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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ ROBERTA DIAS FERNANDES A ASSINATURA DIGITAL COMO PRESSUPOSTO DE VALIDADE DOS CONTRATOS ELETRÔNICOS São José 2010

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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ

ROBERTA DIAS FERNANDES

A ASSINATURA DIGITAL COMO PRESSUPOSTO DE VALIDADE DOS CONTRATOS ELETRÔNICOS

São José

2010

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ROBERTA DIAS FERNANDES

A ASSINATURA DIGITAL COMO PRESSUPOSTO DE VALIDADE DOS CONTRATOS ELETRÔNICOS

Monografia apresentada à Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI , como requisito parcial a obtenção do grau em Bacharel em Direito.

Orientador: Prof. MSc. Flaviano Vetter Tauscheck

São José 2010

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ROBERTA DIAS FERNANDES

A ASSINATURA DIGITAL COMO PRESSUPOSTO DE VALIDADE DOS CONTRATOS ELETRÔNICOS

Esta Monografia foi julgada adequada para a obtenção do título de bacharel e

aprovada pelo Curso de Direito, da Universidade do Vale do Itajaí, Centro de

Ciências Sociais e Jurídicas.

Área de Concentração: Direito Civil

São José, 23 de novembro de 2010.

Prof. MSc. Flaviano Vetter Tauscheck UNIVALI – Campus de São José

Orientador

Prof. MSc. Elisabete Wayne Nogueira UNIVALI – Campus de São José

Membro

Prof. MSc. Adriana Conterato Bulsing Instituição Membro

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TERMO DE ISENÇÃO DE RESPONSABILIDADE

Declaro, para todos os fins de direito, que assumo total responsabilidade

pelo aporte ideológico conferido ao presente trabalho, isentando a Universidade do

Vale do Itajaí, a coordenação do Curso de Direito, a Banca Examinadora e o

Orientador de toda e qualquer responsabilidade acerca do mesmo.

São José, 23 novembro de 2010.

Roberta Dias Fernandes

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RESUMO

A presente monografia tem como escopo demonstrar que, diante da expansão mundial da internet, os contratos antes realizados através de meio físico puderam, em sua grande maioria, ser realizados pelo mundo virtual. A internet se transformou em um meio e em um local de formalização de contratos, passando-se a denominá-los de contratos eletrônicos. Muito embora não haja no ordenamento jurídico brasileiro a expressa menção aos contratos eletrônicos, estes decorrem dos contratos de maneira geral, visto que devem preencher todos os requisitos e pressupostos de qualquer contrato para serem analisados nos planos de existência, validade e eficácia. Concomitantemente com a inovação tecnológica, criou-se uma insegurança jurídica na realização de contratos eletrônicos, diante da possibilidade de alteração nos documentos eletrônicos e da fragilidade de identificação dos contratantes. A fim de garantir a segurança jurídica nos contratos realizados por meio da internet, criou-se a assinatura digital que, através do uso da criptografia assimétrica, assegura as partes a autenticidade das informações trocadas e/ou armazenadas e a identificação do contratante. Palavra-chave: Internet, Contratos, Contratos Eletrônicos, Criptografia, Assinatura Digital, Certificação Digital.

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ABSTRACT This monograph is scoped to demonstrate that given the global expansion of the internet, before the contracts made by the physical environment could, for the most part, be conducted in the virtual world. The internet has become a means and a place of formal contracts, going to call them to electronic contracts. Although there is the Brazilian legal system the express mention of electronic contracts, these contracts result in a general way, as they should complete all requirements and conditions for any contract to be studied by the planes of existence, validity and effectiveness. Concurrent with technological innovation, they created legal uncertainty in the realization of electronic contracts, given the possibility of a change in the electronic documents and identification of the fragility of the contractors. In order to ensure legal certainty in contracts made through the internet, we created the digital signature through the use of asymmetric encryption ensures the authenticity of the parties exchanged information and/or stored and the identification of the contractor. Keyword: Internet, Contracts, Electronic Contracts, Cryptography, Digital Signature, Digital Certificate.

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO.............................................................................................................9

1 TEORIA GERAL DOS CONTRATOS.....................................................................12

1.1 NOÇÕES GERAIS SOBRE CONTRATOS..........................................................12

1.2 PLANO DE EXISTÊNCIA, VALIDADE E EFICÁCIA DOS CONTRATOS............13

1.3 PRINCÍPIOS CONTRATUAIS..............................................................................20

1.3.1 Princípio da dignidade da pessoa humana...................................................20

1.3.2 Princípio da autonomia da vontade ou do consensualismo.......................21

1.3.3 Princípio da supremacia da ordem pública..................................................23

1.3.4 Princípio da função social do contrato.........................................................24

1.3.5 Princípio da relatividade dos contratos........................................................25

1.3.6 Princípio da força obrigatória do contrato – pacta sunt servanda.............26

1.3.7 Princípio da onerosidade excessiva – rebus sic stantibus.........................27

1.3.8 Princípio da boa-fé objetiva e subjetiva........................................................28

1.4 FORMAÇÃO DOS CONTRATOS........................................................................29

1.4.1 Momento da formação....................................................................................30

1.4.2 Local da formação..........................................................................................34

2 DA INTERNET E DOS CONTRATOS ELETRÔNICOS.........................................36

2.1 NOÇÕES GERAIS SOBRE A INTERNET...........................................................36

2.2 CONCEITO DE CONTRATOS ELETRÔNICOS..................................................40

2.3 CLASSIFICAÇÃO DOS CONTRATOS ELETRÔNICOS.....................................41

2.3.1 Contratos eletrônicos intersistêmicos..........................................................41

2.3.2 Contratos eletrônicos interpessoais.............................................................43

2.3.3 Contratos eletrônicos interativos..................................................................45

2.4 DO MOMENTO DE FORMAÇÃO, LOCAL E VALIDADE DOS CONTRATOS

ELETRÔNICOS .........................................................................................................47

3 ASSINATURA DIGITAL.........................................................................................54

3.1 NOÇÕES GERAIS SOBRE A ASSINATURA DIGITAL.......................................54

3.2 CRIPTOGRAFIA..................................................................................................56

3.2.1 Criptografia simétrica ou com chave secreta..............................................58

3.2.2 Criptografia assimétrica ou com chave pública..........................................60

3.3 ASPECTOS GERAIS DO DOCUMENTO ELETRÔNICO...................................63

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3.4 CERTIFICAÇÃO DIGITAL E AUTORIDADE CERTIFICADORA.........................64

3.5 LEGISLAÇÕES E INICIATIVAS LEGISLATIVAS.................................................66

CONSIDERAÇÕES FINAIS.......................................................................................73

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS..........................................................................76

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INTRODUÇÃO

O presente tema visa elucidar as questões concernentes aos contratos

celebrados por meio da internet, numa espécie de aplicação da Teoria Geral dos

Contratos, em que, muito embora sejam utilizados os pressupostos dos contratos

elaborados por meio físico, tem-se, contudo, a problemática jurídica em termos de

formação, validade e autenticidade dos contratos eletrônicos.

Através da análise do ordenamento jurídico brasileiro e de suas

aplicações ao caso concreto, o presente trabalho aborda os institutos da internet,

dos contratos tradicionais previstos nas leis infraconstitucionais, dos documentos

digitais, dos meios de identificação digital, bem como suas autoridades

certificadoras, além de dar ênfase à assinatura digital como pressuposto de validade

dos contratos eletrônicos.

A presente monografia, através da técnica de documentação indireta, tem

como objetivo demonstrar a aplicabilidade da Teoria Geral dos Contratos nos

contratos celebrados eletronicamente, retratando a divergência doutrinária e

jurisprudencial acerca da formação dos contratos eletrônicos, eis que de acordo com

o lapso temporal decorrente, os contratos celebrados eletronicamente podem ser

considerados como formados entre pessoas presentes ou ausentes.

Há de salientar que o contrato eletrônico não é considerado uma nova

modalidade de contrato e, por esta razão, deve atender aos requisitos de qualquer

negócio jurídico, de acordo com a Teoria Geral dos Contratos, bem como dos

princípios contratuais.

Desta forma, a formação jurídica dos contratos eletrônicos é entendida,

por grande parte da doutrina, como realizada entre ausentes, em razão do lapso

temporal entre proposta e aceitação. Todavia, de acordo com o modo pela qual a

internet é utilizada, pode ainda o contrato eletrônico ser considerado como formado

entre presentes, uma vez que a utilização de um sistema que ofereça

simultaneidade entre proposta e aceitação, como na hipótese de utilização de um

chat, faz com que o lapso temporal seja consideravelmente reduzido pelas partes

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em razão da celeridade proporcionada pelo meio eletrônico, sem que haja margem

de espera de resposta por um dos contratantes.

Diante da utilização cada vez maior da internet como meio e local para

formação de contratos eletrônicos, a realização de negócios jurídicos virtuais para os

contratantes tornou-se vantajosa em termos de celeridade e custo-benefício.

Todavia, concomitantemente com este avanço tecnológico, deixou-se de

ter a segurança proporcionada pelos contratos tradicionais, eis que estes eram

passíveis de verificação de autenticidade no próprio documento físico e rubricado

originalmente pela partes envolvidas no negócio jurídico.

Visando aprimorar a celebração de contratos eletrônicos, para que estes

se tornem tão usais e seguros quanto os contratos tradicionais, criou-se a identidade

digital do contratante/usuário, conhecida como assinatura digital.

Esta identificação pode e deve ser aplicada e utilizada como pressuposto

de validade do contrato eletrônico celebrado, através da utilização do sistema de

criptografia assimétrica mediante o emprego de uma assinatura digital que fornecerá

a segurança jurídica para o contrato eletrônico e a respectiva autenticidade do

documento.

Portanto, a fim de aprimorar os contratos eletrônicos existentes no

ordenamento jurídico brasileiro, ainda carentes de legislação específica, o estudo da

assinatura digital como pressuposto de validade dos contratos eletrônicos é de

fundamental importância.

Neste estudo, a metodologia empregada para elaboração da presente

monografia foi o método dedutivo.

Para compreensão do tema, o trabalho foi dividido em três capítulos,

sendo que os dois primeiros visam trazer os elementos necessários de

compreensão acerca dos contratos tradicionais e dos contratos eletrônicos, para que

assim, no terceiro capítulo, a abordagem sobre a assinatura digital possa ser

analisada sob o enfoque da necessidade de sua utilização quando da realização dos

contratos eletrônicos como forma de segurança jurídica para os contratantes.

O primeiro capítulo dedica-se aos contratos em geral, demonstrando os

requisitos para a aplicação da Teoria Geral dos Contratos, seus princípios

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contratuais, bem como o momento e o local de formação dos contratos.

No segundo capítulo, aborda-se o instituto da internet, sua expansão

mundial e sua utilização como instrumento de realização de contratos eletrônicos.

Destaca-se, ainda, a classificação dos contratos eletrônicos, o momento de

formação destes, o local e a validade jurídica no ordenamento jurídico brasileiro.

Por fim, no terceiro capítulo, enfoque maior deste estudo, os contratos

eletrônicos são aprofundados no tocante a validade jurídica, dando-se ênfase a

assinatura digital como pressuposto de validade do contrato eletrônico.

Ao final, pretende-se deixar demonstrado que os contratos eletrônicos são

negócios jurídicos diariamente utilizados e que, diante da falta de legislação

específica, existe insegurança na realização destes, posto não haver critérios para

autenticidade dos documentos eletrônicos e autoria da parte contratante.

Por esta razão, a caracterização da assinatura digital como pressuposto

de validade do contrato eletrônico é uma forma de identificação dos contratantes,

tornando, portanto, a relação jurídica segura quanto aos usuários do negócio e

garantindo a autenticidade do documento eletrônico.

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1 TEORIA GERAL DOS CONTRATOS

1.1 NOÇÕES GERAIS SOBRE CONTRATOS

O contrato é um instituto antigo de enorme relevância social e jurídica, de

modo que suas raízes principiológicas sofrem modificações e interpretações de

acordo com a época de sua aplicação.

As normas gerais sobre os contratos estão contidas no Código Civil (Lei

10.406/2002), mais precisamente no Título V (Contratos em Geral), Livro I (Do

Direito das Obrigações) da Parte Especial do Código.

Importante destacar que o contrato é espécie do gênero negócio jurídico,

sendo este uma manifestação de vontade humana (ação ou omissão) que produz

efeitos no mundo jurídico, através da criação, extinção, conservação ou modificação

de direitos. (GOMES, 2001).

Apesar do Código Civil não definir o contrato, Pablo Stolze Gagliano e

Rodolfo Pamplona Filho (2009, p. 11) o conceituam como:

[...] um negócio jurídico por meio do qual as partes declarantes, limitadas pelos princípios da função social e da boa-fé objetiva, autodisciplinam os efeitos patrimoniais que pretendem atingir, segundo a autonomia das suas próprias vontades.

Portanto, contrato é espécie do gênero negócio jurídico, em que duas ou

mais pessoas resolvem, de comum acordo, estabelecer obrigações e direitos de

caráter patrimonial em detrimento da autonomia privada de que cada parte possui.

Nesse sentido, assim definiu Arnaldo Rizzardo (2008, p. 3):

Os variados modos pelos quais os Estados soberanamente constituídos e os indivíduos adquirem, resguardam, transferem, modificam ou extinguem direitos são negócios jurídicos de direito estrito. Ocupam os contratos o primeiro lugar entre os negócios jurídicos e são, justamente, aqueles por meio dos quais os homens combinam os seus interesses, constituindo, modificando, ou solvendo algum vínculo jurídico. Mais especificamente, são colocados entre os atos-jurídicos bilaterais criadores de uma situação jurídica individual.

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A autonomia da vontade ou a convergência de interesses é o poder que

as partes possuem de autoregulamentar o negócio jurídico a ser realizado,

convencionando da melhor maneira as suas próprias finalidades.

Ainda quanto ao conceito de contrato, Orlando Gomes apud Mirabelli

(2001, p. 7) dispõe que:

Contrato, é assim, o negócio jurídico bilateral, ou plurilateral, que sujeita as partes à observância de conduta idônea à satisfação dos interesses que regularam. Os sujeitos dessa relação contratual chamam-se partes. Parte não se confunde com pessoa. [...] Parte é, em síntese, um centro de interesses, indicando-se com essa expressão a posição dos sujeitos em face da situação na qual incide o ato.

Os sujeitos da relação contratual, portanto, são denominados partes ou

contratantes, condicionados ao cumprimento do negócio jurídico celebrado através

de seus próprios interesses.

No mesmo sentido, Carlos Roberto Gonçalves (2004, p. 2) disciplina que:

O contrato é uma espécie de negócio jurídico que depende, para a sua formação, da participação de pelo menos duas partes. É, portanto, negócio jurídico bilateral ou plurilateral. Com efeito, distinguem-se, na teoria geral dos negócios jurídicos, os unilaterais, que se aperfeiçoam pela manifestação de vontade de apenas uma das partes, e os bilaterais, que resultam de uma composição de interesses. Os últimos, ou seja, os negócios bilaterais, que decorrem de mútuo consenso, constituem os contratos. Contrato é, portanto, como dito, uma espécie do gênero negócio jurídico.

Dessa forma, de acordo com o quanto disposto pelos autores acima

denominados, pode-se dizer que quando duas ou mais partes manifestam suas

vontades no sentido de alcançarem o mesmo fim, concordando com as obrigações

dali advindas, estar-se-á, aparentemente, diante de um negócio jurídico denominado

contrato.

1.2 PLANO DE EXISTÊNCIA, VALIDADE E EFICÁCIA DOS CONTRATOS

Para existir, o contrato deve atender a requisitos mínimos que o tornem

perceptível no mundo jurídico, quais sejam manifestação de vontade, agente, objeto

e forma. (GAGLIANO e PAMPLONA FILHO, 2009)

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Para ser válido, o negócio jurídico deve atender a pressupostos mínimos

capazes de tornar o contrato passível de efeitos na esfera jurídica, conforme

requisitos elencados no art. 104 do Código Civil, quais sejam a manifestação de

vontade de maneira livre e de boa-fé, agente capaz e legítimo, objeto lícito,

determinado ou determinável e forma prescrita ou não defesa em lei. (GONÇALVES,

2004)

Uma vez atendidas às condições de existência e validade do contrato,

para que este se torne eficaz, o que regra geral ocorre é o caráter imediato da

eficácia contratual, deve-se atentar ainda para a possibilidade de o contrato aventar

com fatores determinantes de eficácia, quais sejam o termo, a condição e o

modo/encargo. (GAGLIANO e PAMPLONA FILHO, 2009)

Analisa-se, portanto, os elementos acima dispostos, sendo que,

primeiramente e, essencialmente, deve haver manifestação de vontade das partes

celebrantes do contrato.

