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Universidade de Brasília (UnB) Instituto de Ciência Política (IPOL)
Projeto de Doutoramento (Referencial teórico e metodológico) Aluno: Jackson De Toni (09/0015355) Orientadora: Profa. Dra. Rebecca Abers Título provisório:
“Cooperação e conflito na construção da política industrial brasileira: 1995 a 2010”
1. O problema teórico e as hipóteses de pesquisa
A criação de “arenas” de dialogo entre atores sociais é freqüentemente vista –
tanto na literatura de políticas públicas, quanto nos estudos sobre o Estado e
nos estudos sobre formas de cooperação – como mecanismo que gera
consensos e capacidade cooperativa. Porem, no caso das políticas públicas de
desenvolvimento econômico no Brasil, o design destas “arenas” parece ser do
tipo “ratificativo” das prerrogativas do Estado do que de “poder compartilhado”
ou do tipo “bottomup” , conforme os termos sugeridos por Avritzer (2009)1. Esta
dupla dimensão - “arenas de concertação” versus “arenas de ratificação de
políticas governamentais” – parece definir a natureza dúbia destes espaços
coletivos e a trajetória da interação “público X privada” nestes espaços. As
tensões causadas por esta dualidade determinam a dinâmica de
funcionamento destas “arenas” e influenciam a trajetória das políticas públicas
e o comportamento dos atores.
Partindo desta avaliação, a pergunta que orienta este trabalho é exatamente
como foram criadas e como funcionaram as “arenas” de política industrial no
1 O tipo “ratificativo” tem baixo poder decisório, as arenas funcionam mais como instâncias de
socialização e homologação de decisões governamentais, ao contrario dos modelos bottomup e de
“poder compartilhado” onde, em níveis diferentes, há espaços concretos de autonomia decisória dos
atores envolvidos.
2
Governo Cardoso (1995 – 2002) e no Governo Lula (2003 – 2010). A análise
comparativa que propomos deverá identificar quais mecanismos, preferências
e interesses dos principais atores públicos e privados foram relevantes para a
criação e funcionamento das “arenas”, como se desenvolveram e quais seus
impactos na política industrial. Acreditamos que as hipóteses que explicam esta
dinâmica estejam relacionadas aos incentivos para cooperação e colaboração
entre os atores, ao comportamento racional dos governos e à influência de
idéias sobre desenvolvimento e participação protagonizadas pelos governos.
Estes diferentes mecanismos se desenvolveram de forma combinada e variável
em cada período, conforme as idiossincrasias de cada governo.
Ostrom (2007), como outros autores racionalistas, que valorizam a natureza
cooperativa das instituições, propõe que os indivíduos interagindo constroem
mecanismos e instituições que ajudam a superar o dilema da ação coletiva. Um
destes mecanismos são as “estruturas de arenas de ação”:
“…the structure of action arenas is thus created both by the biophysical world (such as the size of a resource, advantages due to location, and predictability) and by the rules used (such as the boundary rules affecting who can be a legitimate participant, whether individuals can communicate and observe each other’s actions, and the specific rules used related to positive payoffs and negative sanctions).” (Ostrom, 2007, p. 257).
Uma questão chave é como os indivíduos emitem “sinais confiáveis” uns aos
outros para fundamentar o relacionamento político entre os atores, Ostrom
responde que é através da percepção de benefícios mútuos na ação
cooperativa e como resultados positivos em experiências passadas, ou seja, a
construção de uma reputação positiva.
Por sua vez estes processos geram acordos positivos para a execução e o
sucesso de certas políticas que dependem fundamentalmente da cooperação e
coordenação entre atores políticos, mesmo com grandes assimetrias de poder,
sobretudo quando o Estado ou alguns de seus aparelhos está envolvido na
coordenação ou articulação destes espaços.
Um dos autores que estudou as formas de cooperação entre empresários,
sociedade civil e Estado gerando modelos virtuosos foi Peter Evans, nos anos
oitenta, inclusive com estudos de campo no Brasil. Evans se apoiou num
3
conjunto de autores (Weber, Gerschenkron, Hirschman, Amsden, Wade, North
e Bates) para entender o Estado como uma criação histórica, contingente onde
Estado e Sociedade são mutuamente constitutivos. A análise é histórica e
processual, não-funcional. A transformação mutua estado-sociedade implica
numa relação dialética entre parceria e autonomia. Evans fala claramente num
conjunto de normas e estruturas que criam “tipos-ideais” de Estado
(predadores e desenvolvimentistas) conforme o grau de autonomia e parceria
histórica e contextualmente estabelecido. Esta relação viabiliza uma verdadeira
sinergia publico-privada:
“...the best way to understand synergy is as a set of public/private relations built around the integration of complementarity and embeddedness (Evans, 1996, p.1124) e “…creative action by government organizations can foster social capital; linking mobilized citizens to public agencies can enhance the efficacy of government. The combination of strong public institutions and organized communities is a powerful tool for development. (idem, p. 1130).
O Estado poderá assumir formas específicas (demiurgo, parteiro, etc.). Note-se
também que a ênfase dada por Thelen (1999) nos estudos comparativos foi
plenamente realizada por Evans, havendo aqui, uma clara identificação
metodológica no quadro do que se convenciona chamar de “institucionalismo
institucional comparativo”. Uma síntese do esquema teórico de Evans é
apresentado abaixo:
4
Este estudo busca responder à seguinte questão geral: porquê e como estes
“mecanismos de interação público-privado” são criados e como funcionam nas
agendas políticas2.
A política industrial é um tipo de política em que os resultados dependem
basicamente de quanto os atores públicos e privados conseguem obter em
níveis de cooperação e consenso, seja pela concordância entre as partes, seja
pela resposta que os empresários industriais dão aos incentivos
governamentais. Por exemplo, reduções seletivas da carga tributária ou
incentivos para qualificação da força de trabalho produzirão benefícios
(aumento da competitividade, produtividade e redução de preços no varejo)
somente com o protagonismo voluntário dos empresários como decisores
privados de processos produtivos no mercado. Sejam eles derivados da ação
direta do Estado (subsídios, por exemplo) ou de choques externos
(concorrência externa, crises, etc.) ou do domínio de paradigmas econômicos
dos gestores públicos (keynesianismo, por exemplo), ou dos “jogos repetidos” e
da percepção dos atores. Seus instrumentos na maioria das vezes são de
efeito indiretos (incentivos fiscais ou alíquotas diferenciadas, simplificação de
marcos regulatórios, etc.) sobre as principais variáveis de impacto da política:
aumento da competitividade industrial, aumento do valor agregado das
exportações, geração de mais empregos industriais, disseminação de inovação
tecnológica, etc.
Há literatura demonstrando que a política industrial do governo Fernando
Henrique Cardoso (1995 – 2002) era de natureza implícita ou velada, isto é,
não fora concebida e executada como uma política pública convencional,
incorporada na agenda de governo ou no discurso padrão do governo
federal.(Cano e Gonçalves, 2010; Suzigan e Furtado, 2006; Morais e Lima Jr,
2 O termo “agenda política” é usado aqui no mesmo sentido dado por Kingdon (1984). Refere-se
basicamente ao processo pré-decisório de formulação das políticas. As agendas se formam pela
convergência de três processos (multiple streams) diferentes: o de problemas, o de soluções e o de
alternativas. Quando ocorrem crises, eventos ou símbolos específicos as questões transformam-se em
problemas, que despertam um processo competitivo e seletivo por políticas, que são selecionadas de
acordo com seu grau de aceitação, custos toleráveis, etc. As comunidades de políticas (burocratas,
políticos, empresários,...) disseminam as idéias dominantes. Dependendo da força do patrocínio de grupos
de pressão, de burocratas em postos-chave e inclusive do “humor” (national mood), as idéias (soluções)
ganham forma de propostas políticas. Quando os três fluxos (problemas, idéias e políticas) se combinam
(coupling) abre-se uma “janela” transitória de oportunidades que compõe a agenda, o que pode ser casual
ou previsível como o ciclo orçamentário ou a troca de governo. Kingdon enfatiza o papel do
empreendedor político que conecta e catalisa todos os fluxos, “abrindo” as policies windows.
5
2009 e Guimaraes, 1996). Seus instrumentos, medidas, mecanismos de
avaliação, etc., estavam dissolvidos e fragmentados dentro de outras políticas,
como a política fiscal, a política de exportações, a política tecnológica, etc. Não
havia particularmente “arenas” ou espaços de articulação público-privada
assumidos enquanto tal, com foco em políticas industriais.
No Governo Lula (2003-2010) o campo das ações de fomento aos setores
industriais foi explicitamente convertido e assumido como uma política pública
convencional (com quase todas as fases previstas em Bardach, 2008). Com
ritos típicos da formulação, implementação, execução e monitoramento como
outra qualquer política pública. Tratava-se da “Política Industrial, Tecnológica e
de Comércio Exterior” (PITCE) do primeiro mandato (2003 – 2006) e da
“Política de Desenvolvimento Produtivo” do segundo mandato (2007 – 2010).
Uma das características desta fase foi a criação de “arenas de debate” de
idéias entre atores governamentais e entre estes e setores representativos do
empresariado industrial nacional e dos trabalhadores do setor. Cabe mencionar
dois eventos notáveis nesta direção. A criação de um conselho – o “Conselho
Nacional de Desenvolvimento Industrial” (CNDI), e a criação de uma
organização para-estatal, a “Agência Nacional de Desenvolvimento Industrial
(ABDI), para implementar e avaliar o impacto da política, vinculada ao
Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (o MDIC) (ABDI,
2005; De Toni, 2007).
A literatura especializada demonstra que há uma relação positiva-ainda que
seja metodologicamente difícil propor uma causalidade direta - entre a
contribuição da política industrial do governo Lula nos resultados do setor
industrial brasileiro, particularmente no campo da inovação científica e
tecnológica, no período vis a vis as medidas de apoio à indústria (ou a
inexistência de uma política pública enquanto tal) no período do governo
Cardoso.3Talvez o exemplo mais emblemático seja a trajetória dos chamados
“Fundos Setoriais” operados pela Financiadora de Estudos e Projetos (FINEP),
um órgão do governo federal subordinado ao Ministério de Ciência e
3 Uma relação exaustiva de eventos marcantes de apoio a uma política industrial e científica explícita no
governo Lula pode ser encontrada no artigo de Wilson Cano e Ana Gonçalves (Cano e Gonçalves, 2010).
6
Tecnologia. Os “Fundos Setoriais”4, criados em 1999, durante todo o segundo
governo do Presidente Cardoso foram desbloqueados, no primeiro Governo
Lula, além de inovações de governança, os valores efetivamente aplicados em
C&T no setor produtivo passaram de R$ 165,7 milhões em 1998 para R$ 787,3
milhões em 2006 (Melo, 2008).
A literatura indica que a tradição de relacionamento entre empresários
industriais e o governo federal sempre ou quase sempre foi permeada de
mecanismos clientelistas e particularistas. Ora de natureza eminentemente
corporativa ou do tipo “anéis burocráticos”, ora mediados pela atuação de
bancadas parlamentares, ora de acesso direto de segmentos industriais no
controle de alguns aparelhos de Estado. O processo de desenvolvimento
industrial no Brasil gerou mecanismos circulares de reforço mútuo entre
burocratas estatais e empresários, especialmente industriais5. A burocracia
estatal planejadora em aliança com setores políticos e econômicos foi
denominada por Cardoso de “anéis burocráticos” (Cardoso, 1972). Estes
“anéis”, mas amplos e heterogêneos que os lobbies convencionais, atuavam
como grupos de pressão em temas ou projetos específicos, tanto no
planejamento de políticas com racionalidade técnica quanto na ocupação de
espaços políticos, considerada a debilidade de outros mecanismos como os
partidos e o legislativo. Nestas condições havia uma captura de parte da
burocracia pública pelos interesses privados dos setores mais dinâmicos
(urbano-industriais).
Grosso modo em períodos democráticos – pós regime militar – a relação das
entidades representativas, os atores sociais – tem evoluído de uma postura
parasitária e reivindicativa - quando não de ocupação direta do Governo - para
4 Os “Fundos Setoriais de Ciência e Tecnologia”, foram criados em 1999 como instrumentos de
financiamento de projetos de pesquisa, desenvolvimento e inovação. Há 16 fundos operando, sendo 14
específicos para setores e 02 transversais: uma para interação universidade empresa (chamado de Fundo
“verde amarelo”) e outro para apoiar infraestrutura dos Institutos Científicos e Tecnológicos. As receitas
dos fundos tem origem em taxas, parcela do imposto sobre produtos industrializados e na contribuição
sobre o domínio econômico (CIDE), para maior detalhamento pode-se consultar o sítio:
http://www.finep.gov.br/fundos_setoriais/fundos_setoriais_ini.asp. 5 Sobre estas relações, em especial o papel da burocracia no processo decisório durante os governos
Sarney (1985-1990) e Collor (1990-1992), ver o artigo de Rua e Aguiar (1995). A partir dos modelos
propostos por Guy Peters – Paroquial, Funcional, Adversário e Estado Administrativo – de integração /
autonomia entre burocratas e políticos as autoras concluem que a formulação da política industrial neste
período foi marcada pela ausência dos atores políticos (legisladores) e da sociedade civil gerando baixo
controle democrático.
7
uma postura propositiva e mais participativa, aceitando e participando de
instâncias de intermediação de interesses. Esta mudança de comportamento
político coletivo do empresariado industrial ocorreu como resultado de um mix
complexo de fatores, uma “atualização” diante do contexto de plena
democracia eleitoral e partidária, a diminuição de espaços clientelistas, a maior
participação de bases empresariais mais dinâmicas nas direções corporativas,
a crescente complexidade e sofisticação da política econômica, entre outros
(Diniz e Boschi, 2003; 2007; Mancuso, 2007; Mancuso, Leopoldi e Iglecias,
2010). A criação de “arenas” e conselhos faz parte da tradição democrática de
políticas públicas sociais voltadas para o campo do bem estar social (educação
e saúde, p. ex.), para questões do meio ambiente (recursos hídricos e
saneamento básico, por exemplo)ou para políticas distributivas e redistributivas
(assistência social e renda mínima, p. ex.) (Avritzer, 2009). Mas são muito mais
raras e complexas nas políticas públicas do campo do desenvolvimento
econômico strictu senso ou da política econômica.
O Governo Lula representou uma inovação neste sentido, criando um
mecanismo de “concertação” – ainda que elitizado – entre setores industriais
nacionais e diversos ministérios e organizações públicas federais da
administração direta e indireta (o BNDES, p. ex.). O Conselho Nacional de
Desenvolvimento Industrial, CNDI, criado em 2005, produziu medidas
resultantes de grandes debates e acordos que impactaram profundamente os
resultados da política industrial recente, entre as quais a assim chamada “Lei
do Bem” (incentivos para exportações de maior valor tecnológico), a
regulamentação da assim chamada “Lei de Informática”, da chamada “Lei de
Inovação”, entre outras medidas discutidas e deliberada à época (Cano e
Gonçalves, 2010). Além de consensos sobre temas de valor estratégico que
não tornaram-se marcos legais formalizados, mas ajudaram no processo de
convergência política, como os temas da universalização do acesso à internet,
a indústria de fármacos, às políticas de crédito público, etc.6
A literatura de escolha racional nos mostra que os governos agem
racionalmente ao buscar apoio político e legitimidade social (Bardach, 2008;
6 Conforme pode-se concluir a partir da análise das atas das 14 reuniões do CNDI realizadas entre 2005 e
2007, as atas estão disponíveis para consulta na Agência Brasileira de Desenvolvimento Industrial,
www.abdi.com.br
8
Bonafont, 2004; Hill, 2009). Parte significativa desta legitimidade é criada com o
êxito de políticas públicas, traduzido por crescentes níveis de bem estar e
atendimento às expectativas de clientelas específicas. No caso da política
industrial estão envolvidos os principais grupos industriais do país, com grande
influência sobre o Congresso e domínio de recursos não desprezíveis no jogo
político, por exemplo, entidades nacionais e regionais com grande poder de
advocacy e lobby, com a Confederação Nacional da Indústria, a CNI, e a
Federação das Indústrias do Estado de São Paulo, a FIESP, para exemplificar
as duas entidades mais influentes.
O Governo Lula, diferentemente do governo anterior, assumiu publicamente um
discurso impregnado de elementos associados à ampliação dos mecanismos
da democracia formal, tais como a criação de grandes processos de consulta
pública, instituição de “arenas” de composição com atores sociais, etc.7 Para o
caso das políticas de desenvolvimento (econômico) este discurso foi traduzido
na criação do CNDI em 2004. Só houve um paralelo histórico no período pós
redemocratização, nos anos oitenta, durante o Governo Sarney, quando
instituiu-se uma Câmara Setorial para debate dos problemas do setor
automobilístico. A literatura registrou aquela experiência como um evento
tipicamente enquadrado no modelo corporativo (Anderson, 1999; Arbix, 1995).
1.1 As questões de pesquisa
Há duas questões básicas que esta pesquisa se propõe a investigar são:
(1) Como se explica a criação e o funcionamento de “arenas de
concertação” público/privada nas políticas industriais, no Governo
Cardoso e no Governo Lula? ; e
(2) Qual o efeito das “arenas de coordenação” na política industrial?
Como derivações secundárias, há diversas questões que se colocam do ponto
de vista da análise da formação da preferência dos atores e dos mecanismos
de operação destas “arenas”: quais os mecanismos de “concertação” que 7 Sobre a mecanismos participativos no governo Lula, ver a análise crítica de Delgado e Limoncic (2005),
de Moroni (2006) ou de Souza (2008).
9
funcionaram dentro das “arenas”, como funcionavam, que efeito produziram na
cooperação e coordenação entre setor público e privado? Até que ponto pode-
se atribuir os resultados positivos do setor industrial durante o Governo Lula à
existência de uma política assim formalizada e particularmente à instâncias de
“concertação” no seu interior? Porque os empresários industriais, de uma
tradição clientelista e de patronagem, de ocupação direta do governo, ou
dispondo de mecanismos de lobby e advocacy, contribuíram para o
funcionamento destas “arenas”? Participando do jogo político e assumindo os
riscos de eventuais derrotas políticas ? Como eram gerados os compromissos
entre as partes? Se havia mecanismos de “premiação” ou “punição”
coletivamente aceitos ou mecanismos compensatórios para os atores
eventualmente derrotados nas escolhas de política industrial?
1.2 As hipóteses de pesquisa
Para a primeira questão propomos duas hipóteses não excludentes:
Hipótese 1: Os Governos Lula e Cardoso utilizaram mecanismos de
“concertação” que resultaram em processos de cooperação e
coordenação com o setor privado transferindo total ou parcialmente o
ônus da decisão aos agentes diretamente envolvidos nos custos e
benefícios destas políticas para diminuir eventuais perdas de capital
político.
Esta hipótese sugere que a criação e funcionamento de “arenas” de interação
público / privado na política industrial dos dois governos obedeceu à uma lógica
racionalista e instrumental de gestão do capital político e diminuição dos riscos
de perda de apoio associados aos processos decisórios típicos de decisões
alocativas. Considerando a complexidade do tema e a incapacidade do
governo no atendimento completo e pleno das reivindicações de todos os
atores envolvidos (por exemplo, a concessão de benefícios fiscais ou mudança
de marcos regulatórios) e, portanto, a necessidade de estabelecer critérios e
protocolos de decisão e escolha, os governos se desresponsabilizam ou
compartilham o ônus do processo de escolha com os supostos beneficiários
10
diretos das medidas. Este mecanismo operou tanto na relação do Governo com
setores privados participantes, como dentro do próprio governo, entre as
diferentes áreas ministeriais concorrentes por recursos orçamentários e
políticos.
Além disso, nesta primeira hipótese há outros fatores de contorno que estão
subjacentes e influenciam a ação racional dos governos. Entretanto, não serão
aprofundados neste trabalho, sua descrição aqui tem apenas o propósito de
ajudar a compreender a complexidade do tema, em particular, o grau de
dificuldade em identificar relações causais com precisão e rigorosidade:
(a) Condições de conjuntura externa: fatores relacionados ao contexto
internacional – como a crise financeira de 2008 - influenciaram os
mecanismos de “concertação público-privada” e as “arenas”;
(b) Alocação orçamentária: fatores como a escassez de recursos
orçamentários, uma arena desta natureza é especialmente relevante
quando as decisões de política industrial implicam em renuncia fiscal ou
suspensão de tributos reduzindo a disponibilidade de recursos federais para
as demais políticas.
(c) Grau de organização empresarial: os empresários industriais, por sua
vez, tem se organizado como atores coletivos facilitando os processos de
interlocução com o governo. Este processo não representa um ônus ou
diminuição da autoridade do Estado, ao contrário, o mecanismo funciona
como legitimador do discurso participativo governamental sem maiores
riscos.
(d) Controle de agenda pelo governo: além disso, o governo controla a
agenda das “arenas”, impondo restrições ou bloqueios a certos temas – que
não são debatidos, por exemplo, o ônus imposto ao setor industrial pelo
contexto criado pela política macroeconômica (cambio valorizado, juros
altos, etc.).
(e) Gestão da política econômica doméstica: por fim, mas não menos
importante, a forte dependência da trajetória de política econômica – em
especial a política monetária de juros altos e a política cambial de
11
valorização do real – do governo anterior, impôs soluções não
convencionais de política industrial.
Estas soluções implicaram, no governo Lula especialmente, um leque mais
complexo de estratégias, a maioria das quais baseadas em instrumentos e
medidas que dependem da aderência e do alinhamento dos agentes
econômicos (linhas de crédito ou incentivos públicos a produção de pesquisa
tecnológica, por exemplo). Esta característica das novas políticas depende
muito mais de processos de negociação, convencimento e debate entre os
atores. Sabe-se que as estratégias de implementação das políticas não
independem da natureza destas próprias políticas. Neste sentido cabe assinar
que a postura dos Governos Cardoso e do Governo Lula quanto ao uso
instrumental das “arenas de concertação” também diferiu neste quesito.
Enquanto que o Governo Cardoso implementou políticas industriais mais
horizontais ou para corrigir “falhas de mercado”8, o Governo Lula por sua vez,
além de políticas horizontais, implementou políticas mais seletivas. Segundo
Delgado (2008) estas últimas exigem uma estratégia mais sofisticada de
interação público – privada:
“Quaisquer que sejam seus objetivos – equiparação, solução de problemas de coordenação econômica, ampliação do emprego, inovação, desenvolvimento tecnológico -, e seus instrumentos – subsídios, crédito, tarifas, compras do Estado, orientação dos investimentos, apoio à inovação – ela envolve o estabelecimento de laços entre o empresariado e o Estado como uma condição básica para possibilitar ganhos de informação, reciprocidade, credibilidade e confiança, que garantam eficácia às políticas e segurança aos empresários para a realização dos investimentos” (p. 129).
Ainda segundo Delgado:
“A Política Industrial, Tecnológica e de Comércio Exterior (PITCE), contudo, anunciada em 2004, reabilita a perspectiva da política
8 As chamadas “falhas de mercado” são situações ou eventos onde o equilíbrio e a otimização dos
fatores produtivos não pode ser atingida sem que haja uma intervenção externa. Há basicamente três
tipos de falhas de mercado: aquela relacionada à existência de bens públicos puros, as economias de
escala e indivisibilidades de certos bens e serviços produzidos pelo setor privado e aquela relacionada
aos bens de propriedade comum, cujo consumo não permite exclusão, como os recursos naturais. Outra
fonte das falhas de mercado é a situação onde é impossível ou muito custoso atribuir um preço ou
exercer o direito de propriedade sobre determinados benefícios que são usufruídos (externalidades
positivas, no caso), isto é, absorvidos, de forma livre pelo mercado. Em síntese, o mercado falha quando
surgem externalidades (efeitos indiretos que distorcem os preços), quando os mercados são
incompletos (impossibilidade de concorrência), quando há grande assimetria de informação ou quando
os bens públicos ou meritórios são necessários.
