiências dos sujeitos. Ou seja, “o
seu conhecimento é sempre baseado na percepção que eles têm sobre a superfície da terra, e
sobre as representações que eles compartilham dela.” (CLAVAL, 2011, p. 16). Assim, o que
se conceitua como espaço também é baseado nas percepções que fazemos da relação
sociedade e natureza.
Como entendimento do espaço geográfico na Geografia Cultural, Corrêa coloca
que “o espaço geográfico é também um campo de representações simbólicas, rico em signos
que cumprem sua função de expressarem suas estruturas sociais em suas mais diversas
dimensões” (ISNARD apud CORRÊA, 2000, p. 10). Essas representações simbólicas
oferecem às formas novas significações, estas resultantes da vivência dos sujeitos na
materialização das formas.
21
Alguns geógrafos buscam a compreensão do espaço a partir da abordagem
cultural. A abordagem cultural na Geografia apresenta objetivos bem definidos para
estudiosos, como Paul Claval. Ele afirma que
O objetivo da abordagem cultural é entender a experiência dos homens no meio
ambiente e social, compreender a significação que estes impõem ao meio ambiente e
o sentido dado às suas vidas. A abordagem cultural integra as representações
mentais e as reações subjetivas no campo da pesquisa geográfica. (CLAVAL, 2002,
p. 20)
Destarte, a abordagem cultural aprecia o espaço a partir das dimensões da
experiência, da significação e do sentido. Por experiência temos todo conhecimento adquirido
através da utilização dos sentidos. Harvey (1992) ainda aponta que a experiência no tempo e
no espaço é construída por processos materiais que serve para a reprodução da vida social.
Esses processos do qual salienta é a experiência vivida e concretizada.
Para Yi-Fu Tuan (2013, p. 17), “Experiência é um termo que abrange diferentes
maneiras por intermédio das quais uma pessoa conhece e constrói a realidade”. Essa
construção faz do espaço uma elaboração social, vivida através dos sentidos. Vivida porque “a
experiência implica a capacidade de aprender a partir da própria vivência.”4. Então, o espaço é
definido pelas experiências e pelos objetos vivenciados pelos sujeitos. A significação dessas
experiências fazem os homens se comunicarem e se expressarem e disso buscam sentido para
a materialidade construída.
Corrêa (2000) ressalta que na Geografia Humanista os autores costumam definir o
espaço geográfico como espaço vivido. Seguindo esta corrente, concordamos com Oliveira
(2012, p. 144) quando diz que “o espaço, na perspectiva do espaço vivido, como já dito, é,
basicamente, o conjunto de representações simbólicas.”. No momento não nos reportamos
com detalhes sobre os símbolos, pois será discorrido mais a frente. No entanto, lembramos
que essas representações simbólicas são construídas socialmente e juntas formam o espaço
vivido, pois é também vivido simbolicamente.
Cabe então focarmos o espaço como uma relação entre as experiências dos
homens e da natureza. Os homens como agentes sociais, que interpretam a natureza na
medida em que a vivem. Já a natureza como elemento presente e atuante na interpretação dos
sujeitos, é coparticipante com os sujeitos na hora de pensar e viver o espaço. Isso cabe quando
analisamos os espaços religiosos, como nosso empírico, pois os fiéis vivenciam o templo por
4 Ibid. p. 18.
22
meio de experiências, onde o templo é a natureza experienciada e modificada pelas ações ali
realizadas simbolicamente e concretizadas no templo.
Para que esse pensamento seja estudado em um rigor científico que privilegie o
sujeito, adotamos como método as concepções dos estudos fenomenológicos. Entendemos
que
Tratando o espaço como um fenômeno, temos que percebê-lo como objeto de
manifestação do seu(s) sentido(s) e como estrutura que reúne existência e
significação, homem e mundo, pois esta é a concepção de fenômeno que
consideramos, e é nesta linha de pensamento que gira a concepção fenomenológica-
existencialista. (DUARTE e MATIAS, 2005, p. 191)
O espaço é visto como fenômeno e, por isso, a existência e a significação tornam
relevantes na interpretação espacial, em que os homens como seres que se sentem existentes
através da sua materialidade no espaço. E desta materialidade ele acumula sua experiência e a
percebe através dos sentidos.
Consideramos importante destacar esse método, pois ele considera a subjetividade
dos fenômenos, em nosso caso, fenômeno geográfico. Diferentemente dos métodos positivista
e materialista histórico-dialético, a fenomenologia percebe que os fenômenos espaciais são
complexos e a subjetividade deve se fazer presente também nos estudos acadêmicos. Isso tem
sido visto por outros geógrafos que passaram a estudar por este caminho.
É o caso de Werther Holzer que defende haver hoje uma Geografia Cultural
humanística, em que os geógrafos devem se interessar na “aplicação rigorosa, consciente e
corajosa do método fenomenológico.” (HOLZER, 2008, p.146.). Essa aplicação se dá por
uma análise cuidadosa do espaço, na sua totalidade, mas aprofundando o entendimento pelas
singularidades.
Dentre as filosofias para a copreensão do espaço, partilhamos algumas concepções
de Heidegger e Merleau-Ponty. Estes pensadores são bases para os estudos geográficos da
corrente humanística-cultural, dos quais geógrafos como Rosendhal (1996), Gil Filho (2008),
Nogueira (2005), Claval (1999), utilizam em seus aportes teórico-metodológicos.
Consequentemente, nos apoiamos mais do pensamento desses filósofos ao longo do trabalho.
Martin Heidegger (1889-1976) trabalha o espaço como ser-no-mundo (dasein).
Em sua concepção existencialista “o homem como ser-ativo-no-mundo organiza e cria
espaços arrumando e desarrumando de acordo com sua cultura e seus objetivos.”5. Ser no
5 DUARTE e MATIAS. Op. cit. p. 191.
23
mundo é o entendimento da existencialidade humana no espaço. Para a ação, o homem
precisa se ver como ator, logo, o espaço se relaciona a partir da concepção que o homem faz
do mundo, com o discernimento, ou não (pois a negativa também é um ato relacional), que
dele faz parte e influencia. O espaço é concretizado pela ação humana.
O segundo autor adotado na pesquisa como expoente do existencialismo na
compreensão dos fenômenos é Maurice Merleau-Ponty (1908-1961). Este filósofo busca a
compreensão dos fenômenos por meio da percepção. Sua análise parte da corporeidade, em
que as percepções fazem do ser como existencial. Na concepção merleaupontyana o corpo é o
meio referencial da percepção, pois é do corpo que se pode sentir e se orientar no espaço.
Alguns autores dissertam sobre o filósofo, cujos textos usamos neste trabalho para
embasar nossa escolha por este modo de pensar a Geografia e, por conseguinte, o espaço
geográfico. Nogueira (2005) enfatiza a importância deste pensador ao proporcionar à
Geografia a proposta de tratar o homem como indivíduo, que enquanto sujeito está no mundo,
uma experiência própria de vida. Estar no mundo nesse caso é vê-lo a partir de sua
experiência e percepções.
Souza (2013, p. 266) diz que o pensamento de Merleau-Ponty desenvolve sua
“filosofia fenomenológica partindo do corpo como princípio fundamental para a percepção do
mundo.”. O corpo é o elemento de contato entre o perceber e o espaço. A realidade é
intermediada pelo corpo. Em consonância a esta ideia, Pereira, Correia e Oliveira (2010, p.
174) completa: “A Geografia Fenomenológica está pautada na percepção, considerando o
mundo vivido e a subjetividade, que é de suma importância para a compreensão do espaço.”.
A percepção é um elemento onde a essência é imaginada e interpretada pelos sujeitos através
das formas concretas. Nesse caso, o espaço é uma realidade, mas a captação desta realidade é
feita pela interpretação que o corpo percebe e o ser a interpreta.
Em seu livro Fenomenologia da percepção, Merleau-Ponty (2011) assinala o elo
entre corpo e espaço. Segundo ele, “não estou no tempo e no espaço, não penso o espaço e o
tempo; eu sou no espaço e no tempo, meu corpo aplica a eles e os abarca” (MERLEAU-
PONTY, 2011, p. 195). Desta forma, a compreensão espacial passa pelo modo como
percebemos o espaço, como nosso corpo entremeia o percebido com o real. Real esse que
nunca se dá de maneira total, pois na Geografia “o objeto continua, em certa medida,
inacessível, porque o real do qual se ocupa não pode ser inteiramente objetivado.” (DARDEL,
2015, p. 89). Logo, perceber o espaço é uma busca mediada pelo corpo de compreender a
totalidade a seu redor do qual faz parte.
24
Nesse sentido, observamos nosso objeto a partir de um prisma epistemológico
baseado na vertente fenomenológica, uma vez que ele é compreendido como um espaço
percebido. As formas concretas do templo, as relações existentes entre as pessoas e os rituais
ali praticados são interpretadas a partir da percepção dos sujeitos frente ao espaço. Seguindo
as experiências dos fiéis/usuários podemos relacionar o espaço geográfico à vivência dos
sujeitos e assim compreender como as formas do templo e seus objetos permeiam a
significação da realidade e os elementos comuns da função religiosa presente.
Eric Dardel (2015) nos dá um esclarecimento relevante sobre a conceituação de
espaço seguindo a vertente fenomenológica. Ele fala de uma “experiência geográfica”, em
que “convida o homem a dar uma realidade geográfica um tipo de animação e de fisionomia
em que ele revê sua experiência humana, interior e social.” (DARDEL, 2015, p. 6). Ou seja, o
espaço geográfico é a realidade geométrica estimulada pela convivência entre o homem e a
terra.
Convivência porque a natureza interage com o homem, a partir do momento que
ela se adéqua ou responde às manifestações e transformações humanas. Numa cidade,
principalmente com características metropolitanas, percebe-se que há uma predominância da
ação social dos homens, mas ainda assim a natureza se revela ora agindo, ora reagindo, numa
relação de harmonia em certos momentos, mas também de conflito em outros.
Essa convivência corresponde à dinâmica exercida por uma cidade altamente
urbanizada como Fortaleza-CE, onde seu centro comercial caracteriza o poder do homem
sobre a natureza, mediante o concreto. A IURD-TCF faz parte dessa dinâmica, pois a
transformação da paisagem também é refletida na religiosidade, cujas formas devem se
adequar ao poder de transformação do homem sobre a natureza, como uma dádiva,
concretizado nas formas espaciais. Contudo, há além dessa sensação harmônica entre a cidade
e a religião um conflito, pois cada vez mais as formas denunciam a disputa territorial, entre o
espaço comercial e o espaço religioso.
A partir do momento em que os homens experienciam a natureza, eles identificam
possibilidades, objetivas ou subjetivas de interação. Daí o espaço geográfico ser “realidade
geográfica”, conforme Dardel, pois mesmo os atos subjetivos, como os símbolos, surgem da
percepção dos homens ao terem uma relação de experiência com a terra.
Portanto, compreendemos o espaço geográfico como um conjunto de ações e
relações humanas interadas e intermediadas pela natureza, na qual refletimos nossas
percepções sobre aquilo que experienciamos em um lugar. Tomando nosso empírico como
25
ponto de partida, a IURD-TCF é um local onde há relações entre pessoas e formas simbólicas
espaciais6, concretizada e interpretada pela ação dos fiéis, onde a representação manifesta é
fruto de uma percepção do sujeito ao templo. A espacialidade ocorre nessa relação em que o
espaço geográfico é uma relação corporal dos sujeitos com a realidade por estes criada e
interpretada, sendo, também, influenciada por esse cenário, antes natural, mas agora social e
cultural.
2.2 ESPAÇO SAGRADO
A partir do exposto no tópico anterior, acentuamos que os espaços são formados e
vivenciados pela relação do homem com a natureza. Essa relação também é simbólica, pois o
espaço vivido é construído por símbolos criados pela interação do homem com o lugar. Nessa
relação, os lugares assumem diferentes funções, cujos valores são associados pela percepção
compartilhada pelos homens.
Diante disto, observamos que o fenômeno religioso está presente no espaço.
Enfatizamos que o nosso foco de estudo, a IURD-TCF, é um espaço destinado à prática
religiosa, um espaço sagrado para os fiéis. Mas quais características compõem propriedade
para tal afirmativa? Sobre isto, pautamo-nos, a seguir, na compreensão de espaço sagrado,
baseado no, principalmente, no pensamento de Mircea Eliade (1907-1986).
O historiador romeno citado debruçou-se sobre o estudo das religiões e em seu
livro O sagrado e o profano: essência das religiões (1979) estruturou a compreensão das
religiões através do modo de ser no mundo. Assim, classifica o espaço e também o tempo
como sagrados ou profanos. Nesse caso, detalhamos seu raciocínio sobre o conceito de espaço
sagrado.
No entanto, se nos propomos a entender o espaço sagrado, necessitamos
esclarecer conceitualmente, de antemão, o que é o sagrado, uma vez que já o fizemos
anteriormente relacionado ao conceito de espaço. Sagrado, como verbete, de uso atual possui
várias definições, mas todas ligadas à relação entre o homem e a religião. Em alguns casos, é
sinônimo de santo, de onde provém, inclusive, sua raiz etimológica. O dicionário Michaelis
(2009) o define, como
6 Sobre este conceito, aprofundamo-nos no segundo capítulo deste trabalho.
26
[...] Que recebeu um caráter de santidade, mediante certas cerimônias religiosas.
Que, pelas suas qualidades ou destino, merece respeito profundo e veneração
absoluta; venerável. Diz-se de uma coisa em que não se deve mexer ou tocar. Que
não se deve infringir; inviolável.7
Na definição exposta, vemos que o sagrado é envolvido de uma santidade,
respeito e veneração. É algo diferente de um ambiente cotidiano, mais familiar. Esse conceito
está ligado à etimologia de santo, pois tem origem do verbo sancionar, que, por sua vez, vem
do latim sancire (consagrar)8. Sancionar é tornar algo irrevogável, digno de respeito a uma
decisão ou ato. Desse modo, o sagrado é algo inviolável, aceito e ratificado após ser
apresentado.
Rudolf Otto (2007) ao comentar sobre o termo (que em alemão é Das Heilige,
nome de sua obra) diz que seu uso não é rigoroso. Mesmo assim ele salienta que “o termo
heilig e seus equivalentes linguísticos [...] inicialmente designavam apenas esse algo mais”
(OTTO, 2007, p. 37). Ele diz isso porque esse conceito está além das questões morais, apesar
de seus desdobramentos de interpretação levar a esse entendimento. Mas esse algo a mais
abarca o não racional “que foge ao pensamento conceitual” (GIL FILHO, 2008, p. 28). Assim,
é um atributo sensível, mas não definido.
No âmbito que pretendemos na presente pesquisa, o sagrado não é somente o
captado por Otto, mas, principalmente, o que era assimilado por Eliade. Assim como o espaço
sagrado, partimos deste autor para elucidar o conceito de sagrado.
Para ele, o sagrado é “uma realidade de ordem inteiramente diferente das
realidades naturais.” (ELIADE, 1979, p. 24). Essa realidade é entendida pelos estudos de Otto
(2007), quando o autor situa o sagrado como algo numinoso, que “segundo a filosofia de
Rudolf Otto, aplica-se ao estado religioso da alma inspirado pelas qualidades transcendentais
da divindade.”9. Porém, Eliade vai além, evidenciando uma distinção de propostas de análise.
A distinção entre os dois pensadores está no fato de Otto abarcar aspectos
irracionais, não conceitualizados, mas explicados. “Na abordagem de Otto, o sagrado é
considerado como uma categoria de interpretação e avaliação a priori, e como tal, somente
podemos remetê-la ao contexto religioso” (GIL FILHO, 2008, p. 28). Já Eliade, propõe
7 Sagrado. In: Michaelis Moderno Dicionário da Língua Portuguesa. São Paulo: Melhoramentos. c2009.
Disponível em: <http://michaelis.uol.com.br/moderno/portugues/index.php?lingua=portugues-
portugues&palavra=sagrado>. Acesso em: 14/01/2016. 8Origem da Palavra – Site de Etimologia. Disponível em:
<http://origemdapalavra.com.br/site/palavras/sancionar/>. Acesso em: 14/01/2016. 9Numinoso. In: Michaelis Moderno Dicionário da Língua Portuguesa. São Paulo: Melhoramentos. c2009.
Disponível em: <http://michaelis.uol.com.br/moderno/portugues/index.php?lingua=portugues-
portugues&palavra=numinoso>. Acesso em: 14/01/2016.
27
“apresentar o fenômeno do sagrado em toda a sua complexidade, e não apenas no que ele
comporta de irracional.” (ELIADE, 1979, p. 24-25). Para este, a totalidade do sagrado era
relevante.
Neste quesito, o autor aponta que o sagrado se opõe ao profano10
. Isto é, o sagrado
possui uma dimensão oposta ao profano, justamente por entender que neste há a ausência de
uma manifestação. A essa manifestação chamamos de hierofania11
, “algo de sagrado que se
manifesta”, interpretação dada pelo próprio Eliade. Segundo Rosendahl (2006, p. 121), “o
espaço sagrado é o lócus de uma hierofania, isto é, de uma manifestação do sagrado”.
Prontamente, percebemos que a hierofania é uma revelação transcendente que se desponta
espacialmente.
Precisamos esclarecer, a princípio, que, para Eliade, os espaços sagrado e profano
são coexistentes. Para compreendermos o primeiro temos que conceituarmos o segundo.
Dessa forma, ao se falar de espaço sagrado, também se fala em espaço profano. Isso porque
ele considera o sagrado e o profano como “duas situações existenciais assumidas pelo homem
ao longo de sua história” (ELIADE, 1979, p. 28). A estas situações ele constrói seu mundo e o
interpreta.
Ainda segundo o autor, o espaço sagrado é, acima de tudo, heterogêneo dos
demais espaços. Ele diferencia os espaços sagrados e os espaços não-sagrados. O primeiro é
“o único que é real, que realmente existe, e tudo o resto, a extensão informe que o cerca” 12
.
Assim faz essa consideração a partir da compreensão que tem sobre o modo dos homens
verem o mundo (mundo, nesse caso, é o espaço físico vivenciado pelos homens) o
homusreligiosous13
, ou seja, aquele que se comporta do mesmo modo que as sociedades
tradicionais, em que o sagrado era vinculado em todas as suas ações. Logo, o espaço, como as
demais coisas, é compreendido como real na medida em que o espaço é qualificado pelos
homens como sagrado.
Desse modo, o espaço sagrado é uma porção que possui uma qualificação
simbólica por parte das pessoas. Nesse local, os homens têm uma compreensão de que aquele
espaço é algo referencial. Eliade (1979, p. 35) coloca o espaço sagrado como “fundação do
mundo”. Fundação porque é justamente o local onde se manifesta o sagrado, logo, assume
10
Ibid. p. 25. 11
Do G. HYERÓS, “sagrado”, mais PHAÍNEIN, “fazer aparecer”. Origem da Palavra – Site de Etimologia.
Disponível em: <http://origemdapalavra.com.br/site/palavras/hierofania/>. Acesso em: 14/01/2016. 12
Ibid. p. 35. 13
Ibid. p. 29.
28
uma centralidade, ou como ele diz “há também uma revelação de uma realidade absoluta [...]
funda ontologicamente o mundo”14
.
No espaço profano, para Eliade, predomina a homogeneidade, sem roturas e
orientação ritual, seria um espaço amorfo, no que concerne à experiência religiosa em sua
totalidade. Logo, não pode ter nesse espaço a “fundação do mundo”, pois ele seria o “Caos”.
Isso nos reporta a aderir o espaço profano como um espaço que está aquém de uma
organização do sagrado, no entanto, relacionado a ele. É como se o espaço sagrado fosse a
figura e o espaço profano fosse o fundo, se tomarmos como analogia a ideia Gestáltica. Sem a
figura, o fundo não teria uma orientação de sua posição, mas, a partir do momento que a
figura existe, o fundo, o plano, possui um norte que ele mesmo não conseguiria proporcionar.
O espaço profano é amorfo por precisar da orientação do sagrado para impor-se
espacialmente.
Portanto, o espaço sagrado é um ponto fixo. O “espaço sagrado tem um valor
existencial para o homem religioso” (ELIADE, 1979, p. 36). Quando vemos um templo, como
é o caso da IURD-TCF, ou outro monumento consagrado, vemos que há uma experiência
humana que vai além do objetivo. A função dada ao templo é uma maneira que o fiel tem de
se encontrar espacialmente. É uma referência para sua orientação no mundo. Quando ele vai
ao templo, a sua orientação é renovada. Ele novamente localiza o “centro do mundo” e a
partir disso, pode tomar suas direções.
Concretamente, podemos afirmar que o “espaço sagrado se apresenta como palco
privilegiado das práticas religiosas.” (GIL FILHO, 2008, p. 72). A partir do momento que ele
se orienta espacialmente, pode corporalmente e mentalmente projetar suas ações futuras, bem
como avaliar suas ações passadas. Nas palavras de Pereira e Gil Filho (2012, p. 5) o espaço
sagrado não é “apenas o seu receptáculo, e sim também a fonte irradiadora da sacralização”.
O templo assume uma diferenciação espacial para o homem religioso, assim este se sente
confortável para as suas práticas religiosas. É ali que ele se vê mais próximo de sua divindade,
pois esta lhe deu novamente a orientação devida para o cotidiano.
Como centralidade, o espaço sagrado também exerce potência. O que o define
como centro do mundo também o torna potente. Uma força onde está presente o sagrado. Se o
sagrado ali se manifesta, é o poder diferenciador deste espaço com os outros. Nesse caso, “o
espaço sagrado é um campo de forças e de valores que eleva o homem a si mesmo,
transpondo-o para um meio distinto daquele no qual transcorre seu cotidiano.”
14
Ibid. p. 36.
29
(ROSENDAHL, 2008, p. 7). Essa distinção traz aos fiéis uma experiência diferente daquela
que o cotidiano lhe proporciona.
Além de orientação e poder, o espaço sagrado se caracteriza como um sistema.
Voltando a Eliade, este afirma que a “sequência de concepções religiosas e de imagens
cosmológicas que são solidárias e se articulam num ‘sistema’, que pode chamar-se o ‘sistema
do mundo’ das sociedades tradicionais”. (ELIADE, 1979, p. 50). Esse sistema é desencadeado
por ações e percepções simbólicas expressas da religião no espaço. Esse sistema se compõe
basicamente de: rotura espacial, abertura, comunicação e eixo (centralidade). Esse é um
sistema transcendental, em que o homem e os deuses interagem. Essa interação ocorre
espacialmente nos templos, grutas, parques, rios ou onde o sagrado ocorre.
Tomando o espaço como um sistema objetos e sistema de ações, conforme Santos
(2006), evidenciamos que o espaço sagrado faz parte desse sistema, que se materializa pelas
formas aparentes, ou seja, em igrejas, templos, basílicas, catedrais, ou até mesmo em cidades
(caso das hierópolis15
).
Contudo, ressaltamos que o espaço sagrado não é somente o concreto, o local
físico, mas também as relações e trocas simbólicas existentes no espaço. Concordamos com
Pereira (2014, p. 114) quando diz: “o espaço sagrado poderia ser destacadamente uma conjunção
de espacialidades da experiência religiosa; ao invés de unicamente ser uma base fixa locacional.”,
pois somente o local fixo não esgota as possibilidades do sagrado. O sagrado pode se manifestar
em locais não demarcados fisicamente.
Como forma de exemplificar, podemos destacar na IURD-TCF os bazares realizados
no templo ou em seus arredores. A troca de mercadorias passa a ser vista como algo positivo se
estiver dentro do templo, pois nesse caso está associada a uma campanha de fé para melhorias da
igreja ou como fundos para evangelização. Converge, portanto, ao entendimento de que os líderes
da instituição também são agentes de uma espacialização, pois pelo discurso delimitam ou
excluem espaços vinculados ao sagrado, ou seja, deles emergem o poder religioso, conforme o
pensamento de Bourdieu (2007). De igual modo, ainda nessa lógica, quando estão em casa
assistindo aos programas da igreja16, o sagrado está presente, mesmo os líderes, que estão
entendendo que está “fora da casa Deus”. Nesse caso, o sagrado ocorre pela mediação do pastor, e
não pelo local onde o fiel está. Há uma permuta entre sagrado-profano, em que cada fiel tem
15
Termo usado por Rosendahl (1999, 2012) para designar as cidades-santuário, locais que se materializaram no
urbano prioritariamente com finalidades religiosas. 16
A Rede Record de Televisão é de propriedade da IURD. Nela há parte da programação diária dedicada aos
rituais da igreja ou a momentos de oração em que o fiel pode, de sua casa, receber a bênção do pastor ao ouvir a
oração e após beber a água do copo deixada próxima à televisão.
30
particular associação ao sagrado. Porém, tem consciência de que a “casa de Deus” é um lugar
diferente dos demais.
Ainda assim, o espaço sagrado possui uma sensibilidade que é materializada. Ou seja,
“o espaço sagrado é produto da consciência religiosa concreta, e, nesse caso, não é possível a
separação entre posição e conteúdo, pois o último parte de uma consciência do vivido plenamente
sensível.” (GIL FILHO, 2008, p. 71). A sensibilidade parte da experiência vivida do homem com
o espaço, do fiel com o templo.
Essa experiência é percebida, logo, por mais que os espaços sejam homogêneos (aqui
relacionado ao entendimento eliadeano de profano), há sempre uma distinção perceptiva que
chama a atenção do observador. No caso da IURD-TCF, é notório que as formas dão essa
distinção, mas quando olhamos, por exemplo, para o estacionamento da igreja, há uma profanação
do sagrado ou uma sacralização do profano? Como resposta, nós diríamos baseado no expresso
nos parágrafos acima, que seria a segunda alternativa, pois não é um estacionamento qualquer,
mas, sim, de pessoas que se encontram com Deus no templo e o estacionamento pertence ao
templo, portanto, é consagrado pela hierofania praticada dentro do templo.
A nossa pretensão é discorrer sobre a dimensão simbólica existente na forma do
templo, mas o sagrado não está totalmente atrelado ao templo, como se dependesse deste para
existir. Desse modo, conjecturamos que o espaço sagrado é carregado de uma dinamicidade, onde
“não se refere apenas a um espaço localizável/um lugar, mas diz respeito a uma série de
experiências religiosas que conjuntamente estruturam a dimensão da esfera religiosa”. (PEREIRA,
2014, p. 114). Essas experiências partem dos sujeitos e pela sua percepção, no qual funda uma
compreensão do fenômeno, que é vivida espacialmente.
Entretanto, ressaltamos que nossa premissa busca compreender uma forma espacial já
impressa na paisagem. Nosso entendimento qualifica a percepção dos fiéis, contudo é a dimensão
da paisagem que focamos nessa investigação. Para isso, temos em mente que a categoria espaço
sagrado aborda os aspectos culturais impressos nas formas espaciais, sem desmerecer os aspectos
do sujeito e a percepção da manifestação do sagrado.
Para isso, embasamos nosso entendimento a partir dos estudos de Rosendahl (1996,
2006, 2008 e 2014). A autora faz várias considerações sobre a Geografia e a Religião. No que
tange à compreensão do espaço, considera que “o espaço é ritualmente construído”
(ROSENDAHL, 2014, p. 13). Logo, as práticas religiosas promovem a escolha de lugares que são
tomados como “centros do mundo” (ELIADE, 1979), baseadas numa hierofania presente.
31
Com isso, percebe-se o espaço sagrado “caracterizado por uma sacralidade máxima,
expressa por uma materialidade à qual se atribui um valor simbólico.”17. Desse modo, o valor
simbólico associado ao lugar cria uma atmosfera diferente dos espaços ao redor, mas ao mesmo
tempo redimensiona o espaço a partir da centralidade exercida pelo sagrado existente. Nesse
processo, a autora distingue o espaço sagrado em uma tipografia de três níveis:
(a) fixo; (b) não fixo ou móvel e (c) o imaginalis. [...] São exemplos relacionados: (a)
aos santuários, pois envolvem lugares de concentrações de fiéis; (b) aos espaços de
mobilidade do sagrado e; (c) aos recintos de qualidade numinosa que os distingue do
espaço cotidiano. (ROSENDAHL, 2014, p. 14. Grifos da autora)
Assim, o espaço sagrado emerge através de práticas simbólicas, mas associado a
diferentes formas de captação do sagrado, ora em um local delimitado, ora pela mobilidade,
ora pelo imaginário, independente de onde esteja. Como apontado pela mesma autora
(ROSENDAHL, 2008), os espaços sagrados fixos são esforços de firmar na paisagem os
símbolos da manifestação religiosa. Os móveis caracterizados pelo deslocamento que o
sagrado pode ter simbolicamente e o imaginalis como a afetividade e a familiaridade geradora
de uma identidade com o lugar por meio do sagrado.
Aqui, retornamos ao entendimento do espaço profano, que, para Rosendahl (2014,
p. 14), é “caracterizado pela existência de elementos que não possuem a qualidade de
sagrado.”. Estes elementos, não sagrados, chamamos, aqui, de mundanos, ligados à
cotidianidade, aos elementos praticados fora da esfera de relação entre homem e divindade.
Assim, o espaço profano é uma particularidade que entorna o espaço sagrado.
Contudo, compreendemos que o espaço profano é um espaço onde existe também
o sagrado, porém não de maneira exclusiva. Isso quer dizer que os espaços profanos são
continentes de elementos mundanos e sagrados simultaneamente, como uma faixa de
transição. Para melhor esclarecer, podemos dizer que o espaço profano é o “conjunto de
atividades percebidas pelo espectro religioso, que anuncia, prepara e conduz ao sagrado seja
por atração ou repulsão, mas não se confunde com seu mistério inefável.” (OLIVEIRA, 2011,
p. 95). Uma vez que o sagrado é o “centro do mundo” (ELIADE, 1979), então é pela repulsão
ou atração de elementos, a partir do sagrado, que se qualifica o profano. O espaço profano é
uma condução para o espaço sagrado, pois quando se chega a este é porque os elementos
profanos são minimizados ou isentos do lugar.
17
Ibid. p. 14.
32
Entendemos, portanto, que o par sagrado/profano não é dicotômico, mas inerente
um ao outro. Seria um par dialético, em que “o sagrado que delimita e possibilita o profano”
(ROSENDAHL, 1996, p. 32), porém o profano à medida que é delimitado, também possibilita
o sagrado a ser delimitado. Se há locais privilegiados para a presença divina, apesar de ser
onipresente18
, isso quer dizer que a divindade também se apresenta em espaços profanos,
conduzindo os fiéis ao local escolhido para a hierofania.
Cabe aqui então ressalvar que os espaços fora da IURD-TCF são espaços
profanos, mas denominados pelos fiéis como mundanos, isto é, possuem elementos não
sagrados. Para os frequentadores do templo, o profano é sinônimo de mundano, logo, a
compreensão consequente de Deus não estará atuando fora das delimitações do sagrado.
Desse modo, as formas do templo são, além de físicas, fronteiras simbólicas, uma vez que a
atuação divina está estritamente ligada ao espaço sagrado.
Entretanto, se o fiel realiza uma atividade ligada à igreja, automaticamente a
presença divina se configura independente do lugar. Nesse caso, são objetos ou lugares
específicos que são sacralizados. Pode-se ter como exemplo a bíblia ou ícones que passam a
dimensionar um sentido religioso: o copo com água, o óleo, a pedra, o sal, etc. Em relação aos
lugares, podemos exemplificar, em Fortaleza, o batismo coletivo realizado na Praia de
Iracema, em 201519
. Neste lugar, no caso, a praia, o sagrado estava manifesto por meio do ato
batismal, então as águas do mar foram consagradas com a finalidade de remir os pecados das
pessoas que foram se batizar. Houve um deslocamento do sagrado, saindo das paredes do
templo e indo à beira-mar.
Portanto, o espaço sagrado é um lugar vivido pela manifestação do sagrado, onde
a delimitação pode existir ou não fisicamente, mas a potencialidade do lugar é mostrada a
partir da percepção de limites entre o sagrado e o profano. São espaços onde a hierofania
ocorre, e as pessoas podem sentir a manifestação do divino por meio de rituais ou objetos
consagrados. Os templos, nesse caso, são espaços sagrados por serem locais específicos da
prática religiosa, em que o sagrado é vivido pela materialidade das formas e, também, pelas
práticas ritualizadas em comum acordo entre os fiéis. A IURD-TCF é um espaço sagrado,
dotado de formas espaciais simbólicas que remetem à sacralidade existente.
18
Ibid. p. 36. 19
O POVO ON LINE. Fortaleza. 10. out. 2015. Disponível em:
<http://www.opovo.com.br/app/fortaleza/2015/10/10/noticiafortaleza,3517553/batismo-coletivo-reune-milhares-
de-pessoas-na-praia-de-iracema.shtml>. Acesso em: 14/01/2016.
33
2.3 A DINÂMICA RELIGIOSA E O ESPAÇO GEOGRÁFICO
A partir da discussão acima feita sobre o sagrado e o espaço sagrado, podemos
notar que a religião parte como um resultante do que se sacraliza. Porém, cabe a nós, neste
momento, refletirmos sobre o conceito de religião e de religiosidade utilizados pelos
estudiosos, pois estes são termos que perpassam anos de pesquisa e obras publicadas, a fim de
esclarecê-los conceitualmente.
Em nossa pesquisa esse termo tem suma importância, uma vez que entendemos
que as religiões se apresentam, assim como a política e a economia, como maneiras de
construir e viver o espaço geográfico. As relações sociais passam pela religião e para nossa
pesquisa, que trata especificamente de uma igreja, cabe, então, aprofundar esse conceito e
averiguar até que ponto Religião e Geografia andam próximos e, desse modo, ver como a
IURD-TCF se porta geograficamente como uma das religiões presente na capital cearense.
No nosso estudo temos como autores principais para a compreensão do fenômeno
religioso Durkheim (2008) e Berger (2013). Estes nos auxiliam no entendimento de que a
religião é um fato social criado pela sociedade ao interpretar o mundo em que vive ao longo
dos tempos. Se criado socialmente, isto aponta para o homem como agente religioso, que
busca, em sua vida comunitária, entender o mundo e como dele faz parte. A princípio,
caminhamos para isto, mas, a seguir, as reflexões desses autores nos norteiam a uma sólida
compreensão de tal fenômeno.
Na sua obra As formas elementares da vida religiosa (2008), Durkheim apresenta
sua proposta de explicar como a religião surgiu e como analisar a Sociologia da Religião. Ele
usa empiricamente as religiões australianas para expor seu raciocínio. Vai além de ideias já
postas como aceitas em sua época, a exemplo, o animismo e o naturismo20
. Para isso, defende
que a origem das religiões seria a partir das práticas totêmicas, ou como nomenclatura
adotada, o totemismo. Com isso, esquematiza seus estudos em partes para compreender as
formas elementares que levaram as religiões de hoje existirem, mesmo sendo
doutrinariamente diferentes atualmente.
Assim, propõe uma definição de religião. Definição esta baseada em preceitos que
o fundamentam. Uma delas é que todos “os fenômenos religiosos ordenam-se naturalmente
20
Conforme Durkheim, o animismo seria a explicação da origem das religiões por meio da relação do período de
sono e período acordado do homem, no qual se originou a ideia de alma e por conseguinte, as primeiras
religiões. Já o naturismo, seria a explicação da origem das religiões por meio da interpretação de fenômenos
naturais, nos quais a linguagem criaria sinônimos que por sua vez originaram as primeiras relações de divindade
e, conseguinte, a de religião.
34
em duas categorias fundamentais: as crenças e os ritos” (DURKHEIM, 2008, p. 67). Isso
mostra que para propor uma religião deve conter fundamentalmente esses quesitos. O autor
ainda ressalta que esses quesitos são as ações vividas coletivamente porque senão caracteriza-
se como magia21
.
Cabe aqui uma explicação do conceito de crença e de rito. Quando Durkheim fala
sobre os aspectos do fenômeno religioso, ele se atém a explicar esses conceitos. Seu parecer
se dá da seguinte maneira:
Os fenômenos religiosos ordenam-se naturalmente em duas categorias
fundamentais: as crenças e os ritos. As primeiras são estados da opinião, consistem
em representações; os segundos são modos de ação determinados. Entre essas duas
classes de fatos há toda a diferença que separa o pensamento do movimento. Os ritos
podem ser definidos e diferenciados das outras práticas religiosas, especialmente das
práticas morais, senão pela natureza especial do seu objeto. Uma regra moral, com
efeito, nos prescreve, assim como um rito, maneiras de agir, mas que se dirigem a
objetos de gênero diferente. Portanto, é objeto do rito que se deveria caracterizar
para poder caracterizar o próprio rito. Ora, é na crença que a natureza especial desse
objeto está expressa. Só se pode pois definir o rito após ter definido a crença.
(DURKHEIM, 2008, p. 68-69, grifos nossos)
É interessante perceber nesse trecho a distinção que o autor faz entre pensamento
e movimento. Ao afirmar que as crenças são estados de opinião, o autor expressa que estas
são fundadas pelas ideias debatidas por um grupo ou pela própria sociedade. Assim, quando
as crenças são acordadas pelas pessoas passam a ter validade. Logo, a divergência e o
aumento do número de religiões que existem atualmente são ocasionados pela falta de acordo
entre o grupo sobre determinado entendimento. Isso é bem presente para as pessoas que
procuram se filiar a uma igreja hoje, pois, como orienta Berger (2013, p. 145) acerca da
secularização: “a religião manifesta-se em sua forma tipicamente moderna, a saber, como um
complexo legitimamente voluntário adotado por uma clientela não-coagida.”. Essa
voluntariedade em assumir uma religião é a assimilação de que a crença por ela adotada é a
correta.
