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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE FEIRA DE SANTANA DEPARTAMENTO DE CIÊNCIAS HUMANAS E FILOSOFIA PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM PLANEJAMENTO TERRITORIAL (PLANTERR) MESTRADO PROFISSIONAL MARIA VALDELICE VIEIRA SANTOS É PRECISO SABER CONVIVER: O PROJETO UM MILHÃO DE CISTERNAS NA COMUNIDADE RURAL VARGEM EM FEIRA DE SANTANA-BA FEIRA DE SANTANA 2016

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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE FEIRA DE SANTANA

DEPARTAMENTO DE CIÊNCIAS HUMANAS E FILOSOFIA PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM PLANEJAMENTO TERRITORIAL

(PLANTERR) – MESTRADO PROFISSIONAL

MARIA VALDELICE VIEIRA SANTOS

É PRECISO SABER CONVIVER: O PROJETO UM MILHÃO

DE CISTERNAS NA COMUNIDADE RURAL VARGEM EM

FEIRA DE SANTANA-BA

FEIRA DE SANTANA

2016

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MARIA VALDELICE VIEIRA SANTOS

É PRECISO SABER CONVIVER: O PROJETO UM MILHÃO

DE CISTERNAS NA COMUNIDADE RURAL VARGEM EM

FEIRA DE SANTANA-BA

Trabalho apresentado ao Programa de Pós-Graduação em Planejamento Territorial, do Departamento de Ciências Humanas e Filosofia da Universidade Estadual de Feira de Santana, como requisito para obtenção do grau de Mestre em Planejamento Territorial, linha de pesquisa: Planejamento territorial e geoprocessamento.

BANCA EXAMINADORA

____________________________________________________ Orientadora: Profª Drª Nacelice Freitas

Universidade Estadual de Feira de Santana- UEFS Feira de Santana-BA

_____________________________________________________

Banca: Profª Drª Sandra Medeiros Santo Universidade Estadual de Feira de Santana- UEFS

Feira de Santana-BA

______________________________________________________ Banca: Banca: Profª Drª Tatiana Velloso

Universidade Federal do Reconcâvo da Bahia-UFRB Cruz das Almas-BA

FEIRA DE SANTANA 2011

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LISTA DE ABREVIATURAS

ADENE Agência do Desenvolvimento do Nordeste

ANA Agência Nacional de Águas

ASA Articulação do Semiárido Brasileiro

BNB Banco do Nordeste do Brasil

BSC Bancos de Sementes Comunitários

CDT Comitê de Desenvolvimento Territorial

CETEP Centro Territorial de Educação Profissional do Portal do

Sertão

CHESF Companhia Hidroelétrica do São Francisco

CNAPO Comissão Nacional de Agroecologia e Produção Orgânica

CNES Conselho Nacional de Economia Solidária

CODENO Conselho de Desenvolvimento Econômico do Nordeste

CONDRAF Conselho Nacional de Desenvolvimento Rural Sustentável

CONSEA Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional

CPTEC Centro de Previsão de Tempo e Estudos Climáticos

CVSF Conselho do Vale do rio São Francisco

DNOCS Departamento Nacional de Obras Contra as Secas

EMBASA Empresa Baiana de Águas e Saneamento S.A.

EnconASA Encontro Nacional da ASA

FBSAN Fórum Brasileiro de Segurança Alimentar e Nutricional

FNE Fundo Constitucional do Nordeste

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GPS Global Positioning System

GTDN Grupo de trabalho para o desenvolvimento do Nordeste

GTEs Grupos de Trabalho Estaduais

IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística

IDH Índice de Desenvolvimento Humano

IFOCS Inspetoria Federal de Obras Contra as Secas

IOCS Instituto de Obras Contra as Secas

MDS Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome

MESA Ministério Extraordinário de Segurança Alimentar e de

Combate à Fome

MI Ministério da Integração Nacional

MINTER Ministério do Interior

MMA Ministério do Meio Ambiente

MOC Movimento de Organização Comunitária

ONG Organizações Não Governamentais

OSCIP Organização da Sociedade Civil de Interesse Público

OSCs Organizações da Sociedade Civil

P1MC Programa de Formação e Mobilização Social para a

Convivência com o Semiárido: Um Milhão de Cisternas

Rurais

PAA Programa de Aquisição de Alimentos

PATAC Programa de Aplicação de Tecnologias Apropriadas às

Comunidades

PDHC Projeto Dom Hélder Câmara

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PEFP Programa Emergencial de Frentes Produtivas

PFCES Programa Federal de Combate aos Efeitos da Seca

PFPT Programa de Frentes Produtivas de Trabalho

PIN Programa de Integração Nacional

PROTERRA

Programa de Redistribuição de Terras e Estímulo à

Agroindústria do Norte e Nordeste

SAB Semiárido Brasileiro

SIGA Sistema Integrado de Gestão e Auditoria

STR Sindicato dos Trabaladores Rurais de Feira de Santana

SUDENE Superintendência do Desenvolvimento do Nordeste

SUVALE Superintendência do Vale do São Francisco

UEFS Universidade Estadual de Feira de Santana

UELs Unidades Executoras Locais

UGC Unidade Gestora Central

UGMs Unidades Gestoras Microrregionais

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RESUMO A presente pesquisa se construiu a partir da hipótese de que o Programa Um

Milhão de Cisternas (P1MC) promove uma transformação social através do fortalecimento da sociedade civil, diminuição da dependência de medidas paliativas do poder público e de favores dos latifundiários, capacitando ainda famílias sertanejas para a convivência com o semiárido. Para verificar essa hipótese selecionou-se a comunidade rural Vargem, situada no Município de Feira de Santana-BA, no intuito de realizar um estudo de caso. Assim, buscou-se analisar na referida comunidade os impactos sociais e os processos de seleção e capacitação promovidos pelo P1MC. Entretanto, antes da pesquisa de campo, buscou-se realizar a caracterização do espaço geográfico de ocorrência da seca no Brasil, refletir sobre as principais políticas públicas que antecederam o P1MC e descrever como se constituiu a Articulação do Semiárido (ASA) e de que forma o P1MC foi elaborado, observando-se a estruturação das propostas para o Semiárido brasileiro. A pesquisa se justifica pela necessidade de se analisar os impactos sociais promovidos pelo P1MC sobre a vida das famílias rurais do Semiárido após a transferência dessa tecnologia social por colaborar para avaliação dessa Política Pública. Como procedimentos metodológicos foram usados pesquisa bibliográfica e documental, aplicação de questionário e estudo de caso. Ao final do texto, conclui-se que apesar da resistência apresentada por uma parte das famílias beneficiadas em beber a água pluvial e das adversidades que ocorreram para o fidedigno cumprimento dos critérios de seleção para a transferência da tecnologia, constatou-se que a tecnologia foi destinada a quem dela precisava, não havendo desvio de objetivos, ou seja, auxiliando na melhoria das condições de vida das famílias beneficiadas pelo P1MC em Vargem e promovendo uma transformação social nessa comunidade.

Palavras chaves: Água; P1MC; Convivência com o Sémiarido

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ABSTRACT

This research was built on the assumption that the Program One Million Cisterns (P1MC) promotes social change through the strengthening of civil society, decreased dependence on palliative measures of government and favors the landowners, even empowering rural families for coexistence with the semiarid region. To verify this hypothesis was selected rural community Vargem, located in the municipality of Santana-BA Fair in order to conduct a case study. Thus, it sought to analyze in that community social impacts and the selection and training processes promoted by P1MC. However, before the field research, we sought to characterize the drought occurrence of geographic space in Brazil, reflect on major public policies that preceded the P1MC and describe how it was the Semi-Arid Articulation (ASA) and how P1MC was drawn up observing the structure of the proposals for the Brazilian semiarid region. The research is justified by the need to analyze the social impact promoted by P1MC on the lives of rural families in the semiarid region following the transfer of this social technology to collaborate to evaluate this public policy. As methodological procedures were used bibliographical and documentary research, questionnaire and case study. At the end of the text, it is concluded that despite resistance by some of the families benefited drinking rainwater and adversities that occurred for the reliable fulfillment of the selection criteria for the transfer of technology, it was found that the technology was destined to those who needed, with no shift in objectives, namely helping to improve the living conditions of families benefited by P1MC in Vargem and promoting social change in this community. KEYWORDS: WATER; P1MC; COEXISTENCE.

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LISTA DE GRÁFICOS

GRÁFICO 01 RENDA MENSAL DAS FAMÍLIAS DA COMUNIDADE VARGEM

90

GRÁFICO 02 BENEFICIÁRIOS PELA BOLSA FAMÍLIA 91

GRÁFICO 03 PRINCIPAL FONTE DE RENDA DA FAMÍLIA 92

GRÁFICO 04 TAMANHO DA PROPRIEDADE RURAL

94

GRÁFICO 05 SEXO DO RESPONSÁVEL PELA CISTERNA 95

GRÁFICO 06 MULHERES CHEFES DE FAMÍLIA 96

GRÁFICO 07 FAMÍLIAS CONTEMPLADAS COM O P1MC 97

GRÁFICO 08 PARTICIPAÇÃO NO CURSO DE GRH 98

GRÁFICO 09 REALIZAÇÃO DE LIMPEZA DA CISTERNA 100

GRÁFICO 10 CISTERNAS QUE APRESENTARAM DEFEITOS 101

GRÁFICO 11 INTRODUÇÃO DE ELEMENTOS NAS CISTERNAS 102

GRÁFICO 12 TRATAMENTO DA ÁGUA APÓS RETIRADA DA DA CISTERNA 103

GRÁFICO 13 MÉTODO DE RETIRADA DA ÁGUA DA CISTERNA 104

GRÁFICO 14 RECEBEM ORIENTAÇÕES POR PARTE DOS AGENTES DE SAÚDE

105

GRÁFICO 15 ORIENTAÇÕES SOBRE CUIDADOS COM AS CISTERNAS POR PARTE DE INSTITUIÇÕES NÃO LIGADAS À ASA

106

GRÁFICO 16 INFECÇÃO POR DOENÇAS RELACIONADAS À ÁGUA 107

GRÁFICO 17 CONFIANÇA NA QUALIDADE DA ÁGUA DA CISTERNA 109

GRÁFICO 18 QUALIDADE DA ÁGUA UTILIZADA ANTES DA IMPLANTAÇÃO DAS CISTERNAS 110

GRÁFICO 19 FONTE DE CAPTAÇÃO DE ÁGUA ANTERIOR AO P1MC 111

GRÁFICO 20

SUFICIÊNCIA DA ÁGUA DA CISTERNA FRENTE À ESTIAGEM

112

GRÁFICO 21 NÚMERO DE PESSOAS POR FAMÍLIA 113

GRÁFICO 22 DESTINAÇÃO DA ÁGUA DA CISTERNA 114

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GRÁFICO 23 SEGUEM A RECOMENDAÇÃO DA ASA QUANTO A UTILIZAÇÃO DA ÁGUA

115

GRÁFICO 24 ABASTECIMENTO DA CISTERNA SEM SER PELA ÁGUA DA CHUVA 116

GRÁFICO 25 AVALIAÇÃO DO P1MC POR PARTE DAS FAMÍLIAS BENEFÍCIADAS

117

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LISTA DE MAPAS

MAPA 01 LOCALIZAÇÃO DA COMUNIDADE VARGEM 12

MAPA 02 A REGIÃO NORDESTE DO BRASIL 17

MAPA 03 A REGIÃO SEMIARIDEZ DO FNE E O POLÍGONO DAS

SECAS 21

MAPA 04 DELIMITAÇÃO DO SEMIÁRIDO BRASILEIRO 22

MAPA 05 LOCALIZAÇÃO DE MARIA QUINTÉRIA NO SEMIÁRIDO

BRASILEIRO 39

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LISTA DE FOTOGRÁFIAS

FOTOGRÁFIA 1 FICHA DE IDENTIFICAÇÃO DA FAMÍLIA BENEFICIADA 69

FOTOGRÁFIA 2 CASA COM COBERTURA DE FIBRACIMENTO 93

FOTOGRÁFIA 3 BENEFICIARIOS ATUANDO COMO AJUDANTES DE PEDREIROS

99

FOTOGRÁFIA 4 CISTERNA ABERTA 108

FOTOGRÁFIA 5 RECIPIENTES DESCOBERTOS COM ÁGUA 108

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ÍNDICE

RESUMO

ABSTRACT

LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

LISTA DE GRÁFICOS

LISTA DE MAPAS

LISTA DE FOTOGRÁFIAS

1. INTRODUÇÃO ........................................................................................................ 1

1.1 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS .......................................................... 5

1.2 ÁREA DE ESTUDO ........................................................................................ 10

2. É PRECISO COMPREENDER O ESPAÇO DA SECA ........................................ 15

2.1 A REGIÃONORDESTE .................................................................................... 16

2.2 O SERTÃO DA REGIÃO NORDESTE ............................................................ 19

2.3 DELIMITAÇÃO DO SEMIÁRIDO .................................................................... 20

2.4 O DISCURSO DA SECA .................................................................................. 24

2.5 A DESCONSTRUÇÃO DO DISCURSO ........................................................... 31

3. O NORDESTE E AS DIFERENTES INTERVENÇÕES DE 1909 A 2003 ............ 35

3.1 A COMISSÃO IMPERIAL ................................................................................. 36

3.2 INSPETORIA DE OBRAS CONTRA AS SECAS (IOCS) ................................. 37

3.3 INSPETORIA FEDERAL DE OBRAS CONTRA AS SECAS ........................... 38

3.4 DEPARTAMENTO NACIONAL DE OBRAS CONTRA AS SECAS .................. 39

3.5 GRUPO DE TRABALHO PARA O DESENVOLVIMENTO DO NORDESTE ... 43

3.6 SUPERINTENDÊNCIA DO DESENVOLVIMENTO DO NORDESTE

(SUDENE) .............................................................................................................. 44

3.7 A SUDENE DURANTE O REGIME MILITAR.................................................. 47

3.8 A SUDENE APÓS A REDEMOCRATIZAÇÃO DO BRASIL ............................ 51

3.9 O RIO SÃO FRANCISCO: IMPORTÂNCIA REGIONAL ................................. 52

3.10 AS SECAS DÉCADA DE 1990 ...................................................................... 54

4. A GÊNESE DA ASA ............................................................................................ 57

4.1 A CONSOLIDAÇÃO DA A ASA E A CONSTRUÇÃO DO P1MC .................... 62

4.2 A GESTÃO DO P1MC ..................................................................................... 66

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4.3 DO P1MC AO NASCIMENTO DE UMA POLÍTICA PÚBLICA DE ACESSO A

ÁGUA NO SEMIÁRIDO ......................................................................................... 70

4.4 A ASA E O PROGRAMA DE FORMAÇÃO E MOBILIZAÇÃO SOCIAL PARA A

CONVIVÊNCIA COM O SEMIÁRIDO: UM MILHÃO DE CISTERNAS RURAIS

(P1MC) ................................................................................................................... 77

4.5 A CONSTRUÇÃO DA CISTERNA PARA CAPTAÇÃO DA ÁGUA DA CHUVA

............................................................................................................................... 82

4.6 TÉCNICA DE CONSTRUÇÃO DA TECNOLOGIA SOCIAL CISTERNA

DOMICILIAR DE PLACAS DE CIMENTO .............................................................. 83

5. ALTERNATIVA SUSTENTÁVEL DE ACESSO À ÁGUA ATRAVÉS DO P1MC:

A EXPERIÊNCIA DA COMUNIDADE RURAL VARGEM......................................... 85

5.1 DOS CRITÉRIOS DE ELEGIBILIDADE E NORMAS TÉCNICAS À

IMPLEMENTAÇÃO DO P1MC ............................................................................... 87

5.2 MANEJOS POR PARTE DAS FAMÍLIAS: ARMAZENAMENTO E

TRATAMENTO DA ÁGUA E MANUTENÇÃO DAS CISTERNAS. ......................... 99

5.3 P1MC E A DEMANDA FAMILIAR POR ÁGUA ............................................. 111

6. CONSIDERAÇÕES FINAIS ................................................................................ 119

REFERÊNCIAS ....................................................................................................... 125

ANEXO ........................................................................ Erro! Indicador não definido.

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1 INTRODUÇÃO

No Brasil, principalmente em áreas rurais, o acesso a água para consumo

humano ocorre de forma precária e segundo o IBGE (2010) 72% da população

brasileira que vive no meio rural não dispõe de condições adequadas do seu

abastecimento. Quando se refere à população que vive em áreas rurais do

Semiárido a questão do abastecimento de água é ainda mais complexo, uma vez

que segundo a ASA (2012, p. 1) “67% das famílias rurais nos estados que compõem

o Semiárido não possuem acesso à rede geral de abastecimento de água”.

Ainda segundo a ASA (2012) os meios mais utilizados pela população

sertaneja para abastecimento doméstico de água ocorrem através de barreiros,

nascentes e poços, que muitas vezes se localizam distantes de onde residem essas

pessoas, levando as mesmas a percorrerem longas distâncias em busca de água,

que nem sempre está apropriada para o consumo humano. Assim a dificuldade em

encontrar água no semiárido, e a má qualidade da que é consumida por essa

população interfere diretamente na qualidade de vida.

No Semiárido a disponibilidade de água para consumo em geral é agravada

pelas condições climáticas, associada à ausência de políticas públicas de

abastecimento de água adequada à realidade territorial. As condições climáticas do

semiárido apontam que a região está sujeita a períodos cíclicos de secas.

Geograficamente tais processos de estiagem ficaram conhecidos como as principais

causadoras do flagelo social ocorrido no Semiárido brasileiro, por atingir a vida da

população que habita nesse território.

Os longos períodos de estiagens, conhecidos como seca, afetam também a

agricultura de subsistência, principal fonte de renda da população rural, provocando

assim problemas relacionados à economia e à questões sociais. Nessa perspectiva

Buainain e Garcia (2003, p. 1) afirmam que “o Semiárido brasileiro concentra

atualmente a maior parcela da população rural brasileira em situação de pobreza e

de pobreza extrema”.

A região que abrange o semiárido carrega um estereótipo alimentado por

diferentes discursos, os quais apresentam o território brasileiro com incidência de

seca como lugar do flagelo social. Assim o clima semiárido é apontado como se

fosse o principal causador da miséria da região, responsável por fazer os sertanejos

abandonarem suas terras, e ir a buscar de melhores condições de vida,

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desconsiderando a conjuntura e estrutura política e econômica que incidem sobre

essa região.

Desse modo no Semiárido a oferta de água era considerada uma condição

fundamental para superação da pobreza, nesse sentido há mais de um século os

diferentes governos que administraram o Brasil direcionaram medidas para tentar

minimizar os problemas sociais na região. Fizeram parte dessas medidas a criação

de instituições federais para “combater a seca”, a exemplo do Instituto de Obras

Contra as Secas (IOCS), Inspetoria Federal de Obras Contra as Secas (IFOCS)

Departamento Nacional de Obras Contra as Secas (DNOCS), entre outras, que

acreditavam que a questão da seca poderia ser resolvida por meio de construções

hidráulicas.

Com este pensamento as ações dessas instituições estavam centradas na

construção de grandes barragens, açudes e obras de irrigação. As construções

tendiam por questões eleitoreiras ao benefício dos grandes latifundiários, dando

origem a denominada indústria da seca, restando para a população carente as

medidas paliativas como a distribuição de águas em caminhões-pipa e cestas

básicas, fortalecendo desse modo o clientelismo na região, preservando o

coronelismo, não havendo assim efeitos duradouros das políticas que promentiam

combate à seca sobre a situação vivenciada pela população do semiárido.

Na década de 1990, após a queda do regime militar, em 1985, fortalece-se no

Brasil os movimentos sociais que lutam por melhores condições de vida no campo.

Na mesma época amplia-se no mundo um debate sobre sustentabilidade ambiental

e justiça social. Nesse contexto ocorre uma articulação entre as diferentes

organizações sociais existentes e atuantes no Semiárido brasileiro em torno de um

objetivo comum, construir de forma sustentável alternativas de convivência com o

semiárido, como forma de se contrapor as políticas de combate à seca criadas e

desenvolvidas por diferentes governos.

Da união e articulação entre essas organizações nasce a Articulação do

Semiárido Brasileiro (ASA-Brasil) formando este o principal espaço de articulação

das organizações que atuam em prol do desenvolvimento social, econômico, político

e cultural do semiárido brasileiro. Dessa maneira a ASA se concretiza no espaço

político democrático regido pela Declaração da Articulação do Semiárido, sendo este

documento constituído em fórum coletivo da ASA.

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No âmbito dessa articulação é elaborado e implantado O Programa de

Formação e Mobilização Social para a Convivência com o Semiárido: Um Milhão de

Cisternas Rurais (P1MC), tendo como principal objetivo garantir o acesso à água em

comunidades rurais em todo semiárido, através da construção de um milhão de

cisternas de placas de cimento.

As construções das cisternas visam captar e armazenar a água da chuva,

para que a mesma depois de tratada seja usada para consumo humano. Esta

iniciativa está baseada na ideia de que o semiárido brasileiro é o mais chuvoso do

mundo, e que a água da chuva, se armazenada corretamente, poderá suprir a

demanda da população sertaneja inclusive nos meses que não chove (MALVEZZI,

2007).

A proposta da construção das cisternas faz parte de uma estratégia da ASA

em mobilizar e capacitar famílias sertanejas para a convivência com o Semiárido.

Nesse sentido Cavalcanti (2003, p.43) explica que “a perspectiva da convivência não

significa passividade, mas, pelo contrário, requer uma maneira diferente de

estruturar o conhecimento sobre o semiárido” para que os períodos de seca não se

tornem em problemas para aqueles que vivem nessa condição climática.

A cisterna de placas de cimento foi bem aceita, devido ao baixo custo,

durabilidade e potencial em armazenamento de água pluvial, atraindo assim dois

grandes financiadores para o desenvolvimento do Programa, o Governo Federal e a

Federação Brasileira dos Bancos (FEBRABAN).

As cisternas começaram a ser construídas em 2000, e em 2003 passou a ser

uma política pública configurando a agenda das Políticas Públicas do Governo

Federal, tratando-se de uma grande conquista dos movimentos sociais. Assim o

Programa tem se expandido por todo semiárido atingindo muitas comunidades

rurais.

Por entender ser o P1MC de grande importância para as famílias sertanejas,

e devido ao fato de buscar compreender seu desenvolver prático é que este estudo

buscou analisar os impactos sociais e os processos de seleção e capacitação

promovidos pelo Programa Um Milhão de Cisternas Rurais na Comunidade Vargem.

Como objetivos específicos buscou-se caracterizar o espaço geográfico de

ocorrência da seca e os discursos que o envolvem, analisar as principais políticas

públicas de combate à seca inserida no Semiárido que antecederam ao P1MC,

discutir brevemente a formação da Articulação do Semiárido e a elaboração do

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programa um milhão de cisternas, Além disso, avaliar se o P1MC tem cumprindo

com sua finalidade na comunidade rural Vargem.

Esses objetivos foram traçados por entender que a caracterização torna-se

necessário para que se possa analisar o espaço estudado que está sujeita a

ocorrência de secas, assim também para explicar a realidade territorial. Além disso,

avaliar as políticas públicas implantadas nos territórios atingidos pelas secas,

refletido sobre os seus efeitos na vida dos habitantes do Semiárido para que seja

possível o entendimento dos históricos de politicas públicas inseridos neste território.

Assim, buscou-se descrever como se constituiu a ASA e de que forma o

P1MC foi elaborada observando a estruturação das propostas para o Semiárido,

sendo que mais especificamente para a área de estudo, encontra-se apresentada

uma avaliação realizada através de uma pesquisa de campo, na qual constitui-se

elementos para refletir sobre o P1MC.

A pesquisa se construiu a partir da hipótese de que o P1MC promove uma

transformação social através do fortalecimento da sociedade civil, diminuição da

dependência de medidas paliativas do poder público e de favores dos latifundiários.

Capacitando ainda famílias sertanejas para a convivência com o semiárido.

Para verificar essa hipótese foi necessário a escolha de uma comunidade

rural beneficiada pelo P1MC, para que se pudessem analisar os possíveis impactos

sociais ocorridos devido à implantação do programa. Nesse sentido a comunidade

rural escolhida foi a Vargem, situada no município de Feira de Santana, estado da

Bahia, especificamente no Destrito de Maria Quinteria.

Para Freitas (2014, p. 2012) “Feira de Santana é o lugar sertanejo onde

emerge os elementos que permitem a compreensão sobre o desenvolvimento

desigual”, no entanto antes de permitir a compreensão esse espaço sertanejo

apontado pela autora desperta o interesse daquele que não passa despercebido

pelo lugar.

Nesse sentido, a escolha da comunidade Vargem como área de pesquisa

deu-se quando a pesquisadora em visitas ao Centro Territorial de Educação

Profissional do Portal do Sertão (CETEP) localizado nas proximidades da Vargem

passou a observar a comunidade rural onde está instalada a referida escola, e

percebeu então a presença de muitas chácaras e haras com piscina, grama verde e

animais pastando. A presença dessas chácaras e haras se mostravam como

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contradição, haja vista a presença de casas pequenas e simples que pareciam estar

“espremidas” entre as propriedades descritas anteriormente.

A presença das casas simples foi o que mais chamou a atenção da

pesquisadora, que de algum modo, acreditou que elas estivessem resistindo ali.

Passou-se então a olhar aquela paisagem com mais cuidado, notando que do lado

das habitações havia a presença de um tanque branco que armazenava a água da

chuva caída do telhado.

Através dessas observações percebeu-se que os tanques brancos tratavam-

se na verdade das cisternas de placas de cimento construídas através do P1MC,

surgindo daí o desejo de realizar a presente pesquisa que se justifica pela

necessidade de se analisar os impactos sociais promovidos pelo P1MC sobre a vida

das famílias rurais do Semiárido após a transferência dessa tecnologia social.

1.1 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS

O uso da metodologia científica historicamente tem auxiliado nas pesquisas

acadêmicas por orientar os caminhos a serem percorridos na realização de um

trabalho cientifico. Pode-se então dizer, que o sucesso da pesquisa depende da

metodologia a ser aplicada, no entanto, cabe ao pesquisador selecionar os

procedimentos metodológicos que atendam a necessidades da sua investigação.

Diehl (2004) lembra quer as escolhas dos métodos durante o processo de

investigação devem priorizar as metas a serem alcançadas. O mesmo autor ainda

enfatiza que cabe aos procedimentos metodológicos nortear as ações do

pesquisador para que as mesmas transcorram de forma proveitosa e sem prejuízo

de tempo.

Gil (2007, p 17) afirma que “a pesquisa desenvolve-se por um processo

constituído de várias fases, desde a formulação do problema até a apresentação e

discussão dos resultados”. Adverte ainda que das fases das pesquisas a formulação

da metodologia se consagra no momento mais importante, pois é nessa fase que o

pesquisador seleciona os métodos adequados para alcançar os objetivos proposto.

Esta pesquisa trata-se de um estudo de caso, sendo descrito por Yin (2005, p.

32) como “uma investigação empírica que investiga um fenómeno contemporâneo

dentro do seu contexto de vida real, especialmente quando os limites entre o

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6

fenómeno e o contexto não estão claramente definidos”. Na concepção de Ponte

(2006, p. 2)

É uma investigação que se assume como particularística, isto é, que se debruça deliberadamente sobre uma situação específica que se supõe ser única ou especial, pelo menos em certos aspectos, procurando descobrir a que há nela de mais essencial e característico e, desse modo, contribuir para a compreensão global de um certo fenómeno de interesse.

Desse modo o estudo de caso trata-se de uma abordagem metodológica de

investigação sobre uma situação ou realidade específica, buscando explicar o objeto

de pesquisa no seu contexto real, fazendo uso de diferentes métodos que podem

ser qualitativos ou quantitativos para auxiliar no processo de investigação,

contribuindo desse modo para o entendimento de um fenômeno.

Partindo do princípio da construção de uma metodologia de um estudo de

caso capaz de auxiliar no processo de elaboração do trabalho acadêmico seguem

as escolhas dos procedimentos metodológicos selecionados e usados durante o

processo de investigação.

1.1.1 PESQUISA BIBLIOGRÁFICA E DOCUMENTAL

As pesquisas científicas tendem a iniciar-se com uma pesquisa bibliográfica,

pois este procedimento permite ao pesquisador tomar conhecimento do que foi

descrito sobre o objeto de pesquisa. O levantamento bibliográfico trata-se de

buscas de referências teóricas e conceituais sobre o objeto já analisadas e

publicadas, desse modo as referenciais podem ser encontrados em livros,

dissertações, teses, artigos e páginas da internet entre outros. Após o levantamento

do referencial foi realizada a análise do seu conteúdo, que consiste na técnica de

exploração que se inicia por uma leitura fluente e atenta do pesquisador buscando

identificar os principais conceitos, recolher informações ou conhecimentos prévios

do material analisado. (FONSECA, 2002), (GIL, 2007).

No que se refere a pesquisa documental, Fonseca (2002, p. 32) explica que:

A pesquisa documental trilha os mesmos caminhos da pesquisa bibliográfica, não sendo fácil por vezes distingui-las. A pesquisa bibliográfica utiliza fontes constituídas por material já elaborado, constituído basicamente por livros e artigos científicos localizados em bibliotecas. A pesquisa documental recorre a fontes mais diversificadas e dispersas, sem

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tratamento analítico, tais como: tabelas estatísticas, jornais, revistas, relatórios, documentos oficiais, cartas, filmes, fotografias, pinturas, tapeçarias, relatórios de empresas, vídeos de programas de televisão, etc.

Seguindo as ideias defendidas pelo autor a pesquisa documental recorre a

fontes mais diversificadas, por se propor a analisar documentos oficiais aos quais se

encontram nas mais diferentes formas esses documentos representam fontes de

dados correspondentes a uma realidade que podem ser comprovadas ou

questionadas após análise documental. Nesse sentido, nota-se que a pesquisa

documental trata-se de selecionar e analisar documentos oficiais.

Assim a pesquisa bibliográfica e a pesquisa documental são procedimentos

metodológicos que auxiliam no processo de investigação e se complementam na

medida que cada uma possui sua importância no processo da construção do

conhecimento científico. Com essas ideias os dois métodos foram utilizados nesta

pesquisa da seguinte maneira:

A pesquisa bibliográfica ocorreu em bibliotecas, acesso à revistas e páginas

da internet, onde se realizou um levantamento de referenciais teóricos que

fundamentou essa pesquisa, nesse sentido foram dadas prioridades as

leituras que tratavam das secas, políticas públicas, semiárido, ONG’s ,

sociedade civil organizada e tecnologia social.

