UNISUL DE FATObiblioteca do futuro, ampliando o acesso de todos com download gratuito”. O acervo...

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ANO IX | 17 JULHO A DEZEMBRO | 2018 ISSN 2358-601X

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Page 1: UNISUL DE FATObiblioteca do futuro, ampliando o acesso de todos com download gratuito”. O acervo é organizado pelos autores e professores da Unisul, Rosangela Tremel, Virginia Lopes

ANO IX | Nordm 17 asymp JULHO A DEZEMBRO | 2018

ISSN 2358-601X

UNISULDE FATOE DE DIREITO

ANO IX | Nordm 17JULHO A DEZEMBRO | 2018

Nenhuma parte desta publicaccedilatildeo pode ser reproduzida por qualquer meio sem a preacutevia autorizaccedilatildeo desta instituiccedilatildeoCopyright copy UnisulVirtual 2018

UNIVERSIDADE DO SUL DE SANTA CATARINA

Reitor

Mauri Luiz HeerdtVice-Reitor

Lester Marcantonio CamargoProacute-Reitor de Ensino Pesquisa Poacutes-graduaccedilatildeo Extensatildeo e Inovaccedilatildeo

Heacutercules Nunes de ArauacutejoProacute-Reitor de Administraccedilatildeo e Operaccedilotildees

Heitor Wensing JuacuteniorAssessor de Marketing Comunicaccedilatildeo e Relacionamento

Fabiano CerettaDiretor do Campus Universitaacuterio de Tubaratildeo

Rafael Aacutevila FaracorDiretor do Campus Universitaacuterio da Grande Florianoacutepolis

Zacaria Alexandre NassarDiretora do Campus Universitaacuterio UnisulVirtual

Ana Paula Reusing Pacheco

Campus Universitaacuterio UnisulVirtual

Diretora

Ana Paula Reusing PachecoGerente de Administraccedilatildeo e Serviccedilos Acadecircmicos

Renato Andreacute LuzGerente de Ensino Pesquisa Poacutes-graduaccedilatildeo Extensatildeo e Inovaccedilatildeo

Moacir HeerdtGerente de Relacionamento e Mercado

Guilherme Araujo SilvaGerente da Rede de Polos

Joseacute Gabriel da Silva

UNISULDE FATOE DE DIREITO

ANO IX | Nordm 17JULHO A DEZEMBRO | 2018

Universidade do Sul de Santa CatarinaRevista Juriacutedica da Universidade do Sul de Santa Catarina

Ficha catalograacutefica elaborada pela Biblioteca Universitaacuteria da Unisul

U49

Unisul de fato e de direito revista juriacutedica da Universidade do Sul de Santa Catarina

Universidade do Sul de Santa Catarina ndash v 1 n 1 (juldez 2010) ndash Palhoccedila UnisulVir-

tual 2018

SemestralISSN 2177-5303e-ISSN 2358-601x

1 Direito I Universidade do Sul de Santa CatarinaCDD 340

Conselho Editorial

Prof Dr Adolfo Mamoru Nishiyama - UNIPProf Dr Alex Sandro Sommariva - UNISULProfa MSc Ana Maacutercia Marquez Targa - OABSPProf Dr Baltazar de Andrade Guerra-UNISULProf Dr Felipe Asensi - UERJProf Dr Gilberto Fachetti - UFESProf Dr Joseacute Calvo Gonzaacuteles - Universidade de MaacutelagaProf Dr Joseacute Eduardo de Miranda - Universidade

de DeustoProfa Dra Karla Leonora Dahse Nunes - UNISULProf MScDoutorando Leonardo Andreotti Paulo de

Oliveira - Instituto Brasileiro de Direito DesportivoProf Msc Lester Marcantonio Camargo - UNISULProf Dr Luciano Nascimento Silva - UEPBProf MSc Mauricio Daniel Moncons Zanotelli - UNISULProf Dr Miguel Gutieacuterrez Bengoechea - Universidade

de MaacutelagaProfa Dra Milene Pacheco Kindermann ndash UNISULProf Dr Omar Toledo - Universidade Nacional

Mayor de San MarcosProfa Esp Rejane Johansson - UNISULProf Dr Rennan Faria Kruger Thamay - FADISPProf Dr Sidney Eloy Dalabrida - UNISULProfa MSc Solange Buumlchele SThiago- UNISULProfa Esp Tatyane Barbosa Phillipi- UNISULProfa EspDoutoranda Virginia Lopes Rosa- UNISULProf MSc Zacaria Alexandre Nassar - UNISUL

Pareceristas Permanentes

Prof MScDoutorando Alexandre Botelho - UNISULProf Dr Bruno Stigert - Estaacutecio de Saacute Juiz de ForaProf Msc Evinis Talon -UNISCProf Dr Jonathan Regis - UNIVALIProf MSc Paulo Carvalho - UNISULProf Dr Rafael Freire Ferreira - UNIMEProfa Dra Regina Celia Pezzuto Rufino - UNIPProf Dr Rodrigo Ferreira - UEPB

Creacuteditos

Assessoria de Ensino UnisulVirtual

Lis Airecirc FogolariProjeto editorial

Frederico TrilhaDiagramaccedilatildeo

Frederico TrilhaCapa

Foto Museu do Holocausto de Berlim uma releitura abstrata

Fotoacutegrafo Tycho Brahe Fernandes (autorretrato-alheioblogspotcombr)

ISSN

2358-601X

Unisul De Fato e De DireitoRosangela Tremel MScEditor-chefe OABSC 13891 | DRTSC 919-JP

UNA- Ciecircncias Sociais Direito Negoacutecios e Serviccedilos

SumaacuterioEDITORIAL

DE FATOCAED-JUS REVISTA DE FATO E DE DIREITO EMPRESTA NOME AgraveSALA DO CONGRESSO JURIacuteDICO CAED-JUS 11

NO PORTAL DA UNISUL 12

CONSELHEIROS EM DESTAQUE 13

DE DIREITO

DIREITOS HUMANOS DE FATO E DE DIREITO UMA JORNADA DE 70 ANOS

A VIOLEcircNCIA DE GEcircNERO CONSTITUI UMA FORMA DE VIOLACcedilAtildeO DOS DIREITOS HUMANOS 17

Alice Bianchini

AS TREcircS VERTENTES DO SISTEMA PENITENCIAacuteIO UMA ANAacuteLISE CRIMINOLOacuteGICA SOCIAL E CARCERAacuteRIA 31

Andreacuteia Catine CosmeKarem Raimondi Martins

A DEFESA DOS DIREITOS HUMANOS ATRAVEacuteS DO ATIVISMO JUDICIAL TRANSNACIONAL ACcedilOtildeES ENGAJADAS E PARTICIPATIVAS 45

Daniela Mesquita Leutchuk de CademartoriMarlise da Rosa Luz

A REALIDADE DO SISTEMA SOCIOEDUCATIVO E A REDUCcedilAtildeO DA MAIORIDADE PENAL SOB A OacuteTICA DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS 57

Jonathan Cardoso Reacutegis

LA FRAGILIDAD DE LOS DERECHOS 73Joseacute Calvo Gonzaacutelez

DA TRANSVERSAtildeO POLIacuteTICA DO JURIacuteDICO AO FLAGELO DO ESTADO DEMOCRAacuteTICO DE DIREITO A INCONTINENTE DESEFICACIZACcedilAtildeO DOS VALORES CONSTITUCIONAIS NO APOGEU DOS 70 ANOS DA DECLARACcedilAtildeO UNIVERSAL DOS DIREITOS HUMANOS 85

Joseacute Eduardo de MirandaAndreacutea Correcirca Lima

A DOACcedilAtildeO DE OacuteRGAtildeOS DEPOIS DO DECRETO Nordm 91752017 99Juacutelio Moraes Oliveira

DIREITOS HUMANOS E FUNDAMENTAIS NA FRONTEIRA ENTRE DIREITO E ECONOMIA A EFICIEcircNCIA DAS POLIacuteTICAS PUacuteBLICAS DE SAUacuteDE NO BRASIL 107

Marco Aureacutelio Souza da SilvaMaria Berenice Dias

CONDENACcedilOtildeES NA CORTE INTERAMERICANA DE DIREITOS HUMANOS DA OEA UMA FOTOGRAFIA DA VIOLACcedilAtildeO DOS DIREITOS HUMANOS NA AMEacuteRICA LATINA 131

Milene Pacheco Kindermann

DIREITOS HUMANOS NO IMAGINAacuteRIO ARTIacuteSTICO DE CLARICE LISPECTOR O PAacuteSSARO DA LIBERDADE 141

Miacuteriam Coutinho de Faria Alves

PROJETO DE LEI N 37342012 E SUacuteMULA 605 DO STJ O DIREITO DA CRIANCcedilA E DO ADOLESCENTE ESQUECIDO 151

Patriacutecia Rodrigues de Menezes Castagna

AS FACETAS DO NEOLIBERALISMO E SUAS CONSEQUEcircNCIAS NA SOCIOEDUCACcedilAtildeO DE ADOLESCENTES EM CONFLITO COM A LEI NO SUDESTE BRASILEIRO 159

Tatiana Emmerich

6 Revista Juriacutedica da Universidade do Sul de Santa Catarina

DIREITO DE SUSTENTABILIDADE JURIacuteDICA E SISTEcircMICA

REPUTACcedilAtildeO DIGITAL NO FACEBOOK SUSTENTABILIDADE EMPRESARIAL E O CONSUMIDOR 171

Adriano Augusto Fidalgo

O PAPEL DO ADVOGADO NA NEGOCIACcedilAtildeO NA SOCIEDADE CONTEMPORAcircNEA 183Biela JrGlaucia Guisso Fernandes

COMO ACERCAR EL PROCESO CONTENCIOSO ADMINISTRATIVO LABORAL A LOS FUNDAMENTOS DE LA NUEVA LEY PROCESAL DEL TRABAJO 193

Omar Toledo Toribio

OS PROBLEMAS BIOEacuteTICOS EM OS VINGADORES REFLEXOtildeES SOBRE O POacuteS-HUMANISMO E A EacuteTICA DO FUTURO 219

Pedro Ernesto Neubarth JungldquoApenas uma guerra eacute permitida agrave espeacutecie humana a guerra contra a extinccedilatildeo [ ]rdquo

O QUE ESTAMOS PESQUISANDO

DIRETRIZES PARA AUTORES

7Ano IX Nordm 17 | Julho a Dezembro | 2018

EditorialEsta eacute uma ediccedilatildeo especial e isto jaacute pode ser percebido desde a capa pela primeira vez usamos a geome-tria para ilustrar nossa Revista

A fotografia assinada por Tycho Brahe Fernandes eacute uma leitura muito particular de sua ida ao Museu do Holocausto em Berlim quando ele fez uma foto abstrata tirou o foco deixou fortes os contrastes desafiando o leitor a descobrir do que se trata As nuances da cor branca que chegam ao amarela-do total e dos tons de preto que se desfazem em um quase grafite indicam a e gradaccedilatildeo dos absur-

dos cometidos na segunda guerra O objetivo eacute nos fazer a todos pensar em situaccedilotildees que se materializam em matizes sutis Esta eacute a moldura figurativa da ediccedilatildeo De Fato e De Direito alusiva aos 70 anos da Declaraccedilatildeo Universal dos Direitos Humanos (DUDH - 10 de dezembro de 1948) sem deixar de reveren-ciar a Declaraccedilatildeo Americana dos Direitos e Deveres do Homem de 2 de maio de 1948 que precedeu a DUDH em sete meses Ambas fazem a diferenccedila nos cenaacuterios pelos quais todos noacutes hoje gravitamos

Satildeo as nuances as sutilezas na percepccedilatildeo destes institutos que se entrelaccedilam em prol da humanidade pelas quais permeiam autores da maior grandeza

referecircncias em suas aacutereas de estudos professores doutores e pesquisadores que aplicam e sociali-zam o saber para aprimorar o mundo em que vivemos Generosos todos os nomes que compotildeem esta ediccedilatildeo compareceram ao chamado e deixam registradas nestas paacuteginas suas impressotildees sobre o que muitas vezes resumimos na pergunta Que mundo eacute este

Haacute temas uacutenicos diferentes abordagens impressotildees as mais diversas e o leitor poderaacute pensar a ques-tatildeo dos direitos humanos a partir de francas provocaccedilotildees construindo solidamente sua posiccedilatildeo sua verdade garimpando fatos crenccedilas e valores ao longo de nossas paacuteginas

Se esta Seccedilatildeo traz uma sucessatildeo de grandes nomes a sustentabilidade juriacutedica e sistecircmica baluarte de nosso perioacutedico natildeo deixa de estar magistralmente representada e marca nossa essecircncia com galhar-dia proacutepria daqueles que respiram juridicidade

Haacute assunto para todos os puacuteblicos de todas as correntes Desejamos a todos uma profiacutecua leitura

Rosangela TremelEditor- chefe

DE FATO

11Ano IX Nordm 17 | Julho a Dezembro | 2018

Caed-jus Revista De Fato e De Direito empresta nome agrave sala do Congresso Juriacutedico CAED-Jus

A Revista Juriacutedica Unisul De Fato e De Direito foi homenageada pela equipe do CAED-Jus (Congresso de Altos Estudos em Direito) maior momento juriacutedico online da Ameacuterica Latina e crescendo mundo afora denominando uma das salas virtuais no periacuteodo de 20 a 22 de junho

Parceiros de longa data a Revista e o CAED-Jus tecircm histoacuteria para contar juntos Alguns autores de destaque em nosso perioacutedico nos conheceram atraveacutes deste evento sem fronteiras submeteram seus artigos e publicaram conosco

Liderado pelo nosso Conselheiro Editorial Felipe Asensi o CAED-Jus eacute data que se impotildee no calendaacute-rio juriacutedico nacional

De fato e de direito a Revista da Unisul agradece a homenagem e reafirma seu propoacutesito de seguir par-ceira nesta trajetoacuteria de sucesso

12 Revista Juriacutedica da Universidade do Sul de Santa Catarina

No Portal da Unisul

Coletacircnea de Revista Juriacutedica estaacute disponiacutevel para download gratuito em plataforma digital12 de julho de 2018

A coletacircnea da Revista Juriacutedica da Unisul Doze Liccedilotildees De Fato e De Direito estaacute disponiacutevel para consulta e download gratuito no cataacutelogo de obras da Editora da Universidade Estadual da Paraiacuteba (Eduepb) em parceria com a Unisul

Desde o ano passado 2017 a Revista Juriacutedica da Unisul integra o acervo da plataforma Scielo conheci-da mundialmente e que jaacute soma mais de trecircs milhotildees de acessos ao mecircs sob selo editorial que hospeda alguns vencedores do disputado Precircmio Jaboti

Revista Juriacutedica Doze Liccedilotildees De Fato e De Direito

A coletacircnea Doze Liccedilotildees De Fato e De Direito compartilha diferentes assuntos desde anaacutelise literaacuteria da obra de Jorge Amado agrave sauacutede mental monitoramento eletrocircnico de presos e questotildees ambientais

Com a repercussatildeo do projeto inovador o professor Zacaria Alexandre Nassar diretor do Campus da Grande Florianoacutepolis destaca a atenccedilatildeo que a Unisul dispensa agraves inovaccedilotildees tecnoloacutegicas e agrave reconhe-cida qualidade de seu curso de Direito ldquoA Unisul em parceria de sucesso com a Editora da Universidade Estadual da Paraiacuteba inovou na disseminaccedilatildeo do conhecimento na aacuterea juriacutedica e ganhou espaccedilo na biblioteca do futuro ampliando o acesso de todos com download gratuitordquo

O acervo eacute organizado pelos autores e professores da Unisul Rosangela Tremel Virginia Lopes Rosa e Zacaria Alexandre Nassar para integrar o cataacutelogo lanccedilado em 2017 que marcou o encerramento do semestre 20181 e segue para contiacutenua produccedilatildeo da Euepb ao lado de grandes nomes explica a profes-sora Virginia Ros coordenadora do curso de Direito da Unidade Pedra Branca ldquoParceria das mais exito-sas que uniu indelevelmente duas regiotildees do Brasil continental ampliou exponencialmente o objetivo da Revista desde que era mero projeto e referendou o fato de que oferecemos acesso crescente de arti-gos de qualidade para alunos que buscam novos olhares sobre o multifacetado estudo do direitordquo

A capa traz paisagem tiacutepica accediloriana clicada por Tycho Brahe Fernandes marca registrada da Revista cujo conteuacutedo reuacutene autores de Santa Catarina Rio Grande do Sul Paranaacute e Satildeo Paulo ldquoDentre eles haacute professores doutores de expressatildeo internacional egressos da Unisul que se destacam no mercado de trabalho professores por vocaccedilatildeo e dedicaccedilatildeordquo assinala a editora-chefe da Revistardquo Rosangela Tremel

Jaacute o editor da Eduepb professor Luciano Nascimento conta que o cataacutelogo permite ao leitor acessar diversos tiacutetulos ldquoEacute importante divulgar o acervo on line como um todo a cada semestre cumprindo a funccedilatildeo social de disseminar o saber a um clique de distacircnciardquo

13Ano IX Nordm 17 | Julho a Dezembro | 2018

Conselheiros em destaque

Brasil e Espanha na Itaacutelia

Dois dos Conselheiros Editoriais de nossa Revista se encontraram em congresso na Itaacutelia no mecircs de fevereiro Luciano Nascimento (UEPB- Paraiacuteba) e Joseacute Calvo (Universidade de Maacutelaga- Espanha) estiveram juntos no Convegno Internazionale - Ecologia del Non- Sapere - del Centro

di Studi Sul Rischio dellrsquoUniversita del Salento fundado por Niklas Luhmann e Raffaele De Giorgi Na confraternizaccedilatildeo destes nobres professores registrada em fotos e notas nossa Revista De Fato e De Direito foi mencionada

Atitude para ganhar altitude

Joseacute Eduardo de Miranda nosso Conselheiro Editorial eacute PhD em Direito Professor universitaacute-rio jurista e escritor eacute membro do Grupo Internacional de Pesquisa International Association of Cooperative Law (AIDC)Universidade de DeustoEspanha da Caacutetedra UNESCO de Formaccedilatildeo

de Recursos Humanos para Ameacuterica Latinada Universidade de DeustoEspanha da Caacutetedra Euroamericana de Proteccioacuten Juriacutedica de Los Derechos de Los Consumidores da Universidade de CantaacutebriaEspanha do Instituto de Estudos Cooperativos da Universidade de DeustoEspanha

Recebeu o precircmio de melhor trabalho de pesquisa conferido pela AIDC Universidade de DeustoEspanha e o precircmio Ortazadar de Literatura concedido pelo Diaacuterio Deia na Espanha

O autor que considera parte de seu desiacutegnio colaborar com alunos e profissionais para que suas esco-lhas sejam sinocircnimo de sucesso apoacutes publicar ldquoMal dita facultocirc dentro e agorardquo rapidamente esgo-tadoem julho lanccedilou SUSTENTABILIDADE EMOCIONAL ATITUDE PARA GANHAR ALTITUDE Ele define este trabalho como aquele ldquo momento intimista para falar de inteligecircncia emoccedilotildees e felicidaderdquo Vale para todos os que buscam aprimoramento constante no cenaacuterio mundial em franca ebuliccedilatildeo Sob o selo Multifoco a obra eacute assim apresentada

ldquoExiste uma foacutermula para a felicidade Por que algumas pessoas inteligentes natildeo conseguem alcanccedilar o sucesso As emoccedilotildees individuais afetam a produtividade de um grupo Diante das exigecircncias de um mun-do em constante transformaccedilatildeo a inteligecircncia cognitiva deixa de ser a principal responsaacutevel pelo triunfo pessoal O equiliacutebrio das emoccedilotildees e a cooperaccedilatildeo emocional ganham protagonismo na busca pelo sucesso Nesse sentido Joseacute Eduardo de Miranda aborda em SUSTENTABILIDADE EMOCIONAL o redimen-sionamento das emoccedilotildees individuais exaltando as atitudes necessaacuterias agrave realizaccedilatildeo plena de cada um seja no universo pessoal ou corporativordquo

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Universidade do Sul de Santa Catarina

Revista Juriacutedica da Universidade do Sul de Santa Catarina

La destreza de Judith uma sensiacutevel reconstruccedilatildeo cultural do Direito pelas matildeos de uma mulher

Joseacute Calvo Gonzaacutelez (Sevilla Espantildea 1956) Conselheiro de nossa revista e Dr em Direito pela Universidade de Maacutelaga (Espantildea) Doutor Honoris Causa pela Universidade Ricardo Palma (Lima Peru) eacute professor de Filosofia do Direito na Universidade de Maacutelaga Cultiva como linhas prioritaacute-

rias de investigaccedilatildeo ldquoTeoria Narrativista do Direitordquo ldquoDireito e Literaturardquo e ldquoCultura Visual do Direitordquo Entre seus trabalhos mais recentes estatildeo El escudo de Perseo La cultura literaria del Derecho (Edit Comares Granada 2012) Direito curvo (Porto Alegre 2013) Marginalias juriacutedicas en el Smithfield Decretals Valencia 2015) o Justicia constitucional y Literatura (Lima 2016) bem como a coordena-ccedilatildeo e ediccedilatildeo de Derecho y Literatura hispaacutenica (Pisa-Roma 2014) De la Ley iquesto seraacute ficcioacuten (Madrid 2016) y Borges en el espejo de los juristas Derecho y literatura borgeana Cizur Menor Navarra 2016) brinda a todos noacutes seus leitores contumazes com novo livro La destreza de Judith

As breves palavras do autor sobre a obra nos deixam ainda mais ansiosos para lecirc-la na integralidade

ldquoDiriacutea que los estudios de Cultura literaria del Derecho aquiacute reunidos bajo tiacutetulo de La destreza de Judith se calzan de las sandalias que deslumbraron los ojos de Holofernes y aunque la figura y detalle de realce luminoso no haya sido revelado por la imaginacioacuten de los artistas la idea de aquellas modes-tas pero seductoras sandalias me parece que suscita una metaacutefora valedera para los juristas pues de su asombroso imperio tambieacuten deberiacutea cubrirse la guiacutea de los pasos de un jurista que no descamine el sen-dero que conduce al Triunfo del Derecho Y en ese sentido creo que la Literatura es la mejor maacutequina para guarnecer esas sandalias Un jurista ademaacutes tampoco habriacutea de perder de vista la hermosura del rostro de Judith que siacute han plasmado muy diversos pintores He elegido conscientemente la virtuosa representacioacuten que de eacutel nos ofrece Caravaggio Alliacute su belleza pienso no estaacute en la representacioacuten de los rasgos de un semblante juvenil ndashera Judith casi una adolescente todaviacutea en verdad preciosandash sino maacutes bien en la mueca no insensible de su gesto Asiacute el rostro figurado es hermoso no por servir de semblante a la gesta sino por el gesto con que la encara Ese gesto es la semblanza de su destre-za La Cultura literaria del Derecho como sucediera con Judith se instala en una zona de inconfort Por su vocacioacuten criacutetica planta cara a la domesticacioacuten hermeneacuteutica del jurista La Cultura literaria del Derecho acomete el desafiacuteo de descorrer el velo de la situacioacuten dogmaacutetica como Judith irrumpiendo en la tienda de Holofernes para cambiar la situacioacuten de los sentenciados a la verguumlenza y al despotis-mo En consecuencia asume miradas incoacutemodas miradas a la parte maldita del Derecho a su raigam-bre (ideo)loacutegica a la violencia de su funcioacuten represiva a la esteacutetica perversa de su arte cuando escinde desorden e injusticia a su contraccioacuten del otro a sus esclarecidas metaacuteforas sobre el honor a su prejui-ciosa representacioacuten de la cohesioacuten social hellip incluso a la gratificacioacuten simboacutelica de su superioridad civi-lizatoria La Cultura literaria del Derecho mira en esa parte maldita y la mueca no insensible al observar el monstruo que el Derecho tambieacuten lleva dentro es el gesto virtuoso ndashdiestrondash que salva y reconcilia ante dilemas de lealtad entre el Alma y la Ley La Cultura literaria del Derecho revela y adiestra acerca de esos arduos dilemas electivos y sus paradojas

Este libro pues elogia la destreza de Judith y en su celebracioacuten la imita en mira a una reconstruccioacuten cultural sensible del Derecho ldquopor mano de mujerrdquo por mano de la Literaturardquo

DE DIREITO

DIREITOS HUMANOSDE FATO E DE DIREITO UMA JORNADA DE 70 ANOS

17Ano IX Nordm 17 | Julho a Dezembro | 2018

A VIOLEcircNCIA DE GEcircNERO CONSTITUI UMA FORMA DE VIOLACcedilAtildeO DOS DIREITOS HUMANOS

LA VIOLENCIA DE GEacuteNERO CONSTITUYE UNA FORMA DE VIOLACIOacuteN DE LOS DERECHOS HUMANOSAlice Bianchini1

Resumo Com a entrada em vigor da Lei Maria da Penha logo surgiram questionamentos acerca da interpretaccedilatildeo a ser dada ao art 6ordm o qual prevecirc que ldquoA violecircncia domeacutestica e familiar contra a mulher constitui uma das formas de violaccedilatildeo dos direitos humanosrdquo A principal insurgecircncia com o conteuacutedo do artigo antes transcrito foi elaborada por meio dos seguintes questionamentos a violecircncia contra os homens natildeo seria tambeacutem uma forma de violaccedilatildeo de direitos humanos Por qual motivo natildeo englobar todas as categorias sexuais A busca a tais respostas eacute o tema do presente artigo

Palavras-Chave Violecircncia contra a mulher Direitos Humanos Gecircnero Lei Maria da Penha

Resumen Con la entrada en vigor de la Ley Maria da Penha pronto surgieron cuestionamientos acerca de la interpretacioacuten a ser dada al art 6ordm ldquoLa violencia domeacutestica y familiar contra la mujer constituye una de las for-mas de violacioacuten de los derechos humanosrdquo La principal insurgencia con el contenido del artiacuteculo antes trans-crito fue elaborada por medio de los siguientes cuestionamientos la violencia contra los hombres no iquestseriacutea tambieacuten una forma de violacioacuten de derechos humanos iquestPor queacute no englobar todas las categoriacuteas sexuales La buacutesqueda de tales respuestas es el tema del presente artiacuteculo

Palabras Clave Violencia contra la mujer Derechos humanos Geacutenero Ley Maria da Penha

1 INTRODUCcedilAtildeO

Com a entrada em vigor da Lei Maria da Penha logo surgiram questionamentos acerca da interpretaccedilatildeo a ser dada ao art 6ordm o qual prevecirc que ldquoA violecircncia domeacutestica e familiar contra a mulher constitui uma das formas de violaccedilatildeo dos direitos humanosrdquo

A principal insurgecircncia com o conteuacutedo do artigo antes transcrito foi elaborada por meio dos seguintes questionamentos a violecircncia contra os homens natildeo seria tambeacutem uma forma de violaccedilatildeo de direitos humanos Por qual motivo natildeo englobar todas as categorias sexuais A busca a tais respostas eacute o tema do presente artigo

1 Doutora em Direito penal pela PUCSP mestre em Direito pela UFSC especialista em Teoria e Anaacutelise Econocircmica pela Universidade

do Sul de Santa Catarina Unisul-SC e em Direito Penal Econocircmico Europeu pela Universidade de CoimbraIBCCrim Foi professora

do Departamento de Direito Penal da USP e do Curso de Mestrado em Direito da Uniban-SP Leciona em diversos cursos de

especializaccedilatildeo Integrante da Comissatildeo Nacional da Mulher Advogada - OAB Federal Autora de vaacuterios livros e de artigos publicados em

perioacutedicos nacionais e estrangeiros dentre eles Lei Maria da Penha 4 ed Satildeo Paulo Saraiva 2018 Autora do Curso Virtual Estude Lei

Maria da Penha mais de 100 questotildees criminais controvertidas (estudeleimariadapenhacombr)

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Universidade do Sul de Santa Catarina

Revista Juriacutedica da Universidade do Sul de Santa Catarina

2 A VIOLEcircNCIA DE GEcircNERO E OS DIREITOS HUMANOS

Se considerarmos que todo tipo de violecircncia fere os direitos humanos natildeo haveria porque inserir na Lei Maria da Penha o disposto em seu art 6ordm antes transcrito No entanto o que motivou sua inclusatildeo no texto da Lei foi o propoacutesito afirmar a importacircncia na luta pelo fim desse tipo de violecircncia Essa lei natildeo eacute somente da mulher que foi viacutetima de qualquer tipo de violecircncia mas da famiacutelia do Estado e da socieda-de que devem buscar a igualdade entre as pessoas e a dignidade de todos2

Foi na Conferecircncia das Naccedilotildees Unidas sobre Direitos Humanos ocorrida em Viena 1993 que pela pri-meira vez utilizou-se a expressatildeo ldquoos direitos das mulheres satildeo direitos humanosrdquo Pouco tempo depois a Convenccedilatildeo Interamericana para Prevenir Punir e Erradicar a Violecircncia contra a Mulher ndash Convenccedilatildeo Beleacutem do Paraacute tratou a violecircncia contra a mulher da mesma forma Dentre os muitos avanccedilos represen-tados pela Lei Maria da Penha talvez o mais significativo seja o estabelecimento definitivo da discrimi-naccedilatildeo e violecircncia de gecircnero como forma de insulto aos direitos humanos

Ao longo dos seacuteculos ao menos no Ocidente o condicionamento do corpo bioloacutegico a um modelo de comportamento produziu uma seacuterie de estereoacutetipos levando a crenccedilas culturais de que pessoas per-tencentes a cada um dos sexos deveriam ocupar lugares sociais preacute-determinados aos homens o espa-ccedilo puacuteblico agrave mulher o espaccedilo domeacutestico Essa estereotipagem contribuiu para a discriminaccedilatildeo e a into-leracircncia levando agrave violaccedilatildeo de direitos praticada em razatildeo do gecircnero como se verifica em condutas misoacuteginas ou de violecircncia

Como bem observa Ana Lucia Sabadell citando Frances Olsen na civilizaccedilatildeo ocidental predomina um sistema dualista de pensamento racionalirracional ativopassivo abstratoconcreto sendo os pri-meiros identificados ao masculino e os segundos ao feminino significando ldquoque se atribuem agraves mulhe-res caracteriacutesticas lsquoinferioresrsquo como a irracionalidade o sentimentalismo a passividade Essa e uma forma de organizar o pensamento e consequentemente as relaccedilotildees sociais entre indiviacuteduos de sexos diferentes garantindo a supremacia masculinardquo3 Eacute nesse contexto que surge o debate sobre direitos especificamente femininos

Os direitos fundamentais na liccedilatildeo de Canotilho tecircm por objetivo a defesa dos cidadatildeos sob uma dupla perspectiva

a) plano juriacutedico implicam normas de competecircncia negativa para os poderes puacuteblicos proibindo-os prioritariamente de adentrar a esfera juriacutedica individual

b) plano juriacutedico-subjetivo constituem o poder de exercer positivamente direitos funda-mentais e de exigir omissotildees dos poderes puacuteblicos de forma a evitar agressotildees lesivas por parte dos mesmos (liberdade negativa)4

A realocaccedilatildeo dos direitos das mulheres elevando-o agrave categoria de direitos humanos redimensiona o tema

O equacionamento da discriminaccedilatildeo das mulheres em termos de problemaacutetica da violaccedilatildeo dos

seus direitos permite fazer exigecircncias em termos que a comunidade internacional jaacute aceitava

nomeadamente para alguns grupos como por exemplo os grupos eacutetnicos Este enquadramento

permite ainda encontrar uma plataforma comum para as exigecircncias diversificadas das mulheres

nos vaacuterios pontos do globo e definir estrateacutegias de mudanccedila5

2 SAtildeO PAULO Violecircncia Domeacutestica e Familiar contra a Mulher Revista do Nudem Disponiacutevel em lthttpwwwdefensoriaspgovbr

dpesprepositorio41Revista_violC3AAncia20domC3A9sticapdfgt Acesso em 20 mar 2018

3 SABADELL Ana Lucia Manual de Sociologia Juriacutedica 5 ed Satildeo Paulo RT 2010 p 270

4 CAVALCANTI Stela Valeacuteria Soares de Farias Violecircncia domeacutestica anaacutelise da Lei ldquoMaria da Penhardquo n 1134006 3 ed Salvador Podivm

2010 p 86-87

5 Idem p116-7

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Unisul de Fato e de Direito

Ano IX Nordm 17 | Julho a Dezembro | 2018

A comunidade internacional por meio de intelectuais artistas ONGs e governos tem feito pressatildeo no sentido de estabelecer patamares civilizatoacuterios em diversas questotildees incluindo as ofensas contra as mulheres Compreender a discriminaccedilatildeo de gecircnero como insulto aos direitos humanos implica a pos-sibilidade de os Estados tornarem-se atores atuantes na contenccedilatildeo desses abusos bem como de res-ponsabilizaacute-los sejam eles perpetrados na esfera puacuteblica ou na esfera privada Ademais permite que se tomem as contas dos governos acerca de medidas preventivas para elidir as violaccedilotildees

A mulher tanto no Brasil como em todas as outras partes do mundo ainda sofre muita violecircncia base-ada no gecircnero Para se ter uma ideia da dimensatildeo do problema citam-se algumas situaccedilotildees especiacuteficas relatadas pela advogada iraniana e ativista de Direitos Humanos Shirin Ebadi6

bull No Iratilde ateacute poucos anos atraacutes a mulher natildeo podia ter documento de identidade Mesmo com a permissatildeo para documentarem-se as mulheres seguem privadas de diversos direitos poliacuteticos e sociais como o de dirigir automoacutevel

bull No Iratilde as mulheres tecircm direito ao voto e agrave participaccedilatildeo no parlamento haacute mais de 50 anos mas a revoluccedilatildeo de 1979 gerou uma nova legislaccedilatildeo que incentiva a discriminaccedilatildeo sexista Se um homem e uma mulher sofrem um acidente de automoacutevel o valor da indenizaccedilatildeo pago ao homem eacute o dobro do valor pago agrave mulher O testemunho de um homem em um tribunal soacute seraacute invalidado se duas mulheres o desmentirem O homem pode se casar com quatro espo-sas e pedir o divoacutercio sem justificativas sendo que pedidos de divoacutercio vindos da mulher satildeo quase sempre negados Para viajar a mulher precisa de autorizaccedilatildeo escrita do marido As leis poreacutem satildeo anacrocircnicas agrave proacutepria cultura A Ministra da Sauacutede do Iratilde por exemplo eacute uma mu-lher e por decorrecircncia de seu sexo necessita de autorizaccedilatildeo de seu marido para sair do paiacutes

bull No Afeganistatildeo leis preveem a inserccedilatildeo das mulheres na sociedade mas a cultura pa-ternalista eacute mais forte do que a legislaccedilatildeo Mulheres satildeo impedidas de exporem suas ideias O Talibatilde dentre inuacutemeros outros exemplos de coerccedilotildees queimou escolas para crianccedilas do sexo feminino e obriga as mulheres a usarem burca

bull A liberdade da mulher nos paiacuteses islacircmicos tem piorado proporcionalmente com o au-mento do poder dos fundamentalistas o qual por sua vez tem se fortalecido por efeito das intervenccedilotildees militares ocidentais recentes de maneira que a situaccedilatildeo das mulheres hoje no Iraque estaacute pior do que na eacutepoca de Saddam Hussein A ativista natildeo culpa poreacutem o Islatilde pela existecircncia destas leis discriminatoacuterias e sim uma particular interpretaccedilatildeo ma-chista e equivocada do Islatilde que se articula com uma cultura paternalista tradicional dos locais Aleacutem disso a cultura machista eacute disseminada tambeacutem por mulheres as quais de-vem ser informadas sobre a necessidade de superaacute-la e como fazecirc-lo

bull A discriminaccedilatildeo contra o sexo feminino vai aleacutem da religiatildeo sendo uma realidade mundial que independe de paiacutes ou cultura ainda que varie em forma e intensidade Nos Estados Unidos Canadaacute e Europa por exemplo as leis reconhecem a igualdade dos gecircneros mas a cultura local prevecirc compromissos a serem assumidos pelas mulheres em casa e na so-ciedade os quais impedem que elas desfrutem materialmente da igualdade declarada o que pode ser medido pelo nuacutemero reduzido de mulheres em cargos de poder

Podem-se acrescentar ainda os seguintes episoacutedios

bull Em setembro de 2011 Shaima na Araacutebia Saudita foi condenada a dez chibatadas por dirigir automoacutevel7 A condenaccedilatildeo ocorreu logo apoacutes o rei Abdullah anunciar que as mu-lheres poderiam votar o que deve acontecer pela primeira vez na histoacuteria do paiacutes nas eleiccedilotildees de 2015 Tambeacutem foi o rei responsaacutevel por suspender a pena apoacutes inuacutemeras manifestaccedilotildees ocorridas em todo o paiacutes de apoio a Shaima

6 Palestra proferida em 14 de junho de 2011 em Satildeo Paulo promovida por Fronteiras do Pensamento

7 MULHERDisponiacutevel em lthttpwww1folhauolcombrmundo981699-mulher-saudita-e-condenada-a-dez-chibatadas-por-

dirigirshtmlgt Acesso em 20 mar 2018

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bull Agora a heroiacutena mirim Malala Yousufzau do Paquistatildeo que descumpriu as concep-ccedilotildees religiosas do seu paiacutes e decidiu natildeo soacute estudar mas defender que mulheres estu-dassem No dia 9 de outubro de 2012 aos quatorze anos de idade Malala foi atingida na cabeccedila por um tiro agrave queima-roupa dentro do ocircnibus no qual voltava da escola Sobreviveu recebeu o precircmio Nobel da Paz de 2014 e permanece na sua luta8

As histoacuterias acima citadas e tantas outras sejam as conhecidas sejam as silenciadas indicam a neces-sidade de se criar instrumentos de proteccedilatildeo especial da mulher Foi o que fez o Brasil quando em 07 de agosto de 2006 editou a Lei Maria da Penha No acircmbito da Ameacuterica Latina o Brasil foi o 18ordm pais a ter uma lei de proteccedilatildeo integral agrave mulher em situaccedilatildeo de violecircncia domeacutestica ou familiar

3 A LMP Eacute DE ACcedilAtildeO AFIRMATIVA

A Lei Maria da Penha aleacutem da severa criacutetica ao seu art 6ordm o qual enunciou que a violecircncia contra a mulher constituiu uma violaccedilatildeo aos direitos humanos (conforme analisamos no item anterior) tam-beacutem sofreu ataques de vaacuterios autores que se manifestaram no sentido de consideraacute-la uma norma inconstitucional por ferir o princiacutepio da igualdade entre homens e mulheres insculpido no art 5ordm I da CF o qual prevecirc que

Constituiccedilatildeo Federal

Art 5ordm Todos satildeo iguais perante a lei sem distinccedilatildeo de qualquer natureza garantindo-se aos

brasileiros e aos estrangeiros residentes no Paiacutes a inviolabilidade do direito agrave vida agrave liberdade agrave

igualdade agrave seguranccedila e agrave propriedade nos termos seguintes

I - homens e mulheres satildeo iguais em direitos e obrigaccedilotildees nos termos desta Constituiccedilatildeo

No mesmo sentido juiacutezes e desembargadores por todo o Brasil (ainda que tenham sido exceccedilatildeo) trata-ram de declarar a LMP inconstitucional deixando de aplicaacute-la na sua integralidade9

Em razatildeo da celeuma que se instalou no paiacutes o entatildeo presidente da Repuacuteblica Luis Inaacutecio Lula da Silva ingressou perante o STF com uma Accedilatildeo Declaratoacuteria de Constitucionalidade (ADC 19) buscando assentar a constitucionalidade dos artigos 1ordm 33 e 41 da Lei 113402006 (Lei Maria da Penha) O julga-mento da accedilatildeo deu-se em fevereiro de 2012 em conjunto com a ADI 4424

O STF julgou constitucionais os dispositivos da LMP questionados afirmando que a legislaccedilatildeo ordinaacute-ria protetiva estaria em sintonia com a Convenccedilatildeo sobre a Eliminaccedilatildeo de Todas as Formas de Violecircncia contra a Mulher (CEDAW) e com a Convenccedilatildeo de Beleacutem do Paraacute Sob o acircngulo constitucional ressal-tou-se o dever do Estado de assegurar a assistecircncia agrave famiacutelia e de criar mecanismos para coibir a violecircn-cia no acircmbito de suas relaccedilotildees (Informativo STF n 654 6 a 10 de fevereiro de 2012)

Dentre as inuacutemeras fundamentaccedilotildees trazidas no decisun (ADI 4424ADC 19) ficou constando no rela-toacuterio o caraacuteter de accedilatildeo afirmativa da Lei Maria da Penha

8 LAMB Christina YOUSAFZAI Malala Eu sou Malala Satildeo Paulo Companhia das Letras 2013

9 Exemplo paradigmaacutetico aconteceu na cidade de Sete Lagoas em que o magistrado cunhou a Lei Maria da Penha de ldquoconjunto de regras

diaboacutelicasrdquo Em 20112007 o Conselho Nacional de Justiccedila instaurou processo disciplinar contra o juiz para analisar se as expressotildees

usadas em suas decisotildees caracterizam excesso de linguagem e infraccedilatildeo disciplinar O juiz impetrou mandado de seguranccedila para o STF

(MS 30320) O acompanhamento do processo pode ser consultado em lthttpwwwstfjusbrportalprocessoverProcessoAndamento

aspincidente=4022577gt Acesso em 10 mar 2018

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31 UMA QUESTAtildeO TERMINOLOacuteGICA ACcedilAtildeO AFIRMATIVA OU MEDIDA

ESPECIAL DE CARAacuteTER TEMPORAacuteRIO

A questatildeo que se coloca eacute exatamente essa seria a LMP uma lei de accedilatildeo afirmativa como a definiu o STF Ou trata-se de uma medida especial de caraacuteter temporaacuterio como apregoa a CEDAW menciona-da inclusive na proacutepria decisatildeo da Corte Suprema

Ao se analisar a doutrina e jurisprudecircncia brasileiras percebe-se que a utilizaccedilatildeo preponderante eacute pela expressatildeo ldquoaccedilatildeo afirmativardquo Vejamos

311 POSICIONAMENTO 1 A LEI MARIA DA PENHA Eacute DE ACcedilAtildeO AFIRMATIVA

No relatoacuterio da ADC 19 reiteradas vezes o Min Marco Aureacutelio faz referecircncia ao caraacuteter de accedilatildeo afir-mativa da Lei Maria da Penha Confira-se

Nessa ordem de ideias impende ter em mente o amplo reconhecimento do fato de que uma vez

marcadas em uma sociedade machista e patriarcal como a nossa as relaccedilotildees de gecircnero pelo

desequiliacutebrio de poder a concretizaccedilatildeo do princiacutepio isonocircmico (art 5ordm I da Lei Maior) nessa

esfera ndash relaccedilotildees de gecircnero ndash reclama a adoccedilatildeo de accedilotildees e instrumentos afirmativos voltados

exatamente agrave neutralizaccedilatildeo da situaccedilatildeo de desequiliacutebrio STF ADC 19DF Relator Min Marco

Aureacutelio j em 09022012

Em outros trechos

A discriminaccedilatildeo afirmativa que se projeta da Lei Maria da Penha se faz acompanhar de razatildeo

que na exata medida em que se presta a compensar a discriminaccedilatildeo de fato cuja existecircncia

reconhece a justificardquo STF ADC 19DF Relator Min Marco Aureacutelio j em 09022012

Para enfrentar esse problema que aflige o nuacutecleo baacutesico da nossa sociedade ndash a famiacutelia ndash e

se alastra para todo o corpo comunitaacuterio por forccedila dos seus efeitos psicoloacutegicos nefastos eacute

necessaacuteria uma poliacutetica de accedilotildees afirmativas que necessariamente perpassa a utilizaccedilatildeo do

Direito Penal A adoccedilatildeo das accedilotildees afirmativas eacute o resultado de uma releitura do conceito de

igualdade que se desenvolveu desde tempos remotos Na claacutessica obra Aristoteacutelica lsquoA Poliacuteticarsquo

o filoacutesofo jaacute ponderava que ldquoA primeira espeacutecie de democracia eacute aquela que tem a igualdade por

fundamento Nos termos da lei que regula essa democracia a igualdade significa que os ricos e os

pobres natildeo tecircm privileacutegios poliacuteticos que tanto uns como outros natildeo satildeo soberanos de um modo

exclusivo e sim que todos o satildeo exatamente na mesma proporccedilatildeordquo STF ADC 19DF Relator

Min Marco Aureacutelio j em 09022012

Sou das que compartilham do entendimento de que a Lei Maria da Penha inaugurou uma nova

fase no iter das accedilotildees afirmativas em favor da mulher brasileira consistindo em verdadeiro

microssistema de proteccedilatildeo agrave famiacutelia e agrave mulher a contemplar inclusive norma de direito do

trabalho A Lei 113402006 batizada em homenagem a Maria da Penha traduz a luta das

mulheres por reconhecimento constituindo marco histoacuterico com peso efetivo mas tambeacutem

com dimensatildeo simboacutelica e que natildeo pode ser amesquinhada ensombrecida desfigurada

desconsiderada Sinaliza mudanccedila de compreensatildeo em cultura e sociedade de violecircncia que de

tatildeo comum e aceita se tornou invisiacutevel ndash ldquoem briga de marido e mulher ningueacutem mete a colherrdquo

pacto de silecircncio para o qual a mulher contribui seja pela vergonha seja pelo medo STF ADC

19DF Relator Min Marco Aureacutelio j em 09022012

Na doutrina tem-se dentre outros o posicionamento de Miranda

Aplica-se a Lei Maria da Penha as poliacuteticas referentes agraves accedilotildees afirmativas que tem como

fito agrave promoccedilatildeo de oportunidades iguais para viacutetimas de discriminaccedilatildeo poreacutem natildeo abrangem

indiviacuteduos e sim os grupos a que pertencem ou seja negros mulheres idosos destinando-se a

igualar em condiccedilotildees esses grupos em desvantagens conforme os preceitos constitucionais []

Agrave guisa de conclusatildeo na oacuterbita do ordenamento juriacutedico paacutetrio a lei em comento foi elaborada

para proteger a mulher isto posto o tratamento concedido agraves mulheres natildeo afronta o princiacutepio

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da igualdade pois se trata de accedilatildeo afirmativa que tem como objetivo reparar injusticcedilas sofridas

pelas mulheres e que violam os direitos humanos Em suma A Lei nordm 1134006 protege a famiacutelia

pois a praacutetica de tal violecircncia traz consequecircncias natildeo soacute para as mulheres mas tambeacutem para sua

famiacutelia e agrave sociedade em geral10

312 POSICIONAMENTO 2 A LEI MARIA DA PENHA CARACTERIZA-SE POR CRIAR

MEDIDAS ESPECIAIS DE CARAacuteTER TEMPORAacuteRIO

A Convenccedilatildeo para Eliminaccedilatildeo de todas as formas de Discriminaccedilatildeo sobre a Mulher (CEDAW) no seu art 4ordm citada no preacircmbulo e no art 1ordm da Lei Maria da Penha determina que

bull Medidas especiais de caraacuteter temporaacuterio destinadas a acelerar a igualdade de fato en-tre o homem e a mulher natildeo se consideraratildeo discriminaccedilatildeo

bull De nenhuma maneira a utilizaccedilatildeo de tais medidas especiais implicaraacute como consequ-ecircncia a manutenccedilatildeo de normas desiguais

bull Essas medidas cessaratildeo quando os objetivos de igualdade de oportunidade e trata-mento forem alcanccedilados

Na atualidade nem toda discriminaccedilatildeo eacute proibida ou desvaliosa para o ordenamento juriacutedico Um exemplo de descriminaccedilatildeo positiva eacute a Lei Maria da Penha Ela constitui-se em um criteacuterio de equipa-raccedilatildeo desigual igualitaacuterio e representa uma das medidas apresentadas pelo Estado para permitir que ocorra o aceleramento da igualdade de fato entre o homem e a mulher circunscrita aos casos de violecircn-cia domeacutestica e familiar jaacute que o alcance da Lei eacute limitado

Haacute outras accedilotildees nesse sentido previstas na legislaccedilatildeo brasileira destacando-se a lei de cotas poliacuteticas De acordo com a Lei 950497 30 dos candidatos registrados devem pertencer a um dos sexos

A maacutexima tratar os iguais de modo igual e os desiguais de modo desigual representa um reconhecimento de que os indiviacuteduos que se estabeleceram no mundo em condiccedilotildees desiguais natildeo podem por mera declaraccedilatildeo de vontade obter condiccedilatildeo de vida igual equivalente aos que gozam de vantagem sejam elas quais forem Daiacute a necessidade de discriminaccedilotildees positivas ou accedilotildees positivas consubstanciadas em poliacuteticas puacuteblicas que objetivem concretizar materialmente o discurso relevante poreacutem vazio de igualdade com o objetivo de mitigar os efeitos das discriminaccedilotildees que heranccedilas de costumes passados insistem em manter no presente sem nenhum argumento eacutetico que as justifiquem

As medidas especiais de caraacuteter temporaacuterio previstas na Lei Maria da Penha satildeo destinadas ao empo-deramento das mulheres a partir da diminuiccedilatildeo das desigualdades sociais poliacuteticas e econocircmicas

Por serem excepcionais e por preverem seacuterias restriccedilotildees de direitos (como eacute o caso da maioria das medidas protetivas previstas na Lei Maria da Penha) a aplicaccedilatildeo dos instrumentos de discriminaccedilatildeo positiva soacute se justifica em situaccedilotildees muito relevantes (princiacutepio da proporcionalidade) Eacute que ao mes-mo tempo em que de um lado se alargam garantias (em relaccedilatildeo agrave viacutetima garantia da vida da integridade fiacutesica e psicoloacutegica etc) de outro se limitam direitos (concernentes ao reacuteu liberdade de ir e vir presun-ccedilatildeo da inocecircncia direito ao contraditoacuterio etc)

Eacute assentado o entendimento de que

Direitos liberdades poderes e garantias satildeo passiacuteveis de limitaccedilatildeo ou restriccedilatildeo Eacute preciso natildeo

perder de vista poreacutem que tais restriccedilotildees satildeo limitadas [] Esses limites que decorrem da

proacutepria Constituiccedilatildeo referem-se tanto agrave necessidade de proteccedilatildeo de um nuacutecleo essencial do

direito fundamental quanto agrave clareza determinaccedilatildeo generalidade e proporcionalidade das

restriccedilotildees impostas11

10 BARCA Marcelo Disponiacutevel em lthttpmarcelobarcajusbrasilcombrartigos13658428zz8a-legalidade-do-tratamento-

diferenciado-as-mulheres-vitimas-de-violencia-domestica-a-luz-do-ordenamento-juridico-patriogt Acesso em 20 mar 2018

11 MENDES Gilmar COELHO Inocecircncio Maacutertires BRANCO Paulo Gustavo Gonet Curso de Direito Constitucional Satildeo Paulo Saraiva 2007

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A Lei Maria da Penha eacute ao mesmo tempo protetiva de direitos de mulheres e restritiva de direitos de agressores Decorrentemente sua aplicaccedilatildeo somente se justifica em razatildeo das circunstacircncias muito especiacuteficas que envolvem a violecircncia de gecircnero brutalidade institucionalizaccedilatildeo da violecircncia frequecircn-cia reiteraccedilatildeo permanecircncia intimidaccedilatildeo e iacutendices elevadiacutessimos

Aplica-se aqui o princiacutepio da proporcionalidade jaacute que o comum dramaacutetico e de consequecircncias gravo-sas eacute a violecircncia do homem contra a mulher A mulher agredida natildeo se encontra em igualdade de condi-ccedilotildees com o agressor Haacute uma vulnerabilidade mesmo que transitoacuteria ou seja enquanto durar o estado de agressatildeo ainda que iminente

As peculiaridades da violecircncia domeacutestica e familiar contra a mulher bem como os nuacutemeros absurda-mente elevados clamam pela utilizaccedilatildeo de instrumentos eficazes e eneacutergicos mesmo que para tanto tenham-se que se sacrificar em condiccedilotildees especiacuteficas direitos garantias e liberdades

Dentro desta perspectiva somente as viacutetimas de violecircncia domeacutestica e familiar baseada no gecircne-ro (art 5ordm) ou aqueles (homens ou mulheres) que estejam nas situaccedilotildees elencadas no inciso III do art 313 do CPP com as alteraccedilotildees trazidas pela Lei 1240311 (crianccedila adolescente idoso enfermo ou pessoa com deficiecircncia) ou nas condiccedilotildees mencionadas na Lei 980799 (viacutetimas coagidas ou expostas agrave grave ameaccedila em razatildeo de colaborarem com a investigaccedilatildeo ou processo criminal) possuem amparo especiacutefico jaacute que em relaccedilatildeo a tais pessoas haacute motivaccedilotildees particulares que por conta de sua especial vulnerabilidade (vulnerabilidade situacional) justificam um tratamento tambeacutem diferenciado ainda que com a consequecircncia de restringir direitos garantias e liberdades fundamentais do acusado

No caso da violecircncia contra a mulher ldquoao confirmar a inexistecircncia real da igualdade a niacutevel internacio-nal e em muitos paiacuteses democraacuteticos satildeo estabelecidas medidas de accedilatildeo positiva para corrigir as situa-ccedilotildees desequilibradas como consequecircncia de praacuteticas ou sistemas sociais discriminatoacuteriosrdquo12 da qual a Lei Maria da Penha eacute um ilustre exemplo

Entendemos mais correto esse segundo posicionamento Apesar da grande similitude dos dois institu-tos (accedilotildees afirmativas e medidas especiais de caraacuteter temporaacuterio) a Lei Maria da Penha constitui uma representaccedilatildeo do segundo deles Isso pelo fato de que como o seu proacuteprio nome diz as medidas espe-ciais possuem caraacuteter temporaacuterio enquanto as accedilotildees afirmativas tecircm natureza permanente

A distinccedilatildeo entre uma e outra noccedilatildeo foi aclarada pelo Comitecirc para a Eliminaccedilatildeo de todas as Formas de Discriminaccedilatildeo contra a Mulher - CEDAW De acordo com o Comitecirc a expressatildeo accedilatildeo afirmativa natildeo faz parte da linguagem utilizada nos tratados internacionais de direitos humanos ficando reservado o seu uso para a doutrina e o direito interno de alguns paiacuteses Confira-se13

130 O Comitecirc vecirc com preocupaccedilatildeo que o Estado-Parte [referindo-se ao Brasil] utilize a

expressatildeo ldquomedidas positivasrdquo para descrever algumas de suas medidas orientadas a eliminar

a discriminaccedilatildeo e que natildeo a utilize para descrever medidas especiais de caraacuteter temporaacuterio

orientadas a acelerar a igualdade

131 O Comitecirc recomenda que o Estado-Parte [referindo-se ao Brasil] ao formular as poliacuteticas

para conseguir a igualdade entre os gecircneros natildeo apenas elimine a discriminaccedilatildeo mas que

de conformidade com o paraacutegrafo 1deg do artigo 4deg da Convenccedilatildeo adote medidas especiais de

caraacuteter temporaacuterio para acelerar o processo orientado a conseguir a igualdade

12 ESCOBAR CIRUJANO Ana QUINTEROS Andreacutes SAacuteNCHEZ GAMONAL Sara Beleacuten TANDOacuteN RECIO Baacuterbara In PEREZ VIEJO

Jesuacutes M HERNAacuteNDEZ Ana Montalvo (Cood) Violencia de geacutenero prevencioacuten deteccioacuten y atencioacuten Madrid Grupo 5 2011 p 31

13 Naccedilotildees Unidas - Informe do Comitecirc para a eliminaccedilatildeo da Discriminaccedilatildeo contra a Mulher - 28ordm periacuteodo de sessotildees (13 a 31 de Jan de

2003) 29ordm periacuteodo de sessotildees (30 de Junho a 18 de Julho de 2003) Disponiacutevel em lthttpwwwspmgovbrassuntosacoes-internacionais

Articulacaoarticulacao-internacionalrecomendacoes-cedaw-traduzido-e-revisado-26-12-03docgt Acesso em 26 dez 2003

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Eacute exatamente a temporalidade das medidas especiais que constituem o seu traccedilo caracteriacutestico Elas satildeo destinadas a acelerar a igualdade de fato Alcanccedilados os objetivos que justificaram a sua criaccedilatildeo devem ser cessados os seus efeitos

Para Vaacutesquez

Isto resulta muito compreensiacutevel quando se pensa na superaccedilatildeo de discriminaccedilotildees histoacutericas

como a racial e a das mulheres as quais eacute possiacutevel esperar ndash ao menos teoricamente ndash sua

total erradicaccedilatildeo no futuro Poreacutem se se consideram outras medidas como as que se adotam

com relaccedilatildeo a pessoas cegas ou portadoras de deficiecircncias fiacutesicas dificilmente podem ser

consideradas como medidas especiais temporaacuterias ao menos que se acredite ou se aspire que no

futuro natildeo venham a existir pessoas cegas ou com deficiecircncia fiacutesica14

A autora cita como exemplo de accedilatildeo afirmativa para as mulheres a licenccedila poacutes-parto informando que tanto as accedilotildees afirmativas quanto as medidas especiais de caraacuteter temporaacuterio podem ser consideradas como as uacutenicas exceccedilotildees que o direito internacional dos direitos humanos autoriza frente agrave primazia do princiacutepio da igualdade em seu sentido formal15

Ainda de acordo com Vaacutesquez

A justificaccedilatildeo mais consistente para as normas especiais ou diferenciadas se encontra na

aplicaccedilatildeo direta da obrigaccedilatildeo geral de garantia dos direitos sem discriminaccedilatildeo Nela satildeo

encontrados os fundamentos das medidas que se adotam tendo em conta a realidade dos

diversos grupos humanos que portanto natildeo podem entender-se como lsquovantagemrsquo que se

outorgam a grupos socialmente desavantajados16

4 OS DOCUMENTOS INTERNACIONAIS MENCIONADOS NO ART 1ordm DA LEI MARIA DA PENHA

Jaacute em seu preacircmbulo e no seu artigo inicial a Lei Maria da Penha cita importantes instrumentos inter-nacionais de Direitos Fundamentais que lhes datildeo embasamento

a) Convenccedilatildeo sobre a Eliminaccedilatildeo de todas as Formas de Discriminaccedilatildeo contra a Mulher - CEDAW e

b) Convenccedilatildeo Interamericana para Prevenir Punir e Erradicar a Violecircncia Contra a Mulher - Beleacutem do Paraacute

Tratam-se dos dois mais importantes instrumentos internacionais de direitos humanos que alcanccedilam as mulheres brasileiras Eles foram elaborados no acircmbito da ONU e decorrem de um sistema de prote-ccedilatildeo dos direitos humanos com jurisdiccedilatildeo global entre os estados-membros

Ambos os documentos internacionais evidenciam que a violecircncia contra a mulher no acircmbito puacuteblico ou privado constitui uma grave violaccedilatildeo aos direitos humanos e limita total ou parcialmente o exerciacute-cio dos demais direitos fundamentais Mencionam ainda que a violecircncia baseada no gecircnero reflete relaccedilotildees de poder historicamente desiguais e assimeacutetricas entre os sexos

14 TOLEDO VAacuteSQUEZ Patsili FemiciacutedioFeminiciacutedio Buenos Aires Didot 2014 p 163

15 Idem p 164

16 idem p 165

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A violecircncia contra as mulheres ldquoapenas foi reconhecida formalmente como violaccedilatildeo de direitos huma-nos na Conferecircncia das Naccedilotildees Unidas sobre Direitos Humanos no ano de 1993 a partir disso os paiacute-ses-membros da ONU e as organizaccedilotildees da sociedade civil tecircm se dedicado a encontrar maneiras de erradicar esse tipo de violecircnciardquo17 o que inclui a elaboraccedilatildeo de documentos internacionais como eacute o caso dos citados no preacircmbulo e no art 1ordf da Lei Maria da Penha

Tais documentos natildeo possuem status constitucional no Brasil por natildeo terem sido recepcionados com o procedimento previsto no sect3ordm do art 5ordm da CF Tecircm no entanto caraacuteter supralegal18

41 ALGUMAS INFORMACcedilOtildeES SOBRE CADA UM DOS DOCUMENTOS

INTERNACIONAIS ANTES MENCIONADOS

411 CONVENCcedilAtildeO SOBRE A ELIMINACcedilAtildeO DE TODAS AS FORMAS DE

DISCRIMINACcedilAtildeO CONTRA A MULHER ndash CEDAW DE 1979

bull Fruto da I Conferecircncia Mundial sobre a Mulher realizada em 1975 no Meacutexico

bull Adotada pela Resoluccedilatildeo 34180 da Assembleia das Naccedilotildees Unidas em 18 de Dezembro de 1979

bull Assinada pelo Brasil em Toacutequio no dia 31 de marccedilo de 1981

bull Aprovada pelo Congresso Nacional por meio do Decreto Legislativo 931983 com ressalvas

bull Entrou em vigor no Brasil em 020384

bull Promulgada pelo Presidente da Repuacuteblica por meio do Decreto 894601984 com as mesmas ressalvas constantes do Decreto Legislativo

bull Suas ressalvas foram retiradas em 2002 pelo meio do Decreto 4377

Seu art 2ordm exalta a todas as Naccedilotildees do Mundo membros da Organizaccedilatildeo das Naccedilotildees Unidas o que se segue19

Artigo II Os Estados Partes condenam a discriminaccedilatildeo contra a mulher em todas as suas formas

concordam em seguir por todos os meios apropriados e sem dilaccedilotildees uma poliacutetica destinada a

eliminar a discriminaccedilatildeo contra a mulher e com tal objetivo se comprometem a

a) Consagrar se ainda natildeo o tiverem feito em suas constituiccedilotildees nacionais ou em outra

legislaccedilatildeo apropriada o princiacutepio da igualdade do homem e da mulher e assegurar por lei outros

meios apropriados a realizaccedilatildeo praacutetica desse princiacutepio

b) Adotar medidas adequadas legislativas e de outro caraacuteter com as sanccedilotildees cabiacuteveis e que

proiacutebam toda discriminaccedilatildeo contra a mulher

c) Estabelecer a proteccedilatildeo juriacutedica dos direitos da mulher numa base de igualdade com os do

homem e garantir por meio dos tribunais nacionais competentes e de outras instituiccedilotildees

puacuteblicas a proteccedilatildeo efetiva da mulher contra todo ato de discriminaccedilatildeo

d) Abster-se de incorrer em todo ato ou praacutetica de discriminaccedilatildeo contra a mulher e zelar para que

as autoridades e instituiccedilotildees puacuteblicas atuem em conformidade com esta obrigaccedilatildeo

e) Tomar as medidas apropriadas para eliminar a discriminaccedilatildeo contra a mulher praticada por

qualquer pessoa organizaccedilatildeo ou empresa

17 SAtildeO PAULO Disponiacutevel em lthttpwwwdefensoriaspgovbrdpesprepositorio 41Revista_violC3AAncia20dom

C3A9sticapdfgt Acesso em 20 mar 2018

18 Idem

19 BRASIL Disponiacutevel em lthttpwww2camaralegbrleginfeddecret2002decreto-4377-13-setembro-2002-476386-

publicacaooriginal-1-pehtmlgt Acesso em 20 mar 2018

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f) Adotar todas as medidas adequadas inclusive de caraacuteter legislativo para modificar ou

derrogar leis regulamentos usos e praacuteticas que constituam discriminaccedilatildeo contra a mulher

g) Derrogar todas as disposiccedilotildees penais nacionais que constituam discriminaccedilatildeo contra a mulher

Quando aprovada pelo Congresso Nacional brasileiro em 1984 continha inuacutemeras reservas que diziam respeito ao direito de famiacutelia devido agrave incompatibilidade com a legislaccedilatildeo interna pautada pela assimetria entre os direitos do homem e da mulher no nosso paiacutes

Apesar de a Constituiccedilatildeo de 1988 ter incluiacutedo dentre os direitos fundamentais a igualdade entre os sexos (art 5ordm I) tais reservas somente foram retiradas em 2002 por meio do Decreto 4377202 o qual determinou que a Convenccedilatildeo ldquoseraacute executada e cumprida tatildeo inteiramente como nela se conteacutemrdquo

A CEDAW foi o primeiro tratado internacional que dispocircs amplamente sobre os direitos humanos das mulheres propondo duas frentes de trabalho promover os direitos da mulher na busca da igualdade de gecircnero e reprimir quaisquer discriminaccedilotildees contra as mulheres nos Estados-parte

Como bem menciona Jubilut

Tal Convenccedilatildeo se insere no advento da teoria de gecircnero e busca garantir proteccedilatildeo especiacutefica

agraves mulheres agrave qual devem se acrescer todos os direitos humanos assegurados de modo geral

Trata-se assim de se atentar para as particularidades das mulheres e de sobretudo buscar gerar

igualdade real e natildeo apenas formal entre elas e os homens20

De acordo com o relato de Silvia Pimentel21 adoccedilatildeo da CEDAW

Foi o fruto de deacutecadas de esforccedilos internacionais visando agrave proteccedilatildeo e agrave promoccedilatildeo dos direitos

das mulheres em todo o mundo Resultou de iniciativas tomadas dentro da Comissatildeo sobre a

Situaccedilatildeo da Mulher (CSW sigla em inglecircs) da Organizaccedilatildeo das Naccedilotildees Unidas (ONU) oacutergatildeo

criado dentro do sistema das Naccedilotildees Unidas em 1946 com o objetivo de analisar e elaborar

recomendaccedilotildees para a formulaccedilatildeo de poliacuteticas aos vaacuterios paiacuteses signataacuterios da Convenccedilatildeo

visando ao aprimoramento do status da mulher

Baseada em provisotildees da Carta das Naccedilotildees Unidas ndash que afirma expressamente os direitos iguais

de homens e mulheres ndash e na Declaraccedilatildeo Universal dos Direitos Humanos ndash que estabelece que

todos os direitos e liberdades humanos devem ser aplicados igualmente a homens e mulheres

sem distinccedilatildeo de qualquer natureza ndash a Comissatildeo preparou entre os anos de 1949 e 1962

uma seacuterie de tratados que incluiacuteram a Convenccedilatildeo dos Direitos Poliacuteticos das Mulheres (1952)

a Convenccedilatildeo sobre a Nacionalidade de Mulheres Casadas (1957) e a Convenccedilatildeo sobre o

Casamento por Consenso Idade Miacutenima para Casamento e Registro de Casamentos (1962)

Esses tratados tinham por objetivo visavam a proteccedilatildeo e a promoccedilatildeo dos direitos da mulher nas

aacutereas em que esses direitos fossem considerados particularmente vulneraacuteveis pela Comissatildeo

Em 1965 a Comissatildeo empenhou-se nos preparativos para o que viria a se tornar em 1967 a

Declaraccedilatildeo sobre a Eliminaccedilatildeo da Discriminaccedilatildeo contra a Mulher Esta Declaraccedilatildeo incluiacutea em

um uacutenico instrumento legal padrotildees internacionais que articulavam direitos iguais de homens

e mulheres A Declaraccedilatildeo entretanto natildeo se efetivou como um tratado Apesar de sua forccedila

moral e poliacutetica ela natildeo estabeleceu obrigaccedilotildees para os Estados

Em 1972 a Comissatildeo sobre a Situaccedilatildeo da Mulher considerou a possibilidade de organizar um

tratado que conferisse forccedila de lei agrave Declaraccedilatildeo Essa proposta foi impulsionada pelo Plano

Mundial de Accedilatildeo adotado pela Conferecircncia Mundial do Ano Internacional da Mulher das

Naccedilotildees Unidas em 1975 Esse Plano pedia uma Convenccedilatildeo para a Eliminaccedilatildeo da Discriminaccedilatildeo

20 JUBILUT Liliana CombateDisponiacutevel em lthttplilianajubilutjusbrasilcombrartigos121940395o-combate-a-violencia-

contra-a-mulher-no-ambito-da-onugt Acesso em 20 mar 2018

21 Texto baseado na apresentaccedilatildeo da professora Silvia Pimentel presidente do Comitecirc sobre a Eliminaccedilatildeo da Discriminaccedilatildeo contra a

Mulher (Comitecirc CEDAW da ONU) publicada no livro Instrumentos Internacionais de Direitos das Mulheres Heloisa Frossard (org)

SPM-PR 2006 Disponiacutevel em lthttpwwwcompromissoeatitudeorgbrconvencao-sobre-a-eliminacao-de-todas-as-formas-de-

discriminacao-contra-a-mulher-cedaw-1979gt Acesso em 20 mar 2018

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contra a Mulher com procedimentos efetivos para sua implementaccedilatildeo Este trabalho tambeacutem

foi impulsionado pela Assembleia Geral que declarou o periacuteodo 1976-1985 a Deacutecada das

Naccedilotildees Unidas para a Mulher

A Convenccedilatildeo para a Eliminaccedilatildeo de Todas as Formas de Discriminaccedilatildeo contra a Mulher

(CEDAW) foi adotada pela Assembleia Geral em 1979 Na resoluccedilatildeo de adoccedilatildeo da Convenccedilatildeo a

Assembleia Geral demonstrou expectativas de que ela entrasse em accedilatildeo em curto prazo

Convenccedilatildeo Interamericana para Prevenir Punir e Erradicar a Violecircncia Contra a Mulher - Beleacutem do Paraacute de 1994

bull Adotada pela Assembleia Geral da Organizaccedilatildeo dos Estados Americanos no dia 6061994

bull Entrou em vigor no plano internacional em 3031995

bull Aprovada pelo Decreto legislativo 107 de 31081995

bull Ratificada pelo Brasil no dia 27111995

bull O Governo brasileiro depositou a Carta de Ratificaccedilatildeo do instrumento multilateral em epiacutegrafe em 27 de novembro de 1995 passando o mesmo a vigorar para o Brasil em 27 de dezembro de 1995

bull Promulgada pelo Presidente da Repuacuteblica pelo Decreto 1973 de 1081996

412 A CONVENCcedilAtildeO BELEacuteM DO PARAacute ESTABELECEU COMO DEVERES DOS

ESTADOS22

Capiacutetulo III - Deveres dos Estados

Artigo 7ordm Os Estados Membros condenam todas as formas de violecircncia contra a mulher e

concordam em adotar por todos os meios apropriados e sem demora poliacuteticas orientadas e

prevenir punir e erradicar a dita violecircncia e empenhar-se em

Paraacutegrafo 1 Abster-se de qualquer accedilatildeo ou praacutetica de violecircncia contra a mulher e velar para

que as autoridades seus funcionaacuterios pessoal e agentes e instituiccedilotildees puacuteblicas se comportem

conforme esta obrigaccedilatildeo

Paraacutegrafo 2 Atuar com a devida diligecircncia para prevenir investigar e punir a violecircncia contra

a mulher

Paraacutegrafo 3 Incluir em sua legislaccedilatildeo interna normas penais civis e administrativas assim como

as de outra natureza que sejam necessaacuterias para prevenir punir e erradicar a violecircncia contra a

mulher e adotar as medidas administrativas apropriadas que venham ao caso

A Convenccedilatildeo Beleacutem do Paraacute integra o acircmbito do sistema regional de direitos humanos conduzido pela Organizaccedilatildeo dos Estados Americanos - OEA

Apesar de o Estado brasileiro ter ratificado a Convenccedilatildeo de Beleacutem do Paraacute logo apoacutes a sua adoccedilatildeo pela ONU ou seja em 1995 uma das obrigaccedilotildees a que se comprometeu (a de incluir em sua legisla-ccedilatildeo normas especiacuteficas sobre o combate a violecircncia contra a mulher) somente veio a acontecer onze anos depois com a ediccedilatildeo da Lei Maria da Penha (2006) Haacute ainda quem entenda que o compromisso soacute foi cumprido por conta da condenaccedilatildeo que o Brasil sofreu na Comissatildeo Interamericana de Direitos Humanos no caso 5401 em que foi demandante Maria da Penha Maia Fernandes Os detalhes do caso seratildeo trazidos a seguir

22 BRASIL Disponiacutevel em lthttpwww2camaralegbrleginfeddecret1996decreto-1973-1-agosto-1996-435655-publicacaooriginal-

1-pehtmlgt Acesso em 20 mar 2018

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413 RECOMENDACcedilAtildeO DA COMISSAtildeO INTERAMERICANA NO CASO 5401 ndash MARIA

DA PENHA MAIA FERNANDES

Maria da Penha Maia Fernandes ingressou em 2001 junto agrave Comissatildeo Interamericana de Direitos Humanos ndash sistema especial de proteccedilatildeo dos direitos humanos ndash em busca do reconhecimento da tole-racircncia da Repuacuteblica Federativa do Brasil em tomar as providecircncias cabiacuteveis no intuito de processar e punir o seu entatildeo esposo por duas tentativas de homiciacutedio perpetradas contra ela e que tinham ocor-rido haacute mais de 15 anos As agressotildees sofridas por ela ocasionaram inclusive paraplegia irreversiacutevel

Em razatildeo da toleracircncia do Brasil em promover o processo dos crimes praticados com violecircncia domeacutesti-ca e familiar contra a mulher o Centro pela Justiccedila pelo Direito Internacional (CEJIL) e o Comitecirc Latino-Americano de Defesa dos Direitos da Mulher (CLADEM) juntamente com a viacutetima formalizaram uma denuacutencia agrave Comissatildeo Interamericana de Direitos Humanos da Organizaccedilatildeo dos Estados Americanos (OEA) que eacute um oacutergatildeo internacional responsaacutevel pela anaacutelise de violaccedilatildeo de acordos internacionais

A Comissatildeo da OEA condenou o Estado brasileiro pela excessiva toleracircncia em promover a persecuccedilatildeo do crime praticado com violecircncia agrave mulher e recomendou reforma no sistema legislativo com o desiacuteg-nio de simplificar os procedimentos existentes bem como inserir novas formas para a resoluccedilatildeo de con-flitos (Relatoacuterio 5401 Caso 12051 de 40401 - Maria da Penha Maia Fernandes)

A Comissatildeo recomendou ao Brasil dentre outras medidas ldquoprosseguir e intensificar o processo de refor-ma que evite a toleracircncia estatal e o tratamento discriminatoacuterio com respeito agrave violecircncia domeacutestica con-tra mulheres no paiacutesrdquo particularmente dentre outras ldquosimplificar os procedimentos judiciais penais a fim de que possa ser reduzido o tempo processual sem afetar os direitos e garantias do devido processordquo23

A violecircncia contra a mulher infelizmente ainda nos dias de hoje estaacute marcada intensamente por um traccedilo de prevalecimento o qual por muito tempo foi sustentado e legitimado por tratamento juriacutedico que dava ao homem direitos e benefiacutecios natildeo extensiacuteveis agraves mulheres

Um bom exemplo do que se afirma vem do Direito Constitucional brasileiro a despeito de nossas constituiccedilotildees sempre agasalharem em seu interior a maacutexima ldquotodos satildeo iguais perante a leirdquo sendo que quase a totalidade delas proibiu expressamente qualquer distinccedilatildeo em razatildeo dentre outros de criteacuterios baseados no sexo foram convalidadas e criadas inuacutemeras leis elaboradoras de diferenccedilas contrariando assim as disposiccedilotildees constitucionais Somente com a Carta de 1988 eacute que mulheres e homens no Brasil galgaram a igualdade juriacutedica A isonomia de fato entretanto ainda natildeo foi alcanccedila-da No Brasil dois seacuteculos ainda separam mulheres e homens da igualdade24

5 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

A fim de que avanccedilos possam ser operados com mais agilidade foram criados instrumentos juriacutedicos (nacionais e internacionais) todos no sentido de estabelecer o direito das mulheres agrave natildeo violecircncia como categoria merecedora de uma proteccedilatildeo especial

E o que tem de tatildeo diferente na violecircncia contra a mulher que natildeo se encontra presente quando a viacutetima eacute do sexo masculino e que faz com que sejam necessaacuterios instrumentos especiais (nacionais e interna-cionais) de proteccedilatildeo Eacute que ao contraacuterio da violecircncia contra os homens a violecircncia contra as mulheres encontra-se legitimada socialmente mesmo que cada vez menos Ainda persistem praacuteticas discrimina-

23 OAS Para ver o relatoacuterio da Comissatildeo Interamericana de Direitos Humanos Disponiacutevel em lthttpwwwcidhoasorg

annualrep2000port12051htmgt Acesso em 20 mar 2018

24 Ver a pesquisa completa em lthttpmfolhauolcombrasmais2015091675183-no-ritmo-atual-fim-da-desigualdade-entre-

homens-e-mulheres-demoraria-240-anosshtmlgt Acesso em 20 mar 2018

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toacuterias que colocam a mulher em situaccedilatildeo de inferioridade a respeito dos direitos e liberdades essen-ciais Esse eacute um tema de especial importacircncia principalmente quando se verifica que as praacuteticas discri-minatoacuterias levam agraves praacuteticas violentas e vice-versa

A violecircncia independentemente se dirigida contra o homem ou contra a mulher natildeo deve ser tolerada Embora mais homens do que mulheres sejam viacutetimas quando o tema refere-se ao acircmbito domeacutestico a situaccedilatildeo se inverte por conta das inuacutemeras especificidades que marcam a violecircncia domeacutestica e fami-liar contra a mulher convivecircncia afeto entre as partes filhos em comum interesses patrimoniais vul-nerabilidade dependecircncia econocircmica machismo etc Estas particularidades exigem um tratamento especial singularizado bem como justifica a intervenccedilatildeo do Estado na intimidade da famiacutelia

O Estado brasileiro ao ratificar documentos internacionais de proteccedilatildeo agrave mulher assumiu no plano internacional o compromisso de adotar medidas internas para garantir os direitos das mulheres no acircmbi-to das relaccedilotildees domeacutesticas e familiares A fim de cumprir com tal obrigaccedilatildeo planos metas e estrateacutegias foram estabelecidos bem como e principalmente foram implementadas accedilotildees (poliacuteticas puacuteblicas)

Eacute nesse contexto que surge o debate sobre direitos especificamente femininos - ou melhor sobre direitos historicamente natildeo reconhecidos - e a criaccedilatildeo de instrumentos internacionais que criam con-diccedilotildees de se superar a contiacutenua discriminaccedilatildeo contra as mulheres

Os direitos das mulheres satildeo indissociaacuteveis dos direitos humanos natildeo haacute que se falar em garantia uni-versal de direitos sem que as mulheres enquanto humanas e cidadatildes tenham seus direitos especiacuteficos respeitados Tal afirmaccedilatildeo eacute corolaacuterio do princiacutepio da igualdade que determina natildeo poder a lei fazer qualquer distinccedilatildeo entre indiviacuteduos o que inclui a distinccedilatildeo entre os sexos ou entre os gecircneros

Natildeo obstante os avanccedilos surgidos contudo ainda eacute relevante o tratamento juriacutedico diferenciado para homens e mulheres sobretudo em consequecircncia dos muitos anos de desigualdades materiais e for-mais Enfim o que se espera eacute que se consubstancie de fato a incorporaccedilatildeo de novos comportamentos e a construccedilatildeo de outros contextos culturais nos quais seja desnecessaacuteria a determinaccedilatildeo legal de res-peito a direitos sejam de mulheres sejam de homens e que a dignidade da pessoa natildeo dependa de sexo gecircnero ou orientaccedilatildeo sexual mas que decorra exatamente da igual condiccedilatildeo humana

REFEREcircNCIAS

BIANCHINI Alice Lei Maria da Penha 4 ed Satildeo Paulo Saraiva 2018

CANOTILHO Joseacute Joaquim Gomes Direito Constitucional Coimbra Almedina 1992

CAVALCANTI Stela Valeacuteria Soares de Farias Violecircncia domeacutestica anaacutelise da Lei ldquoMaria da Penhardquo n 1134006 3 ed Salvador Podivm 2010

ESCOBAR CIRUJANO Ana QUINTEROS Andreacutes SAacuteNCHEZ GAMONAL Sara Beleacuten TANDOacuteN RECIO Baacuterbara In PEREZ VIEJO Jesuacutes M HERNAacuteNDEZ Ana Montalvo (Cood) Violencia de geacutene-ro prevencioacuten deteccioacuten y atencioacuten Madrid Grupo 5 2011

JUBILUT Liliana Lyra Combate a violenciahellipDisponiacutevel em lthttplilianajubilutjusbrasilcombrartigos121940395o-combate-a-violencia-contra-a-mulher-no-ambito-da-onugt Acesso em 20 mar 2018

LAMB Christina YOUSAFZAI Malala Eu sou Malala Satildeo Paulo Companhia das Letras 2013

MIRANDA Marcelo Barccedila Alves de LegalidadeDisponiacutevel em lthttpmarcelobarcajusbrasilcombrartigos136584288a-legalidade-do-tratamento-diferenciado-as-mulheres-vitimas-de-violen-cia-domestica-a-luz-do-ordenamento-juridico-patriogt Acesso em 20 mar 2018

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Universidade do Sul de Santa Catarina

Revista Juriacutedica da Universidade do Sul de Santa Catarina

MENDES Gilmar COELHO Inocecircncio Maacutertires BRANCO Paulo Gustavo Gonet Curso de Direito Constitucional Satildeo Paulo Saraiva 2007

NACcedilOtildeES UNIDAS - Informe do Comitecirc para a eliminaccedilatildeo da Discriminaccedilatildeo contra a Mulher - 28ordm periacuteo-do de sessotildees (13 a 31 de Janeiro de 2003) 29ordm periacuteodo de sessotildees (30 de Junho a 18 de Julho de 2003) Disponiacutevel em lthttpwwwspmgovbrassuntosacoes-internacionaisArticulacaoarticulacao-in-ternacionalrecomendacoes-cedaw-traduzido-e-revisado-26-12-03docgt Acesso em 20 mar 2018

FORNTEIRAS DO PENSAMENTO Palestra proferida em 14 de junho de 2011 em Satildeo Paulo 2011

OAS Relatoacuterio da Comissatildeo Interamericana de Direitos Humanos Disponiacutevel em lthttpwwwcidhoasorgannualrep2000port12051htmgt 20 mar 2018

PIMENTEL Silvia Disponiacutevel em lthttpwwwcompromissoeatitudeorgbrconvencao-sobre-a-elimi-nacao-de-todas-as-formas-de-discriminacao-contra-a-mulher-cedaw-1979gt Acesso em 20 mar 2018

SABADELL Ana Lucia Manual de Sociologia Juriacutedica 5 ed Satildeo Paulo RT 2010

TOLEDO VAacuteSQUEZ Patsili FemiciacutedioFeminiciacutedio Buenos Aires Didot 2014

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AS TREcircS VERTENTES DO SISTEMA PENITENCIAacuteIO UMA ANAacuteLISE CRIMINOLOacuteGICA SOCIAL E CARCERAacuteRIA

LAS TRES VERTENTES DEL SISTEMA PENITENCIARIO UNA ANAacuteLISIS CRIMINOLOacuteGICA SOCIAL Y CARCERARIAAndreacuteia Catine Cosme1

Karem Raimondi Martins2

Resumo O presente artigo possui como objetivo expor as trecircs principais vertentes da puniccedilatildeo apon-tando a previsatildeo legal visatildeo carceraacuteria e a visatildeo social apresentando quais os fatores responsaacuteveis pela falta da ressocializaccedilatildeo do apenado apoacutes o cumprimento da pena Utilizando-se do meacutetodo indu-tivo se partindo de um caso isolado sendo ele a vivecircncia da populaccedilatildeo carceraacuteria da Colocircnia Penal Agriacutecola de Palhoccedila analisando a vida e os ocorridos durante o tempo e apoacutes o caacutercere do apenado apontando os resultados da pesquisa e consequentemente trabalhando a proteccedilatildeo e a natureza peda-goacutegica da responsabilizaccedilatildeo das penas e da ressocializaccedilatildeo dos detentos conforme a lei de execuccedilatildeo penal e demais legislaccedilotildees pertinentes Por fim seraacute apontando que talvez a responsabilizaccedilatildeo pela fal-ta da ressocializaccedilatildeo natildeo seja exclusivamente do Estado este tem um papel fundamental mas talvez os maiores responsaacuteveis por essa reinserccedilatildeo do apenado do acircmbito social seja a sociedade em geral

Palavras-chave Colocircnia Penal Agriacutecola Ressocializaccedilatildeo Sociedade

Resumen El presente artiacuteculo tiene como objetivo exponer las tres principales vertientes del castigo apuntan-do a la previsioacuten legal visioacuten carcelaria y la visioacuten social presentando cuaacuteles son los factores responsables por la falta de la resocializacioacuten del apenado despueacutes del cumplimiento de la pena En el caso de que se trate de un caso aislado siendo eacutel la vivencia de la poblacioacuten carcelaria de la Colonia Penal Agriacutecola de Palhoccedila analizan-do la vida y los ocurridos durante el tiempo y despueacutes de la caacutercel del apenado apuntando los resultados de la investigacioacuten y en consecuencia trabajando la proteccioacuten y la naturaleza pedagoacutegica de la responsabilizacioacuten de las penas y de la resocializacioacuten de los detenidos conforme a la ley de ejecucioacuten penal y demaacutes legislaciones pertinentes Por uacuteltimo apuntando que quizaacutes la responsabilizacioacuten por la falta de la resocializacioacuten no sea exclusivamente del Estado eacuteste tiene un papel fundamental pero quizaacutes los mayores responsables de esa rein-sercioacuten del apenado del aacutembito social sea la sociedad en general

Palabras-clave Colonia Penal Agriacutecola Resocializacioacuten La sociedad

1 INTRODUCcedilAtildeO

Atraveacutes dos veiacuteculos midiaacuteticos diariamente recebe-se diversas informaccedilotildees a respeito do constante aumento da criminalidade crimes cometidos a todo o instante cadeias lotadas e aquele sentimento de que a ldquojusticcedilardquo precisa ser feita Devido a esse aumento da praacutetica de crimes resolveu-se pesquisar o que estaacute acarretando estes fatores negativos buscando-se colocar no lugar daqueles que satildeo conside-rados o ldquoproblemardquo pesquisando assim pelas trecircs principais vertentes da puniccedilatildeo ou seja a previsatildeo legal a visatildeo carceraacuteria e a visatildeo social

1 Mestre em Sociologia Poliacutetica pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) Graduada em Ciecircncias Sociais pela Universidade

Federal de Santa Catarina (UFSC) e Professora da Universidade do Sul de Santa Catarina (UNISUL) E-mail andreiacosmeunisulbr

2 Poacutes Graduanda em Direito Penal e Criminologia pelo Centro Universitaacuterio Internacional (UNINTER) e Graduada pela Universidade do

Sul de Santa Catarina (UNISUL) E-mail karemraimondigmailcom

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Universidade do Sul de Santa Catarina

Revista Juriacutedica da Universidade do Sul de Santa Catarina

Atualmente se vive em um mundo onde os valores estatildeo invertidos no qual o indiviacuteduo natildeo ousa se colocar no lugar do proacuteximo natildeo se submete a pensar que talvez aquela triste situaccedilatildeo pudesse ser em seu lar com seu familiar com aquele que ama devido a isto se pretende fazer com que cada leitor con-siga vislumbrar qual a sua responsabilidade para com a ressocializaccedilatildeo do apenado

A fim de que o presente artigo natildeo fosse uacutenico e exclusivamente baseado em pesquisa bibliograacutefica se optou pela realizaccedilatildeo de pesquisa de campo sendo realizada a mesma na Colocircnia Penal Agriacutecola localizada na cidade de PalhoccedilaSC para que assim conseguisse enxergar pelos olhos daqueles que se encontram atraacutes dos altos muros qual a real realidade ocorrida apoacutes a condenaccedilatildeo conhecendo assim suas histoacuterias de vida e os motivos que os levaram a chegar ateacute ali tentando assim compreender uma realidade completamente diferente da que se encontra do lado de fora

Para a realizaccedilatildeo de tal projeto foi necessaacuteria a submissatildeo do mesmo perante o Comitecirc de Eacutetica em Pesquisa com Seres Humanos sendo aprovado atraveacutes do nuacutemero 69171417300005369

A pesquisa eacute de suma importacircncia objetivando desmentir algumas inverdades que haacute anos satildeo profe-ridas e disseminadas onde se atribui a culpa apenas ao outro quando o assunto eacute a ressocializaccedilatildeo do apenado apoacutes o cumprimento de sua pena

A problematizaccedilatildeo central do presente artigo eacute se ldquoO sistema penitenciaacuterio atual promove a ressociali-zaccedilatildeo do apenadordquo encontrando assim a real problemaacutetica deste sistema e a possiacutevel soluccedilatildeo cabiacutevel que ajudaraacute a entender este problema social que haacute muito tempo se faz presente na sociedade

O meacutetodo utilizado eacute o indutivo partindo-se de um caso isolado sendo ele a vivecircncia da populaccedilatildeo carceraacuteria da Colocircnia Penal Agriacutecola de Palhoccedila averiguando a vida e os ocorridos durante o tempo e apoacutes o caacutercere do apenado para que ao fim consiga-se apresentar os resultados da pesquisa e conse-quentemente trabalhar a proteccedilatildeo e a natureza pedagoacutegica da responsabilizaccedilatildeo das penas e da resso-cializaccedilatildeo dos detentos conforme a lei de execuccedilatildeo penal e demais legislaccedilotildees pertinentes O que for encontrado na pesquisa seraacute contrastado com a promessa de ressocializaccedilatildeo efetiva

Utiliza-se da metodologia qualitativa pois realizou-se pesquisa de campo sendo elaborado e apre-sentado questionaacuterios para com a populaccedilatildeo carceraacuteria da Colocircnia Penal Agriacutecola fazendo com que a vivecircncia daqueles que estatildeo encarcerados seja objeto de estudo para o presente artigo

2 A PENITENCIAacuteRIA UMA ANAacuteLISE EMPIacuteRICA

Objetivando compreender melhor o sistema carceraacuterio seratildeo aprofundadas as trecircs principais verten-tes deste sistema primeiramente a previsatildeo legal dispondo o que a lei penal brasileira define a sua principal caracteriacutestica a funccedilatildeo ressocializadora demonstrando se esta realmente se faz eficaz na praacutetica posteriormente a visatildeo carceraacuteria almejando enxergar pelos olhos daqueles que pouco satildeo ouvidos os que se encontram atraacutes dos altos muros onde natildeo possuem voz e mesmo apoacutes a quitaccedilatildeo de sua pena parecem permanecer sem esta caracteriacutestica e por uacuteltimo seraacute exposto a visatildeo social procu-rando demonstrar o senso comum estabelecido pela sociedade

21 ANAacuteLISE CRIMINAL

O ser humano vive em sociedade e para o bom e perfeito conviacutevio se faz necessaacuterio uma boa conduta conduta esta que sempre deveraacute estar descrita para que todos possam ter conhecimento do que eacute permi-tido e o que eacute proibido tendo total ciecircncia para que natildeo venha agir de maneira contraacuteria ao estabelecido

Atualmente o poder de puniccedilatildeo se encontra nas matildeos do Estado estando as regras previstas no Coacutedigo Penal3 prevendo que os atos contraacuterios ao bem comum ocasionaratildeo uma puniccedilatildeo devendo o agente praticante de tal ato ser responsabilizado pela sua conduta

3 BRASIL Lei no 2848 de 7 de dezembro de 1940 Coacutedigo Penal Disponiacutevel em lthttpwwwplanaltogovbrccivil_03decreto-lei

Del2848compiladohtmgt Acesso em 05 out 2017

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Unisul de Fato e de Direito

Ano IX Nordm 17 | Julho a Dezembro | 2018

Segundo Joatildeo Farias Juacutenior

O Direito Penal natildeo quer saber de fatores criminoacutegenos Haveria um paradoxo contrariaria

seus proacuteprios fundamentos se o Direito Penal se preocupasse com fatores criminoacutegenos

uma vez que ele se funda no livre-arbitrismo Ele natildeo quer saber das indagaccedilotildees sobre as

razotildees por que o homem se torna criminoso por que sua personalidade natildeo se harmoniza

com as normas e padrotildees de boa convivecircncia em sociedade das razotildees da criminalidade Se

esta oscila se se expande se estaacute causando intranquilidade se a criminalidade alcanccedilou um

estaacutegio de inseguranccedila nada disso importa quer dar soluccedilatildeo atraveacutes da ativaccedilatildeo do poder

punitivo do Estado Ele tem elencado em seu contexto a tipologia dos fatos cada fato aiacute descrito

corresponde abstratamente a um crime e cada crime corresponde por sua vez a uma pena4

Segundo Vigne

Consoante as legislaccedilotildees mais recentes traduzindo o discurso oficial a pena deixa de ter caraacuteter

retributivo e passa a ser aplicada sob a justificativa de ser necessaacuteria para reeducar o criminoso

oportunizando-lhe condiccedilotildees de regresso e conviacutevio com a sociedade5

Conforme Baratta

O efeito cataacutertico da pena e o processo de identificaccedilatildeo da sociedade com o delinquente satildeo

os dois aspectos de uma teoria psicoloacutegica do direito penal segundo a qual as duas concepccedilotildees

fundamentais da pena a concepccedilatildeo retributiva e a concepccedilatildeo preventiva natildeo satildeo mais que

racionalizaccedilotildees de fenocircmenos que fundam suas raiacutezes no inconsciente da psique humana []

Ambas transferem a funccedilatildeo da pena para o resultado futuro que consiste em influenciar a

coletividade ou o autor do delito6

Diferentemente da aplicaccedilatildeo das sanccedilotildees no princiacutepio agora as mesmas tecircm um propoacutesito mais ceacutelere buscando punir o agente praticante do crime mas natildeo com uma pena eterna mas sim como uma espeacute-cie de castigo com tempo determinado para que este reflita sobre o ato cometido e natildeo volte a praticar novamente Aleacutem dessa funccedilatildeo ressocializadora a pena tambeacutem tem sua funccedilatildeo preventiva fazendo com que todos possam ter conhecimento das consequecircncias referentes as accedilotildees previstas como proi-bidas objetivando que de certa forma possa prevenir que as pessoas pratiquem crimes pois teratildeo a convicccedilatildeo de que sofreratildeo seacuterias consequecircncias7

Augusto Thompson aduz sobre a real finalidade da pena de prisatildeo

Propotildeem-se oficialmente como finalidade da pena de prisatildeo a obtenccedilatildeo natildeo de um mas de

vaacuterios objetivos concomitantes

- puniccedilatildeo retributiva do mal causado pelo delinquente

- prevenccedilatildeo da praacutetica de novas infraccedilotildees atraveacutes da intimidaccedilatildeo do condenado e de pessoas

potencialmente criminosas

- regeneraccedilatildeo do preso no sentido de transformaacute-lo de criminoso em natildeo criminoso8

4 FARIAS JUacuteNIOR Joatildeo Manual de Criminologia 3 ed Curitiba Juruaacute 2006 p 35-36

5 VIGNE Valmor Prisatildeo e Ressocializaccedilatildeo Dissertaccedilatildeo (mestrado) - Universidade Federal de Santa Catarina Centro de Ciecircncias Juriacutedica

2001 p 05 Disponiacutevel em ltfileCUsersAdminDesktopPrevidenciC3A1rio179236pdf gt Acesso em 05 out 2017

6 BARATTA Alessandro Criminologia Criacutetica e Criacutetica do Direito Penal Traduccedilatildeo Juarez Cirino dos Santos Rio de Janeiro Revan

Instituto Carioca de Criminologia 6 ed Outubro de 2011 3 reimp ago 2016 p51

7 GRECO Rogeacuterio Curso de Direito Penal 15 ed Rio de Janeiro Impetus 2013 p 476

8 THOMPSON Augusto A Questatildeo Penitenciaacuteria 5 ed Rio de Janeiro Forense 2002 p3

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Universidade do Sul de Santa Catarina

Revista Juriacutedica da Universidade do Sul de Santa Catarina

Conforme Foucault

A recuperaccedilatildeo do condenado como objetivo principal da pena eacute um princiacutepio sagrado cuja

apariccedilatildeo formal no campo da ciecircncia e principalmente no da legislaccedilatildeo eacute bem recente (Congresso

Penitenciaacuterio de Bruxelas 1847) [E a comissatildeo amor de maio de 1945 repete fielmente] A pena

privativa de liberdade tem como objetivo principal a recuperaccedilatildeo e a reclassificaccedilatildeo social do

condenado (Princiacutepio da correccedilatildeo)9

Fazendo uma espeacutecie de analogia a pena pode ser vista como um castigo dado pelo pai para com a crianccedila que desobedeceu uma forma de fazer com que ela aprenda que consiga visualizar o erro que cometeu que natildeo venha repeti-lo mas o castigo tem que ter um tempo determinado para que depois a crianccedila vol-te a brincar No caso do agente praticante do crime a pena tem que cumprir seu papel de punir prevenir mas acima de tudo ressocializar fazendo com que o indiviacuteduo volte a ser inserido na sociedade

Apoacutes a praacutetica do crime o indiviacuteduo seraacute processado julgado e condenado a pena compatiacutevel com o ato que outrora cometeu a partir desse momento iniciaraacute o cumprimento de sua pena estando previsto na Lei nordm 7210 de 11 de julho de 1984 a Lei de Execuccedilatildeo Penal10 como deveraacute ser o cumprimento desta pena

De acordo com Foucault

A justa duraccedilatildeo da pena deve portanto variar natildeo soacute com o ato e suas circunstancias mas com

a proacutepria pena tal como ela se desenrola concretamente O que equivale a dizer que se a pena

deve ser individualizada natildeo eacute a partir do indiviacuteduo-infrator sujeito juriacutedico de seu ato autor

responsaacutevel do delito mas a partir do indiviacuteduo punido objeto de uma mateacuteria controlada de

transformaccedilatildeo o indiviacuteduo em detenccedilatildeo inserido no aparelho carceraacuterio modificado por este

ou a ele reagindo11

Nesse periacuteodo em que o agente praticante do crime fica recluso este estaraacute sob responsabilidade total do Estado devendo o mesmo arcar com as custas referentes ao apenado e dar total suporte conforme prevecirc os artigos 10 e 11 da Lei de Execuccedilatildeo Penal

Art 10 A assistecircncia ao preso e ao internado eacute dever do Estado objetivando prevenir o crime e

orientar o retorno agrave convivecircncia em sociedade

Paraacutegrafo uacutenico A assistecircncia estende-se ao egresso

Art 11 A assistecircncia seraacute

I - material

II - agrave sauacutede

III -juriacutedica

IV - educacional

V - social

VI - religiosa12

9 FOUCAULT Michel Vigiar e Punir nascimento da prisatildeo 38 ed Petroacutepolis Vozes 2010 p 255

10 BRASIL Lei nordm 7210 de 11 de julho de 1984 Lei de Execuccedilatildeo Penal Disponiacutevel em lthttpwwwplanaltogovbrccivil_03leis

L7210compiladohtm gt Acesso em 05 out 2017

11 FOUCAULT Michel Vigiar e Punir nascimento da prisatildeo 38 ed Petroacutepolis Vozes 2010 p 231

12 BRASIL Lei nordm 7210 de 11 de julho de 1984 Lei de Execuccedilatildeo Penal Disponiacutevel em lthttpwwwplanaltogovbrccivil_03leis

L7210compiladohtm gt Acesso em 05 out 2017

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De acordo com Baratta

O caacutercere vem a fazer parte de um continuum que compreende famiacutelia escola assistecircncia

social organizaccedilatildeo cultural do tempo livre preparaccedilatildeo profissional universidade e instruccedilatildeo

dos adultos O tratamento penitenciaacuterio e a assistecircncia poacutes-penitenciaacuteria previstas pelas ovas

legislaccedilotildees satildeo um setor altamente especializado deste continuum dirigido a recuperar atrasos

de socializaccedilatildeo que prejudicam indiviacuteduos marginalizados assim como as escolas especiais

tendem a recuperar os menores que se revelaram inadaptados agrave escola normal Ambas satildeo

instituiccedilotildees especializadas para a integraccedilatildeo de uma minoria de sujeitos desviantes13

Conforme a Declaraccedilatildeo Universal dos Direitos Humanos no seu artigo 5ordm ldquoNingueacutem seraacute submetido a tortura nem a penas ou tratamentos crueacuteis desumanos ou degradantesrdquo14

Segundo Almeida de Jesus

As ideias implantadas na LEP tecircm como base a efetivaccedilatildeo da execuccedilatildeo penal como sendo forma de

preservar os bens juriacutedicos e de reinserccedilatildeo da pessoa que praticou um delito agrave sociedade Visa combater

o excesso ou o desvio da execuccedilatildeo penal que ameaccedila a dignidade ou a humanidade ao aplicar a pena15

De acordo com toda a previsatildeo legal o indiviacuteduo praticante do crime deveraacute quitar sua diacutevida para com a sociedade cumprindo sua pena mas de maneira humanitaacuteria sem tratamentos crueacuteis desumanos ou atraveacutes de qualquer tipo de tortura sendo tais accedilotildees totalmente proibidas pela legislaccedilatildeo vigente O maior objetivo eacute a retirada do indiviacuteduo da sociedade passando um tempo recluso para que cumpra a pena do crime que prati-cou poreacutem apoacutes este periacuteodo o mesmo deveraacute ser reinserido no acircmbito social para que decirc continuidade a sua vida que o tempo de encarceramento sirva para aprender com o erro cometido e que natildeo retorne a praticaacute-lo

22 VISAtildeO CARCERAacuteRIA

Neste toacutepico seraacute abordado de uma forma geral sobre o sistema carceraacuterio de Santa Catarina e de maneira mais especiacutefica a respeito da Colocircnia Penal Agriacutecola localizada na cidade de Palhoccedila

O Estado de Santa Catarina possui 35 (trinta e cinco) estabelecimentos prisionais fracionados da seguinte maneira 05 (cinco) Penitenciaacuterias 01 (uma) Colocircnia Agriacutecola 01 (um) Centro de Observaccedilatildeo Criminoloacutegica e Triagem 01 (um) Hospital de Custoacutedia e Tratamento Psiquiaacutetrico e 27 (vinte e sete) Presiacutedios16

Objetivando uma pesquisa mais ceacutelere foram buscadas natildeo apenas em informaccedilotildees em doutrinas mas sim na produccedilatildeo de dados atraveacutes de pesquisa de campo sendo a mesma realizada na unidade peniten-ciaacuteria Colocircnia Penal Agriacutecola localizada na cidade de Palhoccedila

Conforme Dias

Em 1988 foi adquirida uma aacuterea de 74 (setenta e quatro) hectares no municiacutepio de Palhoccedila

com a finalidade de se construir uma nova Penitenciaacuteria o que natildeo ocorreu devido a intensas

manifestaccedilotildees populares contraacuterias ao empreendimento proposto Assim gradativamente

13 BARATTA Alessandro Criminologia Criacutetica e Criacutetica do Direito Penal Traduccedilatildeo Juarez Cirino dos Santos Rio de Janeiro Revan

Instituto Carioca de Criminologia 6 ed Outubro de 2011 3 reim 2016 p 169 grifo do autor

14 ORGANIZACcedilAtildeO DAS NACcedilOtildeES UNIDAS Declaraccedilatildeo Universal dos Direitos Humanos Disponiacutevel em lt httpswwwuniceforg

brazilptresources_10133htm gt Acesso em 13 out 2017

15 ALMEIDA Cintia Jesus de A importacircncia do trabalho na ressocializaccedilatildeo do preso aplicaccedilatildeo efetiva da Lei de Execuccedilatildeo Penal

Disponiacutevel em lthttpsjuridicocertocompalmeidaadvocaciaartigosa-importancia-do-trabalho-na-ressocializacao-do-preso-

aplicacao-efetiva-da-lei-de-execucao-penal-802gt Acesso em 25 out 2017

16 SANTA CATARINA Plano Diretor do Sistema Penitenciaacuterio do Estado de Santa Cataria Disponiacutevel em lthttpwwwjusticagovbr

seus-direitospolitica-penalarquivosplano-diretoranexos-plano-diretorpdsp_scpdfgt Acesso em 05 out 2017

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Revista Juriacutedica da Universidade do Sul de Santa Catarina

foram implementadas atividades agropecuaacuterias no local surgindo entatildeo o que mais tarde

seria conhecido como Colocircnia Penal Agriacutecola com o emprego de um nuacutemero muito reduzido de

detentos A partir de 1998 foram construiacutedas novas instalaccedilotildees possibilitando que um nuacutemero

maior de apenados pudesse ser envolvido nas atividades laacute desenvolvidas17

A fim de obter informaccedilotildees de melhor precisatildeo realizou-se visita em quatro dias alternados na Colocircnia Penal Agriacutecola de Palhoccedila visando entrevistar detentos agentes penitenciaacuterios e o diretor da respec-tiva unidade carceraacuteria ocasiatildeo em que foi possiacutevel extrair dados que embasaratildeo o presente artigo

A pesquisa contou com a participaccedilatildeo de 20 (vinte) detentos 5 (cinco) agentes penitenciaacuterios e 1 (um) diretor sendo comunicado a todos a importacircncia da respectiva pesquisa e o assunto o qual a mesma se tratava estando todos cientes cada entrevistado assinou o respectivo TCLE ndash Termo de Consentimento Livre e Esclarecido autorizando a utilizaccedilatildeo das informaccedilotildees para uso exclusivamente acadecircmico permanecendo seus dados pessoais sobre total sigilo

Conforme informaccedilotildees do diretor da unidade carceraacuteria a mesma possui capacidade para 450 (qua-trocentos e cinquenta) apenados estando preenchida em sua totalidade natildeo havendo superlotaccedilatildeo como diversas outras unidades carceraacuterias

Os apenados possuem uma rotina regrada iniciando o dia agraves 6 horas com o cafeacute agraves 7 horas comeccedila o trabalho agraves 12 horas tem a pausa para o almoccedilo agraves 15 horas eacute a troca de turno agraves 18 horas o jantar agraves 21 horas a ceia por fim agraves 23 horas satildeo todos os apenados recolhidos

De acordo com os relatos a unidade carceraacuteria foi construiacuteda em 1988 natildeo passando por moderniza-ccedilotildees consideraacuteveis os quais pudessem a transformar em algo melhor e mais atual prevalecendo assim maior parte da estrutura referente a construccedilatildeo inicial

Conforme a Lei de Execuccedilatildeo Penal o Estado deve possibilitar que o apenado tenha acesso aos estudos sendo algo de suma importacircncia conforme o que foi narrado pelo diretor a unidade oferece supletivo e estudos para o Exame Nacional do Ensino Meacutedio (Enem) sendo que cerca de 30 (trinta por cento) dos apenados frequentam as aulas e no ano passado 6 (seis) deles conseguiram obter ecircxito no Enem

Durante uma das entrevistas realizadas pela pesquisadora o apenado narrou que primeiramente ini-ciou os estudos objetivando a remissatildeo mas conforme foi estudando foi se interessando cada vez mais pelos estudos Relatou que realizou a primeira prova do Exame Nacional do Ensino Meacutedio (Enem) e aca-bou obtendo nota zero na redaccedilatildeo poreacutem combinou com o colega de cela que iria tentar novamente foi entatildeo que conseguiu um livro de estudos para o Enem e ficou treinando ao decorrer do ano e para a sua felicidade o mesmo conseguiu a tatildeo sonhada aprovaccedilatildeo conseguindo validar seus estudos pelo exame O apenado contou sua histoacuteria cheio de esperanccedila no olhar manifestando o seu desejo de con-tinuar os estudos apoacutes o cumprimento da pena sonhando com uma futura faculdade para auxiliaacute-lo na mudanccedila de vida

Cabe ressaltar que foram entrevistados 20 (vinte) apenados e que no comeccedilo demonstravam estar com um certo receio da pesquisa talvez desconfiados do porquecirc da convocaccedilatildeo mas esse possiacutevel des-conforto durou pouco a cada pergunta eles iam se soltando mais narrando suas histoacuterias de vida con-tando com orgulho da famiacutelia que os espera laacute fora falando sobre os filhos a esposa e todos os sonhos que ainda pretendem realizar Por diversas vezes eles riram com a pesquisadora e ateacute mesmo se emo-cionaram pelas circunstacircncias que os fizeram chegar ateacute ali

O questionaacuterio aplicado era composto com 20 (vinte) questionamentos sendo facilmente respondi-do em menos de 10 (dez) minutos poreacutem este foi um caacutelculo que natildeo se pode efetuar com ecircxito visto que cada apenado queria contar sua vida seus desejos para o futuro seus sonhos queriam apenas

17 DIAS Faacutebio Coelho A penitenciaacuteria de Florianoacutepolis e sua evoluccedilatildeo no tempo Disponiacutevel em lthttpwwwambito-juridicocombr

siteindexphpn_link=revista_artigos_leituraampartigo_id=8454gtAcesso em 05 out 2017

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um algueacutem para lhes ouvir a solidatildeo eacute o sentimento que mais os acompanha Um exemplo disso foi um senhor de 74 (setenta e quatro) anos de idade com o ensino fundamental incompleto que mal sabia escrever seu nome e antes mesmo do iniacutecio da entrevista ele jaacute se adiantou quis contar toda a sua his-toacuteria explicando que estava ali injustamente que acreditou em uma pessoa e acabou sendo condena-do Se este eacute culpado ou inocente natildeo cabe a pesquisadora julgar naquele momento ele natildeo precisava de mais um julgador mas sim um ouvinte um algueacutem que lhe escutasse e a entrevista que deveria ser de poucos minutos acabou levando mais de meia hora

Conforme Foucault

Pelo fato tambeacutem de que a solidatildeo realiza uma espeacutecie de auto-regulaccedilatildeo da pena e permite

uma como que individualizaccedilatildeo espontacircnea do castigo quanto mais o condenado eacute capaz de

refletir mas ele foi culpado de cometer seu crime mas mais tambeacutem o remorso seraacute vivo e a

solidatildeo dolorosa em compensaccedilatildeo quando estiver profundamente arrependido e corrigido

sem a menor dissimulaccedilatildeo a solidatildeo natildeo lhe seraacute mais pesada18

Cada apenado que foi entrevistado narrou o crime pelo qual foi condenado e o tempo de condenaccedilatildeo havendo diversos crimes variando em roubo furto homiciacutedio estupro de vulneraacutevel latrociacutenio traacutefi-co porte de arma receptaccedilatildeo entre outros Poreacutem o que mais chamou a atenccedilatildeo foi a quantidade de condenaccedilotildees por traacutefico de drogas sendo este resultado jaacute narrado anteriormente pelo diretor o qual afirmou que o maior nuacutemero de apenados que a unidade recebe eacute por traacutefico de drogas estando essas substacircncias iliacutecitas conseguindo acabar com a vida das pessoas de todas as formas quando natildeo eacute pelo consumo eacute pela venda

Alguns dos apenados entrevistados os quais possuem condenaccedilatildeo por traacutefico aduziram que acabaram nessa vida devido ao modo mais faacutecil de conseguir dinheiro chegando a ganhar R$500000 (cinco mil reais) por dia apenas com a venda da substacircncia poreacutem essa raacutepida maneira de ganhar dinheiro tem um preccedilo muito caro Um dos apenados relatou que ldquograna nenhuma paga a liberdaderdquo outro aduziu que ldquoo cara ganha dinheiro faacutecil mas depois acaba perdendo tudo com advogadordquo

Um dos apenados ao ser entrevistado demonstrava ser mais duratildeo com um modo de responder em poucas palavras mas assim que foi perguntado sobre o seu maior arrependimento este amoleceu com-pletamente falou sobre a infacircncia difiacutecil que ainda crianccedila sua matildee o abandonou devido as constantes agressotildees de seu genitor Apoacutes o abandono da matildee o pai continuava a agredi-lo cada vez com maior frequecircncia levando-o a fugir de casa com apenas 9 (nove) anos de idade sozinho com fome e machu-cado este teve que aprender cedo a se virar sozinho fazendo com que assim caiacutesse no mundo do crime Com relaccedilatildeo ao seu arrependimento este informou que seu maior desejo era poder ter estudado mas que agora ele faraacute diferente possui 10 (dez) netos que aguardam o seu retorno e que assim que sair vai voltar para a sua famiacutelia e cuidar dos pequenos

O desejo do retorno aos estudos foi quase que unacircnime praticamente todos partilhando da mesma vontade manifestavam-se no sentido de que hoje conseguiam entender que o estudo eacute fundamental e que sem ele tudo se torna mais difiacutecil Durante a entrevista a pesquisadora foi a responsaacutevel por anotar as respectivas respostas tendo o apenado apenas que assinar o TCLE e essa a simples accedilatildeo de escrever o seu nome jaacute era algo muito difiacutecil muitos deles sentiam grande dificuldade e acabavam narrando que possuiacuteam pouco estudo tendo o ensino fundamental incompleto Contudo um dos entrevistados agiu de maneira diversa primeiramente porque falava muito bem e quando foi escrever seu nome a letra era totalmente legiacutevel e com boa grafia a pesquisadora entatildeo perguntou sua escolaridade este informou que possuiacutea o ensino superior incompleto que havia iniciado o curso de Direito mas que natildeo conseguiu terminar devido sua posterior condenaccedilatildeo pelo crime de traacutefico de drogas mas relatou que passar por essa experiecircncia o fez ficar mais maduro e que assim que recuperasse sua liberdade iria retornar a

18 FOUCAULT Michel Vigiar e Punir nascimento da prisatildeo 38 ed Petroacutepolis Vozes 2010 p 223

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faculdade dando prosseguimento ao seu sonho de ser advogado Ao final foi perguntado o que ele faria de diferente se pudesse volta no tempo poreacutem o mesmo afirmou que ldquoNada faria tudo igual temos que nos arrepender do que natildeo fazemos a profissatildeo que escolhi o sistema iraacute me ajudar vejo isso como uma Poacutes antecipadardquo

O uacuteltimo apenado o qual foi entrevistado contou que havia conseguido a possibilidade de trabalhar na rua natildeo precisando voltar para a unidade porem sofreu um seacuterio acidente no qual perdeu algumas pontas dos dedos ficando impossibilitado de trabalhar por um periacuteodo ocasionando assim seu retorno agrave Colocircnia poreacutem pediu para Deus e em poucos dias de retorno jaacute conseguiu um emprego na unidade neste momento ele se emocionou disse que Deus eacute muito bom e que eacute nele que confia Outro apenado tambeacutem falou sobre a religiatildeo que nesse periacuteodo de encarceramento o melhor jeito de sobreviver a tudo isso eacute atraveacutes da feacute em Deus pois caso contraacuterio o indiviacuteduo natildeo aguenta a pressatildeo

A religiatildeo tem um papel de grande importacircncia na vida dos apenados conforme narrou Varella em sua obra

De iniacutecio foi condenado a dezoito anos Oito meses depois no juacuteri seguinte pegou 112 de uma soacute

vez A pena total ficou em 130 anos e nove meses

- Eu abati um pouco Mas natildeo mudei de vida ateacute piorei para pior Fui para o pavilhatildeo Nove Laacute eu

queria apresentar que era bandido perigoso Chegava no cara e dizia vocecirc eacute de ver Se eacute noacutes

vamos trocar agora Aiacute se ele natildeo queria trocar eu falava entatildeo vocecirc deixa a televisatildeo as coisas

suas e pode atravessar para o Cinco que eacute o teu lugar Eu pensava que a minha vida natildeo tinha

mais jeito jaacute que era para morrer na cadeia natildeo custava que fosse hoje Se tinha que ser esse o

meu destino que secircsse

Entatildeo veio um dia de chuva Para se abrigar ele encostou na parede junto aacute igreja no teacuterreo do

Nove e sem querer ouviu a pregaccedilatildeo do pastor

- A Biacuteblia diz em Isaiacuteas capiacutetulo 9 verso 6 que Jesus Cristo eacute o Conselheiro eacute o Deus forte Pai

da Eternidade e Priacutencipe da Paz Vocecirc que vive na vida errada Deus tem um plano para vocecirc

Venha hoje para Jesus que amanhatilde pode ser tarde Natildeo importa se eacute bandido quantos matou

Jesus Cristo faz questatildeo de perdoar vocecirc com todos os teus pecados te tirar das trevas e operar

uma obra na sua vida

Valente chegou um pouco para dentro Sentiu que o Espiacuterito Santo de Deus falava pela boca

do pastor

- Quem quer aceitar Jesus Quem quer levanta a matildeo

[]

Valente obedeceu e caiu no choro

- Arrependi dos crimes da raparigagem e das maldades Chorei feito nenecirc no colo da matildee

Quando levantou estava desanuviado Sentiu o perdatildeo do Senhor pousar em sua fonte19

Em uma das entrevistas um dos apenados relatou que a pior coisa dentro da unidade carceraacuteria era o conviacutevio com os demais apenados No mesmo sentido dispotildee Augusto Thompson

[] o significado da vida carceraacuteria natildeo se resume a mera questatildeo de muros e grades de celas e

trancas ele deve ser buscado atraveacutes da consideraccedilatildeo de que a penitenciaacuteria eacute uma sociedade

dentro de uma sociedade uma vez que nela foram alteradas drasticamente numerosas feiccedilotildees

da comunidade livre20

Augusto Thompson continua aduzindo que ldquonatildeo eacute a solidatildeo que perturba os indiviacuteduos na comunidade carceraacuteria mas sim a vida em massardquo21

19 VARELLA Drauzio Estaccedilatildeo Carandiru Satildeo Paulo Companhia das Letras 1999 p 277-278

20 THOMPSON Augusto A Questatildeo Penitenciaacuteria 5 ed Rio de Janeiro Forense 2002 p 22

21 Idem p 23

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Diversos apenados narraram o quanto eacute difiacutecil viver e conviver no meio desta sociedade carceraacuteria que eacute necessaacuterio muito esforccedilo para natildeo se contaminar com este meio que eacute preciso muito foco para natildeo se envolver com as diversas accedilotildees ilegais que ocorrem dentro da unidade como o uso constante de entor-pecentes e os celulares que por diversas vezes satildeo levados para dentro da unidade devendo-se sempre manter a ordem para natildeo perderem seus benefiacutecios

Algo que tambeacutem foi citado pelos apenados foi o tratamento o qual recebem que satildeo diariamente tratados com total desrespeito sem qualquer educaccedilatildeo um deles aduziu que ldquopoxa educaccedilatildeo eacute algo que aprendemos em casa eles nos tratam como lixordquo Durante as visitas foi possiacutevel visualizar algumas cenas onde realmente houve excesso de autoridade sendo os apenados chamados e ordenados sem-pre atraveacutes de gritos onde visivelmente natildeo haacute qualquer respeito para com eles

De acordo com Alvim

O apenado ao ser tratado com dignidade e respeito vecirc que eacute possiacutevel recuperar-se e natildeo mais

ter uma vida delituosa como antes Tal fato implicaraacute diretamente na vida dele proacuteprio e tambeacutem

na vida da sociedade que sentiraacute os efeitos de tal recuperaccedilatildeo os iacutendices de violecircncia iratildeo baixar

e a qualidade de vida iraacute melhorar22

Ao entrevistar um dos agentes penitenciaacuterios foi perguntado ao mesmo o que ele pensava sobre a atuaccedilatildeo dos direitos humanos frente a problematizaccedilatildeo do sistema carceraacuterio este respondeu que ldquoDireitos humanos para humanos de direitosrdquo

Segundo Farias Juacutenior

Se queres que algueacutem seja melhor do que eacute trata-o para que ele passe a ser melhor atraveacutes de

tratamento recuperacional se quiseres que algueacutem seja pior do que eacute trata-o como se jaacute fosse

pior avilta-o execra-o degrada-o moralmente e eacute o que a pena faz torna o delinquente cada vez

pior porque a partir da poliacutecia passando pela justiccedila criminal e o sistema prisional ele eacute tratado

como se fosse pior eacute aviltado eacute execrado e eacute degradado moralmente O que pode esperar

Altiacutessimo iacutendice de reincidecircncia23

Com relaccedilatildeo ao retorno dos mesmos a sociedade foi questionado se acreditavam que teriam dificulda-des de arrumar emprego alguns informaram que desejavam sair e montar seu proacuteprio negoacutecio outros que pretendiam continuar atuando na aacuterea que jaacute atuavam anteriormente trabalhando como pedrei-ro pois assim poderia trabalhar para si mesmo outros jaacute informaram que eacute muito difiacutecil pois a socie-dade natildeo estaacute preparada para os receber pois natildeo querem dar emprego para um ex detento que assim que averiguam que o mesmo possui antecedentes jaacute o excluem do polo trabalhista se tornando dificul-toso retornar a vida em sociedade

Um dos detentos narrou que eacute difiacutecil pois ele tem famiacutelia para sustentar quando sair teratildeo pessoas que dependem dele que precisa colocar comida dentro de casa e que pela falta de oportunidade oferecida pela sociedade faz com que muitos retornem para a vida do crime natildeo por escolha mas pela necessidade

Em uma das primeiras conversas com o diretor da unidade este relatou sobre o grande problema da falta de ressocializaccedilatildeo que muitas vezes se coloca a culpa no Estado mas a sociedade natildeo quer fazer a sua parte que cada indiviacuteduo que praticou o crime eacute marcado como uma espeacutecie de tatuagem natildeo permanecendo a pena apenas durante o tempo de sua condenaccedilatildeo mas sim eternamente visto que a sociedade sempre os enxergaraacute como ex detentos Tal assunto iraacute se abordar no toacutepico posterior

22 ALVIM Wesley Botelho A ressocializaccedilatildeo do preso brasileiro 2006 Disponiacutevel em lthttpwwwdireitonetcombrartigos

exibir2965A-ressocializacao-do-preso-brasileirogt Acesso em 25 out 2017

23 FARIAS JUacuteNIOR Joatildeo Manual de Criminologia 3 ed Curitiba Juruaacute 2006 p 252

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23 VISAtildeO SOCIAL

Apoacutes passar pela previsatildeo legal e a visatildeo carceraacuteria se faz necessaacuterio enxergar o lado da sociedade se aprofundando um pouco mais nesta vertente

Atualmente se vive em um mundo cada vez mais violento jornais revistas televisotildees raacutedios transmitem diariamente notiacutecias sobre as constantes violecircncias ocorridas no acircmbito social inocentes sendo mor-tos famiacutelias sendo destruiacutedas crianccedilas violentadas mulheres estupradas roubo furto venda de iliacutecitos diversas satildeo as praacuteticas de crimes ocorridas diariamente Devido a todas estas circunstacircncias a socieda-de se encontra em um momento difiacutecil onde o sentimento de impunidade os toma mas juntamente com esse sentimento vem a vinganccedila muitas vezes retornando a Lei de Taliatildeo ldquoolho por olho dente por denterdquo

Vive-se em um momento em que natildeo se traz o criminoso para perto eacute como se o mesmo estivesse dis-tante que jamais fosse acontecer na famiacutelia de algueacutem natildeo sendo possiacutevel nunca o seu filho pai matildee irmatilde ou ateacute mesmo um amigo tomar uma decisatildeo errada ou por situaccedilatildeo alheia a sua vontade ir parar atraacutes das grades todas essas possibilidades jamais passaratildeo pela cabeccedila pois segundo alguns ldquoo crime eacute uma escolhardquo

A sociedade natildeo quer apenas que o indiviacuteduo praticante do crime cumpra sua pena mas sim que sofra que pague severamente pelo que fez muitos cogitam e apoiam a volta da prisatildeo perpeacutetua ou ateacute mesmo da pena de morte pois ldquobandido bom eacute bandido mortordquo

Segundo Foucault

[] A pena transforma modifica estabelece sinais organiza obstaacuteculos Qual seria sua utilidade

se se tornasse definitiva Uma pena que natildeo tivesse termo seria contraditoacuteria todas as restriccedilotildees

por ela impostas ao condenado e que voltando a ser virtuoso ele nunca poderia aproveitar natildeo

passariam de supliacutecios e o esforccedilo feito para reformaacute-lo seria pena e custo perdidos pelo lado

da sociedade Se haacute incorrigiacuteveis temos que nos resolver e eliminaacute-los Mas para todos os outros

as penas soacute podem funcionar se terminam24

Atualmente a populaccedilatildeo encontra-se desacreditada na justiccedila iniciando assim a praacutetica da ldquojusticcedila com as proacuteprias matildeosrdquo ocasionando diversas atrocidades cometendo crime igualmente poreacutem sem enxer-gar a gravidade de seus atos Um exemplo foi o caso de Fabiane Maria de Jesus o qual foi espancada ateacute a morte pois uma paacutegina divulgou que a mesma sequestrava crianccedilas para utilizaacute-las em rituais de magia negra sendo assim a populaccedilatildeo revoltada se reuniu e agrediu-a ocasionando traumatismo cra-niano levando-a a morte apoacutes a trageacutedia foi descoberto que haviam divulgado a foto de Fabiane equi-vocadamente que em nenhum momento esta foi responsaacutevel pela praacutetica de qualquer crime sendo viacutetima daqueles que lutavam pela ldquojusticcedilardquo 25

Conforme Gomes ldquoToda vinganccedila eacute feita em nome da justiccedila ou seja quando a emoccedilatildeo fala mais alto que a razatildeo tudo quanto satisfaz a ira da massa ou a amargura dos familiares ou a falta de seguranccedila coletiva passa a ser ldquovaacutelidordquo e ldquojustordquordquo26

Recentemente houve um outro caso bastante polecircmico um jovem de 17 (dezessete) anos foi acusado de tentar furtar uma bicicleta segundo relatos a cena foi presenciada por dois indiviacuteduos no qual ao inveacutes de chamarem a poliacutecia preferiram fazer justiccedila com as proacuteprias matildeos tatuando na testa do ado-

24 FOUCAULT Michel Vigiar e Punir nascimento da prisatildeo Traduccedilatildeo Raquel Ramalhete 38 ed Petroacutepolis Vozes 2010 p103

25 ROSSI Mariane Mulher espancada apoacutes boatos em rede social morre em Guarujaacute SP 2014 Disponiacutevel em lthttpg1globocomsp

santos-regiaonoticia201405mulher-espancada-apos-boatos-em-rede-social-morre-em-guaruja-sphtmlgt Acesso em 09 out 2017

26 GOMES Luiz Flaacutevio Beccaria (250 anos) e o drama do castigo penal civilizaccedilatildeo ou barbaacuterie Satildeo Paulo Saraiva 2014 p 8687

Disponiacutevel em lthttpsintegradaminhabibliotecacombrbooks 9788502230033cfi444000202gt Acesso em 28 set 2017

Acesso restrito via Minha Biblioteca

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lescente ldquosou ladratildeo e vacilatildeordquo posteriormente filmaram o ato e colocaram na internet como forma de mostrar que a justiccedila havia sido feita levando diversas pessoas a concordar e ainda aplaudir o ato rea-lizado pelos indiviacuteduos27

Segundo Drechsel

Jaacute se passaram seacuteculos desde que o poder puacuteblico deixou de cortar as matildeos de uma pessoa

que tentou roubar um pedaccedilo de patildeo mas a sensibilidade de algumas pessoas parece regredir

agrave barbaacuterie Nesse caso o desconhecimento dos torturadores sobre a injusticcedila que estavam

fazendo era tatildeo grande que o tatuador Maycon Wesley Carvalho dos Reis 27 anos e o vizinho

Ronildo Moreira de Arauacutejo 29 anos natildeo se contentaram de apenas marcar o rosto do rapaz mas

quiseram ostentar o fato com viacutedeo compartilhado nas miacutedias sociais28

O que se questiona eacute como essa tortura faria o adolescente aprender com o erro Seraacute que talvez os dois indiviacuteduos que realizaram tal ato natildeo o condenaram a uma eternidade de sofrimento Onde se encontraria a proporcionalidade do ato Satildeo inuacutemeras as perguntas a serem realizadas mas tudo isso se faz refletir sobre a sociedade atual o alto iacutendice de desemprego29 cresce dia apoacutes dia entatildeo se for pensar entre dar uma oportunidade para uma pessoa ldquode bemrdquo e um indiviacuteduo o qual carrega em sua testa os dizeres de que eacute ladratildeo a possibilidade de que o mesmo arrume emprego torna-se pratica-mente impossiacutevel fazendo com que o ato dos ldquojusticeirosrdquo natildeo tenha qualquer caraacuteter ressocializador mas sim punitivo

Um exemplo de que se pode haver mudanccedila de vida atraveacutes de oportunidades eacute o do ex detento Edilson Rafael dos Santos no qual hoje eacute o responsaacutevel por chefiar a aacuterea de seguranccedila da Associaccedilatildeo de Proteccedilatildeo e Assistecircncia aos Condenados (Apac) de Itauacutena (MG) uma unidade prisional no qual cumpriu sua pena haacute algum tempo atraacutes30

Segundo relatos de Santos

Quando cheguei na Apac tinha ateacute a quarta seacuterie Fiz ateacute a oitava e agora estou estudando o

resto na rua Tem recuperando que tem cadeia muito alta que chegou analfabeto e faz faculdade

agrave distacircncia Cada dia que eu ficava na Apac era um aprendizado para a minha vida Foi aiacute que eu

resolvi largar o crime e dar o valor na minha famiacutelia

Um ex-recuperando veio aqui dar um depoimento e falou que a maior tristeza da vida era a matildee

e o pai dele natildeo terem visto que ele mudou de vida Isso me marcou Eu falei esse remorso eu

natildeo quero levar natildeo31

27 ARAUacuteJO Glauco Tatuador eacute preso por tortura apoacutes escrever lsquosou ladratildeo e vacilatildeorsquo na testa de adolescente no ABC 2017 Disponiacutevel em

lthttpsg1globocomsao-paulonoticiatatuador-e-preso-por-tortura-apos-escrever-eu-sou-ladrao-e-vacilao-na-testa-de-adolescente-

no-abcghtml gt Acesso em 09 out 2017

28 DRECHSEL Denise ldquoLadratildeordquo tatuado na testa Por que natildeo fazer justiccedila com as proacuteprias matildeos 2017 Disponiacutevel em lthttps

g1globocomsao-paulonoticiatatuador-e-preso-por-tortura-apos-escrever-eu-sou-ladrao-e-vacilao-na-testa-de-adolescente-no-

abcghtmlgt Acesso em 09 out 2017

29 SILVEIRA Daniel CAVALLINI Marta Desemprego fica em 133 em maio e atinge 138 milhotildees 2017 Disponiacutevel em lt https

g1globocomeconomianoticiadesemprego-fica-em-133-no-trimestre-encerrado-em-maioghtml gt Acesso em 09 out 2017

30 ABRANTES Talita A histoacuteria de um ex-preso que hoje eacute chefe de seguranccedila em cadeia 2017 Disponiacutevel em lt httpsexameabrilcom

brbrasila-historia-de-um-ex-preso-que-hoje-e-chefe-de-seguranca-em-cadeia gt Acesso em 12 out 2017

31 Idem

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Revista Juriacutedica da Universidade do Sul de Santa Catarina

Outro caso bastante interessante foi de Edson Roberto Guido que com 19 anos acabou sendo con-denado por traacutefico de drogas sendo detido na penitenciaria de Ahuacute em Curitiba e apoacutes na Colocircnia Penal de Piraquara laacute iniciou o trabalho nas faacutebricas de material esportivo do programa Pintando a Liberdade do Ministeacuterio do Esporte Ao sair do presiacutedio montou uma cooperativa de artesatildeos de redes esportivas hoje eacute dono de seu proacuteprio negoacutecio a Redes Paranaacute empregando assim cerca de 30 funcio-naacuterios sendo 50 ex-detentos32

O ex detento Joatildeo dos Santos Ferreira com 68 anos passou 30 anos dentro do sistema carceraacuterio um certo dia encontrou um livro no lixo da cadeia o qual mudou sua vida terminando seus estudos dentro da penitenciaacuteria e atraveacutes do Exame Nacional do Ensino Meacutedio (Enem) conseguiu sua vaga no curso de direito segundo o mesmo ldquoQuero trabalhar na Defensoria Puacuteblica e defender algueacutem como eu porque o estado natildeo quer ou precisa soacute punir quer tambeacutem recuperar o cidadatildeordquo afirmando ainda que ldquoSomente a educaccedilatildeo muda um ser humano e o mundo Com ignoracircncia vocecirc natildeo arruma nadardquo33

Em um outo caso bastante divulgado pela miacutedia foi do ex-presidiaacuterio Lincoln Gonccedilalves Santos que se formou em Direito e convidou para a sua banca de avaliaccedilatildeo do Trabalho de Conclusatildeo de Curso (TCC) a juiacuteza que lhe concedeu a liberdade condicional possuindo o trabalho como tema lsquoA Educaccedilatildeo como fer-ramenta de transformaccedilatildeo e ressocializaccedilatildeo dos detentosrsquo pela Universidade do Vale do Itajaiacute (Univali) na cidade de Satildeo Joseacute em Santa Catarina34

Atraveacutes destes poucos exemplos citados eacute possiacutevel verificar que haacute possibilidade de mudanccedila errar natildeo significa persistir no erro eternamente todas as pessoas satildeo dignas de segundas chances deven-do a sociedade em geral mudar seu pensamento realmente as vezes muitos deles natildeo querem mudar de vida preferem ir pelo caminho mais faacutecil poreacutem se um deles realmente quiser mudar deve-se aju-dar estender uma matildeo dar a oportunidade que o ex detento tanto precisa porque como qualquer ser humano ele necessita de dinheiro precisa de um trabalho para se sustentar e eventualmente susten-tar aqueles que dependem dele Quando natildeo se oferecem oportunidades a chance do indiviacuteduo que outrora foi preso voltar a praticar crimes para sobreviver eacute muito maior e se isto ocorrer seraacute a socie-dade que pagaraacute novamente esta conta

3 CONCLUSAtildeO

Apoacutes diversos periacuteodos pelo qual a histoacuteria percorreu ainda haacute certos assuntos que parecem constan-temente retroceder ao princiacutepio e estagnar mesmo se vivendo em um mundo onde a tecnologia avanccedila dia apoacutes dia a ciecircncia descobre novos remeacutedios tratamentos e possiacuteveis curas contudo quando se fala em sistema carceraacuterio apenados e pena logo as pessoas insistem em retornar ao passado e pedir puni-ccedilotildees mais severas muitas vezes desacreditam no poder punitivo no Estado e preferem buscar a ldquojus-ticcedilardquo com as proacuteprias matildeos cometendo verdadeiras atrocidades pela busca daquilo que ao seus olhos parece ser o correto contudo quando melhor observado e analisado eacute apenas uma forma de vinganccedila levando aquele ldquoindividuo honestordquo a ser tatildeo culpado quando o criminoso ambos praticando crime igualmente poreacutem cada qual com seu motivo especiacutefico

32 EX PRESIDIAacuteRIO se transforma em maior empresaacuterio de Minas na produccedilatildeo de redes esportivas Correio de Uberlacircndia 19 ago 2011

Disponiacutevel em lt httpwwwcorreiodeuberlandiacombresportesex-presidiario-se-transforma-em-maior-empresario-de-minas-na-

producao-de-redes-esportivas gt Acesso em 12 out 2017

33 EX-DETENDO cursa direito apoacutes 33 anos preso lsquoEducaccedilatildeo muda o homemrsquo G1 31 mai 2015 Disponiacutevel em lthttpg1globocom

sao-paulosao-jose-do-rio-preto-aracatubanoticia201505ex-detento-cursa-direito-apos-33-anos-preso-educacao-muda-o-

homemhtmlgt Acesso em 12 out 2017

34 ANDRADE Scheila Ex-presidiaacuterio se forma em direito e apresenta TCC para juiacuteza que o permitiu estudar 2016 Disponiacutevel em

lthttpsafolhabrasilcombrculturaex-presidiario-se-forma-em-direito-e-apresenta-tcc-para-juiza-que-o-permitiu-estudargt

Acesso em 12 out 2017

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Aos que estatildeo do lado de fora desse sistema eacute faacutecil manifestar seu repuacutedio aos indiviacuteduos que outrora praticaram crime muitas vezes alimentando esse oacutedio atraveacutes de notiacutecias inveriacutedicas disseminadas por meio das miacutedias sociais ferramenta estaacute que possibilita que cada um fale o que deseja plantando assim cada vez mais o oacutedio e o sentimento de vinganccedila para com os apenados

Conforme o exposto a pena possui caraacuteter punitivo preventivo e ressocializador poreacutem esta uacuteltima caracteriacutes-tica eacute a mais difiacutecil de ser colocada em praacutetica todos culpam o Estado pela falto de investimento mas esquecem de atribuir a culpa para si mesmo pensando o que cada um te a ver com a falta da promoccedilatildeo da ressocializaccedilatildeo

Antes de qualquer coisa se faz necessaacuterio se colocar primeiramente no lugar do proacuteximo pensar que todos estatildeo sujeitos a errar a vida natildeo possibilita oportunidades a cada ser humano de maneira iguali-taacuteria natildeo cabendo deste modo afirmar que eacute ldquoquestatildeo de escolhardquo pois muitas vezes o caminho consi-derado o errado eacute o da sobrevivecircncia e este natildeo eacute uma escolha contudo mesmo para com aqueles que de certa forma tomaram a decisatildeo errada e acabaram no mundo do crime todos devem receber uma segunda chance erros satildeo cometidos diariamente mas nenhum deles pode ter uma condenaccedilatildeo eter-na pois se fosse assim a pena natildeo teria seu caraacuteter ressocializador apenas o punitivo

Com a pesquisa de campo pode-se compreender melhor a vivecircncia dos apenados possuindo um papel fundamental saber suas histoacuterias de vida seus planos sonhos e metas para apoacutes o teacutermino do cumpri-mento da pena Foi de grande importacircncia este contato para que assim a pesquisadora natildeo se baseasse apenas nos livros mas sim com um contato real com pessoas de verdade que estatildeo passando pela situ-accedilatildeo tratada fazendo com que fosse de faacutecil compreensatildeo conseguir entender que natildeo satildeo bichos que estatildeo presos atraacutes dos altos muros mas sim seres humanos como qualquer outro que merecem respei-to e uma nova chance pois possuem famiacutelias que os aguardam laacute fora e precisam de um emprego para manter sua casa esposa e filhos caso natildeo encontrem a oportunidade que tanto precisam o nuacutemero de reincidecircncia continuaraacute a aumentar ocasionando assim cadeias cada vez mais lotadas gerando maio-res gastos ao Estado e aumento de violecircncia e criminalidade para a populaccedilatildeo

Com relaccedilatildeo a problemaacutetica central o problema natildeo eacute apenas o sistema carceraacuterio em si mas sim a falta de estrutura social a sociedade natildeo se encontra apta para receber uma pessoa que cometeu um crime e jaacute cumpriu sua diacutevida para com o Estado pois apesar de quitar este deacutebito perante a sociedade estaraacute sempre marcado como o ldquoex detentordquo

REFEREcircNCIAS

ABRANTES Talita A histoacuteria de um ex-preso que hoje eacute chefe de seguranccedila em cadeia 2017 Disponiacutevel em lthttpsexameabrilcombrbrasila-historia-de-um-ex-preso-que-hoje-e-chefe-de--seguranca-em-cadeiagt Acesso em 12 out 2017

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ALVIM Wesley Botelho A ressocializaccedilatildeo do preso brasileiro 2006 Disponiacutevel em lthttpwwwdirei-tonetcombrartigosexibir2965A-ressocializacao-do-preso-brasileirogt Acesso em 25 out 2017

ANDRADE Scheila Ex-presidiaacuterio se forma em direito e apresenta TCC para juiacuteza que o permitiu estudar 2016 Disponiacutevel em lthttpsafolhabrasilcombrculturaex-presidiario-se-forma-em-di-reito-e-apresenta-tcc-para-juiza-que-o-permitiu-estudargt Acesso em 12 out 2017

ARAUacuteJO Glauco Tatuador eacute preso por tortura apoacutes escrever lsquosou ladratildeo e vacilatildeorsquo na testa de adoles-cente no ABC 2017 Disponiacutevel em lthttpsg1globocomsao-paulonoticiatatuador-e-preso-por--tortura-apos-escrever-eu-sou-ladrao-e-vacilao-na-testa-de-adolescente-no-abcghtmlgt Acesso em 09 out 2017

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BARATTA Alessandro Criminologia Criacutetica e Criacutetica do Direito Penal Traduccedilatildeo Juarez Cirino dos Santos Rio de Janeiro Revan Instituto Carioca de Criminologia 6 ed Outubro de 2011 3 reimpr Ago 2016

BRASIL Lei nordm 7210 de 11 de julho de 1984 Lei de Execuccedilatildeo Penal Disponiacutevel em lthttpwwwpla-naltogovbrccivil_03leisL7210compiladohtmgt Acesso em 05 out 2017

______ Lei no 2848 de 7 de dezembro de 1940 Coacutedigo Penal Disponiacutevel em lthttpwwwplanaltogovbrccivil_03decreto-leiDel2848compiladohtmgt Acesso em 05 out 2017

DIAS Faacutebio Coelho A penitenciaacuteria de Florianoacutepolis e sua evoluccedilatildeo no tempo Disponiacutevel em lthttpwwwambito-juridicocombrsiteindexphpn_link=revista_artigos_leituraampartigo_id=8454gt Acesso em 05 out 2017

DRECHSEL Denise ldquoLadratildeordquo tatuado na testa Por que natildeo fazer justiccedila com as proacuteprias matildeos 2017 Disponiacutevel em lthttpsg1globocomsao-paulonoticiatatuador-e-preso-por-tortura-apos-escre-ver-eu-sou-ladrao-e-vacilao-na-testa-de-adolescente-no-abcghtmlgt Acesso em 09 out 2017

EX PRESIDIAacuteRIO se transforma em maior empresaacuterio de Minas na produccedilatildeo de redes esportivas Correio de Uberlacircndia 19 ago 2011 Disponiacutevel em lthttpwwwcorreiodeuberlandiacombresportesex-presidiario-se-transforma-em-maior-empresario-de-minas-na-producao-de-redes-es-portivasgt Acesso em 12 out 2017

EX-DETENDO cursa direito apoacutes 33 anos preso lsquoEducaccedilatildeo muda o homemrsquo G1 31 mai 2015 Disponiacutevel em lthttpg1globocomsao-paulosao-jose-do-rio-preto-aracatubanoticia201505ex-detento-cur-sa-direito-apos-33-anos-preso-educacao-muda-o-homemhtmlgt Acesso em 12 out 2017

FARIAS JUacuteNIOR Joatildeo Manual de Criminologia 3 ed Curitiba Juruaacute 2006

FOUCAULT Michel Vigiar e Punir nascimento da prisatildeo Traduccedilatildeo Raquel Ramalhete 38 ed Petroacutepolis Vozes 2010

GOMES Luiz Flaacutevio Beccaria (250 anos) e o drama do castigo penal civilizaccedilatildeo ou barbaacuterie Satildeo Paulo Saraiva 2014 Disponiacutevel em lthttpsintegradaminhabibliotecacombrbooks9788502230033cfi444000202gt Acesso em 28 set 2017 (virtual)

GRECO Rogeacuterio Curso de Direito Penal 15 ed Rio de Janeiro Impetus 2013

ORGANIZACcedilAtildeO DAS NACcedilOtildeES UNIDAS Declaraccedilatildeo Universal dos Direitos Humanos Disponiacutevel em lthttpswwwuniceforgbrazilptresources_10133htmgt Acesso em 13 out 2017

ROSSI Mariane Mulher espancada apoacutes boatos em rede social morre em Guarujaacute SP 2014 Disponiacutevel em lthttpg1globocomspsantos-regiaonoticia201405mulher-espancada-apos-bo-atos-em-rede-social-morre-em-guaruja-sphtmlgt Acesso em 09 out 2017

SANTA CATARINA Plano Diretor do Sistema Penitenciaacuterio do Estado de Santa Cataria Disponiacutevel em lthttpwwwjusticagovbrseus-direitospolitica-penalarquivosplano-diretoranexos-plano-diretorpdsp_scpdf gt Acesso em 05 out 2017

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VARELLA Drauzio Estaccedilatildeo Carandiru Satildeo Paulo Companhia das Letras 1999

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A DEFESA DOS DIREITOS HUMANOS ATRAVEacuteS DO ATIVISMO JUDICIAL TRANSNACIONAL ACcedilOtildeES ENGAJADAS E PARTICIPATIVAS

THE DEFENSE OF HUMAN RIGHTS THROUGH TRANSNATIONAL JUDICIAL ACTIVISM ENGAGED AND PARTICIPATORY ACTIONSDaniela Mesquita Leutchuk de Cademartori1

Marlise da Rosa Luz2

Resumo Este trabalho inclui reflexotildees sobre a influecircncia da globalizaccedilatildeo na ordem juriacutedica estatal a emergecircncia de movimentos sociais capazes de promover a ampliaccedilatildeo dos espaccedilos puacuteblicos participati-vos e ainda a identificaccedilatildeo do ativismo judicial transnacional como importante meio de atuaccedilatildeo extra estatal da sociedade civil em prol dos direitos humanos Nas uacuteltimas deacutecadas identificou-se um com-prometimento do Estado frente o contexto internacional bem como a emergecircncia de mobilizaccedilotildees sociais emancipatoacuterias que perpassam as fronteira do Estado-naccedilatildeo Assim utiliza-se o meacutetodo dedu-tivo mediante revisatildeo bibliograacutefica exemplificando-se com casos envolvendo o Brasil junto agrave Comissatildeo e a Corte Interamericana de Direitos Humanos

Palavras-Chave ativismo judicial transnacional Globalizaccedilatildeo Movimentos sociais Sistema Interamericano de Direitos Humanos

Abstract This work includes reflections on the influence of globalization in the state legal order The emergence of social movements capable of promoting the expansion of participatory public spaces As well as the identifica-tion of transnational judicial activism as an important means of civil societyrsquos extra-state action in favor of human rights In recent decades the state has been compromised by the international context as well as by the emer-gence of emancipatory social mobilizations that cross the frontiers of the nation-state the deductive method is used through a bibliographic review and analysis of three cases involving Brazil with the Inter-American Court

Keywords Transnational judicial activism Globalization Social movements Inter-American System of Human Rights

1INTRODUCcedilAtildeO

Desde a uacuteltima deacutecada do seacuteculo XX sob influecircncia da globalizaccedilatildeo a assunccedilatildeo do modelo econocircmico--poliacutetico capitalista caracterizado pela mudanccedila nos modelos de produccedilatildeo desenvolvimento de mer-cados de capitais para aleacutem das fronteiras nacionais e o afastamento do papel do Estado frente aos interesses econocircmicos internacionais trouxe severas consequecircncias nas relaccedilotildees sociais internas

A preocupaccedilatildeo poliacutetica e econocircmica dos Estados com o meio internacional subverteu a funccedilatildeo tradicio-nal de incrementar a qualidade de vida de seus nacionais e a assistecircncia dos mais vulneraacuteveis

1 Instituiccedilatildeo- Unilasalle CanoasRS Mestre e Doutora em Direito pela UFSC Professora do PPG em Direito e Sociedade e da graduaccedilatildeo

em Direito da Universidade LaSalle ndash CanoasRS Coordenadora do Projeto Universal MCTICNPq n 12016 (Em Busca de Novas

Gramaacuteticas para os Direitos Humanos inovaccedilotildees soacutecio-juriacutedicas-poliacuteticas entre Ameacuterica Latina e Aacutefrica) E-MAIL danielacademartori

unilasalleedubr

2 Unilasalle CanoasRS Mestre em Direito e Sociedade pela Unilasalle CanoasRS

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Eacute nessa perspectiva que o presente trabalho inicia sua abordagem sobre o ativismo judicial transnacional e a ampliaccedilatildeo de espaccedilos puacuteblicos destacando preliminarmente a forma como a globalizaccedilatildeo assim compreendida no enfoque econocircmico interferiu nas relaccedilotildees sociais internas inclusive no Brasil quando agrave eacutepoca estava diante da nova Constituiccedilatildeo Federal

Admite-se por ativismo judicial transnacional como sendo accedilotildees judiciais ou quase judiciais junto a oacutergatildeos ou instituiccedilotildees internacionais que buscam o fortalecimento de mobilizaccedilotildees sociais mudanccedilas nas poliacuteticas legais internas proteccedilatildeo e reconhecimento de direitos ou ainda instigar os Estados da importacircncia e prevalecircncia de normas internacionais e internas de direitos humanos

Na compreensatildeo da complexidade das mudanccedilas que envolvem a globalizaccedilatildeo - assim compreendida como um fenocircmeno de muacuteltiplas faces seja de natureza econocircmica social poliacutetica cultural religiosa e tambeacutem juriacutedica e que se identifica quando se deixa de poder separar accedilotildees locais do cenaacuterio que abrange o mundo como um todo - a teoria da accedilatildeo comunicativa ocupa um lugar central na compreen-satildeo dos espaccedilos puacuteblicos

Na sequecircncia no segundo momento eacute apresentado o paradigma emergente dessa realidade desta-cando os movimentos sociais como uma proposta de participaccedilatildeo mais ampla e soacutelida vinculada agrave ideia de democracia mediante efetiva participaccedilatildeo em instacircncias diversas de deliberaccedilatildeo e decisatildeo sejam elas estatais ou da sociedade civil

Nessa ideia parte-se da contribuiccedilatildeo de Maria da Gloacuteria Gohn sobre os movimentos sociais como instrumentos para redefiniccedilatildeo de espaccedilos puacuteblicos e acrescenta-se os ensinamentos de Juumlrgen Habermas que parte da complexidade do mundo da vida como o espaccedilo onde emergem as aspiraccedilotildees capacidades e desejos dos grupos sociais

Tambeacutem eacute feita uma abordagem sobre a concepccedilatildeo de direitos humanos a partir praacuteticas sociais eman-cipatoacuterias conforme a contribuiccedilatildeo criacutetica de Joaquin Herrera Flores jurista sevilhano que buscou compreender a produccedilatildeo do direito a partir dos novos processos e movimentos sociais que acabam muitas vezes por propor uma renovaccedilatildeo da anaacutelise social poliacutetica e juriacutedica

Por fim enfatiza-se o ativismo judicial transnacional como exemplo de novas praacuteticas sociais e novas subjetividades no cenaacuterio internacional em prol da proteccedilatildeo e luta pelos direitos humanos a partir da anaacutelise de trecircs casos envolvendo o Brasil junto a Corte Interamericana de direitos humanos o caso Ximenes Lopes ndash incluiu discussatildeo sobre proteccedilatildeo das pessoas com transtornos mentais o da Maria da Penha Fernandes ndash abordou sobre violecircncia domeacutestica e impunidade e o da Hidreleacutetrica de Belo Monte ndash destacou a proteccedilatildeo soacutecio-ambiental da floresta amazocircnica

Portanto a partir de uma pesquisa teoacuterico-dedutiva o presente trabalho propotildee a compreensatildeo da influecircncia da globalizaccedilatildeo no desenvolvimento de novas praacuteticas poliacuteticas e ressalta-se o ativismo judi-cial transnacional como um importante instrumento fortalecedor de praacuteticas civis extraterritoriais de proteccedilatildeo efetivaccedilatildeo e difusatildeo dos direitos humanos

2 BREVES CONSIDERACcedilOtildeES SOBRE A GLOBALIZACcedilAtildeO ECONOcircMICA E A ORDEM INTERNA ESTATAL

O fenocircmeno da globalizaccedilatildeo congrega uma temaacutetica inquietante que cada vez mais ldquoparece questio-nar a ordem mundial que manteacutem o equiliacutebrio entre Estados-naccedilotildees soberanos com base no direito internacionalrdquo Neste sentido a sociologia juriacutedica natildeo eacute de hoje propotildee-se a discutir a terminologia os aspectos e a abrangecircncia da globalizaccedilatildeo nas relaccedilotildees sociais ldquoAlguns autores falam de lsquoglobalizaccedilatildeorsquo e outros de lsquomundializaccedilatildeorsquo ateacute existem aqueles que preferem usar uma palavra a mais [] a lsquointernacio-nalizaccedilatildeorsquordquo (ARNAUD 2000 p 2 348) Em suma em eacutepoca de constantes mudanccedilas globais assume--se uma compreensatildeo de que o termo globalizaccedilatildeo eacute uma palavra polissecircmica e com isso possui uma grande abrangecircncia de vaacuterios significados

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Sousa Santos (2011 p 26) nesse aspecto expotildee que ldquouma revisatildeo dos estudos sobre os processos de globalizaccedilatildeo mostra-nos que estamos perante um fenocircmeno multifacetado com dimensotildees econocircmi-cas sociais poliacuteticas culturais religiosas e juriacutedicas interligada de modo complexordquo Ou seja eacute impor-tante atentar-se para a influecircncia dos efeitos da globalizaccedilatildeo econocircmica e poliacutetica no inter-relaciona-mento entre o Estado e a sociedade nas poliacuteticas puacuteblicas bem como na cultura poliacutetica

O desenvolvimento de inter-relaccedilotildees e conexotildees que ultrapassam as barreiras fronteiriccedilas dos Estados impactam sobremaneira ldquoa regulaccedilatildeo juriacutedica de tipo claacutessicardquo (ARNAUD 2005 p 3) ateacute entatildeo pecu-liar dos Estados soberanos especialmente porque dentre muitos efeitos da globalizaccedilatildeo estaacute incluiacuteda a alteraccedilatildeo da noccedilatildeo de soberania e cidadania

Nesse sentido De Julius-Campuzano (2009 p 83) assevera que

A intensificaccedilatildeo dos fluxos comerciais no acircmbito transnacional e a crescente dependecircncia

dos Estados com relaccedilatildeo agraves corporaccedilotildees transnacionais agraves grandes instacircncias econocircmicas

e agraves forccedilas que operam no mercado global tecircm consequecircncias diretas sobre a capacidade de

controle dos Estados sobre suas iniciativas de governo e seus programas poliacuteticos

Em verdade com o fim da bipolarizaccedilatildeo da Guerra Fria observou-se o decliacutenio do paradigma socia-lista do Estado centralizador autossuficiente e totalitaacuterio assumido pela extinta Uniatildeo Sovieacutetica Em contrapartida viu-se tambeacutem a assunccedilatildeo da superioridade do modelo econocircmico-poliacutetico dos Estados Unidos Esse novo momento favoreceu o surgimento e o crescimento da influecircncia norte-americana sobre novas zonas internacionais Paralelamente ocorre a emergecircncia de um discurso sobre a neces-sidade de restringir a atuaccedilatildeo do Estado no aspecto social e regulador sob o fundamento de que ldquoo Estado intervencionista tende a gerar desequiliacutebrio fiscal agravado nos paiacuteses em desenvolvimento pela contrataccedilatildeo de enormes empreacutestimos internacionaisrdquo Eacute neste contexto que se daacute o Washington Consensus a partir de um evento ocorrido no fim da deacutecada de 1980 quando economistas do governo norte-americano do Banco Mundial e do Fundo Monetaacuterio Internacional (FMI) estabeleceram medi-das voltadas agrave estabilizaccedilatildeo econocircmica dos paiacuteses em desenvolvimento (VIEIRA 2002 p 470)

A partir desta proposta implantam-se programas de ajustes estruturais que incluem ldquoa austeridade fiscal privatizaccedilotildees de empresas que natildeo datildeo lucro ao Estado e liberalizaccedilatildeo dos mercadosrdquo ou seja medidas que deveriam contribuir para uma melhor gestatildeo dos serviccedilos puacuteblicos e para a criaccedilatildeo ou estiacutemulo de programas sociais (TEIXEIRA 2011 p 13)

De modo geral a partir dessa eacutepoca muitos paiacuteses da Ameacuterica Latina inclusive o Brasil aproximaram--se desse modelo econocircmico e poliacutetico Acreditava-se que a adesatildeo ao mercado internacional pela abertura ao capital estrangeiro fosse o meio para sustentar o crescimento e a modernizaccedilatildeo industrial

Contudo a efetivaccedilatildeo destas medidas acabou por ocasionar consequecircncias severas nos paiacuteses eis que a preocupaccedilatildeo poliacutetica e econocircmica dos Estados voltada aos interesses internacionais fez com que relegassem sua funccedilatildeo de incrementar a qualidade de vida de seus nacionais e a assistecircncia dos mais vulneraacuteveis Os Estados que haviam passado a orientar suas decisotildees conforme as diretrizes das gran-des corporaccedilotildees industriais comerciais e financeiras (tais como FMI Banco Mundial aleacutem de ficarem condicionados agraves diretrizes normativas supranacionais acabaram por ldquo[] retroceder em seus progra-mas de accedilatildeo social e econocircmica bem como a abdicar dos conteuacutedos baacutesicos do direto regulador []rdquo (DE JULIUS-CAMPUZANO 2009 p 85)

No caso do Brasil esta perspectiva que acompanhou a globalizaccedilatildeo econocircmica dos finais do seacutecu-lo XX fez-se anunciar ao longo dos anos de 1990 Agrave eacutepoca o Brasil ainda estava diante da noviacutessima Constituiccedilatildeo Federal de 1988 considerada um modelo de ldquoconstitucionalismo dirigista ou de caraacuteter socialrdquo que trazia de modo inovador na histoacuteria constitucional do paiacutes em seu conteuacutedo obrigaccedilotildees positivas ao Estado (VIEIRA 2002 468) A efervescecircncia do sentimento democraacutetico apoacutes um longo periacuteodo de repressatildeo e autoritarismo ditatorial havia instigado a formaccedilatildeo de um Estado Democraacutetico

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de Direito baseado numa sociedade livre justa e solidaacuteria cujas grandes metas incluiacuteam a erradicaccedilatildeo da pobreza e da histoacuterica marginalizaccedilatildeo de amplos setores da populaccedilatildeo a reduccedilatildeo das desigualda-des sociais e regionais conforme os termos do artigo terceiro da Carta Magna O texto constitucional tambeacutem inovou com ldquoa institucionalizaccedilatildeo dos direitos humanosrdquo ressaltando a dignidade humana e os direitos e garantias fundamentais como nuacutecleo baacutesico e informador do ordenamento juriacutedico brasilei-ro os ldquoprinciacutepios da prevalecircncia dos direitos humanos da autodeterminaccedilatildeo dos povos do repuacutedio ao terrorismo e da cooperaccedilatildeo entre os povos para o progresso da humanidade nos termos do art 4ordm II III VIII e IX da Cartardquo sem deixar de incluir dentre os direitos constitucionalmente protegidos aqueles enunciados nos tratados internacionais de que for signataacuterio (PIOVESAN 2012 p 437 444)

Eacute neste contexto que Vieira (2002) afirma que a onda neoliberal pegou o Constitucionalismo brasileiro no contrapeacute as novas diretrizes poliacutetico-econocircmicas emergentes no meio internacional acabaram por influenciar a efetivaccedilatildeo da proacutepria Constituiccedilatildeo de 1988

Aos poucos o Brasil acabou por conciliar sua nova Constituiccedilatildeo agraves orientaccedilotildees econocircmicas inter-nacionais vindo a promover inuacutemeras mudanccedilas no seu texto constitucional com uma sequecircncia de Emendas agrave Constituiccedilatildeo que incluiacuteram conceitos tais como de empresa de capital nacional e mono-poacutelios concessatildeo agraves empresas privadas da exploraccedilatildeo de serviccedilos privatizaccedilotildees reformas nas regras do funcionalismo puacuteblico na previdecircncia social acrescentando ao caput do art 37 da Constituiccedilatildeo Federal o ldquoprinciacutepio da eficiecircnciardquo As medidas tomadas ao longo dos anos desde a promulgaccedilatildeo da Constituiccedilatildeo Federal foram efetivadas ldquosob o argumento de que eacute necessaacuterio buscar adaptar o Estado brasileiro agraves demandas da globalizaccedilatildeordquo (VIEIRA 2002 473)

O sistema juriacutedico nacional passou a assumir prioritariamente um enfoque econocircmico voltado agrave manutenccedilatildeo e gestatildeo financeira interna do Estado em atenccedilatildeo aos ajustes e acordos internacio-nais Identificou-se como consequecircncia um estatuto organizativo estatal com limitaccedilotildees ao discurso democraacutetico pois se inviabilizava a intervenccedilatildeo da cidadania no controle de seu futuro bem como seus interesses poliacuteticos especiacuteficos

Na medida em que os direitos fundamentais passaram a ser sopesados frente agraves possibilidades econocirc-micas internas o Estado ao mesmo tempo que garantidor dos direitos humanos passou a assumir e em muitos casos manter uma postura de violador desses direitos ao limitar sua atuaccedilatildeo e proteccedilatildeo por conta dos interesses financeiros Ainda que natildeo fosse o efetivo violador o Estado brasileiro ndash em espe-ciacutefico - passou a apresentar-se tatildeo comprometido que sequer podia reagir a tais violaccedilotildees

3 O PAPEL DOS NOVOS MOVIMENTOS SOCIAIS NA CONSTRUCcedilAtildeO E EFETIVACcedilAtildeO DOS DIREITOS HUMANOS E NA AMPLIACcedilAtildeO DOS ESPACOS PUBLICOS

A realidade vivenciada desde a uacuteltima deacutecada do seacuteculo XX especialmente pela prevalecircncia do enfo-que econocircmico sobre os direitos fundamentais determinou o surgimento de uma compreensatildeo criacutetica agrave concepccedilatildeo de democracia e cidadania representativas Identificou-se a necessidade de uma atuaccedilatildeo mais ampla e soacutelida vinculada agrave ideia de democracia mediante efetiva participaccedilatildeo em instacircncias diver-sas de deliberaccedilatildeo e decisatildeo sejam elas estatais ou da sociedade civil

Maria da Gloria Gohn importante teoacuterica e pesquisadora brasileira sobre temas como movimentos sociais participaccedilatildeo associativismo e cidadania refere que desde a metade dos anos 80 ocorreram mudanccedilas na conjuntura poliacutetica tanto nacional quanto internacionalmente3 ponderando que as transformaccedilotildees

3 Nacionalmente ocorreu ldquoa redemocratizaccedilatildeo do paiacutes e internacionalmente com a queda do muro de Berlim e a crise dos regimes

socialistas do leste europeurdquo (GOHN 2005 p53)

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Mais significativas foram na conjuntura econocircmica com a estruturaccedilatildeo e o raacutepido crescimento

da globalizaccedilatildeo elevando agrave reestruturaccedilatildeo produtiva das naccedilotildees ao desemprego e agraves reformas

estatais orientadas para reequilibrar a crise fiscal balanccedila de pagamento etc (GOHN 2005 p53)

A autora enfatiza o surgimento de novas caracteriacutesticas envolvendo as relaccedilotildees entre o Estado e a sociedade O papel do Estado tambeacutem passou por uma reestruturaccedilatildeo assumindo uma funccedilatildeo essen-cialmente gerencial e administrativa de recursos o que teria ldquolevado agrave privatizaccedilatildeo de serviccedilos essen-ciais agrave emergecircncia de novos parceiros no atendimento de questotildees sociais e agrave estratificaccedilatildeo desse entendimento segundo os imperativos da loacutegica do mercadordquo O encolhimento do Estado levou a um encolhimento da esfera social com reflexos na cidadania plena4 assim compreendida pela autora como aquela ldquomoldada na tradiccedilatildeo republicana que pressupotildee o conhecimento e a consciecircncia eacutetica dos pro-cessos poliacuteticos da poacutelis e do mundo em que se viverdquo (GOHN 2005 p 11 29)

Nesse novo cenaacuterio a autora enfatiza a emergecircncia paralela de sujeitos sociopoliacuteticos e culturais que entraram em cena

[] no iniacutecio do deste novo milecircnio diferentes organizaccedilotildees movimentos e entidades sociais

continuam lutando por condiccedilotildees de habitalidade nas cidades em aacutereas como seguranccedila

puacuteblica tracircnsito poluiccedilatildeo moradia sauacutede educaccedilatildeo (formal e natildeo-formal destacando-se nesta

uacuteltima as centenas de programas com crianccedilas jovens adolescentes portadores de diferentes

doenccedilas usuaacuterios de drogas etc) assim como pela qualidade dos serviccedilos puacuteblicos aacutereas verdes

recuperaccedilatildeo de aacutereas centrais dentre outros Novos movimentos sociais tem sido criados nas

zonas perifeacutericas que tambeacutem se tornaram heterogecircneas sob a forma de organizaccedilotildees locais

e luta de comunidades territoriais especiacuteficas Organizaccedilotildees natildeo-governamentais (ONGs)

que demandam e constroem accedilotildees pela cidadania (em lutas contra a pobreza a exclusatildeo e a

discriminaccedilatildeo) e programas e poliacuteticas sociais de inclusatildeo social completam o cenaacuterio onde o

novo associativismo se desenvolve articulado por diferentes redes sociais (GOHN 2005 p 14)

Ou seja a medida que o contexto soacutecio-poliacutetico interno estava voltado ao pragmatismo econocircmico aos projetos e acordos de perfil neoliberal com preocupaccedilotildees taacuteticas que resolvam problemas teacutecnicos da economia ocorre a emergecircncia de novos atores sujeitos sociais antes organizados em movimentos e accedilotildees coletivas de protestos agora com enfoque nas poliacuteticas puacuteblicas facilitados por redes forma-das pelo inter-relacionamento de diferentes partes do mundo produzidos pelo fenocircmeno da globali-zaccedilatildeo5 A novidade estaacute em que ldquoos movimentos sociais na atualidade tematizam e redefinem a esfe-ra puacuteblica tem grande poder de controle social e constroem modelos de inovaccedilotildees sociaisrdquo (GOHN 2010 p 16-17)

Nesse aspecto enfatiza-se a perspectiva de Juumlrgen Habermas de que a participaccedilatildeo relaciona-se com a criaccedilatildeo consolidaccedilatildeo e regulamentaccedilatildeo de espaccedilos puacuteblicos autocircnomos (desvinculados do poder puacuteblico) de deliberaccedilatildeo orientados segundo a oacutetica da teoria discursivo-comunicativa

Juumlrgen Habermas apresenta importante contribuiccedilatildeo a respeito de espaccedilo puacuteblico poliacutetica demo-cracia e direito6 O referido filoacutesofo a partir da interpretaccedilatildeo dos fenocircmenos da sociedade moderna propocircs uma compreensatildeo da legitimaccedilatildeo do Direito a partir do reconhecimento dos proacuteprios cidadatildeos

4 Sobre os diferentes sentidos da cidadania ver CADEMARTORI D M L de CADEMARTORI S U A Busca de uma cidadania sul-

americana no contexto da Unasul Revista Eletrocircnica Direito amp Poliacutetica PPCJ da Univali Itajaiacute v 9 n 2 p 1116-1140 2014

5 Neste sentido recorda-se a compreensatildeo de globalizaccedilatildeo de Anthony Giddens para quem ldquoA globalizaccedilatildeo natildeo eacute apenas nem

primordialmente um fenocircmeno econocircmico e natildeo deve ser equacionada com o surgimento de um lsquosistema mundialrsquo A globalizaccedilatildeo trata

efetivamente da transformaccedilatildeo do espaccedilo e do tempo Eu a defino como accedilatildeo a distacircncia e relaciono sua intensificaccedilatildeo nos uacuteltimos anos

ao surgimento da comunicaccedilatildeo global instantanea e ao transporte de massardquo (1996 p 12-3)

6 A Teoria da Accedilatildeo Comunicativa eacute uma obra elementar desenvolvida por Juumlrgen Habermas Inicialmente foi aplicada no acircmbito da eacutetica

no seu livro Consciecircncia moral e agir comunicativo (HABERMAS 1989) e na obra Direito e Democracia entre facticidade e validade

(HABERMAS 1997) o autor amplia a seara de aplicabilidade do princiacutepio discursivo estendendo-o ao Direito

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como os produtores das leis ou seja como os sujeitos que interagem no espaccedilo puacuteblico e podem inter-ferir na realidade social deixando de ser meros destinataacuterios ldquoTrata-se de importante inovaccedilatildeo pois tradicionalmente a Teoria do Direito trabalha com a categoria de destinataacuterios das normas juriacutedicas o que supotildee uma instacircncia produtora e outra receptora das leisrdquo (MESQUITA 2012 p 43)

O conceito de espaccedilo puacuteblico ou esfera puacuteblica de Habermas ganhou especial importacircncia na medi-da em que o autor ldquopassa a trabalhar com o paradigma da comunicaccedilatildeo compreendendo a sociedade como uma permanente tensatildeo entre o mundo sistecircmico e o mundo da vidardquo (OLIVEIRA FERNANDES 2011 p 117)

Na perspectiva harbermasiana a comunicaccedilatildeo existente no mundo sistecircmico difere da comunicaccedilatildeo existente no mundo da vida Aquele eacute ldquocompreendido pela economia e pelo aparato estatal [] pauta-do pela loacutegica instrumental pelas relaccedilotildees impessoais pela busca de resultados que atendam ao bom desempenho administrativo e teacutecnico do Estado e o lucro e a produtividade do mercadordquo Em contra-partida ldquoo mundo da vida eacute formado pela coordenaccedilatildeo da accedilatildeo atraveacutes da comunicaccedilatildeo da linguagem com sujeitos em interaccedilatildeordquo (OLIVEIRA FERNANDES 2011 p 124)

Nessa loacutegica eacute no mundo da vida que surgem os descontentamentos privaccedilotildees e conflitos e que emer-gem as aspiraccedilotildees capacidades e desejos dos grupos sociais que se configuram como alternativas de vida por formas mais concretas de atendimento agraves necessidades tanto materiais quanto morais

Oliveira e Fernandes (2011) trazem importante contribuiccedilatildeo sobre a concepccedilatildeo de esfera puacuteblica na vida moderna

[] um foacuterum importante para onde discussotildees e debates de questotildees sociais relevantes satildeo

trazidos agrave luz por indiviacuteduos e coletividades inclusive por aqueles que eventualmente sintam-se

excluiacutedos Na esfera puacuteblica as minorias tentam defender-se da cultura majoritaacuteria contestando

a validade do auto-entendimento coletivo e se esforccedilando para convencer puacuteblicos amplos da

pertinecircncia e justeza de suas reivindicaccedilotildees Eacute nesse espaccedilo possibilitado pela comunicaccedilatildeo

que sujeitos vatildeo colocar seus pontos de vista suas experiecircncias e perspectivas do que acham

justo e tentar convencer os outros da validade de seus propoacutesitos (OLIVEIRA FERNANDES

2011 p 127)

Ou seja conforme a concepccedilatildeo de Juumlrgen Habermas a comunicaccedilatildeo existente no mundo da vida tem papel importante seja para oportunizar discussotildees relevantes e novas perspectivas na sociedade seja para sugerir novos meios de accedilotildees a partir de um entendimento entre os sujeitos As possibilidades questionadoras da comunicaccedilatildeo oportunizadas pelo mundo da vida ldquoalimenta natildeo apenas seus partici-pantes mais diretos mas impulsiona a sociedade democraacutetica afinal a pluralidade e a diversificaccedilatildeo de modos de vida estatildeo presentes no mundo da vidardquo (OLIVEIRA FERNANDES 2011 p 125)

Com isso a ecircnfase que se destaca neste ponto inclui a discussatildeo sobre a participaccedilatildeo ativa da sociedade o papel dos diferentes instrumentos para o exerciacutecio da cidadania bem como a importacircncia da amplia-ccedilatildeo ocupaccedilatildeo e convivecircncia em espaccedilos puacuteblicos a partir da atuaccedilatildeo de movimentos sociais engajados

Por outro lado partindo-se da interpretaccedilatildeo de Joaquiacuten Herrera Flores de que os direitos humanos satildeo algo mais do que um conjunto de normas formais que os reconhecem e os garantem em niacutevel nacio-nal ou internacional enfatiza-se sua contribuiccedilatildeo a partir de uma teoria criacutetica dos direitos humanos com vistas a compreender a produccedilatildeo do direito a partir de praticas sociais emancipadoras

Para o jusfiloacutesofo sevilhano apoacutes as duas grandes guerras que assolaram o continente europeu durante o seacuteculo XX com a Declaraccedilatildeo Universal dos Direitos Humanos em 1948 surge o conceito de direitos humanos o qual ldquo[] consolida-se como a visatildeo lsquonaturalrsquo e lsquouniversalrsquo expressa de modo diaacutefano e com matizes universais nas lsquonormasrsquo e textos que surgem a partir da ordem institucional global das Naccedilotildees

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Unidasrdquo7 Todavia vivencia-se hoje uma nova fase histoacuterica especialmente desde o fim dos anos oiten-ta e princiacutepios dos noventa do seacuteculo passado com a queda do socialismo e a consequente expansatildeo global do modo de produccedilatildeo e de relaccedilotildees sociais capitalistas (HERRERA FLORES 2004 p 103) Ou seja entende que a globalizaccedilatildeo8 no modelo neoliberal caracteriza-se como a nova fase e as carac-teriacutesticas de apropriaccedilatildeo do capital estatildeo provocando uma mudanccedila importante na conceituaccedilatildeo dos direitos humanos

Seguindo ainda a teoria de Herrera Flores (2009) a progressiva instauraccedilatildeo de uma ordem global sus-tentada na apropriaccedilatildeo do capital e o surgimento de uma consciecircncia de injusticcedilas e desequiliacutebrios con-duzidos pela globalizaccedilatildeo estatildeo provocando o surgimento de processos de reaccedilatildeo social que natildeo se conformam com as tradicionais formas de participaccedilatildeo e articulaccedilatildeo social Satildeo essas reaccedilotildees compre-endidas como processos de lutas que constituem o desafio da nova fase mundial para reconhecimento dos direitos humanos

Natildeo podemos entender os direitos sem vecirc-los como parte da luta de grupos sociais empenhados

em promover a emancipaccedilatildeo humana apesar das correntes que amarram a humanidade na

maior parte de nosso planeta Os direitos humanos natildeo satildeo conquistados apenas por meio das

normas juriacutedicas que propiciam seu reconhecimento mas tambeacutem e de modo muito especial

por meio das praacuteticas sociais de ONGacutes de Associaccedilotildees de Movimentos Sociais de Sindicatos de

Partidos Poliacuteticos de Iniciativas Cidadatildes e de reivindicaccedilotildees de grupos minoritaacuterios (indiacutegenas)

ou natildeo (mulheres) que de um modo ou de outro restaram tradicionalmente marginalizados do

processo de positivaccedilatildeo e de reconhecimento institucional de suas expectativas (HERRERA

FLORES 2009 p 77)

Na perspectiva adotada pelo jurista sevilhano seratildeo as praacuteticas sociais emancipatoacuterias proporcionan-do ldquoum lsquointervencionismo humanitaacuteriorsquo levado a cabo pelos proacuteprios atores sociaisrdquo que iratildeo ensejar a consolidaccedilatildeo da participaccedilatildeo dos

Indiviacuteduos grupos e organizaccedilotildees na hora de construir um marco de accedilatildeo que permita a todos

e a todas criar as condiccedilotildees que garantam de um modo igualitaacuterio o acesso aos bens materiais e

imateriais que fazem com que a vida seja digna de ser vivida (HERRERA FLORES 2009 p 77 25)

Nesta compreensatildeo de direitos humanos eles satildeo percebidos ldquocomo processos institucionais e sociais que possibilitem a abertura e a consolidaccedilatildeo de espaccedilos de luta pela dignidade humanardquo sendo que constituiacutedos a partir da afirmaccedilatildeo da luta do ser humano para ver cumpridos seus desejos e necessida-des nos contextos vitais em que estaacute situadordquo (HERRERA FLORES 2009 p 25)

Nesse aspecto enfatiza-se a concepccedilatildeo de direitos humanos como reaccedilotildees movimentos e evoluccedilatildeo de circunstacircncias histoacutericas que se fortalecem a partir de novas forccedilas transformadoras concepccedilatildeo essa que tem conexatildeo com os movimentos sociais emancipatoacuterios assim compreendidos como mobili-zaccedilotildees coletivas da sociedade de natureza soacutecio-poliacutetica ou cultural que viabilizam formas de discus-sotildees e organizaccedilotildees de seus interesses e demandas

7 ldquo[] se consolida como la visioacuten lsquonaturalrsquo y lsquouniversalrsquo que se expresa diaacutefana y con matices universalistas en las lsquonormasrsquo y textos que van

surgiendo del orden institucional global de Naciones Unidasrdquo(traduccedilatildeo livre ndash HERRERA FLORES 2004 p 87)

8 ldquoLa nueva fase de la globalizacioacuten la denominada lsquoneoliberalrsquo puede caracterizarse en teacuterminos generales bajo cuatro caracteriacutesticas

articuladas a) la proliferacioacuten de centros de poder (el poder poliacutetico nacional se ve obligado a compartir lsquosoberaniacutearsquo con corporaciones

privadas y organismos globales multilaterales) b) la inextricable red de interconexiones financieras (que hacen depender las poliacuteticas

puacuteblicas y la lsquoconstitucioacuten econoacutemicarsquo nacional de fluctuaciones econoacutemicas imprevisibles para el lsquotiemporsquo con el que juega la praxis

democraacutetica en los Estados Nacioacuten) c) la dependencia de una informacioacuten que vuela en tiempo real y es lsquocazadarsquo por las grandes

corporaciones privadas con mucha mayor facilidad que por las estructuras institucionales de los Estados de Derecho) y d) el ataque

frontal a los derechos sociales y laborales (que estaacute provocando que la pobreza y la tiraniacutea se conviertan en ldquoventajas comparativasrdquo para

atraer inversiones y capitales) (FARIA apud HERRERA FLORES 2010 p 103-104)

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4 O ATIVISMO JUDICIAL TRANSNACIONAL UMA PROPOSTA DE AMPLIACcedilAtildeO DA PARTICIPACcedilAtildeO SOCIAL NA EFETIVACcedilAtildeO DOS DIREITOS HUMANOS

A globalizaccedilatildeo compreendida numa visatildeo geral como uma ampliaccedilatildeo do espaccedilo-tempo desterrito-rializaccedilatildeo e transnacionalizaccedilatildeo seja econocircmica tecnoloacutegica e cultural como visto acaba por difundir novos espaccedilos que favorecem a atuaccedilatildeo de novos atores sejam movimentos e organizaccedilotildees natildeo esta-tais plurais e transnacionais

Na evoluccedilatildeo dos movimentos dos direitos humanos houve natildeo soacute ampliaccedilatildeo do conceito como

tambeacutem uma evoluccedilatildeo que vai da conquista de novos direitos agrave criaccedilatildeo de instrumentos que

assegure efetivamente a observacircncia dos direitos conquistados (CATAtildeO 2005 p 364)

Nessa perspectiva destaca-se o ldquoativismo judicial transnacionalrdquo a partir do conceito trabalhado por Santos (2007 p 28)

[] um tipo de ativismo focado na accedilatildeo legal engajada atraveacutes das cortes internacionais ou

instituiccedilotildees quase judiciais em fortalecer as demandas dos movimentos sociais realizar

mudanccedilas legais e poliacuteticas internas reestruturar ou redefinir direitos eou pressionar os

Estados a cumprir as normas internacionais e internas de direitos humanos

Ou seja parte-se de uma concepccedilatildeo de ldquoativismo judicial transnacionalrdquo como uma mobilizaccedilatildeo judi-cial com destaque agrave atuaccedilatildeo de atores sociais como Organizaccedilotildees natildeo Governamentais (ONGs) movi-mentos sociais associaccedilotildees civis que motivados por uma diversidade de interesses desafiam a globali-zaccedilatildeo neoliberal em prol dos direitos humanos (SANTOS 2007 p 32)

Destaca-se tambeacutem a atuaccedilatildeo da Comissatildeo e da Corte Interamericana de Direitos Humanos impor-tantes oacutergatildeos internacionais integrantes do Sistema Interamericano de Proteccedilatildeo dos Direitos Humanos que oportunizam a discussatildeo propulsatildeo e debates sobre os direitos humanos na Ameacuterica Latina Referidos oacutergatildeos foram criados pela Convenccedilatildeo Americana de Direitos Humanos tambeacutem chamado Pacto de Satildeo Joseacute em 1969 o qual foi ratificado pelo Brasil em 1992

Na perspectiva de ampliaccedilatildeo dos horizontes de participaccedilatildeo social a consolidaccedilatildeo da Comissatildeo e da Corte Interamericana de Direitos Humanos como uma esfera puacuteblica projeta um cenaacuterio de profundas transformaccedilotildees nos processos de produccedilatildeo da legitimidade social dos diferentes interesses Em verda-de tais processos tendem a deslocar-se da oacuterbita exclusiva do Estado para o acircmbito dos intercacircmbios comunicativos o que por sua vez poderaacute ter maior forccedila argumentativa Como refere Sousa Santos (2011 p 48) ldquoteraacute maior impacto se tiver ressonacircncia em escalas mais amplas de legalidade articulan-do-se nacional e internacionalmenterdquo

Diz-se isso porque parte-se da concepccedilatildeo de ativismo como accedilatildeo engajada e de uma concepccedilatildeo de direitos fundamentais em constante processo de transformaccedilatildeo que acompanha a sociedade e conse-quentemente suas necessidades de proteccedilatildeo

Abaixo alguns exemplos com base em casos envolvendo o Estado brasileiro que foram analisados pela Comissatildeo e pela Corte IDH em que se pode identificar a importacircncia participativa da sociedade junto a esses oacutergatildeos e os reflexos internos no acircmbito juriacutedico de proteccedilatildeo dos direitos fundamentais

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a) A condenaccedilatildeo no Caso Ximenes Lopes9 por exemplo foi o primeiro caso em que o Brasil foi condenado no sistema interamericano A viacutetima fora internada em casa de tratamento psiquiaacutetrico no Cearaacute em setembro de 1999 torturada vindo a oacutebito trecircs dias apoacutes a internaccedilatildeo Na sentenccedila da Corte houve o reconhecimento da responsabi-lidade do Brasil na violaccedilatildeo agrave vida e agrave integridade pessoal e a inexistecircncia do direito agraves garantias judiciais Ainda sua repercussatildeo ensejou a criaccedilatildeo de regras voltadas a poliacute-ticas puacuteblicas para proteccedilatildeo dos direitos das pessoas com transtornos mentais com a promulgaccedilatildeo da Lei nordm 102162001

b) O caso emblemaacutetico de Maria da Penha Maia Fernandes versando sobre violecircncia do-meacutestica e impunidade Foi levado ao conhecimento da Comissatildeo Interamericana de Direitos Humanos atraveacutes da mobilizaccedilatildeo de ONGs quando entatildeo o Brasil foi respon-sabilizado por omissatildeo e negligecircncia em relaccedilatildeo agrave violecircncia domeacutestica contra a mulher recomendando a adoccedilatildeo de vaacuterias medidas entre elas simplificar os procedimentos judi-ciais penais e a adoccedilatildeo de medidas em acircmbito nacional com a finalidade de eliminar a con-descendecircncia do Estado com a violecircncia domeacutestica (SANTOS 2007 p 440-45) Como reflexo desta condenaccedilatildeo o Brasil aprovou a Lei 113402006 (Lei Maria da Penha) com regras especiacuteficas para coibir a violecircncia domeacutestica e familiar contra a mulher

c) O caso da Hidreleacutetrica de Belo Monte situada na bacia do rio Xingu sudoeste do es-tado do Paraacute cujo empreendimento federal visa em plena floresta amazocircnica a in-dependecircncia energeacutetica para fomentar o desenvolvimento econocircmico10 Neste caso a mobilizaccedilatildeo de povos indiacutegenas ribeirinhos quilombolas e agricultores familiares buscou o respeito por parte do Estado brasileiro das normas protetivas do meio-am-biente e dos direitos humanos Houve grande participaccedilatildeo e coalizatildeo de instituiccedilotildees estaduais nacionais e internacionais ndash Organizaccedilotildees Natildeo Governamentais (ONGs) socioambientalistas sindicatos de trabalhadores rurais e urbanos organizaccedilotildees re-ligiosas associaccedilotildees de moradores cuja proporccedilatildeo ultrapassou as barreiras internas do paiacutes chegando agrave Organizaccedilatildeo das Naccedilotildees Unidas (ONU) e Organizaccedilatildeo dos Estados Americanos (OEA) (SIQUEIRA SILVA 2015 p 177-202)

Em suma estes exemplos datildeo evidecircncia da relevacircncia de espaccedilos puacuteblicos que oportunizem a atua-ccedilatildeo da sociedade civil e de como ela pode estar presente na construccedilatildeo e na defesa do discurso dos interesses dos menos favorecidos excluiacutedos desprotegidos No Brasil as poliacuteticas puacuteblicas ou refor-mas juriacutedicas internas que sejam necessaacuterias satildeo feitas essencialmente pelo Estado A sociedade civil praticamente natildeo tem a possibilidade de promover e incorporar demandas sociais Nesse sentido dos casos acima observados pode-se perceber um dos principais impactos que vem sendo obtidos junto ao Brasil com o ativismo juriacutedico transnacional a provocaccedilatildeo de mudanccedilas nas poliacuteticas puacuteblicas internas em casos em que o Estado brasileiro se omite e quando identificada a sua incompatibilidade com os compromissos assumidos em Tratados internacionais de direitos humanos

Eacute nesse sentido que o ativismo juriacutedico transnacional apresenta-se como importante instrumento de luta proteccedilatildeo e garantia de direitos fundamentais a partir da atuaccedilatildeo participativa e ativa da sociedade civil e seus movimentos sociais junto a espaccedilos que apesar de estarem aleacutem do Estado - como eacute o caso da Comissatildeo e da Corte Interamericana de Direitos Humanos ndash seguem sendo o principal centro seja profanadores ou promotores dos direitos humanos

9 Os dados completos sobre este caso estatildeo disponiacuteveis em lthttpwwwcidhoasorgdemandas1223720Ximenes20Lopez20

Brasil201oct04pdfgt

10 O Caso iniciou a sua tramitaccedilatildeo no final de 2015 quatro anos apoacutes a sua apresentaccedilatildeo encontrando-se em etapa de anaacutelise de

admissibilidade por parte da Comissatildeo IDH Cf Disponiacutevel em lthttpjustificandocartacapitalcombr20170613belo-monte-

cristalizacao-do-retrocesso-ambiental-e-de-direitos-humanosgt Acesso em 15 dez 2017

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5 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

A globalizaccedilatildeo assim compreendida como um fenocircmeno multifacetado e complexo que permite novas conexotildees de tempo e espaccedilo tem influenciado no desenvolvimento de novas praacuteticas poliacuteticas e sociais Desde a uacuteltima deacutecada do seacuteculo XX a inserccedilatildeo do Brasil nas relaccedilotildees internacionais tem sido em gran-de parte a causa para a diminuiccedilatildeo da autonomia das relaccedilotildees sociais mantidas entre o Estado e a sociedade A prevalecircncia pelo interesse econocircmico internacional tem feito com que sejam protelados interesses e claacuteusulas de natureza social ao acaso das forccedilas imprevisiacuteveis do mercado em uma pro-gressiva relativizaccedilatildeo dos interesses sociais ao poderio financeiro do Estado

A partir desse cenaacuterio se identifica o surgimento de uma compreensatildeo criacutetica agrave concepccedilatildeo de demo-cracia e cidadania representativas Identifica-se a necessidade de uma atuaccedilatildeo mais ampla e soacutelida vinculada agrave ideia de democracia mediante efetiva participaccedilatildeo em instacircncias diversas de deliberaccedilatildeo e decisatildeo sejam elas estatais ou da sociedade civil Nesse sentido incluem-se os movimentos sociais e a ampliaccedilatildeo de espaccedilos puacuteblicos como elementos fundamentais para a ocupaccedilatildeo e convivecircncia partici-pativa da sociedade engajada com fins emancipatoacuterios

De outro lado adota-se a interpretaccedilatildeo de que os direitos humanos fundamentais passam por cons-tante evoluccedilatildeo reaccedilotildees e movimentos dialeacuteticos que os modificam e transformam em novas demandas da sociedade em desenvolvimento Identifica-se a concepccedilatildeo de direitos humanos a partir de forccedilas transformadoras que tem nos movimentos sociais importante oportunidade de praacuteticas e articula-ccedilotildees emancipatoacuterias

Eacute nesse enfoque que se sinaliza o ativismo juriacutedico transnacional junto agrave Comissatildeo e agrave Corte Interamericana de Direitos Humanos como importante instrumento de luta proteccedilatildeo e garantia de direitos fundamentais a partir da atuaccedilatildeo participativa e ativa da sociedade civil junto a espaccedilos aleacutem do Estado

Casos envolvendo o Brasil junto a Comissatildeo e Corte Interamericana de Direitos Humanos a partir da mobilizaccedilatildeo civil reproduziram impactos juriacutedicos e legais internos muito significativos para a pro-teccedilatildeo e garantia de direitos humanos fundamentais Por exemplo o caso Ximenes Lopes implicou a criaccedilatildeo de regras voltadas agrave poliacuteticas puacuteblicas para proteccedilatildeo dos direitos das pessoas com transtornos mentais com a promulgaccedilatildeo da Lei nordm 102162001 o caso de Maria da Penha impulsionou a criaccedilatildeo e publicaccedilatildeo da Lei 113402006 (Lei Maria da Penha) com regras especiacuteficas para coibir a violecircncia domeacutestica e familiar contra a mulher o caso da Hidreleacutetrica de Belo Monte implicou numa grande coalizaccedilatildeo de instituiccedilotildees privadas estatais e sociais em prol da proteccedilatildeo do meio ambiente e direitos humanos Referidos casos servem de exemplo de como o indiviacuteduo eou a sociedade civil podem estar presentes na construccedilatildeo e na defesa do discurso dos interesses dos menos favorecidos excluiacutedos des-protegidos superando o formalismo ideoloacutegico e as limitaccedilotildees institucionais internas

REFEREcircNCIAS

ARNAUD Andreacute-Jean FARINtildeA DULCE Maria Joseacute Introduccedilatildeo agrave anaacutelise socioloacutegica dos sistemas juriacutedicos Traduccedilatildeo de Pellew Wilson Rio de Janeiro Renovar 2000 456 p

_____ JUNQUEIRA Eliane Botelho (orgs) Globalizaccedilatildeo e direito 2 ed Rio de Janeiro Lumen Juris 2005 2 v

CATAtildeO Yolanda Direitos Humanos Chegaremos agrave plenitude democraacutetica dentro do processo de globalizaccedilatildeo com os direitos humanos realmente universalizados Avanccedilos ou simples retoacuterica In ARNAUD Andreacute-Jean JUNQUEIRA Eliane Botelho (Org) Globalizaccedilatildeo e direito 2 ed Rio de Janeiro Lumen Juris 2005

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CADEMARTORI D M L de CADEMARTORI S U A Busca de uma cidadania sul-americana no contex-to da Unasul Revista Eletrocircnica Direito amp Poliacutetica PPCJ da Univali Itajaiacute v 9 n 2 p 1116-1140 2014

DE JULIOS-CAMPUZANO Alfonso de Constitucionalismo em tempos de globalizaccedilatildeo Traduccedilatildeo de Jose Luis Bolzan de Morais e Valeacuteria Ribas do Nascimento Porto Alegre Livraria do Advogado 2009 117 p

GIDDENS Anthony Para aleacutem da esquerda e da direita O futuro da poliacutetica radical Traduccedilatildeo de A Hattnher Satildeo Paulo Unesp 1996

GOHN Maria da Gloacuteria Teorias dos movimentos sociais na contemporaneidade In _____ BRINGEL Breno M (orgs) Movimentos sociais na era global 2 ed Petroacutepolis RJ Vozes 2014

HABERMAS Juumlrgen Consciecircncia moral e agir comunicativo Traduccedilatildeo de Guido A de Almeida Rio de Janeiro Tempo Brasileiro 1989

_____Direito e Democracia entre facticidade e validade Rio de Janeiro Tempo Brasileiro 1997 2v

_____ A Inclusatildeo do outro estudos de teoria poliacutetica Satildeo Paulo Ediccedilotildees Loyola 2007

_____ A Constelaccedilatildeo Poacutes-Nacional Traduccedilatildeo de Maacutercio Selligmann-Silva Satildeo Paulo Littera Mundi 2001

HERRERA FLORES Joaquiacuten A reinvenccedilatildeo dos direitos humanos Traduccedilatildeo de Carlos Roberto Diogo Garcia et al Florianoacutepolis Fundaccedilatildeo Boiteux 2009

_____ Los Derechos en el Contexto de la Globalizacion tres precisiones conceptuales In SAacuteNCHEZ RUBIO David HERRERA FLORES Joaquiacuten CARVALHO Salo de (orgs) Direitos humanos e globali-zaccedilatildeo fundamentos e possibilidades desde a teoria criacutetica 2 ed Porto Alegre EDIPUCRS 2010 578 p Disponiacutevel em lthttpwwwpucrsbredipucrsdireitoshumanospdfgt Acesso em 28 jan 2018

MESQUITA Rogeacuterio Garcia Habermas e a Teoria Discursiva do Direito Revista Perspectiva Erechim v36 n134 p41-52 junho2012 Disponiacutevel em lthttpdxdoiorg101590S0103-49792009000100009gt Acesso em 23 nov 2017

OLIVEIRA Luiz Ademir FERNANDES Adeacutelia Barroso Espaccedilo puacuteblico poliacutetica e accedilatildeo comunicativa a partir da concepccedilatildeo habermasiana Revista Estudos Filosoacuteficos DFIMI UFSJ Satildeo Joatildeo del Rei nordm 6 p 116-130 2011 Disponiacutevel em lthttpwwwufsjedubrrevistaestudosfilosoficosrevista_no_6phpgt Acesso em 23 nov 2017

PIOVESAN Flaacutevia Direitos humanos e o direito constitucional internacional 13 ed rev e atual Satildeo Paulo Saraiva 2012 693 p

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SANTOS Ceciacutelia MacDowell Ativismo juriacutedico transnacional e o Estado reflexotildees sobre os casos apresentados contra o Brasil na Comissatildeo Interamericana de direitos humanos SUR - Revista Internacional de Direitos Humanos Rede Universitaacuteria de Direitos Humanos Satildeo Paulo Nuacutemero 7 Ano 4 p 26-57 2007

TEIXEIRA Anderson V Compreendendo a Globalizaccedilatildeo em seus Diversos Contextos In _____ Teoria Pluriversalista do Direito Internacional Satildeo Paulo Martins Fontes 2011

VIEIRA Oscar Vilhena Globalizaccedilatildeo e Constituiccedilatildeo Republicana In PIOVESAN Flaacutevia (Coord) Direitos humanos globalizaccedilatildeo econocircmica e integraccedilatildeo regional desafios do direito constitucional internacional Satildeo Paulo Max Limonad 2002 p 449-476

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A REALIDADE DO SISTEMA SOCIOEDUCATIVO E A REDUCcedilAtildeO DA MAIORIDADE PENAL SOB A OacuteTICA DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS

THE REALITY OF THE SOCIO-EDUCATIONAL SYSTEM AND THE REDUCTION OF CRIMINAL MAJORITY UNDER THE VIEW OF FUNDAMENTAL RIGHTSJonathan Cardoso Reacutegis1

Resumo O presente trabalho visa traccedilar breve reflexatildeo quanto a possibilidade (ou natildeo) da reduccedilatildeo da Maioridade Penal sob a oacutetica da realidade do sistema socioeducativo e por consequecircncia quanto a perspectiva dos direitos fundamentais Acredita-se na ideia da produccedilatildeo de norma legitimada pela sociedade contemporacircnea em estudar a impossibilidade da reduccedilatildeo da Maioridade Penal no Estado brasileiro iniciando pela contextualizaccedilatildeo acerca dos direitos fundamentais e da proteccedilatildeo a crianccedila e ao adolescente Em seguida demonstrar sucintamente a realidade brasileira frente ao desenvolvimen-to socioeconocircmico e sua influecircncia ao crescimento de ato infracional por adolescente em conflito com a lei Na sequecircncia a realidade do sistema socioeducativo e a polecircmica discussatildeo quanto a reduccedilatildeo da Maioridade Penal bem como a reflexatildeo do que realmente importa a simples responsabilizaccedilatildeo do ado-lescente em conflito com a lei ou mecanismos de prevenccedilatildeo

Palavras-chave Adolescente Direitos Fundamentais Maioridade Penal

Abstract The present work aims to give a brief reflection on the possibility (or not) of the reduction of the Penal Majority from the point of view of the reality of the socio-educational system and consequently the perspec-tive of fundamental rights It is believed in the idea of the production of a norm legitimated by contemporary society in studying the impossibility of reducing the Penal Majesty in the Brazilian State starting with the con-textualization about the fundamental rights and the protection of the child and the adolescent Next briefly demonstrate the Brazilian reality regarding socioeconomic development and its influence to the growth of an infraction by adolescents in conflict with the law In the sequence the reality of the socio-educational system and the controversial discussion about the reduction of the Criminal Majority as well as the reflection of what really matters the simple responsibility of the adolescent in conflict with the law or mechanisms of prevention

Key words Adolescent Fundamental Rights Age of Criminal Responsibility

1 INTRODUCcedilAtildeO

O objeto do presente artigo estaacute em buscar uma breve reflexatildeo acerca da possibilidade (ou natildeo) da reduccedilatildeo da Maioridade Penal e a realidade do sistema socioeducativo sob a perspectiva dos direitos fundamentais

Sabe-se que desde 1993 atraveacutes da PEC 171 tramita no Congresso Nacional uma discussatildeo quanto a reduccedilatildeo da maioridade penal com vistas a alteraccedilatildeo do texto constitucional mais precisamente em seu art 228 a fim de que o adolescente com idade entre dezesseis e dezoito anos possa da mesma for-ma que o maior de idade ser penalmente responsabilizado quando do cometimento de infraccedilatildeo penal sob a eacutegide do regramento estabelecido no Coacutedigo Penal brasileiro e natildeo sob o disposto no Estatuto da Crianccedila e do Adolescente - ECA

1 Doutor em Ciecircncia Juriacutedica ndash Univali Doctor en Derecho ndash Univ AlicanteEspanha Mestre em Gestatildeo de Poliacuteticas Puacuteblicas ndash Univali

Especialista em Administraccedilatildeo de Seguranccedila Puacuteblica ndash UnisulPMSC Bacharel em Direito ndash Univali Profordm no Curso de graduaccedilatildeo de

Direito ndash Univali Membro do IASC E-mail joniregisunivalibr

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Ocorre que a realidade do sistema socioeducativo brasileiro natildeo diverge muito do sistema prisional em nosso paiacutes ferindo em ambos premissas voltadas a dignidade da pessoa humana e ao final via de regra natildeo proporcionando objetivamente o previsto pelo legislador ao adolescente em conflito com a lei na aplicaccedilatildeo das medidas socioeducativas o aspecto educativo de conscientizaccedilatildeo e de retorno ao conviacutevio social e familiar

Isto posto vale destacar que muito embora exista um crescimento de menores de idade em praacuteticas delitivas acredita-se que a reduccedilatildeo da imputabilidade penal na legislaccedilatildeo brasileira natildeo seria a melhor soluccedilatildeo mas sim uma aplicaccedilatildeo e cumprimento efetivo das Medidas Socioeducativas reestruturan-do a legislaccedilatildeo vigente alcanccedilaria o resultado pretendido a exemplo de paiacuteses da Ameacuterica do Sul e Europeus existindo uma responsabilizaccedilatildeo penal juvenil diante do processo de formaccedilatildeodesenvol-vimento dos jovens

O crescimento da participaccedilatildeo do menor infrator em infraccedilotildees penais resulta de um fenocircmeno social natildeo apenas psicoloacutegico e desvio de conduta o qual decorre da desigualdade socioeconocircmica e da ausecircncia de oportunidades competindo ao Estado a famiacutelia e a sociedade participaccedilatildeo efetiva em bus-ca de soluccedilotildees natildeo apenas ao longo do processo de ressocializaccedilatildeo mas especialmente preventivo atraveacutes da proposiccedilatildeo da adoccedilatildeo de um novo modelo de alteraccedilatildeo do texto legal e natildeo simplesmente reduzir a imputabilidade penal

2 DIREITOS HUMANOS E DA PROTECcedilAtildeO DA CRIANCcedilA E DO ADOLESCENTE

A fim de melhor compreensatildeo acerca do que se busca na presente reflexatildeo essencial destacar que se tem os Direitos e Garantias Fundamentais como sendo um conjunto de direitos e garantias do ser insti-tucionalizado realccedilado pelo respeito a dignidade humana e a proteccedilatildeo estatal bem como em proporcio-nar condiccedilotildees miacutenimas de vida e desenvolvimento do ser humano com vistas na garantia em respeitar o direito a vida a liberdade a igualdade a dignidade dentre outros direitos inerentes a Pessoa Humana

Sabe-se ainda que os Direitos Humanos fundamentais adveacutem da fusatildeo de diversas fontes tendo-se como ponto principal ou inicial a imprescindibilidade em limitar e controlar os excessos abusivos por parte do Estado e seus agentes consagrando-se os princiacutepios baacutesicos da igualdade liberdade legalida-de e Dignidade da Pessoa Humana inerentes ao Estado moderno e contemporacircneo visando assim o pleno desenvolvimento da personalidade humana

[] a funccedilatildeo de direitos de defesa dos cidadatildeos sob uma dupla perspectiva (1) constituem num

plano juriacutedico-objetivo normas de competecircncia negativa para os poderes juriacutedicos proibindo

fundamentalmente as ingerecircncias destes na esfera juriacutedica individual (2) implicam num plano

juriacutedico-subjetivo o poder de exercer positivamente direitos fundamentais (liberdade positiva)

e de exigir omissotildees dos poderes puacuteblicos de forma a evitar agressotildees lesivas por parte dos

mesmos (liberdade negativa) (CANOTILHO 1995 p 517)

Importa observar que desde o nascimento da Organizaccedilatildeo das Naccedilotildees Unidas (ONU) em 1945 o con-ceito de Direitos Humanos se tem universalizado alcanccedilando uma grande importacircncia na cultura juriacute-dica internacional em especial o periacuteodo poacutes 2ordf Guerra Mundial com a assinatura da Carta das Naccedilotildees Unidas tambeacutem conhecida por Carta de Satildeo Francisco de 26 de junho de 1945 e com entrada em vigor internacionalmente no mecircs de outubro do mesmo ano

A mencionada Carta de Satildeo Francisco composta por cento e onze artigos evidenciada pela preservaccedilatildeo e proteccedilatildeo as geraccedilotildees futuras ldquodo flagelo da guerra que por duas vezes no espaccedilo de uma vida huma-na trouxe sofrimentos indiziacuteveis agrave humanidaderdquo sustentando a crenccedila nos Direitos Fundamentais na dignidade e no valor da Pessoa humana na igualdade de direitos indistintamente somada ao estabe-

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lecimento de condiccedilotildees necessaacuterias para a manutenccedilatildeo da justiccedila assim como tambeacutem do respeito das obrigaccedilotildees resultantes de tratados e de outras fontes do direito internacional e na promoccedilatildeo ao pro-gresso social e melhores condiccedilotildees de vida

Em 10 de dezembro de 1948 temos a Declaraccedilatildeo Universal dos Direitos Humanos a qual fora adotada e proclamada pela Assembleia Geral das Naccedilotildees Unidas como resposta aos horrores da II Guerra Mundial tendo por finalidade sentar as bases da nova ordem internacional que surgia atraacutes do armistiacutecio

[] a Declaraccedilatildeo se impotildee como um coacutedigo de atuaccedilatildeo e de conduta para os Estados integrantes

da comunidade internacional Seu principal significado eacute consagrar o reconhecimento universal

dos direitos humanos pelos Estados consolidando um paracircmetro internacional para a proteccedilatildeo

desses direitos A Declaraccedilatildeo exerce um impacto nas ordens juriacutedicas nacionais na medida em

que os direitos nela previstos tem sido incorporados por Constituiccedilotildees nacionais e por vezes

servem como fonte para decisotildees judiciais nacionais (PIOVESAN 2015 p 226)

Sabe-se que a garantia dos Direitos Fundamentais dos homens surgiu com a evoluccedilatildeo e o desenvolvi-mento social buscando minimizar os excessos perpetrados pelo Estado e nesse sentido eacute sobremo-do importante assinalar o disposto no art 3ordm do Estatuto da Crianccedila e do Adolescente - ECA quanto a preocupaccedilatildeo do legislador no que diz respeito ao gozo de Direitos Fundamentais e a Proteccedilatildeo Integral assegurando a Pessoas em desenvolvimento atraveacutes da legislaccedilatildeo ou por outros meios ldquotodas as oportunidades e facilidades a fim de lhes facultar o desenvolvimento fiacutesico mental moral espiritual e social em condiccedilotildees de liberdade e de dignidaderdquo

Os Direitos Humanos satildeo em verdade valores eacuteticos morais e poliacuteticos considerados por um deter-minado grupo social em determinada eacutepoca assegurados de forma a permitir uma miacutenima existecircncia da dignidade liberdade e igualdade para qualquer Pessoa em qualquer lugar no mundo baseado na proacutepria existecircncia e viabilidade do ser humano Em outras palavras trata-se de uma realidade social (PECES-BARBA 1995 p 109-112) sendo influenciados a todo o momento pelos aspectos poliacuteticos econocircmicos sociais e culturais

[] um conjunto de faculdades e instituiccedilotildees que em cada momento histoacuterico concretizam as

exigecircncias da dignidade da liberdade e da igualdade humanas as quais devem ser reconhecidas

positivamente pelos ordenamentos juriacutedicos em niacutevel nacional e internacional (LUNtildeO 1990 p 48)

Somado a isso de acordo com Piovesan (2015 p 79) os Direitos Humanos satildeo concebidos como sendo ldquouma unidade indivisiacutevel interdependente e inter-relacionada na qual os valores da igualdade e liber-dade se conjugam e se completamrdquo

Tem-se Direitos Fundamentais como sendo um subsistema dentro do sistema juriacutedico (PECES-BARBA 1995 p 109-112)2 ou seja no sentido em que a pretensatildeo moral justificada possa ser incorporada a uma norma a fim de obrigar seus destinataacuterios e poder ser efetivamente exercida e garantida

Parte-se da premissa que os Direitos Humanos estatildeo fundados em quatro pilares ou teses as quais de acordo com o ensinamento de Ferrajoli (2011) satildeo ldquoessenciais a uma teoria da democracia constitucionalrdquo

Assim a primeira tese encontra-se relacionada a distinccedilatildeo estrutural entre Direitos Fundamentais e os direitos patrimoniais iniciando com aquela que estaacute vinculada a classe de sujeitos e o segundo a qualquer de seus titulares excluindo-se todos os outros Jaacute a segunda tese estaacute no sentido de que os Direitos Fundamentais correspondem ldquoa interesses e expectativas de todosrdquo formando o sustentaacutecu-lo assim como o paracircmetro da igualdade juriacutedica e da democracia a terceira tese relaciona-se com a

2 Un subsistema dentro del sistema juriacutedico el Derecho de los derechos fundamentales lo que supone que la pretensioacuten moral justificada

se a teacutecnicamente incorporable a una norma que pueda obligar a unos destinataacuterios correlativos de las obligaciones juriacutedicas que se

desprenden para que el derecho sea efectivo

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ldquonatureza supranacional de grande parte dos Direitos Fundamentaisrdquo e por fim a quarta tese refe-rindo-se a relaccedilatildeo existente entre os direitos e as garantias assim como tambeacutem pelo fato de que ldquoos Direitos Fundamentais consistem em expectativas negativas ou positivas agraves quais correspondem deveres (de prestaccedilotildees) ou proibiccedilotildees (de lesotildees)rdquo conforme assevera Ferrajoli (2011 p 15-16)

Para compor o conceito de Direitos Fundamentais de forma mais completa Peces-Barba (1995 p 109) enfatiza a existecircncia de trecircs aspetos principais Inicialmente o autor destaca que os Direitos Fundamentais satildeo uma pretensatildeo moral justificada deve estar embasada na Dignidade da Pessoa Humana seu alicerce bem como calcada em valores baacutesicos nas ideias de liberdade solidariedade humana e de igualdade que com o passar dos tempos foi sendo somada a ideia de seguranccedila juriacutedica e influecircncia da filosofia poliacutetica liberal democraacutetica e socialista Como pretensatildeo moral justificada deve corresponder a direitos cujo conteuacutedo pode ser generalizado aplicado a todos de forma igualitaacuteria

Direitos Fundamentais pode ser definido como sendo

[] todos aqueles direitos subjetivos que dizem respeito universalmente a ldquotodosrdquo os seres

humanos enquanto dotados do status de pessoa ou de cidadatildeo ou de pessoa capaz de agir

Compreendo por ldquodireito subjetivordquo qualquer expectativa positiva (a prestaccedilatildeo) ou negativa (a

natildeo lesatildeo) vinculada a um sujeito por uma norma juriacutedica e por status a condiccedilatildeo de um sujeito

prevista tambeacutem esta por uma norma juriacutedica positiva qual pressuposto da sua idoneidade a ser

titular de situaccedilotildees juriacutedicas eou autor dos atos que estatildeo em exerciacutecio (FERRAJOLI 2011 p 9)

Ressalta-se que esses instrumentos de garantia de Direitos Humanos dispotildeem de maximizaccedilatildeo de for-ccedila juriacutedica a partir do instante em que satildeo ratificados no acircmbito interno de cada paiacutes incorporando assim o regramento estabelecido internacionalmente ao contexto e ordenamento juriacutedico no com-prometimento compromisso responsabilidade promoccedilatildeo respeito e proteccedilatildeo da cidadania e dos Direitos Humanos

Sendo assim os Direitos Fundamentais devem ser incorporados a uma norma com poder de obrigar os destinataacuterios e possibilidade de ser garantida Por uacuteltimo os Direitos Fundamentais satildeo uma realida-de social sendo influenciados pelas condiccedilotildees sociais econocircmicas poliacuteticas econocircmicas e culturais

2 REALIDADE BRASILEIRA E A CRIANCcedilA E ADOLESCENTE EM CONFLITO COM A LEI BREVES CONSIDERACcedilOtildeES

A fim de se pensar e refletir quanto a possibilidade (ou natildeo) da reduccedilatildeo da Maioridade Penal no Estado brasileiro passa-se a traccedilar de forma breve a realidade social e se esta pode influenciar na formaccedilatildeo ou natildeo do surgimento do menor em conflito com a lei

Quando se fala em realidade social deve-se reportar num primeiro momento no que dispotildee a Constituiccedilatildeo da Repuacuteblica Federativa do Brasil de 1988 - CRFB1988 em especial em seus art 1ordm 3ordm 5ordm e 6ordm sendo que este uacuteltimo preza pelos direitos sociais no Estado Democraacutetico de Direito

Nesse sentido a CRFB1988 estabelece que dentre os fundamentos da Repuacuteblica Federativa do Brasil constituiacuteda em Estado Democraacutetico de Direito a Dignidade da Pessoa Humana somada a seus obje-tivos fundamentais dentre estes a garantia do desenvolvimento nacional bem como a erradicaccedilatildeo da pobreza da marginalizaccedilatildeo e minimizando as desigualdades sociais e regionais

Somado a isso o art 6ordm do texto constitucional obteve nova redaccedilatildeo decorrente da Emenda Constitucional nordm 90 de 15 de setembro de 2015 a qual estabelece que ldquosatildeo direitos sociais a edu-caccedilatildeo a sauacutede a alimentaccedilatildeo o trabalho a moradia o transporte o lazer a seguranccedila a previdecircncia social a proteccedilatildeo agrave maternidade e agrave infacircncia a assistecircncia aos desamparados []rdquo nos termos dispostos na CRFB1988

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Dessa forma os direitos sociais tecircm por finalidade em especial proporcionar que o indiviacuteduo detenha condiccedilotildees indispensaacuteveis a garantia e gozo dos direitos constitucionalmente previstos competindo ao poder puacuteblico assegurar melhores condiccedilotildees de vida

Cesarino Juacutenior (2007 p 132) estabelece que os direitos sociais satildeo um complexo de normas e princiacute-pios imperativos tendo por finalidade a adaptaccedilatildeo da concepccedilatildeo juriacutedica agrave realidade social mediante o entendimento de que o homem na sua individualidade socializada e concretizada estaacute calcado na ldquoproteccedilatildeo dos direitos individuais dependentes do produto de seu trabalho para a subsistecircncia sua e de suas famiacuteliasrdquo

Muito embora fundamental e indispensaacutevel para o crescimento da sociedade humana o desenvolvi-mento econocircmico tambeacutem tem proporcionado ou vem sendo um dos grandes causadores do descon-trole ou melhor desequiliacutebrio social

O crescimento muitas vezes desordenado da induacutestria da agricultura da tecnologia dos espaccedilos urbanos a maacute distribuiccedilatildeo de renda acabam por gerar um descontrole no processo de desenvolvimen-to social (se natildeo houver um acompanhamento e observacircncia dos preceitos constitucionais nesse pro-cesso) acabando por proporcionar as desigualdades tatildeo em voga ao nosso redor e consequentemente fomentar a criminalidade a violecircncia e a pobreza

A implementaccedilatildeo de Poliacuteticas Puacuteblicas eficazes evidenciada em reduzir sensivelmente esse quadro de desigualdade social assim como tambeacutem dos iacutendices de criminalidade objetivando o efetivo exerciacutecio do Estado Democraacutetico de Direito

A previsatildeo constitucional no que se refere ao processo de desenvolvimento social na atual realidade brasileira natildeo vem sendo observada quanto ao miacutenimo necessaacuterio a esse processo que possa contri-buir e evitar a exclusatildeo social3

No que diz respeito ao bem-estar de acordo com estudo realizado pelo Sesi (2012) o mesmo decorre natildeo apenas de recursos econocircmicos mas tambeacutem de aspectos que fogem de caracteriacutesticas natildeo econocircmicas da vida das pessoas (o que fazem podem fazer a apreciaccedilatildeo da proacutepria vida seu meio ambiente natural)

Assim a qualidade de vida deve ser mensurada e sustentada sob diversos criteacuterios em especial aqueles relacionados aos direitos sociais previstos da CRFB1988 como sauacutede educaccedilatildeo condiccedilotildees de traba-lho vida (lazer moradia por exemplo) condiccedilotildees ambientais inseguranccedila pessoal relacionada agrave crimi-nalidade desastres naturais e tambeacutem inseguranccedila econocircmica (niacutevel de desemprego e aposentadoria)

Quando se fala em realidade social brasileira deve-se ter em mente de que forma mensura-se ou se busca tais resultados competindo ao Instituto Brasileiro de Geografia e Estatiacutestica ndash IBGE o estabele-cimento dos indicadores de desenvolvimento a fim de poder visualizar quanto esse aspecto e dessa forma ter uma visatildeo do desenvolvimento social e se esta proporciona (ou natildeo) o miacutenimo desejaacutevel ou esperado no processo de construccedilatildeo e formaccedilatildeo do desenvolvimento de Crianccedilas e Adolescentes e a inserccedilatildeo destas na praacutetica de infraccedilotildees penais

Anualmente o IBGE vem apresentando uma real anaacutelise das condiccedilotildees de vida da populaccedilatildeo brasileira atraveacutes de publicaccedilotildees que demonstram aspectos relacionados ao desenvolvimento social (atraveacutes de indicadores) dentro das distintas realidades populacionais e geograacuteficas existentes no territoacuterio brasileiro

Cumpre ressaltar que tais indicadores levam em conta principalmente o quadro de exclusatildeo e desi-gualdade social assim como tambeacutem as condiccedilotildees de vida como aspectos demograacuteficos ambiente familiar e domiciliar somado aos demais direitos sociais previstos constitucionalmente

3 A exclusatildeo social encontra-se relacionada a quadro de vulnerabilidade desigualdade isolamento eou discriminaccedilatildeo social

que determinas pessoas ou grupos sociais fazem parte A pobreza encontra-se relacionada natildeo apenas a ausecircncia de renda mas

principalmente a carecircncia de acesso aos serviccedilos puacuteblicos de natildeo representaccedilatildeo Dicionaacuterio de poliacuteticas puacuteblicas Org Carmen Luacutecia

Freitas de Castro Cynthia Ruacutebia Braga Gontijo Antocircnio Eduardo de Noronha Amabile Barbacena EdUEMG 2012 p 197-198

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Apresentou-se uma siacutentese de indicadores sociais e a anaacutelise acerca das condiccedilotildees de vida da popula-ccedilatildeo em nosso paiacutes sistematizando uma seacuterie de subsiacutedios relacionadas a realidade brasileira obser-vado ainda as ldquodistintas dimensotildees que envolvem a elaboraccedilatildeo de um sistema de indicadores sociaisrdquo (IBGE 2015 p 7)

Para tanto fez-se uso da anaacutelise de diversas temaacuteticas dentre estas relacionadas aos Aspectos demo-graacuteficos os Grupos sociodemograacuteficos composto por Crianccedilas e Adolescentes idosos e famiacutelias bem como os direitos sociais propriamente ditos (domiciacutelio trabalho educaccedilatildeo e distribuiccedilatildeo de renda) com vistas a identificar atraveacutes da comparaccedilatildeo temporal alguns indicadores e assim identificar impor-tantes aspectos e seu processo evolutivo

Destaca-se que foi empregado como fonte de tais informaccedilotildees a Pesquisa Nacional por Amostra de Domiciacutelios ndash PNAD 2014 somada a outras fontes de dados existentes como o Censo Demograacutefico 2010 a Pesquisa Nacional de Sauacutede do Escolar - PeNSE Pesquisa Nacional de Sauacutede - PNS e bases de dados do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Aniacutesio Teixeira - INEP do Ministeacuterio da Educaccedilatildeo

Fundada em tal estudo a anaacutelise dos indicadores tem como ponto de partida as desigualdades sociais e buscando novas perspectivas na mensuraccedilatildeo do bem-estar social que natildeo gira em torno tatildeo somente aos indicadores de produccedilatildeo mas em especial a apropriaccedilatildeo da riqueza produzida pelos paiacuteses

A pesquisa realizada pelo IBGE e ora referenciada ressalta a diversidade caracteriacutestica da populaccedilatildeo bra-sileira somada a submissatildeo nas uacuteltimas deacutecadas de mudanccedilas econocircmicas sociais e demograacuteficas pas-sando entatildeo a proceder uma anaacutelise comportamental e de maneira mais especiacutefica sobre determinados grupos dentre estes Crianccedilas e Adolescentes os quais detecircm legislaccedilatildeo especiacutefica que os ampara nes-se caso o ECA somada a tutela constitucional prevendo a prioridade na efetivaccedilatildeo e gozo dos Direitos Fundamentais e sociais inerentes a Pessoa Humana e em especial a essas Pessoas em desenvolvimento

Sabe-se que esse processo de desenvolvimento da Crianccedila e do Adolescente evidenciando pelo bem--estar das mesmas encontra-se vinculado segundo a Siacutentese de indicadores sociais do IBGE (2015 p 25) da melhoria de maneira macro das condiccedilotildees de vida em sociedade

A realidade injusta na distribuiccedilatildeo de renda eacute que impede ou impossibilita por assim dizer o ldquobem-es-tar atual e o desenvolvimento futuro de suas sociedades e economiasrdquo somada a taxa de crescimento anual do PIB no acircmbito da Ameacuterica Latina o Brasil manteve-se dentro da meacutedia em comparaccedilatildeo a outros paiacuteses sendo que o crescimento econocircmico na uacuteltima deacutecada e a reduccedilatildeo significativa das desi-gualdades de renda proporcionaram melhoria nas condiccedilotildees de vida do brasileiro girando em uma meacutedia de 3 (trecircs por cento) de crescimento conforme exposto pela pesquisa do IBGE (2015 p 79)

Importa observar que pobreza exclusatildeo social e desigualdade encontram-se interligados assumindo no territoacuterio brasileiro uma ldquodimensatildeo abrangenterdquo

Essa eacute a liccedilatildeo de Silva (2010 p 156) a qual afirma que a pobreza no Brasil evidencia

[] um quadro amplo para intervenccedilatildeo de poliacuteticas puacuteblicas de corte social entendendo que as

poliacuteticas sociais para serem mais eficazes devem estar articuladas a poliacuteticas macroeconocircmicas

que garantam um crescimento econocircmico sustentado a geraccedilatildeo de emprego a elevaccedilatildeo

da renda proveniente do trabalho e sobretudo a redistribuiccedilatildeo de renda ainda altamente

concentrada no Brasil

Silva (2010 p 157) ainda destaca que a exclusatildeo social natildeo estaacute vinculada uacutenica e exclusivamente sob o aspecto econocircmico em estabelecer a vulnerabilidade mas deve ldquoser considerada em articulaccedilatildeo com a proteccedilatildeo socialrdquo

Ademais tendo-se uma sociedade marginalizada sob a oacutetica econocircmica e socialmente falando ldquotem constituiacutedo massas de trabalhadores autocircnomos ou assalariados com rendimentos iacutenfimos que os levam a uma vida precaacuteria e sem proteccedilatildeo social considerados potencialmente perigososrdquo sendo que

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na realidade brasileira a pobreza foi arraigada como resultado de um processo de desenvolvimento concentrado na ldquoriqueza socialmente produzida e dos espaccedilos territoriais representados pelos gran-des latifuacutendios no meio rural e pela especulaccedilatildeo imobiliaacuteria no meio urbanordquo somada a escassez de meios de subsistecircncia (SILVA 2010 p 157)

Com isso ante a impossibilidade efetiva do gozo e exerciacutecio dos Direitos Fundamentais inerentes a Pessoa Humana acaba proporcionando com que permaneccedilam excluiacutedos e marginalizados em espe-cial Crianccedilas e Adolescentes

Esse quadro de exclusatildeo e desigualdade social resulta na realidade brasileira em violecircncia reflexo da insuficiecircncia do Estado em fomentar Poliacuteticas Puacuteblicas eficazes a fim de minimizar ou regular a situaccedilatildeo

[] A violecircncia que entrecorta o Brasil eacute a mesma que afasta investidores leva agrave morte milhares

de viacutetimas provoca o encarecimento de produtos e serviccedilos segurados fomenta injusticcedilas

sociais determina poliacuteticas de seguranccedila truculentas constroacutei o medo social legitima frentes

de accedilatildeo popular conservadoras degenerando os laccedilos da vida social (BITTAR 2008 p 115)4

A deficiecircncia relacionada a igualdade e cidadania deve ser compreendida como imprescindiacutevel ao gozo dos Direitos Fundamentais vinculadas a ldquoquestotildees de poliacuteticas de seguranccedila puacuteblicardquo acaba por caracterizar a violecircncia como uma ciranda que eacute produzida e reproduzida perpetuando-se ldquona dinacircmi-ca de organizaccedilatildeo da vida socialrdquo vista como ldquoum alarmante estado de instabilidade e descontentamen-to geral da sociedaderdquo bem como natildeo deve ser analisada como um problema isolado dentro de Estado ou de um paiacutes conforme assevera Bittar (2008 p 215)

Cumpre ressaltar que de acordo com a liccedilatildeo de Campos (2003 p 51) o crescimento da violecircncia muito embora natildeo seja o fato gerador da exclusatildeo social decorre como sendo o reflexo da realidade existente pela exasperaccedilatildeo de competiccedilatildeo social ldquodas alteraccedilotildees dos valores morais e da nova loacutegica da sociabilida-de que conforma uma sociedade de consumo e tambeacutem em grande medida pela incapacidade de o poder puacuteblico reverter significativamente os indicadores da velha exclusatildeordquo demonstrando assim a correlaccedilatildeo entre a violecircncia urbana desigualdade social e a inserccedilatildeo do menor em conflito com a lei na praacutetica de delitos vem crescendo diariamente e sem uma perspectiva imediata em minimizar essa realidade

Insta salientar que outros aspectos conceituais em especial envolvendo aqueles integrantes da par-cela mais pobre e marginalizada da populaccedilatildeo demonstram que natildeo apenas o desenvolvimento des-controlado mas principalmente como jaacute asseverado a maacute distribuiccedilatildeo de renda o descaso do poder puacuteblico constituiacutedo que natildeo busca minimizar tais desigualdades ou disparidades acaba por gerar o crescimento de accedilotildees criminosas e consequentemente proporcionando um desequiliacutebrio social

3 A REALIDADE DO SISTEMA SOCIOEDUCATIVO E A REDUCcedilAtildeO DA MAIORIDADE PENAL

Eacute sabido que os conflitos fazem parte da vida em sociedade sendo que para regular as relaccedilotildees de con-flito compete ao Estado atraveacutes das normas do direito penal impor restriccedilotildees e proibiccedilotildees para coibir determinadas condutas que extrapolam o limite socialmente aceitaacutevel

O Direito Penal segundo Gonsalves (2010 p 3) eacute o ramo do direito puacuteblico que define as infraccedilotildees penais estabelecendo as penas e as medidas de seguranccedila aplicaacuteveis aos infratores Distingue-se o direito penal objetivo que eacute o conjunto de normas penais em vigor do direito penal subjetivo que eacute o direito de punir que surge para o Estado com a praacutetica de uma infraccedilatildeo penal

4 O crescimento dos crimes e da violecircncia no Brasil eacute em grande medida consequecircncia da emergecircncia e disseminaccedilatildeo do crime organizado

no Brasil em especial em torno do traacutefico de drogas fenocircmeno intensificado a partir da deacutecada de 80 do seacuteculo passado (ADORNO

Seacutergio Crime puniccedilatildeo e prisotildees no Brasil um retrato sem retoques p 08 In Foro Iberoamericano Sobre Seguridad Ciudadana Violecircncia

Social Y Poliacuteticas Publicas Madrid Espanha Anais jun 2006 p19-21 No prelo)

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Ao tutelar o bem juriacutedico o direito penal prevecirc que para cada infraccedilatildeo cometida uma retribuiccedilatildeo na modalidade de pena que seraacute aplicada pelo Estado juiz

A coerccedilatildeo penal (basicamente a pena) deve procurar materializar uma aspiraccedilatildeo eacutetica que seraacute

a razatildeo de atuaccedilatildeo do proacuteprio Direito Penal [hellip] a fim de buscar a prevenccedilatildeo de futuras afetaccedilotildees

de bens juriacutedicos [hellip] a sanccedilatildeo penal soacute seria legiacutetima quando se prestasse para restabelecer

a ordem juriacutedica afetada pela conduta humana violadora de interesses do corpo social [hellip]

(CHAVES JUacuteNIOR OLDONI 2014 p 21)

Aleacutem de normas reguladoras das relaccedilotildees sociais o Direito Penal busca tutelar bens juriacutedicos de inte-resse individual e coletivo como a vida a liberdade e o patrimocircnio devendo fazer atraveacutes do devido processo legal

Ademais o sistema penal deve cumprir com sua funccedilatildeo atendendo os princiacutepios do direito penal em especial o princiacutepio da legalidade e da Dignidade da Pessoa Humana dando uma resposta satisfatoacuteria tanto na puniccedilatildeo do agente quanto na sua reintegraccedilatildeo social conforme exposto por Reacutegis e Paulo (2016) o que pode ser constatado em verdade que natildeo vem atendendo e alcanccedilando a previsatildeo legal e as expectativas da sociedade

A CRFB1988 enfatiza que eacute dever do Estado promover a seguranccedila e exercer o direito de punir quem infrin-gir as normas aplicando a puniccedilatildeo atraveacutes do devido processo legal que eacute garantido constitucionalmente contudo inexiste mecanismos eficazes que permita ao Estado cumprir com tal preceito constitucional

Vigora no direito penal o princiacutepio da intervenccedilatildeo miacutenima o que orienta e limita o poder incriminador do Estado preconizando que a criminalizaccedilatildeo de uma conduta soacute se legitima se constituir meio neces-saacuterio para proteccedilatildeo de determinado bem juriacutedico (CUNHA 2015 p 32)

Assim o Direito penal foi instituiacutedo para solucionar possiacuteveis conflitos que ameaccedilam ou provocam lesatildeo aos bens juriacutedicos tutelados atuando de forma residual respeitando o princiacutepio da intervenccedilatildeo miacutenima ou seja reservado aos casos que os outros ramos do direito natildeo trazem a soluccedilatildeo baseado na Dignidade da Pessoa Humana e na ampla defesa

Nesse sentido o sistema prisional e da mesma forma o sistema socioeducativo tecircm a funccedilatildeo tatildeo somente enclausuradora com superlotaccedilatildeo de inadequadas condiccedilotildees estruturais e humanas inade-quadas e despreparadas que natildeo visam a reeducaccedilatildeo eou ressocializaccedilatildeo do infrator ou do adoles-cente em conflito com a lei havendo por forccedila disso (e natildeo haacute caminho diverso) para a intensa criacutetica voltada ao sistema penal e consequentemente ao sistema socioeducativo

Que prisotildees onde estatildeo enclausuradas milhares de pessoas desprovidas de assistecircncia sem

nenhuma separaccedilatildeo em absurda ociosidade [] Prisotildees onde muitos aguardam julgamento

durante anos enquanto outros satildeo mantidos por tempo superior ao da sentenccedila Prisotildees onde

por alegada inexistecircncia por local proacuteprio para triagem os receacutem-ingressos que deveriam

submeter-se a uma observaccedilatildeo cientifica satildeo trancafiados em celas de castigo ao lado de presos

extremamente perigosos (LEAL 2001 p 58)

Em outras palavras de acordo com Chaves Juacutenior e Oldoni (2014 p 201) a prisatildeo eacute tida como sendo o ldquouacutenico meio para o controle das relaccedilotildees sociais e eliminaccedilagraveo da criminalidaderdquo constatando-se o cres-cimento significativo da violecircncia e a ilusatildeo de que a clausura no cumprimento da pena iraacute minimizar as mazelas e os problemas sociais decorrentes do aprosionamento

Natildeo seraacute exposto aqui quanto a responsabilidade estatal e dos administradores do sistema prisional quanto a omissatildeo na observacircncia de condiccedilotildees miacutenimas de dignidade ao condenado contudo impor-tante destacar que

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[] una lluvia de demandas judiciales fueron interpuestas contra los administradores de las

prisiones por abusos malos tratos arbitrariedad injustificada revocacioacuten injustificada de la

libertad condicional inhumanas condiciones de encarcelamiento y un largo etceacutetera de causas que

tras algunos intentos fallidos lograron que los tribunales federales rompieran con su tradicional

poliacutetica de hands off y entraran a revisar los procesos de concesioacuten de los beneficios penitenciarios

y las condiciones de cumplimiento de las penas de privacioacuten de libertad Concretamente en cuanto

a las condiciones de encarcelamiento los tribunales federales comenzaron a llevar a cabo una

aplicacioacuten mucho maacutes rigurosa de la legislacioacuten sobre derechos civiles y de la Octava Enmienda

de la Constitucioacuten de los EEUU que prohiacutebe expresamente la imposicioacuten de penas crueles y

extraordinarias Con una situacioacuten penitenciaria en la que una buena parte de los establecimientos

se encontraban en condiciones deplorables por la inhumanidad del trato ofrecido a los reclusos

la falta de garantiacuteas para la integridad fiacutesica de los internos la falta de miacutenimas condiciones de

higiene salubridad y habitabilidad los jueces federales comenzaron a remitir a los responsables

directos e indirectos de los establecimientos penitenciarios las oportunas oacuterdenes para que los

adecentaran y humanizaran para que los dotaran con los adecuados medios y personal sanitarios

y para que se pusiera fin al ejercicio de praacutecticas contrarias a los derechos civiles En caso contrario

se encontrariacutean expuestos a responsabilidades criminales y a tener que hacer frente a fuertes

multas5 (DEL ROSAL 1998 p 125)

Diante da falecircncia do sistema prisional brasileiro na liccedilatildeo de Falconi (1998 p 103) o qual eacute puacuteblico e notoacuterio aliado ao reduzido espaccedilo fiacutesico existente e ofertado para o cumprimento da pena as super-lotaccedilotildees inexiste o espiacuterito humanitaacuterio de conduta reciacuteproca entre os envolvidos (infratores da lei e Estado) impossibilitando a observacircncia de tais regramentos uma vez que em natildeo havendo ldquoqualquer bem ou benefiacutecio recebido entatildeo haveraacute de prevalecer a rebeldia a indiferenccedila a apatia a dissimula-ccedilatildeo a falsidade e a deslealdaderdquo comportamentos e condutas estas que satildeo comuns dentro do sistema prisional justamente por natildeo existir o fiel cumprimento dos preceitos estabelecidos pela legislaccedilatildeo infraconstitucional

Agora a pergunta que se faz eacute se haacute falecircncia no sistema prisional brasileiro eacute possiacutevel que o sistema socioeducativo seja diverso dessa realidade

Certo que natildeo Sendo assim se o legislador a nosso ver por intervenccedilatildeo eou influecircncia social e midiaacute-tica busca dar resposta ante o crescente envolvimento de adolescente em conflito com a lei na praacutetica delitiva colocando em discussatildeo a reduccedilatildeo da Maioridade Penal no paiacutes como resoluccedilatildeo dos proble-mas que mecanismos em especial preventivos poderatildeo ser empregados

O proacuteprio ECA em conjunto com a normativa internacional que tutela a crianccedila e Adolescente nos traz a resposta como o gozo de todos os Direitos Fundamentais a Proteccedilatildeo Integral os meios neces-saacuterios para garantir e permitir o desenvolvimento mental moral fiacutesico e social a disponibilizaccedilatildeo de recursos voltados a proteccedilatildeo da infacircncia e juventude a inclusatildeo e convivecircncia familiar direitos sociais (educaccedilatildeo moradia lazer esporte alimentaccedilatildeo sauacutede profissionalizaccedilatildeo) ou seja com a finalidade de promover o bem-estar da crianccedila e do Adolescente tratando-os de maneira efetiva e humana quando em conflito com a lei

