Um Mito para as RRPP

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1 CIÊNCIAS SOCIAIS APLICADAS - Comunicação Social UM MITO PARA AS RELAÇÕES PÚBLICAS Autor: MÔNICA COSTA BANDEIRA Instituição: União das Faculdades dos Grandes Lagos - Unilago Orientador: Sandra Regina Chalela Ayub Resumo As profissões, nos dias de hoje, são representadas e identificadas por um símbolo e este, normalmente está associado a um mito. No entanto, na profissão de Relações Públicas encontramos apenas o símbolo, golfinho, que não está associado a um mito. Assim, o presente artigo tem como objetivo encontrar um mito com características que propiciem uma compreensão das responsabilidades e experiências relacionadas à profissão de Relações Públicas. Para tanto, foi feito um levantamento bibliográfico para comparação do mito proposto com as funções e perfil requerido aos profissionais de Relações Públicas. Introdução Após uma extensa pesquisa, informal, foi observado que a maioria das profissões possui um símbolo e/ou um mito (seja através dos santos católicos ou deuses gregos-romanos) que as identificam, protegem e guiam. Atena, por exemplo, é a deusa grega que simboliza a sabedoria e a justiça e, conseqüentemente, protege os Advogados. Há santos protetores para os jornalistas, publicitários, médicos, lavadeiras, enfim, para tantas profissões quanto se possa imaginar. O fato curioso é que para as Relações Públicas, encontramos apenas um símbolo, que não está ligado ao mito. O golfinho, por ser considerado uma das espécies mais comunicativas, além de terem a sabedoria de prosperar em ambientes difíceis e estarem sempre vigilantes é o símbolo das Relações Públicas. Tais características estão ligadas a descobertas científicas, sem nenhuma relação mítica, lendária ou histórica. Diante do problema, procurou-se encontrar para a profissão de Relações Públicas, uma personagem que pudesse cumprir com as quatro funções básicas do mito, segundo Campbell (1990, p. 32): a) Função Mística: abrir o mundo para a dimensão do mistério, para a consciência do mistério; b) Função Cosmológica: mostrar qual é a forma do universo, de maneira que o mistério se manifeste; c) Função Sociológica: dando suporte e validação de determinada ordem social;

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Após uma extensa pesquisa, informal, foi observado que a maioria das profissões possui um símbolo e/ou um mito (seja através dos santos católicos ou deuses gregos-romanos) que as identificam, protegem e guiam. O fato curioso é que para as Relações Públicas, encontramos apenas um símbolo, que não está ligado ao mito: o golfinho. Diante do problema, procurou-se encontrar para a profissão de Relações Públicas, uma personagem que pudesse cumprir com as quatro funções básicas do mito, segundo Campbell (1990, p. 32): função mística; função cosmológica; função sociológica; função pedagógica.

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CIÊNCIAS SOCIAIS APLICADAS - Comunicação Social

UM MITO PARA AS RELAÇÕES PÚBLICAS

Autor: MÔNICA COSTA BANDEIRA

Instituição: União das Faculdades dos Grandes Lagos - Unilago Orientador: Sandra Regina Chalela Ayub

Resumo As profissões, nos dias de hoje, são representadas e identificadas por um símbolo e este, normalmente está associado a um mito. No entanto, na profissão de Relações Públicas encontramos apenas o símbolo, golfinho, que não está associado a um mito. Assim, o presente artigo tem como objetivo encontrar um mito com características que propiciem uma compreensão das responsabilidades e experiências relacionadas à profissão de Relações Públicas. Para tanto, foi feito um levantamento bibliográfico para comparação do mito proposto com as funções e perfil requerido aos profissionais de Relações Públicas.