Sem declaração de vontade privada, não há que falar em contrato.

Portanto, impende necessariamente que as partes manifestem suas vontades, ou

seja, seus pontos de interesses a fim de que, através da vontade individual de cada

um dos contratantes seja iniciada a relação contratual em questão.

Há a necessidade que um agente manifeste essa vontade, ou seja, duas

ou mais pessoas devem estar dispostas a celebrar o negócio jurídico e declará-lo

juridicamente.

Na acepção lata, o consentimento significa a integração das vontades distintas. Na acepção restrita, a vontade de cada parte. Integradas as vontades, dá-se o acordo, que consiste, pois, na fusão de duas declarações, distintas e coincidentes. As declarações são independentes. Sujeita-se, cada qual, às regras que regulam as manifestações individuais de vontade. Emitidas de harmonia com os requisitos exigidos, é preciso que se encontrem. (GOMES, 2001, p. 48)

Acerca da manifestação de vontade das partes, Sílvio de Salvo Venosa

(2007, p. 405) faz a distinção existente entre a manifestação direta e a indireta da

vontade nos contratos:

Nesse diapasão, podemos falar na manifestação direta e indireta da vontade nos contratos. Assim, é direta a manifestação quando esta se percebe de sinais externos inequívocos, pela fala, pela escrita ou por gestos, quando tais atitudes revelam socialmente uma intenção.

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Por outro lado, a manifestação é indireta quando a intenção de contratar é inferida de um comportamento negocial; isto é, na situação determinada, o comportamento do agente é de aquiescência a um contrato. Essa manifestação indireta, tácita, é cuidada como exceção no sistema e só é admitida quando a lei não exige expressa declaração. Também por vezes a lei admite uma declaração ficta, presumida. A lei deve ser expressa, no entanto.

Dessa forma, as partes poderão revelar seus interesses através de atos

expressos, de caráter comissivo, de concordância manifesta, ou ainda, tão somente

aquiescer com determinada situação, atribuindo-se a esse ato o caráter omissivo.

O Código Civil disciplinou em alguns artigos sobre a manifestação direta e

indireta de vontade nos contratos, conforme se percebe nos dispositivos abaixo

mencionados.

Art. 110. A manifestação de vontade subsiste ainda que o seu autor haja feito a reserva menção de não querer o que manifestou, salvo se dela o destinatário tinha conhecimento. Art. 111. O silêncio importa anuência, quando as circunstâncias ou os usos o autorizarem, e não for necessária a declaração de vontade expressa. Art. 112. Nas declarações de vontade se atenderá mais à intenção nelas consubstanciada do que ao sentido literal da linguagem.

Além da manifestação de vontade, para que se estabeleçam direitos e

obrigações, o contrato deverá conter um objeto que indicará a prestação ou serviço

que as partes estão contratando.

Ou seja, o objeto é, por si só, o motivo maior para o estabelecimento do

negócio jurídico.

Assim, Pablo Stolze Gagliano e Rodolfo Pamplona Filho (2009, p. 20)

tratam da necessidade de haver um objeto contratual, que nada mais é do que a

manifestação central da declaração emanada das partes contratantes.

Justamente o objeto do contrato, que consiste na prestação de relação obrigacional estabelecida, valendo destacar que tal objeto pode ser direto/imediato ou indireto/mediato, à medida que se materialize, respectivamente, na atividade a ser desenvolvida (prestação de dar, fazer ou não fazer) ou no bem da vida posto em circulação.

Ainda, distingue-se o objeto contratual em imediato e mediato. O primeiro,

decorre do próprio ato obrigacional, ou seja, a operação ora realizada, enquanto o

segundo seria o cumprimento da obrigação, através da prestação do serviço,

entrega do produto ou da coisa estipulada. (LISBOA, 2002)

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Diz-se, portanto, que sem objeto, não há contrato. Havendo manifestação

de vontade, agente e objeto, imprescindível que o pacto celebrado seja exteriorizado

de alguma maneira, ou seja, o contrato precisa ter uma forma, muito embora a regra

geral seja a liberdade de forma na elaboração dos contratos.

Reza o art. 107 do Código Civil:

Art. 107. A validade da declaração de vontade não dependerá de forma especial, senão quando a lei expressamente a exigir.

Para Erica Brandini Brabagalo (2001, p. 16) “a forma é a possibilidade de

reconhecimento do ato dentro do ambiente social em que foi produzida.”

As partes poderão adotar a forma que melhor lhes convierem, pois para a

existência de um contrato, regra geral não há uma determinação específica,

competindo as partes decidirem sobre a forma adotada para a realização do negócio

jurídico.

O conceito de liberdade de contratar engloba também a liberdade de forma do contrato. Em princípio, os contratos não estão sujeitos a nenhuma formalidade. A perfeição do contrato não requer o cumprimento de nenhum requisito de forma, seja a escrita, seja qualquer outro requisito formal. [...] A liberdade de forma é extremamente importante no atual contexto do comércio, em que graças a modernos meios de comunicação, como a Internet, contratos podem ser celebrados com grande rapidez e prescindindo do suporte papel, como é o caso dos contratos eletrônicos. (LOUREIRO, 2008, p. 54/55)

Em contrapartida a liberdade de forma dos contratos, Pablo Stolze

Gagliano e Rodolfo Pamplona Filho (2009, p. 26) discorrem sobre a forma especial:

[...] quando a norma legal impõe determinado revestimento para o ato, traduzindo em uma forma especial ou em uma indispensável solenidade, diz-se que o negócio é ad solemnitatem. [...] Ao lado dos negócios ad solemnitatem, figura outra importante categoria: a dos negócios ad probationem. Nesse, apesar de a forma não preponderar sobre o fundo, por não ser essencial, deverá, outrossim, ser observada, para efeito de prova do ato jurídico.

No presente caso, tem-se que a forma é pressuposto de existência do

contrato, bem como requisito no campo de validade, eis que a forma deve ser

adequada, não podendo ser defesa em lei.

Uma vez existente o negócio jurídico, faz-se necessário averiguar se este

será considerado válido.

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Sendo o contrato um negócio jurídico, os requisitos de validade estão

dispostos no art. 104 do Código Civil, que explicita os elementos necessários a

validade do negócio jurídico.

Art. 104. A validade do negócio jurídico requer: I - agente capaz; II - objeto lícito, possível, determinado ou determinável; III - forma prescrita ou não defesa em lei.

Muito embora a manifestação de vontade seja um pressuposto para a

existência do contrato a ser formado, a declaração emanada deve ser realizada de

maneira livre e de boa-fé, de modo a afastar possíveis vícios de consentimento.

Não basta que haja tão somente a manifestação de vontade das partes.

Deve haver a reciprocidade de objetivos, ou seja, um consentimento válido que

corresponda ao acordo formulado pelos contratantes.

O fator novo, elementar ao conceito de contrato, é a coincidência de vontades, ou seja, o acordo entre dois ou mais participantes da convenção. [...] No contrato, porém, dado seu caráter sinalagmático, é mister a existência da manifestação coincidente da vontade de duas ou mais partes. Em regra, apresentam-se dois contratantes, com interesses opostos, que através da convenção se compõem. (RODRIGUES, 2003, p. 13/14)

Deve haver comum acordo entre as partes no tocante ao negócio jurídico

celebrado, de modo que a anuência dos contratantes é que validará a realização do

contrato.

Sobre o assunto, assim discorre Carlos Roberto Gonçalves (2004, p. 14):

O requisito de ordem especial, próprio dos contratos, é o consentimento recíproco ou acordo de vontades. Deve abranger os seus três aspectos: c1) acordo sobre a existência e natureza do contrato (se um dos contratantes quer aceitar uma doação e outro quer vender, contrato não há); c2) acordo sobre o objeto do contrato; e c3) acordo sobre as cláusulas que o compõem (se a divergência recai sobre ponto substancial, não poderá ter eficácia o contrato). O consentimento deve ser livre e espontâneo, sob pena de ter a sua validade afetada pelos vícios ou defeitos do negócio jurídico: erro, dolo, coação, estado de perigo, lesão e fraude.

Portanto, enquanto a manifestação de vontade é condição de existência

do contrato, a declaração da parte através de consentimento livre e de boa-fé é

pressuposto de validade do contrato celebrado.

A manifestação de vontade das partes pode ocorrer através de

consentimento expresso, quando manifestada verbalmente ou por escrito,

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reconhecida também por gestos e sinais. Não obstante, poderá apresentar-se de

maneira tácita, de modo que os fatos ensejadores de determinada situação

autorizem o reconhecimento da manifestação. (RIZZARDO, 2008)

Outro pressuposto de validade do contrato é a capacidade do agente em

declarar sua vontade, competindo à parte atender tanto a capacidade de fato como a

capacidade de direito.

Imprescindível, portanto, que o agente responsável pela celebração do

contrato seja civilmente capaz para realização do ato e que, ainda, seja legitimado

para tanto.

Para ser válido o contrato, a parte deve ser agente capaz, ou seja, gozar de capacidade de direito e de capacidade de fato. Por capacidade de direito, ou de gozo, entende-se a capacidade de ser titular de direitos, o que é inerente a todo ser humano em virtude de sua condição de pessoa [...]. Já a capacidade de fato, ou de exercício, considera-se a faculdade que tem a pessoa de, por si mesma, levar a efeito o uso e gozo dos diversos direitos; é a capacidade de exercer direitos. Dessa maneira, deve a parte ser capaz de ser titular do direito pretendido com a vinculação, bem como ser capaz de exercer tal direito por si mesma, ou ter sua incapacidade de fato suprida [...]. (BARBAGALO, 2001, p. 12-13)

Não basta que o agente seja capaz do exercício de direitos e deveres na

ordem civil, ele deve também ser legítimo para realização do ato em questão,

conforme determina o Código Civil.

Uma vez conferida por lei a capacidade civil a determinado indivíduo,

compete a este, titular de direito e obrigações, o exercício de seu direito de celebrar

negócios jurídicos, sendo que ao celebrar um contrato, passará a ser civilmente

responsável pelo cumprimento das cláusulas ali advindas.

A capacidade das partes é requisito de validade do contrato, sendo que a

falta de capacidade de um ou ambos os contratantes poderá acarretar a nulidade ou

anulabilidade do contrato celebrado (GONÇALVES, 2004).

Ainda quanto a validade dos contratos, existindo objeto a ser executado

ou prestado, deve este ser lícito, possível, determinado ou determinável.

Arnaldo Rizzardo (2008, p. 11/12) revela acerca do objeto do contrato:

Quanto ao objeto, em primeiro lugar, deve o objeto revelar-se lícito como pressuposto para a validade do contrato. Para ser lícita a operação, é necessário que seja conforme a moral, a ordem pública

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e os bons costumes. [...] Em seguimento, é necessário que o objeto seja possível, ou que gire em torno de uma operação realizável. Se estabelecer prestação que jamais se efetivará, como, v. g., por contrariar as leis da natureza, ou ultrapassar as forças humanas, não terá validade. [...] Dentro do conceito de possibilidade, importa que encerre o objeto algum valor econômico, capaz de se transformar, direta ou indiretamente, em dinheiro. Não possuindo estimativa econômica, desinteressa ao mundo jurídico, eis que faltará suporte para uma ação judicial. [...] O contrato envolverá objeto determinado ou determinável, isto é, que possa ser identificado, localizado, percebido, medido, aferido. Inviável a aquisição de um bem que se confunde com outros, ou se torne impossível a sua descrição e individuação.

Em outras palavras, o objeto do contrato não pode ser proibido pela

legislação brasileira (lícito), deve ser passível de ser alcançado concretamente

(possível) e, por último, deve conter requisitos que o possam identificá-lo com

precisão no mundo jurídico (determinado ou determinável).

O objeto sobre o qual repousa a vontade dos contratantes deve ser determinado. Não é possível obrigar o devedor a pagar alguma coisa, ou a exercer alguma atividade, de forma indeterminada. [...] O objeto e as prestações de um contrato devem ser possíveis. A impossibilidade jurídica encontra obstáculo no ordenamento. [...] O objeto do contato deve ser lícito. Não pode contrariar a lei e os bons costumes. Não é lícito um contrato de contrabando, nem é moral um contrato que obrigue uma pessoa a manter-se em ócio, sem trabalhar. (VENOSA, 2007, p. 407/408)

Embora o contrato seja firmado pelas obrigações que os interessados

tenham elaborado, é sempre necessário averiguar para que o contrato não disponha

de forma contrária ao estabelecido na ordem pública, pois se estaria diante de um

contrato ilícito, proibido pela própria legislação.

Destaca-se, também, que a forma, além de ser pressuposto de existência

do contrato, é, ainda, requisito de validade, conforme já mencionado.

É sabido que o contrato, apesar de existir e ser válido, algumas vezes não

será automaticamente eficaz sem o preenchimento de determinados fatores.

Isso porque o contrato muitas vezes possui cessada a sua eficácia por

fatos predeterminados pelas partes contratantes.

Nesse sentido, Pablo Stolze Gagliano e Rodolfo Pamplona Filho (2009, p.

22) elencam três elementos que condicionam a eficácia dos contratos, quais sejam o

termo, a condição ou encargo:

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a) Termo – evento futuro e certo, que protai o começo da produção de efeitos (termo inicial) ou faz cessá-los (termo final). b) Condição – evento futuro e incerto que, se ocorrente, poderá dar início à produção de efeitos (condição suspensiva) ou fazer cessá-los (condição resolutiva). c) Modo/Encargo – determinação acessória acidental de negócios jurídicos gratuitos, que impõe ao beneficiário da liberalidade um ônus a ser cumprido, em prol de uma liberalidade maior.

Analisados os planos de existência, validade e eficácia dos contratos,

necessário elencar alguns princípios norteadores dos contratos em geral, que

traduzem, muitas vezes, um contexto histórico de legitimidade e validade jurídica de

aplicação dos contratos no caso concreto.

1.3 PRINCÍPIOS CONTRATUAIS

1.3.1 Princípio da dignidade da pessoa humana

O princípio da dignidade da pessoa humana, elencado na Constituição

Federal como fundamento da República Federativa do Brasil, é também norteador

das relações contratuais.

Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados, dos Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos: III – a dignidade da pessoa humana.

Isso porque, após a promulgação da Constituição Federal de 1988,

iniciou-se o chamado direito civil-constitucional, que nada mais é do que a

interpretação de normas de cunho privado sob o prisma constitucional. (LENZA,

2009)

Dessa feita, no presente estudo, o princípio da dignidade da pessoa

humana está intimamente relacionado aos contratos jurídicos celebrados, de modo

que as cláusulas contratuais estipuladas não podem ferir a qualidade intrínseca a

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extrínseca das partes, incluindo-se perfeitamente a proteção aos direitos da

personalidade de cada qual.

Avançando, por outro lado, modernamente, sobretudo em razão da evidenciação de novos direitos e das transformações do Estado (de autoritário/absolutista para liberal e de liberal para social, podendo-se, inclusive, falar em Estado pós-social de direito), cada vez mais se percebe uma forte influência do direito constitucional sobre o direito privado. Sob essa perspectiva, especialmente diante do princípio da dignidade da pessoa humana, fundamento da República Federativa do Brasil e princípio-matriz de todos os direitos fundamentais (art. 1°, III, da CF/88), parece mais adequado, então, falar em um direito civil-constitucional, estudando o direito privado à luz das regras constitucionais e podendo, inclusive, em muitos casos, reconhecer a aplicação direta dos direitos fundamentais nas relações privadas [...]. (LENZA, 2009, p. 2)

O respeito à dignidade da pessoa humana é, portanto, instituto basilar do

direito privado, eis que fundamento da Constituição Federal, não podendo ser

limitado pela autonomia da vontade das próprias partes.

A noção jurídica de dignidade traduz um valor fundamental de

respeito à existência humana, segundo as suas possibilidades e

expectativas, patrimoniais e afetivas, indispensáveis à sua realização

pessoal e à busca da felicidade. Mais do que garantir a simples sobrevivência, este princípio assegura o direito de se viver

plenamente, sem quaisquer intervenções espúrias – estatais ou particulares – na realização desta finalidade. (GAGLIANO e PAMPLONA FILHO, 2009, p. 29)

Sendo assim, o princípio constitucional da dignidade da pessoa humana

resguarda as relações contratuais e, portanto, diante da situação fatídica, deve ser

sopesado na aplicação e interpretação das cláusulas de determinado contrato.

1.3.2 Princípio da autonomia da vontade ou do consensualismo

O princípio da autonomia da vontade ou do consensualismo retrata o

contrato em seu sentido mais amplo, qual seja, o de que as partes contratantes,

através de suas próprias liberdades, podem deliberar acerca do objeto e cláusulas

que serão estipuladas no negócio jurídico firmado.