5 [] uma enxurrada de processos foram abertos contra os diretores de abusos prisatildeo maus tratos arbitraacuterias injustificada revogaccedilatildeo

injustificada da liberdade condicional condiccedilotildees de detenccedilatildeo desumanas e uma longa lista de causas que depois de vaacuterias tentativas

frustradas conseguiu o tribunais federais romper com sua tradicional poliacutetica de matildeos fora e entrar para rever os processos de concessatildeo

de benefiacutecios e condiccedilotildees de execuccedilatildeo das penas de prisatildeo de prisatildeo Especificamente sobre as condiccedilotildees das prisotildees tribunais federais

comeccedilaram a realizar uma aplicaccedilatildeo muito mais rigorosa da legislaccedilatildeo dos direitos civis e a Oitava Emenda da Constituiccedilatildeo dos EUA que

proiacutebe expressamente a imposiccedilatildeo de penas crueacuteis e extraordinaacuterias Uma situaccedilatildeo prisional em que grande parte dos estabelecimentos

estavam em condiccedilotildees deploraacuteveis a desumanidade do tratamento oferecido aos presos a falta de garantias para a integridade fiacutesica

dos presos a falta de condiccedilotildees miacutenimas de higiene sauacutede e habitabilidade os juiacutezes federais comeccedilaram a se referir agrave responsabilidade

direta e indireta para prisotildees ordens apropriadas para o adecentaran e humanizar por isso eficientemente com meios adequados

e pessoal sanitaacuterio e para seja posto termo ao exerciacutecio de praacuteticas contraacuterio aos direitos civis Caso contraacuterio eles seriam expostos a

responsabilidade criminal e ter de enfrentar pesadas multas (DEL ROSAL Bernardo Blasco La ldquoprivatizacioacutenrdquo de las prisiones una huida

hacia la pena de privacioacuten de libertad Nuacutemero Extraordinario 12 San Sebastiaacuten Eguzkilore 1998 p 125 Disponiacutevel em lthttpwww

ehueusdocuments1736829217430811+Rosalpdfgt Acesso em 05 jun 2016 traduccedilatildeo livre)

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Importa observar que muito embora as Regras de Mandela desenhem um modelo de sistema prisio-nal de bons princiacutepios e praacuteticas no tratamento de presos essas natildeo regulam a ldquogestatildeo de instituiccedilotildees reservadas para jovens em conflito com a lei []rdquo mas ldquode um modo geral podem ser igualmente aplica-das a tais estabelecimentosrdquo (BRASIL REGRAS DE MANDELA 2016 p 18)

Cabe ressaltar que aliado ao regramento nacional quanto ao cumprimento das Medidas Socioeducativas dispostas no ECA aliado ao processo de desenvolvimento e ressocializaccedilatildeo do adolescente em conflito com a lei como mencionado em capiacutetulos anteriores haacute normativas internacionais que reforccedilam o tratamento a ser dispensado a este podendo destacar as Regras Miacutenimas das Naccedilotildees Unidas para a Administraccedilatildeo da Justiccedila Juvenil - Regras de Beijing Regras das Naccedilotildees Unidas para a Proteccedilatildeo dos Menores Privados de Liberdade e Princiacutepios das Naccedilotildees Unidas para a Prevenccedilatildeo da Delinquecircncia Juvenil - Princiacutepios Orientadores de Riad as quais em essecircncia buscam pelo bem estar da crianccedila e do Adolescente

Esse tratamento dispensado ao jovem em conflito com a lei em regra geral diz respeito ao cumprimen-to em entidade exclusivamente voltada para Adolescentes e distinto daquele destinado ao abrigo ou do sistema prisional (adulto) observados ainda a separaccedilatildeo por criteacuterios de idade compleiccedilatildeo fiacutesica e gra-vidade da infraccedilatildeo bem como com imparcialidade e sem distinccedilatildeo de qualquer natureza aliada a adoccedilatildeo de medidas voltadas a prevenccedilatildeo da delinquecircncia as quais devem ser concretizadas na legislaccedilatildeo assim como tambeacutem pelas instituiccedilotildees e ldquonuma rede de serviccedilos destinada a reduzir a motivaccedilatildeo a necessidade e as oportunidades da praacutetica de infraccedilotildees e a eliminar as condiccedilotildees que datildeo lugar a tal comportamentordquo (PRINCIacutePIOS DAS NACcedilOtildeES UNIDAS PARA A PREVENCcedilAtildeO DA DELINQUEcircNCIA JUVENIL)

Respondendo de forma breve o questionamento realizado anteriormente no que se refere a possibili-dade do sistema socioeducativo brasileiro deter uma realidade diversa do sistema prisional brasileiro constata-se que negativamente

Principia-se que no ano de 2012 foi instituiacuteda a Lei no 12594 de 18 de janeiro tendo por finalidade estabelecer o Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo ndash Sinase6 bem como passou a regu-lamentar a execuccedilatildeo das Medidas Socioeducativas destinadas aos Adolescentes quando da praacutetica de Ato Infracional visando obter respostas ldquode como devem ser enfrentadas as situaccedilotildees de violecircncia que envolvem adolescentes autores de atos infracionais ou viacutetimas de violaccedilatildeo de direitos no cumprimen-to de medidas socioeducativasrdquo (MONTE 2011 p 128)

A proposta disposta na referida lei estaacute na integraccedilatildeo entre Uniatildeo Estados Distrito Federal e Municiacutepios na implementaccedilatildeo de programas de atendimento a Adolescente em conflito com a lei quan-do da aplicaccedilatildeo de medida socioeducativa dando liberdade funcional e organizacional desde que res-peitados os termos estabelecidos na legislaccedilatildeo

O Sinase eacute tido conforme dispotildee o art 1o sect1o da Lei no 125942012 como sendo um ldquoconjunto orde-nado de princiacutepios regras e criteacuterios que envolvem a execuccedilatildeo de medidas socioeducativasrdquo os quais os sistemas estaduais e municipais poderatildeo aderir assim como tambeacutem a ldquotodos os planos poliacuteticas e programas especiacuteficos de atendimento a adolescente em conflito com a leirdquo

Quando do cumprimento das Medidas Socioeducativas sobressai aleacutem de despertar o senso de res-ponsabilizaccedilatildeo pela transgressatildeo praticada a integraccedilatildeo social a garantia dos direitos individuais e sociais atraveacutes do cumprimento de seu plano individual de atendimento (art 1o sect2o)

A referida Lei ainda traz aspectos relacionados aos programas de atendimento a organizaccedilatildeo e o funcionamento por unidade demonstrando deter condiccedilotildees necessaacuterias para o cumprimento das Medidas Socioeducativas composta por equipe multidisciplinar (profissionais da sauacutede assistecircncia

6 A referida Lei assim como o Estatuto da Crianccedila e do Adolescente tem por finalidade aleacutem de dispor acerca da proteccedilatildeo integral dos

direitos fundamentais de crianccedilas e adolescentes traccedila diretrizes quanto o atendimento do adolescente infrator em cumprimento de

medidas socioeducativas em especial em instituiccedilotildees de ressocializaccedilatildeo fundamentais a seu desenvolvimento

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social educaccedilatildeo) somado ao fato que para exercer a responsabilidade de dirigente de programa de atendimento nos regimes de semiliberdade e internaccedilatildeo eacute necessaacuteria formaccedilatildeo de niacutevel superior e comprovaccedilatildeo de experiecircncia de no miacutenimo dois anos no trabalho com Adolescentes

O art 52 estabelece ainda que para o cumprimento das Medidas Socioeducativas em regime de pres-taccedilatildeo de serviccedilos agrave comunidade liberdade assistida semiliberdade ou internaccedilatildeo satildeo dependentes de Plano Individual de Atendimento ndash PIA ldquoinstrumento de previsatildeo registro e gestatildeo das atividades a serem desenvolvidas com o adolescenterdquo tendo a participaccedilatildeo efetiva do Adolescente em conflito com a lei e dos responsaacuteveis ou pais sendo que esses ldquotecircm o dever de contribuir com o processo ressociali-zador do adolescenterdquo

Ademais semelhante ao que dispotildee a LEP a Lei no 125942012 instituidora do Sinase em seu art 71 prevecirc que as entidades de atendimento socioeducativo estabeleccedilam um regime disciplinar tipificando explicitamente as infraccedilotildees (leve meacutedia e grave) bem como especificando as sanccedilotildees corresponden-tes assim como a instauraccedilatildeo de procedimento especiacutefico para apurar a transgressatildeo proporcionando os direitos constitucionais do contraditoacuterio e da ampla defesa dentre outros regramentos

Cabe ressaltar ainda que o Sinase busca afastar a imagem de que as entidades de atendimento socioe-ducativo e os locais de cumprimento das Medidas Socioeducativas se aproximem da existente no sis-tema prisional caracterizadas pelo ldquotratamento despersonalizado padronizado e pela falta de mobili-daderdquo (MONTE 2011 p 128)

[hellip] La caacutercel produce hoy reclutaacutendolo sobre todo en las zonas maacutes desfavorecidas de la

sociedad un sector de marginacioacuten social particularmente cualificado por la intervencioacuten

estigmatizante del sistema punitivo del Estado y por larealizacioacuten de aquellos procesos que en

el nivel de la interaccioacuten social y de la opinioacuten puacuteblica son activados por la pena y concurren a

realizar su efecto marginador y atomizador7 (BARATTA 2004 p 174)

Apesar da previsatildeo legal pode ser observado que o sistema socioeducativo eacute infelizmente reflexo do sistema carceraacuterio brasileiro por diversas razotildees tais como sistema repressivo com atos de violecircn-cia fugas rebeliotildees crescimento da populaccedilatildeo de Adolescentes em conflito com a lei superlotaccedilotildees estruturas fiacutesicas improacuteprias insalubridade iacutendices de reincidecircncia ineficiecircncia no papel educativo profissionais sem capacitaccedilatildeo adequada e em nuacutemero insuficiente para atender a demanda os quais em regra adoram comportamento corretivo e coercitivo de manutenccedilatildeo da ordem e de vigilacircncia dos Adolescentes em conflito com as leis e natildeo de assistecircncia de promoccedilatildeo de direitos senso de responsa-bilidade e de ressocializaccedilatildeo

Tal afirmaccedilatildeo pode ser demonstrada natildeo apenas em mateacuterias jornaliacutesticas mas especialmente pelo Conselho Nacional do Ministeacuterio Puacuteblico ndash CNMP o qual expotildee as superlotaccedilotildees nas unidades de internaccedilatildeo de Adolescentes em conflito com a lei (a qual compromete a qualidade do sistema socio-educativo) evasotildees (fugas) e dos 27 (vinte e sete) Estados da Federaccedilatildeo 19 (dezenove) tecircm de 50 a 100 das entidades em condiccedilotildees insalubres (JORNAL DO BRASIL 2015)

O relatoacuterio intitulado ldquoUm Olhar Mais Atento agraves Unidades de Internaccedilatildeo e de Semiliberdade para Adolescentes8rdquo promovido pela Comissatildeo de Infacircncia e Juventude do Conselho Nacional do Ministeacuterio Puacuteblico ndash CIJCNMP mostra o asseverado acima

7 [] A prisatildeo produz hoje reclutaacutendolo especialmente nas zonas mais desfavorecidas da sociedade um setor de marginalizaccedilatildeo social

particularmente qualificado estigmatizando intervenccedilatildeo estatal sistema punitivo e um reservado esses processos ao niacutevel da interaccedilatildeo

social e puacuteblica satildeo ativados por ele e assistir a seu efeito marginalizaccedilatildeo e fazer atomizador (traduccedilatildeo livre)

8 BRASIL Conselho Nacional do Ministeacuterio Puacuteblico Relatoacuterio da Infacircncia e Juventude ndash Resoluccedilatildeo no 672011 um olhar mais atento

agraves unidades de internaccedilatildeo e semiliberdade para adolescentes Brasiacutelia Conselho Nacional do Ministeacuterio Puacuteblico Brasiacutelia CNMP

2015 Disponiacutevel em lthttpwwwcnmpmpbrportalimagesstoriesDestaquesPublicacoesUm_Olhar_mais_Atento_0207_WEB-

completo-ok-1_1pdfgt Acesso em 14 dez 2016

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A Resoluccedilatildeo no 46 de 29 de outubro de 1996 do Conselho Nacional dos Direitos da Crianccedila e do Adolescente ndash Conanda estabelece que as unidades de internaccedilatildeo deveratildeo atender um nuacutemero natildeo superior a 40 (quarenta) Adolescentes realidade esta inexistente no sistema socioeducativo brasileiro

A determinaccedilatildeo de limitar o atendimento em cada unidade a 40 adolescentes visava reestruturar

o sistema de internaccedilatildeo entatildeo vigente de grandes complexos e centros para locais adequados

a um nuacutemero reduzido de adolescentes onde pudessem receber assistecircncia individualizada

(RELATOacuteRIO DA INFAcircNCIA E JUVENTUDE ndash RESOLUCcedilAtildeO nordm 67 2011 p 28)

Previsatildeo essa tanto quanto utoacutepica sendo que o Estado de Santa Catarina tem todas as unidades de internaccedilatildeo dentro dos limites estabelecidos pelo Conanda e Sinase contudo haacute imperceptiacutevel melhoria em suas estruturas a exemplo de outras unidades da Federaccedilatildeo assim como tambeacutem natildeo ficou claramen-te demonstrado se a unidade de cumprimento da medida socioeducativa eacute proacutexima a residecircncia e dos familiares do Adolescente em conflito com a lei mas apenas exposto que seria a mais proacutexima disponiacutevel conforme abordado no Relatoacuterio da Infacircncia e Juventude ndash Resoluccedilatildeo nordm 67 (2011 p 30-31 41)

Outro fator que se assemelha a realidade do sistema prisional eacute a insalubridade ou seja comprome-tidas e desprovidas de ventilaccedilatildeo conservaccedilatildeo higiene e iluminaccedilatildeo adequadas nas unidades assim como a disponibilizaccedilatildeo de salas de aula inadequadas uma vez que a ldquose pressupotildee na educaccedilatildeo a base fundamental para o sucesso do atendimento socioeducativordquo de espaccedilos para a profissionalizaccedilatildeo praacutetica de esportes cultura e lazer (RELATOacuteRIO DA INFAcircNCIA E JUVENTUDE ndash RESOLUCcedilAtildeO nordm 67 2011 p 43-47)

O disposto no art 123 do ECA determina a separaccedilatildeo rigorosa dos Adolescentes em conflito com a lei ldquopor criteacuterios de idade compleiccedilatildeo fiacutesica e gravidade da infraccedilatildeordquo e entre adolescentes em internaccedilatildeo provisoacuteria e definitiva sendo que tais criteacuterios tecircm a finalidade principal de ldquoprevenir atos de violecircncia dos adolescentes uns contra os outrosrdquo criteacuterio este que tambeacutem deixa a desejar e natildeo eacute observado (RELATOacuteRIO DA INFAcircNCIA E JUVENTUDE ndash RESOLUCcedilAtildeO nordm 67 2011 p 48-50)

Sendo assim

O que se verifica pelos dados colhidos no que se refere aos adolescentes em conflito com a lei

eacute uma grande indiferenccedila agrave doutrina da proteccedilatildeo integral trazida pelo Estatuto da Crianccedila e do

Adolescente [] Ademais eacute preciso incentivar o protagonismo a participaccedilatildeo e a autonomia

dos adolescentes em cumprimento de medidas socioeducativas [] Os programas de execuccedilatildeo

de medidas socioeducativas devem permitir que os adolescentes se preparem para a cidadania

e que aprendam a criar perspectivas de vida o que somente seraacute possiacutevel se o sistema for

plenamente socioeducativo com educaccedilatildeo plena e de qualidade preparaccedilatildeo para o trabalho

participaccedilatildeo e integraccedilatildeo social9 (RELATOacuteRIO DA INFAcircNCIA E JUVENTUDE ndash RESOLUCcedilAtildeO

nordm 67 2011 p 85)

Como jaacute asseverado prevalece infelizmente uma proximidade e semelhanccedila da realidade do siste-ma socioeducativo com o sistema prisional brasileiro seja em relaccedilatildeo ao espaccedilo fiacutesico superlotaccedilotildees fugas rebeliotildees insalubridades precariedade de infraestrutura e de formaccedilatildeo dos profissionais dimi-nutas oportunidades de formaccedilatildeo profissional e educacional realidade essa que dificulta sobremanei-ra o que dispotildee os modelos preconizados pelo ECA e Sinase no cumprimento bem como o alcance das Medidas Socioeducativas de transformaccedilatildeoreinserccedilatildeo familiarsocial e de cidadania

Frente a essa realidade complicada e temeraacuteria aprovar a reduccedilatildeo da maioridade (imputabilidade) penal

9 BRASIL Conselho Nacional do Ministeacuterio Puacuteblico Relatoacuterio da Infacircncia e Juventude ndash Resoluccedilatildeo no 672011 um olhar mais atento agraves

unidades de internaccedilatildeo e semiliberdade para adolescentes p 85

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4 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

O assunto em tela teve por finalidade traccedilar uma breve reflexatildeo acerca de um tema atual polecircmico (diante em especial da influecircncia midiaacutetica no processo de formaccedilatildeo de opiniatildeo) e necessaacuterio

Analisar a viabilidade ou possibilidade da reduccedilatildeo da maioridade penal como forma de resoluccedilatildeo da incidecircncia da criminalidade que assola o estado brasileiro eacute responsabilizar pessoas em processo de desenvolvimento os quais satildeo tutelados natildeo apenas sob a eacutegide do texto constitucional quanto infraconstitucional

Obviamente natildeo se pode hoje afirmar que tatildeo somente o aspecto da desigualdade social eacute o fato gerador desse envolvimento de jovens no cometimento de atos infracionais e consequentemente estarem em conflito com a lei necessita-se de muito mais a fim de evitar que esse cenaacuterio se agrave cada vez mais

Os direitos sociais objetivam promover condiccedilotildees essenciais ao gozo de direitos a fim por exemplo em minimizar as desigualdades competindo ao Estado fomentar accedilotildees em busca de melhor qualidade de vida e igualdade social

Esse desequiliacutebrio socioeconocircmico resulta no crescimento da pobreza da violecircncia e dessa forma da criminalidade estando inserido nessa realidade o jovem excluiacutedo socialmente e vulneraacutevel decorren-te da injusta distribuiccedilatildeo de renda e oportunidades impedindo o pleno desenvolvimento destes ante esse quadro de desigualdades

Direitos fundamentais dispostos nacional e internacionalmente satildeo cristalinos nesse processo de formaccedilatildeo e tutela em todos os sentidos das pessoas em desenvolvimento leia-se jovens e crianccedilas contudo a realidade socioeconocircmica poliacutetica e cultural brasileira infelizmente natildeo permite que tais garantias sejam oportunizados com efetividade e eficiecircncia

A realidade do sistema socioeducativo hoje implementado e existente em nosso paiacutes natildeo condiz em absolutamente nada em atender a finalidade proposta pelo legislador brasileiro nesse processo de (re)educaccedilatildeo socializaccedilatildeo e conscientizaccedilatildeo pelo jovem em conflito com a lei ou seja as medidas socioe-ducativas tecircm como objetivo uacutenico e exclusivo em garantir a proteccedilatildeo e possibilitar o desenvolvimento bem como a reintegraccedilatildeo do Adolescente infrator agrave sociedade e ao seio da famiacutelia

Nesse sentido o sistema socioeducativo acaba sendo influenciado (direta ou indiretamente) pela rea-lidade do sistema prisional aliada a reaccedilatildeo social do etiquetamento por diversos fatores tais como fugas rebeliotildees superlotaccedilotildees insalubridade desrespeito as condiccedilotildees miacutenimas de Dignidade da Pessoa Humana (e em desenvolvimento) e pela ineficiecircncia do caraacuteter educativo das medidas soma-do ao comportamento coercitivo imposto prejudicando ou impedindo sobremaneira o processo de ressocializaccedilatildeo

Assim a efetivaccedilatildeo de Poliacuteticas Puacuteblicas preventivas seria outro fator visando minimizar o crescimen-to de conduta infratora do menor de idade em cumprimento a previsatildeo constitucional e estabelecida no ECA atraveacutes de um processo de democratizaccedilatildeo e de ensinamento de valores como solidariedade de respeito e garantia aos Direitos Fundamentais principalmente atraveacutes da educaccedilatildeo em busca da transformaccedilatildeo social

Eacute preciso repensar e mudar

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REFEREcircNCIAS

ADORNO Seacutergio Crime puniccedilatildeo e prisotildees no Brasil um retrato sem retoques p 08 In Foro Iberoamericano Sobre Seguridad Ciudadana Violecircncia Social Y Poliacuteticas Puacuteblicas Madrid Espanha Anais jun 2006

ALEXY Robert Teoria dos Direitos Fundamentais Trad Virgilio Afonso da Silva 2 ed Satildeo Paulo Malheiros Editores 2012

BARATTA Alessandro Criminologiacutea criacutetica y criacutetica del derecho penal introduccioacuten a la sociologiacutea juriacutedico penal 1 ed Buenos Aires Siglo XXI Editores Argentina 2004

_______ Criminologiacutea y sistema penal compilacioacuten in memoriam Coleccioacuten Memoria Criminoloacutegica n 1 Montevideo-Buenos Aires Editorial B de F 2004

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_______ Conselho Nacional de Justiccedila Regras de Mandela Regras Miacutenimas das Naccedilotildees Unidas para o Tratamento de Presos Conselho Nacional de Justiccedila Departamento de Monitoramento e Fiscalizaccedilatildeo do Sistema Carceraacuterio e do Sistema de Execuccedilatildeo de Medidas Socioeducativas Conselho Nacional de Justiccedila Brasiacutelia Conselho Nacional de Justiccedila 2016

_______ Conselho Nacional do Ministeacuterio Puacuteblico Relatoacuterio da Infacircncia e Juventude ndash Resoluccedilatildeo no 672011 um olhar mais atento agraves unidades de internaccedilatildeo e semiliberdade para adolescentes Brasiacutelia Conselho Nacional do Ministeacuterio Puacuteblico Brasiacutelia CNMP 2015 Disponiacutevel em lthttpwwwcnmpmpbrportalimagesstoriesDestaquesPublicacoesUm_Olhar_mais_Atento_0207_WEB-completo-ok-1_1pdfgt Acesso em 14 dez 2016

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_______ Lei nordm 12594 de 18 de janeiro de 2012 Institui o Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo (Sinase) regulamenta a execuccedilatildeo das medidas socioeducativas destinadas a adolescente que pratique ato infracional e altera as Leis nos 8069 de 13 de julho de 1990 (Estatuto da Crianccedila e do Adolescente) 7560 de 19 de dezembro de 1986 7998 de 11 de janeiro de 1990 5537 de 21 de novembro de 1968 8315 de 23 de dezembro de 1991 8706 de 14 de setembro de 1993 os Decretos-Leis nos 4048 de 22 de janeiro de 1942 8621 de 10 de janeiro de 1946 e a Consolidaccedilatildeo das Leis do Trabalho (CLT) aprovada pelo Decreto-Lei no 5452 de 1o de maio de 1943 Brasiacutelia DF 18 jan 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwplanaltogovbrccivil_03_ato2011-20142012leil12594htmgt Acesso em 05 nov 2015

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Ano IX Nordm 17 | Julho a Dezembro | 2018

CAMPOS A et al Atlas da exclusatildeo social no Brasil dinacircmica e manifestaccedilatildeo territorial Satildeo Paulo Cortez 2003 p 51

CANOTILHO J J Gomes Direito Constitucional 6 edrev Coimbra Almedina 1995

CHAVES JUacuteNIOR Airto OLDONI Fabiano Para que(m) serve o direito penal uma anaacutelise criminoloacute-gica da seletividade dos segmentos de controle social Rio de Janeiro Lumen Juris 2014

CUNHA Rogeacuterio Sanches Manual de Direito Penal parte geral 3 ed Satildeo Paulo Juspodivm 2015

DEL ROSAL Bernardo Blasco La ldquoprivatizacioacutenrdquo de las prisiones una huida hacia la pena de privacioacuten de libertad Nuacutemero Extraordinario 12 San Sebastiaacuten Eguzkilore 1998 Disponiacutevel em lthttpwwwehueusdocuments1736829217430811+Rosalpdfgt Acesso em 05 jun 2016

Dicionaacuterio de poliacuteticas puacuteblicas Org Carmen Luacutecia Freitas de Castro Cynthia Ruacutebia Braga Gontijo Antocircnio Eduardo de Noronha Amabile Barbacena EdUEMG 2012

FALCONI Romeu Sistema presidial reinserccedilatildeo social Satildeo Paulo Iacutecone 1998

FERRAJOLI Luigi Por uma Teoria dos Direitos e dos Bens Fundamentais Trad Alexandre Salim Alfredo Copetti Neto Daniela Cademartori Hermes Zaneti Juacutenior Seacutergio Cademartori Porto Alegre Livraria do Advogado 2011 (sem tiacutetulo original no exemplar utilizado)

GONSALVES Vitor Eduardo Rios Direito Penal 16 ed Reformulada Satildeo Paulo Saraiva 2010

IBGE Uma anaacutelise das condiccedilotildees de vida da populaccedilatildeo brasileira 2015 Disponiacutevel em lthttpwwwibgegovbrhomeestatisticapopulacaocondicaodevidaindicadoresminimossinteseindicso-ciais2015gt Acesso em 03 jan 2016

JANUZZI Paulo de Martino Indicadores Sociais na Formulaccedilatildeo e Avaliaccedilatildeo de Poliacuteticas Puacuteblicas p 2 Disponiacutevel em lthttpwwwenapgovbrdownloadsec43ea4findic-curso-textopdfgt Acesso em 17 ago 2015

Jornal do Brasil CNMP aponta que 17 estados tecircm superlotaccedilatildeo de menores internados Disponiacutevel em lthttpwwwjbcombrpaisnoticias20150622cnmp-aponta-que-17-estados-tem-superlo-tacao-de-menores-internadosgt Acesso em 19 dez 2016

LEAL Ceacutesar Barros Prisatildeo Crepuacutesculo de uma era 2 ed revisada e atualizada Belo Horizonte Del Rey 2001

LUNtildeO Antonio Henrique Peacuterez Derechos Humanos estado de derecho y Constitucioacuten 3 ed Madri Teccnos 1990

MONTE Franciela Feacutelix de Carvalho et al Adolescentes autores de atos infracionais psicologia moral e legislaccedilatildeo Psicol Soc Florianoacutepolis v 23 n 1 p 125-134 Apr 2011 Disponiacutevel em lthttpwwwscielobrscielophpscript=sci_arttextamppid=S0102-71822011000100014amplng=enampnrm=isogt Acesso em 15 jan 2017

PECES-BARBA Gregorio La diacronia Del fundamento y Del concepto de los Derechos em tiempo de La historia In ____ Curso de Derechos Fundamentales teoria general Madrid Universidad Carlos III de Madrid 1995

PIOVESAN Flaacutevia Direitos humanos e o direito constitucional internacional 15 ed Satildeo Paulo Saraiva 2015

REacuteGIS Jonathan Cardoso COELHO Luciana de Carvalho Paulo Sistema prisional e a possibilidade de mudanccedila do reeducando atraveacutes dos estudos exercitando os direitos fundamentais e a cidadania XXV Congresso do Conpedi CuritibaPR 2016

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Revista Juriacutedica da Universidade do Sul de Santa Catarina

SESI Departamento Regional do Paranaacute ndash Curitiba SESIPR 2012 Relatoacuterio da Comissatildeo sobre a Medida de Desempenho Econocircmico e Progresso Social SESI Departamento Regional do Paranaacute ndash Curitiba SESIPR 2012 Traduccedilatildeo de Rapport de la Commission sur la mesure des performances eacuteco-nomiques et du progregraves social STIGLITZ Joseph E SEN Amartya FITOUSSI Jean-Paul (2009) SESI Departamento Regional do Paranaacute ndash Curitiba SESIPR 2012 p 15 Disponiacutevel em lthttpterrito-rioobservatoriofileswordpresscom201304relatc3b3rio-da-comissc3a3o-sobre-a-mensurac3a-7c3a3o-de-desempenho-econc3b4mico-e-progresso-socialpdfgt Acesso em 07 ago 2013

SILVA Maria Ozanira da Silva e Pobreza desigualdade e poliacuteticas puacuteblicas caracterizando e proble-matizando a realidade brasileira Rev Kataacutel Florianoacutepolis v 13 n 2 p 155-163 juldez 2010 p 156 Disponiacutevel em lthttpwwwscielobrpdfrkv13n202pdfgt Acesso em 29 dez 2015

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LA FRAGILIDAD DE LOS DERECHOS1

Joseacute Calvo Gonzaacutelez2

1 LA VIEJA SEGURIDAD ANTEAYER A MAacuteS DE UN SIGLO

En el reloj de la memoria europea de Stefan Zweig (Viena 1881- Petroacutepolis Brasil 1942) suenan al inicio de El mundo de ayer las horas volcadas al nostaacutelgico recuerdo del viejo mundo de la seguridad

Si busco una foacutermula praacutectica para definir la eacutepoca de antes de la Primera Guerra Mundial la eacutepoca

en que creciacute y me crie confiacuteo en haber encontrado la maacutes concisa al decir que fue la edad de oro

de la seguridad Todo en nuestra monarquiacutea austriaca casi milenaria pareciacutea asentarse sobre el

fundamento de la duracioacuten y el propio Estado pareciacutea la garantiacutea suprema de esta estabilidad Los

derechos que otorgaba a sus ciudadanos estaban garantizados por el Parlamento representacioacuten

del pueblo libremente elegida y todos los deberes estaban exactamente delimitados Nuestra

moneda la corona austriaca circulaba en relucientes piezas de oro y garantizaba asiacute su

invariabilidad Todo el mundo sabiacutea cuaacutento teniacutea o cuaacutento le correspondiacutea queacute le estaba permitido

y queacute prohibido Todo teniacutea su norma su medida y su peso determinados [] En aquel basto impero

todo ocupaba su lugar firme e inmutable y en el maacutes alto de todos estaba el anciano emperador y

si eacuteste moriacutea se sabiacutea (o se creiacutea saber) que vendriacutea otro y que nada cambiariacutea en el bien calculado

orden Nadie creiacutea en las guerras las revoluciones ni las subversiones Todo lo radical y violento

pareciacutea imposible en aquella era la de razoacuten Dicho sentimiento de seguridad era la posesioacuten maacutes

deseable de millones de personas el ideal comuacuten de vida [] Primero soacutelo los terratenientes

disfrutaban de tal privilegio pero poco a poco se fueron esforzando por obtenerlo tambieacuten las

grandes masas [hellip] Tambieacuten hubo avances en el aacutembito social antildeo tras antildeo el individuo fue

obteniendo nuevos derechos la justicia procediacutea con maacutes moderacioacuten y humanidad e incluso el

problema de los problemas la pobreza de las grandes masas dejoacute de parecer insuperable Se otorgoacute

el derecho de voto a grandes ciacuterculos cada vez maacutes amplios y con eacutel la posibilidad de defender

legalmente sus intereses socioacutelogos y catedraacuteticos rivalizaban en el afaacuten de hacer maacutes sana e

incluso maacutes feliz la vida del proletariado iquestEs de extrantildear pues que aquel siglo se deleitara con sus

propias conquistas y considerara cada deacutecada terminada como un mero peldantildeo hacia otra mejor

Se creiacutea tan poco en recaiacutedas en la barbarie -por ejemplo guerras entre los pueblos de Europa-

como en brujas y fantasmas nuestros padres estaban plenamente imbuidos de la confianza en

la fuerza infaliblemente aglutinadora de la tolerancia y la conciliacioacuten Creiacutean honradamente que

las fronteras de las divergencias entre naciones y confesiones se fusionariacutean poco a poco en un

humanismo comuacuten y que asiacute la humanidad lograriacutea la paz y la seguridad esos bienes supremos

Para los hombres de hoy que hace tiempo excluimos del vocabulario la palabra ldquoseguridadrdquo como

un fantasma nos resulta faacutecil reiacuternos de la ilusioacuten optimista de aquella generacioacuten cegada por el

idealismo para la cual el progreso teacutecnico debiacutea ir seguido necesariamente de un progreso moral igual

de veloz Nosotros que en el nuevo siglo hemos aprendido a no sorprendernos de cualquier nuevo

brote de bestialidad colectiva nosotros que todos los diacuteas esperaacutebamos una atrocidad peor que la

del diacutea anterior [hellip] hemos tenido que acostumbrarnos poco a poco a vivir sin el suelo bajo nuestros

pies sin derechos sin libertad sin seguridad Para salvaguardar nuestra propia existencia renegamos

ya hace tiempo de la religioacuten de nuestros padres de su fe en el progreso raacutepido y duradero de la

humanidad a quienes aprendimos con horror nos parece banal aquel optimismo precipitado a la vista

de una cataacutestrofe que de un solo golpe nos ha hecho retroceder mil antildeos de esfuerzos humanos [hellip]

1 Texto del Seminario impartido el 3 de marzo de 2005 en el Programa de Doctorado en Derechos Fundamentales Asignatura de Teoriacutea

juriacutedica de los Derechos Fundamentales Instituto de Derechos Humanos Bartolomeacute de Las Casasacute Universidad Carlos III de Madrid

2 Catedraacutetico de Filosofiacutea del Derecho Facultad de Derecho Universidad de Maacutelaga (Espantildea) jcalvoumaes

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Hoy cuando ya hace tiempo que la gran tempestad lo aniquiloacute sabemos a ciencia cierta que

aquel mundo de seguridad fue un castillo de naipes3

El texto que contiene casi todas sus paraacutefrasis posibles precisa de muy pocos comentarios No es difiacute-cil descubrir en eacutel un graacutefico y penetrante ejemplo de sobre queacute dos condiciones baacutesicas se suscitaba y sosteniacutea en el cuadro de una mentalidad burguesa la relacioacuten armoacutenica entre libertad y seguridad Una era la independencia econoacutemica facilitada bien por disponer de bienes patrimoniales (propiedad) o de abundancia de recursos financieros (capital) bien de coberturas o prestaciones sociales para disminuir o paliar el riesgo lo cual se obteniacutea respectivamente mediante una libertad negocial soacutelo intermediada por requerimientos legales miacutenimos y a traveacutes del desarrollo de un sistema seguros (de accidentes de enfermedad planes de jubilaciones etc como el ideado por el Canciller Bismack y que con rapidez se extendioacute a toda Europa) La otra fue psicoloacutegica y vino dada por la satisfaccioacuten de comprobar que las aspiraciones a la conservacioacuten del orden social se cumpliacutean maacutes perfectamente cuando como en la naturaleza se actuaba con la seguridad de los instintos lo natural en sociedad consistiacutea pues en evitar transiciones y cambios que pudieran perturbar la estabilidad que ocasionaran inseguridad razoacuten por la cual el orden existente del mundo debiacutea mantenerse en estado de tranquilidad para que asiacute efectiva-mente perdurara En consecuencia la inseguridad artificial podiacutea preverse y dejar de serlo y en cuanto a la natural el mundo de la libertad maacutes segura seriacutea aquel que maacutes valora la seguridad de donde la liber-tad dependiacutea de la seguridad Y sin embargo todo ese mundo de seguridad se derrumboacute igual que si se tratara de ldquoun castillo de naipesrdquo

Al cataclismo de la Gran Guerra de 1914 sumaron nuevos efectos las revisiones y correcciones (Estado asistencial como especie de reeditado ldquocontrato socialrdquo en una pujante sociedad industrial) que en la Europa de entreguerras (1918-1933) experimentoacute el Estado de Derecho liberal4 y al definitivo fracaso de eacuteste -como igualmente de aqueacutellas- en el contexto de crisis de la Repuacuteblica de Weimar5 que fue tam-bieacuten el del propio positivismo juriacutedico como emblema del Estado de Derecho formal (derecho como

3 ZWEIG Stefan El mundo de ayer Memorias de un europeo trad de J Fontcuberta y A Orzeszek El Acantilado Barcelona 2001 p

17-22 El lector podraacute hallar una uacutetil guiacutea histoacuterica donde seguir los acontecimientos de la poliacutetica europea y mundial a lo largo de la era

Bismark (1862-1890) y aproximarse al equilibrio de poder durante el periacuteodo comprendido entre 1898 y 1914 consultando las obras

de Karl Theodor HEIGEL y Firtz ENDRES Tendencias poliacuteticas en Europa durante el siglo XIX trad de M Saacutenchez Sarto Edit Labor

Barcelona 1930 (c) y Geoffrey BRUUN La Europa del siglo XIX 1815-1914 (1959) trad de F Gonzaacutelez Aramburu FCE Meacutexico 1974

(2ordf reimp) pp 194-238 Es tambieacuten lectura provechosa Carl E SCHORSKE Viena fin-de-siegravecle poliacutetica y cultura trad de I Meneacutendez

Edit Gustavo Gili Barcelona 1981 para la situacioacuten austriaca entre 1867 y 1918 En Espantildea como sentildeala Joseacute-Carlos MAINER La Edad

de Plata (1902-1931) Ensayo de interpretacioacuten de un proceso cultural Los Libros de la Frontera Barcelona 1975 p 85 la novela de

Manuel CIGES APARICIO (1873-1936) Circe y el poeta (eds Edit Mundo Latino Madrid 1926 Novelas de Manuel Ciges Aparicio ed

introd y notas de Cecilio Alonso Conselleria de Cultura Educacioacute i Ciencia de la Generalitat Valenciana Valegravencia 1986 3 t [Col Clagravessics

valencians 3-4-5] y Edit Siete Mares Madrid 2003) retrata en claves muy sencillas el mundo que conocioacute su edad dorada antes de la

conflagracioacuten europea visto desde la mirada de un poeta revolucionario en el Pariacutes de 1914

4 Harold J LASKI El liberalismo europeo (1936) trad de V Migueacutelez (1939) FCE Meacutexico 1953 (1ordf ed 4ordf reimp) sin restar la merecida

importancia a los profundos progresos que al liberalismo se deben ha sentildealado tambieacuten con claridad las causas del fracaso de la doctrina

liberal como impliacutecitas e inasequibles a todo intento de refundacioacuten ldquoEl individuo a quien el liberalismo ha tratado de proteger es aquel

que dentro de su cuadro social es siempre libre para comprar su libertad pero siempre ha sido una minoriacutea de la humanidad el nuacutemero

de los que tienen recursos para hacer esta compra Puede decirse en suma que la idea de liberalismo estaacute histoacutericamente trabada y

esto de modo ineludible con la posicioacuten de propiedad Los fines a los que sirve son siempre los fines de los hombres que se encuentran

en esa posicioacutenrdquo (pp 16-17) concluyendo que ldquosin duda la idea liberal como tal tratoacute de superar el medio en que fue engendrada Sin

duda tambieacuten la urgencia con que fue predicada como idea ayudoacute a mitigar las consecuencias cabales de la sociedad a cuya formacioacuten

contribuyoacute Pero tan pronto como el liberalismo como espiacuteritu que informa las costumbres de las instituciones tratoacute de efectuar su

transformacioacuten fundamental se halloacute con que era prisionero del fin a cuyo servicio habiacutea sido destinado Porque los hombres que lo

sirvieron no creiacutean en sus derechos como distintos a los de ese finrdquo (p 223)

5 Vid Peter GAY La cultura de Weimar (1968) trad de N Catelli Argos Vergara Barcelona 1984 y Joseacute A ESTEacuteVEZ ARAUJO La crisis

del Estado de Derecho Liberal Schmitt en Weimar Edit Ariel Barcelona 1989 Asimismo Joseph ROTH (1894-1939) El juicio de la

historia escritos 1920- 1939 Proacutel trad y notas de E Gil Bera Eds Siglo XXI Madrid 2004 en croacutenicas sobre el proceso por el asesinato

de Walter Rathenau en 1922 y en general sobre la cultura berlinesa de los antildeos 20

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ldquoformardquo en funcioacuten de la paz6 en la Teoriacutea pura del Derecho de Kelsen) sobrevino agregado el presagiable desmoronamiento del modelo de representacioacuten poliacutetica del Estado parlamentario y tras su derribo sucesivamente la emergencia de otros nuevos fenoacutemenos de legitimacioacuten en estructuras y formas de legalidad caracterizadas esta vez por el comuacuten empleo de una metodologiacutea y dialeacutectica decisionistas de iacutendole autoritaria Asiacute poco antes de producirse el estallido de la Segunda Guerra Mundial las solu-ciones a problemas vinculados en la relacioacuten Derecho y Poder al conjunto de derechos y garantiacuteas sobre Libertad y Seguridad ofreciacutean ya con claridad el panorama de un profundo debilitamiento provocado por la implantacioacuten de regiacutemenes totalitarios ndash triunfo de la revolucioacuten bolchevique (Rusia) y ascenso y apogeo de las doctrinas fascistas (Italia y Alemania)- ademaacutes de acelerado por el raacutepido incremento de las tensiones y rupturas diplomaacuteticas en las que la Paz acabariacutea siendo finalmente destruida Luego ya durante el conflicto beacutelico que tuvo al continente europeo como escenario y referencia principal de una conflagracioacuten de dimensiones planetarias tanto la amenaza al programa ilustrado inspirador del reconocimiento y proteccioacuten de derechos del hombre como la ignorancia o rechazo a los avances nacio-nales e interestatales -auacuten tiacutemidos y asistemaacuteticos- en materias de defensa de libertades civiles y poliacuteti-cas no menos que el desentendimiento transgresioacuten y desprecio al conjunto de convenciones e instru-mentos baacutesicos de la comunidad internacional (Pacto de la Sociedad de Naciones Ginebra 1919) sobre el ius in bello y el derecho a la paz7 se hizo traacutegica e incontestable realidad en una atmoacutesfera donde esa generalizada violacioacuten y absoluto abuso alentada por una ideologiacutea ndashel nazismo- de extraordinaria degradacioacuten moral y brutalidad metoacutedica esencial y hasta metafiacutesicamente deshumanizada envolvioacute el propoacutesito del aniquilar la condicioacuten humana8

2 UNA NUEVA SEGURIDAD AYER NO HACE AUacuteN EL SIGLO

La derrota militar del dominio nazi para la que fue necesaria la alianza de las principales potencias inter-nacionales generoacute tambieacuten durante los primeros antildeos de posguerra un basto compromiso de diaacutelogo multilateral y autocriacutetica del que seraacute expresioacuten el consenso moral adoptado en la Declaracioacuten Universal de Derechos del Hombre9 aprobada por la Asamblea General de Naciones Unidas el 10 de diciembre de 1948 plasmando alliacute el establecimiento de una pauta comuacuten para todas las naciones y el ideal de reali-zacioacuten del ser humano libre La etapa histoacuterica que inauguraba se subsumiacutea en una concienciacioacuten criacute-tica de la incivilidad concluida desde la introspectiva de las atrocidades practicadas en Auschwitz (se cumplen ahora 60 antildeos de la liberacioacuten de este campo de exterminio el 27 de enero de 1945) asiacute como del paulatino aunque todaviacutea muy limitado conocimiento de la represioacuten concentracionaria puesta en marcha por Stalin en Siberia En el Considerando segundo del preaacutembulo de esa Declaracioacuten se lee que en efecto ldquoel desconocimiento y menosprecio de los derechos del hombre han originado actos de bar-barie ultrajantes para la conciencia de la humanidadrdquo

6 Vid Hans KELSEN ldquoDie philosophischen Grundlagen der Naturrechtslehre und des Rechtspositivismusrdquo (1928) en Hans KLECATSKI

Reneacute MARCIC Herbert SCHAMBECK (eds) Die WienerRechtstheoretische Europa Verlag Wien-Frankfurt-Zuumlrich 1968 p 281-350

en espc p 344

7 Para un examen doctrinal de de ius ad bellum e ius in bello Alfonso RUIZ MIGUEL La Justicia de la Guerra y de la Paz CEC Madrid 1988

Vid tambieacuten Raymond ARON Paz y guerra entre las naciones trad de L Cuervo Alianza Editorial SA Madrid 1985 Sobre la profunda

resistencia germana a aceptar la implantacioacuten internacional un codex belli como lex scripta es muy recomendable lo escrito por Ramiro de

MAEZTU durante su estancia londinense y vinculacioacuten a los ciacuterculos del socialismo fabiano para Introduccioacuten (p 11-53 y en espc p 31-39)

a Arnold J TOYNBEE El terrorismo alemaacuten en Beacutelgica Narracioacuten basada en los documentos Hayman Christy amp Lilly Ltd Londres 1917

8 Hannah ARENDT Eichmann en Jerusaleacuten (1963-1965) trad de C Ribalta Edit Lumen Barcelona 1999 Karl JASPERS El problema de

la culpa (1945-1946) trad de R Gutieacuterrez Cuartango e introd de E Garzoacuten Valdeacutes Paidoacutes-ICE de la Universidad Autoacutenoma de Barcelona

Barcelona 1998 Vid tambieacuten Norbert BILBENY El idiota moral La banalidad del mal en el siglo XX Anagrama Barcelona 1993

9 Reproducida en Gregorio PECES-BARBA-Liborio HIERRO-Santiago IacuteNtildeIGUEZ DE ONZONO- Aacutengel LLAMAS Derecho positivo de los

Derechos humanos Editorial Debate Madrid 1987 p 274-280 Sobre su genealogiacutea textual y poliacutetica Antonio CASSESE Los derechos

humanos en el mundo contemporaacuteneo (1988) trad de A Pentimalli Melacrino y B Ribera de Madariaga Edit Ariel Barcelona 1991 p

31 y ss

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Revista Juriacutedica da Universidade do Sul de Santa Catarina

No obstante en absoluto se trataba de rescatar y reproducir el agotado paradigma de la vieja seguri-dad baacutesicamente organizado en procedimientos tendentes a evitar o suavizar las domeacutesticas incerti-dumbres pequentildeo-burguesas caracterizadoras del modelo de nacionalismo de Estado liberal Aquella clase de seguridad ndashtal vez la uacutenica concreta e histoacutericamente determinada que el hombre moderno alcanzoacute a conocer- fue la primera viacutectima sacrificada en el extraordinario incendio que abrasoacute todo el mundo contemporaacuteneo10 La inseguridad quedaba ya definitivamente instalada en el estaacutendar de vida de una Humanidad que para entonces pese a vivir una eacutepoca de profunda desconfianza o tal vez por lo que esa misma crisis significaba se decidiacutea sin embargo a proclamar su fe (ldquocomo la aspiracioacuten maacutes ele-vada del hombrerdquo) en ldquoel advenimiento de un mundo en el que los seres humanos liberados del temor y de la miseria disfruten de la libertad de palabra y de la libertad de concienciardquo En adelante los dere-chos humanos no actuariacutean para garantizar la seguridad que para siempre dejoacute de existir e incluso res-pecto de la cual se era en gran medida consciente de que tampoco la sola recuperacioacuten de los restos de la herencia ilustrada (de tradicioacuten individualista) podriacutea devolver a la existencia11 sino para preservar la Paz que soacutelo a tan alto precio pudo ser recuperada Nunca maacutes o mejor nunca jamaacutes el ldquoideal de ser humano librerdquo podriacutea realizarse sin permanecer liberados del temor (y de la miseria) repetiraacuten tam-bieacuten con insistencia el Pacto Internacional de Derechos Civiles y Poliacuteticos (New York 16 de diciembre de 1966) [Reconociendo segundo] y el Pacto Internacional de Derechos Econoacutemicos Sociales y Culturales (New York 16 de diciembre de 1966) [Reconociendo segundo]12 La libertad humana uacutenicamente seriacutea posible velando y protegiendo el en todo ex novo estatus juriacutedico de la emancipacioacuten del miedo (y del mandato legal de desarrollo econoacutemico) obtenido a traveacutes de la Democracia y la Paz desde sus condicionan-te histoacutericos inmediatos la suspensioacuten de la Libertad en los fascismos y el horror de la reciente Guerra

3 LA SEGURIDAD DE HOY AHORA YA EN ESTE SIGLO

Aquella concepcioacuten formada en el juicio valorativo praacutectico sobre la relevancia y responsabilidad del miedo y fuere que en su construccioacuten teoacuterica basilar (Reconociendo sobre innata dignidad del ser huma-no) se inclinara hacia la fundamentacioacuten eacutetica neokantiana del derecho justo13 lo hiciera a favor de reco-brar la antigua idea de derecho natural14 o a diferencia de cualquiera de ambas maacutes bien se mostrara partidaria de reivindicar antes sobre todo su vertiente juriacutedica de positivacioacuten con base en el valor de la dignidad de la persona15 es lo cierto que abrioacute un nuevo rumbo en la historia de los Derechos humanos

Esa idea de los Derechos humanos iba a producir de hecho una fundamental transformacioacuten en el curso de su historia Estrenaba capiacutetulo al establecer para ellos la perspectiva no de salvaguarda de la Seguridad sino de conviccioacuten en la esperanza preservativa de la Paz y precisamente porque la radical experiencia del miedo y su traacutegica catarsis no representaban un principio abstracto planteado por fuera de las condiciones histoacutericas como un golpe del Destino sino una amenaza que efectivamente ya materializoacute sobre la realidad por decisiones y responsabilidades imputables El Holocausto pues

10 Vid Carl AMERY Auschwitz iquestComienza el siglo XXI Hitler como precursor trad de C Garciacutea Ohlrich TurnerFCE Madrid 2002

11 Asiacute la transaccioacuten comunitarista del art 291 ldquoToda persona tiene deberes respecto a la comunidad puesto que soacutelo en ella puede

desarrollar libre y plenamente su personalidadrdquo

12 Reproducidos en Derecho positivo de los Derechos humanos cit p 361-378 379-388

13 Vid Gustav RADBRUCH ldquoLeyes que no son derecho y Derecho por encima de las leyesrdquo (1946) en G RADBRUCH E SCHMIDT H

WENZEL Derecho injusto y Derecho nulo Edit Aguilar Madrid 1971 p 1-21

14 Vid Isaiah BERLIN ldquoLa unidad europea y sus vicisitudesrdquo (1959) en El fuste torcido de la Humanidad Capiacutetulos de historia de las ideas

ed a cargo de H Hardy (1990) trad de JM Aacutelvarez Flores y proacutel de S Giner Eds Peniacutensula Barcelona 1992 en espc p 190-194 Recogido

tambieacuten en Isaiah BERLIN Antologiacutea de ensayos ed e introd de Joaquiacuten Abellaacuten Edit Espasa Calpe SA Madrid 1995 p 415-451

15 Vid Gregorio PECES-BARBA El fundamento de los derechos humanos Edit Debate Madrid 1989 y La dignidad de la persona desde

la Filosofiacutea del Derecho Dykinson Madrid 2003

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habiacutea demostrado ldquotanto la necesidad prudencial de los derechos humanos como su intriacutenseca fragi-lidadrdquo16 Los Derechos humanos se edificaban ahora desde el testimonio de la inseguridad (del miedo como temor y espanto por lo ocurrido en el pasado o como medrosiacutea en un porvenir apocaliacuteptico)17 maacutes que a partir de la seria conviccioacuten y hasta confiable expectativa de su eliminacioacuten inmediata

Es asiacute me parece como se instaura un compromiso histoacuterico antes que nada y un equilibrio de caraacutec-ter loacutegico sobre todo entre Libertad y Seguridad (frente al miedo) desde la Paz (frente a la guerra) como reduccioacuten auteacutentica y efectiva del riesgo O lo que es igual una posicioacuten estrateacutegica de alerta (preservar la Paz) versus una medida taacutectica (garantizar la Seguridad) claramente diferenciables entre siacute pues mientras la primera conduce a mitigar los efectos del riesgo desde su aceptabilidad la segunda soacutelo puede intensificarlo asiacute como tambieacuten porque la primera es cuantificable (control y evitabilidad de consecuencias negativas del riesgo potencial latente) y no lo es la segunda que incapaz de minimizarlo se expone con la amenaza auacuten siquiera conminatoria a alentar y desatar en una escalada creciente y no dominable su activacioacuten su virulencia18

Pero hoy en la actualidad ni ese compromiso ni ese equilibrio se ha mantenido incumplido el uno y el otro roto Y la fragilidad de los derechos que nuestro desideratum habiacutea convertido en triunfos ha que-dado en entredicho y a la vista aunque tal evidencia responda a patrones distintos de aquellos que presi-dieron su origen de posguerra iquestQueacute ha sucedido

Los diacuteas 11-S 2001 (New York World Trade Center Washington Sede del Pentaacutegono) y 11-M 2004 (Madrid Estacioacuten de Atocha) ofrecieron a nuestro mundo contemporaacuteneo las imaacutegenes del abismo Las contemplamos en una visioacuten tan sobresaltada y proacutexima tan pavorosa como imposible de sobrelle-var Era inuacutetil tratar de sobreponerse a la inmediatez de aquel horror Y en su desconcierto las socie-dades modernas (occidentales democraacuteticas y post-industriales) descubrieron de pronto concretada en la retina de cada uno de nosotros la colosal estatura de una amenaza imprevista para la que no se hallaban prestas el ataque del terrorismo transnacional global En esos instantes gran parte de la pre-supuestaria fiabilidad fundada en la fragilidad preservativa de la ldquosociedad del riesgordquo y en verdad vale aquiacute emplear tal expresioacuten (Risikogesellschaft)19 sufrioacute un interno y sustantivo removimiento Entre los efectos de esa honda conmocioacuten a poco se advertiriacutea uno capaz de afectar a elementos doctrinales todaviacutea vigentes en aquel momento sobre la comprensioacuten de los Derechos humanos en sus plantea-mientos sobre Paz Libertad y Seguridad El epicentro del seiacutesmo se localizaba en la mutacioacuten que la viacutevida y muy sensible experiencia de los acontecimientos produjo sobre la nocioacuten de ldquoriesgordquo La extre-mada cercaniacutea con que los sucesos del 11-S (como despueacutes asimismo en el 11-M) fue mediaacuteticamente

16 Michael IGNATIEFF Los derechos humanos como poliacutetica e idolatriacutea introd de A Gutmann coment de K A Appiah et al trad de F

Beltraacuten Adell Eds Paidoacutes Ibeacuterica SA Barcelona 2003 p 100

17 Aun sin las precisas matizaciones que no es caso desarrollar aquiacute con medrosiacutea del porvenir apocaliacuteptico aludo al intensiacutesimo y

disuasorio miedo sentido durante los antildeos de la ldquoguerra friacuteardquo ante la total destruccioacuten del geacutenero humano en un holocausto mundial

resultado del empleo de armas nucleares

18 En el tercero de los artiacuteculos preliminares para la paz perpetua entre los Estados ya sentildealaba Kant que los ejeacutercitos permanentes

(miles perpetuus) suponiacutean ldquouna amenaza de guerra para otros Estados con su disposicioacuten a aparecer siempre preparados para ella Estos

Estados se estimulan mutuamente a superarse dentro de un conjunto que aumenta sin cesar y al resultar finalmente maacutes opresiva la paz

que una guerra corta se convierten ellos mismos en causa de guerras ofensivasrdquo Vid Inmanuel KANT La paz perpetua (1795) trad de J

Abellaacuten Present de A Truyol y Serra Edit Tecnos Madrid 1985 p 7

19 Vid para un examen de la idea de ldquosociedad del riesgordquo diversos trabajos de Ulrich BECK como Risikogesellschaft Auf dem Weg in

eine andere Moderne Suhrkamp Frankfurt 1986 y en espc Gegengifte Die organisierte Unverantwortlichkeit Suhrkamp Frankfurt

1988 y Die Erfindung des Politischen Zu einer Theorie reflexiver Modernisierung Suhrkamp Frankfurt 1993 de Anthony GIDDENS

Consecuencias de la modernidad trad de A Lizoacuten Ramoacuten Alianza Editorial SA Madrid 1993 y Modernidad e identidad del yo El yo y

la sociedad en la eacutepoca contemporaacutenea trad de J L Gil Aristu Eds Peniacutensula Barcelona 1995 Asimismo Niklas LUHMANN desde su

enfoque sisteacutemico Soziologie des Risikos De Gruyter Berlin 1991 Sobre las respectivas posiciones puede consultarse Josetxo BERIAIN

RAZQUIN (ed) Las consecuencias perversas de la modernidad modernidad contingencia y riesgo trad de C Saacutenchez Capdequi

Anthropos Barcelona 1996 Sobre la penetracioacuten e influencia del concepto ldquosociedad del riesgordquo en la doctrina penal Carlos PEacuteREZ DEL

VALLE ldquoSociedad de riesgos y reforma penalrdquo en Poder Judicial 43-44 1996 (II) p 61-84

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ofrecida llegoacute hasta su liacutemite maacutes extra-simboacutelico como una ventana ldquoen directordquo a lo que no pareciacutea suceder donde teniacutea lugar20 determinando que el modo de percepcioacuten y entendimiento del ldquoriesgordquo cambiase a extraordinaria velocidad

La situacioacuten de ldquoriesgordquo (temor a la eventual repeticioacuten de ldquoactos de barbarie ultrajantes para la concien-cia de la humanidadrdquo) trastocoacute de contingente en inminente esto es en ldquopeligrordquo21

La posicioacuten estrateacutegica de alerta (preservar la Paz) habiacutea funcionado mal habiacutea fallado y asiacute se daba a ver per se ante los ojos del mundo entero Ya con todas las alarmas disparadas ya verdaderamente en ldquoestado de alarmardquo en paacutenico la uacutenica medida taacutectica al comienzo sobre todo prioritaria y desde lue-go del todo priorizada estriboacute en ldquogarantizar la Seguridadrdquo La ldquosociedad del riesgordquo pasoacute a ser operati-vamente ldquosociedad del peligrordquo (Gefahrgesellschaft) lo que en su urgencia y a la postre haciacutea admisible optar como respuesta por maximalizar el uso de la fuerza en defensa por suspender e interrumpir la Paz por la intervencioacuten ldquopreventivardquo por la Guerra en definitiva

En ello la consecuencia para la significancia juriacutedica de los Derechos humanos ha sido que de la fragili-dad por riesgo se ha venido a parar en su vulnerabilidad por peligro En otras palabras la Seguridad se ha convertido en el agujero negro de los derechos del Derecho incluso22 (tambieacuten como certeza y previsibi-lidad) Y es asiacute en esos teacuterminos que ldquogarantizar la Seguridadrdquo comporte igualmente un signo inconfun-dible de contramodernidad para con el respeto de los Derechos humanos y de retraccioacuten del desarrollo de nuestra historia y cultura juriacutedicas

4 LOS DERECHOS HUMANOS COMO ldquoDANtildeOS COLATERALESrdquo DE LA SEGURIDAD

Es a menudo complicado no seducirnos por la fantasiacutea de imaginarnos en una situacioacuten que semejariacutea la de la noche en que habieacutendonos acostado al suentildeo de la razoacuten amanecieacuteramos la mantildeana siguiente en la vigilia de la voluntad Que confiando compartir lecho con los postulados racionales y universal-mente vaacutelidos de Kant nos descubrieacutesemos entre Hobbes y Marx de un lado ldquoel estado de naturalezardquo al otro ldquola claserdquo

Ciertamente como escribe Muntildeoz Molina23 ldquolas libertades se dan faacutecilmente por supuestas pero no hay nada maacutes fraacutegil que la democracia entre otras cosas porque no tiene nada de natural Lo natural es el abuso de los fuertes sobre los deacutebiles la adhesioacuten a lo maacutes cercano y la hostilidad a lo extranjero o lo des-conocido el perjuicio y no la curiosidad el impulso y no la razoacuten Es necesario recordar continuamente lo que ha costado ganar lo que tenemos y lo reducido que es en el mundo el espacio de las democracias y del imperio de la ley para darnos cuenta del valor que tiene y de lo faacutecil que seriacutea perderlordquo Pues bien en esta percepcioacuten se contienen dos apreciaciones tan perfectamente suscribibles como diferencia-bles que no obstante exacerbadas e in distinguidas entre siacute conducen a error

20 Antonio MUNtildeOZ MOLINA Ventanas de Manhattan Edit Seix Barral S A Barcelona 2004 p 76-80

21 Creo modestamente que mi formulacioacuten terminoloacutegica aventaja y mejora otras habitualmente empleadas V gr Pierre HASSNER ldquoLa

signification du 11 septembre Divagations politico- philosophiques sur lrsquoeacuteveacutenemetrdquo en Esprit 11 2002 p 153-169 cuando al sostener

que la poliacutetica moderna tiene como proyecto sustituir por pasiones serenas y friacuteas las pasiones violentas y los intereses apasionados

sentildeala que si el siglo XX puso de manifiesto los liacutemites de esta empresa el XXI nace con un nuevo deacuteficit el del terrorismo inspirado por el

fanatismo religioso y el contraterrorismo maniqueo inspirado por el ldquomiedordquo A mi modo de ver la uacutenica conclusioacuten relevante de este uso

de la expresioacuten seriacutea en realidad metalinguumliacutestica mostrando al miedo sobre todo como una infraideologiacutea

22 Vid Miguel CARMONA RUANO ldquoEl impacto juriacutedico del 11 de septiembrerdquo en Jueces para la democracia 45 noviembre2002 p 81-

91 ldquolos atentados no soacutelo produjeron la demolicioacuten brutal de edificios simboacutelicos sino que las Torres Gemelas pueden estar arrastrando

en su caiacuteda principios centrales de nuestra cultura juriacutedicardquo (p 81) Asimismo Mary ROBINSON ldquoLos derechos humanos ensombrecidos

por el 11-Srdquo en diario El Paiacutes 4072002

23 Antonio MUNtildeOZ MOLINA ldquoCiudadaniacutea Culturas Libertadesrdquo en Extranjeros y Derecho penal Cuadernos de Derecho Judicial IV

2003 CGPJ Madrid 2004 p 75-76

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La experiencia desde mediados del siglo XX subraya en realidad la insuficiencia y el rechazo de Hobbes como de Marx aunque asimismo tambieacuten cuestiona seriamente una inmoderada actitud triunfalista respecto de determinados presupuestos nunca o al menos no lo bastante demostrados Esa etapa de la centuria anterior a eacutesta en que vivimos demuestra con dificultad -y maacutes bien prueba lo contrario- el axioma de que bien vale la pena perder libertad y democracia para ganar seguridad Es frecuente en efecto que resultemos atraiacutedos por esa sugestioacuten intelectual Pero la impresioacuten que ella nos brinda-ra seriacutea al final falsa pues en definitiva el devenir de la historia del mundo contemporaacuteneo entre los siglos XIX y XX y de eacuteste al XXI no vino a modificar ni el curso de la precedente ni tampoco otro maacutes antiguo24 Quienes trataran de convencer o persuadir acerca de que no fue asiacute estariacutean falseando la Historia engantildeando De siempre y a lo largo de la Historia la libertad y la democracia suscitaron recelo y desconfianza Con todo nada en lo anterior impide reconocer que quizaacutes hayamos olvidado demasia-do pronto y faacutecilmente los importantes sacrificios es decir desatendido al valor de las renuncias que el arribar a la modernidad nos ha llevado y exigido En tal sentido lo que siacute parece haber sucedido casi como de un diacutea para otro y como casi de la noche a la mantildeana es un cambio del tipo de fragilidad que advertiacutea e informaba sobre el valor de los Derechos humanos Eacutestos por valiosos eran fraacutegiles y tam-bieacuten en esa fragilidad residiacutea su valor La fragilidad de los derechos que en el mundo contemporaacuteneo de la era posterior a la II Guerra Mundial tomaba su circunstancia precisamente de anunciar con bastante fiabilidad el temible riesgo a que su deterioro y erosioacuten conduciacutea ha visto trastornada su naturaleza con la alteracioacuten de su original imagen de salvaguarda frente al fascismo y de freno contra la guerra mediante una variacioacuten donde el ideal de libertad se proclama en el antiterrorismo y la preservacioacuten de la Paz en la garantiacutea de Seguridad

Esa mudanza implica sin duda una aguda transfiguracioacuten una metamorfosis en sentido etimoloacutegico o sea un maacutes allaacute de la figura o aspecto por tanto donde cualquier parecido con el estado inicial se ha desvanecido Y fraacutegil se predica desde ahora de lo enteco caduco perecedero como endebles o sin pujanza transitorios o pasajeros precarios o inestables comenzariacutean a ser tambieacuten desde ahora sin tiempo de descuento los derechos Los Derechos humanos habriacutean perdido su condicioacuten de infungi-bles en el espacio y en el tiempo En la nueva situacioacuten ocupariacutean una posicioacuten destinada a padecer y soportar ldquodantildeos colateralesrdquo

Desde luego es claro que la conciencia de los derechos en su papel transfronterizo frente a la ghettoi-zacioacuten de la universalidad25 ha registrado una mayor y maacutes evidente tendencia al adelgazamiento y la clausura en especial entre los pueblos y gobiernos del mundo acostumbrados a vivir sin pensar en el terrorismo o sentir el temor a su violencia de un modo en todo distinto del actual26 Normalmente esas poblaciones eran tambieacuten las mismas que reaccionaban con la fobia hacia lo extranjero o diferente y se haciacutean representar por sistemas e instituciones que exhibiacutean una continua exaltacioacuten del nacionalismo de Estado Por esa razoacuten ha sido en ellas que asiacute ya apuntaban una metamorfosis del miedo27 donde mayormente la idea de peligro estaacute arraigando o ya lo ha hecho Alliacute es tambieacuten donde maacutes se acentuacutea la restriccioacuten de las libertades y el retroceso en la igualdad

Ademaacutes de manera particular y palpable el aprecio por la legitimidad de los derechos -por la del Derecho- todaviacutea se compromete maacutes de fractura y acaba dantildeado cuando una vez reformulados en

24 Jean Jacques ROUSSEAU Contrato Social (1762) trad de M Armintildeo Alianza Editorial SA Madrid 1991 (8ordf reimp) cap I p 10 ldquoEl

hombre ha nacido libre y por doquier estaacute encadenadordquo

25 Javier DE LUCAS Derechos humanos y xenofobia frente a una sociedad plural Eds Temas de Hoy SA Madrid 1994 y Joseacute CALVO

GONZAacuteLEZ ldquoGhettoizacioacuten de la Universalidad y futuro de los Derechos Humanosrdquo en Derechos y Libertades 51995 p 405-412 Vid

tambieacuten Javier DE LUCAS Europa iquestConvivir con la diferencia Racismo Nacionalismo y Derechos de las minoriacuteas (1992) Edit Tecnos

Madrid 1994 y Puertas que se cierran Europa como fortaleza Icariacutea Barcelona 1996

26 Vid Ignacio RAMONET MIacuteGUEZ Guerras Del siglo XXI Nuevos miedos nuevas amenazas Edit Mondadori Barcelona 2003

27 Vid Roberto ESCOBAR Ironia e paura del quotidiano Edizioni Unicopli Milano 1989 y Metamorfosi de la paura Il Mulino Bologna

1997

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garantiacutea de la Seguridad sirven instrumentalmente a la oportunidad vindicativa La venganza es la fuerza que revoca la distancia entre la justicia y la injusticia Llegando a ese punto el creciente deseo y clamor de venganza impide discutir con serenidad y ser oiacutedo al proponer posibles explicaciones sobre los moacuteviles y coordenadas del terrorismo sea que se concreten en el fracaso del capitalismo de merca-do (o fundamentalismo de Mercado)28 para tratar a los pueblos del Tercer Mundo con justicia (liberarlos de la miseria) e incluirlos en el futuro global o se tracen como brutal respuesta al materialismo laico y la agresiva macdonalizacioacuten de las sociedades tradicionales29

Sin embargo hoy pasados cinco antildeos desde el final del segundo milenio deberiacuteamos discernir con mayor claridad el sentido y valor del fin del viejo mundo de la seguridad y comprender mejor el del mundo que hasta ayer conocimos El contundente paso de uno a otro milenio ha producido el pliegue de una regresioacuten poliacutetica y juriacutedica que demanda por encima incluso de las valientes condenas morales que no desviacutean la mirada de los actos injustos remediar el cuarteamiento y grietas abiertas durante el siglo XX en el Estado constitucional de Derecho30 y detener su proceso de empeoramiento y degradacioacuten

Por tanto uacutenicamente la decisioacuten de acometer en serio una tarea de compostura y consolidacioacuten haraacute auacuten posible continuar construyendo en firme sobre los logros en derechos de la era posterior a la II Guerra Mundial evitando exponer la fragilidad que presidioacute su epifaniacutea contemporaacutenea y que en el escenario histoacuterico del presente se reclama como su principal robustez a una banalizacioacuten de su significancia

Tal resolucioacuten si es sincera exige necesariamente comenzar reparando el maacutes grave resquebrajamien-to el de la regla procesal garantista que asumida en la praacutectica totalidad de los ordenamientos juriacutedi-cos internos fisura sin embargo en el marco de la legalidad interestatal toda persona tiene derecho a ldquoun tribunal independiente e imparcial [] para el examen de cualquier acusacioacuten contra ella en mate-ria penalrdquo (DUDH art 10)31 En la nueva sociedad del peligro terrorista se lo vulnera al permitir que los ofendidos por una conducta antijuriacutedica las viacutectimas de los atentados ldquoadopten simultaacuteneamente el papel de acusador juez y ejecutorrdquo32 El intento por afianzar la universalidad de esa garantiacutea que en efec-to se ha mostrado muy complejo y problemaacutetico en la viacutea diplomaacutetica mientras el modelo que articula la relacioacuten y conducta entre las naciones todaviacutea opera con una foacutermula comprimida y privilegiada de la preservacioacuten de la Paz mundial -el derecho de veto a disposicioacuten de los Estados miembros perma-nentes del Consejo de Seguridad de Naciones Unidas- solo podraacute prosperar a traveacutes de una instancia juriacutedica supranacional la Corte Penal Internacional33 que a razoacuten de la universabilidad de su jurisdic-cioacuten actuando como juez natural persiga y castigue eficazmente la barbarie de los criacutemenes contra la Humanidad pero igualmente patrocine y proteja la paz internacional frente a la inseguridad introdu-cida por un ejercicio desconcentrado de la seguridad o la privatizacioacuten de la agenda de seguridad global por alguacuten grupo de paiacuteses Desde luego como he indicado de nada sirve tratar de ocultar que el vis-lumbre de ese horizonte aparece a una distancia auacuten demasiado lejana del punto a partir del cual hoy

28 Vid Joseph E STIGLITZ Malestar de la globalizacioacuten Taurus Madrid 2002

29 Vid Noam CHOMSKY 11092001 trad de C Aguilar RBA Libros SA Barcelona 2001

30 Joseacute MARTIacuteNEZ DE PISOacuteN Tolerancia y derechos fundamentales en las sociedades multiculturales Edit Tecnos Madrid 2001 p 206

31 Asimismo art 141 del Pacto Internacional de Derechos Civiles y Poliacuteticos

32 Ulrich BECK Sobre el terrorismo y la guerra (2002) trad de R S Carboacute EdsPaidoacutes Ibeacuterica S A Barcelona 2003 p 35 Vid tambieacuten

David HELD ldquoGlobalizacioacuten el peligro y la respuestardquo en diaro El Paiacutes 4072002 ldquoEl atentado terrorista del 11-S contra las Torres

Gemelas y el Pentaacutegono fue un momento definitivo para la historia de las generaciones actuales En respuesta EEUU y sus aliados maacutes

importantes podriacutean haber decidido que la forma maacutes importante y eficaz de detener el torrente de terrorismo global seriacutea reforzar la

legislacioacuten internacional y ampliar las funciones de las instituciones multilaterales Podriacutean haber decidido que era importante que ninguacuten

poder o grupo pudiera actuar por siacute solo como juez jurado y verdugordquo

33 Juan Antonio CARRILLO SALCEDO (Coord) La criminalizacioacuten de la barbarie la Corte Internacional Penal CGPJ Madrid 2000

Isabel LIROLA DELGADO y Magdalena M MARTIacuteN MARTIacuteNEZ La Corte Penal Internacional Justicia versus Impunidad Edit Ariel

Barcelona 2001 y Aacutengel GALGO PECO (Dir) Derecho penal supranacional y cooperacioacuten juriacutedica internacional (Cuadernos de Derecho

Judicial XIII-2003) CGPJ Madrid 2004

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se mueve la poliacutetica internacional de las naciones maacutes poderosas del planeta y que para imprimir una variacioacuten en el curso de esa direccioacuten seriacutea preciso comprometer de hecho pero sobre todo de Derecho justo la participacioacuten de los mismos gobiernos que con maacutes fervor lideran la resistencia a que ese dife-rente sesgo tenga ocasioacuten a producirse Esta apreciacioacuten de la realidad sin embargo no debe hacernos reducir cualquiera imaginables conclusiones a la constatacioacuten de lo que nos encontramos ante lo que vulgarmente se conoce como un problema de tipo ldquocallejoacuten sin salidardquo sin solucioacuten posible sino servir de sentildeal de hacia doacutende no debemos continuar la marcha Es por eso lo maacutes inquietante comprobar que desde una oacuteptica de alcance maacutes regional tampoco el panorama lleva alliacute camino de mejorar y que el espeso nublado que se interpone a la visioacuten en profundidad sigue extendiendo su oscuridad antes que disiparse V gr especificaciones del texto de la Constitucioacuten Europea que para adelantarse a la amenaza terrorista consienten emprender acciones preventivas34

Al propio tiempo ya en niveles de actuacioacuten circunscritos a lo nacional deberiacutea procederse tambieacuten a subsanar y restablecer es decir a restaurar y reponer el sello de origen y marca maacutes contrastada de la fragilidad de los derechos y garantiacuteas en cuanto ldquoley del maacutes deacutebilrdquo35 Seraacute entonces imprescindible lo es ya a virtud del cariz que presentan rehacer las poliacuteticas regionales de seguridad y de seguridad domeacutes-tica en no pocos Estados donde se auspicia y practica una ideologiacutea juriacutedico-poliacutetica de la seguridad consistente en resguardar a sus nacionales de lo presentido (asimismo como sentimiento anticipa-do) y expuesto como el peligro por cuanto enemigo del extrantildeo a la comunidad La idea de ese enemigo (enemicus) recoge del derecho romano arcaico auacuten en eacutepoca maacutes primitiva que la de las XII Tablas lo presentando en su determinacioacuten objetiva como la del que perteneciendo a una misma familia de la que desertaba o a la que traiciona habiacutea dado muerte al padre a la madre o a algunos de los parientes dentro del cuarto grado y asiacute tambieacuten el modo organizar la funcioacuten persecutoria y represora instru-mentada por entonces a traveacutes de la continuacioacuten del rastro trastiberum (maacutes allaacute del riacuteo Tiacuteber como frontera del espacio de identidad comunitario de las familias) y el instituto de la vis privata (resarcimien-to vengativo) El Derecho en nuestros diacuteas aprovecha de ese conjunto de rasgos si bien redibujaacutendolos ahora reviste con la categoriacutea de enemigo al ajeno extrantildeo o extranjero ahora anticipa la tutela a su accioacuten antijuriacutedica que ademaacutes se alegoriza socio-cultural y poliacuteticamente en el peligro de dar muerte a la patria (Estado nacional) matria (organizacioacuten regional) o alianza de sangre (allegados consanguiacute-neos de parentesco maacutes proacuteximo semejantes a nosotros porque les alcanza el ldquoaire de familiardquo) ahora amuralla (res sancte) el recinto de la identidad comuacuten (pomerium) controlando el acceso exterior desde puertas (fores la puerta vista desde el que estaacute dentro de la casa domi v gr foris o foranus versus domes-ticis domesticum) por las que filtra su entrada (cierra el paso y deja fuera) con base en marcadores antro-poloacutegicos (raza [blanca] religioacuten [cristiana] civilizacioacuten [occidental]) o a partir de la procedencia geograacute-fica (continente [europeo Primer Mundo]) a fin de contingentar (porque sin duda se piensa en clave de mercanciacuteas y servicios) la produccioacuten y desarrollo econoacutemico-industrial interior ahora finalmente ya monopolizado el uso de la fuerza por los poderes y oacuterganos del Estado es el propio sistema juriacutedico quien declara y ejecuta la respuesta de aversioacuten hostilidad y enemiga

El Derecho es de esta manera real y verdadero responsable de producir una rarefaccioacuten de la atmoacutesfera de garantiacuteas procesales y alimentar un estado de expansioacuten punitiva habiendo elaborado para ello una construccioacuten dogmaacutetica que va maacutes allaacute del ldquoderecho penal de la puesta en riesgordquo formulada ya como

34 Tratado por el que se establece una Constitucioacuten para Europa parte primera tiacutetulo V capiacutetulo III art I-43 a) establece en matera de

regulacioacuten particular relativa al espacio comuacuten de libertad seguridad y justicia como claacuteusula de solidaridad la movilizacioacuten por la Unioacuten

de ldquolos instrumentos de que disponga incluidos los medios militares puestos a su disposicioacuten por los Estados para prevenir la amenaza

terrorista en el territorio de los Estados miembrosrdquo Con la diccioacuten empleada no se aparta del programa operativo a una intervencioacuten

militar preventive

35 Luigi FERRAJOLI Derechos y garantiacuteas La ley del maacutes deacutebil (1994 y 1994) trad de P Andreacutes Ibaacutentildeez y A Greppi con Proacutel de P Andreacutes

Ibaacutentildeez Edit Trotta Madrid 1999

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ldquoderecho penal del enemigordquo36 y asimismo agente directo y eficaz so pretexto de regulacioacuten del fenoacute-meno inmigratorio37 en disponer mecanismos para la demonizadora segregacioacuten espacial y social de determinados colectivos En una situacioacuten de menoscabo como eacutesta pienso que no basta ya tan siquiera con reconstruir el Estado constitucional de Derecho Es faacutecil constatar que el cuarteamiento es en este siglo XXI una hendidura demasiado profunda que hoy las grietas estaacuten hacieacutendose auteacutenticas quebra-duras Es por eso que la precisa y necesaria accioacuten frente a la progresiva agravacioacuten de esos detrimentos tiene que decidirse a ir maacutes allaacute no limitaacutendose pues soacutelo a sanear aquello que al modelo de la demo-cracia constitucional y la idea de constitucionalismo les impide recuperar su primitiva fisonomiacutea sino procurar una rehabilitacioacuten que los revalorice Y por eso tambieacuten creo que mientras no sea definitiva-mente tarde esto es mejor antes que despueacutes habriacuteamos de asumir que tal labor conlleva reemplazar entendido como resituar algunos de nuestros criterios acerca de ellos y al menos dos

Uno seriacutea a mi entender siempre buscando que ldquolos derechosrdquo resistan en la funcioacuten de fundamen-talidad de autoridad38 que en el sistema juriacutedico les cumple desarrollar ir a la readquisicioacuten del lugar que a la soberaniacutea popular incumbe como criterio de sentido reconstituyente para la democracia cons-titucional39 El otro ir en busca de alguacuten nuevo criterio en el que solventar coacutemo remover los liacutemites de pertenencia de la ciudadaniacutea a la nacionalidad coacutemo trasladar dentro es decir de queacute modo incluir a quienes hoy permanecen a las puertas de ldquolos derechosrdquo y excluidos de sus garantiacuteas porque al no alcanzarles la condicioacuten de nacionales tampoco disponen de los privilegios que a eacutestos les corresponden en el reconocimiento de la universalidad aun cuando como tal eacutesta fuera proclamada por encima cual-quier cierre poliacutetico-espacial40 La solucioacuten quizaacutes consista en ensanchar el aacutembito globalizar ldquocos-mopolitizarrdquo el espacio constitucional hasta identificarlo con una ciudadaniacutea universal De lo que sin embargo no cabe duda es que hasta ahora el mero trasvase inverso de las convenciones internaciona-les carentes de garantiacuteas a los ordenamientos constitucionales no ha dado el resultado apetecible o no desde luego tan igual para todos y suficientemente universalizado como hubiera sido de desear como fue lo deseado Ello en uno u otro caso deberiacutea ponernos de manifiesto la conveniencia de refundar el constitucionalismo sobre bases diferentes a las actuales

36 Vid G PORTILLA CONTRERAS ldquoEL derecho penal del enemigordquo en Mientras tanto 83 2002 p 78 y ss y Guumlnther JAKOBS-Manuel

CANCIO MELIAacute Derecho penal del enemigo Civitas Eds SL Madrid 2003 Esta dogmaacutetica que sostiene la poliacutetica criminal y modelo de

intervencioacuten penal concuerda asimismo en el giro experimentado de los antildeos 80-90 al presente en el pensamiento criminoloacutegico donde

se pasa de una posicioacuten dominante donde el delito aparece como producto de los oacuterganos de control social a la actual en que se lo muestra

fruto de la voluntad delincuente

37 Javier DE LUCAS ldquoInmigrantes extrantildeos a la comunidad enemigos de ida y vuelta en la respuesta del Derecho a la inmigracioacutenrdquo en

Sociologia del Diritto 2 2004 p 23-34 Vid tambieacuten Carlota SOLEacute Sonia PARELLA Amando ALARCOacuteN Valeria BERGALLI y Francesc

GIBERT ldquoEl impacto de la inmigracioacuten en la sociedad receptora El caso del sur de Europardquo en Revista Espantildeola de Investigaciones

Socioloacutegicas 90 abril-junio 2000 p 131-158

38 Gianluigi PALOMBELLA Lacuteautoritagrave dei diritti I diritti fondamentali tra istituzioni e norme Editori Laterza Roma-Bari 2002

39 Vid Gianluigi PALOMBELLA Constitucioacuten y Soberaniacutea El sentido de la democracia constitucional (1997) trad e introd (ldquoDe la

nostalgia civil la soberaniacutea popularrdquo p XIII-XXIV) de J Calvo Gonzaacutelez Edit Comares Granada 2000 ldquoSi queremos mantener activa la

fuerza de nuestras democracias constitucionales debemos reconocer el punto en que las constituciones se ligan a las democracias y en el

que ante ellas se detienen en el que la soberaniacutea popular se liga a las constituciones y en el que ante ellas se detienerdquo (p 140)

40 Luigi FERRAJOLI Derechos y garantiacuteas La ley del maacutes deacutebil cit ldquoTomar en serio los derechos significa hoy tener el valor de desvincularlos

de la ciudadaniacutea como ldquopertenenciardquo (a una comunidad estatal determinada) y de su caraacutecter estatal [hellip] Ello significa admitir de forma

realista que no existe a largo plazo maacutes alternativa a las guerras y el terrorismo que la efectiva universalizacioacuten de aqueacutellos siendo cada

vez maacutes actual e ineludible el nexo entre derechos fundamentales y paz afirmado en el preaacutembulo de la Declaracioacuten universal de 1948 y

que por tanto la presioacuten de los excluidos sobre nuestro mundo privilegiado alcanzaraacute formas de violencia incontrolada a menos que nos

obliguemos a remover sus causas quitando a la ciudadaniacutea su caraacutecter de status privilegiado y garantizando a todos los mismos derechos

incluidas las libertades de residencia y de circulacioacutenrdquo (p 117-118)

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5 FRAGILIDAD DE LOS DERECHOS EN ADELANTE

Estamos en un tiempo en el que debemos asumir las realidades con sinceridad En el tenso pulso a que esta eacutepoca nos desafiacutea los derechos humanos aparecen como las piezas maacutes fraacutegiles del sistema juriacute-dico moderno y todo eacutel se halla ahora bajo la presioacuten de un embate duriacutesimo no soacutelo de un amago rela-tivamente intimidatorio El pasado maacutes reciente los presentaba en teacuterminos de proteccioacuten y amparo como el refugio maacutes primario en que guarecerse y asegurarse ante la inseguridad para liberarnos del temor (y la miseria) desde el horror de un testimonio histoacuterico que explicaba con crudeza las infrahuma-nas consecuencias acarreadas de su negligencia y omisioacuten y para evitar que jamaacutes volvieran de nuevo a repetirse Pero el riesgo nunca estuvo completamente eliminado ni quedoacute tampoco suprimido por lo que la base de su evitacioacuten era fundamentalmente cautelar precautoria De ahiacute su fragilidad Actuaban como balizas y no tanto como baluartes de la civilizacioacuten contra la barbarie Marcaban las zonas de peligro en que no debiacuteamos introducirnos Eran la sentildeal de un non plus ultra en adelante se abriacutea un abismo devorador Su reconocimiento era en realidad la celebracioacuten ndash esperanza en la memoria del horror-41 de un goal maacutes no auacuten del triunfo

En la nueva eacutepoca que estaacute frente a nosotros como en cualquier otra precedente las oportunida-des son tantas todaviacutea como tantas puedan ser tambieacuten las ocasiones que se pierdan A lo largo de las uacuteltimas deacutecadas del siglo XX hay que contar como ocasioacuten perdida algunos de los errores que entonces se cometieron Pero tambieacuten como oportunidad bien aprovechada el acierto que representoacute de la pro-gresiva implantacioacuten de libertades individuales hasta lograr una Democracia plena en la gobernacioacuten de muchos paiacuteses No es buena solucioacuten olvidar los problemas pendientes de respuesta y es uno de los maacutes grandes errores infravalorar cualquiera solucioacuten que el pasado nos ofrezca como pueda serlo la que sobre la cultura poliacutetica de Occidente ha ejercido el perfeccionamiento de los marcos juriacutedico-ins-titucionales en materia de derechos Al medir la experiencia de eacutexitos y fracasos al igual que al calcular cuaacutel pueda ser la expectativa de unos o de otros el presente de la fragilidad devaluada de los derechos procede sobre todo de la forma en que estructuramos las respuestas las soluciones

Al contrario de cuanto sucediacutea en el ayer de la seguridad donde el mundo de la libertad maacutes segura era aquel que maacutes valoraba la seguridad en el de hoy el mundo de la libertad maacutes segura seraacute aquel que maacutes valore la inseguridad

Dependiendo de la estructura en las que formemos las respuestas asiacute seraacuten las que obtengamos Nunca la respuesta de la Paz puede consistir la ldquopacificacioacutenrdquo de quien la amenaza

6 LA SEGURIDAD DE LA PAZ DE FABULA DOCIT

La Humanidad pagoacute a altiacutesimo precio por dos veces en un mismo siglo el coste de la desventurada negligencia y omisioacuten de los derechos

En la cultura de los Derechos durante la uacuteltima mitad del siglo XX auacuten estaba vivo todo aquel sufrimien-to Los derechos simbolizaban una narrativa de trabajo la del miacutetico sufrimiento de Siacutesifo La enorme piedra la que tantas veces escapoacute de nuestras manos rodando ladera abajo hasta el fondo del valle habiacutea sido subida y encumbrada tras un esfuerzo extremo a lo maacutes alto de la montantildea ldquoEsa piedra era la Pazrdquo ha escrito Enzensberger42 Alzada hasta la cima un lugar tan expuesto tan comprometido tan arriesgado era necesario preservarla No pudimos arreglar otro socorro que un enmallado de cuerdas La malla de los derechos Pero esa atadura de cuerdas como las que Ocnos trenzara tambieacuten la devora hoy un asno el asno de la ignorancia de la estulticia de la intolerancia de la venganza Sin la sujecioacuten que le prestaba aquella trama de delgados hilos de los derechos la piedra que ahora se tambalea no ofrece suficiente estabilidad Puede estar cerca de caer terminar aplastaacutendonos y hecha mil pedazos

El peligro de una Paz sin derechos es ldquola paz de la seguridadrdquo

41 Vid Reyes MATE Memoria de Auschwitz Actualidad moral y poliacutetica Edit Trotta Madrid 2003

42 Hans Magnus ENZENSBERGER Perspectivas de guerra civil trad de M Faber-Kaiser Edit Anagrama Barcelona 1994 p 84

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DA TRANSVERSAtildeO POLIacuteTICA DO JURIacuteDICO AO FLAGELO DO ESTADO DEMOCRAacuteTICO DE DIREITO A INCONTINENTE DESEFICACIZACcedilAtildeO DOS VALORES CONSTITUCIONAIS NO APOGEU DOS 70 ANOS DA DECLARACcedilAtildeO UNIVERSAL DOS DIREITOS HUMANOS

FROM THE POLITICAL TRANSVERSION OF THE LEGAL TO THE FLAG OF THE DEMOCRATIC STATE OF LAW THE INCONTINENT DISEASE OF CONSTITUTIONAL VALUES IN THE APOSTLE OF THE 70 YEARS OF THE UNIVERSAL DECLARATION OF HUMAN RIGHTSJoseacute Eduardo de Miranda1

Andreacutea Correcirca Lima2

Resumo O alargamento da atuaccedilatildeo poliacutetica do judiciaacuterio provoca a deseficacizaccedilatildeo dos valores constitucio-nais afetando a estabilidade democraacutetica no apogeu dos setenta anos da Declaraccedilatildeo Universal dos Direitos Humanos O ideaacuterio construiacutedo a partir da Constituiccedilatildeo Federal de 1988 em busca da consolidaccedilatildeo de um Estado Democraacutetico de Direito desvela o sentimento do periacuteodo poacutes-ditatorial em restabelecer uma socie-dade livre justa igualitaacuteria e fraterna aos moldes preconizados pela DUDH de 1948 O poder soberano do Estado alicerccedilado na atuaccedilatildeo independente e harmocircnica dos Poderes Executivo Legislativo e Judiciaacuterio aliado ao restabelecimento de um regime de Direito demonstra a intenccedilatildeo do constituinte conformar um novo cenaacuterio democraacutetico A preferecircncia pelos desiacutegnios de determinados grupos em detrimento dos inte-resses de todos desvirtua o poder estatal desajustado em suas funccedilotildees executivas legislativas e judiciaacuterias O judiciaacuterio alma mater na garantia dos direitos fundamentais como ente integrante do poder poliacutetico uno do Estado desnatura-se ante sua preocupaccedilatildeo puramente poliacutetica Para referendar a anaacutelise utilizou-se da fenomenologia-hermenecircutica heideggeriana assentada na pesquisa bibliograacutefica e documental

Palavras chave Valores Constitucionais Politizaccedilatildeo do Juriacutedico Direitos Humanos

Abstract The extension of judicial policy leads to a definition of constitutional values a democratic situation that is not at the height of the years of the Universal Declaration of Human Rights The ideology of the Federal Constitution of 1988 in search of the consolidation of a Democratic State of Right reveals the feeling of a post-dictatorial division in restoring a free just egalitarian and fraternal society as advocated by the UDHR of 1948 Sovereignty of the State based on its function and harmonious in its executive legislative and judicial powers is also a right to a democratic regime The chance by groups of certain groups to the detriment of the interests of all distorts the state power mis-matched in its executive legislative and judicial functions The judiciary the alma mater in the fundamental guaran-tee as the member of the political power of the State is denatured in the face of its purely political concern To refer an analysis use the heideggerian hermeneutic phenomenology based on bibliographical and documentary research

Key words Constitutional Values Politicization of the Law Human Rights

1 Poacutes Doutor em Direito Doutor em Direito cum laude academica Professor Pesquisador da Caacutetedra UNESCO de Formaccedilatildeo Humana para Ameacuterica Latinada Associaccedilatildeo Internacional de Direito Cooperativo e do Instituto de Estuacutedios Cooperativos da Universidade de Deusto em Bilbao na Espanha Professor Pesquisador da Caacutetedra Euro Americana de Proteccedilatildeo Juriacutedica dos Consumidores adstrita agrave Faculdade de Direto da Universidade de Cantaacutebria em Santander na Espanha Professor em Cursos de Poacutes-graduaccedilatildeo Advogado parecerista fundador de Miranda amp Correcirca Lima jemirandamirandacorrealimacom

2 Doutoranda em Direito Mestra em Direito Especialista em Direito Internacional Professora em Cursos de Poacutes Graduaccedilatildeo Advogado fundadora de Miranda amp Correcirca Lima andreamirandacorrealimacom

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1 A TIacuteTULO DE INTRODUCcedilAtildeO ENQUADRAMENTO SITUACIONAL-CIENTIacuteFICO IMPRESCINDIacuteVEL

A Idade Moderna instituiacuteda por volta do seacuteculo XVIII surge como um periacuteodo de confronto entre tra-diccedilotildees e atitudes que provocam um absoluto redimensionamento na forma de ser e estar da humani-dade Influenciado pelas concepccedilotildees filosoacuteficas do Renascentismo e do Iluminismo o homem moderno depara-se com a laquoeacutetica da autonomiaraquo suplanta o apego agraves convenccedilotildees aos costumes agraves crenccedilas e sobrepuja percepccedilotildees cosmoloacutegicas e teocecircntricas que o faziam acreditar na origem divina dos reis3

Forjado por um novel tipo de subjetividade que o caracteriza como sujeito do conhecimento e da accedilatildeo o homem soterra a imagem da finitude Ato contiacutenuo caminha ao encontro de sua emancipaccedilatildeo enquanto pessoa conforma o sentido do Estado como sociedade organizada descobre a democracia como regime poliacutetico e luta pelo reconhecimento dos direitos civis poliacuteticos e sociais conjugados na Declaraccedilatildeo Universal dos Direitos Humanos proclamada pela Assembleia Geral das Naccedilotildees Unidas em 10 de dezembro de 1948

Independentemente do espaccedilo-tempo de positivaccedilatildeo dos Direitos Humanos pelos paiacuteses membros da ONU o Brasil assinou seu efetivo reconhecimento em 1988 pela promulgaccedilatildeo da vigente Constituiccedilatildeo Federal Nesse sentido e vigilantes agrave exatidatildeo formal dos preceitos constitucionais acredita-se que a obstinaccedilatildeo do Constituinte em positivar elementos delineadores da estrutura poliacutetica de um Estado Democraacutetico pressupunha sua aspiraccedilatildeo pelo alavancamento de um processo de consolidaccedilatildeo do proacuteprio Estado Democraacutetico brasileiro alicerccedilado sobre a atuaccedilatildeo independente e harmocircnica dos Poderes Executivo Legislativo e Judiciaacuterio4

Natildeo obstante nota-se hoje que o alargamento da idiossincrasia por alguns interpretes da Constituiccedilatildeo culmina pela desnaturaccedilatildeo da responsabilidade juriacutedica do Poder Judiciaacuterio levando-o ao extrapolo de suas competecircncias provocando o que se chama de politizaccedilatildeo do juriacutedico e instigando deduccedilotildees sobre a laquopoliticagemraquo no Judiciaacuterio Por lamento isto natildeo eacute fake News eacute o retrato veriacutedico de uma traumaacutetica rea-lidade em que o Direito brasileiro eacute diariamente sabotado pela poliacutetica pela economia e ateacute pela moral5

Justamente quando o seacuteculo XXI caminha ao encontro do amadurecimento temporal e o Brasil procura enaltecer a alacridade pela celebraccedilatildeo conjunta dos setenta anos da Declaraccedilatildeo Universal dos Direitos Humanos com os trinta anos de promulgaccedilatildeo da Constituiccedilatildeo Federal de 1988 a sociedade brasileira vive um periacuteodo de hesitaccedilatildeo O marco axio-principioloacutegico enaltecido pela Declaraccedilatildeo Universal dos Direitos Humanos e incrustrado no acircmago da Constituiccedilatildeo paacutetria fenece gradativamente pela conspur-caccedilatildeo da ceacutelula identitaacuteria das Instituiccedilotildees nacionais provocando natildeo apenas o perecimento agudo da laquoideiaraquo constitucional de democracia6 mas sobretudo a deseficacizaccedilatildeo dos valores constitucionais de liberdade de seguranccedila de bem-estar de desenvolvimento de igualdade e de justiccedila7

Se outrora expectou-se o alcance da liberdade e da igualdade jaacute natildeo se sabe o que esperar daqui para diante

O certo e censuraacutevel eacute que os brasileiros experimentam o seccionamento ideoloacutegico-interpretati-vo pelo qual o Paiacutes literalmente se divide entre uns e outros defensores de bandeiras especiacuteficas e adeptos de teses mirabolantes entoadas para a sustentaccedilatildeo de atos levados a termo por quem estaacute

3 MIRANDA Joseacute Eduardo de CORREcircA LIMA Andreacutea Educacioacuten formacioacuten humana y valores cooperativos una propuesta de

revitalizacioacuten de las praacutecticas educativas brasilentildeas para el rescate del hombre social y fraterno Deusto Estudios Cooperativos

Universidad de Deusto Bilbao n 9 p 87-107 2017

4 Conforme artigo 2ordm da Constituiccedilatildeo Federal

5 Para o escudo de eventual insinuaccedilatildeo que se estaacute exagerando remete-se o leitor agraves manchetes que satildeo veiculadas pelos principais meios

de veiculaccedilatildeo de informaccedilatildeo e notiacutecias do Brasil sejam virtuais ou fiacutesicos

6 E vecirc-se agora mais do que nunca que no Brasil a Democracia nunca passou de uma ideia

7 Adota-se o termo deseficacizaccedilatildeo no sentido soberano de tornar sem efeito pratico

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legitimado para o exerciacutecio de um poder imperioso ao guarnecimento da democracia e da dignidade humana O Poder Judiciaacuterio tem questionada sua autonomia e seus exercentes ou alguns deles satildeo objurgados pela duacutevida acerca da impessoalidade e imparcialidade de suas decisotildees

As duacutevidas as suspeitas e as acusaccedilotildees tornaram-se vedetes daqueles que apontam o dedo em haste suscitando natildeo raras agraves vezes o que se mostra melhor agrave defesa de seus proacuteprios e pessoais interesses Por isso natildeo se estaacute aqui para subscrever um manifesto pessimista ou um pronunciamento leviano de caraacute-ter exagerado teratoloacutegico distante do menor cabide de cientificidade Longe disso A fluente proposta estaacute enganchada para natildeo dizer laquopenduradaraquo nos estertores da fenomenologia-hermenecircutica e aspira pela compreensatildeo ontoloacutegica sobre o que passa na ldquopaacutetria-Brasilrdquo elucidar se o enviesamento da respon-sabilidade poliacutetica do Poder Judiciaacuterio corrompe de um lado a obstinaccedilatildeo democraacutetica vislumbrada pela Terra adorada quando a Constituiccedilatildeo foi promulgada em 05 de outubro de 1988 e adultera de outro a eficaacutecia dos valores imperiosos agrave credibilidade da laquojus-ti-ccedilaraquo e agrave estabilidade social

Frisa-se por isso que ldquoo meacutetodo fenomenoloacutegico enquanto meacutetodo hermenecircutico-linguiacutestico natildeo se desliga da existecircncia concreta nem da carga preacute-ontoloacutegica que na existecircncia jaacute vem sempre antecipa-dardquo8 A fenomenologia eacute suficiente para ldquoindicar coacutemo mostrar y tratar lo que debe tratarse en ciencia Ciencia laquoderaquo los fenoacutemenos quiere decir tal forma de aprehender sus objetos que todo cuanto esteacute a discusioacuten sobre ellos tiene que tratar-se mostraacutendolo directamente y demostraacutendolo directamenterdquo9

Como a fenomenologia eacute a forma demonstrativa do que deve ser tema da ontologia10 pretende-se atraveacutes deste trabalho subtrair o ator juriacutedico da zona de conforto para submetecirc-lo agrave reflexatildeo profun-da sobre fatos-feitos-fenocircmenos que na medida em que deslustram conquistas histoacutericas agridem a ordem juriacutedica-moral e podem no dia menos pensado transformar o devaneio democraacutetico num pesa-delo socircfrego de reversatildeo traumaacutetica e imprevisiacutevel

2 PELOS CAMINHOS DA MODERNIDADE DA RACIONALIDADE HUMANA AO ESTADO DEMOCRAacuteTICO DE DIREITO

No curso do pensamento medieval o homem alheio ao mundo e agrave sua proacutepria condiccedilatildeo de existecircncia esteve radicalmente apegado agrave ideia do divino Posteriormente quando ingressa na Idade Moderna as ponderaccedilotildees filosoacuteficas do Renascimento e do Iluminismo influenciam na conformaccedilatildeo de um novo modelo de subjetividade que permite-lhe o desprendimento do cordatildeo teocecircntrico que o mantinha preso a conceitos tabus e explicaccedilotildees metafiacutesicas Assumindo-se como sujeito do conhecimento adquirido atraveacutes da razatildeo indispensaacutevel agrave descoberta da autossuficiecircncia subjetiva o homem moder-no regozija o florescimento da sua tenacidade emancipatoacuteria-racional11

Dentro desse novo perfil existencial o homem moderno suplanta os limites da proacutepria racionalidade para transformar-se num ser pensante livre do poder e da forccedila da religiatildeo Intuitivo ou integrativo descobre sua capacidade de entendimento de compaixatildeo e de relacionamento com seus comuns ldquoEacute nesse terreno o da historicidade e da finitude que vemos nascer novos discursos Eacute nesse contexto epistemoloacutegico que emergem figuras antes impossiacuteveis de imaginar a produccedilatildeo a vida a linguagem satildeo novos objetos proacuteprios da modernidaderdquo12

8 STEIN Ernildo Introduccedilatildeo ao meacutetodo fenomenoloacutegico heideggeriano In HEIDEGGER Martin Sobre a essecircncia do fundamento A

determinaccedilatildeo do ser do ente segundo Leibniz Hegel e os gregos Satildeo Paulo Livraria Duas Cidades 1971 p 14

9 HEIDEGGER Martin Ser y tempo Traduccioacuten de Joseacute Gaos Barcelona RBA 2004 p 79

10 Ibid p 80

11 MIRANDA CORREcircA LIMA 2017

12 TERNES Joseacute Michel Foucault e o nascimento da modernidade Tempo Social Rev Sociol USP S Paulo 7(1-2) p 45-52 1995

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A modernidade amadurece com o propoacutesito de emancipar o intelecto permitindo que o homem desmis-tifique os misteacuterios da realidade para exercer seu domiacutenio sobre a natureza13 Em nome da espontaneida-de do pensamento ou em benefiacutecio da essecircncia humana como uma substacircncia pensante Reneacute Descartes advoga que todos os homens possuem idecircntica aptidatildeo para alcanccedilar a verdade por que todos possuem a razatildeo como forma natural que lhes confere a faculdade para distinguir o verdadeiro do falso14

Ser de seu tempo e centro do universo o homem recorre agrave organizaccedilatildeo de seu locus Locke ressalta que o homem com o propoacutesito de evitar eventuais ameaccedilas agrave liberdade e agrave igualdade que possui no estado natural cria a sociedade poliacutetica ldquoatraveacutes de um contrato natildeo entre governantes e governados mas entre homens igualmente livres O pacto social natildeo criaria nenhum direito novo que viesse a ser acres-centado aos direitos naturaisrdquo15 Anota-se sobre este aspecto que

O pacto seria apenas um acordo entre indiviacuteduos reunidos para empregar sua forccedila coletiva na

execuccedilatildeo das leis naturais renunciando a executaacute-las pelas matildeos de cada um Seu objetivo seria

a preservaccedilatildeo da vida da liberdade e da propriedade bem como reprimir as violaccedilotildees desses

direitos naturais16

Locke defende que o pacto social natildeo impotildee aos homens a necessidade de renunciarem seus direitos naturais em favor dos governantes Aleacutem disso a harmonia entre os homens estaria assegurada pelas leis que os juiacutezes aplicariam no acircmago de uma sociedade poliacutetica instituiacuteda pelo pacto social Veemente Locke acentua que cada homem

[] consentindo com os outros em instituir um corpo poliacutetico submetido a um uacutenico governo se obriga

diante de todos os membros daquela sociedade a se submeter agrave decisatildeo da maioria e a concordar

com ela do contraacuterio se ele permanecesse livre e regido como antes pelo estado de natureza este

pacto inicial em que ele e os outros se incorporaram em uma sociedade natildeo significaria nada e natildeo

seria um pacto Seraacute que ele teria a aparecircncia de um pacto Que novo compromisso seria este se

o interessado natildeo estava vinculado a outros decretos da sociedade aleacutem daqueles que ele achava

que lhe convinha e nos quais realmente consentiu Esta seria uma liberdade tatildeo completa quanto a

que ele ou qualquer outro possuiacutea antes do pacto no estado de natureza em que nada o impede de

consentir em uma decisatildeo qualquer e de se submeter a ela se lhe parecer conveniente17

Ademais de rechaccedilar a submissatildeo ao absolutismo John Locke pugna tanto pelo viacutenculo instrumen-tal entre governantes e governados como pela preeminecircncia dos direitos naturais sobre os governos opressivos No acircmbito da justiccedila Locke adverte que o magistrado firma sua responsabilidade e exerce o poder de sua autoridade quando proporciona ldquoo bem-estar a preservaccedilatildeo e a paz dos homens na socie-dade que ele estaacute defendendo e assim apenas isso eacute e deve ser o padratildeo e a medida segundo os quais ele deve estabelecer e ajustar suas leis o modelo e a estrutura de seu governordquo18

Eacute prudente enfatizar o entendimento de Locke no sentido de que em havendo possibilidade de uma coexistecircncia paciacutefica entre os homens desnecessaacuteria seria a existecircncia da poliacutetica e dos magistrados eis que a existecircncia de ambos se justifica pela imperiosidade na defesa dos homens contra a fraude e

13 BACON Francis Movum Organum Traduccedilatildeo de Joseacute Aluysio Reis de Andrade Disponiacutevel em lthttpwwwebooksbrasilorg

adobeebooknorganumpdfgt Acesso em 21 jun 2018

14 DESCARTES Reneacute Discurso del meacutetodo meditaciones metafiacutesicas Traduccioacuten de Juan Gil Fernaacutendez Barcelona RBA 2004

15 LOCKE John Ensaio acerca do entendimento humano Satildeo Paulo Editora Nova Cultura Ltda 1999 p 16

16 LOCKE 1999 p 16

17 LOCKE John Segundo tratado sobre o governo civil Traduccedilatildeo de Magda Lopes e Marisa Lobo da Costa Disponiacutevel em lthttpwww

xrprobriflocke-segundo_tratado_sobre_o_governopdfgt Acesso em 21 jun 2018

18 LOCKE Segundo tratado sobre o governo civil p 4

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a violecircncia Dentro desta perspectiva Locke sublinha que ldquoa liberdade dos homens submetidos a um governo consiste em possuir uma regra permanente agrave qual deve obedecer comum a todos os membros daquela sociedade e instituiacuteda pelo poder legislativo nela estabelecidordquo 19

Vigilante ao sentido e agrave importacircncia do pacto social natildeo se pode ocultar que Rosseau defende que a foacutermula adequada da laquocontrataccedilatildeoraquo eacute aquela que viabiliza a defesa e a proteccedilatildeo dos laquocontratantesraquo ou pactuantes e seus bens sem que a uniatildeo entre eles ou de parte deles e mesmo a ruptura parcial ou total fragilize a liberdade de cada um20 As disposiccedilotildees que configuram ou afiguram o pacto social satildeo determinadas pela proacutepria natureza social-coletiva do contrato Rousseau entatildeo assevera que mes-mo as insignificantes alteraccedilotildees das disposiccedilotildees pactuais

[] las hariacutea vanas y de nulo efecto de suerte que aunque no hayan sido acaso nunca

formalmente enunciadas son en todas partes las mismas en todas partes taacutecitamente admitidas

y reconocidas hasta que violado el pacto social cada uno vuelve a sus primeros derechos y

recupera su libertad natural perdiendo la libertad convencional por la que renuncioacute a aquella21

Estaacute em Rosseau a plecirciade do laquosentimentoraquo ideal da democracia Quer dizer ldquocada persona pone en comuacuten su persona y todo su poder bajo la suprema direccioacuten de la voluntad general y recibimos a cada miembro como parte indivisible del todordquo22 A vontade geral registre-se natildeo eacute a adiccedilatildeo da vontade dos particulares Alcanccedila-se a incontestabilidade do pacto social e resguarda-se a solidez da estrutura do Estado quando a vontade da maioria eacute destinada agrave consecuccedilatildeo do bem comum Rousseau entatildeo alerta que

[] para que el pacto social no sea un formulario vano implica taacutecitamente el compromiso

uacutenico que puede dar fuerza a los otros de que el se niegue a obedecer a la voluntad general

seraacute obligado a ello por todo el cuerpo lo cual significa otra cosa sino que se obligaraacute a ser libre

pues tal es la condicioacuten de toda dependencia personal condicioacuten que constituye el artificio y

el funcionamiento de la maacutequina poliacutetica y que es el uacutenico que hace legiacutetimas las obligaciones

civiles las cuales seriacutean si esto absurdas tiraacutenicas y expuestas a los maacutes enormes abusos23

Somente assim encontra-se a plenitude da soberania O governante instituiacutedo pelo contrato social eacute em si mesmo o proacuteprio povo como corpo uno que decreta a vontade e o interesse geral cuja expressatildeo estaacute consolidada no preceito legal A vontade do governante natildeo eacute o governante propriamente dito ldquoA soberaniacutea o poder del cuerpo poliacutetico sobre todos sus miembros se confunde con la voluntad general y sus caracteres son los mismos de esta voluntad inalienable indivisible infalible absolutardquo24

A modernidade salienta Habermas ldquoinventou o conceito de razatildeo praacutetica como faculdade subjetivardquo25 Suplantando acepccedilotildees aristoteacutelicas em benefiacutecio de premissas da filosofia do sujeito a modernida-de extrai do homem o seu apego ao juiacutezo praacutetico subtraindo-o daquilo que Habermas denomina de laquoencarnaccedilotildees nas formas de vida culturais e nas ordens da vida poliacuteticaraquo Com isso logrou-se ldquoreferir a razatildeo praacutetica agrave felicidade entendida de modo individualista e agrave autonomia do indiviacuteduo moralmente

19 Ibid p 41

20 ROUSSEAU Jean-Jacques El contrato social Traduccioacuten de Consuelo Berges Barcelona RBA 2004

21 Ibid p 44

22 ROUSSEAU 2004 p 17

23 Ibid p 48

24 ROUSSEAU 2004 p 17

25 HABERMAS Juumlrgen Direito e democracia entre facticidade e validade Rio de Janeiro Tempo Brasileiro 1997 p 17 V1

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agudizada ndash agrave liberdade do homem tido como um sujeito privado que tambeacutem pode assumir os papeis de um membro da sociedade civil do Estado e do mundordquo26 Ainda Habermas assenta que o projeto da modernidade que os filoacutesofos do iluminismo ordenaram no transcurso do seacuteculo XVIII

[] consiste num desenvolvimento implacaacutevel das ciecircncias objetivas das bases universalistas

da moralidade e da lei e de uma arte autocircnoma consoante a loacutegica interna delas constituindo

ao mesmo tempo poreacutem uma libertaccedilatildeo dos potenciais cognitivos acumulados em decorrecircncia

de suas altas formas esoteacutericas e de sua utilizaccedilatildeo na praacutexis isto eacute na organizaccedilatildeo racional das

condiccedilotildees de vida e das relaccedilotildees sociais27

Enquanto desvenda os descaminhos de sua capacidade racional e expande-se em conhecimento arte e ciecircncia o homem busca a redenccedilatildeo do seu eu-humano-livre-no-mundo frente agraves reminiscecircncias o despotismo e a sagacidade que foram impetradas em larga escala pelo poder religioso Este novo feitio de ser e existir estende-se agrave reconfiguraccedilatildeo da imagem de essencialidade do Estado Democraacutetico de Direito agrave conceituaccedilatildeo de lei e ao significado de Constituiccedilatildeo

2 PARA NAtildeO OLVIDAR-SE O SENTIDO DA DECLARACcedilAtildeO UNIVERSAL DOS DIREITOS HUMANOS

O contributo da modernidade para a consolidaccedilatildeo de um ideal de progresso pautado na exaltaccedilatildeo da racionalidade humana e na fundamentaccedilatildeo da ciecircncia pouco a pouco se torna obscurecido pelos con-tornos que o proacuteprio homem aporta agrave sua realidade a partir da expansatildeo do conhecimento da imersatildeo cientiacutefica e de um entendimento de que a tecnologia pode colocar-se agrave disposiccedilatildeo da busca desenfrea-da pelo poder de uns sobre outros

Nesse aspecto Romano Guardini salienta que a ideia central dos tempos modernos fundamenta as normas da ciecircncia voltadas para o bem estar do homem Diante desse discurso ocultou-se uma e outra vez barbaacuteries produzidas pela ausecircncia completa de escruacutepulos no intuito de alcanccedilar o poder28 Guardini revela ademais que

O homem sabe que em uacuteltima anaacutelise o que estaacute em jogo na teacutecnica nem eacute a utilidade nem o bem

estar mas o domiacutenio domiacutenio no sentido mais extremo da palavra que se exprime numa nova forma

do mundo Procura compreender os elementos da natureza e da existecircncia humana Isto significa

possibilidades insuspeitadas de construir mas tambeacutem de destruir sobretudo quando se trata da

natureza humana muito menos fixa e segura de si do que se pensa geralmente Perigo absoluto

tambeacutem que cresce ateacute ao imensuraacutevel de ser o Estado anoacutenimo quem realiza esse domiacutenio Assim

a relaccedilatildeo com a natureza traz o caraacutecter de uma decisatildeo extrema ou o homem consegue realizar

correctamente a obra de dominaccedilatildeo e entatildeo esta seraacute imensa - ou tudo estaraacute acabado29

Eacute saliente que a modernidade reverbera um autonomismo humano que de uma ou de outra forma gera uma espeacutecie de cegueira coletiva traduzida pela crenccedila vazia e estagnada de uma nova perspectiva de vida decorrente da possibilidade de desfrutar livremente do poder e sentir-se seguro com ele Esse apego agrave laquopseudoraquo liberdade-seguranccedila geradas pelo poder oprime natildeo raras agraves vezes o dimensiona-mento sobre os reflexos que os avanccedilos cientiacuteficos e tecnoloacutegicos e os laquosignosraquo ocultos sob uma repre-sentatividade poliacutetica provocam na condiccedilatildeo humana das laquogentes do mundoraquo

26 HABERMAS 1997 p 17

27 HABERMAS Juumlrgen O discurso filosoacutefico da modernidade Satildeo Paulo Martins Fontes 2002 p 77

28 GUARDINI Romano O fim dos tempos modernos Lisboa Livraria Moraes Editora 1964

29 Ibid p 78-79

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Unisul de Fato e de Direito

Ano IX Nordm 17 | Julho a Dezembro | 2018

As atrocidades praticadas durante a Segunda Guerra Mundial revelam ateacute onde o homem eacute capaz de ir aliando o conhecimento ciecircncia e tecnologia a discursos poliacuteticos progressistas revestidos de um ufanismo insoacutelito fruto da malversaccedilatildeo da racionalidade humana e do desvirtuamento da consciecircncia do eu-no-mundo

A modernidade buscou em sua profundeza resilir a equaccedilatildeo poder-pessoa em especial aquela advin-da do soberano ou do divino Poreacutem em linhas gerais relegou agrave pessoalidade a condiccedilatildeo de mera subje-tividade de reafirmaccedilatildeo de valores sem um norte de retenccedilatildeo ou de horizonte dos juiacutezos reafirmados Como bem afianccedila Rein Staal ldquoo poder lanccedilou sua sombra sobre o homem por meio de instituiccedilotildees impessoais e processos que seguiam a sua proacutepria loacutegica desalmada Natildeo haacute ser que natildeo tenha um mes-trerdquo30 e o poder demoniacuteaco preencheu o vaacutecuo deixado pelo eclipse da responsabilidade pessoal

Eacute justamente neste contexto de necessaacuterio resgate e valorizaccedilatildeo da condiccedilatildeo humana e de limitaccedilatildeo do poder do homem que a comunidade internacional todavia traumatizada pelas sequelas intranspo-niacuteveis da guerra conjuga seus esforccedilos para redigir uma carta suprema que defina os princiacutepios norte-adores de pacificaccedilatildeo mundial e de defesa dos direitos humanos

Apoacutes intenso debate paiacuteses de todas as regiotildees do mundo detentores de caracteriacutesticas socioculturais distintas vivificadas num marco poliacutetico-juriacutedico-nacional diferenciado dedicaram-se agrave elaboraccedilatildeo de um documento que assegurasse o compromisso internacional pelo reconhecimento e garantia dos direi-tos e liberdades de todos os homens Assim aclamaram na Assembleia Geral das Naccedilotildees Unidas em 10 de dezembro de 1948 a Declaraccedilatildeo Universal dos Direitos Humanos por meio da Resoluccedilatildeo 217 A (III)

Sobre este aspecto Austregeacutesilo de Athayde representante da Delegaccedilatildeo brasileira que atuou na elaboraccedilatildeo do texto da DUDH convencido da nova era de liberdade e justiccedila ofertada agrave humanidade adverte em discurso proferido perante a Assembleia da ONU que

Se nosso trabalho resultasse de uma imposiccedilatildeo qualquer e natildeo fosse de uma cooperaccedilatildeo

intelectual e moral das naccedilotildees natildeo estaria evidentemente agrave altura de nossas responsabilidades

nem responderia ao espiacuterito de compreensatildeo universal que eacute a proacutepria base de nossa

organizaccedilatildeo internacional A sua forccedila vem precisamente da diversidade de pensamento de

cultura e de concepccedilatildeo de vida de cada representante Unidos formamos a grande comunidade

do mundo e eacute exatamente dessa uniatildeo que decorre a nossa autoridade moral e poliacutetica31

Diante da forccedila expressa pela DUDH reconhece-se o imprescindiacutevel soerguimento de sociedades democraacuteticas que compreendam ldquo[] que eacute essencial agrave proteccedilatildeo dos direitos do Homem atraveacutes de um regime de direito para que o Homem natildeo seja compelido em supremo recurso agrave revolta contra a tira-nia e a opressatildeordquo32 Salienta-se por corolaacuterio que esse entendimento tem o reforccedilo do paraacutegrafo 3ordm do Art 21 da Declaraccedilatildeo definitivo no sentido de que ldquoa vontade do povo eacute o fundamento da autoridade dos poderes puacuteblicosrdquo

Longe de qualquer intuito pelo exagero ilustrativo mostra-se prudente assinalar que pelo rigor da DUDH todos os atos derivados do exerciacutecio de poder de qualquer autoridade puacuteblica devem estar em consonacircncia com a vontade do povo e com os valores expressos na Declaraccedilatildeo conforme bem estabe-lece o preacircmbulo do documento declaratoacuterio

30 STAAL Rein A histoacuteria esquecida da poacutes-modernidade First Things (dezembro de 2008)Traduccedilatildeo de Grace Guimaratildees Mosquera

Revista Dicta e Contradicta Disponiacutevel em lthttpwwwdictacombredicoesedicao-3a-historia-esquecida-da-pos-modernidadegt

Acesso em 28 jun 2018

31 ATHAYDE Austregeacutesilo de Discurso pronunciado na Assembleia Plenaacuteria da ONU Paris 10 de Dez 1948 Disponiacutevel em lthttps

ajonuorg20121017austregesilo-de-athayde-e-sua-fundamental-importancia-aos-direitos-humanosgt Acesso em 27 jun 2018

32 Ibid

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Revista Juriacutedica da Universidade do Sul de Santa Catarina

[] a fim de que todos os indiviacuteduos e todos os oacutergatildeos da sociedade tendo-a constantemente no

espiacuterito se esforcem pelo ensino e pela educaccedilatildeo por desenvolver o respeito desses direitos e

liberdades e por promover por medidas progressivas de ordem nacional e internacional o seu

reconhecimento e a sua aplicaccedilatildeo universais e efectivos tanto entre as populaccedilotildees dos proacuteprios

Estados membros como entre as dos territoacuterios colocados sob a sua jurisdiccedilatildeo33

A Declaraccedilatildeo Universal dos Direitos Humanos aponta dessa forma para a necessidade de uma educa-ccedilatildeo para o os direitos humanos Natildeo uma educaccedilatildeo no sentido formal escolar ou acadecircmico Mas aque-la educaccedilatildeo que ao promover um exerciacutecio de ponderaccedilatildeo contagie os indiviacuteduos de cada paiacutes sobre a propriedade dos direitos que satildeo inerentes agrave condiccedilatildeo da pessoa humana como um todo e natildeo restrita a um grupo a uma bandeira ou a um partido

Por este caminho elucidativo a Declaraccedilatildeo aponta agrave construccedilatildeo de um novo Estado Democraacutetico de Direito que natildeo resulte exclusivamente da laquovontade do povoraquo mas sobretudo da vontade do povo que eacute concatenada na base de valores convergentes com a afirmaccedilatildeo e defesa dos direitos humanos como os valores de igualdade e de liberdade

Bobbio com maestria lembra que

[] a linguagem poliacutetica moderna conhece tambeacutem o significado de democracia como o regime

caracterizado pelos fins ou valores em direccedilatildeo aos quais um determinado grupo poliacutetico tende e

opera O princiacutepio destes fins ou valores adotado para distinguir natildeo mais apenas formalmente

mas tambeacutem conteudisticamente um regime democraacutetico de um regime natildeo democraacutetico eacute a

igualdade natildeo a igualdade juriacutedica introduzida nas Constituiccedilotildees liberais mesmo quando estas

natildeo eram formalmente democraacuteticas mas a igualdade social e econocircmica (ao menos em parte)34

Defende-se de tal modo que satildeo os ideais de liberdade e de igualdade social e econocircmica provenien-tes da Declaraccedilatildeo Universal dos Direitos Humanos que arrimam a existecircncia do Estado Democraacutetico de Direito cuja solidez natildeo pode ser maculada por ato peremptoacuterio de um ou de outro Poder estatal transgressor do que o Art 29 da DUDH denomina como ldquojustas exigecircncias da moral da ordem puacuteblica e do bem-estar numa sociedade democraacuteticardquo35

3 A PLATAFORMA DE SUSTENTACcedilAtildeO DO ESTADO DEMOCRAacuteTICO

Natildeo eacute demais aduzir que o Estado de Direito eacute alicerccedilado sobre uma superfiacutecie principioloacutegica dimen-sionada pela acepccedilatildeo de soberania nacional de separaccedilatildeo autonomia e independecircncia dos poderes e de supremacia constitucional A Constituiccedilatildeo consequentemente apresenta-se como uma ordenaccedilatildeo sistemaacutetica da comunidade poliacutetica plasmada num documento escrito mediante o qual se estrutura o poder poliacutetico e se asseguram os direitos fundamentais

O Direito por seu turno afigura-se como ldquoum instrumento de transformaccedilatildeo social e natildeo como obstaacute-culo agraves mudanccedilas sociaisrdquo36 De acordo com Streck ldquoos textos constitucionais passam a conter as possi-bilidades de resgate das promessas da modernidade situaccedilatildeo que assume relevacircncia iacutempar em paiacuteses de modernidade tardia como o Brasil em que o welfare state natildeo passou de uma simulaccedilatildeordquo37

33 ONU Declaraccedilatildeo Universal dos Direitos Humanos Disponiacutevel em lthttpswwwohchrorgENUDHRPagesLanguage

aspxLangID=porgt Acesso em 23 jun 2018

34 BOBBIO Norberto Estado Governo e Sociedade para uma teoria geral da poliacutetica Satildeo Paulo Paz e Terra 2005 p 157

35 ONU Declaraccedilatildeo Universal dos Direitos Humanos Disponiacutevel em lthttpswwwohchrorgENUDHRPagesLanguage

aspxLangID=porgt Acesso em 23 jun 2018

36 STRECK Lenio Luiz Hemenecircutica Juriacutedica e(m) crise uma exploraccedilatildeo hermenecircutica da construccedilatildeo do direito Porto Alegre Livraria

do Advogado Editora 2004 p 235

37 ______ Hermenecircutica Constituiccedilatildeo e autonomia do direito Revista de Estudos Constitucionais Hermenecircutica e Teoria do Estado

(RECHTD) 1 (1)65-77 janeiro-junho 2009 p 66

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Dentre as promessas da modernidade a democracia exsurge segundo Pontes de Miranda como ldquoforma de criaccedilatildeo da ordem estatal ou de parte dela processo ou meacutetodo para se decidir (mediante referendo ou em reuniatildeo do povo mesmo) ou para se escolherem chefes legisladores juiacutezes executantesrdquo38 Sob este talante a vazatildeo democraacutetica como baldrame de um regime poliacutetico configura-se atraveacutes da participaccedilatildeo popular ajustada a partir de uma conjuntura organizacional do Estado apta para preservar o equiliacutebrio entre os Poderes a ordem puacuteblica e a salvaguarda da materialidade dos direitos fundamentais

Nessa linha ldquoa democratizaccedilatildeo social fruto das poliacuteticas do Welfare State o advento da democracia no segundo poacutes-guerra e a redemocratizaccedilatildeo de paiacuteses que saiacuteram de regimes autoritaacuteriosditatoriais trazem agrave luz Constituiccedilotildees cujos textos positivam os direitos fundamentais e sociaisrdquo39 Este fenocircmeno provoca a redefiniccedilatildeo do relacionamento entre os Poderes do Estado estendendo ao Poder Judiciaacuterio a laquolegitimidaderaquo de participar do locus poliacutetico pois segundo Streck

[] o Welfare State lhe facultou o acesso agrave administraccedilatildeo do futuro e o constitucionalismo

moderno a partir da experiecircncia negativa de legitimaccedilatildeo do nazi-fascismo pela vontade

da maioria confiou agrave justiccedila constitucional a guarda da vontade geral encerrada de modo

permanente nos princiacutepios fundamentais positivados na ordem juriacutedica40

No Brasil o ideal democraacutetico foi alimentado pela Constituiccedilatildeo Federal de 1988 surgida como a mais cidadatilde de todos os textos constitucionais conhecidos no decorrer da histoacuteria do paiacutes O Estado Democraacutetico brasileiro supera as adversidades acontecidas na eacutepoca totalitaacuteria e conforma-se den-tro de uma suposta e figurada laquodesassociaccedilatildeoraquo dos seus Poderes Harmocircnicos entre si os Poderes do Estado satildeo independentes e autocircnomos Executivo Legislativo e Judiciaacuterio perfazem as palancas de sustentaccedilatildeo do laquoedifiacutecio estatalraquo por onde deve transitar sua populaccedilatildeo revitalizada pela expectativa de seguranccedila e garantia dos direitos fundamentais indispensaacuteveis ao alcance das condiccedilotildees de existecircn-cia digna tal e qual foram preconizados pela Declaraccedilatildeo Universal dos Direitos Humanos

Eacute em razatildeo dessa particularidade que se busca na ontologia fundamental de Heidegger a laquoevidecircnciaraquo que impulsiona a busca pela recuperaccedilatildeo do esquecido de encontrar-se o perdido de enxergar-se o simples Natildeo se pode rechaccedilar que ldquoa resposta ao questionamento do laquoquemraquo eacute o ser-aiacute cotidiano eacute obtida ao ana-lisarmos o estilo de ser no qual de imediato e em geral o ser-aiacute se manteacutemrdquo41 Heidegger especifica que

El laquoser en el mundoraquo del laquoser ahiacuteraquo se ha dispersado y hasta despedazado en cada caso ya con

su facticidad en determinados modos del laquoser enraquo La multiplicidad de tales modos del laquoser

enraquo puede mostrarse por viacutea de ejemplo con la siguiente enumeracioacuten tener que ver con algo

producir algo encargarse y cuidar de algo emplear algo abandonar y dejar que se pierda algo

emprender imponer examinar indagar considerar exponer definirhellip42

Capital portanto editar que as mazelas experienciadas pela sociedade brasileira no periacuteodo ditato-rial forjaram a construccedilatildeo de um interesse poliacutetico comum voltado ao estabelecimento de uma genu-iacutena vontade geral que expressa valores e princiacutepios supremos insculpidos no texto da Constituiccedilatildeo Federal de 1988 Consequentemente a separaccedilatildeo a autonomia e a independecircncia dos Poderes do Estado textualizadas no acircmago da Constituiccedilatildeo inspiram a expectativa de realizaccedilatildeo do espiacuterito demo-craacutetico como o novo nirvana social A igualdade a liberdade e a dignidade sonhos de antanho apresen-tam-se aos brasileiros como valores que orientam a garantia e a cauccedilatildeo dos direitos fundamentais

38 MIRANDA Pontes de Democracia liberdade igualdade Campinas Bookseller 2002 p 50

39 STRECK Lecircnio Luiz Jurisdiccedilatildeo constitucional e hermenecircutica uma nova criacutetica do direito 2 ed Rio de Janeiro Forense 2004 p 147

40 Ibidem

41 HEIDEGGER Martin Todos noacutes ningueacutem um enfoque fenomenoloacutegico do social Traduccedilatildeo de Dulce Mara Critelli Satildeo Paulo Editora

Moraes 1981 p 32

42 HEIDEGGER 2004 p 110

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4 ENTRE A TRANSVERSAtildeO POLIacuteTICA DO JUDICIAacuteRIO O FLAGELO DO ESTADO DEMOCRAacuteTICO DE DIREITO E A DESEFICACIZACcedilAtildeO DOS VALORES CONSTITUCIONAIS

O cenaacuterio formal da constitucionalidade brasileira revela-se proacuteprio agrave realizaccedilatildeo do devaneio demo-craacutetico Ademais o Poder Judiciaacuterio sustenta a espada para a defesa dos direitos fundamentais e para a prevalecircncia da justiccedila atraveacutes do escudo e cumprimento do que determina a Constituiccedilatildeo Ocorre no entanto que entre o dito e o natildeo dito aquele interesse poliacutetico comum que alimentou a atuaccedilatildeo do constituinte feneceu diante dos interesses setorizados da sociedade

No cenaacuterio democraacutetico instituiacutedo no Brasil ou laquore-ins-ti-tu-iacute-doraquo a vontade de alguns comeccedilou a pre-valecer sobre o interesse geral corrompendo a noccedilatildeo de bem comum Ainda que convergente no sen-tido de estabelecer uma unidade nacional mais fraterna a vontade poliacutetica nacional de forma diame-tralmente oposta ao pressaacutegio democraacutetico jamais deixou de divergir na conduccedilatildeo de seus interesses acalorando o levante das formas a busca das fontes e a praacutetica de atitudes adequadas ao destino poliacuteti-co mais apropriado ao ajuste das necessidades setoriais de seu grupo sejam elas de ordem econocircmica religiosa ou social

Desse modo o cotidiano e natildeo os conceitos43 nem os princiacutepios e muito menos as leis desvelam problemas protuberantes que fragilizam a estrutura de separaccedilatildeo independecircncia e autonomia dos Poderes do Estado combalindo materialmente a noccedilatildeo democraacutetica Assim sendo olha-se atraacutes sis-tematiza-se o prenuacutencio constitucional e pondera-se sobre aquele laquodesejoraquo de consolidar um Estado Democraacutetico de Direito emergente de um contexto poacutes-ditatorial procurando atender aos anseios de uma sociedade oprimida por anos a fio necessitada de uma via de efetivaccedilatildeo dos direitos huma-nos enaltecidos pela Declaraccedilatildeo Universal dos Direitos Humanos de 1948 para garantir natildeo apenas a liberdade e a igualdade dos indiviacuteduos mas promover a dignidade humana por meio de uma sociedade mais justa e fraterna

Eacute por esta razatildeo que perdura desde 1988 uma luta renitente de ajustes poliacuteticos que confrontam de forma permanente os valores e princiacutepios constitucionais enfraquecem o poder estatal e fragilizam o entorno social As funccedilotildees executivas legislativas e judiciaacuterias que deveriam resguardar o poder poliacute-tico da sociedade brasileira ou seja o soberano na concepccedilatildeo de Rousseau44 corrompem-se diante da premiaccedilatildeo dos interesses de um ou de outro grupo em detrimento daquilo que interessa a sociedade como um todo

Por meio da laquopoliticagemraquo entenda-se esta como as laquoaccedilotildees poliacuteticas desenvolvidas em prol dos interes-ses de uma parcela de particularesraquo esquecem-se da responsabilidade essencialmente poliacutetica ineren-te a cada funccedilatildeo estatal que representa na sua integralidade o poder poliacutetico e uno do proacuteprio Estado

O Judiciaacuterio como forccedila integrante desse poder estatal carece de assumir a sua responsabilidade--natureza poliacutetica para por meio de sua atividade jurisdicional (que natildeo eacute apenas de buscar dirimir conflitos) efetivamente salvaguardar os valores e princiacutepios constitucionais de modo a colaborar na efetiva construccedilatildeo e consagraccedilatildeo de um Estado verdadeiramente democraacutetico Streck em liccedilatildeo sobre o redimensionamento da tradicional ou claacutessica relaccedilatildeo entre os Poderes do Estado esclarece que o Judiciaacuterio surge ldquocomo uma alternativa para o resgate das promessas da modernidade onde o acesso agrave justiccedila assume um papel de fundamental importacircncia atraveacutes do deslocamento da esfera de tensatildeo ateacute entatildeo calcada nos procedimentos poliacuteticos para os procedimentos judiciaisrdquo45

43 HEIDEGGER 1981

44 ROUSSEAU 2004

45 STRECK p 141

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Tem-se destarte que sobrelevar a necessidade de um exerciacutecio poliacutetico do Poder Judiciaacuterio sem que a politicagem esteja no coraccedilatildeo de sua atuaccedilatildeo jurisdicional Natildeo se pode olvidar que ldquoo juiz natildeo aplica a lei apenas in concreto senatildeo que colabora ele mesmo atraveacutes de sua sentenccedila no desenvolvimento do direito (direito de juiz)rdquo 46 Eacute necessaacuterio resguardar-se a certeza de que ldquonosso saber acerca do direito e dos costumes sempre seraacute complementado a partir de cada caso particular sim seraacute ateacute mesmo deter-minado produtivamenterdquo47

Hodiernamente ao longo das passarelas por onde transitas os exercentes da ciecircncia juriacutedica a mesma dos singulares aplicadores do direito positivo deduz-se conhecer a funccedilatildeo do Poder Judiciaacuterio e a atri-buiccedilatildeo do juiacutezo ldquosobretudo a partir da jurisprudecircncia campo em que o desempenho juriacutedico comple-mentar da lsquohermenecircuticarsquo reside justamente em promover a concreccedilatildeo do direitordquo48 Ocorre que a cisatildeo fenomenoloacutegica que atualmente paira sobre dimensotildees soacutecio-poliacutetica-econocircmica do Estado brasilei-ro que satildeo intercambiaacuteveis com a dimensatildeo autocircnoma do proacuteprio Direito49 leva ao questionamento sobre a efetividade do papel do Poder Judiciaacuterio como guardiatildeo e cumpridor dos preceitos constitu-cionais inerentes agrave preservaccedilatildeo dos valores que sustentam o proacuteprio Estado Democraacutetico de Direito

A despeito de defender-se que o Poder Judiciaacuterio possui responsabilidade poliacutetica inerente agrave sua con-diccedilatildeo funcional de Poder do Estado a Constituiccedilatildeo hoje fragiliza-se diante dos interesses poliacuteticos e falece como ldquoinstacircncia da autonomia do Direito para limitar a transformaccedilatildeo das relaccedilotildees juriacutedico-ins-titucionais em um constante estado de exceccedilatildeo Disso tudo eacute possiacutevel dizer que tanto o velho discricio-narismo positivista quanto o pragmatismo fundado no decliacutenio do direito tecircm algo em comum o deacutefi-cit democraacuteticordquo50 a adulteraccedilatildeo das claacuteusulas democraacuteticas imantadas51 pela Constituiccedilatildeo de 1988 e a deseficacizaccedilatildeo dos valores constitucionais

5 ALENTO FINAL PARA NAtildeO DIZER QUE NAtildeO SE FALOU DAS FLORES

Do sonho poacutes-ditadura da excitaccedilatildeo preacute-democracia vive-se no Brasil o pesadelo da incerteza e da nebulosidade que adejam pelos descaminhos dos incongruentes desvios de competecircncia daqueles que incorporam a responsabilidade pela execuccedilatildeo dos Poderes do Estado O Executivo o Legislativo e o Judiciaacuterio emaranham-se por excessos e omissotildees pecaminosas que afetam agrave integridade moral do Estado Democraacutetico brasileiro

Enquanto a liberdade e a igualdade enfatizadas pelos prolegocircmenos constitucionais no exato estridor que a DUDH lhes deu como vindicaccedilotildees da moral da ordem puacuteblica e do bem-estar presumiacuteveis no seio de uma sociedade democraacutetica desfalecem sob o teto de vidro das Instituiccedilotildees que sobrelevam inte-resses especiacuteficos de grupos determinados a modernidade jaacute intuiacuteda como poacutes-moderna contempla brasileiros de um lado vociferarem contra o golpe e brasileiros de outro gritarem colericamente pela intervenccedilatildeo militar

De uma ou de outra forma e seja por qual dos bramidos que se observe a postura nacional natildeo se pode desprezar que o bem estar da sociedade brasileira estaacute comprometido e o marco axioloacutegico da Constituiccedilatildeo encontra-se rasgado O desrespeito aos matizes da Constituiccedilatildeo pelo desenfreio na dis-

46 GADAMER Hans-Georg Verdade e meacutetodo traccedilos fundamentais de uma hermenecircutica filosoacutefica Traduccedilatildeo de Flaacutevio Paulo Meurer

3 ed Petroacutepolis Editora Vozes 1999 p 88

47 GADAMER p 87

48 Ibid p 87

49 STRECK 2009 p 74

50 Idem p 75

51 KANT Immanuel Criacutetica de la razoacuten pura Traduccioacuten de Pedro Ribas Madrid Cayfosa-Quebecor 2004

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torccedilatildeo ou na extensatildeo semacircntica de preceitos constitucionais determinantes do escudo de direitos que satildeo de todos e natildeo somente de um ou de alguns e devem guarnecer a laquovontade do povoraquo corro-em a probidade dos Poderes do Estado profanando a acuidade do Poder Judiciaacuterio como defensor da Constituiccedilatildeo e garantidor dos Diretos Fundamentais

Por isto e malgrado o mundo se encontre a festejar os setenta anos da Declaraccedilatildeo Universal dos Direitos Humanos os juristas os acadecircmicos e todos os cidadatildeos brasileiros natildeo podem silenciar agraves situaccedilotildees poliacuteticas e as atitudes das autoridades nacionais que abalam a estabilidade dos Poderes do Estado brasileiro contaminando a perspectiva de efetividade dos valores constitucionais que ampa-ram ou deveriam amparar os Direitos Humanos prenunciados em 1948 pela accedilatildeo co-operativa da comunidade internacional que abnegou os excessos dos Estados que priorizavam interesses limitados de uma fraccedilatildeo de indiviacuteduos em detrimento dos direitos de todas as pessoas

Se o Brasil natildeo estaacute na iminecircncia de combalir a constacircncia e continuidade da quimera democraacutetica os brasileiros encontram-se imbuiacutedos na busca desajustada pela glorificaccedilatildeo de verdades que natildeo satildeo suas mas massificaram-se pela proeminecircncia de conformaccedilatildeo de um Poder antagocircnico agrave essecircncia do contrato social que previa como regra maior preservar a vida a liberdade e a igualdade reprimindo todo e qualquer tipo de violaccedilatildeo dos direitos naturais que afetem a dignidade humana seja na ordem material profissional afetiva espiritual

Assim sendo eacute imperioso natildeo olvidar-se que independente da autonomia e independecircncia dos Poderes do Estado a praacutetica jurisdicional e o exerciacutecio da funccedilatildeo e da responsabilidade poliacutetica do Poder Judiciaacuterio necessaacuteria agrave proacutepria garantia dos Direitos Fundamentais natildeo pode ser convertida em atuaccedilatildeo politiqueira que determina natildeo a politizaccedilatildeo do que eacute juriacutedico mas a transfiguraccedilatildeo da liberdade da igualdade e da dignidade em atributos limitados para a satisfaccedilatildeo dos direitos-desejos de uns poucos

No exerciacutecio de defender a Constituiccedilatildeo e assegurar a efetividade dos Direitos Fundamentais para todos os brasileiros o Poder Judiciaacuterio natildeo deve ou natildeo pode omitir-se ao significado que cada cidadatildeo apor-ta agrave contumaacutecia da Democracia e como cada qual interfere na relaccedilatildeo do laquoser aiacuteraquo com o laquoser no mundoraquo

Muito aleacutem de verberarem-se teses rotulantes que acirram acusaccedilotildees reciacuteprocas os grupos devem se unir no processo de instituiccedilatildeo de uma base diferenciada para a sofisticada interpretaccedilatildeo do Direito e da accedilatildeo poliacutetica do Poder Judiciaacuterio indispensaacutevel agrave conformaccedilatildeo teacutecnica-cientiacutefica de novos juristas aptos agrave superaccedilatildeo do tradicional ldquoparadigma metafiacutesicordquo52 de interpretaccedilatildeo juriacutedica

Recorde-se que a Declaraccedilatildeo Universal dos Direitos Humanos perfaz um documento unificador de agregaccedilatildeo impossiacutevel de ser rechaccedilado mesmo por um Estado que possui uma Constituiccedilatildeo balzaquia-na que foi pensada enaltecida e promulgada para preponderar a igualdade e a liberdade com respei-to agraves diferenccedilas impossiacuteveis de serem extirpadas da condiccedilatildeo humana individual de cada pessoa que perfaz o coletivo social

Como nos tempos preacutevios agrave consagraccedilatildeo da laquoConstituiccedilatildeo Cidadatilderaquo ainda ldquocaminhamos cantamos e seguimos a canccedilatildeo Somos todos iguais braccedilos dados ou natildeo e andamos pelas escolas ruas campos e construccedilotildees caminhando cantando e seguindo a canccedilatildeordquo53

Eacute hora de resgatar-se a estabilidade sensorial-ciacutevica para soerguer-se o juiacutezo do valor da naccedilatildeo bra-sileira e assim examinar-se cautelosa e francamente o sentido da responsabilidade e das funccedilotildees do Poder Judiciaacuterio definindo-se os limites de sua atuaccedilatildeo poliacutetica dentro da perspectiva de sua funccedilatildeo de defensor dos preceitos que configuram o Estado Democraacutetico de Direito indispensaacuteveis agrave efetiva-ccedilatildeo dos valores constitucionais

52 STRECK 2009 p 77

53 VANDREacute Geraldo Para natildeo dizer que natildeo falei de flores Disponiacutevel em lthttpswwwculturagenialcomgt Acesso em 23 jun 2018

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Este eacute o grande ldquodesafio hermenecircuticordquo54 posto aos juristas do seacuteculo XXI que precisam acima de qual-quer interpretaccedilatildeo-aplicaccedilatildeo corrosiva do direito positivo compreender a pertinaacutecia material do tex-to constitucional o que faratildeo somente quando apropriarem-se da responsabilidade de ldquoabrir uma nova clareira (Lichtung) no Direito des-ocultar caminhos des-cobrir as sendas que foram encobertas pelo positivismo[]rdquo55

Se assim natildeo for as flores pereceratildeo

REFEREcircNCIAS

ATHAYDE Austregeacutesilo de Discurso pronunciado na Assembleia Plenaacuteria da ONU Paris 10 de Dezembro de 1948 Disponiacutevel em lthttpsajonuorg20121017austregesilo-de-athayde-e-sua--fundamental-importancia-aos-direitos-humanosgt Acesso em 27 jun 2018

BACON Francis Movum Organum Traduccedilatildeo de Joseacute Aluysio Reis de Andrade Disponiacutevel em lthttpwwwebooksbrasilorgadobeebooknorganumpdfgt Acesso em 21 jun 2018

BOBBIO Norberto Estado Governo e Sociedade para uma teoria geral da poliacutetica Satildeo Paulo Editora Paz e Terra 2005

BRASIL 1988 Constituiccedilatildeo da Repuacuteblica Federativa do Brasil de 1988 Disponiacutevel em lthttpwwwplanaltogovbrccivil_03constituicaoconstituicaohtmgt Acesso em 06 jun 2018

DESCARTES Reneacute Discurso del meacutetodo meditaciones metafiacutesicas Traduccioacuten de Juan Gil Fernaacutendez Barcelona RBA 2004

GADAMER Hans-Georg Verdade e meacutetodo traccedilos fundamentais de uma hermenecircutica filosoacutefica Traduccedilatildeo de Flaacutevio Paulo Meurer 3 ed Petroacutepolis Editora Vozes 1999

GUARDINI Romano O fim dos tempos modernos Lisboa Livraria Moraes Editora 1964

HABERMAS Juumlrgen Direito e democracia entre facticidade e validade Rio de Janeiro Tempo Brasileiro 1997v1

______ O discurso filosoacutefico da modernidade Satildeo Paulo Martins Fontes 2002

HEIDEGGER Martin Todos noacutes ningueacutem um enfoque fenomenoloacutegico do social Traduccedilatildeo de Dulce Mara Critelli Satildeo Paulo Editora Moraes 1981

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54 Ibid p 77

55 STRECK 2009 p 77

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VANDREacute Geraldo Para natildeo dizer que natildeo falei de flores Disponiacutevel em lthttpswwwculturagenialcomgt Acesso em 23 jun 2018

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A DOACcedilAtildeO DE OacuteRGAtildeOS DEPOIS DO DECRETO Nordm 91752017

ORGAN DONATION AFTER DECREE Nordm 917517Juacutelio Moraes Oliveira1

Resumo O presente artigo tem por escopo analisar os aspectos juriacutedicos da doaccedilatildeo de oacutergatildeos no Brasil em especial depois da aprovaccedilatildeo do Decreto n 917517 que regulamentou da Lei de doaccedilatildeo de oacutergatildeos no Paiacutes Para tal desiderato analisa-se as principais legislaccedilotildees que regulamentam o tema bem como aspectos da bioeacutetica e do biodireito e as implicaccedilotildees legislativas da doaccedilatildeo em vida e da doaccedilatildeo apoacutes a morte

Palavras-chave Doaccedilatildeo Oacutergatildeos Legislaccedilatildeo

Abstract The purpose of this article is to analyze the legal aspects of organ donation in Brazil especially after the approval of Decree no 9175 17 which regulated the Law on donation of organs in the country To this end it analyzes the main legislation that regulates the subject as well as aspects of bioethics and the bio-law and the legislative implications of donation in life and donation after death

Keywords Donation Organs Legislation

1 INTRODUCcedilAtildeO

Sendo parte integrante do corpo humano e portanto pertencente agrave categoria dos direitos da persona-lidade a integridade fiacutesica deve ser preservada como proteccedilatildeo da proacutepria pessoa humana Os direitos da personalidade satildeo direitos subjetivos da pessoa humana capazes de garantir um miacutenimo necessaacuterio e fundamental agrave uma vida com dignidade 2

O transplante tambeacutem chamado de transplantaccedilatildeo nada mais eacute do que a transferecircncia de ceacutelulas teci-dos e oacutergatildeos vivos com a finalidade de restabelecer uma funccedilatildeo perdida de outro oacutergatildeo ceacutelula ou tecido sendo desse modo uma terapecircutica que tem por finalidade a substituiccedilatildeo de oacutergatildeos que perderam a sua funccedilatildeo no organismo Haacute basicamente dois tipos de transplantes o autoacutelogo cujas ceacutelulas tecidos ou oacutergatildeos satildeo retirados da proacutepria pessoa e implantados em um local diferente do corpo e o alogecircnico que compreende a retirada de material de outra pessoa (doador) para ser implantada no paciente (receptor)

1 Faculdade de Paraacute de Minas ndash Fapam Mestre em Instituiccedilotildees Sociais Direito e Democracia pela Universidade FUMEC (2011)

Especialista em Advocacia Civil pela Escola de Poacutes-Graduaccedilatildeo em Economia e Escola Brasileira de Administraccedilatildeo Puacuteblica e de Empresas

da Fundaccedilatildeo Getuacutelio Vargas EPGEFGV e EBAPEFGV (2007) Bacharel em Direito pela Faculdade de Direito Milton Campos - FDMC

(2005) Membro da Comissatildeo de Defesa do Consumidor - Seccedilatildeo Minas Gerais - OABMG Membro do Instituto Brasileiro de Poliacutetica e

Direito do Consumidor (BRASILCON) Membro Suplente do Conselho Municipal de Proteccedilatildeo e Defesa do Consumidor ndash Comdecon - BH

Professor da FAPAM - Faculdade de Paraacute de Minas Professor da Faculdade Asa de Brumadinho Parecerista da Revista da Faculdade

de Direito do Sul de Minas (FDSM) Qualis B1 Parecerista da Revista Quaestio Iuris da Universidade do Estado Rio de Janeiro (UERJ)

Qualis B1 Pesquisador com diversos artigos publicados em perioacutedicos Autor dos Livros Curso de Direito do Consumidor Completo 4

Ed Consumidor-Empresaacuterio a defesa do finalismo mitigado Advogado com experiecircncia em contencioso e consultivo em direito civil

consumidor empresarial e trabalhista

2 OLIVEIRA Julio Moraes Direitos da Personalidade Bioeacutetica e Biodireito Uma Breve Introduccedilatildeo Revista Direitos Emergentes na

Sociedade Global v 2 n 1 Santa Maria jan-jun 2013 p 1-28

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Revista Juriacutedica da Universidade do Sul de Santa Catarina

Com o objetivo de estabelecer uma nomenclatura unificada no processo de doaccedilatildeo e transplante formou--se um grupo de experts da Organizaccedilatildeo Mundial da Sauacutede (OMS) e da The Transplantation Society (TTS) no ano de 2008 Existia a necessidade dessa unificaccedilatildeo pois os termos eram empregados com significados diferentes em cada paiacutes tornando difiacuteceis a avaliaccedilatildeo e a comparaccedilatildeo dos resultados e estatiacutesticas 3

Ao contraacuterio de outras modalidades de tratamento o transplante de oacutergatildeos envolve aleacutem do pacien-te e da equipe meacutedica uma terceira figura o doador Este eacute quem disponibiliza os oacutergatildeos e tecidos que daratildeo aos receptores a possibilidade de tratamento sendo portanto o elemento mais importante para o sucesso do processo de doaccedilatildeo-transplante

Para que exista a doaccedilatildeo as pessoas necessitam ser conscientizadas da importacircncia do ato para a redu-ccedilatildeo da mortalidade de uma seacuterie de doenccedilas Os oacutergatildeos para transplantes podem ser obtidos de doa-dores vivos ou falecidos Em sua grande maioria as doaccedilotildees ocorrem em casos de morte encefaacutelica havendo tambeacutem um crescente nuacutemero nos paiacuteses desenvolvidos de doadores em morte circulatoacuteria

Desde o diagnoacutestico de morte encefaacutelica ateacute a efetiva realizaccedilatildeo do transplante satildeo deslocados uma seacuterie de pessoas e oacutergatildeos que constituem uma complicada e delicada rede logiacutestica de captaccedilatildeo sele-ccedilatildeo transporte e realizaccedilatildeo do transplante

Recentemente o Conselho Federal de Medicina (CFM) atualizou os criteacuterios para a definiccedilatildeo de morte encefaacutelica que agora poderaacute ser diagnosticada por mais especialistas aleacutem do neurologista Atraveacutes da Resoluccedilatildeo nordm 217317 que substitui a de nordm 148097 e atende o que determina a lei nordm 943497 e o decreto presidencial nordm 917517 que regulamentam o transplante de oacutergatildeos no Brasil

Tendo em vista essa breve introduccedilatildeo o que se pretende com o presente estudo eacute analisar os aspectos juriacutedicos da doaccedilatildeo de oacutergatildeos no Brasil seja em vida ou post mortem

2 A HISTOacuteRIA DOS TRANSPLANTES E SUAS ESTATIacuteSTICAS

A ideacuteia de transferir tecidos de um organismo a outro natildeo eacute recente na histoacuteria afirma Maria Helena Diniz que trezentos anos antes de Cristo a tradiccedilatildeo chinesa apontava a troca de oacutergatildeos entre dois irmatildeos feita pelo meacutedico Pien Chiao 4 Estudos arqueoloacutegicos feitos no Egito na Greacutecia e na Ameacuterica Preacute-colombiana apontam que houve a tentativa de transplantes de dentes

Mas realmente somente agrave partir do transplante realizado por Joseph Murray em 23 de dezembro de 1954 o primeiro transplante de oacutergatildeos humanos bem sucedido no mundo pode-se falar em transplan-te de oacutergatildeos como conhecemos nos dias atuais

Mesmo depois de 64 anos de estudos e desenvolvimento dessas teacutecnicas o conhecimento da popula-ccedilatildeo a respeito do tema ainda eacute muito escasso Essa falta de conhecimento eacute um fato gerador natildeo soacute de desinteresse pelo assunto mas tambeacutem de preconceito e recusa na doaccedilatildeo dos oacutergatildeos pelos familiares

Mesmo com esse desconhecimento a respeito do assunto em 2016 o Brasil registrou o maior nuacutemero de doadores efetivos da histoacuteria foram 2983 doadores o que representa uma taxa de 146 PMP (por milhatildeo da populaccedilatildeo) 5 maior em comparaccedilatildeo a 2015 5

3 GARCIA Valter Duro PACINI Gabriel Sartori Recomendaccedilotildees de Nomenclatura no processo de Doaccedilatildeo e transplante In (Org)

GARCIA Clotilde Druck PEREIRA Japatildeo Droumlse GARCIA Valter Duro Doaccedilatildeo e Transplante de oacutergatildeos e tecidos Satildeo Paulo Segmento

Farma 2015 p 23

4 DINIZ Maria Helena O Estado Atual do Biodireito 5 ed Rev atual e amp Satildeo Paulo Saraiva 2008 p 291

5 BRASIL Nuacutemero de Brasileiros doadores de oacutergatildeos bate recorde em 2016 Dados fornecidos pelo Governo Federal Disponiacutevel em lthttp

wwwbrasilgovbrsaude201703numero-de-brasileiros-doadores-de-orgaos-bate-recorde-em-2016gt Acesso em 05 abr 2018

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Dados da ABTO (Associaccedilatildeo Brasileira de Transplante de oacutergatildeos) apontam que em 2013 por exemplo 47 das famiacutelias que tiveram um ente com morte encefaacutelica recusaram o transplante Esses mesmos dados afirmam que o Brasil eacute trigeacutesimo paiacutes em nuacutemero de transplantes quando relacionados ao nuacuteme-ro de habitantes e o segundo paiacutes em nuacutemeros absolutos de transplantes atraacutes apenas dos Estados Unidos Mesmo assim ateacute 2013 a fila de espera por oacutergatildeo foi de 24 mil pessoas 6

Afirma Maria Helena Diniz que o transplante de oacutergatildeos e tecidos apesar de ser uma das mais notaacuteveis conquistas cientiacuteficas apresenta ainda muitos obstaacuteculos a serem vencidos pelos enormes problemas de natureza eacutetico-juriacutedicas 7

Com efeito o art13 do Coacutedigo Civil disciplina que salvo por exigecircncia meacutedica eacute defeso o ato de dispo-siccedilatildeo do proacuteprio corpo quando importar diminuiccedilatildeo permanente da integridade fiacutesica ou contrariar os bons costumes Jaacute o paraacutegrafo uacutenico afirma que o ato previsto ali seraacute admitido para fins de transplante na forma estabelecida em lei especial Eacute o que se pretende analisar no presente trabalho

3 DA DOACcedilAtildeO EM VIDA

A doaccedilatildeo de oacutergatildeos eacute um dos aspectos mais altruiacutestas da vida em sociedade seu caraacuteter humanitaacuterio eacute incontestaacutevel e a maioria dos paiacuteses a coloca como um dos principais aspectos de poliacutetica de sauacutede puacuteblica

No Brasil os transplantes somente poderatildeo ser realizados em pacientes com doenccedila progressiva ou inca-pacitante e irreversiacutevel por outras teacutecnicas terapecircuticas Eacute permitida a doaccedilatildeo no Brasil agrave doaccedilatildeo entre pessoas vivas de tecidos oacutergatildeos e partes do proacuteprio corpo para fins terapecircuticos ou para transplantes Afirma o art 29 do Decreto n 917517 que somente seraacute permitida a doaccedilatildeo quando se tratar de oacutergatildeos duplos de partes de oacutergatildeos tecidos ceacutelulas e partes do corpo cuja retirada natildeo impeccedila o organismo do doador de continuar vivendo sem risco para a sua integridade e natildeo represente grave comprometimento de suas aptidotildees vitais e de sua sauacutede mental e natildeo cause mutilaccedilatildeo ou deformaccedilatildeo inaceitaacutevel

Na doaccedilatildeo em vida permite-se ao beneficiaacuterio escolher o receptor do oacutergatildeo quando forem parentes na linha reta ou colateral de ateacute 4ordm grau ou ao cocircnjuge ou companheiro e nas outras hipoacuteteses que natildeo sejam parentes consanguiacuteneos eacute necessaacuteria uma autorizaccedilatildeo judicial dispensada esta quando se tratar de medula oacutessea Isso eacute o que dispotildee os artigos 9ordm da Lei n 943497 e o artigo 27 do Decreto n 917518

Anteriormente era exigido ao meacutedico antes de realizar os transplantes entre vivos o envio de um comunicado ao Promotor de Justiccedila da Comarca do domiciacutelio do doador para apuraccedilatildeo da sua licitude atraveacutes de um procedimento investigatoacuterio Todavia com o advento do referido Decreto foram revo-gados os artigos 20 e 25 II Do Decreto n 226897 excluiacuteda portanto a intervenccedilatildeo ministerial8

A retirada de oacutergatildeos soacute seraacute permitida se corresponder a uma necessidade terapecircutica comprovadamen-te indispensaacutevel para a pessoa receptora e o doador vivo seraacute preacutevia e obrigatoriamente esclarecido sobre as consequecircncias e os riscos decorrentes da retirada do oacutergatildeo tecido ceacutelulas ou parte do seu corpo para a doaccedilatildeo Esses esclarecimentos seratildeo consignados em documento lavrado e lido na presenccedila de duas testemunhas e o doador deveraacute especificar o tecido o oacutergatildeo a ceacutelula ou a parte do seu corpo que doaraacute para transplante ou enxerto o nome da pessoa beneficiada e a qualificaccedilatildeo e o endereccedilo dos envolvidos

Nos casos em que a doaccedilatildeo for feita a pessoas fora do ciacuterculo familiar autorizado pela lei o Comitecirc de Bioeacutetica ou a Comissatildeo de Eacutetica do hospital onde se realizaraacute a retirada e o transplante ou o enxerto emitiraacute parecer sobre o caso nos termos do art 29 sect 5ordm do referido Decreto

6 BRASIL Primeiro Transplante faz 50 anos e falta de diaacutelogo dificulta a doaccedilatildeo de oacutergatildeos Disponiacutevel em lthttpagenciabrasilebccom

brgeralnoticia2014-04falta-de-dialogo-sobre-o-assunto-dificulta-doacao-de-orgaosgt Acesso em 05 abr 2018

7 DINIZ Maria Helena O Estado Atual do Biodireito 5 ed Ver atual e amp Satildeo Paulo Saraiva 2008 p 292

8 FARIAS Cristiano Chaves de ROSENVALD Nelson Curso de Direito Civil Parte Geral e LINDB 16 ed Salvador Juspodivm 2018 p 244

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A legislaccedilatildeo tambeacutem permite a doaccedilatildeo de medula oacutessea de pessoa juridicamente incapaz entre seus consanguumliacuteneos desde que sejam observadas autorizaccedilatildeo expressa de ambos os pais ou de seus repre-sentantes legais apoacutes serem esclarecidos sobre os riscos do ato a necessidade de autorizaccedilatildeo judicial e quando o transplante natildeo oferecer risco para a sauacutede do doador

Antes do procedimento de doaccedilatildeo o doador pode desistir a qualquer momento uma vez que a doaccedilatildeo eacute um ato plenamente revogaacutevel a qualquer tempo

Com relaccedilatildeo agraves gestantes estas natildeo poderatildeo doar oacutergatildeos tecidos e partes de seu corpo exceto medula oacutessea desde que natildeo haja risco para a sua sauacutede e a do embriatildeo ou do feto Jaacute a doaccedilatildeo de ceacutelulas pro-genitoras do sangue do cordatildeo umbilical e placentaacuterio do nascituro eacute permitida desde que autorizada pela gestante A doaccedilatildeo de cordatildeo umbilical eacute um dos tratamentos mais promissores da medicina da atualidade a utilizaccedilatildeo das ceacutelulas tronco do cordatildeo umbilical ajuda no tratamento de diversas doen-ccedilas como vaacuterios tipos de leucemia e anemias graves

Hoje ela pode ser feita para armazenamento proacuteprio e para bancos puacuteblicos Depois do parto o cor-datildeo umbilical eacute pinccedilado (lacrado com uma pinccedila) e separado do bebecirc cortando a ligaccedilatildeo entre o bebecirc e a placenta A quantidade de sangue (cerca de 70 ndash 100 ml) que permanece no cordatildeo e na placenta eacute drenada para uma bolsa de coleta as ceacutelulas-tronco satildeo separadas e preparadas para o congelamento Estas mesmas ceacutelulas podem permanecer congeladas por vaacuterios anos no Banco de Sangue de Cordatildeo Umbilical e ficar disponiacuteveis para serem transplantadas A doaccedilatildeo tem caraacuteter sigiloso

Nem todas as gestantes estatildeo aptas a doar o cordatildeo umbilical os criteacuterios meacutedicos determinam uma faixa etaacuteria entre 18 e 36 anos que tenha realizado os exames preacute-natais e que esteja com mais de 35 semanas de gravidez Aleacutem disso a gestante doadora natildeo deve possuir histoacuterico meacutedico de doenccedilas neoplaacutesicas (cacircncer) eou hematoloacutegicas (anemias hereditaacuterias dentre outras)

A legislaccedilatildeo brasileira permite tambeacutem o chamado autotransplante transplante autoacutelogo ou autogecircni-co que nada mais eacute do que usar ceacutelulas do proacuteprio corpo do doador para curar doenccedilas

Com relaccedilatildeo ao receptor o decreto determina que o transplante ou enxerto somente seraacute feito com seu consentimento expresso apoacutes ser alertado dos riscos do procedimento nos termos do art 32 do Decreto n 917517

Nas hipoacuteteses em que o recptor seja juridicamente incapaz ou esteja privado de meio de comunicaccedilatildeo oral ou escrita o consentimento para a realizaccedilatildeo do transplante seraacute fornecido pelo cocircnjuge ou com-panheiro ou por parente consanguiacuteneo ou afim de maior idade e juridicamente capaz na linha reta ou colateral ateacute o quarto grau inclusive Este documento deveraacute ser subscrito por duas testemunhas pre-sentes na assinatura do termo

Os estrangeiros que vierem a falecer em solo brasileiro poderatildeo ser doadores de oacutergatildeos tecidos ceacutelu-las e partes do corpo humano a eles as mesmas exigecircncias referentes aos potenciais doadores brasilei-ros dos artigos 40 e seguintes do Decreto

4 DA DOACcedilAtildeO POST MORTEM

A doaccedilatildeo presumida de oacutergatildeos e tecidos post mortem mediante diagnoacutestico de morte encefaacutelica natildeo mais existe no direito brasileiro por forccedila da redaccedilatildeo da Lei n 1021101 De 1997 a 2001 a Lei n 943497 contou com a possibilidade de doaccedilatildeo presumida de oacutergatildeos que constaria nos documentos de identidade Tal mudanccedila na legislaccedilatildeo cauccedilatildeo uma intensa polecircmica na sociedade que produziu exa-tamente o medo e a desconfianccedila da populaccedilatildeo acerca do procedimento

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Hoje na doaccedilatildeo apoacutes a morte os criteacuterios legais satildeo distintos Em primeiro lugar o Coacutedigo Civil no seu artigo 14 afirma que ldquoeacute vaacutelida com objetivo cientiacutefico ou altruiacutestico a disposiccedilatildeo gratuita do proacuteprio corpo no todo ou em parte para depois da morterdquo Jaacute o artigo 4ordm da Lei n 943497 dispotildee que ldquoa retirada de tecidos oacutergatildeos e partes do corpo de pessoas falecidas para transplantes ou outra finalidade terapecircutica dependeraacute da auto-rizaccedilatildeo do cocircnjuge ou parente maior de idade obedecida a linha sucessoacuteria reta ou colateral ateacute o segundo grau inclusive firmada em documento subscrito por duas testemunhas presentes agrave verificaccedilatildeo da morte Assim tambeacutem determina o art 20 do recente Decreto n 917518 ao externar que ldquoa retirada de oacutergatildeos tecidos ceacutelulas e partes do corpo humano apoacutes a morte somente poderaacute ser realizada com o consentimento livre e esclarecido da famiacutelia do falecido consignado de forma expressa em termo especiacutefico de autorizaccedilatildeordquo

Como se percebe ocorre um aparente conflito de normas acerca da possibilidade de disposiccedilatildeo do proacute-prio corpo para depois da morte inclusive nas situaccedilotildees de transplantes

Esse conflito estaacute diretamente relacionado ao princiacutepio da autonomia privada que rege as relaccedilotildees juriacutedicas do cidadatildeo Natildeo haacute uma unanimidade sobre o conceito de autonomia privada ou mesmo para alguns autonomia da vontade Segundo Perlingieri a autonomia privada consiste no poder reconhe-cido ou atribuiacutedo pelo ordenamento ao sujeito de direito puacuteblico ou privado de regular com proacuteprias manifestaccedilotildees de vontade interesses privados ou puacuteblicos ainda que natildeo necessariamente proacuteprios 9

Jaacute Ceacutesar Fiuza afirma que para se falar em autonomia privada deve-se fazer um resgate histoacuterico Segundo o autor a autonomia da vontade era um princiacutepio de direito privado que facultava agraves pessoas total liberdade para contrair obrigaccedilotildees para testar casar e desquitar Fundava-se na vontade livre na liberdade de agir 10 Jaacute a autonomia privada eacute uma evoluccedilatildeo da autonomia da vontade eacute a esfera de liberdade que as pessoas possuem no ordenamento juriacutedico Difere da autonomia da vontade em que o contrato vem de dentro pra fora na autonomia privada o contrato natildeo vem exclusivamente de den-tro natildeo eacute um fenocircmeno volitivo A vontade eacute condicionada por fatores externos ou por necessidades11

Feita essa breve ponderaccedilatildeo eacute imperioso ressaltar que a doutrina com base na autonomia privada tem afirmado que a vontade do doador em vida deve prevalecer sobre a vontade dos familiares em respei-to ao princiacutepio da autonomia privada

Nesse sentido Nelson Rosenvald e Cristiano Chaves de Farias concluem que havendo manifestaccedilatildeo de vontade do titular ainda vivo no sentido de ser ou natildeo doador de oacutergatildeos haacute de ser respeitada 12

Eacute o que dispotildee o Enunciado 277 da 4ordf Jornada de Direito Civil senatildeo vejamos

O art 14 do Coacutedigo Civil ao afirmar a validade da disposiccedilatildeo gratuita do proacuteprio corpo com

objetivo cientiacutefico ou altruiacutestico para depois da morte determinou que a manifestaccedilatildeo expressa

do doador de oacutergatildeos em vida prevalece sobre a vontade dos familiares portanto a aplicaccedilatildeo do

art 4ordm da Lei n 943497 ficou restrita agrave hipoacutetese de silecircncio do potencial doador

Esse tambeacutem o entendimento de Schreiber ao asseverar que exigir autorizaccedilatildeo de cocircnjuge ou paren-te firmada em documento subscrito por duas testemunhas presentes agrave verificaccedilatildeo da morte eacute impor burocracia que dificulta ainda mais Segundo o referido autor tal interpretaccedilatildeo subordina a autonomia corporal do indiviacuteduo agrave vontade de terceiros tratando-se de grave atentado ao valor constitucional dignidade das pessoas humana13

9 PERLINGIERI Pietro O Direito Civil na Legalidade Constitucional Rio de Janeiro Renovar 2008 p 338

10 FIUZA Ceacutesar Dignidade humana autonomia privada e direitos da personalidade In Autonomia Privada Direitos da Personalidade

(Org) Fiuza Ceacutesar Belo Horizonte Dplaacutecido Editora 2015 p 35

11 Idem p 44

12 FARIAS Cristiano Chaves de ROSENVALD Nelson Curso de Direito Civil Parte Geral e LINDB 16 ed Salvador Juspodivm 2018 p 245

13 SCHREIBER Anderson Direitos da personalidade Satildeo Paulo Atlas 2011 p 47

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Esse parece ser o melhor entendimento acerca do tema pois se coaduna com a autonomia privada do paciente e se submete ao valor da dignidade da pessoa humana como principal objeto de proteccedilatildeo de os Estado Mas infelizmente o legislador do Decreto n 917518 mesmo tendo a oportunidade de cor-rigir essa falha manteve o posicionamento legislativo criticado

Constatada a morte e a ausecircncia de contraindicaccedilotildees cliacutenicas conhecidas caberaacute agraves equipes assisten-ciais do hospital onde se encontra o falecido prover o suporte terapecircutico artificial de forma a ofere-cer a melhor preservaccedilatildeo in situ possiacutevel dos oacutergatildeos tecidos ceacutelulas e partes do corpo humano ateacute que a famiacutelia decida sobre sua doaccedilatildeo A legislaccedilatildeo ainda afirma que cabe agrave rede de procura e doaccedilatildeo de oacutergatildeos tecidos ceacutelulas e partes do corpo humano para transplante sob a coordenaccedilatildeo da CET (Central Estadual de Transplantes) e em consonacircncia com as equipes assistenciais e transplantadoras proce-der ao planejamento ao contingenciamento e agrave provisatildeo dos recursos fiacutesicos e humanos do transporte e dos demais insumos necessaacuterios agrave realizaccedilatildeo da cirurgia de retirada dos oacutergatildeos e dos demais enxertos

Eacute vedada a remoccedilatildeo post mortem de tecidos oacutergatildeos ou partes do corpo de pessoas natildeo identificadas

Apoacutes a retirada de tecidos oacutergatildeos e partes o cadaacutever seraacute imediatamente necropsiado e em qualquer caso condignamente recomposto para ser entregue em seguida aos parentes do morto ou seus res-ponsaacuteveis legais para sepultamento O corpo seraacute acompanhado do relatoacuterio com a descriccedilatildeo da cirur-gia de retirada e dos eventuais procedimentos realizados e a documentaccedilatildeo seraacute anexada ao prontu-aacuterio legal do doador com coacutepia destinada agrave instituiccedilatildeo responsaacutevel pela realizaccedilatildeo da necropsia nos termos do art 25 do Decreto Ao doador de oacutergatildeos tecidos ceacutelulas e partes do corpo humano seraacute dada a precedecircncia para a realizaccedilatildeo da necropsia imediatamente apoacutes a cirurgia de retirada

5 SISTEMA NACIONAL DE TRANSPLANTES

O Sistema Nacional de Transplantes estaacute previsto no Decreto n 9117518 dos artigos 2ordm ao 10 Satildeo integrantes do Sistema Nacional de Transplantes (SNT) o Ministeacuterio da Sauacutede as Secretarias de Sauacutede dos Estados e do Distrito Federal as Secretarias de Sauacutede dos Municiacutepios as Centrais Estaduais de Transplantes - CET a Central Nacional de Transplantes - CNT as estruturas especializadas integrantes da rede de procura e doaccedilatildeo de oacutergatildeos tecidos ceacutelulas e partes do corpo humano para transplantes as estruturas especializadas no processamento para preservaccedilatildeo ex situ de oacutergatildeos tecidos ceacutelulas e par-tes do corpo humano para transplantes os estabelecimentos de sauacutede transplantadores e as equipes especializadas e a rede de serviccedilos auxiliares especiacuteficos para a realizaccedilatildeo de transplantes

O Sistema Nacional de Transplantes tem como atribuiccedilotildees principais a intervenccedilatildeo nas atividades de doaccedilatildeo e transplante de oacutergatildeos tecidos ceacutelulas e partes do corpo humano a partir de doadores vivos ou falecidos a identificaccedilatildeo dos casos de morte encefaacutelica e a determinaccedilatildeo do destino de oacutergatildeos tecidos ceacutelulas e partes do corpo humano retirados para transplante em qualquer ponto do territoacuterio nacional

Ao Ministeacuterio da Sauacutede dentre outras atribuiccedilotildees estaacute a de prover e manter a Central Nacional de Transplantes de oacutergatildeos (CNT) bem como autorizar as Centrais Estaduais de Transplantes (CET) A CNT fica responsaacutevel por gerenciar as CETrsquos bem como por alocar os oacutergatildeos e os tecidos retirados em conformidade com a lista uacutenica de espera de receptores de forma a otimizar as condiccedilotildees teacutecnicas de preservaccedilatildeo transporte e distribuiccedilatildeo considerados os criteacuterios estabelecidos nas normas em vigor e com vistas a garantir o seu melhor aproveitamento e a equidade na sua destinaccedilatildeo

Os transplantes os enxertos ou as retiradas de oacutergatildeos tecidos ceacutelulas e partes do corpo humano somente poderatildeo ser realizados em estabelecimentos de sauacutede puacuteblicos ou privados por equipes especializadas preacutevia e expressamente autorizados pelo oacutergatildeo central do SNT

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6 CONCLUSAtildeO

Diante de todo exposto conclui-se que o tema acerca dos transplantes de oacutergatildeos sempre foi um assun-to bastante polecircmico por envolver questotildees eacutetico-juriacutedicas O Brasil visando evitar a comercializa-ccedilatildeo desse direito da personalidade extra commercium legislou a respeito do tema tratando dos prin-cipais aspectos eacuteticos e praacuteticos da doaccedilatildeo de oacutergatildeos Para isso criou-se um Sistema Nacional de Transplantes que deve atuar de forma integrada para que os resultados sejam alcanccedilados uma vez que o transplante exige uma complexa logiacutestica e uma seacuterie de profissionais envolvidos para que se obtenha o resultado almejado O novo Decreto n 917517 trouxe alguns avanccedilos mas manteve alguns pontos criticados pela doutrina como a manutenccedilatildeo da exigecircncia do consentimento familiar para a retirada de oacutergatildeos de pessoas mortas

Demonstrou-se que salvo melhor juiacutezo tal dispositivo ainda continua violando a autonomia privada do paciente e consequentemente a sua dignidade humana

Mas mesmo com todo esse arcabouccedilo juriacutedico percebe-se que somente a legislaccedilatildeo eacute incapaz de aumentar o altruiacutesmo das pessoas e incentivar a doaccedilatildeo de oacutergatildeos no Brasil

REFEREcircNCIAS

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FARIAS Cristiano Chaves de ROSENVALD Nelson Curso de Direito Civil Parte Geral e LINDB 16 ed Salvador Juspodivm 2018

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SCHREIBER Anderson Direitos da Personalidade Satildeo Paulo Atlas 2011

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DIREITOS HUMANOS E FUNDAMENTAIS NA FRONTEIRA ENTRE DIREITO E ECONOMIA A EFICIEcircNCIA DAS POLIacuteTICAS PUacuteBLICAS DE SAUacuteDE NO BRASIL

HUMAN AND FUNDAMENTAL RIGHTS AT THE BORDER BETWEEN LAW AND ECONOMICS THE EFFICIENCY OF HEALTH PUBLIC POLICIES IN BRAZILMarco Aureacutelio Souza da Silva1

Resumo O artigo aborda a importacircncia da interdisciplinaridade entre direito e economia na concre-tizaccedilatildeo dos direitos constitucionais relacionados agraves poliacuteticas puacuteblicas de sauacutede no Brasil Nas relaccedilotildees entre direito e economia procura-se demonstrar as diversas possibilidades de contribuiccedilotildees da anaacuteli-se econocircmica para a gestatildeo dos recursos puacuteblicos especialmente em relaccedilatildeo ao papel da eficiecircncia no planejamento dos gastos estatais na eleiccedilatildeo das prioridades de alocaccedilatildeo de recursos e na realizaccedilatildeo de poliacuteticas puacuteblicas de sauacutede Partindo do meacutetodo dedutivo o objetivo do estudo eacute examinar alguns aspectos relevantes da teoria da anaacutelise econocircmica do direito que se relacionam com as poliacuteticas puacutebli-cas de sauacutede O debate eacute enriquecido com dados estatiacutesticos do Banco Mundial e do Tribunal de Contas da Uniatildeo sobre a eficiecircncia dos gastos com sauacutede e sua judicializaccedilatildeo no Brasil Conclui-se que os ser-viccedilos puacuteblicos de sauacutede no paiacutes podem ser melhorados em quantidade e qualidade desde que levados em consideraccedilatildeo aspectos natildeo apenas de efetividade mas tambeacutem de eficiecircncia

Palavras-chave Direito e economia Anaacutelise econocircmica do direito Poliacuteticas puacuteblicas Sauacutede Eficiecircncia

Abstract The article discusses the importance of the interdisciplinarity between law and economics in the concretization of constitutional rights related to health public policies in Brazil In the relations between law and economics it is tried to demonstrate the diverse possibilities of contributions of the economic analysis to the management of public resources especially in relation to the role of efficiency in the planning of the sta-te expenses in the election of the priorities of allocation of resources and in the realization of health public policies Based on the deductive method the objective of the study is to examine some relevant aspects of the theory of economic analysis of law that relate to health public policies The debate is enriched with statistical data from the World Bank and the Tribunal de Contas da Uniatildeo on the efficiency of health spending and its judicialization in Brazil It is concluded that health public services in the country can be improved in quantity and quality taking into account aspects not only of effectiveness but also of efficiency

Keywords Law and economics Economic analysis of law Public policies Health Efficiency

1 Doutorando e Mestre em Direito pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) Graduado em Direito pela Universidade Federal

de Santa Catarina (UFSC) Graduado em Medicina Veterinaacuteria pela Universidade Federal de Santa Maria (UFSM) Auditor Fiscal de

Controle Externo do Tribunal de Contas do Estado de Santa Catarina (TCESC) Membro do Centro de Estudos Juriacutedico-Econocircmicos e de

Gestatildeo para o Desenvolvimento (CEJEGD) do Centro de Ciecircncias Juriacutedicas (CCJUFSC) Membro associado da Associaccedilatildeo Brasileira de

Direito e Economia (ABDE) FlorianoacutepolisSC Brasil e-mail marcoaurelio_vetyahoocombr

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1 INTRODUCcedilAtildeO

No ano em que completa 30 anos de existecircncia a Constituiccedilatildeo Federal de 1988 ainda eacute objeto de inten-so debate quando se fala em efetividade e eficiecircncia dos direitos sociais nela proclamados especial-mente em um paiacutes com enormes desigualdades sociais e em meio a crises econocircmica e poliacutetica Parece consenso hoje que as soluccedilotildees para essa situaccedilatildeo ultrapassam a fronteira do direito jaacute que a utilizaccedilatildeo do instrumental juriacutedico isoladamente natildeo foi capaz de levar adiante os ditames constitucionais de um Estado democraacutetico moldado haacute trecircs deacutecadas

Na academia de modo geral haacute um movimento em direccedilatildeo agrave interdisciplinaridade isto eacute agrave necessida-de de o direito romper suas fronteiras e interagir com outras aacutereas do conhecimento e assim iluminar os caminhos para concretizaccedilatildeo de uma sociedade verdadeiramente democraacutetica Uma das relaccedilotildees interdisciplinares que merece destaque nesse campo eacute aquela existente entre direito e economia dada a possibilidade de enorme contribuiccedilatildeo para o planejamento dos gastos puacuteblicos a eleiccedilatildeo das priori-dades de alocaccedilatildeo de recursos e a realizaccedilatildeo das poliacuteticas puacuteblicas visando a atender ao maior interes-se da sociedade e do desenvolvimento

Entre os domiacutenios do direito e da economia tem sido cada vez discutida a anaacutelise econocircmica do direito Essa abordagem compreende diversas correntes cujo propoacutesito eacute o de utilizar uma metodologia cien-tiacutefica que parte de pressupostos econocircmicos para a criaccedilatildeo a interpretaccedilatildeo e a aplicaccedilatildeo das normas juriacutedicas tendo em vista os seus efeitos sobre o comportamento dos indiviacuteduos Desse modo o foco de estudo deixa de ser a causa para ser o resultado das accedilotildees individuais

Para aleacutem de conceber o direito essencialmente como provedor de justiccedila a anaacutelise econocircmica propotildee que as leis e as decisotildees juriacutedicas funcionem como incentivos para modificar o comportamento dos indiviacuteduos a fim de que o Estado possa melhor atingir seu papel distributivo de forma mais efetiva e eficiente Muito embora a eficiecircncia no plano constitucional tenha sido alccedilada agrave condiccedilatildeo de princiacutepio juriacutedico eacute forccediloso considerar o seu niacutetido conteuacutedo econocircmico Daiacute a necessidade de tambeacutem com-preender a eficiecircncia positivada na Constituiccedilatildeo Federal e na legislaccedilatildeo administrativa agrave luz da anaacuteli-se econocircmica do direito como instrumental importante para auxiliar na administraccedilatildeo dos recursos puacuteblicos no desenvolvimento social e na concretizaccedilatildeo de direitos fundamentais sociais por meio das poliacuteticas puacuteblicas

Entre os direitos fundamentais agasalhados pelas poliacuteticas puacuteblicas que deve ser analisado tambeacutem sob a oacuteptica da economia estaacute o direito agrave sauacutede tema de grande debate em razatildeo da judicializaccedilatildeo dado o confronto entre a sua concretizaccedilatildeo e a escassez de recursos orccedilamentaacuterios Essa questatildeo faz emer-gir o problema de que os direitos tecircm custos e que por isso os recursos na sociedade devem ser geridos com eficiecircncia especialmente por parte da Administraccedilatildeo Puacuteblica

O objetivo do presente estudo eacute examinar a relaccedilatildeo entre direito e economia e abordar alguns aspectos relevantes que a visatildeo da anaacutelise econocircmica exerce sobre a interpretaccedilatildeo juriacutedica das poliacuteticas puacutebli-cas de sauacutede com vistas a enriquecer o debate sobre os gastos puacuteblicos tendo como pano de fundo as conclusotildees dos relatoacuterios elaborados pelo Banco Mundial sobre a (in)eficiecircncia dos gastos puacuteblicos em sauacutede no Brasil e pelo Tribunal de Contas da Uniatildeo acerca da judicializaccedilatildeo

O artigo eacute inicialmente estruturado com uma abordagem sobre a interdisciplinaridade entre direito e economia seguido de uma incursatildeo sobre o movimento da anaacutelise econocircmica do direito destacando--se a sua metodologia para a tomada de decisatildeo Na sequecircncia satildeo desenvolvidas as principais ideias acerca do papel da eficiecircncia na anaacutelise econocircmica assim como da proteccedilatildeo dos direitos humanos e fundamentais nas poliacuteticas puacuteblicas de sauacutede Por fim discute-se a eficiecircncia dos gastos com poliacuteticas puacuteblicas de sauacutede e sua judicializaccedilatildeo no Brasil a partir dos dados extraiacutedos dos relatoacuterios do Banco Mundial e do Tribunal de Contas da Uniatildeo

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2 NA FRONTEIRA ENTRE DIREITO E ECONOMIA O DIAacuteLOGO INTERDISCIPLINAR

Em que pese a sua fundamental importacircncia para a estruturaccedilatildeo do Estado a organizaccedilatildeo dos indiviacutedu-os e a convivecircncia coletiva o direito daacute atualmente demonstraccedilotildees de que a sua aplicaccedilatildeo isolada natildeo eacute capaz de solucionar todos os problemas de uma sociedade contemporacircnea complexa e em contiacutenu-as transformaccedilotildees Por isso tem sido cada vez mais comum na academia observar o estudo do direito em um campo de interdisciplinaridade dialogando com outras aacutereas do conhecimento como ocorre por exemplo entre direito e psicanaacutelise direito e literatura direito e criminologia direito e filosofia ou direito e sociologia

No campo interdisciplinar merece ser enfatizada a relaccedilatildeo entre direito e economia norteada pela aplicaccedilatildeo dos conceitos e meacutetodos econocircmicos ao estudo do direito A anaacutelise da relaccedilatildeo entre essas disciplinas natildeo eacute recente mas eacute de grande importacircncia por diversos aspectos notadamente pelo momento por que passa o paiacutes com crise econocircmica crise poliacutetica desorganizaccedilatildeo das contas puacuteblicas e precariedade na efetivaccedilatildeo de direitos sociais

Ao longo da histoacuteria houve momentos ou ondas de aproximaccedilatildeo e de afastamento entre as aacutereas do direito e da economia Schumpeter afirma que a origem comum das disciplinas remonta agrave ideia de direi-to natural desenvolvida pela escolaacutestica medieval (Santo Tomaacutes de Aquino) e pelos filoacutesofos do direito natural do seacuteculo XVII (Hugo Grotius Thomas Hobbes John Locke Samuel von Pufendorf e Christian Wolff)2 Nesse contexto verifica-se que o desenvolvimento cientiacutefico da interaccedilatildeo entre as disciplinas foi edificado em torno da ideia de ordem natural e de construccedilotildees abstratas

Mackaay salienta que precursores do movimento integrativo entre direito e economia tambeacutem podem ser encontrados no utilitarismo do seacuteculo XVIII entre os quais David Hume Cesare Beccaria Adam Smith e Jeremy Bentham Tais pensadores no entanto apesar de realccedilarem a anaacutelise do comporta-mento humano como resultado de escolhas racionais e de custos e benefiacutecios natildeo apresentaram um entendimento sistemaacutetico do direito a partir do modelo de escolha racional3 Posner acrescenta que especificamente em relaccedilatildeo aos pensadores Smith4 e Bentham5 o campo de estudo que remonta ao primeiro diz respeito agrave anaacutelise econocircmica das leis que regulam mercados expliacutecitos ou ainda leis que regulam o sistema econocircmico no sentido convencional enquanto que aquele originado com Bentham se refere agrave anaacutelise econocircmica das leis que regulam o comportamento natildeo comercial (non-market) (aci-dentes crimes casamento poluiccedilatildeo processo poliacutetico etc)6

Em um magniacutefico estudo Mackaay demonstra que a denominada ldquoprimeira ondardquo das relaccedilotildees entre direito e economia estaacute compreendida entre 1830 e 1930 coincidindo com o surgimento da escola histoacuterica alematilde que defendia a utilizaccedilatildeo da histoacuteria como instrumento analiacutetico e de reconstruccedilatildeo teoacuterica como novo paradigma Nesse momento se destacam pensadores como Friedrich List Wilhem Roscher Gustav Schmoller Werner Sombart e Max Weber Destacam-se ainda os economistas Karl Marx Friedrich Engels Carl Menger Achille Loria Augusto Grazziani e Arthur Pigou assim como os

2 SCHUMPETER Joseph A History of Economic Analysis New York Oxford University Press 1954 p 111-118

3 MACKAAY Ejan History of Law and Economics In BOUCKAERT Boudewijn DE GEEST Gerrit (eds) Encyclopedia of Law and

Economics V 1 Cheltenham Edward Elgar 2000 p 67-69

4 Adam Smith a partir de sua obra claacutessica The wealth of Nations (traduzida para o portuguecircs como ldquoA Riqueza das Naccedilotildeesrdquo) jaacute defendia

a liberdade de concorrecircncia para a melhor alocaccedilatildeo dos recursos considerando que os preccedilos seriam naturalmente fixados pelo mercado

ateacute um equiliacutebrio livre de intervencionismo o que veio a ser conhecido pela famosa expressatildeo ldquomatildeo invisiacutevelrdquo

5 Bentham por sua vez formulou a filosofia utilitarista a partir do ldquoprinciacutepio da maior felicidaderdquo Concebia que a natureza humana estava

sob o domiacutenio dos conceitos de dor e prazer relacionados aos estiacutemulos que poderiam ter os homens sustentando que estes tomam

decisotildees visando a maximizar sua felicidade ou o seu prazer diminuindo ou evitando a dor

6 POSNER Richard A Some Uses and Abuses of Economics in Law University of Chicago Law Review v 46 n 2 1979 p 281-282

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juristas Rudolf Stammler e Victor Mataja Esse periacuteodo se encerra com os autores Thorstein Veblen Richard Ely e John Commons vinculados ao movimento institucionalista norte-americano e com os autores Karl Llewellyn Robert Lee Hale e Oliver Wendell Holmes Jr vinculados ao realismo juriacutedico norte-americano7

Entre as deacutecadas de 1940 e 1960 ocorre um afastamento nas relaccedilotildees entre direito e economia pos-sivelmente ocasionado pela metodologia da pesquisa cientiacutefica na modernidade apoacutes o que tem iniacutecio a denominada ldquosegunda ondardquo de reaproximaccedilatildeo das disciplinas que corresponde ao movimento con-temporacircneo de direito e economia Nessa fase os trabalhos pioneiros satildeo atribuiacutedos a Ronald Coase e Guido Calabresi aleacutem de Anthony Downs James Buchanan Gordon Tullock Gary Becker George Stigler Friedrich Hayek Armen Alchian Harold Demsetz Douglass North Warren Samuels e Pietro Trimarchi Vale registrar que em tal periacuteodo (1960-1970) haacute uma fase ou momento histoacuterico de tran-siccedilatildeo do paradigma moderno que estaacute em crise para o paradigma poacutes-moderno de abertura para as ciecircncias sociais Jaacute na deacutecada de 1980 o movimento do direito e economia se amplia com as produccedilotildees doutrinaacuterias de pensadores como Steven Shavell William Landes Richard Posner Guido Calabresi Mitchell Polinsky e Robert Cooter8

Ateacute a deacutecada de 1970 aproximadamente predominavam nos Estados Unidos movimentos como o realismo juriacutedico9 e o utilitarismo10 Segundo Alvarez como contraposiccedilatildeo a essas visotildees predominan-tes agrave eacutepoca surgiram trecircs novos movimentos ndash Law and Economics ou Anaacutelise Econocircmica do Direito (AED) Critical Legal Studies (CLS) ou Escola Criacutetica do Direito e as teorias denominadas Rights-based A AED propunha a anaacutelise do direito sob a perspectiva econocircmica combinando o estudo interdisciplinar entre direito e economia Jaacute o movimento CLS procurava trabalhar o direito sob a perspectiva poliacutetica com a utilizaccedilatildeo de argumentos derivados da filosofia poliacutetica e social E as chamadas teorias Rights-based englobavam todas as contribuiccedilotildees derivadas das teorias da filosofia moral e poliacutetica que tinham como referenciais uma sociedade justa11

Ao longo do seacuteculo XX inicialmente nos Estados Unidos houve a consolidaccedilatildeo dos viacutenculos entre direi-to e economia impulsionado pela anaacutelise do comportamento dos indiviacuteduos Nesse periacuteodo a anaacutelise econocircmica do direito deixa de enfocar apenas questotildees de ordem monetaacuteria para tambeacutem abarcar questotildees relacionadas agrave teoria do comportamento humano a partir da norma sem conteuacutedo mone-taacuterio A intenccedilatildeo era dotar o pensamento juriacutedico de um instrumento que permitisse explicar o com-portamento dos indiviacuteduos frente agraves normas vislumbrando as suas consequecircncias no tocante ao cum-primento ou natildeo das obrigaccedilotildees legais Vale lembrar aqui a definiccedilatildeo claacutessica de Robbins para quem a economia significa a ldquociecircncia que estuda o comportamento humano como uma relaccedilatildeo entre fins e meios escassos para os quais haacute usos alternativosrdquo12

7 MACKAAY Ejan History of Law and Economics In BOUCKAERT Boudewijn DE GEEST Gerrit (eds) Encyclopedia of Law and

Economics V 1 Cheltenham Edward Elgar 2000 p 69-71

8 MACKAAY Ejan History of Law and Economics In BOUCKAERT Boudewijn DE GEEST Gerrit (eds) Encyclopedia of Law and

Economics V 1 Cheltenham Edward Elgar 2000 p 71-80

9 O realismo juriacutedico compreendia o direito como realidade e disciplina autocircnoma constituiacutedo de conceitos e princiacutepios extraiacutedos

das decisotildees judiciais Desse modo pregava que o direito correspondia agravequilo que era estabelecido pela Corte no seu aspecto mais

pragmaacutetico em detrimento do formalismo

10 O utilitarismo por meio de um de seus maiores expoentes Jeremy Bentham baseava-se no princiacutepio de que o ser humano tomava

decisotildees visando agrave busca da felicidade na medida em que procurava maximizar o seu prazer e diminuir a sua dor

11 ALVAREZ Alejandro Bugallo Anaacutelise econocircmica do direito contribuiccedilotildees e desmistificaccedilotildees Revista Direito Estado e Sociedade v

9 juldez 2006 p 49-50

12 ROBBINS Lionel An essay on the nature and significance of economic science London MacMillan amp Co Limited 1932 p 15

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A relaccedilatildeo interdisciplinar entre direito e economia pode parecer num primeiro momento contraditoacute-ria ou conflitante Essa percepccedilatildeo inicial eacute atribuiacuteda agrave diferenccedila entre os meacutetodos utilizados por essas disciplinas13 A natureza da anaacutelise econocircmica segundo Posner eacute muitas vezes incompreendida jaacute que alguns leitores satildeo levados a rejeitar a aplicabilidade da economia ao sujeito de direitos por acreditar que economia se refere a dinheiro e mercados e que quando aplicada a questotildees poliacuteticas e sociais estas se reduzem a objetos de comeacutercio Adverte que essa visatildeo eacute equivocada ressaltando que a eco-nomia trata basicamente da gestatildeo da escassez14

O papel da economia em sua interaccedilatildeo com o direito eacute contribuir para o planejamento dos gastos puacutebli-cos escolhendo prioridades de alocaccedilatildeo de recursos e realizaccedilatildeo de despesas sociais visando a aten-der ao maior interesse da sociedade e do desenvolvimento Levar em conta as implicaccedilotildees econocircmicas da Administraccedilatildeo Puacuteblica15 e das decisotildees judiciais em sede de poliacuteticas puacuteblicas serve tambeacutem para compreender a crise do Estado contemporacircneo da democracia da efetivaccedilatildeo dos direitos fundamen-tais sociais e da ldquoConstituiccedilatildeo Simboacutelicardquo16 Por isso a necessidade de explorar a metodologia da anaacutelise econocircmica do direito a fim de melhor compreender a relaccedilatildeo entre as disciplinas

3 A ANAacuteLISE ECONOcircMICA DO DIREITO COMO METODOLOGIA PARA A TOMADA DE DECISAtildeO

No campo da anaacutelise econocircmica eacute possiacutevel identificar uma vertente que cuida da aplicaccedilatildeo do instrumental metodoloacutegico da teoria econocircmica ao estudo do direito e outra que trata do estudo da relaccedilatildeo entre o siste-ma juriacutedico e o sistema econocircmico A primeira tem recebido o nome de Anaacutelise Econocircmica do Direito (AED)

13 Salama sintetiza com precisatildeo essas diferenccedilas metodoloacutegicas Afirma que enquanto o direito eacute exclusivamente verbal a economia eacute verbal

e matemaacutetica enquanto o procedimento da anaacutelise juriacutedica eacute hermenecircutico o procedimento da anaacutelise econocircmica eacute empiacuterico enquanto a

aspiraccedilatildeo do direito eacute a justiccedila a aspiraccedilatildeo da economia eacute a eficiecircncia enquanto a criacutetica juriacutedica se daacute a partir da legalidade a criacutetica econocircmica

se daacute a partir do custo Nesse contexto pode-se salientar que o jurista busca identificar o que estaacute obrigado permitido ou proibido ou ainda o que

eacute legal e ilegal enquanto que o economista busca identificar o que eacute eficiente e ineficiente a partir da anaacutelise do comportamento dos indiviacuteduos

em um ambiente de mercado ou de trocas (SALAMA Bruno Meyerhof A histoacuteria do decliacutenio e queda do eficientismo na obra de Richard Posner

In LIMA Maria Luacutecia L M Padua (Coord) Agenda contemporacircnea direito e economia Trinta anos de Brasil (Tomo I) Satildeo Paulo Saraiva

2012 p 285) A diferenccedila entre o meacutetodo juriacutedico tradicional e o meacutetodo econocircmico tambeacutem pode ser visualizado sob os pontos de vista

retrospectivo e prospectivo conforme leciona Mathis No direito tende-se a avaliar um caso concreto que jaacute ocorreu (visatildeo retrospectiva)

enquanto que na economia tende-se a avaliar o efeito ou a consequecircncia da medida adotada no caso concreto (visatildeo prospectiva) Eacute a situaccedilatildeo

por exemplo da anaacutelise do efeito precedente da decisatildeo juriacutedica sobre o futuro comportamento de todos os destinataacuterios da decisatildeo ou do

efeito da criaccedilatildeo da norma sobre os seus destinataacuterios Outro exemplo citado por Mathis eacute o da responsabilidade civil em que o jurista estaacute

preocupado com a soluccedilatildeo entre o lesante e o lesado especialmente sobre a indenizaccedilatildeo reclamada por este em face de um incidente Do

ponto de vista econocircmico a soluccedilatildeo eacute enquadrada no impacto do julgamento sobre o comportamento futuro dos possiacuteveis lesantes e lesados

ou seja de que a decisatildeo afetaraacute o comportamento das partes envolvidas (MATHIS Klaus Consequentialism in Law In MATHIS Klaus (ed)

Efficiency Sustainability and Justice to Future Generations University of Lucerne Switzerland 2012 p 6 Disponiacutevel em lthttpswww

uniluchfileadminfakultaetenrfmathisDok6_Mathis_Consequentialism_in_Lawpdfgt Acesso em 07 jan 2018

14 POSNER Richard A The Cost of Rights Implications for Central and Eastern Europe - And for the United States v 32 n 1 Tulsa Law

Journal 1996 p 01-02

15 Num contexto em que existe no pensamento juriacutedico nacional enorme influecircncia dos princiacutepios juriacutedicos em detrimento das regras

propiciando mais incerteza do que previsibilidade na aplicaccedilatildeo das normas e na decisatildeo juriacutedica a anaacutelise interdisciplinar entre direito e

economia auxilia na avaliaccedilatildeo das consequecircncias da tomada de decisatildeo do ponto de vista praacutetico Nesse sentido registre-se a Lei federal

n 136552018 que acrescentou dispositivos agrave Lei de Introduccedilatildeo agraves Normas do Direito Brasileiro (Decreto-Lei n 46571942) entre os

quais Art 20 Nas esferas administrativa controladora e judicial natildeo se decidiraacute com base em valores juriacutedicos abstratos sem que sejam

consideradas as consequecircncias praacuteticas da decisatildeo [] Art 21 A decisatildeo que nas esferas administrativa controladora ou judicial decretar

a invalidaccedilatildeo de ato contrato ajuste processo ou norma administrativa deveraacute indicar de modo expresso suas consequecircncias juriacutedicas

e administrativas [] Art 22 sect 1ordm Em decisatildeo sobre regularidade de conduta ou validade de ato contrato ajuste processo ou norma

administrativa seratildeo consideradas as circunstacircncias praacuteticas que houverem imposto limitado ou condicionado a accedilatildeo do agente []

16 A expressatildeo eacute de Marcelo Neves ao se referir ao simbolismo constitucional que se manifesta quando o significado social e poliacutetico do

texto constitucional estaacute exatamente na relaccedilatildeo inversa da sua concretizaccedilatildeo normativo-juriacutedica ou seja quando haacute uma discrepacircncia

entre a funccedilatildeo hipertroficamente simboacutelica e a insuficiente concretizaccedilatildeo juriacutedica do diploma constitucional (NEVES Marcelo A

Constitucionalizaccedilatildeo simboacutelica 3 ed Satildeo Paulo Martins fontes 2011 p 1)

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e a segunda tem sido denominada Direito e Economia (Law and Economics) Conforme leciona Arauacutejo haacute quem entenda que a expressatildeo ldquoAnaacutelise Econocircmica do Direitordquo seria mais sugestiva de um ascendente teoacute-rico da ciecircncia econocircmica enquanto que a expressatildeo ldquoLaw and Economicsrdquo seria mais uma paridade entre os dois domiacutenios17 Poreacutem destaca que as expressotildees satildeo geralmente utilizadas como sinocircnimas razatildeo pela qual aqui tambeacutem natildeo se faraacute distinccedilatildeo considerando-se apenas a expressatildeo ldquoAnaacutelise Econocircmica do Direitordquo como uma disciplina que envolve naturalmente os campos do direito e da economia

Mercuro e Medema definem AED como sendo a aplicaccedilatildeo da teoria econocircmica - principalmente micro-economia e conceitos baacutesicos de economia do bem-estar - para o exame da formaccedilatildeo da estrutura dos processos e do impacto econocircmico do direito e das instituiccedilotildees juriacutedicas18 Posner por sua vez con-ceitua a disciplina como a aplicaccedilatildeo das teorias e meacutetodos empiacutericos da economia para as instituiccedilotildees centrais do sistema juriacutedico19

Duas abordagens satildeo consideradas quando do estudo dos objetivos da AED ndash positiva e normativa A abordagem positiva tambeacutem denominada descritiva ou explicativa procura descrever como o direito eacute analisando os efeitos ou as consequecircncias das normas no mundo real dos fatos do ponto de vista eco-nocircmico Estaacute ligada agrave escola de Chicago particularmente agraves contribuiccedilotildees de Ronald Coase e Richard Posner Jaacute a abordagem normativa ou prescritiva procura explicar como o direito deve ser como os con-ceitos de justiccedila eficiecircncia e maximizaccedilatildeo de riqueza se comunicam e estaacute mais diretamente ligada agraves escolas de Yale e de Harvard em especial aos trabalhos de Guido Calabresi e Steven Shavell20

Desse modo considerando que os indiviacuteduos ponderam custos e benefiacutecios respondem a incentivos e satildeo maximizadores racionais de suas satisfaccedilotildees ao fazerem escolhas quando procuram identificar por meio da anaacutelise econocircmica quais os efeitos das leis com o fim de alcanccedilar determinados resulta-dos considerados desejaacuteveis fala-se da abordagem positiva (descritiva) da teoria Estuda a eficiecircncia da regra juriacutedica assim como ela eacute na realidade social sem visar a objetivos de intervenccedilatildeo regulatoacuteria Trata-se apenas da previsatildeo das consequecircncias das normas juriacutedicas projetando o comportamento dos agentes perante a lei Nesse caso natildeo estaacute em jogo a formulaccedilatildeo de qualquer tipo de norma ou poliacute-tica puacuteblica21 Tomando-se como exemplo o fato de como as pessoas reagiriam apoacutes a entrada em vigor de uma determinada lei poder-se-ia analisar como os motoristas reagiriam apoacutes a entrada em vigor de uma penalidade mais severa para o homiciacutedio culposo cometido no tracircnsito sob o efeito de aacutelcool22

Jaacute quando se pretende especificar os objetivos desejaacuteveis emitindo um juiacutezo de valor para escolher quais satildeo os melhores ou socialmente desejaacuteveis fala-se da abordagem normativa (prescritiva) Nesta satildeo elaboradas eventuais correccedilotildees nas regras existentes que geraram resultados ineficientes Eacute mais

17 ARAUacuteJO Fernando Anaacutelise econoacutemica do direito programa e guia de estudo Coimbra Almedina 2008 p 10 nota de rodapeacute n 18

18 MERCURO Nicholas MEDEMA Steven G Economics and the law from Posner to postmodernism and beyond 2 ed Princeton

Princeton University Press 2006 p 01

19 POSNER Richard A The Economic Approach to Law Texas Law Review v 53 n 4 1975 p 759

20 POSNER Richard A Some Uses and Abuses of Economics in Law University of Chicago Law Review v 46 n 2 1979 p 284-285

21 Ainda acerca da aplicaccedilatildeo dos conceitos de microeconomia ao direito no campo da AED positiva Cooter distingue trecircs versotildees de

argumentaccedilatildeo reducionista explicativa e preditiva A argumentaccedilatildeo reducionista (minoritaacuteria radical) entende que o direito pode ser

reduzido agrave economia de modo que categorias juriacutedicas (direitos deveres negligecircncia etc) podem ser substituiacutedas por categorias econocircmicas

A argumentaccedilatildeo explicativa defende que a economia pode explicar a estrutura das normas juriacutedicas a partir da maximizaccedilatildeo das preferecircncias

individuais em um ambiente de escassez E a argumentaccedilatildeo preditiva diz respeito agrave ideia de que a economia pode auxiliar na previsatildeo das

consequecircncias ou dos efeitos das regras juriacutedicas sobre o comportamento dos indiviacuteduos (COOTER Robert Law and the imperialism of

economics an introduction to the economic analysis of law and review of the major books UCLA Law Review 1260 v 29 1981 p 1265-1266)

22 Eacute o caso por exemplo de vislumbrar os efeitos da Lei n 135462017 que modificou o Coacutedigo de Tracircnsito (Lei n 95031997)

ampliando as penas miacutenimas e maacuteximas para o condutor de veiacuteculo automotor que provocar sob efeito de aacutelcool e outras drogas acidentes

de tracircnsito que resultarem em homiciacutedio culposo ou lesatildeo corporal grave ou graviacutessima Antes a pena de prisatildeo para o motorista que

cometesse homiciacutedio culposo no tracircnsito estando sob efeito de aacutelcool ou outras drogas psicoativas variava de 2 a 5 anos Com a mudanccedila

a pena aumentou para entre 5 e 8 anos de prisatildeo

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abrangente que a anterior tendo por escopo formular sugestotildees de normas com base nos efeitos eco-nocircmicos analisados O criteacuterio valorativo na escolha dos objetivos desejaacuteveis utilizado pela escola tra-dicional da AED eacute a eficiecircncia Logo sob o aspecto normativo satildeo consideradas noccedilotildees de justiccedila jun-tamente com de eficiecircncia maximizaccedilatildeo de riqueza e de bem-estar a guiar poliacuteticas puacuteblicas Cita-se como exemplo o objetivo de desestimular o uso de veiacuteculos particulares nas cidades em favor do trans-porte coletivo de maneira que o aspecto normativo se sobressai com a busca para encontrar a melhor forma de a norma juriacutedica atingir o resultado pretendido (reduccedilatildeo do congestionamento de tracircnsito menos poluiccedilatildeo melhoria na qualidade do meio ambiente entre outros)

Agrave anaacutelise econocircmica do direito satildeo atribuiacutedas diversas caracteriacutesticas Spector ressalta trecircs como prin-cipais (i) proporciona um modelo analiacutetico unificado para explicar uma formaccedilatildeo de normas juriacutedicas que parecem natildeo ter conexatildeo entre si (ii) constitui premissa fundamental do modelo o fato de que os indiviacuteduos satildeo agentes racionais que escolhem suas accedilotildees para maximizar suas utilidades individuais com base numa ordem coerente de preferecircncias transitivas e (iii) assume que existe uma noccedilatildeo baacutesica de eficiecircncia consistente e inteligiacutevel que pode servir de base para avaliar as instituiccedilotildees juriacutedicas23

A metodologia econocircmica adota essencialmente a racionalidade individual para demonstrar que antes de tomarem uma decisatildeo os agentes avaliam os custos e os benefiacutecios das alternativas possiacute-veis sejam econocircmicas ou sociais a partir das informaccedilotildees que obtiveram Tal avaliaccedilatildeo eacute de cunho probabiliacutestico ou consequencialista porque considera as consequecircncias (e natildeo as causas) que levaram agrave tomada da decisatildeo Daiacute a noccedilatildeo de que o pressuposto econocircmico parte da ideia de que os indiviacuteduos satildeo maximizadores racionais e de que a lei constitui um meio para alterar os preccedilos associados a accedilotildees individuais alternativas

Eacute bem verdade que a racionalidade individual considerada para a tomada de decisatildeo apresenta algu-mas variaccedilotildees em decorrecircncia das experiecircncias de cada indiviacuteduo do contexto envolvido assim como outros aspectos24 De qualquer sorte o que sobreleva eacute a utilidade ou o bem-estar que o agente obteraacute com a escolha da decisatildeo Essa escolha eacute identificada com a eficiecircncia que sob a perspectiva econocircmica pode muito contribuir para o bem-estar social

A interferecircncia do Estado por meio da legislaccedilatildeo ou do Poder Judiciaacuterio estabelecendo comportamen-tos desejaacuteveis e sanccedilotildees para o descumprimento de suas determinaccedilotildees traz consequecircncias tanto para o campo social quanto econocircmico O impacto econocircmico das accedilotildees dos operadores do direito natildeo apenas na Administraccedilatildeo Puacuteblica mas especialmente dos que decidem no acircmbito do Poder Judiciaacuterio tem sido cada vez mais estudado com vistas a tornar as decisotildees mais seguras estaacuteveis e justas A bus-ca pela seguranccedila juriacutedica e pela justiccedila natildeo eacute algo novo pois remonta agrave proacutepria histoacuteria do direito Para aleacutem de conceber o direito essencialmente como provedor de justiccedila a anaacutelise econocircmica propotildee que as leis e as decisotildees juriacutedicas funcionem como incentivos para modificar o comportamento dos indiviacute-

23 SPECTOR Horacio Justicia y bienestar Desde una perspectiva de derecho comparado Doxa n 26 2003 p 243

24 Veja-se por exemplo as pesquisas do ganhador do Precircmio Nobel de Economia de 2017 Richard H Thaler no sentido de que no

mundo real os seres humanos nem sempre satildeo tatildeo racionais em suas escolhas jaacute que traccedilos de personalidade dos indiviacuteduos como

racionalidade limitada preferecircncias sociais e falta de autocontrole afetam tanto decisotildees pessoais quanto do mercado como um todo

(FRAGA Eacuterica Estudo do comportamento na tomada de decisotildees rende Nobel de Economia Mercado Folha de S Paulo 09 de outubro

de 2017 Disponiacutevel em lthttpwww1folhauolcombrmercado2017101925486-estudo-do-comportamento-na-tomada-de-

decisoes-rende-nobel-de-economiashtmlgt Acesso em 05 jan 2018)

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duos a fim de atingir os objetivos das poliacuteticas puacuteblicas entre os quais a distribuiccedilatildeo a efetividade e a eficiecircncia Nesse cenaacuterio a anaacutelise econocircmica do direito constitui uma metodologia importante para a tomada de decisatildeo que natildeo deve ser desprezada mas que tambeacutem exige um pouco de conhecimento acerca da diversidade de escolas ou pensamentos contidos no movimento25

4 O PAPEL DA EFICIEcircNCIA NA ANAacuteLISE ECONOcircMICA DO DIREITO

No plano juriacutedico observa-se que o termo ldquoeficiecircnciardquo foi acrescido pelo Poder Constituinte Derivado Reformador ao art 37 caput da Constituiccedilatildeo Federal quando da ediccedilatildeo da Emenda Constitucional n 1998 consagrando-o como princiacutepio constitucional a ser observado natildeo apenas pela Administraccedilatildeo Puacuteblica como tambeacutem pelo Poder Judiciaacuterio na fundamentaccedilatildeo de suas decisotildees Dada a sua previsatildeo no acircmbito das disposiccedilotildees sobre a Administraccedilatildeo Puacuteblica o conceito de eficiecircncia26 foi mais difundido no direito administrativo sobressaindo-se definiccedilotildees geneacutericas relacionadas agrave adequaccedilatildeo entre meios e fins a serem alcanccedilados pela Administraccedilatildeo Puacuteblica agrave realizaccedilatildeo dos fins segundo o menor custo e agrave reduccedilatildeo de desperdiacutecios mediante a prestaccedilatildeo de serviccedilos com presteza perfeiccedilatildeo e maior rendimen-

25 O movimento da Anaacutelise Econocircmica do Direito natildeo apresenta uma uniformidade de pensamentos porquanto agrupa diversas tendecircncias

ou escolas entre as quais podem ser salientadas a escola Tradicional ou de Chicago a Institucionalista a Neo-Institucionalista a Public Choice

e a escola de New Haven A escola de Chicago eacute considerada a escola originaacuteria e que tem como principal expoente o jurista Richard Posner

Identificada como ortodoxa mais radical ou conservadora aplica a microeconomia na criaccedilatildeo e interpretaccedilatildeo do direito por meio da teoria dos

preccedilos neoclaacutessica A preocupaccedilatildeo central dessa escola eacute de que o sistema juriacutedico deve ser interpretado com vistas a promover a eficiecircncia

econocircmica Para essa corrente portanto eficiecircncia e caacutelculo econocircmico devem ser os criteacuterios utilizados para avaliar as decisotildees judiciais e

as instituiccedilotildees juriacutedicas por serem impessoais e sujeitos agrave comprovaccedilatildeo mais adequado a dirimir aqueles casos essencialmente politizados

ou carregados de emoccedilotildees A escola Institucionalista tem como enfoque a importacircncia das instituiccedilotildees no funcionamento da economia ao

mesmo tempo em que rechaccedila a ecircnfase no individualismo metodoloacutegico da teoria ortodoxa Assim procura ir aleacutem da simples aplicaccedilatildeo da teoria

microeconocircmica ao direito analisando as relaccedilotildees existentes entre o sistema juriacutedico e o sistema econocircmico a fim de identificar como o sistema

juriacutedico afeta e eacute afetado pelo comportamento dos agentes econocircmicos e pelo desenvolvimento A escola Neo-Institucionalista ou Nova

Economia Institucional leva em consideraccedilatildeo a premissa de que as instituiccedilotildees satildeo fundamentais na estrutura econocircmica e no desenvolvimento

da sociedade Sustenta que a visatildeo neoclaacutessica eacute insuficiente para explicar a ineficiecircncia econocircmica das instituiccedilotildees Por sua vez a escola de Yale

ou de New Haven dedica seus estudos agrave anaacutelise da regulaccedilatildeo por parte do Estado sob a perspectiva das poliacuteticas puacuteblicas e da escolha social

(social choice) Essa escola tem origem nos estudos de Guido Calabresi ao examinar sob a oacuteptica da teoria econocircmica a distribuiccedilatildeo do risco

como criteacuterio de imputaccedilatildeo de responsabilidade isto eacute analisa a relaccedilatildeo entre as regras de responsabilidade (liability rules) e a distribuiccedilatildeo

das perdas Sustenta a necessidade de distinguir as noccedilotildees de distribuiccedilatildeo e de justiccedila da noccedilatildeo de eficiecircncia desafiando a ideia defendida pela

escola ortodoxa ou de Chicago no sentido de que a eficiecircncia seja o principal ou uacutenico valor para compensar perdas por danos Aleacutem disso a

escola de New Haven daacute maior ecircnfase agraves leis e aos regulamentos e menos agraves decisotildees judiciais o que exige maior conhecimento das instituiccedilotildees

oficiais e das ferramentas de avaliaccedilatildeo das poliacuteticas puacuteblicas bem assim do comportamento do governo como ator racional Jaacute a escola da

Public Choice ou teoria da escolha puacuteblica realiza uma abordagem econocircmica da poliacutetica e do direito puacuteblico Em siacutentese essa escola toma as

ferramentas e os meacutetodos de abordagem que foram desenvolvidos para niacuteveis analiacuteticos bastante sofisticados na teoria econocircmica e aplica

essas ferramentas e meacutetodos ao setor poliacutetico ou governamental agrave poliacutetica e agrave economia puacuteblica Tal como acontece com a teoria econocircmica

a anaacutelise feita pela citada escola tenta relacionar o comportamento dos atores individuais no setor governamental ou seja o comportamento

das pessoas em suas diversas capacidades como eleitores como candidatos a cargos como representantes eleitos como liacutederes ou membros

de partidos poliacuteticos como burocratas - todos esses satildeo papeacuteis de ldquoescolha puacuteblicardquo - e o conjunto de resultados que podem ser observados

Portanto a teoria da escolha puacuteblica tenta oferecer uma compreensatildeo uma explicaccedilatildeo das interaccedilotildees institucionais complexas que ocorrem

dentro do setor poliacutetico Natildeo obstante a diversidade de escolas de pensamento todas cuidam da aplicaccedilatildeo de pressupostos econocircmicos ao

direito com vistas a fornecer um instrumento cientiacutefico para a anaacutelise do comportamento dos indiviacuteduos diante de recursos escassos

26 Natildeo constitui objeto deste trabalho enveredar pela evoluccedilatildeo conceitual de eficiecircncia entre os doutrinadores no Brasil mas ampliar

os horizontes das posiccedilotildees predominantes no direito com a visatildeo econocircmica Para um estudo minucioso acerca da evoluccedilatildeo conceitual

e jurisprudencial do princiacutepio constitucional da eficiecircncia remete-se o leitor ao artigo de Rosangela Tremel Cf TREMEL Rosangela

Princiacutepio constitucional da eficiecircncia evoluccedilatildeo do conceito e sua concretizaccedilatildeo na justiccedila trabalhista brasileira Unisul De Fato e De

Direito Revista Juriacutedica da Universidade do Sul de Santa Catarina v 9 n 16 janjul 2018 p 101-122

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to funcional27 No entanto parece haver um raciociacutenio superficial e circular nos conceitos de eficiecircncia formulados na seara administrativista o que remete agrave necessidade de agregar o conhecimento inter-disciplinar com a economia

Cabe registrar que o conceito de eficiecircncia entre os economistas tambeacutem natildeo eacute uniforme Coleman aponta como noccedilotildees relevantes a eficiecircncia alocativa de Coase a optimalidade de Pareto a eficiecircncia de Kaldor-Hicks e ainda a maximizaccedilatildeo de riqueza de Posner A eficiecircncia alocativa de Coase pode ser resumida no sentido de que o maacuteximo uso produtivo dos recursos natildeo depende da atribuiccedilatildeo inicial dos direitos A atribuiccedilatildeo inicial eacute apenas o ponto de partida a partir do qual as negociaccedilotildees comeccedilam de maneira que o ponto em que as negociaccedilotildees cessam representa a alocaccedilatildeo eficiente de recursos28 Eacute dessa forma que em The Problem of Social Cost29 Coase afima que em condiccedilotildees de racionalidade conhecimento substancial e custos de transaccedilotildees zero os resultados dos negoacutecios seratildeo eficientes Poreacutem o teorema de Coase eacute vaacutelido apenas quando os custos de transaccedilatildeo satildeo suficientemente insig-nificantes para permitir que o mercado funcione como resultado eficiente no processo de ganho muacutetuo atraveacutes do comeacutercio Onde os custos de transaccedilatildeo satildeo altos criam falhas de mercado ou externalida-des30 a atribuiccedilatildeo inicial de direitos faz a diferenccedila do ponto de vista da eficiecircncia31

Em relaccedilatildeo agrave optimalidade de Pareto os recursos satildeo alocados de uma forma Pareto-oacuteptimo se e somente se qualquer realocaccedilatildeo adicional deles puder melhorar o bem-estar de uma pessoa apenas em detrimento de outra32 Portanto o modelo teoacuterico de Pareto concebe uma situaccedilatildeo como eficiente quando natildeo for possiacutevel melhorar a posiccedilatildeo de uma das partes sem piorar a de outra33

Por outro lado uma redistribuiccedilatildeo de recursos eacute considerada Kaldor-Hicks eficiente se sob a redis-tribuiccedilatildeo os vencedores ganham o suficiente para que possam compensar os perdedores A noccedilatildeo de eficiecircncia de Kaldor-Hicks natildeo exige que os vencedores realmente compensem os perdedores A falta

27 Para Diogenes Gasparini o princiacutepio da eficiecircncia impotildee agrave Administraccedilatildeo Puacuteblica a obrigaccedilatildeo de realizar suas atribuiccedilotildees com rapidez

perfeiccedilatildeo e rendimento (GASPARINI Diogenes Direito Administrativo 16 ed atualizado por Fabriacutecio Motta Satildeo Paulo Saraiva 2011 p 76-

77) Segundo Celso Antocircnio Bandeira de Mello o princiacutepio da eficiecircncia eacute uma faceta do princiacutepio da lsquoboa administraccedilatildeorsquo significando desenvolver

a atividade administrativa do modo mais congruente oportuno e adequado aos fins a serem alcanccedilados (MELLO Celso Antocircnio Bandeira de

Curso de Direito Administrativo 27 ed rev e atual ateacute a Emenda Constitucional 64 de 04022010 Satildeo Paulo Malheiros 2010 p 122-123)

De acordo com Carvalho Filho o princiacutepio da eficiecircncia eacute a procura de produtividade e economicidade com a reduccedilatildeo dos desperdiacutecios de

dinheiro puacuteblico por meio da execuccedilatildeo dos serviccedilos com presteza perfeiccedilatildeo e rendimento funcional (CARVALHO FILHO Joseacute dos Santos

Manual de direito administrativo 29 ed Satildeo Paulo Atlas 2015 p 30-33) Para Di Pietro o princiacutepio da eficiecircncia estaacute relacionado ao modo de

atuaccedilatildeo do agente puacuteblico do qual se espera o melhor desempenho possiacutevel de suas atribuiccedilotildees a fim de lograr os melhores resultados bem

como ao modo de organizar estruturar e disciplinar a Administraccedilatildeo Puacuteblica com o objetivo de alcanccedilar os melhores resultados na prestaccedilatildeo

do serviccedilo puacuteblico (DI PIETRO Maria Sylvia Zanella Direito administrativo 26 ed Satildeo Paulo Atlas 2013 p 83-85) Marccedilal Justen Filho por

sua vez destaca que o princiacutepio da eficiecircncia tem relaccedilatildeo com a vedaccedilatildeo do desperdiacutecio ou da maacute utilizaccedilatildeo dos recursos destinados agrave satisfaccedilatildeo

de necessidades coletivas de modo que eacute necessaacuterio obter o maacuteximo de resultados com a menor quantidade possiacutevel de desembolsos (JUSTEN

FILHO Marccedilal Curso de direito administrativo 11 ed rev atual e ampl Satildeo Paulo Revista dos Tribunais 2015 p 204-206)

28 COLEMAN Jules L Efficiency exchange and auction philosophic aspects of the economic approach to law V 68 Cal L Rev 221 1980 p 225

29 COASE Ronald The problem of social cost Journal of Law and Economic V 3 1960

30 O problema de eficiecircncia no que concerne a Coase surge da existecircncia de externalidades ou efeitos externos consistentes em

subprodutos de uma atividade que influenciam a produccedilatildeo de outros bens ou o bem-estar (ou utilidade) de outros indiviacuteduos Os efeitos

externos podem ser beneacuteficos (externalidades positivas) ou prejudiciais (externalidades negativas) e internalizar uma externalidade

significa eliminar a ineficiecircncia na produccedilatildeo ou troca que ela gera (COLEMAN Jules L Efficiency exchange and auction philosophic

aspects of the economic approach to law V 68 Cal L Rev 221 1980 p 231-232)

31 Coleman cita trecircs abordagens para o problema de controlar externalidades quando os mercados satildeo inadequados para a tarefa

impostos ou subsiacutedios regras de propriedade e regras de responsabilidade Cada abordagem envolve algum tipo de intervenccedilatildeo no

mercado por uma autoridade central (puacuteblica) diferindo apenas em relaccedilatildeo aos instrumentos empregados para proteger o direito

32 COLEMAN Jules L Efficiency utility and wealth maximization Faculty Scholarship series Paper 4202 1980 p 512-513

33 Exemplo ldquoArdquo compra de ldquoBrdquo uma coleccedilatildeo de selos por $ 950 Se a venda foi consensual e natildeo houve fraude nem coaccedilatildeo sabe-se que a

utilidade para ldquoArdquo da coleccedilatildeo de selos eacute maior do que a utilidade de $ 950 e que a utilidade de $ 950 eacute maior para ldquoBrdquo do que a coleccedilatildeo de

selos Assim desde que natildeo haja efeitos negativos sobre terceiros a venda eacute uma melhora no sentido de Pareto

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de exigecircncia de compensaccedilatildeo pode ter o efeito de produzir perdedores34 Esse modelo surgiu com a intenccedilatildeo de melhorar o criteacuterio de Pareto baseando-se na premissa de que uma situaccedilatildeo seraacute eficien-te quando ainda que uma das partes envolvidas tenha a sua situaccedilatildeo piorada haja a possibilidade de compensaacute-la Portanto por esse criteacuterio o importante eacute que os ganhadores possam potencialmente compensar os perdedores ainda que efetivamente natildeo o faccedilam35

No tocante agrave ideia de eficiecircncia em Posner eacute necessaacuterio levar em conta as diversas fases (ascensatildeo apogeu e queda) por que passou o pensamento do autor acerca do assunto Salama destaca com maes-tria a ascensatildeo da eficiecircncia como meacutetodo analiacutetico o seu apogeu como criteacuterio eacutetico e a sua queda como eficiecircncia subordinada ao pragmatismo

A eficiecircncia como meacutetodo analiacutetico (fase de ascensatildeo) corresponde agrave fase que vai desde meados dos anos 1960 ateacute fins da deacutecada de 1970 A ideia de eficiecircncia se identifica com a eficiecircncia econocircmica ou seja com a maximizaccedilatildeo da riqueza medida em padrotildees monetaacuterios O contexto eacute de que as pessoas se utilizam de um caacutelculo racional tanto nos ldquomercados expliacutecitosrdquo quanto nos ldquomercados impliacutecitosrdquo Assim conforme exemplifica Salama se o preccedilo dos tomates aumenta o consumidor tenderaacute a com-prar menos tomates ou os substituiraacute por outro tipo de alimento O mesmo raciociacutenio analiacutetico valeria para a praacutetica de crimes o ajuizamento de accedilotildees a realizaccedilatildeo de acordos etc A utilizaccedilatildeo da raciona-lidade como premissa instrumental natildeo significa necessariamente que haja um caacutelculo consciente de custos e benefiacutecios mas apenas um comportamento previsiacutevel36

A eficiecircncia como criteacuterio eacutetico (fase de apogeu) surge a partir de meados da deacutecada de 1970 quando Posner formula uma siacutentese normativa entre justiccedila e eficiecircncia A obra emblemaacutetica eacute The Economics of Justice37 de 1981 Para Salama essa fase pode ser vista como uma releitura das teorias contratua-listas claacutessicas (Hobbes Locke e Rousseau) em que Posner aplica suas teorias morais (moral theory) a questotildees juriacutedicas Posner utiliza a expressatildeo ldquoteoria moralrdquo em vez de ldquoteoria de justiccedilardquo definindo que o criteacuterio para avaliar se os atos e as instituiccedilotildees satildeo justos deve ser a maximizaccedilatildeo de riqueza da sociedade Desse modo as regras juriacutedicas e as interpretaccedilotildees do direito que promovam a maximiza-ccedilatildeo de riqueza satildeo consideradas justas Posner natildeo distingue as expressotildees ldquomaximizaccedilatildeo de riquezardquo e ldquoeficiecircnciardquo e situa sua teoria como uma construccedilatildeo intermediaacuteria entre a deontologia kantiana e o utilitarismo benthamiano38

34 COLEMAN Jules L Efficiency exchange and auction philosophic aspects of the economic approach to law V 68 Cal L Rev 221

1980 p 237-242

35 Bruno Salama ilustra o sentido do criteacuterio de Kaldor-Hicks com um exemplo ocorrido na cidade de Satildeo Paulo A prefeitura proibiu a

colocaccedilatildeo grandes cartazes de propaganda expostos ao puacuteblico Houve ldquoperdedoresrdquo e disso natildeo resta duacutevida porque vaacuterias pessoas

perderam seus empregos e outras tantas perderam seus negoacutecios Por outro lado o soacutelido apoio da populaccedilatildeo agrave nova legislaccedilatildeo e a

reeleiccedilatildeo do prefeito responsaacutevel por tal mudanccedila sugerem que os ganhos do restante da populaccedilatildeo (os ldquoganhadoresrdquo) provavelmente

excederam as perdas do grupo de ldquoperdedoresrdquo (SALAMA Bruno Meyerhof A histoacuteria do decliacutenio e queda do eficientismo na obra de

Richard Posner In LIMA Maria Luacutecia L M Padua (Coord) Agenda contemporacircnea direito e economia Trinta anos de Brasil (Tomo I)

Satildeo Paulo Saraiva 2012 p 311)

36 SALAMA Bruno Meyerhof A histoacuteria do decliacutenio e queda do eficientismo na obra de Richard Posner In LIMA Maria Luacutecia L M Padua

(Coord) Agenda contemporacircnea direito e economia Trinta anos de Brasil (Tomo I) Satildeo Paulo Saraiva 2012 p 288-293

37 Obra traduzida para o portuguecircs POSNER Richard A A economia da justiccedila Satildeo Paulo Martins Fontes 2010

38 Do utilitarismo Posner manteacutem uma concepccedilatildeo consequencialista de moralidade e justiccedila bem como a noccedilatildeo de caacutelculo individual

como ponto de partida no exame das relaccedilotildees em sociedade Por outro lado rechaccedila o criteacuterio de felicidade elemento fundamental do

utilitarismo substituindo-o pelo da maximizaccedilatildeo da riqueza Da deontologia kantiana Posner manteacutem parte dos conceitos de autonomia

e consenso poreacutem rechaccedila o ldquofanatismordquo kantiano que seria a aversatildeo ao raciociacutenio consequencialista levada ao seu extremo loacutegico

(SALAMA Bruno Meyerhof A histoacuteria do decliacutenio e queda do eficientismo na obra de Richard Posner In LIMA Maria Luacutecia L M Padua

(Coord) Agenda contemporacircnea direito e economia Trinta anos de Brasil (Tomo I) Satildeo Paulo Saraiva 2012 p 293-313)

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A eficiecircncia subordinada ao pragmatismo (fase de queda) eacute resultado das inuacutemeras criacuteticas que sofrera em relaccedilatildeo agrave ideia da maximizaccedilatildeo de riqueza como fundamentaccedilatildeo eacutetica do direito39 Na deacutecada de 1990 com a publicaccedilatildeo da obra The Problems of Jurisprudence40 Posner revecirc sua posiccedilatildeo e abandona a defesa da maximizaccedilatildeo de riqueza como fundaccedilatildeo eacutetica do direito passando a sustentar o pragmatis-mo juriacutedico Trata-se segundo Salama da formulaccedilatildeo e aplicaccedilatildeo do direito sem fundaccedilotildees filosoacuteficas sopesando-se as possiacuteveis consequecircncias das diversas interpretaccedilotildees que o texto permite Essa fase marca o retorno agrave tradiccedilatildeo juriacutedica americana por excelecircncia ndash o pragmatismo41

Seguramente a principal criacutetica agrave anaacutelise econocircmica do direito tem sido a utilizaccedilatildeo do criteacuterio de efi-ciecircncia na teoria do direito No entanto eacute preciso estar atento agraves diversas concepccedilotildees e escolas a que se vincula a noccedilatildeo de eficiecircncia para que se possa compreender melhor que esse criteacuterio pode ser bas-tante uacutetil como instrumental para auxiliar na elaboraccedilatildeo de normas e formulaccedilatildeo de decisotildees judiciais ou administrativas mais eficientes e justas assim como nas situaccedilotildees envolvendo gastos puacuteblicos a exemplo das poliacuteticas puacuteblicas de sauacutede conforme se veraacute mais adiante

5 DIREITOS HUMANOS E FUNDAMENTAIS NAS POLIacuteTICAS PUacuteBLICAS DE SAUacuteDE NO BRASIL

Retrocedendo-se 70 anos no tempo em 10 de dezembro de 1948 um documento proclamado na Assembleia Geral das Naccedilotildees Unidas marcava a histoacuteria dos direitos humanos ndash a Declaraccedilatildeo Universal dos Direitos Humanos (DUDH) Apesar de ter servido de inspiraccedilatildeo para diversas constituiccedilotildees e esta-dos democraacuteticos a declaraccedilatildeo ainda natildeo soacute natildeo atingiu sua plena concretizaccedilatildeo no plano mundial como daacute demonstraccedilotildees de retrocesso em diversas partes do globo Esse eacute o caso do Brasil que passa por um momento de crises poliacutetica e econocircmica (e talvez ainda crise moral) com graves violaccedilotildees dos direitos humanos e fundamentais

Com o fim da Segunda Guerra Mundial e das atrocidades vivenciadas naquele momento histoacuterico hou-ve uma luta pela proteccedilatildeo dos direitos humanos construiacuteda a partir da dignidade da pessoa humana que inspirou a humanidade a postular um padratildeo miacutenimo necessaacuterio para a sobrevivecircncia dos povos e das naccedilotildees Portanto no cenaacuterio internacional como afirma Piovesan a dignidade humana passou a constituir o valor maior que inspirou a Declaraccedilatildeo Universal de Direitos Humanos de 1948 acenando agrave universalidade e agrave indivisibilidade dos direitos humanos representando ldquoo norte e o lastro eacutetico dos demais instrumentos internacionais de proteccedilatildeo dos direitos humanosrdquo42

No tocante agrave sua trajetoacuteria rumo ao direito Barroso afirma que a dignidade se beneficiou da cultura juriacutedica poacutes-positivista identificada com a reaproximaccedilatildeo entre o direito e a eacutetica tornando o ordena-mento juriacutedico permeaacutevel aos valores morais Sustenta que se trata de um valor fundamental conver-tido em princiacutepio juriacutedico de estatura constitucional seja por sua positivaccedilatildeo em norma expressa seja por sua aceitaccedilatildeo como um mandamento juriacutedico extraiacutedo do sistema servindo tanto como justifica-

39 Dentre as criacuteticas podem ser destacadas as de COLEMAN Jules The Normative Basis of Economic Analysis A Critical Review of

Richard Posnerrsquos ldquoThe Economics of Justicersquordquo Stanford Law Review v 34 n 5 1982 p 1105-1131 DWORKIN Ronald M Is Wealth a

Value The Journal of Legal Studies v 9 n 2 1980 p 191-226 KRONMAN Anthony T Wealth Maximization as a Normative Principle

The Journal of Legal Studies v 9 n 2 1980 p 227-242 e MICHELMAN Frank I A Comment on Some Uses and Abuses of Economics in

Law The University of Chicago Law Review v 46 n 2 1979 p 307-315

40 Obra traduzida para o portuguecircs POSNER Richard A Problemas de filosofia do direito Satildeo Paulo Martins Fontes 2007

41 SALAMA Bruno Meyerhof A histoacuteria do decliacutenio e queda do eficientismo na obra de Richard Posner In LIMA Maria Luacutecia L M Padua

(Coord) Agenda contemporacircnea direito e economia Trinta anos de Brasil (Tomo I) Satildeo Paulo Saraiva 2012 p 313-319

42 PIOVESAN Flaacutevia Direitos humanos o princiacutepio da dignidade humana e a Constituiccedilatildeo brasileira de 1988 Revista do Instituto de

Hermenecircutica Juriacutedica ndash RIHJ Belo Horizonte Ano 1 n 2 jandez 2004

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ccedilatildeo moral quanto como fundamento normativo para os direitos fundamentais43

Haacute que se registrar que direitos humanos e direitos fundamentais apresentam uma marcada distin-ccedilatildeo Por uma questatildeo terminoloacutegica adota-se aqui o entendimento de Sarlet para quem os ldquodireitos fundamentaisrdquo satildeo considerados aqueles reconhecidos pelo direito constitucional positivo e portan-to delimitados espacial e temporalmente enquanto os denominados ldquodireitos humanosrdquo constituem posiccedilotildees juriacutedicas reconhecidas na esfera do direito internacional positivo ao ser humano como tal independentemente de sua vinculaccedilatildeo com determinada ordem juriacutedico-positiva interna44