Introdução Após uma extensa pesquisa, informal, foi observado que a maioria das profissões possui um símbolo e/ou um mito (seja através dos santos católicos ou deuses gregos-romanos) que as identificam, protegem e guiam. Atena, por exemplo, é a deusa grega que simboliza a sabedoria e a justiça e, conseqüentemente, protege os Advogados. Há santos protetores para os jornalistas, publicitários, médicos, lavadeiras, enfim, para tantas profissões quanto se possa imaginar. O fato curioso é que para as Relações Públicas, encontramos apenas um símbolo, que não está ligado ao mito. O golfinho, por ser considerado uma das espécies mais comunicativas, além de terem a sabedoria de prosperar em ambientes difíceis e estarem sempre vigilantes é o símbolo das Relações Públicas. Tais características estão ligadas a descobertas científicas, sem nenhuma relação mítica, lendária ou histórica. Diante do problema, procurou-se encontrar para a profissão de Relações Públicas, uma personagem que pudesse cumprir com as quatro funções básicas do mito, segundo Campbell (1990, p. 32):

a) Função Mística: abrir o mundo para a dimensão do mistério, para a consciência do mistério;

b) Função Cosmológica: mostrar qual é a forma do universo, de

maneira que o mistério se manifeste;

c) Função Sociológica: dando suporte e validação de determinada

ordem social;

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d) Função Pedagógica: ensinando a viver a vida sob qualquer circunstancia.

Objetivo Encontrar e associar um mito que, por suas características, propiciem uma compreensão das responsabilidades e experiências relacionadas à profissão de Relações Públicas.

Metodologia

O presente artigo foi elaborado através da revisão bibliográfica, pois tem por base resumir as referências relacionadas com o tema proposto e revelar a situação atual dos conhecimentos sobre o assunto. Para tanto, foram utilizados livros e meios eletrônicos com credibilidade e suficiência de dados.

Conforme explicam Barros e Lehfeld (2000), esse tipo de pesquisa pode levar à construção de trabalhos inéditos daqueles que pretendem rever, reanalisar, interpretar e criticar considerações teóricas, paradigmas e mesmo criar novas proposições de explicação de compreensão de fenômenos das mais diferentes áreas do conhecimento.

Para desenvolver este artigo, foram utilizadas as Cartas do Jogo de Tarô, mais especificamente o Tarô Mitológico, o qual possui uma abordagem psicológica, arquetípica e, portanto, cheia de significados. Através do estudo dessas Cartas, buscou-se um mito que traduzisse na sua essência a função das Relações Públicas. Em alguns momentos, também utilizamos alguns fundamentos do Tarô de Marselha.

1. Definição De Mito

“O mito é capaz de capturá-lo”, afirma Campbell (1990, p. 3) quando questionado sobre o porque damos valor aos mitos. E prosseguia, sabiamente, explicando esse valor:

[...] não estamos familiarizados com a literatura do espírito. Estamos interessados nas notícias do dia e nos problemas do momento. [...] Quando um dia você ficar velho e, tendo as necessidades imediatas todas atendidas, então se voltar para a vida interior, aí bem, se você não souber onde está ou o que é esse centro, você vai sofrer. [...] Muitas histórias se conservava, de hábito, na mente das pessoas. Quando a história está em sua mente, você percebe sua relevância para com aquilo que esteja acontecendo em sua vida. Isso dá perspectiva ao que lhe está acontecendo. Com a perda disso, perdemos efetivamente algo, porque não possuímos nada semelhante para pôr no lugar. Esses bocados de informação, provenientes dos tempos antigos, que têm a ver com os temas que sempre deram sustentação à vida humana, que construíram civilizações e enformaram religiões através dos séculos, têm a ver com os profundos problemas interiores, com os profundos mistérios, com os profundos limiares da travessia, e se você não souber o que dizem os sinais ao longo do caminho, terá de produzí-los por sua conta. Mas assim que for apanhado pelo assunto, haverá um tal senso de informação, de uma ou outra dessas

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tradições, de uma espécie tão profunda, tão rica e vivificadora, que você não quererá abrir mão dele (CAMPBELL, 1990, p. 3-4).