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O princípio da autonomia da vontade particulariza-se no Direito Contratual na liberdade de contratar. Significa o poder dos indivíduos de suscitar, mediante declaração de vontade, efeitos reconhecidos e tutelados pela ordem jurídica. No exercício desse poder, toda pessoa capaz tem aptidão para provocar o nascimento de um direito, ou para obrigar-se. (GOMES, 2001, p. 22)

Dessa forma, o contrato só será realizado porque as partes chegaram a

um consenso pelo qual regularam o contrato em questão.

Assim concluem Pablo Stolze Gagliano e Rodolfo Pamplona Filho (2009,

p. 34) acerca do princípio em questão:

A autonomia da vontade, nessa linha, vista do plano da bilateralidade do contrato, pode ser expressa pelo denominado consensualismo: o encontro das vontades livres e contrapostas faz surgir o consentimento, pedra fundamental do negócio jurídico contratual.

Sob outra ótica, poder-se-ia dizer que a autonomia da vontade

corresponde, inclusive, sobre a liberdade da parte em não querer contratar, ou seja,

em razão de interesses contrapostos, de cláusulas divergentes, da pessoa a qual

será vinculada contratualmente, entre outros motivos como faculdade da parte em

exercer a liberdade de não contratar.

Em primeiro lugar, vigora a faculdade de contratar, isto é, o arbítrio de decidir, segundo os interesses e conveniência de cada um, se e quando estabelecerá com outrem um negócio jurídico contratual... Em segundo lugar, a liberdade de contratar implica a escolha da pessoa com quem fazê-lo, bem como do tipo de negócio a efetuar. Em terceiro lugar, a liberdade de contratar espelha o poder de fixar o conteúdo do contrato, redigidos as suas cláusulas ao sabor do livre jogo das conveniências dos contratantes. Finalmente, uma vez concluído o contrato, passa a constituir fonte formal de direito, autorizando qualquer das partes a mobilizar o aparelho coator do Estado a fazê-lo respeitar tal como está, a assegurar a sua execução segundo a vontade que presidiu à sua constituição. (RIZZARDO apud SILVA PEREIRA, 2008, p. 20)

O princípio do consensualismo corresponde, portanto, a capacidade das

partes em estipular o contrato da melhor maneira que lhes convenha, de modo a

suprir suas próprias necessidades, elaborando cláusulas, estipulando prazos,

fixando multas contratuais etc., respeitando sempre, é claro, a supremacia da ordem

pública e os bons costumes.

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1.3.3 Princípio da supremacia da ordem pública

Por este princípio, os contratantes, muito embora possam exercer suas

prerrogativas e liberdades contratuais, não podem contrariar a supremacia da ordem

pública.

A obrigatoriedade de cumprimento de determinadas normas públicas visa

ao estabelecimento de uma convivência pacífica em sociedade, de modo que a falta

de legislação poderia acarretar uma desordem social caso restasse ao arbítrio das

próprias partes realizarem sua lei privada.

Assim entende Luiz Guilherme Loureiro (2008, p. 68) sobre a necessidade

de prevalecimento de normas de natureza pública sobre a vontade dos particulares:

Outra limitação, mais antiga, determina que a autonomia da vontade das partes não pode contrariar normas de ordem pública. Existem normas de natureza pública e privada de caráter imperativo que prevalecem sobre as regras que estabelecem a liberdade contratual. Este conjunto de normas é essencial à convivência da sociedade e, por isso, prevalecem sobre a vontade dos particulares, limitando-a.

Sob outro prisma, tem-se que a supremacia da ordem pública garante

uma igualdade entre as partes, pois equilibra a relação contratual ao limitar a

vontade das partes sobre determinados assuntos, já devidamente fixados na

legislação e de caráter obrigatório.

O princípio da autonomia da vontade [...] é limitado pelo princípio da supremacia da ordem pública, que resultou da constatação, feita no início do século passado e em face da crescente industrialização, de que a ampla liberdade de contratar provocava desequilíbrios e a exploração do economicamente mais fraco. Compreendeu-se que, se a ordem jurídica prometia igualdade política, não estava assegurando a igualdade econômica. Em alguns setores fazia-se mister a intervenção do Estado, para restabelecer e assegurar a igualdade dos contratantes. (GONÇALVES, 2004, p. 23)

Assim, competem as partes o respeito à supremacia da ordem pública,

pois o interesse individual não poderá prevalecer sobre o interesse coletivo

devidamente legislado por normas cogentes.

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1.3.4 Princípio da função social do contrato

O princípio da função social do contrato, determinado em face do quanto

estabelecido na Constituição Federal de 1988, art. 5º, incisos XXII e XXIII, dispondo

que a propriedade atenderá a sua função social, visou trazer aos contratos

celebrados um caráter de cunho social.

Isso porque o contrato deve também revelar medidas com efeitos

econômicos, sociais, culturais etc., através do respeito à dignidade da pessoa

humana, suas igualdades e liberdades, interessando tanto as partes contratantes à

finalidade do negócio jurídico quanto à coletividade, que, eventualmente, pode ser

lesada por um contrato particular celebrado entre indivíduos comuns.

Em outras palavras, o contrato não se limita a revestir passivamente a operação econômica de um véu legal de per si não significativo, mas deve orientar as operações econômicas de forma a atender os princípios básicos de nossa sociedade: a dignidade da pessoa humana; os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa; a equidade; a solidariedade e a produção de riquezas (arts. 1º e 3º, da CF). Toda vez que a operação econômica revestida pelo contrato violar um desses objetivos, tem-se que ele não cumpre sua função social. (LOUREIRO, 2008, p. 62)

Analisa-se, no conjunto, o bem comum a ser afetado pela celebração do

negócio jurídico.

Nas lições trazidas por Pablo Stolze Gagliano e Rodolfo Pamplona Filho

apud THEODORO JUNIOR apud NALIN (2009, p. 46), pode-se entender a função

social das seguintes maneiras:

A função social manifestar-se-ia em dois níveis: a) intrínseco – o contrato visto como relação jurídica entre as partes negociais, impondo-se o respeito à lealdade negocial e a boa-fé objetiva, buscando-se uma equivalência material entre os contratantes; b) extrínseco – o contrato em face da coletividade, ou seja, visto sob o aspecto de seu impacto eficacial na sociedade em que fora celebrado.

O Código Civil limitou a autonomia das partes ao dispor que deverão

celebrar o contrato em razão e nos limites de sua função social.

Art. 421. A liberdade de contratar será exercida em razão e nos limites da função social do contrato.

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Isso impede o cometimento de abusos de direito com base nos liames

constitucionais, de modo que as partes deverão buscar tornar a relação negocial

economicamente útil e socialmente valiosa.

1.3.5 Princípio da relatividade dos contratos

Uma vez realizado o contrato, este adquire força obrigatória entre as

partes, cabendo a cada contratante o cumprimento de suas obrigações.

“Regra geral, os contratos só geram efeitos entre as próprias partes

contratantes, razão por que se pode afirmar que a sua oponibilidade não é absoluta

ou erga omnes, mas, tão-somente, relativa.” (GAGLIANO e PAMPLONA FILHO,

2009, p. 40)

Impende destacar, todavia, que tal força obrigatória vincula tão somente

aqueles que fazem parte do negócio jurídico firmado.

Ou seja, o contrato não atinge a terceiros que não participaram da

negociação contratual, sendo oponível e surtindo efeitos apenas quanto aos

contratantes.

O princípio da relatividade dos contratos diz respeito à sua eficácia. Sua formulação fez-se em termos claros e concisos [...], o que significa dizer que seus efeitos se produzem exclusivamente entre as partes, não aproveitando nem prejudicando a terceiros. (GOMES, 2001, p. 43)

Dessa forma, terceiros que não participaram da negociação contratual,

através da estipulação de condições, termos, prazos, não podem ser atingidos, em

tese, pelo pacto de particulares.

Portanto, pessoas estranhas à realização do contrato não poderão ser

alcançadas pela eficácia de determinado contrato, com base no princípio da

relatividade dos contratos, eis que o acordo de vontades gera efeitos somente entre

as partes contratantes.

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1.3.6 Princípio da força obrigatória do contrato – pacta sunt servanda

Considerando o princípio da autonomia da vontade das partes, conclui-se

que o contrato só restou firmado porque ambos os contratantes assim o quiseram.

Dessa forma, as partes livremente convencionaram e resolveram,

mutuamente, estipular direitos e obrigações advindas do contrato.

E, se as partes assim o fizeram, é porque existe uma presunção de que o

contrato firmado será cumprido fielmente e integralmente nas condições

estabelecidas.

Diz-se, portanto, que o contrato é lei entre as partes, competindo a cada

qual cumprir com as obrigações a que se obrigou.

O princípio da força obrigatória consubstancia-se na regra de que o contrato é lei entre as partes. Celebrado que seja, com observância de todos pressupostos e requisitos necessários à sua validade, deve ser executado pelas partes como se suas cláusulas fossem preceitos legais imperativos. O contrato obriga os contratantes, sejam quais forem as circunstâncias em que tenha de ser cumprido. (GOMES, 2001, p. 36)

As partes não podem se escusar de cumprir o contrato sem arcar com os

ônus dali advindos, isto porque, é assegurado ao contratante a execução das

cláusulas contratuais ou o cumprimento de uma obrigação resultante do

inadimplemento do contrato.

[...] o princípio da força obrigatória, na medida em que este só deverá incidir plenamente quando, por razão da justiça, as condições econômicas da execução do contrato forem similares às do tempo de sua celebração. (GAGLIANO e PAMPLONA FILHO, 2009, p. 40)

O pacta sunt servanda é princípio basilar dos contratos e implica para as

partes o dever de cumprir com o acordo celebrado, em virtude da boa-fé implícita em

toda relação contratual de que o pacto será respeitado e executado em sua

totalidade. (LOUREIRO, 2008)

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1.3.7 Princípio da onerosidade excessiva – rebus sic stantibus

Também conhecido pela Teoria da Imprevisão, o princípio da onerosidade

excessiva é a possível exceção para o não cumprimento do contrato celebrado.

Como visto no tópico acima, os acordos devem ser cumpridos em função

do princípio da força obrigatória do contrato.

Todavia, existem situações que dificultam ou impedem o cumprimento do

contrato nas condições previamente estabelecidas pelas partes e que, através do

fato determinado, acarrete prejuízo para um dos contratantes e benefício para o

outro.

A teoria recebeu o nome de rebus sic stantibus e consiste basicamente em presumir, nos contratos comutativos, de trato sucessivo e de execução diferida, a existência ímplicita (não expressa) de uma cláusula, pela qual a obrigatoriedade de seu cumprimento pressupõe a inalterabilidade da situação de fato. Se esta, no entanto, modificar-se em razão de acontecimentos extraordinários (uma guerra, p. ex.), que tornem excessivamente oneroso para o devedor o seu adimplemento, poderá este requerer ao juiz que o isente da obrigação, parcial ou totalmente. (GONÇALVES, 2004, p. 30)

Ou seja, determinadas circunstâncias, não necessariamente previstas nas

cláusulas contratuais, mas passíveis de acontecer, modificam a situação de

cumprimento do contrato e, consequentemente, o adimplemento por parte do

devedor, pois a prestação se torna excessivamente onerosa.

Com base no rebus sic stantibus, o contratante poderá ter seu contrato

revisado com base na situação de fato ou à nova realidade, diferentemente daquela

vivenciada quando da celebração do negócio jurídico, pois as condições da

formação do contrato não seriam as mesmas condições de seu cumprimento,

provocando prejuízos para uma parte e benefícios para a outra.

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1.3.8 Princípio da boa-fé objetiva e subjetiva

Conforme disposto no Código Civil, existe para os contratantes, a

obrigação de, tanto no momento de celebração do contrato quanto em sua

execução, zelar pelo princípio da boa-fé, sendo que a omissão no presente caso se

refere a boa-fé objetiva, conforme adiante exposto.

Art. 422. Os contratantes são obrigadas a guardar, assim na conclusão do contrato, como em sua execução, os princípios de probidade e boa-fé.

Vale dizer que as partes devem, reciprocamente, agir com lealdade e

confiança, pois o contrato é o resultado de suas próprias convenções.

Desse modo, a intenção das partes no momento da celebração do

contrato é de fundamental importância, visto que o dispositivo literal muitas vezes

pode se afastar do quanto desejado.

“O princípio da boa-fé entende mais com a interpretação do contrato do

que com a estrutura. Por ele significa que o literal da linguagem não deve prevalecer

sobre a intenção manifestada na declaração de vontade, ou dela inferível.” (GOMES,

2001, p. 42)

O princípio da boa-fé visa impedir a possibilidade de um dos contratantes

agir de má-fé para com o outro ao ditar contratualmente de maneira divergente ou

com interpretação antagônica ao que realmente intentado pela parte.

A distinção reside, portanto, na boa-fé subjetiva e objetiva, conforme

demonstrado por Pablo Stolze Gagliano e Rodolfo Pamplona Filho (2009, p. 64/65)

[...] faz-se necessário que estabeleçamos uma diagnose diferencial entre a boa-fé objetiva e a boa-fé subjetiva. Esta última, de todos conhecida por estar visivelmente presente no Código Civil de 1916, consiste em uma situação psicológica, um estado de ânimo ou de espírito do agente que realiza determinado ato ou vivencia dada situação, sem ter ciência do vício que a inquina. Em geral, esse estado subjetivo deriva do reconhecimento da ignorância do agente a respeito de determinada circunstância, como ocorre na hipótese do possuidor de boa-fé que deconhece o vício que macula a sua posse. [...] Distingue-se, portanto, da boa-fé objetiva, a qual, tendo natureza de princípio jurídico – delineado em um conceito jurídico determinado -, consiste em uma verdadeira regra de comportamento, de fundo

ético e exigibilidade jurídica.

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Diz-se que, implicitamente, existe a boa-fé subjetiva dos contratantes,

pois estes acreditariam na licitude de seus atos, ou seja, estariam convictos que o

ato praticado corresponde ao estado psicológico inicial.

Noutro sentido, a boa-fé objetiva caracterizaria as normas de condutas

que as partes reciprocamente devem praticar, ou seja, o dever de lealdade, respeito,

probidade, honestidade etc. (LOUREIRO, 2008)

Tendo em vista que o Código Civil ao mencionar a boa-fé o fez com o

intuito de boa-fé objetiva, às partes caberá à imposição dos deveres de agir com

boa-fé tanto na formação, celebração quanto na execução do contrato.

1.4 FORMAÇÃO DOS CONTRATOS

Analisados os planos de existência, validade e eficácia dos contratos,

bem como os princípios que os regem, passa-se então à análise do

desenvolvimento da formação de um contrato.

Para tanto, Pablo Stolze Gagliano e Rodolfo Pamplona Filho (2009, p. 90)

definem a formação de um contrato pelo processo abaixo descrito:

O nascimento de um contrato segue um verdadeiro iter ou processo

de formação, cujo início é caracterizado pelas negociações ou tratativas preliminares – denominada fase de puntuação – até que as partes chegam a uma proposta definitiva, seguida da imprescindível aceitação.

Portanto, inicialmente as partes estão em pólos distintos da negociação,

no sentido de que seus interesses ainda não são convergentes.

Somente após uma troca prévia de informações, através de negociações,

as partes estarão aptas a iniciar uma proposta condizente com seus próprios

interesses, sendo que tal proposta, ao final, poderá ser aceita ou rejeitada, conforme

adiante se verá.

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1.4.1 Momento da formação

Para que haja realmente a formação de um contrato, necessariamente

este deverá passar pelas chamadas negociações preliminares, também conhecida

como fase de puntuação, conforme adiante se verá.

Nessa fase, as partes, sem qualquer tipo de vínculo, até mesmo porque

ainda não possuem um ânimo definitivo acerca do contrato, fazem sugestões ao

negócio jurídico, analisam os deveres e obrigações que irão advir, negociam, enfim,

o objeto e as cláusulas do contrato que possivelmente pretendem realizar.

A fase de puntuação, consoante anotamos acima, consiste no período de negociações preliminares, anterior à formação de um contrato. É neste momento prévio que as partes discutem, ponderam, refletem, fazem cálculos, estudos, redigem a minuta do contrato, enfim, contemporizam interesses antagônicos, para que possam chegar a uma proposta final definitiva. (GAGLIANO e PAMPLONA FILHO, 2009, p. 90)

Através do liberalismo das partes, estas podem chegar a interesses

comuns ou contrapostos, sendo que no último caso não haveria a formação do

contrato.

Contudo, muito embora nas negociações preliminares à parte não possa

obrigar à outra ao cumprimento do contrato, poderá exigir a reparação do prejuízo

manifesto, desde que comprovada à responsabilidade civil na fase de puntuação,

com base no Código Civil, diante de despesas adiantadas bem como pela

perda/chance de realização de outro negócio jurídico.

Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito. Art. 187. Também comete ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo, excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes.

Considerando que as partes possuem o efetivo interesse em contratar,

será realizada uma proposta, nomeada igualmente como policitação, que nada mais

é do que a demonstração de uma das partes para com a outra acerca do interesse

em formar o contrato, oferecendo, para tanto, condições para realização do negócio

jurídico. (GAGLIANO e PAMPLONA FILHO, 2009)

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Oferta ou proposta “é a firme declaração receptícia de vontade dirigida à pessoa com a qual pretende alguém celebrar um contrato, ou ao público”. Também conhecida como policitação, a oferta é uma iniciativa que provém de um dos eventuais contratantes, certa e inequívoca, tendente diretamente à conclusão do contrato. (LOUREIRO apud GOMES, 2008, p. 184)

A partir do oferecimento da proposta, ou seja, uma vez declarada à

intenção do proponente de forma concreta, diz-se que a oferta passa a ter caráter

obrigatório.

Assim preceitua o Código Civil:

Art. 427. A proposta de contrato obriga o proponente, se o contrário não resultar dos termos dela, da natureza do negócio, ou das circunstâncias do caso.

Portanto, ao policitante/proponente caberá, em tese, a obrigação de

manter a proposta feita à parte contrária, também denominada oblato/aceitante.

Todavia, poderá o ofertante ficar desobrigado da proposta realizada nos

casos devidamente previstos na legislação, ou seja, nas exceções mencionadas

pelo próprio legislador, como, por exemplo, resultar dos próprios termos da proposta,

da natureza do negócio jurídico, das circunstâncias do caso ou ainda se ultrapassar

o prazo estabelecido para resposta sem aquiescência contrária.

Código Civil Art. 428. Deixa de ser obrigatória a proposta: I - se, feita sem prazo a pessoa presente, não foi imediatamente aceita. Considera-se também presente a pessoa que contrata por telefone ou por meio de comunicação semelhante; II - se, feita sem prazo a pessoa ausente, tiver decorrido tempo suficiente para chegar a resposta ao conhecimento do proponente; III - se, feita a pessoa ausente, não tiver sido expedida a resposta dentro do prazo dado; IV - se, antes dela, ou simultaneamente, chegar ao conhecimento da outra parte a retratação do proponente.

Conforme descrito no art. 428 do Código Civil, a proposta possui prazo de

validade e poderá ser desfeita ou considerada como não aceita, variando caso seja

realizada entre pessoa presente ou pessoa ausente.

Dessa forma, antes de analisar as exceções acerca da possibilidade de

não cumprimento da proposta realizada, Pablo Stolze Gagliano e Rodolfo Pamplona

Filho (2009, p. 94) trazem seu entendimento sobre pessoas presentes e ausentes

para fins de proposta e aceitação do contrato:

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Presentes são as pessoas que mantêm contato direto e simultâneo uma com a outra, a exemplo daquelas que tratam do negócio pessoalmente, ou que utilizem meio de transmissão imediata de vontade (como o telefone, por exemplo). Observa-se que, em tais casos, o aceitante toma ciência da oferta quase no mesmo instante em que ela é emitida. Ausentes, por sua vez, são aquelas pessoas que não mantêm contato direto e imediato entre si, caso daquelas pessoas que contratam por meio de carta ou telegrama (correspondência epistolar). Caso interessante, não previsto expressamente em lei, diz respeito à contratação eletrônica ou via Internet.

Logo, a possibilidade de resposta imediata a proposta/oferta é o que

define se o contrato está sendo realizado entre pessoas presentes ou entre pessoas

ausentes, excluindo-se, portanto, a distância dos contratantes como elemento

caracterizador de tal variação.

Desmembra-se o artigo 428 do Código Civil e conclui-se que, no caso do

inciso I, a proposta deixará de ser obrigatória quando, devidamente ofertada à

pessoa presente, ou seja, aquela capaz de consentir imediatamente, assim não o

faz; em outras palavras, o proponente elenca e expressamente demonstra seu

interesse na realização do negócio, todavia, à parte adversa não se manifesta sobre

a oferta ou logo a rejeita.

No caso do inciso II do artigo 428 do Código Civil, tem-se que a proposta

perderá seu caráter obrigatório quando realizada à pessoa ausente, por assim dizer

aquela que não tem condições de saber em tempo real os termos ofertados, e não

houver sido fixado prazo para resposta, contudo, diante do lapso temporal

transcorrido, entende-se como suficiente para que a proposta não tenha sido aceita

pelo oblato.

Diz-se ainda que a proposta deixa de ser necessária, quando, no caso do

inciso III do artigo 428 do Código Civil, realizada à pessoa ausente com prazo para

refutação, esta não expedir qualquer manifestação de vontade sobre o conteúdo da

oferta.

E, por último, no caso do inciso IV do artigo 428 do Código Civil, cessará

a eficácia da proposta realizada pelo policitante quando, antes dela ou

simultaneamente, chegar ao conhecimento do oblato declaração contrária a

anteriormente feita pelo proponente.

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Diante da possibilidade de formação de negócios jurídicos entre pessoas

ausentes, criaram-se duas teorias para demonstrar o exato momento da formação

do contrato, chamadas Teoria da Cognição e Teoria da Agnição.

Pelo sistema da cognição ou informação, o contrato somente se perfaz no momento em que o proponente toma conhecimento da aceitação. Tem o inconveniente de deixar ao arbítrio do ofertante tomar a iniciativa de conhecer a resposta, abrindo ou não a correspondência. (VENOSA, 2007, p. 485)

A chamada Teoria da Cognição, portanto, define que o momento de

formação do contrato entre pessoas ausentes ocorre somente quando a resposta do

aceitante chega ao conhecimento do proponente. Enquanto não houver tal ato, o

contrato não estará formado. É indispensável, dessa forma, o conhecimento do

policitante acerca da aceitação do oblato.

Pelo sistema da agnação ou declaração em geral, o contrato aperfeiçoa-se pela declaração do oblato. Existem três correntes dentro do sistema da agnação: pela teoria da declaração

propriamente dita, o contrato completa-se no momento em que o oblato redige a aceitação. Nesse momento é que se exterioriza a vontade. No entanto, enquanto não expedida a resposta, a aceitação não ingressa no mundo jurídico, porque dela não se toma conhecimento. O sistema não pertence a qualquer lei comparada. Pela teoria da expedição, o momento de ultimação do contrato é aquele em que a aceitação é expedida pelo oblato. A partir daí, a aceitação ingressa no mundo jurídico, não tendo mais o aceitante como obstar, em tese, os efeitos de sua manifestação de vontade. Finalmente, pela teoria da recepção, o aperfeiçoamento do negócio jurídico somente ocorre quando o proponente recebe o comunicado da aceitação, ainda que não o leia. (VENOSA, 2007, p. 485)

Já na Teoria da Agnição, existe a prévia necessidade de declaração do

oblato para formação do contrato, independentemente da necessidade de chegar ao

proponente o conhecimento de tal resposta.

Tal teoria subdivide-se em três, razão pela qual se diz que o contrato

estará formado quando: i) houver a declaração propriamente dita pelo aceitante no

momento da elaboração do contrato; ii) houver a expedição da aceitação pelo

oblato; ou ainda, iii) houver o recebimento da proposta pelo policitante, sem que,

todavia, haja a leitura da resposta. (GAGLIANO e PAMPLONA FILHO, 2009)

Muito embora tenham sido criadas as teorias acima apresentadas, assim

dispõe o Código Civil:

Art. 434. Os contratos entre ausentes tornam-se perfeitos desde que a aceitação é expedida, exceto:

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I – no caso do artigo antecedente; II – se o proponente se houver comprometido a esperar resposta; III – se ela não chegar no prazo convencionado.

Nos dizeres de Arnaldo Rizzardo (2008, p. 62):

O Código Civil atual e já o Código Civil de 1916 adotaram a teoria da ‘agnição’ ou ‘declaração’, na modalidade da expedição, o que importa em afirmar que não basta escrever a resposta favorável, mas é preciso remetê-la, circunstância expressa no art. 434 (art. 1.086 do Código revogado), o qual considera perfeitos os contratos por correspondência epistolar, ou telegráfica, desde a expedição da resposta ou aceitação.

Portanto, pode-se concluir que o Código Civil se utiliza da Teoria da

Agnição em sua modalidade de expedição ou recepção para distinguir o momento

da formação do contrato.

1.4.2 Local da formação

Uma vez dito que o contrato foi efetivamente formado, necessário saber o

local de sua formação.

Assim dispõe a Lei de Introdução ao Código Civil:

Lei de Introdução ao Código Civil Art. 9o Para qualificar e reger as obrigações, aplicar-se-á a lei do país em que se constituírem. § 1o Destinando-se a obrigação a ser executada no Brasil e dependendo de forma essencial, será esta observada, admitidas as peculiaridades da lei estrangeira quanto aos requisitos extrínsecos do ato. § 2o A obrigação resultante do contrato reputa-se constituída no lugar em que residir o proponente.

Conforme legislação supracitada, o domicílio do proponente é que define

o lugar da celebração do contrato.

Nesse caso, mesmo que a proposta tenha sido realizada em local diverso

do domicílio do policitante, este prevaleceria como lugar de constituição da

obrigação.

Noutro sentido, todavia, o Código Civil assim dispôs:

Art. 435. Reputar-se-á celebrado o contrato no lugar em que foi proposto.

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Ou seja, o local de propositura da oferta, é considerado o lugar de

formação do contrato.

Portanto, o domicílio do ofertante não é analisado para fins de

determinação do lugar de formação do contrato, restando este celebrado no lugar

em que foi proposto.

A importância do conhecimento do lugar de celebração do contrato está

no fato de que, a partir de tal informação, poderá ser definido o juízo competente no

caso de conflitos decorrentes do contrato.

Quanto ao local da formação do contrato, este reputa-se concluído no local em que foi proposto (art. 435). Portanto, é o domicílio do proponente que prevalece para designação do lugar da celebração do contrato. A fixação do lugar da formação é especialmente importante na hipótese de contrato internacional, pois fixará o direito aplicável e a jurisdição competente para conhecer dos litígios resultantes do negócio jurídico. (LOUREIRO, 2008, p. 199)

Uma das dificuldades na definição do local de formação dos contratos

ocorre quando da realização do negócio jurídico eletronicamente, posto que não há

precisão do local originário da proposta, visto ser realizada por meio da internet.

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36

2 DA INTERNET E DOS CONTRATOS ELETRÔNICOS

2.1 NOÇÕES GERAIS SOBRE A INTERNET

O instituto da internet será aqui tratado com a designação encontrada na

alínea “a” do item 3 da norma 004/95, aprovada pela Portaria n° 148/951 do

Ministério do Estado das Comunicações como sendo:

[...] o nome genérico que designa o conjunto de redes, os meios de transmissão e comutação, roteadores, equipamentos e protocolos necessários à comunicação entre computadores, bem como o "software" e os dados contidos nestes computadores.

Diz-se, portanto, que a internet é uma rede de redes mundial que

interconecta milhões de pessoas através do uso de determinados equipamentos

com base em softwares, permitindo que o usuário tenha acesso a inúmeras

informações e transferência de arquivos.

Software do fabricante: Programas preparados pelo fabricante (hardware ou software) para simplificar a operação do computador. Software do usuário: Programas preparados pelo usuário para atingir objetivos específicos de sua organização. (VELLOSO, 2004, p. 61)

Portanto, softwares são programas ou elementos lógicos que visam

identificar o equipamento, bem como cumprir instruções e execuções do próprio

computador, diante de uma prévia manipulação de dados auferida para realização

de determinada tarefa.

Visando aprimorar o uso da internet, que inicialmente se baseava em uma

rede de computadores conectada através da utilização de um mesmo software,

desenvolveu-se uma linguagem comum de troca de informações denominada

protocolo.

Protocolo é o conjunto de regras que especifica como a rede de computadores administrará o fluxo de informações e como deverão

1 Aprova a Norma 004/95 – Uso dos meios da rede pública de telecomunicações para acesso à internet.

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ser administradas as falhas que eventualmente ocorram durante a administração do fluxo de informações. (BARBAGALO, 2001, p. 33)

Toda e qualquer atividade realizada por intermédio da internet será

governada por um protocolo, posto que o protocolo é o denominador comum

necessário para transmissão de dados entre softwares distintos, ou seja, o protocolo

é a linguagem lógica criada para organizar a troca de informações em rede.

Portanto, através da criação desse conjunto de regras chamado de

protocolo, a internet difundiu-se mundialmente diante da possibilidade de envio e

recebimento de dados e informações pela utilização de diferentes softwares.

Dentro da rede de computadores, para utilização da internet, tem-se uma

linguagem comum conhecida como protocolo TCP/IP2, que transmite as informações

enviadas pelo usuário conectado ao servidor.

É através da utilização do software padrão TCP/IP que se torna possível a

comunicação recíproca na internet.

O efetivo acesso à internet ocorre por intermédio de Provedores de

Serviços de internet (internet Service Providers – ISPs), no Brasil analogicamente

conhecido como Serviço de Comunicação Multimídia (SCM), prestado por empresas

brasileiras mediante autorização da Anatel – Agência Nacional de

Telecomunicações.

Os provedores de acesso à internet recebem números de identificação, atualmente compostos por um grupo de quatro números de três dígitos, chamados de endereços de IP, internet Protocol. Para a conexão de um usuário à internet, o provedor atribui-lhe um dos endereços de IP de que dispõe. Essa atribuição de endereço de IP fica, assim, registrada nos sistemas do provedor de acesso durante todo o tempo em que o usuário permanecer conectado à rede. Esse número acompanha a trajetória que o usuário traça na rede, possibilitando ao provedor de acesso identificar o momento em que o usuário se conectou e desconectou. (BARBAGALO, 2001, p. 34/35)

Através de empresas prestadoras de Serviço de Comunicação Multimídia

(SCM), é possível a contratação de um Provedor de Serviço de Conexão à internet

(PSCI), o qual se responsabiliza por garantir o acesso à internet pelo usuário através

2 Conjunto de dois protocolos: TCP – Transmission Control Protocol – Protocolo de Controle de Transmissão. IP – Internet Protocol – Protocolo Internet.

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do uso de um servidor que, no presente caso, nada mais é do um computador

central com um sistema elaborado para fornecimento de serviços atuando

diretamente no controle da rede.

“Servidor é um computador que fornece algum tipo de serviço

administrativo à rede: servidor da rede, servidor de arquivos, servidor de impressão

etc. Uma rede pode ter vários ou apenas um (de múltiplas funções).” (VELLOSO,

2004, p. 213)

O acesso à internet, oportunizado por empresas provedoras através da

utilização de um servidor de rede, pode ser demonstrado pela ilustração abaixo

(CAPRON, 2004, p. 19):

As empresas prestadoras de serviços de telecomunicações (provedores)

atuam mediante concessão, permissão ou autorização da Anatel – Agência Nacional

de Telecomunicações, mediante o uso da rede pública de telecomunicações que é

regulado pela Norma 004/97 aprovada pela Portaria n° 251/973 do Ministério das

Comunicações, através de serviços conhecidos como Serviços de Valor Adicionado

(SVA).

O Serviço de Conexão à internet (SCI), nos termos da Norma 004/95

aprovada pela Portaria n° 148/95, é um exemplo de Serviço de Valor Adicionado

(SVA) prestado por provedores que possibilita o acesso à internet a usuários e

provedores de serviços de informações, sendo que ambos os serviços estão

conceituados pela própria norma anteriormente indicada.

Serviço de Valor Adicionado: serviço que acrescenta a uma rede preexistente de um serviço de telecomunicações, meios ou recursos

3 Aprova a Norma 004/97 – Uso da rede pública de telecomunicações para prestação de serviços de valor adicionado.

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que criam novas utilidades específicas, ou novas atividades produtivas, relacionadas com o acesso, armazenamento, movimentação e recuperação de informações. Serviço de Conexão à internet: nome genérico que designa Serviço de Valor Adicionado que possibilita o acesso à internet a Usuários e Provedores de Serviços de Informações.

A Lei n° 9.472/974 igualmente traz o conceito de Serviço de Valor

Adicionado (SVA), distinguindo-o dos serviços de telecomunicações, normatizando

que, para aquisição de um Serviço de Conexão à internet (SCI), necessariamente

dever-se-á contratar um prestador de serviços de telecomunicações que lhe dê

suporte.