Prestes a completar 30 anos e inspirada na Declaraccedilatildeo Universal dos Direitos Humanos a Constituiccedilatildeo Federal de 1988 eacute considerada o marco juriacutedico da transiccedilatildeo democraacutetica e da institucionalizaccedilatildeo dos direitos e garantias fundamentais por demarcar a ruptura com o regime autoritaacuterio militar instaurado em 1964 situando-se na expressatildeo de Piovesan como o documento mais abrangente e pormenoriza-do sobre os direitos humanos jamais adotado no Brasil45 Daiacute se conceber que na Constituiccedilatildeo estatildeo institucionalizados os direitos humanos na forma de direitos fundamentais sociais e econocircmicos a serem prestados e garantidos por meio de poliacuteticas puacuteblicas

Como instrumentos colocados agrave disposiccedilatildeo do Estado para a concretizaccedilatildeo de direitos humanos fun-damentais abrigados na Constituiccedilatildeo as poliacuteticas puacuteblicas tecircm sido objeto de intenso debate na socie-dade dada a insuficiente capacidade governamental de converter recursos puacuteblicos em satisfaccedilatildeo das necessidades baacutesicas individuais e sociais Entre os direitos fundamentais abrigados pelas poliacuteti-cas puacuteblicas - e que interessa ao presenta trabalho - estaacute o direito agrave sauacutede positivado no art 6ordm da Constituiccedilatildeo Federal e concebido como direito de todos e dever do Estado no seu art 196 Trata-se de comando que obriga os entes federados a proteger a sauacutede de forma sistemaacutetica nos termos do art 198 em torno do conhecido Sistema Uacutenico de Sauacutede (SUS) constituiacutedo de uma rede regionalizada e hieraacuterquica de accedilotildees e serviccedilos de sauacutede com direccedilatildeo uacutenica em cada esfera de governo e estrutura descentralizada para atendimento integral46

43 BARROSO Luiacutes Roberto A dignidade da pessoa humana no direito constitucional contemporacircneo natureza juriacutedica conteuacutedos

miacutenimos e criteacuterios de aplicaccedilatildeo Revista Interesse Puacuteblico ndash IP Belo Horizonte ano 14 n 76 novdez 2012 Disponiacutevel em lthttpbid

editoraforumcombrbidPDI0006aspxpdiCntd=83932gt Acesso em 18 fev 2018

44 SARLET Ingo Wolfgang Os Direitos Fundamentais Sociais Na Constituiccedilatildeo de 1988 Revista Diaacutelogo Juriacutedico Salvador CAJ - Centro

de Atualizaccedilatildeo Juriacutedica v 1 nordm 1 2001 Disponiacutevel em lthttpwwwdireitopublicocombrpdf_segurorevista-dialogo-juridico-01-

2001-ingo-sarletpdfgt Acesso em 27 dez 2017

45 PIOVESAN Flaacutevia Direitos humanos o princiacutepio da dignidade humana e a Constituiccedilatildeo brasileira de 1988 Revista do Instituto de

Hermenecircutica Juriacutedica ndash RIHJ Belo Horizonte Ano 1 n 2 jandez 2004

46 A proteccedilatildeo agrave sauacutede encerra alguns princiacutepios norteadores como o da universalidade que prevecirc o acesso a todos o da equidade que

estabelece o acesso em condiccedilotildees iguais o da integralidade que exige atendimento e acompanhamento cliacutenico e de gastos ao longo do

tratamento e o da descentralizaccedilatildeo entre a Uniatildeo os Estados e os Municiacutepios

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A norma infraconstitucional que conteacutem as diretrizes a serem seguidas pela Uniatildeo pelos Estados e Municiacutepios eacute a Lei federal n 808090 denominada Lei Orgacircnica da Sauacutede47 Cabe destacar que eacute bastante extenso o espectro normativo infraconstitucional e legal (decretos portarias resoluccedilotildees)48 que trata da poliacutetica puacuteblica de sauacutede no paiacutes Satildeo regulamentaccedilotildees fragmentadas que sofrem constantes alteraccedilotildees e agraves vezes de difiacutecil compreensatildeo podendo prejudicar a interaccedilatildeo governamental ou institucional e com o jurisdicionado Deve-se ter em conta ainda que o papel da Administraccedilatildeo Puacuteblica em formular e executar poliacuteticas puacuteblicas de sauacutede vai aleacutem da mera conformidade com os dispositivos constitucionais e legais na medida em que suas accedilotildees estatildeo em uma realidade que envolve questotildees de natureza poliacutetica orccedilamentaacute-ria cientiacutefica tecnoloacutegica eacutetica e econocircmica apenas para citar algumas

Natildeo obstante a Constituiccedilatildeo tenha dado ao Poder Executivo o papel de concretizaccedilatildeo do direito agrave sauacute-de por meio de ldquopoliacuteticas sociais e econocircmicas que visem agrave reduccedilatildeo do risco de doenccedila e de outros agravos e ao acesso universal e igualitaacuterio agraves accedilotildees e serviccedilos para sua promoccedilatildeo proteccedilatildeo e recupe-raccedilatildeordquo observa-se que a extensa e complexa malha de assistecircncia positivada natildeo veio acompanhada da infraestrutura necessaacuteria para a prestaccedilatildeo dos serviccedilos puacuteblicos notadamente em um cenaacuterio de desigualdade social crises econocircmica e poliacutetica situaccedilatildeo que repercute ateacute hoje na baixa concreti-zaccedilatildeo do direito social em comento Com isso o Poder Judiciaacuterio tem sido cada vez mais demandado para obrigar os entes federados a satisfazerem o direito agrave sauacutede situaccedilatildeo conhecida como ldquojudicializa-ccedilatildeo da sauacutederdquo49 Nesse cenaacuterio geralmente haacute um confronto entre a necessidade de cumprimento do direito fundamental de um lado e a escassez dos recursos orccedilamentaacuterios do ente federado de outro50 expondo o custo dos direitos sociais51 e os dispecircndios de recursos puacuteblicos de forma ineficiente52 Na

47 O Decreto n 75082011 tambeacutem dispotildee sobre a mateacuteria assegurando que o acesso universal e equitativo agraves accedilotildees e aos serviccedilos de sauacutede

deve observacircncia ao planejamento integrado agrave avaliaccedilatildeo da gravidade do risco individual e coletivo ao criteacuterio cronoloacutegico agraves particularidades

das pessoas que gozam de proteccedilatildeo especial e agrave orientaccedilatildeo dos fluxos das accedilotildees e dos serviccedilos de sauacutede (arts 11 e 13) entre outros

48 Aleacutem da Constituiccedilatildeo Federal de 1988 (arts 6ordm e 196 e ss) da Lei n 808090 (Lei Orgacircnica da Sauacutede) da Lei n 814290 (Dispotildee sobre a

participaccedilatildeo da comunidade na gestatildeo do SUS e sobre as transferecircncias intergovernamentais de recursos financeiros na aacuterea da sauacutede) da

Lei n 124012011 (Altera a Lei n 808090 para dispor sobre a assistecircncia terapecircutica e a incorporaccedilatildeo de tecnologia em sauacutede no acircmbito

do SUS) do Decreto n 75082011 (Regulamenta a Lei n 808090 para dispor sobre a organizaccedilatildeo do SUS o planejamento da sauacutede a

assistecircncia agrave sauacutede e a articulaccedilatildeo interfederativa) e do Decreto n 76462011 (Dispotildee sobre a Comissatildeo Nacional de Incorporaccedilatildeo de

Tecnologias no Sistema Uacutenico de Sauacutede e sobre o processo administrativo para incorporaccedilatildeo exclusatildeo e alteraccedilatildeo de tecnologias em sauacutede

pelo SUS) existe a Portaria n 391698 (Aprova a Poliacutetica Nacional de Medicamentos) a Resoluccedilatildeo CNS n 3382004 (Aprova a Poliacutetica

Nacional de Assistecircncia Farmacecircutica) a Portaria GMMS n 3992006 (Divulga o Pacto pela Sauacutede 2006 ndash Consolidaccedilatildeo do SUS e aprova

as Diretrizes Operacionais do referido Pacto) a Portaria GMMS n 2042007 (Regulamenta o financiamento e a transferecircncia dos recursos

federais para as accedilotildees e os serviccedilos de sauacutede na forma de blocos de financiamento ndash componentes Baacutesico Estrateacutegico e Especializado - com

o respectivo monitoramento e controle) a Resoluccedilatildeo da Comissatildeo Intergestores Tripartite n 12012 (Diretrizes Nacionais da Rename no

acircmbito do SUS) a Portaria GMMS n 15542013 (Dispotildee sobre as regras de financiamento e execuccedilatildeo do Componente Especializado da

Assistecircncia Farmacecircutica no acircmbito do SUS) a Portaria GMMS n 15552013 (Dispotildee sobre as regras de financiamento e execuccedilatildeo do

Componente Baacutesico da Assistecircncia Farmacecircutica no acircmbito do SUS) e a Portaria GMMS n 12015 (Rename 2014) sem contar as normas

expedidas pelas Secretarias Estaduais Secretarias Municipais e outras relacionadas com poliacuteticas puacuteblicas localizadas

49 A judicializaccedilatildeo se refere agrave massificaccedilatildeo de demandas e de conflitos perante o Judiciaacuterio

50 Essa situaccedilatildeo remete ao debate corrente entre a satisfaccedilatildeo do miacutenimo existencial e a reserva do possiacutevel O ldquomiacutenimo existencialrdquo diz respeito

ao fato de se assegurar as condiccedilotildees baacutesicas de vida digna ao ser humano enquanto a expressatildeo ldquoreserva do possiacutevelrdquo se relaciona agrave ideia de que

a efetividade dos direitos sociais estaacute na dependecircncia das capacidades financeiras do Estado (SARLET Ingo Wolfgang FIGUEIREDO Mariana

Filchtiner Reserva do possiacutevel miacutenimo existencial e direito agrave sauacutede algumas aproximaccedilotildees In SARLET Ingo Wolfgang TIMM Luciano Bentti

(Org) Direitos fundamentais orccedilamento e ldquoreserva do possiacutevelrdquo 2 ed rev e ampl Porto Alegre Livraria do Advogado 2013 p 29)

51 Holmes e Sunstein levantaram a discussatildeo sobre o custo dos direitos arguindo que a eficaacutecia dos direitos depende dos impostos Os

autores sustentam a tese de que o direito custa dinheiro (rights cost money) na medida em que natildeo pode ser protegido ou obrigado sem

suporte econocircmico ou financiamento puacuteblico (HOLMES Stephen SUNSTEIN Cass R The cost of rights why liberty depends on taxes

New York W W Norton amp Company 1999 p 13 e 35)

52 Em 24112017 por exemplo o STF noticiou em sua paacutegina eletrocircnica a manutenccedilatildeo de uma decisatildeo do Tribunal de Justiccedila do Rio de

Janeiro que determinava agrave Fundaccedilatildeo Municipal de Sauacutede de Niteroacutei (RJ) que fornecesse o remeacutedio ldquocanaquinumaberdquo a uma portadora

da Deficiecircncia de Mevalonato Quinase Naquela oportunidade o Municiacutepio de Niteroacutei alegou que o medicamento natildeo era autorizado

pela ANVISA para o tratamento da doenccedila que a paciente possuiacutea e que custava R$ 612 mil por ano o correspondente a 41 da rubrica

orccedilamentaacuteria destinada agrave aquisiccedilatildeo de medicamentos para a populaccedilatildeo como um todo (BRASIL Supremo Tribunal Federal Mantida

decisatildeo que determina fornecimento de remeacutedio a paciente com doenccedila rara Notiacutecias STF 24 de novembro de 2017 Disponiacutevel em

ltwwwstfjusbrportalcmsverNoticiaDetalheaspidConteudo=362752gt Acesso em 15 fev 2018)

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aproximaccedilatildeo entre direito e economia percebe-se com mais clareza que os direitos tecircm custos que os recursos satildeo escassos que as accedilotildees geram reaccedilotildees ou consequecircncias que as normas tambeacutem pro-duzem externalidades que o ecircxito na judicializaccedilatildeo incentiva novas demandas assim como poliacuteticas puacuteblicas de sauacutede mal geridas provocam distorccedilotildees no sistema Para uma ideia mais concreta acerca dos custos desses direitos e a necessidade de eficiecircncia aborda-se a seguir o impacto dos gastos das poliacuteticas de sauacutede e sua judicializaccedilatildeo

6 O IMPACTO DOS GASTOS DAS POLIacuteTICAS PUacuteBLICAS DE SAUacuteDE E DE SUA JUDICIALIZACcedilAtildeO O RETRATO DA INEFICIEcircNCIA NOS DADOS DO TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIAtildeO E DO BANCO MUNDIAL

Os gastos puacuteblicos em sauacutede envolvendo a concessatildeo de medicamentos satildeo atualmente preocupantes na medida em que crescem de forma vertiginosa Um exemplo pode ser visto no caso da concessatildeo de medicamentos pelo governo federal por determinaccedilatildeo judicial Em 2010 o gasto foi de R$ 122 milhotildees em 2011 de R$ 230 milhotildees em 2012 de R$ 367 milhotildees em 2013 de R$ 549 milhotildees em 2014 de R$ 839 milhotildees em 2015 de R$ 11 bilhatildeo e em 2016 de R$ 16 bilhatildeo Um crescimento em 2016 comparado com 2010 de mais de 123353 As despesas com determinaccedilotildees judiciais de atendimento agrave sauacutede envolvendo a Uniatildeo os Estados e os Municiacutepios foi de aproximadamente R$ 7 bilhotildees somen-te no ano de 201754 Tal situaccedilatildeo remete inevitavelmente agrave conclusatildeo de ineficiecircncia da prestaccedilatildeo da sauacutede puacuteblica no paiacutes

A gravidade do problema pode ser verificada mais detalhadamente nas conclusotildees da auditoria opera-cional realizada pelo Tribunal de Contas da Uniatildeo (TCU) no periacuteodo de 26102015 a 29012016 que teve por objetivo identificar o perfil o volume e o impacto das accedilotildees judiciais na aacuterea da sauacutede em acircmbi-to nacional55 a fim de buscar meios de mitigar os efeitos negativos da judicializaccedilatildeo nos orccedilamentos e no acesso dos usuaacuterios agrave assistecircncia agrave sauacutede56

Os dados coletados de 9 Tribunais de Justiccedila e dos Tribunais Regionais Federais evidenciaram uma ten-decircncia de crescimento dos processos relacionados agrave sauacutede puacuteblica entre 2013 e 2014 com uma maior concentraccedilatildeo na Justiccedila Estadual Nos processos analisados a maior parte tratava do fornecimento de medicamentos e de tratamento meacutedico-hospitalar assim como se observou a predominacircncia da liti-gacircncia individual mediante atuaccedilatildeo da advocacia privada e da defensoria puacuteblica

Em relaccedilatildeo ao Ministeacuterio da Sauacutede verificou-se que o nuacutemero de accedilotildees judiciais federais era crescente e sua proporccedilatildeo por habitante era maior em Estados das regiotildees Sul Centro-Oeste e Sudeste A meacutedia nacional de processos judiciais recebidos pelo Ministeacuterio da Sauacutede por 100 mil habitantes dobrou de 3 em 2010 para 6 em 2014 Outra constataccedilatildeo foi de que os Estados com maior iacutendice de accedilotildees federais por habitante possuiacuteam Municiacutepios com maior Iacutendice de Desenvolvimento Humano Municipal (IDHM) indicando uma ausecircncia de relaccedilatildeo causal entre judicializaccedilatildeo da sauacutede e subdesenvolvimento em sauacutede

53 COLLUCCI Claacuteudia SP cede agrave Uniatildeo ldquodetectorrdquo de fraude em accedilotildees por medicamentos Cotidiano Folha de S Paulo 21 de julho de

2017 Disponiacutevel em lthttpwww1folhauolcombrcotidiano2017071903086-sp-cede-a-uniao-detector-de-fraude-em-acoes-

por-medicamentosshtmlgt Acesso em 17 jan 2018

54 BRASIL Conselho Nacional de Justiccedila CNJ avanccedila para qualificar decisotildees judiciais sobre gastos com sauacutede Disponiacutevel em lthttpwww

cnjjusbrnoticiascnj84486-cnj-avanca-na-qualificacao-da-judicializacao-para-otimizar-gasto-de-saudegt Acesso em 24 mar 2018

55 A partir da disponibilidade de suas unidades regionais o TCU selecionou Estados e Municiacutepios para a avaliaccedilatildeo tendo como criteacuterio

a capital de cada Estado e um outro Municiacutepio situado fora da regiatildeo metropolitana da capital com uma das seguintes caracteriacutesticas

histoacuterico de alta judicializaccedilatildeo da sauacutede eou maior populaccedilatildeo Dentre os Municiacutepios foram pesquisados Belo HorizonteMG

DivinoacutepolisMG FlorianoacutepolisSC JoinvilleSC CuiabaacuteMT SinopMT NatalRN MossoroacuteRN Rio de JaneiroRJ AraruamaRJ Satildeo

PauloSP Satildeo Joseacute do Rio PretoSP Porto AlegreRS Santa MariaRS CuritibaPR LondrinaPR e SantanaAP

56 A fiscalizaccedilatildeo objeto da auditoria culminou com a Decisatildeo n 17872017 proferida em 16082017 (BRASIL Tribunal de Contas da

Uniatildeo Acoacuterdatildeo n 17872017 ndash Plenaacuterio Rel Min Bruno Dantas Data julg 16082017)

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Os auditores do TCU verificaram que os valores gastos pelo Ministeacuterio da Sauacutede no cumprimento das decisotildees judiciais nessa aacuterea aumentaram mais de 14 vezes nos uacuteltimos 8 anos Em 2015 foram gas-tos mais de R$ 1 bilhatildeo sendo que em 2008 esses valores eram de aproximadamente R$ 70 milhotildees Ainda assim os auditores consideraram que tais valores estavam subestimados pois se referiam ao cumprimento de decisotildees judiciais quando era necessaacuteria a aquisiccedilatildeo de medicamentos e insumos jaacute que havia outros tipos de gastos como por exemplo depoacutesitos em contas judiciais pagamento direto a beneficiaacuterios e fretes aleacutem da retirada de um medicamento de um programa jaacute existente no caso de a demanda judicial tratar de uma terapecircutica pertencente ao SUS

A maior parte dos gastos com medicamentos judicializados do Ministeacuterio da Sauacutede se referia a itens natildeo incorporados ao SUS Durante o periacuteodo de 2010 a 2015 o Ministeacuterio da Sauacutede despendeu mais de R$ 27 bilhotildees com compras determinadas judicialmente Desse valor a maioria (54 ou R$ 19 bilhatildeo) foi gasto com a compra de apenas 3 medicamentos Elaprasereg (idursulfase) Naglazymereg (galsulfase) e Solirisreg (eculizumabe)57 Em 2014 quando o Solirisreg e o Naglazymereg representavam 55 do total gasto pelo Ministeacuterio com o cumprimento de ordens judiciais o custo meacutedio anual por paciente atendi-do com esses medicamentos era de mais de R$ 1 milhatildeo Foi destacado tambeacutem que ateacute o momento da auditoria o Solirisreg natildeo possuiacutea registro na Agecircncia Nacional de Vigilacircncia Sanitaacuteria (ANVISA)

Quanto aos gastos das Secretarias Estaduais de Sauacutede com a judicializaccedilatildeo os dados indicaram que juntas elas despendiam muito mais recursos do que o Ministeacuterio da Sauacutede Somente as Secretarias de Sauacutede de Minas Gerais Santa Catarina e Satildeo Paulo gastaram nos anos de 2013 e 2014 mais de R$ 734 milhotildees e R$ 772 milhotildees respectivamente Jaacute o Ministeacuterio da Sauacutede gastou no mesmo periacuteodo cerca de R$ 435 milhotildees e R$ 698 milhotildees respectivamente

No tocante ao tipo de gasto com a judicializaccedilatildeo da sauacutede os dados dos anos de 2013 e 2014 das Secretarias Estaduais de Sauacutede de Minas Gerais Santa Catarina e Satildeo Paulo indicaram que os medica-mentos representavam mais de 80 do valor despendido com a judicializaccedilatildeo Em Santa Catarina e Satildeo Paulo os medicamentos que natildeo pertenciam agraves relaccedilotildees do SUS representavam mais de 50 do total gasto com medicamentos judicializados em 2013 Esse iacutendice foi superior a 65 em 2014 Ainda a respei-to desse tipo de gasto foi observado que dos 19 medicamentos responsaacuteveis pelos maiores gastos (em termos percentuais) nesses Estados para o referido periacuteodo 10 eram medicamentos natildeo incorporados ao SUS sendo que 3 deles jaacute haviam tido a sua anaacutelise de incorporaccedilatildeo ao SUS indeferida pela CONITEC

No Estado de Satildeo Paulo os medicamentos do componente especializado da assistecircncia farmacecircutica e os oncoloacutegicos tiveram importante participaccedilatildeo nos gastos com judicializaccedilatildeo (3594 e 2409 nos anos de 2013 e 2014 respectivamente) No Distrito Federal segundo os dados do Tribunal de Justiccedila do Distrito Federal e Territoacuterios (TJDFT) relativos aos processos de primeira instacircncia autuados em 2013 e 2014 32 deles diziam respeito a Unidade de Terapia Intensiva (UTI) ou Unidade de Cuidados Intensivos (UCI) A Procuradoria-Geral do Distrito Federal (PGDF) reportou durante a fiscalizaccedilatildeo que 55 das accedilotildees judiciais referentes ao periacuteodo de 2010 a 2014 diziam respeito a UTI

Nesse contexto de judicializaccedilatildeo apontada pelo Tribunal de Contas da Uniatildeo tambeacutem cabe acrescentar as ocorrecircncias de fraudes as quais ajudam a impulsionar os gastos com sauacutede Citem-se como exem-plos a fraude identificada pela poliacutecia na operaccedilatildeo ldquoGarra Rufardquo em que se descobriu que o Estado de Satildeo Paulo foi compelido judicialmente a fornecer medicamentos para pacientes que natildeo eram portado-res da doenccedila ou para aqueles em que o grau da doenccedila natildeo justificava o uso da medicaccedilatildeo bem como outra fraude em que a maioria dos pacientes desconhecia que era parte na accedilatildeo judicial contra o Estado e muitos nem sequer possuiacuteam a doenccedila58

57 O Elaprase eacute utilizado no tratamento da mucopolissacaridose tipo 2 enquanto o Naglazyme eacute usado para a mucopolissacaridose tipo

6 e o Soliris para o tratamento da siacutendrome hemoliacutetico-urecircmica

58 PINHO Angela Governo vecirc uso de brasileiro como cobaia por laboratoacuterio estrangeiro Cotidiano Folha de S Paulo 11 de agosto de

2017 Disponiacutevel em lthttpwww1folhauolcombrcotidiano2017081909010-governo-ve-uso-de-brasileiro-como-cobaia-por-

laboratorio-estrangeiroshtmlgt Acesso em 17 fev 2018

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Constata-se que os gastos puacuteblicos ineficientes natildeo se limitam agrave judicializaccedilatildeo da sauacutede mas tambeacutem agrave proacutepria execuccedilatildeo das poliacuteticas puacuteblicas O exemplo estaacute no relatoacuterio do Banco Mundial59 publicado em novembro de 2017 e que conteacutem uma anaacutelise minuciosa sobre os gastos puacuteblicos no Brasil em aacutereas como previdecircncia social folha de pagamento dos servidores puacuteblicos aquisiccedilotildees puacuteblicas assistecircncia social educaccedilatildeo sauacutede mercado de trabalho e poliacuteticas de desenvolvimento do setor privado60 A con-clusatildeo eacute de que os governos (federal estaduais e municipais) gastam recursos de maneira ineficiente e muitas vezes injusta ao beneficiarem os mais ricos em detrimento dos mais pobres

No tocante agraves poliacuteticas puacuteblicas de sauacutede o diagnoacutestico revela que cerca de 03 do PIB poderia ser economizado adotando-se maior eficiecircncia a niacutevel local assim como mais 03 com o fim dos creacuteditos tributaacuterios do IRPF para despesas privadas com sauacutede Ao comparar os niacuteveis de eficiecircncia dos municiacute-pios o estudo identificou a possibilidade de ganhos em torno de 37 no atendimento primaacuterio (econo-mia potencial de R$ 9 bilhotildees) e de 71 nos serviccedilos secundaacuterios e terciaacuterios (economia potencial de R$ 12 bilhotildees) o que poderia gerar uma economia potencial de 03 do PIB

Em relaccedilatildeo ao PIB o Brasil gasta em sauacutede tanto quanto a meacutedia entre os paiacuteses da Organizaccedilatildeo para a Cooperaccedilatildeo e Desenvolvimento Econocircmico (OCDE)61 e mais do que os seus parceiros sendo que a maior parte desses gastos ocorre fora do setor puacuteblico No Brasil o gasto total com sauacutede eacute de 92 do PIB comparaacutevel com a meacutedia dos paiacuteses membros da OCDE (89) e maior do que a meacutedia dos seus parceiros estruturais62 e regionais63 (58 e 74 respectivamente)

Em termos per capita o Brasil gasta menos do que a meacutedia entre os paiacuteses da OCDE poreacutem mais do que os seus parceiros regionais e estruturais A despesa total per capita com sauacutede no Brasil (US$ 1334) eacute 35 da meacutedia entre os paiacuteses da OCDE (US$ 3817) 153 dos seus parceiros estruturais (US$ 873) 127 dos regionais (US$ 1054) e 141 maior do que a meacutedia entre os paiacuteses do BRICS64 (US$ 949) O relatoacuterio tambeacutem ressalta que o setor puacuteblico gasta recursos significativos por meio de despesas tribu-taacuterias especialmente para subsidiar seguros privados de sauacutede (05 do PIB)

Quanto ao atendimento primaacuterio identificou-se que a maior parte dos municiacutepios apresenta alta pro-dutividade (relativamente eficiente no uso de recursos) e baixo desempenho ao passo que nos atendi-mentos secundaacuterio e terciaacuterio a maioria revela baixa produtividade e baixo desempenho65 Essa situ-accedilatildeo de atendimento primaacuterio eacute verificada principalmente nos municiacutepios das regiotildees relativamente pobres (Norte e Nordeste) que sofrem mais restriccedilotildees de recursos Em relaccedilatildeo aos atendimentos mais complexos o desempenho da maioria dos municiacutepios eacute igualmente baixo Em termos regionais os municiacutepios das regiotildees Sul Sudeste e Centro-Oeste que tecircm um gasto per capita mais alto com sauacutede primaacuteria satildeo os menos eficientes ao passo que os municiacutepios do Norte e Nordeste que gastam menos satildeo mais eficientes A eficiecircncia estaacute relacionada agrave escala considerando o tamanho do municiacutepio o nuacutemero de leitos e o tamanho dos hospitais

59 BANCO MUNDIAL Um ajuste justo anaacutelise da eficiecircncia e equidade do gasto puacuteblico no Brasil Novembro de 2017 Disponiacutevel em

lthttpwwwworldbankorgptcountrybrazilpublicationbrazil-expenditure-review-reportgt Acesso em 27 mar 2018

60 Vale tambeacutem registrar que o relatoacuterio do Banco Mundial natildeo ficou imune a criacuteticas como por exemplo por ter feito uma leitura essencialmente

economeacutetrica desconsiderando a legislaccedilatildeo e o funcionamento do ensino superior e da educaccedilatildeo baacutesica no Brasil o indicador utilizado para

medir a eficiecircncia das universidades puacuteblicas entre outras (BRASIL Relatoacuterio do Banco Mundial distorce dados e ignora a realidade do paiacutes

alertam especialistas Paiacutes Jornal do Brasil 02 de dezembro de 2017 Disponiacutevel em lthttpwwwjbcombrpaisnoticias20171202

relatorio-do-banco-mundial-distorce-dados-e-ignora-a-realidade-do-pais-alertam-especialistasgt Acesso em 27 mar 2018)

61 Os paiacuteses membros da OCDE satildeo Estados Unidos Sueacutecia Alemanha Suiacuteccedila Holanda Franccedila Canadaacute Beacutelgica Dinamarca Aacuteustria

Japatildeo Nova Zelacircndia Greacutecia Portugal Espanha Noruega Islacircndia Itaacutelia Eslovecircnia Austraacutelia Finlacircndia Reino Unido Irlanda Rep da

Eslovaacutequia Israel Hungria Coreacuteia Rep Checa Polocircnia Lituacircnia Estocircnia Letocircnia e Luxemburgo

62 Os parceiros estruturais satildeo Aacutefrica do Sul Fed Russa China Turquia Iacutendia e Indoneacutesia

63 Os parceiros regionais satildeo Costa Rica Chile Colocircmbia e Meacutexico

64 Os paiacuteses do BRICS satildeo Brasil Ruacutessia Iacutendia China e Aacutefrica do Sul

65 O desempenho constitui uma medida comparativa de produtos e resultados entre vaacuterios municiacutepios sem considerar restriccedilotildees de

recursos enquanto que a produtividade eacute calculada pela relaccedilatildeo entre o desempenho e os gastos

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Em relaccedilatildeo ao tamanho do municiacutepio os dados mostram que a eficiecircncia meacutedia eacute mais baixa entre os municiacutepios com menos de 5000 habitantes No atendimento secundaacuterio e terciaacuterio a tendecircncia de maior eficiecircncia nos municiacutepios maiores eacute mais clara que no atendimento primaacuterio Quanto ao atendi-mento hospitalar as pontuaccedilotildees meacutedias de eficiecircncia dos municiacutepios com mais de 100000 habitantes satildeo quase quatro vezes superiores agrave meacutedia encontrada em municiacutepios com menos de 5000 habitantes

A economia potencial nos gastos com sauacutede estaacute relacionada agrave escala ineficiente de prestaccedilatildeo de ser-viccedilos sobretudo nos hospitais Segundo os pesquisadores do Banco Mundial o sistema brasileiro de sauacutede possui um grande nuacutemero de pequenos hospitais construiacutedos para prestar serviccedilos em regiotildees menos urbanizadas A maioria dos hospitais brasileiros opera em pequena escala e 61 possui menos de 50 leitos sendo que o tamanho ideal estimado eacute de 150 a 200 leitos para obter economias de escala Aleacutem disso as taxas de ocupaccedilatildeo dos leitos tambeacutem satildeo consideradas muito baixas sendo em meacutedia 45 nos hospitais do SUS e apenas 37 nas unidades de terapia intensiva Comparativamente obser-va-se que esses nuacutemeros estatildeo abaixo das meacutedias da OCDE (71) e da taxa de ocupaccedilatildeo desejaacutevel (entre 75 e 85) Os dados revelam ainda a falta de integraccedilatildeo do sistema como um fator da inefici-ecircncia pois quanto mais eficiente for o atendimento primaacuterio de um municiacutepio mais eficiente seraacute seu atendimento hospitalar (secundaacuterio e terciaacuterio) tendo em vista que um atendimento primaacuterio robusto contribui para racionalizar a demanda e melhorar os resultados em todo o sistema

Como se percebe a partir de quaisquer dados tanto do Tribunal de Contas da Uniatildeo quanto do Banco Mundial eacute possiacutevel visualizar a situaccedilatildeo preocupante e draacutestica por que passam as poliacuteticas puacuteblicas de sauacutede no Brasil agravadas pela judicializaccedilatildeo De um lado as pesquisas revelam que os serviccedilos puacuteblicos de sauacutede podem ser melhorados em quantidade e qualidade desde que levados em consideraccedilatildeo aspec-tos natildeo apenas de efetividade mas tambeacutem de eficiecircncia de modo que a maior atenccedilatildeo agrave eficiecircncia implica poder oferecer mais serviccedilos de sauacutede com os mesmos recursos Por outro as pesquisas tambeacutem demons-tram que a judicializaccedilatildeo da sauacutede especialmente na aacuterea de concessatildeo de medicamentos eacute geradora de ineficiecircncia no acircmbito da Administraccedilatildeo Puacuteblica (Uniatildeo Estados Municiacutepios e Distrito Federal) porquan-to as determinaccedilotildees judiciais desalocam recursos previamente destinados agrave coletividade para satisfazer interesses individuais desorganizando as contas puacuteblicas e a proacutepria poliacutetica puacuteblica de sauacutede

Eacute sabido que a questatildeo da judicializaccedilatildeo do direito fundamental agrave sauacutede eacute bastante complexa e de difiacute-cil soluccedilatildeo a curto prazo Por ser um fenocircmeno crescente e que desorganiza a poliacutetica puacuteblica de sauacutede planejada pelo Poder Executivo urge enfrentar o desafio da impossibilidade de a limitaccedilatildeo orccedilamentaacute-ria atender a todas as demandas judiciais que pleiteiam esse direito fundamental Em que pese a legiti-midade do indiviacuteduo isoladamente buscar via Judiciaacuterio a satisfaccedilatildeo do seu direito agrave sauacutede os efeitos negativos sobre as poliacuteticas puacuteblicas nessa aacuterea previamente planejadas pela Administraccedilatildeo implicam a desalocaccedilatildeo de recursos para atendimento da coletividade Daiacute a necessidade de natildeo se desprezar os aspectos de eficiecircncia (nas suas variadas acepccedilotildees) que por possuir conteuacutedo nitidamente econocircmico exige uma anaacutelise interdisciplinar do fenocircmeno

7 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

Conforme se verificou ao longo do estudo o problema relacionado agrave ineficiecircncia dos gastos com poliacuteticas puacuteblicas no Brasil especialmente em relaccedilatildeo agrave sauacutede e sua judicializaccedilatildeo natildeo deve ignorar o olhar interdisciplinar entre direito e economia sobretudo os aportes teoacutericos da anaacutelise econocircmica do direito Partindo da ideia de que os direitos realmente tecircm custos e que os recursos puacuteblicos satildeo escas-sos a aplicaccedilatildeo eficiente desses valores repercute na concretizaccedilatildeo dos direitos humanos e fundamen-tais conforme demonstrado nos dados do Banco Mundial e do Tribunal de Contas da Uniatildeo

A abordagem histoacuterica da anaacutelise econocircmica do direito auxilia a desmitificar a opiniatildeo de que esse movimento se preocupa apenas com questotildees de ordem monetaacuteria juros inflaccedilatildeo preccedilos tributa-ccedilatildeo ou mercados ou que procura reduzir tudo a objeto de comeacutercio Ficou evidenciado que o principal enfoque cuida do estudo do comportamento humano num ambiente de escassez de recursos procu-

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rando demonstrar como os indiviacuteduos tomam decisotildees e respondem a incentivos fornecidos pela nor-ma juriacutedica Natildeo obstante a diversidade de escolas ou correntes trata-se de um pensamento juriacutedico que permite explicar o comportamento dos indiviacuteduos frente agraves normas vislumbrando as suas conse-quecircncias no tocante ao cumprimento ou natildeo das obrigaccedilotildees legais sendo plenamente aplicaacutevel a ques-totildees poliacuteticas e sociais

Verificou-se tambeacutem que a relaccedilatildeo interdisciplinar entre direito e economia natildeo se revela contraditoacute-ria ou conflitante como pode parecer a partir da mera constataccedilatildeo da diferenccedila entre os seus meacutetodos Pelo contraacuterio o papel da economia na interdisciplinaridade com o direito eacute contribuir para o planeja-mento dos gastos puacuteblicos escolhendo prioridades de alocaccedilatildeo de recursos e realizaccedilatildeo de despesas sociais visando a atender ao maior interesse da sociedade e do desenvolvimento Levar em conta as implicaccedilotildees econocircmicas da Administraccedilatildeo Puacuteblica e das decisotildees judiciais em sede de poliacuteticas puacutebli-cas serve tambeacutem para compreender a crise do Estado contemporacircneo da democracia e da efetivaccedilatildeo dos direitos humanos e fundamentais sociais

Para aleacutem de conceber o direito essencialmente como provedor de justiccedila a anaacutelise econocircmica pro-potildee que as leis e as decisotildees juriacutedicas funcionem como incentivos para modificar o comportamento dos indiviacuteduos a fim de atingir os objetivos das poliacuteticas puacuteblicas entre os quais a distribuiccedilatildeo a efeti-vidade e a eficiecircncia Nesse cenaacuterio a anaacutelise econocircmica constitui uma metodologia importante para a tomada de decisatildeo que natildeo deve ser desprezada Assim se a judicializaccedilatildeo for concebida como uma atividade econocircmica e se torna uma atividade lucrativa para quem demanda espera-se que maiores recursos sejam investidos na atividade por quem quer lucrar com ela (incentivos) Se a chance de ecircxito aumenta mais pessoas satildeo levadas a promover a judicializaccedilatildeo A alta probabilidade de sucesso dessas demandas perante o Judiciaacuterio tambeacutem gera demanda e relativa facilidade de acesso agrave Justiccedila

Em que pese tambeacutem natildeo haver uniformidade na definiccedilatildeo do termo eficiecircncia tanto entre juristas quanto entre economistas os principais conceitos dados por Coase Pareto Kaldor-Hicks e Posner auxiliam bastante na sua aplicaccedilatildeo superando a superficialidade com que costuma ser tratada no direi-to administrativo Desse modo torna-se importante o caraacuteter interdisciplinar para a compreensatildeo do princiacutepio da eficiecircncia positivado na Constituiccedilatildeo Federal e na legislaccedilatildeo administrativa assim como a sua leitura agrave luz da anaacutelise econocircmica do direito para que a utilizaccedilatildeo dos recursos puacuteblicos seja devi-damente convertida em desenvolvimento social e concretizaccedilatildeo de direitos fundamentais sociais a exemplo do direito agrave sauacutede

A anaacutelise aprofundada sobre os gastos puacuteblicos no Brasil feita pelo Banco Mundial confirma em gran-de medida a aplicaccedilatildeo dos pressupostos da anaacutelise econocircmica quando a partir das noccedilotildees de desem-penho e produtividade conclui que os governos (federal estaduais e municipais) gastam mais do que podem e de forma ineficiente aleacutem de natildeo cumprirem integralmente seus objetivos realizando inclusi-ve gastos puacuteblicos injustos ao beneficiarem os mais ricos em detrimento dos mais pobres Eacute o caso por exemplo de que em relaccedilatildeo agraves poliacuteticas puacuteblicas de sauacutede cerca de 03 do PIB poderia ser economi-zado atraveacutes de melhorias de eficiecircncia a niacutevel local mantendo o mesmo padratildeo de serviccedilos de sauacutede

O impacto da atuaccedilatildeo eficiente nas poliacuteticas puacuteblicas de sauacutede eacute tatildeo grande que os nuacutemeros do relatoacute-rio do Banco Mundial remetem a uma seacuteria reflexatildeo acerca do que a boa aplicaccedilatildeo dos recursos poderia gerar para a sociedade Ao comparar os niacuteveis de eficiecircncia dos municiacutepios por exemplo o estudo iden-tificou a possibilidade de ganhos em torno de 37 no atendimento primaacuterio (economia potencial de R$ 9 bilhotildees) e de 71 nos serviccedilos secundaacuterios e terciaacuterios (economia potencial de R$ 12 bilhotildees) o que poderia gerar uma economia potencial de 03 do PIB

Entre as causas da ineficiecircncia estaacute a fragmentaccedilatildeo do sistema puacuteblico de sauacutede especialmente do alto nuacutemero de pequenos hospitais impedindo economias de escala na prestaccedilatildeo de serviccedilos A econo-mia potencial nos gastos com sauacutede segundo o relatoacuterio estaacute relacionada a uma escala ineficiente de prestaccedilatildeo de serviccedilos sobretudo nos hospitais O demasiado nuacutemero de pequenos hospitais reflete a necessidade de equilibrar o acesso a serviccedilos hospitalares com o tamanho ideal dos hospitais e a escala de serviccedilos Verificou-se que a maioria dos hospitais brasileiros opera em pequena escala e 61 possui

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menos de 50 leitos sendo que o tamanho ideal estimado eacute de 150 a 200 leitos para obter economias de escala Aleacutem disso as taxas de ocupaccedilatildeo dos leitos tambeacutem satildeo consideradas muito baixas

Jaacute na esteira das conclusotildees da auditoria realizada pelo TCU observou-se que haacute necessidade de que os ges-tores adotem medidas para coleta processamento e anaacutelise de dados referentes agraves accedilotildees judiciais de sauacutede assim como para detecccedilatildeo de fraudes de forma permanente Aleacutem disso eacute imprescindiacutevel elaborar um diag-noacutestico preciso sobre o impacto da judicializaccedilatildeo no orccedilamento e na gestatildeo puacuteblica da sauacutede a partir do cru-zamento de dados do monitoramento de pacientes beneficiaacuterios das decisotildees judiciais e dos medicamentos e insumos pleiteados Tambeacutem eacute necessaacuterio que as unidades gestoras adotem a praacutetica de divulgaccedilatildeo trans-parente e perioacutedica de informaccedilotildees e dados estatiacutesticos sobre a judicializaccedilatildeo da sauacutede para os oacutergatildeos envol-vidos as universidades os pesquisadores as organizaccedilotildees sociais e o puacuteblico interessado notadamente por-que os recursos satildeo puacuteblicos aleacutem de incentivar a participaccedilatildeo de todos na soluccedilatildeo do problema

Diante desse quadro conclui-se que os serviccedilos puacuteblicos de sauacutede podem ser melhorados em quanti-dade e qualidade desde que levados em consideraccedilatildeo aspectos natildeo apenas de efetividade mas tam-beacutem de eficiecircncia Os desafios satildeo enormes em um paiacutes continental como Brasil natildeo mais se podendo tolerar poliacuteticas puacuteblicas ineficientes especialmente porque os anos vindouros desafiaratildeo o sistema com o envelhecimento da populaccedilatildeo e as doenccedilas crocircnicas decorrentes do aumento da expectativa de vida Daiacute a importacircncia da identificaccedilatildeo da fronteira e do necessaacuterio diaacutelogo interdisciplinar entre direito e economia na busca pela efetividade e eficiecircncia das poliacuteticas puacuteblicas de sauacutede no Brasil

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DIA DO ORGULHO LGBTI DIA DE FESTA E DE LUTA

Maria Berenice Dias1

1998 eacute considerado o ano que natildeo acabou

Foi quando eclodiu o movimento de contracultura promovendo a mais significativa reviravolta na his-toacuteria contemporacircnea

Surgiu m Paris com os alunos Sorbonne questionando o perfil conservador da Universidade

O Festival de Woodstock cantou ldquopaz e amorrdquo

A busca da liberdade era expressa pelo lema ldquoeacute proibido proibirrdquo

A partir daiacute a mobilizaccedilatildeo espraiou-se mundo a fora

Os reflexos chegaram ao Brasil pelo Tropicalismo na voz dos Novos Baianos

E haacute exatos 49 anos no dia 28 de junho de 1969 em Nova Iorque no bar Stowall frequentado pela populaccedilatildeo LGBTI houve um confronto com a poliacutecia contra as reiteradas agressotildees invasotildees e perse-guiccedilatildeo que sofriam

A data reconhecida como o Dia Internacional do Orgulho LGBTI eacute marcada por paradas e manifesta-ccedilotildees puacuteblicas na busca de respeito de voz de vez

No entanto o reconhecimento dos direitos somente comeccedilou neste seacuteculo

Enquanto em todos os paiacuteses as conquistas satildeo asseguradas por leis no Brasil a ineacutercia legislativa levou a justiccedila a se transformar em garantidor da cidadania desta parcela da populaccedilatildeo que eacute alvo ain-da de perversa discriminaccedilatildeo

Foi o Judiciaacuterio que reconheceu os viacutenculos homoafetivos como entidade familiar assegurando aos casais formados por pessoas do mesmo sexo todos os direitos acesso ao casamento agrave adoccedilatildeo bem como aos direitos previdenciaacuterios e sucessoacuterios

Tambeacutem foi a Justiccedila que recentemente garantiu aos transgecircneros o direito agrave alteraccedilatildeo do nome e da identidade sexual diretamente junto ao registro civil por autodeclaraccedilatildeo mesmo que natildeo tenha se submetido a qualquer tratamento hormonal ou intervenccedilatildeo ciruacutergica

Apesar de todos estes avanccedilos natildeo eacute respeitado o direito agrave vida O Brasil eacute o campeatildeo de mortes em razatildeo da orientaccedilatildeo sexual ou identidade de gecircnero uma a cada 19 horas

Isto porque a LGBTIfobia natildeo eacute crime Natildeo haacute lei que puna as agressotildees que algueacutem eacute alvo pelo simples fato de natildeo corresponder ao modelo identificado como ldquonormalrdquo de viver e amar

Deste modo a luta precisa continuar para que seja aprovada uma legislaccedilatildeo que assegure os direitos conquistados judicialmente e que tipifique os atos de oacutedio como crime

O PLS 1342008 ndash Estatuto da Diversidade Sexual e Gecircnero apresentado ao Senado Federal por ini-ciativa popular acompanhado de 100 mil assinaturas atende a este propoacutesito Foi elaborado pela Comissatildeo de Diversidade Sexual e Gecircnero da OAB com a participaccedilatildeo dos movimentos sociais

Ou seja muito se tem a festejar mas tambeacutem muito ainda a se fazer

1 Presidente Nacional da Comissatildeo de Diversidade Sexual e Gecircnero da OAB e da Comissatildeo de Direito Homoafetivo e Gecircnero do IBDFAM

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CONDENACcedilOtildeES NA CORTE INTERAMERICANA DE DIREITOS HUMANOS DA OEA UMA FOTOGRAFIA DA VIOLACcedilAtildeO DOS DIREITOS HUMANOS NA AMEacuteRICA LATINA

CONDENACIONES EN LA CORTE INTERAMERICANA DE DERECHOS HUMANOS DE LA OEA UNA FOTOGRAFIacuteA DE LA VIOLACIOacuteN DE LOS DERECHOS HUMANOS EN AMEacuteRICA LATINAMilene Pacheco Kindermann1

Resumo A pesquisa levantou nas condenaccedilotildees dadas pela Corte Interamericana de Direitos HumanosOEA o perfil de desrespeito aos DH localizando as agressotildees aos DH realizadas pelos paiacuteses condena-dos e a tutela concedida aos cidadatildeos americanos A pesquisa foi descritiva com meacutetodo dedutivo niacutevel exploratoacuterio abordagem quali-quantitativa O procedimento foi histoacuterico e monograacutefico com coleta de dados bibliograacutefica e documental As fontes primaacuterias foram 208 sentenccedilas de meacuterito da Corte IDH (de 1988 a 2017) O perfil de violaccedilotildees aos DH refere-se somente aos paiacuteses da Ameacuterica Latina com destaque ao Peru o maior violador Os DH que sofreram mais violaccedilotildees foram os direitos baacutesicos agrave vida e agrave integridade fiacutesica bem como a liberdade pessoal Os DH natildeo violados foram os de indenizaccedilatildeo de retificaccedilatildeo ou resposta e os menos violados foram os de reuniatildeo de nacionalidade e a liberdade de consciecircncia e de religiatildeo Treze outros DH listados no Pacto foram medianamente violados

Palavras-chave Direitos Humanos Corte Interamericana de Direitos Humanos Sentenccedilas

Resumen La investigacioacuten levantoacute en las condenas dadas por la Corte Interamericana de Derechos Humanos OEA el perfil de irrespeto a los DH localizando las agresiones a los DH realizadas por los paiacuteses condenados y la tutela concedida a los ciudadanos americanos La investigacioacuten fue descriptiva con meacutetodo deductivo nivel exploratorio enfoque cualitativo y cuantitativo El procedimiento fue histoacuterico y monograacutefico con recoleccioacuten de datos bibliograacutefica y documental Las fuentes primarias fueron 208 sentencias de meacuterito de la Corte IDH (de 1988 hasta 2017) El perfil de violaciones a los DH se refiere solamente a los paiacuteses de Ameacuterica Latina con destaque a Peruacute el mayor violador Los DH que sufrieron maacutes violaciones fueron los derechos baacutesicos a la vida ya la integridad fiacutesica asiacute como la libertad personal Los DH no violados fueron los de indemnizacioacuten de rectifi-cacioacuten o respuesta y los menos violados fueron los de reunioacuten de nacionalidad y la libertad de conciencia y de religioacuten Trece otros DH enumerados en el Pacto fueron violados de forma mediana

Palabras clave Derechos Humanos Corte Interamericana de Derechos Humanos Sentencias

1 Professora da Universidade do Sul de Santa Catarina- Unisul desde 1992 Coordenou o curso de Relaccedilotildees Internacionais de 1996 a

2009 Foi Diretora do Campus Universitaacuterio de Tubaratildeo de 2009 a 2013 Desde entatildeo eacute Coordenadora da aacuterea institucional da Extensatildeo

Universitaacuteria na Proacute-Reitoria de Extensatildeo Eacute pesquisadora e professora na aacuterea de Direito Internacional e Direitos Humanos

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1 INTRODUCcedilAtildeO

Os Direitos Humanos (DH) apesar de amplamente estudados continuaratildeo sendo ao longo dos tem-pos objeto de pesquisa Os movimentos sociais nacionais e internacionais liderados na maioria das vezes por ONGs tecircm gerado a ampliaccedilatildeo do rol de DH protegidos por normas acompanhando a modernidade e o surgimento das novas tecnologias

Para que a proteccedilatildeo dos DH deixasse de ser assunto de Estado e passasse a ser assunto da sociedade inter-nacional apoacutes a Segunda Guerra Mundial mudou-se o paradigma de tratamento da temaacutetica Com a criaccedilatildeo da ONU ndash Organizaccedilatildeo das Naccedilotildees Unidas (em 1945) os paiacuteses aproximaram-se e desenvolveram o diaacutelo-go em direccedilatildeo agrave universalizaccedilatildeo dos DH editando a Declaraccedilatildeo Universal dos Direitos Humanos (1948) Desde entatildeo diversos tratados tecircm sido construiacutedos para que seja garantida a proteccedilatildeo destes direitos

No entanto natildeo basta a construccedilatildeo de tratados eacute necessaacuteria a existecircncia de um sistema que garanta a sua apli-caccedilatildeo Em niacutevel global a ONU conta com uma sistemaacutetica de acompanhamento da execuccedilatildeo dos tratados de DH por meio de Comissotildees ou Comitecircs que tecircm a funccedilatildeo de fiscalizar e orientar os Estados signataacuterios das con-venccedilotildees no seu cumprimento Satildeo nos sistemas regionais entretanto que se encontram meios mais efetivos de alcance desta proteccedilatildeo (PIOVESAN 2006) Nos sistemas europeu americano e africano haacute a promoccedilatildeo dos DH (feita por meio de tratados) o controle do atendimento aos tratados nos Estados (feito por meio de Comissotildees) e a garantia de cumprimento dos tratados quando violados (feita por meio das Cortes Internacionais)

O tema em estudo foi a proteccedilatildeo dos DH no sistema americano por meio da Corte Interamericana de DH Este sistema constituiu-se no acircmbito da Organizaccedilatildeo dos Estados Americanos ndash OEA concebida em 1948 como um dos seus principais pilares Para tanto em 2 de maio do mesmo ano foi aprovada a Declaraccedilatildeo Americana dos Direitos e Deveres do Homem como o marco inicial dos DH na Ameacuterica

Aleacutem desse importante marco legal outros tratados disciplinam os DH nos paiacuteses americanos como a Convenccedilatildeo Americana sobre Direitos Humanos (o Pacto de San Joseacute da Costa Rica) aprovado em 22 de novembro de 1969 e com entrada em vigor em 18 de Julho de 1978 a Convenccedilatildeo Interamericana para Prevenir e Punir a Tortura de 9 de dezembro de 1985 com vigor em 28 de fevereiro de 1987 o Protocolo Adicional agrave Convenccedilatildeo Americana sobre Direitos Humanos em mateacuteria de Direitos Econocircmicos Sociais e Culturais (Protocolo de San Salvador) de 17 de novembro de 1988 com entrada em vigor em 16 de novembro de 1999 o Protocolo agrave Convenccedilatildeo Americana sobre Direitos Humanos Referente agrave Aboliccedilatildeo da Pena de Morte de 8 de junho de 1990 em vigor desde 28 de agosto de 1991 a Convenccedilatildeo Interamericana para Prevenir Punir e Erradicar a Violecircncia contra a Mulher (Convenccedilatildeo de Beleacutem do Paraacute) de 9 de junho de 1994 com vigor em 5 de marccedilo de 1995 a Convenccedilatildeo Interamericana sobre o Desaparecimento Forccedilado de Pessoas de 9 de junho de 1994 em vigor desde 28 de marccedilo de 1996 e a Convenccedilatildeo Interamericana para a Eliminaccedilatildeo de Todas as Formas de Discriminaccedilatildeo contra as Pessoas Portadoras de Deficiecircncia de 7 de junho de 1999 com entrada em vigor em 14 de setembro de 2001

Jaacute nesse milecircnio outras cartas e declaraccedilotildees foram adotadas sendo do ano 2000 a Declaraccedilatildeo de Princiacutepios sobre Liberdade de Expressatildeo de 2001 a Carta Democraacutetica Interamericana e de 2008 os Princiacutepios e Boas Praacuteticas para a Proteccedilatildeo das Pessoas Privadas de Liberdade nas Ameacutericas (COMISSAtildeO INTERAMERICANA DE DIREITOS HUMANOS 2017)

Para a atenccedilatildeo aos DH no sistema americano foi concebido como oacutergatildeo permanente da OEA em 1959 a Comissatildeo Interamericana de Direitos Humanos ndash CIDH que passou a atuar efetivamente a partir de 1960 Com a entrada em vigor em 1978 da Convenccedilatildeo Americana sobre Direitos Humanos (celebrada em 1969) houve o incremento da efetividade da Comissatildeo o estabelecimento da Corte Interamericana de Direitos Humanos e a mudanccedila da natureza juriacutedica dos instrumentos nos que se baseia a estrutura institucional de declaraccedilatildeo (soft law) para tratados (hard law) Este tratado ampliou o sistema americano de proteccedilatildeo aos DH listando os direitos protegidos o sistema de controle destes direitos (a Comissatildeo Interamericana de Direitos Humanos) e o sistema de garantia destes direitos (a Corte Interamericana de Direitos Humanos ndash CorteIDH)

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Com acesso possiacutevel ao sistema para os cidadatildeos ONGs e Estados-partes a CorteIDH tem assumido o papel de garantir os DH no territoacuterio dos paiacuteses signataacuterios do tratado quando os Estados natildeo suprem ao indiviacuteduo o acesso agraves garantias nos termos do artigo 46 do Pacto (BRASIL 1992)

Nos dados disponiacuteveis no siacutetio da Organizaccedilatildeo dos Estados Americanos (2017) verifica-se que dos 34 Estados Membros da organizaccedilatildeo 23 satildeo signataacuterios do Pacto de Satildeo Joseacute da Costa Rica sendo que a uacuteltima ratificaccedilatildeo deu-se em 1991 por Trindade e Tobago Eram 24 mas dois deles denunciaram o tra-tado Trindade e Tobago em 1998 e Venezuela em 2012 Natildeo satildeo signataacuterios ainda aleacutem dos dois paiacute-ses que denunciaram o Pacto Antiacutegua e Barbuda Bahamas Belize Canadaacute Estados Unidos Guiana Satildeo Cristoacutevatildeo e Neves Santa Luacutecia Satildeo Vicente amp Granadinas

No siacutetio da Corte verifica-se que 22 paiacuteses jaacute foram chamados a responder processos de desrespeito aos DH estando em supervisatildeo de cumprimento 334 decisotildees contra os Estados tanto preliminares quanto de meacuterito no ano de 2017 (CORTE INTERAMERICANA DE DIREITOS HUMANOS 2017)

A pesquisa destinou-se entatildeo a levantar nas sentenccedilas de meacuterito o perfil americano de desrespeito aos DH localizando as agressotildees aos DH realizadas pelos paiacuteses condenados e a tutela concedida pela Corte aos cidadatildeos americanos no continente Para o desenvolvimento do projeto adotou-se como pergunta de pesquisa qual eacute o perfil de desrespeito aos DH tutelados no Pacto de Satildeo Joseacute da Costa Rica a partir da garantia oferecida pela Corte Interamericana de Direitos Humanos da OEA

O objetivo geral foi o de avaliar o descumprimento do Pacto de Satildeo Joseacute da Costa Rica pelos paiacuteses ame-ricanos a partir da identificaccedilatildeo do perfil de desrespeito aos Direitos Humanos nos Estados-Partes do pacto em razatildeo das condenaccedilotildees impostas pela Corte Interamericana de Direitos Humanos da OEA E como objetivos especiacuteficos a) listar os direitos humanos tutelados no Pacto de Satildeo Joseacute da Costa Rica b) estudar as estruturas do sistema americano de proteccedilatildeo dos DH previstas no Pacto de Satildeo Joseacute da Costa Rica c) identificar todos os casos contenciosos sob a anaacutelise da Corte Interamericana de Direitos Humanos da OEA d) levantar nas sentenccedilas jaacute prolatadas quais foram os DH infringidos pelos Estados e as penalidades a eles impostas e) analisar os dados levantados identificando o perfil de descumpri-mento dos direitos tutelados pelo Pacto de Satildeo Joseacute da Costa Rica

2 MEacuteTODOS

Tratou-se de estudo com finalidade descritiva cujo meacutetodo de abordagem utilizado foi o dedutivo A pesquisa teve niacutevel exploratoacuterio com abordagem pelo meacutetodo quali-quantitativo Os meacutetodos de pro-cedimento foram o histoacuterico e o monograacutefico

O procedimento de coleta de dados foi bibliograacutefico e documental tendo como fontes primaacuterias 208 sentenccedilas de meacuterito dos casos contenciosos da Corte IDH da OEA no periacuteodo entre 1988 e 2017 dis-poniacuteveis em meio eletrocircnico e como fontes secundaacuterias livros artigos e outras publicaccedilotildees disponiacuteveis em meios eletrocircnicos ou impressos

Inicialmente foi feito o levantamento de dados por meio de pesquisa bibliograacutefica e documental sobre os DH tutelados e sobre as estruturas do sistema americano de proteccedilatildeo dos DH previstos no Pacto de Satildeo Joseacute da Costa Rica Em seguida foi elaborado formulaacuterio na ferramenta Excel para coleta dos DH infringidos pelos Estados nos casos contenciosos sentenciados pela CorteIDH Foi feita a da leitura das sentenccedilas e o preenchimento do formulaacuterio de coleta indicando os artigos da Convenccedilatildeo que ser-viram de fundamento para cada condenaccedilatildeo estabelecida nas sentenccedilas O levantamento dos dados foi registrado em fichamentos e planilhas A anaacutelise dos dados coletados foi feita agrave luz dos referenciais teoacutericos e documentais (tratados de DH)

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3 RESULTADOS E DISCUSSOtildeES

Primeiramente um dos resultados alcanccedilados refere-se agrave aacuterea de abrangecircncia da competecircncia da CorteIDH e das obrigaccedilotildees do Pacto de Satildeo Joseacute da Costa Rica Nota-se que esse Pacto que estabelece o sistema interamericano de DH refere-se territorialmente agrave praticamente a Ameacuterica Latina pois EUA e Canadaacute e alguns paiacuteses caribenhos ainda natildeo ratificaram o Pacto Isso limita territorialmente o escopo do projeto ao desenho de perfil de violaccedilotildees de DH somente para parte da Ameacuterica e natildeo sua totalidade

A Ameacuterica Latina isto eacute a parte territorial da Ameacuterica inicialmente pertencente aos paiacuteses falantes de liacutenguas latinas (Portugal Espanha e Franccedila) eacute composta de 20 paiacuteses (Argentina Boliacutevia Brasil Chile Colocircmbia Costa Rica Cuba El Salvador Equador Guatemala Haiti Honduras Meacutexico Nicaraacutegua Panamaacute Paraguai Peru Repuacuteblica Dominicana Uruguai e Venezuela) e duas dependecircncias (Guiana Francesa e Porto Rico) Todos esses paiacuteses independentes fazem parte da OEA e satildeo (ou foram) signataacute-rios do Pacto Dos 22 paiacuteses com condenaccedilotildees na Corte IDH natildeo compotildeem a Ameacuterica Latina Barbados (com 2 condenaccedilotildees) Suriname (com 5 condenaccedilotildees) e Trindade e Tobago (com 2 condenaccedilotildees) No entanto como satildeo poucos os casos e como estes paiacuteses territorialmente estatildeo na mesma porccedilatildeo fiacutesica dos demais Estados latino-americanos estes paiacuteses foram mantidos no levantamento dos dados

Os dados extraiacutedos das sentenccedilas 208 sentenccedilas de meacuterito condenatoacuterias aos Estados latino-ameri-canos incluindo os trecircs paiacuteses que natildeo compotildeem a Ameacuterica Latina geraram as tabelas que seguem

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Os dados numeacutericos organizados na tabela permitem algumas constataccedilotildees Os artigos da convenccedilatildeo mais mencionados nas decisotildees foram o 8ordm e o 25 O artigo 8ordm trata das garantias judiciais que o indiviacute-duo deve ter direito (mencionado em 188 casos) e o artigo 25 estabelece o direito agrave proteccedilatildeo judicial (citado em 181 casos) Obviamente que o fato dos casos terem chegado agrave instacircncia da Corte IDH eacute jus-tamente porque no acircmbito nacional as viacutetimas de violaccedilotildees natildeo encontraram a garantia e a proteccedilatildeo do Estado para a defesa de seus direitos Por isso a indicaccedilatildeo desses artigos ocorre em praticamente todas as sentenccedilas da CorteIDH geralmente citados os dois mas tambeacutem citados isoladamente num caso ou em outro

Afastada esta questatildeo outras merecem destaque Os artigos do Pacto que acumularam mais violaccedilotildees foram em ordem decrescente o art 5ordm (direito agrave integridade pessoal) com 155 casos o art7ordm (direito agrave liberdade pessoal) com 110 casos e o art 4ordm (direito agrave vida) com 108 casos Isso demonstra que as incidecircncias de violaccedilotildees de direitos baacutesicos ou fundamentais do ser humano na Ameacuterica Latina ainda satildeo grandes O paiacutes que mais apresentou casos de violaccedilotildees a estes trecircs direitos foi o Peru seguido da Guatemala e da Colocircmbia A lista de DH violados comeccedila a cair em seguida saindo do patamar de 108 violaccedilotildees para 41 violaccedilotildees e se apresentam nesta ordem

Lista de Direitos Violados em Ordem Decrescente

Art 11 Proteccedilatildeo da honra e da dignidade 41

Art 19 Direitos da crianccedila 40

Art 3 Direito ao reconhecimento da personalidade juriacutedica 36

Art 21 Direito agrave propriedade privada 35

Art13 Liberdade de pensamento e de expressatildeo 34

Art 22 Direito de circulaccedilatildeo e de residecircncia 29

Art9 Princiacutepio da legalidade e da retroatividade 28

Art 24 Igualdade perante a lei 28

Art 17 Proteccedilatildeo da famiacutelia 25

Art 23 Direitos poliacuteticos 21

Art 16 Liberdade de associaccedilatildeo 19

Art6 Proibiccedilatildeo da escravidatildeo e da servidatildeo 14

Art 18 Direito ao nome 6

Art 20 Direito agrave nacionalidade 5

Art12 Liberdade de consciecircncia e de religiatildeo 3

Art 15 Direito de reuniatildeo 3

Alguns direitos violados chamam a atenccedilatildeo Eacute o caso dos direitos da crianccedila com 40 casos de violaccedilotildees tendo a Guatemala como paiacutes que mais violou (com 9 casos) Outro eacute a proibiccedilatildeo da escravidatildeo e da ser-vidatildeo abolida no Seacutec XIX do continente americano mas que ainda persiste em 14 casos distribuiacutedos em 8 paiacuteses Tambeacutem um direito violado por 3 paiacuteses foi o da nacionalidade com destaque aos 2 casos da Repuacuteblica Dominicana e a 1 caso do Peru em que as violaccedilotildees resultaram em apatridia isto eacute colo-caram as viacutetimas em situaccedilatildeo de natildeo possuir viacutenculo com qualquer Estado

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Entre os DH assegurados pelo Pacto de Satildeo Joseacute da Costa Rica natildeo tiveram denuacutencias de violaccedilotildees aqueles previstos nos artigos 10 (direito de indenizaccedilatildeo) e 14 (direito de retificaccedilatildeo ou resposta)

Quanto aos paiacuteses os mais violadores entre os que participam do sistema interamericano satildeo o Peru (173 violaccedilotildees) a Guatemala (145 violaccedilotildees) a Colocircmbia (120 violaccedilotildees) o Equador (96 violaccedilotildees) e a Venezuela (75 violaccedilotildees) Jaacute os que menos direitos violaram foram Nicaraacutegua (17 violaccedilotildees) Uruguai (16 violaccedilotildees) Haiti (16 violaccedilotildees) Costa Rica (12 violaccedilotildees) Barbados (10 violaccedilotildees) e Trindade e Tobago (8 violaccedilotildees) Ressalta-se que Trindade e Tobago permaneceu por apenas 7 anos como signataacute-rio do Pacto Ainda no estudo natildeo foram encontrados casos envolvendo Granada e Jamaica

4 CONCLUSOtildeES

O perfil de violaccedilotildees aos DH mediante a tutelacondenaccedilatildeo concedida pela Corte refere-se aos paiacuteses da Ameacuterica Latina que participam do Pacto de Satildeo Joseacute da Costa Rica com destaque ao Peru como o maior violador seguido por Guatemala e Colocircmbia Os menos violadores foram Costa Rica Barbados e Trindade e Tobago sendo que natildeo responderam a processo na Corte IDH os Estados da Jamaica e Granada

Os DH que sofreram mais violaccedilotildees foram os direitos baacutesicos agrave vida e agrave integridade fiacutesica e agrave liberdade pessoal Os DH natildeo violados foram os de indenizaccedilatildeo de retificaccedilatildeo ou resposta e os menos violados foram os de reuniatildeo de nacionalidade e a liberdade de consciecircncia e de religiatildeo Treze outros DH lista-dos no Pacto foram medianamente violados

Percebeu-se que os direitos fundamentais agrave vida agrave liberdade e agrave integridade fiacutesica natildeo protegidos ou muitas vezes violados diretamente pelo Estado ainda satildeo os mais violados nos casos apresentados agrave Corte IDH Isso reflete que os sistemas nacionais de garantia aos DH ainda se apresentam com muitas falhas para garantir o baacutesico agrave populaccedilatildeo do paiacutes levando as viacutetimas agrave busca da garantia internacional de seus direitos

Todos os paiacuteses analisados praticaram atos violadores do direito agrave integridade pessoal Apenas a Nicaraacutegua natildeo sofreu condenaccedilatildeo por violaccedilatildeo da liberdade pessoal e quatro paiacuteses natildeo foram conde-nados por violaccedilatildeo ao direito agrave vida (Chile Haiti Nicaraacutegua e Panamaacute)

Haacute muito a evoluir na proteccedilatildeo aos direitos fundamentais na Ameacuterica E para outros paiacuteses que natildeo participam do Pacto haacute ainda a necessidade de se admitir o foro internacional como uma possibilidade de defesa de direitos aos seus cidadatildeos

AGRADECIMENTOS

Agradecimentos especiais a Julia Rezin de Medeiros de Souza bolsista de pesquisa do Curso de Direito da Unisul de Tubaratildeo pela contribuiccedilatildeo na coleta de dados das sentenccedilas de meacuterito da Corte Interamericana de Direitos Humanos da OEA

REFEREcircNCIAS

BRASIL Decreto nordm 678 de 6 de novembro de 1992 Promulga a Convenccedilatildeo Americana sobre Direitos Humanos (Pacto de Satildeo Joseacute da Costa Rica) de 22 de novembro de 1969 Disponiacutevel em lthttpwwwplanaltogovbrccivil_03decreto1990-1994anexoand678-92pdfgt Acesso em 31 ago 2017

COMISSAtildeO INTERAMERICANA DE DIREITOS HUMANOS Documentos Baacutesicos Disponiacutevel em lthttpwwwoasorgptcidhmandatoBasicosintroduccionaspgt Acesso em 31ago 2017

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CORTE INTERAMERICANA DE DIREITOS HUMANOS Casos Contenciosos Disponiacutevel em lthttpwwwcorteidhorcrcfJurisprudencia2busqueda_casos_contenciososcfmlang=esgt Acesso em 31 ago 2017a

_______ Supervisatildeo de Cumprimento Disponiacutevel em lthttpwwwcorteidhorcrcfJurisprudencia2busqueda_supervision_cumplimientocfmlang=esgt Acesso em 31 ago2017b

PIOVESAN Flaacutevia Direitos humanos e justiccedila internacional um estudo comparativo dos sistemas regionais europeu interamericano e africano Satildeo Paulo Saraiva 2006

ORGANIZACcedilAtildeO DOS ESTADOS AMERICANOS Tratados Multilaterais Convenccedilatildeo Americana sobre Direitos Humanos Disponiacutevel em lthttpwwwoasorgdilesptratados_B-32_Convencion_Americana_sobre_Derechos_Humanos_firmashtmgt Acesso em 31 ago 2017

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DIREITOS HUMANOS NO IMAGINAacuteRIO ARTIacuteSTICO DE CLARICE LISPECTOR O PAacuteSSARO DA LIBERDADE

HUMAN RIGHTS IN THE ARTISTIC IMAGINARY OF CLARICE LISPECTOR THE BIRD OF FREEDOMMiacuteriam Coutinho de Faria Alves1

Resumo As interfaces entre direito e arte servem de base para pensar o processo de ressignificaccedilatildeo dos direitos humanos2Pretende-se neste texto refletir sobre o imaginaacuterio pictoacuterico como imagem cultural e artiacutestica de direitos humanos inscritos na produccedilatildeo artiacutestica e literaacuteria de Clarice Lispector manifesto notadamente no quadro o paacutessaro da liberdade Esta interlocuccedilatildeo nos leva a pensar os direitos culturais como formas hermenecircuticas da cidadania conscientes das identidades e memoacuterias que permeiam a vida social individual e coletiva

Palavras-chaves Direitos Culturais Imaginaacuterio artiacutestico Clarice Lispector

Abstract Interfaces between rights and arts encourage reflections on the resignification process of cultural rights This study aims to discuss the pictorial imaginary as a cultural and artistic image of human rights inscri-bed in the artistic and literary production of Clarice Lispector particularly reproduced in her painting The bird of freedom With such interlocution we see cultural rights as hermeneutic forms of citizenship that make us aware of the identities and memories that permeate social individual and collective life

Key words Cultural rights Artistic imaginary Clarice Lispector

1 INTRODUCcedilAtildeO

No quadro paacutessaro da liberdade pintado em oacuteleo sobre madeira em 05 de junho de 1975 por Clarice Lispector a figura do paacutessaro azul em um fino traccedilo indica um tema essencial de caraacuteter juriacutedico-cul-tural a liberdade A pintura vista nesse aspecto cria narrativas de direitos humanos a serem intuiacutedas em meio a capacidade hermenecircutica de quem observa o quadro E portanto o proacuteprio acesso a essa atitude reflexiva realiza direito fundamental agrave cultura

A Declaraccedilatildeo Universal dos Direitos Humanos (DUDH) marco histoacuterico proclamado pela Organizaccedilatildeo das Naccedilotildees Unidas (ONU) 3 em 1948 nos propicia ao atingir setenta anos contexto histoacuterico a ser revisi-tado em seus constantes desdobramentos e desafios No recorte deste texto opta-se por uma interlocu-ccedilatildeo entre a arte literatura e direitos culturais observando sempre que a participaccedilatildeo livre agrave vida cultural assim como acesso aos bens culturais estatildeo interligados ao princiacutepio da dignidade humana em toda sua dimensatildeo inserido inclusive nas pautas da agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentaacutevel4

1 Professora Adjunta do Departamento de Direito da Universidade Federal de Sergipe (UFS) Coordenadora do Grupo de Pesquisa Direito

Arte e Literatura (CnpQUFS) Membro honoraacuteria da RDL (Rede brasileira de Direito e Literatura) Email miriamfaria2002yahoocombr

2 Cunha Filho ao tratar do dimensionamento e conceituaccedilatildeo dos direitos culturais a partir da Declaraccedilatildeo Universal dos Direitos Humanos

pontua que ldquo os direitos culturais relacionam-se com a ideia de respeito ao modus vivendi peculiar dos distintos povos destinataacuterios e

signataacuterios da declaraccedilatildeo[ Declaraccedilatildeo Universal de Direitos Humanos] no segundo com atividades especiacuteficas cujos nuacutecleos devem ser

extraiacutedos com variaccedilotildees gramaticais do proacuteprio texto artes ciecircncia e literaturardquo (CUNHA FILHO 2015 p27)

3 Observa-se a inscriccedilatildeo dos direitos culturais notadamente nos artigos 22 e 27 da Declaraccedilatildeo Universal dos Direitos Humanos (DUDH)

Disponiacutevel em lthttpswwwohchrorgENUDHRDocumentsUDHR_Translationsporpdfgt Acesso em 06 jul 2018

4 Cf informaccedilotildees contextuais sobre a Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentaacutevel Disponiacutevel lthttpsnacoesunidasorgtema

agenda2030gt Acesso em 06 jul 2018

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Centrada nesta perspectiva a narrativa literaacuteria e artiacutestica ocasiona possibilidades de pensar a dignida-de humana atraveacutes de linguagens artiacutesticas verbais e natildeo verbais Assim o faz a literatura e os quadros de Clarice Neste aspecto o confronto da tela do paacutessaro azul com o ceacuteu evoca uma postura ecoada de idealismo fazendo inversatildeo da realidade posto que eacute o ceacuteu que poderia ser azul mas Clarice nos traz um paacutessaro azul contracenando com o ceacuteu branco acinzentado Esse gesto imaginativo vem proporcionar no dizer de Nunes (2008 p107)5 a consciecircncia da condiccedilatildeo humana oriunda das percepccedilotildees claricianas em que entre a artista a realidade e o espectadorleitor haacute intensa possibilidade de interaccedilatildeo

Conectar-se com este rico imaginaacuterio eacute estabelecer relaccedilotildees entre a esteacutetica literaacuteria artiacutestica e o Direito numa aproximaccedilatildeo que chamamos de imagens culturais do direitos humanos percebidas a par-tir das condiccedilotildees imaginaacuterias da subjetividade feminina

Observa-se que os originais do texto Aacutegua viva (1973) estatildeo repletos de referecircncias em que a escritora desloca a palavra escrever por pintar de modo que as relaccedilotildees entre pintura e narrativa ficcional vatildeo se entrelaccedilando fazendo com que a atividade da pintura desenvolvida em caraacuteter amador e de forma mais frequente entre os anos 19751976 torne-se conteuacutedo privilegiado de reflexatildeo Nesta obra a personagem central eacute uma pintorandashnarradora que atraveacutes da experiecircncia relacional entre pintura-nar-rativa faz com que Clarice utilize formas diversas de elaborar suas identidades sobre a reduccedilatildeo da palavra em relaccedilatildeo agrave imagem Assim nos coloca diante da reflexatildeo sobre a necessidade da palavra para as percepccedilotildees da identidade lanccedilando o pertinente questionamento ldquonatildeo usar as palavras eacute perder a identidaderdquo (LISPECTOR 1998 p65)

A tela parece dissolver a distacircncia entre escritura e pintura intensificando o nexo entre texto e tela entre a figura e as imagens poeacuteticas nos revelando imagens para-filosoacuteficas e culturais identitaacuterias Ao tratar sobre as imagens poeacuteticas em Clarice Assis Brasil nos indica que o conteuacutedo esteacutetico claricia-no ldquodatildeo-lhe caracteriacutestica inconfundiacutevel e servem no plano da criaccedilatildeo para salientar o significado e a existecircncia de suas criaturas e de seu mundo artiacutesticordquo (ASSIS BRASIL 1969 p 95)

Direito ndash como paacutessaro vigilante sob as esferas da cultura Um misto (literaacuterio e juriacutedico) permeia os discursos filosoacuteficos humanistas que ao somar perspectivas artiacutesticas distintas acolhe a visatildeo dos ldquofios curvosrdquo do direito em contraste com a linearidade normativista visando abraccedilar a multidisciplinarida-de dos direitos humanos e culturais

Seguindo a esteira de Joseacute Calvo Gonzalez na obra Direito Curvo observamos que ldquona teoria juriacutedica os direitos satildeo fraacutegeis como uma teia de aranha nada nos leva a crer que as liberdades e os direitos sejam especialmente hoje triunfos (goals) a salvo de toda fragilidaderdquo (CALVO GONZAacuteLEZ 2013 p15) Essa fragilidade na concretizaccedilatildeo dos direitos humanos e amplitude dos direitos culturais podem ser obser-vadas nas relaccedilotildees entre arte e democracia cuja preservaccedilatildeo e sistema de proteccedilatildeo aos direitos cultu-rais locais vem em construccedilatildeo paulatina desde os anos 6070 do seacuteculo6 XX numa tentativa de discipli-nar e preservar bens culturais materiais e imateriais

2 A JUSLITERATURA CULTURAL HUMANISTA DE CLARICE LISPECTOR

A literatura e pintura de Lispector transforma-se em espaccedilo referencial pois os textos claricianos impli-cam em uma fusatildeo de horizontes que iluminam o imaginaacuterio juriacutedico dos direitos culturais brasileiros ampliando as possibilidades interpretativas sobre a essecircncia cultural dos direitos humanos a liberda-de como interaccedilatildeo dialeacutetica na via esteacutetica dos direitos fundamentais

O caraacuteter esteacutetico da obra de arte instaura no leitor espectador uma atitude reflexiva interdisciplinar em que a busca de sentido traz todo um horizonte de abertura para encontrar muacuteltiplos significados e formas em que a intersubjetividade artiacutestica encontra possibilidades simboacutelicas dialogando com valo-res singulares e universais

5 NUNES Benedito O drama da linguagem Uma leitura de Clarice Lispector Satildeo Paulo Aacutetica 2008

6 CF No plano nacional com o Decreto nordm35512000 trata da institucionalizaccedilatildeo do registro de bens culturais de natureza imaterial

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Para investigar a experiecircncia do ponto de vista esteacutetico analisa-se de iniacutecio a forma que os objetos adquirem e de modo especiacutefico a relaccedilatildeo destes com o mundo Assim a experiecircncia esteacutetica confirma a abertura que a linguagem e a apropriaccedilatildeo de sentido nos possibilita ao passo que nos torna mais aptos para outros niacuteveis de abordagem do conhecimento

A tela proporciona uma dicotomia que incorpora os saberes interiores da artista ao tempo em que ela-bora a dimensatildeo humana de suas vivecircncias Vemos nas formas da pintura uma percepccedilatildeo do movimen-to simbolicamente atreladas ao processo de pensar e viver e guardam em si a unidade criativa entre o pintar e o narrar Mario Quintana (1906-1994) no poema Auto-retrato afirma que ldquono retrato que me faccedilo ndash traccedilo a traccedilo-as vezes me pinto nuvem agraves vezes me pinto aacutervore []rdquo 7considerando a relaccedilatildeo entre a auto percepccedilatildeo e a criaccedilatildeo

Desse modo a rede que tece o sentido das narrativas juriacutedicas e literaacuterias tem na esteacutetica literaacuteria cla-riceana um caminho a ser percorrido trilhado pela memoacuteria coletiva e posta atraveacutes da criatividade singular da escritora A consistecircncia da pintura encontra na liberdade de expressatildeo vias para investigar os processos de tomada de consciecircncia que a literaturaarte propicia ao espectadorleitor

A coerecircncia criativa de Clarice se direciona para a busca de sentido atraveacutes de zonas de intensa sensi-bilidade Talvez o paacutessaro da liberdade sobrevoe o deserto imagem recorrente na literatura de Clarice como na Paixatildeo segundo GH e a Maccedilatilde no escuro Talvez tragam a lembranccedila do ceacuteu claro iluminando os dias quentes do Recife que acendia seus olhos quando menina brincando no quintal da rua Conde de Boa Vista (GOTLIB 1995 p 93)8

Clarice Lispector nos revela ldquoLiberdade eacute o meu uacuteltimo refuacutegio forcei-me agrave liberdade e aguento-a natildeo como um dom mas com heroiacutesmo sou heroicamente livrerdquo (LISPECTOR 1998 p16) Essa subessecircncia da imagem da liberdade feminina desenvolvida em forma geomeacutetrica acompanha a noccedilatildeo de liberdade como algo que se ergue do solo que se liberta e transcende as realidades materiais da vida

Entre o concretoabstrato pensarsentir textoimagem paacutessaro feito de azul faz da liberdade um conte-uacutedo quase oniacuterico Observa-se a ecircnfase na representaccedilatildeo psiacutequica das cores como motivaccedilotildees sensoriais onde ganha relevo o caraacuteter psicossocial da construccedilatildeo criativa Formas e cores expressam visotildees de mun-do e datildeo sentido aos fenocircmenos intersubjetivos Clarice traz percepccedilotildees simultacircneas entre as linhas curvas das asas em situaccedilatildeo de voo lanccedilar-se diante da amplitude brancacinza em que o paacutessaro parecer plainar

Goethe aponta o efeito-sensiacutevel da cor azul a partir da ldquocontradiccedilatildeo entre estiacutemulo-repousordquo (GOETHE 1993 p12)9 Como bem diz a escritora em Aacutegua Viva ldquoE eacute assim certa espeacutecie de pensar-sentir que cha-marei de ldquoliberdaderdquo soacute para lhe dar um nome Liberdade mesmo ndash enquanto ato de percepccedilatildeo ndash natildeo tem formardquo (LISPECTOR 1998 p81)

Assim a plasticidade do azul indica um movimento de distacircncia da realidade como um paacutessaro que se distancia do chatildeo O sentimento em tons de azul assinalam a forma de narrativa pictoacuterica liacuterica erguida por uma percepccedilatildeo interna da liberdade Considerando que a ideia de movimento capacidade de accedilatildeo ir e vir caracteriza parte da cultura juriacutedica este dinamismo apela para os limites entre liberdade e pos-sibilidade Desse modo o sentimento do azul repousa na dimensatildeo psicoloacutegica do idealismo

O azul funciona como nuacutecleo das percepccedilotildees ligadas ao lirismo modos de tensatildeo entre sonho e con-cretude representativos das aspiraccedilotildees humanas Por certo a aproximaccedilatildeo entre sonho e vocirco eacute algo recorrente na literatura clariciana Na obra Perto do Coraccedilatildeo Selvagem ldquosonha Joana antes que o sonho se desvaneccedila e ela esteja de volta a sua vida com Otaacutevio um intelectual mediacuteocre que estaacute escrevendo um livro de direito civilrdquo (MOSER 2009 p184)10

7 GOTLIB Naacutedia Battella Clarice Uma vida que se conta 3 ed Satildeo Paulo Aacutetica 1995

8 Idem

9 GOETHE JW Doutrina das Cores Satildeo Paulo Nova Alexandria 1993

10 MOSER Benjamim Clarice uma biografia Satildeo Paulo Cosac Naif 2009

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A esteacutetica criativa de Clarice interliga sentimentos e movimentos repouso e atividade fazendo com que a imagem de paacutessaro reflita a dimensatildeo sociocultural da liberdade como abertura para potencia-lidades do sentir e pensar os direitos culturais A conformidade das linhas estruturantes da figura do paacutessaro demonstra o ritmo investigativo de busca na percepccedilatildeo ordenativa da dinacircmica do voo

Em carta a sua irmatilde Tania datada de 15 de junho de 1946 quando vivia em Berna a escritora afirma que ldquoquem faz arte sofre como os outros soacute que tem um meio de expressatildeordquo (LISPECTOR 2007 p120) Assim o conceito de liberdade articula Tavares em livro intitulado Do silecircncio agrave liberdade sobre a obra Uma apren-dizagem ou O livro dos prazeres repousa na categoria da ldquoexperienciaccedilatildeordquo (TAVARES 2017 p105)11 Essa perspectiva de criar narrativas dotadas de coerecircncia tematizadas diante da funccedilatildeo mimeacutetica da literatu-ra (OLIVEIRA1999 p7)12 datildeo o fino traccedilo no plano da amplitude criativa de Clarice Uma imagem primaacute-ria que evoca a accedilatildeo do vocirco da procura mergulhado na tela branca da narrativa

A fecunda criatividade inscrita na psique feminina assim se manifesta em Aacutegua viva ldquosatildeo sensaccedilotildees que se transformam em ideias porque tenho que usar palavras [] O pensamento primaacuterio pensa com pala-vras A ldquoliberdaderdquo liberta-se da escravidatildeo da palavrardquo (LISPECTOR 1988 p84)

Esta liberdade centrada no azul-oniacuterico percorre um movimento de ideias sobre as quais se organi-zam a intuiccedilatildeo de arqueacutetipos tambeacutem juriacutedicos sobre a condiccedilatildeo humana O direito necessita de pala-vras mas lida com signos natildeo verbais De modo que a estreita conexatildeo entre o princiacutepio da dignidade humana e notadamente o exerciacutecio dos direitos culturais encontram atraveacutes da arte na identidade e na memoacuteria a interlocuccedilatildeo entre o individual e o coletivo

Dessa forma este movimento de vocirco possiacutevel dentro da esfera anunciada do azul indica um presen-te idealismo que se constitui como unidade entre o ser e o dever-ser (categorias arqueacutetipas da teoria do Direito) Fernando Pessoa (1986 p 275)13 ao tratar do poeta liacuterico afirma que este expressa temas diversos que se predispotildee a uma unidade Ao descrever a gradaccedilatildeo da construccedilatildeo poeacutetica assinala que ldquoo poeta mais intelectual ainda mais imaginativo entra em plena despersonalizaccedilatildeo Natildeo soacute sente mas vive os estados de alma que natildeo tem diretamenterdquo (Ibidem p 275) Assim a existecircncia do paacutessaro aquele que voa longe do concreto e proacuteximo ao imaginaacuterio pode estar marcado pela tentativa deses-perada de fuga por exemplo da violecircncia institucionalizada fato que marcou a realidade geracional da escritora nascida em Tchevhenilk cidade da Ucracircnia na primeira metade do seacuteculo XX

Nas memoacuterias e relatos familiares os impactos provocados tanto pela primeira Grande Guerra como pela Revoluccedilatildeo Russa de 1917 os pogroms constituiram perseguiccedilotildees sistemaacuteticas e massacres de famiacutelias judias fazendo com que a busca pela Ameacuterica fosse um objetivo concreto para sobreviver como o necessaacuterio vocirco do paacutessaro pela liberdade

Nesse contexto de violaccedilatildeo sistemaacutetica e geracional familiar de direitos humanos deriva talvez o silenciamento os aspectos sombrios das narrativas clariceanas algo de misterioso que se apresen-ta em tons densos e quase obscuros ao leitor Satildeo recorrentes as passagens em que a exemplo de O Lustrenos deparamos com a sensaccedilatildeo do nebuloso e fugidio

A sala o ceacuteuas meninas comunicavam-se entre si com distacircncias jaacute marcadas cores e sons fixos

ndash o deslizar de uma cena muitas vezes ensaiada Virgiacutenia compreendia despontada que tudo fora

visto haacute anos Para de novo enxergar o que vira e que agora fugira como para sempre tentava

comeccedilar pelo fim da sensaccedilatildeoabria os olhos bem grandes de surpresa Mas em vatildeoela natildeo

erraria mais e veria apenas a realidaderdquo (LISPECTOR 1999 p 54 1999)

11 TAVARES Renata Do silecircncio a Liberdade uma aprendizagem ou o livro dos prazeres2ed Rio de Janeiro Tempo Brasileiro2017

12 OLIVEIRA Valdevino Soares de Poesia e pintura Um diaacutelogo em trecircs dimensotildees Satildeo Paulo Fundaccedilatildeo Editora UNESP1999

13 Idem

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A personagem central Virginia e seu irmatildeo Daniel quando ainda crianccedilas sentiam queldquoa morte lhes eacute revelada e acerca da qual silenciam vai refletir-se nos jogos sombrios das duas crianccedilasrdquo (NUNES 1989 p24)

Dessa forma o real encontra a partir do imaginaacuterio pictoacuterico inclusive oniacuterico raiacutezes histoacutericas cultu-rais e relacionais como nas interaccedilotildees entre pintura e poesia entre formas de fuga da violecircncia para a liberdade atraveacutes do afeto Clarice exerce no imaginaacuterio de sua obra distintas perspectivas e cenaacuterios que se mesclam seja na pintura ou na narrativa literaacuteria com a ideia de liberdade como forma intensa de sair de uma situaccedilatildeo opressora Algo que impulsiona o ser humano para ir aleacutem do chatildeo tornando-se sujeito consciente da reconstruccedilatildeo afetuosa do proacuteprio espaccedilo

Olga de Saacute em A travessia do oposto ao analisar o romance A cidade sitiada revela que o ldquopaacutessaro que atravessa o espaccedilo eacute gralha espantadardquo (2004 p41)14 aquele que flerta com a realidade e se espanta no espaccedilo dos paradoxos vivenciados pela personagem Lucreacutecia devido agrave raacutepida urbanizaccedilatildeo da cidade Assim a ideia de espanto sobre a violecircncia simboacutelica psicoloacutegica e de fuga crescem no imaginaacuterio clari-ciano sendo fonte permanente de investigaccedilatildeo para o amplo campo dos direitos culturais

A autora escreve em A maccedilatilde no escuro ldquoE natildeo havia sequer como fugir de si porque os outros concreti-zavam com impassiacutevel insistecircncia a proacutepria imagem dessa pessoardquo (LISPECTOR 1999 p38) A leitura criacutetica de Aacutelvaro Lins jaacute apontava que ela ldquoescrevia com um conteuacutedo que veio diretamente da sua natu-reza humanardquo (ASSIS BRASIL 1969 p105)15 De modo que a consciecircncia central de direitos humanos como ideia de liberdade reside no compreender que lhe veem de improviso com a vida

Merleau-Ponty na obra Fenomenologia da percepccedilatildeo16 nos indica que a sensaccedilatildeo se diz na ldquomaneira pela qual sou afetado e a experiecircncia de um estado de mim mesmordquo (MERLAEU-PONTY 2006 p 23)17 Essa articulaccedilatildeo que transcorre da experiecircncia intensa e interna satildeo fontes em que as sensaccedilotildees se desdo-bram de modo a dar a possibilidade de compreensatildeo do mundo em que os direitos culturais e os direitos humanos encontram-se reconfigurados e datildeo origem agraves identidades provisoacuterias que revelam memoacute-rias individuais e coletivas

Aacutegua viva tem citaccedilatildeo inicial do pintor belga Michel Sephour18 (1901-1999) autor de vaacuterios livros sobre arte dentre os quais a Dictionary of Abstract Painting e Abstract Painting 50 Years of Accomplishment isto indica que a escolha da citaccedilatildeo do criacutetico belga natildeo foi arbitraacuteria mas incorporada ao processo criativo de elaboraccedilatildeo instaurando uma tendecircncia singular de lidar e pensar a atividade de escrever

Carlos Mendes de Sousa assinala que a multiplicidade de materiais e processos utilizados nos quadros de Clarice contrastam com a afirmaccedilatildeo de que a escritora desconhecia de teacutecnicas de pintura Para este autor esta forma de criaccedilatildeo poderia se caracterizar como teacutecnica mista pois utiliza-se pincel cola tin-ta esferograacutefica diversidade de traccedilos texturas e cores (SOUSA 2013)

Neste periacuteodo na deacutecada de 70 Clarice Lispector jaacute figurava como uma escritora relevante no cenaacuterio nacional como atesta Assis Brasil (1969 p22) Grande parte de sua obra jaacute havia sido traduzida nos Estados Unidos Europa e demais paiacuteses da Ameacuterica do Sul Aacutegua viva incialmente levava o tiacutetulo ldquoAtraacutes do pensamento Monoacutelogo com a vidardquo logo depois em segunda versatildeo o livro leva o tiacutetulo de ldquoObjeto Gritanterdquo como nos revela Licia Manzo (MANZO1997 p142-43)

14 SAacute Olga de Clarice Lispector a travessia do oposto Satildeo Paulo Annablume 2004

15 ASSIS Brasil Clarice Lispector Ensaio Rio de Janeiro Organizaccedilatildeo Simotildees editora 1969

16 No prefaacutecio da fenomenologia da Percepccedilatildeo Merleau Ponty pontua questotildees ainda por resolver e nos explica que ldquoa fenomenologia

eacute o estudo das essecircncias e todos os problemas segundo ela resumem-se em definir essecircncias a essecircncia da percepccedilatildeo a essecircncia da

consciecircncia por exemplordquo (MERLEAU-PONTY2006 p1)

17 MERLEAU-PONTY Maurice Fenomenologia da Percepccedilatildeo 3 ed Satildeo Paulo Martins Fontes 2006

18 SEUPHORMichel Le Style et le cri Quartoze essais sur lrsquoart de ce siegravecle Paris Editions Du Seuil1965

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Observa-se ainda nesta fase aleacutem da publicaccedilatildeo de Aacutegua viva (1973) A via crucis do corpo (1974) Onde estiveste de noite (1974) e A hora da estrela (1977) que transitam entre sintomaacuteticos temas de (im)possibilidades individuais frente ao mundo em que se vive

Na relaccedilatildeo entre Direito e arte o filoacutesofo espanhol Ortega y Gasset visualiza o direito em termos de uma ldquogeometria do humanordquo a grande teacutecnica exata que potildee uma ordem nas paixotildees sociais do homemrdquo (GASSET 2013 p21)19 Calvo Gonzalez (2013 p18) observa esta ideia atraveacutes de uma geometria vari-aacutevel com a qual pensa o direito curvo aquele que se coloca nas instacircncias hermenecircuticas da cidadania

O desejo eacute percebido como algo que desorganiza por isso se busca o direito como hermenecircutica neces-saacuteria para voltar agrave estrutura da ordem a partir de uma mediaccedilatildeo simboacutelica entre a condiccedilatildeo humana e o sistema ordenativo Assim aduz Flusser (2011 p 71-73)20 que haacute palavras que ldquoexigem um esforccedilo quase extralinguiacutestico para serem pensadas e articuladas e haacute palavras que estatildeo organicamente vin-culadas na estrutura da liacutenguardquocomportam perspectivas variadas de diversidade fluidez alteridade como possibilidades que se cruzam

Clarice temia a desumanizaccedilatildeo Percebe-se que os tradicionais traccedilos caracteriacutesticos dos direitos humanos tais como universalidade e abstratividade encontram-se tematizados na sua narrativa lite-raacuteria e artiacutestica Pode-se dizer que Clarice renascida no nordeste apresenta dimensotildees resgatadas da memoacuteria das sensaccedilotildees da infacircncia em que lendo livros de Machado de Assis Monteiro Lobato no bairro de Boa Vista em Recife (GOTLIB1995) vivencia momentos de consciecircncia das desigualdades sociais Um desses momentos por exemplo fora travado com a amiga Reveca oriunda de famiacutelia de poder aquisitivo maior que o de sua famiacutelia e a faz evidenciar ainda cedo as diferenccedilas materiais e espi-rituais que compotildeem as relaccedilotildees humanas

Assim as imagens psiacutequicas clariceanas adquirem um sentido esteacutetico que recriam o real e a partir desse estado desenvolve tramas compreensivas da condiccedilatildeo humana (SAacute 1993 p131) Por exemplo buscava a liberdade mas a temia ldquoeacute que natildeo sei aonde me levaraacute esta minha liberdade Natildeo eacute arbitraacuteria nem libertina Mas estou soltardquo (LISPECTOR1987 p33)

No ritmo clariciano o (im) pulso da vida na narrativa artiacutestica amplia a percepccedilatildeo de tempo Os tem-pos criativos claricianos se fazem como pulsotildees dentro de instantes intersubjetivos do dizer e sentir o mundo desvendando as fronteiras entre os sentidos da paixatildeo e da vida A linguagem artiacutestica torna-se coisa da linguagem que transmigra para a ideia de liberdade fuga afeto vida sendo a pintura ela mes-ma o acontecimento

Eacute assim que delineamos a importacircncia da forma poeacutetica na pintura como expressatildeo destacada no livro de Valery (2012 p338) ldquoas vezes a forma eacute que faz o conteuacutedordquo A pintura como processo investigativo alimenta outras narrativas como as do Direito estabelecendo-se um tracircnsito herrmenecircutico da tela para a linguagem jaacute pre-vistas no quadro Entatildeo nos cabe pensar sobre a preacute-via existecircncia dos direitos humanos nas telas da cultura na densidade de cada artista

O paacutessaro na tela clariciana como espaccedilo imaginativo descortina segredos Haacute uma integraccedilatildeo do natildeo ndash dizer com a realidade histoacuterica e com as matrizes poeacuteticas entre o acontecer como tela e o existir (na parede) Os direitos humanos entatildeo circulam entre coisa posicionadas de forma liacuterica num a experiecircn-cia ndashsiacutentese que eacute a da tela pronta para atingir o olhar de quem vai exercer a busca de sentidos comple-tando a circulariedade hermenecircutica que inicia na intenccedilatildeo e motivaccedilatildeo do artista em pintar

Del Pino (1972 p 55)21 ao tratar do gecircnero liacuterico comenta acerca dos caracteres do lirismo e conside-ra este niacutevel de sentimento como ldquoelemento espiritualrdquo Assim o aspecto emocional espiritualizado no

19 ORTEGA Y GASSETJoseacute A ideia de Teatro Satildeo Paulo Perspectiva2010

20 FLUSSER Vileacutem A duacutevida Satildeo Paulo Annablume 2011

21 DEL PINO Dino Introduccedilatildeo ao Estudo da Literatura 5 ed Porto Alegre Editora Movimento1972 V1

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contexto clariceano incorpora a imagem ao sentir-pensar em um singular processo de densidade exis-tencial Retomando o pensamento do criacutetico Aacutelvaro Lins este autor assinala que Clarice Lispector ldquoeacute a primeira experiecircncia definida que se faz no Brasil do moderno romance liacuterico do romance que se acha dentro da tradiccedilatildeo de um Joyce ou de uma Virgiacutenia Woolfrdquo (1932 p105)

Seguindo os ensinamentos de Santos22 (2015 p106) haacute distinccedilotildees claras entre espiritualismo e idea-lismo gnosioloacutegico ldquoo primeiro eacute de orientaccedilatildeo metafiacutesica enquanto o segundo eacute de orientaccedilatildeo gno-sioloacutegica que afirma que a verdadeira existecircncia estaacute na consciecircnciardquo Esta consciecircncia que se diz artis-ticamente Observa-se que a pintura de Clarice constitui-se em um modo de reflexatildeo extralinguiacutestica Kandinskypintor russo da vanguarda abstracionista do iniacutecio do seacuteculo passado na obra Do espiri-tual da arte e na pintura em particular que ldquocada arte ao se aprofundar fecha-se e separa-se Mas compara-se agraves outras artes e a identidade de suas tendecircncias profundas as leva de volta agrave unidaderdquo (KANDINSKY 1996 p 59)23

O ato de voar traduz uma fluidez necessaacuteria para o tracircnsito entre relaccedilotildees materiais e espirituais No dicio-naacuterio de siacutembolo de Chevalier e Gheerbrant (1999 p 687)24 observa-se a simbologia dos anjos com asas mensageiros na tradiccedilatildeo cristatilde Na perspectiva chinesa os paacutessaros azuis satildeo fadas Na obra o Lustre a per-sonagem Virgiacutenia demonstra que ldquopara nascer as coisas precisam ter vida pois nascer eacute um movimentoldquo

Assis Brasil (1969 p62) indica que no processo criativo clariceano haacute na formaccedilatildeo das personagens uma tendecircncia da autora a generalizar o personagem e os espaccedilos em que ocorrem o cenaacuterio dos seus romances Assim ao sair para brincar no espaccedilo de fora da casa Virginia personagem de O Lustre (1999) tem a sensaccedilatildeo de que ldquotoda a casa flutuava flutuava em nuvens desligada de Brejo Altordquo (1999 p16)

Por certo a imaginaccedilatildeo geomeacutetrica do voo clariceano pode-se combinar com horizontes de flexibili-dade que permeiam as distancias entre a teoria e a concretude dos direitos humanos Entre as curvas do paacutessaro uma arquitetura teoacuterica possiacutevel de um Direito que se diz curvo a partir da perspectiva de Calvo Gonzalez Assim como Wallace Stevens encontrou inspiraccedilatildeo na obra El viejo guitarrista ciego (1903) de Picasso ao compor o poema The man with the Blue Guitar (1957) Clarice Lispector nesta tela encontra inspiraccedilatildeo no azul como inspiradora da ideia liacuterica de liberdade Os criteacuterios por ela estabe-lecidos transitam pelo difiacutecil artefato do fluxo de consciecircncia mas tambeacutem pelo caraacuteter filoliteraacuterio de sua obra Toda a estrutura do paacutessaro eacute marcada pelo alicerce hermenecircutico de busca assim como o caraacuteter investigativo de sua narrativa que percorre as atividades discursivas para compor a inusitada abertura de horizontes ao leitora

O vocirco clariceano traccedila possibilidades do real na memoacuteria das tradiccedilotildees culturais Por certo a teoria narrativista do direito encontra pontes na jusliteratura brasileira que acolhendo a potencialidade da interpretaccedilatildeo ficcional promove conexotildees enriquecida pela anaacutelise da ldquonarraccedilatildeordquo em contato com a cultura juriacutedica brasileira As narrativas pictoacutericas satildeo direitos culturais fundamentais traduzidos nas formas da pintura agraves cenas da cultura dos direitos humanos

O voo arqueado do paacutessaro azul no extenso ceacuteu claro clama por espaccedilos flexiacuteveis e abertos Portanto encontrar-se com o azul eacute fazer uso da narratividade liacuterica e da intersubjetividade refletindo sobre o caraacuteter eacutetico dos espaccedilos da vida privada e dos modos de ser no imaginaacuterio social e poliacutetico

A literatura clariciana transforma-se em momento hermenecircutico em que os textos implicam em uma fusatildeo de horizontes ampliam as possibilidades descritivas trazem contextos em que os desejos nas-cem e produzem uma reaccedilatildeo agrave ordem exterior

22 SANTOS Maacuterio Ferreira Filosofia e Cosmovisatildeo Satildeo Paulo Editora Eacute realizaccedilotildees 2015

23 KANDINSKY Vassily Do espiritual da arte e na pintura em particular Traduccedilatildeo Alvaro Cabral e Antonio Danesi Satildeo Paulo Martins Fontes

1996 Interessante afirmaccedilatildeo de Kandinsky para quem ldquotoda obra de arte eacute filha de seu tempo muitas vezes matildee de nossos sentimentosrdquo

(1996 p 3) Disponiacutevel em lthttpsauh308fileswordpresscom201303sem-9-kandinskypdfgt Acesso em 15 out 2014

24 CHEVALIER Jean GHEERBRANT Alain et al Dicionaacuterio de siacutembolos13 ed Rio de Janeiro Joseacute Olympio1999

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Dessa forma a rede que tece o sentido das narrativas juriacutedicas e literaacuterias tem na esteacutetica literaacuteria cla-riciana um caminho a ser percorrido trilhado pela memoacuteria coletiva e posta atraveacutes da criatividade sin-gular da escritora A consistecircncia da pintura c encontra na liberdade de expressatildeo vias para investigar os processos de tomada de consciecircncia que a literaturaarte propicia ao espectadorleitor significar direitos de liberdade artiacutestica de expressatildeo

Este azul-poeacutetico encontra-se em tantos outros pintores poetas e escritores como Mallarmeacute (1842-1898) Picasso (1881-1973) Kandinsky (1886-1944) tambeacutem presente na muacutesica brasileira a exem-plo do Trem azul de composiccedilatildeo de Locirc Borges Ronaldo Bastos e Tom Jobim onde ldquoo sol pega o trem azul o sol na cabeccedilardquo artistas que assim como Clarice desafiam a exatidatildeo das coisas brasileiras e nos levam a pensar a arte e a vida presentes patrimocircnio cultural material e imaterial brasileiro

Assim a teoria criacutetica do direito ao reconsiderar as interfaces da linguagem juriacutedica com outros campos do conhecimento investiga o sensiacutevel utiliza a percepccedilatildeo e desvela a essecircncia do sentido filo-poeacutetico do imaginaacuterio dos direitos culturais A substacircncia do azul eacute aquilo que vai aleacutem do proacuteprio azul e que ao mesmo tempo permanece no paacutessaro azul na guitarra ou no trem Este azul que chamamos afetivida-de Azul que revela a complexidade da receptividade ldquoque a recusa da palavra e o silecircncio determinardquo (NUNES 1989 p43)

Azul que compotildeem identidades imaginaacuterias que apresenta noccedilotildees eacuteticas em que o sujeito transfor-ma-se na cultura figurativa da liberdade como direito fundamental agrave dignidade humana aquele que eacute capaz de criar revelando a importacircncia da liberdade no plano da justiccedila

3 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

O quadro paacutessaro da liberdade resgata a intuiccedilatildeo sobre a liberdade atraveacutes da arte A pintura clariciana indica noccedilotildees espirituais e figurativas atraveacutes da qual eacute possiacutevel refletir sobre o caraacuteter eacutetico da liber-dade nas manifestaccedilotildees intersubjetivas dos direitos humanos culturais

Assim a escritoraartista investiga os desejos de liberdade como problema existencial que se incorpo-ra no meacutetodo de trabalho e delineia sua esteacutetica natildeo soacute na narrativa literaacuteria mas em tela persistente que conduz a imagens poeacuteticas e de direitos culturais De forma policontextual pintura e escrita estatildeo interligadas tendo como fundamento a intuiccedilatildeo criativa sobre as relaccedilotildees da vida humana

A percepccedilatildeo dos direitos humanos inscritos na arte aprofunda as possibilidades hermenecircuticas em que partindo da esteacutetica literaacuteria para a imagem potildee em cena paracircmetros figurativos da liberdade de expressatildeo

Neste percurso Clarice pinta o paacutessaro hermenecircutico interligando as funccedilotildees de escrever e pintar pos-tas atraveacutes de um pensamento filo-poeacutetico marcado pela escolha esteacutetica do azul A pintura segue um ritmo que tem em comum o fluxo de sensaccedilotildees das narrativas ficcionais estabelecendo uma larga cone-xatildeo poeacutetica e criativa Paacutessaro azul satildeo traccedilos de liberdade que se articulam como narrativa de direitos humanos processo de transformaccedilatildeo interpessoal Dessa forma Clarice conta a narrativa do vocirco mas deixa em aberto o destino do paacutessaro ao olhar do espectador

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JUNG CG A Energia Psiacutequica 7 ed Petroacutepolis Vozes 1999

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Universidade do Sul de Santa Catarina

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PROJETO DE LEI N 37342012 E SUacuteMULA 605 DO STJ O DIREITO DA CRIANCcedilA E DO ADOLESCENTE ESQUECIDO

DRAFT LAW N 37342012 AND SUMMARY 605 OF THE STJ THE RIGHT OF THE CHILD AND THE FORGOTTEN TEENAGERPatriacutecia Rodrigues de Menezes Castagna1

Resumo Apoacutes valiosas conquistas ao longo das uacuteltimas trecircs deacutecadas no tocante ao Direito da Crianccedila e do Adolescente especialmente com a consagraccedilatildeo da Doutrina da Proteccedilatildeo Integral a partir do arti-go 227 da Constituiccedilatildeo Federal de 1988 e do Estatuto da Crianccedila e do Adolescente (Lei 80691990) observam-se os Poderes Legislativo e Judiciaacuterio em direccedilatildeo oposta seja ao acelerar o tracircmite do Projeto de Lei 37342012 contraacuterio agrave Doutrina da Proteccedilatildeo Integral seja pela necessidade de apro-vaccedilatildeo da Suacutemula 605 pelo Superior Tribunal de Justiccedila o que denota o desrespeito pelas instacircncias inferiores agrave referida doutrina pois precisou elucidar duacutevida ou divergecircncia sobre a aplicabilidade de medida socioeducativa apoacutes a maioridade penal O presente artigo procura analisar se tais medidas satildeo prejudiciais ao desenvolvimento de adolescentes submetidos ao regime prisional bem como se desrespeitam o Direito da Crianccedila e do Adolescente

Palavras-chaves Crianccedila Adolescente Ato infracional Medida socioeducativa Proteccedilatildeo integral Regime prisional

Abstract Following valuable achievements over the last three decades regarding the Law of the Child and Adolescent especially with the consecration of the Doctrine of Integral Protection from article 227 of the Federal Constitution of 1988 and the Statute of the Child and Adolescent (Law 80691990) the Legislative and Judiciary Powers are observed in the opposite direction either by accelerating the process of Bill 37342012 contrary to the Doctrine of Integral Protection or by the need for approval of Precedent 605 by the Superior Court of Which denounces the disrespect for bodies inferior to the aforementioned doctrine since it was necessary to elucidate doubt or divergence on the applicability of socio-educational measure after the criminal majority This article examines whether such measures are detrimental to the development of adoles-cents submitted to the prison system as well as disrespecting the Law of Children and Adolescents

Keywords Child Teenager Infraction act Socio-educational measure Integral protection Prison system

1 INTRODUCcedilAtildeO

Quando o assunto eacute crianccedila e adolescente a Doutrina da Proteccedilatildeo Integral e o Estatuto da Crianccedila e do Adolescente despontam e balizam toda e qualquer defesa em favor dessas pessoas especiais pela sua proacutepria condiccedilatildeo de vida em pleno desenvolvimento

Decorre da almejada proteccedilatildeo integral dentre tantas accedilotildees positivas a aplicaccedilatildeo de medidas socioe-ducativas de caraacuteter pedagoacutegico e com a finalidade de reinserir o adolescente praticante do suposto ato infracional em seu ambiente familiar e social

1 Graduada em Direito pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) Poacutes-Graduada em Direito Tributaacuterio pela Universidade Federal

de Santa Catarina e Direito Processual Civil pela Universidade Anhanguera-UNIDERPLFG Advogada inscrita na OABSC n 14752

Atua principalmente nas aacutereas de Direito Civil Direito do Trabalho Direito Processual Civil Direito Tributaacuterio e Direito do Consumidor

Professora das cadeiras de Execuccedilatildeo Civil Relaccedilotildees de Consumo Processo do Trabalho e Teoria do Direito na Universidade do Sul de Santa

Catarina (UNISUL) Tambeacutem jaacute atuou como professora da cadeira de Direito Civil na Universidade do Vale do Itajaiacute (UNIVALI)

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O que se observa no entanto eacute que os Poderes Legislativo e Judiciaacuterio brasileiros parecem caminhar recentemente na contramatildeo da histoacuteria solicitando urgecircncia no tracircmite do Projeto de Lei 37342012 contraacuterio agrave Doutrina da Proteccedilatildeo Integral tatildeo especialmente conquistada ao logo de deacutecadas e con-solidada por nosso ordenamento juriacutedico bem como a Suacutemula 605 criada pelo Superior Tribunal de Justiccedila deixando evidente que a necessidade da sua aprovaccedilatildeo pela Corte Superior em 19032018 denota desrespeito pelas instacircncias inferiores agrave referida doutrina pois precisou elucidar duacutevida ou divergecircncia sobre a aplicabilidade de medida socioeducativa apoacutes a maioridade penal

Pretende-se pois verificar ateacute que ponto referidas medidas satildeo prejudiciais ao desenvolvimento de adolescentes submetidos ao regime prisional bem como o efetivo respeito ao Direito da Crianccedila e do Adolescente que diante da necessidade de criaccedilatildeo de suacutemulas e projetos de lei parece ter-se tornado um direito esquecido

2 DOUTRINA DA PROTECcedilAtildeO INTEGRAL E ESTATUTO DA CRIANCcedilA E DO ADOLESCENTE

A Doutrina da Proteccedilatildeo Integral consagrada no artigo 227 da Constituiccedilatildeo Federal de 1988 e no Estatuto da Crianccedila e do Adolescente (Lei n 80691990) firmou-se no Brasil enquanto fruto da Declaraccedilatildeo Universal dos Direitos da Crianccedila de 1959 criada pela ONU em substituiccedilatildeo agrave Doutrina da Situaccedilatildeo Irregular consolidada no paiacutes por meio do Coacutedigo de Menores (Lei n 66971979)

A Convenccedilatildeo Internacional dos Direitos da Crianccedila e do Adolescente aprovada de forma unacircnime pela Assembleia das Naccedilotildees Unidas em 1989 - portanto entre a Constituiccedilatildeo e o Estatuto - no mesmo senti-do foi fundamental para a consagraccedilatildeo da Doutrina da Proteccedilatildeo Integral pois segundo Veronese ldquotem natureza coercitiva e exige de cada Estado-Parte que a subscreve e ratifica um determinado posiciona-mento Como conjunto de deveres e obrigaccedilotildees aos que a ela formalmente aderiram a Convenccedilatildeo tem forccedila de lei internacional e assim cada Estado natildeo poderaacute violar seus preceitos como tambeacutem deveraacute tomar medidas positivas para promovecirc-los2rdquo

Como resultado portanto dessas importantes alteraccedilotildees em nosso ordenamento juriacutedico consoli-dou-se a Doutrina da Proteccedilatildeo Integral constituindo um verdadeiro divisor de aacuteguas pois as crianccedilas e adolescentes deixaram de ser analisados como uma ldquopatologia socialrdquo ndash sistema menorista ndash para serem observados na condiccedilatildeo de ldquosujeitos de direitosrdquo conforme pensamento de Sanches e Veronese ldquoa nova postura exigida pela Doutrina da Proteccedilatildeo Integral atribui a todas as crianccedilas e adolescentes indistintamente e em qualquer situaccedilatildeo juriacutedica a condiccedilatildeo de sujeitos de direitos sendo-lhes garan-tidos todos aqueles necessaacuterios ao seu pleno desenvolvimento ainda que cometa um ato infracional3rdquo

Nesse sentido com a finalidade de criar ldquoum novo modelo social que priorize o desenvolvimento sadio de nossas crianccedilas e adolescentesrdquo a Doutrina da Proteccedilatildeo Integral enseja ldquonovas praacuteticas accedilotildees con-cretas que incidam nas questotildees do cotidiano com a promoccedilatildeo de uma cidadania para as nossas crian-ccedilas e adolescentes de forma responsaacutevel e sobretudo respeitosa com sua condiccedilatildeo de pessoas em processo de desenvolvimentordquo4

2 VERONESE Josiane Rose Petry O Estatuto da Crianccedila e do Adolescente um novo paradigma In VERONESE Josiane Rose Petry

ROSSATO Luciano Alves e LEacutePORE Paulo Eduardo Estatuto da Crianccedila e do Adolescente 25 anos de desafios e conquistas Satildeo Paulo

Saraiva 2015 p 21-40

3 SANCHES Helen Crystine Correcirca VERONESE Josiane Rose Petry A proteccedilatildeo integral e o direito fundamental de crianccedilas e

adolescentes agrave convivecircncia familiar In VERONESE Josiane Rose Petry et al Direito da Crianccedila e do Adolescente novo curso ndash novos

temas Rio de Janeiro Lumen Juris 2017 p 131-183

4 VERONESE Josiane Rose Petry O Estatuto da Crianccedila e do Adolescente um novo paradigma Op Cit p 36-37

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3 MEDIDA SOCIOEDUCATIVA E PENA

Ressalta-se inicialmente que imputar significa atribuir a algueacutem a responsabilidade por um ato sujei-tando a pessoa suscetiacutevel agrave aplicabilidade das normas e sanccedilotildees previstas no Coacutedigo Penal

Nas palavras de Delmanto rdquoA imputabilidade eacute a capacidade de a pessoa entender que o fato eacute iliacutecito e de agir de acordo com esse entendimento5rdquo

Nos termos do artigo 27 do Coacutedigo Penal ldquoos menores de 18 (dezoito) anos satildeo penalmente inimputaacute-veis ficando sujeitos agraves normas estabelecidas na legislaccedilatildeo especial6rdquo

A Constituiccedilatildeo Federal de 1988 no mesmo sentido confirmou a maioridade penal aos 18 anos ao esta-belecer que ldquoArt 228 Satildeo penalmente inimputaacuteveis os menores de dezoito anos sujeitos agraves normas da legislaccedilatildeo especial7rdquo Destaque-se que por se tratar de claacuteusula peacutetrea tal dispositivo somente poderia ser alterado por uma nova Assembleia Nacional Constituinte

Desse modo desde 1990 a legislaccedilatildeo especial que responsabiliza os adolescentes ndash pessoas de 12 a 18 anos de idade ndash por seus atos eacute o Estatuto da Crianccedila e do Adolescente

No lugar de penas o Estatuto ldquoprevecirc medidas socioeducativas que satildeo dispostas em grau de severida-de no seu art 112 dependendo para a aplicaccedilatildeo de cada medida de algumas questotildees fundamentais que satildeo a capacidade do adolescente em cumprir determinada medida as circunstacircncias que sucedeu o suposto ato infracional e a gravidade deste uacuteltimo8rdquo segundo Veronese

Dentre as medidas socioeducativas previstas no art 112 do Estatuto tem-se advertecircncia obrigaccedilatildeo de reparar o dano prestaccedilatildeo de serviccedilos agrave comunidade liberdade assistida inserccedilatildeo em regime de semiliberdade internaccedilatildeo em estabelecimento educacional aleacutem daquelas previstas no art 101 I a IV do mesmo diploma legal

O que se observa portanto eacute que a legislaccedilatildeo especial a que fazem alusatildeo a Constituiccedilatildeo Federal e o Coacutedigo Penal natildeo tem a pretensatildeo de penalizar o adolescente ateacute porque a sua inimputabilidade natildeo lhe permite entender de forma completa a suposta ilicitude de sua conduta mas antes fortalecer os seus viacuten-culos familiares e comunitaacuterios por meio do caraacuteter pedagoacutegico das medidas socioeducativas pois certa-mente foi a fragilidade ou deterioraccedilatildeo dessas relaccedilotildees que o levou a descumprir preceito legal

Esclareccedila-se todavia que ldquonatildeo penalizarrdquo no sentido estrito previsto no Coacutedigo Penal natildeo signi-fica ldquonatildeo responsabilizarrdquo o adolescente pois como ressalta Veronese9 o Estatuto da Crianccedila e do Adolescente natildeo contempla apenas direitos como muitos defendem mas obriga e responsabiliza con-dutas contraacuterias ao ordenamento juriacutedico por meio das medidas socioeducativas tal como a Lei do SINASE (125942012) que em seu artigo 1ordm sect 2ordm III estabelece que referidas medidas tecircm entre seus objetivos a ldquodesaprovaccedilatildeo da conduta infracionalrdquo

5 DELMANTO Celso Delmanto et al Coacutedigo Penal Comentado 5ed Rio de Janeiro Renovar 2000 p 50

6BRASIL Decreto-lei 28481940 Disponiacutevel em lthttpwwwplanaltogovbrccivil_03decreto-leiDel2848compiladohtmgt Acesso

em 18 abr 2018

7 BRASIL Constituiccedilatildeo Federal de 1988 Disponiacutevel em lthttpwwwplanaltogovbrccivil_03constituicao constituicaohtmgt Acesso

em 18 abr 2018

8 VERONESE Josiane Rose Petry Responsabilizaccedilatildeo estatutaacuteria ou responsabilizaccedilatildeo socioeducativa (sociopedagoacutegica) fundamentos

In VERONESE Josiane Rose Petry ROSSATO Luciano Alves e LEacutePORE Paulo Eduardo Estatuto da Crianccedila e do Adolescente 25 anos de

desafios e conquistas Satildeo Paulo Saraiva 2015 p 91-113

9 VERONESE Josiane Rose Petry Direito penal juvenil e responsabilizaccedilatildeo estatutaacuteria elementos aproximativos eou

distanciadores o que diz a Lei Sinase a inimputabilidade penal em debate Rio de Janeiro Lumen Juris 2015 p 267

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4 PROJETO DE LEI N 37342012 E SISTEMA UacuteNICO DE SEGURANCcedilA PUacuteBLICA ndash SUSP

Embora a Doutrina da Proteccedilatildeo Integral e o Estatuto da Crianccedila e do Adolescente deixem evidente que eacute diferenciado o tratamento destinado aos adolescentes caso cometam ato infracional segundo seus objetivos e finalidade em 23042012 o Poder Executivo apresentou o Projeto de Lei n 3734 que dis-ciplina em especial a organizaccedilatildeo e o funcionamento dos oacutergatildeos responsaacuteveis pela seguranccedila puacuteblica nos termos do sect 7deg do art 144 da Constituiccedilatildeo Federal cria a Poliacutetica Nacional de Seguranccedila Puacuteblica e Defesa Social (PNSPDS) e institui o Sistema Uacutenico de Seguranccedila Puacuteblica (Susp)

Referido projeto de lei pautado com urgecircncia para votaccedilatildeo na Cacircmara dos Deputados no uacuteltimo dia 11042018 teve sua redaccedilatildeo final aprovada no mesmo dia e encaminhada ao Senado Federal no dia 1204201810

Tal redaccedilatildeo prevecirc a inclusatildeo dos agentes e oacutergatildeos do sistema socioeducativo no Sistema Uacutenico de Seguranccedila Puacuteblica (Susp) quando estabelece em seu art 9ordm sect 2ordm IX que ldquosatildeo integrantes operacio-nais do Susp I ndash poliacutecia federal II o poliacutecia rodoviaacuteria federal III ndash poliacutecias civis V poliacutecias militares VI ndash corpos de bombeiros militares VII ndash guardas municipais VIII ndash oacutergatildeos do sistema penitenciaacuterio IX ndash oacutergatildeos do sistema socioeducativo []11rdquo (grifo nosso)

A aprovaccedilatildeo da redaccedilatildeo do Projeto de Lei n 37342012 que possivelmente seraacute aprovado tambeacutem no Senado Federal importa em verdadeiro retrocesso do ponto de vista do Direito da Crianccedila e do Adolescente pois contraria natildeo apenas a Doutrina da Proteccedilatildeo Integral mas os princiacutepios e regras gerais sobre a poliacutetica de atendimento socioeducativo que se destinam a adolescentes autores de atos contraacuterios agrave lei penal e encontram-se previstos no Estatuto da Crianccedila e Adolescente (Lei 806990) e Lei do SINASE (Lei 125942012)

Tal projeto caso se torne lei vincularaacute o sistema de atendimento socioeducativo ao sistema prisional fican-do ambos submetidos aos mesmos princiacutepios diretrizes e objetivos da PNDPDS (Poliacutetica Nacional de Seguranccedila Puacuteblica e Defesa Social) e dessa forma contaminando o sistema socioeducativo com a cultura prisional e policial bem como desvirtuando-o dos princiacutepios que devem reger a accedilatildeo socioeducativa destina-da aos adolescentes fortalecer os seus viacutenculos familiares e comunitaacuterios por meio do caraacuteter pedagoacutegico

O que parece na realidade eacute que busca o Poder Legislativo criar norma que iguale ou aproxime o tra-tamento que eacute dado no sistema prisional aos adolescentes ou seja pretende diminuir a maioridade penal por via transversa jaacute que ateacute o momento natildeo obteve ecircxito na aprovaccedilatildeo da Proposta de Emenda agrave Constituiccedilatildeo (PEC) n 33201212 dentre tantas outras em tracircmite (PECs nordms 74 de 2011 33 de 2012 21 de 2013 e 115 de 2015) que estabelece a reduccedilatildeo da maioridade penal de 18 para 16 anos

Caso o Projeto de Lei n 37342012 seja aprovado e torne-se lei o prejuiacutezo social psicoloacutegico e para a vida adulta dos adolescentes que seratildeo submetidos aos mesmos princiacutepios diretrizes e objetivos da PNDPDS que muito se aproximaraacute do sistema prisional seraacute imensuraacutevel A probabilidade de no futu-ro cometerem novo iliacutecito seraacute muito significativa

A expectativa nesse sentido eacute que referido projeto de lei natildeo seja aprovado pelo Senado Federal ao menos no ponto em que iguala oacutergatildeos do sistema socioeducativo agraves poliacutecias federal rodoviaacuteria federal civis militares guardas municipais e oacutergatildeos do sistema penitenciaacuterio13

10 BRASIL Cacircmara dos Deputados Disponiacutevel em lthttpwwwcamaragovbrproposicoesWeb

fichadetramitacaoidProposicao=542102gtAcesso em 18 abr2018

11BRASIL Cacircmara dos Deputados Disponiacutevel em lthttpwwwcamaragovbr

proposicoesWebprop_ mostrarintegrajsessionid=59B76FB155270327E943E98F65FF1936

proposicoesWebExterno1codteor=1651617ampfilename=Tramitacao-PL+37342012gt Acesso em 18 abr 2018

12 BRASIL SENADO FEDERAL Disponiacutevel em lthttpswww25senadolegbrwebatividadematerias-materia106330gt Acesso

em 18 abr 2018

13 BRASIL Pesquisa sobre opiniatildeo dos cidadatildeos a respeito da aprovaccedilatildeo ou natildeo da PL 37342012 lthttpwwwcamaragovbr

proposicoesWebfichadetramitacaoidProposicao=542102gt Acesso em 19 abr2018

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5 SUacuteMULA 605 DO STJ E APURACcedilAtildeO DE ATO INFRACIONAL

Paralela agrave tramitaccedilatildeo do Projeto de Lei n 37342012 a Terceira Seccedilatildeo do Superior Tribunal de Justiccedila (STJ) aprovou no dia 14032018 a Suacutemula n 605 segundo a qual ldquoA superveniecircncia da maioridade penal natildeo interfere na apuraccedilatildeo de ato infracional nem na aplicabilidade de medida socioeducativa em curso inclusive na liberdade assistida enquanto natildeo atingida a idade de 21 anosrdquo

Embora pareccedila positivo que o Superior Tribunal de Justiccedila tenha sumulado a questatildeo relativa agrave possibi-lidade de o adolescente continuar a submeter-se agrave medida socioeducativa mesmo apoacutes atingir a maio-ridade penal salta aos olhos a necessidade de a Corte Superior necessitar colocar uma paacute de cal sobre assunto pois demonstra que efetivamente dos mais longiacutenquos municiacutepios agraves grandes metroacutepoles haacute divergecircncia e ateacute mesmo desprezo quanto agrave aplicabilidade dos princiacutepios basilares da proteccedilatildeo inte-gral e melhor interesse do Direito da Crianccedila e do Adolescente

Natildeo bastasse a forte presenccedila da Doutrina da Proteccedilatildeo Integral fundamentada na Constituiccedilatildeo Federal e no Estatuto da Crianccedila e do Adolescente o proacuteprio Estatuto admite em seu artigo 121 sect 5ordm a possibili-dade de extensatildeo da medida socioeducativa ateacute os 21 anos de idade Natildeo haveria portanto que suscitar qualquer duacutevida a respeito do assunto sendo inclusive desnecessaacuteria a criaccedilatildeo da Suacutemula 605

Mais uma vez portanto o que se observa eacute a tentativa de oacutergatildeos puacuteblicos como o Ministeacuterio Puacuteblico e Poder Judiciaacuterio exigirem e permitirem que o adolescente passe a cumprir pena no sistema prisional tatildeo logo atinja a maioridade penal sem levar ldquoem consideraccedilatildeo a continuidade da medida socioeduca-tiva que tem o fim de educar e ressocializar o menor14rdquo segundo a Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiccedila Do contraacuterio ter-se-ia uma verdadeira trageacutedia pois aquele adolescente jaacute submetido agrave medida socioeducativa seria deslocado para um estabelecimento penitenciaacuterio onde teria contato com adultos que cumprem as mais variadas penas dificultando sobremaneira a sua ressocializaccedilatildeo Formar-se-ia sem sombra de duacutevida um ldquocriminosordquo para retornar agrave sociedade

Nesse sentido se ldquoo Estatuto compreende que a melhor forma de intervir nesse adolescente em confli-to com a lei ao desaprovar a conduta infracional (v Art 1ordm III da Lei do Sinase) eacute incidir positivamente na sua formaccedilatildeo servindo-se para tanto do processo pedagoacutegico como um mecanismo efetivo que possibilite o conviacutevio cidadatildeo desse adolescente autor de ato infracional em sua comunidade []15rdquo educando-o para a vida social seria totalmente descabido e prejudicial retiraacute-lo desse sistema porque completou 18 anos e introduzi-lo no sistema penal

Como destaca Josiane Rose Petry Veronese16

As medidas [do Estatuto] aleacutem de serem sociais o satildeo tambeacutem lsquoeducativasrsquo A educaccedilatildeo como

uma estrateacutegia de intervenccedilatildeo sobre o adolescente autor de ato infracional Observe-se que natildeo

nos referimos a lsquotratamentorsquo mas sim em lsquointervenccedilatildeorsquo como um procedimento que se aplicado

dentro das matrizes do Estatuto eacute capaz de possibilitar uma efetiva inserccedilatildeo desse adolescente

na sociedade Talvez ateacute fosse mais adequado falarmos que esse adolescente se sentisse parte

configurando aiacute a ideia de pertencimento

Com efeito o deslocamento do adolescente submetido agrave medida socioeducativa para o estabelecimento prisional por ter atingido a maioridade sem a menor duacutevida ceifaria-lhe de forma consideraacutevel a possi-bilidade de reinserccedilatildeo em sua comunidade situaccedilatildeo que importa em evidente desrespeito agrave Doutrina da Proteccedilatildeo Integral presente na Constituiccedilatildeo Federal e no Estatuto da Crianccedila e do Adolescente

14 STJ ndash HC 319987SP Rel Min Antonio Saldanha Palheiro Sexta Turma DJs 03052016

15 VERONESE Josiane Rose Petry Responsabilizaccedilatildeo estatutaacuteria ou responsabilizaccedilatildeo socioeducativa (sociopedagoacutegica) fundamentos

In VERONESE Josiane Rose Petry ROSSATO Luciano Alves e LEacutePORE Paulo Eduardo Estatuto da Crianccedila e do Adolescente 25 anos de

desafios e conquistas Satildeo Paulo Saraiva 2015 p 91-113

16 Idem p 268

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6 O DIREITO DA CRIANCcedilA E DO ADOLESCENTE ESQUECIDO

A partir da reflexatildeo acima constata-se que em variadas situaccedilotildees o Direito da Crianccedila e do Adolescente eacute simplesmente esquecido ou ateacute mesmo ignorado Legisladores criam leis juiacutezes decidem e promo-tores de justiccedila requerem a sujeiccedilatildeo de adolescentes ao cumprimento de penas apoacutes completarem 18 anos em total desacordo com os preceitos e princiacutepios presentes na Constituiccedilatildeo Federal e no Estatuto da Crianccedila e do Adolescente

A supremacia do Direito Penal e do Sistema de Seguranccedila Puacuteblica eacute flagrante pois utilizados forccedilada-mente contra pessoas ainda em fase de desenvolvimento que sequer atingiram a maioridade penal mas que por sua condiccedilatildeo especial de crianccedila e adolescente abandonado ou violentado deve ser penalizado duas vezes pela violecircncia que jaacute sofreu em casa ndash se tiver moradia ndash e que o levou a cometer o ato infracio-nal e a possiacutevel penalizaccedilatildeo que sofreraacute no sistema prisional seja pela poliacutetica de seguranccedila ldquogeralrdquo que se pretende criar por meio do PL 37342012 seja pela divergecircncia que antecedeu a Suacutemula 605 do STJ

Sendo assim eacute evidente que o Direito da Crianccedila e do Adolescente pode ser considerado um direi-to esquecido pois em situaccedilotildees que envolvem atos infracionais praticados por adolescentes a prote-ccedilatildeo integral melhor interesse e todo o arcabouccedilo de proteccedilatildeo a essas pessoas hipervulneraacuteveis satildeo completamente abandonados mantendo-se ainda como se constata acima o pensamento baseado no Direito Penal

7 CONCLUSAtildeO

As finalidades da medida socioeducativa e da pena satildeo completamente distintas Enquanto a primeira procura recolocar o adolescente em seu ambiente social e tem caraacuteter eminentemente pedagoacutegico a segunda tem o sentido de prevenccedilatildeo contra ocorrecircncia de crimes e de retribuiccedilatildeo caso eles efetiva-mente ocorram praticada contra maiores de 18 anos

No mecircs de abril de 2018 contudo o que se observou no paiacutes por nosso Legislativo e Judiciaacuterio satildeo condutas que igualam estas duas formas tatildeo diversas de resposta do Estado pela praacutetica de ato iliacutecito a partir da urgecircncia no tracircmite do Projeto de Lei 34372012 e da criaccedilatildeo da Suacutemula 605 no STJ

Ambos intentam forccedilar adolescentes portanto menores de 18 anos a submeterem-se ao regime pri-sional o qual eacute sabido se trata de uma ldquofaacutebrica do crimerdquo

O que se observa pois eacute que a Doutrina da Proteccedilatildeo Integral e Estatuto da Crianccedila e do Adolescente fazem parte de um direito que na maior parte das vezes eacute esquecido abandonado especialmente quan-do o legislador membro do Ministeacuterio Puacuteblico e magistrado deparam-se com o ato infracional pratica-do por adolescente Um venda em seus olhos parece turvar a realidade de que existe um regime juriacutedico proacuteprio a que estas pessoas ainda em desenvolvimento estatildeo submetidas

A expectativa portanto eacute que os agentes puacuteblicos operem numa perspectiva social e humanitaacuteria direcionada a esses adolescentes praticantes de ato infracional que seja foco de suas preocupaccedilotildees o ambiente de pobreza e violecircncia em que vivem essas pessoas e que por meio de medidas efetivamente socioeducativas ndash e natildeo penas ndash possam transformar a realidade de cada um tornando-se seres huma-nos capazes de viver uma vida digna e responsaacutevel algo que lhes foi negado desde o nascimento no acircmbito familiar e social

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REFEREcircNCIAS

BRASIL Coacutedigo penal Decreto-lei 2848 de 7 de dezembro de 1940 Disponiacutevel em lthttpwwwpla-naltogovbrccivil_03decreto-leiDel2848compiladohtmgt Acesso em 08 Fev 2018

______ Constituiccedilatildeo da Repuacuteblica Federativa do Brasil de 1988 Disponiacutevel em lthttpwwwplanaltogovbrccivil_03constituicaoconstituicao compiladohtmgt Acesso em 7 de fev 2018

______ Lei n 8069 de 13 de julho de 1990 Dispotildee sobre o Estatuto da Crianccedila e do Adolescente e daacute outras providecircncias Disponiacutevel emlthttpwwwplanaltogovbrccivil_03leisL8069Compiladohtmgt Acesso em 08 de Jan 2018

______ Lei n 9394 de 20 de dezembro de 1996 Estabelece as diretrizes e bases da educaccedilatildeo nacio-nal Disponiacutevel em lthttpwwwplanaltogovbr ccivil_03leisL9394htmgt Acesso em 8 Jan 2018

______ Cacircmara dos Deputados Disponiacutevel em lthttpwwwcamara govbrproposicoesWebficha-detramitacaoidProposicao=542102gt Acesso em 18 abr 2018

______Cacircmara dos Deputados Disponiacutevel em lthttpwwwcamaragovbrproposicoesWebprop_mostrarintegrajsessionid=59B76FB155270327E943E98F65FF1936proposicoesWebExterno1-codteor=1651617ampfilename=Tramitacao-PL+37342012gt Acesso em 18 abr 2018

DELMANTO Celso Delmanto et al Coacutedigo Penal Comentado 5ed Rio de Janeiro Renovar 2000

SENADO FEDERAL Disponiacutevel em lthttpswww25senadolegbrwebatividadematerias-mate-ria106330 gt Acesso em 18 abr2018

VERONESE Josiane Rose Petry ROSSATO Luciano Alves LEacutePORE Paulo Eduardo Estatuto da Crianccedila e do Adolescente 25 anos de desafios e conquistas Satildeo Paulo Saraiva 2015

______ Direito penal juvenil e responsabilizaccedilatildeo estatutaacuteria elementos aproximativos eou distancia-dores o que diz a Lei Sinase a inimputabilidade penal em debate Rio de Janeiro Lumen Juris 2015

______ et al Direito da Crianccedila e do Adolescente novo curso ndash novos temas Rio de Janeiro Lumen Juris 2017

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AS FACETAS DO NEOLIBERALISMO E SUAS CONSEQUEcircNCIAS NA SOCIOEDUCACcedilAtildeO DE ADOLESCENTES EM CONFLITO COM A LEI NO SUDESTE BRASILEIRO

THE FACETS OF NEOLIBERALISM AND CONSEQUENCES ON THE SOCIOEDUCATION OF ADOLESCENTS IN CONFLICT WITH THE LAW IN SOUTHEASTERN BRAZILTatiana Emmerich1

Resumo Natildeo eacute de hoje que a sociedade brasileira enfrenta problemas sociais graves advindos do susten-taacuteculo das desigualdades sociais que resultam na manutenccedilatildeo de classes excluindo determinados gru-pos do acesso digno a direitos e garantias fundamentais assegurados pela Constituiccedilatildeo de 1988 como por exemplo a educaccedilatildeo Desta maneira o tema escolhido tem como propoacutesito verificar se as medidas socioeducativas postas pelo Estado possuem ou natildeo resquiacutecios de puniccedilatildeo geradas pelo poder simboacuteli-co Estatal e principalmente as consequecircncias do neoliberalismo na socioeducaccedilatildeo de adolescentes em conflito com a Lei a partir de uma metodologia que usou a pesquisa bibliograacutefica como referecircncia Os resultados encontrados foram de que a ressocializaccedilatildeo estaacute longe de ser alcanccedilada visto que a maio-ria das unidades de internaccedilatildeo sofrem pela superlotaccedilatildeo e consequentemente a falta de professores e outros profissionais que possam suprir a necessidade dentro centros socioeducativos na regiatildeo sudeste

Palavras- chaves Neoliberalismo Socioeducaccedilatildeo Jovens em conflito com a lei Internaccedilatildeo Sudeste

Abstract It is not today that Brazilian society faces serious social problems arising from the support of social inequalities which result in the maintenance of classes excluding certain groups of decent access to rights and fundamental guarantees guaranteed by the Constitution of 1988 for example education In this way the chosen theme has as a purpose to verify if the socio-educational measures put in place by the State have or do not have remnants of punishment generated by the State symbolic power and mainly the consequences of neoliberalism in the socioeducation of adolescents in conflict with the Law from a methodology that used the bibliographic research as reference The results found that resocialization is far from being achieved since most hospitalization units suffer from overcrowding and consequently the lack of teachers and other profes-sionals who can supply the need in socio-educational centers in the southeast region

Keyword Neoliberalism Socioeducation Young people in conflict with the law Hospitalization Southeast

1 Bacharel em Direito pela Universidade Candido Mendes Advogada Professora Universitaacuteria Poacutes Graduaccedilatildeo Estaacutecio e UNISUAM Poacutes

- Graduada em Direito Penal Econocircmico e Europeu pelo Instituto de Direito Penal Econocircmico e Europeu IDPEE da Faculdade de Direito

da Universidade de Coimbra em parceria com o Instituto Brasileiro de Ciecircncias Criminais IBCCRIM Mestre pela Universidade Federal do

Rio de Janeiro pelo Programa de Poacutes Graduaccedilatildeo em Poliacuteticas Puacuteblicas em Direitos Humanos (UFRJ PPDH) Pesquisadora do Grupo de

Pesquisas Matrizes Autoritaacuterias do Processo Penal Brasileiro A Prova Penal e o Sistema de Controles Epistecircmicos (Faculdade Nacional

de Direito - LADIHUFRJ) Lattes lthttplattescnpqbr0353875902696380gt

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1 INTRODUCcedilAtildeO

Natildeo eacute de hoje que a sociedade brasileira enfrenta problemas sociais graves advindos dos sustentaacuteculos das desigualdades sociais podendo citar as altas taxas de desemprego violecircncia urbana e simboacutelica que resultam na manutenccedilatildeo de classes excluindo determinados grupos do acesso digno a direitos e garan-tias fundamentais assegurados pela Constituiccedilatildeo de 1988 como por exemplo a educaccedilatildeo Isto impede a instauraccedilatildeo de uma sociedade mais igualitaacuteria consequecircncia cruel da adoccedilatildeo de ideologias neoliberais

A crescente violecircncia se tornou caracteriacutestica cotidiana dos estados brasileiros principalmente na regiatildeo sudeste que possui as maiores megaloacutepoles e assim um dos maiores iacutendices de violecircncia urbana do paiacutes Poreacutem deve-se ressaltar que a violecircncia no Brasil soacute se torna um problema a ser resolvido quando a viacutetima eacute detentora de algum tipo de poder este podendo ser poliacutetico financeiro ou social

Por vezes a miacutedia ldquoesconderdquo da sociedade os altos iacutendices de homiciacutedios tendo como viacutetimas meninos pobres negros e moradores de aacutereas perifeacutericas consequecircncias negativas da manutenccedilatildeo do poder simboacutelico e do estado de anomia em que vive a sociedade brasileira frente a problemas sociais

Desta maneira o tema escolhido para este artigo As facetas do neoliberalismo e suas consequecircncias na socioeducaccedilatildeo de adolescentes em conflito com a lei no sudeste brasileiro (SOUZA 2018) que tem como propoacutesito verificar se as medidas socioeducativas postas pelo Estado possuem ou natildeo resquiacutecios de puniccedilatildeo geradas pelo poder simboacutelico Estatal e principalmente as consequecircncias do neoliberalis-mo na socioeducaccedilatildeo de adolescentes em conflito com a Lei

A partir de dados que foram fornecidos pelo Panorama Nacional a Execuccedilatildeo de Medidas Socioeducativas de Internaccedilatildeo realizado pelo Conselho Nacional de Justiccedila no ano de 2012 seraacute feita uma anaacutelise sobre a situaccedilatildeo educacional dos adolescentes que cumprem medida socioeducativa de privaccedilatildeo de liberdade

No Sudeste especificamente no Rio de Janeiro as medidas socioeducativas de internaccedilatildeo satildeo cumpri-das dentro do Novo Degase unidades de cumprimento de medidas socioeducativas principalmente as privativas de liberdade como por exemplo a Unidade Santo Expedito (ESSE) esta responsaacutevel pela internaccedilatildeo de meninos entre 15 a 17 anos de idade

Esses centros em tese objetivam uma educaccedilatildeo social com reeducaccedilatildeo ressocializaccedilatildeo e deveriam proporcionar aos adolescentes educaccedilatildeo abrangente com atividades capazes de oportunizar qualifi-caccedilatildeo profissional de modo geral

Poreacutem o que se vecirc natildeo chega nem perto de ressocializaccedilatildeo visto que a maioria das unidades de inter-naccedilatildeo sofrem pela superlotaccedilatildeo consequentemente a falta de professores e outros profissionais que possam suprir esse deacuteficit A falta de investimento financeiro eacute a principal marca do descaso pelas autoridades estatais de implementar poliacuteticas puacuteblicas capazes de fornecer uma reeducaccedilatildeo eficaz

Isto ocorre em funccedilatildeo de adotarmos um modelo neoliberal onde se sustenta a manutenccedilatildeo de classes e que no setor educacional age de modo a priorizar a formaccedilatildeo menos abrangente e mais profissiona-lizante diretamente aliada a um falso jogo de marketing estatal que ldquofornecerdquo mais vagas nos siste-mas de matriacuteculas escolares do que possuem maquiando a situaccedilatildeo precaacuteria do sistema educacional puacuteblico que se revela pela falta de condiccedilotildees de trabalho a professores e pela falta de recursos a serem investidos em educaccedilatildeo de modo a inviabilizar novas vagas

Assim o trabalho se dividiu em duas partes para melhor compreensatildeo da mateacuteria a primeira parte - onde se conceituou o neoliberalismo sob a visatildeo de David Harvey e uma segunda parte - que abordou a situaccedilatildeo cotidiana dos adolescentes em conflito com a lei no sudeste brasileiro no que tange sua rela-ccedilatildeo com o Estado aplicador de medidas socioeducativas de internaccedilatildeo frente aos reflexos do neolibe-ralismo na condiccedilatildeo educacional dos mesmos

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2 MEacuteTODO

O artigo foi desenvolvido com o uso da metodologia de pesquisa bibliograacutefica usando obras de doutri-nas relacionadas as aacutereas juriacutedicas econocircmicas e das ciecircncias sociais O uso de relatoacuterios de pesquisa em especifico do Conselho Nacional de Justiccedila do ano de 2012 tambeacutem foram essenciais para o deba-te do tema escolhido

3 DISCUSSAtildeO E RESULTADOS

31 CONCEITO DE NEOLIBERALISMO SEGUNDO DAVID HARVEY

O neoliberalismo adveacutem do liberalismo econocircmico claacutessico e se originou nos Estados Unidos da Ameacuterica Este pode ser entendido como uma ideologia poliacutetica e econocircmica capitalista que visa o mer-cado e o consumo sustentando o argumento de natildeo participaccedilatildeo do Estado na economia

Esta nova forma de pensar o liberalismo se consubstanciou a partir de sedutoras convicccedilotildees pautadas principalmente na liberdade individual com base na dignidade da pessoa humana tendo como marco temporal o mundo poacutes-guerra fria

Dessa maneira foi possiacutevel implantar um capitalismo global frente as grandes corporaccedilotildees interna-cionais que cresceram atraveacutes da ldquoliberdade individualrdquo Neste interim Harvey escreveu uma de suas principais obras ldquoBreve Relato do Neoliberalismordquo onde o autor fez uma anaacutelise histoacuterica e criacutetica da teoria do neoliberalismo face suas implicaccedilotildees na atualidade

Uma teoria das praacuteticas poliacutetico-econocircmicas que propotildee que o bem-estar humano e pode ser

melhor promovido liberando-se as liberdades e capacidades empreendedoras individuais

no acircmbito de uma estrutura institucional caracterizada por soacutelidos direitos a propriedade

privada livres mercados e livre comeacutercio O papel do Estado eacute criar e preservar uma estrutura

institucional apropriada a essas praacuteticas o Estado tem de garantir por exemplo a qualidade e

integridade do dinheiro Deve tambeacutem estabelecer as estruturas e funccedilotildees militares de defesa

da poliacutecia e legais requeridas para garantir direitos de propriedade individuais e para assegurar

se necessaacuterio pela forccedila o funcionamento apropriado dos mercados Aleacutem disso se natildeo

existirem mercados (em aacutereas como a terra a aacutegua a instruccedilatildeo o cuidado de sauacutede a seguranccedila

social ou a poluiccedilatildeo ambiental) estes deveratildeo ser criados se necessaacuterio pela accedilatildeo do Estado

Mas o Estado natildeo deve aventurar-se para aleacutem dessas tarefas As intervenccedilotildees do Estado nos

mercados (uma vez criados) devem ser mantidas num niacutevel miacutenimo porque de acordo com a

teoria o Estado possivelmente natildeo possui informaccedilotildees suficientes para entender devidamente

os sinais do mercado (preccedilos) e porque poderosos grupos de interesse vatildeo inevitavelmente

distorcer e viciar as intervenccedilotildees do Estado (particularmente nas democracias) em seu proacuteprio

benefiacutecio (HARVEY 2007 p 12)

Harvey eacute um criacutetico do modelo neoliberal que eacute aliado a ideia de que o neoliberalismo foi uma espeacutecie de subterfugio encontrado para que o Estado antes de se ocultar ou enfraquecer passasse a trabalhar em prol do mercado e do grande capital internacional mascarando suas faces ocultas e perigosas que segundo o autor compotildeem-se dos seguintes pontos abordado na tabela a baixo

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Quadro 1- Consequecircncias do Neoliberalismo

I - Domiacutenio geopoliacutetico estadunidense

Com o resultado de diminuiccedilatildeo dos recursos para a esfera social dos Estados expondo a populaccedilatildeo global ao empobrecimento ainda mais profundo

II - Nutriz ideoloacutegica a partir dos ideais de liberdade de multiculturalismo e de democracia

Com base na propriedade privada e no livre-empreendedorismo que implicou em remeter a um relicaacuterio conceitual as ideias de igualdade e de justiccedila social Poreacutem no consumismo narcisista e em outras dimensotildees esteacutetico-teoacutericas que buscam os conhecimentos pautados na dialeacutetica nas reflexotildees sobre poder e exploraccedilatildeo do trabalho

III- Base conservadora Contraditoacuteria aos ideais de liberdade Promoccedilatildeo da ortodoxia em torno do neoliberalismo refletindo em crises em alguns paiacuteses como por exemplo o Meacutexico onde ocorreu um massacre neoliberal Onde empreendeu-se um processo de recolonizaccedilatildeo ou colonialismo sem colocircnias

Desta forma o neoliberalismo concatenou agrave reestruturaccedilatildeo produtiva do capital com base no modelo de acumulaccedilatildeo flexiacutevel onde Harvey atraveacutes de sua criacutetica ao modelo nos chama atenccedilatildeo para a luta poliacutetica em prol da criaccedilatildeo de alternativas agraves accedilotildees hegemocircnicas bem como uma luta contra a carate-riacutestica antidemocraacutetica e autoritaacuteria do neoliberalismo Isso faz com que o conceito de liberdade usado pelo modelo neoliberal seja relativizado

Assim quando relacionamos o neoliberalismo com o tema deste artigo devemos ressaltar que a aacuterea da educaccedilatildeo deixa de servir como um campo social para adquirir caracteriacutesticas funcionais de mercado

Esse fator acaba sendo um agravante da delicada situaccedilatildeo de jovens em conflito com a lei que cumprem medidas de internaccedilatildeo nos sistemas socioeducativos uma vez que a escola passa a ser um ambiente de adequaccedilatildeo agrave ideologia dominante

Para Andriolli (2002 p1)

Em contrapartida a crise do capitalismo em niacutevel mundial em especial do pensamento neoliberal

revela cada vez mais as contradiccedilotildees e limites da estrutura dominante A estrateacutegia liberal continua

a mesma colocar a educaccedilatildeo como prioridade apresentando-a como alternativa de ldquoascensatildeo

socialrdquo e de ldquodemocratizaccedilatildeo das oportunidadesrdquo Por outro lado a escola continua sendo um espaccedilo

com grande potencial de reflexatildeo criacutetica da realidade com incidecircncia sobre a cultura das pessoas

O ato educativo contribui na acumulaccedilatildeo subjetiva de forccedilas contraacuterias agrave dominaccedilatildeo apesar da

exclusatildeo social caracteriacutestica do descaso com as poliacuteticas puacuteblicas na maioria dos governos

De modo a fazer com que a educaccedilatildeo perca seu potencial virtuoso e se volte apenas para um papel estrateacutegico e empresarial de preparar para o trabalho atendendo agraves necessidades da livre iniciativa e fazendo a manutenccedilatildeo das desigualdades e desta maneira impossibilitando a ressocializaccedilatildeo de jovens dentro e fora dos sistemas socioeducativos

32 JUVENTUDE VIOLEcircNCIA ESTADO ldquoSOCIOEDUCADORrdquo E

NEOLIBERALISMO

No Relatoacuterio do Panorama Nacional a Execuccedilatildeo de Medidas Socioeducativas de Internaccedilatildeo realizado no ano de 2012 pelo Conselho Nacional de Justiccedila eacute na adolecescecircncia em que acontece o desenvolvi-mento da proacutepria personalidade e tambeacutem eacute onde se encontram os maiores iacutendices de atos infracionais registrados no Brasil principalemnte entre as faixa etaacuteria dos 15 a 17 anos

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A falta de amparo familiar desses jovens por muitas vezes gera a necessidade de buscar em outros gru-pos sociais o que natildeo tiveram dentro de seus lares Viacutetimas indefesas da violecircncia simboacutelica e da falta de assistecircncia em todos os setores sociais a maioria destes satildeo acolhidos por grupos que gerenciam o mundo do crime aliciando estes jovens oferecendo altos salaacuterios e o poder que nunca tiveram Assim a lei da rua eacute posta aos adolescentes que ingressam na vida do crime sem perspectiva de sairem

Desta maneira o que percebemos eacute a manutenccedilatildeo do poder simboacutelico atraveacutes de medidas socioeduca-tivas ineficazes na tentativa frustrada de ldquoprotegerrdquo o que na verdade se tenta mascarar visto a preca-riedade dos centros de cumprimeto de medidas socioeducativas

O Estado por meio de seu poder simboacutelico faz a construccedilatildeo social de uma cultura que precisa de manu-tenccedilatildeo para que todos sejam captados (Cultura do Controle de Garland)2 eacute desta maneira que a violecircncia simboacutelica comeccedila a ter ldquoformardquo impondo ldquolegitimamenterdquo e de maneira agressiva a cultura dominante

A interiorizaccedilatildeo desta cultura faz da violecircncia simboacutelica aparentemente natildeo visiacutevel aos olhos uma violecircncia que aliena jaacute que o proacuteprio oprimido natildeo se sente na posiccedilatildeo de estar sendo violentado como acontece com os adolescentes em conflitos com a Lei jaacute que a situaccedilatildeo que se perpetua ao longo da his-toacuteria e se torna algo inevitaacutevel no futuro

Natildeo existe ressocializaccedilatildeo mas sim uma maquiagem de problemas sociais graves que derivam de outros mais basilares como a falta educaccedilatildeo puacuteblica de qualidade desde a alfabetizaccedilatildeo

O problema da educaccedilatildeo tambeacutem eacute influenciado por ideologias neoliberais que assumem o controle atraveacutes de uma falsa esperanccedila de colocar a educaccedilatildeo como prioridade poreacutem natildeo eacute isso que acontece segundo Andriolli (2002 p2)

De acordo com o Banco Mundial satildeo duas as tarefas relevantes ao capital que estatildeo colocadas para

a educaccedilatildeo a) ampliar o mercado consumidor apostando na educaccedilatildeo como geradora de trabalho

consumo e cidadania (incluir mais pessoas como consumidoras) b) gerar estabilidade poliacutetica nos

paiacuteses com a subordinaccedilatildeo dos processos educativos aos interesses da reproduccedilatildeo das relaccedilotildees

sociais capitalistas (garantir governabilidade) Eacute evidente que a preocupaccedilatildeo do capital natildeo eacute gratuita

Existe uma coerecircncia do discurso liberal sobre a educaccedilatildeo no sentido de entendecirc-la como ldquodefinidora

da competitividade entre as naccedilotildeesrdquo e por se constituir numa condiccedilatildeo de empregabilidade em

periacuteodos de crise econocircmica Como para os liberais estaacute dado o fato de que todos natildeo conseguiratildeo

ldquovencerrdquo importa entatildeo impregnar a cultura do povo com a ideologia da competiccedilatildeo e valorizar os

poucos que conseguem se adaptar agrave loacutegica excludente o que eacute considerado um ldquoincentivo agrave livre

iniciativa e ao desenvolvimento da criatividaderdquo Mas e o que fazer com os ldquoperdedoresrdquo Conforme o

Prof Roberto Lehrer (UFRJ) o proacuteprio Banco Mundial tem declarado explicitamente que ldquoas pessoas

pobres precisam ser ajudadas senatildeo ficaratildeo zangadasrdquo Essa interpretaccedilatildeo eacute precisa com o que os

proacuteprios Banco tecircm apresentado oficialmente como preocupaccedilatildeo nos paiacuteses pobres ldquoa pobreza

urbana seraacute o problema mais importante e mais explosivo do proacuteximo seacuteculo do ponto de vista poliacutetico

Desta maneira o Estado manteacutem o discurso da cultura dominante naturalizando desigualdades que justificariam o abandono estatal desses adolescentes em conflito com a lei

33 SITUACcedilAtildeO ESCOLAR DOS ADOLESCENTES E OS REFLEXOS DO

NEOLIBERALISMO

Um dos reflexos negativos do neoliberalismo esta diretamente relaciondo a situaccedilatildeo escolar dos jovens em conflito com a lei no sudeste brasileiro Isto acontece em virtude da maioria dos meninos mesmo antes de ingressar ao sistema socioeducativo jaacute possuir algum deficit educacional por exem-plo taxas consideraacuteveis de analfabetismo ou abandono escolar

2 David Garland eacute um importante jurista e socioacutelogo da aacuterea de criminologia Professor da Universidade de Nova York O Autor busca

compreender em que grau as mudanccedilas nas instituiccedilotildees levaram a uma mudanccedila nas sensibilidades a qual tornou possiacutevel que a sociedade

aceitasse melhor uma nova cultura do controle principalmente nas sociedades com taxas altas de crimes

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Segundo Andriolli (2012 p3)

A conjuntura das poliacuteticas educacionais no Brasil ainda demonstra sua centralidade na

hegemonia das ideias liberais sobre a sociedade como reflexo do forte avanccedilo do capital sobre

a organizaccedilatildeo dos trabalhadores na deacutecada de 90 A intervenccedilatildeo de mecanismos internacionais

como o FMI e o Banco Mundial aliada agrave subserviecircncia do governo brasileiro agrave economia mundial

repercute de maneira decisiva sobre a educaccedilatildeo Em contrapartida a crise do capitalismo em

niacutevel mundial em especial do pensamento neoliberal revela cada vez mais as contradiccedilotildees

e limites da estrutura dominante A estrateacutegia liberal continua a mesma colocar a educaccedilatildeo

como prioridade apresentando-a como alternativa de ldquoascensatildeo socialrdquo e de ldquodemocratizaccedilatildeo

das oportunidadesrdquo Por outro lado a escola continua sendo um espaccedilo com grande potencial

de reflexatildeo criacutetica da realidade com incidecircncia sobre a cultura das pessoas O ato educativo

contribui na acumulaccedilatildeo subjetiva de forccedilas contraacuterias agrave dominaccedilatildeo apesar da exclusatildeo social

caracteriacutestica do descaso com as poliacuteticas puacuteblicas na maioria dos governos

Assim na pesquisa do Panorama Nacional a Execuccedilatildeo de Medidas Socioeducativas (2012) 93 dos jovens foram alfabetizados contendo 8 de taxa de analfabetismo poreacutem a idade meacutedia em que inter-romperam seus estudos foi de 14 anos de idade o que corresponde ao primeiro grau incompleto

Graacutefico 1 ndash Meacutedia de idade em que os adolescentes interromperam os estudos

Fonte DMFCNJ | Elaboraccedilatildeo DPJCNJ

A mesma pesquisa tambeacutem ressaltou que haacute uma porcentagem maior de adolescentes cuja uacuteltima seacuterie cursada foi a quinta e a sexta seacuterie do ensino fundamental como vemos no graacutefico

Graacutefico 2 ndash Uacuteltima seacuterie escolar cursada pelo adolescente

Fonte DMFCNJ | Elaboraccedilatildeo DPJCNJ

Os motivos que levam ao abandono escolar pelos adolescentes geralmente tecircm relaccedilatildeo com a dificul-dade de aprendizado complementar a falta de incetivos dentro da escola que fora moldada em formas tradicionais e que natildeo se revelam atraentes aos adolescentes

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Outro motivo relevante se deve ao uso de substacircncias entorpecentes dentro e fora do ambiente esco-lar que por muitas vezes resultam em casos de abandono escolar ou ateacute mesmo expulsotildees pela natildeo cumprimento das normas estabelecidas pela escola

A escola que temos hoje eacute ineficiente visto que ela eacute aquela que expulsa os alunos que natildeo se enqua-dram no perfil ldquoadequadordquo ao inveacutes de ensina-los e atrai-los para o ambiente educacional

O Panorama Nacional a Execuccedilatildeo de Medidas Socioeducativas (2012) tambeacutem revelou que no Brasil 57 dos jovens declararam que natildeo frequentavam a escola antes de ingressar na unidade Consequentemente apenas poucos adolescentes que estatildeo cumprindo medidas de socioeducaccedilatildeo natildeo possuem divergecircncia entre o binocircmio idadeseacuterie

Poreacutem um fator improtate que foi observado eacute que na Regiatildeo Sudeste apenas 10 dos internos decla-raram natildeo frequentar a escola todos os dias constatando assim a grande deficiecircncia do aparelho esta-tal na aplicaccedilatildeo de medidas socioeducativas e de programas sociais voltados agrave educaccedilatildeo

Isto tambeacutem pode ser influenciado pelo fato de que nem sempre o ambiente escolar que frequentam esses adolescentes se mostram favoraveis a frequencia escolar revelando a falta de insvestimento em educaccedilatildeo de qualidade

A importacircncia da educaccedilatildeo vem sendo relativizada pela sociedade hedonista a qual se busca constan-temente a saciaccedilatildeo de vontades e prazeres momento em que muitos acabam se redendo ao mundo do traacutefico que os ludibria pela facilidade de prazeres materiais que revelam uma ascensatildeo de status social no meio em que vivem

Vale tambeacutem ressaltar que historicamente falando a escola foi desenvolvida para classe burguesa natildeo sendo alvo de alcance os adolescentes em conflitos que geralmente pertencem as classes de menor potecircncial economico estes se situando como ldquoinimigos sociaisrdquo excluidos de qualquer direito

Desta maneira a classe trabalhadora teve que protestar seus direitos e lutar para ter o acesso a educa-ccedilatildeo formal igualitaacuteria poreacutem o que se viu foi a diminuiccedilatildeo da qualidade de ensino quando houve essa ampliaccedilatildeo Segundo Freire (1989 p 224)

A ldquodespreocupaccedilatildeordquo pela educaccedilatildeo nos seus aspectos quantitativos eacute consequecircncia desse

construir histoacuterico que traz em seu bojo aleacutem do desprezo pelas camadas populares a interdiccedilatildeo

de muitos ao conhecimento e portanto os perpetua na ldquoincompetecircnciardquo na ldquoignoracircnciardquo nas

ldquotrevasrdquo no ldquosuiciacutediordquo na ldquopraga negrardquo no ldquocancrordquo do analfabetismo

No Brasil foi possivel perceber esta dinacircmica reflexo tambeacutem de politicas neoliberais quando a Lei de Diretrizes e Bases da Educaccedilatildeo Nacional 569271 tranferiu a resposabildiade da educaccedilatildeo antes da federaccedilatildeo para Estados e Municiacutepios que tambeacutem possibilitou o primeiro grau gratuito e o aumento de vagas escolas mas careceu na qualidade social da educaccedilatildeo oferecida agrave classe trabalhadora

Assim temos que ressalvar que neste trabalho natildeo temos a finalidade de atribuir somente a escola a culpa do insucesso como foi destacado impropriamente pelo discurso neoliberal o que queremos destacar eacute que a educaccedilatildeo puacuteblica do Brasil que se destina a classe trabalhadora e aos adolescentes em conflito eacute tratada com desvalor

A desvalorizaccedilatildeo da educaccedilatildeo para as classes trabalhadoras eacute um fenocircmeno histoacuterico e podemos ver isso por exemplo na teoria do capital humano que a educaccedilatildeo eacute concebida de maneira a auxiliar a obtenccedilatildeo maxima de empregos de renda e principalemnte desenvolvimento economico maqueando desigualdades sociais e legitimando os sistemas capitalista

Desta maneira a educaccedilatildeo que seria a priori um direito baacutesico eacute colocada como uma mercadoriainvesti-mento que beneficia o aumento da produccedilatildeo e sobrepujamento do atraso economico justificando assim por meio da meritocracia as desigualdade de renda e de mutabilidade social Restando a educaccedilatildeo ldquoser-vir para preparar a matildeo de obra adestrada e qualifcada ao mercadordquo (FRIGOTTO 1999 p 120)

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Os reflexos das poliacuteticas neoliberais vecircm provocando alteraccedilotildees significantes no atual cenaacuterio educa-cional brasileiro onde o ensino puacuteblico eacute colocado como ineficiente atraveacutes de hostilidade ideologica fazendo com que a educaccedilatildeo se torne uma mercadoria de desejo e natildeo mais como um direito funda-mental garantido pela Constituiccedilatildeo de 88 e extentido a todos

Nesta visatildeo mercadologia neoliberal o estudante seria o consumidor e a educaccedilatildeo privada mercadoria de disputas isso eacute feito atraveacutes de uma politica descentralizada que quer diluir aos poucos o direito de todos possuirem o mesmo direito a educaccedilatildeo Isto tambeacutem progrediu em virtude da mudanccedila dos termos de ldquoigualdade socialrdquo para ldquoequidade socialrdquo que segundo Andriolli (2002) existe uma crescente despre-ocupaccedilatildeo com a igualdade como direito de todos mas como somente a ldquoamenizaccedilatildeordquo da desigualdade

Assim o Estado eacute abraccedilado pela onda neoliberal do surgimento de ficticias ldquoescolas consumordquo que datildeo bons frutos e que disfarccedilam o defecit educacional das camadas que mais precisam desse direito desta maneira eacute possivel percerber as garras do neoliberalismo que disfarccedila o problema e reduz o alcance da educaccedilatildeo ou seja se vocecirc natildeo tem condiccedilotildees economicas de um ensino privado vocecirc seraacute excluido movimentando o sistema capitalista excluedente por natureza

Com as investidas neoliberais no setor da educaccedilatildeo o conhecimento eacute secundaacuterio e o central eacute possuir habilidades reduzindo o invenstimento estatal ou seja haacute uma inversatildeo de valores realizadas pelo neoliberalismo uma vez que a realidade eacute constituida por uma sociedade do conhecimento e quem natildeo o tem eacute totalmente rejeitado

No casos dos adolescentes em confito com a lei a situaccedilatildeo natildeo se mostra diferente mesmo o ECA garantindo no artigo 124 ldquoreceber escolarizaccedilatildeo e profissionalizaccedilatildeordquo a situaccedilatildeo natildeo foi alterada per-petuando a desigualdade social e economica jaacute que dentro das instituiccedilotildees socioeducativas a educa-ccedilatildeo se mostra precaria natildeo sendo um dos objetivos principais jaacute que quem estaacute ali natildeo possui condi-ccedilotildees de ldquoadquirirrdquo educaccedilatildeo segundo a forma neoliberal revelando o caraacuteter punitivo das medidas socio educativas

Quadro 3- A educaccedilatildeo neoliberal

Sem a educaccedilatildeo adequada os adolescentes natildeo conseguem a inserccedilatildeo no mundo que vai recebe-los apoacutes cumprimento das medidas fazendo com que busquem outras formas de sobreviverem atraveacutes de ati-vadas muitas vezes ilicitas o que acabam o reinserindo novamente dentro do sistema socioeducativo

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4 CONCLUSAtildeO

A sociedade capitalista influenciada pelas praacuteticas neoliberais provoca a cada dia o aumento do desemprego este que impede a ascensatildeo da classe trabalhadora por uma nova e contraditoacuteria manei-ra de ver o trabalho onde se impulsiona uma maior qualificaccedilatildeo e ao mesmo tempo a desqualificaccedilatildeo

Esta situaccedilatildeo eacute caracteriacutestica de um sistema neoliberal que por exemplo no caso dos adolescentes em conflito com lei acabam por natildeo receber uma educaccedilatildeo que os possibilite de ingressar no mercado formal dentro dos ambientes socioeducativos de maneira que estejam realmente preparados para enfrentar o elevado o niacutevel de exigecircncia e de escolarizaccedilatildeo

Sem a escolarizaccedilatildeo necessaacuteria que deveria ser proporcionada dentro e fora dos sistemas socioedu-cativos esses adolescentes reingressam na sociedade sem a qualificaccedilatildeo profissional e experiecircncia de trabalho exigidas o que aumenta dificuldade de ingresso no mercado e a probabilidade de reincidecircncia por outros atos infracionais que por muitas vezes satildeo para sustentar viacutecios e outras necessidades que garantem sua sobrevivecircncia fisioloacutegica

Destaco aqui que pobreza natildeo estaacute vinculada a criminalidade mas devemos observar quais seriam as reais chances destes jovens em conflito com a lei possuem de refazerem suas vidas dentro de uma sociedade capitalista marcada pela desigualdade social e pelo discurso dominante disseminado pelo poder simboacutelico

Com o propoacutesito de diminuir a reincidecircncia desses jovens nos sistemas se faz necessaacuterio a modificaccedilatildeo concreta suas vidas que comeccedilaria pela implantaccedilatildeo de poliacuteticas puacuteblicas efetivas que garantam ao mesmo tempo seus direitos fundamentais e condiccedilotildees dignas de estudo e trabalho

Assim as medidas socioeducativas deveriam priorizar e auxiliar esses jovens na superaccedilatildeo da condiccedilatildeo de exclusatildeo redirecionando-os para a inserccedilatildeo social principalmente atraveacutes da educaccedilatildeo que eman-cipa os jovens de sua situaccedilatildeo infracional bem como amplia sua visatildeo criacutetica do mundo

Outra forma tambeacutem seria investir em programas de poliacuteticas puacuteblicas para a elevaccedilatildeo das condiccedilotildees escolares e laborais para a efetivaccedilatildeo das medidas socioeducativas bem como na construccedilatildeo da escola unitaacuteria que segundo Gramsci (1991) seria a escola natildeo hierarquizada de acordo com as classes sociais mais ou menos favorecidas mas sim escolas de todos os niacuteveis de ensino que prepare de maneira igual os indiviacuteduos agraves mesmas oportunidades profissionais

Entendemos que a escola unitaacuteria poderia ser uma boa alternativa para reverter a situaccedilatildeo onde o poder simboacutelico atraveacutes do discurso dominante poderia perder sua forccedila e impediria o avanccedilo dos reflexos neoliberais na educaccedilatildeo principalmente no que tange as praacuteticas socioeducativas

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REFEREcircNCIAS

ANDRIOLI Antocircnio I O que haveria de positivo no neoliberalismo In Correio da Cidadania Satildeo Paulo 13 a 20 de nov de 1999

BRASIL Panorama Nacional a Execuccedilatildeo de Medidas Socioeducativas de Internaccedilatildeo Conselho Nacional de Justiccedila (CNJ) 2012 BRASIL Conselho Nacional do Ministeacuterio Puacuteblico

BOURDIEU Pierre O poder simboacutelico Rio de Janeiro Bertrand Brasil 2003

FREIRE Paulo Learning to Question A Pedagogy of LiberationPraeger Publishers 1989

FRIGOTTO Gaudencio A produtividade da escola improdutiva 5ed Satildeo Paulo Cortez 1999

GRAMSCI Antocircnio Cadernos do caacutercere Os intelectuais O princiacutepio educativo Jornalismo Rio de Janeiro Civilizaccedilatildeo Brasileira 2001 V2

HARVEY David Breve Histoacuteria del Neoliberalismo Madrid Akal 2007

MARX K O 18 Brumaacuterio ldquoCartas a Kulgelmannrdquo 7 ed Rio de Janeiro Paz e Terra 1997

DE DIREITO

DIREITODE SUSTENTABILIDADE JURIacuteDICA E SISTEcircMICA

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REPUTACcedilAtildeO DIGITAL NO FACEBOOK SUSTENTABILIDADE EMPRESARIAL E O CONSUMIDOR

DIGITAL REPUTATION ON FACEBOOK BUSINESS SUSTAINABILITY AND THE CONSUMERAdriano Augusto Fidalgo1

Resumo O presente estudo versa sobre a Reputaccedilatildeo Digital no Facebook Sustentabilidade Empresarial e o Consumidor Buscou-se harmonizar o conviacutevio de todas essas premissas de modo con-comitantemente jaacute que todos tecircm importacircncia e funccedilatildeo social inclusive embasados em princiacutepios de ordem constitucional Em Reputaccedilatildeo Digital no Facebook se viram conceitos enfrentou-se os imaginaacute-veis conflitos entre liberdade de expressatildeo e vedaccedilatildeo ao anonimato a exposiccedilatildeo de dispositivos legais de interesse do Marco Civil e a importacircncia do CONAR Em Sustentabilidade Empresarial se apresen-tou a importacircncia da sustentabilidade das corporaccedilotildees as ferramentas de Governanccedila Corporativa Compliance Gestatildeo de Riscos Auditoria Juriacutedica e se ilustrou o direito ao esquecimento Em sede de Consumidor elencou-se alguns princiacutepios de direito do consumidor relatou-se incidentes de consumo a importacircncia dos sites de reclamaccedilatildeo explicitou-se a eticidade digital observou-se os casos praacuteticos e a atribuiccedilatildeo de indenizaccedilatildeo pelos abusos da liberdade de expressatildeo Em conclusatildeo com alicerce no princiacutepio da dignidade da pessoa humana constatou-se que eacute possiacutevel a convivecircncia de todos esses valores declinados de modo sistecircmico e em uacuteltima instacircncia o Judiciaacuterio atuaraacute para fulminar os abu-sos quando a empresa for atacada indevidamente no Facebook com a maacutecula indevida de sua reputa-ccedilatildeo digital notadamente quando o consumidor incorrer em abuso de direito

Palavras-Chaves Reputaccedilatildeo Digital Facebook Sustentabilidade Empresarial Consumidor Liberdade de expressatildeo

Abstract The present study deals with Digital Reputation in Facebook Business Sustainability and the Consumer It was sought to harmonize the conviviality of all these premises concomitantly since all have impor-tance and social function even based on principles of constitutional order In Digital Reputation on Facebook one sees concepts faced the imaginable conflicts between freedom of expression and fence to anonymity the exhibition of legal devices of interest of the Civil Code and the importance of the CONAR In Corporate Sustainability the importance of corporate sustainability the tools of Corporate Governance Compliance Risk Management and Legal Audit were presented and the right to forgetfulness was illustrated In Consumerrsquos office some principles of consumer law were mentioned incidents of consumption were reported the impor-tance of complaint sites digital ethics was explained the practical cases and the award of compensation for freedom of expression In conclusion based on the principle of the dignity of the human person it was veri-fied that it is possible to coexist with all these declined values in a systemic way and in the last instance the Judiciary will act to fulfill the abuses when the company is attacked improperly on Facebook with the undue blurring of its digital reputation especially when the consumer incurs abuse of rights

Key Words Reputation Digital Facebook Sustainability Business Consumer Freedom expression

1 Mestrando em Educaccedilatildeo Especialista em Computaccedilatildeo Forense pela Universidade Presbiteriana Mackenzie

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1 INTRODUCcedilAtildeO

Observar-se-aacute no mundo fenomecircnico as situaccedilotildees de incidentes digitais que coloquem em exposiccedilatildeo agrave destacada reputaccedilatildeo digital das empresas As redes sociais vecircm cada vez mais gerando informaccedilotildees que estatildeo sendo utilizadas como provas judiciais segundo destacado por Melo (2013 [1-])

Em breve siacutentese para o presente artigo se adotaraacute que reputaccedilatildeo digital eacute a boa fama mantida no universo eletrocircnico ou digital ou seja nas redes sociais sites e aplicativos em que uma empresa possa estar exposta especialmente considerando a sua importacircncia no mundo corporativo assim como os seus efeitos reais

Sendo um dos diacutesticos da empresa a sua marca um bem incorpoacutereo e intangiacutevel mas salutar para qual-quer pessoa juriacutedica de direito privado portanto merece total respaldo legal Como bem explicou Roque (1996 p 156)

A lsquomarcarsquo eacute um dos elementos de identificaccedilatildeo da empresa Eacute o nome ou o traccedilo distintivo de um

produto ou serviccedilo de tal maneira que estes fiquem bem identificados Por exemplo haacute diversas

marcas de televisores Sharp Sanyo National Telefunken Panasonic CCE Haacute tambeacutem vaacuterias

marcas de automoacuteveis Santana Verona Monza Ocircmega e outras Essas marcas soacute podem ser

exploradas pela empresa detentora dos direitos de uso delas devidamente registrada no INPI

Assim o liquidificador Arno soacute poderaacute ser fabricado e comercializado pela empresa que patenteou

essa marca no INPI quem fabricar e vender produto semelhante com essa marca estaraacute incorrendo

em concorrecircncia desleal e uso indevido de marca alheia sujeito portanto agraves penas da lei

Ou como sucintamente define Gusmatildeo (2002 p 15) ldquoMarca eacute o sinal distintivo de determinado pro-duto serviccedilo ou mercadoria visualmente perceptiacutevel e natildeo compreendido nas proibiccedilotildees legais Identifica direta e indiretamente produtos ou serviccedilosrdquo Ademais devem as corporaccedilotildees lutar por sua marca e reputaccedilatildeo seja no mundo fiacutesico seja no mundo eletrocircnico sendo essa uma prerrogativa ina-lienaacutevel e um dever de seus gestores

2 MATERIAL E MEacuteTODOS

O presente artigo seguiraacute caminho dialeacutetico empiacuterico com a observacircncia da legislaccedilatildeo aplicaacutevel e o estudo de casos narrados pela imprensa para subsequentes conclusotildees Com a devida anaacutelise biblio-graacutefica ainda que se considere o caraacuteter exploratoacuterio do artigo pois natildeo haacute trabalhos tratando do tema em especiacutefico que tem caraacuteter interdisciplinar e transdisciplinar

Como sabido o Facebook eacute a maior rede social do mundo inclusive alguns entendem ser tal rede maior que a proacutepria internet conforme notiacutecia recentemente divulgada no site do Jornal o Estado de Satildeo Paulo por Silvestre (2016 [1-])

Natildeo eacute novidade dizer que o Facebook eacute a maior rede social do mundo com mais de 15 bilhatildeo

de usuaacuterios Para muita gente ele eacute maior que a proacutepria Internet Mas esse erro de anaacutelise

natildeo eacute inoacutecuo ele estaacute causando impactos decisivos na vida de todos noacutes e pouca gente parece

perceber isso

Tal plataforma abre um importante campo de comunicaccedilatildeo sem filtro para que os consumidores faccedilam criacuteticas a produtos e a serviccedilos que natildeo lhe tenham trazido agrave satisfaccedilatildeo esperada ou de outro lado inclusive lhe tenham causado dano O que torna a rede social um campo propiacutecio para grande exposiccedilatildeo dos consumidores e das empresas colocando em destaque a credibilidade empresarial transforman-do a rede social em um ldquotribunal popularrdquo por vezes se achincalhando pessoas fiacutesicas e pessoas juriacutedi-cas por frustraccedilotildees ocorridas nas relaccedilotildees de consumo

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A liberdade de expressatildeo em nosso ordenamento juriacutedico tem status de direito constitucional2 Permite que o emitente de um pensamento de expresse sem censura Contudo como todo direito a liberdade de expressatildeo natildeo eacute um direito ilimitado pelo contraacuterio todos os direitos inclusive constitu-cionais encontram limites em outros direitos correlatos ou que lhe deem uma estruturaccedilatildeo

Some-se a isso que a autotutela sempre dever ser vista com ressalvas pelo direito Natildeo pode o cidadatildeo comum mesmo que sendo uma pessoa de bem mesmo que tenha tido um direito vilipendiado por uma empresa comeccedilar a fazer direito com as proacuteprias matildeos sem limites criando ldquonormasrdquo ldquoinvestigandordquo ldquoacusandordquo e ldquosentenciandordquo Isso eacute um perigo flagrantemente antidemocraacutetico sem sombra de duacutevidas

Nesta direccedilatildeo explanou Moraes (1999 p 67-68)

A manifestaccedilatildeo do pensamento eacute livre e garantida em niacutevel constitucional natildeo aludindo a

censura preacutevia em diversotildees e espetaacuteculos puacuteblicos Os abusos porventura ocorridos no

exerciacutecio indevido da manifestaccedilatildeo do pensamento satildeo passiacuteveis de exame e apreciaccedilatildeo pelo

Poder Judiciaacuterio com a consequente responsabilidade civil e penal de seus autores decorrentes

inclusive de publicaccedilotildees injuriosas na imprensa que deve exercer vigilacircncia e controle da

mateacuteria que divulga

Em 2015 o intelectual Eco proferiu as seguintes ponderaccedilotildees sobre as redes sociais a saber

Criacutetico do papel das novas tecnologias no processo de disseminaccedilatildeo de informaccedilatildeo o escritor e filoacutesofo

italiano Umberto Eco afirmou que as redes sociais datildeo o direito agrave palavra a uma lsquolegiatildeo de imbecisrsquo que

antes falavam apenas lsquoem um bar e depois de uma taccedila de vinho sem prejudicar a coletividadersquo

Se decirc um lado temos a liberdade de expressatildeo (artigo 5ordm IV da Constituiccedilatildeo Federal) nas palavras da carta constitucional ldquoeacute livre a manifestaccedilatildeo do pensamentordquo na mesma oraccedilatildeo o diploma constitucio-nal sentencia ldquosendo vedado o anonimatordquo Portanto uma dicotomia que em nada carrega contradiccedilatildeo em termos apenas um princiacutepio refreando o outro na mesma oraccedilatildeo Inclusive o inciso V do artigo 5ordm acima informado trata do direito de resposta e das possibilidades de indenizaccedilatildeo

Neste sentido bem aclara Silva (1994 p 238) apontando os ocircnus da liberdade de expressatildeo ipsis litteris

A liberdade de manifestaccedilatildeo do pensamento tem seus ocircnus tal como o de o manifestante

identificar-se assumir claramente a autoria do produto do pensamento manifestado para

em sendo o caso responder por eventuais danos a terceiros Daiacute por que a Constituiccedilatildeo veda o

anonimato A manifestaccedilatildeo do pensamento natildeo raro atinge situaccedilotildees juriacutedicas de outras pessoas

a que corre o direito tambeacutem individual e fundamental de resposta O art 5ordm V o consigna nos

termos seguintes eacute assegurado o direito de resposta proporcional ao agravo aleacutem da indenizaccedilatildeo

por dano material moral ou agrave imagem Esse direito de resposta como visto antes eacute tambeacutem uma

garantia de eficaacutecia do direito agrave privacidade Esse eacute um tipo de conflito que se verifica com

bastante frequecircncia no exerciacutecio da liberdade de informaccedilatildeo e comunicaccedilatildeo Importante que

a Constituiccedilatildeo assume a tese da indenizabilidade do dano moral problema controvertido na

doutrina mas jaacute razoavelmente estudado

O artigo 2ordm do Marco Civil disciplinando o uso da internet no Brasil tem como fundamento o respeito agrave liberdade de expressatildeo assim como outros valores O inciso II estabelece que ldquoos direitos humanos o desenvolvimento da personalidade e o exerciacutecio da cidadania em meios digitaisrdquo Jaacute o inciso V preza pela ldquolivre iniciativa a livre concorrecircncia e a defesa do consumidorrdquo E o inciso VI elenca ldquoa finalidade social da rederdquo

2 ldquoArt 5ordm Todos satildeo iguais perante a lei sem distinccedilatildeo de qualquer natureza garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no

Paiacutes a inviolabilidade do direito agrave vida agrave liberdade agrave igualdade agrave seguranccedila e agrave propriedade nos termos seguintes[] IV - eacute livre a manifestaccedilatildeo do pensamento sendo vedado o anonimato

[] V - eacute assegurado o direito de resposta proporcional ao agravo aleacutem da indenizaccedilatildeo por dano material moral ou agrave imagemrdquo

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O artigo 3ordm volta a tratar da liberdade de expressatildeo conforme caput e inciso I a saber ldquoArt 3o A disci-plina do uso da internet no Brasil tem os seguintes princiacutepios I - garantia da liberdade de expressatildeo comunicaccedilatildeo e manifestaccedilatildeo de pensamento nos termos da Constituiccedilatildeo Federal []rdquo De outro lado assim como ocorrido no artigo 2ordm inciso V que trata da proteccedilatildeo do consumidor o artigo 7ordm inciso XIII volta a tratar do tema ldquoArt 7o O acesso agrave internet eacute essencial ao exerciacutecio da cidadania e ao usuaacuterio satildeo assegurados os seguintes direitos [] XIII - aplicaccedilatildeo das normas de proteccedilatildeo e defesa do consumidor nas relaccedilotildees de consumo realizadas na internet []rdquo

Portanto nota-se que satildeo dois princiacutepios observados pelo Marco Civil a liberdade de expressatildeo e a proteccedilatildeo e defesa do consumidor Tambeacutem estampado o da livre iniciativa referendando a importacircn-cia das empresas a sua existecircncia e o seu funcionamento De modo que os princiacutepios devem aqui ser compatibilizados e conviverem

Um dos princiacutepios trazidos pelo Marco Civil foi o da necessidade de educaccedilatildeo digital inscrito nos arti-gos 26 e 29 do referido diploma Segundo o artigo 932 I do Coacutedigo Civil os pais satildeo responsaacuteveis pelos atos civis de seus filhos Portanto ao postar ou compartilhar algo os adultos satildeo responsaacuteveis pelo que publicam aleacutem de serem responsabilizados pelos de seus filhos menores Pois pode ocorrer de um menor ofender uma empresa ou seus prepostos pela internet algo ateacute relativamente usual nos dias atuais

Hoje em dia quando se coloca um anuacutencio ou qualquer propaganda de veiculaccedilatildeo puacuteblica seja em raacutedios televisotildees e jornais ou ainda seja nas redes sociais sites e miacutedias correlatas o veiculador agecircn-cia de propagando ou anunciante poderaacute ser instado a ldquoprestar contasrdquo (no sentido de ser indagado) junto ao CONAR Mesmo natildeo sendo ele um oacutergatildeo puacuteblico exerce uma funccedilatildeo puacuteblica e que deteacutem um status de respeito puacuteblico notadamente no ramo de publicidade e propaganda

As situaccedilotildees que acabam nas raias do CONAR satildeo aquelas que ataquem a moral o bom senso comum e que satildeo informadas por consumidores ou por seus Conselheiros de ofiacutecio inclusive as suas normas falam em algumas passagens de proteccedilatildeo a dignidade da pessoa humana Mas as mais comuns satildeo as denuacutencias de cunho machista sexista desrespeito ao consumidor desrespeito aos idosos desrespeito as crianccedilas e etc Apenas para ilustrar mas podem ocorrer casos de natildeo cumprimento da oferta propa-ganda enganosa e demais que violem a legislaccedilatildeo ou a moral dominante

Os nuacutemeros de 2015 do referido oacutergatildeo ficaram da seguinte maneira conforme destaca o seu site no que se refere agrave quantidade de processos por laacute instaurados

NuacutemerosProcessos Instaurados 241Anuacutencios Sustados 44Instaurados por Queixa do Consumidor 128Instaurados por Denuacutencia de Autoridade 7Conciliaccedilotildees 53

Normativamente rege o setor o Coacutedigo Brasileiro de Autorregulamentaccedilatildeo Publicitaacuteria emitido pelo CONAR O artigo 50 do referido Coacutedigo especifica as penalidades aplicaacuteveis ao setor

Da anaacutelise dos dados de 2015 verificam-se as seguintes estatiacutesticas no que tange a reclamaccedilotildees de consumidores em termos percentuais apresentaccedilatildeo verdadeira (301) respeitabilidade (239) responsabilidade social (129) adequaccedilatildeo as leis (37) cuidados com o puacuteblico infantil (117) dis-criminaccedilatildeo (37) padrotildees de dececircncia (49) e diversos 92)

Como se nota antes de veicular um anuacutencio uma propaganda ou uma mensagem institucional (que pode ser considerado anuacutenciopropaganda ainda que natildeo seja) as empresas tecircm que sempre buscar auxiacutelio especializado pois aleacutem de em tese poderem infringir normas basilares como a Constituiccedilatildeo

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Federal o Coacutedigo de Defesa do Consumidor e demais legislaccedilatildeo esparsa importante observar o Coacutedigo Brasileiro de Autorregulamentaccedilatildeo Publicitaacuteria com o arrimo de um advogado com experiecircn-cia frente ao oacutergatildeo para a boa resoluccedilatildeo da eventual demanda ocorrida

No amago deste artigo a sustentabilidade se aflora quando a empresa sempre ao postar algo em sua rede social com certa dose de clarividecircncia deve pensar e repensar na repercussatildeo que aquele con-teuacutedo teraacute E quando um incidente surgir por suscitaccedilatildeo de um consumidor sempre observar em que aquilo pode afetar o seu negoacutecio sua marca seus demais consumidores e etc

A sustentabilidade natildeo eacute apenas relativa agrave preservaccedilatildeo da natureza como se pensou por muito tempo As corporaccedilotildees devem agir de modo sustentaacutevel seja respeitando a natureza seja preservando aos seus funcionaacuterios seja preservando os colaboradores seja mantendo as suas financcedilas em dia seja natildeo se envolvendo em casos de corrupccedilatildeo Jaacute que muitos empregos dependem do sucesso daquela institui-ccedilatildeo aleacutem da sua importacircncia para a economia local e nacional

Como bem explicita Nalini (2011 p 128) sobre a estrita ligaccedilatildeo tambeacutem existente entre a sustentabi-lidade e a eacutetica

Sustentabilidade eacute uma concepccedilatildeo eminentemente eacutetica O aspecto moral estaacute em pensar no

proacuteximo Natildeo se imagina que a empresa soacute pense no proacuteximo Ela eacute uma organizaccedilatildeo que visa o lucro

Natildeo eacute entidade filantroacutepica Mas pode pensar tambeacutem no proacuteximo Uma concepccedilatildeo adequada de

sustentabilidade leva em conta os dois aspectos obter lucro e disseminar as boas praacuteticas

Ou numa senda mais internacional assim defendem Menezes e Nogueira (2011 p 363) referendando que se deve pensar sobre o tema de modo global

Dessa forma natildeo se pode encarar a sustentabilidade como um conceito meramente interno

nacional Isto porque eg uma empresa norte-americana decide abrir uma filial na China

apenas pelo fato da legislaccedilatildeo ambiental e trabalhista ser muito mais fluida do que a de seu paiacutes

de origem temos uma distorccedilatildeo no mercado que impede de atingir o livre comeacutercio um vez que

natildeo se produz um conceito miacutenimo obrigacional que os Estados devem ter para coibir algumas

praacuteticas ou para que as empresas atuem de forma justa em seu territoacuterio

Deste modo tambeacutem se pode constatar que ser sustentaacutevel eacute agir de modo eacutetico E a eacutetica ganha con-tornos universais globais natildeo se pode mais pensar somente de modo micro eis que com uma anaacutelise macro todos podem vencer com nossos atos positivos e dignificantes inclusive os que ocorrem sem grandes pretensotildees e de modo superficial nas redes sociais As empresas vem buscando repassar prin-ciacutepios eacuteticos dentro do que se chama Governanccedila Corporativa

Segundo definiccedilatildeo do Instituto Brasileiro de Governanccedila Corporativa

Governanccedila Corporativa eacute o sistema pelo qual as organizaccedilotildees satildeo dirigidas monitoradas e

incentivadas envolvendo as praacuteticas e os relacionamentos entre proprietaacuterios conselho de

administraccedilatildeo diretoria e oacutergatildeos de controle As boas praacuteticas de Governanccedila Corporativa

convertem princiacutepios em recomendaccedilotildees objetivas alinhando interesses com a finalidade de

preservar e otimizar o valor da organizaccedilatildeo facilitando seu acesso ao capital e contribuindo

para a sua longevidade

Vale dizer que a oacutetima Governanccedila Corporativa tem o escopo de manter a confiabilidade de uma empresa para os seus acionistas mantendo a organizaccedilatildeo de maneira sustentaacutevel De modo a respeitar a comu-nidade local ter um plano de carreira definido aos seus colaboradores dar formaccedilatildeo para evoluccedilatildeo de todos os seus parceiros ter postura eacutetica honrar os seus compromissos manter-se em dia com os seus pagamentos de tributos e passivo trabalhista e ainda procedimentos adequados agrave legislaccedilatildeo do paiacutes (Compliance) de modo a visar a sua perpetuaccedilatildeo como uma empresa soacutelida e economicamente viaacutevel

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Neste sentir Periard (2009) de forma clara destacou os benefiacutecios da Governanccedila Corporativa a saber

A boa Governanccedila Corporativa contribui para um desenvolvimento econocircmico sustentaacutevel

proporcionando melhorias no desempenho das empresas aleacutem de maior acesso a fontes

externas de capital Por estes motivos torna-se tatildeo importante ter conselheiros qualificados

e sistemas de Governanccedila Corporativa de qualidade Evitando-se assim diversos fracassos

empresariais decorrentes de a) Abusos de poder ndash Do acionista controlador sobre minoritaacuterios

da diretoria sobre o acionista e dos administradores sobre terceiros b) Erros estrateacutegicos ndash

Resultado de muito poder concentrado no executivo principal c) Fraudes ndash Uso de informaccedilatildeo

privilegiada em benefiacutecio proacuteprio atuaccedilatildeo em conflito de interesses

Vale dizer ainda que conforme apontam os especialistas o maior escacircndalo de corrupccedilatildeo do paiacutes apu-rado na Operaccedilatildeo Lava Jato trata-se de um exemplo claacutessico de falha grave ou ausecircncia de Governanccedila o que gerou a notiacutecia intitulada ldquoFalhas em governanccedila custaratildeo ateacute US$ 59 bi agrave Petrobraacutes diz estudordquo apontando os prejuiacutezos o cerne da publicaccedilatildeo (ALVES 2015 [1-])

Segundo estudo da consultoria europeia Management amp Excellence processos civis

trabalhistas tributaacuterios entre outros devem render agrave estatal um custo de US$ 59 bilhotildees sem

contar eventuais indenizaccedilotildees que a empresa venha a ter que pagar por processos movidos por

investidores nos EUA por conta do escacircndalo de corrupccedilatildeo investigado pela Lava Jato Para

efeito de comparaccedilatildeo o valor de mercado da companhia era de US$ 314 bilhotildees segundo dados

da BMampFBovespa referentes ao valor de fechamento de quarta-feira

Desta forma nota-se com um caso praacutetico a relevacircncia da Governanccedila Corporativa como fundamental instrumento de diagnoacutestico e prognoacutestico para as instituiccedilotildees Sendo elementar para atuar de modo preventivo evitando diversas situaccedilotildees desagradaacuteveis agraves instituiccedilotildees Vale dizer brevemente que dentro de uma instituiccedilatildeo as aacutereas de Compliance Auditoria Interna e Gestatildeo de Riscos dentre outros satildeo os sustentaacuteculos que compotildee o plexo formador da Governanccedila Corporativa

Conforme cartilha da BMampF BOVESPA a Compliance vai muito aleacutem da conformidade com a legislaccedilatildeo exterior pois se trata de uma questatildeo eacutetica e de cumprimento da normatizaccedilatildeo interna da empresa conforme se lecirc de alguns exemplos a seguir coletados

Disseminar a presente poliacutetica

bull Estruturar implementar e disseminar o Programa de Integridade aos profissionais da

Companhia fiscalizando o seu cumprimento e coordenando os treinamentos perioacutedicos

bull Auxiliar as aacutereas de negoacutecio na anaacutelise de suas estruturas produtos e serviccedilos a fim de alinhaacute-

los agraves normas emitidas pelos oacutergatildeos reguladores e agrave estrutura normativa interna

bull Acompanhar os planos de accedilatildeo quando verificar conduta ou ato em desacordo com as normas

emitidas pelos oacutergatildeos reguladores aplicaacuteveis agrave Companhia

bull Relatar a ocorrecircncia de ato que constitua iliacutecito administrativo civil ou penal ao Conselho de

Administraccedilatildeo agrave Diretoria Executiva e agrave Diretoria Juriacutedica

bull Produzir relatoacuterios mensais com os resultados dos trabalhos referentes ao acompanhamento

da demanda dos oacutergatildeos reguladores submetidos ao Conselho de Administraccedilatildeo e agrave Diretoria

Executiva

bull Participar de discussotildees a respeito de projetos ou alteraccedilotildees normativas objeto de audiecircncia

ou consultas puacuteblicas

bull Coordenar os processos referentes ao Coacutedigo de Conduta sem prejuiacutezo das atribuiccedilotildees do

Comitecirc do Coacutedigo de Conduta

Destarte mostra-se o quatildeo a Compliance tem importacircncia iacutempar dentro das corporaccedilotildees mas cujos refluxos saltaratildeo extra muros efetivando-se a prevenccedilatildeo contra problemas na aacuterea do direito do con-sumidor e digital aqui nosso foco maacuteximo aleacutem da manutenccedilatildeo da boa imagem da empresa perante terceiros junto aos seus funcionaacuterios e com os oacutergatildeos reguladores Isto eacute dignificando a reputaccedilatildeo empresarial e suscitando a perenidade da marca

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A temaacutetica eacute polecircmica Tanto haveraacute os que defenderatildeo o direito da empresa de natildeo ser atacada ou ao menos que a reclamaccedilatildeo seja restrita aos limites do problema assim como alguns entenderatildeo que a manifestaccedilatildeo exacerbada tambeacutem eacute iliacutecita jaacute que natildeo daacute direito do consumidor usar palavras vulgares ou atacar a honra dos soacutecios da empresa Efeitos colaterais do empoderamento dos consumidores nas redes sociais

Um caso bem evidente de que a Gestatildeo de Riscos nas redes sociais eacute fundamental se materializou pela polecircmica ocorrida em fevereiro de 2016 no bar Quitandinha Vila Madalena em Satildeo Paulo em que a reputaccedilatildeo da empresa foi desgastada pela acentuada exposiccedilatildeo conforme notiacutecia que segue

O bar Quitandinha divulgou um viacutedeo com imagens de cacircmeras de seguranccedila do estabelecimento

da Vila Madalena na Zona Oeste de Satildeo Paulo que supostamente exibe o caso de asseacutedio sexual

relatado por uma mulher no dia 5 de fevereiro no Facebook O viacutedeo foi publicado na segunda-

feira (15) e editado em conjunto com trechos da denuacutencia legendas e sem aacuteudio Veja o viacutedeo

aqui A mulher relatou em seu post no Facebook que ela e uma amiga foram abordadas por dois

homens no bar no dia 4 de fevereiro Apoacutes serem ignorados eles as teriam xingado e agredido

Ela afirma ter recorrido ao garccedilom e ao gerente e conta que ao inveacutes de ajudaacute-las os funcionaacuterios

do bar explicaram que tratavam-se de clientes de longa data e solicitaram que o seguranccedila as

expulsasse do local O post teve mais de 130000 likes e mais de 40000 compartilhamentos

Independentemente da culpa de lado a lado o que se tem por certo eacute que a situaccedilatildeo natildeo foi gerida da melhor forma por todos os envolvidos expondo a reputaccedilatildeo do estabelecimento comercial

Como se pode notar de um caso relatado no Conjur mateacuteria assinada por Rover (2013 [1-]) tratando como exerciacutecio regular de direito a prerrogativa dos consumidores poderem reclamar

O consumidor que foi prejudicado por uma empresa pode publicar queixa na internet em

sites de reclamaccedilotildees inclusive sendo lsquoaceitaacutevel seu exacerbado inconformismo e ateacute mesmo

certa exasperaccedilatildeo de linguagemrsquo Aleacutem disso o site que oferece este tipo de serviccedilo natildeo possui

responsabilidade civil por danos morais decorrentes da inserccedilatildeo pelo usuaacuterio em sua paacutegina

virtual de mateacuteria ofensiva agrave honra de terceiro

Por outra vertente Milagre (2013 [1-]) expondo que as reclamaccedilotildees nas redes sociais ou sites de defe-sa do consumidor devem ter limites

Recentemente fui solicitado para consultoria em uma empresa que estaria passando por um

problema Segundo o cliente a empresa estaria sendo difamada na Internet por um consumidor

Difamada por um consumidor Ao acessar o site de reclamaccedilotildees pude constatar que natildeo se

tratava de uma mera reclamaccedilatildeo mas de um discurso de oacutedio lsquoEspeluncarsquo lsquolixorsquo lsquobando de

safadosrsquo eram alguns dos adjetivos que podemos citar A questatildeo era de um viacutecio no produto

A mensagem identificava os soacutecios suas casas familiares e generalizava os rotulando como

peacutessimos prestadores De fato ocorreu um problema pontual mas o consumidor jamais

procurara a empresa preferindo desfilar sua ira nas redes sociais impactando na imagem da

empresa para milhares de pessoas No Google a reclamaccedilatildeo passou a ser a primeira referecircncia

quando se buscava pelo nome da empresa que atuava no mercado haacute mais de vinte anos e que

em sua trajetoacuteria colecionava premiaccedilotildees e reconhecimento puacuteblico

Como se nota qualquer vacilo do empresaacuterio ou uma falta de atendimento adequado poderaacute ser um gatilho para um incidente de consumo De outro lado cabe ao empresariado ver se a situaccedilatildeo natildeo foi reclamada por um perfil fake patrocinada por um inimigo ou concorrente por exemplo Indagar se a pessoa que reclama realmente fora sua cliente E inferir de modo investigativo ateacute que ponto aquela reclamaccedilatildeo eacute justa e natildeo extrapola o direito do consumidor Valendo relembrar que ningueacutem tem direi-to ilimitado em algum assunto todos os direitos se limitam por outros direitos

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Revista Juriacutedica da Universidade do Sul de Santa Catarina

Desta maneira criar uma mentalidade de eacutetica digital eacute crucial Ensinar aos jovens a criar uma reputa-ccedilatildeo digital eacute elementar Pois muitas empresas contratam considerando os perfis das pessoas nas redes sociais antes e durante a contrataccedilatildeo

Nessa levada o homem eacute um ser eacutetico E a dignidade da pessoa humana sempre deve ser o centro das atenccedilotildees Com essa observaccedilatildeo pontuaram Rocasolano e Silveira (2010 p 35)

Pode-se afirmar destarte que o ser humano natildeo se limita a viver uma vida casual e determinada

apenas pelos processos naturais o homem constroacutei a sua proacutepria histoacuteria fruto das suas

constantes decisotildees histoacuterico-seletivas Enfatiza-se a ideia do ser humano como ente que eacute e

que deve ser consciente dessa dignidade Eacute precisamente da autoconsciecircncia acerca de sua

dignidade que surge o conceito de pessoa segundo o qual o homem natildeo eacute homem apenas porque

existe mas pelo significado que adquire sua proacutepria vida

Interessante notar que a eacutetica estaacute em total antagonismo com a corrupccedilatildeo Um grande mal do paiacutes arraigado fortemente em nossa cultura Jaacute antevendo os escacircndalos da Lava Jato e correlatos assim bem detalhou Lucca (2009 p 364) fazendo referecircncias a outro autor

A verdade eacute que a chamada retoacuterica do poder jaacute enfastiou a todos Ningueacutem suporta mais o

descalabro eacutetico da sociedade brasileira A classe empresarial ndash diz-nos com propriedade o

escritor e empresaacuterio Mario Ernesto Humberg ndash possui a grande responsabilidade de liderar

a mudanccedila eacutetica no Paiacutes mostrando que a lsquoroda do futuro comeccedila a girar de forma diferentersquo e

asseverando que alguns empresaacuterios lsquojaacute estatildeo sensibilizados para essa necessidade de adotar

princiacutepios eacuteticos nos seus negoacutecios e estatildeo assumindo essa responsabilidadersquo

Especificamente sobre eticidade digital expuseram Freitas Whitaker e Sacchi (2006 p 16) deste modo

Isso significa que as altas heranccedilas das empresas devem estar empenhadas em se atualizar e

assessorar-se para estabelecer um processo de comunicaccedilatildeo em suas organizaccedilotildees tendo em

vista essa nova ordem instalada na sociedade atual geradora de tantas inovaccedilotildees Inovaccedilotildees

natildeo somente de ferramentas colocadas agrave disposiccedilatildeo de todos (a informaccedilatildeo por exemplo

hoje natildeo eacute privileacutegio de alguns estaacute disseminada por toda parte) mas tambeacutem inovaccedilotildees

provocadas na pessoa em diretores acionistas colaboradores concorrentes fornecedores e

clientes das empresas Deve haver um esforccedilo de aperfeiccediloamento contiacutenuo estruturado pelas

altas lideranccedilas das empresas direcionado a todos os seus stakeholders Isso exige constante e

permanente atenccedilatildeo com a conotaccedilatildeo eacutetica das atitudes das pessoas

De um vieacutes acurado se nota que a eticidade digital auxiliaacuteria a resoluccedilatildeo de dilemas notadamente nas relaccedilotildees de consumo no Facebook como tratado por aqui Duelando estaratildeo o direito a manifestaccedilatildeo do pensamento frente o respeito agrave reputaccedilatildeo digital da empresa

Para ajudar a dirimir tal aparente conflito traz-se a baila a hermenecircutica juriacutedica conforme bem fun-damento por Ferraz Jr (1994 p 308)

Deste modo a hermenecircutica possibilita uma espeacutecie de neutralizaccedilatildeo dos conflitos sociais ao

projetaacute-los dimensatildeo harmoniosa ndash o mundo do legislador racional ndash na qual em tese se tornam

todos decidiacuteveis Ela natildeo elimina assim as contradiccedilotildees mas as torna suportaacuteveis Portanto natildeo

as oculta propriamente mas as disfarccedila trazendo-as para o plano das suas conceptualizaccedilotildees

Repete-se pois na hermenecircutica o que ocorre com a dogmaacutetica analiacutetica (supra 44) Enquanto

esta poreacutem exerce sua funccedilatildeo ao isolar o direito num sistema o saber interpretativo conforma

o sentido do comportamento social agrave luz da incidecircncia normativa Ela cria assim condiccedilotildees

para a decisatildeo Mas natildeo diz como deve ocorrer a decisatildeo Para isso existe um terceiro modelo

dogmaacutetico que toma a proacutepria decisatildeo como seu objeto privilegiado

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A necessidade de educaccedilatildeo digital jaacute eacute uma realidade indesculpaacutevel Urge que a sociedade de um modo geral e as corporaccedilotildees natildeo descuide disso com urgecircncia para ontem Enfrentaraacute o presente toacutepico algu-mas situaccedilotildees praacuteticas relatando decisotildees ou notiacutecias de condenaccedilotildees impostas aos consumidores observando-se a casuiacutestica como tem atuado o Judiciaacuterio para coibir os abusos da liberdade de expressatildeo

Em notiacutecia do site juriacutedico Conjur (2015 [1-]) um consumidor foi condenado por acusar uma empresa de contrabando nestes termos

Pessoas juriacutedicas tambeacutem tecircm patrimocircnio moral que deve ser reparado em caso de ofensa Esse

eacute o entendimento da 1ordf Cacircmara Ciacutevel do Tribunal de Justiccedila da Paraiacuteba que condenou um cliente

a pagar R$ 5 mil de indenizaccedilatildeo a uma empresa de informaacutetica por tecirc-la acusado de contrabando

em seu perfil no Facebook A decisatildeo reformou sentenccedila de instacircncia anterior que havia julgado

o pedido da empresa improcedente O relator do recurso no TJ-PB desembargador Leandro

dos Santos ressaltou que os comentaacuterios publicados pelo consumidor ultrapassaram a mera

criacutetica ou reclamaccedilatildeo descambando para a imputaccedilatildeo natildeo comprovada de praacutetica delituosa de

contrabando por parte da empresa

Jaacute houve casos de condenaccedilatildeo por compartilhamento e curtidas no Facebook No proacuteximo caso ora acostado uma cliente de uma cliacutenica veterinaacuteria acusou a meacutedica indevidamente como se observa de notiacutecia do Tribunal de Justiccedila do Estado de Satildeo Paulo (2015 [1-]) sendo que o tribunal entendeu que tal criacutetica foi abusiva e ela foi condenada a pagar indenizaccedilatildeo por danos morais como se nota

Uma mulher moradora de Campinas pagaraacute R$ 8 mil de indenizaccedilatildeo a uma cliacutenica veterinaacuteria e

uma meacutedica por danos morais A decisatildeo eacute da 3ordf Cacircmara de Direito Privado do TJSP De acordo

com os autos a cadela de estimaccedilatildeo da reacute apresentou sangramento apoacutes uma cirurgia de

castraccedilatildeo em abril de 2013 e correu risco de morte Apoacutes o episoacutedio ela publicou na paacutegina

de seu perfil no Facebook afirmaccedilotildees tidas como injuriosas a respeito do estabelecimento e da

meacutedica responsaacutevel pela operaccedilatildeo do animal A dona da cliacutenica ajuizou accedilatildeo indenizatoacuteria cuja

sentenccedila determinou o pagamento de repaccedilatildeo de R$ 5 mil pela internauta O relator Alexandre

Marcondes manteve a condenaccedilatildeo e elevou o montante da indenizaccedilatildeo para R$ 8 mil

Tudo deve ser efetivado se utilizando de algum criteacuterio No caso hoje em dia jaacute se fala de direito huma-nos de quinta geraccedilatildeo que seriam os direitos digitais De modo que tambeacutem muito se fala de aplicaccedilatildeo dos direitos humanos de modo horizontal inclusive de pessoas fiacutesicas para juriacutedicas e vice-versa Nesta ordem de ideias crecirc-se que um bom paracircmetro para soluccedilatildeo das situaccedilotildees de conflitos no Facebook resultem elas em indenizaccedilotildees ou natildeo deve ter por base o princiacutepio da dignidade da pessoa humana como pedra angular para se decidir algo sobre o assunto Sempre se observando as particularidades de caso a caso

3 RESULTADOS E DISCUSSAtildeO

Pelo exposto buscou-se demonstrar como a Reputaccedilatildeo Digital no Facebook a Sustentabilidade Empresarial e o Consumidor poderatildeo conviver harmonicamente mesmo que haja tensotildees respeitando--se o arcabouccedilo de direitos do consumidor e se preservando a empresa viva e garantindo a sua perenidade

Identificou-se que a empresa tem o direito de primar pela sua reputaccedilatildeo sua marca sua clientela monitorando as ocorrecircncias nas redes sociais para apurar o que pode ser abusivo o que tem razatildeo de ser e o que jamais existiu Urge que se tenha uma postura ativa pelo empresariado sob pena de sua derrocada por natildeo levar a seacuterio o que ocorre em campo digital

Considerando a funccedilatildeo social da empresa deve ela ser sustentaacutevel respeitando diversos fatores como acima elencados E nessa missatildeo a Governanccedila Corporativa o Compliance a Gestatildeo de Riscos e a Auditoria Juriacutedica satildeo fundamentais conforme acima embasado

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Revista Juriacutedica da Universidade do Sul de Santa Catarina

O empoderamento dos consumidores nas redes sociais eacute candente Poucas palavras podem destruir uma reputaccedilatildeo por vezes construiacuteda por anos de trabalho duro O ataque natildeo geraraacute efeitos apenas frente aos donos das empresas mas a todos as pessoas a ela interligadas o que em tese eacute passiacutevel de gerar a perda de centenas ou milhares de postos de trabalho caso a empresa seja meacutedia ou grande

4 CONCLUSOtildeES

Haacute suficiente legislaccedilatildeo aplicaacutevel para se mediar os lados dessa contenda A Constituiccedilatildeo Federal o Marco Civil e o Coacutedigo de Defesa do Consumidor satildeo alguns exemplos Haacute lei para aplicar ou seja natildeo haacute lacuna legislativa sobre o assunto em tela Mas como ocorre natildeo apenas nessa oacuterbita de tensiona-mento entre os consumidores e os fornecedores para ajustar lacunas sistecircmicas eacute necessaacuteria agrave utiliza-ccedilatildeo de princiacutepios juriacutedicos

Normas e sobrenormas a auxiliar o interprete na missatildeo de aplicaccedilatildeo do bom Direito Aqui no caso em voga aplicaacuteveis os vetores constitucionais da liberdade de expressatildeo da vedaccedilatildeo ao anonimato da livre iniciativa da legalidade da proporcionalidade da razoabilidade e da proteccedilatildeo ao consumidor Sistemicamente somados e sem antagonismos reais

Com todos esses elementos descritos chega-se a conclusatildeo que o consumidor tem o direito de expor sua opiniatildeo desde que com base real e moderada sem o intento de lesar a imagem da empresa extra-polando as acusaccedilotildees ou atacando a honra dos gestores ou colaboradores do ente pessoa juriacutedica

Como se nota pelos exemplos colhidos as falhas ocorrem de lado a lado Agraves vezes o consumidor crecirc ter um direito inaliaacutevel que lhe garante o direito de livre manifestaccedilatildeo Mas ele tem que se indagar previa-mente se tem mesmo tanta razatildeo sobre aquele direito conclamado pois o desabafo nas redes sociais poderaacute lhe custar caro

Pelo lado da empresa as falhas vatildeo desde os erros pessoais dos colaboradores que natildeo conseguem lidar com tal ou qual situaccedilatildeo ateacute erros de falta de treinamento falta de documentos da empresa que deter-minem certas posturas como um Coacutedigo de Eacutetica um Termo de Poliacutetica de Uso ou um Regulamento Interno que podem ser relevantes como um bom instrumental e fazerem toda a diferenccedila

Mas o que parece fazer a diferenccedila sobremaneira eacute a suscitaccedilatildeo da conscientizaccedilatildeo advinda de uma educaccedilatildeo do indiviacuteduo para que ele fique cocircnscio de seus direitos e obrigaccedilotildees no mundo digital e para que saiba sem sombra de duacutevidas que o mundo digital traz reflexos no mundo real jaacute que plenamen-te interligados ou melhor dizendo satildeo o mesmo mundo E vale repetir a internet natildeo eacute terra sem lei

O que seraacute elementar para se definir se uma postagem de um consumidor eacute iliacutecita ou natildeo eacute a questatildeo de se mensurar a sua proporcionalidade ligada agrave realidade do que se alega para que se possa criar uma convicccedilatildeo e precisar se aquela postagem fere direito da empresa agrave sua reputaccedilatildeo digital

Sem prejuiacutezo de opiniotildees contraacuterias o que se pode questionar tambeacutem eacute se a soluccedilatildeo natildeo foi tentada em outras vias antes de uma postagem mais arrojada com uma reclamaccedilatildeo ao SAC contato ao Ombudsman3 da empresa ou a comunicaccedilatildeo por qualquer outro canal existente na internet ou fora dela

Ora entende-se que a pedra fundamental para se alicerccedilar uma decisatildeo sobre se a reclamaccedilatildeo eacute devida ou indevida seraacute o princiacutepio da dignidade humana tanto para se avaliar se o consumidor foi malferido em um direito seu elementar quanto do lado antagocircnico em homenagem ao princiacutepio da isonomia para se avaliar se o direito agrave dignidade humana dentro da empresa na pessoa de seus proprietaacuterios e funcionaacuterios tambeacutem natildeo foi vilipendiada

3 Ombudsman eacute uma palavra sueca que significa representante do cidadatildeo Designa nos paiacuteses escandinavos o ouvidor-geral

funccedilatildeo puacuteblica criada para canalizar problemas e reclamaccedilotildees da populaccedilatildeo Disponiacutevel em lthttpwww1folhauolcombr

ombudsman2014091520973-o-que-e-o-cargo-de-ombudsmanshtmlgtAcesso em 30 maio 2016

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Em caso de legalidade e legitimidade da publicaccedilatildeo ela seraacute convalidada pelo Judiciaacuterio e demais oacutergatildeo de Defesa do Consumidor ou que analisem tais publicaccedilotildees como o CONAR quando a empresa publi-car algo indevido ou que viole direitos consumeristas

Do lado da empresa caso constatada a ilegalidade e abusividade da publicaccedilatildeo ela poderaacute pleitear junto ao Judiciaacuterio pela remoccedilatildeo do conteuacutedo inclusive liminarmente aleacutem de que o ofensor lhe inde-nize demonstrando-se abalo de creacutedito por exemplo eventualmente com a compensaccedilatildeo por lucros cessantes e danos emergentes ou ateacute a ocorrecircncia de danos morais com a comprovaccedilatildeo legalmente exigida no primeiro caso ou presumida no segundo

REFEREcircNCIAS

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VOLTOLINI Ramon Perfis em redes sociais satildeo quesitos essenciais avaliados por empregadores Atualizaccedilatildeo 17 Abr2014 Tecmundo Satildeo Paulo 2014 Disponiacutevel em lthttpwwwtecmundocombrempresas-e-instituicoes53694-perfis-em-redes-sociais-sao-quesitos-essenciais-avaliados-por--empregadoreshtmgt Acesso em 18 Nov 2015

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O PAPEL DO ADVOGADO NA NEGOCIACcedilAtildeO NA SOCIEDADE CONTEMPORAcircNEA

THE ROLE OF THE LAWYER IN NEGOTIATION IN CONTEMPORARY SOCIETYBiela Jr1

Glaucia Guisso Fernandes2

Resumo O presente artigo analisa o papel do advogado no procedimento de negociaccedilatildeo no Estado Democraacutetico de Direito a partir do meacutetodo de negociaccedilatildeo de Harvard e da teoria da comunicaccedilatildeo natildeo--violenta viabilizando a comunicaccedilatildeo eficaz desde o seu planejamento execuccedilatildeo finalizaccedilatildeo incenti-vando a continuidade das relaccedilotildees humanas mesmo apoacutes o teacutermino da negociaccedilatildeo

Palavras-Chaves Negociaccedilatildeo Advogado Litiacutegio Eacutetica Meios adequados de soluccedilatildeo consensual de conflitos

Abstract This article analyzes the role of the lawyer in the negotiation process in the Democratic State of Law based on the Harvard negotiation method and nonviolent communication theory enabling effective commu-nication from planning execution finalization encouraging the continuity of human relations even after the end of the negotiations

Keywords Negotiation Lawyer Litigation Ethics Adequate means of consensual solution of conflicts

1 INTRODUCcedilAtildeO

Do latim negotiatio de negociari a negociaccedilatildeo significa o entendimento preliminar de que possa resul-tar o contrato ou de que possa resultar o negoacutecio que natildeo se considera acabado ou concluiacutedo enquan-to as partes natildeo se ajustam nas condiccedilotildees ou claacuteusulas em que se possa realizar e natildeo firmam em defi-nitivo seu consentimento

A negociaccedilatildeo pode ser vista como oportunidade para resolver muitas questotildees incluindo os conflitos sendo uma forma de autocomposiccedilatildeo em que as partes buscam caminhos adequados Para tanto a nego-ciaccedilatildeo natildeo deve ser feita de qualquer forma deve observar teacutecnicas deve ser planejada preparada ade-quadamente criada negociada e aiacute sim devidamente formalizada alcanccedilando o muacutetuo acordo e recons-truindo a histoacuteria entre as partes no sentido de dar continuidade agrave paz social nas relaccedilotildees humanas

Dessa forma no presente artigo seraacute analisada a importacircncia da funccedilatildeo do advogado como negociador na sociedade contemporacircnea considerando sua funccedilatildeo social bem como a aplicabilidade das teacutecnicas de negociaccedilatildeo levando-se em conta o meacutetodo de Harvard em consonacircncia com a teoria da comunica-ccedilatildeo natildeo violenta

1 Advogado e professor de Direito Civil e Eacutetica Profissional Relator da XVIII Turma Disciplinar do TED da OABSP 201220152018

Mestre em Direito pela Universidade Metropolitana de Santos na aacuterea de concentraccedilatildeo Responsabilidade Civil Ambiental Poacutes-graduado

lato sensu em Responsabilidade Civil pela FAAP e em Direito Processual Civil pelo Mackenzie Possui MBA em Gestatildeo de Negoacutecios

Imobiliaacuterios pela FMU Autor de obras juriacutedicas

2 Advogada Conciliadora e Mediadora Professora de Direito na Universidade Nove de Julho e no Centro Paula Souza Licenciada

em Direito na Universidade Satildeo Judas Tadeu Mestre em Direitos Difusos e Coletivos pela Universidade Metropolitana de Santos

Especialista em Direito Empresarial na Universidade Satildeo Judas Tadeu Especialista em Direito Civil e Direito Processual Civil na Escola

Paulista de Direito Instrutora na Oficina de Oratoacuteria Forense na Ordem dos Advogados do Brasil de Satildeo Paulo

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2 A FUNCcedilAtildeO DO ADVOGADO COMO NEGOCIADOR NA SOCIEDADE CONTEMPORAcircNEA

A tiacutetulo de consideraccedilotildees iniciais antes de discorrer sobre a negociaccedilatildeo eacute importante destacar a rele-vacircncia da profissatildeo do advogado pois ele eacute o sujeito indispensaacutevel agrave administraccedilatildeo da justiccedila conforme reza a Constituiccedilatildeo Federal em seu art 133

Segundo Bulos3 ldquoa advocacia natildeo eacute apenas uma profissatildeo mas uma atividade delicadiacutessima porque interfere no consciente e inconsciente da criatura humanardquo portanto pontifica o autor que advogar ldquorequer paciecircncia humildade profundo conhecimento teacutecnico cultura humaniacutestica relacionamento sadio boa vontade persistecircncia amor sentido cristatildeo da vida discernimento perdatildeo renuacutencia senso de justiccedila criatividade etcrdquo

Como indispensaacutevel agrave administraccedilatildeo da justiccedila o advogado no seu ministeacuterio privado presta um ser-viccedilo puacuteblico e exerce uma funccedilatildeo social pois o advogado como particular colabora com o Estado em busca da justiccedila por isso frise-se sua indispensabilidade Tanto isso eacute certo que haacute a regra do quinto constitucional prevista no art 94 ldquocaputrdquo e paraacutegrafo uacutenico cujo objetivo eacute oxigenar o Poder Judiciaacuterio onde advogados puacuteblicos e privados tragam sua experiecircncia e vivecircncia para contrabalanccedilar a visatildeo formada por um tribunal composto somente por juiacutezes de carreira Em outras palavras juiacutezes oriundos da advocacia por sua vivecircncia e experiecircncia tendem a ter uma outra visatildeo no que tange agrave prestaccedilatildeo jurisdicional justa e efetiva

No processo judicial o advogado contribui na postulaccedilatildeo de decisatildeo favoraacutevel ao seu constituinte ao convencimento do julgador e seus atos constituem muacutenus puacuteblico Por outro lado salienta Biela Jr4 ldquoo advogado realiza a funccedilatildeo social quando concretiza a aplicaccedilatildeo do Direito e natildeo apenas da lei partici-pando ativamente da justiccedila socialrdquo como se depreende do art 3ordm do CED

Tradicionalmente no acircmbito social o advogado eacute diretamente associado agrave briga litiacutegio conflito pro-cesso como se sua atuaccedilatildeo profissional fosse resumida agrave atuaccedilatildeo no processo judicial o que eacute uma inverdade pois a formaccedilatildeo teacutecnica do advogado visa orientar esclarecer prevenir e se for o caso liti-gar mas eacute sabido que a formaccedilatildeo acadecircmica tambeacutem contribui para esta visatildeo pois o bacharel em direi-to tem uma formaccedilatildeo mais voltada para a litigiosidade e natildeo para o consenso influindo na sua vida pes-soal e profissional com reflexos no acircmbito social

Nesse sentido perfeita eacute colocaccedilatildeo de Bulos5 ao referir que ldquoo advogado eacute a antena supersensiacutevel da Justiccedila porque seu mister envolve a um soacute tempo 1 Arte ndash de dizer o oacutebvio para quem natildeo quer enten-der a obviedade 2 Poliacutetica ndash disciplina da liberdade dentro da ordem 3 Eacutetica ndash exerciacutecio de virtudes contra a tentaccedilatildeo e 4 Accedilatildeo ndash luta intransigente na defesa e direitos prerrogativasrdquo

Negociar eacute preciso Enfatiza Silva e Figueiredo Mouratildeo6 que enquanto se fizer a mesma coisa conse-guiraacute sempre o mesmo e assim pontifica a distinccedilatildeo da postura do advogado em juiacutezo e na negociaccedilatildeo sendo que em juiacutezo o papel do advogado eacute convencer o julgador do sentido da tese juriacutedica apresenta-da jaacute na negociaccedilatildeo cabe ao advogado convencer a outra parte de que a proposta que tem a oferecer eacute melhor que a alternativa que resta ao oponente como p ex em um acidente de tracircnsito onde todas as provas satildeo favoraacuteveis ao autor e que se esse for ao judiciaacuterio sairaacute vencedor Contudo se o causador do dano propuser uma negociaccedilatildeo onde o veiacuteculo do autor poderaacute ser consertado antes mesmo da citaccedilatildeo na accedilatildeo indenizatoacuteria natildeo seria uma boa proposta Negociar natildeo significa deixar de ganhar mas sim solucionar o conflito buscando muacutetuo acordo

3 BULOS Uadi Lammecircgo Curso de Direito Constitucional Satildeo Paulo Saraiva 2007 p 1161

4 BIELA Jr Minimanual do novo coacutedigo de eacutetica e disciplina dos advogados 2 ed Salvador JusPodivm 2017 p 30

5 Op cit p 1162

6 MOURAtildeO Alessandra Nascimento Silva e Figueiredo Teacutecnicas de negociaccedilatildeo para advogados 4 ed rev Satildeo Paulo Revista dos

Tribunais 2017 p 38

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De fato o advogado eacute o primeiro juiz da causa portanto indispensaacutevel sua atuaccedilatildeo seja judicial ou extra-judicialmente e tanto isso eacute certo que assevera Pupo7 que nos dias atuais a figura desse profissional natildeo pode ficar restrita ao interesse das partes O advogado deve ter um papel niacutetido para evitar a litigiosidade e natildeo pode se esquivar do seu dever de promover o acesso agrave justiccedila o que natildeo se confunde com acesso ao judiciaacuterio mas com todos os meios juriacutedicos agrave disposiccedilatildeo a fim de se buscar uma soluccedilatildeo mais ceacutelere e justa

Assim como primeiro juiz da causa e em cumprimento agrave sua funccedilatildeo social a atuaccedilatildeo do advogado ultra-passa o interesse privado (do cliente) para alcanccedilar o interesse puacuteblico (da sociedade) a administraccedilatildeo da justiccedila Por essa razatildeo satildeo deveres do advogado atuar com a verdade independecircncia honestidade lealdade e boa-feacute devendo desaconselhar lides temeraacuterias bem como estimular os meacutetodos adequa-dos de soluccedilatildeo de conflitos como a negociaccedilatildeo conciliaccedilatildeo mediaccedilatildeo prevenindo a instauraccedilatildeo de conflitos sendo vedada a diminuiccedilatildeo dos honoraacuterios contratados em decorrecircncia da soluccedilatildeo do litiacutegio por qualquer mecanismo adequado de soluccedilatildeo extrajudicial8

Por essa razatildeo o advogado deve mudar o paradigma de adversarial como antes mencionado comu-mente ensinado nas faculdades de Direito para o perfil negociador conciliador jaacute que ele eacute primeiro inteacuterprete da lei e do caso concreto em condiccedilotildees de avaliar o meio mais adequado para solucionar o conflito a fim de alcanccedilar uma soluccedilatildeo ceacutelere (o que o judiciaacuterio em muitas vezes natildeo proporciona) e justa onde natildeo haveraacute o ganha-perde mas sim o ganha-ganha Enfim natildeo haacute advogado que natildeo preci-se negociar pois a vida do advogado eacute negociar desde seu cliente (honoraacuterios) com a parte contraacuteria colegas advogados e por aiacute vai

Silva e Figueiredo Mouratildeo9 pontifica que o art 190 do CPC abriu a grande possibilidade de se negociar os procedimentos processuais poreacutem critica que ainda se vecirc muitas claacuteusulas contratuais que nesse tema se restringem a fazer a eleiccedilatildeo de foro Eacute interessante perceber que o legislador mesmo com o processo judicial em andamento lembra o jurisdicionado da existecircncia de outros caminhos para a reso-luccedilatildeo consensual dos conflitos o que deveraacute ser estimulado pelos operadores do direito inclusive os advogados como prevecirc o artigo 3deg sect 1deg ao 3deg do CPC

Para se cumprir a funccedilatildeo social do advogado como forma da sua indispensabilidade agrave administraccedilatildeo da justiccedila e alcanccedilar a soluccedilatildeo justa do ganha-ganha a mudanccedila de cultura se impotildee partindo do advo-gado como negociador por meio de uma linguagemcomunicaccedilatildeo natildeo violenta ou agir comunicativo10 para buscar o entendimento muacutetuo das partes e assim alcanccedilar a sociedade como um todo consoli-dando-se a mudanccedila de mentalidade social para se ter o judiciaacuterio como um meio subsidiaacuterio para a soluccedilatildeo dos conflitos e natildeo como regra para tanto

Nesse sentido Pupo11 assevera que essa mudanccedila de cultura que se preconiza decorre de uma ldquorea-valiaccedilatildeo do papel do advogado quando ao proceder diante de um conflito a comeccedilar com a anaacutelise da relaccedilatildeo comunicacional que estabelece com o cliente ateacute a implementaccedilatildeo de meacutetodos mais eficientes e eficazes no trato com o litiacutegiordquo jaacute que em razatildeo de sua ldquoproximidade com as partes envolvidas no con-flito permitem o aprofundamento no fundamento da divergecircncia e lhe capacita para realizar a escolha do meacutetodo mais adequado para o caso concretordquo cumprindo seu dever previsto no Coacutedigo de Eacutetica art 2ordm paraacutegrafo uacutenico inciso VI e VII no que tange agrave contenccedilatildeo do descontrole no uso da litigaccedilatildeo judicial

7 PUPO Seacutergio O papel do advogado na sociedade contemporacircnea a gestatildeo do conflito p 114

8 CED art 48 sect 5ordm

9 MOURAtildeO Figueiredo SILVA Alessandra Nascimento Teacutecnicas de negociaccedilatildeo para advogados 4 ed rev Satildeo Paulo Revista dos

Tribunais 2017 p 23

10 Na teoria do agir comunicativo de Habermas o autor sugere uma mudanccedila de paradigma no sentido de obter o entendimento entre

as pessoas por meio da linguagem isto eacute deixar de compreender o mundo a partir de uma visatildeo individualista e seguir para uma anaacutelise

por meio da comunicaccedilatildeo entre os sujeitos apud PUPO Sergio Tadeu O papel do advogado na sociedade contemporacircnea a gestatildeo do

conflito Satildeo Paulo Perse 2014 p 130

11 Op cit p 125

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Nesse diapasatildeo o advogado deve primeiro desenvolver uma escuta ativa que segundo Sergio Pupo12 ldquotem triplo objetivo a) conhecer o cliente b) se aprofundar nas causas do conflito e c) aferir se o clien-te atua estrategicamente ou se haacute campo para o muacutetuo acordordquo Apoacutes a escuta ativa o advogado deve compreender a razatildeo as causas do conflito colocando-se no lugar do outro buscando a eliminaccedilatildeo dos pontos de conflito estimulando a utilizaccedilatildeo dos meios adequados para a soluccedilatildeo dos conflitos como a negociaccedilatildeo para a preservaccedilatildeo das relaccedilotildees de continuidade bem como evitando novos conflitos entre as partes

3 BREVES CONSIDERACcedilOtildeES SOBRE OS FUNDAMENTOS DE NEGOCIACcedilAtildeO DE HARVARD E A TEORIA DA COMUNICACcedilAtildeO NAtildeO VIOLENTA

Negociar natildeo eacute perder abrir matildeo dos seus interesses natildeo implica concessotildees pois todas as pessoas tecircm posiccedilotildees e querem defendecirc-las o que importa eacute atender estas posiccedilotildees com o intuito de atingir o inte-resse comum viabilizando a comunicaccedilatildeo e se for o caso chegando a uma autocomposiccedilatildeo um acordo

Conforme salientam Fisher Ury e Patton na obra Como Chegar ao Sim13 qualquer meacutetodo de negocia-ccedilatildeo pode ser julgado imparcialmente por trecircs criteacuterios 1 Deve produzir um acordo sensato que pode ser definido como aquele que atende aos interesses legiacutetimos de cada uma das partes na medida do possiacutevel resolve imparcialmente os interesses conflitantes eacute duradouro e leva em conta os interesses da comunidade se houver possibilidade de acordo 2 Deve ser eficiente e 3 Deve aprimorar ou pelo menos natildeo prejudicar o relacionamento entre as partes

O negociador natildeo precisa ser afaacutevel ou aacutespero para negociar segundo o Meacutetodo de Negociaccedilatildeo de Harvard haacute quatro pontos fundamentais que devem ser analisados para facilitar o processo de nego-ciaccedilatildeo e produzir resultados satisfatoacuterios para todos os envolvidos no processo14 1 Separe as Pessoas do Problema 2 Concentre-se nos Interesses Natildeo nas Posiccedilotildees 3 Invente Opccedilotildees de Ganhos Muacutetuos 4 Insista em Criteacuterios Objetivos

Para que se alcance um processo de negociaccedilatildeo efetivo eacute necessaacuterio que o processo de comunicaccedilatildeo entre os envolvidos resguarde os preceitos da comunicaccedilatildeo natildeo-violenta viabilizando o fortalecimen-to das relaccedilotildees humanas mesmo em condiccedilotildees adversas pessoais ou profissionais

Para Marshall Rosenberg na obra Comunicaccedilatildeo Natildeo-Violenta15 estes preceitos de comunicaccedilatildeo satildeo utilizados em todas as relaccedilotildees humanas nos relacionamentos iacutentimos nas famiacutelias nas escolas nas organizaccedilotildees e instituiccedilotildees em terapia e aconselhamento nas negociaccedilotildees diplomaacuteticas e comerciais nas disputas e conflitos de toda natureza

O processo da comunicaccedilatildeo natildeo-violenta tem quatro elementos basilares observaccedilatildeo sentimentos necessidades e pedidos16 1 As accedilotildees concretas que estamos observando e que afetam nosso bem-es-tar 2 Como nos sentimos em relaccedilatildeo ao que estamos observando 3 As necessidades valores desejos que estatildeo gerando nossos sentimentos 4 As accedilotildees concretas que pedimos para enriquecer nossa vida

12 Op cit p 141

13 FISHER Roger URY William e PATTON Bruce Como chegar ao sim negociaccedilatildeo de acordos sem concessotildees 2 ed rev e amp Rio de

Janeiro Imago 2005 p 22

14 Op cit p 30

15 ROSENBERG Marshall B Comunicaccedilatildeo natildeo-violenta teacutecnicas para aprimorar relacionamentos pessoais e profissionais Satildeo Paulo

Aacutegora 2006 p 27

16 Ibid p 26

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Os preceitos da comunicaccedilatildeo natildeo-violenta juntamente com os elementos do meacutetodo de Harvard aju-dam e facilitam a comunicaccedilatildeo durante o processo de negociaccedilatildeo e se complementam desde a anaacutelise inicial pelo advogado negociador diagnosticando a situaccedilatildeo preparando bem como durante a exe-cuccedilatildeo criando negociando para se atingir o muacutetuo acordo finalizando o procedimento mantendo os viacutenculos entre os envolvidos