A pesquisa documental ocorreu nos arquivos do Movimento de Organização

Comunitária (MOC), sendo esta uma entidade ligada a ASA, a qual foi

responsável pelo desenvolvimento do P1MC na comunidade da Vargem;

desse modo foi acessado nos arquivos do MOC vasta documentação

referente ao Programa e ao processo de desenvolvimento do mesmo na

comunidade de pesquisa, nestes arquivos encontraram-se fotos, declarações,

artigos, fichas cadastro das famílias, listas de presenças em reuniões e

recibos referentes às entregas das cisternas. Estas documentações serviram

de base para iniciar a pesquisa de campo, e serão apresentadas e analisadas

neste trabalho.

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1.1.2 PESQUISA DE CAMPO

Na pesquisa de campo a observação in loco trata-se da técnica mais comum

entre os pesquisadores, principalmente daqueles inerentes a ciência geográfica, pois

é a partir das observações que surgem as primeiras indagações em relação ao

objeto de pesquisa. Nesta pesquisa tudo começou com as observações de campo,

que logo se tornaram indagações sendo assim Barros e Lehfeld (2000, p.53)

explicam que

A observação como uma das técnicas de coleta de dados imprescindível em toda pesquisa científica. Observar significa aplicar atentamente o sentido a um objeto para dele adquirium conhecimento claro e preciso. Da observação do cotidiano formulam-se problemas que merecem estudo. A observação constitui-se, portanto, a base das investigações científicas.

Em concordância com os autores supracitados as observações foram

imprescindíveis para formulação e desenvolvimento da pesquisa, uma vez que a

técnica usada durante as visitas à campo foi utilizada em todo o desenvolvimento

desta pesquisa que ocorreu em reuniões, conversas e aplicação de questionário.

Na concepção de Gonçalves (2001, p.67)

A pesquisa de campo é o tipo de pesquisa que pretende buscar a informação diretamente com a população pesquisada. Ela exige do pesquisador um encontro mais direto. Nesse caso, o pesquisador precisa ir ao espaço onde o fenômeno ocorre, ou ocorreu e reunir um conjunto de informações a serem documentadas.

Levando em consideração as afirmações feitas por Golçalves (2001) a

pesquisa de campo possui como objetivo entrar em contato com a população a ser

pesquisada, observar de forma direta o fenômeno a ser pesquisado buscando reunir

informações sobre o seu objeto de pesquisa. Nesse sentido as pesquisas de campo

devem ser bem planejadas para possibilita o seu desenvolvimento de forma

harmônica.

A pesquisa de campo funcionou da seguinte maneira, respeitando o Código

de Ética estabelecido da UEFS:

A primeira visita oficial à campo foi determinante para demarcar a área

de pesquisa. Realizou-se um reconhecimento de área através de uma

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caminhada de 3 horas pela comunidade com um GPS onde foi delimitada a

área de estudo;

Na segunda visita de campo, ocorreu o primeiro encontro direto com as

pessoas, visto que a mesma foi realizada no mesmo dia em que os

membros da comunidade vão realizar o pagamento do Sindicato dos

Trabaladores Rurais de Feira de Santana (STR) na própria comunidade.

Fez-se então a apresentação da presente pesquisa de mestrado e convidou-

se os presentes a participarem da mesma, lembrando que para esse

primeiro encontro entrou-se em contado anteriormente com a representante

STR que nos convidou para desfrutar deste momento;

O segundo encontro com as famílias da Vargem ocorreu no mesmo

local onde a comunidade costuma se reunir. A reunião foi marcada para uma

semana depois do primeiro contato com os mesmos, e compareceram 20

representantes das famílias beneficiadas pelo P1MC. O objetivo da reunião

era tirar dúvidas sobre a pesquisa e na oportunidade foram aplicados 20

questionários.

Na sequência de segunda a sexta-feira foram realizadas cinco visitas a

campo onde se realizou, com a companhia da representante do Sindicato

Rural visitas à 30 famílias que foram beneficiadas pelo P1MC, que não

haviam comparecido na reunião anterior, na oportunidade foi apresentada a

pesquisa e a/o responsável pela cisterna de placa de cimento e convidou-se

o mesmo para participar da realização desta pesquisa através da assinatura

do Termo de Livre Esclarecimento e respondendo ao questionário.

1.1.3 APLICAÇÃO DE QUESTIONÁRIO

Para Gil (1999) o uso dos questionários em pesquisas sociais é um

importante procedimento por evitar possível influência do pesquisador nos

resultados, além de garantir o anonimato dos participantes.

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Diniz et al (2011) afirma que os métodos estatísticos atendem a boa parte

das necessidades de análises de dados, porém deixam uma lacuna quanto aos

dados qualitativos, assim a aplicação de questionários com questões abertas torna-

se cada vez mais frequente, nos estudos onde envolve comunidades, por permitir

que os entrevistados não fiquem apenas presos as questões com respostas “pré-

estabelecidas”.

A escolha deste procedimento privilegia a coleta de dados quantitativos, sem

desprezar os dados qualitativos, à medida que o questionário foi composto por 27

(vinte e sete) questões fechadas de múltiplas escolhas, e de uma questão aberta,

permitindo assim ao pesquisador extrair informações sobre a percepção da

comunidade em relação o P1MC.

Os dados obtidos através do questionário foram analisados por meio da

estatística básica e apresentados em forma de gráficos para melhor disposição e

compreensão dos seus resultados. Os gráficos apresentados neste trabalho

representam a totalidade das famílias beneficiadas, sendo ela composta por 50

(cinquenta) famílias.

1.2 ÁREA DE ESTUDO

A área de estudo da presente pesquisa localiza-se no município de Feira de

Santana situado a 108 quilômetros da capital Salvador. Está localizada

geograficamente em uma zona de transição entre a área da Mata e o Sertão baiano,

com predominância do clima semiárido, marcado por longos períodos de estiagem.

É o segundo município mais populoso do estado da Bahia e a maior cidade

do interior nordestino com população estimada em 2015 de 617.528 segundo os

dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatistica (IBGE, 2010).

A pesquisa ocorreu no espaço rural de Feira de Santana, trata-se da

Comunidade Rural Vargem (MAPA 1) distante do centro da cidade

aproximadamente 15 quilômetros, localizada no Distrito de Maria Quinteria, entre a

Estrada da Pedra Ferrada, a Estrada do Besouro e a Rua São José.

O processo de delimitação da área de estudo foi bastante criterioso ao

delimitar a área geográfica de estudo, uma vez que a comunidade Vargem está

próxima de mais duas comunidades rurais Braço Forte e Caldeirão, ambas também

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beneficiadas com o P1MC. Para tanto, seguiu-se as instruções da representante da

Comunidade rural que nos apontou as delimitações territoriais da comunidade.

Seguindo as orientações, fez se uma volta em torno da área de estudo

ulilizando um aparelho com global positioning system (GPS) onde foi possível

determinar com exatidão a aréa a ser pesquisada.

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MAPA 1- LOCALIZAÇÃO DA COMUNIDADE VARGEM

Na comunidade Vargem o P1MC beneficiou 50 famílias, representante do

Sindicato Rural, enquanto ao número total de famílias da Vargem não se pode

afirmar ao certo, uma vez que nem todas participam da Associação de Moradores

da Vargem ou do STR, porém sua população está estimada segundo informações

da representante do SRT em aproximadamente 300 (trezentas) famílias.

O espaço dessa investigação é constituído pela vegetação caatinga, que se

encontra em estado avançado de devastação em decorrência da ocupação humana

e da criação de boivinos, no entanto pode-ser observado, embora em pouca

Comunidade Vagem

Localização de Feira de Santana

Feira de Santana

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quantidade, plantas típicas do bioma caantiga como a palma, xique-xique,

aroeira, umbuzeiro, cajuzeiro, juazeiro, mandacaru, cacto e a paineira-branca (Ceiba

glaziovii).

1.3 ESTRUTURA DA PESQUISA

O texto encontra-se organizado em seis capítulos, cujo primeiro capítulo traz

a introdução que expõe o escopo do trabalho, os objetivos, justificativa,

caracterização da área de estudo e procedimentos metodológicos, além da estrutura

da redação.

O capítulo 2 realiza uma caracterização do território brasileiro atingido pela

seca, para que se pudesse compreender melhor a área geográfica vulnerável a

ocorrência do fenômeno. Faz-se também uma análise desse território do ponto de

vista simbólico e cultural para que se possam compreender os discursos que

envolvem esse espaço geográfico. Fazendo perceber-se que o Sertão Nosdestino é

mais que uma porção do espaço geográfico, tratando-se de questão cultural e de

indentidade.

O capítulo 3 apresenta um estudo das principais estratégias do governo para

combater os efeitos da seca que antecederam o P1MC, se caracterizando em mais

de um século de implementação de políticas públicas no Semiárido. O presente

capítulo buscou, ainda que brevemente, analisar essas estratégias, percebendo-se

que as mesmas, na sua maioria tratavam-se de ações emergenciais e na

reprodução de práticas paliativas e assistencialistas ou se centravam na construção

de grandes obras hídricas, permitindo assim que a população continuasse

vulnerável aos efeitos da seca.

O capítulo 4 analisa a formação da Articulação do Semiárido e a elaboração

do programa um milhão de cisternas. A análise ocorre a partir da discussão da

abertura democrática no cenário político brasileiro após a queda do Regime Militar,

abordando a legitimação das organizações da sociedade civil e dos movimentos

sociais. Nesse contexto histórico a ASA-Brasil se constituiu e se consolidou como a

articulação mais importante do Semiárido brasileiro, sendo atualmente filiada a ASA

3 mil organizações da sociedade civil.

Ainda nesse capítulo foi descrito o processo de elaboração do P1MC, que se

constituiu de forma participativa entre os membros da ASA-Brasil, é apresentado o

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modelo de gestão do Programa que ocorre de forma transparente, facilitando assim

as prestações de contas com seus principais patrocinadores, que são o Governo

Federal e a Federação Brasileira dos Bancos. Buscou-se também analisar os

objetivos traçados pelo Programa e suas metas, observando os critérios eleitos para

selecionar as famílias que participaram do Programa.

O capítulo 5 traz a análise dos impactos sociais na vida das famílias que

foram beneficiadas com o P1MC na comunidade Vargem. Para realização dessas

análises utilizou-se de estatística descritiva, e confeccionaram-se gráficos para a

apresentação dos dados. A primeira fase trata de verificar se as famílias foram

selecionadas em concordância com os critérios do Programa, e se as cisternas

foram construídas também obedecendo aos critérios do programa. A segunda etapa

analisa os diversos manejos da água das cisternas, bem como as questões relativas

à orientação e capacitação das famílias, sobre tratamento e armazenamento das

águas pluviais; coube ainda analisar a capacidade das cisternas para o

armazenamento de água, e se as famílias têm capacidade de realizar a manutenção

das referidas cisternas. Na terceira e última etapa verificou em que medida a

cisterna permite o atendimento das necessidades básicas de consumo doméstico

das famílias que conquistaram a cisterna e a importância das mesmas em suas

possíveis melhorias na qualidade de vida. Para tal, analisou-se as respostas do

questionário, além de levar em conta os relatos das famílias que participaram do

P1MC.

Por fim, o capítulo 6 refere-se às considerações finais, as quais demonstram

os efeitos advindos na comunidade estudada após a implantação do P1MC. Faz-se

ainda uma reflexão sobre os problemas oriundos das longas estiagens, bem como

das políticas para seu enfrentamento e de convivência no Semiárido brasileiro.

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2 É PRECISO COMPREENDER O ESPAÇO DA SECA

A ocorrência da seca no território brasileiro possui um significado que vai além

da presença de um fenômeno climatológico, uma vez que a sua ocorrência está

associada historicamente como o causador das calamidades sociais vivenciadas

pelas populações que habitam no território atingido pelo fenômeno. Nesse sentido,

foi demarcada uma área geográfica propícia à ocorrência da seca, tendo por

finalidade o direcionamento de medidas públicas para amenizar os efeitos do

fenômeno.

Os territórios geográficos incluso nessa demarcação sempre carregaram um

estereótipo que está presente em diferentes discursos que apresentam esses

territórios como lugares atrasados, do flagelo social e de uma gente sem perspectiva

de vida. Os discursos ficaram registrados no imaginário da população brasileira,

principalmente no que se refere a Região Nordeste, como se a totalidade do

território que compõe essa região fosse por inteira atiginda pela seca.

Neste sentido o espaço assolado por longas estiagens passou a ser conhecido

popurlamente como Sertão Nordestino, já que o fenômeno da seca atinge 57%

desta região, no entanto, o fenômeno da seca não se encontra presente apenas no

Nordeste o que fez com que outros territórios propícios à ocorrência da seca

entrassem também na demarcação de áreas geográficas vulneráveis ao fenômeno.

Com a inclusão de novos territórios, a demarcação passou a considerar uma

nova região denominada de Semiárido Brasileiro como área geográfica propícia a

ocorrência da seca. Entretanto, ao contrário do que muitos acreditam, devido à

reprodução de um discurso estereotipado sobre esse território, o Semiárido

brasileiro não é árido, desértico e sem vida, pelo contrário é uma região com

características próprias, com uma vegetação capaz de sobreviver longos períodos

de estiagens, onde se chove muito, no entanto em poucos meses do ano, e é

principalmente um lugar com significativa biodiversidade.

Com este pensamento surge da sociedade civil organizada a proposta de mudar

a concepção construída pelo discurso vilipendioso do clima semiárido, que foram

alimentados e reproduzidos ao longo do tempo, assim muitos são aqueles que se

dispõe a estudar medidas sustentáveis para a convivência com o semiárido

demonstrando que essa é uma região viável.

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Neste sentido, neste capítulo apresenta-se a caracterização do espaço de

ocorrência da seca, por meio da ótica geográfica e dos diversos discursos tecidos

acerca desta região.

2.1 A REGIÃO NORDESTE

O Nordeste conforme pode-ser observado no mapa 2 sob o ponto de vista

oficial, tal como se apresenta atualmente, passou a existir após a divisão do território

brasileiro em magro regiões no ano de 1969, após um longo processo geográfico e

histórico de divisão administrativa, onde o Brasil passa a ser dividido em cinco

grandes regiões, sendo elas Norte, Nordeste, Cento-Oeste, Sul e Sudeste, e por fim

1988 as áreas de delimitações passam novamente por configuração, visto que foram

criados os estados de Tocantins, Roraima, Rondônia e Amapá; e Fernando de

Noronha deixa de ser uma área federal para ser integrada ao estado de

Pernambuco.

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MAPA 2- A REGIÃO NORDESTE DO BRASIL

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A Região Nordeste é das regiões brasileiras que possui o maior número

de estados federativos. Sendo eles Alagoas, Bahia, Ceará,

Maranhão, Paraíba, Piauí, Pernambuco, Rio Grande do Norte e Sergipe. Sua

população total está estimada em 53.081.950 habitantes no ano de 2015, tornando-

se a segunda região mais populosa do Brasil. Sua extensão territorial é de

1 554 291,744 km², representando 18% do território nacional, sendo a região que

possui a maior extensão de costa litorânea do país (IBGE, 2010).

O Nordeste ainda abriga grande diversidade de clima e vegetação, com

peculiaridades entre estes, visto que há biomas distintos, subdivididos em quatro

subregiões, sendo elas: Meio-norte, Sertão, Agreste e Zona da Mata, que

concentram características distintas.

A sub-região Meio-Norte conhecida também como Mata dos Cocais constitui

a maior parte do Maranhão e do Piauí, está situada numa área de transição entre a

Floresta Amazônia e o Cerrado e entre o Cerrado e a Caatinga, sendo caracterizada

por matas com predominância de palmáceas, como, coqueiros, carnaúba e babaçus.

Esta sub-região apresenta índice pluviométrico basante variado. Sendo que, no seu

litoral chove ao equivalente a 2 000 mm anuais, já ao leste o índice pluviométrico é

1 500 mm anuais, e no sul chove ao equivalente a 700 mm por ano.

A sub-região do Sertão é a maior em extensão territorial e, possui clima

semiárido, onde as ocorrências de chuva geralmente se concentram em quatro

meses no ano, maior extensão territorial dessa sub-região encontra-se inclusa na

delimitação do Semiárido brasileiro, com índice pluvimetrico de 350 milímetros de

chuva por ano, sua vegetação predominante é a caatinga.

O Agreste conhecido geograficamente como área de transição entre o Sertão

e a Zona da Mata, faz se presente no Agreste a vegetação da mata atlântica e da

caatinga, com o clima semiárido, situa-se no Planalto da Borborema, que se

configura em um obstáculo físico para a chegada das chuvas do litoral ao sertão, o

que causa a irregularidade de suas chuvas, assim parte do território desta sub-

região é atingida por longas estiagens. Seu índice pluviométrico varia entre 300 e

1200 mm/ano, devido sua posição geográfica localizada em duas destintas sub-

regiões.

A Zona da Mata trata-se da sub-região mais povoada da Região Nordeste,

também é onde ocorre o maior volume de chuva cerca de 2 100 mm/ano, o seu

nome deu-se devido a forte presença da Mata Atlântica, que passou por grande

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devastação devido ao cultivo da cana-de-açúcar e do cacau. Clima é tropical úmido,

e o solo é fértil em razão, além de outros fatores da regularidade de chuvas.

Embora o Nordeste seja um das regiões mais diversificadas do país, tanto no

que se referem aspectos climáticos, quanto em vegetação, a mesma ficou conhecida

como o Nordeste da seca, devido às constantes ocorrências deste fenômeno nesta

região. Entretanto, a seca se concentra apenas em parte do território do Nordeste,

não atingindo toda a região.

As secas ocorrem com maior frequência no território nordestino incluso na

delimitação do Semiárido. Esta área abrange 53% da região Nordeste (ASA, 2010),

ou seja, 53% do território da região Nordeste está sujeito ao fenômeno da seca.

Com tamanha extensão territorial sendo atingido pela seca, o fenômeno passou a

ser alvo político-partidário. Cabe, entretanto, esclarecer que a seca ocorre em outras

regiões brasileiras além do Nordeste.

2.2 O SERTÃO DA REGIÃO NORDESTE

É muito comum na literatura brasileira o uso da palavra sertão para definir a

região semiárida do país, assim o uso do termo trata-se de uma construção

simbólica, que se iniciou na colonização do Brasil, onde os portugueses notaram

uma grande diferença climática ao chegar ao semiárido, e comparar o clima lá

predominante com o existente no litoral da Colônia.

Assim, os primeiros desbravadores do Semiárido o denominaram de sertão,

sendo que esta palavra deriva do latim "sertanus", que significa áreas deserticas ou

desabitada. Era muito utilizada pelos portugueses também para definir as terras

interiores longe do litoral; e para nomear a população que habitava o sertão os

portugueses usaram a palavra sertanejo, que por sua vez, derivava da palavra

sertão.

No Nordeste brasileiro, o Sertão é também uma sub-região que apresenta os

mais baixos índice pluviométrico de todo o país, onde a vegetação típica é a

caatinga, caracterizada pelos longos períodos de estiagens e a decorrência das

secas. A delimitação do Sertão abrange quase todos os estados do Nordeste.

Com a publicação do livro “Os Sertões” de 1902, escrito pelo jornalista

Euclides da Cunha, que ao contar a história da Guerra de Canudos, descreve

minuciosamente a paisagem do semiárido, destacando seu clima e vegetação e as

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recorrentes secas. O autor ainda descreve o sertanejo, seus costumes, suas

crenças e a sua relação com o espaço geográfico habitado.

Assim, a obra Os Sertões provocou importante identificação com o espaço

geográfico do semiárido, principalmente ao descrever o sertanejo como a gênese do

sertão, tornando assim uma referência clássica para identificar o Semiárido como

sertão e a sua população como sertaneja.

Na concepção de Cunha (1902) o sertão era o espaço geográfico onde tudo

faltava. Água, comida e de meios necessários para satisfazer as necessidades

básicas de seus abitantes, no entanto o sertanejo se destacava pela sua bravura

que resistia às diversidades do lugar habitado. Assim, para o autor o sertanejo é

aquele que vive no sertão. A admiração de Cunha (1902, p.51) pelo povo sertanejo o

fez descrever essa gente, como “antes de tudo um forte”.

2.3 DELIMITAÇÃO DO SEMIÁRIDO

A incidência da seca no mesmo espaço geográfico contribuiu para a

delimitação oficial de uma área geográfica propícia a ocorrência de estiagens

prologadas. Essa delimitação foi desenvolvida para auxiliar o Estado na adoção de

políticas públicas para atender a população que habitam nesse espaço. Nesta

perspectiva, em 1936 delimitou-se uma área geográfica denominada Polígono das

Secas (MAPA 3), essa delimitação foi criada por meio da Lei nº 175, de 07/01/1936,

que levou em consideração as incidências de secas na delimitação territorial.

Em 13 de setembro de 1946, a Lei que delimita o Polígono da Seca é

redefinida pelo Decreto-Lei nº 9.857, com o intuito de promover a execução de um

plano de defesa contra os efeitos da seca no Nordeste. A Lei nº 1.004, de 24 de

dezembro de 1949, regulamentou as alterações introduzidas e, em 1951, a área do

Polígono das Secas foi alterada pela Lei n. 1.348, mediante a incorporação de

municípios do norte do Estado de Minas Gerais. (Lobão 2012)

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MAPA 3- A REGIÃO SEMIARIDEZ DO FNE E O POLÍGONO DAS SECAS

Nas palavras de Lobão (2012, p.32)

O Polígono das Secas é uma área formada por um conjunto de 1.877 municípios localizados no Ceará, em sua totalidade e, parcialmente, no

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Piauí, no Rio Grande do Norte, em Pernambuco, na Paraíba, em alagoas, no Sergipe e na Bahia, além da parte do norte Minas Gerais, sendo que quase a metade dessa área encontra-se na Bahia.

Percebe-se que segundo a descrição da autora que metade da área inclusa

no Polígono da seca encontra-se no Estado da Bahia, e o único estado da região

Nordeste que não faz parte do Polígono das Secas é o Maranhão. Esta delimitação

foi reconhecida pela legislação brasileira como sujeita ao fenômeno da seca, e o

esforço do governo em reverter os problemas sociais cometidos em decorrência da

seca se dava prioritariamente neste espaço.

O Ministério da Integração Nacional (MI) definiu a nova delimitação do

Semiárido Brasileiro, com base nos estudos realizados pelo Grupo de trabalho

Interministerial1. Para delimitação do semiárido Brasileiro, foram incorporados novos

critérios, entre eles:

I. Precipitação pluviométrica média inferior a 800 mm/ano (isoieta de 800 mm); II. Índice de aridez de até 0,5, calculado pelo balanço hídrico que relaciona as precipitações e a evapotranspiração potencial, no período entre 1961 e 1990; e, III. risco de seca maior que 60%, tomando-se por base o período entre 1970 e 1990 (Brasil, 2005, p. 03).

Levando em consideração os novos critérios, foram inclusos 102 municípios

na área delimitada, totalizando 1.133 munícipios, contando com os 1.031 já

existentes, com o acréscimo dos 102 novos municípios a área delimitada que era de

892.309 km2 passou a ser de 982.563 km2, ocorrendo um acrescimento de 8,6% da

área considerada como provável para ocorrência de seca, conforme apresentado no

mapa abaixo.

1 GTI instituído por meio da Portaria Interministerial N° 6, de 29 de março de 2004, assinada pelos ministros da Integração Nacional e do Meio Ambiente (BRASIL, 2004).

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MAPA 4- DELIMITAÇÃO DO SEMIÁRIDO BRASILEIRO

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Assim, o Semiárido Brasileiro (SAB) criado pela Lei Federal n. 7.827, de 27 de

setembro de 1989, possui atualmente uma área de 982.566 Km², a qual corresponde

a 18,2% do território nacional, abrande 53% da região Nordeste, estando presente

em todos os estados nordestinos, ocupando 86,8% do Estado do Ceará, 93,4% do

Estado do Rio Grande do Norte, 86,6%do Estado da Paraíba, 88,0% do Estado de

Pernambuco, 59,9% do Estado de Piauí, 69,7% do Estado da Bahia, 45,6% do

Estado de Alagoas, 50,9% do Estado do Sergipe, e cerca de 1% do Estado do

Maranhão, além de 17,7% do Norte de Minas Gerais. A população do Semiárido

esta estimada em 22 milhões de habitantes, e dela faz parte a maior concentração

de população rural do Brasil. (ASA, 2009).

Com esta nova delimitação, Brasil (2005) recomenda-se não utilizar mais o

Polígono da Seca, para se referenciar as áreas propicias ao fenômeno da seca, e

para o Semiárido deve ser destinados, pelo menos a metade dos recursos do Fundo

Constitucional do Nordeste (FNE). O FNE que foi regulamentado pela Constituição

Federal de 1988, tornando- se fonte de recursos direcionados ao desenvolvimento

do Nordeste, prioritariamente em determinados municípios, tal como apresentado no

Mapa 1.

2.4 O DISCURSO SOBRE A SECA

O discurso pode ser compreendido enquanto uma construção do pensar,

dizer e fazer sobre determinada ação no tempo, visto que o acontecimento discurso

é um acontecimento histórico (FOUCAULT, 1997).

Para desenvolver sua produção sobre o discurso, Foucault (1997)

desenvolveu o método geneológico-arqueologico, por meio da qual é possível

compreender o sujeito como produção de diversos saberes e relações de poder e do

sujeito com ele mesmo.

O método é aplicado no mesmo sentido dos estudos arqueológicos de

civilizações antigas, e em sua utilização para com o discurso. Foucault (1997)

busca explicar o discurso por meio da análise do mesmo, sem se preocupar com o

que “pode” estar por tráz do discurso. Para tanto, será necessário escavar as

camadas desse discurso. O compreendendo-o historicamente, assim, por meio de

questões que incidem sobre toda fala, variando de acordo com cada período e com

as relações já descritas.

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Nas palavras do próprio Foucault (1997, p. 159)

A arqueologia busca definir não os pensamentos, as representações, as imagens, os temas, as obsessões que se ocultam ou se manifestam nos discursos; mas os próprios discursos, enquanto práticas que obedecem a regras. Ela não trata o discurso como documento, como signo de alguma coisa, como elemento que deveria ser transparente, mas cuja opacidade importuna é preciso atravessar frequentemente para reencontrar, enfim, aí onde se mantém a parte, a profundidade do essencial; ela se dirige ao discurso em seu volume próprio, na qualidade de monumento. Não se trata de uma disciplina interpretativa: não busca um “outro” discurso mais oculto. Recusa-se a ser “alegórica”.

Dessa maneira, o teórico reflete sobre a necessidade em desnudar um

determinado discurso, para compreender o colorário que se assenta sobre o mesmo,

e assim, descobrir as intenções e relações imputadas por meio do que é pensado,

feito e dito.

Em relação a presente pesquisa, apresenta-se a seguir os discursos sobre as

secas, a fim de analisar as influências dos mesmos para a caracterização deste

espaço, bem como explicar as medidas adotadas pelo Estado, e as que deveriam ter

sido adotadas e não o foram, por determinados grupos (oligárquicos) políticos,

endógenos e exógenos, nessa região.

Sabe-se que a seca é um fenômeno natural, decorrente do EL NINO, que se

caracteriza pelo aquecimento e resfriamento anormal da superfície do Oceano

Pacífico Tropical, interferindo, assim nas condições meteorológicas em diversas

regiões do globo, principalmente no que se refere ao regime das chuvas e na

elevação da temperatura (SANTANA, 2007).

A ocorrência do EL NIÑO provoca o prolongamento da estiagem na região

semiárida do Brasil, interferindo diretamente na distribuição das cuvas. Vale

ressaltar que no Semiárido brasileiro, o período chuvoso concentra-se em quatro

meses do ano, enquanto os outros oito meses são plenos de estiagem,

caracterizando pelo curto período chuvoso. Desta maneira a região é semiárida, e

não árida, pois a seca só ocorre quando os meses de estiagem se estendem mais

que o previsto.

Nos períodos de prologadas estiagens, mais conhecido e debatido como

seca, a má distribuição da chuva afeta diretamente a agricultura familiar, principal

fonte de subsistência das famílias rurais do Nordeste, chegando a faltar água para

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as necessidades básicas da população. Sobre este aspecto da seca, Campos (1997,

p.6) enumeram outras secas que ocorrem devido à seca climatológica

A falta de chuva, ou ocorrência de um total de chuvas bem abaixo do normal é definida como seca climatológica. Por sua vez, o meio físico onde se concentra o potencial hidráulico fixo é formado pelo sistema solo x planta. Em condições normais, de não seca, a chuva fixa umidade no solo em quantidade e tempo suficiente para permitir a produção agrícola. A condição de seca ocorre quando a permanência de umidade no solo não é suficiente para que as culturas completem seus ciclos vegetativos. Essa deficiência de umidade no solo é definida como seca edáfica que pode ter como causa primária a escassez de chuva ou uma má distribuição das chuvas ao longo do tempo. Como consequências dessa seca são afetadas atividades econômicas da agricultura de sequeiro que resultam no flagelo dos camponeses. O resultado do flagelo é a migração para os centros urbanos ou para as frentes de serviços. Nessa sequência se teria: a seca climatológica tem como efeito a seca edáfica; a seca edáfica tem como causa a seca climatológica e como efeito a seca social.

Observa-se que a seca precisa ser entendida para além de uma questão

climatológica, que embora seja um fenômeno físico de cunho climático, a sua

ocorrência acaba por desencadear outras secas que têm efeitos muito mais

profundos sobre a população que habita no território atingido pelo fenômeno

climatológico. A questão primordial, apontada por Campos (1997) é que as longas

estiagens afetam diretamente a agricultura de subsistência, principal fonte de renda

da população rural que vive no semiárido, provocando assim a seca social.

A associação entre o clima semiárido e a situação de miséria da população do

semiárido, sempre foi parte fundamental nos discursos dos Deputados Federais para

conseguir verbas do Governo Federais para investimentos na região, na visão dos

políticos que faziam/fazem parte da bancada Nordestina na Câmara dos Deputados

Federais o clima era responsáveis pelos problemas causados na economia do

Nordeste, e como compensação a região necessitava de maior investimento do

Governo Federal.

O discurso desenvolvido pelos políticos caracterizava o fator climático como o

principal culpado das calamidades sociais existente na região. Conforme pode se

verificar no discurso pronunciado na Câmara dos Deputados Federais em Brasília no

dia 21 de novembro de 1984:

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A terrível e prolongada seca nordestina, destruidora de vidas, causa de sofrimentos incontáveis e de grandes prejuízos, aparentemente cessou. As chuvas voltaram depois de cinco anos de estiagem, colorindo a paisagem e fazendo renascer no nosso povo a tímida esperança por melhores dias. (COELHO, 1985, p. 6).