Art. 61. Serviço de valor adicionado é a atividade que acrescenta, a um serviço de telecomunicações que lhe dá suporte e com o qual não se confunde, novas utilidades relacionadas ao acesso, armazenamento, apresentação, movimentação ou recuperação de informações. § 1º Serviço de valor adicionado não constitui serviço de telecomunicações, classificando-se seu provedor como usuário do serviço de telecomunicações que lhe dá suporte, com os direitos e deveres inerentes a essa condição. § 2° É assegurado aos interessados o uso das redes de serviços de telecomunicações para prestação de serviços de valor adicionado, cabendo à Agência, para assegurar esse direito, regular os condicionamentos, assim como o relacionamento entre aqueles e as prestadoras de serviço de telecomunicações.

Cumpre destacar que todos os serviços supramencionados são regulados

pela Agência Nacional de Telecomunicações - Anatel, que é uma entidade da

administração pública federal indireta vinculada ao Ministério das Comunicações, a

qual compete à função primordial de regular os serviços de telecomunicações no

Brasil.

4 Dispõe sobre a organização dos serviços de telecomunicações, a criação e o funcionamento de um órgão regulador e outros aspectos institucionais, nos termos da Emenda Constituciona n° 8, de 1995.

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40

2.2 CONCEITO DE CONTRATOS ELETRÔNICOS

A utilização de meios eletrônicos para realização de contratos com o

passar dos anos tornou-se um instrumento viável para contratantes que estão

distantes fisicamente um do outro, facilitando a comunicação para celebração de

contratos eletrônicos diante da celeridade que o mundo digital apresenta para seus

usuários.

Primeiramente, urge destacar que os contratos eletrônicos são regidos

pelos preceitos de qualquer contrato, muito embora não estejam expressamente

definidos no Código Civil, diferenciando-se apenas pelo método de formação, eis

que são concluídos através da internet, conforme adiante se verá.

Ou seja, a distinção existente entre os contratos eletrônicos e os contratos

tradicionais reside tão somente no fato de que aqueles são manifestados através de

declarações de vontade através da rede de computadores.

Dessa forma, para que haja a formação válida de um contrato eletrônico é

necessária a observância dos pressupostos e requisitos contidos no Código Civil

acerca do negócio jurídico.

A contratação por meio eletrônico é uma inovação jurídica, ainda carente

de recursos normativos, mas que de fato trouxe inúmeras facilidades para os

sujeitos de direito.

Importante destacar que os contratos eletrônicos também podem ser

nominados como contratos digitais, contratos informáticos, contratos virtuais,

contratos cibernéticos, entre outros nomes, variando conforme o doutrinador.

A fim de conceituar os contratos eletrônicos, Vinicius Roberto Prioli de

Souza (2009, p. 73) os define da seguinte maneira:

[...] os contratos eletrônicos podem ser conceituados como negócios jurídicos bilaterais, que se utilizam de computadores e outros tipos de aparelhos eletrônicos (ex. aparelho de telefone celular) conectados à internet, por meio de um provedor de acesso, a fim de se instrumentalizar e firmar o vínculo contratual, gerando, assim uma

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nova modalidade de contratação, denominada contratação

eletrônica.

Portanto, o requisito primordial para caracterização de um contrato

eletrônico é a utilização de um meio eletrônico para sua celebração ou execução, ou

seja, a troca de informações entre os contratantes ocorre diretamente através do uso

da internet.

Contrato eletrônico é aquele celebrado por meio de programas de computador ou aparelhos com tais programas. Dispensam assinatura ou exigem assinatura codificada ou senha. A segurança de tais contratos vem sendo desenvolvida por processos de codificação secreta, chamados de criptografia ou encriptação. (LUCCA apud

GLANZ, 2001, p. 47)

Diante da conceituação dos contratos eletrônicos, tem-se que estes

podem ser classificados em intersistêmicos, interpessoais ou interativos, conforme a

interação para celebração ou execução do contrato ocorra entre pessoas, entre

pessoa e máquina ou somente entre máquinas.

A classificação dos contratos eletrônicos é de fundamental importância,

eis que o modo pelo qual o computador é utilizado no momento do vínculo contratual

determina o local de formação destes, conforme adiante se verá.

2.3 CLASSIFICAÇÃO DOS CONTRATOS ELETRÔNICOS

2.3.1 Contratos eletrônicos intersistêmicos

Os contratos eletrônicos intersistêmicos não se encaixam, propriamente

dito, no conceito de contratos eletrônicos, posto que neste tipo de contratação ocorre

basicamente uma operação entre computadores, previamente estipulada e

programada pelos contratantes.

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Neste caso, diz-se que os contratos eletrônicos intersistêmicos são

executados entre computadores, através de uma manifestação de vontade humana

exteriorizada anteriormente.

Erica Brandini Barbagalo (2001, p. 51) assim define os contratos

eletrônicos intersistêmicos:

São assim caracterizados os contratos eletrônicos formados utilizando-se o computador como ponto convergente de vontades preexistentes, ou seja, as partes apenas transpõem para o computador as vontades resultantes de negociação prévia, sem que o equipamento interligado em rede tenha interferência na formação dessas vontades. [...] As partes previamente acordam um protocolo de comunicação e a instalação deste, e a interligação dos sistemas se caracteriza já a aceitação dos termos do negócio jurídico efetuado, existindo tal intervenção somente no momento da preparação dos sistemas computacionais para a comunicação.

A contratação eletrônica ocorre sem a intervenção humana, visto que a

utilização da internet funciona como ponto convergente do consentimento das partes

contratantes, que previamente estipularam suas vontades.

O computador, neste tipo de contratação, é utilizado tão somente com o

escopo de um utensílio que serve para operar a negociação já concretizada pelas

partes.

Nestes contratos, todo o conteúdo é previamente estabelecido pelos contratantes, de modo que ambos se utilizam dos computadores apenas para se reunir e integralizar suas respectivas vontades; logo, a utilização do computador não interfere na formação do consentimento das partes, pois existe um acordo prévio e as partes apenas passam suas vontades para o computador conectado à internet, sem que este interfira na formação das referidas partes. (SOUZA, 2009, p. 103)

Portanto, o computador não interferiria de forma alguma na manifestação

de vontade das partes, posto que o meio eletrônico em questão já possuiria todas as

informações necessárias para realizar o negócio jurídico consentido entre os

contratantes.

Diante do pacto previamente estipulado entre as partes, a troca de

informações por intermédio do computador fica adstrita aos próprios contratantes,

nos moldes do protocolo de comunicação que os conecta a internet.

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A contratação em rede fechada necessita de um prévio acordo entre os contratantes, e, além do mais, o acesso se torna restrito àqueles que fazem parte do acordo. Um exemplo desse tipo de contratação é o sistema chamado de troca eletrônica de dados (EDI – eletronic

data interchange – intercâmbio eletrônico de dados). (...) O EDI é um modo de efetivar comunicação por meio do computador, tendo por base o intercâmbio de transmissão e recepção de dados, servindo como uma ferramenta para proporcionar a troca de informações entre empresas e organizações comerciais. (BOIAGO Jr., 2005, p. 88)

A contratação através do intercâmbio de dados – EDI, conforme

supracitado, é uma modalidade de contrato eletrônico intersistêmico de fácil e rápida

interação pelos contratantes, permitindo que cada parte acesse ao sistema de

computadores pré-determinado e elaborado de acordo com a manifestação de

vontade das partes.

O contrato eletrônico intersistêmico é considerado como contrato

acessório, posto que o computador apenas atua como um instrumento para

realização do negócio jurídico, firmado, anteriormente, pelo meio tradicional.

Esta modalidade de contrato eletrônico diverge das demais em razão da

ausência de presença humana na relação jurídica proposta, diante da livre troca de

informações pactuadas pelas partes no sistema único formado consensualmente.

Nos contratos eletrônicos intersistêmicos o computador é tão somente um

meio para manifestação de vontade das partes, visto que atua como fonte de

comunicação dos dados inseridos em seu próprio sistema pela vontade dos

contratantes já aperfeiçoada.

2.3.2 Contratos eletrônicos interpessoais

Esta modalidade de contrato eletrônico necessita, basicamente, de

interação humana, a qual ocorre por intermédio da utilização de um meio eletrônico,

que vigorará como um lugar estabelecido para realização do negócio jurídico.

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Desta forma, a parte interage com a máquina, repassando seus

interesses pelo computador para que assim a outra parte possa se manifestar

acerca dos termos propostos.

Em verdade, o computador funciona como um local estabelecido para o

encontro das vontades manifestadas pelos contratantes.

Vinicius Roberto Prioli de Souza (2009, p. 105) assim define os contratos

eletrônicos interpessoais:

[...] neste tipo contratual, as partes obrigatoriamente dependerão da utilização dos computadores conectados à internet para a formação do vínculo contratual, pois as manifestações de vontade ocorrem no mundo virtual e a partir da comunicação estabelecida entre o proponente e o oblato; as partes reúnem-se e interagem em meio virtual. Esses contratos eletrônicos podem ocorrer de forma simultânea ou não e tal determinação é de significativa importância para se estabelecer se o contrato foi firmado entre presentes ou entre ausentes.

A contratação eletrônica ocorre com a intervenção humana, visto que a

utilização da internet funciona como ponto convergente do consentimento das partes

contratantes, que apenas utilizaram o computador como um meio de comunicação,

interagindo, portanto, com a própria máquina.

Como interpessoais podem ser entendidos os contratos celebrados por computador quando este é utilizado como meio de comunicação entre as partes, interagindo na formação da vontade destas e na instrumentalização do contrato, não sendo apenas forma de comunicação de vontade já concebida. Essa categoria se caracteriza principalmente pela interação humana nos dois extremos da relação. (BARBAGALO, 2001, p. 53)

Os contratos eletrônicos interpessoais podem ser divididos em

instantâneos/simultâneos ou não-instantâneos/não-simultâneos, conforme a

manifestação de vontade das partes através do computador ocorra em tempo real

ou não.

Quando as partes estiverem simultaneamente conectadas e, dessa forma,

puderem exprimir suas vontades em tempo real uma para com a outra, ou seja,

como se presentes estivessem, sem qualquer lapso temporal, estar-se-á diante de

um contrato eletrônico interpessoal instantâneo, comumente perceptível nas

contratações por chat, videoconferência etc.

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Todavia, se as partes não puderem exprimir suas vontades no mesmo

momento, ou seja, como se ausentes estivessem de modo que haverá necessidade

de aguardar resposta por tempo incompatível com o real, estar-se-á diante de um

contrato eletrônico interpessoal não-instantâneo, como nos casos de trocas de

correio eletrônico.

Os contratos eletrônicos interpessoais simultâneos, por motivos óbvios, são firmados em tempo real, já que o proponente envia sua proposta e, de forma simultânea, o oblato manifesta sua vontade evidente de contratar; ambas as partes encontram-se on-line. [...] Existem, ainda, os contratos eletrônicos interpessoais não simultâneos, nos quais decorre um tempo considerável entre a oferta do proponente e a aceitação por parte do oblato; neste contexto encaixam-se os contratos celebrados por e-mails, situações em que, tanto a proposta quanto a aceitação ocorrem por meio do correio eletrônico. (SOUZA, 2009, p. 105)

Portanto, o lapso temporal decorrido ou não entre a declaração de

vontade da parte e a recepção pela parte contrária definem se o contrato eletrônico

interpessoal será denominado como instantâneo ou não-simultâneo.

Esta divisão existente nos contratos eletrônicos interpessoais define os

critérios de obrigatoriedade da proposta, conforme explicitado no 1º Capítulo.

2.3.3 Contratos eletrônicos interativos

Os contratos eletrônicos interativos consistem na interação de uma

pessoa, o contratante, diretamente com o computador pré-disposto a ofertar

produtos ou serviços.

Para este tipo de contratação, comumente utilizada, haverá,

necessariamente, um sistema disponível, devidamente programado, o qual

possibilitará ao usuário, mediante simples aceitação pela internet, efetuar o contrato

eletrônico.

Nos dizeres de José Wilson Boiago Júnior (2005, p. 92/93):

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Para que sejam efetivados os contratos eletrônicos interativos, inicialmente, deve existir um sistema eletrônico vinculado aos computadores, previamente programado, para ofertar produtos e serviços, colocando-os à disposição dos internautas, tendo como conseqüência e de maneira simultânea, o receptor da oferta do produto ou da prestação do serviço interagindo com o computador proponente. Esses tipos de contratações provêm da construção de uma comunicação efetivada entre uma pessoa e um sistema de programa de computador, previamente colocado à disposição do público. [...] Com efeito, a interação com o sistema de programa colocado à disposição do usuário permite que este tenha conhecimento de que o proprietário desse sistema computacional pretende a efetivação do vínculo contratual, sendo que, neste caso, o computador atuará como um auxiliar no processo da formação volitiva do usuário.

Esta modalidade de contratação eletrônica não imputa dizer que o

contrato é celebrado entre uma pessoa e uma máquina, posto que as informações

contidas no próprio computador foram previamente inseridas por outra pessoa.

É possível realizar o contrato eletrônico interativo em razão da pré-

disposição do proponente em desenvolver anúncios na internet ofertando bens e/ou

serviços.

Por esse meio de utilização uma pessoa interage com um sistema destinado ao processamento eletrônico de informações, colocado à disposição por outra pessoa, sem que esta esteja, ao mesmo tempo, conectada e sem que tenha ciência imediata de que o contrato foi efetuado. Este é o exemplo mais comum de conclusão via internet, pela World Wide Web, do qual derivam as compras de produtos ou contratação de serviços pela rede de computadores, mediante acesso aos chamados Web sites, compostos do que se usou denominar “páginas eletrônicas”. (BARBAGALO, 2001, p. 55/56)

Os contratos eletrônicos interativos caracterizam-se por serem contratos

de adesão, visto que as condições contratuais são dispostas no site de venda de

produtos e/ou serviços, competindo ao contratante/consumidor aceitar, se for o caso,

mediante simples “clique” no link disponível.

Não há, portanto, negociação quanto aos termos do contrato, eis que as

cláusulas são pré-estabelecidas, impossibilitando, portanto, qualquer modificação de

cláusula contratual, ou seja, o consumidor apenas anui acerca dos termos da

contratação.

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47

Os contratos eletrônicos interativos são os mais comuns na contratação

eletrônica, diante da quantidade de lojas virtuais existentes e das facilidades

proporcionadas pela compra online.

2.4 DO MOMENTO DE FORMAÇÃO, LOCAL E VALIDADE DOS CONTRATOS ELETRÔNICOS

Conforme hipóteses acima descritas, os contratos eletrônicos têm como

premissa fundamental a utilização de um meio eletrônico para manifestação da

vontade do contratante.

Em razão da utilização de computadores para expressão da vontade de

contratar, surge então a dúvida sobre qual seria o exato momento de formação do

contrato eletrônico, eis que proposta e aceitação podem ocorrer simultaneamente ou

com lapso temporal.

Dúvida não há quanto à aplicabilidade imediata do Código Civil para

regular a questão, eis que como já apontado, os contratos eletrônicos são regidos

pelos preceitos de todo negócio jurídico, devendo, portanto, respeitar-se os

requisitos e pressupostos de qualquer contrato.

Quanto ao momento de formação de um contrato eletrônico, muito

embora a declaração de vontade da parte ocorra através de um computador, torna-

se necessário definir se os contratos eletrônicos são considerados como realizados

entre pessoas presentes ou entre pessoas ausentes.

Acerca da declaração de vontade pela utilização da rede de

computadores, Erica Brandini Barbagalo (2001, p. 61) assim entende:

A pessoa que se conecta à rede de computadores, ou acessa um sistema de computadores, manifesta sua vontade, declarando-a por escrito ou acionando um comando, ou conjunto de comandos, programado para enviar a manifestação à outra parte. Pode manifestar sua vontade também pela palavra falada, bastando tenha equipamentos técnicos competentes para tanto, bem como tenha a

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parte destinatária equipamento apto a identificar a mensagem dessa forma emitida.

Impende novamente destacar que a distância não é elemento

caracterizador para definição do aspecto de celebração dos contratos eletrônicos

como sendo entre pessoas presentes ou ausentes, eis que a imediatidade na

possibilidade de resposta é o que importa para o caso.

“As principais características dos contratos eletrônicos são: a) as partes

não estão fisicamente presentes; b) o tempo de intercâmbio entre a oferta e a

aceitação pode ser instantânea ou não.” (BOIAGO Jr., 2005, p. 96)

Portanto, quando duas partes negociam através de um meio eletrônico,

como por exemplo em um chat ou videoconferência, a realização de proposta e a

aceitação instantânea caracterizará o contrato eletrônico, neste caso na modalidade

interpessoal, como se realizado entre pessoas presentes.

Isto ocorre diante do contato direto entre as partes, pela possibilidade de

manifestação de vontade dos contratantes quase no exato momento em que é

realizada a proposta e emitida à aceitação.

No caso acima, o momento de formação do contrato eletrônico ocorreria

no instante em que se dá a aceitação, posto que o meio eletrônico funcionaria tão

somente como um lugar para realização da proposta e consequente aceitação.