Para Campbell (1990, p. 6) os “mitos são pistas para as

potencialidades espirituais da vida humana” e podem ensinar ao homem a “se voltar para dentro”, a “captar a mensagem dos símbolos”, “a colocar sua mente em contato com essa experiência de estar vivo”.

Já para Sharman-Burke e Greene (1988, p. 12) “as imagens míticas são na realidade quadros, figuras ou representações espontâneas, provenientes da imaginação do homem, que descreve em linguagem poética as experiências fundamentais e padrões do seu desenvolvimento”.

Assim, percebe-se que estamos cercados pelo mito: mitos do cinema, da música, da arte, da política, na religião. Mitos por todos os lados.

Mas afinal, o que é um mito? Segundo o Dicionário Aurélio, o mito pode ser:

1.Narrativa dos tempos fabulosos ou heróicos. 2.Narrativa na qual aparecem seres e acontecimentos imaginários, que simbolizam forças da natureza, aspectos da vida humana, etc. 3.Representação de fatos ou personagens reais, exagerada pela imaginação popular, pela tradição, etc. 4.Pessoa ou fato assim representado ou concebido: Para muitos, Rui Barbosa é um mito. [Sin. (relativo a pessoa), nesta acepç.: monstro sagrado (q. v.).] 5.Idéia falsa, sem correspondente na realidade: As dívidas surgidas no inventário demonstram que a sua fortuna era um mito. 6.Representação (passada ou futura) de um estádio ideal da humanidade: O mito da Idade do Ouro. 7.Imagem simplificada de pessoa ou de acontecimento, não raro ilusória, elaborada ou aceita pelos grupos humanos, e que representa significativo papel em seu comportamento. 8.Coisa inacreditável, fantasiosa, irreal; utopia: A perfeição absoluta é um mito. 9.Antrop. Narrativa de significação simbólica, transmitida de geração em geração e considerada verdadeira ou autêntica dentro de um grupo, tendo ger. a forma de um relato sobre a origem de determinado fenômeno, instituição, etc., e pelo qual se formula uma explicação da ordem natural e social e de aspectos da condição humana. 10.Filos. Forma de pensamento oposta à do pensamento lógico e científico.

Campbell (1990, p. 24-26) nos dá a definição que mais se adequa aos

propósitos desse trabalho:

[...] Um deus é a personificação de um poder motivador ou de um sistema de valores que funciona para a vida humana e para o universo – os poderes do seu próprio corpo e da natureza. Os mitos são metáforas da potencialidade espiritual do ser humano, e os mesmos poderes que animam nossa vida animam a vida do mundo. Mas há também mitos e deuses que têm a ver com sociedades específicas ou com as deidades tutelares da sociedade. [...] Precisamos de mitos que identifiquem o indivíduo, não com seu grupo regional, mas com o planeta.

Para Sharman-Burke e Greene (1988, p. 13) “o mito descreve padrões

da vida por meio de parábolas, estórias e representações iconográficas”

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2. Mito E Tarô

Porque utilizar o Tarô para encontrar um arquétipo ideal para as Relações Públicas? Porque suas cartas possuem os três tipos de simbolismos necessários para essa “viagem”, segundo explica Mebes (1980): o simbolismo das cores; simbolismo dos quadros e figuras geométricas; simbolismo dos números. Isso se fez necessário para ir além do estudo do mito puro e simples.

As Cartas de Tarô são compostas de 78 cartas, sendo 22 conhecidas por Arcanos Maiores e 56, denominadas Arcanos Menores. Para Mebes (1980, p. 11) “Arcanum é um mistério cujo conhecimento é indispensável para compreender um grupo determinado de fatos, leis ou princípios”. Devido esses fatores, a pesquisa iniciou-se com os Arcanos do Tarô.