Nota-se através do Deputado Federal Osvaldo Coelho (1985) que é atribuído à

seca a responsabilidade pelos danos causados ao Nordeste no período de

estiagem. É possível observar os diferentes adjetivos que são atribuídos à palavra

seca, como “terrível” e “destruidora”. Em contrapartida o Deputado faz reverência a

chegada da chuva como solução para os problemas do Nordeste, à medida que a

mesma traria esperanças de dias melhores, levando aos receptores do discurso

acreditarem que as mazelas da região seriam resolvidas pelo vieís hídrico.

Para Bursztyn (1990) Os discursos que a seca era a causadora dos

problemas socioeconômicos do Nordeste, favoreceu a criação de órgãos federais

que tinham por objetivo o combate à seca, no entanto os políticos colocavam os

serviços dos órgãos federais a serviço de grupos locais, formados pela elite agrária

em troca de apoio político, que por sua vez exercia o domínio sobre uma área

eleitoral, fazendo uso dos recursos que eram destinados ao combate aos efeitos da

seca para barganhar votos.

Nessa perspectiva os latifundiários passavam a se beneficiar de

investimentos realizados pelo Governo Federal, fazendo uso dos recursos

destinados ao combate aos efeitos da seca para sustentar o poder patriarcal

clientelista, evidenciando desta maneira que o problema do semiárido não era

apenas a falta de chuva, mais também o mau uso dos recursos públicos.

Para Castro (1996) tais discursos de clima flagelador funcionavam mais como

estratégia politíca, já que na visão da autora o clima semiárido existente em outros

países não causava os mesmo danos causados no Semiárido brasileiro. A autora

ainda enfatiza que os problemas causados na região semiárida, estão sempre

ligados a ocupação da terra ao longo da história da formação territorial do Brasil que

seguiu de forma paternalista, se configurando numa estrutura social, marcada pela

concentração de terra nas mãos de poucas pessoas.

No entanto, o discurso de seca como responsável pelo flagelo social no

Nordeste passou a fazer parte do imaginário de muitas pessoas, ganhando destaque

também na cultura popular principalmente na voz de Luiz Gonzaca, considerado o

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“Rei do Baião”. Em um trecho de sua música com Humberto Teixeira, Asa Branca

(1947), considerada pela crítica como uma das mais populares, tem-se as seguintes

descrições

Quando olhei a terra ardendo/ Qual fogueira de São João/ Eu perguntei ai, a Deus do céu, ai/ Porque tamanha judiação/ Que braseiro, que fornalha/ Nenhum pé de plantação/ Por falta d’água perdi meu gado/ Morreu de sede meu alazão/ Inté mesmo a asa branca bateu asas do sertão/ Entonce eu disse adeus, Rosinha/ Leva contigo, meu coração/ Hoje léguas, muitas léguas/ / Nesta triste solidão/ Espero a chuva cair de novo/ Pra mim voltar pro meu sertão/ Quando o verde dos teus olhos/ Se espalhar na plantação/ Eu te asseguro, não chore não, viu/ Que eu voltarei, viu, meu coração

Luiz Gonzaga contribuiu para que a região fosse conhecida pelo Brasil, numa

época em que o Nordeste era pouco conhecido pelos brasileiros. Compôs e cantou

músicas que retratavam a realidade vivida e sensibilizou todo o Brasil com o “drama”

do nordestino. A letra da música Asa Branca faz referência aos longos períodos de

estiagens e ao clima quente do semiárido. Demostra ainda que, as plantações e as

criações não resistem a ausência da chuva, caracterizando o problema do Nordeste

com a escassez de água e a temperatura climática que consequentemente

dificultaria a prática da agricultura e da pecuária que são as principais atividades

econômicas desenvolvidas pela população rural que habitam no Semiárido.

Em bibliografias acadêmicas também é possível encontrar relatos da seca

sendo apontada como causada miséria nordestina, conforme pode ser observado

em Pinto (1938, p.17):

Que é uma seca? É um fenômeno de natureza física com profunda repercussão nos meios econômico e social. São efeitos seus, o deslocamento das populações, a dizimação dos rebanhos, o aniquilamento da lavoura, com o seguinte cortejo: fome, morte, viuvez e orfandade; em uma palavra: a miséria.

No estudo realizado por Pinto (1938) a seca é apontada como a responsável

pela miséria, sendo a causa primeira dos flagelos ocorridos na região, como o êxodo

rural, pois era muito comum nos períodos de estiagens prologadas a população que

vivia no território atingido pelo fenômeno migrarem para outros espaços. Os

emigrantes que fugiam da seca ficaram conhecidos como retirantes, pois quando o

período de estiagem cessava, retomavam para seu território de origem.

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Na visão do autor, a seca destruía as lavouras e os rebanhos causando a

fome que posteriormente provocaria a morte, não permitindo que as sertanejas e os

sertanejos permanecerem em seu território, ficando evidente tanto na letra da

música Asa Branca, quanto nesse estudo de cunho acadêmico que a seca

climatológica é apontada como principal vilã, desencadeando sempre os mesmos

flagelos sociais.

As notícias sobre a seca sempre vinculou na impressa o seu caráter de

causadora de calamidades socais, no entanto, os noticiarios colaboraram ainda,

para a formação de opinião sobre um espaço geográfico, ao que descreve a imagem

dos sertões brasileiros

Quem conhece os sertões do Brasil, e tem visto o sol dos trópicos requeimar as plantas, dessecar as fontes, evaporando na última gota d’agua, arrebatada pelos tufões ardentes que varrem os campos como a labareda de um incêndio, toda a seiva do vegetal e a derradeira esperança do homem e do vivente, em geral, não estranha às cenas horrorosas que descrevem os jornais (ECO DO POVO, 09/07/1879, n. 3, p. 03 APUD BURGARDT 2014, p.? )

Com essa descrição entre muitas outras os jornais colaboraram para reforçar

o estereótipo da Região Nordeste, do retirante e do clima semiárido como

responsável pelos problemas sociais nordestinos. A perspectiva da seca como

execrável ficaram registradas em noticiários que circularam no país, a exemplo dos

jornais Diário de Pernambuco, Eco do Povo e A Opinião, levando consigo uma

imagem do Nordeste, do seu clima e de sua gente (Burgardt, 2014).

Graciliano Ramos, romancista, inspirou-se nos dramas vividos pelos

sertanejos para escrever o romance Vidas Secas (1938) que se tornou uma

importante obra literária. Por, além de descrever uma imagem hostil do sertão, já

descrita por noticiários, Ramos (2010) narrar a história de uma família sertaneja que

foge da seca, em busca de sobrevivência, onde é possível identificar na narrativa do

autor denúncias sociais, como o abuso dos patrões, os fazedeiros, a discriminação,

a miséria vivida pelas sertanejas e os sertanejos; e sobretudo o sistema que o

impossibilita adquirir o mínimo necessário para sobrevivência humana.

Ramos, (2010, p.18) afirma

Sim, senhor, arrumara-se. Chegara naquele estado, com a família morrendo de fome, comendo raízes. Cairá no fim do pátio, de baixo de um juazeiro, depois tomara conta da casa deserta. Ele, a mulher e os filhos tinham-se

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habituado à camarinha escura, pareciam ratos – e a lembrança dos sofrimentos passados esmorecera.

Ramos (2010) descreve a situação da chegada da família nordestina numa

fazenda aonde posteriormente viriam a trabalhar. É destacada a fadiga da viagem, a

falta de alimentação adequada, e a péssima condição de moradia. O autor ainda

chama atenção que a família já estava habituada a viver nessas condições de vida,

e por fim, compara o ser humano ao rato. Ao denunciar a miséria de uma família,

demostra quanto o homem estava vulnerável aos efeitos da seca.

A seguir Ramos (2010, p. 18) narra à fuga da família da fazenda a qual havia

se instalado anteriormente.

E Fabiano resistia, pedido a Deus um milagre. Mas quando a fazenda despovoou, viu que tudo estava perdido, combinou a viagem com a mulher, matou o bezerro morrinhento que possuíam, salgou a carne, largou-se com a família, sem si despedir do amo. Não poderia nunca liquidar aquela divida exagerada. Só lhe restavam jogar-se ao mundo, como negro fugitivo.

Ao narrar à fuga da família sertaneja da fazenda, o autor descreve o sertanejo

como um fugitivo, primeiro teria fugido da seca e depois da exploração cometida

pelos fazendeiros, que muitas vezes aproveitava-se dos efeitos da seca e o estado

de vulnerabilidade social dos retirantes, para oferece-lhe uma forma de trabalho

injusta, onde só o dono da fazenda teria vantagem.

Nessa perspectiva, Ramos (2010) traz à tona a exploração, sofrida pelos

sertanejos nas fazendas onde conseguiam trabalho. A situação de trabalho se

configurava no sistema de acordo entre padrão e empregado, onde o empregado

tem direito a metade do que produz, no entanto a metade da produção agrícola que

cabe ao empregado é em muitos casos vendido a preços irrisórios ao próprio dono

da terra.

Muitas vezes o valor que resta ao trabalhador é usado para pagar dívidas

adquiridas anteriormente ao plantio, como as ferramentas de trabalhos, as sementes

e os alimentos para alimentar a família.

Geralmente essas compras são realizadas no armazém que pertencem ao

fazendeiros/latifundiários, que cobram preços exorbitantes, com isso o trabalhador,

permanece em divida com o patrão mesmo depois da colheita, tendo que trabalhar

mais para pagar novas dívidas, tornando assim o trabalhador refém de uma conta de

armazém que nunca acaba durando às vezes gerações.

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Graciliano Ramos (2010) sensibilizou o Brasil com os problemas sociais

decorrente das secas, além de fazer uma denúncia à exploração do sertanejo no

campo. Algo novo na obra do autor é que o mesmo não chama atenção apenas para

a questão do clima como responsável pela miséria do sertanejo, mas também para

exploração da mão-de-obra que o mantem no sistema de dependência do

latifundiário.

De forma conjunta os discursos políticos, científicos, musicais e literários

colaboraram para construção de um imaginário sobre o “Nordeste das secas”, onde

a palavra “seca” estava associada à desgraça e ao êxodo rural, enquanto a palavra

chuva estava associada à esperança e abundância.

É indiscutível que a seca é um fenômeno climático que provoca longos

períodos de estiagem, altas temperaturas que colabora para a evaporação da água

do solo e dos reservatórios, interferindo na economia do território atingido pelo

fenômeno, no entanto, percebe-se que os discursos que sustentavam os longos

períodos de estiagem, como a causa principal dos flagelos, defendia uma falsa ideia

da inexorabilidade do clima semiárido. Entretanto essa ideia vem sendo

desconstruída, para a construção de um novo paradigma que sustenta o conceito

que é possível conviver com o clima semiárido e criar condições necessárias, sem

agredir a natureza, para a permanência da população sertaneja no semiárido

mesmo durante a ocorrência das secas.

2.5 A DESCONSTRUÇÃO DO DISCURSO SOBRE A SECA

Segundo pesquisadores como ANA (2005) Baptista (2010), Malvezzi (2007)

Andrade(1985) afirmam que a seca não é um fenômeno que ocorre apenas no

Semiárido brasileiro, atinge também regiões da África, da Ásia, da Austrália e da

América do Norte, podendo ser prognosticada com uma certa antecedência, já que o

fenômeno apresenta uma relativa periodicidade. No entanto, sua ocorrência tende a

provocar maiores impactos em regiões mais povoadas e nesse sentido o Semiárido

brasileiro, segundo a ASA (2009) é o semiárido mais povoado do mundo.

No entanto Andrade (1985, p.7) lembra que

é necessário desmistificar a seca como elemento desestabilizador da economia e da vida social nordestina e como fonte de elevadas despesas para a União...desmitificar a ideia de que a seca, sendo um fenômeno

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natural, é responsável pela fome e pela miséria que dominam na região, como se esses elementos estivessem presentes só aí.

Na visão do autor é necessário desvincular a imagem da seca como a

responsável pelo baixo desenvolvimento econômico do Nordeste, assim como a

falsa ideia que ela, sendo um fator natural seja a responsável pelos problemas

sociais presentes no Semiárido.

Para Baptista (2010) a seca não é nenhuma catástrofe. Catástrofe é segundo

o autor a falta de planejamento dos nossos governos para a convivência com o

período da seca, já que o governo teve três décadas, desde a última grande seca

para se preparar para ocorrência de uma nova seca, e mesmo assim, como tantas

outras vezes, parecem que foram apanhados de surpresa, mesmo sabendo que as

secas ocorreriam. O autor ainda adverte que por falta de planejamento, o governo

faz uso de medidas de emergência, gastando valores exorbitantes para evitar casos

de calamidades sociais, denominando suas ações de combate a seca.

Na visão de Schistek (2010) o termo “combate à seca” foi escolhido com

muita astúcia pelo governo, pois através deste lema os políticos em diferentes

épocas procuravam demostrar à preocupação com a área geográfica mais dramática

do Brasil. É fato que o Governo Federal tenha investido milhõesem tentativas

frustradas de combater os efeitos da seca, todavia Baptista (2010, p. 22) afirma que

não se pode combater ecossistemas, variações climáticas, direção de ventos e o sol. É preciso haver políticas públicas que façam a região produzir de maneira segura para si e para o mercado, viver sem catástrofe, exatamente com este clima que temos.

Na visão do autor não se pode combater aquilo que é próprio de uma região,

como suas condições climáticas e seu ecossistema, em outras palavras segundo o

autor, “as políticas direcionadas ao combate a seca trata o Semiárido, como se está

não fosse uma região viável” (BAPTISTA, 2010, p.102).

Castro (1992) ressalta que as políticas de combate a seca, não têm

enfrentado a concentração da água e da terra nas mãos de poucos, que se

configuram nos principais causadores da desigualdade social existente no Nordeste.

Baptista (2010) em concordância com Castro (1992) lembra ainda que, existe na

Região Nordeste além da acumulação da água e da terra em mãos de poucos, a

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acumulação do saber e das oportunidades nas mãos de uma classe abastarda,

contribuindo assim para a manutenção de uma concentração de renda desigual.

Segundo informações da ASA (2010) em alguns locais do Semiárido o índice

das chuvas pode chegar a 800 milímetros por ano, enquanto em outros a média

passa apenas um pouco de 300 milímetros anuais, fazendo do Semiárido brasileiro

o mais chuvoso do mundo, portanto o problema do Semiárido não é a escassez de

água, e sim a distribuição da chuva em poucos meses do ano, quando 90% das

água da chuva é perdida por evaporação e escoamento superficial.

No entanto, a ASA (2010) ainda lembra que existe no Nordeste o

armazenamento de quase 35 bilhões de litros de água nos grandes açudes e

barragens, porém o problema encontra-se na concentração e distribuição desta

água, pois a maior parte deste armazenamento é feita pela elite agrária, que utilizam

está água para produção em larga escala e a outra parte é destinada ao

abastecimento dos centros urbanos, excluído os pequenos agricultores rurais, que

possuem na agricultura a sua principal fonte de renda, permitindo que esses sujeitos

fiquem vulneráveis ao fenômeno da seca. ANA (2005, p.24) explica que

Os impactos da seca dependem da vulnerabilidade das pessoas, das atividades econômicas e do meio ambiente. As pessoas pobres são, naturalmente, as mais vulneráveis, porque não dispõem de meios para enfrentar crises de qualquer natureza. O Semiárido, como se sabe, tem a maior parte da sua população em condição de pobreza, portanto, de alta vulnerabilidade. Entre as atividades econômicas, as que dependem diretamente do clima são mais vulneráveis, de modo especial a agricultura de sequeiro e a pecuária. Em conjunto, a pequena agricultura de subsistência, praticada por trabalhadores rurais e pequenos produtores, forma o conjunto econômico e social mais vulnerável à seca.

Esses sujeitos descritos pela ANA (2005) que muitas das vezes compõem a

imagem dos flagelados pela seca, que encontram como única alternativa de

sobrevivência a migração para o litoral, quando na verdade essas condições de

calamidades se dão pela falta de uma política pública que se construa na

convivência com o semiárido, criando alternativas para que o sertanejo não precise

abandonar suas terras em busca de sobrevivência.

Nas observações realizadas por Carvalho (2011, p. 175) em reflexão as políticas

de combate a seca diz que as ações estão

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desconectadas dos saberes e demandas reais das comunidades rurais, não atribuindo e nem fortalecendo a coesão e força simbólica dos sujeitos ao seu lugar; a visão tecnicista fundada nas ações emergenciais, pontuais e descontextuais que não validaram as singularidades e as particularidades da identidade territorial, como também vincularam a concepção de natureza hostil com conotações de “inóspita”, feia e morta.

Percebe-se, nesse contexto, que, as políticas públicas destinadas ao

Semiárido se davam de forma desvinculada da realidade de sua população, que ao

invés de criar meios de convivência com o lugar habitado, apenas funcionavam

como medidas emergenciais, além de negar as potencialidades da região sobre tudo

do seu ecossistema, associando a imagem da caatinga ao deserto. No entanto a

realidade é que o Semiárido dispõe de grandes variedades de plantas e animais que

souberam se adaptar as condições climáticas, porém as politicas públicas destinada

a está área geográfica ocorriam de forma descontextualizada com a realidade,

contribuindo para desvalorização do Semiárido.

Nesse contexto, emergem um novo discurso para o Semiárido brasileiro

baseado na convivência e não mais no combate a seca; este novo discurso emerge

dos movimentos sociais e de institutos de pesquisa que se dedicam a estudar as

potencialidades da região, assim como, criar medidas sustentáveis para

convivências com o Semiárido.

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3 PRINCIPAIS POLÍTICAS PÚBLICAS QUE ANTECEDERAM O PROGRAMA 1 MILHÃO DE CISTERNAS

As ações do estado para a tentativa de diminuição às calamidades causadas

pelas fortes secas que castigavam a região semiárida do país só tiveram seu início

devido à grande estiagem que atingiu a região no ano de 1877, a qual causou a

morte de milhares de pessoas.

Além dos efeitos das secas houve a assolação de epidemia de varíola o que

agravou a situação dos sertanejos e ocasionou um grande êxodo rumo ao Sudeste

do Brasil. Após essas ocorrências é que o governo federal, pós-proclamação da

República, passou a criar mecanismos para tentar resolver os problemas da seca,

atuando em conjunto com os governos estaduais.

No que se refere às políticas públicas direcionadas ao combate dos efeitos da

seca no Nordeste, o governo federal possui uma grande experiência, adquiridas nas

tentativas de superar os problemas sociais ocasionados pela má distrribuição de

chuvas nessa região. Embora se trate de um fenômeno natural, ela incide nas

atividades econômicas realizadas pela população que habita em territórios atingidos.

Por políticas públicas podemos entender como todas as intervenções do

Estado na sociedade, visando a superação ou mitigação de algum problema

existente (SOUZA, 2003). As políticas públicas podem ser definidas de acordo com

sua tipologia, por exemplo, política pública educacional, agrícola, agrária, de saúde,

entre outras, ou ainda, enquanto sua finalidade, podendo ser econômica, social,

ambiental, entre outras. Mas independentemente do objetivo/finalidade e a área que

deseje atingir, todas as ações do governo causam desdobramentos na vida da

população, e por isso devem ser bem planejadas, para que se maximizem seus

efeitos positivos, e se minimize a possibilidade de riscos negativos que podem

engendrar.

Assim, será analisado neste capítulo as políticas públicas direcionadas à esta

problemática, em mais de um século de intervenções no território da seca na

tentativa de minimizar os danos causados pelos longos períodos de estiagem.

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3.1 A SECA E A COMISSÃO IMPERIAL

Durante o Brasil Império os efeitos causados pela seca já eram conhecidos

pela Coroa, contudo o governo imperial não fazia uso de nenhuma medida

preventiva para amenizar seus efeitos. No entanto, com a seca que ocorreu entre

1877 a 1879, a qual foi responsável pela morte de aproximadamente 5% da

população brasileira, fez com que o Nordeste, que na época era Norte, se tornasse a

“região problema” do país, merecendo atenção especial por parte de seus

governantes (VILLA, 2000).

A seca ocorrida entre 1877 e 1879, ficou conhecida como a mais devastadora

do século XIX, pois a longa estiagem ocorreu associada a uma epidemia de varíola,

aumentando assim a necessidade da água. Os flagelados que sobreviveram à seca

começaram a se deslocar em direção aos centros urbanos da região em busca de

emprego. Assim, a seca havia provocado além de muitas mortes, a desnutrição, a

desidratação e a proliferação de muitas doenças, fazendo com que o êxodo rural

aumentasse.

A situação dos flagelados que conseguiram chegar às cidades foi descrita por

Villa (2000, p.51) que informa: “as cidades eram invadidas por milhares de retirantes

nus, esfarrapados, mortos a fome, com a pele e osso, constituía o mais doloroso

espetáculo”.

No cenário descrito por Villa (2000) o governo imperial nomeou a Comissão

Imperial em 1877 incumbida de analisar os problemas causados exclusivamente por

esta seca e propor soluções, após um breve estudo realizado nos estados

nordestinos. A Comissão Imperial concluiu que o problema se dava unicamente pela

falta de chuva, e como sugestão propôs o desenvolvimento dos transportes, a

construção de barragens e a transposição do rio São Francisco (ALVES, 2004).

O desenvolvimento dos transportes objetivava o esvaziamento populacional

dos territórios atingidos pela seca, assim o governo passou a pagar passagens para

os sertanejos em direção ao litoral do Nordeste, onde posteriormente serviria de

mão de obra barata nos canaviais e para a Amazônia, que até o momento era um

território pouco conhhecido nacionalmente, porém havia grande oferta de trabalho

nos seringais.

Tratava-se de uma política de incentivo à migração que pretendia impedir o

aumento da população urbana nas capitais do Nordeste, onde a situação já estava

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bastante tensa com a presença dos flagelados que sem nenhum recurso se

tornavam pedintes.

Outras medidas também foram adotadas, como a distribuição de água e

alimentos, além da construção de barragens médias e pequenas para estocar água.

As construções eram realizadas pelas Frentes de Trabalhos. As Frentes de

Trabalhos eram conhecidas desde a década de 1970, e consistiam do recrutamento

de flagelados pela seca para a execução de obras públicas remuneradas, neste

sentido os alistados executavam construções de barragens, açudes e estradas.

Esses trabalhadores viajavam o país executando as obras, havendo assim, o

deslocamento do sertanejo do seu lugar de origem para trabalhar em construções

públicas em diferentes estados do Brasil.

Nos anos posteriores, a seca se repete em 1888/1889 atingindo o Estado de

Pernambuco e Paraíba, em sequência ocorre à seca de 1898 a 1900, atingindo

apenas o Estado de Pernambuco, nestas duas secas, as problemáticas que

envolvem esse fenômeno já eram nacionalmente conhecidas devido à repercussão

da grande seca de 1877.

Todavia, o governo manteve as medidas assistencialistas já adotadas

anteriormente, e passou a fornecer “um serviço gratuito de transporte para os

retirantes que desejassem se deslocar para as lavouras de café no Centro-Sul e

para a Amazônia, a fim de trabalhar nos seringais” (SILVA, 2010, p. 102), praticando

assim mais uma política de apoio à migração, responsável pelo êxodo rural nos

estados nordestinos, estimulando e acentuando o esvaziamento do Semiárido.

3.2 A INSPETORIA DE OBRAS CONTRA AS SECAS (IOCS)

No período de 1903-1904 ocorreu outra grande seca na região, muito mais

severa que as duas anteriores, atingindo quase toda a região nordestina, fazendo

novas vítimas e provocando mais uma migração em massa. No entanto esta seca

exigiu mais esforço do governo, pois as Frentes de Trabalhos solicitavam cada vez

mais recursos financeiros da República, assim os recursos de combate à seca

passaram a constar na Lei de Orçamento da República.

Dessa maneira, no ano de 1909 foi criada a Inspetoria de Obras Contra as

Secas (IOCS), sendo o primeiro órgão federal com o objetivo de sistematizar o

combate às secas.

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Por falta de especialista no Brasil, o órgão recém-formado trouxe cientistas

estrangeiros com a finalidade de realizar estudos científicos sobre as periódicas

secas. Ao final dos estudos foram elaborados relatórios que apontavam prováveis

soluções ao problema posto; tratava-se de uma política de armazenamento de água

para suprir a população e a agricultura durante os longos períodos de estiagem, a

qual ficou conhecida como a “solução hidráulica” (Oliveira, 2006).

Durante a seca de 1915, o IOCS, iniciou a construção de açudes e a

perfuração de poços na região, pois, acreditava-se que o acesso à água se daria

através das obras hidráulica. Visando favorecer o desenvolvimento econômico do

Nordeste, o órgão também investiu na construção de rodovias, mudando dessa

maneira sua característica de instituição de pesquisa para infraestrutura. Dessa

maneira, o IOCS sofreu uma reestruturação administrativa e transformou-se na

Inspetoria Federal de Obras Contra as Secas (IFOCS) através do Decreto nº 13.687,

de 9 de julho 1919.

3.3 A INSPETORIA FEDERAL DE OBRAS CONTRA AS SECAS (IFOCS)

A Inspetoria Federal de Obras Contra as Secas intensificou a execução de

projetos hidráulicos, como construção de portos, barragens, açudes e poços,

realizou ainda um importante estudo sobre as potencialidades e os limites do clima,

do solo e da vegetação do Semiárido.

Durante a atuação do IFOCS o Nordeste sofreu quatro secas consecutivas,

1908/1909, 1910, 1914/1915, 1919/1921 e a de 1932, sendo a mais danosa a

ocorrida entre 1919 e 1921, onde o IFOCS alegou não possuir recursos suficientes

para amenizar os efeitos causados por uma seca tão longa, fazendo com que em

1920, fosse criada a Caixa Especial de Obras de Irrigação de Terras Cultiváveis do

Nordeste Brasileiro, mantida com 2% da receita tributária anual da União.

Neste mesmo período o IFOCS passou a receber críticas que alegavam que

suas obras estavam ligadas aos interesses das oligarquias da região, notícias da

época contavam que açudes eram construídos em terras de grandes latifundiários,

favorecendo uma elite agrária. Houve também denúncias sobre o desvio de recursos

destinados à construção de obras hidráulicas e de uso indevido do órgão público

(Castro, 1992; Villa, 2000).

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Sobre as denúncias de corrupção Castro (1992, p.71) lembra que “a velha

oligarquia agrária consegue manter sob seu controle alguns espaços de poder,

sobretudo o poder local, em nível de município, apoiando as forças mais retrogradas

da política nacional nos setores estadual e federal”. Nesse sentido, o IFOCS

funcionava segundo Castro (1992) sob o domínio da elite agrária, o que favorecia

para que os sertanejos mais pobres continuassem vulneráveis aos efeitos da seca.

Além das denúncias sobre corrupção o esforço realizado pela IFOCS no

Semiárido, se mostrou insuficiente para resolver os problemas decorrentes das

secas, uma vez que a técnica usada para o armazenamento da água não funcionava

como planejado, o solo apresentava elevada capacidade de infiltração, o clima com

alta temperatura favorecia a evaporação da água armazenada nos açudes,

contribuindo para que mesmo com tantas obras os habitantes do Semiárido

continuassem vulneráveis aos efeitos das secas.

3.4 O DEPARTAMENTO NACIONAL DE OBRAS CONTRA AS SECAS (DNOCS)

Em 1945, ano em que o Nordeste sofria as consequências de mais uma

grande seca, o IFOCS foi extinto e criou-se o Departamento Nacional de Obras

Contra as Secas (DNOCS), com o propósito de combater os efeitos da seca nas

suas dimensões física e de infraestrutura, através de construção da engenharia

jamais vista no Nordeste. Tratava-se das “obras contra as secas”, ou seja,

acreditava-se mais uma vez numa solução hidráulica, em que a construção de

açudes seria suficiente para armazenar água, para uso nos períodos de estiagens.

A diretoria do DNOCS assim como o IFOCS indicava que a solução para os

problemas causados pela seca seria alcançada através de grandes obras da

engenharia. Nos primeiros anos de funcionamento, o DNOCS executou obras de

infraestrutura viária, mantendo o mesmo padrão de investimento anterior, mas a

situação tendia a se modificar.

Embora tratasse de um órgão nacional, o DNOCS centrou suas atividades no

semiárido nordestino, áreas mais vulneráveis ao fenômeno da seca, onde passou a

realizar grandes obras como perfuração de poços, construção de barragens, açudes

e de implantação de perímetros irrigados. Todas as obras eram tecnicamente

planejadas com o objetivo de expandir a irrigação, promovendo a agricultura irrigada

no Semiárido (VELOSSO, 2000).

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O investimento na agricultura irrigada no Nordeste representava “a primeira

manifestação do planejamento da atividade governamental para resolver os

problemas da economia regional”, sendo que a criação de perímetros irrigados tinha

por objetivo minimizar os efeitos da seca na agricultura, reduzido o atraso

econômico do Nordeste em relação ao Centro-Sul. (OLIVEIRA, 1977, p. 44)

Todavia Bursztyn (1985) enfatiza que a proposta de irrigação privilegiava

principalmente as terras de grandes fazendeiros, mantendo excluída do projeto uma

grande parcela de população carente, não causando assim um desenvolvimento

social, e funcionava principalmente para a manutenção do poder da oligarquia rural

e a concentração de terra. Percebe-se que a lógica da utilização do patrimônio

público para benefício de uma classe de coronéis e grandes fazendeiros regionais

ainda persistia, pois, como órgão meramente operacional, o DNOCS ficava a mercê

dos interesses políticos de certos grupos, e ainda mais, “as máquinas e

equipamentos do DNOCS eram utilizados por fazendeiros ao seu bel-prazer”

(FURTADO, 1997, p. 86).

Com a utilização do DNOCS para benefício dos grandes latifundiários

regionais, além de não resolver os efeitos da seca para o sertanejo, o governo

auxiliou ainda para o acirramento de outro problema, a concentração de terras, e a

não reforma agrária no semiárido.

Dessa maneira, ao pequeno agricultor restava apenas a sujeição à

remuneração que os donos das fazendas quisessem pagar, visto que não possuíam

condição para produzir em seus pequenos lotes. A esse respeito, Furtado (1997, p.

86) lembra que “nas terras irrigadas com água dos açudes construídos e mantidos

pelo governo federal, produzia-se para o mercado do litoral úmido, e em benefício de

alguns fazendeiros que pagavam salários de fome”. Em resumo, a seca era

favorável política e economicamente para pequenas oligarquias da região semiárida.