Todavia, caso a transação a ser realizada utilize a internet como um

meio para se atingir a finalidade, o contrato eletrônico, neste caso, será considerado

como celebrado entre pessoas ausentes, diante da impossibilidade de resposta em

tempo real pelos contratantes.

Deve-se atentar ao fato de que o Código Civil se utiliza da Teoria da

Agnição em sua modalidade de expedição ou recepção para distinguir o momento

da formação do contrato.

Nas hipóteses de contratos eletrônicos interativos, em que se encontram

disponíveis na internet, através de sites, produtos e serviços ofertados ao público,

ainda que o contrato eletrônico seja considerado como entre pessoas ausentes,

poderá haver distinção quanto ao momento de sua formação.

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Isto porque, quando o usuário/consumidor encontra no site todas as

informações pertinentes ao produto e/ou serviço, sendo possibilitado a este a

aquisição dos itens e disponibilizado todos os termos do contrato, o momento de

formação do contrato eletrônico ocorrerá quando da manifestação de vontade da

parte através de um clique no link correlato para expressar sua concordância com a

proposta.

Todavia, quando o usuário/consumidor receber a proposta sem seu e-

mail, diz-se que após a expedição de aceitação dos termos contratuais, o contrato

eletrônico somente será considerado formado quando do exato conhecimento pelo

proponente da confirmação da aquisição.

“O interesse de conhecer o momento da formação do contrato é a

possibilidade, para o ofertante, de retirar sua oferta antes da recepção da aceitação.”

(LOUREIRO, 2008, p. 329)

Importante destacar a criação da Lei Modelo da Uncitral sobre Comércio

Eletrônico, recepcionada pelo Brasil, cuja finalidade foi a elaboração de regras

gerais no âmbito internacional acerca da validade dos meios eletrônicos como forma

de comunicação e, consequentemente, de formalização de negócios jurídicos.

Dentre o seu âmbito de aplicação, destaca-se o Capítulo III, que trata

acerca da comunicação de mensagens de dados e a formação de um contrato por

meios eletrônicos:

Artigo 11 - Formação e validade dos contratos 1) Salvo disposição em contrário das partes, na formação de um contrato, a oferta e sua aceitação podem ser expressas por mensagens eletrônicas. Não se negará validade ou eficácia a um contrato pela simples razão de que se utilizaram mensagens eletrônicas para a sua formação.

Muito embora a Lei Modelo da Uncitral não disponha expressamente

sobre o momento de formação do contrato eletrônico, é possível vislumbrar a

validade e eficácia de proposta e aceitação firmados eletronicamente.

Já quanto ao local de formação dos contratos eletrônicos, a regra geral

contida no art. 435 do Código Civil é o da propositura da oferta, funcionando desta

maneira quando proponente e aceitante residirem no Brasil, aplicando-se,

consequentemente, a competência da autoridade judiciária brasileira.

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50

A dificuldade reside, porém, no fato de saber o real local onde foi

realizada a proposta, eis que a utilização da internet como meio de formalizar o

contrato, ou seja, um local de encontro virtual, não garante a segurança devida

neste quesito.

A identificação do usuário de rede de computador refere-se a uma localização lógica e não geográfica. Assim, uma pessoa residente no Brasil pode ter uma identificação lógica procedente nos Estados Unidos da América, por exemplo. Ainda, essa identificação, por ser lógica, pode ser utilizada de qualquer parte do mundo, ou até mesmo estando o usuário em trânsito, em navio ou avião, sem que se altere. (BARBAGALO, 2001, p. 64)

Diante da falta de legislação específica no assunto, cabe a análise a cada

caso para enfim precisar o local de formação dos contratos eletrônicos.

Quando o contrato eletrônico celebrado adentrar no âmbito do direito

internacional, possibilidade esta extremamente vivenciada diante da quebra de

fronteiras pelo uso da internet, dever-se-á aplicar a regra geral disposta no art. 9°, §

2° da Lei de Introdução ao Código Civil que dispõe o local de formação dos

contratos, inclusive os eletrônicos, no lugar em que residir o proponente.

Não obstante, assim dispõe a Lei Modelo da Uncitral:

Artigo 15 - Tempo e lugar de despacho e recebimento das mensagens de dados (...) 4) Salvo convenção em contrário entre o remetente e o destinatário, uma mensagem eletrônica se considera expedida no local onde o remetente tenha seu estabelecimento e recebida no local onde o destinatário tenha o seu estabelecimento. Para os fins do presente parágrafo: a) se o remetente ou o destinatário têm mais de um estabelecimento, o seu estabelecimento é aquele que guarde a relação mais estreita com a transação subjacente ou, caso não exista uma transação subjacente, o seu estabelecimento principal. b) se o remetente ou o destinatário não possuírem estabelecimento, se levará em conta a sua residência habitual.

Conclui-se, portanto, que o local físico onde se encontra o computador

utilizado como meio de manifestação de vontade não define o local de celebração do

contrato eletrônico, devendo ser analisado o domicílio/estabelecimento das partes.

O Brasil, conforme já dito, não possui legislação específica vigente acerca

dos contratos eletrônicos, todavia, possui projetos de lei que, caso efetivamente

consagrados, poderão suprir muitas das dúvidas existentes nesta seara.

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Neste sentido, destacam-se os Projetos de Lei n° 6725, n° 1.4836 e n°

1.5897, estes últimos apensados ao primeiro, todos do ano 1999.

O Projeto de Lei n° 672 traz, basicamente, algumas disposições

semelhantes à Lei Modelo da Uncitral, normatizando os efeitos jurídicos das

informações trocadas sob a forma de mensagem eletrônica, inclusive quanto à oferta

e aceitação, incorporando de vez esta legislação no direito interno brasileiro.

Os Projetos de Lei n° 1.483 e n° 1.589, tratam sobre a instituição da

assinatura digital no comércio eletrônico, visando garantir segurança jurídica nas

transações eletrônicas.

Portanto, o Brasil ainda não possui legislação que trate acerca do

documento eletrônico, assinatura digital, comércio eletrônico, utilizando-se

basicamente das diretrizes estabelecidas pela Lei Modelo da Uncitral para a

resolução dos casos existentes sobre a matéria.

A validade dos contratos eletrônicos deve obedecer aos mesmos

requisitos elencados no art. 104 do Código Civil, conforme já explicitado no 1°

Capítulo.

Todavia, diante da utilização de um meio eletrônico para celebração do

contrato, existe ainda insegurança no tocante à identificação das partes

contratantes, inclusive quanto à capacidade para realização de negócios jurídicos,

bem como acerca da integridade do contrato formado, eis que passível de

adulterações.

Em razão da distância física dos contratantes, inúmeras distorções podem

ser cometidas na celebração dos contratos eletrônicos, pois mesmo com a

possibilidade de reconhecimento do endereço lógico IP ou do domínio, ainda assim

não é possível precisar quem de fato celebrou o contrato.

Se não é possível identificar com segurança o agente, não será possível aferir sua capacidade jurídica. Isto interfere diretamente com o comércio eletrônico, pois cabe perguntar até que ponto os negócios

5 Dispõe sobre o comércio eletrônico. 6 Institui a fatura eletrônica e a assinatura digital nas transações de “comércio eletrônico. 7 Dispõe sobre o comércio eletrônico, a validade jurídica do documento eletrônico e a assinatura digital, e dá outras providências.

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celebrados por um menor de idade que adquire livros, discos etc. remotamente, serão contratos válidos ou viciados. Contudo, incertezas aparecerão quando utilizamos o chat, e-mail. Com efeito, vamos hipotetizar o fato de um jovem de dez anos comerciando através de uma loja virtual e fazendo vendas e compras sem o cumprimento da legislação que regula o seu funcionamento. Isto tudo é plausível de ocorrer, visto que o negócio jurídico é formado sem a presença física, portanto, não há como afirmar com segurança que os terminais estão trocando mensagens de dados e sendo efetivamente utilizados pelos interessados no vínculo contratual. (BOIAGO Jr apud LAWAND, 2005, p. 99)

Os sites de vendas de produtos e/ou serviços tentam reduzir ou amenizar

a possibilidade de celebração de contratos eletrônicos com pessoa diversa da

efetivamente declarada através da solicitação de dados pessoais, a fim de evitar um

possível vício que declare a nulidade absoluta do contrato celebrado.

A realidade demonstra, todavia, que menores absolutamente ou

relativamente incapazes, diante da facilidade do exercício das tecnologias

eletrônicas, celebram contratos eletrônicos se utilizando dos dados pessoais e

bancários de pessoas civilmente capazes para realização do negócio jurídico.

A capacidade e legitimação das partes para celebração do contrato

eletrônico são abordadas por Erica Brandini Barbagalo (2001, p. 40) da seguinte

maneira:

Dos requisitos de validade do contrato analisados, a capacidade e a legitimação das partes merecem especial atenção quando tratamos de contratos eletrônicos, pois a verificação desses requisitos é dificultada pela característica, inerente aos contratos eletrônicos, de ser a declaração de vontade manifestada sem que as partes estejam uma perante a outra. Essa dificuldade, aliás, verifica-se na maioria dos contratos firmados sem que as partes estejam fisicamente presentes.

A assinatura digital, que será tratada no capítulo seguinte, é um dos

instrumentos que possibilitam a identificação do usuário no ambiente virtual e trazem

maior segurança nas negociações eletrônicas.

Quanto ao objeto da oferta, este deverá ser minuciosamente informado,

com suas características essenciais, de modo a permitir que o oblato tenha

conhecimento de todos os elementos pertinentes ao objeto em análise capazes de

lhe assegurar a aceitação da oferta e da garantia de segurança acerca da

idoneidade do objeto.

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Isto porque, em virtude da negociação ocorrer eletronicamente, o

usuário/contratante, quando tratar-se, por exemplo, de uma compra e venda, não

tem contato físico com o bem/produto, o que lhe retira a possibilidade de

experimentá-lo antes da aquisição.

No tocante à forma como sendo requisito de validade dos contratos em

geral, esta não se aplica ao caso dos contratos eletrônicos em virtude da

inexistência de solenidade para celebração do negócio jurídico, posto estar

expressamente previsto na legislação os contratos que necessitam de formalidade

para sua realização.

Portanto, atendidos os requisitos acima descritos, os contratos eletrônicos

serão passíveis de validade no mundo jurídico.

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3 ASSINATURA DIGITAL

3.1 NOÇÕES GERAIS SOBRE A ASSINATURA DIGITAL

Conforme abordado no capítulo anterior, diante da distância física entre

as partes na realização de um contrato eletrônico, tendo como pressuposto a

utilização de um meio eletrônico para celebração do contrato, perdura no meio

jurídico a insegurança quanto à identificação do contratante, eis que nem sempre o

endereço lógico IP ou domínio corresponde aos dados da pessoa informada.

Deste modo, a fim de resguardar ou minimizar a possibilidade de fraudes

na realização dos contratos eletrônicos, criou-se a assinatura digital.

O Código Civil, em seu art. 219 dispõe que “as declarações constantes

de documentos assinados presumem-se verdadeiras em relação aos signatários.”

Todavia, o disposto no artigo supracitado não pode ser aplicado quanto à

assinatura digital, posto que a declaração a que se refere o Código Civil decorre das

assinaturas constantes no documento físico, e não as declarações efetuadas por

meios eletrônicos.

Portanto, diferentemente da assinatura tradicional aposta em um

documento físico, a assinatura digital decorre de uma composição numérica que

permite ao usuário firmar seu nome em determinado documento eletrônico,

assegurando perante os outros que o documento em questão não foi modificado

quando de seu envio através de um computador.

Em verdade, a assinatura digital é “uma sequência de bits e, portanto,

são composições binárias que expressam, em linguagem de máquina, aquilo que

para o usuário pode ser compreendido como caracteres de uso comum dele.”

(GARCIA Jr., 2007, p. 57)

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Neste sentido assenta Erica Brandini Barbagalo (2001, p. 43/44) ao tratar

acerca da assinatura digital:

A assinatura digital é criada mediante o processamento da mensagem a que vai ser aposta por um algoritmo específico, denominado hash, procedimento que permite obter uma condensação da mensagem, transformando-a em uma sequência de bits, e cifrando essa sequência de bits com a aplicação da chave privada do autor da mensagem.

O conteúdo da mensagem enviada, após devidamente assinado

digitalmente, permite à parte contrária conferir se o documento original corresponde

efetivamente àquele enviado anteriormente.

Neste sentido, a assinatura digital pode também ser conceituada da

seguinte maneira:

Transformação de uma mensagem eletrônica através da aplicação de uma função matemática e da criptografia do seu resultado com a Chave Privada do remetente, de modo que o destinatário da mensagem possa verificar sua origem e integridade. A assinatura digital garante que um conjunto de dados (mensagem ou arquivo) realmente provém de determinado remetente e não foi adulterado após o envio.1

Portanto, a aplicação da assinatura digital assegura ao receptor da

mensagem que o conteúdo foi de fato encaminhado por quem o assinou e não

sofreu qualquer tipo de modificação em sua trajetória eletrônica.

A ilustração abaixo permite uma melhor compreensão acerca do

funcionamento da assinatura digital (VOLPI, 2001, p. 17)

1 http://www.certisign.com.br/certificacao-digital/por-dentro-da-certificacao-digital/glossario

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Conforme se depreende da figura acima, a aplicação da assinatura digital

na mensagem original possibilita ao receptor da mensagem verificar sua autoria e

confiabilidade do conteúdo da mensagem.

A assinatura digital como pressuposto de validades dos contratos

eletrônicos é questão a ser remediada pelas futuras legislações, posto que diante da

falta de regulamentação normativa, impera a insegurança jurídica nos contratos

celebrados por meio da internet.

Marlon Marcelo Volpi (2001, p. 17) entende a assinatura digital “como

sendo um mecanismo digital utilizado para fornecer confiabilidade, tanto sobre a

autenticidade de um determinado documento como sobre o remetente do mesmo.”

Com a adoção obrigatória de assinaturas digitais para celebração de

negócios jurídicos realizados pela rede de computadores, ter-se-ia a garantia

necessária acerca da autoria do documento, bem como se a mensagem sofreu ou

não algum tipo de alteração no percurso ou armazenamento das informações.

Criou-se a assinatura digital, elaborada através de um processo técnico

que utiliza o sistema de criptografia, ou seja, utilização de cifras ou códigos que

possibilita a identificação do usuário do documento digital, garantindo, portanto, a

autenticidade e originalidade do documento. (SOUZA, 2009)

Sendo assim, a assinatura digital é um mecanismo utilizado para que

ocorra a identificação do remetente de determinada mensagem, de forma segura e

confiável, através do uso da criptografia.

3.2 CRIPTOGRAFIA

A utilização do sistema de criptografia, especificamente quanto à

assinatura digital, visa assegurar, no âmbito dos meios eletrônicos, a intangibilidade

das informações contidas em determinado documento, competindo tão somente às

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partes possuidoras da chave secreta de criptografia a visualização do documento

em si.

A criptografia é uma ciência que garante o sigilo, integridade e

autenticação no tocante ao armazenamento e troca de informações na rede de

computadores, eis que a técnica criptográfica impede que os dados inseridos na

mensagem sejam visualizados por pessoa distinta da envolvida na transação.

Nos dizeres de Armando Alvares Garcia Júnior (2007, p. 103), pode se

conceituar a criptografia da seguinte maneira:

É a conversão, para caracteres incompreensíveis e com observância de normas especiais consignadas em cifras ou códigos, do texto de uma mensagem redigida com caracteres ordinariamente compreensíveis. A codificação também é denominada “chave”. A chave torna caracteres incompreensíveis para leitores comuns. Somente a pessoa que tiver o código adequado (chave) poderá converter o incompreensível à decodificação e tornar novamente compreensível a mensagem.

A mensagem que inicialmente era legível passa por um processo de troca

de caracteres, tornando-a ilegível sem a chave secreta. De acordo com o tipo de

criptografia utilizada, o acesso a chave secreta será determinado para o caso em si.

Ocorre, portanto, um embaralhamento dos dados originais que somente com o uso

da chave secreta poderão retornar ao seu estado original.

Chama-se chave todo código secreto composto por uma sequência de valores numéricos, arranjados por computador a partir da aplicação de algoritmos. É a chave que abre ou dá acesso a uma mensagem codificada ou lhe tranca o acesso, criptografando-a. (BARBAGALO, 2001, p. 43)

Nos contratos eletrônicos é de fundamental importância a utilização do

sistema de criptografia através de assinatura digital, posto que as mensagens e

informações são trocadas com a segurança necessária para a realização do

negócio jurídico, impedindo que sejam realizadas alterações nos dados

originariamente encaminhados.