De acordo com Sharman-Burke e Greene (1988), a origem do Tarô é desconhecida, mas muitas pessoas o ligam aos mistérios ocultos, dando-lhe muitas vezes uma imagem caricatural errônea. Na realidade não possuem nada de sobrenaturais, misteriosas ou de exclusividade esotérica. Acredita-se que originaram em rituais religiosos e dos símbolos do antigo Egito ou, ainda, de cultos misteriosos dos mitras, nas primeiros séculos cristãos, bem como de crenças célticas pagãs durante a Idade Média na Europa oriental. Porém, as evidências históricas, através do Baralho de Carlos VI e do Baralho Visconti-Sforza, revelam que as cartas do Tarô foram pintadas na metade do século XV na Europa, mais especificamente na Itália, e eram de livre acesso a todos aqueles que as pudessem comprar.

Segundo Mebes (1989, p. 12) “o Tarô é considerado um esquema da cosmovisão dos iniciados da antiguidade”.

Conforme explica Lerrer (2007), existem diversos tipos de Tarôs, sendo o de Marselha, datado do final do século XV, na França, o que possui a simbologia mais próxima da cultura ocidental.

[...] pouquíssimo se sabe a respeito da história das cartas do Tarô ou a respeito da origem e da evolução das designações de naipe e do simbolismo dos vinte e dois Trunfos. Mas as muitas hipóteses imagiativas que se referem ao advento das cartas e às numerosas visões e revisões inspiradas pela sua simbologia pictórica constituem uma prova da sua atração universal e demonstram o seu poder de ativar a imaginação humana. [...] Parece evidente que essas velhas cartas foram concebidas no mais profundo das entranhas da experiência humana, no nível mais profundo da psique humana. [...] As figuras nos Trunfos do Tarô contam uma história simbólica. [...] Podemos fazer melhor a conexão com o seu significado através da analogia com mitos, contos de fadas, dramas, quadros, acontecimentos históricos, ou qualquer outro material com motivos similares, que evocam universalmente grupos de sentimentos, instituições, pensamentos ou sensações. [...] As figuras do Tarô estão sempre presentes em nossa vida de várias maneiras (NICHOLS, 1980, p. 21-24).

No presente artigo foi utilizado o Tarô Mitológico, criado por Sharman-

Burke e Greene em 1998, redesenhado por Tricia Newell, com inspiração nos deuses gregos ambivalentes e símbolos perfeitos da natureza humana e buscando uma abordagem histórica e psicológica.

O Tarô pode ser considerado um “livro” de mensagens, já que cada carta possui uma simbologia muito profunda. Sendo assim, ele é evidentemente um instrumento da comunicação.

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2.1 Um Estudo Sobre O Arcano 14 Do Tarô Mitológico

De acordo com Mebes (1980, p. 282), “Os três títulos do Arcano XIV são: ‘Deductio’, ‘Harmonia mixtorum’ e ‘Reversibilitas’. Na linguagem erudita esta imagem é chamada ‘Ingenium Solare’, e na linguagem comum – ‘A Temperança’. Portanto, o domínio desse Arcano, seu fruto é a capacidade de sintetizar”.

Mebes (1980, p. 283) também faz uma análise aritmética do Arcano:

14= 1+ 13. Hermes Trismegisto (1), possuidor do princípio da imortalidade (13) apresenta um grandioso quadro geral da dedução (14). Um ser humano tridimensional (1), utilizando com sabedoria suas encanarções (13), acaba realizando a harmonia hermética (14).

Mebes (1980, p. 283), destaca que “a finalidade da dedução é

equilibrar a racionalidade de todas as nossas conclusões, estabelecer um sistema completo de associações, dispensando a necessidade de procurar as causalidades isoladas”.

O Arcano 14 é intitulado “A Temperança” que, além de ser uma virtude, significa equilibrar, colocar sob limites.

Segundo Nichols (1980, p. 32; 34), “A Temperança” é uma figura prestimosa, um anjo que se ocupa incansavelmente do trabalho de “deitar o líquido de um vaso em outro”, “absorta em criar uma interação equilibrada”, fazendo com que o “herói” volte a ter energia e esperança “numa nova direção”.