12
industrial e restaurou os espaços neocorporativistas de articulação entre o Estado e o empresariado, com a criação do Conselho Nacional de Desenvolvimento Industrial (CNDI), além de definir instrumentos para a formulação e execução da política, tal como a Agência Brasileira de Desenvolvimento Industrial (ABDI)... Na Política de Desenvolvimento Produtivo (PDP) do segundo quadriênio de Lula, a política industrial ...estabelece diversos mecanismos de coordenação e monitoramento da política e sinaliza para a definição de contrapartidas do setor privado...” (pag. 135).
Esta reflexão nos alerta que – além das condições de contorno – que influenciaram o uso instrumental das “arenas”, o próprio design da política deve ser considerado nos mecanismos explicativos.
Hipótese 2: O governo Lula criou e manteve “arenas” sobre a política
industrial influenciado pelo ideário “neo-desenvolvimentista”9 e
participativo e este aspecto constituiu-se na maior diferença entre os dois
períodos de governo.
Esta hipótese sugere que o governo Lula, diferentemente do Governo Cardoso,
declarou publicamente no processo eleitoral através dos debates públicos e do
programa de governo uma visão teoricamente diferenciada de desenvolvimento
econômico e participação social na gestão pública. Supostamente estas idéias
teriam exercido uma influência na criação e funcionamento das “arenas” com
maior robustez e legitimidade. Esta hipótese demanda uma distinção e um
cotejamento - parte do objeto da pesquisa – entre o ideário sobre
desenvolvimento industrial, strictu sensu, de um lado, e o ideário mais geral
sobre as condições de gestão macroeconômica, do outro lado. Pois, supõe-se
também que a eficácia do ideário “neo desenvolvimentista” (em termos muito
genéricos: a primazia da dimensão produtiva – indústria, agricultura e serviços
- sobre a dimensão financeira, numa visão de desenvolvimento nacional)
tenha sido diminuída ou parcialmente neutralizada pela crença – pública e
9 O termo “neo – desenvolvimentismo” ou “novo desenvolvimentismo” tem sido usado para designar um
conjunto de governos na América Latina que sucederam as reformas liberais dos anos noventa. Estas
governos “pós neo-liberais” estariam retomando as prerrogativas para uma maior intervenção do Estado
nos mercados e em programas sociais. A diferença fundamental com o ciclo desenvolvimentista dos anos
cinqüenta (influenciado pelas idéias da CEPAL), seria a manutenção dos fundamentos de política
econômica herdados do período anterior, basicamente o controle da inflação e da dívida pública.
Conforme Boschi, R. e Gaitan, F. (2008), esta agenda “pos liberal” permitiu a criação de “núcleos de
concertação” público-privado gerando vantagens comparativas institucionais para os países emergentes,
como o Brasil, Chile e Argentina.
13
inquestionável – do Governo Lula (na manutenção e) nos fundamentos de
política econômica do Governo Cardoso.
A segunda hipótese sugere que o Governo Lula inovou parcialmente a tradição
política pré-existente (na esfera do governo federal), por força de seu projeto
político-ideológico que enfatiza mecanismos de participação, ampliação da
democracia formal e redistribuição de renda10. Esta renovação do ideário foi
fortemente influenciada pelas condições contextuais e históricas, sobretudo a
estabilidade econômica herdada do governo anterior, as condições favoráveis
de crescimento econômico (apesar da crise internacional de 2008) e condições
políticas internas de alta governabilidade no Congresso Nacional e nos
governos estaduais. Estas “novas idéias” relacionadas a um novo estilo de
governo, com ênfase em procedimentos mais participativos e coletivos
acabaram também influenciando o campo de políticas de desenvolvimento
econômico. Conforme sugerem Boschi e Gaitán (2008), o governo Lula se
notabilizou pelas iniciativas de cooperação sistemática entre o setor público e
privado:
“ A cooperação entre as elites econômicas locais e os esforços coordenados de vários segmentos da burocracia são importantes no sentido de se definir estratégias de desenvolvimento. De fato, a cooperação entre os setores público e privado é o centro das iniciativas do governo Lula, desde o planejamento estratégico realizado no início de seu primeiro mandato até as políticas de Arranjos Produtivos Locais e as Parcerias Público-Privadas. Mais recentemente, além de uma série de conselhos de cunho consultivo, têm sido ativados um conjunto de fóruns voltados à discussão de prioridades públicas envolvendo diferentes segmentos da sociedade civil e do Estado” (p.104).
e
“O Estado brasileiro mantém uma série de mecanismos de consulta e concertação, tendo constituído, especificamente, arenas de intermediação entre o setor privado e o Estado.” (p.105)
10
Certamente o “estilo participativo” tem muita relação com a natureza político-programática do
Governo Lula – uma coalizão de centro-esquerda – como também no perfil dos ocupantes de cargos
chaves. Maria Celina D´Araujo (2009) afirma que 45% dos ocupantes de cargos comissionados (de livre
nomeação dos gestores políticos) de alto escalão do governo federal tinham origem, como o Presidente
da República, em sindicatos de trabalhadores cuja natureza per se é de decisões coletivas.
14
A literatura tem apontado para a retomada de um projeto “neo-
desenvolvimentista” com reativação do papel do Estado no processo de
desenvolvimento, ainda que em bases diferenciadas do que ocorreu nos anos
do pós guerra até a década de setenta, quando se formou o parque industrial
brasileiro.11 Esta nova hegemonia é legado direto da crise do modelo neo-
liberal na segunda metade dos anos noventa. Neste caso a criação de “arenas”
em política industrial representou um inovador processo de concepção e idéias
vinculado a um ideário democrático parcialmente que continuou e rompeu com
o legado do Governo Cardoso.
Para responder à segunda – o efeito das “arenas” sobre a política industrial -
questão propomos uma terceira hipótese:
Hipótese 3: As “arenas” modificam os incentivos racionais dos atores em
direção a uma maior cooperação.
A criação de instâncias de “concertação” – acordos e consensos básicos -
(assim como de organizações e regras) diminui consideravelmente a assimetria
de informação entre governo e empresários e o custo de transação das
negociações, como sugere a literatura de escolha racional. Houve um processo
de organização coletiva dos empresários industriais – induzindo a uma
convergência crescente entre os vários segmentos industriais - com o
surgimento de novos interlocutores e de novas “arenas” dentro do Estado12. A
cooperação e coordenação público-privada que implica em decisões mais
racionais e otimizadoras dos recursos disponíveis (desde recursos fiscais que
são renunciados em beneficio de segmentos industriais até recursos políticos
que são consumidos no processo de negociação). Com a redução de custos de
transação as políticas adquirem mais eficiência e eficácia.
11
Sobre a retomada do ideário desenvolvimentista especificamente no Governo Lula e as implicações
para a trajetória de desenvolvimento do Brasil pode-se consultar Bresser-Pereira (2003), Sallum Jr (2008),
Lima (2010), entre outros. 12
A superação da fragmentação dos grupos de pressão tem impactos além do cenário político strictu
sensu. Alguns autores identificam a fragmentação e pouco poder dos grupos de interesse (incluindo
empresários industriais), as vezes com demandas contraditórias, como funcional para os interesses do
Executivo, mas sub-otima em termos de produtividade da economia nacional. A existência de vários
níveis de governança ajudaria a criar vários “pontos de entrada” para demandas particularistas dos grupos
com diferentes acessos aos benefícios do Estado (acesso ao BNDES, por exemplo). Por outro lado esta
mesma fragmentação foi instrumentalizada pelo o governo para impor sua agenda econômica ao
Congresso. Um dos efeitos negativos da fragmentação e pouco poder dos grupos seria, por exemplo, a
alta carga tributária para financiar despesas públicas questionáveis. (Alston et alii, 2010).
15
2. O referencial teórico neo-institucionalista
“Historical institutionalism is not a cry of
despair about the complexity of the world.
Many of its most important insights can be
reduced to testable propositions that greatly
enrich our models of institutional change.”
Hall, P. (2010).
2.1 A formação de preferências e o comportamento racional
O conceito de paradigma científico kuhniano13 como um conjunto de crenças e
compromissos de uma comunidade científica, guiando a seleção de problemas
e a identificação de trajetórias metodológicas não se aplica exatamente na
ciência política. Conforme aponta Beardsley (1974), o convívio de múltiplos
pontos de vista parece ser uma característica real na análise dos sistemas
políticos. Acredita-se, com Grofman (1997), que a metáfora de que cientistas
políticos “sentam em mesas separadas” deve ser substituída pela interação
possível, embora não obrigatória entre diferentes perspectivas epistemológicas,
combinando estilos de pesquisa. Uma situação multi-paradigmática definiria
melhor o que é a ciência política, e é nesta perspectiva que serão examinados
a seguir a abordagem da “escolha racional”, do institucionalismo histórico e a
tentativa de integração metodológica. Entendemos que estes referenciais
teóricos são "roteiros abertos” para entender a complexidade representada pelo 13
Refere-se a obra de Thomas Samuel Kuhn, físico norte-americano, que publicou em 1962 o livro “A
estrutura das revoluções científicas” com grande impacto nos estudos sobre epistemologia e filosofia da
ciência. Kuhn afirmava que a ciência normal é estável até que anomaliasda realidade não consigam mais
ser explicadas satisfatoriamente. Nesta fase, chamada de ciência extraordinária, um período de
reestruturação acontece, com paradigmas em transição, contradições conceituais e conflitos cognitivos
internos. Após esta fase, retoma-se o estagio de ciência normal. Este ciclo de revoluções científicas
explicaria o avanço científico. Na ciência política o problema epistemológico parece associado
umbilicalmente a um problema ontológico, que resulta na convivência multi-paradigmática, permanente e
inevitável.
16
tema desta pesquisa: a dinâmica da relação entre atores, interesses e poder na
formulação da política industrial durante os governos Cardoso e Lula.
Apesar da grande variedade de versões, estudos e abordagens que vão desde
o estudo dos padrões de suicídio, até a explicação da freqüência à Igreja e os
casamentos (Baert 1997), a “escolha racional” (ER ou RC, em inglês) parte da
premissa de que a ação individual é feita com intencionalidade e racionalidade,
os atores agem conforme seus interesses. Para a Escolha Racional cada ator
é portador ex ante de preferências e interesses: os consumidores são
motivados pela satisfação e utilidade, os empresários pelo lucro, os
trabalhadores pela disponibilidade de bens e tempo livre e finalmente os
investidores pelas taxas de retorno, a escolha de cada segmento teria uma
“utilidade esperada” associada a níveis de risco e incerteza (Shepsle e
Bonchek, 1997). Esta utilidade, associada à probabilidades quantitativas, é a
base conceitual da ampla maioria dos modelos racionalistas de decisão.
Os indivíduos agem intencionalmente e produzem efeitos não-intencionais
(efeitos de agregação) nas ações dos demais. Um dos efeitos negativos deste
encadeamento é a possibilidade de soluções individuais sub ótimas, quando os
indivíduos acreditam que as possibilidades de ação podem ser reproduzidas
para todos os indivíduos nas mesmas circunstâncias (Elster, 1978). O “dilema
do prisioneiro” na teoria dos jogos seria um exemplo mais difundido de
comportamento subótimo.
“Racionalidade, neste contexto, significa que, ao agir e interagir, os indivíduos têm planos coerentes e tentam maximizar a satisfação de suas preferências ao mesmo tempo que minimizar os custos envolvidos. A racionalidade pressupõe, portanto, a "premissa da conectividade", isto é, o indivíduo envolvido é capaz de estabelecer um completo ordenamento das alternativas. Desta ordenação de preferências os cientistas sociais podem inferir uma "função de utilidade", que atribui um número a cada opção de acordo com a sua posição nessa ordenação de preferências.” (Baert, 1997, p. 4).
O comportamento individual é informado por preferências e convicções
subjetivas, pode-se, por exemplo, agir racionalmente baseado em falsas
crenças e suposições. A consistência das convicções depende, por sua vez, da
carga de informação disponível. Como é muito difícil reunir todas as
informações necessárias para agir com total racionalidade, o indivíduo
17
estabelece diferentes probabilidades para cada escolha alternativa, estas
probabilidades estariam associadas a diferentes níveis de risco. Assim já
podemos elencar uma síntese dos “mandamentos” do “indivíduo racional”,
seguindo o raciocínio de um clássico do tema, Anthony Downs(1957, p. 6.):
1. Ele sempre pode tomar uma decisão confrontando com um conjunto de alternativas.
2. Ele prioriza as alternativas em ordem de preferência. 3. O seu ranking de preferências é transitivo. 4. Ele escolherá sempre, entre as alternativas possíveis, aquela que estiver
na melhor posição de preferência. 5. Ele repetirá a escolha todas as vezes que as alternativas forem as
mesmas.
O enfoque da “escolha racional” tem tido inúmeras aplicações e variações
teóricas, onde cada autor parece incorporar novas contra-provas para
preservar a capacidade explicativa (mais do que preditiva) da teoria. Arrow
(1951) analisou o problema da racionalidade das escolhas sociais,
particularmente dos sistemas eleitorais, o que foi chamada do “paradoxo do
voto” ou “teorema da impossibilidade”. Um dos fenômenos é o logrolling: a
troca recíproca de apoio entre bancadas minoritárias para constituir maiorias
artificiais. Downs (1957) utilizou conceitos típicos da microeconomia (renda
marginal, função utilidade e formação de preços) para analisar as preferências
partidárias e como os eleitores formam suas estratégias de escolha. Olson
(1965) estudou como funcionam os mecanismos de ação coletiva, os incentivos
e sanções necessários para neutralizar a desmotivação natural para o
engajamento individual, os “dilemas da ação coletiva”14. Becker (1976) aplicou
14
Esta expressão foi notabilizada por Mancur Olson ao estudar os problemas de ação coletiva.
Resumidamente sua análise apontou para os seguintes fatores: (a) não-percepção: há inúmeras situações
na vida cotidiana de não convergência entre a ação imediata do indivíduo e seu interesse próprio ou
legítimo. Por ignorância das alternativas possíveis ou conseqüências futuras de determinadas escolhas os
indivíduos podem inclusive agir contra seus interesses, dificultando ações coletivas onde esta não-
percepção tem mais chance de acontecer. Além disso, há sempre o problema da informação assimétrica
entre os vários atores sociais, o foco muda conforme o posicionamento no tabuleiro do “jogo social”; (b)
defecção: ocorre quando o indivíduo abandona a ação coletiva em função de uma avaliação
custo/benefício mais favorável à ação individual. Por apatia, descrença, acomodação ou inércia os
benefícios da ação coletiva são diminuídos ou seus custos aumentados; (c) tamanho do grupo latente:
quanto maior é o grupo e mais complexo o mosaico e a composição de interesses de sub-grupos, mais
marginal será a contribuição individual. Se um grupo é muito pequeno, por outro lado, os custos
individuais de participação aumentam e os resultados do processo tendem a diminuir. A figura do free
rider ou “carona” surge, pois há um desestimulo a participação individual se os benefícios da ação
coletiva atingirão todos igualmente, participantes e não-participantes, eles não podem ser
individualizados; (d) custos altos: o primeiro deles é a busca e manutenção de informação, indispensável
para qualificar a participação, sacrifícios pessoais, alto grau de exposição individual, disponibilidade para
18
a abordagem tipicamente econômica a várias dimensões do comportamento
humano, tais como a estabilidade das preferências individuais, problemas de
maximização e a função coordenadora dos mercados. Coleman (1990)
abordou os problemas envolvidos na relação entre a ação individual,
direcionada a fins específicos e sua interação no plano social através dos
valores culturais.
A abordagem da Rational Choice tem se estabelecido, assim, como o
paradigma dominante na ciência política, sobre ela já foi dito ser a única
possibilidade de uma “ciência política verdadeiramente científica” (Riker, 1997).
De qualquer forma ela tem o mérito de abordar satisfatoriamente os micro-
fundamentos das escolhas coletivas, mas as críticas são crescentes como será
visto a seguir com mais profundidade.
A origem dos estudos institucionalistas da Escolha Racional está associada à
dificuldade dos modelos clássicos de escolha racional em explicar a ocorrência
de maiorias estáveis no Congresso norte-americano no final dos anos setenta
(Hall e Taylor, 1996). A explicação nova estava relacionada à diminuição do
custo de transação relacionado ao processo de realização dos acordos. As
instituições do Congresso (funcionamento das comissões, regras sobre a pauta
dos debates, etc.) agiriam criando incentivos para resolver os típicos problemas
de ação coletiva. Foi Oliver Williamson15 quem definiu custos de transação há
mais de trinta anos, como os custos decorrentes das imperfeições do mercado,
especialmente aquelas relacionadas às assimetrias informacionais entre
agentes, às externalidades e à fragilidade dos direitos de propriedade. Na
economia este movimento foi conhecido como a “Nova Economia Institucional”
(NEI), para diferenciar dos trabalhos de Veblen, Commons e Mitchels que no
ínício do século XX já enfatizavam o problema do funcionamento das
travar conflitos e conviver em ambientes hostis são alguns exemplos básicos; (e) lógica temporal: nos
processos de participação política geralmente os custos são imediatos e os benefícios de longo prazo, às
vezes inter geracionais. Para aprofundar a análise pode consultar Olson (1965). Ostrom tornou relativo os
argumentos de Olson estudando como comunidades que gerenciam recursos comuns (common pool
resources), como reservas de água, enfrentam problemas de ação coletiva. Nestes casos processos
crescentes de capital social, como reciprocidade e confiança, cooperação voluntária e aprendizado
coletivo costumam se estabelecer (Ostrom, 1990).
15
Williamson dividiu o Premio Nobel de Economia em 2009 com ElinorOstrom, seus estudos sobre
custos de transação, baseado nos argumentos de Coase, influenciaram uma nova teoria das organizações e
aprofundaram a crítica ao pensamento econômico neo clássico.
19
instituições para explicar problemas de funcionamento no mercado. A partir dos
anos noventa o ER se expande com os trabalhos de Gary Cox, McCubbins,
Prezeworski, Geddes e outros analisando temas distintos como a relação entre
os partidos e o legislativo, o funcionamento das coalizões políticas, estudos de
política comparativa, os conflitos étnicos, etc. Para Hall e Taylor (op.cit.) o
“institucionalismo da escolha racional” (abreviadamente: IER) apesar da grande
versatilidade dos objetos de estudo possui traços em comuns. O primeiro deles
é a análise centrada no comportamento individual ou coletivo de atores, na
formação de preferências ou interesses. Todo ator político atua de forma
utilitarista, maximizando seu próprio interesse, fazendo sempre um cálculo
estratégico que otimiza seu próprio bem estar. Este raciocínio transfere para o
campo das relações de poder, do exercício da política, quase que os mesmos
princípios da economia clássica e neo-classica, da racionalidade do homo
economicus.
Um outro princípio de análise é a idéia de que a ação política está submetida
sempre a um dilema de ação coletiva, entendido como a impossibilidade de
construir e assegurar um equilíbrio paretiano16, por conta das imperfeições
institucionais que condicionam o agir político. O exemplo do “dilema do
prisioneiro” e da “tragédia dos comuns” são exemplos clássicos deste dilema.
Um terceiro princípio de análise nos indica que o comportamento dos atores é
orientado pela interação estratégica, isto é, auto-interessada e influenciada
pelo provável ou potencial comportamento dos demais atores. As instituições
existem para restringir ou disciplinar esta interação de modo a facilitar o “jogo
político” e situações de equilíbrio na satisfação de expectativas dos diferentes
atores, se aproximando do ótimo paretiano (situação em que o acréscimo de
um benefício individual qualquer irá diminuir o benefício coletivo). O papel das
instituições também compõe um conceito peculiar para o IER. As instituições
são criadas somente se suas funções assegurarem em algum grau a solução
para os dilemas de ação coletiva, criando incentivos para a cooperação, como
16
Vilfredo Pareto foi um economista e sociólogo italiano do início do século XX. De origem
aristocrática, que fez estudos sobre economia, mais tarde conhecidos como “Lei de Pareto” ou “ótimo de
Pareto”: um sistema atinge estágio ótimo ou equilibrado, quando nenhum dos seus elementos (ou agentes)
pode melhorar de posição, sem que qualquer outro piore ou tenha benefícios diminuídos. Pareto constatou
que80% da riqueza era apropriado por 20% da população, no que resultou, atualmente num outro
princípio muito difundido em teorias administrativas.
20
um “acordo voluntário” entre os diversos agentes em benefício de todos
envolvidos. Assim instituições tão diferentes como a constituição inglesa de
1688 ou o funcionamento das comissões no Congresso norte americano são
justificadas em relação a sua funcionalidade em manter mecanismos de
cooperação e coordenação entre atores, diminuindo custos de transação e
garantindo direitos de propriedade. O conceito de instituição na literatura
institucionalista ainda é muito fluido, vejamos por exemplo, as observações de
Elinor Ostrom (2007):
“It is hard to make much progress in the study of institutions if scholars define the term “institution” as meaning almost anything. A major confusion exists between scholars who use the term to refer to an organizational entity such as the U.S. Congress, a business firm, a political party, or a family, and scholars who use the term to refer to the rules, norms, and strategies adopted by individuals operating whitin or across organizations… I will use the term “institution … to the shared concepts used by humans in repetitive situations organized by rules, norms and strategies...”
E ela segue:
“By rules, I mean shared prescriptions (mus, must not or may) that are mutually understood and predictably enforced in particular situations by agents responsible for monitoring conduct and for imposing sanctions. By norms, I mean shared prescriptions that tend to be enforced by the participants themselves through internally and externally imposed costs an inducements…”
E finalmente:
“By strategies, I mean the regularized plans that individuals make within the structure of incentives produced b rules, norms and expectations of the likely behavior of other in a situation affected by relevant physical and material conditions”. (p 23).
Ostrom propõe um esquema interpretativo sobre a mudança social (Ostrom,
2002) que combina elementos do racionalismo convencional com temas
relacionados à assimetria na distribuição do poder, sofisticando o modelo
original.
21
Nesta perspectiva a determinação da preferência e do comportamento político
dos atores é basicamente exógena e induzida por fatores pré-determinados.
Estes fatores estão relacionados ao cálculo de maximização de satisfação,
seguindo o princípio da economia política clássica e neo-classica. Cada
indivíduo teria uma “função de preferências” que orientaria um comportamento
estratégico. Isto implicaria que todas as opções e informações sobre custos e
benefícios das escolhas disponíveis fossem conhecidas pelo tomador de
decisões. Nesta perspectiva as instituições só se justificam, são criadas,
evoluem e se mantém somente se conseguem diminuir o custo de obtenção
destas informações, facilitando o comportamento estratégico dos atores,
viabilizando mais previsibilidade e estabilidade ao comportamento individual ou
coletivo, incluindo as interações com os demais agentes políticos. Nesta
abordagem a origem das instituições é retrospectiva, isto é, as causas da
origem de uma instituição é explicada pelos efeitos de sua existência.
Na visão de Hall e Taylor (op.cit.) isto limitaria o potencial explicativo do IER.
Nem sempre, segundo eles, as instituições são resultados automáticos de
soluções dos dilemas de ação coletiva, nem os atores teriam ciência prévia de
todas as alternativas e possibilidades para voluntariamente empreender a
criação de instituições. A teoria funcionaria melhor em contextos onde haja
consenso e cooperação ex ante ou situações altamente concorrenciais como o
mercado.
2.1.1 Síntese das principais categorias do institucionalismo da escolha
racional:
22
Conceito de instituição: as instituições resultam de uma estratégia para
superar os dilemas de ação coletiva, ao contrário do institucionalismo histórico,
onde as estratégias resultam de instituições. A instituição ao coordenar a ação
dos atores ex ante através do fluxo de informações, viabiliza um baixo custo de
transação e garante a vigência dos direitos de propriedade. Ou seja, as
instituições são arranjos formais de agregação de indivíduos e de regulação de
comportamentos individuais e coletivos, os quais,mediante o uso de regras
explícitas e de processos decisórios, são executados por um ator ou conjunto
de atores formalmente reconhecidos como portadores deste poder. O padrão
para analisar e avaliar as instituições é sua instrumentalidade estabilizadora,
em suma, as instituições previnem o caos.