Isso mostra que as representações são escolhidas. A crença está ligada ao mito. É
o mito, então, que se aceita como real. Há uma liberdade de representar e/ou absorver a
representação proposta por tal segmento religioso, uma vez que se lhe não agradar, o fiel
busca outra mais aprazível. Isso se exemplifica pelo número de pessoas que se filiam às
instituições religiosas protestantes, que cresceram nos últimos anos (JACOB, 2003).
Conforme Berger (2013, p. 176), “a religião torna-se cada vez mais uma questão de livre 21
Ibid. p. 74-75.
35
escolha subjetiva, isto é, perde seu caráter obrigatório intersubjetivo.”. Esta escolha também é
uma expressão da crença que o fiel tem como verdade, porém essa realidade pode ser mudada
conforme a legitimação não corresponda às suas expectativas.
Pela referência do livro de Durkheim transcrita acima, também destacamos a
importância dos ritos. Ele afirma que são modos de ação determinados. Isso nos leva a
entender que os ritos só existem por meio de uma ordem estabelecida, ou seja, aquela dada
pela crença. Nisso temos o rito como “celebrações e reatualizações dos mitos fundantes de
uma religião, povo ou cultura.” (MAGALHÃES e PORTELLA, 2008, p. 68). Essas
reatualizações do mito, conforme Durkheim são objetos expressados pela crença. A crença,
então, orienta o rito, ou seja, não existe um rito que não tenha por trás uma crença e, por sua
vez, os ritos são os que podem ser concretizados, espacializados. São nos ritos que a paisagem
religiosa se mostra, ou, em outras palavras, somente pelos ritos que se pode revelar a religião
praticada.
Deste modo, os ritos são materializações da crença. Esta crença para se
materializar, carece de um espaço legitimado e um grupo de pessoas que o materialize. Isto
mostra o caráter social existente na religião, mas também seu caráter espacial. Estas
categorias são elementares na distinção que a religião faz no mundo.
Voltando à caracterização da religião, Durkheim ressalta que as religiões fazem
uma separação do que é sagrado e o que é profano. Ele caracteriza isso por meio da
compreensão de que a religião hierarquiza os seres, diferencia opostamente o sagrado do
profano e, por consequência, cria um mundo bipartido. Isso ocorre justamente pela
sacralização existente na sociedade. A vida coletiva faz com que atos, pessoas, objetos e
lugares sejam destoados dos demais, criando uma importância diferente do cotidiano. É a
sacralização ordenada pelos ritos, mediante a crença que faz existir a religião. Logo, o espaço
é fundamental porque a sua influência na vivência social captada pelos sujeitos cria, demarca
e/ou ressignifica o lugar, elaborando nas relações sociais existentes o sagrado por eles
percebido.
No entanto, Durkheim acrescenta um ponto fundamental para que sua definição
de religião seja completa: a igreja. Seu entendimento sobre igreja é um pouco diferente do que
se vê praticamente defendida pelas instituições religiosas existentes atualmente. Ele considera
a igreja como pessoas, não como o lugar. Em suas palavras, ele define que a igreja é
36
Uma sociedade cujos membros estão unidos pelo fato de conceber, da mesma
maneira, o mundo sagrado, e de suas relações com o mundo profano, e de traduzir
essa concepção comum em práticas idênticas. (DURKHEIM, 2008, p. 75)
Aqui cabe pausarmos um pouco e discutir esse conceito. Durkheim vê a igreja
como sociedade, isto é, grupo de indivíduos para fins comuns. Os espaços, então, destinados
ao encontro entre membros é um adendo social que se faz presente para que os ritos sejam
praticados por todos. Isso nos mostra que o espaço sagrado é conceitualmente diferente de
igreja, uma vez que, como já discutido, o espaço sagrado é onde o sagrado se manifesta22
,
estritamente ligado ao espaço, e igreja está ligado aos sujeitos. Entendemos que aqui está uma
importante ligação entre Geografia e Religião, pois as religiões, pelo menos cristãs, adotaram
o termo igreja para designar o lugar onde se cultua23
.
No caso do presente trabalho de dissertação, temos uma denominação religiosa de
origem cristã. Como o cristianismo se baseia na bíblia e na tradição judaica, temos em mente
que a ideia de templo é importante para a IURD-TCF. No entanto, a influência cristã, ou pelo
menos nos escritos bíblicos do Novo Testamento, aponta para uma igreja constituída de
pessoas, e não de um lugar. Vemos isso de maneira exemplar em um texto extraído do livro
de Mateus: “E eu lhe digo que você é Pedro, e sobre esta pedra edificarei a minha igreja, e as
portas do Hades não poderão vencê-la.” (BIBLIA, Mateus, 16: 18). Apesar das divergências
doutrinárias existentes entre as denominações cristãs, o texto mostra a igreja sendo edificada,
porém se analisarmos a raiz etimológica da palavra, vemos que igreja é o conjunto de
pessoas24
.
As possibilidades dessa associação são historicamente construídas e convergiu
para uma definição ambígua da palavra, mas sem perder de vista o foco de nosso trabalho.
Somos consoantes ao que nos fala Durkheim (2008) sobre como as pessoas coletivamente
relacionadas fazem do local um espaço destinado à prática religiosa. Isso pode nos alertar, ao
estudar a IURD-TCF como entendem o templo onde frequentam. Podemos, a princípio, dizer
que a IURD-TCF é uma igreja e seu local de culto é visto como um espaço sagrado. Isso nos
revela que o espaço é um meio de percepção presente na história da igreja, sendo fundamental
para a prática da fé, pois dimensiona o sagrado.
22
ELIADE, 1979, p. 25. 23
Templo dedicado ao culto cristão. Esta é a primeira definição que aparece no Dicionário Michaelis. Igreja. In:
Michaelis Moderno Dicionário da Língua Portuguesa. São Paulo: Melhoramentos. c2009. Disponível
em:<http://michaelis.uol.com.br/moderno/portugues/index.php?lingua=portugues-portugues&palavra=igreja>.
Acesso em: 21/01/2016. 24
Conforme o Dicionário Internacional de Teologia do Novo Testamento, 2000, p. 995.
37
Voltando ao conceito por nós proposto a discorrer, a religião assume a
característica distintiva de magia pelo fato de ser inerente à igreja. Desse modo, só pode haver
religião onde está a igreja. Assim, Durkheim encontra o elemento chave para uma definição
sociológica para a religião.
Dessa forma, ele define a religião como
um sistema solidário de crenças e de práticas relativas a coisas sagradas, isto é,
separadas, proibidas, crenças e práticas que reúnem numa mesma comunidade
moral, chamada igreja, todos aqueles a que ela aderem. (DURKHEIM, 2008, p. 79).
Desta definição, ressaltamos algumas considerações. Primeiro: a religião é um
sistema, ou seja, coordenada para um determinado fim, nesse caso à prática do sagrado.
Segundo: é intrinsecamente coletivo, ninguém pode fazer religião sozinho. Por fim, é
essencialmente geográfico, não por igreja ser sinônimo de templo, mas porque a religião
pressupõe reunião e esta atrelada a um espaço.
Peter Berger aponta uma definição de religião mais próxima de Durkheim, porém
de forte ligação ao conceito de sagrado. Ele define a religião como “o empreendimento
humano pelo qual se estabelece um cosmos sagrado.” (BERGER, 2013, p. 38). Como já
vimos acima, o sagrado é o ponto crucial para definição de uma religião. Berger salienta isso
não somente pela definição dada, mas pela importância que a religião tem na formação do
mundo. Ou seja, a religião é um fato social e um esforço social. Ele se preocupa em
compreender o cosmos e assim, em propor sua religião.
Berger entende ser a religião um dos maiores atributos social da cultura25
. Ele
compreende que a religião surgiu para conformar a realidade sobre o mundo. Assim, diz: “A
religião representa o ponto máximo da auto-exteriorização do homem pela infusão, dos seus
próprios sentidos sobre a realidade.”26
. O autor se baseia na busca de que o homem tem por
significado. Logo, a religião é um conjunto de ideias, símbolos, crenças e rituais que
significam o mundo. Essas significações são realizadas no entendimento humano a partir da
realização do ritual. É dar ao sagrado uma concretude significativa que por si só o homem ou
o grupo não poderiam expressar de outra maneira.
À medida que a secularização, entendida por Berger (2013. p. 119) como o
“processo pelo qual setores da sociedade e da cultura são subtraídos à dominação das
instituições e símbolos religiosos.”, se faz presente em um grupo, novos significados são
25
Ibid. p. 15 et seq. 26
Ibid. p. 41.
38
apresentados ou solicitados para a compreensão do mundo. A religião nesse ponto pode
passar por um processo de transformação total ou parcial. Mas ainda assim o sagrado se faz
presente, pois a secularização consiste em uma priorização dos elementos profanos,
cotidianos. Porém, o profano, por seu caráter relacional oposto ao sagrado, continua
conduzindo a pessoa ou o grupo a uma orientação sacra. Consequentemente, a religião pode
ser ausente como modo de vida, mas ainda está envolvida socialmente na construção do
mundo. Por esse motivo é considerada como estrategicamente eficiente para a construção do
mundo, como afirma Berger (2013).
Sobre a religiosidade, concordamos com Marchi (2005, p. 47) ao considerar que
“a religiosidade é vista como um comportamento pessoal e intransmissível, alheia ao debate,
às igrejas, às instituições religiosas.”. A religiosidade é o que cada um assimila da religião,
como a pratica e a engloba em seu cotidiano. Se na religião, a igreja é fundamental, a
religiosidade tem como elemento essencial a personalidade de cada um. A religiosidade é um
reflexo da composição consciente entre a religião e o ser.
Os rituais são de extrema importância para a religiosidade, ao ponto de que eles
tendem a serem primeiro entendidos do que a própria crença. Pois os ritos são materializados,
a marca que, primeiramente, é captada pelos sentidos e, assim, percebida pelo corpo do fiel.
Desse modo, a religiosidade tende a ser manifesta nos lugares onde a hierofania acontece, ou
seja, nos espaços sagrados, uma vez que a hierofania é o percebida como o elemento que
destoa o ser do cotidiano. O próprio ato de “ir à igreja” pode ser visto como uma concretude
da religiosidade na vida da pessoa, pois o deslocamento simboliza seu desejo de abandono
pelo mundo e a busca pelo divino.
Baseado no exposto até aqui, podemos, então, fazer algumas considerações que
nos norteiam nesse trabalho. Entendemos o espaço geográfico como uma relação perceptiva
entre o homem e o mundo, em que cria e modifica por meio de ações e símbolos o que
interpreta do mundo em que vive. O espaço é vivido, isso porque somos no espaço, sendo o
corpo o elo da percepção entre o sujeito e o mundo que vive.
Ao vivermos o espaço, como seres sociais, criamos e reelaboramos, a partir do
natural, maneiras de compreender o mundo e, assim, cultivamos a cultura. Esta molda nossa
consciência e ações e, por sua vez, é fruto de nossa experiência sobre o mundo. A cultura é
uma condicionante social e elemento essencial para a materialização espacial.
Dentre as manifestações culturais temos a religião. Ela é estratégica para a
significação que temos do mundo (BERGER, 2013). Além de ser antiga na história humana, é
39
uma grande fonte de significados presentes nossa forma de ver o mundo, sendo, inclusive,
fonte de ideologias ou vítima delas. Mas em ambos os casos, resistentes ao processo de
secularização, por meio de adaptações em suas crenças e ritos, influenciados pelo “gosto” das
pessoas, mediante a modernização social trazida pela sociedade industrial.
Como conceituação, partimos da análise dukheimiana que a religião é um fato
social, um sistema de crenças e valores adotados por uma comunidade em comum acordo. A
religiosidade é a crença vivida e ritualizada pessoalmente mediante seu entendimento do que é
sagrado e profano, mas também influenciada pela lógica cotidiana no qual está inserida.
O sagrado é o elemento regulador da prática religiosa. Ele centraliza a consciência
e ações do grupo, além de dar significado às legitimações deixadas pela religião ao longo dos
anos. Seu oposto, porém elemento preparatório é o profano, em que o sagrado não está
presente. Isso move o fiel a uma prática diferente da concebida cotidianamente e o justifica
como ser atuante nesse mundo.
Para a vivência do sagrado, há espaços onde o sagrado se manifesta por meio da
hierofania. Esses espaços chamados de espaços sagrados (ELIADE, 1979) se diferenciam do
profano por existir neles “o centro do mundo”, uma orientação para o contato com o divino,
ou seja, a realidade do mundo. O espaço sagrado possui forma homogênea, onde se separa do
profano criando dois mundos, hierarquicamente e bipartidamente justapostos. Esses espaços
podem ser representados por objetos ou lugares, como os templos.
No nosso trabalho, caracterizamos o objeto como um espaço sagrado, onde é
vivida uma hierofania, resultante do fato social religioso. Essa vivência ocorre de maneira
espacial, em que a relação homem e da natureza é marcada pelo caráter simbólico religioso
existente na relação fiel e igreja. A seguir focamos a relação da paisagem com o sagrado e
seus geossímbolos existentes para a compreensão da ação religiosa.
40
3 AS DIMENSÕES DO SAGRADO A PARTIR DAS FORMAS SIMBÓLICAS
ESPACIAIS
O sagrado é o elemento presente na vida humana e a partir do momento que se
manifesta espacialmente, existe uma hierofania que entrelaça o sujeito ao espaço criando um
ambiente diferente do que ele vive no cotidiano.
Essa espacialidade é confirmada por meio de ritos que são ciclicamente repetidos
rememorando a sacralidade do lugar. Podemos dizer que
Um objeto ou uma ação só se tornam reais na medida em que imitam ou repelem um
arquétipo. Assim, a realidade só é atingida pela repetição ou pela participação; tudo
o que não possui um modelo exemplar é ‘desprovido de sentido’, isto é, não possui
realidade. Esta tendência pode parecer paradoxal, no sentido de que o homem das
culturas tradicionais só se reconhece como real na medida em que deixa de ser ele
próprio (para um observador moderno) e se contenta em imitar e repetir os gestos de
um outro. (ELIADE, 1985, p. 49, grifos do autor).
Na religião cristã, especialmente a neopentecostal, essa repetição ocorre
semanalmente, com dias específicos para a finalidade desejada. Em nosso objeto de estudo,
por exemplo, nas sextas-feiras acontece o “dia do desmanche”, no qual qualquer malefício
que atormenta a pessoa é eliminado através de orações e ofertas alçadas no templo e, assim, a
hierofania surge como fonte de solução para a angústia do fiel. A presença no templo é
essencial para que se consiga chegar ao sagrado, uma vez que lá os rituais são feitos. E a
repetição temporal ocorre como uma maneira de perseverar o propósito estabelecido pelo fiel.
Desse modo, o espaço sagrado se apresenta como um fixo onde as pessoas
identificam no templo um local diferenciado dos demais e isso se revela primeiramente pela
paisagem. Cabe a nós, agora, mostrar como as formas simbólicas espaciais são elementos
essenciais na sacralidade exercida na IURD-TCF. Para expormos essa relação apontamos os
seguintes pontos: espaço e simbolismo, geossímbolos e a relação corpo e sagrado. Assim,
podemos esclarecer a espacialidade envolvida na paisagem proporcionada pelo templo central
da Igreja Universal do Reino de Deus em Fortaleza.
3.1 ESPAÇO E SIMBOLISMO
Já assinalamos como o sagrado se manifesta espacialmente. No entanto, sentimos
a necessidade de considerar a paisagem como categoria de análise importante em nosso
41
trabalho, uma vez que na paisagem estão os elementos simbólicos adotados pelos fiéis na hora
de dimensionar o sagrado no espaço. Porquanto, a paisagem é o conceito a ser evidenciado
neste momento. Milton Santos ao falar da paisagem e sua conceituação nos ensina que
[...] é tudo aquilo que nós vemos, o que nossa visão alcança, é a paisagem. Esta pode
ser definida como o domínio do visível, aquilo que a vista abarca. Não é formada
apenas de volumes, mas também de cores, movimentos, odores, sons, etc. (SANTOS, 1988, p. 21)
Logo, deduzimos que o conceito de paisagem é abrangente, pois o olhar não capta
somente as formas concretas, mas as relações envolvidas na construção da paisagem. “A
paisagem possui elasticidade e ambiguidade, necessariamente sendo impossível se apreendê-
la de forma totalizante e encarcerá-la em uma definição única.” (NAME, 2010, p. 180). Por
essa falta de definição única apreendemos um caminho de entendimento da paisagem a partir
não somente da visão, mas dos sentidos. Assim, a paisagem é apreendida pelos sentidos. Em
outras palavras, “A dimensão da paisagem é a dimensão da percepção, o que chega aos
sentidos.” (SANTOS, 1988, p. 22).
A percepção ocorre de tal forma que o sujeito se vê no mundo, conforme a
acepção de Merleau-Ponty (2011). A percepção é uma fusão do sujeito com a paisagem.
Conforme Lima,
se funde com a paisagem, redimensionando e a desdobrando em múltiplas outras
paisagens a cada série de experiências, coexistindo com as sucessivas paisagens que
se estendem para além de seu campo perceptivo, ou seja, pela paisagem apreendida
pelo conjunto de corpos”. (LIMA, 2010, p. 82, grifos do autor)
Consequentemente, a paisagem não é um resultado, algo pronto, pois “não há, na
verdade, paisagem parada, inerme, e se usamos este conceito é apenas como recurso analítico.
A paisagem é materialidade, formada por objetos materiais e não-materiais.” (SANTOS,
1988, p. 25). De tal modo, não podemos colocar a paisagem como indefesa ao modelado da
sociedade, mas como elemento que influencia o modo em que a sociedade perceberá o seu
mundo, isto é, o espaço percebido (NOGUEIRA, 2005).
É nesse momento que associamos o espaço aos símbolos, pois a paisagem resulta
da percepção que as formas transmitem ao observador. São salutares as considerações que
Costa (2009; 2011; 2013) faz sobre o símbolo na percepção do espaço e conseguinte à
interpretação da paisagem. Segundo o autor citado, “a leitura da paisagem a partir do símbolo,
torna-se uma empresa da Geografia Humanística, que discute categorias tais como paisagem e
42
lugar como e que se torna familiar ao indivíduo.” (COSTA, 2013, p. 150). Oferecendo esteio ao
estudo geográfico humanista, a paisagem é interpretada mediante os símbolos percebidos pelos
sujeitos que a vivenciam.
Precisamos, contudo, estabelecer algumas definições pertinentes à dimensão
simbólica. Antes de tudo, temos que distinguir signo de símbolo, pois este é um
desdobramento do outro. São os signos primeiramente formados no nosso consciente, em
etapas e a partir dele chegamos ao símbolo. O que vemos inicialmente são coisas. Estas são
objetos quando ocorrem interações dinâmicas, segundo Deely (1990). Milton Santos também
falara sobre os objetos, afirmando que “as próprias coisas, dádivas da natureza, quando
utilizadas pelos homens a partir de um conjunto de intenções sociais, passam, também, a ser
objetos.” (SANTOS, 2006, p. 41). A partir do momento que experienciamos a coisa, mediante
a sua leitura, esta se torna objeto, ou seja, “na medida em que é objeto, ele também existe para
alguém como um elemento da experiência, diferenciando um campo perceptual de maneira
definida e relacionada com o seu ser enquanto coisa entre outros elementos do ambiente.”
(DEELY, 1990, p. 43-44).
Essa interação gera uma relação semiótica, o que torna um signo, mediante a
interpretação dada ao objeto. Em outras palavras: “como signo, ele não apenas se representa
dentro da experiência e no ambiente, mas também representa outra coisa, algo além de si
mesmo” (DEELY, op. cit., p. 44). Esse algo mais de que trata o texto é o significado. Para ser
signo, é necessário ter significado para o sujeito. Assim, a coisa é vista, lida pelo sujeito,
objetivada e interpretada, adquirindo, pois, significado.
Ressalta-se a importância da experiência para a formação dos signos. Essa
experiência é o elemento geográfico existente na relação sujeito e objeto, de modo que, a
partir da interpretação dos objetos, os signos estabelecem um significado. Isto é, a relação
geográfica é formadora de signos, uma vez que no espaço ocorre o elo entre o ser e o signo,
mediante a experiência do homem com os objetos.
Destacamos ainda que essa experiência é uma relação ontológica mediada
corporalmente. Primeiramente pelos sentidos que sentem as coisas. Em seguida pela
percepção que, por sua vez, as leem, direcionando a uma interpretação do sujeito. A
percepção faz parte da experiência, pois é a ligação entre o sujeito e o mundo, que, nesse caso,
são os objetos objetivados pelos significados. Nas palavras de Rocha (2013, p. 75), “a
percepção é a forma como, através dos sentidos, as coisas do mundo natural ou humano
chegam à consciência”. Isso somente ocorre porque “o homem está no mundo, é no mundo
43
que ele se conhece” (MERLEAU-PONTY, 2011, p. 8). Ou seja, é uma relação espacial,
mediada pela relação corpo e mundo.
Podemos definir o signo, segundo uma definição pierceana, como “uma coisa que
representa outra coisa: seu objeto. Ele só pode funcionar como signo se carregar esse poder de
representar, substituir uma outra coisa diferente dele” (SANTAELLA, 1990, p. 58). A autora
deixa claro que o signo não é o objeto, mas está em seu lugar. Ou seja, o signo é uma
representação contida em uma coisa que percebida e interpretada pelo sujeito adquire um
significado. Desse modo, é a relação do objeto interpretado com a sua representação a causa
de aparecerem signos no espaço. Os signos, portanto, são espaciais, pois são coisas adquiridas
de significado a partir de uma relação espacial com o sujeito que o observa e o interpreta.
O signo é o componente essencial, no qual pode se dividir em modelos
qualitativos cujo símbolo é um deles. Os outros componentes do signo são o ícone e o índice.
Enquanto o ícone se assemelha ao objeto representado, como a fotografia de um carro que
representa um carro; e o índice denota algo relacionado ao objeto representado, como a
fumaça é associada ao fogo; “o símbolo é um signo que tem uma relação de convenção com
seu objeto.” (ROCHA, 2003, p. 74). Desse modo, os símbolos são construídos
convencionalmente, dotados de uma pluralidade de significados cujos objetos, a priori, não se
destinavam a significar. Podemos exemplificar a Bíblia, que basicamente é um livro, mas para
os cristãos é um símbolo. Também podemos exemplificar o que foi dito por intermédio de
nosso objeto, pois para os fiéis o templo é um símbolo da morada de Deus na Terra, inclusive
se diz entre eles: “vamos à casa de Deus”, referindo-se às visitas ao templo.
Isso é resultante da relação que o símbolo tem com seu objeto. Segundo a
classificação de Pierce, na interpretação de Santaella (1990), o símbolo é de lei, isto é, uma
adoção de significado universal, determinada socialmente. Em outras palavras, o símbolo
Extrai seu poder de representação porque é portador de uma lei que, por convenção
ou pacto coletivo, determina que aquele signo represente seu objeto. [...] Desse
modo, o objeto de uma palavra não é a alguma coisa existente, mas uma ideia
abstrata, lei armazenada na programação linguística de nossos cérebros.
(SANTAELLA, 1990, p. 67).
Destacamos, concomitantemente, que o símbolo etimologicamente se refere “a
reunir duas partes separadas” (RUIZ, 2004, p. 133). Segundo este autor, “o símbolo tem como
potencialidade própria a conjunção das partes fraturadas numa nova unidade significativa”27
.
27
Id. Ibid. p. 134.
44
Ou seja, as partes são coisas que antes, separadas, não remetiam a um significado comum,
porém pela experiência do sujeito adquire signos que se complementam em algo novo, um
novo significado, que faz parte do vivido pelo sujeito.
O simbolismo se apropria dos signos de maneira que a partir deles sinaliza um
novo objeto. É esse novo objeto que aproxima o sujeito e a paisagem. O símbolo se forma
dessa interação ressignificando o objeto, dando um valor antes não assimilado, mas que agora
faz parte de sua vivência. Podemos também definir o símbolo como uma projeção humana
sobre um objeto. Em outras palavras,
Tudo o que, da parte do homem, coporta além de sua significação imediata um
segundo sentido, que transfigura a realidade material e garante assim uma mediação
entre o cotidiano do homem de onde provém este sinal e uma realidade que o
ultrapassa. (MESLIN, 1992, p. 168).
Os símbolos tendem a significar de maneira mais uniforme em que o grupo possui
o mesmo conhecimento de significação, ou seja, em grupos de mesmas tradições ou culturas.
Isso nos remete a identificar que alguns símbolos são facilmente captados em nosso objeto de
estudo por estar em uma tradição judaico-cristã ocidentalizada. Uma maneira de exemplificar
é a cruz existente dentro do templo da IURD-TCF que independente da religião que o
visitante tenha prontamente sabe o significado da cruz além de sua significação primeira.
O símbolo vai além da interpretação inicial, pois são acrescidos de significados
cujos contextos espaço-temporais são os mais diversos. Implica, portanto, em uma
polivocalidade, “isto é, as múltiplas construções de significados.” (CORRÊA, 2011, p. 13).
Assim, o símbolo expressa diferentes interpretações numa mesma paisagem, cabendo ao
sujeito a maneira de atribuir um significado por meio da vivência.
Esses símbolos são ligações entre o sujeito e o objeto. Pela vivência o sujeito se
encontra no espaço mediado pelos símbolos que suas relações oferecem. Isto é, “Essa relação
entre o indivíduo e a paisagem é, portanto, mediatizada por uma rede simbólica cuja
materialidade traz também o imaterial, algo visível que mostra o invisível, um gesto que
significa um valor.” (COSTA, 2013, p. 151). O que é visível, através das formas na paisagem
exibe, de maneira perceptiva, o que também não está nas formas, mas, sim, no espaço, uma
vez que este abarca também a vida que o anima (SANTOS, 1988).
O símbolo, então, se manifesta no espaço através das formas visíveis, mas de
maneira subjetiva, através das relações cotidianas estabelecidas pelos sujeitos. No caso do
nosso estudo, o templo é a forma visível espacialmente, mas que transmite símbolos que são
45
vividos pelos frequentadores ao passarem ou o adentrarem. Dessa forma, os signos existentes
no templo remetem a uma simbologia específica, em que direcionam o olhar dos
frequentadores de modo que o sagrado é apresentado espacialmente pela paisagem refletida
nos signos.
Portanto, o símbolo é uma construção espacial objetivada na paisagem, uma vez
que é a interação entre sujeito e objeto, sendo este primeiramente o signo, que, a partir da
relação de vivência, ocorrida espacialmente, transporta o símbolo retido pelo sujeito. Assim, a
paisagem é a reflexão dessa relação, ou
Do modo mais amplo possível, a paisagem pode ser compreendida como um
trabalho discursivo de ordenamento da imagem do mundo a partir do ambiente
próximo, concreto e apreensível pelos sentidos humanos, mediante estruturas
mentais correntes no universo cultural de cada época e de cada povo. (MACIEL,
2009, p. 11).
Esse ordenamento da imagem ocorre na percepção que o sujeito tem do espaço.
Como “nossas relações com o espaço não são as de um puro sujeito desencarnado com um
objeto longínquo, mas as de um habitante do espaço com seu meio familiar” (MERLEAU-
PONTY, 2004, p. 16), as imagens são captadas pelos sujeitos de maneira que as
representações dos signos fornecem uma simbologia particular orientando a vivência no
espaço. Assim, “a paisagem é mais do que se vê. É o que se pensa sobre o que se vê”
(MEINIG, 2003). A paisagem é maior do que o visível, pois abarca também as
representações.
Essas representações resultam de uma experiência vivida, portanto presente na
memória do sujeito. Logo, as palavras de Costa nos auxiliam nesta compreensão, pois
afirmam que
A relação entre paisagem e memória, está assentada na geografia da percepção, na
existência de um conjunto de signos que estruturam a paisagem segundo o próprio
sujeito e refletindo uma composição mental resultante de uma seleção plena de
subjetividade a partir da informação emitida por seu entorno. (COSTA, 2013, p.
150)
Esta relação entre paisagem e memória faz do espaço sagrado um lugar simbólico
para quem o frequenta. Adquire um valor especial ao sujeito “Os lugares simbólicos por
excelência, aqueles que são diferentes de outros lugares, como tal, são aquelas cujo valor
simbólico é claras, até mesmo essenciais, na sua identificação como sítios.” (MONNET,
46
1998, p. 4). Logo, essa relação promove uma identidade do sujeito para com o objeto, neste
caso, o espaço sagrado.
A experiência vivida pela percepção traz ao sujeito uma forma particular de
interpretar aquele lugar e justificar suas ações e maneira de viver. Por isto, temos neste espaço
uma vivência. Ou seja, “O espaço é vivido e percebido de maneira diferente pelos indivíduos”
(LENCIONI, 2003, p. 152). O vivido é particular do que cada um interpreta dos símbolos ali
existentes, isto é, “o espaço vivido passa a ser construído socialmente através da percepção e
da interpretação dos indivíduos, revelando as práticas sociais.” (PEREIRA; CORREIA;
OLIVEIRA, 2010, p. 176).
A interpretação do espaço sagrado perpassa, então, pela interpretação simbólica
da paisagem. Os elementos presentes na paisagem são assimilados perceptivamente e
interpretados a partir dos símbolos captados pelos sujeitos. Isso justifica suas ações e
fornecem uma explicação da realidade.
A partir disto, temos nas formas simbólicas espaciais a chave de compreensão do
espaço sagrado. Por isso, destacamos a seguir as formas simbólicas espaciais e sua influência
na interpretação de um espaço cuja representação simbólica se faz presente.
3.2 AS FORMAS SIMBÓLICAS ESPACIAIS E OS GEOSSÍMBOLOS
A discussão que foi feita anteriormente envolvendo a relação entre espaço e
símbolo, para nós, é um elemento composto na paisagem. A interpretação da paisagem por
meio dos símbolos nos dá um entendimento do sagrado existente em um lugar, caso aqui
presente pela IURD-TCF. Essa relação estabelecida no espaço entre a paisagem e o símbolo
aponta para a importância das formas existentes no espaço e como essas são percebidas pelos
sujeitos e adquirem funções distintas das demais.
Nesse ponto, faz-se necessário entender que, na cumplicidade da relação do
homem com a terra, pela concretude das formas, existem símbolos que as relações humanas
criam para entender a totalidade espacial que os cerca. Quando esses símbolos estão
geograficamente delimitados podemos dizer que são geossímbolos. Tomamos nossa
compreensão de geossímbolo a partir da definição proposta por Bonnemaison, quando afirma
que
47
um geossímbolo pode ser definido como um lugar, um itinerário, uma extensão que,
por razões religiosas, políticas ou culturais, aos olhos de certas pessoas e grupos
étnicos assume uma dimensão simbólica que os fortalece em sua identidade.
(BONNEMAISON, 2002, p. 109)
Os geossímbolos possuem um poder identitário que promove aos sujeitos a ação
de vivenciar um lugar. “Essas representações simbólicas revestem-se de um poder que gera
um interacionismo entre as formas espaciais e o sujeito” (COSTA, 2009, p. 49). O sujeito
vivencia e modifica o espaço pelas interações simbólicas com o lugar.
Essas são vividas a partir do momento em que os sujeitos estabelecem
demarcações, físicas ou não, com o lugar, gerando uma diferenciação entre os lugares. Onde
se vive se cria laços e estes são demarcados simbolicamente, ou também fisicamente, no
espaço pelo território. Nesse ponto, concordamos com Bonnemaison (2002) quando diz que o
território é um espaço simbólico, pois é atrelado aos sentidos e à memória dos sujeitos.
Quando as relações espaciais são demarcadas simbolicamente exprimem um sentimento não
somente de vivência, mas de potência em relação ao lugar, uma vez que o sujeito se sente
participante e capaz de atuar naquele local, criando uma identidade. Desse modo, ele associa o
que sente naquele espaço, por meio de símbolos, desejos, crenças e sentimentos que constrói
ao interagir com o lugar.
O lugar é mediado por geossímbolos, uma vez que ligam o sujeito ao espaço
vivido. A paisagem, nesse caso, é o elemento perceptível inicial dessa relação, pois o sujeito
admite uma interação a partir do que vê e sente no lugar, atribuindo significados. Podemos
dizer que
Neste contexto, a paisagem faz parte da realização humana, eivada de um
significado pleno no seu sentido fenomenológico, marcada pelas ações e
interrelações coletivas dos grupos humanos que através da mediação simbólica irão
modificar continuamente o seu entorno. (COSTA, 2009, p. 49).
Esta modificação ocorre por meio de gestos, comportamentos, linguagens e/ou
rituais que aprofundam a identidade do sujeito com o lugar. Dentre estas ações estão o ato de
delimitar, dar ao lugar uma proximidade identitária, cujos valores são de pertença, mas
também de comunhão com modo de vida desejado, de que o espaço faz parte e conecta o
indivíduo ao mundo desejado. Assim, os geossímbolos ganham força, pois remetem a essa
conexão, aproximando o sujeito ao lugar assim desejado. Por isso, um templo, ou objetos
encontrados nele carregam uma força simbólica muito grande, pois direciona a uma relação
profunda entre o sujeito e o desejado por ele ao vivenciar o lugar.
48
No caso de um templo religioso, os geossímbolos trazem um constante contato
entre o humano e o divino. Se tomarmos como exemplo a IURD-TCF, percebemos que o
próprio templo é um geossímbolo porque é um lugar, por razão religiosa, marcado por uma
dimensão simbólica que remete à identidade do grupo que o frequenta. Isso porque quem
frequenta se identifica no lugar como pertencente aos que podem entrar em contato com o
divino. Entretanto, quem apenas passa pela frente do templo, ou seja, quem o vê por fora,
também identifica naquela construção um lugar de predominância religiosa, mas não
pertencente a sua crença particular. Nesse caso, mesmo sendo de entendimento doutrinário
distinto, reconhece o templo como um local onde ocorre o contato com o divino, o que, em
alguns casos, convida pessoas de outras crenças a visitarem e constatar como a religiosidade
ali se pratica.
Portanto, os geossímbolos são pontos ou trajetórias em que há um direcionamento
simbólico. Ou seja, é “algo material ou imaterial que ali está para nos remeter a outro ponto,
reificar uma ideia ou lugar diverso.” (CORRÊA, 2006, p. 53). No nosso objeto de estudo, o
símbolo remete ao centro do mundo (ELIADE, 1979), ao local onde Deus certamente se faz
presente a quem o busca. Como esses símbolos estão espacialmente delimitados, podemos
dizer que são as formas apreendidas na relação entre sujeito e objeto que ressignificam o
lugar. Como se trata de delimitações de razões religiosas, as formas contextualizam símbolos
sagrados, cujos valores neles inseridos são modificados pela função que as formas adquirem
nessa conjuntura.
Podemos aqui utilizar das palavras de Costa para dizer que os geossímbolos
religiosos são resultantes da relação entre os sujeitos e o sagrado. Pois o autor afirma que
Na tentativa de conjugar elementos geossimbólicos dentro de uma contextualidade
de um espaço sagrado, [...] o homem se exprime sob formas simbólicas que se
relacionam no espaço, sendo as formas e os objetos de culto eivados de uma aura de
elevado valor moral. (COSTA, 2009, p. 56)
Ao entender que as formas simbólicas espaciais contemplam nossa discussão,
elucidamos daquelas a ideia central de interpretar o espaço sagrado representado pela IURD-
TCF.
As formas simbólicas espaciais derivam do entendimento concebido pelas formas
simbólicas. Para compreender a primeira precisamos, de antemão, entender a segunda. Por
meio do conceito de formas simbólicas há uma reflexão direcionada a uma compreensão e
49
aplicação das formas simbólicas espaciais, aqui baseadas nas ideias estudadas por Corrêa
(2007).
Corrêa (2006; 2007; 2009; 2011; 2012) procura investigar a discussão sobre a
forma simbólica para tratar de diversos assuntos pertinentes à Geografia no que concerne a
monumentos públicos, política, espaço geográfico. Entre seus textos, projeta seu
entendimento sobre formas simbólicas em dois autores. Um deles é Stuart Hall (1997) em seu
texto The work of representation, em que aborda as representações por meio da ação cultural.
Contudo, também se embasa em Ernst Cassirer (2001), principalmente em seu trabalho A
FILOSOFIA DAS FORMAS SIMBÓLICAS, VOLUME II, sobre o pensamento mítico. Como o
autor utiliza diversas fontes em textos distintos, consideramos relevante analisar a ideia desses
autores para a definição de formas simbólicas para, posteriormente, se chegar às formas
simbólicas espaciais de Corrêa (2007; 2012).
Corrêa assume a forma espacial como uma representação, a partir de Hall (1997).
Assim, Corrêa coloca que “As formas simbólicas são representações da realidade, resultantes
do complexo processo pelo qual os significados são produzidos e comunicados entre pessoas
de um mesmo grupo cultural” (CORRÊA, 2007, p. 7). Representações da realidade porque
para Hall (1997, p. 28, tradução nossa) “A representação é a produção de sentido através da
linguagem.”. A realidade se objetiva por meio de significados constituídos na comunicação
entre o grupo.
Essa comunicação produtora de sentidos ocorre por meio de uma relação entre
significantes e significados. Os significantes são as formas e os significados são os conceitos
(CORRÊA, op.cit). Para conceituação dos objetos, precisamos visualizar e perceber as
formas, a partir do momento em que as assimilamos, nossa mente busca dar-lhes significados.
Assim, é a assimilação dos significantes (formas) que orientam os significados (conceitos), ou
seja, as formas captadas pelo grupo são interpretadas para exprimir um significado que é
repassado a outros do grupo pela linguagem.