Para Nichols (1980), ela é um alquimista capaz de romper com as velhas formas e desatar os nós mais rígidos.

No Tarô Mitológico, o Arcano 14 (fig. 1) é representada pela deusa Grega Íris, que, incansavelmente, busca o equilíbrio, o saber lidar com os conflitos dos relacionamentos e as possibilidades de unir o que está teoricamente separado.

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Figura 1 – Arcano 14, A Temperança, do Tarô Mitológico de Sharman-Burke e Greene (1998) Analisando as cores e imagens presentes na Carta (Fig.1), de acordo

com as características descritas por Sharman-Burke e Greene (1998, p. 52), tomando por base os textos encontrados em meio eletrônico de Porto (2007) e Sakall (2007), podemos entender o seguinte:

• “Uma jovem de fartos cabelos pretos, soltos ao vento”: simbolicamente,

cabelos representam principalmente força e poder. Cabelos soltos sugerem liberdade e soltura, o que vai de encontro com a figura alada, livre para voar e transitar por todos os reinos.

• “A Temperança usa um “lindo” vestido branco com as cores do arco-íris. Suas asas acompanham também a mesma escala de cores”: roupas brancas são associadas à limpeza, à pureza e à inocência. Nos países orientais, o branco é usado como uma cor adequada para a morte e o pesar, aceitando que a pessoa morta partiu do mundo físico para um plano espiritual mais puro. É a cor do desprendimento. Assim, o branco tem uma forte relação com a Temperança, seja pela pureza que lhe é associada (e para poder lidar com os conflitos do relacionamento há que se convir que é necessário ter certa pureza de coração) quanto pela relação da transição do mundo físico para o espiritual.

• Está de pé, às margens de um rio e um dos pés toca a água enquanto o outro está em terra firme: tal atitude demonstra perfeito equilíbrio, a união entre forças e naturezas opostas: a terra e a água, o masculino e o feminino.

• “Em primeiro plano, à esquerda, vemos uma íris de cor púrpura”: a cor violeta (mais próxima do púrpura) gera sentimentos como respeito próprio, dignidade e auto-estima; também pode refletir santidade, humildade e criatividade. A cor colocada em primeiro plano, pode sugerir que para lidar com a temperança, com o equilíbrio, com as situações conflitantes, faz-se necessário ter antes de mais nada as características sugeridas pelo significado da cor.

• “No horizonte, o arco-íris dá colorido especial à paisagem verdejante”: Novamente a cor verde que também compõe a imagem relaciona-se fortemente com o significado da Carta: equilíbrio, suavidade, calma, harmonia. Para que Íris alcance seu objetivo ela deverá estar envolta por um ambiente calmo, equilibrado e harmônico. Vale lembrar que o azul também compõe o ambiente onde Íris se encontra. O azul pode simbolizar a entrada nos domínios mais profundos do espírito. Possui um aspecto frio e, por sua quietude e confiança, promove a devoção e a fé. O azul é uma cor popular associada ao dever, à beleza e à habilidade. Relacionando-a a Íris, entendemos que trata-se justamente do dever de transportar as mensagens e à habilidade em promover a conciliação onde existir o conflito. Mais de uma vez, as sete cores que formam o arco-íris surgem no Arcano 14 e, como a própria descrição da Carta sugere, este é o símbolo da ligação entre o céu e a terra e, portanto, da promessa de renovação de relacionamentos.

• “Segura nas mãos duas taças, uma de ouro e outra de prata e está despejando água de uma para outra”: segundo Sharman-Burke e Greene (1980), o ouro simboliza o sol, o masculino, o consciente; a prata, a lua, o feminino e o inconsciente. A presença das duas cores na Carta sugerem fluxo dos sentimentos. A água é o princípio da vida. Representa a purificação, a regeneração, a profundeza e o infinito. Em quase todas as culturas, a água aparece como símbolo da força feminina e da emoção, associada à fertilidade e

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à vida. Fluir a água de uma taça para outra é buscar a harmonia através dos sentimentos, função principal de Íris.