A palavra criptografia é de origem grega kryptós e grafos, que significam escondido e oculto, e grafia e escrita, respectivamente. Assim, verifica-se que criptografia é a arte ou a ciência de escrever em cifra ou código, tornando incompreensível uma informação original, tanto que somente o destinatário que possui a senha tem condições de decifrar e compreender a informação. (BOIAGO Jr., 2005, p. 68/69)

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A figura abaixo traduz o sistema de criptografia na troca de informações

entre o emissor e receptor de determinada mensagem (VOLPI, 2001, p. 7):

Analisando a ilustração acima, verifica-se que, inicialmente na mensagem

original é utilizado o sistema de criptografia, gerando, portanto, uma chave secreta.

A mensagem original criptografada é encaminhada ao receptor, sendo que este, ao

recebê-la, utiliza a chave secreta que lhe foi informada para descriptografar a

mensagem e, desta forma, ter acesso ao conteúdo do documento.

Este é, portando, um simples processo de criptografia sobre determinada

mensagem. Todavia, diante das evoluções tecnológicas, pode-se falar em dois

processos de criptografia, quais sejam a criptografia simétrica, também denominada

de convencional, e a criptografia assimétrica, também conhecida como chave

pública.

3.2.1 Criptografia simétrica ou com chave secreta

A criptografia simétrica, também conhecida por convencional, tem como

conceito básico a utilização de uma chave secreta pelo emissor ao codificar a

mensagem original, de modo que posteriormente tal chave é repassada ao receptor

a fim de que este possa decodificar a mensagem e ter acesso ao conteúdo.

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Necessariamente a chave secreta para criptografar e descriptografar a

mensagem será a mesma quando se tratar de criptografia simétrica. Caberá ao

emissor repassar a chave secreta ao receptor a fim de que a mensagem original

torne-se novamente legível.

O processo de criptografia de chave privada ou simétrica pode ser

verificado conforme figura abaixo (NAKAMURA, 2007, p. 303):

Portanto, através da criptografia simétrica o sigilo das informações

contidas no documento quando da transferência entre computadores ou no seu

próprio armazenamento pode ser desfeito com o uso da mesma chave secreta que

gerou o arquivo criptografado.

Para José Wilson Boiago Jr. (2005, p. 69) a criptografia simétrica pode

ser definida da seguinte maneira:

No sistema da criptografia simétrica, há necessidade tanto do remetente quanto do destinatário conhecerem a chamada chave secreta, a qual é utilizada para criptografar (codificar) e decriptografar (decodificar) a informação por meio de regras que controlam a substituição de um carácter por outro, que, no caso de computadores, são feitas por algoritmos de codificação, devendo ser lembrado que esse tipo de codificação é para criptografar uma mensagem específica. (BOIAGO Jr., 2005, p. 69)

A confiança neste tipo de criptografia reside no fato de que somente os

interessados deverão ter acesso a chave secreta, pois uma vez que tal informação

seja repassada erroneamente a terceiros fora da relação jurídica poderá o conteúdo

da mensagem sofrer alterações sem, contudo, retirar a originalidade do documento,

eis que permanecerá assinado digitalmente com a senha do emissor.

A chave é denominada simétrica se a mesma cifra (ou código) é utilizada para encriptar (criptografar) e decriptar (descriptografar) a mensagem. Na criptografia simétrica, o programa codificador do

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texto em caracteres indecifráveis utiliza a mesma chave para criptografar e descriptografar. (GARCIA Jr., 2007, p. 103)

Na criptografia simétrica existirá somente uma chave secreta comum que

garantirá a confidencialidade e autenticidade do documento, sendo considerada,

inclusive, como um sistema mais célere na execução da decodificação. O grande

problema neste tipo de criptografia é que esta não permite a utilização de assinatura

digital e certificação digital que são utilizadas necessariamente por uma chave

pública, conforme adiante se verá.

3.2.2 Criptografia assimétrica ou com chave pública

Inicialmente, cumpre destacar que a criptografia assimétrica é a

responsável pela utilização de assinaturas digitais na celebração dos contratos

eletrônicos, eis que sua utilização é muito mais segura comparada a criptografia

simétrica.

A criptografia assimétrica, também conhecida como chave pública, tem

como conceito básico a utilização de um par de chaves, sendo uma chave privada

utilizada para criptografar a mensagem pelo emissor e uma chave pública

necessária para decodificar a mensagem pelo receptor.

Necessariamente a chave secreta para criptografar a mensagem e a

chave pública para descriptografá-la serão distintas quando se tratar de criptografia

assimétrica. Caberá ao emissor manter em segredo a chave secreta, impedindo,

desta forma, que terceiros estranhos a relação jurídica tenham acesso às

informações.

Para Armando Alvares Garcia Júnior (2007, p. 103) a criptografia

assimétrica pode ser definida da seguinte maneira:

As chaves são denominadas assimétricas se a cifra (ou código) utilizada para encriptar difere da cifra para decodificar (ou decriptar) a mensagem. No caso de chaves assimétricas (ou “chaves públicas”), cria-se um par casado de chaves (tipo “chave e

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fechadura”), pelo qual uma é utilizada para encriptar (chave privada, apenas conhecida por seu titular) e outra é utilizada para decriptar (chave pública). Apenas para citar um exemplo, a tecnologia utilizada pelo Banco do Brasil é a PKI (Public Key Infrastruture ou Infraestrutura de Chave Pública).

O processo de criptografia de chave pública ou assimétrica pode ser

verificado conforme figura abaixo (VOLPI, 2001, p. 14):

Portanto, através da criptografia assimétrica o sigilo das informações

contidas no documento quando da transferência entre computadores ou no seu

próprio armazenamento pode ser desfeito tão somente com o uso de uma chave

pública diferente da chave secreta que gerou o arquivo criptografado.

O interessante neste tipo de criptografia é que o emissor, ao resguardar o

sigilo da chave privada e repassar a chave pública ao receptor permitirá a este que

a mensagem seja lida, sem contudo, haver possibilidade de alteração na mensagem

original por parte do receptor ou de qualquer outra pessoa que tenha acesso a

chave pública.

Existirá sempre a garantia que a mensagem criptografada corresponderá

de fato ao emissor da chave privada, eis que só este será o possuidor de tal

informação.

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Inclusive, diante da figura acima, é possível verificar que,

independentemente do número de pessoas possuidoras da chave pública, sempre

que esta for utilizada para o envio de uma mensagem, somente o possuidor da

chave privada terá acesso ao conteúdo da mensagem, pois a chave pública está

diretamente ligada à chave privada em questão.

A criptografia assimétrica pode ser acionada através da utilização de

algoritmos de autenticação, “que operam como elementos de verificação da autoria

e do conteúdo dos dados enviados.” (VOLPI, 2001, p. 16)

A função dos algoritmos de autenticação é verificar se os elementos

informativos enviados na origem conferem com as informações que chegam ao

destinatário correspondente.

É através da criptografia assimétrica baseada em algoritmos de

autenticação que torna possível a utilização da assinatura digital.

A assinatura digital pode ser obtida com o uso de algoritmos de chave pública, no qual o usuário que deseja assinar digitalmente uma mensagem utiliza sua chave privada. Como somente ele possui acesso à chave privada e como somente a chave pública correspondente pode fazer com que a mensagem volte ao seu estado original, utilizar a chave privada significa que o usuário assina digitalmente uma mensagem. (NAKAMURA, 2007, p. 305)

Afinal, a assinatura digital é a utilização da criptografia assimétrica na

mensagem original, em que o emissor autentica o documento com sua chave

privada e o receptor visualiza a mensagem e confere as informações decodificando

a mensagem com uma chave pública, verificando se de fato a mensagem pertence

ser a quem a enviou.

Com a assinatura digital é possível garantir confiança ao documento e

sua origem por parte do remetente que a assinou, de modo que sua utilização nos

contratos eletrônicos é de fundamental importância para minimizar os riscos nestes

tipos de contratação ainda carentes de legislação própria.

Dentre os benefícios trazidos pela assinatura digital nos contratos

eletrônicos pode-se citar a possibilidade de identificação do contratante, a

autenticação do documento através da criptografia e a privacidade na troca de

informações eletrônicas.

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3.3 ASPECTOS GERAIS DO DOCUMENTO ELETRÔNICO

No mundo virtual, deixa-se de utilizar o papel meio físico para dar guarida

ao documento digital, sendo que este só pode ser visualizado através de um

computador.

Diante deste fator, os contratos que antes eram celebrados através de

papel devidamente assinado pelas partes, passam a ser elaborados por meio de

documentos eletrônicos.

Insta destacar duas hipóteses de documentos eletrônicos: aqueles que

são mera reprodução do papel meio físico, que uma vez digitalizados tomam a

forma digital; e aqueles devidamente produzidos na própria rede de computadores,

que são reconhecidos pelas partes através de assinaturas digitais ou mesmo por

mera concordância no mundo virtual.

Podemos afirmar que o fundamento de comprovação das negociações efetuadas através do e-commerce é o documento eletrônico que de acordo com Ettore Giannontonio são tanto o documento formado pelo computador, como o documento formado através do computador. Desta feita, podemos inferir que o meio pelo qual se perfazem os contratos efetivados através da internet, são os documentos eletrônicos, que, de acordo com Regis Magalhães Soares de Queiroz, ‘pode ser entendido como aquele que foi gerado ou arquivado por sistema computadorizado, em meio digital, e mais adiante ressalta que os pontos críticos desse tipo de documento são: a comprovação da identidade das partes (autoria e aceitação) e a prova de seu conteúdo e da sua integridade. (BOIAGO Jr. Apud Jorge José Lawand, 2005, p. 138/139)

Todavia, a legislação nada menciona acerca do documento eletrônico,

existindo, portanto, dúvida quanto à sua aplicabilidade na esfera jurídica, muito

embora o Código de Processo Civil nada contenha sobre a proibição do documento

digital e sua eficácia probatória.

Art. 332. Todos os meios legais, bem como os moralmente legítimos, ainda que não especificados neste Código, são hábeis para provar a verdade dos fatos, em que se funda a ação ou defesa. Art. 335. Em falta de normas jurídicas particulares, o juiz aplicará as regras de experiência comum subministradas pela observação do que ordinariamente acontece e ainda as regras da experiência técnica, ressalvado, quanto a esta, o exame pericial.

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Diante do avanço tecnológico cada vez mais presente na celebração dos

contratos, o conceito de documento físico passa por uma mudança interpretativa, de

modo que a ideia de estar associado a um suporte material torna-se relativa em

razão da utilização dos documentos eletrônicos.

Acerca da validade do documento eletrônico, Regis Magalhães Soares de

Queiróz (LUCCA, 2001, p. 403) assim entende:

[...] vigorando o princípio da liberdade negocial sempre que não houver exigência legal de alguma forma especial, os contratos estabelecidos por via telemática e assinados digitalmente cumprem os requisitos para terem sua validade reconhecida. Por isso, devem ser reconhecidos como qualquer outro documento particular assinado manualmente.

O fato de estar-se diante de uma mensagem eletrônica, por si só, não

pode desvirtuar sua eficácia probatória, visto que, uma vez reconhecidas à autoria e

autenticidade do documento, este passa a ter força executória de informação.

A dificuldade reside, portanto, em garantir a preservação da integridade

do documento eletrônico, ou seja, sua confiabilidade no mundo jurídico, não

podendo sua análise ser restringida tão somente por se tratar de documento em

suporte eletrônico.

3.4 CERTIFICAÇÃO DIGITAL E AUTORIDADE CERTIFICADORA

Visando dar confiabilidade na celebração dos contratos eletrônicos,

podem os contratantes se utilizarem de um certificado digital que garanta a

autenticidade, integridade e validade do documento eletrônico, devidamente

gerenciado por uma autoridade certificadora.

Em verdade, o certificado digital pode servir como instrumento de sigilo

das informações, autenticação de cliente ou ainda como assinatura digital.

O certificado digital permite que, através da utilização da criptografia

assimétrica, o receptor da mensagem se utilize de uma chave pública que lha dará

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acesso ao documento, sendo escopo do certificado digital agrupar as informações

do emissor e garantir a identificação daquele perante os outros.

Um certificado é um documento eletrônico cujo objeto consiste em estabelecer um vínculo entre uma pessoa e um par de chaves assimétricas. O certificado deve conter, assim, diferentes informações sobre a identidade de um signatário, principalmente a sua chave pública. Este documento é realizado e assinado pela autoridade de certificação com a ajuda da criptografia assimétrica e é protegido contra alterações. Ele pode ser emitido, sob pedido, para qualquer signatário registrado junto a uma autoridade de certificação. (LOUREIRO, 2008, p. 367)

O certificado digital possui algumas informações básicas, tais como

chave pública do emissor, seu nome e endereço completos, data de validade da

chave pública, autoridade certificadora responsável etc.

Para se utilizar de um certificado digital compete à parte requisitar

perante uma autoridade certificadora a expedição do certificado, sendo que após a

análise de informações, será introduzida uma chave privada, própria e única do

emissor, no certificado.

O funcionamento de um certificado digital pode ser ilustrado da seguinte

maneira (VOLPI, 2001, p. 37):

Como se depreende da figura, o certificado digital é um método de

criptografia assimétrica, em que a mensagem original é cifrada com a utilização de

uma assinatura digital da autoridade certificadora, a qual garante perante o receptor

da mensagem que o documento é confiável e de autoria reconhecida.

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No documento eletrônico constará a assinatura digital da autoridade

certificadora, e não a do próprio emissor, pois as informações concernentes a este

estarão devidamente arquivadas pela autoridade certificadora, a qual apenas

informa perante terceiros que os dados ali presentes são verdadeiros.

Destaca-se que o certificado digital possui prazo de validade, sendo que,

no caso de findar-se o prazo e não haver renovação do certificado, a autoridade

certificado deverá revogá-lo, tornando pública tal revogação.

Luiz Guilherme Loureiro (2008, p. 368) conceitua a autoridade de

certificação nos seguintes dizeres:

Autoridade de certificação é a autoridade encarregada por um ou por vários usuários de criar e de atribuir sua chave pública e seu certificado. A noção de autoridade de certificação deve ser compreendida dentro de uma arquitetura de chave pública, como a adotada no Brasil pela recente MP 2.200/01. Em uma tal arquitetura, a utilização da chave pública permite verificar uma assinatura numérica realizada com a ajuda da chave privada correspondente.

A existência de autoridades certificadoras, constituídas por empresas

privadas, possui como objetivo gerenciar e controlar o sistema de chaves públicas,

competindo a estas averiguar e comprovar a identidade física do usuário através da

atribuição de chaves públicas e certificado digital.

3.5 LEGISLAÇÕES E INICIATIVAS LEGISLATIVAS

Conforme já explicitado, ainda há carência legislativa acerca da

assinatura digital e dos contratos eletrônicos, muito embora a utilização destes

instrumentos seja cada vez mais comum e aplicada no dia a dia, todavia, existem

alguns projetos de leis tramitando a fim de regular a questão.

Inicialmente, como norte da questão, no âmbito internacional, a

contratação por meios eletrônicos, inclusive com a utilização de assinatura digital, já

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encontra guarida na Lei Modelo das Nações Unidas sobre o Comércio Internacional

de 1996, conhecida como Uncitral, devidamente recepcionada pelo Brasil.

Nesta lei, aplicada a qualquer tipo de informação na forma de mensagem

de dados usada no contexto de atividades comerciais, pode-se verificar definições

acerca dos termos mensagem eletrônica, intercâmbio eletrônico de dados (EDI),

remetente e destinatário etc.

A Lei Modelo Uncitral visa uniformizar internacionalmente a legislação

sobre comércio eletrônico, inclusive trazendo em seu corpo de texto a flexibilização

da assinatura digital.

Artigo 7 – Assinatura 1) Quando a Lei requeira a assinatura de uma pessoa, este requisito considerar-se-á preenchido por uma mensagem eletrônica quando: a) For utilizado algum método para identificar a pessoa e indicar sua aprovação para a informação contida na mensagem eletrônica; e b) Tal método seja tão confiável quanto seja apropriado para os propósitos para os quais a mensagem foi gerada ou comunicada, levando-se em consideração todas as circunstâncias do caso, incluindo qualquer acordo das partes a respeito.

Este foi o primeiro e o mais importante passo legislativo criado até o

momento que pudesse regular a questão da assinatura digital como pressuposto de

validade dos contratos eletrônicos.

No Brasil, a normatização da assinatura digital está em tramitação,

todavia a matéria já vem sendo pautada e discutida com afinco, sendo objeto de

alguns projetos de lei.

