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    COLEO TEMAS DE FORMAO

    Rejane Galvo CoutinhoKlaus Schlnzen Junior

    Elisa Tomoe Moriya Schlnzen

    (Organizadores)

    Artes

    Acessibilidade: Audiodescrio

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    ArtesCOLEO TEMAS DE FORMAO

    VOLUME 5

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    ORGANIZADORESRejane Galvo CoutinhoKlaus Schlnzen Junior

    Elisa Tomoe Moriya Schlnzen

    ArtesCOLEO TEMAS DE FORMAO

    VOLUME 5

    Luiza Helena da Silva ChristovAna Mae Barbosa

    Rejane Galvo CoutinhoRita Luciana Berti Bredariolli

    Jos Leonardo do NascimentoMario Fernando Bolognesi

    Ana PortichAnderson de Souza Zanetti da Silva

    Milton SogabeRosangella Leote

    AUTORES

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    BY UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA

    Pr-Reitoria de Ps-Graduao UNESPRua Quirino de Andrade, 215CEP 01049-010 So Paulo SP

    Tel.: (11) 5627-0561www.unesp.br

    NEaD Ncleo de Educao a Distncia UNESPRua Dom Lus Lasagna, 400 - IpirangaCEP 04266-030 - So Paulo/SP

    Tel.: (11) 2274-4191www.unesp.br/nead/

    Artes [recurso eletrnico] / Rejane Galvo Coutinho, Klaus Schlnzen Junior[e] Elisa Tomoe Moriya Schlnzen (Coordenadores). So Paulo : CulturaAcadmica : Universidade Estadual Paulista : Ncleo de Educao Distncia,[2013]. (Coleo Temas de Formao ; v. 5)

    Requisitos do sistema: Adobe Acrobat ReaderModo de acesso: World Wide WebAcesso em: www.acervodigital.unesp.brTextos provenientes do Programa Rede So Paulo de Formao Docente(Redefor)Trata de aperfeioamento da formao em Artes de docentes da rede pblica

    estadual de ensino para ministrarem a disciplina no Ensino Funda-mental II e Ensino Mdio.Acessibilidade: AudiodescrioISBN

    1. Artes Estudo e Ensino. Professores Educao Continuada. I. Coutinho,Rejane Galvo. II. Schlnzen Junior, Klaus. III. Schlnzen, Elisa Tomoe Moriya. IV.

    Universidade Estadual Paulista. Ncleo de Educao a Distncia da Unesp.

    CDD 707

    Todos os direitos reservados. De acordo a Lei de Direitos Autorais (Lei 9.610/1998).

    A786

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    GOVERNO DO ESTADO DE SO PAULO

    GovernadorGeraldo Alckmin

    SECRETARIA DE DESENVOLVIMENTO ECONMICO,CINCIA E TECNOLOGIA

    SecretrioLuiz Carlos Quadreli

    UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA

    ReitorJulio Cezar Durigan

    Vice-ReitoraMarilza Vieira Cunha Rudge

    Chefe de GabineteRoberval Daiton Vieira

    Pr-Reitor de Graduao

    Laurence Duarte ColvaraPr-Reitor de Ps-Graduao

    Eduardo Kokubun

    Pr-Reitora de PesquisaMaria Jos Soares Mendes Giannini

    Pr-Reitora de Extenso UniversitriaMaringela Spotti Lopes Fujita

    Pr-Reitor de AdministraoCarlos Antonio Gamero

    Secretria GeralMaria Dalva Silva Pagotto

    FUNDUNESP

    Diretor-PresidenteEdivaldo Domingues Velini

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    Administrao NEaDJessica Papp

    Joo Menezes MussoliniSueli Maiellaro Fernandes

    Equipe de Design GrficoAndr Ribeiro Buika

    Luciano Nunes MalheiroEquipe de Comunicao

    Dalner PalomoRoberto Rodrigues FranciscoRodolfo Paganelli Jaquetto

    Sofia DiasSoraia Marino Salum

    Equipe de Design Instrucional (DI)Fabiana Aparecida Rodrigues

    Lia Tiemi HiratomiMrcia Debieux

    Marcos Leonel de SouzaEdio e Catalogao de Materiais

    Antnio Netto JniorFrederico Ventura

    Equipe de WebdesignAriel Tadami Siena HirataElisandra Andr MaranheErik Rafael Alves Ferreira

    Grupo de Tecnologia da InformaoPierre Archag Iskenderian

    Andr Lus Rodrigues FerreiraFernando Paraso CiaralloGuilherme de Andrade Lemeszenski

    Marcos Roberto GreinerPedro Cssio BissettiRen Gomes Beato

    SecretariaPatrcia Porto

    Suellen ArajoVera Reis

    Aline Gama Gomes

    Rebeca Naves dos ReisRoseli Aparecida da Silva Bortoloto

    NCLEO DE EDUCAO A DISTNCIA DA UNESP - NEaD

    CoordenadorKlaus Schlnzen Junior

    Coordenao Acadmica - RedeforElisa Tomoe Moriya Schlnzen

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    Ir para o sumrio

    Os materiais didticos reunidos neste livro referem-seaos contedos das disciplinas dos cursos de espe-

    cializao a distncia oferecidos pela Universidade

    Estadual Paulista Jlio de Mesquita Filho (Unesp) a educadoresdo Ensino Fundamental II e Mdio da rede estadual de SoPaulo, no mbito do Programa Rede So Paulo de FormaoDocente (Redefor).

    Elaborado sob a responsabilidade de docentes doutoresda Unesp, com a devida considerao do projeto pedaggicoda Secretaria da Educao do Estado de So Paulo (Seesp) efecunda colaborao da equipe pedaggica da Escola de For-

    mao de Professores Paulo Renato Costa Souza, o conjuntodestes materiais didticos evidenciou-se suficientemente amplo,rico, e capaz de fomentar a construo e a implementao deprojetos pedaggicos prprios e diferenciados em escolas darede pblica.

    Agora, o ciclo se completa: disciplinas aprimoradas emavaliao formativa nas duas edies concludas do curso tmseus contedos estruturados no formato e-book, para consulta

    Apresentao

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    Ir para o sumrio

    e downloadgratuito, com recursos de acessibilidade como

    libras e audiodescrio.Com esta ltima iniciativa, a Unesp demonstra uma vez

    mais seu compromisso de sempre: democratizar o acesso aosprodutos intelectuais gerados em suas atividades, em prol daeducao no Brasil.

    s equipes da Pr-Reitoria de Ps-Graduao, do Ncleode Educao a Distncia, da Fundao para o Desenvolvi-

    mento da Unesp e da Fundao para o Vestibular da Unesp,

    bem como aos docentes unespianos engajados no ProgramaRedefor, o meu reconhecimento pelo competente trabalho.No posso deixar de destacar, tambm, outros fundamentaisatores que contriburam para transformar a ideia do curso emrealidade: os orientadores pedaggicos e especialistas em EaDespecialmente contratados.

    Colocamos este e-book disposio da comunidade, nocumprimento de nossa misso institucional de gerar, difundire fomentar o conhecimento, contribuindo para a superaode desigualdades e para o exerccio pleno da cidadania.

    Marilza Vieira Cunha Rudge

    Vice-ReitoraCoordenadora Geral dos Cursos Redefor-Unesp

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    SumrioApresentao 6

    Prefcio 11

    Parte I Repertrio dos professores em formao

    1. Relaes pessoais com a arte 16

    2. Memrias de formao 273. Concepes fundamentais

    para o professor de Artes 38

    Referncias bibliogrficas 52

    Parte II Ensino da Arte no Brasil: aspectoshistricos e metodolgicos

    4. Ensino da Arte no Brasil: uma histria que vai dadependncia antropofagia 57

    5. Concepes e tendncias formativas 92

    Referncias bibliogrficas 109

    Parte III Emoo, percepo e criatividade: a contribuioda Psicologia para Artes e Ensino de Artes

    6. Dilogo entre Psicologia e Artes: um exemplo

    a partir da contribuio de Freud 1147. Psicologia e ensino de Artes 124

    8. A palavra percepo e sua importnciapara o ensino de Artes 136

    9. Emoo: outra palavra que interessas artes e ao seu ensino 145

    10. A palavra criatividade como conceito integradorentre Psicologia, Artes e ensino de Artes 154

    Referncias bibliogrficas 164

    http://-/?-http://-/?-http://-/?-http://-/?-http://-/?-http://-/?-http://-/?-http://-/?-http://-/?-http://-/?-http://-/?-http://-/?-http://-/?-http://-/?-http://-/?-http://-/?-
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    Parte IV Metodologias para ensinoe aprendizagem de Arte

    11. Metforas, Mtodos e Metodologias, Metforas 171

    12. Metodologias para ensino e aprendizagem de arte 189

    13. Isto tambm uma metodologia: duasverses contemporneas de mtodos,metodologias, educao e arte 218

    14. Professor-pesquisador: os outros,

    os mesmos mapas 23515. Metodologias para a prtica de uma pesquisa ativa 243

    Referncias Bibliogrficas 255

    Parte V Arte como cultura: concepese problematizaes

    16. Cultura e civilizao: histria de dois conceitos 263

    17. Arte como sistema cultural 276

    18. A pesquisa em arte e concepescontemporneas de cultura 296

    Referncias Bibliogrficas 311

    Parte VI Recepo e mediao dopatrimnio artstico e cultural

    Introduo 315

    19. Arte/educao como mediao cultural e social 31720. Questes sobre educao patrimonial 328

    21. As prticas de produo, difuso emediao na contemporaneidade 337

    22. A recepo e a interpretao dasprodues artsticas 347

    23. O arte/educador como mediador 359

    Referncias bibliogrficas 366

    http://-/?-http://-/?-http://-/?-http://-/?-http://-/?-http://-/?-http://-/?-http://-/?-http://-/?-http://-/?-http://-/?-http://-/?-http://-/?-http://-/?-http://-/?-http://-/?-http://-/?-http://-/?-http://-/?-http://-/?-http://-/?-http://-/?-http://-/?-http://-/?-http://-/?-http://-/?-http://-/?-
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    Parte VII Esttica: histria de um conceito, visescontemporneas e educao esttica

    24. Um incio de conversa 371

    25. A Filosofia da Arte na Antiguidade greco-romana 376

    26. Para entender o significado de esttica 389

    27. Questes de Esttica 402

    28. A Esttica e as artes 413

    Referncias bibliogrficas 427

    Parte VIII Potica, linguagens e mdias

    29. Construindo a realidade 432

    30. Comunicao e arte 439

    31. O corpo como arte 456

    32. Arte e tecnologia 472

    33. Convergncias e dilogos 492

    Referncias bibliogrficas 507

    Crditos das Imagens 516

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    As prticas artsticas e as dimenses estticas atravessammbitos culturais diversos das sociedades com seussentidos e valores que se fazem presente em aes

    coletivas e na constituio de subjetividades. Por isso difcil

    imaginar uma vida sem arte ou uma coletividade sem prticasartsticas e culturais.