Percebe-se, assim que aos pequenos agricultores restavam apenas vender

força de trabalho, que conforme Furtado (1997) era um salário que malmente

garantia a sobrevivência do trabalhador, consentido que a população sertaneja se

mantivesse dependente dos grandes latifundiários. Desse modo, os projetos de

irrigação que deveriam por fim à miséria do campo, fortalecendo a agricultura local,

passou a favorecer a concentração de terra e de renda.

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Apesar de não resolver os problemas de convivência com a seca, o DNOCS

funcionava a todo vapor, executando diversos projetos, a ponto de Castro (1992)

apontar que parecia um canteiro de obras o Nordeste brasileiro.

Em meio a esta situação, foi criado ainda o Banco do Nordeste do Brasil

(BNB) em 1952, com o principal objetivo de aplicar os recursos destinados às

construções das obras de combate às secas, além das verbas destinadas às

medidas assistencialistas, que também eram administradas pelo DNOCS.

Simultaneamente, o BNB passou a apoiar a economia do Nordeste,

executando projetos para estimular a economia local como a concessão de crédito

rural e projetos de redescontos rurais para pequenos produtores. Almeida (1986, p.

77), tornou-se o primeiro presidente do BNB e pode fazer a seguinte observação:

(...) nós examinávamos a experiência de combate aos efeitos da seca, e mostrávamos que a solução de engenharia era uma solução insuficiente, que era preciso pensar em termos econômicos, sociais e agronômicos e que não se devia cuidar somente da seca e do polígono das secas, mas da região que era afetada por ele, ou seja, de todo o Nordeste. Era preciso pensar em termos econômicos.

Estava clara a preocupação de Almeida (1986) em pensar o Nordeste para

além das obras hidráulicas, neste sentido, desenvolveu-se projetos de incentivo ao

crédito rural para garantir o funcionamento da economia nordestina, conciliada com

a política de combate aos efeitos da seca, entretanto, esta foi mais uma instituição

apontada por Bursztyn (1985) que favoreceu uma classe nordestina já privilegiada,

ou seja, a oligarquia agrária.

O objetivo dos projetos desenvolvidos pelo DNOCS apoiado pelo BNB era de

diminuir o efeito das secas sobre a vida dos pequenos agricultores, no entanto no

ano de 1958, o Nordeste enfrentou a seca mais severa desde a criação do DNOCS.

As obras implementadas até o momento não se apresentaram como eficientes no

que se refere no combate aos efeitos da seca, ou seja, a ocorrência da seca

continuava causando fome, êxodo rural e desnutrição no semiárido.

Neste mesmo período a instituição passou a receber inúmeras denúncias de

corrupção. Já falou-se da denúncia apresentada por Celso Furtado (1997), mas

outros tantos apontavam a existência das fraudes do DNOCS. A esse respeito Josué

de Castro (1967, p. 194) informa que

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Mais grave ainda que a miopia técnica fora a mistificação política em que caíra este organismo ao qual competia, também, a distribuição e aplicação das polpudas verbas para ajuda aos flagelados das secas. Nenhum outro organismo técnico fora tão desvirtuado em seus objetivos do que este que canalizava para os bolsos dos senhores de terras e dos seus apaziguados quase todos os recursos que deviam ser destinados a alimentar, a educar, a ajudar a viver os camponeses da região.

Furtado (1998, p. 21) lembra que “quando acontece uma seca, toda a

estrutura sofre, mas o peso maior é suportado pelos que estão mais embaixo”. A

seca provocaria a devastação da produção agrícola, e embora os grandes

proprietários sofressem os prejuízos das longas estiagens, para o sertanejo, a seca

se resumiria em fome, o que demostrava como era frágil a economia da região

Nordeste.

Sobre as ações desenvolvidas pela DNOCS, Suassuna (2002, p. 5) ressalta

que

(.....) o órgão foi dominado pela elite regional e serviu aos interesses dos grandes proprietários rurais acabando, portanto, por permanecer durante décadas nas mãos de políticos oligárquicos, apropriação privada e seletiva dos benefícios, portanto, por permanecer durante décadas nas mãos de políticos oligárquicos, combater a seca representava, quase exclusivamente, a construção de grandes obras de engenharia para represar água.

Conforme exposto por Suassuna (2002) a seca tornou-se um grande negócio

para a elite rural, que se beneficiavam com os recursos públicos. As obras

realizadas pela Instituição concentravam-se, principalmente, nos grandes latifúndios.

O autor enfatiza que a elite econômica e política nordestina assumiu um papel

central na trajetória do DNOCS, onde as ações continuaram servindo muito mais

para manter a realidade existente no semiárido do que modificá-la.

Durante a ocorrência de mais uma grande seca a de 1951/1953, que teve

efeito devastador sobre o semiárido, ficou nítido que as políticas de combate aos

efeitos da seca não haviam causado efeitos duradouros sobre a situação de pobreza

das áreas atingidas pelo fenômeno natural.

Almeida (1995) explica que a relação do DNOCS em relação ao flagelo das

secas, se justificava pelo domínio exercido pelos políticos no desenvolvimento das

ações da instituição. Os políticos oligárquicos serviam aos interesses dos grandes

proprietários rurais, que por sua vez mantinha sob seu controle uma grande área

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eleitoral, através da troca do voto por benefícios concedidos pelo governo, como por

exemplo, água, sementes e alimentos.

Em relação às obras que deveriam ajudar a combater os efeitos da seca,

Rebouças (2004, p.56) faz as seguintes observações:

Verifica-se que muito investimento improdutivo e operacionalmente não sustentável foi feito, seja porque os grandes e pequenos açudes mais servem para evaporar água do que para regularizar a sua oferta, seja porque os grandes açudes, que poderiam ser uma fonte confiável de água, não se integraram numa política pública de uso racional da água, uma vez que os meios necessários nunca foram sequer construídos – sistemas de adução, canais e adutoras, por exemplo – para conduzir água para onde a maior parte da população da região vive e trabalha.

É notória, através da reflexão do autor a fragilidade das obras de engenharia

construídas pelo DNOCS, onde os açudes não conseguiam armazenar quantidade

de água suficiente para o período de estiagem. Percebe-se ainda, a falta de uma

política de uso racional de água. Outro fator questionado pelo autor é a falta de

infraestrutura para levar a água do açude onde a maior parte da população sertaneja

vive e trabalha.

3.5 O GRUPO DE TRABALHO PARA O DESENVOLVIMENTO DO NORDESTE

(GTDN)

Sobre a influência de mais uma seca, a de 1958, em 1959 formou-se o Grupo

de Trabalho para o Desenvolvimento do Nordeste (GTDN) sob a responsabilidade

de Celso Furtado, o então diretor do Banco Nacional de Desenvolvimento

Econômico (BNDE), com o objetivo de planejar alternativas permanentes para o

desenvolvimento da região.

Com este pensamento, o GTDN elaborou o relatório, Uma política de

Desenvolvimento para o Nordeste, onde explicou que, a causa do atraso econômico

do Nordeste em relação ao Sul, dava-se mais por questões como a concentração de

renda na mão da elite agrária, formação de grandes latifúndios, agricultura que

funciona de forma arcaica e a existência de um sistema social patriarcal, do que

propriamente por causa do fenômeno da seca, uma vez que a situação de pobreza

nas áreas úmidas da região Nordeste também era latente (GTDN, 1997).

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A questão do subdesenvolvimento do Nordeste pela primeira vez estava

sendo desvinculada da questão hídrica, para uma questão muito mais ampla, como

a distribuição desigual de renda e a concentração de terra. Como possível solução

foi indicada pelo GTDN a implementação de uma política industrial no Nordeste

como forma de dinamizar a economia e promover o desenvolvimento da Região

através de um plano de ação considerando os seguintes pontos:

a) promover oferta de emprego à massa populacional flutuante; b) substituir a antiga classe dominante (oligarquia) por uma classe dirigente que visasse o desenvolvimento; c) providenciar para o Nordeste capitais formados em outras atividades econômicas; d) através da industrialização concederia autonomia e expansão manufatureira; e) transformar a economia agrícola da faixa úmida pela ampliação da oferta de alimentos; f) deslocamento da fronteira agrícola do Nordeste para a faixa úmida do hinterland maranhense (GUMIERO, 2014, p. 10).

Para concretização do proposto pelo referido relatório, formou-se o Conselho

de Desenvolvimento Econômico do Nordeste (CODENO), que apontou para a

necessidade da criação de uma autarquia, “o que significava ter um nível

institucional equiparado a de um Ministério, o qual respondia diretamente a

Presidência da República.” (FURTADO, p.12). Para o desenvolvimento do

planejamento elaborado pela GTDN, definiu-se pela criação da Superintendência do

Desenvolvimento do Nordeste (SUDENE, 2000).

3.6 A SUPERINTENDÊNCIA DO DESENVOLVIMENTO DO NORDESTE (SUDENE)

Na perspectiva da concretização do relatório, Uma Política de

Desenvolvimento para o Nordeste, em 1959, foi instituída a Superintendência do

Desenvolvimento do Nordeste (SUDENE, 2000), com a missão de promover o

desenvolvimento da Região Nordeste, através da modernização da infraestrutura e a

reorganização da economia nordestina com base numa política de industrialização.

A SUDENE possuía em seu organograma além da função de superintendente

uma Secretaria Executiva, composta por técnicos e burocratas; e um Conselho

Deliberativo, composto por ministros, e os nove governadores da Região Nordeste e

do estado de Minas Gerais, sendo que possuía como área de atuação da SUDENE

a região norte, haja vista que ela compõe a região semiárida brasileira, também

chamado Polígono das Secas.

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Na busca pela superação dos problemas decorrentes da utilização indevida

da estrutura do DNOCS, ao se instituir a SUDENE, esta ficou como supervisora do

DNOCS, o qual passou a se responsabilizar pela execussão de obras de

aproveitamento de água, extinguindo-se seu papel na execução de obras

rodoviárias, as quais ficaram sob a responsabilidade dos governos federal e

estadual (FURTADO, 1997).

A nova posição da DNOCS diante da constituição de um novo órgão causou

resistência na bancada nordestina, na Câmera dos Deputados Federais, que era

formada por políticos conservadores, “particularmente o pessoal que vive direta ou

indiretamente da seca” (FURTADO, 1998, p.20).

Furtado (1998) faz referência aos desvios dos recursos destinados à seca,

para favorecer a elite nordestina. A instituição já vinha sofrendo denúncias de

corrupção deste a época do IFOCS, tendo sua imagem bastante desgastada por não

ter conseguindo evitar as situações de calamidade durante as secas em que atuou

como órgão responsável por combater os efeitos da seca.

O primeiro Plano Diretor da SUDENE tratava do estabelecimento de uma

política de modernização da infraestrutura na Região. Houve um grande significativo

investimento no setor da energia elétrica, transporte e nos serviços de

abastecimento de água. Nos centros urbanos, tratou ainda de reformular a política

de aproveitamento de recursos hídricos.

Para favorecer a reorganização da economia nordestina, a SUDENE

incentivou a formação de empresas privadas especializadas em diferentes setores

produtivos, através dos incentivos fiscais, nas áreas de caatinga, mas também na

Zona da Mata, com o objetivo da garantia de um “aproveitamento mais racional dos

recursos de terra, colonização da zona úmida, do Maranhão e Sul da Bahia,

coordenação dos investimentos públicos e privados para as indústrias de base”

(GUMIERO, 2014, p.12).

Por meio de estudos científicos a SUDENE analisou as instituições públicas já

existentes no Nordeste, com o objetivo de conhecer os erros e acertos ao longo das

suas execuções, assim, em relação a produção rural, foi desenvolvido o programa

de desenvolvimento agropecuário do Nordeste, uma articulação interinstitucional

entre, Ministério da Agricultura, o DNOCS, o Conselho do Vale do rio São Francisco

(CVSF), o Banco do Nordeste do Brasil e outros órgãos com a supervisão e

investimento de fundos da SUDENE (GUMIERO, 2014).

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O Segundo Plano Diretor da SUDENE além de dar continuidade às ações do

primeiro plano empregou maior atenção à questão social, fazendo investimentos na

qualificação profissional local, já que faltava mão-de-obra especializada no Brasil,

promovendo a expansão da educação técnica e superior. A questão da expansão do

ensino no Nordeste era percebida como essencial para o sucesso da

industrialização na região, no entanto os investimentos na área da educação eram

voltados para favorecer a industrialização. Sobre isso Furtado (1984, p. 8) reflete

que

O desenvolvimento não é apenas um processo de acumulação e de aumento de produtividade econômica, mas principalmente uma via de acesso a formas sociais mais aptas para estimular a criatividade humana e

para responder às aspirações de uma coletividade.

Nota-se que embora a capacitação humana estivesse voltada para o

processo industrial, que estava sendo implantado na região, havia pela parte do

órgão executor do processo uma preocupação com o capital humano, de forma que

os empregos gerados pelas indústrias fossem ocupados pelos nordestinos, evitando

assim o deslocamento de uma população para ocupar empregos gerados no

Nordeste, no entanto, segundo Bursztyn (1985) os cargos para os quais era

necessário maior capacitação acabaram por ser ocupados por pessoas oriundas de

outros estados e até mesmo de outros países.

Além das medidas para a industrialização do Nordeste, Furtado (1959)

acreditava que uma Lei de Irrigação seria fundamental para evitar que os recursos

destinados aos perímetros irrigados fossem desviados e não favorecessem os

pequenos agricultores. Assim por influência de Furtado, que se tratava do primeiro

Superitedente da SUDENE

Em 1968, o Governo Federal instituiu o Grupo Executivo de Irrigação e Desenvolvimento Agrário (GEIDA), que, em 1970, lançava os delineamentos de uma política de irrigação para o Brasil, através do Programa Plurianual de Irrigação (PPI). A maior parte dos investimentos do PPI foi destinada à Região Nordeste (...) Em 1970, o Programa de Integração Nacional (PIN) contemplou o financiamento da primeira fase do Plano Nacional de Irrigação (BRASIL, 2008, p. 09).

O Primeiro Plano Nacional de Irrigação viabilizou para a implantação de

políticas públicas de irrigação que privilegiou especialmente a região semiárida do

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Nordeste, aparti de 1970, muitos projetos de irrigação foram iniciados, a exemplo

dos perímentros irrigados e da fruticultura irrigada, mantendo o foco no

desenvolvimento rural.

Furtado (1959) lembra que, durante o desenvolvimento das metas traçadas

pela SUDENE, a instituição também fazia uso de medidas paliativas como a

distribuição de água e alimentos para tentar amenizar os problemas causados pela

seca de 1958 que destruiu as lavouras, deixando muitas famílias sertanejas na

miséria. O DNOCS por sua vez continuava como uma instituição de construções

hídricas, agora, no entanto sob a supervisão da SUDENE.

Em relação aos planos diretores da SUDENE, Gumiero (2014, p.14) explica

que

O Segundo Plano Diretor da SUDENE foi elaborado para o período de 1963/65 e seguiu de modo geral as diretrizes estabelecidas pelo seu antecessor. As mudanças ocorridas do Primeiro para o Segundo Plano Diretor da SUDENE foram redução dos investimentos em infraestrutura de 75% para 46%. No setor de produção, os investimentos elevaram-se de 15% para 24%. No fator humano e bem estar social os investimentos ampliou de 5% para 15%.

Aqui fica perceptível o pensamento de convívio com o semiárido, e não mais

do combate à seca com as grandes obras hídricas dos períodos anteriores. Neste

ponto o desenvolvimento social e econômico foi privilegiado, na tentativa de

dinamizar a economia local com a produção agropecuária adaptada às condições

climáticas locais.

3.7 A SUDENE E A MILITAR

O Segundo Plano Diretor da SUDENE foi interrompido pelo Golpe Militar de

1964, que derrubou o então presidente eleito democraticamente João Goulart,

levando à presidência do Brasil o Militar Humberto de Alencar Castello Branco.

Durante a Ditadura Militar, Celso Furtado o principal mentor da SUDENE foi exilado,

e a SUDENE perdeu sua autonomia como Autarquia, passando a ser uma agência

confiada ao Ministério do Interior (MINTER).

Sob o comando militar, a SUDENE, sofreu cortes no orçamento, centrando

suas ações em medidas assistencialistas para atender os flagelados da seca, e em

contrapartida retomou as ações para o projeto hidráulico nordestino. No discurso a

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medida era para realizar um aproveitamento das construções realizadas

anteriormente pelo DNOCS, visto que haviam sido construídos diversos açudes e

barragens. Na prática beneficiou a agricultura irrigada e, por conseguinte os

fazendeiros locais, apesar de terem apontado que iriam superar o modelo político

adotado até o momento.

Além do aproveitamento da estrutura hidráulica já instalada, a SUDENE do

período militar centrou esforços na insdustrialização, contudo, essa ocorreu por meio

de incentivos a empreendimentos que se instalaram na área litorânea do Nordeste, e

não na região semiárida.

Entre os anos de 1964 e 1984, uma sucessão de programas governamentais

foram implementados na tentativa de ampliar o desenvolvimento econômico

nordestino, a esse respeito Colombo (2014, p.243) explica que:

A SUDENE não foi extinta porque os militares sabiam que o Nordeste continuava a destoar em níveis de desigualdade quando comparado com as demais regiões e que a exclusão da Superintendência, naquele momento, poderia causar um desgaste ainda maior à região. Todavia, os resultados que a SUDENE apresentava não eram condizentes com o que Furtado desejou inicialmente.

Nota-se que embora a SUDENE tenha sido mantida, os governos militares

que presidiram esta instituição durante todo período militar, que se instalou em 01 de

abril de 1964 e se estendeu até 15 de março de 1985, não seguiram o que estava

estabelecido no planejamento da instituição, fugindo assim do seu foco principal,

que era promover o desenvolvimento econômico do Nordeste.

Houve ainda neste período o fortalecimento do DNOCS que havia perdido

autonomia com a formação da SUDENE, porque após seu fortalecimento, passou a

ser supervisionado por sucessivos coronéis do exército brasileiro, que segundo Villa

(2000) não apresentavam uma real preocupação com a situação dos sertanejos,

focando as ações da instituição para fortalecer o poder da oligarquia agrária.

As secas, no entanto, permaneceram assolando o Nordeste, a mais intensa

dos anos iniciais do governo militar foi a de 1969/1970, e os órgãos governamentais

de atuação na região, mostraram-se despreparados para lidar com eficientemente

com elas.

Um dos maiores problemas existente no período e que em medida

semelhante ainda ocorre e ampliavam os efeitos danosos da seca era a grande

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concentração de terras, tal como aponta Villa (2000), mais de 50% das terras

estavam nas mãos de pouco mais de 2% da população na década de 1970. Os

governos militares não apoiavam o planejamento da SUDENE no que diz respeito à

reforma agrária, garantindo assim a perpetuação do problema e o favorecimento

uma elite rural. Para acentuar ainda mais os benefícios aos grandes proprietários de

terra, o governo continuavam realizando obras em propriedades particulares.

Sem êxito para combater os efeitos da seca, a Ditadura Militar construiu mais

açudes na região, os quais possuíam uma estrutura física que resistiram por pouco

tempo até se deteriorarem completamente.

As medidas tomadas durante o governo militar segundo Bursztyn (1985)

estavam muito mais ligadas à preocupação dos militares em conter a agitação no

campo, e evitar uma reforma agrária do que em solucionar os problemas causados

pelas secas.

Nesse sentido, foram implantados, o Programa de Integração Nacional (PIN)

que tinha como objetivo a transferência da mão-de-obra do Nordeste para a

Amazônia, incentivando desta forma a migração; o Programa de Redistribuição de

Terras e Estímulo à Agroindústria do Norte e Nordeste (PROTERRA),que visava o

aproveitar as águas do São Francisco e dos açudes já existentes para irrigação e

pecuária de pequenos núcleos e o POLONORDESTE que objetivava criar alguns

polos rurais de desenvolvimento, espalhados pelo Nordeste; e o Projeto Sertanejo,

que visava aumentar a resistência do estabelecimento agrícola contra os efeitos da

seca (BURSZTYN,1985).

Segundo Bursztyn (1985) todos esses projetos não pareciam apresentar

efeitos duradouros, já que havia uma execução equivocada dos projetos, que não

permitia ao sertanejo uma melhor qualidade de vida. Esse equívoco segundo o autor

está relacionado à falta de assistência técnica aos agricultores e até mesmo a falta

de água nos perímetros irrigados, além do desvio de verbas públicas.

A década de 1970 também foi marcada por grandes empreendimentos na

infraestrutura, tendo, por exemplo, a transposição de bacias, perímetros irrigados,

exploração mineral, ferrovias e construção de barragens, além de atrair para a

região megas empresas, consolidando a industrialização.

No entanto Colombo (2014, p.54) lembra que os empreendimentos ocorriam

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não mais por um sistema planejado, nos moldes do antigo órgão, mas por meio do controle, pelo Governo Federal, da política de desenvolvimento regional, empreendida agora sob as vestes dos Planos Nacionais de Desenvolvimento.

Conforme se pode notar a atual SUDENE, havia se distanciado da ideia de

um desenvolvimento planejado e sustentável, conforme pregava seus planos

diretores, adotando uma postura inteiramente capitalista, atraindo para Região

empresas descompromissadas com a sustentabilidade e as questões sociais. Vale

destacar que como consequência da falta de um planejamento eficaz, a instalação

das indústrias provocou a migração em massa das pessoas do campo para cidade,

constituindo assim um êxodo rural, provocando a precarização da vida nos centros

urbanos, adensamento das favelas próximas aos pólos industriais, e a

desvalorização da mão-de-obra nas indústrias.

A SUDENE estava muito aquém do planejado pelo seu mentor Celso Furtado

e embora o Nordeste tenha crescido muito economicamente, nas décadas de 1970 a

1980, não existiu uma distribuição de renda, o que provocou níveis de desigualdade

muito acentuados na região. Os grandes complexos industriais correspondiam uma

lógica de mercado internacional, o que pouco favoreceu para o desenvolvimento

local.

Durante os anos de 1979 até 1985 ocorreu à seca mais longa do Nordeste

com duração de sete anos. Para amenizar os efeitos de uma seca tão longa o

governo militar optou por investir ainda mais nas frentes de trabalhos, mais de 1,5

milhão de pessoas se alistaram. Só que pela primeira vez as frentes de trabalhos

passaram a realizar obras principalmente hídricas, em propriedades privadas, ou

seja, os trabalhos que inicialmente deveriam ser exercidos apenas em obras

públicas passaram a ser executados em obras privadas.

Sobre essa medida Castro (1992) lembra que, o governo militar argumentava

que os trabalhos em obras privadas manteriam os sertanejos em seus lugares de

origem, evitando assim o deslocamento da população do Nordeste para realização

de trabalhos em outros lugares distantes, porém a autora adverte que essa era mais

uma manobra encontrada pelo Governo de beneficiar a elite agrária do Nordeste e

que a grande repercussão do caso, fez com que as frentes de trabalhos nas

próximas secas voltassem a ser realizadas apenas em obras públicas.

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51

3.8 A SUDENE E O PROCESSO DE REDEMOCRATIZAÇÃO DO BRASIL

Com a redemocratização do Brasil, em 1985, a SUDENE “revelou-se uma

instituição esfacelada diante de novas opções que se configuravam para o próprio

Nordeste” (COLOMBO, 2014, p. 203). A Instituição pouco se parecia com aquela

planejada por Celso Furtado, de tanto que se afastou dos seus principais ideais, a

exemplo da reforma agrária e do processo de irrigação.

A SUDENE se mostrou entrelaçada as questões da velha e conhecida

oligarquia nordestina, reproduzindo o clientelismo e paternalismo, onde muitas vezes

suas intervenções encobertavam interesses políticos/partidários. Através de

medidas realizadas com recursos públicos, os políticos que possuíam influência

direta sobre áreas eleitorais, é quem decidiam sua destinação.

A questão é que a corrupção nos órgãos públicos destinados ao combate dos

efeitos da seca já vinham sendo denunciados há bastante tempo. Desse modo,

Pessoa (1987) lembra que a SUDENE havia se tornado a principal reprodutora da

Indústria da seca. Sobre a indústria da seca Pessoa (1987, p.98) explica que

Surge a indústria da seca, quando algo em si natural é usado politicamente para a reprodução histórica de privilégios em favor de minorias. Assim, a pobreza nordestina é menos função da seca, do que da exclusão política a que a maioria da população é submetida. Para tanto, concorre

pesadamente à manutenção da ignorância.

O autor explica que a SUDENE como a principal responsável pela reprodução

da ignorância política e pelo fortalecimento da Indústria da seca, uma vez que eram

mantidos os privilégios, e, portanto, o domínio político da oligarquia agrária.

Nota-se ainda que a indústria da seca não é algo novo no Nordeste, já que

historicamente vem se mantendo esta prática de favorecimento no Nordeste. Assim,

a instituição passou a concentrar gastos públicos injustificáveis, e como as demais

instituições que deveriam estimular o desenvolvimento do Nordeste, passou a

reproduzir as mesmas práticas ligadas ao clientelismo, paternalismo e ao

assistencialismo, que já foram alvos de crítica pela própria instituição.

Com a imagem desgastada, o órgão foi desativado em 2001, e substituído

pela Agência do Desenvolvimento do Nordeste (ADENE), criada em 2002, para

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desempenhar o papel antes exercido pela SUDENE, entretanto no ano de 2004,

após a mudança no Governo Federal a SUDENE foi reestabelecida2.

3.9 RIO SÃO FRANCISCO: IMPORTÂNCIA REGIONAL

Durante o Império, já era reconhecido o grande potencial do Rio São

Francisco na Região Nordeste, no entanto suas águas não eram usadas

adequadamente para minimizar os dramas sofridos na região favorável à ocorrência

da seca. Nesse período correspondente ao ano de 1877 a água do rio perene que

cruza o interior de Minas Gerais e passa por quatro Estados do Nordeste a Bahia,

Sergipe, Alagoas e Pernambuco, era utilizada timidamente, por uma população sem

muitos recursos técnicos.

Foi dado um impulso para o aproveitamento da água do Rio para projetos de

irrigação e desvio de água para abastecer barragens, no ano de 1909 através de

obras hidrícas realizadas pelo IFOCS, porém o enorme potencial do Rio São

Francisco só veio a tona com a construção da Companhia Hidroelétrica do São

Francisco (CHESF) em 1945, que deu um enorme impulso ao desenvolvimento da

Região Nordeste. Oliveira (2001) ressalta que a CHESF representava

Uma das alternativas utilizadas pelo Estado para viabilizar suas estratégias desenvolvimentistas por meio da criação de empresas estatais autônomas e orientadas para a dimensão técnica em detrimento da dimensão política, cujo resultado foi a proliferação de organizações detentoras de melhor desempenho no setor público, sobretudo se comparadas a outras de suas congêneres (2001, p. 11).

Nesse sentido a CHESF representava um avanço do Estado, na promoção de

políticas públicas para a região, tratava-se da maior rede de geração e transmissão

de energia elétrica em alta tensão do País. A área de concessão da CHESF,

inicialmente, beneficiaria os estados nordestinos que estavam incluídos no Polígono

da Seca: Bahia, Sergipe, Alagoas, Pernambuco e Paraíba.

A CHESF apresentava um grande avanço para construir a infraestrutura

necessária, na oferta de energia elétrica, para estimulá-lo o desenvolvimento

industrial no Nordeste, no entanto um marco na história da Companhia demostra

2 Devido a sua longa trajetória e devido as alterações em suas ações (por vários contextos distintos), não houve aqui a pretensão de exaurir toda a sua história, sobre tudo em um tópico de capítulo, assim, trouxemos apenas um breve panorama.

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que ela privilegiou mais as áreas urbanas dos Estados, do que os territórios rurais,

onde a situação de energia e flagelo se mostrava muito mais necessária.

Devido a esta situação, houve a necessidade de criação da Comissão do Vale

do São Francisco, em 1948, tendo como justificativa, o melhor aproveitamento dos

recursos do rio, para favorecer a agricultura irrigada no vale do São Francisco,

promovendo o desenvolvimento econômico da população local. Carvalho (2012)

explica que se tratava de uma rede de proteção hídrica e de proteção social, uma

vez que os projetos de irrigação provocaria uma melhor qualidade de vida, aos

moradores do vale São do Francisco onde até então, a pobreza continuava imutável.

Ainda neste período, sob a justificativa de melhor aproveitamento do potencial

hidráulico do rio, foi apresentado um projeto, propondo a transposição de parte da

água do São Francisco para outras bacias do semiárido. Tal projeto ainda se

encontra em fase de implantação, devido a grande resistência que encontrou na sua

execução, pois colocou em dúvidas a sustentabilidade do rio, e por ao longo da sua

existência, ter favorecido uma classe já abastada com os projetos de irrigação,

permitido que grande parte da população ribeirinha permanecesse na miséria.

A Comissão do Vale São Francisco passou por transformações

administrativas. Tornando-se a Superintendência do Vale do São Francisco

(SUVALE), em 1967, e em 1974, a Companhia do Vale do São Francisco

(CODEVASF), para dar seguimento ao projeto de desenvolvimento à região do Vale

do São Francisco.

O geógrafo Aziz Ab’Sáber, no artigo “A quem serve a transposição?” de 2005,

afirma que:

O risco final é que, atravessando acidentes geográficos consideráveis, como a elevação da escarpa do Araripe – com grande gasto de energia! -, a transposição acabe por significar apenas um canal tímido de água, de duvidosa validade econômica e interesse social, de grande custo, e que acabaria, sobretudo, por movimentar o mercado especulativo, da terra e da política. No fim, tudo apareceria como o movimento geral de transformar todo o espaço em mercadoria. ( AZIZ AB’SÁBER, 2005, p.?)

Dessa maneira percebe-se que a transposição sofre de grandes impasses

devido a questões técnicas bem como das dúvidas por parte da sociedade sobre

seus verdadeiros objetivos, visto que por meio desta transposição não seria possível

solucionar os efeitos da seca, mas aparentemente beneficiar um grupo,

transformando as terras por onde o leito do rio seria desviado mais valorizado.

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3.10 AS SECAS DA DÉCADA DE 1990

A década de 90 entrou para os registros climáticos da Região como a década

mais assolada pela seca no Nordeste e no Norte de Minas Gerais Os anos de 1993,

1996, 1997, 1998 e 1999, foram marcados por longas estiagens, quando o que

separava a demarcação de tempo de uma seca para outra era a ocorrência de

invernos fracos, ou seja, curto período chuvoso que não eram suficientes para a

demanda hídrica da região.