4 CARACTERIacuteSTICAS E TEacuteCNICAS DA NEGOCIACcedilAtildeO PARA ADVOGADOS

Segundo Alessandra Mouratildeo vaacuterios elementos auxiliam os negociadores a terem ecircxito planejamento propostas legitimidade comunicaccedilatildeo relacionamento alternativas e compromisso17

41 PLANEJAMENTO

O advogado deveraacute analisar os interesses perceber o cliente entender seus objetivos descobrir os interesses em jogo eacute preciso treino eacute interessante apoacutes ouvir o cliente inverter os papeacuteis fazendo com que o cliente coloque-se no lugar da outra parte de forma empaacutetica a fim de perceber que nem sempre o outro lado estaacute errado entendendo o que estaacute acontecendo e buscando opccedilotildees

Isto natildeo implica concordar com o outro mas sim entendecirc-lo trata-se de aprender a loacutegica do adversaacute-rio importante fazer propostas levando em conta o interesse da outra parte aleacutem de escutar quais satildeo as opccedilotildees que o outro tem se o acordo natildeo for formalizado

O advogado negociador natildeo discute teses juriacutedicas o que eacute uma perda tempo impedindo o diaacutelogo restringindo as opccedilotildees natildeo pode ser leviano desonesto insensiacutevel intolerante tampouco seu cliente eacute necessaacuterio a reciprocidade para que todos possam conversar O foco deve ser o problema a ser resol-vido e natildeo as pessoas

O advogado deve conhecer seu cliente os interesses que o movem deve contar tudo o que aconteceu eacute importante o poder de investigaccedilatildeo do advogado fazendo perguntas indo aleacutem daquilo que o cliente expotildee ressaltando que a relaccedilatildeo entre cliente e advogado eacute de confianccedila pautada na verdade assim como a relaccedilatildeo entre cliente e paciente ou seja expor a verdade eacute fundamental nas relaccedilotildees humanas incluindo as relaccedilotildees profissionais em que atuam profissionais liberais facilitando e promovendo o diaacutelogo

O advogado deve ajudar o cliente a entender o seu conflito a se auto perceber entender o que real-mente quer ter clareza quanto aos aspectos emocionais psicoloacutegicos sociais financeiros anseios temores vaidades sensaccedilotildees anguacutestias alegrias tristezas enfim tudo o que estaacute relacionado com a realidade do cliente e da parte contraacuteria

Neste sentido o advogado negociador deveraacute separar as pessoas dos problemas observando sem ava-liar e concentrar nos interesses natildeo nas posiccedilotildees demonstrando os sentimentos

42 PROPOSTAS COM GANHOS RECIacutePROCOS

Eacute importante respeitar a inteligecircncia e astuacutecia da outra parte todos devem ganhar na negociaccedilatildeo O advogado deve ser flexiacutevel e criativo com base nos interesses do seu cliente de acordo com a exposiccedilatildeo verdadeira dos fatos bem como com os interesses da parte contraacuteria colocando-se no lugar desta para que possam ser criadas as opccedilotildees viabilizando o interesse comum A fixaccedilatildeo num uacutenico posiciona-mento ignorando os demais interesses pode comprometer o processo de negociaccedilatildeo

17 MOURAtildeO Figueiredo SILVA Alessandra Nascimento Teacutecnicas de negociaccedilatildeo para advogados 4 ed rev Satildeo Paulo Revista dos

Tribunais 2017 passim

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Durante o processo de negociaccedilatildeo os envolvidos natildeo podem ser precipitados eacute preciso ter paciecircncia ouvir todas as propostas as partes devem ser esclarecidas as duacutevidas devem ser sanadas pode-se pedir sugestotildees para o cliente para outro colega de profissatildeo ou para a outra parte eacute viaacutevel conhecer melhor as propostas deve ser exercida a escuta ativa observando com atenccedilatildeo escutando e natildeo sim-plesmente ouvindo olhando e natildeo simplesmente vendo eacute preciso ter tempo e disponibilidade

Infelizmente muitas tentativas de negociaccedilatildeo no acircmbito judicial sejam frustradas ainda que com a possibilidade de serem marcadas outras sessotildees pois como muitos advogados natildeo satildeo negociadores natildeo preparam as partes os envolvidos natildeo estatildeo dispostos a se comunicarem eficazmente e os conci-liadores e mediadores natildeo estatildeo devidamente preparados e capacitados haacute o comprometimento do procedimento tudo isto atrelado agrave falta de tempo paciecircncia conhecimento e educaccedilatildeo

Muitas vezes numa sessatildeo de negociaccedilatildeo mesmo com a utilizaccedilatildeo das teacutecnicas e dos elementos da comunicaccedilatildeo natildeo violenta dependendo das partes e dos advogados o tempo necessaacuterio do procedi-mento pode ser curto ou longo para se alcanccedilar o acordo muacutetuo sendo que algumas vezes pode ser que natildeo ocorra a autocomposiccedilatildeo o que natildeo quer dizer que todos perderam tempo pois se comunica-ram de maneira eficaz

Sabendo claramente o que cada parte quer eacute possiacutevel chegar a um interesse comum natildeo eacute viaacutevel negar ou concordar de pronto eacute preciso levar em conta todas as possibilidades ter empatia natildeo significa con-cordar com tudo o que o outro diz mas sim respeitar suas colocaccedilotildees e juntos criar outras alternati-vas Haacute vaacuterias respostas para um uacutenico problema

A meta da negociaccedilatildeo natildeo deve ser o confronto mas sim o ganho reciacuteproco e o advogado deve deixar isto claro para o seu cliente que o contato e a conversa com o advogado da parte contraacuteria aleacutem de ser uma conduta educada o que se aprende desde o berccedilo natildeo significa deixar de representar os seus interesses tecnicamente muito pelo contraacuterio isto favorece a busca pelo interesse comum Uma postura teacutecnico negociadora sempre atendendo o interesse do cliente eacute estar lado a lado com a outra parte por isto a mesa de negociaccedilatildeo deve ser redonda sem pontas trazendo a ideia de igualdade de oportunidades

Eacute importante que o advogado tenha clareza do seu papel na negociaccedilatildeo valorize sua profissatildeo sua experiecircncia pessoal seu conhecimento teacutecnico tenha autoconfianccedila estimule o procedimento que natildeo veja a tecnologia como impedimento para a negociaccedilatildeo mas sim uma ferramenta favoraacutevel ao fim almejado que valorize seu trabalho

43 LEGITIMIDADE

As opccedilotildees escolhidas pelas partes devem adequadas para todos os envolvidos na negociaccedilatildeo devendo ser legiacutetimas e justas trazendo uma sensaccedilatildeo agradaacutevel para todos sem que um ou outro sinta-se enga-nado lesado desmotivado a fim de viabilizar o cumprimento do acordado

Quando o processo de negociaccedilatildeo eacute feito de forma adequada fazendo com que as partes resgatem suas responsabilidades sobre o conflito a possibilidade de descumprimento do que foi acordado eacute qua-se nula posto que haacute engajamento de todos o que natildeo ocorre se as partes estiverem com sentimentos negativos com relaccedilatildeo ao andamento do procedimento portanto natildeo pode haver pressa nem pressatildeo fiacutesica ou psicoloacutegica tudo deve ocorrer no seu tempo

Eacute importante ter criteacuterios objetivos para negociar evitando apenas basear-se na subjetivamente que pode prejudicar a negociaccedilatildeo tendo paracircmetros de valores (de mercado referecircncia venal) estatiacutes-ticas decisotildees jurisprudenciais entendimentos doutrinaacuterios mapeamentos escalas tabelas periacutecia vistorias exames avaliaccedilotildees laudos pareceres enfim tudo o que pode servir de base para uma boa conversa criando uma aacuterea de acordo possiacutevel que permita uma discussatildeo direcionada

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O aspecto subjetivo tambeacutem eacute importante mas deve ser levado em conta com criteacuterios e se a parte natildeo estaacute muito criativa ou natildeo teve condiccedilotildees de apresentar criteacuterios objetivos poderaacute ser auxiliada pela sugestatildeo apresentada pelo outro e por isto deve saber ouvir reiterando que pode haver mais de uma resposta para o mesmo problema

44 COMUNICACcedilAtildeO

Durante o procedimento da negociaccedilatildeo eacute importante estar atento a todos os tipos de manifestaccedilotildees das partes envolvidas inclusive o silecircncio pois o corpo fala de diferentes formas

Prestar atenccedilatildeo em si e no outro eacute essencial para o andamento dos trabalhos repetir o que o outro disse demonstra respeito ajuda a estabelecer os pontos principais possibilita a empatia assim como fazer anotaccedilotildees e apontamentos O uso dos sentidos deve ser equilibrado entre as partes saber falar ouvir e olhar no momento correto eacute fundamental

As pessoas que ficam muito tempo em silecircncio durante a negociaccedilatildeo devem ser tratadas com cau-tela satildeo observadoras e pode ser que as expressotildees natildeo coincidam com os sentimentos passando uma maacute impressatildeo por isto eacute conveniente perguntar se a pessoa estaacute entendendo pedir sua partici-paccedilatildeo motivar sua manifestaccedilatildeo Eacute preciso conhecer para natildeo desconfiar ter clareza objetividade espontaneidade

45 RELACIONAMENTO

Estar presente de forma respeitosa e atenta durante a negociaccedilatildeo possibilita um clima agradaacutevel entre todos deve-se ter cuidado com o impacto que uma accedilatildeo ou omissatildeo causa no outro A empatia implica colocar-se no lugar do outro mesmo discordando

O poder de convencer o outro tambeacutem eacute relevante na negociaccedilatildeo mas eacute importante entender que cada parte tem o seu momento para falar um deve respeitar o outro natildeo podem ser admitidas interrup-ccedilotildees os trabalhos devem ser conduzidos de maneira adequada com reciprocidade o respeito ajuda a aumentar a reputaccedilatildeo do negociador e o advogado deve ter isto em mente

Para iniciar os trabalhos agraves vezes eacute interessante comeccedilar a conversa com as partes separadamente evitando um confronto direto para depois uni-las e havendo algum problema todos devem saber o momento de suspender os trabalhos para depois retomar a negociaccedilatildeo ou encerraacute-la por um tempo podendo sempre ser retomada Enfim o advogado negociador deve criar opccedilotildees de ganhos muacutetuos atendendo as necessidades dos envolvidos no procedimento

46 ALTERNATIVAS

Alternativas satildeo as escolhas apoacutes serem analisadas as opccedilotildees quando ainda natildeo se alcanccedilou a compo-siccedilatildeo eacute preciso conhecer todas as opccedilotildees para serem feitas as escolhas por isto eacute imprescindiacutevel saber ouvir a outra parte e entendecirc-la

Mostrar que se tem alternativas eacute viaacutevel faz com que o outro entenda o seu ponto de vista sem surpre-sas desagradaacuteveis explicar que alguns meios podem ser desgastantes financeira e emocionalmente aleacutem de levarem muito tempo e natildeo se ter certeza do resultado como ocorre com o processo judicial eacute uma forma de mostrar os riscos existentes e se as partes natildeo querem correr o risco fica mais faacutecil tran-sacionar pois se tem uma delimitaccedilatildeo e predisposiccedilatildeo para tanto

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47 COMPROMISSO

Caso as partes cheguem numa autocomposiccedilatildeo num acordo o que poderaacute ocorrer integralmente ou parcialmente deveratildeo redigi-lo de forma que seja exequiacutevel exigiacutevel praacutetico e duradouro Entretanto eacute oportuno salientar que a precipitaccedilatildeo natildeo combina com uma comunicaccedilatildeo eficaz tampouco com a satisfaccedilatildeo de todos os envolvidos

Havendo um acordo que atenda os interesses das partes eacute preciso pensar nas suas consequecircncias incluindo um possiacutevel descumprimento mas como jaacute foi dito se existir seriedade responsabilidade e engajamento eacute difiacutecil que isto aconteccedila daiacute porque toda a negociaccedilatildeo precisa ser bem feita o acordo deve ser bem redigido exigindo para tanto que todo o planejamento da negociaccedilatildeo e sua execuccedilatildeo sejam adequados implicando em lealdade boa-feacute e probidade

Deve-se pensar nos aspectos objetivos e subjetivos no tempo na forma e no lugar que seraacute cumprido o acordo bem como nas consequecircncias para as partes como elas vatildeo se sentir e viabilizar sua efetivaccedilatildeo Deve portanto o negociador insistir em criteacuterios objetivos e saber formular os pedidos pensando em todos detalhes que deveratildeo ser escritos pelo advogado e ao final formalizado o muacutetuo acordo assina-do pelas partes e pelos advogados

5 CONCLUSAtildeO

O tempo eacute o senhor de todas as coisas portanto eacute preciso permitir que tudo aconteccedila naturalmente a fim de evitar situaccedilotildees indelicadas de arrependimento ou de outros sentimentos negativos respeitando a dignidade das pessoas envolvidas no procedimento da negociaccedilatildeo

A negociaccedilatildeo eacute um caminho que viabiliza a comunicaccedilatildeo entre as partes existindo ou natildeo o conflito podendo ser utilizada em todas as relaccedilotildees sociais

Neste processo para obter um resultado eficaz eacute preciso que todos estejam aptos a se envolver conhecendo suas fragilidades preparando-se adequadamente e principalmente possibilitando que o outro lado tambeacutem mostre seus interesses colocando-se no lugar do outro permitindo a busca por um caminho que atenda ao interesse de todos

Tal processo natildeo implica em concessotildees perdas submissatildeo mas sim em agregar comprometer-se bus-cando ver aqueles com quem se estaacute negociando natildeo como inimigos ainda que sejam adversaacuterios mas sim como pessoas que tambeacutem possuem interesses necessidades e buscam algo que precisam resolver

A negociaccedilatildeo pode ocorrer nos acircmbitos extrajudicial judicial ou arbitral e muitas vezes pode antecedecirc--los podendo ser retomada a qualquer tempo durante e apoacutes alguma decisatildeo sendo sempre pertinente

O advogado tem papel fundamental para o bom desempenho do procedimento de negociaccedilatildeo incenti-vando seu cliente mostrando os benefiacutecios que o procedimento traraacute tendo acesso agrave parte contraacuteria ao seu patrono promovendo uma comunicaccedilatildeo eficaz promissora empaacutetica com reciprocidade e respeito

Sendo assim eacute relevante que exista uma visatildeo multidisciplinar sobre a realidade dos conflitos uma visatildeo diferenciada dos litigantes com profissionais adequadamente preparados para orientaacute-los e conscientes do melhor meio para alcanccedilar o bem comum sem imposiccedilotildees arbitrariedades e abusos buscando a conscientizaccedilatildeo em prol do interesse comum para que todos busquem uma soluccedilatildeo pres-supondo o resgate de suas responsabilidades

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Diante disto o uso dos fundamentos da negociaccedilatildeo do Meacutetodo de Harvard e os elementos da Teoria da Comunicaccedilatildeo Natildeo-Violenta satildeo mecanismos que auxiliaratildeo nestas relaccedilotildees humanas restabelecen-do a comunicaccedilatildeo entre as partes sendo menos traumaacutetica para os litigantes viabilizando o trabalho daqueles que se dispotildeem a ajudaacute-los estando todos focados nesta busca o que sem duacutevida aleacutem de beneficiar os envolvidos no conflito beneficiaraacute toda a sociedade resguardando o princiacutepio da digni-dade humana o acesso agrave justiccedila e o exerciacutecio de cidadania restabelecendo viacutenculos promovendo paz e harmonia com resultados eficazes e satisfaccedilatildeo pessoal e profissional

REFEREcircNCIAS

BIELA Jr Minimanual do novo coacutedigo de eacutetica e disciplina dos advogados 2 ed Salvador JusPodivm 2017

BULOS Uadi Lammecircgo Curso de Direito Constitucional Satildeo Paulo Saraiva 2007

CURIA Luiz Roberto CEacuteSPEDES Livia ROCHA Fabiana Dias da Novo coacutedigo de processo civil obra coletiva Satildeo Paulo Saraiva 2015

FISHER Roger URY William e PATTON Bruce Como chegar ao sim negociaccedilatildeo de acordos sem con-cessotildees 2 ed rev e amp Rio de Janeiro Imago 2005

MOURAtildeO Figueiredo SILVA Alessandra Nascimento Teacutecnicas de negociaccedilatildeo para advogados 4 ed rev Satildeo Paulo Revista dos Tribunais 2017

PUPO Sergio Tadeu O papel do advogado na sociedade contemporacircnea a gestatildeo do conflito Satildeo Paulo Perse 2014

ROSENBERG Marshall B Comunicaccedilatildeo natildeo-violenta teacutecnicas para aprimorar relacionamentos pes-soais e profissionais Satildeo Paulo Aacutegora 2006

SILVA De Plaacutecido e Vocabulaacuterio juriacutedico 4 ed Rio de Janeiro Forense 1994 v I II III

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COMO ACERCAR EL PROCESO CONTENCIOSO ADMINISTRATIVO LABORAL A LOS FUNDAMENTOS DE LA NUEVA LEY PROCESAL DEL TRABAJO1

Omar Toledo Toribio2

1 INTRODUCCIOacuteN

La Nueva Ley Procesal del Trabajo (en adelante NLPT) en su artiacuteculo en el artiacuteculo 24 establece que los Jueces Especializados de Trabajo son competentes para conocer en proceso contencioso adminis-trativo conforme a la ley de la materia las pretensiones originadas en las prestaciones de servicios de caraacutecter personal de naturaleza laboral administrativa o de seguridad social de derecho puacuteblico asiacute como las impugnaciones contra actuaciones de la autoridad administrativa de trabajo

La mencioacuten a que el proceso contencioso administrativo laboral (En adelante PCAL) se tramitaraacute con-forme a la ley de la materia nos indica ciertamente que la tramitacioacuten de dichos procesos deberaacuten seguirse bajo la pauta del TUO de la Ley del Proceso Contencioso Administrativo aprobado por decre-to Supremo 013-2008-JUS (en adelante LPCA) que como sabemos establece un procedimiento pre-dominantemente escrito con algunos rasgos orales como es el caso de los informes orales que pudieran solicitarse antes de que la causa se encuentre expedita para dictar sentencia (Artiacuteculo 29 e) y f)

Sin embargo de cara a las bondades y evidentes beneficios que significa la instrumentacioacuten de un pro-ceso oral esto es un proceso ceacutelere transparente y en el que se destaca los principios de inmediacioacuten y concentracioacuten existen planteamientos no solamente en sede nacional sino en el derecho comparado3 que destacan la necesidad de implementar la oralidad en el PCAL para lo cual se discute si es necesaria una modificacioacuten legislativa o si en una especie de buenas praacutecticas judiciales se puede perfectamente introducir y aplicar los fundamentos y principios que inspiran la NLPT y especialmente la oralidad que se resume en la norma contenida en el artiacuteculo 121 de la NLPT que preveacute que en los procesos laborales por audiencias las exposiciones orales de las partes y sus abogados prevalecen sobre las escritas sobre la base de las cuales el juez dirige las actuaciones procesales y pronuncia sentencia

Precisamente la intencioacuten de la presente ponencia es plantear un conjunto de ideas que van en la direc-cioacuten de establecer la aplicacioacuten de los principios y fundamentos que sustentan la NLPT en el desarrollo del PCAL lo cual va a tono con las nuevas tendencias procesales que en nuestro paiacutes se inicioacute en el aacutembi-to penal y luego en el aacuterea laboral y a tenor de las propuestas hechas puacuteblicas recientemente ahora se plantea en la justicia civil

1 Ponencia presentada en el II Congreso Internacional de Derecho Procesal del Trabajo realizado en Cajamarca-Peruacute del 25 al 27 de abril

2018 y organizado por la Sociedad Peruana de Derecho del Trabajo y la Seguridad Social

2 Doctor en Derecho y Ciencia Poliacutetica (UNMSM) Magister en Derecho (UNMSM) Juez (p) de la Tercera Sala de Derecho Constitucional y Social

Transitoria de la Corte Suprema de Justicia de la Repuacuteblica del Peruacute con estudios en Litigacioacuten Oral Laboral en el California Western School Of

Law en la Universidad de Medelliacuten y en la Escuela Judicial ldquoRodrigo Lara Bonillardquo de Colombia Catedraacutetico de Maestriacutea y Doctorado de la Facultad

de Derecho ndashUnidad de Post Grado de la Universidad Nacional Mayor de San Marcos Catedraacutetico de la Facultad de Derecho y Ciencias Poliacuteticas

(Seccioacuten de pre y post grado) de la Universidad de San Martiacuten de Porres Profesor Principal de la Academia de la Magistratura Asociado Ordinario

de la Asociacioacuten Peruana de Derecho Constitucional y Delegado en Peruacute de la Asociacioacuten Latinoamericana de Jueces de Trabajo Miembro de la

Sociedad Peruana de Derecho del Trabajo y la seguridad Social Ostenta la Condecoracioacuten con la Orden de Trabajo en Grado de Oficial otorgada

el antildeo 2010 y la MEDALLA CIacuteVICA DEL DERECHO otorgada por el Ilustre Colegio de Abogados de Lima en diciembre del antildeo 2017

3 A decir del Profesor costarricense Ernesto Jinesta L ldquouna de las soluciones para acelerar abreviar o acortar el proceso administrativo

lo constituye la introduccioacuten de un proceso por audiencias en la oralidad constituyen indudablemente remedios efectivos y acertados

contra la lentitud patoloacutegica del proceso administrativordquo En JINESTA Ernesto (1999) La oralidad en el Proceso Contencioso

Administrativo Ivstituia (Antildeo 13 n 155-156)

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2 LOS PRINCIPIOS Y FUNDAMENTOS EN LA NUEVA LEY PROCESAL DE TRABAJO

Los principios del derecho procesal laboral constituyen la base dogmaacutetica del mismo que lo tipifican como una disciplina autoacutenoma Son pautas o reglas de orientacioacuten que intervienen en las diversas fases de la actividad juriacutedica esto es en la creacioacuten o gestacioacuten de normas en la interpretacioacuten y en la aplica-cioacuten de las mismas por parte de los tribunales

Tal como sentildeala PLAacute RODRIGUEZ Ameacuterico ldquo[hellip] los principios y fundamentos del proceso laboral asu-men caracteriacutesticas que es necesario resaltar Una primera caracteriacutestica consiste en sentildealar que son enunciado baacutesicos que pretenden abarcar una serie indefinida de situaciones y no una en particular de tal manera que puedan ser utilizados en una diversidad de situaciones lugares tiempos etcrdquo4

Los principios por su propia naturaleza pertenecen al aacutembito del ldquodebe serrdquo y no necesariamente del ldquoserrdquo es decir algunos de estos postulados no siempre se dan en la realidad aunque algunos de ellos ya han sido recogidos en la legislacioacuten positiva

Gamarra Viacutelchez sentildeala que ldquolos principios del Derecho Procesal del Trabajo poseen sus propias caracteriacutesticas y funciones dentro del Derecho Laboral sustantividad propia en razoacuten del Derecho Laboral sustantividad propia en razoacuten de su generalidad y obedecen a la inspiracioacuten de justicia social que es la razoacuten de ser desde su nacimiento de ahiacute que busquen favorecer al trabajador Y se vinculan con cada institucioacuten procesal en una determinada realidad social en donde actuacutean o deben de actuar ampliando o restringiendo el criterio de su aplicacioacuten Por ello es importante la necesidad de una auto-nomiacutea normativa que permitan construir un sistema de derecho procesal del trabajo En tanto que un sistema denota relacioacuten de coherencia entre los principios y las normas que la componen5A continua-cioacuten analizaremos los principios del derecho procesal del trabajo que precisamente lo distinguen como una disciplina especial orientada a superar el desequilibrio innato de las partes de la relacioacuten laboral

3 PRINCIPIO INQUISITIVO (dispositivo atenuado)

El Sistema Dispositivo y el Sistema Inquisitivo son los grandes sistemas procesales ldquoEl principio dispo-sitivo es aquel en el que se asigna a las partes y no al Juez la iniciativa del proceso el ejercicio y el poder de renunciar a los actos del proceso En el inquisitivo en cambio es el oacutergano jurisdiccional el que tiene esos poderes eacutel es quien debe actuar por siacute e investigar (inquirire) Un proceso estaacute dominado por el principio dispositivo entonces cuando las partes pueden iniciarlo libremente y tienen la disponibilidad de este y de sus diversos actos En el inquisitivo es el tribunal es el que lo inicia averigua y decide con libertad sin estar encerrado en los liacutemites fijados por las partesrdquo 6

Sin embargo como sostiene el profesor Monroy Gaacutelvez ldquola historia del derecho procesal no conoce un solo caso de vigencia real y efectiva de un ordenamiento procesal en el que alguno de los dos sistemas procesales esteacute presente sin ser afectado por el otro ldquolos sistemas citados no se presentan quiacutemica-mente puros lo que suele haber son tendencias maacutes o menos definidas que permiten advertir la prima-ciacutea de uno sobre otrordquo7

4 PLAacute RODRIGUEZ Ameacuterico ldquoLos Principios del Derecho del Trabajordquo 3 Ed Ediciones Depalma Buenos Aires 1998

5 GAMARRA VIacuteLCHEZ Leopoldo Los Principios del Derecho Procesal del Trabajo en Aportes para la reforma del Proceso Laboral

Peruano SPDTSS Lima 2005 p 26

6 Vescovi Enrique Teoriacutea General del Proceso Temis Bogotaacute 1984 p51-52

7 Monroy Galvez Juan Introduccioacuten al Proceso Civil Temis Bogotaacute 1996 p 87

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Si se trata de ubicar al Proceso Laboral en uno de los grandes sistemas procesales podemos concluir sin lugar a dudas que dicho proceso se ubica en el Sistema Inquisitivo En efecto en el proceso laboral el Juez se encuentra dotado de una serie de facultades atribuciones y prerrogativas que lo convierten en un principal impulsor del proceso y confieren por tanto un tinte marcadamente inquisitivo a dicho proceso

El artiacuteculo III del Tiacutetulo Preliminar de la Nueva Ley Procesal de Trabajo (en adelante NLPT) establece que los jueces laborales tienen un rol protagoacutenico en el desarrollo e impulso del proceso lo cual patentiza la presencia del caraacutecter inquisitivo del proceso laboral Ademaacutes de ello a lo largo de la nueva norma procesal encontramos un conjunto de rasgos y signos que nos demuestran dicho caraacutecter y los cuales vamos a ver a continuacioacuten

31 FACULTAD DE FALLO ULTRA PETITA

Una de las manifestaciones de caraacutecter inquisitivo del proceso laboral consiste en que el Juez Laboral se encuentra facultado para expedir sentencias que vayan maacutes allaacute del petitorio contenido en la demanda posibilidad que se encuentra proscrita en el proceso comuacuten o proceso civil en virtud de que en el mismo impera el principio de congruencia contemplado en el artiacuteculo VII del Tiacutetulo Preliminar del Coacutedigo Procesal Civil8 De esta manera la facultad de fallo ultra petita constituye una hipoacutetesis de flexibilizacioacuten del principio de congruencia que se justifica por la naturaleza especial de la controversia laboral y por la necesidad de garantizar el acceso a la tutela jurisdiccional efectiva en un estado democraacutetico y social de derecho

Refirieacutendose a esta facultad del juzgador laboral el extinto profesor de la Universidad Catoacutelica Mario Pasco Cosmoacutepolis sostiene que ldquopor economiacutea procesal por suplencia indirecta de la demanda por proteccioacuten de los derechos irrenunciables del trabajador por prevalencia del fondo y de la verdad real sobre la verdad formal o aparente el derecho procesal del Trabajo admite pues la posibilidad de un fallo que despojaacutendose de ataduras formales excesivas desborde lo demandado Cuando tal exceso es cuantitativo se denomina ultra petita maacutes allaacute de lo pedido cuando es cualitativo se denomina extra petita distinto de lo demandadordquo9

Nos encontramos frente a un fallo ultra petita cuando el Juez ordena el pago de un monto mayor a lo deman-dado si advierte errores aritmeacuteticos o de caacutelculo o errores en la fundamentacioacuten juriacutedica de la demanda o cuando percibe que se ha aplicado indebidamente una norma legal que tiene implicancia en el monto del fallo Es decir estamos ante un fallo ultra petita cuando la sentencia sobrepuja o excede a la demanda en teacuterminos cuantitativos Nuestro sistema procesal laboral confiere al Juzgador la facultad ultra petita esto es la posibilidad de expedir sentencias que en teacuterminos cuantitativos excedan a la demanda

Seguacuten Ernesto Krotoschin ldquoLa jurisprudencia por lo general ha comprendido en el sentido que acaba de exponerse la facultad de sentenciar ultra petita Aplicando este criterio se ha decidido que la antiguumledad a los efectos de calcular la indemnizacioacuten por despido debe computarse de conformidad con lo dispuesto por la ley vigente aun cuando el demandante la haya calculado en forma menos favorable para eacutel o que corresponde disponer el pago de intereses sobre dicha indemnizacioacuten en cambio si soacutelo se reclama por indemnizacioacuten no entra en las facultades del juez condenar tambieacuten al pago de salarios atrasados o de la retribucioacuten por vacaciones y del sueldo anual complementario de horas extraordinarias de trabajo ni de los diacuteas faltante para completar el mes de despido y otorgamiento de un certificado de trabajordquo (sic)10

8 El principio de congruencia tiene las siguientes manifestaciones El objeto del proceso (Thema decidendum) lo fijan las partes y es dentro

de esos liacutemites como el Juez debe decidir el Juez deberaacute fallar de conformidad con lo alegado y probado por las partes (secundum allegata e probata) y la sentencia debe fijarse dentro de los liacutemites de las pretensiones deducidas por el actor y aquello que reconoce o controvierte

el demandado En otras palabras el Juez debe resolver todo lo que las partes piden pero no maacutes esto es conforme (congruente) con lo

solicita por la parte En eat judex ultra petita partium

9 Pasco Cosmoacutepolis Mario-rdquoFundamentos de Derecho Procesal del Trabajordquo Lima aele 1997p55

10 Ernesto Krotoschin ldquoTratado praacutectico de derecho del trabajordquo4ta ed Buenos Aires Ed Desalma 1981 pp 639-693 (cuarta parte)

Citado por el Centro Interamericano de Administracioacuten del Trabajo (CIATOIT) en el libro ldquoFichas para la Investigacioacutenrdquo 1era edicioacuten

diciembre de 1986

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Por su parte para el doctor Mario Pasco Cosmoacutepolis ldquoLos requisitos para la incorporacioacuten en la sen-tencia de cantidades superiores o materias distintas son taxativos e inexcusables a saber a Que aun-que no aparezcan o aparezcan de modo distinto en la demanda hayan surgido a debate en el curso del proceso b Que hayan quedado acreditadas probadas de modo tan incuestionable que hayan podido producir conviccioacuten absoluta en el juez sobre la precedencia del derecho c Que el derecho se ampa-rado esto es que la faculta se ejerza pro operario d Que versen sobre derechos irrenunciablesrdquo(sic)11

El artiacuteculo 48 inciso 3 de la Ley 26636 estableciacutea que el juez puede ordenar el pago de sumas mayores a las reclamadas si de lo actuada apareciere error en los caacutelculos de las liquidaciones demandadas

La norma legal citada tiene su antecedente en el inciso c) del artiacuteculo 50 del Decreto Supremo No 03-80-TR norma legal con rango de ley que reguloacute el Proceso Laboral Judicial hasta la entrada en vigencia de la Ley Procesal de Trabajo 2663612

Por su parte la NLPT en el artiacuteculo 31 establece que la sentencia se pronuncia sobre todas las articu-laciones o medios de defensa propuestos por las partes y sobre la demanda en caso de que la declare fundada total o parcialmente indicando los derechos reconocidos asiacute como las prestaciones que debe cumplir el demandado Si la prestacioacuten ordenada es de dar una suma de dinero la misma debe estar indicada en monto liacutequido El juez puede disponer el pago de sumas mayores a las demandadas si apare-ciere error en el caacutelculo de los derechos demandados o error en la invocacioacuten de las normas aplicables

De esta manera en virtud de la facultad ultra petita el juez laboral podriacutea otorgar un mayor monto por Compensacioacuten por Tiempo de Servicios en caso de que el actor incurra en un error al no considerar determinados rubros que legalmente forman parte de la Remuneracioacuten Computable (remuneracioacuten que se toma como base de caacutelculo para establecer la Compensacioacuten por Tiempo de Servicios conforme a lo regulado por los artiacuteculos 9 a 20 del Decreto Supremo No 01-97-TR -Texto Uacutenico Ordenado de la Ley de CTS) De otro lado en teacuterminos generales dicha facultad resulta igualmente aplicable en el caso de que exista alguacuten error aritmeacutetico en la determinacioacuten de los beneficios sociales o en la sumatoria del total adeudado Finalmente consideramos que la citada atribucioacuten podriacutea ser ejercitada si el actor reclama el pago de las gratificaciones de los meses de julio y diciembre considerando erroacuteneamente que el monto de cada gratificacioacuten asciende al 50 de la Remuneracioacuten del actor cuando de conformi-dad con la Ley 27735 la gratificacioacuten equivale a un sueldo iacutentegro por cada oportunidad

32 LA FLEXIBILIZACIOacuteN DEL PRINCIPIO DE CONGRUENCIA EN EL

PROCESO CONTENCIOSO ADMINISTRATIVO LABORAL

Si bien en la LPCA no existe una disposicioacuten similar a la prevista en el artiacuteculo 31 de la NLPT si resul-ta posible que la sentencia en el proceso contencioso administrativo pueda sobrepujar o exceder los teacuterminos de la demanda que incluso puede ser considerada como una facultad de fallo extra petita En efecto el TUO de la LPCA en su artiacuteculo 41 establece que ldquoLa sentencia que declare fundada la deman-da podraacute decidir en funcioacuten de la pretensioacuten planteada lo siguiente 2 El restablecimiento o reconoci-miento de una situacioacuten juriacutedica individualizada y la adopcioacuten de cuantas medidas sean necesarias para el restablecimiento o reconocimiento de la situacioacuten juriacutedica lesionada aun cuando no hayan sido pre-tendidas en la demanda[hellip]rdquo(lo resaltado es nuestro)

11 Pasco Cosmoacutepolis MariordquoFundamentos de Derecho Procesal del Trabajordquo Lima aele 1997p57

12 Artiacuteculo 50 La sentencia declararaacute fundada la demanda c) Respecto de los hechos constatados por el Juez Privativo de Trabajo y

Comunidades Laborales que constituyan violacioacuten de las normas legales o convencionales objeto de la demanda pudiendo ordenar

tambieacuten el pago de sumas mayores a las reclamadas si de lo actuado apareciere error en los caacutelculos de las liquidaciones demandadasrdquo

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Para Giovanni Priori ldquoesta es una consecuencia del contencioso-administrativo de plena jurisdiccioacuten y con la finalidad de brindar una efectiva tutela a la situacioacuten juriacutedica objeto del proceso el Juez podraacute ordenar las medidas necesarias para su efectiva tutela aun cuando no hayan sido demandadas con-virtieacutendose esta decisioacuten en una excepcioacuten al principio de congruencia algo que es plausible de la Ley pues al menos en esta sede siacute reconoce una excepcioacuten al principio de congruenciardquo13

En este orden de ideas constatamos que si es posible la instrumentacioacuten del principio inquisitivo del proceso laboral en un proceso contencioso administrativo desde el momento que la sentencia puede exceder los planteamientos de la demanda

4 PRINCIPIO DE SUPLENCIA INDIRECTA DE LA DEMANDA

Por otro lado uno de los pocos rasgos de caraacutecter dispositivo del proceso laboral14 es que los teacuterminos de la demanda son fijados por el actor lo cual delimita los extremos de la controversia Sin embargo por la naturaleza de los derechos en controversia en el proceso laboral pues se tratan de derechos contenidos en normas de orden puacuteblico y se encuentran vinculados al ejercicio de derechos fundamentales al Juez laboral se le ha dotado de la facultad de suplencia indirecta de la demanda En virtud de esta facultad siendo que los derechos laborales son de orden puacuteblico el Juez puede adecuar la calificacioacuten efectuada en la demanda si de los hechos que forman parte de la causa petendi expuesta por el actor se puede concluir de manera categoacuterica cual es realmente la calificacioacuten juriacutedica que corresponde a lo pretendido por el demandante lo cual no es sino en principio la aplicacioacuten del principio de iura novit curia

Por otro lado la suplencia indirecta de la demanda laboral constituye una hipoacutetesis de flexibilizacioacuten del principio de congruencia en un estado democraacutetico y social de derecho que encuentra sustento no solamente en la necesidad de garantizar el derecho al acceso a la justicia componente fundamental del derecho al debido proceso y la tutela jurisdiccional efectiva garantizado en el artiacuteculo 139 inciso 3 de la Carta Poliacutetica sino en los principios que inspiran al nuevo proceso laboral regulado por la Ley Ndeg 29497 cuyo artiacuteculo III del Tiacutetulo Preliminar proclama que en todo proceso laboral los jueces privile-gian el fondo sobre la forma e interpretan los requisitos y presupuestos procesales en sentido favora-ble a la continuidad del proceso

En ese sentido y en armoniacutea con los principios descritos resulta vital que la prosecucioacuten del nuevo pro-ceso laboral debe estar orientado a que el Juez despojaacutendose de las formalidades ingrese al anaacutelisis de lo sustancial o medular siempre que se garantice los derechos de ambas partes esencialmente el dere-cho de defensa sustento baacutesico del debido proceso

En los seguidos por Jherlin Wilmer Suarez Milian contra Hilanderiacutea Andina SAC sobre reposicioacuten y otros Exp Ndeg 30711-2012-0-1801-JR-LA-03 (A) la Cuarta Sala Laboral de Lima bajo la ponencia nuestra mediante mandato de fecha 27 de diciembre de 2013 ha resuelto REVOCAR la resoluci-oacuten nuacutemero dos de fecha 18 de enero de 2013 obrante de fojas 61 a 63 que declara improcedente la demanda y REFORMAacuteNDOLA se dispuso la adecuacioacuten de la demanda y que el juez de la causa admita a traacutemite la demanda de reposicioacuten por despido fraudulento y prosiga la causa conforme a su estado bajo los siguientes fundamentos

13 Priori Posada Giovanni ldquoComentarios a la Ley del proceso Contencioso Administrativordquo ARA Editores 4taEdic Lima 2009 p272

14 Si bien el proceso laboral tiene un tinte marcadamente inquisitivo no hay que olvidar que posee algunos rasgos dispositivos como el

sentildealado Estos conceptos han sido analizados por el Vocal Ponente en el artiacuteculo ldquoEl Principio de Congruencia en el Proceso Laboralrdquo en

el Artiacuteculo publicado en Revista Actualidad Juriacutedica Ndeg 193 diciembre de 2009 p 263-266

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17 Se advierte del escrito de demanda que el actor presentoacute ante el 03deg Juzgado Especializado de

Trabajo Permanente de Lima como petitorio (petitum) ldquo[hellip] se ordene a la demandada se deje sin

efecto el DESPIDO INCAUSADO que sufriera el 08 de noviembre de 2012 y consiguientemente

se ordene mi reposicioacuten en el mismo puesto y en el cargo de Hilandero que veniacutea ostentando

hasta antes de ser despedido por considerar que estamos ante un tiacutepico despido incausado ya

que la demandada so- pretexto de comisioacuten de falta grave me ha despedido del trabajo sin que

mi persona haya cometido falta algunardquo (sic)

18 Asimismo en el escrito de subsanacioacuten de demanda que obra de fojas 58 a 60 el accionante

precisa que en su caso se ha producido un despido arbitrario ya que considera que en el presente

proceso la demandada no podraacute demostrar la supuesta falta contenida por su persona hecho

que de acuerdo a lo establecido en el artiacuteculo 34 del Decreto Supremo Ndeg 003-97-Tr hay

arbitrariedad cuando en un proceso no se puede probar la falta atribuida

19 Por otro lado como causa petendi sentildeala que su persona en ninguacuten momento ha cometido

falta grave que amerite su despido y que es falso que su persona haya agredido al sentildeor Yan Taijin

Nagkai y que solo se trata de actos de represalia por su condicioacuten de trabajador sindicalista

20 De lo antes expuesto se colige que los hechos expuestos por el demandante como causa

petendi encuadrariacutean dentro de la figura del despido fraudulento esto es cuando se despide

al trabajador con aacutenimo perverso y auspiciado por el engantildeo por ende de manera contraria a

la verdad y la rectitud de las relaciones laborales aun cuando se cumple con la imputacioacuten de

una causal y los caacutenones procedimentales como sucede cuando se imputa al trabajador hechos

notoriamente inexistentes falsos o imaginarios o asimismo se le atribuye una falta no prevista

legalmente vulnerando el principio de tipicidad Definicioacuten del despido fraudulento aportada

por el Tribunal Constitucional en la sentencia recaiacuteda en el expediente Ndeg 976-2001-AATC

Caso Eusebio Llanos Huasco

21 En ese sentido si bien el accionante solicita como petitorio sentildealando que en su caso se ha

producido un despido arbitrario y como consecuencia de ello solicita la reposicioacuten a su centro de

labores conforme lo ha expresado en su escrito de subsanacioacuten de demanda obrante de fojas

58 a 60 de los hechos expuestos como causa de pedir puede colegirse meridianamente que el

petitum de reposicioacuten estaacute respaldado por hechos que configurariacutean un despido fraudulento

que como hemos sostenido en este colegiado en pronunciamientos anteriores no constituye

sino una modalidad de despido arbitrario

22 Por lo tanto por aplicacioacuten del principio del iura novit curia y por suplencia indirecta de la

demanda y en la labor de optimizar la proteccioacuten de los derechos fundamentales este Colegiado

considera que la tutela pretendida en este proceso es de naturaleza restitutoria (reposicioacuten)

por despido fraudulento siendo que corresponderaacute al pronunciamiento en la sentencia luego de

cumplirse con las reglas del contradictorio y el debate probatorio establecer si efectivamente

los hechos expuestos por el demandante tienen asidero

En esta orientacioacuten con mucha satisfaccioacuten hemos constatado que el Pleno Jurisdiccional Nacional Laboral del antildeo 2014 celebrado el 24 y 25 de octubre en la ciudad de Tacna ha acordado por mayoriacutea en el tema 2 referido a la calificacioacuten juriacutedica de los hechos expuestos en la demanda que ldquoSi puede el juez calificar los hechos expuestos en la demanda sobre reposicioacuten eligiendo entre los diferentes supuestos de despido inconstitucionales (incausado fraudulento y nulo) en virtud de la aplicacioacuten de principios como son Suplencia de queja deficiente Iura Novit Curia y Prevalencia de fondo sobre la forma siem-pre y cuando haya sido sometido a contradictoriordquo15

41 EL PRINCIPIO DE SUPLENCIA DE OFICIO EN LA LPCA

A diferencia del principio de suplencia indirecta de la demanda que podemos extraer mediante una labor interpretativa de los principios que gobiernan el nuevo proceso laboral la LPCA si contiene expresamente el principio de la suplencia de oficio al sentildealar en el artiacuteculo 24 que el juez deberaacute suplir las deficiencias formales en las que incurran las partes sin perjuicio de disponer la subsanacioacuten de las mismas en un plazo razonable en los casos en que no sea posible la suplencia de oficio

15 En Materiales proporcionados en el Taller De Intercambio de Experiencias Sobre La Nueva Ley Procesal Del Trabajo realizado el 01

de diciembre 2014 en la provincia constitucional del Callao y organizado por PPR 099-Celeridad en los Procesos Judiciales Laborales

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A decir de Viacutector Anacleto por este principio se busca que el juez dinaacutemico activo coadyuve al control de la Administracioacuten Puacuteblica y por ello es que ante cualquier desconocimiento del ciudadano tiene que suplir tiene que apoyar para suplir las deficiencias formales del administrado al juez le compete favo-recer para que se acceda al control de la Administracioacuten Puacuteblica16

De esta forma constatamos que existe un acercamiento de los principios que impulsan el nuevo proce-so laboral con aquellos principios que sustentan el Proceso Contencioso Administrativo

5 EL PRINCIPIO DE VERACIDAD

El artiacuteculo I del Tiacutetulo Preliminar de NLPT ha consagrado expliacutecitamente este principio seguacuten el cual el proceso laboral no se conforma con la verdad aparente formal la que fluye uacutenicamente de los docu-mentos sino que busca la verdad absoluta la realidad de los hechos

El principio de veracidad no es sino el correlato del principio de la primaciacutea de la realidad

Al respecto Ameacuterico Pla Rodriacuteguez sentildeala que ldquoel principio de la primaciacutea de la realidad significa que en caso de discordancia entre lo que ocurre en la praacutectica y lo que surge de los documentos y acuerdos debe darse preferencia a lo primero es decir a lo que sucede en el terreno de los hechosrdquo 17

El principio de la primaciacutea de la realidad es una de las herramientas maacutes relevantes del Derecho del Trabajo que en el caso peruano no solamente tiene un arraigo en la jurisprudencia sino que incluso ya se encuentra positivizado en nuestro ordenamiento laboral18

Se trata de evitar que en el aacutembito de las relaciones laborales con el objeto de burlar los derechos labo-rales se disfrace una relacioacuten laboral y se haga aparecer como si se tratara de una relacioacuten de caraacutecter civil o comercial o para burlar a los acreedores o lograr algunas prestaciones de la Seguridad Social se trate de aparentar la existencia de una relacioacuten laboral

El principio de la Primaciacutea de la Realidad se ha plasmado en numerosos pronunciamientos jurispru-denciales no soacutelo de la judicatura laboral sino incluso del Tribunal Fiscal y del INDECOPI siendo que incluso el Pleno Jurisdiccional Laboral realizado en la ciudad de Tarapoto en el antildeo 2000 ha acordado que ldquosi el Juez constata la existencia de una relacioacuten laboral a pesar de la celebracioacuten de un contrato de servicios civil o mercantil deberaacute preferir la aplicacioacuten de los principios de la primaciacutea de la realidad y de irrenunciabilidad sobre el buena feacute contractual que preconiza el Coacutedigo Civil para reconocer los derechos laborales que correspondanrdquo

Que este reconocimiento a nivel doctrinal y jurisprudencial ya habiacutea sido recogido en el artiacuteculo I del Tiacutetulo Preliminar de la Ley Procesal de Trabajo 2636 bajo la denominacioacuten del principio de veracidad que como hemos indicado liacuteneas arriba no es sino el correlato del mismo aunque como tal esto es como principio de primaciacutea de la realidad ha sido positivizado por vez primera en nuestra legislacioacuten laboral mediante el Decreto Legislativo 910 cuyo artiacuteculo 5 inciso f) establece que la inspeccioacuten de tra-bajo se ejecuta a traveacutes de las acciones entre otras ldquoAplicar el principio de primaciacutea de la realidad que rige el derecho laboral el cual determina que se deba privilegiar los hechos vinculados sustantivamen-te con el trabajo sobre los actos formales que difieran de la naturaleza de tales situacionesrdquo El artiacuteculo 22 de la actual Ley General de Inspeccioacuten del Trabajo Nordm 28806 lo reconoce en similares teacuterminos19

16 ANACLETO GUERRERO Viacutector Proceso Contencioso Administrativo Lex amp Iuris Grupo Editorial 2016 p105

17 Los Principios del Derecho del Trabajo Depalma Bs As 1998 p 313

18 TOLEDO TORIBIO Omar ldquoEl Principio de la Primaciacutea de la Realidadrdquo En Revista Diaacutelogo con la Jurisprudencia Antildeo 10 Ndeg75 Diciembre

2004 pp 87 a 89

19 TOLEDO TORIBIO Omar ldquoPrincipios Ordenadores que rigen el Sistema de Inspeccioacuten de Trabajordquo En Comentarios a la Ley General de

Inspeccioacuten de Trabajo Gaceta Juriacutedica SA Lima 2008 p33-42

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A este inicial reconocimiento legal del principio de la primaciacutea de la realidad se agrega que en el Artiacuteculo 54 del Anteproyecto de la Ley de Reforma de la Constitucioacuten se sentildeala que el Estado estaacute obligado a garantizar la prevencioacuten eliminacioacuten y remedio de cualquier praacutectica que implique abuso en el cam-po laboral siendo que para ello se sentildeala que en toda relacioacuten de trabajo se garantizaran principios miacutenimos entre ellos el principio de la primaciacutea de la realidad (inciso 4) Asimismo el Art XIV6 del Anteproyecto de Ley General de Trabajo consagra como principios del ordenamiento laboral entre otros a la Primaciacutea de la realidad para preferir los hechos sobre las formas y las apariencias

A ello debemos agregar que la Ley General del Sistema Concursal (Ley 27809 -EP 8802) ha incor-porado la referencia a este importante principio del Derecho Laboral en lo relativo a la calificacioacuten de creacuteditos laborales En efecto seguacuten esta ley para el reconocimiento de creacuteditos de origen laboral y siempre que el acreedor lo haya invocado la Comisioacuten podraacute aplicar el principio de la primaciacutea de la realidad privilegiando los hechos verificados sobre las formas o apariencias contractuales que susten-ten el creacutedito (Artiacuteculo 40)

De manera pues que la aplicacioacuten del principio de la primaciacutea de la realidad viene a constituir un impor-tante instrumento a efectos de calificar debidamente los creacuteditos laborales y evitar de esta manera la simulacioacuten de la existencia de contratos de otra naturaleza para encubrir verdaderos contratos labo-rales o la simulacioacuten de la existencia de creacuteditos laborales con el objeto de beneficiarse en este uacuteltimo caso del caraacutecter preferencial de los creacuteditos laborales garantizado en el artiacuteculo 24 de la Constitucioacuten Poliacutetica y el artiacuteculo 421 de la Ley del Sistema Concursal

Creemos que la consagracioacuten legislativa del principio implica que no solamente resulta de aplicacioacuten en los aacutembitos indicados sino con mayor razoacuten seraacute de aplicacioacuten por parte de la judicatura al decidir sobre conflictos juriacutedicos de naturaleza laboral

La jurisprudencia del Tribunal Constitucional ha sido muy recurrente en cuanto a la aplicacioacuten de este principio tal es el caso de la sentencia expedida en el Expediente Ndeg 00457-2006 AATC Ucayali ha sentildealado que

5 De la evaluacioacuten conjunta del acta de inspeccioacuten y de los abundantes medios probatorios

resentildeados que obran en el expediente se comprueba que si bien durante el tiempo que

los recurrentes trabajaron en la empresa demandada celebraron contratos de locacioacuten de

servicios en realidad llevaban a cabo sus labores bajo un horario establecido y estaban sujetos

a una relacioacuten de subordinacioacuten y dependencia Consecuentemente conforme al principio

de primaciacutea de la realidad los contratos de locacioacuten de servicios de los recurrentes se

desnaturalizaron convirtieacutendose en contratos de trabajo de duracioacuten indeterminada estando

a ello este Tribunal considera que los recurrentes teniacutean un viacutenculo laboral vigente al momento

en que supuestamente vencieron sus contratos de locacioacuten de servicios Por tanto no podiacutean ser

despedidos sino por el procedimiento previamente establecido en la ley de modo que han sido

objeto de despido arbitrario (el subrayado es nuestro)

Precisamente con el objeto de alcanzar la verdad real la NLPT igualmente ha contemplado la posibili-dad del Juez laboral pueda ordenar la actuacioacuten de pruebas de oficio Sin embargo debemos sentildealar que se encuentra estableciendo liacutemites y condiciones para que el Juzgador haga efectiva dicha facul-tad En ese sentido el artiacuteculo 22 de la NLPT preveacute que Excepcionalmente el juez puede ordenar la praacutectica de alguna prueba adicional en cuyo caso dispondraacute lo conveniente para su realizacioacuten pro-cediendo a suspender la audiencia en la que se actuacutean las pruebas por un lapso adecuado no mayor a treinta (30) diacuteas haacutebiles y a citar en el mismo acto fecha y hora para su continuacioacuten Esta decisioacuten es inimpugnable Esta facultad no puede ser invocada encontraacutendose el proceso en casacioacuten La omisioacuten de esta facultad no acarrea la nulidad de la sentencia

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51 EL PRINCIPIO DE VERACIDAD EN EL PROCESO CONTENCIOSO

ADMINISTRATIVO LABORAL

El Tribunal Constitucional se ha referido al principio de primaciacutea de la realidad y por ende al principio de veracidad en los siguientes teacuterminos

En cuanto al principio de primaciacutea de la realidad que es un elemento impliacutecito en nuestro

ordenamiento juriacutedico y concretamente impuesto por la propia naturaleza tuitiva de nuestra

Constitucioacuten el Tribunal Constitucional ha precisado en la STC Ndeg 1944-2002-AATC que ldquo[]

en caso de discordancia entre lo que ocurre en la praacutectica y lo que fluye de los documentos debe

darse preferencia a lo primero es decir a lo que sucede en el terreno de los hechosrdquo (STC Ndeg

01388-2011-PATC FUNDAMENTO 4)

Siendo que el Tribunal Constitucional considera al principio de primaciacutea de la realidad y por lo tanto al principio de veracidad como un elemento impliacutecito en nuestro ordenamiento juriacutedico y concreta-mente impuesto por la propia naturaleza tuitiva de nuestra Constitucioacuten resulta incuestionable su aplicacioacuten al PCAL tanto maacutes si en el anaacutelisis de las actuaciones administrativas deberaacute aplicarse el principio de verdad material principio contenido en la Ley del Procedimiento Administrativo General en los siguientes teacuterminos

En el procedimiento la autoridad administrativa competente deberaacute verificar plenamente los

hechos que sirven de motivo a sus decisiones para lo cual deberaacute adoptar todas las medidas

probatorias necesarias autorizadas por la ley aun cuando no hayan sido propuestas por los

administrados o hayan acordado eximirse de ellas En el caso de procedimientos trilaterales la

autoridad administrativa estaraacute facultada a verificar por todos los medios disponibles la verdad

de los hechos que le son propuestos por las partes sin que ello signifique una sustitucioacuten del

deber probatorio que corresponde a estas Sin embargo la autoridad administrativa estaraacute

obligada a ejercer dicha facultad cuando su pronunciamiento pudiera involucrar tambieacuten al

intereacutes puacuteblico (art IV 111 TUO aprobado por DS 006-2017-JUS)

Por otro lado el TUO de la LPCA confiere igualmente al Juez la facultad de actuar pruebas de oficio pues el artiacuteculo 32 sentildeala que cuando los medios probatorios ofrecidos por las partes sean insuficien-tes para formar conviccioacuten el Juez en decisioacuten motivada e inimpugnable puede ordenar la actuacioacuten de medios probatorios adicionales que considere convenientes

6 LA CARGA DE LA PRUEBA EN EL PROCESO LABORAL

En el proceso civil las partes deben probar los hechos que aleguen excepto aquellos que se presumen conforme a ley Es decir la ldquocarga de la pruebardquo o el onus probandi recae en quien afirma un hecho o una circunstancia (Artiacuteculo 196deg del Coacutedigo Procesal Civil)

Tradicionalmente se ha considerado que en el proceso Laboral se da el fenoacutemeno de la inversioacuten de la carga de la prueba principio seguacuten el cual la mayor responsabilidad probatoria o casi toda la carga de la prueba lo soportaba el empleador siendo que el trabajador en la generalidad de los casos solo estaacute obligado a probar la relacioacuten laboral Sin embargo a raiacutez de las modificaciones legislativas producidas desde la deacutecada pasada en este movimiento flexibilizador o desregulador de las relaciones laborales el principio de inversioacuten de la carga de la prueba se habiacutea atenuado o relativizado de tal manera que en algunos tipos de procesos laborales como en los procesos de nulidad de despido o las acciones deriva-das de los actos de hostilidad la carga de la prueba recaiacutea exclusivamente en el trabajador20 En ese sen-

20 Artiacuteculo 27 Ley 26636 CARGA DE LA PRUEBA Corresponde a las partes probar sus afirmaciones y esencialmente 3 al empleador

la causa del despido al trabajador probar la existencia del despido su nulidad cuando la invoque y la hostilidad de la que fuera objeto

(subrayado nuestro)

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tido conforme a la Ley 26636 podemos decir que praacutecticamente es en los procesos de cobro de benefi-cios sociales y otros derechos remunerativos en los uacutenicos que se cumple estrictamente este principio pues corresponde al trabajador esencialmente probar la existencia del viacutenculo laboral en cambio al empleador le corresponde probar casi todo lo demaacutes es decir el cumplimiento de las obligaciones con-tenidas en las normas legales los convenios colectivos la costumbre el reglamento interno y el contra-to individual de trabajo(art 27 incs1 y 2 de la Ley 26636) Por ello en lugar de inversioacuten de la carga de la prueba algunos prefieren hablar de distribucioacuten o asignacioacuten de la carga de la prueba

La NLPT se ocupa de la carga de la prueba en el artiacuteculo 23 regulacioacuten que a nuestro criterio reivindica el principio de inversioacuten de la carga de la prueba de tal forma que el citado principio se convierte en una medida tendiente a equilibrar a las partes que intervienen en el proceso pues como sabemos una de las manifestaciones del desequilibrio innato entre las partes de la relacioacuten laboral es la desigualdad pro-batoria En efecto desde el momento en que la relacioacuten laboral se lleva a cabo en el lugar indicado por el empleador eacuteste tiene mayores y mejores posibilidades de premunirse de medios probatorios que le van a servir en un eventual conflicto juriacutedico En ese sentido resulta necesario que la norma procesal laboral contenga disposiciones que tiendan a superar este desequilibrio

El citado artiacuteculo 23 establece lo siguiente

ldquoArtiacuteculo 23- Carga de la prueba

231 La carga de la prueba corresponde a quien afirma hechos que configuran su pretensioacuten

o a quien los contradice alegando nuevos hechos sujetos a las siguientes reglas especiales

de distribucioacuten de la carga probatoria sin perjuicio de que por ley se dispongan otras

adicionales

232 Acreditada la prestacioacuten personal de servicios se presume la existencia de viacutenculo laboral

a plazo indeterminado salvo prueba en contrario

233 Cuando corresponda si el demandante invoca la calidad de trabajador o ex trabajador

tiene la carga de la prueba de

a) La existencia de la fuente normativa de los derechos alegados de origen distinto al

constitucional o legal

b) El motivo de nulidad invocado y el acto de hostilidad padecido

c) La existencia del dantildeo alegado

234 De modo paralelo cuando corresponda incumbe al demandado que sea sentildealado como

empleador la carga de la prueba de

a) El pago el cumplimiento de las normas legales el cumplimiento de sus obligaciones

contractuales su extincioacuten o inexigibilidad

b) La existencia de un motivo razonable distinto al hecho lesivo alegado

c) El estado del viacutenculo laboral y la causa del despido

235 En aquellos casos en que de la demanda y de la prueba actuada aparezcan indicios que

permitan presumir la existencia del hecho lesivo alegado el juez debe darlo por cierto salvo

que el demandado haya aportado elementos suficientes para demostrar que existe justificacioacuten

objetiva y razonable de las medidas adoptadas y de su proporcionalidadrdquo

61 LA PRESUNCIOacuteN DE LABORALIDAD

De la norma citada debemos destacar la presuncioacuten de laboralidad contenida en el artiacuteculo 232 de la NLPT que a nuestro criterio revoluciona el tratamiento de la carga de la prueba En efecto superaacuten-dose la presuncioacuten contenida en el artiacuteculo 4 del TUO del Decreto legislativo 728 que exige la confi-guracioacuten de los tres elementos esenciales del contrato de trabajo (prestacioacuten personal subordinacioacuten y remuneracioacuten) a efectos de que presuma la existencia de la relacioacuten laboral la noviacutesima norma soacutelo exige la acreditacioacuten de la prestacioacuten personal de servicios a efectos de que se presuma la existencia de un contrato de trabajo a tiempo indeterminado siendo que corresponderaacute al empleador destruir la

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presuncioacuten acreditando lo contrario lo cual no significa que el empleador tendraacute que demostrar la no subordinacioacuten (prueba diaboacutelica o negativa) sino que teniendo en cuenta que las pruebas van orientadas a demostrar hechos positivos estaraacute obligado a demostrar el caraacutecter autoacutenomo o independiente de la prestacioacuten laboral o que el trabajador teniacutea la posibilidad de ser ayudado por otras personas o reem-plazado en su labor por personas de su eleccioacuten no vinculadas al empleador o que la obligada a prestar los servicios era una persona juriacutedica y no una persona natural

62 CARGA DE PRUEBA EN LOS PROCESOS DE NULIDAD DE DESPIDO

El otro tema contemplado por la NLPT que consideramos relevante es el tratamiento de la carga de prueba en los procesos de nulidad de despido En efecto si bien el artiacuteculo 233 de la noviacutesima Ley preveacute que corresponde al trabajador demandante probar b) El motivo de nulidad invocado y el acto de hostilidad padecido el artiacuteculo 234 determina quede modo paralelo cuando corresponda incumbe al demandado que sea sentildealado como empleador la carga de la prueba de b) La existencia de un motivo razo-nable distinto al hecho lesivo alegado

Somos de la opinioacuten que lo anterior significa la extensioacuten para todas las causales de despido nulo y para todas las acciones derivadas de los actos de hostilidad (acciones de cese de hostilidad e indemnizacioacuten por despido indirecto) del disentildeo de carga de la prueba implantado por la Ley 27185 artiacuteculo 1 para el despido de la mujer embarazada quien como se sabe estaacute protegida por el llamado fuero de maternidad

La Ley 27185 publicada el 19-10-99 establece que ldquo[] Se presume que el despido tiene por motivo el embarazo si el empleador no acredita en este caso la existencia de causa justa para despedir Lo dis-puesto en el presente inciso es aplicable siempre que el empleador hubiere sido notificado documen-talmente del embarazo en forma previa al despido y no enerva la facultad del empleador de despedir por causa justardquo

De esta forma en el caso de la mujer embarazada eacutesta debe acreditar uacutenicamente dos hechos baacutesicos esto es su condicioacuten y que el empleador teniacutea conocimiento de este hecho A partir de dicho momento se invierte la carga de la prueba de tal forma que seraacute el empleador el que demuestre la existencia de otro motivo distinto que justifique el despido del trabajador

Refuerza la conclusioacuten lo regulado en el artiacuteculo 235 de la NLPT cuando sentildeala que en aquellos casos en que de la demanda y de la prueba actuada aparezcan indicios que permitan presumir la existencia del hecho lesivo alegado el juez debe darlo por cierto salvo que el demandado haya aportado elemen-tos suficientes para demostrar que existe justificacioacuten objetiva y razonable de las medidas adoptadas y de su proporcionalidad (lo resaltado es nuestro)

63 LA CARGA DE LA PRUEBA EN EL PROCESO CONTENCIOSO ADMINISTRATIVO

Respecto a la carga de la prueba la LPCA establece en su artiacuteculo 33 que salvo disposicioacuten legal diferen-te la carga de la prueba corresponde a quien afirma los hechos que sustentan su pretensioacuten Sin embar-go si la actuacioacuten administrativa impugnada establece una sancioacuten o medidas correctivas o cuando por razoacuten de su funcioacuten o especialidad la entidad administrativa estaacute en mejores condiciones de acre-ditar los hechos la carga de probar corresponde a eacutesta

Lo anterior no significa sino la consagracioacuten en nuestro sistema procesal de la teoriacutea de las cargas pro-batorias dinaacutemicas instituto que igualmente estaacute recogido en la Nueva Ley Procesal del Trabajo pues si analizamos las diversas reglas de la carga de prueba establecidas en la NLPT no significan sino la plas-macioacuten de esta doctrina por lo que en esta temaacutetica resulta evidente que ambos procesos confluyen

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7 PRINCIPIO DE IRRENUNCIABILIDAD DE DERECHOS

El principio de irrenunciabilidad de derechos laborales tiene reconocimiento constitucional en la norma contenida en el inciso 2 del artiacuteculo 26 de la Constitucioacuten Poliacutetica del Estado que prescribe lo siguiente ldquoEn toda relacioacuten laboral se respeta el caraacutecter irrenunciable de los derechos reconocidos por la Constitucioacuten y la Leyrdquo

El artiacuteculo 26ordm inciso 1ordm de la Constitucioacuten establece que en la relacioacuten laboral se respeta el caraacutecter irrenunciable de los derechos contenidos en la Constitucioacuten y la Ley

El sistema juriacutedico no reconoce al trabajador la facultad de dejar de lado o abandonar sus derechos laborales La justificacioacuten de esto la encontramos en el hecho real de que el trabajador por su posicioacuten de inferioridad frente al empleador por presioacuten falsas promesas o simple temor reverencial pueda dis-poner de los derechos que el ordenamiento juriacutedico le reconoce

Sin embargo es preciso aclarar que conforme a la redaccioacuten del texto constitucional no todos los dere-chos laborales son irrenunciables Los derechos que no tengan como fuente la Constitucioacuten o la Ley son perfectamente disponibles Vgr el trabajador puede renunciar a la tolerancia que otorga el empleador para el ingreso al centro laboral o puede renunciar al otorgamiento de la ldquoCanasta Navidentildeardquo o a una suma concedida a tiacutetulo de liberalidad por el empleador

Respecto a la ineficacia de los actos de renuncia de derechos la Constitucioacuten Poliacutetica de 1979 teniacutea un pronunciamiento categoacuterico En efecto el artiacuteculo 57 estableciacutea que ldquoLos derechos reconocidos a los trabajadores son irrenunciables Su ejercicio estaacute garantizado por la Constitucioacuten Todo pacto en contrario es nulordquo (la negrilla es nuestra) Por lo tanto resulta evidente que la anterior carta poliacutetica ademaacutes de otorgar el caraacutecter de irrenunciable a todos los derechos reconocidos a los trabajadores y no solamente a los que tengan oriacutegen constitucional o legal sanciona con nulidad todo acuerdo de renuncia de derechos

Sin embargo en teacuterminos actuales tambieacuten se puede concluir que los actos de disposicioacuten de dere-chos laborales son ineficaces en virtud a la aplicacioacuten de la nulidad virtual prevista en el artiacuteculo V del Tiacutetulo Preliminar del Coacutedigo Civil seguacuten la cual es nulo el acto juriacutedico contrario a las normas que inte-resan al orden puacuteblico o a las buenas costumbres En efecto siendo que la norma contenida en el artiacute-culo 26 inciso 2 de la Constitucioacuten Poliacutetica es de orden puacuteblico los actos que la contravengan resultan ineficaces

El Tribunal Constitucional en la STC Ndeg 008-2005-PITC hace referencia a este principio en los siguien-tes teacuterminos

24 Hace referencia a la regla de no revocabilidad e irrenunciabilidad de los derechos reconocidos

al trabajador por la Constitucioacuten y la ley Al respecto es preciso considerar que tambieacuten tienen la

condicioacuten de irrenunciables los derechos reconocidos por los tratados de Derechos Humanos

toda vez que estos constituyen el estaacutendar miacutenimo de derechos que los Estados se obligan a

garantizar a sus ciudadanos [Remotti Carbonell Joseacute Carlos La Corte Interamericana de

Derechos Humanos Estructura funcionamiento y jurisprudencia Barcelona Instituto Europeo

de Derecho 2003 p 18]

En ese sentido de conformidad con lo establecido en el artiacuteculo V del Tiacutetulo Preliminar del

Coacutedigo Civil la renuncia a dichos derechos seriacutea nula y sin efecto legal alguno

Asiacute conforme se desprende de lo previsto en el inciso 2) del artiacuteculo 26ordm de la Constitucioacuten la

irrenunciabilidad soacutelo alcanza a aquellos ldquo() derechos reconocidos por la Constitucioacuten y la leyrdquo

No cubre pues a aquellos provenientes de la convencioacuten colectiva de trabajo o la costumbre

Por otro lado debe precisarse que un derecho de naturaleza laboral puede provenir de una

norma dispositiva o taxativa En ese contexto la irrenunciabilidad es soacutelo operativa en el caso

de la segunda

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La norma dispositiva es aquella que opera soacutelo cuando no existe manifestacioacuten de voluntad

o cuando eacutesta se expresa con ausencia de claridad El Estado las hace valer uacutenicamente por

defecto u omisioacuten en la expresioacuten de voluntad de los sujetos de la relacioacuten laboral

Las normas dispositivas se caracterizan por suplir o interpretar una voluntad no declarada o

precisar y aclararla por defecto de manifestacioacuten y por otorgar a los sujetos de una relacioacuten laboral

la atribucioacuten de regulacioacuten con pleno albedriacuteo dentro del marco de la Constitucioacuten y la ley

Ante este tipo de modalidad normativa el trabajador puede libremente decidir sobre la

conveniencia o no de ejercitar total o parcialmente un derecho de naturaleza individual

Al respecto puede citarse el caso del derecho a vacaciones contemplado en el Decreto

Legislativo Nordm 713 en donde se establece que el trabajador tiene derecho a treinta diacuteas

naturales de descanso remunerado al antildeo y dentro de ese contexto por la prerrogativa de la

voluntad establecida en dicha norma este puede disponer hasta de quince diacuteas para continuar

prestando servicios a su empleador a cambio de una compensacioacuten extraordinaria Por ende

tiene la capacidad autodeterminativa de decidir un ldquocanjerdquo sobre aquello

En cambio la norma taxativa es aquella que ordena y dispone sin tomar en cuenta la voluntad de

los sujetos de la relacioacuten laboral En ese aacutembito el trabajador no puede ldquodespojarserdquo permutar o

renunciar a los beneficios facultades o atribuciones que le concede la norma

Javier Neves Mujica [Introduccioacuten al derecho laboral Lima Fondo Editorial de la PUCP 2003 p

103] manifiesta que el principio de irrenunciabilidad de derechos es justamente el que prohiacutebe

que los actos de disposicioacuten del trabajador como titular de un derecho recaigan sobre normas

taxativas y sanciona con la invalidez la transgresioacuten de esta pauta basilar

La irrenunciabilidad de los derechos laborales proviene y se sujeta al aacutembito de las normas

taxativas que por tales son de orden puacuteblico y con vocacioacuten tuitiva a la parte maacutes deacutebil de la

relacioacuten laboral Es conveniente consignar que una norma juriacutedica puede contener dentro de su

texto partes taxativas y dispositivas

El Tribunal Constitucional ha tenido ocasioacuten de pronunciarse sobre la materia en el caso

Sindicato de Trabajadores de Toquepala vs Southern Peruacute Copper Corporation (Expediente Ndeg

1396-2001-AATC) en donde establecioacute que si ldquo[] las partes acordaron no solo la duracioacuten

de la jornada ordinaria de trabajo seraacute tambieacuten las jornadas atiacutepicas situacioacuten que de por si no

violenta derecho fundamental de los afiliados al Sindicato sino soacutelo cuando dicha estipulacioacuten

sea indebidamente aplicada de otro lado lo expuesto no soacutelo no contradice el principio

contenido en el inciso 2) del artiacuteculo 26ordm de la Constitucioacuten relativo al caraacutecter irrenunciable

de los derechos reconocidos por la Constitucioacuten y la ley por encontrarse previsto en la misma

como se ha observado sino tambieacuten porque el derecho protegido en la Carta Magna es el

relativo a una jornada de trabajo que no excede de las cuarenta y ocho horas semanales []rdquo

La Ley 26636 en el Artiacuteculo III del Tiacutetulo Preliminar la contemplado de manera expliacutecita este principio en los siguientes teacuterminos El Juez debe velar por el respeto del caraacutecter irrenunciable de los derechos reco-nocidos por la Constitucioacuten y la Ley

Si bien la NLPT no ha considerado en su tiacutetulo preliminar de manera expresa al citado principio ello no sig-nifica que no constituya obligacioacuten del juzgador su acatamiento pues como se ha precisado se trata de un mandato constitucional Es mas la virtud de la noviacutesima Ley ha sido el de haber regulado por primera vez algunos criterios que se deben considerar al momento de efectuar un juicio de irrenunciabilidad En efecto si bien hasta ahora existen en la Ley 26636 disposiciones que obligan al Juzgador a efectuar una anaacutelisis de irrenunciabilidad al momento de adoptar ciertas decisiones como son las vinculadas a la aprobacioacuten de las actas de conciliacioacuten judicial homologacioacuten de conciliaciones privadas aprobacioacuten de un desisti-miento o resolver una excepcioacuten de transaccioacuten no se habiacutea disentildeado paraacutemetros de anaacutelisis y aspectos a tener en cuenta para una oacuteptima decisioacuten resguardando el principio materia de anaacutelisis

El Artiacuteculo 30 de la NLPT preveacute que para que un acuerdo conciliatorio o transaccional ponga fin al pro-ceso debe superar el test de disponibilidad de derechos para lo cual se toman los siguientes criterios

a) El acuerdo debe versar sobre derechos nacidos de una norma dispositiva debiendo el juez

verificar que no afecte derechos indisponibles

b) debe ser adoptado por el titular del derecho y

c) debe haber participado el abogado del prestador de servicios demandante(Lo resaltado es nuestro)

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Lo anterior significa que por primera vez en nuestro medio se regula este test de disponibilidad de dere-chos que como hemos sentildealado constituiraacute un referente para el oacutergano jurisdiccional al momento de analizar la vigencia del principio de irrenunciabilidad de derechos

71 EN EL PROCESO CONTENCIOSO ADMINISTRATIVO

Teniendo en cuenta que el principio de irrenunciabilidad de derechos laborales tiene un reconocimien-to constitucional resulta evidente su aplicacioacuten al Proceso Contencioso Administrativo Laboral sien-do que en la eventualidad de que se produzca un acto de transaccioacuten o conciliacioacuten a que se refiere el artiacuteculo 43 de la LPCA el Juez deberaacute aplicar un juicio de disponibilidad con el objeto de garantizar que se respete la norma imperativa contenida en el artiacuteculo 262 de la Constitucioacuten Poliacutetica del Estado

8 PRINCIPIO DEL IN DUBIO PRO OPERARIO

Este principio es materia de alegacioacuten frecuente a las intervenciones escritas y orales de los miembros del foro Sin embargo es preciso sentildealar que la aplicacioacuten de este principio no es ilimitada

En efecto el texto constitucional (artiacuteculo 26 inciso 3) ha previsto este instituto en su acepcioacuten restrin-gida esto es como regla hermeneacuteutica o criterio de interpretacioacuten de la praacutectica aplicativa del orde-namiento laboral En ese sentido podemos concluir que en nuestro sistema legal la aplicacioacuten de este principio procede uacutenicamente cuando existe duda insalvable sobre los diversos sentidos de una norma

Si tenemos en cuenta que las normas juriacutedicas son multiacutevocas esto es que admiten diversas interpre-taciones si el Juez Laboral se encuentra ante una norma que puede ser interpretada de diversa manera seguacuten el texto constitucional deberiacutea agotar todos los recursos interpretativos aplicando los meacutetodos y teacutecnicas hermeneuacuteticas y soacutelo en la eventualidad de que la duda no pueda despejarse optar por la inter-pretacioacuten que favorezca al trabajador

Por lo tanto no resulta de aplicacioacuten el citado principio cuando se trata de resolver dudas referidas a los hechos que sustentan las pretensiones de las partes y deben ser materia de prueba en el proceso Asimismo no resulta de aplicacioacuten este principio cuando se trata de la valoracioacuten de los medios probatorios

El Tribunal Constitucional respecto a este principio en el fundamento 21 de la STC 008-2005-PITC expresa lo siguiente

ldquoc31 Indubio pro operario

21 Hace referencia a la traslacioacuten de la vieja regla del derecho romano indubio pro reo Nuestra

Constitucioacuten exige la interpretacioacuten favorable al trabajador en caso de duda insalvable sobre

el sentido de una norma vale decir que se acredite que a pesar de los aportes de las fuentes de

interpretacioacuten la norma deviene indubitablemente en un contenido incierto e indeterminado

La nocioacuten de duda insalvable debe ser entendida como aquella que no puede ser resuelta por

medio de la teacutecnica hermeneacuteutica

El principio indubio pro operario seraacute aplicable cuando exista un problema de asignacioacuten

de significado de los alcances y contenido de una norma Ergo nace de un conflicto de

interpretacioacuten mas no de integracioacuten normativa La nocioacuten de ldquonormardquo abarca a la misma

Constitucioacuten los tratados leyes los reglamentos los convenios colectivos de trabajo los

contratos de trabajo etc

Pasco Cosmopolis precisa que la aplicacioacuten de este principio debe ajustarse a los siguientes dos

requisitos

- Existencia de una duda insalvable o inexpugnable

- Respeto a la ratio juris de la norma objeto de interpretacioacuten (para tal efecto el aplicador del

derecho deberaacute asignarle un sentido concordante y compatible con la razoacuten de eacutesta)

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El Tribunal Constitucional considera que la aplicacioacuten del referido principio estaacute sujeta a las

cuatro consideraciones siguientes

- Existencia de una norma juriacutedica que como consecuencia del proceso de interpretacioacuten ofrece

varios sentidos

- Imposibilidad loacutegico-axioloacutegica de dirimir esta duda mediante la utilizacioacuten de cualquier

meacutetodo de interpretacioacuten admitido como vaacutelido por el ordenamiento nacional

- Obligacioacuten de adoptar como sentido normativo a aqueacutel que ofrece mayores beneficios al trabajador

- Imposibilidad del operador de integrar la norma ya que el principio no se refiere a suplir la

voluntad de eacuteste sino a adjudicarle el sentido maacutes favorable al trabajadorrdquo (sic)

Si bien la NLPT no ha considerado expresamente este principio no cabe duda que constituyendo un mandato constitucional resulta de aplicacioacuten en el nuevo proceso Laboral e igualmente en el Proceso Contencioso Administrativo Laboral pues en realidad se trata de que en ambos procesos se ventilan derechos de caraacutecter laboral

9 PRINCIPIO DE INMEDIATEZ

El fundamento doctrinario del principio de inmediatez radica en el hecho de que sobre la relacioacuten laboral no puede pender permanentemente la posibilidad de su disolucioacuten por hechos ocurridos a lo largo de su desarrollo pues no puede concebirse que el contrato de trabajo mantenga en reserva indeterminada las infracciones pasadas como si fueran actualmente relevantes Asimismo este principio implica que debe existir una relacioacuten de cercaniacutea en teacuterminos temporales entre la accioacuten y la reaccioacuten De esta forma no habraacute inmediatez si el empleador deja pasar un tiempo considerable antes de actuar frente a una infrac-cioacuten laboral ya que el transcurso del tiempo implica el olvido de la falta (artiacuteculo 31 del DS 03-97-TR)

De igual forma hay ausencia de inmediatez si el trabajador alega como la motivacioacuten del despido nulo que invoca un hecho distante en el tiempo o cuando el trabajador sentildeala ser objeto de un acto de hosti-lidad basaacutendose en un hecho ocurrido hace tiempo

De manera pues que la inmediatez es un principio aplicable tanto al empleador como al trabajador en la cautela de sus respectivos derechos y su inobservancia supone el olvido de los hechos ocurridos los mismos que no pueden ser invocados posteriormente

La Ley 26636 ni la NLPT han previsto expresamente la aplicacioacuten del principio de inmediatez Sin embargo resulta evidente su aplicacioacuten en los procesos laborales como lo revelan los pronunciamien-tos de la justicia ordinaria y los pronunciamientos del Tribunal Constitucional

Efectivamente al respecto en la STC Ndeg00543-2007-PATC el Tribunal Constitucional ha sentildealado

5 El principio de inmediatez en el procedimiento de despido ha sido regulado en el artiacuteculo 31ordm del

Texto Uacutenico Ordenado del Decreto Legislativo Nordm 728 Ley de Productividad y Competitividad

Laboral Decreto Supremo 003-97-TR (TUO LPCL DS 003-97-TR) que expresamente establece

El empleador no podraacute despedir por causa relacionada con la conducta o con la capacidad del

trabajador sin antes otorgarle por escrito un plazo razonable no menor de seis diacuteas naturales

para que pueda defenderse por escrito de los cargos que se le formulare salvo aquellos casos de

falta grave flagrante en que no resulte razonable tal posibilidad o de treinta diacuteas naturales para

que demuestre su capacidad o corrija su deficiencia

Mientras dure el traacutemite previo vinculado al despido por causa relacionada con la conducta

del trabajador el empleador puede exonerarlo de su obligacioacuten de asistir al centro de trabajo

siempre que ello no perjudique su derecho de defensa y se le abone la remuneracioacuten y demaacutes

derechos y beneficios que pudieran corresponderle La exoneracioacuten debe constar por escrito

Tanto en el caso contemplado en el presente artiacuteculo como en el Artiacuteculo 32 debe observarse

el principio de inmediatez

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6 Asiacute el legislador ha regulado al principio de inmediatez como un requisito esencial que

condiciona formalmente el despido (Ibiacutedem Comentario a la Casacioacuten Nordm 1917-2003-Lima (El

Peruano 31 de mayo de 2007) paacuteg 234) el cual limita la facultad sancionadora del empleador

y que en el presente caso va a determinar si su vulneracioacuten conduce a un despido incausado o

viceversa si su observancia va a conducir al despido fundado en causa justa Por otro lado si

bien es cierto que el legislador no le ha establecido un plazo determinado es porque obviamente

su funcioacuten tiene mucha relacioacuten con el principio de razonabilidad y proporcionalidad y deja al

juzgador al momento de examinar el caso concreto su verificacioacuten u observancia

7 El principio de inmediatez tiene dos etapas definidas

(i) El proceso de cognicioacuten que estariacutea conformado por todos los hechos que ocurren despueacutes

de la comisioacuten de la falta por el trabajador lo que significa primero tomar conocimiento (de la

falta) a raiacutez de una accioacuten propia a traveacutes de los oacuterganos que dispone la empresa o a raiacutez de una

intervencioacuten de terceros como los clientes los proveedores las autoridades etc En segundo

lugar debe calificarse esto es encuadrar o definir la conducta descubierta como una infraccioacuten

tipificada por la ley susceptible de ser sancionada Y en tercer lugar debe comunicarse a los

oacuterganos de control y de direccioacuten de la empleadora que representan la instancia facultada

para tomar decisiones ya que mientras el conocimiento de la falta permanezca en los niveles

subalternos no produce ninguacuten efecto para el coacutemputo de cualquier teacutermino que recaiga bajo

la responsabilidad de la empresa (Ibiacutedem Comentario a la Casacioacuten Nordm 1917-2003-Lima (El

Peruano 31 de mayo de 2007) Citando el comentario de Jaime Beltraacuten Quiroga p 231) es

decir que se tome conocimiento pleno de los hechos sucedidos para posteriormente tomar

decisiones en el marco de las facultades sancionadoras del empleador

(ii) El proceso volitivo se refiere a la activacioacuten de los mecanismos decisorios del empleador

para configurar la voluntad del despido ya que eacuteste por esencia representa un acto unilateral

de voluntad manifiesta o presunta del patrono El inicio de este proceso estaacute dado por la

evolucioacuten de la gravedad de la falta por las repercusiones que causan al nivel de productividad

y a las relaciones laborales existentes en la empresa y por el examen de los antecedentes del

trabajador infractor y la conducta desarrollada en el centro de trabajo para establecer si excediacutea

los maacutergenes de confianza depositados en eacutel Con este cuadro de perspectivas la segunda etapa

estaacute dada por la toma de decisioacuten que depende de la complejidad que tenga la organizacioacuten

empresarial ya que mientras mayor sea eacutesta las instancias que intervengan en la solucioacuten

deberaacuten ser maacutes numerosas y por el contrario mientras maacutes simple sea como el caso de un

empresario individual que dirija su propia pequentildea empresa bastaraacute con su sola decisioacuten la que

podraacute ser adoptada en el maacutes breve plazo (Ibiacutedem)

8 En consecuencia los teacuterminos o plazos existentes entre ambas etapas es variado y se dan de

acuerdo a la complejidad de la falta cometida asiacute como de la organizacioacuten empresarial Entonces

el principio de inmediatez resulta sumamente elaacutestico (Ibiacutedem)teniendo en cuenta que incluso

al interior de estas etapas se desarrolla un procedimiento tal como ha sido sentildealado supra

9 En el mismo sentido en el aacutembito internacional tambieacuten se ha determinado la importancia

del principio de inmediatez y su relacioacuten con el plazo razonable Asiacute la Recomendacioacuten Nordm 166

de la OIT sobre ldquola terminacioacuten de la relacioacuten laboralrdquo en su numeral 10 sentildeala que ldquose deberiacutea

considerar que el empleador ha renunciado a su derecho de dar por terminada la relacioacuten de

trabajo de un trabajador a causa de una falta de eacuteste si no hubiera adoptado esta medida dentro

de un periodo razonable desde que tuvo conocimiento de la faltardquo

10 De lo dicho hasta acaacute se deduce claramente que el plazo razonable para ejercer la facultad

sancionadora del empleador no estaacute determinado por un determinado periodo de tiempo fijo

sino por las situaciones especiales que pudieran presentarse y por las acciones realizadas por

el empleador a fin de establecer certeramente la falta cometida en las etapas descritas en los

fundamentos precedentes

Si bien la el principio de inmediatez se encuentra contemplado de manera expresa en el artiacuteculo 31 del TUO del Decreto Legislativo 728 no cabe duda que resulta de aplicacioacuten general en el ejercicio de la potestad disciplinaria del Estado En ese sentido en la instrumentacioacuten de un PCAL en el que se cuestione una sancioacuten disciplinaria de un trabajador del Estado que no se encuentre bajo el reacutegi-men de la actividad privada esto es que se encuentre bajo el Reacutegimen del DL 276 o el Reacutegimen del Decreto Legislativo 1057 resulta perfectamente aplicable el principio de inmediateacutez siendo que inclu-so en ese sentido se ha pronunciado el Tribunal del Servicio Civil en la Resolucioacuten de Sala Plena Ndeg 003-2010-SERVIRTSC su fecha 10 de agosto de 2010

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10 PRINCIPIO DE IGUALDAD PROCESAL

El artiacuteculo III del Tiacutetulo Preliminar de la NLPT establece que en todo proceso laboral los jueces deben evitar que la desigualdad entre las partes afecte el desarrollo o resultado del proceso para cuyo efecto procuran alcanzar la igualdad real de las partes En particular acentuacutean estos deberes frente a la madre gestante el menor de edad y la persona con discapacidad

Este principio resulta de aplicacioacuten igualmente en el PCAL pues el artiacuteculo 22 de la LPCA establece que las partes en el proceso contencioso administrativo deberaacuten ser tratadas con igualdad indepen-dientemente de su condicioacuten de entidad puacuteblica o administrado

Este principio es compartido por ambos sistemas procesales se sustenta precisamente en la norma constitucional prevista en el artiacuteculo 22 del Texto Constitucional seguacuten el cual toda persona tiene derecho a la igualdad ante la ley siendo que nadie debe ser discriminado por motivo de origen raza sexo idioma religioacuten opinioacuten condicioacuten econoacutemica o de cualquiera otra iacutendole

11 PRINCIPIO DE RAZONABILIDAD

El artiacuteculo III del Tiacutetulo Preliminar de la NLPT ha contemplado expresamente el principio de razonabili-dad como un principio que debe ser observado por los jueces

El principio de razonabilidad consiste en la afirmacioacuten esencial de que el ser humano en sus relaciones laborales procede y debe proceder conforme a la razoacuten esto es que se trata de una especie de liacutemite o freno moral y elaacutestico al mismo tiempo aplicable a aquellas aacutereas del comportamiento donde la norma no puede prescribir liacutemites muy riacutegidos ni en un sentido ni en otro y sobre todo donde la norma no puede prever la infinidad de circunstancias posibles y siendo ello asiacute este principio se deberaacute aplicar tenien-do en cuenta la necesidad de analizar en concreto cada caso en que se aplica este criterio el enfoque flexible y elaacutestico con que debe manejarse y la necesidad de una cierta proporcionalidad entre la accioacuten y la reaccioacuten ocasionada21

El Tribunal Constitucional respecto de este principio se ha pronunciado en el siguiente sentido

El principio de razonabilidad o proporcionalidad es consustancial al Estado Social y Democraacutetico

de Derecho y estaacute configurado en la Constitucioacuten en sus artiacuteculos 3ordm y 43ordm y plasmado

expresamente en su artiacuteculo 200deg uacuteltimo paacuterrafo Si bien la doctrina suele hacer distinciones

entre el principio de proporcionalidad y el principio de razonabilidad como estrategias para

resolver conflictos de principios constitucionales y orientar al juzgador hacia una decisioacuten que no

sea arbitraria sino justa puede establecerse prima facie una similitud entre ambos principios

en la medida que una decisioacuten que se adopta en el marco de convergencia de dos principios

constitucionales cuando no respeta el principio de proporcionalidad no seraacute razonable En este

sentido el principio de razonabilidad parece sugerir una valoracioacuten respecto del resultado del

razonamiento del juzgador expresado en su decisioacuten mientras que el procedimiento para llegar

a este resultado seriacutea la aplicacioacuten del principio de proporcionalidad con sus tres subprincipios

de adecuacioacuten de necesidad y de proporcionalidad en sentido estricto o ponderacioacutenrdquo

(Fundamento 15 Sentencia del Exp Ndeg 2192-2004-AATC)

[hellip] Por lo precedentemente expuesto este Colegiado considera que en el presente caso tambieacuten

se ha violado el principio de proporcionalidad como atributo del Estado Social y Democraacutetico de

Derecho reconocido expliacutecitamente por el artiacuteculo 200deg de la Constitucioacutenrdquo (Fundamento 22

Sentencia del Exp Ndeg 2192-2004-AATC)

Por otro lado en STC Ndeg 0090-2004-AATC fundamento 35 respecto al principio de razonabilidad propiamente ha expuesto lo siguiente

21 Sala de Derecho Constitucional y Social de la Corte Suprema de la Repuacuteblica Res De fecha 120299 Exp Casacioacuten 0785-96

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La razonabilidad implica que el acto estatal debe mantener su justificacioacuten loacutegica y axioloacutegica en

los sucesos o circunstancias que fueran Asiacute la doctrina exige que se produzca una consonancia

entre el hecho antecedente ldquocreadorrdquo o ldquomotivadorrdquo del acto estatal y el hecho consecuente

derivado de aqueacutel

En consecuencia la razonabilidad comporta una adecuada relacioacuten loacutegico-axioloacutegica entre la

circunstancia motivante el objeto buscado y el medio empleado

Por otro lado la razonabilidad puede ser analizada desde una doble perspectiva cuantitativa

y cualitativa

La razonabilidad cuantitativa pondera el contenido del proceso discursivo o inferente que

concluye con una proposicioacuten loacutegica y axioloacutegicamente vaacutelida Su fundamentacioacuten apuesta a la

adecuacioacuten entre el hecho desencadenante del acto estatal y el resultado de eacuteste en cuanto a su

magnitud numeacuterica dineraria aritmeacutetica etc

La razonabilidad cualitativa pondera el proceso discursivo o inferente que concluye con

una regla simeacutetrica o asimeacutetrica de asignacioacuten de facultades derechos deberes deberes o

servicios seguacuten sean iguales o diferentes los hechos generados por las personas Asiacute su objeto

seraacute la determinacioacuten de consecuencias juriacutedicas homoacutelogas para aquellos que se encuentren en

ideacutenticas circunstancias y distintas para los que se hallen en disiacutemiles circunstancias

El acto estatal debe acreditar la necesaria disposicioacuten o correspondencia entre la causa que lo

origina y el efecto buscado Existe entonces la necesidad de acreditar coherencia y equilibrio

entre el antecedente que origina el acto estatal y la consecuencia derivada de aqueacutel

La doctrina plantea la verificacioacuten loacutegico-axioloacutegica de una proposicioacuten juriacutedica bicondicional

esto es que se justifique la asignacioacuten de derechos facultades deberes o sanciones si y soacutelo siacute

guardan armoniacutea y sindeacuteresis con los hechos sucesos o circunstancias predeterminantes

La proporcionalidad exige la existencia indubitable de una conexioacuten directa indirecta y

relacional entre causa y efecto vale decir que la consecuencia juriacutedica establecida sea

uniacutevocamente previsible y justificable a partir del hecho ocasionante del acto estatal En

consecuencia la proporcionalidad lo seraacute cuando la razoacuten del efecto sea deducible de la causa

o previsible a partir de ella

Ahora bien maacutes allaacute de la convencioacuten doctrinaria que admite su autonomiacutea como concepto en

puridad la proporcionalidad es una modalidad maacutes de la razonabilidad (razonabilidad instrumental)rdquo

En la legislacioacuten laboral encontramos algunas disposiciones que hacen referencia a este principio

Artiacuteculo 25 DS 03-97-TR- Falta grave es la infraccioacuten por el trabajador de los deberes esenciales que emanan del contrato de tal iacutendole que haga irrazonable la subsistencia de la relacioacuten

Artiacuteculo 9 DS 03-97-TR- Por la subordinacioacuten el trabajador presta sus servicios bajo direccioacuten de su empleador el cual tiene facultades para normar reglamentariamente las labores dictar las oacuterdenes necesarias para la ejecucioacuten de las mismas y sancionar disciplinariamente dentro de los liacutemites de la razonabilidad cualquier infraccioacuten o incumplimiento de las obligaciones a cargo del trabajador

El empleador estaacute facultado para introducir cambios o modificar turnos diacuteas u horas de trabajo asiacute como la forma y modalidad de la prestacioacuten de las labores dentro de criterios de razonabilidad y teniendo en cuenta las necesidades del centro de trabajo

Artiacuteculo 30 paacuterrafo final DS 03-97-TR El trabajador antes de accionar judicialmente deberaacute emplazar por escrito a su empleador imputaacutendole el acto de hostilidad correspondiente otorgaacutendole un plazo razonable no menor de seis diacuteas naturales para que efectuacutee su descargo o enmiende su conducta seguacuten sea el caso

Artiacuteculo 31 DS 03-97-TR- El empleador no podraacute despedir por causa relacionada con la conducta o con la capacidad del trabajador sin antes otorgarle por escrito un plazo razonable no menor de seis diacuteas naturales para que pueda defenderse por escrito de los cargos que se le formulare salvo aquellos casos de falta grave flagrante en que no resulte razonable tal posibilidad o de treinta diacuteas naturales para que demuestre su capacidad o corrija su deficiencia

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111 EN EL PROCESO CONTENCIOSO ADMINISTRATIVO

Resulta evidente que el principio de razonabilidad resulta de aplicacioacuten en el PCA desde que consti-tuye una previsioacuten constitucional contemplado en el artiacuteculo 200 de la Carta Poliacutetica y la aplicacioacuten y utilizacioacuten de este principio debe ser ademaacutes verificada por el juzgador contencioso administrativo a propoacutesito del control judicial de las decisiones administrativas las mismas que deben observar igual-mente este principio a tenor de lo previsto en el artiacuteculo IV 14 del TUO de la Ley del Procedimiento Administrativo General que establece que las decisiones de la autoridad administrativa cuando creen obligaciones califiquen infracciones impongan sanciones o establezcan restricciones a los administra-dos deben adoptarse dentro de los liacutemites de la facultad atribuida y manteniendo la debida proporcioacuten entre los medios a emplear y los fines puacuteblicos que deba tutelar a fin de que respondan a lo estricta-mente necesario para la satisfaccioacuten de su cometido

Por otro lado en virtud del principio de integracioacuten previsto en el artiacuteculo 21 del TUO de la LPCA los jueces no deben dejar de resolver el conflicto de intereses o la incertidumbre con relevancia juriacutedico por defecto o deficiencia de la ley En tales casos deberaacuten aplicar los principios del derecho administrativo

12 EL DEBIDO PROCESO Y LA TUTELA JURISDICCIONAL

La NLPT en el Titulo Preliminar artiacuteculo III se refiere a estos principios en los siguientes teacuterminos En todo proceso laboral los jueces deben evitar que la desigualdad entre las partes afecte el desarrollo o resultado del proceso para cuyo efecto procuran alcanzar la igualdad real de las partes privilegian el fondo sobre la forma interpretan los requisitos y presupuestos procesales en sentido favorable a la continuidad del proceso observan el debido proceso la tutela jurisdiccional y el principio de razona-bilidad En particular acentuacutean estos deberes frente a la madre gestante el menor de edad y la persona con discapacidad (Lo resaltado es nuestro)

El debido proceso y la tutela jurisdiccioacuten constituyen principios aplicables a todo proceso y como tal estaacuten contemplados en el artiacuteculo 139 de la Constitucioacuten Poliacutetica del Estado y por lo tanto resulta indu-dable su aplicacioacuten al proceso laboral y al proceso contencioso administrativo

13 PRINCIPIOS OPERACIONALES

Finalmente los artiacuteculos I y III del Tiacutetulo Preliminar de la NLPT han previsto los denominados principios operacionales o principios del procedimiento y que son los siguientes

131 ORALIDAD

Respecto de este principio la NLPT en el artiacuteculo 12 establece la prevalencia de la oralidad en los proce-sos por audiencias En efecto esta norma preveacute que en los procesos laborales por audiencias las expo-siciones orales de las partes y sus abogados prevalecen sobre las escritas sobre la base de las cuales el juez dirige las actuaciones procesales y pronuncia sentencia Las audiencias son sustancialmente un debate oral de posiciones presididas por el juez quien puede interrogar a las partes sus abogados y terceros participantes en cualquier momento Las actuaciones realizadas en audiencia salvo la etapa de conciliacioacuten son registradas en audio y viacutedeo utilizando cualquier medio apto que permita garanti-zar fidelidad conservacioacuten y reproduccioacuten de su contenido Las partes tienen derecho a la obtencioacuten de las respectivas copias en soporte electroacutenico a su costo Si no se dispusiese de medios de grabacioacuten electroacutenicos el registro de las exposiciones orales se efectuacutea haciendo constar en acta las ideas cen-trales expuestas

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La oralidad contribuye a la democratizacioacuten de la justicia y del derecho puesto que se requiere un juez que ademaacutes de un rol activo ndash director e impulsor del proceso esto es que dirija ordene y agilice el proceso asuma un papel asistencial interactuando con las partes para determinar y delimitar el objeto del proceso los hechos controvertidos y la prueba admisible y pertinente esto es colaborando en la buacutesqueda de la verdad real y asegurando una igualdad real entre las partes de tal manera que la parte victoriosa sea la que probablemente tiene la razoacuten y no la que posee maacutes medios econoacutemicos para pagar a un representante haacutebil que complique el proceso en aras a los intereses de su representado y resista la lentitud del proceso22

Para el profesor Paul Paredes Palacios ldquola oralidad no significa solamente el uso de la palabra hablada como medio de comunicacioacuten en las audiencias (oralidad en sentido deacutebil) Significa la necesidad de interaccioacuten entre los partiacutecipes en las audiencias para actualizar las pretensiones las defensas y los medios probatorios a fin de permitir al juez a su conclusioacuten la construccioacuten del sustento faacutectico ndash juriacute-dico de su decisioacuten (oralidad en sentido fuerte)El sentido o significado fuerte de la oralidad se aprecia claramente en el disentildeo de las audiencias de conciliacioacuten y de juzgamiento (en el proceso ordinario laboral) y en el de la audiencia uacutenica (en el proceso abreviado laboral) En ellos el valor de la oralidad estaacute en su capacidad de actualizacioacuten del conflicto23

En el proceso contencioso administrativo existen dos posibilidades de realizarse una audiencia que resulta ser una audiencia de pruebas a saber 1) la audiencia de pruebas en el proceso especial la misma que se realiza soacutelo cuando la actuacioacuten de los medios probatorios ofrecidos lo requiera (art 281 LPCA) y 2) cuando al incorporarse medios probatorios extemporaacuteneos es necesaria la citacioacuten a audiencia para la actuacioacuten de un medio probatorio (art 31 LPCA)

Es en estas oportunidades en que puede instrumentarse el principio de oralidad ademaacutes de la posibi-lidad de realizarse un informe oral antes del dictado de la sentencia en primera instancia siempre a pedido de parte (art 281 in fine de la LPCA) o en la vista de la causa a propoacutesito de la interposicioacuten del recurso de apelacioacuten o de casacioacuten

132 INMEDIACIOacuteN

La inmediacioacuten implica que el juzgador deberaacute tomar contacto directo e inmediato con los elementos objetivos y subjetivos de la controversia En ese sentido conforme a este principio las audiencias y la actuacioacuten de medios probatorios se realizan ante el Juez siendo indelegables bajo sancioacuten de nulidad

La inmediacioacuten prevista como principio en la NLPT viene a ser en realidad un principio que se comple-menta con el principio de oralidad de tal manera que seraacute de aplicacioacuten en el PCA en las oportunidades en que se pueda instrumentar un proceso por audiencias conforme a lo descrito en el acaacutepite anterior Ademaacutes resulta igualmente de aplicacioacuten en el PCA pues conforme al artiacuteculo 2 del TUO de la PCA el proceso contencioso administrativo se rige por los principios del derecho procesal sin perjuicio de la aplicacioacuten supletoria de los principios del derecho procesal civil en los casos en que sea compatible

133 CONCENTRACIOacuteN

Este principio se refiere a que el proceso se realiza procurando que su desarrollo ocurra en el menor nuacutemero de actos procesales

La concentracioacuten prevista como principio en la NLPT viene a ser un principio que complementa al prin-cipio de oralidad y resulta igualmente de aplicacioacuten en el PCA pues conforme al artiacuteculo 2 del TUO de la PCA el proceso contencioso administrativo se rige por los principios del derecho procesal sin perjuicio de la aplicacioacuten supletoria de los principios del derecho procesal civil en los casos en que sea compatible

22 JINESTA Ernesto (1999) La oralidad en el Proceso Contencioso Administrativo Ivstituia (Antildeo 13 Ndeg 155-156) Paacutegina 3

23 PAREDES PALACIOS Paul ldquoLa Oralidad como herramienta para el acceso a la justicia en el nuevo proceso laboral peruanordquo Disponivel em

lthttpwwwacademiaedu25637914La_oralidad_como_herramienta_para_el_acceso_a_la_justicia_en_el_nuevo_proceso_laboral_peruanogt

Obtenido el 20 abr 2018

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134 CELERIDAD

Conforme a este principio la actividad procesal se realiza diligentemente y dentro de los plazos estab-lecidos debiendo el Juez a traveacutes de los auxiliares bajo su direccioacuten tomar las medidas necesarias para lograr una pronta y eficaz solucioacuten del conflicto de intereses o incertidumbre juriacutedica

El artiacuteculo III segundo paacuterrafo del Tiacutetulo Preliminar de la NLPT establece al efecto que los jueces labo-rales tienen un rol protagoacutenico en el desarrollo e impulso del proceso por lo que tienen el deber de impedir y sancionar la inconducta contraria a los deberes de veracidad probidad lealtad y buena fe de las partes sus representantes sus abogados y terceros

La celeridad procesal prevista como principio en la NLPT resulta igualmente de aplicacioacuten en el PCA pues conforme al artiacuteculo 2 del TUO de la PCA el proceso contencioso administrativo se rige por los principios del derecho procesal sin perjuicio de la aplicacioacuten supletoria de los principios del derecho procesal civil en los casos en que sea compatible

135 ECONOMIacuteA PROCESAL

En virtud de este principio el Juez dirige el proceso tendiendo a una reduccioacuten de los actos procesales sin afectar el caraacutecter imperativo de las actuaciones que lo requieran

MONROY GAacuteLVEZ Juan sentildeala que ldquoEl principio de economiacutea procesal exige que tanto la estructura del proceso como los deberes facultades y actuaciones de las partes y el juez deben realizarse bajo una loacutegica de eficiencia que permita reducir costos directos e indirectos o lo que doctrinalmente se ha lla-mado economiacutea del gasto refirieacutendose a los costos patrimonialmente cuantificables de forma directa que se sufragan en un proceso economiacutea del esfuerzo para referirse al nuacutemero de actos procesales por llevarse a cabo y economiacutea del tiempo en alusioacuten a la duracioacuten del procesordquo24

Como hemos expuesto anteriormente en relacioacuten al principio de concentracioacuten procesal la economiacutea procesal prevista como principio en la NLPT viene a ser un principio que complementa al principio de oralidad y resulta igualmente de aplicacioacuten en el PCA pues conforme al artiacuteculo 2 del TUO de la PCA el proceso contencioso administrativo se rige por los principios del derecho procesal sin perjuicio de la aplicacioacuten supletoria de los principios del derecho procesal civil en los casos en que sea compatible

136 FAVORECIMIENTO DEL PROCESO

En virtud de este principio los jueces interpretan los requisitos y presupuestos procesales en sentido favo-rable a la continuidad del proceso conforme lo establece el Artiacuteculo III del Tiacutetulo Preliminar de la NLPT

Esta norma tiene su antecedente en el artiacuteculo 2 inciso 3 de Texto Uacutenico Ordenado de la Ley que Regula el Proceso Contencioso Administrativo aprobado por el Decreto Supremo Nordm 013-2008-JUS seguacuten el cual el Juez no podraacute rechazar liminarmente la demanda en aquellos casos en los que por falta de preci-sioacuten del marco legal exista incertidumbre respecto del agotamiento de la viacutea previa Asimismo en caso de que el Juez tenga cualquier otra duda razonable sobre la procedencia o no de la demanda deberaacute preferir darle traacutemite a la misma

En ese sentido el Tribunal Constitucional en la sentencia de fecha treinta de enero de dos mil cuatro expedida en el Expediente Nordm 1049-2003-AA citando a Pico I Junoy Joan Las garantiacuteas constituciona-les del proceso Barcelona Bosh 1997 en el fundamento nuacutemero cinco ha hecho referencia al princi-pio favor actionis o pro actione seguacuten el cual ldquose impone a los juzgadores la exigencia de interpretar los requisitos y presupuestos procesales en el sentido maacutes favorable a la plena efectividad del derecho a obtener una resolucioacuten vaacutelida sobre el fondo (P49)rdquo

24MONROY GAacuteLVEZ Juan op Cit p99

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Lo anterior no significa sino la vigencia del derecho al acceso a la tutela jurisdiccional garantizada cons-titucionalmente en el numeral 3) del artiacuteculo 139ordm de la Constitucioacuten Poliacutetica del Estado

En relacioacuten a este principio del PCA el profesor Giovanni Priori sentildeala que ldquono debe entenderse que con dicho principio se estaacute estableciendo que los requisitos procesales no resultan trascendentes o que no deben ser cumplidos sino que uacutenicamente y exclusivamente se estaacute estableciendo un criterio inter-pretativo en caso el juez al momento de admitir la demanda encuentre duda si se ha cumplido o no con un requisito procesal En esos casos el juez deberaacute atendiendo al derecho constitucional de acceso a la jurisdiccioacuten preferir darle traacutemite al proceso sin perjuicio que en un momento posterior pueda decla-rar esta vez ya con certeza que efectivamente no se habiacutea cumplido con un requisito de procedencia lo que podraacute hacer incluso antes de dictar sentencia a traveacutes de una sentencia inhibitoria25

Por otro lado Anacleto Guerrero sentildeala que ldquocabe indicar que el principio pro actione o de favorecimiento del proceso seraacute aplicable no soacutelo para atenuar las barreras procesales que limitan el acceso a la jurisdicci-oacuten sino tambieacuten para aquellos casos en los que deban interpretarse requisitos formales del acto procesal y presupuestos procesales en el sentido maacutes favorable a la plena efectividad de la tutela jurisdiccionalrdquo26

De esta manera el principio de favorecimiento del proceso es compartido tanto por la NLPT como por la LPCA

137 PREVALENCIA DEL FONDO SOBRE LA FORMA

Constituye fundamento del nuevo proceso laboral contemplado en el artiacuteculo III del Tiacutetulo Preliminar de la NLPT que en todo proceso laboral los jueces deben evitar que la desigualdad entre las partes afecte el desarrollo o resultado del proceso para cuyo efecto procuran alcanzar la igualdad real de las partes privile-gian el fondo sobre la forma interpretan los requisitos y presupuestos procesales en sentido favorable a la continuidad del proceso observan el debido proceso la tutela jurisdiccional y el principio de razonabilidad

Bajo esta orientacioacuten resulta necesario que en el nuevo esquema procesal se tienda a evitar pronun-ciamientos inhibitorios o nulificantes que tienen efectos perniciosos no solamente en la imagen sino en la propia subsistencia del modelo En efecto si tenemos en cuenta de que el nuacutemero de personal es limitado y la carga procesal agobiante -producto entre otras razones de la expectativa que genera un nuevo proceso laboral ceacutelere y eficaz- quienes se encuentran al frente de los procesos laborales deben estar mentalizados en la tendencia de emitir pronunciamientos respecto al fondo de la controversia en todos los casos salvo excepciones muy contadas evitando de esa formas las criacuteticas que siempre se formulan en contra de la institucioacuten judicial situacioacuten que lleva a que se deslegitime el modelo

Este principio resulta igualmente de aplicacioacuten al proceso contencioso administrativo pues bajo la eacutegida del principio de integracioacuten previsto en el artiacuteculo 21 de la LPCA resulta de aplicacioacuten al PCA el principio de informalismo contemplado en el artiacuteculo IV 16 del TUO de la Ley del Procedimiento Administrativo General seguacuten el cual las normas del procedimiento deben ser interpretadas en sentido favorable a admisioacuten y decisioacuten final de las pretensiones de los administrados de modo que sus derechos e intereses no sean afectados por la exigencia de aspectos formales que puedan ser subsanados dentro del procedi-miento siempre que dicha excusa no afecte derechos de terceros o el intereacutes puacuteblico

14 CONCLUSIONES

1- La mencioacuten contenida en el artiacuteculo 24 de la NLPT a que el proceso contencioso administrativo laboral se tramitaraacute conforme a la ley de la materia nos indica ciertamente que la tramitacioacuten de dichos procesos deberaacuten seguirse bajo la pauta del TUO de la Ley del Proceso Contencioso Administrativo Laboral aprobado por decreto Supremo 013-2008-JUS (en adelante TUO - LPCA) que como sabemos establece un procedi-miento predominantemente escrito con algunos rasgos orales como es el caso de los informes orales que pudieran solicitarse antes de que la causa se encuentre expedita para dictar sentencia ( Artiacuteculo 29 e) y f)

25 PRIORI POSADA Giovanni op cit 104-105

26 ANACLETO GUERRERO Victor Proceso Contencioso Administrativo Lex amp Iuris Grupo Editorial 2016 p104

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2- Sin embargo de cara a las bondades y evidentes beneficios que significa la instrumentacioacuten de un proceso oral esto es in proceso ceacutelere transparente en el que se destaca los principios de inmediacioacuten y concentracioacuten existen planteamientos no solamente en sede nacional sino en el derecho comparado destinados a la necesidad de implementar la oralidad en el PCAL para lo cual se discute si es necesaria una modificacioacuten legislativa o si en una especie de buenas praacutecticas judiciales se puede perfectamente introducir y aplicar los fundamentos y principios que inspiran la NLPT y especialmente la oralidad que se resume en la norma contenida en el artiacuteculo 121 de la NLPT que preveacute que en los procesos laborales por audiencias las exposiciones orales de las partes y sus abogados prevalecen sobre las escritas sobre la base de las cuales el juez dirige las actuaciones procesales y pronuncia sentencia

3- Si bien en la LPCA no existe una disposicioacuten similar a la prevista en el artiacuteculo 31 de la NLPT si resul-ta posible que la sentencia en el proceso contencioso administrativo pueda sobrepujar o exceder los teacuterminos de la demanda En efecto el TUO de la LPCA en su artiacuteculo 41 establece que ldquoLa sentencia que declare fundada la demanda podraacute decidir en funcioacuten de la pretensioacuten planteada lo siguiente 2 El restablecimiento o reconocimiento de una situacioacuten juriacutedica individualizada y la adopcioacuten de cuantas medidas sean necesarias para el restablecimiento o reconocimiento de la situacioacuten juriacutedica lesionada aun cuando no hayan sido pretendidas en la demanda[hellip]rdquo(lo resaltado es nuestro)

4- A diferencia del principio de suplencia indirecta de la demanda que podemos extraer mediante una labor interpretativa de los principios que gobiernan el nuevo proceso laboral la LPCA si contiene expresamente el principio de la suplencia de oficio al sentildealar en el artiacuteculo 24 que el juez deberaacute suplir las deficiencias formales en las que incurran las partes sin perjuicio de disponer la subsanacioacuten de las mismas en un plazo razonable en los casos en que no sea posible la suplencia de oficio

5- Siendo que el Tribunal Constitucional considera al principio de primaciacutea de la realidad y por lo tanto al principio de veracidad como un elemento impliacutecito en nuestro ordenamiento juriacutedico y concretamente impuesto por la propia naturaleza tuitiva de nuestra Constitucioacuten resulta incuestionable su aplicacioacuten al PCAL tanto maacutes si en el anaacutelisis de las actuaciones administrativas deberaacute aplicarse el principio de verdad material principio contenido en la Ley del Procedimiento Administrativo General Por otro lado el TUO de la LPCA confiere igualmente al Juez la facultad de actuar pruebas de oficio pues el artiacuteculo 32 sentildeala que cuando los medios probatorios ofrecidos por las partes sean insuficientes para formar conviccioacuten el Juez en decisioacuten motivada e inimpugnable puede ordenar la actuacioacuten de medios probatorios adicionales que considere convenientes

6- Respecto a la carga de la prueba la LPCA establece que en su artiacuteculo 33 que salvo disposicioacuten legal diferente la carga de la prueba corresponde a quien afirma los hechos que sustentan su pretensioacuten Sin embargo si la actuacioacuten administrativa impugnada establece una sancioacuten o medidas correctivas o cuando por razoacuten de su funcioacuten o especialidad la entidad administrativa estaacute en mejores condiciones de acreditar los hechos la carga de probar corresponde a eacutesta

Lo anterior no significa sino la consagracioacuten en nuestro sistema procesal de la teoriacutea de las cargas pro-batorias dinaacutemicas instituto que igualmente estaacute recogido en la Nueva Ley Procesal del Trabajo pues si analizamos las diversas reglas de la carga de prueba establecidas en la NLPT no significan sino la plas-macioacuten de esta doctrina por lo que en esta temaacutetica resulta evidente que ambos procesos confluyen

7- Teniendo en cuenta que el principio de irrenunciabilidad de derechos laborales tiene un reconoci-miento constitucional resulta evidente su aplicacioacuten al Proceso Contencioso Administrativo Laboral siendo que en la eventualidad de que se produzca un acto de transaccioacuten o conciliacioacuten a que se refiere el artiacuteculo 43 de la LPCA el Juez deberaacute aplicar un juicio de disponibilidad con el objeto de garantizar que se respete la norma imperativa contenida en el artiacuteculo 262 de la Constitucioacuten Poliacutetica del Estado

8- Si bien la NLPT no ha considerado expresamente el principio del in dubio pro operario no cabe duda que constituyendo un mandato constitucional resulta de aplicacioacuten en el nuevo proceso Laboral e igualmente en el Proceso Contencioso Administrativo Laboral pues en realidad se trata de que en ambos procesos se ventilan derechos de caraacutecter laboral

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9- Si bien la el principio de inmediatez se encuentra contemplado de manera expresa en el artiacuteculo 31 del TUO del Decreto Legislativo 728 no cabe duda que resulta de aplicacioacuten general en el ejercicio de la potestad disciplinaria del Estado En ese sentido en la instrumentacioacuten de un PCAL en el que se cuestione una sancioacuten disciplinaria de un trabajador del Estado que no se encuentre bajo el reacutegi-men de la actividad privada esto es que se encuentre bajo el Reacutegimen del DL 276 o el Reacutegimen del Decreto Legislativo 1057 resulta perfectamente aplicable el principio de inmediateacutez siendo que inclu-so en ese sentido se ha pronunciado el Tribunal del Servicio Civil en la Resolucioacuten de Sala Plena Ndeg 003-2010-SERVIRTSC su fecha 10 de agosto de 2010

10- El artiacuteculo III del Tiacutetulo Preliminar de la NLPT establece que en todo proceso laboral los jueces deben evitar que la desigualdad entre las partes afecte el desarrollo o resultado del proceso para cuyo efecto pro-curan alcanzar la igualdad real de las partes En particular acentuacutean estos deberes frente a la madre ges-tante el menor de edad y la persona con discapacidad Este principio resulta de aplicacioacuten igualmente en el PCAL pues el artiacuteculo 22 de la LPCA establece que las partes en el proceso contencioso administrativo deberaacuten ser tratadas con igualdad independientemente de su condicioacuten de entidad puacuteblica o administrado

10- Resulta evidente que el principio de razonabilidad resulta de aplicacioacuten en el PCA desde que cons-tituye una previsioacuten constitucional contemplado en el artiacuteculo 200 de la Carta Poliacutetica y la aplicacioacuten y utilizacioacuten de este principio debe ser ademaacutes verificada por el juzgador contencioso administrativo a propoacutesito del control judicial de las decisiones administrativas las mismas que deben observar igual-mente este principio a tenor de lo previsto en el artiacuteculo IV 14 del TUO de la Ley del Procedimiento Administrativo General que establece que las decisiones de la autoridad administrativa cuando creen obligaciones califiquen infracciones impongan sanciones o establezcan restricciones a los administra-dos deben adoptarse dentro de los liacutemites de la facultad atribuida y manteniendo la debida proporcioacuten entre los medios a emplear y los fines puacuteblicos que deba tutelar a fin de que respondan a lo estricta-mente necesario para la satisfaccioacuten de su cometido Por otro lado en virtud del principio de integra-cioacuten previsto en el artiacuteculo 21 del TUO de la LPCA los jueces no deben dejar de resolver el conflicto de intereses o la incertidumbre con relevancia juriacutedico por defecto o deficiencia de la ley En tales casos deberaacuten aplicar los principios del derecho administrativo

11- En el proceso contencioso administrativo existen dos posibilidades de realizarse una audiencia que resulta ser una audiencia de pruebas a saber 1) la audiencia de pruebas en el proceso especial la misma que se realiza soacutelo cuando la actuacioacuten de los medios probatorios ofrecidos lo requiera (art 281 LPCA) y 2) cuando al incorporarse medios probatorios extemporaacuteneos es necesaria la citacioacuten a audiencia para la actuacioacuten de un medio probatorio (art 31 LPCA) Es en estas oportunidades en que puede instrumentarse el principio de oralidad ademaacutes de la posibilidad de realizarse un informe oral antes del dictado de la sentencia en primera instancia siempre a pedido de parte (art 281 in fine de la LPCA) o en la vista de la causa a propoacutesito de la interposicioacuten del recurso de apelacioacuten o de casacioacuten

12- La inmediacioacuten prevista como principio en la NLPT viene a ser en realidad un principio que se com-plementa con el principio de oralidad de tal manera que seraacute de aplicacioacuten en el PCA en las oportunida-des en que se pueda instrumentar un proceso por audiencias conforme a lo descrito en el acaacutepite ante-rior Lo mismo sucede con los principios de concentracioacuten y economiacutea procesal

13 En virtud del principio de favorecimiento del proceso los jueces interpretan los requisitos y presu-puestos procesales en sentido favorable a la continuidad del proceso conforme lo establece el Artiacuteculo III del Tiacutetulo Preliminar de la NLPT Este principio se encuentra previsto en el artiacuteculo 2 inciso 3 de Texto Uacutenico Ordenado de la Ley que Regula el Proceso Contencioso Administrativo aprobado por el Decreto Supremo Nordm 013-2008-JUS seguacuten el cual el Juez no podraacute rechazar liminarmente la demanda en aquellos casos en los que por falta de precisioacuten del marco legal exista incertidumbre respecto del agotamiento de la viacutea previa Asimismo en caso de que el Juez tenga cualquier otra duda razonable sobre la procedencia o no de la demanda deberaacute preferir darle traacutemite a la misma

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14- La prevalencia del fondo sobre la forma resulta igualmente de aplicacioacuten proceso contencioso administrativo pues bajo la eacutegida del principio de integracioacuten previsto en el artiacuteculo 21 de la LPCA resulta de aplicacioacuten al PCA el principio de informalismo contemplado en el artiacuteculo IV 16 del TUO de la Ley del Procedimiento Administrativo General seguacuten el cual las normas del procedimiento deben ser interpretadas en sentido favorable a admisioacuten y decisioacuten final de las pretensiones de los adminis-trados de modo que sus derechos e intereses no sean afectados por la exigencia de aspectos formales que puedan ser subsanados dentro del procedimiento siempre que dicha excusa no afecte derechos de terceros o el intereacutes puacuteblico

15 Es posible la aplicacioacuten de los principios y fundamentos que sustentan la NLPT en el desarrollo del PCAL lo cual va a tono con las nuevas tendencias procesales que en nuestro paiacutes se inicioacute en el aacutembito penal y luego en el aacuterea laboral y a tenor de las propuestas hechas puacuteblicas recientemente ahora se plantea en la justicia civil Nosotros proponemos que no resulta necesaria una modificacioacuten legislati-va pues en virtud de lo que se denomina buenas praacutecticas judiciales se pueden perfectamente aplicar los principios y fundamentos que inspiran el nuevo proceso oral al desarrollo del proceso contencioso administrativo laboral

REFERENCIAS

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TOLEDO TORIBIO Omar ldquoEl Principio de la Primaciacutea de la Realidadrdquo Revista Diaacutelogo con la Jurisprudencia Antildeo 10 ndeg75 Diciembre 2004 p 87-89

TOLEDO TORIBIO Omar ldquoPrincipios Ordenadores que rigen el Sistema de Inspeccioacuten de Trabajordquo En Comentarios a la Ley General de Inspeccioacuten de Trabajo Gaceta Juriacutedica SA Lima 2008 p33-42

VESCOVI Enrique Teoriacutea General del Proceso Temis Bogotaacute 1984

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OS PROBLEMAS BIOEacuteTICOS EM OS VINGADORES REFLEXOtildeES SOBRE O POacuteS-HUMANISMO E A EacuteTICA DO FUTURO

THE BIOETHICAL PROBLEMS IN THE AVENGERS REFLECTIONS ABOUT POSTHUMANISM AND THE ETHICS OF THE FUTUREPedro Ernesto Neubarth Jung1

ldquoApenas uma guerra eacute permitida agrave espeacutecie humana

a guerra contra a extinccedilatildeo []rdquo2

Resumo No atual momento histoacuterico da humanidade toma-se cada vez mais conhecimento dos espeta-culares avanccedilos cientiacuteficos e tecnoloacutegicos Diante desses avanccedilos a cada dia que se passa nos aproxima-mos mais dos cenaacuterios de ficccedilatildeo cientiacutefica abordados pela 7ordf Arte Tem-se assim que tal aproximaccedilatildeo pos-sa nos levar a discussotildees acerca das atuais e futuras implicaccedilotildees biotecnoloacutegicas em relaccedilatildeo aos preceitos eacuteticos presentes nesses avanccedilos ou seja na interaccedilatildeo entre a espeacutecie humana e os poacutes-humanos Nesse contexto os filmes do Universo Cinematograacutefico da Marvel satildeo oacutetimos aportes pois levantam inuacutemeras questotildees que navegam perfeitamente entre o aperfeiccediloamento humano ao desenvolvimento de exoes-queletos ligados ao coacutertex cerebral Desse modo o presente artigo visa entrelaccedilar os conceitos supra abordados com intuito de se fornecer uma visatildeo da responsabilidade ante a eacutetica do futuro Se adotaraacute outrossim a presente pesquisa o meacutetodo indutivo utilizando-se ainda a revisatildeo da literatura nacional e internacional bem como a observaccedilatildeo dos filmes do aludido Universo cinematograacutefico

Palavras-Chaves Poacutes-humano Aprimoramento geneacutetico Ciecircncia Bioeacutetica Cinema

Abstract In the current historical moment of humanity more and more knowledge of the spectacular scientific and technological advances is made Faced with these advances with each passing day we approach more of the scenarios of science fiction addressed by the 7th Art It is as soon as this approach can lead us to discussions about the current and future biotechnological implications in relation to the ethical precepts present in these advances that is in the interaction between the human species and the post-humans In this context the films of the Marvel Cinematic Universe are great contributions as they raise many questions which navigate perfectly between the human improvement to the development of exoskeletons linked to the cerebral cortex Thus this article aims to interweave the concepts discussed above in order to provide a vision of responsibility to the ethics of the futu-re In addition the present research will adopt the inductive method using also the revision of the national and international literature as well as the observation of the films of the aforementioned cinematographic Universe

Keywords Posthuman Genetic enhancement Science Medicine Movie theater

1 Graduado em Direito pela Universidade Feevale atualmente estaacute cursando Mestrado em Direito no PPGD da Universidade do Vale do

Rio dos Sinos na qual atua como pesquisador mestrando nos projetos de pesquisa ldquoTeoria do Direito e Diferenciaccedilatildeo Social na Ameacuterica

Latinardquo ldquoAUTOORGANIZACcedilAtildeO DO SISTEMA JURIacuteDICO Comunicaccedilotildees e Autorreferecircncia entre Brasil e Chilerdquo e ldquoTeoria do Direito e

Evoluccedilatildeo Social - UNISINOSrdquo Tem experiecircncia na aacuterea de Direito com ecircnfase em Direito Puacuteblico Advogado

2 ASIMOV Isaac Life and Time [Sl] Avon Books 1979 p 245

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1 INTRODUCcedilAtildeO

Nunca antes na histoacuteria da humanidade a sociedade internacional tomou tanto conhecimento dos espetaculares avanccedilos cientiacuteficos e tecnoloacutegicos como na contemporaneidade principalmente no que diz respeito ao acircmbito da engenharia geneacutetica Destarte tem-se que a humanidade encontre se enca-minhando para uma nova fase de sua evoluccedilatildeo uma fase doravante denominada Poacutes-Humana Nessa nova etapa diversos questionamentos pairam sobre si duacutevidas essas que em alguns casos satildeo antevis-tos de maneira muito inteligente e peculiar pela 7ordf Arte (Cinema) e 9ordf Arte (Histoacuterias em Quadrinho)

Almeja-se assim ao presente estudo abordar algumas das questotildees relacionadas agrave responsabilidade moral e eacutetica entre a espeacutecie humana e a Poacutes-Humana de forma comparada as abordadas nos filmes ldquoOs Vingadores Era de Ultronrdquo e ldquoCapitatildeo Ameacuterica Guerra Civilrdquo que anteveem de certo modo pos-siacuteveis mudanccedilas ocorridas na atualidade a funccedilatildeo da nova eacutetica ou melhor dizendo da eacutetica do futuro

Destarte por opccedilatildeo metodoloacutegica seraacute abordado na primeira parte desse trabalho os principais con-ceitos filosoacuteficos relacionados ao Poacutes-Humanismo Na segunda etapa seraacute tratado especificamente sobre a aproximaccedilatildeo dos filmes elencados ao novo periacuteodo para o qual a espeacutecie humana estaacute possi-velmente se encaminhando Jaacute no terceiro e uacuteltimo item se buscaraacute identificar qual o papel da eacutetica do futuro nessa nova fase vivida e no presente ainda deveras obscura a que noacutes seres humanos estamos nos direcionando qual seja o Poacutes-Humanismo

Enfim antepotildeem-se ao iniacutecio desse estudo o fato de que o foco da presente pesquisa natildeo eacute propria-mente dito a discussatildeo do sistema do Direito mas sim aquilo que o antecede para tanto utilizaremos o meacutetodo o indutivo atrelada a revisatildeo bibliograacutefica nacional e internacional bem como a observaccedilatildeo dos filmes ora relatados a fim de se abranger uma resposta agrave problemaacutetica abordada

2 PREAcircMBULOS AO FUTURO (POacuteS-)HUMANO

Em um futuro natildeo muito distante o cenaacuterio de desenvolvimento biotecnoloacutegico estaraacute em conflito direto com os dilemas da moralidade isto eacute ao inveacutes de enfrentarmos questotildees de atitudes e deveres morais que devemos ter para com os seres que hoje compreendemos como natildeo humanos estaremos face a face com questotildees envolvendo os chamados poacutes-humanos ou quem sabe deles para conosco (espeacutecie humana)3

Nessa senda surge o transumanismo como sendo um movimento natildeo acabado que se encontra em desenvolvimento estando suas ideias amparadas nas ideologias do humanismo racionalista4 Os tran-sumanos partem assim da premissa de que a espeacutecie humana em sua forma atual natildeo representa o fim da nossa evoluccedilatildeo mas sim o iniacutecio dessa5

Leocir Pessini escreve nessa linha que com as descobertas feitas no iniacutecio do Seacutec XXI muitas aacutereas da ciecircncia nunca mais seratildeo as mesmas

A biologia medicina e biotecnologia entraram em sua idade de ouro Com o teacutermino da fase

3 VILACcedilA Murilo Mariano DIAS Maria Clara Marques Transumanismo e o futuro (poacutes-) humano Physis ndash Revista de Sauacutede Coletiva

Rio de Janeiro v 24 n 02 2014 p 342 Disponiacutevel em lthttpwwwscielobrpdfphysisv24n20103-7331-physis-24-02-00341pdfgt

Acesso em 06 jul 2017

4 SCHUSTER Diego Henrique Sobre a Dignidade Humana como Qualificadora do Gecircnero Humano e Fonte de Legitimidade dos Direitos

uma Reflexatildeo sobre o Movimento Transumanista e sua Influecircncia sobre o Desenvolvimento Futuro da Humanidade In Revista Brasileira

de Direitos Humanos v 16 2016 p 71-90

5 [hellip] Transhumanism is a way of thinking about the future that is based on the premise that the human species in its current form does not

represent the end of our development but rather a comparatively early phase [hellip] (Traduccedilatildeo nossa) HUMANITY+ Transhumanist FAQ

[Sd] Disponiacutevel em lthttphumanityplusorg philosophytranshumanist-faqgt Acesso em 07 jul 2017

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do sequenciamento do DNA do projeto Genoma Humano no ano 2000 e a emergecircncia da

pesquisa com ceacutelulas-tronco se pode sem duacutevida esperar por mais descobertas sobre o

desenvolvimento humano normal e anormal bem como tratamentos novos e mais focados

precisamente nas doenccedilas humanas Avanccedilos na neurociecircncia trazem a promessa de

poderosas e novas compreensotildees dos processos mentais e comportamento bem como da cura

de doenccedilas mentais devastadoras Instrumentos nanotecnoloacutegicos geniais implantaacuteveis no

corpo e ceacuterebro humano trazem esperanccedila de superaccedilatildeo da cegueira e surdez bem como de

aprimoramento das naturais capacidades humanas de consciecircncia e accedilatildeo Pesquisas na aacuterea da

biologia do envelhecimento e senescecircncia sugerem a possibilidade de diminuir o processo de

decliacutenio dos corpos e mentes e talvez ateacute mesmo aumentar ao maacuteximo o tempo da vida humana

De inuacutemeras maneiras as descobertas dos bioacutelogos e as invenccedilotildees dos biotecnologistas estatildeo

aumentando o poder de intervir no funcionamento de nossos corpos e mentes e alteraacute-los []6

Para tanto a fim de assimilarem-se os respectivos acontecimentos que ainda estatildeo por vir bem como seus argumentos podemos comparar a revoluccedilatildeo geneacutetica que embora seja ainda desconhecida repercutiraacute na sociedade futura transformando-a em uma nova sociedade fato esse que foi seme-lhante ao ocorrido com as sucessivas revoluccedilotildees industriais tecnoloacutegicas e da informaacutetica Essas em outros tempos conduziram a sociedade por sua vez agrave poacutes-modernidade7

Outrossim Roberto Andorno leciona que nas sociedades contemporacircneas a melhoria da qualidade de vida da populaccedilatildeo estaacute em grande medida ligada agrave promoccedilatildeo dos progressos cientiacuteficos e teacutecnicos por conseguinte tem-se que essa necessita de liberdade para avanccedilar nos mais diversos campos Todavia essa liberdade evidentemente natildeo eacute absoluta eis que natildeo pode atuar agrave margem da eacutetica e do respeito aos Direitos Humanos8

Assim em uma anaacutelise preliminar eacute possiacutevel aduzir que com as melhorias ambicionadas pelos transumanos nossos descendentes os poacutes-humanos por sua vez poderatildeo ter um longo prazo de vida sem precedentes conhecidos ateacute o momento Poderatildeo ter faculdades intelectuais maiores do que as atuais e tambeacutem sen-sibilidades inteiramente novas com a possibilidade ateacute mesmo de controle de suas proacuteprias emoccedilotildees9

Poreacutem natildeo satildeo apenas de coisas fascinantes que o futuro da humanidade estaacute circundado Existem tambeacutem problemas que aqui devem ser abordados e eacute por esse motivo que se faz necessaacuteria a reali-zaccedilatildeo de um pequeno recorte a fim identificar o dualismo existente a respeito do presente tema isto eacute as consequecircncias do melhoramento humano por vias biotecnoloacutegicas que vecircm acirrando um dos mais importan-tes debates no campo da eacutetica que tem como palco o futuro da humanidade em face da problemaacutetica e obscu-rescente oposiccedilatildeo binaacuteria de tipo ldquobem versus malrdquo10

De acordo com Eacuteverton Willian Pone e Marcia Teshima os transumanistas aleacutem do jaacute anteriormen-te exposto satildeo tambeacutem os defensores do desenvolvimento biotecnoloacutegico e da engenharia geneacuteti-ca como modo de alcanccedilar o aperfeiccediloamento humano (human enhancement) Por sua vez na linha

6 PESSINI Leocir Bioeacutetica e o desafio do transumanismo ideologia ou utopia ameaccedila ou esperanccedila Revista Bioeacutetica v 14 n 02 2006

p 129 Disponiacutevel em lthttpwwwredalycorgarticulooaid=361533244002gt Acesso em 07 jul 2017

7 COELHO Luiz Fernando Clonagem reprodutiva e clonagem terapecircutica questotildees juriacutedicas Revista Centro de Estudos Judiciaacuterios

Brasiacutelia v 06 n 16 2002 p 30 Disponiacutevel em lthttpwwwjfjusbrojs2indexphp revcejarticleview438619gt Acesso em 08 jul 2017

8 ANDORNO Roberto ldquoLiberdaderdquo e ldquoDignidaderdquo da Pessoas dois paradigmas opostos ou complementares na bioeacutetica In MARTINS-

COSTA Judith MOumlLLER Letiacutecia Luwdwig (Orgs) Bioeacutetica e Responsabilidade Rio de Janeiro Forense 2009 p 80-82

9 [hellip] Ultimately it is possible that such enhancements may make us or our descendants lsquoposthumanrsquo beings who may have indefinite health-

spans much greater intellectual faculties than any current human being ndash and perhaps entirely new sensibilities or modalities ndash as well as the

ability to control their own emotions [hellip] (Traduccedilatildeo nossa) BROSTOM Nick In defence of posthuman dignity Bioethics Oxford v 19 n 03

2005 p 203 Disponiacutevel em lthttpwwwpsyvanderbilteducourseshon182Posthuman_dignity_Bostrompdfgt Acesso em 09 jul 2017

10 VILACcedilA Murilo Mariano DIAS Maria Clara Marques Transumanismo e o futuro (poacutes-) humano Physis ndash Revista de Sauacutede Coletiva

Rio de Janeiro v 24 n 02 2014 p 342 Disponiacutevel em lthttpwwwscielobr pdfphysisv24n20103-7331-physis-24-02-00341pdfgt

Acesso em 06 jul 2017

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contraacuteria existem os bioconservadores que se centram na defesa da continuidade de uma natureza eminentemente humana ou seja sem a utilizaccedilatildeo de tecnologias e conhecimentos geneacuteticos capazes originar indiviacuteduos poacutes-humanos11

Nessa linha destacam-se como alguns dos representantes da ideologia transumanista Brostom Savulescu e possivelmente Dworkin que na medida do possiacutevel claramente dirigiu criacuteticas agrave argu-mentaccedilatildeo contra a eugenia apresentada por Habermas Jaacute em oposiccedilatildeo a essa visatildeo enfatizamos como proeminentes bioconservadores os escritores Leon Kass e Francis Fukuyama

Barretto quanto aos argumentos e preocupaccedilotildees relacionados agrave eugenia por Habermas assim aduz

A questatildeo portanto encontra-se no perigo da queda em argumentos e poliacuteticas eugecircnicas de

aperfeiccediloamento (positivas) pois se torna difiacutecil estabelecer criteacuterios do que eacute ou do que natildeo

eacute terapecircutico Aceitando-se essa premissa Habermas aponta para o medo da mudanccedila da

autocompreensatildeo da espeacutecie humana que ocorreria em duas etapas Em primeiro momento

pela consagraccedilatildeo de uma eugenia liberal negativa para apoacutes no segundo momento cair-se no

abismo moral da eugenia positiva (de aperfeiccediloamento) []12

Barretto ensina ainda a respeito de Habermas e nessa senda em relaccedilatildeo ao seu segundo questio-namento sobre os perigos da eugenia que na sociedade contemporacircnea predominam os interesses econocircmico-poliacutetico-individuais os quais variam de grupo social para grupo social Todavia os que mais se complicam diante dessas situaccedilotildees satildeo os beneficiaacuterios finais pois os interesses que mais preponde-ram no caso em tela satildeo os dos cientistas e dos fabricantes sobre os seres humanos13

Habermas suscita aleacutem disso um uacuteltimo ponto preocupante em relaccedilatildeo as eugenias de aperfeiccediloa-mento qual seja o fato dessas alterarem a autocompreensatildeo eacutetica da espeacutecie humana ldquode tal modo que natildeo possamos mais nos compreender como seres vivos eticamente livres e moralmente iguais orienta-dos por normas e fundamentosrdquo14

No entanto como anteriormente relatado Ronald Dworkin direciona criticas diretas aos questiona-mentos de Habermas em relaccedilatildeo agrave eugenia Destarte Barretto e Subtil lecionam a respeito desse e suas criacuteticas aduzindo que

[] quanto agrave objeccedilatildeo de que as pesquisas geneacuteticas trazem perigo numa concretizaccedilatildeo da

engenharia geneacutetica total ou seja sobre a questatildeo da Seguranccedila preconiza que os abortos

realizados as deformidades eventualmente encontradas e os exemplos tomados das clonagens

em animais por si soacute natildeo podem obstar a concretizaccedilatildeo dos conhecimentos teacutecnicos Aleacutem

disso disserta sobre a necessidade de regulamentaccedilatildeo da utilizaccedilatildeo destas novas tecnologias e

da preocupaccedilatildeo em avaliar os riscos pois natildeo se pode excluir o melhoramento de caracteriacutesticas

humanas somente sob o argumento de ldquomero perigordquo da espeacutecie humana15

Assim como Habermas direcionara trecircs questionamentos agrave eugenia Dowrkin rebateu a esses questiona-

11 PONA Eacuteverton Willian TESHIMA Marcia X-Men da ficccedilatildeo agrave realidade Posicionamentos de sentinelas bioconservadoras Revista

de Informaccedilatildeo Legislativa Brasiacutelia v 52 n 205 2015 p 190 Disponiacutevel em lthttpwww12senadolegbrriledicoes52205ril_v52_

n205_p189pdf gt Acesso em 09 jul 2017

12 BARRETTO Vicente de Paulo O Fetiche dos Direitos Humanos e outros Temas 2 ed rev e ampl Porto Alegre Ed Livraria do

Advogado 2013 p 331

13 Ibidem p 331

14 HABERMAS Juumlrgen O Futuro da natureza humana a caminho de uma eugenia liberal Satildeo Paulo Ed Martins Fontes 2004 p 57

15 BARRETTO Vicente de Paulo SUBTIL Camargo Leonardo Habermas Direito e Eugenia RECHTD ndash Revista de Estudos

Constitucionais Hermenecircutica e Teoria do Direito Satildeo Leopoldo v 02 n 02 2010 p 170 Disponiacutevel em lthttpwwwrevistasunisinos

brindexphpRECHTDarticleview298gt Acesso em 07 jul 2017

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mentos em trecircs criacuteticas agrave temaacutetica contra-eugecircnica Destarte a segunda critica trata do fato de ldquoas vaida-des dos ricos natildeo serem os uacutenicos objetivos das teacutecnicas [] Dworkin surge com argumentaccedilotildees opostas aos defensores da proibiccedilatildeo das pesquisas [] afirmando que natildeo se devem instituir criteacuterios de igualdade por baixo ou seja nivelar a igualdaderdquo16 pois essas teacutecnicas meacutedicas destinadas aos ricos geram descober-tas de repercussatildeo mais geral para todos justificando temporariamente a desigualdade

Por fim a terceira e uacuteltima criacutetica realizada versa sobre as repulsas e medos de a espeacutecie humana estar Brincando de Deus isto eacute as consequecircncias que poderiam recair agrave espeacutecie humana face o desenvolvi-mento de novas tecnologias Todavia para Dworkin o homem se sente apenas ameaccedilado pela engenha-ria geneacutetica pois teme a possibilidade de pessoas virem a criar outras pessoas ultrapassando assim os limites entre a sorte e a escolha natildeo estando efetivamente Brincando de Deus Natildeo obstante o ateacute aqui aduzido eacute imperioso destacar ainda sob essa oacutetica que noacutes seres humanos Brincamos de Deus desde os primoacuterdios da humanidade quando da descoberta do Fogo momento esse em que comeccedilamos a uti-lizaacute-lobrincar com ele de acordo com nossos proacuteprios interesses17

Tendo em vista essa dualidade de pensamentos sobre o futuro da espeacutecie humana Murilo Mariano Vilaccedila e Maria Clara Marques Dias lecionam que

Dito de outro modo ao passo que os transumanistas apostam na superaccedilatildeo dos limites da

condiccedilatildeo humana e na poacutes-humanidade como uma ampliaccedilatildeo das possibilidades de ser no

mundo [] os bioconservadores avocam o papel de defensores intransigentes da natureza

humana ainda que isso implique manutenccedilatildeo daqueles limites [] enquanto para alguns o

processo de alteraccedilatildeo da condiccedilatildeo humana daraacute origem a um ser poacutes-humano e isso seraacute algo

positivo melhorador pois beneficiaraacute o humano para outros ocorreraacute justa e radicalmente o

inverso O que parece estar em questatildeo ndash por sinal de modo indevido ndash seria quem ameaccedilaria

(lado do ldquomalrdquo) a natureza humana tentando ldquomelhoraacute-lardquo e quem supostamente a protegeria

(lado do ldquobemrdquo) mantendo-a estruturalmente precaacuteria18

Nesse ponto observa-se que aparentemente haacute um consenso entre os pensamentos transumanistas e bioconservadores qual seja o fato de que independentemente de qual dessas ideologias venha a predominar seratildeo as biotecnologias de grande importacircncia para o futuro da humanidade19 O impacto da geneacutetica na cultura contemporacircnea jaacute eacute fortiacutessimo com tendecircncias de aumentar o contato da vida humana para com um mundo que ateacute entatildeo era desconhecido atraveacutes da manipulaccedilatildeo da proacutepria ori-gem da vida O fato dessa tornar-se transformaacutevel bem como a sua compreensatildeo material traraacute ainda muitas e surpreendentes revelaccedilotildees para o ser humano do futuro20

Hans Jonas doutrina em sua monumental obra ldquoO Princiacutepio Responsabilidade ensaio de uma eacutetica para a civilizaccedilatildeo tecnoloacutegicardquo a respeito dessas revelaccedilotildees futuras agrave espeacutecie humana que agrave techne como uma dessas jaacute ultrapassou os proacuteprios objetivos dos tempos de outrora impulsionando e trans-formando o homem para um adiante infinito Tal assertiva nos leva por conseguinte ao fato de que talvez a vocaccedilatildeo do homem seja justamente a do contiacutenuo progresso da superaccedilatildeo de si mesmo e tam-beacutem a busca por feitos cada vez maiores Em outras palavras o desejo do homo faber eacute o de ter em suas proacuteprias matildeos a sua evoluccedilatildeo triunfando assim sobre o que antigamente costumava ser uma parte de

16 Idem

17Idem

18 VILACcedilA Murilo Mariano DIAS Maria Clara Marques Transumanismo e o futuro (poacutes-) humano Physis ndash Revista de Sauacutede Coletiva

Rio de Janeiro v 24 n 02 2014 p 343 Disponiacutevel em lthttpwwwscielobrpdfphysisv24n20103-7331-physis-24-02-00341pdfgt

Acesso em 06 jul 2017

19 Idem

20 BENTO Luiz Antonio CALVO Paulo Rafael Sanches Quando a vida imita a arte a bioeacutetica dos homens-maacutequinas In Revista

Bioethikos Satildeo Camilo v 07 n 03 2013 p 315 Disponiacutevel em lthttpswwwsaocamilo-spbrpdfbioethikos1051815pdfgt Acesso

em 09 jul 2017

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si e hoje se encontra melhorada e transformada com base em seu proacuteprio projeto21

Nesse iacutenterim eacute importante se destacar que Tecircmis Limberger perfeitamente descreve a techne como sendo

[] a antiacutetese da natureza a physis dos gregos eacute a expressatildeo techne isto eacute criaccedilatildeo artificial

Assim a artificialidade reconhecida como caracteriacutestica do direito na eacutepoca da automaccedilatildeo

caracteriza-se como uma metaacutefora empregada para precisar o momento loacutegico-formal

constitutivo da experiencia juriacutedica em consonacircncia com o momento eacutetico enquanto que entre

ambos se manteacutem e transcorre a tensatildeo da consciecircncia humana a partir da qual brota toda

norma toda a sentenccedila toda a accedilatildeo juriacutedica22

Em face desse contexto e conceito retoma-se as ideias originarias desse capiacutetulo se fazendo neces-saacuterio constatar que os debates em torno do melhoramento humano estatildeo profundamente enraizados a questotildees eacuteticas morais e religiosas dentre outras as quais por sua vez envolvem as definiccedilotildees de conceitos baacutesicos especialmente no que diz respeito agrave natureza humana Como exemplo disso existe o chamado melhoramento moral que busca alterar em niacutevel cerebral os remitentes problemas23

Haacute tambeacutem o prolongamento da vida humana exemplo esse quiccedilaacute o mais fundamental dos aprimoramen-tos pois com os crescentes avanccedilos na biologia celular os processos bioquiacutemicos de envelhecimento vecircm sendo reduzidos ampliando-se assim a capacidade de prolongamento da vida humana podendo-se falar ateacute mesmo na almejada eternizaccedilatildeo da vida humana Apesar disso seria essa condizente com as questotildees relacionadas agrave finitude da proacutepria vida humana e tambeacutem com o equiliacutebrio entre a morte e a procriaccedilatildeo24

Outro exemplo que exige um maior grau de respeito e reflexatildeo por parte da espeacutecie humana eacute o rela-cionado agrave manipulaccedilatildeo geneacutetica dessa Entretanto como o proacuteprio Hans Jonas aduz trata-se de um assunto grande demais para ser abordado de forma introdutoacuteria na presente pesquisa No entanto eacute imperioso arguir aqui os questionamentos por traacutes desse tipo de melhoramento qual seja temos o direito de fazecirc-lo somos qualificados para esse papel criador e ainda diversos outros dilemas eacuteticos25

O doutrinador Leocir Pessini natildeo obstante registra a respeito desses aperfeiccediloamentos que

[] essas prediccedilotildees em relaccedilatildeo ao futuro poacutes-humano satildeo problemaacuteticas Nem todos gostam da

ideacuteia de recriar o Eacuteden ou do homem brincando de Deus Nem todos acreditam que este mundo

profetizado seja melhor que o que se vive atualmente Nasce aqui a necessidade da discussatildeo

eacutetica que permeie esse cenaacuterio claramente polarizado em termos de ser a favor de uma nova

realidade poacutes-humana ou contraacuterio a ela Se a inquietaccedilatildeo em relaccedilatildeo ao uso da biotecnologia e

o temor quanto ao mau uso da manipulaccedilatildeo geneacutetica estatildeo manifestos haacute que se refletir sobre

o assunto para que qualquer decisatildeo sobre ele manifeste senatildeo um consenso ao menos uma

perspectiva largamente ponderada26

O fato portanto eacute que o ser humano estaacute em um caminho sem volta um ponto que o faz tornar-se

21 JONAS Hans O Princiacutepio Responsabilidade ensaio de uma eacutetica para a civilizaccedilatildeo tecnoloacutegica Rio de Janeiro Ed Contraponto Ed

PUC-Rio 2006 p 43

22 LIMBERGER Tecircmis Cibertransparecircncia informaccedilatildeo puacuteblica em rede e a cidade em tempos de globalizaccedilatildeo In STRECK Lecircnio Luiz

ROCHA Leonel Severo ENGELMANN Wilson (Orgs) Constituiccedilatildeo Sistemas Sociais e Hermenecircutica anuaacuterio do Programa de Poacutes-

Graduaccedilatildeo em Direito da UNISINOS ndash Mestrado e Doutorado Porto Alegre Livraria do Advogado n 12 2016 p 205

23 VILACcedilA Murilo Mariano DIAS Maria Clara Marques Transumanismo e o futuro (poacutes-) humano Physis ndash Revista de Sauacutede Coletiva

Rio de Janeiro v 24 n 02 2014 p 343 Disponiacutevel em lthttpwwwscielobrpdfphysisv24n20103-7331-physis-24-02-00341pdfgt

Acesso em 06 jul 2017

24 JONAS Hans O Princiacutepio Responsabilidade ensaio de uma eacutetica para a civilizaccedilatildeo tecnoloacutegica Rio de Janeiro Ed Contraponto Ed

PUC-Rio 2006 p 57-58

25 Idem p 61

26 PESSINI Leocir Bioeacutetica e o desafio do transumanismo ideologia ou utopia ameaccedila ou esperanccedila Revista Bioeacutetica v 14 n 02 2006

p 129 Disponiacutevel em lthttpwwwredalycorgarticulooaid=361533244002gt Acesso em 07 jul 2017

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capaz de manipular a sua proacutepria formaccedilatildeo biofiacutesica Poreacutem isso natildeo significa que esse deva fazer tudo o que eacute capaz de fazer uma vez que goza de dignidade e sacralidade ditames esses que devem ser levados em consideraccedilatildeo em relaccedilatildeo a proacutepria vida humana natildeo podendo o sujeito ser tratado como objeto pois uma pessoa eacute uacutenica natildeo repetiacutevel e insubstituiacutevel27 eacute por esses motivos que na proacutexima etapa seratildeo abordados os problemas bioeacuteticos existentes nos filmes ldquoOs Vingadores Era de Ultronrdquo e ldquoCapitatildeo Ameacuterica Guerra Civilrdquo obras essas que podem demonstrar a complexidade e as cataacutestrofes que porventura ocorreratildeo com a espeacutecie humana diante da eventual falta de fundamentaccedilatildeo eacutetica da produccedilatildeo cientiacutefica poacutes-moderna

3 QUANDO A VIDA IMITA A ARTE

Muitas satildeo as obras que merecem serem lembradas como exemplos de um futuro distoacutepico rasgado pelo perigo da biotecnologia Os livros de Isaac Asimov Aldous Leonard Huxley Robert Louis Stevenson e Mary Wollstonecraft Shelley satildeo esses exemplos Todavia optou-se pela escolha dos filmes do universo cinemato-graacutefico da Marvel devido ao seu grande feito atual assim ao criar os Vingadores Stan Lee Jack Kirby e Dick Ayers bem como Joe Simon e Jack Kirby em relaccedilatildeo ao Capitatildeo Ameacuterica natildeo imaginavam que um mundo com poacutes-humanos seria possiacutevel Na verdade dificilmente esses imaginavam que suas histoacuterias em quadri-nhos um dia viessem a se tornar filmes de sucesso muito menos que esses filmes e histoacuterias em quadrinhos pudessem vir a ser utilizados como referencial para estudos cientiacuteficos envolvendo temas bioeacuteticos

Em ldquoOs Vingadores Era de Ultronrdquo a equipe ndash formada pelo Homem de Ferro Hulk Thor Capitatildeo Ameacuterica Viuacuteva Negra e Gaviatildeo Arqueiro ndash invade um posto avanccedilado da Hidra na cidade de Sokovia onde encontram dois seres aprimorados geneticamente ndash os gecircmeos Pietro Maximoff e Wanda Maximoff ndash Posteriormente um dos protagonistas desenvolve uma inteligecircncia artificial ndash Ultron ndash que reflete sobre sua missatildeo endeusando a si mesmo no papel de purificar a terra e para conseguir essa faccedilanha seraacute necessaacuterio exterminar com a espeacutecie humana Ultron entatildeo obriga a Dra Helen Cho a usar sua tec-nologia de tecidos sinteacuteticos para criar um novo corpo perfeito para ele mas no entanto quando estava para ser transferido para o novo corpo eacute impedido pela equipe que rouba o respectivo corpo e o transfor-ma no personagem Visatildeo A equipe retorna entatildeo para a cidade de Sokovia onde enfrenta sua derradei-ra batalha contra Ultron que eacute derrotado a um preccedilo muito alto qual seja a destruiccedilatildeo total da cidade28

Eacute inegaacutevel afirmar nesse singelo relato que muitos satildeo os questionamentos eacuteticos que poderiam ser suscitados antes de serem tomadas decisotildees assim como as consequecircncias futuras da falta dessas indagaccedilotildees Nesse iacutenterim temos como consequecircncias dessa ausecircncia de questionamentos bioeacuteticos a realizaccedilatildeo de pesquisas com seres humanos pesquisas essas que levaram ao aprimoramento geneacute-tico dos gecircmeos bem como dos personagens Capitatildeo Ameacuterica e Hulk Nessa senda destaca-se que assim como nas obras jaacute se passaram os tempos em que o aprimoramento geneacutetico natildeo seria realizado devido agrave falta de condiccedilotildees cientificas motivo esse pelo qual atualmente ldquo[] tecircm-se impulsionado a realizaccedilatildeo pesquisa e o desenvolvimento de teacutecnicas que permitem o enhancement [] a questatildeo prin-cipal do debate contudo tem sido discutir se haacute algo de muito valioso no ser humano que o aprimora-mento geneacutetico poderia destruirrdquo29 e natildeo a sua natildeo realizaccedilatildeo propriamente dita Dessa forma obser-

27 BENTO Luiz Antonio CALVO Paulo Rafael Sanches Quando a vida imita a arte a bioeacutetica dos homens-maacutequinas Revista Bioethikos

Satildeo Camilo v 07 n 03 2013 p 315 Disponiacutevel em lthttpswwwsaocamilo-spbrpdfbioethikos1051815pdfgt Acesso em 09 jul 2017

28 MARVEL Avengers Age of Ultron 2015 Disponiacutevel em lthttpsmarvelcommoviesmovie193 avengers_age_of_ultrongt Acesso

em 08 jul 2017

29 PONA Eacuteverton Willian TESHIMA Marcia X-Men da ficccedilatildeo agrave realidade Posicionamentos de sentinelas bioconservadoras Revista

de Informaccedilatildeo Legislativa Brasiacutelia v 52 n 205 2015 p 191 Disponiacutevel em lthttpwww12senadolegbrriledicoes52205ril_v52_

n205_p189pdfgt Acesso em 09 jul 2017

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va-se que se questionamentos como esse houvessem sido realizados diversos problemas teriam sido solucionados antes mesmo de ocorrerem evitando assim o desfecho catastroacutefico da obra

Outro problema bioeacutetico a ser levantado eacute a ausecircncia de questionamento eacutetico quanto ao desenvol-vimento de uma inteligecircncia artificial por parte dos personagens o que acabou levando a uma guerra na respectiva obra que destruiu toda a cidade fictiacutecia de Sokovia Tal problema no mundo real sequer esta perto de acontecer poreacutem as questotildees ausentes no filme assombram a mente de muitos cientis-tas e estudiosos uma vez que como seraacute que uma inteligecircncia artificial (IA) veraacute a noacutes seres humanos ou se estariacuteamos noacutes espeacutecie humana a nos divinizar realizando tal desenvolvimento ldquona atualidade nas aacutereas de biotecnologia e neurotecnologia [] o desenvolvimento de neuroproacuteteses e as interfaces homem-maacutequina levam ainda a mais questotildees [] como o que significa ser homem ou maacutequina [] e se as maacutequinas satildeo capazes de ldquopensarrdquordquo30

No filme ldquoCapitatildeo Ameacuterica Guerra Civilrdquo produzido pela Marvel Studios por sua vez o time ndash compos-to pelo Capitatildeo America Viuacuteva Negra Wanda Maximoff e Falccedilatildeo ndash impede o roubo de uma arma bioloacute-gica no entanto uma explosatildeo ocorre vitimando diversas pessoas comuns Apoacutes o referido aconteci-mento o Secretaacuterio de Estado dos Estados Unidos da Ameacuterica Thunderbolt Ross comunica a equipe que devido aos reiterados desastres31 a Organizaccedilatildeo das Naccedilotildees Unidas regulamentou a funccedilatildeo de heroacuteis atraveacutes do Acordo de Sokovia que estabelece que esses somente sejam chamados a agir quan-do essa realmente entender necessaacuterio Tal decisatildeo fragmentou a equipe em dois times ndash do Homem de Ferro que apoacuteia as decisotildees da OrganizaccedilatildeoGoverno e do Capitatildeo Ameacuterica que acredita natildeo ser esse o melhor caminho a se seguir Devido a essa divisatildeo uma batalha se desenrola deixando um dos heroacuteis paraliacutetico o qual volta a andar mas com o apoio de pernas exoesqueleacuteticas32

Os problemas eacuteticos ao entorno desse filme assim como no anterior satildeo muitos dentre os quais des-tacamos o fato de haverem sido desenvolvidas pernas exoesqueleacuteticas ao personagem que ficou para-liacutetico Essas pernas assim como a armadura do Homem de Ferro satildeo ligadas ao seu coacutertex cerebral por nanomaacutequinas neurotecnoloacutegias Contudo os problemas aqui levantados diferentemente dos levan-tados na obra fictiacutecia anterior satildeo mais facilmente assimilados pela espeacutecie humana pois na ldquoaacuterea de neurotecnologia principalmente neuroproacuteteses e interfaces homem-maacutequina ldquoo melhoramentordquo tan-to para restauraccedilatildeo de movimentos e sensibilidade como para os inuacutemeros benefiacutecios que essa aacuterea pode trazer Eacute uma gradaccedilatildeo exponencial de benefiacutecios para a humanidade sem medidasrdquo33

Observa-se no presente filme natildeo propriamente dito um problema bioeacutetico mas sim uma problemaacute-tica relacionada ao biodireito34 qual seja a proposta de realizaccedilatildeo de um acordo pela Organizaccedilatildeo das Naccedilotildees Unidas que visava preservar a espeacutecie humana como conhecemos em relaccedilatildeo agraves consequumlecircn-cias dos atos praticados pelos heroacuteispoacutes-humanos uma vez que as biotecnologias jaacute haviam afetado natildeo soacute o presente da humanidade mas tambeacutem o futuro Destarte o Acordo de Sokavia tratava sobre os heroacuteis deixarem ldquo[] de operar livremente ou de maneira natildeo regulamentada passando a operar sob

30 BENTO Luiz Antonio CALVO Paulo Rafael Sanches Quando a vida imita a arte a bioeacutetica dos homens-maacutequinas Revista Bioethikos

Satildeo Camilo v 07 n 03 2013 p 318 Disponiacutevel em lthttpswwwsaocamilo-spbrpdfbioethikos1051815pdfgt Acesso em 09 jul 2017

31 Destacam-se nessa senda alguns desses outros desastres como a destruiccedilatildeo de uma parte da cidade de Nova York (Os Vingadores

2012) a destruiccedilatildeo de uma parte de Washington DC (Capitatildeo Ameacuterica O Soldado Invernal 2014) e igualmente de Londres (Thor

O Mundo Sombrio 2013) contudo para uma maior imersatildeo e compreensatildeo da abrangecircncia do respectivo Universo Cinematograacutefico

recomenda-se assistir a todos os outros filmes da Marvel Studios

32 MARVEL Captain America Civil War 2016 Disponiacutevel em lthttpsmarvelcommoviesmovie219 captain_america_civil_wargt

Acesso em 08 jul 2017

33 BENTO Luiz Antonio CALVO Paulo Rafael Sanches Quando a vida imita a arte a bioeacutetica dos homens-maacutequinas Revista Bioethikos

Satildeo Camilo v 07 n 03 2013 p 319 Disponiacutevel em lthttpswwwsaocamilo-spbrpdfbioethikos1051815pdfgt Acesso em 09 jul 2017

34 Para maiores esclarecimentos a respeito da Eacutetica Direito e Biodireito recomenda-se a leitura de ROCHA Leonel Severo OLIVEIRA

Cheila A A Bioeacutetica e o Biodireito como Acoplamentos Estruturais entre a Eacutetica e o Direito na Proteccedilatildeo da Vida Humana In Revista

Brasileira de Direito Passo Fundo v 1 2008

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as regras decretos e governanccedilas das Naccedilotildees Unidas [] atuando somente quando e se o grupo consi-derar adequado eou necessaacuteriordquo35

Desse modo em que pese agrave proposta de regulamentaccedilatildeo apresentada no filme e essa tenha sido ampla-mente aceita pela populaccedilatildeo mundial e tambeacutem por determinados poacutes-humanos alguns desses heroacuteis natildeo concordaram pois esse acordo colidiria frontalmente na forma em que foram dispostos com princiacute-pios morais o que acabou por deflagrar uma guerra civil entre os favoraacuteveis agrave regulamentaccedilatildeo e os con-traacuterios a essa Tais problemas fictiacutecios nos levam a muitos questionamentos como jaacute asseverado diversas vezes nesse capiacutetulo Todavia o grande problema aqui presente eacute justamente o que natildeo estaacute presente nos filmes e que deveria servir de ensinamento para a espeacutecie humana poacutes-moderna qual seja reflexotildees pro-fundas antes da efetivaccedilatildeo de aprimoramentos geneacuteticos em relaccedilatildeo agrave funccedilatildeo da nova eacutetica ou da eacutetica do futuro no presente () questatildeo essa que se pretende responder no proacuteximo capiacutetulo

4 A EacuteTICA DO FUTURO

Com o fluir do tempo as normas de convivecircncia assim como os sistemas de educaccedilatildeo evoluiacuteram de acor-do com a maturidade adquirida por cada comunidade O racionalismo por exemplo trouxe mais clareza quando o homem comeccedilou a buscar na natureza a causa dos fenocircmenos e desse modo a cada degrau subido do processo evolutivo do conhecimento humano surgiram novos desafios a espeacutecie humana que colocavam em questatildeo noccedilotildees como a de responsabilidade liberdade autonomia igualdade e dignidade No entanto a noccedilatildeo de eacutetica diferentemente dessas outras noccedilotildees despontou como sendo uma ciecircncia proacutepria a qual para Hans Jonas natildeo trata da accedilatildeo do humano sobre o natildeo-humano mas sim

2 A significaccedilatildeo eacutetica dizia respeito ao relacionamento direto de homem com homem inclusive

o de cada homem consigo mesmo toda eacutetica tradicional eacute antropocecircntrica 3 Para efeito de accedilatildeo

nessa esfera a entidade homem e sua condiccedilatildeo fundamental era considerada como constante

quanto agrave sua essecircncia natildeo sendo ela proacutepria objeto da techne (arte) reconfiguradora36

Noutra senda Barretto ao explicar a eacutetica em Kant dispotildee que estaacute se encontra relacionada agrave moral pois o homem natildeo possui boa vontade sempre e o dever eacute que iraacute permitir que se torne boa a vontade nos seres finitos A boa vontade reside portanto no ato de cumprir o dever pelo respeito ao dever e a bondade incondicional se realiza quando se pratica o que eacute justo por se moralmente correto e inde-pendentemente de qualquer causa externa37 Os atos humanos em Kant poderiam assim serem com-preendidos sob duas premissas os imperativos hipoteacuteticos e os imperativos categoacutericos O primeiro traduz as accedilotildees ditas boas para se atingir algum fim jaacute o segundo trata das accedilotildees necessaacuterias indepen-dentemente de qualquer fim Essas accedilotildees portanto seriam boas em si mesmas38

Kant tem a lei moral como a uacutenica estabelecida pela consciecircncia individual Ela seraacute o princiacutepio deter-minante para a manifestaccedilatildeo da autonomia e em respeito a essa lei moral que os homens se inter-rela-cionam A lei moral eacute universal e vale para todos pois o homem existe como um fim em si mesmo e natildeo apenas como meio para uso arbitraacuterio de vontades adversas isto eacute nas palavras de Barretto

O homem natildeo eacute pois um fim subjetivo para a accedilatildeo mas um fim objetivo isto eacute algo cuja existecircncia

35 CINEPOP lsquoCapitatildeo Ameacuterica ndash Guerra Civilrsquo Leia na iacutentegra o curioso Acordo de Sokovia 2015 Disponiacutevel emlthttpcinepopcombr

capitao-america-guerra-civil-leia-na-integra-o-curioso-acordo-de-sokovia-108459gt Acesso em 07 jul 2017

36 JONAS Hans O Princiacutepio Responsabilidade ensaio de uma eacutetica para a civilizaccedilatildeo tecnoloacutegica Rio de Janeiro Ed Contraponto Ed

PUC-Rio 2006 p 35

37 BARRETTO Vicente de Paulo O Fetiche dos Direitos Humanos e outros Temas 2 ed rev e ampl Porto Alegre Ed Livraria do

Advogado 2013 p 52

38 Idem p 52-53

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eacute em si mesma um fim Por isso Kant remete agrave existecircncia de um princiacutepio praacutetico da razatildeo que

determina a vontade humana e que pressupotildees que a natureza racional existe como fim em si A

submissatildeo a esta lei ordena que cada homem jamais trate a si mesmo ou aos outros simplesmente

como meios remete a uma ligaccedilatildeo sistemaacutetica de leis objetivas comuns isto eacute a um ldquoreino dos finsrdquo

ou seja a um estado no qual cada homem eacute um fim em si mesmo e somente nesse ldquoreinordquo o homem eacute

um ser livre um ser autocircnomo em cuja vontade reside toda obrigaccedilatildeo e toda a autonomia39

Logo eacute possiacutevel asseverar-se que devido a velocidade da evoluccedilatildeo da tecnociecircncia mesmo que em niacuteveis dife-rentes podem-se alcanccedilar campos como os abordados nas obras do Universo Cinematograacutefico da Marvel ou seja pode vir a revelar um novo agir humano que vai muito aleacutem do mundo natural jaacute impactado severamen-te por accedilotildees muitas vezes irreversiacuteveis ou de difiacutecil reparaccedilatildeo Eacute por esses motivos se faz preciso uma maior prudecircncia em relaccedilatildeo agraves problemaacuteticas abordadas nos filmes por parte da espeacutecie humana contemporacircnea Eacute preciso prever os eventuais problemas e se natildeo se adequarem ao bem comum evitar atitudes que as provo-quem colocando em pauta o agir humano e os frutos disso no tempo bem como as possiacuteveis sequelas para a o indiviacuteduo e para a humanidade e seus efeitos colaterais no Estado na sociedade e no direito

Hans Jonas doutrina desse modo que a espeacutecie humana estaacute diante de uma nova dimensatildeo onde a teacutecnica moderna introduziraacute accedilotildees de ordem ineacutedita e a moldura da eacutetica antiga natildeo conseguiraacute mais se enquadrar Logo a eacutetica puramente antropoloacutegica e tradicional natildeo mais se adequa ao novo mundo das possibilidades infinitas e as antigas maacuteximas da eacutetica que guiavam os comportamentos e estavam cristalizadas no imaginaacuterio do inconsciente coletivo mesmo que ainda pudessem ser vaacutelidas para o relacionamento com o proacuteximo perdem forccedila diante da accedilatildeo coletiva que as difere em causa e conse-quecircncia deste plano proacuteximo o que poderaacute direcionar a eacutetica a uma nova dimensatildeo um plano que nun-ca antes sequer fora sonhada isto eacute um niacutevel de maiores responsabilidades40

O princiacutepio da responsabilidade dessa forma vem fornecer bases eacuteticas ao novo agir humano abran-gendo natildeo apenas o homem mas o universo a sua volta e o espaccedilo aleacutem da estratosfera A responsabili-dade vai mais longe aleacutem do mundo natural e dialoga com a poliacutetica revecirc as utopias busca a equidade e a dignidade questiona a relaccedilatildeo que existe entre pesquisa e poder uma vez que todo o saber cientiacute-fico se encontra acumulado nas matildeos de poucos que decidem o futuro de muitos A eacutetica eacute portanto de vital importacircncia para a tecnociecircncia Seus fundamentos poderatildeo alicerccedilar uma estabilidade har-mocircnica responsaacutevel e uma convivecircncia paciacutefica entre a ciecircncia e a humanidade que deveraacute se servir dos produtos da teacutecnica para a sua evoluccedilatildeo racional e consciente em busca do progresso constante

Nesse iacutenterim a ficccedilatildeo cientiacutefica entra na realidade como uma ferramenta de auxiacutelio pois ajuda o imponderaacutevel a se tornar real no imaginaacuterio e realccedila o temor ante o destino Hans Jonas doutrina que a heuriacutestica do medo funciona como um auxiacutelio na busca pelo bem ldquo[] o que noacutes natildeo queremos sabe-mos muito antes do que aquilo que queremos Por isso para investigar o que realmente valorizamos a filosofia da moral tem de consultar o nosso medo antes do nosso desejordquo41

Destarte para se conceber tal princiacutepio no ativo e complexo contemporacircneo eacute preciso pensar uma eacutetica que responda aos efeitos dos atos humanos no porvir de modo a contemplar os conceitos que se adequem agrave velocidade das transformaccedilotildees prever o inexistente pressupor situaccedilotildees hipoteacuteticas e gerir o imponderaacutevel Essas satildeo portanto caracteriacutesticas dessa eacutetica do futuro que igualmente preci-sa controlar com responsabilidade a garantia de permanecircncia da raccedila humana considerando o justo o bom o certo o autecircntico e o digno42

39 Idem p 54-55

40 JONAS Hans O Princiacutepio Responsabilidade ensaio de uma eacutetica para a civilizaccedilatildeo tecnoloacutegica Rio de Janeiro Ed Contraponto

PUC-Rio 2006 p 39

41 Idem p 71

42 Ibidem

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Revista Juriacutedica da Universidade do Sul de Santa Catarina

De acordo com Hans Jonas faz parte dos desafios de uma eacutetica do futuro o dever de visualizar efeitos de longo prazo mobilizar o sentimento que melhor se adeque agraves representaccedilotildees das possibilidades avaliar a inseguranccedila quanto agraves projeccedilotildees futuras e observar o conhecimento do que eacute possiacutevel ou o simples saber sobre as possibilidades43 Em outras palavras trata de garantir um meio ambiente equilibrado agraves geraccedilotildees vindouras meta essa da eacutetica do futuro O agir humano natildeo pode portanto colocar em risco os interesses coletivos assim como o ocorrido nos filmes ora telados que colocaram em risco natildeo somente os personagens atraveacutes de determinadas experiecircncias cientiacuteficas mas tambeacutem a essecircncia do ser humano

Respeitar o dever de existir dos descendentes eacute ter responsabilidade para com os atos do presente que invariavelmente afetariam sua plenitude em uma vida futura A existecircncia da humanidade eacute portanto o primeiro imperativo para a eacutetica da responsabilidade com relaccedilatildeo ao futuro e deve ser o mais importan-te dever coletivo devido ao forte potencial de destruiccedilatildeo da civilizaccedilatildeo tecnoloacutegica Hans Jonas dessa forma leciona ainda quanto o plano baconiano que visa dominar a natureza atraveacutes do saber eximindo a racionalidade e retidotildees adequadas o sucesso e os excessos que esse ideal acusaram como ecircxito eco-nocircmico e o bioloacutegico e tambeacutem a imprevisibilidade real das dimensotildees do ecircxito ldquoA ameaccedila de cataacutestro-fe do ideal baconiano de dominaccedilatildeo da natureza por meio da teacutecnica reside portanto na magnitude de seu ecircxitordquo44 Logo pode ser contestado que somente atraveacutes da disciplina social extrema e politicamente imposta eacute que se seraacute capaz de rever as vantagens ou as falsas vantagens do agora em detrimento dos imperativos do futuro Em outras letras a compulsatildeo em exercer o poderio sobre a natureza

[] eacute a perspectiva apocaliacuteptica que se insere de forma previsiacutevel na dinacircmica do atual curso da

humanidade Devemos compreender que estamos diante de uma dialeacutetica que soacute poderaacute ser

enfrentada graccedilas a uma escala em termos de poder e natildeo com uma renuacutencia quietista ao poder

A foacutermula baconiana afirma que saber eacute poder Mas o proacuteprio programa baconiano no auge do

triunfo revela-se insuficiente com a sua contradiccedilatildeo intriacutenseca ou seja o descontrole sobre

si mesmo mostrando-o incapaz de proteger o homem de si mesmo e a natureza do homem45

A eacutetica do futuro deve dessa forma pautar-se em accedilotildees humanas prevendo e analisando as accedilotildees conjuntamente pois natildeo existe mais espaccedilo para o isolamento na sociedade poacutes-moderna uma vez que o destino de toda a humanidade estaacute intrinsecamente ligado natildeo soacute agraves grandes atitudes mas tam-beacutem aos pequenos atos individuais ou de grupos de indiviacuteduos que por atingir a todos necessitam serem revistos dentro dos limites do acircmbito particular de suas accedilotildees E se isso natildeo ocorrer estare-mos fadados a consequecircncias e cataacutestrofes como as vistas nas obras ldquoOs Vingadores Era de Ultronrdquo e ldquoCapitatildeo Ameacuterica Guerra Civilrdquo que ocorreram devido agraves atitudes tomadas individualmente ou em alguns casos por grupos de indiviacuteduos sem a devida reflexatildeo eacutetico-moral

5 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

Se pretendeu despertar no leitor com o presente artigo o desejo por um novo tipo de conhecimento isto eacute um raciociacutenio loacutegico e criacutetico a respeito de um assunto ainda jovem no campo da Bioeacutetica e quase alheio agrave grande populaccedilatildeo Para tanto tendo em vista o faacutecil acesso agrave grande parcela da sociedade a induacutestria cinematograacutefico se propocircs trazer agrave tona a discussatildeo de temas que cada dia se fazem mais impactantes na Bioeacutetica e que estatildeo a envolver igualmente cada vez mais no cotidiano da espeacutecie humana

Nesse iacutenterim foram constatadas algumas das problemaacuteticas da (bio)eacutetica nos filmes ldquoOs Vingadores Era de Ultronrdquo e ldquoCapitatildeo Ameacuterica Guerra Civilrdquo problemas como o enhancement da espeacutecie humana o desenvolvimento de inteligecircncias artificiais e de exoesqueletos os quais se mostraram em cada cena

43 Idem p 72-74

44 idem p 235

45 JONAS Hans O Princiacutepio Responsabilidade ensaio de uma eacutetica para a civilizaccedilatildeo tecnoloacutegica Rio de Janeiro Ed Contraponto

PUC-Rio 2006 p 236

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Unisul de Fato e de Direito

Ano IX Nordm 17 | Julho a Dezembro | 2018

das obras mais complexos e catastroacuteficos problemaacuteticas essas que tal qual nos filmes vem se fazendo cada vez mais presente na sociedade fora do mundo imaginario Tem-se por conseguinte que a imagi-naccedilatildeo humana muitas vezes crie tais obras de ficccedilatildeo como formas de natildeo apenas sutilmente ante-ver tais questotildees de alta complexidade e propensas a cataacutestrofes futuras agrave humanidade mas tambeacutem como meio de advertir a si mesma dos riscos que se encontra correndo

As implicaccedilotildees da produccedilatildeo cientiacutefica na contemporaneidade tal qual nos filmes deve depender de fundamentaccedilotildees eacuteticas a fim de proteger o homem do proacuteprio homem e dos descaminhos que o poder outrora possa vir a lhe causar Sua responsabilidade deve assim invadir os domiacutenios do desconheci-do quando se fala em problemaacuteticas como as abordadas nos filmes do Universo Cinematograacutefico da Marvel pois seus efeitos satildeo imprevisiacuteveis em outras entonaccedilotildees o princiacutepio da responsabilidade deve preservar a imagem e semelhanccedila do humano e pensar no medo como um conselheiro possiacutevel levan-do em conta a imagem positiva do homem ante sua negativa a qual deriva de suas accedilotildees desastrosas no presente

A eacutetica do futuro assim deve preencher os espaccedilos que se permitirem serem completados mesmo que moralmente O homem necessita rever a eacutetica pois se saber eacute poder um saber negativo pode nos levar ao retrocesso da espeacutecie humana bem como a sua descontinuidade Moral eacute eacuteticamente falando os perigos que a civilizaccedilatildeo do presente possa vir a enfrentar os quais satildeo muitos e podem se multipli-car exponencialmente caso natildeo busquemos antever suas consequecircncias Contudo o maior perigo que podemos enfrentar aleacutem da proacutepria espeacutecie humana eacute a inviabilizaccedilatildeo do mundo como conhecemos para as presentes e futuras geraccedilotildees sejam elas humanas ou Poacutes-Humanas

AGRADECIMENTOS

A Claacuteudia Lissandra Martins de Andrade Advogada e Arte-educadora os sinceros agradecimentos pela disponibilidade de conversar a respeito do emprego da 7ordm Arte no presente artigo conversas essas que se mostraram muito frutiveras consoante pode-se observar nas consideraccedilotildees finais expostas

REFEREcircNCIAS

ANDORNO Roberto ldquoLiberdaderdquo e ldquoDignidaderdquo da Pessoas dois paradigmas opostos ou comple-mentares na bioeacutetica In MARTINS-COSTA Judith MOumlLLER Letiacutecia Luwdwig (Orgs) Bioeacutetica e Responsabilidade Rio de Janeiro Forense 2009

BARRETTO Vicente de Paulo O Fetiche dos Direitos Humanos e outros Temas 2 ed rev e ampl Porto Alegre Livraria do Advogado 2013

___________ SUBTIL Camargo Leonardo Habermas Direito e Eugenia RECHTD ndash Revista de Estudos Constitucionais Hermenecircutica e Teoria do Direito Satildeo Leopoldo v 02 n 02 2010 Disponiacutevel em lthttpwwwrevistasunisinosbrindexphpRECHTDarticleview298gt Acesso em 07 jul 2017

BENTO Luiz Antonio CALVO Paulo Rafael Sanches Quando a vida imita a arte a bioeacutetica dos homens--maacutequinas Revista Bioethikos Satildeo Camilo v 07 n 03 2013 Disponiacutevel em lthttpswwwsaocamilo--spbrpdfbioethikos1051815pdfgt Acesso em 09 jul 2017

BROSTOM Nick In defence of posthuman dignity Bioethics Oxford v 19 n 03 2005 Disponiacutevel em lthttpwwwpsyvanderbilteducourseshon182Posthuman_dignity_Bostrompdfgt Acesso em 09 jul 2017

CASADO Maria A vueltas sobre las relaciones entre la bioeacutetica y el derecho Revista Bioeacutetica Brasiacutelia v 19 n 01 2011 Disponiacutevel em lthttpwwwredalycorgarticulooaid=361533255002gt Acesso em 07 jul 2017

CINEPOP lsquoCapitatildeo Ameacuterica Guerra Civilrsquo Leia na iacutentegra o curioso Acordo de Sokovia 2015 Disponiacutevel em lthttpcinepopcombrcapitao-america-guerra-civil-leia-na-integra-o-curioso-acor-do-de-sokovia-108459gt Acesso em 07 jul 2017

COELHO Luiz Fernando Clonagem reprodutiva e clonagem terapecircutica questotildees juriacutedicas Revista Centro de Estudos Judiciaacuterios Brasiacutelia v 06 n 16 2002 Disponiacutevel em lthttpwwwjfjusbrojs2indexphprevcejarticleview438619gt Acesso em 08 jul 2017

HABERMAS Juumlrgen O Futuro da natureza humana a caminho de uma eugenia liberal Satildeo Paulo Ed Martins Fontes 2004

HUMANITY+ Transhumanist FAQ [Sd] Disponiacutevel em lthttphumanityplusorgphilosophytranshumanist-faqgt Acesso em 07 jul 2017

JONAS Hans O Princiacutepio Responsabilidade ensaio de uma eacutetica para a civilizaccedilatildeo tecnoloacutegica Rio de Janeiro Contraponto Ed PUC-Rio 2006

LIMBERGER Tecircmis Cibertransparecircncia informaccedilatildeo puacuteblica em rede e a cidade em tempos de globa-lizaccedilatildeo In STRECK Lecircnio Luiz ROCHA Leonel Severo ENGELMANN Wilson (Orgs) Constituiccedilatildeo Sistemas Sociais e Hermenecircutica anuaacuterio do Programa de Poacutes-Graduaccedilatildeo em Direito da UNISINOS ndash Mestrado e Doutorado Porto Alegre Livraria do Advogado n 12 2016

MARVEL Avengers Age of Ultron 2015 Disponiacutevel em lthttpsmarvelcommoviesmovie193avengers_age_of_ultrongt Acesso em 08 jul 2017

______ Captain America Civil War 2016 Disponiacutevel em lthttpsmarvelcommoviesmovie219cap-tain_america_civil_wargt Acesso em 08 jul 2017

PESSINI Leocir Bioeacutetica e o desafio do transumanismo ideologia ou utopia ameaccedila ou esperan-ccedila Revista Bioeacutetica Brasiacutelia v 14 n 02 2006 Disponiacutevel em lthttpwwwredalycorgarticulooaid=361533244002gt Acesso em 07 jul 2017

PONA Eacuteverton Willian TESHIMA Marcia X-Men da ficccedilatildeo agrave realidade Posicionamentos de sentine-las bioconservadoras Revista de Informaccedilatildeo Legislativa Brasiacutelia v 52 n 205 2015 Disponiacutevel em lthttpwww12senadolegbrriledicoes52205ril_ v52_n205_p189pdfgt Acesso em 09 jul 2017

ROCHA Leonel Severo OLIVEIRA Cheila A A Bioeacutetica e o Biodireito como Acoplamentos Estruturais entre a Eacutetica e o Direito na Proteccedilatildeo da Vida Humana Revista Brasileira de Direito Passo Fundo v 1 2008

SCHUSTER Diego Henrique Sobre a Dignidade Humana como Qualificadora do Gecircnero Humano e Fonte de Legitimidade dos Direitos uma Reflexatildeo sobre o Movimento Transumanista e sua Influecircncia sobre o Desenvolvimento Futuro da Humanidade Revista Brasileira de Direitos Humanos v 16 2016

VILACcedilA Murilo Mariano DIAS Maria Clara Marques Transumanismo e o futuro (poacutes-) humano Physis Revista de Sauacutede Coletiva Rio de Janeiro v 24 n 02 2014 Disponiacutevel em lthttpwwwscie-lobrpdfphysisv24n20103-7331-physis-24-02-00341pdfgt Acesso em 06 jul 2017

Sob a chancela do corpo docente da Unisul Campus

Universitaacuterio da Grande Florianoacutepolis eis o resultado

dos trabalhos monograacuteficos indicados para publicaccedilatildeo

meticulosamente revisados por professores

orientadores membros integrantes de banca e

coordenadores de nuacutecleo de monografia

O QUE ESTAMOS PESQUISANDO

235Ano IX Nordm 17 | Julho a Dezembro | 2018

A IMPORTAcircNCIA DO REGIME DISCIPLINAR DIFERENCIADO NO COMBATE AO CRIME ORGANIZADO Agrave LUZ DOS PRINCIacutePIOS DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA E DA PROPORCIONALIDADEAcadecircmica Alana Felchilcher

Orientador Sidney Eloy Dalabrida

Examinador 1 Eacutelio de Amorim

Examinadora 2 Eliana Becker

E-mail alanafelchilcherhotmailcom

Resumo A presente monografia tem como objetivo principal estudar a importacircncia da aplicaccedilatildeo do regime disciplinar diferenciado no combate ao crime organizado agrave luz dos princiacutepios da dignidade da pessoa humana e da proporcionalidade Edificada a partir do meacutetodo dedutivo e por meio de pesquisa bibliograacutefica qualitativa visa-se estudar os princiacutepios da dignidade da pessoa humana e da proporcio-nalidade demonstrando sua importacircncia e sua eficaacutecia juriacutedica expor o regime prisional comum bem como o regime disciplinar diferenciado e demonstrar a importacircncia deste no combate agrave criminalidade organizada agrave luz dos princiacutepios da dignidade da pessoa humana e da proporcionalidade Para tal verifi-caccedilatildeo a pesquisa recorre agrave doutrina paacutetria atraveacutes da qual percebe-se que apesar de o regime discipli-nar diferenciado restringir alguns direitos fundamentais conferidos aos presos essa restriccedilatildeo eacute excep-cional atende agraves necessidades do contexto bem como a dignidade da pessoa humana pauta-se na proporcionalidade e garante agrave coletividade o desfrute dos seus direitos constitucionalmente conferi-dos sendo por isso constitucional e de fundamental importacircncia para o combate ao crime organizado

Palavras-Chave Regime disciplinar diferenciado Crime organizado Dignidade da pessoa humana Proporcionalidade

236 Revista Juriacutedica da Universidade do Sul de Santa Catarina

O REGIME JURIacuteDICO DOS CONTRATOS NAS ESTATAIS EM FUNCcedilAtildeO DA LEI 133032016 UM ESTUDO DO REGULAMENTO DA ELETROBRASAcadecircmica Ana Luacutecia Schveitzer

Orientadora Patriacutecia de Oliveira Franccedila

Examinador 1 Henrique Barros Souto Maior Baiatildeo

Examinador 2Juacutelio Ceacutesar Marcellino Juacutenior

E-mail anaschveitzergmailcom

Resumo A Lei 1330316 (Estatuto das Estatais) trouxe um novo regramento no campo das licitaccedilotildees e contrataccedilotildees dessas entidades principalmente o art 68 ao definir que os contratos celebrados na vigecircncia da Lei seriam regulados pelos preceitos de direito privado divergente do modelo anterior sob o regramento da Lei 866693 em que eram considerados contratos administrativos Tal modifi-caccedilatildeo cria grande impacto na relaccedilatildeo juriacutedico-administrativa entre o contratante e o contratado mais horizontal pois na concepccedilatildeo privada natildeo haacute que se falar em claacuteusulas exorbitantes caracteriacutestica do poder puacuteblico O objetivo dessa monografia eacute verificar por meio de pesquisa bibliograacutefica (doutrina Lei 133032016 e atos regulamentadores jaacute editados) o regime juriacutedico dos contratos estatais a par-tir da Lei 1330316 apontando quais fundamentos de direito puacuteblico ainda se aplicam e quais migra-ram para o direito privado sendo o meacutetodo de abordagem utilizado quanto agrave natureza qualitativo e quanto ao pensamento dedutivo Concluiu-se que embora o Estatuto tenha por objetivo aproximar o contrato estatal do privado o acordo decorrente da Lei 1330316 natildeo eacute puramente civilista mas assi-nalado por um regime hiacutebrido com pressupostos do direito privado todavia ainda com obrigaccedilotildees e benesses da Administraccedilatildeo Puacuteblica Da anaacutelise do Regulamento da Eletrobras e demais regulamentos utilizados para fim de estudo comparado acentuou-se a ideia do hibridismo e ateacute mesmo de um contra-to administrativo diferenciado havendo em alguns momentos falta de coerecircncia por parte das Estatais ao dispor sobre direito puacuteblico eou privado provavelmente em funccedilatildeo da cultura publicista existente e da imaturidade dessa mudanccedila

Palavras-Chave Lei 133032016 Hibridismo juriacutedico Contratos Estatais

237Ano IX Nordm 17 | Julho a Dezembro | 2018

CRIMINAL COMPLIANCE NO AcircMBITO DO DIREITO PENAL TRIBUTAacuteRIO MECANISMO DE PROTECcedilAtildeO DA EMPRESA FRENTE AOS DELITOS TRIBUTAacuteRIOS PREVISTOS NA LEI Nordm 81371990Acadecircmica Ana Paula Dallanora

Orientadora Tania Maria Franccedilosi Santhias

Examinadora Giglione Edite Janela Maia

Examinadora Patricia Castagna

E-mail anapauladallanorahotmailcom

Resumo O presente trabalho tem como escopo esmiuccedilar sobre o sistema Criminal Compliance no acircmbito do Direito Penal Tributaacuterio e os benefiacutecios que sua implementaccedilatildeo trazem as empresas e aos empresaacuterios tanto de cunho material quanto de ordem imaterial Natildeo soacute por oferecer meacutetodos de prevenccedilatildeo que visam coibir a praacutetica dos iliacutecitos previstos na Lei 8137 de 27 de novembro de 1990 o que gera maior credibilidade agrave empresa no mercado e evita custos desnecessaacuterios com processos judiciais mas por trazer a possibilidade de delegaccedilatildeo do dever de vigilacircncia diante da definiccedilatildeo de sob quem e quando recairaacute a responsabilidade criminal por esse dever Isso porque mesmo o ordenamen-to juriacutedico brasileiro tendo como um dos princiacutepios basilares o da individualizaccedilatildeo da pena previsto no artigo 5ordm inciso XLVI da Constituiccedilatildeo da Repuacuteblica Federativa do Brasil de 1988 que garante a cada pessoa responder por crimes na medida de sua culpabilidade devendo a dosimetria ser feita de forma individual para cada infrator os tribunais brasileiros vem admitindo as chamadas denuacutencias geneacutericas diante da complexidade que envolve a apuraccedilatildeo do verdadeiro agente cometedor do iliacutecito quando se trata de crimes societaacuterios inclusive quando da apuraccedilatildeo de praacuteticas de crimes contra a ordem tribu-taacuteria praticados por particulares previstos na Lei nordm 81371990 Isso aliado ao fato de eacute adotado pelo ordenamento juriacutedico brasileiro a tradicional teoria do delito que prevecirc dentre outros requisitos a necessidade de potencial consciecircncia humana da ilicitude o que impossibilita a imputaccedilatildeo diretamen-te aos entes juriacutedicos mas que natildeo obsta a aplicaccedilatildeo de sanccedilotildees penais aos agentes que constam no contrato social da empresa Tal possibilidade que vem permitindo que os tribunais brasileiros imputem sanccedilotildees de cunho penal aos empresaacuterios sob o argumento de que a eles incumbe a administraccedilatildeo e fis-calizaccedilatildeo dos atos de seus subordinados Ou seja o dever de zelar e vigiar os atos desses Assim com a implantaccedilatildeo do Criminal Compliance e seus mecanismos de antecipaccedilatildeo bem como o nascimento das figuras Chieff Compliancer Officer e dos Whistleblowers fica mais faacutecil evitar os delitos previstos na Lei nordm 81371990 ou nos piores casos apurar quem foram os verdadeiros responsaacuteveis pelo cometi-mento dos delitos evitando condenaccedilotildees desnecessaacuterias e injustas a aqueles que agiram dentro dos ditames legais

Palavras-chave Criminal Compliance Benefiacutecios PrevenccedilatildeoVigilacircncia

238 Revista Juriacutedica da Universidade do Sul de Santa Catarina

A PAZ PERPEacuteTUA KANTIANA NO SEacuteCULO XXIAcadecircmico Anderson de Souza Rosa

Orientador Joatildeo Batista da Silva

Examinador Alexandre Botelho

Examinadora Priscila Azambuja Tagliari

E-mail andersonsrosa94gmailcom

Resumo A presente pesquisa tem como principal objetivo verificar a possibilidade de aplicaccedilatildeo da paz perpeacutetua apresentada por Immanuel Kant no primeiro quartel do seacuteculo XXI Para tanto utiliza-se do meacutetodo de procedimento monograacutefico para chegar agrave resposta do questionamento Primeiramente foram apresentadas as origens da guerra e da paz e suas consequecircncias nas relaccedilotildees internacionais para entatildeo apresentar a teoria kantiana de paz perpeacutetua que tem como objetivo pocircr fim ou minimizar drasticamente o uso da guerra nas relaccedilotildees interestatais E por fim esta teoria fora contraposta com as atitudes e pen-samentos correntes a fim de saber a possibilidade de sua aplicabilidade no periacuteodo proposto Ao fim a conclusatildeo alcanccedilada com a presente pesquisa eacute de que natildeo eacute possiacutevel a aplicaccedilatildeo da paz perpeacutetua devido agrave resistecircncia ainda existente entre os Estados em ceder sua soberania para a criaccedilatildeo de uma Federaccedilatildeo de Estados bem como do sentimento nacionalista ainda presente entre seus cidadatildeos

Palavras-chave Guerra e Paz Paz Perpeacutetua Kantiana Federaccedilatildeo de Estados

239Ano IX Nordm 17 | Julho a Dezembro | 2018

AMICUS CURIAE NOVA MODALIDADE DE INTERVENCcedilAtildeO DE TERCEIRO NO PROCESSO CIVIL BRASILEIROAcadecircmica Andressa Paula Mucelin

Orientador Guilherme de Almeida Bossle

Examinador 1 Hernani Luiz Sobierajski

Examinador 2 Herciacutelio E Lentz

Email andressapmucelingmailcom

Resumo O tema deste Trabalho de Conclusatildeo de Curso versa sobre o amigo da corte sua origem e atuaccedilatildeo efetiva no Supremo Tribunal Federal em Accedilotildees de Controle de Constitucionalidade discorre sobre as alteraccedilotildees advindas com o novo Coacutedigo de Processo Civil de 2015 bem como os requisitos para atuar nesta condiccedilatildeo O objetivo do trabalho eacute ressaltar sua imprescindibilidade e pois disponibi-lizar informaccedilotildees acerca deste agrave sociedade afim de abertamente motivaacute-la a integrar o processo pelo instituto do amicus curiae quando lhe competir aleacutem de revelar o interesse que o amigo da corte possa ter mesmo natildeo se beneficiando da decisatildeo processual propriamente dita Ao desenvolver este estudo concluiu-se que mesmo natildeo integrando qualquer dos polos da relaccedilatildeo juriacutedica processual o instituto eacute capaz de defender seu entendimento teacutecnico e cientiacutefico esclarecendo duacutevidas de sua competecircncia ao magistrado por desconhecimento teacutecnico do Poder Judiciaacuterio na mateacuteria controvertida em litiacutegio

Palavras-Chave Amigo da Corte Supremo Tribunal Federal Controle de Constitucionalidade Coacutedigo de Processo Civil de 2015 Intervenccedilatildeo de Terceiros no Processo Procedimento da Intervenccedilatildeo

240 Revista Juriacutedica da Universidade do Sul de Santa Catarina

SISTEMA PROCESSUAL PENAL ACUSATOacuteRIO PRETENSAtildeO PUNITIVA ESTATAL E JURISDICcedilAtildeOAcadecircmica Andressa Pimenta Tomazini

Orientador Sidney Eloy Dalabrida

Examinador 1 Elio de Amorim

Examinador 2 Eliana Becker

E-mail dessaptomazinigmailcom

Resumo O presente trabalho monograacutefico traz como objeto de estudo a tutela jurisdicional tendo em vista a tamanha importacircncia que possui dentro de um Estado Democraacutetico de Direito e qual o grau de vinculaccedilatildeo que esta possui com a pretensatildeo punitiva estatal em uma Accedilatildeo Penal dentro de um Sistema Processual Penal Acusatoacuterio como o Espanhol Assim nesse sentido e contexto o objetivo principal desta pesquisa eacute mostrar qual o limite da tutela jurisdicional quando ocorre a mudanccedila da pretensatildeo condenatoacuteria ou seja quando o requerimento ministerial for absolutoacuterio Para tanto utili-zou-se o pensamento indutivo pois a partir de categorias especiacuteficas (sistema processual acusatoacuterio pretensatildeo punitiva e limite da tutela jurisdicional) mostrar-se-aacute o limite decisional em face da alte-raccedilatildeo da pretensatildeo punitiva dentro de um Sistema Processual Acusatoacuterio A natureza da pesquisa eacute qualitativa e o meacutetodo procedimental eacute monograacutefico englobando a pesquisa bibliograacutefica com base na doutrina obras claacutessicas legislaccedilatildeo perioacutedicos e artigos cientiacuteficos Conclui-se que o limite decisional consiste no interesse puacuteblico estatal exercido e manifestado pelo Ministeacuterio Puacuteblico de modo que ao optar pelo requerimento absolutoacuterio natildeo existe mais a pretensatildeo condenatoacuteria devendo ser prolata-da pelo magistrado uma sentenccedila penal absolutoacuteria

Palavras-Chave Sistema processual penal acusatoacuterio Pretensatildeo punitiva Limite da tutela jurisdicional

241Ano IX Nordm 17 | Julho a Dezembro | 2018

PROGRAMAS DE COMPLIANCE E A SUA IMPORTAcircNCIA PARA AS EMPRESAS NO BRASILAcadecircmica Cristiana Melillo Bittencourt

Orientador Henrique Barros Souto Maior Baiatildeo

Examinador 1 Hernani Luiz Sobierajski

Examinador 2 Herciacutelio E Lentz

E-mail cristianamelillogmailcom

Resumo Este trabalho tem por objetivo geral verificar a importacircncia da adoccedilatildeo dos programas de com-pliance para as empresas no Brasil Para cumprir com esse objetivo realiza-se uma pesquisa com o meacutetodo de abordagem dedutivo de natureza qualitativa com o meacutetodo de procedimento monograacutefico e a teacutecnica de pesquisa bibliograacutefica e documental As principais descobertas realizadas por esta monografia satildeo que as convenccedilotildees internacionais anticorrupccedilatildeo ratificadas pelo Brasil influenciaram a tipificaccedilatildeo da Lei anticorrupccedilatildeo brasileira que o FCPA e o UK Bribery Act influenciaram na promoccedilatildeo do compliance no Brasil que o complianceganhou relevacircncia no Brasil a partir da sua previsatildeo na Lei anticorrupccedilatildeo brasi-leira e que a legislaccedilatildeo anticorrupccedilatildeo brasileira incentiva a adoccedilatildeo de programas de compliance realmen-te eficazes Conclui-se que a importacircncia da adoccedilatildeo dos programas decompliance para as empresas no Brasil se verifica principalmente na possibilidade de reduccedilatildeo dos riscos legais e reputacionais das pessoas fiacutesicas e juriacutedicas na remediaccedilatildeo dos prejuiacutezos caso se identifique alguma irregularidade e o transbor-damento dos comportamentos derivados da poliacutetica de compliance da esfera da empresa para a esfera social beneficiando a empresa seus empregados e a sociedade como um todo

Palavras-Chave Compliance Lei anticorrupccedilatildeo Programas de integridade

242 Revista Juriacutedica da Universidade do Sul de Santa Catarina

MEIO AMBIENTE DE TRABALHO SAUDAacuteVEL O BANIMENTO DO AMIANTO CRISOTILA (ASBESTO BRANCO) NO BRASIL E A RESPONSABILIDADE CIVIL DO EMPREGADOR POR ACIDENTE DE TRABALHOAcadecircmica Gabriela Thomas Coutinho

Orientador Elvis Daniel Muumlller

Examinador 1 Carlos Alberto Crispim

Examinador 2 Rafael de Miranda Santos

Email gabitmscgmailcom

Resumo A exposiccedilatildeo do trabalhador a substacircncias altamente canceriacutegenas tem se demonstrado um desafio mundial Segundo dados da Organizaccedilatildeo Mundial da Sauacutede estima-se que 125 milhotildees de tra-balhadores em todo o mundo estatildeo expostos ao amianto em seus locais de trabalho Diante dos altos iacutendices de doenccedilas e mortes relacionadas ao composto muito paiacuteses jaacute proibiram o seu uso No Brasil percebe-se uma verdadeira ineacutercia estatal quanto ao assunto Apesar de ser signataacuterio da Convenccedilatildeo n 162OIT que trata da substituiccedilatildeo gradativa do amianto as medidas assumidas natildeo foram concre-tizadas Levando o judiciaacuterio a posicionar-se a respeito De outro norte tambeacutem inertes quanto aos malefiacutecios do amianto os empregadores continuam a expor seus empregados nas linhas de produccedilatildeo visando tatildeo somente os lucros provenientes desse composto polivalente e de baixo custo Diante des-te contexto a pesquisadora busca em seu trabalho verificar o banimento do amianto crisotila (asbesto branco) no Brasil e a Responsabilidade Civil do empregador por acidente de trabalho Utilizando o pro-cedimento monograacutefico com teacutecnicas de pesquisa bibliograacutefica e documental a pesquisadora apre-senta e conceitua os princiacutepios da dignidade da pessoa humana e da proteccedilatildeo do trabalhador e ainda o meio ambiente de trabalho Da mesma forma identifica a reponsabilidade civil do empregador em caso de acidente de trabalho e a divergecircncia doutrinaacuteria acerca do tema Ao fim da pesquisa apesar da decisatildeo pelo banimento do amianto crisotila no Brasil ser recente e ainda estar com seus efeitos sus-pensos a pesquisadora verificou que haacute fundamentos plausiacuteveis para a declaraccedilatildeo da inconstituciona-lidade do art 2ordm da Lei n 905595 (Lei do Amianto) bem como identificou que a responsabilidade do empregador por acidente de trabalho segundo corrente majoritaacuteria ainda eacute subjetiva dependendo da comprovaccedilatildeo da culpa

Palavras-Chave Meio ambiente de trabalho Banimento do amianto Responsabilidade civil do empregador

243Ano IX Nordm 17 | Julho a Dezembro | 2018

O ALCANCE DA NORMA CONTIDA NO PARAacuteGRAFO UacuteNICO DO ART 932 DO COacuteDIGO DE PROCESSO CIVILAcadecircmico Glauber William Duarte

Orientadora Sacircmia Mocircnica Fortunato

Examinadora Patriacutecia de Oliveira Franccedila

Examinador Leonardo Martins Fornari

E-mail glauberwilliamduartegmailcom

Resumo O objetivo do presente trabalho eacute identificar o alcance da norma contida no paraacutegrafo uacutenico do art 932 do Coacutedigo de Processo Civil no que tange ao juiacutezo de admissibilidade dos recursos ciacuteveis uma vez que tal norma por si soacute natildeo delimita o seu alcance quanto agrave sanabilidade de viacutecios nos pres-supostos de admissibilidade recursal Apoacutes o estudo da norma em questatildeo ou seja de seu contexto e de seu conteuacutedo agrave luz dos conceitos primordiais do direito processual civil bem como da principio-logia que rege este como um tudo e a proacutepria atividade recursal a conclusatildeo foi no sentido de diante dos princiacutepios da primazia do julgamento do meacuterito e da cooperaccedilatildeo do qual se extraem os deveres de consulta e prevenccedilatildeo que a norma alcanccedila todos os viacutecios capazes de tornar um recurso inadmissiacutevel devendo a anaacutelise da sanabilidade dos pressupostos ser feita no caso concreto apoacutes a oitiva da parte recorrente oitiva esta que eacute direito subjetivo de quem recorre Para tanto utilizou-se como meacutetodo de abordagem o pensamento dedutivo e como meacutetodo de procedimento o monograacutefico tendo como teacutec-nica de pesquisa a bibliograacutefica com base em doutrina legislaccedilatildeo jurisprudecircncia e artigos cientiacuteficos

Palavras-chave Juiacutezo de admissibilidade Dever de prevenccedilatildeo Primazia do meacuterito

244 Revista Juriacutedica da Universidade do Sul de Santa Catarina

A PRODUCcedilAtildeO DE NULIDADE EM VIRTUDE DO USO INJUSTIFICADO DE ALGEMAS NO PLENAacuteRIO DO JUacuteRIAcadecircmico Hernani Oliveira Costa

Orientadora Cristiane Goulart Cherem

Examinadora Virgiacutenia Lopes Rosa

Examinador Joel Irineu Lohn

E-mail hernaniocostagmailcom

Resumo O presente trabalho de conclusatildeo de curso tem como objetivo geral abordar temaacuteticas rela-cionadas ao tribunal do juacuteri tendo como enfoque principal verificar quais posicionamentos e paracircme-tros tecircm sido adotados pelos tribunais superiores a respeito do uso de algemas nas sessotildees de julga-mento perante o Conselho de Sentenccedila Foram diversas as alteraccedilotildees sofridas pelo tribunal do juacuteri desde sua incorporaccedilatildeo ao sistema judiciaacuterio brasileiro tendo surgido neste iacutenterim a discussatildeo acer-ca da influecircncia do uso de algemas na percepccedilatildeo dos jurados leigos assunto que gera divergecircncia dou-trinaria Dessa forma fez-se necessaacuteria discussatildeo a respeito da temaacutetica verificando-se as hipoacuteteses excepcionais em que o uso de algemas eacute permitido quando o acusado se encontra ocupando o ldquobanco dos reacuteusrdquo O marco teoacuterico foca quatro temas que se considerou fundamentais para a sustentaccedilatildeo da pesquisa o tribunal do juacuteri a origem os princiacutepios e a legalidade do uso de algemas Desta forma para esta pesquisa o meacutetodo de abordagem utilizado eacute o dedutivo sendo procedimento monograacutefico de natureza qualitativa com teacutecnicas de pesquisa bibliograacutefica e documental

Palavras-chave Tribunal do Juacuteri Princiacutepios Uso de algemas

245Ano IX Nordm 17 | Julho a Dezembro | 2018

O CARAacuteTER TRANSITOacuteRIO DOS ALIMENTOS DEVIDOS AO EX-COcircNJUGECOMPANHEIRO E OS ELEMENTOS NECESSAacuteRIOS PARA EXONERACcedilAtildeOAcadecircmica Juacutelia Gevaerd de Oliveira Ramos

Orientadora Gisele Rodrigues Martins Goedert

Examinador 1 Luciana Faiacutesca Nahas

Examinadora 2 Priscila de Azambuja Tagliari

E-mail juliaggevaerdgmailcom

Resumo Este trabalho o qual utilizou-se do meacutetodo dedutivo para sua consecuccedilatildeo pretende susci-tar as particularidades conferidas aos alimentos devidos entre ex-cocircnjuges e ex-companheiros res-saltando-se em especial o caraacuteter transitoacuterio que lhes foi atribuiacutedo ao longo dos uacuteltimos anos pelo ordenamento juriacutedico paacutetrio Em um primeiro momento realizou-se um estudo acerca da evoluccedilatildeo das entidades familiares e suas novas diretrizes embasadas no afeto na independecircncia dos consortes e na igualdade dos gecircneros Logo em sequecircncia discorreu-se no segundo capiacutetulo acerca do instituto dos alimentos suas hipoacuteteses de prestaccedilatildeo caracteriacutesticas e espeacutecies tendo-se desaguado na catego-ria dos alimentos transitoacuterios de conceituaccedilatildeo elementar para a construccedilatildeo da pesquisa Consagrado pelos tribunais e doutrinadores os alimentos assim denominados transitoacuterios tecircm sua duraccedilatildeo restrita por lapso temporal certo ou condiccedilatildeo futura exoneratoacuteria ambos determinados por magistrado com-petente Ao aprofundar-se na aplicaccedilatildeo da categoria pelos tribunais paacutetrios notou-se no uacuteltimo capiacute-tulo do trabalho que o judiciaacuterio vem fundamentando a aplicaccedilatildeo da espeacutecie nas obrigaccedilotildees alimenta-res entre ex-cocircnjuges e companheiros geralmente na evoluccedilatildeo da igualdade dos gecircneros Explanam que caberia a ambos do ex-casal buscarem sua independecircncia financeira apoacutes o teacutermino da relaccedilatildeo havida natildeo sendo mais aceitaacutevel a imputaccedilatildeo de obrigaccedilatildeo vitaliacutecia a um dos ex-consortes quando o outra detenha condiccedilotildees proacuteprias de subsistecircncia Por fim verificou-se que a implementaccedilatildeo de ter-mos e condiccedilotildees previamente estipuladas em juiacutezo para o teacutermino da obrigaccedilatildeo refletiu nas accedilotildees de exoneraccedilatildeo dos encargos alimentares transitoacuterios tendo se dedicado espaccedilo no trabalho sobre tais consequecircncias Ante a recorrecircncia da utilizaccedilatildeo do instituto pelo poder judiciaacuterio em sua atuaccedilatildeo e a concomitante inexistecircncia de legislaccedilatildeo sobre o assunto demonstrou-se relevante a pesquisa sobre o tema Percebe-se pois um movimento em prol da emancipaccedilatildeo dos consortes apoacutes o teacutermino de suas relaccedilotildees enquanto proacuteprio reflexo da evoluccedilatildeo das entidades familiares parecendo adequado o posi-cionamento das cortes brasileiras acerca da aplicaccedilatildeo da transitoriedade nas situaccedilotildees citadas desde que sempre criteriosamente avaliados os casos concretos vindos agrave sua baila

Palavras-Chave Famiacutelia Pensatildeo Alimentiacutecia Alimentos transitoacuterios Exoneraccedilatildeo

246 Revista Juriacutedica da Universidade do Sul de Santa Catarina

A (IM)POSSIBILIDADE DE RECONHECIMENTO NO ORDENAMENTO JURIacuteDICO BRASILEIRO DOS ANIMAIS NAtildeO HUMANOS COMO SUJEITOS DE DIREITOAcadecircmica Luciana Aparecida Schossler

Orientador Jeferson Puel

Examinador 1 Wacircnio Wiggers

Examinador 2 Eliana Becker

e-mail lucianaastjscjusbr

Resumo O presente trabalho tem como objetivo verificar a (im)possibilidade de reconhecimento pelo ordenamento juriacutedico brasileiro dos animais natildeo humanos como sujeitos de direito Utiliza-se para isso o meacutetodo dedutivo de procedimento histoacuterico e monograacutefico com resposta ao problema da pes-quisa de natureza qualitativa e teacutecnica de pesquisa bibliograacutefica Para uma melhor contextualizaccedilatildeo do tema aborda-se o histoacuterico da exploraccedilatildeo animal as premissas do especismo o nascimento do movi-mento pelos direitos dos animais e seus princiacutepios norteadores Apresenta-se a relaccedilatildeo dos animais (humanos e natildeo humanos) com a Natureza e a proteccedilatildeo dos natildeo humanos no ordenamento juriacutedico brasileiro nos acircmbitos constitucional e ambiental Explora-se o impacto ambiental gerado pela criaccedilatildeo de animais para alimentaccedilatildeo a qual gera sofrimento natildeo soacute aos natildeo humanos mas tambeacutem agraves pesso-as envolvidas nessa praacutetica especialmente no que diz respeito agrave sauacutede do trabalhador da induacutestria de abate Apontam-se os conceitos de sujeito e objeto de direito e na sequecircncia o status de coisapro-priedade conferido aos natildeo humanos pela norma civilista Mostram-se algumas mudanccedilas legislativas realizadas por outros paiacuteses no que concerne ao reconhecimento de direitos aos natildeo humanos Por fim analisam-se decisotildees judiciais acerca do assunto Conclui-se que embora natildeo haja o reconhecimento dos natildeo humanos como sujeitos de direito em norma positivada no acircmbito nacional haacute projetos de lei em tramitaccedilatildeo no Congresso Nacional que visam dar a eles um novo status juriacutedico bem como julgados que reconhecem os animais como seres sencientes e dignos de consideraccedilatildeo moral com o interesse juriacutedico de ao menos natildeo sofrer

Palavras-Chave Direito dos Animais Sujeito de direito Senciecircncia

247Ano IX Nordm 17 | Julho a Dezembro | 2018

AS CONTROVEacuteRSIAS JURIacuteDICAS SOBRE A REVOGACcedilAtildeO DOS ARTS 322 E 350 DO COacuteDIGO PENAL PELA LEI DE ABUSO DE AUTORIDADEAcadecircmico Luiz Felipe Deschamps Westphal

Orientadora Patriacutecia Ribeiro Mombach

Examinador 1 Wacircnio Wiggers

Examinador 2 Jeferson Puel

E-mail lipedwhotmailcom

Resumo Utilizando-se do meacutetodo de abordagem dedutivo e do meacutetodo de procedimento monograacutefi-co este trabalho tem como objetivo geral apresentar as controveacutersias doutrinaacuterias e jurisprudenciais sobre a revogaccedilatildeo dos arts 322 e 350 ambos do vigente Decreto-Lei nordm 2848 de 7 de dezembro de 1940 notoriamente conhecido como Coacutedigo Penal pela Lei nordm 4898 de 9 de dezembro de 1965 deno-minada como Lei de Abuso de Autoridade O primeiro dispositivo mencionado daquela legislaccedilatildeo trata do crime de violecircncia arbitraacuteria enquanto que o segundo se refere ao delito de exerciacutecio arbitraacuterio ou abuso de poder Diante da abrangecircncia de condutas previstas nesta norma existem diferentes argu-mentaccedilotildees sobre a sua revogaccedilatildeo Alguns sustentam que houve a sua revogaccedilatildeo total outros acredi-tam que ela foi parcial e ainda perduram aqueles que entendem que ele natildeo foi revogado Demonstra-se que a ediccedilatildeo da lei especial em comento gerou diversas duacutevidas sobre a aplicabilidade daqueles dois artigos e ainda natildeo haacute um consenso entre os doutrinadores e os aplicadores do direito sobre terem eles sido revogados ou natildeo Atraveacutes das teacutecnicas de pesquisa bibliograacutefica e documental eacute possiacutevel perce-ber que o art 322 do Coacutedigo Penal natildeo foi revogado ao contraacuterio do art 350 do mesmo diploma legal que foi revogado inteiramente pela Lei de Abuso de Autoridade

Palavras-Chave Abuso de autoridade Violecircncia arbitraacuteria Exerciacutecio arbitraacuterio ou abuso de poder Revogaccedilatildeo Controveacutersias juriacutedicas

248 Revista Juriacutedica da Universidade do Sul de Santa Catarina

MEDIACcedilAtildeO NA RESOLUCcedilAtildeO DE CONFLITOS FAMILIARES ANAacuteLISE DO PERFIL DOS USUAacuteRIOS DO NUacuteCLEO DE PRAacuteTICA JURIacuteDICA DA UNISULAcadecircmico Luiz Guilherme Buchmann Figueiredo

Orientadora Profa Gisele Rodrigues Martins Goedert

Examinador Prof Joel Irineu Lohn

Examinadora Prof Denis de Souza Luiz

E-mail guilhermebuchmanngmailcom

Resumo Neste trabalho foi realizada uma anaacutelise da mediaccedilatildeo como meio de resoluccedilatildeo de confli-tos familiares considerando aspectos legais jurisprudenciais e doutrinaacuterios Foi tambeacutem realizada uma pesquisa empiacuterica com o objetivo de traccedilar o perfil dos usuaacuterios do Nuacutecleo de Praacutetica Juriacutedica da UNISUL Unidade Pedra Branca Partindo da formulaccedilatildeo do problema da pesquisa fez-se os seguin-tes questionamentos Quais princiacutepios satildeo resguardados agraves famiacutelias brasileiras por intermeacutedio da Constituiccedilatildeo de 1988 e da legislaccedilatildeo ordinaacuteria Como proporcionar acesso agrave Justiccedila de forma eficien-te para atender aos conflitos familiares Qual o perfil do puacuteblico atendido no escritoacuterio do Nuacutecleo de Praacuteticas Juriacutedicas da UNISUL E ainda como se daacute a percepccedilatildeo do papel do mediador em uma audiecircncia de mediaccedilatildeo sob a percepccedilatildeo dos usuaacuterios da soluccedilatildeo paciacutefica de conflitos Nesse contexto se efetuou uma anaacutelise legal e doutrinaacuteria sobre o Direito das Famiacutelias dos meacutetodos alternativos para a soluccedilatildeo de conflitos da utilizaccedilatildeo da mediaccedilatildeo como praacutetica de resoluccedilatildeo paciacutefica de conflitos familiares e por fim foi efetuado um estudo praacutetico atraveacutes de um questionaacuterio aplicado a uma amostra de 45 usuaacuterios de uma populaccedilatildeo de 90 indiviacuteduos do serviccedilo de mediaccedilatildeo Extrajudicial do NPJ da UNISUL durante o ano de 2016 e primeiro semestre de 2017 para verificar o perfil dos mediados e a visatildeo das partes em relaccedilatildeo ao papel do mediador extrajudicial Ao teacutermino do estudo concluiu-se que a Constituiccedilatildeo da Repuacuteblica Federativa do Brasil de 1988 (CRFB1988) por ser principioloacutegica garantiu uma seacuterie de direitos agraves famiacutelias por priorizar o afeto e natildeo mais apenas o interesse patrimonial do casamento que Mediaccedilatildeo eacute o meacutetodo de acesso agrave Justiccedila mais indicado para a soluccedilatildeo de conflitos familiares e que os usuaacuterios da Mediaccedilatildeo do NPJ satildeo na sua maioria adultos jovens de ateacute 35 anos que buscam o serviccedilo por questotildees financeiras (economia) e pela agilidade na soluccedilatildeo dos conflitos O principal conflito exis-tente eacute o relacionado a dissoluccedilatildeo de matrimocircnios e uniotildees estaacuteveis e ainda concluiu-se que quase a totalidade das mediaccedilotildees resultaram em acordos satisfatoacuterios e que os usuaacuterios percebem o mediador como algueacutem que iraacute auxiliar na composiccedilatildeo do acordo prestando informaccedilotildees e dizimando duacutevidas

Palavras-chave Mediaccedilatildeo Soluccedilatildeo de Conflitos Direito das Famiacutelias

249Ano IX Nordm 17 | Julho a Dezembro | 2018

RESPONSABILIDADE CIVIL DO EMPREGADOR NO ACIDENTE DE TRABALHOAcadecircmica Manoela Platen

Orientador Gilmar Cavalieri

Examinador 1 Elvis Daniel Muller

Examinador 2 Carina Milioli Correcirca

E-mail manoelaplatenyahoocombr

Resumo O presente trabalho de conclusatildeo de curso aborda o acidente do trabalho e a responsabili-dade civil do empregador Com posicionamentos distintos considerando doutrina e jurisprudecircncia para avaliar a responsabilidade civil do empregador nos casos de acidente de trabalho Observando para este estudo a aplicaccedilatildeo da responsabilidade objetiva prevista no paraacutegrafo uacutenico do artigo 927 do Coacutedigo Civil ainda a responsabilidade subjetiva prevista no artigo 7ordm inciso XXVIII da Constituiccedilatildeo da Repuacuteblica Federativa do Brasil de 1988 Atualmente com a chamada Reforma Trabalhista Lei 134672017 em relaccedilatildeo ao dano extrapatrimonial em que se discute a possibilidade da aplicaccedilatildeo quando da ocorrecircncia de um acidente no ambiente de trabalho e reparaccedilatildeo dos danos decorrentes do infortuacutenio A presente pesquisa aborda as duas teorias de responsabilidade bem como aplicaccedilatildeo no acircmbito do Direito do Trabalho

Palavras-Chave Acidente de trabalho Responsabilidade civil Risco

250 Revista Juriacutedica da Universidade do Sul de Santa Catarina

A RESCISAtildeO DO CONTRATO DE TRABALHO DO ATLETA PROFISSIONAL BRASILEIRO POR DOPING FRENTE AgraveS POLIacuteTICAS DO COacuteDIGO MUNDIAL ANTIDOPING (CMAD) DA WORLD ANTIDOPING AGENCY (WADA) E DAS FEDERACcedilOtildeES INTERNACIONAISAcadecircmico Mauro Henrique Vaterkemper Fernandes

Orientador Prof Leonardo Martins Fornari Esp

Examinadora Prof Carolina de Aragatildeo Santana Esp

Examinador Prof Denis de Souza Luiz Esp

E-mail mauro_wfhotmailcom

Resumo Estamos na era dos superatletas que superam os limites do proacuteprio corpo diariamente Assim para esses atletas um centeacutesimo de segundo um ponto ou um gol representa muito mais que um deta-lhe representa um possiacutevel contrato extraordinaacuterio Esse eacute um dos motivos que fazem os atletas a se submeterem a todo tipo de esforccedilo para poderem entrar e continuar nas miacutedias e assim garantir o retorno financeiro para o clube e para si mesmo Por isso qualquer substacircncia que consiga explorar o maacuteximo do atleta eacute utilizada e com isso o doping virou um fenocircmeno mundial Entretanto apesar de natildeo ser uma praacutetica nova apenas na atualidade vem recebendo maior destaque e chamando atenccedilatildeo dos mecanismos nacionais e internacionais que lutam por um esporte justo Nesse contexto foi criada em 1999 a World Anti-Doping Agency (WADA) que eacute uma organizaccedilatildeo independente criada por inicia-tiva coletiva liderada pelo Comitecirc Oliacutempico Internacional (COI) e aconteceu a Terceira Conferecircncia Internacional de Ministros e Altos Responsaacuteveis pela Educaccedilatildeo Fiacutesica e Esporte (MINEPS III) em Punta del Este Uruguai em dezembro do mesmo ano Na mesma linha no ano de 2004 o Coacutedigo Mundial Antidoping (CMAD) foi implementado por organizaccedilotildees esportivas a partir dos Jogos Oliacutempicos de Atenas padronizando as regras que governam o antidoping em todos os esportes em todos os paiacuteses Em 2005 como resposta aos apelos da comunidade internacional a United Nations Educational Scientific and Cultural Organization (UNESCO) aliou-se a esta luta adotando a Convenccedilatildeo realizada em Punta del Este e assim colaborou para assegurar a eficaacutecia do WADA Em relaccedilatildeo a metodologia trata-se de pes-quisa de natureza qualitativa realizada por meio de meacutetodo de abordagem de pensamento dedutivo O meacutetodo de procedimento eacute monograacutefico realizado por meio de teacutecnica bibliograacutefica Conclui-se que no Direito Desportivo a rescisatildeo de contrato do atleta profissional por doping eacute regida pela legislaccedilatildeo nacional e submetida agraves normas internacionais inclusive responsabilizando o staff em casos nos quais os atletas sofrem submissatildeo por parte dos que responde hierarquicamente desde que comprovado

Palavras-chave Atleta profissional Doping Rescisatildeo de contrato de trabalho

251Ano IX Nordm 17 | Julho a Dezembro | 2018

A APLICACcedilAtildeO DO INCIDENTE DE RESOLUCcedilAtildeO DE DEMANDAS REPETITIVAS NOS JUIZADOS ESPECIAIS CIacuteVEISAcadecircmico Rafael Ibraim Garcia Marques

Orientadora Carina Milioli Correcirca

Examinador 1 Elvis Daniel Muller

Examinador 2 Gilmar Cavalieri

E-mail ibraimgmgmailcom

Resumo O objetivo deste trabalho de conclusatildeo de curso eacute verificar a constitucionalidade da aplicaccedilatildeo do Incidente de Resoluccedilatildeo de Demandas Repetitivas (IRDR) no acircmbito dos juizados especiais ciacuteveis bem como identificar os problemas praacuteticos da aplicaccedilatildeo do instituto nos juizados Inicialmente seraacute feita uma contextualizaccedilatildeo dos juizados especiais passando por seu histoacuterico seus princiacutepios fundamentais e seu sistema recursal Em seguida seratildeo abordados alguns dos principais institutos estrangeiros usados para o controle de demandas coletivas como a Group Litigation Order e o Musterverfahren para em seguida expor o IRDR em si apontando suas principais caracteriacutesticas e descrevendo brevemente seu procedi-mento Na sequecircncia seratildeo demonstrados alguns dos principais problemas do novo instituto tanto os intimamente relacionados agrave constitucionalidade do instituto quanto os diretamente relacionados com a aplicaccedilatildeo dele agrave realidade dos juizados especiais concluindo por fim que embora o IRDR tenha o con-datildeo de contribuir positivamente para a resoluccedilatildeo mais eficiente das demandas de massa sua inclusatildeo no ordenamento juriacutedico brasileiro ndash e particularmente sua aplicaccedilatildeo aos juizados especiais ndash traz agrave luz uma seacuterie de questionamentos que demonstram a falta de amadurecimento quanto agrave elaboraccedilatildeo do instituto A metodologia utilizada para o desenvolvimento deste trabalho eacute a dedutiva utilizando o meacutetodo mono-graacutefico quanto ao procedimento Em relaccedilatildeo agraves teacutecnicas de pesquisa foram utilizadas as teacutecnicas biblio-graacutefica e documental com base na doutrina na legislaccedilatildeo e na jurisprudecircncia

Palavras-Chave Juizado especial Incidente de Resoluccedilatildeo de Demandas Repetitivas Demandas coletivas

252 Revista Juriacutedica da Universidade do Sul de Santa Catarina

A REGULAMENTACcedilAtildeO DO ARTIGO 68 DO ADCT COMO RECONHECIMENTO DE UM ESTADO PLURIEacuteTNICOAcadecircmica Simone Rolim de Moura

Orientador Joatildeo Batista da Silva

Examinador 1 Solange Buchele de SThiago

Examinador 2 Andreacuteia Catine Cosme

E-mail srolimdemouragmailcom

Resumo O presente trabalho de conclusatildeo de curso versa sobre o direito disposto no artigo 68 do Ato das Disposiccedilotildees Constitucionais Transitoacuterias ndash o reconhecimento dos remanescentes das comunida-des dos quilombos e o direito de propriedade agraves suas terras Para tanto busca-se discutir o procedi-mento de reconhecimento dos remanescentes das comunidades dos quilombos rurais pelo Estado em niacutevel federal refletindo sobre as implicaccedilotildees do tiacutetulo coletivo e proacute-indiviso concedido pelo Poder Puacuteblico e asseverando a Repuacuteblica Federativa do Brasil enquanto um Estado Democraacutetico de Direito plurieacutetnico No intuito de alcanccedilar esse objetivo utiliza-se como meacutetodo de abordagem o pensamen-to dedutivo e de natureza qualitativa viabilizado por meio do meacutetodo do procedimento monograacutefi-co e das teacutecnicas de pesquisa bibliograacutefica e documental ndash com base em doutrinas livros do campo da antropologia artigos cientiacuteficos jurisprudecircncias dissertaccedilotildees de mestrado teses de doutorado e nas regulamentaccedilotildees do artigo 68 do ADCT em niacutevel federal Parte-se da apresentaccedilatildeo dos conceitos histoacuterico e antropoloacutegico de quilombo a fim de discutir as regulamentaccedilotildees em niacutevel federal do direi-to fundamental contido no artigo 68 do ADCT e asseverar as implicaccedilotildees da titulaccedilatildeo das terras aos remanescentes das comunidades dos quilombos Conclui-se que o acesso agrave terra a esses remanescen-tes eacute norma que exemplifica o Brasil como Estado Democraacutetico de Direito plurieacutetnico de acordo com a Constituiccedilatildeo da Repuacuteblica Federativa do Brasil ndash requerendo titulaccedilatildeo diferenciada da hegemocircnica e construccedilatildeo de poliacuteticas puacuteblicas especiacuteficas pelo Estado com o intuito de reconhecer a diversidade cultural brasileira e o respeito a essa plurietnicidade

Palavras-Chave Quilombo Direitos Culturais Estado Democraacutetico de Direito plurieacutetnico

253Ano IX Nordm 17 | Julho a Dezembro | 2018

O CONTROLE CONCENTRADO DE CONSTITUCIONALIDADE DAS LEIS MUNICIPAIS NO ESTADO DE SANTA CATARINA (2013-2018)Acadecircmica Suele de Souza Rosa

Orientador Alexandre Botelho

Examinador Paulo Calgaro de Carvalho

Examinadora Patriacutecia de Oliveira Franccedila

E-mail suelesouzarosagmailcom

Resumo A presente pesquisa tem como objetivo descrever o procedimento relativo ao controle con-centrado de constitucionalidade das leis municipais no acircmbito do Tribunal de Justiccedila de Santa Catarina e classificar as leis municipais arguidas inconstitucionais na corte catarinense de acordo com o seu con-teuacutedo no periacuteodo de 2013 a 2018 Para tanto a pesquisa utiliza dos meacutetodos de procedimentos mono-graacutefico e estatiacutestico uma vez que se pretende verificar qualitativamente as espeacutecies de leis municipais constitucionalmente contestadas no Estado de Santa Catarina Para chegar agrave resposta do questiona-mento primeiramente eacute apresentada a teoria acerca do controle de constitucionalidade e suas parti-cularidades objetivando verificar o procedimento do controle de constitucionalidade das leis munici-pais Por fim iraacute classificar e identificar as espeacutecies de leis municipais contestadas no Estado de Santa Catarina quanto ao seu conteuacutedo no periacuteodo de 2013 a 2018 A conclusatildeo alcanccedilada com a presente pesquisa revela uma preocupante ausecircncia de conhecimento juriacutedico por parte dos legisladores muni-cipais diante do elevado nuacutemero de accedilotildees que foram julgadas inconstitucionais pelo Tribunal de Justiccedila de Santa Catarina

Palavras-chave Controle concentrado de constitucionalidade Accedilatildeo direta de inconstitucionalidade Leis municipais

DIRETRIZES PARA AUTORES

257Ano IX Nordm 17 | Julho a Dezembro | 2018

Diretrizes para AutoresA Comissatildeo Editorial da Unisul de Fato e de Direito revista juriacutedica da Universidade do Sul de Santa Catarina define as seguintes normas editoriais para submissatildeo de artigos

a) Seratildeo aceitos manuscritos tatildeo somente de profissionais da aacuterea do Direito e das Relaccedilotildees Internacionais sendo indispensaacutevel a inclusatildeo do link do curriculum lattes

b) Seratildeo aceitos textos nas liacutenguas portuguesa inglesa francesa espanhola e italiana

c) Os artigos deveratildeo ser apresentados de acordo com as orientaccedilotildees descritas na NBR 6022 da ABNT2003 Disponiacuteveis tambeacutem no documento Trabalhos Acadecircmicos da Unisul seccedilatildeo 34

MACHADO Christiane et al Trabalhos Acadecircmicos na Unisul apresentaccedilatildeo graacutefica Disponiacutevel em lthttpaplicacoesunisulbrpergamumpdftau_2012pdfgt Acesso em 27 set 2012

d) Os textos deveratildeo ser submetidos na plataforma SEER

e) Os textos deveratildeo apresentados na seguinte forma

raquo espacejamento entrelinhas 15 fonte tipo Arial 12 com margens laterais de 25cm e com no maacuteximo 20 laudas e nos formatos doc ou rtf (desde que natildeo ultrapasse os 2MB)

raquo ordem dos elementos que compotildeem o artigo Tiacutetulo Resumo Palavras-chaves (estes trecircs toacutepicos em portuguecircs e em segundo idioma a escolher- inglecircs espa-nhol francecircs italiano) Introduccedilatildeo Material e meacutetodos Resultados e discus-satildeo Conclusotildees Referecircncias

raquo Eventuais agradecimentos devem aparecer apoacutes as referecircncias

raquo O tiacutetulo de cada seccedilatildeo deve estar escrito em letras maiuacutesculas e destacado em negrito

f) A identificaccedilatildeo de autoria do trabalho deveraacute ser removida do arquivo e da opccedilatildeo Propriedades no Word garantindo desta forma o criteacuterio de sigilo da revista caso submetido para avaliaccedilatildeo por pares (ex artigos) conforme instruccedilotildees disponiacuteveis em Assegurando a Avaliaccedilatildeo Cega por Pares

g) O tiacutetulo do artigo deveraacute ser claro e conciso devendo facilitar pronta identificaccedilatildeo do que o trabalho encerra de original ou fundamental escrito em letras maiuacutesculas

h) O autor deveraacute informar ao Comitecirc Editorial se o trabalho foi apresentado em algum evento ou publicado em outro meio ou em fase de anaacutelise por outros perioacutedicos no es-paccedilo destinado a ldquoComentaacuterio ao Editorrdquo no momento da submissatildeo na plataforma SEER

i) O resumo deveraacute constar com ateacute 250 palavras em seguida separadas por trecircs espaccedilos abaixo deveratildeo ser colocadas as palavras-chaves

j) As citaccedilotildees no texto bem como a lista de referecircncias deveratildeo obedecer as NBR 10520 e NBR 6023 respectivamente ou as orientaccedilotildees da publicaccedilatildeo da UnisulMACHADO Christiane et al Trabalhos Acadecircmicos na Unisul apresentaccedilatildeo graacutefica Disponiacutevel em lthttpaplicacoesunisulbrpergamumpdftau_2012pdfgt Acesso em 27 set 2012

k) As ilustraccedilotildees tabelas foacutermulas e graacuteficos deveratildeo vir na sequecircncia mais adequada ao entendimento do texto com seus respectivos tiacutetulos ou legendas As figuras deveratildeo ter o tamanho igual ao que se deseja na publicaccedilatildeo final Letras e nuacutemeros deveratildeo ser perfeitamente legiacuteveis e as fotografias deveratildeo ser em preto e branco niacutetidas e bem contrastadas No texto TABELA e FIGURA (em maiuacutesculas) e na citaccedilatildeoTabela Figura (primeira letra maiuacutescula)

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Universidade do Sul de Santa Catarina

Revista Juriacutedica da Universidade do Sul de Santa Catarina

l) A aceitaccedilatildeo dos trabalhos dependeraacute de anaacutelise do Conselho Editorial

m) Satildeo de exclusiva responsabilidade dos autores as opiniotildees e conceitos emitidos nos traba-lhos A Revista entretanto reserva-se o direito de adaptar os originais ao estilo adotado

n) Todos os endereccedilos de paacuteginas na Internet (URLs) incluiacutedas no texto (Ex httpwwwunisulbr) deveratildeo estar ativos e prontos para clicar

Declaraccedilatildeo de Direito AutoralAo encaminhar os originais o(s) autor(es) cede(m) os direitos de publicaccedilatildeo para a Revista versatildeo impressa eou eletrocircnica

Poliacutetica de PrivacidadeOs nomes e endereccedilos informados nesta revista seratildeo usados exclusivamente para os serviccedilos presta-dos por esta publicaccedilatildeo natildeo sendo disponibilizados para outras finalidades ou para terceiros

Condiccedilotildees para submissatildeoComo parte do processo de submissatildeo os autores satildeo obrigados a verificar a conformidade da submis-satildeo em relaccedilatildeo a todos os itens listados a seguir As submissotildees que natildeo estiverem de acordo com as normas seratildeo devolvidas aos autores