    Por conta dessas intrincadas relaes, Arte campo deconhecimento complexo que vem sendo estudado ao longoda histria e na contemporaneidade por diferentes aborda-

    gens, tais como as filosficas, antropolgicas, sociolgicas,psicolgicas, lingusticas, culturalistas e suas derivaes. Fruto

    da necessidade de apreender um fenmeno, muito alm deum simples produto, em suas mltiplas inter-relaes.

    Como rea de conhecimento, o ensino e aprendizagemde Arte vm tambm histrica e contemporaneamente acom-panhando as transformaes em seu campo conceitual, de umensino centrado no objeto de conhecimento para um ensinoque valoriza a experincia circunstancial do sujeito com o co-

    nhecimento. De um polo conceitual ao outro, h variaes que

    Prefcio

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    consideram mais os aspectos tcnicos e prticos dos saberes;e/ou variaes que consideram os aspectos subjetivos, comoa expressividade ou a criatividade no manejo dos saberes; e/ou variaes que consideram aspectos contextuais e culturaisdesses saberes.

    Importante ressaltar que seja qual for a abordagemconceitual privilegiada, h uma variante que se mantm: paraum ensino e aprendizagem de Arte de qualidade necessrioter professores comprometidos com o conhecimento e com a

    circulao e recepo do conhecimento. Professores dispostosa enfrentar os desafios de um campo em permanente mutao,professores pesquisadores. Professores atentos e sensveis aosaspectos afetivos e subjetivos do ensinar e aprender, profes-sores reflexivos. So qualidades que devem ser estimuladas eexercitadas junto com pensamento potico/pedaggico nosprocessos de formao inicial e continuada.

    Essas premissas norteiam este conjunto de textos aquireunidos, resultantes dos textos de orientao das oito discipli-nas que compem o curso de especializao para professoresde Arte, na modalidade a distncia, Arte na Educao Bsica:fundamentos tericos e perspectivas didticas, que faz parte doPrograma Rede So Paulo de Formao Docente, Redefor,

    da Secretaria de Educao do Estado de So Paulo (SEESP),elaborado por docentes do Instituto de Artes da Unesp.

    O projeto inicial partiu da necessidade de atualizao

    dos professores da rede estadual frente implantao danova proposta curricular. Esta atualizao pressupunha umainstrumentalizao para leitura e apropriao de uma propostacontempornea, com todas as contradies paradigmticas

    que a contemporaneidade nos apresenta cotidianamente.

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    Para enfrentar este desafio, o eixo central do projeto con-vida o professor a refletir sobre sua prpria formao, buscandovalorizar suas experincias pessoais e profissionais como pontode partida para explorar o novo e, ao mesmo tempo, espaode encontro consigo mesmo. O primeiro captulo, Repertriode professores em formao, de Luiza Helena da Silva Christov,abre esta publicao (e o curso) instigando o leitor a entrar emcontato com suas experincias formativas no campo da arte,estimulando as narrativas e os sentidos que delas podem advir.

    E para situar a diversidade de contextos e possibilidadesde formao, o segundo captulo traz uma narrativa da histriado ensino de artes no Brasil tecida por Ana Mae Barbosa compontuaes das principais tendncias metodolgicas feitaspor mim, que escrevo este prefcio. Trata-se de histria paraentender o presente e compreender as convivncias e sobre-posies conceituais, uma histria que gera subsdios para osenredos pessoais, onde pode-se ancorar referenciais.

    Para dar apoios filosficos, conceituais e metodolgicos,a sequncia de captulos segue na via da instrumentalizaoreflexiva. Foram pinados alguns tpicos considerados capitaispara um processo de atualizao no campo do ensino de artes.O captulo sobre Emoo, percepo e criatividade: a contribuioda Psicologia para Artes e ensino de Artes, tambm de Luiza Chris-tov, adentra pelas relaes muitas vezes obscuras impressas

    no senso comum entre Psicologia e Artes, buscando ampliarreferenciais conceituais segundo diferentes abordagens. J ocaptulo Metodologias para ensino e aprendizagem de arte, deRita Luciana Berti Bredariolli, toma o caminho da histria e daepistemologia para situar o desenvolvimento de conceitos carosaos professores, como os de mtodo e metodologia, aportan-do em concepes artstico-educacionais contemporneas.

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    As diferentes verses de cultura so tambm historiadasno captulo Arte como cultura: concepes e problematizaes,de autoria de Jos Leonardo Nascimento. Parte-se de umaideia de arte como sistema cultural para compreender asrelaes postas no captulo seguinte, Recepo e mediao dopatrimnio artstico e cultural, tambm de minha autoria, queexplora o papel do professor como mediador nas relaesentre os sujeitos, professores e estudantes, e os processos ebens patrimoniais.

    A esttica e a potica so assuntos dos dois ltimos cap-tulos. Em Esttica: histria de um conceito, vises contempornease educao esttica, escrito por Mrio Bolognesi, Ana Portich eAnderson de Souza Zanetti da Silva, procura-se aproximar oleitor da complexidade da filosofia, sem abrir mo da densidadepertinente ao tema, para aclarar este campo conceitual. EmPotica, linguagem e mdias, Milton T. Sogabe e Rosangela daSilva Leote propem um mergulho nas ntimas especificidades

    da Arte, levando o leitor a adentrar os processos de construode artefatos, objetos e aes artsticas em relaes contextuais.

    Este conjunto de textos reunidos tem uma trajetria

    experienciada nas duas edies do curso de especializaoquando foram leitura de referncia para processos de for-mao continuada de professores de Arte da rede estadual.Cada captulo desta publicao traz tona um condensado de

    experincias e referncias tecidas por seus autores e autoras eagora compartilhados com todos aqueles que desejam elabo-rar novas questes, novos significados e novas possibilidadespara o ensino de Arte.

    Rejane Galvo Coutinho

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    Repertrio dos professores

    em formao

    Parte I

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    LUIZAHELENADASILVACHRISTOV

    Mestre em Educao: Histria, Poltica, Sociedade pela Pontifcia Universidade Catlicade So Paulo (1992) e doutora em Educao (Psicologia da Educao) pela Pontifcia

    Universidade Catlica de So Paulo (2001). Atualmente professora assistente doutorado Instituto de Artes da Universidade Estadual Paulista Jlio de Mesquita Filho (Unesp).

    Realizou estgio de ps-doutoramento junto Universidade de Barcelona sob a orientaodo prof. dr. Jorge Larrosa Bondia. Coordenadora, no Instituto de Artes, do Programa

    Institucional de Bolsa de Iniciao Docncia, financiado pela Capes, com projeto deparceria com a rede estadual paulista. Assessora da Secretaria Estadual da Educao de So

    Paulo em diferentes projetos de formao e elaborao de material didtico.

    Vdeo com audiodescrio

    http://edutec.unesp.br/images/stories/redefor/artes/paginavideos/paginavideos_audiodescricao.php?vdo=141248/1/arte_audiodesc_d1_ficha&vdo1=141248/5/arte_audiodesc_d1_fichahttp://edutec.unesp.br/images/stories/redefor/artes/paginavideos/paginavideos_audiodescricao.php?vdo=141248/1/arte_audiodesc_d1_ficha&vdo1=141248/5/arte_audiodesc_d1_ficha
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    Captulo 1Relaes pessoais com a arte

    P

    or que iniciar um processo de formao voltado para professores de Ar-tes pelas histrias desses mesmos professores sobre suas relaes comArtes e seu ensino?Porque todo desenvolvimento de competncias pessoal, est na mo

    da pessoa que as desenvolve e exige profunda pessoalidade para mergulhointelectual e emocional nas aes que provocam esse desenvolvimento (Ma-chado, 2002). Mas esse entendimento seria suficiente para iniciarmos nosso pro-cesso de formao pelas histrias de vida dos professores? Optamos por umrecorte nessas histrias de vida, focando o olhar e o esforo reflexivo em uma

    relao de interesse imediato para a formao do professor de Artes, ou seja,optamos por perguntar logo de incio pelos modos como construram apro-ximaes, ao longo de sua trajetria, desse campo que seu compromisso deensino e aprendizagem. De que forma as artes comparecem na trajetria decada um e por que foram abraadas como profisso de ensinar e de aprender?

    As trajetrias de relaes com a arte podem ter sido marcadas por pro-cessos intuitivos, por curiosidade ingnua (Freire, 1999) que merecem ser con-templadas no processo de formao, ser analisadas, e podem se oferecer como

    oportunidades de hipteses a serem trocadas entre professor(a) e seus colegas

    Vdeo com audiodescrio

    http://edutec.unesp.br/images/stories/redefor/artes/paginavideos/paginavideos_audiodescricao.php?vdo=141248/2/arte_audiodesc_d1_t1&vdo1=141248/6/arte_audiodesc_d1_t1http://edutec.unesp.br/images/stories/redefor/artes/paginavideos/paginavideos_audiodescricao.php?vdo=141248/2/arte_audiodesc_d1_t1&vdo1=141248/6/arte_audiodesc_d1_t1
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    e mediadores neste curso. Ao longo desta primeira parte do livro, juntamentecom voc professor(a), buscaremos responder a questes como:

    Quais as motivaes para a carreira docente que esto presentes nas tra-jetrias dos professores de Artes? E de que forma as Artes enquanto cam-po de conhecimento determinante e faz mediao para opo pelomagistrio?

    1.1.Histrias de relaes com a arte

    Como referncia para leitura de imagens e textos que constituem o pai-nel sobre histrias de relaes com a arte, destaca-se a contribuio de JohnDewey, filsofo norte-americano que props relaes entre Filosofia, Arte eEducao na primeira metade do sculo XX.

    John Dewey nasceu em 20 de outubro de 1859 nos Estados Unidos, ondetambm faleceu em junho de 1952.

    Doutorou-se em Filosofia e em 1884 iniciou sua carreira de professor. Em1894 foi para a Universidade de Chicago, onde exerceu as funes de presiden-te do Departamento de Filosofia, Psicologia e Pedagogia. Dewey foi militanteativo, liderando movimentos de natureza sindical em defesa de direitos profis-sionais de educadores e campanhas por melhores condies para os trabalha-dores. Em 1915, foi um dos fundadores da Associao Americana de ProfessoresUniversitrios e, no ano seguinte, tornou-se membro honorrio do primeiro

    Sindicato de Professores da cidade de Nova Iorque. Em 1919, ajudou a fundara Nova Escola para a Investigao Social e, em 1933, a Universidade-no-Exlio,para estudantes perseguidos em pases com regimes totalitrios.