Formação de preferências:os atores são reacionais e agem estrategicamente
maximizando seu auto-interesse, as preferências são formadas indutivamente
a partir de um modelo abstrato e prévio de interesses que são transitivos. As
preferências são formadas exogenamente e são transitivas entre si. A
agregação de preferência pode ocorrer, mas de maneira sempre imperfeita ou
sub ótima (a “impossibilidade de Arrow”, como uma generalização do
“paradoxo de Condorcet”)17.
Mudança Institucional: ocorre quando as instituições não são mais funcionais
à otimização dos interesses dos agentes participantes. Grupos e indivíduos
modificam seus interesses e preferências refletindo em novas coalizões que
vão atuar sobre as regras institucionais, para mantê-las ou modificá-las. O
calculo estratégico que determina as mudanças é a percepção da relação entre
benefícios futuros e custos atuais.
2.2 A “crítica racionalista” ao institucionalismo da rational choice
17
Teorema da Impossibilidade de Arrow: é impossível fazer comparações inter-individuais de utilidade e
compor uma “função de bem estar social” coletiva. Assim o procedimento democrático gera
inconsistências no processo de escolha que seria essencialmente arbitrário e instável, ou seja, irracional. O
“paradoxo de Condorcet” sugere que há sempre distorções entre a vontade individual (mesmo com
preferências transitivas e completas)e os resultados coletivos. Os dois argumentos tem ampla implicação
sobre as teorias do voto, os modelos de decisão e o problema da representação democrática.
23
O debate sobre o racionalismo na ciência política e sobre o racionalismo no
debate institucionalista vem de longa data. Sem a pretensão de exaurir o tema,
vamos comentar as críticas feitas pelos principais autores, sem contudo,
romper totalmente com este paradigma. Sem desconhecer o papel que a
Escolha Racional teve ao retomar aspectos subjetivos e reflexivos no
comportamento humano, Boudon (2002) critica fortemente o caráter utilitarista
e instrumental desta abordagem. Para o sociólogo francês os indivíduos não
são portadores passivos de fatos coletivos (correntes estruturalistas), nem a
sociedade seria um “conjunto de átomos” (racionalismo), a ação racional só
poderia ser entendida na relação como o contexto social. Mais do que o critério
custo-benefício, o indivíduo age sob a “força de argumentos” dentro de seu
universo cognitivo e axiológico. Para Boudon a ação social racional ocorre
orientada por ideologias (“pacotes de idéias”) que nunca são tema de reflexão
para os indivíduos. É um conceito parecido com os “atalhos cognitivos” de
Simon comentados adiante.18
Outra crítica consistente acusa a Escolha Racional de dar sentido aos seus
argumentos lançando mão de uma racionalidade ex post facto. Se
aproximando de uma vocação quase-funcionalista a Escolha Racional tenta
“conferir um sentido racional” a processos que não aparentam seguir padrão
algum de conduta prévia, para “imunizar suas teorias contra potenciais
falsificações” (Baert, op. cit. p. 4). Confirmações a posteriori não podem ser, a
rigor, validadas empiricamente (as pessoas superestimam o impacto de suas
ações, p. exemplo), além disso, observações mutuamente exclusivas (do tipo
cooperação ou defecção, voto ou abstenção) não são falsificáveis.
Na mesma linha Green e Shappiro (1994), reafirmam os problemas
metodológicos na Escolha Racional relacionados à seleção das evidências, à
ignorância intencional sobre fatos não explicados, à pobreza de testes
empíricos e ao viés de seleção das amostras (tendenciosidade). Analisando as
obras de Arrow, Downs e Olson estes autores questionam a auto-nomeação da
RC (Rational Choice) como uma “teoria científica de validade universal” dada a
não-testabilidade de suas hipóteses (dedutivismo). Caberia registrar que a
18
Para aprofundar as críticas de Boudon ao modelo clássico de RationalChoice, traçando um paralelo
com outras críticas do tipo “racional compreensivo” sugere-se consultar o texto “Racionalidade e Retórica
– teoria discursiva da ação coletiva”, de Raul Magalhães, Clio Edições Eletrônicas, UFJF/MG.
24
crítica destes autores se coloca como uma crítica “de dentro” do modelo, isto é,
advogam ao fim e ao cabo, um aperfeiçoamento metodológico da RC, ou ela
muda suas suposições para tornar-se mais realística ou mantendo seus
pressupostos, abandona as pretensões de universalidade.
Considerando exatamente este aspecto que muitas críticas de fato não
rompem com os pressupostos da RC, mas os complexificam tentando ampliar
sua capacidade explicativa. Herbert Simon (1967), criticando a abordagem
tradicional da “escolha racional” argumentou que a capacidade de organização
e análise de informações dos indivíduos é muito menor que a teoria da decisão
racional havia suposto. Ele levantou limites biológicos e ambientais que limitam
a efetividade da escolha racional.
"(...) Because of the psychological limits of the organism (particulary with respect to computational and predictive ability), actual human rationality-striving can at best be an extremely crude and simplified approximation to the kind of global rationality that is implied, for example by game-theoretical models, while the approximations that organisms employ may not be the best - even at the levels of computational complexity they are able to handle - it is probable that a great deal can be learned about possible mechanisms from an examination of the schemes of approximations that are actually employed by human and other organisms." (Simon, 1967, p. 243)
Segundo a abordagem assim chamada, bounded rationality, as escolhas
podem ser satisfatórias, embora sejam subótimas. A racionalidade seria assim
um processo de sucessivas adaptações ao meio entre metas e objetivos
possíveis. Simon introduziu o tema da limitação cognitiva e da complexidade do
ambiente externo. Assim os indivíduos e as organizações desenvolvem
“atalhos”e “rotinas cognitivas” que funcionam como sistemas de apoio ao
processo decisório. Em contextos democráticos, por exemplo, os eleitores
mudam as escolhas (choice reversals), nem tanto as crenças ou preferências,
conforme mudanças no ambiente político geradas por “n” fatores, como a ação
das lideranças, o papel da mídia, novos atores e polêmicas públicas, questões
emocionais e simbólicas (Jones, 1994). Assim, o tempo e a quantidade de
informações não são fatores suficientes para que o indivíduo faça todas as
ponderações sobre todas alternativas disponíveis. Ele usa padrões
25
operacionais prévios (shortcuts) para decidir. Definitivamente o comportamento
manifesto, segundo estas críticas,não expressaria suas reais preferências.
A contribuição da crítica de Simon aos princípios restritos das teses originais da
escola clássica e neoclássica (a defesa do homo economicus), acabou se
tornando um lugar comum para várias perspectivas posteriores à Escola
Racional, inclusive as novas correntes do institucionalismo, conforme
observado há mais de vinte anos por Herbert Simon:
“Today, we have a large mass of descriptive data, from both laboratory and field, that show how human problem solving and decision making actually take place in a wide variety of situations. A number of theories have been constructed to account for these data, and while these theories certainly do not yet constitute a single coherent whole, there is much in common among them. In one way or another, they incorporate the notions of bounded rationality: the need to search for decision alternatives, the replacement of optimization by targets and satisficing goals, and mechanisms of learning and adaptation. If our interest lies in descriptive decision theory (or even normative decision theory), it is now entirely clear that the classical and neoclassical theories have been replaced by a superior alternative that provides us with a much closer approximation to what is actually going on.” (Simon, 1979, p. 510)
A idéia de indivíduos otimizadores, auto interessados, maximizadores de
utilidade, em competição por recursos escassos é a base do “indivíduo
racional”. Como vimos estes argumentos estilizam a realidade, são modelos
muito abstratos e auto referenciados, isto é, eles são válidos desde que o
observador (ou pesquisador) acredite nos seus pressupostos. No limite o
racionalismo extremado nos conduziria a uma situação de impossibilidade de
escolhas coletivas, de objetivos comuns, de formação da vontade geral
roussoniana. A abordagem racional sugere – no limite -que existem apenas
indivíduos e “organizações”, o “Estado” não surgiu historicamente das
necessidades de controlar um excedente econômico ou para regular a vida
coletiva, mas da necessidade de reduzir os “custos de transação” entre
burocratas e políticos para garantir eficácia às trocas de mercado.
Para o racionalismo o Estado, povoado por free-riders e rent-seekers, é quase
um “mal necessário”,tolerável desde que não represente riscos para a
“transitividade das escolhas individuais”. Ou como já disse Coase, se os custos
26
de transação forem baixos e os direitos de propriedade plenos e assegurados,
então o Governo seria quase dispensável. É claro que há uma variação
imensa de autores racionalistas, alguns contraditórios, outros muito
sofisticados, mas em síntese, o racionalismo coloca o Estado como o “pólo
ruim” na relação Estado/Sociedade. Uma destes visões alternativas é proposta
por Terry Moe. A tese deste autor é basicamente a seguinte: a relações entre
instituições e entre indivíduos e instituições (o Estado, por exemplo), pode
reduzir a uma cooperação (complementariedade, parceria, etc.) ou ao conflito,
dependendo da direção e natureza das relações de poder. Moe (2005) critica a
abordagem clássica na economia e na ciência política exatamente por
colocarem na periferia o “tema do poder”. Como podem indivíduos auto
interessados e oportunistas superar seus problemas de ação coletiva para
cooperar num jogo de “ganha-ganha” ? Moe responde como os racionalistas e
neo institucionalistas: são as organizações (como equivalente às instituições).
Mas acrescenta: há o problema da assimetria de informação, da assimetria de
poder entre os agentes. Vai mais além, diz que as variáveis como a autoridade
política legitimada por escolhas coletivas (eleições) e o jogo de interesses, de
projetos, as barganhas políticas são variáveis que nos conduzem para uma
conclusão simples e poderosa: instituições políticas são mais do que apenas
estruturas de cooperação, são também e principalmente estruturas de poder.
Para Moe cooperação e poder são parceiros obrigatórios num sistema
democrático, onde perdedores e vencedores tem sistemas de compensação e
auto-limitações. Ele diz:
“In democratic politics, cooperation and power are two sides of the same coin: cooperation makes the exercise of power possible, and the exercise of power often motivates the cooperation. To focus on cooperation alone, then, is to miss the essence of what is going on as democratic institutions are being created and designed…Power is typically just an add-on to the underlying cooperationist theory, playing a peripheral role that leaves the fundamentals of voluntarism and mutual benefit unchanged. Predation and other downsides of power are acknowledged, but the focus tends to be on cooperative solutions that lead todemocracy, the rule of law, protection of property rights, and economic growth.” (Moe, 2005, p.229).
Assim como Simon, Moe e outros autores mais contemporâneos, sem invalidar
a lógica da escolha racional, oferecem explicações sobre algumas de suas
27
principais falhas, sobretudo, para superar seu grau de irrealismo original. Em
realidade, como será abordado adiante, a evolução teórica do racionalismo
institucionalista criou muitas conexões e convergências com os demais
“institucionalismos”. Faz parte do nossos objetivos tentar construir uma
abordagem de aplicação integrada entre a vertente histórica e racionalista,
evitando as armadilhas do ecletismo e da mera justaposição de conceitos.
Sintetizando e sistematizando as principais críticas ao institucionalismo da
escolha racional (na sua forma mais ortodoxa), seriam as seguintes:
(a) Os interesses e preferências dos atores não são formados
exogenamente às instituições, nem seguiriam uma “lógica de
maximização”;
(b) Os limites impostos pelas deficiências cognitivas dos atores e pela
assimetria de informações só permitem soluções aproximativas e sub-
ótimas;
(c) A mudança nas instituições não ocorre somente quando se elevam
custos de transação ou as instituições não podem mais assegurar a
vigência de compromissos e regras de conduta, mas também, por
fatores históricos, culturais ou simbólicos;
2.3 O contexto histórico e a dependência da trajetória
A dificuldade das abordagens pluralistas e comportamentalistas em explicar a
distribuição desigual de recursos de poder ajudou a construir uma abordagem
teórica diferenciada desde o final dos anos sessenta. Hall e Taylor atribuem o
aparecimento do termo “institucionalismo histórico” (abreviadamente: IH) a obra
organizada por Sven Steinmo, Katheleen Thelen e Frank Longstreth, publicada
em 199219. Estes autores centravam a análise da evolução de estruturas
econômicas e comunidades políticas como categorias centrais na análise
política. Influenciados pelo funcionalismo e pelo estruturalismo marxista os
primeiros estudos concentraram atenção no Estado, não mais como agente
19
Structuring Politics. Historical Institutionalism in Comparative Analysis, Cambridge Press.
28
neutro, mas como um complexo de instituições interagindo em contextos
culturais, econômicos, políticos e sociais com outros grupos em condições de
assimetria de poder.
O institucionalismo histórico vai tentar entender porque os grupos de interesse
demandam políticas diferenciadas em diferentes países ou num mesmo país
em épocas diferentes. As diferenças estariam associadas a diferentes redes,
estruturas e aparatos institucionais. É uma abordagem sem pretensão de
generalização ampla, são categorias analíticas de médio alcance20 tais como
os arranjos corporativos, as “redes de políticas”21, a relação entre burocratas e
empresários, as estruturas dos partidos, a atuação de atores no contexto
nacionais e internacional. Muitos estudos são de natureza comparativa,
analisando países diferentes, ou épocas diferentes num mesmo país.Nas
palavras de Theleen e Steinmo (1992):
“historical institutionalists generally develop their hypotheses more inductively, in the course of interpreting the empirical material itself. The more inductive approach of historical institutionalists reflects a different approach to the study of politics that essentially rejects the idea that political behavior can be analyzed with the same techniques that may be useful in economics” (pg 12, op.cit.).
Esta abordagem define instituições como o conjunto de procedimentos,
protocolos, normas e convenções formais e não-formais que orientam o
comportamento dos atores e formam suas preferências. Para Thelen e Streeck
(2004) instituições são processos sociais com regras que fixam o 20
A expressão “médio alcance” está relacionada ao conceito de middle range theory, desenvolvido pelo
sociólogo norte americano Robert Merton. Ele propunha um ajuste mais adequado entre a carga empírica
e a formulação teórica no processo de pesquisa. Enfatizando aqueles conceitos ou teorias que –sem a
pretensão de fornecer explicações sobre todas as dimensões da vida humana – se concentram em aspectos
particulares, mecanismos ou processos sociais, Merton advertia sobre as generalizações muito amplas.
21 O conceito de “redes de política” está associado na literatura de políticas públicas, a uma
contraposição ao racionalismo, na medida em que a análise envolve contextos de informação imperfeita
em processos de aprendizagem e experiência histórica acumulada. Bonafont (2004), apoiada no
incrementalismo (Lindblom), na formação da agenda (Kingdon), no conceito de coalizões de defesa
(Sabatier) e no instititucionalismo, conceitua policy network como “um conjunto de relações estáveis
entre atores públicos e privados que interagem através de uma estrutura hierárquica e interdependente
para atingir objetivos comuns...se converte em forum privilegiado onde se trocam recursos e informação e
se elaboram propostas”. (p.36) Há implícita uma visão de “ausência” ou diminuição do papel estratégico
do Estado e da visão neo-corporativa convencional. O conceito existe há décadas na teoria política, mas
ainda é muito elástico e sujeito a diversas tipologias. Pode ser combinado, como um caso especial, por
exemplo, à noção de “triângulos de ferro” (Iron Trangle), cunhada por Theodore Lowi em 1964 para
análise das relações entre governo, Congresso e grupos de interesse ou ao conceito de “redes temáticas”
(issues networks) de Hugh Heclo (Modern social politics in Britain and Sweden: from relief to income
maintenance, New Haven, Yale University Press, 1974).
29
comportamento esperado e neutralizam ou eliminam os comportamentos
indesejados. As instituições adotam regimes de normas e regras, porém existe
sempre um gap, uma distância entre o conjunto de regras e sua implementação
pelos agentes, aqui há espaço para a atuação estratégica dos atores em
mudanças que podem ser incrementais ou endógenas. Dizem eles, que o que
definem uma instituição é a contínua interação entre aqueles que produzem
regras e aqueles que seguem as regras quando cada nova interpretação das
regras pode ser descoberta, inventada, sugerida, rejeitada ou adotada. É uma
visão dinâmica de contínua criação e recriação por atores com interesses
convergentes ou divergentes, em graus de poder diferenciados e com limites
cognitivos, em comportamentos imprevisíveis, contingentes que só podem ser
entendidos quando de fato, acontecem.
Segundo, Hall e Taylor (op. cit.), em que pese a grande diversidade de estudos
em IH podemos identificar grandes padrões nos estudos que (a) relacionam o
comportamento individual com as instituições de forma muito geral e indireta,
(b) enfatizam sempre as assimetrias de poder entre instituições e/ou atores, (c)
explicam o processo de formação de preferências e comportamento político a
partir do desenvolvimento institucional e histórico, identificando as
dependências da trajetória de cada ator e instituição22, (d) os processos de
mudança são em geral incrementais, porém choques internos ou externos,
como novas idéias ou mudanças de poder podem induzir mudanças mais
abruptas, sejam endógenas ou exógenas.
Neste perspectiva, o comportamento dos atores não é otimizador, nem
totalmente estratégico. Ainda que os institucionalistas históricos reconheçam
de um modo geral que o comportamento é orientado para fins e busca uma
racionalidade, as preferências são endogenamente determinadas, isto é, a
racionalidade sempre será limitada e condicionada por fatores intrínsecos ao
próprio processo político. Haveria outras racionalidades alternativas ou
contextuais, mesmo a racionalidade instrumental é historicamente determinada,
inclusive por idéias que influenciam o comportamento social (Immergut, 1998).
As instituições interagem com seu contexto, criam identidades, símbolos,
22
A origem do conceito de path dependence está relacionada aos estudos sobre economia do
desenvolvimento e o impacto da tecnologia, particularmente em David (1985), retomada por North (1990)
para analisar a evolução das instituições econômicas.
30
cenários, filtros de interpretação para os atores. Elas fazem muito mais do que
diminuir os custos de transação, elas criam identidades. Na abordagem do IH
as instituições não são elementos neutros de simples coordenação que só se
justificariam para manter o equilíbrio de preferências exógenas entre os
agentes envolvidos. Elas não seriam simples instrumentos funcionais para
solucionar problemas de ação coletiva, mas campos de batalha, “arenas”
complexas onde os conflitos e a luta pelo poder se realizam
A abordagem da mudança política está relacionada a outra abordagem
presente na literatura institucionalista, conhecida como “equilíbrio pontuado” ou
punctuated equilibrium, usada para analisar mudanças sobretudo na análise de
políticas públicas. Baumgartner e Jones (1993), inspirados na teoria biológica
homônima desenvolvida por paleontólogos, sugerem que as políticas que se
desenvolvem por longos períodos de estabilidade são pontuadas, esporádica e
randomicamente, por períodos de instabilidade. Estes períodos resultariam em
mudanças repentinas, abruptas e radicais no sistema político, Estado ou
sociedade, conduzindo a novos patamares de equilíbrio e estabilidade. Em
determinado ponto algumas idéias podem encontrar eco em indivíduos ou
grupos dominantes, por algum motivo elas produzem uma rápida mudança
(punctuations) do status quo político. Os autores chamam de efeito cascata
(bandwagon) a disseminação rápida de novas preferências e comportamentos
políticos. Pensado inicialmente para tentar explicar o processo político norte
americano, o modelo sinaliza que enquanto agentes governamentais
protagonizam os macro processos mais importantes (a condução de uma
política pública qualquer,por exemplo), há em paralelo diversos micro-sistemas
políticos operando por comunidades de políticas. Os movimentos de ruptura
geralmente acontecem quando um destes micro-sistemas consegue entrar
nesta agenda de maior centralidade. Indivíduos e grupos lutam
permanentemente pelo monopólio das visões políticas, influenciados pela
estrutura institucional e pelos valores políticos da comunidade. A chave para o
entendimento da mudança – neste modelo – seria como os atores fazem esta
transição do micro para o macro sistema, criando uma nova idéia dominante,
denominada policy image. A fundamentação para uma nova “imagem de uma
política” (um novo conceito) seria seu embasamento em informações empíricas
31
(fatos) e fatores emotivos. O exemplo dado pelos autores é emblemático,
tratava-se da associação que os defensores do programa nuclear norte-
americano faziam com o progresso científico do país. Quando as preocupações
ambientais ganharam relevância, aquela policy image rapidamente se deteriora
e resulta em perda de prestígio da comunidade que a defendia. Entretanto;
para que uma nova idéia emergente se consolide será necessário sempre a
ocorrência de um empreendedor político, individual ou coletivo, capaz de fazer
a ligação entre problemas e soluções no processo político. Aqui a relevância
sobre o entendimento de uma certa questão ou política é fundamental,
retomaremos esta perspectiva mais adiante no debate sobre a força das novas
idéias e a mudança institucional.
Uma outra característica – a dependência da trajetória – também possui
nuances diversificados na literatura institucionalista. Há visões mais
determinísticas, que atribuem somente a força de eventos exógenos a
capacidade de mudara trajetória institucional (Pierson, 2004). Outros, não-
deterministas, admitem processos mais adaptativos relacionados as mudanças
exógenas, mas também endógenas, enfatizando mais o momento e a
sequência de eventos, do que o processo permanente de auto-reforço
institucional. Pierson, entre outros autores, chama de positive feedback os
processos políticos que geram benefícios associados aos fatores de
permanência e resiliência institucional23. A realimentação positiva nos
processos políticos significa que quanto maior o tempo numa trajetória dada,
maiores deverão ser os custos de reversão ou de retorno a uma fase anterior
ou inicial. Para Pierson (op.cit.) estes mecanismos são sustentados por vários
motivos, entre os quais: (1) os custos para o início ou construção inicial de uma
instituição; (2) os custos de aprendizagem sobre um sistema ou instituição; (3)
os efeitos das sinergias ou complementariedades entre instituições, que North
(1990) chama de “matrizes institucionais”,situação em que várias instituições se
apóiam simultaneamente e (4) uma tendência para os atores construírem
23
“resiliência” é uma das categorias propostas por Ostrom (2005) para analisar a ação dos indivíduos
como primeiro passo do modelo denominado “Institutional Analysis and Development (IAD)”:
“resilience is defined as the amount of disruption needed to transform a system from stability domain
(characterized by a configuration of mutually reinforcing process and structures) to another...resilience
was initially defined related to ecological systems” (p.67)
32
expectativas sobre o futuro que orientam suas ações de forma adaptativa, com
base na aprendizagem, na reputação e na experiência passada.
Para Thelen e Streeck (2004) o processo de mudança pode ser incremental ou
abrupto, ainda que os autores enfatizem a mudança incremental. Para estes
autores a mudança institucional pode acontecer de diferentes formas e ritmos.
A primeira possibilidade sugerida é o que eles denominam de (1) displacement,
ou seja, as instituições possuem internamente incoerências, arranjos internos
conflitantes, a mudança ocorre quando novos arranjos de normas, regras ou
idéias, deslocam os velhos arranjos. Novos atores assumem o protagonismo,
muitas vezes antigas idéias ou instituições são reabilitadas e ocupam novas
centralidades. Um segunda forma de mudança é a (2) layering, que traduz a
introdução de novas normas, convenções e regras que são “acomodadas”
sobre as que já existem. Normalmente a acomodação é incremental e
progressiva, utilizando uma estratégia que evite a resistência das formas
antigas. Instituições antigas passam a “acolher” novas funcionalidades, novos
atores. Uma terceira forma é o que os autores chamam de (3) drift, isto é,uma
“flutuação” das regras em virtude de mudanças no ambiente. É o caso de
instituições que são incapazes de absorver choques externos ou internos, não
conseguem recalibrar ou renegociar seus acordos e conflitos e tendem a
erosão e atrofia de suas funcionalidades, fazendo com que os atores e suas
agendas percam legitimidade. Por fim uma quarta forma de mudança
institucional proposta é a (4) conversion, que traduz a conversão da instituição
para novos interesses, objetivos e regras. Estas mudanças podem derivar de
novas condições ambientais, as vezes efeitos não intencionais dos atores, ou
surgimento de novas atores que mudam as relações de poder.Thelen e Streeck
ainda sugerem uma situação em que as instituições não conseguem superar
contradições internas e estruturais e caminham para sua extinção (exhaustion)
que normalmente é lenta e gradual.