1) A contribuiccedilatildeo eacute original e ineacutedita e natildeo estaacute sendo avaliada para publicaccedilatildeo por outra revista caso contraacuterio deve-se justificar em ldquoComentaacuterios ao Editorrdquo

2) O espacejamento entrelinhas 15 fonte tipo Arial 12 com margens laterais de 25cm e com no maacuteximo 20 laudas e nos formatos doc ou rtf (desde que natildeo ultrapasse os 2MB)

3) URLs para as referecircncias foram informadas quando necessaacuterio

4) O texto segue os padrotildees de estilo e requisitos bibliograacuteficos descritos em Diretrizes para Autores na seccedilatildeo Sobre a Revista

5) A identificaccedilatildeo de autoria do trabalho foi removida do arquivo e da opccedilatildeo Propriedades no Word garantindo desta forma o criteacuterio de sigilo da revista caso submetido para avaliaccedilatildeo por pares (ex artigos) conforme instruccedilotildees disponiacuteveis em Assegurando a Avaliaccedilatildeo Cega por Pares

Poliacutetica de PrivacidadeOs nomes e endereccedilos informados nesta revista seratildeo usados exclusivamente para os serviccedilos presta-dos por esta publicaccedilatildeo natildeo sendo disponibilizados para outras finalidades ou a terceiros

Endereccedilo defatodedireitounisulbr

NESTE NUacuteMERO

Direitos Humanos de fato e de direito uma jornada de 70 anosA violecircncia de gecircnero constitui uma forma de violaccedilatildeo dos direitos humanosAlice Bianchini

As trecircs vertentes do sistema penitenciaacuterio uma anaacutelise criminoloacutegica social e carceraacuteriaAndreacuteia Catine Cosme Karem Raimondi Martins

A defesa dos Direitos Humanos atraveacutes do ativismo judicial transnacional accedilotildees engajadas e participativasDaniela Daniela Mesquita Leutchuk de Cademartori Marlise da Rosa Luz

A realidade do sistema socioeducativo e a reduccedilatildeo da maioridade penal sob a oacutetica dos direitos fundamentaisJonathan Cardoso Reacutegis

La fragilidad de los derechosJoseacute Calvo Gonzaacutelez

Da transversatildeo poliacutetica do juriacutedico ao flagelo do estado democraacutetico de direito a incontinente deseficacizaccedilatildeo dos valores constitucionais no apogeu dos 70 anos da declaraccedilatildeo universal dos direitos humanosJoseacute Eduardo de Miranda Andreacutea Correcirca Lima

A doaccedilatildeo de oacutergatildeos depois do Decreto nordm 91752017Juacutelio Moraes Oliveira

Direitos Humanos e fundamentais na fronteira entre direito e economia a eficiecircncia das poliacuteticas puacuteblicas de sauacutede no BrasilMarco Aureacutelio Souza da Silva

Dia do Orgulho LGBTI dia de festa e de lutaMaria Berenice Dias

Condenaccedilotildees na Corte Interamericana de Direitos Humanos da OEA uma fotografia da violaccedilatildeo dos direitos humanos na ameacuterica latinaMilene Pacheco Kindermann

Direitos Humanos no imaginaacuterio artiacutestico de Clarice Lispector o paacutessaro da liberdadeMiacuteriam Coutinho de Faria Alves

Projeto de Lei nordm 37342012 e Suacutemula 605 do STJ o direito da crianccedila e do adolescente esquecidoPatriacutecia Rodrigues de Menezes Castagna

As facetas do neoliberalismo e suas consequecircncias na socioeducaccedilatildeo de adolescentes em conflito com a lei no sudeste brasileiroTatiana Emmerich

Direito de sustentabilidade juriacutedica e sistecircmica Reputaccedilatildeo digital no facebook sustentabilidade empresarial e o consumidorAdriano Augusto Fidalgo

O papel do advogado na negociaccedilatildeo na sociedade contemporacircneaBiela Jr Glaucia Guisso Fernandes

Como acercar el proceso contencioso administrativo laboral a los fundamentos de la nueva Ley Procesal del TrabajoOmar Toledo Toribio

Os problemas bioeacuteticos em os vingadores reflexotildees sobre o poacutes-humanismo e a eacutetica do futuroPedro Ernesto Neubarth Jung

  • Editorial
  • DE FATO
  • Caed-jus Revista De Fato e De Direito empresta nome agrave sala do Congresso Juriacutedico CAED-Jus
  • No Portal da Unisul
  • Conselheiros em destaque
  • DE DIREITO
  • A VIOLEcircNCIA DE GEcircNERO CONSTITUI UMA FORMA DE VIOLACcedilAtildeO DOS DIREITOS HUMANOS
    • Alice Bianchini
      • AS TREcircS VERTENTES DO SISTEMA PENITENCIAacuteIO UMA ANAacuteLISE CRIMINOLOacuteGICA SOCIAL E CARCERAacuteRIA
        • Andreacuteia Catine Cosme
        • Karem Raimondi Martins
          • A DEFESA DOS DIREITOS HUMANOS ATRAVEacuteS DO ATIVISMO JUDICIAL TRANSNACIONAL ACcedilOtildeES ENGAJADAS E PARTICIPATIVAS
            • Daniela Mesquita Leutchuk de Cademartori
            • Marlise da Rosa Luz
              • A REALIDADE DO SISTEMA SOCIOEDUCATIVO E A REDUCcedilAtildeO DA MAIORIDADE PENAL SOB A OacuteTICA DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS
                • Jonathan Cardoso Reacutegis
                  • LA FRAGILIDAD DE LOS DERECHOS
                    • Joseacute Calvo Gonzaacutelez
                      • DA TRANSVERSAtildeO POLIacuteTICA DO JURIacuteDICO AO FLAGELO DO ESTADO DEMOCRAacuteTICO DE DIREITO A INCONTINENTE DESEFICACIZACcedilAtildeO DOS VALORES CONSTITUCIONAIS NO APOGEU DOS 70 ANOS DA DECLARACcedilAtildeO UNIVERSAL DOS DIREITOS HUMANOS
                        • Joseacute Eduardo de Miranda
                        • Andreacutea Correcirca Lima
                          • A DOACcedilAtildeO DE OacuteRGAtildeOS DEPOIS DO DECRETO Nordm 91752017
                            • Juacutelio Moraes Oliveira
                              • DIREITOS HUMANOS E FUNDAMENTAIS NA FRONTEIRA ENTRE DIREITO E ECONOMIA A EFICIEcircNCIA DAS POLIacuteTICAS PUacuteBLICAS DE SAUacuteDE NO BRASIL
                                • Marco Aureacutelio Souza da Silva
                                • Maria Berenice Dias
                                  • CONDENACcedilOtildeES NA CORTE INTERAMERICANA DE DIREITOS HUMANOS DA OEA UMA FOTOGRAFIA DA VIOLACcedilAtildeO DOS DIREITOS HUMANOS NA AMEacuteRICA LATINA
                                    • Milene Pacheco Kindermann
                                      • DIREITOS HUMANOS NO IMAGINAacuteRIO ARTIacuteSTICO DE CLARICE LISPECTOR O PAacuteSSARO DA LIBERDADE
                                        • Miacuteriam Coutinho de Faria Alves
                                          • Projeto de Lei n 37342012 e Suacutemula 605 do STJ o Direito da Crianccedila e do Adolescente esquecido
                                            • Patriacutecia Rodrigues de Menezes Castagna
                                              • AS FACETAS DO NEOLIBERALISMO E SUAS CONSEQUEcircNCIAS NA SOCIOEDUCACcedilAtildeO DE ADOLESCENTES EM CONFLITO COM A LEI NO SUDESTE BRASILEIRO
                                                • Tatiana Emmerich
                                                  • REPUTACcedilAtildeO DIGITAL NO FACEBOOK SUSTENTABILIDADE EMPRESARIAL E O CONSUMIDOR
                                                    • Adriano Augusto Fidalgo
                                                      • O PAPEL DO ADVOGADO NA NEGOCIACcedilAtildeO NA SOCIEDADE CONTEMPORAcircNEA
                                                        • Biela Jr
                                                        • Glaucia Guisso Fernandes
                                                          • COMO ACERCAR EL PROCESO CONTENCIOSO ADMINISTRATIVO LABORAL A LOS FUNDAMENTOS DE LA NUEVA LEY PROCESAL DEL TRABAJO
                                                            • Omar Toledo Toribio
                                                              • OS PROBLEMAS BIOEacuteTICOS EM OS VINGADORES REFLEXOtildeES SOBRE O POacuteS-HUMANISMO E A EacuteTICA DO FUTURO
                                                                • Pedro Ernesto Neubarth Jung
                                                                • ldquoApenas uma guerra eacute permitida agrave espeacutecie humana a guerra contra a extinccedilatildeo []rdquo
                                                                  • O que estamos pesquisando
                                                                  • Diretrizes para Autores
                                                                  • _GoBack
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Page 2: UNISUL DE FATObiblioteca do futuro, ampliando o acesso de todos com download gratuito”. O acervo é organizado pelos autores e professores da Unisul, Rosangela Tremel, Virginia Lopes

UNISULDE FATOE DE DIREITO

ANO IX | Nordm 17JULHO A DEZEMBRO | 2018

Nenhuma parte desta publicaccedilatildeo pode ser reproduzida por qualquer meio sem a preacutevia autorizaccedilatildeo desta instituiccedilatildeoCopyright copy UnisulVirtual 2018

UNIVERSIDADE DO SUL DE SANTA CATARINA

Reitor

Mauri Luiz HeerdtVice-Reitor

Lester Marcantonio CamargoProacute-Reitor de Ensino Pesquisa Poacutes-graduaccedilatildeo Extensatildeo e Inovaccedilatildeo

Heacutercules Nunes de ArauacutejoProacute-Reitor de Administraccedilatildeo e Operaccedilotildees

Heitor Wensing JuacuteniorAssessor de Marketing Comunicaccedilatildeo e Relacionamento

Fabiano CerettaDiretor do Campus Universitaacuterio de Tubaratildeo

Rafael Aacutevila FaracorDiretor do Campus Universitaacuterio da Grande Florianoacutepolis

Zacaria Alexandre NassarDiretora do Campus Universitaacuterio UnisulVirtual

Ana Paula Reusing Pacheco

Campus Universitaacuterio UnisulVirtual

Diretora

Ana Paula Reusing PachecoGerente de Administraccedilatildeo e Serviccedilos Acadecircmicos

Renato Andreacute LuzGerente de Ensino Pesquisa Poacutes-graduaccedilatildeo Extensatildeo e Inovaccedilatildeo

Moacir HeerdtGerente de Relacionamento e Mercado

Guilherme Araujo SilvaGerente da Rede de Polos

Joseacute Gabriel da Silva

UNISULDE FATOE DE DIREITO

ANO IX | Nordm 17JULHO A DEZEMBRO | 2018

Universidade do Sul de Santa CatarinaRevista Juriacutedica da Universidade do Sul de Santa Catarina

Ficha catalograacutefica elaborada pela Biblioteca Universitaacuteria da Unisul

U49

Unisul de fato e de direito revista juriacutedica da Universidade do Sul de Santa Catarina

Universidade do Sul de Santa Catarina ndash v 1 n 1 (juldez 2010) ndash Palhoccedila UnisulVir-

tual 2018

SemestralISSN 2177-5303e-ISSN 2358-601x

1 Direito I Universidade do Sul de Santa CatarinaCDD 340

Conselho Editorial

Prof Dr Adolfo Mamoru Nishiyama - UNIPProf Dr Alex Sandro Sommariva - UNISULProfa MSc Ana Maacutercia Marquez Targa - OABSPProf Dr Baltazar de Andrade Guerra-UNISULProf Dr Felipe Asensi - UERJProf Dr Gilberto Fachetti - UFESProf Dr Joseacute Calvo Gonzaacuteles - Universidade de MaacutelagaProf Dr Joseacute Eduardo de Miranda - Universidade

de DeustoProfa Dra Karla Leonora Dahse Nunes - UNISULProf MScDoutorando Leonardo Andreotti Paulo de

Oliveira - Instituto Brasileiro de Direito DesportivoProf Msc Lester Marcantonio Camargo - UNISULProf Dr Luciano Nascimento Silva - UEPBProf MSc Mauricio Daniel Moncons Zanotelli - UNISULProf Dr Miguel Gutieacuterrez Bengoechea - Universidade

de MaacutelagaProfa Dra Milene Pacheco Kindermann ndash UNISULProf Dr Omar Toledo - Universidade Nacional

Mayor de San MarcosProfa Esp Rejane Johansson - UNISULProf Dr Rennan Faria Kruger Thamay - FADISPProf Dr Sidney Eloy Dalabrida - UNISULProfa MSc Solange Buumlchele SThiago- UNISULProfa Esp Tatyane Barbosa Phillipi- UNISULProfa EspDoutoranda Virginia Lopes Rosa- UNISULProf MSc Zacaria Alexandre Nassar - UNISUL

Pareceristas Permanentes

Prof MScDoutorando Alexandre Botelho - UNISULProf Dr Bruno Stigert - Estaacutecio de Saacute Juiz de ForaProf Msc Evinis Talon -UNISCProf Dr Jonathan Regis - UNIVALIProf MSc Paulo Carvalho - UNISULProf Dr Rafael Freire Ferreira - UNIMEProfa Dra Regina Celia Pezzuto Rufino - UNIPProf Dr Rodrigo Ferreira - UEPB

Creacuteditos

Assessoria de Ensino UnisulVirtual

Lis Airecirc FogolariProjeto editorial

Frederico TrilhaDiagramaccedilatildeo

Frederico TrilhaCapa

Foto Museu do Holocausto de Berlim uma releitura abstrata

Fotoacutegrafo Tycho Brahe Fernandes (autorretrato-alheioblogspotcombr)

ISSN

2358-601X

Unisul De Fato e De DireitoRosangela Tremel MScEditor-chefe OABSC 13891 | DRTSC 919-JP

UNA- Ciecircncias Sociais Direito Negoacutecios e Serviccedilos

SumaacuterioEDITORIAL

DE FATOCAED-JUS REVISTA DE FATO E DE DIREITO EMPRESTA NOME AgraveSALA DO CONGRESSO JURIacuteDICO CAED-JUS 11

NO PORTAL DA UNISUL 12

CONSELHEIROS EM DESTAQUE 13

DE DIREITO

DIREITOS HUMANOS DE FATO E DE DIREITO UMA JORNADA DE 70 ANOS

A VIOLEcircNCIA DE GEcircNERO CONSTITUI UMA FORMA DE VIOLACcedilAtildeO DOS DIREITOS HUMANOS 17

Alice Bianchini

AS TREcircS VERTENTES DO SISTEMA PENITENCIAacuteIO UMA ANAacuteLISE CRIMINOLOacuteGICA SOCIAL E CARCERAacuteRIA 31

Andreacuteia Catine CosmeKarem Raimondi Martins

A DEFESA DOS DIREITOS HUMANOS ATRAVEacuteS DO ATIVISMO JUDICIAL TRANSNACIONAL ACcedilOtildeES ENGAJADAS E PARTICIPATIVAS 45

Daniela Mesquita Leutchuk de CademartoriMarlise da Rosa Luz

A REALIDADE DO SISTEMA SOCIOEDUCATIVO E A REDUCcedilAtildeO DA MAIORIDADE PENAL SOB A OacuteTICA DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS 57

Jonathan Cardoso Reacutegis

LA FRAGILIDAD DE LOS DERECHOS 73Joseacute Calvo Gonzaacutelez

DA TRANSVERSAtildeO POLIacuteTICA DO JURIacuteDICO AO FLAGELO DO ESTADO DEMOCRAacuteTICO DE DIREITO A INCONTINENTE DESEFICACIZACcedilAtildeO DOS VALORES CONSTITUCIONAIS NO APOGEU DOS 70 ANOS DA DECLARACcedilAtildeO UNIVERSAL DOS DIREITOS HUMANOS 85

Joseacute Eduardo de MirandaAndreacutea Correcirca Lima

A DOACcedilAtildeO DE OacuteRGAtildeOS DEPOIS DO DECRETO Nordm 91752017 99Juacutelio Moraes Oliveira

DIREITOS HUMANOS E FUNDAMENTAIS NA FRONTEIRA ENTRE DIREITO E ECONOMIA A EFICIEcircNCIA DAS POLIacuteTICAS PUacuteBLICAS DE SAUacuteDE NO BRASIL 107

Marco Aureacutelio Souza da SilvaMaria Berenice Dias

CONDENACcedilOtildeES NA CORTE INTERAMERICANA DE DIREITOS HUMANOS DA OEA UMA FOTOGRAFIA DA VIOLACcedilAtildeO DOS DIREITOS HUMANOS NA AMEacuteRICA LATINA 131

Milene Pacheco Kindermann

DIREITOS HUMANOS NO IMAGINAacuteRIO ARTIacuteSTICO DE CLARICE LISPECTOR O PAacuteSSARO DA LIBERDADE 141

Miacuteriam Coutinho de Faria Alves

PROJETO DE LEI N 37342012 E SUacuteMULA 605 DO STJ O DIREITO DA CRIANCcedilA E DO ADOLESCENTE ESQUECIDO 151

Patriacutecia Rodrigues de Menezes Castagna

AS FACETAS DO NEOLIBERALISMO E SUAS CONSEQUEcircNCIAS NA SOCIOEDUCACcedilAtildeO DE ADOLESCENTES EM CONFLITO COM A LEI NO SUDESTE BRASILEIRO 159

Tatiana Emmerich

6 Revista Juriacutedica da Universidade do Sul de Santa Catarina

DIREITO DE SUSTENTABILIDADE JURIacuteDICA E SISTEcircMICA

REPUTACcedilAtildeO DIGITAL NO FACEBOOK SUSTENTABILIDADE EMPRESARIAL E O CONSUMIDOR 171

Adriano Augusto Fidalgo

O PAPEL DO ADVOGADO NA NEGOCIACcedilAtildeO NA SOCIEDADE CONTEMPORAcircNEA 183Biela JrGlaucia Guisso Fernandes

COMO ACERCAR EL PROCESO CONTENCIOSO ADMINISTRATIVO LABORAL A LOS FUNDAMENTOS DE LA NUEVA LEY PROCESAL DEL TRABAJO 193

Omar Toledo Toribio

OS PROBLEMAS BIOEacuteTICOS EM OS VINGADORES REFLEXOtildeES SOBRE O POacuteS-HUMANISMO E A EacuteTICA DO FUTURO 219

Pedro Ernesto Neubarth JungldquoApenas uma guerra eacute permitida agrave espeacutecie humana a guerra contra a extinccedilatildeo [ ]rdquo

O QUE ESTAMOS PESQUISANDO

DIRETRIZES PARA AUTORES

7Ano IX Nordm 17 | Julho a Dezembro | 2018

EditorialEsta eacute uma ediccedilatildeo especial e isto jaacute pode ser percebido desde a capa pela primeira vez usamos a geome-tria para ilustrar nossa Revista

A fotografia assinada por Tycho Brahe Fernandes eacute uma leitura muito particular de sua ida ao Museu do Holocausto em Berlim quando ele fez uma foto abstrata tirou o foco deixou fortes os contrastes desafiando o leitor a descobrir do que se trata As nuances da cor branca que chegam ao amarela-do total e dos tons de preto que se desfazem em um quase grafite indicam a e gradaccedilatildeo dos absur-

dos cometidos na segunda guerra O objetivo eacute nos fazer a todos pensar em situaccedilotildees que se materializam em matizes sutis Esta eacute a moldura figurativa da ediccedilatildeo De Fato e De Direito alusiva aos 70 anos da Declaraccedilatildeo Universal dos Direitos Humanos (DUDH - 10 de dezembro de 1948) sem deixar de reveren-ciar a Declaraccedilatildeo Americana dos Direitos e Deveres do Homem de 2 de maio de 1948 que precedeu a DUDH em sete meses Ambas fazem a diferenccedila nos cenaacuterios pelos quais todos noacutes hoje gravitamos

Satildeo as nuances as sutilezas na percepccedilatildeo destes institutos que se entrelaccedilam em prol da humanidade pelas quais permeiam autores da maior grandeza

referecircncias em suas aacutereas de estudos professores doutores e pesquisadores que aplicam e sociali-zam o saber para aprimorar o mundo em que vivemos Generosos todos os nomes que compotildeem esta ediccedilatildeo compareceram ao chamado e deixam registradas nestas paacuteginas suas impressotildees sobre o que muitas vezes resumimos na pergunta Que mundo eacute este

Haacute temas uacutenicos diferentes abordagens impressotildees as mais diversas e o leitor poderaacute pensar a ques-tatildeo dos direitos humanos a partir de francas provocaccedilotildees construindo solidamente sua posiccedilatildeo sua verdade garimpando fatos crenccedilas e valores ao longo de nossas paacuteginas

Se esta Seccedilatildeo traz uma sucessatildeo de grandes nomes a sustentabilidade juriacutedica e sistecircmica baluarte de nosso perioacutedico natildeo deixa de estar magistralmente representada e marca nossa essecircncia com galhar-dia proacutepria daqueles que respiram juridicidade

Haacute assunto para todos os puacuteblicos de todas as correntes Desejamos a todos uma profiacutecua leitura

Rosangela TremelEditor- chefe

DE FATO

11Ano IX Nordm 17 | Julho a Dezembro | 2018

Caed-jus Revista De Fato e De Direito empresta nome agrave sala do Congresso Juriacutedico CAED-Jus

A Revista Juriacutedica Unisul De Fato e De Direito foi homenageada pela equipe do CAED-Jus (Congresso de Altos Estudos em Direito) maior momento juriacutedico online da Ameacuterica Latina e crescendo mundo afora denominando uma das salas virtuais no periacuteodo de 20 a 22 de junho

Parceiros de longa data a Revista e o CAED-Jus tecircm histoacuteria para contar juntos Alguns autores de destaque em nosso perioacutedico nos conheceram atraveacutes deste evento sem fronteiras submeteram seus artigos e publicaram conosco

Liderado pelo nosso Conselheiro Editorial Felipe Asensi o CAED-Jus eacute data que se impotildee no calendaacute-rio juriacutedico nacional

De fato e de direito a Revista da Unisul agradece a homenagem e reafirma seu propoacutesito de seguir par-ceira nesta trajetoacuteria de sucesso

12 Revista Juriacutedica da Universidade do Sul de Santa Catarina

No Portal da Unisul

Coletacircnea de Revista Juriacutedica estaacute disponiacutevel para download gratuito em plataforma digital12 de julho de 2018

A coletacircnea da Revista Juriacutedica da Unisul Doze Liccedilotildees De Fato e De Direito estaacute disponiacutevel para consulta e download gratuito no cataacutelogo de obras da Editora da Universidade Estadual da Paraiacuteba (Eduepb) em parceria com a Unisul

Desde o ano passado 2017 a Revista Juriacutedica da Unisul integra o acervo da plataforma Scielo conheci-da mundialmente e que jaacute soma mais de trecircs milhotildees de acessos ao mecircs sob selo editorial que hospeda alguns vencedores do disputado Precircmio Jaboti

Revista Juriacutedica Doze Liccedilotildees De Fato e De Direito

A coletacircnea Doze Liccedilotildees De Fato e De Direito compartilha diferentes assuntos desde anaacutelise literaacuteria da obra de Jorge Amado agrave sauacutede mental monitoramento eletrocircnico de presos e questotildees ambientais

Com a repercussatildeo do projeto inovador o professor Zacaria Alexandre Nassar diretor do Campus da Grande Florianoacutepolis destaca a atenccedilatildeo que a Unisul dispensa agraves inovaccedilotildees tecnoloacutegicas e agrave reconhe-cida qualidade de seu curso de Direito ldquoA Unisul em parceria de sucesso com a Editora da Universidade Estadual da Paraiacuteba inovou na disseminaccedilatildeo do conhecimento na aacuterea juriacutedica e ganhou espaccedilo na biblioteca do futuro ampliando o acesso de todos com download gratuitordquo

O acervo eacute organizado pelos autores e professores da Unisul Rosangela Tremel Virginia Lopes Rosa e Zacaria Alexandre Nassar para integrar o cataacutelogo lanccedilado em 2017 que marcou o encerramento do semestre 20181 e segue para contiacutenua produccedilatildeo da Euepb ao lado de grandes nomes explica a profes-sora Virginia Ros coordenadora do curso de Direito da Unidade Pedra Branca ldquoParceria das mais exito-sas que uniu indelevelmente duas regiotildees do Brasil continental ampliou exponencialmente o objetivo da Revista desde que era mero projeto e referendou o fato de que oferecemos acesso crescente de arti-gos de qualidade para alunos que buscam novos olhares sobre o multifacetado estudo do direitordquo

A capa traz paisagem tiacutepica accediloriana clicada por Tycho Brahe Fernandes marca registrada da Revista cujo conteuacutedo reuacutene autores de Santa Catarina Rio Grande do Sul Paranaacute e Satildeo Paulo ldquoDentre eles haacute professores doutores de expressatildeo internacional egressos da Unisul que se destacam no mercado de trabalho professores por vocaccedilatildeo e dedicaccedilatildeordquo assinala a editora-chefe da Revistardquo Rosangela Tremel

Jaacute o editor da Eduepb professor Luciano Nascimento conta que o cataacutelogo permite ao leitor acessar diversos tiacutetulos ldquoEacute importante divulgar o acervo on line como um todo a cada semestre cumprindo a funccedilatildeo social de disseminar o saber a um clique de distacircnciardquo

13Ano IX Nordm 17 | Julho a Dezembro | 2018

Conselheiros em destaque

Brasil e Espanha na Itaacutelia

Dois dos Conselheiros Editoriais de nossa Revista se encontraram em congresso na Itaacutelia no mecircs de fevereiro Luciano Nascimento (UEPB- Paraiacuteba) e Joseacute Calvo (Universidade de Maacutelaga- Espanha) estiveram juntos no Convegno Internazionale - Ecologia del Non- Sapere - del Centro

di Studi Sul Rischio dellrsquoUniversita del Salento fundado por Niklas Luhmann e Raffaele De Giorgi Na confraternizaccedilatildeo destes nobres professores registrada em fotos e notas nossa Revista De Fato e De Direito foi mencionada

Atitude para ganhar altitude

Joseacute Eduardo de Miranda nosso Conselheiro Editorial eacute PhD em Direito Professor universitaacute-rio jurista e escritor eacute membro do Grupo Internacional de Pesquisa International Association of Cooperative Law (AIDC)Universidade de DeustoEspanha da Caacutetedra UNESCO de Formaccedilatildeo

de Recursos Humanos para Ameacuterica Latinada Universidade de DeustoEspanha da Caacutetedra Euroamericana de Proteccioacuten Juriacutedica de Los Derechos de Los Consumidores da Universidade de CantaacutebriaEspanha do Instituto de Estudos Cooperativos da Universidade de DeustoEspanha

Recebeu o precircmio de melhor trabalho de pesquisa conferido pela AIDC Universidade de DeustoEspanha e o precircmio Ortazadar de Literatura concedido pelo Diaacuterio Deia na Espanha

O autor que considera parte de seu desiacutegnio colaborar com alunos e profissionais para que suas esco-lhas sejam sinocircnimo de sucesso apoacutes publicar ldquoMal dita facultocirc dentro e agorardquo rapidamente esgo-tadoem julho lanccedilou SUSTENTABILIDADE EMOCIONAL ATITUDE PARA GANHAR ALTITUDE Ele define este trabalho como aquele ldquo momento intimista para falar de inteligecircncia emoccedilotildees e felicidaderdquo Vale para todos os que buscam aprimoramento constante no cenaacuterio mundial em franca ebuliccedilatildeo Sob o selo Multifoco a obra eacute assim apresentada

ldquoExiste uma foacutermula para a felicidade Por que algumas pessoas inteligentes natildeo conseguem alcanccedilar o sucesso As emoccedilotildees individuais afetam a produtividade de um grupo Diante das exigecircncias de um mun-do em constante transformaccedilatildeo a inteligecircncia cognitiva deixa de ser a principal responsaacutevel pelo triunfo pessoal O equiliacutebrio das emoccedilotildees e a cooperaccedilatildeo emocional ganham protagonismo na busca pelo sucesso Nesse sentido Joseacute Eduardo de Miranda aborda em SUSTENTABILIDADE EMOCIONAL o redimen-sionamento das emoccedilotildees individuais exaltando as atitudes necessaacuterias agrave realizaccedilatildeo plena de cada um seja no universo pessoal ou corporativordquo

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Universidade do Sul de Santa Catarina

Revista Juriacutedica da Universidade do Sul de Santa Catarina

La destreza de Judith uma sensiacutevel reconstruccedilatildeo cultural do Direito pelas matildeos de uma mulher

Joseacute Calvo Gonzaacutelez (Sevilla Espantildea 1956) Conselheiro de nossa revista e Dr em Direito pela Universidade de Maacutelaga (Espantildea) Doutor Honoris Causa pela Universidade Ricardo Palma (Lima Peru) eacute professor de Filosofia do Direito na Universidade de Maacutelaga Cultiva como linhas prioritaacute-

rias de investigaccedilatildeo ldquoTeoria Narrativista do Direitordquo ldquoDireito e Literaturardquo e ldquoCultura Visual do Direitordquo Entre seus trabalhos mais recentes estatildeo El escudo de Perseo La cultura literaria del Derecho (Edit Comares Granada 2012) Direito curvo (Porto Alegre 2013) Marginalias juriacutedicas en el Smithfield Decretals Valencia 2015) o Justicia constitucional y Literatura (Lima 2016) bem como a coordena-ccedilatildeo e ediccedilatildeo de Derecho y Literatura hispaacutenica (Pisa-Roma 2014) De la Ley iquesto seraacute ficcioacuten (Madrid 2016) y Borges en el espejo de los juristas Derecho y literatura borgeana Cizur Menor Navarra 2016) brinda a todos noacutes seus leitores contumazes com novo livro La destreza de Judith

As breves palavras do autor sobre a obra nos deixam ainda mais ansiosos para lecirc-la na integralidade

ldquoDiriacutea que los estudios de Cultura literaria del Derecho aquiacute reunidos bajo tiacutetulo de La destreza de Judith se calzan de las sandalias que deslumbraron los ojos de Holofernes y aunque la figura y detalle de realce luminoso no haya sido revelado por la imaginacioacuten de los artistas la idea de aquellas modes-tas pero seductoras sandalias me parece que suscita una metaacutefora valedera para los juristas pues de su asombroso imperio tambieacuten deberiacutea cubrirse la guiacutea de los pasos de un jurista que no descamine el sen-dero que conduce al Triunfo del Derecho Y en ese sentido creo que la Literatura es la mejor maacutequina para guarnecer esas sandalias Un jurista ademaacutes tampoco habriacutea de perder de vista la hermosura del rostro de Judith que siacute han plasmado muy diversos pintores He elegido conscientemente la virtuosa representacioacuten que de eacutel nos ofrece Caravaggio Alliacute su belleza pienso no estaacute en la representacioacuten de los rasgos de un semblante juvenil ndashera Judith casi una adolescente todaviacutea en verdad preciosandash sino maacutes bien en la mueca no insensible de su gesto Asiacute el rostro figurado es hermoso no por servir de semblante a la gesta sino por el gesto con que la encara Ese gesto es la semblanza de su destre-za La Cultura literaria del Derecho como sucediera con Judith se instala en una zona de inconfort Por su vocacioacuten criacutetica planta cara a la domesticacioacuten hermeneacuteutica del jurista La Cultura literaria del Derecho acomete el desafiacuteo de descorrer el velo de la situacioacuten dogmaacutetica como Judith irrumpiendo en la tienda de Holofernes para cambiar la situacioacuten de los sentenciados a la verguumlenza y al despotis-mo En consecuencia asume miradas incoacutemodas miradas a la parte maldita del Derecho a su raigam-bre (ideo)loacutegica a la violencia de su funcioacuten represiva a la esteacutetica perversa de su arte cuando escinde desorden e injusticia a su contraccioacuten del otro a sus esclarecidas metaacuteforas sobre el honor a su prejui-ciosa representacioacuten de la cohesioacuten social hellip incluso a la gratificacioacuten simboacutelica de su superioridad civi-lizatoria La Cultura literaria del Derecho mira en esa parte maldita y la mueca no insensible al observar el monstruo que el Derecho tambieacuten lleva dentro es el gesto virtuoso ndashdiestrondash que salva y reconcilia ante dilemas de lealtad entre el Alma y la Ley La Cultura literaria del Derecho revela y adiestra acerca de esos arduos dilemas electivos y sus paradojas

Este libro pues elogia la destreza de Judith y en su celebracioacuten la imita en mira a una reconstruccioacuten cultural sensible del Derecho ldquopor mano de mujerrdquo por mano de la Literaturardquo

DE DIREITO

DIREITOS HUMANOSDE FATO E DE DIREITO UMA JORNADA DE 70 ANOS

17Ano IX Nordm 17 | Julho a Dezembro | 2018

A VIOLEcircNCIA DE GEcircNERO CONSTITUI UMA FORMA DE VIOLACcedilAtildeO DOS DIREITOS HUMANOS

LA VIOLENCIA DE GEacuteNERO CONSTITUYE UNA FORMA DE VIOLACIOacuteN DE LOS DERECHOS HUMANOSAlice Bianchini1

Resumo Com a entrada em vigor da Lei Maria da Penha logo surgiram questionamentos acerca da interpretaccedilatildeo a ser dada ao art 6ordm o qual prevecirc que ldquoA violecircncia domeacutestica e familiar contra a mulher constitui uma das formas de violaccedilatildeo dos direitos humanosrdquo A principal insurgecircncia com o conteuacutedo do artigo antes transcrito foi elaborada por meio dos seguintes questionamentos a violecircncia contra os homens natildeo seria tambeacutem uma forma de violaccedilatildeo de direitos humanos Por qual motivo natildeo englobar todas as categorias sexuais A busca a tais respostas eacute o tema do presente artigo

Palavras-Chave Violecircncia contra a mulher Direitos Humanos Gecircnero Lei Maria da Penha

Resumen Con la entrada en vigor de la Ley Maria da Penha pronto surgieron cuestionamientos acerca de la interpretacioacuten a ser dada al art 6ordm ldquoLa violencia domeacutestica y familiar contra la mujer constituye una de las for-mas de violacioacuten de los derechos humanosrdquo La principal insurgencia con el contenido del artiacuteculo antes trans-crito fue elaborada por medio de los siguientes cuestionamientos la violencia contra los hombres no iquestseriacutea tambieacuten una forma de violacioacuten de derechos humanos iquestPor queacute no englobar todas las categoriacuteas sexuales La buacutesqueda de tales respuestas es el tema del presente artiacuteculo

Palabras Clave Violencia contra la mujer Derechos humanos Geacutenero Ley Maria da Penha

1 INTRODUCcedilAtildeO

Com a entrada em vigor da Lei Maria da Penha logo surgiram questionamentos acerca da interpretaccedilatildeo a ser dada ao art 6ordm o qual prevecirc que ldquoA violecircncia domeacutestica e familiar contra a mulher constitui uma das formas de violaccedilatildeo dos direitos humanosrdquo

A principal insurgecircncia com o conteuacutedo do artigo antes transcrito foi elaborada por meio dos seguintes questionamentos a violecircncia contra os homens natildeo seria tambeacutem uma forma de violaccedilatildeo de direitos humanos Por qual motivo natildeo englobar todas as categorias sexuais A busca a tais respostas eacute o tema do presente artigo

1 Doutora em Direito penal pela PUCSP mestre em Direito pela UFSC especialista em Teoria e Anaacutelise Econocircmica pela Universidade

do Sul de Santa Catarina Unisul-SC e em Direito Penal Econocircmico Europeu pela Universidade de CoimbraIBCCrim Foi professora

do Departamento de Direito Penal da USP e do Curso de Mestrado em Direito da Uniban-SP Leciona em diversos cursos de

especializaccedilatildeo Integrante da Comissatildeo Nacional da Mulher Advogada - OAB Federal Autora de vaacuterios livros e de artigos publicados em

perioacutedicos nacionais e estrangeiros dentre eles Lei Maria da Penha 4 ed Satildeo Paulo Saraiva 2018 Autora do Curso Virtual Estude Lei

Maria da Penha mais de 100 questotildees criminais controvertidas (estudeleimariadapenhacombr)

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Universidade do Sul de Santa Catarina

Revista Juriacutedica da Universidade do Sul de Santa Catarina

2 A VIOLEcircNCIA DE GEcircNERO E OS DIREITOS HUMANOS

Se considerarmos que todo tipo de violecircncia fere os direitos humanos natildeo haveria porque inserir na Lei Maria da Penha o disposto em seu art 6ordm antes transcrito No entanto o que motivou sua inclusatildeo no texto da Lei foi o propoacutesito afirmar a importacircncia na luta pelo fim desse tipo de violecircncia Essa lei natildeo eacute somente da mulher que foi viacutetima de qualquer tipo de violecircncia mas da famiacutelia do Estado e da socieda-de que devem buscar a igualdade entre as pessoas e a dignidade de todos2

Foi na Conferecircncia das Naccedilotildees Unidas sobre Direitos Humanos ocorrida em Viena 1993 que pela pri-meira vez utilizou-se a expressatildeo ldquoos direitos das mulheres satildeo direitos humanosrdquo Pouco tempo depois a Convenccedilatildeo Interamericana para Prevenir Punir e Erradicar a Violecircncia contra a Mulher ndash Convenccedilatildeo Beleacutem do Paraacute tratou a violecircncia contra a mulher da mesma forma Dentre os muitos avanccedilos represen-tados pela Lei Maria da Penha talvez o mais significativo seja o estabelecimento definitivo da discrimi-naccedilatildeo e violecircncia de gecircnero como forma de insulto aos direitos humanos

Ao longo dos seacuteculos ao menos no Ocidente o condicionamento do corpo bioloacutegico a um modelo de comportamento produziu uma seacuterie de estereoacutetipos levando a crenccedilas culturais de que pessoas per-tencentes a cada um dos sexos deveriam ocupar lugares sociais preacute-determinados aos homens o espa-ccedilo puacuteblico agrave mulher o espaccedilo domeacutestico Essa estereotipagem contribuiu para a discriminaccedilatildeo e a into-leracircncia levando agrave violaccedilatildeo de direitos praticada em razatildeo do gecircnero como se verifica em condutas misoacuteginas ou de violecircncia

Como bem observa Ana Lucia Sabadell citando Frances Olsen na civilizaccedilatildeo ocidental predomina um sistema dualista de pensamento racionalirracional ativopassivo abstratoconcreto sendo os pri-meiros identificados ao masculino e os segundos ao feminino significando ldquoque se atribuem agraves mulhe-res caracteriacutesticas lsquoinferioresrsquo como a irracionalidade o sentimentalismo a passividade Essa e uma forma de organizar o pensamento e consequentemente as relaccedilotildees sociais entre indiviacuteduos de sexos diferentes garantindo a supremacia masculinardquo3 Eacute nesse contexto que surge o debate sobre direitos especificamente femininos

Os direitos fundamentais na liccedilatildeo de Canotilho tecircm por objetivo a defesa dos cidadatildeos sob uma dupla perspectiva

a) plano juriacutedico implicam normas de competecircncia negativa para os poderes puacuteblicos proibindo-os prioritariamente de adentrar a esfera juriacutedica individual

b) plano juriacutedico-subjetivo constituem o poder de exercer positivamente direitos funda-mentais e de exigir omissotildees dos poderes puacuteblicos de forma a evitar agressotildees lesivas por parte dos mesmos (liberdade negativa)4

A realocaccedilatildeo dos direitos das mulheres elevando-o agrave categoria de direitos humanos redimensiona o tema

O equacionamento da discriminaccedilatildeo das mulheres em termos de problemaacutetica da violaccedilatildeo dos

seus direitos permite fazer exigecircncias em termos que a comunidade internacional jaacute aceitava

nomeadamente para alguns grupos como por exemplo os grupos eacutetnicos Este enquadramento

permite ainda encontrar uma plataforma comum para as exigecircncias diversificadas das mulheres

nos vaacuterios pontos do globo e definir estrateacutegias de mudanccedila5

2 SAtildeO PAULO Violecircncia Domeacutestica e Familiar contra a Mulher Revista do Nudem Disponiacutevel em lthttpwwwdefensoriaspgovbr

dpesprepositorio41Revista_violC3AAncia20domC3A9sticapdfgt Acesso em 20 mar 2018

3 SABADELL Ana Lucia Manual de Sociologia Juriacutedica 5 ed Satildeo Paulo RT 2010 p 270

4 CAVALCANTI Stela Valeacuteria Soares de Farias Violecircncia domeacutestica anaacutelise da Lei ldquoMaria da Penhardquo n 1134006 3 ed Salvador Podivm

2010 p 86-87

5 Idem p116-7

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Unisul de Fato e de Direito

Ano IX Nordm 17 | Julho a Dezembro | 2018

A comunidade internacional por meio de intelectuais artistas ONGs e governos tem feito pressatildeo no sentido de estabelecer patamares civilizatoacuterios em diversas questotildees incluindo as ofensas contra as mulheres Compreender a discriminaccedilatildeo de gecircnero como insulto aos direitos humanos implica a pos-sibilidade de os Estados tornarem-se atores atuantes na contenccedilatildeo desses abusos bem como de res-ponsabilizaacute-los sejam eles perpetrados na esfera puacuteblica ou na esfera privada Ademais permite que se tomem as contas dos governos acerca de medidas preventivas para elidir as violaccedilotildees

A mulher tanto no Brasil como em todas as outras partes do mundo ainda sofre muita violecircncia base-ada no gecircnero Para se ter uma ideia da dimensatildeo do problema citam-se algumas situaccedilotildees especiacuteficas relatadas pela advogada iraniana e ativista de Direitos Humanos Shirin Ebadi6

bull No Iratilde ateacute poucos anos atraacutes a mulher natildeo podia ter documento de identidade Mesmo com a permissatildeo para documentarem-se as mulheres seguem privadas de diversos direitos poliacuteticos e sociais como o de dirigir automoacutevel

bull No Iratilde as mulheres tecircm direito ao voto e agrave participaccedilatildeo no parlamento haacute mais de 50 anos mas a revoluccedilatildeo de 1979 gerou uma nova legislaccedilatildeo que incentiva a discriminaccedilatildeo sexista Se um homem e uma mulher sofrem um acidente de automoacutevel o valor da indenizaccedilatildeo pago ao homem eacute o dobro do valor pago agrave mulher O testemunho de um homem em um tribunal soacute seraacute invalidado se duas mulheres o desmentirem O homem pode se casar com quatro espo-sas e pedir o divoacutercio sem justificativas sendo que pedidos de divoacutercio vindos da mulher satildeo quase sempre negados Para viajar a mulher precisa de autorizaccedilatildeo escrita do marido As leis poreacutem satildeo anacrocircnicas agrave proacutepria cultura A Ministra da Sauacutede do Iratilde por exemplo eacute uma mu-lher e por decorrecircncia de seu sexo necessita de autorizaccedilatildeo de seu marido para sair do paiacutes

bull No Afeganistatildeo leis preveem a inserccedilatildeo das mulheres na sociedade mas a cultura pa-ternalista eacute mais forte do que a legislaccedilatildeo Mulheres satildeo impedidas de exporem suas ideias O Talibatilde dentre inuacutemeros outros exemplos de coerccedilotildees queimou escolas para crianccedilas do sexo feminino e obriga as mulheres a usarem burca

bull A liberdade da mulher nos paiacuteses islacircmicos tem piorado proporcionalmente com o au-mento do poder dos fundamentalistas o qual por sua vez tem se fortalecido por efeito das intervenccedilotildees militares ocidentais recentes de maneira que a situaccedilatildeo das mulheres hoje no Iraque estaacute pior do que na eacutepoca de Saddam Hussein A ativista natildeo culpa poreacutem o Islatilde pela existecircncia destas leis discriminatoacuterias e sim uma particular interpretaccedilatildeo ma-chista e equivocada do Islatilde que se articula com uma cultura paternalista tradicional dos locais Aleacutem disso a cultura machista eacute disseminada tambeacutem por mulheres as quais de-vem ser informadas sobre a necessidade de superaacute-la e como fazecirc-lo

bull A discriminaccedilatildeo contra o sexo feminino vai aleacutem da religiatildeo sendo uma realidade mundial que independe de paiacutes ou cultura ainda que varie em forma e intensidade Nos Estados Unidos Canadaacute e Europa por exemplo as leis reconhecem a igualdade dos gecircneros mas a cultura local prevecirc compromissos a serem assumidos pelas mulheres em casa e na so-ciedade os quais impedem que elas desfrutem materialmente da igualdade declarada o que pode ser medido pelo nuacutemero reduzido de mulheres em cargos de poder

Podem-se acrescentar ainda os seguintes episoacutedios

bull Em setembro de 2011 Shaima na Araacutebia Saudita foi condenada a dez chibatadas por dirigir automoacutevel7 A condenaccedilatildeo ocorreu logo apoacutes o rei Abdullah anunciar que as mu-lheres poderiam votar o que deve acontecer pela primeira vez na histoacuteria do paiacutes nas eleiccedilotildees de 2015 Tambeacutem foi o rei responsaacutevel por suspender a pena apoacutes inuacutemeras manifestaccedilotildees ocorridas em todo o paiacutes de apoio a Shaima

6 Palestra proferida em 14 de junho de 2011 em Satildeo Paulo promovida por Fronteiras do Pensamento

7 MULHERDisponiacutevel em lthttpwww1folhauolcombrmundo981699-mulher-saudita-e-condenada-a-dez-chibatadas-por-

dirigirshtmlgt Acesso em 20 mar 2018

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Universidade do Sul de Santa Catarina

Revista Juriacutedica da Universidade do Sul de Santa Catarina

bull Agora a heroiacutena mirim Malala Yousufzau do Paquistatildeo que descumpriu as concep-ccedilotildees religiosas do seu paiacutes e decidiu natildeo soacute estudar mas defender que mulheres estu-dassem No dia 9 de outubro de 2012 aos quatorze anos de idade Malala foi atingida na cabeccedila por um tiro agrave queima-roupa dentro do ocircnibus no qual voltava da escola Sobreviveu recebeu o precircmio Nobel da Paz de 2014 e permanece na sua luta8

As histoacuterias acima citadas e tantas outras sejam as conhecidas sejam as silenciadas indicam a neces-sidade de se criar instrumentos de proteccedilatildeo especial da mulher Foi o que fez o Brasil quando em 07 de agosto de 2006 editou a Lei Maria da Penha No acircmbito da Ameacuterica Latina o Brasil foi o 18ordm pais a ter uma lei de proteccedilatildeo integral agrave mulher em situaccedilatildeo de violecircncia domeacutestica ou familiar

3 A LMP Eacute DE ACcedilAtildeO AFIRMATIVA

A Lei Maria da Penha aleacutem da severa criacutetica ao seu art 6ordm o qual enunciou que a violecircncia contra a mulher constituiu uma violaccedilatildeo aos direitos humanos (conforme analisamos no item anterior) tam-beacutem sofreu ataques de vaacuterios autores que se manifestaram no sentido de consideraacute-la uma norma inconstitucional por ferir o princiacutepio da igualdade entre homens e mulheres insculpido no art 5ordm I da CF o qual prevecirc que

Constituiccedilatildeo Federal

Art 5ordm Todos satildeo iguais perante a lei sem distinccedilatildeo de qualquer natureza garantindo-se aos

brasileiros e aos estrangeiros residentes no Paiacutes a inviolabilidade do direito agrave vida agrave liberdade agrave

igualdade agrave seguranccedila e agrave propriedade nos termos seguintes

I - homens e mulheres satildeo iguais em direitos e obrigaccedilotildees nos termos desta Constituiccedilatildeo

No mesmo sentido juiacutezes e desembargadores por todo o Brasil (ainda que tenham sido exceccedilatildeo) trata-ram de declarar a LMP inconstitucional deixando de aplicaacute-la na sua integralidade9

Em razatildeo da celeuma que se instalou no paiacutes o entatildeo presidente da Repuacuteblica Luis Inaacutecio Lula da Silva ingressou perante o STF com uma Accedilatildeo Declaratoacuteria de Constitucionalidade (ADC 19) buscando assentar a constitucionalidade dos artigos 1ordm 33 e 41 da Lei 113402006 (Lei Maria da Penha) O julga-mento da accedilatildeo deu-se em fevereiro de 2012 em conjunto com a ADI 4424

O STF julgou constitucionais os dispositivos da LMP questionados afirmando que a legislaccedilatildeo ordinaacute-ria protetiva estaria em sintonia com a Convenccedilatildeo sobre a Eliminaccedilatildeo de Todas as Formas de Violecircncia contra a Mulher (CEDAW) e com a Convenccedilatildeo de Beleacutem do Paraacute Sob o acircngulo constitucional ressal-tou-se o dever do Estado de assegurar a assistecircncia agrave famiacutelia e de criar mecanismos para coibir a violecircn-cia no acircmbito de suas relaccedilotildees (Informativo STF n 654 6 a 10 de fevereiro de 2012)

Dentre as inuacutemeras fundamentaccedilotildees trazidas no decisun (ADI 4424ADC 19) ficou constando no rela-toacuterio o caraacuteter de accedilatildeo afirmativa da Lei Maria da Penha

8 LAMB Christina YOUSAFZAI Malala Eu sou Malala Satildeo Paulo Companhia das Letras 2013

9 Exemplo paradigmaacutetico aconteceu na cidade de Sete Lagoas em que o magistrado cunhou a Lei Maria da Penha de ldquoconjunto de regras

diaboacutelicasrdquo Em 20112007 o Conselho Nacional de Justiccedila instaurou processo disciplinar contra o juiz para analisar se as expressotildees

usadas em suas decisotildees caracterizam excesso de linguagem e infraccedilatildeo disciplinar O juiz impetrou mandado de seguranccedila para o STF

(MS 30320) O acompanhamento do processo pode ser consultado em lthttpwwwstfjusbrportalprocessoverProcessoAndamento

aspincidente=4022577gt Acesso em 10 mar 2018

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Unisul de Fato e de Direito

Ano IX Nordm 17 | Julho a Dezembro | 2018

31 UMA QUESTAtildeO TERMINOLOacuteGICA ACcedilAtildeO AFIRMATIVA OU MEDIDA

ESPECIAL DE CARAacuteTER TEMPORAacuteRIO

A questatildeo que se coloca eacute exatamente essa seria a LMP uma lei de accedilatildeo afirmativa como a definiu o STF Ou trata-se de uma medida especial de caraacuteter temporaacuterio como apregoa a CEDAW menciona-da inclusive na proacutepria decisatildeo da Corte Suprema

Ao se analisar a doutrina e jurisprudecircncia brasileiras percebe-se que a utilizaccedilatildeo preponderante eacute pela expressatildeo ldquoaccedilatildeo afirmativardquo Vejamos

311 POSICIONAMENTO 1 A LEI MARIA DA PENHA Eacute DE ACcedilAtildeO AFIRMATIVA

No relatoacuterio da ADC 19 reiteradas vezes o Min Marco Aureacutelio faz referecircncia ao caraacuteter de accedilatildeo afir-mativa da Lei Maria da Penha Confira-se

Nessa ordem de ideias impende ter em mente o amplo reconhecimento do fato de que uma vez

marcadas em uma sociedade machista e patriarcal como a nossa as relaccedilotildees de gecircnero pelo

desequiliacutebrio de poder a concretizaccedilatildeo do princiacutepio isonocircmico (art 5ordm I da Lei Maior) nessa

esfera ndash relaccedilotildees de gecircnero ndash reclama a adoccedilatildeo de accedilotildees e instrumentos afirmativos voltados

exatamente agrave neutralizaccedilatildeo da situaccedilatildeo de desequiliacutebrio STF ADC 19DF Relator Min Marco

Aureacutelio j em 09022012

Em outros trechos

A discriminaccedilatildeo afirmativa que se projeta da Lei Maria da Penha se faz acompanhar de razatildeo

que na exata medida em que se presta a compensar a discriminaccedilatildeo de fato cuja existecircncia

reconhece a justificardquo STF ADC 19DF Relator Min Marco Aureacutelio j em 09022012

Para enfrentar esse problema que aflige o nuacutecleo baacutesico da nossa sociedade ndash a famiacutelia ndash e

se alastra para todo o corpo comunitaacuterio por forccedila dos seus efeitos psicoloacutegicos nefastos eacute

necessaacuteria uma poliacutetica de accedilotildees afirmativas que necessariamente perpassa a utilizaccedilatildeo do

Direito Penal A adoccedilatildeo das accedilotildees afirmativas eacute o resultado de uma releitura do conceito de

igualdade que se desenvolveu desde tempos remotos Na claacutessica obra Aristoteacutelica lsquoA Poliacuteticarsquo

o filoacutesofo jaacute ponderava que ldquoA primeira espeacutecie de democracia eacute aquela que tem a igualdade por

fundamento Nos termos da lei que regula essa democracia a igualdade significa que os ricos e os

pobres natildeo tecircm privileacutegios poliacuteticos que tanto uns como outros natildeo satildeo soberanos de um modo

exclusivo e sim que todos o satildeo exatamente na mesma proporccedilatildeordquo STF ADC 19DF Relator

Min Marco Aureacutelio j em 09022012

Sou das que compartilham do entendimento de que a Lei Maria da Penha inaugurou uma nova

fase no iter das accedilotildees afirmativas em favor da mulher brasileira consistindo em verdadeiro

microssistema de proteccedilatildeo agrave famiacutelia e agrave mulher a contemplar inclusive norma de direito do

trabalho A Lei 113402006 batizada em homenagem a Maria da Penha traduz a luta das

mulheres por reconhecimento constituindo marco histoacuterico com peso efetivo mas tambeacutem

com dimensatildeo simboacutelica e que natildeo pode ser amesquinhada ensombrecida desfigurada

desconsiderada Sinaliza mudanccedila de compreensatildeo em cultura e sociedade de violecircncia que de

tatildeo comum e aceita se tornou invisiacutevel ndash ldquoem briga de marido e mulher ningueacutem mete a colherrdquo

pacto de silecircncio para o qual a mulher contribui seja pela vergonha seja pelo medo STF ADC

19DF Relator Min Marco Aureacutelio j em 09022012

Na doutrina tem-se dentre outros o posicionamento de Miranda

Aplica-se a Lei Maria da Penha as poliacuteticas referentes agraves accedilotildees afirmativas que tem como

fito agrave promoccedilatildeo de oportunidades iguais para viacutetimas de discriminaccedilatildeo poreacutem natildeo abrangem

indiviacuteduos e sim os grupos a que pertencem ou seja negros mulheres idosos destinando-se a

igualar em condiccedilotildees esses grupos em desvantagens conforme os preceitos constitucionais []

Agrave guisa de conclusatildeo na oacuterbita do ordenamento juriacutedico paacutetrio a lei em comento foi elaborada

para proteger a mulher isto posto o tratamento concedido agraves mulheres natildeo afronta o princiacutepio

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da igualdade pois se trata de accedilatildeo afirmativa que tem como objetivo reparar injusticcedilas sofridas

pelas mulheres e que violam os direitos humanos Em suma A Lei nordm 1134006 protege a famiacutelia

pois a praacutetica de tal violecircncia traz consequecircncias natildeo soacute para as mulheres mas tambeacutem para sua

famiacutelia e agrave sociedade em geral10

312 POSICIONAMENTO 2 A LEI MARIA DA PENHA CARACTERIZA-SE POR CRIAR

MEDIDAS ESPECIAIS DE CARAacuteTER TEMPORAacuteRIO

A Convenccedilatildeo para Eliminaccedilatildeo de todas as formas de Discriminaccedilatildeo sobre a Mulher (CEDAW) no seu art 4ordm citada no preacircmbulo e no art 1ordm da Lei Maria da Penha determina que

bull Medidas especiais de caraacuteter temporaacuterio destinadas a acelerar a igualdade de fato en-tre o homem e a mulher natildeo se consideraratildeo discriminaccedilatildeo

bull De nenhuma maneira a utilizaccedilatildeo de tais medidas especiais implicaraacute como consequ-ecircncia a manutenccedilatildeo de normas desiguais

bull Essas medidas cessaratildeo quando os objetivos de igualdade de oportunidade e trata-mento forem alcanccedilados

Na atualidade nem toda discriminaccedilatildeo eacute proibida ou desvaliosa para o ordenamento juriacutedico Um exemplo de descriminaccedilatildeo positiva eacute a Lei Maria da Penha Ela constitui-se em um criteacuterio de equipa-raccedilatildeo desigual igualitaacuterio e representa uma das medidas apresentadas pelo Estado para permitir que ocorra o aceleramento da igualdade de fato entre o homem e a mulher circunscrita aos casos de violecircn-cia domeacutestica e familiar jaacute que o alcance da Lei eacute limitado

Haacute outras accedilotildees nesse sentido previstas na legislaccedilatildeo brasileira destacando-se a lei de cotas poliacuteticas De acordo com a Lei 950497 30 dos candidatos registrados devem pertencer a um dos sexos

A maacutexima tratar os iguais de modo igual e os desiguais de modo desigual representa um reconhecimento de que os indiviacuteduos que se estabeleceram no mundo em condiccedilotildees desiguais natildeo podem por mera declaraccedilatildeo de vontade obter condiccedilatildeo de vida igual equivalente aos que gozam de vantagem sejam elas quais forem Daiacute a necessidade de discriminaccedilotildees positivas ou accedilotildees positivas consubstanciadas em poliacuteticas puacuteblicas que objetivem concretizar materialmente o discurso relevante poreacutem vazio de igualdade com o objetivo de mitigar os efeitos das discriminaccedilotildees que heranccedilas de costumes passados insistem em manter no presente sem nenhum argumento eacutetico que as justifiquem

As medidas especiais de caraacuteter temporaacuterio previstas na Lei Maria da Penha satildeo destinadas ao empo-deramento das mulheres a partir da diminuiccedilatildeo das desigualdades sociais poliacuteticas e econocircmicas

Por serem excepcionais e por preverem seacuterias restriccedilotildees de direitos (como eacute o caso da maioria das medidas protetivas previstas na Lei Maria da Penha) a aplicaccedilatildeo dos instrumentos de discriminaccedilatildeo positiva soacute se justifica em situaccedilotildees muito relevantes (princiacutepio da proporcionalidade) Eacute que ao mes-mo tempo em que de um lado se alargam garantias (em relaccedilatildeo agrave viacutetima garantia da vida da integridade fiacutesica e psicoloacutegica etc) de outro se limitam direitos (concernentes ao reacuteu liberdade de ir e vir presun-ccedilatildeo da inocecircncia direito ao contraditoacuterio etc)

Eacute assentado o entendimento de que

Direitos liberdades poderes e garantias satildeo passiacuteveis de limitaccedilatildeo ou restriccedilatildeo Eacute preciso natildeo

perder de vista poreacutem que tais restriccedilotildees satildeo limitadas [] Esses limites que decorrem da

proacutepria Constituiccedilatildeo referem-se tanto agrave necessidade de proteccedilatildeo de um nuacutecleo essencial do

direito fundamental quanto agrave clareza determinaccedilatildeo generalidade e proporcionalidade das

restriccedilotildees impostas11

10 BARCA Marcelo Disponiacutevel em lthttpmarcelobarcajusbrasilcombrartigos13658428zz8a-legalidade-do-tratamento-

diferenciado-as-mulheres-vitimas-de-violencia-domestica-a-luz-do-ordenamento-juridico-patriogt Acesso em 20 mar 2018

11 MENDES Gilmar COELHO Inocecircncio Maacutertires BRANCO Paulo Gustavo Gonet Curso de Direito Constitucional Satildeo Paulo Saraiva 2007

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A Lei Maria da Penha eacute ao mesmo tempo protetiva de direitos de mulheres e restritiva de direitos de agressores Decorrentemente sua aplicaccedilatildeo somente se justifica em razatildeo das circunstacircncias muito especiacuteficas que envolvem a violecircncia de gecircnero brutalidade institucionalizaccedilatildeo da violecircncia frequecircn-cia reiteraccedilatildeo permanecircncia intimidaccedilatildeo e iacutendices elevadiacutessimos

Aplica-se aqui o princiacutepio da proporcionalidade jaacute que o comum dramaacutetico e de consequecircncias gravo-sas eacute a violecircncia do homem contra a mulher A mulher agredida natildeo se encontra em igualdade de condi-ccedilotildees com o agressor Haacute uma vulnerabilidade mesmo que transitoacuteria ou seja enquanto durar o estado de agressatildeo ainda que iminente

As peculiaridades da violecircncia domeacutestica e familiar contra a mulher bem como os nuacutemeros absurda-mente elevados clamam pela utilizaccedilatildeo de instrumentos eficazes e eneacutergicos mesmo que para tanto tenham-se que se sacrificar em condiccedilotildees especiacuteficas direitos garantias e liberdades

Dentro desta perspectiva somente as viacutetimas de violecircncia domeacutestica e familiar baseada no gecircne-ro (art 5ordm) ou aqueles (homens ou mulheres) que estejam nas situaccedilotildees elencadas no inciso III do art 313 do CPP com as alteraccedilotildees trazidas pela Lei 1240311 (crianccedila adolescente idoso enfermo ou pessoa com deficiecircncia) ou nas condiccedilotildees mencionadas na Lei 980799 (viacutetimas coagidas ou expostas agrave grave ameaccedila em razatildeo de colaborarem com a investigaccedilatildeo ou processo criminal) possuem amparo especiacutefico jaacute que em relaccedilatildeo a tais pessoas haacute motivaccedilotildees particulares que por conta de sua especial vulnerabilidade (vulnerabilidade situacional) justificam um tratamento tambeacutem diferenciado ainda que com a consequecircncia de restringir direitos garantias e liberdades fundamentais do acusado

No caso da violecircncia contra a mulher ldquoao confirmar a inexistecircncia real da igualdade a niacutevel internacio-nal e em muitos paiacuteses democraacuteticos satildeo estabelecidas medidas de accedilatildeo positiva para corrigir as situa-ccedilotildees desequilibradas como consequecircncia de praacuteticas ou sistemas sociais discriminatoacuteriosrdquo12 da qual a Lei Maria da Penha eacute um ilustre exemplo

Entendemos mais correto esse segundo posicionamento Apesar da grande similitude dos dois institu-tos (accedilotildees afirmativas e medidas especiais de caraacuteter temporaacuterio) a Lei Maria da Penha constitui uma representaccedilatildeo do segundo deles Isso pelo fato de que como o seu proacuteprio nome diz as medidas espe-ciais possuem caraacuteter temporaacuterio enquanto as accedilotildees afirmativas tecircm natureza permanente

A distinccedilatildeo entre uma e outra noccedilatildeo foi aclarada pelo Comitecirc para a Eliminaccedilatildeo de todas as Formas de Discriminaccedilatildeo contra a Mulher - CEDAW De acordo com o Comitecirc a expressatildeo accedilatildeo afirmativa natildeo faz parte da linguagem utilizada nos tratados internacionais de direitos humanos ficando reservado o seu uso para a doutrina e o direito interno de alguns paiacuteses Confira-se13

130 O Comitecirc vecirc com preocupaccedilatildeo que o Estado-Parte [referindo-se ao Brasil] utilize a

expressatildeo ldquomedidas positivasrdquo para descrever algumas de suas medidas orientadas a eliminar

a discriminaccedilatildeo e que natildeo a utilize para descrever medidas especiais de caraacuteter temporaacuterio

orientadas a acelerar a igualdade

131 O Comitecirc recomenda que o Estado-Parte [referindo-se ao Brasil] ao formular as poliacuteticas

para conseguir a igualdade entre os gecircneros natildeo apenas elimine a discriminaccedilatildeo mas que

de conformidade com o paraacutegrafo 1deg do artigo 4deg da Convenccedilatildeo adote medidas especiais de

caraacuteter temporaacuterio para acelerar o processo orientado a conseguir a igualdade

12 ESCOBAR CIRUJANO Ana QUINTEROS Andreacutes SAacuteNCHEZ GAMONAL Sara Beleacuten TANDOacuteN RECIO Baacuterbara In PEREZ VIEJO

Jesuacutes M HERNAacuteNDEZ Ana Montalvo (Cood) Violencia de geacutenero prevencioacuten deteccioacuten y atencioacuten Madrid Grupo 5 2011 p 31

13 Naccedilotildees Unidas - Informe do Comitecirc para a eliminaccedilatildeo da Discriminaccedilatildeo contra a Mulher - 28ordm periacuteodo de sessotildees (13 a 31 de Jan de

2003) 29ordm periacuteodo de sessotildees (30 de Junho a 18 de Julho de 2003) Disponiacutevel em lthttpwwwspmgovbrassuntosacoes-internacionais

Articulacaoarticulacao-internacionalrecomendacoes-cedaw-traduzido-e-revisado-26-12-03docgt Acesso em 26 dez 2003

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Eacute exatamente a temporalidade das medidas especiais que constituem o seu traccedilo caracteriacutestico Elas satildeo destinadas a acelerar a igualdade de fato Alcanccedilados os objetivos que justificaram a sua criaccedilatildeo devem ser cessados os seus efeitos

Para Vaacutesquez

Isto resulta muito compreensiacutevel quando se pensa na superaccedilatildeo de discriminaccedilotildees histoacutericas

como a racial e a das mulheres as quais eacute possiacutevel esperar ndash ao menos teoricamente ndash sua

total erradicaccedilatildeo no futuro Poreacutem se se consideram outras medidas como as que se adotam

com relaccedilatildeo a pessoas cegas ou portadoras de deficiecircncias fiacutesicas dificilmente podem ser

consideradas como medidas especiais temporaacuterias ao menos que se acredite ou se aspire que no

futuro natildeo venham a existir pessoas cegas ou com deficiecircncia fiacutesica14

A autora cita como exemplo de accedilatildeo afirmativa para as mulheres a licenccedila poacutes-parto informando que tanto as accedilotildees afirmativas quanto as medidas especiais de caraacuteter temporaacuterio podem ser consideradas como as uacutenicas exceccedilotildees que o direito internacional dos direitos humanos autoriza frente agrave primazia do princiacutepio da igualdade em seu sentido formal15

Ainda de acordo com Vaacutesquez

A justificaccedilatildeo mais consistente para as normas especiais ou diferenciadas se encontra na

aplicaccedilatildeo direta da obrigaccedilatildeo geral de garantia dos direitos sem discriminaccedilatildeo Nela satildeo

encontrados os fundamentos das medidas que se adotam tendo em conta a realidade dos

diversos grupos humanos que portanto natildeo podem entender-se como lsquovantagemrsquo que se

outorgam a grupos socialmente desavantajados16

4 OS DOCUMENTOS INTERNACIONAIS MENCIONADOS NO ART 1ordm DA LEI MARIA DA PENHA

Jaacute em seu preacircmbulo e no seu artigo inicial a Lei Maria da Penha cita importantes instrumentos inter-nacionais de Direitos Fundamentais que lhes datildeo embasamento

a) Convenccedilatildeo sobre a Eliminaccedilatildeo de todas as Formas de Discriminaccedilatildeo contra a Mulher - CEDAW e

b) Convenccedilatildeo Interamericana para Prevenir Punir e Erradicar a Violecircncia Contra a Mulher - Beleacutem do Paraacute

Tratam-se dos dois mais importantes instrumentos internacionais de direitos humanos que alcanccedilam as mulheres brasileiras Eles foram elaborados no acircmbito da ONU e decorrem de um sistema de prote-ccedilatildeo dos direitos humanos com jurisdiccedilatildeo global entre os estados-membros

Ambos os documentos internacionais evidenciam que a violecircncia contra a mulher no acircmbito puacuteblico ou privado constitui uma grave violaccedilatildeo aos direitos humanos e limita total ou parcialmente o exerciacute-cio dos demais direitos fundamentais Mencionam ainda que a violecircncia baseada no gecircnero reflete relaccedilotildees de poder historicamente desiguais e assimeacutetricas entre os sexos

14 TOLEDO VAacuteSQUEZ Patsili FemiciacutedioFeminiciacutedio Buenos Aires Didot 2014 p 163

15 Idem p 164

16 idem p 165

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A violecircncia contra as mulheres ldquoapenas foi reconhecida formalmente como violaccedilatildeo de direitos huma-nos na Conferecircncia das Naccedilotildees Unidas sobre Direitos Humanos no ano de 1993 a partir disso os paiacute-ses-membros da ONU e as organizaccedilotildees da sociedade civil tecircm se dedicado a encontrar maneiras de erradicar esse tipo de violecircnciardquo17 o que inclui a elaboraccedilatildeo de documentos internacionais como eacute o caso dos citados no preacircmbulo e no art 1ordf da Lei Maria da Penha

Tais documentos natildeo possuem status constitucional no Brasil por natildeo terem sido recepcionados com o procedimento previsto no sect3ordm do art 5ordm da CF Tecircm no entanto caraacuteter supralegal18

41 ALGUMAS INFORMACcedilOtildeES SOBRE CADA UM DOS DOCUMENTOS

INTERNACIONAIS ANTES MENCIONADOS

411 CONVENCcedilAtildeO SOBRE A ELIMINACcedilAtildeO DE TODAS AS FORMAS DE

DISCRIMINACcedilAtildeO CONTRA A MULHER ndash CEDAW DE 1979

bull Fruto da I Conferecircncia Mundial sobre a Mulher realizada em 1975 no Meacutexico

bull Adotada pela Resoluccedilatildeo 34180 da Assembleia das Naccedilotildees Unidas em 18 de Dezembro de 1979

bull Assinada pelo Brasil em Toacutequio no dia 31 de marccedilo de 1981

bull Aprovada pelo Congresso Nacional por meio do Decreto Legislativo 931983 com ressalvas

bull Entrou em vigor no Brasil em 020384

bull Promulgada pelo Presidente da Repuacuteblica por meio do Decreto 894601984 com as mesmas ressalvas constantes do Decreto Legislativo

bull Suas ressalvas foram retiradas em 2002 pelo meio do Decreto 4377

Seu art 2ordm exalta a todas as Naccedilotildees do Mundo membros da Organizaccedilatildeo das Naccedilotildees Unidas o que se segue19

Artigo II Os Estados Partes condenam a discriminaccedilatildeo contra a mulher em todas as suas formas

concordam em seguir por todos os meios apropriados e sem dilaccedilotildees uma poliacutetica destinada a

eliminar a discriminaccedilatildeo contra a mulher e com tal objetivo se comprometem a

a) Consagrar se ainda natildeo o tiverem feito em suas constituiccedilotildees nacionais ou em outra

legislaccedilatildeo apropriada o princiacutepio da igualdade do homem e da mulher e assegurar por lei outros

meios apropriados a realizaccedilatildeo praacutetica desse princiacutepio

b) Adotar medidas adequadas legislativas e de outro caraacuteter com as sanccedilotildees cabiacuteveis e que

proiacutebam toda discriminaccedilatildeo contra a mulher

c) Estabelecer a proteccedilatildeo juriacutedica dos direitos da mulher numa base de igualdade com os do

homem e garantir por meio dos tribunais nacionais competentes e de outras instituiccedilotildees

puacuteblicas a proteccedilatildeo efetiva da mulher contra todo ato de discriminaccedilatildeo

d) Abster-se de incorrer em todo ato ou praacutetica de discriminaccedilatildeo contra a mulher e zelar para que

as autoridades e instituiccedilotildees puacuteblicas atuem em conformidade com esta obrigaccedilatildeo

e) Tomar as medidas apropriadas para eliminar a discriminaccedilatildeo contra a mulher praticada por

qualquer pessoa organizaccedilatildeo ou empresa

17 SAtildeO PAULO Disponiacutevel em lthttpwwwdefensoriaspgovbrdpesprepositorio 41Revista_violC3AAncia20dom

C3A9sticapdfgt Acesso em 20 mar 2018

18 Idem

19 BRASIL Disponiacutevel em lthttpwww2camaralegbrleginfeddecret2002decreto-4377-13-setembro-2002-476386-

publicacaooriginal-1-pehtmlgt Acesso em 20 mar 2018

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f) Adotar todas as medidas adequadas inclusive de caraacuteter legislativo para modificar ou

derrogar leis regulamentos usos e praacuteticas que constituam discriminaccedilatildeo contra a mulher

g) Derrogar todas as disposiccedilotildees penais nacionais que constituam discriminaccedilatildeo contra a mulher

Quando aprovada pelo Congresso Nacional brasileiro em 1984 continha inuacutemeras reservas que diziam respeito ao direito de famiacutelia devido agrave incompatibilidade com a legislaccedilatildeo interna pautada pela assimetria entre os direitos do homem e da mulher no nosso paiacutes

Apesar de a Constituiccedilatildeo de 1988 ter incluiacutedo dentre os direitos fundamentais a igualdade entre os sexos (art 5ordm I) tais reservas somente foram retiradas em 2002 por meio do Decreto 4377202 o qual determinou que a Convenccedilatildeo ldquoseraacute executada e cumprida tatildeo inteiramente como nela se conteacutemrdquo

A CEDAW foi o primeiro tratado internacional que dispocircs amplamente sobre os direitos humanos das mulheres propondo duas frentes de trabalho promover os direitos da mulher na busca da igualdade de gecircnero e reprimir quaisquer discriminaccedilotildees contra as mulheres nos Estados-parte

Como bem menciona Jubilut

Tal Convenccedilatildeo se insere no advento da teoria de gecircnero e busca garantir proteccedilatildeo especiacutefica

agraves mulheres agrave qual devem se acrescer todos os direitos humanos assegurados de modo geral

Trata-se assim de se atentar para as particularidades das mulheres e de sobretudo buscar gerar

igualdade real e natildeo apenas formal entre elas e os homens20

De acordo com o relato de Silvia Pimentel21 adoccedilatildeo da CEDAW

Foi o fruto de deacutecadas de esforccedilos internacionais visando agrave proteccedilatildeo e agrave promoccedilatildeo dos direitos

das mulheres em todo o mundo Resultou de iniciativas tomadas dentro da Comissatildeo sobre a

Situaccedilatildeo da Mulher (CSW sigla em inglecircs) da Organizaccedilatildeo das Naccedilotildees Unidas (ONU) oacutergatildeo

criado dentro do sistema das Naccedilotildees Unidas em 1946 com o objetivo de analisar e elaborar

recomendaccedilotildees para a formulaccedilatildeo de poliacuteticas aos vaacuterios paiacuteses signataacuterios da Convenccedilatildeo

visando ao aprimoramento do status da mulher

Baseada em provisotildees da Carta das Naccedilotildees Unidas ndash que afirma expressamente os direitos iguais

de homens e mulheres ndash e na Declaraccedilatildeo Universal dos Direitos Humanos ndash que estabelece que

todos os direitos e liberdades humanos devem ser aplicados igualmente a homens e mulheres

sem distinccedilatildeo de qualquer natureza ndash a Comissatildeo preparou entre os anos de 1949 e 1962

uma seacuterie de tratados que incluiacuteram a Convenccedilatildeo dos Direitos Poliacuteticos das Mulheres (1952)

a Convenccedilatildeo sobre a Nacionalidade de Mulheres Casadas (1957) e a Convenccedilatildeo sobre o

Casamento por Consenso Idade Miacutenima para Casamento e Registro de Casamentos (1962)

Esses tratados tinham por objetivo visavam a proteccedilatildeo e a promoccedilatildeo dos direitos da mulher nas

aacutereas em que esses direitos fossem considerados particularmente vulneraacuteveis pela Comissatildeo

Em 1965 a Comissatildeo empenhou-se nos preparativos para o que viria a se tornar em 1967 a

Declaraccedilatildeo sobre a Eliminaccedilatildeo da Discriminaccedilatildeo contra a Mulher Esta Declaraccedilatildeo incluiacutea em

um uacutenico instrumento legal padrotildees internacionais que articulavam direitos iguais de homens

e mulheres A Declaraccedilatildeo entretanto natildeo se efetivou como um tratado Apesar de sua forccedila

moral e poliacutetica ela natildeo estabeleceu obrigaccedilotildees para os Estados

Em 1972 a Comissatildeo sobre a Situaccedilatildeo da Mulher considerou a possibilidade de organizar um

tratado que conferisse forccedila de lei agrave Declaraccedilatildeo Essa proposta foi impulsionada pelo Plano

Mundial de Accedilatildeo adotado pela Conferecircncia Mundial do Ano Internacional da Mulher das

Naccedilotildees Unidas em 1975 Esse Plano pedia uma Convenccedilatildeo para a Eliminaccedilatildeo da Discriminaccedilatildeo

20 JUBILUT Liliana CombateDisponiacutevel em lthttplilianajubilutjusbrasilcombrartigos121940395o-combate-a-violencia-

contra-a-mulher-no-ambito-da-onugt Acesso em 20 mar 2018

21 Texto baseado na apresentaccedilatildeo da professora Silvia Pimentel presidente do Comitecirc sobre a Eliminaccedilatildeo da Discriminaccedilatildeo contra a

Mulher (Comitecirc CEDAW da ONU) publicada no livro Instrumentos Internacionais de Direitos das Mulheres Heloisa Frossard (org)

SPM-PR 2006 Disponiacutevel em lthttpwwwcompromissoeatitudeorgbrconvencao-sobre-a-eliminacao-de-todas-as-formas-de-

discriminacao-contra-a-mulher-cedaw-1979gt Acesso em 20 mar 2018

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contra a Mulher com procedimentos efetivos para sua implementaccedilatildeo Este trabalho tambeacutem

foi impulsionado pela Assembleia Geral que declarou o periacuteodo 1976-1985 a Deacutecada das

Naccedilotildees Unidas para a Mulher

A Convenccedilatildeo para a Eliminaccedilatildeo de Todas as Formas de Discriminaccedilatildeo contra a Mulher

(CEDAW) foi adotada pela Assembleia Geral em 1979 Na resoluccedilatildeo de adoccedilatildeo da Convenccedilatildeo a

Assembleia Geral demonstrou expectativas de que ela entrasse em accedilatildeo em curto prazo

Convenccedilatildeo Interamericana para Prevenir Punir e Erradicar a Violecircncia Contra a Mulher - Beleacutem do Paraacute de 1994

bull Adotada pela Assembleia Geral da Organizaccedilatildeo dos Estados Americanos no dia 6061994

bull Entrou em vigor no plano internacional em 3031995

bull Aprovada pelo Decreto legislativo 107 de 31081995

bull Ratificada pelo Brasil no dia 27111995

bull O Governo brasileiro depositou a Carta de Ratificaccedilatildeo do instrumento multilateral em epiacutegrafe em 27 de novembro de 1995 passando o mesmo a vigorar para o Brasil em 27 de dezembro de 1995

bull Promulgada pelo Presidente da Repuacuteblica pelo Decreto 1973 de 1081996

412 A CONVENCcedilAtildeO BELEacuteM DO PARAacute ESTABELECEU COMO DEVERES DOS

ESTADOS22

Capiacutetulo III - Deveres dos Estados

Artigo 7ordm Os Estados Membros condenam todas as formas de violecircncia contra a mulher e

concordam em adotar por todos os meios apropriados e sem demora poliacuteticas orientadas e

prevenir punir e erradicar a dita violecircncia e empenhar-se em

Paraacutegrafo 1 Abster-se de qualquer accedilatildeo ou praacutetica de violecircncia contra a mulher e velar para

que as autoridades seus funcionaacuterios pessoal e agentes e instituiccedilotildees puacuteblicas se comportem

conforme esta obrigaccedilatildeo

Paraacutegrafo 2 Atuar com a devida diligecircncia para prevenir investigar e punir a violecircncia contra

a mulher

Paraacutegrafo 3 Incluir em sua legislaccedilatildeo interna normas penais civis e administrativas assim como

as de outra natureza que sejam necessaacuterias para prevenir punir e erradicar a violecircncia contra a

mulher e adotar as medidas administrativas apropriadas que venham ao caso

A Convenccedilatildeo Beleacutem do Paraacute integra o acircmbito do sistema regional de direitos humanos conduzido pela Organizaccedilatildeo dos Estados Americanos - OEA

Apesar de o Estado brasileiro ter ratificado a Convenccedilatildeo de Beleacutem do Paraacute logo apoacutes a sua adoccedilatildeo pela ONU ou seja em 1995 uma das obrigaccedilotildees a que se comprometeu (a de incluir em sua legisla-ccedilatildeo normas especiacuteficas sobre o combate a violecircncia contra a mulher) somente veio a acontecer onze anos depois com a ediccedilatildeo da Lei Maria da Penha (2006) Haacute ainda quem entenda que o compromisso soacute foi cumprido por conta da condenaccedilatildeo que o Brasil sofreu na Comissatildeo Interamericana de Direitos Humanos no caso 5401 em que foi demandante Maria da Penha Maia Fernandes Os detalhes do caso seratildeo trazidos a seguir

22 BRASIL Disponiacutevel em lthttpwww2camaralegbrleginfeddecret1996decreto-1973-1-agosto-1996-435655-publicacaooriginal-

1-pehtmlgt Acesso em 20 mar 2018

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413 RECOMENDACcedilAtildeO DA COMISSAtildeO INTERAMERICANA NO CASO 5401 ndash MARIA

DA PENHA MAIA FERNANDES

Maria da Penha Maia Fernandes ingressou em 2001 junto agrave Comissatildeo Interamericana de Direitos Humanos ndash sistema especial de proteccedilatildeo dos direitos humanos ndash em busca do reconhecimento da tole-racircncia da Repuacuteblica Federativa do Brasil em tomar as providecircncias cabiacuteveis no intuito de processar e punir o seu entatildeo esposo por duas tentativas de homiciacutedio perpetradas contra ela e que tinham ocor-rido haacute mais de 15 anos As agressotildees sofridas por ela ocasionaram inclusive paraplegia irreversiacutevel

Em razatildeo da toleracircncia do Brasil em promover o processo dos crimes praticados com violecircncia domeacutesti-ca e familiar contra a mulher o Centro pela Justiccedila pelo Direito Internacional (CEJIL) e o Comitecirc Latino-Americano de Defesa dos Direitos da Mulher (CLADEM) juntamente com a viacutetima formalizaram uma denuacutencia agrave Comissatildeo Interamericana de Direitos Humanos da Organizaccedilatildeo dos Estados Americanos (OEA) que eacute um oacutergatildeo internacional responsaacutevel pela anaacutelise de violaccedilatildeo de acordos internacionais

A Comissatildeo da OEA condenou o Estado brasileiro pela excessiva toleracircncia em promover a persecuccedilatildeo do crime praticado com violecircncia agrave mulher e recomendou reforma no sistema legislativo com o desiacuteg-nio de simplificar os procedimentos existentes bem como inserir novas formas para a resoluccedilatildeo de con-flitos (Relatoacuterio 5401 Caso 12051 de 40401 - Maria da Penha Maia Fernandes)

A Comissatildeo recomendou ao Brasil dentre outras medidas ldquoprosseguir e intensificar o processo de refor-ma que evite a toleracircncia estatal e o tratamento discriminatoacuterio com respeito agrave violecircncia domeacutestica con-tra mulheres no paiacutesrdquo particularmente dentre outras ldquosimplificar os procedimentos judiciais penais a fim de que possa ser reduzido o tempo processual sem afetar os direitos e garantias do devido processordquo23

A violecircncia contra a mulher infelizmente ainda nos dias de hoje estaacute marcada intensamente por um traccedilo de prevalecimento o qual por muito tempo foi sustentado e legitimado por tratamento juriacutedico que dava ao homem direitos e benefiacutecios natildeo extensiacuteveis agraves mulheres

Um bom exemplo do que se afirma vem do Direito Constitucional brasileiro a despeito de nossas constituiccedilotildees sempre agasalharem em seu interior a maacutexima ldquotodos satildeo iguais perante a leirdquo sendo que quase a totalidade delas proibiu expressamente qualquer distinccedilatildeo em razatildeo dentre outros de criteacuterios baseados no sexo foram convalidadas e criadas inuacutemeras leis elaboradoras de diferenccedilas contrariando assim as disposiccedilotildees constitucionais Somente com a Carta de 1988 eacute que mulheres e homens no Brasil galgaram a igualdade juriacutedica A isonomia de fato entretanto ainda natildeo foi alcanccedila-da No Brasil dois seacuteculos ainda separam mulheres e homens da igualdade24

5 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

A fim de que avanccedilos possam ser operados com mais agilidade foram criados instrumentos juriacutedicos (nacionais e internacionais) todos no sentido de estabelecer o direito das mulheres agrave natildeo violecircncia como categoria merecedora de uma proteccedilatildeo especial

E o que tem de tatildeo diferente na violecircncia contra a mulher que natildeo se encontra presente quando a viacutetima eacute do sexo masculino e que faz com que sejam necessaacuterios instrumentos especiais (nacionais e interna-cionais) de proteccedilatildeo Eacute que ao contraacuterio da violecircncia contra os homens a violecircncia contra as mulheres encontra-se legitimada socialmente mesmo que cada vez menos Ainda persistem praacuteticas discrimina-

23 OAS Para ver o relatoacuterio da Comissatildeo Interamericana de Direitos Humanos Disponiacutevel em lthttpwwwcidhoasorg

annualrep2000port12051htmgt Acesso em 20 mar 2018

24 Ver a pesquisa completa em lthttpmfolhauolcombrasmais2015091675183-no-ritmo-atual-fim-da-desigualdade-entre-

homens-e-mulheres-demoraria-240-anosshtmlgt Acesso em 20 mar 2018

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toacuterias que colocam a mulher em situaccedilatildeo de inferioridade a respeito dos direitos e liberdades essen-ciais Esse eacute um tema de especial importacircncia principalmente quando se verifica que as praacuteticas discri-minatoacuterias levam agraves praacuteticas violentas e vice-versa

A violecircncia independentemente se dirigida contra o homem ou contra a mulher natildeo deve ser tolerada Embora mais homens do que mulheres sejam viacutetimas quando o tema refere-se ao acircmbito domeacutestico a situaccedilatildeo se inverte por conta das inuacutemeras especificidades que marcam a violecircncia domeacutestica e fami-liar contra a mulher convivecircncia afeto entre as partes filhos em comum interesses patrimoniais vul-nerabilidade dependecircncia econocircmica machismo etc Estas particularidades exigem um tratamento especial singularizado bem como justifica a intervenccedilatildeo do Estado na intimidade da famiacutelia

O Estado brasileiro ao ratificar documentos internacionais de proteccedilatildeo agrave mulher assumiu no plano internacional o compromisso de adotar medidas internas para garantir os direitos das mulheres no acircmbi-to das relaccedilotildees domeacutesticas e familiares A fim de cumprir com tal obrigaccedilatildeo planos metas e estrateacutegias foram estabelecidos bem como e principalmente foram implementadas accedilotildees (poliacuteticas puacuteblicas)

Eacute nesse contexto que surge o debate sobre direitos especificamente femininos - ou melhor sobre direitos historicamente natildeo reconhecidos - e a criaccedilatildeo de instrumentos internacionais que criam con-diccedilotildees de se superar a contiacutenua discriminaccedilatildeo contra as mulheres

Os direitos das mulheres satildeo indissociaacuteveis dos direitos humanos natildeo haacute que se falar em garantia uni-versal de direitos sem que as mulheres enquanto humanas e cidadatildes tenham seus direitos especiacuteficos respeitados Tal afirmaccedilatildeo eacute corolaacuterio do princiacutepio da igualdade que determina natildeo poder a lei fazer qualquer distinccedilatildeo entre indiviacuteduos o que inclui a distinccedilatildeo entre os sexos ou entre os gecircneros

Natildeo obstante os avanccedilos surgidos contudo ainda eacute relevante o tratamento juriacutedico diferenciado para homens e mulheres sobretudo em consequecircncia dos muitos anos de desigualdades materiais e for-mais Enfim o que se espera eacute que se consubstancie de fato a incorporaccedilatildeo de novos comportamentos e a construccedilatildeo de outros contextos culturais nos quais seja desnecessaacuteria a determinaccedilatildeo legal de res-peito a direitos sejam de mulheres sejam de homens e que a dignidade da pessoa natildeo dependa de sexo gecircnero ou orientaccedilatildeo sexual mas que decorra exatamente da igual condiccedilatildeo humana

REFEREcircNCIAS

BIANCHINI Alice Lei Maria da Penha 4 ed Satildeo Paulo Saraiva 2018

CANOTILHO Joseacute Joaquim Gomes Direito Constitucional Coimbra Almedina 1992

CAVALCANTI Stela Valeacuteria Soares de Farias Violecircncia domeacutestica anaacutelise da Lei ldquoMaria da Penhardquo n 1134006 3 ed Salvador Podivm 2010

ESCOBAR CIRUJANO Ana QUINTEROS Andreacutes SAacuteNCHEZ GAMONAL Sara Beleacuten TANDOacuteN RECIO Baacuterbara In PEREZ VIEJO Jesuacutes M HERNAacuteNDEZ Ana Montalvo (Cood) Violencia de geacutene-ro prevencioacuten deteccioacuten y atencioacuten Madrid Grupo 5 2011

JUBILUT Liliana Lyra Combate a violenciahellipDisponiacutevel em lthttplilianajubilutjusbrasilcombrartigos121940395o-combate-a-violencia-contra-a-mulher-no-ambito-da-onugt Acesso em 20 mar 2018

LAMB Christina YOUSAFZAI Malala Eu sou Malala Satildeo Paulo Companhia das Letras 2013

MIRANDA Marcelo Barccedila Alves de LegalidadeDisponiacutevel em lthttpmarcelobarcajusbrasilcombrartigos136584288a-legalidade-do-tratamento-diferenciado-as-mulheres-vitimas-de-violen-cia-domestica-a-luz-do-ordenamento-juridico-patriogt Acesso em 20 mar 2018

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Universidade do Sul de Santa Catarina

Revista Juriacutedica da Universidade do Sul de Santa Catarina

MENDES Gilmar COELHO Inocecircncio Maacutertires BRANCO Paulo Gustavo Gonet Curso de Direito Constitucional Satildeo Paulo Saraiva 2007

NACcedilOtildeES UNIDAS - Informe do Comitecirc para a eliminaccedilatildeo da Discriminaccedilatildeo contra a Mulher - 28ordm periacuteo-do de sessotildees (13 a 31 de Janeiro de 2003) 29ordm periacuteodo de sessotildees (30 de Junho a 18 de Julho de 2003) Disponiacutevel em lthttpwwwspmgovbrassuntosacoes-internacionaisArticulacaoarticulacao-in-ternacionalrecomendacoes-cedaw-traduzido-e-revisado-26-12-03docgt Acesso em 20 mar 2018

FORNTEIRAS DO PENSAMENTO Palestra proferida em 14 de junho de 2011 em Satildeo Paulo 2011

OAS Relatoacuterio da Comissatildeo Interamericana de Direitos Humanos Disponiacutevel em lthttpwwwcidhoasorgannualrep2000port12051htmgt 20 mar 2018

PIMENTEL Silvia Disponiacutevel em lthttpwwwcompromissoeatitudeorgbrconvencao-sobre-a-elimi-nacao-de-todas-as-formas-de-discriminacao-contra-a-mulher-cedaw-1979gt Acesso em 20 mar 2018

SABADELL Ana Lucia Manual de Sociologia Juriacutedica 5 ed Satildeo Paulo RT 2010

TOLEDO VAacuteSQUEZ Patsili FemiciacutedioFeminiciacutedio Buenos Aires Didot 2014

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AS TREcircS VERTENTES DO SISTEMA PENITENCIAacuteIO UMA ANAacuteLISE CRIMINOLOacuteGICA SOCIAL E CARCERAacuteRIA

LAS TRES VERTENTES DEL SISTEMA PENITENCIARIO UNA ANAacuteLISIS CRIMINOLOacuteGICA SOCIAL Y CARCERARIAAndreacuteia Catine Cosme1

Karem Raimondi Martins2

Resumo O presente artigo possui como objetivo expor as trecircs principais vertentes da puniccedilatildeo apon-tando a previsatildeo legal visatildeo carceraacuteria e a visatildeo social apresentando quais os fatores responsaacuteveis pela falta da ressocializaccedilatildeo do apenado apoacutes o cumprimento da pena Utilizando-se do meacutetodo indu-tivo se partindo de um caso isolado sendo ele a vivecircncia da populaccedilatildeo carceraacuteria da Colocircnia Penal Agriacutecola de Palhoccedila analisando a vida e os ocorridos durante o tempo e apoacutes o caacutercere do apenado apontando os resultados da pesquisa e consequentemente trabalhando a proteccedilatildeo e a natureza peda-goacutegica da responsabilizaccedilatildeo das penas e da ressocializaccedilatildeo dos detentos conforme a lei de execuccedilatildeo penal e demais legislaccedilotildees pertinentes Por fim seraacute apontando que talvez a responsabilizaccedilatildeo pela fal-ta da ressocializaccedilatildeo natildeo seja exclusivamente do Estado este tem um papel fundamental mas talvez os maiores responsaacuteveis por essa reinserccedilatildeo do apenado do acircmbito social seja a sociedade em geral

Palavras-chave Colocircnia Penal Agriacutecola Ressocializaccedilatildeo Sociedade

Resumen El presente artiacuteculo tiene como objetivo exponer las tres principales vertientes del castigo apuntan-do a la previsioacuten legal visioacuten carcelaria y la visioacuten social presentando cuaacuteles son los factores responsables por la falta de la resocializacioacuten del apenado despueacutes del cumplimiento de la pena En el caso de que se trate de un caso aislado siendo eacutel la vivencia de la poblacioacuten carcelaria de la Colonia Penal Agriacutecola de Palhoccedila analizan-do la vida y los ocurridos durante el tiempo y despueacutes de la caacutercel del apenado apuntando los resultados de la investigacioacuten y en consecuencia trabajando la proteccioacuten y la naturaleza pedagoacutegica de la responsabilizacioacuten de las penas y de la resocializacioacuten de los detenidos conforme a la ley de ejecucioacuten penal y demaacutes legislaciones pertinentes Por uacuteltimo apuntando que quizaacutes la responsabilizacioacuten por la falta de la resocializacioacuten no sea exclusivamente del Estado eacuteste tiene un papel fundamental pero quizaacutes los mayores responsables de esa rein-sercioacuten del apenado del aacutembito social sea la sociedad en general

Palabras-clave Colonia Penal Agriacutecola Resocializacioacuten La sociedad

1 INTRODUCcedilAtildeO

Atraveacutes dos veiacuteculos midiaacuteticos diariamente recebe-se diversas informaccedilotildees a respeito do constante aumento da criminalidade crimes cometidos a todo o instante cadeias lotadas e aquele sentimento de que a ldquojusticcedilardquo precisa ser feita Devido a esse aumento da praacutetica de crimes resolveu-se pesquisar o que estaacute acarretando estes fatores negativos buscando-se colocar no lugar daqueles que satildeo conside-rados o ldquoproblemardquo pesquisando assim pelas trecircs principais vertentes da puniccedilatildeo ou seja a previsatildeo legal a visatildeo carceraacuteria e a visatildeo social

1 Mestre em Sociologia Poliacutetica pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) Graduada em Ciecircncias Sociais pela Universidade

Federal de Santa Catarina (UFSC) e Professora da Universidade do Sul de Santa Catarina (UNISUL) E-mail andreiacosmeunisulbr

2 Poacutes Graduanda em Direito Penal e Criminologia pelo Centro Universitaacuterio Internacional (UNINTER) e Graduada pela Universidade do

Sul de Santa Catarina (UNISUL) E-mail karemraimondigmailcom

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Atualmente se vive em um mundo onde os valores estatildeo invertidos no qual o indiviacuteduo natildeo ousa se colocar no lugar do proacuteximo natildeo se submete a pensar que talvez aquela triste situaccedilatildeo pudesse ser em seu lar com seu familiar com aquele que ama devido a isto se pretende fazer com que cada leitor con-siga vislumbrar qual a sua responsabilidade para com a ressocializaccedilatildeo do apenado

A fim de que o presente artigo natildeo fosse uacutenico e exclusivamente baseado em pesquisa bibliograacutefica se optou pela realizaccedilatildeo de pesquisa de campo sendo realizada a mesma na Colocircnia Penal Agriacutecola localizada na cidade de PalhoccedilaSC para que assim conseguisse enxergar pelos olhos daqueles que se encontram atraacutes dos altos muros qual a real realidade ocorrida apoacutes a condenaccedilatildeo conhecendo assim suas histoacuterias de vida e os motivos que os levaram a chegar ateacute ali tentando assim compreender uma realidade completamente diferente da que se encontra do lado de fora

Para a realizaccedilatildeo de tal projeto foi necessaacuteria a submissatildeo do mesmo perante o Comitecirc de Eacutetica em Pesquisa com Seres Humanos sendo aprovado atraveacutes do nuacutemero 69171417300005369

A pesquisa eacute de suma importacircncia objetivando desmentir algumas inverdades que haacute anos satildeo profe-ridas e disseminadas onde se atribui a culpa apenas ao outro quando o assunto eacute a ressocializaccedilatildeo do apenado apoacutes o cumprimento de sua pena

A problematizaccedilatildeo central do presente artigo eacute se ldquoO sistema penitenciaacuterio atual promove a ressociali-zaccedilatildeo do apenadordquo encontrando assim a real problemaacutetica deste sistema e a possiacutevel soluccedilatildeo cabiacutevel que ajudaraacute a entender este problema social que haacute muito tempo se faz presente na sociedade

O meacutetodo utilizado eacute o indutivo partindo-se de um caso isolado sendo ele a vivecircncia da populaccedilatildeo carceraacuteria da Colocircnia Penal Agriacutecola de Palhoccedila averiguando a vida e os ocorridos durante o tempo e apoacutes o caacutercere do apenado para que ao fim consiga-se apresentar os resultados da pesquisa e conse-quentemente trabalhar a proteccedilatildeo e a natureza pedagoacutegica da responsabilizaccedilatildeo das penas e da resso-cializaccedilatildeo dos detentos conforme a lei de execuccedilatildeo penal e demais legislaccedilotildees pertinentes O que for encontrado na pesquisa seraacute contrastado com a promessa de ressocializaccedilatildeo efetiva

Utiliza-se da metodologia qualitativa pois realizou-se pesquisa de campo sendo elaborado e apre-sentado questionaacuterios para com a populaccedilatildeo carceraacuteria da Colocircnia Penal Agriacutecola fazendo com que a vivecircncia daqueles que estatildeo encarcerados seja objeto de estudo para o presente artigo

2 A PENITENCIAacuteRIA UMA ANAacuteLISE EMPIacuteRICA

Objetivando compreender melhor o sistema carceraacuterio seratildeo aprofundadas as trecircs principais verten-tes deste sistema primeiramente a previsatildeo legal dispondo o que a lei penal brasileira define a sua principal caracteriacutestica a funccedilatildeo ressocializadora demonstrando se esta realmente se faz eficaz na praacutetica posteriormente a visatildeo carceraacuteria almejando enxergar pelos olhos daqueles que pouco satildeo ouvidos os que se encontram atraacutes dos altos muros onde natildeo possuem voz e mesmo apoacutes a quitaccedilatildeo de sua pena parecem permanecer sem esta caracteriacutestica e por uacuteltimo seraacute exposto a visatildeo social procu-rando demonstrar o senso comum estabelecido pela sociedade

21 ANAacuteLISE CRIMINAL

O ser humano vive em sociedade e para o bom e perfeito conviacutevio se faz necessaacuterio uma boa conduta conduta esta que sempre deveraacute estar descrita para que todos possam ter conhecimento do que eacute permi-tido e o que eacute proibido tendo total ciecircncia para que natildeo venha agir de maneira contraacuteria ao estabelecido

Atualmente o poder de puniccedilatildeo se encontra nas matildeos do Estado estando as regras previstas no Coacutedigo Penal3 prevendo que os atos contraacuterios ao bem comum ocasionaratildeo uma puniccedilatildeo devendo o agente praticante de tal ato ser responsabilizado pela sua conduta

3 BRASIL Lei no 2848 de 7 de dezembro de 1940 Coacutedigo Penal Disponiacutevel em lthttpwwwplanaltogovbrccivil_03decreto-lei

Del2848compiladohtmgt Acesso em 05 out 2017

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Segundo Joatildeo Farias Juacutenior

O Direito Penal natildeo quer saber de fatores criminoacutegenos Haveria um paradoxo contrariaria

seus proacuteprios fundamentos se o Direito Penal se preocupasse com fatores criminoacutegenos

uma vez que ele se funda no livre-arbitrismo Ele natildeo quer saber das indagaccedilotildees sobre as

razotildees por que o homem se torna criminoso por que sua personalidade natildeo se harmoniza

com as normas e padrotildees de boa convivecircncia em sociedade das razotildees da criminalidade Se

esta oscila se se expande se estaacute causando intranquilidade se a criminalidade alcanccedilou um

estaacutegio de inseguranccedila nada disso importa quer dar soluccedilatildeo atraveacutes da ativaccedilatildeo do poder

punitivo do Estado Ele tem elencado em seu contexto a tipologia dos fatos cada fato aiacute descrito

corresponde abstratamente a um crime e cada crime corresponde por sua vez a uma pena4

Segundo Vigne

Consoante as legislaccedilotildees mais recentes traduzindo o discurso oficial a pena deixa de ter caraacuteter

retributivo e passa a ser aplicada sob a justificativa de ser necessaacuteria para reeducar o criminoso

oportunizando-lhe condiccedilotildees de regresso e conviacutevio com a sociedade5

Conforme Baratta

O efeito cataacutertico da pena e o processo de identificaccedilatildeo da sociedade com o delinquente satildeo

os dois aspectos de uma teoria psicoloacutegica do direito penal segundo a qual as duas concepccedilotildees

fundamentais da pena a concepccedilatildeo retributiva e a concepccedilatildeo preventiva natildeo satildeo mais que

racionalizaccedilotildees de fenocircmenos que fundam suas raiacutezes no inconsciente da psique humana []

Ambas transferem a funccedilatildeo da pena para o resultado futuro que consiste em influenciar a

coletividade ou o autor do delito6

Diferentemente da aplicaccedilatildeo das sanccedilotildees no princiacutepio agora as mesmas tecircm um propoacutesito mais ceacutelere buscando punir o agente praticante do crime mas natildeo com uma pena eterna mas sim como uma espeacute-cie de castigo com tempo determinado para que este reflita sobre o ato cometido e natildeo volte a praticar novamente Aleacutem dessa funccedilatildeo ressocializadora a pena tambeacutem tem sua funccedilatildeo preventiva fazendo com que todos possam ter conhecimento das consequecircncias referentes as accedilotildees previstas como proi-bidas objetivando que de certa forma possa prevenir que as pessoas pratiquem crimes pois teratildeo a convicccedilatildeo de que sofreratildeo seacuterias consequecircncias7

Augusto Thompson aduz sobre a real finalidade da pena de prisatildeo

Propotildeem-se oficialmente como finalidade da pena de prisatildeo a obtenccedilatildeo natildeo de um mas de

vaacuterios objetivos concomitantes

- puniccedilatildeo retributiva do mal causado pelo delinquente

- prevenccedilatildeo da praacutetica de novas infraccedilotildees atraveacutes da intimidaccedilatildeo do condenado e de pessoas

potencialmente criminosas

- regeneraccedilatildeo do preso no sentido de transformaacute-lo de criminoso em natildeo criminoso8

4 FARIAS JUacuteNIOR Joatildeo Manual de Criminologia 3 ed Curitiba Juruaacute 2006 p 35-36

5 VIGNE Valmor Prisatildeo e Ressocializaccedilatildeo Dissertaccedilatildeo (mestrado) - Universidade Federal de Santa Catarina Centro de Ciecircncias Juriacutedica

2001 p 05 Disponiacutevel em ltfileCUsersAdminDesktopPrevidenciC3A1rio179236pdf gt Acesso em 05 out 2017

6 BARATTA Alessandro Criminologia Criacutetica e Criacutetica do Direito Penal Traduccedilatildeo Juarez Cirino dos Santos Rio de Janeiro Revan

Instituto Carioca de Criminologia 6 ed Outubro de 2011 3 reimp ago 2016 p51

7 GRECO Rogeacuterio Curso de Direito Penal 15 ed Rio de Janeiro Impetus 2013 p 476

8 THOMPSON Augusto A Questatildeo Penitenciaacuteria 5 ed Rio de Janeiro Forense 2002 p3

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Conforme Foucault

A recuperaccedilatildeo do condenado como objetivo principal da pena eacute um princiacutepio sagrado cuja

apariccedilatildeo formal no campo da ciecircncia e principalmente no da legislaccedilatildeo eacute bem recente (Congresso

Penitenciaacuterio de Bruxelas 1847) [E a comissatildeo amor de maio de 1945 repete fielmente] A pena

privativa de liberdade tem como objetivo principal a recuperaccedilatildeo e a reclassificaccedilatildeo social do

condenado (Princiacutepio da correccedilatildeo)9

Fazendo uma espeacutecie de analogia a pena pode ser vista como um castigo dado pelo pai para com a crianccedila que desobedeceu uma forma de fazer com que ela aprenda que consiga visualizar o erro que cometeu que natildeo venha repeti-lo mas o castigo tem que ter um tempo determinado para que depois a crianccedila vol-te a brincar No caso do agente praticante do crime a pena tem que cumprir seu papel de punir prevenir mas acima de tudo ressocializar fazendo com que o indiviacuteduo volte a ser inserido na sociedade

Apoacutes a praacutetica do crime o indiviacuteduo seraacute processado julgado e condenado a pena compatiacutevel com o ato que outrora cometeu a partir desse momento iniciaraacute o cumprimento de sua pena estando previsto na Lei nordm 7210 de 11 de julho de 1984 a Lei de Execuccedilatildeo Penal10 como deveraacute ser o cumprimento desta pena

De acordo com Foucault

A justa duraccedilatildeo da pena deve portanto variar natildeo soacute com o ato e suas circunstancias mas com

a proacutepria pena tal como ela se desenrola concretamente O que equivale a dizer que se a pena

deve ser individualizada natildeo eacute a partir do indiviacuteduo-infrator sujeito juriacutedico de seu ato autor

responsaacutevel do delito mas a partir do indiviacuteduo punido objeto de uma mateacuteria controlada de

transformaccedilatildeo o indiviacuteduo em detenccedilatildeo inserido no aparelho carceraacuterio modificado por este

ou a ele reagindo11

Nesse periacuteodo em que o agente praticante do crime fica recluso este estaraacute sob responsabilidade total do Estado devendo o mesmo arcar com as custas referentes ao apenado e dar total suporte conforme prevecirc os artigos 10 e 11 da Lei de Execuccedilatildeo Penal

Art 10 A assistecircncia ao preso e ao internado eacute dever do Estado objetivando prevenir o crime e

orientar o retorno agrave convivecircncia em sociedade

Paraacutegrafo uacutenico A assistecircncia estende-se ao egresso

Art 11 A assistecircncia seraacute

I - material

II - agrave sauacutede

III -juriacutedica

IV - educacional

V - social

VI - religiosa12

9 FOUCAULT Michel Vigiar e Punir nascimento da prisatildeo 38 ed Petroacutepolis Vozes 2010 p 255

10 BRASIL Lei nordm 7210 de 11 de julho de 1984 Lei de Execuccedilatildeo Penal Disponiacutevel em lthttpwwwplanaltogovbrccivil_03leis

L7210compiladohtm gt Acesso em 05 out 2017

11 FOUCAULT Michel Vigiar e Punir nascimento da prisatildeo 38 ed Petroacutepolis Vozes 2010 p 231

12 BRASIL Lei nordm 7210 de 11 de julho de 1984 Lei de Execuccedilatildeo Penal Disponiacutevel em lthttpwwwplanaltogovbrccivil_03leis

L7210compiladohtm gt Acesso em 05 out 2017

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De acordo com Baratta

O caacutercere vem a fazer parte de um continuum que compreende famiacutelia escola assistecircncia

social organizaccedilatildeo cultural do tempo livre preparaccedilatildeo profissional universidade e instruccedilatildeo

dos adultos O tratamento penitenciaacuterio e a assistecircncia poacutes-penitenciaacuteria previstas pelas ovas

legislaccedilotildees satildeo um setor altamente especializado deste continuum dirigido a recuperar atrasos

de socializaccedilatildeo que prejudicam indiviacuteduos marginalizados assim como as escolas especiais

tendem a recuperar os menores que se revelaram inadaptados agrave escola normal Ambas satildeo

instituiccedilotildees especializadas para a integraccedilatildeo de uma minoria de sujeitos desviantes13

Conforme a Declaraccedilatildeo Universal dos Direitos Humanos no seu artigo 5ordm ldquoNingueacutem seraacute submetido a tortura nem a penas ou tratamentos crueacuteis desumanos ou degradantesrdquo14

Segundo Almeida de Jesus

As ideias implantadas na LEP tecircm como base a efetivaccedilatildeo da execuccedilatildeo penal como sendo forma de

preservar os bens juriacutedicos e de reinserccedilatildeo da pessoa que praticou um delito agrave sociedade Visa combater

o excesso ou o desvio da execuccedilatildeo penal que ameaccedila a dignidade ou a humanidade ao aplicar a pena15

De acordo com toda a previsatildeo legal o indiviacuteduo praticante do crime deveraacute quitar sua diacutevida para com a sociedade cumprindo sua pena mas de maneira humanitaacuteria sem tratamentos crueacuteis desumanos ou atraveacutes de qualquer tipo de tortura sendo tais accedilotildees totalmente proibidas pela legislaccedilatildeo vigente O maior objetivo eacute a retirada do indiviacuteduo da sociedade passando um tempo recluso para que cumpra a pena do crime que prati-cou poreacutem apoacutes este periacuteodo o mesmo deveraacute ser reinserido no acircmbito social para que decirc continuidade a sua vida que o tempo de encarceramento sirva para aprender com o erro cometido e que natildeo retorne a praticaacute-lo

22 VISAtildeO CARCERAacuteRIA

Neste toacutepico seraacute abordado de uma forma geral sobre o sistema carceraacuterio de Santa Catarina e de maneira mais especiacutefica a respeito da Colocircnia Penal Agriacutecola localizada na cidade de Palhoccedila

O Estado de Santa Catarina possui 35 (trinta e cinco) estabelecimentos prisionais fracionados da seguinte maneira 05 (cinco) Penitenciaacuterias 01 (uma) Colocircnia Agriacutecola 01 (um) Centro de Observaccedilatildeo Criminoloacutegica e Triagem 01 (um) Hospital de Custoacutedia e Tratamento Psiquiaacutetrico e 27 (vinte e sete) Presiacutedios16

Objetivando uma pesquisa mais ceacutelere foram buscadas natildeo apenas em informaccedilotildees em doutrinas mas sim na produccedilatildeo de dados atraveacutes de pesquisa de campo sendo a mesma realizada na unidade peniten-ciaacuteria Colocircnia Penal Agriacutecola localizada na cidade de Palhoccedila

Conforme Dias

Em 1988 foi adquirida uma aacuterea de 74 (setenta e quatro) hectares no municiacutepio de Palhoccedila

com a finalidade de se construir uma nova Penitenciaacuteria o que natildeo ocorreu devido a intensas

manifestaccedilotildees populares contraacuterias ao empreendimento proposto Assim gradativamente

13 BARATTA Alessandro Criminologia Criacutetica e Criacutetica do Direito Penal Traduccedilatildeo Juarez Cirino dos Santos Rio de Janeiro Revan

Instituto Carioca de Criminologia 6 ed Outubro de 2011 3 reim 2016 p 169 grifo do autor

14 ORGANIZACcedilAtildeO DAS NACcedilOtildeES UNIDAS Declaraccedilatildeo Universal dos Direitos Humanos Disponiacutevel em lt httpswwwuniceforg

brazilptresources_10133htm gt Acesso em 13 out 2017

15 ALMEIDA Cintia Jesus de A importacircncia do trabalho na ressocializaccedilatildeo do preso aplicaccedilatildeo efetiva da Lei de Execuccedilatildeo Penal

Disponiacutevel em lthttpsjuridicocertocompalmeidaadvocaciaartigosa-importancia-do-trabalho-na-ressocializacao-do-preso-

aplicacao-efetiva-da-lei-de-execucao-penal-802gt Acesso em 25 out 2017

16 SANTA CATARINA Plano Diretor do Sistema Penitenciaacuterio do Estado de Santa Cataria Disponiacutevel em lthttpwwwjusticagovbr

seus-direitospolitica-penalarquivosplano-diretoranexos-plano-diretorpdsp_scpdfgt Acesso em 05 out 2017

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Revista Juriacutedica da Universidade do Sul de Santa Catarina

foram implementadas atividades agropecuaacuterias no local surgindo entatildeo o que mais tarde

seria conhecido como Colocircnia Penal Agriacutecola com o emprego de um nuacutemero muito reduzido de

detentos A partir de 1998 foram construiacutedas novas instalaccedilotildees possibilitando que um nuacutemero

maior de apenados pudesse ser envolvido nas atividades laacute desenvolvidas17

A fim de obter informaccedilotildees de melhor precisatildeo realizou-se visita em quatro dias alternados na Colocircnia Penal Agriacutecola de Palhoccedila visando entrevistar detentos agentes penitenciaacuterios e o diretor da respec-tiva unidade carceraacuteria ocasiatildeo em que foi possiacutevel extrair dados que embasaratildeo o presente artigo

A pesquisa contou com a participaccedilatildeo de 20 (vinte) detentos 5 (cinco) agentes penitenciaacuterios e 1 (um) diretor sendo comunicado a todos a importacircncia da respectiva pesquisa e o assunto o qual a mesma se tratava estando todos cientes cada entrevistado assinou o respectivo TCLE ndash Termo de Consentimento Livre e Esclarecido autorizando a utilizaccedilatildeo das informaccedilotildees para uso exclusivamente acadecircmico permanecendo seus dados pessoais sobre total sigilo

Conforme informaccedilotildees do diretor da unidade carceraacuteria a mesma possui capacidade para 450 (qua-trocentos e cinquenta) apenados estando preenchida em sua totalidade natildeo havendo superlotaccedilatildeo como diversas outras unidades carceraacuterias

Os apenados possuem uma rotina regrada iniciando o dia agraves 6 horas com o cafeacute agraves 7 horas comeccedila o trabalho agraves 12 horas tem a pausa para o almoccedilo agraves 15 horas eacute a troca de turno agraves 18 horas o jantar agraves 21 horas a ceia por fim agraves 23 horas satildeo todos os apenados recolhidos

De acordo com os relatos a unidade carceraacuteria foi construiacuteda em 1988 natildeo passando por moderniza-ccedilotildees consideraacuteveis os quais pudessem a transformar em algo melhor e mais atual prevalecendo assim maior parte da estrutura referente a construccedilatildeo inicial

Conforme a Lei de Execuccedilatildeo Penal o Estado deve possibilitar que o apenado tenha acesso aos estudos sendo algo de suma importacircncia conforme o que foi narrado pelo diretor a unidade oferece supletivo e estudos para o Exame Nacional do Ensino Meacutedio (Enem) sendo que cerca de 30 (trinta por cento) dos apenados frequentam as aulas e no ano passado 6 (seis) deles conseguiram obter ecircxito no Enem

Durante uma das entrevistas realizadas pela pesquisadora o apenado narrou que primeiramente ini-ciou os estudos objetivando a remissatildeo mas conforme foi estudando foi se interessando cada vez mais pelos estudos Relatou que realizou a primeira prova do Exame Nacional do Ensino Meacutedio (Enem) e aca-bou obtendo nota zero na redaccedilatildeo poreacutem combinou com o colega de cela que iria tentar novamente foi entatildeo que conseguiu um livro de estudos para o Enem e ficou treinando ao decorrer do ano e para a sua felicidade o mesmo conseguiu a tatildeo sonhada aprovaccedilatildeo conseguindo validar seus estudos pelo exame O apenado contou sua histoacuteria cheio de esperanccedila no olhar manifestando o seu desejo de con-tinuar os estudos apoacutes o cumprimento da pena sonhando com uma futura faculdade para auxiliaacute-lo na mudanccedila de vida

Cabe ressaltar que foram entrevistados 20 (vinte) apenados e que no comeccedilo demonstravam estar com um certo receio da pesquisa talvez desconfiados do porquecirc da convocaccedilatildeo mas esse possiacutevel des-conforto durou pouco a cada pergunta eles iam se soltando mais narrando suas histoacuterias de vida con-tando com orgulho da famiacutelia que os espera laacute fora falando sobre os filhos a esposa e todos os sonhos que ainda pretendem realizar Por diversas vezes eles riram com a pesquisadora e ateacute mesmo se emo-cionaram pelas circunstacircncias que os fizeram chegar ateacute ali

O questionaacuterio aplicado era composto com 20 (vinte) questionamentos sendo facilmente respondi-do em menos de 10 (dez) minutos poreacutem este foi um caacutelculo que natildeo se pode efetuar com ecircxito visto que cada apenado queria contar sua vida seus desejos para o futuro seus sonhos queriam apenas

17 DIAS Faacutebio Coelho A penitenciaacuteria de Florianoacutepolis e sua evoluccedilatildeo no tempo Disponiacutevel em lthttpwwwambito-juridicocombr

siteindexphpn_link=revista_artigos_leituraampartigo_id=8454gtAcesso em 05 out 2017

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um algueacutem para lhes ouvir a solidatildeo eacute o sentimento que mais os acompanha Um exemplo disso foi um senhor de 74 (setenta e quatro) anos de idade com o ensino fundamental incompleto que mal sabia escrever seu nome e antes mesmo do iniacutecio da entrevista ele jaacute se adiantou quis contar toda a sua his-toacuteria explicando que estava ali injustamente que acreditou em uma pessoa e acabou sendo condena-do Se este eacute culpado ou inocente natildeo cabe a pesquisadora julgar naquele momento ele natildeo precisava de mais um julgador mas sim um ouvinte um algueacutem que lhe escutasse e a entrevista que deveria ser de poucos minutos acabou levando mais de meia hora

Conforme Foucault

Pelo fato tambeacutem de que a solidatildeo realiza uma espeacutecie de auto-regulaccedilatildeo da pena e permite

uma como que individualizaccedilatildeo espontacircnea do castigo quanto mais o condenado eacute capaz de

refletir mas ele foi culpado de cometer seu crime mas mais tambeacutem o remorso seraacute vivo e a

solidatildeo dolorosa em compensaccedilatildeo quando estiver profundamente arrependido e corrigido

sem a menor dissimulaccedilatildeo a solidatildeo natildeo lhe seraacute mais pesada18

Cada apenado que foi entrevistado narrou o crime pelo qual foi condenado e o tempo de condenaccedilatildeo havendo diversos crimes variando em roubo furto homiciacutedio estupro de vulneraacutevel latrociacutenio traacutefi-co porte de arma receptaccedilatildeo entre outros Poreacutem o que mais chamou a atenccedilatildeo foi a quantidade de condenaccedilotildees por traacutefico de drogas sendo este resultado jaacute narrado anteriormente pelo diretor o qual afirmou que o maior nuacutemero de apenados que a unidade recebe eacute por traacutefico de drogas estando essas substacircncias iliacutecitas conseguindo acabar com a vida das pessoas de todas as formas quando natildeo eacute pelo consumo eacute pela venda

Alguns dos apenados entrevistados os quais possuem condenaccedilatildeo por traacutefico aduziram que acabaram nessa vida devido ao modo mais faacutecil de conseguir dinheiro chegando a ganhar R$500000 (cinco mil reais) por dia apenas com a venda da substacircncia poreacutem essa raacutepida maneira de ganhar dinheiro tem um preccedilo muito caro Um dos apenados relatou que ldquograna nenhuma paga a liberdaderdquo outro aduziu que ldquoo cara ganha dinheiro faacutecil mas depois acaba perdendo tudo com advogadordquo

Um dos apenados ao ser entrevistado demonstrava ser mais duratildeo com um modo de responder em poucas palavras mas assim que foi perguntado sobre o seu maior arrependimento este amoleceu com-pletamente falou sobre a infacircncia difiacutecil que ainda crianccedila sua matildee o abandonou devido as constantes agressotildees de seu genitor Apoacutes o abandono da matildee o pai continuava a agredi-lo cada vez com maior frequecircncia levando-o a fugir de casa com apenas 9 (nove) anos de idade sozinho com fome e machu-cado este teve que aprender cedo a se virar sozinho fazendo com que assim caiacutesse no mundo do crime Com relaccedilatildeo ao seu arrependimento este informou que seu maior desejo era poder ter estudado mas que agora ele faraacute diferente possui 10 (dez) netos que aguardam o seu retorno e que assim que sair vai voltar para a sua famiacutelia e cuidar dos pequenos

O desejo do retorno aos estudos foi quase que unacircnime praticamente todos partilhando da mesma vontade manifestavam-se no sentido de que hoje conseguiam entender que o estudo eacute fundamental e que sem ele tudo se torna mais difiacutecil Durante a entrevista a pesquisadora foi a responsaacutevel por anotar as respectivas respostas tendo o apenado apenas que assinar o TCLE e essa a simples accedilatildeo de escrever o seu nome jaacute era algo muito difiacutecil muitos deles sentiam grande dificuldade e acabavam narrando que possuiacuteam pouco estudo tendo o ensino fundamental incompleto Contudo um dos entrevistados agiu de maneira diversa primeiramente porque falava muito bem e quando foi escrever seu nome a letra era totalmente legiacutevel e com boa grafia a pesquisadora entatildeo perguntou sua escolaridade este informou que possuiacutea o ensino superior incompleto que havia iniciado o curso de Direito mas que natildeo conseguiu terminar devido sua posterior condenaccedilatildeo pelo crime de traacutefico de drogas mas relatou que passar por essa experiecircncia o fez ficar mais maduro e que assim que recuperasse sua liberdade iria retornar a

18 FOUCAULT Michel Vigiar e Punir nascimento da prisatildeo 38 ed Petroacutepolis Vozes 2010 p 223

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faculdade dando prosseguimento ao seu sonho de ser advogado Ao final foi perguntado o que ele faria de diferente se pudesse volta no tempo poreacutem o mesmo afirmou que ldquoNada faria tudo igual temos que nos arrepender do que natildeo fazemos a profissatildeo que escolhi o sistema iraacute me ajudar vejo isso como uma Poacutes antecipadardquo

O uacuteltimo apenado o qual foi entrevistado contou que havia conseguido a possibilidade de trabalhar na rua natildeo precisando voltar para a unidade porem sofreu um seacuterio acidente no qual perdeu algumas pontas dos dedos ficando impossibilitado de trabalhar por um periacuteodo ocasionando assim seu retorno agrave Colocircnia poreacutem pediu para Deus e em poucos dias de retorno jaacute conseguiu um emprego na unidade neste momento ele se emocionou disse que Deus eacute muito bom e que eacute nele que confia Outro apenado tambeacutem falou sobre a religiatildeo que nesse periacuteodo de encarceramento o melhor jeito de sobreviver a tudo isso eacute atraveacutes da feacute em Deus pois caso contraacuterio o indiviacuteduo natildeo aguenta a pressatildeo

A religiatildeo tem um papel de grande importacircncia na vida dos apenados conforme narrou Varella em sua obra

De iniacutecio foi condenado a dezoito anos Oito meses depois no juacuteri seguinte pegou 112 de uma soacute

vez A pena total ficou em 130 anos e nove meses

- Eu abati um pouco Mas natildeo mudei de vida ateacute piorei para pior Fui para o pavilhatildeo Nove Laacute eu

queria apresentar que era bandido perigoso Chegava no cara e dizia vocecirc eacute de ver Se eacute noacutes

vamos trocar agora Aiacute se ele natildeo queria trocar eu falava entatildeo vocecirc deixa a televisatildeo as coisas

suas e pode atravessar para o Cinco que eacute o teu lugar Eu pensava que a minha vida natildeo tinha

mais jeito jaacute que era para morrer na cadeia natildeo custava que fosse hoje Se tinha que ser esse o

meu destino que secircsse

Entatildeo veio um dia de chuva Para se abrigar ele encostou na parede junto aacute igreja no teacuterreo do

Nove e sem querer ouviu a pregaccedilatildeo do pastor

- A Biacuteblia diz em Isaiacuteas capiacutetulo 9 verso 6 que Jesus Cristo eacute o Conselheiro eacute o Deus forte Pai

da Eternidade e Priacutencipe da Paz Vocecirc que vive na vida errada Deus tem um plano para vocecirc

Venha hoje para Jesus que amanhatilde pode ser tarde Natildeo importa se eacute bandido quantos matou

Jesus Cristo faz questatildeo de perdoar vocecirc com todos os teus pecados te tirar das trevas e operar

uma obra na sua vida

Valente chegou um pouco para dentro Sentiu que o Espiacuterito Santo de Deus falava pela boca

do pastor

- Quem quer aceitar Jesus Quem quer levanta a matildeo

[]

Valente obedeceu e caiu no choro

- Arrependi dos crimes da raparigagem e das maldades Chorei feito nenecirc no colo da matildee

Quando levantou estava desanuviado Sentiu o perdatildeo do Senhor pousar em sua fonte19

Em uma das entrevistas um dos apenados relatou que a pior coisa dentro da unidade carceraacuteria era o conviacutevio com os demais apenados No mesmo sentido dispotildee Augusto Thompson

[] o significado da vida carceraacuteria natildeo se resume a mera questatildeo de muros e grades de celas e

trancas ele deve ser buscado atraveacutes da consideraccedilatildeo de que a penitenciaacuteria eacute uma sociedade

dentro de uma sociedade uma vez que nela foram alteradas drasticamente numerosas feiccedilotildees

da comunidade livre20

Augusto Thompson continua aduzindo que ldquonatildeo eacute a solidatildeo que perturba os indiviacuteduos na comunidade carceraacuteria mas sim a vida em massardquo21

19 VARELLA Drauzio Estaccedilatildeo Carandiru Satildeo Paulo Companhia das Letras 1999 p 277-278

20 THOMPSON Augusto A Questatildeo Penitenciaacuteria 5 ed Rio de Janeiro Forense 2002 p 22

21 Idem p 23

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Diversos apenados narraram o quanto eacute difiacutecil viver e conviver no meio desta sociedade carceraacuteria que eacute necessaacuterio muito esforccedilo para natildeo se contaminar com este meio que eacute preciso muito foco para natildeo se envolver com as diversas accedilotildees ilegais que ocorrem dentro da unidade como o uso constante de entor-pecentes e os celulares que por diversas vezes satildeo levados para dentro da unidade devendo-se sempre manter a ordem para natildeo perderem seus benefiacutecios

Algo que tambeacutem foi citado pelos apenados foi o tratamento o qual recebem que satildeo diariamente tratados com total desrespeito sem qualquer educaccedilatildeo um deles aduziu que ldquopoxa educaccedilatildeo eacute algo que aprendemos em casa eles nos tratam como lixordquo Durante as visitas foi possiacutevel visualizar algumas cenas onde realmente houve excesso de autoridade sendo os apenados chamados e ordenados sem-pre atraveacutes de gritos onde visivelmente natildeo haacute qualquer respeito para com eles

De acordo com Alvim

O apenado ao ser tratado com dignidade e respeito vecirc que eacute possiacutevel recuperar-se e natildeo mais

ter uma vida delituosa como antes Tal fato implicaraacute diretamente na vida dele proacuteprio e tambeacutem

na vida da sociedade que sentiraacute os efeitos de tal recuperaccedilatildeo os iacutendices de violecircncia iratildeo baixar

e a qualidade de vida iraacute melhorar22

Ao entrevistar um dos agentes penitenciaacuterios foi perguntado ao mesmo o que ele pensava sobre a atuaccedilatildeo dos direitos humanos frente a problematizaccedilatildeo do sistema carceraacuterio este respondeu que ldquoDireitos humanos para humanos de direitosrdquo

Segundo Farias Juacutenior

Se queres que algueacutem seja melhor do que eacute trata-o para que ele passe a ser melhor atraveacutes de

tratamento recuperacional se quiseres que algueacutem seja pior do que eacute trata-o como se jaacute fosse

pior avilta-o execra-o degrada-o moralmente e eacute o que a pena faz torna o delinquente cada vez

pior porque a partir da poliacutecia passando pela justiccedila criminal e o sistema prisional ele eacute tratado

como se fosse pior eacute aviltado eacute execrado e eacute degradado moralmente O que pode esperar

Altiacutessimo iacutendice de reincidecircncia23

Com relaccedilatildeo ao retorno dos mesmos a sociedade foi questionado se acreditavam que teriam dificulda-des de arrumar emprego alguns informaram que desejavam sair e montar seu proacuteprio negoacutecio outros que pretendiam continuar atuando na aacuterea que jaacute atuavam anteriormente trabalhando como pedrei-ro pois assim poderia trabalhar para si mesmo outros jaacute informaram que eacute muito difiacutecil pois a socie-dade natildeo estaacute preparada para os receber pois natildeo querem dar emprego para um ex detento que assim que averiguam que o mesmo possui antecedentes jaacute o excluem do polo trabalhista se tornando dificul-toso retornar a vida em sociedade

Um dos detentos narrou que eacute difiacutecil pois ele tem famiacutelia para sustentar quando sair teratildeo pessoas que dependem dele que precisa colocar comida dentro de casa e que pela falta de oportunidade oferecida pela sociedade faz com que muitos retornem para a vida do crime natildeo por escolha mas pela necessidade

Em uma das primeiras conversas com o diretor da unidade este relatou sobre o grande problema da falta de ressocializaccedilatildeo que muitas vezes se coloca a culpa no Estado mas a sociedade natildeo quer fazer a sua parte que cada indiviacuteduo que praticou o crime eacute marcado como uma espeacutecie de tatuagem natildeo permanecendo a pena apenas durante o tempo de sua condenaccedilatildeo mas sim eternamente visto que a sociedade sempre os enxergaraacute como ex detentos Tal assunto iraacute se abordar no toacutepico posterior

22 ALVIM Wesley Botelho A ressocializaccedilatildeo do preso brasileiro 2006 Disponiacutevel em lthttpwwwdireitonetcombrartigos

exibir2965A-ressocializacao-do-preso-brasileirogt Acesso em 25 out 2017

23 FARIAS JUacuteNIOR Joatildeo Manual de Criminologia 3 ed Curitiba Juruaacute 2006 p 252

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23 VISAtildeO SOCIAL

Apoacutes passar pela previsatildeo legal e a visatildeo carceraacuteria se faz necessaacuterio enxergar o lado da sociedade se aprofundando um pouco mais nesta vertente

Atualmente se vive em um mundo cada vez mais violento jornais revistas televisotildees raacutedios transmitem diariamente notiacutecias sobre as constantes violecircncias ocorridas no acircmbito social inocentes sendo mor-tos famiacutelias sendo destruiacutedas crianccedilas violentadas mulheres estupradas roubo furto venda de iliacutecitos diversas satildeo as praacuteticas de crimes ocorridas diariamente Devido a todas estas circunstacircncias a socieda-de se encontra em um momento difiacutecil onde o sentimento de impunidade os toma mas juntamente com esse sentimento vem a vinganccedila muitas vezes retornando a Lei de Taliatildeo ldquoolho por olho dente por denterdquo

Vive-se em um momento em que natildeo se traz o criminoso para perto eacute como se o mesmo estivesse dis-tante que jamais fosse acontecer na famiacutelia de algueacutem natildeo sendo possiacutevel nunca o seu filho pai matildee irmatilde ou ateacute mesmo um amigo tomar uma decisatildeo errada ou por situaccedilatildeo alheia a sua vontade ir parar atraacutes das grades todas essas possibilidades jamais passaratildeo pela cabeccedila pois segundo alguns ldquoo crime eacute uma escolhardquo

A sociedade natildeo quer apenas que o indiviacuteduo praticante do crime cumpra sua pena mas sim que sofra que pague severamente pelo que fez muitos cogitam e apoiam a volta da prisatildeo perpeacutetua ou ateacute mesmo da pena de morte pois ldquobandido bom eacute bandido mortordquo

Segundo Foucault

[] A pena transforma modifica estabelece sinais organiza obstaacuteculos Qual seria sua utilidade

se se tornasse definitiva Uma pena que natildeo tivesse termo seria contraditoacuteria todas as restriccedilotildees

por ela impostas ao condenado e que voltando a ser virtuoso ele nunca poderia aproveitar natildeo

passariam de supliacutecios e o esforccedilo feito para reformaacute-lo seria pena e custo perdidos pelo lado

da sociedade Se haacute incorrigiacuteveis temos que nos resolver e eliminaacute-los Mas para todos os outros

as penas soacute podem funcionar se terminam24

Atualmente a populaccedilatildeo encontra-se desacreditada na justiccedila iniciando assim a praacutetica da ldquojusticcedila com as proacuteprias matildeosrdquo ocasionando diversas atrocidades cometendo crime igualmente poreacutem sem enxer-gar a gravidade de seus atos Um exemplo foi o caso de Fabiane Maria de Jesus o qual foi espancada ateacute a morte pois uma paacutegina divulgou que a mesma sequestrava crianccedilas para utilizaacute-las em rituais de magia negra sendo assim a populaccedilatildeo revoltada se reuniu e agrediu-a ocasionando traumatismo cra-niano levando-a a morte apoacutes a trageacutedia foi descoberto que haviam divulgado a foto de Fabiane equi-vocadamente que em nenhum momento esta foi responsaacutevel pela praacutetica de qualquer crime sendo viacutetima daqueles que lutavam pela ldquojusticcedilardquo 25

Conforme Gomes ldquoToda vinganccedila eacute feita em nome da justiccedila ou seja quando a emoccedilatildeo fala mais alto que a razatildeo tudo quanto satisfaz a ira da massa ou a amargura dos familiares ou a falta de seguranccedila coletiva passa a ser ldquovaacutelidordquo e ldquojustordquordquo26

Recentemente houve um outro caso bastante polecircmico um jovem de 17 (dezessete) anos foi acusado de tentar furtar uma bicicleta segundo relatos a cena foi presenciada por dois indiviacuteduos no qual ao inveacutes de chamarem a poliacutecia preferiram fazer justiccedila com as proacuteprias matildeos tatuando na testa do ado-

24 FOUCAULT Michel Vigiar e Punir nascimento da prisatildeo Traduccedilatildeo Raquel Ramalhete 38 ed Petroacutepolis Vozes 2010 p103

25 ROSSI Mariane Mulher espancada apoacutes boatos em rede social morre em Guarujaacute SP 2014 Disponiacutevel em lthttpg1globocomsp

santos-regiaonoticia201405mulher-espancada-apos-boatos-em-rede-social-morre-em-guaruja-sphtmlgt Acesso em 09 out 2017

26 GOMES Luiz Flaacutevio Beccaria (250 anos) e o drama do castigo penal civilizaccedilatildeo ou barbaacuterie Satildeo Paulo Saraiva 2014 p 8687

Disponiacutevel em lthttpsintegradaminhabibliotecacombrbooks 9788502230033cfi444000202gt Acesso em 28 set 2017

Acesso restrito via Minha Biblioteca

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lescente ldquosou ladratildeo e vacilatildeordquo posteriormente filmaram o ato e colocaram na internet como forma de mostrar que a justiccedila havia sido feita levando diversas pessoas a concordar e ainda aplaudir o ato rea-lizado pelos indiviacuteduos27

Segundo Drechsel

Jaacute se passaram seacuteculos desde que o poder puacuteblico deixou de cortar as matildeos de uma pessoa

que tentou roubar um pedaccedilo de patildeo mas a sensibilidade de algumas pessoas parece regredir

agrave barbaacuterie Nesse caso o desconhecimento dos torturadores sobre a injusticcedila que estavam

fazendo era tatildeo grande que o tatuador Maycon Wesley Carvalho dos Reis 27 anos e o vizinho

Ronildo Moreira de Arauacutejo 29 anos natildeo se contentaram de apenas marcar o rosto do rapaz mas

quiseram ostentar o fato com viacutedeo compartilhado nas miacutedias sociais28

O que se questiona eacute como essa tortura faria o adolescente aprender com o erro Seraacute que talvez os dois indiviacuteduos que realizaram tal ato natildeo o condenaram a uma eternidade de sofrimento Onde se encontraria a proporcionalidade do ato Satildeo inuacutemeras as perguntas a serem realizadas mas tudo isso se faz refletir sobre a sociedade atual o alto iacutendice de desemprego29 cresce dia apoacutes dia entatildeo se for pensar entre dar uma oportunidade para uma pessoa ldquode bemrdquo e um indiviacuteduo o qual carrega em sua testa os dizeres de que eacute ladratildeo a possibilidade de que o mesmo arrume emprego torna-se pratica-mente impossiacutevel fazendo com que o ato dos ldquojusticeirosrdquo natildeo tenha qualquer caraacuteter ressocializador mas sim punitivo

Um exemplo de que se pode haver mudanccedila de vida atraveacutes de oportunidades eacute o do ex detento Edilson Rafael dos Santos no qual hoje eacute o responsaacutevel por chefiar a aacuterea de seguranccedila da Associaccedilatildeo de Proteccedilatildeo e Assistecircncia aos Condenados (Apac) de Itauacutena (MG) uma unidade prisional no qual cumpriu sua pena haacute algum tempo atraacutes30

Segundo relatos de Santos

Quando cheguei na Apac tinha ateacute a quarta seacuterie Fiz ateacute a oitava e agora estou estudando o

resto na rua Tem recuperando que tem cadeia muito alta que chegou analfabeto e faz faculdade

agrave distacircncia Cada dia que eu ficava na Apac era um aprendizado para a minha vida Foi aiacute que eu

resolvi largar o crime e dar o valor na minha famiacutelia

Um ex-recuperando veio aqui dar um depoimento e falou que a maior tristeza da vida era a matildee

e o pai dele natildeo terem visto que ele mudou de vida Isso me marcou Eu falei esse remorso eu

natildeo quero levar natildeo31

27 ARAUacuteJO Glauco Tatuador eacute preso por tortura apoacutes escrever lsquosou ladratildeo e vacilatildeorsquo na testa de adolescente no ABC 2017 Disponiacutevel em

lthttpsg1globocomsao-paulonoticiatatuador-e-preso-por-tortura-apos-escrever-eu-sou-ladrao-e-vacilao-na-testa-de-adolescente-

no-abcghtml gt Acesso em 09 out 2017

28 DRECHSEL Denise ldquoLadratildeordquo tatuado na testa Por que natildeo fazer justiccedila com as proacuteprias matildeos 2017 Disponiacutevel em lthttps

g1globocomsao-paulonoticiatatuador-e-preso-por-tortura-apos-escrever-eu-sou-ladrao-e-vacilao-na-testa-de-adolescente-no-

abcghtmlgt Acesso em 09 out 2017

29 SILVEIRA Daniel CAVALLINI Marta Desemprego fica em 133 em maio e atinge 138 milhotildees 2017 Disponiacutevel em lt https

g1globocomeconomianoticiadesemprego-fica-em-133-no-trimestre-encerrado-em-maioghtml gt Acesso em 09 out 2017

30 ABRANTES Talita A histoacuteria de um ex-preso que hoje eacute chefe de seguranccedila em cadeia 2017 Disponiacutevel em lt httpsexameabrilcom

brbrasila-historia-de-um-ex-preso-que-hoje-e-chefe-de-seguranca-em-cadeia gt Acesso em 12 out 2017

31 Idem

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Outro caso bastante interessante foi de Edson Roberto Guido que com 19 anos acabou sendo con-denado por traacutefico de drogas sendo detido na penitenciaria de Ahuacute em Curitiba e apoacutes na Colocircnia Penal de Piraquara laacute iniciou o trabalho nas faacutebricas de material esportivo do programa Pintando a Liberdade do Ministeacuterio do Esporte Ao sair do presiacutedio montou uma cooperativa de artesatildeos de redes esportivas hoje eacute dono de seu proacuteprio negoacutecio a Redes Paranaacute empregando assim cerca de 30 funcio-naacuterios sendo 50 ex-detentos32

O ex detento Joatildeo dos Santos Ferreira com 68 anos passou 30 anos dentro do sistema carceraacuterio um certo dia encontrou um livro no lixo da cadeia o qual mudou sua vida terminando seus estudos dentro da penitenciaacuteria e atraveacutes do Exame Nacional do Ensino Meacutedio (Enem) conseguiu sua vaga no curso de direito segundo o mesmo ldquoQuero trabalhar na Defensoria Puacuteblica e defender algueacutem como eu porque o estado natildeo quer ou precisa soacute punir quer tambeacutem recuperar o cidadatildeordquo afirmando ainda que ldquoSomente a educaccedilatildeo muda um ser humano e o mundo Com ignoracircncia vocecirc natildeo arruma nadardquo33

Em um outo caso bastante divulgado pela miacutedia foi do ex-presidiaacuterio Lincoln Gonccedilalves Santos que se formou em Direito e convidou para a sua banca de avaliaccedilatildeo do Trabalho de Conclusatildeo de Curso (TCC) a juiacuteza que lhe concedeu a liberdade condicional possuindo o trabalho como tema lsquoA Educaccedilatildeo como fer-ramenta de transformaccedilatildeo e ressocializaccedilatildeo dos detentosrsquo pela Universidade do Vale do Itajaiacute (Univali) na cidade de Satildeo Joseacute em Santa Catarina34

Atraveacutes destes poucos exemplos citados eacute possiacutevel verificar que haacute possibilidade de mudanccedila errar natildeo significa persistir no erro eternamente todas as pessoas satildeo dignas de segundas chances deven-do a sociedade em geral mudar seu pensamento realmente as vezes muitos deles natildeo querem mudar de vida preferem ir pelo caminho mais faacutecil poreacutem se um deles realmente quiser mudar deve-se aju-dar estender uma matildeo dar a oportunidade que o ex detento tanto precisa porque como qualquer ser humano ele necessita de dinheiro precisa de um trabalho para se sustentar e eventualmente susten-tar aqueles que dependem dele Quando natildeo se oferecem oportunidades a chance do indiviacuteduo que outrora foi preso voltar a praticar crimes para sobreviver eacute muito maior e se isto ocorrer seraacute a socie-dade que pagaraacute novamente esta conta

3 CONCLUSAtildeO

Apoacutes diversos periacuteodos pelo qual a histoacuteria percorreu ainda haacute certos assuntos que parecem constan-temente retroceder ao princiacutepio e estagnar mesmo se vivendo em um mundo onde a tecnologia avanccedila dia apoacutes dia a ciecircncia descobre novos remeacutedios tratamentos e possiacuteveis curas contudo quando se fala em sistema carceraacuterio apenados e pena logo as pessoas insistem em retornar ao passado e pedir puni-ccedilotildees mais severas muitas vezes desacreditam no poder punitivo no Estado e preferem buscar a ldquojus-ticcedilardquo com as proacuteprias matildeos cometendo verdadeiras atrocidades pela busca daquilo que ao seus olhos parece ser o correto contudo quando melhor observado e analisado eacute apenas uma forma de vinganccedila levando aquele ldquoindividuo honestordquo a ser tatildeo culpado quando o criminoso ambos praticando crime igualmente poreacutem cada qual com seu motivo especiacutefico

32 EX PRESIDIAacuteRIO se transforma em maior empresaacuterio de Minas na produccedilatildeo de redes esportivas Correio de Uberlacircndia 19 ago 2011

Disponiacutevel em lt httpwwwcorreiodeuberlandiacombresportesex-presidiario-se-transforma-em-maior-empresario-de-minas-na-

producao-de-redes-esportivas gt Acesso em 12 out 2017

33 EX-DETENDO cursa direito apoacutes 33 anos preso lsquoEducaccedilatildeo muda o homemrsquo G1 31 mai 2015 Disponiacutevel em lthttpg1globocom

sao-paulosao-jose-do-rio-preto-aracatubanoticia201505ex-detento-cursa-direito-apos-33-anos-preso-educacao-muda-o-

homemhtmlgt Acesso em 12 out 2017

34 ANDRADE Scheila Ex-presidiaacuterio se forma em direito e apresenta TCC para juiacuteza que o permitiu estudar 2016 Disponiacutevel em

lthttpsafolhabrasilcombrculturaex-presidiario-se-forma-em-direito-e-apresenta-tcc-para-juiza-que-o-permitiu-estudargt

Acesso em 12 out 2017

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Aos que estatildeo do lado de fora desse sistema eacute faacutecil manifestar seu repuacutedio aos indiviacuteduos que outrora praticaram crime muitas vezes alimentando esse oacutedio atraveacutes de notiacutecias inveriacutedicas disseminadas por meio das miacutedias sociais ferramenta estaacute que possibilita que cada um fale o que deseja plantando assim cada vez mais o oacutedio e o sentimento de vinganccedila para com os apenados

Conforme o exposto a pena possui caraacuteter punitivo preventivo e ressocializador poreacutem esta uacuteltima caracteriacutes-tica eacute a mais difiacutecil de ser colocada em praacutetica todos culpam o Estado pela falto de investimento mas esquecem de atribuir a culpa para si mesmo pensando o que cada um te a ver com a falta da promoccedilatildeo da ressocializaccedilatildeo

Antes de qualquer coisa se faz necessaacuterio se colocar primeiramente no lugar do proacuteximo pensar que todos estatildeo sujeitos a errar a vida natildeo possibilita oportunidades a cada ser humano de maneira iguali-taacuteria natildeo cabendo deste modo afirmar que eacute ldquoquestatildeo de escolhardquo pois muitas vezes o caminho consi-derado o errado eacute o da sobrevivecircncia e este natildeo eacute uma escolha contudo mesmo para com aqueles que de certa forma tomaram a decisatildeo errada e acabaram no mundo do crime todos devem receber uma segunda chance erros satildeo cometidos diariamente mas nenhum deles pode ter uma condenaccedilatildeo eter-na pois se fosse assim a pena natildeo teria seu caraacuteter ressocializador apenas o punitivo

Com a pesquisa de campo pode-se compreender melhor a vivecircncia dos apenados possuindo um papel fundamental saber suas histoacuterias de vida seus planos sonhos e metas para apoacutes o teacutermino do cumpri-mento da pena Foi de grande importacircncia este contato para que assim a pesquisadora natildeo se baseasse apenas nos livros mas sim com um contato real com pessoas de verdade que estatildeo passando pela situ-accedilatildeo tratada fazendo com que fosse de faacutecil compreensatildeo conseguir entender que natildeo satildeo bichos que estatildeo presos atraacutes dos altos muros mas sim seres humanos como qualquer outro que merecem respei-to e uma nova chance pois possuem famiacutelias que os aguardam laacute fora e precisam de um emprego para manter sua casa esposa e filhos caso natildeo encontrem a oportunidade que tanto precisam o nuacutemero de reincidecircncia continuaraacute a aumentar ocasionando assim cadeias cada vez mais lotadas gerando maio-res gastos ao Estado e aumento de violecircncia e criminalidade para a populaccedilatildeo

Com relaccedilatildeo a problemaacutetica central o problema natildeo eacute apenas o sistema carceraacuterio em si mas sim a falta de estrutura social a sociedade natildeo se encontra apta para receber uma pessoa que cometeu um crime e jaacute cumpriu sua diacutevida para com o Estado pois apesar de quitar este deacutebito perante a sociedade estaraacute sempre marcado como o ldquoex detentordquo

REFEREcircNCIAS

ABRANTES Talita A histoacuteria de um ex-preso que hoje eacute chefe de seguranccedila em cadeia 2017 Disponiacutevel em lthttpsexameabrilcombrbrasila-historia-de-um-ex-preso-que-hoje-e-chefe-de--seguranca-em-cadeiagt Acesso em 12 out 2017

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ALVIM Wesley Botelho A ressocializaccedilatildeo do preso brasileiro 2006 Disponiacutevel em lthttpwwwdirei-tonetcombrartigosexibir2965A-ressocializacao-do-preso-brasileirogt Acesso em 25 out 2017

ANDRADE Scheila Ex-presidiaacuterio se forma em direito e apresenta TCC para juiacuteza que o permitiu estudar 2016 Disponiacutevel em lthttpsafolhabrasilcombrculturaex-presidiario-se-forma-em-di-reito-e-apresenta-tcc-para-juiza-que-o-permitiu-estudargt Acesso em 12 out 2017

ARAUacuteJO Glauco Tatuador eacute preso por tortura apoacutes escrever lsquosou ladratildeo e vacilatildeorsquo na testa de adoles-cente no ABC 2017 Disponiacutevel em lthttpsg1globocomsao-paulonoticiatatuador-e-preso-por--tortura-apos-escrever-eu-sou-ladrao-e-vacilao-na-testa-de-adolescente-no-abcghtmlgt Acesso em 09 out 2017

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Universidade do Sul de Santa Catarina

Revista Juriacutedica da Universidade do Sul de Santa Catarina

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DIAS Faacutebio Coelho A penitenciaacuteria de Florianoacutepolis e sua evoluccedilatildeo no tempo Disponiacutevel em lthttpwwwambito-juridicocombrsiteindexphpn_link=revista_artigos_leituraampartigo_id=8454gt Acesso em 05 out 2017

DRECHSEL Denise ldquoLadratildeordquo tatuado na testa Por que natildeo fazer justiccedila com as proacuteprias matildeos 2017 Disponiacutevel em lthttpsg1globocomsao-paulonoticiatatuador-e-preso-por-tortura-apos-escre-ver-eu-sou-ladrao-e-vacilao-na-testa-de-adolescente-no-abcghtmlgt Acesso em 09 out 2017

EX PRESIDIAacuteRIO se transforma em maior empresaacuterio de Minas na produccedilatildeo de redes esportivas Correio de Uberlacircndia 19 ago 2011 Disponiacutevel em lthttpwwwcorreiodeuberlandiacombresportesex-presidiario-se-transforma-em-maior-empresario-de-minas-na-producao-de-redes-es-portivasgt Acesso em 12 out 2017

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FOUCAULT Michel Vigiar e Punir nascimento da prisatildeo Traduccedilatildeo Raquel Ramalhete 38 ed Petroacutepolis Vozes 2010

GOMES Luiz Flaacutevio Beccaria (250 anos) e o drama do castigo penal civilizaccedilatildeo ou barbaacuterie Satildeo Paulo Saraiva 2014 Disponiacutevel em lthttpsintegradaminhabibliotecacombrbooks9788502230033cfi444000202gt Acesso em 28 set 2017 (virtual)

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A DEFESA DOS DIREITOS HUMANOS ATRAVEacuteS DO ATIVISMO JUDICIAL TRANSNACIONAL ACcedilOtildeES ENGAJADAS E PARTICIPATIVAS

THE DEFENSE OF HUMAN RIGHTS THROUGH TRANSNATIONAL JUDICIAL ACTIVISM ENGAGED AND PARTICIPATORY ACTIONSDaniela Mesquita Leutchuk de Cademartori1

Marlise da Rosa Luz2

Resumo Este trabalho inclui reflexotildees sobre a influecircncia da globalizaccedilatildeo na ordem juriacutedica estatal a emergecircncia de movimentos sociais capazes de promover a ampliaccedilatildeo dos espaccedilos puacuteblicos participati-vos e ainda a identificaccedilatildeo do ativismo judicial transnacional como importante meio de atuaccedilatildeo extra estatal da sociedade civil em prol dos direitos humanos Nas uacuteltimas deacutecadas identificou-se um com-prometimento do Estado frente o contexto internacional bem como a emergecircncia de mobilizaccedilotildees sociais emancipatoacuterias que perpassam as fronteira do Estado-naccedilatildeo Assim utiliza-se o meacutetodo dedu-tivo mediante revisatildeo bibliograacutefica exemplificando-se com casos envolvendo o Brasil junto agrave Comissatildeo e a Corte Interamericana de Direitos Humanos

Palavras-Chave ativismo judicial transnacional Globalizaccedilatildeo Movimentos sociais Sistema Interamericano de Direitos Humanos

Abstract This work includes reflections on the influence of globalization in the state legal order The emergence of social movements capable of promoting the expansion of participatory public spaces As well as the identifica-tion of transnational judicial activism as an important means of civil societyrsquos extra-state action in favor of human rights In recent decades the state has been compromised by the international context as well as by the emer-gence of emancipatory social mobilizations that cross the frontiers of the nation-state the deductive method is used through a bibliographic review and analysis of three cases involving Brazil with the Inter-American Court

Keywords Transnational judicial activism Globalization Social movements Inter-American System of Human Rights

1INTRODUCcedilAtildeO

Desde a uacuteltima deacutecada do seacuteculo XX sob influecircncia da globalizaccedilatildeo a assunccedilatildeo do modelo econocircmico--poliacutetico capitalista caracterizado pela mudanccedila nos modelos de produccedilatildeo desenvolvimento de mer-cados de capitais para aleacutem das fronteiras nacionais e o afastamento do papel do Estado frente aos interesses econocircmicos internacionais trouxe severas consequecircncias nas relaccedilotildees sociais internas

A preocupaccedilatildeo poliacutetica e econocircmica dos Estados com o meio internacional subverteu a funccedilatildeo tradicio-nal de incrementar a qualidade de vida de seus nacionais e a assistecircncia dos mais vulneraacuteveis

1 Instituiccedilatildeo- Unilasalle CanoasRS Mestre e Doutora em Direito pela UFSC Professora do PPG em Direito e Sociedade e da graduaccedilatildeo

em Direito da Universidade LaSalle ndash CanoasRS Coordenadora do Projeto Universal MCTICNPq n 12016 (Em Busca de Novas

Gramaacuteticas para os Direitos Humanos inovaccedilotildees soacutecio-juriacutedicas-poliacuteticas entre Ameacuterica Latina e Aacutefrica) E-MAIL danielacademartori

unilasalleedubr

2 Unilasalle CanoasRS Mestre em Direito e Sociedade pela Unilasalle CanoasRS

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Eacute nessa perspectiva que o presente trabalho inicia sua abordagem sobre o ativismo judicial transnacional e a ampliaccedilatildeo de espaccedilos puacuteblicos destacando preliminarmente a forma como a globalizaccedilatildeo assim compreendida no enfoque econocircmico interferiu nas relaccedilotildees sociais internas inclusive no Brasil quando agrave eacutepoca estava diante da nova Constituiccedilatildeo Federal

Admite-se por ativismo judicial transnacional como sendo accedilotildees judiciais ou quase judiciais junto a oacutergatildeos ou instituiccedilotildees internacionais que buscam o fortalecimento de mobilizaccedilotildees sociais mudanccedilas nas poliacuteticas legais internas proteccedilatildeo e reconhecimento de direitos ou ainda instigar os Estados da importacircncia e prevalecircncia de normas internacionais e internas de direitos humanos

Na compreensatildeo da complexidade das mudanccedilas que envolvem a globalizaccedilatildeo - assim compreendida como um fenocircmeno de muacuteltiplas faces seja de natureza econocircmica social poliacutetica cultural religiosa e tambeacutem juriacutedica e que se identifica quando se deixa de poder separar accedilotildees locais do cenaacuterio que abrange o mundo como um todo - a teoria da accedilatildeo comunicativa ocupa um lugar central na compreen-satildeo dos espaccedilos puacuteblicos

Na sequecircncia no segundo momento eacute apresentado o paradigma emergente dessa realidade desta-cando os movimentos sociais como uma proposta de participaccedilatildeo mais ampla e soacutelida vinculada agrave ideia de democracia mediante efetiva participaccedilatildeo em instacircncias diversas de deliberaccedilatildeo e decisatildeo sejam elas estatais ou da sociedade civil

Nessa ideia parte-se da contribuiccedilatildeo de Maria da Gloacuteria Gohn sobre os movimentos sociais como instrumentos para redefiniccedilatildeo de espaccedilos puacuteblicos e acrescenta-se os ensinamentos de Juumlrgen Habermas que parte da complexidade do mundo da vida como o espaccedilo onde emergem as aspiraccedilotildees capacidades e desejos dos grupos sociais

Tambeacutem eacute feita uma abordagem sobre a concepccedilatildeo de direitos humanos a partir praacuteticas sociais eman-cipatoacuterias conforme a contribuiccedilatildeo criacutetica de Joaquin Herrera Flores jurista sevilhano que buscou compreender a produccedilatildeo do direito a partir dos novos processos e movimentos sociais que acabam muitas vezes por propor uma renovaccedilatildeo da anaacutelise social poliacutetica e juriacutedica

Por fim enfatiza-se o ativismo judicial transnacional como exemplo de novas praacuteticas sociais e novas subjetividades no cenaacuterio internacional em prol da proteccedilatildeo e luta pelos direitos humanos a partir da anaacutelise de trecircs casos envolvendo o Brasil junto a Corte Interamericana de direitos humanos o caso Ximenes Lopes ndash incluiu discussatildeo sobre proteccedilatildeo das pessoas com transtornos mentais o da Maria da Penha Fernandes ndash abordou sobre violecircncia domeacutestica e impunidade e o da Hidreleacutetrica de Belo Monte ndash destacou a proteccedilatildeo soacutecio-ambiental da floresta amazocircnica

Portanto a partir de uma pesquisa teoacuterico-dedutiva o presente trabalho propotildee a compreensatildeo da influecircncia da globalizaccedilatildeo no desenvolvimento de novas praacuteticas poliacuteticas e ressalta-se o ativismo judi-cial transnacional como um importante instrumento fortalecedor de praacuteticas civis extraterritoriais de proteccedilatildeo efetivaccedilatildeo e difusatildeo dos direitos humanos

2 BREVES CONSIDERACcedilOtildeES SOBRE A GLOBALIZACcedilAtildeO ECONOcircMICA E A ORDEM INTERNA ESTATAL

O fenocircmeno da globalizaccedilatildeo congrega uma temaacutetica inquietante que cada vez mais ldquoparece questio-nar a ordem mundial que manteacutem o equiliacutebrio entre Estados-naccedilotildees soberanos com base no direito internacionalrdquo Neste sentido a sociologia juriacutedica natildeo eacute de hoje propotildee-se a discutir a terminologia os aspectos e a abrangecircncia da globalizaccedilatildeo nas relaccedilotildees sociais ldquoAlguns autores falam de lsquoglobalizaccedilatildeorsquo e outros de lsquomundializaccedilatildeorsquo ateacute existem aqueles que preferem usar uma palavra a mais [] a lsquointernacio-nalizaccedilatildeorsquordquo (ARNAUD 2000 p 2 348) Em suma em eacutepoca de constantes mudanccedilas globais assume--se uma compreensatildeo de que o termo globalizaccedilatildeo eacute uma palavra polissecircmica e com isso possui uma grande abrangecircncia de vaacuterios significados

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Sousa Santos (2011 p 26) nesse aspecto expotildee que ldquouma revisatildeo dos estudos sobre os processos de globalizaccedilatildeo mostra-nos que estamos perante um fenocircmeno multifacetado com dimensotildees econocircmi-cas sociais poliacuteticas culturais religiosas e juriacutedicas interligada de modo complexordquo Ou seja eacute impor-tante atentar-se para a influecircncia dos efeitos da globalizaccedilatildeo econocircmica e poliacutetica no inter-relaciona-mento entre o Estado e a sociedade nas poliacuteticas puacuteblicas bem como na cultura poliacutetica

O desenvolvimento de inter-relaccedilotildees e conexotildees que ultrapassam as barreiras fronteiriccedilas dos Estados impactam sobremaneira ldquoa regulaccedilatildeo juriacutedica de tipo claacutessicardquo (ARNAUD 2005 p 3) ateacute entatildeo pecu-liar dos Estados soberanos especialmente porque dentre muitos efeitos da globalizaccedilatildeo estaacute incluiacuteda a alteraccedilatildeo da noccedilatildeo de soberania e cidadania

Nesse sentido De Julius-Campuzano (2009 p 83) assevera que

A intensificaccedilatildeo dos fluxos comerciais no acircmbito transnacional e a crescente dependecircncia

dos Estados com relaccedilatildeo agraves corporaccedilotildees transnacionais agraves grandes instacircncias econocircmicas

e agraves forccedilas que operam no mercado global tecircm consequecircncias diretas sobre a capacidade de

controle dos Estados sobre suas iniciativas de governo e seus programas poliacuteticos

Em verdade com o fim da bipolarizaccedilatildeo da Guerra Fria observou-se o decliacutenio do paradigma socia-lista do Estado centralizador autossuficiente e totalitaacuterio assumido pela extinta Uniatildeo Sovieacutetica Em contrapartida viu-se tambeacutem a assunccedilatildeo da superioridade do modelo econocircmico-poliacutetico dos Estados Unidos Esse novo momento favoreceu o surgimento e o crescimento da influecircncia norte-americana sobre novas zonas internacionais Paralelamente ocorre a emergecircncia de um discurso sobre a neces-sidade de restringir a atuaccedilatildeo do Estado no aspecto social e regulador sob o fundamento de que ldquoo Estado intervencionista tende a gerar desequiliacutebrio fiscal agravado nos paiacuteses em desenvolvimento pela contrataccedilatildeo de enormes empreacutestimos internacionaisrdquo Eacute neste contexto que se daacute o Washington Consensus a partir de um evento ocorrido no fim da deacutecada de 1980 quando economistas do governo norte-americano do Banco Mundial e do Fundo Monetaacuterio Internacional (FMI) estabeleceram medi-das voltadas agrave estabilizaccedilatildeo econocircmica dos paiacuteses em desenvolvimento (VIEIRA 2002 p 470)

A partir desta proposta implantam-se programas de ajustes estruturais que incluem ldquoa austeridade fiscal privatizaccedilotildees de empresas que natildeo datildeo lucro ao Estado e liberalizaccedilatildeo dos mercadosrdquo ou seja medidas que deveriam contribuir para uma melhor gestatildeo dos serviccedilos puacuteblicos e para a criaccedilatildeo ou estiacutemulo de programas sociais (TEIXEIRA 2011 p 13)

De modo geral a partir dessa eacutepoca muitos paiacuteses da Ameacuterica Latina inclusive o Brasil aproximaram--se desse modelo econocircmico e poliacutetico Acreditava-se que a adesatildeo ao mercado internacional pela abertura ao capital estrangeiro fosse o meio para sustentar o crescimento e a modernizaccedilatildeo industrial

Contudo a efetivaccedilatildeo destas medidas acabou por ocasionar consequecircncias severas nos paiacuteses eis que a preocupaccedilatildeo poliacutetica e econocircmica dos Estados voltada aos interesses internacionais fez com que relegassem sua funccedilatildeo de incrementar a qualidade de vida de seus nacionais e a assistecircncia dos mais vulneraacuteveis Os Estados que haviam passado a orientar suas decisotildees conforme as diretrizes das gran-des corporaccedilotildees industriais comerciais e financeiras (tais como FMI Banco Mundial aleacutem de ficarem condicionados agraves diretrizes normativas supranacionais acabaram por ldquo[] retroceder em seus progra-mas de accedilatildeo social e econocircmica bem como a abdicar dos conteuacutedos baacutesicos do direto regulador []rdquo (DE JULIUS-CAMPUZANO 2009 p 85)

No caso do Brasil esta perspectiva que acompanhou a globalizaccedilatildeo econocircmica dos finais do seacutecu-lo XX fez-se anunciar ao longo dos anos de 1990 Agrave eacutepoca o Brasil ainda estava diante da noviacutessima Constituiccedilatildeo Federal de 1988 considerada um modelo de ldquoconstitucionalismo dirigista ou de caraacuteter socialrdquo que trazia de modo inovador na histoacuteria constitucional do paiacutes em seu conteuacutedo obrigaccedilotildees positivas ao Estado (VIEIRA 2002 468) A efervescecircncia do sentimento democraacutetico apoacutes um longo periacuteodo de repressatildeo e autoritarismo ditatorial havia instigado a formaccedilatildeo de um Estado Democraacutetico

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de Direito baseado numa sociedade livre justa e solidaacuteria cujas grandes metas incluiacuteam a erradicaccedilatildeo da pobreza e da histoacuterica marginalizaccedilatildeo de amplos setores da populaccedilatildeo a reduccedilatildeo das desigualda-des sociais e regionais conforme os termos do artigo terceiro da Carta Magna O texto constitucional tambeacutem inovou com ldquoa institucionalizaccedilatildeo dos direitos humanosrdquo ressaltando a dignidade humana e os direitos e garantias fundamentais como nuacutecleo baacutesico e informador do ordenamento juriacutedico brasilei-ro os ldquoprinciacutepios da prevalecircncia dos direitos humanos da autodeterminaccedilatildeo dos povos do repuacutedio ao terrorismo e da cooperaccedilatildeo entre os povos para o progresso da humanidade nos termos do art 4ordm II III VIII e IX da Cartardquo sem deixar de incluir dentre os direitos constitucionalmente protegidos aqueles enunciados nos tratados internacionais de que for signataacuterio (PIOVESAN 2012 p 437 444)

Eacute neste contexto que Vieira (2002) afirma que a onda neoliberal pegou o Constitucionalismo brasileiro no contrapeacute as novas diretrizes poliacutetico-econocircmicas emergentes no meio internacional acabaram por influenciar a efetivaccedilatildeo da proacutepria Constituiccedilatildeo de 1988

Aos poucos o Brasil acabou por conciliar sua nova Constituiccedilatildeo agraves orientaccedilotildees econocircmicas inter-nacionais vindo a promover inuacutemeras mudanccedilas no seu texto constitucional com uma sequecircncia de Emendas agrave Constituiccedilatildeo que incluiacuteram conceitos tais como de empresa de capital nacional e mono-poacutelios concessatildeo agraves empresas privadas da exploraccedilatildeo de serviccedilos privatizaccedilotildees reformas nas regras do funcionalismo puacuteblico na previdecircncia social acrescentando ao caput do art 37 da Constituiccedilatildeo Federal o ldquoprinciacutepio da eficiecircnciardquo As medidas tomadas ao longo dos anos desde a promulgaccedilatildeo da Constituiccedilatildeo Federal foram efetivadas ldquosob o argumento de que eacute necessaacuterio buscar adaptar o Estado brasileiro agraves demandas da globalizaccedilatildeordquo (VIEIRA 2002 473)

O sistema juriacutedico nacional passou a assumir prioritariamente um enfoque econocircmico voltado agrave manutenccedilatildeo e gestatildeo financeira interna do Estado em atenccedilatildeo aos ajustes e acordos internacio-nais Identificou-se como consequecircncia um estatuto organizativo estatal com limitaccedilotildees ao discurso democraacutetico pois se inviabilizava a intervenccedilatildeo da cidadania no controle de seu futuro bem como seus interesses poliacuteticos especiacuteficos

Na medida em que os direitos fundamentais passaram a ser sopesados frente agraves possibilidades econocirc-micas internas o Estado ao mesmo tempo que garantidor dos direitos humanos passou a assumir e em muitos casos manter uma postura de violador desses direitos ao limitar sua atuaccedilatildeo e proteccedilatildeo por conta dos interesses financeiros Ainda que natildeo fosse o efetivo violador o Estado brasileiro ndash em espe-ciacutefico - passou a apresentar-se tatildeo comprometido que sequer podia reagir a tais violaccedilotildees

3 O PAPEL DOS NOVOS MOVIMENTOS SOCIAIS NA CONSTRUCcedilAtildeO E EFETIVACcedilAtildeO DOS DIREITOS HUMANOS E NA AMPLIACcedilAtildeO DOS ESPACOS PUBLICOS

A realidade vivenciada desde a uacuteltima deacutecada do seacuteculo XX especialmente pela prevalecircncia do enfo-que econocircmico sobre os direitos fundamentais determinou o surgimento de uma compreensatildeo criacutetica agrave concepccedilatildeo de democracia e cidadania representativas Identificou-se a necessidade de uma atuaccedilatildeo mais ampla e soacutelida vinculada agrave ideia de democracia mediante efetiva participaccedilatildeo em instacircncias diver-sas de deliberaccedilatildeo e decisatildeo sejam elas estatais ou da sociedade civil

Maria da Gloria Gohn importante teoacuterica e pesquisadora brasileira sobre temas como movimentos sociais participaccedilatildeo associativismo e cidadania refere que desde a metade dos anos 80 ocorreram mudanccedilas na conjuntura poliacutetica tanto nacional quanto internacionalmente3 ponderando que as transformaccedilotildees

3 Nacionalmente ocorreu ldquoa redemocratizaccedilatildeo do paiacutes e internacionalmente com a queda do muro de Berlim e a crise dos regimes

socialistas do leste europeurdquo (GOHN 2005 p53)

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Mais significativas foram na conjuntura econocircmica com a estruturaccedilatildeo e o raacutepido crescimento

da globalizaccedilatildeo elevando agrave reestruturaccedilatildeo produtiva das naccedilotildees ao desemprego e agraves reformas

estatais orientadas para reequilibrar a crise fiscal balanccedila de pagamento etc (GOHN 2005 p53)

A autora enfatiza o surgimento de novas caracteriacutesticas envolvendo as relaccedilotildees entre o Estado e a sociedade O papel do Estado tambeacutem passou por uma reestruturaccedilatildeo assumindo uma funccedilatildeo essen-cialmente gerencial e administrativa de recursos o que teria ldquolevado agrave privatizaccedilatildeo de serviccedilos essen-ciais agrave emergecircncia de novos parceiros no atendimento de questotildees sociais e agrave estratificaccedilatildeo desse entendimento segundo os imperativos da loacutegica do mercadordquo O encolhimento do Estado levou a um encolhimento da esfera social com reflexos na cidadania plena4 assim compreendida pela autora como aquela ldquomoldada na tradiccedilatildeo republicana que pressupotildee o conhecimento e a consciecircncia eacutetica dos pro-cessos poliacuteticos da poacutelis e do mundo em que se viverdquo (GOHN 2005 p 11 29)

Nesse novo cenaacuterio a autora enfatiza a emergecircncia paralela de sujeitos sociopoliacuteticos e culturais que entraram em cena

[] no iniacutecio do deste novo milecircnio diferentes organizaccedilotildees movimentos e entidades sociais

continuam lutando por condiccedilotildees de habitalidade nas cidades em aacutereas como seguranccedila

puacuteblica tracircnsito poluiccedilatildeo moradia sauacutede educaccedilatildeo (formal e natildeo-formal destacando-se nesta

uacuteltima as centenas de programas com crianccedilas jovens adolescentes portadores de diferentes

doenccedilas usuaacuterios de drogas etc) assim como pela qualidade dos serviccedilos puacuteblicos aacutereas verdes

recuperaccedilatildeo de aacutereas centrais dentre outros Novos movimentos sociais tem sido criados nas

zonas perifeacutericas que tambeacutem se tornaram heterogecircneas sob a forma de organizaccedilotildees locais

e luta de comunidades territoriais especiacuteficas Organizaccedilotildees natildeo-governamentais (ONGs)

que demandam e constroem accedilotildees pela cidadania (em lutas contra a pobreza a exclusatildeo e a

discriminaccedilatildeo) e programas e poliacuteticas sociais de inclusatildeo social completam o cenaacuterio onde o

novo associativismo se desenvolve articulado por diferentes redes sociais (GOHN 2005 p 14)

Ou seja a medida que o contexto soacutecio-poliacutetico interno estava voltado ao pragmatismo econocircmico aos projetos e acordos de perfil neoliberal com preocupaccedilotildees taacuteticas que resolvam problemas teacutecnicos da economia ocorre a emergecircncia de novos atores sujeitos sociais antes organizados em movimentos e accedilotildees coletivas de protestos agora com enfoque nas poliacuteticas puacuteblicas facilitados por redes forma-das pelo inter-relacionamento de diferentes partes do mundo produzidos pelo fenocircmeno da globali-zaccedilatildeo5 A novidade estaacute em que ldquoos movimentos sociais na atualidade tematizam e redefinem a esfe-ra puacuteblica tem grande poder de controle social e constroem modelos de inovaccedilotildees sociaisrdquo (GOHN 2010 p 16-17)

Nesse aspecto enfatiza-se a perspectiva de Juumlrgen Habermas de que a participaccedilatildeo relaciona-se com a criaccedilatildeo consolidaccedilatildeo e regulamentaccedilatildeo de espaccedilos puacuteblicos autocircnomos (desvinculados do poder puacuteblico) de deliberaccedilatildeo orientados segundo a oacutetica da teoria discursivo-comunicativa

Juumlrgen Habermas apresenta importante contribuiccedilatildeo a respeito de espaccedilo puacuteblico poliacutetica demo-cracia e direito6 O referido filoacutesofo a partir da interpretaccedilatildeo dos fenocircmenos da sociedade moderna propocircs uma compreensatildeo da legitimaccedilatildeo do Direito a partir do reconhecimento dos proacuteprios cidadatildeos

4 Sobre os diferentes sentidos da cidadania ver CADEMARTORI D M L de CADEMARTORI S U A Busca de uma cidadania sul-

americana no contexto da Unasul Revista Eletrocircnica Direito amp Poliacutetica PPCJ da Univali Itajaiacute v 9 n 2 p 1116-1140 2014

5 Neste sentido recorda-se a compreensatildeo de globalizaccedilatildeo de Anthony Giddens para quem ldquoA globalizaccedilatildeo natildeo eacute apenas nem

primordialmente um fenocircmeno econocircmico e natildeo deve ser equacionada com o surgimento de um lsquosistema mundialrsquo A globalizaccedilatildeo trata

efetivamente da transformaccedilatildeo do espaccedilo e do tempo Eu a defino como accedilatildeo a distacircncia e relaciono sua intensificaccedilatildeo nos uacuteltimos anos

ao surgimento da comunicaccedilatildeo global instantanea e ao transporte de massardquo (1996 p 12-3)

6 A Teoria da Accedilatildeo Comunicativa eacute uma obra elementar desenvolvida por Juumlrgen Habermas Inicialmente foi aplicada no acircmbito da eacutetica

no seu livro Consciecircncia moral e agir comunicativo (HABERMAS 1989) e na obra Direito e Democracia entre facticidade e validade

(HABERMAS 1997) o autor amplia a seara de aplicabilidade do princiacutepio discursivo estendendo-o ao Direito

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como os produtores das leis ou seja como os sujeitos que interagem no espaccedilo puacuteblico e podem inter-ferir na realidade social deixando de ser meros destinataacuterios ldquoTrata-se de importante inovaccedilatildeo pois tradicionalmente a Teoria do Direito trabalha com a categoria de destinataacuterios das normas juriacutedicas o que supotildee uma instacircncia produtora e outra receptora das leisrdquo (MESQUITA 2012 p 43)

O conceito de espaccedilo puacuteblico ou esfera puacuteblica de Habermas ganhou especial importacircncia na medi-da em que o autor ldquopassa a trabalhar com o paradigma da comunicaccedilatildeo compreendendo a sociedade como uma permanente tensatildeo entre o mundo sistecircmico e o mundo da vidardquo (OLIVEIRA FERNANDES 2011 p 117)

Na perspectiva harbermasiana a comunicaccedilatildeo existente no mundo sistecircmico difere da comunicaccedilatildeo existente no mundo da vida Aquele eacute ldquocompreendido pela economia e pelo aparato estatal [] pauta-do pela loacutegica instrumental pelas relaccedilotildees impessoais pela busca de resultados que atendam ao bom desempenho administrativo e teacutecnico do Estado e o lucro e a produtividade do mercadordquo Em contra-partida ldquoo mundo da vida eacute formado pela coordenaccedilatildeo da accedilatildeo atraveacutes da comunicaccedilatildeo da linguagem com sujeitos em interaccedilatildeordquo (OLIVEIRA FERNANDES 2011 p 124)

Nessa loacutegica eacute no mundo da vida que surgem os descontentamentos privaccedilotildees e conflitos e que emer-gem as aspiraccedilotildees capacidades e desejos dos grupos sociais que se configuram como alternativas de vida por formas mais concretas de atendimento agraves necessidades tanto materiais quanto morais

Oliveira e Fernandes (2011) trazem importante contribuiccedilatildeo sobre a concepccedilatildeo de esfera puacuteblica na vida moderna

[] um foacuterum importante para onde discussotildees e debates de questotildees sociais relevantes satildeo

trazidos agrave luz por indiviacuteduos e coletividades inclusive por aqueles que eventualmente sintam-se

excluiacutedos Na esfera puacuteblica as minorias tentam defender-se da cultura majoritaacuteria contestando

a validade do auto-entendimento coletivo e se esforccedilando para convencer puacuteblicos amplos da

pertinecircncia e justeza de suas reivindicaccedilotildees Eacute nesse espaccedilo possibilitado pela comunicaccedilatildeo

que sujeitos vatildeo colocar seus pontos de vista suas experiecircncias e perspectivas do que acham

justo e tentar convencer os outros da validade de seus propoacutesitos (OLIVEIRA FERNANDES

2011 p 127)

Ou seja conforme a concepccedilatildeo de Juumlrgen Habermas a comunicaccedilatildeo existente no mundo da vida tem papel importante seja para oportunizar discussotildees relevantes e novas perspectivas na sociedade seja para sugerir novos meios de accedilotildees a partir de um entendimento entre os sujeitos As possibilidades questionadoras da comunicaccedilatildeo oportunizadas pelo mundo da vida ldquoalimenta natildeo apenas seus partici-pantes mais diretos mas impulsiona a sociedade democraacutetica afinal a pluralidade e a diversificaccedilatildeo de modos de vida estatildeo presentes no mundo da vidardquo (OLIVEIRA FERNANDES 2011 p 125)

Com isso a ecircnfase que se destaca neste ponto inclui a discussatildeo sobre a participaccedilatildeo ativa da sociedade o papel dos diferentes instrumentos para o exerciacutecio da cidadania bem como a importacircncia da amplia-ccedilatildeo ocupaccedilatildeo e convivecircncia em espaccedilos puacuteblicos a partir da atuaccedilatildeo de movimentos sociais engajados

Por outro lado partindo-se da interpretaccedilatildeo de Joaquiacuten Herrera Flores de que os direitos humanos satildeo algo mais do que um conjunto de normas formais que os reconhecem e os garantem em niacutevel nacio-nal ou internacional enfatiza-se sua contribuiccedilatildeo a partir de uma teoria criacutetica dos direitos humanos com vistas a compreender a produccedilatildeo do direito a partir de praticas sociais emancipadoras

Para o jusfiloacutesofo sevilhano apoacutes as duas grandes guerras que assolaram o continente europeu durante o seacuteculo XX com a Declaraccedilatildeo Universal dos Direitos Humanos em 1948 surge o conceito de direitos humanos o qual ldquo[] consolida-se como a visatildeo lsquonaturalrsquo e lsquouniversalrsquo expressa de modo diaacutefano e com matizes universais nas lsquonormasrsquo e textos que surgem a partir da ordem institucional global das Naccedilotildees

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Unidasrdquo7 Todavia vivencia-se hoje uma nova fase histoacuterica especialmente desde o fim dos anos oiten-ta e princiacutepios dos noventa do seacuteculo passado com a queda do socialismo e a consequente expansatildeo global do modo de produccedilatildeo e de relaccedilotildees sociais capitalistas (HERRERA FLORES 2004 p 103) Ou seja entende que a globalizaccedilatildeo8 no modelo neoliberal caracteriza-se como a nova fase e as carac-teriacutesticas de apropriaccedilatildeo do capital estatildeo provocando uma mudanccedila importante na conceituaccedilatildeo dos direitos humanos

Seguindo ainda a teoria de Herrera Flores (2009) a progressiva instauraccedilatildeo de uma ordem global sus-tentada na apropriaccedilatildeo do capital e o surgimento de uma consciecircncia de injusticcedilas e desequiliacutebrios con-duzidos pela globalizaccedilatildeo estatildeo provocando o surgimento de processos de reaccedilatildeo social que natildeo se conformam com as tradicionais formas de participaccedilatildeo e articulaccedilatildeo social Satildeo essas reaccedilotildees compre-endidas como processos de lutas que constituem o desafio da nova fase mundial para reconhecimento dos direitos humanos

Natildeo podemos entender os direitos sem vecirc-los como parte da luta de grupos sociais empenhados

em promover a emancipaccedilatildeo humana apesar das correntes que amarram a humanidade na

maior parte de nosso planeta Os direitos humanos natildeo satildeo conquistados apenas por meio das

normas juriacutedicas que propiciam seu reconhecimento mas tambeacutem e de modo muito especial

por meio das praacuteticas sociais de ONGacutes de Associaccedilotildees de Movimentos Sociais de Sindicatos de

Partidos Poliacuteticos de Iniciativas Cidadatildes e de reivindicaccedilotildees de grupos minoritaacuterios (indiacutegenas)

ou natildeo (mulheres) que de um modo ou de outro restaram tradicionalmente marginalizados do

processo de positivaccedilatildeo e de reconhecimento institucional de suas expectativas (HERRERA

FLORES 2009 p 77)

Na perspectiva adotada pelo jurista sevilhano seratildeo as praacuteticas sociais emancipatoacuterias proporcionan-do ldquoum lsquointervencionismo humanitaacuteriorsquo levado a cabo pelos proacuteprios atores sociaisrdquo que iratildeo ensejar a consolidaccedilatildeo da participaccedilatildeo dos

Indiviacuteduos grupos e organizaccedilotildees na hora de construir um marco de accedilatildeo que permita a todos

e a todas criar as condiccedilotildees que garantam de um modo igualitaacuterio o acesso aos bens materiais e

imateriais que fazem com que a vida seja digna de ser vivida (HERRERA FLORES 2009 p 77 25)

Nesta compreensatildeo de direitos humanos eles satildeo percebidos ldquocomo processos institucionais e sociais que possibilitem a abertura e a consolidaccedilatildeo de espaccedilos de luta pela dignidade humanardquo sendo que constituiacutedos a partir da afirmaccedilatildeo da luta do ser humano para ver cumpridos seus desejos e necessida-des nos contextos vitais em que estaacute situadordquo (HERRERA FLORES 2009 p 25)

Nesse aspecto enfatiza-se a concepccedilatildeo de direitos humanos como reaccedilotildees movimentos e evoluccedilatildeo de circunstacircncias histoacutericas que se fortalecem a partir de novas forccedilas transformadoras concepccedilatildeo essa que tem conexatildeo com os movimentos sociais emancipatoacuterios assim compreendidos como mobili-zaccedilotildees coletivas da sociedade de natureza soacutecio-poliacutetica ou cultural que viabilizam formas de discus-sotildees e organizaccedilotildees de seus interesses e demandas

7 ldquo[] se consolida como la visioacuten lsquonaturalrsquo y lsquouniversalrsquo que se expresa diaacutefana y con matices universalistas en las lsquonormasrsquo y textos que van

surgiendo del orden institucional global de Naciones Unidasrdquo(traduccedilatildeo livre ndash HERRERA FLORES 2004 p 87)

8 ldquoLa nueva fase de la globalizacioacuten la denominada lsquoneoliberalrsquo puede caracterizarse en teacuterminos generales bajo cuatro caracteriacutesticas

articuladas a) la proliferacioacuten de centros de poder (el poder poliacutetico nacional se ve obligado a compartir lsquosoberaniacutearsquo con corporaciones

privadas y organismos globales multilaterales) b) la inextricable red de interconexiones financieras (que hacen depender las poliacuteticas

puacuteblicas y la lsquoconstitucioacuten econoacutemicarsquo nacional de fluctuaciones econoacutemicas imprevisibles para el lsquotiemporsquo con el que juega la praxis

democraacutetica en los Estados Nacioacuten) c) la dependencia de una informacioacuten que vuela en tiempo real y es lsquocazadarsquo por las grandes

corporaciones privadas con mucha mayor facilidad que por las estructuras institucionales de los Estados de Derecho) y d) el ataque

frontal a los derechos sociales y laborales (que estaacute provocando que la pobreza y la tiraniacutea se conviertan en ldquoventajas comparativasrdquo para

atraer inversiones y capitales) (FARIA apud HERRERA FLORES 2010 p 103-104)

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4 O ATIVISMO JUDICIAL TRANSNACIONAL UMA PROPOSTA DE AMPLIACcedilAtildeO DA PARTICIPACcedilAtildeO SOCIAL NA EFETIVACcedilAtildeO DOS DIREITOS HUMANOS

A globalizaccedilatildeo compreendida numa visatildeo geral como uma ampliaccedilatildeo do espaccedilo-tempo desterrito-rializaccedilatildeo e transnacionalizaccedilatildeo seja econocircmica tecnoloacutegica e cultural como visto acaba por difundir novos espaccedilos que favorecem a atuaccedilatildeo de novos atores sejam movimentos e organizaccedilotildees natildeo esta-tais plurais e transnacionais

Na evoluccedilatildeo dos movimentos dos direitos humanos houve natildeo soacute ampliaccedilatildeo do conceito como

tambeacutem uma evoluccedilatildeo que vai da conquista de novos direitos agrave criaccedilatildeo de instrumentos que

assegure efetivamente a observacircncia dos direitos conquistados (CATAtildeO 2005 p 364)

Nessa perspectiva destaca-se o ldquoativismo judicial transnacionalrdquo a partir do conceito trabalhado por Santos (2007 p 28)

[] um tipo de ativismo focado na accedilatildeo legal engajada atraveacutes das cortes internacionais ou

instituiccedilotildees quase judiciais em fortalecer as demandas dos movimentos sociais realizar

mudanccedilas legais e poliacuteticas internas reestruturar ou redefinir direitos eou pressionar os

Estados a cumprir as normas internacionais e internas de direitos humanos

Ou seja parte-se de uma concepccedilatildeo de ldquoativismo judicial transnacionalrdquo como uma mobilizaccedilatildeo judi-cial com destaque agrave atuaccedilatildeo de atores sociais como Organizaccedilotildees natildeo Governamentais (ONGs) movi-mentos sociais associaccedilotildees civis que motivados por uma diversidade de interesses desafiam a globali-zaccedilatildeo neoliberal em prol dos direitos humanos (SANTOS 2007 p 32)

Destaca-se tambeacutem a atuaccedilatildeo da Comissatildeo e da Corte Interamericana de Direitos Humanos impor-tantes oacutergatildeos internacionais integrantes do Sistema Interamericano de Proteccedilatildeo dos Direitos Humanos que oportunizam a discussatildeo propulsatildeo e debates sobre os direitos humanos na Ameacuterica Latina Referidos oacutergatildeos foram criados pela Convenccedilatildeo Americana de Direitos Humanos tambeacutem chamado Pacto de Satildeo Joseacute em 1969 o qual foi ratificado pelo Brasil em 1992

Na perspectiva de ampliaccedilatildeo dos horizontes de participaccedilatildeo social a consolidaccedilatildeo da Comissatildeo e da Corte Interamericana de Direitos Humanos como uma esfera puacuteblica projeta um cenaacuterio de profundas transformaccedilotildees nos processos de produccedilatildeo da legitimidade social dos diferentes interesses Em verda-de tais processos tendem a deslocar-se da oacuterbita exclusiva do Estado para o acircmbito dos intercacircmbios comunicativos o que por sua vez poderaacute ter maior forccedila argumentativa Como refere Sousa Santos (2011 p 48) ldquoteraacute maior impacto se tiver ressonacircncia em escalas mais amplas de legalidade articulan-do-se nacional e internacionalmenterdquo

Diz-se isso porque parte-se da concepccedilatildeo de ativismo como accedilatildeo engajada e de uma concepccedilatildeo de direitos fundamentais em constante processo de transformaccedilatildeo que acompanha a sociedade e conse-quentemente suas necessidades de proteccedilatildeo

Abaixo alguns exemplos com base em casos envolvendo o Estado brasileiro que foram analisados pela Comissatildeo e pela Corte IDH em que se pode identificar a importacircncia participativa da sociedade junto a esses oacutergatildeos e os reflexos internos no acircmbito juriacutedico de proteccedilatildeo dos direitos fundamentais

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a) A condenaccedilatildeo no Caso Ximenes Lopes9 por exemplo foi o primeiro caso em que o Brasil foi condenado no sistema interamericano A viacutetima fora internada em casa de tratamento psiquiaacutetrico no Cearaacute em setembro de 1999 torturada vindo a oacutebito trecircs dias apoacutes a internaccedilatildeo Na sentenccedila da Corte houve o reconhecimento da responsabi-lidade do Brasil na violaccedilatildeo agrave vida e agrave integridade pessoal e a inexistecircncia do direito agraves garantias judiciais Ainda sua repercussatildeo ensejou a criaccedilatildeo de regras voltadas a poliacute-ticas puacuteblicas para proteccedilatildeo dos direitos das pessoas com transtornos mentais com a promulgaccedilatildeo da Lei nordm 102162001

b) O caso emblemaacutetico de Maria da Penha Maia Fernandes versando sobre violecircncia do-meacutestica e impunidade Foi levado ao conhecimento da Comissatildeo Interamericana de Direitos Humanos atraveacutes da mobilizaccedilatildeo de ONGs quando entatildeo o Brasil foi respon-sabilizado por omissatildeo e negligecircncia em relaccedilatildeo agrave violecircncia domeacutestica contra a mulher recomendando a adoccedilatildeo de vaacuterias medidas entre elas simplificar os procedimentos judi-ciais penais e a adoccedilatildeo de medidas em acircmbito nacional com a finalidade de eliminar a con-descendecircncia do Estado com a violecircncia domeacutestica (SANTOS 2007 p 440-45) Como reflexo desta condenaccedilatildeo o Brasil aprovou a Lei 113402006 (Lei Maria da Penha) com regras especiacuteficas para coibir a violecircncia domeacutestica e familiar contra a mulher

c) O caso da Hidreleacutetrica de Belo Monte situada na bacia do rio Xingu sudoeste do es-tado do Paraacute cujo empreendimento federal visa em plena floresta amazocircnica a in-dependecircncia energeacutetica para fomentar o desenvolvimento econocircmico10 Neste caso a mobilizaccedilatildeo de povos indiacutegenas ribeirinhos quilombolas e agricultores familiares buscou o respeito por parte do Estado brasileiro das normas protetivas do meio-am-biente e dos direitos humanos Houve grande participaccedilatildeo e coalizatildeo de instituiccedilotildees estaduais nacionais e internacionais ndash Organizaccedilotildees Natildeo Governamentais (ONGs) socioambientalistas sindicatos de trabalhadores rurais e urbanos organizaccedilotildees re-ligiosas associaccedilotildees de moradores cuja proporccedilatildeo ultrapassou as barreiras internas do paiacutes chegando agrave Organizaccedilatildeo das Naccedilotildees Unidas (ONU) e Organizaccedilatildeo dos Estados Americanos (OEA) (SIQUEIRA SILVA 2015 p 177-202)

Em suma estes exemplos datildeo evidecircncia da relevacircncia de espaccedilos puacuteblicos que oportunizem a atua-ccedilatildeo da sociedade civil e de como ela pode estar presente na construccedilatildeo e na defesa do discurso dos interesses dos menos favorecidos excluiacutedos desprotegidos No Brasil as poliacuteticas puacuteblicas ou refor-mas juriacutedicas internas que sejam necessaacuterias satildeo feitas essencialmente pelo Estado A sociedade civil praticamente natildeo tem a possibilidade de promover e incorporar demandas sociais Nesse sentido dos casos acima observados pode-se perceber um dos principais impactos que vem sendo obtidos junto ao Brasil com o ativismo juriacutedico transnacional a provocaccedilatildeo de mudanccedilas nas poliacuteticas puacuteblicas internas em casos em que o Estado brasileiro se omite e quando identificada a sua incompatibilidade com os compromissos assumidos em Tratados internacionais de direitos humanos

Eacute nesse sentido que o ativismo juriacutedico transnacional apresenta-se como importante instrumento de luta proteccedilatildeo e garantia de direitos fundamentais a partir da atuaccedilatildeo participativa e ativa da sociedade civil e seus movimentos sociais junto a espaccedilos que apesar de estarem aleacutem do Estado - como eacute o caso da Comissatildeo e da Corte Interamericana de Direitos Humanos ndash seguem sendo o principal centro seja profanadores ou promotores dos direitos humanos

9 Os dados completos sobre este caso estatildeo disponiacuteveis em lthttpwwwcidhoasorgdemandas1223720Ximenes20Lopez20

Brasil201oct04pdfgt

10 O Caso iniciou a sua tramitaccedilatildeo no final de 2015 quatro anos apoacutes a sua apresentaccedilatildeo encontrando-se em etapa de anaacutelise de

admissibilidade por parte da Comissatildeo IDH Cf Disponiacutevel em lthttpjustificandocartacapitalcombr20170613belo-monte-

cristalizacao-do-retrocesso-ambiental-e-de-direitos-humanosgt Acesso em 15 dez 2017

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5 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

A globalizaccedilatildeo assim compreendida como um fenocircmeno multifacetado e complexo que permite novas conexotildees de tempo e espaccedilo tem influenciado no desenvolvimento de novas praacuteticas poliacuteticas e sociais Desde a uacuteltima deacutecada do seacuteculo XX a inserccedilatildeo do Brasil nas relaccedilotildees internacionais tem sido em gran-de parte a causa para a diminuiccedilatildeo da autonomia das relaccedilotildees sociais mantidas entre o Estado e a sociedade A prevalecircncia pelo interesse econocircmico internacional tem feito com que sejam protelados interesses e claacuteusulas de natureza social ao acaso das forccedilas imprevisiacuteveis do mercado em uma pro-gressiva relativizaccedilatildeo dos interesses sociais ao poderio financeiro do Estado

A partir desse cenaacuterio se identifica o surgimento de uma compreensatildeo criacutetica agrave concepccedilatildeo de demo-cracia e cidadania representativas Identifica-se a necessidade de uma atuaccedilatildeo mais ampla e soacutelida vinculada agrave ideia de democracia mediante efetiva participaccedilatildeo em instacircncias diversas de deliberaccedilatildeo e decisatildeo sejam elas estatais ou da sociedade civil Nesse sentido incluem-se os movimentos sociais e a ampliaccedilatildeo de espaccedilos puacuteblicos como elementos fundamentais para a ocupaccedilatildeo e convivecircncia partici-pativa da sociedade engajada com fins emancipatoacuterios

De outro lado adota-se a interpretaccedilatildeo de que os direitos humanos fundamentais passam por cons-tante evoluccedilatildeo reaccedilotildees e movimentos dialeacuteticos que os modificam e transformam em novas demandas da sociedade em desenvolvimento Identifica-se a concepccedilatildeo de direitos humanos a partir de forccedilas transformadoras que tem nos movimentos sociais importante oportunidade de praacuteticas e articula-ccedilotildees emancipatoacuterias

Eacute nesse enfoque que se sinaliza o ativismo juriacutedico transnacional junto agrave Comissatildeo e agrave Corte Interamericana de Direitos Humanos como importante instrumento de luta proteccedilatildeo e garantia de direitos fundamentais a partir da atuaccedilatildeo participativa e ativa da sociedade civil junto a espaccedilos aleacutem do Estado

Casos envolvendo o Brasil junto a Comissatildeo e Corte Interamericana de Direitos Humanos a partir da mobilizaccedilatildeo civil reproduziram impactos juriacutedicos e legais internos muito significativos para a pro-teccedilatildeo e garantia de direitos humanos fundamentais Por exemplo o caso Ximenes Lopes implicou a criaccedilatildeo de regras voltadas agrave poliacuteticas puacuteblicas para proteccedilatildeo dos direitos das pessoas com transtornos mentais com a promulgaccedilatildeo da Lei nordm 102162001 o caso de Maria da Penha impulsionou a criaccedilatildeo e publicaccedilatildeo da Lei 113402006 (Lei Maria da Penha) com regras especiacuteficas para coibir a violecircncia domeacutestica e familiar contra a mulher o caso da Hidreleacutetrica de Belo Monte implicou numa grande coalizaccedilatildeo de instituiccedilotildees privadas estatais e sociais em prol da proteccedilatildeo do meio ambiente e direitos humanos Referidos casos servem de exemplo de como o indiviacuteduo eou a sociedade civil podem estar presentes na construccedilatildeo e na defesa do discurso dos interesses dos menos favorecidos excluiacutedos des-protegidos superando o formalismo ideoloacutegico e as limitaccedilotildees institucionais internas

REFEREcircNCIAS

ARNAUD Andreacute-Jean FARINtildeA DULCE Maria Joseacute Introduccedilatildeo agrave anaacutelise socioloacutegica dos sistemas juriacutedicos Traduccedilatildeo de Pellew Wilson Rio de Janeiro Renovar 2000 456 p

_____ JUNQUEIRA Eliane Botelho (orgs) Globalizaccedilatildeo e direito 2 ed Rio de Janeiro Lumen Juris 2005 2 v

CATAtildeO Yolanda Direitos Humanos Chegaremos agrave plenitude democraacutetica dentro do processo de globalizaccedilatildeo com os direitos humanos realmente universalizados Avanccedilos ou simples retoacuterica In ARNAUD Andreacute-Jean JUNQUEIRA Eliane Botelho (Org) Globalizaccedilatildeo e direito 2 ed Rio de Janeiro Lumen Juris 2005

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CADEMARTORI D M L de CADEMARTORI S U A Busca de uma cidadania sul-americana no contex-to da Unasul Revista Eletrocircnica Direito amp Poliacutetica PPCJ da Univali Itajaiacute v 9 n 2 p 1116-1140 2014

DE JULIOS-CAMPUZANO Alfonso de Constitucionalismo em tempos de globalizaccedilatildeo Traduccedilatildeo de Jose Luis Bolzan de Morais e Valeacuteria Ribas do Nascimento Porto Alegre Livraria do Advogado 2009 117 p

GIDDENS Anthony Para aleacutem da esquerda e da direita O futuro da poliacutetica radical Traduccedilatildeo de A Hattnher Satildeo Paulo Unesp 1996

GOHN Maria da Gloacuteria Teorias dos movimentos sociais na contemporaneidade In _____ BRINGEL Breno M (orgs) Movimentos sociais na era global 2 ed Petroacutepolis RJ Vozes 2014

HABERMAS Juumlrgen Consciecircncia moral e agir comunicativo Traduccedilatildeo de Guido A de Almeida Rio de Janeiro Tempo Brasileiro 1989

_____Direito e Democracia entre facticidade e validade Rio de Janeiro Tempo Brasileiro 1997 2v

_____ A Inclusatildeo do outro estudos de teoria poliacutetica Satildeo Paulo Ediccedilotildees Loyola 2007

_____ A Constelaccedilatildeo Poacutes-Nacional Traduccedilatildeo de Maacutercio Selligmann-Silva Satildeo Paulo Littera Mundi 2001

HERRERA FLORES Joaquiacuten A reinvenccedilatildeo dos direitos humanos Traduccedilatildeo de Carlos Roberto Diogo Garcia et al Florianoacutepolis Fundaccedilatildeo Boiteux 2009

_____ Los Derechos en el Contexto de la Globalizacion tres precisiones conceptuales In SAacuteNCHEZ RUBIO David HERRERA FLORES Joaquiacuten CARVALHO Salo de (orgs) Direitos humanos e globali-zaccedilatildeo fundamentos e possibilidades desde a teoria criacutetica 2 ed Porto Alegre EDIPUCRS 2010 578 p Disponiacutevel em lthttpwwwpucrsbredipucrsdireitoshumanospdfgt Acesso em 28 jan 2018

MESQUITA Rogeacuterio Garcia Habermas e a Teoria Discursiva do Direito Revista Perspectiva Erechim v36 n134 p41-52 junho2012 Disponiacutevel em lthttpdxdoiorg101590S0103-49792009000100009gt Acesso em 23 nov 2017

OLIVEIRA Luiz Ademir FERNANDES Adeacutelia Barroso Espaccedilo puacuteblico poliacutetica e accedilatildeo comunicativa a partir da concepccedilatildeo habermasiana Revista Estudos Filosoacuteficos DFIMI UFSJ Satildeo Joatildeo del Rei nordm 6 p 116-130 2011 Disponiacutevel em lthttpwwwufsjedubrrevistaestudosfilosoficosrevista_no_6phpgt Acesso em 23 nov 2017

PIOVESAN Flaacutevia Direitos humanos e o direito constitucional internacional 13 ed rev e atual Satildeo Paulo Saraiva 2012 693 p

_____ Direitos sociais econocircmicos e culturais e direitos civis e poliacuteticos SUR - Revista Internacional de Direitos Humanos Rede Universitaacuteria de Direitos Humanos Satildeo Paulo Nuacutemero 1 Ano 1 1ordm semestre p 21-47 2004

SANTOS Boaventura de Sousa (org) A globalizaccedilatildeo e as ciecircncias sociais 4 ed Satildeo Paulo Cortez 2011 572 p

SANTOS Ceciacutelia MacDowell Ativismo juriacutedico transnacional e o Estado reflexotildees sobre os casos apresentados contra o Brasil na Comissatildeo Interamericana de direitos humanos SUR - Revista Internacional de Direitos Humanos Rede Universitaacuteria de Direitos Humanos Satildeo Paulo Nuacutemero 7 Ano 4 p 26-57 2007

TEIXEIRA Anderson V Compreendendo a Globalizaccedilatildeo em seus Diversos Contextos In _____ Teoria Pluriversalista do Direito Internacional Satildeo Paulo Martins Fontes 2011

VIEIRA Oscar Vilhena Globalizaccedilatildeo e Constituiccedilatildeo Republicana In PIOVESAN Flaacutevia (Coord) Direitos humanos globalizaccedilatildeo econocircmica e integraccedilatildeo regional desafios do direito constitucional internacional Satildeo Paulo Max Limonad 2002 p 449-476

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A REALIDADE DO SISTEMA SOCIOEDUCATIVO E A REDUCcedilAtildeO DA MAIORIDADE PENAL SOB A OacuteTICA DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS

THE REALITY OF THE SOCIO-EDUCATIONAL SYSTEM AND THE REDUCTION OF CRIMINAL MAJORITY UNDER THE VIEW OF FUNDAMENTAL RIGHTSJonathan Cardoso Reacutegis1

Resumo O presente trabalho visa traccedilar breve reflexatildeo quanto a possibilidade (ou natildeo) da reduccedilatildeo da Maioridade Penal sob a oacutetica da realidade do sistema socioeducativo e por consequecircncia quanto a perspectiva dos direitos fundamentais Acredita-se na ideia da produccedilatildeo de norma legitimada pela sociedade contemporacircnea em estudar a impossibilidade da reduccedilatildeo da Maioridade Penal no Estado brasileiro iniciando pela contextualizaccedilatildeo acerca dos direitos fundamentais e da proteccedilatildeo a crianccedila e ao adolescente Em seguida demonstrar sucintamente a realidade brasileira frente ao desenvolvimen-to socioeconocircmico e sua influecircncia ao crescimento de ato infracional por adolescente em conflito com a lei Na sequecircncia a realidade do sistema socioeducativo e a polecircmica discussatildeo quanto a reduccedilatildeo da Maioridade Penal bem como a reflexatildeo do que realmente importa a simples responsabilizaccedilatildeo do ado-lescente em conflito com a lei ou mecanismos de prevenccedilatildeo

Palavras-chave Adolescente Direitos Fundamentais Maioridade Penal

Abstract The present work aims to give a brief reflection on the possibility (or not) of the reduction of the Penal Majority from the point of view of the reality of the socio-educational system and consequently the perspec-tive of fundamental rights It is believed in the idea of the production of a norm legitimated by contemporary society in studying the impossibility of reducing the Penal Majesty in the Brazilian State starting with the con-textualization about the fundamental rights and the protection of the child and the adolescent Next briefly demonstrate the Brazilian reality regarding socioeconomic development and its influence to the growth of an infraction by adolescents in conflict with the law In the sequence the reality of the socio-educational system and the controversial discussion about the reduction of the Criminal Majority as well as the reflection of what really matters the simple responsibility of the adolescent in conflict with the law or mechanisms of prevention

Key words Adolescent Fundamental Rights Age of Criminal Responsibility

1 INTRODUCcedilAtildeO

O objeto do presente artigo estaacute em buscar uma breve reflexatildeo acerca da possibilidade (ou natildeo) da reduccedilatildeo da Maioridade Penal e a realidade do sistema socioeducativo sob a perspectiva dos direitos fundamentais

Sabe-se que desde 1993 atraveacutes da PEC 171 tramita no Congresso Nacional uma discussatildeo quanto a reduccedilatildeo da maioridade penal com vistas a alteraccedilatildeo do texto constitucional mais precisamente em seu art 228 a fim de que o adolescente com idade entre dezesseis e dezoito anos possa da mesma for-ma que o maior de idade ser penalmente responsabilizado quando do cometimento de infraccedilatildeo penal sob a eacutegide do regramento estabelecido no Coacutedigo Penal brasileiro e natildeo sob o disposto no Estatuto da Crianccedila e do Adolescente - ECA

1 Doutor em Ciecircncia Juriacutedica ndash Univali Doctor en Derecho ndash Univ AlicanteEspanha Mestre em Gestatildeo de Poliacuteticas Puacuteblicas ndash Univali

Especialista em Administraccedilatildeo de Seguranccedila Puacuteblica ndash UnisulPMSC Bacharel em Direito ndash Univali Profordm no Curso de graduaccedilatildeo de

Direito ndash Univali Membro do IASC E-mail joniregisunivalibr

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Ocorre que a realidade do sistema socioeducativo brasileiro natildeo diverge muito do sistema prisional em nosso paiacutes ferindo em ambos premissas voltadas a dignidade da pessoa humana e ao final via de regra natildeo proporcionando objetivamente o previsto pelo legislador ao adolescente em conflito com a lei na aplicaccedilatildeo das medidas socioeducativas o aspecto educativo de conscientizaccedilatildeo e de retorno ao conviacutevio social e familiar

Isto posto vale destacar que muito embora exista um crescimento de menores de idade em praacuteticas delitivas acredita-se que a reduccedilatildeo da imputabilidade penal na legislaccedilatildeo brasileira natildeo seria a melhor soluccedilatildeo mas sim uma aplicaccedilatildeo e cumprimento efetivo das Medidas Socioeducativas reestruturan-do a legislaccedilatildeo vigente alcanccedilaria o resultado pretendido a exemplo de paiacuteses da Ameacuterica do Sul e Europeus existindo uma responsabilizaccedilatildeo penal juvenil diante do processo de formaccedilatildeodesenvol-vimento dos jovens

O crescimento da participaccedilatildeo do menor infrator em infraccedilotildees penais resulta de um fenocircmeno social natildeo apenas psicoloacutegico e desvio de conduta o qual decorre da desigualdade socioeconocircmica e da ausecircncia de oportunidades competindo ao Estado a famiacutelia e a sociedade participaccedilatildeo efetiva em bus-ca de soluccedilotildees natildeo apenas ao longo do processo de ressocializaccedilatildeo mas especialmente preventivo atraveacutes da proposiccedilatildeo da adoccedilatildeo de um novo modelo de alteraccedilatildeo do texto legal e natildeo simplesmente reduzir a imputabilidade penal

2 DIREITOS HUMANOS E DA PROTECcedilAtildeO DA CRIANCcedilA E DO ADOLESCENTE

A fim de melhor compreensatildeo acerca do que se busca na presente reflexatildeo essencial destacar que se tem os Direitos e Garantias Fundamentais como sendo um conjunto de direitos e garantias do ser insti-tucionalizado realccedilado pelo respeito a dignidade humana e a proteccedilatildeo estatal bem como em proporcio-nar condiccedilotildees miacutenimas de vida e desenvolvimento do ser humano com vistas na garantia em respeitar o direito a vida a liberdade a igualdade a dignidade dentre outros direitos inerentes a Pessoa Humana

Sabe-se ainda que os Direitos Humanos fundamentais adveacutem da fusatildeo de diversas fontes tendo-se como ponto principal ou inicial a imprescindibilidade em limitar e controlar os excessos abusivos por parte do Estado e seus agentes consagrando-se os princiacutepios baacutesicos da igualdade liberdade legalida-de e Dignidade da Pessoa Humana inerentes ao Estado moderno e contemporacircneo visando assim o pleno desenvolvimento da personalidade humana

[] a funccedilatildeo de direitos de defesa dos cidadatildeos sob uma dupla perspectiva (1) constituem num

plano juriacutedico-objetivo normas de competecircncia negativa para os poderes juriacutedicos proibindo

fundamentalmente as ingerecircncias destes na esfera juriacutedica individual (2) implicam num plano

juriacutedico-subjetivo o poder de exercer positivamente direitos fundamentais (liberdade positiva)

e de exigir omissotildees dos poderes puacuteblicos de forma a evitar agressotildees lesivas por parte dos

mesmos (liberdade negativa) (CANOTILHO 1995 p 517)

Importa observar que desde o nascimento da Organizaccedilatildeo das Naccedilotildees Unidas (ONU) em 1945 o con-ceito de Direitos Humanos se tem universalizado alcanccedilando uma grande importacircncia na cultura juriacute-dica internacional em especial o periacuteodo poacutes 2ordf Guerra Mundial com a assinatura da Carta das Naccedilotildees Unidas tambeacutem conhecida por Carta de Satildeo Francisco de 26 de junho de 1945 e com entrada em vigor internacionalmente no mecircs de outubro do mesmo ano

A mencionada Carta de Satildeo Francisco composta por cento e onze artigos evidenciada pela preservaccedilatildeo e proteccedilatildeo as geraccedilotildees futuras ldquodo flagelo da guerra que por duas vezes no espaccedilo de uma vida huma-na trouxe sofrimentos indiziacuteveis agrave humanidaderdquo sustentando a crenccedila nos Direitos Fundamentais na dignidade e no valor da Pessoa humana na igualdade de direitos indistintamente somada ao estabe-

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lecimento de condiccedilotildees necessaacuterias para a manutenccedilatildeo da justiccedila assim como tambeacutem do respeito das obrigaccedilotildees resultantes de tratados e de outras fontes do direito internacional e na promoccedilatildeo ao pro-gresso social e melhores condiccedilotildees de vida

Em 10 de dezembro de 1948 temos a Declaraccedilatildeo Universal dos Direitos Humanos a qual fora adotada e proclamada pela Assembleia Geral das Naccedilotildees Unidas como resposta aos horrores da II Guerra Mundial tendo por finalidade sentar as bases da nova ordem internacional que surgia atraacutes do armistiacutecio

[] a Declaraccedilatildeo se impotildee como um coacutedigo de atuaccedilatildeo e de conduta para os Estados integrantes

da comunidade internacional Seu principal significado eacute consagrar o reconhecimento universal

dos direitos humanos pelos Estados consolidando um paracircmetro internacional para a proteccedilatildeo

desses direitos A Declaraccedilatildeo exerce um impacto nas ordens juriacutedicas nacionais na medida em

que os direitos nela previstos tem sido incorporados por Constituiccedilotildees nacionais e por vezes

servem como fonte para decisotildees judiciais nacionais (PIOVESAN 2015 p 226)

Sabe-se que a garantia dos Direitos Fundamentais dos homens surgiu com a evoluccedilatildeo e o desenvolvi-mento social buscando minimizar os excessos perpetrados pelo Estado e nesse sentido eacute sobremo-do importante assinalar o disposto no art 3ordm do Estatuto da Crianccedila e do Adolescente - ECA quanto a preocupaccedilatildeo do legislador no que diz respeito ao gozo de Direitos Fundamentais e a Proteccedilatildeo Integral assegurando a Pessoas em desenvolvimento atraveacutes da legislaccedilatildeo ou por outros meios ldquotodas as oportunidades e facilidades a fim de lhes facultar o desenvolvimento fiacutesico mental moral espiritual e social em condiccedilotildees de liberdade e de dignidaderdquo

Os Direitos Humanos satildeo em verdade valores eacuteticos morais e poliacuteticos considerados por um deter-minado grupo social em determinada eacutepoca assegurados de forma a permitir uma miacutenima existecircncia da dignidade liberdade e igualdade para qualquer Pessoa em qualquer lugar no mundo baseado na proacutepria existecircncia e viabilidade do ser humano Em outras palavras trata-se de uma realidade social (PECES-BARBA 1995 p 109-112) sendo influenciados a todo o momento pelos aspectos poliacuteticos econocircmicos sociais e culturais

[] um conjunto de faculdades e instituiccedilotildees que em cada momento histoacuterico concretizam as

exigecircncias da dignidade da liberdade e da igualdade humanas as quais devem ser reconhecidas

positivamente pelos ordenamentos juriacutedicos em niacutevel nacional e internacional (LUNtildeO 1990 p 48)

Somado a isso de acordo com Piovesan (2015 p 79) os Direitos Humanos satildeo concebidos como sendo ldquouma unidade indivisiacutevel interdependente e inter-relacionada na qual os valores da igualdade e liber-dade se conjugam e se completamrdquo

Tem-se Direitos Fundamentais como sendo um subsistema dentro do sistema juriacutedico (PECES-BARBA 1995 p 109-112)2 ou seja no sentido em que a pretensatildeo moral justificada possa ser incorporada a uma norma a fim de obrigar seus destinataacuterios e poder ser efetivamente exercida e garantida

Parte-se da premissa que os Direitos Humanos estatildeo fundados em quatro pilares ou teses as quais de acordo com o ensinamento de Ferrajoli (2011) satildeo ldquoessenciais a uma teoria da democracia constitucionalrdquo

Assim a primeira tese encontra-se relacionada a distinccedilatildeo estrutural entre Direitos Fundamentais e os direitos patrimoniais iniciando com aquela que estaacute vinculada a classe de sujeitos e o segundo a qualquer de seus titulares excluindo-se todos os outros Jaacute a segunda tese estaacute no sentido de que os Direitos Fundamentais correspondem ldquoa interesses e expectativas de todosrdquo formando o sustentaacutecu-lo assim como o paracircmetro da igualdade juriacutedica e da democracia a terceira tese relaciona-se com a

2 Un subsistema dentro del sistema juriacutedico el Derecho de los derechos fundamentales lo que supone que la pretensioacuten moral justificada

se a teacutecnicamente incorporable a una norma que pueda obligar a unos destinataacuterios correlativos de las obligaciones juriacutedicas que se

desprenden para que el derecho sea efectivo

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ldquonatureza supranacional de grande parte dos Direitos Fundamentaisrdquo e por fim a quarta tese refe-rindo-se a relaccedilatildeo existente entre os direitos e as garantias assim como tambeacutem pelo fato de que ldquoos Direitos Fundamentais consistem em expectativas negativas ou positivas agraves quais correspondem deveres (de prestaccedilotildees) ou proibiccedilotildees (de lesotildees)rdquo conforme assevera Ferrajoli (2011 p 15-16)

Para compor o conceito de Direitos Fundamentais de forma mais completa Peces-Barba (1995 p 109) enfatiza a existecircncia de trecircs aspetos principais Inicialmente o autor destaca que os Direitos Fundamentais satildeo uma pretensatildeo moral justificada deve estar embasada na Dignidade da Pessoa Humana seu alicerce bem como calcada em valores baacutesicos nas ideias de liberdade solidariedade humana e de igualdade que com o passar dos tempos foi sendo somada a ideia de seguranccedila juriacutedica e influecircncia da filosofia poliacutetica liberal democraacutetica e socialista Como pretensatildeo moral justificada deve corresponder a direitos cujo conteuacutedo pode ser generalizado aplicado a todos de forma igualitaacuteria

Direitos Fundamentais pode ser definido como sendo

[] todos aqueles direitos subjetivos que dizem respeito universalmente a ldquotodosrdquo os seres

humanos enquanto dotados do status de pessoa ou de cidadatildeo ou de pessoa capaz de agir

Compreendo por ldquodireito subjetivordquo qualquer expectativa positiva (a prestaccedilatildeo) ou negativa (a

natildeo lesatildeo) vinculada a um sujeito por uma norma juriacutedica e por status a condiccedilatildeo de um sujeito

prevista tambeacutem esta por uma norma juriacutedica positiva qual pressuposto da sua idoneidade a ser

titular de situaccedilotildees juriacutedicas eou autor dos atos que estatildeo em exerciacutecio (FERRAJOLI 2011 p 9)

Ressalta-se que esses instrumentos de garantia de Direitos Humanos dispotildeem de maximizaccedilatildeo de for-ccedila juriacutedica a partir do instante em que satildeo ratificados no acircmbito interno de cada paiacutes incorporando assim o regramento estabelecido internacionalmente ao contexto e ordenamento juriacutedico no com-prometimento compromisso responsabilidade promoccedilatildeo respeito e proteccedilatildeo da cidadania e dos Direitos Humanos

Sendo assim os Direitos Fundamentais devem ser incorporados a uma norma com poder de obrigar os destinataacuterios e possibilidade de ser garantida Por uacuteltimo os Direitos Fundamentais satildeo uma realida-de social sendo influenciados pelas condiccedilotildees sociais econocircmicas poliacuteticas econocircmicas e culturais

2 REALIDADE BRASILEIRA E A CRIANCcedilA E ADOLESCENTE EM CONFLITO COM A LEI BREVES CONSIDERACcedilOtildeES

A fim de se pensar e refletir quanto a possibilidade (ou natildeo) da reduccedilatildeo da Maioridade Penal no Estado brasileiro passa-se a traccedilar de forma breve a realidade social e se esta pode influenciar na formaccedilatildeo ou natildeo do surgimento do menor em conflito com a lei

Quando se fala em realidade social deve-se reportar num primeiro momento no que dispotildee a Constituiccedilatildeo da Repuacuteblica Federativa do Brasil de 1988 - CRFB1988 em especial em seus art 1ordm 3ordm 5ordm e 6ordm sendo que este uacuteltimo preza pelos direitos sociais no Estado Democraacutetico de Direito

Nesse sentido a CRFB1988 estabelece que dentre os fundamentos da Repuacuteblica Federativa do Brasil constituiacuteda em Estado Democraacutetico de Direito a Dignidade da Pessoa Humana somada a seus obje-tivos fundamentais dentre estes a garantia do desenvolvimento nacional bem como a erradicaccedilatildeo da pobreza da marginalizaccedilatildeo e minimizando as desigualdades sociais e regionais

Somado a isso o art 6ordm do texto constitucional obteve nova redaccedilatildeo decorrente da Emenda Constitucional nordm 90 de 15 de setembro de 2015 a qual estabelece que ldquosatildeo direitos sociais a edu-caccedilatildeo a sauacutede a alimentaccedilatildeo o trabalho a moradia o transporte o lazer a seguranccedila a previdecircncia social a proteccedilatildeo agrave maternidade e agrave infacircncia a assistecircncia aos desamparados []rdquo nos termos dispostos na CRFB1988

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Dessa forma os direitos sociais tecircm por finalidade em especial proporcionar que o indiviacuteduo detenha condiccedilotildees indispensaacuteveis a garantia e gozo dos direitos constitucionalmente previstos competindo ao poder puacuteblico assegurar melhores condiccedilotildees de vida

Cesarino Juacutenior (2007 p 132) estabelece que os direitos sociais satildeo um complexo de normas e princiacute-pios imperativos tendo por finalidade a adaptaccedilatildeo da concepccedilatildeo juriacutedica agrave realidade social mediante o entendimento de que o homem na sua individualidade socializada e concretizada estaacute calcado na ldquoproteccedilatildeo dos direitos individuais dependentes do produto de seu trabalho para a subsistecircncia sua e de suas famiacuteliasrdquo

Muito embora fundamental e indispensaacutevel para o crescimento da sociedade humana o desenvolvi-mento econocircmico tambeacutem tem proporcionado ou vem sendo um dos grandes causadores do descon-trole ou melhor desequiliacutebrio social

O crescimento muitas vezes desordenado da induacutestria da agricultura da tecnologia dos espaccedilos urbanos a maacute distribuiccedilatildeo de renda acabam por gerar um descontrole no processo de desenvolvimen-to social (se natildeo houver um acompanhamento e observacircncia dos preceitos constitucionais nesse pro-cesso) acabando por proporcionar as desigualdades tatildeo em voga ao nosso redor e consequentemente fomentar a criminalidade a violecircncia e a pobreza

A implementaccedilatildeo de Poliacuteticas Puacuteblicas eficazes evidenciada em reduzir sensivelmente esse quadro de desigualdade social assim como tambeacutem dos iacutendices de criminalidade objetivando o efetivo exerciacutecio do Estado Democraacutetico de Direito

A previsatildeo constitucional no que se refere ao processo de desenvolvimento social na atual realidade brasileira natildeo vem sendo observada quanto ao miacutenimo necessaacuterio a esse processo que possa contri-buir e evitar a exclusatildeo social3

No que diz respeito ao bem-estar de acordo com estudo realizado pelo Sesi (2012) o mesmo decorre natildeo apenas de recursos econocircmicos mas tambeacutem de aspectos que fogem de caracteriacutesticas natildeo econocircmicas da vida das pessoas (o que fazem podem fazer a apreciaccedilatildeo da proacutepria vida seu meio ambiente natural)

Assim a qualidade de vida deve ser mensurada e sustentada sob diversos criteacuterios em especial aqueles relacionados aos direitos sociais previstos da CRFB1988 como sauacutede educaccedilatildeo condiccedilotildees de traba-lho vida (lazer moradia por exemplo) condiccedilotildees ambientais inseguranccedila pessoal relacionada agrave crimi-nalidade desastres naturais e tambeacutem inseguranccedila econocircmica (niacutevel de desemprego e aposentadoria)

Quando se fala em realidade social brasileira deve-se ter em mente de que forma mensura-se ou se busca tais resultados competindo ao Instituto Brasileiro de Geografia e Estatiacutestica ndash IBGE o estabele-cimento dos indicadores de desenvolvimento a fim de poder visualizar quanto esse aspecto e dessa forma ter uma visatildeo do desenvolvimento social e se esta proporciona (ou natildeo) o miacutenimo desejaacutevel ou esperado no processo de construccedilatildeo e formaccedilatildeo do desenvolvimento de Crianccedilas e Adolescentes e a inserccedilatildeo destas na praacutetica de infraccedilotildees penais

Anualmente o IBGE vem apresentando uma real anaacutelise das condiccedilotildees de vida da populaccedilatildeo brasileira atraveacutes de publicaccedilotildees que demonstram aspectos relacionados ao desenvolvimento social (atraveacutes de indicadores) dentro das distintas realidades populacionais e geograacuteficas existentes no territoacuterio brasileiro

Cumpre ressaltar que tais indicadores levam em conta principalmente o quadro de exclusatildeo e desi-gualdade social assim como tambeacutem as condiccedilotildees de vida como aspectos demograacuteficos ambiente familiar e domiciliar somado aos demais direitos sociais previstos constitucionalmente

3 A exclusatildeo social encontra-se relacionada a quadro de vulnerabilidade desigualdade isolamento eou discriminaccedilatildeo social

que determinas pessoas ou grupos sociais fazem parte A pobreza encontra-se relacionada natildeo apenas a ausecircncia de renda mas

principalmente a carecircncia de acesso aos serviccedilos puacuteblicos de natildeo representaccedilatildeo Dicionaacuterio de poliacuteticas puacuteblicas Org Carmen Luacutecia

Freitas de Castro Cynthia Ruacutebia Braga Gontijo Antocircnio Eduardo de Noronha Amabile Barbacena EdUEMG 2012 p 197-198

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Apresentou-se uma siacutentese de indicadores sociais e a anaacutelise acerca das condiccedilotildees de vida da popula-ccedilatildeo em nosso paiacutes sistematizando uma seacuterie de subsiacutedios relacionadas a realidade brasileira obser-vado ainda as ldquodistintas dimensotildees que envolvem a elaboraccedilatildeo de um sistema de indicadores sociaisrdquo (IBGE 2015 p 7)

Para tanto fez-se uso da anaacutelise de diversas temaacuteticas dentre estas relacionadas aos Aspectos demo-graacuteficos os Grupos sociodemograacuteficos composto por Crianccedilas e Adolescentes idosos e famiacutelias bem como os direitos sociais propriamente ditos (domiciacutelio trabalho educaccedilatildeo e distribuiccedilatildeo de renda) com vistas a identificar atraveacutes da comparaccedilatildeo temporal alguns indicadores e assim identificar impor-tantes aspectos e seu processo evolutivo

Destaca-se que foi empregado como fonte de tais informaccedilotildees a Pesquisa Nacional por Amostra de Domiciacutelios ndash PNAD 2014 somada a outras fontes de dados existentes como o Censo Demograacutefico 2010 a Pesquisa Nacional de Sauacutede do Escolar - PeNSE Pesquisa Nacional de Sauacutede - PNS e bases de dados do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Aniacutesio Teixeira - INEP do Ministeacuterio da Educaccedilatildeo

Fundada em tal estudo a anaacutelise dos indicadores tem como ponto de partida as desigualdades sociais e buscando novas perspectivas na mensuraccedilatildeo do bem-estar social que natildeo gira em torno tatildeo somente aos indicadores de produccedilatildeo mas em especial a apropriaccedilatildeo da riqueza produzida pelos paiacuteses

A pesquisa realizada pelo IBGE e ora referenciada ressalta a diversidade caracteriacutestica da populaccedilatildeo bra-sileira somada a submissatildeo nas uacuteltimas deacutecadas de mudanccedilas econocircmicas sociais e demograacuteficas pas-sando entatildeo a proceder uma anaacutelise comportamental e de maneira mais especiacutefica sobre determinados grupos dentre estes Crianccedilas e Adolescentes os quais detecircm legislaccedilatildeo especiacutefica que os ampara nes-se caso o ECA somada a tutela constitucional prevendo a prioridade na efetivaccedilatildeo e gozo dos Direitos Fundamentais e sociais inerentes a Pessoa Humana e em especial a essas Pessoas em desenvolvimento

Sabe-se que esse processo de desenvolvimento da Crianccedila e do Adolescente evidenciando pelo bem--estar das mesmas encontra-se vinculado segundo a Siacutentese de indicadores sociais do IBGE (2015 p 25) da melhoria de maneira macro das condiccedilotildees de vida em sociedade

A realidade injusta na distribuiccedilatildeo de renda eacute que impede ou impossibilita por assim dizer o ldquobem-es-tar atual e o desenvolvimento futuro de suas sociedades e economiasrdquo somada a taxa de crescimento anual do PIB no acircmbito da Ameacuterica Latina o Brasil manteve-se dentro da meacutedia em comparaccedilatildeo a outros paiacuteses sendo que o crescimento econocircmico na uacuteltima deacutecada e a reduccedilatildeo significativa das desi-gualdades de renda proporcionaram melhoria nas condiccedilotildees de vida do brasileiro girando em uma meacutedia de 3 (trecircs por cento) de crescimento conforme exposto pela pesquisa do IBGE (2015 p 79)

Importa observar que pobreza exclusatildeo social e desigualdade encontram-se interligados assumindo no territoacuterio brasileiro uma ldquodimensatildeo abrangenterdquo

Essa eacute a liccedilatildeo de Silva (2010 p 156) a qual afirma que a pobreza no Brasil evidencia

[] um quadro amplo para intervenccedilatildeo de poliacuteticas puacuteblicas de corte social entendendo que as

poliacuteticas sociais para serem mais eficazes devem estar articuladas a poliacuteticas macroeconocircmicas

que garantam um crescimento econocircmico sustentado a geraccedilatildeo de emprego a elevaccedilatildeo

da renda proveniente do trabalho e sobretudo a redistribuiccedilatildeo de renda ainda altamente

concentrada no Brasil

Silva (2010 p 157) ainda destaca que a exclusatildeo social natildeo estaacute vinculada uacutenica e exclusivamente sob o aspecto econocircmico em estabelecer a vulnerabilidade mas deve ldquoser considerada em articulaccedilatildeo com a proteccedilatildeo socialrdquo

Ademais tendo-se uma sociedade marginalizada sob a oacutetica econocircmica e socialmente falando ldquotem constituiacutedo massas de trabalhadores autocircnomos ou assalariados com rendimentos iacutenfimos que os levam a uma vida precaacuteria e sem proteccedilatildeo social considerados potencialmente perigososrdquo sendo que

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na realidade brasileira a pobreza foi arraigada como resultado de um processo de desenvolvimento concentrado na ldquoriqueza socialmente produzida e dos espaccedilos territoriais representados pelos gran-des latifuacutendios no meio rural e pela especulaccedilatildeo imobiliaacuteria no meio urbanordquo somada a escassez de meios de subsistecircncia (SILVA 2010 p 157)

Com isso ante a impossibilidade efetiva do gozo e exerciacutecio dos Direitos Fundamentais inerentes a Pessoa Humana acaba proporcionando com que permaneccedilam excluiacutedos e marginalizados em espe-cial Crianccedilas e Adolescentes

Esse quadro de exclusatildeo e desigualdade social resulta na realidade brasileira em violecircncia reflexo da insuficiecircncia do Estado em fomentar Poliacuteticas Puacuteblicas eficazes a fim de minimizar ou regular a situaccedilatildeo

[] A violecircncia que entrecorta o Brasil eacute a mesma que afasta investidores leva agrave morte milhares

de viacutetimas provoca o encarecimento de produtos e serviccedilos segurados fomenta injusticcedilas

sociais determina poliacuteticas de seguranccedila truculentas constroacutei o medo social legitima frentes

de accedilatildeo popular conservadoras degenerando os laccedilos da vida social (BITTAR 2008 p 115)4

A deficiecircncia relacionada a igualdade e cidadania deve ser compreendida como imprescindiacutevel ao gozo dos Direitos Fundamentais vinculadas a ldquoquestotildees de poliacuteticas de seguranccedila puacuteblicardquo acaba por caracterizar a violecircncia como uma ciranda que eacute produzida e reproduzida perpetuando-se ldquona dinacircmi-ca de organizaccedilatildeo da vida socialrdquo vista como ldquoum alarmante estado de instabilidade e descontentamen-to geral da sociedaderdquo bem como natildeo deve ser analisada como um problema isolado dentro de Estado ou de um paiacutes conforme assevera Bittar (2008 p 215)

Cumpre ressaltar que de acordo com a liccedilatildeo de Campos (2003 p 51) o crescimento da violecircncia muito embora natildeo seja o fato gerador da exclusatildeo social decorre como sendo o reflexo da realidade existente pela exasperaccedilatildeo de competiccedilatildeo social ldquodas alteraccedilotildees dos valores morais e da nova loacutegica da sociabilida-de que conforma uma sociedade de consumo e tambeacutem em grande medida pela incapacidade de o poder puacuteblico reverter significativamente os indicadores da velha exclusatildeordquo demonstrando assim a correlaccedilatildeo entre a violecircncia urbana desigualdade social e a inserccedilatildeo do menor em conflito com a lei na praacutetica de delitos vem crescendo diariamente e sem uma perspectiva imediata em minimizar essa realidade

Insta salientar que outros aspectos conceituais em especial envolvendo aqueles integrantes da par-cela mais pobre e marginalizada da populaccedilatildeo demonstram que natildeo apenas o desenvolvimento des-controlado mas principalmente como jaacute asseverado a maacute distribuiccedilatildeo de renda o descaso do poder puacuteblico constituiacutedo que natildeo busca minimizar tais desigualdades ou disparidades acaba por gerar o crescimento de accedilotildees criminosas e consequentemente proporcionando um desequiliacutebrio social

3 A REALIDADE DO SISTEMA SOCIOEDUCATIVO E A REDUCcedilAtildeO DA MAIORIDADE PENAL

Eacute sabido que os conflitos fazem parte da vida em sociedade sendo que para regular as relaccedilotildees de con-flito compete ao Estado atraveacutes das normas do direito penal impor restriccedilotildees e proibiccedilotildees para coibir determinadas condutas que extrapolam o limite socialmente aceitaacutevel

O Direito Penal segundo Gonsalves (2010 p 3) eacute o ramo do direito puacuteblico que define as infraccedilotildees penais estabelecendo as penas e as medidas de seguranccedila aplicaacuteveis aos infratores Distingue-se o direito penal objetivo que eacute o conjunto de normas penais em vigor do direito penal subjetivo que eacute o direito de punir que surge para o Estado com a praacutetica de uma infraccedilatildeo penal

4 O crescimento dos crimes e da violecircncia no Brasil eacute em grande medida consequecircncia da emergecircncia e disseminaccedilatildeo do crime organizado

no Brasil em especial em torno do traacutefico de drogas fenocircmeno intensificado a partir da deacutecada de 80 do seacuteculo passado (ADORNO

Seacutergio Crime puniccedilatildeo e prisotildees no Brasil um retrato sem retoques p 08 In Foro Iberoamericano Sobre Seguridad Ciudadana Violecircncia

Social Y Poliacuteticas Publicas Madrid Espanha Anais jun 2006 p19-21 No prelo)

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Ao tutelar o bem juriacutedico o direito penal prevecirc que para cada infraccedilatildeo cometida uma retribuiccedilatildeo na modalidade de pena que seraacute aplicada pelo Estado juiz

A coerccedilatildeo penal (basicamente a pena) deve procurar materializar uma aspiraccedilatildeo eacutetica que seraacute

a razatildeo de atuaccedilatildeo do proacuteprio Direito Penal [hellip] a fim de buscar a prevenccedilatildeo de futuras afetaccedilotildees

de bens juriacutedicos [hellip] a sanccedilatildeo penal soacute seria legiacutetima quando se prestasse para restabelecer

a ordem juriacutedica afetada pela conduta humana violadora de interesses do corpo social [hellip]

(CHAVES JUacuteNIOR OLDONI 2014 p 21)

Aleacutem de normas reguladoras das relaccedilotildees sociais o Direito Penal busca tutelar bens juriacutedicos de inte-resse individual e coletivo como a vida a liberdade e o patrimocircnio devendo fazer atraveacutes do devido processo legal

Ademais o sistema penal deve cumprir com sua funccedilatildeo atendendo os princiacutepios do direito penal em especial o princiacutepio da legalidade e da Dignidade da Pessoa Humana dando uma resposta satisfatoacuteria tanto na puniccedilatildeo do agente quanto na sua reintegraccedilatildeo social conforme exposto por Reacutegis e Paulo (2016) o que pode ser constatado em verdade que natildeo vem atendendo e alcanccedilando a previsatildeo legal e as expectativas da sociedade

A CRFB1988 enfatiza que eacute dever do Estado promover a seguranccedila e exercer o direito de punir quem infrin-gir as normas aplicando a puniccedilatildeo atraveacutes do devido processo legal que eacute garantido constitucionalmente contudo inexiste mecanismos eficazes que permita ao Estado cumprir com tal preceito constitucional

Vigora no direito penal o princiacutepio da intervenccedilatildeo miacutenima o que orienta e limita o poder incriminador do Estado preconizando que a criminalizaccedilatildeo de uma conduta soacute se legitima se constituir meio neces-saacuterio para proteccedilatildeo de determinado bem juriacutedico (CUNHA 2015 p 32)