    Interessa a esta reflexo pelo menos duas concepes apresentadas porDewey: os conceitos de conhecimento e de experincia. Esses dois conceitosesto relacionados. Por conhecimento, Dewey entende o processo pelo qualse descobre relaes entre informaes anteriores e novas situaes, um pro-cesso que permite relaes com fatos crus da existncia; um processo que

    envolve atividade do sujeito que conhece: atividade de pensamento e de movi-

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    Ir para o sumrio

    mento do corpo. O conceito de experincia uma mediao fundamental parase compreender o conhecimento em Dewey. A experincia no entendidacomo um mero fazer, mas como uma ao refletida, intencional, planejada, querequer a percepo dos fins para que seja possvel julgar os meios e os produtosa serem criados. A experincia de conhecimento s de fato experincia quan-do aquele que se pe a conhecer tem a oportunidade de perceber integral-mente o objeto a ser conhecido, de estabelecer relaes diversas com o que jsabe, com outras experincias, com signos j construdos e com hipteses quepoder ento produzir. Requer uma ao ativa do sujeito que aprende e um

    pensar e agir compreendendo o todo. Dewey faz uma crtica aos que acreditamque para aprender preciso primeiro conhecer as propriedades de um objetoou aprender a manusear seus instrumentos; para ele, o sujeito que aprendetem que operar com o todo e colocar em jogo suas potencialidades corprea,intelectual e emocional. Para que uma experincia possa se constituir em umaexperincia especfica, capaz de ser incorporada em nosso repertrio cultural,so necessrios trs movimentos do sujeito que conhece: movimento do inte-lecto para pensar, nomear, conceituar o real; movimento prtico para mudar delugar e de forma de ver o real, para intervir, manipular material e moralmente omundo; e movimento emocional, para se permitir o padecimento que constituia sensvel relao com o mundo e com a crise provocada pela perplexidadeque motiva a busca por novas respostas.

    A experincia, assim, no algo fragmentado e descontnuo, uma to-talidade, porque abarca a individualidade de cada sujeito que aprende, as inte-raes que realiza em seu contexto cultural, as relaes que estabelece entre

    seus saberes, seus signos, seus valores e as relaes que estabelece produzindosentidos sobre os novos desafios postos pela experincia.Tendo o conceito de experincia como fator central de seus pressupos-

    tos, Dewey chega concluso de que a escola no pode ser uma preparaopara a vida, mas sim, a prpria vida. Assim, para ele, vida-experincia e apren-dizagem esto unidas, de tal forma que a funo da educao encontra-se empossibilitar a quem aprende uma reconstruo permanente da experincia.

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    O fragmento a seguir sintetiza os fundamentos analisados:

    Para perceber, um espectador precisa criar sua prpria experincia. E sua cria-o tem de incluir conexes comparveis quelas que o produtor original

    sentiu. No so as mesmas, em qualquer sentido literal. No obstante, com o

    espectador, assim como com o artista, tem de haver uma ordenao dos ele-

    mentos do todo que , quanto forma, ainda que no quanto aos pormeno-

    res, a mesma do processo de organizao que o criador da obra experimentou

    conscientemente. Sem um ato de recriao, o objeto no ser percebido como

    obra de arte. O artista selecionou, simplificou, clarificou, abreviou e condensoude acordo com seu desejo. O espectador tem de percorrer tais operaes de

    acordo com seu ponto de vista prprio e seu prprio interesse. Em ambos tem

    lugar um ato de abstrao, isto , de extrao do que significativo. Em ambos,

    h compreenso, em sua significao literal isto , um ajuntar mincias e par-

    ticularidades fisicamente dispersas em um todo experienciado. H um trabalho

    realizado pelo que percebe, assim como pelo artista. Aquele que, por ser dema-

    siadamente preguioso, frvolo ou obstinado nas convenes, no efetue esse

    trabalho, no ver, nem ouvir. Sua apreciao ser uma mistura de fragmen-tos do saber em conformidade com normas de admirao convencional e com

    uma confusa, ainda que genuna, excitao emocional. (Dewey, 1980)

    Para ampliar conhecimentos

    DEWEY, J. Democracia e educao. So Paulo: Nacional, 1979.Esta obra registra os fundamentos propostos pelo autor para contextuali-

    zar a finalidade da educao no mbito da realizao de uma sociedade demo-crtica. Alm de apresentar contribuio de natureza filosfica sobre educaoe democracia, o autor detalha fundamentos epistemolgicos e de metodologiade ensino em diferentes reas do conhecimento.

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    DEWEY, J.Arte como experincia. So Paulo: Martins Fontes, 2010.Livro importante para a compreenso do conceito de experincia est-

    tica e para o entendimento de que toda experincia de conhecimento abarcanecessariamente trs processos: processo intelectual; processo prtico; e pro-cesso emocional.

    1.2. Experincia de vida e formao

    As teorias que fundamentam a opo por estabelecer dilogo perma-

    nente entre os saberes da experincia e os saberes eleitos para o processo deformao so inmeras e esto presentes em diferentes campos desde a Psi-cologia at a Antropologia, com paradas significativas na Filosofia e Sociologia.Destacamos quatro autores que fundamentam esta opo. So eles: Paulo Frei-re, Nilson Jos Machado, Jorge Larrosa e Marie-Christinne Josso.

    Paulo Freire defende, ao longo de toda sua obra, a ideia de que o universocultural de cada ser humano, marcado por valores, teorias, crenas, conscinciaingnua e conscincia crtica, um conjunto denso do qual so retirados cdi-

    gos e referncias para leitura do mundo. Cada ser humano um ser capaz desaber anteriormente escolarizao, um ser que elabora saberes no cotidianoque o habilitam a ler, interpretar e pronunciar o mundo. Para Freire, no h hie-rarquia entre os saberes: os saberes do cotidiano so to importantes quanto ossaberes escolares, cientficos e filosficos.

    Entende que todo conhecimento tem incio com a curiosidade: exigeperguntas sobre a vida, sobre o mundo, sobre a prpria experincia.

    Nilson Jos Machado (2002), professor e pesquisador da Faculdade deEducao da USP, afirma que todo desenvolvimento de competncias pesso-al, est na mo da pessoa que a desenvolve e exige profunda pessoalidade paramergulho intelecto-emocional na ao que provoca esse desenvolvimento. Tercomo referncia a trajetria pessoal de quem est em formao considerar olugar primeiro no qual se pode deparar com desafios para aperfeioamento decompetncias.

    Com Jorge Larrosa, professor e pesquisador da Universidade de Barcelo-

    na, encontramos a argumentao de que a formao um processo no qual a

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    pessoa envolvida se permite ser influenciada pelos mestres, pelas experinciasde vida.

    A formao uma viagem aberta, uma viagem que no pode estar an-tecipada, e uma viagem interior, uma viagem na qual algum se deixainfluenciar a si prprio, se deixa seduzir e solicitar por quem vai ao seuencontro... a experincia formativa e a experincia esttica no so tran-sitivas... no vo de algum para algum, mas acontecem a algum comalgum. (Larrosa, 2003)

    Marie-Christinne Josso, professora da Faculdade de Psicologia e Cinciasda Educao da Universidade de Genebra, tambm prope uma abordagemde formao experiencial. Segundo a autora:

    Falar das prprias experincias formadoras , pois, de certa maneira, con-tar sobre si mesmo a prpria histria, as suas qualidades pessoais e socio-culturais, o valor que se atribui ao que vivido na continuidade tem-poral do nosso ser psicossomtico. [...] tambm um modo de dizermosque, neste continuumtemporal, algumas vivncias tm uma intensidadeparticular que se impe nossa conscincia e delas extrairemos as infor-maes teis s nossas transaes conosco prprios e/ou com o nossoambiente humano e natural. (Josso, 2004)

    Em sua obra, a autora utiliza a imagem caminhar para si. Para ela, a for-

    mao uma viagem, uma mudana de lugar, na qual viajante e percurso setransformam mutuamente, a partir da conscincia de quem viaja sobre seumodo de estar nesse percurso e sobre o que este provoca e exige de quemnele est.

    Em suma, destacamos que escrever sobre si mesmo e sua trajetria exigedo professor de Artes um olhar sistematizado e reflexivo sobre suas qualidadespessoais, sobre escolhas tanto profissionais quanto pessoais, sobre conheci-mentos adquiridos. O professor, ao narrar suas experincias de vida em arte-

    -educao, o faz em ao de repensar e dar sentido histria narrada, compre-

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    endendo-se como pertencente a um perodo, a uma comunidade, inserido emum meio sociocultural, possibilitando, assim, revelar-se e revelar os contextosnos quais se forma.

    Com o esforo intelectual e o mtodo necessrio explicitao das ques-tes e concepes presentes em sua experincia profissional e pessoal, os pro-fessores elaboram saberes que favorecem o dilogo entre suas experinciasprofissionais e pessoais e as teorias que oferecem elementos para contextuali-zao mais ampla das experincias de cada um. Tais teorias permitem, ainda, aproblematizao do que vivenciado em cada situao particular. Elaboramos

    saberes com a leitura de nossas experincias em dilogo com teorias e comoutras experincias. Construmos saberes quando fazemos perguntas s expe-rincias, aos autores e a ns mesmos; quando no nos satisfazemos com asprimeiras respostas e com as aparncias e comeamos a nos perguntar sobreas relaes, os motivos, as consequncias, as dvidas, os problemas de cadaao ou de cada contribuio terica. A construo de saberes exige que co-loquemos perguntas nossa prtica. Quo maior for nossa habilidade de lernossa experincia, maior ser nossa habilidade pra compreender autores e, poroutro lado, o conhecimento de outros autores e outras experincias auxiliam nacompreenso sobre nossa prpria prtica.

    Essas duas afirmaes parecem muito simples e muito fceis de seremcolocadas em prtica. Na verdade, no o so. Se o fossem no teramos as quei-xas to frequentes sobre a distncia entre teoria e prtica. Fato que no vive-mos, no Brasil, em um ambiente educacional que nos prepare para construir-mos boas relaes com teorias, nossas ou alheias.