Em decorrência dos efeitos das secas, a população passou a sofrer as

mazelas já conhecidas em tempos de seca, como fome, morte por desnutrição,

perda das lavouras e de criações de animais.

Como já havia ocorrido nas secas anteriores houve o alistamento dos

flagelados nas frentes de trabalhos, e adoção de medidas assistencialistas, como

por exemplo, a distribuição de alimentos. O que nos revela que após décadas de

iniciativas do Governo para contornar os problemas causados pela estiagem, não

parece haver efeitos permanentes dessas intervenções do Estado na vida da

população atingida.

Houve, no entanto modificações no Programa de Frentes Produtivas de

Trabalho (PFPT), que objetivava alistar trabalhadores de áreas atingidas pela seca

para trabalho braçal em obras públicas, passando a permitir a realização do trabalho

em propriedades privadas, se houvesse o compromisso formal do proprietário de

tornar as obras acessíveis à comunidade, para evitar o favorecimento de trabalhos

pagos pelo governo em obras privadas.

Duarte (2000) considerou um avanço no programa, principalmente ao que se

refere à fiscalização do mesmo, que ficaram a cargo das Comissões Municipais. As

Comissões Municipais, criadas em 1993, eram compostas por representantes dos

vários segmentos da sociedade (os poderes executivo, legislativo e judiciário, as

instituições religiosas, as associações comunitárias e os sindicatos dos

trabalhadores). Cabia à comissão a fiscalização do possível cumprimento dos

acordos realizados com os donos das propriedades privadas, as condições de

trabalhos e o pagamento dos salários.

No que se refere à seca de 1998, que se estendeu para 1999, Duarte (2000)

lembra que a mesma estava prevista há mais de um ano pelo Centro de Previsão de

Tempo e Estudos Climáticos (CPTEC), o que sem dúvida marcou um grande

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avanço, na previsão das secas, uma vez que o Estado teria um ano para se planejar

para evitar uma catástrofe social decorrente da seca, no entanto, o autor lembra que

o país passava por um ajuste fiscal, e que o Governo Federal mesmo tendo as

previsões meteorológicas a seu favor não se planejou para agir.

Seis meses após a ocorrência da seca, quando os dramas sofridos pelos

sertanejos já eram denunciados em noticiarios, o Governo Federal instituiu o

Programa Federal de Combate aos Efeitos da Seca (PFCES) trazendo algumas

inovações no combate aos efeitos da seca, através da criação de programas

especiais que se integravam ao programa maior, que era o PFCES, como a

instituição do Programa Especial de Financiamento para Combate aos Efeitos da

Estiagem que objetivava a oferta de linha de crédito, a mini, pequenos, médios e

grandes produtores rurais, ou à cooperativas, com menor taxa de juros comparado

ao mercado financeiro comum, havendo ainda a possibilidade da prorrogação do

pagamento do empréstimo em caso de ocorrência de seca (DUARTE, 2000).

No que se refere às Frentes de Trabalho, estas passaram por modificações

em sua implementação, visto que passou a incluir programas de educação e

capacitação para os alistados, para que os mesmos pudessem após a seca

conseguir o engajamento noutros postos de trabalho, devido à capacitação

adquirida, marcando assim um avanço nas frentes de trabalhos, que nesse

momento atendia pela nomenclatura de Programa Emergencial de Frentes

Produtivas (PEFP) que funcionavam no Nordeste deste a década de 1970.

Fazendo parte do PEFP, o Programa de Alfabetização e Capacitação para

Jovens e Adultos, objetivava alfabetizar os trabalhadores das Frentes Produtivas,

além de lhes ensinar técnicas para o cultivo da agricultura no Semiárido, criou-se

ainda as Frentes Ecológicas, as quais tinham por objetivo ensinar aos alistados às

técnicas de conservação e recuperação ambiental e de capacitá-los para tarefas

relacionadas com o ecoturismo e as Frentes Culturais que deveriam estimular o

artesanato nordestino através da criação de mercados solidários (SUDENE,1998;

DUARTE, 2000).

Observa-se que após um século de políticas públicas direcionadas ao

combate aos efeitos da seca sobre a vida das pessoas, as secas ainda conseguem

flagelar uma população que continua vulnerável aos seus efeitos. Não se pode dizer

ao mesmo tempo, que os governos e a população são surpreendidos pelo fenômeno

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natural, uma vez que o mesmo tornou-se previsível, devido ao grande avanço dos

estudos metereológicos no país.

Sobre esse aspecto Villa (2000) ressalta que as catástrofes causadas pelas

secas, já são demasiadamente conhecidas, no entanto o governo espera sua

chegada para agir, em quanto poderiam agir anteriormente através de programas

permanentes, que preparassem o homem para conviver com o clima.

O que se percebe até aqui, é que o governo estava mais empenhado em

esvaziar o território nordestino, fornecendo mão-de-obra para lavouras noutras

regiões (como Norte e Sudeste) do que criar um planejamento emancipatório para a

região, que sofria com as devastadoras secas.

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4. A GÊNESE DA ASA

No capítulo 3 discutiu-se as intervenções do estado frente às demandas

sociais no Nordeste, e pode-se perceber como foi tratado ao longo de diversas

décadas o problema da má distribuição da chuva nessa Região, assim como no

espaço propício a ocorrência da seca, já que tal fenômeno não ocorre apenas no

Nordeste. Nesse sentido os longos períodos de estiagem levavam a população a

depender dos programas do governo que ocorriam, muitas vezes, em caráter

emergencial, assistencialitas e eleitoreiros.

Frente a esta situação e na busca pela modificação do paradigma existente,

os trabalhadores rurais nordestinos começaram a se expressar e propor medidas

que contornassem os problemas regionais. Esses diálogos começaram a ser

possíveis quando do fim do governda Ditadura Militar em virtude da possibilidade da

sociedade civil emitir opiniões sem as represálias que o regime militar impunha.

Assim, camponeses e as organizações de representação e apoio, como,

Sindicatos dos Trabaladores Rurais, Pastorais da Igreja Catolica, Organizações Não

Governamentais (ONG’s), Associações Rurais, entre outras, se organizavam

buscando intervenções estatais permanentes, para a mitigação e solução dos

problemas, não mais como paliativos. Em 1993, houve a ocupação da sede da

SUDENE, quando da ocorrência de mais uma seca no Nordeste, e a solicitação de

providências eficazes para contornar os problemas advindos com a seca.

Como resposta a grande pressão popular, a SUDENE realiza em maio de

1993 um seminário que envolveu 112 entidades com o tema Ações Permanentes

para o Desenvolvimento do Semiárido Brasileiro. Como produto deste seminário

houve a confecção de um documento proposto pelo Fórum, ali formado, para

definição de um programa permanente com medidas realizadas pelo governo para

garantir um desenvolvimento sustentável no semiárido. O mesmo seria estruturado

de maneira descentralizada por meio de uma gestão democrática, das políticas

agrícolas e agrárias, e de transferência de tecnologias apropriadas (FREITAS,

1993).

Tais propostas foram encaminhadas ao governo federal em julho de 1993, e

foi criado então o Programa de Ações Governamentais para o Nordeste, com ele

houve alterações nas frentes de ação para tratamento da seca, mas que apontavam

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ao menos para uma nova perspectiva de enfrentamento, pois as Frentes de

Emergência passaram a ser chamadas de Frentes Produtivas de Trabalho.

Antes desse Programa ser entregue e iniciado pela presidência da república,

houve um outro episódio que seria imprescindível para bom funcionamento e para a

participação e controle social das políticas de superação do problemas causados

pela seca, a saber, o nascimento da Articulação do Semiárido (ASA), por meio da

articulação de diversas organizações quando da proposição e realização do

seminário sobre o Semiárido, realizado em junho de 1993, Campina Grande na

Paraíba.

Ainda nesse momento a ASA atuava apenas na Paraíba, sendo composto por

diversas entidades paraibanas, formando assim a ASA-Paraíba que posteriormente

serviu de modelo para a estruturação da ASA- Brasil. vale ressaltar que a situação

de êxodo rural e da grave crise hídrica do momento não possibilitava um cenário

favorável à organização dos camponeses.

Nesse cenário, paulatinamente havia a integração e participação de mais

famílias nos diálogos e ações da ASA, que se fortaleciam com os intercâmbios de

saberes, característico de uma organização política de articulação. As formações e

qualificações realizadas pela ASA além de resgatar os saberes locais, propunham e

desenvolviam novas tecnologias para mitigação do problema climático da região.

Como já mencionado, o problema do semiárido é a má distribuição de chuvas

ao longo do ano e irregularidade das localidades onde chove, ademais, há poucos

cursos d’água superficiais. As obras de combate aos efeitos da seca até então se

davam por meio de abastecimento via caminhão-pipa, e grandes obras como

barragens e açudes. Esse modelo favorecia a subordinação dos pequenos

camponeses, enquanto contribuíam para com os grandes produtores e seus

sistemas de irrigação, visto que esses eram os maiores beneficiários do barramento

das águas nessas grandes obras.

Assim, para além das discussões e propostas de políticas para o semiárido,

ocorreram por parte da ASA às primeiras ações na gestão sustentável dos recursos

hídricos para a região do semiárido, por meio do armazenamento de água da chuva,

através de diversas tecnologias sociais, como tanques de pedra, poços, barreiros,

cisternas de placas entre outras, as quais foram implantadas com grande celeridade

pelas diversas comunidades.

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As primeiras cisternas de placas foram desenvolvidas no município de

Soledade-PB, por meio do sistema de micro-financiamento3 para garantir que um

maior número de pessoas fossem beneficiadas com essa tecnologia. (CÁRITAS

BRASILEIRA, 2013)

Ações conjuntas foram desenvolvidas para buscar uma convivência com o

semiárido, entre as entidades que representavam a sociedade civil organizada e as

ONG’s articuladas no Fórum Nordeste uma delas, Programa de Aplicação de

Tecnologias Apropriadas às Comunidades (PATAC), foi vanguardista para a difusão

das cisternas.

O PATAC surgiu em 1970 e atuava inicialmente na periferia de Campina

Grande-PB com a difusão de tecnologias sociais para a construção de moradias. Na

década de 1980, passou a atuar no semiárido paraibano, desenvolvendo ações para

a viabilização de uma agricultura familiar sustentável por meio de técnicas e

metodologias de convívio com o semiárido para manejo de recursos hídricos e de

criação animal e produção vegetal (PATAC, 2000, p. ?).

Assim, o PATAC começou a realizar ações conjuntas com os camponeses e

outras ONG’s e entidades de representação dos camponeses, para a difusão do

processo de construção das cisternas e para ampliar sua instalação. O papel das

ONG’s foi bastante importante no que se refere ao acesso à fundo governamentais

por meio de projetos para implantação das cisternas que auxiliou na manutenção do

trabalho em rede.

Além da qualificação para o aprendizado da técnica de construção das

cisternas, houve outras ações complementares de formação em gestão de recursos

hídricos, e a difusão das práticas de preservação das sementes crioulas/da paixão, o

que culminou com a criação dos Bancos de Sementes Comunitários (BSC).

A tradição de guardar as sementes e plantá-las nos primeiros dias de chuva é

inerente a cultura local, e, portanto, não foi um projeto da ASA, mas que com a

criação da Articulação ganhou força e ampliação em sua difusão. A instalação dos

3 O micro-financiamento foi realizado por meio dos Fundos Rotativos Solidários-FRS. Para maiores informações sobre o funcionamento dos FRS, acessar: http://caritas.org.br/fundo-rotativo-solidario-incentiva-desenvolvimento-economico-de-mais-dez-mil-familias-brasileiras/13299

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BSC garante a perpetuação de espécies nativas e, portanto resistentes ao clima

local e seu uso por parte dos agricultores no período para o melhor plantio4.

No ano de 1999, quando o semiárido brasileiro atravessava mais uma seca,

ocorria em Recife entre 15 e 26 de novembro a 3ª Conferência das Partes da

Convenção de Combate à Desertificação e à Seca (COP3), patrocinada pelas

Nações Unidas. A sociedade civil organizada e atuante na região do semiárido

promoveu o Fórum Paralelo da Sociedade Civil, que contava com a participação de

diversos segmentos da sociedade organizada como os Sindicatos de Trabalhadores

Rurais, Entidades Ambientalistas, Organizações Não-Governamentais, Igrejas

Cristãs, Agências de Cooperação Internacional, Associações e Cooperativas,

Movimentos de Mulheres e as Universidades com o propósito de discutir as

necessidades de intervenção no espaço do semiárido e criar proposta de

intervenções sustentáveis.

Segundo Assis (2009) durante a realização do fórum as discussões teriam

sido bastantes intensas devido à contraposição à política governamental de combate

aos efeitos na seca vigente na época, surgindo assim à necessidade de um espaço

permanente onde as instituições já existentes pudessem se articular politicamente

para pautar a convivência com o Semiárido.

Com este pensamento as diferentes organizações marcam sua união através

de uma articulação permanente. Criando-se oficialmente a Articulação do Semiárido

(ASA), sendo este, sobretudo um espaço politico democrático, onde “diversas

unidades que, através de certas ligações, trocam elementos entre si, fortalecendo-se

reciprocamente, e que podem se multiplicar em novas unidades” (MANCE, 2000, p.

24).

A ASA recém-criada marca seu nascimento, assim por dizer, com a

construção coletiva da Declaração do Semiárido em 26 de novembro de 1999 em

Recife, sendo este um documento que descreve os princípios que regem as

organizações que aderirem a ASA, e os objetivos traçados pela articulação. Desde

então qualquer organização que deseja fazer parte da ASA obrigatoriamente precisa

aderir ao documento.

4 Vale apontar que devido a pressões populares atualmente a legislação foi alterada e houve a legalização das sementes da paixão para o recebimento de financiamentos

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A Declaração do Semiárido Brasileiro, é considerada o documento mais

importante para pautar a convivência com o semiárido, por apontar medidas

sustentáveis para o desenvolvimento do Semiárido.

Em seu escopo a Declaração do Semiárido (p.03, 1999) inclui

O fortalecimento da agricultura familiar, como eixo central da estratégia de convivência com o semiárido, em módulos fundiários compatíveis com as condições ambientais. A garantia da segurança alimentar da região, como um objetivo a ser alcançado a curtíssimo prazo. O uso de tecnologias e metodologias adaptadas ao semiárido e à sua população, como ferramentas básicas para a convivência com as condições da região. A universalização do abastecimento em água para beber e cozinhar, como um caso exemplar, que demonstra como tecnologias simples e baratas como a cisterna de placas de cimento, podem se tornar o elemento central de políticas públicas de convivência com as secas. A articulação entre produção, extensão, pesquisa e desenvolvimento científico e tecnológico adaptado às realidades locais, como uma necessidade. O acesso ao crédito e aos canais de comercialização, como meios indispensáveis para ultrapassar o estágio da mera subsistência.

A Declaração pautava as necessidades mais urgentes a serem tomadas para

o desenvolvimento do semiárido como a universalização do acesso a água e o

fortalecimento da agricultura familiar. Ao contrário de grandes obras hídricas,

propõe-se o uso de tecnologias baratas para captação da água e priorizar o

pequeno proprietário de terras no acesso a tecnologias sociais e a sistemas de

créditos de forma que a segurança alimentar seja assegurada.

Na visão de Baptista (2010) As propostas elaboradas pelo documento citado

só poderiam ser descritos por organizações que conheciam o semiárido e sabiam

que seria possível criar uma estrutura adequada para que os sertanejos viverem

com dignidade nos períodos de seca.

Segundo a ASA (2008) as trocas de experiências durante a oficialização da

articulação, fez com que os presentes percebessem que a Articulação do Semiárido

deveria nascer juntamente com um grande projeto que incluísse as metas descritas

na declaração do seminário, desse modo é lançado à ideia no fórum da construção

de cisternas de placas em todo semiárido para garantir a água para beber e

cozinhar, já que a experiência da implantação dessas cisternas por algumas

instituições havia alcançados resultados positivos.

Para Batista (2010) a proposta das cisternas demostravam como tecnologias

sociais e baratas podiam funcionar como políticas permanente de convivência com o

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semiárido, outro fator positivo ao acolhimento da proposta era que a ASA não

poderia correr o risco de se constituir como uma grande articulação sem um projeto

que demonstrasse em todo Semiárido a sua bandeira de convivência com o

semiárido.

Ainda para o mesmo autor, muitas instituições não tinham qualquer

experiência com a construção de cisternas de placas, no entanto se mostraram

favorável ao projeto e se dispuserem a apreender, já que a proposta da captação da

água da chuva se mostrava como uma alternativa para a convivência do semiárido,

devido, sobretudo ao baixo custo do investimento para sua construção e por já haver

exitosas experiências em algumas comunidades.

Com a aceitação da proposta da construção de cisternas de placas de

cimento para captação da água da chuva, os presentes se dispuseram a realizar a

construção conjunta de um projeto para a implantação de diversas cisternas para

captação de água da chuva, com abrangência em toda a região do semiárido, assim

foi concebida a idéia Projeto um Milhão de Cisternas (P1MC).

A proposta das construções das cisternas ainda tinha outro marco histórico,

pela primeira vez, as organizações da sociedade civil do semiárido começam a

desenvolver de forma coletiva um mesmo projeto para ampliar as experiências de

convivência com o semiárido, no entanto ainda caberia à articulação recém-criada a

busca de apoio financeiro para alcançar a meta de um milhão de cisternas

construídas.

Nota-se que na Convenção de Combate à Desertificação e à Seca (COP3) da

Organização das Nações Unidas (ONU), as organizações civis haviam dando

grande passo para sua consolidação enquanto Articulação do Semiárido Brasileiro

não mais se limitando a um único estado haviam lançado a sua própria declaração

como carta de apresentação usada pela agora ASA Brasil até a atualidade e

principalmente a escolha de uma meta em comum, no entanto outros passos

deveriam ser dados em seguida, como à estruturação de um projeto que incluísse

todos os princípios da ASA para as construções das cisternas, a busca de recursos

financeiros para as construções, e a construção das diretrizes da ASA-Brasil.

4.1 A CONSOLIDAÇÃO DA ASA E A CONSTRUÇÃO DO P1MC

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No ano seguinte ao da COP3, em 15 de fevereiro de 2000, na cidade de

Igarassú-PE, ocorria o Primeiro Encontro da Articulação do Semiarido Brasileiro (I

EnconASA), ou seja, de um encontro entre representantes de organizações da

sociedade civil organizada de todo o Semiárido brasileiro que aderiram a Declaração

do Semiárido.

Nesse momento, ainda havia uma coordenação provisória, contudo, foi o

contexto político e democrático mais importante para as organizações que aderiram

a Articulação do Semiárido, pois foi neste espaço que se constitui a Carta de

Princípios da ASA-Brasil, em que é reafirmado os princípios e fundamentos da

articulação, como pode ser conferido a seguir:

A Articulação no Semiárido – ASA – é o espaço de articulação política regional da sociedade civil organizada, no semiárido brasileiro; São membros ou parceiros da ASA todas as entidades ou organizações da sociedade civil que aderem à “Declaração do Semiárido” (Recife 1999) e à presente Carta de Princípios; A ASA é apartidária e sem personalidade jurídica, e rege-se por mandato próprio; respeita totalmente a individualidade e identidade de seus membros e estimula o fortalecimento ou surgimento de outras redes de nível estadual, local ou temático, adotando o princípio de liderança compartilhada; A ASA se fundamenta no compromisso com as necessidades, potencialidades e interesses das populações locais, em especial os agricultores e agricultoras familiares, baseado em: a) a conservação, uso sustentável e recomposição ambiental dos recursos naturais do semiárido; b) a quebra do monopólio de ASA Articulação no Semiárido Brasileiro 2 acesso à terra, água e outros meios de produção - de forma que esses elementos, juntos, promovam o desenvolvimento humano sustentável do semiárido; A ASA busca contribuir para a implementação de ações integradas para o semiárido, fortalecendo inserções de natureza política, técnica e organizacional, demandadas das entidades que atuam nos níveis locais; apoia a difusão de métodos, técnicas e procedimentos que contribuam para a convivência com o semiárido; A ASA se propõe a sensibilizar a sociedade civil, os formadores de opinião e as decisões políticos para uma ação articulada em prol do desenvolvimento sustentável, dando visibilidade às potencialidades do semiárido; A ASA busca contribuir para a formulação de políticas estruturadoras para o desenvolvimento do semiárido, bem como monitorar a execução das políticas públicas; A ASA se propõe a influenciar os processos decisórios das COPs - Conferências das Partes da Convenção de Combate à Desertificação, das Nações Unidas, para fortalecer a implementação das propostas da Sociedade Civil para o Semiárido, e busca articular-se aos outros Fóruns Internacionais de luta contra desertificação.

Com os princípios descritos a ASA-Brasil é um Fórum de organizações que

atuam em prol do desenvolvimento social, econômico, político e cultural do

semiárido brasileiro, sendo uma rede formada por organizações da sociedade civil

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existentes no Semiárido que atuam na gestão e no desenvolvimento de políticas de

convivência com a região semiárida, essas organizações são constituídas com a

missão de fortalecer a sociedade civil na construção de processos participativos

para o desenvolvimento sustentável e a convivência com o Semiárido referenciado

em valores culturais e de justiça social.

Vale ressaltar que a ASA não é uma entidade física e sim uma articulação,

por isso o desenvolvimento dos projetos se fazem presente em diferentes territórios

do semiárido através de suas filiadas. Existem várias entidades e grupos filiados à

ASA que se articulam, tanto no nível de seus municípios, quanto do próprio estado,

já que organizações de nove estados fazem parte da ASA. As articulações dos

Estados são autônomas no encaminhamento de suas programações, propostas e

projetos, desde que respeitem os princípios estabelecidos pela ASA-Brasil descritos

na Declaração do Semiárido e em sua Carta de Princípio.

O Encontro Nacional da ASA (EnconASA) trata-se da mais alta instância de

decisão da ASA que se realiza uma vez ao ano entre os anos de 2000 a 2003,

quando passou a ser bianual. O encontro reúne dois delegados de cada estado, que

são também os dois Coordenadores Executivos de cada ASA Estadual, que são

eleitos nos Encontros Estaduais da ASA, que antecedem o EnconASA. São ainda

nos Encontros Estaduais, que as entidades participantes definem as posições e

diretrizes levadas para o EnconASA. Participam ainda do EconASA os responsáveis

pela Associação do Programa Um Milhão de Cisternas (AP1MC).

A metodologia de ação da ASA pode ser percebida através da valorização

dos saberes tradicionais, e isso faz com que o camponês seja sempre parte do

processo, assegurando sua participação nas decisões dos rumos da ASA; e as

práticas de formação, as quais além de propagar os conhecimentos tradicionais,

incluem a difusão de novas tecnologias.

Tais ações se dão por meio de alguns instrumentos como intercâmbios de

saberes, diagnóstico situacional da comunidade, para levantar a situação hídrica

local e sobre aspectos do solo e outras questões ligadas a agropecuária, do

diagnóstico há a realização de um plano de ação para tratar dos problemas

encontrados e situar as intervenções necessárias para superá-los.

Os intercâmbios são realizados em quatro escalas, a saber, microrregional,

regional, estadual e interestadual por meio de encontros, fóruns, reuniões e outras

tipologias de eventos entre os membros da ASA. Esses encontros são realizados

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entre as ONG’s que compõem a ASA, ou também contando com a presença dos

agricultores. Os temas neles tratados são diversos, como sistema de cultivo e

manejo agroecológico, aspectos sobre os FRS, e discussões diversas sobre temas

de relevante interesse aos princípios da ASA.

Há a representação estadual, e é por meio dela que são construídos os fóruns

de discussões, os quais deliberam sobre os Encontros Estaduais e também os

Encontros Nacionais, assim como sua dinâmica e pauta.

O I EnconASA que tina por objetivo tratar sobre o problema de acesso à água

em períodos de longas estiagens sem o formato assistencialista, e por meio de

práticas que garantissem ações sistemáticas entre seus membros. Sabia-se, no

entanto que as discussões sobre as metodologias a serem adotadas pelo projeto

deveriam ser amplamente discutidas. Assim, foi formado o Grupo de Trabalho

Cisternas (GTCisternas), que em parceria com a coordenação provisória desenhou

o Programa de Formação e Mobilização Social para a Convivência com o Semiárido:

Um Milhão de Cisternas Rurais, com o propósito de elaborar um pré-projeto para o

planejamento da construção de um milhão de cisternas no semiárido; tratava-se de

dar corpo a ideia das construções das cisternas originada ainda na COP3.

Esse projeto foi criado seguindo um planejamento baseado em duas

instâncias,

A primeira, que abrangia toda a regiãodo semiárido, era o GT Cisterna, coordenado pela Diaconia. A segunda era composta pelosGrupos de Trabalho Estaduais (GTEs), responsáveis pelas articulações em cada um dos 10 estados-alvo do Programa (Piauí, Ceará, Rio Grande do Norte, Paraíba, Pernambuco,Alagoas, Sergipe, Bahia, Minas Gerais e Espírito Santo) (FERREIRA, 1993, p. 15).

Através do desenvolvimento do projeto P1MC a ASA pretende

Contribuir com o processo educativo e de transformação social, gerenciado pela sociedade civil, visando a [sic] preservação, o acesso, o gerenciamento e a valorização da água, como um direito essencial da vida e cidadania, ampliando a compreensão e a prática da convivência sustentável e solidária com o ecossistema do semiárido (ARTICULAÇÃO DO SEMIÁRIDO BRASILEIRO, 2001, p. 19).

Nota-se que o P1MC não trata apenas de construções de cisternas, mas da

promoção de uma transformação social no Semiárido por meio da ampliação de

práticas sustentáveis de convivência com o semiárido, onde o acesso e o

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gerenciamento da própria água são vistos como direito essencial à vida. Neste

sentido o P1MC ainda incluiu seis pontos principais a serem considerado no seu

desenvolvimento “Conviver com o semiárido, orientar os investimentos, fortalecer a

sociedade, incluir mulheres e jovens, cuidar dos recursos naturais e buscar meios de

financiamentos adequados” (DECLARAÇÃO DO SEMIÁRIDO BRASILEIRO, 1999,

p.02).

Pode-se perceber que as estratégias descritas pela Declaração do Semiárido

a ser considerado no desenvolvimento do P1MC, possibilita o surgimento de um

novo paradigma no desenvolvimento de projetos no semiárido uma vez que é

explícito o desejo de fortalecer a sociedade, incluindo mulheres e jovens e,

sobretudo o cuidado com os recursos naturais no Semiárido, tendo ainda o desafio

de buscar meios de financiamentos adequados para P1MC, ou seja, que respeitem

os compromissos estabelecidos pela Carta de Princípios e a Declaração do

Semiárido que rege a ASA.

Para garantir a execução desse projeto fez-se necessário realizar a

mobilização para captação de recursos, para o financiamento das obras. Dentre os

financiadores o governo federal, via Ministério do Meio Ambiente (MMA) o qual

apoiou o Projeto Piloto com 500 cisternas entre 2000 e 2001, a Agência Nacional da

Água (ANA), financiou uma nova etapa do projeto entre 2001 e 2003, e também via

Ministério do Desenvolvimento Social (MDS), a partir de 2003.

Outros aportes financeiros também foram adquiridos por meio de parcerias

com empresas estatais e privadas, por meio de pequenas doações de indivíduos e

outras organizações como a Federação Brasileira dos Bancos (FEBRABAN). Ao

total já foram construídas até junho de 2016, 588.544 cisternas (ASA, 2016) na

região do Semiárido brasileiro.

4.2 A GESTÃO DO P1MC

A ASA é uma articulação apartidária e sem personalidade jurídica, conforme

está determinado na Declaração do Semiárido; isso implica na impossibilidade da

Articulação contratos, firmar convênios e dirigir recursos financeiros. Essa

impossibilidade jurídica foi determinada pelas organizações civis que aderiram a

ASA, para preservar a identidade da ASA como um fórum de articulação política e

não de entidade.

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Nesse sentido segundo a ASA (2001) a execução do P1MC fica a cargo das

entidades que aderiram a Articulação do Semiárido e a Carta de Princípios tornando-

se membro da ASA-Brasil, que através de pessoas jurídicas podem assinar

convênios e dirigir recursos financeiros. No entanto, para manter a transparência do

P1MC se fazia necessárias à formação de uma unidade de gestão central do

programa, capaz de assinar convênios e prestar contas sobre os recursos

arrecadados (ASA, 2001).

Para responder a necessidade desta função, criou-se a Associação Programa

Um Milhão de Cisternas (AP1MC) cuja direção é rotativa e eleita pelos membros da

ASA, tornando-a em seguida uma Organização da Sociedade Civil de Interesse

Público (OSCIP5).

A AP1MC na posição de OSCIP passa a ter legitimidades para captar

recursos financeiros, e em seguida firmar contratos para a execução do P1MC com

as entidades que se tornaram Unidades Gestoras Microrregionais (UGMs), ou seja,

essas organizações passam a ser responsável pela execução do programa em cada

microrregião do Semiárido, para o desenvolvimento do projeto.

As UGMs possuem uma relação contratual com a AP1MC para o

desenvolvimento do P1MC, devendo prestar contas dos recursos gastos e do

andamento do P1MC nos Encontros Estaduais da ASA.

Para auxiliar e fiscalizar o trabalho das UGMs a ASA constituiu uma Unidade

Gestora Central (UGC) que trata-se de uma Equipe Técnica da AP1MC, formada por

22 técnicos/as responsáveis por várias ações como: elaboração e negociação de

projetos, desenvolvimento de ferramentas de controle das informações,

monitoramento das ações realizadas pelas UGMs, orientação técnica e gerencial

para as UGMs e elaboração de relatórios para prestação de contas aos

financiadores.

As escolhas das entidades para cumprirem a função de UGMs seguem

critérios criados pela ASA, como ser entidades integrantes da ASA, com pessoa

jurídica formalizada há pelo menos três anos, com experiência em gestão de

5 OSCIP trata-se de um título fornecido pelo Ministério da Justiça do Brasil às ONG’s que atendem ao requisito de normas de transparência administrativas, o que as permite firmar parcerias e convênios com todos os níveis de governo e órgãos públicos (federal, estadual e municipal) e admite ainda que doações feitas por empresas privadas às OSCIP’s possam ser descontadas no imposto de renda das doadoras (FERREIRA, 2009)

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recursos públicos, trabalhar com agricultores familiares e trabalhadores rurais e ter

experiência específica com a construção de cisternas, estar com a documentação da

entidade regularizada, inclusive no que se refere ao pagamento das obrigações

sociais, a entidade não pode ser dirigida com caráter partidário ou político (ASA,

2001).