Em obra mais recente, Thelen e Mahoney (2010) aprofundam a discussão
sobre a mudança institucional. O processo de mudanças seria explicado quase
sempre pela ocorrência de eventos em três planos distintos: a evolução do
contexto político, a natureza das características das instituições existentes e o
tipo de ator político centralmente dominante. O problema do poder está ligado à
33
evolução do contexto político. Para os institucionalistas históricos de um modo
geral as questões relacionadas ao poder são mais importantes que os efeitos
coordenadores da instituição valorizados pelos institucionalistas da escolha
racional. A mudança institucional sempre esbarra no poder de veto daqueles
atores que defendem os fatores de permanência, ou o status quo. Quanto
maior o poder de veto destes atores, maiores os custos associados ao
processo de mudança, mas estes custos são assimetricamente distribuídos
entre os atores. A natureza institucional pode influenciar o processo de
mudança na medida em que o grau de discricionariedade, de enforcement,
legal ou não. Quanto menor a distância entre a regra e a interpretação e o agir
dos atores, menores serão as possibilidades de atuação conflitiva,
independente ou contestatória dos agentes. Porém, com a racionalidade das
regras, normas e estratégias e o agir dos atores sociais sempre será limitado
cognitivamente, será impossível evitar o surgimento de contradições e
desequilíbrios institucionais. Thelen e Mahoney sugerem uma tipologia de
atores para definir parâmetros de mudança institucional. Há os atores (1)
insurgentes, que conduzem as instituições a rupturas, que deslocam
abruptamente as regras e rejeitam o espaço de possibilidades fixados pelo
quadro institucional; (2) os simbiontes (ou simbióticos), que a semelhança dos
parasitas, numa condição de acomodação ou sedimentação de novas regras,
normas ou convenções se ajustam para obtenção de ganhos privados. Estes
atores podem ter dois comportamentos, no limite, preservam a estabilidade
institucional para manter seus próprios ganhos ou em função disso,
comprometem a continuidade institucional. Há também os (3) subversivos,
atores que buscam a mudança, porém sem comprometer a existência da
instituição, trabalhando “por dentro” do sistema de status quo. Eles são
dominantes num cenário de mudança do tipo layering, onde a instituição acolhe
novas regras que são acomodadas sem conflitos estruturais sobre as antigas.
Por fim, os autores sugerem a existência de um ator do tipo (4) oportunistas
que tem uma relação ambígua com a instituição. Eles reforçam a ambigüidade
das regras e o espaço para interpretações em proveito próprio. A seguir o
quadro resumo proposto pelos autores:
34
Quadro 1
Fatores institucionais e contextuais da mudança institucional
Fonte: Mahoney e Theleen (2010, p. 09)
Na trajetória epistêmica do institucionalismo histórico, e em grande medida no
de inspiração racionalista, o papel das novas idéias e dos roteiros cognitivos foi
sempre fundamental. No estudo clássico de Hall sobre a disseminação de
idéias keynesianas em diversos países no período entre-guerras, fica evidente
a importância desta variável na definição de preferências, comportamentos e
instituições (Hall, 1989). Ele vai identificar três grandes mecanismos causais
que podem explicar as diferenças de difusão em cada contexto nacional: uma
centrada na economia, outra centrada na ação do Estado e finalmente uma
terceira centrada em coalizões. A primeira focaliza o papel exercido pelo
conhecimento técnico, especializado, em especial dos economistas. Aqui o
central é o compartilhamento de princípios em comunidades ou redes que
formulam políticas públicas. A segunda, centrada no Estado, vai depender das
configurações institucionais, do tipo de instâncias decisórias, do grau de
abertura para novos participantes, da qualificação da burocracia estatal (aqui
vê-se a influencia de Peter Evans) e do modo como acontece o processo
decisório estatal e governamental. A terceira explicação reside na capacidade e
habilidade de cada regime político em construir coalizões de sustentação de
novos experimentos políticos.
Hall sugere alguns fatores para entender o impacto de novas idéias sobre as
políticas: a orientação do partido no governo, a estrutura do Estado e relações
com a Sociedade, o tipo de discurso político e o impacto de eventos exógenos.
Em relação ao Estado, que guarda relação próxima com os objetivos desta
tese, Hall sinaliza que não é condição suficiente a existência de
empreendedores políticos se as estruturas estatais não são ocupadas por
35
gestores públicos com autoridade e capacidade técnica para implementar
mudanças no programa, no ideário. São variáveis explicativas interessantes,
segundo o autor, (a) a permeabilidade dos funcionários ao novo; a (b) maior ou
menor concentração de poder na área em que as novas idéias serão
recepcionadas e (c) o poder do órgão ou agência envolvida (naquele caso
específico, os bancos centrais nacionais). O impacto das novas idéias
relacionado à natureza do discurso político dependeria de quanto estas idéias
dialogam com a memória coletiva, com experiências passadas, à diferentes
semânticas políticas ou mimetizando modelos de sucesso ou percebidos como
tal24. A capacidade efetiva que novas idéias tem ou não de condicionar ou
influenciar preferências, interesses e mudanças institucionais depende de quais
arranjos (matrizes) institucionais prévias estavam operando e do curso prévio
de ação dos atores sociais relevantes.
Sikkink (1991), na trilha sugerida por Hall, aplica este mesmo raciocínio na
tentativa de entendimento do porquê das idéias desenvolvimentistas apesar de
terem sido divulgadas quase que simultaneamente na Argentina e no Brasil nos
anos cinqüenta, só tiveram recepção mais efetiva neste último. Ela constrói os
nexos causais desta diferença em múltiplos eventos: no Brasil havia tomadores
de decisão (empreendedores ou pivotal decision makers, nos termos de
Weingast, 2005), na Argentina, não; no Brasil havia mais state capacity, uma
burocracia mais adaptada (o caso do BNDES foi emblemático); a ideologia e as
instituições pré-existentes recepcionaram as idéias desenvolvimentistas (uma
espécie de harmonização com o zeitgeist ou o spri de l’époque) ao contrário da
Argentina. Sikkink reforça Hall: novas idéias não entram num “vácuo
ideológico”, elas são inseridas num espaço político já ocupado por ideologias
anteriores. Outro exemplo, a evolução do modelo de bem estar sueco,
analisado por Blyth (2001), confirma as mesmas teses do modelo ideativo ou
discursivo. Neste caso a capacidade do Estado em garantir um sistema de
partilhas dos benefícios do crescimento entre empresários e trabalhadores foi
determinante para o modelo de bem estar até os anos oitenta. Blyth alerta que
em certos contextos as idéias ganham autonomias dos seus autores e podem
24
Sobre o papel desempenhado pelos processos de mimetização (mimicking) de modelos de sucesso,
sobretudo de receituários prescritivos de organismos internacionais e a construção discursiva de um
“modelo de sucesso” ver o interessante artigo de Tapia e Gomes (2008).
36
ser disseminadas em processos que não são lineares, são lentos e custos,
como foi o processo de adaptação do welfarestate sueco aos parâmetros de
um sistema com menor protagonismo estatal.
Para Vivian Schmidt (2008) as idéias são os elementos-chave na análise dos
contextos mais amplos onde ocorremos eventos políticos. As idéias não só se
relacionam com as estruturas de poder, mas permitem a possibilidade de
agência dos atores, quando comandam e servem como “guia” para a escolha,
para a ação e para o comportamento individual ou coletivo. A despeito do uso
pejorativo do termo atribuído às correntes pós-modernas, o discurso dos atores
importa para entender as relações de dominância, diferenciação e poder.
Schmidt sugere uma tipologia: discursos coordenativos que surgem na
formulação das políticas e discursos comunicativos na apresentação e
deliberação de políticas. A autora se propõe a entender o “contexto institucional
das idéias”, isto é, “para quem”, “como” e “quando” se diz, se comunica, vis a
vis, o sentido que as idéias adquirem (ou não) vinculadas a um contexto
imanente e material (background). O foco em idéias permitiria ao pesquisador
identificar com maior rigor a capacidade de agência dos atores, mais que nas
formas histórica e sociológica do institucionalismo.
2.3.1 Síntese das principais categorias do institucionalismo histórico:
Conceito de instituições: instituições são regras, convenções, normas,
organizações, formais ou informais, com capacidade de coação que resultam
de processos históricos e contextuais e que produzem um condicionamento ou
um direcionamento sobre o comportamento presente e futuro dos atores
sociais.
Dependência da trajetória: a evolução das instituições é fortemente
dependente da trajetória (path dependence), as relações de poder,
simbologias, valores, normas, reputações, mecanismos culturais, econômicos e
políticos que se estabeleceram como dominantes no passado influenciam de
forma decisiva e condicionam permanentemente as possibilidades presentes
do processo político. Esta visão sugere que as mudanças ocorrem
37
preferencialmente de forma incremental e progressiva, o futuro é uma projeção
aproximada do passado. A probabilidade de ocorrência de eventos ao longo de
uma trajetória aumenta a partir do início, processo chamado de
retroalimentação positiva (positive feedbacks).
Eventos críticos (critical junctures): são eventos, fatos, processos capazes
de alterar a estrutura de poder, a hegemonia de idéias ou a trajetória
institucional. Afetam a percepção dos atores sobre as regras institucionais.
Dinâmica da mudança institucional: no curso da história há momentos
críticos, critical junctures, causados por impactos das crises (militares ou
econômicas, por exemplo) que rompem com uma trajetória pré-existente,
possibilitando uma mudança mais radical e profunda no curso dos
acontecimentos e no comportamento dos atores políticos.Estas mudanças
podem ser novas idéias capazes de mobilizarem atores para o rompimento
como o state of rules vigentes. Esta visão sugere que há um componente
absolutamente imprevisível na mudança institucional, contingente e
multicasual. As fontes do dinamismo institucional empiricamente verificáveis
estão relacionadas às mudanças na economia e sociedade, ao contexto
político que pode valorizar instituições antes latentes, mudanças no balanço de
poder que podem mudar a missão ou finalidade de instituições existentes; e
mudanças exógenas que podem atribuir novos objetivos e estratégias para
instituições ou novos objetivos para atores antigos dentro das mesmas
instituições; outra fonte da mudança é quando os atores mudam para se
acomodar a mudanças nas suas próprias instituições (falência institucional,
crises profundas,...).
2.4 Uma abordagem teórica combinada
Há quinze anos Hall e Taylor (1996) diziam-se surpresos em como as
diferentes escolas (neo) institucionalistas permaneciam fechadas, sugerindo
um aumento de intercâmbios entre as duas abordagens. Como em todas as
tentativas de integração teórica o problema geralmente reside na busca de uma
lógica de complementação que faça sentido explicativo. Conforme os autores:
38
“…each seems to be providing a partial account of the forces at work in a given situation or capturing different dimensions of the human action and institutional impact present there. For instance, an actor’s behavior may be influenced both by strategic calculation about the likely strategies of others and by reference to a familiar set of moral or cognitive templates, each of which may depend on the configuration of existing institutions. Consider the case of French workers contemplating adherence to an incomes policy during the 1950s. On the one hand, the divided structure of the French labor movement discouraged a strategy of adherence because it was conducive to free-riding. On the other hand, the syndicalist ideologies of many French unions also militated against cooperation in such an endeavor.It is possible that there were two respects in which the institutions of the French labor movement were influencing behavior at this time, each modeled more effectively by a different school of thought. (p. 22)
A integração teórica, ou melhor, a combinação teórica deve sugerir um quadro
mais geral e completo para o entendimento de um processo ou mecanismo.
Parece que esta possibilidade se encontra mais facilmente quando uma das
abordagens chega a uma situação-limite para explicar um fenômeno qualquer.
Por exemplo, uma explicação baseada em fatores culturais pode ajudar a
entender um mecanismo de cooperação ou coordenação entre atores quando a
lógica da “teoria dos jogos” se mostrar insuficiente ou incompleta. Hall e Taylor
exemplificam diversas tentativas combinando instrumentos nestas situações:
símbolos e idéias podem contextualizar a escolha de um agente entre vários
equilíbrios possíveis; escolhas baseadas em razão instrumental, porém
limitadas pela trajetória histórica ou interações estratégicas entre atores
ambientadas em modelos culturalistas.
A idéia de integração reside na complementariedade entre os diversos
enfoques, por exemplo, usando duas categorias importantes: a formação de
preferências e o funcionamento das instituições. Weingast e Katznelson (2005)
sugerem que as preferências sejam de fato imputadas aos atores a partir de
um modelo ou estrutura teórica, mas sugerem também que são formadas por
processos históricos e induzidas por circunstâncias de interação estratégica
com outros atores. Ambas as escolas (IER e IH) compartilham o papel das
instituições como solução para problemas de coordenação e cooperação
humana, com múltiplas dimensões com esta finalidade. Eles reconhecem que
na abordagem histórica o comportamento dos atores, que muda em cada
39
contexto, com múltiplas causas imprevisíveis e indeterminadas, é muito mais
complexo que a aplicação da “teoria dos jogos” pela IER, ainda que os modelos
sejam elegantes e sofisticados. Há na verdade uma combinação em
proporções variáveis de situações e eventos históricos que se combinam
sistematicamente com a capacidade de agência dos atores para formar suas
preferências. No institucionalismo historico convencional:
“…holistic analyses that treated structures both as outcomes of large scale historical process and as causes that, alone and in combination, established fields of action within which human beings lived, cooperated, and conflicted. In the analytical hierarchy typical of these works, rather less attention was paid in the first instance to agents and their preferences. People and their preferences tended tobe collapsed into categories established by the interplay of theory and history”.(p.13).
Weingast e Katznelson insistem na tese de que é possível compreender o
comportamento individual racionalmente, desde que esteja clara a relação com
a lógica institucional:
“there is a devotion to understanding particular cases in depth. Individuals are always historical and embedded, never free-standing or the irreducible units of analysis. Institutions are understood to be both stable arrangements that endure over the long term and locations that can produce profound disturbances to the status quo. Institutions change probabilities of preference formation and action. People pursue projects based on their preferences within institutions, just as institutions delineate the scope of possible projects and help bring preferences. “ (p15).
Os trabalhos marcantes de autores como Bendix, Moore, Hall, Immergut,
Skocpol, Steinmo, Thelen e Tilly ao abordarem processos relacionados à
consolidação do capitalismo ocidental, à urbanização, à fenômenos da
economia política ou a transição do feudalismo, tentam a partir da análise
profunda de casos singulares, identificar possíveis relações de causalidade e
generalizações contextualizadas.
40
Na mesma linha James Mahoney (2010) trabalha a estratégia de unir micro e
macro fundamentações das preferências e das instituições, como se o foco
racionalista e o histórico fossem duas faces de uma mesma moeda. Segundo
ele a grande maioria dos estudos que focalizam processos de dependência da
trajetória em mudanças de longo curso e de caráter irreversível (por exemplo, a
transição do feudalismo para o capitalismo), não explicam bem como os atores
– neste processo – fazem suas escolhas. O IER propõe – nestes casos -
instrumentos que podem modelar estas escolhas, baseados em suposições
racionalistas que podem (e devem) ser combinadas com as critical junctures da
história. Neste artigo o autor exemplifica analisando como diferentes escolhas
de dirigentes políticos da América Central, num mesmo contexto histórico,
conduziram a regimes liberalizantes diferenciados. Em que pese o uso da
tradicional modelagem de atribuir utilidades e probabilidades quantitativas para
cada ator/escolha, Mahoney claramente aponta para a subjetividade da
escolha influenciada por fatores históricos, posição de classe, crenças
ideológicas e estrutura de poder:
“…the expression preferences and situations might refer to the idea that historical circumstances shape a wide range of components of actor choice, not only utility functions...” pg 318.
Os atores são inspirados por convicções normativas profundas estudadas na
análise histórica que não raro remonta ao processo de socialização familiar,
cultural, escolar, etc. Gostos e hábitos são internalizados dentro do convívio
prolongado em um grupo sócio-econômico. As posições de classe oferecem
oportunidades e incentivos semelhantes. Mahoney trabalha também com a
idéia de complementação: os modelos não capturam a complexidade da
realidade, a modelagem de eventos críticos e trajetória em IH pode ser micro-
fundamentada por estudos de IER, como se fossem camadas, apenas se
distinguindo pela escala,profundidade e estratégias cognitivas, não pela sua
natureza ou conteúdo:
“ scholars affiliated with RCI stand to benefit from the concern of HI with empirically justifying assumptions about actor goals and
41
assessments. Moreover, HI can contribute to RCI by identifying those specific periods when actor choices are especially consequential and thus need to be carefully modeled…scholars in the field of HI can benefit from the concern of RCI with rigorously modeling the mechanisms through which actor make choices during key historical periods…” (p. 330).
Em outra derivação Weingast (2005) sugere enriquecer as analises de IER
usando princípios macroscópicos de análise como a estrutura de poder, o
papel das idéias na mudança institucional e os eventos críticos na formação
das preferências. Ele sugere que em cada evento crítico o pesquisador
identifique um “decisor estratégico ou pivotal” (pivotal decision maker) que
obedeça a seguinte condições: é aquele indivíduo (ou grupo) cujo abandono do
status quo e migração para um novo posicionamento, seja capaz de catalisar
ou mover todos os demais para este novo posicionamento, gerando uma
ruptura com o estado de poder, crenças e legitimidades estabelecidas:
“...under well-defined conditions, rational individuals change their mind in face of evidence, and in so doing often change the political ends they pursue and the policies they prefer “ (p.162).
Weingast aponta como variáveis centrais para explicar a motivação do “grupo
pivotal” os seguintes fatores: (a) capacidade de convencimento dos demais
grupos e indivíduos, quanto maior o número de “convertidos” maiores as
probabilidades de mudança; (b) eventos externos ao controle do pivotal
decision maker devem confirmar, como evidências materiais, os indícios de
benefícios futuros maiores que os custos da mudança, para os grupos ainda
não convertidos; (c) tudo depende, afinal, de compromissos credíveis (credible
commitments) dos empreendedores políticos, que se relaciona também com
sua reputação pregressa e sua posição de poder no grupo.
Calculando probabilidades críticas de mudança, de permanência na situação
atual e de riscos envolvidos, o autor aplica o modelo ao estudo da Revolução
Americana. Weingast chama de “racionalidade do medo” (rationality of fear) a
mudança de postura dos colonos americanos frente à coroa. O mecanismo-
chave para o entendimento da revolução americana foio processo pelo qual a
coroa britânica passou da posição de garantidora de direitos na colônia norte
42
americana, para um forte fator de ameaça após a Guerra dos Sete Anos com a
França (1763). O sentido lógico, a plausibilidade e presunção de factibilidade
dos novos paradigmas, entretanto, podem ser afetados pela informação
incompleta dos grupos e indivíduos que pode suportar um modelo mental hostil
ou refratário às mudanças. Para cada nova idéia haveria um custo, este custo
édado pela probabilidade das promessas que as novas idéias trazem não ser
confirmada (hipótese da plausibilidade), ou seja, uma idéia de risco associada
à decisão. É por isso que Weingast introduz a hipótese de “eventos críticos”
capazes de confirmarem novos paradigmas em estado de latência ou potencial:
“... a critical juncture occurs when a major dislocation occurs in society, such as when people abandon previus views an come to hold new ones sufficiently different that the direction of politics transforms radically” ( p.171).
Nas conclusões o autor sistematiza os quatro elementos do modelo: (I) uma
nova idéia tem a probabilidade de ser verdadeira, no inicio é negligenciável e
baixa, para cada idéia há uma probabilidade crítica, se ela for atingida o “grupo
pivotal” passará a apoiar a nova idéia e seus efeitos políticos; a maioria das
idéias nunca atingem esta faixa e nunca provocarão mudança de preferência
ou posição; (II) para que a probabilidade crítica seja atingida eventos devem
ocorrer, mas estes eventos devem estar ou ser independentes dos defensores
das novas idéias (plausibilidade e credibilidade), só assim os grupos
majoritários - que são moderados - podem mudar de opinião; (III) se o nível de
controvérsia aumenta os empreendedores políticos tem um incentivo para
convencer os demais (“arenas” e debate público) mudar de lado e apoiar ações
radicais; (IV) o “pivô” muda de lado e cria um evento de descontinuidade
política, isto é, processos revolucionários.
Analisando o processo de união monetária da Comunidade Européia, Peter
Hall (2005) também reforça a possibilidade de combinar paradigmas. Suas
conclusões sobre este processo foram a de que cada ator envolvido (os
Bancos Centrais europeus) formaram suas preferências a partir de múltiplos
interesses, mas todos eles tinham em comum a manifestação de uma
identidade prévia relacionada a um projeto nacional ou a uma identidade
nacional. Esta identidade é explicada pela história, não pela agregação de
43
“funções utilidade”. Entretanto a criação da comunidade como organização
política solucionou parcialmente o problema da agregação, criando regras auto-
impostas com previsibilidade e credibilidade, evitando que “efeitos não
intencionais” ameacem uma condição de equilíbrio.
Em trabalho mais recente Hall aprofunda este raciocínio (Hall, 2010). Ele toma
como base os princípios racionalistas e tenta sofisticar o modelo utilizando o
instrumental analítico histórico. Ele adota o conceito racionalista de mudança
institucional, como cálculo induzido pela percepção dos atores sobre custos e
benefícios em adotar novas regras. Entretanto, combina com o conceito
histórico de “mudanças ideacionais” afirmando que o calculo estratégico dos
atores é determinado pela incerteza, por sua vez, as “novas idéias”
funcionariam como “instrumentos de confiança” capazes de conferir
credibilidade às novas opções. Ele acrescenta também outros fatores: a
organização do sistema político, a natureza dos atores e o formato das
hierarquias organizacionais. Como Weingast, Hall, credita à capacidade
mobilizatória dos empreendedores parte da responsabilidade para superar os
dilemas da ação coletiva, esclarecer os custos de oportunidade que serão
maiores ou menores conforme a intensidade da dependência do passado
(trajetória). A mudança institucional seria um “jogo de coordenação”, porém,
mais sofisticado, com ingredientes estranhos ao vocabulário racionalista:
estrutura de poder, posicionamento ideológico, crenças normativas, múltiplas
identidades, influencia de redes institucionais. Este modelo racional expandido
pode ser assim resumido:
1. A existência e montagem de uma coalizão a favor de novas regras é precondição para a mudança institucional, mas só a coalizão não é suficiente, deve haver um processo desagregador prévio, capaz de reinterpretar regras, significados e padrões de conduta;
2. A incerteza sobre efeitos das reformas e a expectativa de que algumas crenças normativas podem contornar esta incerteza é fator-chave;
3. As mudanças são afetadas por características organizacionais preexistentes e isto nos remete a questões de como o poder é assimetricamente distribuído entre os diversos atores e os problemas de ação coletiva;
4. As mudanças podem ser modeladas como “jogos de coordenação”, mas as questões de distribuição e do poder relativo dos atores em função de
44
seu custo de oportunidade e capacidade de mobilizaçãosão fundamentais para resolver questões “distributivas”;
5. As funções de preferência dos atores são múltiplas e relativas a identidades diversas que são assumidas, portanto não há um único equilíbrio ou situação ótima;
6. A mudança institucional, finalmente é mediada pelas práticas institucionais existentes e anteriores, condicionando o comportamento dos atores sociais.