    Longos perodos ditatoriais 15 anos de Vargas e 21 de governos mi-litares seriam suficientes para justificarem polticas educacionais e culturaissilenciadoras e bloqueadoras de um aprendizado adequado elaborao deteorias particulares ou coletivas sobre a realidade. Afinal, quem se permite o es-foro terico de elaborar saberes sobre a prpria experincia apresenta maiorescondies de anlise e crtica a respeito do real. Ditadura nenhuma admite isso.

    Porm, as ditaduras no respondem sozinhas por nossas dificuldades re-lativas construo da relao entre teoria e prtica. Nosso ambiente escolar e

    cultural, mesmo em espaos e momentos democrticos, padecem de um pro-

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    blema a ser solucionado. Trata-se da imposio sub-reptcia de algumas teorias,de alguns autores. Trata-se da valorizao de uma postura que impe tradies,pensamentos, teorias, modelos, autores e impede a construo pessoal de cadaestudante ou profissional em processo de conhecimento. Este deve incorporare repetir teorias, sem ousar elaborar suas questes e suas afirmaes e sem valo-rizar seu repertrio cultural como lugar privilegiado para elaborao de saberese para gerar perplexidades e desafios que motivem a busca de conhecimentos.

    Assim, o desenvolvimento da habilidade de se ler a prpria experincia, aexperincia alheia, o mundo e autores em dilogo com nossas questes no

    privilegiada pela tradio escolar no Brasil.Quando insistimos para que os processos de formao de professores,

    em servio ou nos cursos de magistrio e licenciatura, apresentem as condiesmnimas para que se relacione teoria e prtica estamos sugerindo o sentido daconstruo do leitor/autor da prpria experincia. Experincia que se percebe asi mesma como terica porque refletida, avaliada, recriada.

    Para ampliar conhecimentos

    Chaplin, Charles. Minha vida. 10.ed. Rio de Janeiro: Jos Olympio, 1998.Nessa obra, Charles Chaplin destaca experincias marcantes para sua atu-

    ao como artista e cidado. Aos educadores interessa particularmente suasmemrias sobre infncia e escolarizao, com crtica a respeito da postura deprofessores que no souberam tornar interessante o conhecimento que deve-riam ensinar.

    Nvoa, Antnio. Vida de professores. Porto: Porto, 1992.Nesse livro, o autor enfatiza a importncia de se considerar as dimenses

    pessoais, afetivas e ticas dos professores em formao. Situa o debate sobreprofissionalizao em contexto que valoriza formao integral com olhar espe-cfico para a pessoalidade do professor.

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    1.3. Inveno de si e autopoiesis: dois fundamentos para a formaodo arte-educador

    Alm de Josso, outro autor ajuda a fundamentar a opo por um proces-so de formao como ponto de partida na experincia de vida dos educadoresque se formam. Trata-se de Humberto Maturana, filsofo e bilogo chileno, pro-fessor da Universidade de Santiago do Chile e autor de uma teoria que alia vidae conhecimento bem como o conceito de autopoiesis, destacado neste texto.

    A palavra autopoiesistem origem na lngua grega antiga e pode ser en-tendida como criao de si, uma vez que auto significa prprio, referido a simesmo e poiesis significa criao. A partir de suas investigaes na rea daBiologia, com observao minuciosa de diferentes seres vivos, Maturana enten-de que um sistema vivo est constantemente se autoproduzindo, autorregulan-do sua forma de existir em resposta aos desafios que seu meio estabelece. ParaMaturana, os seres vivos criam a si prprios provocados pelo contexto de vida,mas a partir de um movimento interno a esses seres vivos.

    A este processo de reao e autocriao em um meio, Maturana chama

    de conhecimento, pois preciso que os seres vivos tomem conhecimento dosdesafios impostos externamente para inventarem novas formas de ser inter-namente. Segundo essa abordagem, a realidade no captada por processomecnico de fora para dentro, mas estimula uma organizao interna elabo-rada autonomamente e capaz de apresentar novas relaes entre as partes decada ser e com o meio externo. O ser vivo entendido, ento, como capaz deconhecer, renovar-se e renovar seu meio. O autor argumenta ainda que cadaorganismo no est aberto recebendo o mundo e modificando-se diante dessarecepo, mas um sistema fechado que atua no mundo tomando conhe-cimento deste e a partir da se inventa e se transforma. Se fosse um sistemainteiramente aberto, o processo de mudana seria automtico e imediato semao do ser que recebe o mundo. Essa relao com o mundo no imediata,mas mediada por um processo que se identifica como conhecimento e requerlinguagem. A vida processo de conhecimento e criao permanentes.

    Essa tomada de conhecimento dos organismos a respeito do seu meio

    sugere uma comunicao e como condio para essa comunicao, um pro-

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    cesso de linguagem. Maturana entende que processos de linguagem so funda-mentais para a autopoiesis. Para ele, linguagem no processo exclusivamenteracional e lgico, mas constitudo por tudo o que caracteriza o organismo emsua capacidade de receber e expressar-se no mundo, com o mundo. Lingua-gem resulta da relao com o mundo, de forma que tambm no previsvel efixada para todas as relaes. conversa com o mundo que inclui movimento,emoo e lgica no caso dos seres humanos. O autor valoriza a origem eti-molgica da palavra conversa: do latim cum, que significa com, e verso, quesignifica voltar, revirar, revolver; mudar, alterar, e postula que estar vivo estar

    s voltas com outros seres e criar-se a partir desse movimento.A palavra conversar sugere, assim, estar s voltas em movimento de per-

    ceber o mundo e voltar-se para si mesmo modificando-se para continuar nomundo, criando permanentemente a vida, o modo de ser e estar vivo entre osdemais seres.

    A imagem do caminhar para si proposta por Josso (2004) aproxima-se daideia de autopoiesis formulada por Maturana, uma vez que aprender, conhecer,formar-se requer um movimento de voltar-se para si investigando condiesinternas para receber o mundo e para colocar-se no mundo.

    O que est em jogo neste conhecimento de si mesmo no apenascompreender como nos formamos por meio de um conjunto de expe-rincias, ao longo de nossa vida, mas sim tomar conscincia de que estereconhecimento de si mesmo como sujeito, mais ou menos ativo ou pas-sivo segundo as circunstncias, permite pessoa, da em diante, encarar

    o seu itinerrio de vida, os seus investimentos e os seus objetivos na basede uma auto-orientao possvel, que articule de uma forma mais cons-ciente as suas heranas, as suas experincias formadoras, os seus gruposde convvio, as suas valorizaes, os seus desejos e o seu imaginrio nasoportunidades socioculturais que soube aproveitar, criar e explorar, paraque surja um ser que aprenda a identificar e a combinar constrangimen-tos e margens de liberdade. (Josso, 2004)

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    Para os dois autores, temos a ideia de um sujeito que constri sua auto-nomia em uma dialtica que abarca o movimento de ir e vir do mundo para simesmo, processando relaes e modos de ser nessas relaes. Josso usa a ex-presso para que surja um ser que aprenda a identificar e a combinar constran-gimentos e margens de liberdade. O caminhar para si no implica esgotar-seem si mesmo, mas, ao contrrio, implica analisar as condies de abertura parareceber e aprender com essa abertura, para tomar conscincia do que me faltae me impele para o outro, para fora de mim. O processo de caminhar para si projeto para o decorrer da vida e inclui projeto de conhecimento daquilo que

    somos, pensamos, fazemos, valorizamos e desejamos na nossa relao conos-co, com os outros e com o ambiente humano e natural (Josso, 2004).

    Para fechar este captulo, registramos quatro tomadas de conscin-cia que resumem o processo de caminhar para si, segundo Josso: cons-cincia dos referenciais (saberes, ideologias, crenas) aos quais aderimos;conscincia da cosmogonia na qual nos inscrevemos e do seu carter cultu-ral; conscincia da nossa maior ou menor disponibilidade para com referenciaisnovos e conscincia das situaes, dos acontecimentos, dos encontros que co-locaram em questo ou fizeram evoluir os nossos referenciais, da crise episte-molgica que eles provocam e reajustamentos que foram feitos.

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    Captulo 2Memrias de formao

    Professor(a), o contedo principal deste captulo se refere s suas narra-tivas de formao. O exerccio autorreflexivo sobre as prprias trajetrias deformao, bem como sobre referncias e aprendizados conquistados na con-dio de educadores que so mediadores do conhecimento em Artes valori-zado para construo da conscincia sobre necessidades de formao e sobreo aperfeioamento profissional que decorre do aperfeioamento intelectual eesttico.

    Alm desse contedo principal seu discurso sobre sua formao re-gistram-se tambm referncias tericas que fundamentam a opo por focar

    memrias de formao como objeto de reflexo.No desenvolvimento do tema em questo, voc entrar em contato com

    suas trajetrias enquanto ser capaz de aprender com a experincia, pensar aexperincia e criar novas formas de ser profissional e educador no campo deArtes.

    Vdeo com audiodescrio

    http://edutec.unesp.br/images/stories/redefor/artes/paginavideos/paginavideos_audiodescricao.php?vdo=141248/3/arte_audiodesc_d1_t2&vdo1=141248/7/arte_audiodesc_d1_t2http://edutec.unesp.br/images/stories/redefor/artes/paginavideos/paginavideos_audiodescricao.php?vdo=141248/3/arte_audiodesc_d1_t2&vdo1=141248/7/arte_audiodesc_d1_t2
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    2.1. Narrativas sobre experincias de formao

    A mediao formulada por Josso como condio para o caminhar parasi est localizada na linguagem, por meio do processo de narrar-se autobiogra-ficamente. As narrativas biogrficas so formas que ajudam a compreender oque foi armazenado no esprito no processo de histria de vida dos educadores.

    A narrativa sobre a prpria experincia um recurso metodolgico frtilpara a compreenso de memrias de experincias de educadores. Frtil por-que potencializa o entendimento e as implicaes de determinadas prticasde trabalho por parte das pessoas envolvidas nos processos de formao, bemcomo do sujeito narrador.

    Aquele que narra no fica indiferente a sua prpria narrativa. Coloca-seem contato com sua singularidade e mirada interior, e ao faz-lo toma para sio contedo de sua experincia para question-la e assumir uma posio deaprendiz. Portanto, a narrativa se apresenta como um movimento de investiga-o-formao nas questes que permeiam a pessoa, o profissional e sua vivn-cia sociocultural.

    A narrativa provoca perguntas, espantos, hipteses e inquietaes dura-douras que podem, em outros momentos, serem revisitadas. Elas se asseme-lham a essas sementes de trigo que durante milhares de anos ficaram fechadashermeticamente nas cmaras das pirmides e que conservam at hoje suasforas germinativas (Benjamin, 1993).