Segundo Ferreira (2009) cabe ainda as UGMs estabelecerem parcerias locais

com outras entidades, as Unidades Executoras Locais (UELs), que atuem no âmbito

do município ou das comunidades nos diferentes municípios do Semiárido para

desenvolver o P1MC, pois as expectativas da ASA ao criar as UGMs eram que

essas unidades se articulassem com mais 20 entidades locais, fortalecendo-as e

ampliando a participação da sociedade civil organizada na construção de um

Semiárido mais justo.

Segundo os critérios da ASA (2007, p. ?) para tornar-se uma UEL

(....) as instituições devem ter um envolvimento direto na realização de políticas públicas de convivência com o semiárido e experiência com gestão de recursos públicos e construção de cisternas, dentro da lógica e dos princípios da ASA e do P1MC.

A inclusão das organizações locais no desenvolvimento do P1MC, segundo

Ferreira (2009) é positivo porque aumenta a credibilidade da população local na

capacidade dessas organizações em gerir projetos que tragam benefícios para a

comunidade, causando assim uma maior participação da população nessas

organizações locais que podem ser sindicato, associações, ou outras organizações

coletivas, fortalecendo esses espaços políticos locais.

Para monitorar as informações físicas e financeiras do desenvolvimento do

P1MC, a ASA criou um Sistema Integrado de Gestão e Auditoria (SIGA), que é

abastecido pelas informações das UGC e pelas UGMs. O sistema permite que os

financiadores acompanhem o desenvolvimento do P1MC em tempo real, o SIGA

ainda é capaz de gerar relatórios de prestação de contas e demostra a evolução do

P1MC em todo Semiárido.

O SIGA possui um sistema de georreferenciamento das cisternas, tornando

possível identificar onde estão localizadas geograficamente as cisternas construídas.

Para cada cisterna construída, a ASA numera segundo a ordem de construção, para

que possa saber quantas cisternas foram construídas e quantas ainda faltam até

chegar à meta inicial de um milhão.

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As cisternas construídas pela ASA ainda são fotografadas juntamente com o

responsável pela cisterna, que no momento da fotográfia assina um recibo

comprovando que recebeu a tecnologia. O documento com a foto do responsável

com a cisterna, juntamente com sua assinatura é associado ao número de

identificação social da família (NIS) tornando o processo ainda mais transparente,

durante a pesquisa documental realizada no MOC, fez se o registro fotográfico de

uma ficha da comunidade Vargem, conforme a fotográfia 1.

FOTOGRÁFIA 1 – FICHA DE IDENTIFICAÇÃO DA FAMÍLIA BENEFICIADA

FONTE: MOC, 2015.

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O SIGA ao mesmo tempo em que aumenta a responsabilidade das

organizações que desenvolvem o projeto propicia a efetivação de uma gestão mais

responsável e transparente, aumentando assim a confiabilidade dos investidores. No

site da ASA há a prestação de contas com os demonstrativos financeiros e

contábeis de cada ano de exercício da AP1MC (ASA, 2016).

Cabe lembrar que no sistema de gestão do P1MC assim como ao longo de

todo o processo metodológico da ASA, as famílias beneficiárias pelo projeto se

fazem presentes, situação imprescindível para sua autonomia e empoderamento. A

participação das famílias em cada etapa do processo contribui para a construção do

entendimento de que a água é um direito e a cisterna é uma conquista da família.

4.3 DO P1MC AO NASCIMENTO DE UMA POLÍTICA PÚBLICA DE ACESSO A

ÁGUA NO SEMIÁRIDO

A ASA desenvolveu o Programa de Formação e Mobilização Social para a

Convivência com o Semiárido por compreender que a água é um direito humano

básico, e, a manutenção do seu acesso garante o consumo humano, a produção de

alimentos e animais, porém o objetivo do Programa é suprir uma necessidade

básica, a água de beber, entende-se que a garantia de água de qualidade é o

principal compromisso assumido pela ASA para com a população do Semiárido

brasileiro (ASA, 2009).

Com a cisterna de placa de cimento ao lado da casa, há a democratização da

água, visto que anteriormente as ações do estado garantiam as construções de

grandes represas e açudes, muitas vezes em áreas privadas, que beneficiavam

apenas os grandes proprietários. Assim, a democratização da água cumpre com

objetivos de cunho social, econômico e político, haja vista que cada família é a

gestora de sua água, o que lhe garante a autonomia, e ainda diminui as práticas de

trocas eleitorais que ocorriam com o sistema de abastecimento pontual por

caminhão-pipa. Sobre esse respeito, a ASA (2016, p ?) aponta que

As medidas emergenciais de combate à seca adotadas ao longo dos anos, como os grandes açudes e poços, são ineficazes e objetos de manipulação política e eleitoral das comunidades. Eles promovem a concentração e não a democratização da água. A concentração da água está, indissociavelmente, ligada à concentração da terra. Os latifúndios, os

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grandes projetos do agronegócio, as grandes e tradicionais fazendas de gado são estruturados numa injusta distribuição de terras e de água.

O objetivo central da ASA não se constitui apenas em construir cisternas, e

sim, dar início ao projeto maior que consiste em mobilizar, as famílias e as entidades

do semiárido para construir a convivência com o semiárido. No desenvolvimento do

P1MC estão inclusos cursos de gerenciamentos de água, cursos de pedreiro,

reuniões que buscam fortalecer a participação da sociedade sobre a problemática do

acesso a água. Dessa maneira, a construção da cisterna é mais uma ferramenta

mobilizadora, como um material didático, por atender as necessidades básicas que é

a água para consumo humano. Assim

o P1MC possibilita inúmeros avanços não só para as famílias, mas para as comunidades rurais como um todo, como o aumento da frequência escolar, a diminuição da incidência de doenças em virtude do consumo de água contaminada e a diminuição da sobrecarga de trabalho das mulheres nas atividades domésticas (ASA, 2016, p?).

Para Duque (2008) as organizações da sociedade Civil envolvidas no

processo estrutural do Programa, acreditam que é possível a convivência com o

semiárido, desde que haja políticas públicas permanentes e adequadas às

necessidades do território, para que não se repitam as mesmas políticas

desenvolvidas há séculos que se configuravam nas principais responsáveis pela

miséria e pela desertificação no meio rural.

Construir um milhão de cisternas no Semiárido brasileiro, compreende um

projeto audacioso que mesmo com a contrapartida das famílias, e o valor unitário da

cisterna ser muito baixo, o valor total do projeto teria um custo muito alto, que

segundo a ASA (2009) custaria R$ 1.000.000.000,000 (um bilhão de reais), por esta

questão a ASA tinha a consciência que um projeto dessa magnitude só alcançaria

sua meta com o apoio do Governo Federal.

Assim, após uma década de execução do projeto, este passou a ter recursos

previstos no Orçamento Geral da União, tornando-se uma política pública, na qual o

P1MC é reconhecido pelo Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional

– Consea como elemento de segurança alimentar e hídrica.

As entidades que formavam a base da ASA temia que com o apoio do

governo, o P1MC perdesse sua autonomia e passasse a reproduzir as velhas

políticas de clientelismo e assistencialista, neste ponto a articulação decidiu que

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negociaria com o governo, mas determinou que houvesse pontos do projeto que

eram inegociáveis, a exemplo da mobilização que é realizada na comunidade para

construção das cisternas.

Durante a realização do COP3, o ministro do Ministério do Meio Ambiente

(MMA), realizou uma visita ao fórum paralelo da sociedade civil, na oportunidade as

entidades presentes apresentaram a proposta do projeto, e solicitaram o apoio do

ministro para construção das cisternas, que se comprometeu em auxiliar.

Em 2000, firma-se o primeiro convênio com o Ministério do Meio Ambiente,

que só foi possível devido uma parceria com recém-criada Agência Nacional de

Águas (ANA), onde se dar a construção de 500 cisternas para a captação da água

da chuva e a construção de um projeto executivo para o P1MC, que é financiado

pelo convênio. Durante a realização deste convênio a ASA tinha a oportunidade de

demostrar à capacidade de suas entidades na construção de cisterna, e no

desenvolvimento de projetos em grande escala.

A primeira cisterna do P1MC foi inaugurada em novembro de 2000, na

comunidade Lagoa Grande, em Sobradinho na Bahia, a família beneficiada havia

sido desalojada pela construção da barragem de Sobradinho, no rio São Francisco,

e removida para uma área com escassez de água.

A trajetória da família beneficiada pela primeira cisterna do programa era de

grande simbolismo, por demostrar uma realidade no Semiárido brasileiro, onde

muitas famílias sofrem pela falta de água até para as necessidades básicas, como

beber e cozinhar, mesmo morando próximo a grandes barragens.

Com o final do primeiro convênio com o MMA em 2001, a ASA já tinha

transformado o projeto do P1MC em um modelo bem estruturado em torno do

objetivo de construção de cisternas para as famílias das zonas rurais do semiárido.

O P1MC passou atrair novas entidades que se filiaram a ASA, sendo que o

planejamento para aquisição de recursos financeiros para o projeto passou a manter

as entidades unidas (FERREIRA, 2009).

Em um ano de existência a ASA já havia reunido 600 (seiscentas)

organizações atuantes no semiárido, passando a ser referência para as

organizações da sociedade civil, não apenas em quantidades que aderiram a

Articulação, mas também em relação à mobilização.

Em pouco tempo a P1MC ganhou visibilidade, por demostrar que é possível a

convivência com o semiárido através de práticas sustentáveis, Duque lembra que

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“Outrora o conceito de seca era aquele de modificar o ambiente para o homem nele

viver melhor. A ecologia está nos mostrando que nós devemos preparar a população

para viver com a semiaridez, tirar dela as vantagens” (DUQUE, 2005, p.? apud

SILVA, 2006, p228).

Nesse contexto, a ASA estava expandindo sua prática sustentável de

convivência com o semiárido através do armazenamento da água da chuva, no

entanto as entidades ainda continuavam a lutar por recursos financeiros. Novos

convênios foram realizados em parceria com a ANA, para dar continuidade à

primeira experiência bem sucedida, mas a ASA precisava atrair novos financiadores.

Com o mérito do programa, a ASA passou atrair novos financiadores de

diferentes organizações não governamentais nacionais e internacionais, como

também de iniciativas privadas. O fato também se deve ao modelo da APM1C que

muito facilitava a captação de recursos financeiros de diferentes entidades.

Por outro ângulo Gohn (2006) adverte que ao assumir o compromisso de

construir um milhão de cisternas no semiárido, com o intuito de garantir o acesso à

água de qualidade para consumo humano, a ASA está, assumindo

responsabilidades que pertence ao Governo, como representante oficial do Estado.

Baptista (2010) ressalta que a ASA desenvolvia projetos, através de

convênios e de parcerias, e que ao final de cada meta pré-estabelecida pelo

convênio, a entidade executora realiza-se uma avaliação, em um desses momentos

o autor lembra que

um agricultor, contrariado porque não sepodia ter a continuidade da ação, afirmou mais ou menos nestes termos, para os ricos tem as políticas, para os pobres tem projetos. As políticas ficam durante muito e muito tempo. Os projetos nos tapeiam (aos pobres) durante um tempo e depois desaparecem. E nós vivemos atrás de projetos e nunca de políticas.

Segundo a fala do agricultor descrita por Baptista (2010, p. 108), o mesmo

explica que os projetos “abrangem poucas pessoas, num determinado tempo e área

geográfica. São coisas boas, melhoram a vida de um grupo de pessoas, mas não

vão, além disso,”. Enquanto as políticas “devem atingir a todas as pessoas daquela

categoria ou tipo de necessidade, pois são direitos de todas as pessoas e devem ser

executadas com recursos públicos”.

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Ainda segundo Baptista (2010) a ASA desenvolvia um projeto o P1MC, que

melhorou a vida de muitas famílias de comunidades rurais no semiárido, no entanto

os recursos eram poucos e acabavam por contemplar poucas famílias, e ao final de

cada convênio a ASA passava a batalhar por um novo. No entanto as experiências

com o desenvolvimento do projeto preparou as entidades base da ASA para mais

tarde vir a desenvolver uma politica pública.

Batista (2010, p. 103) ainda lembra que “as políticas no Brasil se constroem

numa correlação de forças. Quanto mais formos capazes de correlacionar forças e

parceiros, mais fácil será a construção das políticas no rumo que desejamos”. Nesse

sentido uma estratégia da Articulação foi fazer-se presente em diferentes conselhos

que contemplam a participação da sociedade civil como forma de interferir nas

politicas públicas.

Segundo Baptista (2015) atualmente a ASA compõe e participa de 16

(dezesseis) fóruns de controle proposição de políticas públicas, sendo eles

Comissão Nacional de Agroecologia e Produção Orgânica (CNAPO)

Comitê Consultivo do Grupo Gestor do Programa de Aquisição de

Alimentos (PAA)

Comitê de Desenvolvimento Territorial (CDT) do Conselho Nacional de

Desenvolvimento Rural Sustentável (Condraf)

Comitê Gestor do Projeto Dom Hélder Câmara (PDHC)

Comitê Gestor do Projeto Marco Regulatório para as Organizações da

Sociedade Civil (OSCs)

Comitê Gestor Garantia Safra

Comitê Nacional dos Fundos Solidários

Comitê Técnico de Tecnologias Sociais do Programa Cisternas do

Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome (MDS)

Conselho Nacional de Desenvolvimento Rural Sustentável (Condraf)

Conselho Nacional de Economia Solidária (CNES)

Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (Consea)

Fórum Brasileiro de Segurança Alimentar e Nutricional (FBSAN)

Fórum Mudanças Climáticas e Justiça Social

Núcleo Executivo da Articulação Nacional de Agroecologia (ANA)

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Ponto Focal Nacional da Sociedade Civil para o Combate à Desertificação

(Convenção das Nações Unidas para o Combate à Desertificação e

Mitigação dos Efeitos das Secas - UNCCD)

Programa de Apoio a Projetos Produtivos Solidários

Nesses espaços políticos a ASA busca além de apresentar sua luta, propor

medidas que facilite a convivência do homem e da mulher com o semiárido,

mostrando através da sua experiência que é possível uma educação contextualizada

com o semiárido, o combate a desertificação através da adoção de práticas

sustentáveis. Dessa forma, a ASA articula-se com outras redes de organizações

pautando a convivência com o semiárido. Duque (2006, p. 140) lembra que “A

grande ambição da ASA é precisamente conseguir inscrever nas políticas públicas o

novo modelo de desenvolvimento para o semiárido, modelo que as famílias

agricultoras estão experimentando e divulgando”.

Para Baptista ( 2010, p.173) “não podemos ficar apenas nos projetos,

devemos partir deles para as políticas”, com este pensamento a ASA aproveitou a

troca de Presidente da República que ocorreu nas eleições de 2002, para dialogar

com o novo governo, em busca de apoio para efetivação de uma politica pública de

acesso a água no semiárido.

A segurança alimentar era um tema prioritário defendido pelo novo presidente

da República Luiz Inácio Lula da Silva, que na tentativa de erradicar a fome no

Brasil, criou o Programa Fome zero, o carro chefe do seu governo, nesse propósito

criou-se o Ministério Extraordinário de Segurança Alimentar e de Combate à Fome

(MESA) em 2003, para gerir o programa.

Em 2003 existiam 44 milhões de pessoas ameaçadas pela fome no Brasil,

onde a sua grande maioria se concentrava na população rural do Nordeste, na lista

das cinco áreas prioritárias a serem atendidos pelo governo federal pelo Programa

Fome Zero, os municípios do semiárido nordestino, incluído o Vale do

Jequitinhonha, em Minas Gerais estava em primeiro lugar (BRASIL, 2003).

Por acreditar fielmente que a superação da pobreza rural no Semiárido

brasileiro está vinculada com a descentralização da água para consumo humano,

onde não se pode falar em superação da pobreza, sem antes promover o acesso à

água, que a ASA encontrou caminhos para discutir com o Ministro do MESA a

importância da ação de uma política permanente de acesso à água no semiárido.

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Segundo Ferreira (2009) como fruto deste encontro entre a Articulação e o

ministro, abriu se uma negociação para que o P1MC passasse a fazer parte do

Programa Fome Zero.

No entanto ainda em 2003, o primeiro termo de parceria entre a MESA e a

AP1MC foi realizado, essa parceria marcava a transição do P1MC, “que deixa de ser

uma ação isolada apoiada pela Agência Nacional de Águas, para figurar como uma

política pública substancial”. Essa diferença institucional ocorre porque o P1MC

passa a fazer parte da agenda de políticas públicas do Governo Federal, como parte

integrante do maior programa a ser desenvolvido pelo Governo Federal.

Com a extinção do MESA, o P1MC passou a ser coordenado pelo Ministério

do Desenvolvimento Social e Combate à Fome (MDS), criado para substituir o

MESA em 23 de janeiro de 2004. Desde 2003 até o ano de 2016 o Governo Federal

continua sendo o maior financiador do programa.

Sobre o contexto das politicas públicas serem desenvolvidas por uma

organização não-governamental, mesmo fazendo parte da agenda política de um

país, Almeida (2005, p. 2) adverte que “não há porque imaginar que a

descentralização suponha inexoravelmente redução da importância do governo

nacional, que pode expandir-se para novos campos de ação ou assumir novos

papéis normativos”. Percebe-se desta maneira que embora a ASA seja a executora

de uma política pública, o governo exerce o papel de principal financiador e

fiscalizador desta politica, não havendo assim diminuição de sua importância, ele

apenas passa a assumir outra função.

A FEBRABAN se tornou desde 2003 o segundo maior financiador do P1MC, o

interesse da Federação em financiar o programa deu-se como contribuição da

entidade ao Programa Fome Zero. O apoio configurou-se no significativo ganho para

AP1MC, no desenvolvimento do P1MC, pois existem gastos para o desenvolvimento

do projeto que não podem ser feitos com os recursos públicos. Desse modo, com o

financiamento da Federação foi possível estruturar as UGMs, através da aquisição

de computadores, carros, telefone entre outros.

Além do P1MC, há também o Projeto Cisternas nas Escolas, o qual possui o

objetivo de garantir água nas escolas rurais do Semiárido, durante todo o ano (visto

que o funcionamento das escolas fica comprometido nos períodos de seca)

garantindo o seu pleno funcionamento, por meio da dotação da tecnologia social de

captação de água da chuva, por meio da implantação de cisterna de 52 mil litros.

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77

Esse projeto pode possibilitar uma articulação entre a sociedade civil e

Governos para a criação de programas e políticas voltados para a educação

contextualizada no semiárido.

4.4 A ASA E O PROGRAMA DE FORMAÇÃO E MOBILIZAÇÃO SOCIAL PARA A CONVIVÊNCIA COM O SEMIÁRIDO: UM MILHÃO DE CISTERNAS RURAIS (P1MC)

Na Declaração do Semiárido a captação da água de chuva aparece como

solução para a demanda de recursos hídricos do semiárido, garantindo assim a

sustentabilidade econômica, social e ambiental da região. A alternativa é apontada

em contrapartida com a política de “açudagem”, que envolve projetos de grandes

riscos ambientais. Conforme pode ser conferida abaixo

Aprendemos, também, que a água é um elemento indispensável, longe, porém, de ser o único fator determinante no semiárido. Sabemos agora que não há como simplificar, reduzindo as respostas a chavões como “irrigação”, “açudagem” ou “adutoras”. Além do mais, os megaprojetos de transposição de bacias, em particular a do São Francisco, são soluções de altíssimo risco ambiental e social. Vale lembrar que este ano, em Petrolina, durante a Nona Conferência Internacional de Sistemas de Captação de Água de Chuva, especialistas do mundo inteiro concluíram, na base da sua experiência internacional, que a captação da água de chuva no Semiárido Brasileiro seria uma fonte hídrica suficiente para as necessidades produtivas e sociais da região. (DECLARAÇÃO DO SEMIÁRIDO, 1999, p. 02)

Não há apenas uma oposição a política desenvolvida durantes séculos no

semiárido pelos governos que tão pouco compreendeu a região, existe antes de

qualquer coisa, a consciência que “a água é um elemento indispensável, longe,

porém, de ser o único fator determinante no semiárido” (p.2). Sabia-se, no entanto

que o problema do acesso a água não era a única questão a ser resolvida no

Semiárido, havia segundo Batista (2010) poucas pessoas acumulava água, saber e

terra, mantendo a maioria da população sertaneja na extrema pobreza.

Quando a ASA se consolida através da Declaração do Semiárido, a primeira

proposta é de desenvolver um programa de acesso à água em grande escala. Lopes

(2007, p. 2) lembra que “a gente tinha a clareza de que a água de beber e cozinhar

eram uma questão central. Então, qual era a experiência que a gente tinha

acumulado individualmente, cada organização? Era a cisterna”.

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Neste sentido o P1MC foi milimetricamente planejado, para se tornar uma

tecnologia social de baixo custo com grande potencial para o armazenamento de

água, contribuído assim para que a população do Semiárido tenha acesso à água

necessária para beber e cozinhar. Além de perpetuar a proposta de convivência com

o semiárido.

Para a ASA o P1MC se constitui “em um processo de formação, educação e

mobilização de pessoas e instituições, que vem desencadeando um movimento de

articulação e de convivência sustentável com o semiárido, através do fortalecimento

da sociedade civil e da construção de cisternas”(ASA,) tendo como objetivo principal

“implementar um processo de formação, calcado na educação para a convivência

com o semiárido e na participação das pessoas e grupos na implantação de políticas

públicas”;

Fazem parte da proposta da construção de um milhão de cisternas, os

seguintes objetivos (ASA, 2008, p.3):

Mobilizar e capacitar um milhão de pessoas;

Construir um milhão de cisternas para captação e armazenamento de

água de chuva;

Propiciar o acesso descentralizado à água potável para um milhão de

famílias, atingindo aproximadamente 5 milhões de pessoas do semiárido.

Para o desenvolvimento desses objetivos, foram construindo uma

metodologia que se inicia com os critérios para seleção dos municípios da região

semiárida para desenvolvimento do projeto, (ASA, 2008, p.3) são eles:

Índice de Desenvolvimento Humano (IDH);

Índice de aridez e cobertura do programa, estimada pelo Cadastro Único

de Políticas Sociais;

Crianças e adolescentes em situação de risco, mortalidade infantil.

No município escolhido para implatar o Programa, seleciona-se as

comunidades rurais sem fonte de água potável nas proximidades de suas casas, ou

com precariedade nas fontes existentes. Posteriormente, inicia-se a seleção das

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famílias que serão beneficiadas com o programa, levando em consideração os

seguintes critérios (ASA, 2008, p.4):

Mulheres chefes de família;

Famílias com crianças de 0 a 6 anos;

Crianças e adolescentes frequentando a escola;

Adultos com idade igual ou superior a 65 anos;

Deficientes físicos e/ou mentais

No processo seletivo a estrutura da cobertura da casa é de fundamental

importância para a inclusão das famílias selecionadas no projeto, pois o uso do

telhado adequado irá garante a qualidade da água, nesse sentido a ASA considera

adequado o telado feito com telha de barro.

O P1MC é composto por seis componentes, sendo eles a mobilização, a

capacitação, construção de cisternas, controle social, fortalecimento institucional,

comunicação. As ações a ser desenvolvidas por esses componentes serão

apontadas no quadro a seguir.

QUADRO 1: COMPONENTES E AÇÕES DO P1MC COMPONENTES AÇÕES

Mobilização Formação das comissões municipais, executoras e comunitárias; Cadastramento das famílias que conquistarão as cisternas; Seleção das famílias a partir do cadastro.

Capacitação Formação continuada das equipes técnicas das UGMs; Formação de agentes multiplicadores/as em GRH; Formação continuada de pedreiros/as; Capacitação das famílias em GRH, cidadania e convivência com o Semiárido; Capacitação de jovens em confecção e instalação de bombas manuais.

Construção de Cisternas Envolver as famílias, as comissões e as Equipes Técnicas, desde a marcação do local, até a construção da cisterna.

Controle Social

Compreende os ciclos de eventos que promovem a participação de pessoas e instituições, garantindo a legitimidade dos processos da ASA e o fortalecimento da sociedade civil, em todos os níveis: Encontros Microrregionais; Encontros Estaduais; EnconASA.

Fortalecimento Institucional

Fortalecer as UGMs e a AP1MC,através dos recursos financeiros que permitem a manutenção das 60 UGMs e da UGC, compreendendo: Custeio (Pessoal e manutenção); Investimento (infraestrutura e SIGA)

Comunicação

Promover o acesso comum às informações e a interação entre as organizações que compõem a ASA; A valorização da cultura da região; A imagem positiva do Semiárido; O desenvolvimento de material pedagógico e informativo para as organizações, famílias e comunidades envolvidas com o P1MC. Essas ações são desenvolvidas pela Assessoria de Comunicação da ASA.

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FONTE: ASA (2001), ELABORAÇÃO DA AUTORA, 2016.

As Comissões municipais são formadas no processo de mobilização, por no

mínimo três integrantes de organizações sociais diferentes com atuação no

município selecionado para implantação do programa. Um das organizações

presentes na comissão municipal torna-se Unidade Gestora Municipal, cabendo a

mesma supervisionar e monitorar a execução do programa.

A constituição das comissões comunitárias, que são formadas por

representantes locais, por no mínimo três entidades com atuação no município,

como por exemplo, presidentes de associação rural, professores, agentes

comunitários, padres, pastores, enfim pessoas que representem uma liderança na

comunidade. A esta comissão cabe à responsabilidade de acompanhar todas as

etapas de desenvolvimento do Programa em âmbito local (ASA, 2009).

As comissões recebem capacitação para desempenhar as suas ações com

domínio, o P1MC ainda busca valorizar a força do trabalho jovem na comunidade

beneficiada, neste sentido filhas e filhos de agricultores recebem treinamento para

desempenhar o papel de animadores de campo, cabendo a eles a tarefa de auxiliar

no processo de mobilização das famílias.

Após o processo de formação e capacitação das comissões. Elas iniciam a

fazer o cadastramento das famílias interessadas a receber a tecnologia social na

comunidade, o animador de campo deve avisar as famílias do cadastramento com

antecedência de forma que todos e todas da comunidade tenham conhecimento do

processo de cadastramento. O cadastro das famílias é realizado através de uma

ficha cadastro em anexo, formado por questões que registram a situação

socioeconômica das famílias e as formas de acesso à água para consumo humano.

Este cadastramento é utilizado pela comissão municipal para realizar a

seleção das famílias a serem beneficiadas com as cisternas, uma vez que a

demanda pela tecnologia costuma ser maior que a ofertada. A seleção é realizada

dentro dos critérios já estabelecidos pela ASA e fiscalizada pela comissão

comunitária, e a lista das famílias contempladas é publica, qualquer pessoa pode ter

acesso, e questionar caso não considere justa a seleção de alguma família.

É ofertado aos homens e as mulheres pertencente às famílias selecionadas a

oportunidade de realizar o curso de capacitação de pedreiras e pedreiros, sendo que

o curso é direcionado para ensinar a técnica da construção de cisternas de placas

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de cimento para captação da água da chuva, neste sentido a ASA acredita que

esteja contribuindo para que as famílias desenvolvam uma nova prática econômica

para auxiliar na renda da família, além de propagar uma técnica prática e segura de

convivência com o semiárido.

Faz parte da estratégia de mobilização que as famílias apresentem uma

contrapartida para a construção, sendo assim a contrapartida da família inclui a

escavação do solo no local onde ocorrerá a construção da cisterna, e a oferta de

hospedagem e alimentação aos pedreiros durante a construção da cisterna.

Geralmente a hospedagem ocorre na própria residência da família.

De acordo com a ASA (2016) Depois de selecionadas as famílias devem

participar do Curso de Gerenciamento de Recursos Hídricos (GRH) como quesito

para conquistar a cisterna. Durante a realização do curso, que ocorre na própria

comunidade, é abordada questões relacionadas ao Semiárido e ao cuidado com a

cisterna e a água. Em cada curso, são discutidos os seguintes temas.

Gerenciamento dos recursos hídricos – aborda a importância da captação do manejo da água de chuva para a melhoria das condições de vida das famílias e situa a água como um direito básico e a cisterna como uma conquista; Cidadania - faz uma reflexão sobre as relações políticas entre a Sociedade Civil e o Estado, com ênfase nos modelos de desenvolvimento implantados na região semiárida ao longo da história; Convivência com o Semiárido– promove reflexões sobre as características naturais da região e as possibilidades que influenciam nas práticas de convivência sustentável. (ASA, 2016, p?)

Como foi possível observar o curso de GRH discute temas importantes sobre

a proposta de convivência com o Semiárido, as cisternas nesses momentos

formativos funcionam como elemento mobilizador da comunidade rural,

demostrando que a convivência com o semiárido é possível, através de práticas

sustentáveis com o meio natural, faz-se também uma reflexão das velhas práticas

de combate à seca que em nada melhorava a vida dos que viviam no semiárido e

causava grande impacto ao meio ambiente, em contrapartida é debatido como

políticas públicas adequadas podem facilitar a convivência das famílias sertanejas

com a seca.

Ainda nesse momento de formação as famílias são orientadas do cuidado que

devem ter com as cisternas e com a água da chuva armazenada. É ensinada para

as famílias a técnica de coletar da água da cisterna para evitar contaminação da

mesma, o curso de GRH também ensinam formas de tratamento da água da chuva

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para consumo humano. Nesse sentido, a ASA criou os dez mandamentos da P1MC,

que devem ser repassado às famílias que conquistaram a tecnologia.

1º. A água é presente de Deus e como tal não pode ser vendida, nem negada. 2º. Todas as pessoas, animais e plantas têm direito a água. 3º. Toda casa da zona rural deve ter a sua cisterna. 4º. A cisterna deve ser construída ao lado da casa, longe das plantas com raízes esparramadas e longe de fossas e currais. 5º. A cisterna deve ser cuidada: Lavar todos os anos antes da chuva; Pintar a parte externa de cal branca; Manter a cisterna sempre bem tampada; Proteger os suspiros e entradas de água com tela e pano fino; Guardar os canos depois das chuvas para evitar que rachem, 6º. A água da primeira chuva é para lavar o telhado da casa. Não pode ir para a cisterna. 7º. A água da primeira chuva juntada na cisterna, não pode ser misturada com outra água. 8º. A vasilha para tirar água da cisterna deve ser muito limpa e usada só para isso. Não deixar a vasilha encosta no chão, na terra ou em lugares sujos. 9º. A água da cisterna é para o consumo humano: beber e cozinhar. Assim vai durar todo o período da seca; 10º. Toda água para consumo humano deve ser tratada. (OS DEZ MANDAMENTOS DA CISTERNA DE PLACAS DE CIMENTO, ASA, 2010, p.1)

No sentido de manter os mandamentos sempre lembrados realiza-se um

curso de gerenciamento de recursos hídricos com os agentes comunitários e os

agentes de saúde que atendem a comunidade onde se encontra as cisternas de

placas de cimento, este curso tem como objetivo capacitar os agentes para orientar

os moradores sobre os cuidados com a água da cisterna.