Para Hall as instituições são instrumentos que os atores sociais usam para
negociar a complexidade do mundo, longe de ditar ações particulares, as
instituições são vistas como estruturas, rituais e sistemas simbólicos que
capacitam os atores para exercerem seu próprio poder de agência.
Possibilidades de uma abordagem (trans -) institucionalista - conclusões
Retomando as hipóteses iniciais de pesquisa – “arenas” como incentivos à
cooperação, ação racional dos governos e influência das idéias na criação e
manutenção de “arenas” – podemos retomar algumas possibilidades de
pesquisa a partir da revisão bibliográfica até este momento. Em primeiro lugar
fica evidente que a literatura neo-institucionalista, em seu núcleo teórico
comum, permite uma abordagem consistente e robusta capaz de explicar o
funcionamento de mecanismos institucionais na interação entre atores – as
“arenas”. A lógica conceitual da “ação racional incentivada pelas arenas” pode
e deve ser combinada com outras lógicas como aquelas relacionadas às
“arenas” como “produtos da trajetória” ou “influenciadas por condições
exógenas”. Tanto a literatura de institucionalismo da escolha racional como a
do institucionalismo histórico e de idéias fornecem categorias analíticas que –
se combinadas com coerência e consistência interna – poderão fornecer
instrumental para explicar as “arenas” na política industrial. A evolução das
“arenas” no governo Lula, em especial do Conselho Nacional de
Desenvolvimento Industrial (CNDI), dificilmente pode ser entendida sem a
combinação de um conjunto de explicações, ora complementares, ora
superpostas.
A revisão da literatura claramente coloca algumas questões para a análise
empírica: uma revisão da trajetória do governo e dos seus atores (em
particular: empresários industriais participantes e Ministros envolvidos), a
45
influencia de atores-chaves na sua dinâmica decisória, os interesses macro-
políticos do governo (o lugar da política industrial na política macro-econômica)
e a influência de um ideário supostamente desenvolvimentista e participativo no
comportamento do governo, são algumas mais evidentes. Em segundo lugar, a
literatura revisada pode ser utilizada para estabelecer convergências e
divergências no modo como as “arenas” funcionaram nos dois últimos
governos e qual sua influência na política industrial realmente existente. No
Governo Cardoso as “arenas” de política industrial foram pouco enfatizadas e
tiveram funcionamento quase homologatório das políticas governamentais. No
Governo Lula as “arenas” de política industrial adquiriram certa importância,
com debates e propostas que foram posteriormente acatadas pelo governo.
Ambos os governos agiram com racionalidade no funcionamento destas
“arenas”, porém o governo Lula estabeleceu uma agenda mais complexa e
participativa, igualando pelo menos no plano político a agenda monetária
(cambio, inflação e juros) com a agenda industrial (subsídios, incentivos e
tecnologia).
2.5 Estado, empresários e política industrial
Há estudos que sugerem a idéia de que os países em desenvolvimento, sob
condições restritivas de competição no setor externo (câmbios
sobrevalorizados, custos produtivos elevados, deficiência de recursos naturais,
etc.), podem desenvolver vantagens comparativas institucionais. Tais
vantagens podem funcionar como mecanismo compensatório para a perda de
competitividade inerente a estas estruturas econômicas com baixa intensidade
de capital e investimento. Estas vantagens comparativas implicariam em
modalidades de coordenação econômica e política, baseadas por uma lado no
papel estratégico do Estado, e por outro lado nas articulações do Estado com o
setor privado, no âmbito da seleção e implementação de políticas públicas de
natureza desenvolvimentista, seguindo a recomendação de Hall e Soskice,
(2001).
46
O quadro de mudanças drásticas que foram desencadeadas pelas reformas
orientadas para o mercado nos anos oitenta e noventa,provocaram mudanças
adaptativas do aparato estatal. A abertura de mercados, a exposição externa, o
surgimento de novos atores ligados ao cenário internacional e o
aperfeiçoamento da democracia, ajudaram a induzir novos formatos
institucionais baseados sobretudo, no aumento da capacidade de coordenação
do Estado nas suas relações com o setor privado. As instituições políticas
operariam – neste processo adaptativo – como um conjunto de filtros das
pressões externas que – combinadas à trajetória prévia de cada país – seriam
essenciais para aprimorar a governança econômica e política em direção ao
desenvolvimento de longo prazo. Assim a capacidade de ação coletiva de
capitalistas industriais e trabalhadores, a dimensão institucional e o papel
indutor do Estado poderiam oferecer uma ferramenta analítica diferenciada
para entender a transição do período desenvolvimentista até a fase atual do
capitalismo brasileiro, mais caracterizada pela industrialização e financeirização
do sistema produtivo. Não se trata simplesmente de dizer que as instituições
fazem diferença, mas entender como operam, quais mecanismos causais
fazem diferença para resultados de avanço ou retrocesso do desenvolvimento
econômico.
Nesta abordagem da escola denominada “variedades de capitalismo”, o
mercado não atuaria como único mecanismo de coordenação e cooperação. A
governança corporativa no plano das firmas, as instituições, a regulação estatal
e a trajetória anterior das relações entre os atores teriam tanta ou mais
capacidade analítica que os mecanismos de otimização do lucro, maximização
do comportamento econômico e assim por diante. A questão central seria,
portanto, saber como os diferentes incentivos estabelecidos pelas instituições
estatais impactam e estruturam o comportamento e as relações entre os
agentes econômicos. Fatores como os modos de financiamento produtivo, as
relações inter-industriais, as políticas de incentivo à pesquisa e
desenvolvimento, por exemplo, funcionariam diferentemente em economias
ditas “reguladas” ou de “mercado coordenado” e “economias liberais”, onde a
intervenção do Estado é mínima. Neste modelo o modo como se organizam
empresários industriais e trabalhadores é central. A natureza dos grupos de
47
interesse, sua dinâmica de funcionamento, o padrão de comportamento em
relação ao Estado, etc., são variáveis importantes para identificá-los como
instrumentos ou não de processos coordenativos e cooperativos (e de
processos de conflito e antagonismo).
Conforme já foi observado, podemos dividir grosso modo, as economias
capitalistas entre economias de mercado liberais e economias de mercado
coordenadas, representando tipos ideais de arranjos institucionais. Cada
modelo gera valores e incentivos para o comportamento dos atores sociais,
condicionados pelas suas trajetórias e pelas alterações induzias na regulação
da economia internacional. Os exemplos clássicos dos modelos seriam os
Estados Unidos e a Alemanha. Em ambas as formulações o Estado aparece
como central para o enforcement das condições em que se processa a
interação e estratégia empresarial. O Estado não é um agente como os outros,
ele esta acima e ao mesmo tempo abaixo no sentido de dar substrato jurídico,
econômico e político a todos os outros atores.
É comum na literatura econômica caracterizar o período que vai do final da
segunda grande guerra até os anos setenta como o predomínio do paradigma
fordista de produção (Piore e Sabel, 1984)25. Em linhas gerais os Estados
desenvolvidos seguiam políticas liberais em momentos de expansão e do tipo
keynesianas em momentos de contração econômica. O predomínio industrial
era do setor metal mecânico, a taxas de cambio fixas com base num padrão de
referência internacionalmente aceito (o padrão-ouro). A presença de sindicatos
poderosos, sobretudo no contexto europeu, garantia níveis de renda
relativamente bem distribuídos e mercados internos suficientemente robustos
para viabilizar estabilidade e previsibilidade do sistema político. Neste período
o padrão de cooperação e coordenação de políticas entre empresários,
trabalhadores e governos foi bem definido pela análise corporativista
(Schmitter, 1983). Na fase final deste período se consolidam os dois grandes
modelos, conforme Hall e Soskice (2001) propuseram.
25
“fordismo” foi um termo notabilizado pela assim chamada “escola de regulação” francesa de origem no
estruturalismo marxista e no institucionalismo, nos anos oitenta: Michel Alglietta, Robert Boyer, Alain
Lipietz, entre outros.O foco desta escola era a análise dos diferentes arranjos entre o que foi denominado
“regimes de acumulação”e “modos de regulação”, suas tensões internas, contradições e crises (produção
em massa e sub-consumo, políticas keynesianas e crise fiscal, estagflação) e a transição para o período
pós-fordismo.
48
O modelo de “Economias de Mercado Liberal” (ou EML), marcado pelo domínio
de coordenação de mercado nas relações entre firmas e destas como trabalho
e com a esfera financeira. O mecanismo central de coordenação é a formação
de preços, de competição capitalista, geralmente do tipo monopólio ou
oligopólio. As empresas tem normalmente estruturas de comando verticais, as
relações entre as empresas são competitivas, as relações com os
trabalhadores são normalmente conflitivas e fragmentadas e o financiamento
para investimentos produtivos é baseado na avaliação de desempenho e
patrimônio das firmas. A qualificação da força de trabalho é feita
predominantemente de forma externa às empresas, em redes de apoio
fomentadas ou criadas. Por fim a transferência tecnológica é pautada pelo
modo como funcionam os direitos de propriedade intelectual no mercado.
Neste modelo os estímulos de um mercado não regulamentado e competitivo
induziriam a um ambiente de inovação tecnológica radical. Estas são as
variáveis de análise: como as empresas interagem entre si, o modo como se
financiam, como se relacionam com o mundo do trabalho e qual o padrão de
aprendizado tecnológico que adotam.
As economias do tipo “Economia de Mercado Coordenado” (ou EMC), por sua
vez, como no caso da Alemanha, com variações importantes para o caso
japonês ou sueco, as relações inter firmas acontecem sob um marco ou
referência institucional e cultural que favorece a cooperação e coordenação
através de espaços deliberativos, que enfatizam a colaboração e a confiança
recíproca entre os agentes. As relações com o sistema financeiro, muito mais
estreitas que no modelo EML, permitem arranjos de financiamento de mais
longo prazo, baseados nas expectativas de crescimento, mais do que as taxas
de markup de curto prazo. A estrutura de comando empresarial frequentemente
incorpora formas colegiadas de direção e processos de informação e decisão
que estreitam a relação entre acionistas, clientes e fornecedores. Sindicatos
patronais e de trabalhadores são poderosos e estabelecem pactos de
crescimento mutuamente benéficos, em negociações coletivas, validados pelo
Estado. Estes acordos envolvem as barganhas salariais, os níveis de
qualificação e empregabilidade por um lado e as concessões de vantagens
fiscais, proteção de mercados e tecnologia do outro. Neste modelo as
49
inovações são mais incrementais porque inseridas em contextos mais
regulados, de longo prazo, no mecanismo de competição entre as empresas.
Nestas economias o Estado tende a garantir níveis de proteção social
superiores, implicando um percentual de gasto público superior (na Alemanha
era de 50%, contra 35% dos Estados Unidos, nos anos noventa,
aproximadamente).
Nos países da periferia do sistema o tipo de hegemonia dos países centrais
abriu brechas para a construção de políticas desenvolvimentistas que
assumiram outros padrões diversos dos modelos básicos abordados. Um
exemplo recorrente na literatura de variaties of capitalism é o caso da Coréia
do Sul. O exemplo coreano é marcado pela exacerbação do modelo
coordenado de capitalismo. A presença do Estado intervindo diretamente é a
marca deste modelo. Os salários foram contidos pela repressão aos sindicatos,
mantendo os custos produtivos baixos e tornando os produtos coreanos mais
competitivos. A qualificação da força de trabalho foi compulsória, utilizada
como contrapartida para obtenção de vantagens fiscais. O crédito era garantido
pelo controle público sobre os bancos, tanto o interno quanto o externo. O
consumo de supérfluos foi taxado para garantir arrecadação fiscal e proteção à
economia local. A política industrial foi direcionada totalmente para exportação,
considerando a debilidade do mercado interno de consumo. O Estado induzia a
obtenção de ganhos de escala através da formação de cartéis (chamados de
chaebol) e da verticalização da produção. Apesar disso os baixos níveis de
desemprego, a contenção das imigrações pela reforma agrária e certo nível de
proteção social criaram as condições para que empresários e trabalhadores
cooperassem em torno de objetivos de uma política marcadamente
nacionalista. A tecnologia associada aos ganhos de competitividade foi
resultado de um longo processo de imitação tecnológica simultânea à criação
de um sistema nacional de inovação (Haggard, 2004).
O estudo do Estado, em relação aos demais atores tem grande relevância
nesta abordagem. Em relação ao papel do Estado é central o conceito de
“autonomia inserida” (embedded autonomy) proposto por Peter Evans (2004).
A idéia central é que processos de desenvolvimento de longo prazo só podem
surgir quando o ambiente institucional favorece a ação de sinergias entre o
50
setor público e privado. Estas sinergias exigem uma burocracia estável,
qualificada e comprometida com o ideal desenvolvimentista, de um lado, e
grupos empresariais e de trabalhadores, do outro lado, igualmente
comprometidos com uma visão não-rentista ou não-clientelista de
desenvolvimento. Evans analisou com profundidade as experiências do
sudoeste asiático, em especial a Coréia, concluindo que o sucesso econômico
está muito relacionado com a trajetória e habilidade dos burocratas estatais
criarem elites empresariais numa estratégia que ficou conhecida como “seleção
dos vencedores” ou em inglês: pick-up the winners. Por sua vez, o mercado e
seus grupos de interesse soube manter e preservar a burocracia estatal sem
degenerar em novas formas de insulamento militarizado ou predação do
Estado.
Evans propõe um modelo híbrido, combinando três grandes forças que
construiriam um equilíbrio institucional: a capacidade da burocracia em dar
respostas rápidas e eficientes aos sinais de mercado, a capacidade de
regulação e coordenação do Estado (ele chama de Estado Desenvolvimentista
em oposição “Estado Predador”) e o processo democrático, em especial, os
mecanismos de controle e transparência, de baixo para cima. O processo
democrático permite por excelência a conexão (a inserção) da burocracia com
os diversos grupos sociais organizados. A autonomia do Estado em Evans,
portanto não é só relativa como no sentido clássico marxista de subordinação
dialética da esfera política às condições materiais de produção, mas é relativa
também porque submete o Estado a um conjunto de elos, compromissos e
relações (no bojo da democracia) com canais de negociação permanentes e
institucionalizados. A parceria preconizada implica no compartilhamento de
projetos, na sinergia e simbiose público e privada. Não devemos confundir,
entretanto, a autonomia com insulamento, nem a parceria com anulação das
diferenças ou captura do Estado pelo mercado (como nos típicos “problemas
de agência”). Ainda que tanto os problemas de agência, como o insulamento
burocrático sejam fenômenos comuns e observáveis na vida pública de países
em desenvolvimento.
Outros autores também enfatizam uma perspectiva de influência crescente do
Estado sobre os mercados. Chang (2004), por exemplo, ao analisar o processo
51
de industrialização do sudoeste asiático reafirma o papel do Estado nas
medidas regulatórias. Chang diz que a globalização e o domínio das
transnacionais não é necessariamente um obstáculo ao desenvolvimento,
desde que haja uma efetiva política industrial. Chang e Rodrik (2002) reputam
a falência de políticas neoliberais nos países menos desenvolvidos pela sua
incapacidade de dar conta da complexidade de fatores políticos e econômicos
destes países. Os países que desenvolveram estratégias autônomas de ação
como políticas industriais ativas tiveram sucesso, os que simplesmente
seguiram o roteiro proposto pelas organizações multilaterais sofreram longos
períodos de estagnação econômica e conflitos sociais.
O que os teóricos desta escola nos dizem é que não há uma única estratégia
de cooperação e coordenação entre Estado e mercado. Há uma variedade de
arranjos institucionais endógenos que dependem de um conjunto muito grande
e diversificado de fatores políticos para serem efetivos (Haggard, 2004). O
Chile seria uma caso emblemático onde variáveis institucionais endógenas
explicariam melhor sua estabilidade e desenvolvimento, do que suas relações
econômicas com o setor externo. As coalizões políticas estabelecidas no
período autoritário, a presença de tecnocratas com autonomia, por exemplo,
são fatores mais potentes que a abertura comercial indiscriminada ou as
reformas neo liberais dos anos oitenta e noventa.
No Brasil, o poder de agenda conferido ao Executivo na nossa matriz
institucional permitiu desenvolver mecanismos de coordenação com o
mercado, mesmo em governos de esquerda onde as prioridades mudam e a
governabilidade se restringe. O modelo de presidencialismo permite a
formação de uma coalizão no parlamento capaz de garantir o mínimo de
sustentação para a ação coordenadora e reguladora do Estado. Como tem
demonstrado o comportamento do Congresso em relação ao poder executivo
ao longo dos anos pós-redemocratização e a fragmentação corporativa e
patrimonialista dos grupos depressão, com baixo ou quase nenhum poder de
veto.
52
2.5.1 A relação entre Estado e Empresários industriais
A relação entre o Estado e os empresários industriais no Brasil tem sido
marcada por relações de sinergia, mas também por momentos de crise e
conflito em conjunturas específicas quando as políticas públicas sinalizam
algum constrangimento para a atividade industrial. Tomando como referência
estudos recentes (Pereira e Diniz, 2009; Diniz e Boschi, 2009) podemos definir
no mínimo três grandes ciclos recentes: o período dos anos noventa
caracterizado pela perda de poder político dos empresários e predomínio de
políticas neoliberais, um segundo ciclo marcado pela ruptura do consenso
liberal e retomada do protagonismo do empresariado e um terceiro ciclo
iniciado com o governo Lula de retomada das políticas industriais ativas e uma
nova repactuação entre Estado e empresários industriais.
No período de consolidação do parque industrial brasileiro, entre 1930 e 1980,
o país se industrializou sob a direção de uma coalizão política-institucional que
tinha como principais atores os empresários industriais nacionais, uma
burocracia pública em formação e condições externas favoráveis que
estimularam e protegeram setores domésticos da concorrência predatória de
concorrentes externos. Este período foi conhecido como substituição de
importações e foi amplamente analisado pela literatura especializada .
Nos anos noventa predominou na formulação de políticas públicas de
desenvolvimento as idéias originadas no movimento teórico-político hoje
conhecido como “Consenso de Washington”. Foi um processo de debate
organizado pelo Banco Mundial e FMI no final dos anos oitenta que produziu
uma agenda propositiva capaz de servir como orientação aos gestores das
instituições multilaterais de crédito e fomento. Basicamente as propostas
retomavam o ideário liberal do final do século XIX. No Brasil a conjuntura deste
período era de extrema instabilidade política. O País recém havia saído de uma
crise profunda de governabilidade no período 1987 – 1990, produzida pelo
fracasso das políticas de estabilização, em especial o chamado “Plano
Cruzado” durante o governo do Presidente José Sarney. As elites políticas, a
direção do governo federal e os próprios empresários industriais estavam
enfraquecidos e vulneráveis em relação ao receituário neoliberal dos
53
organismos internacionais. O Governo Collor, a despeito da abreviação do seu
mandato, em 1990, iniciou um longo período de medidas que privilegiaram o
setor financeiro e bancário em detrimento do setor produtivo e industrial. O
período desenvolvimentista (proteção de setores estratégicos, substituição de
importações, investimentos públicos em setores produtivos e infraestrutura,
coalizão entre burocracia pública e empresários industriais, etc.) foi visto como
um atraso, uma espécie de populismo econômico que conduzia à ineficiência
generalizada do sistema econômico e surtos freqüentes e crônicos de alta
inflacionária. Junto com esta crítica se propunha a diminuição drástica do
Estado na formação de poupança e investimento, o que significou um profundo
processo de desestatização em diversos setores produtivos. Outras medidas
forma implementadas como a flexibilização e precarização das relações
salariais e empregatícias, o combate ao déficit público com cortes profundos no
orçamento estatal e o fim progressivo dos subsídios e incentivos fiscais, tão
comuns no período anterior.
Na década de noventa as reformas econômicas foram orientadas para diminuir
a influência do Estado no funcionamento dos mercados. Em 1994 o governo
Itamar Franco elaborou um plano heterodoxo de combate à inflação e
estabilidade monetária, sob a direção do então Ministro da Fazenda, o
sociólogo Fernando Henrique Cardoso. O sucesso do plano alavancou a vitória
eleitoral do presidente Cardoso em 1995. O plano estimulou a
internacionalização da economia pela apreciação da taxa de câmbio, abertura
comercial e liberalização dos fluxos financeiros. Houve uma profunda
reestruturação no parque industrial com uma onda de aquisições, fusões e
compras de fábricas nacionais por empresas estrangeiras. O processo de
desindustrialização crescente só não foi maior porque havia um estoque de
plantas industriais bem consolidadas do período econômico anterior. Uma das
marcas deste período foi o crescimento drástico da titularidade estrangeira, ou
seja, de uma desnacionalização profunda das empresas.
A reação empresarial, ainda que não uniforme, foi claramente marcada pela
dissonância em relação à estratégia neoliberal. O Instituto de Estudos para o
54
Desenvolvimento Industrial26, o IEDI, por exemplo, produziu documentos
propondo que o Estado retomasse um papel ativo no desenvolvimento. A
FIESP, por outro lado, publicou um documento intitulado “Livre para crescer,
proposta para um Brasil Moderno”, em 1990, onde defendia a estratégia geral
do governo. Os empresários chegaram a formar uma coalizão de clara
natureza lobista e de advocacy chamada “Ação Empresarial” liderada por Jorge
Gerdau, (líder corporativo e empresário monopolista na cadeia siderúrgica).
Nesta época a Confederação Nacional da Indústria (CNI), dirigida por Fernando
Bezerra, também fazia coro às políticas do governo Cardoso (1995-2002).
Muitos empresários e líderes setoriais, ao perderem posições no mercado,
tiveram respectivamente sua influência política reduzida. Foi, por exemplo, o
caso da empresa “Metal Leve”, tradicional no setor de autopeças, que foi
vendida à Mahle, alemã. Em paralelo um conjunto de empresários nacionais,
normalmente aliados com investidores externos forma alçados a uma posição
de destaque na medida em que adquiriram setores antes estatais como o
sistema de telefonia, fixa e móvel, complexos siderúrgicos que foram
privatizados, etc. Nas palavras de Pereira e Diniz (2009):
“Sob a égide das novas diretrizes neoliberais, é a lógica concentradora das grandes corporações transnacionais que comanda a nova ordem econômica, cuja prioridade é a inserção-integração das economias nacionais numa estrutura de poder de escopo transnacional marcada por fortes assimetrias econômicas e políticas. Somente uma fração muito restrita do empresariado local, em geral associada aos grandes conglomerados, tem condições de aceder e participar desta estrutura. Os demais segmentos operam sob condições altamente desfavoráveis, no limite da sobrevivência. Grande parte pereceu; os que garantiram sua sobrevivência pela fusão, associação ou parceria com empresas internacionais tiveram sua sorte atrelada ao sucesso da estratégia dominante.” (p.89).
Alguns debates que eram centrais no período desenvolvimentista como o
binômio “empresa nacional/empresa estrangeira” e “centro/periferia” perderam
conteúdo, já que o capital externo passa a ser visto como parceiro e sua
presença é naturalizada na paisagem econômica doméstica. Este período
reforçou a percepção já antiga de que o empresariado industrial brasileiro tem
26
Importante think-tank do setor privado industrial, foi fundado em 1989 e reúne atualmente 44 empresas
de grande porte (www.iedi.org.br), tem se pautado recentemente por uma postura (neo)
desenvolvimentista.
55
uma fraca organização como ator coletivo, uma baixa capacidade de ação
conjunta. Uma das causas desta desarticulação sistêmica – a despeito do peso
econômico de muitos grupos – é a própria estrutura corporativa de
representação de interesses, herdada do modelo sindical varguista dos anos
trinta. A inexistência de uma organização de elite, de natureza multi-setorial,
capaz de concentrar a representatividade de múltiplos setores, aliada à
incapacidade dos empresários industriais formularem um projeto mais amplo
que seus próprios interesses imediatos (incorporando os trabalhadores, por
exemplo), estão entre as causas endêmicas da sua baixa influência.