Contudo, esse processo não é simples, pois envolve dois sistemas de
representação: um que está interno ao sujeito, o mapa conceitual, e outro social que é a
linguagem (Hall, op. cit). Temos
Em primeiro lugar, então, o significado depende do sistema de conceitos e imagens
formados em nossos pensamentos que podem estar a favor ou 'representam' o
mundo, o que nos permite referir-se a coisas tanto dentro como fora de nossas
cabeças.” (HALL, op. cit. p. 17, tradução nossa).
50
O segundo corresponde à linguagem. Segundo o autor aqui analisado,
Nosso mapa conceitual comum deve ser traduzido juntamente com a linguagem,
para que possamos correlacionar nossos conceitos e ideias com algumas palavras
escritas, faladas, sons ou imagens visuais. O termo geral que usamos para palavras,
sons ou imagens que carregam significados é signo. Estes signos mostram ou
representam os conceitos e as relações conceituais entre eles e o que carregamos em
nossas cabeças e, juntos, compõem os sistemas de significados da nossa cultura.
(HALL, op. cit., p. 18, Tradução nossa, grifo do autor).
Portanto, é a junção desses dois sistemas de representação que formam os
significados daquilo que vemos ou percebemos, isto é, as formas. Logo, para este autor,
notamos que o processo de significação é obtido pela relação entre o sujeito, interpretante, e o
signo, objeto interpretado, convergindo com as ideias mencionadas mais acima (DEELY,
1990; SANTAELLA, 1990).
Portanto, Corrêa (2007, 2012) entende que as formas simbólicas são resultantes
do processo de significação. Esse processo dá uma função às formas, formando a tríade
processo, função e significado (CORRÊA, 2009). Assim, as formas simbólicas são elementos
de um sistema de representação.
As funções adquiridas pelas formas, como no caso da IURD-TCF, estão eivadas
de significados para àqueles que o veem e/ou frequentam. A partir das formas dão significado
as suas ações e convicções. No caso em questão, os fiéis interpretam o templo como a ‘casa
de Deus’, um lugar sagrado, onde a habitação divina fortalece a vida de quem se faz presente
e participante dos rituais.
Os estudos de Hall (1997) passam pela compreensão de cultura. Pela cultura que
se entende a relação entre os signos e os grupos sociais. Esse sistema de representação ocorre
de maneira cultural, pois perpassa representações assimiladas e difundidas em um grupo
social. Aqui é outro ponto que Corrêa utiliza o pensamento de Hall, pois é uma aplicação da
abordagem construtivista da representação. Segundo Hall (1997, p. 25),
A terceira abordagem reconhece esse caráter público e social da linguagem. Ela
reconhece que nem coisas em si nem os usuários individuais da linguagem podem
decidir o significado na linguagem. O que quero dizer: nós construímos o
significado, utilizando sistemas de representação - conceitos e signos. (Tradução
nossa)
Ele vê a cultura como “cultura enquanto conjunto de valores ou significados
partilhados.” (SANTI, 2008, p. 2). Como é o grupo cultural que constrói os conceitos, é
51
também por aquela que se disseminam as formas simbólicas. Portanto, as formas simbólicas
são reflexos dos significados organizados pelo grupo.
Corrêa (2012, p. 135) complementa que “se as formas simbólicas refletem os
significados estabelecidos, elas também criam significados”. Ou seja, as formas simbólicas
são duais em seu sentido: exprimem os conceitos do grupo cultural e também criam conceitos
mediante as relações entre os sujeitos e as formas, ou, no pensamento de Berque (1998), são
marcas e matrizes de significados.
Ainda trilhando as ideias de Hall, Corrêa (2007, p. 8) assinala: “De acordo com a
corrente construtivista, as formas simbólicas são marcadas pela instabilidade de significados,
pela polivocalidade.” Esta é caracterizada por Hall (1997) por um mesmo processo ou
fenômeno que pode ter interpretações diferentes, gerando, portanto, significados distintos.
Disso concluímos que as formas simbólicas derivam das relações sociais culturais, mas não
necessariamente regradas, pois podem divergir a outras culturas distintas.
Desta maneira, as formas simbólicas não são necessariamente materiais. Além das
formas materiais, as formas simbólicas podem ser não-materiais, como Corrêa exemplifica ao
citar a linguagem e os rituais (CORRÊA, 2007; 2012).
Portanto, podemos inferir que Corrêa (2007; 2012) entende as formas simbólicas
como um sistema de representação apoiado em uma abordagem construtivista da
representação. Assim, as formas resultam da relação entre forma e conceito, formando signos,
que comunicam os grupos de uma mesma cultura. Somente lembrando que os símbolos são
parte integrante dos signos, segundo vemos em Santaella (1990).
O outro componente do entendimento de Corrêa (2009) sobre formas simbólicas
parte de Cassirer (2001), em que utiliza em seu texto: Processo, Forma e Significado
(CORRÊA, 2009). O autor afirma que para o espaço “se torne plenamente inteligível, é
necessário introduzir os significados construídos e reconstruídos a seu respeito pelos diversos
grupos sociais.” (CORRÊA, op. cit, p. 4). Introduzir significados, portanto é essencial para
realização espacial.
A relação entre o homem e a terra (DARDEL, 2015) é possível porque os homens
interpretam a realidade concreta por meio de uma simbolização. Somando ao pensamento
cassireriano de que o homem é um ser simbólico. Em outras palavras
O homem descobriu, por assim dizer, um novo método para adaptar-se ao seu
ambiente. Entre o sistema receptor e efetuador, que são encontrados em todas as
espécies animais, observamos no homem um terceiro elo que podemos descrever
52
como o sistema simbólico. Essa nova aquisição transforma o conjunto da vida
humana. (CASSIRER, 1994, p. 47).
O centro do pensamento de Cassirer (1994) coloca o homem como um ser
simbólico. Logo, a realidade é intermediada por meio dos símbolos criados pela vida humana
ao experienciar os fatos. No entanto, para o autor citado a realidade é objetivada pelo sistema
simbólico (PEREIRA, 2014). Esse sistema simbólico faz com que o homem não somente
entenda a realidade em que vive, mas também crie uma forma de vivenciar o mundo. O
sistema simbólico é para Cassirer (1994, p. 51) um dos “traços mais característicos da vida
humana.”. Assim, também influencia na cultura.
Seguindo a lógica de Cassirer, as formas simbólicas são responsáveis pela
objetivação do mundo. Dessa forma “o real se constitui como unidade e pluralidade, como
multiplicidade das configurações que, entretanto, afinal são unificadas através de uma unidade
de significação.” (CASSIRER, 2001, p. 64). Ou seja, somos sujeitos simbólicos e o que
apreendemos são símbolos que nos direcionam a uma realidade.
Igualmente, o homem tem suas experiências e as transforma em símbolos. Em
outras palavras “As formas simbólicas tendem a resignificar lugares específicos e conectá-los
a projetos de sentido mais amplo.” (OLIVEIRA e SOUZA, 2010, p. 4). Logo, a espacialidade
é uma relação simbólica, pois resulta da experiência que o sujeito tem com o lugar e sua
capacidade intelectual de inventar seu mundo simbólico (PEREIRA, 2014).
Portanto, o espaço é “um conjunto de funções ideais que se complementam e
determinam mutuamente para formar um resultado unificado.” (CASSIRER, 2001, p. 54).
Esse resultado unificado é vivido pelos sujeitos em suas relações sociais, sendo a religião uma
forma de simbolização presente no espaço. As formas simbólicas são associadas às formas
concretas, dando sentido conforme aqueles que as vivem.
Podemos então dizer que
Parece-nos claro que as formas se tornam simbólicas pelo depósito de significados
que lhes são atribuídos; sendo o seu estudo, geográfico ou de outra natureza,
passível de análises individuais e coletivas, isso porque um dado objeto pode
instigar a proeminência de significações das mais variadas, diferença esta produto de
um processo cultural subjetivo. (OLIVEIRA e SOUZA, 2010, p. 4, grifo dos
autores).
Ou seja, as formas concretas, são assimiladas de diferentes maneiras porque lhes
são atribuídas diferentes significações, conforme o grupo que as vivencia, modelam e
propagam sua vida social. Por exemplo, temos a forma concreta da IURD-TCF e variadas
53
possibilidades de significações, conforme o grupo que a vivencia no cotidiano. O templo não
tem o mesmo significado se compararmos um fiel e um ambulante que vende em frente à
igreja, assim como a doutrina defendida pela instituição diferencia significados para esses
dois tipos de pessoas. A variedade de significados perpassa pela condição de sermos animais
simbólicos (CASSIRER, 2001).
Dessa maneira, podemos, agora, compreender as formas simbólicas espaciais,
pois é uma geografização das formas simbólicas estudadas por Hall (1997) e Cassirer (2001).
Corrêa afirma categoricamente que “As formas simbólicas tornam-se espaciais quando estão
diretamente vinculadas ao espaço, constituindo-se em fixos e fluxos, isto é, localizações e
itinerários, que são atributos primários da espacialidade.” (CORRÊA, 2012, p. 137). Portanto,
as formas simbólicas espaciais se constituem de formas concretas (fixos), caso dos templos
religiosos, como também de formas não-concretas (fluxos), caso de procissões religiosas.
Ambos estão associados a significados simbólicos.
Desse modo, as formas simbólicas espaciais são interpretações das formas
simbólicas existentes relacionadas à vivência dos sujeitos no espaço. O que nos permite dizer,
como já dito anteriormente, que a relação entre o homem e o espaço é derivada de uma
experiência sentida e percebida, capaz de fazê-lo atribuir significados que o identificam
naquele espaço. Logo, as formas simbólicas espaciais são arranjos cuja simbologia perceptiva
do sujeito o direciona a dar um significado identitário, ou seja, a formação de geossímbolos.
A paisagem assume então uma forma específica, interpretada mediante os
geossímbolos existentes. Esses geossímbolos compõem as formas simbólicas espaciais,
proporcionando uma relação de identidade àqueles que o vivenciam. Se for uma relação de
vivência, então nós assumimos uma duplicidade, ou seja, “as formas simbólicas podem
incorporar os atributos já conferidos aos lugares e itinerários, como estes podem, por outro
lado, beneficiar-se ou não da presença de formas simbólicas.” (CORRÊA, 2007, p. 9). Essa
duplicidade realça a vivência entre sujeitos e objetos, como coparticipantes da composição da
paisagem.
Remete-nos, portanto, ao entendimento que analisamos sobre as formas e funções,
pois as funções existentes exigem das formas uma resposta, assim como as formas sinaliza
uma função a ser seguida. Se nós tomamos uma forma simbólica espacial de razão religiosa,
percebemos que o sagrado é um componente no significado geossimbólico do lugar. Ou como
afirma o autor
54
A manifestação do poder do sagrado no espaço realiza-se por meio de formas
simbólicas diversas. Imagens representativas dessas formas aparecem em procissões,
romarias, peregrinações, visitas religiosas, templos, santuários, entre outros. [...]. As
formas e funções devem ser entendidas por intermédio de seus significados; os
significados que os homens criam, sustentam e representam. (SOUZA, 2013, p. 3)
A IURD-TCF é um representante dessa manifestação do sagrado, pois assume em
suas formas um significado que potencializa a função no qual assume. Os significados
expressos pelas formas simbólicas espaciais, como o próprio templo, conduzem aos sujeitos
percepções que direcionam a um comportamento distinto, uma vez que os indivíduos se
sentem na presença divina.
Assim, o templo é também um condicionante espacial. Situado em um centro
urbano comercial, mas que consegue se impor como elemento distinto e presente de
sacralidade, cujas formas evidenciam o elemento religioso funcional do lugar.
Além disso, a IURD-TCF detém um poder identitário cujos fiéis acolhem uma
necessidade de frequência ao lugar para confirmar e fortalecer essa relação. Em seu cotidiano,
não se identifica apenas como membro, mas procura constante conexão com o templo, como
uma orientação espacial, seu centro no mundo. Assim, se afirma como ‘filho de Deus’ e
‘abençoado por Deus’ na medida em que sua constância ao templo se torna frequente e
duradoura. Parar de frequentar o templo significa estar “afastado”, ou seja, perde a identidade
de ‘filho’ e membro da família divina.
A IURD-TCF é também um espaço construído com intenções bem claras de
significar poder. Poder esse conduzido espacialmente pelos geossímbolos e pelas relações
entre líderes e fiéis. Concordamos com Oliveira e Souza (2010, p. 8) quando dizem que
A construção do espaço sagrado, empiricamente, acontece diante da posse e
transformação de um espaço profano, e é uma produção intelectual que busca
satisfazer necessidades psicológicas, e em algumas vezes mercadológicas.
O espaço profano, modificado pelos dirigentes da igreja conduz a uma mudança
de significado na paisagem urbana, mostrando que as intencionalidades estão presentes na
relação espacial, pois os líderes construíram o templo e conduzem suas reuniões de tal modo
que transmitem ser aquele espaço sagrado uma manifestação do divino em meio à
“corrupção” humana, espacialmente representada pelo espaço profano. Assim, o espaço
profano também faz parte do sagrado, pois denota a fronteira simbólica de onde Deus mora e
onde Deus apenas observa.
55
O espaço profano é representado através de formas simbólicas espaciais, cujos
significados são percebidos pelos fiéis como distintos das formas sagradas. Contudo, também
estão inseridas no espaço sagrado da IURD-TCF como símbolo do divino sobre o mundano.
O profano, deste modo, prepara o sagrado. O simbolismo se manifesta em um jogo de
significados em que sagrado e profano não se repelem, mas se diferenciam (ROSENDAHL,
1996). A conjuntura urbana de Fortaleza fortalece as formas simbólicas espaciais e ressalta a
paisagem religiosa manifestada pela IURD-TCF.
Os geossímbolos presentes remontam a um cenário captado pelos sujeitos que
percebem ali a presença do sagrado. Consequentemente, a identidade assumida pelos
fiéis/usuários do templo se fortalece e os direciona a um modo de vida que represente o
discurso simbólico do lugar.
Portanto, consignamos que as formas simbólicas espaciais são resultantes de uma
relação simbólico-religiosa, em que o sujeito é o elemento essencial, pois é a partir deste que
essas relações se simbolizam. Ou seja,
As transformações das formas simbólicas culturais em formas simbólicas espaciais,
quando temos o santuário como símbolo relevante ao e do turismo religioso, por
exemplo, nos levam a crer que existe uma fenomenologia simbólico-religiosa do
espaço sagrado, que merece ser analisada pelas percepções das pessoas que
vivenciam este espaço. (OLIVEIRA e SOUZA, 2010, p. 19).
O espaço geográfico, então, possui não somente as formas e as funções, mas
também identidades formadas a partir da vivência e da experiência humana, percebida e
interpretada pela mediação do corpo com as formas. As formas são extensões das ações
humanas, percebidas e situadas no espaço.
Por conseguinte, precisamos entender a relação corpo e sagrado para
compreendermos como os geossímbolos atuam e assumem formas simbólicas espaciais
mediante os sujeitos e sua percepção.
3.3 A RELAÇÃO CORPO X SAGRADO
A partir do que foi exposto até o momento, compreendemos que o espaço sagrado
é uma relação simbólica mediada pelas formas simbólicas espaciais através geossímbolos que
interagem com os sujeitos por meio da experiência. Ou seja, as formas simbólicas espaciais
são elementos condicionantes de uma dimensão do sagrado, de tal forma que este se torna
possível pela percepção da paisagem e dos elementos geossimbólicos presentes.
56
Deste modo, a IURD-TCF é uma forma simbólica espacial, cujos elementos
fazem parte da interpretação simbólica dos sujeitos que vivem esse lugar. Essa interpretação
ocorre por meio de formas simbólicas presentes na paisagem, captadas por meio da
experiência.
Entretanto, resta-nos entender de que maneira essa experiência ocorre. Saber
como o sagrado é captado e assimilado pelos sujeitos e como os geossímbolos assumem
significados voltados ao sagrado, revestindo a religiosidade praticada de uma realidade
convergente entre o humano e o divino.
Partimos do pressuposto de que o corpo é o agente que liga o consciente ao
mundo. Dessa forma, concordamos ser o corpo uma relação entre o ser e o espaço. Para
referendar a afirmativa anterior, consideramos os estudos de Merleau-Ponty (1908-1961) e
outros autores que trabalham o corpo a partir do entendimento da fenomenologia da
percepção.
Este filósofo entende a compreensão da realidade como fruto de uma relação entre
o ser com o mundo mediado pelo corpo. É através da consciência perceptiva que o sujeito irá
se deparar com algo que se apresenta diante de sua consciência. Assim, o constructo teórico
de Merleau-Ponty parte da compreensão de que o corpo é a ponte entre o ser e o espaço.
Podemos, assim, tecer algumas considerações a partir de sua obra Fenomenologia
da Percepção (2011). Ele parte do princípio fenomenológico de Husserl (s.d., p. 4) quando
explica que “a fenomenologia é a doutrina universal das essências, em que integra a ciência
da essência do conhecimento.”. Com esse pensamento centraliza suas ideias em aprofundar
o pensamento fenomenológico, contudo a partir de um viés particular de entendimento que é
a percepção.
Como afirma Souza (2012, p. 27) “a obra de Merleau-Ponty está centrada na
percepção”. Desta forma, é esse conceito que marca o pensamento do filósofo francês. A
partir disso assume as essências buscadas nos estudos fenomenológicos, como “buscar
aquilo que de fato ele é para nós antes de qualquer tematização” (MERLEAU-PONTY,
2011, p. 13). Então o caminho por ele trilhado para o desenvolvimento teórico é a
percepção.
A percepção é o viés de interpretação. É uma verdade intrínseca (SOUZA,
2012), isto é, a maneira reconhecida pelo ser de que o objeto existe, sem, contudo, lhe
atribuir um juízo. Nesse sentido, a percepção é um movimento (LIMA, 2010).
57
Mediante a isto, recorremos à definição proposta pelo filósofo que “Perceber é
envolver em um só golpe todo um futuro de experiências em um presente que a rigor nunca
o garante, é crer em um mundo.” (MERLEAU-PONTY, 2011, p. 399). Ele também coloca
em outro trecho que “perceber é [...] apreender um sentido imanente ao sensível antes de
qualquer juízo”. (Op. cit. p. 63). Assim, perceber é uma junção entre experiência e a
projeção simultânea dos objetos sensíveis, de modo que esses objetos são assimilados
inseparavelmente à sua essência.
Logo, a percepção é um ato humano, que admite uma realidade mediante o
objeto que vê no mundo. É uma ação de confirmação de verdade inerente ao ser humano.
“A percepção é um juízo” (Op. cit., p. 73). Isso quer dizer que o objeto antes mesmo de ser
pensado e refletido já é percebido pelo sujeito, trazendo, pois, uma significação. Isso ocorre
porque para ser refletido o objeto passa pelo agente da percepção, que, segundo o
pensamento merleaupontiano, é o corpo.
O corpo é a ponte entre o ser e o mundo no qual habita. É o meio pelo qual nos
comunicamos com o mundo. De uma maneira mais específica Merleau-Ponty (Op. cit. p.
270) afirma que “Ele [o corpo] não é apenas um objeto entre outros todos”, e de igual modo
“eu não poderia apreender a unidade de um objeto sem a mediação da experiência corporal”
(MERLEAU-PONTY, Op. cit. p. 273). Logo, o corpo é o mediador entre o sujeito e a
apreensão dos objetos e o mundo em que vive.
O mundo, aliás, na concepção deste filósofo “é o meio natural e o campo de
todos os meus pensamentos e de todas as minhas percepções explícitas” (MERLEAU-
PONTY, Op. cit. p. 6). Deste modo, o mundo é o espaço total (2010), uma vez que nele
ocorrem nossas experiências e projetos de vida (MERLEAU-PONTY, 2011). O próprio
filósofo diz ser o mundo “aquilo que nós percebemos. [...] aquilo que eu vivo.”
(MERLEAU-PONTY, Op. cit. p. 13-14). Assim, temos uma máxima do pensamento de
Merleau-Ponty: o sujeito como “ser-no-mundo”.
Esse pensamento converge à compreensão de Dardel, quando fala de
geograficidade, pois a vivência do mundo é “uma geograficidade do homem como modo de
existência e de seu destino.” (DARDEL, 2015, p. 1-2, grifo do autor). É uma descoberta do
mundo envolvido, cujos elementos são desvendados pela percepção dos objetos.
Porquanto, o mundo para Dardel é o mundo da existência (BESSE, 2015). Este
autor explica que o espaço geográfico para Dardel “é o mundo da existência, um mundo que
agrupa certamente as dimensões do conhecimento, mas também, e, sobretudo, aquelas da
58
ação e da afetividade.” (BESSE, 2015, p. 114). Dessa forma, o corpo interage com o mundo,
fazendo parte dele, vivendo-o, buscando a descoberta constante do espaço geográfico.
A geograficidade de Dardel é possível mediante a corporeidade (MARINHO,
2010). Isso quer dizer que a corporeidade é uma relação, mas não somente com as coisas, e
sim com outrem. Segundo este autor, “a corporeidade é, pois, uma relação a um só tempo
limitante e concreta com esse mundo, dando-lhe e reportando ao mesmo a transcendência
terrena necessária ao estabelecimento de novas e múltiplas vivências.” (MARINHO, 2010,
p. 77-78).
Logo, o espaço vivido, ou espaço total, são correspondentes do mundo
perceptivo. Pino (1996), ao falar do espaço na Psicologia, utiliza Merleau-Ponty para
justificar a ideia de que o espaço acontece quando o corpo real coincide com o corpo
virtual28
. O mesmo autor diz que “a corporeidade é o nome dado à experiência de nossa
materialidade.” (PINO, Op. cit. p. 58). Ou seja, é a experiência que temos com os objetos
que define a corporeidade, e não o objeto em si.
Este pensamento nos reporta ser a corporeidade uma espacialidade, porque por
ela compreendemos as intersecções estabelecidas entre o corpo e o espaço. A espacialidade,
por sua vez, “seria uma das maneiras principais maneiras pela qual o sujeito corpóreo
constrói sua experiência de mundo.” (SOUSA, 2009, p. 38). Para haver uma espacialidade é
mister a corporeidade, pois “é o corpo, sujeito do espaço, que desempenha o papel essencial
na constituição do nível espacial.” (PINO, 1996, p. 57). Nessa relação a espacialidade surge,
uma vez que
O ordenamento de nossas percepções supõe uma relação de reciprocidade em que
corpo e espaço se implicam mutuamente. Para um indivíduo não haveria espaço se
ele próprio não fosse um corpo no mundo, ou seja, ele é no espaço. (LIMA, 2010, p.
67, grifo do autor).
O próprio filósofo francês lança o entendimento de espacialidade no estudo da
fenomenologia da percepção. Pois diz que: “No que concerne a espacialidade, [...] o corpo é o
terceiro termo, sempre subentendido, da estrutura figura e fundo” (MERLEAU-PONTY,
2011, p. 147). O terceiro termo porque liga o objeto, com suas formas, até então, sem sentido,
ao ser, cujos significados são projetados passando pela percepção. Disto temos a
espacialidade: esse movimento de significação das formas, lembrando Cassirer (2001), as
formas simbólicas.
28
Segundo o autor, o espaço virtual é “o sistema de ações possíveis em diferentes configurações espaciais”.
59
O elo aqui tratado não é somente uma amarração simples, sem ação, mas uma
ligação interativa, pois esta relação é também uma interação. Podemos dizer que o corpo, por
meio da percepção, interage homem e espaço. Melhor explicando,
Com a consciência perceptiva, todavia, não pensamos o objeto puro e simplesmente:
interagimos com esse corpo que nos revela um espaço. Ou seja, se estivesse voltado
exclusivamente para consigo, o corpo não poderia ter consciência nem mesmo de si,
mas, voltando-se para o espaço, ele expande seus horizontes agregando múltiplas
experiências. Desse modo, o corpo adquire consciência de si mesmo mediante a
percepção do espaço. (LIMA, 2010, p. 74)
Portanto, o corpo é entendido em nosso trabalho como um elemento de ligação
entre o sujeito e o espaço. Ou, nas palavras de Souza (2012, p. 102), “O corpo e o espaço
implicam mutuamente uma relação de reciprocidade como um todo”. A experiência obtida
nessa relação é o que nos liga ao espaço. “Nesse sentido, toda experiência corporal é por
definição e princípio uma experiência espacial.” (LIMA, 2010, p. 67).
Do que foi explicitado, podemos inferir que a IURD-TCF é um espaço vivido
pela experiência corporal dos fiéis, de modo que a percepção comum dentre eles promove o
entendimento coletivo do templo como um geossímbolo. O corpo percebe e o sujeito
interage com o mundo a sua volta. O mundo que estabelece símbolos para compreender e
criar sua realidade. O templo é parte desse mundo e lócus de uma realidade intrínseca,
permitindo aos fiéis compreenderem o mundo no qual vivem. O geossímbolo atua no
sentido de lhes dar uma identidade, percebida real para cada um e juntos formando uma
cultura que tem no sagrado a representação máxima da realidade.
Nesse sentido, as formas simbólicas espaciais direcionam, no caso da IURD-
TCF, a um espaço sagrado, cujo corpo é o elemento convergente entre o ser e o mundo.
Juntos compreendem o transcendental envolvente na relação das formas do templo
(sagradas) com as formas fora do templo (profanas29
). As formas simbólicas espaciais
remetem a uma paisagem sagrada, percebida pelo corpo através de geossímbolos. Estes são
identificados e construídos pela espacialidade em uma paisagem residente do sagrado.
Assim, a IURD-TCF se torna uma forma simbólica espacial aos sujeitos que remontam este
lugar a um reencontro com o divino, o ponto fixo, retomando o que nos diz Eliade (1979).
A partir das intencionalidades humanas de compreender o mundo, há uma busca
incessante de explicar a realidade e o corpo assume, por meio da percepção, a primeira
29
Profanas em sentido de preparação ao sagrado, pois o sagrado direciona o profano e o profano destaca o
sagrado, pois aquele é amorfo (ELIADE, 1979).
60
resposta para isso. A vivência espacial passa por uma construção do mundo, pela
corporeidade. A experiência espacial dá uma significação vinculada ao sagrado, que, por
sua vez, é uma realidade percebida e sua interpretação formadora de símbolos.
A IURD-TCF é uma maneira de materializar uma realidade perceptiva e as
atividades nela praticadas endossam a interpretação dos fiéis ao perceberem ali o sagrado.
Para os fiéis, a igreja realiza a vivência de um lugar onde Deus está presente e sua atuação e
participação são importantes para se direcionar a vida cotidiana. É um porto seguro, cujas
necessidades espirituais e materiais são atendidos. É um lugar que lhes confere uma
identidade, pois na igreja reafirmam a aliança de “filhos de Deus”, diferenciando-os das
outras pessoas que vivem o caos comercial do centro urbano.
Tomando por parte dos organizadores, a IURD-TCF é uma agente de serviços
simbólicos, atuante na perpetuação de uma realidade expressa por símbolos materiais
(objetos usados nos cultos que firmam a ação de Deus e dos fiéis nas trocas simbólicas) e
não-materiais (discurso dos pastores, fluxo das pessoas como prática de fé, campanhas
realizadas pelos fiéis, associações entre membros30
, testemunhos e rituais), conduzindo a
uma experiência espacial diferente da proporcionada pelo espaço mundano31
. O encontro
dessas duas posturas, a do fiel e dos organizadores permite uma troca simbólica
(BOURDIEU, 2007) em que agentes assumem duas extremidades da relação religiosa: a dos
detentores do saber religioso ou capital simbólico, segundo Bourdieu, e a dos leigos, que
são os frequentadores do templo, sendo estes assumidos de uma carência espiritual que só
podem ser sanadas mediante a frequência regular e a observação das ordenanças
promovidas pelos líderes.
Tomando por base o entendimento de Bourdieu, podemos afirmar que a IURD-
TCF é uma instituição reprodutora de bens simbólicos, cujos fiéis são desprovidos de
capital simbólico, este oferecido no templo através do corpo de sacerdotes (bispos e
pastores) como uma “teologia erigida em dogma cuja validade e perpetuação ele [corpo de
sacerdotes] garante” (BOURDIEU, 2007, p. 38). Deste modo, os fiéis participam dessa
legitimação através da presença ao templo, percebendo os símbolos existentes e, a partir
disso, validando as práticas ensinadas. Assim, a troca existente entre eles se apresenta em
dois polos extremos: “o auto-consumo religioso, de um lado, e a monopolização completa
da produção religiosa por especialistas, de outro lado.” (BOURDIEU, op. cit. p. 40, grifos
30
São grupos de jovens, grupo de obreiros, grupo de senhores, entre outros. 31
Que alguns autores tratam como profano. Seria a vida cotidiana: o trabalho, o estudo, o lazer, entre outras
vivências.
61
do autor). Portanto, os leigos, corporalmente perceptivos, são legitimadores dos bens
simbólicos oferecidos pelos líderes representantes da instituição, nesse caso a maioria dos
bens simbólicos são espacializados por meio dos geossímbolos.
O corpo, como portador da ponte entre ser e espaço, é o mediador do sagrado,
cabendo a este a função de perceber os símbolos e ligar os objetos a significados
condizentes com a proposta discursiva dos pastores e identificar no espaço sagrado o elo
transcendental entre homem e Deus. Temos, então, o corpo como um elemento
geossimbolizante, pois transmite o percebido, cuja significação dada pelo sujeito se forma.
O sagrado é então fruto do percebido espacialmente, ou seja, o corpo nos revela um espaço
(LIMA, 2010), onde o sagrado é significado por meio das formas simbólicas espaciais
existentes.
Diante disto, a IURD-TCF é uma realidade perceptiva aos seus fiéis. Isso se
firma pelo fato de que “enfatizar a experiência do corpo como campo criador de sentidos,
isto porque a percepção não é uma representação mentalista, mas um acontecimento da
corporeidade e, como tal, da existência.” (NÓBREGA, 2008, p. 142). Logo, o que se
percebe é o que se realiza para o fiel desta igreja, assim como ambos se orientam no espaço,
pois o fiel se vê perto ou longe de Deus na medida em que está perto ou longe do templo.
Os símbolos se manifestam no espaço por meio de formas visíveis e por meio
das relações cotidianas, ou seja, o símbolo é uma construção espacial. Sendo assim, as
formas simbólicas espaciais são provenientes da interpretação simbólica da paisagem. Essa
paisagem se molda por meio de geossímbolos, que são fixos e fluxos ao assumirem uma
dimensão simbólica que fortalece a identidade do grupo. O sujeito vivencia o espaço pelas
interações simbólicas com o lugar. Assim, o lugar é mediado por geossímbolos. A IURD-
TCF é um geossímbolo, mas também há elementos geossimbólicos dentro do próprio
templo.
As formas simbólicas espaciais são interpretações das formas simbólicas que são
vivenciadas no espaço, pois simbolizam a vivencia dos sujeitos e sua relação com os
geossímbolos. A IURD-TCF é uma forma simbólica espacial religiosa. A percepção das
formas simbólicas espaciais se dá pela interação corporal com os geossímbolos.
O mundo percebido é o intermediado pelo corpo, mostrando que o ser é um
vivente no espaço e este é real a partir do momento que é no espaço. A percepção é espacial
e o mundo é uma descoberta dos objetos percebidos. O corpo, então, nos revela o espaço e
também direciona as formas simbólicas espaciais da IURD-TCF a um espaço sagrado, pois
62
a sacralidade envolvida se materializa por meio dos sentidos, percebidos corporalmente
pelos fiéis/usuários do templo.
63
4 CONTEXTO HISTÓRICO DA IGREJA UNIVERSAL DO REINO DE DEUS EM
FORTALEZA
Inicialmente para fazer a descrição e a interpretação da IURD-TCF, atentamos
para o processo de expansão da Igreja Universal pelo Brasil e sua chegada a Fortaleza.
Ressaltamos a relevância deste contexto por perceber no presente um resultado de
movimentos passados que se refletem de forma espacializada. Uma vez que entendemos o
espaço geográfico como sucessão de movimentos concretizados pelas formas por meio das
experiências entre o homem e a terra, vividas e materializadas pelos significados devido às
formas concretizadas pelos grupos culturais (CORRÊA, 2007, 2009; DARDEL, 2015),
tomamos como elementar estabelecer uma prospecção histórica ao nosso objeto de estudo,
mostrando a igreja como junção das pessoas com as formas simbólicas espaciais
concretizadas e simbolizadas pelos significados dadas ao templo. Dessa maneira, a IURD-
TCF é uma construção simbólica, remetendo-nos a entender como isso se procedeu.
Para isso, elucidamos alguns aspectos que remontam um contexto histórico da
instituição e sua chegada à capital cearense. Este prisma passa por características do
desenvolvimento da religião e seu desdobramento após acontecimentos históricos de impactos
sociais relevantes. Partimos de uma contextualização a partir da segunda metade do século
XIX, pois é a partir deste que temos um dimensionamento religioso inicial do que hoje é
representado também pela Igreja Universal do Reino de Deus. Assim, como esta, várias
igrejas no Brasil são componentes da religião cristã, herdeiros de uma cultura judaico-cristã
com valores e normas de conduta influenciadas pela cultura greco-latina. Assim, temos um
ponto de partida para a formação do nosso contexto histórico.
O que nos levou a demarcar este período para essa contextualização foi o
desdobramento histórico de três fatores: a reforma protestante, a colonização da América e a
Revolução Industrial. Esses moldaram um arranjo geográfico propício ao desenvolvimento de
uma diversidade de entendimento da religião cristã, sobretudo no continente americano. Uma
vez que a Reforma Protestante e a descoberta da América ocorreram em épocas semelhantes,
a difusão das ideias contra a Igreja Católica permeou a Europa, bem como fora do continente
europeu, difundidas, principalmente, por ingleses que buscaram vivenciar a fé protestante no
novo mundo.
Com a Revolução Industrial, as condições sociais também pesaram para uma
mudança de postura em relação à fé cristã. Conforme Campos Jr. (1995, p. 12-13),
64
Com a Revolução Industrial e a formação do operariado inglês, as cidades passaram
a apresentar um elevado índice populacional. A pobreza e a exploração pelo
capitalismo que se desenvolvia na Europa do século XVII criaram condições
necessárias para o aparecimento de um avivalismo religioso (o mesmo que
avivamento: o despertar buscando maior motivação da crença incentivando orações
e isolamento) entre os setores da população inglesa que mais sofriam.
Dessa forma, as condições econômicas e sociais foram determinantes para
remodelar as práticas de fé. A Reforma Protestante causou impactos na religião cristã e a
América foi um campo de “refugiados da fé”, onde houve um desenrolar do pentecostalismo
surgido dos Estados Unidos, chegando ao Brasil em meados do século XIX. Segundo
Mariano (2012. p. 9-10),
A expansão do pentecostalismo constitui fenômeno de amplitude mundial, posto que
este ramo do cristianismo, formado no início do século [nesse caso, século XX] na
América do Norte, vem crescendo aceleradamente em várias sociedades em
desenvolvimento.
Assim, adotamos uma contextualização segmentada em quatro partes. A primeira
parte trata do pentecostalismo, sua origem, características e chegada ao Brasil. Logo após,
discorremos sobre o neopentecostalismo e suas características. Em seguida, apontamos a
origem da Igreja Universal do Reino de Deus e sua disseminação no país e, por fim,
reportamos sobre a IURD no Ceará. Desta forma, podemos compreender o contexto do espaço
sagrado representado pela IURD-TCF.
4.1 O PENTECOSTALISMO COMO PLANO DE FUNDO DA IGREJA UNIVERSAL DO
REINO DE DEUS
O intento desta parte do texto é situar um panorama da origem do que chamamos
pentecostalismo. Este consolidado nas primeiras décadas do século XX. O pentecostalismo
acometeu uma lógica doutrinária capaz de promover uma igreja como a IURD, apesar de
diferenças existentes entre a base pentecostal e a prática iurdiana.
As raízes da segmentação doutrinária desde a Reforma Protestante derivou vários
segmentos, tanto na Europa como nos Estados Unidos. A fé pentecostal foi dos segmentos da
crença cristã. “O Pentecostalismo teve origem nas doutrinas de John Wesley. O fundador do
metodismo acreditava que o homem devia, após a justificação, dedicar-se à santificação.”
(CAMPOS JR., 1995). Suas ideias repercutiram, principalmente, nos Estados Unidos, onde os
imigrantes europeus ensinavam “a ênfase em uma vida que refletisse uma fé comprometida,
65
bem como seu ardor missionário.” (COSTA, 1999, p. 9). Com diferentes entendimentos das
ideias wesleyanas, as divergências doutrinárias rachavam opiniões e, assim, alguns grupos
surgiram, seguindo ideias diferentes já praticadas no continente europeu. Em particular o
pietismo32
. O pietismo surgiu primeiramente na Europa. Podemos definir o pietismo como
Um movimento surgido na Igreja Presbiteriana na segunda metade do século XVII,
que teve como uma de suas características mais evidentes a reação contra um
cristianismo que sob muitos aspectos se tornara vazio, tendo uma prática dissociada
da genuína doutrina bíblica. O alvo do pietismo era o retorno à teologia viva dos
apóstolos e da Reforma, com forte ênfase na pregação do Evangelho, acompanhada
de um testemunho cristão condizente. (COSTA, 1999, p. 3).