4.5 A CONSTRUÇÃO DA CISTERNA PARA CAPTAÇÃO DA ÁGUA DA CHUVA

Segundo informações da ASA (2003) as entidades ligadas a Articulação

haviam acumulado experiências em diversos tipos de construção de cisternas para

captação da agua da chuva, no entanto para fazer parte do P1MC os integrantes da

ASA acreditaram que deveriam padronizar um tipo específico de cisterna, com esse

intuito a ASA aproveitou a construção das primeiras 500 (quinhentas) cisternas do

programa para avaliar qual seria o modelo mais adequado.

Segundo a mesma fonte a Cisterna de placas de cimento demostrou ser a

mais eficaz pela durabilidade e capacidade de armazenamento e baixo índice de

evaporação da água acumulado. Após a escolha da tecnologia social a mesma

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passou por ajuste técnico para aprimorar e satisfazer as necessidades do Programa,

o modelo desenhado para cisterna é o resultado de um trabalho coletivo feito por

muitas mãos.

Para Batista (2010) a captação inteligente da água da chuva sempre foi feita

no Semiárido, essas experiências individuais do sertanejo foram adaptadas com o

passar do tempo, assim sua essência sempre esteve ligada com as regiões

semiáridas, tratando-se de tecnologias que fazem parte do conhecimento popular

que não está restrita a uma única pessoa, mas a uma experiência coletiva. Sobre a

elaboração de tecnologia social é valido lembra que

A tecnologia social implica a construção de soluções de modo coletivo pelos que irão se beneficiar dessas soluções e que atuam com autonomia, ou seja, não são apenas usuários de soluções importadas ou produzidas por equipes especialistas (RODRIGUES & BARBIERE, 2008, p.7).

De acordo com Gnadlinger (2006, p.103).

A coleta de água de chuva é uma técnica popular em muitas partes do mundo, especialmente em regiões áridas e semiáridas (que abrangem mais ou menos 30% da superfície da Terra), onde as chuvas ocorrem somente em poucos meses do ano e com bastante variabilidade interanual. O conceito de tecnologia dos sistemas de captação de água de chuva é tão antigo quanto às montanhas, que dizer é uma tecnologia primordial. A coleta de água de chuva foi inventada independentemente em diversas partes do mundo e em diferentes continentes há milhares de anos.

Com esta perceptiva Gnadlinger (2006) ressalta que a coleta de água da

chuva é uma técnica popular, inventada de forma independente em diferentes

lugares no mundo, sendo que se trata de uma tecnologia milenar existente

principalmente em regiões áridas e semiáridas, surgindo devido às necessidades

próprias de cada região. O mesmo autor ainda revela que as grandes civilizações da

historia, como a Greco-romana, Chinesa, Incas e Astecas, adquiriram extensa

experiência com o armazenamento da agua da chuva.

4.6 TÉCNICA DE CONSTRUÇÃO DA TECNOLOGIA SOCIAL CISTERNA DOMICILIAR DE PLACAS DE CIMENTO

O local escolhido para construção da cisterna deve levar em consideração

uma distância segura das fossas sépticas, currais e chiqueiros para que a água

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acumulada não se contamine, deve se evitar ainda realizar a construção próximo

das árvores para que as raízes da mesma não danifique a tecnologia. Após a

escolha do lugar ideal, inicia-se a escavação que deve ocorrer de forma circular,

com um raio de 1,90 metros, por 1,30 de profundidade.

A confecção do piso da cisterna ocorre com uma camada de 3cm de concreto

com a argamassa que deve ser feita com um saco de cimento, três latas de areia e

quatro latas de brita nº 1. Sobre esta estrutura põe-se uma malha de ferro

confeccionada no local, garantido o nivelamento do piso e aumentando a resistência

do mesmo.

As placas são construídas de forma circular em diferentes tamanhos levando

em consideração a construção da parede e da tampa, os materiais necessários para

construção das placas moldadas de cimento são areia grossa de boa qualidade e o

cimento, as placas são construídas no mesmo local onde ocorrerá a construção.

Com as placas prontas elas vão montando a estrutura da cisterna que

inicialmente é sustentada por madeira, até que suas paredes estejam prontas,

prendem-se três fios de arame nº 12, circundando todos os trilhos na parte exterior

da cisterna, para evitar que a estrutura montada se desprenda durante a aplicação

da argamassa.

Os próximos passos consistem em confeccionar e instalar calhas e canos pvc

nas casas para captação de água da chuva que cai no telhado e escoa para a

cisterna através das calhas. Instala-se ainda nas cisternasbombas manuais para

retirada da água, placas de identificação, tampas e cadeados, além de coadores e

telas de proteção na cisterna e na bica que conduz a agua do telhado para cisterna.

Todos os materiais utilizados na construção e adquirido na sede dos

municípios beneficiados com o Programa como uma forma de movimentar a

economia dos municípios.

Segundo informações da ASA (2003) as cisternas de placas de cimento é

uma tecnologia durável, existem construções no Semiárido com mais de quarenta

anos de existência, no entanto a ASA adverte que a duração está diretamente

relacionada com os cuidados, pois a cisternas costumam a apresentar rachadura

quando permanecem vazias por muito tempo, dessa maneira a cisterna precisa

manter um nível de água mínimo até a próxima chuva, que cubra o fundo da cisterna

para evitar rachaduras.

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As cisternas de placas tem capacidade para armazenar 16.000 litros de água,

que segundo a ASA é o suficiente para atender as necessidades básicas de uma

família de até cinco pessoas durante oito meses de estiagem. As necessidades

básicas descritas pela ASA é beber, cozinha e escovar os dentes.

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5. ALTERNATIVA SUSTENTÁVEL DE ACESSO À ÁGUA ATRAVÉS DO P1MC: A EXPERIÊNCIA DA COMUNIDADE RURAL VARGEM

O Programa de Formação e Mobilização Social para a Convivência com o

Semiárido, Um Milhão de Cisternas, vem sendo implementado em diversas

comunidades rurais do Semiárido Brasileiro como alternativa sustentável de acesso

à água na região. Segundo a ASA (2016) até 21 de maio de 2016 já foram

construídas 585.114 (quinhentos e oitenta e cinco mil e cento e quatorze) cisternas

rurais, sendo que a meta do programa é construir um milhão de cisternas.

Para a ASA (2010), as construções das cisternas têm desencadeado um

movimento de articulação e de convívio sustentável com os recursos naturais, uma

vez que o desenvolvimento do Projeto não se trata apenas de construções, mas de

instituir uma prática sustentável para a realidade do semiárido, através da

mobilização e capacitação das famílias rurais.

Acredita-se ainda que a tecnologia social permita que as famílias tenham uma

melhor condição de vida, com a garantia do acesso à água potável e sem maiores

transtornos, visto que as cisternas são individuais e ficam próximas das casas dos

beneficiados, evitando assim longas caminhadas em busca de água ou da

dependência de caminhão-pipas, o que resultava comumente em trocas/favores

eleitoreiros.

Todavia, é imprescindível confrontar a realidade posta e os objetivos

propostos pelo Programa, a fim de verificar se sua finalidade está sendo alcançada,

bem como se os critérios técnicos estão sendo atendidos.

Assim, nesta etapa da investigação, será analisado se na comunidade rural

Vargem, localizada no município de Feira de Santana-Bahia, onde P1MC foi

implantado no ano de 2014 há o fidedigno cumprimento da finalidade e normas do

Programa, haja vista que nesta comunidade foram implantadas 50 (cinquenta)

cisternas. De forma complementar, foi realizada também análises acerca do impacto

do acesso à água, via cisternas, sobre as condições de vida das famílias

beneficiadas por esta tecnologia social.

As ações para a implantação do P1MC na comunidade rural da Vargem foram

realizadas pelo Movimento de Organização Comunitária (MOC); estando essa em

funcionamento desde outubro de 1967 se caracteriza por uma entidade civil, de

direito privado, para fins filantrópicos e não econômicos. Suas ações no campo

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incidem no desenvolvimento de políticas públicas para promover a participação

social, a convivência com o Semiárido, a agroecologia, as relações sociais de

gênero, a economia solidária, a educação do campo contextualizada, soberania e

segurança alimentar e nutricional, desenvolvimento sustentável e o direito à

comunicação tendo como alvo principal as trabalhadoras e os trabalhadores rurais,

agricultores e agricultoras familiares, pequenos produtores urbanos, professores

rurais, excluídos dos meios de produção, organizações populares, crianças e

adolescentes em situação de risco social.

A atuação existe em três territórios, sendo eles Sisal, Bacia do Jacuípe e

Portal do Sertão, atendendo 16 (dezesseis) municípios ao qual esta o Município de

Feira de Santana, sendo este o município sede do MOC. Para o desenvolvimento de

suas ações a entidade conta com importantes parceiros, entre eles está o Fundo das

Nações Unidas para a Infância (UNICEF), Ministério do desenvolvimento Agrário

(MDA) e a Articulação do Semiárido brasileiro (ASA-Brasil), entre outros. A parceria

com a ASA-Brasil permite ao MOC o desenvolvimento do P1MC nos territórios de

sua atuação.

Nesse sentido, Trevisan e Pittol (2008) afirmam que as avaliações e

monitoramentos de programas sociais e políticas públicas em geral são

fundamentais para provocar o melhor desempenho das mesmas, uma vez que as

avaliações tendem a apontar os principais erros e acentos cometidos, levando assim

a uma compreensão que pode favorecer uma reforma no programa. Frey (2000,

p.229) lembra que “a fase da avaliação é imprescindível para o desenvolvimento e a

adaptação contínua das formas e instrumentos de ação pública”, por provocar

aprimoramento ou reformulação das ações desenvolvidas.

Na perspectiva de contribuir com o monitoramento das políticas públicas, que

visam desencadear um processo de transformação social no semiárido, buscou-se

verificar o Programa, como numa pesquisa empírica. Considerou-se o ponto de vista

daqueles que usufruem do Programa, identificando sua percepção sobre possíveis

mudanças proporcionadas pelas cisternas em suas condições de vida. Neste

sentido, coube as famílias beneficiadas avaliarem em que medida a cisterna atende

suas necessidades básicas de consumo, e a importância das cisternas em suas

vidas.

5.1 DOS CRITÉRIOS DE ELEGIBILIDADE E NORMAS TÉCNICAS À

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IMPLEMENTAÇÃO DO P1MC

O P1MC é destinado à população rural de baixa renda6 que vive no Semiárido

e não possui acesso à água encanada ou outro tipo de acesso à água na sua

residência como poço artesiano, cisternas próprias ou outros. Neste intuito, buscou-

se analisar se as 50 (cinquentas) famílias atendidas pelo Programa estavam

incluídas neste critério.

Inicialmente, fez-se necessário averiguar se a comunidade rural Vargem

encontra-se localizada no sertão, haja vista, que a mesma localiza-se no Distrito de

Maria Quitéria no município de Feira de Santana, o qual encontra-se em uma zona

de transição entre a Zona da Mata e o Sertão. Por meio da base de dados do IBGE

(2010) foi realizada uma análise para identificar a localização da comunidade

constatando-se que a mesma é integrante do território que faz parte do Semiárido

Brasileiro conforme mapa 5.

6 O Institudo de Pesquisa Economica Aplicado (IPEA) define baixa renda famílias com o rendimento per capita de até meio salário mínimo mensal.

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MAPA 4- LOCALIZAÇÃO DE MARIA QUITÉRIA NO SEMIÁRIDO BRASILEIRO

Sistema Geodésico de Referência: SIRGAS2000 Projeção Cartográfica: Sistema de Coordenadas Geográficas Fonte: IBGE e PMFS Data: Julho/2016 Organizadora: Maria Valdelice Vieira Elaboradora: Caroline Martins Pereira

Distritos de Feira de Santana - Destaque

Maria Quitéria

Feira de

Santana –

Distrito Sede

Maria Quitéria

Jaguara

Bomfim de Feira

Gov. João

Durval Carneiro

Humildes

Jaíba

Matinha

Tiquaruçu

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Situada no bioma semiárido, dessa maneira, fica claro que o primeiro critério

estabelecido pelo P1MC foi cumprido. Ainda, conforme orientação do MDS a

condição socioeconômica das famílias deve ser condição priorizada para ter acesso

ao Programa, sendo essencial para as famílias encontrar no extrato socioeconômico

de baixa renda, ou seja, possuir menos ou igual a meio salário mínimo per capta

mensal no núcleo familiar.

Para investigar se as famílias beneficiárias em Vargem situam-se no grupo

dos elegíveis ao P1MC, realizou-se levantamento com as mesmas para observar os

rendimentos mensais do grupo familiar, apresentado aqui através do gráfico 1.

GRÁFICO 1: RENDA MENSAL DAS FAMÍLIAS DA COMUNIDADE VARGEM

FONTE: DADOS DA PESQUISA DE CAMPO, 2015.

Constatou-se que apenas 3 (três) famílias beneficiárias pesquisadas vivem

com um salário mínimo, sendo este valor oriundo de aposentadoria ou de pensão

por doença, ou seja essas famílias não se encaixam na categoria baixa renda. No

que se refere às famílias baixa renda 47 (quarenta e sete) famílias estão nesse

critério, dessas famílias encaixadas no critério de baixa renda, observou-se que 21

(vinte e uma) famílias estão situadas na linha de pobreza7, pois as mesmas

possuem renda entre $100 (cem) a $150 (cento e cinquenta) reais.

Correlacinou-se a situação econômica das famílias com outras informações

7 O IPEA define a linha de pobreza composta por famílias com o rendimento per capita de até $ 154 (cento e cinquenta e quatro) reais.

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que reforçam o entendimento de famílias baixa renda, como o acesso a programas

de transferência de renda do Governo Federal. Uma vez que é recomendação do

MDS para com o P1MC beneficiar famílias atendidas pelo Programa Federal Bolsa

Família (PBF) como uma forma de garantir a segurança alimentar e nutricional

dessas pessoas em situação de vulnerabilidade social. Afinal “não se faz uma

política de segurança alimentar e nutricional sem acesso adequado à água, que é o

alimento principal para o corpo” (MDS, 2008, p.12).

No entanto, ser beneficiário do PBF para ter acesso ao P1MC é uma

recomendação do MDS, não se configurando assim como um critério que deve ser

seguindo obrigatoriamente. Nesse sentido, o gráfico 2 representa as famílias que

conquistaram o P1MC que também estão integradas no Programa Bolsa Família.

GRÁFICO 2: BENEFICIÁRIOS PELO BOLSA FAMÍLIA

FONTE: DADOS DA PESQUISA DE CAMPO, 2015.

Pode-se notar que 41 (quarenta e uma) das famílias beneficiadas são

também beneficiadas do PBF, o qual visa atender famílias que estão classificadas

como pobres ou extremamente pobres. Durante a entrevista em campo, as famílias

apontaram o PBF como a principal fonte de renda familiar.

Buscou-se ainda conhecer a principal fonte de renda de cada família, a fim de

conhecer mais detalhadamente a realidade econômica das famílias que participaram

desse estudo. Questionou-se, então, qual era a principal fonte de renda da família. A

resposta encontra-se representada no gráfico 3, onde constatou-se que 29 famílias

beneficiadas possuem os programas sociais de transferência de renda como sua

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92

principal fonte de renda.

GRÁFICO 3: PRINCIPAL FONTE DE RENDA DA FAMÍLIA

FONTE: DADOS DA PESQUISA DE CAMPO, 2015.

Enquanto 3 (três) famílias beneficiadas apontaram a aposentadoria ou pensão

como a responsável pela renda familiar, no que se refere à criação de animais essa

é a principal responsável pela renda de 14 (quatorze famílias), já 4 (quatro) famílias

sinalizaram que a base de sua renda está em vender sua força de trabalho, se

caracterizando por diarista.

Outro critério estabelecido pelo P1MC é o tipo e a condição do material do

telhado, assim no sentido de manter a qualidade da água, ficou estabelecido que as

cisternas de placas de cimento só seriam construídas em casa com telhado de

barro, no entanto, das famílias pesquisadas, uma possui a casa com telhado de

fibrocimento, conforme pode ser visto na fotografia 2.

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93

FOTOGRÁFIA 2- CASA COM COBERTURA DE FIBRACIMENTO

FONTE: PESQUISA DE CAMPO, 2015.

Na concepção de Pereira (2013) na maioria dos países, o uso do fibrocimento

como material de telhado é proibido, por provocar a inalação de fibras, o que

representa um risco à saúde. Quanto ao consumo de água proveniente do telhado

de fibracimento, a autora adverte que os riscos à saúde serão apresentados ao

longo prazo do consumo dessa água contaminada com amianto.

Nessa perspectiva, uma família beneficiada pelo P1MC está fora do critério

de elegibilidade para o Programa; sabe-se, no entanto, que as famílias mais pobres

do Semiárido possuem suas casas com cobertura de fibrocimento por ser um

material mais barato, quando comparado com telhas de barros. Esse critério do

Programa para Pereira (2013) se constitui no principal motivo da exclusão das

famílias mais pobres do Programa, porém entende-se que seja uma medida de

segurança.

Outra situação que foge às conformidades do programa e foi percebida

durante a pesquisa, é que das 50 (cinquenta) famílias beneficiadas com a

construção das cisternas, 2 (duas) famílias possuem suas cisternas construídas em

casa de familiares. Essa situação ocorreu devido ao fato do telhado das residências

dessas duas famílias não corresponderem aos critérios do Programa. Essa

alternativa foi negociada entre beneficiários e os técnicos do MOC, porém, a mesma

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é inexistente nos critérios do Programa. Percebeu-se ainda, que a água armazenada

é usada pelas duas famílias. Todavia, observou-se que as cisternas estão situadas

na mesma propriedade rural ocupada pelo proprietário da cisterna e tende a

beneficiar as duas famílias, a que consta como proprietária da cisterna, e a que cede

o telhado de sua casa para construção da mesma.

Ao contrário das antigas políticas de combate à seca que tinham como

objetivo a construção de grandes obras hídricas, construídas em grandes

propriedades rurais, o Projeto Cisterna visa sua implantação em pequenas

propriedades rurais, como apresentado pelo gráfico 4, a fim de garantir água de

beber para a população pobre do Semiárido.

GRÁFICO 4 – TAMANHO DA PROPRIEDADE RURAL

FONTE: DADOS DA PESQUISA DE CAMPO, 2015.

Percebe-se através do gráfico que 47 (quarenta e sete) famílias beneficiadas

com a tecnologia possuem 1 tarefa de terra o que representa aproximadamente 0,15

hectare. Observou-se ainda que essas famílias moram em propriedade própria ou

dos pais e que apenas uma das residências contempladas com o P1MC encontra­se

alugada.

Faz parte ainda do critério estabelecido pela ASA beneficiar as mulheres,

tornando-as as principais responsáveis pelas cisternas. Para Cardoso (2015) trata-

se de uma estratégia de valorização da mulher no Semiárido Brasileiro, uma vez que

vivemos numa sociedade patriarcal e machista, onde as mulheres ainda se

encontram excluídas da maioria das políticas do campo. Nesse sentido, constatou-

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se através do gráfico 5 que apenas 1 (uma) das 50 (cinquenta) cisternas construídas

na Vargem tem o homem como principal responsável.

GRÁFICO 5 – SEXO DO PRINCIPAL RESPONSAVEL PELA CISTERNA

FONTE: DADOS DA PESQUISA DE CAMPO, 2015.

Segundo a ASA (2010), mulheres chefes de famílias são aquelas que vivem

sem a companhia de um cônjuge e com filhos e são referência em seu domicílio.

Assim, considerou-se que as mulheres que se declararam solteiras, separadas e

viúvas e possuem filhos correspondem a esse critério. O gráfico 6 traz a quantidade

de famílias que possui as mulheres como chefes de família que foram beneficiadas

pelo P1MC em Vargem.

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96

GRÁFICO 6: MULHERES CHEFES DE FAMÍLIA

FONTE: DADOS DA PESQUISA DE CAMPO, 2015.

Constatou-se que das 49 (quarenta e nove) mulheres selecionadas pelo

Programa, 33 (trinta e três) são chefes de famílias, enquanto 16 (dezesseis) dividem

a responsabilidade do domicílio com um companheiro. Nesse caso, mais um critério

do Programa foi cumprido, por buscar a emancipação feminina no campo.

Além dos critérios supracitados, observou-se a estrutura familiar, conforme

apresentado no gráfico 7, onde pode-se notar que as famílias contempladas

correspondem ainda a outros critérios, o de crianças e jovens na residência.

Verificou-se que 23 (vinte e três) das famílias beneficiadas contêm jovens

frequentando a escola, 16 (dezesseis) possuem crianças menores de 6 (seis) anos,

3 (três) das famílias possuem idosos e 2 (dois) representam famílias com

deficientes.

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GRÁFICO 7: FAMÍLIAS CONTEMPLADAS COM O P1MC

FONTE: DADOS DA PESQUISA DE CAMPO, 2015.

Percebe-se que as famílias beneficiadas selecionadas se encaixam em mais

de um critério, isto ocorre porque a demanda pela tecnologia na comunidade é muito

maior que a disponibilizada pelo Programa, porém esta se tratou da primeira etapa

do Programa na comunidade, a segunda etapa ocorrerá no ano de 2016 segundo

estimativa do MOC.

O P1MC prevê além da instalação da cisterna, formação para o convívio das

famílias selecionadas na gestão da tecnologia adquirida, assim, o Curso de

Gerenciamento de Recursos Hídricos (GRH) é considerado pela ASA como a etapa

mais importante do Programa, pois é nesse momento que as famílias que

conquistaram a tecnologia social recebem instrução de como cuidar e preservar da

cisterna. Também é ensinado diferentes formas de tratamentos da água da chuva,

para que a mesma se torne potável, ainda são debatidas questões relacionadas ao

direito à água e formas de convivência sustentável com o semiárido.

Além da vital importância da formação para o convívio sustentável no

semiárido, esta etapa configura­se como elemento obrigatório para todas as famílias

beneficiadas pelo P1MC. Desse modo, foi observada a participação das famílias no

CGRH, conforme apresentado no gráfico 8.

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GRÁFICO 8: PARTICIPAÇÃO NO CURSO DE GRH

FONTE: DADOS DA PESQUISA DE CAMPO, 2015.

Pode-se constatar que 2 (duas) famílias beneficiadas não compareceram ao

curso, não tendo acesso dessa maneira aos conhecimentos compartilhados pelos

presentes, o prejuízo maior na ausência dos beneficiados no curso já citado é que a

mesma não aprende os manejos necessários para o tratamento da água proveniente

da chuva, uma vez que essa água só se torna potável através do tratamento

adequado. Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), as orientações

fornecem o conhecimento necessário para a prática, capaz de tornar a água potável

apropriada para o consumo humano (OMS, 2011).

Em relação ao critério de contribuir com a construção da cisterna, foi

observado que todas as famílias beneficiadas cumpriram este requisito. Todos os

beneficiados afirmaram que contribuíram cavando o buraco da cisterna, conforme

indicado, serviram todas as refeições durante os dias em que os pedreiros

trabalharam na construção das cisternas em suas propriedades, e ainda atuaram

como ajudantes/servente de pedreiros como pode ser visto na fotografia 2.

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FOTOGRÁFIA 3 - BENEFICIARIOS ATUANDO COMO AJUDANTES DE PEDREIROS

FONTE: MOC, 2013.

Além da participação como auxiliares na construção, e no apoio às refeições,

a comunidade se organizou e conjuntamente alugou uma casa para hospedar os

pedreiros ao longo da construção de todas as 50 (cinquenta) cisternas, já que a

hospedagem e alimentação dos pedreiros entram como contrapartida da família

beneficiada.

5.2 MANEJOS POR PARTE DAS FAMÍLIAS: ARMAZENAMENTO E TRATAMENTO DA ÁGUA E A MANUTENÇÃO DAS CISTERNAS

O manejo com as cisternas, assim como o tratamento da água armazenada

demostram a sustentabilidade do P1MC, porque mais importante que construir as

cisternas é mantê-las funcionando e garantindo o acesso à água de qualidade para

as famílias beneficiadas que conquistaram essa tecnologia. Portanto, é fundamental

que as famílias realizem as manutenções, de acordo com as orientações da ASA.

Nesse intuito, buscou-se através das entrevistas analisar se as técnicas de

manutenção e demais orientações sobre a gestão da água e da cisternas estão

sendo cumpridas.

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Em relação à higienização das cisternas, pode-se perceber através dos dados

representados pelo gráfico 9, que 33 (trinta e três) das famílias beneficiadas

apontaram ter realizado o procedimento de limpeza da cisterna após o término da

água da mesma conforme orientação da ASA.

GRÁFICO 9: REALIZAÇÃO DE LIMPEZA DA CISTERNA

FONTE: DADOS DA PESQUISA DE CAMPO, 2015.

Os demais representados por 17 (dezessete) famílias beneficiadas

confessaram que nunca haviam lavado a cisterna, justificando que não o fizeram

devido ao fato de terem receio em esvaziar sua cisterna para limpar, pois a mesma

ainda possuía água no período orientado pelos técnicos da ASA para realização da

limpeza, esse período geralmente é o final do verão e início do inverno. No que diz

respeito à limpeza do telhado e das calhas, todas as famílias beneficiadas afirmaram

que possuem essa prática visando a qualidade da água armazenada.

Outro fato relevante apresentado pelo gráfico 10 é que 27 (vinte e sete) das

50 (cinquenta) cisternas construídas na Vagem apresentaram defeitos, sendo esses,

rachaduras e infiltrações. Segundo a Beneficiada A, “fomos advertidos que esses

problemas poderiam ocorrer se a cisterna ficasse vazia por muito tempo, mas depois

de feita o tanque ficou três meses vazio esperando a chuva’’ (BENEFICIÁRIA “A”,

PESQUISA DE CAMPO, 2015).

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101

GRÁFICO 10: CISTERNAS QUE APRESENTARAM DEFEITOS

FONTE: DADOS DA PESQUISA DE CAMPO, 2015.

Acredita-se que os defeitos, estejam relacionados com o tempo que a

tecnologia social ficou vazia. No entanto, 23 (vinte e três) famílias beneficiadas

afirmaram não ter tido problema algum com a cisterna. Todavia, das cisternas que

apresentaram defeitos, constatou-se que 24 (vinte e cinco) já tiveram a manutenção

necessária e 3 (três) encontravam-se ainda com defeitos.

Os reparos foram realizados pelos próprios moradores. Sobre esta questão a

Beneficiária B apontou que durante o curso de GRH havia sido ensinado como

realizar o conserto da cisterna, “é só fazer uma massa de cimento consistente e

passar no fundo da cisterna e esperar secar” (BENEFICIÁRIA B, PESQUISA DE

CAMPO, 2016) relatou a mesma. Esse fato corrobora com a imprescindível

necessidade de participação no curso ofertado pela ASA no processo de

transferência da tecnologia.

Durante as entrevistas, questionou-se às famílias beneficiadas se

costumavam colocar alguma substância/elemento dentro da cisterna como forma de

tratamento da água. Esse requisito está apresentado pelo gráfico 12 onde

constatou-se que 34 (trinta e quatro) das famílias beneficiadas introduzem algum

tipo de elemento na água.

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102

GRÁFICO 11 – INTRODUÇÃO DE ELEMENTOS NAS CISTERNAS

FONTE: DADOS DA PESQUISA DE CAMPO, 2015.

Assim, foi verificado que 16 (dezesseis) das famílias beneficiadas inserem

peixes nas cisternas. A esse respeito Pereira (2013) aponta que essa ação pode

levar à contaminação da água, pois o peixe emite sujeira que além de provocar

odores pode interferir na qualidade da água. Verificou-se ainda que 18 (dezoito)

famílias beneficiadas fazem introdução de produtos químicos nas cisternas, sendo

eles cloro, hipoclorito e enxofre o que Silva (2012) apontou como um risco para

saúde, uma vez que essas famílias não tem noção da quantidade exata do produto

que deve ser inserido na cisterna, o que na concepção do autor pode provocar um

intoxicação por consumo de água contaminada com produto químico.

Notou-se ainda que 16 (dezesseis) das famílias beneficiadas agem conforme

orientação do curso de GRH, não inserindo nada dentro da cisterna tratando a água

apenas depois da sua retirada da mesma.

Segundo Di Bernardo (2003), qualquer água pode se tornar potável ao

receber o tratamento necessário. Nessa perspectiva questionou-se o tipo de

tratamento para purificar a água da chuva após sua retirada da cisterna. O gráfico 13

ilustra os tratamentos diferentes tipos de tratamento d’água realizado pelas famílias

em estudo.

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103

GRÁFICO 12 - TRATAMENTO DA ÁGUA APÓS RETIRADA DA DA CISTERNA

FONTE: DADOS DA PESQUISA DE CAMPO, 2015.

Sabendo-se que o requisito da qualidade da água da chuva só pode ser

considerado mediante tratamento, pois esta não é uma água potável, mas de fácil

tratamento, percebeu-se através da sistematização das respostas no gráfico 13 que

10 (dez) famílias beneficiadas não submetem a água a nenhum tipo de tratamento;

outras 10(dez) famílias beneficiadas côa a água - esse processo, no entanto,

garante a retirada de partículas sólidas em suspensão que estejam na água, não

garantido o tratamento da mesma; 11 (onze) famílias optaram pela filtragem da

água, método que retêm as impurezas da água como bactérias, parasitas, pesticidas

- porém, o método por si só não consegue eliminar todas as possíveis impureza da

água; e 16 (dezesseis) famílias beneficiadas fazem uso do cloro, entretanto o

Ministério da Saúde (2010) adverte que quando a dosagem do cloro é menor

que a recomendada, esta não é capaz de provocar a desinfecção, se maior,

acarreta cheiro e sabor desagradável à água, além de possíveis malefícios à saúde.

A forma como a água é retirada da cisterna pode contribuir para

contaminação da mesma. Logo, as famílias beneficiadas são orientadas a usar

apenas um balde para retirar a água da cisterna e não permitirem que esse

recipiente seja usado com outra finalidade. As cisternas ainda são equipadas com

bombas manuais para diminuir a possibilidade de possíveis contaminações. O

gráfico 13 representa as formas mais comuns de retirada da água nas cisternas da

comunidade Vargem.