    As narrativas fiam conexes com outras prticas, com textos tericos, porisso elas se constituem em formas artesanais de comunicao. Escavam profun-didades e trazem tona as situaes fundamentais da condio humana, sejamelas grandiosas ou mesquinhas.

    As narrativas so deslocamentos, pois com elas podemos gerar novaspercepes dos outros, de ns mesmos e do modo como vivemos. As narrati-vas nos permitem viajar para lugares especialmente preparados, para territriosdesconhecidos ou pouco conhecidos, descobrindo novas paisagens e novosmodos de habitar. Trazem tona o desejo humano pelo que ainda no se sabe,no se conhece, no se viu.

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    Por mais que tenhamos refletido, lido, visto, vivido, estar frente a uma nar-rativa muito diferente, pois ela nos convida a expedies instigantes. Quais asferramentas fundamentais do nosso narrador nessa expedio? As ferramentasso a palavra, a escrita e a experincia. As palavras constituem o nosso mundo,so sinais, smbolos, produzem mensagens e alegorias. Tal como nos diz Man-guel (2008):

    As imagens que formam nosso mundo so smbolos, mensagens e alegorias.

    Ou talvez sejam apenas presenas vazias que completamos com o nosso dese-

    jo, experincia, questionamento e remorso. Qualquer que seja o caso, as ima-gens, assim como as palavras so a matria de que somos feitos.

    Mestres e aprendizes esto numa relao de palavra dividida ou partilhada o logos a dois.

    Quando o escritor escreve, o mistrio da palavra que se realiza o verbo que

    se faz carne e habita entre ns. Como o tecelo que tece pelo avesso, o escritor

    se rodeia e nos rodeia de sinais para que, sem que saibamos onde e quando, osentido se manifeste, como o desenho da tapearia, urdidura incompreensvel

    de fios. Toda arte segredo e mistrio. (Chaui, 1982)

    As palavras escritas nas vivncias cotidianas do acesso s explicitaes eexpectativas, resultantes de atividades, contextos, encontros que foram forma-dores e/ou transformadores de atitudes, de referenciais tericos e at mesmode posicionamentos e decises. As palavras reinventam o que j foi vivido. Essa

    construo exige certa disponibilidade para rever e reformular a escrita numprocesso permanente de tomada de conscincia, para situar os desafios, confir-mar ideias, abandonar conceitos, confrontar opinies e argumentos. A autoriado texto documenta o dilogo entre o pensar e o escrever. E, ao faz-lo, evi-dencia os componentes da subjetividade e os focos de sua construo. Pensar garimpar ideias e compreenses de uma experincia obscura que se oferecepara ns.

    Escrever tomar posse de um recorte da realidade e deixar marcas. o

    exerccio ativo de movimentar o pensamento.

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    O processo da escrita resgata memrias de vrios tempos. Permite que aspalavras ganhem forma, nome e realidade.

    E o narrador? Nas palavras de Walter Benjamin (1993):

    O narrador trabalha a matria prima da experincia a sua e a dos outros

    transformando-a num produto slido e nico [...] Recorre ao acervo de toda

    uma vida (que no inclui apenas a prpria experincia, mas em grande parte a

    experincia alheia). O narrador assimila sua substncia mais ntima aquilo que

    sabe por ouvir dizer.

    Imprime-se na narrativa a marca do narrador como a pincelada do pintorna tela e o olhar do registrador na fotografia. O narrador utiliza fragmentos eresduos de acontecimentos, o que lhe toca, o que guarda em seu repertrio ecom ele cria percursos de dizer sobre o seu fazer. Nesse processo de registrar asexperincias acrescenta elementos de suas referncias prticas, tericas e cul-turais.

    A escritura pode ser comparada aos rios que cortam a terra e se inscrevem sobreo seio dos solos [...] se os rios so escrituras, navegar sobre eles, com eles ou con-

    tra eles, escritura dentro da escritura. Os rios so escritas mveis, a gua que

    corre sobre a terra, rasgando-a sobre a mata de madeira como a tinta que cor-

    re sobre o papel, desenhando marcas de sinuosidades, deixando a sombra do

    gesto. (Matuck, 2003)

    Aquele que escreve marca sulcos, deixa cicatrizes. O escritor constri o

    texto com o que tem, problematiza a partir de seu acervo e pesquisa para com-plementar a narrativa. Abriga reflexes epistemolgicas e formadoras das pr-ticas de escrita e narrativa de si, assinala possibilidades de transformao advin-das da experincia e tenta compreender sentidos impressos em suas vivncias.

    O narrador, ao inventariar experincias, expressa aquilo que lhe toca e,assim, alimenta a sua reflexo formadora atribuindo sentido ao que aprendeu.Aprende com sua viagem memorial a tomar distncia das situaes e dos acon-tecimentos para tornar-se leitor de sua prpria escrita e potencializar suas an-

    lises e compreenses.

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    Ao transformar a experincia em palavras, a primeira dificuldade do nar-rador esbarra na conscincia de que impossvel narrar tudo, narrar a inteirezada experincia. Narrar sempre uma deciso que seleciona, prioriza, escolhe oque contar. Justamente nesta escolha, neste recorte e no esforo terico por eleexigido reside o potencial reflexivo da narrativa. Trata-se de um trabalho quepe em jogo memria e decises sobre o memorvel. Trata-se de um trabalhodo pensar, de quem pensa e questiona o vivido.

    2.2. Como o professor aprende?

    Para iniciar este tpico, vamos registrar algumas referncias sobre oaprendizado dos adultos. A Andragogia foi definida por Malcolm Knowles (1913-1997), professor e pesquisador norte-americano das Universidades de Chicagoe Arkansas, como campo de estudos voltado a investigar aprendizados de adul-tos e para formular princpios que pudessem ajudar o adulto a aprender. Cientede que o aprendizado do adulto no difere substancialmente do aprendizadode crianas, Knowles chegou a indicar que os dois conceitos formariam um

    continuumentre educao centrada no adulto e educao centrada na criana.Identificou, pelo menos, cinco pressupostos-chave para a educao de adultose que mais tarde transformaram-se em referncias de pesquisas. O primeiropressuposto refere-se ao fato de que os adultos so motivados a aprender namedida em que experimentam que suas necessidades e interesses possam sersatisfeitos. Por isto, estes so os pontos mais apropriados para se iniciar a orga-nizao das atividades de aprendizagem do adulto.

    O segundo pressuposto afirma que a orientao de aprendizagem doadulto est centrada na vida; por isto, as unidades apropriadas para se organizarseu programa de aprendizagem so situaes de vida e no apenas disciplinasclssicas sobre contedos cientficos e filosficos.

    O terceiro pressuposto ou princpio da teoria de Knowles traz que a expe-rincia a mais rica fonte para o adulto aprender; por isto, o centro da metodo-logia da educao do adulto a anlise das experincias.

    O quarto pressuposto diz que adultos tambm tm necessidade de se-

    rem liderados por mediadores; por isto, o papel do professor engajar-se no

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    processo de mtua investigao com os alunos e no apenas transmitir-lhesinformaes e depois avali-los sem que possam analisar e problematizar infor-maes.

    E, finalmente, o quinto pressuposto diz que as diferenas individuais entrepessoas crescem com a idade; por isto, a educao de adultos deve consideraras diferenas de estilo, tempo, lugar e ritmo de aprendizagem.

    Pode-se afirmar que os pressupostos de Knowles no diferem funda-mentalmente das abordagens da Psicologia Cognitiva sobre o aprendizado dascrianas. Destacamos, porm, que se no caso das crianas h grande valoriza-

    o do universo cultural e dos saberes da experincia para o dilogo com osaber escolar, no caso dos adultos essa valorizao se intensifica pelo simplesfato de que o adulto conta com amplo repertrio de experincias e saberes emdiferentes campos do real.

    A partir daqui, focaremos como o professor aprende.O grupo de pesquisas liderado pela profa. dra. Vera Placco da PUC de So

    Paulo pesquisou e publicou sua contribuio em 2006, apresentando condi-es para o aprendizado do professor.

    Segundo essa investigao, os professores vivem os seguintes processospara elaborar aprendizados: processos em torno da subjetividade, processosem torno da memria e processos de metacognio. Todos esses processosso mediados pela intencionalidade de quem aprende para se reverterem emaprendizado de fato.

    Subjetividade entendida como caracterstica prpria de cada um empermanente constituio, construda nas relaes sociais, que permite pessoa

    um modo prprio de agir, de pensar, de ser no mundo, modo que a faz atri-buir significados e sentidos singulares s situaes vividas (Placco; Souza, 2006,p.43). A referncia para a compreenso do processo de significao e sentidoest em Vygotsky, especificamente em sua obra Pensamento e linguagem. ParaVygotsky, o significado de cada palavra uma generalizao ou um conceito ecomo tal atividade do pensamento, pela palavra que significa temos acessoao pensamento.

    A relao entre o pensamento e a palavra um movimento contnuo

    de vaivm do pensamento para a palavra e da palavra para o pensamento. A

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    partir da contribuio do linguista francs Jean Paulham (1884-1968), Vygotskycompreende o significado como o aspecto estvel do pensamento, como oaspecto passvel de dicionarizao que resiste aos sentidos. So os conceitosproduzidos em todas as reas do conhecimento e tambm aqueles produzidosno cotidiano que unificam entendimentos, por isto tem carter mais objetivo.Compreende que os significados ganham sentidos em contextos especficos. Osentido a soma de todos os eventos psicolgicos que a palavra desperta emnossa conscincia. todo complexo e dinmico que relaciona imagens, emo-es, processos inconscientes e funda-se na subjetividade, no modo particular

    de pensar e falar.Memria funo e recurso para se estar no mundo, com o mundo, en-

    trelaando aprendizados. funo mental aliada percepo e ateno quepermite a construo de repertrio continente de signos, significados, sentidos,nossas histrias. Vygotsky (1999) lembra que a memria funo psicolgicacomplexa que permite a aprendizagem.

    A memria faz e refaz, afasta e aproxima. Utiliza objetos, indcios, imagens, pa-

    lavras como verdadeiros passaportes para cenrios de prazer, de alvio e de dor,trazidos para a situao atual. Ao interiorizar estmulos externos, por meio da

    mediao de carter simblico, a memria se amplia significativamente em re-

    lao a contedos culturais e emocionais. (Placco; SOUZA, 2006)

    Metacognio o processo pelo qual se torna consciente o aprendiza-do. Quando iniciamos este tpico com perguntas sobre como os professoresaprendem, propusemos um exerccio de metacognio.