Assim o Direito penal foi instituiacutedo para solucionar possiacuteveis conflitos que ameaccedilam ou provocam lesatildeo aos bens juriacutedicos tutelados atuando de forma residual respeitando o princiacutepio da intervenccedilatildeo miacutenima ou seja reservado aos casos que os outros ramos do direito natildeo trazem a soluccedilatildeo baseado na Dignidade da Pessoa Humana e na ampla defesa

Nesse sentido o sistema prisional e da mesma forma o sistema socioeducativo tecircm a funccedilatildeo tatildeo somente enclausuradora com superlotaccedilatildeo de inadequadas condiccedilotildees estruturais e humanas inade-quadas e despreparadas que natildeo visam a reeducaccedilatildeo eou ressocializaccedilatildeo do infrator ou do adoles-cente em conflito com a lei havendo por forccedila disso (e natildeo haacute caminho diverso) para a intensa criacutetica voltada ao sistema penal e consequentemente ao sistema socioeducativo

Que prisotildees onde estatildeo enclausuradas milhares de pessoas desprovidas de assistecircncia sem

nenhuma separaccedilatildeo em absurda ociosidade [] Prisotildees onde muitos aguardam julgamento

durante anos enquanto outros satildeo mantidos por tempo superior ao da sentenccedila Prisotildees onde

por alegada inexistecircncia por local proacuteprio para triagem os receacutem-ingressos que deveriam

submeter-se a uma observaccedilatildeo cientifica satildeo trancafiados em celas de castigo ao lado de presos

extremamente perigosos (LEAL 2001 p 58)

Em outras palavras de acordo com Chaves Juacutenior e Oldoni (2014 p 201) a prisatildeo eacute tida como sendo o ldquouacutenico meio para o controle das relaccedilotildees sociais e eliminaccedilagraveo da criminalidaderdquo constatando-se o cres-cimento significativo da violecircncia e a ilusatildeo de que a clausura no cumprimento da pena iraacute minimizar as mazelas e os problemas sociais decorrentes do aprosionamento

Natildeo seraacute exposto aqui quanto a responsabilidade estatal e dos administradores do sistema prisional quanto a omissatildeo na observacircncia de condiccedilotildees miacutenimas de dignidade ao condenado contudo impor-tante destacar que

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[] una lluvia de demandas judiciales fueron interpuestas contra los administradores de las

prisiones por abusos malos tratos arbitrariedad injustificada revocacioacuten injustificada de la

libertad condicional inhumanas condiciones de encarcelamiento y un largo etceacutetera de causas que

tras algunos intentos fallidos lograron que los tribunales federales rompieran con su tradicional

poliacutetica de hands off y entraran a revisar los procesos de concesioacuten de los beneficios penitenciarios

y las condiciones de cumplimiento de las penas de privacioacuten de libertad Concretamente en cuanto

a las condiciones de encarcelamiento los tribunales federales comenzaron a llevar a cabo una

aplicacioacuten mucho maacutes rigurosa de la legislacioacuten sobre derechos civiles y de la Octava Enmienda

de la Constitucioacuten de los EEUU que prohiacutebe expresamente la imposicioacuten de penas crueles y

extraordinarias Con una situacioacuten penitenciaria en la que una buena parte de los establecimientos

se encontraban en condiciones deplorables por la inhumanidad del trato ofrecido a los reclusos

la falta de garantiacuteas para la integridad fiacutesica de los internos la falta de miacutenimas condiciones de

higiene salubridad y habitabilidad los jueces federales comenzaron a remitir a los responsables

directos e indirectos de los establecimientos penitenciarios las oportunas oacuterdenes para que los

adecentaran y humanizaran para que los dotaran con los adecuados medios y personal sanitarios

y para que se pusiera fin al ejercicio de praacutecticas contrarias a los derechos civiles En caso contrario

se encontrariacutean expuestos a responsabilidades criminales y a tener que hacer frente a fuertes

multas5 (DEL ROSAL 1998 p 125)

Diante da falecircncia do sistema prisional brasileiro na liccedilatildeo de Falconi (1998 p 103) o qual eacute puacuteblico e notoacuterio aliado ao reduzido espaccedilo fiacutesico existente e ofertado para o cumprimento da pena as super-lotaccedilotildees inexiste o espiacuterito humanitaacuterio de conduta reciacuteproca entre os envolvidos (infratores da lei e Estado) impossibilitando a observacircncia de tais regramentos uma vez que em natildeo havendo ldquoqualquer bem ou benefiacutecio recebido entatildeo haveraacute de prevalecer a rebeldia a indiferenccedila a apatia a dissimula-ccedilatildeo a falsidade e a deslealdaderdquo comportamentos e condutas estas que satildeo comuns dentro do sistema prisional justamente por natildeo existir o fiel cumprimento dos preceitos estabelecidos pela legislaccedilatildeo infraconstitucional

Agora a pergunta que se faz eacute se haacute falecircncia no sistema prisional brasileiro eacute possiacutevel que o sistema socioeducativo seja diverso dessa realidade

Certo que natildeo Sendo assim se o legislador a nosso ver por intervenccedilatildeo eou influecircncia social e midiaacute-tica busca dar resposta ante o crescente envolvimento de adolescente em conflito com a lei na praacutetica delitiva colocando em discussatildeo a reduccedilatildeo da Maioridade Penal no paiacutes como resoluccedilatildeo dos proble-mas que mecanismos em especial preventivos poderatildeo ser empregados

O proacuteprio ECA em conjunto com a normativa internacional que tutela a crianccedila e Adolescente nos traz a resposta como o gozo de todos os Direitos Fundamentais a Proteccedilatildeo Integral os meios neces-saacuterios para garantir e permitir o desenvolvimento mental moral fiacutesico e social a disponibilizaccedilatildeo de recursos voltados a proteccedilatildeo da infacircncia e juventude a inclusatildeo e convivecircncia familiar direitos sociais (educaccedilatildeo moradia lazer esporte alimentaccedilatildeo sauacutede profissionalizaccedilatildeo) ou seja com a finalidade de promover o bem-estar da crianccedila e do Adolescente tratando-os de maneira efetiva e humana quando em conflito com a lei

5 [] uma enxurrada de processos foram abertos contra os diretores de abusos prisatildeo maus tratos arbitraacuterias injustificada revogaccedilatildeo

injustificada da liberdade condicional condiccedilotildees de detenccedilatildeo desumanas e uma longa lista de causas que depois de vaacuterias tentativas

frustradas conseguiu o tribunais federais romper com sua tradicional poliacutetica de matildeos fora e entrar para rever os processos de concessatildeo

de benefiacutecios e condiccedilotildees de execuccedilatildeo das penas de prisatildeo de prisatildeo Especificamente sobre as condiccedilotildees das prisotildees tribunais federais

comeccedilaram a realizar uma aplicaccedilatildeo muito mais rigorosa da legislaccedilatildeo dos direitos civis e a Oitava Emenda da Constituiccedilatildeo dos EUA que

proiacutebe expressamente a imposiccedilatildeo de penas crueacuteis e extraordinaacuterias Uma situaccedilatildeo prisional em que grande parte dos estabelecimentos

estavam em condiccedilotildees deploraacuteveis a desumanidade do tratamento oferecido aos presos a falta de garantias para a integridade fiacutesica

dos presos a falta de condiccedilotildees miacutenimas de higiene sauacutede e habitabilidade os juiacutezes federais comeccedilaram a se referir agrave responsabilidade

direta e indireta para prisotildees ordens apropriadas para o adecentaran e humanizar por isso eficientemente com meios adequados

e pessoal sanitaacuterio e para seja posto termo ao exerciacutecio de praacuteticas contraacuterio aos direitos civis Caso contraacuterio eles seriam expostos a

responsabilidade criminal e ter de enfrentar pesadas multas (DEL ROSAL Bernardo Blasco La ldquoprivatizacioacutenrdquo de las prisiones una huida

hacia la pena de privacioacuten de libertad Nuacutemero Extraordinario 12 San Sebastiaacuten Eguzkilore 1998 p 125 Disponiacutevel em lthttpwww

ehueusdocuments1736829217430811+Rosalpdfgt Acesso em 05 jun 2016 traduccedilatildeo livre)

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Importa observar que muito embora as Regras de Mandela desenhem um modelo de sistema prisio-nal de bons princiacutepios e praacuteticas no tratamento de presos essas natildeo regulam a ldquogestatildeo de instituiccedilotildees reservadas para jovens em conflito com a lei []rdquo mas ldquode um modo geral podem ser igualmente aplica-das a tais estabelecimentosrdquo (BRASIL REGRAS DE MANDELA 2016 p 18)

Cabe ressaltar que aliado ao regramento nacional quanto ao cumprimento das Medidas Socioeducativas dispostas no ECA aliado ao processo de desenvolvimento e ressocializaccedilatildeo do adolescente em conflito com a lei como mencionado em capiacutetulos anteriores haacute normativas internacionais que reforccedilam o tratamento a ser dispensado a este podendo destacar as Regras Miacutenimas das Naccedilotildees Unidas para a Administraccedilatildeo da Justiccedila Juvenil - Regras de Beijing Regras das Naccedilotildees Unidas para a Proteccedilatildeo dos Menores Privados de Liberdade e Princiacutepios das Naccedilotildees Unidas para a Prevenccedilatildeo da Delinquecircncia Juvenil - Princiacutepios Orientadores de Riad as quais em essecircncia buscam pelo bem estar da crianccedila e do Adolescente

Esse tratamento dispensado ao jovem em conflito com a lei em regra geral diz respeito ao cumprimen-to em entidade exclusivamente voltada para Adolescentes e distinto daquele destinado ao abrigo ou do sistema prisional (adulto) observados ainda a separaccedilatildeo por criteacuterios de idade compleiccedilatildeo fiacutesica e gra-vidade da infraccedilatildeo bem como com imparcialidade e sem distinccedilatildeo de qualquer natureza aliada a adoccedilatildeo de medidas voltadas a prevenccedilatildeo da delinquecircncia as quais devem ser concretizadas na legislaccedilatildeo assim como tambeacutem pelas instituiccedilotildees e ldquonuma rede de serviccedilos destinada a reduzir a motivaccedilatildeo a necessidade e as oportunidades da praacutetica de infraccedilotildees e a eliminar as condiccedilotildees que datildeo lugar a tal comportamentordquo (PRINCIacutePIOS DAS NACcedilOtildeES UNIDAS PARA A PREVENCcedilAtildeO DA DELINQUEcircNCIA JUVENIL)

Respondendo de forma breve o questionamento realizado anteriormente no que se refere a possibili-dade do sistema socioeducativo brasileiro deter uma realidade diversa do sistema prisional brasileiro constata-se que negativamente

Principia-se que no ano de 2012 foi instituiacuteda a Lei no 12594 de 18 de janeiro tendo por finalidade estabelecer o Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo ndash Sinase6 bem como passou a regu-lamentar a execuccedilatildeo das Medidas Socioeducativas destinadas aos Adolescentes quando da praacutetica de Ato Infracional visando obter respostas ldquode como devem ser enfrentadas as situaccedilotildees de violecircncia que envolvem adolescentes autores de atos infracionais ou viacutetimas de violaccedilatildeo de direitos no cumprimen-to de medidas socioeducativasrdquo (MONTE 2011 p 128)

A proposta disposta na referida lei estaacute na integraccedilatildeo entre Uniatildeo Estados Distrito Federal e Municiacutepios na implementaccedilatildeo de programas de atendimento a Adolescente em conflito com a lei quan-do da aplicaccedilatildeo de medida socioeducativa dando liberdade funcional e organizacional desde que res-peitados os termos estabelecidos na legislaccedilatildeo

O Sinase eacute tido conforme dispotildee o art 1o sect1o da Lei no 125942012 como sendo um ldquoconjunto orde-nado de princiacutepios regras e criteacuterios que envolvem a execuccedilatildeo de medidas socioeducativasrdquo os quais os sistemas estaduais e municipais poderatildeo aderir assim como tambeacutem a ldquotodos os planos poliacuteticas e programas especiacuteficos de atendimento a adolescente em conflito com a leirdquo

Quando do cumprimento das Medidas Socioeducativas sobressai aleacutem de despertar o senso de res-ponsabilizaccedilatildeo pela transgressatildeo praticada a integraccedilatildeo social a garantia dos direitos individuais e sociais atraveacutes do cumprimento de seu plano individual de atendimento (art 1o sect2o)

A referida Lei ainda traz aspectos relacionados aos programas de atendimento a organizaccedilatildeo e o funcionamento por unidade demonstrando deter condiccedilotildees necessaacuterias para o cumprimento das Medidas Socioeducativas composta por equipe multidisciplinar (profissionais da sauacutede assistecircncia

6 A referida Lei assim como o Estatuto da Crianccedila e do Adolescente tem por finalidade aleacutem de dispor acerca da proteccedilatildeo integral dos

direitos fundamentais de crianccedilas e adolescentes traccedila diretrizes quanto o atendimento do adolescente infrator em cumprimento de

medidas socioeducativas em especial em instituiccedilotildees de ressocializaccedilatildeo fundamentais a seu desenvolvimento

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social educaccedilatildeo) somado ao fato que para exercer a responsabilidade de dirigente de programa de atendimento nos regimes de semiliberdade e internaccedilatildeo eacute necessaacuteria formaccedilatildeo de niacutevel superior e comprovaccedilatildeo de experiecircncia de no miacutenimo dois anos no trabalho com Adolescentes

O art 52 estabelece ainda que para o cumprimento das Medidas Socioeducativas em regime de pres-taccedilatildeo de serviccedilos agrave comunidade liberdade assistida semiliberdade ou internaccedilatildeo satildeo dependentes de Plano Individual de Atendimento ndash PIA ldquoinstrumento de previsatildeo registro e gestatildeo das atividades a serem desenvolvidas com o adolescenterdquo tendo a participaccedilatildeo efetiva do Adolescente em conflito com a lei e dos responsaacuteveis ou pais sendo que esses ldquotecircm o dever de contribuir com o processo ressociali-zador do adolescenterdquo

Ademais semelhante ao que dispotildee a LEP a Lei no 125942012 instituidora do Sinase em seu art 71 prevecirc que as entidades de atendimento socioeducativo estabeleccedilam um regime disciplinar tipificando explicitamente as infraccedilotildees (leve meacutedia e grave) bem como especificando as sanccedilotildees corresponden-tes assim como a instauraccedilatildeo de procedimento especiacutefico para apurar a transgressatildeo proporcionando os direitos constitucionais do contraditoacuterio e da ampla defesa dentre outros regramentos

Cabe ressaltar ainda que o Sinase busca afastar a imagem de que as entidades de atendimento socioe-ducativo e os locais de cumprimento das Medidas Socioeducativas se aproximem da existente no sis-tema prisional caracterizadas pelo ldquotratamento despersonalizado padronizado e pela falta de mobili-daderdquo (MONTE 2011 p 128)

[hellip] La caacutercel produce hoy reclutaacutendolo sobre todo en las zonas maacutes desfavorecidas de la

sociedad un sector de marginacioacuten social particularmente cualificado por la intervencioacuten

estigmatizante del sistema punitivo del Estado y por larealizacioacuten de aquellos procesos que en

el nivel de la interaccioacuten social y de la opinioacuten puacuteblica son activados por la pena y concurren a

realizar su efecto marginador y atomizador7 (BARATTA 2004 p 174)

Apesar da previsatildeo legal pode ser observado que o sistema socioeducativo eacute infelizmente reflexo do sistema carceraacuterio brasileiro por diversas razotildees tais como sistema repressivo com atos de violecircn-cia fugas rebeliotildees crescimento da populaccedilatildeo de Adolescentes em conflito com a lei superlotaccedilotildees estruturas fiacutesicas improacuteprias insalubridade iacutendices de reincidecircncia ineficiecircncia no papel educativo profissionais sem capacitaccedilatildeo adequada e em nuacutemero insuficiente para atender a demanda os quais em regra adoram comportamento corretivo e coercitivo de manutenccedilatildeo da ordem e de vigilacircncia dos Adolescentes em conflito com as leis e natildeo de assistecircncia de promoccedilatildeo de direitos senso de responsa-bilidade e de ressocializaccedilatildeo

Tal afirmaccedilatildeo pode ser demonstrada natildeo apenas em mateacuterias jornaliacutesticas mas especialmente pelo Conselho Nacional do Ministeacuterio Puacuteblico ndash CNMP o qual expotildee as superlotaccedilotildees nas unidades de internaccedilatildeo de Adolescentes em conflito com a lei (a qual compromete a qualidade do sistema socio-educativo) evasotildees (fugas) e dos 27 (vinte e sete) Estados da Federaccedilatildeo 19 (dezenove) tecircm de 50 a 100 das entidades em condiccedilotildees insalubres (JORNAL DO BRASIL 2015)

O relatoacuterio intitulado ldquoUm Olhar Mais Atento agraves Unidades de Internaccedilatildeo e de Semiliberdade para Adolescentes8rdquo promovido pela Comissatildeo de Infacircncia e Juventude do Conselho Nacional do Ministeacuterio Puacuteblico ndash CIJCNMP mostra o asseverado acima

7 [] A prisatildeo produz hoje reclutaacutendolo especialmente nas zonas mais desfavorecidas da sociedade um setor de marginalizaccedilatildeo social

particularmente qualificado estigmatizando intervenccedilatildeo estatal sistema punitivo e um reservado esses processos ao niacutevel da interaccedilatildeo

social e puacuteblica satildeo ativados por ele e assistir a seu efeito marginalizaccedilatildeo e fazer atomizador (traduccedilatildeo livre)

8 BRASIL Conselho Nacional do Ministeacuterio Puacuteblico Relatoacuterio da Infacircncia e Juventude ndash Resoluccedilatildeo no 672011 um olhar mais atento

agraves unidades de internaccedilatildeo e semiliberdade para adolescentes Brasiacutelia Conselho Nacional do Ministeacuterio Puacuteblico Brasiacutelia CNMP

2015 Disponiacutevel em lthttpwwwcnmpmpbrportalimagesstoriesDestaquesPublicacoesUm_Olhar_mais_Atento_0207_WEB-

completo-ok-1_1pdfgt Acesso em 14 dez 2016

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A Resoluccedilatildeo no 46 de 29 de outubro de 1996 do Conselho Nacional dos Direitos da Crianccedila e do Adolescente ndash Conanda estabelece que as unidades de internaccedilatildeo deveratildeo atender um nuacutemero natildeo superior a 40 (quarenta) Adolescentes realidade esta inexistente no sistema socioeducativo brasileiro

A determinaccedilatildeo de limitar o atendimento em cada unidade a 40 adolescentes visava reestruturar

o sistema de internaccedilatildeo entatildeo vigente de grandes complexos e centros para locais adequados

a um nuacutemero reduzido de adolescentes onde pudessem receber assistecircncia individualizada

(RELATOacuteRIO DA INFAcircNCIA E JUVENTUDE ndash RESOLUCcedilAtildeO nordm 67 2011 p 28)

Previsatildeo essa tanto quanto utoacutepica sendo que o Estado de Santa Catarina tem todas as unidades de internaccedilatildeo dentro dos limites estabelecidos pelo Conanda e Sinase contudo haacute imperceptiacutevel melhoria em suas estruturas a exemplo de outras unidades da Federaccedilatildeo assim como tambeacutem natildeo ficou claramen-te demonstrado se a unidade de cumprimento da medida socioeducativa eacute proacutexima a residecircncia e dos familiares do Adolescente em conflito com a lei mas apenas exposto que seria a mais proacutexima disponiacutevel conforme abordado no Relatoacuterio da Infacircncia e Juventude ndash Resoluccedilatildeo nordm 67 (2011 p 30-31 41)

Outro fator que se assemelha a realidade do sistema prisional eacute a insalubridade ou seja comprome-tidas e desprovidas de ventilaccedilatildeo conservaccedilatildeo higiene e iluminaccedilatildeo adequadas nas unidades assim como a disponibilizaccedilatildeo de salas de aula inadequadas uma vez que a ldquose pressupotildee na educaccedilatildeo a base fundamental para o sucesso do atendimento socioeducativordquo de espaccedilos para a profissionalizaccedilatildeo praacutetica de esportes cultura e lazer (RELATOacuteRIO DA INFAcircNCIA E JUVENTUDE ndash RESOLUCcedilAtildeO nordm 67 2011 p 43-47)

O disposto no art 123 do ECA determina a separaccedilatildeo rigorosa dos Adolescentes em conflito com a lei ldquopor criteacuterios de idade compleiccedilatildeo fiacutesica e gravidade da infraccedilatildeordquo e entre adolescentes em internaccedilatildeo provisoacuteria e definitiva sendo que tais criteacuterios tecircm a finalidade principal de ldquoprevenir atos de violecircncia dos adolescentes uns contra os outrosrdquo criteacuterio este que tambeacutem deixa a desejar e natildeo eacute observado (RELATOacuteRIO DA INFAcircNCIA E JUVENTUDE ndash RESOLUCcedilAtildeO nordm 67 2011 p 48-50)

Sendo assim

O que se verifica pelos dados colhidos no que se refere aos adolescentes em conflito com a lei

eacute uma grande indiferenccedila agrave doutrina da proteccedilatildeo integral trazida pelo Estatuto da Crianccedila e do

Adolescente [] Ademais eacute preciso incentivar o protagonismo a participaccedilatildeo e a autonomia

dos adolescentes em cumprimento de medidas socioeducativas [] Os programas de execuccedilatildeo

de medidas socioeducativas devem permitir que os adolescentes se preparem para a cidadania

e que aprendam a criar perspectivas de vida o que somente seraacute possiacutevel se o sistema for

plenamente socioeducativo com educaccedilatildeo plena e de qualidade preparaccedilatildeo para o trabalho

participaccedilatildeo e integraccedilatildeo social9 (RELATOacuteRIO DA INFAcircNCIA E JUVENTUDE ndash RESOLUCcedilAtildeO

nordm 67 2011 p 85)

Como jaacute asseverado prevalece infelizmente uma proximidade e semelhanccedila da realidade do siste-ma socioeducativo com o sistema prisional brasileiro seja em relaccedilatildeo ao espaccedilo fiacutesico superlotaccedilotildees fugas rebeliotildees insalubridades precariedade de infraestrutura e de formaccedilatildeo dos profissionais dimi-nutas oportunidades de formaccedilatildeo profissional e educacional realidade essa que dificulta sobremanei-ra o que dispotildee os modelos preconizados pelo ECA e Sinase no cumprimento bem como o alcance das Medidas Socioeducativas de transformaccedilatildeoreinserccedilatildeo familiarsocial e de cidadania

Frente a essa realidade complicada e temeraacuteria aprovar a reduccedilatildeo da maioridade (imputabilidade) penal

9 BRASIL Conselho Nacional do Ministeacuterio Puacuteblico Relatoacuterio da Infacircncia e Juventude ndash Resoluccedilatildeo no 672011 um olhar mais atento agraves

unidades de internaccedilatildeo e semiliberdade para adolescentes p 85

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4 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

O assunto em tela teve por finalidade traccedilar uma breve reflexatildeo acerca de um tema atual polecircmico (diante em especial da influecircncia midiaacutetica no processo de formaccedilatildeo de opiniatildeo) e necessaacuterio

Analisar a viabilidade ou possibilidade da reduccedilatildeo da maioridade penal como forma de resoluccedilatildeo da incidecircncia da criminalidade que assola o estado brasileiro eacute responsabilizar pessoas em processo de desenvolvimento os quais satildeo tutelados natildeo apenas sob a eacutegide do texto constitucional quanto infraconstitucional

Obviamente natildeo se pode hoje afirmar que tatildeo somente o aspecto da desigualdade social eacute o fato gerador desse envolvimento de jovens no cometimento de atos infracionais e consequentemente estarem em conflito com a lei necessita-se de muito mais a fim de evitar que esse cenaacuterio se agrave cada vez mais

Os direitos sociais objetivam promover condiccedilotildees essenciais ao gozo de direitos a fim por exemplo em minimizar as desigualdades competindo ao Estado fomentar accedilotildees em busca de melhor qualidade de vida e igualdade social

Esse desequiliacutebrio socioeconocircmico resulta no crescimento da pobreza da violecircncia e dessa forma da criminalidade estando inserido nessa realidade o jovem excluiacutedo socialmente e vulneraacutevel decorren-te da injusta distribuiccedilatildeo de renda e oportunidades impedindo o pleno desenvolvimento destes ante esse quadro de desigualdades

Direitos fundamentais dispostos nacional e internacionalmente satildeo cristalinos nesse processo de formaccedilatildeo e tutela em todos os sentidos das pessoas em desenvolvimento leia-se jovens e crianccedilas contudo a realidade socioeconocircmica poliacutetica e cultural brasileira infelizmente natildeo permite que tais garantias sejam oportunizados com efetividade e eficiecircncia

A realidade do sistema socioeducativo hoje implementado e existente em nosso paiacutes natildeo condiz em absolutamente nada em atender a finalidade proposta pelo legislador brasileiro nesse processo de (re)educaccedilatildeo socializaccedilatildeo e conscientizaccedilatildeo pelo jovem em conflito com a lei ou seja as medidas socioe-ducativas tecircm como objetivo uacutenico e exclusivo em garantir a proteccedilatildeo e possibilitar o desenvolvimento bem como a reintegraccedilatildeo do Adolescente infrator agrave sociedade e ao seio da famiacutelia

Nesse sentido o sistema socioeducativo acaba sendo influenciado (direta ou indiretamente) pela rea-lidade do sistema prisional aliada a reaccedilatildeo social do etiquetamento por diversos fatores tais como fugas rebeliotildees superlotaccedilotildees insalubridade desrespeito as condiccedilotildees miacutenimas de Dignidade da Pessoa Humana (e em desenvolvimento) e pela ineficiecircncia do caraacuteter educativo das medidas soma-do ao comportamento coercitivo imposto prejudicando ou impedindo sobremaneira o processo de ressocializaccedilatildeo

Assim a efetivaccedilatildeo de Poliacuteticas Puacuteblicas preventivas seria outro fator visando minimizar o crescimen-to de conduta infratora do menor de idade em cumprimento a previsatildeo constitucional e estabelecida no ECA atraveacutes de um processo de democratizaccedilatildeo e de ensinamento de valores como solidariedade de respeito e garantia aos Direitos Fundamentais principalmente atraveacutes da educaccedilatildeo em busca da transformaccedilatildeo social

Eacute preciso repensar e mudar

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REFEREcircNCIAS

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SESI Departamento Regional do Paranaacute ndash Curitiba SESIPR 2012 Relatoacuterio da Comissatildeo sobre a Medida de Desempenho Econocircmico e Progresso Social SESI Departamento Regional do Paranaacute ndash Curitiba SESIPR 2012 Traduccedilatildeo de Rapport de la Commission sur la mesure des performances eacuteco-nomiques et du progregraves social STIGLITZ Joseph E SEN Amartya FITOUSSI Jean-Paul (2009) SESI Departamento Regional do Paranaacute ndash Curitiba SESIPR 2012 p 15 Disponiacutevel em lthttpterrito-rioobservatoriofileswordpresscom201304relatc3b3rio-da-comissc3a3o-sobre-a-mensurac3a-7c3a3o-de-desempenho-econc3b4mico-e-progresso-socialpdfgt Acesso em 07 ago 2013

SILVA Maria Ozanira da Silva e Pobreza desigualdade e poliacuteticas puacuteblicas caracterizando e proble-matizando a realidade brasileira Rev Kataacutel Florianoacutepolis v 13 n 2 p 155-163 juldez 2010 p 156 Disponiacutevel em lthttpwwwscielobrpdfrkv13n202pdfgt Acesso em 29 dez 2015

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LA FRAGILIDAD DE LOS DERECHOS1

Joseacute Calvo Gonzaacutelez2

1 LA VIEJA SEGURIDAD ANTEAYER A MAacuteS DE UN SIGLO

En el reloj de la memoria europea de Stefan Zweig (Viena 1881- Petroacutepolis Brasil 1942) suenan al inicio de El mundo de ayer las horas volcadas al nostaacutelgico recuerdo del viejo mundo de la seguridad

Si busco una foacutermula praacutectica para definir la eacutepoca de antes de la Primera Guerra Mundial la eacutepoca

en que creciacute y me crie confiacuteo en haber encontrado la maacutes concisa al decir que fue la edad de oro

de la seguridad Todo en nuestra monarquiacutea austriaca casi milenaria pareciacutea asentarse sobre el

fundamento de la duracioacuten y el propio Estado pareciacutea la garantiacutea suprema de esta estabilidad Los

derechos que otorgaba a sus ciudadanos estaban garantizados por el Parlamento representacioacuten

del pueblo libremente elegida y todos los deberes estaban exactamente delimitados Nuestra

moneda la corona austriaca circulaba en relucientes piezas de oro y garantizaba asiacute su

invariabilidad Todo el mundo sabiacutea cuaacutento teniacutea o cuaacutento le correspondiacutea queacute le estaba permitido

y queacute prohibido Todo teniacutea su norma su medida y su peso determinados [] En aquel basto impero

todo ocupaba su lugar firme e inmutable y en el maacutes alto de todos estaba el anciano emperador y

si eacuteste moriacutea se sabiacutea (o se creiacutea saber) que vendriacutea otro y que nada cambiariacutea en el bien calculado

orden Nadie creiacutea en las guerras las revoluciones ni las subversiones Todo lo radical y violento

pareciacutea imposible en aquella era la de razoacuten Dicho sentimiento de seguridad era la posesioacuten maacutes

deseable de millones de personas el ideal comuacuten de vida [] Primero soacutelo los terratenientes

disfrutaban de tal privilegio pero poco a poco se fueron esforzando por obtenerlo tambieacuten las

grandes masas [hellip] Tambieacuten hubo avances en el aacutembito social antildeo tras antildeo el individuo fue

obteniendo nuevos derechos la justicia procediacutea con maacutes moderacioacuten y humanidad e incluso el

problema de los problemas la pobreza de las grandes masas dejoacute de parecer insuperable Se otorgoacute

el derecho de voto a grandes ciacuterculos cada vez maacutes amplios y con eacutel la posibilidad de defender

legalmente sus intereses socioacutelogos y catedraacuteticos rivalizaban en el afaacuten de hacer maacutes sana e

incluso maacutes feliz la vida del proletariado iquestEs de extrantildear pues que aquel siglo se deleitara con sus

propias conquistas y considerara cada deacutecada terminada como un mero peldantildeo hacia otra mejor

Se creiacutea tan poco en recaiacutedas en la barbarie -por ejemplo guerras entre los pueblos de Europa-

como en brujas y fantasmas nuestros padres estaban plenamente imbuidos de la confianza en

la fuerza infaliblemente aglutinadora de la tolerancia y la conciliacioacuten Creiacutean honradamente que

las fronteras de las divergencias entre naciones y confesiones se fusionariacutean poco a poco en un

humanismo comuacuten y que asiacute la humanidad lograriacutea la paz y la seguridad esos bienes supremos

Para los hombres de hoy que hace tiempo excluimos del vocabulario la palabra ldquoseguridadrdquo como

un fantasma nos resulta faacutecil reiacuternos de la ilusioacuten optimista de aquella generacioacuten cegada por el

idealismo para la cual el progreso teacutecnico debiacutea ir seguido necesariamente de un progreso moral igual

de veloz Nosotros que en el nuevo siglo hemos aprendido a no sorprendernos de cualquier nuevo

brote de bestialidad colectiva nosotros que todos los diacuteas esperaacutebamos una atrocidad peor que la

del diacutea anterior [hellip] hemos tenido que acostumbrarnos poco a poco a vivir sin el suelo bajo nuestros

pies sin derechos sin libertad sin seguridad Para salvaguardar nuestra propia existencia renegamos

ya hace tiempo de la religioacuten de nuestros padres de su fe en el progreso raacutepido y duradero de la

humanidad a quienes aprendimos con horror nos parece banal aquel optimismo precipitado a la vista

de una cataacutestrofe que de un solo golpe nos ha hecho retroceder mil antildeos de esfuerzos humanos [hellip]

1 Texto del Seminario impartido el 3 de marzo de 2005 en el Programa de Doctorado en Derechos Fundamentales Asignatura de Teoriacutea

juriacutedica de los Derechos Fundamentales Instituto de Derechos Humanos Bartolomeacute de Las Casasacute Universidad Carlos III de Madrid

2 Catedraacutetico de Filosofiacutea del Derecho Facultad de Derecho Universidad de Maacutelaga (Espantildea) jcalvoumaes

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Hoy cuando ya hace tiempo que la gran tempestad lo aniquiloacute sabemos a ciencia cierta que

aquel mundo de seguridad fue un castillo de naipes3

El texto que contiene casi todas sus paraacutefrasis posibles precisa de muy pocos comentarios No es difiacute-cil descubrir en eacutel un graacutefico y penetrante ejemplo de sobre queacute dos condiciones baacutesicas se suscitaba y sosteniacutea en el cuadro de una mentalidad burguesa la relacioacuten armoacutenica entre libertad y seguridad Una era la independencia econoacutemica facilitada bien por disponer de bienes patrimoniales (propiedad) o de abundancia de recursos financieros (capital) bien de coberturas o prestaciones sociales para disminuir o paliar el riesgo lo cual se obteniacutea respectivamente mediante una libertad negocial soacutelo intermediada por requerimientos legales miacutenimos y a traveacutes del desarrollo de un sistema seguros (de accidentes de enfermedad planes de jubilaciones etc como el ideado por el Canciller Bismack y que con rapidez se extendioacute a toda Europa) La otra fue psicoloacutegica y vino dada por la satisfaccioacuten de comprobar que las aspiraciones a la conservacioacuten del orden social se cumpliacutean maacutes perfectamente cuando como en la naturaleza se actuaba con la seguridad de los instintos lo natural en sociedad consistiacutea pues en evitar transiciones y cambios que pudieran perturbar la estabilidad que ocasionaran inseguridad razoacuten por la cual el orden existente del mundo debiacutea mantenerse en estado de tranquilidad para que asiacute efectiva-mente perdurara En consecuencia la inseguridad artificial podiacutea preverse y dejar de serlo y en cuanto a la natural el mundo de la libertad maacutes segura seriacutea aquel que maacutes valora la seguridad de donde la liber-tad dependiacutea de la seguridad Y sin embargo todo ese mundo de seguridad se derrumboacute igual que si se tratara de ldquoun castillo de naipesrdquo

Al cataclismo de la Gran Guerra de 1914 sumaron nuevos efectos las revisiones y correcciones (Estado asistencial como especie de reeditado ldquocontrato socialrdquo en una pujante sociedad industrial) que en la Europa de entreguerras (1918-1933) experimentoacute el Estado de Derecho liberal4 y al definitivo fracaso de eacuteste -como igualmente de aqueacutellas- en el contexto de crisis de la Repuacuteblica de Weimar5 que fue tam-bieacuten el del propio positivismo juriacutedico como emblema del Estado de Derecho formal (derecho como

3 ZWEIG Stefan El mundo de ayer Memorias de un europeo trad de J Fontcuberta y A Orzeszek El Acantilado Barcelona 2001 p

17-22 El lector podraacute hallar una uacutetil guiacutea histoacuterica donde seguir los acontecimientos de la poliacutetica europea y mundial a lo largo de la era

Bismark (1862-1890) y aproximarse al equilibrio de poder durante el periacuteodo comprendido entre 1898 y 1914 consultando las obras

de Karl Theodor HEIGEL y Firtz ENDRES Tendencias poliacuteticas en Europa durante el siglo XIX trad de M Saacutenchez Sarto Edit Labor

Barcelona 1930 (c) y Geoffrey BRUUN La Europa del siglo XIX 1815-1914 (1959) trad de F Gonzaacutelez Aramburu FCE Meacutexico 1974

(2ordf reimp) pp 194-238 Es tambieacuten lectura provechosa Carl E SCHORSKE Viena fin-de-siegravecle poliacutetica y cultura trad de I Meneacutendez

Edit Gustavo Gili Barcelona 1981 para la situacioacuten austriaca entre 1867 y 1918 En Espantildea como sentildeala Joseacute-Carlos MAINER La Edad

de Plata (1902-1931) Ensayo de interpretacioacuten de un proceso cultural Los Libros de la Frontera Barcelona 1975 p 85 la novela de

Manuel CIGES APARICIO (1873-1936) Circe y el poeta (eds Edit Mundo Latino Madrid 1926 Novelas de Manuel Ciges Aparicio ed

introd y notas de Cecilio Alonso Conselleria de Cultura Educacioacute i Ciencia de la Generalitat Valenciana Valegravencia 1986 3 t [Col Clagravessics

valencians 3-4-5] y Edit Siete Mares Madrid 2003) retrata en claves muy sencillas el mundo que conocioacute su edad dorada antes de la

conflagracioacuten europea visto desde la mirada de un poeta revolucionario en el Pariacutes de 1914

4 Harold J LASKI El liberalismo europeo (1936) trad de V Migueacutelez (1939) FCE Meacutexico 1953 (1ordf ed 4ordf reimp) sin restar la merecida

importancia a los profundos progresos que al liberalismo se deben ha sentildealado tambieacuten con claridad las causas del fracaso de la doctrina

liberal como impliacutecitas e inasequibles a todo intento de refundacioacuten ldquoEl individuo a quien el liberalismo ha tratado de proteger es aquel

que dentro de su cuadro social es siempre libre para comprar su libertad pero siempre ha sido una minoriacutea de la humanidad el nuacutemero

de los que tienen recursos para hacer esta compra Puede decirse en suma que la idea de liberalismo estaacute histoacutericamente trabada y

esto de modo ineludible con la posicioacuten de propiedad Los fines a los que sirve son siempre los fines de los hombres que se encuentran

en esa posicioacutenrdquo (pp 16-17) concluyendo que ldquosin duda la idea liberal como tal tratoacute de superar el medio en que fue engendrada Sin

duda tambieacuten la urgencia con que fue predicada como idea ayudoacute a mitigar las consecuencias cabales de la sociedad a cuya formacioacuten

contribuyoacute Pero tan pronto como el liberalismo como espiacuteritu que informa las costumbres de las instituciones tratoacute de efectuar su

transformacioacuten fundamental se halloacute con que era prisionero del fin a cuyo servicio habiacutea sido destinado Porque los hombres que lo

sirvieron no creiacutean en sus derechos como distintos a los de ese finrdquo (p 223)

5 Vid Peter GAY La cultura de Weimar (1968) trad de N Catelli Argos Vergara Barcelona 1984 y Joseacute A ESTEacuteVEZ ARAUJO La crisis

del Estado de Derecho Liberal Schmitt en Weimar Edit Ariel Barcelona 1989 Asimismo Joseph ROTH (1894-1939) El juicio de la

historia escritos 1920- 1939 Proacutel trad y notas de E Gil Bera Eds Siglo XXI Madrid 2004 en croacutenicas sobre el proceso por el asesinato

de Walter Rathenau en 1922 y en general sobre la cultura berlinesa de los antildeos 20

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ldquoformardquo en funcioacuten de la paz6 en la Teoriacutea pura del Derecho de Kelsen) sobrevino agregado el presagiable desmoronamiento del modelo de representacioacuten poliacutetica del Estado parlamentario y tras su derribo sucesivamente la emergencia de otros nuevos fenoacutemenos de legitimacioacuten en estructuras y formas de legalidad caracterizadas esta vez por el comuacuten empleo de una metodologiacutea y dialeacutectica decisionistas de iacutendole autoritaria Asiacute poco antes de producirse el estallido de la Segunda Guerra Mundial las solu-ciones a problemas vinculados en la relacioacuten Derecho y Poder al conjunto de derechos y garantiacuteas sobre Libertad y Seguridad ofreciacutean ya con claridad el panorama de un profundo debilitamiento provocado por la implantacioacuten de regiacutemenes totalitarios ndash triunfo de la revolucioacuten bolchevique (Rusia) y ascenso y apogeo de las doctrinas fascistas (Italia y Alemania)- ademaacutes de acelerado por el raacutepido incremento de las tensiones y rupturas diplomaacuteticas en las que la Paz acabariacutea siendo finalmente destruida Luego ya durante el conflicto beacutelico que tuvo al continente europeo como escenario y referencia principal de una conflagracioacuten de dimensiones planetarias tanto la amenaza al programa ilustrado inspirador del reconocimiento y proteccioacuten de derechos del hombre como la ignorancia o rechazo a los avances nacio-nales e interestatales -auacuten tiacutemidos y asistemaacuteticos- en materias de defensa de libertades civiles y poliacuteti-cas no menos que el desentendimiento transgresioacuten y desprecio al conjunto de convenciones e instru-mentos baacutesicos de la comunidad internacional (Pacto de la Sociedad de Naciones Ginebra 1919) sobre el ius in bello y el derecho a la paz7 se hizo traacutegica e incontestable realidad en una atmoacutesfera donde esa generalizada violacioacuten y absoluto abuso alentada por una ideologiacutea ndashel nazismo- de extraordinaria degradacioacuten moral y brutalidad metoacutedica esencial y hasta metafiacutesicamente deshumanizada envolvioacute el propoacutesito del aniquilar la condicioacuten humana8

2 UNA NUEVA SEGURIDAD AYER NO HACE AUacuteN EL SIGLO

La derrota militar del dominio nazi para la que fue necesaria la alianza de las principales potencias inter-nacionales generoacute tambieacuten durante los primeros antildeos de posguerra un basto compromiso de diaacutelogo multilateral y autocriacutetica del que seraacute expresioacuten el consenso moral adoptado en la Declaracioacuten Universal de Derechos del Hombre9 aprobada por la Asamblea General de Naciones Unidas el 10 de diciembre de 1948 plasmando alliacute el establecimiento de una pauta comuacuten para todas las naciones y el ideal de reali-zacioacuten del ser humano libre La etapa histoacuterica que inauguraba se subsumiacutea en una concienciacioacuten criacute-tica de la incivilidad concluida desde la introspectiva de las atrocidades practicadas en Auschwitz (se cumplen ahora 60 antildeos de la liberacioacuten de este campo de exterminio el 27 de enero de 1945) asiacute como del paulatino aunque todaviacutea muy limitado conocimiento de la represioacuten concentracionaria puesta en marcha por Stalin en Siberia En el Considerando segundo del preaacutembulo de esa Declaracioacuten se lee que en efecto ldquoel desconocimiento y menosprecio de los derechos del hombre han originado actos de bar-barie ultrajantes para la conciencia de la humanidadrdquo

6 Vid Hans KELSEN ldquoDie philosophischen Grundlagen der Naturrechtslehre und des Rechtspositivismusrdquo (1928) en Hans KLECATSKI

Reneacute MARCIC Herbert SCHAMBECK (eds) Die WienerRechtstheoretische Europa Verlag Wien-Frankfurt-Zuumlrich 1968 p 281-350

en espc p 344

7 Para un examen doctrinal de de ius ad bellum e ius in bello Alfonso RUIZ MIGUEL La Justicia de la Guerra y de la Paz CEC Madrid 1988

Vid tambieacuten Raymond ARON Paz y guerra entre las naciones trad de L Cuervo Alianza Editorial SA Madrid 1985 Sobre la profunda

resistencia germana a aceptar la implantacioacuten internacional un codex belli como lex scripta es muy recomendable lo escrito por Ramiro de

MAEZTU durante su estancia londinense y vinculacioacuten a los ciacuterculos del socialismo fabiano para Introduccioacuten (p 11-53 y en espc p 31-39)

a Arnold J TOYNBEE El terrorismo alemaacuten en Beacutelgica Narracioacuten basada en los documentos Hayman Christy amp Lilly Ltd Londres 1917

8 Hannah ARENDT Eichmann en Jerusaleacuten (1963-1965) trad de C Ribalta Edit Lumen Barcelona 1999 Karl JASPERS El problema de

la culpa (1945-1946) trad de R Gutieacuterrez Cuartango e introd de E Garzoacuten Valdeacutes Paidoacutes-ICE de la Universidad Autoacutenoma de Barcelona

Barcelona 1998 Vid tambieacuten Norbert BILBENY El idiota moral La banalidad del mal en el siglo XX Anagrama Barcelona 1993

9 Reproducida en Gregorio PECES-BARBA-Liborio HIERRO-Santiago IacuteNtildeIGUEZ DE ONZONO- Aacutengel LLAMAS Derecho positivo de los

Derechos humanos Editorial Debate Madrid 1987 p 274-280 Sobre su genealogiacutea textual y poliacutetica Antonio CASSESE Los derechos

humanos en el mundo contemporaacuteneo (1988) trad de A Pentimalli Melacrino y B Ribera de Madariaga Edit Ariel Barcelona 1991 p

31 y ss

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No obstante en absoluto se trataba de rescatar y reproducir el agotado paradigma de la vieja seguri-dad baacutesicamente organizado en procedimientos tendentes a evitar o suavizar las domeacutesticas incerti-dumbres pequentildeo-burguesas caracterizadoras del modelo de nacionalismo de Estado liberal Aquella clase de seguridad ndashtal vez la uacutenica concreta e histoacutericamente determinada que el hombre moderno alcanzoacute a conocer- fue la primera viacutectima sacrificada en el extraordinario incendio que abrasoacute todo el mundo contemporaacuteneo10 La inseguridad quedaba ya definitivamente instalada en el estaacutendar de vida de una Humanidad que para entonces pese a vivir una eacutepoca de profunda desconfianza o tal vez por lo que esa misma crisis significaba se decidiacutea sin embargo a proclamar su fe (ldquocomo la aspiracioacuten maacutes ele-vada del hombrerdquo) en ldquoel advenimiento de un mundo en el que los seres humanos liberados del temor y de la miseria disfruten de la libertad de palabra y de la libertad de concienciardquo En adelante los dere-chos humanos no actuariacutean para garantizar la seguridad que para siempre dejoacute de existir e incluso res-pecto de la cual se era en gran medida consciente de que tampoco la sola recuperacioacuten de los restos de la herencia ilustrada (de tradicioacuten individualista) podriacutea devolver a la existencia11 sino para preservar la Paz que soacutelo a tan alto precio pudo ser recuperada Nunca maacutes o mejor nunca jamaacutes el ldquoideal de ser humano librerdquo podriacutea realizarse sin permanecer liberados del temor (y de la miseria) repetiraacuten tam-bieacuten con insistencia el Pacto Internacional de Derechos Civiles y Poliacuteticos (New York 16 de diciembre de 1966) [Reconociendo segundo] y el Pacto Internacional de Derechos Econoacutemicos Sociales y Culturales (New York 16 de diciembre de 1966) [Reconociendo segundo]12 La libertad humana uacutenicamente seriacutea posible velando y protegiendo el en todo ex novo estatus juriacutedico de la emancipacioacuten del miedo (y del mandato legal de desarrollo econoacutemico) obtenido a traveacutes de la Democracia y la Paz desde sus condicionan-te histoacutericos inmediatos la suspensioacuten de la Libertad en los fascismos y el horror de la reciente Guerra

3 LA SEGURIDAD DE HOY AHORA YA EN ESTE SIGLO

Aquella concepcioacuten formada en el juicio valorativo praacutectico sobre la relevancia y responsabilidad del miedo y fuere que en su construccioacuten teoacuterica basilar (Reconociendo sobre innata dignidad del ser huma-no) se inclinara hacia la fundamentacioacuten eacutetica neokantiana del derecho justo13 lo hiciera a favor de reco-brar la antigua idea de derecho natural14 o a diferencia de cualquiera de ambas maacutes bien se mostrara partidaria de reivindicar antes sobre todo su vertiente juriacutedica de positivacioacuten con base en el valor de la dignidad de la persona15 es lo cierto que abrioacute un nuevo rumbo en la historia de los Derechos humanos

Esa idea de los Derechos humanos iba a producir de hecho una fundamental transformacioacuten en el curso de su historia Estrenaba capiacutetulo al establecer para ellos la perspectiva no de salvaguarda de la Seguridad sino de conviccioacuten en la esperanza preservativa de la Paz y precisamente porque la radical experiencia del miedo y su traacutegica catarsis no representaban un principio abstracto planteado por fuera de las condiciones histoacutericas como un golpe del Destino sino una amenaza que efectivamente ya materializoacute sobre la realidad por decisiones y responsabilidades imputables El Holocausto pues

10 Vid Carl AMERY Auschwitz iquestComienza el siglo XXI Hitler como precursor trad de C Garciacutea Ohlrich TurnerFCE Madrid 2002

11 Asiacute la transaccioacuten comunitarista del art 291 ldquoToda persona tiene deberes respecto a la comunidad puesto que soacutelo en ella puede

desarrollar libre y plenamente su personalidadrdquo

12 Reproducidos en Derecho positivo de los Derechos humanos cit p 361-378 379-388

13 Vid Gustav RADBRUCH ldquoLeyes que no son derecho y Derecho por encima de las leyesrdquo (1946) en G RADBRUCH E SCHMIDT H

WENZEL Derecho injusto y Derecho nulo Edit Aguilar Madrid 1971 p 1-21

14 Vid Isaiah BERLIN ldquoLa unidad europea y sus vicisitudesrdquo (1959) en El fuste torcido de la Humanidad Capiacutetulos de historia de las ideas

ed a cargo de H Hardy (1990) trad de JM Aacutelvarez Flores y proacutel de S Giner Eds Peniacutensula Barcelona 1992 en espc p 190-194 Recogido

tambieacuten en Isaiah BERLIN Antologiacutea de ensayos ed e introd de Joaquiacuten Abellaacuten Edit Espasa Calpe SA Madrid 1995 p 415-451

15 Vid Gregorio PECES-BARBA El fundamento de los derechos humanos Edit Debate Madrid 1989 y La dignidad de la persona desde

la Filosofiacutea del Derecho Dykinson Madrid 2003

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habiacutea demostrado ldquotanto la necesidad prudencial de los derechos humanos como su intriacutenseca fragi-lidadrdquo16 Los Derechos humanos se edificaban ahora desde el testimonio de la inseguridad (del miedo como temor y espanto por lo ocurrido en el pasado o como medrosiacutea en un porvenir apocaliacuteptico)17 maacutes que a partir de la seria conviccioacuten y hasta confiable expectativa de su eliminacioacuten inmediata

Es asiacute me parece como se instaura un compromiso histoacuterico antes que nada y un equilibrio de caraacutec-ter loacutegico sobre todo entre Libertad y Seguridad (frente al miedo) desde la Paz (frente a la guerra) como reduccioacuten auteacutentica y efectiva del riesgo O lo que es igual una posicioacuten estrateacutegica de alerta (preservar la Paz) versus una medida taacutectica (garantizar la Seguridad) claramente diferenciables entre siacute pues mientras la primera conduce a mitigar los efectos del riesgo desde su aceptabilidad la segunda soacutelo puede intensificarlo asiacute como tambieacuten porque la primera es cuantificable (control y evitabilidad de consecuencias negativas del riesgo potencial latente) y no lo es la segunda que incapaz de minimizarlo se expone con la amenaza auacuten siquiera conminatoria a alentar y desatar en una escalada creciente y no dominable su activacioacuten su virulencia18

Pero hoy en la actualidad ni ese compromiso ni ese equilibrio se ha mantenido incumplido el uno y el otro roto Y la fragilidad de los derechos que nuestro desideratum habiacutea convertido en triunfos ha que-dado en entredicho y a la vista aunque tal evidencia responda a patrones distintos de aquellos que presi-dieron su origen de posguerra iquestQueacute ha sucedido

Los diacuteas 11-S 2001 (New York World Trade Center Washington Sede del Pentaacutegono) y 11-M 2004 (Madrid Estacioacuten de Atocha) ofrecieron a nuestro mundo contemporaacuteneo las imaacutegenes del abismo Las contemplamos en una visioacuten tan sobresaltada y proacutexima tan pavorosa como imposible de sobrelle-var Era inuacutetil tratar de sobreponerse a la inmediatez de aquel horror Y en su desconcierto las socie-dades modernas (occidentales democraacuteticas y post-industriales) descubrieron de pronto concretada en la retina de cada uno de nosotros la colosal estatura de una amenaza imprevista para la que no se hallaban prestas el ataque del terrorismo transnacional global En esos instantes gran parte de la pre-supuestaria fiabilidad fundada en la fragilidad preservativa de la ldquosociedad del riesgordquo y en verdad vale aquiacute emplear tal expresioacuten (Risikogesellschaft)19 sufrioacute un interno y sustantivo removimiento Entre los efectos de esa honda conmocioacuten a poco se advertiriacutea uno capaz de afectar a elementos doctrinales todaviacutea vigentes en aquel momento sobre la comprensioacuten de los Derechos humanos en sus plantea-mientos sobre Paz Libertad y Seguridad El epicentro del seiacutesmo se localizaba en la mutacioacuten que la viacutevida y muy sensible experiencia de los acontecimientos produjo sobre la nocioacuten de ldquoriesgordquo La extre-mada cercaniacutea con que los sucesos del 11-S (como despueacutes asimismo en el 11-M) fue mediaacuteticamente

16 Michael IGNATIEFF Los derechos humanos como poliacutetica e idolatriacutea introd de A Gutmann coment de K A Appiah et al trad de F

Beltraacuten Adell Eds Paidoacutes Ibeacuterica SA Barcelona 2003 p 100

17 Aun sin las precisas matizaciones que no es caso desarrollar aquiacute con medrosiacutea del porvenir apocaliacuteptico aludo al intensiacutesimo y

disuasorio miedo sentido durante los antildeos de la ldquoguerra friacuteardquo ante la total destruccioacuten del geacutenero humano en un holocausto mundial

resultado del empleo de armas nucleares

18 En el tercero de los artiacuteculos preliminares para la paz perpetua entre los Estados ya sentildealaba Kant que los ejeacutercitos permanentes

(miles perpetuus) suponiacutean ldquouna amenaza de guerra para otros Estados con su disposicioacuten a aparecer siempre preparados para ella Estos

Estados se estimulan mutuamente a superarse dentro de un conjunto que aumenta sin cesar y al resultar finalmente maacutes opresiva la paz

que una guerra corta se convierten ellos mismos en causa de guerras ofensivasrdquo Vid Inmanuel KANT La paz perpetua (1795) trad de J

Abellaacuten Present de A Truyol y Serra Edit Tecnos Madrid 1985 p 7

19 Vid para un examen de la idea de ldquosociedad del riesgordquo diversos trabajos de Ulrich BECK como Risikogesellschaft Auf dem Weg in

eine andere Moderne Suhrkamp Frankfurt 1986 y en espc Gegengifte Die organisierte Unverantwortlichkeit Suhrkamp Frankfurt

1988 y Die Erfindung des Politischen Zu einer Theorie reflexiver Modernisierung Suhrkamp Frankfurt 1993 de Anthony GIDDENS

Consecuencias de la modernidad trad de A Lizoacuten Ramoacuten Alianza Editorial SA Madrid 1993 y Modernidad e identidad del yo El yo y

la sociedad en la eacutepoca contemporaacutenea trad de J L Gil Aristu Eds Peniacutensula Barcelona 1995 Asimismo Niklas LUHMANN desde su

enfoque sisteacutemico Soziologie des Risikos De Gruyter Berlin 1991 Sobre las respectivas posiciones puede consultarse Josetxo BERIAIN

RAZQUIN (ed) Las consecuencias perversas de la modernidad modernidad contingencia y riesgo trad de C Saacutenchez Capdequi

Anthropos Barcelona 1996 Sobre la penetracioacuten e influencia del concepto ldquosociedad del riesgordquo en la doctrina penal Carlos PEacuteREZ DEL

VALLE ldquoSociedad de riesgos y reforma penalrdquo en Poder Judicial 43-44 1996 (II) p 61-84

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ofrecida llegoacute hasta su liacutemite maacutes extra-simboacutelico como una ventana ldquoen directordquo a lo que no pareciacutea suceder donde teniacutea lugar20 determinando que el modo de percepcioacuten y entendimiento del ldquoriesgordquo cambiase a extraordinaria velocidad

La situacioacuten de ldquoriesgordquo (temor a la eventual repeticioacuten de ldquoactos de barbarie ultrajantes para la concien-cia de la humanidadrdquo) trastocoacute de contingente en inminente esto es en ldquopeligrordquo21

La posicioacuten estrateacutegica de alerta (preservar la Paz) habiacutea funcionado mal habiacutea fallado y asiacute se daba a ver per se ante los ojos del mundo entero Ya con todas las alarmas disparadas ya verdaderamente en ldquoestado de alarmardquo en paacutenico la uacutenica medida taacutectica al comienzo sobre todo prioritaria y desde lue-go del todo priorizada estriboacute en ldquogarantizar la Seguridadrdquo La ldquosociedad del riesgordquo pasoacute a ser operati-vamente ldquosociedad del peligrordquo (Gefahrgesellschaft) lo que en su urgencia y a la postre haciacutea admisible optar como respuesta por maximalizar el uso de la fuerza en defensa por suspender e interrumpir la Paz por la intervencioacuten ldquopreventivardquo por la Guerra en definitiva

En ello la consecuencia para la significancia juriacutedica de los Derechos humanos ha sido que de la fragili-dad por riesgo se ha venido a parar en su vulnerabilidad por peligro En otras palabras la Seguridad se ha convertido en el agujero negro de los derechos del Derecho incluso22 (tambieacuten como certeza y previsibi-lidad) Y es asiacute en esos teacuterminos que ldquogarantizar la Seguridadrdquo comporte igualmente un signo inconfun-dible de contramodernidad para con el respeto de los Derechos humanos y de retraccioacuten del desarrollo de nuestra historia y cultura juriacutedicas

4 LOS DERECHOS HUMANOS COMO ldquoDANtildeOS COLATERALESrdquo DE LA SEGURIDAD

Es a menudo complicado no seducirnos por la fantasiacutea de imaginarnos en una situacioacuten que semejariacutea la de la noche en que habieacutendonos acostado al suentildeo de la razoacuten amanecieacuteramos la mantildeana siguiente en la vigilia de la voluntad Que confiando compartir lecho con los postulados racionales y universal-mente vaacutelidos de Kant nos descubrieacutesemos entre Hobbes y Marx de un lado ldquoel estado de naturalezardquo al otro ldquola claserdquo

Ciertamente como escribe Muntildeoz Molina23 ldquolas libertades se dan faacutecilmente por supuestas pero no hay nada maacutes fraacutegil que la democracia entre otras cosas porque no tiene nada de natural Lo natural es el abuso de los fuertes sobre los deacutebiles la adhesioacuten a lo maacutes cercano y la hostilidad a lo extranjero o lo des-conocido el perjuicio y no la curiosidad el impulso y no la razoacuten Es necesario recordar continuamente lo que ha costado ganar lo que tenemos y lo reducido que es en el mundo el espacio de las democracias y del imperio de la ley para darnos cuenta del valor que tiene y de lo faacutecil que seriacutea perderlordquo Pues bien en esta percepcioacuten se contienen dos apreciaciones tan perfectamente suscribibles como diferencia-bles que no obstante exacerbadas e in distinguidas entre siacute conducen a error

20 Antonio MUNtildeOZ MOLINA Ventanas de Manhattan Edit Seix Barral S A Barcelona 2004 p 76-80

21 Creo modestamente que mi formulacioacuten terminoloacutegica aventaja y mejora otras habitualmente empleadas V gr Pierre HASSNER ldquoLa

signification du 11 septembre Divagations politico- philosophiques sur lrsquoeacuteveacutenemetrdquo en Esprit 11 2002 p 153-169 cuando al sostener

que la poliacutetica moderna tiene como proyecto sustituir por pasiones serenas y friacuteas las pasiones violentas y los intereses apasionados

sentildeala que si el siglo XX puso de manifiesto los liacutemites de esta empresa el XXI nace con un nuevo deacuteficit el del terrorismo inspirado por el

fanatismo religioso y el contraterrorismo maniqueo inspirado por el ldquomiedordquo A mi modo de ver la uacutenica conclusioacuten relevante de este uso

de la expresioacuten seriacutea en realidad metalinguumliacutestica mostrando al miedo sobre todo como una infraideologiacutea

22 Vid Miguel CARMONA RUANO ldquoEl impacto juriacutedico del 11 de septiembrerdquo en Jueces para la democracia 45 noviembre2002 p 81-

91 ldquolos atentados no soacutelo produjeron la demolicioacuten brutal de edificios simboacutelicos sino que las Torres Gemelas pueden estar arrastrando

en su caiacuteda principios centrales de nuestra cultura juriacutedicardquo (p 81) Asimismo Mary ROBINSON ldquoLos derechos humanos ensombrecidos

por el 11-Srdquo en diario El Paiacutes 4072002

23 Antonio MUNtildeOZ MOLINA ldquoCiudadaniacutea Culturas Libertadesrdquo en Extranjeros y Derecho penal Cuadernos de Derecho Judicial IV

2003 CGPJ Madrid 2004 p 75-76

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La experiencia desde mediados del siglo XX subraya en realidad la insuficiencia y el rechazo de Hobbes como de Marx aunque asimismo tambieacuten cuestiona seriamente una inmoderada actitud triunfalista respecto de determinados presupuestos nunca o al menos no lo bastante demostrados Esa etapa de la centuria anterior a eacutesta en que vivimos demuestra con dificultad -y maacutes bien prueba lo contrario- el axioma de que bien vale la pena perder libertad y democracia para ganar seguridad Es frecuente en efecto que resultemos atraiacutedos por esa sugestioacuten intelectual Pero la impresioacuten que ella nos brinda-ra seriacutea al final falsa pues en definitiva el devenir de la historia del mundo contemporaacuteneo entre los siglos XIX y XX y de eacuteste al XXI no vino a modificar ni el curso de la precedente ni tampoco otro maacutes antiguo24 Quienes trataran de convencer o persuadir acerca de que no fue asiacute estariacutean falseando la Historia engantildeando De siempre y a lo largo de la Historia la libertad y la democracia suscitaron recelo y desconfianza Con todo nada en lo anterior impide reconocer que quizaacutes hayamos olvidado demasia-do pronto y faacutecilmente los importantes sacrificios es decir desatendido al valor de las renuncias que el arribar a la modernidad nos ha llevado y exigido En tal sentido lo que siacute parece haber sucedido casi como de un diacutea para otro y como casi de la noche a la mantildeana es un cambio del tipo de fragilidad que advertiacutea e informaba sobre el valor de los Derechos humanos Eacutestos por valiosos eran fraacutegiles y tam-bieacuten en esa fragilidad residiacutea su valor La fragilidad de los derechos que en el mundo contemporaacuteneo de la era posterior a la II Guerra Mundial tomaba su circunstancia precisamente de anunciar con bastante fiabilidad el temible riesgo a que su deterioro y erosioacuten conduciacutea ha visto trastornada su naturaleza con la alteracioacuten de su original imagen de salvaguarda frente al fascismo y de freno contra la guerra mediante una variacioacuten donde el ideal de libertad se proclama en el antiterrorismo y la preservacioacuten de la Paz en la garantiacutea de Seguridad

Esa mudanza implica sin duda una aguda transfiguracioacuten una metamorfosis en sentido etimoloacutegico o sea un maacutes allaacute de la figura o aspecto por tanto donde cualquier parecido con el estado inicial se ha desvanecido Y fraacutegil se predica desde ahora de lo enteco caduco perecedero como endebles o sin pujanza transitorios o pasajeros precarios o inestables comenzariacutean a ser tambieacuten desde ahora sin tiempo de descuento los derechos Los Derechos humanos habriacutean perdido su condicioacuten de infungi-bles en el espacio y en el tiempo En la nueva situacioacuten ocupariacutean una posicioacuten destinada a padecer y soportar ldquodantildeos colateralesrdquo

Desde luego es claro que la conciencia de los derechos en su papel transfronterizo frente a la ghettoi-zacioacuten de la universalidad25 ha registrado una mayor y maacutes evidente tendencia al adelgazamiento y la clausura en especial entre los pueblos y gobiernos del mundo acostumbrados a vivir sin pensar en el terrorismo o sentir el temor a su violencia de un modo en todo distinto del actual26 Normalmente esas poblaciones eran tambieacuten las mismas que reaccionaban con la fobia hacia lo extranjero o diferente y se haciacutean representar por sistemas e instituciones que exhibiacutean una continua exaltacioacuten del nacionalismo de Estado Por esa razoacuten ha sido en ellas que asiacute ya apuntaban una metamorfosis del miedo27 donde mayormente la idea de peligro estaacute arraigando o ya lo ha hecho Alliacute es tambieacuten donde maacutes se acentuacutea la restriccioacuten de las libertades y el retroceso en la igualdad

Ademaacutes de manera particular y palpable el aprecio por la legitimidad de los derechos -por la del Derecho- todaviacutea se compromete maacutes de fractura y acaba dantildeado cuando una vez reformulados en

24 Jean Jacques ROUSSEAU Contrato Social (1762) trad de M Armintildeo Alianza Editorial SA Madrid 1991 (8ordf reimp) cap I p 10 ldquoEl

hombre ha nacido libre y por doquier estaacute encadenadordquo

25 Javier DE LUCAS Derechos humanos y xenofobia frente a una sociedad plural Eds Temas de Hoy SA Madrid 1994 y Joseacute CALVO

GONZAacuteLEZ ldquoGhettoizacioacuten de la Universalidad y futuro de los Derechos Humanosrdquo en Derechos y Libertades 51995 p 405-412 Vid

tambieacuten Javier DE LUCAS Europa iquestConvivir con la diferencia Racismo Nacionalismo y Derechos de las minoriacuteas (1992) Edit Tecnos

Madrid 1994 y Puertas que se cierran Europa como fortaleza Icariacutea Barcelona 1996

26 Vid Ignacio RAMONET MIacuteGUEZ Guerras Del siglo XXI Nuevos miedos nuevas amenazas Edit Mondadori Barcelona 2003

27 Vid Roberto ESCOBAR Ironia e paura del quotidiano Edizioni Unicopli Milano 1989 y Metamorfosi de la paura Il Mulino Bologna

1997

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garantiacutea de la Seguridad sirven instrumentalmente a la oportunidad vindicativa La venganza es la fuerza que revoca la distancia entre la justicia y la injusticia Llegando a ese punto el creciente deseo y clamor de venganza impide discutir con serenidad y ser oiacutedo al proponer posibles explicaciones sobre los moacuteviles y coordenadas del terrorismo sea que se concreten en el fracaso del capitalismo de merca-do (o fundamentalismo de Mercado)28 para tratar a los pueblos del Tercer Mundo con justicia (liberarlos de la miseria) e incluirlos en el futuro global o se tracen como brutal respuesta al materialismo laico y la agresiva macdonalizacioacuten de las sociedades tradicionales29

Sin embargo hoy pasados cinco antildeos desde el final del segundo milenio deberiacuteamos discernir con mayor claridad el sentido y valor del fin del viejo mundo de la seguridad y comprender mejor el del mundo que hasta ayer conocimos El contundente paso de uno a otro milenio ha producido el pliegue de una regresioacuten poliacutetica y juriacutedica que demanda por encima incluso de las valientes condenas morales que no desviacutean la mirada de los actos injustos remediar el cuarteamiento y grietas abiertas durante el siglo XX en el Estado constitucional de Derecho30 y detener su proceso de empeoramiento y degradacioacuten

Por tanto uacutenicamente la decisioacuten de acometer en serio una tarea de compostura y consolidacioacuten haraacute auacuten posible continuar construyendo en firme sobre los logros en derechos de la era posterior a la II Guerra Mundial evitando exponer la fragilidad que presidioacute su epifaniacutea contemporaacutenea y que en el escenario histoacuterico del presente se reclama como su principal robustez a una banalizacioacuten de su significancia

Tal resolucioacuten si es sincera exige necesariamente comenzar reparando el maacutes grave resquebrajamien-to el de la regla procesal garantista que asumida en la praacutectica totalidad de los ordenamientos juriacutedi-cos internos fisura sin embargo en el marco de la legalidad interestatal toda persona tiene derecho a ldquoun tribunal independiente e imparcial [] para el examen de cualquier acusacioacuten contra ella en mate-ria penalrdquo (DUDH art 10)31 En la nueva sociedad del peligro terrorista se lo vulnera al permitir que los ofendidos por una conducta antijuriacutedica las viacutectimas de los atentados ldquoadopten simultaacuteneamente el papel de acusador juez y ejecutorrdquo32 El intento por afianzar la universalidad de esa garantiacutea que en efec-to se ha mostrado muy complejo y problemaacutetico en la viacutea diplomaacutetica mientras el modelo que articula la relacioacuten y conducta entre las naciones todaviacutea opera con una foacutermula comprimida y privilegiada de la preservacioacuten de la Paz mundial -el derecho de veto a disposicioacuten de los Estados miembros perma-nentes del Consejo de Seguridad de Naciones Unidas- solo podraacute prosperar a traveacutes de una instancia juriacutedica supranacional la Corte Penal Internacional33 que a razoacuten de la universabilidad de su jurisdic-cioacuten actuando como juez natural persiga y castigue eficazmente la barbarie de los criacutemenes contra la Humanidad pero igualmente patrocine y proteja la paz internacional frente a la inseguridad introdu-cida por un ejercicio desconcentrado de la seguridad o la privatizacioacuten de la agenda de seguridad global por alguacuten grupo de paiacuteses Desde luego como he indicado de nada sirve tratar de ocultar que el vis-lumbre de ese horizonte aparece a una distancia auacuten demasiado lejana del punto a partir del cual hoy

28 Vid Joseph E STIGLITZ Malestar de la globalizacioacuten Taurus Madrid 2002

29 Vid Noam CHOMSKY 11092001 trad de C Aguilar RBA Libros SA Barcelona 2001

30 Joseacute MARTIacuteNEZ DE PISOacuteN Tolerancia y derechos fundamentales en las sociedades multiculturales Edit Tecnos Madrid 2001 p 206

31 Asimismo art 141 del Pacto Internacional de Derechos Civiles y Poliacuteticos

32 Ulrich BECK Sobre el terrorismo y la guerra (2002) trad de R S Carboacute EdsPaidoacutes Ibeacuterica S A Barcelona 2003 p 35 Vid tambieacuten

David HELD ldquoGlobalizacioacuten el peligro y la respuestardquo en diaro El Paiacutes 4072002 ldquoEl atentado terrorista del 11-S contra las Torres

Gemelas y el Pentaacutegono fue un momento definitivo para la historia de las generaciones actuales En respuesta EEUU y sus aliados maacutes

importantes podriacutean haber decidido que la forma maacutes importante y eficaz de detener el torrente de terrorismo global seriacutea reforzar la

legislacioacuten internacional y ampliar las funciones de las instituciones multilaterales Podriacutean haber decidido que era importante que ninguacuten

poder o grupo pudiera actuar por siacute solo como juez jurado y verdugordquo

33 Juan Antonio CARRILLO SALCEDO (Coord) La criminalizacioacuten de la barbarie la Corte Internacional Penal CGPJ Madrid 2000

Isabel LIROLA DELGADO y Magdalena M MARTIacuteN MARTIacuteNEZ La Corte Penal Internacional Justicia versus Impunidad Edit Ariel

Barcelona 2001 y Aacutengel GALGO PECO (Dir) Derecho penal supranacional y cooperacioacuten juriacutedica internacional (Cuadernos de Derecho

Judicial XIII-2003) CGPJ Madrid 2004

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se mueve la poliacutetica internacional de las naciones maacutes poderosas del planeta y que para imprimir una variacioacuten en el curso de esa direccioacuten seriacutea preciso comprometer de hecho pero sobre todo de Derecho justo la participacioacuten de los mismos gobiernos que con maacutes fervor lideran la resistencia a que ese dife-rente sesgo tenga ocasioacuten a producirse Esta apreciacioacuten de la realidad sin embargo no debe hacernos reducir cualquiera imaginables conclusiones a la constatacioacuten de lo que nos encontramos ante lo que vulgarmente se conoce como un problema de tipo ldquocallejoacuten sin salidardquo sin solucioacuten posible sino servir de sentildeal de hacia doacutende no debemos continuar la marcha Es por eso lo maacutes inquietante comprobar que desde una oacuteptica de alcance maacutes regional tampoco el panorama lleva alliacute camino de mejorar y que el espeso nublado que se interpone a la visioacuten en profundidad sigue extendiendo su oscuridad antes que disiparse V gr especificaciones del texto de la Constitucioacuten Europea que para adelantarse a la amenaza terrorista consienten emprender acciones preventivas34

Al propio tiempo ya en niveles de actuacioacuten circunscritos a lo nacional deberiacutea procederse tambieacuten a subsanar y restablecer es decir a restaurar y reponer el sello de origen y marca maacutes contrastada de la fragilidad de los derechos y garantiacuteas en cuanto ldquoley del maacutes deacutebilrdquo35 Seraacute entonces imprescindible lo es ya a virtud del cariz que presentan rehacer las poliacuteticas regionales de seguridad y de seguridad domeacutes-tica en no pocos Estados donde se auspicia y practica una ideologiacutea juriacutedico-poliacutetica de la seguridad consistente en resguardar a sus nacionales de lo presentido (asimismo como sentimiento anticipa-do) y expuesto como el peligro por cuanto enemigo del extrantildeo a la comunidad La idea de ese enemigo (enemicus) recoge del derecho romano arcaico auacuten en eacutepoca maacutes primitiva que la de las XII Tablas lo presentando en su determinacioacuten objetiva como la del que perteneciendo a una misma familia de la que desertaba o a la que traiciona habiacutea dado muerte al padre a la madre o a algunos de los parientes dentro del cuarto grado y asiacute tambieacuten el modo organizar la funcioacuten persecutoria y represora instru-mentada por entonces a traveacutes de la continuacioacuten del rastro trastiberum (maacutes allaacute del riacuteo Tiacuteber como frontera del espacio de identidad comunitario de las familias) y el instituto de la vis privata (resarcimien-to vengativo) El Derecho en nuestros diacuteas aprovecha de ese conjunto de rasgos si bien redibujaacutendolos ahora reviste con la categoriacutea de enemigo al ajeno extrantildeo o extranjero ahora anticipa la tutela a su accioacuten antijuriacutedica que ademaacutes se alegoriza socio-cultural y poliacuteticamente en el peligro de dar muerte a la patria (Estado nacional) matria (organizacioacuten regional) o alianza de sangre (allegados consanguiacute-neos de parentesco maacutes proacuteximo semejantes a nosotros porque les alcanza el ldquoaire de familiardquo) ahora amuralla (res sancte) el recinto de la identidad comuacuten (pomerium) controlando el acceso exterior desde puertas (fores la puerta vista desde el que estaacute dentro de la casa domi v gr foris o foranus versus domes-ticis domesticum) por las que filtra su entrada (cierra el paso y deja fuera) con base en marcadores antro-poloacutegicos (raza [blanca] religioacuten [cristiana] civilizacioacuten [occidental]) o a partir de la procedencia geograacute-fica (continente [europeo Primer Mundo]) a fin de contingentar (porque sin duda se piensa en clave de mercanciacuteas y servicios) la produccioacuten y desarrollo econoacutemico-industrial interior ahora finalmente ya monopolizado el uso de la fuerza por los poderes y oacuterganos del Estado es el propio sistema juriacutedico quien declara y ejecuta la respuesta de aversioacuten hostilidad y enemiga

El Derecho es de esta manera real y verdadero responsable de producir una rarefaccioacuten de la atmoacutesfera de garantiacuteas procesales y alimentar un estado de expansioacuten punitiva habiendo elaborado para ello una construccioacuten dogmaacutetica que va maacutes allaacute del ldquoderecho penal de la puesta en riesgordquo formulada ya como

34 Tratado por el que se establece una Constitucioacuten para Europa parte primera tiacutetulo V capiacutetulo III art I-43 a) establece en matera de

regulacioacuten particular relativa al espacio comuacuten de libertad seguridad y justicia como claacuteusula de solidaridad la movilizacioacuten por la Unioacuten

de ldquolos instrumentos de que disponga incluidos los medios militares puestos a su disposicioacuten por los Estados para prevenir la amenaza

terrorista en el territorio de los Estados miembrosrdquo Con la diccioacuten empleada no se aparta del programa operativo a una intervencioacuten

militar preventive

35 Luigi FERRAJOLI Derechos y garantiacuteas La ley del maacutes deacutebil (1994 y 1994) trad de P Andreacutes Ibaacutentildeez y A Greppi con Proacutel de P Andreacutes

Ibaacutentildeez Edit Trotta Madrid 1999

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ldquoderecho penal del enemigordquo36 y asimismo agente directo y eficaz so pretexto de regulacioacuten del fenoacute-meno inmigratorio37 en disponer mecanismos para la demonizadora segregacioacuten espacial y social de determinados colectivos En una situacioacuten de menoscabo como eacutesta pienso que no basta ya tan siquiera con reconstruir el Estado constitucional de Derecho Es faacutecil constatar que el cuarteamiento es en este siglo XXI una hendidura demasiado profunda que hoy las grietas estaacuten hacieacutendose auteacutenticas quebra-duras Es por eso que la precisa y necesaria accioacuten frente a la progresiva agravacioacuten de esos detrimentos tiene que decidirse a ir maacutes allaacute no limitaacutendose pues soacutelo a sanear aquello que al modelo de la demo-cracia constitucional y la idea de constitucionalismo les impide recuperar su primitiva fisonomiacutea sino procurar una rehabilitacioacuten que los revalorice Y por eso tambieacuten creo que mientras no sea definitiva-mente tarde esto es mejor antes que despueacutes habriacuteamos de asumir que tal labor conlleva reemplazar entendido como resituar algunos de nuestros criterios acerca de ellos y al menos dos

Uno seriacutea a mi entender siempre buscando que ldquolos derechosrdquo resistan en la funcioacuten de fundamen-talidad de autoridad38 que en el sistema juriacutedico les cumple desarrollar ir a la readquisicioacuten del lugar que a la soberaniacutea popular incumbe como criterio de sentido reconstituyente para la democracia cons-titucional39 El otro ir en busca de alguacuten nuevo criterio en el que solventar coacutemo remover los liacutemites de pertenencia de la ciudadaniacutea a la nacionalidad coacutemo trasladar dentro es decir de queacute modo incluir a quienes hoy permanecen a las puertas de ldquolos derechosrdquo y excluidos de sus garantiacuteas porque al no alcanzarles la condicioacuten de nacionales tampoco disponen de los privilegios que a eacutestos les corresponden en el reconocimiento de la universalidad aun cuando como tal eacutesta fuera proclamada por encima cual-quier cierre poliacutetico-espacial40 La solucioacuten quizaacutes consista en ensanchar el aacutembito globalizar ldquocos-mopolitizarrdquo el espacio constitucional hasta identificarlo con una ciudadaniacutea universal De lo que sin embargo no cabe duda es que hasta ahora el mero trasvase inverso de las convenciones internaciona-les carentes de garantiacuteas a los ordenamientos constitucionales no ha dado el resultado apetecible o no desde luego tan igual para todos y suficientemente universalizado como hubiera sido de desear como fue lo deseado Ello en uno u otro caso deberiacutea ponernos de manifiesto la conveniencia de refundar el constitucionalismo sobre bases diferentes a las actuales

36 Vid G PORTILLA CONTRERAS ldquoEL derecho penal del enemigordquo en Mientras tanto 83 2002 p 78 y ss y Guumlnther JAKOBS-Manuel

CANCIO MELIAacute Derecho penal del enemigo Civitas Eds SL Madrid 2003 Esta dogmaacutetica que sostiene la poliacutetica criminal y modelo de

intervencioacuten penal concuerda asimismo en el giro experimentado de los antildeos 80-90 al presente en el pensamiento criminoloacutegico donde

se pasa de una posicioacuten dominante donde el delito aparece como producto de los oacuterganos de control social a la actual en que se lo muestra

fruto de la voluntad delincuente

37 Javier DE LUCAS ldquoInmigrantes extrantildeos a la comunidad enemigos de ida y vuelta en la respuesta del Derecho a la inmigracioacutenrdquo en

Sociologia del Diritto 2 2004 p 23-34 Vid tambieacuten Carlota SOLEacute Sonia PARELLA Amando ALARCOacuteN Valeria BERGALLI y Francesc

GIBERT ldquoEl impacto de la inmigracioacuten en la sociedad receptora El caso del sur de Europardquo en Revista Espantildeola de Investigaciones

Socioloacutegicas 90 abril-junio 2000 p 131-158

38 Gianluigi PALOMBELLA Lacuteautoritagrave dei diritti I diritti fondamentali tra istituzioni e norme Editori Laterza Roma-Bari 2002

39 Vid Gianluigi PALOMBELLA Constitucioacuten y Soberaniacutea El sentido de la democracia constitucional (1997) trad e introd (ldquoDe la

nostalgia civil la soberaniacutea popularrdquo p XIII-XXIV) de J Calvo Gonzaacutelez Edit Comares Granada 2000 ldquoSi queremos mantener activa la

fuerza de nuestras democracias constitucionales debemos reconocer el punto en que las constituciones se ligan a las democracias y en el

que ante ellas se detienen en el que la soberaniacutea popular se liga a las constituciones y en el que ante ellas se detienerdquo (p 140)

40 Luigi FERRAJOLI Derechos y garantiacuteas La ley del maacutes deacutebil cit ldquoTomar en serio los derechos significa hoy tener el valor de desvincularlos

de la ciudadaniacutea como ldquopertenenciardquo (a una comunidad estatal determinada) y de su caraacutecter estatal [hellip] Ello significa admitir de forma

realista que no existe a largo plazo maacutes alternativa a las guerras y el terrorismo que la efectiva universalizacioacuten de aqueacutellos siendo cada

vez maacutes actual e ineludible el nexo entre derechos fundamentales y paz afirmado en el preaacutembulo de la Declaracioacuten universal de 1948 y

que por tanto la presioacuten de los excluidos sobre nuestro mundo privilegiado alcanzaraacute formas de violencia incontrolada a menos que nos

obliguemos a remover sus causas quitando a la ciudadaniacutea su caraacutecter de status privilegiado y garantizando a todos los mismos derechos

incluidas las libertades de residencia y de circulacioacutenrdquo (p 117-118)

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5 FRAGILIDAD DE LOS DERECHOS EN ADELANTE

Estamos en un tiempo en el que debemos asumir las realidades con sinceridad En el tenso pulso a que esta eacutepoca nos desafiacutea los derechos humanos aparecen como las piezas maacutes fraacutegiles del sistema juriacute-dico moderno y todo eacutel se halla ahora bajo la presioacuten de un embate duriacutesimo no soacutelo de un amago rela-tivamente intimidatorio El pasado maacutes reciente los presentaba en teacuterminos de proteccioacuten y amparo como el refugio maacutes primario en que guarecerse y asegurarse ante la inseguridad para liberarnos del temor (y la miseria) desde el horror de un testimonio histoacuterico que explicaba con crudeza las infrahuma-nas consecuencias acarreadas de su negligencia y omisioacuten y para evitar que jamaacutes volvieran de nuevo a repetirse Pero el riesgo nunca estuvo completamente eliminado ni quedoacute tampoco suprimido por lo que la base de su evitacioacuten era fundamentalmente cautelar precautoria De ahiacute su fragilidad Actuaban como balizas y no tanto como baluartes de la civilizacioacuten contra la barbarie Marcaban las zonas de peligro en que no debiacuteamos introducirnos Eran la sentildeal de un non plus ultra en adelante se abriacutea un abismo devorador Su reconocimiento era en realidad la celebracioacuten ndash esperanza en la memoria del horror-41 de un goal maacutes no auacuten del triunfo

En la nueva eacutepoca que estaacute frente a nosotros como en cualquier otra precedente las oportunida-des son tantas todaviacutea como tantas puedan ser tambieacuten las ocasiones que se pierdan A lo largo de las uacuteltimas deacutecadas del siglo XX hay que contar como ocasioacuten perdida algunos de los errores que entonces se cometieron Pero tambieacuten como oportunidad bien aprovechada el acierto que representoacute de la pro-gresiva implantacioacuten de libertades individuales hasta lograr una Democracia plena en la gobernacioacuten de muchos paiacuteses No es buena solucioacuten olvidar los problemas pendientes de respuesta y es uno de los maacutes grandes errores infravalorar cualquiera solucioacuten que el pasado nos ofrezca como pueda serlo la que sobre la cultura poliacutetica de Occidente ha ejercido el perfeccionamiento de los marcos juriacutedico-ins-titucionales en materia de derechos Al medir la experiencia de eacutexitos y fracasos al igual que al calcular cuaacutel pueda ser la expectativa de unos o de otros el presente de la fragilidad devaluada de los derechos procede sobre todo de la forma en que estructuramos las respuestas las soluciones

Al contrario de cuanto sucediacutea en el ayer de la seguridad donde el mundo de la libertad maacutes segura era aquel que maacutes valoraba la seguridad en el de hoy el mundo de la libertad maacutes segura seraacute aquel que maacutes valore la inseguridad

Dependiendo de la estructura en las que formemos las respuestas asiacute seraacuten las que obtengamos Nunca la respuesta de la Paz puede consistir la ldquopacificacioacutenrdquo de quien la amenaza

6 LA SEGURIDAD DE LA PAZ DE FABULA DOCIT

La Humanidad pagoacute a altiacutesimo precio por dos veces en un mismo siglo el coste de la desventurada negligencia y omisioacuten de los derechos

En la cultura de los Derechos durante la uacuteltima mitad del siglo XX auacuten estaba vivo todo aquel sufrimien-to Los derechos simbolizaban una narrativa de trabajo la del miacutetico sufrimiento de Siacutesifo La enorme piedra la que tantas veces escapoacute de nuestras manos rodando ladera abajo hasta el fondo del valle habiacutea sido subida y encumbrada tras un esfuerzo extremo a lo maacutes alto de la montantildea ldquoEsa piedra era la Pazrdquo ha escrito Enzensberger42 Alzada hasta la cima un lugar tan expuesto tan comprometido tan arriesgado era necesario preservarla No pudimos arreglar otro socorro que un enmallado de cuerdas La malla de los derechos Pero esa atadura de cuerdas como las que Ocnos trenzara tambieacuten la devora hoy un asno el asno de la ignorancia de la estulticia de la intolerancia de la venganza Sin la sujecioacuten que le prestaba aquella trama de delgados hilos de los derechos la piedra que ahora se tambalea no ofrece suficiente estabilidad Puede estar cerca de caer terminar aplastaacutendonos y hecha mil pedazos

El peligro de una Paz sin derechos es ldquola paz de la seguridadrdquo

41 Vid Reyes MATE Memoria de Auschwitz Actualidad moral y poliacutetica Edit Trotta Madrid 2003

42 Hans Magnus ENZENSBERGER Perspectivas de guerra civil trad de M Faber-Kaiser Edit Anagrama Barcelona 1994 p 84

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85Ano IX Nordm 17 | Julho a Dezembro | 2018

DA TRANSVERSAtildeO POLIacuteTICA DO JURIacuteDICO AO FLAGELO DO ESTADO DEMOCRAacuteTICO DE DIREITO A INCONTINENTE DESEFICACIZACcedilAtildeO DOS VALORES CONSTITUCIONAIS NO APOGEU DOS 70 ANOS DA DECLARACcedilAtildeO UNIVERSAL DOS DIREITOS HUMANOS

FROM THE POLITICAL TRANSVERSION OF THE LEGAL TO THE FLAG OF THE DEMOCRATIC STATE OF LAW THE INCONTINENT DISEASE OF CONSTITUTIONAL VALUES IN THE APOSTLE OF THE 70 YEARS OF THE UNIVERSAL DECLARATION OF HUMAN RIGHTSJoseacute Eduardo de Miranda1

Andreacutea Correcirca Lima2

Resumo O alargamento da atuaccedilatildeo poliacutetica do judiciaacuterio provoca a deseficacizaccedilatildeo dos valores constitucio-nais afetando a estabilidade democraacutetica no apogeu dos setenta anos da Declaraccedilatildeo Universal dos Direitos Humanos O ideaacuterio construiacutedo a partir da Constituiccedilatildeo Federal de 1988 em busca da consolidaccedilatildeo de um Estado Democraacutetico de Direito desvela o sentimento do periacuteodo poacutes-ditatorial em restabelecer uma socie-dade livre justa igualitaacuteria e fraterna aos moldes preconizados pela DUDH de 1948 O poder soberano do Estado alicerccedilado na atuaccedilatildeo independente e harmocircnica dos Poderes Executivo Legislativo e Judiciaacuterio aliado ao restabelecimento de um regime de Direito demonstra a intenccedilatildeo do constituinte conformar um novo cenaacuterio democraacutetico A preferecircncia pelos desiacutegnios de determinados grupos em detrimento dos inte-resses de todos desvirtua o poder estatal desajustado em suas funccedilotildees executivas legislativas e judiciaacuterias O judiciaacuterio alma mater na garantia dos direitos fundamentais como ente integrante do poder poliacutetico uno do Estado desnatura-se ante sua preocupaccedilatildeo puramente poliacutetica Para referendar a anaacutelise utilizou-se da fenomenologia-hermenecircutica heideggeriana assentada na pesquisa bibliograacutefica e documental

Palavras chave Valores Constitucionais Politizaccedilatildeo do Juriacutedico Direitos Humanos

Abstract The extension of judicial policy leads to a definition of constitutional values a democratic situation that is not at the height of the years of the Universal Declaration of Human Rights The ideology of the Federal Constitution of 1988 in search of the consolidation of a Democratic State of Right reveals the feeling of a post-dictatorial division in restoring a free just egalitarian and fraternal society as advocated by the UDHR of 1948 Sovereignty of the State based on its function and harmonious in its executive legislative and judicial powers is also a right to a democratic regime The chance by groups of certain groups to the detriment of the interests of all distorts the state power mis-matched in its executive legislative and judicial functions The judiciary the alma mater in the fundamental guaran-tee as the member of the political power of the State is denatured in the face of its purely political concern To refer an analysis use the heideggerian hermeneutic phenomenology based on bibliographical and documentary research

Key words Constitutional Values Politicization of the Law Human Rights

1 Poacutes Doutor em Direito Doutor em Direito cum laude academica Professor Pesquisador da Caacutetedra UNESCO de Formaccedilatildeo Humana para Ameacuterica Latinada Associaccedilatildeo Internacional de Direito Cooperativo e do Instituto de Estuacutedios Cooperativos da Universidade de Deusto em Bilbao na Espanha Professor Pesquisador da Caacutetedra Euro Americana de Proteccedilatildeo Juriacutedica dos Consumidores adstrita agrave Faculdade de Direto da Universidade de Cantaacutebria em Santander na Espanha Professor em Cursos de Poacutes-graduaccedilatildeo Advogado parecerista fundador de Miranda amp Correcirca Lima jemirandamirandacorrealimacom

2 Doutoranda em Direito Mestra em Direito Especialista em Direito Internacional Professora em Cursos de Poacutes Graduaccedilatildeo Advogado fundadora de Miranda amp Correcirca Lima andreamirandacorrealimacom

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1 A TIacuteTULO DE INTRODUCcedilAtildeO ENQUADRAMENTO SITUACIONAL-CIENTIacuteFICO IMPRESCINDIacuteVEL

A Idade Moderna instituiacuteda por volta do seacuteculo XVIII surge como um periacuteodo de confronto entre tra-diccedilotildees e atitudes que provocam um absoluto redimensionamento na forma de ser e estar da humani-dade Influenciado pelas concepccedilotildees filosoacuteficas do Renascentismo e do Iluminismo o homem moderno depara-se com a laquoeacutetica da autonomiaraquo suplanta o apego agraves convenccedilotildees aos costumes agraves crenccedilas e sobrepuja percepccedilotildees cosmoloacutegicas e teocecircntricas que o faziam acreditar na origem divina dos reis3

Forjado por um novel tipo de subjetividade que o caracteriza como sujeito do conhecimento e da accedilatildeo o homem soterra a imagem da finitude Ato contiacutenuo caminha ao encontro de sua emancipaccedilatildeo enquanto pessoa conforma o sentido do Estado como sociedade organizada descobre a democracia como regime poliacutetico e luta pelo reconhecimento dos direitos civis poliacuteticos e sociais conjugados na Declaraccedilatildeo Universal dos Direitos Humanos proclamada pela Assembleia Geral das Naccedilotildees Unidas em 10 de dezembro de 1948

Independentemente do espaccedilo-tempo de positivaccedilatildeo dos Direitos Humanos pelos paiacuteses membros da ONU o Brasil assinou seu efetivo reconhecimento em 1988 pela promulgaccedilatildeo da vigente Constituiccedilatildeo Federal Nesse sentido e vigilantes agrave exatidatildeo formal dos preceitos constitucionais acredita-se que a obstinaccedilatildeo do Constituinte em positivar elementos delineadores da estrutura poliacutetica de um Estado Democraacutetico pressupunha sua aspiraccedilatildeo pelo alavancamento de um processo de consolidaccedilatildeo do proacuteprio Estado Democraacutetico brasileiro alicerccedilado sobre a atuaccedilatildeo independente e harmocircnica dos Poderes Executivo Legislativo e Judiciaacuterio4

Natildeo obstante nota-se hoje que o alargamento da idiossincrasia por alguns interpretes da Constituiccedilatildeo culmina pela desnaturaccedilatildeo da responsabilidade juriacutedica do Poder Judiciaacuterio levando-o ao extrapolo de suas competecircncias provocando o que se chama de politizaccedilatildeo do juriacutedico e instigando deduccedilotildees sobre a laquopoliticagemraquo no Judiciaacuterio Por lamento isto natildeo eacute fake News eacute o retrato veriacutedico de uma traumaacutetica rea-lidade em que o Direito brasileiro eacute diariamente sabotado pela poliacutetica pela economia e ateacute pela moral5

Justamente quando o seacuteculo XXI caminha ao encontro do amadurecimento temporal e o Brasil procura enaltecer a alacridade pela celebraccedilatildeo conjunta dos setenta anos da Declaraccedilatildeo Universal dos Direitos Humanos com os trinta anos de promulgaccedilatildeo da Constituiccedilatildeo Federal de 1988 a sociedade brasileira vive um periacuteodo de hesitaccedilatildeo O marco axio-principioloacutegico enaltecido pela Declaraccedilatildeo Universal dos Direitos Humanos e incrustrado no acircmago da Constituiccedilatildeo paacutetria fenece gradativamente pela conspur-caccedilatildeo da ceacutelula identitaacuteria das Instituiccedilotildees nacionais provocando natildeo apenas o perecimento agudo da laquoideiaraquo constitucional de democracia6 mas sobretudo a deseficacizaccedilatildeo dos valores constitucionais de liberdade de seguranccedila de bem-estar de desenvolvimento de igualdade e de justiccedila7

Se outrora expectou-se o alcance da liberdade e da igualdade jaacute natildeo se sabe o que esperar daqui para diante

O certo e censuraacutevel eacute que os brasileiros experimentam o seccionamento ideoloacutegico-interpretati-vo pelo qual o Paiacutes literalmente se divide entre uns e outros defensores de bandeiras especiacuteficas e adeptos de teses mirabolantes entoadas para a sustentaccedilatildeo de atos levados a termo por quem estaacute

3 MIRANDA Joseacute Eduardo de CORREcircA LIMA Andreacutea Educacioacuten formacioacuten humana y valores cooperativos una propuesta de

revitalizacioacuten de las praacutecticas educativas brasilentildeas para el rescate del hombre social y fraterno Deusto Estudios Cooperativos

Universidad de Deusto Bilbao n 9 p 87-107 2017

4 Conforme artigo 2ordm da Constituiccedilatildeo Federal

5 Para o escudo de eventual insinuaccedilatildeo que se estaacute exagerando remete-se o leitor agraves manchetes que satildeo veiculadas pelos principais meios

de veiculaccedilatildeo de informaccedilatildeo e notiacutecias do Brasil sejam virtuais ou fiacutesicos

6 E vecirc-se agora mais do que nunca que no Brasil a Democracia nunca passou de uma ideia

7 Adota-se o termo deseficacizaccedilatildeo no sentido soberano de tornar sem efeito pratico

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legitimado para o exerciacutecio de um poder imperioso ao guarnecimento da democracia e da dignidade humana O Poder Judiciaacuterio tem questionada sua autonomia e seus exercentes ou alguns deles satildeo objurgados pela duacutevida acerca da impessoalidade e imparcialidade de suas decisotildees

As duacutevidas as suspeitas e as acusaccedilotildees tornaram-se vedetes daqueles que apontam o dedo em haste suscitando natildeo raras agraves vezes o que se mostra melhor agrave defesa de seus proacuteprios e pessoais interesses Por isso natildeo se estaacute aqui para subscrever um manifesto pessimista ou um pronunciamento leviano de caraacute-ter exagerado teratoloacutegico distante do menor cabide de cientificidade Longe disso A fluente proposta estaacute enganchada para natildeo dizer laquopenduradaraquo nos estertores da fenomenologia-hermenecircutica e aspira pela compreensatildeo ontoloacutegica sobre o que passa na ldquopaacutetria-Brasilrdquo elucidar se o enviesamento da respon-sabilidade poliacutetica do Poder Judiciaacuterio corrompe de um lado a obstinaccedilatildeo democraacutetica vislumbrada pela Terra adorada quando a Constituiccedilatildeo foi promulgada em 05 de outubro de 1988 e adultera de outro a eficaacutecia dos valores imperiosos agrave credibilidade da laquojus-ti-ccedilaraquo e agrave estabilidade social

Frisa-se por isso que ldquoo meacutetodo fenomenoloacutegico enquanto meacutetodo hermenecircutico-linguiacutestico natildeo se desliga da existecircncia concreta nem da carga preacute-ontoloacutegica que na existecircncia jaacute vem sempre antecipa-dardquo8 A fenomenologia eacute suficiente para ldquoindicar coacutemo mostrar y tratar lo que debe tratarse en ciencia Ciencia laquoderaquo los fenoacutemenos quiere decir tal forma de aprehender sus objetos que todo cuanto esteacute a discusioacuten sobre ellos tiene que tratar-se mostraacutendolo directamente y demostraacutendolo directamenterdquo9

Como a fenomenologia eacute a forma demonstrativa do que deve ser tema da ontologia10 pretende-se atraveacutes deste trabalho subtrair o ator juriacutedico da zona de conforto para submetecirc-lo agrave reflexatildeo profun-da sobre fatos-feitos-fenocircmenos que na medida em que deslustram conquistas histoacutericas agridem a ordem juriacutedica-moral e podem no dia menos pensado transformar o devaneio democraacutetico num pesa-delo socircfrego de reversatildeo traumaacutetica e imprevisiacutevel

2 PELOS CAMINHOS DA MODERNIDADE DA RACIONALIDADE HUMANA AO ESTADO DEMOCRAacuteTICO DE DIREITO

No curso do pensamento medieval o homem alheio ao mundo e agrave sua proacutepria condiccedilatildeo de existecircncia esteve radicalmente apegado agrave ideia do divino Posteriormente quando ingressa na Idade Moderna as ponderaccedilotildees filosoacuteficas do Renascimento e do Iluminismo influenciam na conformaccedilatildeo de um novo modelo de subjetividade que permite-lhe o desprendimento do cordatildeo teocecircntrico que o mantinha preso a conceitos tabus e explicaccedilotildees metafiacutesicas Assumindo-se como sujeito do conhecimento adquirido atraveacutes da razatildeo indispensaacutevel agrave descoberta da autossuficiecircncia subjetiva o homem moder-no regozija o florescimento da sua tenacidade emancipatoacuteria-racional11

Dentro desse novo perfil existencial o homem moderno suplanta os limites da proacutepria racionalidade para transformar-se num ser pensante livre do poder e da forccedila da religiatildeo Intuitivo ou integrativo descobre sua capacidade de entendimento de compaixatildeo e de relacionamento com seus comuns ldquoEacute nesse terreno o da historicidade e da finitude que vemos nascer novos discursos Eacute nesse contexto epistemoloacutegico que emergem figuras antes impossiacuteveis de imaginar a produccedilatildeo a vida a linguagem satildeo novos objetos proacuteprios da modernidaderdquo12

8 STEIN Ernildo Introduccedilatildeo ao meacutetodo fenomenoloacutegico heideggeriano In HEIDEGGER Martin Sobre a essecircncia do fundamento A

determinaccedilatildeo do ser do ente segundo Leibniz Hegel e os gregos Satildeo Paulo Livraria Duas Cidades 1971 p 14

9 HEIDEGGER Martin Ser y tempo Traduccioacuten de Joseacute Gaos Barcelona RBA 2004 p 79

10 Ibid p 80

11 MIRANDA CORREcircA LIMA 2017

12 TERNES Joseacute Michel Foucault e o nascimento da modernidade Tempo Social Rev Sociol USP S Paulo 7(1-2) p 45-52 1995

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A modernidade amadurece com o propoacutesito de emancipar o intelecto permitindo que o homem desmis-tifique os misteacuterios da realidade para exercer seu domiacutenio sobre a natureza13 Em nome da espontaneida-de do pensamento ou em benefiacutecio da essecircncia humana como uma substacircncia pensante Reneacute Descartes advoga que todos os homens possuem idecircntica aptidatildeo para alcanccedilar a verdade por que todos possuem a razatildeo como forma natural que lhes confere a faculdade para distinguir o verdadeiro do falso14

Ser de seu tempo e centro do universo o homem recorre agrave organizaccedilatildeo de seu locus Locke ressalta que o homem com o propoacutesito de evitar eventuais ameaccedilas agrave liberdade e agrave igualdade que possui no estado natural cria a sociedade poliacutetica ldquoatraveacutes de um contrato natildeo entre governantes e governados mas entre homens igualmente livres O pacto social natildeo criaria nenhum direito novo que viesse a ser acres-centado aos direitos naturaisrdquo15 Anota-se sobre este aspecto que

O pacto seria apenas um acordo entre indiviacuteduos reunidos para empregar sua forccedila coletiva na

execuccedilatildeo das leis naturais renunciando a executaacute-las pelas matildeos de cada um Seu objetivo seria

a preservaccedilatildeo da vida da liberdade e da propriedade bem como reprimir as violaccedilotildees desses

direitos naturais16

Locke defende que o pacto social natildeo impotildee aos homens a necessidade de renunciarem seus direitos naturais em favor dos governantes Aleacutem disso a harmonia entre os homens estaria assegurada pelas leis que os juiacutezes aplicariam no acircmago de uma sociedade poliacutetica instituiacuteda pelo pacto social Veemente Locke acentua que cada homem

[] consentindo com os outros em instituir um corpo poliacutetico submetido a um uacutenico governo se obriga

diante de todos os membros daquela sociedade a se submeter agrave decisatildeo da maioria e a concordar

com ela do contraacuterio se ele permanecesse livre e regido como antes pelo estado de natureza este

pacto inicial em que ele e os outros se incorporaram em uma sociedade natildeo significaria nada e natildeo

seria um pacto Seraacute que ele teria a aparecircncia de um pacto Que novo compromisso seria este se

o interessado natildeo estava vinculado a outros decretos da sociedade aleacutem daqueles que ele achava

que lhe convinha e nos quais realmente consentiu Esta seria uma liberdade tatildeo completa quanto a

que ele ou qualquer outro possuiacutea antes do pacto no estado de natureza em que nada o impede de

consentir em uma decisatildeo qualquer e de se submeter a ela se lhe parecer conveniente17

Ademais de rechaccedilar a submissatildeo ao absolutismo John Locke pugna tanto pelo viacutenculo instrumen-tal entre governantes e governados como pela preeminecircncia dos direitos naturais sobre os governos opressivos No acircmbito da justiccedila Locke adverte que o magistrado firma sua responsabilidade e exerce o poder de sua autoridade quando proporciona ldquoo bem-estar a preservaccedilatildeo e a paz dos homens na socie-dade que ele estaacute defendendo e assim apenas isso eacute e deve ser o padratildeo e a medida segundo os quais ele deve estabelecer e ajustar suas leis o modelo e a estrutura de seu governordquo18

Eacute prudente enfatizar o entendimento de Locke no sentido de que em havendo possibilidade de uma coexistecircncia paciacutefica entre os homens desnecessaacuteria seria a existecircncia da poliacutetica e dos magistrados eis que a existecircncia de ambos se justifica pela imperiosidade na defesa dos homens contra a fraude e

13 BACON Francis Movum Organum Traduccedilatildeo de Joseacute Aluysio Reis de Andrade Disponiacutevel em lthttpwwwebooksbrasilorg

adobeebooknorganumpdfgt Acesso em 21 jun 2018

14 DESCARTES Reneacute Discurso del meacutetodo meditaciones metafiacutesicas Traduccioacuten de Juan Gil Fernaacutendez Barcelona RBA 2004

15 LOCKE John Ensaio acerca do entendimento humano Satildeo Paulo Editora Nova Cultura Ltda 1999 p 16

16 LOCKE 1999 p 16

17 LOCKE John Segundo tratado sobre o governo civil Traduccedilatildeo de Magda Lopes e Marisa Lobo da Costa Disponiacutevel em lthttpwww

xrprobriflocke-segundo_tratado_sobre_o_governopdfgt Acesso em 21 jun 2018

18 LOCKE Segundo tratado sobre o governo civil p 4

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a violecircncia Dentro desta perspectiva Locke sublinha que ldquoa liberdade dos homens submetidos a um governo consiste em possuir uma regra permanente agrave qual deve obedecer comum a todos os membros daquela sociedade e instituiacuteda pelo poder legislativo nela estabelecidordquo 19

Vigilante ao sentido e agrave importacircncia do pacto social natildeo se pode ocultar que Rosseau defende que a foacutermula adequada da laquocontrataccedilatildeoraquo eacute aquela que viabiliza a defesa e a proteccedilatildeo dos laquocontratantesraquo ou pactuantes e seus bens sem que a uniatildeo entre eles ou de parte deles e mesmo a ruptura parcial ou total fragilize a liberdade de cada um20 As disposiccedilotildees que configuram ou afiguram o pacto social satildeo determinadas pela proacutepria natureza social-coletiva do contrato Rousseau entatildeo assevera que mes-mo as insignificantes alteraccedilotildees das disposiccedilotildees pactuais

[] las hariacutea vanas y de nulo efecto de suerte que aunque no hayan sido acaso nunca

formalmente enunciadas son en todas partes las mismas en todas partes taacutecitamente admitidas

y reconocidas hasta que violado el pacto social cada uno vuelve a sus primeros derechos y

recupera su libertad natural perdiendo la libertad convencional por la que renuncioacute a aquella21

Estaacute em Rosseau a plecirciade do laquosentimentoraquo ideal da democracia Quer dizer ldquocada persona pone en comuacuten su persona y todo su poder bajo la suprema direccioacuten de la voluntad general y recibimos a cada miembro como parte indivisible del todordquo22 A vontade geral registre-se natildeo eacute a adiccedilatildeo da vontade dos particulares Alcanccedila-se a incontestabilidade do pacto social e resguarda-se a solidez da estrutura do Estado quando a vontade da maioria eacute destinada agrave consecuccedilatildeo do bem comum Rousseau entatildeo alerta que

[] para que el pacto social no sea un formulario vano implica taacutecitamente el compromiso

uacutenico que puede dar fuerza a los otros de que el se niegue a obedecer a la voluntad general

seraacute obligado a ello por todo el cuerpo lo cual significa otra cosa sino que se obligaraacute a ser libre

pues tal es la condicioacuten de toda dependencia personal condicioacuten que constituye el artificio y

el funcionamiento de la maacutequina poliacutetica y que es el uacutenico que hace legiacutetimas las obligaciones

civiles las cuales seriacutean si esto absurdas tiraacutenicas y expuestas a los maacutes enormes abusos23

Somente assim encontra-se a plenitude da soberania O governante instituiacutedo pelo contrato social eacute em si mesmo o proacuteprio povo como corpo uno que decreta a vontade e o interesse geral cuja expressatildeo estaacute consolidada no preceito legal A vontade do governante natildeo eacute o governante propriamente dito ldquoA soberaniacutea o poder del cuerpo poliacutetico sobre todos sus miembros se confunde con la voluntad general y sus caracteres son los mismos de esta voluntad inalienable indivisible infalible absolutardquo24

A modernidade salienta Habermas ldquoinventou o conceito de razatildeo praacutetica como faculdade subjetivardquo25 Suplantando acepccedilotildees aristoteacutelicas em benefiacutecio de premissas da filosofia do sujeito a modernida-de extrai do homem o seu apego ao juiacutezo praacutetico subtraindo-o daquilo que Habermas denomina de laquoencarnaccedilotildees nas formas de vida culturais e nas ordens da vida poliacuteticaraquo Com isso logrou-se ldquoreferir a razatildeo praacutetica agrave felicidade entendida de modo individualista e agrave autonomia do indiviacuteduo moralmente

19 Ibid p 41

20 ROUSSEAU Jean-Jacques El contrato social Traduccioacuten de Consuelo Berges Barcelona RBA 2004

21 Ibid p 44

22 ROUSSEAU 2004 p 17

23 Ibid p 48

24 ROUSSEAU 2004 p 17

25 HABERMAS Juumlrgen Direito e democracia entre facticidade e validade Rio de Janeiro Tempo Brasileiro 1997 p 17 V1

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agudizada ndash agrave liberdade do homem tido como um sujeito privado que tambeacutem pode assumir os papeis de um membro da sociedade civil do Estado e do mundordquo26 Ainda Habermas assenta que o projeto da modernidade que os filoacutesofos do iluminismo ordenaram no transcurso do seacuteculo XVIII

[] consiste num desenvolvimento implacaacutevel das ciecircncias objetivas das bases universalistas

da moralidade e da lei e de uma arte autocircnoma consoante a loacutegica interna delas constituindo

ao mesmo tempo poreacutem uma libertaccedilatildeo dos potenciais cognitivos acumulados em decorrecircncia

de suas altas formas esoteacutericas e de sua utilizaccedilatildeo na praacutexis isto eacute na organizaccedilatildeo racional das

condiccedilotildees de vida e das relaccedilotildees sociais27

Enquanto desvenda os descaminhos de sua capacidade racional e expande-se em conhecimento arte e ciecircncia o homem busca a redenccedilatildeo do seu eu-humano-livre-no-mundo frente agraves reminiscecircncias o despotismo e a sagacidade que foram impetradas em larga escala pelo poder religioso Este novo feitio de ser e existir estende-se agrave reconfiguraccedilatildeo da imagem de essencialidade do Estado Democraacutetico de Direito agrave conceituaccedilatildeo de lei e ao significado de Constituiccedilatildeo

2 PARA NAtildeO OLVIDAR-SE O SENTIDO DA DECLARACcedilAtildeO UNIVERSAL DOS DIREITOS HUMANOS

O contributo da modernidade para a consolidaccedilatildeo de um ideal de progresso pautado na exaltaccedilatildeo da racionalidade humana e na fundamentaccedilatildeo da ciecircncia pouco a pouco se torna obscurecido pelos con-tornos que o proacuteprio homem aporta agrave sua realidade a partir da expansatildeo do conhecimento da imersatildeo cientiacutefica e de um entendimento de que a tecnologia pode colocar-se agrave disposiccedilatildeo da busca desenfrea-da pelo poder de uns sobre outros

Nesse aspecto Romano Guardini salienta que a ideia central dos tempos modernos fundamenta as normas da ciecircncia voltadas para o bem estar do homem Diante desse discurso ocultou-se uma e outra vez barbaacuteries produzidas pela ausecircncia completa de escruacutepulos no intuito de alcanccedilar o poder28 Guardini revela ademais que

O homem sabe que em uacuteltima anaacutelise o que estaacute em jogo na teacutecnica nem eacute a utilidade nem o bem

estar mas o domiacutenio domiacutenio no sentido mais extremo da palavra que se exprime numa nova forma

do mundo Procura compreender os elementos da natureza e da existecircncia humana Isto significa

possibilidades insuspeitadas de construir mas tambeacutem de destruir sobretudo quando se trata da

natureza humana muito menos fixa e segura de si do que se pensa geralmente Perigo absoluto

tambeacutem que cresce ateacute ao imensuraacutevel de ser o Estado anoacutenimo quem realiza esse domiacutenio Assim

a relaccedilatildeo com a natureza traz o caraacutecter de uma decisatildeo extrema ou o homem consegue realizar

correctamente a obra de dominaccedilatildeo e entatildeo esta seraacute imensa - ou tudo estaraacute acabado29

Eacute saliente que a modernidade reverbera um autonomismo humano que de uma ou de outra forma gera uma espeacutecie de cegueira coletiva traduzida pela crenccedila vazia e estagnada de uma nova perspectiva de vida decorrente da possibilidade de desfrutar livremente do poder e sentir-se seguro com ele Esse apego agrave laquopseudoraquo liberdade-seguranccedila geradas pelo poder oprime natildeo raras agraves vezes o dimensiona-mento sobre os reflexos que os avanccedilos cientiacuteficos e tecnoloacutegicos e os laquosignosraquo ocultos sob uma repre-sentatividade poliacutetica provocam na condiccedilatildeo humana das laquogentes do mundoraquo

26 HABERMAS 1997 p 17

27 HABERMAS Juumlrgen O discurso filosoacutefico da modernidade Satildeo Paulo Martins Fontes 2002 p 77

28 GUARDINI Romano O fim dos tempos modernos Lisboa Livraria Moraes Editora 1964

29 Ibid p 78-79

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As atrocidades praticadas durante a Segunda Guerra Mundial revelam ateacute onde o homem eacute capaz de ir aliando o conhecimento ciecircncia e tecnologia a discursos poliacuteticos progressistas revestidos de um ufanismo insoacutelito fruto da malversaccedilatildeo da racionalidade humana e do desvirtuamento da consciecircncia do eu-no-mundo

A modernidade buscou em sua profundeza resilir a equaccedilatildeo poder-pessoa em especial aquela advin-da do soberano ou do divino Poreacutem em linhas gerais relegou agrave pessoalidade a condiccedilatildeo de mera subje-tividade de reafirmaccedilatildeo de valores sem um norte de retenccedilatildeo ou de horizonte dos juiacutezos reafirmados Como bem afianccedila Rein Staal ldquoo poder lanccedilou sua sombra sobre o homem por meio de instituiccedilotildees impessoais e processos que seguiam a sua proacutepria loacutegica desalmada Natildeo haacute ser que natildeo tenha um mes-trerdquo30 e o poder demoniacuteaco preencheu o vaacutecuo deixado pelo eclipse da responsabilidade pessoal

Eacute justamente neste contexto de necessaacuterio resgate e valorizaccedilatildeo da condiccedilatildeo humana e de limitaccedilatildeo do poder do homem que a comunidade internacional todavia traumatizada pelas sequelas intranspo-niacuteveis da guerra conjuga seus esforccedilos para redigir uma carta suprema que defina os princiacutepios norte-adores de pacificaccedilatildeo mundial e de defesa dos direitos humanos

Apoacutes intenso debate paiacuteses de todas as regiotildees do mundo detentores de caracteriacutesticas socioculturais distintas vivificadas num marco poliacutetico-juriacutedico-nacional diferenciado dedicaram-se agrave elaboraccedilatildeo de um documento que assegurasse o compromisso internacional pelo reconhecimento e garantia dos direi-tos e liberdades de todos os homens Assim aclamaram na Assembleia Geral das Naccedilotildees Unidas em 10 de dezembro de 1948 a Declaraccedilatildeo Universal dos Direitos Humanos por meio da Resoluccedilatildeo 217 A (III)

Sobre este aspecto Austregeacutesilo de Athayde representante da Delegaccedilatildeo brasileira que atuou na elaboraccedilatildeo do texto da DUDH convencido da nova era de liberdade e justiccedila ofertada agrave humanidade adverte em discurso proferido perante a Assembleia da ONU que

Se nosso trabalho resultasse de uma imposiccedilatildeo qualquer e natildeo fosse de uma cooperaccedilatildeo

intelectual e moral das naccedilotildees natildeo estaria evidentemente agrave altura de nossas responsabilidades

nem responderia ao espiacuterito de compreensatildeo universal que eacute a proacutepria base de nossa

organizaccedilatildeo internacional A sua forccedila vem precisamente da diversidade de pensamento de

cultura e de concepccedilatildeo de vida de cada representante Unidos formamos a grande comunidade

do mundo e eacute exatamente dessa uniatildeo que decorre a nossa autoridade moral e poliacutetica31

Diante da forccedila expressa pela DUDH reconhece-se o imprescindiacutevel soerguimento de sociedades democraacuteticas que compreendam ldquo[] que eacute essencial agrave proteccedilatildeo dos direitos do Homem atraveacutes de um regime de direito para que o Homem natildeo seja compelido em supremo recurso agrave revolta contra a tira-nia e a opressatildeordquo32 Salienta-se por corolaacuterio que esse entendimento tem o reforccedilo do paraacutegrafo 3ordm do Art 21 da Declaraccedilatildeo definitivo no sentido de que ldquoa vontade do povo eacute o fundamento da autoridade dos poderes puacuteblicosrdquo

Longe de qualquer intuito pelo exagero ilustrativo mostra-se prudente assinalar que pelo rigor da DUDH todos os atos derivados do exerciacutecio de poder de qualquer autoridade puacuteblica devem estar em consonacircncia com a vontade do povo e com os valores expressos na Declaraccedilatildeo conforme bem estabe-lece o preacircmbulo do documento declaratoacuterio

30 STAAL Rein A histoacuteria esquecida da poacutes-modernidade First Things (dezembro de 2008)Traduccedilatildeo de Grace Guimaratildees Mosquera

Revista Dicta e Contradicta Disponiacutevel em lthttpwwwdictacombredicoesedicao-3a-historia-esquecida-da-pos-modernidadegt

Acesso em 28 jun 2018

31 ATHAYDE Austregeacutesilo de Discurso pronunciado na Assembleia Plenaacuteria da ONU Paris 10 de Dez 1948 Disponiacutevel em lthttps

ajonuorg20121017austregesilo-de-athayde-e-sua-fundamental-importancia-aos-direitos-humanosgt Acesso em 27 jun 2018

32 Ibid

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[] a fim de que todos os indiviacuteduos e todos os oacutergatildeos da sociedade tendo-a constantemente no

espiacuterito se esforcem pelo ensino e pela educaccedilatildeo por desenvolver o respeito desses direitos e

liberdades e por promover por medidas progressivas de ordem nacional e internacional o seu

reconhecimento e a sua aplicaccedilatildeo universais e efectivos tanto entre as populaccedilotildees dos proacuteprios

Estados membros como entre as dos territoacuterios colocados sob a sua jurisdiccedilatildeo33

A Declaraccedilatildeo Universal dos Direitos Humanos aponta dessa forma para a necessidade de uma educa-ccedilatildeo para o os direitos humanos Natildeo uma educaccedilatildeo no sentido formal escolar ou acadecircmico Mas aque-la educaccedilatildeo que ao promover um exerciacutecio de ponderaccedilatildeo contagie os indiviacuteduos de cada paiacutes sobre a propriedade dos direitos que satildeo inerentes agrave condiccedilatildeo da pessoa humana como um todo e natildeo restrita a um grupo a uma bandeira ou a um partido

Por este caminho elucidativo a Declaraccedilatildeo aponta agrave construccedilatildeo de um novo Estado Democraacutetico de Direito que natildeo resulte exclusivamente da laquovontade do povoraquo mas sobretudo da vontade do povo que eacute concatenada na base de valores convergentes com a afirmaccedilatildeo e defesa dos direitos humanos como os valores de igualdade e de liberdade

Bobbio com maestria lembra que

[] a linguagem poliacutetica moderna conhece tambeacutem o significado de democracia como o regime

caracterizado pelos fins ou valores em direccedilatildeo aos quais um determinado grupo poliacutetico tende e

opera O princiacutepio destes fins ou valores adotado para distinguir natildeo mais apenas formalmente

mas tambeacutem conteudisticamente um regime democraacutetico de um regime natildeo democraacutetico eacute a

igualdade natildeo a igualdade juriacutedica introduzida nas Constituiccedilotildees liberais mesmo quando estas

natildeo eram formalmente democraacuteticas mas a igualdade social e econocircmica (ao menos em parte)34

Defende-se de tal modo que satildeo os ideais de liberdade e de igualdade social e econocircmica provenien-tes da Declaraccedilatildeo Universal dos Direitos Humanos que arrimam a existecircncia do Estado Democraacutetico de Direito cuja solidez natildeo pode ser maculada por ato peremptoacuterio de um ou de outro Poder estatal transgressor do que o Art 29 da DUDH denomina como ldquojustas exigecircncias da moral da ordem puacuteblica e do bem-estar numa sociedade democraacuteticardquo35

3 A PLATAFORMA DE SUSTENTACcedilAtildeO DO ESTADO DEMOCRAacuteTICO

Natildeo eacute demais aduzir que o Estado de Direito eacute alicerccedilado sobre uma superfiacutecie principioloacutegica dimen-sionada pela acepccedilatildeo de soberania nacional de separaccedilatildeo autonomia e independecircncia dos poderes e de supremacia constitucional A Constituiccedilatildeo consequentemente apresenta-se como uma ordenaccedilatildeo sistemaacutetica da comunidade poliacutetica plasmada num documento escrito mediante o qual se estrutura o poder poliacutetico e se asseguram os direitos fundamentais

O Direito por seu turno afigura-se como ldquoum instrumento de transformaccedilatildeo social e natildeo como obstaacute-culo agraves mudanccedilas sociaisrdquo36 De acordo com Streck ldquoos textos constitucionais passam a conter as possi-bilidades de resgate das promessas da modernidade situaccedilatildeo que assume relevacircncia iacutempar em paiacuteses de modernidade tardia como o Brasil em que o welfare state natildeo passou de uma simulaccedilatildeordquo37

33 ONU Declaraccedilatildeo Universal dos Direitos Humanos Disponiacutevel em lthttpswwwohchrorgENUDHRPagesLanguage

aspxLangID=porgt Acesso em 23 jun 2018

34 BOBBIO Norberto Estado Governo e Sociedade para uma teoria geral da poliacutetica Satildeo Paulo Paz e Terra 2005 p 157

35 ONU Declaraccedilatildeo Universal dos Direitos Humanos Disponiacutevel em lthttpswwwohchrorgENUDHRPagesLanguage

aspxLangID=porgt Acesso em 23 jun 2018

36 STRECK Lenio Luiz Hemenecircutica Juriacutedica e(m) crise uma exploraccedilatildeo hermenecircutica da construccedilatildeo do direito Porto Alegre Livraria

do Advogado Editora 2004 p 235

37 ______ Hermenecircutica Constituiccedilatildeo e autonomia do direito Revista de Estudos Constitucionais Hermenecircutica e Teoria do Estado

(RECHTD) 1 (1)65-77 janeiro-junho 2009 p 66

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Dentre as promessas da modernidade a democracia exsurge segundo Pontes de Miranda como ldquoforma de criaccedilatildeo da ordem estatal ou de parte dela processo ou meacutetodo para se decidir (mediante referendo ou em reuniatildeo do povo mesmo) ou para se escolherem chefes legisladores juiacutezes executantesrdquo38 Sob este talante a vazatildeo democraacutetica como baldrame de um regime poliacutetico configura-se atraveacutes da participaccedilatildeo popular ajustada a partir de uma conjuntura organizacional do Estado apta para preservar o equiliacutebrio entre os Poderes a ordem puacuteblica e a salvaguarda da materialidade dos direitos fundamentais

Nessa linha ldquoa democratizaccedilatildeo social fruto das poliacuteticas do Welfare State o advento da democracia no segundo poacutes-guerra e a redemocratizaccedilatildeo de paiacuteses que saiacuteram de regimes autoritaacuteriosditatoriais trazem agrave luz Constituiccedilotildees cujos textos positivam os direitos fundamentais e sociaisrdquo39 Este fenocircmeno provoca a redefiniccedilatildeo do relacionamento entre os Poderes do Estado estendendo ao Poder Judiciaacuterio a laquolegitimidaderaquo de participar do locus poliacutetico pois segundo Streck

[] o Welfare State lhe facultou o acesso agrave administraccedilatildeo do futuro e o constitucionalismo

moderno a partir da experiecircncia negativa de legitimaccedilatildeo do nazi-fascismo pela vontade

da maioria confiou agrave justiccedila constitucional a guarda da vontade geral encerrada de modo

permanente nos princiacutepios fundamentais positivados na ordem juriacutedica40

No Brasil o ideal democraacutetico foi alimentado pela Constituiccedilatildeo Federal de 1988 surgida como a mais cidadatilde de todos os textos constitucionais conhecidos no decorrer da histoacuteria do paiacutes O Estado Democraacutetico brasileiro supera as adversidades acontecidas na eacutepoca totalitaacuteria e conforma-se den-tro de uma suposta e figurada laquodesassociaccedilatildeoraquo dos seus Poderes Harmocircnicos entre si os Poderes do Estado satildeo independentes e autocircnomos Executivo Legislativo e Judiciaacuterio perfazem as palancas de sustentaccedilatildeo do laquoedifiacutecio estatalraquo por onde deve transitar sua populaccedilatildeo revitalizada pela expectativa de seguranccedila e garantia dos direitos fundamentais indispensaacuteveis ao alcance das condiccedilotildees de existecircn-cia digna tal e qual foram preconizados pela Declaraccedilatildeo Universal dos Direitos Humanos

Eacute em razatildeo dessa particularidade que se busca na ontologia fundamental de Heidegger a laquoevidecircnciaraquo que impulsiona a busca pela recuperaccedilatildeo do esquecido de encontrar-se o perdido de enxergar-se o simples Natildeo se pode rechaccedilar que ldquoa resposta ao questionamento do laquoquemraquo eacute o ser-aiacute cotidiano eacute obtida ao ana-lisarmos o estilo de ser no qual de imediato e em geral o ser-aiacute se manteacutemrdquo41 Heidegger especifica que

El laquoser en el mundoraquo del laquoser ahiacuteraquo se ha dispersado y hasta despedazado en cada caso ya con

su facticidad en determinados modos del laquoser enraquo La multiplicidad de tales modos del laquoser

enraquo puede mostrarse por viacutea de ejemplo con la siguiente enumeracioacuten tener que ver con algo

producir algo encargarse y cuidar de algo emplear algo abandonar y dejar que se pierda algo

emprender imponer examinar indagar considerar exponer definirhellip42

Capital portanto editar que as mazelas experienciadas pela sociedade brasileira no periacuteodo ditato-rial forjaram a construccedilatildeo de um interesse poliacutetico comum voltado ao estabelecimento de uma genu-iacutena vontade geral que expressa valores e princiacutepios supremos insculpidos no texto da Constituiccedilatildeo Federal de 1988 Consequentemente a separaccedilatildeo a autonomia e a independecircncia dos Poderes do Estado textualizadas no acircmago da Constituiccedilatildeo inspiram a expectativa de realizaccedilatildeo do espiacuterito demo-craacutetico como o novo nirvana social A igualdade a liberdade e a dignidade sonhos de antanho apresen-tam-se aos brasileiros como valores que orientam a garantia e a cauccedilatildeo dos direitos fundamentais

38 MIRANDA Pontes de Democracia liberdade igualdade Campinas Bookseller 2002 p 50

39 STRECK Lecircnio Luiz Jurisdiccedilatildeo constitucional e hermenecircutica uma nova criacutetica do direito 2 ed Rio de Janeiro Forense 2004 p 147

40 Ibidem

41 HEIDEGGER Martin Todos noacutes ningueacutem um enfoque fenomenoloacutegico do social Traduccedilatildeo de Dulce Mara Critelli Satildeo Paulo Editora

Moraes 1981 p 32

42 HEIDEGGER 2004 p 110

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4 ENTRE A TRANSVERSAtildeO POLIacuteTICA DO JUDICIAacuteRIO O FLAGELO DO ESTADO DEMOCRAacuteTICO DE DIREITO E A DESEFICACIZACcedilAtildeO DOS VALORES CONSTITUCIONAIS

O cenaacuterio formal da constitucionalidade brasileira revela-se proacuteprio agrave realizaccedilatildeo do devaneio demo-craacutetico Ademais o Poder Judiciaacuterio sustenta a espada para a defesa dos direitos fundamentais e para a prevalecircncia da justiccedila atraveacutes do escudo e cumprimento do que determina a Constituiccedilatildeo Ocorre no entanto que entre o dito e o natildeo dito aquele interesse poliacutetico comum que alimentou a atuaccedilatildeo do constituinte feneceu diante dos interesses setorizados da sociedade

No cenaacuterio democraacutetico instituiacutedo no Brasil ou laquore-ins-ti-tu-iacute-doraquo a vontade de alguns comeccedilou a pre-valecer sobre o interesse geral corrompendo a noccedilatildeo de bem comum Ainda que convergente no sen-tido de estabelecer uma unidade nacional mais fraterna a vontade poliacutetica nacional de forma diame-tralmente oposta ao pressaacutegio democraacutetico jamais deixou de divergir na conduccedilatildeo de seus interesses acalorando o levante das formas a busca das fontes e a praacutetica de atitudes adequadas ao destino poliacuteti-co mais apropriado ao ajuste das necessidades setoriais de seu grupo sejam elas de ordem econocircmica religiosa ou social

Desse modo o cotidiano e natildeo os conceitos43 nem os princiacutepios e muito menos as leis desvelam problemas protuberantes que fragilizam a estrutura de separaccedilatildeo independecircncia e autonomia dos Poderes do Estado combalindo materialmente a noccedilatildeo democraacutetica Assim sendo olha-se atraacutes sis-tematiza-se o prenuacutencio constitucional e pondera-se sobre aquele laquodesejoraquo de consolidar um Estado Democraacutetico de Direito emergente de um contexto poacutes-ditatorial procurando atender aos anseios de uma sociedade oprimida por anos a fio necessitada de uma via de efetivaccedilatildeo dos direitos huma-nos enaltecidos pela Declaraccedilatildeo Universal dos Direitos Humanos de 1948 para garantir natildeo apenas a liberdade e a igualdade dos indiviacuteduos mas promover a dignidade humana por meio de uma sociedade mais justa e fraterna

Eacute por esta razatildeo que perdura desde 1988 uma luta renitente de ajustes poliacuteticos que confrontam de forma permanente os valores e princiacutepios constitucionais enfraquecem o poder estatal e fragilizam o entorno social As funccedilotildees executivas legislativas e judiciaacuterias que deveriam resguardar o poder poliacute-tico da sociedade brasileira ou seja o soberano na concepccedilatildeo de Rousseau44 corrompem-se diante da premiaccedilatildeo dos interesses de um ou de outro grupo em detrimento daquilo que interessa a sociedade como um todo

Por meio da laquopoliticagemraquo entenda-se esta como as laquoaccedilotildees poliacuteticas desenvolvidas em prol dos interes-ses de uma parcela de particularesraquo esquecem-se da responsabilidade essencialmente poliacutetica ineren-te a cada funccedilatildeo estatal que representa na sua integralidade o poder poliacutetico e uno do proacuteprio Estado

O Judiciaacuterio como forccedila integrante desse poder estatal carece de assumir a sua responsabilidade--natureza poliacutetica para por meio de sua atividade jurisdicional (que natildeo eacute apenas de buscar dirimir conflitos) efetivamente salvaguardar os valores e princiacutepios constitucionais de modo a colaborar na efetiva construccedilatildeo e consagraccedilatildeo de um Estado verdadeiramente democraacutetico Streck em liccedilatildeo sobre o redimensionamento da tradicional ou claacutessica relaccedilatildeo entre os Poderes do Estado esclarece que o Judiciaacuterio surge ldquocomo uma alternativa para o resgate das promessas da modernidade onde o acesso agrave justiccedila assume um papel de fundamental importacircncia atraveacutes do deslocamento da esfera de tensatildeo ateacute entatildeo calcada nos procedimentos poliacuteticos para os procedimentos judiciaisrdquo45

43 HEIDEGGER 1981

44 ROUSSEAU 2004

45 STRECK p 141

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Tem-se destarte que sobrelevar a necessidade de um exerciacutecio poliacutetico do Poder Judiciaacuterio sem que a politicagem esteja no coraccedilatildeo de sua atuaccedilatildeo jurisdicional Natildeo se pode olvidar que ldquoo juiz natildeo aplica a lei apenas in concreto senatildeo que colabora ele mesmo atraveacutes de sua sentenccedila no desenvolvimento do direito (direito de juiz)rdquo 46 Eacute necessaacuterio resguardar-se a certeza de que ldquonosso saber acerca do direito e dos costumes sempre seraacute complementado a partir de cada caso particular sim seraacute ateacute mesmo deter-minado produtivamenterdquo47

Hodiernamente ao longo das passarelas por onde transitas os exercentes da ciecircncia juriacutedica a mesma dos singulares aplicadores do direito positivo deduz-se conhecer a funccedilatildeo do Poder Judiciaacuterio e a atri-buiccedilatildeo do juiacutezo ldquosobretudo a partir da jurisprudecircncia campo em que o desempenho juriacutedico comple-mentar da lsquohermenecircuticarsquo reside justamente em promover a concreccedilatildeo do direitordquo48 Ocorre que a cisatildeo fenomenoloacutegica que atualmente paira sobre dimensotildees soacutecio-poliacutetica-econocircmica do Estado brasilei-ro que satildeo intercambiaacuteveis com a dimensatildeo autocircnoma do proacuteprio Direito49 leva ao questionamento sobre a efetividade do papel do Poder Judiciaacuterio como guardiatildeo e cumpridor dos preceitos constitu-cionais inerentes agrave preservaccedilatildeo dos valores que sustentam o proacuteprio Estado Democraacutetico de Direito

A despeito de defender-se que o Poder Judiciaacuterio possui responsabilidade poliacutetica inerente agrave sua con-diccedilatildeo funcional de Poder do Estado a Constituiccedilatildeo hoje fragiliza-se diante dos interesses poliacuteticos e falece como ldquoinstacircncia da autonomia do Direito para limitar a transformaccedilatildeo das relaccedilotildees juriacutedico-ins-titucionais em um constante estado de exceccedilatildeo Disso tudo eacute possiacutevel dizer que tanto o velho discricio-narismo positivista quanto o pragmatismo fundado no decliacutenio do direito tecircm algo em comum o deacutefi-cit democraacuteticordquo50 a adulteraccedilatildeo das claacuteusulas democraacuteticas imantadas51 pela Constituiccedilatildeo de 1988 e a deseficacizaccedilatildeo dos valores constitucionais

5 ALENTO FINAL PARA NAtildeO DIZER QUE NAtildeO SE FALOU DAS FLORES

Do sonho poacutes-ditadura da excitaccedilatildeo preacute-democracia vive-se no Brasil o pesadelo da incerteza e da nebulosidade que adejam pelos descaminhos dos incongruentes desvios de competecircncia daqueles que incorporam a responsabilidade pela execuccedilatildeo dos Poderes do Estado O Executivo o Legislativo e o Judiciaacuterio emaranham-se por excessos e omissotildees pecaminosas que afetam agrave integridade moral do Estado Democraacutetico brasileiro

Enquanto a liberdade e a igualdade enfatizadas pelos prolegocircmenos constitucionais no exato estridor que a DUDH lhes deu como vindicaccedilotildees da moral da ordem puacuteblica e do bem-estar presumiacuteveis no seio de uma sociedade democraacutetica desfalecem sob o teto de vidro das Instituiccedilotildees que sobrelevam inte-resses especiacuteficos de grupos determinados a modernidade jaacute intuiacuteda como poacutes-moderna contempla brasileiros de um lado vociferarem contra o golpe e brasileiros de outro gritarem colericamente pela intervenccedilatildeo militar

De uma ou de outra forma e seja por qual dos bramidos que se observe a postura nacional natildeo se pode desprezar que o bem estar da sociedade brasileira estaacute comprometido e o marco axioloacutegico da Constituiccedilatildeo encontra-se rasgado O desrespeito aos matizes da Constituiccedilatildeo pelo desenfreio na dis-

46 GADAMER Hans-Georg Verdade e meacutetodo traccedilos fundamentais de uma hermenecircutica filosoacutefica Traduccedilatildeo de Flaacutevio Paulo Meurer

3 ed Petroacutepolis Editora Vozes 1999 p 88

47 GADAMER p 87

48 Ibid p 87

49 STRECK 2009 p 74

50 Idem p 75

51 KANT Immanuel Criacutetica de la razoacuten pura Traduccioacuten de Pedro Ribas Madrid Cayfosa-Quebecor 2004

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torccedilatildeo ou na extensatildeo semacircntica de preceitos constitucionais determinantes do escudo de direitos que satildeo de todos e natildeo somente de um ou de alguns e devem guarnecer a laquovontade do povoraquo corro-em a probidade dos Poderes do Estado profanando a acuidade do Poder Judiciaacuterio como defensor da Constituiccedilatildeo e garantidor dos Diretos Fundamentais

Por isto e malgrado o mundo se encontre a festejar os setenta anos da Declaraccedilatildeo Universal dos Direitos Humanos os juristas os acadecircmicos e todos os cidadatildeos brasileiros natildeo podem silenciar agraves situaccedilotildees poliacuteticas e as atitudes das autoridades nacionais que abalam a estabilidade dos Poderes do Estado brasileiro contaminando a perspectiva de efetividade dos valores constitucionais que ampa-ram ou deveriam amparar os Direitos Humanos prenunciados em 1948 pela accedilatildeo co-operativa da comunidade internacional que abnegou os excessos dos Estados que priorizavam interesses limitados de uma fraccedilatildeo de indiviacuteduos em detrimento dos direitos de todas as pessoas

Se o Brasil natildeo estaacute na iminecircncia de combalir a constacircncia e continuidade da quimera democraacutetica os brasileiros encontram-se imbuiacutedos na busca desajustada pela glorificaccedilatildeo de verdades que natildeo satildeo suas mas massificaram-se pela proeminecircncia de conformaccedilatildeo de um Poder antagocircnico agrave essecircncia do contrato social que previa como regra maior preservar a vida a liberdade e a igualdade reprimindo todo e qualquer tipo de violaccedilatildeo dos direitos naturais que afetem a dignidade humana seja na ordem material profissional afetiva espiritual

Assim sendo eacute imperioso natildeo olvidar-se que independente da autonomia e independecircncia dos Poderes do Estado a praacutetica jurisdicional e o exerciacutecio da funccedilatildeo e da responsabilidade poliacutetica do Poder Judiciaacuterio necessaacuteria agrave proacutepria garantia dos Direitos Fundamentais natildeo pode ser convertida em atuaccedilatildeo politiqueira que determina natildeo a politizaccedilatildeo do que eacute juriacutedico mas a transfiguraccedilatildeo da liberdade da igualdade e da dignidade em atributos limitados para a satisfaccedilatildeo dos direitos-desejos de uns poucos

No exerciacutecio de defender a Constituiccedilatildeo e assegurar a efetividade dos Direitos Fundamentais para todos os brasileiros o Poder Judiciaacuterio natildeo deve ou natildeo pode omitir-se ao significado que cada cidadatildeo apor-ta agrave contumaacutecia da Democracia e como cada qual interfere na relaccedilatildeo do laquoser aiacuteraquo com o laquoser no mundoraquo

Muito aleacutem de verberarem-se teses rotulantes que acirram acusaccedilotildees reciacuteprocas os grupos devem se unir no processo de instituiccedilatildeo de uma base diferenciada para a sofisticada interpretaccedilatildeo do Direito e da accedilatildeo poliacutetica do Poder Judiciaacuterio indispensaacutevel agrave conformaccedilatildeo teacutecnica-cientiacutefica de novos juristas aptos agrave superaccedilatildeo do tradicional ldquoparadigma metafiacutesicordquo52 de interpretaccedilatildeo juriacutedica

Recorde-se que a Declaraccedilatildeo Universal dos Direitos Humanos perfaz um documento unificador de agregaccedilatildeo impossiacutevel de ser rechaccedilado mesmo por um Estado que possui uma Constituiccedilatildeo balzaquia-na que foi pensada enaltecida e promulgada para preponderar a igualdade e a liberdade com respei-to agraves diferenccedilas impossiacuteveis de serem extirpadas da condiccedilatildeo humana individual de cada pessoa que perfaz o coletivo social

Como nos tempos preacutevios agrave consagraccedilatildeo da laquoConstituiccedilatildeo Cidadatilderaquo ainda ldquocaminhamos cantamos e seguimos a canccedilatildeo Somos todos iguais braccedilos dados ou natildeo e andamos pelas escolas ruas campos e construccedilotildees caminhando cantando e seguindo a canccedilatildeordquo53

Eacute hora de resgatar-se a estabilidade sensorial-ciacutevica para soerguer-se o juiacutezo do valor da naccedilatildeo bra-sileira e assim examinar-se cautelosa e francamente o sentido da responsabilidade e das funccedilotildees do Poder Judiciaacuterio definindo-se os limites de sua atuaccedilatildeo poliacutetica dentro da perspectiva de sua funccedilatildeo de defensor dos preceitos que configuram o Estado Democraacutetico de Direito indispensaacuteveis agrave efetiva-ccedilatildeo dos valores constitucionais

52 STRECK 2009 p 77

53 VANDREacute Geraldo Para natildeo dizer que natildeo falei de flores Disponiacutevel em lthttpswwwculturagenialcomgt Acesso em 23 jun 2018

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Este eacute o grande ldquodesafio hermenecircuticordquo54 posto aos juristas do seacuteculo XXI que precisam acima de qual-quer interpretaccedilatildeo-aplicaccedilatildeo corrosiva do direito positivo compreender a pertinaacutecia material do tex-to constitucional o que faratildeo somente quando apropriarem-se da responsabilidade de ldquoabrir uma nova clareira (Lichtung) no Direito des-ocultar caminhos des-cobrir as sendas que foram encobertas pelo positivismo[]rdquo55

Se assim natildeo for as flores pereceratildeo

REFEREcircNCIAS

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MIRANDA Joseacute Eduardo de CORREcircA LIMA Andreacutea Educacioacuten formacioacuten humana y valores coopera-tivos una propuesta de revitalizacioacuten de las praacutecticas educativas brasilentildeas para el rescate del hombre social y fraterno Deusto Estudios Cooperativos Universidad de Deusto Bilbao n 9 p 87-107 2017

54 Ibid p 77

55 STRECK 2009 p 77

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A DOACcedilAtildeO DE OacuteRGAtildeOS DEPOIS DO DECRETO Nordm 91752017

ORGAN DONATION AFTER DECREE Nordm 917517Juacutelio Moraes Oliveira1

Resumo O presente artigo tem por escopo analisar os aspectos juriacutedicos da doaccedilatildeo de oacutergatildeos no Brasil em especial depois da aprovaccedilatildeo do Decreto n 917517 que regulamentou da Lei de doaccedilatildeo de oacutergatildeos no Paiacutes Para tal desiderato analisa-se as principais legislaccedilotildees que regulamentam o tema bem como aspectos da bioeacutetica e do biodireito e as implicaccedilotildees legislativas da doaccedilatildeo em vida e da doaccedilatildeo apoacutes a morte

Palavras-chave Doaccedilatildeo Oacutergatildeos Legislaccedilatildeo

Abstract The purpose of this article is to analyze the legal aspects of organ donation in Brazil especially after the approval of Decree no 9175 17 which regulated the Law on donation of organs in the country To this end it analyzes the main legislation that regulates the subject as well as aspects of bioethics and the bio-law and the legislative implications of donation in life and donation after death

Keywords Donation Organs Legislation

1 INTRODUCcedilAtildeO

Sendo parte integrante do corpo humano e portanto pertencente agrave categoria dos direitos da persona-lidade a integridade fiacutesica deve ser preservada como proteccedilatildeo da proacutepria pessoa humana Os direitos da personalidade satildeo direitos subjetivos da pessoa humana capazes de garantir um miacutenimo necessaacuterio e fundamental agrave uma vida com dignidade 2

O transplante tambeacutem chamado de transplantaccedilatildeo nada mais eacute do que a transferecircncia de ceacutelulas teci-dos e oacutergatildeos vivos com a finalidade de restabelecer uma funccedilatildeo perdida de outro oacutergatildeo ceacutelula ou tecido sendo desse modo uma terapecircutica que tem por finalidade a substituiccedilatildeo de oacutergatildeos que perderam a sua funccedilatildeo no organismo Haacute basicamente dois tipos de transplantes o autoacutelogo cujas ceacutelulas tecidos ou oacutergatildeos satildeo retirados da proacutepria pessoa e implantados em um local diferente do corpo e o alogecircnico que compreende a retirada de material de outra pessoa (doador) para ser implantada no paciente (receptor)

1 Faculdade de Paraacute de Minas ndash Fapam Mestre em Instituiccedilotildees Sociais Direito e Democracia pela Universidade FUMEC (2011)

Especialista em Advocacia Civil pela Escola de Poacutes-Graduaccedilatildeo em Economia e Escola Brasileira de Administraccedilatildeo Puacuteblica e de Empresas

da Fundaccedilatildeo Getuacutelio Vargas EPGEFGV e EBAPEFGV (2007) Bacharel em Direito pela Faculdade de Direito Milton Campos - FDMC

(2005) Membro da Comissatildeo de Defesa do Consumidor - Seccedilatildeo Minas Gerais - OABMG Membro do Instituto Brasileiro de Poliacutetica e

Direito do Consumidor (BRASILCON) Membro Suplente do Conselho Municipal de Proteccedilatildeo e Defesa do Consumidor ndash Comdecon - BH

Professor da FAPAM - Faculdade de Paraacute de Minas Professor da Faculdade Asa de Brumadinho Parecerista da Revista da Faculdade

de Direito do Sul de Minas (FDSM) Qualis B1 Parecerista da Revista Quaestio Iuris da Universidade do Estado Rio de Janeiro (UERJ)

Qualis B1 Pesquisador com diversos artigos publicados em perioacutedicos Autor dos Livros Curso de Direito do Consumidor Completo 4

Ed Consumidor-Empresaacuterio a defesa do finalismo mitigado Advogado com experiecircncia em contencioso e consultivo em direito civil

consumidor empresarial e trabalhista

2 OLIVEIRA Julio Moraes Direitos da Personalidade Bioeacutetica e Biodireito Uma Breve Introduccedilatildeo Revista Direitos Emergentes na

Sociedade Global v 2 n 1 Santa Maria jan-jun 2013 p 1-28

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Universidade do Sul de Santa Catarina

Revista Juriacutedica da Universidade do Sul de Santa Catarina

Com o objetivo de estabelecer uma nomenclatura unificada no processo de doaccedilatildeo e transplante formou--se um grupo de experts da Organizaccedilatildeo Mundial da Sauacutede (OMS) e da The Transplantation Society (TTS) no ano de 2008 Existia a necessidade dessa unificaccedilatildeo pois os termos eram empregados com significados diferentes em cada paiacutes tornando difiacuteceis a avaliaccedilatildeo e a comparaccedilatildeo dos resultados e estatiacutesticas 3

Ao contraacuterio de outras modalidades de tratamento o transplante de oacutergatildeos envolve aleacutem do pacien-te e da equipe meacutedica uma terceira figura o doador Este eacute quem disponibiliza os oacutergatildeos e tecidos que daratildeo aos receptores a possibilidade de tratamento sendo portanto o elemento mais importante para o sucesso do processo de doaccedilatildeo-transplante

Para que exista a doaccedilatildeo as pessoas necessitam ser conscientizadas da importacircncia do ato para a redu-ccedilatildeo da mortalidade de uma seacuterie de doenccedilas Os oacutergatildeos para transplantes podem ser obtidos de doa-dores vivos ou falecidos Em sua grande maioria as doaccedilotildees ocorrem em casos de morte encefaacutelica havendo tambeacutem um crescente nuacutemero nos paiacuteses desenvolvidos de doadores em morte circulatoacuteria

Desde o diagnoacutestico de morte encefaacutelica ateacute a efetiva realizaccedilatildeo do transplante satildeo deslocados uma seacuterie de pessoas e oacutergatildeos que constituem uma complicada e delicada rede logiacutestica de captaccedilatildeo sele-ccedilatildeo transporte e realizaccedilatildeo do transplante

Recentemente o Conselho Federal de Medicina (CFM) atualizou os criteacuterios para a definiccedilatildeo de morte encefaacutelica que agora poderaacute ser diagnosticada por mais especialistas aleacutem do neurologista Atraveacutes da Resoluccedilatildeo nordm 217317 que substitui a de nordm 148097 e atende o que determina a lei nordm 943497 e o decreto presidencial nordm 917517 que regulamentam o transplante de oacutergatildeos no Brasil

Tendo em vista essa breve introduccedilatildeo o que se pretende com o presente estudo eacute analisar os aspectos juriacutedicos da doaccedilatildeo de oacutergatildeos no Brasil seja em vida ou post mortem

2 A HISTOacuteRIA DOS TRANSPLANTES E SUAS ESTATIacuteSTICAS

A ideacuteia de transferir tecidos de um organismo a outro natildeo eacute recente na histoacuteria afirma Maria Helena Diniz que trezentos anos antes de Cristo a tradiccedilatildeo chinesa apontava a troca de oacutergatildeos entre dois irmatildeos feita pelo meacutedico Pien Chiao 4 Estudos arqueoloacutegicos feitos no Egito na Greacutecia e na Ameacuterica Preacute-colombiana apontam que houve a tentativa de transplantes de dentes

Mas realmente somente agrave partir do transplante realizado por Joseph Murray em 23 de dezembro de 1954 o primeiro transplante de oacutergatildeos humanos bem sucedido no mundo pode-se falar em transplan-te de oacutergatildeos como conhecemos nos dias atuais

Mesmo depois de 64 anos de estudos e desenvolvimento dessas teacutecnicas o conhecimento da popula-ccedilatildeo a respeito do tema ainda eacute muito escasso Essa falta de conhecimento eacute um fato gerador natildeo soacute de desinteresse pelo assunto mas tambeacutem de preconceito e recusa na doaccedilatildeo dos oacutergatildeos pelos familiares

Mesmo com esse desconhecimento a respeito do assunto em 2016 o Brasil registrou o maior nuacutemero de doadores efetivos da histoacuteria foram 2983 doadores o que representa uma taxa de 146 PMP (por milhatildeo da populaccedilatildeo) 5 maior em comparaccedilatildeo a 2015 5

3 GARCIA Valter Duro PACINI Gabriel Sartori Recomendaccedilotildees de Nomenclatura no processo de Doaccedilatildeo e transplante In (Org)

GARCIA Clotilde Druck PEREIRA Japatildeo Droumlse GARCIA Valter Duro Doaccedilatildeo e Transplante de oacutergatildeos e tecidos Satildeo Paulo Segmento

Farma 2015 p 23

4 DINIZ Maria Helena O Estado Atual do Biodireito 5 ed Rev atual e amp Satildeo Paulo Saraiva 2008 p 291

5 BRASIL Nuacutemero de Brasileiros doadores de oacutergatildeos bate recorde em 2016 Dados fornecidos pelo Governo Federal Disponiacutevel em lthttp

wwwbrasilgovbrsaude201703numero-de-brasileiros-doadores-de-orgaos-bate-recorde-em-2016gt Acesso em 05 abr 2018

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Dados da ABTO (Associaccedilatildeo Brasileira de Transplante de oacutergatildeos) apontam que em 2013 por exemplo 47 das famiacutelias que tiveram um ente com morte encefaacutelica recusaram o transplante Esses mesmos dados afirmam que o Brasil eacute trigeacutesimo paiacutes em nuacutemero de transplantes quando relacionados ao nuacuteme-ro de habitantes e o segundo paiacutes em nuacutemeros absolutos de transplantes atraacutes apenas dos Estados Unidos Mesmo assim ateacute 2013 a fila de espera por oacutergatildeo foi de 24 mil pessoas 6

Afirma Maria Helena Diniz que o transplante de oacutergatildeos e tecidos apesar de ser uma das mais notaacuteveis conquistas cientiacuteficas apresenta ainda muitos obstaacuteculos a serem vencidos pelos enormes problemas de natureza eacutetico-juriacutedicas 7

Com efeito o art13 do Coacutedigo Civil disciplina que salvo por exigecircncia meacutedica eacute defeso o ato de dispo-siccedilatildeo do proacuteprio corpo quando importar diminuiccedilatildeo permanente da integridade fiacutesica ou contrariar os bons costumes Jaacute o paraacutegrafo uacutenico afirma que o ato previsto ali seraacute admitido para fins de transplante na forma estabelecida em lei especial Eacute o que se pretende analisar no presente trabalho

3 DA DOACcedilAtildeO EM VIDA

A doaccedilatildeo de oacutergatildeos eacute um dos aspectos mais altruiacutestas da vida em sociedade seu caraacuteter humanitaacuterio eacute incontestaacutevel e a maioria dos paiacuteses a coloca como um dos principais aspectos de poliacutetica de sauacutede puacuteblica

No Brasil os transplantes somente poderatildeo ser realizados em pacientes com doenccedila progressiva ou inca-pacitante e irreversiacutevel por outras teacutecnicas terapecircuticas Eacute permitida a doaccedilatildeo no Brasil agrave doaccedilatildeo entre pessoas vivas de tecidos oacutergatildeos e partes do proacuteprio corpo para fins terapecircuticos ou para transplantes Afirma o art 29 do Decreto n 917517 que somente seraacute permitida a doaccedilatildeo quando se tratar de oacutergatildeos duplos de partes de oacutergatildeos tecidos ceacutelulas e partes do corpo cuja retirada natildeo impeccedila o organismo do doador de continuar vivendo sem risco para a sua integridade e natildeo represente grave comprometimento de suas aptidotildees vitais e de sua sauacutede mental e natildeo cause mutilaccedilatildeo ou deformaccedilatildeo inaceitaacutevel

Na doaccedilatildeo em vida permite-se ao beneficiaacuterio escolher o receptor do oacutergatildeo quando forem parentes na linha reta ou colateral de ateacute 4ordm grau ou ao cocircnjuge ou companheiro e nas outras hipoacuteteses que natildeo sejam parentes consanguiacuteneos eacute necessaacuteria uma autorizaccedilatildeo judicial dispensada esta quando se tratar de medula oacutessea Isso eacute o que dispotildee os artigos 9ordm da Lei n 943497 e o artigo 27 do Decreto n 917518

Anteriormente era exigido ao meacutedico antes de realizar os transplantes entre vivos o envio de um comunicado ao Promotor de Justiccedila da Comarca do domiciacutelio do doador para apuraccedilatildeo da sua licitude atraveacutes de um procedimento investigatoacuterio Todavia com o advento do referido Decreto foram revo-gados os artigos 20 e 25 II Do Decreto n 226897 excluiacuteda portanto a intervenccedilatildeo ministerial8

A retirada de oacutergatildeos soacute seraacute permitida se corresponder a uma necessidade terapecircutica comprovadamen-te indispensaacutevel para a pessoa receptora e o doador vivo seraacute preacutevia e obrigatoriamente esclarecido sobre as consequecircncias e os riscos decorrentes da retirada do oacutergatildeo tecido ceacutelulas ou parte do seu corpo para a doaccedilatildeo Esses esclarecimentos seratildeo consignados em documento lavrado e lido na presenccedila de duas testemunhas e o doador deveraacute especificar o tecido o oacutergatildeo a ceacutelula ou a parte do seu corpo que doaraacute para transplante ou enxerto o nome da pessoa beneficiada e a qualificaccedilatildeo e o endereccedilo dos envolvidos

Nos casos em que a doaccedilatildeo for feita a pessoas fora do ciacuterculo familiar autorizado pela lei o Comitecirc de Bioeacutetica ou a Comissatildeo de Eacutetica do hospital onde se realizaraacute a retirada e o transplante ou o enxerto emitiraacute parecer sobre o caso nos termos do art 29 sect 5ordm do referido Decreto

6 BRASIL Primeiro Transplante faz 50 anos e falta de diaacutelogo dificulta a doaccedilatildeo de oacutergatildeos Disponiacutevel em lthttpagenciabrasilebccom

brgeralnoticia2014-04falta-de-dialogo-sobre-o-assunto-dificulta-doacao-de-orgaosgt Acesso em 05 abr 2018

7 DINIZ Maria Helena O Estado Atual do Biodireito 5 ed Ver atual e amp Satildeo Paulo Saraiva 2008 p 292

8 FARIAS Cristiano Chaves de ROSENVALD Nelson Curso de Direito Civil Parte Geral e LINDB 16 ed Salvador Juspodivm 2018 p 244

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A legislaccedilatildeo tambeacutem permite a doaccedilatildeo de medula oacutessea de pessoa juridicamente incapaz entre seus consanguumliacuteneos desde que sejam observadas autorizaccedilatildeo expressa de ambos os pais ou de seus repre-sentantes legais apoacutes serem esclarecidos sobre os riscos do ato a necessidade de autorizaccedilatildeo judicial e quando o transplante natildeo oferecer risco para a sauacutede do doador

Antes do procedimento de doaccedilatildeo o doador pode desistir a qualquer momento uma vez que a doaccedilatildeo eacute um ato plenamente revogaacutevel a qualquer tempo

Com relaccedilatildeo agraves gestantes estas natildeo poderatildeo doar oacutergatildeos tecidos e partes de seu corpo exceto medula oacutessea desde que natildeo haja risco para a sua sauacutede e a do embriatildeo ou do feto Jaacute a doaccedilatildeo de ceacutelulas pro-genitoras do sangue do cordatildeo umbilical e placentaacuterio do nascituro eacute permitida desde que autorizada pela gestante A doaccedilatildeo de cordatildeo umbilical eacute um dos tratamentos mais promissores da medicina da atualidade a utilizaccedilatildeo das ceacutelulas tronco do cordatildeo umbilical ajuda no tratamento de diversas doen-ccedilas como vaacuterios tipos de leucemia e anemias graves

Hoje ela pode ser feita para armazenamento proacuteprio e para bancos puacuteblicos Depois do parto o cor-datildeo umbilical eacute pinccedilado (lacrado com uma pinccedila) e separado do bebecirc cortando a ligaccedilatildeo entre o bebecirc e a placenta A quantidade de sangue (cerca de 70 ndash 100 ml) que permanece no cordatildeo e na placenta eacute drenada para uma bolsa de coleta as ceacutelulas-tronco satildeo separadas e preparadas para o congelamento Estas mesmas ceacutelulas podem permanecer congeladas por vaacuterios anos no Banco de Sangue de Cordatildeo Umbilical e ficar disponiacuteveis para serem transplantadas A doaccedilatildeo tem caraacuteter sigiloso

Nem todas as gestantes estatildeo aptas a doar o cordatildeo umbilical os criteacuterios meacutedicos determinam uma faixa etaacuteria entre 18 e 36 anos que tenha realizado os exames preacute-natais e que esteja com mais de 35 semanas de gravidez Aleacutem disso a gestante doadora natildeo deve possuir histoacuterico meacutedico de doenccedilas neoplaacutesicas (cacircncer) eou hematoloacutegicas (anemias hereditaacuterias dentre outras)

A legislaccedilatildeo brasileira permite tambeacutem o chamado autotransplante transplante autoacutelogo ou autogecircni-co que nada mais eacute do que usar ceacutelulas do proacuteprio corpo do doador para curar doenccedilas

Com relaccedilatildeo ao receptor o decreto determina que o transplante ou enxerto somente seraacute feito com seu consentimento expresso apoacutes ser alertado dos riscos do procedimento nos termos do art 32 do Decreto n 917517

Nas hipoacuteteses em que o recptor seja juridicamente incapaz ou esteja privado de meio de comunicaccedilatildeo oral ou escrita o consentimento para a realizaccedilatildeo do transplante seraacute fornecido pelo cocircnjuge ou com-panheiro ou por parente consanguiacuteneo ou afim de maior idade e juridicamente capaz na linha reta ou colateral ateacute o quarto grau inclusive Este documento deveraacute ser subscrito por duas testemunhas pre-sentes na assinatura do termo

Os estrangeiros que vierem a falecer em solo brasileiro poderatildeo ser doadores de oacutergatildeos tecidos ceacutelu-las e partes do corpo humano a eles as mesmas exigecircncias referentes aos potenciais doadores brasilei-ros dos artigos 40 e seguintes do Decreto

4 DA DOACcedilAtildeO POST MORTEM

A doaccedilatildeo presumida de oacutergatildeos e tecidos post mortem mediante diagnoacutestico de morte encefaacutelica natildeo mais existe no direito brasileiro por forccedila da redaccedilatildeo da Lei n 1021101 De 1997 a 2001 a Lei n 943497 contou com a possibilidade de doaccedilatildeo presumida de oacutergatildeos que constaria nos documentos de identidade Tal mudanccedila na legislaccedilatildeo cauccedilatildeo uma intensa polecircmica na sociedade que produziu exa-tamente o medo e a desconfianccedila da populaccedilatildeo acerca do procedimento

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Hoje na doaccedilatildeo apoacutes a morte os criteacuterios legais satildeo distintos Em primeiro lugar o Coacutedigo Civil no seu artigo 14 afirma que ldquoeacute vaacutelida com objetivo cientiacutefico ou altruiacutestico a disposiccedilatildeo gratuita do proacuteprio corpo no todo ou em parte para depois da morterdquo Jaacute o artigo 4ordm da Lei n 943497 dispotildee que ldquoa retirada de tecidos oacutergatildeos e partes do corpo de pessoas falecidas para transplantes ou outra finalidade terapecircutica dependeraacute da auto-rizaccedilatildeo do cocircnjuge ou parente maior de idade obedecida a linha sucessoacuteria reta ou colateral ateacute o segundo grau inclusive firmada em documento subscrito por duas testemunhas presentes agrave verificaccedilatildeo da morte Assim tambeacutem determina o art 20 do recente Decreto n 917518 ao externar que ldquoa retirada de oacutergatildeos tecidos ceacutelulas e partes do corpo humano apoacutes a morte somente poderaacute ser realizada com o consentimento livre e esclarecido da famiacutelia do falecido consignado de forma expressa em termo especiacutefico de autorizaccedilatildeordquo

Como se percebe ocorre um aparente conflito de normas acerca da possibilidade de disposiccedilatildeo do proacute-prio corpo para depois da morte inclusive nas situaccedilotildees de transplantes

Esse conflito estaacute diretamente relacionado ao princiacutepio da autonomia privada que rege as relaccedilotildees juriacutedicas do cidadatildeo Natildeo haacute uma unanimidade sobre o conceito de autonomia privada ou mesmo para alguns autonomia da vontade Segundo Perlingieri a autonomia privada consiste no poder reconhe-cido ou atribuiacutedo pelo ordenamento ao sujeito de direito puacuteblico ou privado de regular com proacuteprias manifestaccedilotildees de vontade interesses privados ou puacuteblicos ainda que natildeo necessariamente proacuteprios 9

Jaacute Ceacutesar Fiuza afirma que para se falar em autonomia privada deve-se fazer um resgate histoacuterico Segundo o autor a autonomia da vontade era um princiacutepio de direito privado que facultava agraves pessoas total liberdade para contrair obrigaccedilotildees para testar casar e desquitar Fundava-se na vontade livre na liberdade de agir 10 Jaacute a autonomia privada eacute uma evoluccedilatildeo da autonomia da vontade eacute a esfera de liberdade que as pessoas possuem no ordenamento juriacutedico Difere da autonomia da vontade em que o contrato vem de dentro pra fora na autonomia privada o contrato natildeo vem exclusivamente de den-tro natildeo eacute um fenocircmeno volitivo A vontade eacute condicionada por fatores externos ou por necessidades11

Feita essa breve ponderaccedilatildeo eacute imperioso ressaltar que a doutrina com base na autonomia privada tem afirmado que a vontade do doador em vida deve prevalecer sobre a vontade dos familiares em respei-to ao princiacutepio da autonomia privada

Nesse sentido Nelson Rosenvald e Cristiano Chaves de Farias concluem que havendo manifestaccedilatildeo de vontade do titular ainda vivo no sentido de ser ou natildeo doador de oacutergatildeos haacute de ser respeitada 12

Eacute o que dispotildee o Enunciado 277 da 4ordf Jornada de Direito Civil senatildeo vejamos

O art 14 do Coacutedigo Civil ao afirmar a validade da disposiccedilatildeo gratuita do proacuteprio corpo com

objetivo cientiacutefico ou altruiacutestico para depois da morte determinou que a manifestaccedilatildeo expressa

do doador de oacutergatildeos em vida prevalece sobre a vontade dos familiares portanto a aplicaccedilatildeo do

art 4ordm da Lei n 943497 ficou restrita agrave hipoacutetese de silecircncio do potencial doador

Esse tambeacutem o entendimento de Schreiber ao asseverar que exigir autorizaccedilatildeo de cocircnjuge ou paren-te firmada em documento subscrito por duas testemunhas presentes agrave verificaccedilatildeo da morte eacute impor burocracia que dificulta ainda mais Segundo o referido autor tal interpretaccedilatildeo subordina a autonomia corporal do indiviacuteduo agrave vontade de terceiros tratando-se de grave atentado ao valor constitucional dignidade das pessoas humana13

9 PERLINGIERI Pietro O Direito Civil na Legalidade Constitucional Rio de Janeiro Renovar 2008 p 338

10 FIUZA Ceacutesar Dignidade humana autonomia privada e direitos da personalidade In Autonomia Privada Direitos da Personalidade

(Org) Fiuza Ceacutesar Belo Horizonte Dplaacutecido Editora 2015 p 35

11 Idem p 44

12 FARIAS Cristiano Chaves de ROSENVALD Nelson Curso de Direito Civil Parte Geral e LINDB 16 ed Salvador Juspodivm 2018 p 245

13 SCHREIBER Anderson Direitos da personalidade Satildeo Paulo Atlas 2011 p 47

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Esse parece ser o melhor entendimento acerca do tema pois se coaduna com a autonomia privada do paciente e se submete ao valor da dignidade da pessoa humana como principal objeto de proteccedilatildeo de os Estado Mas infelizmente o legislador do Decreto n 917518 mesmo tendo a oportunidade de cor-rigir essa falha manteve o posicionamento legislativo criticado

Constatada a morte e a ausecircncia de contraindicaccedilotildees cliacutenicas conhecidas caberaacute agraves equipes assisten-ciais do hospital onde se encontra o falecido prover o suporte terapecircutico artificial de forma a ofere-cer a melhor preservaccedilatildeo in situ possiacutevel dos oacutergatildeos tecidos ceacutelulas e partes do corpo humano ateacute que a famiacutelia decida sobre sua doaccedilatildeo A legislaccedilatildeo ainda afirma que cabe agrave rede de procura e doaccedilatildeo de oacutergatildeos tecidos ceacutelulas e partes do corpo humano para transplante sob a coordenaccedilatildeo da CET (Central Estadual de Transplantes) e em consonacircncia com as equipes assistenciais e transplantadoras proce-der ao planejamento ao contingenciamento e agrave provisatildeo dos recursos fiacutesicos e humanos do transporte e dos demais insumos necessaacuterios agrave realizaccedilatildeo da cirurgia de retirada dos oacutergatildeos e dos demais enxertos

Eacute vedada a remoccedilatildeo post mortem de tecidos oacutergatildeos ou partes do corpo de pessoas natildeo identificadas

Apoacutes a retirada de tecidos oacutergatildeos e partes o cadaacutever seraacute imediatamente necropsiado e em qualquer caso condignamente recomposto para ser entregue em seguida aos parentes do morto ou seus res-ponsaacuteveis legais para sepultamento O corpo seraacute acompanhado do relatoacuterio com a descriccedilatildeo da cirur-gia de retirada e dos eventuais procedimentos realizados e a documentaccedilatildeo seraacute anexada ao prontu-aacuterio legal do doador com coacutepia destinada agrave instituiccedilatildeo responsaacutevel pela realizaccedilatildeo da necropsia nos termos do art 25 do Decreto Ao doador de oacutergatildeos tecidos ceacutelulas e partes do corpo humano seraacute dada a precedecircncia para a realizaccedilatildeo da necropsia imediatamente apoacutes a cirurgia de retirada

5 SISTEMA NACIONAL DE TRANSPLANTES

O Sistema Nacional de Transplantes estaacute previsto no Decreto n 9117518 dos artigos 2ordm ao 10 Satildeo integrantes do Sistema Nacional de Transplantes (SNT) o Ministeacuterio da Sauacutede as Secretarias de Sauacutede dos Estados e do Distrito Federal as Secretarias de Sauacutede dos Municiacutepios as Centrais Estaduais de Transplantes - CET a Central Nacional de Transplantes - CNT as estruturas especializadas integrantes da rede de procura e doaccedilatildeo de oacutergatildeos tecidos ceacutelulas e partes do corpo humano para transplantes as estruturas especializadas no processamento para preservaccedilatildeo ex situ de oacutergatildeos tecidos ceacutelulas e par-tes do corpo humano para transplantes os estabelecimentos de sauacutede transplantadores e as equipes especializadas e a rede de serviccedilos auxiliares especiacuteficos para a realizaccedilatildeo de transplantes

O Sistema Nacional de Transplantes tem como atribuiccedilotildees principais a intervenccedilatildeo nas atividades de doaccedilatildeo e transplante de oacutergatildeos tecidos ceacutelulas e partes do corpo humano a partir de doadores vivos ou falecidos a identificaccedilatildeo dos casos de morte encefaacutelica e a determinaccedilatildeo do destino de oacutergatildeos tecidos ceacutelulas e partes do corpo humano retirados para transplante em qualquer ponto do territoacuterio nacional

Ao Ministeacuterio da Sauacutede dentre outras atribuiccedilotildees estaacute a de prover e manter a Central Nacional de Transplantes de oacutergatildeos (CNT) bem como autorizar as Centrais Estaduais de Transplantes (CET) A CNT fica responsaacutevel por gerenciar as CETrsquos bem como por alocar os oacutergatildeos e os tecidos retirados em conformidade com a lista uacutenica de espera de receptores de forma a otimizar as condiccedilotildees teacutecnicas de preservaccedilatildeo transporte e distribuiccedilatildeo considerados os criteacuterios estabelecidos nas normas em vigor e com vistas a garantir o seu melhor aproveitamento e a equidade na sua destinaccedilatildeo

Os transplantes os enxertos ou as retiradas de oacutergatildeos tecidos ceacutelulas e partes do corpo humano somente poderatildeo ser realizados em estabelecimentos de sauacutede puacuteblicos ou privados por equipes especializadas preacutevia e expressamente autorizados pelo oacutergatildeo central do SNT

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6 CONCLUSAtildeO

Diante de todo exposto conclui-se que o tema acerca dos transplantes de oacutergatildeos sempre foi um assun-to bastante polecircmico por envolver questotildees eacutetico-juriacutedicas O Brasil visando evitar a comercializa-ccedilatildeo desse direito da personalidade extra commercium legislou a respeito do tema tratando dos prin-cipais aspectos eacuteticos e praacuteticos da doaccedilatildeo de oacutergatildeos Para isso criou-se um Sistema Nacional de Transplantes que deve atuar de forma integrada para que os resultados sejam alcanccedilados uma vez que o transplante exige uma complexa logiacutestica e uma seacuterie de profissionais envolvidos para que se obtenha o resultado almejado O novo Decreto n 917517 trouxe alguns avanccedilos mas manteve alguns pontos criticados pela doutrina como a manutenccedilatildeo da exigecircncia do consentimento familiar para a retirada de oacutergatildeos de pessoas mortas

Demonstrou-se que salvo melhor juiacutezo tal dispositivo ainda continua violando a autonomia privada do paciente e consequentemente a sua dignidade humana

Mas mesmo com todo esse arcabouccedilo juriacutedico percebe-se que somente a legislaccedilatildeo eacute incapaz de aumentar o altruiacutesmo das pessoas e incentivar a doaccedilatildeo de oacutergatildeos no Brasil

REFEREcircNCIAS

BRASIL Nuacutemero de Brasileiros doadores de oacutergatildeos bate recorde em 2016 Dados fornecidos pelo Governo Federal Disponiacutevel em lthttpwwwbrasilgovbrsaude201703numero-de-brasileiros--doadores-de-orgaos-bate-recorde-em-2016gt Acesso em 05 ar 2018

______ Primeiro Transplante faz 50 anos e falta de diaacutelogo dificulta a doaccedilatildeo de oacutergatildeos Disponiacutevel em lthttpagenciabrasilebccombrgeralnoticia2014-04falta-de-dialogo-sobre-o-assunto-difi-culta-doacao-de-orgaosgt Acesso em 05 abr 2018

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GARCIA Valter Duro PACINI Gabriel Sartori Recomendaccedilotildees de Nomenclatura no processo de Doaccedilatildeo e transplante In (Org) GARCIA Clotilde Druck PEREIRA Japatildeo Droumlse GARCIA Valter Duro Doaccedilatildeo e Transplante de oacutergatildeos e tecidos Satildeo Paulo Segmento Farma 2015

OLIVEIRA Julio Moraes Direitos da Personalidade Bioeacutetica e Biodireito Uma Breve Introduccedilatildeo Revista Direitos Emergentes na Sociedade Global Santa Maria v 2 n 1 jan-jun 2013 p 1-28

PERLINGIERI Pietro O Direito Civil na Legalidade Constitucional Rio de Janeiro Renovar 2008

PERLINGIERI Pietro Perfis do Direito Civil Introduccedilatildeo ao Direito Civil Constitucional Rio de Janeiro Renovar 1999

SCHREIBER Anderson Direitos da Personalidade Satildeo Paulo Atlas 2011

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DIREITOS HUMANOS E FUNDAMENTAIS NA FRONTEIRA ENTRE DIREITO E ECONOMIA A EFICIEcircNCIA DAS POLIacuteTICAS PUacuteBLICAS DE SAUacuteDE NO BRASIL

HUMAN AND FUNDAMENTAL RIGHTS AT THE BORDER BETWEEN LAW AND ECONOMICS THE EFFICIENCY OF HEALTH PUBLIC POLICIES IN BRAZILMarco Aureacutelio Souza da Silva1

Resumo O artigo aborda a importacircncia da interdisciplinaridade entre direito e economia na concre-tizaccedilatildeo dos direitos constitucionais relacionados agraves poliacuteticas puacuteblicas de sauacutede no Brasil Nas relaccedilotildees entre direito e economia procura-se demonstrar as diversas possibilidades de contribuiccedilotildees da anaacuteli-se econocircmica para a gestatildeo dos recursos puacuteblicos especialmente em relaccedilatildeo ao papel da eficiecircncia no planejamento dos gastos estatais na eleiccedilatildeo das prioridades de alocaccedilatildeo de recursos e na realizaccedilatildeo de poliacuteticas puacuteblicas de sauacutede Partindo do meacutetodo dedutivo o objetivo do estudo eacute examinar alguns aspectos relevantes da teoria da anaacutelise econocircmica do direito que se relacionam com as poliacuteticas puacutebli-cas de sauacutede O debate eacute enriquecido com dados estatiacutesticos do Banco Mundial e do Tribunal de Contas da Uniatildeo sobre a eficiecircncia dos gastos com sauacutede e sua judicializaccedilatildeo no Brasil Conclui-se que os ser-viccedilos puacuteblicos de sauacutede no paiacutes podem ser melhorados em quantidade e qualidade desde que levados em consideraccedilatildeo aspectos natildeo apenas de efetividade mas tambeacutem de eficiecircncia

Palavras-chave Direito e economia Anaacutelise econocircmica do direito Poliacuteticas puacuteblicas Sauacutede Eficiecircncia

Abstract The article discusses the importance of the interdisciplinarity between law and economics in the concretization of constitutional rights related to health public policies in Brazil In the relations between law and economics it is tried to demonstrate the diverse possibilities of contributions of the economic analysis to the management of public resources especially in relation to the role of efficiency in the planning of the sta-te expenses in the election of the priorities of allocation of resources and in the realization of health public policies Based on the deductive method the objective of the study is to examine some relevant aspects of the theory of economic analysis of law that relate to health public policies The debate is enriched with statistical data from the World Bank and the Tribunal de Contas da Uniatildeo on the efficiency of health spending and its judicialization in Brazil It is concluded that health public services in the country can be improved in quantity and quality taking into account aspects not only of effectiveness but also of efficiency

Keywords Law and economics Economic analysis of law Public policies Health Efficiency

1 Doutorando e Mestre em Direito pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) Graduado em Direito pela Universidade Federal

de Santa Catarina (UFSC) Graduado em Medicina Veterinaacuteria pela Universidade Federal de Santa Maria (UFSM) Auditor Fiscal de

Controle Externo do Tribunal de Contas do Estado de Santa Catarina (TCESC) Membro do Centro de Estudos Juriacutedico-Econocircmicos e de

Gestatildeo para o Desenvolvimento (CEJEGD) do Centro de Ciecircncias Juriacutedicas (CCJUFSC) Membro associado da Associaccedilatildeo Brasileira de

Direito e Economia (ABDE) FlorianoacutepolisSC Brasil e-mail marcoaurelio_vetyahoocombr

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1 INTRODUCcedilAtildeO

No ano em que completa 30 anos de existecircncia a Constituiccedilatildeo Federal de 1988 ainda eacute objeto de inten-so debate quando se fala em efetividade e eficiecircncia dos direitos sociais nela proclamados especial-mente em um paiacutes com enormes desigualdades sociais e em meio a crises econocircmica e poliacutetica Parece consenso hoje que as soluccedilotildees para essa situaccedilatildeo ultrapassam a fronteira do direito jaacute que a utilizaccedilatildeo do instrumental juriacutedico isoladamente natildeo foi capaz de levar adiante os ditames constitucionais de um Estado democraacutetico moldado haacute trecircs deacutecadas

Na academia de modo geral haacute um movimento em direccedilatildeo agrave interdisciplinaridade isto eacute agrave necessida-de de o direito romper suas fronteiras e interagir com outras aacutereas do conhecimento e assim iluminar os caminhos para concretizaccedilatildeo de uma sociedade verdadeiramente democraacutetica Uma das relaccedilotildees interdisciplinares que merece destaque nesse campo eacute aquela existente entre direito e economia dada a possibilidade de enorme contribuiccedilatildeo para o planejamento dos gastos puacuteblicos a eleiccedilatildeo das priori-dades de alocaccedilatildeo de recursos e a realizaccedilatildeo das poliacuteticas puacuteblicas visando a atender ao maior interes-se da sociedade e do desenvolvimento

Entre os domiacutenios do direito e da economia tem sido cada vez discutida a anaacutelise econocircmica do direito Essa abordagem compreende diversas correntes cujo propoacutesito eacute o de utilizar uma metodologia cien-tiacutefica que parte de pressupostos econocircmicos para a criaccedilatildeo a interpretaccedilatildeo e a aplicaccedilatildeo das normas juriacutedicas tendo em vista os seus efeitos sobre o comportamento dos indiviacuteduos Desse modo o foco de estudo deixa de ser a causa para ser o resultado das accedilotildees individuais

Para aleacutem de conceber o direito essencialmente como provedor de justiccedila a anaacutelise econocircmica propotildee que as leis e as decisotildees juriacutedicas funcionem como incentivos para modificar o comportamento dos indiviacuteduos a fim de que o Estado possa melhor atingir seu papel distributivo de forma mais efetiva e eficiente Muito embora a eficiecircncia no plano constitucional tenha sido alccedilada agrave condiccedilatildeo de princiacutepio juriacutedico eacute forccediloso considerar o seu niacutetido conteuacutedo econocircmico Daiacute a necessidade de tambeacutem com-preender a eficiecircncia positivada na Constituiccedilatildeo Federal e na legislaccedilatildeo administrativa agrave luz da anaacuteli-se econocircmica do direito como instrumental importante para auxiliar na administraccedilatildeo dos recursos puacuteblicos no desenvolvimento social e na concretizaccedilatildeo de direitos fundamentais sociais por meio das poliacuteticas puacuteblicas

Entre os direitos fundamentais agasalhados pelas poliacuteticas puacuteblicas que deve ser analisado tambeacutem sob a oacuteptica da economia estaacute o direito agrave sauacutede tema de grande debate em razatildeo da judicializaccedilatildeo dado o confronto entre a sua concretizaccedilatildeo e a escassez de recursos orccedilamentaacuterios Essa questatildeo faz emer-gir o problema de que os direitos tecircm custos e que por isso os recursos na sociedade devem ser geridos com eficiecircncia especialmente por parte da Administraccedilatildeo Puacuteblica

O objetivo do presente estudo eacute examinar a relaccedilatildeo entre direito e economia e abordar alguns aspectos relevantes que a visatildeo da anaacutelise econocircmica exerce sobre a interpretaccedilatildeo juriacutedica das poliacuteticas puacutebli-cas de sauacutede com vistas a enriquecer o debate sobre os gastos puacuteblicos tendo como pano de fundo as conclusotildees dos relatoacuterios elaborados pelo Banco Mundial sobre a (in)eficiecircncia dos gastos puacuteblicos em sauacutede no Brasil e pelo Tribunal de Contas da Uniatildeo acerca da judicializaccedilatildeo

O artigo eacute inicialmente estruturado com uma abordagem sobre a interdisciplinaridade entre direito e economia seguido de uma incursatildeo sobre o movimento da anaacutelise econocircmica do direito destacando--se a sua metodologia para a tomada de decisatildeo Na sequecircncia satildeo desenvolvidas as principais ideias acerca do papel da eficiecircncia na anaacutelise econocircmica assim como da proteccedilatildeo dos direitos humanos e fundamentais nas poliacuteticas puacuteblicas de sauacutede Por fim discute-se a eficiecircncia dos gastos com poliacuteticas puacuteblicas de sauacutede e sua judicializaccedilatildeo no Brasil a partir dos dados extraiacutedos dos relatoacuterios do Banco Mundial e do Tribunal de Contas da Uniatildeo

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2 NA FRONTEIRA ENTRE DIREITO E ECONOMIA O DIAacuteLOGO INTERDISCIPLINAR

Em que pese a sua fundamental importacircncia para a estruturaccedilatildeo do Estado a organizaccedilatildeo dos indiviacutedu-os e a convivecircncia coletiva o direito daacute atualmente demonstraccedilotildees de que a sua aplicaccedilatildeo isolada natildeo eacute capaz de solucionar todos os problemas de uma sociedade contemporacircnea complexa e em contiacutenu-as transformaccedilotildees Por isso tem sido cada vez mais comum na academia observar o estudo do direito em um campo de interdisciplinaridade dialogando com outras aacutereas do conhecimento como ocorre por exemplo entre direito e psicanaacutelise direito e literatura direito e criminologia direito e filosofia ou direito e sociologia

No campo interdisciplinar merece ser enfatizada a relaccedilatildeo entre direito e economia norteada pela aplicaccedilatildeo dos conceitos e meacutetodos econocircmicos ao estudo do direito A anaacutelise da relaccedilatildeo entre essas disciplinas natildeo eacute recente mas eacute de grande importacircncia por diversos aspectos notadamente pelo momento por que passa o paiacutes com crise econocircmica crise poliacutetica desorganizaccedilatildeo das contas puacuteblicas e precariedade na efetivaccedilatildeo de direitos sociais

Ao longo da histoacuteria houve momentos ou ondas de aproximaccedilatildeo e de afastamento entre as aacutereas do direito e da economia Schumpeter afirma que a origem comum das disciplinas remonta agrave ideia de direi-to natural desenvolvida pela escolaacutestica medieval (Santo Tomaacutes de Aquino) e pelos filoacutesofos do direito natural do seacuteculo XVII (Hugo Grotius Thomas Hobbes John Locke Samuel von Pufendorf e Christian Wolff)2 Nesse contexto verifica-se que o desenvolvimento cientiacutefico da interaccedilatildeo entre as disciplinas foi edificado em torno da ideia de ordem natural e de construccedilotildees abstratas

Mackaay salienta que precursores do movimento integrativo entre direito e economia tambeacutem podem ser encontrados no utilitarismo do seacuteculo XVIII entre os quais David Hume Cesare Beccaria Adam Smith e Jeremy Bentham Tais pensadores no entanto apesar de realccedilarem a anaacutelise do comporta-mento humano como resultado de escolhas racionais e de custos e benefiacutecios natildeo apresentaram um entendimento sistemaacutetico do direito a partir do modelo de escolha racional3 Posner acrescenta que especificamente em relaccedilatildeo aos pensadores Smith4 e Bentham5 o campo de estudo que remonta ao primeiro diz respeito agrave anaacutelise econocircmica das leis que regulam mercados expliacutecitos ou ainda leis que regulam o sistema econocircmico no sentido convencional enquanto que aquele originado com Bentham se refere agrave anaacutelise econocircmica das leis que regulam o comportamento natildeo comercial (non-market) (aci-dentes crimes casamento poluiccedilatildeo processo poliacutetico etc)6

Em um magniacutefico estudo Mackaay demonstra que a denominada ldquoprimeira ondardquo das relaccedilotildees entre direito e economia estaacute compreendida entre 1830 e 1930 coincidindo com o surgimento da escola histoacuterica alematilde que defendia a utilizaccedilatildeo da histoacuteria como instrumento analiacutetico e de reconstruccedilatildeo teoacuterica como novo paradigma Nesse momento se destacam pensadores como Friedrich List Wilhem Roscher Gustav Schmoller Werner Sombart e Max Weber Destacam-se ainda os economistas Karl Marx Friedrich Engels Carl Menger Achille Loria Augusto Grazziani e Arthur Pigou assim como os

2 SCHUMPETER Joseph A History of Economic Analysis New York Oxford University Press 1954 p 111-118

3 MACKAAY Ejan History of Law and Economics In BOUCKAERT Boudewijn DE GEEST Gerrit (eds) Encyclopedia of Law and

Economics V 1 Cheltenham Edward Elgar 2000 p 67-69

4 Adam Smith a partir de sua obra claacutessica The wealth of Nations (traduzida para o portuguecircs como ldquoA Riqueza das Naccedilotildeesrdquo) jaacute defendia

a liberdade de concorrecircncia para a melhor alocaccedilatildeo dos recursos considerando que os preccedilos seriam naturalmente fixados pelo mercado

ateacute um equiliacutebrio livre de intervencionismo o que veio a ser conhecido pela famosa expressatildeo ldquomatildeo invisiacutevelrdquo

5 Bentham por sua vez formulou a filosofia utilitarista a partir do ldquoprinciacutepio da maior felicidaderdquo Concebia que a natureza humana estava

sob o domiacutenio dos conceitos de dor e prazer relacionados aos estiacutemulos que poderiam ter os homens sustentando que estes tomam

decisotildees visando a maximizar sua felicidade ou o seu prazer diminuindo ou evitando a dor

6 POSNER Richard A Some Uses and Abuses of Economics in Law University of Chicago Law Review v 46 n 2 1979 p 281-282

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juristas Rudolf Stammler e Victor Mataja Esse periacuteodo se encerra com os autores Thorstein Veblen Richard Ely e John Commons vinculados ao movimento institucionalista norte-americano e com os autores Karl Llewellyn Robert Lee Hale e Oliver Wendell Holmes Jr vinculados ao realismo juriacutedico norte-americano7

Entre as deacutecadas de 1940 e 1960 ocorre um afastamento nas relaccedilotildees entre direito e economia pos-sivelmente ocasionado pela metodologia da pesquisa cientiacutefica na modernidade apoacutes o que tem iniacutecio a denominada ldquosegunda ondardquo de reaproximaccedilatildeo das disciplinas que corresponde ao movimento con-temporacircneo de direito e economia Nessa fase os trabalhos pioneiros satildeo atribuiacutedos a Ronald Coase e Guido Calabresi aleacutem de Anthony Downs James Buchanan Gordon Tullock Gary Becker George Stigler Friedrich Hayek Armen Alchian Harold Demsetz Douglass North Warren Samuels e Pietro Trimarchi Vale registrar que em tal periacuteodo (1960-1970) haacute uma fase ou momento histoacuterico de tran-siccedilatildeo do paradigma moderno que estaacute em crise para o paradigma poacutes-moderno de abertura para as ciecircncias sociais Jaacute na deacutecada de 1980 o movimento do direito e economia se amplia com as produccedilotildees doutrinaacuterias de pensadores como Steven Shavell William Landes Richard Posner Guido Calabresi Mitchell Polinsky e Robert Cooter8

Ateacute a deacutecada de 1970 aproximadamente predominavam nos Estados Unidos movimentos como o realismo juriacutedico9 e o utilitarismo10 Segundo Alvarez como contraposiccedilatildeo a essas visotildees predominan-tes agrave eacutepoca surgiram trecircs novos movimentos ndash Law and Economics ou Anaacutelise Econocircmica do Direito (AED) Critical Legal Studies (CLS) ou Escola Criacutetica do Direito e as teorias denominadas Rights-based A AED propunha a anaacutelise do direito sob a perspectiva econocircmica combinando o estudo interdisciplinar entre direito e economia Jaacute o movimento CLS procurava trabalhar o direito sob a perspectiva poliacutetica com a utilizaccedilatildeo de argumentos derivados da filosofia poliacutetica e social E as chamadas teorias Rights-based englobavam todas as contribuiccedilotildees derivadas das teorias da filosofia moral e poliacutetica que tinham como referenciais uma sociedade justa11

Ao longo do seacuteculo XX inicialmente nos Estados Unidos houve a consolidaccedilatildeo dos viacutenculos entre direi-to e economia impulsionado pela anaacutelise do comportamento dos indiviacuteduos Nesse periacuteodo a anaacutelise econocircmica do direito deixa de enfocar apenas questotildees de ordem monetaacuteria para tambeacutem abarcar questotildees relacionadas agrave teoria do comportamento humano a partir da norma sem conteuacutedo mone-taacuterio A intenccedilatildeo era dotar o pensamento juriacutedico de um instrumento que permitisse explicar o com-portamento dos indiviacuteduos frente agraves normas vislumbrando as suas consequecircncias no tocante ao cum-primento ou natildeo das obrigaccedilotildees legais Vale lembrar aqui a definiccedilatildeo claacutessica de Robbins para quem a economia significa a ldquociecircncia que estuda o comportamento humano como uma relaccedilatildeo entre fins e meios escassos para os quais haacute usos alternativosrdquo12

7 MACKAAY Ejan History of Law and Economics In BOUCKAERT Boudewijn DE GEEST Gerrit (eds) Encyclopedia of Law and

Economics V 1 Cheltenham Edward Elgar 2000 p 69-71

8 MACKAAY Ejan History of Law and Economics In BOUCKAERT Boudewijn DE GEEST Gerrit (eds) Encyclopedia of Law and

Economics V 1 Cheltenham Edward Elgar 2000 p 71-80

9 O realismo juriacutedico compreendia o direito como realidade e disciplina autocircnoma constituiacutedo de conceitos e princiacutepios extraiacutedos

das decisotildees judiciais Desse modo pregava que o direito correspondia agravequilo que era estabelecido pela Corte no seu aspecto mais

pragmaacutetico em detrimento do formalismo

10 O utilitarismo por meio de um de seus maiores expoentes Jeremy Bentham baseava-se no princiacutepio de que o ser humano tomava

decisotildees visando agrave busca da felicidade na medida em que procurava maximizar o seu prazer e diminuir a sua dor

11 ALVAREZ Alejandro Bugallo Anaacutelise econocircmica do direito contribuiccedilotildees e desmistificaccedilotildees Revista Direito Estado e Sociedade v

9 juldez 2006 p 49-50

12 ROBBINS Lionel An essay on the nature and significance of economic science London MacMillan amp Co Limited 1932 p 15

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A relaccedilatildeo interdisciplinar entre direito e economia pode parecer num primeiro momento contraditoacute-ria ou conflitante Essa percepccedilatildeo inicial eacute atribuiacuteda agrave diferenccedila entre os meacutetodos utilizados por essas disciplinas13 A natureza da anaacutelise econocircmica segundo Posner eacute muitas vezes incompreendida jaacute que alguns leitores satildeo levados a rejeitar a aplicabilidade da economia ao sujeito de direitos por acreditar que economia se refere a dinheiro e mercados e que quando aplicada a questotildees poliacuteticas e sociais estas se reduzem a objetos de comeacutercio Adverte que essa visatildeo eacute equivocada ressaltando que a eco-nomia trata basicamente da gestatildeo da escassez14

O papel da economia em sua interaccedilatildeo com o direito eacute contribuir para o planejamento dos gastos puacutebli-cos escolhendo prioridades de alocaccedilatildeo de recursos e realizaccedilatildeo de despesas sociais visando a aten-der ao maior interesse da sociedade e do desenvolvimento Levar em conta as implicaccedilotildees econocircmicas da Administraccedilatildeo Puacuteblica15 e das decisotildees judiciais em sede de poliacuteticas puacuteblicas serve tambeacutem para compreender a crise do Estado contemporacircneo da democracia da efetivaccedilatildeo dos direitos fundamen-tais sociais e da ldquoConstituiccedilatildeo Simboacutelicardquo16 Por isso a necessidade de explorar a metodologia da anaacutelise econocircmica do direito a fim de melhor compreender a relaccedilatildeo entre as disciplinas

3 A ANAacuteLISE ECONOcircMICA DO DIREITO COMO METODOLOGIA PARA A TOMADA DE DECISAtildeO

No campo da anaacutelise econocircmica eacute possiacutevel identificar uma vertente que cuida da aplicaccedilatildeo do instrumental metodoloacutegico da teoria econocircmica ao estudo do direito e outra que trata do estudo da relaccedilatildeo entre o siste-ma juriacutedico e o sistema econocircmico A primeira tem recebido o nome de Anaacutelise Econocircmica do Direito (AED)

13 Salama sintetiza com precisatildeo essas diferenccedilas metodoloacutegicas Afirma que enquanto o direito eacute exclusivamente verbal a economia eacute verbal

e matemaacutetica enquanto o procedimento da anaacutelise juriacutedica eacute hermenecircutico o procedimento da anaacutelise econocircmica eacute empiacuterico enquanto a

aspiraccedilatildeo do direito eacute a justiccedila a aspiraccedilatildeo da economia eacute a eficiecircncia enquanto a criacutetica juriacutedica se daacute a partir da legalidade a criacutetica econocircmica

se daacute a partir do custo Nesse contexto pode-se salientar que o jurista busca identificar o que estaacute obrigado permitido ou proibido ou ainda o que

eacute legal e ilegal enquanto que o economista busca identificar o que eacute eficiente e ineficiente a partir da anaacutelise do comportamento dos indiviacuteduos

em um ambiente de mercado ou de trocas (SALAMA Bruno Meyerhof A histoacuteria do decliacutenio e queda do eficientismo na obra de Richard Posner

In LIMA Maria Luacutecia L M Padua (Coord) Agenda contemporacircnea direito e economia Trinta anos de Brasil (Tomo I) Satildeo Paulo Saraiva

2012 p 285) A diferenccedila entre o meacutetodo juriacutedico tradicional e o meacutetodo econocircmico tambeacutem pode ser visualizado sob os pontos de vista

retrospectivo e prospectivo conforme leciona Mathis No direito tende-se a avaliar um caso concreto que jaacute ocorreu (visatildeo retrospectiva)

enquanto que na economia tende-se a avaliar o efeito ou a consequecircncia da medida adotada no caso concreto (visatildeo prospectiva) Eacute a situaccedilatildeo

por exemplo da anaacutelise do efeito precedente da decisatildeo juriacutedica sobre o futuro comportamento de todos os destinataacuterios da decisatildeo ou do

efeito da criaccedilatildeo da norma sobre os seus destinataacuterios Outro exemplo citado por Mathis eacute o da responsabilidade civil em que o jurista estaacute

preocupado com a soluccedilatildeo entre o lesante e o lesado especialmente sobre a indenizaccedilatildeo reclamada por este em face de um incidente Do

ponto de vista econocircmico a soluccedilatildeo eacute enquadrada no impacto do julgamento sobre o comportamento futuro dos possiacuteveis lesantes e lesados

ou seja de que a decisatildeo afetaraacute o comportamento das partes envolvidas (MATHIS Klaus Consequentialism in Law In MATHIS Klaus (ed)

Efficiency Sustainability and Justice to Future Generations University of Lucerne Switzerland 2012 p 6 Disponiacutevel em lthttpswww

uniluchfileadminfakultaetenrfmathisDok6_Mathis_Consequentialism_in_Lawpdfgt Acesso em 07 jan 2018

14 POSNER Richard A The Cost of Rights Implications for Central and Eastern Europe - And for the United States v 32 n 1 Tulsa Law

Journal 1996 p 01-02

15 Num contexto em que existe no pensamento juriacutedico nacional enorme influecircncia dos princiacutepios juriacutedicos em detrimento das regras

propiciando mais incerteza do que previsibilidade na aplicaccedilatildeo das normas e na decisatildeo juriacutedica a anaacutelise interdisciplinar entre direito e

economia auxilia na avaliaccedilatildeo das consequecircncias da tomada de decisatildeo do ponto de vista praacutetico Nesse sentido registre-se a Lei federal

n 136552018 que acrescentou dispositivos agrave Lei de Introduccedilatildeo agraves Normas do Direito Brasileiro (Decreto-Lei n 46571942) entre os

quais Art 20 Nas esferas administrativa controladora e judicial natildeo se decidiraacute com base em valores juriacutedicos abstratos sem que sejam

consideradas as consequecircncias praacuteticas da decisatildeo [] Art 21 A decisatildeo que nas esferas administrativa controladora ou judicial decretar

a invalidaccedilatildeo de ato contrato ajuste processo ou norma administrativa deveraacute indicar de modo expresso suas consequecircncias juriacutedicas

e administrativas [] Art 22 sect 1ordm Em decisatildeo sobre regularidade de conduta ou validade de ato contrato ajuste processo ou norma

administrativa seratildeo consideradas as circunstacircncias praacuteticas que houverem imposto limitado ou condicionado a accedilatildeo do agente []

16 A expressatildeo eacute de Marcelo Neves ao se referir ao simbolismo constitucional que se manifesta quando o significado social e poliacutetico do

texto constitucional estaacute exatamente na relaccedilatildeo inversa da sua concretizaccedilatildeo normativo-juriacutedica ou seja quando haacute uma discrepacircncia

entre a funccedilatildeo hipertroficamente simboacutelica e a insuficiente concretizaccedilatildeo juriacutedica do diploma constitucional (NEVES Marcelo A

Constitucionalizaccedilatildeo simboacutelica 3 ed Satildeo Paulo Martins fontes 2011 p 1)

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e a segunda tem sido denominada Direito e Economia (Law and Economics) Conforme leciona Arauacutejo haacute quem entenda que a expressatildeo ldquoAnaacutelise Econocircmica do Direitordquo seria mais sugestiva de um ascendente teoacute-rico da ciecircncia econocircmica enquanto que a expressatildeo ldquoLaw and Economicsrdquo seria mais uma paridade entre os dois domiacutenios17 Poreacutem destaca que as expressotildees satildeo geralmente utilizadas como sinocircnimas razatildeo pela qual aqui tambeacutem natildeo se faraacute distinccedilatildeo considerando-se apenas a expressatildeo ldquoAnaacutelise Econocircmica do Direitordquo como uma disciplina que envolve naturalmente os campos do direito e da economia

Mercuro e Medema definem AED como sendo a aplicaccedilatildeo da teoria econocircmica - principalmente micro-economia e conceitos baacutesicos de economia do bem-estar - para o exame da formaccedilatildeo da estrutura dos processos e do impacto econocircmico do direito e das instituiccedilotildees juriacutedicas18 Posner por sua vez con-ceitua a disciplina como a aplicaccedilatildeo das teorias e meacutetodos empiacutericos da economia para as instituiccedilotildees centrais do sistema juriacutedico19

Duas abordagens satildeo consideradas quando do estudo dos objetivos da AED ndash positiva e normativa A abordagem positiva tambeacutem denominada descritiva ou explicativa procura descrever como o direito eacute analisando os efeitos ou as consequecircncias das normas no mundo real dos fatos do ponto de vista eco-nocircmico Estaacute ligada agrave escola de Chicago particularmente agraves contribuiccedilotildees de Ronald Coase e Richard Posner Jaacute a abordagem normativa ou prescritiva procura explicar como o direito deve ser como os con-ceitos de justiccedila eficiecircncia e maximizaccedilatildeo de riqueza se comunicam e estaacute mais diretamente ligada agraves escolas de Yale e de Harvard em especial aos trabalhos de Guido Calabresi e Steven Shavell20

Desse modo considerando que os indiviacuteduos ponderam custos e benefiacutecios respondem a incentivos e satildeo maximizadores racionais de suas satisfaccedilotildees ao fazerem escolhas quando procuram identificar por meio da anaacutelise econocircmica quais os efeitos das leis com o fim de alcanccedilar determinados resulta-dos considerados desejaacuteveis fala-se da abordagem positiva (descritiva) da teoria Estuda a eficiecircncia da regra juriacutedica assim como ela eacute na realidade social sem visar a objetivos de intervenccedilatildeo regulatoacuteria Trata-se apenas da previsatildeo das consequecircncias das normas juriacutedicas projetando o comportamento dos agentes perante a lei Nesse caso natildeo estaacute em jogo a formulaccedilatildeo de qualquer tipo de norma ou poliacute-tica puacuteblica21 Tomando-se como exemplo o fato de como as pessoas reagiriam apoacutes a entrada em vigor de uma determinada lei poder-se-ia analisar como os motoristas reagiriam apoacutes a entrada em vigor de uma penalidade mais severa para o homiciacutedio culposo cometido no tracircnsito sob o efeito de aacutelcool22

Jaacute quando se pretende especificar os objetivos desejaacuteveis emitindo um juiacutezo de valor para escolher quais satildeo os melhores ou socialmente desejaacuteveis fala-se da abordagem normativa (prescritiva) Nesta satildeo elaboradas eventuais correccedilotildees nas regras existentes que geraram resultados ineficientes Eacute mais

17 ARAUacuteJO Fernando Anaacutelise econoacutemica do direito programa e guia de estudo Coimbra Almedina 2008 p 10 nota de rodapeacute n 18

18 MERCURO Nicholas MEDEMA Steven G Economics and the law from Posner to postmodernism and beyond 2 ed Princeton

Princeton University Press 2006 p 01

19 POSNER Richard A The Economic Approach to Law Texas Law Review v 53 n 4 1975 p 759

20 POSNER Richard A Some Uses and Abuses of Economics in Law University of Chicago Law Review v 46 n 2 1979 p 284-285

21 Ainda acerca da aplicaccedilatildeo dos conceitos de microeconomia ao direito no campo da AED positiva Cooter distingue trecircs versotildees de

argumentaccedilatildeo reducionista explicativa e preditiva A argumentaccedilatildeo reducionista (minoritaacuteria radical) entende que o direito pode ser

reduzido agrave economia de modo que categorias juriacutedicas (direitos deveres negligecircncia etc) podem ser substituiacutedas por categorias econocircmicas

A argumentaccedilatildeo explicativa defende que a economia pode explicar a estrutura das normas juriacutedicas a partir da maximizaccedilatildeo das preferecircncias

individuais em um ambiente de escassez E a argumentaccedilatildeo preditiva diz respeito agrave ideia de que a economia pode auxiliar na previsatildeo das

consequecircncias ou dos efeitos das regras juriacutedicas sobre o comportamento dos indiviacuteduos (COOTER Robert Law and the imperialism of

economics an introduction to the economic analysis of law and review of the major books UCLA Law Review 1260 v 29 1981 p 1265-1266)

22 Eacute o caso por exemplo de vislumbrar os efeitos da Lei n 135462017 que modificou o Coacutedigo de Tracircnsito (Lei n 95031997)

ampliando as penas miacutenimas e maacuteximas para o condutor de veiacuteculo automotor que provocar sob efeito de aacutelcool e outras drogas acidentes

de tracircnsito que resultarem em homiciacutedio culposo ou lesatildeo corporal grave ou graviacutessima Antes a pena de prisatildeo para o motorista que

cometesse homiciacutedio culposo no tracircnsito estando sob efeito de aacutelcool ou outras drogas psicoativas variava de 2 a 5 anos Com a mudanccedila

a pena aumentou para entre 5 e 8 anos de prisatildeo

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abrangente que a anterior tendo por escopo formular sugestotildees de normas com base nos efeitos eco-nocircmicos analisados O criteacuterio valorativo na escolha dos objetivos desejaacuteveis utilizado pela escola tra-dicional da AED eacute a eficiecircncia Logo sob o aspecto normativo satildeo consideradas noccedilotildees de justiccedila jun-tamente com de eficiecircncia maximizaccedilatildeo de riqueza e de bem-estar a guiar poliacuteticas puacuteblicas Cita-se como exemplo o objetivo de desestimular o uso de veiacuteculos particulares nas cidades em favor do trans-porte coletivo de maneira que o aspecto normativo se sobressai com a busca para encontrar a melhor forma de a norma juriacutedica atingir o resultado pretendido (reduccedilatildeo do congestionamento de tracircnsito menos poluiccedilatildeo melhoria na qualidade do meio ambiente entre outros)

Agrave anaacutelise econocircmica do direito satildeo atribuiacutedas diversas caracteriacutesticas Spector ressalta trecircs como prin-cipais (i) proporciona um modelo analiacutetico unificado para explicar uma formaccedilatildeo de normas juriacutedicas que parecem natildeo ter conexatildeo entre si (ii) constitui premissa fundamental do modelo o fato de que os indiviacuteduos satildeo agentes racionais que escolhem suas accedilotildees para maximizar suas utilidades individuais com base numa ordem coerente de preferecircncias transitivas e (iii) assume que existe uma noccedilatildeo baacutesica de eficiecircncia consistente e inteligiacutevel que pode servir de base para avaliar as instituiccedilotildees juriacutedicas23

A metodologia econocircmica adota essencialmente a racionalidade individual para demonstrar que antes de tomarem uma decisatildeo os agentes avaliam os custos e os benefiacutecios das alternativas possiacute-veis sejam econocircmicas ou sociais a partir das informaccedilotildees que obtiveram Tal avaliaccedilatildeo eacute de cunho probabiliacutestico ou consequencialista porque considera as consequecircncias (e natildeo as causas) que levaram agrave tomada da decisatildeo Daiacute a noccedilatildeo de que o pressuposto econocircmico parte da ideia de que os indiviacuteduos satildeo maximizadores racionais e de que a lei constitui um meio para alterar os preccedilos associados a accedilotildees individuais alternativas

Eacute bem verdade que a racionalidade individual considerada para a tomada de decisatildeo apresenta algu-mas variaccedilotildees em decorrecircncia das experiecircncias de cada indiviacuteduo do contexto envolvido assim como outros aspectos24 De qualquer sorte o que sobreleva eacute a utilidade ou o bem-estar que o agente obteraacute com a escolha da decisatildeo Essa escolha eacute identificada com a eficiecircncia que sob a perspectiva econocircmica pode muito contribuir para o bem-estar social

A interferecircncia do Estado por meio da legislaccedilatildeo ou do Poder Judiciaacuterio estabelecendo comportamen-tos desejaacuteveis e sanccedilotildees para o descumprimento de suas determinaccedilotildees traz consequecircncias tanto para o campo social quanto econocircmico O impacto econocircmico das accedilotildees dos operadores do direito natildeo apenas na Administraccedilatildeo Puacuteblica mas especialmente dos que decidem no acircmbito do Poder Judiciaacuterio tem sido cada vez mais estudado com vistas a tornar as decisotildees mais seguras estaacuteveis e justas A bus-ca pela seguranccedila juriacutedica e pela justiccedila natildeo eacute algo novo pois remonta agrave proacutepria histoacuteria do direito Para aleacutem de conceber o direito essencialmente como provedor de justiccedila a anaacutelise econocircmica propotildee que as leis e as decisotildees juriacutedicas funcionem como incentivos para modificar o comportamento dos indiviacute-

23 SPECTOR Horacio Justicia y bienestar Desde una perspectiva de derecho comparado Doxa n 26 2003 p 243

24 Veja-se por exemplo as pesquisas do ganhador do Precircmio Nobel de Economia de 2017 Richard H Thaler no sentido de que no

mundo real os seres humanos nem sempre satildeo tatildeo racionais em suas escolhas jaacute que traccedilos de personalidade dos indiviacuteduos como

racionalidade limitada preferecircncias sociais e falta de autocontrole afetam tanto decisotildees pessoais quanto do mercado como um todo

(FRAGA Eacuterica Estudo do comportamento na tomada de decisotildees rende Nobel de Economia Mercado Folha de S Paulo 09 de outubro

de 2017 Disponiacutevel em lthttpwww1folhauolcombrmercado2017101925486-estudo-do-comportamento-na-tomada-de-

decisoes-rende-nobel-de-economiashtmlgt Acesso em 05 jan 2018)

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duos a fim de atingir os objetivos das poliacuteticas puacuteblicas entre os quais a distribuiccedilatildeo a efetividade e a eficiecircncia Nesse cenaacuterio a anaacutelise econocircmica do direito constitui uma metodologia importante para a tomada de decisatildeo que natildeo deve ser desprezada mas que tambeacutem exige um pouco de conhecimento acerca da diversidade de escolas ou pensamentos contidos no movimento25

4 O PAPEL DA EFICIEcircNCIA NA ANAacuteLISE ECONOcircMICA DO DIREITO

No plano juriacutedico observa-se que o termo ldquoeficiecircnciardquo foi acrescido pelo Poder Constituinte Derivado Reformador ao art 37 caput da Constituiccedilatildeo Federal quando da ediccedilatildeo da Emenda Constitucional n 1998 consagrando-o como princiacutepio constitucional a ser observado natildeo apenas pela Administraccedilatildeo Puacuteblica como tambeacutem pelo Poder Judiciaacuterio na fundamentaccedilatildeo de suas decisotildees Dada a sua previsatildeo no acircmbito das disposiccedilotildees sobre a Administraccedilatildeo Puacuteblica o conceito de eficiecircncia26 foi mais difundido no direito administrativo sobressaindo-se definiccedilotildees geneacutericas relacionadas agrave adequaccedilatildeo entre meios e fins a serem alcanccedilados pela Administraccedilatildeo Puacuteblica agrave realizaccedilatildeo dos fins segundo o menor custo e agrave reduccedilatildeo de desperdiacutecios mediante a prestaccedilatildeo de serviccedilos com presteza perfeiccedilatildeo e maior rendimen-

25 O movimento da Anaacutelise Econocircmica do Direito natildeo apresenta uma uniformidade de pensamentos porquanto agrupa diversas tendecircncias

ou escolas entre as quais podem ser salientadas a escola Tradicional ou de Chicago a Institucionalista a Neo-Institucionalista a Public Choice

e a escola de New Haven A escola de Chicago eacute considerada a escola originaacuteria e que tem como principal expoente o jurista Richard Posner

Identificada como ortodoxa mais radical ou conservadora aplica a microeconomia na criaccedilatildeo e interpretaccedilatildeo do direito por meio da teoria dos

preccedilos neoclaacutessica A preocupaccedilatildeo central dessa escola eacute de que o sistema juriacutedico deve ser interpretado com vistas a promover a eficiecircncia

econocircmica Para essa corrente portanto eficiecircncia e caacutelculo econocircmico devem ser os criteacuterios utilizados para avaliar as decisotildees judiciais e

as instituiccedilotildees juriacutedicas por serem impessoais e sujeitos agrave comprovaccedilatildeo mais adequado a dirimir aqueles casos essencialmente politizados

ou carregados de emoccedilotildees A escola Institucionalista tem como enfoque a importacircncia das instituiccedilotildees no funcionamento da economia ao

mesmo tempo em que rechaccedila a ecircnfase no individualismo metodoloacutegico da teoria ortodoxa Assim procura ir aleacutem da simples aplicaccedilatildeo da teoria

microeconocircmica ao direito analisando as relaccedilotildees existentes entre o sistema juriacutedico e o sistema econocircmico a fim de identificar como o sistema

juriacutedico afeta e eacute afetado pelo comportamento dos agentes econocircmicos e pelo desenvolvimento A escola Neo-Institucionalista ou Nova

Economia Institucional leva em consideraccedilatildeo a premissa de que as instituiccedilotildees satildeo fundamentais na estrutura econocircmica e no desenvolvimento

da sociedade Sustenta que a visatildeo neoclaacutessica eacute insuficiente para explicar a ineficiecircncia econocircmica das instituiccedilotildees Por sua vez a escola de Yale

ou de New Haven dedica seus estudos agrave anaacutelise da regulaccedilatildeo por parte do Estado sob a perspectiva das poliacuteticas puacuteblicas e da escolha social

(social choice) Essa escola tem origem nos estudos de Guido Calabresi ao examinar sob a oacuteptica da teoria econocircmica a distribuiccedilatildeo do risco

como criteacuterio de imputaccedilatildeo de responsabilidade isto eacute analisa a relaccedilatildeo entre as regras de responsabilidade (liability rules) e a distribuiccedilatildeo

das perdas Sustenta a necessidade de distinguir as noccedilotildees de distribuiccedilatildeo e de justiccedila da noccedilatildeo de eficiecircncia desafiando a ideia defendida pela

escola ortodoxa ou de Chicago no sentido de que a eficiecircncia seja o principal ou uacutenico valor para compensar perdas por danos Aleacutem disso a

escola de New Haven daacute maior ecircnfase agraves leis e aos regulamentos e menos agraves decisotildees judiciais o que exige maior conhecimento das instituiccedilotildees

oficiais e das ferramentas de avaliaccedilatildeo das poliacuteticas puacuteblicas bem assim do comportamento do governo como ator racional Jaacute a escola da

Public Choice ou teoria da escolha puacuteblica realiza uma abordagem econocircmica da poliacutetica e do direito puacuteblico Em siacutentese essa escola toma as

ferramentas e os meacutetodos de abordagem que foram desenvolvidos para niacuteveis analiacuteticos bastante sofisticados na teoria econocircmica e aplica

essas ferramentas e meacutetodos ao setor poliacutetico ou governamental agrave poliacutetica e agrave economia puacuteblica Tal como acontece com a teoria econocircmica

a anaacutelise feita pela citada escola tenta relacionar o comportamento dos atores individuais no setor governamental ou seja o comportamento

das pessoas em suas diversas capacidades como eleitores como candidatos a cargos como representantes eleitos como liacutederes ou membros

de partidos poliacuteticos como burocratas - todos esses satildeo papeacuteis de ldquoescolha puacuteblicardquo - e o conjunto de resultados que podem ser observados

Portanto a teoria da escolha puacuteblica tenta oferecer uma compreensatildeo uma explicaccedilatildeo das interaccedilotildees institucionais complexas que ocorrem

dentro do setor poliacutetico Natildeo obstante a diversidade de escolas de pensamento todas cuidam da aplicaccedilatildeo de pressupostos econocircmicos ao

direito com vistas a fornecer um instrumento cientiacutefico para a anaacutelise do comportamento dos indiviacuteduos diante de recursos escassos

26 Natildeo constitui objeto deste trabalho enveredar pela evoluccedilatildeo conceitual de eficiecircncia entre os doutrinadores no Brasil mas ampliar

os horizontes das posiccedilotildees predominantes no direito com a visatildeo econocircmica Para um estudo minucioso acerca da evoluccedilatildeo conceitual

e jurisprudencial do princiacutepio constitucional da eficiecircncia remete-se o leitor ao artigo de Rosangela Tremel Cf TREMEL Rosangela

Princiacutepio constitucional da eficiecircncia evoluccedilatildeo do conceito e sua concretizaccedilatildeo na justiccedila trabalhista brasileira Unisul De Fato e De

Direito Revista Juriacutedica da Universidade do Sul de Santa Catarina v 9 n 16 janjul 2018 p 101-122

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to funcional27 No entanto parece haver um raciociacutenio superficial e circular nos conceitos de eficiecircncia formulados na seara administrativista o que remete agrave necessidade de agregar o conhecimento inter-disciplinar com a economia

Cabe registrar que o conceito de eficiecircncia entre os economistas tambeacutem natildeo eacute uniforme Coleman aponta como noccedilotildees relevantes a eficiecircncia alocativa de Coase a optimalidade de Pareto a eficiecircncia de Kaldor-Hicks e ainda a maximizaccedilatildeo de riqueza de Posner A eficiecircncia alocativa de Coase pode ser resumida no sentido de que o maacuteximo uso produtivo dos recursos natildeo depende da atribuiccedilatildeo inicial dos direitos A atribuiccedilatildeo inicial eacute apenas o ponto de partida a partir do qual as negociaccedilotildees comeccedilam de maneira que o ponto em que as negociaccedilotildees cessam representa a alocaccedilatildeo eficiente de recursos28 Eacute dessa forma que em The Problem of Social Cost29 Coase afima que em condiccedilotildees de racionalidade conhecimento substancial e custos de transaccedilotildees zero os resultados dos negoacutecios seratildeo eficientes Poreacutem o teorema de Coase eacute vaacutelido apenas quando os custos de transaccedilatildeo satildeo suficientemente insig-nificantes para permitir que o mercado funcione como resultado eficiente no processo de ganho muacutetuo atraveacutes do comeacutercio Onde os custos de transaccedilatildeo satildeo altos criam falhas de mercado ou externalida-des30 a atribuiccedilatildeo inicial de direitos faz a diferenccedila do ponto de vista da eficiecircncia31

Em relaccedilatildeo agrave optimalidade de Pareto os recursos satildeo alocados de uma forma Pareto-oacuteptimo se e somente se qualquer realocaccedilatildeo adicional deles puder melhorar o bem-estar de uma pessoa apenas em detrimento de outra32 Portanto o modelo teoacuterico de Pareto concebe uma situaccedilatildeo como eficiente quando natildeo for possiacutevel melhorar a posiccedilatildeo de uma das partes sem piorar a de outra33

Por outro lado uma redistribuiccedilatildeo de recursos eacute considerada Kaldor-Hicks eficiente se sob a redis-tribuiccedilatildeo os vencedores ganham o suficiente para que possam compensar os perdedores A noccedilatildeo de eficiecircncia de Kaldor-Hicks natildeo exige que os vencedores realmente compensem os perdedores A falta

27 Para Diogenes Gasparini o princiacutepio da eficiecircncia impotildee agrave Administraccedilatildeo Puacuteblica a obrigaccedilatildeo de realizar suas atribuiccedilotildees com rapidez

perfeiccedilatildeo e rendimento (GASPARINI Diogenes Direito Administrativo 16 ed atualizado por Fabriacutecio Motta Satildeo Paulo Saraiva 2011 p 76-

77) Segundo Celso Antocircnio Bandeira de Mello o princiacutepio da eficiecircncia eacute uma faceta do princiacutepio da lsquoboa administraccedilatildeorsquo significando desenvolver

a atividade administrativa do modo mais congruente oportuno e adequado aos fins a serem alcanccedilados (MELLO Celso Antocircnio Bandeira de

Curso de Direito Administrativo 27 ed rev e atual ateacute a Emenda Constitucional 64 de 04022010 Satildeo Paulo Malheiros 2010 p 122-123)

De acordo com Carvalho Filho o princiacutepio da eficiecircncia eacute a procura de produtividade e economicidade com a reduccedilatildeo dos desperdiacutecios de

dinheiro puacuteblico por meio da execuccedilatildeo dos serviccedilos com presteza perfeiccedilatildeo e rendimento funcional (CARVALHO FILHO Joseacute dos Santos

Manual de direito administrativo 29 ed Satildeo Paulo Atlas 2015 p 30-33) Para Di Pietro o princiacutepio da eficiecircncia estaacute relacionado ao modo de

atuaccedilatildeo do agente puacuteblico do qual se espera o melhor desempenho possiacutevel de suas atribuiccedilotildees a fim de lograr os melhores resultados bem

como ao modo de organizar estruturar e disciplinar a Administraccedilatildeo Puacuteblica com o objetivo de alcanccedilar os melhores resultados na prestaccedilatildeo

do serviccedilo puacuteblico (DI PIETRO Maria Sylvia Zanella Direito administrativo 26 ed Satildeo Paulo Atlas 2013 p 83-85) Marccedilal Justen Filho por

sua vez destaca que o princiacutepio da eficiecircncia tem relaccedilatildeo com a vedaccedilatildeo do desperdiacutecio ou da maacute utilizaccedilatildeo dos recursos destinados agrave satisfaccedilatildeo

de necessidades coletivas de modo que eacute necessaacuterio obter o maacuteximo de resultados com a menor quantidade possiacutevel de desembolsos (JUSTEN

FILHO Marccedilal Curso de direito administrativo 11 ed rev atual e ampl Satildeo Paulo Revista dos Tribunais 2015 p 204-206)

28 COLEMAN Jules L Efficiency exchange and auction philosophic aspects of the economic approach to law V 68 Cal L Rev 221 1980 p 225

29 COASE Ronald The problem of social cost Journal of Law and Economic V 3 1960

30 O problema de eficiecircncia no que concerne a Coase surge da existecircncia de externalidades ou efeitos externos consistentes em

subprodutos de uma atividade que influenciam a produccedilatildeo de outros bens ou o bem-estar (ou utilidade) de outros indiviacuteduos Os efeitos

externos podem ser beneacuteficos (externalidades positivas) ou prejudiciais (externalidades negativas) e internalizar uma externalidade

significa eliminar a ineficiecircncia na produccedilatildeo ou troca que ela gera (COLEMAN Jules L Efficiency exchange and auction philosophic

aspects of the economic approach to law V 68 Cal L Rev 221 1980 p 231-232)

31 Coleman cita trecircs abordagens para o problema de controlar externalidades quando os mercados satildeo inadequados para a tarefa

impostos ou subsiacutedios regras de propriedade e regras de responsabilidade Cada abordagem envolve algum tipo de intervenccedilatildeo no

mercado por uma autoridade central (puacuteblica) diferindo apenas em relaccedilatildeo aos instrumentos empregados para proteger o direito

32 COLEMAN Jules L Efficiency utility and wealth maximization Faculty Scholarship series Paper 4202 1980 p 512-513

33 Exemplo ldquoArdquo compra de ldquoBrdquo uma coleccedilatildeo de selos por $ 950 Se a venda foi consensual e natildeo houve fraude nem coaccedilatildeo sabe-se que a

utilidade para ldquoArdquo da coleccedilatildeo de selos eacute maior do que a utilidade de $ 950 e que a utilidade de $ 950 eacute maior para ldquoBrdquo do que a coleccedilatildeo de

selos Assim desde que natildeo haja efeitos negativos sobre terceiros a venda eacute uma melhora no sentido de Pareto

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de exigecircncia de compensaccedilatildeo pode ter o efeito de produzir perdedores34 Esse modelo surgiu com a intenccedilatildeo de melhorar o criteacuterio de Pareto baseando-se na premissa de que uma situaccedilatildeo seraacute eficien-te quando ainda que uma das partes envolvidas tenha a sua situaccedilatildeo piorada haja a possibilidade de compensaacute-la Portanto por esse criteacuterio o importante eacute que os ganhadores possam potencialmente compensar os perdedores ainda que efetivamente natildeo o faccedilam35

No tocante agrave ideia de eficiecircncia em Posner eacute necessaacuterio levar em conta as diversas fases (ascensatildeo apogeu e queda) por que passou o pensamento do autor acerca do assunto Salama destaca com maes-tria a ascensatildeo da eficiecircncia como meacutetodo analiacutetico o seu apogeu como criteacuterio eacutetico e a sua queda como eficiecircncia subordinada ao pragmatismo

A eficiecircncia como meacutetodo analiacutetico (fase de ascensatildeo) corresponde agrave fase que vai desde meados dos anos 1960 ateacute fins da deacutecada de 1970 A ideia de eficiecircncia se identifica com a eficiecircncia econocircmica ou seja com a maximizaccedilatildeo da riqueza medida em padrotildees monetaacuterios O contexto eacute de que as pessoas se utilizam de um caacutelculo racional tanto nos ldquomercados expliacutecitosrdquo quanto nos ldquomercados impliacutecitosrdquo Assim conforme exemplifica Salama se o preccedilo dos tomates aumenta o consumidor tenderaacute a com-prar menos tomates ou os substituiraacute por outro tipo de alimento O mesmo raciociacutenio analiacutetico valeria para a praacutetica de crimes o ajuizamento de accedilotildees a realizaccedilatildeo de acordos etc A utilizaccedilatildeo da raciona-lidade como premissa instrumental natildeo significa necessariamente que haja um caacutelculo consciente de custos e benefiacutecios mas apenas um comportamento previsiacutevel36

A eficiecircncia como criteacuterio eacutetico (fase de apogeu) surge a partir de meados da deacutecada de 1970 quando Posner formula uma siacutentese normativa entre justiccedila e eficiecircncia A obra emblemaacutetica eacute The Economics of Justice37 de 1981 Para Salama essa fase pode ser vista como uma releitura das teorias contratua-listas claacutessicas (Hobbes Locke e Rousseau) em que Posner aplica suas teorias morais (moral theory) a questotildees juriacutedicas Posner utiliza a expressatildeo ldquoteoria moralrdquo em vez de ldquoteoria de justiccedilardquo definindo que o criteacuterio para avaliar se os atos e as instituiccedilotildees satildeo justos deve ser a maximizaccedilatildeo de riqueza da sociedade Desse modo as regras juriacutedicas e as interpretaccedilotildees do direito que promovam a maximiza-ccedilatildeo de riqueza satildeo consideradas justas Posner natildeo distingue as expressotildees ldquomaximizaccedilatildeo de riquezardquo e ldquoeficiecircnciardquo e situa sua teoria como uma construccedilatildeo intermediaacuteria entre a deontologia kantiana e o utilitarismo benthamiano38

34 COLEMAN Jules L Efficiency exchange and auction philosophic aspects of the economic approach to law V 68 Cal L Rev 221

1980 p 237-242

35 Bruno Salama ilustra o sentido do criteacuterio de Kaldor-Hicks com um exemplo ocorrido na cidade de Satildeo Paulo A prefeitura proibiu a

colocaccedilatildeo grandes cartazes de propaganda expostos ao puacuteblico Houve ldquoperdedoresrdquo e disso natildeo resta duacutevida porque vaacuterias pessoas

perderam seus empregos e outras tantas perderam seus negoacutecios Por outro lado o soacutelido apoio da populaccedilatildeo agrave nova legislaccedilatildeo e a

reeleiccedilatildeo do prefeito responsaacutevel por tal mudanccedila sugerem que os ganhos do restante da populaccedilatildeo (os ldquoganhadoresrdquo) provavelmente

excederam as perdas do grupo de ldquoperdedoresrdquo (SALAMA Bruno Meyerhof A histoacuteria do decliacutenio e queda do eficientismo na obra de

Richard Posner In LIMA Maria Luacutecia L M Padua (Coord) Agenda contemporacircnea direito e economia Trinta anos de Brasil (Tomo I)

Satildeo Paulo Saraiva 2012 p 311)

36 SALAMA Bruno Meyerhof A histoacuteria do decliacutenio e queda do eficientismo na obra de Richard Posner In LIMA Maria Luacutecia L M Padua

(Coord) Agenda contemporacircnea direito e economia Trinta anos de Brasil (Tomo I) Satildeo Paulo Saraiva 2012 p 288-293

37 Obra traduzida para o portuguecircs POSNER Richard A A economia da justiccedila Satildeo Paulo Martins Fontes 2010

38 Do utilitarismo Posner manteacutem uma concepccedilatildeo consequencialista de moralidade e justiccedila bem como a noccedilatildeo de caacutelculo individual

como ponto de partida no exame das relaccedilotildees em sociedade Por outro lado rechaccedila o criteacuterio de felicidade elemento fundamental do

utilitarismo substituindo-o pelo da maximizaccedilatildeo da riqueza Da deontologia kantiana Posner manteacutem parte dos conceitos de autonomia

e consenso poreacutem rechaccedila o ldquofanatismordquo kantiano que seria a aversatildeo ao raciociacutenio consequencialista levada ao seu extremo loacutegico

(SALAMA Bruno Meyerhof A histoacuteria do decliacutenio e queda do eficientismo na obra de Richard Posner In LIMA Maria Luacutecia L M Padua

(Coord) Agenda contemporacircnea direito e economia Trinta anos de Brasil (Tomo I) Satildeo Paulo Saraiva 2012 p 293-313)

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A eficiecircncia subordinada ao pragmatismo (fase de queda) eacute resultado das inuacutemeras criacuteticas que sofrera em relaccedilatildeo agrave ideia da maximizaccedilatildeo de riqueza como fundamentaccedilatildeo eacutetica do direito39 Na deacutecada de 1990 com a publicaccedilatildeo da obra The Problems of Jurisprudence40 Posner revecirc sua posiccedilatildeo e abandona a defesa da maximizaccedilatildeo de riqueza como fundaccedilatildeo eacutetica do direito passando a sustentar o pragmatis-mo juriacutedico Trata-se segundo Salama da formulaccedilatildeo e aplicaccedilatildeo do direito sem fundaccedilotildees filosoacuteficas sopesando-se as possiacuteveis consequecircncias das diversas interpretaccedilotildees que o texto permite Essa fase marca o retorno agrave tradiccedilatildeo juriacutedica americana por excelecircncia ndash o pragmatismo41

Seguramente a principal criacutetica agrave anaacutelise econocircmica do direito tem sido a utilizaccedilatildeo do criteacuterio de efi-ciecircncia na teoria do direito No entanto eacute preciso estar atento agraves diversas concepccedilotildees e escolas a que se vincula a noccedilatildeo de eficiecircncia para que se possa compreender melhor que esse criteacuterio pode ser bas-tante uacutetil como instrumental para auxiliar na elaboraccedilatildeo de normas e formulaccedilatildeo de decisotildees judiciais ou administrativas mais eficientes e justas assim como nas situaccedilotildees envolvendo gastos puacuteblicos a exemplo das poliacuteticas puacuteblicas de sauacutede conforme se veraacute mais adiante

5 DIREITOS HUMANOS E FUNDAMENTAIS NAS POLIacuteTICAS PUacuteBLICAS DE SAUacuteDE NO BRASIL

Retrocedendo-se 70 anos no tempo em 10 de dezembro de 1948 um documento proclamado na Assembleia Geral das Naccedilotildees Unidas marcava a histoacuteria dos direitos humanos ndash a Declaraccedilatildeo Universal dos Direitos Humanos (DUDH) Apesar de ter servido de inspiraccedilatildeo para diversas constituiccedilotildees e esta-dos democraacuteticos a declaraccedilatildeo ainda natildeo soacute natildeo atingiu sua plena concretizaccedilatildeo no plano mundial como daacute demonstraccedilotildees de retrocesso em diversas partes do globo Esse eacute o caso do Brasil que passa por um momento de crises poliacutetica e econocircmica (e talvez ainda crise moral) com graves violaccedilotildees dos direitos humanos e fundamentais

Com o fim da Segunda Guerra Mundial e das atrocidades vivenciadas naquele momento histoacuterico hou-ve uma luta pela proteccedilatildeo dos direitos humanos construiacuteda a partir da dignidade da pessoa humana que inspirou a humanidade a postular um padratildeo miacutenimo necessaacuterio para a sobrevivecircncia dos povos e das naccedilotildees Portanto no cenaacuterio internacional como afirma Piovesan a dignidade humana passou a constituir o valor maior que inspirou a Declaraccedilatildeo Universal de Direitos Humanos de 1948 acenando agrave universalidade e agrave indivisibilidade dos direitos humanos representando ldquoo norte e o lastro eacutetico dos demais instrumentos internacionais de proteccedilatildeo dos direitos humanosrdquo42

No tocante agrave sua trajetoacuteria rumo ao direito Barroso afirma que a dignidade se beneficiou da cultura juriacutedica poacutes-positivista identificada com a reaproximaccedilatildeo entre o direito e a eacutetica tornando o ordena-mento juriacutedico permeaacutevel aos valores morais Sustenta que se trata de um valor fundamental conver-tido em princiacutepio juriacutedico de estatura constitucional seja por sua positivaccedilatildeo em norma expressa seja por sua aceitaccedilatildeo como um mandamento juriacutedico extraiacutedo do sistema servindo tanto como justifica-

39 Dentre as criacuteticas podem ser destacadas as de COLEMAN Jules The Normative Basis of Economic Analysis A Critical Review of

Richard Posnerrsquos ldquoThe Economics of Justicersquordquo Stanford Law Review v 34 n 5 1982 p 1105-1131 DWORKIN Ronald M Is Wealth a

Value The Journal of Legal Studies v 9 n 2 1980 p 191-226 KRONMAN Anthony T Wealth Maximization as a Normative Principle

The Journal of Legal Studies v 9 n 2 1980 p 227-242 e MICHELMAN Frank I A Comment on Some Uses and Abuses of Economics in

Law The University of Chicago Law Review v 46 n 2 1979 p 307-315

40 Obra traduzida para o portuguecircs POSNER Richard A Problemas de filosofia do direito Satildeo Paulo Martins Fontes 2007

41 SALAMA Bruno Meyerhof A histoacuteria do decliacutenio e queda do eficientismo na obra de Richard Posner In LIMA Maria Luacutecia L M Padua

(Coord) Agenda contemporacircnea direito e economia Trinta anos de Brasil (Tomo I) Satildeo Paulo Saraiva 2012 p 313-319

42 PIOVESAN Flaacutevia Direitos humanos o princiacutepio da dignidade humana e a Constituiccedilatildeo brasileira de 1988 Revista do Instituto de

Hermenecircutica Juriacutedica ndash RIHJ Belo Horizonte Ano 1 n 2 jandez 2004

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Universidade do Sul de Santa Catarina

Revista Juriacutedica da Universidade do Sul de Santa Catarina

ccedilatildeo moral quanto como fundamento normativo para os direitos fundamentais43

Haacute que se registrar que direitos humanos e direitos fundamentais apresentam uma marcada distin-ccedilatildeo Por uma questatildeo terminoloacutegica adota-se aqui o entendimento de Sarlet para quem os ldquodireitos fundamentaisrdquo satildeo considerados aqueles reconhecidos pelo direito constitucional positivo e portan-to delimitados espacial e temporalmente enquanto os denominados ldquodireitos humanosrdquo constituem posiccedilotildees juriacutedicas reconhecidas na esfera do direito internacional positivo ao ser humano como tal independentemente de sua vinculaccedilatildeo com determinada ordem juriacutedico-positiva interna44

Prestes a completar 30 anos e inspirada na Declaraccedilatildeo Universal dos Direitos Humanos a Constituiccedilatildeo Federal de 1988 eacute considerada o marco juriacutedico da transiccedilatildeo democraacutetica e da institucionalizaccedilatildeo dos direitos e garantias fundamentais por demarcar a ruptura com o regime autoritaacuterio militar instaurado em 1964 situando-se na expressatildeo de Piovesan como o documento mais abrangente e pormenoriza-do sobre os direitos humanos jamais adotado no Brasil45 Daiacute se conceber que na Constituiccedilatildeo estatildeo institucionalizados os direitos humanos na forma de direitos fundamentais sociais e econocircmicos a serem prestados e garantidos por meio de poliacuteticas puacuteblicas