• “O arco-íris”: por simbolizar uma ponte existente entre o céu e a terra, o arco-íris também sugere a idéia de relacionamento. O arco íris também simboliza algo bom que vem depois da tormenta, trazendo sorte e felicidade. Neste caso, sua presença pode apontar para a finalização do conflito, desde que ocorra a mediação entre os opostos.

2.2 Um Estudo Sobre O Arcano 14 Do Tarô Mitológico

Passamos agora a descrever a deusa Íris, de acordo com Sharman-Burke e Greene (1988, p. 52-55)

Íris, a deusa grega do Arco-Íris, mensageira de Hera, representa o lado feminino de Hermes, emissário de Zeus.

Era adorada pelos deuses e pelos mortais, por seu amor e bondade. Quando Hera ou Zeus desejavam transmitir seus desejos aos homens,

Íris descia à terra pelo arco-íris, na forma humana ou surgia como uma linda mulher alada.

Por poder caminhar pelas águas e pelo arco-íris (que ligava o céu e a terra), até o mundo das trevas se abria para ela.

Era Íris quem recepcionava os deuses com néctar e ambrósia, quando estes voltavam ao Olímpo depois de suas viagens.

Além de levar as mensagens de Hera, também tinha a missão de ser o agente cumpridor de suas vinganças e, ainda, consolar e pacificar os povos.

Íris representa o coração equilibrado, a temperança, a misericórdia, sem ser piegas ou sentimental. Seu sentimento está relacionado à escolha refletida de um afeto. Seu principal propósito é a cooperação, a harmonia e a busca de um relacionamento melhor, fazendo com que as reações de conflito ou raiva encontrem uma melhor maneira para fluir. Assim, o sentimento é inteligente, racional como o pensamento.

Íris era uma deusa que não tinha inimigos e nos leva a refletir que precisamos conduzir com mais delicadeza o julgamento dos sentimentos – esquecendo a emoção racional ou o sentimentalismo piegas e hipócrita.

Seu grande ensinamento é a necessidade que o ser humano tem de redirecionar o fluxo dos sentimentos e dos relacionamentos através da harmonia e da cooperação.

3. Resultado: Estabelecendo Uma Comparação

Podemos verificar que Íris e a sua Temperança pode ser o mito que procuramos para ser patrono das Relações Públicas.

A análise foi feita apenas sobre os Arcanos Maiores, pois, segundo Sharman-Burke e Greene (1988, p. 15; 17), estes estão centrados em uma “viagem arquetípica da vida, que na realidade é a nossa grande viagem interior” e “descrevem tanto o momento interior do indivíduo num determinado trecho da vida, bem como a espécie de experiência que ele poderá encontrar na vida a nível externo”.

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As imagens das cartas do Tarô são símbolos antigos e evocam experiências de vida, pertencentes à condição humana e ao nosso próprio destino. E esses símbolos dão mais sentido e dignidade à vida, pois por meio deles é que nos damos conta de que muitos outros antes de nós já estiveram aqui nesse mundo e que, de um modo ou de outro, conseguiram atingir seus objetivos, à medida em que ultrapassaram todos os obstáculos no processo de crescimento e conseqüente enriquecimento como seres humanos. [...] Todas as cartas dos Arcanos Maiores são ritos de passagem. São estágios e processos dinâmicos e não simplesmente resultados ou quadros estáticos que permanecem inalteraldos (SHARMAN-BURKE; GREENE, 1988, p. 18)

A análise das 22 cartas dos Arcanos Maiores (Trunfos), nos levou a

identificar o Arcano 14 – A Temperança e o mito relacionado a ela, como a legítima representante da profissão de Relações Públicas.