Uma das manifestações defendidas pelo movimento pietista é um reavivamento
do espírito, compreendido do que interpretam da Bíblia. Há um entendimento de que a figura
de Cristo estaria espiritualizada na força do Espírito Santo, cujo sinal identitário era
principalmente o “dom de línguas estranhas”33
. Esse pensamento é retratado como ocorrido na
festa judaica de Pentecostes, daí vem o termo Pentecostal, identificador das igrejas que
pregam a manifestação do Espírito Santo em seus templos. Para os que professam a fé
pentecostal esse evento sinaliza o começo deste avivamento e pregam que ocorre também a
mesma manifestação nos templos ainda hoje.
No caso do pietismo americano, esse movimento foi precursor de uma nova
maneira de evangelização. As massas eram alvos da pregação evangélica, servindo-se de
voluntários que professavam e auxiliavam campanhas sinalizando um novo êxodo, agora em
terras americanas34
. Isso despertou uma profunda vontade de levar o evangelho aos
americanos, alcançando todo tipo de pessoas, independente de classes sociais e raças. Essa
evangelização, inclusive, era destinada a outros países.
Derivando das atitudes pietistas, alguns evangelistas pregavam o “derramamento
do Espírito Santo”. Nas pregações litúrgicas, línguas estranhas eram faladas nas reuniões35
. A
partir daí, os ajuntamentos religiosos onde manifestava a glossolalia passaram a ser distintos
de outros grupos mais conservadores em relação à forma de propagação evangelística. Pois
para estes, a mensagem deve ser inteligível aos ouvintes, já para os adeptos da glossolalia, a
32
Movimento iniciado dentro do protestantismo, pelos fins do século XVII, na Alemanha, que, opondo-se ao
dogmatismo e ao formalismo da teologia luterana, enfatizava a prática da fé, a piedade subjetiva e as obras de
misericórdia. (MICHAELIS, 2016, [online]). 33
O que os estudiosos da área chamam de Glossolalia. 34
Isso é uma referência ao relato bíblico da saída dos hebreus do Egito e indo para a “Terra Prometida”, segundo
o livro de Êxodo. 35
Segundo Campos Jr. (1995, p. 21) essas línguas poderiam ser outros idiomas ou então linguagem de sons
indefinidos.
66
interpretação dessas mensagens era um sinal da atuação de Jesus no lugar, por intermédio do
“Consolador”36
. Ou seja, o derramamento do Espírito Santo era a evidência da presença
divina.
Esse talvez seja o elemento essencial gerador das crenças praticadas atualmente
pelas igrejas de confissão neopentecostal, pois uma vez que aderem à manifestação presencial
do poder divino, representado pelo Espírito Santo, passam a identificar o local como um lugar
santo. A manifestação do Espírito Santo é comum em várias igrejas neopentecostais, contudo
o sinal da glossolalia não é unânime, porém outras formas de manifestação ocorrem, como
curas, exorcismos e revelações divinas.
No Brasil, o pentecostalismo surgiu a partir das imigrações de evangelistas
missionários. Defendendo essa nova manifestação da fé cristã, primeiramente na cidade de
Belém, no Pará, com os missionários Daniel Berg e Gunnar Vingren, fundadores da
Assembleia de Deus no país. Como se percebe, o pentecostalismo surgiu fora da região
central do país. Contudo, foi na região Sudeste onde rapidamente se espalharam as igrejas
pentecostais (CAMPOS JR., 1995). O desejo de enviar a mensagem a outros povos acelerou o
processo de divulgação do pentecostalismo no Brasil e outros missionários vieram com esta
intenção.
Em terras brasileiras, várias denominações pentecostais surgiram. Além das
pioneiras, Assembleia de Deus e Congregação Cristã, também surgiram A Igreja do
Evangelho Quadrangular (IEQ) e a Igreja Pentecostal Brasil para Cristo (IPBC), ambas na
década de 1950 (CAMPOS JR., 1995). Destas quatro, algumas divisões surgiram e outras
denominações foram criadas, contudo mantendo a ideia da manifestação do Espírito Santo.
O pentecostalismo, além dos fundamentos já citados, possui características
particulares em sua difusão e vivência cristã, fatos destacados a seguir. A primeira delas é o
batismo no Espírito Santo, isto é, a pessoa somente recebe os dons divinos caso o espírito se
apodere dela. Isso ocorre quando, no templo, o indivíduo manifeste um dos dons considerados
miraculosos37
. É a confirmação de que a pessoa está fiel em Cristo. Esta especialidade está
presente em várias denominações brasileiras.
36
Segundo o Livro de João, o Consolador é a forma espiritual que Jesus assumiria após a sua ressurreição,
podendo ser aqui entendida como o Espírito Santo. 37
Algumas passagens da Bíblia mencionam um ou alguns dons, mas para ilustrar temos esse trecho extraído do
livro de Marcos: “E estes sinais seguirão aos que crerem: Em meu nome expulsarão os demônios; falarão novas
línguas; Pegarão nas serpentes; e, se beberem alguma coisa mortífera, não lhes fará dano algum; e porão as mãos
sobre os enfermos, e os curarão.” (Mc 16:17-18).
67
Outra característica é a cura. Dentro dos templos, mediante as orações dos
pastores e/ou obreiros, as mazelas físicas das pessoas são eliminadas, desde que tenham fé.
Acompanhado às curas, as revelações e visões também são presentes nas reuniões
pentecostais. Do mesmo modo que o dom de línguas e da cura, estas revelações e visões são
consideradas miraculosas.
As divisões internas também distinguem as igrejas pentecostais. Há uma grande
hierarquia dentro destas igrejas, desde o pastor fundador, como é o caso do falecido Pastor
Presidente da Igreja Deus é Amor, David Miranda, até cargos considerados “menores” dentro
da congregação. Os cargos mais comuns nessas instituições são: pastores, bispos, presbíteros,
evangelistas, diáconos e levitas. Funções extraídas de passagens ou da interpretação da bíblia.
Mas também há outros atributos como: presidente, tesoureiro, auxiliar, dependendo da
instituição ou demanda da assembleia. Contudo, as funções de pastor, bispo e presbítero são
consideradas “maiores” no serviço ministerial.
Além disso, os pentecostais valorizam as vigílias e os jejuns. A particularidade
nessa prática se deve à regularidade. Não há uma especificação de dias, mas a maturidade
espiritual dos fiéis é percebida pela capacidade de “jejuar” e “vigiar”. No caso das vigílias, o
templo é o local apropriado para tal, uma vez que na igreja os membros podem cantar e orar
coletivamente.
Por fim, as práticas de anunciação são bem particulares no pentecostalismo.
Desde praças públicas, até estádios de futebol, um lugar capaz de aglomerar pessoas é um
lócus potencial para a propagação evangelística. Os grandes ajuntamentos são os alvos
preferidos para ensinar os dogmas. Nesse caso, a pessoa é apta para ensinar o evangelho, no
entanto, o que se ensina é a mensagem de anunciação do sagrado remetido à igreja, por meio
de Cristo. Nos templos abrem-se exceções para mensagens curtas ou revelações, mas o ensino
litúrgico, “a pregação” é função dos eclesiásticos. No pentecostalismo, quanto mais pessoas
“ouvirem a mensagem” melhor.
Consequentemente, o pentecostalismo atinge um elevado número de pessoas. Seja
por sua forma de propagação ou por outros contextos sociais, alguma dessas características
provocaram discórdias doutrinárias resultando em divisões entre as igrejas. Entre essas
divisões alteração de ideias que levaram, a partir da década de 70 e 80, a uma nova maneira
de viver o cristianismo, sem largar as convicções pentecostais. Assim, surge o
neopentecostalismo tratado a seguir.
68
4.2 O NEOPENTECOSTALISMO: SUA CLASSIFICAÇÃO E PRINCIPAIS
CARACTERÍSTICAS
Retomando a condução traçada para este capítulo, interessa-nos nesta descrição
contextualizar o objeto para compreender a IURD-TCF como um espaço sagrado. A
sacralidade para o membro desta igreja se encontra no poder divino que acompanha o fiel no
seu cotidiano, mas, sobretudo sua manifestação ocorre dentro do templo. Como essa
manifestação apresenta a atuação do Espírito Santo na vida dos expectadores, as melhorias na
vida de cada um se relacionam aos benefícios concedidos pelo próprio Espírito Santo. Porém,
cada período histórico e cada grupo eclesiástico interpreta essa aparição com certas
particularidades, o que carece de distinção desses grupos no decorrer do aparecimento
pentecostal no Brasil.
Deste modo, precisamos distinguir o pentecostalismo do neopentecostalismo.
Adotamos para isso uma divisão temporal proposta por Freston (1993) que relaciona os tipos
de igreja ao período de origem. Assim, o autor separa as igrejas pentecostais no que chama de
três ondas. Ele afirma que
A primeira onda é a década de (1910), com a chegada da Congregação Cristã (1910)
e da Assembleia de Deus (1911) [...] A segunda onda pentecostal é dos anos 50 e
início dos anos 60, [...] surgem: a Quadrangular (1951), Brasil Para Cristo (1955) e
Deus é Amor (1962) [...] A terceira onda começa no final dos anos 70 e ganha força
nos anos 80. Suas principais representantes são a Igreja Universal do Reino de Deus
(1977) e a Igreja Internacional da Graça de Deus (1980). (FRESTON, 1993, p. 66)
Concordamos com Mariano (2012) quando utiliza essa divisão para classificar as
igrejas pentecostais brasileiras devido às particularidades inerentes a estes grupos. Ele
menciona que as duas primeiras ondas são teologicamente parecidas, diferente apenas no
destaque de atuação do Espírito Santo. “A primeira enfatiza o dom de línguas, a segunda, o de
cura” (MARIANO, 2012, p. 31). Contudo, cabe salientar que entre uma onda e outra há um
intervalo de quarenta anos, o que infere díspares contextos sócio-espaciais. Logo, neste
trabalho utilizamos a classificação sugerida por este autor para contextualizar a IURD-TCF.
Destarte, podemos dizer que a Igreja Universal do Reino de Deus é uma igreja
classificada como de terceira onda em seu contexto histórico-institucional. Essa classificação
intenta a uma divisão histórica, mas a terceira onda aflora diferenças maiores do que o recorte
temporal. De antemão, recorremos também à utilização do termo neopentecostal para
classificar nosso objeto de estudo. Para Mariano (op. cit., p.33),
69
A terceira onda demarca o corte histórico-institucional da formação de uma corrente
pentecostal que será aqui designada de neopentecostal, termo praticamente já
consagrado pelos pesquisadores brasileiros para classificar as novas igrejas
pentecostais, em espacial a Universal do Reino de Deus. O prefixo neo mostra-se
apropriado para designá-la tanto por remeter à sua formação recente como ao caráter
inovador do neopentecostalismo. (grifos do autor)
Portanto, a IURD-TCF é uma igreja neopentecostal, justamente por ser
considerada recente no cenário religioso brasileiro e por, também, se destacar enquanto mais
antiga no que concerne a algumas características. Mas quais são elas? Nesse quesito,
concordamos com Bledsoe (2012) quando diz que as igrejas neopentecostais se especializam
pela adoção da teologia da prosperidade, do fortalecimento da consciência e prática da batalha
espiritual, em que o exorcismo é uma prática recorrente, e da diminuição dos ensinamentos
sobre uma vida santificada. Esta última é arrefecida pelos ensinos vinculados à prosperidade,
seja financeira, emotiva, profissional e/ou relacional. Em consonância ao autor acima,
Mariano descreve essas características da seguinte forma:
Sobre as características do neopentecostalismo, destaco três aspectos fundamentais:
1) exarcebação da guerra espiritual contra o Diabo e seu séquito de anjos decaídos;
2) pregação enfática da Teologia da Prosperidade; 3) liberalização dos
estereotipados usos e costumes de santidade. (MARIANO, 2012, p. 36)
Contudo, em outra parte do mesmo texto, Mariano (2012) sugere uma quarta
característica: a gestão empresarial, baseada no estudo de Oro (1992), em que o autor
argumenta que “Elas verdadeiramente agem como empresas e, pelo menos algumas delas,
possuem fins lucrativos. Resulta destas características a ruptura com os tradicionais
sectarismo e ascetismo pentecostais” (MARIANO, 2012, p. 36). Ou seja, o grande diferencial
das igrejas neopentecostais é a exaltação da economia como um viés de santidade resultante
da vitória contra as forças malignas. Assim, o neopentecostalismo se direciona a uma prática
inovadora e complexa atrelada às atividades religiosas.
Ainda segundo Mariano (2012), há outras diferenças entre os pentecostais e os
neopentecostais em relação à diversidade teológica. “Primeiro, que entre as igrejas
neopentecostais não existe homogeneidade teológica. [...] O segundo problema diz respeito à
crescente influência exercida pelas igrejas neopentecostais sobre as demais.” (MARIANO,
2012, p. 38). Assim, a complexidade em analisá-las se eleva e mais particularidades surgem.
Cabe de momento verificar essas diferenças e averiguar a dimensão espacial
existente nestas particularidades. Podemos enfatizar que, de modo geral, as igrejas
70
neopentecostais almejam as aglomerações e os grandes públicos, assim como as demais
igrejas pentecostais. Assim, também podemos falar sobre o uso midiático e as campanhas
evangelísticas. No entanto, a diferença está no modo de arrebanhar prosélitos, uma vez que no
neopentecostalismo algumas práticas foram realçadas ou supervalorizadas. Mariano (2012, p.
43), ao falar do exorcismo na IURD, chega a dizer que “a Universal o exacerba nos cultos de
libertação, concedendo ao Diabo e aos demônios, [...], destaque e importância sem
precedentes.” De igual modo há práticas que se mantêm, outras que se divergem.
Em relação às diferenças, existem algumas que auxiliam na caracterização do
neopentecostalismo. Bledsoe (2012) e Mariano (2012) apontam de modo semelhante algumas
distinções. O primeiro as elenca da seguinte forma:
Em primeiro lugar, a estratégia da segunda onda quanto ao uso do rádio permanece e
é acrescida de um forte investimento em televisão. Segundo, as igrejas tomam
emprestadas práticas do catolicismo popular e das religiões afro-brasileiras ao
mesmo tempo em que declaram a tais instituições concorrentes. Em terceiro lugar,
as denominações de terceira onda se organizam de maneira semelhante a uma
corporação, geralmente contando com um ou alguns que representem a máxima
autoridade executiva e espiritual sobre as igrejas afiliadas a seus seguidores. Quarto,
os pastores de congregações locais estão acostumados ao estilo do contexto urbano
[...]. Finalmente, a lealdade da membresia é mais dirigida à denominação como
provedora de serviços do que um compromisso fraternal uns com os outros.
(BLEDSOE, 2012, p. 44).
Mariano (2012) faz uma consideração a somar com os predicados acima descritos.
Para este autor, além da diferença mencionada sobre o exorcismo, ressalta que “outra
característica dos neopentecostais reside no rompimento com a ideia da busca da salvação
pelo ascetismo de rejeição ao mundo.” (MARIANO, op. cit. p. 44). Isto é, os neopentecostais
não assumem mais com tanta eminência que a salvação se dá por um desapego com este
mundo. Pelo contrário, assumem uma postura cuja santidade permeia a vida econômica e
profissional dos fiéis ao ponto que “as bênçãos“ são in hoc tempore.
Podemos interpretar estas características ao que Berger (2013) chama de
secularização. Uma vez que as condições materiais das pessoas influenciam nos seus atos e
relações, “as igrejas neopentecostais estão se acomodando rapidamente à sociedade inclusiva,
à cultura e à religiosidade popular.” (MARIANO, 2012, p. 45). Este autor chega apontar “um
processo de mundanização”. Assim, a secularização que permeia pelo neopentecostalismo
causa uma adaptação na sacralidade dos fiéis, resultando numa postura de profundo interesse
material junto à devoção espiritual.
71
No caso da IURD-TCF, conforme veremos adiante, percebemos essa
característica notadamente nas reuniões das segundas-feiras. Neste dia, o foco da pregação é o
sucesso financeiro, resultado que os fiéis almejam cumprindo os rituais propostos pelos
pastores, de modo que a recompensa não é o “Reino dos céus”, mas o “Reino na Terra”.
Assim, o desejo de ascensão que a sociedade tem no cotidiano é levado ao espaço sagrado,
sacralizando o dinheiro como símbolo de auxílio divino.
Aqui cabe destacar a relevância que o templo tem para o neopentecostalismo.
Sobre isso Mariano (2012, p. 46-47) afirma que o templo é uma ferramenta indispensável para
apoiar o televangelismo, pois na IURD “a presença dos fiéis nos templos é crucial para que a
denominação possa ampliar o número de dizimistas e ofertantes, e com isso, financiar novos
programas e projetos evangelísticos e, se possível, comprar emissoras de rádio e TV.”. Logo,
a dimensão espacial é uma realidade na vida do neopentecostal e nisso há uma aproximação
entre a religião e a Geografia, pois há um processo de significação que ajusta o pensamento
do fiel à prática de “ir ao templo”. Sobre essa discussão, retomaremos no próximo capítulo.
Logo, relacionamos alguns pontos entre o neopentecostalismo e o espaço sagrado,
mediante as convicções proferidas pelos grupos neopentecostais. Para estes grupos, como para
os pentecostais em geral, o templo é “um espaço sagrado, somente quando nele se instala um
grupo de adoradores” (CAMPOS, 1997, p. 118). Isso quer dizer que a construção e as formas
do templo são aparentemente relegadas a um plano inferior, uma vez que as pessoas seriam os
adoradores e, assim, a partir daquelas o sagrado se manifesta. Os rituais são considerados
sagrados. Isso faz parte do discurso de muitos pastores pentecostais.
Porém, o que se percebe nos discursos de pregadores pentecostais e
neopentecostais é uma relevância ao local de adoração, isto é, o templo. Podemos constatar
isso em algumas reuniões que presenciamos. Os pregadores colocam o templo como a “casa
de Deus”, “onde Deus age na vida da pessoa” ou ainda, “lugar onde os milagres acontecem”.
Expressões como estas são corriqueiras nas reuniões neopentecostais, como é o caso da
IURD. Para exemplificar a importância do espaço físico do templo, destacamos o artigo a
seguir, cujo tema é o uso do celular dentro da igreja. O texto é assim publicado:
Situações assim [uso do celular nas reuniões] são comuns dentro da igreja, mas não
deveriam ser. Primeiro, por educação. Uma vez que quando vamos ao cinema,
teatro, palestra ou em qualquer reunião com pessoas deste mundo fazemos questão
de nos certificar de que nada vai atrapalhar o nosso compromisso, ainda mais o
toque inesperado do celular. Por que então o mesmo respeito não é visto quando se
vai ao encontro do Altíssimo, em Sua casa de oração?
O próprio Senhor Jesus deixou um alerta para os cristãos, ao se deparar com a falta
de consideração com o Templo divino em sua época:
72
“Jesus entrou no templo, expulsou todos os que ali vendiam e compravam,
derribou as mesas dos cambistas, e as cadeiras dos que vendiam as pombas; e
disse-lhes: Está escrito: A minha casa será chamada casa de oração; vós, porém,
a fazeis covil de salteadores.” Mateus 21:12-13
Exemplos bíblicos não faltam para demonstrar o zelo que devemos ter na Casa de
Deus, porém, acontecimentos diários nos fazem refletir sobre o fato de que muitos
que nunca tiveram experiências com o Deus da Bíblia agem com respeito e
consideração com seus deuses, objetos de culto e templos, diferentemente de muitos
que se dizem cristãos.
É preciso entender que quando nos dirigimos ao Templo do Senhor o fazemos não
para rever amigos, colocar a conversa em dia ou nos exibir, mas para um
fortalecimento espiritual, que virá a todos por meio das mensagens que vêm do altar.
Assim, toda reverência, temor e silêncio são imprescindíveis, pois, mais importante
do que um hospital que presta os primeiros socorros aos pacientes que sofrem com
doenças físicas, na casa de Deus chegam doentes espirituais, que podem perder não
só a vida aqui na Terra, que é passageira, mas a Salvação eterna.
Sem contar que o único que ganha com distúrbios provocados durante os encontros
de fé é o mal, pois ele é o mais interessado em que a boa semente, como Jesus
chama a Palavra de Deus, caia pelo caminho e não dê frutos. (MEIBACH, 2013,
Grifos da autora).
Este relato é interessante porque demonstra o entendimento que a IURD, como
igreja neopentecostal, tem sobre o espaço físico do templo. Apesar do livre acesso e ensino
sobre a importância das pessoas, e não do templo, o local de adoração é importante para a
presença do divino. Para quem frequenta estes espaços, o templo é uma habitação e, por isso,
digno de respeito por parte de quem o frequenta. O zelo é resultante da crença de que o
templo é a casa de Deus, portanto uma manifestação que irrompe com o cotidiano.
Isso nos remete a uma forma de hierofania. Segundo Rosendahl (2006, p. 121), a
hierofania é “uma manifestação do sagrado, a qual permite que se defina um ‘ponto fixo’,
ponto de toda a orientação inicial, o ‘centro do mundo’.”. Ou seja, o templo é um ponto fixo,
pois é a morada de Deus, onde ele se situa quando o fiel vivencia a experiência religiosa. O
zelo é uma demonstração de como a hierofania é vivenciada pelo grupo, pois “O homem, ao
aceitar a hierofania, experimenta um sentimento religioso em relação ao objeto sagrado.”
(ROSENDAHL, 1996, p. 27). Consequentemente, a forma do templo remete a relação entre o
fiel e o sagrado.
Entretanto, concordamos de maneira preliminar com Campos (1997) quanto à
dualidade lógica existente no grupo pentecostal e neopentecostal em relação ao espaço
sagrado. Assim, alega que “Essa tensão entre a sacralização e dessacralização do espaço de
culto se deve de duas lógicas que insistem, uma na desterritorialização do sagrado, outra na
sacramentalização do lugar, onde o Espírito Santo se manifesta.” (CAMPOS, 1997, p. 120).
Portanto, pode considerar o local de culto como um espaço qualquer, mas ao mesmo tempo
aceitá-lo como a “casa de Deus”, referente à presença ritualística do Espírito Santo. Podemos
73
aceitar, então que nessa forma de pensar o cristianismo, há uma fluidez na materialidade do
sagrado, porém uma rigidez na sacralidade do discurso. Lembrando que um geossímbolo
(BONNEMAISON, 2002) pode ser algo material ou não, no entanto, está diretamente ligado a
uma espacialidade, neste caso, na coletividade ritualística, pois mesmo não se mostrando afeto
aos demais presentes no templo, neste mesmo local irradia um mesmo modo de ver o espaço,
ou seja, como lócus da hierofania. Portanto, mesmo nesta dualidade lógica, o espaço continua
sagrado, por meio do discurso e aceitação deste por parte dos fiéis.
Assim, o templo se reveste, no neopentecostalismo, de uma dupla interpretação: é
um espaço sagrado, por ser o local hierofânico, mas também espaço profano por compor de
materiais comuns outros locais simbólicos. Quem determina a sacralidade são os que possuem
o capital simbólico (BOURDIEU, 2007). Corroborando com Gil Filho (2008, p. 121), ao
afirmar que “o edifício da igreja é o eixo simbólico que congrega o espaço construído, os
atores sociais e a atuação destes na hierarquia institucional.”. Logo, o templo é visto pelos
fiéis neopentecostais como um elemento de ligação entre o sagrado e o profano. Nesse
sentido, adentramos na constituição da Igreja Universal do Reino de Deus, exposta a seguir.
4.3 CONTEXTUALIZANDO A IGREJA UNIVERSAL DO REINO DE DEUS
Contextualizando, inicialmente, a Igreja Universal do Reino de Deus (IURD)
temos uma vasta bibliografia. Desse modo, a descrição aqui feita é pautada , sobretudo, nos
informes da própria instituição e nos autores já anteriormente citados (CAMPOS, 1997;
CAMPOS JÚNIOR, 1995; MARIANO, 2012; BLEDSOE, 2012).
Sobre sua origem, a IURD é bem sucinta em seu relato oficial no site da igreja38
,
quando ainda nem possuía um local próprio. A saber:
Tudo começou em um coreto no subúrbio do Rio de Janeiro. Com teclado,
microfone e uma Bíblia, o então pastor Edir Macedo Bezerra ia todos os sábados ao
bairro do Méier. Subia os sete degraus do coreto e pregava para poucos. Eram os
primeiros passos da Igreja Universal, que teve como principal incentivadora a
senhora Eugênia, mãe do hoje bispo Edir Macedo.
A primeira igreja foi erguida onde funcionava uma antiga funerária, no bairro da
Abolição, também no Rio de Janeiro. O primeiro culto foi realizado naquele local,
em 9 de julho de 1977. A ajuda dos primeiros membros foi fundamental. Albino da
Silva encontrou o imóvel. Dona Lindalva doou o ventilador.
Uma antiga fábrica de móveis no número 7.702 da Avenida Suburbana foi alugada,
parecendo ser o local ideal para iniciar a Obra. O galpão se tornou o grande templo
da Abolição, com capacidade inicial para 1,5 mil fiéis. Mas logo precisou ser
38
Site da IURD: <http://www.universal.org/>.
74
ampliado e, atualmente, comporta 2 mil pessoas39
confortavelmente sentadas.40
(Grifos nossos).
Esses três parágrafos retratam o início da Igreja Universal no Brasil na visão de
seus idealizadores. Por hora, detemo-nos nesta descrição para ressaltar a espacialidade
envolvida no discurso do sítio da igreja. Segundo o texto acima, o primeiro local da igreja foi
um coreto (Figura 01). Aqui, a simbologia da igreja entra em ação ao sacralizar um espaço até
então profano. Contudo, o coreto em si é um símbolo de mensagem, uma vez que é um espaço
reservado para propagação de discursos, musicais ou prosa. Este coreto não é mais um coreto
qualquer, mas um espaço geossimbolizado pelo discurso religioso da IURD. Não é pelo local,
mas o que se fez no local ressignificou seu uso, criando uma identidade com o fiel desta
igreja, pelo menos quanto a sua origem.
Figura 01 – Coreto do Méier, local do primeiro culto da IURD, na cidade do Rio de Janeiro.
Fonte: Blog de notícias da Universal41
.
39
Contudo, após o término da expansão, o templo aumentou sua capacidade para 12 mil pessoas, segundo o sítio
Gospel Prime. Disponível em: <https://noticias.gospelprime.com.br/catedral-mundial-da-fe-da-iurd-completa-
10-anos-neste-sabado/>. Acesso em: 28/07/2016. 40
História da Universal. Disponível em: <http://www.universal.org/institucional/historia-da-universal.html>.
Acesso em 27/06/16. 41
Disponível em: <http://noticiasdauniversal.blogspot.com.br/2010/06/nasce-o-sonho-o-coreto-funeraria-
o.html>. Acesso em: 27/06/2016.
75
O coreto também representa uma simbologia da igreja em relação ao que chamam
de “batalha espiritual”. Nessa luta, a utilização de espaços públicos para atos religiosos é uma
maneira de mostrar a adversidade entre o sagrado e o profano, mas adversidade esta que se
mescla mediante a hierofania. O que era profano agora é sacralizado pela evangelização cristã
da Igreja Universal. Essa tática faz parte da disseminação desta igreja em outros pontos do
país e do mundo. Neste caso, por ser um espaço público, não se pode comprá-lo, mas pode-se
mistificá-lo como o ponto inicial da “manifestação de Deus”.
Essa lógica foi característica na década de 1990 nas igrejas pentecostais.
Conforme Machado (1997), as igrejas pentecostais se territorializaram de maneira informal e
fugaz, ou seja, buscam espaços para nucleação de fiéis, geralmente eram alugados, e caso se
fixasse na localidade e aumentasse o número de membros, adquiria-se um espaço permanente.
Como esses espaços são alugados, a mobilidade é fluida, pois depende do sucesso do núcleo.
Dessa forma, essas igrejas se espalharam de maneira mais rápida e fácil. Nos casos de espaços
públicos, as reuniões eram denominadas de missões ou campanhas de evangelização, em que
eram utilizados desde coretos, como no caso da IURD, até grandes locais de concentração
como estádios, parques ou até mesmo nas praias. Hoje, porém, é diferente, uma vez que
constroem catedrais como meio de atrair público e conquistar novos fiéis.
O sagrado se forma mediante o discurso de quem prega. Neste caso, a história da
IURD se mistura com a de seu fundador, o bispo Edir Macedo (MARIANO, 2012). Como
vimos na descrição acima, aquele foi o pastor que levou a igreja a um coreto. Logo, é o
detentor do poder simbólico da IURD. O poder simbólico é exercido quando “o corpo de
sacerdotes tem a ver diretamente com a racionalização da religião e deriva o princípio de sua
legitimidade de uma teologia erigida em dogma cuja validade e perpetuação ele garante.”
(BOURDIEU, 2007, p. 38). Edir Macedo faz isso, pois em seu discurso o espaço se sacraliza
mediante os “eleitos de Deus” para propagação do evangelho. Nisso se pauta a doutrina da
Universal, tendo como autoridade máxima o seu fundador. Isso centraliza as ações desta
igreja em todos os locais onde se instala como é o caso de nosso objeto de estudo, em que um
espaço antes profano foi transformado em sagrado por intermédio do discurso de que ali Deus
confiou seu poder aos homens que o transmitem aos fiéis.
Isso é perceptível no segundo local de funcionamento da Universal relatado
anteriormente. A antiga funerária deu lugar à igreja (Figura 2). O espaço dos mortos seria
então um espaço para os “ressuscitados em Cristo”. É uma ressignificação das formas-
conteúdos (SANTOS, 2014). Os significados são direcionados a identidade dos sujeitos, como
76
exposto por Corrêa (2009), através dos geossímbolos (BONNEMAISON, 2002). A funerária
passou a ser uma igreja, esse relato ressalta o poder do discurso na ocupação de locais e a
formação de uma identidade do fiel com a igreja, pois assim como a igreja muda as funções
espaciais, muda também a vida de seus frequentadores.
Figura 2 – Primeira reunião na antiga funerária em 09/07/1977, Abolição, Rio de Janeiro.
Fonte: Blog de notícias da Universal42
.
Neste relato também há uma ênfase no protagonismo do fiel (MARIANO, 2012),
uma vez que atua, também, no funcionamento da igreja. Isso nos ajuda a entender como os
membros se afeiçoam ao templo, pois o protagonismo no fiel se dá mediante sua colaboração.
O próprio bispo fundador deixa isso claro ao falar das ofertas dadas por membros: “uma das
maiores revelações dadas ao homem é a de que Deus deseja ser nosso sócio” (MACEDO,
2000, p. 59). Ser sócio é igualar a relação de participação entre Deus e o homem. Desta
forma, o fiel se sente importante na perpetuação espacial da igreja, uma vez que ali tem sua
contribuição, como no caso acima, em que uma senhora doou o ventilador.
O primeiro templo (neste caso, catedral) foi erguido e inaugurado em quinze de
agosto de 1999, situado na Avenida Dom Hélder Câmara (antiga Av. Suburbana), no bairro de
Del Castilho, Rio de Janeiro, com amplo espaço oferecendo uma maior visibilidade (Figura
3). Logo, percebemos uma lógica de crescimento espacial mediante o espaço sagrado da
igreja. Encadeia-se a lógica de expansão da seguinte maneira: ocupação sem espaço próprio,
42
Disponível em: <http://noticiasdauniversal.blogspot.com.br/2012/09/historias-da-iurd-funeraria-que-
virou.html>. Acesso em: 08/07/16.
77
ocupação em espaço alugado e espaço construído e próprio da igreja. Esse crescimento é
horizontal no espaço e vertical na ideia, uma vez que retrata o poder dado pelo divino na
expansão eclesiástica. Esse poder é percebido espacialmente, pois no primeiro momento nada
se construiu (coreto), no segundo momento (funerária), pequenas alterações no local, e no
terceiro momento (catedral), o total controle de construção do espaço destinado ao sagrado.
Figura 3 – Catedral Mundial da Fé, no Rio de Janeiro.
Fonte: Blog de notícias da Igreja Universal43
.
Igualmente, podemos identificar na história oficial da igreja uma valorização
espacial de seus domínios. O auge desta expansão atualmente se dá agora não somente pela
construção, mas pela transferência simbólica do espaço sagrado judaico-cristão representado
pelo Templo de Salomão, em São Paulo. A IURD revela seu poder pela paisagem, pois agora
o local eleito por Deus veio até os fiéis através do templo. Essa simbologia faz com que os
templos da igreja sejam centros irradiadores do sagrado (ELIADE, 1979).
Como nossa ênfase neste capítulo é descrever a Igreja Universal e sua chegada ao
Ceará, destacamos os princípios acima mencionados: a expansão da fé pela sacralização
intencional dos espaços. É dessa maneira que a igreja alcança atualmente vários locais do
Brasil e do mundo. Conforme Bledsoe (2012) a IURD afirma estar presente em 172 países.
Essa presença ocorre por meio de templos construídos ou por núcleos evangelísticos, “Os
núcleos se referem a novas frentes de trabalho que se reúnem em um local previamente
43
Disponível em: < http://noticiasdauniversal.blogspot.com.br/2010/04/fotos-da-catedral-mundial-da-fe.html>.
Acesso em: 11/07/16.
78
estabelecido ou um espaço alugado temporariamente para as reuniões.” (BLEDSOE, 2012, p.
91). Assim, construídos ou não, o sucesso de expansão visto pela igreja ocorre em sua difusão
espacial. Na medida em que constrói um templo, sua expansão se consolida.
Entretanto, a história da IURD não se iniciou somente por Edir Macedo. A igreja
começou com o nome: Cruzada do Caminho Eterno (MARIANO, 2012) e seus fundadores
foram juntamente com Macedo Romildo Ribeiro Soares, Roberto Augusto Lopes e os irmãos
Samuel e Fidélis Coutinho (MARIANO, op. cit, p. 55). Ainda segundo Mariano (opcit), os
fundadores eram provenientes da Igreja de Nova Vida, igreja pentecostal fundada na década
de 1960, pelo pastor canadense Walter Robert McAlister (BLEDSOE, 2012; MARIANO,
2012). Após desentendimentos, os fundadores da Cruzada se separaram, ficando Edir
Macedo, Romildo Ribeiro Soares (conhecido por R. R. Soares) e Roberto Lopes como
fundadores da então Igreja Universal do Reino de Deus. Contudo, após novos
desentendimentos, Romildo Soares se desvinculou da IURD, fundando a Igreja Internacional
da Graça de Deus, também neopentecostal e difundida em vários locais do Brasil.
Após as sucessivas cisões, Edir Macedo figurou como o líder da IURD. A
identidade do fiel da IURD se mescla com a de seu fundador, que é exaltado pelos membros
iurdianos44
. Desse modo, o bispo Macedo é o principal porta-voz e administrador da igreja, e,
por conseguinte, o portador principal do capital simbólico da instituição. A expansão da
IURD se deve as suas estratégias de liderança e ousadia nas pregações (MARIANO, 2012).
Consequentemente, nenhuma decisão da igreja é tomada sem consentimento de seu líder.
Logo, a organização da IURD passa pelos direcionamentos do bispo Macedo e de outros
bispos que administram as sedes regionais e estaduais.
Para administrar a igreja, Edir Macedo, juntamente com os bispos da igreja, adota
uma teologia peculiar em relação aos pentecostais clássicos e deuteropentecostais
(MARIANO, 2012.). A meta principal da igreja é o crescimento rápido do número de fiéis e
de templos, o que chamam de “libertar as pessoas pelo evangelho”. Para isso, conduze uma
doutrina caracterizada por preceitos que levem a uma conexão entre fé e poder. Isto é, a
potência para adquirir elementos materiais e/ou não materiais na vida do indivíduo dependerá
da sua devoção e convicção naquilo que pratica e entende dos ensinamentos cristãos. Nas
palavras de Bledsoe (2012, p. 121) “a IURD enfatiza que o evangelho requer a libertação
demoníaca do sofrimento para que a pessoa possa desfrutar dos benefícios de prosperidade e
saúde, além da salvação eterna.”. Logo, para que a libertação aconteça, é necessário que o fiel
44
Nomenclatura utilizada por Campos (1997) para designar os fiéis da Igreja Universal do Reino de Deus.
79
da IURD assuma que os ensinos ministrados lhe proporcionam poder para “vencer neste
mundo” e desfrutar do que se deseja durante sua vivência. Esta ênfase torna a teologia da
IURD diferente das pentecostais mais tradicionais.
Uma marca da teologia proferida pela IURD é o sacrifício. Significando
etimologicamente “fazer sagrado” (sacrefacere), o sacrifício é moldado pela Universal como
ações que promovem uma aproximação com Deus e assim adquirir “as bênçãos”45
. O próprio
fundador da IURD ensina em um de seus livros: “Mas o Senhor Jesus nos ensinou que a vida
cristã implica em renúncias, o que nos leva a outras formas de sacrifícios.” (MACEDO, 1999,
p. 34). O sacrifício é o elemento que direciona ao fiel um poder de decisão, em que ao aceitar
os ensinos passa a exercer sacrifícios para estar em constante aproximação com Deus. Estes
sacrifícios podem ser comportamentais ou contribuições financeiras à igreja.
Há uma preocupação latente entre a liderança da IURD para que os fiéis entendam
que os donativos são práticas de sacrifício. O bispo explica a relação do dinheiro com o
sacrifício por meio da oferta (no sentido de oferenda). Ele ensina que
De acordo com a Bíblia, oferta é uma ação, objeto ou comportamento que serve
como meio a partir do qual o indivíduo se aproxima de Deus. A raiz da palavra
oferta, no hebraico, significa aproximar-se. Trazendo as ofertas sem defeitos, os
antigos servos de Deus entravam em Sua presença. (MACEDO, op. cit. p. 36).