    Metacognio um conceito proposto por John Hurley Flavell, psiclogoe professor norte-americano nascido em 1928. Dedicou-se Psicologia Cogniti-va, introduzindo a teoria de Piaget na Psicologia norte-americana. Seus estudosfocaram a compreenso da criana no desempenho de papis, a sua capacida-de de comunicao e o desenvolvimento de sua memria. John Flavell desen-volveu uma teoria sobre a metacognio e a metaconscincia, que consistena compreenso da criana relativamente ao funcionamento do pensamento

    humano e ao seu processo de reflexo. Flavell (1999) refere-se cognio sobre

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    a cognio, entendendo-se por cognio mais o processo de conhecimentodo que os conhecimentos resultantes desse processo. Assim, metacognio aatividade mental por meio da qual outros processos mentais se tornam alvo dereflexo e o sujeito torna-se um espectador de seus prprios modos de pensare das estratgias que emprega para resolver problemas, buscando identificarcomo aprimor-los.

    2.3. Mestres e referncias gerais para a formao

    No desenvolvimento deste captulo, at o momento, valorizou-se a cons-cincia sobre o sujeito que aprende em movimento de olhar para si mesmoperguntando-se sobre experincias consideradas mais relevantes e modos deaprender do professor. Neste terceiro tpico, propomos um movimento de sa-da de si e perguntamos com quem aprendemos, onde aprendemos. Pergunta--se por referncias externas que nos mobilizam como educadores a procurar-mos melhores lugares para aproximar alunos de conhecimentos em arte.

    Se concordamos com Rousseau (2004), em sua obra Emlio, ou Da edu-

    cao, escrita em 1762, que afirma que aprendemos com a natureza, com osoutros homens e com as coisas, temos trs mbitos ou contextos relacionaispara aprender.

    A natureza nos oferece o ritmo vital e os desafios de nossa condio bio-lgica. Com ela aprendemos sobre ciclos de vida e de morte, de tempo e espa-o, de reproduo, de possibilidades e de limites de um corpo.

    A tradio filosfica conta com vasta literatura a nos alerta sobre essa

    insero. Destacamos Descartes (1596-1650) e Pascal (1623-1662):

    E, primeiramente, no h dvida de que tudo o que a natureza me ensina con-

    tm alguma verdade. [...] Ora, nada h que esta natureza me ensine mais ex-

    pressivamente, nem mais sensivelmente do que o fato de que tenho um corpo

    que est mal disposto, quando sinto dor, que tem necessidade de comer ou de

    beber, quando nutro sentimentos de fome e de sede, etc. E, portanto, no devo,

    de modo algum, duvidar que haja nisso alguma verdade.

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    A natureza me ensina tambm por estes sentimentos de dor, fome, sede, etc.

    que no somente estou alojado em meu corpo, como um piloto em seu navio,

    mas que, alm disso, lhe estou conjugado muito estreitamente e de tal modo

    confundido e misturado, que componho com ele um nico todo. [...]

    Alm disso, a natureza me ensina que muitos outros corpos existem em torno

    do meu, entre os quais devo procurar uns e fugir de outros. (Descartes, 1979)

    A primeira coisa que se oferece ao homem ao contemplar-se a si prprio, seucorpo, isto , certa parcela de matria que lhe peculiar. Mas, para compreen-

    der o que ela representa a fix-la dentro de seus justos limites, precisa compar-

    -la a tudo o que se encontra acima ou abaixo dela. No se atenha, pois, a olhar

    para os objetos que o cercam, simplesmente, mas contemple a natureza inteira

    na sua alta e plena majestade. Considere esta brilhante luz colocada acima dele

    como uma lmpada eterna para iluminar o universo, e que a Terra lhe aparea

    como um ponto na rbita ampla deste astro e maravilhe-se de ver que essa

    amplitude no passa de um ponto insignificante na rota dos outros astros que

    se espalham pelo firmamento. E se nossa vista a se detm, que nossa imagi-

    nao no pare; mais rapidamente se cansar ela de conceber, que a natureza

    de revelar. Todo esse mundo visvel apenas um trao perceptvel na amplido

    da natureza, que nem sequer nos dado a conhecer de um modo vago. Por

    mais que ampliemos as nossas concepes e as projetemos alm de espaos

    imaginveis, concebemos to somente tomos em comparao com a realida-

    de das coisas. [...] Afinal, que o homem dentro da natureza? Nada, em relaoao infinito; tudo, em relao ao nada; um ponto intermedirio entre o tudo e o

    nada. Infinitamente incapaz de compreender os extremos, tanto o fim das coi-

    sas quanto o seu princpio permanecem ocultos num segredo impenetrvel, e

    -lhe igualmente impossvel ver o nada de onde saiu e o infinito que o envolve.

    (Pascal, 2001)

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    Merecem destaque nos fragmentos dos dois autores:

    a afirmao enftica de que somos um corpo; a imagem de que a natureza nos ensina; a ideia de que convivo com outros corpos; a ideia de que fujo de alguns e de outros me aproximo; a ideia de que no vemos, no compreendemos nossos extremos:

    nem fim, nem princpio.

    Se Descartes traz a viso de conflito entre os homens, Pascal traz a ideiade nossa limitao frente natureza. Duas condies bsicas da existnciahumana que precisam ser enfrentadas para a compreenso do ser humano.Qualquer projeto educacional com vista preservao da natureza, e com estaa preservao da humanidade, requer conscientizao sobre nossos limites enossas necessidades enquanto seres corpreos que at o presente momentonada sabem sobre seu incio, seu fim e que vivem o dilema, ainda, entre preser-va-se ou destruir-se mutuamente.

    Retornando a Rousseau, alm de aprendermos com a natureza, apren-demos com os outros homens. Claro que um pensamento mais contempor-neo, que no dicotomiza homem e natureza, entrelaa esses dois mbitos deaprendizado. Porm, h um valor reflexivo e didtico em separarmos os dois.Neste momento, o que interesse que na categoria outros homens localizamosautores, alunos, pessoas de nossos afetos pessoais e colegas de profisso. Lo-calizamos, tambm, mestres presenciais em situao mais formal, como nossos

    professores, por exemplo. Localizamos os meios de comunicao e cada ser hu-mano que episodicamente encontramos e pode nos desafiar a pensar e buscarformas de entendimento ampliado da realidade.

    Cada agrupamento ou mesmo cada pessoa est circunscrita a contextossocioculturais, o que resulta em uma rede na qual os conhecimentos esto li-gados por pontos que se movem a cada toque e a cada novo posicionamentoda malha: o toque em um dos pontos implica em movimento dos demais. Ocorte em alguma de suas partes provoca uma lacuna a ser costurada, a ser res-

    tabelecida. Acompanha a metfora de conhecimento como rede a noo de

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    que nenhum n univocamente subordinado a outro ou outros, sendo sem-pre possvel diversos percursos alternativos para os trajetos entre os diferentespontos das redes.

    Essa dinmica de percursos entre os pontos favoreceria a no permann-cia em apenas alguns, nem a supervalorizao desta ou daquela teoria, desteou daquele conceito. Essa ideia de malha de saberes que se move como umtodo e em suas partes parece adequada por sugerir um determinado tipo derelao, no hierarquizada, entre os diversos conhecimentos necessrios e tam-bm por sugerir algo que se move e muda de forma a colocar em relao co-

    nhecimento e realidade.A noo de conhecimento como rede amplia os horizontes de um co-

    nhecimento estritamente enciclopdico/cientfico e permite uma aproximaocom a noo de saber que aliado conduta na vida. Que um dilogo entreconhecimento cientfico e saberes do senso comum. Que oportunidade derelaes entre saberes necessrios em dado momento e dado espao. No cor-po dessa rede insere-se o terceiro mbito citado por Rousseau: o aprendizadocom as coisas. As coisas criadas pelos homens por meio da arte, da tcnica, dacincia.

    Naturezas biolgicas e culturais compondo uma s rede na qual/com aqual se caminha para si e para o mundo.

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    Captulo 3Concepes fundamentais parao professor de Artes

    Trs campos conceituais configuram-se como centrais para a elaboraodos saberes dos professores de artes. O primeiro e mais amplo refere-seao campo da cultura. Esse campo ser trabalhado especialmente nas

    partes III e IV, sendo apenas introduzido neste momento como um dos con-ceitos centrais para a prtica do professor de Artes. Discutir representaes desenso comum e conceitos tericos sobre cultura constitui um dos compromis-sos iniciais para os professores de Artes, uma vez que toda produo artsticaest necessariamente articulada a um contexto cultural historicamente situado.

    O segundo conceito refere-se ao termo arte propriamente dito. Como os pro-fessores em formao concebem a arte? Elaborar saberes sobre a historicidadedesse termo e posicionar-se em um processo aproximativo do que arte exigncia sem a qual os professores correm o risco de reproduzir vises super-ficiais ou mesmo aprisionadoras da experincia artstica junto aos seus estu-dantes. Compreender a historicidade das palavras cultura e arte, deslocando-asdo singular para o plural culturas e artes ponto de partida fundamental,

    portanto, em um curso de especializao cujo objetivo preparar diretamenteos professores para implementao de poltica curricular. Todo currculo esco-

    Vdeo com audiodescrio

    http://edutec.unesp.br/images/stories/redefor/artes/paginavideos/paginavideos_audiodescricao.php?vdo=141248/4/arte_audiodesc_d1_t3&vdo1=141248/8/arte_audiodesc_d1_t3http://edutec.unesp.br/images/stories/redefor/artes/paginavideos/paginavideos_audiodescricao.php?vdo=141248/4/arte_audiodesc_d1_t3&vdo1=141248/8/arte_audiodesc_d1_t3
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    lar est embasado em viso ou vises de cultura e, no caso deste curso, emvises sobre arte, contedo privilegiado de ensino dos professores participan-tes. O terceiro campo de saberes relevante para a atuao dos professores aliaas perguntas: qual conceito de cultura queremos construir junto aos jovens daescola bsica no Brasil atual? Os saberes que se articulam para elaborao dasrespostas a estas perguntas compem o conjunto de utopias dos professoresno que diz respeito sua profisso; constituem o conjunto de argumentos emdefesa da profissionalizao e do lugar da arte no currculo da educao bsica.Este terceiro captulo est subdividido em trs tpicos: concepes sobre cul-

    tura; concepes sobre arte e utopias que cercam o ensino de arte: intenes eprojetos. Vamos a eles.

    3.1. Concepes sobre cultura: reflexo introdutria

    Algumas representaes de senso comum sobre cultura

    Eu no tenho cultura.ngela tem muita cultura.

    O educador precisa promover o acesso cultura.