A aplicação da agenda pró-mercado produziu; entretanto, efeitos colaterais
extremamente nocivos tais como a reconcentração de renda, um crescimento
desproporcional do setor financeiro, insatisfação dos trabalhadores pelas
políticas de contenção salarial, aumento da vulnerabilidade externa, apreciação
cambial exagerada, etc. O aumento da instabilidade política na região da
América Latina resultou num espaço relativamente curto na eleição de
presidentes de centro esquerda ou que se opuseram ao receituário
macroeconômico ortodoxo, entre os países que sofreram esta inflexão política
podemos citar o Equador, a Bolívia, o Uruguai, o Paraguai, a Argentina, a
Bolívia, a Venezuela e mesmo o Brasil em 2002 com a eleição de Luis Inácio
Lula da Silva. Estes governos, de corte nacionalista e com fortes prioridades na
agenda social (fruto de compromissos com bases sociais de trabalhadores e
excluídos), se equilibram numa macroeconomia de transição entre o modelo
ortodoxo e o modelo heterodoxo. Em 1998 acontece a primeira grande crise
após a implantação do Plano Real em 1994. Naquele ano houve uma
desvalorização cambial profunda com fortes impactos sobre a política de
exportações industriais. Paralelamente o IEDI retoma o viés de defesa de uma
política industrial ativa. Pesou nesta retomada de posições a liderança de Julio
Almeida, professor de Economia da Unicamp que recolocou nos debates os
temas macroeconômicos. Outra mudança significativa neste período foi a
eleição para a direção da FIESP, Federação das Indústrias de São Paulo e
poderoso centro de pressão do empresariado industrial, de Horácio Lafer Piva
e na Confederação Nacional da Indústria de Armando Monteiro, ambos
empresários com forte viés nacionalista e sensibilidade para qualificação da
56
pauta típica empresarial com temas de maior universalidade, de interesse
social mais geral.
A eleição de uma coalizão de centro-esquerda encabeçada por Lula em 2002 a
princípio provocou uma reação negativa de parte do empresariado industrial
que temia, por razoes ideológicas e históricas um governo restritivo aos
interesses do mercado. Na medida em que Lula define um perfil de
compromisso com as bases do antigo modelo (cumprimento dos acordos
internacionais, manutenção da política monetária, pagamento da dívida externa
e interna, etc.) o empresariado industrial se aproxima do governo. Por outro
lado o Governo Lula, tendo parte de seus quadros dirigentes originado no
ambiente industrial mais dinâmico do país – a indústria automobilística do “ABC
paulista”-vai retomar ativamente a proposição das políticas industriais vistas
anteriormente. A criação de colegiados negociais e pactuais (Conselho de
Desenvolvimento Econômico e Social, CNDI, câmaras setoriais no Ministério
do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior) com o convite explícito às
maiores lideranças industriais, sinalizava um novo período de relação entre
Estado e indústria.O processo de recepção e acomodação do ideário lulista ao
mainstream das elites industriais é um dos elementos das hipóteses desta
pesquisa.
Desde 2002 o IEDI e a FIESP, assim como a CNI, através de suas assessorias
econômicas sugerem uma série de temas típicos ao debate da estabilização
econômica com crescimento: retomada das exportações, os juros altos inibindo
o crédito, o problema da inovação nas empresas, a desindustrialização pelo
câmbio super valorizado, etc. O tema da suposta desindustrialização é
particularmente interessante porque aborda um aspecto estrutural da formação
do grupo de capitalistas industriais. Em países de alto grau de
desenvolvimento, por exemplo, é normal que a indústria diminua peso relativo
no conjunto da economia. Isto acontece porque a força de trabalho super
especializada acaba se concentrando na área de serviços, com valor
adicionada per capita bem mais alto. Porém no Brasil, este movimento tem
caráter prematuro já que as cadeias industriais não absorvem toda mão-de-
obra excedente e o setor serviços ainda é muito dependente da indústria.
57
A eleição de Lula em 2002 com uma proposta de retomada do
desenvolvimentismo, porém sem desconstruir as bases da estabilidade
monetária conquistada anteriormente (geração de superávits públicos, câmbio
flutuante e independência operacional do Banco Central), inaugura uma
terceira fase, marcada pela retomada dos empresários industriais como
produtores de políticas. Os empresários, entretanto fazem desde o início uma
crítica muito forte à política monetária das taxas de juros muito altas e às
flutuações cambiais. A reeleição de Lula para um novo mandato presidencial
em 2006 demonstrou que a política econômica incorporou de forma
politicamente exitosa a fatores que não estavam no cenário anterior como um
forte componente redistributivo (programas de renda mínima, aumento real do
salário mínimo e das pensões) e um forte programa de investimentos públicos
estruturantes. A crise internacional de 2007/2008 só confirmou o cenário de
retomada do papel coordenador do Estado e de novas oportunidades para
países emergentes na geopolítica mundial.
Esta terceira fase ainda não está consolidada. De um lado o protagonismo de
entidades como a CNI aumentou, o que pode ser visto pela influência junto ao
Congresso Nacional e nos meios de comunicação. O Governo Lula,
especialmente no segundo mandato valorizou políticas distributivas que
amenizaram o problema da manutenção da política econômica anterior, sem
alterá-la na sua lógica operacional. Os fóruns de debate e consulta envolvendo
empresários e trabalhadores continuam a se reunir com uma pauta e agendas
com relativo poder de influência e agenda no governo, em especial o Conselho
de Desenvolvimento Econômico e Social, o CDES e o Conselho de
Desenvolvimento Industrial (o CNDI), este último com maior intensidade entre
2005 e 2007. A Política de Desenvolvimento Produtivo, por exemplo, lançada
em 2008 contou com a presença e apoio ativo das entidades empresarias e de
trabalhadores. O governo federal parece ter um protagonismo central, é o
Estado que organiza as pautas, as agendas, convoca os atores e os legitima
nestas instâncias, como se fosse um modelo corporativo clássico. Mas
persistem sérios problemas, por exemplo, o tema da reforma sindical e
trabalhista tem pontos de antagonismo e conflito claramente não resolvidos
entre trabalhadores e empresários. A política monetária é outro conflito que une
58
trabalhadores organizados e empresários industriais de um lado e o governo de
outro. Mesmo dentro do governo os setores mais ligados à produção e às
políticas sociais fazem críticas veladas à manutenção do receituário econômico
ortodoxo. Há uma série de “filtros discursivos” que selecionam e induzem
alianças táticas, movediças e por vezes contraditórias, no interior destes fóruns
durante todo o governo Lula, mecanismos que é objeto desta pesquisa.
Nestes novos ciclos de relação Estado /Sociedade há exemplos concretos de
reorganização dos empresários industriais. A adoção por várias entidades de
um modelo profissional de gestão, se colocando como articuladoras políticas e
prestadoras de serviços para as empresas foi fator marcante(Diniz e Boschi,
2003). A Associação Brasileira da Indústria Química, a ABIQUIM, é um
exemplo emblemático. A gestão foi toda profissionalizada, segundo Diniz e
Boschi, a direção é dada por um conselho superior e a entidade apoia as
empresas num sem número de funções que ultrapassam a mera atividade de
representação, tais como a capacitação empresarial, a promoção comercial no
exterior. Outras entidades são citadas como o Instituto Brasileiro de Siderurgia,
a Associação Brasileira de Indústria Farmacêutica e a Associação Brasileira de
Indústria eletro-eletrônica, entre outras entidades nacionais de representação.
A existência de uma burocracia estável e qualificada nestas entidades permitiu
que elas desenvolvessem desde o início da década atual uma forte ação de
lobby no governo federal e no Congresso Nacional. Esta atuação demandou
forte modernização da estrutura de representação de muitas organizações. A
Organização Nacional da Indústria do Petróleo, ONIP, foi por excelência o
emblema de uma nova matriz organizacional. Estruturada como uma
Organização Não Governamental – de adesão voluntária, não obrigatória, ela
significou um espaço de articulação entre o setor estatal – a Petrobrás -e as
empresas privadas, de classe ou profissionais e órgãos governamentais na
busca de estratégias para expansão e fortalecimento da cadeia produtiva como
um todo.
Outro exemplo foi a criação da “Sociedade Brasileira Pró-Inovação
Tecnológica” (PROTEC), criada em fevereiro de 2002, num evento da
Associação Brasileira de Máquinas e Equipamentos, a ABIMAQ. O tema da
inovação, assim como da expansão do comércio exterior e da política industrial
59
e de desenvolvimento regional já havia sido objeto de documentos lançados
publicamente pela CNI, FIESP e IEDI na transição do governo FHC para o
governo Lula em 2002.
Deve-se ressaltar que para muitos autores esta convergência entre os
interesses do Estado e de uma “burguesia industrial” não eram tão recentes.
Ianni (1989), por exemplo, afirma claramente que a expansão do capitalismo
industrial no país não foi um processo imposto ou forjado de forma verticalizada
pelo Estado, mas:
“o resultado de um largo e crescente convívio entre a burguesia industrial e o poder público. Depois da Revolução de 1930, paulatinamente os membros dessa burguesia nascente procuraram interferir nas decisões do governo, no sentido de estimular-se a industrialização e planificar-se o desenvolvimento econômico nacional ...” (p.94)
Nesta perspectiva mais histórica das formas de cooperação Estado / Mercado
cabe citar a experiência das “Câmaras Setoriais” no Brasil. No início dos anos
noventa, no Governo de Collor de Mello houve uma reestruturação profunda
dos organismos colegiados e conselhos tripartites (Governo, empresários e
trabalhadores) que haviam funcionado durante os anos de crise na década de
oitenta. Foi criado o Ministério da Economia, de vida curta, assim como o
governo, extintos o Conselho Interministerial de Preços (o CIP), o Conselho de
Desenvolvimento Industrial (CDI), o Conselho de Política Aduaneira (CPA) e
assim por diante. Neste contexto o governo propôs a criação de Câmaras
Setoriais tripartites para negociação de preços e salários. Adotou-se um
modelo inspirado no corporativismo Europeu, embora aqui com menos
participação dos trabalhadores e o escopo das negociações, um alcance mais
restrito e pontual que a experiência corporativista européia. O sucesso
aconteceu sobretudo no setor automobilístico, de forte representatividade,
produziram-se acordos para manutenção de emprego em troca de incentivos
fiscais e contenção das reivindicações trabalhistas. Vários acordos foram
pactuados em 1992, 1993 e 1995, com efeitos benéficos sobre o nível de
emprego, faturamento do setor e arrecadação fiscal.
As resistências do governo da época, entretanto, receoso de perder o controle
centralizado da política industrial, acabou condenando a experiência que foi
60
rapidamente desmobilizada. Estas “arenas” corporativas foram desmontadas
rapidamente no início do segundo mandato de Cardoso. Há estudos que
tentam demonstrar os efeitos danosos para a política automotiva neste período
resultantes do fim destas “arenas” de negociação: desequilíbrio de preços,
desnacionalização do setor de peças, grande renúncia fiscal, conflitos entre
governos estaduais disputando investimentos, aumento do preço dos veículos
e desemprego setorial (Arbix, 2000 e De Negri, 1998). Esta experiência
ocorrida no Governo Cardoso tem especial interesse para os objetivos da
pesquisa porque revela que a aparente racionalidade da arena – que resultou
em benefícios para o governo (políticos, fiscais, etc.) e para a indústria
automobilística (menos concorrência predatória, mais estabilidade, vendas,
proteção concorrencial, etc.)- não foi suficiente para garantir sua existência.
Uma das hipóteses deste trabalho sugere que a explicação para o a
desmobilização da arena esteja exatamente na ausência de um ideário
governamental participativo e desenvolvimentista no período FHC.
No Brasil, como vimos, o modelo corporativo de organização da produção
ajuda a entender como foi a história do capitalismo brasileiro pós 1930. As
relações entre capital e trabalho, bem como a estruturação das formas de
representação de empresários e trabalhadores, foi determinada pela legislação,
pelo Estado varguista no período autoritário conhecido como Estado Novo. A
pulverização da estrutura sindical, sua verticalização e o papel da Justiça do
Trabalho, a incapacidade do sistema em ser representativo e a baixa punição à
deserção fizeram desta estrutura um ambiente pouco propenso à negociação,
à cooperação, à formação de pactos coletivos. Esta talvez seja uma primeira e
marcante diferença do modelo corporativo europeu clássico.
A formação dos trabalhadores foi precária neste período conhecido como fase
desenvolvimentista. O ciclo de substituição de importações ainda que tenha
industrializado boa parte da economia foi feito pela transferência de tecnologias
de baixa complexidade, muitas já obsoletas e pouco inovadoras nos seus
países de origem. A força de trabalho mais dinâmica (indústria automobilística
e de bens duráveis) foi formada por instituições para estatais como o SENAI
(Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial). A estrutura de financiamento
produtivo, por sua vez, era fortemente dependente do Estado através do
61
BNDE, ainda sem o “S” pois a dimensão social só viria mais tarde. A inovação
tecnológica foi praticamente inexistente, limitando muito a expansão da
produtividade. Neste padrão de relacionamento as formas de cooperação eram
quase inexistentes. Nas palavras de Delgado (2007):
“Na relação inter-firmas, é possível identificar padrões de coordenação de mercado e informais, ao lado da presença expressiva das estatais no fornecimento de diversos insumos. A reduzida capacidade das entidades empresariais para a orquestração de esquemas de colaboração, a transferência de tecnologia processada através da relação entre as empresas e fornecedores externos, a incipiente formação e os vínculos precários da força de trabalho com as empresas, a desarticulação entre o sistema de ciência e tecnologia e o mundo da produção, a prevalência de políticas alocativas nas ações do Estado – sem exigências de contrapartidas junto às empresas, seja para a formação dos trabalhadores, seja para a inovação – circunscreveram as atividades de inovação incrementais e/ou radicais, tendencialmente concentradas em empresas públicas, com fraco rebatimento no tecido industrial” (p. 10).
Uma das diferenças mais marcantes da trajetória brasileira daquela observada
no leste asiático no mesmo período foi a pouca capacidade de enforcement do
Estado brasileiro. Mesmo no regime de exceção o Estado não logrou
universalizar procedimentos capitalistas e coibir formas pré-capitalistas de
produção que sobreviveram em setores, empresas ou regiões, de baixa
produtividade, dinamismo e acumulação. O domínio estatal inclusive de setores
produtivos, aliado à estrutura corporativa de representação, impediu que atores
específicos desenvolvessem mais autonomia e capacidade de arbítrio e
negociação.
A crise do paradigma fordista nos anos setenta (fim da conversibilidade de
Bretton Woods, custos elevados dos choques do petróleo, crise de
endividamento, etc.) mudou este quadro (Piore e Sabel, op. cit.). Foi a
retomada das soluções pró-mercado que resultaram no final dos oitenta no já
conhecido Washington Consensus. As medidas preconizadas: abrir o país ao
comércio internacional, flexibilizar o fluxo de capitais, tornar o cambio flutuante,
desregulamentar os mercados, em especial o mercado da força de trabalho,
62
reformar a administração pública para cortar gastos, em especiais os gastos
sociais, privatizando setores produtivos estatais, assegurar direitos de
propriedade em novos marcos de regulação e “agencificação”27, estabelecer
metas de inflação e políticas monetárias ativas de juros altos para conter
eventuais aumentos de demanda, etc., foram algumas das principais medidas.
A história é conhecida, nos países onde mais fielmente este receituário foi
aplicado, maior foi a débâcle econômica e social, sendo que os próprios
organismos multilaterais, em especial o Fundo Monetário Internacional e o
Banco Mundial reconheceram tal fracasso (Rodrik, 2002).
Foi neste ambiente de crítica à trajetória neo liberal e retomada da centralidade
do Estado que ressurgem as políticas industriais nos países da periferia, ou
chamados de “emergentes” como o Brasil. Como já foi abordado a política
industrial na concepção clássica ou é para corrigir as chamadas “falhas do
mercado” (quando o mecanismo de preços não assegura a alocação ótima dos
recursos), ou são “políticas horizontais” (orientadas para temas transversais
como capital humano, infra-estrutura, tecnologia, etc.). As políticas ditas
“seletivas” são aquelas orientadas pela coordenação econômica pelo Estado,
supondo-se que haja custos de transação e informação imperfeita. O problema
das políticas seletivas é o estabelecimento dos critérios para a escolha dos
alvos, dos objetivos a serem perseguidos. Por exemplo, dada a escassez de
recursos para pós-graduação há que se escolher quais setores serão
beneficiados e justificar tais escolhas com comparações do tipo custo /
benefício que nem sempre são legitimadas política ou socialmente. A política
industrial brasileira atual combina elementos de políticas horizontais com
escolhas específicas. Por exemplo, o apoio à bolsas de ensino para projetos
que representam inovação (de processo ou produto) seria uma política
horizontal, já o objetivo de recuperar a industria naval brasileira seria um
política seletiva. Segundo a síntese de Delgado:
27
“agencificação” é um termo comumente utilizado na literatura de gestão pública para designar o
processo vivido pelo Brasil a partir dos projetos do Plano Diretor de Reforma do Aparelho de Estado
(1995) que criaram as agências reguladoras e executivas (inspirado teoricamente na escola do New Public
Management ou simplesmente “gerencialismo”). O processo de “agencificação” se inscreve num amplo
leque de estratégias e instrumentos (privatização de serviços públicos, gestão para resultados,
contratualização de serviços, competição por recursos, uso de modelos gerenciais do setor privado, etc.)
inspirado na “desministerialização” do civil service britânico nos anos oitenta e criação das agências.
Hoje no Brasil há um amplo debate entre o poder Executivo e o Congresso sobre o escopo de jurisdição
das Agências, sua relação com os prestadores de serviço e o poder de concessão da autoridade pública.
63
“Quaisquer que sejam seus objetivos – equiparação, solução de problemas de coordenação econômica, ampliação do emprego, inovação e desenvolvimento tecnológicos -, e seus instrumentos – subsídios, crédito, tarifas, compras do Estado, orientação dos investimentos, apoio à inovação –, ela deve envolver o estabelecimento de laços entre o empresariado e o Estado como uma condição básica para possibilitar ganhos de informação, reciprocidade, credibilidade e confiança, que garantam eficácia às políticas e segurança aos empresários para a realização dos investimentos. As condições institucionais mais favoráveis para a colaboração Estado/empresariado realçam certas características da organização da máquina do Estado e da estrutura de articulação de interesses do empresariado. (Delgado, 2007, p.18).”
Em síntese, a literatura sobre desenvolvimento nos países emergentes aponta
algumas características como fundamentais para a existência de políticas
industriais, todas elas podem ser identificadas na trajetória dos Governo
Cardoso e Lula, com intensidades e impactos variáveis:
(a) Uma burocracia tipicamente weberiana, objetiva, qualificada,
impessoal, com autonomia, mas com fortes vínculos com grupos e
setores econômicos (capital e trabalho), no sentido dado por Evans;
(b) A existência de organizações, grupos e atores, tanto de trabalhadores
quanto de empresários, em organizações com densidade política e
institucional, representatividade e capacidade de elaboração mais
estratégica, além de seus horizontes corporativos;
(c) A existência de instituições estatais ou para estatais capazes de
organizar as “arenas” de pactuação e negociação coletiva, inclusive o
funcionamento dos colegiados e câmaras setoriais;
(d) A existência de um sistema juridicamente viável de contrapartidas,
como no modelo corporativo clássico, de metas recíprocas entre
Governo, empresário e trabalhadores, como exemplo, a meta de
emprego e produção assumida pelo capital em contra parte à
incentivos fiscais equivalentes;
(e) O ambiente macroeconômico importa também, a estabilidade com
crescimento e baixa inflação pode assegurar a previsibilidade
necessária para ampliação dos investimentos. Por outro lado,
64
insegurança jurídica, juros altos que inviabilizam o crédito produtivo e
contribuem para a crescente financeirização, câmbios super
valorizados, etc., são fatores que dificultam a cooperação e a
coordenação entre atores.
As características da economia brasileira recente, em especial as políticas
industriais e no seu bojo a política de inovação tecnológica, parecem reproduzir
o modelo “Economia de Mercado Coordenado” ainda que com características
diferenciadas da experiência alemã, coreana ou japonesa.
Em síntese:
1. Sobre o referencial teórico necessário ao entendimento da trajetória do
capitalismo brasileiro recente, em especial da relação Estado e Sociedade: a
abordagem teórica da escola VariatiesofCapitalism(VoC) parece ser
adequada para entender a trajetória institucional da política industrial
brasileira, em particular o funcionamento das “arenas”. Ao introduzir o
conceito de “complementariedade institucional” (retomando a noção de North
de “matriz institucional”) fornece uma ferramenta teórica para entender como
as várias organizações públicas e privadas foram articuladas na produção da
política industrial recente, criando um regime de incentivos e restrições aos
comportamentos dos agentes e rejeitando a famosa tese da “convergência
institucional” defendida pelo Washington Consensus.28Ao elencar entre suas
categorias analíticas o grau de cooperação entre burocratas e empresários
modernos a abordagem se aproxima de autores vinculados ao neo-
institucionalismo e outras derivações como Evans (“autonomia inserida”),
Schnneider (“capitalismo político”) ou Chang (“perspectiva histórica
comparada”). Um dos elementos teóricos do programa de pesquisa proposto
pela VoC é a idéia de que a eficiência econômica depende da coordenação
que acontece em diversos níveis, intra-firmas, inter-firmas e entre atores
sociais e políticos. Hall e Soskice (op.cit.), enfatizam que ao ampliarem a
esfera deliberativa, certas instituições podem ampliara base de
28
O assim chamado “consenso de Washington” foi inicialmente um termo criado pelo economista John
Williamson numa conferência de organismos financeiros multilaterais na capital norte americana no final
dos anos oitenta, preconizava medidas fiscais, monetárias e cambiais de natureza liberal o que ajudou a
direcionar estes organismos para apoiar grandes processos de privatização, redução de gastos públicos e
reformas do Estado em diversos países da América Latina.
65
conhecimento comum que facilita o processo de coordenação. Além disso,
eles propõem o conceito da logic of appropriateness (lógica da adequação)
para entender a relação entre instituições e comportamento dos agentes,
que, digamos, “relativiza” a lógica racionalista strictu sensu29.Para concluir a
abordagem da VoC sinaliza claramente a possibilidade de mudança
institucional endógena através de processos de “reforma”, “defecção” e
“reinterpretação” (Hall e Thelen, 2009). Este último enfatiza a mudança
institucional através da mudança de idéias:
“…the actors associated with an institution leave its formal attributes intact but gradually change the content of the practices associated with it. In some cases, that entails reinterpreting a legal or regulatory regime. In others, it involves the gradual acceptance of practices that would not formerly have been seen as congruent with the continued existence of the institution. In comparison to ‘reforms’ discussed above that formally revise or abolish an institution…” (p.23)
2. A capacidade de cooperação entre agentes públicos e privados está
associada ao grau de convergência da opinião pública empresarial com as
ações de governo. Foi assim no período desenvolvimentista até a crise nos
anos oitenta e a crise do neoliberalismo nos anos noventa. A coordenação e
cooperação depende também da orientação estratégica da política industrial.
Ao fomentar incentivos e benefícios fiscais em setores intensivos em força
de trabalho (setores de móveis, calçados, têxteis, por exemplo) ou de valor
médio e superior (indústria automobilística) o governo conquistou apoio
destes segmentos. Paradoxalmente um governo de “centro-esquerda” teve
grande apoio do sistema financeiro por conta da política de juros elevada;
29
O conceito de “lógica da adequação” (appropriateness) foi criativamente trabalhado por James March
(March, 1994). Há uma “lógica das conseqüências” que só opera no processo decisório em casos restritos
e controlados, ela seque os princípios do comportamento racional. A incerteza cria risco e probabilidades
que são desconhecidas pelo ator, em cada opção. A estimação do risco dependeria a informação
disponível (que sempre é incompleta), do número de agentes envolvidos, da identificação de preferências
dos demais e do tipo de heurística decisória usada pelos outros. March é inspirado pela idéia simoniana de
“racionalidade aproximada ou suficiente” (satisficing=satisfy + suffice), e na linha dos racionalistas mais
críticos, acrescenta elementos ao modelo de decisão não típicos desta escola: percepção, identidade,
reputação, ideologia, instituições como estratégia, relações de poder, escolhas não-probabilísticas, mitos e
símbolos, etc. March sugere o “modelo da lata de lixo” (garbage can model) como o mais adequado
entender situações de alta complexidade e ambigüidade extrema, dada sua interatividade.