De igual modo, a partir do entendimento de sacrifício, os fiéis acordam em
promover a Teologia da Prosperidade. Enquanto instituição, a IURD é uma das difusoras
dessa corrente no Brasil. Segundo Mariano (2012, p. 158), “a Teologia da Prosperidade
valoriza a fé em Deus como meio de obter saúde, riqueza, felicidade, sucesso e poder
terrenos.” (grifo do autor). Assim, o sacrifício é na verdade um investimento de fé, pois quem
se sacrifica recebe as benesses.
Mas a teologia da Igreja Universal não está restrita apenas aos ditos. Há outros
pontos abordados por Campos (1997), que resumimos nos aspectos seguintes. Primeiro, a
IURD se volta para os que se sentem excluídos da sociedade, ou seja, prega a ascensão social
por meio da fé. Ou seja, as pessoas são mobilizadas a não se conformarem com sua situação
econômica e lutarem para reverter a situação, tendo na igreja o foco de sua mudança.
45
Entre os frequentadores da IURD, entende-se “bênção” como qualquer ganho particular, seja de natureza
material (casa, carro, geladeira, etc.), pessoal (emprego, fama, saúde, etc) ou espiritual (libertação de demônios,
salvação, convicção de crença, etc.). Seu uso é bem abrangente dentro da igreja e difícil conceituá-la de forma
precisa.
80
Segundo, a IURD destaca o insucesso pessoal atrelado ao tipo de religiosidade
praticada. Ela incentiva os frequentadores a relacionar a igreja ao sucesso, de modo que atrai
as pessoas que se sentem enganadas ao não ascenderem socialmente frequentando outras
denominações e/ou religiões. Inclusive, ressalta-se que uma parcela considerável de fiéis
advém do catolicismo e de religiões afro-brasileiras (MARIANO, 2012). Ensina-se que em
outras igrejas o poder não se efetiva como Deus pode dar. Ou seja, há uma forte
conscientização de que o lugar é um componente do sagrado.
Terceiro, a IURD prega a cura como componente da concretização de fé. Somente
está apto para curar-se das mazelas quem possui fé atuante, quer dizer, esteja assiduamente
nas reuniões e pratique fielmente os sacrifícios ensinados. Eles se apropriam de ensinos e
tradições culturais de outros povos para ritualização de curas nas igrejas. Existe cura pra quem
tem fé, mas o fiel precisa estar no lugar onde a fé se manifesta. Isso está associado à figura do
pastor, pois é o intermediário do recobro. Somente nos locais onde há oração dos pastores da
IURD pode ocorrer à cura.
Em quarto lugar, acredita-se que todos podem alcançar a prosperidade, mas
depende da fé de cada um. Isso remete que a pobreza existente na sociedade é fruto de falta de
crença ou desobediência das doutrinas da IURD. Enquanto o sucesso pessoal, profissional e
relacional não chegam, é necessário uma busca maior e mais sacrifícios ofertados. Levando
em conta que vivemos numa sociedade onde a desigualdade é constante, o ensino da igreja
direciona ao entendimento de que sempre há pessoas com falta de fé carentes de Deus, que, de
modo estrito, significa a necessidade de filiados à IURD.
Um quinto aspecto a ser considerado na teologia da IURD sugerida por Campos
(1997) é o rompimento com as escatologias do protestantismo histórico. Os ensinos da igreja
são voltados ao sucesso terreno, deixando de lado as concepções do pós-morte. A liderança da
Universal propõe que a ascensão financeira e uma vida moralmente bem sucedida é
consequência de um servo fiel a Deus, portanto uma pessoa apta à salvação. Na concepção
iurdiana, quem precisa ser salvo é quem está fora da igreja, numa vida “miserável”, seja na
situação financeira, seja na vida pessoal. Assim, a espiritualidade de uma pessoa é medida
pelo grau de sucesso que adquire ao participar da igreja.
Ainda há uma sexta característica da teologia iurdiana, que é sua acomodação
frente ao cenário socioeconômico. Não há uma conscientização política frente à atualidade
social em que as pessoas vivem. Há uma aceitação de que há desfavorecidos e isso é normal,
pois estes estão sob atuação de demônios. Segundo a lógica da igreja, não está ao alcance das
81
pessoas uma mudança no mundo, porque isso faz parte de uma “guerra espiritual”, cujo único
vencedor é Jesus Cristo. Assim, as pessoas são impotentes pra mudar a vida dos outros,
devendo se preocupar com sua situação individual. Portanto, a IURD eleva posições
individualistas em detrimento das coletivas.
Finalmente, há um “afrouxamento comportamental” entre os membros da igreja.
Para a IURD, o essencial são os sacrifícios nos quais os fiéis estão dispostos a oferecer,
deixando de lado posturas praticadas nas igrejas pentecostais clássicas, como uso regrado de
roupas, tipos de locais a se frequentar, modéstias quanto à vaidade pessoal, entre outros que
associam a IURD como uma igreja adaptada a uma cultura pós-moderna.
Lembrando que as características teológicas da Igreja Universal refletem no tipo
de conduta praticada e moral assimilada pelos frequentadores. Mariano (2012, p. 226)
argumenta que no neopentecostalismo, como a IURD, “Ser cristão tornou-se o meio
primordial para permanecer liberto do Diabo e obter prosperidade financeira, saúde e triunfo
nos empreendimentos terrenos.”. Deste modo, as vivências dos frequentadores se baseiam em
vencer socialmente através da participação do sagrado, por meio dos rituais praticados na
igreja e até fora dela, uma vez que promove “campanhas”, baseadas em ações pessoais, como
ritos domésticos ou ações comerciais, como rifas, vendas de produtos, bazares, entre outros a
fim de arrecadar o que se transforma em “sacrifícios” ao chegar ao espaço sagrado.
Ainda se tratando da conduta das pessoas pertencentes a IURD, temos uma forte
marcha de secularização. Berger (2013, p. 119) define a secularização como “processo pelo
qual setores da sociedade e da cultura são subtraídos à dominação das instituições e símbolos
religiosos.”. Ou seja, é um fenômeno no qual as instituições religiosas perdem dominância nas
ações e decisões, como a destituição entre igreja e Estado, por exemplo. Porém,
Secularização, porém, não se processa pari passu na mentalidade desses religiosos,
já que os pensamentos mágico e mítico, reavivados cotidianamente nos cultos,
constituem uma das principais forças motrizes do movimento pentecostal.
(MARIANO, 2012, p. 234).
Por conseguinte, a liturgia praticada na igreja realça um modelo de
comportamento a ser seguido, contudo os fiéis são despojados de uma cobrança de conduta,
ou seja, ficam à vontade no modo de conviver no espaço profano. Logo, certas ações do
cotidiano são levadas ao espaço sagrado, sendo incorporadas à igreja, sem rejeições, e até
como incentivo. Podemos exemplificar isso de maneira objetiva tratando da questão
relacional. Na IURD-TCF é incentivado às mulheres serem vaidosas para conquistarem, pela
82
aparência, os possíveis pretendentes. A aparência neste caso é uma arma de persuasão profana
bem vinda ao espaço sagrado, uma vez que atrai pretendentes pertencentes à mesma fé.
Pelo exposto nos parágrafos acima, a espacialidade é um dos elementos para a
propagação da teologia iurdiana e, consequentemente, para a difusão da igreja, pois os
aspectos da IURD elencados, a necessidade de ir ao espaço sagrado é manifesta. No templo é
que se concretiza a fé, por meio dos sacrifícios e posturas exercidas pelos frequentadores. No
templo também se alimenta espiritualmente, se conseguem as curas e se adquire meios para
prosperidade. Nas palavras do bispo fundador: “É necessário que as pessoas se conscientizem
de que é na igreja que elas recebem força para vencer as batalhas da vida.” (MACEDO, 1997,
p. 55). O elemento espacial é efetivo para a propagação da igreja.
Assim, esses elementos acompanham os líderes da IURD pelo Brasil e pelo
exterior. Essa tática acompanha o crescimento da igreja desde os primeiros anos de
implantação. O seu líder é conhecido pelo “estilo autoritário e centralizador” (MARIANO,
2012, p. 56) e se utiliza disso para capitanear a expansão da igreja, adotando táticas
empresariais de fixação das igrejas, através de seus comandados, que hierarquicamente são
constituídos, do maior para o menor, de bispos, pastores e obreiros.
Os bispos são deslocados às catedrais (nome dado por eles aos templos próprios
de grande porte), que estão situadas nas capitais estaduais, bem como grandes cidades do
país46
. Como estratégia de propagação, o direcionamento episcopal começou pela capital
carioca e em seguida no centro político paulista. Isso se deve ao caráter urbano desta igreja,
conforme Bledsoe (2012, p. 49), “Tendo sua mais alta concentração de igrejas filiadas no Rio
e São Paulo, a IURD é reconhecida nacionalmente como uma denominação urbana.”. Isso
reflete que as cidades onde se fixam primeiro e se constroem as catedrais sejam as capitais
estaduais, pois são grandes centros urbanos. Assim, os bispos são encarregados de repassar as
ordens de Macedo, bispo presidente, bem como administrar as igrejas de seus respectivos
estados.
Assim, a IURD adotou a expansão radial de suas igrejas, através da periferização.
As periferias das grandes cidades se tornaram alvos de pontos de nucleação, por intermédio de
aluguel de galpões ou compra de pequenos terrenos para construção de templos secundários.
No entanto, a hierarquia se mantém fixada nas catedrais. Conforme Bledsoe,
46
No portal da IURD, podemos localizar os templos existentes em cada estado. Ver em:
<http://www.universal.org/enderecos/>. Acesso em: 28/06/16.
83
Essas instalações constituem em estruturas grandiosas que oferecem um nível de
conforto maior do que os templos nos bairros. Embora ofereçam a mesma série
padrão de reuniões das demais afiliadas, as catedrais também servem como pontos
de coordenação para os líderes. (BLEDSOE, op. cit. p. 50)
Essa tática permitiu a uma rápida expansão pelo território brasileiro. Segundo
Mariano,
Nenhuma outra igreja evangélica cresceu tanto em tão pouco tempo no Brasil. Seu
crescimento institucional foi acelerado desde o início. Em 1985, com oito anos de
existência, já contava com 195 templos em catorze Estados e no Distrito Federal.
Dois anos depois, eram 356 templos em dezoito Estados. Em 1989, ano em que
começou a negociar a compra da Rede Record, somava 571 locais de culto. Entre
1980 e 1989, o número de templos cresceu 2.600%. Nos primeiros anos, sua
distribuição geográfica concentrou-se nas regiões metropolitanas do Rio de Janeiro,
de São Paulo e de Salvador. Em seguida, expandiu-se pelas demais Capitais e
grandes e médias cidades. Na década de 1990, passou a cobrir todos os Estados do
território brasileiro, período no qual logrou taxa de crescimento anual de 25,7%,
saltando de 269 mil (dado certamente subestimado) para 2.101.887 adeptos no
Brasil, de onde se espraiou para mais de oitenta países. (MARIANO, 2004, p. 125)
E nos anos seguintes essa expansão continuou, apesar de um pequeno declínio nas
taxas de crescimento. Podemos ver nos números publicados por Jacob quando ele relata que
o recenseamento de 2000 distingue 15 religiões pentecostais diferentes. Ao serem
classificadas por ordem de importância, quanta ao numero declarado de fiéis, apenas
três religiões representam, cada uma delas, mais de 10% no total dos pentecostais
(Assembléia de Deus, Congregação Crista do Brasil e Universal do Reino de Deus),
totalizando três quartos dos adeptos. (JACOB et alli, 2003, p. 41)
Nessa classificação percebemos que a IURD está qualificada, para o IBGE, como
pentecostal. A Assembléia de Deus (AD) é a igreja pentecostal que possui o maior número de
fiéis no Brasil, além de ser a mais antiga. Contudo, a IURD teve um crescimento vertiginoso
se comparado a AD, uma vez que esta se iniciou em 1911, enquanto aquela em 1977. Nesse
caso, alguns fatores contribuíram para este veloz crescimento.
Segundo os autores aqui utilizados, além da expansão de forma centralizadora nos
centros urbanos e sua periferização nas cidades, atrela-se a rápida expansão da IURD ao uso
de elementos midiáticos. A IURD, assim como outras igrejas pentecostais, faz forte uso de
mídias, contudo algumas preferem a impressa e outras a radiofônica, e outras ainda, a
televisiva. Segundo Campos (1997, p. 245), a IURD, como outras neopentecostais,
“empregam frequentemente telefone, imprensa, rádio e televisão, com maior grau de
profissionalização, usando-o na divulgação de seus princípios, na atração de novos fiéis, na
aculturação de sua ‘membresia’.”. Atualmente, as grandes difusoras midiáticas da IURD são:
o jornal Folha Universal, as emissoras de rádio e a Rede Record de Televisão.
84
Por meio de aluguel de horários e aquisições de programas e emissoras, a IURD
construiu um império na comunicação nacional, tornando-se a igreja mais expressiva na mídia
nacional. Nas palavras de Mariano,
Sua expansão se deve, em grande medida, à sua eficiência no uso dos meios de
comunicação de massa, sobretudo o rádio, veículo no qual sempre fez proselitismo.
[...] Em abril de 1983, já transmitia 27 programas de rádio. A compra da primeira
emissora, a Copacabana, do Rio, ocorreu no ano seguinte. Mas foi a partir de 1988
que a igreja, com mais de 400 templos, deslanchou a comprar rádios. Em 1990, já
havia adquirido emissoras nos estados de São Paulo, Rio de Janeiro, Ceará, Minas
Gerais, Goiás, Bahia, Rio Grande do Sul e Paraná. Bastariam poucos anos para que
possuísse uma rede de extensão de cerca de 40 emissoras.
Em 1980, com apenas três anos e duas dúzias de templos, a Universal já fazia
incursões pela TV. Transmitia O Despertar da Fé na Rede Bandeirantes, para os
estados do Rio de Janeiro, São Paulo, Paraná, Pernambuco e, na TV Itapuã, Bahia.
Em abril de 1983, o programa já era exibido, pela mesma Bandeirantes, para quase
todo território nacional. Se isso constituía um feito e tanto, não se compara à façanha
que foi a aquisição, por US$ 45 milhões, da Rede Record de Rádio e Televisão, em
novembro de 1989. (MARIANO, 2012, p. 66)
A compra da Rede Record foi motivo de discussão e polêmica. Uma emissora
endividada, mas ainda sim de grande porte no cenário nacional, despertou desconfiança em
relação à origem do valor pago e, consequentemente, gerou um efeito negativo, e outro
positivo. O negativo ocorreu por investigações policiais e manchetes contra a instituição,
delegando ao público uma imagem de que a igreja crescia por meios ilícitos (MARIANO. Op.
cit). O fato mais incisivo foi a prisão do bispo Edir Macedo acusado por charlatanismo,
curandeismo e estelionato no dia 24/05/1992, no qual ficou onze dias encarcerado. Contudo,
sem nenhuma prova contundente, o bispo foi solto e adquiriu fama nacional até por quem não
era membro da IURD.
Edir Macedo transformou os ataques e prisão como armas midiáticas. Foi uma
espécie de propaganda às avessas, pois tais fatos repercutiram de modo que, onde uma igreja
se instalava, seus líderes testemunhavam a perseguição sofrida por parte da imprensa ao seu
bispo fundador. Edir Macedo se utiliza dos ataques sofridos como meio de promover a
igreja47
. Sobre sua prisão, o próprio bispo disse:
No fim da primeira semana preso, deixei a delegacia para prestar depoimento. Fui
colocado no banco de trás da viatura policial, sempre com a Bíblia nas mãos. Já no
fórum, fiquei frente a frente com o juiz que assinou o meu pedido de prisão. Era um
rapaz jovem, pouco mais de 30 anos, substituto do titular da vara criminal que
expediu o mandado. No meio do interrogatório, o juiz fez uma pergunta intrigante e
47
CHAGAS, Tiago. Bispo Edir Macedo afirma que Igreja Universal é odiada porque ensina fiéis a
pensarem. São Paulo: Golpel Mais [sítio]. Disponível em: <https://noticias.gospelmais.com.br/bispo-macedo-
igreja-universal-odiada-ensina-fieis-pensarem-40236.html>. Acesso em: 08/07/16.
85
abusiva, já que não tinha a menor ligação com as acusações pelas quais eu
respondia. Ele queria saber se havia diminuído o povo da Igreja Universal depois da
minha prisão. Fui seco. Disse que não, pelo contrário, se multiplicou. Os templos, de
fato, começaram a abarrotar de gente, muitas curiosas com o noticiário e outras em
apoio à luta da Igreja. (MACEDO, 2012, p. 35-36).
Portanto, a mídia sempre foi um auxílio na expansão da IURD no país. Desse
modo, a imagem do bispo Edir Macedo ficou cada vez mais popular, ganhando aceitação de
muitos como um “enviado de Deus” para “combater o Diabo”. Nessa luta, a expansão da
igreja continuou a crescer, de modo que, segundo o último Censo (IBGE, 2010), a IURD
contava com 1.873.243 de adeptos declarados (Figura 4).
Gráfico 1 – População da Igreja Universal do Reino de Deus, por Unidades da Federação –
2010.
Fonte: IBGE, 2010.
Como constata no gráfico, quase metade da população iurdiana está na região
Sudeste (47% do total). Obviamente, referenda o que já dissemos sobre sua forma de
expansão, bem como ser a região de origem e onde a mídia mais se proliferou. Assim, a
IURD se dissemina por meios midiáticos e territoriais. Além do Sudeste, sua maior
86
concentração está no Nordeste (23%), seguido do Norte (12%) e, por último, no Sul e Centro-
Oeste (9% ambos). Destaca-se que o Ceará possui quatro por cento da população declarada da
IURD, sendo a segunda maior contagem do Nordeste, atrás somente da Bahia, estado mais
populoso da região.
4.4 A IGREJA UNIVERSAL DO REINO DE DEUS NO CEARÁ
Para relatar sobre o templo central da IURD, em Fortaleza, tomaremos por base as
informações dadas por pastores desta igreja, bem como por outras fontes que possam ser
confiáveis. Ressaltamos, contudo, que os dirigentes da igreja são discretos quanto à
divulgação de informações, tornando árdua a captação de subsídios sobre a catedral cearense.
Contudo, buscamos uma descrição de como a igreja chegou à cidade, bem como o local onde
foi instalado.
Segundo o IBGE (Censo, 2010), 82.262 pessoas confessam ser fiéis da IURD e
destes 44.384 estão em Fortaleza (53,95%). Essa aglomeração se deve, principalmente, a
fatores econômicos, uma vez que Fortaleza também concentra a economia do estado (45,72%
do PIB cearense, segundo o IBGE). Isso reflete na expansão religiosa neopentecostal, pois os
centros urbanos são locais preferidos para implantar uma igreja (BLEDSOE, 2012). Assim, a
cidade-sede administrativa do Ceará conta com o maior número de cearenses filiados à Igreja
Universal do Reino de Deus.
Consequentemente, é em Fortaleza que se encontra a maior quantidade de templos
instalados dentro do território cearense. Segundo o sítio da igreja, a IURD conta com 316
templos no Ceará48
. Destes, a maior densidade está na capital com 131 igrejas instaladas, ou
seja, mais de um terço existente no estado. A forma como ocorreu a expansão desta igreja no
Ceará foi radial e nuclear, partindo da capital para periferia e interior do estado.
Paralelamente, da capital para cidades de médio porte e depois para cidades menores, ao
mesmo tempo, do centro de Fortaleza para bairros de maior concentração de serviços e, em
seguida, maior concentração populacional. De modo que, na capital, uma parcela considerável
está em bairros densamente povoados, e as sedes regionais estão em bairros estratégicos para
a economia fortalezense.
Com relação às áreas além da capital, a IURD possui 114 templos e destes a maior
concentração está em cidades da região metropolitana e de médio porte. Destacam-se Caucaia
48
Website (Wordpress) da IURD . Disponível em: <https://iurdenderecos.wordpress.com/about/br-ceara/>.
Acesso em: 04/07/16.
87
(17 templos), Maracanaú (13 templos), Pacatuba (5 templos) e Aquiraz (4 templos). As
demais cidades aparecem com um, dois ou três templos localizados, preferencialmente, salvo
exceções49
, no centro da cidade.
Em Fortaleza, a IURD instalou seu primeiro templo. Sua inauguração ocorreu em
onze de fevereiro de 199850
. Este templo centraliza as ações da IURD no Ceará, segundo
informações recebidas na secretaria da catedral. Isso quer dizer que as ordens vindas do bispo
presidente são direcionadas ao bispo de Fortaleza, atualmente representado por Odivan
Pagnocelli, e dele são redirecionadas aos bispos dos outros estados e também aos pastores da
igreja no Ceará e de Fortaleza.
Deste templo, seguem, além das ordens do bispo, as remessas do jornal Folha
Universal para as demais cidades cearenses e bairros de Fortaleza. As tiragens são
disseminadas para os templos e seus pastores comparecem à catedral para reuniões semanais
onde orientações são repassadas. Desta forma, a organização administrativa da IURD, no
Ceará, é hierarquizada e centralizada em sua sede estadual.
Portanto, a IURD chegou ao Ceará por meio de uma nucleação urbana
centralizada nas áreas mais populosas e se expandindo para as periferias. Esta forma de
expansão foi rápida, pois os núcleos geralmente são prédios ou galpões alugados, repetindo a
estratégia inicial da instituição nas metrópoles carioca e paulista. A sedimentação da igreja
ocorre por meio da construção de prédios fixos, construídos com verbas provenientes dos
“sacrifícios”, ou seja, da ajuda financeira dos membros do local ou de outras cidades, uma vez
que a gerência administrativa e financeira da IURD é hierarquizada e orquestrada pelos
líderes centrais e intermediados por seus dirigentes locais, na figura do bispo. Contudo, a
manutenção dos pontos de culto é de responsabilidade exclusiva dos pastores locais que
arrecadam fundos por meio das ofertas dos frequentadores.
Desse modo, destacamos a sede estadual cearense, nosso objeto de estudo, como
espaço sagrado central da IURD no Ceará. É pela hierarquia administrativa deste templo que
se moldam as outras igrejas construídas ou alugadas na cidade e no estado. Assim, a IURD no
Ceará tem como referência administrativa o templo central de Fortaleza.
49
As cidades de Ipu, Jucás, Madalena, Várzea Grande contam com um templo, mas não estão endereçadas no
centro da cidade. 50
Segundo a Cronologia Ilustrada de Fortaleza – NIREZ, divulgada no Portal da História do Ceará. Disponível
em:
<http://www.ceara.pro.br/Pesquisas/ListaFATOSHISTORICOS.php?verbete=universal&verbete2=&pesquisa=p
esquisa+hist%F3rica>. Acesso em: 11/07/16.
88
5 O TEMPLO CENTRAL DA IGREJA UNIVERSAL DO REINO DE DEUS EM
FORTALEZA: DIMENSIONANDO UM ESPAÇO SAGRADO
A partir do que foi até agora exposto, temos uma base teórica e um contexto
histórico que nos auxiliam ao trato de nosso objeto de estudo. Desta feita, propomos agora
fazer uma reflexão sobre a IURD-TCF, com vistas a responder os questionamentos lançados
para esta análise.
Para isso, utilizamos uma metodologia que consiste em três passos. Em primeiro
lugar, uma descrição da IURD-TCF, desde sua localização, como seu entorno e interior, com
detalhes estruturais e vivências presenciadas em loco. A descrição é relevante para apreensão
de detalhes que aparecem através do olhar, fornecendo elementos perceptivos que auxiliam na
interpretação do objeto.
Em outro momento, tratamos das impressões e vivências dos entrevistados. O
conjunto de entrevistas apresenta duas modalidades: as entrevistas semi-estruturadas, em que
alguns fiéis cederam suas respostas mediante conhecimento dos questionamentos, e, também,
a partir de conversas informais antes e depois dos cultos. Nesses intervalos as pessoas
estavam solícitas para conversar enquanto esperavam o início do próximo culto. Conversavam
também como chegaram a IURD e o que as motivavam a estarem lá. São informações
relevantes, pois sem a inibição causada pelas perguntas previamente estabelecidas, os
entrevistados eram mais espontâneos ao relatarem suas experiências.
Em um terceiro momento, analisamos os relatos relacionados à proposição teórica
previamente discutida. Neste momento se objetiva, nesta pesquisa, encaminhando-nos à
resolução da problematização inicialmente apresentada. Propomos utilizar as falas dos
entrevistados e nossas anotações de campo para fazer ligações com os conceitos aqui
discutidos, de forma a estruturar uma relação entre a fundamentação teórica à pesquisa
prática.
5.1 UMA APRESENTAÇÃO DESCRITIVA DA IGREJA UNIVERSAL DO REINO DE
DEUS – TEMPLO CENTRAL DE FORTALEZA
A IURD-TCF é uma igreja localizada na Avenida Tristão Gonçalves, 613, Centro
de Fortaleza, Ceará. Gomes (2011, p. 164) ressalta que “com as catedrais, a IURD mantém
sua prática de se instalar em locais privilegiados na cidade, destacando sua marca visual no
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espaço.”. Está localizada em um ponto estratégico da cidade, pois está bem próximo de
lugares conhecidos da cidade: a Praça e o Teatro José de Alencar. A Praça José de Alencar é
um dos lugares antigos do centro da cidade e local onde atualmente se reúnem muitos
ambulantes e artistas populares. O Teatro José de Alencar é um equipamento tombado pelo
Patrimônio Histórico e de valor relevante para a cidade, enquanto referencial turístico do
centro da cidade.
Além dos equipamentos urbanos citados, a IURD-TCF está estrategicamente
localizada porque ao redor existem vários serviços essenciais para quem mora em Fortaleza e
até mesmo na Região Metropolitana. Podemos aqui elencar alguns destes equipamentos,
como o Fórum Autran Nunes, localizado a três quarteirões do templo, na Rua Pedro I, esquina
com a Avenida Tristão Gonçalves. Neste fórum funciona o Tribunal Regional do Trabalho 7ª
Região, SINE- IDT e uma agência da Caixa Econômica Federal. Ou seja, é um centro
judiciário voltado às questões trabalhistas.
Em frente ao prédio do fórum citado está o Centro de Dermatologia Dona Libânia.
Ele atende pessoas de toda a Região Metropolitana de Fortaleza, inclusive é referência para
tratamento de hanseníase. Assim, o fluxo de pessoas nas proximidades do templo também se
volta para cuidados médicos-sanitários.
Outro equipamento é o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico – IPHAN,
que tem sua agência localizada na Rua Liberato Barroso, esquina com a Rua 24 de Maio,
sendo seus muros consolidados com o anexo do Teatro José de Alencar, de fronte à saída
alternativa da IURD-TCF, que se situa nesta rua. É um equipamento voltado para o
patrimônio histórico.
Ao lado da saída que fica localizada na Rua 24 de Maio há um Serviço Social do
Comércio – SESC. É uma instituição social, de caráter privado e sem fins lucrativos, mantida
por empresários do comércio de bens e serviços.
Ainda nas imediações da IURD-TCF existem outros equipamentos voltados à
saúde. O Hospital Geral Doutor César Cals e o Centro de especialidades Odontológicas do
estado do Ceará.
Todos esses equipamentos se situam nas vias de acesso que ligam a periferia ao
centro da cidade. Nesse caso, a importância da Avenida Tristão Gonçalves se torna maior e a
IURD-TCF acaba sendo um componente na paisagem de quem passa no Centro da cidade de
Fortaleza.
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Temos nas imediações do templo vários equipamentos destinados ao comércio, à
saúde, ao trabalho e à justiça. Assim, o templo da IURD se estabelece enquanto componente
religioso em meio às funcionalidades promovidas nesta área central. Concorre com o espaço
profano, que, ao mesmo tempo, anuncia o sagrado ali existente pela diferenciação das formas
do templo presentes em meio às lojas, aos equipamentos e aos serviços diversos.
O templo central (chamado de catedral pelos pastores e frequentadores) também
possui vantagem estratégica em relação à sua localização mediante o acesso. A Avenida
Tristão Gonçalves é a continuação das Avenidas José Bastos e Carapinima, uma das vias de
acesso mais movimentadas da cidade, pois faz parte da rota norte-sul de Fortaleza, além de ser
acesso para a Região Metropolitana de Fortaleza, bem como a rede metroviária. Isto
proporciona várias linhas de transporte que saem do Centro aos bairros da periferia e tenham
como ponto inicial próximo à catedral da IURD-TCF, uma vez que, seguindo à Avenida
Tristão Gonçalves, após a estação de metrô, o fluxo diminui. Isto porque das paradas
próximas ao templo, as rotas dos transportes retomam em direção à periferia da cidade.
Consequentemente, muitos usuários do transporte público, seja o rodoviário ou o metrô, têm
na IURD-TCF um referencial simbólico de localização no centro da cidade. Percebemos que
após as reuniões, as paradas de ônibus ficam repletas de pessoas a espera do coletivo que as
levam até as proximidades de suas moradias.
Sua posição é privilegiada em relação ao comércio, porque ao lado do templo há
vendas a preços populares. Um deles é o popularmente chamado “Beco da Poeira”, área
ocupada por comerciantes de confecção. O local onde se concentravam é hoje a estação de
metrô cujo nome é o mesmo da praça. Esse local possui grande fluxo de pessoas. Os
comerciantes do “Beco da Poeira” foram deslocados para um galpão cedido pela Prefeitura
localizado na Avenida do Imperador, paralela à Avenida Tristão Gonçalves, ou seja, ainda
próximo do local original e, consequentemente, perto da catedral.
Alguns destes comerciantes, que não quiseram ou não puderam ir ao novo local,
instalaram-se em uma edificação não concluída, localizada na Rua 24 de maio, próximo à
Praça José de Alencar. Este local está com suas obras paradas e consideradas abandonadas
pelos comerciantes ocupantes. O local é conhecido como “esqueleto”, pois só estão erguidos
os alicerces e colunas do inacabado prédio. Isso fez com que o número de comerciantes
aumentasse nas imediações da praça.
A presença destes comerciantes no estabelecimento popular provocou um grande
deslocamento de pessoas para esses locais e, devido às rotas de ônibus, acabam passnado em
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frente à IURD-TCF. O templo passa a ser, então, um componente da paisagem dessas
pessoas. No próprio quarteirão onde está localizada a IURD-TCF existe um prédio cujas obras
estão paradas, em que ambulantes se instalaram em frente aos tapumes colocados cercando o
prédio em construção. Assim, formam um corredor de comerciantes irregulares concorrentes
na venda de roupas, frutas e calçados.
Por se tratar de uma área comercial, evidentemente o número de estabelecimentos
comerciais é grande nas imediações do templo. Em sua maioria, são compostos por
comerciantes do setor de vestuário, mas também podemos encontrar ambulantes que vendem
artigos variados, como religiosos, farmacêuticos, alimentícios, bibliográficos, além de existir
nesta área alguns estacionamentos privados. Esses pontos proporcionam uma dinamicidade ao
centro da cidade. No caso do templo, esses pontos comerciais são úteis para complementar os
serviços que a igreja não oferece.
Há uma relação de troca entre a IURD-TCF e o comércio circundante, pois os
fiéis da igreja geralmente são fregueses dessas lojas. Isso ocorre pela localização das lojas em
relação ao templo como também da proximidade dessas lojas com o templo e as paradas de
embarque dos coletivos. Podemos destacar que muitas das lojas da área são de produtos
populares. Isto atrai as pessoas das classes sociais mais baixas para realizar suas compras. O
tipo de lojas ao redor do templo reflete também a situação financeira das pessoas que
frequentam o templo.
A IURD se insere segundo as estatísticas como pertencente à origem pentecostal,
logo, em relação aos seus membros predominam aqueles de baixo poder aquisitivo, uma vez
que 91% da população de origem pentecostal ganham até dois salários mínimos (IBGE,
2010).
Este dado colabora para existência de lojas comerciais situadas nas proximidades
da IURD-TCF. É perceptível que uma parcela considerável dos pontos comerciais se destina a
venda de produtos designados a pessoas que possuem baixo poder aquisitivo. Ou então são
revendedores que compram a preços mais baixos para revenderem em suas localidades de
domicílio.
No entanto, o que releva a IURD-TCF no contexto acima mencionado é seu
aspecto monumental. Os organizadores da instituição adotam espaços amplos para recepção
de fiéis, utilizando o termo catedral para designar as sedes estaduais, as maiores igrejas da
IURD. Para embasar o entendimento sobre as catedrais da IURD, adotamos o conceito dado
por Gomes (2011), em que afirma que “as catedrais representam um marco para a IURD, um
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símbolo da consolidação do seu processo institucional”. Logo, as formas do templo se
apresentam na paisagem no centro de Fortaleza, pois são exuberantes e chamam a atenção de
quem passa em frente, tanto pelo tamanho, como pelos detalhes nela apresentados.
Para quem vê de fora, o templo se afirma como algo grandioso, ao ponto do senso
comum, baseado em acusações midiáticas, considerar ser fruto de charlatanismo. De fato, a
riqueza em detalhes e as formas no qual a igreja foi concebida e construída transmitem uma
mensagem bem específica: “a concretização da ‘obra de Deus’.” (GOMES, 2011, p. 135). Isso
reflete espacialmente na formação de geossímbolos (BONNEMAISON, 2002), uma vez que a
identidade dos fiéis se substancia também pela grandiosidade da igreja no qual declaram sua
fé e esperança.
Assim, para quem frequenta o templo, seu tamanho e estrutura são equivalentes à
força divina na propagação da igreja pela cidade. Mesmo existindo mais de uma centena de
templos na cidade, é a catedral que sustenta simbolicamente a presença da igreja na cidade,
pois, mesmo quem frequenta uma IURD na periferia, concebe a catedral como o “templo
maior”. Neste caso, de onde saem às instruções e direcionamentos à igreja. Testemunhamos
isso várias vezes em nossas visitas de campo, em que os pastores utilizam frases do tipo:
“Não somente aqui, mas em todas as igrejas Universal estaremos fazendo um grande encontro
com Deus”, ou então “Esta campanha está sendo repassada em todas as igrejas Universal do
Ceará e de Fortaleza” (sic). A força administrativa da igreja durante os rituais é perpassada
não somente em frases como estas, mas também pela própria presença do bispo, porque ele só
ministra neste templo.
Neste sentido, a centralidade simbólica da IURD-TCF é eminente para quem
frequenta o templo por atender aos direcionamentos administrativos do bispo e dos pastores,
mas também é representação da presença da instituição na cidade para quem não a frequenta.
Para o observador externo, a igreja está operante e é exitosa em sua propagação pela cidade.
Para o frequentador é a resposta divina para quem a busca e quer vencer neste mundo. É a
materialidade do poder divino. Conforme podemos observar no argumento de Gomes que:
A IURD investe na construção de um vínculo com o “indivíduo errante” e também
com o “praticante”, de modo a possibilitar uma identificação e permanência na
igreja. Compromisso e fidelidade são cobrados em troca de espaço para a inserção
de seus filhos na instituição. (GOMES, 2011, p. 147).
Ou seja, a IURD-TCF é um espaço que transmite significados a partir de suas
formas. Espacialmente, ela é um geossímbolo que transmite a ideia não só de uma igreja
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poderosa para o “indivíduo errante”, aquele que apenas passa em frente ou visita, como
também de uma igreja permanente e legítima para o fiel, aquele que frequenta assiduamente.
Entendemos que “as formas simbólicas, materiais ou não, constituem signos construídos a
partir da relação entre formas, os significantes, e os conceitos, os significados.” (CORRÊA,
2007, p. 7). Esta relação ocorre no momento que os fiéis visitam o templo ou quando outras
pessoas que não são fiéis da IURD passam em frente à igreja. De qualquer modo, suas formas
demonstram constância e prontidão, devido ao atendimento constante aos fiéis ou visitantes,
além da sua aparente imponência.
A presteza desempenhada na IURD-TCF é caracterizada pela flexibilidade que o
frequentador tem para ir ao templo. Concordamos com Campos (1997, p. 123) quando diz que
os templos da Universal “atuam como se fossem um ‘pronto-socorro’ espiritual ou uma
‘igreja de conveniência’ onde, conforme propaganda, ‘há sempre um pastor e um milagre que
esperam por você’.”. Inclusive há uma disposição eclesiástica disposta para tal empreitada. Na
mesma linha de pensamento, Mariano (2012, p. 59) afirma que “a Universal exige enorme
empenho e disposição de seus pastores e obreiros. Ao prometer solução para todos os males
terrenos, a igreja funciona como verdadeiro ‘pronto-socorro espiritual’.” A exemplo disso,
podemos ver diariamente na calçada em frente ao templo duas tendas da igreja. Estas estão
posicionadas, uma a esquerda e outra a direita da escadaria do templo. Na própria tenda há a
frase: “ATENDIMENTO ESPIRITUAL” (Figura 5). Este local é composto por mesas com
panfletos e jornais da igreja e sempre obreiros a disposição de quem chega pedindo
informações ou orações. É uma espécie de plantão espiritual, sem se importar com qual tipo
de pessoas apareça. É uma tática de evangelização adotada pela igreja que permite uma livre
escolha dos frequentadores porque está sempre aberta para atender quem lá chega.
94
Figura 5 – Tenda de atendimento em frente à entrada principal da IURD-TCF.
Fonte: SANTOS FILHO, 2016.
A IURD-TCF é um estabelecimento religioso que funciona em regime de plantão
de atendimento e serviços regulares. As reuniões são de domingo a domingo, com horários
distribuídos ao longo do dia. De segunda a sábado são às reuniões de 6h, 8h, 10h, 12h, 15h e
19h30m. Na segunda, acrescenta-se uma reunião às 21h. No domingo, as reuniões acontecem
às 7h, 9h30m, 12h, 15h e 18h30m. Entre os horários das reuniões coletivas ocorrem
atendimentos espirituais, em que os pastores recebem os fiéis para um atendimento particular,
fazem orações e anotam as demandas dos fiéis para levá-los ao bispo que também faz orações.