[...] as personalidades do Tarô introduziram-se em nossa auto-satisfação a fim de trazer-nos mensagens de grande importância; mas o homem moderno, imerso como está numa cultura verbal, acha a linguagem pictórica não-verbal do Tarô difícil de decifrar. [...] Uma viagem pelas cartas do Tarô, primeiro que tudo, é uma viagem às nossas próprias profundezas. [...] uma nova sabedoria é a grande necessidade do nosso tempo – sabedoria para resolver nossos problemas pessoais e sabedoria para encontrar respostas criativas às perguntas universais que a todos nos confrontam. (NICHOLS, 1980, p. 18).

Tomamos por base as explicações de Sallie Nichols (1980, p. 247-257)

para explicar as múltiplas facetas do inconsciente coletivo contidas nas cartas do Tarô e compará-las com as funções e características existentes no profissional de Relações Públicas.

O líquido que flui dos jarros é pura essência, energia, dois opostos que não podem confrontar-se diretamente, pois a situação decorrente poderia ser catastrófica. Assim, Íris ou a Temperança, exercem a perfeita função de árbitro, fazendo que as correntes fluam em harmonia, não apenas de forma lógica e racional, mas pela experiência, pelo conhecimento interior.

É isso que um bom Relações Públicas deve fazer: diante do conflito, agir como um árbitro, buscar soluções baseadas no conhecimento, na experiência, que leve dois opostos a se entenderem: o chefe que se comunica com seus funcionários, a empresa que mostra uma nova imagem ao cliente. É a interação dos opostos.

De acordo com Nichols (1980, p. 248), “O Anjo da Temperança não se anuncia com um fulgor de luzes ofuscantes nem com um fragor de címbalos. [...] posta-se diante de nós tranqüilamente, como uma presença permanente. [...] não encena entrada alguma. Limita-se a estar ali, entretido no afã de verter”.

É dessa forma que o Relações Públicas age: nos bastidores, sem o brilho da fama, sem a ambição do reconhecimento público.

Para Íris ou para a Temperança, a integração se dá através de ritos: verter a água de um jarro para outro.

O profissional de Relações Públicas também realiza seu rito: as pesquisas, as avaliações, as estratégias de comunicação, os planejamentos.

Íris ou a Temperança oferecem ao homem um auxílio vital, seja para sua realidade externa ou para sua jornada interior: leva o homem a reconciliar dois aspectos antagônicos de sua vida.

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E não é exatamente isso o que um Relações Públicas faz: reconcilia dois grupos diferentes através da comunicação, harmoniza públicos diferentes?

Se Íris ou a Temperança não interferirem nos universos do homem, a sua vida se tornará desorganizada e confusa, com resultados desastrosos.

O mesmo não ocorre quando a tarefa de Relações Públicas é relegada a segundo plano? As empresas necessitam de um “anjo” que cuide de suas relações e dos conflitos originados a fim de regular o fluxo de suas ações.

Conforme Nichols (1980, p. 254), embora ela seja alada, “está solidamente postada na realidade; [...] compartilha tanto do reino celeste quanto do terrestre, ligando-os”.

E assim trabalha um Relações Públicas, ligando e unindo os diversos públicos, utilizando de sua habilidade e perspicácia para interagir com os públicos alvos de suas ações.

“Temperar significa trazer a um estado adequado ou desejado pela combinação ou pela mistura. Temperamos o aço para torná-lo forte, porém flexível” (NICHOLS, 1980, p. 253).

Íris, o Anjo da Temperança e o Relações Públicas, nada mais são do que alquimistas capazes de reduzir toda a matéria ou qualquer outra substância a tal ponto que ela se torne pura e incorruptível – o ouro dos filósofos.

Além disso, o estudo sobre o Arcano 14 nos mostra que a sua palavra-chave é harmonia hermética, ou seja, uma qualidade fundamental para um profissional de Relações Públicas. A temperança deve ser a sua virtude e todas as suas ações devem buscar sempre o equilíbrio através da racionalidade e das associações.