66
3. É verdade também que as instituições – vistas sobretudo como
“organizações para a ação” - de fato parecem funcionar no caso brasileiro,
como estratégias de superação dos dilemas de ação coletiva e redução dos
custos de transação coesianos. A reorganização de associações
empresariais – que romperam com a estrutura de monopólio da organização
sindical empresarial – cuja natureza extrapola a mera representação (ONIP,
ABIQUIM, p. exemplo) lograram elevar o debate público com governo num
novo patamar. Por outro lado o governo brasileiro, em especial no governo
Lula (cabe lembrar: um presidente surgido do ambiente sindical e
corporativista dos anos oitenta), estimula – com grande publicidade –
algumas “arenas” de “concertação” (CDES, CNDI e os assim chamados
“Foruns de Competitividade”, por exemplo) e novos arranjos institucionais (a
Agência Brasileira de Desenvolvimento Industrial é o significativo exemplo),
na tentativa de legitimar por um lado, mas controlar por outro, a crescente
demanda de novos empresários industriais;
4. Podemos concluir que o ambiente macro-economico, as condições
exógenas e a expectativa de negócios, são fatores com grande influência na
cooperação e coordenação entre atores públicos e privados. Por outro lado,
pari i pasu, com a boa vontade de ambas as partes em definir iniciativas
fundamentais do desenvolvimento brasileiro, havia (e há ainda) um conjunto
de crenças e temas que reforçam a não cooperação, a separação e a não
convergência de preferências e interesses. Em geral estes temas
permaneceram de um governo para outro (talvez a grande diferença entre os
dois governos analisados seja a disposição para o diálogo, maior em Lula
que em Cardoso, uma das hipóteses desta tese). Ainda que, todos os
pontos críticos da agenda governamental desde 1994: os debates sobre qual
o nível correto da taxa de juros, o excesso de carga tributária, o “custo brasil”
que é associado aos custos de logística, a grande burocratização do estado
e sobretudo a grande apreciação cambial que reduz nossa competitividade
externa, ainda são comuns aos dois governos;
5. Não são só fatores institucionais, choques externos ou re-significações
institucionais que explicam o processo de mudança. Há também a
concorrência de figuras e “elementos-chave” – empreendedores políticos -
67
que explicam o processo de mudança institucional, sobretudo do lado
empresarial para o processo de coooperação / não – cooperação. Estes
agentes “pivotais” são fundamentais para explicar os incentivos à
cooperação racional que explica a permanência das “arenas”, conforme
sugerido pela primeira hipótese de pesquisa. A título de exemplo, podemos
citar os presidentes responsáveis pela aproximação da FIESP às posições
do governo Lula e de um projeto mais desenvolvimentista, como Horácio
Lafer Piva e Paulo Skaf. Eles existiram também no governo: no Governo
Cardoso. Tivemos Pedro Malan, Gustavo Franco e Arminio Fraga, o primeiro
Ministro da Fazenda, os dois últimos, presidentes do Banco Central em
distintos momentos. No período Lula pesaram nas negociações da política
econômica os ex-ministros Antonio Palocci (Fazenda) e Fernando Furlan
(Desenvolvimento), os economistas Carlos Lessa eLuciano Coutinho
(presidentes do BNDES) e o sociólogo Glauco Arbix (Presidente do IPEA, à
época). É significativo lembrar a ausência deste debate dos setores
organizados dos trabalhadores, mesmo aqueles mais envolvidos como a
“Federação dos Metalúrgicos do ABC”, ligada à CUT, não aparecem nas
“arenas” e na produção de documentos defendendo suas posições (em que
pese terem acento formalizado no CNDI);
6. Não deixa de ser interessante que a geração de grandes consensos em
torno de políticas públicas que afetam diretamente a rentabilidade do capital
e a lógica da acumulação capitalista no Brasil (como são ou deveriam ser as
políticas industriais) tenham sido processos liderados por forças políticas de
centro-esquerda que estiveram durante quase vinte anos alijadas
completamente do poder federal. A esquerda fez um progressivo trade off
entre um programa transformador de natureza socialista (dez anos antes
Lula defendia, por exemplo, uma moratória unilateral da dívida externa) e a
governabilidade e os empresários industriais abriram mão da defesa do neo-
liberalismo e do mantra do Estado-Mínimo em troca de uma política
econômica que mantivesse a estabilidade herdada, mas também retomasse
investimentos públicos em infra-estrutura e reativasse um mercado interno
de massas.
68
3. Potencial e limites para uma abordagem integrada
Há na literatura de ciência política diversas abordagens que analisam a
formulação de políticas, o funcionamento dos governos e o processo decisório
em situações de assimetria de informações e altos custos de transação30. O
institucionalismo da escolha racional (IER), como vimos, por exemplo, enfatiza
que as organizações, ao estabilizarem as expectativas mútuas sobre o
comportamento futuro dos agentes, reduzem custos de transação e facilitam a
obtenção de estágios de equilíbrios cada vez mais otimizadores e racionais. O
“modelo da agência”, por exemplo, analisa situações que podem ajudar a
entender a operação da política industrial onde há grande assimetrias de
informação, o monitoramento dos empresários tem um alto custo para o
governo e os resultados das ações empresariais (os agentes), nem sempre tem
relação com o impacto obtido. Além disto, esta literatura ajuda a entender
porque é racionalmente pertinente supor que os governos tenham incentivos
para obter sucesso na execução de políticas (Miller, 2005).
Porém a literatura da escolha racional, ainda que ajude a compreender os
mecanismos mais imediatos e simplificados das escolhas e comportamentos
(micro fundamentos dos mecanismos), é insuficiente para analisar fatores
relacionados à processos históricos e estruturais, ou mesmo para entender o
impacto pontuado de fatores críticos exógenos. Por exemplo, o comportamento
oportunista de empresários industriais não se explica só pelo “regime de
incentivos”, mas também pela longa tradição de relacionamentos simbióticos
entre as elites industriais e as elites políticas no Brasil, pelas “redes de
políticas” e “comunidades de políticas” consolidadas durante décadas de
sucessos na trajetória industrial do Brasil. A própria natureza do Estado
brasileiro e os modelos de desenvolvimento adotados criam restrições e
possibilidades para a formação das preferências e interesses dos vários
agentes, como já foi sugerido pela dualidade conceitual “parceria/autonomia”,
cunhado por Peter Evans.
30
Consultar os diversos modelos sugeridos em Hill (2009) e Shepsle & Bonchek (1997).
69
Como vimos há na literatura neo-institucionalista diversas abordagens sobre os
modelos de mudança institucional que podem ajudar a explicar porque o
Governo Lula manteve basicamente os princípios da política econômica, mas
tentou inovar na política de desenvolvimento, ainda que a última dependesse
em grande parteda primeira (Thelen e Mahoney, 2010; Thelen e Streeck, 2004;
Hall, 2010).
O desafio metodológico então, é combinar as várias abordagens para obter um
quadro teórico suficientemente amplo e compreensivo que permita o
entendimento da complexidade destes mecanismos e “arenas” de
“concertação” na produção de políticas.
Metodologicamente, propõe-se combinar as explicações institucionalistas (IER,
HI e Idéias) conformando uma síntese e unidade complementar entre as
diversas abordagens (Weingast, 2005; Weingast e Katznelson, 2005;
Hall,2005, 2010). Acredita-se, com isso, uma maior capacidade de
compreensão destes fenômenos, em particular nas políticas econômicas e
desenvolvimento (política industrial). Há também uma preocupação
metodológica em identificar as possibilidades e ganhos na combinação das
abordagens, mas também em identificar limites e problemas teóricos surgidos
deste arranjo teórico-metodológico. Para realizar identificar estes “arranjos
institucionais” será necessário identificar quais mecanismos funcionaram no
processo político nos dois períodos de governo (Lula e Cardoso).
3.1 Os mecanismos e a causalidade nos processos políticos
Tilly define mecanismos da seguinte forma:
“ Mechanism - and process-based accounts explain salient features of episodes, or significant differences among them, by identifying within those episodes robust mechanisms of relatively general scope ... Similarly, they search for recurrent concatenations of mechanisms into more complex processes. Compared with covering law, propensity, and system approaches, mechanism- and process-based explanations aim at modest ends - selective explanation of salient features by means of partial causal analogies...”(2001, p.24).
70
Ele enfatiza a importância de uma visão histórica e comparativa, identificando
fatos, eventos e processos que adquirem relevância nas analogias. Tilly sugere
uma classificação dos mecanismos conforme os fatores preponderantes na sua
lógica interna ou dinâmica explicativa: podem ser ambientais se a influência de
fatores externos for dominante, relacionais, quando impactam nas conexões de
pessoas ou grupos e cognitivos quando implicam em alteração da percepção.
Os processos são sucessões de mecanismos, como por exemplo, o processo
de democratização do Brasil nos anos oitenta. Abordando a formação de
regimes democráticos Tilly indica uma transformação entre indivíduos e
governos que se realiza em três níveis diferentes: as ações políticas praticadas
pela população, a percepção da desigualdade e o fortalecimento das redes de
confiança. Em Tilly e outros (2008) há indicações de como mensurar e
identificar os mecanismos nos processos sociais e políticos. O primeiro deles é
a mudança de escala dos processos quando, por exemplo, as propostas de
grupos localizados, superando as fronteiras do meramente local, por processos
de negociação, criam identidades e transitam suas propostas para “arenas” e
instituições mais amplas. Um exemplo típico é a formação das agendas no
parlamento. A formação de coalizões entre os grupos seria outra forma, mais
etnográfica, para identificar formação de identidades, convergência de agendas
e unificação de pautas. Uma terceira forma seria a mensuração por indicadores
estatísticos (o processo de deserção das elites, por exemplo). As relações de
intermediação entre centro e periferia seria outra forma, a quarta, de
identificação dos mecanismos.
Os autores alertam para vários aspectos que julgamos útil sintetizar aqui
observando os requesitos metodológicos desta tese: não distorcer o significado
de episódios para confirmar um mecanismo; a natureza generalizante de um
mecanismo depende da profundidade e variedade dos estudos
comparativos;as mudanças de escala e contexto produzem resultados
diferentes, ainda que o mecanismos seja o mesmo e que o entendimento do
mecanismos será mais rigoroso quando métodos quantitativos e qualitativos
forem combinados, assim como abordagens metodológicas diferentes. A
mensuração de mecanismos não é trivial, como também reconhece Elster,
conhecido autor da linha racionalista:
71
“...diría que no es que pretenda afirmar que explicar los hechos mediante el uso de mecanismos sea lo ideal o la norma. Explicar a través de mecanismos es mejor aunque más difícil, mucho más de lo que generalmente se cree. Además, seré claro desde ahora, no sugiero que los mecanismos puedan ser identificados mediante condiciones formales análogas a las utilizadas em laformulación de leyes. Aducir “si P, entonces Q” es prácticamente inútil. La explicación por médio de mecanismos opera cuando y porque podemos reconocer um patrón causal en particular que es identificable a través de las circunstancias que rodean al hecho observado y que además puede proporcionar una respuestainteligible a la pregunta: ¿por qué ese individuo hizo aquello?” (2005, p. 246).
Há diversos exemplos na literatura examinada nesta revisão que ajudam a
entender a lógica analítica dos mecanismos. A abordagem de Evans (1996,
2001, 2003) conhecida como o “modelo de autonomia e parceria” (embedded
autonomy), pode ser entendida como um mecanismo explicativo das relações
entre grupos econômicos, em particular empresários industriais e as formas de
Governo, no âmbito dos modelos de desenvolvimento. Evans adota os
seguintes pressupostos na auto denominada “síntese institucional
comparativa”:
(a) o comportamento dos Estados não pode ser deduzido pela agregação das motivações individuais e diferentes estruturas estatais implicam em níveis de eficácia diferenciados;
(b) a burocracia pública não é “maximizadora de satisfação”; (c) as decisões dependem de contextos institucionais
complexos e interações históricas enraizadas; (d) estes contextos e interações conformam estruturas e
padrões aceitos, anteriores aos “interesses individuais” e (e) o funcionamento dos mercados depende das conexões com
redes formais e informais que formam uma cultura. Evans se apóia num conjunto de autores (Weber, Gerschenkron, Hirschman,
Amsden, Wade, North e Bates) para entender o Estado como uma criação
histórica, contingente onde Estado e Sociedade são mutuamente constitutivos.
A análise é histórica e processual, não-funcional. A transformação mutua
estado-sociedade implica numa relação dialética entre parceria e autonomia.
Evans fala claramente num conjunto de normas e estruturas que criam “tipos-
ideais” de Estado (predadores e desenvolvimentistas) conforme o grau de
72
autonomia e parceria histórica e contextualmente estabelecido. Esta relação
viabiliza uma verdadeira sinergia público-privada:
“...the best way to understand synergy is as a set of public/private relations built around the integration of complementarity and embeddedness (Evans, 1996, p.1124) e “…creative action by government organizations can foster social capital; linking mobilized citizens to public agencies can enhance the efficacy of government. The combination of strong public institutions and organized communities is a powerful tool for development. (idem, p. 130).
Em cada contexto o Estado poderá assumir formas específicas (demiurgo,
parteiro, etc.). Em Evans operariam “mecanismos de causação circular” ou
recíproca, entre empresários e Governos, conforme a direção destes
mecanismos, se formam estados “predadores” ou estados
“desenvolvimentistas”. Em Evans as sementes da mudança são endógenas
sobretudo, regimes predatórios, por exemplo põe em marcha redes e grupos
que serão o germe da mudança. O mecanismo proposto por Evans de
“autonomia e parceria” se configura como uma teoria de médio alcance sobre o
processo de interação entre o Estado e grupos organizados nas disputas pelos
projetos e modelos de desenvolvimento industrial.
Encontramos outro exemplo emblemático em Robinson (2006). Esta autor faz
uma análise dos impactos do desenvolvimento econômico na democracia. O
autor sugere um processo (conjunto de mecanismos) interconectando
desenvolvimento e democracia. Estes mecanismos seriam: a ação coletiva da
população reivindicando mais liberdade, as condições de credibilidade do
regime, o trade off para as elites entre custo da repressão e custo da ampliação
da liberdade, os choques e as crises externas, a natureza da riqueza das elites,
se industrial ou rural e o grau de desigualdade de renda inter-grupos. A
democratização se explicaria pelo crescimento da ação coletiva em função da
grande desigualdade existente e da urbanização, e perda de credibilidade (um
problema de mecanismo cognitivo) das elites que passariam a perceber a
ampliação da democracia como menos custosa que o risco revolucionário.
Robinson se apoia num conjunto de autores (Acemoglu, Moore, Dahl,
73
O´Donnell) para afirmar também que faz parte deste mecanismo a luta política
para mudar as instituições, reforçando também o papel do conflito e do agente.
Robinson vai sofisticar este mecanismo que associa desenvolvimento à
democracia dizendo que o mecanismo só vai operar com sentido (isto é como
um nexo) no longo prazo. Isto se verificaria, como sugere o autor,pela
existência de “histórical critical junctures”:
“…over long periods of time, income per capita and democracy are positively correlated because countries move along development paths where these two variables are jointly determined—probably by economic institutions, ... Whereas the first view is connected to a long-run version of the modernization hypothesis, the second view is closely related to the work of scholars who emphasize how the institutions of societies diverge as the result of historical critical junctures. At critical junctures, societies diverge because of key differences. These differences may stem from the nature of the feudal legacy (Moore, 1966), the organization of labor movements (Collier & Collier 1991), the integration of countries into world markets (Mahoney 2001), or the initial conditions and factor endowments in European colonies at the time of colonization [Engerman & Sokoloff (1997), Acemoglu et al. (2001, 2002)]…” (2008, p. 523).
Cada um destes fatores históricos críticos poderiam ser considerados como
mecanismos em si mesmos, peculiares para cada contexto e período histórico,
como sugeriu Tilly.
A abordagem dos mecanismos relacionais permite,enfrentar de modo
satisfatório o dilema clássico dos debates metodológicos nas ciências sociais
sobre o ponto correto do trade off entre a capacidade de generalização das
teorias (como leis gerais,por exemplo) e a necessidade do conhecimento em
profundidade e detalhe dos fenômenos políticos. As “relações de confiança” em
Putnam, a “autonomia da burocracia publica” em Evans ou o “custo da
repressão” em Robinson são todos elementos singulares (no mesmo sentido
apontado por Weingast, 2005) agindo como causas de processos mais
complexos e abrangentes da democracia. Que podem, por sua vez – sob
certas condições históricas (que devem ser explicitadas e explicadas pelo
pesquisador) – viabilizar analogias explicativas parciais e localizadas. Esta é
exatamente a definição de “mecanismos e processos” de Tilly.
74
O fundamental é entender, como diz Mahoney (2001, 2009), que as
explicações por mecanismos não são “novos achados” na realidade, mas
relações construídas teoricamente que abrem a “caixa preta” da causação dos
fenômenos sociais, que nos permitem entender melhor a relação entre “X” e
“Y”. A explicação por mecanismos nos conduz à uma estratégia de pesquisa
parcimoniosa, cumulativa e provisória, na perspectiva da verossimilhança
popperiana. Uma perspectiva que ao mesmo tempo, resiste à sedução teórica
das “grandes narrativas” (que explicam tudo, sem explicar nada) e ao
singularismo dos “casos únicos”. King, Keohane e Verba (1994) já diziam que o
problema não é saber se o evento é único ou não (a Revolução Francesa, por
exemplo), mas se as questões chave da realidade social que nós precisamos
entender podem ser abstraídas/inferidas da massa de fatos brutos deste
evento. A explicação por mecanismos tenta fazer isto, capturar o “blooming and
buzzing” do mundo real, equilibrando-se no meio termo entre a generalização e
o “caso único”.
4. O estudo de caso
O institucionalismo histórico está focado na compreensão da complexidade dos
fenômenos, normalmente em estudos de caso, para produzir generalizações de
médio alcance e contribuir com sistemas teóricos mais abrangentes, de forma
indireta. Não há a possibilidade, neste marco teórico-conceitual, de teorias
gerais que prescindam de verificações empíricas. Para Hall (2003), quando
abordou problemas de natureza metodológica, não podemos separar
metodologia de ontologia, isto é, um dos fatores que determina a natureza da
pesquisa são as suposições que o pesquisador faz sobre como deve funcionar
a realidade social. Quando a motivação dos atores é parte fundamental pelo
interesse na pesquisa, os métodos quantitativos perdem muito sua eficácia.
Hall define as principais características das relações causais nos eventos
sociais: (a) a existência de efeitos de interação entre as variáveis; (b) a
ocorrência de multicausalidade; (c) os efeitos inter-variáveis dependem muito
do tempo e do seqüenciamento como ocorrem; (d) existência de
multicolinearidade; (e) variáveis dependentes e independentes se influenciam
75
mutua e simultaneamente. O trabalho de pesquisa central é identificar os nexos
causais entre os eventos, identificar os mecanismos pelos quais se pode
explicar os eventos, nos exemplos que abordamos antes seria como responder
as seguintes perguntas: como ocorre o processo de autonomia e parceria?
Como a democracia se relaciona com o desenvolvimento econômico? Ou como
a confiança e a reputação geram comportamentos coordenados e
cooperativos?
Este procedimento investigativo que faz um verdadeiro rastreamento de
processos (process tracing) foi sugerido por George e Bennett (2005) como
fundamental para gerar inúmeras observações de casos singulares e
sistematizá-las numa explicação causal. Eles recomendam estudos
comparativos para complementar as inferências causais. Os estudos de caso
assim se configuram em um exame detalhado de um evento e seu contexto
para testar explicações que podem explicar eventualmente outros eventos em
contextos similares ou diferentes (George e Bennet, 2005; Yin, 2003).
Conforme Borges (2007), os estudos de caso são criticados a partir de três
argumentos. O primeiro é sobre a natureza indeterminada do desenho de
pesquisa que tem um “N” muito pequeno (número de casos menor que número
de variáveis independentes em potencial). Um segundo problema seriam os
desvios de seleção, já que a seleção de amostra não segue o critério da
aleatoriedade. Um terceiro problema se relaciona à confusão nos estudos
comparativos entre as variáveis dependentes que podem ser necessárias e/ou
suficientes dependendo do tipo de comparação, se por semelhanças ou por
diferenças. Borges sugere algumas vantagens do método de estudo de caso:
(a) um único caso pode produzir uma multiplicidade de observações (N), ainda
mais se for comparativo e contribuir com métodos de escolha ou análise que
poderão ser empregadas em outros casos e contextos (George e Bennet,
2005); (b) a definição do escopo da população a ser comparada não é aleatória
porque é um dos objetivos da pesquisa, assim o problema do “viés de seleção”
fica relativizado; (c) pode-se testar hipóteses probabilísticas sem recorrer aos
métodos de regressão e permitem trabalhar com situações de heterogeneidade
causal (não independência entre as observações). Segundo Borges:
76
“... os estudos de caso são particularmente úteis para a análise de fenômenos marcados por interações complexas entre as variáveis, equifinalidade, causalidade recíproca, e outros tipos de complexidade causal. Em particular, este tipo de abordagem permite ao pesquisador ir além da mera identificação de uma correlação entre uma variável explicativa x e uma variável dependente y, mas também revelar, de forma detalhada e a partir de múltiplas observações, as seqüências e processos causais que conectam x a y... A grande vantagem metodológica dos estudos de caso estaria, neste sentido, na possibilidade de identificação de mecanismos e seqüências causais, os quais tendem a ser deixados de lado ou, no máximo, presumidos, pelos estudos quantitativos de grandes amostras.” (p. 17)
4.1 Delimitação do objeto de estudo
Conforme já comentado o objetivo da pesquisa é analisar a evolução da
política industrial no período que vai de 1995 a 2010, comparando dois
governos, do Presidente Fernando Henrique Cardoso (1995/2002) com o
período do Presidente Lula (2002/2010). Como a política industrial latu sensu é
considerada pela literatura a partir de uma ampla gama de diretrizes,
estratégias e instrumentos (Peres e Primi, 2009; Cimoli, Dosi e Stiglitz, 2009), o
foco da pesquisa será limitado pelas diretrizes, estratégias e instrumentos
relacionados às políticas de Ciência, Tecnologia e Inovação (C,T & I).
As políticas e “arenas” que compõem o objeto da pesquisa – na ordem
cronológica de início ou criação - são as seguintes:
No Governo Cardoso:
1. Criação do Programa de Apoio à Capacitação Tecnológica da
Indústria, 1993;
2. Implantação das Câmaras Setoriais, 1995;
3. Criação dos Fundos Setoriais de Ciência e Tecnologia, 1999;
No Governo Lula:
4. Criação da Política Industrial, Tecnológica e de Comércio Exterior
(PITCE); 2004;
5. Criação da Agência Brasileira de Desenvolvimento Industrial, 2005;
77
6. Implementação do Conselho Nacional de Desenvolvimento Industrial,
2005;
7. Criação do Plano Ciência, Tecnologia e Inovação para o
Desenvolvimento Nacional (PACTI), 2007;
8. Criação da Política de Desenvolvimento Produtivo (PDP), 2008.
O objetivo é analisar os processos causais, os mecanismos relacionais e a
seqüência de eventos temporais na política industrial. Identificar atores,
preferências e motivações para compreender a complexidade dos fenômenos e
eventos ocorridos. Considerando comparativamente fatores como a multi-
causalidade entre os processos, os diferentes contextos e trajetórias, os
eventuais choques externos, a distribuição de poder, o funcionamento das
“arenas” de interação entre burocratas e empresários e a disseminação de um
novo ideário sobre participação e desenvolvimento.