Como instrumentos colocados agrave disposiccedilatildeo do Estado para a concretizaccedilatildeo de direitos humanos fun-damentais abrigados na Constituiccedilatildeo as poliacuteticas puacuteblicas tecircm sido objeto de intenso debate na socie-dade dada a insuficiente capacidade governamental de converter recursos puacuteblicos em satisfaccedilatildeo das necessidades baacutesicas individuais e sociais Entre os direitos fundamentais abrigados pelas poliacuteti-cas puacuteblicas - e que interessa ao presenta trabalho - estaacute o direito agrave sauacutede positivado no art 6ordm da Constituiccedilatildeo Federal e concebido como direito de todos e dever do Estado no seu art 196 Trata-se de comando que obriga os entes federados a proteger a sauacutede de forma sistemaacutetica nos termos do art 198 em torno do conhecido Sistema Uacutenico de Sauacutede (SUS) constituiacutedo de uma rede regionalizada e hieraacuterquica de accedilotildees e serviccedilos de sauacutede com direccedilatildeo uacutenica em cada esfera de governo e estrutura descentralizada para atendimento integral46

43 BARROSO Luiacutes Roberto A dignidade da pessoa humana no direito constitucional contemporacircneo natureza juriacutedica conteuacutedos

miacutenimos e criteacuterios de aplicaccedilatildeo Revista Interesse Puacuteblico ndash IP Belo Horizonte ano 14 n 76 novdez 2012 Disponiacutevel em lthttpbid

editoraforumcombrbidPDI0006aspxpdiCntd=83932gt Acesso em 18 fev 2018

44 SARLET Ingo Wolfgang Os Direitos Fundamentais Sociais Na Constituiccedilatildeo de 1988 Revista Diaacutelogo Juriacutedico Salvador CAJ - Centro

de Atualizaccedilatildeo Juriacutedica v 1 nordm 1 2001 Disponiacutevel em lthttpwwwdireitopublicocombrpdf_segurorevista-dialogo-juridico-01-

2001-ingo-sarletpdfgt Acesso em 27 dez 2017

45 PIOVESAN Flaacutevia Direitos humanos o princiacutepio da dignidade humana e a Constituiccedilatildeo brasileira de 1988 Revista do Instituto de

Hermenecircutica Juriacutedica ndash RIHJ Belo Horizonte Ano 1 n 2 jandez 2004

46 A proteccedilatildeo agrave sauacutede encerra alguns princiacutepios norteadores como o da universalidade que prevecirc o acesso a todos o da equidade que

estabelece o acesso em condiccedilotildees iguais o da integralidade que exige atendimento e acompanhamento cliacutenico e de gastos ao longo do

tratamento e o da descentralizaccedilatildeo entre a Uniatildeo os Estados e os Municiacutepios

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A norma infraconstitucional que conteacutem as diretrizes a serem seguidas pela Uniatildeo pelos Estados e Municiacutepios eacute a Lei federal n 808090 denominada Lei Orgacircnica da Sauacutede47 Cabe destacar que eacute bastante extenso o espectro normativo infraconstitucional e legal (decretos portarias resoluccedilotildees)48 que trata da poliacutetica puacuteblica de sauacutede no paiacutes Satildeo regulamentaccedilotildees fragmentadas que sofrem constantes alteraccedilotildees e agraves vezes de difiacutecil compreensatildeo podendo prejudicar a interaccedilatildeo governamental ou institucional e com o jurisdicionado Deve-se ter em conta ainda que o papel da Administraccedilatildeo Puacuteblica em formular e executar poliacuteticas puacuteblicas de sauacutede vai aleacutem da mera conformidade com os dispositivos constitucionais e legais na medida em que suas accedilotildees estatildeo em uma realidade que envolve questotildees de natureza poliacutetica orccedilamentaacute-ria cientiacutefica tecnoloacutegica eacutetica e econocircmica apenas para citar algumas

Natildeo obstante a Constituiccedilatildeo tenha dado ao Poder Executivo o papel de concretizaccedilatildeo do direito agrave sauacute-de por meio de ldquopoliacuteticas sociais e econocircmicas que visem agrave reduccedilatildeo do risco de doenccedila e de outros agravos e ao acesso universal e igualitaacuterio agraves accedilotildees e serviccedilos para sua promoccedilatildeo proteccedilatildeo e recupe-raccedilatildeordquo observa-se que a extensa e complexa malha de assistecircncia positivada natildeo veio acompanhada da infraestrutura necessaacuteria para a prestaccedilatildeo dos serviccedilos puacuteblicos notadamente em um cenaacuterio de desigualdade social crises econocircmica e poliacutetica situaccedilatildeo que repercute ateacute hoje na baixa concreti-zaccedilatildeo do direito social em comento Com isso o Poder Judiciaacuterio tem sido cada vez mais demandado para obrigar os entes federados a satisfazerem o direito agrave sauacutede situaccedilatildeo conhecida como ldquojudicializa-ccedilatildeo da sauacutederdquo49 Nesse cenaacuterio geralmente haacute um confronto entre a necessidade de cumprimento do direito fundamental de um lado e a escassez dos recursos orccedilamentaacuterios do ente federado de outro50 expondo o custo dos direitos sociais51 e os dispecircndios de recursos puacuteblicos de forma ineficiente52 Na

47 O Decreto n 75082011 tambeacutem dispotildee sobre a mateacuteria assegurando que o acesso universal e equitativo agraves accedilotildees e aos serviccedilos de sauacutede

deve observacircncia ao planejamento integrado agrave avaliaccedilatildeo da gravidade do risco individual e coletivo ao criteacuterio cronoloacutegico agraves particularidades

das pessoas que gozam de proteccedilatildeo especial e agrave orientaccedilatildeo dos fluxos das accedilotildees e dos serviccedilos de sauacutede (arts 11 e 13) entre outros

48 Aleacutem da Constituiccedilatildeo Federal de 1988 (arts 6ordm e 196 e ss) da Lei n 808090 (Lei Orgacircnica da Sauacutede) da Lei n 814290 (Dispotildee sobre a

participaccedilatildeo da comunidade na gestatildeo do SUS e sobre as transferecircncias intergovernamentais de recursos financeiros na aacuterea da sauacutede) da

Lei n 124012011 (Altera a Lei n 808090 para dispor sobre a assistecircncia terapecircutica e a incorporaccedilatildeo de tecnologia em sauacutede no acircmbito

do SUS) do Decreto n 75082011 (Regulamenta a Lei n 808090 para dispor sobre a organizaccedilatildeo do SUS o planejamento da sauacutede a

assistecircncia agrave sauacutede e a articulaccedilatildeo interfederativa) e do Decreto n 76462011 (Dispotildee sobre a Comissatildeo Nacional de Incorporaccedilatildeo de

Tecnologias no Sistema Uacutenico de Sauacutede e sobre o processo administrativo para incorporaccedilatildeo exclusatildeo e alteraccedilatildeo de tecnologias em sauacutede

pelo SUS) existe a Portaria n 391698 (Aprova a Poliacutetica Nacional de Medicamentos) a Resoluccedilatildeo CNS n 3382004 (Aprova a Poliacutetica

Nacional de Assistecircncia Farmacecircutica) a Portaria GMMS n 3992006 (Divulga o Pacto pela Sauacutede 2006 ndash Consolidaccedilatildeo do SUS e aprova

as Diretrizes Operacionais do referido Pacto) a Portaria GMMS n 2042007 (Regulamenta o financiamento e a transferecircncia dos recursos

federais para as accedilotildees e os serviccedilos de sauacutede na forma de blocos de financiamento ndash componentes Baacutesico Estrateacutegico e Especializado - com

o respectivo monitoramento e controle) a Resoluccedilatildeo da Comissatildeo Intergestores Tripartite n 12012 (Diretrizes Nacionais da Rename no

acircmbito do SUS) a Portaria GMMS n 15542013 (Dispotildee sobre as regras de financiamento e execuccedilatildeo do Componente Especializado da

Assistecircncia Farmacecircutica no acircmbito do SUS) a Portaria GMMS n 15552013 (Dispotildee sobre as regras de financiamento e execuccedilatildeo do

Componente Baacutesico da Assistecircncia Farmacecircutica no acircmbito do SUS) e a Portaria GMMS n 12015 (Rename 2014) sem contar as normas

expedidas pelas Secretarias Estaduais Secretarias Municipais e outras relacionadas com poliacuteticas puacuteblicas localizadas

49 A judicializaccedilatildeo se refere agrave massificaccedilatildeo de demandas e de conflitos perante o Judiciaacuterio

50 Essa situaccedilatildeo remete ao debate corrente entre a satisfaccedilatildeo do miacutenimo existencial e a reserva do possiacutevel O ldquomiacutenimo existencialrdquo diz respeito

ao fato de se assegurar as condiccedilotildees baacutesicas de vida digna ao ser humano enquanto a expressatildeo ldquoreserva do possiacutevelrdquo se relaciona agrave ideia de que

a efetividade dos direitos sociais estaacute na dependecircncia das capacidades financeiras do Estado (SARLET Ingo Wolfgang FIGUEIREDO Mariana

Filchtiner Reserva do possiacutevel miacutenimo existencial e direito agrave sauacutede algumas aproximaccedilotildees In SARLET Ingo Wolfgang TIMM Luciano Bentti

(Org) Direitos fundamentais orccedilamento e ldquoreserva do possiacutevelrdquo 2 ed rev e ampl Porto Alegre Livraria do Advogado 2013 p 29)

51 Holmes e Sunstein levantaram a discussatildeo sobre o custo dos direitos arguindo que a eficaacutecia dos direitos depende dos impostos Os

autores sustentam a tese de que o direito custa dinheiro (rights cost money) na medida em que natildeo pode ser protegido ou obrigado sem

suporte econocircmico ou financiamento puacuteblico (HOLMES Stephen SUNSTEIN Cass R The cost of rights why liberty depends on taxes

New York W W Norton amp Company 1999 p 13 e 35)

52 Em 24112017 por exemplo o STF noticiou em sua paacutegina eletrocircnica a manutenccedilatildeo de uma decisatildeo do Tribunal de Justiccedila do Rio de

Janeiro que determinava agrave Fundaccedilatildeo Municipal de Sauacutede de Niteroacutei (RJ) que fornecesse o remeacutedio ldquocanaquinumaberdquo a uma portadora

da Deficiecircncia de Mevalonato Quinase Naquela oportunidade o Municiacutepio de Niteroacutei alegou que o medicamento natildeo era autorizado

pela ANVISA para o tratamento da doenccedila que a paciente possuiacutea e que custava R$ 612 mil por ano o correspondente a 41 da rubrica

orccedilamentaacuteria destinada agrave aquisiccedilatildeo de medicamentos para a populaccedilatildeo como um todo (BRASIL Supremo Tribunal Federal Mantida

decisatildeo que determina fornecimento de remeacutedio a paciente com doenccedila rara Notiacutecias STF 24 de novembro de 2017 Disponiacutevel em

ltwwwstfjusbrportalcmsverNoticiaDetalheaspidConteudo=362752gt Acesso em 15 fev 2018)

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aproximaccedilatildeo entre direito e economia percebe-se com mais clareza que os direitos tecircm custos que os recursos satildeo escassos que as accedilotildees geram reaccedilotildees ou consequecircncias que as normas tambeacutem pro-duzem externalidades que o ecircxito na judicializaccedilatildeo incentiva novas demandas assim como poliacuteticas puacuteblicas de sauacutede mal geridas provocam distorccedilotildees no sistema Para uma ideia mais concreta acerca dos custos desses direitos e a necessidade de eficiecircncia aborda-se a seguir o impacto dos gastos das poliacuteticas de sauacutede e sua judicializaccedilatildeo

6 O IMPACTO DOS GASTOS DAS POLIacuteTICAS PUacuteBLICAS DE SAUacuteDE E DE SUA JUDICIALIZACcedilAtildeO O RETRATO DA INEFICIEcircNCIA NOS DADOS DO TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIAtildeO E DO BANCO MUNDIAL

Os gastos puacuteblicos em sauacutede envolvendo a concessatildeo de medicamentos satildeo atualmente preocupantes na medida em que crescem de forma vertiginosa Um exemplo pode ser visto no caso da concessatildeo de medicamentos pelo governo federal por determinaccedilatildeo judicial Em 2010 o gasto foi de R$ 122 milhotildees em 2011 de R$ 230 milhotildees em 2012 de R$ 367 milhotildees em 2013 de R$ 549 milhotildees em 2014 de R$ 839 milhotildees em 2015 de R$ 11 bilhatildeo e em 2016 de R$ 16 bilhatildeo Um crescimento em 2016 comparado com 2010 de mais de 123353 As despesas com determinaccedilotildees judiciais de atendimento agrave sauacutede envolvendo a Uniatildeo os Estados e os Municiacutepios foi de aproximadamente R$ 7 bilhotildees somen-te no ano de 201754 Tal situaccedilatildeo remete inevitavelmente agrave conclusatildeo de ineficiecircncia da prestaccedilatildeo da sauacutede puacuteblica no paiacutes

A gravidade do problema pode ser verificada mais detalhadamente nas conclusotildees da auditoria opera-cional realizada pelo Tribunal de Contas da Uniatildeo (TCU) no periacuteodo de 26102015 a 29012016 que teve por objetivo identificar o perfil o volume e o impacto das accedilotildees judiciais na aacuterea da sauacutede em acircmbi-to nacional55 a fim de buscar meios de mitigar os efeitos negativos da judicializaccedilatildeo nos orccedilamentos e no acesso dos usuaacuterios agrave assistecircncia agrave sauacutede56

Os dados coletados de 9 Tribunais de Justiccedila e dos Tribunais Regionais Federais evidenciaram uma ten-decircncia de crescimento dos processos relacionados agrave sauacutede puacuteblica entre 2013 e 2014 com uma maior concentraccedilatildeo na Justiccedila Estadual Nos processos analisados a maior parte tratava do fornecimento de medicamentos e de tratamento meacutedico-hospitalar assim como se observou a predominacircncia da liti-gacircncia individual mediante atuaccedilatildeo da advocacia privada e da defensoria puacuteblica

Em relaccedilatildeo ao Ministeacuterio da Sauacutede verificou-se que o nuacutemero de accedilotildees judiciais federais era crescente e sua proporccedilatildeo por habitante era maior em Estados das regiotildees Sul Centro-Oeste e Sudeste A meacutedia nacional de processos judiciais recebidos pelo Ministeacuterio da Sauacutede por 100 mil habitantes dobrou de 3 em 2010 para 6 em 2014 Outra constataccedilatildeo foi de que os Estados com maior iacutendice de accedilotildees federais por habitante possuiacuteam Municiacutepios com maior Iacutendice de Desenvolvimento Humano Municipal (IDHM) indicando uma ausecircncia de relaccedilatildeo causal entre judicializaccedilatildeo da sauacutede e subdesenvolvimento em sauacutede

53 COLLUCCI Claacuteudia SP cede agrave Uniatildeo ldquodetectorrdquo de fraude em accedilotildees por medicamentos Cotidiano Folha de S Paulo 21 de julho de

2017 Disponiacutevel em lthttpwww1folhauolcombrcotidiano2017071903086-sp-cede-a-uniao-detector-de-fraude-em-acoes-

por-medicamentosshtmlgt Acesso em 17 jan 2018

54 BRASIL Conselho Nacional de Justiccedila CNJ avanccedila para qualificar decisotildees judiciais sobre gastos com sauacutede Disponiacutevel em lthttpwww

cnjjusbrnoticiascnj84486-cnj-avanca-na-qualificacao-da-judicializacao-para-otimizar-gasto-de-saudegt Acesso em 24 mar 2018

55 A partir da disponibilidade de suas unidades regionais o TCU selecionou Estados e Municiacutepios para a avaliaccedilatildeo tendo como criteacuterio

a capital de cada Estado e um outro Municiacutepio situado fora da regiatildeo metropolitana da capital com uma das seguintes caracteriacutesticas

histoacuterico de alta judicializaccedilatildeo da sauacutede eou maior populaccedilatildeo Dentre os Municiacutepios foram pesquisados Belo HorizonteMG

DivinoacutepolisMG FlorianoacutepolisSC JoinvilleSC CuiabaacuteMT SinopMT NatalRN MossoroacuteRN Rio de JaneiroRJ AraruamaRJ Satildeo

PauloSP Satildeo Joseacute do Rio PretoSP Porto AlegreRS Santa MariaRS CuritibaPR LondrinaPR e SantanaAP

56 A fiscalizaccedilatildeo objeto da auditoria culminou com a Decisatildeo n 17872017 proferida em 16082017 (BRASIL Tribunal de Contas da

Uniatildeo Acoacuterdatildeo n 17872017 ndash Plenaacuterio Rel Min Bruno Dantas Data julg 16082017)

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Os auditores do TCU verificaram que os valores gastos pelo Ministeacuterio da Sauacutede no cumprimento das decisotildees judiciais nessa aacuterea aumentaram mais de 14 vezes nos uacuteltimos 8 anos Em 2015 foram gas-tos mais de R$ 1 bilhatildeo sendo que em 2008 esses valores eram de aproximadamente R$ 70 milhotildees Ainda assim os auditores consideraram que tais valores estavam subestimados pois se referiam ao cumprimento de decisotildees judiciais quando era necessaacuteria a aquisiccedilatildeo de medicamentos e insumos jaacute que havia outros tipos de gastos como por exemplo depoacutesitos em contas judiciais pagamento direto a beneficiaacuterios e fretes aleacutem da retirada de um medicamento de um programa jaacute existente no caso de a demanda judicial tratar de uma terapecircutica pertencente ao SUS

A maior parte dos gastos com medicamentos judicializados do Ministeacuterio da Sauacutede se referia a itens natildeo incorporados ao SUS Durante o periacuteodo de 2010 a 2015 o Ministeacuterio da Sauacutede despendeu mais de R$ 27 bilhotildees com compras determinadas judicialmente Desse valor a maioria (54 ou R$ 19 bilhatildeo) foi gasto com a compra de apenas 3 medicamentos Elaprasereg (idursulfase) Naglazymereg (galsulfase) e Solirisreg (eculizumabe)57 Em 2014 quando o Solirisreg e o Naglazymereg representavam 55 do total gasto pelo Ministeacuterio com o cumprimento de ordens judiciais o custo meacutedio anual por paciente atendi-do com esses medicamentos era de mais de R$ 1 milhatildeo Foi destacado tambeacutem que ateacute o momento da auditoria o Solirisreg natildeo possuiacutea registro na Agecircncia Nacional de Vigilacircncia Sanitaacuteria (ANVISA)

Quanto aos gastos das Secretarias Estaduais de Sauacutede com a judicializaccedilatildeo os dados indicaram que juntas elas despendiam muito mais recursos do que o Ministeacuterio da Sauacutede Somente as Secretarias de Sauacutede de Minas Gerais Santa Catarina e Satildeo Paulo gastaram nos anos de 2013 e 2014 mais de R$ 734 milhotildees e R$ 772 milhotildees respectivamente Jaacute o Ministeacuterio da Sauacutede gastou no mesmo periacuteodo cerca de R$ 435 milhotildees e R$ 698 milhotildees respectivamente

No tocante ao tipo de gasto com a judicializaccedilatildeo da sauacutede os dados dos anos de 2013 e 2014 das Secretarias Estaduais de Sauacutede de Minas Gerais Santa Catarina e Satildeo Paulo indicaram que os medica-mentos representavam mais de 80 do valor despendido com a judicializaccedilatildeo Em Santa Catarina e Satildeo Paulo os medicamentos que natildeo pertenciam agraves relaccedilotildees do SUS representavam mais de 50 do total gasto com medicamentos judicializados em 2013 Esse iacutendice foi superior a 65 em 2014 Ainda a respei-to desse tipo de gasto foi observado que dos 19 medicamentos responsaacuteveis pelos maiores gastos (em termos percentuais) nesses Estados para o referido periacuteodo 10 eram medicamentos natildeo incorporados ao SUS sendo que 3 deles jaacute haviam tido a sua anaacutelise de incorporaccedilatildeo ao SUS indeferida pela CONITEC

No Estado de Satildeo Paulo os medicamentos do componente especializado da assistecircncia farmacecircutica e os oncoloacutegicos tiveram importante participaccedilatildeo nos gastos com judicializaccedilatildeo (3594 e 2409 nos anos de 2013 e 2014 respectivamente) No Distrito Federal segundo os dados do Tribunal de Justiccedila do Distrito Federal e Territoacuterios (TJDFT) relativos aos processos de primeira instacircncia autuados em 2013 e 2014 32 deles diziam respeito a Unidade de Terapia Intensiva (UTI) ou Unidade de Cuidados Intensivos (UCI) A Procuradoria-Geral do Distrito Federal (PGDF) reportou durante a fiscalizaccedilatildeo que 55 das accedilotildees judiciais referentes ao periacuteodo de 2010 a 2014 diziam respeito a UTI

Nesse contexto de judicializaccedilatildeo apontada pelo Tribunal de Contas da Uniatildeo tambeacutem cabe acrescentar as ocorrecircncias de fraudes as quais ajudam a impulsionar os gastos com sauacutede Citem-se como exem-plos a fraude identificada pela poliacutecia na operaccedilatildeo ldquoGarra Rufardquo em que se descobriu que o Estado de Satildeo Paulo foi compelido judicialmente a fornecer medicamentos para pacientes que natildeo eram portado-res da doenccedila ou para aqueles em que o grau da doenccedila natildeo justificava o uso da medicaccedilatildeo bem como outra fraude em que a maioria dos pacientes desconhecia que era parte na accedilatildeo judicial contra o Estado e muitos nem sequer possuiacuteam a doenccedila58

57 O Elaprase eacute utilizado no tratamento da mucopolissacaridose tipo 2 enquanto o Naglazyme eacute usado para a mucopolissacaridose tipo

6 e o Soliris para o tratamento da siacutendrome hemoliacutetico-urecircmica

58 PINHO Angela Governo vecirc uso de brasileiro como cobaia por laboratoacuterio estrangeiro Cotidiano Folha de S Paulo 11 de agosto de

2017 Disponiacutevel em lthttpwww1folhauolcombrcotidiano2017081909010-governo-ve-uso-de-brasileiro-como-cobaia-por-

laboratorio-estrangeiroshtmlgt Acesso em 17 fev 2018

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Constata-se que os gastos puacuteblicos ineficientes natildeo se limitam agrave judicializaccedilatildeo da sauacutede mas tambeacutem agrave proacutepria execuccedilatildeo das poliacuteticas puacuteblicas O exemplo estaacute no relatoacuterio do Banco Mundial59 publicado em novembro de 2017 e que conteacutem uma anaacutelise minuciosa sobre os gastos puacuteblicos no Brasil em aacutereas como previdecircncia social folha de pagamento dos servidores puacuteblicos aquisiccedilotildees puacuteblicas assistecircncia social educaccedilatildeo sauacutede mercado de trabalho e poliacuteticas de desenvolvimento do setor privado60 A con-clusatildeo eacute de que os governos (federal estaduais e municipais) gastam recursos de maneira ineficiente e muitas vezes injusta ao beneficiarem os mais ricos em detrimento dos mais pobres

No tocante agraves poliacuteticas puacuteblicas de sauacutede o diagnoacutestico revela que cerca de 03 do PIB poderia ser economizado adotando-se maior eficiecircncia a niacutevel local assim como mais 03 com o fim dos creacuteditos tributaacuterios do IRPF para despesas privadas com sauacutede Ao comparar os niacuteveis de eficiecircncia dos municiacute-pios o estudo identificou a possibilidade de ganhos em torno de 37 no atendimento primaacuterio (econo-mia potencial de R$ 9 bilhotildees) e de 71 nos serviccedilos secundaacuterios e terciaacuterios (economia potencial de R$ 12 bilhotildees) o que poderia gerar uma economia potencial de 03 do PIB

Em relaccedilatildeo ao PIB o Brasil gasta em sauacutede tanto quanto a meacutedia entre os paiacuteses da Organizaccedilatildeo para a Cooperaccedilatildeo e Desenvolvimento Econocircmico (OCDE)61 e mais do que os seus parceiros sendo que a maior parte desses gastos ocorre fora do setor puacuteblico No Brasil o gasto total com sauacutede eacute de 92 do PIB comparaacutevel com a meacutedia dos paiacuteses membros da OCDE (89) e maior do que a meacutedia dos seus parceiros estruturais62 e regionais63 (58 e 74 respectivamente)

Em termos per capita o Brasil gasta menos do que a meacutedia entre os paiacuteses da OCDE poreacutem mais do que os seus parceiros regionais e estruturais A despesa total per capita com sauacutede no Brasil (US$ 1334) eacute 35 da meacutedia entre os paiacuteses da OCDE (US$ 3817) 153 dos seus parceiros estruturais (US$ 873) 127 dos regionais (US$ 1054) e 141 maior do que a meacutedia entre os paiacuteses do BRICS64 (US$ 949) O relatoacuterio tambeacutem ressalta que o setor puacuteblico gasta recursos significativos por meio de despesas tribu-taacuterias especialmente para subsidiar seguros privados de sauacutede (05 do PIB)

Quanto ao atendimento primaacuterio identificou-se que a maior parte dos municiacutepios apresenta alta pro-dutividade (relativamente eficiente no uso de recursos) e baixo desempenho ao passo que nos atendi-mentos secundaacuterio e terciaacuterio a maioria revela baixa produtividade e baixo desempenho65 Essa situ-accedilatildeo de atendimento primaacuterio eacute verificada principalmente nos municiacutepios das regiotildees relativamente pobres (Norte e Nordeste) que sofrem mais restriccedilotildees de recursos Em relaccedilatildeo aos atendimentos mais complexos o desempenho da maioria dos municiacutepios eacute igualmente baixo Em termos regionais os municiacutepios das regiotildees Sul Sudeste e Centro-Oeste que tecircm um gasto per capita mais alto com sauacutede primaacuteria satildeo os menos eficientes ao passo que os municiacutepios do Norte e Nordeste que gastam menos satildeo mais eficientes A eficiecircncia estaacute relacionada agrave escala considerando o tamanho do municiacutepio o nuacutemero de leitos e o tamanho dos hospitais

59 BANCO MUNDIAL Um ajuste justo anaacutelise da eficiecircncia e equidade do gasto puacuteblico no Brasil Novembro de 2017 Disponiacutevel em

lthttpwwwworldbankorgptcountrybrazilpublicationbrazil-expenditure-review-reportgt Acesso em 27 mar 2018

60 Vale tambeacutem registrar que o relatoacuterio do Banco Mundial natildeo ficou imune a criacuteticas como por exemplo por ter feito uma leitura essencialmente

economeacutetrica desconsiderando a legislaccedilatildeo e o funcionamento do ensino superior e da educaccedilatildeo baacutesica no Brasil o indicador utilizado para

medir a eficiecircncia das universidades puacuteblicas entre outras (BRASIL Relatoacuterio do Banco Mundial distorce dados e ignora a realidade do paiacutes

alertam especialistas Paiacutes Jornal do Brasil 02 de dezembro de 2017 Disponiacutevel em lthttpwwwjbcombrpaisnoticias20171202

relatorio-do-banco-mundial-distorce-dados-e-ignora-a-realidade-do-pais-alertam-especialistasgt Acesso em 27 mar 2018)

61 Os paiacuteses membros da OCDE satildeo Estados Unidos Sueacutecia Alemanha Suiacuteccedila Holanda Franccedila Canadaacute Beacutelgica Dinamarca Aacuteustria

Japatildeo Nova Zelacircndia Greacutecia Portugal Espanha Noruega Islacircndia Itaacutelia Eslovecircnia Austraacutelia Finlacircndia Reino Unido Irlanda Rep da

Eslovaacutequia Israel Hungria Coreacuteia Rep Checa Polocircnia Lituacircnia Estocircnia Letocircnia e Luxemburgo

62 Os parceiros estruturais satildeo Aacutefrica do Sul Fed Russa China Turquia Iacutendia e Indoneacutesia

63 Os parceiros regionais satildeo Costa Rica Chile Colocircmbia e Meacutexico

64 Os paiacuteses do BRICS satildeo Brasil Ruacutessia Iacutendia China e Aacutefrica do Sul

65 O desempenho constitui uma medida comparativa de produtos e resultados entre vaacuterios municiacutepios sem considerar restriccedilotildees de

recursos enquanto que a produtividade eacute calculada pela relaccedilatildeo entre o desempenho e os gastos

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Em relaccedilatildeo ao tamanho do municiacutepio os dados mostram que a eficiecircncia meacutedia eacute mais baixa entre os municiacutepios com menos de 5000 habitantes No atendimento secundaacuterio e terciaacuterio a tendecircncia de maior eficiecircncia nos municiacutepios maiores eacute mais clara que no atendimento primaacuterio Quanto ao atendi-mento hospitalar as pontuaccedilotildees meacutedias de eficiecircncia dos municiacutepios com mais de 100000 habitantes satildeo quase quatro vezes superiores agrave meacutedia encontrada em municiacutepios com menos de 5000 habitantes

A economia potencial nos gastos com sauacutede estaacute relacionada agrave escala ineficiente de prestaccedilatildeo de ser-viccedilos sobretudo nos hospitais Segundo os pesquisadores do Banco Mundial o sistema brasileiro de sauacutede possui um grande nuacutemero de pequenos hospitais construiacutedos para prestar serviccedilos em regiotildees menos urbanizadas A maioria dos hospitais brasileiros opera em pequena escala e 61 possui menos de 50 leitos sendo que o tamanho ideal estimado eacute de 150 a 200 leitos para obter economias de escala Aleacutem disso as taxas de ocupaccedilatildeo dos leitos tambeacutem satildeo consideradas muito baixas sendo em meacutedia 45 nos hospitais do SUS e apenas 37 nas unidades de terapia intensiva Comparativamente obser-va-se que esses nuacutemeros estatildeo abaixo das meacutedias da OCDE (71) e da taxa de ocupaccedilatildeo desejaacutevel (entre 75 e 85) Os dados revelam ainda a falta de integraccedilatildeo do sistema como um fator da inefici-ecircncia pois quanto mais eficiente for o atendimento primaacuterio de um municiacutepio mais eficiente seraacute seu atendimento hospitalar (secundaacuterio e terciaacuterio) tendo em vista que um atendimento primaacuterio robusto contribui para racionalizar a demanda e melhorar os resultados em todo o sistema

Como se percebe a partir de quaisquer dados tanto do Tribunal de Contas da Uniatildeo quanto do Banco Mundial eacute possiacutevel visualizar a situaccedilatildeo preocupante e draacutestica por que passam as poliacuteticas puacuteblicas de sauacutede no Brasil agravadas pela judicializaccedilatildeo De um lado as pesquisas revelam que os serviccedilos puacuteblicos de sauacutede podem ser melhorados em quantidade e qualidade desde que levados em consideraccedilatildeo aspec-tos natildeo apenas de efetividade mas tambeacutem de eficiecircncia de modo que a maior atenccedilatildeo agrave eficiecircncia implica poder oferecer mais serviccedilos de sauacutede com os mesmos recursos Por outro as pesquisas tambeacutem demons-tram que a judicializaccedilatildeo da sauacutede especialmente na aacuterea de concessatildeo de medicamentos eacute geradora de ineficiecircncia no acircmbito da Administraccedilatildeo Puacuteblica (Uniatildeo Estados Municiacutepios e Distrito Federal) porquan-to as determinaccedilotildees judiciais desalocam recursos previamente destinados agrave coletividade para satisfazer interesses individuais desorganizando as contas puacuteblicas e a proacutepria poliacutetica puacuteblica de sauacutede

Eacute sabido que a questatildeo da judicializaccedilatildeo do direito fundamental agrave sauacutede eacute bastante complexa e de difiacute-cil soluccedilatildeo a curto prazo Por ser um fenocircmeno crescente e que desorganiza a poliacutetica puacuteblica de sauacutede planejada pelo Poder Executivo urge enfrentar o desafio da impossibilidade de a limitaccedilatildeo orccedilamentaacute-ria atender a todas as demandas judiciais que pleiteiam esse direito fundamental Em que pese a legiti-midade do indiviacuteduo isoladamente buscar via Judiciaacuterio a satisfaccedilatildeo do seu direito agrave sauacutede os efeitos negativos sobre as poliacuteticas puacuteblicas nessa aacuterea previamente planejadas pela Administraccedilatildeo implicam a desalocaccedilatildeo de recursos para atendimento da coletividade Daiacute a necessidade de natildeo se desprezar os aspectos de eficiecircncia (nas suas variadas acepccedilotildees) que por possuir conteuacutedo nitidamente econocircmico exige uma anaacutelise interdisciplinar do fenocircmeno

7 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

Conforme se verificou ao longo do estudo o problema relacionado agrave ineficiecircncia dos gastos com poliacuteticas puacuteblicas no Brasil especialmente em relaccedilatildeo agrave sauacutede e sua judicializaccedilatildeo natildeo deve ignorar o olhar interdisciplinar entre direito e economia sobretudo os aportes teoacutericos da anaacutelise econocircmica do direito Partindo da ideia de que os direitos realmente tecircm custos e que os recursos puacuteblicos satildeo escas-sos a aplicaccedilatildeo eficiente desses valores repercute na concretizaccedilatildeo dos direitos humanos e fundamen-tais conforme demonstrado nos dados do Banco Mundial e do Tribunal de Contas da Uniatildeo

A abordagem histoacuterica da anaacutelise econocircmica do direito auxilia a desmitificar a opiniatildeo de que esse movimento se preocupa apenas com questotildees de ordem monetaacuteria juros inflaccedilatildeo preccedilos tributa-ccedilatildeo ou mercados ou que procura reduzir tudo a objeto de comeacutercio Ficou evidenciado que o principal enfoque cuida do estudo do comportamento humano num ambiente de escassez de recursos procu-

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rando demonstrar como os indiviacuteduos tomam decisotildees e respondem a incentivos fornecidos pela nor-ma juriacutedica Natildeo obstante a diversidade de escolas ou correntes trata-se de um pensamento juriacutedico que permite explicar o comportamento dos indiviacuteduos frente agraves normas vislumbrando as suas conse-quecircncias no tocante ao cumprimento ou natildeo das obrigaccedilotildees legais sendo plenamente aplicaacutevel a ques-totildees poliacuteticas e sociais

Verificou-se tambeacutem que a relaccedilatildeo interdisciplinar entre direito e economia natildeo se revela contraditoacute-ria ou conflitante como pode parecer a partir da mera constataccedilatildeo da diferenccedila entre os seus meacutetodos Pelo contraacuterio o papel da economia na interdisciplinaridade com o direito eacute contribuir para o planeja-mento dos gastos puacuteblicos escolhendo prioridades de alocaccedilatildeo de recursos e realizaccedilatildeo de despesas sociais visando a atender ao maior interesse da sociedade e do desenvolvimento Levar em conta as implicaccedilotildees econocircmicas da Administraccedilatildeo Puacuteblica e das decisotildees judiciais em sede de poliacuteticas puacutebli-cas serve tambeacutem para compreender a crise do Estado contemporacircneo da democracia e da efetivaccedilatildeo dos direitos humanos e fundamentais sociais

Para aleacutem de conceber o direito essencialmente como provedor de justiccedila a anaacutelise econocircmica pro-potildee que as leis e as decisotildees juriacutedicas funcionem como incentivos para modificar o comportamento dos indiviacuteduos a fim de atingir os objetivos das poliacuteticas puacuteblicas entre os quais a distribuiccedilatildeo a efeti-vidade e a eficiecircncia Nesse cenaacuterio a anaacutelise econocircmica constitui uma metodologia importante para a tomada de decisatildeo que natildeo deve ser desprezada Assim se a judicializaccedilatildeo for concebida como uma atividade econocircmica e se torna uma atividade lucrativa para quem demanda espera-se que maiores recursos sejam investidos na atividade por quem quer lucrar com ela (incentivos) Se a chance de ecircxito aumenta mais pessoas satildeo levadas a promover a judicializaccedilatildeo A alta probabilidade de sucesso dessas demandas perante o Judiciaacuterio tambeacutem gera demanda e relativa facilidade de acesso agrave Justiccedila

Em que pese tambeacutem natildeo haver uniformidade na definiccedilatildeo do termo eficiecircncia tanto entre juristas quanto entre economistas os principais conceitos dados por Coase Pareto Kaldor-Hicks e Posner auxiliam bastante na sua aplicaccedilatildeo superando a superficialidade com que costuma ser tratada no direi-to administrativo Desse modo torna-se importante o caraacuteter interdisciplinar para a compreensatildeo do princiacutepio da eficiecircncia positivado na Constituiccedilatildeo Federal e na legislaccedilatildeo administrativa assim como a sua leitura agrave luz da anaacutelise econocircmica do direito para que a utilizaccedilatildeo dos recursos puacuteblicos seja devi-damente convertida em desenvolvimento social e concretizaccedilatildeo de direitos fundamentais sociais a exemplo do direito agrave sauacutede

A anaacutelise aprofundada sobre os gastos puacuteblicos no Brasil feita pelo Banco Mundial confirma em gran-de medida a aplicaccedilatildeo dos pressupostos da anaacutelise econocircmica quando a partir das noccedilotildees de desem-penho e produtividade conclui que os governos (federal estaduais e municipais) gastam mais do que podem e de forma ineficiente aleacutem de natildeo cumprirem integralmente seus objetivos realizando inclusi-ve gastos puacuteblicos injustos ao beneficiarem os mais ricos em detrimento dos mais pobres Eacute o caso por exemplo de que em relaccedilatildeo agraves poliacuteticas puacuteblicas de sauacutede cerca de 03 do PIB poderia ser economi-zado atraveacutes de melhorias de eficiecircncia a niacutevel local mantendo o mesmo padratildeo de serviccedilos de sauacutede

O impacto da atuaccedilatildeo eficiente nas poliacuteticas puacuteblicas de sauacutede eacute tatildeo grande que os nuacutemeros do relatoacute-rio do Banco Mundial remetem a uma seacuteria reflexatildeo acerca do que a boa aplicaccedilatildeo dos recursos poderia gerar para a sociedade Ao comparar os niacuteveis de eficiecircncia dos municiacutepios por exemplo o estudo iden-tificou a possibilidade de ganhos em torno de 37 no atendimento primaacuterio (economia potencial de R$ 9 bilhotildees) e de 71 nos serviccedilos secundaacuterios e terciaacuterios (economia potencial de R$ 12 bilhotildees) o que poderia gerar uma economia potencial de 03 do PIB

Entre as causas da ineficiecircncia estaacute a fragmentaccedilatildeo do sistema puacuteblico de sauacutede especialmente do alto nuacutemero de pequenos hospitais impedindo economias de escala na prestaccedilatildeo de serviccedilos A econo-mia potencial nos gastos com sauacutede segundo o relatoacuterio estaacute relacionada a uma escala ineficiente de prestaccedilatildeo de serviccedilos sobretudo nos hospitais O demasiado nuacutemero de pequenos hospitais reflete a necessidade de equilibrar o acesso a serviccedilos hospitalares com o tamanho ideal dos hospitais e a escala de serviccedilos Verificou-se que a maioria dos hospitais brasileiros opera em pequena escala e 61 possui

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menos de 50 leitos sendo que o tamanho ideal estimado eacute de 150 a 200 leitos para obter economias de escala Aleacutem disso as taxas de ocupaccedilatildeo dos leitos tambeacutem satildeo consideradas muito baixas

Jaacute na esteira das conclusotildees da auditoria realizada pelo TCU observou-se que haacute necessidade de que os ges-tores adotem medidas para coleta processamento e anaacutelise de dados referentes agraves accedilotildees judiciais de sauacutede assim como para detecccedilatildeo de fraudes de forma permanente Aleacutem disso eacute imprescindiacutevel elaborar um diag-noacutestico preciso sobre o impacto da judicializaccedilatildeo no orccedilamento e na gestatildeo puacuteblica da sauacutede a partir do cru-zamento de dados do monitoramento de pacientes beneficiaacuterios das decisotildees judiciais e dos medicamentos e insumos pleiteados Tambeacutem eacute necessaacuterio que as unidades gestoras adotem a praacutetica de divulgaccedilatildeo trans-parente e perioacutedica de informaccedilotildees e dados estatiacutesticos sobre a judicializaccedilatildeo da sauacutede para os oacutergatildeos envol-vidos as universidades os pesquisadores as organizaccedilotildees sociais e o puacuteblico interessado notadamente por-que os recursos satildeo puacuteblicos aleacutem de incentivar a participaccedilatildeo de todos na soluccedilatildeo do problema

Diante desse quadro conclui-se que os serviccedilos puacuteblicos de sauacutede podem ser melhorados em quanti-dade e qualidade desde que levados em consideraccedilatildeo aspectos natildeo apenas de efetividade mas tam-beacutem de eficiecircncia Os desafios satildeo enormes em um paiacutes continental como Brasil natildeo mais se podendo tolerar poliacuteticas puacuteblicas ineficientes especialmente porque os anos vindouros desafiaratildeo o sistema com o envelhecimento da populaccedilatildeo e as doenccedilas crocircnicas decorrentes do aumento da expectativa de vida Daiacute a importacircncia da identificaccedilatildeo da fronteira e do necessaacuterio diaacutelogo interdisciplinar entre direito e economia na busca pela efetividade e eficiecircncia das poliacuteticas puacuteblicas de sauacutede no Brasil

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DIA DO ORGULHO LGBTI DIA DE FESTA E DE LUTA

Maria Berenice Dias1

1998 eacute considerado o ano que natildeo acabou

Foi quando eclodiu o movimento de contracultura promovendo a mais significativa reviravolta na his-toacuteria contemporacircnea

Surgiu m Paris com os alunos Sorbonne questionando o perfil conservador da Universidade

O Festival de Woodstock cantou ldquopaz e amorrdquo

A busca da liberdade era expressa pelo lema ldquoeacute proibido proibirrdquo

A partir daiacute a mobilizaccedilatildeo espraiou-se mundo a fora

Os reflexos chegaram ao Brasil pelo Tropicalismo na voz dos Novos Baianos

E haacute exatos 49 anos no dia 28 de junho de 1969 em Nova Iorque no bar Stowall frequentado pela populaccedilatildeo LGBTI houve um confronto com a poliacutecia contra as reiteradas agressotildees invasotildees e perse-guiccedilatildeo que sofriam

A data reconhecida como o Dia Internacional do Orgulho LGBTI eacute marcada por paradas e manifesta-ccedilotildees puacuteblicas na busca de respeito de voz de vez

No entanto o reconhecimento dos direitos somente comeccedilou neste seacuteculo

Enquanto em todos os paiacuteses as conquistas satildeo asseguradas por leis no Brasil a ineacutercia legislativa levou a justiccedila a se transformar em garantidor da cidadania desta parcela da populaccedilatildeo que eacute alvo ain-da de perversa discriminaccedilatildeo

Foi o Judiciaacuterio que reconheceu os viacutenculos homoafetivos como entidade familiar assegurando aos casais formados por pessoas do mesmo sexo todos os direitos acesso ao casamento agrave adoccedilatildeo bem como aos direitos previdenciaacuterios e sucessoacuterios

Tambeacutem foi a Justiccedila que recentemente garantiu aos transgecircneros o direito agrave alteraccedilatildeo do nome e da identidade sexual diretamente junto ao registro civil por autodeclaraccedilatildeo mesmo que natildeo tenha se submetido a qualquer tratamento hormonal ou intervenccedilatildeo ciruacutergica

Apesar de todos estes avanccedilos natildeo eacute respeitado o direito agrave vida O Brasil eacute o campeatildeo de mortes em razatildeo da orientaccedilatildeo sexual ou identidade de gecircnero uma a cada 19 horas

Isto porque a LGBTIfobia natildeo eacute crime Natildeo haacute lei que puna as agressotildees que algueacutem eacute alvo pelo simples fato de natildeo corresponder ao modelo identificado como ldquonormalrdquo de viver e amar

Deste modo a luta precisa continuar para que seja aprovada uma legislaccedilatildeo que assegure os direitos conquistados judicialmente e que tipifique os atos de oacutedio como crime

O PLS 1342008 ndash Estatuto da Diversidade Sexual e Gecircnero apresentado ao Senado Federal por ini-ciativa popular acompanhado de 100 mil assinaturas atende a este propoacutesito Foi elaborado pela Comissatildeo de Diversidade Sexual e Gecircnero da OAB com a participaccedilatildeo dos movimentos sociais

Ou seja muito se tem a festejar mas tambeacutem muito ainda a se fazer

1 Presidente Nacional da Comissatildeo de Diversidade Sexual e Gecircnero da OAB e da Comissatildeo de Direito Homoafetivo e Gecircnero do IBDFAM

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CONDENACcedilOtildeES NA CORTE INTERAMERICANA DE DIREITOS HUMANOS DA OEA UMA FOTOGRAFIA DA VIOLACcedilAtildeO DOS DIREITOS HUMANOS NA AMEacuteRICA LATINA

CONDENACIONES EN LA CORTE INTERAMERICANA DE DERECHOS HUMANOS DE LA OEA UNA FOTOGRAFIacuteA DE LA VIOLACIOacuteN DE LOS DERECHOS HUMANOS EN AMEacuteRICA LATINAMilene Pacheco Kindermann1

Resumo A pesquisa levantou nas condenaccedilotildees dadas pela Corte Interamericana de Direitos HumanosOEA o perfil de desrespeito aos DH localizando as agressotildees aos DH realizadas pelos paiacuteses condena-dos e a tutela concedida aos cidadatildeos americanos A pesquisa foi descritiva com meacutetodo dedutivo niacutevel exploratoacuterio abordagem quali-quantitativa O procedimento foi histoacuterico e monograacutefico com coleta de dados bibliograacutefica e documental As fontes primaacuterias foram 208 sentenccedilas de meacuterito da Corte IDH (de 1988 a 2017) O perfil de violaccedilotildees aos DH refere-se somente aos paiacuteses da Ameacuterica Latina com destaque ao Peru o maior violador Os DH que sofreram mais violaccedilotildees foram os direitos baacutesicos agrave vida e agrave integridade fiacutesica bem como a liberdade pessoal Os DH natildeo violados foram os de indenizaccedilatildeo de retificaccedilatildeo ou resposta e os menos violados foram os de reuniatildeo de nacionalidade e a liberdade de consciecircncia e de religiatildeo Treze outros DH listados no Pacto foram medianamente violados

Palavras-chave Direitos Humanos Corte Interamericana de Direitos Humanos Sentenccedilas

Resumen La investigacioacuten levantoacute en las condenas dadas por la Corte Interamericana de Derechos Humanos OEA el perfil de irrespeto a los DH localizando las agresiones a los DH realizadas por los paiacuteses condenados y la tutela concedida a los ciudadanos americanos La investigacioacuten fue descriptiva con meacutetodo deductivo nivel exploratorio enfoque cualitativo y cuantitativo El procedimiento fue histoacuterico y monograacutefico con recoleccioacuten de datos bibliograacutefica y documental Las fuentes primarias fueron 208 sentencias de meacuterito de la Corte IDH (de 1988 hasta 2017) El perfil de violaciones a los DH se refiere solamente a los paiacuteses de Ameacuterica Latina con destaque a Peruacute el mayor violador Los DH que sufrieron maacutes violaciones fueron los derechos baacutesicos a la vida ya la integridad fiacutesica asiacute como la libertad personal Los DH no violados fueron los de indemnizacioacuten de rectifi-cacioacuten o respuesta y los menos violados fueron los de reunioacuten de nacionalidad y la libertad de conciencia y de religioacuten Trece otros DH enumerados en el Pacto fueron violados de forma mediana

Palabras clave Derechos Humanos Corte Interamericana de Derechos Humanos Sentencias

1 Professora da Universidade do Sul de Santa Catarina- Unisul desde 1992 Coordenou o curso de Relaccedilotildees Internacionais de 1996 a

2009 Foi Diretora do Campus Universitaacuterio de Tubaratildeo de 2009 a 2013 Desde entatildeo eacute Coordenadora da aacuterea institucional da Extensatildeo

Universitaacuteria na Proacute-Reitoria de Extensatildeo Eacute pesquisadora e professora na aacuterea de Direito Internacional e Direitos Humanos

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1 INTRODUCcedilAtildeO

Os Direitos Humanos (DH) apesar de amplamente estudados continuaratildeo sendo ao longo dos tem-pos objeto de pesquisa Os movimentos sociais nacionais e internacionais liderados na maioria das vezes por ONGs tecircm gerado a ampliaccedilatildeo do rol de DH protegidos por normas acompanhando a modernidade e o surgimento das novas tecnologias

Para que a proteccedilatildeo dos DH deixasse de ser assunto de Estado e passasse a ser assunto da sociedade inter-nacional apoacutes a Segunda Guerra Mundial mudou-se o paradigma de tratamento da temaacutetica Com a criaccedilatildeo da ONU ndash Organizaccedilatildeo das Naccedilotildees Unidas (em 1945) os paiacuteses aproximaram-se e desenvolveram o diaacutelo-go em direccedilatildeo agrave universalizaccedilatildeo dos DH editando a Declaraccedilatildeo Universal dos Direitos Humanos (1948) Desde entatildeo diversos tratados tecircm sido construiacutedos para que seja garantida a proteccedilatildeo destes direitos

No entanto natildeo basta a construccedilatildeo de tratados eacute necessaacuteria a existecircncia de um sistema que garanta a sua apli-caccedilatildeo Em niacutevel global a ONU conta com uma sistemaacutetica de acompanhamento da execuccedilatildeo dos tratados de DH por meio de Comissotildees ou Comitecircs que tecircm a funccedilatildeo de fiscalizar e orientar os Estados signataacuterios das con-venccedilotildees no seu cumprimento Satildeo nos sistemas regionais entretanto que se encontram meios mais efetivos de alcance desta proteccedilatildeo (PIOVESAN 2006) Nos sistemas europeu americano e africano haacute a promoccedilatildeo dos DH (feita por meio de tratados) o controle do atendimento aos tratados nos Estados (feito por meio de Comissotildees) e a garantia de cumprimento dos tratados quando violados (feita por meio das Cortes Internacionais)

O tema em estudo foi a proteccedilatildeo dos DH no sistema americano por meio da Corte Interamericana de DH Este sistema constituiu-se no acircmbito da Organizaccedilatildeo dos Estados Americanos ndash OEA concebida em 1948 como um dos seus principais pilares Para tanto em 2 de maio do mesmo ano foi aprovada a Declaraccedilatildeo Americana dos Direitos e Deveres do Homem como o marco inicial dos DH na Ameacuterica

Aleacutem desse importante marco legal outros tratados disciplinam os DH nos paiacuteses americanos como a Convenccedilatildeo Americana sobre Direitos Humanos (o Pacto de San Joseacute da Costa Rica) aprovado em 22 de novembro de 1969 e com entrada em vigor em 18 de Julho de 1978 a Convenccedilatildeo Interamericana para Prevenir e Punir a Tortura de 9 de dezembro de 1985 com vigor em 28 de fevereiro de 1987 o Protocolo Adicional agrave Convenccedilatildeo Americana sobre Direitos Humanos em mateacuteria de Direitos Econocircmicos Sociais e Culturais (Protocolo de San Salvador) de 17 de novembro de 1988 com entrada em vigor em 16 de novembro de 1999 o Protocolo agrave Convenccedilatildeo Americana sobre Direitos Humanos Referente agrave Aboliccedilatildeo da Pena de Morte de 8 de junho de 1990 em vigor desde 28 de agosto de 1991 a Convenccedilatildeo Interamericana para Prevenir Punir e Erradicar a Violecircncia contra a Mulher (Convenccedilatildeo de Beleacutem do Paraacute) de 9 de junho de 1994 com vigor em 5 de marccedilo de 1995 a Convenccedilatildeo Interamericana sobre o Desaparecimento Forccedilado de Pessoas de 9 de junho de 1994 em vigor desde 28 de marccedilo de 1996 e a Convenccedilatildeo Interamericana para a Eliminaccedilatildeo de Todas as Formas de Discriminaccedilatildeo contra as Pessoas Portadoras de Deficiecircncia de 7 de junho de 1999 com entrada em vigor em 14 de setembro de 2001

Jaacute nesse milecircnio outras cartas e declaraccedilotildees foram adotadas sendo do ano 2000 a Declaraccedilatildeo de Princiacutepios sobre Liberdade de Expressatildeo de 2001 a Carta Democraacutetica Interamericana e de 2008 os Princiacutepios e Boas Praacuteticas para a Proteccedilatildeo das Pessoas Privadas de Liberdade nas Ameacutericas (COMISSAtildeO INTERAMERICANA DE DIREITOS HUMANOS 2017)

Para a atenccedilatildeo aos DH no sistema americano foi concebido como oacutergatildeo permanente da OEA em 1959 a Comissatildeo Interamericana de Direitos Humanos ndash CIDH que passou a atuar efetivamente a partir de 1960 Com a entrada em vigor em 1978 da Convenccedilatildeo Americana sobre Direitos Humanos (celebrada em 1969) houve o incremento da efetividade da Comissatildeo o estabelecimento da Corte Interamericana de Direitos Humanos e a mudanccedila da natureza juriacutedica dos instrumentos nos que se baseia a estrutura institucional de declaraccedilatildeo (soft law) para tratados (hard law) Este tratado ampliou o sistema americano de proteccedilatildeo aos DH listando os direitos protegidos o sistema de controle destes direitos (a Comissatildeo Interamericana de Direitos Humanos) e o sistema de garantia destes direitos (a Corte Interamericana de Direitos Humanos ndash CorteIDH)

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Com acesso possiacutevel ao sistema para os cidadatildeos ONGs e Estados-partes a CorteIDH tem assumido o papel de garantir os DH no territoacuterio dos paiacuteses signataacuterios do tratado quando os Estados natildeo suprem ao indiviacuteduo o acesso agraves garantias nos termos do artigo 46 do Pacto (BRASIL 1992)

Nos dados disponiacuteveis no siacutetio da Organizaccedilatildeo dos Estados Americanos (2017) verifica-se que dos 34 Estados Membros da organizaccedilatildeo 23 satildeo signataacuterios do Pacto de Satildeo Joseacute da Costa Rica sendo que a uacuteltima ratificaccedilatildeo deu-se em 1991 por Trindade e Tobago Eram 24 mas dois deles denunciaram o tra-tado Trindade e Tobago em 1998 e Venezuela em 2012 Natildeo satildeo signataacuterios ainda aleacutem dos dois paiacute-ses que denunciaram o Pacto Antiacutegua e Barbuda Bahamas Belize Canadaacute Estados Unidos Guiana Satildeo Cristoacutevatildeo e Neves Santa Luacutecia Satildeo Vicente amp Granadinas

No siacutetio da Corte verifica-se que 22 paiacuteses jaacute foram chamados a responder processos de desrespeito aos DH estando em supervisatildeo de cumprimento 334 decisotildees contra os Estados tanto preliminares quanto de meacuterito no ano de 2017 (CORTE INTERAMERICANA DE DIREITOS HUMANOS 2017)

A pesquisa destinou-se entatildeo a levantar nas sentenccedilas de meacuterito o perfil americano de desrespeito aos DH localizando as agressotildees aos DH realizadas pelos paiacuteses condenados e a tutela concedida pela Corte aos cidadatildeos americanos no continente Para o desenvolvimento do projeto adotou-se como pergunta de pesquisa qual eacute o perfil de desrespeito aos DH tutelados no Pacto de Satildeo Joseacute da Costa Rica a partir da garantia oferecida pela Corte Interamericana de Direitos Humanos da OEA

O objetivo geral foi o de avaliar o descumprimento do Pacto de Satildeo Joseacute da Costa Rica pelos paiacuteses ame-ricanos a partir da identificaccedilatildeo do perfil de desrespeito aos Direitos Humanos nos Estados-Partes do pacto em razatildeo das condenaccedilotildees impostas pela Corte Interamericana de Direitos Humanos da OEA E como objetivos especiacuteficos a) listar os direitos humanos tutelados no Pacto de Satildeo Joseacute da Costa Rica b) estudar as estruturas do sistema americano de proteccedilatildeo dos DH previstas no Pacto de Satildeo Joseacute da Costa Rica c) identificar todos os casos contenciosos sob a anaacutelise da Corte Interamericana de Direitos Humanos da OEA d) levantar nas sentenccedilas jaacute prolatadas quais foram os DH infringidos pelos Estados e as penalidades a eles impostas e) analisar os dados levantados identificando o perfil de descumpri-mento dos direitos tutelados pelo Pacto de Satildeo Joseacute da Costa Rica

2 MEacuteTODOS

Tratou-se de estudo com finalidade descritiva cujo meacutetodo de abordagem utilizado foi o dedutivo A pesquisa teve niacutevel exploratoacuterio com abordagem pelo meacutetodo quali-quantitativo Os meacutetodos de pro-cedimento foram o histoacuterico e o monograacutefico

O procedimento de coleta de dados foi bibliograacutefico e documental tendo como fontes primaacuterias 208 sentenccedilas de meacuterito dos casos contenciosos da Corte IDH da OEA no periacuteodo entre 1988 e 2017 dis-poniacuteveis em meio eletrocircnico e como fontes secundaacuterias livros artigos e outras publicaccedilotildees disponiacuteveis em meios eletrocircnicos ou impressos

Inicialmente foi feito o levantamento de dados por meio de pesquisa bibliograacutefica e documental sobre os DH tutelados e sobre as estruturas do sistema americano de proteccedilatildeo dos DH previstos no Pacto de Satildeo Joseacute da Costa Rica Em seguida foi elaborado formulaacuterio na ferramenta Excel para coleta dos DH infringidos pelos Estados nos casos contenciosos sentenciados pela CorteIDH Foi feita a da leitura das sentenccedilas e o preenchimento do formulaacuterio de coleta indicando os artigos da Convenccedilatildeo que ser-viram de fundamento para cada condenaccedilatildeo estabelecida nas sentenccedilas O levantamento dos dados foi registrado em fichamentos e planilhas A anaacutelise dos dados coletados foi feita agrave luz dos referenciais teoacutericos e documentais (tratados de DH)

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3 RESULTADOS E DISCUSSOtildeES

Primeiramente um dos resultados alcanccedilados refere-se agrave aacuterea de abrangecircncia da competecircncia da CorteIDH e das obrigaccedilotildees do Pacto de Satildeo Joseacute da Costa Rica Nota-se que esse Pacto que estabelece o sistema interamericano de DH refere-se territorialmente agrave praticamente a Ameacuterica Latina pois EUA e Canadaacute e alguns paiacuteses caribenhos ainda natildeo ratificaram o Pacto Isso limita territorialmente o escopo do projeto ao desenho de perfil de violaccedilotildees de DH somente para parte da Ameacuterica e natildeo sua totalidade

A Ameacuterica Latina isto eacute a parte territorial da Ameacuterica inicialmente pertencente aos paiacuteses falantes de liacutenguas latinas (Portugal Espanha e Franccedila) eacute composta de 20 paiacuteses (Argentina Boliacutevia Brasil Chile Colocircmbia Costa Rica Cuba El Salvador Equador Guatemala Haiti Honduras Meacutexico Nicaraacutegua Panamaacute Paraguai Peru Repuacuteblica Dominicana Uruguai e Venezuela) e duas dependecircncias (Guiana Francesa e Porto Rico) Todos esses paiacuteses independentes fazem parte da OEA e satildeo (ou foram) signataacute-rios do Pacto Dos 22 paiacuteses com condenaccedilotildees na Corte IDH natildeo compotildeem a Ameacuterica Latina Barbados (com 2 condenaccedilotildees) Suriname (com 5 condenaccedilotildees) e Trindade e Tobago (com 2 condenaccedilotildees) No entanto como satildeo poucos os casos e como estes paiacuteses territorialmente estatildeo na mesma porccedilatildeo fiacutesica dos demais Estados latino-americanos estes paiacuteses foram mantidos no levantamento dos dados

Os dados extraiacutedos das sentenccedilas 208 sentenccedilas de meacuterito condenatoacuterias aos Estados latino-ameri-canos incluindo os trecircs paiacuteses que natildeo compotildeem a Ameacuterica Latina geraram as tabelas que seguem

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Os dados numeacutericos organizados na tabela permitem algumas constataccedilotildees Os artigos da convenccedilatildeo mais mencionados nas decisotildees foram o 8ordm e o 25 O artigo 8ordm trata das garantias judiciais que o indiviacute-duo deve ter direito (mencionado em 188 casos) e o artigo 25 estabelece o direito agrave proteccedilatildeo judicial (citado em 181 casos) Obviamente que o fato dos casos terem chegado agrave instacircncia da Corte IDH eacute jus-tamente porque no acircmbito nacional as viacutetimas de violaccedilotildees natildeo encontraram a garantia e a proteccedilatildeo do Estado para a defesa de seus direitos Por isso a indicaccedilatildeo desses artigos ocorre em praticamente todas as sentenccedilas da CorteIDH geralmente citados os dois mas tambeacutem citados isoladamente num caso ou em outro

Afastada esta questatildeo outras merecem destaque Os artigos do Pacto que acumularam mais violaccedilotildees foram em ordem decrescente o art 5ordm (direito agrave integridade pessoal) com 155 casos o art7ordm (direito agrave liberdade pessoal) com 110 casos e o art 4ordm (direito agrave vida) com 108 casos Isso demonstra que as incidecircncias de violaccedilotildees de direitos baacutesicos ou fundamentais do ser humano na Ameacuterica Latina ainda satildeo grandes O paiacutes que mais apresentou casos de violaccedilotildees a estes trecircs direitos foi o Peru seguido da Guatemala e da Colocircmbia A lista de DH violados comeccedila a cair em seguida saindo do patamar de 108 violaccedilotildees para 41 violaccedilotildees e se apresentam nesta ordem

Lista de Direitos Violados em Ordem Decrescente

Art 11 Proteccedilatildeo da honra e da dignidade 41

Art 19 Direitos da crianccedila 40

Art 3 Direito ao reconhecimento da personalidade juriacutedica 36

Art 21 Direito agrave propriedade privada 35

Art13 Liberdade de pensamento e de expressatildeo 34

Art 22 Direito de circulaccedilatildeo e de residecircncia 29

Art9 Princiacutepio da legalidade e da retroatividade 28

Art 24 Igualdade perante a lei 28

Art 17 Proteccedilatildeo da famiacutelia 25

Art 23 Direitos poliacuteticos 21

Art 16 Liberdade de associaccedilatildeo 19

Art6 Proibiccedilatildeo da escravidatildeo e da servidatildeo 14

Art 18 Direito ao nome 6

Art 20 Direito agrave nacionalidade 5

Art12 Liberdade de consciecircncia e de religiatildeo 3

Art 15 Direito de reuniatildeo 3

Alguns direitos violados chamam a atenccedilatildeo Eacute o caso dos direitos da crianccedila com 40 casos de violaccedilotildees tendo a Guatemala como paiacutes que mais violou (com 9 casos) Outro eacute a proibiccedilatildeo da escravidatildeo e da ser-vidatildeo abolida no Seacutec XIX do continente americano mas que ainda persiste em 14 casos distribuiacutedos em 8 paiacuteses Tambeacutem um direito violado por 3 paiacuteses foi o da nacionalidade com destaque aos 2 casos da Repuacuteblica Dominicana e a 1 caso do Peru em que as violaccedilotildees resultaram em apatridia isto eacute colo-caram as viacutetimas em situaccedilatildeo de natildeo possuir viacutenculo com qualquer Estado

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Revista Juriacutedica da Universidade do Sul de Santa Catarina

Entre os DH assegurados pelo Pacto de Satildeo Joseacute da Costa Rica natildeo tiveram denuacutencias de violaccedilotildees aqueles previstos nos artigos 10 (direito de indenizaccedilatildeo) e 14 (direito de retificaccedilatildeo ou resposta)

Quanto aos paiacuteses os mais violadores entre os que participam do sistema interamericano satildeo o Peru (173 violaccedilotildees) a Guatemala (145 violaccedilotildees) a Colocircmbia (120 violaccedilotildees) o Equador (96 violaccedilotildees) e a Venezuela (75 violaccedilotildees) Jaacute os que menos direitos violaram foram Nicaraacutegua (17 violaccedilotildees) Uruguai (16 violaccedilotildees) Haiti (16 violaccedilotildees) Costa Rica (12 violaccedilotildees) Barbados (10 violaccedilotildees) e Trindade e Tobago (8 violaccedilotildees) Ressalta-se que Trindade e Tobago permaneceu por apenas 7 anos como signataacute-rio do Pacto Ainda no estudo natildeo foram encontrados casos envolvendo Granada e Jamaica

4 CONCLUSOtildeES

O perfil de violaccedilotildees aos DH mediante a tutelacondenaccedilatildeo concedida pela Corte refere-se aos paiacuteses da Ameacuterica Latina que participam do Pacto de Satildeo Joseacute da Costa Rica com destaque ao Peru como o maior violador seguido por Guatemala e Colocircmbia Os menos violadores foram Costa Rica Barbados e Trindade e Tobago sendo que natildeo responderam a processo na Corte IDH os Estados da Jamaica e Granada

Os DH que sofreram mais violaccedilotildees foram os direitos baacutesicos agrave vida e agrave integridade fiacutesica e agrave liberdade pessoal Os DH natildeo violados foram os de indenizaccedilatildeo de retificaccedilatildeo ou resposta e os menos violados foram os de reuniatildeo de nacionalidade e a liberdade de consciecircncia e de religiatildeo Treze outros DH lista-dos no Pacto foram medianamente violados

Percebeu-se que os direitos fundamentais agrave vida agrave liberdade e agrave integridade fiacutesica natildeo protegidos ou muitas vezes violados diretamente pelo Estado ainda satildeo os mais violados nos casos apresentados agrave Corte IDH Isso reflete que os sistemas nacionais de garantia aos DH ainda se apresentam com muitas falhas para garantir o baacutesico agrave populaccedilatildeo do paiacutes levando as viacutetimas agrave busca da garantia internacional de seus direitos

Todos os paiacuteses analisados praticaram atos violadores do direito agrave integridade pessoal Apenas a Nicaraacutegua natildeo sofreu condenaccedilatildeo por violaccedilatildeo da liberdade pessoal e quatro paiacuteses natildeo foram conde-nados por violaccedilatildeo ao direito agrave vida (Chile Haiti Nicaraacutegua e Panamaacute)

Haacute muito a evoluir na proteccedilatildeo aos direitos fundamentais na Ameacuterica E para outros paiacuteses que natildeo participam do Pacto haacute ainda a necessidade de se admitir o foro internacional como uma possibilidade de defesa de direitos aos seus cidadatildeos

AGRADECIMENTOS

Agradecimentos especiais a Julia Rezin de Medeiros de Souza bolsista de pesquisa do Curso de Direito da Unisul de Tubaratildeo pela contribuiccedilatildeo na coleta de dados das sentenccedilas de meacuterito da Corte Interamericana de Direitos Humanos da OEA

REFEREcircNCIAS

BRASIL Decreto nordm 678 de 6 de novembro de 1992 Promulga a Convenccedilatildeo Americana sobre Direitos Humanos (Pacto de Satildeo Joseacute da Costa Rica) de 22 de novembro de 1969 Disponiacutevel em lthttpwwwplanaltogovbrccivil_03decreto1990-1994anexoand678-92pdfgt Acesso em 31 ago 2017

COMISSAtildeO INTERAMERICANA DE DIREITOS HUMANOS Documentos Baacutesicos Disponiacutevel em lthttpwwwoasorgptcidhmandatoBasicosintroduccionaspgt Acesso em 31ago 2017

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CORTE INTERAMERICANA DE DIREITOS HUMANOS Casos Contenciosos Disponiacutevel em lthttpwwwcorteidhorcrcfJurisprudencia2busqueda_casos_contenciososcfmlang=esgt Acesso em 31 ago 2017a

_______ Supervisatildeo de Cumprimento Disponiacutevel em lthttpwwwcorteidhorcrcfJurisprudencia2busqueda_supervision_cumplimientocfmlang=esgt Acesso em 31 ago2017b

PIOVESAN Flaacutevia Direitos humanos e justiccedila internacional um estudo comparativo dos sistemas regionais europeu interamericano e africano Satildeo Paulo Saraiva 2006

ORGANIZACcedilAtildeO DOS ESTADOS AMERICANOS Tratados Multilaterais Convenccedilatildeo Americana sobre Direitos Humanos Disponiacutevel em lthttpwwwoasorgdilesptratados_B-32_Convencion_Americana_sobre_Derechos_Humanos_firmashtmgt Acesso em 31 ago 2017

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DIREITOS HUMANOS NO IMAGINAacuteRIO ARTIacuteSTICO DE CLARICE LISPECTOR O PAacuteSSARO DA LIBERDADE

HUMAN RIGHTS IN THE ARTISTIC IMAGINARY OF CLARICE LISPECTOR THE BIRD OF FREEDOMMiacuteriam Coutinho de Faria Alves1

Resumo As interfaces entre direito e arte servem de base para pensar o processo de ressignificaccedilatildeo dos direitos humanos2Pretende-se neste texto refletir sobre o imaginaacuterio pictoacuterico como imagem cultural e artiacutestica de direitos humanos inscritos na produccedilatildeo artiacutestica e literaacuteria de Clarice Lispector manifesto notadamente no quadro o paacutessaro da liberdade Esta interlocuccedilatildeo nos leva a pensar os direitos culturais como formas hermenecircuticas da cidadania conscientes das identidades e memoacuterias que permeiam a vida social individual e coletiva

Palavras-chaves Direitos Culturais Imaginaacuterio artiacutestico Clarice Lispector

Abstract Interfaces between rights and arts encourage reflections on the resignification process of cultural rights This study aims to discuss the pictorial imaginary as a cultural and artistic image of human rights inscri-bed in the artistic and literary production of Clarice Lispector particularly reproduced in her painting The bird of freedom With such interlocution we see cultural rights as hermeneutic forms of citizenship that make us aware of the identities and memories that permeate social individual and collective life

Key words Cultural rights Artistic imaginary Clarice Lispector

1 INTRODUCcedilAtildeO

No quadro paacutessaro da liberdade pintado em oacuteleo sobre madeira em 05 de junho de 1975 por Clarice Lispector a figura do paacutessaro azul em um fino traccedilo indica um tema essencial de caraacuteter juriacutedico-cul-tural a liberdade A pintura vista nesse aspecto cria narrativas de direitos humanos a serem intuiacutedas em meio a capacidade hermenecircutica de quem observa o quadro E portanto o proacuteprio acesso a essa atitude reflexiva realiza direito fundamental agrave cultura

A Declaraccedilatildeo Universal dos Direitos Humanos (DUDH) marco histoacuterico proclamado pela Organizaccedilatildeo das Naccedilotildees Unidas (ONU) 3 em 1948 nos propicia ao atingir setenta anos contexto histoacuterico a ser revisi-tado em seus constantes desdobramentos e desafios No recorte deste texto opta-se por uma interlocu-ccedilatildeo entre a arte literatura e direitos culturais observando sempre que a participaccedilatildeo livre agrave vida cultural assim como acesso aos bens culturais estatildeo interligados ao princiacutepio da dignidade humana em toda sua dimensatildeo inserido inclusive nas pautas da agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentaacutevel4

1 Professora Adjunta do Departamento de Direito da Universidade Federal de Sergipe (UFS) Coordenadora do Grupo de Pesquisa Direito

Arte e Literatura (CnpQUFS) Membro honoraacuteria da RDL (Rede brasileira de Direito e Literatura) Email miriamfaria2002yahoocombr

2 Cunha Filho ao tratar do dimensionamento e conceituaccedilatildeo dos direitos culturais a partir da Declaraccedilatildeo Universal dos Direitos Humanos

pontua que ldquo os direitos culturais relacionam-se com a ideia de respeito ao modus vivendi peculiar dos distintos povos destinataacuterios e

signataacuterios da declaraccedilatildeo[ Declaraccedilatildeo Universal de Direitos Humanos] no segundo com atividades especiacuteficas cujos nuacutecleos devem ser

extraiacutedos com variaccedilotildees gramaticais do proacuteprio texto artes ciecircncia e literaturardquo (CUNHA FILHO 2015 p27)

3 Observa-se a inscriccedilatildeo dos direitos culturais notadamente nos artigos 22 e 27 da Declaraccedilatildeo Universal dos Direitos Humanos (DUDH)

Disponiacutevel em lthttpswwwohchrorgENUDHRDocumentsUDHR_Translationsporpdfgt Acesso em 06 jul 2018

4 Cf informaccedilotildees contextuais sobre a Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentaacutevel Disponiacutevel lthttpsnacoesunidasorgtema

agenda2030gt Acesso em 06 jul 2018

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Centrada nesta perspectiva a narrativa literaacuteria e artiacutestica ocasiona possibilidades de pensar a dignida-de humana atraveacutes de linguagens artiacutesticas verbais e natildeo verbais Assim o faz a literatura e os quadros de Clarice Neste aspecto o confronto da tela do paacutessaro azul com o ceacuteu evoca uma postura ecoada de idealismo fazendo inversatildeo da realidade posto que eacute o ceacuteu que poderia ser azul mas Clarice nos traz um paacutessaro azul contracenando com o ceacuteu branco acinzentado Esse gesto imaginativo vem proporcionar no dizer de Nunes (2008 p107)5 a consciecircncia da condiccedilatildeo humana oriunda das percepccedilotildees claricianas em que entre a artista a realidade e o espectadorleitor haacute intensa possibilidade de interaccedilatildeo

Conectar-se com este rico imaginaacuterio eacute estabelecer relaccedilotildees entre a esteacutetica literaacuteria artiacutestica e o Direito numa aproximaccedilatildeo que chamamos de imagens culturais do direitos humanos percebidas a par-tir das condiccedilotildees imaginaacuterias da subjetividade feminina

Observa-se que os originais do texto Aacutegua viva (1973) estatildeo repletos de referecircncias em que a escritora desloca a palavra escrever por pintar de modo que as relaccedilotildees entre pintura e narrativa ficcional vatildeo se entrelaccedilando fazendo com que a atividade da pintura desenvolvida em caraacuteter amador e de forma mais frequente entre os anos 19751976 torne-se conteuacutedo privilegiado de reflexatildeo Nesta obra a personagem central eacute uma pintorandashnarradora que atraveacutes da experiecircncia relacional entre pintura-nar-rativa faz com que Clarice utilize formas diversas de elaborar suas identidades sobre a reduccedilatildeo da palavra em relaccedilatildeo agrave imagem Assim nos coloca diante da reflexatildeo sobre a necessidade da palavra para as percepccedilotildees da identidade lanccedilando o pertinente questionamento ldquonatildeo usar as palavras eacute perder a identidaderdquo (LISPECTOR 1998 p65)

A tela parece dissolver a distacircncia entre escritura e pintura intensificando o nexo entre texto e tela entre a figura e as imagens poeacuteticas nos revelando imagens para-filosoacuteficas e culturais identitaacuterias Ao tratar sobre as imagens poeacuteticas em Clarice Assis Brasil nos indica que o conteuacutedo esteacutetico claricia-no ldquodatildeo-lhe caracteriacutestica inconfundiacutevel e servem no plano da criaccedilatildeo para salientar o significado e a existecircncia de suas criaturas e de seu mundo artiacutesticordquo (ASSIS BRASIL 1969 p 95)

Direito ndash como paacutessaro vigilante sob as esferas da cultura Um misto (literaacuterio e juriacutedico) permeia os discursos filosoacuteficos humanistas que ao somar perspectivas artiacutesticas distintas acolhe a visatildeo dos ldquofios curvosrdquo do direito em contraste com a linearidade normativista visando abraccedilar a multidisciplinarida-de dos direitos humanos e culturais

Seguindo a esteira de Joseacute Calvo Gonzalez na obra Direito Curvo observamos que ldquona teoria juriacutedica os direitos satildeo fraacutegeis como uma teia de aranha nada nos leva a crer que as liberdades e os direitos sejam especialmente hoje triunfos (goals) a salvo de toda fragilidaderdquo (CALVO GONZAacuteLEZ 2013 p15) Essa fragilidade na concretizaccedilatildeo dos direitos humanos e amplitude dos direitos culturais podem ser obser-vadas nas relaccedilotildees entre arte e democracia cuja preservaccedilatildeo e sistema de proteccedilatildeo aos direitos cultu-rais locais vem em construccedilatildeo paulatina desde os anos 6070 do seacuteculo6 XX numa tentativa de discipli-nar e preservar bens culturais materiais e imateriais

2 A JUSLITERATURA CULTURAL HUMANISTA DE CLARICE LISPECTOR

A literatura e pintura de Lispector transforma-se em espaccedilo referencial pois os textos claricianos impli-cam em uma fusatildeo de horizontes que iluminam o imaginaacuterio juriacutedico dos direitos culturais brasileiros ampliando as possibilidades interpretativas sobre a essecircncia cultural dos direitos humanos a liberda-de como interaccedilatildeo dialeacutetica na via esteacutetica dos direitos fundamentais

O caraacuteter esteacutetico da obra de arte instaura no leitor espectador uma atitude reflexiva interdisciplinar em que a busca de sentido traz todo um horizonte de abertura para encontrar muacuteltiplos significados e formas em que a intersubjetividade artiacutestica encontra possibilidades simboacutelicas dialogando com valo-res singulares e universais

5 NUNES Benedito O drama da linguagem Uma leitura de Clarice Lispector Satildeo Paulo Aacutetica 2008

6 CF No plano nacional com o Decreto nordm35512000 trata da institucionalizaccedilatildeo do registro de bens culturais de natureza imaterial

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Para investigar a experiecircncia do ponto de vista esteacutetico analisa-se de iniacutecio a forma que os objetos adquirem e de modo especiacutefico a relaccedilatildeo destes com o mundo Assim a experiecircncia esteacutetica confirma a abertura que a linguagem e a apropriaccedilatildeo de sentido nos possibilita ao passo que nos torna mais aptos para outros niacuteveis de abordagem do conhecimento

A tela proporciona uma dicotomia que incorpora os saberes interiores da artista ao tempo em que ela-bora a dimensatildeo humana de suas vivecircncias Vemos nas formas da pintura uma percepccedilatildeo do movimen-to simbolicamente atreladas ao processo de pensar e viver e guardam em si a unidade criativa entre o pintar e o narrar Mario Quintana (1906-1994) no poema Auto-retrato afirma que ldquono retrato que me faccedilo ndash traccedilo a traccedilo-as vezes me pinto nuvem agraves vezes me pinto aacutervore []rdquo 7considerando a relaccedilatildeo entre a auto percepccedilatildeo e a criaccedilatildeo

Desse modo a rede que tece o sentido das narrativas juriacutedicas e literaacuterias tem na esteacutetica literaacuteria cla-riceana um caminho a ser percorrido trilhado pela memoacuteria coletiva e posta atraveacutes da criatividade singular da escritora A consistecircncia da pintura encontra na liberdade de expressatildeo vias para investigar os processos de tomada de consciecircncia que a literaturaarte propicia ao espectadorleitor

A coerecircncia criativa de Clarice se direciona para a busca de sentido atraveacutes de zonas de intensa sensi-bilidade Talvez o paacutessaro da liberdade sobrevoe o deserto imagem recorrente na literatura de Clarice como na Paixatildeo segundo GH e a Maccedilatilde no escuro Talvez tragam a lembranccedila do ceacuteu claro iluminando os dias quentes do Recife que acendia seus olhos quando menina brincando no quintal da rua Conde de Boa Vista (GOTLIB 1995 p 93)8

Clarice Lispector nos revela ldquoLiberdade eacute o meu uacuteltimo refuacutegio forcei-me agrave liberdade e aguento-a natildeo como um dom mas com heroiacutesmo sou heroicamente livrerdquo (LISPECTOR 1998 p16) Essa subessecircncia da imagem da liberdade feminina desenvolvida em forma geomeacutetrica acompanha a noccedilatildeo de liberdade como algo que se ergue do solo que se liberta e transcende as realidades materiais da vida

Entre o concretoabstrato pensarsentir textoimagem paacutessaro feito de azul faz da liberdade um conte-uacutedo quase oniacuterico Observa-se a ecircnfase na representaccedilatildeo psiacutequica das cores como motivaccedilotildees sensoriais onde ganha relevo o caraacuteter psicossocial da construccedilatildeo criativa Formas e cores expressam visotildees de mun-do e datildeo sentido aos fenocircmenos intersubjetivos Clarice traz percepccedilotildees simultacircneas entre as linhas curvas das asas em situaccedilatildeo de voo lanccedilar-se diante da amplitude brancacinza em que o paacutessaro parecer plainar

Goethe aponta o efeito-sensiacutevel da cor azul a partir da ldquocontradiccedilatildeo entre estiacutemulo-repousordquo (GOETHE 1993 p12)9 Como bem diz a escritora em Aacutegua Viva ldquoE eacute assim certa espeacutecie de pensar-sentir que cha-marei de ldquoliberdaderdquo soacute para lhe dar um nome Liberdade mesmo ndash enquanto ato de percepccedilatildeo ndash natildeo tem formardquo (LISPECTOR 1998 p81)

Assim a plasticidade do azul indica um movimento de distacircncia da realidade como um paacutessaro que se distancia do chatildeo O sentimento em tons de azul assinalam a forma de narrativa pictoacuterica liacuterica erguida por uma percepccedilatildeo interna da liberdade Considerando que a ideia de movimento capacidade de accedilatildeo ir e vir caracteriza parte da cultura juriacutedica este dinamismo apela para os limites entre liberdade e pos-sibilidade Desse modo o sentimento do azul repousa na dimensatildeo psicoloacutegica do idealismo

O azul funciona como nuacutecleo das percepccedilotildees ligadas ao lirismo modos de tensatildeo entre sonho e con-cretude representativos das aspiraccedilotildees humanas Por certo a aproximaccedilatildeo entre sonho e vocirco eacute algo recorrente na literatura clariciana Na obra Perto do Coraccedilatildeo Selvagem ldquosonha Joana antes que o sonho se desvaneccedila e ela esteja de volta a sua vida com Otaacutevio um intelectual mediacuteocre que estaacute escrevendo um livro de direito civilrdquo (MOSER 2009 p184)10

7 GOTLIB Naacutedia Battella Clarice Uma vida que se conta 3 ed Satildeo Paulo Aacutetica 1995

8 Idem

9 GOETHE JW Doutrina das Cores Satildeo Paulo Nova Alexandria 1993

10 MOSER Benjamim Clarice uma biografia Satildeo Paulo Cosac Naif 2009

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A esteacutetica criativa de Clarice interliga sentimentos e movimentos repouso e atividade fazendo com que a imagem de paacutessaro reflita a dimensatildeo sociocultural da liberdade como abertura para potencia-lidades do sentir e pensar os direitos culturais A conformidade das linhas estruturantes da figura do paacutessaro demonstra o ritmo investigativo de busca na percepccedilatildeo ordenativa da dinacircmica do voo

Em carta a sua irmatilde Tania datada de 15 de junho de 1946 quando vivia em Berna a escritora afirma que ldquoquem faz arte sofre como os outros soacute que tem um meio de expressatildeordquo (LISPECTOR 2007 p120) Assim o conceito de liberdade articula Tavares em livro intitulado Do silecircncio agrave liberdade sobre a obra Uma apren-dizagem ou O livro dos prazeres repousa na categoria da ldquoexperienciaccedilatildeordquo (TAVARES 2017 p105)11 Essa perspectiva de criar narrativas dotadas de coerecircncia tematizadas diante da funccedilatildeo mimeacutetica da literatu-ra (OLIVEIRA1999 p7)12 datildeo o fino traccedilo no plano da amplitude criativa de Clarice Uma imagem primaacute-ria que evoca a accedilatildeo do vocirco da procura mergulhado na tela branca da narrativa

A fecunda criatividade inscrita na psique feminina assim se manifesta em Aacutegua viva ldquosatildeo sensaccedilotildees que se transformam em ideias porque tenho que usar palavras [] O pensamento primaacuterio pensa com pala-vras A ldquoliberdaderdquo liberta-se da escravidatildeo da palavrardquo (LISPECTOR 1988 p84)

Esta liberdade centrada no azul-oniacuterico percorre um movimento de ideias sobre as quais se organi-zam a intuiccedilatildeo de arqueacutetipos tambeacutem juriacutedicos sobre a condiccedilatildeo humana O direito necessita de pala-vras mas lida com signos natildeo verbais De modo que a estreita conexatildeo entre o princiacutepio da dignidade humana e notadamente o exerciacutecio dos direitos culturais encontram atraveacutes da arte na identidade e na memoacuteria a interlocuccedilatildeo entre o individual e o coletivo

Dessa forma este movimento de vocirco possiacutevel dentro da esfera anunciada do azul indica um presen-te idealismo que se constitui como unidade entre o ser e o dever-ser (categorias arqueacutetipas da teoria do Direito) Fernando Pessoa (1986 p 275)13 ao tratar do poeta liacuterico afirma que este expressa temas diversos que se predispotildee a uma unidade Ao descrever a gradaccedilatildeo da construccedilatildeo poeacutetica assinala que ldquoo poeta mais intelectual ainda mais imaginativo entra em plena despersonalizaccedilatildeo Natildeo soacute sente mas vive os estados de alma que natildeo tem diretamenterdquo (Ibidem p 275) Assim a existecircncia do paacutessaro aquele que voa longe do concreto e proacuteximo ao imaginaacuterio pode estar marcado pela tentativa deses-perada de fuga por exemplo da violecircncia institucionalizada fato que marcou a realidade geracional da escritora nascida em Tchevhenilk cidade da Ucracircnia na primeira metade do seacuteculo XX

Nas memoacuterias e relatos familiares os impactos provocados tanto pela primeira Grande Guerra como pela Revoluccedilatildeo Russa de 1917 os pogroms constituiram perseguiccedilotildees sistemaacuteticas e massacres de famiacutelias judias fazendo com que a busca pela Ameacuterica fosse um objetivo concreto para sobreviver como o necessaacuterio vocirco do paacutessaro pela liberdade

Nesse contexto de violaccedilatildeo sistemaacutetica e geracional familiar de direitos humanos deriva talvez o silenciamento os aspectos sombrios das narrativas clariceanas algo de misterioso que se apresen-ta em tons densos e quase obscuros ao leitor Satildeo recorrentes as passagens em que a exemplo de O Lustrenos deparamos com a sensaccedilatildeo do nebuloso e fugidio

A sala o ceacuteuas meninas comunicavam-se entre si com distacircncias jaacute marcadas cores e sons fixos

ndash o deslizar de uma cena muitas vezes ensaiada Virgiacutenia compreendia despontada que tudo fora

visto haacute anos Para de novo enxergar o que vira e que agora fugira como para sempre tentava

comeccedilar pelo fim da sensaccedilatildeoabria os olhos bem grandes de surpresa Mas em vatildeoela natildeo

erraria mais e veria apenas a realidaderdquo (LISPECTOR 1999 p 54 1999)

11 TAVARES Renata Do silecircncio a Liberdade uma aprendizagem ou o livro dos prazeres2ed Rio de Janeiro Tempo Brasileiro2017

12 OLIVEIRA Valdevino Soares de Poesia e pintura Um diaacutelogo em trecircs dimensotildees Satildeo Paulo Fundaccedilatildeo Editora UNESP1999

13 Idem

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A personagem central Virginia e seu irmatildeo Daniel quando ainda crianccedilas sentiam queldquoa morte lhes eacute revelada e acerca da qual silenciam vai refletir-se nos jogos sombrios das duas crianccedilasrdquo (NUNES 1989 p24)

Dessa forma o real encontra a partir do imaginaacuterio pictoacuterico inclusive oniacuterico raiacutezes histoacutericas cultu-rais e relacionais como nas interaccedilotildees entre pintura e poesia entre formas de fuga da violecircncia para a liberdade atraveacutes do afeto Clarice exerce no imaginaacuterio de sua obra distintas perspectivas e cenaacuterios que se mesclam seja na pintura ou na narrativa literaacuteria com a ideia de liberdade como forma intensa de sair de uma situaccedilatildeo opressora Algo que impulsiona o ser humano para ir aleacutem do chatildeo tornando-se sujeito consciente da reconstruccedilatildeo afetuosa do proacuteprio espaccedilo

Olga de Saacute em A travessia do oposto ao analisar o romance A cidade sitiada revela que o ldquopaacutessaro que atravessa o espaccedilo eacute gralha espantadardquo (2004 p41)14 aquele que flerta com a realidade e se espanta no espaccedilo dos paradoxos vivenciados pela personagem Lucreacutecia devido agrave raacutepida urbanizaccedilatildeo da cidade Assim a ideia de espanto sobre a violecircncia simboacutelica psicoloacutegica e de fuga crescem no imaginaacuterio clari-ciano sendo fonte permanente de investigaccedilatildeo para o amplo campo dos direitos culturais

A autora escreve em A maccedilatilde no escuro ldquoE natildeo havia sequer como fugir de si porque os outros concreti-zavam com impassiacutevel insistecircncia a proacutepria imagem dessa pessoardquo (LISPECTOR 1999 p38) A leitura criacutetica de Aacutelvaro Lins jaacute apontava que ela ldquoescrevia com um conteuacutedo que veio diretamente da sua natu-reza humanardquo (ASSIS BRASIL 1969 p105)15 De modo que a consciecircncia central de direitos humanos como ideia de liberdade reside no compreender que lhe veem de improviso com a vida

Merleau-Ponty na obra Fenomenologia da percepccedilatildeo16 nos indica que a sensaccedilatildeo se diz na ldquomaneira pela qual sou afetado e a experiecircncia de um estado de mim mesmordquo (MERLAEU-PONTY 2006 p 23)17 Essa articulaccedilatildeo que transcorre da experiecircncia intensa e interna satildeo fontes em que as sensaccedilotildees se desdo-bram de modo a dar a possibilidade de compreensatildeo do mundo em que os direitos culturais e os direitos humanos encontram-se reconfigurados e datildeo origem agraves identidades provisoacuterias que revelam memoacute-rias individuais e coletivas

Aacutegua viva tem citaccedilatildeo inicial do pintor belga Michel Sephour18 (1901-1999) autor de vaacuterios livros sobre arte dentre os quais a Dictionary of Abstract Painting e Abstract Painting 50 Years of Accomplishment isto indica que a escolha da citaccedilatildeo do criacutetico belga natildeo foi arbitraacuteria mas incorporada ao processo criativo de elaboraccedilatildeo instaurando uma tendecircncia singular de lidar e pensar a atividade de escrever

Carlos Mendes de Sousa assinala que a multiplicidade de materiais e processos utilizados nos quadros de Clarice contrastam com a afirmaccedilatildeo de que a escritora desconhecia de teacutecnicas de pintura Para este autor esta forma de criaccedilatildeo poderia se caracterizar como teacutecnica mista pois utiliza-se pincel cola tin-ta esferograacutefica diversidade de traccedilos texturas e cores (SOUSA 2013)

Neste periacuteodo na deacutecada de 70 Clarice Lispector jaacute figurava como uma escritora relevante no cenaacuterio nacional como atesta Assis Brasil (1969 p22) Grande parte de sua obra jaacute havia sido traduzida nos Estados Unidos Europa e demais paiacuteses da Ameacuterica do Sul Aacutegua viva incialmente levava o tiacutetulo ldquoAtraacutes do pensamento Monoacutelogo com a vidardquo logo depois em segunda versatildeo o livro leva o tiacutetulo de ldquoObjeto Gritanterdquo como nos revela Licia Manzo (MANZO1997 p142-43)

14 SAacute Olga de Clarice Lispector a travessia do oposto Satildeo Paulo Annablume 2004

15 ASSIS Brasil Clarice Lispector Ensaio Rio de Janeiro Organizaccedilatildeo Simotildees editora 1969

16 No prefaacutecio da fenomenologia da Percepccedilatildeo Merleau Ponty pontua questotildees ainda por resolver e nos explica que ldquoa fenomenologia

eacute o estudo das essecircncias e todos os problemas segundo ela resumem-se em definir essecircncias a essecircncia da percepccedilatildeo a essecircncia da

consciecircncia por exemplordquo (MERLEAU-PONTY2006 p1)

17 MERLEAU-PONTY Maurice Fenomenologia da Percepccedilatildeo 3 ed Satildeo Paulo Martins Fontes 2006

18 SEUPHORMichel Le Style et le cri Quartoze essais sur lrsquoart de ce siegravecle Paris Editions Du Seuil1965

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Observa-se ainda nesta fase aleacutem da publicaccedilatildeo de Aacutegua viva (1973) A via crucis do corpo (1974) Onde estiveste de noite (1974) e A hora da estrela (1977) que transitam entre sintomaacuteticos temas de (im)possibilidades individuais frente ao mundo em que se vive

Na relaccedilatildeo entre Direito e arte o filoacutesofo espanhol Ortega y Gasset visualiza o direito em termos de uma ldquogeometria do humanordquo a grande teacutecnica exata que potildee uma ordem nas paixotildees sociais do homemrdquo (GASSET 2013 p21)19 Calvo Gonzalez (2013 p18) observa esta ideia atraveacutes de uma geometria vari-aacutevel com a qual pensa o direito curvo aquele que se coloca nas instacircncias hermenecircuticas da cidadania

O desejo eacute percebido como algo que desorganiza por isso se busca o direito como hermenecircutica neces-saacuteria para voltar agrave estrutura da ordem a partir de uma mediaccedilatildeo simboacutelica entre a condiccedilatildeo humana e o sistema ordenativo Assim aduz Flusser (2011 p 71-73)20 que haacute palavras que ldquoexigem um esforccedilo quase extralinguiacutestico para serem pensadas e articuladas e haacute palavras que estatildeo organicamente vin-culadas na estrutura da liacutenguardquocomportam perspectivas variadas de diversidade fluidez alteridade como possibilidades que se cruzam

Clarice temia a desumanizaccedilatildeo Percebe-se que os tradicionais traccedilos caracteriacutesticos dos direitos humanos tais como universalidade e abstratividade encontram-se tematizados na sua narrativa lite-raacuteria e artiacutestica Pode-se dizer que Clarice renascida no nordeste apresenta dimensotildees resgatadas da memoacuteria das sensaccedilotildees da infacircncia em que lendo livros de Machado de Assis Monteiro Lobato no bairro de Boa Vista em Recife (GOTLIB1995) vivencia momentos de consciecircncia das desigualdades sociais Um desses momentos por exemplo fora travado com a amiga Reveca oriunda de famiacutelia de poder aquisitivo maior que o de sua famiacutelia e a faz evidenciar ainda cedo as diferenccedilas materiais e espi-rituais que compotildeem as relaccedilotildees humanas

Assim as imagens psiacutequicas clariceanas adquirem um sentido esteacutetico que recriam o real e a partir desse estado desenvolve tramas compreensivas da condiccedilatildeo humana (SAacute 1993 p131) Por exemplo buscava a liberdade mas a temia ldquoeacute que natildeo sei aonde me levaraacute esta minha liberdade Natildeo eacute arbitraacuteria nem libertina Mas estou soltardquo (LISPECTOR1987 p33)

No ritmo clariciano o (im) pulso da vida na narrativa artiacutestica amplia a percepccedilatildeo de tempo Os tem-pos criativos claricianos se fazem como pulsotildees dentro de instantes intersubjetivos do dizer e sentir o mundo desvendando as fronteiras entre os sentidos da paixatildeo e da vida A linguagem artiacutestica torna-se coisa da linguagem que transmigra para a ideia de liberdade fuga afeto vida sendo a pintura ela mes-ma o acontecimento

Eacute assim que delineamos a importacircncia da forma poeacutetica na pintura como expressatildeo destacada no livro de Valery (2012 p338) ldquoas vezes a forma eacute que faz o conteuacutedordquo A pintura como processo investigativo alimenta outras narrativas como as do Direito estabelecendo-se um tracircnsito herrmenecircutico da tela para a linguagem jaacute pre-vistas no quadro Entatildeo nos cabe pensar sobre a preacute-via existecircncia dos direitos humanos nas telas da cultura na densidade de cada artista

O paacutessaro na tela clariciana como espaccedilo imaginativo descortina segredos Haacute uma integraccedilatildeo do natildeo ndash dizer com a realidade histoacuterica e com as matrizes poeacuteticas entre o acontecer como tela e o existir (na parede) Os direitos humanos entatildeo circulam entre coisa posicionadas de forma liacuterica num a experiecircn-cia ndashsiacutentese que eacute a da tela pronta para atingir o olhar de quem vai exercer a busca de sentidos comple-tando a circulariedade hermenecircutica que inicia na intenccedilatildeo e motivaccedilatildeo do artista em pintar

Del Pino (1972 p 55)21 ao tratar do gecircnero liacuterico comenta acerca dos caracteres do lirismo e conside-ra este niacutevel de sentimento como ldquoelemento espiritualrdquo Assim o aspecto emocional espiritualizado no

19 ORTEGA Y GASSETJoseacute A ideia de Teatro Satildeo Paulo Perspectiva2010

20 FLUSSER Vileacutem A duacutevida Satildeo Paulo Annablume 2011

21 DEL PINO Dino Introduccedilatildeo ao Estudo da Literatura 5 ed Porto Alegre Editora Movimento1972 V1

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contexto clariceano incorpora a imagem ao sentir-pensar em um singular processo de densidade exis-tencial Retomando o pensamento do criacutetico Aacutelvaro Lins este autor assinala que Clarice Lispector ldquoeacute a primeira experiecircncia definida que se faz no Brasil do moderno romance liacuterico do romance que se acha dentro da tradiccedilatildeo de um Joyce ou de uma Virgiacutenia Woolfrdquo (1932 p105)

Seguindo os ensinamentos de Santos22 (2015 p106) haacute distinccedilotildees claras entre espiritualismo e idea-lismo gnosioloacutegico ldquoo primeiro eacute de orientaccedilatildeo metafiacutesica enquanto o segundo eacute de orientaccedilatildeo gno-sioloacutegica que afirma que a verdadeira existecircncia estaacute na consciecircnciardquo Esta consciecircncia que se diz artis-ticamente Observa-se que a pintura de Clarice constitui-se em um modo de reflexatildeo extralinguiacutestica Kandinskypintor russo da vanguarda abstracionista do iniacutecio do seacuteculo passado na obra Do espiri-tual da arte e na pintura em particular que ldquocada arte ao se aprofundar fecha-se e separa-se Mas compara-se agraves outras artes e a identidade de suas tendecircncias profundas as leva de volta agrave unidaderdquo (KANDINSKY 1996 p 59)23

O ato de voar traduz uma fluidez necessaacuteria para o tracircnsito entre relaccedilotildees materiais e espirituais No dicio-naacuterio de siacutembolo de Chevalier e Gheerbrant (1999 p 687)24 observa-se a simbologia dos anjos com asas mensageiros na tradiccedilatildeo cristatilde Na perspectiva chinesa os paacutessaros azuis satildeo fadas Na obra o Lustre a per-sonagem Virgiacutenia demonstra que ldquopara nascer as coisas precisam ter vida pois nascer eacute um movimentoldquo

Assis Brasil (1969 p62) indica que no processo criativo clariceano haacute na formaccedilatildeo das personagens uma tendecircncia da autora a generalizar o personagem e os espaccedilos em que ocorrem o cenaacuterio dos seus romances Assim ao sair para brincar no espaccedilo de fora da casa Virginia personagem de O Lustre (1999) tem a sensaccedilatildeo de que ldquotoda a casa flutuava flutuava em nuvens desligada de Brejo Altordquo (1999 p16)

Por certo a imaginaccedilatildeo geomeacutetrica do voo clariceano pode-se combinar com horizontes de flexibili-dade que permeiam as distancias entre a teoria e a concretude dos direitos humanos Entre as curvas do paacutessaro uma arquitetura teoacuterica possiacutevel de um Direito que se diz curvo a partir da perspectiva de Calvo Gonzalez Assim como Wallace Stevens encontrou inspiraccedilatildeo na obra El viejo guitarrista ciego (1903) de Picasso ao compor o poema The man with the Blue Guitar (1957) Clarice Lispector nesta tela encontra inspiraccedilatildeo no azul como inspiradora da ideia liacuterica de liberdade Os criteacuterios por ela estabe-lecidos transitam pelo difiacutecil artefato do fluxo de consciecircncia mas tambeacutem pelo caraacuteter filoliteraacuterio de sua obra Toda a estrutura do paacutessaro eacute marcada pelo alicerce hermenecircutico de busca assim como o caraacuteter investigativo de sua narrativa que percorre as atividades discursivas para compor a inusitada abertura de horizontes ao leitora

O vocirco clariceano traccedila possibilidades do real na memoacuteria das tradiccedilotildees culturais Por certo a teoria narrativista do direito encontra pontes na jusliteratura brasileira que acolhendo a potencialidade da interpretaccedilatildeo ficcional promove conexotildees enriquecida pela anaacutelise da ldquonarraccedilatildeordquo em contato com a cultura juriacutedica brasileira As narrativas pictoacutericas satildeo direitos culturais fundamentais traduzidos nas formas da pintura agraves cenas da cultura dos direitos humanos

O voo arqueado do paacutessaro azul no extenso ceacuteu claro clama por espaccedilos flexiacuteveis e abertos Portanto encontrar-se com o azul eacute fazer uso da narratividade liacuterica e da intersubjetividade refletindo sobre o caraacuteter eacutetico dos espaccedilos da vida privada e dos modos de ser no imaginaacuterio social e poliacutetico

A literatura clariciana transforma-se em momento hermenecircutico em que os textos implicam em uma fusatildeo de horizontes ampliam as possibilidades descritivas trazem contextos em que os desejos nas-cem e produzem uma reaccedilatildeo agrave ordem exterior

22 SANTOS Maacuterio Ferreira Filosofia e Cosmovisatildeo Satildeo Paulo Editora Eacute realizaccedilotildees 2015

23 KANDINSKY Vassily Do espiritual da arte e na pintura em particular Traduccedilatildeo Alvaro Cabral e Antonio Danesi Satildeo Paulo Martins Fontes

1996 Interessante afirmaccedilatildeo de Kandinsky para quem ldquotoda obra de arte eacute filha de seu tempo muitas vezes matildee de nossos sentimentosrdquo

(1996 p 3) Disponiacutevel em lthttpsauh308fileswordpresscom201303sem-9-kandinskypdfgt Acesso em 15 out 2014

24 CHEVALIER Jean GHEERBRANT Alain et al Dicionaacuterio de siacutembolos13 ed Rio de Janeiro Joseacute Olympio1999

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Dessa forma a rede que tece o sentido das narrativas juriacutedicas e literaacuterias tem na esteacutetica literaacuteria cla-riciana um caminho a ser percorrido trilhado pela memoacuteria coletiva e posta atraveacutes da criatividade sin-gular da escritora A consistecircncia da pintura c encontra na liberdade de expressatildeo vias para investigar os processos de tomada de consciecircncia que a literaturaarte propicia ao espectadorleitor significar direitos de liberdade artiacutestica de expressatildeo

Este azul-poeacutetico encontra-se em tantos outros pintores poetas e escritores como Mallarmeacute (1842-1898) Picasso (1881-1973) Kandinsky (1886-1944) tambeacutem presente na muacutesica brasileira a exem-plo do Trem azul de composiccedilatildeo de Locirc Borges Ronaldo Bastos e Tom Jobim onde ldquoo sol pega o trem azul o sol na cabeccedilardquo artistas que assim como Clarice desafiam a exatidatildeo das coisas brasileiras e nos levam a pensar a arte e a vida presentes patrimocircnio cultural material e imaterial brasileiro

Assim a teoria criacutetica do direito ao reconsiderar as interfaces da linguagem juriacutedica com outros campos do conhecimento investiga o sensiacutevel utiliza a percepccedilatildeo e desvela a essecircncia do sentido filo-poeacutetico do imaginaacuterio dos direitos culturais A substacircncia do azul eacute aquilo que vai aleacutem do proacuteprio azul e que ao mesmo tempo permanece no paacutessaro azul na guitarra ou no trem Este azul que chamamos afetivida-de Azul que revela a complexidade da receptividade ldquoque a recusa da palavra e o silecircncio determinardquo (NUNES 1989 p43)

Azul que compotildeem identidades imaginaacuterias que apresenta noccedilotildees eacuteticas em que o sujeito transfor-ma-se na cultura figurativa da liberdade como direito fundamental agrave dignidade humana aquele que eacute capaz de criar revelando a importacircncia da liberdade no plano da justiccedila

3 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

O quadro paacutessaro da liberdade resgata a intuiccedilatildeo sobre a liberdade atraveacutes da arte A pintura clariciana indica noccedilotildees espirituais e figurativas atraveacutes da qual eacute possiacutevel refletir sobre o caraacuteter eacutetico da liber-dade nas manifestaccedilotildees intersubjetivas dos direitos humanos culturais

Assim a escritoraartista investiga os desejos de liberdade como problema existencial que se incorpo-ra no meacutetodo de trabalho e delineia sua esteacutetica natildeo soacute na narrativa literaacuteria mas em tela persistente que conduz a imagens poeacuteticas e de direitos culturais De forma policontextual pintura e escrita estatildeo interligadas tendo como fundamento a intuiccedilatildeo criativa sobre as relaccedilotildees da vida humana

A percepccedilatildeo dos direitos humanos inscritos na arte aprofunda as possibilidades hermenecircuticas em que partindo da esteacutetica literaacuteria para a imagem potildee em cena paracircmetros figurativos da liberdade de expressatildeo

Neste percurso Clarice pinta o paacutessaro hermenecircutico interligando as funccedilotildees de escrever e pintar pos-tas atraveacutes de um pensamento filo-poeacutetico marcado pela escolha esteacutetica do azul A pintura segue um ritmo que tem em comum o fluxo de sensaccedilotildees das narrativas ficcionais estabelecendo uma larga cone-xatildeo poeacutetica e criativa Paacutessaro azul satildeo traccedilos de liberdade que se articulam como narrativa de direitos humanos processo de transformaccedilatildeo interpessoal Dessa forma Clarice conta a narrativa do vocirco mas deixa em aberto o destino do paacutessaro ao olhar do espectador

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JUNG CG A Energia Psiacutequica 7 ed Petroacutepolis Vozes 1999

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PROJETO DE LEI N 37342012 E SUacuteMULA 605 DO STJ O DIREITO DA CRIANCcedilA E DO ADOLESCENTE ESQUECIDO

DRAFT LAW N 37342012 AND SUMMARY 605 OF THE STJ THE RIGHT OF THE CHILD AND THE FORGOTTEN TEENAGERPatriacutecia Rodrigues de Menezes Castagna1

Resumo Apoacutes valiosas conquistas ao longo das uacuteltimas trecircs deacutecadas no tocante ao Direito da Crianccedila e do Adolescente especialmente com a consagraccedilatildeo da Doutrina da Proteccedilatildeo Integral a partir do arti-go 227 da Constituiccedilatildeo Federal de 1988 e do Estatuto da Crianccedila e do Adolescente (Lei 80691990) observam-se os Poderes Legislativo e Judiciaacuterio em direccedilatildeo oposta seja ao acelerar o tracircmite do Projeto de Lei 37342012 contraacuterio agrave Doutrina da Proteccedilatildeo Integral seja pela necessidade de apro-vaccedilatildeo da Suacutemula 605 pelo Superior Tribunal de Justiccedila o que denota o desrespeito pelas instacircncias inferiores agrave referida doutrina pois precisou elucidar duacutevida ou divergecircncia sobre a aplicabilidade de medida socioeducativa apoacutes a maioridade penal O presente artigo procura analisar se tais medidas satildeo prejudiciais ao desenvolvimento de adolescentes submetidos ao regime prisional bem como se desrespeitam o Direito da Crianccedila e do Adolescente

Palavras-chaves Crianccedila Adolescente Ato infracional Medida socioeducativa Proteccedilatildeo integral Regime prisional

Abstract Following valuable achievements over the last three decades regarding the Law of the Child and Adolescent especially with the consecration of the Doctrine of Integral Protection from article 227 of the Federal Constitution of 1988 and the Statute of the Child and Adolescent (Law 80691990) the Legislative and Judiciary Powers are observed in the opposite direction either by accelerating the process of Bill 37342012 contrary to the Doctrine of Integral Protection or by the need for approval of Precedent 605 by the Superior Court of Which denounces the disrespect for bodies inferior to the aforementioned doctrine since it was necessary to elucidate doubt or divergence on the applicability of socio-educational measure after the criminal majority This article examines whether such measures are detrimental to the development of adoles-cents submitted to the prison system as well as disrespecting the Law of Children and Adolescents

Keywords Child Teenager Infraction act Socio-educational measure Integral protection Prison system

1 INTRODUCcedilAtildeO

Quando o assunto eacute crianccedila e adolescente a Doutrina da Proteccedilatildeo Integral e o Estatuto da Crianccedila e do Adolescente despontam e balizam toda e qualquer defesa em favor dessas pessoas especiais pela sua proacutepria condiccedilatildeo de vida em pleno desenvolvimento

Decorre da almejada proteccedilatildeo integral dentre tantas accedilotildees positivas a aplicaccedilatildeo de medidas socioe-ducativas de caraacuteter pedagoacutegico e com a finalidade de reinserir o adolescente praticante do suposto ato infracional em seu ambiente familiar e social

1 Graduada em Direito pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) Poacutes-Graduada em Direito Tributaacuterio pela Universidade Federal

de Santa Catarina e Direito Processual Civil pela Universidade Anhanguera-UNIDERPLFG Advogada inscrita na OABSC n 14752

Atua principalmente nas aacutereas de Direito Civil Direito do Trabalho Direito Processual Civil Direito Tributaacuterio e Direito do Consumidor

Professora das cadeiras de Execuccedilatildeo Civil Relaccedilotildees de Consumo Processo do Trabalho e Teoria do Direito na Universidade do Sul de Santa

Catarina (UNISUL) Tambeacutem jaacute atuou como professora da cadeira de Direito Civil na Universidade do Vale do Itajaiacute (UNIVALI)

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O que se observa no entanto eacute que os Poderes Legislativo e Judiciaacuterio brasileiros parecem caminhar recentemente na contramatildeo da histoacuteria solicitando urgecircncia no tracircmite do Projeto de Lei 37342012 contraacuterio agrave Doutrina da Proteccedilatildeo Integral tatildeo especialmente conquistada ao logo de deacutecadas e con-solidada por nosso ordenamento juriacutedico bem como a Suacutemula 605 criada pelo Superior Tribunal de Justiccedila deixando evidente que a necessidade da sua aprovaccedilatildeo pela Corte Superior em 19032018 denota desrespeito pelas instacircncias inferiores agrave referida doutrina pois precisou elucidar duacutevida ou divergecircncia sobre a aplicabilidade de medida socioeducativa apoacutes a maioridade penal

Pretende-se pois verificar ateacute que ponto referidas medidas satildeo prejudiciais ao desenvolvimento de adolescentes submetidos ao regime prisional bem como o efetivo respeito ao Direito da Crianccedila e do Adolescente que diante da necessidade de criaccedilatildeo de suacutemulas e projetos de lei parece ter-se tornado um direito esquecido

2 DOUTRINA DA PROTECcedilAtildeO INTEGRAL E ESTATUTO DA CRIANCcedilA E DO ADOLESCENTE

A Doutrina da Proteccedilatildeo Integral consagrada no artigo 227 da Constituiccedilatildeo Federal de 1988 e no Estatuto da Crianccedila e do Adolescente (Lei n 80691990) firmou-se no Brasil enquanto fruto da Declaraccedilatildeo Universal dos Direitos da Crianccedila de 1959 criada pela ONU em substituiccedilatildeo agrave Doutrina da Situaccedilatildeo Irregular consolidada no paiacutes por meio do Coacutedigo de Menores (Lei n 66971979)

A Convenccedilatildeo Internacional dos Direitos da Crianccedila e do Adolescente aprovada de forma unacircnime pela Assembleia das Naccedilotildees Unidas em 1989 - portanto entre a Constituiccedilatildeo e o Estatuto - no mesmo senti-do foi fundamental para a consagraccedilatildeo da Doutrina da Proteccedilatildeo Integral pois segundo Veronese ldquotem natureza coercitiva e exige de cada Estado-Parte que a subscreve e ratifica um determinado posiciona-mento Como conjunto de deveres e obrigaccedilotildees aos que a ela formalmente aderiram a Convenccedilatildeo tem forccedila de lei internacional e assim cada Estado natildeo poderaacute violar seus preceitos como tambeacutem deveraacute tomar medidas positivas para promovecirc-los2rdquo

Como resultado portanto dessas importantes alteraccedilotildees em nosso ordenamento juriacutedico consoli-dou-se a Doutrina da Proteccedilatildeo Integral constituindo um verdadeiro divisor de aacuteguas pois as crianccedilas e adolescentes deixaram de ser analisados como uma ldquopatologia socialrdquo ndash sistema menorista ndash para serem observados na condiccedilatildeo de ldquosujeitos de direitosrdquo conforme pensamento de Sanches e Veronese ldquoa nova postura exigida pela Doutrina da Proteccedilatildeo Integral atribui a todas as crianccedilas e adolescentes indistintamente e em qualquer situaccedilatildeo juriacutedica a condiccedilatildeo de sujeitos de direitos sendo-lhes garan-tidos todos aqueles necessaacuterios ao seu pleno desenvolvimento ainda que cometa um ato infracional3rdquo

Nesse sentido com a finalidade de criar ldquoum novo modelo social que priorize o desenvolvimento sadio de nossas crianccedilas e adolescentesrdquo a Doutrina da Proteccedilatildeo Integral enseja ldquonovas praacuteticas accedilotildees con-cretas que incidam nas questotildees do cotidiano com a promoccedilatildeo de uma cidadania para as nossas crian-ccedilas e adolescentes de forma responsaacutevel e sobretudo respeitosa com sua condiccedilatildeo de pessoas em processo de desenvolvimentordquo4

2 VERONESE Josiane Rose Petry O Estatuto da Crianccedila e do Adolescente um novo paradigma In VERONESE Josiane Rose Petry

ROSSATO Luciano Alves e LEacutePORE Paulo Eduardo Estatuto da Crianccedila e do Adolescente 25 anos de desafios e conquistas Satildeo Paulo

Saraiva 2015 p 21-40

3 SANCHES Helen Crystine Correcirca VERONESE Josiane Rose Petry A proteccedilatildeo integral e o direito fundamental de crianccedilas e

adolescentes agrave convivecircncia familiar In VERONESE Josiane Rose Petry et al Direito da Crianccedila e do Adolescente novo curso ndash novos

temas Rio de Janeiro Lumen Juris 2017 p 131-183

4 VERONESE Josiane Rose Petry O Estatuto da Crianccedila e do Adolescente um novo paradigma Op Cit p 36-37

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3 MEDIDA SOCIOEDUCATIVA E PENA

Ressalta-se inicialmente que imputar significa atribuir a algueacutem a responsabilidade por um ato sujei-tando a pessoa suscetiacutevel agrave aplicabilidade das normas e sanccedilotildees previstas no Coacutedigo Penal

Nas palavras de Delmanto rdquoA imputabilidade eacute a capacidade de a pessoa entender que o fato eacute iliacutecito e de agir de acordo com esse entendimento5rdquo

Nos termos do artigo 27 do Coacutedigo Penal ldquoos menores de 18 (dezoito) anos satildeo penalmente inimputaacute-veis ficando sujeitos agraves normas estabelecidas na legislaccedilatildeo especial6rdquo

A Constituiccedilatildeo Federal de 1988 no mesmo sentido confirmou a maioridade penal aos 18 anos ao esta-belecer que ldquoArt 228 Satildeo penalmente inimputaacuteveis os menores de dezoito anos sujeitos agraves normas da legislaccedilatildeo especial7rdquo Destaque-se que por se tratar de claacuteusula peacutetrea tal dispositivo somente poderia ser alterado por uma nova Assembleia Nacional Constituinte

Desse modo desde 1990 a legislaccedilatildeo especial que responsabiliza os adolescentes ndash pessoas de 12 a 18 anos de idade ndash por seus atos eacute o Estatuto da Crianccedila e do Adolescente

No lugar de penas o Estatuto ldquoprevecirc medidas socioeducativas que satildeo dispostas em grau de severida-de no seu art 112 dependendo para a aplicaccedilatildeo de cada medida de algumas questotildees fundamentais que satildeo a capacidade do adolescente em cumprir determinada medida as circunstacircncias que sucedeu o suposto ato infracional e a gravidade deste uacuteltimo8rdquo segundo Veronese

Dentre as medidas socioeducativas previstas no art 112 do Estatuto tem-se advertecircncia obrigaccedilatildeo de reparar o dano prestaccedilatildeo de serviccedilos agrave comunidade liberdade assistida inserccedilatildeo em regime de semiliberdade internaccedilatildeo em estabelecimento educacional aleacutem daquelas previstas no art 101 I a IV do mesmo diploma legal

O que se observa portanto eacute que a legislaccedilatildeo especial a que fazem alusatildeo a Constituiccedilatildeo Federal e o Coacutedigo Penal natildeo tem a pretensatildeo de penalizar o adolescente ateacute porque a sua inimputabilidade natildeo lhe permite entender de forma completa a suposta ilicitude de sua conduta mas antes fortalecer os seus viacuten-culos familiares e comunitaacuterios por meio do caraacuteter pedagoacutegico das medidas socioeducativas pois certa-mente foi a fragilidade ou deterioraccedilatildeo dessas relaccedilotildees que o levou a descumprir preceito legal

Esclareccedila-se todavia que ldquonatildeo penalizarrdquo no sentido estrito previsto no Coacutedigo Penal natildeo signi-fica ldquonatildeo responsabilizarrdquo o adolescente pois como ressalta Veronese9 o Estatuto da Crianccedila e do Adolescente natildeo contempla apenas direitos como muitos defendem mas obriga e responsabiliza con-dutas contraacuterias ao ordenamento juriacutedico por meio das medidas socioeducativas tal como a Lei do SINASE (125942012) que em seu artigo 1ordm sect 2ordm III estabelece que referidas medidas tecircm entre seus objetivos a ldquodesaprovaccedilatildeo da conduta infracionalrdquo

5 DELMANTO Celso Delmanto et al Coacutedigo Penal Comentado 5ed Rio de Janeiro Renovar 2000 p 50

6BRASIL Decreto-lei 28481940 Disponiacutevel em lthttpwwwplanaltogovbrccivil_03decreto-leiDel2848compiladohtmgt Acesso

em 18 abr 2018

7 BRASIL Constituiccedilatildeo Federal de 1988 Disponiacutevel em lthttpwwwplanaltogovbrccivil_03constituicao constituicaohtmgt Acesso

em 18 abr 2018

8 VERONESE Josiane Rose Petry Responsabilizaccedilatildeo estatutaacuteria ou responsabilizaccedilatildeo socioeducativa (sociopedagoacutegica) fundamentos

In VERONESE Josiane Rose Petry ROSSATO Luciano Alves e LEacutePORE Paulo Eduardo Estatuto da Crianccedila e do Adolescente 25 anos de

desafios e conquistas Satildeo Paulo Saraiva 2015 p 91-113

9 VERONESE Josiane Rose Petry Direito penal juvenil e responsabilizaccedilatildeo estatutaacuteria elementos aproximativos eou

distanciadores o que diz a Lei Sinase a inimputabilidade penal em debate Rio de Janeiro Lumen Juris 2015 p 267

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4 PROJETO DE LEI N 37342012 E SISTEMA UacuteNICO DE SEGURANCcedilA PUacuteBLICA ndash SUSP

Embora a Doutrina da Proteccedilatildeo Integral e o Estatuto da Crianccedila e do Adolescente deixem evidente que eacute diferenciado o tratamento destinado aos adolescentes caso cometam ato infracional segundo seus objetivos e finalidade em 23042012 o Poder Executivo apresentou o Projeto de Lei n 3734 que dis-ciplina em especial a organizaccedilatildeo e o funcionamento dos oacutergatildeos responsaacuteveis pela seguranccedila puacuteblica nos termos do sect 7deg do art 144 da Constituiccedilatildeo Federal cria a Poliacutetica Nacional de Seguranccedila Puacuteblica e Defesa Social (PNSPDS) e institui o Sistema Uacutenico de Seguranccedila Puacuteblica (Susp)

Referido projeto de lei pautado com urgecircncia para votaccedilatildeo na Cacircmara dos Deputados no uacuteltimo dia 11042018 teve sua redaccedilatildeo final aprovada no mesmo dia e encaminhada ao Senado Federal no dia 1204201810

Tal redaccedilatildeo prevecirc a inclusatildeo dos agentes e oacutergatildeos do sistema socioeducativo no Sistema Uacutenico de Seguranccedila Puacuteblica (Susp) quando estabelece em seu art 9ordm sect 2ordm IX que ldquosatildeo integrantes operacio-nais do Susp I ndash poliacutecia federal II o poliacutecia rodoviaacuteria federal III ndash poliacutecias civis V poliacutecias militares VI ndash corpos de bombeiros militares VII ndash guardas municipais VIII ndash oacutergatildeos do sistema penitenciaacuterio IX ndash oacutergatildeos do sistema socioeducativo []11rdquo (grifo nosso)

A aprovaccedilatildeo da redaccedilatildeo do Projeto de Lei n 37342012 que possivelmente seraacute aprovado tambeacutem no Senado Federal importa em verdadeiro retrocesso do ponto de vista do Direito da Crianccedila e do Adolescente pois contraria natildeo apenas a Doutrina da Proteccedilatildeo Integral mas os princiacutepios e regras gerais sobre a poliacutetica de atendimento socioeducativo que se destinam a adolescentes autores de atos contraacuterios agrave lei penal e encontram-se previstos no Estatuto da Crianccedila e Adolescente (Lei 806990) e Lei do SINASE (Lei 125942012)

Tal projeto caso se torne lei vincularaacute o sistema de atendimento socioeducativo ao sistema prisional fican-do ambos submetidos aos mesmos princiacutepios diretrizes e objetivos da PNDPDS (Poliacutetica Nacional de Seguranccedila Puacuteblica e Defesa Social) e dessa forma contaminando o sistema socioeducativo com a cultura prisional e policial bem como desvirtuando-o dos princiacutepios que devem reger a accedilatildeo socioeducativa destina-da aos adolescentes fortalecer os seus viacutenculos familiares e comunitaacuterios por meio do caraacuteter pedagoacutegico

O que parece na realidade eacute que busca o Poder Legislativo criar norma que iguale ou aproxime o tra-tamento que eacute dado no sistema prisional aos adolescentes ou seja pretende diminuir a maioridade penal por via transversa jaacute que ateacute o momento natildeo obteve ecircxito na aprovaccedilatildeo da Proposta de Emenda agrave Constituiccedilatildeo (PEC) n 33201212 dentre tantas outras em tracircmite (PECs nordms 74 de 2011 33 de 2012 21 de 2013 e 115 de 2015) que estabelece a reduccedilatildeo da maioridade penal de 18 para 16 anos

Caso o Projeto de Lei n 37342012 seja aprovado e torne-se lei o prejuiacutezo social psicoloacutegico e para a vida adulta dos adolescentes que seratildeo submetidos aos mesmos princiacutepios diretrizes e objetivos da PNDPDS que muito se aproximaraacute do sistema prisional seraacute imensuraacutevel A probabilidade de no futu-ro cometerem novo iliacutecito seraacute muito significativa

A expectativa nesse sentido eacute que referido projeto de lei natildeo seja aprovado pelo Senado Federal ao menos no ponto em que iguala oacutergatildeos do sistema socioeducativo agraves poliacutecias federal rodoviaacuteria federal civis militares guardas municipais e oacutergatildeos do sistema penitenciaacuterio13

10 BRASIL Cacircmara dos Deputados Disponiacutevel em lthttpwwwcamaragovbrproposicoesWeb

fichadetramitacaoidProposicao=542102gtAcesso em 18 abr2018

11BRASIL Cacircmara dos Deputados Disponiacutevel em lthttpwwwcamaragovbr

proposicoesWebprop_ mostrarintegrajsessionid=59B76FB155270327E943E98F65FF1936

proposicoesWebExterno1codteor=1651617ampfilename=Tramitacao-PL+37342012gt Acesso em 18 abr 2018

12 BRASIL SENADO FEDERAL Disponiacutevel em lthttpswww25senadolegbrwebatividadematerias-materia106330gt Acesso

em 18 abr 2018

13 BRASIL Pesquisa sobre opiniatildeo dos cidadatildeos a respeito da aprovaccedilatildeo ou natildeo da PL 37342012 lthttpwwwcamaragovbr

proposicoesWebfichadetramitacaoidProposicao=542102gt Acesso em 19 abr2018

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5 SUacuteMULA 605 DO STJ E APURACcedilAtildeO DE ATO INFRACIONAL

Paralela agrave tramitaccedilatildeo do Projeto de Lei n 37342012 a Terceira Seccedilatildeo do Superior Tribunal de Justiccedila (STJ) aprovou no dia 14032018 a Suacutemula n 605 segundo a qual ldquoA superveniecircncia da maioridade penal natildeo interfere na apuraccedilatildeo de ato infracional nem na aplicabilidade de medida socioeducativa em curso inclusive na liberdade assistida enquanto natildeo atingida a idade de 21 anosrdquo

Embora pareccedila positivo que o Superior Tribunal de Justiccedila tenha sumulado a questatildeo relativa agrave possibi-lidade de o adolescente continuar a submeter-se agrave medida socioeducativa mesmo apoacutes atingir a maio-ridade penal salta aos olhos a necessidade de a Corte Superior necessitar colocar uma paacute de cal sobre assunto pois demonstra que efetivamente dos mais longiacutenquos municiacutepios agraves grandes metroacutepoles haacute divergecircncia e ateacute mesmo desprezo quanto agrave aplicabilidade dos princiacutepios basilares da proteccedilatildeo inte-gral e melhor interesse do Direito da Crianccedila e do Adolescente

Natildeo bastasse a forte presenccedila da Doutrina da Proteccedilatildeo Integral fundamentada na Constituiccedilatildeo Federal e no Estatuto da Crianccedila e do Adolescente o proacuteprio Estatuto admite em seu artigo 121 sect 5ordm a possibili-dade de extensatildeo da medida socioeducativa ateacute os 21 anos de idade Natildeo haveria portanto que suscitar qualquer duacutevida a respeito do assunto sendo inclusive desnecessaacuteria a criaccedilatildeo da Suacutemula 605

Mais uma vez portanto o que se observa eacute a tentativa de oacutergatildeos puacuteblicos como o Ministeacuterio Puacuteblico e Poder Judiciaacuterio exigirem e permitirem que o adolescente passe a cumprir pena no sistema prisional tatildeo logo atinja a maioridade penal sem levar ldquoem consideraccedilatildeo a continuidade da medida socioeduca-tiva que tem o fim de educar e ressocializar o menor14rdquo segundo a Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiccedila Do contraacuterio ter-se-ia uma verdadeira trageacutedia pois aquele adolescente jaacute submetido agrave medida socioeducativa seria deslocado para um estabelecimento penitenciaacuterio onde teria contato com adultos que cumprem as mais variadas penas dificultando sobremaneira a sua ressocializaccedilatildeo Formar-se-ia sem sombra de duacutevida um ldquocriminosordquo para retornar agrave sociedade

Nesse sentido se ldquoo Estatuto compreende que a melhor forma de intervir nesse adolescente em confli-to com a lei ao desaprovar a conduta infracional (v Art 1ordm III da Lei do Sinase) eacute incidir positivamente na sua formaccedilatildeo servindo-se para tanto do processo pedagoacutegico como um mecanismo efetivo que possibilite o conviacutevio cidadatildeo desse adolescente autor de ato infracional em sua comunidade []15rdquo educando-o para a vida social seria totalmente descabido e prejudicial retiraacute-lo desse sistema porque completou 18 anos e introduzi-lo no sistema penal

Como destaca Josiane Rose Petry Veronese16

As medidas [do Estatuto] aleacutem de serem sociais o satildeo tambeacutem lsquoeducativasrsquo A educaccedilatildeo como

uma estrateacutegia de intervenccedilatildeo sobre o adolescente autor de ato infracional Observe-se que natildeo

nos referimos a lsquotratamentorsquo mas sim em lsquointervenccedilatildeorsquo como um procedimento que se aplicado

dentro das matrizes do Estatuto eacute capaz de possibilitar uma efetiva inserccedilatildeo desse adolescente

na sociedade Talvez ateacute fosse mais adequado falarmos que esse adolescente se sentisse parte

configurando aiacute a ideia de pertencimento

Com efeito o deslocamento do adolescente submetido agrave medida socioeducativa para o estabelecimento prisional por ter atingido a maioridade sem a menor duacutevida ceifaria-lhe de forma consideraacutevel a possi-bilidade de reinserccedilatildeo em sua comunidade situaccedilatildeo que importa em evidente desrespeito agrave Doutrina da Proteccedilatildeo Integral presente na Constituiccedilatildeo Federal e no Estatuto da Crianccedila e do Adolescente

14 STJ ndash HC 319987SP Rel Min Antonio Saldanha Palheiro Sexta Turma DJs 03052016

15 VERONESE Josiane Rose Petry Responsabilizaccedilatildeo estatutaacuteria ou responsabilizaccedilatildeo socioeducativa (sociopedagoacutegica) fundamentos

In VERONESE Josiane Rose Petry ROSSATO Luciano Alves e LEacutePORE Paulo Eduardo Estatuto da Crianccedila e do Adolescente 25 anos de

desafios e conquistas Satildeo Paulo Saraiva 2015 p 91-113

16 Idem p 268

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6 O DIREITO DA CRIANCcedilA E DO ADOLESCENTE ESQUECIDO

A partir da reflexatildeo acima constata-se que em variadas situaccedilotildees o Direito da Crianccedila e do Adolescente eacute simplesmente esquecido ou ateacute mesmo ignorado Legisladores criam leis juiacutezes decidem e promo-tores de justiccedila requerem a sujeiccedilatildeo de adolescentes ao cumprimento de penas apoacutes completarem 18 anos em total desacordo com os preceitos e princiacutepios presentes na Constituiccedilatildeo Federal e no Estatuto da Crianccedila e do Adolescente

A supremacia do Direito Penal e do Sistema de Seguranccedila Puacuteblica eacute flagrante pois utilizados forccedilada-mente contra pessoas ainda em fase de desenvolvimento que sequer atingiram a maioridade penal mas que por sua condiccedilatildeo especial de crianccedila e adolescente abandonado ou violentado deve ser penalizado duas vezes pela violecircncia que jaacute sofreu em casa ndash se tiver moradia ndash e que o levou a cometer o ato infracio-nal e a possiacutevel penalizaccedilatildeo que sofreraacute no sistema prisional seja pela poliacutetica de seguranccedila ldquogeralrdquo que se pretende criar por meio do PL 37342012 seja pela divergecircncia que antecedeu a Suacutemula 605 do STJ

Sendo assim eacute evidente que o Direito da Crianccedila e do Adolescente pode ser considerado um direi-to esquecido pois em situaccedilotildees que envolvem atos infracionais praticados por adolescentes a prote-ccedilatildeo integral melhor interesse e todo o arcabouccedilo de proteccedilatildeo a essas pessoas hipervulneraacuteveis satildeo completamente abandonados mantendo-se ainda como se constata acima o pensamento baseado no Direito Penal

7 CONCLUSAtildeO

As finalidades da medida socioeducativa e da pena satildeo completamente distintas Enquanto a primeira procura recolocar o adolescente em seu ambiente social e tem caraacuteter eminentemente pedagoacutegico a segunda tem o sentido de prevenccedilatildeo contra ocorrecircncia de crimes e de retribuiccedilatildeo caso eles efetiva-mente ocorram praticada contra maiores de 18 anos

No mecircs de abril de 2018 contudo o que se observou no paiacutes por nosso Legislativo e Judiciaacuterio satildeo condutas que igualam estas duas formas tatildeo diversas de resposta do Estado pela praacutetica de ato iliacutecito a partir da urgecircncia no tracircmite do Projeto de Lei 34372012 e da criaccedilatildeo da Suacutemula 605 no STJ

Ambos intentam forccedilar adolescentes portanto menores de 18 anos a submeterem-se ao regime pri-sional o qual eacute sabido se trata de uma ldquofaacutebrica do crimerdquo

O que se observa pois eacute que a Doutrina da Proteccedilatildeo Integral e Estatuto da Crianccedila e do Adolescente fazem parte de um direito que na maior parte das vezes eacute esquecido abandonado especialmente quan-do o legislador membro do Ministeacuterio Puacuteblico e magistrado deparam-se com o ato infracional pratica-do por adolescente Um venda em seus olhos parece turvar a realidade de que existe um regime juriacutedico proacuteprio a que estas pessoas ainda em desenvolvimento estatildeo submetidas

A expectativa portanto eacute que os agentes puacuteblicos operem numa perspectiva social e humanitaacuteria direcionada a esses adolescentes praticantes de ato infracional que seja foco de suas preocupaccedilotildees o ambiente de pobreza e violecircncia em que vivem essas pessoas e que por meio de medidas efetivamente socioeducativas ndash e natildeo penas ndash possam transformar a realidade de cada um tornando-se seres huma-nos capazes de viver uma vida digna e responsaacutevel algo que lhes foi negado desde o nascimento no acircmbito familiar e social

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AS FACETAS DO NEOLIBERALISMO E SUAS CONSEQUEcircNCIAS NA SOCIOEDUCACcedilAtildeO DE ADOLESCENTES EM CONFLITO COM A LEI NO SUDESTE BRASILEIRO

THE FACETS OF NEOLIBERALISM AND CONSEQUENCES ON THE SOCIOEDUCATION OF ADOLESCENTS IN CONFLICT WITH THE LAW IN SOUTHEASTERN BRAZILTatiana Emmerich1

Resumo Natildeo eacute de hoje que a sociedade brasileira enfrenta problemas sociais graves advindos do susten-taacuteculo das desigualdades sociais que resultam na manutenccedilatildeo de classes excluindo determinados gru-pos do acesso digno a direitos e garantias fundamentais assegurados pela Constituiccedilatildeo de 1988 como por exemplo a educaccedilatildeo Desta maneira o tema escolhido tem como propoacutesito verificar se as medidas socioeducativas postas pelo Estado possuem ou natildeo resquiacutecios de puniccedilatildeo geradas pelo poder simboacuteli-co Estatal e principalmente as consequecircncias do neoliberalismo na socioeducaccedilatildeo de adolescentes em conflito com a Lei a partir de uma metodologia que usou a pesquisa bibliograacutefica como referecircncia Os resultados encontrados foram de que a ressocializaccedilatildeo estaacute longe de ser alcanccedilada visto que a maio-ria das unidades de internaccedilatildeo sofrem pela superlotaccedilatildeo e consequentemente a falta de professores e outros profissionais que possam suprir a necessidade dentro centros socioeducativos na regiatildeo sudeste

Palavras- chaves Neoliberalismo Socioeducaccedilatildeo Jovens em conflito com a lei Internaccedilatildeo Sudeste

Abstract It is not today that Brazilian society faces serious social problems arising from the support of social inequalities which result in the maintenance of classes excluding certain groups of decent access to rights and fundamental guarantees guaranteed by the Constitution of 1988 for example education In this way the chosen theme has as a purpose to verify if the socio-educational measures put in place by the State have or do not have remnants of punishment generated by the State symbolic power and mainly the consequences of neoliberalism in the socioeducation of adolescents in conflict with the Law from a methodology that used the bibliographic research as reference The results found that resocialization is far from being achieved since most hospitalization units suffer from overcrowding and consequently the lack of teachers and other profes-sionals who can supply the need in socio-educational centers in the southeast region

Keyword Neoliberalism Socioeducation Young people in conflict with the law Hospitalization Southeast

1 Bacharel em Direito pela Universidade Candido Mendes Advogada Professora Universitaacuteria Poacutes Graduaccedilatildeo Estaacutecio e UNISUAM Poacutes

- Graduada em Direito Penal Econocircmico e Europeu pelo Instituto de Direito Penal Econocircmico e Europeu IDPEE da Faculdade de Direito

da Universidade de Coimbra em parceria com o Instituto Brasileiro de Ciecircncias Criminais IBCCRIM Mestre pela Universidade Federal do

Rio de Janeiro pelo Programa de Poacutes Graduaccedilatildeo em Poliacuteticas Puacuteblicas em Direitos Humanos (UFRJ PPDH) Pesquisadora do Grupo de

Pesquisas Matrizes Autoritaacuterias do Processo Penal Brasileiro A Prova Penal e o Sistema de Controles Epistecircmicos (Faculdade Nacional

de Direito - LADIHUFRJ) Lattes lthttplattescnpqbr0353875902696380gt

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1 INTRODUCcedilAtildeO

Natildeo eacute de hoje que a sociedade brasileira enfrenta problemas sociais graves advindos dos sustentaacuteculos das desigualdades sociais podendo citar as altas taxas de desemprego violecircncia urbana e simboacutelica que resultam na manutenccedilatildeo de classes excluindo determinados grupos do acesso digno a direitos e garan-tias fundamentais assegurados pela Constituiccedilatildeo de 1988 como por exemplo a educaccedilatildeo Isto impede a instauraccedilatildeo de uma sociedade mais igualitaacuteria consequecircncia cruel da adoccedilatildeo de ideologias neoliberais

A crescente violecircncia se tornou caracteriacutestica cotidiana dos estados brasileiros principalmente na regiatildeo sudeste que possui as maiores megaloacutepoles e assim um dos maiores iacutendices de violecircncia urbana do paiacutes Poreacutem deve-se ressaltar que a violecircncia no Brasil soacute se torna um problema a ser resolvido quando a viacutetima eacute detentora de algum tipo de poder este podendo ser poliacutetico financeiro ou social

Por vezes a miacutedia ldquoesconderdquo da sociedade os altos iacutendices de homiciacutedios tendo como viacutetimas meninos pobres negros e moradores de aacutereas perifeacutericas consequecircncias negativas da manutenccedilatildeo do poder simboacutelico e do estado de anomia em que vive a sociedade brasileira frente a problemas sociais

Desta maneira o tema escolhido para este artigo As facetas do neoliberalismo e suas consequecircncias na socioeducaccedilatildeo de adolescentes em conflito com a lei no sudeste brasileiro (SOUZA 2018) que tem como propoacutesito verificar se as medidas socioeducativas postas pelo Estado possuem ou natildeo resquiacutecios de puniccedilatildeo geradas pelo poder simboacutelico Estatal e principalmente as consequecircncias do neoliberalis-mo na socioeducaccedilatildeo de adolescentes em conflito com a Lei

A partir de dados que foram fornecidos pelo Panorama Nacional a Execuccedilatildeo de Medidas Socioeducativas de Internaccedilatildeo realizado pelo Conselho Nacional de Justiccedila no ano de 2012 seraacute feita uma anaacutelise sobre a situaccedilatildeo educacional dos adolescentes que cumprem medida socioeducativa de privaccedilatildeo de liberdade

No Sudeste especificamente no Rio de Janeiro as medidas socioeducativas de internaccedilatildeo satildeo cumpri-das dentro do Novo Degase unidades de cumprimento de medidas socioeducativas principalmente as privativas de liberdade como por exemplo a Unidade Santo Expedito (ESSE) esta responsaacutevel pela internaccedilatildeo de meninos entre 15 a 17 anos de idade

Esses centros em tese objetivam uma educaccedilatildeo social com reeducaccedilatildeo ressocializaccedilatildeo e deveriam proporcionar aos adolescentes educaccedilatildeo abrangente com atividades capazes de oportunizar qualifi-caccedilatildeo profissional de modo geral

Poreacutem o que se vecirc natildeo chega nem perto de ressocializaccedilatildeo visto que a maioria das unidades de inter-naccedilatildeo sofrem pela superlotaccedilatildeo consequentemente a falta de professores e outros profissionais que possam suprir esse deacuteficit A falta de investimento financeiro eacute a principal marca do descaso pelas autoridades estatais de implementar poliacuteticas puacuteblicas capazes de fornecer uma reeducaccedilatildeo eficaz

Isto ocorre em funccedilatildeo de adotarmos um modelo neoliberal onde se sustenta a manutenccedilatildeo de classes e que no setor educacional age de modo a priorizar a formaccedilatildeo menos abrangente e mais profissiona-lizante diretamente aliada a um falso jogo de marketing estatal que ldquofornecerdquo mais vagas nos siste-mas de matriacuteculas escolares do que possuem maquiando a situaccedilatildeo precaacuteria do sistema educacional puacuteblico que se revela pela falta de condiccedilotildees de trabalho a professores e pela falta de recursos a serem investidos em educaccedilatildeo de modo a inviabilizar novas vagas

Assim o trabalho se dividiu em duas partes para melhor compreensatildeo da mateacuteria a primeira parte - onde se conceituou o neoliberalismo sob a visatildeo de David Harvey e uma segunda parte - que abordou a situaccedilatildeo cotidiana dos adolescentes em conflito com a lei no sudeste brasileiro no que tange sua rela-ccedilatildeo com o Estado aplicador de medidas socioeducativas de internaccedilatildeo frente aos reflexos do neolibe-ralismo na condiccedilatildeo educacional dos mesmos

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2 MEacuteTODO

O artigo foi desenvolvido com o uso da metodologia de pesquisa bibliograacutefica usando obras de doutri-nas relacionadas as aacutereas juriacutedicas econocircmicas e das ciecircncias sociais O uso de relatoacuterios de pesquisa em especifico do Conselho Nacional de Justiccedila do ano de 2012 tambeacutem foram essenciais para o deba-te do tema escolhido

3 DISCUSSAtildeO E RESULTADOS

31 CONCEITO DE NEOLIBERALISMO SEGUNDO DAVID HARVEY

O neoliberalismo adveacutem do liberalismo econocircmico claacutessico e se originou nos Estados Unidos da Ameacuterica Este pode ser entendido como uma ideologia poliacutetica e econocircmica capitalista que visa o mer-cado e o consumo sustentando o argumento de natildeo participaccedilatildeo do Estado na economia

Esta nova forma de pensar o liberalismo se consubstanciou a partir de sedutoras convicccedilotildees pautadas principalmente na liberdade individual com base na dignidade da pessoa humana tendo como marco temporal o mundo poacutes-guerra fria

Dessa maneira foi possiacutevel implantar um capitalismo global frente as grandes corporaccedilotildees interna-cionais que cresceram atraveacutes da ldquoliberdade individualrdquo Neste interim Harvey escreveu uma de suas principais obras ldquoBreve Relato do Neoliberalismordquo onde o autor fez uma anaacutelise histoacuterica e criacutetica da teoria do neoliberalismo face suas implicaccedilotildees na atualidade

Uma teoria das praacuteticas poliacutetico-econocircmicas que propotildee que o bem-estar humano e pode ser

melhor promovido liberando-se as liberdades e capacidades empreendedoras individuais

no acircmbito de uma estrutura institucional caracterizada por soacutelidos direitos a propriedade

privada livres mercados e livre comeacutercio O papel do Estado eacute criar e preservar uma estrutura

institucional apropriada a essas praacuteticas o Estado tem de garantir por exemplo a qualidade e

integridade do dinheiro Deve tambeacutem estabelecer as estruturas e funccedilotildees militares de defesa

da poliacutecia e legais requeridas para garantir direitos de propriedade individuais e para assegurar

se necessaacuterio pela forccedila o funcionamento apropriado dos mercados Aleacutem disso se natildeo

existirem mercados (em aacutereas como a terra a aacutegua a instruccedilatildeo o cuidado de sauacutede a seguranccedila

social ou a poluiccedilatildeo ambiental) estes deveratildeo ser criados se necessaacuterio pela accedilatildeo do Estado

Mas o Estado natildeo deve aventurar-se para aleacutem dessas tarefas As intervenccedilotildees do Estado nos

mercados (uma vez criados) devem ser mantidas num niacutevel miacutenimo porque de acordo com a

teoria o Estado possivelmente natildeo possui informaccedilotildees suficientes para entender devidamente

os sinais do mercado (preccedilos) e porque poderosos grupos de interesse vatildeo inevitavelmente

distorcer e viciar as intervenccedilotildees do Estado (particularmente nas democracias) em seu proacuteprio

benefiacutecio (HARVEY 2007 p 12)

Harvey eacute um criacutetico do modelo neoliberal que eacute aliado a ideia de que o neoliberalismo foi uma espeacutecie de subterfugio encontrado para que o Estado antes de se ocultar ou enfraquecer passasse a trabalhar em prol do mercado e do grande capital internacional mascarando suas faces ocultas e perigosas que segundo o autor compotildeem-se dos seguintes pontos abordado na tabela a baixo

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Quadro 1- Consequecircncias do Neoliberalismo

I - Domiacutenio geopoliacutetico estadunidense

Com o resultado de diminuiccedilatildeo dos recursos para a esfera social dos Estados expondo a populaccedilatildeo global ao empobrecimento ainda mais profundo

II - Nutriz ideoloacutegica a partir dos ideais de liberdade de multiculturalismo e de democracia

Com base na propriedade privada e no livre-empreendedorismo que implicou em remeter a um relicaacuterio conceitual as ideias de igualdade e de justiccedila social Poreacutem no consumismo narcisista e em outras dimensotildees esteacutetico-teoacutericas que buscam os conhecimentos pautados na dialeacutetica nas reflexotildees sobre poder e exploraccedilatildeo do trabalho

III- Base conservadora Contraditoacuteria aos ideais de liberdade Promoccedilatildeo da ortodoxia em torno do neoliberalismo refletindo em crises em alguns paiacuteses como por exemplo o Meacutexico onde ocorreu um massacre neoliberal Onde empreendeu-se um processo de recolonizaccedilatildeo ou colonialismo sem colocircnias

Desta forma o neoliberalismo concatenou agrave reestruturaccedilatildeo produtiva do capital com base no modelo de acumulaccedilatildeo flexiacutevel onde Harvey atraveacutes de sua criacutetica ao modelo nos chama atenccedilatildeo para a luta poliacutetica em prol da criaccedilatildeo de alternativas agraves accedilotildees hegemocircnicas bem como uma luta contra a carate-riacutestica antidemocraacutetica e autoritaacuteria do neoliberalismo Isso faz com que o conceito de liberdade usado pelo modelo neoliberal seja relativizado

Assim quando relacionamos o neoliberalismo com o tema deste artigo devemos ressaltar que a aacuterea da educaccedilatildeo deixa de servir como um campo social para adquirir caracteriacutesticas funcionais de mercado

Esse fator acaba sendo um agravante da delicada situaccedilatildeo de jovens em conflito com a lei que cumprem medidas de internaccedilatildeo nos sistemas socioeducativos uma vez que a escola passa a ser um ambiente de adequaccedilatildeo agrave ideologia dominante

Para Andriolli (2002 p1)

Em contrapartida a crise do capitalismo em niacutevel mundial em especial do pensamento neoliberal

revela cada vez mais as contradiccedilotildees e limites da estrutura dominante A estrateacutegia liberal continua

a mesma colocar a educaccedilatildeo como prioridade apresentando-a como alternativa de ldquoascensatildeo

socialrdquo e de ldquodemocratizaccedilatildeo das oportunidadesrdquo Por outro lado a escola continua sendo um espaccedilo

com grande potencial de reflexatildeo criacutetica da realidade com incidecircncia sobre a cultura das pessoas

O ato educativo contribui na acumulaccedilatildeo subjetiva de forccedilas contraacuterias agrave dominaccedilatildeo apesar da

exclusatildeo social caracteriacutestica do descaso com as poliacuteticas puacuteblicas na maioria dos governos

De modo a fazer com que a educaccedilatildeo perca seu potencial virtuoso e se volte apenas para um papel estrateacutegico e empresarial de preparar para o trabalho atendendo agraves necessidades da livre iniciativa e fazendo a manutenccedilatildeo das desigualdades e desta maneira impossibilitando a ressocializaccedilatildeo de jovens dentro e fora dos sistemas socioeducativos

32 JUVENTUDE VIOLEcircNCIA ESTADO ldquoSOCIOEDUCADORrdquo E

NEOLIBERALISMO

No Relatoacuterio do Panorama Nacional a Execuccedilatildeo de Medidas Socioeducativas de Internaccedilatildeo realizado no ano de 2012 pelo Conselho Nacional de Justiccedila eacute na adolecescecircncia em que acontece o desenvolvi-mento da proacutepria personalidade e tambeacutem eacute onde se encontram os maiores iacutendices de atos infracionais registrados no Brasil principalemnte entre as faixa etaacuteria dos 15 a 17 anos

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A falta de amparo familiar desses jovens por muitas vezes gera a necessidade de buscar em outros gru-pos sociais o que natildeo tiveram dentro de seus lares Viacutetimas indefesas da violecircncia simboacutelica e da falta de assistecircncia em todos os setores sociais a maioria destes satildeo acolhidos por grupos que gerenciam o mundo do crime aliciando estes jovens oferecendo altos salaacuterios e o poder que nunca tiveram Assim a lei da rua eacute posta aos adolescentes que ingressam na vida do crime sem perspectiva de sairem

Desta maneira o que percebemos eacute a manutenccedilatildeo do poder simboacutelico atraveacutes de medidas socioeduca-tivas ineficazes na tentativa frustrada de ldquoprotegerrdquo o que na verdade se tenta mascarar visto a preca-riedade dos centros de cumprimeto de medidas socioeducativas

O Estado por meio de seu poder simboacutelico faz a construccedilatildeo social de uma cultura que precisa de manu-tenccedilatildeo para que todos sejam captados (Cultura do Controle de Garland)2 eacute desta maneira que a violecircncia simboacutelica comeccedila a ter ldquoformardquo impondo ldquolegitimamenterdquo e de maneira agressiva a cultura dominante

A interiorizaccedilatildeo desta cultura faz da violecircncia simboacutelica aparentemente natildeo visiacutevel aos olhos uma violecircncia que aliena jaacute que o proacuteprio oprimido natildeo se sente na posiccedilatildeo de estar sendo violentado como acontece com os adolescentes em conflitos com a Lei jaacute que a situaccedilatildeo que se perpetua ao longo da his-toacuteria e se torna algo inevitaacutevel no futuro

Natildeo existe ressocializaccedilatildeo mas sim uma maquiagem de problemas sociais graves que derivam de outros mais basilares como a falta educaccedilatildeo puacuteblica de qualidade desde a alfabetizaccedilatildeo

O problema da educaccedilatildeo tambeacutem eacute influenciado por ideologias neoliberais que assumem o controle atraveacutes de uma falsa esperanccedila de colocar a educaccedilatildeo como prioridade poreacutem natildeo eacute isso que acontece segundo Andriolli (2002 p2)

De acordo com o Banco Mundial satildeo duas as tarefas relevantes ao capital que estatildeo colocadas para

a educaccedilatildeo a) ampliar o mercado consumidor apostando na educaccedilatildeo como geradora de trabalho

consumo e cidadania (incluir mais pessoas como consumidoras) b) gerar estabilidade poliacutetica nos

paiacuteses com a subordinaccedilatildeo dos processos educativos aos interesses da reproduccedilatildeo das relaccedilotildees

sociais capitalistas (garantir governabilidade) Eacute evidente que a preocupaccedilatildeo do capital natildeo eacute gratuita

Existe uma coerecircncia do discurso liberal sobre a educaccedilatildeo no sentido de entendecirc-la como ldquodefinidora

da competitividade entre as naccedilotildeesrdquo e por se constituir numa condiccedilatildeo de empregabilidade em

periacuteodos de crise econocircmica Como para os liberais estaacute dado o fato de que todos natildeo conseguiratildeo

ldquovencerrdquo importa entatildeo impregnar a cultura do povo com a ideologia da competiccedilatildeo e valorizar os

poucos que conseguem se adaptar agrave loacutegica excludente o que eacute considerado um ldquoincentivo agrave livre

iniciativa e ao desenvolvimento da criatividaderdquo Mas e o que fazer com os ldquoperdedoresrdquo Conforme o

Prof Roberto Lehrer (UFRJ) o proacuteprio Banco Mundial tem declarado explicitamente que ldquoas pessoas

pobres precisam ser ajudadas senatildeo ficaratildeo zangadasrdquo Essa interpretaccedilatildeo eacute precisa com o que os

proacuteprios Banco tecircm apresentado oficialmente como preocupaccedilatildeo nos paiacuteses pobres ldquoa pobreza

urbana seraacute o problema mais importante e mais explosivo do proacuteximo seacuteculo do ponto de vista poliacutetico

Desta maneira o Estado manteacutem o discurso da cultura dominante naturalizando desigualdades que justificariam o abandono estatal desses adolescentes em conflito com a lei

33 SITUACcedilAtildeO ESCOLAR DOS ADOLESCENTES E OS REFLEXOS DO

NEOLIBERALISMO

Um dos reflexos negativos do neoliberalismo esta diretamente relaciondo a situaccedilatildeo escolar dos jovens em conflito com a lei no sudeste brasileiro Isto acontece em virtude da maioria dos meninos mesmo antes de ingressar ao sistema socioeducativo jaacute possuir algum deficit educacional por exem-plo taxas consideraacuteveis de analfabetismo ou abandono escolar

2 David Garland eacute um importante jurista e socioacutelogo da aacuterea de criminologia Professor da Universidade de Nova York O Autor busca

compreender em que grau as mudanccedilas nas instituiccedilotildees levaram a uma mudanccedila nas sensibilidades a qual tornou possiacutevel que a sociedade

aceitasse melhor uma nova cultura do controle principalmente nas sociedades com taxas altas de crimes

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Segundo Andriolli (2012 p3)

A conjuntura das poliacuteticas educacionais no Brasil ainda demonstra sua centralidade na

hegemonia das ideias liberais sobre a sociedade como reflexo do forte avanccedilo do capital sobre

a organizaccedilatildeo dos trabalhadores na deacutecada de 90 A intervenccedilatildeo de mecanismos internacionais

como o FMI e o Banco Mundial aliada agrave subserviecircncia do governo brasileiro agrave economia mundial

repercute de maneira decisiva sobre a educaccedilatildeo Em contrapartida a crise do capitalismo em

niacutevel mundial em especial do pensamento neoliberal revela cada vez mais as contradiccedilotildees

e limites da estrutura dominante A estrateacutegia liberal continua a mesma colocar a educaccedilatildeo

como prioridade apresentando-a como alternativa de ldquoascensatildeo socialrdquo e de ldquodemocratizaccedilatildeo

das oportunidadesrdquo Por outro lado a escola continua sendo um espaccedilo com grande potencial

de reflexatildeo criacutetica da realidade com incidecircncia sobre a cultura das pessoas O ato educativo

contribui na acumulaccedilatildeo subjetiva de forccedilas contraacuterias agrave dominaccedilatildeo apesar da exclusatildeo social

caracteriacutestica do descaso com as poliacuteticas puacuteblicas na maioria dos governos

Assim na pesquisa do Panorama Nacional a Execuccedilatildeo de Medidas Socioeducativas (2012) 93 dos jovens foram alfabetizados contendo 8 de taxa de analfabetismo poreacutem a idade meacutedia em que inter-romperam seus estudos foi de 14 anos de idade o que corresponde ao primeiro grau incompleto

Graacutefico 1 ndash Meacutedia de idade em que os adolescentes interromperam os estudos

Fonte DMFCNJ | Elaboraccedilatildeo DPJCNJ

A mesma pesquisa tambeacutem ressaltou que haacute uma porcentagem maior de adolescentes cuja uacuteltima seacuterie cursada foi a quinta e a sexta seacuterie do ensino fundamental como vemos no graacutefico

Graacutefico 2 ndash Uacuteltima seacuterie escolar cursada pelo adolescente

Fonte DMFCNJ | Elaboraccedilatildeo DPJCNJ

Os motivos que levam ao abandono escolar pelos adolescentes geralmente tecircm relaccedilatildeo com a dificul-dade de aprendizado complementar a falta de incetivos dentro da escola que fora moldada em formas tradicionais e que natildeo se revelam atraentes aos adolescentes

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Outro motivo relevante se deve ao uso de substacircncias entorpecentes dentro e fora do ambiente esco-lar que por muitas vezes resultam em casos de abandono escolar ou ateacute mesmo expulsotildees pela natildeo cumprimento das normas estabelecidas pela escola

A escola que temos hoje eacute ineficiente visto que ela eacute aquela que expulsa os alunos que natildeo se enqua-dram no perfil ldquoadequadordquo ao inveacutes de ensina-los e atrai-los para o ambiente educacional

O Panorama Nacional a Execuccedilatildeo de Medidas Socioeducativas (2012) tambeacutem revelou que no Brasil 57 dos jovens declararam que natildeo frequentavam a escola antes de ingressar na unidade Consequentemente apenas poucos adolescentes que estatildeo cumprindo medidas de socioeducaccedilatildeo natildeo possuem divergecircncia entre o binocircmio idadeseacuterie

Poreacutem um fator improtate que foi observado eacute que na Regiatildeo Sudeste apenas 10 dos internos decla-raram natildeo frequentar a escola todos os dias constatando assim a grande deficiecircncia do aparelho esta-tal na aplicaccedilatildeo de medidas socioeducativas e de programas sociais voltados agrave educaccedilatildeo

Isto tambeacutem pode ser influenciado pelo fato de que nem sempre o ambiente escolar que frequentam esses adolescentes se mostram favoraveis a frequencia escolar revelando a falta de insvestimento em educaccedilatildeo de qualidade

A importacircncia da educaccedilatildeo vem sendo relativizada pela sociedade hedonista a qual se busca constan-temente a saciaccedilatildeo de vontades e prazeres momento em que muitos acabam se redendo ao mundo do traacutefico que os ludibria pela facilidade de prazeres materiais que revelam uma ascensatildeo de status social no meio em que vivem

Vale tambeacutem ressaltar que historicamente falando a escola foi desenvolvida para classe burguesa natildeo sendo alvo de alcance os adolescentes em conflitos que geralmente pertencem as classes de menor potecircncial economico estes se situando como ldquoinimigos sociaisrdquo excluidos de qualquer direito

Desta maneira a classe trabalhadora teve que protestar seus direitos e lutar para ter o acesso a educa-ccedilatildeo formal igualitaacuteria poreacutem o que se viu foi a diminuiccedilatildeo da qualidade de ensino quando houve essa ampliaccedilatildeo Segundo Freire (1989 p 224)

A ldquodespreocupaccedilatildeordquo pela educaccedilatildeo nos seus aspectos quantitativos eacute consequecircncia desse

construir histoacuterico que traz em seu bojo aleacutem do desprezo pelas camadas populares a interdiccedilatildeo

de muitos ao conhecimento e portanto os perpetua na ldquoincompetecircnciardquo na ldquoignoracircnciardquo nas

ldquotrevasrdquo no ldquosuiciacutediordquo na ldquopraga negrardquo no ldquocancrordquo do analfabetismo

No Brasil foi possivel perceber esta dinacircmica reflexo tambeacutem de politicas neoliberais quando a Lei de Diretrizes e Bases da Educaccedilatildeo Nacional 569271 tranferiu a resposabildiade da educaccedilatildeo antes da federaccedilatildeo para Estados e Municiacutepios que tambeacutem possibilitou o primeiro grau gratuito e o aumento de vagas escolas mas careceu na qualidade social da educaccedilatildeo oferecida agrave classe trabalhadora

Assim temos que ressalvar que neste trabalho natildeo temos a finalidade de atribuir somente a escola a culpa do insucesso como foi destacado impropriamente pelo discurso neoliberal o que queremos destacar eacute que a educaccedilatildeo puacuteblica do Brasil que se destina a classe trabalhadora e aos adolescentes em conflito eacute tratada com desvalor

A desvalorizaccedilatildeo da educaccedilatildeo para as classes trabalhadoras eacute um fenocircmeno histoacuterico e podemos ver isso por exemplo na teoria do capital humano que a educaccedilatildeo eacute concebida de maneira a auxiliar a obtenccedilatildeo maxima de empregos de renda e principalemnte desenvolvimento economico maqueando desigualdades sociais e legitimando os sistemas capitalista

Desta maneira a educaccedilatildeo que seria a priori um direito baacutesico eacute colocada como uma mercadoriainvesti-mento que beneficia o aumento da produccedilatildeo e sobrepujamento do atraso economico justificando assim por meio da meritocracia as desigualdade de renda e de mutabilidade social Restando a educaccedilatildeo ldquoser-vir para preparar a matildeo de obra adestrada e qualifcada ao mercadordquo (FRIGOTTO 1999 p 120)

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Os reflexos das poliacuteticas neoliberais vecircm provocando alteraccedilotildees significantes no atual cenaacuterio educa-cional brasileiro onde o ensino puacuteblico eacute colocado como ineficiente atraveacutes de hostilidade ideologica fazendo com que a educaccedilatildeo se torne uma mercadoria de desejo e natildeo mais como um direito funda-mental garantido pela Constituiccedilatildeo de 88 e extentido a todos

Nesta visatildeo mercadologia neoliberal o estudante seria o consumidor e a educaccedilatildeo privada mercadoria de disputas isso eacute feito atraveacutes de uma politica descentralizada que quer diluir aos poucos o direito de todos possuirem o mesmo direito a educaccedilatildeo Isto tambeacutem progrediu em virtude da mudanccedila dos termos de ldquoigualdade socialrdquo para ldquoequidade socialrdquo que segundo Andriolli (2002) existe uma crescente despre-ocupaccedilatildeo com a igualdade como direito de todos mas como somente a ldquoamenizaccedilatildeordquo da desigualdade

Assim o Estado eacute abraccedilado pela onda neoliberal do surgimento de ficticias ldquoescolas consumordquo que datildeo bons frutos e que disfarccedilam o defecit educacional das camadas que mais precisam desse direito desta maneira eacute possivel percerber as garras do neoliberalismo que disfarccedila o problema e reduz o alcance da educaccedilatildeo ou seja se vocecirc natildeo tem condiccedilotildees economicas de um ensino privado vocecirc seraacute excluido movimentando o sistema capitalista excluedente por natureza

Com as investidas neoliberais no setor da educaccedilatildeo o conhecimento eacute secundaacuterio e o central eacute possuir habilidades reduzindo o invenstimento estatal ou seja haacute uma inversatildeo de valores realizadas pelo neoliberalismo uma vez que a realidade eacute constituida por uma sociedade do conhecimento e quem natildeo o tem eacute totalmente rejeitado

No casos dos adolescentes em confito com a lei a situaccedilatildeo natildeo se mostra diferente mesmo o ECA garantindo no artigo 124 ldquoreceber escolarizaccedilatildeo e profissionalizaccedilatildeordquo a situaccedilatildeo natildeo foi alterada per-petuando a desigualdade social e economica jaacute que dentro das instituiccedilotildees socioeducativas a educa-ccedilatildeo se mostra precaria natildeo sendo um dos objetivos principais jaacute que quem estaacute ali natildeo possui condi-ccedilotildees de ldquoadquirirrdquo educaccedilatildeo segundo a forma neoliberal revelando o caraacuteter punitivo das medidas socio educativas

Quadro 3- A educaccedilatildeo neoliberal

Sem a educaccedilatildeo adequada os adolescentes natildeo conseguem a inserccedilatildeo no mundo que vai recebe-los apoacutes cumprimento das medidas fazendo com que busquem outras formas de sobreviverem atraveacutes de ati-vadas muitas vezes ilicitas o que acabam o reinserindo novamente dentro do sistema socioeducativo

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4 CONCLUSAtildeO

A sociedade capitalista influenciada pelas praacuteticas neoliberais provoca a cada dia o aumento do desemprego este que impede a ascensatildeo da classe trabalhadora por uma nova e contraditoacuteria manei-ra de ver o trabalho onde se impulsiona uma maior qualificaccedilatildeo e ao mesmo tempo a desqualificaccedilatildeo

Esta situaccedilatildeo eacute caracteriacutestica de um sistema neoliberal que por exemplo no caso dos adolescentes em conflito com lei acabam por natildeo receber uma educaccedilatildeo que os possibilite de ingressar no mercado formal dentro dos ambientes socioeducativos de maneira que estejam realmente preparados para enfrentar o elevado o niacutevel de exigecircncia e de escolarizaccedilatildeo

Sem a escolarizaccedilatildeo necessaacuteria que deveria ser proporcionada dentro e fora dos sistemas socioedu-cativos esses adolescentes reingressam na sociedade sem a qualificaccedilatildeo profissional e experiecircncia de trabalho exigidas o que aumenta dificuldade de ingresso no mercado e a probabilidade de reincidecircncia por outros atos infracionais que por muitas vezes satildeo para sustentar viacutecios e outras necessidades que garantem sua sobrevivecircncia fisioloacutegica

Destaco aqui que pobreza natildeo estaacute vinculada a criminalidade mas devemos observar quais seriam as reais chances destes jovens em conflito com a lei possuem de refazerem suas vidas dentro de uma sociedade capitalista marcada pela desigualdade social e pelo discurso dominante disseminado pelo poder simboacutelico

Com o propoacutesito de diminuir a reincidecircncia desses jovens nos sistemas se faz necessaacuterio a modificaccedilatildeo concreta suas vidas que comeccedilaria pela implantaccedilatildeo de poliacuteticas puacuteblicas efetivas que garantam ao mesmo tempo seus direitos fundamentais e condiccedilotildees dignas de estudo e trabalho

Assim as medidas socioeducativas deveriam priorizar e auxiliar esses jovens na superaccedilatildeo da condiccedilatildeo de exclusatildeo redirecionando-os para a inserccedilatildeo social principalmente atraveacutes da educaccedilatildeo que eman-cipa os jovens de sua situaccedilatildeo infracional bem como amplia sua visatildeo criacutetica do mundo

Outra forma tambeacutem seria investir em programas de poliacuteticas puacuteblicas para a elevaccedilatildeo das condiccedilotildees escolares e laborais para a efetivaccedilatildeo das medidas socioeducativas bem como na construccedilatildeo da escola unitaacuteria que segundo Gramsci (1991) seria a escola natildeo hierarquizada de acordo com as classes sociais mais ou menos favorecidas mas sim escolas de todos os niacuteveis de ensino que prepare de maneira igual os indiviacuteduos agraves mesmas oportunidades profissionais

Entendemos que a escola unitaacuteria poderia ser uma boa alternativa para reverter a situaccedilatildeo onde o poder simboacutelico atraveacutes do discurso dominante poderia perder sua forccedila e impediria o avanccedilo dos reflexos neoliberais na educaccedilatildeo principalmente no que tange as praacuteticas socioeducativas

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REFEREcircNCIAS

ANDRIOLI Antocircnio I O que haveria de positivo no neoliberalismo In Correio da Cidadania Satildeo Paulo 13 a 20 de nov de 1999

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DE DIREITO

DIREITODE SUSTENTABILIDADE JURIacuteDICA E SISTEcircMICA

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REPUTACcedilAtildeO DIGITAL NO FACEBOOK SUSTENTABILIDADE EMPRESARIAL E O CONSUMIDOR

DIGITAL REPUTATION ON FACEBOOK BUSINESS SUSTAINABILITY AND THE CONSUMERAdriano Augusto Fidalgo1

Resumo O presente estudo versa sobre a Reputaccedilatildeo Digital no Facebook Sustentabilidade Empresarial e o Consumidor Buscou-se harmonizar o conviacutevio de todas essas premissas de modo con-comitantemente jaacute que todos tecircm importacircncia e funccedilatildeo social inclusive embasados em princiacutepios de ordem constitucional Em Reputaccedilatildeo Digital no Facebook se viram conceitos enfrentou-se os imaginaacute-veis conflitos entre liberdade de expressatildeo e vedaccedilatildeo ao anonimato a exposiccedilatildeo de dispositivos legais de interesse do Marco Civil e a importacircncia do CONAR Em Sustentabilidade Empresarial se apresen-tou a importacircncia da sustentabilidade das corporaccedilotildees as ferramentas de Governanccedila Corporativa Compliance Gestatildeo de Riscos Auditoria Juriacutedica e se ilustrou o direito ao esquecimento Em sede de Consumidor elencou-se alguns princiacutepios de direito do consumidor relatou-se incidentes de consumo a importacircncia dos sites de reclamaccedilatildeo explicitou-se a eticidade digital observou-se os casos praacuteticos e a atribuiccedilatildeo de indenizaccedilatildeo pelos abusos da liberdade de expressatildeo Em conclusatildeo com alicerce no princiacutepio da dignidade da pessoa humana constatou-se que eacute possiacutevel a convivecircncia de todos esses valores declinados de modo sistecircmico e em uacuteltima instacircncia o Judiciaacuterio atuaraacute para fulminar os abu-sos quando a empresa for atacada indevidamente no Facebook com a maacutecula indevida de sua reputa-ccedilatildeo digital notadamente quando o consumidor incorrer em abuso de direito

Palavras-Chaves Reputaccedilatildeo Digital Facebook Sustentabilidade Empresarial Consumidor Liberdade de expressatildeo

Abstract The present study deals with Digital Reputation in Facebook Business Sustainability and the Consumer It was sought to harmonize the conviviality of all these premises concomitantly since all have impor-tance and social function even based on principles of constitutional order In Digital Reputation on Facebook one sees concepts faced the imaginable conflicts between freedom of expression and fence to anonymity the exhibition of legal devices of interest of the Civil Code and the importance of the CONAR In Corporate Sustainability the importance of corporate sustainability the tools of Corporate Governance Compliance Risk Management and Legal Audit were presented and the right to forgetfulness was illustrated In Consumerrsquos office some principles of consumer law were mentioned incidents of consumption were reported the impor-tance of complaint sites digital ethics was explained the practical cases and the award of compensation for freedom of expression In conclusion based on the principle of the dignity of the human person it was veri-fied that it is possible to coexist with all these declined values in a systemic way and in the last instance the Judiciary will act to fulfill the abuses when the company is attacked improperly on Facebook with the undue blurring of its digital reputation especially when the consumer incurs abuse of rights

Key Words Reputation Digital Facebook Sustainability Business Consumer Freedom expression

1 Mestrando em Educaccedilatildeo Especialista em Computaccedilatildeo Forense pela Universidade Presbiteriana Mackenzie

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1 INTRODUCcedilAtildeO

Observar-se-aacute no mundo fenomecircnico as situaccedilotildees de incidentes digitais que coloquem em exposiccedilatildeo agrave destacada reputaccedilatildeo digital das empresas As redes sociais vecircm cada vez mais gerando informaccedilotildees que estatildeo sendo utilizadas como provas judiciais segundo destacado por Melo (2013 [1-])

Em breve siacutentese para o presente artigo se adotaraacute que reputaccedilatildeo digital eacute a boa fama mantida no universo eletrocircnico ou digital ou seja nas redes sociais sites e aplicativos em que uma empresa possa estar exposta especialmente considerando a sua importacircncia no mundo corporativo assim como os seus efeitos reais

Sendo um dos diacutesticos da empresa a sua marca um bem incorpoacutereo e intangiacutevel mas salutar para qual-quer pessoa juriacutedica de direito privado portanto merece total respaldo legal Como bem explicou Roque (1996 p 156)

A lsquomarcarsquo eacute um dos elementos de identificaccedilatildeo da empresa Eacute o nome ou o traccedilo distintivo de um

produto ou serviccedilo de tal maneira que estes fiquem bem identificados Por exemplo haacute diversas

marcas de televisores Sharp Sanyo National Telefunken Panasonic CCE Haacute tambeacutem vaacuterias

marcas de automoacuteveis Santana Verona Monza Ocircmega e outras Essas marcas soacute podem ser

exploradas pela empresa detentora dos direitos de uso delas devidamente registrada no INPI

Assim o liquidificador Arno soacute poderaacute ser fabricado e comercializado pela empresa que patenteou

essa marca no INPI quem fabricar e vender produto semelhante com essa marca estaraacute incorrendo

em concorrecircncia desleal e uso indevido de marca alheia sujeito portanto agraves penas da lei

Ou como sucintamente define Gusmatildeo (2002 p 15) ldquoMarca eacute o sinal distintivo de determinado pro-duto serviccedilo ou mercadoria visualmente perceptiacutevel e natildeo compreendido nas proibiccedilotildees legais Identifica direta e indiretamente produtos ou serviccedilosrdquo Ademais devem as corporaccedilotildees lutar por sua marca e reputaccedilatildeo seja no mundo fiacutesico seja no mundo eletrocircnico sendo essa uma prerrogativa ina-lienaacutevel e um dever de seus gestores

2 MATERIAL E MEacuteTODOS

O presente artigo seguiraacute caminho dialeacutetico empiacuterico com a observacircncia da legislaccedilatildeo aplicaacutevel e o estudo de casos narrados pela imprensa para subsequentes conclusotildees Com a devida anaacutelise biblio-graacutefica ainda que se considere o caraacuteter exploratoacuterio do artigo pois natildeo haacute trabalhos tratando do tema em especiacutefico que tem caraacuteter interdisciplinar e transdisciplinar

Como sabido o Facebook eacute a maior rede social do mundo inclusive alguns entendem ser tal rede maior que a proacutepria internet conforme notiacutecia recentemente divulgada no site do Jornal o Estado de Satildeo Paulo por Silvestre (2016 [1-])

Natildeo eacute novidade dizer que o Facebook eacute a maior rede social do mundo com mais de 15 bilhatildeo

de usuaacuterios Para muita gente ele eacute maior que a proacutepria Internet Mas esse erro de anaacutelise

natildeo eacute inoacutecuo ele estaacute causando impactos decisivos na vida de todos noacutes e pouca gente parece

perceber isso

Tal plataforma abre um importante campo de comunicaccedilatildeo sem filtro para que os consumidores faccedilam criacuteticas a produtos e a serviccedilos que natildeo lhe tenham trazido agrave satisfaccedilatildeo esperada ou de outro lado inclusive lhe tenham causado dano O que torna a rede social um campo propiacutecio para grande exposiccedilatildeo dos consumidores e das empresas colocando em destaque a credibilidade empresarial transforman-do a rede social em um ldquotribunal popularrdquo por vezes se achincalhando pessoas fiacutesicas e pessoas juriacutedi-cas por frustraccedilotildees ocorridas nas relaccedilotildees de consumo

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A liberdade de expressatildeo em nosso ordenamento juriacutedico tem status de direito constitucional2 Permite que o emitente de um pensamento de expresse sem censura Contudo como todo direito a liberdade de expressatildeo natildeo eacute um direito ilimitado pelo contraacuterio todos os direitos inclusive constitu-cionais encontram limites em outros direitos correlatos ou que lhe deem uma estruturaccedilatildeo

Some-se a isso que a autotutela sempre dever ser vista com ressalvas pelo direito Natildeo pode o cidadatildeo comum mesmo que sendo uma pessoa de bem mesmo que tenha tido um direito vilipendiado por uma empresa comeccedilar a fazer direito com as proacuteprias matildeos sem limites criando ldquonormasrdquo ldquoinvestigandordquo ldquoacusandordquo e ldquosentenciandordquo Isso eacute um perigo flagrantemente antidemocraacutetico sem sombra de duacutevidas

Nesta direccedilatildeo explanou Moraes (1999 p 67-68)

A manifestaccedilatildeo do pensamento eacute livre e garantida em niacutevel constitucional natildeo aludindo a

censura preacutevia em diversotildees e espetaacuteculos puacuteblicos Os abusos porventura ocorridos no

exerciacutecio indevido da manifestaccedilatildeo do pensamento satildeo passiacuteveis de exame e apreciaccedilatildeo pelo

Poder Judiciaacuterio com a consequente responsabilidade civil e penal de seus autores decorrentes

inclusive de publicaccedilotildees injuriosas na imprensa que deve exercer vigilacircncia e controle da

mateacuteria que divulga

Em 2015 o intelectual Eco proferiu as seguintes ponderaccedilotildees sobre as redes sociais a saber

Criacutetico do papel das novas tecnologias no processo de disseminaccedilatildeo de informaccedilatildeo o escritor e filoacutesofo

italiano Umberto Eco afirmou que as redes sociais datildeo o direito agrave palavra a uma lsquolegiatildeo de imbecisrsquo que

antes falavam apenas lsquoem um bar e depois de uma taccedila de vinho sem prejudicar a coletividadersquo

Se decirc um lado temos a liberdade de expressatildeo (artigo 5ordm IV da Constituiccedilatildeo Federal) nas palavras da carta constitucional ldquoeacute livre a manifestaccedilatildeo do pensamentordquo na mesma oraccedilatildeo o diploma constitucio-nal sentencia ldquosendo vedado o anonimatordquo Portanto uma dicotomia que em nada carrega contradiccedilatildeo em termos apenas um princiacutepio refreando o outro na mesma oraccedilatildeo Inclusive o inciso V do artigo 5ordm acima informado trata do direito de resposta e das possibilidades de indenizaccedilatildeo

Neste sentido bem aclara Silva (1994 p 238) apontando os ocircnus da liberdade de expressatildeo ipsis litteris

A liberdade de manifestaccedilatildeo do pensamento tem seus ocircnus tal como o de o manifestante

identificar-se assumir claramente a autoria do produto do pensamento manifestado para

em sendo o caso responder por eventuais danos a terceiros Daiacute por que a Constituiccedilatildeo veda o

anonimato A manifestaccedilatildeo do pensamento natildeo raro atinge situaccedilotildees juriacutedicas de outras pessoas

a que corre o direito tambeacutem individual e fundamental de resposta O art 5ordm V o consigna nos

termos seguintes eacute assegurado o direito de resposta proporcional ao agravo aleacutem da indenizaccedilatildeo

por dano material moral ou agrave imagem Esse direito de resposta como visto antes eacute tambeacutem uma

garantia de eficaacutecia do direito agrave privacidade Esse eacute um tipo de conflito que se verifica com

bastante frequecircncia no exerciacutecio da liberdade de informaccedilatildeo e comunicaccedilatildeo Importante que

a Constituiccedilatildeo assume a tese da indenizabilidade do dano moral problema controvertido na

doutrina mas jaacute razoavelmente estudado

O artigo 2ordm do Marco Civil disciplinando o uso da internet no Brasil tem como fundamento o respeito agrave liberdade de expressatildeo assim como outros valores O inciso II estabelece que ldquoos direitos humanos o desenvolvimento da personalidade e o exerciacutecio da cidadania em meios digitaisrdquo Jaacute o inciso V preza pela ldquolivre iniciativa a livre concorrecircncia e a defesa do consumidorrdquo E o inciso VI elenca ldquoa finalidade social da rederdquo

2 ldquoArt 5ordm Todos satildeo iguais perante a lei sem distinccedilatildeo de qualquer natureza garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no

Paiacutes a inviolabilidade do direito agrave vida agrave liberdade agrave igualdade agrave seguranccedila e agrave propriedade nos termos seguintes[] IV - eacute livre a manifestaccedilatildeo do pensamento sendo vedado o anonimato

[] V - eacute assegurado o direito de resposta proporcional ao agravo aleacutem da indenizaccedilatildeo por dano material moral ou agrave imagemrdquo

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O artigo 3ordm volta a tratar da liberdade de expressatildeo conforme caput e inciso I a saber ldquoArt 3o A disci-plina do uso da internet no Brasil tem os seguintes princiacutepios I - garantia da liberdade de expressatildeo comunicaccedilatildeo e manifestaccedilatildeo de pensamento nos termos da Constituiccedilatildeo Federal []rdquo De outro lado assim como ocorrido no artigo 2ordm inciso V que trata da proteccedilatildeo do consumidor o artigo 7ordm inciso XIII volta a tratar do tema ldquoArt 7o O acesso agrave internet eacute essencial ao exerciacutecio da cidadania e ao usuaacuterio satildeo assegurados os seguintes direitos [] XIII - aplicaccedilatildeo das normas de proteccedilatildeo e defesa do consumidor nas relaccedilotildees de consumo realizadas na internet []rdquo

Portanto nota-se que satildeo dois princiacutepios observados pelo Marco Civil a liberdade de expressatildeo e a proteccedilatildeo e defesa do consumidor Tambeacutem estampado o da livre iniciativa referendando a importacircn-cia das empresas a sua existecircncia e o seu funcionamento De modo que os princiacutepios devem aqui ser compatibilizados e conviverem

Um dos princiacutepios trazidos pelo Marco Civil foi o da necessidade de educaccedilatildeo digital inscrito nos arti-gos 26 e 29 do referido diploma Segundo o artigo 932 I do Coacutedigo Civil os pais satildeo responsaacuteveis pelos atos civis de seus filhos Portanto ao postar ou compartilhar algo os adultos satildeo responsaacuteveis pelo que publicam aleacutem de serem responsabilizados pelos de seus filhos menores Pois pode ocorrer de um menor ofender uma empresa ou seus prepostos pela internet algo ateacute relativamente usual nos dias atuais

Hoje em dia quando se coloca um anuacutencio ou qualquer propaganda de veiculaccedilatildeo puacuteblica seja em raacutedios televisotildees e jornais ou ainda seja nas redes sociais sites e miacutedias correlatas o veiculador agecircn-cia de propagando ou anunciante poderaacute ser instado a ldquoprestar contasrdquo (no sentido de ser indagado) junto ao CONAR Mesmo natildeo sendo ele um oacutergatildeo puacuteblico exerce uma funccedilatildeo puacuteblica e que deteacutem um status de respeito puacuteblico notadamente no ramo de publicidade e propaganda

As situaccedilotildees que acabam nas raias do CONAR satildeo aquelas que ataquem a moral o bom senso comum e que satildeo informadas por consumidores ou por seus Conselheiros de ofiacutecio inclusive as suas normas falam em algumas passagens de proteccedilatildeo a dignidade da pessoa humana Mas as mais comuns satildeo as denuacutencias de cunho machista sexista desrespeito ao consumidor desrespeito aos idosos desrespeito as crianccedilas e etc Apenas para ilustrar mas podem ocorrer casos de natildeo cumprimento da oferta propa-ganda enganosa e demais que violem a legislaccedilatildeo ou a moral dominante

Os nuacutemeros de 2015 do referido oacutergatildeo ficaram da seguinte maneira conforme destaca o seu site no que se refere agrave quantidade de processos por laacute instaurados

NuacutemerosProcessos Instaurados 241Anuacutencios Sustados 44Instaurados por Queixa do Consumidor 128Instaurados por Denuacutencia de Autoridade 7Conciliaccedilotildees 53

Normativamente rege o setor o Coacutedigo Brasileiro de Autorregulamentaccedilatildeo Publicitaacuteria emitido pelo CONAR O artigo 50 do referido Coacutedigo especifica as penalidades aplicaacuteveis ao setor

Da anaacutelise dos dados de 2015 verificam-se as seguintes estatiacutesticas no que tange a reclamaccedilotildees de consumidores em termos percentuais apresentaccedilatildeo verdadeira (301) respeitabilidade (239) responsabilidade social (129) adequaccedilatildeo as leis (37) cuidados com o puacuteblico infantil (117) dis-criminaccedilatildeo (37) padrotildees de dececircncia (49) e diversos 92)

Como se nota antes de veicular um anuacutencio uma propaganda ou uma mensagem institucional (que pode ser considerado anuacutenciopropaganda ainda que natildeo seja) as empresas tecircm que sempre buscar auxiacutelio especializado pois aleacutem de em tese poderem infringir normas basilares como a Constituiccedilatildeo

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Federal o Coacutedigo de Defesa do Consumidor e demais legislaccedilatildeo esparsa importante observar o Coacutedigo Brasileiro de Autorregulamentaccedilatildeo Publicitaacuteria com o arrimo de um advogado com experiecircn-cia frente ao oacutergatildeo para a boa resoluccedilatildeo da eventual demanda ocorrida

No amago deste artigo a sustentabilidade se aflora quando a empresa sempre ao postar algo em sua rede social com certa dose de clarividecircncia deve pensar e repensar na repercussatildeo que aquele con-teuacutedo teraacute E quando um incidente surgir por suscitaccedilatildeo de um consumidor sempre observar em que aquilo pode afetar o seu negoacutecio sua marca seus demais consumidores e etc

A sustentabilidade natildeo eacute apenas relativa agrave preservaccedilatildeo da natureza como se pensou por muito tempo As corporaccedilotildees devem agir de modo sustentaacutevel seja respeitando a natureza seja preservando aos seus funcionaacuterios seja preservando os colaboradores seja mantendo as suas financcedilas em dia seja natildeo se envolvendo em casos de corrupccedilatildeo Jaacute que muitos empregos dependem do sucesso daquela institui-ccedilatildeo aleacutem da sua importacircncia para a economia local e nacional

Como bem explicita Nalini (2011 p 128) sobre a estrita ligaccedilatildeo tambeacutem existente entre a sustentabi-lidade e a eacutetica

Sustentabilidade eacute uma concepccedilatildeo eminentemente eacutetica O aspecto moral estaacute em pensar no

proacuteximo Natildeo se imagina que a empresa soacute pense no proacuteximo Ela eacute uma organizaccedilatildeo que visa o lucro

Natildeo eacute entidade filantroacutepica Mas pode pensar tambeacutem no proacuteximo Uma concepccedilatildeo adequada de

sustentabilidade leva em conta os dois aspectos obter lucro e disseminar as boas praacuteticas

Ou numa senda mais internacional assim defendem Menezes e Nogueira (2011 p 363) referendando que se deve pensar sobre o tema de modo global

Dessa forma natildeo se pode encarar a sustentabilidade como um conceito meramente interno

nacional Isto porque eg uma empresa norte-americana decide abrir uma filial na China

apenas pelo fato da legislaccedilatildeo ambiental e trabalhista ser muito mais fluida do que a de seu paiacutes

de origem temos uma distorccedilatildeo no mercado que impede de atingir o livre comeacutercio um vez que

natildeo se produz um conceito miacutenimo obrigacional que os Estados devem ter para coibir algumas

praacuteticas ou para que as empresas atuem de forma justa em seu territoacuterio

Deste modo tambeacutem se pode constatar que ser sustentaacutevel eacute agir de modo eacutetico E a eacutetica ganha con-tornos universais globais natildeo se pode mais pensar somente de modo micro eis que com uma anaacutelise macro todos podem vencer com nossos atos positivos e dignificantes inclusive os que ocorrem sem grandes pretensotildees e de modo superficial nas redes sociais As empresas vem buscando repassar prin-ciacutepios eacuteticos dentro do que se chama Governanccedila Corporativa

Segundo definiccedilatildeo do Instituto Brasileiro de Governanccedila Corporativa

Governanccedila Corporativa eacute o sistema pelo qual as organizaccedilotildees satildeo dirigidas monitoradas e

incentivadas envolvendo as praacuteticas e os relacionamentos entre proprietaacuterios conselho de

administraccedilatildeo diretoria e oacutergatildeos de controle As boas praacuteticas de Governanccedila Corporativa

convertem princiacutepios em recomendaccedilotildees objetivas alinhando interesses com a finalidade de

preservar e otimizar o valor da organizaccedilatildeo facilitando seu acesso ao capital e contribuindo

para a sua longevidade

Vale dizer que a oacutetima Governanccedila Corporativa tem o escopo de manter a confiabilidade de uma empresa para os seus acionistas mantendo a organizaccedilatildeo de maneira sustentaacutevel De modo a respeitar a comu-nidade local ter um plano de carreira definido aos seus colaboradores dar formaccedilatildeo para evoluccedilatildeo de todos os seus parceiros ter postura eacutetica honrar os seus compromissos manter-se em dia com os seus pagamentos de tributos e passivo trabalhista e ainda procedimentos adequados agrave legislaccedilatildeo do paiacutes (Compliance) de modo a visar a sua perpetuaccedilatildeo como uma empresa soacutelida e economicamente viaacutevel

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Neste sentir Periard (2009) de forma clara destacou os benefiacutecios da Governanccedila Corporativa a saber

A boa Governanccedila Corporativa contribui para um desenvolvimento econocircmico sustentaacutevel

proporcionando melhorias no desempenho das empresas aleacutem de maior acesso a fontes

externas de capital Por estes motivos torna-se tatildeo importante ter conselheiros qualificados

e sistemas de Governanccedila Corporativa de qualidade Evitando-se assim diversos fracassos

empresariais decorrentes de a) Abusos de poder ndash Do acionista controlador sobre minoritaacuterios

da diretoria sobre o acionista e dos administradores sobre terceiros b) Erros estrateacutegicos ndash

Resultado de muito poder concentrado no executivo principal c) Fraudes ndash Uso de informaccedilatildeo

privilegiada em benefiacutecio proacuteprio atuaccedilatildeo em conflito de interesses

Vale dizer ainda que conforme apontam os especialistas o maior escacircndalo de corrupccedilatildeo do paiacutes apu-rado na Operaccedilatildeo Lava Jato trata-se de um exemplo claacutessico de falha grave ou ausecircncia de Governanccedila o que gerou a notiacutecia intitulada ldquoFalhas em governanccedila custaratildeo ateacute US$ 59 bi agrave Petrobraacutes diz estudordquo apontando os prejuiacutezos o cerne da publicaccedilatildeo (ALVES 2015 [1-])

Segundo estudo da consultoria europeia Management amp Excellence processos civis

trabalhistas tributaacuterios entre outros devem render agrave estatal um custo de US$ 59 bilhotildees sem

contar eventuais indenizaccedilotildees que a empresa venha a ter que pagar por processos movidos por

investidores nos EUA por conta do escacircndalo de corrupccedilatildeo investigado pela Lava Jato Para

efeito de comparaccedilatildeo o valor de mercado da companhia era de US$ 314 bilhotildees segundo dados

da BMampFBovespa referentes ao valor de fechamento de quarta-feira

Desta forma nota-se com um caso praacutetico a relevacircncia da Governanccedila Corporativa como fundamental instrumento de diagnoacutestico e prognoacutestico para as instituiccedilotildees Sendo elementar para atuar de modo preventivo evitando diversas situaccedilotildees desagradaacuteveis agraves instituiccedilotildees Vale dizer brevemente que dentro de uma instituiccedilatildeo as aacutereas de Compliance Auditoria Interna e Gestatildeo de Riscos dentre outros satildeo os sustentaacuteculos que compotildee o plexo formador da Governanccedila Corporativa

Conforme cartilha da BMampF BOVESPA a Compliance vai muito aleacutem da conformidade com a legislaccedilatildeo exterior pois se trata de uma questatildeo eacutetica e de cumprimento da normatizaccedilatildeo interna da empresa conforme se lecirc de alguns exemplos a seguir coletados

Disseminar a presente poliacutetica

bull Estruturar implementar e disseminar o Programa de Integridade aos profissionais da

Companhia fiscalizando o seu cumprimento e coordenando os treinamentos perioacutedicos

bull Auxiliar as aacutereas de negoacutecio na anaacutelise de suas estruturas produtos e serviccedilos a fim de alinhaacute-

los agraves normas emitidas pelos oacutergatildeos reguladores e agrave estrutura normativa interna

bull Acompanhar os planos de accedilatildeo quando verificar conduta ou ato em desacordo com as normas

emitidas pelos oacutergatildeos reguladores aplicaacuteveis agrave Companhia

bull Relatar a ocorrecircncia de ato que constitua iliacutecito administrativo civil ou penal ao Conselho de

Administraccedilatildeo agrave Diretoria Executiva e agrave Diretoria Juriacutedica

bull Produzir relatoacuterios mensais com os resultados dos trabalhos referentes ao acompanhamento

da demanda dos oacutergatildeos reguladores submetidos ao Conselho de Administraccedilatildeo e agrave Diretoria

Executiva

bull Participar de discussotildees a respeito de projetos ou alteraccedilotildees normativas objeto de audiecircncia

ou consultas puacuteblicas

bull Coordenar os processos referentes ao Coacutedigo de Conduta sem prejuiacutezo das atribuiccedilotildees do

Comitecirc do Coacutedigo de Conduta

Destarte mostra-se o quatildeo a Compliance tem importacircncia iacutempar dentro das corporaccedilotildees mas cujos refluxos saltaratildeo extra muros efetivando-se a prevenccedilatildeo contra problemas na aacuterea do direito do con-sumidor e digital aqui nosso foco maacuteximo aleacutem da manutenccedilatildeo da boa imagem da empresa perante terceiros junto aos seus funcionaacuterios e com os oacutergatildeos reguladores Isto eacute dignificando a reputaccedilatildeo empresarial e suscitando a perenidade da marca

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A temaacutetica eacute polecircmica Tanto haveraacute os que defenderatildeo o direito da empresa de natildeo ser atacada ou ao menos que a reclamaccedilatildeo seja restrita aos limites do problema assim como alguns entenderatildeo que a manifestaccedilatildeo exacerbada tambeacutem eacute iliacutecita jaacute que natildeo daacute direito do consumidor usar palavras vulgares ou atacar a honra dos soacutecios da empresa Efeitos colaterais do empoderamento dos consumidores nas redes sociais

Um caso bem evidente de que a Gestatildeo de Riscos nas redes sociais eacute fundamental se materializou pela polecircmica ocorrida em fevereiro de 2016 no bar Quitandinha Vila Madalena em Satildeo Paulo em que a reputaccedilatildeo da empresa foi desgastada pela acentuada exposiccedilatildeo conforme notiacutecia que segue

O bar Quitandinha divulgou um viacutedeo com imagens de cacircmeras de seguranccedila do estabelecimento

da Vila Madalena na Zona Oeste de Satildeo Paulo que supostamente exibe o caso de asseacutedio sexual

relatado por uma mulher no dia 5 de fevereiro no Facebook O viacutedeo foi publicado na segunda-

feira (15) e editado em conjunto com trechos da denuacutencia legendas e sem aacuteudio Veja o viacutedeo

aqui A mulher relatou em seu post no Facebook que ela e uma amiga foram abordadas por dois

homens no bar no dia 4 de fevereiro Apoacutes serem ignorados eles as teriam xingado e agredido

Ela afirma ter recorrido ao garccedilom e ao gerente e conta que ao inveacutes de ajudaacute-las os funcionaacuterios

do bar explicaram que tratavam-se de clientes de longa data e solicitaram que o seguranccedila as

expulsasse do local O post teve mais de 130000 likes e mais de 40000 compartilhamentos

Independentemente da culpa de lado a lado o que se tem por certo eacute que a situaccedilatildeo natildeo foi gerida da melhor forma por todos os envolvidos expondo a reputaccedilatildeo do estabelecimento comercial

Como se pode notar de um caso relatado no Conjur mateacuteria assinada por Rover (2013 [1-]) tratando como exerciacutecio regular de direito a prerrogativa dos consumidores poderem reclamar

O consumidor que foi prejudicado por uma empresa pode publicar queixa na internet em

sites de reclamaccedilotildees inclusive sendo lsquoaceitaacutevel seu exacerbado inconformismo e ateacute mesmo

certa exasperaccedilatildeo de linguagemrsquo Aleacutem disso o site que oferece este tipo de serviccedilo natildeo possui

responsabilidade civil por danos morais decorrentes da inserccedilatildeo pelo usuaacuterio em sua paacutegina

virtual de mateacuteria ofensiva agrave honra de terceiro

Por outra vertente Milagre (2013 [1-]) expondo que as reclamaccedilotildees nas redes sociais ou sites de defe-sa do consumidor devem ter limites

Recentemente fui solicitado para consultoria em uma empresa que estaria passando por um

problema Segundo o cliente a empresa estaria sendo difamada na Internet por um consumidor

Difamada por um consumidor Ao acessar o site de reclamaccedilotildees pude constatar que natildeo se

tratava de uma mera reclamaccedilatildeo mas de um discurso de oacutedio lsquoEspeluncarsquo lsquolixorsquo lsquobando de

safadosrsquo eram alguns dos adjetivos que podemos citar A questatildeo era de um viacutecio no produto

A mensagem identificava os soacutecios suas casas familiares e generalizava os rotulando como

peacutessimos prestadores De fato ocorreu um problema pontual mas o consumidor jamais

procurara a empresa preferindo desfilar sua ira nas redes sociais impactando na imagem da

empresa para milhares de pessoas No Google a reclamaccedilatildeo passou a ser a primeira referecircncia

quando se buscava pelo nome da empresa que atuava no mercado haacute mais de vinte anos e que

em sua trajetoacuteria colecionava premiaccedilotildees e reconhecimento puacuteblico

Como se nota qualquer vacilo do empresaacuterio ou uma falta de atendimento adequado poderaacute ser um gatilho para um incidente de consumo De outro lado cabe ao empresariado ver se a situaccedilatildeo natildeo foi reclamada por um perfil fake patrocinada por um inimigo ou concorrente por exemplo Indagar se a pessoa que reclama realmente fora sua cliente E inferir de modo investigativo ateacute que ponto aquela reclamaccedilatildeo eacute justa e natildeo extrapola o direito do consumidor Valendo relembrar que ningueacutem tem direi-to ilimitado em algum assunto todos os direitos se limitam por outros direitos

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Desta maneira criar uma mentalidade de eacutetica digital eacute crucial Ensinar aos jovens a criar uma reputa-ccedilatildeo digital eacute elementar Pois muitas empresas contratam considerando os perfis das pessoas nas redes sociais antes e durante a contrataccedilatildeo

Nessa levada o homem eacute um ser eacutetico E a dignidade da pessoa humana sempre deve ser o centro das atenccedilotildees Com essa observaccedilatildeo pontuaram Rocasolano e Silveira (2010 p 35)

Pode-se afirmar destarte que o ser humano natildeo se limita a viver uma vida casual e determinada

apenas pelos processos naturais o homem constroacutei a sua proacutepria histoacuteria fruto das suas

constantes decisotildees histoacuterico-seletivas Enfatiza-se a ideia do ser humano como ente que eacute e

que deve ser consciente dessa dignidade Eacute precisamente da autoconsciecircncia acerca de sua

dignidade que surge o conceito de pessoa segundo o qual o homem natildeo eacute homem apenas porque

existe mas pelo significado que adquire sua proacutepria vida

Interessante notar que a eacutetica estaacute em total antagonismo com a corrupccedilatildeo Um grande mal do paiacutes arraigado fortemente em nossa cultura Jaacute antevendo os escacircndalos da Lava Jato e correlatos assim bem detalhou Lucca (2009 p 364) fazendo referecircncias a outro autor

A verdade eacute que a chamada retoacuterica do poder jaacute enfastiou a todos Ningueacutem suporta mais o

descalabro eacutetico da sociedade brasileira A classe empresarial ndash diz-nos com propriedade o

escritor e empresaacuterio Mario Ernesto Humberg ndash possui a grande responsabilidade de liderar

a mudanccedila eacutetica no Paiacutes mostrando que a lsquoroda do futuro comeccedila a girar de forma diferentersquo e

asseverando que alguns empresaacuterios lsquojaacute estatildeo sensibilizados para essa necessidade de adotar

princiacutepios eacuteticos nos seus negoacutecios e estatildeo assumindo essa responsabilidadersquo

Especificamente sobre eticidade digital expuseram Freitas Whitaker e Sacchi (2006 p 16) deste modo

Isso significa que as altas heranccedilas das empresas devem estar empenhadas em se atualizar e

assessorar-se para estabelecer um processo de comunicaccedilatildeo em suas organizaccedilotildees tendo em

vista essa nova ordem instalada na sociedade atual geradora de tantas inovaccedilotildees Inovaccedilotildees

natildeo somente de ferramentas colocadas agrave disposiccedilatildeo de todos (a informaccedilatildeo por exemplo

hoje natildeo eacute privileacutegio de alguns estaacute disseminada por toda parte) mas tambeacutem inovaccedilotildees

provocadas na pessoa em diretores acionistas colaboradores concorrentes fornecedores e

clientes das empresas Deve haver um esforccedilo de aperfeiccediloamento contiacutenuo estruturado pelas

altas lideranccedilas das empresas direcionado a todos os seus stakeholders Isso exige constante e

permanente atenccedilatildeo com a conotaccedilatildeo eacutetica das atitudes das pessoas

De um vieacutes acurado se nota que a eticidade digital auxiliaacuteria a resoluccedilatildeo de dilemas notadamente nas relaccedilotildees de consumo no Facebook como tratado por aqui Duelando estaratildeo o direito a manifestaccedilatildeo do pensamento frente o respeito agrave reputaccedilatildeo digital da empresa

Para ajudar a dirimir tal aparente conflito traz-se a baila a hermenecircutica juriacutedica conforme bem fun-damento por Ferraz Jr (1994 p 308)

Deste modo a hermenecircutica possibilita uma espeacutecie de neutralizaccedilatildeo dos conflitos sociais ao

projetaacute-los dimensatildeo harmoniosa ndash o mundo do legislador racional ndash na qual em tese se tornam

todos decidiacuteveis Ela natildeo elimina assim as contradiccedilotildees mas as torna suportaacuteveis Portanto natildeo

as oculta propriamente mas as disfarccedila trazendo-as para o plano das suas conceptualizaccedilotildees

Repete-se pois na hermenecircutica o que ocorre com a dogmaacutetica analiacutetica (supra 44) Enquanto

esta poreacutem exerce sua funccedilatildeo ao isolar o direito num sistema o saber interpretativo conforma

o sentido do comportamento social agrave luz da incidecircncia normativa Ela cria assim condiccedilotildees

para a decisatildeo Mas natildeo diz como deve ocorrer a decisatildeo Para isso existe um terceiro modelo

dogmaacutetico que toma a proacutepria decisatildeo como seu objeto privilegiado

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Unisul de Fato e de Direito

Ano IX Nordm 17 | Julho a Dezembro | 2018

A necessidade de educaccedilatildeo digital jaacute eacute uma realidade indesculpaacutevel Urge que a sociedade de um modo geral e as corporaccedilotildees natildeo descuide disso com urgecircncia para ontem Enfrentaraacute o presente toacutepico algu-mas situaccedilotildees praacuteticas relatando decisotildees ou notiacutecias de condenaccedilotildees impostas aos consumidores observando-se a casuiacutestica como tem atuado o Judiciaacuterio para coibir os abusos da liberdade de expressatildeo

Em notiacutecia do site juriacutedico Conjur (2015 [1-]) um consumidor foi condenado por acusar uma empresa de contrabando nestes termos

Pessoas juriacutedicas tambeacutem tecircm patrimocircnio moral que deve ser reparado em caso de ofensa Esse

eacute o entendimento da 1ordf Cacircmara Ciacutevel do Tribunal de Justiccedila da Paraiacuteba que condenou um cliente

a pagar R$ 5 mil de indenizaccedilatildeo a uma empresa de informaacutetica por tecirc-la acusado de contrabando

em seu perfil no Facebook A decisatildeo reformou sentenccedila de instacircncia anterior que havia julgado

o pedido da empresa improcedente O relator do recurso no TJ-PB desembargador Leandro

dos Santos ressaltou que os comentaacuterios publicados pelo consumidor ultrapassaram a mera

criacutetica ou reclamaccedilatildeo descambando para a imputaccedilatildeo natildeo comprovada de praacutetica delituosa de

contrabando por parte da empresa

Jaacute houve casos de condenaccedilatildeo por compartilhamento e curtidas no Facebook No proacuteximo caso ora acostado uma cliente de uma cliacutenica veterinaacuteria acusou a meacutedica indevidamente como se observa de notiacutecia do Tribunal de Justiccedila do Estado de Satildeo Paulo (2015 [1-]) sendo que o tribunal entendeu que tal criacutetica foi abusiva e ela foi condenada a pagar indenizaccedilatildeo por danos morais como se nota

Uma mulher moradora de Campinas pagaraacute R$ 8 mil de indenizaccedilatildeo a uma cliacutenica veterinaacuteria e

uma meacutedica por danos morais A decisatildeo eacute da 3ordf Cacircmara de Direito Privado do TJSP De acordo

com os autos a cadela de estimaccedilatildeo da reacute apresentou sangramento apoacutes uma cirurgia de

castraccedilatildeo em abril de 2013 e correu risco de morte Apoacutes o episoacutedio ela publicou na paacutegina

de seu perfil no Facebook afirmaccedilotildees tidas como injuriosas a respeito do estabelecimento e da

meacutedica responsaacutevel pela operaccedilatildeo do animal A dona da cliacutenica ajuizou accedilatildeo indenizatoacuteria cuja

sentenccedila determinou o pagamento de repaccedilatildeo de R$ 5 mil pela internauta O relator Alexandre

Marcondes manteve a condenaccedilatildeo e elevou o montante da indenizaccedilatildeo para R$ 8 mil

Tudo deve ser efetivado se utilizando de algum criteacuterio No caso hoje em dia jaacute se fala de direito huma-nos de quinta geraccedilatildeo que seriam os direitos digitais De modo que tambeacutem muito se fala de aplicaccedilatildeo dos direitos humanos de modo horizontal inclusive de pessoas fiacutesicas para juriacutedicas e vice-versa Nesta ordem de ideias crecirc-se que um bom paracircmetro para soluccedilatildeo das situaccedilotildees de conflitos no Facebook resultem elas em indenizaccedilotildees ou natildeo deve ter por base o princiacutepio da dignidade da pessoa humana como pedra angular para se decidir algo sobre o assunto Sempre se observando as particularidades de caso a caso

3 RESULTADOS E DISCUSSAtildeO

Pelo exposto buscou-se demonstrar como a Reputaccedilatildeo Digital no Facebook a Sustentabilidade Empresarial e o Consumidor poderatildeo conviver harmonicamente mesmo que haja tensotildees respeitando--se o arcabouccedilo de direitos do consumidor e se preservando a empresa viva e garantindo a sua perenidade

Identificou-se que a empresa tem o direito de primar pela sua reputaccedilatildeo sua marca sua clientela monitorando as ocorrecircncias nas redes sociais para apurar o que pode ser abusivo o que tem razatildeo de ser e o que jamais existiu Urge que se tenha uma postura ativa pelo empresariado sob pena de sua derrocada por natildeo levar a seacuterio o que ocorre em campo digital

Considerando a funccedilatildeo social da empresa deve ela ser sustentaacutevel respeitando diversos fatores como acima elencados E nessa missatildeo a Governanccedila Corporativa o Compliance a Gestatildeo de Riscos e a Auditoria Juriacutedica satildeo fundamentais conforme acima embasado

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Universidade do Sul de Santa Catarina

Revista Juriacutedica da Universidade do Sul de Santa Catarina

O empoderamento dos consumidores nas redes sociais eacute candente Poucas palavras podem destruir uma reputaccedilatildeo por vezes construiacuteda por anos de trabalho duro O ataque natildeo geraraacute efeitos apenas frente aos donos das empresas mas a todos as pessoas a ela interligadas o que em tese eacute passiacutevel de gerar a perda de centenas ou milhares de postos de trabalho caso a empresa seja meacutedia ou grande

4 CONCLUSOtildeES

Haacute suficiente legislaccedilatildeo aplicaacutevel para se mediar os lados dessa contenda A Constituiccedilatildeo Federal o Marco Civil e o Coacutedigo de Defesa do Consumidor satildeo alguns exemplos Haacute lei para aplicar ou seja natildeo haacute lacuna legislativa sobre o assunto em tela Mas como ocorre natildeo apenas nessa oacuterbita de tensiona-mento entre os consumidores e os fornecedores para ajustar lacunas sistecircmicas eacute necessaacuteria agrave utiliza-ccedilatildeo de princiacutepios juriacutedicos

Normas e sobrenormas a auxiliar o interprete na missatildeo de aplicaccedilatildeo do bom Direito Aqui no caso em voga aplicaacuteveis os vetores constitucionais da liberdade de expressatildeo da vedaccedilatildeo ao anonimato da livre iniciativa da legalidade da proporcionalidade da razoabilidade e da proteccedilatildeo ao consumidor Sistemicamente somados e sem antagonismos reais

Com todos esses elementos descritos chega-se a conclusatildeo que o consumidor tem o direito de expor sua opiniatildeo desde que com base real e moderada sem o intento de lesar a imagem da empresa extra-polando as acusaccedilotildees ou atacando a honra dos gestores ou colaboradores do ente pessoa juriacutedica

Como se nota pelos exemplos colhidos as falhas ocorrem de lado a lado Agraves vezes o consumidor crecirc ter um direito inaliaacutevel que lhe garante o direito de livre manifestaccedilatildeo Mas ele tem que se indagar previa-mente se tem mesmo tanta razatildeo sobre aquele direito conclamado pois o desabafo nas redes sociais poderaacute lhe custar caro

Pelo lado da empresa as falhas vatildeo desde os erros pessoais dos colaboradores que natildeo conseguem lidar com tal ou qual situaccedilatildeo ateacute erros de falta de treinamento falta de documentos da empresa que deter-minem certas posturas como um Coacutedigo de Eacutetica um Termo de Poliacutetica de Uso ou um Regulamento Interno que podem ser relevantes como um bom instrumental e fazerem toda a diferenccedila

Mas o que parece fazer a diferenccedila sobremaneira eacute a suscitaccedilatildeo da conscientizaccedilatildeo advinda de uma educaccedilatildeo do indiviacuteduo para que ele fique cocircnscio de seus direitos e obrigaccedilotildees no mundo digital e para que saiba sem sombra de duacutevidas que o mundo digital traz reflexos no mundo real jaacute que plenamen-te interligados ou melhor dizendo satildeo o mesmo mundo E vale repetir a internet natildeo eacute terra sem lei

O que seraacute elementar para se definir se uma postagem de um consumidor eacute iliacutecita ou natildeo eacute a questatildeo de se mensurar a sua proporcionalidade ligada agrave realidade do que se alega para que se possa criar uma convicccedilatildeo e precisar se aquela postagem fere direito da empresa agrave sua reputaccedilatildeo digital

Sem prejuiacutezo de opiniotildees contraacuterias o que se pode questionar tambeacutem eacute se a soluccedilatildeo natildeo foi tentada em outras vias antes de uma postagem mais arrojada com uma reclamaccedilatildeo ao SAC contato ao Ombudsman3 da empresa ou a comunicaccedilatildeo por qualquer outro canal existente na internet ou fora dela

Ora entende-se que a pedra fundamental para se alicerccedilar uma decisatildeo sobre se a reclamaccedilatildeo eacute devida ou indevida seraacute o princiacutepio da dignidade humana tanto para se avaliar se o consumidor foi malferido em um direito seu elementar quanto do lado antagocircnico em homenagem ao princiacutepio da isonomia para se avaliar se o direito agrave dignidade humana dentro da empresa na pessoa de seus proprietaacuterios e funcionaacuterios tambeacutem natildeo foi vilipendiada

3 Ombudsman eacute uma palavra sueca que significa representante do cidadatildeo Designa nos paiacuteses escandinavos o ouvidor-geral

funccedilatildeo puacuteblica criada para canalizar problemas e reclamaccedilotildees da populaccedilatildeo Disponiacutevel em lthttpwww1folhauolcombr

ombudsman2014091520973-o-que-e-o-cargo-de-ombudsmanshtmlgtAcesso em 30 maio 2016

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Unisul de Fato e de Direito

Ano IX Nordm 17 | Julho a Dezembro | 2018

Em caso de legalidade e legitimidade da publicaccedilatildeo ela seraacute convalidada pelo Judiciaacuterio e demais oacutergatildeo de Defesa do Consumidor ou que analisem tais publicaccedilotildees como o CONAR quando a empresa publi-car algo indevido ou que viole direitos consumeristas

Do lado da empresa caso constatada a ilegalidade e abusividade da publicaccedilatildeo ela poderaacute pleitear junto ao Judiciaacuterio pela remoccedilatildeo do conteuacutedo inclusive liminarmente aleacutem de que o ofensor lhe inde-nize demonstrando-se abalo de creacutedito por exemplo eventualmente com a compensaccedilatildeo por lucros cessantes e danos emergentes ou ateacute a ocorrecircncia de danos morais com a comprovaccedilatildeo legalmente exigida no primeiro caso ou presumida no segundo

REFEREcircNCIAS

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Universidade do Sul de Santa Catarina

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183Ano IX Nordm 17 | Julho a Dezembro | 2018

O PAPEL DO ADVOGADO NA NEGOCIACcedilAtildeO NA SOCIEDADE CONTEMPORAcircNEA

THE ROLE OF THE LAWYER IN NEGOTIATION IN CONTEMPORARY SOCIETYBiela Jr1

Glaucia Guisso Fernandes2

Resumo O presente artigo analisa o papel do advogado no procedimento de negociaccedilatildeo no Estado Democraacutetico de Direito a partir do meacutetodo de negociaccedilatildeo de Harvard e da teoria da comunicaccedilatildeo natildeo--violenta viabilizando a comunicaccedilatildeo eficaz desde o seu planejamento execuccedilatildeo finalizaccedilatildeo incenti-vando a continuidade das relaccedilotildees humanas mesmo apoacutes o teacutermino da negociaccedilatildeo

Palavras-Chaves Negociaccedilatildeo Advogado Litiacutegio Eacutetica Meios adequados de soluccedilatildeo consensual de conflitos

Abstract This article analyzes the role of the lawyer in the negotiation process in the Democratic State of Law based on the Harvard negotiation method and nonviolent communication theory enabling effective commu-nication from planning execution finalization encouraging the continuity of human relations even after the end of the negotiations

Keywords Negotiation Lawyer Litigation Ethics Adequate means of consensual solution of conflicts

1 INTRODUCcedilAtildeO

Do latim negotiatio de negociari a negociaccedilatildeo significa o entendimento preliminar de que possa resul-tar o contrato ou de que possa resultar o negoacutecio que natildeo se considera acabado ou concluiacutedo enquan-to as partes natildeo se ajustam nas condiccedilotildees ou claacuteusulas em que se possa realizar e natildeo firmam em defi-nitivo seu consentimento

A negociaccedilatildeo pode ser vista como oportunidade para resolver muitas questotildees incluindo os conflitos sendo uma forma de autocomposiccedilatildeo em que as partes buscam caminhos adequados Para tanto a nego-ciaccedilatildeo natildeo deve ser feita de qualquer forma deve observar teacutecnicas deve ser planejada preparada ade-quadamente criada negociada e aiacute sim devidamente formalizada alcanccedilando o muacutetuo acordo e recons-truindo a histoacuteria entre as partes no sentido de dar continuidade agrave paz social nas relaccedilotildees humanas

Dessa forma no presente artigo seraacute analisada a importacircncia da funccedilatildeo do advogado como negociador na sociedade contemporacircnea considerando sua funccedilatildeo social bem como a aplicabilidade das teacutecnicas de negociaccedilatildeo levando-se em conta o meacutetodo de Harvard em consonacircncia com a teoria da comunica-ccedilatildeo natildeo violenta

1 Advogado e professor de Direito Civil e Eacutetica Profissional Relator da XVIII Turma Disciplinar do TED da OABSP 201220152018

Mestre em Direito pela Universidade Metropolitana de Santos na aacuterea de concentraccedilatildeo Responsabilidade Civil Ambiental Poacutes-graduado

lato sensu em Responsabilidade Civil pela FAAP e em Direito Processual Civil pelo Mackenzie Possui MBA em Gestatildeo de Negoacutecios

Imobiliaacuterios pela FMU Autor de obras juriacutedicas

2 Advogada Conciliadora e Mediadora Professora de Direito na Universidade Nove de Julho e no Centro Paula Souza Licenciada

em Direito na Universidade Satildeo Judas Tadeu Mestre em Direitos Difusos e Coletivos pela Universidade Metropolitana de Santos

Especialista em Direito Empresarial na Universidade Satildeo Judas Tadeu Especialista em Direito Civil e Direito Processual Civil na Escola

Paulista de Direito Instrutora na Oficina de Oratoacuteria Forense na Ordem dos Advogados do Brasil de Satildeo Paulo

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Universidade do Sul de Santa Catarina

Revista Juriacutedica da Universidade do Sul de Santa Catarina

2 A FUNCcedilAtildeO DO ADVOGADO COMO NEGOCIADOR NA SOCIEDADE CONTEMPORAcircNEA

A tiacutetulo de consideraccedilotildees iniciais antes de discorrer sobre a negociaccedilatildeo eacute importante destacar a rele-vacircncia da profissatildeo do advogado pois ele eacute o sujeito indispensaacutevel agrave administraccedilatildeo da justiccedila conforme reza a Constituiccedilatildeo Federal em seu art 133

Segundo Bulos3 ldquoa advocacia natildeo eacute apenas uma profissatildeo mas uma atividade delicadiacutessima porque interfere no consciente e inconsciente da criatura humanardquo portanto pontifica o autor que advogar ldquorequer paciecircncia humildade profundo conhecimento teacutecnico cultura humaniacutestica relacionamento sadio boa vontade persistecircncia amor sentido cristatildeo da vida discernimento perdatildeo renuacutencia senso de justiccedila criatividade etcrdquo

Como indispensaacutevel agrave administraccedilatildeo da justiccedila o advogado no seu ministeacuterio privado presta um ser-viccedilo puacuteblico e exerce uma funccedilatildeo social pois o advogado como particular colabora com o Estado em busca da justiccedila por isso frise-se sua indispensabilidade Tanto isso eacute certo que haacute a regra do quinto constitucional prevista no art 94 ldquocaputrdquo e paraacutegrafo uacutenico cujo objetivo eacute oxigenar o Poder Judiciaacuterio onde advogados puacuteblicos e privados tragam sua experiecircncia e vivecircncia para contrabalanccedilar a visatildeo formada por um tribunal composto somente por juiacutezes de carreira Em outras palavras juiacutezes oriundos da advocacia por sua vivecircncia e experiecircncia tendem a ter uma outra visatildeo no que tange agrave prestaccedilatildeo jurisdicional justa e efetiva

No processo judicial o advogado contribui na postulaccedilatildeo de decisatildeo favoraacutevel ao seu constituinte ao convencimento do julgador e seus atos constituem muacutenus puacuteblico Por outro lado salienta Biela Jr4 ldquoo advogado realiza a funccedilatildeo social quando concretiza a aplicaccedilatildeo do Direito e natildeo apenas da lei partici-pando ativamente da justiccedila socialrdquo como se depreende do art 3ordm do CED

Tradicionalmente no acircmbito social o advogado eacute diretamente associado agrave briga litiacutegio conflito pro-cesso como se sua atuaccedilatildeo profissional fosse resumida agrave atuaccedilatildeo no processo judicial o que eacute uma inverdade pois a formaccedilatildeo teacutecnica do advogado visa orientar esclarecer prevenir e se for o caso liti-gar mas eacute sabido que a formaccedilatildeo acadecircmica tambeacutem contribui para esta visatildeo pois o bacharel em direi-to tem uma formaccedilatildeo mais voltada para a litigiosidade e natildeo para o consenso influindo na sua vida pes-soal e profissional com reflexos no acircmbito social

Nesse sentido perfeita eacute colocaccedilatildeo de Bulos5 ao referir que ldquoo advogado eacute a antena supersensiacutevel da Justiccedila porque seu mister envolve a um soacute tempo 1 Arte ndash de dizer o oacutebvio para quem natildeo quer enten-der a obviedade 2 Poliacutetica ndash disciplina da liberdade dentro da ordem 3 Eacutetica ndash exerciacutecio de virtudes contra a tentaccedilatildeo e 4 Accedilatildeo ndash luta intransigente na defesa e direitos prerrogativasrdquo

Negociar eacute preciso Enfatiza Silva e Figueiredo Mouratildeo6 que enquanto se fizer a mesma coisa conse-guiraacute sempre o mesmo e assim pontifica a distinccedilatildeo da postura do advogado em juiacutezo e na negociaccedilatildeo sendo que em juiacutezo o papel do advogado eacute convencer o julgador do sentido da tese juriacutedica apresenta-da jaacute na negociaccedilatildeo cabe ao advogado convencer a outra parte de que a proposta que tem a oferecer eacute melhor que a alternativa que resta ao oponente como p ex em um acidente de tracircnsito onde todas as provas satildeo favoraacuteveis ao autor e que se esse for ao judiciaacuterio sairaacute vencedor Contudo se o causador do dano propuser uma negociaccedilatildeo onde o veiacuteculo do autor poderaacute ser consertado antes mesmo da citaccedilatildeo na accedilatildeo indenizatoacuteria natildeo seria uma boa proposta Negociar natildeo significa deixar de ganhar mas sim solucionar o conflito buscando muacutetuo acordo

3 BULOS Uadi Lammecircgo Curso de Direito Constitucional Satildeo Paulo Saraiva 2007 p 1161

4 BIELA Jr Minimanual do novo coacutedigo de eacutetica e disciplina dos advogados 2 ed Salvador JusPodivm 2017 p 30

5 Op cit p 1162

6 MOURAtildeO Alessandra Nascimento Silva e Figueiredo Teacutecnicas de negociaccedilatildeo para advogados 4 ed rev Satildeo Paulo Revista dos

Tribunais 2017 p 38

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Unisul de Fato e de Direito

Ano IX Nordm 17 | Julho a Dezembro | 2018

De fato o advogado eacute o primeiro juiz da causa portanto indispensaacutevel sua atuaccedilatildeo seja judicial ou extra-judicialmente e tanto isso eacute certo que assevera Pupo7 que nos dias atuais a figura desse profissional natildeo pode ficar restrita ao interesse das partes O advogado deve ter um papel niacutetido para evitar a litigiosidade e natildeo pode se esquivar do seu dever de promover o acesso agrave justiccedila o que natildeo se confunde com acesso ao judiciaacuterio mas com todos os meios juriacutedicos agrave disposiccedilatildeo a fim de se buscar uma soluccedilatildeo mais ceacutelere e justa

Assim como primeiro juiz da causa e em cumprimento agrave sua funccedilatildeo social a atuaccedilatildeo do advogado ultra-passa o interesse privado (do cliente) para alcanccedilar o interesse puacuteblico (da sociedade) a administraccedilatildeo da justiccedila Por essa razatildeo satildeo deveres do advogado atuar com a verdade independecircncia honestidade lealdade e boa-feacute devendo desaconselhar lides temeraacuterias bem como estimular os meacutetodos adequa-dos de soluccedilatildeo de conflitos como a negociaccedilatildeo conciliaccedilatildeo mediaccedilatildeo prevenindo a instauraccedilatildeo de conflitos sendo vedada a diminuiccedilatildeo dos honoraacuterios contratados em decorrecircncia da soluccedilatildeo do litiacutegio por qualquer mecanismo adequado de soluccedilatildeo extrajudicial8

Por essa razatildeo o advogado deve mudar o paradigma de adversarial como antes mencionado comu-mente ensinado nas faculdades de Direito para o perfil negociador conciliador jaacute que ele eacute primeiro inteacuterprete da lei e do caso concreto em condiccedilotildees de avaliar o meio mais adequado para solucionar o conflito a fim de alcanccedilar uma soluccedilatildeo ceacutelere (o que o judiciaacuterio em muitas vezes natildeo proporciona) e justa onde natildeo haveraacute o ganha-perde mas sim o ganha-ganha Enfim natildeo haacute advogado que natildeo preci-se negociar pois a vida do advogado eacute negociar desde seu cliente (honoraacuterios) com a parte contraacuteria colegas advogados e por aiacute vai

Silva e Figueiredo Mouratildeo9 pontifica que o art 190 do CPC abriu a grande possibilidade de se negociar os procedimentos processuais poreacutem critica que ainda se vecirc muitas claacuteusulas contratuais que nesse tema se restringem a fazer a eleiccedilatildeo de foro Eacute interessante perceber que o legislador mesmo com o processo judicial em andamento lembra o jurisdicionado da existecircncia de outros caminhos para a reso-luccedilatildeo consensual dos conflitos o que deveraacute ser estimulado pelos operadores do direito inclusive os advogados como prevecirc o artigo 3deg sect 1deg ao 3deg do CPC

Para se cumprir a funccedilatildeo social do advogado como forma da sua indispensabilidade agrave administraccedilatildeo da justiccedila e alcanccedilar a soluccedilatildeo justa do ganha-ganha a mudanccedila de cultura se impotildee partindo do advo-gado como negociador por meio de uma linguagemcomunicaccedilatildeo natildeo violenta ou agir comunicativo10 para buscar o entendimento muacutetuo das partes e assim alcanccedilar a sociedade como um todo consoli-dando-se a mudanccedila de mentalidade social para se ter o judiciaacuterio como um meio subsidiaacuterio para a soluccedilatildeo dos conflitos e natildeo como regra para tanto

Nesse sentido Pupo11 assevera que essa mudanccedila de cultura que se preconiza decorre de uma ldquorea-valiaccedilatildeo do papel do advogado quando ao proceder diante de um conflito a comeccedilar com a anaacutelise da relaccedilatildeo comunicacional que estabelece com o cliente ateacute a implementaccedilatildeo de meacutetodos mais eficientes e eficazes no trato com o litiacutegiordquo jaacute que em razatildeo de sua ldquoproximidade com as partes envolvidas no con-flito permitem o aprofundamento no fundamento da divergecircncia e lhe capacita para realizar a escolha do meacutetodo mais adequado para o caso concretordquo cumprindo seu dever previsto no Coacutedigo de Eacutetica art 2ordm paraacutegrafo uacutenico inciso VI e VII no que tange agrave contenccedilatildeo do descontrole no uso da litigaccedilatildeo judicial

7 PUPO Seacutergio O papel do advogado na sociedade contemporacircnea a gestatildeo do conflito p 114

8 CED art 48 sect 5ordm

9 MOURAtildeO Figueiredo SILVA Alessandra Nascimento Teacutecnicas de negociaccedilatildeo para advogados 4 ed rev Satildeo Paulo Revista dos

Tribunais 2017 p 23

10 Na teoria do agir comunicativo de Habermas o autor sugere uma mudanccedila de paradigma no sentido de obter o entendimento entre

as pessoas por meio da linguagem isto eacute deixar de compreender o mundo a partir de uma visatildeo individualista e seguir para uma anaacutelise

por meio da comunicaccedilatildeo entre os sujeitos apud PUPO Sergio Tadeu O papel do advogado na sociedade contemporacircnea a gestatildeo do

conflito Satildeo Paulo Perse 2014 p 130

11 Op cit p 125

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Nesse diapasatildeo o advogado deve primeiro desenvolver uma escuta ativa que segundo Sergio Pupo12 ldquotem triplo objetivo a) conhecer o cliente b) se aprofundar nas causas do conflito e c) aferir se o clien-te atua estrategicamente ou se haacute campo para o muacutetuo acordordquo Apoacutes a escuta ativa o advogado deve compreender a razatildeo as causas do conflito colocando-se no lugar do outro buscando a eliminaccedilatildeo dos pontos de conflito estimulando a utilizaccedilatildeo dos meios adequados para a soluccedilatildeo dos conflitos como a negociaccedilatildeo para a preservaccedilatildeo das relaccedilotildees de continuidade bem como evitando novos conflitos entre as partes

3 BREVES CONSIDERACcedilOtildeES SOBRE OS FUNDAMENTOS DE NEGOCIACcedilAtildeO DE HARVARD E A TEORIA DA COMUNICACcedilAtildeO NAtildeO VIOLENTA

Negociar natildeo eacute perder abrir matildeo dos seus interesses natildeo implica concessotildees pois todas as pessoas tecircm posiccedilotildees e querem defendecirc-las o que importa eacute atender estas posiccedilotildees com o intuito de atingir o inte-resse comum viabilizando a comunicaccedilatildeo e se for o caso chegando a uma autocomposiccedilatildeo um acordo

Conforme salientam Fisher Ury e Patton na obra Como Chegar ao Sim13 qualquer meacutetodo de negocia-ccedilatildeo pode ser julgado imparcialmente por trecircs criteacuterios 1 Deve produzir um acordo sensato que pode ser definido como aquele que atende aos interesses legiacutetimos de cada uma das partes na medida do possiacutevel resolve imparcialmente os interesses conflitantes eacute duradouro e leva em conta os interesses da comunidade se houver possibilidade de acordo 2 Deve ser eficiente e 3 Deve aprimorar ou pelo menos natildeo prejudicar o relacionamento entre as partes

O negociador natildeo precisa ser afaacutevel ou aacutespero para negociar segundo o Meacutetodo de Negociaccedilatildeo de Harvard haacute quatro pontos fundamentais que devem ser analisados para facilitar o processo de nego-ciaccedilatildeo e produzir resultados satisfatoacuterios para todos os envolvidos no processo14 1 Separe as Pessoas do Problema 2 Concentre-se nos Interesses Natildeo nas Posiccedilotildees 3 Invente Opccedilotildees de Ganhos Muacutetuos 4 Insista em Criteacuterios Objetivos

Para que se alcance um processo de negociaccedilatildeo efetivo eacute necessaacuterio que o processo de comunicaccedilatildeo entre os envolvidos resguarde os preceitos da comunicaccedilatildeo natildeo-violenta viabilizando o fortalecimen-to das relaccedilotildees humanas mesmo em condiccedilotildees adversas pessoais ou profissionais

Para Marshall Rosenberg na obra Comunicaccedilatildeo Natildeo-Violenta15 estes preceitos de comunicaccedilatildeo satildeo utilizados em todas as relaccedilotildees humanas nos relacionamentos iacutentimos nas famiacutelias nas escolas nas organizaccedilotildees e instituiccedilotildees em terapia e aconselhamento nas negociaccedilotildees diplomaacuteticas e comerciais nas disputas e conflitos de toda natureza

O processo da comunicaccedilatildeo natildeo-violenta tem quatro elementos basilares observaccedilatildeo sentimentos necessidades e pedidos16 1 As accedilotildees concretas que estamos observando e que afetam nosso bem-es-tar 2 Como nos sentimos em relaccedilatildeo ao que estamos observando 3 As necessidades valores desejos que estatildeo gerando nossos sentimentos 4 As accedilotildees concretas que pedimos para enriquecer nossa vida

12 Op cit p 141

13 FISHER Roger URY William e PATTON Bruce Como chegar ao sim negociaccedilatildeo de acordos sem concessotildees 2 ed rev e amp Rio de

Janeiro Imago 2005 p 22

14 Op cit p 30

15 ROSENBERG Marshall B Comunicaccedilatildeo natildeo-violenta teacutecnicas para aprimorar relacionamentos pessoais e profissionais Satildeo Paulo

Aacutegora 2006 p 27

16 Ibid p 26

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Os preceitos da comunicaccedilatildeo natildeo-violenta juntamente com os elementos do meacutetodo de Harvard aju-dam e facilitam a comunicaccedilatildeo durante o processo de negociaccedilatildeo e se complementam desde a anaacutelise inicial pelo advogado negociador diagnosticando a situaccedilatildeo preparando bem como durante a exe-cuccedilatildeo criando negociando para se atingir o muacutetuo acordo finalizando o procedimento mantendo os viacutenculos entre os envolvidos

4 CARACTERIacuteSTICAS E TEacuteCNICAS DA NEGOCIACcedilAtildeO PARA ADVOGADOS

Segundo Alessandra Mouratildeo vaacuterios elementos auxiliam os negociadores a terem ecircxito planejamento propostas legitimidade comunicaccedilatildeo relacionamento alternativas e compromisso17

41 PLANEJAMENTO

O advogado deveraacute analisar os interesses perceber o cliente entender seus objetivos descobrir os interesses em jogo eacute preciso treino eacute interessante apoacutes ouvir o cliente inverter os papeacuteis fazendo com que o cliente coloque-se no lugar da outra parte de forma empaacutetica a fim de perceber que nem sempre o outro lado estaacute errado entendendo o que estaacute acontecendo e buscando opccedilotildees

Isto natildeo implica concordar com o outro mas sim entendecirc-lo trata-se de aprender a loacutegica do adversaacute-rio importante fazer propostas levando em conta o interesse da outra parte aleacutem de escutar quais satildeo as opccedilotildees que o outro tem se o acordo natildeo for formalizado

O advogado negociador natildeo discute teses juriacutedicas o que eacute uma perda tempo impedindo o diaacutelogo restringindo as opccedilotildees natildeo pode ser leviano desonesto insensiacutevel intolerante tampouco seu cliente eacute necessaacuterio a reciprocidade para que todos possam conversar O foco deve ser o problema a ser resol-vido e natildeo as pessoas

O advogado deve conhecer seu cliente os interesses que o movem deve contar tudo o que aconteceu eacute importante o poder de investigaccedilatildeo do advogado fazendo perguntas indo aleacutem daquilo que o cliente expotildee ressaltando que a relaccedilatildeo entre cliente e advogado eacute de confianccedila pautada na verdade assim como a relaccedilatildeo entre cliente e paciente ou seja expor a verdade eacute fundamental nas relaccedilotildees humanas incluindo as relaccedilotildees profissionais em que atuam profissionais liberais facilitando e promovendo o diaacutelogo

O advogado deve ajudar o cliente a entender o seu conflito a se auto perceber entender o que real-mente quer ter clareza quanto aos aspectos emocionais psicoloacutegicos sociais financeiros anseios temores vaidades sensaccedilotildees anguacutestias alegrias tristezas enfim tudo o que estaacute relacionado com a realidade do cliente e da parte contraacuteria

Neste sentido o advogado negociador deveraacute separar as pessoas dos problemas observando sem ava-liar e concentrar nos interesses natildeo nas posiccedilotildees demonstrando os sentimentos

42 PROPOSTAS COM GANHOS RECIacutePROCOS

Eacute importante respeitar a inteligecircncia e astuacutecia da outra parte todos devem ganhar na negociaccedilatildeo O advogado deve ser flexiacutevel e criativo com base nos interesses do seu cliente de acordo com a exposiccedilatildeo verdadeira dos fatos bem como com os interesses da parte contraacuteria colocando-se no lugar desta para que possam ser criadas as opccedilotildees viabilizando o interesse comum A fixaccedilatildeo num uacutenico posiciona-mento ignorando os demais interesses pode comprometer o processo de negociaccedilatildeo

17 MOURAtildeO Figueiredo SILVA Alessandra Nascimento Teacutecnicas de negociaccedilatildeo para advogados 4 ed rev Satildeo Paulo Revista dos

Tribunais 2017 passim

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Durante o processo de negociaccedilatildeo os envolvidos natildeo podem ser precipitados eacute preciso ter paciecircncia ouvir todas as propostas as partes devem ser esclarecidas as duacutevidas devem ser sanadas pode-se pedir sugestotildees para o cliente para outro colega de profissatildeo ou para a outra parte eacute viaacutevel conhecer melhor as propostas deve ser exercida a escuta ativa observando com atenccedilatildeo escutando e natildeo sim-plesmente ouvindo olhando e natildeo simplesmente vendo eacute preciso ter tempo e disponibilidade

Infelizmente muitas tentativas de negociaccedilatildeo no acircmbito judicial sejam frustradas ainda que com a possibilidade de serem marcadas outras sessotildees pois como muitos advogados natildeo satildeo negociadores natildeo preparam as partes os envolvidos natildeo estatildeo dispostos a se comunicarem eficazmente e os conci-liadores e mediadores natildeo estatildeo devidamente preparados e capacitados haacute o comprometimento do procedimento tudo isto atrelado agrave falta de tempo paciecircncia conhecimento e educaccedilatildeo