Alguns dos horários mencionados merecem destaque por ter maior movimentação
no templo. Percebemos que o horário do meio-dia recebe um público considerável e,
dependendo do dia da semana, lota o espaço do templo. Isso nos leva a perceber que muitos
fiéis trabalham no centro da cidade e utilizam o horário do almoço para participar do culto.
Em alguns dias da semana, o culto do meio-dia é filmado, devido ao grande número de fiéis,
principalmente às sextas-feiras, conhecido por “vigília do meio-dia”. Portanto, a reunião do
meio-dia é uma das principais da programação semanal da IURD-TCF. Ainda sobre esse
horário, cabe destacar que, pela movimentação de fiéis, quem celebra o culto é o bispo. Em
outros horários são pastores.
Outro horário de maior número de visitantes ao templo é o das 19h30m. Esta hora
se associa ao motivo do meio-dia, ou seja, devido ser à saída do expediente de trabalho para a
maioria das pessoas. Algumas saem do trabalho e vão direto ao templo, outros vêm de casa.
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Este culto é considerado pelos pastores como o principal do dia, inclusive incentivam as
pessoas que visitam a catedral em outros horários a comparecerem, também, ao culto das
19h30m. Isto faz com que neste horário o templo esteja sempre repleto.
Na segunda-feira tem outra reunião às 21h. Neste culto, devido ao horário de
término da reunião, o número de pessoas que depende de ônibus é menor. Essa reunião é para
quem trabalha por conta própria, chamada pelos pastores como a “Reunião dos Empresários”.
Pelo que se percebe, a presença de pessoas utilizando transporte próprio é grande e o
estacionamento particular da igreja dá maior segurança para quem frequenta esse horário.
Assim, é uma exceção no calendário semanal da igreja.
Aos domingos, há também horários diferenciados, pois são menos reuniões que na
semana. Pela manhã, o primeiro culto é bastante lotado e começa às 7h. São fiéis que gostam
de fazer liturgia logo cedo e usufruir da folga de domingo. No entanto, o horário mais cheio,
em que capacidade fica repleta, é o culto das 9h30m. Como constatamos nas entrevistas,
muitas pessoas vêm de outros bairros e até de outras cidades para assistir a reunião, e isso
reflete na distância entre a residência e o templo e no horário de sair de casa. Essa reunião é
ministrada pelo bispo. Ainda no domingo, outra reunião, horário das 18h30m, é ministrada
pelo epíscopo, é a última reunião do dia, também com número considerável de fiéis visitando
o templo.
Em relação aos dias de reunião, há um tema específico para cada dia da semana.
Às segundas-feiras é a reunião para “Prosperidade Financeira”, em que as pessoas vão à busca
de emprego ou melhorar a situação financeira de seu estabelecimento comercial. Nestas
reuniões, há mensagens para quem deseja ser ou já é micro, médio ou grande empresário, com
conselhos voltados ao controle financeiro e dedicação às finanças. Segundo o sítio da igreja
Durante a palestra as pessoas aprendem a construir e realizar sonhos profissionais e
descobrem talentos que antes nem imaginavam possuir. Conquistar a casa própria,
ter uma empresa, é um sonho para muitos, mas para aqueles que aplicam os
ensinamentos das palestras é realidade. A cada reunião é possível conhecer pessoas
que chegaram ao congresso endividadas, com muitos problemas profissionais e hoje
venceram e têm uma vida de sucesso. Muitos buscam emprego ou melhorias de
função no emprego atual. A mensagem principal é a de que Deus está querendo
melhorar a vida financeira. (UNIVERSAL, 2016)
Ou seja, essas reuniões funcionam um curso de autoajuda para as áreas
administrativas e econômicas. Os princípios adotados pelos pregadores são a obediência e a
disciplina na hora de pensar e como ganhar e gastar o dinheiro. Há um forte processo de
secularização nestas reuniões, pois vários dos ensinos são repasses de assuntos estudos
96
academicamente, mas polidos de uma moral pentecostal, resultante de uma ética protestante
quando
Surgiu uma ética econômica especificamente burguesa. Com a consciência de estar
em plenitude da graça de Deus e visivelmente por Ele abençoado, o empreendedor
burguês, desde que permanecesse dentro dos limites da correção formal, que sua
conduta moral estivesse intacta e que não fosse questionável o uso que se fazia da
riqueza, poderia perseguir seus interesses pecuniários o quanto quisesse, e com isso
sentir que estava cumprindo seu dever. (WEBER, 2007, p. 137).
Logo, ir às reuniões de segundas-feiras e buscar prosperidade é também um ato de
obediência. Por isso, nessas reuniões há muitos testemunhos de pessoas que obtiveram êxito
de emprego, abertura de empresas, aumento de lucros, quitação de dívidas, etc., mostrando a
quem visita que buscar a riqueza é bom, desde que seja nos moldes ensinados pela IURD.
Nas terças-feiras, há a “Reunião do Descarrego”. Esta reunião é exclusiva para
retirar os demônios que atormentam a vida dos fiéis. Estes demônios podem se manifestar em
vários setores da vida pessoal: no amor, nas finanças, no trabalho, na residência, na família e
na saúde. Eles podem se manifestar fisicamente ou não nas pessoas. Naquelas em que o
demônio se manifesta fisicamente, os pastores apresentam à igreja e fazem orações para
retirar o demônio do corpo. As práticas litúrgicas geralmente são direcionadas a orações e
gestos de expulsão, isto é, movimentos coletivos que dão a entender que o demônio tem que
sair do templo, isto é, sair do templo é também sair da pessoa no qual ele está inserido,
mostrando a forte ligação do lugar com o fiel, pois ali dentro o demônio não pode ficar, pois é
sagrado.
Nas quartas-feiras ocorrem as “Reuniões dos Filhos de Deus”. Neste dia os fiéis
assumem compromissos espirituais, fazendo promessas, campanhas e votos buscando a
salvação espiritual e uma transformação na vida do fiel. Esse dia pode também ser destinado a
um objetivo específico, como por exemplo, o que ocorreu no dia primeiro de junho de 2016,
em que se celebrou a Noite do Noivo51
, cujo fiel assume ter o noivo (referência a Jesus) na
sua vida. A palavra de ordem neste dia é aliança. De modo que é formalizada pela visita ao
templo e se perpetua pela assiduidade do fiel. O templo é o local do compromisso, daí assume
um símbolo de união.
Às quintas-feiras acontece a “Terapia do Amor”. Esta reunião é direcionada ao
fortalecimento dos relacionamentos afetivos e familiares. Destina-se às pessoas solteiras que
51
Portal da Universal. Disponível em: <http://www.universal.org/agenda/2016/06/01/noite-do-noivo-
28669.html>. Acesso em: 30/05/16.
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querem encontrar um parceiro(a) e ao casais que estão com dificuldades de convivência ou
em processo de separação. Também casais que querem ter filhos e não conseguem por vias
naturais procuram a “Terapia do Amor”. Nestas reuniões as pessoas são ensinadas a ter
determinadas condutas que auxiliem em relacionamentos, segundo a doutrina bíblica.
As reuniões são em estilo de escola, em que cada lição é dada em uma semana
diferente, mostrando, mais uma vez, que o processo de secularização está presente na IURD.
As lições se baseiam totalmente em dados disponibilizados por estudos de Psicologia e da
Antropologia, além de usar, consideravelmente, pesquisas publicadas em revistas científicas.
Ou seja, o divino não está presente nessas lições, mas são anexadas no discurso dos pastores.
As informações ali passadas poderiam ser adquiridas em outros lugares, mas para o fiel, são
conselhos de Deus.
As reuniões de sextas-feiras são chamadas de “Libertação”. Isso porque nesse dia
acontecem desmanches espirituais, ou seja, pessoas que estão com dificuldades ou se sentindo
perseguidas por forças sobrenaturais. Geralmente os pastores usam de amuletos para as
práticas litúrgicas que fazem referências a interrupções da ação maligna. Também ocorre
nestas reuniões o aparecimento de demônios, que são expulsos do corpo da pessoa. Neste dia,
há duas reuniões especiais, que são as vigílias do meio-dia e da meia-noite (começa às 22h).
A do meio-dia é uma das mais cheias da semana.
Aos sábados, as reuniões são chamadas de “Jejum das Causas Impossíveis52”,
destinadas às pessoas que já tentaram de modos tradicionais ou espirituais se livrar de causas
particulares, só eliminadas por meio de atitudes físicas dos fiéis. A referência ao jejum está
ligada à concepção da igreja em fazer sacrifícios, neste caso, compreendidos como uma
atitude física de abstenção financeira ou de alimento, ou ainda de lazer. Neste dia, também
ocorre às reuniões de jovens. Os jovens da IURD fazem parte da comunidade criada pela
instituição chamada de Força Jovem Universal (FJU)53
. Geralmente se reúnem às 15h na
IURD-TCF, mas são realizadas nos espaços da igreja fora da nave54
.
Finalmente, aos domingos acontecem as reuniões de “Encontro com Deus”. São
os cultos tradicionais da liturgia cristã, com louvores, orações, ofertas, e pregações do bispo
ou do pastor. Este dia conta com a presença maior de fiéis. Há uma particularidade na IURD-
TCF, pois o estacionamento nas ruas é liberado, bem como não funciona a faixa exclusiva aos
52
Portal da Universal. Disponível em: <http://www.universal.org/reunioes/causas-impossiveis>. Acesso em:
30/05/16. 53
Portal da Universal. Disponível em: <http://www.universal.org/grupos-de-trabalho/forca-jovem-
universal.html>. Acesso em: 30/05/16. 54
Parte do templo, no qual ficam as cadeiras para o público, o salão principal.
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ônibus coletivos da Avenida Tristão Gonçalves. Isso faz com que muitas pessoas que se
destinam ao templo estacionem nas ruas próximas ao templo e o número de vendedores
ambulantes aumenta principalmente os que vendem comidas, como lanches e almoço.
Deste modo, inferimos que a temporalidade também é um marco de autenticidade
e presença da igreja que se filia ao espaço para demonstrar sua potência religiosa. Através das
reuniões, o tempo sagrado é formulado e praticado, direcionando ao fiel uma escolha de
quando se direcionar ao sagrado e que tipo de manifestação ele quer presenciar e participar.
Corroborando com uma das características da pós-modernidade em relação à religião,
Bauman (1998) explica que hoje
A idéia da auto-suficiência humana minou o domínio da religião institucionalizada
não prometendo um caminho alternativo para a vida eterna, mas chamando a atenção
humana para longe desse ponto; concentrando-se, em vez disso, em tarefas que os
seres humanos podem executar e cujas consequências eles podem experimentar
enquanto ainda são 'seres que experimentam' - e isso significa aqui, nesta vida.
(BAUMAN, 1998, p. 213)
Isto significa que na religião praticada atualmente, o fiel deve ir à igreja para
experimentar. As reuniões e cultos são flexíveis à escolha do fiel e ao tipo de experiência
almeja. No caso da IURD-TCF, cada dia da semana há uma opção de prática, seja para
expulsar demônios, seja para curas, seja para prosperidade ou ainda para participar de
campanha. Inclusive os horários, pois há reuniões em momentos de baixo fluxo, há grande
movimentação de membros, cabendo ao fiel decidir se quer um ambiente mais restrito ou se
quer se esconder na multidão, uma vez que o grande número de pessoas o torna uma grande
massa de pessoas “sem identificação”.
De maneira similar, essa temporalidade flexível das reuniões e atendimento aos
fiéis sinaliza uma característica do processo de secularização. Berger (2013, p. 145) diz que
“uma dessas características essenciais é a ‘individualização’. Isso significa que a religião
privatizada é assunto de ‘escolha’ ou ‘preferência’ do indivíduo ou do núcleo familiar, ipso
facto carecendo de obrigatoriedade.” Disto, deduzimos que a IURD-TCF fornece uma
variabilidade de cultos ampliando seu raio de atuação ao gosto dos fiéis, aproveitando as
formas do templo em um uso constante e flexível do espaço para repassar sua doutrina.
99
5.2 COMPREENDENDO A ARQUITETURA DO TEMPLO ENQUANTO FORMA
SIMBÓLICA ESPACIAL
Junto à programação flexível, há uma liberdade de acesso. O estabelecimento fica
sempre aberto e as pessoas podem circular livremente pela nave do prédio. Inclusive, há
muitas pessoas que atravessam o quarteirão utilizando as entradas da estrutura religiosa,
saindo da Avenida Tristão Gonçalves para a Rua 24 de Maio e vice-versa. Os pedestres
utilizam a climatização do local para fazer a travessia, livrando-se do calor do Centro da
cidade. Assim, aproveitam a liberdade de acesso para descansarem, sentando-se nas poltronas
do templo. Isso é evidentemente, visto que, ao chegar ao local, há reuniões cujos assentos não
são ocupados. Além disso, há no templo banheiros e bebedouros disponíveis para qualquer
pessoa. Por mais simples que pareça isso auxilia, pois não há banheiros públicos no Centro,
precisando aos pedestres usarem banheiros particulares e comprar água de vendedores
ambulantes.
A parte restrita da igreja é o estacionamento interno, localizado no subsolo, onde
somente pessoas vinculadas à liderança da igreja, ou seja, bispo, pastores e obreiros podem
usar. Na entrada desse estacionamento sempre tem vigilância particular que observa a entrada
e a saída de veículos. Esse estacionamento tem uma entrada que fica defronte aos banheiros e
é monitorado por câmeras de vigilância (Figura 6).
Figura 6 – Estacionamento interno da IURD-TCF.
Fonte: SANTOS FILHO, 2015.
100
Outra parte restrita da catedral é o prédio anexo (Figura 7) onde uma das entradas
está na parte interior, ao fundo, e a outra entrada se encontra na Avenida Tristão Gonçalves.
Neste prédio são realizadas reuniões entre o bispo e pastores. Lá as ordens episcopais são
direcionadas aos pastores de outros templos da cidade e da região metropolitana. Acontecem
uma ou duas reuniões por semana e, também há, algumas vezes, reuniões destinadas somente
às mulheres. Neste prédio, quando um fiel sem cargo eclesiástico ou visitante adentra, é
compelido por vigilantes presentes na entrada e se deslocar à entrada principal do templo.
O prédio em anexo, situado à direita da entrada principal, também segue alguns
padrões. Podemos exemplificar A escada de acesso, a altura do desnível e a cor negra da base
das paredes junto à calçada. Porém, além disso, as semelhanças se dissipam. O prédio possui
cores distintas, com estilo arquitetônico mais moderno, portas de vidro na cor azul em estilo
espelhado, parecendo ser um prédio comercial. Contudo, os dirigentes fizeram questão de
identificá-lo com a igreja, uma vez que este prédio tem uma saída que dá para dentro do
templo e, no alto, há uma enorme cruz em dourado, forjado no mesmo estilo do letreiro
anterior existente no templo. Neste prédio, há uma recepção e até elevadores para acesso aos
andares superiores. Aparentemente, são seis andares, mas não podemos confirmar, pois o
acesso, como já dito anteriormente, é restrito.
Figura 7 – Prédio anexo da IURD-TCF.
Fonte: SANTOS FILHO, 2015.
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Como parte da infraestrutura da IURD-TCF, existe também um espaço destinado
à “Escolinha Bíblica” para crianças, e um fraldário, além de uma pequena livraria com títulos,
exclusivamente, elaborados pela instituição. Estes espaços são de acesso fácil ao público e
durante as reuniões os obreiros levam as crianças, com permissão do responsável, para um
destes espaços, ou simplesmente para irem ao banheiro ou beberem água. Estes espaços ficam
na entrada secundária do templo, defronte à Rua 24 de maio. Ainda nesta entrada fica a
recepção, local aonde chegam as correspondências, convites e aquisições direcionadas ao
bispo ou pastor responsável.
O grande destaque pra quem vê a IURD-TCF da rua é a imponência. O modelo
arquitetônico das catedrais da IURD é referente à “noção de ecletismo com referência ao
neoclássico” (GOMES, 2011, p. 163). O neoclássico é um estilo arquitetônico
Descrito como um revival da Antiguidade clássica Greco-romana, principalmente na
arquitetura, que, no contexto da Revolução Francesa, expressou a influência e o
poder da nova classe dominante, a burguesia. As referências neoclássicas na
arquitetura baseiam-se na grandiosidade e autoridade, principalmente expressas em
fachadas de prédios ou em entradas principais. (GOMES, 2011, p. 163)
Isso mostra que a intenção, por parte dos líderes da IURD, é realmente transmitir
sua potência enquanto igreja. Assim, como a burguesia expressava sua emergência social, a
IURD demonstra a sua emergência religiosa a partir de suas formas, principalmente pela
fachada e pelo tamanho, como é o caso da IURD-TCF (Figura 8).
Figura 8 – Fachada principal da IURD-TCF.
Fonte: SANTOS FILHO, 2016.
102
No que concerne às suas formas, o templo impressiona pela grandiosidade. Para o
acesso ao interior da igreja existem escadas, em cor cinza, com doze degraus, por volta de um
metro e meio do nível do piso da rua. Esse desnível já seleciona a diferença entre espaços,
pois marca uma passagem do espaço profano para o espaço sagrado. Recentemente
reformaram a rampa de acesso aos portadores de dificuldades locomotoras, sendo aquela
localizada ao lado da esquerda das escadas, no sentido de quem adentra ao local.
Os destaques neoclássicos da estrutura são as colunas frontais, posicionadas nas
escadas a frente das portas principais da igreja, além das formas ortogonais geométricas e
simétricas da parte frontal do templo. São cinco colunas em cor branca, com uma base
quadrada revestida de granito preto. Essas colunas são seccionadas por cinco sulcos que
acompanham o modelado arredondado da coluna. Aparentemente, possui um metro de
intervalo entre cada sulco, totalizando cinco metros de altura, fora a estrutura que está acima.
Estas colunas estão mais avançadas que a parede frontal, formando uma espécie de pórtico,
remetendo ao estilo grego de construção. Este estilo evoca a grandiosidade do poder grego,
cujos alguns monumentos, ainda hoje, estão de pé. Essas formas gregas representavam a
morada dos deuses ou a sede do poder cívico. Passando a ideia de força para a religião por
meio das formas.
Na parede frontal as colunas também aparecem. Contudo, são anexadas às paredes
de modo que só podemos ver uma parte dela, realçada na cor branca, mas em mesmo estilo
arquitetônico que as demais. Nesse caso, são oito colunas posicionadas em distâncias iguais,
com exceção da posicionada ao lado esquerdo que está mais próxima da outra mais a direita.
Este aspecto remete à IURD-TCF uma arquitetura em estilo neoclássico, santuário dos deuses,
só que, nesse caso, santuário do único Deus.
Entre as colunas, as paredes também se destacam. São revestidas de arenitos, com
exceção da fachada frontal acima das portas de entrada, pois é coberto por revestimento
cimentado na cor cinza. Entre as portas, a parede é lisa, pintada de bege. Já as portas, são
pintadas de preto, com vidros ofuscados em preto também. Essa configuração das portas isola
o ambiente interno do externo, ou seja, quem está fora não vê o que está dentro. Nas paredes
laterais, além do arenito, há vitrais como se fossem janelas, com figuras que remetem à IURD.
As figuras que aparecem são a logomarca da igreja, além de símbolos como a menorah
(candelabro, símbolo judaico), cálices (símbolo cristão) e coroas (símbolo de poder) (Figura
9). No total são cinco janelas com dimensões bem grandes, porém todas são isoladas. É como
se o templo escondesse o sagrado ali apresentado.
103
Figura 9 – Janelas laterais da entrada principal da IURD-TCF.
Fonte: SANTOS FILHO, 2015.
A beira do edifício também é um elemento de destaque. Toda a cobertura da nave
é pintada de bege, com eiras e beiras em cor branca. Na parte central, acima das portas de
entrada, o formato retilíneo dá lugar a um formato piramidal, também lembrando o formato
das contruções gregas. Nesta parte está o nome da igreja com sua logomarca principal: o
coração vermelho com uma pomba branca no centro (Figura 10).
Figura 10 – Logomarca da IURD.
Fonte: SANTOS FILHO, 2016.
Ressaltamos que o letreiro da igreja mudou durante o tempo da pesquisa. Nas
nossas primeiras visitas, o letreiro era em cor dourada, com a logomarca também em dourado,
posicionada bem acima na parte piramidal do eirado. Logo abaixo, ao invés do nome da
igreja, havia somente os dizeres “Jesus Cristo é o Senhor”, slogan da instituição e, na parte
inferior, acima das portas, atrás das colunas frontais, se posicionava o nome da igreja. Após a
104
alteração, o slogan foi reduzido em tamanho e colocado na parte piramidal do eirado, junto
com o nome reduzido da igreja, UNIVERSAL, com letras azuis e a logomarca, a esquerda do
nome em sua cor original, como se vê na imagem acima. Não se sabe o motivo da alteração,
mas podemos perceber que outros templos da IURD também fizeram reformas em suas
fachadas. Parece ser um tipo de padronização da instituição, mas não podemos informar ao
certo por falta de confirmação dos dirigentes. Contudo, como uma marca registrada com fins
religiosos, não é difícil deduzir que seja um molde padronizado adotado para melhor
identidade e difusão da igreja.
Há também uma estrutura auxiliar, que funciona como sala de obreiros e parte da
imprensa da igreja. Diferentemente do outro prédio vinculado à igreja, este, localizado do
lado esquerdo, é mais modesto, com apenas três andares, além do térreo (Figura 11). O térreo
tem portas metálicas retráteis, lembrando um ponto comercial, e os andares acima apenas com
uma pintura branca e janelas em cor preta. É também restrita ao público, mas a movimentação
é mais próxima da população, uma vez que está no mesmo nível da calçada. Podemos ver em
nossas visitas que este prédio é utilizado como um depósito, para guardar, principalmente, os
jornais da igreja. É um local para funcionamento logístico da igreja. A entrada também é
vigiada por segurança particular. Como não tivemos acesso a este local, podemos apenas
deduzir que também dá acesso ao templo e às salas de obreiros e pastores. Este prédio é um
pouco ocultado na paisagem da IURD-TCF, diferentemente do outro que a igreja expõe.
Figura 11 – Prédio de acesso às salas dos pastores.
Fonte: SANTOS FILHO, 2016.
105
Em relação aos estacionamentos podemos evidenciar três. O primeiro é interno,
no subsolo da igreja, com entrada pela Avenida Tristão Gonçalves e restrito aos dirigentes,
pastores, ao bispo, e pessoas autorizadas. A entrada é discreta e também vigiada. O segundo
estacionamento, mais antigo e menor, está localizado na Rua 24 de maio, onde é destinado
aos obreiros e também aos visitantes. O acesso é livre, tendo apenas um cone que controla a
entrada. Já o terceiro estacionamento, este maior, está posicionado a frente da entrada
principal do templo, com uma guarita na entrada, além de uma cancela (Figura 12). O aviso
na entrada diz ser particular, mas o acesso é livre a todos que querem ir ao templo. Este é mais
amplo, atravessando o quarteirão, com saída para a Avenida do Imperador.
Figura 12 – Estacionamento privativo da IURD-TCF.
Fonte: SANTOS FILHO, 2015.
Percebemos também que na frente à IURD-TCF há poucos ambulantes. Os que lá
estão são permissionários, com autorização da Prefeitura, e vendem bebidas, doces e salgados.
Os que não são permissionários apenas circulam com uma caixa de isopor vendendo,
principalmente, água. Segundo entrevistas com permissionários, a relação entre ambulantes e
dirigentes da igreja não é amistosa, pois reivindicam o espaço, que a prefeitura cedeu
legalmente. Dessa forma, os líderes da IURD não podem removê-los nem denunciá-los, com
exceção dos ilegais.
Podemos perceber que a segurança no local é reforçada. A igreja possui muitos
seguranças particulares, bem vestidos e com comunicação direta entre si. Observamos sempre
dois ou três seguranças na entrada principal, além de ficar um no prédio anexo da esquerda
vigiando, também, a entrada do estacionamento e mais dois no prédio anexo da direita, o
chamado prédio dos pastores. Há seguranças na parte interna, que circulam discretamente, e
mais dois seguranças na entrada secundária do prédio.
106
Além da segurança particular, percebemos que a segurança pública no local
também é intensiva. Em nossas visitas, observamos que policiais de bicicleta fazem a ronda
no local, e até casos de ficarem em guarda de frente ao templo. Uma vez que é um local de
muita movimentação e parada de ônibus, a polícia tem uma justificativa para tal ação.
Na parte interna da nave, temos o espaço maior. O local acomoda, segundo uma
placa anexada na entrada, 3500 pessoas sentadas. Porém, a empresa responsável pela
construção admite comportar 3000 pessoas sentadas55
. As cadeiras são acolchoadas e
reclináveis para a posição vertical, proporcionando que as pessoas fiquem de pé nos seus
lugares. O espaço de uma fileira de cadeiras para outra é mínimo, com exceção dos corredores
centrais e laterais. São três corredores no sentido paralelo e quatro em sentido perpendicular
ao altar. Estes corredores são também para circulação dos obreiros que ficam passeando pelo
templo durante as reuniões, além de distribuir os amuletos de fé anunciados pelos pastores.
O ambiente interno é muito amplo. Com uma altura considerável, ao ponto de
comportar na parte do altar dois telões fixos, o local é alto em seu tamanho, fato que estimula
os fiéis contemplar o próprio templo. Os telões servem para a transmissão do culto em dias de
maior concentração. Inclusive, há uma grua cinematográfica, em que instala uma câmera
capta imagens da reunião, circulando pelas cadeiras e focando imagens do alto, ressaltando a
presença massiva dos fiéis. No entanto, só é usada em dias de maior público, ficando
desativada nas outras reuniões, apesar de continuar fisicamente no local.
Fora os telões fixos, o templo possui um telão móvel ao centro, na frente do altar,
para projeção. Geralmente é usado para reuniões durante a semana, quando os pastores
lecionam aos fiéis às lições referentes ao tema da reunião. Neste telão também são mostrados
vídeos das ações de inimigos espirituais ou então propagandas de programações da igreja, ou
ainda mensagens do Bispo Edir Macedo.
Na parte interna, podemos constatar a grandiosidade exposta pela arquitetura do
prédio. As colunas de sustentação ficam expostas, pintadas de branco, acopladas às paredes.
Somente no fundo da nave, devido ao prédio anexo ao templo, as colunas são expostas
totalmente, sem paredes, inclusive atrapalhando a visão das cadeiras que ficam atrás. Nas
paredes, observamos desenhos de janelas com figuras referentes à confissão judaico-cristã,
como menorah’s e cálices. Junto às figuras, existe o emblema da Universal. As cores das
paredes são discretas: bege na parte superior e amadeirada na parte inferior. Essa parte
55
Fonte: FUJITA Engenharia. Disponível em: <http://novo.fujita.com.br/projetos/obras-institucionais/>. Acesso
em: 15/02/2016.
107
inferior tem, aproximadamente, dois metros de altura e o restante reflete a cor bege. Entre as
diferenças de tonalidades, aparece uma linha modelada de gesso branco.
As portas isolam o ambiente interno da igreja, tanto visualmente como
acusticamente. São pintadas de branco no interior da igreja com vidros foscos, isolando
totalmente a visão interna e externa. Essas portas, de igual modo, barram o som que vem da
rua, dando uma acústica diferenciada para quem está dentro. Em momentos de reuniões, o
som que paira é, predominantemente, do pastor, sendo possível ouvir de maneira confusa as
vozes dos fiéis em orações. Nos intervalos litúrgicos, o silêncio predomina. Nem as buzinas
de automóveis são ouvidas dentro do templo. Esse ambiente de silêncio até ajuda àqueles que
vão ao templo somente repousar. É como se lá dentro a pessoa estivesse fora do centro de
Fortaleza.
O teto possui uma aparência discreta. É revestido de material sintético tampando
os tubos de ventilação. É um ambiente claro. No entanto, nem todas as luzes são acesas
durante a semana. Como algumas reuniões possuem pequeno número de fiéis, deixam as luzes
do fundo desligadas, incentivando as pessoas a se dirigirem às proximidades do altar. Mais
um motivo que levam pessoas ao templo em busca de sossego. Além do silêncio, a pessoa
desfruta da pouca luminosidade. No teto são fixadas algumas caixas de som e algumas
câmeras de vigilância, mas, devido à altura e à ausência de cores chamativas, são quase
imperceptíveis aos frequentadores.
Outro ponto a se destacar na infraestrutura da IURD-TCF é o sistema de
ventilação. O ambiente é climatizado constantemente, sendo a temperatura bem abaixo do que
está fora. Como o acesso é livre, muitas pessoas adentram à nave apenas de passagem, para se
“refrescarem” com o clima artificial, e logo após saem pela outra porta. Percebemos, portanto,
que a IURD-TCF é um ambiente de intenção reconfortante aos visitantes. O ambiente é
propício para o relaxamento e para acomodação de seus frequentadores, fiéis ou não.
Elementos como a climatização e o som ambiente transformam o ambiente religioso em um
ambiente pacífico. A guerra espiritual pregada pelos pastores é preenchida por uma paz
planejada e eficiente que dá a sensação de que o transcendental existente dentro do templo
conforta os que nele visitam.
Com relação ao piso, a estrutura arquitetônica denota a grandiosidade do lugar. É
revestido de peças de granito e mármore, modeladas nos corredores e no revestimento do
altar. A grandiosidade sentida se dá pelo valor que esse tipo de piso tem no mercado, além de
nos corredores serem colocados para demarcar espaços específicos de trânsito, orientando os
108
usuários da igreja. É o caminho para o altar e espaço de poder, uma vez que delimita onde
permanecer e onde fluir.
Do que descrevemos até aqui sobre o ambiente interno da IURD-TCF, o grande
destaque do templo é o altar. Este é destacadamente visível e de traços diferenciados em
relação aos outros lados da construção. O altar é o local considerado no espaço sagrado. É
onde são direcionados os olhares das pessoas que adentram na construção religiosa.
O cenário do altar é riquíssimo em detalhes, merecendo uma pormenorização
descritiva. Temos elementos que só aparecem nesta parte do templo e é nele onde são
colocados os objetos utilizados nas liturgias da igreja. O altar exibe desenhos distintivos na
paisagem da igreja e também é o local mais iluminado da nave. A riqueza de itens presentes
no altar, bem como as cores e os detalhes fazem desse local uma centralidade perceptiva
dentro da igreja, daí precisamos observar mais atentamente (Figura 13).
Figura 13 – Altar da IURD-TCF
Fonte: SANTOS FILHO, 2016.
O primeiro destaque a ressaltar é o nível do piso. Tem, aproximadamente, 1,2m de
altura em relação ao piso da nave, na sua parte central, de onde são ministradas as reuniões.
Esse desnível é revertido de um mármore avermelhado, onde as pessoas se aproximam e
fazem orações curtas encostadas neste pavimento. Para subir ao altar, as pessoas utilizam as
escadas laterais revestidas de granito preto e com corrimões de cor prateada. O acesso se dá
pelos dois lados.
109
No altar, vemos o púlpito de onde o bispo e os pastores dirigem as reuniões. É
cilíndrico, amadeirado, formicado em cor escura e algumas partes em dourado. Na parte
central, em dourado, está fixada uma cruz. Podemos dizer que é um geossímbolo, uma vez
que é um elemento identitário do fiel, pois lá existe um estrado com uma base do oráculo de
onde sai à mensagem divina. Para o pregador, é um auxílio litúrgico, tendo em vista que o fiel
encosta sobre a tribuna a bíblia e outros objetos simbólicos usados nas reuniões. O púlpito faz
referência à área onde os sacerdotes hebreus faziam os holocaustos e oblações56
. Isso remete a
ideia de que no púlpito o lócus do perdão sacrificial é dado por Deus aos fiéis, mediante a
ação do pregador. Observamos nas reuniões que, a partir do púlpito, o pastor dá as bênçãos e
pede proteção aos fiéis, bem como é do estrado que roga pela expulsão dos demônios
existentes no recinto.
O altar como um todo é um local especial para o fiel da IURD-TCF. Possui
elementos que anunciam a sacralidade do lugar. Um exemplo disso é o batistério localizado
ao fundo do altar, permanece no interior do templo, uma vez que está disponível a qualquer
momento para pessoas que buscam arrependimento espiritual, conforme a tradição cristã. É
adornado por vitrais que explicitam uma queda d´água, ligando o ato batismal à imersão em
águas correntes. É um componente do templo que transmite não somente as formas, mas as
relações entre fiéis e a divindade, uma vez que o batismo é um ato de ligação do cristão com
Deus. A presença do batistério realça ainda mais a particularidade do altar no espaço sagrado
da IURD-TCF.
Outro elemento geossimbólico presente no altar é a célebre frase da Igreja
Universal do Reino de Deus: Jesus Cristo é o Senhor. Não é somente a frase em si, mas tudo
que está simbolizado nela. A começar pelas letras colocadas no alto do altar. São letras
grandes e de cor dourada. O dourado claramente demonstrando a riqueza que a frase exprime
ao fiel. Ao lado esquerdo da frase está uma cruz igualmente dourada. A junção simbólica da
cruz com a frase explicita ainda mais a confissão de fé existente no templo. Jesus Cristo não é
somente o Messias, mas rico em valor espiritual e sentimental. A frase é estampada no altar
de modo que, ao se olhar para o altar, automaticamente se observa o letreiro. Desse modo, o
altar ganha um novo significado, pois não é somente um espaço de sacrifício, mas também um
espaço de salvação. Logo, a área é um espaço de salvação e a frase estampada no alto aponta
para essa confissão.
56
BÍBLIA SAGRADA [online]: “Ungirás também o altar do holocausto, e todos os seus utensílios; e santificarás
o altar; e o altar será santíssimo.” Êxodo 40:10
110
Ainda temos um terceiro elemento destacado no altar: os vitrais posicionados um
em cada lado do batistério. Esses vitrais são em formatos de cruz, sendo que na parte de cima
destes existe a figura de uma coroa e no meio deles existem duas referências à fé cristã: de um
lado, um ícone das tábuas contendo os dez mandamentos de Deus deixado a Moisés no Monte
Horebe57
. Nesse caso, o altar é um símbolo da autoridade existente na igreja. Os fiéis se
sentem submissos aos pastores e obreiros do templo e do altar saem ordens de Deus ao povo.
No outro vitral, do lado direito temos um trecho do Salmo 23, um dos mais
conhecidos proferidos nos cultos da IURD58
. Esse salmo é uma referência à proteção divina
ao seu seguidor. Desse modo, a pessoa que chega ao templo, ao estar próximo do altar, recebe
a proteção que Deus promete, mediante as Escrituras Sagradas. Assim, o altar é a conexão
entre o fiel e a segurança divina.
Alguns elementos do altar são secundários, mas fazem parte do lugar. No lado
esquerdo de quem visualiza, na parte de baixo do altar, existe um piano e duas portas de
acesso restrito. Uma das portas sinaliza que é a sala de obreiros. No lado esquerdo, também na
parte de baixo, está uma grua cinematográfica e mais uma entrada sinalizada como sala dos
pastores. Esta mesma sala tem uma segunda porta que fica de frente para a parte elevada do
altar, deparando-se com as escadas. Na parte de elevada do altar, além do púlpito, há,
também, uma mesa de madeira, com objetos variados, dependendo do dia da reunião. Há
também caixas de som para o retorno do áudio, uma vez que todas as reuniões utilizam
amplificadores de som, sendo, inclusive, o microfone um símbolo de quem tem a vez de falar,
portanto, o poder do discurso no momento da reunião.
Assim, o altar é o espaço principal da IURD-TCF. Nele o fiel encontra uma
centralidade simbólica, por meios dos valores buscados pelo fiel, resultante da doutrinação
proposta pelos organizadores do templo. Isto é, diante do altar o fiel adquire a ligação, a
salvação, o perdão, a riqueza e a proteção prometidos por Deus. No entanto, a realização
dessas ações e da referência ao altar é fortemente pregada pelos pastores da igreja. Podemos
assim dizer que o discurso eclesiástico existente no espaço santifica o lugar e valoriza o
templo como local onde se realizam as trocas simbólicas, pois
57
BÍBLIA SAGRADA [online]: Êxodo 32:15,16. “E virou-se Moisés e desceu do monte com as duas tábuas do
testemunho na mão, tábuas escritas de ambos os lados; de um e de outro lado estavam escritas. E aquelas tábuas
eram obra de Deus; também a escritura era a mesma escritura de Deus, esculpida nas tábuas.” 58
BÍBLIA SAGRADA [online]: Salmos 23:1-6. “O SENHOR é o meu pastor, nada me faltará. Deitar-me faz em
verdes pastos, guia-me mansamente a águas tranquilas. Refrigera a minha alma; guia-me pelas veredas da
justiça, por amor do seu nome. Ainda que eu andasse pelo vale da sombra da morte, não temeria mal algum,
porque tu estás comigo; a tua vara e o teu cajado me consolam. Preparas uma mesa perante mim na presença dos
meus inimigos, unges a minha cabeça com óleo, o meu cálice transborda. Certamente que a bondade e a
misericórdia me seguirão todos os dias da minha vida; e habitarei na casa do Senhor por longos dias.”.
111
a mensagem religiosa mais capaz de satisfazer o interesse religioso de um grupo
determinado de leigos, e de exercer sobre ele o efeito propriamente simbólico de
mobilização que resulta do poder de absolutização do relativo e de legitimação do
arbitrário (BOURDIEU, 2007, p. 51).