Por fim, destacamos as principais características de Íris apontadas por Sharman-Burke e Greene (1988):

- sua principal função era ser mensageira e, para tanto, a comunicação fazia parte de sua essência;

- bondosa e amorosa no lidar com o conflito e com os envolvidos; - seu perfil de mensageira e excelente comunicadora é destacada

pelo fato dela poder transitar tanto na terra, como céu e nas trevas em qualquer momento;

- além da função de mensageira, também tinha como incumbências recepcionar e atender os deuses;

- era consoladora e pacificadora; - era equilibrada e buscava constantemente a harmonia, através da

racionalidade; - redirecionava o fluxo dos sentimentos e dos relacionamentos. Como podemos notar, todas as características acima descritas vão de

encontro ao perfil necessário para um Relações Públicas no exercício de seu trabalho.

Conclusão

Analisar a mitologia nos permite perceber que a comunicação é um fato presente e de grande importância desde os primórdios da humanidade. Até os deuses precisavam de alguém que intermediasse suas relações com os mortais, de maneira rápida e eficaz para que estes pudessem interpretar e entender as mensagens adequadamente.

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Os deuses gregos possuíam uma natureza humana e é essa humanidade que os aproxima dos homens em todos os sentidos.

Embora as Relações Públicas já possuam seu símbolo, o golfinho, este não tem o mesmo poder que um mito teria. É necessário buscar construir um arquétipo que trabalhe a psique dos profissionais, pois “as projeções são instrumentos úteis à conquista do autoconhecimento”, como afirma Nichols (1980, p., 26).

Associar a profissão das Relações Públicas a um mito, possibilita uma compreensão quase que divina das responsabilidades que serão impostas pela consciência daqueles que pretendem ingressar nessa área.

O mito da deusa Íris traduz muito bem, de maneira poética e arquetípica, o universo das Relações Públicas. Apontam o caminho que estes profissionais devem seguir no seu cotidiano: mediando conflitos, buscando harmonia e melhorando os relacionamentos, utilizando-se para isso não de uma fórmula mágica, mas de estratégias inteligentes e racionais que levem à cooperação e, conseqüentemente, à dissolução dos conflitos. Além disso, ao associar a imagem à profissão ocorrerá a possibilidade de um mergulho mais profundo às experiências que serão vividas por esses profissionais.

O arquétipo encontrado tanto no mito quanto nas simbologias encontradas na análise do Arcano 14, nos leva a afirmar que a deusa Íris dá significado, representação e, ainda, atua diretamente na psique dos profissionais de Relações Públicas. Nichols (1980, p. 34) ressalta muito bem essa importância ao afirmar que “[...]quando um ser humano adquire determinado grau de autopercepção, é capaz de fazer escolhas diferentes das da multidão e de expressar-se de um jeito só seu. [...] Será capaz de examinar costumes sociais e idéias correntes e adotá-los ou não, como bem entender. Estará livre para agir conforme as necessidades mais profundas e o mais verdadeiro eu”.

Referências Bibliográficas BARROS, A. J. S; LEHFELD, N. A. S. Fundamentos de metodologia científica - um guia para a iniciação científica. 2 ed. São Paulo.: Makron Books, 2000, p. 24.

CAMPBELL, J. O poder do mito. São Paulo: Palas Athena, 1990.

LERRER, D. O jogo que virou oráculo. Disponível em: <http://www.terra.com.br/planetanaweb/flash/335/guiacosmico/oraculos/jogo.htm>. Acesso em 02 ago.2007.

NICHOLS, S. Jung e o Tarô. Uma jornada arquetípica. São Paulo: Cultrix, 1980.

PORTO, A.; DIAS, C. O efeito de cada cor. Disponível em: <http://www.tci.art.br/cor/efeito.htm>. Acesso em 10 mai.2007.

SAKALL, S. E. Simbologia. Símbolos. Disponível em: <http://www.sergiosakall.com.br/montagem/simbolos.htm>. Acesso em 10 mai.2007.

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SHARMAN-BURKE, J.; GREENE, L. O Tarô mitológico. Uma nova abordagem para a leitura do Tarô. São Paulo: Siciliano, 1988.