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104

GRÁFICO 13: MÉTODO DE RETIRADA DA ÁGUA DA CISTERNA

FONTE: DADOS DA PESQUISA DE CAMPO, 2015.

Nota-se que apenas 2 (duas) famílias usam apenas a bomba para retirar a

água, enquanto 30 (trinta) famílias preferem usar o balde, o que a depender do

cuidado com esse recipiente pode facilitar o processo de proliferação de patógenos

nocivos à saúde na água armazenada na cisterna. Já as outras 18 (dezoito) famílias

fazem uso dos dois métodos.

É sabido que além do curso GRH com os beneficiários pelo P1MC, a ASA

ainda oferece capacitação para os agentes comunitários e agentes de saúde para

que os mesmos reforcem junto à comunidade as boas práticas com o manejo da

água das cisternas e os cuidados com essa tecnologia social. Desse modo,

questionou-se às famílias se recebem orientações por parte desses profissionais

sobre os cuidados com a tecnologia social e com o tratamento da água da chuva, as

respostas encontram-se ilustradas no gráfico 14.

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105

GRÁFICO 14: RECEBEM ORIENTAÇÕES POR PARTE DOS AGENTES DE SAÚDE

FONTE: DADOS DA PESQUISA DE CAMPO, 2015.

Observa-se, dessa maneira, que 11 (onze) famílias beneficiadas estão sendo

orientadas pelo agente de saúde, conforme planejado pela ASA, mas 39 (trinta e

nove) famílias beneficiadas afirmam que não recebem qualquer tipo de orientação

em relação ao manejo com a tecnologia social, por parte do agente de saúde.

Pereira (2010) considera que o trabalho conjunto entre ASA e os agentes de saúde

é de fundamental importância para o bom andamento do Programa, entretanto

quando isso não ocorre acarreta em prejuízos às metas estabelecidas pelo P1MC.

Visto que a ASA articula as ações do P1MC em âmbito local por meio de

relações com outras instituições que desenvolvem ações no município, procurou-se

saber se as famílias recebem ou já receberam algum tipo de orientação sobre o

mesmo conteúdo, vindo de qualquer instituição existente na comunidade ou que as

famílias costumam frequentar, como por exemplo, escolas, Centro de Referência da

Assistência Social (CRAS), Igreja, Posto de Saúde ou outros. As respostas

provenientes desse questionamento encontram-se sintetizada no gráfico 15.

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GRÁFICO 15: ORIENTAÇÕES SOBRE CUIDADOS COM AS CISTERNAS POR PARTE DE INSTITUIÇÕES NÃO LIGADAS À ASA

FONTE: DADOS DA PESQUISA DE CAMPO, 2015.

Nesta perspectiva, 35 (trinta e cinco) famílias beneficiadas afirmaram nunca

ter recebido nenhuma orientação ou informação sobre o tratamento da água e dos

cuidados com as cisternas por parte de qualquer instituição ou organização, já 15

(quinze) famílias beneficiadas afirmaram já ter recebido alguma instrução sobre a

tecnologia social do P1MC. Essas orientações foram oriundas do CRAS e de

escolas onde os filhos dos beneficiários estudam.

Questionou-se ainda se no último ano, as famílias haviam apresentado

alguma doença de veiculação hídrica, como mostra a ilustração no gráfico 16.

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GRÁFICO 16: INFECÇÃO POR DOENÇAS RELACIONADAS À ÁGUA

FONTE: DADOS DA PESQUISA DE CAMPO, 2015.

Constatou que 37 (trinta e sete) das famílias beneficiadas, pelo menos um

membro da família foi infectado por dengue, chikungunya ou zika, 6 (seis) famílias

apresentaram infecção por verminose e 7 (sete) das famílias afirmaram que na sua

residência não houve caso de doenças de veiculação hídrica.

Notou-se ainda no gráfico 16, que das 50 (cinquenta) famílias entrevistadas,

37 (trinta e sete) relataram contaminação por aedes aegipty e aedes albopictus,

que são mosquitos transmissores da dengue, chinkungunia e da zika. Sabe­se, no

entanto, que no ano de 2015 o Brasil passou por uma epidemia das doenças

supracitadas, principalmente da zica e da chinkungunia, tendo seu surto iniciado na

Região Nordeste do país (MDS, 2015).

A dengue, chinkungunia e zika são consideradas doenças de veiculação

hídrica por ser transmitida por mosquitos que se reproduzem na água doce parada

(OMS, 2010). Por essa razão, existe por parte da ASA a preocupação de fornecer

um cadeado com chave aos beneficiários da cisterna para que os mesmos

mantenham as cisternas sempre trancadas, impedindo, assim, sujeiras na cisterna

ou a proliferação de mosquitos. Porém na visita a campo constatou-se 5 (cinco)

cisternas abertas, conforme ilustrado na fotografia 4.

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FOTOGRÁFIA 4- CISTERNA ABERTA

FONTE: PESQUISA DE CAMPO, 2015.

Além de aberta, é possível observar que a cisterna é usada como suporte de objetos

o que pode interferir diretamente na qualidade da água. Verificou-se ainda durante a

visita a campo a presença de vários recipientes colocados nos quintais para

armazenar a água da chuva, esses vasos eram mais comuns em famílias que

possuíam criação de animais, como ilustra pela fotografia 5.

FOTOGRÁFIA 5 - RECIPIENTES DESCOBERTOS COM ÁGUA

FONTE: PESQUISA DE CAMPO, 2015.

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Esses recipientes descobertos representam um risco à saúde, por serem

focos de reprodução do mosquito transmissor da dengue, chikungunya e zika, que

não por acaso é a principal doença de veiculação hídrica presente na Comunidade

da Vargem.

Quanto à confiança na água da cisterna, o gráfico 17 mostra que 24 (vinte e

quarto) das famílias beneficiadas demonstram confiar na qualidade da água da

cisterna, enquanto que 17 (dezessete) famílias beneficiadas afirmaram não confiar,

já 9 (nove) famílias beneficiadas afirmaram ter dúvidas sobre a qualidade da água.

GRÁFICO 17: CONFIANÇA NA QUALIDADE DA ÁGUA DA CISTERNA

FONTE: DADOS DA PESQUISA DE CAMPO, 2016.

Os motivos apresentados para não confiarem ou terem dúvidas sobre a

qualidade da água da cisterna estavam segundo o Beneficiário C relacionados ao

fato da mesma escorrer pelos telhados e ficar armazenada por muito tempo na

cisterna ou pelo fato de ser água proveniente da chuva. (BENEFICIÁRIO C,

PESQUISA DE CAMPO, 2015).

O gráfico 18 apresenta a relação de resposta sobre a água que as pessoas

tinham acesso antes das cisternas, se esta possuía uma qualidade superior,

levando em consideração à cor, ao cheiro e ao sabor da água, em relação à água

que têm acesso atualmente em suas residências, por meio do P1MC.

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GRÁFICO 18: QUALIDADE DA ÁGUA UTILIZADA ANTES DA IMPLANTAÇÃO DAS CISTERNAS

FONTE: DADOS DA PESQUISA DE CAMPO, 2016.

Pode-se perceber que 24 (vinte e quarto) das famílias pesquisadas considera

que a água é de melhor qualidade, para 23 (vinte e três) das famílias a água anterior

possuía uma qualidade superior à das cisternas, já para 3 (três) famílias é

indiferente a qualidade da água que tinham acesso anteriormente e as captadas via

cisternas.

Em relação à origem dessa água anterior às cisternas de placas de cimentos,

o gráfico 19 representa a resposta obtida com o questionamento, onde 26 (vinte e

seis) dos beneficiários informaram que abasteciam suas casas com águas oriundas

de poço artesiano que pertencem a vizinhos, 20 (vinte) dos beneficiários

consumiam a água vindas de barreiros e caminhão-pipa, e 4 (quatro) beneficiários

assinalaram que suas famílias consomem água comprada na mão de pessoas que

vendem galão de água tratada na comunidade8.

8 Esses vendedores informam aos consumidores que a água vendida é captada de suas torneiras residenciais, providas da Empresa Baiana de Águas e Saneamento (EMBASA), e após o acondicionamento nos galões, transportam pra a comercialização no local.

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GRÁFICO 19: FONTE DE CAPTAÇÃO DE ÁGUA ANTERIOR AO P1MC

FONTE: DADOS DA PESQUISA DE CAMPO, 2015.

Em relação ao caminhão-pipa, os entrevistados afirmaram que este costuma

demorar muito para atender a comunidade, e quando atende, a água nunca é

suficiente para atender a todos, tampouco em quantidade suficiente para suprir suas

demandas, por esse motivo faziam uso mais frequente de água proveniente de

barreiros.

5.3 – P1MC E A DEMANDA FAMILIAR POR ÁGUA

As cisternas implantadas na comunidade pelo P1MC possuem capacidade de

armazenamento de até 16 mil litros de água. Segundo a ASA (2008), esta

quantidade representa o volume de água suficiente para suprir as necessidades

básicas, considerado pela Articulação como beber, cozinhar e escovar os dentes, de

uma família de até 5 pessoas por 8 meses, sendo este o período considerado de

estiagem na região.

Todavia, durante as entrevistas, buscou-se confirmar se a água armazenada

no período chuvoso teria sido suficiente para uso no período de estiagem. Essa

questão encontra-se representada no gráfico 20.

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112

GRÁFICO 20 – SUFICIÊNCIA DA ÁGUA DA CISTERNA FRENTE À ESTIAGEM

Fonte: dados da pesquisa, 2015.

Constatando que 19 (dezenove) das famílias beneficiadas afirmaram que a

água armazenada não é suficiente nem para os primeiros meses de estiagem, 16

(dezesseis) famílias, responderam que a água só é suficiente para os primeiros

meses de estiagem, enquanto que 15 (quinze) responderam que a água é suficiente

para todo o período de estiagem.

Com esta informação, notou-se que já nos primeiros meses de estiagem, boa

parte das famílias beneficiadas em Vargem, ou seja 19 (dezenove) famílias não

possuem água armazenada.

Visto que segundo a ASA (2008), a água armazenada nas cisternas seria

suficiente para suprir as necessidades básicas das famílias durante todo o período

da estiagem, tentou-se compreender os motivos pelos quais a água das cisternas

não seria suficiente para os primeiros meses de estiagem.

Assim, avaliou-se o tamanho das famílias na hipótese de que o grande

número de indivíduos utilizando as águas de uma mesma cisterna possa ter

comprometido a sua duração, baseando-se nos parâmetros da ASA, assim,

representa-se no gráfico 21 as informações a esse respeito.

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113

GRÁFICO 21: NÚMERO DE PESSOAS POR FAMÍLIA

FONTE: PESQUISA DE CAMPO, 2016.

Considerando-se, que as cisternas de placas de cimento foram projetadas

para armazenar água suficiente para uma família de 5 (cinco) pessoas, verificou-se

que a composição das famílias entrevistadas variam de 1 (uma) a 6 (seis) pessoas,

sendo que 18 (dezoito) famílias são compostas por 3 (três) pessoas, 13 (treze)

famílias por 2 (dois) pessoas, 10 (dez) famílias por 5 (cinco) pessoas e 3 (três)

famílias por 6 (seis) pessoas.

Desta maneira, o número de integrantes não justificava o motivo pelo qual a

água não foi suficiente para todo período de estiagem. Procurou-se analisar, então,

os usos realizados pela família da água em questão. Assim, chegou-se às

informações representadas pelo gráfico 22, observando assim suas diversas

destinações:

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GRÁFICO 22: DESTINAÇÃO DA ÁGUA DA CISTERNA

FONTE: DADOS DA PESQUISA, 2016.

Através do gráfico 22 é possível compreender que as famílias fazem diversos

usos da água. Para cada resposta é considerada as 50 (cinquenta) famílias

beneficiadas, neste sentido as respostas se configuram da seguinte forma. Das 50

(cinquenta) famílias beneficiadas, 30 (trinta) famílias usam a água para beber,

enquanto 20 (vinte) famílias não bebem d’água da chuva para beberem, 36 (trinta e

seis) usam a água para cozinhar enquanto 14 (quatoze) famílias não usam a água

com essa finalidade, 46 (quarenta e seis) famílias usam a água para tomar banho,

enquanto 4 (quatro) famílias não usam a água com essa finalidade, quarenta e uma

(41) famílias usam a água para escovar os dentes, enquanto 9 (nove) famílias não

usam a água com essa finalidade, 45 (quarenta e cinco) famílias usam a água para

limpar a casa e lavar roupa, enquanto 5 (cinco) familias não usam a água com essa

finalidade, 32 (trinta e duas) famílias dão essa água para seus animais domésticos,

enquanto 18 (dezoito) familias não usam a água para essa finalidade, 31 (trinta e

uma) família usa a água na criação de animais para vender, 19 (dezenove) famílias

não usam a água com essa finalidade e 26 (vinte e seis) famílias usam a água para

irrigar plantações, enquanto 24 (vinte e quatro) não usam a agua com essa

finalidade.

Enquanto as famílias que fazem uso da água, conforme parâmetros utilizados

pela ASA para nível de cálculo, apontadas no gráfico 23:

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GRÁFICO 23: SEGUEM A RECOMENDAÇÃO DA ASA QUANTO A UTILIZAÇÃO DA ÁGUA

FONTE: DADOS DA PESQUISA, 2015.

Percebe-se, assim, que apenas 1 (uma) família das 50 (cinquenta) famílias

beneficiadas segue as recomendações de uso da água, sendo elas apenas para

satisfazer suas necessidades básicas, consideradas pela ASA como beber, cozinhar

e escovar os dentes. A esse respeito, uma das entrevistadas aponta que “devido a

necessidade que temos para nós e para os animais a quantidade de água

armazenada é pouca, porque demora muito para chover” (BENEFICIÁRIA D,

PESQUISA DE CAMPO, 2015).

Também se questionou se as cisternas já haviam sido abastecidas com outra

água, sem ser pela água pluvial, buscando verificar se a meta da ASA de que a

água provida da chuva seria suficiente para os meses de estiagens, preservando,

assim, as famílias do semiárido da dependência de medidas clientelista, como

doação de água por intermédio de caminhão-pipa ou suposta dependência de

favores. A resposta encontra-se sintetizada no gráfico 24.

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GRÁFICO 25: ABASTECIMENTO DA CISTERNA SEM SER PELA ÁGUA DA CHUVA

FONTE: DADOS DA PESQUISA, 2015.

Observa-se que 31 (trinta e uma) das famílias beneficiadas apontam que sim,

que ao término da água da chuva, faz-se uso da cisterna para o armazenamento de

água provida de caminhões-pipa ou por água adquirida por água da Embasa;

enquanto 18 (dezoito) das famílias beneficiadas afirmam que não armazenam outra

água na cisterna a não ser a água oriunda da chuva, evidenciando desse jeito que a

comunidade em estudo ainda faz uso de medidas paliativas para suprir sua

demanda por água.

Em relação à avaliação do P1MC, buscou-se saber dos beneficiários se o

mesmo está adequado à realidade da comunidade no que se refere ao acesso a

água, as respostas foram sintetizada no gráfico 26.

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GRÁFICO 26: AVALIAÇÃO DO P1MC POR PARTE DAS FAMÍLIAS BENEFÍCIADAS

FONTE: DADOS DA PESQUISA, 2015.

Constata-se, destarte, que 47 (quarenta e sete) das famílias beneficiadas

apontam que sim, que o P1MC encontra-se adequado à realidade da comunidade

no que diz respeito ao acesso a água. Buscou-se, então, justificativa para as

respostas. Os entrevistados, por sua vez, relataram que “é como, uma mudança

grande, melhorou tudo, Deus mandando a chuva, temos onde armazenar”

(BENEFICIÁRIA E, PESQUISA DE CAMPO, 2015). Nesta perspectiva, outra

beneficiária relatou “é muito boa porque a água é nossa, não pagamos nada por ela,

é só ter cuidado para a cisterna não vazar” (BENEFICIÁRIA F, PESQUISA DE

CAMPO, 2015).

As falas das beneficiárias aqui descritas demonstram que as mesmas estão

cientes do objetivo do Programa e da necessidade do cuidado com a tecnologia,

pode-se averiguar ainda o sentimento de pertencimento sobre a água em seu

domínio, quando a descreve como sua.

Notou-se, ainda, que 1 (uma) das famílias beneficiadas apontou a tecnologia

como inadequada, segundo o mesmo “a água não é suficiente para o período de

estiagem, ficamos sem água a maior parte do tempo, aqui, assim eu penso deveria

ter água encanada”. Percebe-se através da fala do entrevistado o

descontentamento com o P1MC, devido a água armazenada não ser suficiente para

o período de estiagem, no entanto a ASA (2008) adverte que a suficiência da água

armazenada depende em grande parte da gestão feita pela família.

Houve ainda 2 (dois) beneficiários que responderam que o Programa é

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razoável, por atender apenas em parte suas necessidades por recursos hídricos.

Assim, relataram “Aqui precisamos de água para tudo, não temos outro acesso a

água, mas se a água é só para beber e cozinhar, fico sem água para outras

necessidades” (BENEFICIÁRIA G, PESQUISA DE CAMPO ,2015). A outra

Beneficiária, por outro lado, relatou que “não sei se essa água vinda da chuva serve

para beber” (BENEFICIÁRIA H, PESQUISA DE CAMPO, 2015).

Neste sentido, os relatos trazem à tona duas questões já levantadas por essa

pesquisa, uma está relacionada à dúvida no que tange à qualidade da água e a

outra está ligada ao direcionamento dado à água proveniente da cisterna e às

necessidades referentes à disponibilidade d’água. Percebe-se que a demanda por

água está mais ligada à necessidade das famílias, do que por má gestão do recurso

hídrico, uma vez que foram apresentados os diversos usos da água pela família.

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6 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Notou-se ao longo deste trabalho que a população rural brasileira sofre com a

precariedade de acesso à água, e essa realidade não é diferente na área de estudo

aqui pesquisada, no entanto a comunidade Vargem possui a questão do acesso à

água ainda mais agravado, devido às condições climáticas existentes no espaço

onde está situada. Sendo que essa é a realidade de muitas comunidades

localizadas no Semiárido brasileiro.

Sabe-se ainda que a maior parte do território da Região Nordeste situa-se no

Semiárido brasileiro, espaço geográfico demarcado pela ocorrência de longos

períodos de estiagem. Ciente das características físicas do espaço surge a

inquietação no intuito de buscar compreender os problemas decorrentes da seca, e,

a razão da persistência da ocorrência de danos à população que habita nesse

espaço.

Os problemas sociais mais conhecidos decorrentes da má distribuição da

chuva são a fome e a sede, já que a produção agrícola é a principal atividade

econômica da população rural, e essa fica comprometida, quando ocorre uma

estiagem prologada. Com o comprometimento da produção agrícola os sertanejos

se veêm sem recursos para permanecer no lugar de origem, o que provoca, assim, o

êxodo rural. No que se refere à sede, esta é agravada nos períodos de estiagem,

pois o clima semiárido contribui para a evaporação da água superficial e a água

oriunda de poços, muitas vezes é salobra devido à composição química e à

concentração de sais, característica do solo do Semiárido.

Todas essas questões aqui apresentadas são intensificadas por estiagens

prologadas. Alimentava-se um discurso que apresentava o território semiárido como

um espaço dramático, onde a seca seria a principal responsável pelas mazelas

sociais. No entanto, ao longo desse trabalho ficou claro que os problemas sociais

encontrados nesta região decorrem da concentração de terra, água e saber nas

mãos de uma minoria, enquanto a maioria sofria as mazelas por parte do poder

público, que ao invés de realizar intervenções resolutivas, realizava ações paliativas

ou descontextualizadas com as condições climáticas para amenizar um problema

pontual e assim retroalimentar o caráter clientelista que impunha à população local.

As intervenções ocorriam por intermédio principalmente das instituições

criadas com o propósito de combater os efeitos da seca como o Instituto de Obras

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Contra as Secas, Inspetoria Federal de Obras Contra as Secas, Departamento

Nacional de Obras Contra as Secas, entre outras, que acreditavam que a questão

da seca poderia ser resolvida por meio de construções hidráulicas.

Nesse sentido, essas Instituições investiram nas construções de grandes

obras hídricas, como açudes, poços e barragens, entretanto essas construções

muitas vezes, eram realizadas em propriedades privadas, o que provocava o

favorecimento dos latifundiários. Aos pequenos agricultores, restavam as medidas

paliativas, a exemplo da distribuição de cestas básicas, distribuição de água em

caminhão-pipa e vender sua força de trabalho nas Frentes de Trabalhos. Vale

lembrar que as Frentes de Trabalhos também beneficiavam os latifundiários, através

do trabalho pago pelo Estado em propriedades privadas.

Essas medidas ocasionando a indústria da seca, conforme se discutiu neste

trabalho, a indústria da seca refere-se ao uso político do fenômeno climático para

angariar recursos públicos federais com o pretexto de combater os efeitos da seca

sobre a população. Entretanto, não existe uma verdadeira intenção política em

solucionar problema algum, visto que esses políticos usam os recursos adquiridos

para investimentos por vezes equivocados, como a construção de obras hídricas

que tendem a favorecer a elite agrária, como construções de açudes em propriedade

privada e fazendo uso das medidas paliativas para a população com menos

recursos.

As elites agrárias, por sua vez, mantinham um domínio sobre uma área

eleitoral, fazendo uso dos recursos adquiridos para combater a seca a fim de usar

como “moeda de troca”, o que Castro (1992) caracterizou como voto de cabresto, ou

seja, o domínio que a elite agrária mantinha sobre uma área eleitoral para favorecer

um politico de sua preferência. Nesse sentido, não existia um real interesse em

solucionar as questões sociais que decorriam das secas.

Contudo, inicia-se com a SUDENE a proposta de pensar o Nordeste

economicamente, através de um projeto de industrialização aliado a um

planejamento de desenvolvimento econômico e social para região. Porém, o projeto

construindo para SUDENE é interrompido pelo Golpe Militar de 1964 e embora a

então Superintendência tenha provocado a industrialização na região, a mesma é

apontada como a principal reprodutora da indústria da seca.

Constatou-se ainda, que após o fim da Ditadura Militar, a sociedade civil

organizada encontrou uma abertura democrática para expressar seu

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descontentamento com as políticas públicas de combate aos efeitos da seca

debatido nesse trabalho. A redemocratização do país possibilitou a união de

diferentes organizações existentes no semiárido que tinham como objetivo comum

pautar a convivência com o semiárido.

Da união e articulação entre diferentes organizações nasce a ASA-Brasil

formando este o principal espaço de articulação das organizações que atuam em

prol do desenvolvimento social, econômico, político e cultural do Semiárido

brasileiro. Sendo no âmbito dessa articulação que foi elaborado e implantado em

2000 o P1MC, que em 2003 tornou-se uma política pública tendo como principal

objetivo garantir o acesso à água em comunidades rurais em todo semiárido, através

da construção de um milhão de cisternas de placas de cimento.

Assim, o P1MC apresenta-se como pilar central no auxílio à convivência das

famílias com o semiárido, visto que possibilita que a família mantenha suas

necessidades mínimas de consumo familiar de água garantida enquanto o período

de estiagem se mantém. O acesso a esta água captada das chuvas, somado a

utilização de técnicas adequadas à realidade local, garantem a dignidade da

população local, possibilitando melhores condições de vida.

Por entender ser esta a meta do Programa, buscou-se aqui verificar se o

P1MC promove uma transformação social através do fortalecimento da sociedade

civil, diminuição da dependência de medidas paliativas do poder público e de favores

dos latifundiários, capacitando ainda famílias sertanejas para a convivência com o

semiárido.

Como a proposta aqui presente consistia em realizar uma avaliação de uma

política pública, percebeu-se que a utilização de estudo de caso foi a metodologia

mais adequada, e que a utilização de técnicas, como questionário e entrevista,

foram também adequadamente ajustadas. Por meio deste percurso metodológico foi

possível coletar as informações desejadas e imprescindíveis à conclusão desta

pesquisa.

Houve a escolha de uma comunidade rural beneficiada pelo P1MC, para que

se pudessem analisar os possíveis impactos sociais ocorridos devido à implantação

do programa. Nesse sentido a comunidade rural escolhida foi a Vargem, situada no

município de Feira de Santana, estado da Bahia, especificamente no Distrito de

Maria Quitéria.

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Vale lembrar que a avaliação de políticas públicas é necessária ao passo em

que pode orientar novas possibilidades de execução não previstas quando de sua

elaboração, ou seja, promovendo uma adequação para um melhor desempenho de

seus objetivos. Contudo, cabe ressaltar que um estudo de caso não reflete a

totalidade dos fatos, sobretudo em um Programa que se desenvolve em diversos

estados e municípios, mas, somado a outros estudos podem garantir um panorama

mais fiel a uma avaliação do P1MC e de seus impactos.

O P1MC é uma idealização da ASA-Brasil com a meta da construção de um

milhão de cisternas rurais no Semiárido brasileiro, descentralizando o acesso à água

para consumo humano, garantindo assim prioritariamente água para beber e

cozinhar.

A partir do objetivo do Programa, já é possível compreender que a iniciativa

busca superar a condição de políticas paliativas que eram práticas comuns na

região. Dessa maneira, ao invés da realização de grandes obras que figurativamente

beneficiariam por igual os habitantes do semiárido, mas na prática beneficiava

principalmente os grandes latifundiários que comumente doam suas terras para a

construção das barragens e seus projetos de irrigação, o P1MC realiza pequenas

obras que auxiliam diretamente as famílias beneficiárias na superação o acesso à

água, permitindo ainda que a família beneficiada com a cisterna tenha pleno domínio

sobre sua água.

Com a tecnologia social da implantação de cisternas, não há impactos

adversos na paisagem, nem no modus vivendis da comunidade, como ocorre

quando da implantação de uma barragem. O principal no P1MC é a garantia de

acesso à água que se configura no direito humano fundamental no período da

estiagem às famílias rurais do semiárido, o que auxilia na redução de riscos à saúde

por ingestão de água contaminada e principalmente na dependência de caminhão-

pipas ou de favores políticos.

No P1MC a ideia é envolver a população na execução do projeto o que

garante o sentimento de pertencimento ao longo da transferência de tecnologia

social e ocasiona maior cuidado com a cisterna, visto que conta com a participação

e colaboração dos moradores e entidades de representação de cada um dos

municípios contemplados com o Programa. Essa união de forças entre a ASA e

beneficiários garante o empoderamento da comunidade, com dignidade e qualidade

de vida às famílias do meio rural que sofrem com prologadas estiagens.

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De acordo com os resultados da pesquisa chegou-se à conclusão de que nem

todos os critérios técnicos de elegibilidade para acesso à tecnologia social foram

cumpridos, contudo, isso não ocorreu numa alteração do objetivo do Programa,

mostrando inclusive que houve sensibilidade da equipe técnica do MOC para

garantir o acesso à água às famílias mais carentes da comunidade Vargem.

As inconformidades citadas se referem ao tipo inadequado de cobertura das

casas a não participação no curso de gerenciamento de recursos hídricos e em

relação à posse do imóvel, por tanto nem todas as famílias beneficiárias se

encontram dentro dos critérios estabelecidos pela ASA para transferência da

tecnologia cisterna.

Contudo, a ausência no curso sobre gerenciamento de recursos hídricos pode

ocasionar inconvenientes ao bom andamento do projeto após a entrega da cisterna

para as famílias, tais como a manutenção da tecnologia, o que pode ocasionar

problemas na conservação da estrutura da cisterna, como provocar rachaduras;

além de danos físicos às cisternas, há também a possibilidade de contaminação da

água por fatores biológicos e químicos, como a introdução de peixes e de produtos

químicos para desinfecção da água.

Além da manutenção das cisternas e das águas nelas condicionadas, a falta

de conhecimentos adequados para a manipulação da água captada nas cisternas

pode causar problemas aos usuários dessa tecnologia, visto que a adição de

elementos como o cloro em quantidade inadequada pode causar riscos à saúde.

Há também a desconfiança dos beneficiários com a água da chuva, pela falta

de costume em consumi-la, visto que habitualmente utilizava-se água oriunda de

poços artesianos e de caminhão-pipa. Constatou-se ainda que o agente de saúde e

as entidades municipais existentes na comunidade não têm colaborado com o bom

andamento do Programa, uma vez, que cabem às entidades como a Associação de

Moradores, Posto de Saúde, Escola e principalmente o agente de saúde continuar

orientando a população sobre os cuidados com a cisterna.

Outro dado expressivo é a forma como é utilizada a água da cisterna: essa

água é usada pela maioria das famílias beneficiadas da Vargem para diversas

finalidades, fugindo assim do princípio do Programa que é armazenar água para

beber, cozinhar e escovar os dentes. No entanto, as famílias demostraram

resistência em beber a à água provida da chuva, sendo que os outros destinos dado

a água também estão relacionados à necessidade de consumo de cada família,

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porém foge ao principal objetivo do P1MC que é o armazenamento da água

prioritariamente para beber.

Apesar da resistência em beber a água da chuva por parte das famílias

beneficiadas e das adversidades que ocorrem para o fidedigno cumprimento dos

critérios de seleção para a transferência da tecnologia, percebeu-se que a tecnologia

foi destinada a quem dela precisava, não havendo desvio de objetivo, nem

desajustes em sua execução, ou seja, auxiliando na melhoria das condições de vida

das famílias beneficiadas pelo P1MC em Vargem e promovendo uma transformação

social nessa comunidade, no entanto, percebeu-se ainda que essas transformações

sociais não ocorreram de forma plena uma vez que as famílias beneficiadas

continuam fazendo uso de medidas paliativas.

Contudo, entende-se que por a tecnologia ter sido implantada no ano de 2013

na comunidade em estudo, ou seja, até o desenvolvimento da pesquisa havia

apenas 2 (dois) ano de funciomanento da cisterna de placas de cimento, a

população ainda esteja em etapa de adaptação a nova tecnologia de

armazenamento de água, afinal levou-se uma vida inteira consumindo-se apenas a

água subterania no semiárido. Neste sentido, cabe aqui reforça a necessidade do

trabalho desenvolvido pelos agentes de saúde desse lugar, uma vez que segundo a

ASA (2008) cabe a esses profissionais as orientações continuam na comunidade

sobre o manejo com a água provida da chuva, por outro lado cabe também as

instituições locais colaborarem para o bom andamento dessa Política Pública, já que

a convivência da mulher e do homem com o clima semiárido devem ser efetivada

através da adoção de novas práticas, que devem ser constantemente encentivadas.

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