É do altar que o discurso eclesiástico domina e por onde os leigos percebem
“chegar a Deus”. E a presença do fiel no templo é exigida para que se recebam as promessas,
daí afirmarmos que o templo é geossímbolo para os fiéis da IURD-TCF e também o local
principal do templo.
5.3 ATRAVÉS DAS ENTREVISTAS: PERCEPÇÃO DE UM LUGAR SAGRADO
Para discorremos sobre os procedimentos de coleta de dados precisamos descrever
a metodologia adotada para tal feito. Ao buscarmos a percepção dos fiéis para analisar nosso
empírico, contemplamos uma forma de coleta que elucidasse elementos que viessem a somar
a observação realizada durante a pesquisa. Nossa análise se pauta na observação direta da
igreja e seu entorno; conversas informais com pessoas da igreja e comerciantes próximos ao
templo, além de entrevistas semiestruturadas com fiéis da catedral da IURD de Fortaleza.
O período de observação foi entre os meses de novembro de 2015 a junho de
2016. Tentamos, ao máximo, diversificar os horários e dias das reuniões para verificar o
funcionamento da igreja em momentos diferentes. A partir disso, notamos que entre as
reuniões, principalmente antes dos cultos que concentravam mais pessoas, era o momento
propício para realização das entrevistas, pois havia um momento de silêncio e aguardo que
facilitava a aproximação do entrevistador ao entrevistado.
Direcionamos as entrevistas e conversas informais para os meses de março a maio
de 2016. Procuramos pessoas que estivesse esperando a reunião começar e não se
incomodassem com a solicitação de respostas. Ocorreu algumas vezes a recusa por parte dos
fiéis em ceder à entrevista, devido às anotações que eram feitas. Havia um incômodo ao ver
papéis e canetas com o entrevistador. Isso resultou em uma identificação de nossa parte como
idealizadores de uma pesquisa e se realmente os voluntários poderiam participar. Alguns
respondiam as perguntas, mas depois pediam detalhamentos sobre o destino final da
entrevista. Outros, mesmo explicando a finalidade do exercício, ainda ficavam desconfiados e
suas respostas eram curtas e vagas, tornando nossa coleta de dados mais demorada.
112
Todavia, as pessoas que aceitaram colaborar expuseram suas convicções e
opiniões sobre a IURD. Havia uma empolgação muito grande quando era para falar da
instituição e do local em que congregavam. Isso nos proporcionou respostas bem
convincentes da percepção que eles têm da catedral de Fortaleza como um lugar especial e
cativante no exercício da fé que possuem.
Para respaldar o modo de entrevista que realizamos consultamos alguns métodos
que valorizam a visão do entrevistado. Partindo da fenomenologia de Merleau-Ponty (2011),
buscamos a essência do nosso empírico – a IURD-TCF, de modo que interpretamos as
entrevistas à luz do entendimento de que o corpo é o agente conectivo entre o ser e o espaço.
Logo, a percepção dos fiéis/usuários do templo nos interessa para uma interpretação do
espaço sagrado, pois, parafraseando Souza (2012), a partir da experimentação dos sujeitos
conseguimos entender a construção espacial como uma vivência.
Em relação ao modelo de entrevista, procuramos um método qualitativo.
Adotamos a entrevista como método de coleta porque temíamos que os questionários não
fossem respondidos de maneira satisfatória, uma vez que os fiéis são desconfiados com
pessoas que perguntam sobre a instituição fora da igreja. Evidenciamos isso quando
conversávamos de maneira informal, momento que nos identificávamos como visitantes e
desejosos de exercitar os ritos da igreja. Nestes momentos, os entrevistados eram mais
espontâneos para falar sobre a igreja.
Desse modo, optamos por entrevistas qualitativas semiestruturadas e não
diretivas, nos casos das conversas informais. As entrevistas semiestruturadas “combinam
perguntas abertas e fechadas, onde o informante tem a possibilidade de discorrer sobre o tema
proposto.” (BONI e QUARESMA, 2005). Aquelas têm como finalidade analisar e interpretar
geograficamente as impressões que os fiéis têm daquele espaço. As entrevistas não-diretivas
ocorrem sem perguntas pré definidas e sem uma orientação estabelecida. Usamos de
conversas em que os fiéis se sentiram incomodados ao ver o papel de anotações ou quando
nos identificávamos como frequentadores do templo, ou ainda entre as perguntas iniciais da
entrevista como modo de descontrair e instigar o interesse por parte do entrevistado. Nestes
casos, as pessoas vão falando o que sentem e, após a conversa, os ditos são transcritos. Este
método apresenta problemas quanto à fidelidade da transcrição, pois uma vez que se
transcreve já se utiliza uma interpretação por parte do entrevistador, porém, através desse
método, tivemos a vantagem de uma maior abertura maior por parte do entrevistado, pois não
se sente inibido em relatar suas experiências, fato que colabora para o cerne da pesquisa.
113
Focamos nossas entrevistas aos fiéis, uma vez que os pastores não cedem
entrevistas sem autorização do bispo. Este, por sua vez, não foi encontrado para conversar
conosco, devido indisponibilidade de agenda. Assim, os fiéis foram o alvo das entrevistas.
Dos que aceitaram responder, contamos com 23 entrevistas escritas, além de algumas
transcrições que utilizamos para nossa interpretação.
Desse modo, a estrutura da nossa entrevista contempla três enfoques. O primeiro,
com informações gerais, como nome, idade, grau de escolaridade e bairro de residência. O
segundo tem enfoque sobre as preferências do fiel quanto ao local preferido e dias que gosta
de visitar, bem como a frequência, o que lhe chama a atenção no templo e sua vantagem sobre
as igrejas locais da IURD. O terceiro está relacionado à compreensão que o fiel tem sobre o
espaço e como ele associa o templo ou elementos compostos nele a um espaço sagrado.
O intento dos aspectos acima é identificar como o fiel participa da IURD, mas,
acima de tudo, identificar elementos que forneçam a percepção do fiel sobre o templo. A
partir das preferências que se tem a respeito do local que congrega, podemos perceber o grau
de vivência entre fiel e IURD-TCF. Com as informações sobre a compreensão do sagrado,
identificamos a percepção frente ao espaço, o modo como ele vivencia o sagrado dentro do
templo. Deste modo, podemos compreender como objetiva este espaço e quais elementos são
essenciais para a experimentação do sagrado neste local.
A partir do exposto nos parágrafos antecedentes, temos um escopo para,
finalmente, adentramos na interpretação das entrevistas. Sobre o perfil dos entrevistados,
observamos que a maioria está na faixa etária entre os 19 e 49 anos. Possuem ensino médio
completo e são residentes na periferia de Fortaleza. Estes bairros são distantes, fato que
acarreta o deslocamento, através de algum meio de transporte, dos fiéis até a catedral.
Também foi verificado que alguns moram na Região Metropolitana de Fortaleza. Outros
residem em localidades a mais de 68 km de distância da sede estadual da Universal, como
Cascavel e Paraipaba. O próprio deslocamento é algo que destacamos, pois os locais de
moradia dos entrevistados possuem templos da IURD, mas ainda assim preferem, mesmo que
ocasionalmente, ir à catedral. Do total de entrevistados, mais da metade não frequentam a
igreja Universal do bairro em que moram.
Procuramos saber os motivos que levam essas pessoas a preferir a IURD-TCF, e
não a igreja do seu local de moradia. Dentre os motivos, o que mais se repetiu foi à presteza
que há no templo maior de Fortaleza. Um dos entrevistadores disse ao responder esta questão:
“porque tem mais atenção dos obreiros e pastores pra conversar.” (Jhonathan). Outros
114
afirmaram ser por causa do pastor e por ser mais cômodo, uma vez que a estrutura do templo
é confortável para quem o visita. A atenção dada pelos pastores e obreiros é notória tanto pela
quantidade como pela disponibilidade, uma vez que há plantão de pastores, mesmo em
horários diferentes dos cultos. A prontidão oferecida pela IURD-TCF atrai os fiéis a
expressarem suas frustrações e desejos. Eles afirmam que na catedral se sentem acolhidos na
hora que quiserem ou quando algo lhe aborrece.
Outra pergunta associada a esta foi saber qual a vantagem da catedral em relação à
igreja do bairro. Nesta questão, a maioria das respostas focou o serviço dos pastores. A
maioria dos entrevistados, frente a esta pergunta, utilizou a concepção de “força” para
expressar a superioridade da catedral em relação às outras igrejas da instituição. Um dos
entrevistados disse: “Porque aqui você sente outra alma, as orações são mais fortes.”
(Manuel). Outro colocou da seguinte forma: “Os pastores do bairro não tem a fé como os
daqui [catedral].” (Sandra). Ou seja, a “força” percebida pelos fiéis associa-se aos pastores
que se situam no templo central. É um indicativo de que a ministração dos serviços religiosos
na catedral são mais qualitativos do que nos bairros. Mas o interessante é que os pastores e
obreiros da catedral revezam com os dos bairros, conforme sua capacidade de cativar e
ensinar as pessoas. Mariano (2012, p. 63) diz que “há uma forte correlação entre capacidade
de arrecadação de recursos e promoção. [...] obedecem uma a um esquema de rodízio e não
gerenciam os recursos que arrecadam.”. Isso quer dizer que o fiel sente diferença entre os
pastores , sendo influenciado pelo local onde exercem o sacerdócio.
Essa capacidade vem de pessoas especializadas. Campos (1997) classifica os
pastores da IURD como pastores-atores. Ele afirma que
o pastor-ator cria, a partir de um cenário apropriado, um ambiente ‘mágico’, no qual
os membros do grupo são convencidos de que seus desejos e vontades poderão
tornar-se realidade, graças à intervenção de forças visíveis apenas, através de quem
pode enxergar com os olhos da fé. (CAMPOS, 1997, p. 94).
Ou seja, há uma confiança dos fiéis frente ao discurso do pastor, que está sempre
disposto a contribuir e aconselhar acerca de atitudes ou ações que possam melhorar a vida do
fiel que o procura. No caso da IURD-TCF, os encarregados de receber os fiéis são sempre
amigáveis e dispostos a orar pelos membros e suas famílias.
Como se observa, há um elemento espacial envolvido nessa relação. Como vemos
na citação acima, o pastor-ator carece de um cenário apropriado. Isso quer dizer que os
elementos espaciais são importantes para efetivação da capacidade administrativa do pastor.
115
O próprio formato do templo, composto por um o altar mais alto e o público mais abaixo,
favorece ao discurso do pastor, que tem a autoridade dada pelo altar do templo para ministrar
as mensagens ao público. Neste sentido, as formas do templo ampliam a visibilidade, mas
fornecem uma simbologia de poder ao pregador.
Outro questionamento dirigido aos entrevistados foi o motivo que os leva a ir ao
templo. A resposta majoritária é a busca. Os três elementos da trindade cristã (Deus Pai, Jesus
e o Espírito Santo) são os alvos desta busca. Entre as falas destacamos: “Preencher de Deus,
pois as lutas existem, mas Deus ajuda a ir em frente.” (Thaís); “entrar na presença de Deus.”
(Jhonathan) e; “Comunhão com o Espírito Santo e para alimentação espiritual.” (Cristiane).
Para “preencher” de Deus é necessário estar na igreja. Isso vai de encontro com o discurso
pentecostal que ressalta que o importante são as práticas. “Entrar na presença” e “comunhão”
são termos usados pelos evangélicos em geral para demonstrar que buscam obedecer à
doutrina cristã, sendo a visita ao templo um elemento dessa obediência e motivo da busca. Ou
seja, a busca ressaltada nas respostas representa um encontro, sendo o templo o local
mediador e de interação entre os fiéis e os personagens divinos.
Um elemento importante inserido nos depoimentos acima é a utilidade que os fiéis
percebem ao visitar a IURD-TCF. É evidente a procura dos serviços religiosos, porque “é o
lócus privilegiado para a realização do milagre e, mesmo que o prodígio aconteça em casa, é
no templo que ele é aprovado, legitimado e divulgado.” (CAMPOS, 1997, p. 134). Então,
quando se precisa de determinado serviço religioso (cura, prosperidade financeira,
recuperação de familiar do mundo das drogas, retirada de um espírito imundo, etc.), o fiel
procura o templo. Podemos ver explicitamente em algumas falas. Esta frequentadora do
templo diz procurar “Libertação, prosperidade para se manter e o essencial: fortalecimento”
(Sandra) ou este que visa “Buscar melhorias para o relacionamento.” (Jorge Ivan). Nestes
casos, eles têm um objetivo específico e declarado procurando à IURD-TCF no dia específico
que trata do tipo de problema que declaram. Isso confirma o assinalado, por nós, que o templo
central da IURD funciona para os fiéis como um fórum espiritual, uma vez que se reivindicam
soluções e prestam queixas de problemas cotidianos reais e presentes na vida de cada um.
Esses serviços estão ligados ao encontro que eles têm com Deus, pois a busca por
Deus neste contexto significa resolver as dificuldades existentes na vida profana. Por mais
que a solução seja abstrata, acreditam que o contato com Deus, no templo, traz benefícios à
suas vidas sociais. Neste caso, o espaço sagrado é construído sobre o discurso de que Deus
116
está presente na IURD-TCF e percebido como um auxílio imaterial para as necessidades
materiais por meio dos serviços prestados pela IURD.
Podemos então dizer que a IURD-TCF funciona como fórum espiritual a serviço
das pessoas, prestador de um serviço de maior qualidade do que outros espaços religiosos.
Algumas frases captadas nas entrevistas exemplificam o que verificamos: “É diferente, tem
um tratamento espiritual sentimental” (Deise); “na Catedral os propósitos são diferentes, e
porque sempre tem alguém pra ajudar.” (Cristiane); “As campanhas são mais fortes. Há um
afinco maior.” (Glícia). A ministração dos serviços religiosos é percebida pelos fiéis na
prontidão, quantidade de pastores e disposição em ensinar e orar pelos que os procuram.
Neste sentido, o templo também funciona simbolicamente como uma clínica
religiosa. As pessoas buscam um amparo que os serviços públicos não disponibilizam com
eficiência. Observamos nas visitas de campo que o tratamento aos visitantes é prestativo e
atencioso. Há obreiras que cuidam das crianças enquanto as mães ficam no culto. Essas
obreiras levam os filhos das fiéis ao banheiro, ao bebedouro e se tiverem idade para participar
das Escolinhas Bíblicas, há um espaço exclusivo para que brinquem, pintem e aprendam
lições de educação e doutrinas cristãs. Para as mães que levam os filhos ao culto, é um serviço
eficaz, pois pode dar total atenção aos ensinos do pastor, além de participar de maneira mais
produtiva dos rituais. Enquanto os filhos são assistidos, os pais são confortados.
Outro fator que colabora para a ideia de clínica religiosa são as características
estruturais do templo. Além de espaços destinados às crianças, como mencionado acima, há
elementos que favorecem uma aceitação do fiel ao espaço que visita. Nas entrevistas isso
transparece na fala de Thaís quando questionada sobre a vantagem da catedral em relação à
igreja do bairro. Ela disse que “Conforto (ar condicionado), locomoção e a questão de
privacidade são coisas que me atraem pra cá”. O serviço de climatização é destacado por
outros quando mencionam do conforto da IURD-TCF. Não foi raro ver pessoas cochilando no
templo, outras utilizando notebooks ou celulares, e ainda mães dando de mamar aos bebês.
Além da climatização, há cadeiras acolchoadas, bebedouros, banheiros, objetos que, no centro
de Fortaleza, são difíceis de encontrar para usufruir gratuitamente. O frequentador da IURD-
TCF se sente atraído pela recepção que o templo oferece através destes serviços, além dos
serviços religiosos.
O que presenciamos revela ser o templo um símbolo de acolhimento. As pessoas
se sentem acolhidas na entrada do templo, uma vez que o acesso é livre e fácil, e também
117
dentro do templo, a partir do conforto e disponibilidade de atenção. Podemos usar as
seguintes palavras para corroborar o que presenciamos in loco:
Foi verificado que tanto o ambiente externo quanto o interno do Templo da IURD de
Fortaleza passa a ideia de acessibilidade, inclusão, integração, conforto, segurança,
organização, limpeza, funcionalidade, enfim, é um ambiente, no mínimo agradável
para quem faz uso dele. (SOARES, 2013, p. 107)
Um ambiente agradável já é uma prestação de serviços, visto que o centro da
cidade é uma junção de atributos físicos e sociais de exclusão. Devido às condições climáticas
da cidade, o calor tendo em vista que o calor aumenta no Centro da cidade, sobretudo por
conta das construções dos grandes prédios, que barram os ventos, bem como pela retirada da
vegetação local. Também há uma exclusão por parte das finalidades econômicas dispostas no
local que somente acolhe àqueles que fazem compras ou utilizam determinados serviços.
Neste contexto, quem passa pelo centro vê, na IURD-TCF, um oásis onde pode se refrescar,
beber água, descansar, ou seja, gratuitamente e com acesso a todos que passam. Os fiéis usam
o templo como refúgio, servindo-se de um serviço que os estabelecimentos comerciais do
entorno da igreja não oferecem.
Destacamos esta ideia de refúgio como prestação de serviços porque, apesar de
não ser a maioria dos entrevistados, percebemos que alguns usam o templo estrategicamente
quando se dirigem ao Centro de Fortaleza. Um dos entrevistados disse que “Prefiro a
Catedral, porque resolvo coisas no Centro e aí aproveito.” (Carlos Antônio). Inclusive este
entrevistado disse que compra frutas para revender em sua casa, no bairro Bom Jardim. Este
visita a igreja do bairro, mas utiliza o tempo e o espaço do seu cotidiano para encontrar o
sagrado, uma vez que ele mesmo afirma que “aqui as orações são mais fortes”, quando
questionado sobre a vantagem que vê na catedral em relação à do bairro. Assim, o
entrevistado não somente utiliza a catedral como um serviço de conforto, mas de atendimento,
para ele, é de melhor qualidade.
Também se interrogou aos entrevistados sobre a frequência com que vão à
catedral. Percebemos que a maioria vai de 2 a 3 vezes por semana, sendo os dias preferidos às
sextas-feiras e os domingos. Não foi perguntado sobre os horários de preferência, mas, pelo
que observamos durante as nossas visitas às reuniões do meio-dia e à noite, durante a semana,
são mais frequentadas. No domingo é o período matutino que ocorre a maior aglomeração de
fiéis. Alguns dos entrevistados associam o dia que preferem às “correntes” e “campanhas de
118
fé” que ocorrem nos templos da IURD e, consequentemente, no templo maior de Fortaleza.
Campos (1997) assinala que
É preciso separar nas atividades da Igreja Universal as “correntes”, atividades que
obedecem a um calendário semanal uniforme e fixo, só excepcionalmente flexível,
uma espécie de repetição contínua; das “campanhas de fé”, atividades sazonais,
realizadas conforme as exigências e circunstâncias, adaptadas às condições locais de
aplicação. (CAMPOS, 1997, p. 145, grifos do autor).
Foi comum ver as correntes na IURD-TCF. Os fiéis, ao aderirem à corrente, se
comprometem a estar naquele dia proposto. As sextas-feiras, Dia da Libertação, eram feitas
várias campanhas. Temos como exemplo o “Caminho do Sal”, em que o fiel precisa ir durante
certo período sempre as sextas-feiras, ao templo para passar por um corredor cheio de sal,
cujas laterais são preenchidas por pastores que oram pelos transeuntes a fim de libertar dos
problemas que afligem aqueles que passam pelo corredor. Neste caso, a campanha é semanal,
comprometendo o fiel a assumir certa assiduidade ao templo, a fim de cumprir seu voto.
Mesmo sem ser obrigado, ele se vê na condição de negociador: a sua presença e caminhada
pelo “caminho de sal” em troca das bênçãos desejadas.
Disto, podemos perceber que os fiéis da IURD-TCF são permanentes, mas há
também os que são sazonais. A temporalidade é o fator imediato de sua presença, pois o efeito
cíclico da corrente ou campanha promove uma interação espacial. Há uma valorização por
parte dos fiéis quando as correntes são no templo maior de Fortaleza. Sandra, por exemplo,
afirma que “aqui [na catedral] sinto que o avivamento é maior”. A simbologia passada pelo
templo central da IURD de Fortaleza direciona uma potencialização do sagrado. Essa potência
pode ser vivida apenas quando recorre ao cumprimento de sua corrente ou então a cada visita.
Isso é de preferência do fiel. Assim, essas correntes influenciam a preferência dos
frequentadores neste dia. Podemos observar nesta prática o que afirma Eliade (1985, p. 35):
todos os rituais se desenvolvem não só num espaço consagrado, ou seja, num espaço
essencialmente distinto do espaço profano, mas também num ‘tempo sagrado’,
‘naquele tempo’ (in illo tempore, ab origine) em que o ritual foi realizado pela
primeira vez por um deus, um antepassado ou um herói. (grifos do autor)
No caso da IURD-TCF, são os feitos dos personagens bíblicos, sobretudo os do
Velho Testamento que se aplicam como gesto fundador e imitado pelos fiéis. Quando um fiel
se compromete com a corrente, ele o faz na convicção de que, assim como nos exemplos
bíblicos, a vitória será aporte daquio que almeja.
119
Nas entrevistas, percebemos que alguns, uma minoria, participam efetivamente de
algum grupo ou atividade social da igreja. Isso mostra que o grau de comprometimento com a
instituição se restringe às buscas pessoais. Alguns se mostraram desejosos em participar de
grupos de jovens ou evangelização, mas não se sentem aptos para tal tarefa. A percepção dos
fiéis é que está em fase de amadurecimento espiritual, o engajamento é maior e mais
frequente nas reuniões, correntes e campanhas. Assim, se sentem como um aprendiz, e o
templo, em contrapartida, é a escola, onde precisa ter assiduidade regular para que a
aprendizagem seja maior. Nesse sentido, utilizam o termo “alimento” para simbolizar os
ensinos e dogmas aprendidos dentro do templo. E somente no templo ocorre uma
aproximação, pois a mídia utilizada pela igreja serve para chamar a atenção das pessoas para
irem ao templo. Conforme Campos (1997, p. 134) “Toda a publicidade da Igreja Universal, na
sua própria mídia, está voltada para uma única meta: levar pessoas ao templo”. Concorda com
ele Mariano (2012, p. 69): “Elas [as emissoras de rádio] atraem grande número de pessoas por
meio de testemunhos e promessas de bênçãos”. Dessa forma, os fiéis precisam estar no
templo para, de fato, aproximar-se do que “Deus tem a dizer”.
Com relação aos questionamentos voltados à compreensão do sagrado, a partir da
percepção dos fiéis sobre o espaço sagrado da IURD- TCF foi perguntado quais itens (alguma
pessoa, algum espaço, algum objeto) que você considera mais sagrado na igreja? Por que você
considera esse lugar como mais sagrado? Como um lugar se torna sagrado? Estas questões
cobram do entrevistado uma visão bem pessoal do que entendem por sagrado. Mas também
questionamos sobre a influência na altura entre o altar e o restante do templo. Consideramos
estas perguntas fundamentais para estabelecermos geossímbolos percebidos pelos que
convivem com este espaço.
Dos 23 entrevistados, 18 afirmaram ser o altar o lugar mais sagrado da igreja.
Esse dado é relevante para nossa compreensão de geossímbolo, pois conforme já assinalado,
por nós, neste trabalho, Bonnemaison (2002) estabelece ao símbolo um grau de identidade. O
altar é a identificação que o fiel da IURD-TCF tem da presença divina. Foi recorrente
observamos nas reuniões que vários membros ao adentrarem na catedral se direcionavam ao
altar e, de frente a este, encostando as mãos sobre a beirada, faziam uma oração silenciosa, de
olhos fechados e de cabeça baixa. Este rito, geralmente, durava alguns segundos e, logo após,
o membro seguia para uma das cadeiras disponíveis no salão. Este simples ato e as respostas
dadas relacionam a importância do altar para o iurdiano. O sagrado se materializa na presença
do templo e também na sua utilização por parte dos pastores.
120
A resposta dominante sobre o altar é reforçada em outra questão que fizemos.
Uma das poucas perguntas estruturadas que usamos indagava sobre o motivo gerador da
diferença de relevo do altar para o público, tendo como opções: porque é um lugar sagrado;
para melhorar a visibilidade do pastor ou; outro motivo. A maioria justificou através da
primeira alternativa, constatando que veem algo especial no altar.
Quando perguntado o motivo da sacralidade do altar, as respostas variaram mais,
contudo girando acerca do entendimento do eixo: encontro-solução-autoridade. Alguns
informaram que o altar é sagrado porque Deus está lá, outros disseram ser o local de onde
vêm as bênçãos e ainda outros colocaram ser a presença do pastor que torna o altar sagrado.
Em ambas as respostas, o discurso do pregador é o condicionante da sacralidade. Logo, o
poder simbólico do bispo e pastores atua com as formas simbólicas do templo,
transformando-o em uma forma simbólica espacial. Corrêa (2009, p. 4) afirma que “Processos
e formas estão impregnados de significados, podendo se falar em formas simbólicas ou
símbolos.”. No nosso empírico, os significados são criados e propagados pelos dirigentes da
igreja, mas, juntamente com os fiéis, desenvolvem uma espacialidade objetivada: àqueles
como prestação de serviços religiosos, estes no exercício da fé. Isso ocorre na troca de
atividades participativas e sacrifícios por parte do fiel e pela atuação do discurso e
atendimento por parte dos dirigentes. Consequentemente, o resultado é uma interação baseada
no encontro com o templo, em que se almeja e recebe as bênçãos pela autoridade proferida
aos pastores.
O discurso dominante dos pastores reflete nos significados das formas do templo.
Identificamos em algumas falas que realçam que a percepção do fiel está atrelada ao discurso
que ouve, juntamente com os objetivos que almeja ao buscar os serviços da IURD-TCF.
Regiane argumenta que “é no altar que você encontra uma solução para os problemas” (sic).
Esta assimila os ensinos dos pregadores e associa à sua prática cotidiana. Nessa relação, vê no
altar uma representação de orientação, transformando-o numa forma simbólica espacial. Ao
objetivar o altar como elemento material capaz de lhe atribuir sentido, o identifica como um
lugar especial atraindo-a para uma vivência no templo. Esta entrevistada visita a catedral
quatro vezes por semana, mostrando sua relação com o templo, mas, acima de tudo, seu
interesse em aprender o que o “altar” tem para ensinar. O fator essencial nessa relação, então,
é o pastor e seu discurso, mas, como já destacamos, este se complementa pela figuração
simbólica que o altar propicia.
121
Percebemos isso também em outra fala. Ao responder a mesma questão, Priscila
(obreira da IURD em Quadras, Maracanaú) responde: “Porque ele se sacrifica pra abençoar os
outros [referência ao pastor], o altar por ser o local de sacrifícios, não só financeiramente.”.
Há uma ênfase dada ao pastor, mas destacamos como o fiel vê a sua relação com o altar. Sua
fala remete aos vários exemplos bíblicos de sacrifícios realizados pelo povo judeu. A figura
do sacerdote como o único autorizado a fazer os sacrifícios remete um poder divinamente
resguardado e, assim, o altar como o lugar autorizado para que os sacrifícios aconteçam.
O sacrifício no contexto iurdiano é um símbolo marcante de exercício da fé. A
IURD coloca o sacrifício como uma das maiores ações de fé e obediência do cristão. Segundo
o fundador da IURD
Quais sacrifícios que agradam a Deus? Em primeiro lugar, o nosso corpo, ou seja,
nossa vida, nossa força, aquilo que somos fisicamente. A Bíblia diz que devemos
adorar em espírito e em verdade. Nossas ações, nosso caráter e a nossa entrega à
obra de Deus são importantes, bem como tudo aquilo que fazemos e que contribui
para o bem dos nossos semelhantes, para o crescimento da obra de Deus, e para Sua
glória. (MACEDO, 1999, p. 34-35, grifos nossos).
Realçamos o trecho acima para mostrar que a entrega é o ato do fiel ir à igreja e
participar das ações instigadas pelos pastores. Quando a entrevistada fala em sacrifício, esta
mostra atitude para com o templo: uma entrega. O altar é o local dessa entrega, pois somente
no templo esta entrega contribui para a obra de Deus, ápice da mensagem citada acima pelo
bispo. Na IURD, esta entrega é ritualizada e deve ser praticada por quem procura eficiência
nos serviços religiosos. Em outras palavras,
Em suma, o sacrifício é um ritual de passagem sem o qual não há possibilidade de
conquista. A noção de sacrifício pessoal sugere uma reinterpretação da leitura cristã
realtiva ao martírio sofrido por Jesus Cristo, representando a remissão dos pecados.
Não haveria mais uma necessidade de sacrifícios, pois Jesus teria realizado o maior
de todos pela humanidade. Na interpretação da IURD, a obrigação de cada fiel para
manter a salvação deve ser renunciar e pagar dia a dia por ela. Acreditar que se está
livre de realizar um sacrifício é uma ‘acomodação da fé’, o contrário pregado pela
igreja: a fé em ação. (GOMES, 2011, p. 111)
A entrega, portanto, é sinônima de possibilidade de conquista. Como todo ritual, o
sacrifício precisa de um local, que, na IURD-TCF, é o altar. Logo, o altar é uma representação
de entrega, mas também de conquista, pois a prática do ritual possibilita uma resposta
eficiente. Ou seja, o altar é uma troca, “o dar e receber” materializado, portanto uma forma
simbólica espacial.
122
Podemos, deste modo, conceber a IURD-TCF como um clube espiritual. Cada
membro sente orgulho em participar dos atos de sacrifício, isto é, de entrega e sente usufruir o
retorno de suas ações, seja em doações como as participações ritualísticas. Podemos acreditar
que
O sentimento de integrar a “obra de Deus” é composto por dois aspectos
importantes: o chamado a um compromisso pela igreja, dirigido à colaboração de
todos os membros na construção das catedrais por meio de doações, em um
investimento coletivo para a continuidade e permanência do grupo religioso. O
segundo aspecto concerne à satisfação do membro da igreja por poder contribuir de
algum modo para a construção de um espaço que os acolhe, produzindo ose “sentir
bem”, por “ter um poder muito forte”. Assim, na mesma medida em que contribuem,
confirmam sua identidade religiosa iurdiana. (SOARES, 2011, p. 155-156)
Fica clara a associação da igreja a um clube. Para ter seus interesses comuns
satisfeitos, os membros participam com os “sacrifícios”. Assim, tornam-se associados à
igreja, desfrutando daquilo que ajudou a construir. Nesse sentido, o templo assume uma
identidade com o fiel e o templo se torna um geossímbolo.
Isto fica mais manifesto quando analisamos as respostas referentes aos que
pensam da IURD. Seis entrevistados sintetizaram suas respostas à palavra “tudo”. Isto
evidencia que a igreja, na percepção destes fiéis, supre seus interesses, motivando-os a
colaborar continuamente e/ou ciclicamente, caso adeptos de correntes ou campanhas. Assim,
colocam a IURD-TCF como respostas as suas carências: “No momento de dor, foi à porta que
eu achei” (Sandra); “Ela não é uma igreja, è uma faculdade pra minha vida. Ela trabalha com
tudo. Ela se preocupa com tudo.” (Glícia); “Foi uma porta para conhecer o Senhor Jesus para
se livrar dos problemas pessoais [ela retratou ser depressão]” (Priscila). Assim, sentem-se
realizadas porque a igreja acolheu de modo satisfatório e isso as estimula a participar ainda
mais coletivamente.
Quanto ao entendimento de como um lugar se torna sagrado, as respostas são
associadas ao grau de percepção que têm da IURD-TCF. O sagrado é assimilado por meio de
sentimentos que aspiram. Cabe destacar que esta pergunta foi a mais difícil na concepção dos
entrevistados. Dentre as respostas, tivemos: “quando a gente sente a presença do Espírito
Santo, eu me sinto todo arrepiado" (Jhonathan); “Cuidado espiritual, zelo dos pastores, pela
própria vida deles.” (Thaís); “Um lugar que tenha paz.” (Ivanildo); “quando se tem respeito,
tranquilidade” (Jorge Ivan); “Paz de espírito, bem estar.” (Elaine); “Fidelidade acima de
tudo.” (Cristiane). Pelos depoimentos percebemos características presentes como: arrepio,
123
zelo, paz, respeito, tranquilidade, bem estar, fidelidade, um conjunto de atitudes ou qualidades
que diferenciam da vida profana de um centro comercial.
O templo transmite essas características, pois são sensações que atribuem um
lugar sagrado, assim vivem no templo essas sensações. Deste modo, recria um ambiente
desejado, ou segundo Eliade (1979, p. 57) “o homem religioso experimenta a necessidade de
existir sempre num mundo total e organizado, num Cosmos”. Esse Cosmos se organiza de tal
forma que se podem sentir aquelas sensações descritas nas entrevistas.
Neste momento, surge a importância dos símbolos para a compreensão desse
espaço sagrado. Assim, pelos significados atribuídos coletivamente se promove uma
identificação com as formas, dotando-as de uma simbologia específica capaz de comunicar
ser o templo uma fonte irradiadora do sagrado. Ainda segundo Eliade (1979, p. 218) “porque
graças aos símbolos que o homem sai da sua situação particular e se abre para o geral e para o
universal. Os símbolos despertam a experiência individual e transmudam-na em acto
espiritual, em compreensão metafísica do mundo.”. Os símbolos são representações
construídas pelos fiéis durante os cultos.
Quando entram em contato com os objetos, experimentam o espaço de modo que
atribui novos significados, mediante a prática e o discurso dominante dos pastores. Na IURD,
esses objetos são chamados de pontos de contato. Segundo o bispo, “pontos de contato são
elementos usados para despertar a fé das pessoas, de modo que tenham acesso a uma resposta
de Deus para seus anseios” (MACEDO, 1999, p. 101). Esses elementos são objetos simples,
mas que dentro do templo, mediante ao discurso dos pastores adquirem novos significados.
Podemos dizer que são símbolos, pois o símbolo “extrai seu poder de representação porque é
portador de uma lei que, por convenção ou pacto coletivo, determina que aquele signo
represente seu objeto.” (SANTAELLA, 1990, p. 67). Neste caso, os pontos de contato
apresentados na IURD-TCF são convenções triádicas que envolve o objeto, o interpretante, e
o significado.
Temos como exemplo a vara de Arão (Figura 14). Os fiéis participam da corrente
por meio da posse do objeto, um espeto de churrasco feito em madeira, contudo o intérprete
do discurso é o pastor, baseado na história bíblica do sacerdote Arão. A história de Arão
remete ao objeto um novo significado, pois o crente, ao adquirir a vara e participar da reunião,
terá sua vida florida, assim como a vara de Arão. Concorda este fato com a cosmogonia
proposta por Eliade (1979) ao explicar que o homem religioso quer reviver os atos dos deuses
ou heróis. Em síntese, a vara é um símbolo de esperança e prosperidade.
124
Figura 14 – Vara de Arão, distribuída durante uma reunião na IURD-TCF.
Fonte: SANTOS FILHO, 2016.
Alguns membros que participaram da entrevista disseram ir à catedral para
cumprir as campanhas. Assim, esses pontos de contato só têm eficiência caso seja ministrado
no templo. É a espacialidade da origem de posse desse objeto que desperta a fé dos membros
da IURD. Lembrando que “esses objetos não têm poderes em si mesmos, mas despertam o
coração e as mentes das pessoas para a realidade de que o Senhor está presente para abençoá-
las.” (MACEDO, 1999, p. 101). Logo, os pontos de contato são objetos de representação
construídos pelo grupo que, ao adquirirem novos significados mediante o discurso do pastor,
direcionam os fiéis a uma relação de vivência com o templo, pois a eficiência prometida
associa-se à frequência do membro na igreja.
Portanto, a partir das análises realizadas acima e da construção teórica realizada
até o momento, podemos partir para nossa análise sobre o que foi pesquisado.
5.4 A INTERPRETAÇÃO DA PERCEPÇÃO DOS FIÉIS ACERCA DA IURD-TCF
A partir do exposto podemos analisar que o sagrado da IURD-TCF em conjunção
de três atividades existentes: a religiosa, a administrativa e a midiática. A religiosa é formada
pelo conjunto de crenças e regras apregoadas pelo neopentecostalismo. Esta forma de
exercício do cristianismo é, essencialmente, caracterizada pela guerra contra o Diabo, teologia
da prosperidade e maior liberdade de conduta (MARIANO, 2012). De modo que as atividades
125
religiosas são ritualizadas por encontros em que o transcendente é extremamente associado
aos movimentos cotidianos, sendo o templo um modelo de consolidação da fé vencedora
diante do espaço ao redor, distinto por ações profanas, criando uma dimensão do sagrado na
igreja a partir dos rituais lá praticados.
A IURD-TCF é um espaço mítico, mas também um espaço físico de auxílio
social. Isto porque os fiéis veem no templo uma possibilidade de melhora social,
comportamental, psicológica e relacional. Os membros buscam o templo para realizar suas
atividades religiosas na convicção de que estão promovendo atos benéficos para suas vidas,
tendo um encontro com o divino, mais próximos de uma santidade. Mas também seus atos são
benéficos para a sociedade, já que, por meio da sua prática, podem conseguir algumas
melhorias como saúde, emprego, boas companhias, educação melhor para os filhos, entre
outras ações que as relações sociais, fora da instituição, não têm proporcionado. Nas palavras
de Tuan, podemos afirmar que
O espaço mítico é também uma resposta do sentimento e da imaginação às
necessidades humanas fundamentais. Difere dos espaços concebidos pragmática e
cientificamente no sentido que ignora a lógica da exclusão e da contradição. (TUAN, 2013, p. 126)
O frequentador da IURD-TCF percebe um espaço homogêneo, onde pode
depositar suas esperanças e convicções, pois sente melhoras em sua vida pessoal à medida que
permanece em contato com a igreja.