Pode-se citar, no entanto, como marco regulatório, o Decreto n° 3.587 de

5 de setembro de 2000, que estabeleceu normas para a infra-estrutura de chaves

públicas do Poder Executivo Federal – ICP-Gov, ou seja, a utilização de assinaturas

digitais pelas autoridades do Poder Executivo Federal Brasileiro, a fim de garantir a

troca de informações de forma confiável no âmbito das repartições.

O Decreto n° 3.587/00 trata a questão de uma forma

pormenorizadamente técnica, inclusive quanto à utilização de certificados digitais e

autoridades certificadoras, podendo ser extraídos alguns conceitos do glossário do

próprio decreto.

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Autoridade Certificado – AC (Certification Authority – CA) – Entidade que emite certificados de acordo com as práticas definidas na Declaração de Regras Operacionais – DRO. É comumente conhecida por sua abreviatura – AC. Assinatura digital (Digital Signature) – Transformação matemática de uma mensagem por meio da utilização de um função matemática e da criptografia assimétrica do resultado desta com a chave privada da entidade assinante. Criptografia (Cryptography) – Disciplina que trata dos princípios, meios e métodos para a transformação de dados, de forma a proteger a informação contra acesso não autorizado a seu conteúdo.

Diz-se que o Decreto n° 3.587/00 foi o primeiro avanço da questão para

normatizar a assinatura digital no Brasil, a qual é objeto dos projetos de lei que

serão adiante abordados.

Neste sentido, destacam-se os Projetos de Lei n° 6722, n° 1.4833 e n°

1.5894, este penúltimo apensado ao último, todos do ano 1999.

O Projeto de Lei n° 672/99, de autoria do Senador Lucio Alcantara, traz,

basicamente, algumas disposições semelhantes à Lei Modelo da Uncitral,

normatizando os efeitos jurídicos das informações trocadas sob a forma de

mensagem eletrônica, inclusive quanto à oferta e aceitação, incorporando de vez

esta legislação no direito interno brasileiro.

Não há no Projeto de Lei n° 672/99 o enfoque na validade da assinatura

digital, discorrendo de forma ampla sobre esta questão.

Dentre as justificativas do Projeto de Lei n° 672/99, podem ser citadas à

proposta de efeitos jurídicos das informações trocadas através de mensagens

eletrônicas, a assinatura digital e a formação dos contratos eletrônicos por

intermédio de oferta e aceitação virtuais, visando incorporar de vez no ordenamento

jurídico brasileiro os assuntos.

O Projeto de Lei n° 1.483/99, de autoria do Deputado Hélio,

extremamente abstrato, foi criado visando instituir a fatura eletrônica e a assinatura

digital nas transações de comércio eletrônico.

2 Dispõe sobre o comércio eletrônico. 3 Institui a fatura eletrônica e a assinatura digital nas transações de “comércio eletrônico. 4 Dispõe sobre o comércio eletrônico, a validade jurídica do documento eletrônico e a assinatura digital, e dá outras providências.

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Não há maiores elucidações no projeto, posto ser constituído de apenas

dois artigos, propondo, todavia, a validação da assinatura digital a ser autenticada e

reconhecida por órgão público.

Art. 1° Fica instituída a fatura eletrônica, assim como a assinatura digital, nas transações comerciais eletrônicas realizadas em todo o território nacional. Art. 2° A assinatura digital terá sua autenticação e reconhecimento certificado por órgão público que será regulamentado para este fim. Parágrafo único. Toda documentação eletrônica, bem como o cadastro de assinaturas digitais, deverão estar com seus registros disponíveis para avaliação e fiscalização dos órgãos federais responsáveis.

O Projeto de Lei n° 1.589/99, de autoria do Senador Luciano Pizzatto e

outros, trata sobre a instituição da assinatura digital no comércio eletrônico, visando

garantir segurança jurídica nas transações eletrônicas.

O Projeto de Lei n° 1.589/99 é o projeto mais extenso em relação aos

demais acima relacionados, eis que desenvolve a matéria de forma mais especifica,

definindo com maior precisão o âmbito de sua utilização, definindo o documento

eletrônico e a assinatura digital.

Art. 14 – Considera-se original o documento eletrônico assinado pelo seu autor mediante sistema criptográfico de chave pública. § 1° - Considera-se cópia o documento eletrônico resultante de digitalização de documento físico, bem como a materialização física de documento eletrônico original. § 2° - Presumem-se conformes ao original as cópias mencionadas no parágrafo anterior, quando autenticadas pelo escrivão na forma dos arts. 33 e 34 desta lei. § 3° - A cópia não autenticada terá o mesmo valor probante do original, se a parte contra quem foi produzida não negar sua conformidade. Art. 15 – As declarações constantes do documento eletrônico, digitalmente assinado, presumem-se verdadeiras em relação ao signatário, desde que a assinatura digital: a) seja única e exclusiva para o documento assinado; b) seja passível de verificação; c) seja gerada sob o exclusivo controle do signatário; d) esteja de tal modo ligada ao documento eletrônico que, em caso de posterior alteração deste, a assinatura seja invalidade; e e) não tenha sido gerada posteriormente à expiração, revogação ou suspensão das chaves.

O Projeto de Lei n° 1.589/99 aborda ainda aspectos da contratação

eletrônica, da aplicabilidade das normas de proteção ao consumidor, da eficácia

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jurídica dos documentos eletrônicos, dos certificados eletrônicos, inclusive quanto à

sua revogação, trazendo ao final sanções administrativas e penais.

Cumpre destacar que foi apresentado em junho de 2001 um Substitutivo

aos Projetos de Lei 1.483/99 e 1.589/99, através do Projeto de Lei n° 4.906 de

autoria do Deputado Júlio Semeghimi, visando acrescentar melhoramentos nos

assuntos já tratados pelos projetos anteriores e, de maneira mais objetiva, discorrer

acerca da assinatura digital através do método de criptografia assimétrica.

Não obstante, em junho de 2001, o Governo Federal instituiu a Infra-

Estrutura de Chaves Públicas Brasileira (ICP-Brasil), por meio da Medida Provisória

n° 2.200, com o dever de fornecer condições de validade, autenticidade e

integridade aos documentos eletrônicos a fim de que estes possuam eficácia no

mundo jurídico.

Destaca-se também o Decreto n° 4.829/03, que dispõe sobre a criação

do Comitê Gestor da Internet no Brasil – CGI.br e sobre o modelo de governança da

Internet no Brasil.

Portanto, muito embora estejam tramitando os projetos de lei acima

mencionados, o Brasil ainda não possui legislação específica que trate acerca do

documento eletrônico, assinatura digital e contratos eletrônicos, utilizando-se

basicamente das diretrizes estabelecidas pela Lei Modelo da Uncitral para a

resolução dos casos existentes sobre a matéria.

Diante da falta de regulamentação do assunto, o Supremo Tribunal

Federal já se manifestou a respeito da assinatura digital e sua necessidade de

normatização no ordenamento jurídico brasileiro, conforme se depreende do julgado

abaixo:

Ato Processual: Recurso: Chancela Eletrônica: Exigência de Regulamentação do seu uso para resguardo da segurança jurídica. 1. Assente o entendimento do Supremo Tribunal de que apenas a petição em que o advogado tenha firmado originalmente sua assinatura tem validade reconhecida. Precedentes. 2. No caso dos autos, não se trata de certificado digital ou versão impressa de documento digital protegido por certificado digital; trata-se de mera chancela eletrônica sem qualquer regulamentação e cuja originalidade não é possível afirmar sem o auxílio de perícia técnica. 3. A necessidade de regulamentação para a utilização da assinatura

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digitalizada não é mero formalismo processual, mas, exigência razoável que visa impedir a prática de atos cuja responsabilização não seria possível. (Agravo de Instrumento n. 564765 do Rio de Janeiro. Rel. Min. Sepúlveda Pertence. Órgão Julgador: Primeira Turma. Data de publicação: 17.03.2006) [sem grifo no original]

No mesmo sentido, o Superior Tribunal de Justiça assentou seu

posicionamento quanto à utilização da certificação digital, diante da instituição da

Infra-Estrutura de Chaves Públicas Brasileira – ICP Brasil:

Agravo Regimental. Recurso Especial Intempestivo. Juntada de documento retirado de sítio da internet. Inexistência de fé pública. Impossibilidade de demonstração da prorrogação do prazo recursal. 1. A Medida Provisória nº 2.200/01 instituiu a Infra-Estrutura de Chaves Públicas Brasileira- ICP-Brasil, e regulou a utilização da certificação digital no Brasil. O artigo 10, § 1° determina que “as declarações constantes dos documentos em forma eletrônica produzidos com a utilização de certificação disponibilizado pela ICP-Brasil presumem-se verdadeiros em relação aos signatários”. 2. O artigo 10, § 2º da MP determina que “não obsta a utilização de outro meio de comprovação da autoria e integridade de documentos em forma eletrônica, inclusive os que utilizem certificados não emitidos pela ICP-Brasil, desde que admitido pelas partes como válido ou aceito pela pessoa a quem for oposto o documento”. 3. A cópia juntada foi retirada de sítio de internet que não possui certificação digital, bem como não constitui sítio de entidade pública à qual presumir-se-ia possuir fé pública acerca das informações prestadas. [...] 6. Recurso infundado, a ensejar a aplicação da multa prevista no artigo 557, § 2º, do CPC. 7. Agravo regimental improvido. (Agravo Regimental no Recurso Especial n. 792429 de São Paulo. Rel. Min. Luis Felipe Salomão. Órgão Julgador: Quarta Turma. Data de publicação: 08/05/2009) [sem grifo no original]

Já há, por parte dos órgãos do Poder Judiciário, decisões que tratem

sobre a matéria, especificamente quanto à assinatura digital, sem que no entanto

haja uma base normativa passível de ser aplicada ao caso concreto.

E, ainda que existentes tais manifestações jurisprudenciais, o próprio

Supremo Tribunal Federal, através do informativo n° 4095 demonstra existir

divergência de posicionamentos no tocante às decisões dos próprios ministros

diante da falta de regulamentação da assinatura digital:

A Turma iniciou julgamento de agravo de instrumento em que se pretende a reforma de decisão [...] ao fundamento de que a peça recursal não teria validade reconhecida por se apresentar por cópia, da mesma forma como a assinatura nela firmada pelo procurador. [...] O Min. Sepúlveda Pertence, relator, por entender que a utilização de recursos tecnológicos, tal como a assinatura

5 Petição por meio de cópia de assinatura.

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digitalizada, precisa ser normatizada antes de ser posta em prática, negou provimento ao recurso. Considerou não se tratar, no caso, de assinatura com certificado digital ou de versão impressa de documento digital protegido por certificado digital, e sim de mera chancela eletrônica utilizada sem qualquer regulamentação, cujo atestado de originalidade dependeria de perícia técnica. Salientou que a necessidade de regulamentação para a utilização da assinatura digitalizada não é mero formalismo processual, mas exigência razoável que visa impedir a prática de atos cuja responsabilização não seria possível. Acompanhou o voto o Min. Eros Grau. O Min. Marco Aurélio, em divergência, votou no sentido de dar provimento ao recurso. Acolhendo a argumentação de que há grande volume de processos enfrentados pela União, considerou o fato de ter havido flexibilizações processuais, inclusive por parte do Supremo, como a da assinatura digital, regulamentada por ele mesmo, e não por lei, bem como a da dispensa da declaração da autenticidade das peças trasladadas pelo profissional da advocacia. [...] AI 564765/RJ, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, 17.11.2005. (AI-664765) [sem grifo no original]

Em verdade, ainda impera a insegurança jurídica quanto à utilização da

assinatura digital, sendo que, especificamente no tocante aos contratos eletrônicos,

a adoção de tal método para realização dos negócios jurídicos possibilitaria aos

contratantes maior confiabilidade na relação e autenticidade e autoria do documento

eletrônico.

Desta forma, é necessário que, diante do avanço tecnológico, sejam

elaboras leis que regulamentem a questão, posto que os contratos eletrônicos, os

documentos eletrônicos e a assinatura digital já se tornaram uma aplicação comum

no âmbito social brasileiro, todavia, ainda carentes de normas específicas que lhes

garantam a segurança visada pelos contratantes de um modo geral.

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

A presente monografia teve como escopo analisar os contratos

celebrados por meio da internet à luz do ordenamento jurídico brasileiro, diante da

expansão cada vez mais crescente desta espécie de negócio jurídico.

Para tanto, o estudo dividiu-se em três etapas, quais sejam a análise dos

contratos tradicionais, previstos no Código Civil, e a chamada Teoria Geral dos

Contratos, o estudo da internet como instrumento e local de formação de negócios

jurídicos, mais precisamente os contratos eletrônicos e, por fim, a criptografia

assimétrica como método de introdução da assinatura digital na celebração de

contratos.

Diante da pesquisa realizada, verificou-se, primeiramente, que o contrato,

em qualquer de sua modalidade, é uma espécie do gênero negócio jurídico, pelo

qual duas ou mais pessoas visam estabelecer direitos e obrigações patrimoniais

pela liberdade que lhes competem.

Muito embora os contratantes possuam autonomia da vontade para

negociar as cláusulas contratuais, acima de suas próprias estipulações, devem ser

respeitados os ditames da legislação de modo a garantir a existência, validade e

eficácia dos contratos.

Concluída esta etapa da pesquisa, passou-se a analisar o instituto da

internet no meio jurídico, inclusive através de conceituações técnicas e regulatórias

pela Agência Nacional de Telecomunicações - Anatel.

A internet, como rede de redes mundial de computadores, pode ser

utilizada como um meio e um local de formação de contratos eletrônicos, sendo que

estes são caracterizados exatamente pela troca de informações eletrônicas, ou seja,

a manifestação de vontade das partes ocorre através do uso da internet.

Em razão da falta de legislação específica acerca dos contratos

eletrônicos e, concomitantemente ao fato de sua crescente utilização pelas partes

em função da celeridade proporcionada por este meio de contratação, existe ainda

insegurança jurídica no tocante a algumas questões.

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Conforme aludido no segundo capítulo, pode-se perceber que o Código

Civil é utilizado como legislação para os contratos eletrônicos no que se refere aos

requisitos de todo contrato e que definir se os contratos eletrônicos são

considerados como realizados entre pessoas presentes ou ausentes depende do

lapso temporal entre proposta e aceitação.

Ainda no segundo capítulo, analisou-se o momento de formação, local e

validade dos contratos eletrônicos.

Conclui-se que o momento de formação dos contratos eletrônicos é

verificado de acordo com a utilização que é dada para o computador, posto que este

pode servir como um lugar estipulado pelas partes, para que, no dia e hora

marcados estas formalizem o negócio jurídico ou, ainda, como um instrumento de

manifestação de vontade.

Caso as partes utilizem o computador como um lugar, a formação do

contrato eletrônico ocorre no exato momento da aceitação da proposta,

considerando-se, portanto, como realizado entre pessoas presentes, eis que a

resposta é praticamente imediata. Todavia, se as partes utilizarem o computador

como um instrumento para manifestação de vontade, a formação dos contratos

eletrônicos será tida como entre pessoas ausentes, diante da impossibilidade de

resposta em tempo real pelos contratantes.

Em razão da falta de legislação específica sobre contratos eletrônicos,

não há norma reguladora acerca do local de celebração destes, analisando-se, para

tanto, o domicílio/estabelecimento das partes no caso concreto.

Todavia, restou comprovado que, muito embora o ordenamento jurídico

brasileiro seja carente de legislação, os contratos eletrônicos são considerados

válidos e devidamente aceitos no meio jurídico.

Já no terceiro capítulo, enfoque deste trabalho, buscou-se sanar a

questão da insegurança jurídica proporcionada pelos contratos eletrônicos no que

diz respeito à autenticidade e autoria do documento eletrônico através do uso da

assinatura digital.

A assinatura digital tem como base um sistema de criptografia assimétrica

que permite as partes contratantes verificar que o conteúdo de determinada

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mensagem efetivamente corresponde ao receptor da mensagem e que não sofreu

qualquer tipo de alteração durante sua troca de informações ou armazenamento.

Verifica-se que a assinatura digital, como forma de identificação dos

contratantes e autenticidade do documento eletrônico, deve ser aplicada e utilizada

como pressuposto de validade do contrato eletrônico celebrado.

Portanto, atingiu-se os objetivos propostos neste trabalho, evidenciando-

se que a aplicação da assinatura digital na celebração dos contratos eletrônicos é

hipótese de garantia e segurança jurídica, razão pela qual se conclui que a

assinatura digital deve ser utilizada como pressuposto de validade dos contratos

eletrônicos.

Observado este pressuposto na contratação eletrônica, haverá um

avanço em termos de confiança jurídica, sendo o objeto deste trabalho inclusive

tema de iniciativas legislativas que, uma vez regulamentadas, poderão aperfeiçoar

as contratações eletrônicas e assim minimizar as divergências doutrinárias e

jurisprudenciais existentes.

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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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