    As periferias das cidades brasileiras no apresentam vida cultural.

    Os italianos so mais cultos que os moambicanos.

    Diante das representaes de senso comum, pode-se perguntar: Como foram elaboradas? Quais os pressupostos que as motivam?

    Um breve panorama histrico sobre diferentes compreenses sobre cul-tura ajuda a entender pressupostos presentes na viso de cultura que compare-ce em interpretaes do senso comum.

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    Vises hegemnicas sobre cultura: uma breve introduo

    Historicamente, a palavra cultura assumiu diferentes conotaes. Na An-tiguidade grega, era associada palavra paideia. Originalmente, essa palavrasignificava educao das crianas e evoluiu, a partir do sculo V a.C., ainda naGrcia antiga, para educao dos homens, dos cidados. Era marcada pelo idealde educao que aliava preparao tica para ser governante e para ser sdito,cidado. Alm do preparo na lngua, na msica e na ginstica, a paideia incluao preparo para o exerccio da cidadania, para tomar decises na polis. A partirdo sculo VI a.C. passa a designar o ideal de cultura que se amplia para toda aGrcia: o homem civilizado, capaz de conviver napolis.

    Na Antiguidade romana, a ideia de cultura era sintetizada na palavrahumanitas, cujo ideal era tornar o homem civilizado por meio do conhecimentode arte e filosofia romanas. A arte e a filosofia romanas foram marcadas pelacultura grega, uma vez que os romanos dominaram tambm a Grcia. Porm, apartir de Ccero (106- 43 a.C.),filsofo, orador,escritore poltico romano, formula-se o conceito de humanitas para distinguir a cultura romana das demais com

    empenho de se caracterizar o humano como romano e para universalizar osvalores culturais de Roma. Culto e civilizado, assim o homem que fala grego elatim, que conhece e vivencia as leis definidas pelo direito romano, que conheceos textos literrios e filosficos produzidos em Roma.

    Com a decadncia do Imprio Romano durante os sculos III, IV e V d.C.,ocorre, concomitantemente, a consolidao da Igreja Catlica no Ocidente eu-ropeu. Em 323 o imperador Constantino professa publicamente sua conversoao cristianismo. Em 325, realiza-se o Conclio de Niceia, que fixa os principaisdogmas da f e condena as primeiras heresias. Pode-se consider-lo como oato de fundao da Igreja Catlica. Em 380, por decreto do imperador Teodsio,o catolicismo torna-se religio oficial do Estado romano, j em decadncia. Aofinal do sculo IV, j se pode contar com uma Igreja Catlica organizada e oficialque deter o monoplio da cultura em todo o perodo medieval, traduzindo osfilsofos gregos e romanos e disseminando valores de referncia para definir ohomem civilizado ou culto.

    http://pt.wikipedia.org/wiki/106_a.C.http://pt.wikipedia.org/wiki/43_a.C.http://pt.wikipedia.org/wiki/Filosofiahttp://pt.wikipedia.org/wiki/Orat%C3%B3riahttp://pt.wikipedia.org/wiki/Literaturahttp://pt.wikipedia.org/wiki/Imp%C3%A9rio_romanohttp://pt.wikipedia.org/wiki/Imp%C3%A9rio_romanohttp://pt.wikipedia.org/wiki/Literaturahttp://pt.wikipedia.org/wiki/Orat%C3%B3riahttp://pt.wikipedia.org/wiki/Filosofiahttp://pt.wikipedia.org/wiki/43_a.C.http://pt.wikipedia.org/wiki/106_a.C.
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    O perodo medieval europeu marcado por uma viso de cultura que seexpande para os territrios conquistados na Amrica e na frica associado aoprocesso de dominao social do mercantilismo. Culto aquele que domina olatim, que se converteu ao cristianismo catlico e que identifica a Europa comoespao de produo da civilizao e o pensamento teocntrico como critriode verdade: Deus e Cristo so fontes explicadoras do mundo e servem de refe-rncia para formao humana.

    O perodo renascentista outro momento marcado por uma viso decultura que se impe como hegemnica a partir do mundo europeu. Renasci-

    mento corresponde a um grande movimento de mudanas culturais, vivencia-do na Europa Ocidental entre os sculos XIV e XVI, caracterizado pela retomadados valores da cultura greco-romana, com nfase na concepo antropocntri-ca, formulada como crtica viso teocntrica medieval. Da a defesa da razohumana, postulando o homem como critrio de verdade e explicao do mun-do. O mundo no explicado por Deus e precisa ser conhecido e explicadopelos critrios da razo humana. A ideia de que cada um responsvel pelaconduo de sua vida, a possibilidade de fazer opes e de manifestar-se so-bre diversos assuntos acentuaram gradualmente um individualismo. Outro va-lor importante para o pensamento renascentista o universalismo, segundo oqual o homem deve desenvolver todas as reas do saber. No decorrer do sculoXVI, a cultura renascentista expandiu-se para outros pases da Europa Ocidental,e para que isso ocorresse contriburam as guerras e invases vividas pela Itlia.As ocupaes francesa e espanhola determinaram um conhecimento melhorsobre as obras renascentistas e a expanso em direo a outros pases, cada um

    adaptando-o segundo suas peculiaridades, numa poca de formao do abso-lutismo e de incio do movimento de Reforma Religiosa. O sculo XVI foi mar-cado pelo mercantilismo e pelas grandes navegaes dos europeus em buscade novos mercados e territrios na Amrica e frica, processo que resultou emconfronto cultural e imposio violenta dos valores europeus aos americanose africanos.

    Herdeiro do Renascimento e do racionalismo que se impe a partir dosculo XVII, outro movimento que serve como paradigma cultural fundou-se

    no sculo XVIII e identificado como Iluminismo. O conjunto de descobertas

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    cientficas empreendidas no perodo que se estende do sculo XVI at o sculoXVII levou convico de que os esforos da razo so responsveis pelo pro-gresso histrico da humanidade. Formula-se a ideia de humanidade como in-tegrao de todos os povos, acima de diferenas tnicas, temporais e espaciais.Os escritos de Jean-Jacques Rousseau e dos enciclopedistas franceses foram osmais divulgados do movimento, e Francis Bacon, Descartes, Newton e Lockeso alguns dos filsofos e cientistas apontados como precursores. Para todos osiluministas a razo humana tem a possibilidade de dissipar a ignorncia, o erroe iluminar o caminho da cincia que pode conduzir a humanidade ao progres-

    so e ao bem-estar. Os ideais iluministas so associados a uma crtica racionalpropcia investigao cientfica e tecnolgica, ao humanitarismo e aos direitosuniversais do homem. O iluminismo propagou a mentalidade crescentementeorientada para a valorizao da cincia como campo de conhecimento exclusi-vamente autorizado para categorizar o mundo e oferecer referncias de leiturada realidade, para a crena na possibilidade de dominar a natureza e de coloc--la a servio do homem. A viso de cultura que se funda nesses pressupostos marcada por hierarquizao dos saberes, com os conhecimentos filosfico ecientfico assumindo lugares privilegiados em relao aos conhecimentos dosenso comum, elaborados no cotidiano dos cidados. Com o Iluminismo, tem--se a radicalizao da ideia de que a cultura patrimnio artstico, cientfico, fi-losfico que exerce papel civilizador para o mundo a partir da cultura europeia,entendida como depositria das expresses mais avanadas desse mesmo pa-trimnio. Portanto, a cultura europeia configura-se como aquela que merece edeve ser universalizada para realizar sua misso civilizatria.

    A viso contempornea de cultura contrape-se justamente a esse pro-cesso de universalizao cultural com valorizao e imposio de uma determi-nada cultura sobre as demais. A partir das investigaes realizadas nos camposda Sociologia e Antropologia, possvel uma crtica viso iluminista e euro-cntrica de cultura. Atualmente, pode-se afirmar que cultura o conjunto dosmodos de vida criados, adquiridos e transmitidos de uma gerao para outraentre os membros de determinada sociedade. a formao coletiva e annimade um grupo social e, nessa perspectiva, todas as sociedades humanas tm cul-

    tura e so dotadas de valor existencial no sentido de efetivamente abrigarem as

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    relaes que permitem modos de vida, solues para a vida e criao do viver.Se considerarmos a viso de tericos como Stuart Hall e Raymond Willians, queconceberam em seus trabalhos a cultura como um lugar de dilogo e conflitoentre culturas variadas e associadas a estratos particulares da sociedade, e noapenas como um espao simblico de dominao e reproduo das ideias do-minantes, temos um panorama frtil para pensarmos o encontro entre culturas.

    Michel de Certeau (1925-1986), filsofo e jesuta francs, ao analisar a his-toricidade da palavra cultura afirma que vrios so seus empregos:

    Modelo de homem: um homem culto.

    Patrimnio de obras a serem valorizadas. Imagem prpria a certos meios: cultura rural. Quadro de ideologias, mitos, comportamentos e instituies. Enquanto distino em relao ao inato: oposio sociedade e natureza.

    Tendo como fundamento a viso de cultura defendida por Certeau, po-de-se afirmar que a cultura humana maior que um tipo de vida: abarca diver-sos tipos de vida. Ele afirma: Primeira impresso, mal-estar constante: a cultura flexvel (Certeau, 1995, p.233), chamando ateno para historicidade da expe-rincia cultural, cada tempo e cada espao abarcam movimento de criao erecriao permanente dos modos de vida em sociedade. Diante de cada dife-rente cultura, vlido perguntar:

    por sua gnese, sua trajetria;por suas possibilidades de dilogos com outras culturas e outroscontextos;

    por seus movimentos e pelos conflitos que impelem seus movimentos.

    3.2. Concepes sobre arte: reflexo introdutria

    O contedo apresentado neste tpico apenas um recorte introdutriopara motivar o levantamento de suas representaes, professor(a), sobre artes.A anlise aprofundada sobre diferentes concepes de arte abarca tanto estaparte como a totalidade deste livro.

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    Em diferentes situaes de escuta de professores e estudantes, em expe-rincias de pesquisa e de formao, encontramos as seguintes afirmaes:

    1. Eu no levo jeito para arte.2. Grande parte da populao no tem acesso arte. 3. Na aula de Artes, pode-se descontrair e viver um momento mais

    divertido.4. A arte popular menos elaborada que a arte erudita.

    5. Na Bienal de Artes Visuais, muitas obras no podem ser conside-

    radas como arte.