Muitas vezes numa sessatildeo de negociaccedilatildeo mesmo com a utilizaccedilatildeo das teacutecnicas e dos elementos da comunicaccedilatildeo natildeo violenta dependendo das partes e dos advogados o tempo necessaacuterio do procedi-mento pode ser curto ou longo para se alcanccedilar o acordo muacutetuo sendo que algumas vezes pode ser que natildeo ocorra a autocomposiccedilatildeo o que natildeo quer dizer que todos perderam tempo pois se comunica-ram de maneira eficaz

Sabendo claramente o que cada parte quer eacute possiacutevel chegar a um interesse comum natildeo eacute viaacutevel negar ou concordar de pronto eacute preciso levar em conta todas as possibilidades ter empatia natildeo significa con-cordar com tudo o que o outro diz mas sim respeitar suas colocaccedilotildees e juntos criar outras alternati-vas Haacute vaacuterias respostas para um uacutenico problema

A meta da negociaccedilatildeo natildeo deve ser o confronto mas sim o ganho reciacuteproco e o advogado deve deixar isto claro para o seu cliente que o contato e a conversa com o advogado da parte contraacuteria aleacutem de ser uma conduta educada o que se aprende desde o berccedilo natildeo significa deixar de representar os seus interesses tecnicamente muito pelo contraacuterio isto favorece a busca pelo interesse comum Uma postura teacutecnico negociadora sempre atendendo o interesse do cliente eacute estar lado a lado com a outra parte por isto a mesa de negociaccedilatildeo deve ser redonda sem pontas trazendo a ideia de igualdade de oportunidades

Eacute importante que o advogado tenha clareza do seu papel na negociaccedilatildeo valorize sua profissatildeo sua experiecircncia pessoal seu conhecimento teacutecnico tenha autoconfianccedila estimule o procedimento que natildeo veja a tecnologia como impedimento para a negociaccedilatildeo mas sim uma ferramenta favoraacutevel ao fim almejado que valorize seu trabalho

43 LEGITIMIDADE

As opccedilotildees escolhidas pelas partes devem adequadas para todos os envolvidos na negociaccedilatildeo devendo ser legiacutetimas e justas trazendo uma sensaccedilatildeo agradaacutevel para todos sem que um ou outro sinta-se enga-nado lesado desmotivado a fim de viabilizar o cumprimento do acordado

Quando o processo de negociaccedilatildeo eacute feito de forma adequada fazendo com que as partes resgatem suas responsabilidades sobre o conflito a possibilidade de descumprimento do que foi acordado eacute qua-se nula posto que haacute engajamento de todos o que natildeo ocorre se as partes estiverem com sentimentos negativos com relaccedilatildeo ao andamento do procedimento portanto natildeo pode haver pressa nem pressatildeo fiacutesica ou psicoloacutegica tudo deve ocorrer no seu tempo

Eacute importante ter criteacuterios objetivos para negociar evitando apenas basear-se na subjetivamente que pode prejudicar a negociaccedilatildeo tendo paracircmetros de valores (de mercado referecircncia venal) estatiacutes-ticas decisotildees jurisprudenciais entendimentos doutrinaacuterios mapeamentos escalas tabelas periacutecia vistorias exames avaliaccedilotildees laudos pareceres enfim tudo o que pode servir de base para uma boa conversa criando uma aacuterea de acordo possiacutevel que permita uma discussatildeo direcionada

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O aspecto subjetivo tambeacutem eacute importante mas deve ser levado em conta com criteacuterios e se a parte natildeo estaacute muito criativa ou natildeo teve condiccedilotildees de apresentar criteacuterios objetivos poderaacute ser auxiliada pela sugestatildeo apresentada pelo outro e por isto deve saber ouvir reiterando que pode haver mais de uma resposta para o mesmo problema

44 COMUNICACcedilAtildeO

Durante o procedimento da negociaccedilatildeo eacute importante estar atento a todos os tipos de manifestaccedilotildees das partes envolvidas inclusive o silecircncio pois o corpo fala de diferentes formas

Prestar atenccedilatildeo em si e no outro eacute essencial para o andamento dos trabalhos repetir o que o outro disse demonstra respeito ajuda a estabelecer os pontos principais possibilita a empatia assim como fazer anotaccedilotildees e apontamentos O uso dos sentidos deve ser equilibrado entre as partes saber falar ouvir e olhar no momento correto eacute fundamental

As pessoas que ficam muito tempo em silecircncio durante a negociaccedilatildeo devem ser tratadas com cau-tela satildeo observadoras e pode ser que as expressotildees natildeo coincidam com os sentimentos passando uma maacute impressatildeo por isto eacute conveniente perguntar se a pessoa estaacute entendendo pedir sua partici-paccedilatildeo motivar sua manifestaccedilatildeo Eacute preciso conhecer para natildeo desconfiar ter clareza objetividade espontaneidade

45 RELACIONAMENTO

Estar presente de forma respeitosa e atenta durante a negociaccedilatildeo possibilita um clima agradaacutevel entre todos deve-se ter cuidado com o impacto que uma accedilatildeo ou omissatildeo causa no outro A empatia implica colocar-se no lugar do outro mesmo discordando

O poder de convencer o outro tambeacutem eacute relevante na negociaccedilatildeo mas eacute importante entender que cada parte tem o seu momento para falar um deve respeitar o outro natildeo podem ser admitidas interrup-ccedilotildees os trabalhos devem ser conduzidos de maneira adequada com reciprocidade o respeito ajuda a aumentar a reputaccedilatildeo do negociador e o advogado deve ter isto em mente

Para iniciar os trabalhos agraves vezes eacute interessante comeccedilar a conversa com as partes separadamente evitando um confronto direto para depois uni-las e havendo algum problema todos devem saber o momento de suspender os trabalhos para depois retomar a negociaccedilatildeo ou encerraacute-la por um tempo podendo sempre ser retomada Enfim o advogado negociador deve criar opccedilotildees de ganhos muacutetuos atendendo as necessidades dos envolvidos no procedimento

46 ALTERNATIVAS

Alternativas satildeo as escolhas apoacutes serem analisadas as opccedilotildees quando ainda natildeo se alcanccedilou a compo-siccedilatildeo eacute preciso conhecer todas as opccedilotildees para serem feitas as escolhas por isto eacute imprescindiacutevel saber ouvir a outra parte e entendecirc-la

Mostrar que se tem alternativas eacute viaacutevel faz com que o outro entenda o seu ponto de vista sem surpre-sas desagradaacuteveis explicar que alguns meios podem ser desgastantes financeira e emocionalmente aleacutem de levarem muito tempo e natildeo se ter certeza do resultado como ocorre com o processo judicial eacute uma forma de mostrar os riscos existentes e se as partes natildeo querem correr o risco fica mais faacutecil tran-sacionar pois se tem uma delimitaccedilatildeo e predisposiccedilatildeo para tanto

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47 COMPROMISSO

Caso as partes cheguem numa autocomposiccedilatildeo num acordo o que poderaacute ocorrer integralmente ou parcialmente deveratildeo redigi-lo de forma que seja exequiacutevel exigiacutevel praacutetico e duradouro Entretanto eacute oportuno salientar que a precipitaccedilatildeo natildeo combina com uma comunicaccedilatildeo eficaz tampouco com a satisfaccedilatildeo de todos os envolvidos

Havendo um acordo que atenda os interesses das partes eacute preciso pensar nas suas consequecircncias incluindo um possiacutevel descumprimento mas como jaacute foi dito se existir seriedade responsabilidade e engajamento eacute difiacutecil que isto aconteccedila daiacute porque toda a negociaccedilatildeo precisa ser bem feita o acordo deve ser bem redigido exigindo para tanto que todo o planejamento da negociaccedilatildeo e sua execuccedilatildeo sejam adequados implicando em lealdade boa-feacute e probidade

Deve-se pensar nos aspectos objetivos e subjetivos no tempo na forma e no lugar que seraacute cumprido o acordo bem como nas consequecircncias para as partes como elas vatildeo se sentir e viabilizar sua efetivaccedilatildeo Deve portanto o negociador insistir em criteacuterios objetivos e saber formular os pedidos pensando em todos detalhes que deveratildeo ser escritos pelo advogado e ao final formalizado o muacutetuo acordo assina-do pelas partes e pelos advogados

5 CONCLUSAtildeO

O tempo eacute o senhor de todas as coisas portanto eacute preciso permitir que tudo aconteccedila naturalmente a fim de evitar situaccedilotildees indelicadas de arrependimento ou de outros sentimentos negativos respeitando a dignidade das pessoas envolvidas no procedimento da negociaccedilatildeo

A negociaccedilatildeo eacute um caminho que viabiliza a comunicaccedilatildeo entre as partes existindo ou natildeo o conflito podendo ser utilizada em todas as relaccedilotildees sociais

Neste processo para obter um resultado eficaz eacute preciso que todos estejam aptos a se envolver conhecendo suas fragilidades preparando-se adequadamente e principalmente possibilitando que o outro lado tambeacutem mostre seus interesses colocando-se no lugar do outro permitindo a busca por um caminho que atenda ao interesse de todos

Tal processo natildeo implica em concessotildees perdas submissatildeo mas sim em agregar comprometer-se bus-cando ver aqueles com quem se estaacute negociando natildeo como inimigos ainda que sejam adversaacuterios mas sim como pessoas que tambeacutem possuem interesses necessidades e buscam algo que precisam resolver

A negociaccedilatildeo pode ocorrer nos acircmbitos extrajudicial judicial ou arbitral e muitas vezes pode antecedecirc--los podendo ser retomada a qualquer tempo durante e apoacutes alguma decisatildeo sendo sempre pertinente

O advogado tem papel fundamental para o bom desempenho do procedimento de negociaccedilatildeo incenti-vando seu cliente mostrando os benefiacutecios que o procedimento traraacute tendo acesso agrave parte contraacuteria ao seu patrono promovendo uma comunicaccedilatildeo eficaz promissora empaacutetica com reciprocidade e respeito

Sendo assim eacute relevante que exista uma visatildeo multidisciplinar sobre a realidade dos conflitos uma visatildeo diferenciada dos litigantes com profissionais adequadamente preparados para orientaacute-los e conscientes do melhor meio para alcanccedilar o bem comum sem imposiccedilotildees arbitrariedades e abusos buscando a conscientizaccedilatildeo em prol do interesse comum para que todos busquem uma soluccedilatildeo pres-supondo o resgate de suas responsabilidades

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Diante disto o uso dos fundamentos da negociaccedilatildeo do Meacutetodo de Harvard e os elementos da Teoria da Comunicaccedilatildeo Natildeo-Violenta satildeo mecanismos que auxiliaratildeo nestas relaccedilotildees humanas restabelecen-do a comunicaccedilatildeo entre as partes sendo menos traumaacutetica para os litigantes viabilizando o trabalho daqueles que se dispotildeem a ajudaacute-los estando todos focados nesta busca o que sem duacutevida aleacutem de beneficiar os envolvidos no conflito beneficiaraacute toda a sociedade resguardando o princiacutepio da digni-dade humana o acesso agrave justiccedila e o exerciacutecio de cidadania restabelecendo viacutenculos promovendo paz e harmonia com resultados eficazes e satisfaccedilatildeo pessoal e profissional

REFEREcircNCIAS

BIELA Jr Minimanual do novo coacutedigo de eacutetica e disciplina dos advogados 2 ed Salvador JusPodivm 2017

BULOS Uadi Lammecircgo Curso de Direito Constitucional Satildeo Paulo Saraiva 2007

CURIA Luiz Roberto CEacuteSPEDES Livia ROCHA Fabiana Dias da Novo coacutedigo de processo civil obra coletiva Satildeo Paulo Saraiva 2015

FISHER Roger URY William e PATTON Bruce Como chegar ao sim negociaccedilatildeo de acordos sem con-cessotildees 2 ed rev e amp Rio de Janeiro Imago 2005

MOURAtildeO Figueiredo SILVA Alessandra Nascimento Teacutecnicas de negociaccedilatildeo para advogados 4 ed rev Satildeo Paulo Revista dos Tribunais 2017

PUPO Sergio Tadeu O papel do advogado na sociedade contemporacircnea a gestatildeo do conflito Satildeo Paulo Perse 2014

ROSENBERG Marshall B Comunicaccedilatildeo natildeo-violenta teacutecnicas para aprimorar relacionamentos pes-soais e profissionais Satildeo Paulo Aacutegora 2006

SILVA De Plaacutecido e Vocabulaacuterio juriacutedico 4 ed Rio de Janeiro Forense 1994 v I II III

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COMO ACERCAR EL PROCESO CONTENCIOSO ADMINISTRATIVO LABORAL A LOS FUNDAMENTOS DE LA NUEVA LEY PROCESAL DEL TRABAJO1

Omar Toledo Toribio2

1 INTRODUCCIOacuteN

La Nueva Ley Procesal del Trabajo (en adelante NLPT) en su artiacuteculo en el artiacuteculo 24 establece que los Jueces Especializados de Trabajo son competentes para conocer en proceso contencioso adminis-trativo conforme a la ley de la materia las pretensiones originadas en las prestaciones de servicios de caraacutecter personal de naturaleza laboral administrativa o de seguridad social de derecho puacuteblico asiacute como las impugnaciones contra actuaciones de la autoridad administrativa de trabajo

La mencioacuten a que el proceso contencioso administrativo laboral (En adelante PCAL) se tramitaraacute con-forme a la ley de la materia nos indica ciertamente que la tramitacioacuten de dichos procesos deberaacuten seguirse bajo la pauta del TUO de la Ley del Proceso Contencioso Administrativo aprobado por decre-to Supremo 013-2008-JUS (en adelante LPCA) que como sabemos establece un procedimiento pre-dominantemente escrito con algunos rasgos orales como es el caso de los informes orales que pudieran solicitarse antes de que la causa se encuentre expedita para dictar sentencia (Artiacuteculo 29 e) y f)

Sin embargo de cara a las bondades y evidentes beneficios que significa la instrumentacioacuten de un pro-ceso oral esto es un proceso ceacutelere transparente y en el que se destaca los principios de inmediacioacuten y concentracioacuten existen planteamientos no solamente en sede nacional sino en el derecho comparado3 que destacan la necesidad de implementar la oralidad en el PCAL para lo cual se discute si es necesaria una modificacioacuten legislativa o si en una especie de buenas praacutecticas judiciales se puede perfectamente introducir y aplicar los fundamentos y principios que inspiran la NLPT y especialmente la oralidad que se resume en la norma contenida en el artiacuteculo 121 de la NLPT que preveacute que en los procesos laborales por audiencias las exposiciones orales de las partes y sus abogados prevalecen sobre las escritas sobre la base de las cuales el juez dirige las actuaciones procesales y pronuncia sentencia

Precisamente la intencioacuten de la presente ponencia es plantear un conjunto de ideas que van en la direc-cioacuten de establecer la aplicacioacuten de los principios y fundamentos que sustentan la NLPT en el desarrollo del PCAL lo cual va a tono con las nuevas tendencias procesales que en nuestro paiacutes se inicioacute en el aacutembi-to penal y luego en el aacuterea laboral y a tenor de las propuestas hechas puacuteblicas recientemente ahora se plantea en la justicia civil

1 Ponencia presentada en el II Congreso Internacional de Derecho Procesal del Trabajo realizado en Cajamarca-Peruacute del 25 al 27 de abril

2018 y organizado por la Sociedad Peruana de Derecho del Trabajo y la Seguridad Social

2 Doctor en Derecho y Ciencia Poliacutetica (UNMSM) Magister en Derecho (UNMSM) Juez (p) de la Tercera Sala de Derecho Constitucional y Social

Transitoria de la Corte Suprema de Justicia de la Repuacuteblica del Peruacute con estudios en Litigacioacuten Oral Laboral en el California Western School Of

Law en la Universidad de Medelliacuten y en la Escuela Judicial ldquoRodrigo Lara Bonillardquo de Colombia Catedraacutetico de Maestriacutea y Doctorado de la Facultad

de Derecho ndashUnidad de Post Grado de la Universidad Nacional Mayor de San Marcos Catedraacutetico de la Facultad de Derecho y Ciencias Poliacuteticas

(Seccioacuten de pre y post grado) de la Universidad de San Martiacuten de Porres Profesor Principal de la Academia de la Magistratura Asociado Ordinario

de la Asociacioacuten Peruana de Derecho Constitucional y Delegado en Peruacute de la Asociacioacuten Latinoamericana de Jueces de Trabajo Miembro de la

Sociedad Peruana de Derecho del Trabajo y la seguridad Social Ostenta la Condecoracioacuten con la Orden de Trabajo en Grado de Oficial otorgada

el antildeo 2010 y la MEDALLA CIacuteVICA DEL DERECHO otorgada por el Ilustre Colegio de Abogados de Lima en diciembre del antildeo 2017

3 A decir del Profesor costarricense Ernesto Jinesta L ldquouna de las soluciones para acelerar abreviar o acortar el proceso administrativo

lo constituye la introduccioacuten de un proceso por audiencias en la oralidad constituyen indudablemente remedios efectivos y acertados

contra la lentitud patoloacutegica del proceso administrativordquo En JINESTA Ernesto (1999) La oralidad en el Proceso Contencioso

Administrativo Ivstituia (Antildeo 13 n 155-156)

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2 LOS PRINCIPIOS Y FUNDAMENTOS EN LA NUEVA LEY PROCESAL DE TRABAJO

Los principios del derecho procesal laboral constituyen la base dogmaacutetica del mismo que lo tipifican como una disciplina autoacutenoma Son pautas o reglas de orientacioacuten que intervienen en las diversas fases de la actividad juriacutedica esto es en la creacioacuten o gestacioacuten de normas en la interpretacioacuten y en la aplica-cioacuten de las mismas por parte de los tribunales

Tal como sentildeala PLAacute RODRIGUEZ Ameacuterico ldquo[hellip] los principios y fundamentos del proceso laboral asu-men caracteriacutesticas que es necesario resaltar Una primera caracteriacutestica consiste en sentildealar que son enunciado baacutesicos que pretenden abarcar una serie indefinida de situaciones y no una en particular de tal manera que puedan ser utilizados en una diversidad de situaciones lugares tiempos etcrdquo4

Los principios por su propia naturaleza pertenecen al aacutembito del ldquodebe serrdquo y no necesariamente del ldquoserrdquo es decir algunos de estos postulados no siempre se dan en la realidad aunque algunos de ellos ya han sido recogidos en la legislacioacuten positiva

Gamarra Viacutelchez sentildeala que ldquolos principios del Derecho Procesal del Trabajo poseen sus propias caracteriacutesticas y funciones dentro del Derecho Laboral sustantividad propia en razoacuten del Derecho Laboral sustantividad propia en razoacuten de su generalidad y obedecen a la inspiracioacuten de justicia social que es la razoacuten de ser desde su nacimiento de ahiacute que busquen favorecer al trabajador Y se vinculan con cada institucioacuten procesal en una determinada realidad social en donde actuacutean o deben de actuar ampliando o restringiendo el criterio de su aplicacioacuten Por ello es importante la necesidad de una auto-nomiacutea normativa que permitan construir un sistema de derecho procesal del trabajo En tanto que un sistema denota relacioacuten de coherencia entre los principios y las normas que la componen5A continua-cioacuten analizaremos los principios del derecho procesal del trabajo que precisamente lo distinguen como una disciplina especial orientada a superar el desequilibrio innato de las partes de la relacioacuten laboral

3 PRINCIPIO INQUISITIVO (dispositivo atenuado)

El Sistema Dispositivo y el Sistema Inquisitivo son los grandes sistemas procesales ldquoEl principio dispo-sitivo es aquel en el que se asigna a las partes y no al Juez la iniciativa del proceso el ejercicio y el poder de renunciar a los actos del proceso En el inquisitivo en cambio es el oacutergano jurisdiccional el que tiene esos poderes eacutel es quien debe actuar por siacute e investigar (inquirire) Un proceso estaacute dominado por el principio dispositivo entonces cuando las partes pueden iniciarlo libremente y tienen la disponibilidad de este y de sus diversos actos En el inquisitivo es el tribunal es el que lo inicia averigua y decide con libertad sin estar encerrado en los liacutemites fijados por las partesrdquo 6

Sin embargo como sostiene el profesor Monroy Gaacutelvez ldquola historia del derecho procesal no conoce un solo caso de vigencia real y efectiva de un ordenamiento procesal en el que alguno de los dos sistemas procesales esteacute presente sin ser afectado por el otro ldquolos sistemas citados no se presentan quiacutemica-mente puros lo que suele haber son tendencias maacutes o menos definidas que permiten advertir la prima-ciacutea de uno sobre otrordquo7

4 PLAacute RODRIGUEZ Ameacuterico ldquoLos Principios del Derecho del Trabajordquo 3 Ed Ediciones Depalma Buenos Aires 1998

5 GAMARRA VIacuteLCHEZ Leopoldo Los Principios del Derecho Procesal del Trabajo en Aportes para la reforma del Proceso Laboral

Peruano SPDTSS Lima 2005 p 26

6 Vescovi Enrique Teoriacutea General del Proceso Temis Bogotaacute 1984 p51-52

7 Monroy Galvez Juan Introduccioacuten al Proceso Civil Temis Bogotaacute 1996 p 87

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Si se trata de ubicar al Proceso Laboral en uno de los grandes sistemas procesales podemos concluir sin lugar a dudas que dicho proceso se ubica en el Sistema Inquisitivo En efecto en el proceso laboral el Juez se encuentra dotado de una serie de facultades atribuciones y prerrogativas que lo convierten en un principal impulsor del proceso y confieren por tanto un tinte marcadamente inquisitivo a dicho proceso

El artiacuteculo III del Tiacutetulo Preliminar de la Nueva Ley Procesal de Trabajo (en adelante NLPT) establece que los jueces laborales tienen un rol protagoacutenico en el desarrollo e impulso del proceso lo cual patentiza la presencia del caraacutecter inquisitivo del proceso laboral Ademaacutes de ello a lo largo de la nueva norma procesal encontramos un conjunto de rasgos y signos que nos demuestran dicho caraacutecter y los cuales vamos a ver a continuacioacuten

31 FACULTAD DE FALLO ULTRA PETITA

Una de las manifestaciones de caraacutecter inquisitivo del proceso laboral consiste en que el Juez Laboral se encuentra facultado para expedir sentencias que vayan maacutes allaacute del petitorio contenido en la demanda posibilidad que se encuentra proscrita en el proceso comuacuten o proceso civil en virtud de que en el mismo impera el principio de congruencia contemplado en el artiacuteculo VII del Tiacutetulo Preliminar del Coacutedigo Procesal Civil8 De esta manera la facultad de fallo ultra petita constituye una hipoacutetesis de flexibilizacioacuten del principio de congruencia que se justifica por la naturaleza especial de la controversia laboral y por la necesidad de garantizar el acceso a la tutela jurisdiccional efectiva en un estado democraacutetico y social de derecho

Refirieacutendose a esta facultad del juzgador laboral el extinto profesor de la Universidad Catoacutelica Mario Pasco Cosmoacutepolis sostiene que ldquopor economiacutea procesal por suplencia indirecta de la demanda por proteccioacuten de los derechos irrenunciables del trabajador por prevalencia del fondo y de la verdad real sobre la verdad formal o aparente el derecho procesal del Trabajo admite pues la posibilidad de un fallo que despojaacutendose de ataduras formales excesivas desborde lo demandado Cuando tal exceso es cuantitativo se denomina ultra petita maacutes allaacute de lo pedido cuando es cualitativo se denomina extra petita distinto de lo demandadordquo9

Nos encontramos frente a un fallo ultra petita cuando el Juez ordena el pago de un monto mayor a lo deman-dado si advierte errores aritmeacuteticos o de caacutelculo o errores en la fundamentacioacuten juriacutedica de la demanda o cuando percibe que se ha aplicado indebidamente una norma legal que tiene implicancia en el monto del fallo Es decir estamos ante un fallo ultra petita cuando la sentencia sobrepuja o excede a la demanda en teacuterminos cuantitativos Nuestro sistema procesal laboral confiere al Juzgador la facultad ultra petita esto es la posibilidad de expedir sentencias que en teacuterminos cuantitativos excedan a la demanda

Seguacuten Ernesto Krotoschin ldquoLa jurisprudencia por lo general ha comprendido en el sentido que acaba de exponerse la facultad de sentenciar ultra petita Aplicando este criterio se ha decidido que la antiguumledad a los efectos de calcular la indemnizacioacuten por despido debe computarse de conformidad con lo dispuesto por la ley vigente aun cuando el demandante la haya calculado en forma menos favorable para eacutel o que corresponde disponer el pago de intereses sobre dicha indemnizacioacuten en cambio si soacutelo se reclama por indemnizacioacuten no entra en las facultades del juez condenar tambieacuten al pago de salarios atrasados o de la retribucioacuten por vacaciones y del sueldo anual complementario de horas extraordinarias de trabajo ni de los diacuteas faltante para completar el mes de despido y otorgamiento de un certificado de trabajordquo (sic)10

8 El principio de congruencia tiene las siguientes manifestaciones El objeto del proceso (Thema decidendum) lo fijan las partes y es dentro

de esos liacutemites como el Juez debe decidir el Juez deberaacute fallar de conformidad con lo alegado y probado por las partes (secundum allegata e probata) y la sentencia debe fijarse dentro de los liacutemites de las pretensiones deducidas por el actor y aquello que reconoce o controvierte

el demandado En otras palabras el Juez debe resolver todo lo que las partes piden pero no maacutes esto es conforme (congruente) con lo

solicita por la parte En eat judex ultra petita partium

9 Pasco Cosmoacutepolis Mario-rdquoFundamentos de Derecho Procesal del Trabajordquo Lima aele 1997p55

10 Ernesto Krotoschin ldquoTratado praacutectico de derecho del trabajordquo4ta ed Buenos Aires Ed Desalma 1981 pp 639-693 (cuarta parte)

Citado por el Centro Interamericano de Administracioacuten del Trabajo (CIATOIT) en el libro ldquoFichas para la Investigacioacutenrdquo 1era edicioacuten

diciembre de 1986

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Por su parte para el doctor Mario Pasco Cosmoacutepolis ldquoLos requisitos para la incorporacioacuten en la sen-tencia de cantidades superiores o materias distintas son taxativos e inexcusables a saber a Que aun-que no aparezcan o aparezcan de modo distinto en la demanda hayan surgido a debate en el curso del proceso b Que hayan quedado acreditadas probadas de modo tan incuestionable que hayan podido producir conviccioacuten absoluta en el juez sobre la precedencia del derecho c Que el derecho se ampa-rado esto es que la faculta se ejerza pro operario d Que versen sobre derechos irrenunciablesrdquo(sic)11

El artiacuteculo 48 inciso 3 de la Ley 26636 estableciacutea que el juez puede ordenar el pago de sumas mayores a las reclamadas si de lo actuada apareciere error en los caacutelculos de las liquidaciones demandadas

La norma legal citada tiene su antecedente en el inciso c) del artiacuteculo 50 del Decreto Supremo No 03-80-TR norma legal con rango de ley que reguloacute el Proceso Laboral Judicial hasta la entrada en vigencia de la Ley Procesal de Trabajo 2663612

Por su parte la NLPT en el artiacuteculo 31 establece que la sentencia se pronuncia sobre todas las articu-laciones o medios de defensa propuestos por las partes y sobre la demanda en caso de que la declare fundada total o parcialmente indicando los derechos reconocidos asiacute como las prestaciones que debe cumplir el demandado Si la prestacioacuten ordenada es de dar una suma de dinero la misma debe estar indicada en monto liacutequido El juez puede disponer el pago de sumas mayores a las demandadas si apare-ciere error en el caacutelculo de los derechos demandados o error en la invocacioacuten de las normas aplicables

De esta manera en virtud de la facultad ultra petita el juez laboral podriacutea otorgar un mayor monto por Compensacioacuten por Tiempo de Servicios en caso de que el actor incurra en un error al no considerar determinados rubros que legalmente forman parte de la Remuneracioacuten Computable (remuneracioacuten que se toma como base de caacutelculo para establecer la Compensacioacuten por Tiempo de Servicios conforme a lo regulado por los artiacuteculos 9 a 20 del Decreto Supremo No 01-97-TR -Texto Uacutenico Ordenado de la Ley de CTS) De otro lado en teacuterminos generales dicha facultad resulta igualmente aplicable en el caso de que exista alguacuten error aritmeacutetico en la determinacioacuten de los beneficios sociales o en la sumatoria del total adeudado Finalmente consideramos que la citada atribucioacuten podriacutea ser ejercitada si el actor reclama el pago de las gratificaciones de los meses de julio y diciembre considerando erroacuteneamente que el monto de cada gratificacioacuten asciende al 50 de la Remuneracioacuten del actor cuando de conformi-dad con la Ley 27735 la gratificacioacuten equivale a un sueldo iacutentegro por cada oportunidad

32 LA FLEXIBILIZACIOacuteN DEL PRINCIPIO DE CONGRUENCIA EN EL

PROCESO CONTENCIOSO ADMINISTRATIVO LABORAL

Si bien en la LPCA no existe una disposicioacuten similar a la prevista en el artiacuteculo 31 de la NLPT si resul-ta posible que la sentencia en el proceso contencioso administrativo pueda sobrepujar o exceder los teacuterminos de la demanda que incluso puede ser considerada como una facultad de fallo extra petita En efecto el TUO de la LPCA en su artiacuteculo 41 establece que ldquoLa sentencia que declare fundada la deman-da podraacute decidir en funcioacuten de la pretensioacuten planteada lo siguiente 2 El restablecimiento o reconoci-miento de una situacioacuten juriacutedica individualizada y la adopcioacuten de cuantas medidas sean necesarias para el restablecimiento o reconocimiento de la situacioacuten juriacutedica lesionada aun cuando no hayan sido pre-tendidas en la demanda[hellip]rdquo(lo resaltado es nuestro)

11 Pasco Cosmoacutepolis MariordquoFundamentos de Derecho Procesal del Trabajordquo Lima aele 1997p57

12 Artiacuteculo 50 La sentencia declararaacute fundada la demanda c) Respecto de los hechos constatados por el Juez Privativo de Trabajo y

Comunidades Laborales que constituyan violacioacuten de las normas legales o convencionales objeto de la demanda pudiendo ordenar

tambieacuten el pago de sumas mayores a las reclamadas si de lo actuado apareciere error en los caacutelculos de las liquidaciones demandadasrdquo

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Para Giovanni Priori ldquoesta es una consecuencia del contencioso-administrativo de plena jurisdiccioacuten y con la finalidad de brindar una efectiva tutela a la situacioacuten juriacutedica objeto del proceso el Juez podraacute ordenar las medidas necesarias para su efectiva tutela aun cuando no hayan sido demandadas con-virtieacutendose esta decisioacuten en una excepcioacuten al principio de congruencia algo que es plausible de la Ley pues al menos en esta sede siacute reconoce una excepcioacuten al principio de congruenciardquo13

En este orden de ideas constatamos que si es posible la instrumentacioacuten del principio inquisitivo del proceso laboral en un proceso contencioso administrativo desde el momento que la sentencia puede exceder los planteamientos de la demanda

4 PRINCIPIO DE SUPLENCIA INDIRECTA DE LA DEMANDA

Por otro lado uno de los pocos rasgos de caraacutecter dispositivo del proceso laboral14 es que los teacuterminos de la demanda son fijados por el actor lo cual delimita los extremos de la controversia Sin embargo por la naturaleza de los derechos en controversia en el proceso laboral pues se tratan de derechos contenidos en normas de orden puacuteblico y se encuentran vinculados al ejercicio de derechos fundamentales al Juez laboral se le ha dotado de la facultad de suplencia indirecta de la demanda En virtud de esta facultad siendo que los derechos laborales son de orden puacuteblico el Juez puede adecuar la calificacioacuten efectuada en la demanda si de los hechos que forman parte de la causa petendi expuesta por el actor se puede concluir de manera categoacuterica cual es realmente la calificacioacuten juriacutedica que corresponde a lo pretendido por el demandante lo cual no es sino en principio la aplicacioacuten del principio de iura novit curia

Por otro lado la suplencia indirecta de la demanda laboral constituye una hipoacutetesis de flexibilizacioacuten del principio de congruencia en un estado democraacutetico y social de derecho que encuentra sustento no solamente en la necesidad de garantizar el derecho al acceso a la justicia componente fundamental del derecho al debido proceso y la tutela jurisdiccional efectiva garantizado en el artiacuteculo 139 inciso 3 de la Carta Poliacutetica sino en los principios que inspiran al nuevo proceso laboral regulado por la Ley Ndeg 29497 cuyo artiacuteculo III del Tiacutetulo Preliminar proclama que en todo proceso laboral los jueces privile-gian el fondo sobre la forma e interpretan los requisitos y presupuestos procesales en sentido favora-ble a la continuidad del proceso

En ese sentido y en armoniacutea con los principios descritos resulta vital que la prosecucioacuten del nuevo pro-ceso laboral debe estar orientado a que el Juez despojaacutendose de las formalidades ingrese al anaacutelisis de lo sustancial o medular siempre que se garantice los derechos de ambas partes esencialmente el dere-cho de defensa sustento baacutesico del debido proceso

En los seguidos por Jherlin Wilmer Suarez Milian contra Hilanderiacutea Andina SAC sobre reposicioacuten y otros Exp Ndeg 30711-2012-0-1801-JR-LA-03 (A) la Cuarta Sala Laboral de Lima bajo la ponencia nuestra mediante mandato de fecha 27 de diciembre de 2013 ha resuelto REVOCAR la resoluci-oacuten nuacutemero dos de fecha 18 de enero de 2013 obrante de fojas 61 a 63 que declara improcedente la demanda y REFORMAacuteNDOLA se dispuso la adecuacioacuten de la demanda y que el juez de la causa admita a traacutemite la demanda de reposicioacuten por despido fraudulento y prosiga la causa conforme a su estado bajo los siguientes fundamentos

13 Priori Posada Giovanni ldquoComentarios a la Ley del proceso Contencioso Administrativordquo ARA Editores 4taEdic Lima 2009 p272

14 Si bien el proceso laboral tiene un tinte marcadamente inquisitivo no hay que olvidar que posee algunos rasgos dispositivos como el

sentildealado Estos conceptos han sido analizados por el Vocal Ponente en el artiacuteculo ldquoEl Principio de Congruencia en el Proceso Laboralrdquo en

el Artiacuteculo publicado en Revista Actualidad Juriacutedica Ndeg 193 diciembre de 2009 p 263-266

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17 Se advierte del escrito de demanda que el actor presentoacute ante el 03deg Juzgado Especializado de

Trabajo Permanente de Lima como petitorio (petitum) ldquo[hellip] se ordene a la demandada se deje sin

efecto el DESPIDO INCAUSADO que sufriera el 08 de noviembre de 2012 y consiguientemente

se ordene mi reposicioacuten en el mismo puesto y en el cargo de Hilandero que veniacutea ostentando

hasta antes de ser despedido por considerar que estamos ante un tiacutepico despido incausado ya

que la demandada so- pretexto de comisioacuten de falta grave me ha despedido del trabajo sin que

mi persona haya cometido falta algunardquo (sic)

18 Asimismo en el escrito de subsanacioacuten de demanda que obra de fojas 58 a 60 el accionante

precisa que en su caso se ha producido un despido arbitrario ya que considera que en el presente

proceso la demandada no podraacute demostrar la supuesta falta contenida por su persona hecho

que de acuerdo a lo establecido en el artiacuteculo 34 del Decreto Supremo Ndeg 003-97-Tr hay

arbitrariedad cuando en un proceso no se puede probar la falta atribuida

19 Por otro lado como causa petendi sentildeala que su persona en ninguacuten momento ha cometido

falta grave que amerite su despido y que es falso que su persona haya agredido al sentildeor Yan Taijin

Nagkai y que solo se trata de actos de represalia por su condicioacuten de trabajador sindicalista

20 De lo antes expuesto se colige que los hechos expuestos por el demandante como causa

petendi encuadrariacutean dentro de la figura del despido fraudulento esto es cuando se despide

al trabajador con aacutenimo perverso y auspiciado por el engantildeo por ende de manera contraria a

la verdad y la rectitud de las relaciones laborales aun cuando se cumple con la imputacioacuten de

una causal y los caacutenones procedimentales como sucede cuando se imputa al trabajador hechos

notoriamente inexistentes falsos o imaginarios o asimismo se le atribuye una falta no prevista

legalmente vulnerando el principio de tipicidad Definicioacuten del despido fraudulento aportada

por el Tribunal Constitucional en la sentencia recaiacuteda en el expediente Ndeg 976-2001-AATC

Caso Eusebio Llanos Huasco

21 En ese sentido si bien el accionante solicita como petitorio sentildealando que en su caso se ha

producido un despido arbitrario y como consecuencia de ello solicita la reposicioacuten a su centro de

labores conforme lo ha expresado en su escrito de subsanacioacuten de demanda obrante de fojas

58 a 60 de los hechos expuestos como causa de pedir puede colegirse meridianamente que el

petitum de reposicioacuten estaacute respaldado por hechos que configurariacutean un despido fraudulento

que como hemos sostenido en este colegiado en pronunciamientos anteriores no constituye

sino una modalidad de despido arbitrario

22 Por lo tanto por aplicacioacuten del principio del iura novit curia y por suplencia indirecta de la

demanda y en la labor de optimizar la proteccioacuten de los derechos fundamentales este Colegiado

considera que la tutela pretendida en este proceso es de naturaleza restitutoria (reposicioacuten)

por despido fraudulento siendo que corresponderaacute al pronunciamiento en la sentencia luego de

cumplirse con las reglas del contradictorio y el debate probatorio establecer si efectivamente

los hechos expuestos por el demandante tienen asidero

En esta orientacioacuten con mucha satisfaccioacuten hemos constatado que el Pleno Jurisdiccional Nacional Laboral del antildeo 2014 celebrado el 24 y 25 de octubre en la ciudad de Tacna ha acordado por mayoriacutea en el tema 2 referido a la calificacioacuten juriacutedica de los hechos expuestos en la demanda que ldquoSi puede el juez calificar los hechos expuestos en la demanda sobre reposicioacuten eligiendo entre los diferentes supuestos de despido inconstitucionales (incausado fraudulento y nulo) en virtud de la aplicacioacuten de principios como son Suplencia de queja deficiente Iura Novit Curia y Prevalencia de fondo sobre la forma siem-pre y cuando haya sido sometido a contradictoriordquo15

41 EL PRINCIPIO DE SUPLENCIA DE OFICIO EN LA LPCA

A diferencia del principio de suplencia indirecta de la demanda que podemos extraer mediante una labor interpretativa de los principios que gobiernan el nuevo proceso laboral la LPCA si contiene expresamente el principio de la suplencia de oficio al sentildealar en el artiacuteculo 24 que el juez deberaacute suplir las deficiencias formales en las que incurran las partes sin perjuicio de disponer la subsanacioacuten de las mismas en un plazo razonable en los casos en que no sea posible la suplencia de oficio

15 En Materiales proporcionados en el Taller De Intercambio de Experiencias Sobre La Nueva Ley Procesal Del Trabajo realizado el 01

de diciembre 2014 en la provincia constitucional del Callao y organizado por PPR 099-Celeridad en los Procesos Judiciales Laborales

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A decir de Viacutector Anacleto por este principio se busca que el juez dinaacutemico activo coadyuve al control de la Administracioacuten Puacuteblica y por ello es que ante cualquier desconocimiento del ciudadano tiene que suplir tiene que apoyar para suplir las deficiencias formales del administrado al juez le compete favo-recer para que se acceda al control de la Administracioacuten Puacuteblica16

De esta forma constatamos que existe un acercamiento de los principios que impulsan el nuevo proce-so laboral con aquellos principios que sustentan el Proceso Contencioso Administrativo

5 EL PRINCIPIO DE VERACIDAD

El artiacuteculo I del Tiacutetulo Preliminar de NLPT ha consagrado expliacutecitamente este principio seguacuten el cual el proceso laboral no se conforma con la verdad aparente formal la que fluye uacutenicamente de los docu-mentos sino que busca la verdad absoluta la realidad de los hechos

El principio de veracidad no es sino el correlato del principio de la primaciacutea de la realidad

Al respecto Ameacuterico Pla Rodriacuteguez sentildeala que ldquoel principio de la primaciacutea de la realidad significa que en caso de discordancia entre lo que ocurre en la praacutectica y lo que surge de los documentos y acuerdos debe darse preferencia a lo primero es decir a lo que sucede en el terreno de los hechosrdquo 17

El principio de la primaciacutea de la realidad es una de las herramientas maacutes relevantes del Derecho del Trabajo que en el caso peruano no solamente tiene un arraigo en la jurisprudencia sino que incluso ya se encuentra positivizado en nuestro ordenamiento laboral18

Se trata de evitar que en el aacutembito de las relaciones laborales con el objeto de burlar los derechos labo-rales se disfrace una relacioacuten laboral y se haga aparecer como si se tratara de una relacioacuten de caraacutecter civil o comercial o para burlar a los acreedores o lograr algunas prestaciones de la Seguridad Social se trate de aparentar la existencia de una relacioacuten laboral

El principio de la Primaciacutea de la Realidad se ha plasmado en numerosos pronunciamientos jurispru-denciales no soacutelo de la judicatura laboral sino incluso del Tribunal Fiscal y del INDECOPI siendo que incluso el Pleno Jurisdiccional Laboral realizado en la ciudad de Tarapoto en el antildeo 2000 ha acordado que ldquosi el Juez constata la existencia de una relacioacuten laboral a pesar de la celebracioacuten de un contrato de servicios civil o mercantil deberaacute preferir la aplicacioacuten de los principios de la primaciacutea de la realidad y de irrenunciabilidad sobre el buena feacute contractual que preconiza el Coacutedigo Civil para reconocer los derechos laborales que correspondanrdquo

Que este reconocimiento a nivel doctrinal y jurisprudencial ya habiacutea sido recogido en el artiacuteculo I del Tiacutetulo Preliminar de la Ley Procesal de Trabajo 2636 bajo la denominacioacuten del principio de veracidad que como hemos indicado liacuteneas arriba no es sino el correlato del mismo aunque como tal esto es como principio de primaciacutea de la realidad ha sido positivizado por vez primera en nuestra legislacioacuten laboral mediante el Decreto Legislativo 910 cuyo artiacuteculo 5 inciso f) establece que la inspeccioacuten de tra-bajo se ejecuta a traveacutes de las acciones entre otras ldquoAplicar el principio de primaciacutea de la realidad que rige el derecho laboral el cual determina que se deba privilegiar los hechos vinculados sustantivamen-te con el trabajo sobre los actos formales que difieran de la naturaleza de tales situacionesrdquo El artiacuteculo 22 de la actual Ley General de Inspeccioacuten del Trabajo Nordm 28806 lo reconoce en similares teacuterminos19

16 ANACLETO GUERRERO Viacutector Proceso Contencioso Administrativo Lex amp Iuris Grupo Editorial 2016 p105

17 Los Principios del Derecho del Trabajo Depalma Bs As 1998 p 313

18 TOLEDO TORIBIO Omar ldquoEl Principio de la Primaciacutea de la Realidadrdquo En Revista Diaacutelogo con la Jurisprudencia Antildeo 10 Ndeg75 Diciembre

2004 pp 87 a 89

19 TOLEDO TORIBIO Omar ldquoPrincipios Ordenadores que rigen el Sistema de Inspeccioacuten de Trabajordquo En Comentarios a la Ley General de

Inspeccioacuten de Trabajo Gaceta Juriacutedica SA Lima 2008 p33-42

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A este inicial reconocimiento legal del principio de la primaciacutea de la realidad se agrega que en el Artiacuteculo 54 del Anteproyecto de la Ley de Reforma de la Constitucioacuten se sentildeala que el Estado estaacute obligado a garantizar la prevencioacuten eliminacioacuten y remedio de cualquier praacutectica que implique abuso en el cam-po laboral siendo que para ello se sentildeala que en toda relacioacuten de trabajo se garantizaran principios miacutenimos entre ellos el principio de la primaciacutea de la realidad (inciso 4) Asimismo el Art XIV6 del Anteproyecto de Ley General de Trabajo consagra como principios del ordenamiento laboral entre otros a la Primaciacutea de la realidad para preferir los hechos sobre las formas y las apariencias

A ello debemos agregar que la Ley General del Sistema Concursal (Ley 27809 -EP 8802) ha incor-porado la referencia a este importante principio del Derecho Laboral en lo relativo a la calificacioacuten de creacuteditos laborales En efecto seguacuten esta ley para el reconocimiento de creacuteditos de origen laboral y siempre que el acreedor lo haya invocado la Comisioacuten podraacute aplicar el principio de la primaciacutea de la realidad privilegiando los hechos verificados sobre las formas o apariencias contractuales que susten-ten el creacutedito (Artiacuteculo 40)

De manera pues que la aplicacioacuten del principio de la primaciacutea de la realidad viene a constituir un impor-tante instrumento a efectos de calificar debidamente los creacuteditos laborales y evitar de esta manera la simulacioacuten de la existencia de contratos de otra naturaleza para encubrir verdaderos contratos labo-rales o la simulacioacuten de la existencia de creacuteditos laborales con el objeto de beneficiarse en este uacuteltimo caso del caraacutecter preferencial de los creacuteditos laborales garantizado en el artiacuteculo 24 de la Constitucioacuten Poliacutetica y el artiacuteculo 421 de la Ley del Sistema Concursal

Creemos que la consagracioacuten legislativa del principio implica que no solamente resulta de aplicacioacuten en los aacutembitos indicados sino con mayor razoacuten seraacute de aplicacioacuten por parte de la judicatura al decidir sobre conflictos juriacutedicos de naturaleza laboral

La jurisprudencia del Tribunal Constitucional ha sido muy recurrente en cuanto a la aplicacioacuten de este principio tal es el caso de la sentencia expedida en el Expediente Ndeg 00457-2006 AATC Ucayali ha sentildealado que

5 De la evaluacioacuten conjunta del acta de inspeccioacuten y de los abundantes medios probatorios

resentildeados que obran en el expediente se comprueba que si bien durante el tiempo que

los recurrentes trabajaron en la empresa demandada celebraron contratos de locacioacuten de

servicios en realidad llevaban a cabo sus labores bajo un horario establecido y estaban sujetos

a una relacioacuten de subordinacioacuten y dependencia Consecuentemente conforme al principio

de primaciacutea de la realidad los contratos de locacioacuten de servicios de los recurrentes se

desnaturalizaron convirtieacutendose en contratos de trabajo de duracioacuten indeterminada estando

a ello este Tribunal considera que los recurrentes teniacutean un viacutenculo laboral vigente al momento

en que supuestamente vencieron sus contratos de locacioacuten de servicios Por tanto no podiacutean ser

despedidos sino por el procedimiento previamente establecido en la ley de modo que han sido

objeto de despido arbitrario (el subrayado es nuestro)

Precisamente con el objeto de alcanzar la verdad real la NLPT igualmente ha contemplado la posibili-dad del Juez laboral pueda ordenar la actuacioacuten de pruebas de oficio Sin embargo debemos sentildealar que se encuentra estableciendo liacutemites y condiciones para que el Juzgador haga efectiva dicha facul-tad En ese sentido el artiacuteculo 22 de la NLPT preveacute que Excepcionalmente el juez puede ordenar la praacutectica de alguna prueba adicional en cuyo caso dispondraacute lo conveniente para su realizacioacuten pro-cediendo a suspender la audiencia en la que se actuacutean las pruebas por un lapso adecuado no mayor a treinta (30) diacuteas haacutebiles y a citar en el mismo acto fecha y hora para su continuacioacuten Esta decisioacuten es inimpugnable Esta facultad no puede ser invocada encontraacutendose el proceso en casacioacuten La omisioacuten de esta facultad no acarrea la nulidad de la sentencia

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51 EL PRINCIPIO DE VERACIDAD EN EL PROCESO CONTENCIOSO

ADMINISTRATIVO LABORAL

El Tribunal Constitucional se ha referido al principio de primaciacutea de la realidad y por ende al principio de veracidad en los siguientes teacuterminos

En cuanto al principio de primaciacutea de la realidad que es un elemento impliacutecito en nuestro

ordenamiento juriacutedico y concretamente impuesto por la propia naturaleza tuitiva de nuestra

Constitucioacuten el Tribunal Constitucional ha precisado en la STC Ndeg 1944-2002-AATC que ldquo[]

en caso de discordancia entre lo que ocurre en la praacutectica y lo que fluye de los documentos debe

darse preferencia a lo primero es decir a lo que sucede en el terreno de los hechosrdquo (STC Ndeg

01388-2011-PATC FUNDAMENTO 4)

Siendo que el Tribunal Constitucional considera al principio de primaciacutea de la realidad y por lo tanto al principio de veracidad como un elemento impliacutecito en nuestro ordenamiento juriacutedico y concreta-mente impuesto por la propia naturaleza tuitiva de nuestra Constitucioacuten resulta incuestionable su aplicacioacuten al PCAL tanto maacutes si en el anaacutelisis de las actuaciones administrativas deberaacute aplicarse el principio de verdad material principio contenido en la Ley del Procedimiento Administrativo General en los siguientes teacuterminos

En el procedimiento la autoridad administrativa competente deberaacute verificar plenamente los

hechos que sirven de motivo a sus decisiones para lo cual deberaacute adoptar todas las medidas

probatorias necesarias autorizadas por la ley aun cuando no hayan sido propuestas por los

administrados o hayan acordado eximirse de ellas En el caso de procedimientos trilaterales la

autoridad administrativa estaraacute facultada a verificar por todos los medios disponibles la verdad

de los hechos que le son propuestos por las partes sin que ello signifique una sustitucioacuten del

deber probatorio que corresponde a estas Sin embargo la autoridad administrativa estaraacute

obligada a ejercer dicha facultad cuando su pronunciamiento pudiera involucrar tambieacuten al

intereacutes puacuteblico (art IV 111 TUO aprobado por DS 006-2017-JUS)

Por otro lado el TUO de la LPCA confiere igualmente al Juez la facultad de actuar pruebas de oficio pues el artiacuteculo 32 sentildeala que cuando los medios probatorios ofrecidos por las partes sean insuficien-tes para formar conviccioacuten el Juez en decisioacuten motivada e inimpugnable puede ordenar la actuacioacuten de medios probatorios adicionales que considere convenientes

6 LA CARGA DE LA PRUEBA EN EL PROCESO LABORAL

En el proceso civil las partes deben probar los hechos que aleguen excepto aquellos que se presumen conforme a ley Es decir la ldquocarga de la pruebardquo o el onus probandi recae en quien afirma un hecho o una circunstancia (Artiacuteculo 196deg del Coacutedigo Procesal Civil)

Tradicionalmente se ha considerado que en el proceso Laboral se da el fenoacutemeno de la inversioacuten de la carga de la prueba principio seguacuten el cual la mayor responsabilidad probatoria o casi toda la carga de la prueba lo soportaba el empleador siendo que el trabajador en la generalidad de los casos solo estaacute obligado a probar la relacioacuten laboral Sin embargo a raiacutez de las modificaciones legislativas producidas desde la deacutecada pasada en este movimiento flexibilizador o desregulador de las relaciones laborales el principio de inversioacuten de la carga de la prueba se habiacutea atenuado o relativizado de tal manera que en algunos tipos de procesos laborales como en los procesos de nulidad de despido o las acciones deriva-das de los actos de hostilidad la carga de la prueba recaiacutea exclusivamente en el trabajador20 En ese sen-

20 Artiacuteculo 27 Ley 26636 CARGA DE LA PRUEBA Corresponde a las partes probar sus afirmaciones y esencialmente 3 al empleador

la causa del despido al trabajador probar la existencia del despido su nulidad cuando la invoque y la hostilidad de la que fuera objeto

(subrayado nuestro)

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tido conforme a la Ley 26636 podemos decir que praacutecticamente es en los procesos de cobro de benefi-cios sociales y otros derechos remunerativos en los uacutenicos que se cumple estrictamente este principio pues corresponde al trabajador esencialmente probar la existencia del viacutenculo laboral en cambio al empleador le corresponde probar casi todo lo demaacutes es decir el cumplimiento de las obligaciones con-tenidas en las normas legales los convenios colectivos la costumbre el reglamento interno y el contra-to individual de trabajo(art 27 incs1 y 2 de la Ley 26636) Por ello en lugar de inversioacuten de la carga de la prueba algunos prefieren hablar de distribucioacuten o asignacioacuten de la carga de la prueba

La NLPT se ocupa de la carga de la prueba en el artiacuteculo 23 regulacioacuten que a nuestro criterio reivindica el principio de inversioacuten de la carga de la prueba de tal forma que el citado principio se convierte en una medida tendiente a equilibrar a las partes que intervienen en el proceso pues como sabemos una de las manifestaciones del desequilibrio innato entre las partes de la relacioacuten laboral es la desigualdad pro-batoria En efecto desde el momento en que la relacioacuten laboral se lleva a cabo en el lugar indicado por el empleador eacuteste tiene mayores y mejores posibilidades de premunirse de medios probatorios que le van a servir en un eventual conflicto juriacutedico En ese sentido resulta necesario que la norma procesal laboral contenga disposiciones que tiendan a superar este desequilibrio

El citado artiacuteculo 23 establece lo siguiente

ldquoArtiacuteculo 23- Carga de la prueba

231 La carga de la prueba corresponde a quien afirma hechos que configuran su pretensioacuten

o a quien los contradice alegando nuevos hechos sujetos a las siguientes reglas especiales

de distribucioacuten de la carga probatoria sin perjuicio de que por ley se dispongan otras

adicionales

232 Acreditada la prestacioacuten personal de servicios se presume la existencia de viacutenculo laboral

a plazo indeterminado salvo prueba en contrario

233 Cuando corresponda si el demandante invoca la calidad de trabajador o ex trabajador

tiene la carga de la prueba de

a) La existencia de la fuente normativa de los derechos alegados de origen distinto al

constitucional o legal

b) El motivo de nulidad invocado y el acto de hostilidad padecido

c) La existencia del dantildeo alegado

234 De modo paralelo cuando corresponda incumbe al demandado que sea sentildealado como

empleador la carga de la prueba de

a) El pago el cumplimiento de las normas legales el cumplimiento de sus obligaciones

contractuales su extincioacuten o inexigibilidad

b) La existencia de un motivo razonable distinto al hecho lesivo alegado

c) El estado del viacutenculo laboral y la causa del despido

235 En aquellos casos en que de la demanda y de la prueba actuada aparezcan indicios que

permitan presumir la existencia del hecho lesivo alegado el juez debe darlo por cierto salvo

que el demandado haya aportado elementos suficientes para demostrar que existe justificacioacuten

objetiva y razonable de las medidas adoptadas y de su proporcionalidadrdquo

61 LA PRESUNCIOacuteN DE LABORALIDAD

De la norma citada debemos destacar la presuncioacuten de laboralidad contenida en el artiacuteculo 232 de la NLPT que a nuestro criterio revoluciona el tratamiento de la carga de la prueba En efecto superaacuten-dose la presuncioacuten contenida en el artiacuteculo 4 del TUO del Decreto legislativo 728 que exige la confi-guracioacuten de los tres elementos esenciales del contrato de trabajo (prestacioacuten personal subordinacioacuten y remuneracioacuten) a efectos de que presuma la existencia de la relacioacuten laboral la noviacutesima norma soacutelo exige la acreditacioacuten de la prestacioacuten personal de servicios a efectos de que se presuma la existencia de un contrato de trabajo a tiempo indeterminado siendo que corresponderaacute al empleador destruir la

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presuncioacuten acreditando lo contrario lo cual no significa que el empleador tendraacute que demostrar la no subordinacioacuten (prueba diaboacutelica o negativa) sino que teniendo en cuenta que las pruebas van orientadas a demostrar hechos positivos estaraacute obligado a demostrar el caraacutecter autoacutenomo o independiente de la prestacioacuten laboral o que el trabajador teniacutea la posibilidad de ser ayudado por otras personas o reem-plazado en su labor por personas de su eleccioacuten no vinculadas al empleador o que la obligada a prestar los servicios era una persona juriacutedica y no una persona natural

62 CARGA DE PRUEBA EN LOS PROCESOS DE NULIDAD DE DESPIDO

El otro tema contemplado por la NLPT que consideramos relevante es el tratamiento de la carga de prueba en los procesos de nulidad de despido En efecto si bien el artiacuteculo 233 de la noviacutesima Ley preveacute que corresponde al trabajador demandante probar b) El motivo de nulidad invocado y el acto de hostilidad padecido el artiacuteculo 234 determina quede modo paralelo cuando corresponda incumbe al demandado que sea sentildealado como empleador la carga de la prueba de b) La existencia de un motivo razo-nable distinto al hecho lesivo alegado

Somos de la opinioacuten que lo anterior significa la extensioacuten para todas las causales de despido nulo y para todas las acciones derivadas de los actos de hostilidad (acciones de cese de hostilidad e indemnizacioacuten por despido indirecto) del disentildeo de carga de la prueba implantado por la Ley 27185 artiacuteculo 1 para el despido de la mujer embarazada quien como se sabe estaacute protegida por el llamado fuero de maternidad

La Ley 27185 publicada el 19-10-99 establece que ldquo[] Se presume que el despido tiene por motivo el embarazo si el empleador no acredita en este caso la existencia de causa justa para despedir Lo dis-puesto en el presente inciso es aplicable siempre que el empleador hubiere sido notificado documen-talmente del embarazo en forma previa al despido y no enerva la facultad del empleador de despedir por causa justardquo

De esta forma en el caso de la mujer embarazada eacutesta debe acreditar uacutenicamente dos hechos baacutesicos esto es su condicioacuten y que el empleador teniacutea conocimiento de este hecho A partir de dicho momento se invierte la carga de la prueba de tal forma que seraacute el empleador el que demuestre la existencia de otro motivo distinto que justifique el despido del trabajador

Refuerza la conclusioacuten lo regulado en el artiacuteculo 235 de la NLPT cuando sentildeala que en aquellos casos en que de la demanda y de la prueba actuada aparezcan indicios que permitan presumir la existencia del hecho lesivo alegado el juez debe darlo por cierto salvo que el demandado haya aportado elemen-tos suficientes para demostrar que existe justificacioacuten objetiva y razonable de las medidas adoptadas y de su proporcionalidad (lo resaltado es nuestro)

63 LA CARGA DE LA PRUEBA EN EL PROCESO CONTENCIOSO ADMINISTRATIVO

Respecto a la carga de la prueba la LPCA establece en su artiacuteculo 33 que salvo disposicioacuten legal diferen-te la carga de la prueba corresponde a quien afirma los hechos que sustentan su pretensioacuten Sin embar-go si la actuacioacuten administrativa impugnada establece una sancioacuten o medidas correctivas o cuando por razoacuten de su funcioacuten o especialidad la entidad administrativa estaacute en mejores condiciones de acre-ditar los hechos la carga de probar corresponde a eacutesta

Lo anterior no significa sino la consagracioacuten en nuestro sistema procesal de la teoriacutea de las cargas pro-batorias dinaacutemicas instituto que igualmente estaacute recogido en la Nueva Ley Procesal del Trabajo pues si analizamos las diversas reglas de la carga de prueba establecidas en la NLPT no significan sino la plas-macioacuten de esta doctrina por lo que en esta temaacutetica resulta evidente que ambos procesos confluyen

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7 PRINCIPIO DE IRRENUNCIABILIDAD DE DERECHOS

El principio de irrenunciabilidad de derechos laborales tiene reconocimiento constitucional en la norma contenida en el inciso 2 del artiacuteculo 26 de la Constitucioacuten Poliacutetica del Estado que prescribe lo siguiente ldquoEn toda relacioacuten laboral se respeta el caraacutecter irrenunciable de los derechos reconocidos por la Constitucioacuten y la Leyrdquo

El artiacuteculo 26ordm inciso 1ordm de la Constitucioacuten establece que en la relacioacuten laboral se respeta el caraacutecter irrenunciable de los derechos contenidos en la Constitucioacuten y la Ley

El sistema juriacutedico no reconoce al trabajador la facultad de dejar de lado o abandonar sus derechos laborales La justificacioacuten de esto la encontramos en el hecho real de que el trabajador por su posicioacuten de inferioridad frente al empleador por presioacuten falsas promesas o simple temor reverencial pueda dis-poner de los derechos que el ordenamiento juriacutedico le reconoce

Sin embargo es preciso aclarar que conforme a la redaccioacuten del texto constitucional no todos los dere-chos laborales son irrenunciables Los derechos que no tengan como fuente la Constitucioacuten o la Ley son perfectamente disponibles Vgr el trabajador puede renunciar a la tolerancia que otorga el empleador para el ingreso al centro laboral o puede renunciar al otorgamiento de la ldquoCanasta Navidentildeardquo o a una suma concedida a tiacutetulo de liberalidad por el empleador

Respecto a la ineficacia de los actos de renuncia de derechos la Constitucioacuten Poliacutetica de 1979 teniacutea un pronunciamiento categoacuterico En efecto el artiacuteculo 57 estableciacutea que ldquoLos derechos reconocidos a los trabajadores son irrenunciables Su ejercicio estaacute garantizado por la Constitucioacuten Todo pacto en contrario es nulordquo (la negrilla es nuestra) Por lo tanto resulta evidente que la anterior carta poliacutetica ademaacutes de otorgar el caraacutecter de irrenunciable a todos los derechos reconocidos a los trabajadores y no solamente a los que tengan oriacutegen constitucional o legal sanciona con nulidad todo acuerdo de renuncia de derechos

Sin embargo en teacuterminos actuales tambieacuten se puede concluir que los actos de disposicioacuten de dere-chos laborales son ineficaces en virtud a la aplicacioacuten de la nulidad virtual prevista en el artiacuteculo V del Tiacutetulo Preliminar del Coacutedigo Civil seguacuten la cual es nulo el acto juriacutedico contrario a las normas que inte-resan al orden puacuteblico o a las buenas costumbres En efecto siendo que la norma contenida en el artiacute-culo 26 inciso 2 de la Constitucioacuten Poliacutetica es de orden puacuteblico los actos que la contravengan resultan ineficaces

El Tribunal Constitucional en la STC Ndeg 008-2005-PITC hace referencia a este principio en los siguien-tes teacuterminos

24 Hace referencia a la regla de no revocabilidad e irrenunciabilidad de los derechos reconocidos

al trabajador por la Constitucioacuten y la ley Al respecto es preciso considerar que tambieacuten tienen la

condicioacuten de irrenunciables los derechos reconocidos por los tratados de Derechos Humanos

toda vez que estos constituyen el estaacutendar miacutenimo de derechos que los Estados se obligan a

garantizar a sus ciudadanos [Remotti Carbonell Joseacute Carlos La Corte Interamericana de

Derechos Humanos Estructura funcionamiento y jurisprudencia Barcelona Instituto Europeo

de Derecho 2003 p 18]

En ese sentido de conformidad con lo establecido en el artiacuteculo V del Tiacutetulo Preliminar del

Coacutedigo Civil la renuncia a dichos derechos seriacutea nula y sin efecto legal alguno

Asiacute conforme se desprende de lo previsto en el inciso 2) del artiacuteculo 26ordm de la Constitucioacuten la

irrenunciabilidad soacutelo alcanza a aquellos ldquo() derechos reconocidos por la Constitucioacuten y la leyrdquo

No cubre pues a aquellos provenientes de la convencioacuten colectiva de trabajo o la costumbre

Por otro lado debe precisarse que un derecho de naturaleza laboral puede provenir de una

norma dispositiva o taxativa En ese contexto la irrenunciabilidad es soacutelo operativa en el caso

de la segunda

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La norma dispositiva es aquella que opera soacutelo cuando no existe manifestacioacuten de voluntad

o cuando eacutesta se expresa con ausencia de claridad El Estado las hace valer uacutenicamente por

defecto u omisioacuten en la expresioacuten de voluntad de los sujetos de la relacioacuten laboral

Las normas dispositivas se caracterizan por suplir o interpretar una voluntad no declarada o

precisar y aclararla por defecto de manifestacioacuten y por otorgar a los sujetos de una relacioacuten laboral

la atribucioacuten de regulacioacuten con pleno albedriacuteo dentro del marco de la Constitucioacuten y la ley

Ante este tipo de modalidad normativa el trabajador puede libremente decidir sobre la

conveniencia o no de ejercitar total o parcialmente un derecho de naturaleza individual

Al respecto puede citarse el caso del derecho a vacaciones contemplado en el Decreto

Legislativo Nordm 713 en donde se establece que el trabajador tiene derecho a treinta diacuteas

naturales de descanso remunerado al antildeo y dentro de ese contexto por la prerrogativa de la

voluntad establecida en dicha norma este puede disponer hasta de quince diacuteas para continuar

prestando servicios a su empleador a cambio de una compensacioacuten extraordinaria Por ende

tiene la capacidad autodeterminativa de decidir un ldquocanjerdquo sobre aquello

En cambio la norma taxativa es aquella que ordena y dispone sin tomar en cuenta la voluntad de

los sujetos de la relacioacuten laboral En ese aacutembito el trabajador no puede ldquodespojarserdquo permutar o

renunciar a los beneficios facultades o atribuciones que le concede la norma

Javier Neves Mujica [Introduccioacuten al derecho laboral Lima Fondo Editorial de la PUCP 2003 p

103] manifiesta que el principio de irrenunciabilidad de derechos es justamente el que prohiacutebe

que los actos de disposicioacuten del trabajador como titular de un derecho recaigan sobre normas

taxativas y sanciona con la invalidez la transgresioacuten de esta pauta basilar

La irrenunciabilidad de los derechos laborales proviene y se sujeta al aacutembito de las normas

taxativas que por tales son de orden puacuteblico y con vocacioacuten tuitiva a la parte maacutes deacutebil de la

relacioacuten laboral Es conveniente consignar que una norma juriacutedica puede contener dentro de su

texto partes taxativas y dispositivas

El Tribunal Constitucional ha tenido ocasioacuten de pronunciarse sobre la materia en el caso

Sindicato de Trabajadores de Toquepala vs Southern Peruacute Copper Corporation (Expediente Ndeg

1396-2001-AATC) en donde establecioacute que si ldquo[] las partes acordaron no solo la duracioacuten

de la jornada ordinaria de trabajo seraacute tambieacuten las jornadas atiacutepicas situacioacuten que de por si no

violenta derecho fundamental de los afiliados al Sindicato sino soacutelo cuando dicha estipulacioacuten

sea indebidamente aplicada de otro lado lo expuesto no soacutelo no contradice el principio

contenido en el inciso 2) del artiacuteculo 26ordm de la Constitucioacuten relativo al caraacutecter irrenunciable

de los derechos reconocidos por la Constitucioacuten y la ley por encontrarse previsto en la misma

como se ha observado sino tambieacuten porque el derecho protegido en la Carta Magna es el

relativo a una jornada de trabajo que no excede de las cuarenta y ocho horas semanales []rdquo

La Ley 26636 en el Artiacuteculo III del Tiacutetulo Preliminar la contemplado de manera expliacutecita este principio en los siguientes teacuterminos El Juez debe velar por el respeto del caraacutecter irrenunciable de los derechos reco-nocidos por la Constitucioacuten y la Ley

Si bien la NLPT no ha considerado en su tiacutetulo preliminar de manera expresa al citado principio ello no sig-nifica que no constituya obligacioacuten del juzgador su acatamiento pues como se ha precisado se trata de un mandato constitucional Es mas la virtud de la noviacutesima Ley ha sido el de haber regulado por primera vez algunos criterios que se deben considerar al momento de efectuar un juicio de irrenunciabilidad En efecto si bien hasta ahora existen en la Ley 26636 disposiciones que obligan al Juzgador a efectuar una anaacutelisis de irrenunciabilidad al momento de adoptar ciertas decisiones como son las vinculadas a la aprobacioacuten de las actas de conciliacioacuten judicial homologacioacuten de conciliaciones privadas aprobacioacuten de un desisti-miento o resolver una excepcioacuten de transaccioacuten no se habiacutea disentildeado paraacutemetros de anaacutelisis y aspectos a tener en cuenta para una oacuteptima decisioacuten resguardando el principio materia de anaacutelisis

El Artiacuteculo 30 de la NLPT preveacute que para que un acuerdo conciliatorio o transaccional ponga fin al pro-ceso debe superar el test de disponibilidad de derechos para lo cual se toman los siguientes criterios

a) El acuerdo debe versar sobre derechos nacidos de una norma dispositiva debiendo el juez

verificar que no afecte derechos indisponibles

b) debe ser adoptado por el titular del derecho y

c) debe haber participado el abogado del prestador de servicios demandante(Lo resaltado es nuestro)

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Lo anterior significa que por primera vez en nuestro medio se regula este test de disponibilidad de dere-chos que como hemos sentildealado constituiraacute un referente para el oacutergano jurisdiccional al momento de analizar la vigencia del principio de irrenunciabilidad de derechos

71 EN EL PROCESO CONTENCIOSO ADMINISTRATIVO

Teniendo en cuenta que el principio de irrenunciabilidad de derechos laborales tiene un reconocimien-to constitucional resulta evidente su aplicacioacuten al Proceso Contencioso Administrativo Laboral sien-do que en la eventualidad de que se produzca un acto de transaccioacuten o conciliacioacuten a que se refiere el artiacuteculo 43 de la LPCA el Juez deberaacute aplicar un juicio de disponibilidad con el objeto de garantizar que se respete la norma imperativa contenida en el artiacuteculo 262 de la Constitucioacuten Poliacutetica del Estado

8 PRINCIPIO DEL IN DUBIO PRO OPERARIO

Este principio es materia de alegacioacuten frecuente a las intervenciones escritas y orales de los miembros del foro Sin embargo es preciso sentildealar que la aplicacioacuten de este principio no es ilimitada

En efecto el texto constitucional (artiacuteculo 26 inciso 3) ha previsto este instituto en su acepcioacuten restrin-gida esto es como regla hermeneacuteutica o criterio de interpretacioacuten de la praacutectica aplicativa del orde-namiento laboral En ese sentido podemos concluir que en nuestro sistema legal la aplicacioacuten de este principio procede uacutenicamente cuando existe duda insalvable sobre los diversos sentidos de una norma

Si tenemos en cuenta que las normas juriacutedicas son multiacutevocas esto es que admiten diversas interpre-taciones si el Juez Laboral se encuentra ante una norma que puede ser interpretada de diversa manera seguacuten el texto constitucional deberiacutea agotar todos los recursos interpretativos aplicando los meacutetodos y teacutecnicas hermeneuacuteticas y soacutelo en la eventualidad de que la duda no pueda despejarse optar por la inter-pretacioacuten que favorezca al trabajador

Por lo tanto no resulta de aplicacioacuten el citado principio cuando se trata de resolver dudas referidas a los hechos que sustentan las pretensiones de las partes y deben ser materia de prueba en el proceso Asimismo no resulta de aplicacioacuten este principio cuando se trata de la valoracioacuten de los medios probatorios

El Tribunal Constitucional respecto a este principio en el fundamento 21 de la STC 008-2005-PITC expresa lo siguiente

ldquoc31 Indubio pro operario

21 Hace referencia a la traslacioacuten de la vieja regla del derecho romano indubio pro reo Nuestra

Constitucioacuten exige la interpretacioacuten favorable al trabajador en caso de duda insalvable sobre

el sentido de una norma vale decir que se acredite que a pesar de los aportes de las fuentes de

interpretacioacuten la norma deviene indubitablemente en un contenido incierto e indeterminado

La nocioacuten de duda insalvable debe ser entendida como aquella que no puede ser resuelta por

medio de la teacutecnica hermeneacuteutica

El principio indubio pro operario seraacute aplicable cuando exista un problema de asignacioacuten

de significado de los alcances y contenido de una norma Ergo nace de un conflicto de

interpretacioacuten mas no de integracioacuten normativa La nocioacuten de ldquonormardquo abarca a la misma

Constitucioacuten los tratados leyes los reglamentos los convenios colectivos de trabajo los

contratos de trabajo etc

Pasco Cosmopolis precisa que la aplicacioacuten de este principio debe ajustarse a los siguientes dos

requisitos

- Existencia de una duda insalvable o inexpugnable

- Respeto a la ratio juris de la norma objeto de interpretacioacuten (para tal efecto el aplicador del

derecho deberaacute asignarle un sentido concordante y compatible con la razoacuten de eacutesta)

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El Tribunal Constitucional considera que la aplicacioacuten del referido principio estaacute sujeta a las

cuatro consideraciones siguientes

- Existencia de una norma juriacutedica que como consecuencia del proceso de interpretacioacuten ofrece

varios sentidos

- Imposibilidad loacutegico-axioloacutegica de dirimir esta duda mediante la utilizacioacuten de cualquier

meacutetodo de interpretacioacuten admitido como vaacutelido por el ordenamiento nacional

- Obligacioacuten de adoptar como sentido normativo a aqueacutel que ofrece mayores beneficios al trabajador

- Imposibilidad del operador de integrar la norma ya que el principio no se refiere a suplir la

voluntad de eacuteste sino a adjudicarle el sentido maacutes favorable al trabajadorrdquo (sic)

Si bien la NLPT no ha considerado expresamente este principio no cabe duda que constituyendo un mandato constitucional resulta de aplicacioacuten en el nuevo proceso Laboral e igualmente en el Proceso Contencioso Administrativo Laboral pues en realidad se trata de que en ambos procesos se ventilan derechos de caraacutecter laboral

9 PRINCIPIO DE INMEDIATEZ

El fundamento doctrinario del principio de inmediatez radica en el hecho de que sobre la relacioacuten laboral no puede pender permanentemente la posibilidad de su disolucioacuten por hechos ocurridos a lo largo de su desarrollo pues no puede concebirse que el contrato de trabajo mantenga en reserva indeterminada las infracciones pasadas como si fueran actualmente relevantes Asimismo este principio implica que debe existir una relacioacuten de cercaniacutea en teacuterminos temporales entre la accioacuten y la reaccioacuten De esta forma no habraacute inmediatez si el empleador deja pasar un tiempo considerable antes de actuar frente a una infrac-cioacuten laboral ya que el transcurso del tiempo implica el olvido de la falta (artiacuteculo 31 del DS 03-97-TR)

De igual forma hay ausencia de inmediatez si el trabajador alega como la motivacioacuten del despido nulo que invoca un hecho distante en el tiempo o cuando el trabajador sentildeala ser objeto de un acto de hosti-lidad basaacutendose en un hecho ocurrido hace tiempo

De manera pues que la inmediatez es un principio aplicable tanto al empleador como al trabajador en la cautela de sus respectivos derechos y su inobservancia supone el olvido de los hechos ocurridos los mismos que no pueden ser invocados posteriormente

La Ley 26636 ni la NLPT han previsto expresamente la aplicacioacuten del principio de inmediatez Sin embargo resulta evidente su aplicacioacuten en los procesos laborales como lo revelan los pronunciamien-tos de la justicia ordinaria y los pronunciamientos del Tribunal Constitucional

Efectivamente al respecto en la STC Ndeg00543-2007-PATC el Tribunal Constitucional ha sentildealado

5 El principio de inmediatez en el procedimiento de despido ha sido regulado en el artiacuteculo 31ordm del

Texto Uacutenico Ordenado del Decreto Legislativo Nordm 728 Ley de Productividad y Competitividad

Laboral Decreto Supremo 003-97-TR (TUO LPCL DS 003-97-TR) que expresamente establece

El empleador no podraacute despedir por causa relacionada con la conducta o con la capacidad del

trabajador sin antes otorgarle por escrito un plazo razonable no menor de seis diacuteas naturales

para que pueda defenderse por escrito de los cargos que se le formulare salvo aquellos casos de

falta grave flagrante en que no resulte razonable tal posibilidad o de treinta diacuteas naturales para

que demuestre su capacidad o corrija su deficiencia

Mientras dure el traacutemite previo vinculado al despido por causa relacionada con la conducta

del trabajador el empleador puede exonerarlo de su obligacioacuten de asistir al centro de trabajo

siempre que ello no perjudique su derecho de defensa y se le abone la remuneracioacuten y demaacutes

derechos y beneficios que pudieran corresponderle La exoneracioacuten debe constar por escrito

Tanto en el caso contemplado en el presente artiacuteculo como en el Artiacuteculo 32 debe observarse

el principio de inmediatez

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6 Asiacute el legislador ha regulado al principio de inmediatez como un requisito esencial que

condiciona formalmente el despido (Ibiacutedem Comentario a la Casacioacuten Nordm 1917-2003-Lima (El

Peruano 31 de mayo de 2007) paacuteg 234) el cual limita la facultad sancionadora del empleador

y que en el presente caso va a determinar si su vulneracioacuten conduce a un despido incausado o

viceversa si su observancia va a conducir al despido fundado en causa justa Por otro lado si

bien es cierto que el legislador no le ha establecido un plazo determinado es porque obviamente

su funcioacuten tiene mucha relacioacuten con el principio de razonabilidad y proporcionalidad y deja al

juzgador al momento de examinar el caso concreto su verificacioacuten u observancia

7 El principio de inmediatez tiene dos etapas definidas

(i) El proceso de cognicioacuten que estariacutea conformado por todos los hechos que ocurren despueacutes

de la comisioacuten de la falta por el trabajador lo que significa primero tomar conocimiento (de la

falta) a raiacutez de una accioacuten propia a traveacutes de los oacuterganos que dispone la empresa o a raiacutez de una

intervencioacuten de terceros como los clientes los proveedores las autoridades etc En segundo

lugar debe calificarse esto es encuadrar o definir la conducta descubierta como una infraccioacuten

tipificada por la ley susceptible de ser sancionada Y en tercer lugar debe comunicarse a los

oacuterganos de control y de direccioacuten de la empleadora que representan la instancia facultada

para tomar decisiones ya que mientras el conocimiento de la falta permanezca en los niveles

subalternos no produce ninguacuten efecto para el coacutemputo de cualquier teacutermino que recaiga bajo

la responsabilidad de la empresa (Ibiacutedem Comentario a la Casacioacuten Nordm 1917-2003-Lima (El

Peruano 31 de mayo de 2007) Citando el comentario de Jaime Beltraacuten Quiroga p 231) es

decir que se tome conocimiento pleno de los hechos sucedidos para posteriormente tomar

decisiones en el marco de las facultades sancionadoras del empleador

(ii) El proceso volitivo se refiere a la activacioacuten de los mecanismos decisorios del empleador

para configurar la voluntad del despido ya que eacuteste por esencia representa un acto unilateral

de voluntad manifiesta o presunta del patrono El inicio de este proceso estaacute dado por la

evolucioacuten de la gravedad de la falta por las repercusiones que causan al nivel de productividad

y a las relaciones laborales existentes en la empresa y por el examen de los antecedentes del

trabajador infractor y la conducta desarrollada en el centro de trabajo para establecer si excediacutea

los maacutergenes de confianza depositados en eacutel Con este cuadro de perspectivas la segunda etapa

estaacute dada por la toma de decisioacuten que depende de la complejidad que tenga la organizacioacuten

empresarial ya que mientras mayor sea eacutesta las instancias que intervengan en la solucioacuten

deberaacuten ser maacutes numerosas y por el contrario mientras maacutes simple sea como el caso de un

empresario individual que dirija su propia pequentildea empresa bastaraacute con su sola decisioacuten la que

podraacute ser adoptada en el maacutes breve plazo (Ibiacutedem)

8 En consecuencia los teacuterminos o plazos existentes entre ambas etapas es variado y se dan de

acuerdo a la complejidad de la falta cometida asiacute como de la organizacioacuten empresarial Entonces

el principio de inmediatez resulta sumamente elaacutestico (Ibiacutedem)teniendo en cuenta que incluso

al interior de estas etapas se desarrolla un procedimiento tal como ha sido sentildealado supra

9 En el mismo sentido en el aacutembito internacional tambieacuten se ha determinado la importancia

del principio de inmediatez y su relacioacuten con el plazo razonable Asiacute la Recomendacioacuten Nordm 166

de la OIT sobre ldquola terminacioacuten de la relacioacuten laboralrdquo en su numeral 10 sentildeala que ldquose deberiacutea

considerar que el empleador ha renunciado a su derecho de dar por terminada la relacioacuten de

trabajo de un trabajador a causa de una falta de eacuteste si no hubiera adoptado esta medida dentro

de un periodo razonable desde que tuvo conocimiento de la faltardquo

10 De lo dicho hasta acaacute se deduce claramente que el plazo razonable para ejercer la facultad

sancionadora del empleador no estaacute determinado por un determinado periodo de tiempo fijo

sino por las situaciones especiales que pudieran presentarse y por las acciones realizadas por

el empleador a fin de establecer certeramente la falta cometida en las etapas descritas en los

fundamentos precedentes

Si bien la el principio de inmediatez se encuentra contemplado de manera expresa en el artiacuteculo 31 del TUO del Decreto Legislativo 728 no cabe duda que resulta de aplicacioacuten general en el ejercicio de la potestad disciplinaria del Estado En ese sentido en la instrumentacioacuten de un PCAL en el que se cuestione una sancioacuten disciplinaria de un trabajador del Estado que no se encuentre bajo el reacutegi-men de la actividad privada esto es que se encuentre bajo el Reacutegimen del DL 276 o el Reacutegimen del Decreto Legislativo 1057 resulta perfectamente aplicable el principio de inmediateacutez siendo que inclu-so en ese sentido se ha pronunciado el Tribunal del Servicio Civil en la Resolucioacuten de Sala Plena Ndeg 003-2010-SERVIRTSC su fecha 10 de agosto de 2010

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10 PRINCIPIO DE IGUALDAD PROCESAL

El artiacuteculo III del Tiacutetulo Preliminar de la NLPT establece que en todo proceso laboral los jueces deben evitar que la desigualdad entre las partes afecte el desarrollo o resultado del proceso para cuyo efecto procuran alcanzar la igualdad real de las partes En particular acentuacutean estos deberes frente a la madre gestante el menor de edad y la persona con discapacidad

Este principio resulta de aplicacioacuten igualmente en el PCAL pues el artiacuteculo 22 de la LPCA establece que las partes en el proceso contencioso administrativo deberaacuten ser tratadas con igualdad indepen-dientemente de su condicioacuten de entidad puacuteblica o administrado

Este principio es compartido por ambos sistemas procesales se sustenta precisamente en la norma constitucional prevista en el artiacuteculo 22 del Texto Constitucional seguacuten el cual toda persona tiene derecho a la igualdad ante la ley siendo que nadie debe ser discriminado por motivo de origen raza sexo idioma religioacuten opinioacuten condicioacuten econoacutemica o de cualquiera otra iacutendole

11 PRINCIPIO DE RAZONABILIDAD

El artiacuteculo III del Tiacutetulo Preliminar de la NLPT ha contemplado expresamente el principio de razonabili-dad como un principio que debe ser observado por los jueces

El principio de razonabilidad consiste en la afirmacioacuten esencial de que el ser humano en sus relaciones laborales procede y debe proceder conforme a la razoacuten esto es que se trata de una especie de liacutemite o freno moral y elaacutestico al mismo tiempo aplicable a aquellas aacutereas del comportamiento donde la norma no puede prescribir liacutemites muy riacutegidos ni en un sentido ni en otro y sobre todo donde la norma no puede prever la infinidad de circunstancias posibles y siendo ello asiacute este principio se deberaacute aplicar tenien-do en cuenta la necesidad de analizar en concreto cada caso en que se aplica este criterio el enfoque flexible y elaacutestico con que debe manejarse y la necesidad de una cierta proporcionalidad entre la accioacuten y la reaccioacuten ocasionada21

El Tribunal Constitucional respecto de este principio se ha pronunciado en el siguiente sentido

El principio de razonabilidad o proporcionalidad es consustancial al Estado Social y Democraacutetico

de Derecho y estaacute configurado en la Constitucioacuten en sus artiacuteculos 3ordm y 43ordm y plasmado

expresamente en su artiacuteculo 200deg uacuteltimo paacuterrafo Si bien la doctrina suele hacer distinciones

entre el principio de proporcionalidad y el principio de razonabilidad como estrategias para

resolver conflictos de principios constitucionales y orientar al juzgador hacia una decisioacuten que no

sea arbitraria sino justa puede establecerse prima facie una similitud entre ambos principios

en la medida que una decisioacuten que se adopta en el marco de convergencia de dos principios

constitucionales cuando no respeta el principio de proporcionalidad no seraacute razonable En este

sentido el principio de razonabilidad parece sugerir una valoracioacuten respecto del resultado del

razonamiento del juzgador expresado en su decisioacuten mientras que el procedimiento para llegar

a este resultado seriacutea la aplicacioacuten del principio de proporcionalidad con sus tres subprincipios

de adecuacioacuten de necesidad y de proporcionalidad en sentido estricto o ponderacioacutenrdquo

(Fundamento 15 Sentencia del Exp Ndeg 2192-2004-AATC)

[hellip] Por lo precedentemente expuesto este Colegiado considera que en el presente caso tambieacuten

se ha violado el principio de proporcionalidad como atributo del Estado Social y Democraacutetico de

Derecho reconocido expliacutecitamente por el artiacuteculo 200deg de la Constitucioacutenrdquo (Fundamento 22

Sentencia del Exp Ndeg 2192-2004-AATC)

Por otro lado en STC Ndeg 0090-2004-AATC fundamento 35 respecto al principio de razonabilidad propiamente ha expuesto lo siguiente

21 Sala de Derecho Constitucional y Social de la Corte Suprema de la Repuacuteblica Res De fecha 120299 Exp Casacioacuten 0785-96

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La razonabilidad implica que el acto estatal debe mantener su justificacioacuten loacutegica y axioloacutegica en

los sucesos o circunstancias que fueran Asiacute la doctrina exige que se produzca una consonancia

entre el hecho antecedente ldquocreadorrdquo o ldquomotivadorrdquo del acto estatal y el hecho consecuente

derivado de aqueacutel

En consecuencia la razonabilidad comporta una adecuada relacioacuten loacutegico-axioloacutegica entre la

circunstancia motivante el objeto buscado y el medio empleado

Por otro lado la razonabilidad puede ser analizada desde una doble perspectiva cuantitativa

y cualitativa

La razonabilidad cuantitativa pondera el contenido del proceso discursivo o inferente que

concluye con una proposicioacuten loacutegica y axioloacutegicamente vaacutelida Su fundamentacioacuten apuesta a la

adecuacioacuten entre el hecho desencadenante del acto estatal y el resultado de eacuteste en cuanto a su

magnitud numeacuterica dineraria aritmeacutetica etc

La razonabilidad cualitativa pondera el proceso discursivo o inferente que concluye con

una regla simeacutetrica o asimeacutetrica de asignacioacuten de facultades derechos deberes deberes o

servicios seguacuten sean iguales o diferentes los hechos generados por las personas Asiacute su objeto

seraacute la determinacioacuten de consecuencias juriacutedicas homoacutelogas para aquellos que se encuentren en

ideacutenticas circunstancias y distintas para los que se hallen en disiacutemiles circunstancias

El acto estatal debe acreditar la necesaria disposicioacuten o correspondencia entre la causa que lo

origina y el efecto buscado Existe entonces la necesidad de acreditar coherencia y equilibrio

entre el antecedente que origina el acto estatal y la consecuencia derivada de aqueacutel

La doctrina plantea la verificacioacuten loacutegico-axioloacutegica de una proposicioacuten juriacutedica bicondicional

esto es que se justifique la asignacioacuten de derechos facultades deberes o sanciones si y soacutelo siacute

guardan armoniacutea y sindeacuteresis con los hechos sucesos o circunstancias predeterminantes

La proporcionalidad exige la existencia indubitable de una conexioacuten directa indirecta y

relacional entre causa y efecto vale decir que la consecuencia juriacutedica establecida sea

uniacutevocamente previsible y justificable a partir del hecho ocasionante del acto estatal En

consecuencia la proporcionalidad lo seraacute cuando la razoacuten del efecto sea deducible de la causa

o previsible a partir de ella

Ahora bien maacutes allaacute de la convencioacuten doctrinaria que admite su autonomiacutea como concepto en

puridad la proporcionalidad es una modalidad maacutes de la razonabilidad (razonabilidad instrumental)rdquo

En la legislacioacuten laboral encontramos algunas disposiciones que hacen referencia a este principio

Artiacuteculo 25 DS 03-97-TR- Falta grave es la infraccioacuten por el trabajador de los deberes esenciales que emanan del contrato de tal iacutendole que haga irrazonable la subsistencia de la relacioacuten

Artiacuteculo 9 DS 03-97-TR- Por la subordinacioacuten el trabajador presta sus servicios bajo direccioacuten de su empleador el cual tiene facultades para normar reglamentariamente las labores dictar las oacuterdenes necesarias para la ejecucioacuten de las mismas y sancionar disciplinariamente dentro de los liacutemites de la razonabilidad cualquier infraccioacuten o incumplimiento de las obligaciones a cargo del trabajador

El empleador estaacute facultado para introducir cambios o modificar turnos diacuteas u horas de trabajo asiacute como la forma y modalidad de la prestacioacuten de las labores dentro de criterios de razonabilidad y teniendo en cuenta las necesidades del centro de trabajo

Artiacuteculo 30 paacuterrafo final DS 03-97-TR El trabajador antes de accionar judicialmente deberaacute emplazar por escrito a su empleador imputaacutendole el acto de hostilidad correspondiente otorgaacutendole un plazo razonable no menor de seis diacuteas naturales para que efectuacutee su descargo o enmiende su conducta seguacuten sea el caso

Artiacuteculo 31 DS 03-97-TR- El empleador no podraacute despedir por causa relacionada con la conducta o con la capacidad del trabajador sin antes otorgarle por escrito un plazo razonable no menor de seis diacuteas naturales para que pueda defenderse por escrito de los cargos que se le formulare salvo aquellos casos de falta grave flagrante en que no resulte razonable tal posibilidad o de treinta diacuteas naturales para que demuestre su capacidad o corrija su deficiencia

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111 EN EL PROCESO CONTENCIOSO ADMINISTRATIVO

Resulta evidente que el principio de razonabilidad resulta de aplicacioacuten en el PCA desde que consti-tuye una previsioacuten constitucional contemplado en el artiacuteculo 200 de la Carta Poliacutetica y la aplicacioacuten y utilizacioacuten de este principio debe ser ademaacutes verificada por el juzgador contencioso administrativo a propoacutesito del control judicial de las decisiones administrativas las mismas que deben observar igual-mente este principio a tenor de lo previsto en el artiacuteculo IV 14 del TUO de la Ley del Procedimiento Administrativo General que establece que las decisiones de la autoridad administrativa cuando creen obligaciones califiquen infracciones impongan sanciones o establezcan restricciones a los administra-dos deben adoptarse dentro de los liacutemites de la facultad atribuida y manteniendo la debida proporcioacuten entre los medios a emplear y los fines puacuteblicos que deba tutelar a fin de que respondan a lo estricta-mente necesario para la satisfaccioacuten de su cometido

Por otro lado en virtud del principio de integracioacuten previsto en el artiacuteculo 21 del TUO de la LPCA los jueces no deben dejar de resolver el conflicto de intereses o la incertidumbre con relevancia juriacutedico por defecto o deficiencia de la ley En tales casos deberaacuten aplicar los principios del derecho administrativo

12 EL DEBIDO PROCESO Y LA TUTELA JURISDICCIONAL

La NLPT en el Titulo Preliminar artiacuteculo III se refiere a estos principios en los siguientes teacuterminos En todo proceso laboral los jueces deben evitar que la desigualdad entre las partes afecte el desarrollo o resultado del proceso para cuyo efecto procuran alcanzar la igualdad real de las partes privilegian el fondo sobre la forma interpretan los requisitos y presupuestos procesales en sentido favorable a la continuidad del proceso observan el debido proceso la tutela jurisdiccional y el principio de razona-bilidad En particular acentuacutean estos deberes frente a la madre gestante el menor de edad y la persona con discapacidad (Lo resaltado es nuestro)

El debido proceso y la tutela jurisdiccioacuten constituyen principios aplicables a todo proceso y como tal estaacuten contemplados en el artiacuteculo 139 de la Constitucioacuten Poliacutetica del Estado y por lo tanto resulta indu-dable su aplicacioacuten al proceso laboral y al proceso contencioso administrativo

13 PRINCIPIOS OPERACIONALES

Finalmente los artiacuteculos I y III del Tiacutetulo Preliminar de la NLPT han previsto los denominados principios operacionales o principios del procedimiento y que son los siguientes

131 ORALIDAD

Respecto de este principio la NLPT en el artiacuteculo 12 establece la prevalencia de la oralidad en los proce-sos por audiencias En efecto esta norma preveacute que en los procesos laborales por audiencias las expo-siciones orales de las partes y sus abogados prevalecen sobre las escritas sobre la base de las cuales el juez dirige las actuaciones procesales y pronuncia sentencia Las audiencias son sustancialmente un debate oral de posiciones presididas por el juez quien puede interrogar a las partes sus abogados y terceros participantes en cualquier momento Las actuaciones realizadas en audiencia salvo la etapa de conciliacioacuten son registradas en audio y viacutedeo utilizando cualquier medio apto que permita garanti-zar fidelidad conservacioacuten y reproduccioacuten de su contenido Las partes tienen derecho a la obtencioacuten de las respectivas copias en soporte electroacutenico a su costo Si no se dispusiese de medios de grabacioacuten electroacutenicos el registro de las exposiciones orales se efectuacutea haciendo constar en acta las ideas cen-trales expuestas

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La oralidad contribuye a la democratizacioacuten de la justicia y del derecho puesto que se requiere un juez que ademaacutes de un rol activo ndash director e impulsor del proceso esto es que dirija ordene y agilice el proceso asuma un papel asistencial interactuando con las partes para determinar y delimitar el objeto del proceso los hechos controvertidos y la prueba admisible y pertinente esto es colaborando en la buacutesqueda de la verdad real y asegurando una igualdad real entre las partes de tal manera que la parte victoriosa sea la que probablemente tiene la razoacuten y no la que posee maacutes medios econoacutemicos para pagar a un representante haacutebil que complique el proceso en aras a los intereses de su representado y resista la lentitud del proceso22

Para el profesor Paul Paredes Palacios ldquola oralidad no significa solamente el uso de la palabra hablada como medio de comunicacioacuten en las audiencias (oralidad en sentido deacutebil) Significa la necesidad de interaccioacuten entre los partiacutecipes en las audiencias para actualizar las pretensiones las defensas y los medios probatorios a fin de permitir al juez a su conclusioacuten la construccioacuten del sustento faacutectico ndash juriacute-dico de su decisioacuten (oralidad en sentido fuerte)El sentido o significado fuerte de la oralidad se aprecia claramente en el disentildeo de las audiencias de conciliacioacuten y de juzgamiento (en el proceso ordinario laboral) y en el de la audiencia uacutenica (en el proceso abreviado laboral) En ellos el valor de la oralidad estaacute en su capacidad de actualizacioacuten del conflicto23

En el proceso contencioso administrativo existen dos posibilidades de realizarse una audiencia que resulta ser una audiencia de pruebas a saber 1) la audiencia de pruebas en el proceso especial la misma que se realiza soacutelo cuando la actuacioacuten de los medios probatorios ofrecidos lo requiera (art 281 LPCA) y 2) cuando al incorporarse medios probatorios extemporaacuteneos es necesaria la citacioacuten a audiencia para la actuacioacuten de un medio probatorio (art 31 LPCA)

Es en estas oportunidades en que puede instrumentarse el principio de oralidad ademaacutes de la posibi-lidad de realizarse un informe oral antes del dictado de la sentencia en primera instancia siempre a pedido de parte (art 281 in fine de la LPCA) o en la vista de la causa a propoacutesito de la interposicioacuten del recurso de apelacioacuten o de casacioacuten

132 INMEDIACIOacuteN

La inmediacioacuten implica que el juzgador deberaacute tomar contacto directo e inmediato con los elementos objetivos y subjetivos de la controversia En ese sentido conforme a este principio las audiencias y la actuacioacuten de medios probatorios se realizan ante el Juez siendo indelegables bajo sancioacuten de nulidad

La inmediacioacuten prevista como principio en la NLPT viene a ser en realidad un principio que se comple-menta con el principio de oralidad de tal manera que seraacute de aplicacioacuten en el PCA en las oportunidades en que se pueda instrumentar un proceso por audiencias conforme a lo descrito en el acaacutepite anterior Ademaacutes resulta igualmente de aplicacioacuten en el PCA pues conforme al artiacuteculo 2 del TUO de la PCA el proceso contencioso administrativo se rige por los principios del derecho procesal sin perjuicio de la aplicacioacuten supletoria de los principios del derecho procesal civil en los casos en que sea compatible

133 CONCENTRACIOacuteN

Este principio se refiere a que el proceso se realiza procurando que su desarrollo ocurra en el menor nuacutemero de actos procesales

La concentracioacuten prevista como principio en la NLPT viene a ser un principio que complementa al prin-cipio de oralidad y resulta igualmente de aplicacioacuten en el PCA pues conforme al artiacuteculo 2 del TUO de la PCA el proceso contencioso administrativo se rige por los principios del derecho procesal sin perjuicio de la aplicacioacuten supletoria de los principios del derecho procesal civil en los casos en que sea compatible

22 JINESTA Ernesto (1999) La oralidad en el Proceso Contencioso Administrativo Ivstituia (Antildeo 13 Ndeg 155-156) Paacutegina 3

23 PAREDES PALACIOS Paul ldquoLa Oralidad como herramienta para el acceso a la justicia en el nuevo proceso laboral peruanordquo Disponivel em

lthttpwwwacademiaedu25637914La_oralidad_como_herramienta_para_el_acceso_a_la_justicia_en_el_nuevo_proceso_laboral_peruanogt

Obtenido el 20 abr 2018

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134 CELERIDAD

Conforme a este principio la actividad procesal se realiza diligentemente y dentro de los plazos estab-lecidos debiendo el Juez a traveacutes de los auxiliares bajo su direccioacuten tomar las medidas necesarias para lograr una pronta y eficaz solucioacuten del conflicto de intereses o incertidumbre juriacutedica

El artiacuteculo III segundo paacuterrafo del Tiacutetulo Preliminar de la NLPT establece al efecto que los jueces labo-rales tienen un rol protagoacutenico en el desarrollo e impulso del proceso por lo que tienen el deber de impedir y sancionar la inconducta contraria a los deberes de veracidad probidad lealtad y buena fe de las partes sus representantes sus abogados y terceros

La celeridad procesal prevista como principio en la NLPT resulta igualmente de aplicacioacuten en el PCA pues conforme al artiacuteculo 2 del TUO de la PCA el proceso contencioso administrativo se rige por los principios del derecho procesal sin perjuicio de la aplicacioacuten supletoria de los principios del derecho procesal civil en los casos en que sea compatible

135 ECONOMIacuteA PROCESAL

En virtud de este principio el Juez dirige el proceso tendiendo a una reduccioacuten de los actos procesales sin afectar el caraacutecter imperativo de las actuaciones que lo requieran

MONROY GAacuteLVEZ Juan sentildeala que ldquoEl principio de economiacutea procesal exige que tanto la estructura del proceso como los deberes facultades y actuaciones de las partes y el juez deben realizarse bajo una loacutegica de eficiencia que permita reducir costos directos e indirectos o lo que doctrinalmente se ha lla-mado economiacutea del gasto refirieacutendose a los costos patrimonialmente cuantificables de forma directa que se sufragan en un proceso economiacutea del esfuerzo para referirse al nuacutemero de actos procesales por llevarse a cabo y economiacutea del tiempo en alusioacuten a la duracioacuten del procesordquo24

Como hemos expuesto anteriormente en relacioacuten al principio de concentracioacuten procesal la economiacutea procesal prevista como principio en la NLPT viene a ser un principio que complementa al principio de oralidad y resulta igualmente de aplicacioacuten en el PCA pues conforme al artiacuteculo 2 del TUO de la PCA el proceso contencioso administrativo se rige por los principios del derecho procesal sin perjuicio de la aplicacioacuten supletoria de los principios del derecho procesal civil en los casos en que sea compatible

136 FAVORECIMIENTO DEL PROCESO

En virtud de este principio los jueces interpretan los requisitos y presupuestos procesales en sentido favo-rable a la continuidad del proceso conforme lo establece el Artiacuteculo III del Tiacutetulo Preliminar de la NLPT

Esta norma tiene su antecedente en el artiacuteculo 2 inciso 3 de Texto Uacutenico Ordenado de la Ley que Regula el Proceso Contencioso Administrativo aprobado por el Decreto Supremo Nordm 013-2008-JUS seguacuten el cual el Juez no podraacute rechazar liminarmente la demanda en aquellos casos en los que por falta de preci-sioacuten del marco legal exista incertidumbre respecto del agotamiento de la viacutea previa Asimismo en caso de que el Juez tenga cualquier otra duda razonable sobre la procedencia o no de la demanda deberaacute preferir darle traacutemite a la misma

En ese sentido el Tribunal Constitucional en la sentencia de fecha treinta de enero de dos mil cuatro expedida en el Expediente Nordm 1049-2003-AA citando a Pico I Junoy Joan Las garantiacuteas constituciona-les del proceso Barcelona Bosh 1997 en el fundamento nuacutemero cinco ha hecho referencia al princi-pio favor actionis o pro actione seguacuten el cual ldquose impone a los juzgadores la exigencia de interpretar los requisitos y presupuestos procesales en el sentido maacutes favorable a la plena efectividad del derecho a obtener una resolucioacuten vaacutelida sobre el fondo (P49)rdquo

24MONROY GAacuteLVEZ Juan op Cit p99

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Lo anterior no significa sino la vigencia del derecho al acceso a la tutela jurisdiccional garantizada cons-titucionalmente en el numeral 3) del artiacuteculo 139ordm de la Constitucioacuten Poliacutetica del Estado

En relacioacuten a este principio del PCA el profesor Giovanni Priori sentildeala que ldquono debe entenderse que con dicho principio se estaacute estableciendo que los requisitos procesales no resultan trascendentes o que no deben ser cumplidos sino que uacutenicamente y exclusivamente se estaacute estableciendo un criterio inter-pretativo en caso el juez al momento de admitir la demanda encuentre duda si se ha cumplido o no con un requisito procesal En esos casos el juez deberaacute atendiendo al derecho constitucional de acceso a la jurisdiccioacuten preferir darle traacutemite al proceso sin perjuicio que en un momento posterior pueda decla-rar esta vez ya con certeza que efectivamente no se habiacutea cumplido con un requisito de procedencia lo que podraacute hacer incluso antes de dictar sentencia a traveacutes de una sentencia inhibitoria25

Por otro lado Anacleto Guerrero sentildeala que ldquocabe indicar que el principio pro actione o de favorecimiento del proceso seraacute aplicable no soacutelo para atenuar las barreras procesales que limitan el acceso a la jurisdicci-oacuten sino tambieacuten para aquellos casos en los que deban interpretarse requisitos formales del acto procesal y presupuestos procesales en el sentido maacutes favorable a la plena efectividad de la tutela jurisdiccionalrdquo26

De esta manera el principio de favorecimiento del proceso es compartido tanto por la NLPT como por la LPCA

137 PREVALENCIA DEL FONDO SOBRE LA FORMA

Constituye fundamento del nuevo proceso laboral contemplado en el artiacuteculo III del Tiacutetulo Preliminar de la NLPT que en todo proceso laboral los jueces deben evitar que la desigualdad entre las partes afecte el desarrollo o resultado del proceso para cuyo efecto procuran alcanzar la igualdad real de las partes privile-gian el fondo sobre la forma interpretan los requisitos y presupuestos procesales en sentido favorable a la continuidad del proceso observan el debido proceso la tutela jurisdiccional y el principio de razonabilidad

Bajo esta orientacioacuten resulta necesario que en el nuevo esquema procesal se tienda a evitar pronun-ciamientos inhibitorios o nulificantes que tienen efectos perniciosos no solamente en la imagen sino en la propia subsistencia del modelo En efecto si tenemos en cuenta de que el nuacutemero de personal es limitado y la carga procesal agobiante -producto entre otras razones de la expectativa que genera un nuevo proceso laboral ceacutelere y eficaz- quienes se encuentran al frente de los procesos laborales deben estar mentalizados en la tendencia de emitir pronunciamientos respecto al fondo de la controversia en todos los casos salvo excepciones muy contadas evitando de esa formas las criacuteticas que siempre se formulan en contra de la institucioacuten judicial situacioacuten que lleva a que se deslegitime el modelo

Este principio resulta igualmente de aplicacioacuten al proceso contencioso administrativo pues bajo la eacutegida del principio de integracioacuten previsto en el artiacuteculo 21 de la LPCA resulta de aplicacioacuten al PCA el principio de informalismo contemplado en el artiacuteculo IV 16 del TUO de la Ley del Procedimiento Administrativo General seguacuten el cual las normas del procedimiento deben ser interpretadas en sentido favorable a admisioacuten y decisioacuten final de las pretensiones de los administrados de modo que sus derechos e intereses no sean afectados por la exigencia de aspectos formales que puedan ser subsanados dentro del procedi-miento siempre que dicha excusa no afecte derechos de terceros o el intereacutes puacuteblico

14 CONCLUSIONES

1- La mencioacuten contenida en el artiacuteculo 24 de la NLPT a que el proceso contencioso administrativo laboral se tramitaraacute conforme a la ley de la materia nos indica ciertamente que la tramitacioacuten de dichos procesos deberaacuten seguirse bajo la pauta del TUO de la Ley del Proceso Contencioso Administrativo Laboral aprobado por decreto Supremo 013-2008-JUS (en adelante TUO - LPCA) que como sabemos establece un procedi-miento predominantemente escrito con algunos rasgos orales como es el caso de los informes orales que pudieran solicitarse antes de que la causa se encuentre expedita para dictar sentencia ( Artiacuteculo 29 e) y f)

25 PRIORI POSADA Giovanni op cit 104-105

26 ANACLETO GUERRERO Victor Proceso Contencioso Administrativo Lex amp Iuris Grupo Editorial 2016 p104

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2- Sin embargo de cara a las bondades y evidentes beneficios que significa la instrumentacioacuten de un proceso oral esto es in proceso ceacutelere transparente en el que se destaca los principios de inmediacioacuten y concentracioacuten existen planteamientos no solamente en sede nacional sino en el derecho comparado destinados a la necesidad de implementar la oralidad en el PCAL para lo cual se discute si es necesaria una modificacioacuten legislativa o si en una especie de buenas praacutecticas judiciales se puede perfectamente introducir y aplicar los fundamentos y principios que inspiran la NLPT y especialmente la oralidad que se resume en la norma contenida en el artiacuteculo 121 de la NLPT que preveacute que en los procesos laborales por audiencias las exposiciones orales de las partes y sus abogados prevalecen sobre las escritas sobre la base de las cuales el juez dirige las actuaciones procesales y pronuncia sentencia

3- Si bien en la LPCA no existe una disposicioacuten similar a la prevista en el artiacuteculo 31 de la NLPT si resul-ta posible que la sentencia en el proceso contencioso administrativo pueda sobrepujar o exceder los teacuterminos de la demanda En efecto el TUO de la LPCA en su artiacuteculo 41 establece que ldquoLa sentencia que declare fundada la demanda podraacute decidir en funcioacuten de la pretensioacuten planteada lo siguiente 2 El restablecimiento o reconocimiento de una situacioacuten juriacutedica individualizada y la adopcioacuten de cuantas medidas sean necesarias para el restablecimiento o reconocimiento de la situacioacuten juriacutedica lesionada aun cuando no hayan sido pretendidas en la demanda[hellip]rdquo(lo resaltado es nuestro)

4- A diferencia del principio de suplencia indirecta de la demanda que podemos extraer mediante una labor interpretativa de los principios que gobiernan el nuevo proceso laboral la LPCA si contiene expresamente el principio de la suplencia de oficio al sentildealar en el artiacuteculo 24 que el juez deberaacute suplir las deficiencias formales en las que incurran las partes sin perjuicio de disponer la subsanacioacuten de las mismas en un plazo razonable en los casos en que no sea posible la suplencia de oficio

5- Siendo que el Tribunal Constitucional considera al principio de primaciacutea de la realidad y por lo tanto al principio de veracidad como un elemento impliacutecito en nuestro ordenamiento juriacutedico y concretamente impuesto por la propia naturaleza tuitiva de nuestra Constitucioacuten resulta incuestionable su aplicacioacuten al PCAL tanto maacutes si en el anaacutelisis de las actuaciones administrativas deberaacute aplicarse el principio de verdad material principio contenido en la Ley del Procedimiento Administrativo General Por otro lado el TUO de la LPCA confiere igualmente al Juez la facultad de actuar pruebas de oficio pues el artiacuteculo 32 sentildeala que cuando los medios probatorios ofrecidos por las partes sean insuficientes para formar conviccioacuten el Juez en decisioacuten motivada e inimpugnable puede ordenar la actuacioacuten de medios probatorios adicionales que considere convenientes

6- Respecto a la carga de la prueba la LPCA establece que en su artiacuteculo 33 que salvo disposicioacuten legal diferente la carga de la prueba corresponde a quien afirma los hechos que sustentan su pretensioacuten Sin embargo si la actuacioacuten administrativa impugnada establece una sancioacuten o medidas correctivas o cuando por razoacuten de su funcioacuten o especialidad la entidad administrativa estaacute en mejores condiciones de acreditar los hechos la carga de probar corresponde a eacutesta

Lo anterior no significa sino la consagracioacuten en nuestro sistema procesal de la teoriacutea de las cargas pro-batorias dinaacutemicas instituto que igualmente estaacute recogido en la Nueva Ley Procesal del Trabajo pues si analizamos las diversas reglas de la carga de prueba establecidas en la NLPT no significan sino la plas-macioacuten de esta doctrina por lo que en esta temaacutetica resulta evidente que ambos procesos confluyen

7- Teniendo en cuenta que el principio de irrenunciabilidad de derechos laborales tiene un reconoci-miento constitucional resulta evidente su aplicacioacuten al Proceso Contencioso Administrativo Laboral siendo que en la eventualidad de que se produzca un acto de transaccioacuten o conciliacioacuten a que se refiere el artiacuteculo 43 de la LPCA el Juez deberaacute aplicar un juicio de disponibilidad con el objeto de garantizar que se respete la norma imperativa contenida en el artiacuteculo 262 de la Constitucioacuten Poliacutetica del Estado

8- Si bien la NLPT no ha considerado expresamente el principio del in dubio pro operario no cabe duda que constituyendo un mandato constitucional resulta de aplicacioacuten en el nuevo proceso Laboral e igualmente en el Proceso Contencioso Administrativo Laboral pues en realidad se trata de que en ambos procesos se ventilan derechos de caraacutecter laboral

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9- Si bien la el principio de inmediatez se encuentra contemplado de manera expresa en el artiacuteculo 31 del TUO del Decreto Legislativo 728 no cabe duda que resulta de aplicacioacuten general en el ejercicio de la potestad disciplinaria del Estado En ese sentido en la instrumentacioacuten de un PCAL en el que se cuestione una sancioacuten disciplinaria de un trabajador del Estado que no se encuentre bajo el reacutegi-men de la actividad privada esto es que se encuentre bajo el Reacutegimen del DL 276 o el Reacutegimen del Decreto Legislativo 1057 resulta perfectamente aplicable el principio de inmediateacutez siendo que inclu-so en ese sentido se ha pronunciado el Tribunal del Servicio Civil en la Resolucioacuten de Sala Plena Ndeg 003-2010-SERVIRTSC su fecha 10 de agosto de 2010

10- El artiacuteculo III del Tiacutetulo Preliminar de la NLPT establece que en todo proceso laboral los jueces deben evitar que la desigualdad entre las partes afecte el desarrollo o resultado del proceso para cuyo efecto pro-curan alcanzar la igualdad real de las partes En particular acentuacutean estos deberes frente a la madre ges-tante el menor de edad y la persona con discapacidad Este principio resulta de aplicacioacuten igualmente en el PCAL pues el artiacuteculo 22 de la LPCA establece que las partes en el proceso contencioso administrativo deberaacuten ser tratadas con igualdad independientemente de su condicioacuten de entidad puacuteblica o administrado

10- Resulta evidente que el principio de razonabilidad resulta de aplicacioacuten en el PCA desde que cons-tituye una previsioacuten constitucional contemplado en el artiacuteculo 200 de la Carta Poliacutetica y la aplicacioacuten y utilizacioacuten de este principio debe ser ademaacutes verificada por el juzgador contencioso administrativo a propoacutesito del control judicial de las decisiones administrativas las mismas que deben observar igual-mente este principio a tenor de lo previsto en el artiacuteculo IV 14 del TUO de la Ley del Procedimiento Administrativo General que establece que las decisiones de la autoridad administrativa cuando creen obligaciones califiquen infracciones impongan sanciones o establezcan restricciones a los administra-dos deben adoptarse dentro de los liacutemites de la facultad atribuida y manteniendo la debida proporcioacuten entre los medios a emplear y los fines puacuteblicos que deba tutelar a fin de que respondan a lo estricta-mente necesario para la satisfaccioacuten de su cometido Por otro lado en virtud del principio de integra-cioacuten previsto en el artiacuteculo 21 del TUO de la LPCA los jueces no deben dejar de resolver el conflicto de intereses o la incertidumbre con relevancia juriacutedico por defecto o deficiencia de la ley En tales casos deberaacuten aplicar los principios del derecho administrativo

11- En el proceso contencioso administrativo existen dos posibilidades de realizarse una audiencia que resulta ser una audiencia de pruebas a saber 1) la audiencia de pruebas en el proceso especial la misma que se realiza soacutelo cuando la actuacioacuten de los medios probatorios ofrecidos lo requiera (art 281 LPCA) y 2) cuando al incorporarse medios probatorios extemporaacuteneos es necesaria la citacioacuten a audiencia para la actuacioacuten de un medio probatorio (art 31 LPCA) Es en estas oportunidades en que puede instrumentarse el principio de oralidad ademaacutes de la posibilidad de realizarse un informe oral antes del dictado de la sentencia en primera instancia siempre a pedido de parte (art 281 in fine de la LPCA) o en la vista de la causa a propoacutesito de la interposicioacuten del recurso de apelacioacuten o de casacioacuten

12- La inmediacioacuten prevista como principio en la NLPT viene a ser en realidad un principio que se com-plementa con el principio de oralidad de tal manera que seraacute de aplicacioacuten en el PCA en las oportunida-des en que se pueda instrumentar un proceso por audiencias conforme a lo descrito en el acaacutepite ante-rior Lo mismo sucede con los principios de concentracioacuten y economiacutea procesal

13 En virtud del principio de favorecimiento del proceso los jueces interpretan los requisitos y presu-puestos procesales en sentido favorable a la continuidad del proceso conforme lo establece el Artiacuteculo III del Tiacutetulo Preliminar de la NLPT Este principio se encuentra previsto en el artiacuteculo 2 inciso 3 de Texto Uacutenico Ordenado de la Ley que Regula el Proceso Contencioso Administrativo aprobado por el Decreto Supremo Nordm 013-2008-JUS seguacuten el cual el Juez no podraacute rechazar liminarmente la demanda en aquellos casos en los que por falta de precisioacuten del marco legal exista incertidumbre respecto del agotamiento de la viacutea previa Asimismo en caso de que el Juez tenga cualquier otra duda razonable sobre la procedencia o no de la demanda deberaacute preferir darle traacutemite a la misma

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14- La prevalencia del fondo sobre la forma resulta igualmente de aplicacioacuten proceso contencioso administrativo pues bajo la eacutegida del principio de integracioacuten previsto en el artiacuteculo 21 de la LPCA resulta de aplicacioacuten al PCA el principio de informalismo contemplado en el artiacuteculo IV 16 del TUO de la Ley del Procedimiento Administrativo General seguacuten el cual las normas del procedimiento deben ser interpretadas en sentido favorable a admisioacuten y decisioacuten final de las pretensiones de los adminis-trados de modo que sus derechos e intereses no sean afectados por la exigencia de aspectos formales que puedan ser subsanados dentro del procedimiento siempre que dicha excusa no afecte derechos de terceros o el intereacutes puacuteblico

15 Es posible la aplicacioacuten de los principios y fundamentos que sustentan la NLPT en el desarrollo del PCAL lo cual va a tono con las nuevas tendencias procesales que en nuestro paiacutes se inicioacute en el aacutembito penal y luego en el aacuterea laboral y a tenor de las propuestas hechas puacuteblicas recientemente ahora se plantea en la justicia civil Nosotros proponemos que no resulta necesaria una modificacioacuten legislati-va pues en virtud de lo que se denomina buenas praacutecticas judiciales se pueden perfectamente aplicar los principios y fundamentos que inspiran el nuevo proceso oral al desarrollo del proceso contencioso administrativo laboral

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VESCOVI Enrique Teoriacutea General del Proceso Temis Bogotaacute 1984

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OS PROBLEMAS BIOEacuteTICOS EM OS VINGADORES REFLEXOtildeES SOBRE O POacuteS-HUMANISMO E A EacuteTICA DO FUTURO

THE BIOETHICAL PROBLEMS IN THE AVENGERS REFLECTIONS ABOUT POSTHUMANISM AND THE ETHICS OF THE FUTUREPedro Ernesto Neubarth Jung1

ldquoApenas uma guerra eacute permitida agrave espeacutecie humana

a guerra contra a extinccedilatildeo []rdquo2

Resumo No atual momento histoacuterico da humanidade toma-se cada vez mais conhecimento dos espeta-culares avanccedilos cientiacuteficos e tecnoloacutegicos Diante desses avanccedilos a cada dia que se passa nos aproxima-mos mais dos cenaacuterios de ficccedilatildeo cientiacutefica abordados pela 7ordf Arte Tem-se assim que tal aproximaccedilatildeo pos-sa nos levar a discussotildees acerca das atuais e futuras implicaccedilotildees biotecnoloacutegicas em relaccedilatildeo aos preceitos eacuteticos presentes nesses avanccedilos ou seja na interaccedilatildeo entre a espeacutecie humana e os poacutes-humanos Nesse contexto os filmes do Universo Cinematograacutefico da Marvel satildeo oacutetimos aportes pois levantam inuacutemeras questotildees que navegam perfeitamente entre o aperfeiccediloamento humano ao desenvolvimento de exoes-queletos ligados ao coacutertex cerebral Desse modo o presente artigo visa entrelaccedilar os conceitos supra abordados com intuito de se fornecer uma visatildeo da responsabilidade ante a eacutetica do futuro Se adotaraacute outrossim a presente pesquisa o meacutetodo indutivo utilizando-se ainda a revisatildeo da literatura nacional e internacional bem como a observaccedilatildeo dos filmes do aludido Universo cinematograacutefico

Palavras-Chaves Poacutes-humano Aprimoramento geneacutetico Ciecircncia Bioeacutetica Cinema

Abstract In the current historical moment of humanity more and more knowledge of the spectacular scientific and technological advances is made Faced with these advances with each passing day we approach more of the scenarios of science fiction addressed by the 7th Art It is as soon as this approach can lead us to discussions about the current and future biotechnological implications in relation to the ethical precepts present in these advances that is in the interaction between the human species and the post-humans In this context the films of the Marvel Cinematic Universe are great contributions as they raise many questions which navigate perfectly between the human improvement to the development of exoskeletons linked to the cerebral cortex Thus this article aims to interweave the concepts discussed above in order to provide a vision of responsibility to the ethics of the futu-re In addition the present research will adopt the inductive method using also the revision of the national and international literature as well as the observation of the films of the aforementioned cinematographic Universe

Keywords Posthuman Genetic enhancement Science Medicine Movie theater

1 Graduado em Direito pela Universidade Feevale atualmente estaacute cursando Mestrado em Direito no PPGD da Universidade do Vale do

Rio dos Sinos na qual atua como pesquisador mestrando nos projetos de pesquisa ldquoTeoria do Direito e Diferenciaccedilatildeo Social na Ameacuterica

Latinardquo ldquoAUTOORGANIZACcedilAtildeO DO SISTEMA JURIacuteDICO Comunicaccedilotildees e Autorreferecircncia entre Brasil e Chilerdquo e ldquoTeoria do Direito e

Evoluccedilatildeo Social - UNISINOSrdquo Tem experiecircncia na aacuterea de Direito com ecircnfase em Direito Puacuteblico Advogado

2 ASIMOV Isaac Life and Time [Sl] Avon Books 1979 p 245

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1 INTRODUCcedilAtildeO

Nunca antes na histoacuteria da humanidade a sociedade internacional tomou tanto conhecimento dos espetaculares avanccedilos cientiacuteficos e tecnoloacutegicos como na contemporaneidade principalmente no que diz respeito ao acircmbito da engenharia geneacutetica Destarte tem-se que a humanidade encontre se enca-minhando para uma nova fase de sua evoluccedilatildeo uma fase doravante denominada Poacutes-Humana Nessa nova etapa diversos questionamentos pairam sobre si duacutevidas essas que em alguns casos satildeo antevis-tos de maneira muito inteligente e peculiar pela 7ordf Arte (Cinema) e 9ordf Arte (Histoacuterias em Quadrinho)

Almeja-se assim ao presente estudo abordar algumas das questotildees relacionadas agrave responsabilidade moral e eacutetica entre a espeacutecie humana e a Poacutes-Humana de forma comparada as abordadas nos filmes ldquoOs Vingadores Era de Ultronrdquo e ldquoCapitatildeo Ameacuterica Guerra Civilrdquo que anteveem de certo modo pos-siacuteveis mudanccedilas ocorridas na atualidade a funccedilatildeo da nova eacutetica ou melhor dizendo da eacutetica do futuro

Destarte por opccedilatildeo metodoloacutegica seraacute abordado na primeira parte desse trabalho os principais con-ceitos filosoacuteficos relacionados ao Poacutes-Humanismo Na segunda etapa seraacute tratado especificamente sobre a aproximaccedilatildeo dos filmes elencados ao novo periacuteodo para o qual a espeacutecie humana estaacute possi-velmente se encaminhando Jaacute no terceiro e uacuteltimo item se buscaraacute identificar qual o papel da eacutetica do futuro nessa nova fase vivida e no presente ainda deveras obscura a que noacutes seres humanos estamos nos direcionando qual seja o Poacutes-Humanismo

Enfim antepotildeem-se ao iniacutecio desse estudo o fato de que o foco da presente pesquisa natildeo eacute propria-mente dito a discussatildeo do sistema do Direito mas sim aquilo que o antecede para tanto utilizaremos o meacutetodo o indutivo atrelada a revisatildeo bibliograacutefica nacional e internacional bem como a observaccedilatildeo dos filmes ora relatados a fim de se abranger uma resposta agrave problemaacutetica abordada

2 PREAcircMBULOS AO FUTURO (POacuteS-)HUMANO

Em um futuro natildeo muito distante o cenaacuterio de desenvolvimento biotecnoloacutegico estaraacute em conflito direto com os dilemas da moralidade isto eacute ao inveacutes de enfrentarmos questotildees de atitudes e deveres morais que devemos ter para com os seres que hoje compreendemos como natildeo humanos estaremos face a face com questotildees envolvendo os chamados poacutes-humanos ou quem sabe deles para conosco (espeacutecie humana)3

Nessa senda surge o transumanismo como sendo um movimento natildeo acabado que se encontra em desenvolvimento estando suas ideias amparadas nas ideologias do humanismo racionalista4 Os tran-sumanos partem assim da premissa de que a espeacutecie humana em sua forma atual natildeo representa o fim da nossa evoluccedilatildeo mas sim o iniacutecio dessa5

Leocir Pessini escreve nessa linha que com as descobertas feitas no iniacutecio do Seacutec XXI muitas aacutereas da ciecircncia nunca mais seratildeo as mesmas

A biologia medicina e biotecnologia entraram em sua idade de ouro Com o teacutermino da fase

3 VILACcedilA Murilo Mariano DIAS Maria Clara Marques Transumanismo e o futuro (poacutes-) humano Physis ndash Revista de Sauacutede Coletiva

Rio de Janeiro v 24 n 02 2014 p 342 Disponiacutevel em lthttpwwwscielobrpdfphysisv24n20103-7331-physis-24-02-00341pdfgt

Acesso em 06 jul 2017

4 SCHUSTER Diego Henrique Sobre a Dignidade Humana como Qualificadora do Gecircnero Humano e Fonte de Legitimidade dos Direitos

uma Reflexatildeo sobre o Movimento Transumanista e sua Influecircncia sobre o Desenvolvimento Futuro da Humanidade In Revista Brasileira

de Direitos Humanos v 16 2016 p 71-90

5 [hellip] Transhumanism is a way of thinking about the future that is based on the premise that the human species in its current form does not

represent the end of our development but rather a comparatively early phase [hellip] (Traduccedilatildeo nossa) HUMANITY+ Transhumanist FAQ

[Sd] Disponiacutevel em lthttphumanityplusorg philosophytranshumanist-faqgt Acesso em 07 jul 2017

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do sequenciamento do DNA do projeto Genoma Humano no ano 2000 e a emergecircncia da

pesquisa com ceacutelulas-tronco se pode sem duacutevida esperar por mais descobertas sobre o

desenvolvimento humano normal e anormal bem como tratamentos novos e mais focados

precisamente nas doenccedilas humanas Avanccedilos na neurociecircncia trazem a promessa de

poderosas e novas compreensotildees dos processos mentais e comportamento bem como da cura

de doenccedilas mentais devastadoras Instrumentos nanotecnoloacutegicos geniais implantaacuteveis no

corpo e ceacuterebro humano trazem esperanccedila de superaccedilatildeo da cegueira e surdez bem como de

aprimoramento das naturais capacidades humanas de consciecircncia e accedilatildeo Pesquisas na aacuterea da

biologia do envelhecimento e senescecircncia sugerem a possibilidade de diminuir o processo de

decliacutenio dos corpos e mentes e talvez ateacute mesmo aumentar ao maacuteximo o tempo da vida humana

De inuacutemeras maneiras as descobertas dos bioacutelogos e as invenccedilotildees dos biotecnologistas estatildeo

aumentando o poder de intervir no funcionamento de nossos corpos e mentes e alteraacute-los []6

Para tanto a fim de assimilarem-se os respectivos acontecimentos que ainda estatildeo por vir bem como seus argumentos podemos comparar a revoluccedilatildeo geneacutetica que embora seja ainda desconhecida repercutiraacute na sociedade futura transformando-a em uma nova sociedade fato esse que foi seme-lhante ao ocorrido com as sucessivas revoluccedilotildees industriais tecnoloacutegicas e da informaacutetica Essas em outros tempos conduziram a sociedade por sua vez agrave poacutes-modernidade7

Outrossim Roberto Andorno leciona que nas sociedades contemporacircneas a melhoria da qualidade de vida da populaccedilatildeo estaacute em grande medida ligada agrave promoccedilatildeo dos progressos cientiacuteficos e teacutecnicos por conseguinte tem-se que essa necessita de liberdade para avanccedilar nos mais diversos campos Todavia essa liberdade evidentemente natildeo eacute absoluta eis que natildeo pode atuar agrave margem da eacutetica e do respeito aos Direitos Humanos8

Assim em uma anaacutelise preliminar eacute possiacutevel aduzir que com as melhorias ambicionadas pelos transumanos nossos descendentes os poacutes-humanos por sua vez poderatildeo ter um longo prazo de vida sem precedentes conhecidos ateacute o momento Poderatildeo ter faculdades intelectuais maiores do que as atuais e tambeacutem sen-sibilidades inteiramente novas com a possibilidade ateacute mesmo de controle de suas proacuteprias emoccedilotildees9

Poreacutem natildeo satildeo apenas de coisas fascinantes que o futuro da humanidade estaacute circundado Existem tambeacutem problemas que aqui devem ser abordados e eacute por esse motivo que se faz necessaacuteria a reali-zaccedilatildeo de um pequeno recorte a fim identificar o dualismo existente a respeito do presente tema isto eacute as consequecircncias do melhoramento humano por vias biotecnoloacutegicas que vecircm acirrando um dos mais importan-tes debates no campo da eacutetica que tem como palco o futuro da humanidade em face da problemaacutetica e obscu-rescente oposiccedilatildeo binaacuteria de tipo ldquobem versus malrdquo10

De acordo com Eacuteverton Willian Pone e Marcia Teshima os transumanistas aleacutem do jaacute anteriormen-te exposto satildeo tambeacutem os defensores do desenvolvimento biotecnoloacutegico e da engenharia geneacuteti-ca como modo de alcanccedilar o aperfeiccediloamento humano (human enhancement) Por sua vez na linha

6 PESSINI Leocir Bioeacutetica e o desafio do transumanismo ideologia ou utopia ameaccedila ou esperanccedila Revista Bioeacutetica v 14 n 02 2006

p 129 Disponiacutevel em lthttpwwwredalycorgarticulooaid=361533244002gt Acesso em 07 jul 2017

7 COELHO Luiz Fernando Clonagem reprodutiva e clonagem terapecircutica questotildees juriacutedicas Revista Centro de Estudos Judiciaacuterios

Brasiacutelia v 06 n 16 2002 p 30 Disponiacutevel em lthttpwwwjfjusbrojs2indexphp revcejarticleview438619gt Acesso em 08 jul 2017

8 ANDORNO Roberto ldquoLiberdaderdquo e ldquoDignidaderdquo da Pessoas dois paradigmas opostos ou complementares na bioeacutetica In MARTINS-

COSTA Judith MOumlLLER Letiacutecia Luwdwig (Orgs) Bioeacutetica e Responsabilidade Rio de Janeiro Forense 2009 p 80-82

9 [hellip] Ultimately it is possible that such enhancements may make us or our descendants lsquoposthumanrsquo beings who may have indefinite health-

spans much greater intellectual faculties than any current human being ndash and perhaps entirely new sensibilities or modalities ndash as well as the

ability to control their own emotions [hellip] (Traduccedilatildeo nossa) BROSTOM Nick In defence of posthuman dignity Bioethics Oxford v 19 n 03

2005 p 203 Disponiacutevel em lthttpwwwpsyvanderbilteducourseshon182Posthuman_dignity_Bostrompdfgt Acesso em 09 jul 2017

10 VILACcedilA Murilo Mariano DIAS Maria Clara Marques Transumanismo e o futuro (poacutes-) humano Physis ndash Revista de Sauacutede Coletiva

Rio de Janeiro v 24 n 02 2014 p 342 Disponiacutevel em lthttpwwwscielobr pdfphysisv24n20103-7331-physis-24-02-00341pdfgt

Acesso em 06 jul 2017

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contraacuteria existem os bioconservadores que se centram na defesa da continuidade de uma natureza eminentemente humana ou seja sem a utilizaccedilatildeo de tecnologias e conhecimentos geneacuteticos capazes originar indiviacuteduos poacutes-humanos11

Nessa linha destacam-se como alguns dos representantes da ideologia transumanista Brostom Savulescu e possivelmente Dworkin que na medida do possiacutevel claramente dirigiu criacuteticas agrave argu-mentaccedilatildeo contra a eugenia apresentada por Habermas Jaacute em oposiccedilatildeo a essa visatildeo enfatizamos como proeminentes bioconservadores os escritores Leon Kass e Francis Fukuyama

Barretto quanto aos argumentos e preocupaccedilotildees relacionados agrave eugenia por Habermas assim aduz

A questatildeo portanto encontra-se no perigo da queda em argumentos e poliacuteticas eugecircnicas de

aperfeiccediloamento (positivas) pois se torna difiacutecil estabelecer criteacuterios do que eacute ou do que natildeo

eacute terapecircutico Aceitando-se essa premissa Habermas aponta para o medo da mudanccedila da

autocompreensatildeo da espeacutecie humana que ocorreria em duas etapas Em primeiro momento

pela consagraccedilatildeo de uma eugenia liberal negativa para apoacutes no segundo momento cair-se no

abismo moral da eugenia positiva (de aperfeiccediloamento) []12

Barretto ensina ainda a respeito de Habermas e nessa senda em relaccedilatildeo ao seu segundo questio-namento sobre os perigos da eugenia que na sociedade contemporacircnea predominam os interesses econocircmico-poliacutetico-individuais os quais variam de grupo social para grupo social Todavia os que mais se complicam diante dessas situaccedilotildees satildeo os beneficiaacuterios finais pois os interesses que mais preponde-ram no caso em tela satildeo os dos cientistas e dos fabricantes sobre os seres humanos13

Habermas suscita aleacutem disso um uacuteltimo ponto preocupante em relaccedilatildeo as eugenias de aperfeiccediloa-mento qual seja o fato dessas alterarem a autocompreensatildeo eacutetica da espeacutecie humana ldquode tal modo que natildeo possamos mais nos compreender como seres vivos eticamente livres e moralmente iguais orienta-dos por normas e fundamentosrdquo14

No entanto como anteriormente relatado Ronald Dworkin direciona criticas diretas aos questiona-mentos de Habermas em relaccedilatildeo agrave eugenia Destarte Barretto e Subtil lecionam a respeito desse e suas criacuteticas aduzindo que

[] quanto agrave objeccedilatildeo de que as pesquisas geneacuteticas trazem perigo numa concretizaccedilatildeo da

engenharia geneacutetica total ou seja sobre a questatildeo da Seguranccedila preconiza que os abortos

realizados as deformidades eventualmente encontradas e os exemplos tomados das clonagens

em animais por si soacute natildeo podem obstar a concretizaccedilatildeo dos conhecimentos teacutecnicos Aleacutem

disso disserta sobre a necessidade de regulamentaccedilatildeo da utilizaccedilatildeo destas novas tecnologias e

da preocupaccedilatildeo em avaliar os riscos pois natildeo se pode excluir o melhoramento de caracteriacutesticas

humanas somente sob o argumento de ldquomero perigordquo da espeacutecie humana15

Assim como Habermas direcionara trecircs questionamentos agrave eugenia Dowrkin rebateu a esses questiona-

11 PONA Eacuteverton Willian TESHIMA Marcia X-Men da ficccedilatildeo agrave realidade Posicionamentos de sentinelas bioconservadoras Revista

de Informaccedilatildeo Legislativa Brasiacutelia v 52 n 205 2015 p 190 Disponiacutevel em lthttpwww12senadolegbrriledicoes52205ril_v52_

n205_p189pdf gt Acesso em 09 jul 2017

12 BARRETTO Vicente de Paulo O Fetiche dos Direitos Humanos e outros Temas 2 ed rev e ampl Porto Alegre Ed Livraria do

Advogado 2013 p 331

13 Ibidem p 331

14 HABERMAS Juumlrgen O Futuro da natureza humana a caminho de uma eugenia liberal Satildeo Paulo Ed Martins Fontes 2004 p 57

15 BARRETTO Vicente de Paulo SUBTIL Camargo Leonardo Habermas Direito e Eugenia RECHTD ndash Revista de Estudos

Constitucionais Hermenecircutica e Teoria do Direito Satildeo Leopoldo v 02 n 02 2010 p 170 Disponiacutevel em lthttpwwwrevistasunisinos

brindexphpRECHTDarticleview298gt Acesso em 07 jul 2017

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mentos em trecircs criacuteticas agrave temaacutetica contra-eugecircnica Destarte a segunda critica trata do fato de ldquoas vaida-des dos ricos natildeo serem os uacutenicos objetivos das teacutecnicas [] Dworkin surge com argumentaccedilotildees opostas aos defensores da proibiccedilatildeo das pesquisas [] afirmando que natildeo se devem instituir criteacuterios de igualdade por baixo ou seja nivelar a igualdaderdquo16 pois essas teacutecnicas meacutedicas destinadas aos ricos geram descober-tas de repercussatildeo mais geral para todos justificando temporariamente a desigualdade

Por fim a terceira e uacuteltima criacutetica realizada versa sobre as repulsas e medos de a espeacutecie humana estar Brincando de Deus isto eacute as consequecircncias que poderiam recair agrave espeacutecie humana face o desenvolvi-mento de novas tecnologias Todavia para Dworkin o homem se sente apenas ameaccedilado pela engenha-ria geneacutetica pois teme a possibilidade de pessoas virem a criar outras pessoas ultrapassando assim os limites entre a sorte e a escolha natildeo estando efetivamente Brincando de Deus Natildeo obstante o ateacute aqui aduzido eacute imperioso destacar ainda sob essa oacutetica que noacutes seres humanos Brincamos de Deus desde os primoacuterdios da humanidade quando da descoberta do Fogo momento esse em que comeccedilamos a uti-lizaacute-lobrincar com ele de acordo com nossos proacuteprios interesses17

Tendo em vista essa dualidade de pensamentos sobre o futuro da espeacutecie humana Murilo Mariano Vilaccedila e Maria Clara Marques Dias lecionam que

Dito de outro modo ao passo que os transumanistas apostam na superaccedilatildeo dos limites da

condiccedilatildeo humana e na poacutes-humanidade como uma ampliaccedilatildeo das possibilidades de ser no

mundo [] os bioconservadores avocam o papel de defensores intransigentes da natureza

humana ainda que isso implique manutenccedilatildeo daqueles limites [] enquanto para alguns o

processo de alteraccedilatildeo da condiccedilatildeo humana daraacute origem a um ser poacutes-humano e isso seraacute algo

positivo melhorador pois beneficiaraacute o humano para outros ocorreraacute justa e radicalmente o

inverso O que parece estar em questatildeo ndash por sinal de modo indevido ndash seria quem ameaccedilaria

(lado do ldquomalrdquo) a natureza humana tentando ldquomelhoraacute-lardquo e quem supostamente a protegeria

(lado do ldquobemrdquo) mantendo-a estruturalmente precaacuteria18

Nesse ponto observa-se que aparentemente haacute um consenso entre os pensamentos transumanistas e bioconservadores qual seja o fato de que independentemente de qual dessas ideologias venha a predominar seratildeo as biotecnologias de grande importacircncia para o futuro da humanidade19 O impacto da geneacutetica na cultura contemporacircnea jaacute eacute fortiacutessimo com tendecircncias de aumentar o contato da vida humana para com um mundo que ateacute entatildeo era desconhecido atraveacutes da manipulaccedilatildeo da proacutepria ori-gem da vida O fato dessa tornar-se transformaacutevel bem como a sua compreensatildeo material traraacute ainda muitas e surpreendentes revelaccedilotildees para o ser humano do futuro20

Hans Jonas doutrina em sua monumental obra ldquoO Princiacutepio Responsabilidade ensaio de uma eacutetica para a civilizaccedilatildeo tecnoloacutegicardquo a respeito dessas revelaccedilotildees futuras agrave espeacutecie humana que agrave techne como uma dessas jaacute ultrapassou os proacuteprios objetivos dos tempos de outrora impulsionando e trans-formando o homem para um adiante infinito Tal assertiva nos leva por conseguinte ao fato de que talvez a vocaccedilatildeo do homem seja justamente a do contiacutenuo progresso da superaccedilatildeo de si mesmo e tam-beacutem a busca por feitos cada vez maiores Em outras palavras o desejo do homo faber eacute o de ter em suas proacuteprias matildeos a sua evoluccedilatildeo triunfando assim sobre o que antigamente costumava ser uma parte de

16 Idem

17Idem

18 VILACcedilA Murilo Mariano DIAS Maria Clara Marques Transumanismo e o futuro (poacutes-) humano Physis ndash Revista de Sauacutede Coletiva

Rio de Janeiro v 24 n 02 2014 p 343 Disponiacutevel em lthttpwwwscielobrpdfphysisv24n20103-7331-physis-24-02-00341pdfgt

Acesso em 06 jul 2017

19 Idem

20 BENTO Luiz Antonio CALVO Paulo Rafael Sanches Quando a vida imita a arte a bioeacutetica dos homens-maacutequinas In Revista

Bioethikos Satildeo Camilo v 07 n 03 2013 p 315 Disponiacutevel em lthttpswwwsaocamilo-spbrpdfbioethikos1051815pdfgt Acesso

em 09 jul 2017

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si e hoje se encontra melhorada e transformada com base em seu proacuteprio projeto21

Nesse iacutenterim eacute importante se destacar que Tecircmis Limberger perfeitamente descreve a techne como sendo

[] a antiacutetese da natureza a physis dos gregos eacute a expressatildeo techne isto eacute criaccedilatildeo artificial

Assim a artificialidade reconhecida como caracteriacutestica do direito na eacutepoca da automaccedilatildeo

caracteriza-se como uma metaacutefora empregada para precisar o momento loacutegico-formal

constitutivo da experiencia juriacutedica em consonacircncia com o momento eacutetico enquanto que entre

ambos se manteacutem e transcorre a tensatildeo da consciecircncia humana a partir da qual brota toda

norma toda a sentenccedila toda a accedilatildeo juriacutedica22

Em face desse contexto e conceito retoma-se as ideias originarias desse capiacutetulo se fazendo neces-saacuterio constatar que os debates em torno do melhoramento humano estatildeo profundamente enraizados a questotildees eacuteticas morais e religiosas dentre outras as quais por sua vez envolvem as definiccedilotildees de conceitos baacutesicos especialmente no que diz respeito agrave natureza humana Como exemplo disso existe o chamado melhoramento moral que busca alterar em niacutevel cerebral os remitentes problemas23

Haacute tambeacutem o prolongamento da vida humana exemplo esse quiccedilaacute o mais fundamental dos aprimoramen-tos pois com os crescentes avanccedilos na biologia celular os processos bioquiacutemicos de envelhecimento vecircm sendo reduzidos ampliando-se assim a capacidade de prolongamento da vida humana podendo-se falar ateacute mesmo na almejada eternizaccedilatildeo da vida humana Apesar disso seria essa condizente com as questotildees relacionadas agrave finitude da proacutepria vida humana e tambeacutem com o equiliacutebrio entre a morte e a procriaccedilatildeo24

Outro exemplo que exige um maior grau de respeito e reflexatildeo por parte da espeacutecie humana eacute o rela-cionado agrave manipulaccedilatildeo geneacutetica dessa Entretanto como o proacuteprio Hans Jonas aduz trata-se de um assunto grande demais para ser abordado de forma introdutoacuteria na presente pesquisa No entanto eacute imperioso arguir aqui os questionamentos por traacutes desse tipo de melhoramento qual seja temos o direito de fazecirc-lo somos qualificados para esse papel criador e ainda diversos outros dilemas eacuteticos25

O doutrinador Leocir Pessini natildeo obstante registra a respeito desses aperfeiccediloamentos que

[] essas prediccedilotildees em relaccedilatildeo ao futuro poacutes-humano satildeo problemaacuteticas Nem todos gostam da

ideacuteia de recriar o Eacuteden ou do homem brincando de Deus Nem todos acreditam que este mundo

profetizado seja melhor que o que se vive atualmente Nasce aqui a necessidade da discussatildeo

eacutetica que permeie esse cenaacuterio claramente polarizado em termos de ser a favor de uma nova

realidade poacutes-humana ou contraacuterio a ela Se a inquietaccedilatildeo em relaccedilatildeo ao uso da biotecnologia e

o temor quanto ao mau uso da manipulaccedilatildeo geneacutetica estatildeo manifestos haacute que se refletir sobre

o assunto para que qualquer decisatildeo sobre ele manifeste senatildeo um consenso ao menos uma

perspectiva largamente ponderada26

O fato portanto eacute que o ser humano estaacute em um caminho sem volta um ponto que o faz tornar-se

21 JONAS Hans O Princiacutepio Responsabilidade ensaio de uma eacutetica para a civilizaccedilatildeo tecnoloacutegica Rio de Janeiro Ed Contraponto Ed

PUC-Rio 2006 p 43

22 LIMBERGER Tecircmis Cibertransparecircncia informaccedilatildeo puacuteblica em rede e a cidade em tempos de globalizaccedilatildeo In STRECK Lecircnio Luiz

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Rio de Janeiro v 24 n 02 2014 p 343 Disponiacutevel em lthttpwwwscielobrpdfphysisv24n20103-7331-physis-24-02-00341pdfgt

Acesso em 06 jul 2017

24 JONAS Hans O Princiacutepio Responsabilidade ensaio de uma eacutetica para a civilizaccedilatildeo tecnoloacutegica Rio de Janeiro Ed Contraponto Ed

PUC-Rio 2006 p 57-58

25 Idem p 61

26 PESSINI Leocir Bioeacutetica e o desafio do transumanismo ideologia ou utopia ameaccedila ou esperanccedila Revista Bioeacutetica v 14 n 02 2006

p 129 Disponiacutevel em lthttpwwwredalycorgarticulooaid=361533244002gt Acesso em 07 jul 2017

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capaz de manipular a sua proacutepria formaccedilatildeo biofiacutesica Poreacutem isso natildeo significa que esse deva fazer tudo o que eacute capaz de fazer uma vez que goza de dignidade e sacralidade ditames esses que devem ser levados em consideraccedilatildeo em relaccedilatildeo a proacutepria vida humana natildeo podendo o sujeito ser tratado como objeto pois uma pessoa eacute uacutenica natildeo repetiacutevel e insubstituiacutevel27 eacute por esses motivos que na proacutexima etapa seratildeo abordados os problemas bioeacuteticos existentes nos filmes ldquoOs Vingadores Era de Ultronrdquo e ldquoCapitatildeo Ameacuterica Guerra Civilrdquo obras essas que podem demonstrar a complexidade e as cataacutestrofes que porventura ocorreratildeo com a espeacutecie humana diante da eventual falta de fundamentaccedilatildeo eacutetica da produccedilatildeo cientiacutefica poacutes-moderna

3 QUANDO A VIDA IMITA A ARTE

Muitas satildeo as obras que merecem serem lembradas como exemplos de um futuro distoacutepico rasgado pelo perigo da biotecnologia Os livros de Isaac Asimov Aldous Leonard Huxley Robert Louis Stevenson e Mary Wollstonecraft Shelley satildeo esses exemplos Todavia optou-se pela escolha dos filmes do universo cinemato-graacutefico da Marvel devido ao seu grande feito atual assim ao criar os Vingadores Stan Lee Jack Kirby e Dick Ayers bem como Joe Simon e Jack Kirby em relaccedilatildeo ao Capitatildeo Ameacuterica natildeo imaginavam que um mundo com poacutes-humanos seria possiacutevel Na verdade dificilmente esses imaginavam que suas histoacuterias em quadri-nhos um dia viessem a se tornar filmes de sucesso muito menos que esses filmes e histoacuterias em quadrinhos pudessem vir a ser utilizados como referencial para estudos cientiacuteficos envolvendo temas bioeacuteticos

Em ldquoOs Vingadores Era de Ultronrdquo a equipe ndash formada pelo Homem de Ferro Hulk Thor Capitatildeo Ameacuterica Viuacuteva Negra e Gaviatildeo Arqueiro ndash invade um posto avanccedilado da Hidra na cidade de Sokovia onde encontram dois seres aprimorados geneticamente ndash os gecircmeos Pietro Maximoff e Wanda Maximoff ndash Posteriormente um dos protagonistas desenvolve uma inteligecircncia artificial ndash Ultron ndash que reflete sobre sua missatildeo endeusando a si mesmo no papel de purificar a terra e para conseguir essa faccedilanha seraacute necessaacuterio exterminar com a espeacutecie humana Ultron entatildeo obriga a Dra Helen Cho a usar sua tec-nologia de tecidos sinteacuteticos para criar um novo corpo perfeito para ele mas no entanto quando estava para ser transferido para o novo corpo eacute impedido pela equipe que rouba o respectivo corpo e o transfor-ma no personagem Visatildeo A equipe retorna entatildeo para a cidade de Sokovia onde enfrenta sua derradei-ra batalha contra Ultron que eacute derrotado a um preccedilo muito alto qual seja a destruiccedilatildeo total da cidade28

Eacute inegaacutevel afirmar nesse singelo relato que muitos satildeo os questionamentos eacuteticos que poderiam ser suscitados antes de serem tomadas decisotildees assim como as consequecircncias futuras da falta dessas indagaccedilotildees Nesse iacutenterim temos como consequecircncias dessa ausecircncia de questionamentos bioeacuteticos a realizaccedilatildeo de pesquisas com seres humanos pesquisas essas que levaram ao aprimoramento geneacute-tico dos gecircmeos bem como dos personagens Capitatildeo Ameacuterica e Hulk Nessa senda destaca-se que assim como nas obras jaacute se passaram os tempos em que o aprimoramento geneacutetico natildeo seria realizado devido agrave falta de condiccedilotildees cientificas motivo esse pelo qual atualmente ldquo[] tecircm-se impulsionado a realizaccedilatildeo pesquisa e o desenvolvimento de teacutecnicas que permitem o enhancement [] a questatildeo prin-cipal do debate contudo tem sido discutir se haacute algo de muito valioso no ser humano que o aprimora-mento geneacutetico poderia destruirrdquo29 e natildeo a sua natildeo realizaccedilatildeo propriamente dita Dessa forma obser-

27 BENTO Luiz Antonio CALVO Paulo Rafael Sanches Quando a vida imita a arte a bioeacutetica dos homens-maacutequinas Revista Bioethikos

Satildeo Camilo v 07 n 03 2013 p 315 Disponiacutevel em lthttpswwwsaocamilo-spbrpdfbioethikos1051815pdfgt Acesso em 09 jul 2017

28 MARVEL Avengers Age of Ultron 2015 Disponiacutevel em lthttpsmarvelcommoviesmovie193 avengers_age_of_ultrongt Acesso

em 08 jul 2017

29 PONA Eacuteverton Willian TESHIMA Marcia X-Men da ficccedilatildeo agrave realidade Posicionamentos de sentinelas bioconservadoras Revista

de Informaccedilatildeo Legislativa Brasiacutelia v 52 n 205 2015 p 191 Disponiacutevel em lthttpwww12senadolegbrriledicoes52205ril_v52_

n205_p189pdfgt Acesso em 09 jul 2017

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va-se que se questionamentos como esse houvessem sido realizados diversos problemas teriam sido solucionados antes mesmo de ocorrerem evitando assim o desfecho catastroacutefico da obra

Outro problema bioeacutetico a ser levantado eacute a ausecircncia de questionamento eacutetico quanto ao desenvol-vimento de uma inteligecircncia artificial por parte dos personagens o que acabou levando a uma guerra na respectiva obra que destruiu toda a cidade fictiacutecia de Sokovia Tal problema no mundo real sequer esta perto de acontecer poreacutem as questotildees ausentes no filme assombram a mente de muitos cientis-tas e estudiosos uma vez que como seraacute que uma inteligecircncia artificial (IA) veraacute a noacutes seres humanos ou se estariacuteamos noacutes espeacutecie humana a nos divinizar realizando tal desenvolvimento ldquona atualidade nas aacutereas de biotecnologia e neurotecnologia [] o desenvolvimento de neuroproacuteteses e as interfaces homem-maacutequina levam ainda a mais questotildees [] como o que significa ser homem ou maacutequina [] e se as maacutequinas satildeo capazes de ldquopensarrdquordquo30

No filme ldquoCapitatildeo Ameacuterica Guerra Civilrdquo produzido pela Marvel Studios por sua vez o time ndash compos-to pelo Capitatildeo America Viuacuteva Negra Wanda Maximoff e Falccedilatildeo ndash impede o roubo de uma arma bioloacute-gica no entanto uma explosatildeo ocorre vitimando diversas pessoas comuns Apoacutes o referido aconteci-mento o Secretaacuterio de Estado dos Estados Unidos da Ameacuterica Thunderbolt Ross comunica a equipe que devido aos reiterados desastres31 a Organizaccedilatildeo das Naccedilotildees Unidas regulamentou a funccedilatildeo de heroacuteis atraveacutes do Acordo de Sokovia que estabelece que esses somente sejam chamados a agir quan-do essa realmente entender necessaacuterio Tal decisatildeo fragmentou a equipe em dois times ndash do Homem de Ferro que apoacuteia as decisotildees da OrganizaccedilatildeoGoverno e do Capitatildeo Ameacuterica que acredita natildeo ser esse o melhor caminho a se seguir Devido a essa divisatildeo uma batalha se desenrola deixando um dos heroacuteis paraliacutetico o qual volta a andar mas com o apoio de pernas exoesqueleacuteticas32

Os problemas eacuteticos ao entorno desse filme assim como no anterior satildeo muitos dentre os quais des-tacamos o fato de haverem sido desenvolvidas pernas exoesqueleacuteticas ao personagem que ficou para-liacutetico Essas pernas assim como a armadura do Homem de Ferro satildeo ligadas ao seu coacutertex cerebral por nanomaacutequinas neurotecnoloacutegias Contudo os problemas aqui levantados diferentemente dos levan-tados na obra fictiacutecia anterior satildeo mais facilmente assimilados pela espeacutecie humana pois na ldquoaacuterea de neurotecnologia principalmente neuroproacuteteses e interfaces homem-maacutequina ldquoo melhoramentordquo tan-to para restauraccedilatildeo de movimentos e sensibilidade como para os inuacutemeros benefiacutecios que essa aacuterea pode trazer Eacute uma gradaccedilatildeo exponencial de benefiacutecios para a humanidade sem medidasrdquo33

Observa-se no presente filme natildeo propriamente dito um problema bioeacutetico mas sim uma problemaacute-tica relacionada ao biodireito34 qual seja a proposta de realizaccedilatildeo de um acordo pela Organizaccedilatildeo das Naccedilotildees Unidas que visava preservar a espeacutecie humana como conhecemos em relaccedilatildeo agraves consequumlecircn-cias dos atos praticados pelos heroacuteispoacutes-humanos uma vez que as biotecnologias jaacute haviam afetado natildeo soacute o presente da humanidade mas tambeacutem o futuro Destarte o Acordo de Sokavia tratava sobre os heroacuteis deixarem ldquo[] de operar livremente ou de maneira natildeo regulamentada passando a operar sob

30 BENTO Luiz Antonio CALVO Paulo Rafael Sanches Quando a vida imita a arte a bioeacutetica dos homens-maacutequinas Revista Bioethikos

Satildeo Camilo v 07 n 03 2013 p 318 Disponiacutevel em lthttpswwwsaocamilo-spbrpdfbioethikos1051815pdfgt Acesso em 09 jul 2017

31 Destacam-se nessa senda alguns desses outros desastres como a destruiccedilatildeo de uma parte da cidade de Nova York (Os Vingadores

2012) a destruiccedilatildeo de uma parte de Washington DC (Capitatildeo Ameacuterica O Soldado Invernal 2014) e igualmente de Londres (Thor

O Mundo Sombrio 2013) contudo para uma maior imersatildeo e compreensatildeo da abrangecircncia do respectivo Universo Cinematograacutefico

recomenda-se assistir a todos os outros filmes da Marvel Studios

32 MARVEL Captain America Civil War 2016 Disponiacutevel em lthttpsmarvelcommoviesmovie219 captain_america_civil_wargt

Acesso em 08 jul 2017

33 BENTO Luiz Antonio CALVO Paulo Rafael Sanches Quando a vida imita a arte a bioeacutetica dos homens-maacutequinas Revista Bioethikos

Satildeo Camilo v 07 n 03 2013 p 319 Disponiacutevel em lthttpswwwsaocamilo-spbrpdfbioethikos1051815pdfgt Acesso em 09 jul 2017

34 Para maiores esclarecimentos a respeito da Eacutetica Direito e Biodireito recomenda-se a leitura de ROCHA Leonel Severo OLIVEIRA

Cheila A A Bioeacutetica e o Biodireito como Acoplamentos Estruturais entre a Eacutetica e o Direito na Proteccedilatildeo da Vida Humana In Revista

Brasileira de Direito Passo Fundo v 1 2008

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as regras decretos e governanccedilas das Naccedilotildees Unidas [] atuando somente quando e se o grupo consi-derar adequado eou necessaacuteriordquo35

Desse modo em que pese agrave proposta de regulamentaccedilatildeo apresentada no filme e essa tenha sido ampla-mente aceita pela populaccedilatildeo mundial e tambeacutem por determinados poacutes-humanos alguns desses heroacuteis natildeo concordaram pois esse acordo colidiria frontalmente na forma em que foram dispostos com princiacute-pios morais o que acabou por deflagrar uma guerra civil entre os favoraacuteveis agrave regulamentaccedilatildeo e os con-traacuterios a essa Tais problemas fictiacutecios nos levam a muitos questionamentos como jaacute asseverado diversas vezes nesse capiacutetulo Todavia o grande problema aqui presente eacute justamente o que natildeo estaacute presente nos filmes e que deveria servir de ensinamento para a espeacutecie humana poacutes-moderna qual seja reflexotildees pro-fundas antes da efetivaccedilatildeo de aprimoramentos geneacuteticos em relaccedilatildeo agrave funccedilatildeo da nova eacutetica ou da eacutetica do futuro no presente () questatildeo essa que se pretende responder no proacuteximo capiacutetulo

4 A EacuteTICA DO FUTURO

Com o fluir do tempo as normas de convivecircncia assim como os sistemas de educaccedilatildeo evoluiacuteram de acor-do com a maturidade adquirida por cada comunidade O racionalismo por exemplo trouxe mais clareza quando o homem comeccedilou a buscar na natureza a causa dos fenocircmenos e desse modo a cada degrau subido do processo evolutivo do conhecimento humano surgiram novos desafios a espeacutecie humana que colocavam em questatildeo noccedilotildees como a de responsabilidade liberdade autonomia igualdade e dignidade No entanto a noccedilatildeo de eacutetica diferentemente dessas outras noccedilotildees despontou como sendo uma ciecircncia proacutepria a qual para Hans Jonas natildeo trata da accedilatildeo do humano sobre o natildeo-humano mas sim

2 A significaccedilatildeo eacutetica dizia respeito ao relacionamento direto de homem com homem inclusive

o de cada homem consigo mesmo toda eacutetica tradicional eacute antropocecircntrica 3 Para efeito de accedilatildeo

nessa esfera a entidade homem e sua condiccedilatildeo fundamental era considerada como constante

quanto agrave sua essecircncia natildeo sendo ela proacutepria objeto da techne (arte) reconfiguradora36

Noutra senda Barretto ao explicar a eacutetica em Kant dispotildee que estaacute se encontra relacionada agrave moral pois o homem natildeo possui boa vontade sempre e o dever eacute que iraacute permitir que se torne boa a vontade nos seres finitos A boa vontade reside portanto no ato de cumprir o dever pelo respeito ao dever e a bondade incondicional se realiza quando se pratica o que eacute justo por se moralmente correto e inde-pendentemente de qualquer causa externa37 Os atos humanos em Kant poderiam assim serem com-preendidos sob duas premissas os imperativos hipoteacuteticos e os imperativos categoacutericos O primeiro traduz as accedilotildees ditas boas para se atingir algum fim jaacute o segundo trata das accedilotildees necessaacuterias indepen-dentemente de qualquer fim Essas accedilotildees portanto seriam boas em si mesmas38

Kant tem a lei moral como a uacutenica estabelecida pela consciecircncia individual Ela seraacute o princiacutepio deter-minante para a manifestaccedilatildeo da autonomia e em respeito a essa lei moral que os homens se inter-rela-cionam A lei moral eacute universal e vale para todos pois o homem existe como um fim em si mesmo e natildeo apenas como meio para uso arbitraacuterio de vontades adversas isto eacute nas palavras de Barretto

O homem natildeo eacute pois um fim subjetivo para a accedilatildeo mas um fim objetivo isto eacute algo cuja existecircncia

35 CINEPOP lsquoCapitatildeo Ameacuterica ndash Guerra Civilrsquo Leia na iacutentegra o curioso Acordo de Sokovia 2015 Disponiacutevel emlthttpcinepopcombr

capitao-america-guerra-civil-leia-na-integra-o-curioso-acordo-de-sokovia-108459gt Acesso em 07 jul 2017

36 JONAS Hans O Princiacutepio Responsabilidade ensaio de uma eacutetica para a civilizaccedilatildeo tecnoloacutegica Rio de Janeiro Ed Contraponto Ed

PUC-Rio 2006 p 35

37 BARRETTO Vicente de Paulo O Fetiche dos Direitos Humanos e outros Temas 2 ed rev e ampl Porto Alegre Ed Livraria do

Advogado 2013 p 52

38 Idem p 52-53

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eacute em si mesma um fim Por isso Kant remete agrave existecircncia de um princiacutepio praacutetico da razatildeo que

determina a vontade humana e que pressupotildees que a natureza racional existe como fim em si A

submissatildeo a esta lei ordena que cada homem jamais trate a si mesmo ou aos outros simplesmente

como meios remete a uma ligaccedilatildeo sistemaacutetica de leis objetivas comuns isto eacute a um ldquoreino dos finsrdquo

ou seja a um estado no qual cada homem eacute um fim em si mesmo e somente nesse ldquoreinordquo o homem eacute

um ser livre um ser autocircnomo em cuja vontade reside toda obrigaccedilatildeo e toda a autonomia39

Logo eacute possiacutevel asseverar-se que devido a velocidade da evoluccedilatildeo da tecnociecircncia mesmo que em niacuteveis dife-rentes podem-se alcanccedilar campos como os abordados nas obras do Universo Cinematograacutefico da Marvel ou seja pode vir a revelar um novo agir humano que vai muito aleacutem do mundo natural jaacute impactado severamen-te por accedilotildees muitas vezes irreversiacuteveis ou de difiacutecil reparaccedilatildeo Eacute por esses motivos se faz preciso uma maior prudecircncia em relaccedilatildeo agraves problemaacuteticas abordadas nos filmes por parte da espeacutecie humana contemporacircnea Eacute preciso prever os eventuais problemas e se natildeo se adequarem ao bem comum evitar atitudes que as provo-quem colocando em pauta o agir humano e os frutos disso no tempo bem como as possiacuteveis sequelas para a o indiviacuteduo e para a humanidade e seus efeitos colaterais no Estado na sociedade e no direito

Hans Jonas doutrina desse modo que a espeacutecie humana estaacute diante de uma nova dimensatildeo onde a teacutecnica moderna introduziraacute accedilotildees de ordem ineacutedita e a moldura da eacutetica antiga natildeo conseguiraacute mais se enquadrar Logo a eacutetica puramente antropoloacutegica e tradicional natildeo mais se adequa ao novo mundo das possibilidades infinitas e as antigas maacuteximas da eacutetica que guiavam os comportamentos e estavam cristalizadas no imaginaacuterio do inconsciente coletivo mesmo que ainda pudessem ser vaacutelidas para o relacionamento com o proacuteximo perdem forccedila diante da accedilatildeo coletiva que as difere em causa e conse-quecircncia deste plano proacuteximo o que poderaacute direcionar a eacutetica a uma nova dimensatildeo um plano que nun-ca antes sequer fora sonhada isto eacute um niacutevel de maiores responsabilidades40

O princiacutepio da responsabilidade dessa forma vem fornecer bases eacuteticas ao novo agir humano abran-gendo natildeo apenas o homem mas o universo a sua volta e o espaccedilo aleacutem da estratosfera A responsabili-dade vai mais longe aleacutem do mundo natural e dialoga com a poliacutetica revecirc as utopias busca a equidade e a dignidade questiona a relaccedilatildeo que existe entre pesquisa e poder uma vez que todo o saber cientiacute-fico se encontra acumulado nas matildeos de poucos que decidem o futuro de muitos A eacutetica eacute portanto de vital importacircncia para a tecnociecircncia Seus fundamentos poderatildeo alicerccedilar uma estabilidade har-mocircnica responsaacutevel e uma convivecircncia paciacutefica entre a ciecircncia e a humanidade que deveraacute se servir dos produtos da teacutecnica para a sua evoluccedilatildeo racional e consciente em busca do progresso constante

Nesse iacutenterim a ficccedilatildeo cientiacutefica entra na realidade como uma ferramenta de auxiacutelio pois ajuda o imponderaacutevel a se tornar real no imaginaacuterio e realccedila o temor ante o destino Hans Jonas doutrina que a heuriacutestica do medo funciona como um auxiacutelio na busca pelo bem ldquo[] o que noacutes natildeo queremos sabe-mos muito antes do que aquilo que queremos Por isso para investigar o que realmente valorizamos a filosofia da moral tem de consultar o nosso medo antes do nosso desejordquo41

Destarte para se conceber tal princiacutepio no ativo e complexo contemporacircneo eacute preciso pensar uma eacutetica que responda aos efeitos dos atos humanos no porvir de modo a contemplar os conceitos que se adequem agrave velocidade das transformaccedilotildees prever o inexistente pressupor situaccedilotildees hipoteacuteticas e gerir o imponderaacutevel Essas satildeo portanto caracteriacutesticas dessa eacutetica do futuro que igualmente preci-sa controlar com responsabilidade a garantia de permanecircncia da raccedila humana considerando o justo o bom o certo o autecircntico e o digno42

39 Idem p 54-55

40 JONAS Hans O Princiacutepio Responsabilidade ensaio de uma eacutetica para a civilizaccedilatildeo tecnoloacutegica Rio de Janeiro Ed Contraponto

PUC-Rio 2006 p 39

41 Idem p 71

42 Ibidem

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De acordo com Hans Jonas faz parte dos desafios de uma eacutetica do futuro o dever de visualizar efeitos de longo prazo mobilizar o sentimento que melhor se adeque agraves representaccedilotildees das possibilidades avaliar a inseguranccedila quanto agraves projeccedilotildees futuras e observar o conhecimento do que eacute possiacutevel ou o simples saber sobre as possibilidades43 Em outras palavras trata de garantir um meio ambiente equilibrado agraves geraccedilotildees vindouras meta essa da eacutetica do futuro O agir humano natildeo pode portanto colocar em risco os interesses coletivos assim como o ocorrido nos filmes ora telados que colocaram em risco natildeo somente os personagens atraveacutes de determinadas experiecircncias cientiacuteficas mas tambeacutem a essecircncia do ser humano

Respeitar o dever de existir dos descendentes eacute ter responsabilidade para com os atos do presente que invariavelmente afetariam sua plenitude em uma vida futura A existecircncia da humanidade eacute portanto o primeiro imperativo para a eacutetica da responsabilidade com relaccedilatildeo ao futuro e deve ser o mais importan-te dever coletivo devido ao forte potencial de destruiccedilatildeo da civilizaccedilatildeo tecnoloacutegica Hans Jonas dessa forma leciona ainda quanto o plano baconiano que visa dominar a natureza atraveacutes do saber eximindo a racionalidade e retidotildees adequadas o sucesso e os excessos que esse ideal acusaram como ecircxito eco-nocircmico e o bioloacutegico e tambeacutem a imprevisibilidade real das dimensotildees do ecircxito ldquoA ameaccedila de cataacutestro-fe do ideal baconiano de dominaccedilatildeo da natureza por meio da teacutecnica reside portanto na magnitude de seu ecircxitordquo44 Logo pode ser contestado que somente atraveacutes da disciplina social extrema e politicamente imposta eacute que se seraacute capaz de rever as vantagens ou as falsas vantagens do agora em detrimento dos imperativos do futuro Em outras letras a compulsatildeo em exercer o poderio sobre a natureza

[] eacute a perspectiva apocaliacuteptica que se insere de forma previsiacutevel na dinacircmica do atual curso da

humanidade Devemos compreender que estamos diante de uma dialeacutetica que soacute poderaacute ser

enfrentada graccedilas a uma escala em termos de poder e natildeo com uma renuacutencia quietista ao poder

A foacutermula baconiana afirma que saber eacute poder Mas o proacuteprio programa baconiano no auge do

triunfo revela-se insuficiente com a sua contradiccedilatildeo intriacutenseca ou seja o descontrole sobre

si mesmo mostrando-o incapaz de proteger o homem de si mesmo e a natureza do homem45

A eacutetica do futuro deve dessa forma pautar-se em accedilotildees humanas prevendo e analisando as accedilotildees conjuntamente pois natildeo existe mais espaccedilo para o isolamento na sociedade poacutes-moderna uma vez que o destino de toda a humanidade estaacute intrinsecamente ligado natildeo soacute agraves grandes atitudes mas tam-beacutem aos pequenos atos individuais ou de grupos de indiviacuteduos que por atingir a todos necessitam serem revistos dentro dos limites do acircmbito particular de suas accedilotildees E se isso natildeo ocorrer estare-mos fadados a consequecircncias e cataacutestrofes como as vistas nas obras ldquoOs Vingadores Era de Ultronrdquo e ldquoCapitatildeo Ameacuterica Guerra Civilrdquo que ocorreram devido agraves atitudes tomadas individualmente ou em alguns casos por grupos de indiviacuteduos sem a devida reflexatildeo eacutetico-moral

5 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

Se pretendeu despertar no leitor com o presente artigo o desejo por um novo tipo de conhecimento isto eacute um raciociacutenio loacutegico e criacutetico a respeito de um assunto ainda jovem no campo da Bioeacutetica e quase alheio agrave grande populaccedilatildeo Para tanto tendo em vista o faacutecil acesso agrave grande parcela da sociedade a induacutestria cinematograacutefico se propocircs trazer agrave tona a discussatildeo de temas que cada dia se fazem mais impactantes na Bioeacutetica e que estatildeo a envolver igualmente cada vez mais no cotidiano da espeacutecie humana

Nesse iacutenterim foram constatadas algumas das problemaacuteticas da (bio)eacutetica nos filmes ldquoOs Vingadores Era de Ultronrdquo e ldquoCapitatildeo Ameacuterica Guerra Civilrdquo problemas como o enhancement da espeacutecie humana o desenvolvimento de inteligecircncias artificiais e de exoesqueletos os quais se mostraram em cada cena

43 Idem p 72-74

44 idem p 235

45 JONAS Hans O Princiacutepio Responsabilidade ensaio de uma eacutetica para a civilizaccedilatildeo tecnoloacutegica Rio de Janeiro Ed Contraponto

PUC-Rio 2006 p 236

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das obras mais complexos e catastroacuteficos problemaacuteticas essas que tal qual nos filmes vem se fazendo cada vez mais presente na sociedade fora do mundo imaginario Tem-se por conseguinte que a imagi-naccedilatildeo humana muitas vezes crie tais obras de ficccedilatildeo como formas de natildeo apenas sutilmente ante-ver tais questotildees de alta complexidade e propensas a cataacutestrofes futuras agrave humanidade mas tambeacutem como meio de advertir a si mesma dos riscos que se encontra correndo

As implicaccedilotildees da produccedilatildeo cientiacutefica na contemporaneidade tal qual nos filmes deve depender de fundamentaccedilotildees eacuteticas a fim de proteger o homem do proacuteprio homem e dos descaminhos que o poder outrora possa vir a lhe causar Sua responsabilidade deve assim invadir os domiacutenios do desconheci-do quando se fala em problemaacuteticas como as abordadas nos filmes do Universo Cinematograacutefico da Marvel pois seus efeitos satildeo imprevisiacuteveis em outras entonaccedilotildees o princiacutepio da responsabilidade deve preservar a imagem e semelhanccedila do humano e pensar no medo como um conselheiro possiacutevel levan-do em conta a imagem positiva do homem ante sua negativa a qual deriva de suas accedilotildees desastrosas no presente

A eacutetica do futuro assim deve preencher os espaccedilos que se permitirem serem completados mesmo que moralmente O homem necessita rever a eacutetica pois se saber eacute poder um saber negativo pode nos levar ao retrocesso da espeacutecie humana bem como a sua descontinuidade Moral eacute eacuteticamente falando os perigos que a civilizaccedilatildeo do presente possa vir a enfrentar os quais satildeo muitos e podem se multipli-car exponencialmente caso natildeo busquemos antever suas consequecircncias Contudo o maior perigo que podemos enfrentar aleacutem da proacutepria espeacutecie humana eacute a inviabilizaccedilatildeo do mundo como conhecemos para as presentes e futuras geraccedilotildees sejam elas humanas ou Poacutes-Humanas

AGRADECIMENTOS

A Claacuteudia Lissandra Martins de Andrade Advogada e Arte-educadora os sinceros agradecimentos pela disponibilidade de conversar a respeito do emprego da 7ordm Arte no presente artigo conversas essas que se mostraram muito frutiveras consoante pode-se observar nas consideraccedilotildees finais expostas

REFEREcircNCIAS

ANDORNO Roberto ldquoLiberdaderdquo e ldquoDignidaderdquo da Pessoas dois paradigmas opostos ou comple-mentares na bioeacutetica In MARTINS-COSTA Judith MOumlLLER Letiacutecia Luwdwig (Orgs) Bioeacutetica e Responsabilidade Rio de Janeiro Forense 2009

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LIMBERGER Tecircmis Cibertransparecircncia informaccedilatildeo puacuteblica em rede e a cidade em tempos de globa-lizaccedilatildeo In STRECK Lecircnio Luiz ROCHA Leonel Severo ENGELMANN Wilson (Orgs) Constituiccedilatildeo Sistemas Sociais e Hermenecircutica anuaacuterio do Programa de Poacutes-Graduaccedilatildeo em Direito da UNISINOS ndash Mestrado e Doutorado Porto Alegre Livraria do Advogado n 12 2016

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PONA Eacuteverton Willian TESHIMA Marcia X-Men da ficccedilatildeo agrave realidade Posicionamentos de sentine-las bioconservadoras Revista de Informaccedilatildeo Legislativa Brasiacutelia v 52 n 205 2015 Disponiacutevel em lthttpwww12senadolegbrriledicoes52205ril_ v52_n205_p189pdfgt Acesso em 09 jul 2017

ROCHA Leonel Severo OLIVEIRA Cheila A A Bioeacutetica e o Biodireito como Acoplamentos Estruturais entre a Eacutetica e o Direito na Proteccedilatildeo da Vida Humana Revista Brasileira de Direito Passo Fundo v 1 2008

SCHUSTER Diego Henrique Sobre a Dignidade Humana como Qualificadora do Gecircnero Humano e Fonte de Legitimidade dos Direitos uma Reflexatildeo sobre o Movimento Transumanista e sua Influecircncia sobre o Desenvolvimento Futuro da Humanidade Revista Brasileira de Direitos Humanos v 16 2016

VILACcedilA Murilo Mariano DIAS Maria Clara Marques Transumanismo e o futuro (poacutes-) humano Physis Revista de Sauacutede Coletiva Rio de Janeiro v 24 n 02 2014 Disponiacutevel em lthttpwwwscie-lobrpdfphysisv24n20103-7331-physis-24-02-00341pdfgt Acesso em 06 jul 2017

Sob a chancela do corpo docente da Unisul Campus

Universitaacuterio da Grande Florianoacutepolis eis o resultado

dos trabalhos monograacuteficos indicados para publicaccedilatildeo

meticulosamente revisados por professores

orientadores membros integrantes de banca e

coordenadores de nuacutecleo de monografia

O QUE ESTAMOS PESQUISANDO

235Ano IX Nordm 17 | Julho a Dezembro | 2018

A IMPORTAcircNCIA DO REGIME DISCIPLINAR DIFERENCIADO NO COMBATE AO CRIME ORGANIZADO Agrave LUZ DOS PRINCIacutePIOS DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA E DA PROPORCIONALIDADEAcadecircmica Alana Felchilcher

Orientador Sidney Eloy Dalabrida

Examinador 1 Eacutelio de Amorim

Examinadora 2 Eliana Becker

E-mail alanafelchilcherhotmailcom

Resumo A presente monografia tem como objetivo principal estudar a importacircncia da aplicaccedilatildeo do regime disciplinar diferenciado no combate ao crime organizado agrave luz dos princiacutepios da dignidade da pessoa humana e da proporcionalidade Edificada a partir do meacutetodo dedutivo e por meio de pesquisa bibliograacutefica qualitativa visa-se estudar os princiacutepios da dignidade da pessoa humana e da proporcio-nalidade demonstrando sua importacircncia e sua eficaacutecia juriacutedica expor o regime prisional comum bem como o regime disciplinar diferenciado e demonstrar a importacircncia deste no combate agrave criminalidade organizada agrave luz dos princiacutepios da dignidade da pessoa humana e da proporcionalidade Para tal verifi-caccedilatildeo a pesquisa recorre agrave doutrina paacutetria atraveacutes da qual percebe-se que apesar de o regime discipli-nar diferenciado restringir alguns direitos fundamentais conferidos aos presos essa restriccedilatildeo eacute excep-cional atende agraves necessidades do contexto bem como a dignidade da pessoa humana pauta-se na proporcionalidade e garante agrave coletividade o desfrute dos seus direitos constitucionalmente conferi-dos sendo por isso constitucional e de fundamental importacircncia para o combate ao crime organizado

Palavras-Chave Regime disciplinar diferenciado Crime organizado Dignidade da pessoa humana Proporcionalidade

236 Revista Juriacutedica da Universidade do Sul de Santa Catarina

O REGIME JURIacuteDICO DOS CONTRATOS NAS ESTATAIS EM FUNCcedilAtildeO DA LEI 133032016 UM ESTUDO DO REGULAMENTO DA ELETROBRASAcadecircmica Ana Luacutecia Schveitzer

Orientadora Patriacutecia de Oliveira Franccedila

Examinador 1 Henrique Barros Souto Maior Baiatildeo

Examinador 2Juacutelio Ceacutesar Marcellino Juacutenior

E-mail anaschveitzergmailcom

Resumo A Lei 1330316 (Estatuto das Estatais) trouxe um novo regramento no campo das licitaccedilotildees e contrataccedilotildees dessas entidades principalmente o art 68 ao definir que os contratos celebrados na vigecircncia da Lei seriam regulados pelos preceitos de direito privado divergente do modelo anterior sob o regramento da Lei 866693 em que eram considerados contratos administrativos Tal modifi-caccedilatildeo cria grande impacto na relaccedilatildeo juriacutedico-administrativa entre o contratante e o contratado mais horizontal pois na concepccedilatildeo privada natildeo haacute que se falar em claacuteusulas exorbitantes caracteriacutestica do poder puacuteblico O objetivo dessa monografia eacute verificar por meio de pesquisa bibliograacutefica (doutrina Lei 133032016 e atos regulamentadores jaacute editados) o regime juriacutedico dos contratos estatais a par-tir da Lei 1330316 apontando quais fundamentos de direito puacuteblico ainda se aplicam e quais migra-ram para o direito privado sendo o meacutetodo de abordagem utilizado quanto agrave natureza qualitativo e quanto ao pensamento dedutivo Concluiu-se que embora o Estatuto tenha por objetivo aproximar o contrato estatal do privado o acordo decorrente da Lei 1330316 natildeo eacute puramente civilista mas assi-nalado por um regime hiacutebrido com pressupostos do direito privado todavia ainda com obrigaccedilotildees e benesses da Administraccedilatildeo Puacuteblica Da anaacutelise do Regulamento da Eletrobras e demais regulamentos utilizados para fim de estudo comparado acentuou-se a ideia do hibridismo e ateacute mesmo de um contra-to administrativo diferenciado havendo em alguns momentos falta de coerecircncia por parte das Estatais ao dispor sobre direito puacuteblico eou privado provavelmente em funccedilatildeo da cultura publicista existente e da imaturidade dessa mudanccedila

Palavras-Chave Lei 133032016 Hibridismo juriacutedico Contratos Estatais

237Ano IX Nordm 17 | Julho a Dezembro | 2018

CRIMINAL COMPLIANCE NO AcircMBITO DO DIREITO PENAL TRIBUTAacuteRIO MECANISMO DE PROTECcedilAtildeO DA EMPRESA FRENTE AOS DELITOS TRIBUTAacuteRIOS PREVISTOS NA LEI Nordm 81371990Acadecircmica Ana Paula Dallanora

Orientadora Tania Maria Franccedilosi Santhias

Examinadora Giglione Edite Janela Maia

Examinadora Patricia Castagna

E-mail anapauladallanorahotmailcom

Resumo O presente trabalho tem como escopo esmiuccedilar sobre o sistema Criminal Compliance no acircmbito do Direito Penal Tributaacuterio e os benefiacutecios que sua implementaccedilatildeo trazem as empresas e aos empresaacuterios tanto de cunho material quanto de ordem imaterial Natildeo soacute por oferecer meacutetodos de prevenccedilatildeo que visam coibir a praacutetica dos iliacutecitos previstos na Lei 8137 de 27 de novembro de 1990 o que gera maior credibilidade agrave empresa no mercado e evita custos desnecessaacuterios com processos judiciais mas por trazer a possibilidade de delegaccedilatildeo do dever de vigilacircncia diante da definiccedilatildeo de sob quem e quando recairaacute a responsabilidade criminal por esse dever Isso porque mesmo o ordenamen-to juriacutedico brasileiro tendo como um dos princiacutepios basilares o da individualizaccedilatildeo da pena previsto no artigo 5ordm inciso XLVI da Constituiccedilatildeo da Repuacuteblica Federativa do Brasil de 1988 que garante a cada pessoa responder por crimes na medida de sua culpabilidade devendo a dosimetria ser feita de forma individual para cada infrator os tribunais brasileiros vem admitindo as chamadas denuacutencias geneacutericas diante da complexidade que envolve a apuraccedilatildeo do verdadeiro agente cometedor do iliacutecito quando se trata de crimes societaacuterios inclusive quando da apuraccedilatildeo de praacuteticas de crimes contra a ordem tribu-taacuteria praticados por particulares previstos na Lei nordm 81371990 Isso aliado ao fato de eacute adotado pelo ordenamento juriacutedico brasileiro a tradicional teoria do delito que prevecirc dentre outros requisitos a necessidade de potencial consciecircncia humana da ilicitude o que impossibilita a imputaccedilatildeo diretamen-te aos entes juriacutedicos mas que natildeo obsta a aplicaccedilatildeo de sanccedilotildees penais aos agentes que constam no contrato social da empresa Tal possibilidade que vem permitindo que os tribunais brasileiros imputem sanccedilotildees de cunho penal aos empresaacuterios sob o argumento de que a eles incumbe a administraccedilatildeo e fis-calizaccedilatildeo dos atos de seus subordinados Ou seja o dever de zelar e vigiar os atos desses Assim com a implantaccedilatildeo do Criminal Compliance e seus mecanismos de antecipaccedilatildeo bem como o nascimento das figuras Chieff Compliancer Officer e dos Whistleblowers fica mais faacutecil evitar os delitos previstos na Lei nordm 81371990 ou nos piores casos apurar quem foram os verdadeiros responsaacuteveis pelo cometi-mento dos delitos evitando condenaccedilotildees desnecessaacuterias e injustas a aqueles que agiram dentro dos ditames legais

Palavras-chave Criminal Compliance Benefiacutecios PrevenccedilatildeoVigilacircncia

238 Revista Juriacutedica da Universidade do Sul de Santa Catarina

A PAZ PERPEacuteTUA KANTIANA NO SEacuteCULO XXIAcadecircmico Anderson de Souza Rosa

Orientador Joatildeo Batista da Silva

Examinador Alexandre Botelho

Examinadora Priscila Azambuja Tagliari

E-mail andersonsrosa94gmailcom

Resumo A presente pesquisa tem como principal objetivo verificar a possibilidade de aplicaccedilatildeo da paz perpeacutetua apresentada por Immanuel Kant no primeiro quartel do seacuteculo XXI Para tanto utiliza-se do meacutetodo de procedimento monograacutefico para chegar agrave resposta do questionamento Primeiramente foram apresentadas as origens da guerra e da paz e suas consequecircncias nas relaccedilotildees internacionais para entatildeo apresentar a teoria kantiana de paz perpeacutetua que tem como objetivo pocircr fim ou minimizar drasticamente o uso da guerra nas relaccedilotildees interestatais E por fim esta teoria fora contraposta com as atitudes e pen-samentos correntes a fim de saber a possibilidade de sua aplicabilidade no periacuteodo proposto Ao fim a conclusatildeo alcanccedilada com a presente pesquisa eacute de que natildeo eacute possiacutevel a aplicaccedilatildeo da paz perpeacutetua devido agrave resistecircncia ainda existente entre os Estados em ceder sua soberania para a criaccedilatildeo de uma Federaccedilatildeo de Estados bem como do sentimento nacionalista ainda presente entre seus cidadatildeos

Palavras-chave Guerra e Paz Paz Perpeacutetua Kantiana Federaccedilatildeo de Estados

239Ano IX Nordm 17 | Julho a Dezembro | 2018

AMICUS CURIAE NOVA MODALIDADE DE INTERVENCcedilAtildeO DE TERCEIRO NO PROCESSO CIVIL BRASILEIROAcadecircmica Andressa Paula Mucelin

Orientador Guilherme de Almeida Bossle

Examinador 1 Hernani Luiz Sobierajski

Examinador 2 Herciacutelio E Lentz

Email andressapmucelingmailcom

Resumo O tema deste Trabalho de Conclusatildeo de Curso versa sobre o amigo da corte sua origem e atuaccedilatildeo efetiva no Supremo Tribunal Federal em Accedilotildees de Controle de Constitucionalidade discorre sobre as alteraccedilotildees advindas com o novo Coacutedigo de Processo Civil de 2015 bem como os requisitos para atuar nesta condiccedilatildeo O objetivo do trabalho eacute ressaltar sua imprescindibilidade e pois disponibi-lizar informaccedilotildees acerca deste agrave sociedade afim de abertamente motivaacute-la a integrar o processo pelo instituto do amicus curiae quando lhe competir aleacutem de revelar o interesse que o amigo da corte possa ter mesmo natildeo se beneficiando da decisatildeo processual propriamente dita Ao desenvolver este estudo concluiu-se que mesmo natildeo integrando qualquer dos polos da relaccedilatildeo juriacutedica processual o instituto eacute capaz de defender seu entendimento teacutecnico e cientiacutefico esclarecendo duacutevidas de sua competecircncia ao magistrado por desconhecimento teacutecnico do Poder Judiciaacuterio na mateacuteria controvertida em litiacutegio

Palavras-Chave Amigo da Corte Supremo Tribunal Federal Controle de Constitucionalidade Coacutedigo de Processo Civil de 2015 Intervenccedilatildeo de Terceiros no Processo Procedimento da Intervenccedilatildeo

240 Revista Juriacutedica da Universidade do Sul de Santa Catarina

SISTEMA PROCESSUAL PENAL ACUSATOacuteRIO PRETENSAtildeO PUNITIVA ESTATAL E JURISDICcedilAtildeOAcadecircmica Andressa Pimenta Tomazini

Orientador Sidney Eloy Dalabrida

Examinador 1 Elio de Amorim

Examinador 2 Eliana Becker

E-mail dessaptomazinigmailcom

Resumo O presente trabalho monograacutefico traz como objeto de estudo a tutela jurisdicional tendo em vista a tamanha importacircncia que possui dentro de um Estado Democraacutetico de Direito e qual o grau de vinculaccedilatildeo que esta possui com a pretensatildeo punitiva estatal em uma Accedilatildeo Penal dentro de um Sistema Processual Penal Acusatoacuterio como o Espanhol Assim nesse sentido e contexto o objetivo principal desta pesquisa eacute mostrar qual o limite da tutela jurisdicional quando ocorre a mudanccedila da pretensatildeo condenatoacuteria ou seja quando o requerimento ministerial for absolutoacuterio Para tanto utili-zou-se o pensamento indutivo pois a partir de categorias especiacuteficas (sistema processual acusatoacuterio pretensatildeo punitiva e limite da tutela jurisdicional) mostrar-se-aacute o limite decisional em face da alte-raccedilatildeo da pretensatildeo punitiva dentro de um Sistema Processual Acusatoacuterio A natureza da pesquisa eacute qualitativa e o meacutetodo procedimental eacute monograacutefico englobando a pesquisa bibliograacutefica com base na doutrina obras claacutessicas legislaccedilatildeo perioacutedicos e artigos cientiacuteficos Conclui-se que o limite decisional consiste no interesse puacuteblico estatal exercido e manifestado pelo Ministeacuterio Puacuteblico de modo que ao optar pelo requerimento absolutoacuterio natildeo existe mais a pretensatildeo condenatoacuteria devendo ser prolata-da pelo magistrado uma sentenccedila penal absolutoacuteria

Palavras-Chave Sistema processual penal acusatoacuterio Pretensatildeo punitiva Limite da tutela jurisdicional

241Ano IX Nordm 17 | Julho a Dezembro | 2018

PROGRAMAS DE COMPLIANCE E A SUA IMPORTAcircNCIA PARA AS EMPRESAS NO BRASILAcadecircmica Cristiana Melillo Bittencourt

Orientador Henrique Barros Souto Maior Baiatildeo

Examinador 1 Hernani Luiz Sobierajski

Examinador 2 Herciacutelio E Lentz

E-mail cristianamelillogmailcom

Resumo Este trabalho tem por objetivo geral verificar a importacircncia da adoccedilatildeo dos programas de com-pliance para as empresas no Brasil Para cumprir com esse objetivo realiza-se uma pesquisa com o meacutetodo de abordagem dedutivo de natureza qualitativa com o meacutetodo de procedimento monograacutefico e a teacutecnica de pesquisa bibliograacutefica e documental As principais descobertas realizadas por esta monografia satildeo que as convenccedilotildees internacionais anticorrupccedilatildeo ratificadas pelo Brasil influenciaram a tipificaccedilatildeo da Lei anticorrupccedilatildeo brasileira que o FCPA e o UK Bribery Act influenciaram na promoccedilatildeo do compliance no Brasil que o complianceganhou relevacircncia no Brasil a partir da sua previsatildeo na Lei anticorrupccedilatildeo brasi-leira e que a legislaccedilatildeo anticorrupccedilatildeo brasileira incentiva a adoccedilatildeo de programas de compliance realmen-te eficazes Conclui-se que a importacircncia da adoccedilatildeo dos programas decompliance para as empresas no Brasil se verifica principalmente na possibilidade de reduccedilatildeo dos riscos legais e reputacionais das pessoas fiacutesicas e juriacutedicas na remediaccedilatildeo dos prejuiacutezos caso se identifique alguma irregularidade e o transbor-damento dos comportamentos derivados da poliacutetica de compliance da esfera da empresa para a esfera social beneficiando a empresa seus empregados e a sociedade como um todo

Palavras-Chave Compliance Lei anticorrupccedilatildeo Programas de integridade

242 Revista Juriacutedica da Universidade do Sul de Santa Catarina

MEIO AMBIENTE DE TRABALHO SAUDAacuteVEL O BANIMENTO DO AMIANTO CRISOTILA (ASBESTO BRANCO) NO BRASIL E A RESPONSABILIDADE CIVIL DO EMPREGADOR POR ACIDENTE DE TRABALHOAcadecircmica Gabriela Thomas Coutinho

Orientador Elvis Daniel Muumlller

Examinador 1 Carlos Alberto Crispim

Examinador 2 Rafael de Miranda Santos

Email gabitmscgmailcom

Resumo A exposiccedilatildeo do trabalhador a substacircncias altamente canceriacutegenas tem se demonstrado um desafio mundial Segundo dados da Organizaccedilatildeo Mundial da Sauacutede estima-se que 125 milhotildees de tra-balhadores em todo o mundo estatildeo expostos ao amianto em seus locais de trabalho Diante dos altos iacutendices de doenccedilas e mortes relacionadas ao composto muito paiacuteses jaacute proibiram o seu uso No Brasil percebe-se uma verdadeira ineacutercia estatal quanto ao assunto Apesar de ser signataacuterio da Convenccedilatildeo n 162OIT que trata da substituiccedilatildeo gradativa do amianto as medidas assumidas natildeo foram concre-tizadas Levando o judiciaacuterio a posicionar-se a respeito De outro norte tambeacutem inertes quanto aos malefiacutecios do amianto os empregadores continuam a expor seus empregados nas linhas de produccedilatildeo visando tatildeo somente os lucros provenientes desse composto polivalente e de baixo custo Diante des-te contexto a pesquisadora busca em seu trabalho verificar o banimento do amianto crisotila (asbesto branco) no Brasil e a Responsabilidade Civil do empregador por acidente de trabalho Utilizando o pro-cedimento monograacutefico com teacutecnicas de pesquisa bibliograacutefica e documental a pesquisadora apre-senta e conceitua os princiacutepios da dignidade da pessoa humana e da proteccedilatildeo do trabalhador e ainda o meio ambiente de trabalho Da mesma forma identifica a reponsabilidade civil do empregador em caso de acidente de trabalho e a divergecircncia doutrinaacuteria acerca do tema Ao fim da pesquisa apesar da decisatildeo pelo banimento do amianto crisotila no Brasil ser recente e ainda estar com seus efeitos sus-pensos a pesquisadora verificou que haacute fundamentos plausiacuteveis para a declaraccedilatildeo da inconstituciona-lidade do art 2ordm da Lei n 905595 (Lei do Amianto) bem como identificou que a responsabilidade do empregador por acidente de trabalho segundo corrente majoritaacuteria ainda eacute subjetiva dependendo da comprovaccedilatildeo da culpa

Palavras-Chave Meio ambiente de trabalho Banimento do amianto Responsabilidade civil do empregador

243Ano IX Nordm 17 | Julho a Dezembro | 2018

O ALCANCE DA NORMA CONTIDA NO PARAacuteGRAFO UacuteNICO DO ART 932 DO COacuteDIGO DE PROCESSO CIVILAcadecircmico Glauber William Duarte

Orientadora Sacircmia Mocircnica Fortunato

Examinadora Patriacutecia de Oliveira Franccedila

Examinador Leonardo Martins Fornari

E-mail glauberwilliamduartegmailcom

Resumo O objetivo do presente trabalho eacute identificar o alcance da norma contida no paraacutegrafo uacutenico do art 932 do Coacutedigo de Processo Civil no que tange ao juiacutezo de admissibilidade dos recursos ciacuteveis uma vez que tal norma por si soacute natildeo delimita o seu alcance quanto agrave sanabilidade de viacutecios nos pres-supostos de admissibilidade recursal Apoacutes o estudo da norma em questatildeo ou seja de seu contexto e de seu conteuacutedo agrave luz dos conceitos primordiais do direito processual civil bem como da principio-logia que rege este como um tudo e a proacutepria atividade recursal a conclusatildeo foi no sentido de diante dos princiacutepios da primazia do julgamento do meacuterito e da cooperaccedilatildeo do qual se extraem os deveres de consulta e prevenccedilatildeo que a norma alcanccedila todos os viacutecios capazes de tornar um recurso inadmissiacutevel devendo a anaacutelise da sanabilidade dos pressupostos ser feita no caso concreto apoacutes a oitiva da parte recorrente oitiva esta que eacute direito subjetivo de quem recorre Para tanto utilizou-se como meacutetodo de abordagem o pensamento dedutivo e como meacutetodo de procedimento o monograacutefico tendo como teacutec-nica de pesquisa a bibliograacutefica com base em doutrina legislaccedilatildeo jurisprudecircncia e artigos cientiacuteficos

Palavras-chave Juiacutezo de admissibilidade Dever de prevenccedilatildeo Primazia do meacuterito

244 Revista Juriacutedica da Universidade do Sul de Santa Catarina

A PRODUCcedilAtildeO DE NULIDADE EM VIRTUDE DO USO INJUSTIFICADO DE ALGEMAS NO PLENAacuteRIO DO JUacuteRIAcadecircmico Hernani Oliveira Costa

Orientadora Cristiane Goulart Cherem

Examinadora Virgiacutenia Lopes Rosa

Examinador Joel Irineu Lohn

E-mail hernaniocostagmailcom

Resumo O presente trabalho de conclusatildeo de curso tem como objetivo geral abordar temaacuteticas rela-cionadas ao tribunal do juacuteri tendo como enfoque principal verificar quais posicionamentos e paracircme-tros tecircm sido adotados pelos tribunais superiores a respeito do uso de algemas nas sessotildees de julga-mento perante o Conselho de Sentenccedila Foram diversas as alteraccedilotildees sofridas pelo tribunal do juacuteri desde sua incorporaccedilatildeo ao sistema judiciaacuterio brasileiro tendo surgido neste iacutenterim a discussatildeo acer-ca da influecircncia do uso de algemas na percepccedilatildeo dos jurados leigos assunto que gera divergecircncia dou-trinaria Dessa forma fez-se necessaacuteria discussatildeo a respeito da temaacutetica verificando-se as hipoacuteteses excepcionais em que o uso de algemas eacute permitido quando o acusado se encontra ocupando o ldquobanco dos reacuteusrdquo O marco teoacuterico foca quatro temas que se considerou fundamentais para a sustentaccedilatildeo da pesquisa o tribunal do juacuteri a origem os princiacutepios e a legalidade do uso de algemas Desta forma para esta pesquisa o meacutetodo de abordagem utilizado eacute o dedutivo sendo procedimento monograacutefico de natureza qualitativa com teacutecnicas de pesquisa bibliograacutefica e documental

Palavras-chave Tribunal do Juacuteri Princiacutepios Uso de algemas

245Ano IX Nordm 17 | Julho a Dezembro | 2018

O CARAacuteTER TRANSITOacuteRIO DOS ALIMENTOS DEVIDOS AO EX-COcircNJUGECOMPANHEIRO E OS ELEMENTOS NECESSAacuteRIOS PARA EXONERACcedilAtildeOAcadecircmica Juacutelia Gevaerd de Oliveira Ramos

Orientadora Gisele Rodrigues Martins Goedert

Examinador 1 Luciana Faiacutesca Nahas

Examinadora 2 Priscila de Azambuja Tagliari

E-mail juliaggevaerdgmailcom

Resumo Este trabalho o qual utilizou-se do meacutetodo dedutivo para sua consecuccedilatildeo pretende susci-tar as particularidades conferidas aos alimentos devidos entre ex-cocircnjuges e ex-companheiros res-saltando-se em especial o caraacuteter transitoacuterio que lhes foi atribuiacutedo ao longo dos uacuteltimos anos pelo ordenamento juriacutedico paacutetrio Em um primeiro momento realizou-se um estudo acerca da evoluccedilatildeo das entidades familiares e suas novas diretrizes embasadas no afeto na independecircncia dos consortes e na igualdade dos gecircneros Logo em sequecircncia discorreu-se no segundo capiacutetulo acerca do instituto dos alimentos suas hipoacuteteses de prestaccedilatildeo caracteriacutesticas e espeacutecies tendo-se desaguado na catego-ria dos alimentos transitoacuterios de conceituaccedilatildeo elementar para a construccedilatildeo da pesquisa Consagrado pelos tribunais e doutrinadores os alimentos assim denominados transitoacuterios tecircm sua duraccedilatildeo restrita por lapso temporal certo ou condiccedilatildeo futura exoneratoacuteria ambos determinados por magistrado com-petente Ao aprofundar-se na aplicaccedilatildeo da categoria pelos tribunais paacutetrios notou-se no uacuteltimo capiacute-tulo do trabalho que o judiciaacuterio vem fundamentando a aplicaccedilatildeo da espeacutecie nas obrigaccedilotildees alimenta-res entre ex-cocircnjuges e companheiros geralmente na evoluccedilatildeo da igualdade dos gecircneros Explanam que caberia a ambos do ex-casal buscarem sua independecircncia financeira apoacutes o teacutermino da relaccedilatildeo havida natildeo sendo mais aceitaacutevel a imputaccedilatildeo de obrigaccedilatildeo vitaliacutecia a um dos ex-consortes quando o outra detenha condiccedilotildees proacuteprias de subsistecircncia Por fim verificou-se que a implementaccedilatildeo de ter-mos e condiccedilotildees previamente estipuladas em juiacutezo para o teacutermino da obrigaccedilatildeo refletiu nas accedilotildees de exoneraccedilatildeo dos encargos alimentares transitoacuterios tendo se dedicado espaccedilo no trabalho sobre tais consequecircncias Ante a recorrecircncia da utilizaccedilatildeo do instituto pelo poder judiciaacuterio em sua atuaccedilatildeo e a concomitante inexistecircncia de legislaccedilatildeo sobre o assunto demonstrou-se relevante a pesquisa sobre o tema Percebe-se pois um movimento em prol da emancipaccedilatildeo dos consortes apoacutes o teacutermino de suas relaccedilotildees enquanto proacuteprio reflexo da evoluccedilatildeo das entidades familiares parecendo adequado o posi-cionamento das cortes brasileiras acerca da aplicaccedilatildeo da transitoriedade nas situaccedilotildees citadas desde que sempre criteriosamente avaliados os casos concretos vindos agrave sua baila

Palavras-Chave Famiacutelia Pensatildeo Alimentiacutecia Alimentos transitoacuterios Exoneraccedilatildeo

246 Revista Juriacutedica da Universidade do Sul de Santa Catarina

A (IM)POSSIBILIDADE DE RECONHECIMENTO NO ORDENAMENTO JURIacuteDICO BRASILEIRO DOS ANIMAIS NAtildeO HUMANOS COMO SUJEITOS DE DIREITOAcadecircmica Luciana Aparecida Schossler

Orientador Jeferson Puel

Examinador 1 Wacircnio Wiggers

Examinador 2 Eliana Becker

e-mail lucianaastjscjusbr

Resumo O presente trabalho tem como objetivo verificar a (im)possibilidade de reconhecimento pelo ordenamento juriacutedico brasileiro dos animais natildeo humanos como sujeitos de direito Utiliza-se para isso o meacutetodo dedutivo de procedimento histoacuterico e monograacutefico com resposta ao problema da pes-quisa de natureza qualitativa e teacutecnica de pesquisa bibliograacutefica Para uma melhor contextualizaccedilatildeo do tema aborda-se o histoacuterico da exploraccedilatildeo animal as premissas do especismo o nascimento do movi-mento pelos direitos dos animais e seus princiacutepios norteadores Apresenta-se a relaccedilatildeo dos animais (humanos e natildeo humanos) com a Natureza e a proteccedilatildeo dos natildeo humanos no ordenamento juriacutedico brasileiro nos acircmbitos constitucional e ambiental Explora-se o impacto ambiental gerado pela criaccedilatildeo de animais para alimentaccedilatildeo a qual gera sofrimento natildeo soacute aos natildeo humanos mas tambeacutem agraves pesso-as envolvidas nessa praacutetica especialmente no que diz respeito agrave sauacutede do trabalhador da induacutestria de abate Apontam-se os conceitos de sujeito e objeto de direito e na sequecircncia o status de coisapro-priedade conferido aos natildeo humanos pela norma civilista Mostram-se algumas mudanccedilas legislativas realizadas por outros paiacuteses no que concerne ao reconhecimento de direitos aos natildeo humanos Por fim analisam-se decisotildees judiciais acerca do assunto Conclui-se que embora natildeo haja o reconhecimento dos natildeo humanos como sujeitos de direito em norma positivada no acircmbito nacional haacute projetos de lei em tramitaccedilatildeo no Congresso Nacional que visam dar a eles um novo status juriacutedico bem como julgados que reconhecem os animais como seres sencientes e dignos de consideraccedilatildeo moral com o interesse juriacutedico de ao menos natildeo sofrer

Palavras-Chave Direito dos Animais Sujeito de direito Senciecircncia

247Ano IX Nordm 17 | Julho a Dezembro | 2018

AS CONTROVEacuteRSIAS JURIacuteDICAS SOBRE A REVOGACcedilAtildeO DOS ARTS 322 E 350 DO COacuteDIGO PENAL PELA LEI DE ABUSO DE AUTORIDADEAcadecircmico Luiz Felipe Deschamps Westphal

Orientadora Patriacutecia Ribeiro Mombach

Examinador 1 Wacircnio Wiggers

Examinador 2 Jeferson Puel

E-mail lipedwhotmailcom

Resumo Utilizando-se do meacutetodo de abordagem dedutivo e do meacutetodo de procedimento monograacutefi-co este trabalho tem como objetivo geral apresentar as controveacutersias doutrinaacuterias e jurisprudenciais sobre a revogaccedilatildeo dos arts 322 e 350 ambos do vigente Decreto-Lei nordm 2848 de 7 de dezembro de 1940 notoriamente conhecido como Coacutedigo Penal pela Lei nordm 4898 de 9 de dezembro de 1965 deno-minada como Lei de Abuso de Autoridade O primeiro dispositivo mencionado daquela legislaccedilatildeo trata do crime de violecircncia arbitraacuteria enquanto que o segundo se refere ao delito de exerciacutecio arbitraacuterio ou abuso de poder Diante da abrangecircncia de condutas previstas nesta norma existem diferentes argu-mentaccedilotildees sobre a sua revogaccedilatildeo Alguns sustentam que houve a sua revogaccedilatildeo total outros acredi-tam que ela foi parcial e ainda perduram aqueles que entendem que ele natildeo foi revogado Demonstra-se que a ediccedilatildeo da lei especial em comento gerou diversas duacutevidas sobre a aplicabilidade daqueles dois artigos e ainda natildeo haacute um consenso entre os doutrinadores e os aplicadores do direito sobre terem eles sido revogados ou natildeo Atraveacutes das teacutecnicas de pesquisa bibliograacutefica e documental eacute possiacutevel perce-ber que o art 322 do Coacutedigo Penal natildeo foi revogado ao contraacuterio do art 350 do mesmo diploma legal que foi revogado inteiramente pela Lei de Abuso de Autoridade

Palavras-Chave Abuso de autoridade Violecircncia arbitraacuteria Exerciacutecio arbitraacuterio ou abuso de poder Revogaccedilatildeo Controveacutersias juriacutedicas

248 Revista Juriacutedica da Universidade do Sul de Santa Catarina

MEDIACcedilAtildeO NA RESOLUCcedilAtildeO DE CONFLITOS FAMILIARES ANAacuteLISE DO PERFIL DOS USUAacuteRIOS DO NUacuteCLEO DE PRAacuteTICA JURIacuteDICA DA UNISULAcadecircmico Luiz Guilherme Buchmann Figueiredo

Orientadora Profa Gisele Rodrigues Martins Goedert

Examinador Prof Joel Irineu Lohn

Examinadora Prof Denis de Souza Luiz

E-mail guilhermebuchmanngmailcom

Resumo Neste trabalho foi realizada uma anaacutelise da mediaccedilatildeo como meio de resoluccedilatildeo de confli-tos familiares considerando aspectos legais jurisprudenciais e doutrinaacuterios Foi tambeacutem realizada uma pesquisa empiacuterica com o objetivo de traccedilar o perfil dos usuaacuterios do Nuacutecleo de Praacutetica Juriacutedica da UNISUL Unidade Pedra Branca Partindo da formulaccedilatildeo do problema da pesquisa fez-se os seguin-tes questionamentos Quais princiacutepios satildeo resguardados agraves famiacutelias brasileiras por intermeacutedio da Constituiccedilatildeo de 1988 e da legislaccedilatildeo ordinaacuteria Como proporcionar acesso agrave Justiccedila de forma eficien-te para atender aos conflitos familiares Qual o perfil do puacuteblico atendido no escritoacuterio do Nuacutecleo de Praacuteticas Juriacutedicas da UNISUL E ainda como se daacute a percepccedilatildeo do papel do mediador em uma audiecircncia de mediaccedilatildeo sob a percepccedilatildeo dos usuaacuterios da soluccedilatildeo paciacutefica de conflitos Nesse contexto se efetuou uma anaacutelise legal e doutrinaacuteria sobre o Direito das Famiacutelias dos meacutetodos alternativos para a soluccedilatildeo de conflitos da utilizaccedilatildeo da mediaccedilatildeo como praacutetica de resoluccedilatildeo paciacutefica de conflitos familiares e por fim foi efetuado um estudo praacutetico atraveacutes de um questionaacuterio aplicado a uma amostra de 45 usuaacuterios de uma populaccedilatildeo de 90 indiviacuteduos do serviccedilo de mediaccedilatildeo Extrajudicial do NPJ da UNISUL durante o ano de 2016 e primeiro semestre de 2017 para verificar o perfil dos mediados e a visatildeo das partes em relaccedilatildeo ao papel do mediador extrajudicial Ao teacutermino do estudo concluiu-se que a Constituiccedilatildeo da Repuacuteblica Federativa do Brasil de 1988 (CRFB1988) por ser principioloacutegica garantiu uma seacuterie de direitos agraves famiacutelias por priorizar o afeto e natildeo mais apenas o interesse patrimonial do casamento que Mediaccedilatildeo eacute o meacutetodo de acesso agrave Justiccedila mais indicado para a soluccedilatildeo de conflitos familiares e que os usuaacuterios da Mediaccedilatildeo do NPJ satildeo na sua maioria adultos jovens de ateacute 35 anos que buscam o serviccedilo por questotildees financeiras (economia) e pela agilidade na soluccedilatildeo dos conflitos O principal conflito exis-tente eacute o relacionado a dissoluccedilatildeo de matrimocircnios e uniotildees estaacuteveis e ainda concluiu-se que quase a totalidade das mediaccedilotildees resultaram em acordos satisfatoacuterios e que os usuaacuterios percebem o mediador como algueacutem que iraacute auxiliar na composiccedilatildeo do acordo prestando informaccedilotildees e dizimando duacutevidas

Palavras-chave Mediaccedilatildeo Soluccedilatildeo de Conflitos Direito das Famiacutelias

249Ano IX Nordm 17 | Julho a Dezembro | 2018

RESPONSABILIDADE CIVIL DO EMPREGADOR NO ACIDENTE DE TRABALHOAcadecircmica Manoela Platen

Orientador Gilmar Cavalieri

Examinador 1 Elvis Daniel Muller

Examinador 2 Carina Milioli Correcirca

E-mail manoelaplatenyahoocombr

Resumo O presente trabalho de conclusatildeo de curso aborda o acidente do trabalho e a responsabili-dade civil do empregador Com posicionamentos distintos considerando doutrina e jurisprudecircncia para avaliar a responsabilidade civil do empregador nos casos de acidente de trabalho Observando para este estudo a aplicaccedilatildeo da responsabilidade objetiva prevista no paraacutegrafo uacutenico do artigo 927 do Coacutedigo Civil ainda a responsabilidade subjetiva prevista no artigo 7ordm inciso XXVIII da Constituiccedilatildeo da Repuacuteblica Federativa do Brasil de 1988 Atualmente com a chamada Reforma Trabalhista Lei 134672017 em relaccedilatildeo ao dano extrapatrimonial em que se discute a possibilidade da aplicaccedilatildeo quando da ocorrecircncia de um acidente no ambiente de trabalho e reparaccedilatildeo dos danos decorrentes do infortuacutenio A presente pesquisa aborda as duas teorias de responsabilidade bem como aplicaccedilatildeo no acircmbito do Direito do Trabalho

Palavras-Chave Acidente de trabalho Responsabilidade civil Risco

250 Revista Juriacutedica da Universidade do Sul de Santa Catarina

A RESCISAtildeO DO CONTRATO DE TRABALHO DO ATLETA PROFISSIONAL BRASILEIRO POR DOPING FRENTE AgraveS POLIacuteTICAS DO COacuteDIGO MUNDIAL ANTIDOPING (CMAD) DA WORLD ANTIDOPING AGENCY (WADA) E DAS FEDERACcedilOtildeES INTERNACIONAISAcadecircmico Mauro Henrique Vaterkemper Fernandes

Orientador Prof Leonardo Martins Fornari Esp

Examinadora Prof Carolina de Aragatildeo Santana Esp

Examinador Prof Denis de Souza Luiz Esp

E-mail mauro_wfhotmailcom

Resumo Estamos na era dos superatletas que superam os limites do proacuteprio corpo diariamente Assim para esses atletas um centeacutesimo de segundo um ponto ou um gol representa muito mais que um deta-lhe representa um possiacutevel contrato extraordinaacuterio Esse eacute um dos motivos que fazem os atletas a se submeterem a todo tipo de esforccedilo para poderem entrar e continuar nas miacutedias e assim garantir o retorno financeiro para o clube e para si mesmo Por isso qualquer substacircncia que consiga explorar o maacuteximo do atleta eacute utilizada e com isso o doping virou um fenocircmeno mundial Entretanto apesar de natildeo ser uma praacutetica nova apenas na atualidade vem recebendo maior destaque e chamando atenccedilatildeo dos mecanismos nacionais e internacionais que lutam por um esporte justo Nesse contexto foi criada em 1999 a World Anti-Doping Agency (WADA) que eacute uma organizaccedilatildeo independente criada por inicia-tiva coletiva liderada pelo Comitecirc Oliacutempico Internacional (COI) e aconteceu a Terceira Conferecircncia Internacional de Ministros e Altos Responsaacuteveis pela Educaccedilatildeo Fiacutesica e Esporte (MINEPS III) em Punta del Este Uruguai em dezembro do mesmo ano Na mesma linha no ano de 2004 o Coacutedigo Mundial Antidoping (CMAD) foi implementado por organizaccedilotildees esportivas a partir dos Jogos Oliacutempicos de Atenas padronizando as regras que governam o antidoping em todos os esportes em todos os paiacuteses Em 2005 como resposta aos apelos da comunidade internacional a United Nations Educational Scientific and Cultural Organization (UNESCO) aliou-se a esta luta adotando a Convenccedilatildeo realizada em Punta del Este e assim colaborou para assegurar a eficaacutecia do WADA Em relaccedilatildeo a metodologia trata-se de pes-quisa de natureza qualitativa realizada por meio de meacutetodo de abordagem de pensamento dedutivo O meacutetodo de procedimento eacute monograacutefico realizado por meio de teacutecnica bibliograacutefica Conclui-se que no Direito Desportivo a rescisatildeo de contrato do atleta profissional por doping eacute regida pela legislaccedilatildeo nacional e submetida agraves normas internacionais inclusive responsabilizando o staff em casos nos quais os atletas sofrem submissatildeo por parte dos que responde hierarquicamente desde que comprovado

Palavras-chave Atleta profissional Doping Rescisatildeo de contrato de trabalho

251Ano IX Nordm 17 | Julho a Dezembro | 2018

A APLICACcedilAtildeO DO INCIDENTE DE RESOLUCcedilAtildeO DE DEMANDAS REPETITIVAS NOS JUIZADOS ESPECIAIS CIacuteVEISAcadecircmico Rafael Ibraim Garcia Marques

Orientadora Carina Milioli Correcirca

Examinador 1 Elvis Daniel Muller

Examinador 2 Gilmar Cavalieri

E-mail ibraimgmgmailcom

Resumo O objetivo deste trabalho de conclusatildeo de curso eacute verificar a constitucionalidade da aplicaccedilatildeo do Incidente de Resoluccedilatildeo de Demandas Repetitivas (IRDR) no acircmbito dos juizados especiais ciacuteveis bem como identificar os problemas praacuteticos da aplicaccedilatildeo do instituto nos juizados Inicialmente seraacute feita uma contextualizaccedilatildeo dos juizados especiais passando por seu histoacuterico seus princiacutepios fundamentais e seu sistema recursal Em seguida seratildeo abordados alguns dos principais institutos estrangeiros usados para o controle de demandas coletivas como a Group Litigation Order e o Musterverfahren para em seguida expor o IRDR em si apontando suas principais caracteriacutesticas e descrevendo brevemente seu procedi-mento Na sequecircncia seratildeo demonstrados alguns dos principais problemas do novo instituto tanto os intimamente relacionados agrave constitucionalidade do instituto quanto os diretamente relacionados com a aplicaccedilatildeo dele agrave realidade dos juizados especiais concluindo por fim que embora o IRDR tenha o con-datildeo de contribuir positivamente para a resoluccedilatildeo mais eficiente das demandas de massa sua inclusatildeo no ordenamento juriacutedico brasileiro ndash e particularmente sua aplicaccedilatildeo aos juizados especiais ndash traz agrave luz uma seacuterie de questionamentos que demonstram a falta de amadurecimento quanto agrave elaboraccedilatildeo do instituto A metodologia utilizada para o desenvolvimento deste trabalho eacute a dedutiva utilizando o meacutetodo mono-graacutefico quanto ao procedimento Em relaccedilatildeo agraves teacutecnicas de pesquisa foram utilizadas as teacutecnicas biblio-graacutefica e documental com base na doutrina na legislaccedilatildeo e na jurisprudecircncia

Palavras-Chave Juizado especial Incidente de Resoluccedilatildeo de Demandas Repetitivas Demandas coletivas

252 Revista Juriacutedica da Universidade do Sul de Santa Catarina

A REGULAMENTACcedilAtildeO DO ARTIGO 68 DO ADCT COMO RECONHECIMENTO DE UM ESTADO PLURIEacuteTNICOAcadecircmica Simone Rolim de Moura

Orientador Joatildeo Batista da Silva

Examinador 1 Solange Buchele de SThiago

Examinador 2 Andreacuteia Catine Cosme

E-mail srolimdemouragmailcom

Resumo O presente trabalho de conclusatildeo de curso versa sobre o direito disposto no artigo 68 do Ato das Disposiccedilotildees Constitucionais Transitoacuterias ndash o reconhecimento dos remanescentes das comunida-des dos quilombos e o direito de propriedade agraves suas terras Para tanto busca-se discutir o procedi-mento de reconhecimento dos remanescentes das comunidades dos quilombos rurais pelo Estado em niacutevel federal refletindo sobre as implicaccedilotildees do tiacutetulo coletivo e proacute-indiviso concedido pelo Poder Puacuteblico e asseverando a Repuacuteblica Federativa do Brasil enquanto um Estado Democraacutetico de Direito plurieacutetnico No intuito de alcanccedilar esse objetivo utiliza-se como meacutetodo de abordagem o pensamen-to dedutivo e de natureza qualitativa viabilizado por meio do meacutetodo do procedimento monograacutefi-co e das teacutecnicas de pesquisa bibliograacutefica e documental ndash com base em doutrinas livros do campo da antropologia artigos cientiacuteficos jurisprudecircncias dissertaccedilotildees de mestrado teses de doutorado e nas regulamentaccedilotildees do artigo 68 do ADCT em niacutevel federal Parte-se da apresentaccedilatildeo dos conceitos histoacuterico e antropoloacutegico de quilombo a fim de discutir as regulamentaccedilotildees em niacutevel federal do direi-to fundamental contido no artigo 68 do ADCT e asseverar as implicaccedilotildees da titulaccedilatildeo das terras aos remanescentes das comunidades dos quilombos Conclui-se que o acesso agrave terra a esses remanescen-tes eacute norma que exemplifica o Brasil como Estado Democraacutetico de Direito plurieacutetnico de acordo com a Constituiccedilatildeo da Repuacuteblica Federativa do Brasil ndash requerendo titulaccedilatildeo diferenciada da hegemocircnica e construccedilatildeo de poliacuteticas puacuteblicas especiacuteficas pelo Estado com o intuito de reconhecer a diversidade cultural brasileira e o respeito a essa plurietnicidade

Palavras-Chave Quilombo Direitos Culturais Estado Democraacutetico de Direito plurieacutetnico

253Ano IX Nordm 17 | Julho a Dezembro | 2018

O CONTROLE CONCENTRADO DE CONSTITUCIONALIDADE DAS LEIS MUNICIPAIS NO ESTADO DE SANTA CATARINA (2013-2018)Acadecircmica Suele de Souza Rosa

Orientador Alexandre Botelho

Examinador Paulo Calgaro de Carvalho

Examinadora Patriacutecia de Oliveira Franccedila

E-mail suelesouzarosagmailcom

Resumo A presente pesquisa tem como objetivo descrever o procedimento relativo ao controle con-centrado de constitucionalidade das leis municipais no acircmbito do Tribunal de Justiccedila de Santa Catarina e classificar as leis municipais arguidas inconstitucionais na corte catarinense de acordo com o seu con-teuacutedo no periacuteodo de 2013 a 2018 Para tanto a pesquisa utiliza dos meacutetodos de procedimentos mono-graacutefico e estatiacutestico uma vez que se pretende verificar qualitativamente as espeacutecies de leis municipais constitucionalmente contestadas no Estado de Santa Catarina Para chegar agrave resposta do questiona-mento primeiramente eacute apresentada a teoria acerca do controle de constitucionalidade e suas parti-cularidades objetivando verificar o procedimento do controle de constitucionalidade das leis munici-pais Por fim iraacute classificar e identificar as espeacutecies de leis municipais contestadas no Estado de Santa Catarina quanto ao seu conteuacutedo no periacuteodo de 2013 a 2018 A conclusatildeo alcanccedilada com a presente pesquisa revela uma preocupante ausecircncia de conhecimento juriacutedico por parte dos legisladores muni-cipais diante do elevado nuacutemero de accedilotildees que foram julgadas inconstitucionais pelo Tribunal de Justiccedila de Santa Catarina

Palavras-chave Controle concentrado de constitucionalidade Accedilatildeo direta de inconstitucionalidade Leis municipais

DIRETRIZES PARA AUTORES

257Ano IX Nordm 17 | Julho a Dezembro | 2018

Diretrizes para AutoresA Comissatildeo Editorial da Unisul de Fato e de Direito revista juriacutedica da Universidade do Sul de Santa Catarina define as seguintes normas editoriais para submissatildeo de artigos

a) Seratildeo aceitos manuscritos tatildeo somente de profissionais da aacuterea do Direito e das Relaccedilotildees Internacionais sendo indispensaacutevel a inclusatildeo do link do curriculum lattes

b) Seratildeo aceitos textos nas liacutenguas portuguesa inglesa francesa espanhola e italiana

c) Os artigos deveratildeo ser apresentados de acordo com as orientaccedilotildees descritas na NBR 6022 da ABNT2003 Disponiacuteveis tambeacutem no documento Trabalhos Acadecircmicos da Unisul seccedilatildeo 34

MACHADO Christiane et al Trabalhos Acadecircmicos na Unisul apresentaccedilatildeo graacutefica Disponiacutevel em lthttpaplicacoesunisulbrpergamumpdftau_2012pdfgt Acesso em 27 set 2012

d) Os textos deveratildeo ser submetidos na plataforma SEER

e) Os textos deveratildeo apresentados na seguinte forma

raquo espacejamento entrelinhas 15 fonte tipo Arial 12 com margens laterais de 25cm e com no maacuteximo 20 laudas e nos formatos doc ou rtf (desde que natildeo ultrapasse os 2MB)

raquo ordem dos elementos que compotildeem o artigo Tiacutetulo Resumo Palavras-chaves (estes trecircs toacutepicos em portuguecircs e em segundo idioma a escolher- inglecircs espa-nhol francecircs italiano) Introduccedilatildeo Material e meacutetodos Resultados e discus-satildeo Conclusotildees Referecircncias

raquo Eventuais agradecimentos devem aparecer apoacutes as referecircncias

raquo O tiacutetulo de cada seccedilatildeo deve estar escrito em letras maiuacutesculas e destacado em negrito

f) A identificaccedilatildeo de autoria do trabalho deveraacute ser removida do arquivo e da opccedilatildeo Propriedades no Word garantindo desta forma o criteacuterio de sigilo da revista caso submetido para avaliaccedilatildeo por pares (ex artigos) conforme instruccedilotildees disponiacuteveis em Assegurando a Avaliaccedilatildeo Cega por Pares

g) O tiacutetulo do artigo deveraacute ser claro e conciso devendo facilitar pronta identificaccedilatildeo do que o trabalho encerra de original ou fundamental escrito em letras maiuacutesculas

h) O autor deveraacute informar ao Comitecirc Editorial se o trabalho foi apresentado em algum evento ou publicado em outro meio ou em fase de anaacutelise por outros perioacutedicos no es-paccedilo destinado a ldquoComentaacuterio ao Editorrdquo no momento da submissatildeo na plataforma SEER

i) O resumo deveraacute constar com ateacute 250 palavras em seguida separadas por trecircs espaccedilos abaixo deveratildeo ser colocadas as palavras-chaves

j) As citaccedilotildees no texto bem como a lista de referecircncias deveratildeo obedecer as NBR 10520 e NBR 6023 respectivamente ou as orientaccedilotildees da publicaccedilatildeo da UnisulMACHADO Christiane et al Trabalhos Acadecircmicos na Unisul apresentaccedilatildeo graacutefica Disponiacutevel em lthttpaplicacoesunisulbrpergamumpdftau_2012pdfgt Acesso em 27 set 2012

k) As ilustraccedilotildees tabelas foacutermulas e graacuteficos deveratildeo vir na sequecircncia mais adequada ao entendimento do texto com seus respectivos tiacutetulos ou legendas As figuras deveratildeo ter o tamanho igual ao que se deseja na publicaccedilatildeo final Letras e nuacutemeros deveratildeo ser perfeitamente legiacuteveis e as fotografias deveratildeo ser em preto e branco niacutetidas e bem contrastadas No texto TABELA e FIGURA (em maiuacutesculas) e na citaccedilatildeoTabela Figura (primeira letra maiuacutescula)

258

Universidade do Sul de Santa Catarina

Revista Juriacutedica da Universidade do Sul de Santa Catarina

l) A aceitaccedilatildeo dos trabalhos dependeraacute de anaacutelise do Conselho Editorial

m) Satildeo de exclusiva responsabilidade dos autores as opiniotildees e conceitos emitidos nos traba-lhos A Revista entretanto reserva-se o direito de adaptar os originais ao estilo adotado

n) Todos os endereccedilos de paacuteginas na Internet (URLs) incluiacutedas no texto (Ex httpwwwunisulbr) deveratildeo estar ativos e prontos para clicar

Declaraccedilatildeo de Direito AutoralAo encaminhar os originais o(s) autor(es) cede(m) os direitos de publicaccedilatildeo para a Revista versatildeo impressa eou eletrocircnica

Poliacutetica de PrivacidadeOs nomes e endereccedilos informados nesta revista seratildeo usados exclusivamente para os serviccedilos presta-dos por esta publicaccedilatildeo natildeo sendo disponibilizados para outras finalidades ou para terceiros

Condiccedilotildees para submissatildeoComo parte do processo de submissatildeo os autores satildeo obrigados a verificar a conformidade da submis-satildeo em relaccedilatildeo a todos os itens listados a seguir As submissotildees que natildeo estiverem de acordo com as normas seratildeo devolvidas aos autores

1) A contribuiccedilatildeo eacute original e ineacutedita e natildeo estaacute sendo avaliada para publicaccedilatildeo por outra revista caso contraacuterio deve-se justificar em ldquoComentaacuterios ao Editorrdquo

2) O espacejamento entrelinhas 15 fonte tipo Arial 12 com margens laterais de 25cm e com no maacuteximo 20 laudas e nos formatos doc ou rtf (desde que natildeo ultrapasse os 2MB)

3) URLs para as referecircncias foram informadas quando necessaacuterio

4) O texto segue os padrotildees de estilo e requisitos bibliograacuteficos descritos em Diretrizes para Autores na seccedilatildeo Sobre a Revista

5) A identificaccedilatildeo de autoria do trabalho foi removida do arquivo e da opccedilatildeo Propriedades no Word garantindo desta forma o criteacuterio de sigilo da revista caso submetido para avaliaccedilatildeo por pares (ex artigos) conforme instruccedilotildees disponiacuteveis em Assegurando a Avaliaccedilatildeo Cega por Pares

Poliacutetica de PrivacidadeOs nomes e endereccedilos informados nesta revista seratildeo usados exclusivamente para os serviccedilos presta-dos por esta publicaccedilatildeo natildeo sendo disponibilizados para outras finalidades ou a terceiros

Endereccedilo defatodedireitounisulbr

NESTE NUacuteMERO

Direitos Humanos de fato e de direito uma jornada de 70 anosA violecircncia de gecircnero constitui uma forma de violaccedilatildeo dos direitos humanosAlice Bianchini

As trecircs vertentes do sistema penitenciaacuterio uma anaacutelise criminoloacutegica social e carceraacuteriaAndreacuteia Catine Cosme Karem Raimondi Martins

A defesa dos Direitos Humanos atraveacutes do ativismo judicial transnacional accedilotildees engajadas e participativasDaniela Daniela Mesquita Leutchuk de Cademartori Marlise da Rosa Luz

A realidade do sistema socioeducativo e a reduccedilatildeo da maioridade penal sob a oacutetica dos direitos fundamentaisJonathan Cardoso Reacutegis

La fragilidad de los derechosJoseacute Calvo Gonzaacutelez

Da transversatildeo poliacutetica do juriacutedico ao flagelo do estado democraacutetico de direito a incontinente deseficacizaccedilatildeo dos valores constitucionais no apogeu dos 70 anos da declaraccedilatildeo universal dos direitos humanosJoseacute Eduardo de Miranda Andreacutea Correcirca Lima

A doaccedilatildeo de oacutergatildeos depois do Decreto nordm 91752017Juacutelio Moraes Oliveira

Direitos Humanos e fundamentais na fronteira entre direito e economia a eficiecircncia das poliacuteticas puacuteblicas de sauacutede no BrasilMarco Aureacutelio Souza da Silva

Dia do Orgulho LGBTI dia de festa e de lutaMaria Berenice Dias

Condenaccedilotildees na Corte Interamericana de Direitos Humanos da OEA uma fotografia da violaccedilatildeo dos direitos humanos na ameacuterica latinaMilene Pacheco Kindermann

Direitos Humanos no imaginaacuterio artiacutestico de Clarice Lispector o paacutessaro da liberdadeMiacuteriam Coutinho de Faria Alves

Projeto de Lei nordm 37342012 e Suacutemula 605 do STJ o direito da crianccedila e do adolescente esquecidoPatriacutecia Rodrigues de Menezes Castagna

As facetas do neoliberalismo e suas consequecircncias na socioeducaccedilatildeo de adolescentes em conflito com a lei no sudeste brasileiroTatiana Emmerich

Direito de sustentabilidade juriacutedica e sistecircmica Reputaccedilatildeo digital no facebook sustentabilidade empresarial e o consumidorAdriano Augusto Fidalgo

O papel do advogado na negociaccedilatildeo na sociedade contemporacircneaBiela Jr Glaucia Guisso Fernandes

Como acercar el proceso contencioso administrativo laboral a los fundamentos de la nueva Ley Procesal del TrabajoOmar Toledo Toribio

Os problemas bioeacuteticos em os vingadores reflexotildees sobre o poacutes-humanismo e a eacutetica do futuroPedro Ernesto Neubarth Jung

  • Editorial
  • DE FATO
  • Caed-jus Revista De Fato e De Direito empresta nome agrave sala do Congresso Juriacutedico CAED-Jus
  • No Portal da Unisul
  • Conselheiros em destaque
  • DE DIREITO
  • A VIOLEcircNCIA DE GEcircNERO CONSTITUI UMA FORMA DE VIOLACcedilAtildeO DOS DIREITOS HUMANOS
    • Alice Bianchini
      • AS TREcircS VERTENTES DO SISTEMA PENITENCIAacuteIO UMA ANAacuteLISE CRIMINOLOacuteGICA SOCIAL E CARCERAacuteRIA
        • Andreacuteia Catine Cosme
        • Karem Raimondi Martins
          • A DEFESA DOS DIREITOS HUMANOS ATRAVEacuteS DO ATIVISMO JUDICIAL TRANSNACIONAL ACcedilOtildeES ENGAJADAS E PARTICIPATIVAS
            • Daniela Mesquita Leutchuk de Cademartori
            • Marlise da Rosa Luz
              • A REALIDADE DO SISTEMA SOCIOEDUCATIVO E A REDUCcedilAtildeO DA MAIORIDADE PENAL SOB A OacuteTICA DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS
                • Jonathan Cardoso Reacutegis
                  • LA FRAGILIDAD DE LOS DERECHOS
                    • Joseacute Calvo Gonzaacutelez
                      • DA TRANSVERSAtildeO POLIacuteTICA DO JURIacuteDICO AO FLAGELO DO ESTADO DEMOCRAacuteTICO DE DIREITO A INCONTINENTE DESEFICACIZACcedilAtildeO DOS VALORES CONSTITUCIONAIS NO APOGEU DOS 70 ANOS DA DECLARACcedilAtildeO UNIVERSAL DOS DIREITOS HUMANOS
                        • Joseacute Eduardo de Miranda
                        • Andreacutea Correcirca Lima
                          • A DOACcedilAtildeO DE OacuteRGAtildeOS DEPOIS DO DECRETO Nordm 91752017
                            • Juacutelio Moraes Oliveira
                              • DIREITOS HUMANOS E FUNDAMENTAIS NA FRONTEIRA ENTRE DIREITO E ECONOMIA A EFICIEcircNCIA DAS POLIacuteTICAS PUacuteBLICAS DE SAUacuteDE NO BRASIL
                                • Marco Aureacutelio Souza da Silva
                                • Maria Berenice Dias
                                  • CONDENACcedilOtildeES NA CORTE INTERAMERICANA DE DIREITOS HUMANOS DA OEA UMA FOTOGRAFIA DA VIOLACcedilAtildeO DOS DIREITOS HUMANOS NA AMEacuteRICA LATINA
                                    • Milene Pacheco Kindermann
                                      • DIREITOS HUMANOS NO IMAGINAacuteRIO ARTIacuteSTICO DE CLARICE LISPECTOR O PAacuteSSARO DA LIBERDADE
                                        • Miacuteriam Coutinho de Faria Alves
                                          • Projeto de Lei n 37342012 e Suacutemula 605 do STJ o Direito da Crianccedila e do Adolescente esquecido
                                            • Patriacutecia Rodrigues de Menezes Castagna
                                              • AS FACETAS DO NEOLIBERALISMO E SUAS CONSEQUEcircNCIAS NA SOCIOEDUCACcedilAtildeO DE ADOLESCENTES EM CONFLITO COM A LEI NO SUDESTE BRASILEIRO
                                                • Tatiana Emmerich
                                                  • REPUTACcedilAtildeO DIGITAL NO FACEBOOK SUSTENTABILIDADE EMPRESARIAL E O CONSUMIDOR
                                                    • Adriano Augusto Fidalgo
                                                      • O PAPEL DO ADVOGADO NA NEGOCIACcedilAtildeO NA SOCIEDADE CONTEMPORAcircNEA
                                                        • Biela Jr
                                                        • Glaucia Guisso Fernandes
                                                          • COMO ACERCAR EL PROCESO CONTENCIOSO ADMINISTRATIVO LABORAL A LOS FUNDAMENTOS DE LA NUEVA LEY PROCESAL DEL TRABAJO
                                                            • Omar Toledo Toribio
                                                              • OS PROBLEMAS BIOEacuteTICOS EM OS VINGADORES REFLEXOtildeES SOBRE O POacuteS-HUMANISMO E A EacuteTICA DO FUTURO
                                                                • Pedro Ernesto Neubarth Jung
                                                                • ldquoApenas uma guerra eacute permitida agrave espeacutecie humana a guerra contra a extinccedilatildeo []rdquo
                                                                  • O que estamos pesquisando
                                                                  • Diretrizes para Autores
                                                                  • _GoBack
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