As atividades religiosas podem ser caracterizadas por sua proximidade com as
religiões populares, isto é, com algumas práticas católicas e/ou de religiões afro-brasileiras.
Estas características são:
[...] especializada em ajudar pessoas a acessar o poder divino em seus momentos de
necessidade [...] oferece soluções pragmáticas para problemas práticos [...] sintetiza
princípios e estratégias espirituais tanto de fontes cristãs quanto de não cristãs. (BLEDSOE, 2012, p. 103)
Essas características influenciam o modo como o fiel percebe a igreja, pois, ao
almejar soluções práticas para sua vida, ele vê no templo, não somente um lócus do sagrado,
mas um espaço de conveniência.
Esse espaço torna-se sagrado na proporção em que os rituais são criados e
praticados coletivamente por meio da atividade religiosa. Há uma criação discursiva por parte
daqueles que detém o poder simbólico que transformam uma edificação humana em uma
126
habitação da divindade. Neste caso, as formas simbólicas espaciais do templo objetivam esse
significado nos fiéis, a partir do momento em que percebem a grandiosidade e o conforto
existente no templo. Gomes (2011, p. 137-138) afirma ser a catedral da IURD “um símbolo
da consolidação do seu processo institucional” e que “a utilização de uma vasta gama de
objetos em seus templos [...] é justificada como mediação das práticas religiosas”. Neste
sentido, as atividades religiosas da IURD-TCF dependem do local onde essa prática se realiza.
Quanto às atividades administrativas, observamos ser a IURD-TCF um espaço
organizado, hierarquizado e preparatório para fé. A administração da igreja é centralizada,
tendo como poder máximo o bispo. Este recebe as ordens diretamente de Edir Macedo,
fundador da IURD, comanda as ações que devem ser ministradas, escolhe os pastores que
devem subir ao altar, destina os dízimos e as ofertas dados pelos fiéis e visitantes e administra
melhor o espaço do templo. Neste aspecto, concordamos com Campos, quando afirma
A igreja Universal optou por um modelo episcopal de governo, e tem um bispo
responsável pela sua atuação em cada país ou região. Porém, a manutenção dessa
unidade organizacional exigirá, com certeza, uma notável capacidade de administrar
bem as culturas diferentes e tendências conflitantes, se quiser evitar a fragmentação,
um fenômeno bastante comum no meio pentecostal. (CAMPOS, 1997, p. 414)
Essa forma organizacional da IURD-TCF reflete sociologicamente e
espacialmente através de sua simbolização. Na primeira dimensão, a administração da IURD
opta por liberar as ações dos fiéis, mudando o comportamento, aparência e certas culturas dos
membros. Ponderamos sobre a IURD-TCF, como igreja neopentecostal que,
As massas de crentes – cada vez mais conformadas aos valores e padrões de conduta
da sociedade e, portanto, cada vez menos sectárias e distintas dos não-crentes –
passaram a se acomodar para cultuar e pleitear graças a Deus, submetendo-se a um
rol de sacrifícios comportamentais bem menos rigoroso do que o praticado por
irmãos de fé das vertentes pentecostais tradicionais. A ética de ascetismo e de
renúncia do mundo perderam terreno e sentido. (MARIANO, 2012, p. 223).
Os membros da IURD-TCF, além de liberdade de frequência às reuniões,
liberdade sobre as roupas que podem usar e são livres para participar de vários eventos
considerados mundanos por outros pentecostais. Quanto ao vestuário, presenciamos várias
vezes a presença de homens vestidos de bermuda, calçados com chinelos e variados tipos de
camisetas. As mulheres, de maneira similar, utilizam variados tipos de roupas que seriam
reprovadas em igrejas pentecostais tradicionais, por exemplo, blusas com alças, decotes,
calças jeans, etc. Neste contexto, algo que chama a atenção é que esta liberdade de vestuário
127
permite que pessoas muito pobres ou em momentos de apuros adentrem o templo, sem se
incomodar com a roupa que vestem. É uma tática que atrai pessoas, pois, como vimos nas
entrevistas, as pessoas se sentem bem.
É uma forma de secularização que se presencia na IURD-TCF. Conforme Berger
(2013, p. 158) “a religião pode ser comercializada mais facilmente se se puder mostrar que ela
é mais ‘relevante’ para a vida privada, do que se se enfatizar que ela tem aplicações
específicas às grandes instituições públicas.”. Efetivamente percebemos isso nos relatos sobre
os motivos que os fazem ir ao templo central da IURD de Fortaleza. Não importa a aparência
que o fiel apresente, mas antes que tenha seu desejo saciado, sendo que esta saciedade não é
concreta, mas percebida na relação que tem com o templo.
Considerando sua dimensão espacial, as atividades administrativas do templo
produzem um discurso de sacralidade do espaço. Ao entender que “o espaço sagrado é uma
produção intelectual.” (ROSENDAHL, 2006, p. 125) e que a religião é um conjunto de
crenças e ritos inseridos num sistema por coisas sagradas que mantém entre si uma relação de
coordenação e subordinação (DURKHEIM, 2008), podemos afirmar que as atividades
administrativas da IURD-TCF são direcionadas a um entendimento de que aquele espaço é a
morada do sagrado, e este se manifesta a cada vez que o culto acontece, onde os fiéis podem
se aproximar do “Centro do mundo”. Os pastores exercem a função de criar no templo uma
sacralidade perceptível aos fiéis. Por isso, vemos na catedral inúmeros testemunhos de fé, pois
estes alimentam o discurso dos dirigentes e reforçam a sacralidade do espaço.
A sacralidade perceptível por nós proposta embasa-se no entendimento de
percepção a partir da experiência. A experiência proporciona o contato entre o sujeito e o
templo, em que o primeiro passa a perceber o segundo no momento em que o vive. Isso
ocorre porque perceber “é ver jorrar de uma constelação de dados um sentido imanente sem o
qual nenhum apelo às recordações seria possível.” (MERLEAU-PONTY, 2011, p. 47). Ou
seja, esse sentido imanente é projetado pela organização do templo por meio do discurso
atribuído à igreja para que os fiéis o experimentem no momento que adentram ao templo.
Concordamos, no aspecto administrativo, com Gil Filho (2008) sobre o discurso
religioso. O autor diz que “o líder religioso personifica o poder pleno de enunciar em nome da
instituição, pois ele é a própria instituição quando fala. Há por assim dizer, um poder fora da
palavra que rege o argumento e nos faz conhecer a performática do discurso.” (GIL FILHO,
2008, p. 86). Assim, o discurso se volta não somente às palavras proferidas, mas ao cenário
composto para aceitação de tal discurso.
128
Neste caso, a IURD-TCF se posiciona como um local estruturado e acessível para
todos, transformando este fator espacial num discurso fundador que enlaça àqueles que se
sentem fragilizados socialmente. Assim, o próprio templo é um discurso materializado e
administrativamente preparado para tal fim. Isso acarreta um fluxo intenso de novos
potenciais fiéis, bem como a permanência daqueles que já foram assistidos.
A isto se somam as atividades midiáticas. A IURD-TCF assumiu a postura de
utilizar recursos midiáticos para chamar a atenção dos fiéis. É uma postura adotada em todas
as catedrais da IURD pelo Brasil, aproveitando das mídias coletivas e locais. De maneira
geral, podemos dizer que “a Igreja Universal se constituiu como movimento religioso num
contexto de globalização, que tornou possível o emprego da propaganda, publicidade e
marketing religioso em seu processo de expansão.” (CAMPOS, 1997, p. 244). Esse contexto
de globalização provocou que as instituições, sejam religiosas ou de outra natureza,
estimulem aos potenciais “clientes” a preferência por seus serviços.
Dentre os recursos mais utilizados temos a mídia impressa, a radiofônica e a
televisiva, sendo esta última o grande “carro chefe” na produção midiática da igreja. No caso
do nosso empírico, dissemina as tiragens do jornal Folha Universal para todas as igrejas filiais
do Ceará. Observamos isso em campo quando vimos exemplares sendo empilhados para
transportá-los a outras cidades (Figura 15). Visualizamos várias cidades do estado como
destino e quantidades variadas, mostrando ser algo bem organizado e planejado. Geralmente,
esses jornais são distribuídos nos templos, ao final das reuniões, como forma de promover a
igreja. Os pastores incentivam os membros a passarem aos familiares e/ou vizinhos como
forma de evangelização.
129
Figura 15 – Remessa do Jornal Folha Universal em frente à IURD-TCF.
Fonte: SANTOS FILHO, 2016.
Além da forma impressa, a IURD-TCF tem uma emissora de rádio filiada à Rede
Aleluia. Em Fortaleza, é transmitida nas sintonias 99,9 FM e 460 AM, com conteúdos
voltados à catedral fortalezense, juntamente com a programação nacional. Geralmente,
apresentam orações e testemunhos de fé, igualmente com o que ocorre na televisão.
A mídia televisiva é talvez a que mais chame a atenção, no que se refere à IURD-
TCF, pois, além da programação vinculada ao Brasil inteiro, tem programas exclusivos para o
estado cearense, sobretudo na capital. Além da emissora da própria igreja, a IURD aluga
horários em outras emissoras. Temos como exemplo o horário de 12h00min de segunda a
sexta-feira na Rede TV. Nesse horário começa a programação da IURD-TCF, mostrando
vários testemunhos de fé ocorridos nas reuniões principais do templo maior de Fortaleza. São
praticamente três horas de programa. O programa geralmente é apresentado pelo bispo
Odivan Pagnocelli, que faz as orações ao vivo. Já os testemunhos são todos editados,
geralmente selecionando os dias da semana, isto é, caso o programa seja transmitido na
segunda-feira mostram os testemunhos ocorridos durante segundas-feiras anteriores e assim
por diante.
Na emissora da IURD, a programação destinada à IURD-TCF ocorre diariamente,
durante dez minutos, dentro de um dos programas locais. Este programa se chama Nosso
Tempo e também é ministrado pelo bispo Odivan Pagnocelli (Figura 16). Igualmente, faz uma
oração, convidando as pessoas a colocarem um copo com água perto do televisor para, após a
oração, beberem a água. Apesar de curta duração, o programa é bem relevante para o público,
130
pois está inserido num dos programas de maior audiência no Ceará, proporcionando uma
maior visibilidade da igreja ao público cearense.
Figura 16 – Exibição do programa Nosso Tempo, da IURD-TCF.
Fonte: Vigília do meio-dia. NOSSO TEMPO. Fortaleza: TV Cidade, 04/02/2016. Programa
religioso.
Em ambas as emissoras, podemos ver, durante os programas exibidos, os
endereços dos templos em Fortaleza e cidades do interior. Na foto acima, a referência é ao
próprio templo central, mas, durante os testemunhos, alternam os endereços para outros
templos. Contudo, como sede estadual, obviamente as atenções se destinam a principal.
É bem evidente que a função das mídias descritas é levar a pessoa a um contato
com o templo. “A IURD tem conseguido apresentar sua programação religiosa do rádio e
televisão de forma a preparar e incentivar novos interessados a irem às suas reuniões.”
(BLEDSOE, 2012, p. 103). Neste caso, os testemunhos ocorridos espacialmente no templo,
viram propaganda para novos interessados. Ou seja, a IURD-TCF convoca os fortalezenses a
suprirem suas carências espirituais e sociais no templo, mostrando que outros já adquiriram
“vitórias”.
Essa ideia é referente a uma produção de demanda pelo específico serviço.
Baudrillard (1985, p. 16) diz que “Hoje é preciso produzir os consumidores, é preciso
produzir a própria demanda e essa produção é infinitamente mais custosa do que a das
mercadorias.” Isso explica o motivo que a IURD-TCF paga para transmitir sua programação
em uma emissora diferente da Rede Record. Esta estimula as pessoas a irem à catedral,
131
aproveitando a carência de serviços prestada a alguns grupos da sociedade, conforme afirma
Campos (1997, p. 293): “as técnicas publicitárias dominam as relações da Igreja Universal,
produtora de bens simbólicos e serviços religiosos, com um público carente de tais bens e
serviços.”. Desse modo, sua eficácia é notória e relevante para a instituição.
Mesmo sendo de elevado custo para a igreja vale à pena difundir seus serviços
televisivamente, além se ser usado como discurso para colaboração dos fiéis. Segundo
Mariano (2012, p.46-47) “a presença dos fiéis nos templos é crucial para que a denominação
possa ampliar o número de dizimistas e ofertantes e, com isso, financiar novos programas e
projetos evangelísticos e, se possível, comprar emissoras de rádio e TV.”. Desse modo, o fiel
se sente participante da consolidação da igreja e percebe que suas ofertas financeiras têm bom
uso, pois retorna aos próprios fiéis.
Mas, além das mídias eletrônicas, a IURD-TCF tem com o templo uma forma de
expor midiaticamente sua consolidação e poder. O templo, apesar de estático, revela uma
atividade midiática, pois anuncia uma grandeza eminente da instituição, em que o fiel percebe
como poder divino, atuando de forma visível e invisível. Visível pela capacidade de todos
visualizarem o crescimento da IURD, e invisível pela atuação espiritual que lá dentro ocorre,
uma vez que a simbologia criada pela Universal abrange serviços já conhecidos pelos crentes
e não crentes na igreja, de modo que o próprio templo remete a um conjunto de ações, ou seja,
o templo em si já é um símbolo.
Também podemos afirmar o templo como uma atividade midiática, devido ao
conceito de monumentalidade. As formas são projetadas de maneira que chame a atenção do
fiel. “A monumentalidade é tudo aquilo que o monumento transmite, não apenas como objeto
material, mas também pelos valores e mensagens que comunica.” (SOARES, 2013, p. 78).
Logo, a monumentalidade da IURD-TCF não é estática, por isso podemos incluí-la numa
atividade midiática.
Ressaltando que a materialidade do templo é associada à simbologia que
representa. Quando os entrevistados falam do conforto do templo e sua beleza, obviamente
são advindos de uma estrutura material pujante aos olhos de quem vê, contudo a ligação
perceptiva que o fiel faz do templo e as características citadas fazem parte da força espiritual
emitida através dos rituais ali praticados. Gomes (2011) ao relatar sua experiência de
investigação na catedral carioca da IURD, também percebeu essa ligação que os fiéis
associam entre a forma e o poder. Ela diz que “em entrevistas, observou-se que seus membros
compartilhavam dessa mesma visão, destacando suas características de beleza, grandiosidade,
132
conforto, lugar de paz e com um grande poder.” (GOMES, 2011, p. 165-166). De modo, o
templo também se torna uma referência como local de adoração.
Deste modo, as atividades exercidas pela IURD-TCF atuam em três frentes: as
atividades religiosas, administrativas e midiáticas, formando uma centralidade religiosa da
IURD. Estas são praticadas em conjunto e são exercidas pelas atuações de bispo, pastores,
obreiros e membros, cujo discurso é dominado pelos eclesiásticos e aos membros cabe a
atuação receptiva, que, neste caso, é a percepção de um “poder maior” existente na catedral e
nos ministros religiosos nela presentes. Assim, a IURD-TCF assume um papel distinto das
demais igrejas da cidade e do estado.
A IURD-TCF é uma centralidade simbólica religiosa para os membros da
instituição. Não somente pelo tamanho do templo, mas pela presença de serviços religiosos
exclusivos ou de maior constância e representatividade. Essa centralidade é representada pela
forma simbólica espacial do templo, de modo que associa o templo a uma representação da
habitação de Deus, objetivada em serviços prestados pelos dirigentes da igreja, derivados de
um modelo de pensamento neopentecostal.
Outro aspecto que faz da IURD-TCF uma centralidade simbólica é sua
localização. A acessibilidade à catedral é diversificada, pois utiliza a centralidade econômica
exercida pelo centro de Fortaleza para captar os fiéis. Neste caso, as vias de acesso para o
centro facilitam o deslocamento dos fiéis para o templo maior da IURD em Fortaleza,
tornando-o um ponto de encontro e referência locacional. É o que Corrêa (2007, p. 9) sinaliza
ao falar do aspecto relacional das formas simbólicas espaciais, pois afirma que “as formas
simbólicas, por outro lado têm uma localização relativa, associada à visibilidade, mas,
sobretudo, à acessibilidade face toda a cidade ou espaço regional ou nacional.”. Por isso, a
IURD-TCF é uma forma simbólica espacial relativa à centralidade urbana de Fortaleza.
De igual modo, podemos caracterizar essa centralidade simbólica pelos
geossímbolos presentes na igreja. Mediante as entrevistas realizadas in loco inferimos que,
para os iurdianos, o templo, o altar e o bispo/pastores são geossímbolos peculiares que
remetem à IURD-TCF uma centralidade simbólica, pois quando o fiel sente a necessidade de
buscar “algo mais forte”, não se ampara nas filiais, mas identifica na catedral o lugar para
solucionar seus problemas. Mesmo o ensino, ritos e princípios doutrinários padronizados
entre as IURD, o fiel associa o poder da igreja aos geossímbolos supracitados, algo inerente à
catedral.
133
Portanto, a IURD-TCF é uma centralidade espacial, composta por elementos
geossímbólicos que ligam a experiência do fiel ao sagrado. O sagrado constitui-se como uma
rede de serviços criados cujos fiéis têm acesso mediante a frequência ao templo. O profano é
um elo de preparação ao sagrado, o fiel associa os elementos profanos às mazelas sociais,
logo o sagrado são as peculiaridades socialmente positivas, mas à escolha de quem busca.
Somente em um lugar onde o sagrado se manifeste é permitido o acesso do fiel, por isso busca
no discurso e nos testemunhos propagados pela catedral, um contato com o transcendente, que
neste caso, não é o contato direto com o divino, mas com as benesses que pode oferecer.
As entrevistas sinalizaram que o entendimento do sagrado para um iurdiano é
distinto do entendimento religioso tradicional, pois é inserido de elementos secularizantes que
moldam o pensamento neopentecostal. Neste contexto, o sagrado é aquilo que se pode
perceber, ou seja, que seja apresentável à sua experiência e assimilado pela mediação
corporal, gerando um sentimento religioso espontâneo, objetivado em ações ritualísticas que
revivem os feitos de Deus ao povo judeu e cristão.
As entrevistas também apontaram que os geossímbolos são importantes na
percepção dos fiéis, pois pelos geossímbolos os pontos de contato recebidos dos pastores
adquirem uma eficácia sobrenatural para os desejos de seus membros. Os objetos despertam a
fé, mas é o lugar sagrado que lhes propicia o poder necessário para que essa fé seja atuante.
Os pontos de contato não teriam sustentação teológica se não estivessem ligados aos
geossímbolos.
A IURD-TCF é um centro de eventos, uma espacialidade multifuncional de
âmbito religioso. Funciona como um local de refúgio psicológico e ambiente confortador.
Além disso, seus atributos religiosos remetem uma forma simbólica com distintos atributos.
Elencamos esses atributos em: Praça espiritual = Encontro com a manifestação do sagrado;
Fórum = local de reivindicação para as mazelas sociais; Divã = Atendimento para expressão
dos sentimentos; Escola = aprendizagem para satisfação social; Clínica = cura para males;
Mercado = negociação do sagrado por meio da troca simbólica. Ou seja, o espaço sagrado da
IURD-TCF é para o fiel um centro de conveniência simbólico, sendo o sagrado o sentimento
religioso de resposta aos ritos lá praticados coletiva e/ou individualmente.
134
6 CONSIDERAÇÕES FINAIS
A presente dissertação buscou interpretar um templo religioso a partir das formas
simbólicas espaciais existentes. Escolhemos como recorte empírico a Igreja Universal do
Reino de Deus – Templo Central de Fortaleza. Por este recorte fizemos uma aproximação
entre Geografia e religião, tendo como perspectiva uma valorização do significado expresso
pelas percepções dos fiéis com o templo. Partimos do pressuposto de que a espacialização de
uma determinada prática religiosa dimensiona uma ação intuitiva do ser humano através do
sentimento e do pensamento religioso.
Foi contemplada uma análise da estrutura socioespacial do templo central da
IURD em Fortaleza enquanto um espaço sagrado. Buscamos entender como o templo se
apresenta e influencia a vivência dos fiéis. Partimos da compreensão das formas simbólicas
espaciais da igreja como um conjunto de formas resultantes da significação criadas e seguidas
pelo grupo que o frequenta.
Assim, ao consideramos a relação entre Geografia e religião no contexto de uma
relação simbólica, buscamos compreender as manifestações que ocorreram em um espaço
sagrado dentro de dimensões estruturantes com uma perspectiva fenomenológica. Partimos do
pressuposto, vislumbrando o espaço da religião, em que as expressões e percepções dos fiéis
participantes da IURD-TCF são marcadas por relações simbólicas que envolveram as
incertezas, inclusive a existencial, vividas por uma sociedade com características pós-
moderna. O retorno ao sagrado é vivido como resposta e motivo de busca das pessoas que
vivem uma religião.
Para isto, buscamos distinguir as atividades religiosas, administrativas e
midiáticas existentes no espaço sagrado da IURD-TCF, bem como identificar os elementos
geossimbólicos transformadores e entender as formas simbólicas espaciais entre as práticas do
templo e a formação de uma centralidade simbólica.
Chegamos nestas ideias por meio de um esteio teórico-metodológico que nos
ajudasse a compreender o espaço sagrado, as formas simbólicas espaciais e a religião, no
contexto de uma segmentação neopentecostal. Para assimilação deste aporte fundamentamos
nosso entendimento nos pressupostos da fenomenologia da percepção e no corpo como
elemento geográfico mediador entre ser e objeto.
Metodologicamente, além da fundamentação teórica, realizamos pesquisa em
campo de maneira a vivenciar e observar as práticas na IURD-TCF. Realizamos entrevistas
para captar as essências percebidas pelos fiéis ao viverem o espaço sagrado da catedral de
135
Fortaleza. Destas informações, extraímos impressões sobre o sagrado vivido no templo.
Percebemos que a religião vivida no templo maior da IURD de Fortaleza se baseia numa
vivência com características pós-moderna do sagrado. Essas características são expressas pela
liquidez das relações sociais, em que há formação de um “coquetel religioso”. “O homem
hiper-moderno vive a religião ‘à la carte’, de tipo ‘self-service’, numa mistura de vários
aspectos que mais interessam e satisfazem as exigências e necessidades momentâneas.”
(MELQUIOR, 2009, p. 5). Constatamos isto pelas vezes que os entrevistados afirmaram se
afastarem por períodos dos rituais e retornarem após algum tempo.
O sagrado é uma transcendência que move as preferências dos fiéis para um modo
de vida ideal, baseado na individualidade, cabendo à instituição o suprimento dos desejos a
partir de serviços promotores de bens simbólicos administrados pelos organizadores do
templo.
Como resultante da análise bibliográfica, observações e participação dos
entrevistados, elencamos possibilidades de interpretação do sagrado, representado pela IURD-
TCF. Portanto, consideramos a importância dos significados, construído mediante a vivência
dos sujeitos e suas percepções de mundo, direcionando comportamentos que auxiliam na
compreensão espacial por meio da forma, processo e significado.
A religião como outros aspectos culturais se baseia na vivência das relações,
sendo as formas simbólicas espaciais o meio interativo da captação da realidade. As formas
simbólicas são resultantes de um sistema de representação de base construtivista por reflexo
dos significados organizados pelo grupo. Assim, o sagrado, o fato social e a forma de ver o
mundo são espacializados a partir da heterogeneidade e da centralidade remetida a um espaço
por meio de hierofanias criadas e resultantes das relações perceptivas entre homem e a terra.
O espaço sagrado é um lugar delimitado, ou não, pela manifestação do sagrado.
Os templos são espaços sagrados constituídos, pois, além de ser vivido pela materialidade das
formas, são compostos por práticas religiosas que o legitimam como local onde o sagrado
acontece. Assim, se materializa pela manifestação da religião adotada pelo grupo. A religião
como fato social é um sistema de crenças e ritos que se materializam em comum acordo em
um local cuja vivência faz o fiel experenciar o sagrado.
No nosso trabalho, caracterizamos o objeto como um espaço sagrado manifestado
resultante do fato social religioso. Esta vivência ocorre espacialmente, em que a relação
homem e natureza é marcada pelo caráter simbólico religioso existente na relação fiel e igreja.
A IURD-TCF é uma representante da manifestação do sagrado, pois assume em suas formas
136
significados que potencializam a função que assume. Estes significados, expressos pelas
formas simbólicas espaciais, como o próprio templo, conduzem aos sujeitos percepções que
se identificam e direcionam um comportamento distinto.
A IURD-TCF expressa símbolos que são polissêmicos ao gosto dos fiéis. Para
cada necessidade pessoal, o templo articula um significado novo, gerando símbolos prestados
para atendê-los. Conforme o fiel busca uma necessidade pessoal específica, remete ao templo
procurando um elemento simbólico próximo de sua busca. Se o problema for financeiro,
procura símbolos nos quais o levem a acreditar que prosperará. Se for um problema de saúde,
adquire um produto simbólico no qual ele crê levar à cura. Ou seja, os símbolos vão se
moldando de maneira variada ao que o fiel quer alcançar.
Podemos inferir que a IURD-TCF é um espaço vivido pela experiência corporal
dos fiéis, pois a presença física é um componente relevante que o leva a “sentir” a presença
divina, de modo que a percepção comum promove o entendimento coletivo do templo como
um geossímbolo. O corpo percebe e o sujeito interage com o mundo a sua volta. O templo é
parte desse mundo e lócus de uma realidade intrínseca, permitindo aos fiéis compreenderem
o mundo onde vivem. O geossímbolo atua no sentido de lhes dar uma identidade, percebida
como real para cada um, formando uma cultura que tem no sagrado sua representação
máxima da realidade.
A IURD-TCF conforme seu espaço é um conjunto de simbólicos atuante na
perpetuação de uma realidade expressa por símbolos materiais (objetos usados nos cultos
que firmam a ação de Deus e dos fiéis nas trocas simbólicas) e não-materiais (discurso dos
pastores, fluxo das pessoas, como prática de fé, campanhas realizadas pelos fiéis,
associações entre membros, testemunhos e rituais), conduzindo uma experiência espacial
diferente da proporcionada pelo espaço profano.
O espaço sagrado é essencial para a propagação da teologia iurdiana e,
consequentemente, para difusão da igreja. A necessidade de ir ao espaço sagrado é manifesta
por meio dos sacrifícios e posturas exercidas pelos frequentadores.
Considerando o espaço sagrado como percepção das formas simbólicas espaciais
materializadas em geossímbolos presentes na IURD-TCF, chegamos a considerações
importantes sobre este espaço composta por três frentes atuantes: as atividades religiosas,
administrativas e midiáticas. Concordamos com Oliveira (2012) quando se refere a vetores
simbólicos para explicar o ato religioso, em especial o vetor midiático-ecossistêmico. Por este
137
vetor, a imaginação dos sujeitos é promovida pela experiência, cujos símbolos se revelam nas
relações entre sujeitos e lugar simbólico. Nas palavras de Oliveira (2011, p. 101)
O “patrimônio” do vetor mediático é cria legítima da imaginação; ele precisa sim
absorver as práticas institucionais do planejamento, advindas de uma cidadania (tão
estatal quanto eclesial), mas não pode ignorar a inversão dos processos de
valorização. Estes cada vez menos dependentes da materialidade orgânica dos
monumentos (naturais ou culturais) são cada vez mais associados ao culto mediático
dos espetáculos.
Assim, relacionamos ao lugar esta dinâmica e identificamos os elementos que nos
ajudaram a compreender como o espaço sagrado da IURD-TCF possui uma articulação
vetorial com as formas simbólicas. Neste caso, as atuações da classe sacerdotal da instituição
promovem aos membros um ambiente favorável para prática religiosa e percepção de um
“poder maior” existente na catedral e nos ministros religiosos nela presentes, assumindo,
assim, um papel particular na expressão do sagrado.
As atividades religiosas consistem no conjunto de crenças e regras constantes no
neopentecostalismo, ou seja, a guerra contra o diabo, teologia da prosperidade e maior
liberdade de conduta para os membros. O espaço sagrado neste contexto assume um lugar de
serviços religiosos capaz de trazer satisfação, conforto, atenção e motivação para eventuais
problemas de ordem sentimental, relacional, profissional ou financeira. Além de atribuir ao
espaço um poder maior, consolidado e identificado com o sagrado manifesto no templo, que
outras instituições sociais não são capazes de suprir. Neste caso, o principal geossímbolo que
representa essas atividades religiosas é o altar.
Com relação às atividades administrativas que se orientam a partir da organização,
hierarquização e preparação para fé, percebemos que sua organização é centralizada, focando
nos líderes as decisões da promoção do sagrado na igreja. A partir do entendimento de que o
bispo é um missionário de Deus, ele é percebido como um geossímbolo destas atividades,
pois se apresenta somente na catedral, promovendo uma associação do templo ao poder
episcopal. Por sua vez, ministra os serviços e adéqua os rituais ao gosto dos fiéis por meio de
campanhas e correntes no espaço sagrado da IURD-TCF. O bispo torna-se uma representação
da presença de Deus mediante o poder simbólico instituído e promovido.
As atividades midiáticas também aparecem na IURD-TCF. Ela é promotora de um
discurso que irradia o sagrado em suas liturgias. Por meio de um aparato midiático, transporta
ao frequentador uma monumentalidade percebida pelo fiel como autenticidade da
manifestação divina. Neste caso, o próprio templo se configura como um geossímbolo, pois
138
suas formas simbólicas espaciais remetem ao fiel uma consolidação e crescimento da
instituição que se identifica. Ele se sente atuante na medida em que participa e se projeta
como um colaborador do crescimento da igreja. Assim, as atividades midiáticas são vividas
pelos fiéis durante suas visitas ao templo e na sua representação fora dele, quando está no
espaço profano.
Deste modo, altar e templo são geossímbolos que tornam a IURD-TCF um espaço
sagrado. O numinoso se apresenta nestes geossímbolos, uma vez que para o fiel o sentimento
de acolhimento, zelo e atenção o preenche quando vai à “casa de Deus” ouvir o que “Deus
tem a dizer” no local em que se apresenta. Por meio do irracional, se vê amparado para suas
necessidades reais, identificando-se com a catedral.
A relação dos fiéis com estes geossímbolos fazem da IURD-TCF uma
centralidade simbólica. Por mais que existam outros templos da IURD em Fortaleza, esta
centraliza as ações da instituição, portando-se como fonte irradiadora do sagrado através de
sua administração e hierarquia. Além de estar localizada junto a outras centralidades urbanas
existentes. É, pois, uma centralidade religiosa aos fiéis, pois tem acesso facilitado e melhores
serviços religiosos a oferecer, além de ser um espaço reconfortante, por meio da infraestrutura
e pronto atendimento.
A centralidade religiosa da IURD-TCF traz aos fiéis um entendimento
representativo do templo como um centro de eventos, uma espacialidade multifuncional para
a prática do sagrado, atuando em diferentes direcionamentos funcionais. Suas funcionalidades
atuam simbolicamente pelos rituais, em que os fiéis percebem os serviços como
manifestações divinas em suas vidas, pois os fortalecem e os acolhem, assumindo um local de
refúgio psicológico e um ambiente confortador.
Dentre as funcionalidades representadas pela IURD-TCF, há o lugar de convívio.
Ou seja, é um local de encontro entre os fiéis. Apesar de ser um espaço edificado não público,
a facilidade de acesso é deliberada de modo que qualquer pessoa, com vínculo ou não, pode
nele se apresentar. É um espaço de convívio, apesar da individualidade existente no
comportamento dos fiéis. Eles entram e saem, muitas vezes, sem se comunicar com os fiéis
próximos, mas acordam nos procedimentos e ideias expostas no lugar.
Outra função representativa do templo maior de Fortaleza é o tribunal como local
de reivindicação de justiça para as mazelas sociais. Para percepção dos fiéis é o lugar onde se
realizam audiências e se fazem os julgamentos. O sentido aqui é de que o templo é o local
onde os fiéis podem fazer suas queixas pessoais para que o juiz (neste caso, Deus) os escute e
139
tome providências. Também é o local onde se julga o mal (figurados no Diabo e demônios),
cujo julgamento divino ocorre por meio da expulsão dos maus espíritos da vida das pessoas,
resultando em melhoras sociais para elas.
Alguns se utilizam do templo para relatar “males” no cotidiano, usando a catedral
iurdiana fortalezense como um Divã. Assim como o mobiliário na clínica psiquiátrica é usado
como meio de um paciente para relaxar e contar suas angústias e dificuldades religiosas que
perpassam também as sociais, é um local apropriado para expressão dos sentimentos, cujo
pastor ou bispo assume a função de psicólogos para a área espiritual.
Outros buscam o templo central da IURD com uma escola. A aprendizagem para
satisfação social, nos quais os fiéis não vão somente conhecer os dogmas da igreja, mas,
sobretudo, aprender lições para a vida cotidiana, seja na área financeira, amorosa e/ou
comportamental. São lições para a vida profana, articuladas ao sagrado.
Ainda tem como funcionalidade a busca pela saúde física, pois a IURD-TCF
também é percebida como um local de cura. É muito comum ver testemunhos de cura das
mais variadas doenças, desde uma dor de cabeça até tumores no corpo. Sem passar pela
medicina tradicional, o ambiente sagrado traz ao indivíduo um sentimento de estar curado,
seja comprovado pela ciência ou não.
Dentre as variadas funções aqui já mencionadas, cabe ainda a de mercado. A
IURD-TCF é um lugar de negociação do sagrado por meio das trocas simbólicas. Na
concepção neopentecostal assumida pela IURD Deus está disposto a fornecer seus serviços
por meio da barganha simbólica, materializada pelo dinheiro (dízimos, ofertas, campanhas e
correntes) ou não materializadas por meio do sacrifício (deslocamento ao templo,
evangelização, testemunhos de fé, abandono de certos hábitos). Estas trocas são
recompensadas mediante o afinco e disponibilidade de “pagar” por elas. Se paga muito,
recebe muito, contudo sem a obrigatoriedade de pagar, isentando também o divino de
retribuir. É o negócio da fé, entendido aqui, não como ato charlatanesco, mas uma troca
simbólica assumida na relação percebida entre fiel e o transcendente.
Portanto, o espaço sagrado da IURD-TCF é para o fiel um centro de conveniência
simbólico, sendo o sagrado o sentimento religioso de resposta aos ritos lá praticados coletiva
e/ou individualmente, compostos por várias funcionalidades simbólicas que remetem a
objetividades sociais na vida dos próprios fiéis. Estas funcionalidades são condições sociais
não satisfatoriamente providos pelo poder público ou econômico, causando uma busca por
parte dos indivíduos.
140
Contudo, o tempo que tivemos para realizar nossa dissertação, ficamos com
questionamentos para pesquisas futuras, no aguardo de novas discussões que complementem
o que foi pesquisado. Podemos elencar aqui algumas delas: Qual a importância do centro
econômico da cidade para os dirigentes da instituição? O que eles pensam sobre os múltiplos
territórios religiosos ocupados pela IURD no Ceará? Como ocorre a rede espacial entre
templo central e filial da IURD? Quais são as similaridades entre as territorialidades da IURD,
dos terreiros de candomblé e Igreja Católica em Fortaleza? Como reconhecer a presente
vigilância/monitoramento das pessoas nas dependências? Quais as possíveis barreiras
encontradas na difusão espacial, em Fortaleza, da vivência dos adeptos da IURD?
141
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149
APÊNDICE A – Entrevista realizada com os fiéis da IURD-TCF.
Esta entrevista é sobre opinião individual, portanto não há respostas corretas e
incorretas.
Data: _____/_____/_______ Idade: _________ Sexo: M ( ) F ( )
Bairro em que mora: _________________________________________________
Grau de escolaridade:
( ) Ensino Fundamental incompleto. ( ) Ensino Fundamental completo.
( ) Ensino Médio incompleto. ( ) Ensino Médio completo.
( ) Ensino Superior incompleto. ( ) Ensino Superior completo.
01. Você frequenta a catedral/igreja do seu bairro? Sim ( ) Não ( )
02. Quantas vezes por semana você vem/vai à catedral?
___________________________________________________________________________
03. Você prefere vir/ir à catedral ou ir/vir na igreja do bairro? Por quê?
___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
04. Qual é o dia da semana que você prefere visitar à catedral/à igreja do bairro?
___________________________________________________________________________
05. Em sua opinião, quais ítens (alguma pessoa, algum espaço, algum objeto) que você
considera mais sagrado na igreja?
___________________________________________________________________________
06. Por que você considera esse lugar como mais sagrado?
___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
07. Como um lugar se torna sagrado?
___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
08. O que você procura quando vem à catedral/igreja?
___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
09. Quando você vem à catedral, aproveita pra fazer algo mais no Centro?
Sim ( ) Não ( )
10. Que atividades realizadas pela igreja que você gosta ou participa?
150
___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
11. O púlpito da igreja se destaca, por se localizar alguns degraus acima do nível restante da
igreja. Na sua opinião, por que acontece isso?
( ) Melhora da visibilidade do pregador. ( ) O púlpito é o lugar mais sagrado.
( ) Outro motivo. Qual?
___________________________________________________________________________
12. O que representa a IURD pra você?
___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
13. O que mais lhe chama atenção neste lugar?
___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
14. Qual a vantagem que a catedral tem em relação à igreja local?
___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________