    Sem a pretenso de exibir uma definio nica e restrita sobre o termoarte, vamos realizar o esforo de uma aproximao conceitual com o auxliode autores. O objetivo central desse esforo funda-se na necessidade de su-perar vises preconceituosas, perpassadas por imagens ideolgicas ancoradasno senso comum que possam prejudicar a formulao de objetivos associa-dos s prticas do ensino de Artes. Trata-se, pois, muito mais de um esforo dedesconstruo de significaes atribudas arte do que de uma tentativa dedefinio.

    A Filosofia da Arte oferece um panorama geral que pode comparecercomo informao neste incio de reflexo.

    Destacamos dois grupos de teorias: as teorias essencialistas e as teorias daindefinibilidade da arte.

    As teorias essencialistas defendem a existncia de propriedades essen-

    ciais comuns a todas as obras de arte e que s podem ser encontradas nasobras de arte. A obra de arte teria uma objetividade capaz de impor critriosuniversais para sua interpretao e valorao.

    As teorias da indefinibilidade da arte ou teorias crticas ao essencialismonegam esse carter objetivo e universal da obra de arte. Trs vertentes desta-cam-se nesta abordagem:

    1. A teoria do conceito aberto, de Morris Weitz (1916-1981), professor nor-te-americano da Universidade de Ohio, segundo o qual fechar o conceito de

    arte intil, uma vez que isso seria excluir a prpria noo de criatividade na

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    arte e na busca de conhecimento sobre arte. Para esse autor, cada poca, cadamovimento artstico, cada filosofia da arte tentou estabelecer o seu ideal quefoi contestado por uma nova teoria, alm disso, as teoria no chegam a umaviso definitiva sobre a arte, porque nenhuma obra de arte tem propriedadesnecessrias e suficientes capazes de silenciar interpretaes que neguem essasmesmas propriedades. Diz esse autor:

    Pretendo mostrar que a insuficincia das teorias no primariamente ocasiona-

    da por nenhuma dificuldade legtima originada, por exemplo, pela vasta com-

    plexidade das artes, a qual poderia ser corrigida por uma explorao e investi-gao complementares. As suas insuficincias bsicas residem antes numa m

    compreenso fundamental da arte. A teoria esttica toda ela est errada em

    princpio ao pensar que uma teoria correta possvel uma vez que adultera ra-

    dicalmente a lgica do conceito de arte. falsa a sua principal contenda de que

    a arte susceptvel de uma definio real ou de outro tipo de definio verda-

    deira. A sua tentativa de descobrir as propriedades necessrias e suficientes da

    arte logicamente ilegtima pela simples razo de que nunca aparecer um tal

    conjunto de propriedades nem, consequentemente, a sua frmula. A arte, talcomo a lgica do conceito mostra, no tem nenhum conjunto de propriedades

    necessrias e suficientes; logo, uma teoria acerca dela logicamente impossvel

    e no apenas factualmente impossvel. A teoria esttica tenta definir o que no

    pode ser definido no sentido requerido. (Weitz, 1956)

    2. A teoria institucional de George Dickie (1926, EUA), professor da Univer-sidade de Illinois, afirma que o mundo da arte, as escolas, as sociedades dizem

    o que arte historicamente, no existindo uma definio universal, vlida paratodos os contextos.

    3. A teoria Simblica de Goodman

    (1906-1998), professor de Harvard, nopergunta o que arte, mas quando h arte. arte quando provoca sensibilidade,conhecimento e questionamento de padres estticos. Para Goodman (1995),todos os objetos podem funcionar como smbolos estticos; a arte assume v-rios modos de ser, assim como o mundo. No h uma nica definio de arte

    porque muitas descries podem dizer a arte.

    http://pt.wikipedia.org/wiki/1906http://pt.wikipedia.org/wiki/1998http://pt.wikipedia.org/wiki/1998http://pt.wikipedia.org/wiki/1906
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    Desde que o mstico est preocupado com o modo como o mundo e ele

    sabe que o modo no pode ser expresso, sua ltima resposta questo sobre

    o modo como o mundo deve ser, como ele reconhece, o silncio. Como eu

    estou mais preocupado com os modos como o mundo , minha resposta deve

    ser construir uma ou mais descries. A resposta questo Qual o modo

    como o mundo ? Quais so os modos como o mundo ? no o emudeci-

    mento, mas uma tagarelice. (Goodman, 1972)

    Acrescentamos ainda nesta reflexo introdutria sobre arte a contribui-

    o de mais dois autores perfilados com uma viso contempornea. So elesLuigi Pareyson e Imanol Aguirre Arriaga, em seus respectivos textos: Os proble-mas da esttica (2001)e Contenidos y enfoques metodologicos de la educacion ar-tstica (2007).

    Luigi Pareyson (1918-1991) foi um filsofo italiano com relevante produoem Esttica. Para ele, mais importante do que apresentar uma definio de arte compreender que arte construo, conhecimento e expresso.

    Construo, pois a palavra latina ars gera em portugus arte e ambas

    esto na raiz do verbo articular: unir partes de um todo, construir um todo. Arte produo que exige tcnica, mas no se reduz tcnica. Supe trabalho detransformao e criao e no de mera cpia do real, pois mesmo as cpiasrecriam, transformam matrias e formas. Arte um fazer que contempla regrasde linguagem, tcnicas de criao para superao de limites, em dilogo com arealidade para criar outras realidades.

    Arte conhecimento, pois o termo alemo para arte Kunstque se apro-xima do termo ingls know, do prprio latim cognoscoe do grego gignosco. Sotermos derivados da raiz gno, que significa saber terico ou prtico. Arte tam-bm expresso, pois cria formas para dizer e formas para exteriorizar emoese conceitos. Desta maneira, evitando enclausurar a arte em um nico conceito,o autor defende que imitar ou transformar o real, criando formas (construo) esignificados que geram sentidos e provocam perguntas (conhecimento), bemcomo criar formas de dizer e externar emoes e conhecimentos (expresso)so atributos do fazer artstico.

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    Imanol Aguirre Arriaga, professor da Universidade Pblica de Navarra, Es-panha, tambm colaborador do Instituto de Artes da Unesp, apresenta duasafirmaes para uma aproximao ao entendimento da palavra arte: como re-lato aberto e como condensado de experincias. Como relato aberto porque construo narrativa que elege certos elementos para construir significados,deixando outros de fora. Esse processo seletivo sugere perguntas associadas srazes pessoais e culturais que motivam esta ou aquela seleo, mais do queperguntas sobre o que arte em termos de uma definio geral. A partir deJohn Dewey e Roland Barthes, Arriaga afirma sua convico de que preciso

    despojar a arte e suas obras da dimenso transcendental na qual a tradio mo-derna as havia colocado e compreend-las como relato aberto, como investiga-o criativa e condensado de experincias que permite a compreenso da artecomo materializao esttica de todo um sistema de crenas, valores, formas,projetos e sensibilidades individuais e coletivas (Aguirre, 2007).

    Diante de cada linguagem ou relato artstico assim entendido, podemosnos perguntar:

    por sua gnese e sua trajetria; por suas possibilidades intertextuais; pelos questionamentos que provoca; por seus contextos ou redes de valores e relaes que fazem existir a

    arte, quem a cria e quem a interpreta.

    3.3. Utopias que cercam o ensino de Artes: intenes e projetos

    Para finalizar este captulo e as reflexes desta parte do livro, convm di-recionar o levantamento das representaes de vocs, professores, para identi-ficar suas expectativas relativas profisso e ao ensino de Artes.

    Dois pressupostos motivam esse direcionamento: os professores elabo-ram intenes e projetos sobre sua profisso e cultivam propsitos a respeitode sua rea de conhecimento. Incluir tais propsitos e projetos nos debates emtorno da construo curricular justifica-se porque as expectativas dos professo-

    res so acionadas, provocadas diante das demandas institucionais que articu-

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    lam projetos mais amplos, no apenas para o sistema escolar como tambmpara a sociedade. A efetiva experincia do currculo em ao entrelaa diversosprojetos: de cada educador, da instituio, da sociedade e de cada estudantetambm.

    Todo processo formativo voltado para a implementao curricular exigea explicitao de tais expectativas, ainda que inicialmente no assumam a con-figurao de um projeto.

    Uma palavra merece ser considerada com mais ateno quando o objeti-vo evidenciar intenes dos professores: trata-se da palavra projeto.

    Para uma aproximao ao conceito de projeto, convidamos o professorNilson Jos Machado com um fragmento que associa capacidade de projetar auma das marcas do humano.

    A ideia de projetoNota 1

    A palavra projetocostuma ser associada tanto ao trabalho do arquiteto

    ou do engenheiro quanto aos trabalhos acadmicos ou aos planos deao educacional, poltica ou econmica. Em todos os casos, dois soos ingredientes fundamentais sem os quais no se pode ter seno umaplida ideia do significado de tal palavra: futuro (antecipao) e abertura(no determinao). Como esboo, desenho, guia da imaginao ousemente da ao, um projeto significa sempre uma antecipao, umareferncia ao futuro. Distingue- se, no entanto, de previso, de uma visoprospectiva ou uma conjectura, que so, muitas vezes, efetivamente,

    representaes antecipadoras, mas que no dizem respeito, de modoalgum, a um futuro a realizar, anunciando simplesmente acontecimentossusceptveis de ocorrer, ou uma previso sobre evolues possveis doreal, passveis de serem consideradas na elaborao das estratgias dosatores, mas que no se constituem necessariamente em realizaes dosmesmos. Por outro lado, uma concepo rigorosamente determinstica

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    do real elimina completamente a ideia de projeto; o segundo elementoconstituinte de tal ideia a permanente abertura para o novo, para ono determinado, para o universo das possibilidades, da imaginao, dacriao. Sem dvida, no h projeto sem futuro e, simetricamente, namedida em que a realidade uma construo humana, pode-se afirmartambm que no h futuro sem projeto.

    A capacidade de elaborar projetos pode ser identificada como acaracterstica mais verdadeiramente humana; somente o homem

    capaz no s de projetar como tambm e primordialmente de viversua prpria vida como um projeto. Marx recorreu ideia de projetopara distinguir o trabalho humano da atividade de uma aranha oudas construes de um castor. Mais recentemente, nos debates sobreo significado da inteligncia e a possibilidade de uma IntelignciaArtificial, novamente a capacidade de ter vontades, iniciativas, de criar,de cultivar sonhos ou iluses, em outras palavras, de ter projetos, temsido considerada a caracterstica humana distintiva, tanto em relao

    aos animais como em relao s mquinas. Um computador, por maissofisticao que venha a ostentar, ainda que possa vir a realizar certasoperaes similares s realizadas pela mente humana, jamais alimentarsonhos ou iluses, nunca ser capaz de ter projetos pessoa