O objetivo, portanto não é identificar e explicar eventuais resultados isolados ou
setoriais da política industrial brasileira dos últimos dezesseis anos, seu mérito
ou desempenho. O objetivo é analisar o processo de mudança institucional e a
relação biunívoca com o comportamento dos atores sociais e governamentais
envolvidos, identificando as variáveis e sua dinâmica de funcionamento.
A variável dependente do estudo é o processo de mudança institucional na
política industrial, para os períodos Cardoso/Lula. As variáveis que
hipoteticamente podem explicar este processo teoricamente são muito amplas
e possivelmente desconhecidas. Cabe, sobretudo, identificar os nexos causais
a partir dos referenciais teóricos já comentados. A suposição é de que as
variáveis independentes não exercem implicações e efeitos lineares e
absolutamente independentes umas em relação às outras. Observando este
cuidado, podemos elencar provisoriamente as seguintes variáveis explicativas:
(a) a dinâmica dos mecanismos de interação público/privada, sobretudo o
CNDI, sua situação anterior e evolução no período de estudo; (b) a evolução
das idéias da política de Ciência, Tecnologia e Inovação; (c) a evolução do
ideário sobre desenvolvimento nacional; (d) a trajetória dos empresários
industriais, em especial de suas entidades representativas; (e) a natureza,
interesses e a evolução do comportamento da burocracia governamental das
78
organizações envolvidas no processo de formulação e execução da política
industrial e finalmente (f) a dinâmica da conjuntura econômica – interna e
externa –e o contexto político geral do período de análise.
4.2 A estratégia de Pesquisa
Retomando as perguntas básicas da pesquisa e suas respectivas hipóteses:
I - Como se explica a criação e o funcionamento de “arenas” de “concertação”
público/privada em políticas industriais, no Governo Cardoso e no Governo
Lula?
(H1) Os Governos Lula e Cardoso utilizaram mecanismos de
“concertação” que resultaram em processos de cooperação e
coordenação com o setor privado transferindo total ou parcialmente o
ônus da decisão aos agentes diretamente envolvidos nos custos e
benefícios destas políticas para diminuir eventuais perdas de capital
político;
(H2) o governo Lula criou e manteve “arenas” sobre a política industrial
influenciado pelo ideário “neo-desenvolvimentista” e participativo e este
aspecto constitui a maior diferença entre os dois períodos de governo.
II - Qual o efeito das “arenas” de coordenação na política industrial?
(H3) as “arenas” modificam os incentivos racionais dos atores em direção
a uma maior cooperação.
As perguntas principais serão desdobradas em perguntas complementares que
servirão de base para estruturar um roteiro de abordagem nas entrevistas.
A pesquisa será conduzida tendo como caso principal a política industrial no
período do Governo Lula e como caso secundário a mesma política no governo
Cardoso. Para o caso principal e secundário informações serão obtidas em
fontes primárias tais como atas de reuniões, relatórios técnicos, projetos de lei,
notas e pareceres técnicos. Além disso, a pesquisa será apoiada por fontes
secundárias, como o trabalho de Giesteira (2010) e Hirata (2006).
79
4.2.1 Eventos críticos na trajetória do CNDI
Na trajetória do CNDI há um conjunto de eventos críticos que impactaram de
forma crítica na política industrial brasileira recente, quase todos sugeridos ou
no âmbito das políticas industriais do período (a PITCE/MDIC e o PACTI/MCT).
Em especial aqueles relacionados à mudança de marcos regulatórios,
incentivos fiscais e lançamento de instrumentos específicos. As pautas mais
importantes do CNDI, conforme a leitura de suas atas e degravações dos
debates estão relacionados abaixo, em ordem cronológica, de 2004 (primeiras
reuniões informais do Conselho), até o final de 2007:
1. Aprovação da nova Lei de Informática (Lei 11.077, de 30/12/04;
regulamentada pelo Decreto 5.906, de 26/09/06).
2. Nova Lei das Parcerias Público-Privadas – PPP (Lei 11.079, de
30/12/04).
3. Introdução do biodiesel na matriz energética brasileira (Lei 11.097, de
13/01/05).
4. Aprovação da Lei de Biossegurança (Lei 11.105, de 24/03/05).
5. Redução a zero das alíquotas de IPI para bens de capital (Decreto
5.468, de 15/06/05).
6. Aprovação da “Lei do Bem” (Lei 11.196, de 21/11//05; regulamentada
pelo Decreto 5.798, de 07/07/06).
7. Instituição do Regime Especial de Tributação para a Plataforma de
Exportação de Serviços de Tecnologia da Informação – REPES (Lei
11.196, de 21/11//05).
8. Regulamentação do Regime Especial de Aquisição de Bens de Capital
para Empresas Exportadoras – RECAP (Decreto 5.649, de 29/12/05).
9. Criação da Secretaria de Comércio e Serviços do MDIC.
10. Criação da Rede Nacional de Agentes de Política Industrial – RENAPI
(abr/06).
11. Criação do Sistema Brasileiro de Televisão Digital – SBTVD-T (Decreto
5.820, de 29/06/06).
80
12. Lançamento da Lei Geral da Microempresa e Empresa de Pequeno
Porte (Lei Complementar 123, de 14/12/06).
13. Lançamento da Política de Desenvolvimento da Biotecnologia e criação
do Comitê Nacional de Biotecnologia – CNB (Decreto 6.041, 08/02/07).
14. Criação do Programa de Apoio ao Desenvolvimento Tecnológico da
Indústria de Semicondutores – PADIS e do Programa de Apoio ao
Desenvolvimento.
15. Tecnológico da Indústria de Equipamentos para a TV Digital – PATVD
(Lei 11.484,de 31/05/07).
16. Lançamento do Plano de Ação, Ciência e Tecnologia (PACTI) pelo MCT
(nov/07).
17. Implementação do Novo PROFARMA/BNDES (nov/07).
18. Instituição do Sistema Brasileiro de Tecnologia – SIBRATEC (Decreto
6.259, de 20/11/07).
19. Criação da Rede Nacional para a Simplificação do Registro e da
Legalização de Empresas e Negócios - REDESIM (Lei 11.598,
03/12/07).
Optamos por concentrar nossos procedimentos de pesquisa (em especial o
roteiro de entrevistas) em eventos selecionados conforme os seguintes
critérios: (a) sua representatividade para a política industrial do período, com
foco para ciência & tecnologia, combinando medidas legais, incentivos fiscais e
estruturas institucionais novas; (b) a natureza e o impacto na indústria; (c) a
possibilidade de explorar com mais riqueza e flexibilidade os instrumentos de
pesquisa e as fontes primárias, conforme a metodologia adotada. São eles, em
ordem cronológica:
• Aprovação da nova Lei de Informática (Lei 11.077, de 30/12/04;
regulamentada pelo Decreto 5.906, de 26/09/06).
• Redução a zero das alíquotas de IPI para bens de capital (Decreto
5.468, de 15/06/05).
• Aprovação da “Lei do Bem” (Lei 11.196, de 21/11//05; regulamentada
pelo Decreto 5.798, de 07/07/06). [regimes fiscais especiais para
empresas de base tecnológica exportadoras).
81
• Lançamento da Lei Geral da Microempresa e Empresa de Pequeno
Porte (Lei Complementar 123, de 14/12/06).
• Lançamento da Política de Desenvolvimento da Biotecnologia e
criação do Comitê Nacional de Biotecnologia – CNB (Decreto 6.041,
08/02/07).
• Instituição do Sistema Brasileiro de Tecnologia – SIBRATEC (Decreto
6.259, de 20/11/07).
A seguir um quadro síntese que relaciona as questões de pesquisa e as
hipóteses relacionadas com as fontes primárias de pesquisa a partir de um
conjunto de perguntas que detalham e desenvolvem as questões iniciais.
4.2.2 Seleção dos entrevistados
Os entrevistados são os membros titulares participantes do Conselho Nacional
de Desenvolvimento Industrial no período de 2005 a 2007. É um grupo
composto por gestores públicos do primeiro escalão governamental, líderes
industriais nacionais e representantes de duas centrais sindicais de
trabalhadores. Eventualmente outros entrevistados poderão ser procurados
para complementar ou esclarecer pontos específicos ou questões novas
surgidas no decorrer da pesquisa, ou ainda substituir eventuais desistências.
Além dos participantes do CNDI pretende-se entrevistar um outro segmento
responsável pela produção de informações, processamento de conhecimento
para o processo decisório e formadores de opinião. Este grupo é normalmente
heterogêneo e é composto por quadros técnicos do setor público em posição
de assessoramento superior, professores de centros de pesquisa acadêmica,
gestores de organizações com papel de think tank, geralmente de assessoria
às entidades empresariais, etc.
A lista de entrevistados está no ANEXO I.
4.2.3 Roteiro de questões (estrutura sugerida):
82
Para o caso principal serão realizadas entrevistas semi-estruturadas com
especialistas e participantes dos eventos analisados, em especial os membros
do Conselho Nacional de Desenvolvimento Industrial. Este conselho foi a arena
mais relevante para o processo de mudança institucional e interação entre
atores públicos e privados na política industrial brasileira e teve especial
relevância entre os anos de 2005 e 2007 quando realizou 14 reuniões formais.
O roteiro de questões objetiva identificar com os participantes deste processo,
divididos em quatro segmentos (empresários, trabalhadores, burocratas e
academia), as diferentes percepções sobre o funcionamento, papel, impacto e
dinâmica de mudança institucional das “arenas” de política industrial nos dois
governos analisados.
O conjunto de questões descritas a seguir tem a natureza de um roteiro, isto é,
um “fio condutor” que deverá orientar o diálogo com os entrevistados. Como as
pautas das “arenas” foram muito diversificadas (veja-se a relação de temas do
CNDI adiante) e os atores envolvidos tem muitas peculiaridades, cada
entrevista deverá sofrer processos de adaptação na medida em que forem
acontecendo. Esta observação é importante porque será importante captar na
manifestação dos envolvidos em aspectos únicos ou pautas específicas para
identificar protocolos de negociação, alianças táticas e estratégicas, mudanças
de preferências e interesses, coalizões e confrontos manifestos ou não, etc.
O roteiro de questões está no ANEXO II.
83
4.3 Quadro síntese das Questões, Hipóteses e fontes de pesquisa
Questões Questões derivadas Fontes de Pesquisa (I) Como se explicam a criação e o funcionamento destas “arenas” no governo
Cardoso e no Governo Lula? (H1) Os Governos Lula e Cardoso utilizaram mecanismos de “concertação” que resultaram em processos de cooperação e coordenação com o setor privado transferindo total ou parcialmente o ônus da decisão aos agentes diretamente envolvidos nos custos e benefícios destas políticas para diminuir perdas de capital político.
1. Como o governo tratava as reivindicações do setor privado?
2. Como acontecia o processo decisório?
3. Como negociavam as partes envolvidas?
4. Como o governo dava publicidade aos resultados das reuniões?
5. Em que medida sugestões dos fóruns eram incorporadas nas políticas oficiais do governo?
6. Os temas do CNDI era debatidos em outros fóruns do Governo como o CDES?
1. Entrevistas de autoridades do governo / Pesquisa de mídia impressa (clipping)
1. Relatórios Técnicos do MDIC. 2. Atas de Reunião CNDI. 3. Degravações das reuniões do CNDI. 4. Documentação dos Planos Plurianuais
do período Lula e Cardoso. 5. Entrevistas com representantes
membros do CNDI do governo. 6. Exposição de Motivos de Leis e
Decretos discutidos no CNDI. 7. Registros dos debates no Congresso
Nacional sobre as Medidas Provisórias aprovadas pelo CNDI.
(H2) o governo Lula criou e manteve “arenas” sobre a política industrial influenciado pelo ideário “neo-desenvolvimentista” e participativo e este aspecto constitui a maior diferença entre os dois períodos de governo
1. Quais eram as
idéias/programas do Gov. Lula sobre o tema?
2. Quais eram as idéias sobre participação no Gov. Lula?
3. Que diferenças de idéias sobre desenvolvimento e participação podem ser identificadas nos dois governos?
4. Os debates no Conselho de Desenvolvimento Economico e Social repercutiam sobre o CNDI?
2. Textos do Programa Eleitoral de Lula. 3. Textos do Programa Eleitoral de
Fernando Henrique Cardoso. 4. Documentação dos Planos Plurianuais
do período Lula e Cardoso. 5. Discursos do Presidente e Ministros no
CDES e CNDI. 6. Entrevistas com representantes
membros do CNDI. 7. Degravações das reuniões do CNDI. 8. Atas das reuniões do CDES. 9. Pesquisa de mídia impressa (clipping)
(II) Qual o efeito das “arenas” de coordenação na política industrial ?
(H3) incentivos racionais dos atores em direção a uma maior cooperação
1. Qual era a dinâmica de formulação de proposta nos fóruns?
2. Como acontecia o processo decisório e de formação da agenda?
3. Como eram sistematizadas as divergências internas ao governo e internas ao setor privado?
4. Os participantes tinham acesso a todas informações envolvidas no processo decisório?
5. Havia mecanismos de monitoramento e controle das decisões?
6. Como eram decididas as contrapartidas do setor privado?
1. Atas de Reunião CNDI. 2. Degravações das reuniões do CNDI. 3. Entrevistas com representantes
membros do CNDI. 4. Relatórios Técnicos do MDIC, MCT e
ABDI sobre a performance da política industrial.
5. Exposição de Motivos de Leis e Decretos discutidos no CNDI.
6. Registros dos debates no Congresso Nacional sobre as Medidas Provisórias aprovadas pelo CNDI.
84
5. Cronograma
I - Revisão teórica dos modelos teóricos aplicáveis ao objeto de pesquisa e
definição dos modelos conceituais de referência para a pesquisa; revisão da
literatura geral e específica e elaboração do Projeto para qualificação.
II - Pesquisa de campo: acesso, coleta e sistematização de dados primários e
secundários relacionados à identificação dos interesses, posicionamentos e
estratégias dos principais atores, grupos e redes relacionados ao problema de
pesquisa (variáveis independentes); aplicação dos questionários.
III – Sistematização dos roteiros de questões e dados em fontes primárias e
secundárias, elaboração do modelo explicativo proposto a partir das
referências teóricas adotadas e dos resultados de pesquisa de campo.
IV – Redação final da tese.
V – Revisão, edição final da tese e defesa.
Ano 2011 Ano 2012
mês 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12
I
II
III
IV
V
85
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91
ANEXO I
Entrevistados
Membros do Conselho Nacional de Desenvolvimento Industrial (2005 –
2007):
Representando a sociedade civil:
Armando de Queiroz Monteiro Neto (Confederação Nacional da Indústria) João Carlos Gonçalvez ( Força Sindical) Walquíria Pereira Aires ( Federação das Indústrias de Brasília) Josué Gomes da Silva ( Coteminas e Associação Brasileira da Indústria Têxtil) Paulo Godoy (Associação Brasileira da Indústria de Base) Amarílio Proença de Macedo (J Macedo – grupo privado) Maurício Botelho (EMBRAER) Marcus Vinicius Pratini de Moraes (Associação Brasileira dos Exportadores de Carnes) Eugênio Emílio Staub (Gradiente - grupo privado) Jorge Gerdau Johanpeter (Grupo Gerdau - grupo privado) Osmar ZogbI (Ripasa e Bracelpa - grupo privado) Luiz Marinho (Central Única dos Trabalhadores - CUT) João Felício (Central Única dos Trabalhadores - CUT) Arthur Henrique da Silva (Central Única dos Trabalhadores - CUT) Antonio Fernandes dos Santos Neto (Central Geral dos Trabalhadores do Brasil) Luiz Carlos Delben Leite (Associação Brasileira de Máquinas e Equipamentos)
Representando o Governo Federal:
Luiz Fernando Furlan Miguel Jorge José Dirceu Dilma Roussef Eduardo Campos Sérgio Machado Rezende Antonio Palocci Guido Mantega Celso Amorim Nelson Machado (Interino) Paulo Bernardo Silva Ciro Gomes Pedro Brito Nascimento Marina Silva Silas Rondeau Cavalcante Silva Roberto Rodrigues Luis Carlos Geudes Pinto
92
Ricardo Berzoini Luiz Marinho Alfredo Pereira do Nascimento Paulo Sérgio Oliveira Passos Luiz Dulce Guido Mantega Demian Fiocca
Outros entrevistados (nomes a definir) Público-alvo:
• Acadêmicos da UNICAMP, USP, UFRJ e UFMG (núcleos de política
industrial e tecnológica);
• Assessoria técnica e think tank do setor privado: gestores do Instituto de
Estudos e Desenvolvimento Industrial (IEDI), assessoria técnica da CNI,
da ABIMAQ, da ABINEE e da ONIP;
• Institutos estatais ou para-estatais: quadros técnicos do Centro de
Gestão e Estudos Estratégicos (CGEE), da Agencia Brasileira de
Desenvolvimento Industrial (ABDI), do Banco Nacional de
Desenvolvimento Industrial (BNDES) e da Financiadora de Estudos e
Projetos (FINEP);
93
ANEXO II
Roteiro de Questões
Bloco I: Identificação do entrevistado, em particular, se também participou dos
debates de política industrial nos dois governos;
Bloco II (perguntas válidas para participantes de “arenas” em ambos governos,
quando aplicável ao entrevistado):
BLOCO I
Roteiro comum a todos os segmentos:
1. Quais foram as principais diferenças na política industrial entre o governo
Lula e o governo Fernando Henrique Cardoso?
2. Quais foram os principais problemas de coordenação na política industrial
no governo Lula e no governo Fernando Henrique Cardoso?
3. Você acha que os problemas de coordenação interna no Governo e deste
com o setor industrial foram importantes para a política industrial no
Governo Lula ? Explique.
4. Qual sua opinião sobre o papel ou a função do Conselho Nacional de
Desenvolvimento Industrial, em especial, entre os anos de 2005 e 2007?
5. O governo levou a sério as discussões no Conselho? Justifique.
6. Como era o processo decisório dentro do Conselho, em especial, quando
havia divergência entre membros do governo e destes com
representantes do setor privado (industriais e centrais sindicais)?
7. Explique os principais motivos que o levaram a participar daquele
Conselho e participar de seus debates?
8. Você acha que existe alguma ideologia ou conjunto de idéias especiais do
governo Lula que justificaram ou embasaram a criação do CNDI?
9. Se o CNDI não houvesse existido, por hipótese, haveria alguma mudança
substancial na política industrial durante o governo Lula?
94
Objetivo: este bloco de perguntas permite aferir a viabilidade do conjunto das
hipóteses de pesquisa segundo a percepção dos quatro segmentos listados,
bem como, cruzar respostas para identificar a criação de identidades,
convergências e divergências sobre o funcionamento das “arenas” nos dois
governos, os incentivos existentes e o grau de influencia do ideário “neo
desenvolvimentista” e participativo do Governo Lula.
BLOCO II
Para empresários industriais (foco nos participantes do CNDI e
presidentes de associações empresariais industriais)
1. Na sua opinião, houve diferenças entre o Governo Lula e o Governo F.H.
Cardoso no que diz respeito ao relacionamento entre governo e
empresários do setor industrial ? Explique.
2. Que avaliação você faz da evolução da organização dos empresários
industriais como classe, categoria ou grupo de pressão desde o Governo
Cardoso?
3. Quais seriam as principais reivindicações ou demandas dos empresários
industriais no Governo Cardoso e o que mudou no Governo Lula?
4. A política industrial do governo Lula estabeleceu contrapartidas para o setor
empresarial? Você poderia citar algum exemplo?
5. Como você avalia o engajamento de empresários da indústria na campanha
eleitoral de Lula, e depois de eleito, na elaboração da política industrial?
Objetivo: avaliar a percepção do empresariado industrial sobre os diferentes
mecanismos de interação nos dois governos.
Entrevistados: membros titulares do CNDI e líderes de associações industriais
nacionais.
95
Para representantes de organizações sindicais nacionais de
trabalhadores na indústria:
1. Na sua opinião houve diferenças entre o Governo Lula e o Governo F.H.
Cardoso no que diz respeito ao relacionamento entre governo e entidades
sindicais de trabalhadores do setor industrial? Explique.
2. Na sua opinião como foram as relações da sua organização sindical como o
Governo Lula, desde a época da campanha ou com o PT, e depois durante
o seu governo?
3. Numa conjuntura de crescimento econômico como tem ocorrido nos últimos
anos as demandas do movimento sindical mudaram? Em que sentido?
4. As idéias mais gerais que orientaram a ação sindical durante o Governo
Cardoso permaneceram iguais no Governo Lula? Porque?
Objetivo: avaliar a percepção do empresariado industrial sobre os diferentes
mecanismos de interação nos dois governos.
Entrevistados: membros titulares do CNDI da CUT e Força Sindical.
Para gestores públicos federais da área:
1. O CNDI influenciou o nível de coordenação interna no governo? Explique.
2. Como era o processo decisório dentro do Conselho, em especial, quando
havia divergência entre membros do governo e destes com representantes
do setor privado (industriais e centrais sindicais)?
3. Os debates no CNDI eram orientados por estudos técnicos? Nos casos
afirmativos, a existência de tais estudos foi importante para as decisões
e/ou encaminhamentos finais?
4. Quando o governo discutiu a criação do CNDI em 2004, quais eram os
debates, as dúvidas ou divergências quanto a sua função, composição,
estrutura e funcionamento? Você lembra das principais posições das
pessoas envolvidas?
96
Objetivo: avaliar a percepção da burocracia federal sobre os mecanismos de
funcionamento da arena e estratégias de negociação. No caso de entrevistas
com quadros intermediários, do corpo de assessoria técnica, é grande a
probabilidade de obter avaliações comparativas dos dois governos, já que a
burocracia intermediária do Governo Lula é muito semelhante à do Governo
Cardoso.
Entrevistados: Ministros, Secretários, Diretores e Coordenadores envolvidos
na política industrial do governo Lula e do Governo Cardoso, no MDIC
(Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior), MCT (Ministério
da Ciência e Tecnologia), IPEA (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada),
APEX (Agência de Promoção de Exportações e Investimentos) e ABDI
(Agência Brasileira de Desenvolvimento Industrial).
Para acadêmicos da área, consultores, entidades de pesquisa da área e
centros de assessoria:
1. Você e/ou sua instituição influenciaram de alguma maneira a elaboração
de propostas para debatenos fóruns da política industrial do Governo
Lula e do Governo Cardoso ? Explique.
Objetivo: identificar influência de formadores de opinião e centros de think tank
na formulação da política industrial e na interação do discurso técnico com o
discurso político.
Entrevistados: acadêmicos da UNICAMP, USP, UFRJ e UFMG; gestores do
Instituto de Estudos e Desenvolvimento Industrial (IEDI), assessoria técnica da
CNI, da ABIMAQ, da ABINEE e da ONIP; gestores do Centro de Gestão e
Estudos Estratégicos (CGEE);
97
ANEXO III
Estrutura textual provisória da tese:
1. Introdução
a. Apresentação do tema b. Relevância e Justificativa
c. Conclusões
2. Referencial Teórico e Metodológico
a. O problema teórico e as hipóteses de pesquisa
b. O referencial teórico
c. Estado, empresários e política industrial
d. Questões Metodológicas
3. A dinâmica da política industrial de 1995 a 2010
a. A política industrial em países de capitalismo tardio
b. Burocratas, empresários e políticos
c. Governo Cardoso: estabilização macroeconômica e política industrial implícita
d. Governo Lula: novas “arenas” e novas idéias
4. Atores, interesses e trajetórias
a. Apresentação do estudo de caso e analise das entrevistas
b. Redes de poder e formação de agenda
c. Dependência da trajetória, contexto histórico e eventos críticos
5. Conclusões